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INTRODUÇÃO

Esta apostila tem como principal objetivo estruturar um processo


para o desenvolvimento de um novo negócio, tendo como base a
abordagem lean startup. Para tanto, foi estruturada em três módulos,
descritos a seguir.
O primeiro módulo, Transformando ideias em oportunidades de
negócios, tem como propósito apresentar ao leitor as diversas definições
existentes acerca do termo empreendedor, bem como suas principais
características. Além disso, nesse módulo, inicia-se a discussão do
processo de identificação de oportunidades de negócios, que é o
primeiro passo para quem está pensando em empreender. Para tanto,
são descritas três ferramentas que auxiliam no entendimento do
potencial cliente da oportunidade identificada – persona, mapa de
empatia e ponto de vista do usuário.
No segundo módulo, Identificação do modelo de negócio, será
explicado o conceito de modelo de negócio, fundamental para embasar
o empreendimento. Para definir o modelo de negócio, são utilizados
três princípios. O primeiro deles é resumir as hipóteses do seu negócio
em uma ferramenta chamada Canvas; o segundo princípio é o de sair a
campo para testar as hipóteses definidas no Canvas e o terceiro
princípio é desenvolver o produto ou serviço junto ao potencial cliente,
por meio de um produto mínimo viável.
Após a aplicação dos três princípios e sendo os resultados
satisfatórios, o empreendedor finaliza a busca do seu modelo de
negócio, podendo então partir para a execução, assunto que compõe o
terceiro módulo da apostila, Execução do negócio. Para tanto, ele vai
precisar desenvolver habilidades para vender seu negócio a um potencial
investidor, razão pela qual será necessário que ele saiba fazer um bom
pitch de negócios. Adicionalmente, serão apresentadas as principais
fontes de recursos utilizadas pelo empreendedor para efetivamente
colocar o negócio em pé. Por fim, a apostila será concluída enfatizando-
se que o processo empreendedor nela descrito também serve para quem
deseja intraempreender, ou seja, montar um negócio mesmo sendo
empregado em uma organização.
A Figura 1, a seguir, esquematiza os passos necessários para a construção de um negócio.
SUMÁRIO
MÓDULO I – TRANSFORMANDO IDEIAS EM OPORTUNIDADES DE NEGÓCIO......................................... 7

DEFINIÇÃO DE EMPREENDEDORISMO ........................................................................................................7


TRANSFORMANDO IDEIAS EM OPORTUNIDADES DE NOVOS NEGÓCIOS....................................... 11
FERRAMENTAS PARA ENTENDER MELHOR O SEU PÚBLICO: PERSONA, MAPA DE EMPATIA E
PONTO DE VISTA DO USUÁRIO .................................................................................................................. 13

MÓDULO II – IDENTIFICAÇÃO DO MODELO DE NEGÓCIO ........................................................................ 17

MODELO DE NEGÓCIO................................................................................................................................. 18

MÓDULO III – EXECUÇÃO DO NEGÓCIO ....................................................................................................... 25

RECURSOS DO PRÓPRIO EMPREENDEDOR ............................................................................................ 26


SÓCIOS ............................................................................................................................................................. 26
FAMILIARES E AMIGOS ................................................................................................................................. 27
INVESTIDORES-ANJOS................................................................................................................................... 27
VENTURE CAPITAL ............................................................................................................................................ 28
OUTRAS FONTES: CROWDFUNDING E RECURSOS GOVERNAMENTAIS .............................................. 30

APÊNDICE ............................................................................................................................................................ 31

PLANO DE NEGÓCIO: HAMBURGUERIA ................................................................................................... 31


A OPORTUNIDADE ........................................................................................................................................ 31
OS INVESTIMENTOS NECESSÁRIOS E SUA UTILIZAÇÃO........................................................................ 33
RETORNO ESPERADO DO INVESTIMENTO .............................................................................................. 33

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................................... 35

PROFESSORES-AUTORES ..................................................................................................................... 37
MÓDULO I – TRANSFORMANDO IDEIAS EM
OPORTUNIDADES DE NEGÓCIO

Este módulo tem como propósito apresentar ao leitor as diversas definições existentes acerca
do termo empreendedor, bem como suas principais características. Além disso, inicia-se, aqui, a
discussão do processo de identificação de oportunidades de negócios, que é o primeiro passo para
quem está pensando em empreender.

Definição de empreendedorismo
De tempos em tempos, aparecem umas “palavras mágicas” em Administração. Se qualidade
e reengenharia já reinaram absolutas na agenda dos executivos do passado, hoje a palavra da moda
é empreendedorismo. Nunca se falou tanto sobre esse tema e as histórias dos jovens milionários que
inventaram um aplicativo e agora são ricos e famosos.
Mas, afinal, como definir um empreendedor?
A definição do que seja um empreendedor não é algo simples, já que existem diversas
abordagens para a palavra. Segundo Degen (2009), o termo empreendedor é originário do inglês,
entrepreneur, que, por sua vez, se origina do francês, e é uma combinação das palavras latinas inter
(entre) e prehendere (comprador). Assim, o empreendedor era o intermediário, o indivíduo que
comercializava bens e produtos, cujo exemplo histórico pioneiro está no veneziano Marco Polo,
que tentou estabelecer uma rota comercial entre Europa e Oriente.
Segundo Neto et al. (2013), um dos primeiros estudiosos a tratar com destaque o tema
empreendedorismo foi Joseph Schumpeter (1883-1950), economista austríaco e professor de
Harvard, para quem empreendedor é o responsável pela introdução de uma inovação que altera a
ordem econômica vigente, a chamada “destruição criativa”. Para Schumpeter, a inovação e o
progresso econômico são promovidos pelos empreendedores, os quais possuem papel ativo no
desenvolvimento econômico dos países. Um exemplo de um empreendedora, segundo o conceito
de Schumpeter, é Bill Gates, da Microsoft, que, ao introduzir o sistema Windows, acabou
transformando toda a indústria de tecnologia de informação.
Em outro extremo, há uma definição mais ampla, conforme defendida por Longenecker,
Moore e Petty (1998), segundo os quais o empreendedor pode ser considerado uma pessoa que está
iniciando ou operando um negócio. Tal definição já abrange um número muito maior de pessoas,
pois considera qualquer tipo de empreendedor – do Bill Gates ao dono de um pequeno comércio.
Há, também, uma terceira abordagem, que fica no meio-termo entre essas duas definições.
Essa abordagem, defendida por autores como Hisrich, Peters e Shepherd (2009), relaciona o
empreendedor com algumas atitudes, tais como inovação, busca por oportunidades, crescimento
do negócio e propensão ao risco. Para esses autores, o empreendedor é aquele indivíduo que
assume riscos e inicia algo novo, orientado ao crescimento do negócio.
A definição de Filion (1999), estudioso canadense do empreendedorismo, incorpora várias das
definições abordadas anteriormente. Para ele, o empreendedor é uma pessoa criativa, caracterizada
pela capacidade de estabelecer e alcançar objetivos. Precisa estar constantemente informado, a fim de
detectar novas oportunidades e, à medida que continua se informando e tomando um conjunto de
decisões moderadamente arriscadas, ele estará desempenhando um papel inovador.
Nesta apostila, a definição de empreendedor que será considerada se aproxima da definição
de Filion (1999) e Hisrich, Peters e Shepherd (2009), relacionando empreendedorismo com
inovação, risco, busca pelo crescimento e identificação de uma oportunidade de negócio. Assim,
um indivíduo que monta um bar na esquina de sua casa, sem grandes ambições de crescimento,
apenas por uma questão de sobrevivência e sem oferecer nada de muito novo ao cliente, na nossa
concepção, é muito mais um proprietário de um pequeno negócio do que um empreendedor. No
entanto, se esse mesmo indivíduo tem a ambição de transformar seu bar em uma grande rede de
franquias no futuro, identifica uma oportunidade ao oferecer um tipo de comida que ninguém
oferece, inova ao acrescentar sabores e pratos diferenciados e, consequentemente, corre risco por
oferecer essa inovação, então estamos diante de um empreendedor.
Como várias das definições anteriores ressaltam o papel inovador do empreendedor, vale a
pena conhecer a definição de inovação de Schumpeter (1934), para quem a inovação pode
acontecer em cinco contextos:
a) criação de um novo produto ou uma nova qualidade de um produto – a criação do
telefone celular é um exemplo de uma inovação de produto, e o surgimento do telefone
celular que vibra é um exemplo de uma nova qualidade de produto;
b) nova maneira de produzir ou comercializar alguma coisa – a introdução de um processo
que reduz o tempo de fabricação de um móvel é um exemplo de inovação de processo;
c) descoberta de um novo mercado – pode-se citar a aquisição de produtos pelas classes
mais baixas em função da queda do seu custo originada pela inovação, como ocorrido
pelo carro indiano produzido pela Tata;

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d) descoberta de uma nova fonte de matéria-prima – o uso do plástico para a fabricação de
calçados é um exemplo desse tipo de inovação;
e) transferência da organização de um ramo econômico para outro – a constituição de
um oligopólio, como ocorrido no ramo dos supermercados, é um exemplo desse
tipo de inovação.

