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a. j.

bachrach

In tro d u çã o à

m
i ; i ■. ï

e.p.u
editora pedagdgica e universitária ltda.
1 ^ l l 1
Pesquisa não é estatística. Muitos estudantes assus­
tam-se e se afastam da agradável realização da pes­
quisa porque a igualam às complicadas manipula­
ções estatísticas. A estatística é, apenas, um instru­
mento de pesquisa, necessário para a elucidação de
alguns dados científicos.
A motivação para a pesquisa reside na curiosidade,
pois, como diz Pauling: “ A satisfação da própria
curiosidade é uma das maiores fontes de felicidade
na vida” .
Na presente obra o Autor analisa, de modo claro e
sucinto, os métodos fundamentais da pesquisa, as
características e os objetivos da ciência, dados, hi­
póteses e definições, os problemas de clareza e
certeza, os trabalhos de laboratórios etc.
Tratando-se de uma introdução, o Autor não preten­
deu abarcar todas as partes da ciência e do método
científico. Não obstante, a presente obra é de grande
valor para todos os estudantes, professores e pes­
quisadores, que procuram melhor conduzir suas
pesquisas segundo as orientações e temas prefe­
ridos.

6006
INTRODUÇÃO À PESQUISA
PSICOLÓGICA
FICHA CATALOGRÁFICA

[Preparada pelo Centro de Catalogação-na-fonte,


Câmara Brasileira do Livro, SP]

Bachrach, Arthur J.
B 12i Introdução à pesquisa psicológica |tradução
brasileira de Geraldina Porto Witter| São Paulo,
E .P.U ., 4^ Reimpressão, 1975
X V , 107 p. (Ciências do Comporta­
m ento).
Bibliografia.

1. Pesquisa psicológica I . Série.

73-0580 C D D -150.72

índices para o catálogo sistemático:

1. Pesquisa: Psicologia 150.72


2 . Psicologia: Pesquisa 150.72
A r t h u r J. B a c h ra c h

Departamento de Psicologia da Universidade do Arizona

INTRODUÇÃO À PESQUISA
PSICOLÓGICA

Tradução de
Geraldina Porto Witter

5.a Reimpressão

E.P.U. — Editora Pedagógica e Universitária Ltda.


São Paulo
Tradução brasileira da segunda edição original americana: Psychological
Research, An Introduction, de Arthur J. B a c h r a c h , publicado em 1965
por Random H ouse — N ew York.

© Editora Herder, São Paulo, 1969


(C) 3? Reimpressão, E.P.U. — Editora Pedagógica e Universitária Ltda., 1974.
Todos os direitos reservados. Interdito qualquer tipo de reprodução, mesmo de
partes deste livro, sem a permissão, por escrito, dos editores. Aos infratores se
aplicam as sanções previstas na Lei (artigos 122-130 da Lei 5.988, de 14 de de­
zembro de 1973).
E.P.U. — Praça D om José Gaspar, 106 — 39 andar — Caixa Postal 7509 —
01.000 São Paulo, Brasil.
Impresso no Brasil Printed in Brazil
DEDICATÓRIA

A tradição manda esperar até o meio da tourada para dedicar o touro


a alguém na platéia. Saber-se-á assim se o touro é suficientemente
bravo para ser ou não oferecido. Infelizmente, não é possível fazer isto
com um livro, e, desta forma, tomo este livro pelos chifres e o de­
dico a tais estimados amigos e colegas que me ensinaram a pesquisar:

M urray S id m a n , Joel G r e e n sp o o n
e Frank B anghart

VII
ÍNDICE

Prefácio da Segunda Edição XI

Prefácio da Primeira Edição XIII

I. Introdução 1
Curiosidade, acidente e descoberta, 1 — O cuidadoso casual, 5 —
U m caso de “serendipity”, 8 — Idéias pré-concebidas: miopia de
hipótese, 14.

II. Características e Objetivos da Ciência 19


Algumas características importantes da ciência, 19 — Os objeti­
vos da ciência, 21 — Observação e experimento, 22 — Raciocí­
nio a partir de experimento: a busca de ordem e lei, 27 — Pre­
dição a partir da observação e do experimento, 29 — Mensura-
ção em ciência, 32.

III. Dois Métodos Fundamentais da Pesquisa:Teórico For­


mal e Teórico In fo rm a l 39
Dados, hipótese, teoria e lei: o método teórico formal, 39.
Dados, micro-hipóteses, ordem e lei: método teórico informal, 45.

IV. O Problema da D efin ição ....................................... ........ 51


Três níveis da definição, 52 — O problema da clareza, 53 —
Um a tentativa de clareza e certeza, 55 — Conceitos inferidos e
inventados, 60.

V. O Laboratório e o “Mundo Real” :Pesquisa com Ani­


mais e Seres Humanos 63
Mas por que animais? 65 — O erro analógico, 68.

VI. Considerações Éticas na P esq u isa...................................... 73

IX
Preocupação do público com a pesquisa, 73 — Considerações
éticas na pesquisa com animais, 75 — Considerações éticas na
pesquisa com seres humanos, 76. Consentimento, confidência e
procedimento aceitável ou padrão, 78.

V II. O Cientista e a Ordem Social ......................................... 83


A comunicação do cientista com o público, 84 — A comunica­
ção do cientista com outros cientistas, 88 — Ciência e a ordem
social, 93.

Bibliografia ...................... 97

Sugestões para outras leituras ....................................................... 101

Índice de autores e assu n to s........................................................... 103


Prefácio da Segunda Edição

A maneira pela qual o público respondeu à primeira edição deste


livro me foi muito agradável. O livro não foi apresentado como um
tratado importante sobre a ciência ou sobre o método científico, mas
simplesmente como uma introdução a certos conceitos e idéias que
pudessem levar o leitor a realizar outras explorações no mundo da
pesquisa. A maioria das pessoas reconheceu que ele era apenas um
aperitivo e não um curso completo e como tal o aceitou. Agradou-me
o fato de ele, em sua modéstia, ter servido de entretenimento e in­
formação.
A revisão consistiu principalmente na elaboração das idéias da
última parte, a qual trata do papel do cientista na sociedade. Agradeço
ao meu assistente de pesquisa Andrée Fleming-Holland pela ajuda
prestada nesta revisão e à Sra. Jane Little pelo preparo do manus­
crito.

XI
é
Prefácio da Primeira Edição

Em geral não se faz pesquisa da maneira pela qual os que es­


crevem livros sobre pesquisa dizem que elas são feitas.

Esta é a minha Primeira Lei1, uma boa lei informal que pode
necessitar de um pouco mais de elaboração. Quero dizer simples­
mente que, em geral, os livros sobre pesquisa são afirmações de prin­
cípios gerais formalizados e apenas refletem, de uma maneira ideal, a
realidade cotidiana da prática da pesquisa. Apresentam uma visão des­
prendida da ciência e pouco, senão nada, do prazer e da frustração.
Em resumo, os livros sobre pesquisa são (para usar uma metáfora)
como um traje de gala e a própria pesquisa é como uma roupa de
trabalho.
Neste livro tentarei apresentar tanto alguns dos princípios formais
do método científico (particularmente no que se relacionam com a
psicologia) bem como algo da satisfação cotidiana subjacente à pes­
quisa. Não posso pretender abarcar todas as partes da ciência e do
método científico em tão breve espaço pois, afinal de contas, trata-se
de uma introdução. Se puder compartilhar algumas idéias sobre pes­
quisa, dissipar algumas falsas idéias sobre o tédio que a envolve e
interessar alguns estudiosos a investigar melhor o assunto, ficarei mais
do que satisfeito.

1) A minha Segunda Lei refere-se aos problemas de planejamento na


pesquisa e diz simplesmente que: A s coisas levam mais tem po do que se
supõe.

XIII
Grande parte deste livro foi escrita quando eu era Diretor da
Divisão de Ciência do Comportamento da Escola de Medicina da Uni­
versidade de Virginia. Sou profundamente grato ao Diretor T. H. Hun-
ter e ao Dr. T. R. Johns da Escola de Medicina por me terem dado
a oportunidade e o estímulo para a pesquisa.
A ciência do homem. . . já não é coisa tão abstrata que possa
ser construída a priori c de perspectivas gerais; é o método experi­
mental universal aplicado à vida humana e, portanto, o estudo de
todos os produtos dentro da esfera de sua atividade, acima de tudo
de sua atividade espontânea.

Ernest R enan
The Future of Science. (1848)

XV
I

Introdução

Pesquisa não é estatística. Começo esta introdução ao estudo da


pesquisa psicológica com uma afirmação negativa porque senti que
muitos estudantes assustam-se e afastam-se da agradável realização
da pesquisa, porque a igualam ao tédio e às complicadas manipula­
ções estatísticas. Isto não é difícil de compreender pois o estudante que
abre um livro de pesquisa, provavelmente, achará que o mesmo não é
mais do que um livro sobre estatística no planejamento da pesquisa.
Isto não é, de maneira alguma, para desacreditar a estatística mas,
meramente para indicar que a estatística é um instrumento de pesquisa,
útil sem a menor dúvida, mas não mais do que uma técnica para tra­
tamento de alguns (não de todos) dados da pesquisa. Tratarei da
pesquisa de um’ outro ponto de vista, mencionando brevemente alguns
aspectos básicos (tais como controle e grupo experimental), mas
sem fazer qualquer tentativa para introduzir o estudante nas técnicas
estatísticas. Prefiro me ocupar com as origens da pesquisa, com a
prática e método científico, com o significado dos dados e teorias,
com os aspectos éticos da pesquisa com animais e seres humanos,
e, o que é mais importante, com a curiosidade do cientista que é seu
principal atributo e sua principal fonte de prazer. Como certa vezj
observou o brilhante químico Linus Pauling: “A satisfação da própria
curiosidade é uma das maiores fontes de felicidade na vida”.

