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LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE

TEXTOS HISTORIOGRÁFICOS
AULA 1

Prof. Fábio Sapragonas Andrioni


CONVERSA INICIAL

Esta aula nos fará capazes de analisar um texto historiográfico. Todavia,


para desenvolver essa capacidade, precisamos inicialmente desenvolver
algumas outras competências.
A análise de um texto historiográfico requer, em primeiro lugar, a
capacidade de reconhecer e identificar um. Essa identificação passa justamente
por compreender quais são os elementos que caracterizam um texto
historiográfico.
O texto historiográfico é todo aquele que se dedica a entender, narrar ou
retratar um determinado momento, episódio ou período do passado. Portanto, é
um texto dedicado essencialmente à compreensão da história.
Uma de suas características é que ele sempre é o produto do trabalho de
um historiador.
Sabendo que todo ser humano vive em um tempo determinado, o
historiador também pertence a um dado tempo e, por isso, a obra histórica que
ele produz também apresenta uma historicidade. Assim, analisar um texto passa
por identificar ou construir contextos.
O contexto não é somente o tempo específico de produção da obra, mas
é também um determinado recorte espacial e um determinado recorte intelectual.
Portanto, ao analisar um texto de história, devemos entendê-lo como o
trabalho de um historiador, e, por isso, como um produto de um determinado
tempo e um espaço específico (uma instituição, um país, uma cidade etc.),
conforme um determinado conjunto de fatores intelectuais e de prática de sua
disciplina.

TEMA 1 – O QUE É UM TEXTO HISTORIOGRÁFICO?

O texto historiográfico é todo aquele que busca narrar ou analisar a


história, seja um grande período, seja apenas um acontecimento isolado. Essa
noção remete ao próprio termo historiografia, que significa “a escrita da
história”. Por isso, todo texto historiográfico é aquele que tem como intenção
escrever a história.
Essa definição não esclarece totalmente o que vem a ser compreendido
por texto historiográfico, mas altera a pergunta, que passa a ser: o que é, então,
escrever a história? Essa questão é bem mais complexa e estende-se para além

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do que esta aula e este curso pretendem. Aqui, tentaremos, a partir de agora,
entender como reconhecer um texto historiográfico e, então, analisá-lo.

1.1 Reconhecendo um texto historiográfico

Um texto historiográfico sempre tem como tema algum momento da


história. Portanto, um primeiro ponto para reconhecê-lo é ver se ele apresenta
um recorte temporal. Um exemplo seria um artigo de uma revista científica sobre
a vida das mulheres solteiras em Curitiba durante a ditadura militar, entre os
anos de 1968 e 1970. Outro exemplo possível seria um livro sobre a história do
Império no Brasil, desde de 1822 até 1888. Enfim, a obra historiográfica tem,
então, uma preocupação em narrar ou analisar um determinado período da
história.
Outra característica que define um texto historiográfico é ele pertence a
um contexto. Toda obra historiográfica é uma resposta ao tempo em que foi
produzida, conforme questões que o historiador coloca e conforme maneiras que
o historiador escolhe para desenvolver seu estudo, incluindo suas fontes, formas
de analisá-las e como constituir sua narrativa. Portanto, o texto historiográfico
sempre tem autoria.
Assim, o texto historiográfico é, primeiramente, um recorte da análise de
um tempo passado, sendo essa análise, sempre, uma opção do historiador,
conforme determinada opção teórica, que reúne um conjunto metodológico, o
qual passa pela concepção de fontes e de como, com base nelas, estudar o
passado e reconstruí-lo.

TEMA 2 – A HISTORICIDADE DOS TEXTOS

Um primeiro a ponto a considerar quando analisamos um texto sobre a


história é a própria história do texto. Isso significa levar em consideração,
inicialmente, o momento histórico da elaboração do texto.
Todo texto histórico é fruto de seu tempo, uma vez que é produto de um
historiador – ou vários historiadores – que o escreve conforme questões que seu
tempo coloca e para as quais ele busca respostas.
Portanto, quando fazemos uma análise historiográfica, ou seja, uma
leitura de um texto sobre a história, devemos sempre considerar o período em
que aquele texto foi escrito e quem era o seu autor. É da relação do autor com o

