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Ijuí (RS)
2016
MAX ARTUR ZINGLER SILVA
Ijuí (RS)
2016
AGRADECIMENTOS
Historicamente, o termo posse era utilizado para definir a relação dos homens com as
coisas que se estendia, inclusive, sobre as pessoas, confundindo-se com o conceito de
soberania. Considerando a existência da posse e propriedade como duas figuras jurídicas
distintas, surgia o instituto do usucapião. Entretanto, foi somente a partir do século XX que a
propriedade passou a ser entendida não mais como um direito individual e egoísta, mas um
direito que deveria ser capaz de promover o bem estar social e coletivo, surgindo, então, a
função social da propriedade. A responsabilidade do exercício da função social da
propriedade é do indivíduo, proprietário do imóvel, possibilitando que a propriedade atenda às
necessidades sociais, políticas e econômicas a que deve se destinar. Em não se observando tal
função, pode-se intentar a ação de usucapião especial urbana, desde que preenchidos
determinados requisitos constantes no ordenamento jurídico, tais como a situação da pessoa
jurídica, o domínio de outro imóvel, os limites da área de terreno ou de construção , as
áreas possíveis de usucapir e a impossibilidade de usucapir mais de uma vez. É desta forma,
portanto, que se organiza o presente estudo: o primeiro capítulo trata dos aspectos históricos
do usucapião, perpassando os conceitos de posse e propriedade, bem como a função social da
mesma; o segundo capítulo, por sua vez, abarca os requisitos para a ação de usucapião
especial urbana, supracitados. Utilizou-se de pesquisa bibliográfica para a coleta de
ensinamentos jurídicos necessários à construção deste estudo.
Historically, the term office was used to define the relationship of men with things that
stretched even on people, mingling with the concept of sovereignty. Considering the existence
of possession and ownership as two different legal figures, came the usurpation of the
institute. However, it was not until the twentieth century that the property has to be
understood not as an individual and selfish right, but a right that should be able to promote
social welfare and collective, emerging, then, the social function of property . The
responsibility of the exercise of the social function of property is the individual property
owner, allowing the property meets the social, political and economic needs that must be
intended. In not observing this function, you can bring the action of urban special adverse
possession, since met certain requirements in the law, such as the status of legal person, the
domain of another property, the boundaries of the land area or building, possible areas of
usucapir and the impossibility of usucapir more than once. It is in this way, therefore,
organized this study: the first chapter deals with the historical aspects of adverse possession,
passing the concepts of ownership and property as well as the social function thereof; the
second chapter, in turn, covers the requirements for the action of urban special adverse
possession, above. It used bibliographical research to collect legal lessons needed to build this
study.
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................6
CONCLUSÃO............................................................................................................... ..........28
A posse e propriedade de bens imóveis sempre fora tema controverso, estando à mercê
da vontade dos governantes e daqueles que detinham maior poder de capital durante muito
tempo da história. A posse, no Direito Romano, se estendia inclusive às pessoas, onde os
menos abastados eram considerados propriedades daqueles que possuíam melhores condições
financeiras e detinham, além de capital, poder social.
propriedade por determinado período e preenchendo, ainda, outros requisitos dispostos em lei,
podem reivindicar para si a propriedade efetiva daquele imóvel, através da ação de usucapião
especial urbana.
Ocorre, entretanto, que dentre destes dispositivos legais que entrelaçam a posse e a
propriedade dos bens imóveis, a questão da função social ou socioambiental permeia,
também, os aspectos relacionados à dignidade, uma vez que permite que indivíduos que não
possuam uma moradia para si e sua família possam se valer do instituto do usucapião para
garantirem a sua plena cidadania no contexto social.
Este é, portanto, o tema principal deste estudo: a usucapião especial urbana. Através
de uma metodologia pautada exclusivamente na revisão bibliográfica, buscou-se compilar o
conhecimento de diversos juristas brasileiros, tais como Coelho (2012), Gonçalves (2014) e
Venosa (2005), entre outros estudiosos reconhecidos no campo do Direito Civil. Ainda,
buscando enriquecer o presente trabalho, foram utilizadas fontes atuais, acessadas através da
internet, inclusive legislações atualizadas.
