Você está na página 1de 29

Cálculo 3 - Aula 8 - Integrais de Linha

Professores Responsáveis:
Marcelo J. D. Nascimento

Departamento de Matemática
UFSCar / São Carlos

5 de maio de 2021

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Objetivo:

Estudar integrais de linha de campos conservativos. Forma Di-


ferencial Exata e Independência do caminho de integração.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Campos Conservativos

Definição 1
Dizemos que um campo vetorial F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn é conser-
vativo se existe um campo escalar diferenciável ϕ : Ω −→ R tal
que   ∂ϕ ∂ϕ 
∇ϕ = F~ em Ω. ∇ϕ = ,..., .
∂x1 ∂xn
Neste caso, dizemos que ϕ é uma função potencial de F~ .

Definição 2
Seja F~ (x, y, z) = P (x, y, z)~i+Q(x, y, z)~j +R(x, y, z)~k definido em
Ω ⊂ R3 , com P, Q, R funções que admitem derivadas parciais em
Ω. Definimos o rotacional de F~ como o campo vetorial dado
por
 ∂R ∂Q ~  ∂P ∂R ~  ∂Q ∂P ~
rot F~ = − i+ − j+ − k.
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Observação 3
Podemos representar o rot F~ simbolicamente como

~i ~j ~k




∂ ∂ ∂
rot F~ = ~,

=∇∧F
∂x ∂y ∂z


P Q R
 
∂ ∂ ∂ ∂
onde ∇ = ∂x , ∂y , ∂z e o produto ∂y por R deve ser interpretado
∂R
como a derivada parcial ∂x .

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Se F~ : Ω ⊂ R2 −→ R2 , definimos rot F~ : Ω ⊂ R2 −→ R2 por
 ∂Q ∂P ~
rot F~ = − k,
∂x ∂y
ou simbolicamente,

~i ~j ~k




~
∂ ∂ ∂
rot F = .
∂x ∂y ∂z


P Q 0

Dizemos que F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn , (n = 2, 3) é irrotacional se


rot F~ = ~0 em Ω.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 4
Considere um fluido em escoamento bidimensional com campo de ve-
locidade ~v (x, y) = −y~i + x~j. Calcule rot ~v .

Prova: Sabemos que


 ∂Q ∂P 
~k = ∂x − ∂(−y) ~k = 2~k.
 
rot F~ = −
∂x ∂y ∂x ∂y

Agora, observe que se ~r = x~i + y~j, então

~v .~r = (−y, x).(x, y) = 0,

isto é, ~v é tangente, no ponto (x, y), à circunferência de centro na origem


que passa por (x, y).
A velocidade escalar da partı́cula que se encontra na posição (x, y) é
p
k~v (x, y)k = x2 + y 2 .

As partı́culas do fluido descrevem circunferências de centro na origem.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


O próximo teorema fornece uma condição necessária (mas não
suficiente) para que um campo vetorial F~ seja conservativo.
Teorema 5
Seja F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn (n = 2, 3) um campo vetorial de classe
C 1 no aberto Ω. Uma condição necessária para F~ ser conserva-
tivo é que rot F~ = ~0 em Ω.

Prova: Faremos a prova no caso n = 3. Se F~ = P~i + Q~j + R~k é


conservativo, então existe ϕ : Ω −→ R tal que

∇ϕ = F~ , em Ω,

o que é equivalente a
∂ϕ ∂ϕ ∂ϕ
= P, = Q, = R, em Ω.
∂x ∂y ∂z

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Como F~ é de classe C 1 , resulta que ϕ é de classe C 2 . Temos
∂ϕ ∂2ϕ ∂P
=P ⇒ =
∂x ∂y∂x ∂y
∂ϕ 2
∂ ϕ ∂Q
=Q ⇒ = .
∂y ∂x∂y ∂x
Como ϕ é de classe C 2 , segue do Teorema de Schwarz que
∂2ϕ ∂2ϕ
=
∂y∂x ∂x∂y
e, portanto
∂P ∂Q
= , em Ω.
∂y ∂x

Analogamente, concluı́mos que


∂P ∂R ∂Q ∂R
= e = em Ω.
∂z ∂x ∂z ∂y
Logo, rot F~ = ~0 em Ω.
Marcelo Nascimento Cálculo 3
Mais adiante, veremos um exemplo de um campo vetorial F~ ,
não-conservativo, com rotacional igual a ~0, que mostrará que a
condição rot F~ = ~0 é necessária, mas não suficiente, para F~ ser
conservativo.

