Rua em Grandes Centros Urbanos The Family Health Strategy Focused on Access Equity and Targeted at the Homeless Population Living in Large Urban Centers
Nivaldo Carneiro Junior Resumo
Médico Sanitarista. Doutor em Medicina Preventiva. Diretor do Centro de Saúde Escola Barra Funda Dr. Alexandre Vranjac/Irman- Este artigo relata experiência na implantação da dade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Professor da atenção à saúde da população em situação de rua da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. cidade de São Paulo, visando à equidade de acesso Endereço: Rua Dr. Abraão Ribeiro, 283, CEP 01133-020, São Paulo, SP, Brasil. às ações de saúde no Sistema Único de Saúde. As E-mail: csebf.dirtec@santacasasp.org.br dificuldades de utilização dos serviços de saúde por esses indivíduos devem-se a: concepção do adoeci- Christiane Herold de Jesus Enfermeira Sanitarista. Mestre em Saúde Coletiva. Chefe de En- mento-cuidado, organização técnico-administrativa fermagem do Centro de Saúde Escola Barra Funda Dr. Alexandre dos serviços, preconceitos de profissionais e usu- Vranjac/Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. ários e fragilidades de ações intersetoriais, entre Endereço: Rua Dr. Abraão Ribeiro, 283, CEP 01133-020, São Paulo, outros. Ademais, observa-se prevalência maior de SP, Brasil. algumas condições na população de rua quando E-mail: csebf.chenf@santacasasp.org.br comparada às da população geral, como gestações Maria Angélica Crevelim seis vezes; alcoolismo 30 vezes e tuberculose 57 Enfermeira Sanitarista. Mestre em Administração em Enfermagem. vezes – demonstrando, proporcionalmente, o grau Secretária Executiva do Conselho de Ensino da Secretaria Municipal de vulnerabilidade desse grupo. São necessários de Saúde de São Paulo. Endereço: Rua General Jardim, 36, CEP 01223-010, São Paulo, SP, novos processos de trabalho pró-ativos na atenção Brasil. à saúde que incorporem particularidades desses E- mail: acrevelim@prefeitura.sp.gov.br indivíduos, garantindo, assim, o acesso. Nesse sentido, a Estratégia Saúde da Família, por suas características, responde a tais necessidades. A partir de 2004, o projeto “A Gente na Rua” – fruto de parcerias entre a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo e instituições filantrópicas – foi imple- mentado; inicialmente com o Programa de Agentes Comunitários de Saúde, e hoje com equipes de Saúde da Família. Conclui-se que, na cidade de São Paulo, a política adotada para a atenção à saúde da popu- lação de rua promoveu o acesso à atenção básica e processos de trabalho específicos. Questões como novas estratégias de cuidado aos que apresentam transtornos mentais, integralidade, longitudinalida- de e intersetorialidade nas ações, entre outras aqui
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enunciadas, devem ser consideradas na constituição Abstract de futuras análises. Palavras-chave: População em Situação de Rua; This article reports the experience concerning the Estratégia de Saúde da Família; Equidade; Acesso; implementation of a health care program addressed Atenção Primária à Saúde. to homeless people in the city of São Paulo, aiming at equity in the access to governmental health services. These individuals’ difficulties in using the health services are due to their misconceptions about illness and care, health teams’ and users’ preconcep- tions, services’ technical-administrative organiza- tion, and fragile intersector actions, among others. Additionally, this population is highly vulnerable to some health disorders, as shown by the high rates of alcoholism, tuberculosis and even pregnancy. Inno- vative actions as well as adequate health strategies addressing a real improvement in the access should be considered as essential. In this sense, the Family Health Strategy is a useful tool of the primary health care services. Since 2004, a Project named “A Gente na Rua”, which resulted from a partnership between the Municipal Health Department of São Paulo and philanthropic institutions, has been implemented, with the action of community health agent teams. It is concluded that, in the city of São Paulo, the adop- tion of this health policy targeted at the homeless has promoted better access to primary health care services. Moreover, it has created a more focused approach to this population. Despite the success of this strategy, we should take into account that remaining challenges have to be tackled in future projects, such as the need of new strategies focusing on homeless people with mental disorders, as well as the guarantee of quality care characterized by comprehensiveness, longitudinality and coordina- tion, among others. Keywords: Homeless Population; Family Health Strategy; Equity; Access; Primary Care.