O presente trabalho foi organizado em dois capítulos. O primeiro deles versa a respeito
dos precedentes históricos da posse, da propriedade e, consequentemente, da possibilidade de
se usucapir imóvel de outrem. Tendo em vista esta evolução histórica, fala-se em seguida
sobre a função social da propriedade e o conceito de “casa” para a ação de usucapião,
entendendo-se a moradia como um fator fundamental para o pleno desenvolvimento da
cidadania e da observância do princípio da dignidade humana. Por fim, este capítulo aborda o
próprio conceito de usucapião especial urbana, uma constante no ordenamento jurídico
brasileiro.
públicos não são passíveis de usucapião e, por fim, a impossibilidade de uma mesma pessoa
intentar duas ações de usucapião, justamente pelo fato de que o objetivo deste instituto é a
garantia de um teto, de um lar, uma moradia, para o indivíduo e sua família e, segundo o
consenso dos doutrinadores e da própria sociedade, somente um espaço pode ser,
efetivamente, chamado de “lar”, ou “domicílio”, conforme o entendimento legal.
Historicamente, o termo posse era utilizado para definir a relação dos homens com as
coisas, desde o Direito Romano (NOBRE, 2013). O poder sobre as coisas se estendia,
inclusive, sobre as pessoas, através do "Pater Familias". Após a promulgação da Lei das Doze
Tábuas, os termos "posse" e "propriedade" passaram a ser utilizadas com significados
diferentes, assim utilizados até hoje.
Gonçalves (2014) coloca que o direito civil moderno edificou-se sobre as bases do
Direito Romano, responsável por estabelecer a estrutura da propriedade. Entretanto, como
bem coloca Coelho (2012), a posse a propriedade são conceitos jurídicos distintos,
exemplificando com o caso de um imóvel alugado. O proprietário não tem a posse, pois a
posse está com o locatário.
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A história não registra nenhuma etapa da evolução humana em que houvesse Direito,
mas não o direito de propriedade (COELHO, 2012, p.137). Inicialmente, a propriedade era
vista sob a ótica puramente individualista e foi desta forma mantido até o início do século XX,
quando “restrições foram impostas à onipotência do proprietário, proclamando-se o
predomínio do interesse público sobre o privado” (GONÇALVES, 2014, p.15).
Cabe ressaltar ainda que durante o período de vigência da Lei das XII Tábuas, a
aquisição da propriedade estava restrita apenas aos cidadãos romanos. Os séculos foram
passando e as fronteiras do Império foram expandidas, e nesse momento se observa o
aumento da possibilidade de usucapir, vez que o possuidor peregrino passa a ter acesso ao
instituto citado, o qual passa a figurar como uma espécie de prescrição (FREYESLEBEN,
1998).
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No Brasil, a partir do século XX, diversas Constituições foram promulgadas até a atual
Carta Magna, de 1988. Durante este período, o entendimento acerca da propriedade foi
enriquecendo, tornando-se cada vez mais claro para o ordenamento jurídico a relação entre a
função social e a propriedade dos bens imóveis (COELHO, 2012).
exemplificar a diversidade de tal classificação e evitar que este estudo se estenda para além
dos objetivos principais.
No entendimento de Nobre (2013, p.24), posse direta "é aquela onde é exercida por
quem não seja dono, ou seja, é o feito da transmissão para que um terceiro a exerça, tendo os
mesmos direitos e deveres como se dono fosse". Deste mesmo exemplo tem-se a definição de
posse indireta, que é a exercida pelo proprietário do imóvel.