Observação 6
Conclusão:
1 Se F~ é conservativo então rot F~ = ~0.
2 Se rot F ~ = ~0, F~ pode ou não ser conservativo.
3 Se rot F ~ 6= ~0, então F~ não é conservativo.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 7
O campo
x ~ y ~
F~ (x, y) = i+ 2 j, (x, y) 6= (0, 0)
x2 +y 2 x + y2
é conservativo?
Prova: Primeiro, note que rot F~ = ~0. Verifique!
Para que F~ seja conservativo, deve existir um campo escalar ϕ :
R2 − {(0, 0)} −→ R tal que
∂ϕ x ∂ϕ y
= 2 e = 2 .
∂x x + y2 ∂y x + y2

Vejamos, olhe y constante com relação à x, então


ˆ ˆ u=x2 +y 2 ˆ
∂ϕ x du=2xdx 1 1
ϕ(x, y) = dx = 2 2
dx = du
∂x x +y 2 u
1
= ln(x2 + y 2 ) + g(y).
2
Marcelo Nascimento Cálculo 3
∂ϕ y
Como devemos ter ∂y = x2 +y 2
, então

y ∂ϕ y
= = 2 + g 0 (y) ⇒ g 0 (y) = 0 ⇒ g(y) = k.
x2 +y 2 ∂y x + y2
Portanto,
1
ϕ(x, y) = ln(x2 + y 2 ) + k,
2
satisfaz
∇ϕ = F~ ,
e, portanto F~ é conservativo.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 8
O campo F~ (x, y) = −y~i + x~j é conservativo?

Prova: Não é conservativo, pois


 ∂Q ∂P ~  ∂x ∂(−y) ~
rot F~ (x, y) = − k= − k = 2~k 6= ~0.
∂x ∂y ∂x ∂y

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Forma Diferencial Exata

Seja F~ (x, y) = P (x, y)~i + Q(x, y)~j definido em Ω ⊂ R2 aberto.


Vimos que ˆ
P (x, y)dx + Q(x, y)dy
γ

é uma notação para indicar a integral de linha de F~ sobre γ. De


agora em diante, vamos nos referir à expressão

P (x, y)dx + Q(x, y)dy (1)

como forma diferencial definida no aberto Ω.


Diremos que (1) é uma forma diferencial exata se existir uma
função diferenciável ϕ : Ω −→ R tal que
∂ϕ ∂ϕ
=P e = Q, em Ω.
∂x ∂y

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Nesse caso, dizemos que ϕ é uma primitiva de (1).
Note que P (x, y)dx + Q(x, y)dy é exata se, e somente se o campo
vetorial F~ (x, y) = P (x, y)~i + Q(x, y)~j é conservativo.
Mas vimos que, se F~ for conservativo, então rot F~ = ~0, isto é,
∂Q ∂P
= , em Ω.
∂x ∂y
Disto, segue que se
∂Q ∂P
6= , em Ω,
∂x ∂y

então P (x, y)dx + Q(x, y)dy não é exata.


Concluindo, se P, Q forem de classe C 1 no aberto Ω, então uma
condição necessária para (1) ser exata é que ∂Q ∂P
∂x = ∂y , em Ω.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Da mesma forma, se P, Q, R forem de classe C 1 no aberto Ω ⊂ R3 ,
então uma condição necessária para

P (x, y, z)dx + Q(x, y, z)dy + R(x, y, z)dz

ser exata é que


∂P ∂Q


 = ,
 ∂y ∂x






∂P ∂R
= ,


 ∂z ∂x

∂Q ∂R


= , em Ω.



∂z ∂y

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 9
A forma diferencial 2xdx + 2ydy é exata?

Prova: A resposta é sim, pois essa forma admite ϕ(x, y) = x2 +y 2


como primitiva. Note que
∂ϕ ∂ϕ
= 2x = P (x, y) e = 2y = Q(x, y).
∂x ∂y

Exemplo 10
A forma diferencial ydx + 2xdy é exata?

