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O constituinte “esqueceu-se” de adequar este art.º 143 da CRM com o novo
art.º 224:
Artigo 224
(Definição)
1. O Tribunal Supremo é o órgão superior da hierarquia dos tribunais judiciais.
2. O Tribunal Supremo garante a aplicação uniforme da lei na esfera da sua
jurisdição e ao serviço dos interesses do povo moçambicano.
(…)
E nos casos de uniformização de jurisprudência? Vejamos o seu regime.
Artigo 495
(Interposição e efeito)
1. No requerimento de interposição do recurso, o recorrente identifica o
acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre em oposição e, se este estiver
publicado, o lugar da publicação e justifica a oposição que origina o conflito de
jurisprudência.
2. O recurso para fixação de jurisprudência não tem efeito suspensivo.
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Artigo 502
(Eficácia da decisão)
1. Sem prejuízo do disposto no número 3 do artigo 500, a decisão que resolver
o conflito tem eficácia no processo em que o recurso foi interposto e nos processos
cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do número 2 do artigo 4981.
2. O Tribunal Supremo, conforme os casos, revê a decisão recorrida ou reenvia
o processo.
3. A decisão que resolver o conflito não constitui jurisprudência obrigatória
para os tribunais judiciais, mas estes devem fundamentar as divergências relativas à
jurisprudência fixada naquela decisão.
Sendo a lei a principal fonte de Direito Processual Penal é imperativo que esta
seja interpretada. A interpretação da lei processual penal – a determinação do sentido
da norma – não é de natureza diferente da que se opera noutras áreas, ou seja, da
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Tendo sido, porém, anteriormente reconhecida a oposição de julgados sobre a mesma matéria de
direito, os termos do recurso são suspensos até ao julgamento daquele em que primeiro se tiver
concluído pela oposição (art.º 498/2).
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Com a excepção assinalada aos Acórdãos do CC.
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interpretação das restantes normas do ordenamento jurídico. Por isso, são de aceitar,
neste âmbito, os cânones gerais da interpretação jurídica constantes do Código Civil
(cfr. Germano Marques da Silva).
No entanto, é preciso contextualizar esta interpretação. A interpretação da lei
processual penal é feita no ambiente de um processo conflitual, e por isso, temos que
ter cuidado com as interpretações restritivas para não destruir o equilíbrio entre os
deveres. Assim sendo, conclui-se que para fazer a interpretação da lei processual penal
temos que ter em conta certos referentes e limites, para além daquilo que resulta das
técnicas hermenêuticas de interpretação.
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Veja-se o que se diz no preâmbulo deste novo CPP: “Sendo certo que o processo penal é direito
constitucional aplicado, impõe-se que a fruição dos direitos de cidadania na sociedade democrática e
plural que estamos a consolidar, tanto no que concerne a direitos individuais como a deveres para com
a comunidade, deve constituir a bússola orientadora do novo quadro jurídico-penal da coeva sociedade
moçambicana”.
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decisões jurisprudenciais. Muitas vezes a doutrina e a jurisprudência confundem aquilo
que existe, com aquilo que devia existir.
Artigo 12
(Integração de lacunas)
Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se
por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o
processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.
Sobre esta questão há desde logo, que distinguir as normas que agravem a
posição juridico-processual do arguido das restantes. Quanto a estas, rege o art.º 12,
segundo o qual a integração de lacunas deverá ser feita prioritariamente por recurso a
normas do CPP (analogia legis), e apenas quando tal não seja possível se admite o
recurso ao Código de Processo Civil, ou, em última instância, aos princípios gerais do
processo penal, como fontes integradoras de lacunas e, consequentemente, como
fontes de Direito.
Quanto às normas que agravem a posição juridico-processual do arguido, dois
argumentos restringem a possibilidade de recurso à analogia: (1) o recurso ao princípio
da legalidade, na medida em que a CRM e a lei penal proíbem o recurso à analogia
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para incriminar ou atribuir responsabilidade penal. Neste sentido, seria também
vedado o recurso à analogia em situações em que tal se traduza no agravamento da
situação processual do arguido; (2) por outro lado, o facto de se poder considerar que
a norma que restringe o direito de defesa do arguido é uma norma excepcional, por
força da aplicação dos princípios constitucionais relativos a direitos, liberdades e
garantias. Assim sendo, e de acordo com o art.º 11 do CC, as normas excepcionais não
comportam aplicação analógica.
