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As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não
exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou do
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.
É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte.
Reproduções para fins comerciais são proibidas.
A obra retratada na capa deste livro é o desenho Nova York, de Candido Portinari (1903-1962),
datada de 1942. Além da inegável beleza e expressividade de suas obras, Portinari tem importância
conceitual para um instituto de pesquisas como o Ipea. O “pintor do novo mundo”, como já foi
chamado, retratou momentos-chave da história do Brasil, os ciclos econômicos e, sobretudo, o
povo brasileiro, em suas condições de vida e trabalho: questões cujo estudo faz parte da própria
missão do Ipea. O instituto agradece ao Projeto Portinari pela honra de usar obras do artista em
sua produção.
CAPÍTULO 2
1 INTRODUÇÃO
O debate crítico e propositivo sobre a mobilidade nas condições atuais de nossas
cidades não deve ser posto exclusivamente no âmbito do econômico e do téc-
nico, embora esses fatores sejam relevantes no cenário urbano contemporâneo.
Acreditamos que se faz necessário incorporar a dimensão política ao debate sobre
a mobilidade urbana, especialmente no atual período de compressão espaço-tempo
(Harvey, 1994), que faz do domínio e do manejo de escalas de mobilidade um
trunfo de poder para empresas, governos e cidadãos.
A mobilidade assume, portanto, dimensão estratégica na reprodução do urbano
em seu momento de extensão hierarquizada, que – para diferentes autores – tem
sido denominado como metropolização do espaço. Cidades, lugares e territórios são
reconfigurados em processos seletivos de produção e consumo, sob a hegemonia da
economia dos fluxos. Não é sem razão que Pinson (2011) define a metropolização
como fenômeno multiforme e contraditório de dilatação, ampliação e diversifi-
cação de mobilidades.
Colocar em causa – no plano da reflexão conceitual crítica – as condições
sociopolíticas da mobilidade é um exercício de desvelamento da sociedade em
seu momento de generalização urbana. E, a nosso ver, uma oportunidade para
identificar atores possíveis nas disputas de apropriação e uso do espaço socialmente
construído. É esse o propósito maior deste capítulo.
o que trouxe outra dimensão para o sentido das escalas do movimento. É nesse
filtro social de perspectivas que a mobilidade ganha significado conceitual e se
inscreve na prática social, o que implica seu reconhecimento como uma conquista
no campo do direito à cidade (Herce, 2009).
TABELA 1
Deslocamento de trabalhadores em RMs selecionadas (2010)
(Em %)
RMs Trabalhadores que se deslocam por mais de uma hora
2. A composição do capital social do indivíduo tem a ver com a dimensão subjetiva que potencializa sua inserção no
mundo. O capital social é uma potência de vida adquirida em espacialidades diferenciadas de encontros com outros
indivíduos e no acesso a bens simbólicos (educação, cultura, artes e técnicas) reunidos em diferentes lugares. Explica-
-se porque a mobilidade se torna fundamental para a composição socialmente orgânica do capital dos indivíduos.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É possível assegurar que a mobilidade urbana tornou-se uma importante chave
de leitura da metropolização como unidade contraditória e desigual da produção
do urbano e da urbanização contemporâneas, principalmente porque coloca em
causa o significado da hegemonia da economia dos fluxos da velocidade e, ao mesmo
tempo, porque vem se configurando como esfera pública de disputa política da
produção do espaço urbano.
A mobilidade é prática socioespacial que permite a presença de sujeitos so-
ciais em diferentes lugares como corporificação de direitos. Estão em debate não
somente as possibilidades técnicas e econômicas dos deslocamentos das pessoas,
ou até mesmo da decisiva inflexão territorial de investimentos públicos. Também
entram na cena política as posições dos atores sociais em significados mais abran-
gentes da mudança de relações de poder socioespacial. Como relembra Massey
(2000), não se trata simplesmente de algumas pessoas se movimentarem mais
que outras, mas do fato de que a mobilidade de alguns grupos sociais significa
enfraquecer e limitar a vida de outras pessoas.
3. Moradores de favelas localizados em áreas centrais da metrópole apresentam condições de reduzida mobilidade
urbana, tal como os residentes de bairros em subúrbios e periferias. Na verdade, não são apenas as limitações impostas
pela distância física e social que operam distinções do movimento de pessoas na metrópole. Há as restrições corpóreas
e constrangimentos simbólicos que também impedem a livre mobilidade de homens e mulheres na cidade. Homens
adultos e saudáveis movem-se, e são movidos, pela cidade muito mais que as mulheres. O recorte de gênero, de raça
e etnia – bem como o de ordem geracional – é também significativo, quando se trata do exercício da mobilidade nas
cidades contemporâneas.
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O Significado da Mobilidade na Construção Democrática da Cidade | 55
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