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RESUMO

Durante o período em que o Código de Processo Civil de 1973 estava em vigor, o precedente
judicial não era um tema muito explorado pela doutrina no Brasil e era praticamente ignorado
pelo próprio Código. Foi apenas com a chegada do CPC/2015 que esse instituto começou a
receber mais atenção da comunidade jurídica do país. Em termos simples, um precedente
pode ser definido como um evento do passado que guia uma decisão no presente. No campo
do Direito, a importância de um acontecimento passado para a solução de conflitos pelo juiz é
crucial. Se uma demanda envolvendo o fato foi decidida de uma forma específica devido à
razão, em um caso futuro envolvendo o mesmo fato e a mesma razão, espera-se a mesma
decisão. Isso vai além da previsibilidade, pois envolve questões de justiça e imparcialidade que
não devem depender das partes envolvidas ou do julgador. Assim, fica claro que o precedente
judicial é essencial para a definição de decisões futuras no sistema jurídico.

Destaca-se a importância da análise da ratio decidendi - o motivo da decisão - para


compreender o alcance e a aplicação dos precedentes na teoria do precedente dos países de
common law. Conforme mencionado, um precedente não nasce como tal, mas se torna
precedente a partir de sua invocação em casos futuros.

Dessa forma, ao analisar casos precedentes, é fundamental examinar as circunstâncias de fato


que embasaram a controvérsia, assim como a tese ou princípio jurídico estabelecido na
motivação da decisão anterior. Esses elementos são essenciais para determinar a aplicação e o
alcance do precedente no caso em questão.

Segundo “Hermes Zaneti Júnior”, pode ser observado em duas situações: Quando a decisão
limitar-se a aplicar a lei escrita em si, de forma determinativa, vez que “a decisão que apenas
refletir a interpretação dada a uma norma legal vinculativa pela própria força da lei não gera
um precedente”; ou quando a decisão for integralmente pautada numa norma jurídica criada
no julgamento de caso pretérito, caso em que “a vinculação decorre do precedente anterior,
do caso precedente, e não da decisão presente no caso atual”(P.24)

A distinção apresentada pelo autor ‘’Hermes Zaneti Júnior’’ ressalta a importância de


diferenciar situações em que a decisão judicial está estritamente baseada na aplicação da lei
escrita, sem criar uma nova norma jurídica, daquelas em que a decisão se baseia em um
precedente estabelecido em um caso pretérito. A replicação do precedente não implica
necessariamente a criação de uma nova norma jurídica, mas sim a aplicação de um
entendimento jurídico já estabelecido em casos anteriores.

É relevante considerar a distinção entre julgamentos de casos fáceis e casos difíceis, conceito
discutido por Hart e Dworkin, que aponta para a complexidade envolvida na interpretação e
aplicação da lei em casos que apresentam desafios distintos. A compreensão dessas nuances é
essencial para uma análise mais aprofundada sobre a criação e aplicação de normas jurídicas
em diferentes contextos judiciais.

A análise de Hermes Zaneti ressalta que uma decisão judicial que se limita a aplicar uma lei
clara e não objeto de controvérsia não tem o potencial de se tornar um precedente
significativo. Isso ocorre porque essa decisão simplesmente reflete a interpretação que já está
contida na norma legal e que é vinculativa pela própria força da lei. Dessa forma, ela não
contribui para o desenvolvimento ou estabelecimento de precedentes jurisprudenciais
relevantes. (P,31)
A discordância apresentada destaca a importância da atuação do juiz na aplicação da lei,
mesmo nos casos em que o texto legal parece aderir claramente a um suporte fático. Nesses
casos, não se trata de uma mera aplicação mecânica da lei, mas de uma análise cuidadosa para
garantir a constitucionalidade do dispositivo, a correta incidência da regra e a subsunção dos
fatos à norma. Problemas de subsunção, como mencionado por “Teresa Arruda Alvim”, podem
surgir e exigem do juiz um trabalho de encaixe da norma aos fatos concretos ocorridos no
mundo empírico.

PLANOS DE INCIDÊNCIA DO PRECEDENTE

A análise sobre a influência do precedente judicial nos órgãos jurisdicionais aponta para a
distinção entre os planos de incidência do precedente em vertical e horizontal. No plano
vertical, os órgãos judiciais superiores influenciam os inferiores, enquanto no plano horizontal,
os órgãos de mesmo nível podem se influenciar mutuamente. Essa divisão é fundamental para
compreender a aplicação dos precedentes judiciais em diferentes contextos jurídicos.

Em artigo publicado há mais de duas décadas, “Calmon de Passos” já vislumbrava essa


irradiação horizontal (e vertical) que os precedentes das Cortes de vértice emanam, afirmando
que, ao decidir um caso concreto, “o tribunal se impõe diretrizes para seus julgamentos e
necessariamente as coloca, também, para os julgadores de instâncias inferiores.” (P,52)

As considerações de Calmon de Passos sobre a irradiação horizontal e vertical dos precedentes


judiciais demonstram a relevância da coerência e consistência nas decisões proferidas pelos
tribunais superiores. A harmonização na aplicação do entendimento jurídico não apenas
orienta os julgadores na mesma instância, mas também influencia as decisões dos tribunais
inferiores, contribuindo para a uniformidade e previsibilidade no sistema jurisprudencial.