Depois de definir o empreendedor, é importante, também, relacionar suas principais


características. No entanto, aqui também é difícil estabelecer tais características, uma vez que a
variabilidade de comportamentos apontada pela literatura é bastante grande. Neto et al. (2013) cita
o trabalho de Dornelas (2007), que analisou 25 artigos publicados em periódicos internacionais e
em livros de referência no período de 1972 a 2005, relacionando as características que apareceram
mais frequentemente nos artigos e livros analisados, tal como a Tabela 1 permite visualizar.

Tabela 1: Características dos empreendedores.

Características Nº de citações %
Exposição a riscos 15 11,4%
Independência/autonomia 10 7,6%
Inovação 9 6,8%
Realização 9 6,8%
Autocontrole 8 6,0%
Criatividade 8 6,0%
Autoconfiança 7 5,3%
Responsabilidade 6 4,6%
Determinação 5 3,8%
Energia/Entusiasmo 5 3,8%
Liderança 5 3,8%
Metas 5 3,8%
Tolerância a incertezas 5 3,8%
Ambição 4 3,0%
Busca por dinheiro 4 3,0%
Iniciativa 4 3,0%
Oportunidades 4 3,0%
Rede de contato 4 3,0%
Busca de informação 3 2,3%
Comprometimento 3 2,3%
Persistência 3 2,3%
Poder 3 2,3%
Positivismo 3 2,3%
Total 132 100%
Fonte: Dornelas (2007). Adaptado.

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Pela Tabela 1, podemos perceber que muitas dessas características não apresentam
fronteiras muito claras e acabam se misturando entre si, como é o caso de dinheiro e ambição;
inovação e criatividade; energia, determinação, liderança e iniciativa. Ressalta-se, ainda, que é
praticamente impossível reunir todas essas características em um único empreendedor. Hashimoto
(2006) faz uma alusão a esse fato ao comentar que só um empreendedor-herói poderia possuir
todas as características que se costuma atribuir a ele.
Existem diversos testes no mercado que podem auxiliar quem está pensando em empreender
a entender se possui um perfil empreendedor ou não. Testes nunca são conclusivos, mas podem ser
úteis ao indicar algumas características que devem estar presentes em um empreendedor. O teste
GET, por exemplo, relaciona cinco dimensões para um comportamento empreendedor:
a) necessidade de realização – empreendedores têm necessidade de deixar um legado,
realizar algo que seja relevante para determinado público. Em geral, são otimistas,
persistentes, determinados, orientado às realizações de tarefas;
b) necessidade de autonomia – empreendedores têm uma forte tendência de estar no
controle das ações. Não gostam de receber ordens e, muitas vezes, essa é a razão pela
qual deixam de ser empregados para virar empreendedores. São teimosos, determinados
e não cedem facilmente à pressão do grupo;
c) tendência criativa – empreendedores são sonhadores, curiosos, versáteis. Gostam de
novos desafios e de pensar coisas novas para resolver problemas antigos;
d) riscos calculados – empreendedores tendem a estar dispostos a assumir riscos calculados.
Para tanto, aprendem a tomar decisões sob contextos com pouca informação e, para
tanto, utilizam muito a intuição;
e) drive e determinação – empreendedores não acreditam em destino, por isso tendem a
ser determinados e orientados a seus projetos. Sabem identificar e aproveitar
oportunidades de negócios.

Finalizada essa parte inicial, cujo propósito é tecer algumas considerações acerca da
definição e das características do empreendedor, passa-se ao primeiro passo do processo de criação
de um negócio, que é a identificação de oportunidades de novos negócios.

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Transformando ideias em oportunidades de novos
negócios
Todo empreendimento começa com uma ideia de um produto ou de um serviço. Ter uma
ideia é muito fácil. É de graça. Todos nós já tivemos ideias geniais que, se colocadas em prática,
iriam revolucionar o mundo. A grande questão, no entanto, é transformar uma ideia em uma
oportunidade de negócio. Para tanto, as ideias precisam preencher quatro requisitos:
a) devem ter valor, que pode ser entendido como a qualidade da ideia em si;
b) devem solucionar uma necessidade, uma dor, um problema;
c) devem atingir um determinado mercado que se disponha a comprá-las e
d) devem ser desenvolvidas no momento certo.

Especificamente com relação ao item d, muitos produtos são desenvolvidos ou pensados no


timing errado, seja em função da tecnologia disponível, seja em função de o mercado ainda não
estar preparado para recebê-los. Leonardo da Vinci, por exemplo, projetou muitos produtos,
como a lente de contato ou a asa-delta, há alguns séculos, mas que não puderam ser fabricados em
função da tecnologia ainda inexistente na época. Outro exemplo é um cartão de débito lançado
em alguns estados no Sul do Brasil pela Fundação Certi, bem antes de se espalhar pelo país. No
entanto, não foi para frente em função do baixo entendimento do público com relação ao cartão.
As ideias podem surgir basicamente de duas frentes – perfil pessoal ou mercado. As ideias
que surgem a partir do perfil pessoal do empreendedor estão ligadas aos gostos e hobbies do
empreendedor, sejam eles tangíveis (livros, futebol, viagens, comidas, etc) ou intangíveis
(conversar, lidar com pessoas, aprender, etc). Quantos restaurantes, hoje famosos, não começaram
porque o empreendedor gostava de cozinhar? Primeiro, ele cozinhava para os amigos, depois para
os amigos dos amigos, até que a casa ficava pequena e ele tinha que alugar um pequeno espaço.
Passado algum tempo, o espaço também ficava pequeno, abria-se uma filial, depois mais outra,
até virar uma rede de franquias.
As ideias também podem ser originárias do mercado, seja por meio de negócios já existentes
no mercado internacional, exploração de nichos no mercado doméstico ainda não explorados ou,
ainda, examinando algumas tendências. Com relação ao primeiro tipo, negócios já existentes no
mercado internacional, pode-se citar o exemplo das lan houses. O empreendedor que lançou as lan
houses no Brasil teve a ideia a partir de uma temporada de férias na Coreia. No entanto, ser o
primeiro também tem seus riscos. Muitos produtos que funcionam bem no exterior não
necessariamente dão certo no Brasil. Fast food de frango frito, sopas enlatadas, pizzas assadas em
forno elétrico são alguns exemplos de negócios bem-sucedidos em vários países e que, aqui, nunca
decolaram, por não se adaptarem aos gostos e hábitos do brasileiro. Por isso é importante começar
devagar, testar o produto e, principalmente, fazer algumas adaptações de modo a torná-lo mais
próximo do gosto do brasileiro.

