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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO AMAZONAS

COMARCA DE AMATURÁ
VARA ÚNICA DA COMARCA DE AMATURÁ - CÍVEL - PROJUDI
Rua principal, sn - Amaturá/AM - CEP: 69..62-0-000

Processo: 0000005-72.2018.8.04.7901
Classe Processual: Procedimento Ordinário
Assunto Principal: Obrigação de Fazer / Não Fazer
Autor(s): JOSÉ FERREIRA DA MOTA NETO
Réu(s): ESTADO DO AMAZONAS
O ESTADO DO AMAZONAS
SUSAM - Secretaria de Estado de Saúde

SENTENÇA

Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE


ANTECIPAÇÃO DE TUTELA ajuizada por JOSÉ FERREIRA DA MOTA NETO em
desfavor do ESTADO DO AMAZONAS, pessoa jurídica de direito público
interno.

Narra o autor na peça inicial que, é servidor público


concursado da SUSAM - Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas desde o
ano de 2016, lotado em Amaturá/AM, no entanto, em decorrência de
problemas de saúde, precisou se afastar do exercício de suas funções de
enfermeiro para tratamento de sua própria saúde, conforme atestam as
declarações médicas por ele juntadas.

Alega o requerente que, por não ter família no Estado do


Amazonas, decidiu por realizar seu tratamento no Piauí, onde mora sua
família, e enviava os atestados para o hospital em que trabalhava. Que
em janeiro de 2018 seu pagamento foi suspenso, uma vez que, a SUSAM
instaurou Processo Administrativo Disciplinar para investigar suposto
abandono de cargo cometido pelo autor.

Em sede de liminar, requereu o demandante que fosse


determinado por este juízo o seu imediato retorno ao serviço, bem como
a regularização de seus pagamentos, e ao final, no mérito, pugnou pelo
abono das faltas do período que estava em tratamento, o pagamento
retroativo das verbas suspensas, e a consequente confirmação da medida
liminar.

Por fim, o autor pediu que lhes fossem concedidos os


benefícios da justiça gratuita.

Tendo em vista a natureza da tutela de urgência


pleiteada, que poderia acarretar em prejuízo à administração pública,
foi determinada a imediata citação do ente público para que
apresentasse defesa, razão pela qual o pedido de urgência não foi
apreciado (evento 5).
Citado, o réu contestou a demanda (evento 12),
oportunidade na qual, asseverou que o autor abandonou o cargo, pois
ausentou-se do seu local de trabalho sem a devida justificativa por
período superior a 30 (trinta) dias consecutivos.

Aduz o requerido, que para um servidor se afastar de


suas funções para tratar de alguma enfermidade é necessária a obtenção
de uma licença, que será dada após uma inspeção realizada pela Junta
Médica Pericial do Estado, porém, o requerente só se apresentou no
órgão competente após 7 (sete) meses de afastamento, e por esse motivo,
a presente ação merece ser julgada totalmente IMPROCEDENTE.

As partes não demonstraram interesse na realização de


audiência conciliatória.

Após as verificações de praxe, constatou-se que a


matéria discutida na presente demanda é de direito e de fato, sem a
necessidade de produção de provas em audiência, sendo então cabível o
Julgamento Antecipado do Mérito, por força do artigo 355, inciso I do
CPC.

Sem resignação das partes, que foram devidamente


intimadas (evento 14), voltaram-me os autos conclusos para sentença.

É o que basta relatar.

Decido.

A respeito do pedido de desentranhamento feito pela


Procuradoria do Estado, este não merece acolhimento, pois, conforme
declarou a DPE, houve um equívoco na Secretaria deste Juízo que
resultou na ausência de intimação da parte autora, assim sendo, aceito
as provas juntadas no evento 22.

Posto isto, passo a apreciar o mérito.

Depreende-se dos autos que o demandante é servidor


público concursado da Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas -
SUSAM, lotado no município de Amaturá, onde exercia a função de
enfermeiro, no entanto, foi impedido de retornar a exercer suas funções
e teve seu salário suspenso após ausentar-se do seu local de trabalho
por mais de 200 (duzentos) dias consecutivos (08/08/2017 a 05/03/2018)
para tratamento de saúde.