FORÇA DO PRECEDENTE JUDICIAL

Classificação interessante para os precedentes, dividindo-os em três graus de obrigatoriedade:


forte, médio e fraco. No grau de obrigatoriedade forte estão os precedentes para os quais o
Código prevê a possibilidade de ação específica para contrariar uma decisão que os
desrespeite, sendo permitido o manejo de reclamação (art. 988, CPC). Já a obrigatoriedade
média diz respeito aos precedentes que, quando violados, exigem um contraste por meio de
algum instrumento jurídico específico.

Segundo ‘’Teresa Arruda Alvim’’, que divide os precedentes em graus de obrigatoriedade


(forte, médio e fraco), parece se afinar semanticamente com a concepção de precedente
adotada pelos países de common law, embora estes utilizem a classificação de persuasivos ou
obrigatórios. Essa abordagem, ao considerar diferentes níveis de obrigatoriedade conforme a
situação, pode trazer maior flexibilidade e adaptação ao sistema jurídico. (P,71)

A distinção entre precedentes obrigatórios e persuasivos, bem como a categorização em


precedentes de obrigatoriedade forte, média e fraca, são abordagens relevantes dentro do
estudo da força do precedente judicial. Essas classificações auxiliam na compreensão da
influência que os precedentes exercem sobre os julgamentos futuros e na formação da
jurisprudência.

Os conceitos apresentados sobre a força do precedente judicial ressaltam a importância da


vinculação dos órgãos jurisdicionais às decisões anteriores, especialmente nos sistemas onde a
eficácia das decisões é absolutamente vinculante. No sistema verticalmente obrigatório de
precedentes, todas as cortes são obrigadas a seguir as decisões das cortes hierarquicamente
superiores.

estaca-se, ainda, no entendimento de ‘’Marcelo Alves Dias de Souza’’, a distinção entre


precedente relativamente obrigatório que mesmo diante da eficácia vinculante pode não ser
aplicado no caso futuro, exigindo-se para tanto fundamentação pontual sobre os motivos que
levaram ao afastamento do precedente e precedente absolutamente obrigatório, definido
pelo autor como “aquele que deve ser seguido, mesmo que o Juiz ou Tribunal o considere
incorreto ou irracional. Atém-se ao precedente judicial e não se move o que está quieto (teoria
do stare decisis et non queta movere).” (P,58)

A distinção entre precedente relativamente obrigatório e precedente absolutamente


obrigatório de acordo com Marcelo Alves Dias de Souza é crucial para entender a aplicação dos
precedentes judiciais. Enquanto o primeiro permite certa flexibilidade na aplicação, desde que
devidamente justificada, o segundo exige que o juiz ou tribunal siga o precedente, mesmo que
o considere incorreto. Essa abordagem enfatiza a importância da estabilidade e consistência
no sistema de precedentes judiciais.

Por outro lado, o precedente persuasivo não possui força vinculante, ou seja, não obriga o
órgão jurisdicional a segui-lo em casos futuros. No entanto, ele pode servir como um indicativo
de uma solução racional e socialmente adequada, orientando o julgador a adotar um
posicionamento já previsto. Assim, mesmo não sendo obrigatório, o precedente persuasivo
pode influenciar a decisão de casos semelhantes.

‘’Luiz Guilherme Marinoni’’ ressalta a importância da fundamentação e justificativa por parte


do julgador ao decidir não seguir um precedente persuasivo. A ideia é que, mesmo não sendo
vinculante, o precedente persuasivo deve ser considerado e respeitado na medida do possível,
a menos que existam argumentos sólidos e bem fundamentados que justifiquem a sua não
observância. Isso contribui para a coerência e previsibilidade das decisões judiciais.(P,63)

Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) ao manter e aprimorar as técnicas de objetivação


da prestação jurisdicional presentes em sua versão anterior. Um dos institutos criados com
esse propósito é o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), que se tornou
emblemático.

O CPC/2015 busca valorizar a missão do Judiciário em delimitar a melhor norma jurídica


aplicável a um determinado caso, reconhecendo a existência de diversas normas que podem
ser extraídas do processo de aplicação da lei sobre os fatos. Nesse sentido, os artigos 926, 927
e 489, § 1º, V do referido Código são citados como fundamentais para essa valorização.

Esses dispositivos do CPC/2015 contribuem para a racionalidade na escolha das normas


jurídicas aplicáveis, dando ao Judiciário o papel de encontrar a solução mais adequada e
justificada para cada caso concreto. Assim, o Código de 2015 fortalece a importância da
jurisprudência e da uniformização das decisões judiciais, promovendo maior segurança jurídica
e eficiência no sistema processual.

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