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Introdução acesso, uma vez que fatores relacionados ao con- sumo e à oferta influenciam sua utilização, como A Estratégia de Saúde da Família (ESF), por suas concentração de serviços em determinado nível de possibilidades na mudança do perfil epidemiológico, complexidade tecnológica, características culturais transformou-se em política pública para o Sistema e econômicas da população, fluxos e rotinas dos ser- Único de Saúde (SUS), uma vez que “[...] introduziu viços e graus de satisfação do usuário na utilização uma visão ativa da intervenção em saúde, a de não dos serviços, entre outros (Aday e Andersen, 1974; ‘esperar’ a demanda ‘chegar’ para intervir, mas de Penchansky e Thomas, 1981; Frenk, 1992; Wallace e agir sobre ela preventivamente, representando, Enriquez-Hass, 2001). assim, um instrumento real de reorganização da Para melhor compreender o acesso, os diversos demanda” (Viana e Dal Póz, 1998, p. 10). aspectos de utilização dos serviços de saúde, que A organização do processo de trabalho para a o influenciam de forma positiva ou negativa, po- garantia do acesso aos serviços de saúde nas comu- dem ser agrupados nas seguintes dimensões: (1) nidades assistidas pela ESF é uma das principais disponibilidade – diz respeito à oferta de serviços; características que lhe confere singularidade e (2) acessibilidade – relaciona-se à proximidade e/ potência como modalidade tecnoassistencial em ou facilidade geográfica do serviço, como também atenção básica. às formas de trabalho organizadas para atenção, Inserir-se no território, constituindo relações fluxos, horários, rotinas, prioridades técnicas, pró-ativas com a comunidade de sua responsabili- entre outros; e (3) aceitabilidade – dimensão que se dade, favorece o estabelecimento mais efetivo do relaciona com as características da população, isto cuidado em saúde, pois, além de permitir identificar é, suas crenças, condições socioeconômicas, graus problemas e priorizar intervenções, cria vínculos de satisfação com o serviço utilizado, entre outros contínuos com os assistidos, possibilitando indivi- (Frenk, 1992; Aday, Andersen, 1974). dualizar suas necessidades e organizar processos De acordo com Hortale e colaboradores (1999, p. particulares de cuidado. 87), “a categoria acesso deve, portanto, ser vista não Este artigo pretende, portanto, descrever a expe- somente como geográfica e econômica, mas também riência na implantação da ESF para atenção à saúde organizacional e sociocultural. Ela pode descrever da população em situação de rua na cidade de São a capacidade que um serviço tem de dar cobertura Paulo, apresentando, desse modo, não só a exposição a uma determinada população, ou o obstáculo a sua de determinada política pública, mas também uma utilização, caracterizando uma interação que ocorre contribuição para o debate sobre a organização da em um processo de produção de serviços”. equidade no acesso às ações de saúde no Sistema Nesse sentido, acesso constitui uma categoria Único de Saúde (SUS). importante para a análise dos sistemas de saúde, uma vez que revela dimensões de caráter social e po- Equidade e Acesso aos Serviços de lítico, necessariamente presentes nas formulações e implementações de políticas de saúde (Hortale e Saúde col., 2000). Alguns estudos tomam o acesso como categoria ana- Essa discussão é pertinente, sobretudo porque lítica para apreender as iniquidades da assistência formas diferenciadas de acesso às políticas públicas à saúde de determinados grupos sociais, isto é, as por diversos segmentos sociais sempre orientaram desigualdades de acesso a recursos tecnológicos as políticas adotadas pelo Estado brasileiro, che- disponíveis para diferentes grupos sociais, que gando às décadas de 1970 e 1980 com padrões de estabelecem a maior ou menor disponibilidade de profundas desigualdades sociais, o que decorre do cuidados à saúde (Giovanella e Fleury, 1996; Tra- próprio caráter excludente da sociedade. Ao prescre- vassos e col., 2000). ver que o Estado tem o dever de tornar disponível a Vários autores têm ressaltado o fato de que saúde igualitária para todos os cidadãos, o Sistema apenas ter serviços disponíveis não garante o Único de Saúde configura-se como uma política que