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Pode-se também identificar nichos ainda não explorados, como fizeram as academias voltadas
apenas para mulheres, os serviços para o público da terceira idade ou LGBT, entre outros.
Finalmente, podem-se procurar ideias de negócios examinando tendências de mercado.
Todo empreendedor que se preze tem de estar sempre atento às tendências do mercado, de modo
a identificar oportunidades para seus negócios. Academicamente, chamamos isso de alertness. Sai
na frente o empreendedor que consegue perceber essas tendências antes dos demais, já que tudo o
que é novo atrai mais mídia, inclusive a gratuita, além de fixar a marca nos clientes ávidos por
aqueles produtos. Vejamos alguns exemplos:
a) O caso das pessoas que vivem sozinhas. Esse é um público cada vez maior no Brasil,
formado por pessoas que estão adiando o casamento ou simplesmente optando por
viverem sós. Segundo o IBGE, o número de brasileiros que vivem sozinhos é cerca de
68 milhões de pessoas. Com esse dado, é possível pensar em várias opções de negócios
para satisfazer esse público, tais como: alimentos vendidos em embalagens menores,
serviços de limpeza doméstica, congelados e manutenção da casa durante períodos de
viagens, etc.
b) Outra tendência que está cada vez mais se consolidando é a praticidade. Ninguém mais
quer perder tempo fazendo coisas chatas ou lidando com problemas que podem ser
facilmente evitados. Parece que as pessoas estão tão cansadas e estressadas que fazem
tudo para não terem de resolver problemas cotidianos. Um exemplo disso são as
moradias, cada vez menores. Hoje em dia, morar em grandes espaços virou uma dor de
cabeça. Os altos preços das taxas condominiais ou da manutenção das casas levam as
pessoas a quererem morar em espaços cada vez menores. Há apartamentos de 14 metros
quadrados sendo oferecidos no mercado.
c) Essa tendência acabou gerando uma série de oportunidades de negócios. Há empresas que
realizam faxinas expressas, de uma ou duas horas; outras se especializaram em resolver
pequenos problemas elétricos ou hidráulicos; há as que enviam todos os ingredientes de
uma receita, se você quiser fazer um jantar especial; você também pode fazer uma
assinatura e receber meias e cuecas todo mês. Enfim, a comodidade parece ser a regra.
d) Beleza e moda também são uma forte tendência no nosso país. As pessoas estão se cuidando
e não se importam em gastar em cosméticos, tratamentos estéticos, academias de ginástica,
roupas, etc. Negócios que vão ao encontro dessa tendência parecem se fortalecer cada vez
mais. No entanto, como a concorrência nesses setores é alta, o empreendedor deve buscar
um modo de se diferenciar: focar em um nicho de mercado, utilizar uma técnica inovadora,
inovar nos processos, oferecer um preço mais em conta, etc.
e) Tendências também podem ser identificadas a partir de algumas mudanças de ordem
tecnológica, política, social, demográfica ou setoriais. Por exemplo, nos anos 70, foram
criadas várias leis para diminuir o risco de incêndio em apartamentos, exigindo porta

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corta-fogo, hidrantes, mangueiras, extintores, etc. Isso gera a oportunidades para novos
negócios, que são criados para atender aos requisitos da nova legislação.
f) Antes dos anos 80, não havia pet shops na cidade de São Paulo, por exemplo. Banho, tosa,
ração e outras infinidades de artigos, que podem ser encontrados nos shoppings de animais
nos dias de hoje, naquela época não existiam. Os poucos artigos disponíveis para os animais
de estimação eram vendidos em aviculturas, entre alpiste e comida para galinhas. Da mesma
forma que o mercado pet, vários outros setores passaram por transformações significativas
nesses últimos anos. Montar um dos primeiros pet shops da cidade, identificando uma
tendência antes dos demais e apostar nela, fez diferença. Por outro lado, ser o décimo pet
shop a ser aberto no bairro provavelmente não irá levá-lo muito longe.

Por isso, lembre-se: ser pioneiro tem suas vantagens. Você corre muito mais risco, mas, se o
negócio der certo, você poderá colher retornos significativos. É a velha lei da proporcionalidade –
quanto maior o risco corrido, maior pode ser o seu retorno. É por isso que o empreendedor deve
dedicar parte do seu tempo para prospectar essas tendências. Isso irá ajudá-lo a melhor identificar
uma oportunidade de negócio.
E como conseguir isso? Procure fazer um exercício seminal, reservando um tempo
específico para a prospecção de tendências. Assinar revistas internacionais do segmento em que
sua atual ou futura empresa atua pode ser uma estratégia para saber para onde seu setor está
caminhando. Visitar feiras e eventos pode ser outra. Filiar-se a associações de classe permite
criar um networking com especialistas do seu setor. Ficar atento ao que ocorre em outros países
também pode ajudar, dado o caráter global de nossa economia. Uma vez identificada uma
oportunidade de negócio, o próximo passo é verificar se ela realmente se revela uma
oportunidade viável. Para tanto, vale a pena entender melhor o seu público-alvo, utilizando
algumas ferramentas que permitem esse entendimento.

Ferramentas para entender melhor o seu público:


persona, mapa de empatia e ponto de vista do usuário
Uma vez identificada a oportunidade, é possível utilizar algumas ferramentas que auxiliam a
melhor definir seu público e, com isso, melhor caracterizar a oportunidade de negócios. Tais
ferramentas permitem que o empreendedor obtenha determinadas informações a partir de
projeções feitas em clientes potenciais.
A primeira dessas ferramentas é a persona, cujo objetivo é associar características ao potencial
cliente do produto, tais como nome, idade, ocupação, características físicas, características
psicológicas, nível de escolaridade, principais objetivos, maiores dificuldades, etc. Vamos imaginar
que o empreendedor queira lançar um e-commerce de bijuterias sofisticadas com dicas de uso e moda

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on-line. Vamos construir a persona desse negócio: trata-se de Ana Paula, uma mulher de 40 anos,
executiva financeira de uma grande empresa multinacional. Ana Paula tem uma jornada de trabalho
bastante intensa, que muitas vezes se estende em jantares de negócio com executivos estrangeiros
que estão visitando o Brasil. Para ela, passar uma imagem de elegância e sofisticação é importante,
muito embora tenha pouco tempo disponível para visitar lojas e butiques. Por isso, é usuária da
compra on-line. A Figura 2, a seguir, esquematiza a persona.

Figura 2: Exemplo de persona.

Outra ferramenta, o mapa da empatia, detalha a ferramenta anterior, indo mais a fundo no
entendimento do potencial cliente. Assim, o mapa de empatia classifica os comportamentos da
persona com relação ao que ela faz, escuta, pensa, sente e vê. No exemplo de Ana Paula, podemos
ir mais a fundo complementando que ela está buscando uma posição de CEO em sua empresa,
mas não descarta trocar seu emprego por outro em uma empresa similar. É uma pessoa ambiciosa,
mas sem atropelar os outros para atingir seus objetivos. Não se importa de trabalhar longas
jornadas, desde que seja reconhecida por isso. Teve uma infância difícil e, por isso, dá muita
importância à imagem e à sofisticação, investindo boa parte do seu salário em educação e moda.
Por não ter muito tempo para acompanhar a evolução da moda, às vezes se sente insegura ao usar
determinada roupa ou bijuteria. A Figura 3, a seguir, esquematiza o mapa de empatia.

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Figura 3: Mapa de empatia.

Finalmente, a terceira ferramenta é o POV – ponto de vista do usuário, em que se cria uma
frase que conecta o usuário a uma necessidade. Dessa forma, uma <persona> precisa de uma
<necessidade> porque existe um <ponto de dor>. Por exemplo, <Ana Paula, uma executiva do
setor financeiro> precisa de <uma forma rápida de comprar bijuterias que se adeque ao seu estilo
de vida, preferencialmente acompanhada de certa orientação de como utilizá-las> porque <ainda
se sente insegura com relação a alguns aspectos da moda, não conseguindo acompanhar toda a
evolução do segmento>.
Agora que já vimos algumas ferramentas para melhor entender a oportunidade de negócio e
seu potencial cliente, passemos a entender melhor o que significa um modelo de negócio, tema do
próximo módulo.