Curiosidade, acidente e descoberta. — Comecemos pela curio­


sidade do cientista. Muitas pesquisas começam com uma descoberta

1
acidental. O cientista está trabalhando diligentemente em seu labora-
tório com um problema particular e com um objetivo determinado em
vista, quando algo acontece, talvez alguma coisa errada. A Sir Alexan­
dre Fleming isto ocorreu quando estava tentando fazer a cultura de
uma bactéria. O leitor recordará que tinha aparecido um mofo verde
no frasco em que estava fazendo a cultura e que as bactérias tinham
morrido. Isto, provavelmente, já tinha acontecido a muitos cientistas
antes dele, que talvez tenham praguejado silenciosamente pelo expe­
rimento arruinado, jogado fora a cultura e recomeçado novamente a
cultura da bactéria.
Mas isto seria contrário ao ideal do método científico. Conforme
veremos mais tarde, depois de ter sido escolhido o problema, o método
científico consiste fundamentalmente de duas partes: 1) a cóleta de
dados e 2) o estabelecimento de uma relação funcional entre estes
dados. Para Fleming e os que o procederam havia dois dados básicos:
a cultura de bactéria havia sido destruída e um mofo verde estava
presente no recipiente. Este é o fato: A e B coexistiam. Agora, haverá
uma relação funcional entre os dois? Teria A (o mofo) algum efeito
sobre B (a bactéria)? Este é o começo da pesquisa, manipular as
condições sob as quais A e B coexistem de modo que se possa obter
uma resposta. Se eles forem funcionalmente relacionados (isto é, se A
tem efeito sobre B) isto já será uma resposta. Se não o forem e a
coexistência foi puro acaso, esta também poderá ser uma resposta.

Portanto, Fleming começou com uma observação. Para começar


seu experimento provavelmente ele formulou uma espécie de hipótese
que poderia ser redigida, grosseiramente, da seguinte forma: “O apa­
recimento do mofo verde e a destruição da colônia de bactéria estão
relacionados; o mofo verde é o responsável pela destruição da bactéria”.
Neste ponto conduziu um experimento para testar a hipótese. Poderia
ter tomado o mofo verde e posto em contato com uma nova colônia
de bactérias vivas. Os resultados deste experimento poderiam refutar ou
confirmar a hipótese. Se a segunda colônia de bactérias também pe­
recesse quando em contato com o mofo verde o experimentador po­
deria se sentir mais à vontade ao presumir uma relação causal. Há
outros fatores que poderiam ser levados em consideração, tais como

2
mudanças de temperatura, presença ou ausência de luz solar. Mas, no
momento, pressupondo que estas variáveis tenham sido controladas,
o experimento poderia constituir-se em manipular o mofo verde e a
bactéria sob várias condições controladas.
Naturalmente, a pesquisa de Fleming mostrou que o mofo verde
era responsável pela destruição das bactérias e de suas descobertas
surgiu a penicilina. Quero acentuar o aspecto mais importante disto
tudo. Fleming descobriu o mofo verde por acidente; o que estava
tentando era cultivar uma determinada colônia de bactérias. Um pes­
quisador de menor envergadura poderia ter ficado irritado e aborreci­
do com a morte das bactérias e, ignorando o mofo, simplesmente
teria lavado o recipiciente na pia. O fato de Fleming não o ter feito
ilustra uma das características do bom cientista. Manter os olhos aber­
tos; nunca se limitar a um caminho fixo de experimentação a ponto de
ficar cego para eventos não usuais que possam vir a ocorrer. Skin-
n e r ( 5 2 ) 1 em um de seus “princípios informais da ciência” diz:
“Quando encontrar alguma coisa interessante deixe tudo o mais para
estudá-la”. Embora isto possa não se enquadrar com a imagem da
ciência e do cientista que o estudante concebia, ilustra como se ori­
gina e se desenvolve a maioria das pesquisas. Para quem olha a ciên­
cia ela pode parecer um corpo de conhecimento lógico, coerente e alta­
mente organizado que gira ao redor do núcleo de uma rígida metodo­
logia pré-estabeleeida. J. Z. Young, em seu tratado sobre a ciên­
cia (65), diz o seguinte:

Bastante curioso é que uma das características dos cientistas e de seus tra­
balhos seja a confusão, quase a desordem. Isto pode parecer estranho quando
se acostumou a pensar na ciência com C maiúsculo, com o sendo tudo cla­
reza e luz. Realmente a finalidade da ciência são a lei e a certeza. A s leis
científicas foram as bases do estupendo desenvolvimento da tecnologia que
transformou o mundo ocidental, tornando-o, a despeito de todos os seus perigos,
um lugar mais confortável e feliz. Mas ao conversar com üm cientista logo
se verá que suas idéias não estão tão bem ordenadas. O cientista aprecia a
discussão, mas não pensa sempre com esquemas coerentes e com pletos tais com o
os que são usados pelos filósofos, juristas e clérigos. A lém disso, em seu la-

1) Os números entre parêntese referem-se aos itens numerados da biblio­


grafia no fim do livro.

3
boratório não dispende muito tempo pensando em leis científicas e assuntos
semelhantes. Está ocupado com outras coisas, tentando fazer alguma peça de
aparelho funcionar, procurando um m eio de medir algo com maior precisão,
ou fazendo dissecações que mostrarão mais claramente as partes de um animal
ou planta. Sentir-se-á que dificilmente sabe que lei está tentando provar. Está
continuamente observando, mas seu trabalho é com o tatear no escuro. Quando
pressionado a dizer o que está fazendo, pode dar a impressão de incerteza ou
de dúvida, ou mesmo de autêntica confusão.

Embora a metodologia do cientista possa parecer casual, há uma


concepção global dos objetivos. Incursões no planejamento de apare­
lhos, discussões e outras agradáveis voltinhas permanecem, contudo,
dentro do plano final de conhecimento e descoberta.
Há momentos em que a curiosidade do cientista é estimulada por
situações fora do comum ou inexplicáveis, nem sempre fáceis de se­
rem estudadas experimentalmente, mas se constituindo em um estímulo
potencial para a pesquisa. Deixe-me dar um exemplo de uma destas
situações curiosas. (29) Há algum tempo um viajante mundialmente
famoso fez a seguinte descrição do planeta Marte e seus satélites:

“Eles... descobriram dois astros menores ou satélites que giram ao redor de


Marte, cujo interior dista do centro do planeta primário exatamente três vezes
o seu diâmetro e o exterior cinco vezes; o primeiro completa sua órbita em 10
horas e o último <em vinte e uma horas e meia, de modo que os quadrados
de seus tempos periódicos estão muito próximos das mesmas proporções do cubo
de suas distâncias do centro de Marte, o que, evidentemente, demonstra serem
governados pela mesma lei de gravitação que influencia os outros corpos pesa­
dos”.

Esta é uma descrição acurada de Marte. De fato este planeta


tem duas luas. As revoluções dadas estão bem próximas dos períodos
reais. Fobos gira ao redor de Marte na mesma direção que Marte
gira, mas em cerca de um terço do tempo. Isto faz parecer que Fobos
nasce a Oeste e se põe a Este. Já se havia notado que este é o único
corpo no universo que gira ao redor de um corpo central com mais
velocidade do que este último. Apesar do fato de isso ser singular,
aparece na descrição do viajante, e verificamos que se trata de uma
descrição muito acurada de Marte e da natureza fora do comum de
seus satélites.
Por que este relato é tão interessante? Porque o viajante mun­