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pretende reverter esse quadro. racionalidade na utilização dos demais níveis assis- No processo de organização e implantação do tenciais e produz resultados positivos nos principais SUS, a garantia de acesso aos serviços de saúde indicadores de saúde das populações assistidas tem sido uma das grandes preocupações e um dos pelas equipes (Brasil, 2009). maiores desafios dos gestores. Nessa perspectiva, No município de São Paulo, a Estratégia de Saú- a ampliação e a efetiva ação da atenção básica em de da Família foi implantada pelo gestor municipal saúde tornam-se uma política prioritária do SUS, em 2001. Hoje conta com 850 equipes em atuação, por se reconhecer que, nesse nível assistencial, é envolvendo 4.915 agentes comunitários de saúde, possível resolver os principais problemas de saúde, que correspondem a 26,62% da população total da promover saúde e reorganizar o uso real dos demais cidade (Brasil, 2009). níveis da atenção (Starfield, 2002). A Estratégia de Saúde da Família foi a modalidade tecnoassistencial A Estratégia de Saúde da Família eleita para dar conta dessa política. para a População em Situação de A Estratégia Saúde da Família Rua na Cidade de São Paulo A população em situação de rua tem presença O Programa Saúde da Família (PSF) no Brasil, for- marcante em regiões centrais das metrópoles, pois mulado pelo Ministério da Saúde a partir de 1994, essas áreas parecem oferecer mais possibilidades representa o ápice de várias propostas de mudanças de viabilizar seu “modo de andar a vida”: grande – inspiradas pela reforma sanitária e pelos princí- concentração de serviços, baixa concentração de pios do SUS – nos projetos de criação dos Distritos residências e alta circulação de pessoas que contri- Sanitários e dos Sistemas Locais de Saúde (SILOS) buem para a sua localização territorial. (Silva Junior, 1998). O PSF emerge de um acúmulo A rua pode ora se constituir em abrigo para de experiências desenvolvidas em algumas regiões aqueles que, sem recursos, dormem circunstan- do país, principalmente com o Programa de Agentes cialmente sob marquises de lojas, viadutos, bancos Comunitários de Saúde (PACS), criado em 1991, na de jardim; ora ser, ainda, um modo de vida para esteira dos programas de agentes de saúde do Ceará os que já construíram nela seu hábitat e que esta- e de Goiás (Crevelim, 2004). belecem com ela uma complexa rede de relações A Saúde da Família é entendida como uma es- (Vieira e col., 2004). tratégia de reorientação do modelo assistencial, Trata-se de um grupo populacional heterogêneo, operacionalizada mediante a implantação de equi- determinado, principalmente, pela relação variável pes multiprofissionais em unidades básicas de entre o tempo na rua e os mais diversos vínculos saúde. Essas equipes são responsáveis pelo acom- sociais. Nessa perspectiva, faz-se interessante o panhamento de um número definido de famílias, agrupamento de três grandes situações que, de al- localizadas em uma área geográfica delimitada, e guma maneira, ajudam a traçar o perfil desse grupo: atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, ficar na rua (momento circunstancial), estar na rua recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais (a rua como o local de pernoite) ou ser de rua (a rua frequentes e na manutenção da saúde dessa comuni- torna-se um espaço de moradia de forma pratica- dade. Esse processo de acompanhamento estabelece, mente definitiva) (Vieira e col., 2004). para as equipes de saúde da família, a necessidade De acordo com a pesquisa realizada em 2003 de ultrapassar os limites classicamente definidos (São Paulo, 2003), havia 10.490 pessoas vivendo em para a atenção básica no Brasil, especialmente no situação de rua na cidade de São Paulo, das quais contexto do SUS (Brasil, 2009). 60 % na região central. Atualmente, projeções não Como estratégia estruturante dos sistemas mu- oficiais apontam número próximo de 13 mil. nicipais de saúde, a Saúde da Família tem provocado Junto a essa população, o acesso aos serviços de um importante movimento no sentido de reordenar saúde se apresenta, de modo geral, com significati- o modelo de atenção no SUS, já que busca maior vos obstáculos para sua efetiva garantia, em especial