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MÓDULO II – IDENTIFICAÇÃO DO MODELO
DE NEGÓCIO

Neste segundo módulo, Identificação do modelo de negócio, será explicado o conceito de


modelo de negócio, fundamental para embasar o empreendimento. Feito isso, vamos explorar os
três princípios do lean startup que auxiliam o empreendedor a definir seu modelo de negócio:
Canvas, entrevistas de validação do Canvas e produto minimamente viável.
Até a primeira década dos anos 2000, a ferramenta mais utilizada para iniciar uma empresa
era o plano de negócios, um documento com cerca de 30 páginas que tradicionalmente
estabelecia as premissas básicas de um negócio, premissas essas ligadas ao marketing, finanças,
pessoas e operações de uma potencial empresa. Nessa época, quando um empreendedor tinha
uma ideia, ele a validava rapidamente com seus conhecidos e já partia para o plano de negócios,
que consumia alguns meses para ser desenvolvido. Com o plano em mãos, o próximo passo era
utilizá-lo para captar recursos e iniciar o negócio.
Por exemplo, se o empreendedor tivesse como objetivo montar um restaurante
especializado em comida francesa, ele elaborava um plano descrevendo seu público-alvo, quantas
refeições seriam servidas por dia, bebidas que seriam consumidas, como seria a propaganda do
restaurante, preço dos produtos, menu, local em que o restaurante iria funcionar, número de
empregados, número de mesas, horário de funcionamento, receitas, despesas e o lucro do
restaurante. Perceba, leitor, que é impossível fazer um planejamento tão detalhado para algo que o
empreendedor não tem nenhum controle e, muitas vezes, sequer uma mínima experiência prévia
naquele setor. Na verdade, o plano de negócios aplicado a esse contexto acabava sendo um
documento fictício, baseado em premissas não validadas ou validadas de modo superficial.
Com o negócio em pé, qual não era a surpresa do empreendedor ao constatar que seus
produtos ou serviços não se vendiam, pois não eram exatamente aquilo que o consumidor
desejava. Só que, naquele momento, já era muito tarde para rever as estratégias do negócio e, na
maioria dos casos, a única solução era fechar o empreendimento.
Isso não quer dizer que o plano de negócios seja um documento inútil. Em contextos bem
conhecidos, ou quando o empreendedor já encontrou seu modelo de negócios, ele pode ser
utilizado como ferramenta de planejamento e auxiliar na montagem do negócio, mas não enquanto
o empreendedor não encontrar um modelo que tenho sido validado por outras metodologias.
Em 2001, a professora Saras Sarasvathy publica um artigo introduzindo a teoria effectuation.
Ela entrevistou empreendedores com muitos anos de experiência, perguntando como eles tomavam
decisões a partir de algumas situações que ela lhes apresentava. Ela acreditava que, por serem muito
experientes, utilizavam uma forma mais racional de tomada de decisão, baseando-se em métodos de
planejamento estruturados. Surpreendentemente, muito desses empreendedores buscavam
informações entre seus conhecidos, abusavam de tentativa-e-erro e não estavam muito preocupados
em saber quanto que eles iriam ganhar ao investir seu capital em determinado negócio.
Dez anos depois do artigo de Sarasvathy, foram publicados três livros fortemente
influenciados por seu trabalho e que servem de base do movimento lean startup ou startup enxuta:
Blank e Dorf (2012), Ries (2012) e Osterwalder e Pigneur (2011).
Segundo esse movimento, deve-se dividir o processo de criação de um negócio em duas
etapas – a busca pelo modelo de negócio e a execução propriamente dita. Nesta apostila, será
enfatizada a primeira etapa, a busca pelo modelo de negócio. Uma vez encontrado o modelo,
passa-se à fase de execução, que é a construção de um plano de negócio. No apêndice da apostila,
foi disponibilizado um modelo resumido de plano de negócio. Vamos, então, entender o que é
um modelo de negócio.

Modelo de negócio
Podemos encontrar diversas definições com relação ao termo, com destaque para a que
relaciona modelo de negócio com a lógica que está por trás do empreendimento e que tem como
resultado a entrega de valor para o cliente. No entanto, de uma forma mais simplista e
compreensível, pode-se entender o conceito com uma pergunta: como você ganha dinheiro?
Creio que muitos já escutaram que os postos de gasolina não ganham dinheiro vendendo
gasolina, já que as margens desse produto são muito pequenas. Um posto ganha dinheiro mesmo é
com os serviços que ele oferece, ou seja, troca de óleo, lavagem e, principalmente, na loja de
conveniência. A lógica que está por trás desse negócio é oferecer produtos de conveniência a seus
clientes e, nesse caso, um bom gerente de posto tem de entender tanto de varejo quanto de gasolina.
Da mesma forma, grande parte da receita de um cinema vem da pipoca, do café e dos doces, e é por
isso que o setor da pipoca e dos doces têm ganhado cada vez mais espaço nas salas de cinema.
A dica é que o empreendedor procure pensar em um modelo de negócio consistente, que
permita que o empreendimento cresça e se fortaleça. Por exemplo, um negócio cujo modelo
permita receitas recorrentes, como fizeram os fabricantes de elevadores, em que grande parte das
receitas vem dos contratos de manutenção, em vez de vir da venda do elevador em si. Não pense,

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contudo, que encontrar um modelo consistente é tarefa fácil. Muito esforço, muita pesquisa,
muita tentativa-e-erro são necessários até você ouvir aquele “click”: ter aquela ideia que fará você
montar efetivamente um negócio.
Outro modelo de negócio muito em voga hoje em dia é o market place. Trata-se de uma
plataforma digital que une dois públicos, um que demanda e outro que oferta algo. A empresa
põe em contato esses dois públicos, cobrando uma comissão por isso. Se, anos atrás, alguém
dissesse que, no futuro, haveria um negócio em que as pessoas compartilhariam sua casa com um
estranho, provavelmente esse alguém seria chamado de louco. No entanto, o Airbnb, market place
que permite o compartilhamento de casas ou quartos, foi recentemente avaliado em 25 bilhões de
dólares, uma das mais valiosas startups da atualidade!
Outro caso emblemático é o Booking.com, site de reserva de hotéis. A vantagem de um
market place é que não há necessidade de se ter todo um aparato logístico para a entrega do
produto, como no e-commerce. Dada a alta escalabilidade desse modelo, com uma equipe
razoavelmente pequenas, pode-se atingir uma quantidade imensa de pessoas.
Alguns aspectos são críticos nesse modelo. Um deles é a massa crítica, ou seja, como a
comissão cobrada é baixa, é preciso ter muitos clientes para atingir um nível satisfatório de
receitas. Outro ponto é o gerenciamento da demanda e da oferta, de modo a estabelecer uma
relação de confiança mútua entre vendedor e comprador. O Airbnb, por exemplo, permite que
tanto o locador quanto o locatário possam registrar no site a experiência, influenciando a decisão
dos próximos compradores e vendedores.
Outro tipo de modelo de negócio é o freemium, em que a versão básica do produto ou do
serviço é oferecida gratuitamente ao consumidor. No entanto, caso ele deseje serviços adicionais,
tem de pagar por isso. Um exemplo típico desse modelo de negócio é o Dropbox, plataforma de
armazenamento na nuvem, cuja versão básica é gratuita. À medida que o consumidor precisar de
espaço adicional, porém, tem de pagar por isso.
Por fim, pode-se citar também o modelo da cauda longa, que foca em mercados de nicho, e
não em grandes mercados, muito mais competitivos e difíceis. Há editoras, por exemplo, que, em
vez de trabalharem com um número reduzido de autores conhecidos e best-sellers, preferem
explorar centenas de títulos de autores que vendem em nichos específicos.
Antes de colocar o negócio efetivamente em pé, deve-se testar exaustivamente a ideia do negócio
para que se tenha certeza de que é isso mesmo o que o cliente quer e vai comprar, ou seja, encontrar
um modelo de negócio suficientemente robusto. Para tanto, três princípios devem ser seguidos:
a) resumo das hipóteses no Canvas, e não no desenvolvimento de um plano de negócio;
b) hipóteses exaustivamente testadas, junto a potenciais consumidores, por meio de
entrevistas e
c) construção de um produto minimamente viável e o seu aperfeiçoamento a partir da
sugestão de seus potenciais clientes.

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O primeiro dos três princípios do lean startup é elaborar uma série de hipóteses (ou seja, qual é o
meu público-alvo, qual é o meu canal de distribuição, quais são os meus recursos, etc) no Canvas, em
vez de desenvolver um plano de negócios. O Canvas foi inspirado nos conceitos de design thinking, no
qual se prioriza a representação gráfica como forma de estruturar o pensamento. Osterwalder e
Pigneur (2011), autores do livro Business model generation, cujo download das primeiras 72 páginas
pode ser obtido gratuitamente no site http://www.businessmodelgeneration.com/book, preconizam
que o empreendedor deve, ao pensar em uma ideia de negócio, elaborar hipóteses sobre nove blocos:
1. segmentos de clientes;
2. proposta de valor;
3. canais;
4. relacionamento com clientes;
5. fontes de receita;
6. estrutura de custos;
7. atividades-chaves;
8. recursos principais e
9. parcerias principais.