4
dialmente famoso que o escreveu foi Lemue Gulliver, em 1726, se­
gundo escreveu Jonathan Swift nas Viagens de Gulliver. Embora esta
obra tivesse sido escrita em 1726, as duas luas somente foram desco­
bertas em 1877, um século e meio depois da descrição de Gulliver.
Na realidade, até 1820 não se havia ainda construído um telescópio
bastante potente para ver os dois satélites.
Esta é uma das formas pelas quais a pesquisa começa. Mas en­
tão? Embora a expressão possa parecer demasiado vulgar para a
mentalidade científica, expressa o começo do assombro. Como pôde
Gulliver descrever essas luas com tanta precisão 150 anos de elas te­
rem sido descobertas? Seria mera coincidência? Seria possível que
Jonathan Swift tivesse alguma informação que os outros não possuíam?
Foi meramente uma feliz conjectura? Não há resposta para isto mas
este fato proporciona um estímulo para uma possível investigação.
O cuidadoso casual. — No Prefácio eu sugeri uma lei que, em­
bora não seja formal, é fundamental para a pesquisa; trata-se do se­
guinte: “Em geral, não se faz pesquisa da maneira pela qual os que
escrevem livros sobre pesquisa dizem que elas são feitas” . Este livro,
como muitos outros, apresenta, antes de tudo, um ideal para a me­
todologia da pesquisa, ou, talvez, uma estrutura geral de princípios
para guiar e não para limitar o pesquisador.
Entre as qualidades de que necesita um bom pesquisador a mais
importante é a que Pasteur denominou de mente preparada. É claro
que é impossível a qualquer pessoa que se dedica à pesquisa predizer
todos os acontecimentos que possam ocorrer. O pesquisador precisa
começar com cuidado o planejamento e a execução da sua pesquisa,
mas não deve se prender rigidamente ao plano e, assim, se tornar
incapaz de ver as descobertas acidentais que possam surgir, como o
caso de Fleming, no exemplo anteriormente citado da descoberta da
penicilina. O pesquisador também deve ser um tanto casual, partir de
um ponto de vista flexível, mas nem por isso menos alerta em re­
lação à pesquisa, a qual pode propiciar ocaisíão para uma descoberta
inesperada. Isto é o que Pasteur denominou de mente preparada, uma
combinação de conhecimentos básicos acumulados e uma prontidão
para perceber o extraordinário.

5
Cannon, em seu livro sobre as maneiras de ser de um investiga­
dor (21), referiu-se a esse tipo de descoberta acidental como “se-
rendipity”. Tomou este termo da obra Three Princes of Serendip, de
Walpole, uma história de três príncipes que saíram pelo mundo à
procura de algo, não encontraram o que buscavam, mas em suas
jornadas descobriram muitas coisas que não haviam procurado. Can­
non considera que a “serendipity”, ou descoberta acidental, é uma
importante qualidade da pesquisa e a mente preparada deve estar
aberta para percebê-la.
Desta forma, o pesquisador deve ser cuidadoso e casual. Um ou­
tro aspecto da pesquisa é o meio pelo qual é concebida e conduzida.
Quando aparece um artigo numa revista científica, geralmente obedece
ele a um formato pré-determinado e aceito. A maioria dos artigos co­
meça com uma introdução, seguindo-se uma revista da literatura, uma
descrição do plano experimental, a apresentação dos resultados obti­
dos no experimento, a discussão destes resultados e um sumário se­
guido por uma bibliografia dos artigos mais relevantes. Tais artigos
científicos usualmente são áridos e formais e de maneira alguma re­
fletem os aspectos bastante informais e agradáveis das conversas no
laboratório com os colegas sobre a mançira pela qual a pesquisa po­
deria ser conduzida. O produto final é uma forma desidratada da
história toda.

Permitam-me dar um exemplo pessoal de um destes casos. Em


uma pesquisa, com sujeitos humanos, sobre comportamento verbal,
meus colaboradores e eu estávamos procurando um tipo de reforço
para ser usado como recompensa para o falar. Nossos sujeitos foram
equipados com microfones individuais e estávamos estudando os pa­
drões verbais dos indivíduos isoladamente e quando em interação em
um grupo. Por sua participação eles eram pagos por hora. Mas quan­
do nos reunimos e conversamos sobre o experimento, isto não nos
pareceu uma recompensa adequada nos nossos propósitos, uma vez
que não tínhamos meios para saber quanto e quão alto o sujeito fa­
lava durante a sessão. O sujeito recebia a mesma quantia a despeito
de quanto falasse. Desejávamos saber o que aconteceria se tentássemos
pedir-lhe que falasse depressa e alto, recompensando-o por esta ver-

6
balização. Reconhecendo que o dinheiro é uma boa recompensa em
nossa cultura, decidimos que seria uma boa idéia verificar o que
aconteceria se pagássemos o sujeito em dinheiro, à medida que falasse,
de modo que cada impulso vocal no microfone fosse recompensado. O
que aconteceria se o pagássemos por impulso vocal? Pensamos que
uma moeda caindo num recipiente através de uma fenda, toda vez
que ele falasse acima de uma certa amplitude, seria um bom re­
forço para produzir e manter tal comportamento.
Mas aí começamos a contar o número de tais impulsos durante
uma hora de sessão e verificamos que poderia haver diversas cen­
tenas. Seria financeiramente impossível usar uma moeda, a menos
que usássemos “pennies”. No curso desta discussão informal decidiu-se
que, devido a um teste informal que todos tínhamos tentado, os
“pennies” não são, na realidade, boa recompensa em nossa cultura.
Mesmo um secretário executivo, ganhando 25.000 dólares por ano,
pára e apanha nm “nikel” se o vê, mas não o faz quando se trata
de um “penny”. Num “nickel” parecia haver mais do que cinco vezes
o valor da recompensa de um “penny”2. Portanto, a recompensa fi­
nanceira mínima, em forma de moeda, que se poderia usar, prova­
velmente seria o “nickel”. Isto tornar-se-ia tão dispendioso como re­
compensa em tal experimento que, se usássemos o “nickel”, poderia
ocorrer o caso dos experimentadores tentarem trocar de lugar com
o sujeito!
Alguém sugeriu que poderíamos tentar usar fichas de pôquer,
que os sujeitos poderiam trocar por dinheiro no final da sessão. Desta
forma estariam trabalhando por uma recompensa monetária simbóli­
ca que é fortemente reforçada em nossa cultura. Conversamos sobre
o significado das fichas e as imagens que despertam em várias pessoas
em um grupo. Foram discutidas as ligações dessas fichas, falou-se de
montes de fichas diante de um jogador em uma sala cheia de fumaça
e de diversas associações dramáticas com as fichas de jogo no folclore
de nossa cultura. Naturalmente, uma porção de anedotas foram apre-

(2 ) Um “penny” vale um centavo de dólar, um “nickel” vale cinco cen­


tavos de dólar. (N . da T .).

7
sentadas, alguém desejou saber se teríamos de usar protetor de olhos,
enrolar as mangas das camisas e prendê-las com ligas; se teríamos
que usar para experimento uma mesa circular forrada com feltro ver­
de, e assim por diante, invocando o humor da situação de jogo. Final­
mente decidimos usar fichas.
O relato acima é apenas um registro sucinto das muitas horas de
discussão em nível informal, conduzida nesta etapa particular do ex­
perimento. Quando finalmente o artigo foi escrito para publicação em
revista especializada relatou-se apenas que: “devido à natureza de re­
forço generalizado das fichas, elas foram usadas como reforço para
o comportamento verbal, substituindo a recompensa monetária (mas
funcionando como símbolo de reforço monetário condicionado) pois
logo depois seriam trocadas por dinheiro”. Nada se disse sobre o pro­
tetor verde para os olhos, as ligas para mangas, a sala esfumaçada,
observações impróprias para um artigo científico.

É lamentável que as anedotas e as discussões informais do grupo


sejam filtradas quando o trabalho toma a forma de publicação. Aos
alunos que poderiam considerar a pesquisa como uma carreira agra­
dável, as publicações dão a idéia de que a pesquisa é uma disciplina
tediosa, árida e rígida. Em resumo, o cuidadoso sempre aparece im­
presso, mas raramente isto ocorre com o casual. O casual aparece nos
contatos informais entre cientistas, tanto em seus laboratórios e em
reuniões como nos congressos. Se existe uma importante função dos
congressos de cientistas (que se reúnem pelo menos uma vez por ano)
esta não é a apresentação de trabalhos, mas os contatos informais nos
bares e restaurantes, que propiciam a oportunidade para a troca de
idéias e informações.

Um caso de “serendipily”. Em um relato de pesquisa, feito espe­


cialmente para estudar exemplos de descobertas acidentais e os hábi­
tos de investigadores, dois sociólogos, Barber e Fox, (7) entrevis­
taram dois notáveis cientistas. Ambos haviam observado um fato, mas
somente um deles o acompanhou até uma descoberta eventual. Barber
e Fox denominaram este artigo de: “The Case of Floppy Eared Rab-

8
bits: An Instance of Serendipity Gained and Serendipity Lost.”3 Por
ser este um dos melhores exemplos disponíveis de descoberta aciden­
tal, gostaria de discuti-lo mais pormenorizadamente.
Barber e Fox ouviram falar de uma descoberta acidental feita
por dois pesquisadores. Um deles, o Dr. Lewis Thomas, eminente cien­
tista, que na época em que o trabalho foi publicado (1958) era o
chefe do Departamento de Medicina do “College” de Medicina da
Universidade de Nova York e que, anteriormente, tinha sido pro­
fessor e chefe do Departamento de Patologia. O outro pesquisador
era o Dr. Aaron Kellner, professor associado do Departamento de
Patologia do “College’ de Medicina da Universidade de Cornell e
diretor de seus laboratórios centrais.
Os dois cientistas eram plenamente qualificados, respeitados e
filiados a excelentes escolas de medicina. No curso de suas pesquisas
em patologia, os dois homens tiveram ocasião de injetar, em coelhos,
um enzima, a papaína; ambos observaram que as orelhas dos coelhos
caíam depois da injeção. A despeito do fato de ambos terem obser­
vado as orelhas caídas após a injeção intravenosa nos coelhos, so­
mente um deles veio a descobrir a explicação para este evento inco-
mum e divertido. As razões deste fato apresentam um quadro fasci­
nante das condições sob as quais a pesquisa em geral se realiza e o
que acontece aos pesquisadores.
Barber e Fox falam das entrevistas com os doutores Thomas e
Kellner. Comecemos pelo Dr. Thomas, que notou pela primeira vez
a queda reversível das orelhas dos coelhos quando estava investigando
o efeito de uma classe de enzimas, os proteolíticos4. Disse o Dr.
Thomas:

Tentava explorar a idéia de que as lesões cardíacas e as dos vasos san­


güíneos em certos estados de hipersensibilidade podem ser devidas à presiença
de enzimas proteolíticos. É uma idéia atraente sobre a qual existem poucas

(3 ) “O caso dos coelhos de orelhas caídas: Um exem plo de ‘serendipity’


aproveitada e de serendipity perdida”. (N . da T .)
(4 ) Enzimas proteolíticos são enzimas que, pela ação catalizadora, acele­
ram a hidrólise das proteínas em substâncias orgânicas mais simples.