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na atenção primária, constituindo-se em um impor- atendimento. Esse projeto, sediado no CSEBFAV, foi tante preditor de suas condições de saúde, lembran- estabelecido através de “Termo de Convênio” entre do que o padrão de risco observado é constantemente a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo e a desvantajoso para indivíduos pertencentes a grupos Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São sociais menos privilegiados. Aspectos relacionados Paulo, com a contratação de uma enfermeira e de um às concepções do adoecimento e do processo do agente comunitário de saúde egresso da situação de cuidado desses indivíduos também contribuem rua (Silva, 2007; Silva e col., 2007). para sua não adesão. Todavia, questões referentes Nesse contexto de organização de práticas de à própria organização do serviço exercem papel saúde específicas, orientado por políticas públicas fundamental no acesso: exigência de documentação, equânimes, e também em resposta ao “Dia de Luta restrição no atendimento da demanda espontânea, da População em Situação de Rua”, mobilização limites na atuação intersetorial, preconceitos, entre social ocorrida em junho de 2003 que reivindicava outras, criam vínculos precários (Carneiro Junior e acesso aos serviços sociais, incluindo os da saúde, col., 1998). surge a partir de 2004 o projeto “A Gente na Rua”, Frente ao quadro, são necessários novas abor- tendo como estratégia tecnoassistencial a Saúde da dagens e novos processos de trabalho na atenção Família (São Paulo, 2004). à saúde dessa população, os quais introduzam em A implantação desse projeto, inicialmente opera- suas formulações a equidade no acesso aos serviços cionalizado através do Programa Agente Comunitá- de saúde e que sejam orientados para o que se de- rio de Saúde, pode ser considerada uma experiência nomina “discriminação positiva”, particularmente singular, transformadora de valores e concepções, no que tange aos serviços de atenção primária à exemplificada por uma série de adequações aos saúde. É preciso intervir nos aspectos relacionados processos de trabalhos conhecidos. A começar à vulnerabilidade programática, de modo a garantir pelos próprios agentes comunitários (egressos do a acessibilidade e, assim, diminuir a iniquidade tão segmento social em situação de rua), passando pela presente nesse segmento populacional (Carneiro articulação intersetorial, que se torna uma exigên- Junior e Silveira, 2003; Jesus, 2006). cia, até a necessidade de elaboração de novos termos e conceitos. Desse modo, “visita domiciliar” passa a ser “visita de rua”; domicílio, “o lugar em que se O Projeto A Gente na Rua costuma ficar na rua”, e família aquela “constituída O Centro de Saúde Escola Barra Funda Dr. Alexandre por indivíduos declarados no momento do cadastro” Vranjac (CSEBFAV) – unidade básica de saúde da (cadastro que contemple particularidades como exis- Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São tência de animal de estimação, locais para refeições Paulo – atende uma população moradora e usuária e higiene, entre outros aspectos). de distritos administrativos localizados na região Tais adequações foram necessárias devido às central do município de São Paulo. Desde 1995, co- singularidades do “modo de andar a vida” dos indi- meçou a sistematizar ações voltadas para a atenção víduos em situação de rua, requerendo novas apren- à população em situação de rua (Carneiro Junior e dizagens do processo de trabalho e novas maneiras col., 2006). de organizar o serviço. Resultante de várias articulações e projetos se- Em novembro de 2004, o projeto “A Gente na Rua” toriais e intersetoriais, como a implantação da Casa foi implantado em sete Unidades Básicas de Saúde de Cuidados Carolina Maria de Jesus (destinada a (UBS), nas regiões das subprefeituras Sé, Mooca e indivíduos em situação de rua egressos de serviços Pinheiros, contando com 11 Agentes Comunitários médico-hospitalares), teve início, a partir de 2003, de Saúde de Rua (ACSR) e uma enfermeira, amplian- o Programa de Agentes Comunitários de Saúde, do, assim, o programa acima mencionado. constituindo-se um projeto piloto cuja população- Entre outras ações, eram, inicialmente, de res- alvo eram os usuários dos serviços sociais da região ponsabilidade do Agente Comunitário de Saúde de de abrangência do CSEBFAV e/ou de seu próprio Rua (São Paulo, 2004):