O Canvas é algo bastante simples, não passando de uma folha, mas que contém premissas
importantes para delinear um negócio. Por ser simples, o empreendedor é encorajado a mudar tais
premissas toda vez que encontra uma contingência, fato que não é tão natural ao se elaborar um
plano de negócios. A Figura 4, a seguir, mostra a representação do Canvas.

Figura 4: Representação do Canvas.

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A análise e a validação das hipóteses junto ao potencial consumidor podem ajudar o
empreendedor a verificar se o seu negócio possui um modelo consistente ou não. Em caso
negativo, o melhor a fazer é “pivotar”, ou seja, mudar suas hipóteses e testá-las novamente junto
ao público, e repetir até achar o modelo. Por exemplo, se o segmento de clientes pessoas físicas se
revelar pouco rentável, ele pode tentar vender para pessoas jurídicas, ou, então, tentar obter uma
parceria estratégica que irá impactar sua estrutura de custos.
Vale ressaltar que, ao fazer o Canvas, o empreendedor já tem uma ideia de quem será seu
cliente, pois já elaborou a persona, mapa de empatia e ponto de vista do usuário. Caso ele
verifique que o cliente imaginado não é o adequado e tenha que pivotar seu segmento de clientes,
ele terá de refazer a persona, o mapa de empatia e o ponto de vista do usuário, agora aplicados ao
novo cliente. Nesse modelo que está sendo apresentado, a tônica é realmente “ir e vir”, refazendo
quantas vezes for necessário, até validar as hipóteses relacionadas. Isso ocorre porque exploramos,
ao contrário da metodologia que utiliza o plano de negócios, as contingências que surgem e que
irão impactar o negócio.
E por que explorar contingências é tão importante?
Décadas atrás, o mercado brasileiro era fechado e o que se produzia, independentemente da
qualidade, era consumido internamente. Nossos computadores e carros, protegidos por leis que
não permitiam importação de produtos, tinham uma qualidade muito aquém de produtos de
outros países.
Hoje em dia, as empresas têm de competir arduamente para conseguir seus clientes. E, para
tanto, o mercado deve vir antes do produto, ou seja, antes de sair oferecendo seus produtos ou
serviços, as empresas devem analisar as condicionantes que afetam o mercado, tais como
regulações, políticas, desejos do consumidor, tendências e outras variáveis que as auxiliam a
diminuir a chance de oferecer um produto que ninguém quer.
Há diversos exemplos de empresas que exploraram as contingências e acabaram mudando
de ramo. A 3M começou como mineradora, a Jacuzzi já foi uma empresa que produzia aviões e a
Nokia era, inicialmente, uma empresa de borracha. Todas elas aproveitaram gaps de mercado para
alterar as suas estratégias e ir atrás das oportunidades identificadas.
O segundo princípio do lean startup é o que chamamos de get out of the building, ou “saia
do prédio”, em tradução literal. Uma vez que o empreendedor terminou de preencher o Canvas
com suas hipóteses, o próximo passo é validar tais hipóteses com o potencial consumidor. Para
tanto, o empreendedor deve sair a campo, entrevistando tais consumidores.
Existe todo um critério para se proceder as entrevistas. Para validar o Canvas, são feitas
entrevistas longas, de, no mínimo, meia hora, nas quais o mais importante é compreender os pontos
de vista do cliente com relação ao produto ou serviço. Perguntar diretamente se o cliente vai
comprar ou não o produto deve ser a última questão da entrevista. Antes, é importante entender o

21
contexto do cliente, seus gostos, seus problemas, sua relação com alguns aspectos ligados ao
produto. Seguem quatro técnicas para se obter um melhor aproveitamento das entrevistas:
a) ouça e observe (sem julgar). Procure ter uma postura a mais neutra possível quando
estiver realizando uma entrevista. Muitas vezes, pequenos gestos, como franzir a testa ou
arregalar os olhos, podem inibir o respondente;
b) note contradições entre o que as pessoas dizem que fazem e o que elas realmente
fazem. Por exemplo, você pode perguntar a frequência com que uma pessoa vai ao
cinema e, algumas perguntas depois, pedir para a pessoa citar os três últimos filmes
que ela assistiu no cinema. Outra possibilidade é fazer a mesma pergunta com outra
redação em diferentes momentos da entrevista, para ver se o respondente cai em
alguma contradição;
c) ouça as histórias das pessoas. Deixe as pessoas falarem livremente, não as interrompa a
todo o momento. As melhores contribuições aparecem quando o entrevistado está
completamente à vontade, falando o que ele realmente pensa, e não seguindo um
padrão pré-concebido;
d) separe as necessidades das soluções. Quem vai ter a solução do problema é você. Na
entrevista, mais importante do que a solução, deve-se explorar a necessidade do cliente,
ou a “dor” dele, ou seja, qual a real necessidade de um cliente que levaria ele a pagar por
um produto ou um serviço para resolver essa “dor”.

O terceiro princípio, produto mínimo viável (PMV), recomenda que o empreendedor


desenvolva o produto ou serviço junto ao potencial cliente, por meio de um produto mínimo viável.
O PMV não é simplesmente um protótipo, mas muito mais do que isso. O PMV é um
produto (ou serviço) que ainda não está totalmente pronto, mas já tem condições de ser
comercializado, tendo sido construído com uma quantidade mínima de esforço e
desenvolvimento. Com base no feedback do comprador, o empreendedor vai adicionando novas
funcionalidades ao produto, de modo que este atenda às necessidades e desejos do cliente. Após a
comercialização do PMV, podem advir quatro resultados possíveis:
a) o PMV pode resolver a dor do usuário, conforme visto ao final do módulo anterior;
b) o PMV pode revelar o que falta para resolver a dor do usuário;
c) o PMV pode revelar um novo uso para o produto, diferente do originalmente pensado e
d) o PMV pode mostrar que o produto é irrelevante para resolver a dor do usuário, mas
revelar o porquê. Isso não é necessariamente ruim, pois se o empreendedor fosse adiante
e lançasse o produto, poderia ter um grande prejuízo.

Vamos dar um exemplo, no setor de serviços, a fim de que os conceitos fiquem mais claros
e que o leitor possa verificar que a abordagem lean startup vale tanto para produtos quantos para
serviços. Imagine um empreendedor que deseja montar um restaurante especializado em comida

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típica da África do Sul. Ele já fez o Canvas e elaborou uma série de hipóteses que foram validadas
por meio de entrevistas. Falta agora o PMV para ele ter certeza de que os clientes vão comprar sua
comida. E como fazer esse PMV?
Há várias formas de colocar o PMV em prática. Ele pode, por exemplo, montar uma
barraca em uma feira gastronômica, a fim de testar a receptividade do cliente com relação à
comida sul-africana. Outra possibilidade é montar um quiosque em um pequeno shopping center.
Ele pode, ainda, organizar jantares em sua própria casa.
É cada vez mais comum, nos grandes centros, que chefes de cozinha em início de carreira
recebam em suas próprias casas, uma ou duas vezes por mês, clientes para testar suas criações.
Inicialmente, são apenas amigos, depois amigos de amigos, até que eles formem uma clientela
ávida por experimentar seus novos pratos e pagar por eles. Dessa forma, o empreendedor
consegue ir testando uma série de itens – temperos, ingredientes, bebidas que acompanham os
pratos, entre outros – que muito o ajudarão na concepção do seu restaurante quando ele
realmente for lançado para o grande público.
Se o PMV for satisfatório – o que é facilmente verificado pelo fato de o cliente querer ou
não comprar o produto ou serviço –, o empreendedor finaliza a fase de busca pelo modelo de
negócio, ou seja, ele já descobriu “como ele vai ganhar dinheiro”. Pode partir, então, para a fase
de execução, ou seja, colocar o negócio em pé. Para essa fase, ele tem de buscar recursos para
efetivar seu negócio e, para tanto, precisa fazer o pitch de seu empreendimento, como veremos no
próximo módulo.