Boa-fé é a crença do possuidor de que legitimamente lhe pertence a coisa de que tem
posse. Essa crença é sempre resultado de erro de fato. O erro que procede da
ignorância do vício ou do obstáculo que impede a transferência do domínio. A boa-
fé deve estar presente em todo o decurso da posse. Se começou de boa-fé, mas se
tornou de má-fé, fica destruída a pretensão aquisitiva por via de usucapião ordinário
(FIUZA, 2008, p.780).
A composse, por sua vez, resulta do disposto no artigo 1.199 do Código Civil: “Se
duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos
possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores”. Assim, trata-se de
posse de duas ou mais pessoas sobre uma mesma coisa, havendo interesses comuns e
simultâneos (NOBRE, 2013).
A posse justa é aquela não for violenta, clandestina ou precária, conforme preconiza o
artigo 1200 do Código Civil. De outro lado, tem-se a posse injusta, subdividida em violenta,
clandestina ou precária. No entendimento de Coelho (2012), a posse violenta é aquela obtida
através do uso indevido da força física. Já a posse clandestina pode ser definida como aquela
em que se oculta daquela que titula o direito de a ela se opôr. Existe, ainda, a figura da posse
precária, obtida por meio do abuso de confiança.
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Atualmente, a posse é direito real (COELHO, 2012), seja sobre coisa própria ou sobre
coisa alheia. O proprietário pode ou não ser possuidor da coisa, assim como o possuidor pode
ou não ser proprietário. Ambos podem defender seu direito de posse e, no caso de possuidor
não proprietário, este pode defendê-la inclusive contra o titular da propriedade, sendo possível
que se torne legítimo proprietário.
Na usucapião especial urbana, a questão da moradia tem se destacado, uma vez que a
própria CF arrolou o direito à moradia como um dos direitos fundamentais para o pleno
exercício da cidadania. Há que se ressaltar o real significado da função social da propriedade
e na implicação sobre o direito à moradia no ordenamento jurídico. No entendimento de
Barruffini (1998), a função social da propriedade exige que a mesma seja utilizada de modo a
proporcionar o bem-estar coletivo, buscando o interesse público acima do interesse particular.
Desta forma:
Candeia (2016) ressalta não ser a propriedade, propriamente dita, que exerce a função
social. Quem atende a esta função são as pessoas e o uso que fazem dos bens imóveis. Assim,
a responsabilidade do exercício da função social da propriedade é do indivíduo, proprietário
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Para que o direito à moradia, conforme Lima Jr. e Zetterstrom (2002), revista-se de
eficácia jurídica e social, deve-se pressupor a ação positiva do Estado, através da promoção de
políticas urbanas voltadas à habitação, além de políticas públicas de caráter social nas mais
diversas áreas. Transfere-se o pensamento sobre a propriedade da esfera individual para a
esfera coletiva, social. Neste sentido, bem coloca Barruffini (1998, p.214):
Através do diagnóstico geral da crise do direito dos nossos dias, observa-se uma
inevitável transformação do individualismo jurídico em socialismo jurídico. O social
tem de ser colocado antes do humano. A propriedade protege-se e garante-se,
sobretudo, em razão de sua função social.
Gonçalves (2014) coloca, ainda, que a propriedade deixa de ser direito subjetivo e
individual, passando a ser vista como um meio de promover a riqueza social, não apenas
individual. Retira-se o status de direito inatingível e sagrado da propriedade, compreendendo-
a como um direito em transformação contínua, que deve ser adequado conforme as demandas
sociais vigentes.
Há que se ressaltar, neste sentido, que o ordenamento jurídico brasileiro, à luz da CF,
está composto também pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001). Em relação à função social
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da propriedade, Pagani (2009, p.163) coloca que o referido estatuto “inaugura um verdadeiro
marco histórico”, considerando o fato de que o mesmo rompe com o tradicionalismo jurídico
até então adotado em termos de propriedade, constituindo-se em uma ferramenta democrática
capaz de auxiliar os gestores públicos a transformar o espaço social das cidades, garantindo a
possibilidade de intervenção em casos onde a propriedade não esteja cumprindo com a sua
função social.