9
evidências. Foi estudada uma vez ou outra por quase todos os que estudaram
a hipersensibilidade. Para esta investigação usei tripsina, por ser o enzima mais
disponível no laboratório, e não obtive qualquer resultado. Dispúnhamos também
de papaína não sei de que procedência mas, com o a possuíamos, tentei usá-la.
Também tentei usar um terceiro enzima, a ficínia, que é extraída dos figos, e
é comumente usada. Tem sabor catalítico e desta forma é muito útil no la­
boratório. Portanto, eu dispunha destes três enzimas. Os outros dois não pro­
duziram lesões. O mesmo ocorrendo com a papaína. Mas a papaína sempre
produziu estas estranhas mudanças nas orelhas dos coelhos. . . Trata-se de uma
das mais uniformes reações que eu já vira na biologia. Sempre acontecia. Pa­
recia que alguma coisa importante devia ter sucedido para causar esta rea-
çã o .(8 )

Diversas frases particularmente interessantes aparecem neste re­


lato inicial da descoberta. Uma delas diz: “Para esta investigação usei
tripsina, por ser o enzima mais disponível no laboratório. . . ” (itálicos
meus). Prossegue com “dispúnhamos também de papaína; não sei de
que procedência, mas a possuíamos e tentei usá-la”. Aqui também está
o acidental “dispunham” de um enzima e o outro era “o mais dispo­
nível” no laboratório. A escolha destes enzimas particulares não obe­
dece a um teste rigoroso de hipótese preconcebida. Foi puro acidente
eles “existirem” no laboratório.
Sendo um bom cientista pesquisador, o Dr. Thomas não deixou
passar este evento fora do comum. Prossegue descrevendo como iniciou
a imediata busca de uma explicação:

Eu a persegui com o um louco. Mas não fiz o que devia. . . Fiz o que
era de se esperar. Preparei e fiz cortes com todas as técnicas disponíveis na
época. Estudei o que acreditava serem as partes constituintes da orelha do coe­
lho. Olhei todos os cortes e não pude perceber nada de diferente. O tecido
conjuntivo estava intacto. N ão havia qualquer mudança na quantidade de tecido
elástico. N ão havia inflamação, nem lesão no tecido. Esperava encontrar uma
grande mudança porque pensava que tivéssemos destruído alguma coisa.(9 )

Aparece aqui uma outra frase significativa: “Fiz o que era de se


esperar”. Prosseguiu cortando as lâminas e corando-as com todas as
técnicas disponíveis na época do experimento. Disse que “esperava
encontrar uma grande mudança” porque pensava que alguma coisa
tivesse sido destruída. Ao mesmo tempo indica ter estudado a carti­
lagem da orelha do coelho e tê-la considerado normal. “ . . .As células
pareciam sadias e apresentavam um núcleo normal. Conclui não haver

10
lesão na cartilagem. E foi tudo. . Acrescentou ainda que o exame
da cartilagem nesse época era rotina e bastante casual porque ele não
defendia seriamente a idéia de que a flacidez das orelhas poderia estar
associada a uma mudança na cartilagem. “Não havia pensado na car­
tilagem. Era pouco provável que o fizesse porque ela não era consi­
derada interessante. . . Reconheço que minha idéia havia sido sempre
a de que a cartilagem é um tecido imóvel e inativo”.
É indubitável que as pessoas têm preconceitos tais como os do
Dr. Thomas. Ele pensava que deveria haver alguma lesão e não havia.
Considerou que a lesão deveria estar no tecido conjuntivo ou elástico
da orelha e compartilhava com outros a convicção de que a cartilagem
é “inerte e relativamente desinteressante” ; desta forma não lhe prestou
muita atenção. Isto o tornou pouco receptivo à explicação real da fla­
cidez da orelha em termos de mudanças na cartilagem. Alguns anos
depois, acidentalmente, ele próprio descobriu esta explicação.
O Dr. Thomas estava muito ansioso para encontrar alguma ex­
plicação para este fato biológico incomum, mas foi obrigado a deixar
o problema das orelhas caídas de coelho porque estava “terrivelmente
ocupado com um outro problema nessa época”, um problema no qual
ele “estava progredindo”. Notou também que tinha “em verdade usado
todos os coelhos disponíveis, estando desta forma predisposto a aban­
donar a pesquisa”. Aqui estão dois outros fatos acidentais que mu­
daram o curso da pesquisa. Estava fazendo outra pesquisa na qual
estava obtendo progressos (reforçador para ele) e seu orçamento não
permitia obter o grande número de coelhos de que necessitava para
prosseguir adequadamente o estudo. Desta forma persuadiu-se a aban­
donar a pesquisa sobre as orelhas caídas de coelho e aceitar, tempo­
rariamente, o insucesso.
Barber e Fox notaram que não é comum relatar experimentos ne­
gativos na literatura científica por muitas razões, uma das quais, dentre
as menos importantes, é a falta de espaço disponível para experimentos
possivelmente interessantes e valiosos, mas que não são apresentados
como projetos de pesquisa relativamente completos. Portanto, ninguém
formalmente conhecia o trabalho do Dr. Thomas sobre as orelhas caí­
das de coelhos. Porém, ele não as esqueceu e manteve vivo o pro-

11
blema das orelhas caídas em muitos contatos informais com colegas
que visitavam seu laboratório, e em outras reuniões informais. Por
exemplo, lembrou que demonstrou este fenômeno, duas vezes, a alguns
dos seus colegas incrédulos. Conforme disse: “Eles não acreditaram
quando lhes falei o que tinha acontecido. Realmente não acreditaram
que se pudesse provocar tanta mudança sem que nenhuma alteração
aparecesse no exame microscópico”. Desta forma, o assunto perma­
neceu vivo no intercâmbio informal entre cientistas.
Dois anos depois desta descoberta acidental, o Dr. Thomas estava
fazendo um outro tipo de experimento, que assim relatou:

Estava procurando um m e i o . . . de reduzir o nível de fibrinogênio do san­


gue de coelhos. Estudava uma forma de fibrinóide que ocorre dentro dos vasos
sangüíneos na reação generalizada de Schwartzman e que parece se derivar do
fibrinogênio. Minha hipótese de trabalho era a de que se o fibrinogênio aca­
basse e disso resultasse o não aparecimento do fibrinóide, isto poderia ser
útil. Já haviam relatado que se se injeta enzima proteolítico ele esgota o
fibrinogênio. Desta forma tentei inibir a reação de Schwartzman injetando pa-
paína intravenosa nos coelhos. N ão deu resultado algum em relação ao fibrino­
gênio . . . Mas a mesma coisa estranha aconteceu novamente com as orelhas dos
coelhos!