Artigo 156
(Legalidade da prova e métodos proibidos de produção)
1. São admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.
2. São nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura,
coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas.
3. São ofensivas da integridade física ou moral das pessoas as provas obtidas,
mesmo que com consentimento delas, mediante: a) perturbação da liberdade de
vontade ou de decisão através de maus-tratos, ofensas corporais, administração de
meios de qualquer natureza, hipnose ou utilização de meios cruéis ou enganosos; b)
perturbação, por qualquer meio, da capacidade de memória ou de avaliação; c)
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utilização da força, fora dos casos e dos limites permitidos pela lei; d) ameaça com
medida legalmente inadmissível e, bem assim, com denegação ou condicionamento da
obtenção de benefício legalmente previsto; e) Promessa de vantagem legalmente
inadmissível.
4. Ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas as provas obtidas
mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas
telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular.
5. Se o uso dos métodos de obtenção de provas previstos neste artigo
constituir crime, podem aquelas ser utilizadas com o fim exclusivo de proceder contra
os agentes do mesmo (cfr. v.g., art.º 194 do CP).
Artigo 135 (Nulidades insanáveis); Artigo 136 (Nulidades dependentes de
arguição). Quando existem uma violação que não é nenhuma das duas, o que temos?
Uma irregularidade nos termos do art.º 139/2.
Artigo 139
(Irregularidades)
1. Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do acto a que
se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando tiver sido arguida pelos
interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos 3 dias seguintes a
contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou
intervindo em algum acto nele praticado.
2. Pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no
momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afectar o valor
do acto praticado.
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4. Aplicação da lei processual penal no tempo
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Casos específicos:
a) as normas sobre prescrição do procedimento criminal, já que constituem “causa
de afastamento da infracção”, são de aplicação retroactiva quando mais favoráveis
ao arguido;
b) relativamente às normas sobre condições de procedibilidade, verificam-se
algumas divergências. Em termos gerais é de aplicar a lei que concretamente se
mostre mais favorável ao arguido e recusar a aplicação retroactiva da lei mais
gravosa (G. Marques da Silva).
Topicamente:
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O problema da alteração da natureza do crime
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permite-se que o processo iniciado na lei antiga adopte um pressuposto da lei nova – a
desistência.
Se o processo não se iniciou, este pode iniciar-se com a lei nova e com o regime
do crime público com apenas uma excepção: o crime era semipúblico, conhecendo os
factos e os autores, o ofendido tinha 2 anos, ou um ano, consoante os casos (cfr. art.º
155/2 do CP), para apresentar a queixa.
Se não o fez, deixa de ser possível, enquanto vigorar a lei antiga, apresentar
queixa. Se o direito de queixa caducou, antes da entrada em vigor da lei nova, a
situação jurídica caducou e não pode ser repristinada. Se assim não fosse gerar-se-ia
uma enorme desigualdade.
Se o processo já começou, ou se retira ao ofendido o direito de desistir e o
processo continua como público, ou se reconhece a possibilidade para desistir, mas
daquilo que já é um crime público. Nenhuma solução é boa. Frederico da Costa Pinto
considera que apesar da conversão do crime em crime público, aquele processo que
começou bem, com queixa ao abrigo do regime tipo de crime, deve permitir a
desistência. Ou seja, a conversão do crime não deve retirar ao ofendido a possibilidade
de retirar queixa. Em todo o caso, nestes casos, o melhor seria que legislador tivesse
criado um regime transitório. Não o fez.
De acordo com o art.º 65/4 da CRM, “Nenhuma causa pode ser retirada ao
tribunal cuja competência se encontra estabelecida em lei anterior, salvo nos casos
especialmente previstos na lei”. Significa que, a lei que regula a competência é a lei do
momento da prática do crime (Noronha Silveira). Tem por finalidade evitar a
designação arbitrária de um juiz ou tribunal para resolver um caso determinado.
Esta garantia deverá ser relacionada com a estabelecida também pelo art.º
222/6 CRM [proibição dos tribunais de excepção], que proíbe “a existência de
tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de
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crimes”, à excepção dos tribunais militares durante a vigência do estado de guerra (cfr.
art.º 223 da CRM).
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