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seu tempo que obtemos as pistas e os indícios para uma leitura e uma análise
críticas
Todavia, não podemos desconsiderar que o autor escreve para um grupo
de leitores. O historiador espera que sua obra seja lida por alguém, que pode ser
um público amplo ou mesmo outros historiadores. Por isso, opta por
determinadas formas de escrita, narrativa e análise. O leitor com quem o autor
espera se relacionar é também um índice histórico, e devemos considerá-lo
quando analisamos um texto.
Porém, devemos também lembrar que todo texto tem potencial para ir
além do público intencionado pelo autor. Ou seja, um texto pode ser lido de
formas diferentes. Um exemplo disso é que nós, de um tempo, podemos ler uma
obra escrita em outra época, sem sermos o público intentado pelo autor.
Em seu próprio tempo, uma obra também pode ser alvo de leituras
diferentes. Imagine, por exemplo, um texto que busque divulgar uma
determinada interpretação sobre um evento. Ele, todavia, pode ser lido por
pessoas ou intelectuais que divirjam daquela interpretação. Reflita, por exemplo,
sobre a diferença por trás da definição de um determinado acontecimento como
Revolução ou Golpe, ou de um certo evento como a independência de um país.
Portanto, os nomes dados a determinados eventos e as categorias nas
quais eles são colocados são indícios importantes do tempo em que a obra foi
elaborada e escrita. As revisões posteriores dessas categorias e desses nomes
são também produtos de diferentes temporalidades e indicam a historicidade de
uma interpretação da história.
Ou seja, a linguagem é um indicativo importante para percebermos a
temporalidade de um texto e identificarmos sua historicidade. Portanto, devemos
lembrar que a linguagem é também histórica e localiza-se em um determinado
tempo.
Quando o historiador opta por nomear um evento e, com isso, inseri-lo em
uma determina categoria, revelam-se as posições culturais, socioeconômicas e
culturais do autor em seu tempo.
Portanto, ao cruzar esse conjunto de informações sobre a época do texto,
começamos a revelar mais sobre o autor e sobre as condições históricas da
produção do texto e, consequentemente, sobre a historicidade da obra
analisada.

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TEMA 3 – O CONTEXTO ESPACIAL DO TEXTO

Dois dos elementos importantes no trabalho de análise de um texto


historiográfico são a construção e a identificação dos contextos do texto. As
relações texto-contexto não são necessariamente evidentes. É o analista do
texto historiográfico que, na busca de entender o texto, constrói os contextos
para entender a obra.
Identificar a historicidade de um texto é realizar a construção de um
contexto, buscando as relações do tempo com o texto. Isso significa estabelecer,
com base no texto e no autor, as relações com o tempo de vivência e de
elaboração da obra.
Outro contexto possível é o espacial. Toda obra e todo historiador ocorrem
em um país, em uma cidade e dentro de outros recortes possíveis de espaço.
As relações espaciais do texto com o contexto não são evidentes e findadas.

3.1 A instituição como um lugar de produção de história

Toda obra de história é produzida por uma orientação disciplinar. Os


historiadores – ou aqueles que se propõem a escrever história – têm uma
compreensão de como escrevê-la. Ela ou se origina em uma instituição ou está
ligada a uma instituição. É essa instituição que fornece um grupo no qual o
historiador se insere e compartilha formas determinadas de interpretar o
passado. Isso dá ao historiador uma legitimação para seu trabalho.
Se é o local institucional que fornece as bases que legitimam o autor
dentro de um grupo conforme uma prática, esse mesmo local também cria limites
para o trabalho possível do historiador, pois, ao acatar as demandas e as regras
da instituição, o autor restringe suas possibilidades.
Os locais institucionais autorizados a escrever a história também têm
historicidade, pois o que é considerado o modo correto de escrever a história
varia de acordo com o tempo.
Dito tudo isso, podemos afirmar que o trabalho de um historiador não é
um resultado totalmente subjetivo, mas é também o produto de fatores que um
grupo, detentor das diretrizes disciplinares, impõe, implícita ou explicitamente,
ao autor. É também dessa relação com o grupo que obtemos pistas importantes
para levantar quem eram os leitores intencionados ou potenciais do autor do
texto historiográfico.