Este estatuto define as ferramentas que poder público municipal pode utilizar no
enfrentamento aos problemas sociais, a exemplo da desigualdade social e territorial nas
cidades, através da observância de determinadas diretrizes e instrumentos de política urbana,
relacionadas na referida lei (LIMA JR. E ZETTERSTROM, 2002).
Neste mesmo sentido se posiciona Jelinek (2006), afirmando que esta função social
corresponde a um poder-dever, impondo comportamentos positivos e negativos ao
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A posse para o usucapião constitucional ou especial urbano tem que ser exercida
diretamente pelo pretenso adquirente da propriedade, devendo ele utilizar o imóvel
para sua moradia ou de sua família, não podendo, portanto, ser exercida por terceiros
ou prepostos.
que se encontrar um ponto de equilíbrio entre ambos os interesses para que a propriedade
possa, de fato, exercer o seu papel fundamental frente à democracia brasileira.
O termo "usucapião" origina-se do latim usucapio, em que usa significa "pelo uso" e
capio significa "aquisição". Assim, trata-se de uma aquisição pelo uso, um tipo extraordinário
de aquisição da propriedade (FIUZA, 2008). Neste sentido, pode-se auferir que o usucapião é
uma aquisição pelo uso de alguém que está ocupando determinado imóvel no lugar de quem
deveria utilizá-lo ou ocupá-lo. Assim, se o proprietário não está dando a devida utilidade ao
bem, o mesmo torna-se passível de usucapião por terceiros, desde que preenchidos os
requisitos.
A ação de usucapião especial urbana é desta forma denominada por estar prevista na
Constituição Federal, no artigo 183, integrante do Capítulo reservado para a política urbana.
Fundamenta-se principalmente no princípio da função social da propriedade (FIUZA, 2008),
conforme preconiza o artigo 183 da Carta Magna:
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Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta
metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a
para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Além de áreas urbanas, a CF preconiza o usucapião também nas áreas rurais (artigo
191). Porém, em virtude deste estudo abordar apenas o usucapião especial urbano, torna-se
desnecessária a abordagem específica do instituto em áreas rurais.
O prazo para posse ininterrupta encontra-se disposto no artigo 1.240 do Código Civil,
sendo de 5 anos. Novamente, ressalta-se que, durante este tempo, a posse não pode haver
sofrido descontinuidade, salvo em caso de posses sucessivas, previamente acordadas
(COELHO, 2012).
O Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) elenca, em seu artigo 12, as partes legítimas
para propôr a ação de usucapião especial urbana:
A coisa possível de ser adquirida através do usucapião deve estar nos negócios ou
comércio (res in commercio) e ser hábil (res habilis). Isto posto, somente se adquirem por
usucapião os direitos reais que recaiam sobre coisas prescritíveis, como a propriedade, o
usufruto, a habitação, a servidão etc. (RIBEIRO, 1998a). As coisas fora do comércio, como o
ar, o mar e os bens públicos, por exemplo, não são passíveis de usucapir (GONÇALVES,
2003).
Barrufini (1998, p.27) elenca o papel fundamental da usucapião, pois, sem este
instituto, “a propriedade seria provisória e reinaria uma incerteza permanente e universal, que
teria como conseqüência uma perturbação geral. O fundamento básico realmente é o bem
comum”.
Buscando elucidar ainda mais sobre este instituto, neste capítulo serão analisados os
fatores relacionados à situação da pessoa jurídica (e sua incapacidade de usucapir), a
impossibilidade de haver domínio de outro imóvel por parte do requerente, os limites físicos
das áreas passíveis de usucapião, as áreas usucapíveis (excluindo-se imóveis públicos) e a
impossibilidade de se requerer o usucapião por mais de uma vez.
Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros
quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua
moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário
de outro imóvel urbano ou rural.
