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DOM QUIXOTE
Jeferson Silva Ribeiro
Jaime Estevão dos Reis
Introdução
Esta comunicação nasceu das reflexões iniciais da pesquisa de mestrado que estamos
iniciando pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de
Maringá. A pesquisa a ser desenvolvida, têm como objetivo analisar como Cervantes, em sua
obra clássica, Dom Quixote de la Mancha, escrita em dois volumes, um em 1605, e outro em
1615, apresenta a figura do cavaleiro de forma cômica, ou parodística. Paródia construída
tendo como modelo as novelas de cavalaria, ainda muito difundidas em seu período.
Algumas transformações ocorridas nesse período, com relação a Idade Média,
testificam uma sociedade em transição, na qual os ideais, e a função da cavalaria medieval
perderam a sua vitalidade diante das novas condições sociais e mentais, pois, ao fim da Idade
Média alguns elementos contribuem para a mudança da utilização da força bélica. Novas
tecnologias, novas formas de confronto e a reorganização social, são os principais desses
elementos. Com a reorganização social pós-crise, uma nova política também vai surgindo. A
formação dos Estados Modernos é acompanhada pela necessidade de uma nova forma de
combate, mais “profissional”, devido ao maior tempo despendido nas guerras e as novas
tecnologias nela empregadas – como o arco longo – os velhos combatentes – nobres em seus
cavalos, que deviam um tempo determinado de serviços bélicos a seus senhores (40 dias no
máximo) – tornam-se obsoletos.
A publicação por Cervantes de Dom Quixote de la Mancha, marca o auge dessa
mudança ideológica no seio da cavalaria. Publicado pela primeira vez em 1605, a obra
apresenta a configuração da nova mentalidade do homem moderno. E principalmente, nota-se
que a velha apreciação da cavalaria não cabe mais nessa sociedade. A forma que Cervantes se
propõe a satirizar os ideais de cavalaria presentes nas novelas e crônicas, ainda difundidos em
seu tempo, leva-nos a pensar no total desequilíbrio mental do protagonista como um
É nesse sentido, portanto, que queremos entender a obra de Cervantes, como ruptura
dessas forças medievais através do riso, mas para isso é importante entendermos melhor o seu
período, o mundo que o cerca e que lhe dá as ferramentas e as formas para que ele possa
esculpir sua bela arte na figura do decrépito cavaleiro andante.
Vimos até agora algumas discussões teóricas sobre o riso e algumas reflexões sobre o
humor em Cervantes, mas o que significa esse riso? Como podemos interpretá-lo na própria
visão do contexto cervantino? Como podemos nos aproximar dessas respostas? E quais
cuidados devemos tomar, enquanto historiadores para evitar os excessos interpretativos da
obra?
Como um clássico, torna-se obvio a imensa produção sobre a obra de Cervantes, e
com ela uma grande possibilidade de leituras e interpretações. Este ano comemorou-se o
quarto centenário da publicação do segundo volume de Dom Quixote, e algumas releituras
interpretativas são bem convenientes, como é o caso da dissertação escrita em 2011 por
Valéria da Silva Morais, intitulada O cômico e o riso em Dom Quixote. Um dos objetivos
principais dessa dissertação é entender o caráter cômico da obra, pois, segundo Morais,
Vemos então que, mesmo partindo de uma análise semiótica, o intérprete tem seus
limites, e esses serão apresentados, na maioria das vezes, pelo próprio texto, como o exemplo
irônico dado por Eco, em que ele diz que possivelmente, se Jack Estripador dissesse que a
motivação para seus crimes encontra-se no evangelho de Lucas, o tomaríamos logo por
extremamento louco – mesmo que seja difícil dizer que assim não fosse.
Para apresentar os “limites de uma interpretação” Umberto Eco fala de uma
“economia textual”, que poderá ser definida como a relevância, ou não, da interpretação
sugerida, que muitas vezes tenta apresentar elementos forçados para uma interpretação que
não faz parte do texto, ou nem mesmo de qualquer abordagem que poderia ser proporcionada
pelo autor.
Dessa forma, quando observamos as interpretações que quiseram dar um
encaminhamento idealista para o Dom Quixote, no decorrer do século XIX, percebemos que
elas não se atentaram para qualquer intenção que poderia proceder do autor e deram enfoque a
intenção do próprio texto, que, segundo Eco, desligado do autor e do contexto em que foi
produzida, pode proporcionar as interpretações mais absurdas. O texto assim, desligado de
Conclusão
Com essa noção podemos atribuir o retrato pintado por Cervantes da cavalaria, no
quadro quixotesco, como uma caricatura, das novelas de cavalaria. Cervantes apresenta às
imperfeições, escondidas aos olhos comuns, dessas obras que já não falavam de seu tempo.
Ele apresenta a seus leitores as caretas cavaleirescas que não podem mais serem reproduzidas
em seu período. Partindo do estilo de Cervantes, podemos notar uma nova noção de literatura.
Seu contato com o realismo é abordado desde a própria estética de sua narrativa, em que a
Referências:
CHARTIER, Roger. Textos, Impressões, Leituras. In: HUNT, Lynn. A nova história cultural.
São Paulo: Martins Fontes, 1992.
MORAIS, Valéria da Silva. O cômico e o riso no Quixote. São Paulo: USP, 2011.
Dissertação de mestrado.