23
MÓDULO III – EXECUÇÃO DO NEGÓCIO

O terceiro e último módulo, Execução do negócio, será dedicado à busca por fontes de
recursos disponíveis para, efetivamente, colocar o negócio em pé. Para isso, o empreendedor vai
precisar fazer o pitch de seu empreendimento. Adicionalmente, será feito um fechamento da
apostila, ressaltando que o modelo aqui proposto também serve para quem deseja
intraempreender, ou seja, montar um negócio mesmo sendo empregado em uma organização.
É muito comum, ao longo do processo de empreender, que o empreendedor tenha de fazer
um pitch de seu negócio, isto é, fazer uma apresentação rápida, clara e concisa, de, no máximo, 10
ou 15 minutos, de modo a conseguir apoio de um investidor. O sucesso de um pitch depende da
capacidade de o empreendedor ser sucinto e, ao mesmo tempo, claro na exposição das ideias.
Vender a viabilidade do projeto, o conhecimento do assunto e a motivação da equipe são outros
fatores que interferem no sucesso de um pitch. Em linhas gerais, um pitch deve responder a quatro
questões: i) o quê? ii) para quem? iii) por que é especial? e iv) como fazer dinheiro com isso?
Antes da apresentação, é fundamental que o empreendedor treine seu pitch entre conhecidos,
a fim de ter certeza de que seu discurso seja claro e objetivo. Nada pior do que uma apresentação
prolixa, com diversas informações irrelevantes para o entendimento do negócio. É importante,
também, treinar a sessão de perguntas e respostas, solicitando à audiência que elabore um grande
número de questões para que o empreendedor não seja pego desprevenido no pitch real.
Com o pitch na ponta da língua, o próximo desafio é buscar recursos para a implementação
do seu negócio. Especialmente no Brasil, a obtenção de crédito para pequenas e médias empresas
ainda é cara, complicada e burocrática. Uma dica é não imobilizar capital, deixando, assim, uma
reserva para quando precisar. Assim, em vez de comprar um ponto comercial, alugue. O custo do
aluguel varia entre 0,5% a 1% do valor do imóvel, seguramente bem menor do que as taxas de
juros que você terá de pagar ao solicitar empréstimos bancários.
Existem algumas formas de se conseguir recursos para investir nos negócios, como
veremos a seguir.

Recursos do próprio empreendedor


Na grande maioria dos casos, o empreendedor acaba aportando recursos próprios para
iniciar seu negócio, seja utilizando suas economias, vendendo um bem ou recorrendo a
empréstimos bancários. No caso dos bancos, é recomendável utilizar as linhas de financiamento
bancárias específicas para a compra de máquinas, equipamentos ou veículos. Como esses bens
funcionam como garantia do empréstimo, em geral as taxas de juros nesses casos são
consideravelmente menores. Outra dica é não aceitar a primeira oferta que o gerente fizer e
pesquisar em outros bancos, já que as taxas de juros e as condições de pagamento costumam variar
bastante de banco para banco. Procure também linhas específicas de crédito, criadas para
determinado propósito, como, por exemplo, para o estabelecimento de franquias ou
investimentos em inovação, pois, nesses casos, as taxas também costumam ser menores.
Pouquíssimos são os empreendimentos lançados sem os recursos pessoais do empreendedor
(Hisrich, Peters e Shepherd, 2009). A utilização de recursos próprios aumenta de forma
significativa o risco do empreendedor, pois ele arcará com a responsabilidade por qualquer capital
investido na empresa.
Para Neto et al. (2013), a ausência de outros fornecedores de capital para o negócio dá ao
fundador maior liberdade na gestão do empreendimento, sem precisar dar satisfação de suas
decisões a outros investidores. No entanto, prosseguem os autores, quando o empreendedor contrai
dívidas para investir no empreendimento, seu risco pessoal aumenta muito. Em alguns casos, as
preocupações com as dívidas podem chegar a tirar o foco do negócio. Adicionalmente, os problemas
familiares que decorrem dessa situação podem afetar ainda mais o equilíbrio do empreendedor.

Sócios
É comum ouvirmos histórias de negócios que não deram certo por desavenças entre os
sócios, o que pode dar a falsa impressão de que o melhor a fazer é tocar o negócio sozinho, sem
sócios. Isso não é verdade.
É muito difícil haver um empreendedor que entenda a fundo de marketing, finanças e
operações. Por isso, é importante ter alguém com quem o empreendedor possa dividir suas
decisões e, ainda, contar em receber uma injeção de capital. Assim, na escolha de um sócio, não é
só a contribuição financeira que deve ser levada em conta.
Em primeiro lugar, sócios devem ter conhecimentos complementares. Se o empreendedor é
bom em marketing, deve arranjar um sócio que seja bom em finanças. Se ele é introspectivo, um

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sócio extrovertido e com uma boa rede de contatos pode ser uma “mão na roda”. No entanto,
embora os sócios devam ter conhecimentos complementares, seus valores éticos devem ser
semelhantes. Como dica final, deve-se sempre consultar um advogado para a elaboração do
contrato social, definindo questões como atribuições de cada sócio, rompimento da sociedade, se
parentes podem ou não trabalhar na empresa, entre outros pontos.

Familiares e amigos
Neto et al. (2013) relatam que o mercado costuma se referir a uma opção de recursos
denominada de FFF, significando, em inglês, family, friends and fools, ou seja, “familiares, amigos
e tolos” que, muito provavelmente, irão perder dinheiro ao investir no negócio. Brincadeiras à
parte, a ideia é que principalmente familiares e amigos estejam dispostos, com base em laços
afetivos, a colocar recursos de baixo risco e com nítida intenção de ajudar o empreendedor.
Nenhum empreendedor deve descartar essa possibilidade, mas também deve estar ciente de que
tais recursos não ajudam em nada a profissionalização do negócio, diferentemente de um
investimento-anjo ou do venture capital.
Infelizmente, muitos desses financiamentos são feitos sem qualquer formalização, o que cria
um potencial conflito futuro. Assim, é importante formalizar as condições nas quais os recursos
estão sendo cedidos. O ideal é que essa formalização seja feita com um compromisso da empresa
com relação ao investidor FFF, e não da pessoa física do empreendedor (Neto et al., 2013). Assim,
elaborar um contrato com o apoio de um advogado especializado é uma recomendação importante.

Investidores-anjos
Para Neto et al. (2013), em geral, o investidor-anjo é uma pessoa física bastante influente, que
se dispõe a investir no projeto do empreendedor para alavancar o início do empreendimento. Isso é
feito em troca de uma participação no negócio que virá a render dividendos em caso de sucesso.
Outras vezes, ocorre na forma de uma dívida, com cláusulas especiais que facilitem o pagamento por
parte do empreendedor, podendo haver convertibilidade em participação no negócio, sob
determinadas condições. Tipicamente, o investidor-anjo não estará envolvido com o dia a dia do
negócio, mas acompanhará de perto seu desenvolvimento e fará de tudo para que o negócio dê certo,
para colher os frutos do investimento. São pessoas que entendem muito do setor investido, pois já
atuaram como empreendedores ou executivos naquele setor. Se esse investidor-anjo tiver uma boa
rede de relacionamentos, ou outros negócios que acrescentem sinergia ao empreendimento, o valor
dele para o negócio será muito superior ao valor monetário de sua participação.

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É comum, também, o investidor-anjo ser um grande empresário com participações em
diversas empresas. À medida que o empreendimento se expande, é possível tomar crédito a juros
reduzidos junto a bancos por conta do aval ao crédito dado pelo investidor-anjo.
Recentemente, aconteceram algumas iniciativas no sentido de aproximar os empreendedores
dos investidores-anjos. Pode ser citada como exemplo dessas iniciativas a criação da associação Anjos
do Brasil, ou os Demo Days, organizados por aceleradoras e incubadoras – ocasião em que os
empreendedores expõem seus negócios para um grupo de investidores convidados.
Em média, os investimentos-anjos são da ordem de 100 mil reais e a participação acionária
gira em torno de 20%. A ideia é que, depois de um tempo, a empresa cresça e seja vendida, e,
então, o investidor-anjo receba o valor investido acrescido da valorização da empresa.
As estatísticas da Anjos do Brasil mostram que, em 2016, o investimento-anjo atingiu a
cifra de 851 milhões de reais, muito abaixo dos valores americanos, que chegam a US$ 23 bilhões.
Uma pena, pois em um país cuja taxa de juros ainda é alta, como no Brasil, o investimento-anjo
constitui-se em uma excelente opção para quem quer iniciar um negócio. No entanto, para que
isso ocorra, é fundamental que haja uma maior difusão da cultura do investimento-anjo no Brasil.
Do ponto de vista do empreendedor, é fundamental que ele seja o mais transparente possível,
prestando contas detalhadas de seus gastos. Afinal, quem tem sócio tem patrão.
Por outro lado, o investidor-anjo tem de entender que o risco faz parte do negócio e que
não adianta ficar procurando um negócio com risco zero. Se ele não quiser correr risco, o melhor
a fazer é deixar o dinheiro na poupança. Para maiores informações sobre investimento-anjo,
sugerimos entrar na página da Anjos do Brasil, no endereço www.anjosdobrasil.net.