Prova: Não é exata, pois


∂P ∂Q
= 1 6= = 2.
∂y ∂x

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Integral de Linha de um Campo Conservativo

Lembremos, do Teorema Fundamental do Cálculo, que se f :


[a, b] −→ R é uma função contı́nua e F é uma primitiva de f
(isto é, F 0 = f ), então
ˆ b ˆ b
f (x)dx = F 0 (x)dx = F (b) − F (a).
a a

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Temos um resultado análogo para integrais de linha quando F~ é um
campo conservativo.
Teorema 11
Sejam F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn um campo vetorial contı́nuo e conservativo.
Se ϕ : Ω −→ R for uma função potencial para F~ (isto é, ∇ϕ = F~ ) e se
γ : [a, b] −→ Ω for uma curva de classe C 1 (por partes), com A = γ(a)
e B = γ(b), entãoˆ ˆ
~
F dγ = ∇ϕdγ = ϕ(B) − ϕ(A).
γ γ

Prova: Como F~ = ∇ϕ é contı́nuo, resulta que ϕ é de classe C 1 em Ω.


Logo, usando a Regra da Cadeia,
d 
ϕ(γ(t)) = ∇ϕ(γ(t)).γ 0 (t) = F~ (γ(t)).γ 0 (t).
dt
Assim,
ˆ ˆ b ˆ b 
d 
F~ dγ = F~ (γ(t)).γ 0 (t)dt = ϕ(γ(t)) dt
γ a a dt
= ϕ(γ(b)) − ϕ(γ(a)) = ϕ(B) − ϕ(A).

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Sejam P (x, y) e Q(x, y) contı́nuas no aberto Ω e seja γ : [a, b] −→
Ω de classe C 1 por partes. Segue do teorema anterior, que se
P dx + Qdy for exata, com primitiva ϕ, então
ˆ ˆ
P dx + Qdy = dϕ = ϕ(B) − ϕ(A),
γ γ

onde dϕ = P dx + Qdy, A = γ(a) e B = γ(b).


Observação 12
Sempre que for calcular uma integral de linha, verifique, primeiro,
se o campo vetorial é conservativo (ou se a forma diferencial é
exata). Em caso afirmativo, aplique os resultados obtidos nesta
seção.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 13
´
Calcule γ xdx + ydy, onde γ(t) = (arctan(t), sen(t3 )), t ∈ [0, 1].

Prova: Note que a forma diferencial é exata, com primitiva


2 2
ϕ(x, y) = x +y
2 . Logo, como

γ(a) = γ(0) = (arctan(0), sen(03 )) = (0, 0),

e
π
γ(b) = γ(1) = (arctan(1), sen(13 )) = ( , sen(1)),
4
então
ˆ π 
xdx + ydy = ϕ(γ(1)) − ϕ(γ(0)) = ϕ , sen(1) − ϕ(0, 0)
γ 4
( π4 )2 + sen2 (1) π 2 + 16 sen2 (1)
= = .
2 32

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 14
´
Calcule γ F~ dγ, onde F~ é um campo vetorial conservativo de
classe C 1 , contı́nua com função potencial ϕ e γ é uma curva
fechada de classe C 1 por partes (ou seja, γ(a) = γ(b)).

Prova: Como F~ é conservativo (∇ϕ = F~ ), segue do teorema


anterior que
ˆ ˆ
~
F dγ = ∇ϕdγ = ϕ(γ(b)) − ϕ(γ(a)) = 0.
γ γ

Assim, mostramos que a integral de linha de um campo conser-


vativo sobre uma curva C 1 por partes e fechada é igual a zero.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 15 (de um campo não-conservativo com rotacional ~0)
Considere o campo vetorial
y ~ x ~
F~ (x, y) = − i+ 2 j, (x, y) 6= (0, 0).
x2 +y 2 x + y2

Calcule rot F~ .
Prova: Temos que
 ∂Q ∂P ~
rot F~ (x, y) = − k
∂x ∂y
 x2 + y 2 − 2x2  −x2 − y 2 + 2x2 
= − ~k
(x2 + y 2 )2 (x2 + y 2 )2
= 0~k = ~0.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Agora, considere a curva fechada γ(t) = (cos(t), sen(t)), 0 6 t 6
2π. Temos que
ˆ ˆ 2π
F~ dγ = F~ (γ(t)).γ 0 (t)dt = 2π.
γ 0

Se F~ fosse conservativo, existiria ϕ : Ω −→ R com ∇ϕ = F~ em


Ω, e então, pelo exemplo anterior, como γ é fechada, terı́amos
que
ˆ ˆ
~
F dγ = ∇ϕdγ = ϕ(γ(b)) − ϕ(γ(a)) = 0 6= 2π.
γ γ

Portanto, F~ não pode ser conservativo.