Desta vez, felizmente, o Dr. Thomas foi capaz de resolver o que­


bra-cabeça e realizar o que, em certo sentido, foi uma descoberta aci­
dental. Em suas próprias palavras o que aconteceu foi o iseguinte:

Eu estava ensinando patologia a segundanistas de medicina. Tinhamos pe­


quenos seminários com eles: sessões de duas horas, pela manhã, duas vezes por
semana, com seis ou oito estudantes. Eram seminários dedicados à patologia
experimental e aos aspectos teóricos do mecanismo das doenças. Os estudantes
tinham oportunidade de ver o que eu, o doente estávamos fazendo no laboratório.
Aconteceu ter com os estudantes uma sessão no mesmo m omento em que tom ou
a reproduzir-se o fato das orelhas caídas dos coelhos. Pensei que poderia ser
uma coisa interessante para e l e s . . . uma coisa espetacular. Os estudantes fica­
ram muito interessados. Expliquei-lhes que não podia realmente explicar o que
estava acontecendo. E que eu havia feito este experimento de propósito para
eles, para ver o que iriam p e n sa r .. . Além disso eu estava preso aos meus
outros experimentos. N ão havia muito o que fazer neles. N ão estava sendo bri­
lhante nestes outros problemas. . . Bem, nesta ocasião fiz o que não havia feito
antes. Fiz cortes simultâneos das orelhas dos coelhos depois de ter-lhes dado
papaína e cortes de orelhas normais. Esta é a parte da história da qual mais
me envergonho. Ainda me altero quando penso nela. N ão havia qualquer dano
no tecido no sentido de lesão. Mas o que ocorria era uma mudança quantitativa

12
na matriz da cartilagem. O único meio de se constatar essa m odificação era
comparar, simultâneamente, cortes tirados das orelhas de coelhos nos quais se
tinham injetado papaína com cortes comparáveis de orelhas de coelhos do m es­
mo tamanho e idade que não haviam recebido p a p a ín a .. . Antes desse fato
eu ficara tão impressionado com a amplitude da mudança que não percebera
algo tão óbvio, e concluíra que nada havia . . . A lém disso não dispunha,
naquela ocasião, de grande quantidade de coelhos com que trabalhar.(1 0 )

Esta é uma das principais funções desempenhadas pelos estudan­


tes. Lembram aos instrutores a maneira pela qual a pesquisa deveria ter
sido feita desde o início. Ao ser obrigado, num certo sentido, a “fazê-
la direito” e a comparar, cuidadosamente, orelhas de coelhos normais
com as daqueles nos quais se injetou papaína, como exemplo para os
estudantes, ele descobriu mudanças quantitativas na cartilagem que
constituíam uma explicação para as orelhas caídas. Deixem-se repro­
duzir, para concluir, o trecho do artigo do Dr. Thomas (do Journal
of Experimental Medicine) em que ele relata o que aconteceu à car­
tilagem das orelhas de coelhos. É bastante técnico mas é o produto
final de anos de contatos informais, dificuldades, pesquisa e acidente.
“A cartilagem da orelha apresentava perda da maior parte da matriz
intercelular e completa ausência de basofilia na pequena porção rema­
nescente da matriz. As células da cartilagem pareciam um pouco maio­
res e mais circulares do que as normais e apresentavam maior con­
tato entre si. . . (O contraste entre cartilagem da orelha normal e do
tecido obtido quatro horas depois da injeção é ilustrado nas Figuras
3A e 3B deste artigo.)” Que maneira excessivamente formal de rela­
tar a diversão e o assombro tão maravilhosamente humanos que exis­
tiram por muitos anos no laboratório do Dr. Thomas!
Uma descoberta acidental interessante e final foi feita nesta de­
monstração do Dr. Thomas aos estudantes:

Estava tão completamente convencido da uniformidade deste acontecimento


que usei o mesmo coelho (em cada semi nári o) . . . A terceira vez não funcio­
nou. Fiquei perplexo. Os estudantes lá estavam e as orelhas do coelho se
mantinham firmes no lugar. . . A princípio pensei que o técnico tivesse injetado
outra droga. Mas quando verifiquei que isto não havia ocorrido e dei a m esm a
droga a outros coelhos e funcionou constatei que o coelho havia se tom ado
imune. Esta é uma descoberta potencialmente fecunda. . . ( 1 1 )

Esta foi a seqüência de acidentes e descobertas vividos pelo Dr.

13
Thomas. Dr. Kellner, um cientista igualmente qualificado, viu as ore­
lhas caídas do coelho quando estava trabalhando com injeções de pa-
paína, mas nada fez para chegar à descoberta, principalmente porque
a seqüência da descoberta levou-o a outros problemas. Primariamente,
o Dr. Kellner estava interessado no tecido muscular e na pesquisa car­
díaca. Quando observou a mudança nas orelhas dos coelhos durante
uma pesquisa sobre os músculos cardíacos, disse ter ficado “um pouco
curioso, em relação ao fato, naquela época” e que “fora levado a
investigar o observado até o ponto de fazer cortes de orelhas de coe­
lhos”. Mas aqui seu interesse pelos músculos e suas idéias pré-con-
cebidas sobre cartilagem (as mesmas do Dr. Thomas — a qualidade
inerte) impediram-no de prosseguir na observação:

Já que eu estava, primariamente, interessado em pesquisar problemas re­


lativos aos músculos cardíacos, pensava em termos de músculos. Isto impediu-me
de ver a idéia de mudanças na cartilagem que não me ocorreu com o uma pos­
sibilidade. Procurava músculos nos cortes e nunca sonhei que era carti­
lagem. (12)

Uma das maiores influências sobre o Dr. Kellner foi a exer­


cida pelas pessoas que trabalhavam com ele, no laboratório, colegas de
pesquisa que compartilhavam o seu interesse por músculos cardíacos
e que reforçaram sua tendência para deixar de lado o divertido quebra-
cabeças das orelhas caídas para dedicar-se a outras áreas de maior
interesse para todos. Outras descobertas acidentais derivaram do pro­
blema das orelhas caídas. Entre outras coisas, o Dr. Kellner foi ca­
paz de descobrir um defeito de coagulação sangüínea nos coelhos que
haviam recebido uma injeção de papaína, um defeito parecido, em cer­
tos aspectos, com a hemofilia. Portanto, é possível que aqui a “seren-
dipity”, embora não tivesse levado à explicação, em termos, da car­
tilagem das orelhas caídas, se evidenciou em outros resultados even­
tuais de certa importância.

Idéias pré-concebidas: miopia de hipótese: Na pág. 39 iniciarei


uma discussão mais formal sobre o teste de hipótese e das teorias na
ciência, no entretanto, um comentário sobre a miopia de hipótese, uma
enfermidade comum entre pesquisadores com certas idéias pré-conce­
bidas, que podem se interpor e impedir as descobertas, parece ser ade­

14
quado neste ponto. Este caso é ilustrado no episódio dos dois cientistas,
os Drs. Thomas e Kellner; ambos foram retardados em uma desco­
berta por uma idéia pré-concebida sobre a natureza inerte da cartila­
gem. Mas, estes pesquisadores erraram apenas porque não prossegui­
ram imediatamente em busca de novos fatos. O que eu denomino de
miopia de hipótese é um distúrbio de visão, uma incapacidade de ver
longe ao pesquisar, devido às idéias pré-concebidas. O pesquisado;,
diante dos fatos presentes, recusa-se a aceitá-los ou procura descartar-se
deles com explicações simplistas. Dois casos bem documentados de
miopia de hipótese podem ser apresentados. Um relatado durante o
tempo de Galileu, e outro mais recentemente.
Olhando através de seu telescópio recentemente inventado, Gali­
leu descobriu que existiam manchas no sol. Apresentou esta descoberta
aos seus colegas, e um grupo deles, seguidores de um modo de pensar
aristotélico, rejeitou seus dados. A teoria sobre a composição da ma­
téria celestial que aceitavam indicava-lhes que o sol não poderia ter
manchas, e por isso recusaram-se a olhar através do telescópio! O ar­
gumento deles era simples: o sol não possui manchas; o telescópio
estava distorcendo a percepção. Visto que sabiam que não existiam
manchas, então por que deveriam preocupar-se em olhar através de
um instrumento obviamente errado?
Há um certo mérito em uma parte deste argumento — a fidedig-
nidade do instrumento. Testar a precisão do telescópio seria um pri­
meiro passo nessa pesquisa e, nesse sentido, em parte, os aristotélicos
tinham razão ao questionar sua precisão. Mas foram míopes quando se
recusaram a fazer este teste (que poderia ser facilmente realizado em
uma situação terrestre) e quando evitaram questionar os seus “conhe­
cimentos seguros” sobre a ausência de manchas no sol.
O segundo é um caso de leve miopia de hipótese, envolvendo dois
físicos que realizaram um experimento cuidadosamente preparado e
obtiveram resultados negativos.
Em 1887, dois físicos, Michelson e Morley, realizaram um ex­
perimento para medir a exata velocidade da luz. Construíram um apa­
relho para objter essa medida exata consistindo em dois tubos colo­
cados em ângulo reto um em relação ao outro. Um dos tubos foi co-

15
locado na direção do movimento da Terra ao redor do Sol, enquanto
que o outro foi colocado na direção contrária ao movimento de rotação
da Terra. Colocaram então um espelho na extremidade de cada tubo e
um outro no ponto de intersecção; introduziram exatamente ao mes­
mo tempo um feixe de luz em cada tubo; estes feixes atingiram o
espelho colocado no ponto de intersecção; refletiram-se através do com­
primento dos tubos, atingiram os espelhos das extremidades e tornaram
a se refletir no espelho central. A teoria dominante naquela época
era de que havia um éter invisível preenchendo todo o espaço não
ocupado por objetos sólidos. Se esta teoria fosse correta, então um
dos raios de luz iria contra a “corrente” do éter enquanto que o
outro iria a favor da mesma, portanto em maior velocidade. Mas não
foi isto que aconteceu. Os dois feixes de luz retornaram ao espelho
central exatamente ao mesmo tempo. Os resultados do experimento fo­
ram considerados negativos, isto é, não confirmaram a hipótese de que
a luz seria menos veloz se a Terra se movesse através do éter. Con­
forme Copeland e Bennett (22) observaram, o experimento realizado
deu “um resultado negativo que criou um problema maior de inter­
pretação”. A despeito das provas de que as trajetórias da luz tinham
características de ondas, “os exemplos anteriores de movimento ondu­
latório requeriam um meio material” (por exemplo, o som no ar) e
era difícil encontrar este meio material para a luz. A conclusão do
experimento foi necessariamente a de que a luz não se propagava
num meio como o som se propagava no ar.
Copeland e Bennett posteriormente notaram que Fitzgerald tentou
explicar os resultados negativos em termos da contração de um dos
braços do aparelho, isto é, o comprimento do tubo que apontava no
sentido do movimento da Terra se contrairia apenas o suficiente, para
compensar a diferença na interferência. Outras interpretações dos re­
sultados foram feitas também em termos da teoria predominante do
éter. Embora os físicos aceitassem os dados, foram incapazes de en­
quadrá-los nas hipóteses existentes até 1905, quando Einstein fez a
reconstrução básica da teoria em seu famoso trabalho: Uma teoria
especial da relatividade. Explicou o que havia ocorrido com os resul­
tados “negativos” obtidos por Michelson e Morley. Eles haviam me-