Venture capital
Até um tempo atrás, a forma de investimento venture capital era traduzida para o português
como “capital de risco”. No entanto, dada a conotação negativa do termo “risco”, muitos autores
passaram a utilizar o termo “capital empreendedor”. Dornelas, Timmons e Spinelli (2010, p.
312) conceituam venture capital como uma “indústria que oferece capital e outros recursos para os
empreendedores em negócios com alto potencial de crescimento na esperança de conseguir uma
alta taxa de retorno sobre os fundos investidos”.
Para Neto et al. (2013), o principal risco para o empreendedor na obtenção desse tipo de
recurso é que ele vem acompanhado de grandes exigências quanto à administração da empresa e,
quase via de regra, da imposição de uma gestão compartilhada pelo fundo de venture capital. O
custo desses recursos também costuma ser muito elevado, se considerarmos a parcela de
participação no capital próprio total da empresa exigida em contrapartida. Não são raros os
relatos de empreendedores que não ficaram felizes com os resultados, uma vez que se viram com
pouco poder sobre a gestão da empresa depois de terem se aberto para tais fundos.

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Esses fundos tornam-se interessantes especialmente em dois casos: quando o
empreendimento exige grande aporte de capital para o seu sucesso e quando há problemas de
gestão da empresa. Isso porque eles possuem profissionais altamente qualificados, além de forte
relacionamento no mercado, podendo ser de grande ajuda quando a empresa está atravessando
dificuldades com suas operações e seus processos. A principal restrição que se faz ao objetivo de
tais fundos é o fato de focarem quase que exclusivamente na rentabilidade do capital empregado,
levando o empreendimento em uma direção que pode, muitas vezes, ser contrária à dos sonhos
que motivaram o empreendedor a iniciar o negócio (Neto et al., 2013).
O papel dos investidores no empreendedorismo é de extrema relevância, muito mais do que
simplesmente injetar capital no negócio. Em um artigo clássico, os acadêmicos americanos Daniel
Cable e Scott Shane comparam a relação entre investidores e empreendedores com o famoso
dilema dos prisioneiros, metáfora utilizada em teoria dos jogos (Cable e Shane, 1997).
Segundo tal teoria, dois suspeitos são acusados por um mesmo delito e interrogados
separadamente pela polícia, que não tem provas suficientes para condená-los. Por isso, oferece o
seguinte acordo a ambos: se um dos prisioneiros confessar e testemunhar contra o outro e esse
outro permanecer calado, o prisioneiro que confessou sai livre enquanto o cúmplice silencioso
pega 10 anos de cadeia. Se os dois permanecessem calados, a polícia só pode condená-los a 6
meses de cadeia cada um. Se os dois traíssem o comparsa, cada um cumpre 5 anos de pena. Cada
prisioneiro toma sua decisão sem saber que decisão o outro tomou. Ou seja, cada prisioneiro tem
um incentivo maior ao agir em seu próprio interesse, de forma individual; no entanto, se os dois
agirem assim, os dois perdem, mostrando que ao pensar no outro, os dois ganham.
Um grau de cooperação mútua entre investidores e empreendedores é uma condição
necessária, porém não suficiente, para o sucesso da empresa. Isto porque ambos possuem
conhecimentos distintos e que não existem em abundância no mercado. Investidores geralmente
concentram seus investimentos em um único setor, conhecendo a fundo como o fluxo
financeiro funciona dentro deste. Por outro lado, empreendedores possuem uma tecnologia ou
identificam uma oportunidade que outros não identificaram. Substituir empreendedores e
investidores não é tão trivial, não há uma abundância deles disponível no mercado. Por isso a
importância da cooperação.
Tentações para comportamentos não colaborativos existem dos dois lados. Empreendedores
podem omitir informações críticas sobre o seu negócio, superestimar seu fluxo de receitas futuro
ou, ainda, abusar dos gastos pessoais. Já investidores podem exigir retiradas cedo demais, não
reinvestindo o lucro no negócio ou, então, dedicar pouco tempo ao acompanhamento do
negócio. Tais estratégias podem funcionar no curto prazo, mas, em longo prazo, acabam não se
sustentando, de tal forma que, como no caso dos prisioneiros, ambos acabam perdendo.

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Outras fontes: crowdfunding e recursos governamentais
Há alguns anos apareceram no Brasil plataformas de crowdfunding, como o Catarse
(www.catarse.me) cujos projetos, na maioria do setor de entretenimento/artes, recebem auxílio do
público em troca de ingressos ou brindes.
Mais recentemente, no entanto, começaram a aparecer plataformas de equity crowdfunding, ou
investimento coletivo, em que o investidor recebe uma participação acionária no negócio ou um título
de dívida em troca do investimento. Um dos exemplos mais interessantes é o Broota
(www.broota.com.br). As plataformas de equity crowdfunding possuem regulamentação mais
complexa, dado que suas captações devem ser informadas à CVM – Comissão de Valores Mobiliários
– e seguir regras específicas, como, por exemplo, uma captação não superior a 2,4 milhões de reais.
O investidor que deseja participar do negócio adquire um Título de Dívida Conversível,
tornando-se, em um primeiro momento, credor de uma dívida, podendo convertê-la em
participação na empresa investida caso o negócio dê certo. Dessa forma, o investidor só vira sócio
quando o negócio já estiver um pouco mais sólido, evitando toda a burocracia brasileira que o
sócio tem de enfrentar quando o empreendimento não vai para frente.
Outra forma de obter recursos é conseguir financiamento governamental. Segundo Neto et
al. (2013), no Brasil, empreendedores também podem buscar recursos a fundo perdido – ou seja,
recursos que não precisam ser posteriormente reembolsados – junto a fundações para incentivo à
pesquisa, como a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), a Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) ou a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (FAPESP).
O volume de recursos públicos para as empresas ainda é pequeno, mas acaba funcionando
como um selo de aprovação para a empresa, uma vez que ela precisa se submeter a um processo de
aprovação para obtenção dos recursos. Uma empresa que tenha recebido recursos públicos é bem-
vista por investidores, aumentando sua chance de conseguir mais recursos externos.
Uma vez conseguidos os recursos, ou uma parte suficiente deles para se iniciar o negócio, o
empreendedor poderá começar a executá-lo. Para tanto, é importante planejar cada detalhe e, para
isso, poderá lançar mão de um plano de negócios. Como foi dito na apresentação desta apostila,
não foi objetivo aqui aprofundar o processo de execução, já que o processo de busca do modelo de
negócio é muito mais decisivo para que o empreendimento consiga sobreviver, e este sim foi o
foco desta apostila. No apêndice desta apostila foi apresentado um plano de negócios resumido,
com algumas indicações de livros que contêm um exemplo completo de um plano de negócios.
Para concluir, vale ressaltar que o processo de empreender não vale apenas para as pessoas que
desejam se tornar empreendedoras. Muitos funcionários de empresas também estão utilizando a
metodologia lean startup para lançarem novos produtos e serviços. Assim, caso nosso leitor prefira
trabalhar em uma organização a empreender, poderá aproveitar os ensinamentos aqui contidos para
aplicar em sua organização, fenômeno este que denominamos intraempreendedorismo.

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APÊNDICE

Neste apêndice, apresentamos um exemplo resumido de um plano de negócios, relativo à


criação de uma hamburgueria. Para tanto, utilizamos um plano descrito em Neto et al. (2013).
Ressaltamos que um plano de negócio é, em geral, mais detalhado do que o resumo que é
apresentado aqui, mas ele é suficiente para o leitor compreender suas principais características.
Caso o leitor queria se aprofundar em exemplos de planos de negócios, sugerimos consultar os
livros Hashimoto et al. (2012), Degen (2009) e Siegel (1993), relacionados nas referências.

