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Crônica

Domingo animal

Na quarta-feira, fui até a Associação dos dentistas, quase que do outro lado da cidade,
embaixo de uma baita chuva, e, embora tenha ido e voltado de táxi e estivesse bem agasalhada,
peguei chuva.
Na sexta-feira, começou a tosse chata, aquela que arranha o peito encatarrado. Aff. Auto-
diagnóstico: resfriado! Muito embora, a possibilidade de ser a talzinha H1N1 tenha fugazmente me
passado pela cabeça, já que estamos em tempos de epidemia.
Tomo, diariamente, todos os cuidados possíveis: assim que chego em casa lavo e higienizo
as mãos com álcool gel, até banho diário tenho tomado e trocado de roupa todo dia.
Bom, resfriado não é tão grave, mas é chato. Tira a disposição, o corpo fica ruim, alguns
calafrios. Então apelei para o abençoado diclofenaco sódico, alho e limão em jejum, e suco de mel
com gengibre e limão para me ajudar expectorar. Também tenho me mantido quietinha dentro de
casa, aquecida.
Até ontem, sábado, choveu muito e não pude sair com meus cães. As fêmeas, Hadija,
Menininha e Nina, essa última é minha gata, mui compreensivamente, entenderam a situação e se
mostraram muito colaborativas e ficaram numa frustração sossegada, por eu não lhes dar a atenção
habitual. Já o único macho do “pedaço”, mister Zorro Antônio Banderas, com a falta de feeling,
característica da maioria dos machos de toda espécie, se mostrou inconformado, frustrado e ansioso.
Bem, hoje, domingo, nove e meia da manhã, o meu querido casal de vizinhos-cachorreiros,
M e P, passaram aqui com a dálmata Nina, que sem hipócritas etiquetas, entrou assim que abri o
portão, para vasculhar a casa inteira atrás da minha gata, sua xará e lhe dar bom dia, enquanto o
casal me convencia a dar “só uma voltinha” até o largo S. Bento.
Como o solzinho já estava a dar as caras, embora frio, parei de assistir um documentário
sobre José Saramago: José e Pilar, e meio a contra-gosto coloquei as guias nos cães e os
acompanhei até a praça.
Depois de soltar os cachorros para fazerem suas necessidades e correr um pouco, M e eu
ficamos tomando um solzinho, num dos bancos mais próximos da minha rua. Enquanto isso, seu P
dirigiu-se até a porta do mosteiro, no outro extremo da praça, para se escondendo, brincar com a
Nina. Eu, em pé, apoiada na grade ouvia M discorrer sobre seus assuntos quando, correndo o olhar
para o outro canteiro da praça, vislumbrei de relance, um homem de boné, com um cão bege no
colo, chegando na praça e sendo, a seguir, coberto pelas folhagens. Imediatamente, uma voz
masculina meio grasnada e alta começou a esbrabejar. Nós, M e eu, nada víamos. Só ouvíamos sem
entender. Nina, parada no meio da praça olhava placidamente tentando entender. Os grasnados
continuavam. Ouvi a voz do seu P, que logo a seguir veio em em nossa direção com Nina o
acompanhando. Hadija, Menininha e Zorro estavam juntos de mim. Foi então que o homem de meia
idade, saiu de trás dos arbustos no sentido de cruzar a praça e tomar a rua em direção ao fórum
velho. Levava pela guia dois pudous, o bege e um branco. Menininha, num de seus rompantes
infelizes, correu agressiva, latindo em direção aos bichinhos. Tive que berrar (maravilha pra minha
garganta) para chamá-la de volta. Meio a contra-gosto, obedeceu e voltou. Eu a prendi na guia e só
então reparei que era um primo meu, de uma das facções mais neuróticas e sequeladas da família a
quem abaneia a mão em cumprimento.
Seu P então comentou que ele, enquanto gritava, tinha ameaçado usar uma arma de choque
nos “nossos” cães.
Sem titubear eu exteriorizei meus pensamentos. Mas ele, o primo, andando muito rápido, já
dobrava a esquina e nem sei se ouviu-me. Dei de ombros e afiancei seu P, que mal as cachorros ele
não faria, e que uma das raras qualidades daquela ala da família era gostar muito de bichos.
Então, tomamos o rumo de casa e nos despedimos no portão.

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