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Devemos considerar que esses lugares institucionais também
apresentam uma localização social mais restrita, com base na qual, no entanto,
se pensa a sociedade de forma mais ampla. E o historiador, além do grupo e da
localização institucional, também tem outras relações sociais. Ao realizar a
análise do texto historiográfico, devemos, conforme o contexto que construímos,
recuperar esses outros aspectos.
Um último aspecto que essa análise contextual nos ensina é que não
existe texto histórico neutro. Contar e analisar a história de uma forma
determinada é uma opção por um lugar de fala, que autoriza o que pode e deve
ser dito e o que, por outro lado, não pode e não deve ser dito. E por mais que
essa inserção a um local institucional não seja explicitamente revelada no texto
ela está ali presente, dando a dimensão de possibilidade ao texto. Ao realizar a
análise do texto historiográfico, devemos nos atentar a esse silêncio que suporta
a sua elaboração.

TEMA 4 – O CONTEXTO INTELECTUAL DO TEXTO

O principal lugar social do historiador é o lugar institucional, no qual o


sujeito aprende a ser historiador. Aprender a ser historiador significa munir-se de
um conjunto de procedimentos que definem a profissão. Esse é o contexto
intelectual.
As normas disciplinares dão a base para o ofício do historiador, indicando
os procedimentos considerados mais corretos para realizar a pesquisa histórica.
É, portanto, dentro do local institucional que uma pessoa é autorizada a ser
historiadora, e isso passa por reconhecer, aplicar e dominar certas noções e
formas de trabalho. É, portanto, um contexto intelectual que permite a elaboração
do texto reconhecido como historiográfico.
É, por exemplo, no lugar institucional que o historiador em formação
aprende o que pode ou não ser considerado como um recorte válido, quais as
possíveis fontes de pesquisa para analisar o recorte, os métodos para ler e
interpretar os documentos e, por fim, as maneiras autorizadas de escrita do texto
histórico.
Mas, mais que tudo isso, o local institucional forma não só o historiador,
mas também a história como ciência do passado. Com isso, é nesse local que
se formam as pessoas que serão autorizadas, de forma geral, pela sociedade a
dizer o que ocorreu no passado.
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Ao analisar o texto historiográfico, é possível perceber isso tudo. O texto,
normalmente – até por uma obrigação da profissão –, apresenta seus
referenciais teóricos e metodológicos. Devemos nos atentar a esses aspectos,
pois eles indicam de qual lugar institucional o autor parte.
Além disso, devemos também ter a consciência de que o local institucional
da história não é único. Por mais que existam elementos comuns e
compartilhados, o lugar institucional da história é plural. Há várias linhas de
pesquisa, cada qual trabalhando com um determinado recorte temporal ou
temático, reconhecendo um conjunto de fontes em detrimento de outras, assim
como autorizando determinados tipos de abordagens e desautorizando outros.
Dessa forma, parte da análise que fazemos de um texto historiográfico
deve focar os elementos teóricos e metodológicos do próprio texto.
Conforme recuamos no tempo e lemos textos mais antigos, vemos que as
mudanças na concepção de história e, portanto, no contexto intelectual são mais
profundas. Se hoje, apesar da pluralidade de recortes metodológicos sobre a
história, temos alguns elementos comuns, que permitem perceber um grande
fundo disciplinar da história, em outros tempos, encontraremos visões bem
diferentes de certos aspectos que nos parecem óbvias e fundamentais.
Dessa forma, o contexto intelectual se relaciona com o institucional e o
espacial, pois é o que autoriza, legitima e define as práticas do que é a
historiografia, ou do que pode ser considerado como a escrita da história. Por
isso, ao analisar o texto, devemos buscar os elementos metodológicos, teóricos
e de compreensão do que é história, pois são caminhos importantes para
pensarmos os contextos a serem relacionados com os textos. Contudo, não
devemos esquecer que esses contextos são também históricos, ou seja,
constituem-se e alteram-se com o passar do tempo.

