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Sucumbência na Ação Civil Pública

E como fica o advogado?


Erick Santana Batista
Publicado em https://www.jusbrasil.com.br/

A ação civil pública tem como lei regulatória a lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Em relação aos
honorários sucumbenciais, a norma referente a honoráo é clara:
Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos,
honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo
comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais. (Redação dada
pela Lei nº 8.078, de 1990)
A literalidade da lei não deixa dúvidas de que é vedada a condenação em honorários advocatícios na
Ação Civil Pública. E não adianta ir para a Constituição Federal espernear procurando um artigo
que discorde de tal injustiça contra quem advoga em tal ação, pois, além de ser o artigo acima uma
alteração em plena vigência do regime constitucional atual, assim como ter sido a lei recepcionada
pela Constituição Federal, vai se deparar com o seguinte:
Art. 5º LXXVII - são gratuitas as ações de "habeas-corpus" e "habeas-data", e, na forma da lei, os
atos necessários ao exercício da cidadania.
E para saber quais são esses atos necessários ao exercício da cidadania basta ir atrás da lei que os
regulamenta:

Art. 1º São gratuitos os atos necessários ao exercício da cidadania, assim considerados: (...)
V - quaisquer requerimentos ou petições que visem as garantias individuais e a defesa do interesse
público.
Por se tratar a Ação Civil Pública de defesa do interesse público, enquadra-se essa ação na situação
de gratuidade que se estende, inclusive, para os honorários sucumbenciais, deixando o advogado a
ver navios. O único consolo que a jurisprudência oferece, o que não é bem consolo, apenas é uma
alegação de igualdade normativa, pois “pau que dá em Chico dá em Francisco”, é o seguinte:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


DISSENSO CONFIGURADO ENTRE O ARESTO EMBARGADO E ARESTO PARADIGMA
ORIUNDO DA QUARTA TURMA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA PELA UNIÃO.
CONDENAÇÃO DA PARTE REQUERIDA EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE
MÁ-FÉ. DESCABIMENTO. ART. 18 DA LEI N. 7.347/1985. PRINCÍPIO DA SIMETRIA.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA A QUE SE NEGA ROVIMENTO.
1. Trata-se de recurso interposto em ação civil pública, de que é autora a União, no qual pleiteia a
condenação da parte requerida em honorários advocatícios, sob o fundamento de que a regra do
art. 18 da Lei n. 7.347/1985 apenas beneficia o autor, salvo quando comprovada má-fé.
2. O acórdão embargado aplicou o princípio da simetria, para reconhecer que o benefício do
art. 18 da Lei n. 7.347/1985 se aplica, igualmente, à parte requerida, visto que não ocorreu má-fé.
Assim, o dissenso para conhecimento dos embargos de divergência ocorre pelo confronto entre o
aresto embargado e um julgado recente da eg. Quarta Turma, proferido nos EDcl no REsp
748.242/RJ, Rel.
Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 12/4/2016, DJe 25/4/2016.
3. Com efeito, o entendimento exposto pelas Turmas, que compõem a Primeira Seção desta Corte, é
no sentido de que, "em favor da simetria, a previsão do art. 18 da Lei 7.347/1985 deve ser
interpretada também em favor do requerido em ação civil pública.
Assim, a impossibilidade de condenação do Ministério Público ou da União em honorários
advocatícios - salvo comprovada má-fé - impede serem beneficiados quando vencedores na ação
civil pública" (STJ, AgInt no AREsp 996.192/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira
Turma, DJe 30/8/2017). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.531.504/CE, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 21/9/2016; AgInt no REsp 1.127.319/SC, Rel. Ministro
Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 18/8/2017; AgInt no REsp 1.435.350/RJ, Rel. Ministro
Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 31/8/2016; REsp 1.374.541/RJ, Rel. Ministro Gurgel de
Faria, Primeira Turma, DJe 16/8/2017.
4. De igual forma, mesmo no âmbito da Terceira e Quarta Turmas do Superior Tribunal de Justiça,
ainda que o tema não tenha sido analisado sob a óptica de a parte autora ser ente de direito
público - até porque falece, em tese, competência àqueles órgãos fracionários quando num dos
polos da demanda esteja alguma pessoa jurídica de direito público -, o princípio da simetria foi
aplicado em diversas oportunidades: AgInt no REsp 1.600.165/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro,
Terceira Turma, julgado em 20/6/2017, DJe 30/6/2017;
REsp 1.438.815/RN, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/11/2016, DJe
1º/12/2016; REsp 1.362.084/RJ, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/5/2017, DJe 1º/8/2017.
5. Dessa forma, deve-se privilegiar, no âmbito desta Corte Especial, o entendimento dos órgãos
fracionários deste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, em razão da simetria, descabe a
condenação em honorários advocatícios da parte requerida em ação civil pública, quando
inexistente má-fé, de igual sorte como ocorre com a parte autora, por força da aplicação do
art. 18 da Lei n. 7.347/1985.
6. Embargos de divergência a que se nega provimento.
(EAREsp 962.250/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em
15/08/2018, DJe 21/08/2018)

Em razão da simetria que deve haver entre as partes não cabe condenação em honorários ao réu,
assim como não cabe ao autor, exceto no caso de haver má-fe. Esse é o consolo jurisprudencial que
o advogado incauto terá, depois que ficar frustrado defendendo uma ação de valor considerável
achando que estará fazendo bom negócio.

O causídico deve refletir se valerá a pena do ponto de vista financeiro patrocinar um cliente
em Ação Civil Pública, pois não poderá contar com condenação em honorários, a não ser que
esteja muito certo de que há má-fé na atuação do legitimado a defender o interesse público.

A gratuidade de honorário tem fundamento na intenção do legislador de oferecer ao cidadão uma


forma de defender o interesse público sem que se sinta intimidado pela possibilidade de arcar com
altos custos, o que inviabilizaria o acesso à justiça por esse cidadão. Mas vale lembrar que o
honorário de advogado é de natureza alimentar, e não tem como o profissional se alimentar se não
recebe, somente trabalha.

Qual seria a alternativa para evitar que haja restrição ao acesso à justiça sem prejudicar o advogado?
Não parece fácil o cálculo, exceto se se considera o interesse individual como algo diabólico em
face do interesse público, o que daria como resposta: dane-se o advogado, viva o povo! Mas o povo
é composto por indivíduos que o compõem, entre eles os advogado, aliás, diga-se de passagem,
importante personagem na construção do regime democrático, não me deixam mentir Sobral Pinto,
Pedro Eurico, Idibal Pivetta e outros.

O importante seria dar algum estímulo, ainda que não financeiro, para que o advogado não seja tão
desvalorizado em sua atividade primordial que é defender os direitos de quem quer que seja.
Referências:
Silvio Tendler, “Os Advogados Contra a Ditadura: Por uma questão de Justiça ,” Acervo
Memória e Direitos Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), acesso em
13 de maio de 2021, https://www.memoriaedireitoshumanos.ufsc.br/items/show/944.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Em regra, o demandado que for sucumbente na ACP
não tem o dever de pagar honorários advocatícios. Buscador Dizer o Direito, Manaus.
Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/8aa2c95dc0a6833d2d0cb
944555739cc>. Acesso em: 13/05/2021

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