16
dido com precisão a velocidade da luz, mas a teoria da existência do
éter era incorreta. Afirmou que a luz sempre se move na mesma ve­
locidade a despeito das condições e que, além disso, o movimento da
terra em relação ao sol não tem qualquer efeito sobre a velocidade
da luz. Não poderíamos esperar que, a partir de seus dados, Michel-
son e Morley chegassem à Teoria Especial da Relatividade, mas po­
deríamos esperar que, ao encontrar resultados que não combinavam
com a teoria, pudessem pô-la em dúvida. Na realidade, não existe
resultado negativo ou insucesso num experimento. Todo dado obtido
fornece informação para a mente preparada que respeita os dados e
não deixa que as hipóteses impeçam a pesquisa.

17
n

Características e Objetivos da Ciência

Algumas características importantes da ciência — Já afirmei que


a ciência é uma mescla de dúvida e certeza. Considero que o bom cien­
tista é arrogantemente humilde. Isto não é um mero jogo de palavras,
pois ele deve ser arrogante no método e humilde na fé que tem no seu
conhecimento. No meu caso, o de um psicólogo, isto se aplica de
forma bem clara. Tantos são os aspectos que desconhecemos no estu­
do do comportamento humano que é essencial uma humildade adequa­
da; entretanto, este fato não deve levar-nos a aceitar as explicações
não científicas do comportamento (tais como a da “natureza huma­
na” ) que entram em conflito com o método científico. Conforme Skin-
n e r(5 3 ) sugeriu, é melhor ficar sem resposta do que aceitar uma
resposta inadequada. Esta é uma característica importante da ciência,
a habilidade de esperar por uma resposta combinada com uma busca
contínua de explicação e a rejeição de explicações prematuras. Skinner
também sugeriu outras características da ciência, entre elas as seguin­
tes: a ciência é um conjunto de atitudes, “uma disposição para lidar
com os fatos e não com a opinião que alguém emitiu sobre eles”. (54)
A ciência rejeita suas próprias autoridades quando suas afirmações
entram em conflito com as observações dos eventos naturais. Os dados
subsistem, não os homens.
Skinner observa também que a ciência “é uma disposição para
aceitar fatos, mesmo quando eles se opõem aos desejos”. (55) A ciên­

19
cia outorga um prêmio elevado à honestidade1 e são muito raros os
casos de alteração de dados no sentido de adaptá-los à teoria favorita
da pessoa. No entretanto, mesmo aceitando a honestidade de um pes­
quisador, ninguém que esteja firmemente ligado a um ponto de vista
se regozija ao vê-lo abalado. Se seus próprios dados destroem crenças
que lhe são caras, o cientista aceita os fatos, mesmo quando isso en­
volve a perda de um velho amigo, isto é, uma teoria retida em se­
gredo. Neste caso a moral é clara: Não se empenhe em provar alguma
coisa, deixe que os fatos o guiem. Como disse Skinner: “Os experi­
mentos nem sempre dão os resultados esperados; mas os fatos devem
permanecer e as expectativas desvanecer-se. O assunto estudado sabe
mais do que o cientista.” (56).
Skinner também salientou que a ciência é mais do que um con­
junto de atitudes, é a “busca da ordem e da uniformidade de rela­
ções, sujeitas às leis, entre os fatos da natureza”. (57) Começa por
um evento único cuidadosamente observado e procede, eventualmente,
até a formulação de uma lei geral.
Mencionei que o cientista torna-se arrogante em relação à sua
metodologia e humilde quanto a seus dados. Isto pode criar o que
Gardner (30) denominou a “ortodoxia da teimosia” da ciência, uma
dedicação ao dogma que, como ele diz, é “tão necessária quanto desejá­
vel para o bem da ciência” . Isto significa que um cientista respeita os
fatos e o indivíduo que apresenta um novo ponto de vista está obrigado
a demonstrar evidência suficiente a fim de alcançar o reconhecimento
de sua teoria. O mundo está repleto de pessoas que têm teorias sobre
cada evenito imaginável e os cientistas, facilmente, poderiam dispender
todo o tempo de que dispõem ouvindo e refutando a maioria deles. É
preciso haver alguma defesa contra isso, pois, conforme diz Gardner:

( 1) “N o século X IX , o fam oso matemático francês Lagrange apresentou-


se diante de uma douta sociedade para explicar uma prova que havia elaborado
para um problema até então insolúvel. Havia apenas com eçado a ler seu tra­
balho quando, subitamente, parou de falar, franziu o cenho, dobrou as folhas de
seu trabalho e disse: ‘Senhores, preciso pensar mais sobre este assunto’. Este é
um cientista que se auto-corrige. Provavelmente seria conveniente que um maior
número de pessoas dobrassem as folhas de seus trabalhos” .

20
“A ciência se reduziria a nada se tivesse que examinar cada nova no­
ção periférica que surgisse. Evidentemente, os cientistas têm tarefas
mais importantes. Se alguém anuncia que a lua é feita de queijo verde
não se pode esperar que o astrônomo abandone seu telescópio e es­
creva uma refutação pormenorizada”.
Esta constante recusa de examinar cada teoria apresentada pro­
duziu alguns mártires. Homens do calibre de Pasteur foram criticados
e questionados. Todavia, é um filtro necessário para evitar que se en­
torpeçam as engrenagens da ciência. Acreditamos que uma teoria oca­
sional que é correta e que é refutada em uma dada ocasião subsistirá,
pois, como vimos, são os dados e não os homens que prevalecem.
Os objetivos da ciência: — Em última instância, sejam quais
forem as disciplinas científicas, o objetivo da ciência é compreender
e controlar o que constitui seu objeto de estudo. Pode ser mais fácil
aceitar a parte desse par relativa à compreensão porque existem ciên­
cias que não têm qualquer controle do seu objeto, como, por exemplo,
a astronomia e a geologia. A astronomia tem um corpo de conheci­
mentos altamente desenvolvidos que permite aos astrônomos descrever
e predizer, com grande previsão, por exemplo, os movimentos das
estrelas, ou o aparecimento de um cometa. O americano do norte, de
Connecticut, do conto de Mark Twain — pôde assombrar e impressio­
nar a corte do Rei Arthur, prevendo um eclipse; isto hoje se aceita
como um tipo corriqueiro de predição. Apesar dessa habilidade para
descrever e predizer, a astronomia não dispõe de nenhum meio para
controlar os fenômenos celestes; portanto, pode-se dizer que a astro­
nomia é uma ciência descritiva. Além disso, pode-se dizer que a astro­
nomia é uma ciência “pura” quanto ao controle dos eclipses e come­
tas; mas isto é um tanto tangencial, pois recentemente se desenvolveu
uma geologia experimental (13) aproximando a geologia, ciência des­
critiva, da possibilidade de tornar-se experimental.
Acrescentei aos objetivos da ciência dois outros aspectos vin­
culados aos objetivos de compreensão e controle, a descrição e a pre­
dição. O primeiro entre eles é a descrição. A observação e a mensura-
ção são fundamentais para toda ciência, pois fornecem uma descrição
dos fatos e um meio de quantificá-los, o que possibilita a manipula­