TEMA 5 – A ESCRITA COMO PRODUTO

A escrita da história e os relatos e narrativas que ela produz são


elaboradas conforme os contextos temporais, espaciais e intelectuais. Ou seja,
ela é fruto de um tempo, de determinados locais – principalmente de uma
instituição – e de uma dada formação intelectual que define o trabalho do
historiador.
A escrita é também parte da formação intelectual do autor. O autor
reorganiza as fontes e os documentos, visando um efeito narrativo que vai além
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da simples descrição. Um exemplo disso é que o historiador escolhe quando a
história começa e acaba, porém, a história não acaba, ela é um fluxo constante.
Além disso, o historiador constitui uma unidade de eventos e coisas ocorridas,
as quais talvez não fossem nem evidentes nem conscientes para os atores da
época abordada. Nesse sentido, o historiador também busca estabelecer
relações entre eventos, dando a entender que algo que ocorreu antes levou a
algo que ocorreu depois, sem que, contudo, os agentes da época tivessem a
noção ou concordassem com essas relações.
Todas essas opções sobre a escrita são um resultado direto das ações do
contexto. O que o historiador conta, quais agentes considera e de que forma
interpreta os eventos e suas concatenações são escolhas dele, conscientes ou
não, conforme os diferentes contextos com os quais se articula e convive. Os
mais prementes dos contextos são o intelectual e o institucional, uma vez que
são aqueles que impactam mais claramente o trabalho de pesquisa e escrita da
obra historiográfica. Dessa forma, podemos considerar a escrita como uma
prática social.
A escrita da história tem, como finalidade, narrar ou analisar um período
do passado. Ou seja, a finalidade dela não é ser um retrato de seu tempo ou de
diferentes contextos. Todavia, os contextos deixam marcas encobertas. É o
trabalho de análise historiográfica que permite perceber essas marcas implícitas
e ocultas. A forma com que o texto é construído revela informações sobre seus
locais, seu tempo e sobre o trabalho intelectual envolvido em sua elaboração.
Um ponto para o qual devemos nos atentar quando analisamos um texto
de história é que ele parte de questões do presente do autor. Justamente por ser
um produto da relação direta com o contexto temporal do autor, as marcas do
tempo aparecem no texto. Um indício disso, muitas vezes, está no próprio objeto
do texto, ou na abordagem feita por ele. Não é raro ver que historiadores buscam
no passado questões e respostas que se relacionam com as de seu tempo. Por
exemplo, atualmente, testemunhamos como as denúncias sobre a violência
contra as mulheres ou os homossexuais aparecem na mídia, e isso, então,
reflete no estudo de questões de gênero no passado. Assim, os debates de um
tempo refletem, invariavelmente, como se pensa naquele período e como nele
se produz o conhecimento sobre o passado, ou seja, a história.
Outro aspecto que a escrita da história apresenta é o sentido da narrativa.
Tradicionalmente, a história parte do mais antigo para o mais recente, seguindo

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uma cronologia progressiva que revela a história conforme uma relação causal
entre eventos. Hoje, já podemos nos deparar com narrativas que subvertem essa
maneira tradicional. Porém, ao estabelecer relações entre eventos em tempos
diferentes, dificilmente o autor não estabelece um sentido entre os
acontecimentos.
A forma como um historiador liga eventos diferentes revela muito sobre
os contextos intelectual e institucional nos quais ele se insere, pois ambos os
contextos se relacionam decisivamente com a compreensão de história do autor.
Isso impacta diretamente na historiografia que o autor produz, transparecendo
inclusive na maneira como os eventos e as relações entre eles são
estabelecidas.
O sentido dado aos eventos distantes e diferentes no tempo, como
resultado do trabalho teórico e metodológico do autor, pressupõe também uma
seleção de documentos e fontes, além de métodos para lê-los e interpretá-los.
As opções metodológicas são também as que permitem ao historiador separar
o passado do presente. Portanto, é dentro do universo contextual que o
historiador se torna apto a criar um objeto concreto que se torna passível de
conhecimento para a sociedade na qual o historiador se insere.
A narrativa histórica faz sentido, porque a sociedade, de forma geral,
compartilha dos problemas e das questões expostas no texto, assim como as
respostas dadas também são inteligíveis e fazem sentido. O historiador, pelos
contextos institucional e intelectual dos quais faz parte, torna-se o sujeito
reconhecido pela sociedade como apto a descrever, traduzir e analisar o
passado. Por isso, a análise do texto historiográfico é também uma análise da
história, pois o texto evidencia aspectos de um tempo passado.
Ao analisar um texto historiográfico, o único material que temos é aquele
escrito e a sua linguagem. E isso não é pouco, uma vez que o texto é elaborado
na confluência de diversos contextos, e, por mais que não os enuncie
explicitamente, eles estão ali presentes, ocultos no texto. O trabalho de quem
analisa tal texto é justamente cavar até atingir essas camadas ocultas.