Observação 16
Seja F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn de classe C 1 no aberto Ω. Sob certas
condições sobre o aberto Ω, a condição rot F~ = ~0 em Ω será
necessária e suficiente para F~ ser conservativo.
Marcelo Nascimento Cálculo 3
Independência do Caminho de Integração

Definição 17
Seja Ω ⊂ Rn . Dizemos que Ω é conexo por caminhos se qual-
quer que seja A, B ∈ Ω, existe uma poligonal contida em Ω de
extremidades A e B.
Sejam γ1 e γ2 duas curvas de classe C 1 com mesmos ponto inicial
e final.

γ1
A

B
γ2

Sabemos que, em geral,


ˆ ˆ
F~ .d~r 6= F~ .d~r.
γ1 γ2

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Definição 18
Seja F~ : Ω ⊂ Rn −→ R n
´ um campo vetorial contı́nuo. Dizemos
que a integral de linha γ F~ .d~r é independente do caminho de
´ ´
integração se γ1 F~ .d~r = γ2 F~ .d~r, para quaisquer dois caminhos
γ1 e γ2 em Ω que tenham os mesmos pontos iniciais e finais.
´
Notação: Se γ F~ .d~r for independente do caminho de integração
em Ω, ˆ B
F~ .d~r
A

denota a integral de linha de F~ sobre uma curva qualquer C 1 por


partes γ : [a, b] −→ Ω, com γ(a) = A e γ(b) = B.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Teorema 19 (Existência de Função Potencial)

Seja F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn um campo´vetorial contı́nuo no aberto conexo


por caminhos Ω. Suponhamos que γ F~ .d~r seja independente do cami-
nho de integração em Ω. Seja A ∈ Ω. Então a função ϕ : Ω −→ R
dada por
ˆ X
ϕ(X) = F~ .dγ
A

é tal que ∇ϕ = F~ em Ω.

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Exemplo 20
Seja γ : [a, b] −→ Ω uma curva de classe C 1 em Ω e F~ : Ω ⊂
Rn −→ Rn um campo vetorial contı́nuo. Se −γ denota a curva
com mesmo traço de ˆγ orientada noˆ sentido oposto, mostre que
F~ .d~r = − F~ .d~r.
−γ γ

Prova: Note que −γ pode ser parametrizada por −γ : [0, 1] −→


Ω com −γ(t) = γ((1 − t)b + ta). Assim,
ˆ ˆ 1
~
F .d~r = F~ (−γ(t)).(−γ 0 (t))dt
−γ 0
ˆ 1
= F~ (γ((1 − t)b + ta)).γ 0 ((1 − t)b + ta)(−b + a)dt
0
ˆ a ˆ b
0
= ~
F (γ(u)).γ (u)du = − F~ (γ(u)).γ 0 (u)du
bˆ a

= − F~ .dγ.
γ
Marcelo Nascimento Cálculo 3
Teorema 21
Seja F~ : Ω ⊂ Rn −→ Rn um campo vetorial contı́nuo no aberto
conexo por caminhos Ω. São equivalentes:
(a) F~ é um campo conservativo.
´
(b) γ F~ .dγ = 0, para toda curva γ, fechada, C 1 por partes,
com imagem de γ contida em Ω.
´
(c) γ F~ .dγ é independente do caminho de integração em Ω.

Prova: (a) ⇒ (b) segue do Exemplo 14.


(b) ⇒ (c): Dados A, B ∈ Ω, sejam γ1 e γ2 caminhos quaisquer
contidos em Ω, ligando A e B.

γ1
B
A
γ2

Marcelo Nascimento Cálculo 3


Seja γ = γ1 ∪ (−γ2 ). Assim definida, γ é uma curva fechada, logo
da hipótese (item (b)) segue que
ˆ
F~ .d~r = 0,
γ

então
ˆ ˆ ˆ ˆ ˆ
0= F~ .d~r = F~ .d~r + F~ .d~r = F~ .d~r − F~ .d~r
γ γ1 −γ2 γ1 γ2

ou seja, ˆ ˆ
F~ .d~r = F~ .d~r.
γ1 γ2
´
Como γ1 e γ2 são quaisquer, segue que γ2 F~ .d~r é independente
do caminho de integração.
(c) ⇒ (a) segue do Teorema 19.

Marcelo Nascimento Cálculo 3

Você também pode gostar