Importante ressaltar que, não há discussão entre as


partes no que se refere à veracidade dos atestados apresentados pelo
autor, o que está em debate é se eles cobrem todo o período do
afastamento, e se DEVERIA ou não ter passado por perícia médica
oficial.

O Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado do


Amazonas (Lei nº 1.762 de 1986), determina em seu artigo 68 que, "a
licença para tratamento de saúde depende de inspeção médica, e será
concedida sem prejuízo da remuneração".

Ainda sobre o tema, o Estatuto da Junta Médico-Pericial


do Estado do Amazonas (Decreto nº 37.502 de 2016) traz as seguintes
disposições:

"Art. 3.º Para os fins deste Estatuto, considera-se


perícia médica todo e qualquer ato realizado por
profissional da área médica, investido formalmente na
função de perito, consistente em exame pessoal,
avaliação indireta ou sindicância específica de cada
área, para fins de exames admissionais, exercício do
cargo, licenças médicas, readaptação, aposentadoria por
invalidez ou incapacidade, isenção de imposto renda e
outras exigências legais.

Art. 12. O inspecionado que necessitar de afastamento


superior a 72 horas consecutivas será encaminhado à
perícia médica, através da área de recursos humanos do
seu órgão ou entidade.

DA LICENÇA MÉDICA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE E TFD


(Tratamento Fora de Domicílio)

Art. 19.As perícias médicas dos servidores, deverão ser


agendadas previamente na Junta Médica.

Art. 20. Para fins de concessão de licença médica, o


servidor deverá apresentar os seguintes documentos
originais ou cópias autenticadas:

I - formulário de encaminhamento do servidor pelo setor


de RH do órgão;

II - contracheque atualizado;

III - atestado médico contendo CID (da doença), data do


início da licença, carimbo e assinatura do médico
assistente;

IV - CPF, Identidade e comprovante de residência;

V - Exames complementares que comprovem a doença


diagnosticada pelo médico assistente.

Art. 22. O pedido de licença não poderá exceder 48 horas


para os servidores da capital e interior, dando ciência
ao setor de recursos humanos ou chefia imediata, que
preencherá o formulário e encaminhará à Junta Médica.

Art. 23. Dos prazos da perícia médica para concessão de


licença médica:

I - para os servidores do interior, caberá a chefia de


recursos humanos do órgão, fazer chegar à Junta Médica,
o processo de licença médica, no período máximo de 60
dias;

II - caberá ao servidor da capital, no prazo máximo de


05 (cinco) dias, agendar perícia médica.

Parágrafo único. Considerando o não cumprimento dos


prazos disposto no artigo anterior, a licença médica
será indeferida por decurso de prazo.

Art. 24. Para a realização de perícia médica os


servidores serão pré-agendados e, no dia marcado, serão
atendidos por ordem de chegada, não sendo permitido
acompanhante nas salas de perícia, salvo se o caso assim
o exigir.

Art. 26. O servidor que solicitar à Junta Médica,


licença médica para Tratamento Fora de Domicílio - TFD,
deverá apresentar:

I - Documentos constantes no artigo 20;

II - Cópia da documentação do T.F.D.;

III - Cópia das passagens com data marcada.

Parágrafo único. Se o T.F.D. não for concedido pelo


órgão oficial, o servidor terá que apresentar um
relatório médico justificando sua necessidade."

Veja-se, é nítido que o autor não respeitou os


procedimentos exigidos para que seu afastamento fosse permitido, logo,
o egresso se deu sem qualquer respaldo legal, e ainda sem a anuência do
Órgão Público ao qual estava vinculado.

Para que o distanciamento do servidor fosse reconhecido,


deveria ter preenchido um formulário de afastamento e encaminhado ao
setor de Recursos Humanos da SUSAM, ou então à Secretaria de Atenção
Especializada do Interior, que efetuariam o devido protocolamento do
pedido dando início ao processo de afastamento, e ainda, seria o
funcionário devidamente instruído de todos os procedimentos a serem
executados dali em diante.

Todavia, o autor se limitou a apresentar atestados de


médicos particulares para justificar sua ausência no trabalho.