Este fato também é colocado por Ribeiro (1998a), embasando a questão no Direito
Civil, onde as pessoas capazes são as pessoas naturais, ou seja, os homens titulares ou sujeitos
de direitos, englobando brasileiros e estrangeiros. Ausente, portanto, a legitimidade da pessoa
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jurídica para a proposição deste tipo de ação. Da mesma forma, diz-se que “a pessoa jurídica,
tendo sede, não residência, não tem família e, portanto, não detém legitimidade para valer-se
da prescrição aquisitiva” (RIBEIRO, 1998b, p.875).
Assim:
Cediço que as pessoas jurídicas são mera ficção que tem o direito por genetriz.
Inconcebível atribuir-se à pessoa jurídica tanto uma família quanto uma moradia ou
residência. Não se argumente que admissível a usucapião especial urbana por pessoa
jurídica, alegando que esta exerceria a posse do imóvel por intermédio de pessoas
físicas, pois, no caso, não haveria a posse (FREYESLEBEN, 1998, p.30).
A origem da pessoa jurídica não é natural, portanto. O seu início se dá a partir de uma
provocação jurídica, onde uma ou mais pessoas físicas (naturais) passam a se tornar uma
única pessoa que, do ponto de vista legal, transforma-se numa pessoa jurídica. Cada uma
destas pessoas físicas pode possuir um espaço para chamar de seu, denominado residência,
enquanto a pessoa jurídica possui um espaço para o exercício de suas atividades
organizacionais, denominado sede.
Isto ocorre uma vez que, por se tratar de um direito voltado para o aspecto social da
propriedade, que deve atender a algumas funções pré-determinadas pela legislação e pela
própria sociedade, este direito só pode existir em condições em que o requerente não seja
possuidor de qualquer outro imóvel, pois do contrário, deveria residir no imóvel que lhe
pertence.
Desta forma, considerando a natureza protetiva da usucapião, não há que se falar neste
instituto com relação a indivíduos que tenham domínio de outros imóveis, “pois o que se visa
não é o enriquecimento do que já tem abrigo, mas a proteção de quem não o tem”
(FREYESLEBEN, 1998, p.32). E, neste sentido, tem-se por abrigo a residência, o local onde
o indivíduo possa se sentir seguro e abrigar também a sua família, seus entes queridos,
devendo, neste caso, ser único.
Além deste requisito, a área passível de ser usucapida possui certo limites de extensão,
dispostos na legislação brasileira. Este requisito do instituto de usucapião encontra-se tratado
em seguida.
Art. 9º Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e
cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição,
utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que
não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Par Ribeiro (1998b), as propriedades com área superior a duzentos e cinqüenta metros
quadrados não são passíveis de usucapião urbana, salvo nos casos em que seja possível a
redução possessória aos limites fixados pela Constituição Federal. Entretanto, não pode haver
intenção de posse sobre área maior do que o determinado pela legislação.
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Não há que se falar, portanto, em ações de usucapião especial urbana que tenham por
objeto imóveis maiores do que duzentos e cinqüenta metros quadrados, sob pena de
descaracterização do referido instituto.
Além da limitação física, existem ainda limitações concernentes aos tipos de áreas
urbanas que podem ser objeto do tipo de usucapião aqui abordado. O item a seguir abordará
esta questão.
De acordo com Ribeiro (1998a), o Código Civil elenca como bens públicos aqueles
pertencentes ao domínio da União, Estados e Municípios. Desta forma, excluídos estes bens,
os que restarem são classificados como particulares.
Isto ocorre devido à imprescritibilidade dos bens imóveis públicos. Por mais tempo
que um indivíduo esteja de posse de um bem imóvel pertencente a uma pessoa jurídica de
direito público, este primeiro nunca terá o domínio do imóvel, pois a regra que aqui se aplica
é o interesse coletivo sobre o interesse individual (COELHO, 2012). Trata-se do resultado da
inalienabilidade do bem público: por não poder ser alienado, também não pode ser objeto de
usucapião (RIBEIRO, 1998a).