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1) acompanhar em média 200 pessoas em seu local populacionais: as gestações ocorrem seis vezes mais de moradia, vinculando-as às Unidades Básicas de que na população em situação de rua, assim como o Saúde; alcoolismo incide 30 vezes mais e a tuberculose 57 2) desenvolver ações básicas de saúde nas áreas de vezes mais que na população em geral. Embora em atenção em todas as fases do ciclo de vida e nos pro- termos absolutos a quantidade seja muito menor, jetos prioritários, com ênfase na promoção da saúde proporcionalmente os números revelam o tamanho e prevenção de doenças, mobilizando a população da vulnerabilidade dos indivíduos em situação de atendida com vistas à ampliação de autonomia na rua (Secretaria Municipal da Saúde, 2007). saúde. Para isso, a equipe deveria: Considerações Finais 1) prestar assistência in loco, quando houvesse Nos últimos anos, implantou-se, na cidade de São necessidade; Paulo, uma política pública específica para a atenção 2) atuar de forma integrada com os diversos segmen- à população de rua através da Estratégia de Saúde tos da comunidade, na perspectiva de estabelecer da Família. Iniciativa que tem sido bem-sucedida em canais de diálogo, criando vínculos e compromissos favorecer o acesso desse segmento à atenção básica compartilhados na tarefa de promover a saúde. por meio de trabalhos específicos, da atuação em Para a capacitação específica da equipe, foi fun- logradouros públicos e/ou albergues e do estabeleci- damental a incorporação de temáticas e reflexões mento de vínculos e acompanhamento dos cuidados sobre a situação de rua, peculiaridades do processo necessários aos indivíduos em situação de rua. saúde-doença-cuidado nessa população, caracterís- Outro aspecto a ser ressaltado é o esforço para ticas dos serviços, possíveis resistências; questões a superação de ações isoladas, a fim de que elas se desafiadoras tanto na organização quanto no de- pautem na premissa de um trabalho intersecretarial, senvolvimento do projeto. Além do estabelecimento já que a parceria é fundamental no enfrentamento de um processo de supervisão técnica intensiva e dos determinantes do processo saúde-doença. Ainda particularizada, pois alguns agentes apresentaram em relação à população em situação de rua, essa necessárias intervenções assistenciais, em especial parceria torna-se condição intrínseca no sentido no campo da saúde mental. de assistir integralmente um grupo tão específico No ano de 2005, o número de equipes subiu para e diversificado. três, com um total de 35 Agentes Comunitários de Contudo, para o aprofundamento de futuros Saúde (ACS) nas mesmas regiões. Segundo dados de trabalhos na atenção à saúde desse segmento, há dezembro de 2007, havia 5.000 pessoas cadastradas ainda que se observar uma série de questões que, nas regiões em que o projeto estava implantado embora tenham sido apontadas, não foram aqui (Secretaria Municipal da Saúde, 2007). Em 2008, as plenamente desenvolvidas: o acesso às ações de equipes de PACS foram transformadas em equipes saúde na perspectiva da integralidade e, neste caso, de PSF, perfazendo um total de nove, com 57 ACS, a efetividade do segmento longitudinal dos indiví- além da contratação de três médicos e seis auxilia- duos em situação de rua; a organização do cuidado res de enfermagem. Dados de dezembro de 2008 já para os que apresentam transtornos mentais, com apontam 11.406 pessoas cadastradas, compondo um abordagens terapêuticas mais específicas, como o universo de 7.677 famílias (Secretaria Municipal da gerenciamento de casos ou o estabelecimento de Saúde, 2008). acompanhantes terapêuticos; a nova orientação Comparando os dados do Sistema de Informação da Secretaria Municipal da Saúde de que os novos da Atenção Básica (SIAB) da população em geral do Agentes Comunitários de Saúde não precisam ser município de São Paulo, cadastrada pelas equipes da egressos desse segmento populacional; e a efetiva- Saúde da Família, com os da população em situação ção da política intersecretarial tanto em nível micro de rua, para o período de janeiro de 2007, é possível – discussões conjuntas entre os agentes públicos das observar certas diferenças entre esses dois grupos áreas sociais sobre plano de cuidados, dificuldades