Das declarações médicas apresentadas, três estabeleciam


prazos subsequentes, sendo duas de 15 (quinze) dias e uma de 60
(sessenta) dias, totalizando 90(noventa) dias de atestado, abrangendo o
período de ausência de 08/08/2017 a 05/11/2017 (eventos 1.11, 1.12 e
1.25), porém, o requerente só retornou para o Amazonas no início de
março de 2018.

Posteriormente, na tentativa de justificar suas faltas


no período de 06/11/2017 a 05/03/2018, exibiu mais um atestado, este
último com data de 28/02/2018 e sem prazo algum, apenas informando que
o demandante estava em tratamento desde o mês de setembro do ano de
2017, mas que naquele momento já encontrava-se bem melhor para exercer
seu trabalho (evento 1.23).

O autor se apresentou perante a Junta Médico-Pericial do


Estado no dia 06/03/2018, oportunidade em que obteve uma Licença Médica
(Laudo Médico nº /2018107239) de 10 (dez) dias, e após seu término,
deveria voltar ao trabalho (evento 1.22). Na mesma ocasião, na
tentativa de regularizar seu afastamento, com uma espécie de "atestado
retroativa", requereu perante a Junta Médica licença de 90 dias para
cobrir as datas de 08/08/2017 a 05/11/2017, mas foi negada pelo órgão
oficial por decurso de prazo (evento 1.21).

Extrai-se dos autos que o autor ficou afastado do seu


cargo por cerca de 07 (sete) meses sem nenhum tipo de permissão do
Órgão Público empregador, de forma totalmente contrária aos
procedimentos exigidos pelas legislações e decretos em vigor, e ainda,
não apresentou justificativas que sustentem suas faltas no período
decorrido entre 06/11/2017 e 05/03/2018.

Ante o exposto, vislumbro que, embora o afastamento


compreendido entre as datas de 08/08/2017 a 05/11/2017 esteja amparado
por atestados médicos, não estão amparados pela Junta Médico-Pericial
do Estado, uma vez que, o autor não obteve licença para tratamento de
saúde, conforme determina o artigo 68 da Lei Estadual supracitada.

E ainda, no que tange a sua ausência no local de


trabalho entre o dia 06/11/2017 a 05/03/2018, o demandante não tem
qualquer amparo, nem atestado médico indicando o prazo para tratamento.

Um servidor público do Estado não pode se afastar de


suas funções por mais de 200 (duzentos) dias sem o amparo legal
necessário, gerando prejuízo ao erário e à prestação do serviço de
saúde à população.

As faltas do requerente não devem ser abonadas, pois não


foram reconhecidas como justas pelo órgão competente, qual seja, a
Junta Médico-Pericial do Estado, e ainda, a Lei nº 1.762 de 1986 limita
os abonos, permitindo apenas 03 (três) por mês, para períodos que
excedam esse tempo, é exigida a homologação da Junta Médica Oficial, o
que não é o caso em epígrafe.

No que concerne ao pedido de pagamento dos salários


retroativos, não vejo motivo para seu acolhimento, pois estes só foram
suspensos em janeiro de 2018, após aproximadamente 05 (cinco) meses de
afastamento irregular do demandante e a consequente instauração do PAD
para apuração dos fatos.

Por fim, diante de todo o conjunto probatório colhido,


constata-se que o direito não assiste o autor, tendo em vista que, a
conduta por ele praticada, caracteriza de fato o abandono de cargo,
conforme dicção do artigo 161 do Estatuto dos Funcionários Públicos
Civis do Estado do Amazonas (Lei nº 1.762 de 1986), inexistindo
qualquer ilegalidade nos atos da administração, podendo ser aplicada a
pena de demissão ao final do Processo Administrativo Disciplinar (PAD).
Assim, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de
Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos contidos na exordial e,
por conseguinte, julgo o processo com resolução do mérito.

DEFIRO os benefícios da justiça gratuita em favor do


autor.

Sentença publicada eletronicamente.

Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, ARQUIVE-SE com as cautelas


de praxe.

CUMPRA-SE.

Amaturá, 08 de junho de 2021.

Hercilio Tenorio de Barros Filho


Juiz de Direito

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