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Quando é chegada a hora do desencarne, Pai Omulu, o Senhor dos Campos Santos,

rompe o cordão de prata que mantém ligado a Matéria ao Espírito. Ele o faz da forma
mais serena, cuidadosa e sublime, e então recebe seu filho com um abraço e um sorriso
estampado, como alguém que revê um velho amigo que a muito não encontrava. E então,
dando início a uma nova jornada (que na verdade não é tão nova assim), Pai Omulu
entrega seu filho aos cuidados de Nanã, que da mesma forma que Iemanjá (a Mãe
Geradora) utiliza o Elemento Gerador Água para Vivificar um filho na Matéria, ela, a
Mãe Receptora, utiliza deste mesmo Elemento para receber um filho de volta ao plano
espiritual.

Ela irá lhe lavar e purificar, com o auxílio das ervas de Ossain, até que todas as
dores, doenças, chagas, decepções e tristezas já não façam mais parte do seu ser. Quanto
tempo levará? Não há como precisar, pois o tempo já não importa mais. O tempo já não
é mais o mesmo. Já não existe mais a tal da relatividade. Quando estiver pronto, Bará, o
Senhor dos Caminhos e da Comunicação, o acompanhará em sua jornada ao Orun. Desta
vez, diferente de quando no plano material, não existirão encruzilhadas, ou dúvidas para
qual lado seguir. O caminho será um só, até que chegue o momento de ser recebido por
Xangô, o Pai da Justiça. Esse momento, diferente do que muitos pensam, não é para que
seja aplicada alguma sentença referente às ações cometidas enquanto na Matéria. É ali,
diante de Xangô, que serão esclarecidas todas as dúvidas. É Xangô quem irá iniciar a
retirada da venda que é colocada sobre filho, a respeito de vidas anteriores, de afetos e
desafetos, de escolhas feitas antes de ingressar no plano material, escolhas que esclarecem
toda e qualquer situação vivenciada na matéria, que antes o filho não compreendia.

Após esclarecidos todos assuntos que ainda poderiam trazer algum amargor,
rancor ou tristeza, e livre de qualquer senso de julgamento, Xangô o conduzirá de
encontro a Oxum, a Grande Mãe, não a Mãe Geradora, mas a Mãe Acolhedora, que com
todo seu Amor e Benevolência, ampara a todos. É neste momento, que a Grande Mãe irá
reunir o filho, que está retornando ao seio fraternal, àqueles que ali já se encontram e
estavam aguardando ansiosos por esse momento. Ao término deste reencontro, de grandes
alegrias e emoções, é chegado o instante de encontrar Orunmilá, o Grande Pai, o Senhor
da Sabedoria e dos Destinos. É nessa hora que o filho é despido por completo de qualquer
resquício de materialidade, e a venda que ocultava as Verdades Divinas é totalmente
retirada e ele passará a experimentar novamente a plenitude da consciência. Com isso o
filho é capaz de ver todo o seu passado, de forma clara e objetiva e pode vislumbrar
possíveis caminhos futuros. E então, já esclarecido e totalmente equilibrado, o filho passa
a enxergar os seus entes, que ainda permanecem no plano terrestre, e dentro dos limites
impostos pela Lei Divina, de forma que não interfira no livre arbítrio dos outros, uma vez
ou outra pode se aproximar desses (e até intuí-los em alguns momentos de indecisão),
sempre acompanhado de Ogum, o Senhor dos Caminhos que afasta o Caos e a Desordem.

E dessa forma, aquele ente querido, que a tão pouco se encontrava presente, junto
a nós, passa a ser lembrado com carinho, como um Ancestral (os nossos Orixás), que
reverenciamos e cultuamos com amor e devoção, até que chegue o nosso momento.
Momento em que o Orun clamará por nossa volta, e então também faremos esta mesma
peregrinação e nos reencontraremos, para posteriormente embarcarmos novamente em
uma outra jornada material, até que tenhamos evoluído o suficiente a ponto de não mais
precisar reviver o ciclo reencarnatório. Quando será? Não é possível dizer, afinal os
tempos não são (mais) os mesmos.

Porto Alegre, 23 de março de 2021.

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