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no manuseio de certas situações apresentadas pelos HORTALE, V. A.; CONILL, E. M.; PEDROZA, M. indivíduos em situação de rua, por exemplo – como Desafios na construção de um modelo para análise em nível macro – criação de centros de serviços comparada da organização de serviços de saúde. e oportunidades de trabalho, moradia, educação, Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 15, n. entre outros. 1, p. 79-88, jan./mar. 1999. HORTALE, V. A.; PEDROZA, M.; ROSA, M. L. Referências G. Operacionalizando as categorias acesso e descentralização na análise de sistemas de saúde. ADAY, L. A.; ANDERSEN, R. A framework for the Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 16, n. study of access to medical care. Health Services 1, p. 231-39, jan./mar. 2000. Research, Chicago, v. 9, n. 3, p. 208-20, 1974. JESUS, C. H. Estudo descritivo da população BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde da Família. adulta em situação de rua da área central do Disponível em: <http:// www.saude.gov.br/ Município de São Paulo relativo à vulnerabilidade saudedafamilia>. Acesso em: 09 fev. 2009. às infecções sexualmente transmissíveis e à AIDS. CARNEIRO JUNIOR, N. et al. Serviços de saúde e São Paulo, 2006. Dissertação (Mestrado em Saúde população de rua: contribuição para um debate. Coletiva) - Faculdade de Ciências Médicas da Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 47-62, Santa Casa de São Paulo, São Paulo, 2006. ago./dez.1998. PENCHANSKY, R.; THOMAS, J. W. The concept of CARNEIRO JUNIOR, N.; SILVEIRA, C. Organização access: definition and relationship to consumer das práticas de atenção primária em saúde no satisfaction. Medical Care, Philadelphia, v. 19, n. 2, contexto dos processos de exclusão/inclusão p. 127-40, feb. 1981. social. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, SÃO PAULO (Município). Prefeitura do Município v. 19, n. 6, p. 1827-35, nov./dez. 2003. de São Paulo. Secretaria Municipal da Assistência CARNEIRO JUNIOR, N. et al. Organização Social. Fundação e Instituto de Pesquisa. de práticas de saúde equânimes em atenção Estimativa do número de pessoas em situação de primária em região metropolitana no contexto dos rua da cidade de São Paulo em 2003. São Paulo: processos de inclusão e exclusão social. Saúde e Secretaria Municipal de Assistência Social, 2003. Sociedade, São Paulo, v. 15, n. 3, p. 30-39, set./dez. SÃO PAULO (Município). Prefeitura do Município 2006. de São Paulo. Secretaria Municipal da Saúde. CREVELIM, M. A. A Participação da comunidade Secretaria Municipal de Assistência Social. no Programa Saúde da Família na perspectiva do Protocolo de Intenções entre as Secretarias trabalho em equipe. São Paulo, 2004. Dissertação Municipais de Saúde e de Assistência Social para (Mestrado em Administração de Enfermagem) a Atenção à População em Situação de Rua. São - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo: Secretaria Municipal de Assistência Social, Paulo, São Paulo, 2004. 26 de maio de 2004. FRENK, J. El concepto y la medicion de SÃO PAULO (Município). Prefeitura do Município accesibilidad. In: WHITE, K. L. (Ed.). de São Paulo. Secretaria Municipal da Saúde. Investigaciones sobre servicios de salud: una Sistema de Informação da Atenção Básica. antologia. Washington-D.C: OPS, 1992. p. 929-43. Consolidado das famílias cadastradas e das equipes no ano de 2007. São Paulo: Secretaria GIOVANELLA, L.; FLEURY, S. Universalidade da Municipal da Saúde, 2007. atenção à saúde: acesso como categoria de análise. In: EIBENSCHUTZ, C. (Org.). Política de saúde: o público e o privado. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1996. p. 177-98.
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