NA PRÁTICA

O conteúdo que vimos nesta aula é essencialmente prático. A análise de


um texto historiográfico é o resultado da forma como o historiador analisa as
obras que abordam a história. Assim, no trabalho de pesquisa, a análise de um
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texto historiográfico reflete a forma como nos relacionaremos com outros textos
de história. A leitura crítica dos trabalhos dos colegas historiadores –
contemporâneos ou não – nos ajuda a entender as condições de produção do
texto historiográfico.
Um dos principais textos que podemos usar para conhecer os elementos
da análise historiográfica e entender como desenvolver uma boa análise
historiográfica é “A operação historiográfica”, de Michel de Certeau, presente no
livro A escrita da história (2008), do mesmo autor.
Por outro lado, a análise aqui apresentada também é importante e
essencial na atividade de ensino. Incialmente, é importante ensinar e
desenvolver com os alunos os elementos básicos da leitura crítica de um texto
de história. A formação de cidadãos críticos se dá também em saber ler e
interpretar as formas em que a história é apresentada. Além disso, os livros
didáticos de história são, em alguma dimensão, textos historiográficos, e, por
isso, passíveis da análise crítica aqui proposta, podendo constituir, assim, um
primeiro exercício de leitura crítica com os alunos.
De maneira mais geral, os elementos básicos da leitura crítica aqui
apresentada também podem ser aplicados em outros textos e não somente aos
historiográficos, uma vez que todos são históricos e fruto da relação de diferentes
contextos. A diferença é que os “outros” textos não são dedicados ao passado,
ou seja, são frutos de diversos contextos institucionais e intelectuais.

FINALIZANDO

Nesta aula, vimos que texto historiográfico é aquele que trata de um


período histórico e que, por isso, apresenta um recorte de análise e uma
abordagem sobre o passado. Essas análise e abordagem do passado são
sempre elaboradas por um historiador, o qual pertence a um determinado tempo,
e, por isso, a análise apresentada é também fruto de um tempo. Assim, o texto
historiográfico nasce de uma relação entre diferentes contextos com o
historiador.
Portanto, um primeiro contexto que podemos apontar no texto
historiográfico é o tempo em que ele foi produzido. Todo texto é produto de um
historiador, que é um sujeito de um período determinado, e, por isso, alguém que
enfrenta questões e problemas daquele tempo específico. Essa relação do
historiador com seu tempo aparece refletida no texto. A linguagem é o meio pelo
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qual podemos perceber isso; pelas categorias e conceitos empregados. Assim,
a linguagem revela as posições cultural, socioeconômica e política do texto e de
seu autor. A linguagem também pode revelar com qual público o texto pretende
se relacionar. Todavia, um texto raramente se restringe a um público, podendo
ser lido sob diferentes pontos de vista, tanto em seu tempo quanto em períodos
posteriores.
Outro contexto é o espacial. Todo texto é elaborado por um autor que se
localiza em algum espaço. O principal espaço para a análise do texto
historiográfico é o institucional. O que o historiador considera como fonte do
passado, as maneiras que emprega para analisá-lo, as formas com as quais
constitui sua narrativa e outros procedimentos historiográficos são o resultado
desse local institucional, o qual é responsável pela formação e pela legitimação
do historiador como figura autorizada a falar o que foi o passado. Esse local
institucional não é fixo e único, e por isso apresenta variações tanto no tempo
quanto no espaço. Logo, não há uma obra historiográfica neutra.
Por fim, há o contexto intelectual, que é justamente aquele que trata da
formação do historiador e do desenvolvimento e aprendizado dos procedimentos
considerados como os mais corretos para fazer historiografia. Como os locais
institucionais são plurais, os contextos intelectuais também o são, resultando em
diferentes linhas de interpretação sobre a história. Portanto, o contexto
intelectual também muda conforme o tempo.
As relações entre esses contextos, e entre eles e o historiador, resultam
na escrita da história. O texto historiográfico é, dessa forma, fruto de um tempo,
de locais específicos e de uma instituição disciplinar, refletindo a formação
intelectual do historiador. É na escrita que todos os diferentes contextos
aparecem, muitas vezes de forma oculta e implícita. Portanto, a leitura crítica do
texto visa justamente reconstruir esses contextos.

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REFERÊNCIAS

ANKERSMIT, F. A escrita da história: a natureza da representação histórica.


Londrina: EDUEL, 2012.
CERTEAU, M. A escrita da história. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2008.
JENKINS, K. A história repensada. São Paulo: Contexto, 2001.

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