21
ção experimental. Pode-se dizer que os dois fundamentos críticos da
ciência são a observação e a experimentação, e que a mensuração for­
nece um meio significativo para manipular e ordenar os fatos. Natu­
ralmente, o fim último da ciência é o de ^rdenár os fatos em leis
gerais coerentes, a partir das quais se torne possível a predição mas,
inevitavelmente, ela começa com a observação. Discutirei brevemente
a observação e a experimentação, em seguida, o uso da mensuração e,
finalmente, a ordenação de fatos de observações e de experimentação
em leis gerais.
Observação e experimento. A ciência é sempre um equilíbrio entre
a observação e o experimento, pois, a primeira é a coleta empírica dos
fatos e o segundo é o raciocinar sobre esses fatos e a sua manipulação,
visando obter maiores conhecimentos. Envolve também a observação
sob condição experimental controlada. Estudiosos da ciência argumen­
tam que Descartes e Bacon representam posições antagônicas de ati­
vidade científica. Descartes fez todo o seu trabalho no leito, enquanto
que Bacon, segundo se diz, morreu aos 65 anos de idade em conse­
qüência de uma gripe contraída enquanto fazia experimentos numa ne-
vasca. Para Descartes era possível obter os elementos, o fato e a ra­
zão — que são cruciais em ciência sem recorrer à experimentação;
no entanto, esta não é, geralmente, a maneira da ciência progredir. A
razão se amplia na experimentação mas está enraizada na observação.
Bronowski (17) observou que a ciência é uma maneira de des­
crever a realidade e “é, portanto, cirsunscrita pelos limites da obser­
vação e nada afirma que esteja além da observação. Qualquer outra
coisa não é ciência — é academismo”. Aqui Bronowski evoca a ima­
gem de escolasticismo, filosofia da Europa Ocidental, na Idade Mé­
dia, que era essencialmente anti-empírica e, certamente, anti-experi­
mental no sentido moderno. Mas, quando diz que a ciência está cir­
cunscrita pelos limites da observação, estabelece uma das fronteiras
da metodologia científica. Quando diz que a ciência não afirma nada
que esteja fora da observação, está formulando um outro dogma bá­
sico do método científico. O observável é a verdadeira pedra funda­
mental da ciência. Einstein sugeriu que a unidade fundamental na fí­
sica era: evento — sinal — observador. Com isto queria dizer que

22
quando ocorre um evento apresenta-se alguma manifestação exterior
que requer a presença de um observador para registrá-la. Certamente,
este trio, evento-sinal-observador, é básico para outras ciências, além
da física; e é da responsabilidade do cientista, seja qual for a disciplina
em que trabalha, observar cuidadosamente o sinal que representa o
evento e registrá-lo com exatidão. Esta é a razão pela qual a instru­
mentação se desenvolveu. Disseram que o homem está entre um átomo
e uma estrela, e que inventou o microscópio e o telescópio para ampliar
sua visão em ambas as direções. Os principais objetivos a que serve
um instrumento são: possibilitar uma observação acurada de modo a
eliminar o viés do observador e ampliar e quantificar as observa­
ções do pesquisador.
Existem, sem dúvida, problemas na observação e em qualquer
discussão sobre o observador. É importante mencionar Heisenberg, fí­
sico alemão que, em 1927, estabeleceu o Princípio da Incerteza (ou
Indeterminismo), que afirma não ser possível determinar, ao mesmo
tempo, a posição e a velocidade de um elétron. O observador deve se
restringir a um ou a outro fato. Se escolhe observar a posição do
eléctron com precisão, deve renunciar a uma avaliação precisa de sua
velocidade, ou vice-versa2. O Princípio da Incerteza passou a significar
que, para estudar um fato, o observador deve interferir no seu curso
natural. E, portanto, o cientista não pode ter toda a informação rele­
vante que precisa ao mesmo tempo. Naturalmente, isto é considerado
na pesquisa e, realmente, constitui a base dos repetidos experimentos
nos quais são estudadas isoladamente variáveis diferentes. O Princípio
da Incerteza foi invocado, em psicologia, em discussões sobre assun­
tos tais como a introspecção, porque não é verdadeiramente possível
olhar-se para si mesmo com clareza.
Voltando à afirmação de Bronowski de que tudo o que está fora
da observação não é ciência, gostaria de elaborá-la segundo meu pon­

(2 ) Com o disse Margenau, ( 35) esta afirmação não é inteiramente cor­


reta. Pondera que já dispomos de técnicas mediante as quais é possível fazer
tais mensurações, e que essas medidas, no entretanto, não são tão signifi­
cativas.

23
to de vista, para dizer que um dos requisitos críticos da observação
é o de ser replicável, isto é, relatada por outros que também são ca­
pazes de ver e registrar. Isto é o que se quer dizer quando se fala
de uma linguagem de dados em ciência. Um exemplo simples seria o
do físico ao ler o movimento de um ponteiro no qual um observador
pode registrar uma alteração no ponteiro, medi-la e repetir essa ob­
servação com outras pessoas. Quanto mais precisa for a mensuração,
tanto mais semelhante será a réplica da observação. Um dos problemas
básicos da psicologia tem sido o da ausência de uma linguagem uni­
versal de dados, à qual poderiam se relacionar as obiservações e com
a qual estas poderiam ser expressas. Por exemplo, obviamente é dife­
rente falar de uma personalidade desajustada e de um desvio de três
graus num ponteiro. A margem de erro na primeira descrição é
grande, enquanto que na segunda é mínima. Greenspoon (31) e Da-
vis (23) consideram a necesidade que a psicologia tem de uma lin­
guagem de dados para refinar a observação e a descrição psicológi­
cas. Ambos sugerem referentes físicos para a observação e a descrição
psicológicas. A linguagem de dados da psicologia será discutida um
pouco mais pormenorizadamente na parte relativa aos métodos opera­
cionais, pág. 51.

Sugiro, portanto, que, se a observação não for clara e replicável


dentro dos limites de uma observação definida, ela não é passível de
um estudo científico. É possível que isto venha a ocorrer no futuro
quando os instrumentos ampliarem a capacidade de medir e observar;
porém, de maneira alguma isto muda o^critério das fronteiras científi­
cas. Conforme vimos ao discutir as Çaracte^ísticas da ciência, é me­
lhor esperar do que criar uma resposta inadequada.
Muitas áreas de estudos podem ser abordadas, experimentalmen­
te, com técnicas estatísticas e de planejamento sofisticadas e acessíveis
à ciência; e, no entanto, podem permanecer fora do domínio da in­
vestigação científica. Uma delas, escolhida porque ilustra muitos dos
aspectos que desejo considerar, é a área da parapsicologia, o estudo
dos fenômenos paranormais, tais como a telepatia e a percepção ex-
tra-sensocial (ESP). Não há dúvida que existem investigadores dili­
gentes, laboriosos e produtivos na parapsicologia. Até o momento,

24
contudo, apesar do uso de instrumentos científicos, tais como plane­
jamento experimental e provas estatísticas, existem fatores que co­
locam a parapsicologia fora das fronteiras da ciência. Um destes fa­
tores é o problema da replicabilidade do observador. Por exemplo, o
insucesso de um pesquisador, na obtenção de resultados com um de­
terminado sujeito experimental enquanto que outro pesquisador, apa­
rentemente, obtém bons resultados, em termos de altos escores em ta­
refas de percepção extra-sensorial, foi explicado como um problema
de atitude. Um experimentador hostil à hipótese da percepção extra-
sensorial não obterá bons resultados enquanto que o experimentador
simpatizante os obterá. A suposição (ainda não comprovada) é de
que estas atitudes afetam a atividade mental do sujeito.
Ainda que possa parecer desnecessariamente restritivo, deve-tse di­
zer que os dados da parapsicologia não podem ser admitidos como cien­
tíficos até que tantais observações de diferentes experimentadores, feitas
sob condições específicas e com controle de variáveis, não sejam coe­
rentes. Isto não condena tais dados ao limbo do qual não possam re­
tornar. Simplesmente significa que a observação de Bronowski sobre
o caráter não científico dos eventos que estão fora do alcance da ob­
servação deve ser levada em consideração ao se avaliar esta investi­
gação, mesmo quando os experimentos são cuidadosamente concebi­
dos e executados.

A parapsicologia não é a única a sofrer os efeitos do problema


de réplica do observador. Muitas áreas da psicologia trabalham ten­
do estas inconveniências, em grande parte, porque, como disse ante­
riormente, não dispõem de uma linguagem de dados suficientemente
clara para permitir (ou criar) a concordância entre os observadores.
Desta forma, a parapsicologia obtém resultados diferentes de diferentes
sujeitos sob condições experimentais diferentes. Esta variabilidade de
desempenho, ainda que lamentável, não é rara. O que parece excluir a
parapsicologia do corpo da ciência é sua pressuposição inicial de even­
tos para-normais, ilustrada pela expressão extra-sensorial. Esta pres­
suposição inicial afirma que os dados da parapsicologia estão além dos
eventos normais, e a pesquisa sempre foi orientada por esta suposição.
A ciência parte da afirmação básica de que os eventos na natureza