Plano de negócio: hamburgueria


A execução desse plano de negócio tem como objetivo viabilizar a abertura de um negócio
próprio. O projeto inicial é abrir a primeira loja de hambúrgueres especiais e, com a experiência
adquirida, abrir outras duas em regiões próximas, formando, assim, uma pequena rede que
proporcione economia de escala e, com isso, se possa ter maior controle sobre as operações. Uma
vez que a primeira rede de três lojas esteja funcionando de forma eficiente, ampliar o
empreendimento por meio da criação de novas lojas franqueadas.

A oportunidade
A cidade de São Paulo testemunha, nesta década, um boom de hamburguerias de sucesso,
nicho antes ocupado por poucas e tradicionais lanchonetes. Agora possui redes que se
posicionaram na faixa premium, que podem ser classificadas como casual dinner. Entre as grandes
hamburguerias especializadas nesse nicho, se destacam: The Fifties, Lanchonete da Cidade,

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Burdog, Joakins, New Dog, General Prime Burguer, Hamburgueria Nacional, Chico
Hamburguer. Essas redes, pelo seu posicionamento como opção gastronômica, não são
competidoras diretas com os famosos fast-foods McDonald´s e Bob’s.
Hoje, os paulistanos apreciadores de hambúrguer premium fazem suas escolhas com base no
ponto da carne de determinado estabelecimento, comparam o pão do sanduíche e discutem qual é
a melhor maionese da cidade. O cliente se tornou mais exigente por qualidade e sabor em um
ambiente sofisticado, com grife e associação a um nome gourmet, valorizando, com isso, o preço
dos produtos vendidos. Portanto, a justificativa para o novo empreendimento é a grande demanda
por hambúrgueres, o crescimento do mercado de refeições fora do lar e o aumento do poder
aquisitivo em geral, que leva os clientes a buscarem algo que lhe dê prazer, ainda que tenham de
pagar um prêmio por isso.
Diante desse contexto, é preciso analisar as oportunidades de diferenciação, tais como: receitas
criativas (lanches exclusivos), decoração de vanguarda ou temática, localização conveniente,
estacionamento e atendimento personalizado. Além disso, a grande oportunidade está em sintonia
com a tendência mundial de qualidade de vida e origem dos alimentos e, com isso, a crescente
demanda por alimentos orgânicos e conceitos de responsabilidade socioambiental.
Essa tendência é ainda mais acentuada nos grandes centros, onde um público carente de um
contato mais próximo da natureza tem procurado amenizar esse sentimento por meio do
consumo de alimentos orgânicos. A carne orgânica procede de um animal que é alimentado em
pastos adubados organicamente e criado com cuidados especiais. Esses animais, quando
necessários, são tratados com homeopatia por veterinários especialistas. Assim, a segunda
justificativa para o empreendimento é a oportunidade de lançar a primeira hamburgueria orgânica
do país, uma importante diferenciação, que condiciona o negócio a produtos premium.
Entre as propostas de qualidade e inovação do mercado, observamos que, em geral, a
maior parte dos players ocupa o mesmo espaço, disputando o mesmo cliente. A maior
concentração das principais hamburguerias em São Paulo está localizada na zona sul, nos bairros
Itaim, Vila Olímpia, Jardins e Moema. Apesar da grande demanda, essa saturação de
hamburguerias ocorre em meio a outra concentração: a dos restaurantes e bares da moda. Por
outro lado, importantes regiões de São Paulo carecem de estabelecimentos de alto nível. Dessa
forma, a terceira justificativa é a oportunidade de levar uma nova opção a um mercado com
grande potencial, que são os bairros que tiveram um enorme crescimento, em função do
deslocamento de bairros de classe média alta para além das regiões já exploradas. Esses bairros
são Vila Leopoldina, Mooca e Tatuapé.
As três justificativas para o negócio escolhido conduzem a uma estratégia de
posicionamento de produtos premium e diferenciados, o que garante um maior valor agregado
para os produtos e serviços a serem oferecidos.

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Os investimentos necessários e sua utilização
O investimento total foi definido em R$ 1.200.000,00 para a primeira loja e R$
1.100.000,00 para as demais. A origem desse capital será prioritariamente feita por investimento
dos sócios proponentes do negócio em 50%. Os outros 50% serão aportados por sócios
capitalistas que tenham interesse no setor. A utilização dos recursos será realizada de acordo com o
demonstrativo abaixo.

Retorno esperado do investimento


As Figuras 1 e 2, a seguir, mostram, respectivamente, os investimentos necessários e seus
usos, bem como o fluxo de caixa do empreendimento. O faturamento foi calculado tendo como
base uma previsão de vendas compatível com outras hamburguerias atuantes no setor.

Figura 1: Investimentos necessários e seus usos

investimentos necessários e seus usos

despesas pré-operacionais unidade 1

constituição da empresa 10.000

aluguel – 6 meses 90.000

energia, telefone, água 40.000

adequação do imóvel 300.000

móveis e utensílios 250.000

contratação e trein. m. obra 60.000

marketing 50.000

capital de giro 400.000

investimento pré-operacional 1.200.000

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Figura 2: Fluxo de caixa previsto.

fluxo de caixa previsto

pré- 1 (seis
ano 2 3 4 5
operacional meses)

caixa - 1.200.000 400.000 405.000 925.000 1.609.000 2.437.000

faturamento 900.000 2.400.000 2.640.000 2.880.000 3.000.000

custo dos produtos


- 400.000 - 800.00 - 840.000 - 900.000 - 900.000
vendidos

aluguéis - 90.000 - 180.000 - 180.000 - 180.000 - 180.000

m.obra - 180.000 - 360.000 - 360.000 - 360.000 - 360.000

despesas fixas - 90.000 - 180.000 - 180.000 - 180.000 - 180.000

impostos - 135.000 - 360.000 - 396.000 - 432.000 - 450.000

resultado líquido - 1.200.000 5.000 520.000 684.000 828.000 930.000

resultado acumulado 405.000 925.000 1.609.000 2.437.000 3.367.000

Taxa Interna de
29%
Retorno (TIR)

valor presente líquido


678.374
(TMA 12%aa)

34
BIBLIOGRAFIA
BLANK, S.; DORF, B. The startup owner´s manual: the step-by-step guide for building a great
company. Pescadero: K&S Ranch Publishing Division, 2012.

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PROFESSORES-AUTORES
Adriana Ventura é doutora e mestre pela FGV-EAESP, com estudos desenvolvidos na
École Supérièure des Sciences Économiques et Commerciales (Essec), na França. Possui larga
experiência profissional em administração geral com ênfase em comunicação, administração de
recursos humanos e relações industriais. Já empreendeu em diversos segmentos (cultural, químico,
esportivo, educacional, imobiliário). Atualmente, é professora dos cursos de graduação e pós-
graduação da FGV-EAESP; sócia-diretora do Espaço 10x21 – espaço multicultural destinado a
projetos e atividades artísticas e culturais; e proprietária de uma empresa de cosméticos que está
desenvolvendo e aprovando uma linha cosmética masculina. Realizou treinamentos e workshops
em inúmeras empresas, como: Usina São João, Itaú, Confab, Kraft, Elektro, Seara Cargill, Pirelli,
Telefônica, Vega Engenharia, Votorantim, entre outras.

Tales Andreassi é doutor, mestre e bacharel em Administração pela Universidade de São


Paulo e mestre pela University of Sussex, na Inglaterra. Foi pesquisador visitante na Simon Fraser
University, no Canadá, e professor visitante em escolas na Índia, no Equador e na França. Atuou
por dez anos como gerente de projetos da Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e
Engenharia das Empresas Inovadoras (Anpei). Atualmente, é professor e vice-diretor da FGV-
EAESP e dedica-se à pesquisa e à docência nas áreas de empreendedorismo e inovação. É autor de
oito livros e quarenta artigos científicos publicados no Brasil e no Exterior. Assinou, por quatro
anos, uma coluna quinzenal sobre empreendedorismo no jornal Folha de São Paulo.

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