No passado, “os bens dominiais do Estado podiam ser adquiridos por usucapião
extraordinário; mas o prazo requerido era de quarenta anos” (ESPÍNOLA, 2002 apud
COSTA, 1999, p.331). Porém, atualmente esta modalidade de prescrição e aquisição de
propriedade não é mais possível.
Por fim, e não menos importante, outro requisito fundamental para a legitimidade da
ação de usucapião especial urbana é a impossibilidade de usucapir mais de uma vez, assunto
abordado a seguir.
Da mesma forma que o requerente da ação de usucapião especial urbana não pode ser
possuidor ou ter o domínio de outro imóvel, também não poderá usucapir mais de uma vez.
No Estatuto da Cidade, o §2º do artigo 9º é categórico ao afirmar que “o direito de que trata
este artigo não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez”. O artigo 183 da
Constituição Federal, §2º, ressalta a mesma informação.
Isto ocorre devido ao fato de que “não se poderá exercer o mesmo direito duas vezes.
Imaginando-se que certa pessoa, após adquirir imóvel por usucapião especial, venha a vendê-
lo, apossando-se de outro, não poderá requerer o usucapião deste último” (FIUZA, 2008,
p.782).
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Para usucapião urbano exige-se a posse ad usucapionem, por prazo de cinco anos. O
possuidor deverá estar imbuído de vontade de dono, como no usucapião
extraordinário. Não é necessária a convicção de ser dono. Além disso, o imóvel deve
ser utilizado para moradia do requerente ou de sua família, não podendo eles ser
proprietários de outro imóvel, seja urbano ou rural (FIUZA, 2007, p. 793).
Não há que se falar, portanto, em novo usucapião, visto que o direito a possuir uma
moradia para si e sua família já foi concedido, uma vez, ao requerente. De acordo com
Barruffini (1998, p.212), é “a primeira e única prescrição aquisitiva é que recebe eficácia e
validade do texto constitucional”.
Corroborando com este pensamento, Coelho (2012, p. 201) entende que, “como se
destina o instituto a amparar interesses da população de baixa renda, tanto a norma
constitucional como as ordinárias limitaram o reconhecimento do direito à usucapião especial
de imóvel urbano a certo possuidor por uma só vez”.
Estes são, portanto, os requisitos contidos no artigo 183 da Constituição Federal, que
visa balizar o entendimento acerca do instituto do usucapião especial urbano. Por se tratar de
uma ação que visa reconhecer a necessidade do requerente em possuir um imóvel para sua
moradia e de sua família, dada à inviabilidade econômica de adquiri-lo por meios financeiros
próprios, há que se atentar para determinados requisitos, sob pena de extinguir a real função
desta ação, que é a de garantir a função social da propriedade, onde o interesse coletivo
sempre se sobrepõe ao interesse do particular.
CONCLUSÃO
Entretanto, para que a ação possa ser intentada e produza o efeito desejado pelo
proponente, é necessária a presença de alguns requisitos, dispostos na Constituição Federal.
Estes requisitos buscam garantir que a propriedade seja repassada, de fato, a um indivíduo que
não tenha condições de adquirir um bem imóvel por conta própria, personificando a própria
função social da propriedade.
De outro lado, alguns requisitos como não possuir outro imóvel e não usucapir mais de
uma vez, buscam garantir a boa fé do próprio instituto pois, se o mesmo fosse destinado a ser
proposto mais de uma vez pela mesma pessoa ou, ainda, que esta pessoa já seja possuidora de
outro imóvel, estaria o referido instituto atentando contra princípios constitucionais,
promovendo, inclusive, o enriquecimento, de modo ilícito, do requerente, que poderia ter para
si mais de um imóvel, através do usucapião, sem que para isso tenha que haver trabalhado ou
se esforçado para adquiri-lo, bastando a comprovação da posse pelo tempo determinado.
O que se percebe, portanto, é que a ação de usucapião especial urbana visa garantir
que a propriedade exerça sua função social (contemporaneamente chamada de função
28
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