25
(incluindo comportamento) são ordenados e obedecem a leis e de que
o objetivo de um cientista é buscar a ordem e a' similaridade.
Creio (e esta é obviamente uma preferência pessoal) que o estudo
da telepatia poderia começar, com mais propriedades, com um estudo
mais intensivo da percepção normal e não com a afirmação inicial so­
bre o para-normal. Mesmo o espiritualista mais dedicado, ao se re­
ferir a almas, usa meios físicos de visão e audição para conjurar os
e$|>íritos, As pessoas não relatam visões? Então o mais indicado seria
coiheçar por um exame completo da percepção normal desses indiví­
duos. Quando os horizontes são ampliados para abranger o estudo de
visões além do espaço e do tempo, a preocupação deve continuar a
mesma, isto é, buscar a ordem e não ignorar as explicações mais
econômicas. A pessoa que oferece uma explicação notoriamente fora
do corpo comum das leis de uma ciência tem o encargo de prová-la.
Ninguém pode esperar que o cientista aceite evidências sobre a reencar-
nação das almas sem uma prova cientificamente obtida, e isto não
significa anedotas sobre espíritos ou sobre existências anteriores. As
dificuldades encontradas ao se procurar estudar cientificamente estes
problemas são ilustradas num ensaio de Ian Stevenson (60) sobre o
destino da “personalidade do morto” e a reencarnação. Estes relatos
incluem observações apresentadas numa linguagem difícil de incluir
nas metodologias padronizadas, embora, a princípio, por exemplo, o
mesmo tenha ocorrido com as formulações originais de Einstein rela­
tivas ao espaço e ao tempo. A diferença óbvia é a de que as obser­
vações de Einstein foram confirmadas.
A maior dificuldade que se coloca à parapsicologia é a aceitação
de uma posição dualista que a separa completamente das ciências na­
turais. Não tenho intenção de me envolver no problema mente-corpo
neste ponto — o livro é demasiado pequeno para tanto — somente
afirmarei que a psicologia, como ciência, precisa aceitar a posição mo-
nística da ciência e rejeitar a tentação de lidar com os eventos mentais
como se eles tivessem uma existência separada dos eventos físicos. A
principal razão para isto deriva do simples fato de que esta posição foi
bem sucedida em outras ciências e está de acordo com o objetivo de
buscar a ordem e a uniformidade que é básica na metodologia cientí-

26
fica. O argumento de que existem obviamente eventos mentais — tais
como os processos de pensamento e os sonhos — novamente con­
funde o assunto, porque o estudo desses eventos deve obedecer às
linhas estabelecidas em ciência. O leitor interessado poderá encontrar
uma discussão mais ampla desta linha monística em Greenspoon (31)
e Ryle (43).
Esta posição de rejeitar observações que ultrapassam as fron­
teiras da ciência pode parecer restritiva e limitativa mas, aqui tam­
bém cabe à pessoa que apresenta as observações apresentar as provas.
Isto, freqüentemente, cria um mártir da rigidez científica (tais como o
foram Pasteur, Koch ou Semmelweiss) mas, como vimos, dados e não
homens subsistem. Às vezes, o mártir apresenta um caso fundamen­
tado e razoável, como na citação que se segue: “Para mim a verdade
é preciosa. . . Prefiro estar certo e só, do que acompanhar a multidão
e estar errado. . . A defesa das perspectivas aqui expostas chegou até
o ponto de alguns de meus companheiros me escarnecerem, despreza­
rem e ridicularizarem. Olham-me como se eu fosse uma pessoa rara,
estranha e peculiar. . . Mas a verdade é a verdade, e ainda que todos
a rejeitem e se voltem contra mim, continuarei apegado a ela.” Estas
frases impressionantes e corajosas são de um livro de Ford (25), pu­
blicado em 1931, no qual prova o achatamento da terra. A afirmação
de Gardner, citada na pág. 21, sobre a necessária ortodoxia da tei­
mosia da ciência não pode ser melhor ilustrada do que o é com esta
citação de Ford. Se sua informação difere das informações ordenadas
da ciência é sua a responsabilidade de oferecer as provas. Atender
estas é responsabilidade da ciência.

Raciocínio a partir de experimento: a busca de ordem e lei. O


primeiro passo no método científico, portanto, é a observação ou a
coleta empírica de fatos. Mas, fatos não são suficientes por si mes­
mos. Constituem, somente, o primeiro passo. Conforme mencionei, a
ordenação através da atividade fundamentada é essencial para atingir
os objetivos da ciência. A ciência não se confunde com a coleção de
fatos isolados por maior que tenha sido a precisão de uma observação
e de seu registro. O que caracteriza o método científico é a busca de

27
coerência ou ordem entre os fatos3. Sem dúvida, registrar X, Y e Z
com precisão é o primeiro passo crítico, mas a ciência, eventualmente,
deve descrever as semelhanças existentes entre as variáveis e suas re­
lações funcionais. Bronowski (18) observou: “ . . . a verdade em ciên­
cia não é a verdade a respeito do fato, que nunca pode ser mais do
que aproximada, mas a verdade das leis que vemos nos fatos”.
O cientista parte da observação cuidadosa dos fatos para uma
busca de ordem, de coerência e uniformidades, de relações funcionais
que obedecem a leis entre os eventos que estudou. Começando com um
evento isolado ele tenta encontrar cada vez mais informações que re­
lacionará os eventos em uma ordem significativa e coerente. Requer
uniformidade de eventos. Bronowski, em outro trecho, diz:
/

N ão podem o^aefinir a verdade em ciência antes de passar do fato à lei.


Dentro do corpo das leis, por sua vez, o que nos impressiona é a coerência
ordenada das partes. Elas se ajustam umas às outras com o personagens em uma
boa novela, ou com o palavras em um poema. Deveríam os realmente conservar
sempre presente esta última analogia. Pois ciência é linguagem, e com o lingua­
gem define suas partes pela maneira pela qual compõe um significado.
Cada palavra na sentença tem alguma imprecisão de definição, e não obs­
tante a frase define seu próprio significado, por conseguinte, o das palavras
que a compõem*. A unidade e a coerência eterna da ciência lhe dão a verdade
que a torna um sistema melhor de predição do que qualquer linguagem menos
ordenada. (19)

Neste sentido, conforme sugeriu Bronowski, a ciência torna-se


uma linguagem para descrever a natureza. Começa com uma decla­
ração de fé ao afirmar que o mundo é ordenado, que os eventos do
mundo podem ser comprendidos e que são sujeitos a leis. No caso
da psicologia e do estudo do comportamento isto não pode funcionar
eficientemente como científico a menos que aceite a afirmação de que
o comportamento pode ser compreendido e está sujeito a leis, reco­

( 3) Em 1848, Renam escreveu no U A ven ir de la Science ( O futuro da


ciência): “Todas as ciências especiais começam pela afirmação da unidade e
somente iniciam a diferenciação quando a análise revela numerosas diferenças
onde, anteriormente, somente era visível a uniformidade. Leia os psicólogos es­
coceses e verá em cada página que a primeira regra do método filosófico é
manter separado o que é distinto, não antecipar fatos com uma redução apres­
sada à unidade e não retroceder ante a multiplicidade de causas”.

28
nhecendo também o fato algo ingênuo de que a finalidade da ciência
é controlar o comportamento. Posteriormente, quando falarmos sobre
considerações éticas em pesquisa, discutiremos alguns dos problemas
de ética no controle do comportamento. No momento, preciso somente
observar que a psicologia, como disciplina científica, aceita o dogma
geral da existência de lei e uniformidade dos eventos naturais, um dog­
ma que qualquer outra ciência considera como um fundamento crí­
tico.
Desta forma, a observação nos conduziu à experimentação e esta
nos levou à busca de ordem e uniformidade nas quais podemos busear
as leis. Sidman ofereceu um relato interessante sobre uma experiência
pessoal que ilustra a importância das uniformidades na metodologia
científica. Escreve:

Quando jovem estudante universitário. . . achei que meu trabalho deveria


ser diferente, que deveria produzir algo novo que assombrasse o mundo. Se­
guindo esta orientação, certa vez elaborei um trabalho escrito descrevendo parte
de um trabalho, no qual destacava com o meus experimentos eram liferentes de
qualquer outro até então realizado. U m dos meus professores, W. N . Schoenfeld,
concordou que os dados eram muito interessantes, mas prosseguiu acrescentan­
do que eu tinha escrito o trabalho de um ponto de vista muito peculiar. Tinha
enfatizado as diferenças entre meu trabalho e o de outros autores. Porém, co-
mumente a ciência não progride desta forma. A tarefa da ciência é encontrar
as relações ordenadas entre os fenôm enos, não diferenças. Teria sido mais úfil
se eu tivesse indicado suas semelhanças entre meu trabalho e os experimentos
anteriores. (4 4 )

De forma alguma isto significa que os cientistas buscam a con­


formidade. Nem estão meramente tentando repetir experimentos dos
outros ou pondo em dúvida os dados experimentais que outros tenham
obtido. Longe disto. Significa, simplesmente, que quanto mais desen­
volvermos as semelhanças e as relações ordenadas entre os eventos,
mais próximos estamos da predição e do controle efetivos de nossa
ciência. Por exemplo, quando descobrimos a semelhança que existe
entre o bacilo, o vírus e o cristal, ou a semelhança funcional que pode
existir entre a célula, o organismo e a sociedade, mais nos aproxima­
mos de uma predição eficiente.
Predição a partir da observação e do experimento. Ressaltei que
a ciência é uma técnica para ordenar os eventos em relações que obe­

29
decem a leis e que o obetivo da ciência é predição e controle baseado
nessas leis. Usualmente, a lei é descrita como uma coleção de fatos
agrupados num corpo coerente de conhecimentos, a partir dos quais
é possível fazer predições. É óbvio que nenhuma predição é completa­
mente certa porque não é possível conhecer todas as variáveis que
operam em uma determinada situação. Tudo o que exigimos de uma
predição é que se baseie numa ordenação dos eventos expressa em
lei, e que prediga, tão precisamente quanto possível, o que aconte­
cerá em um evento futuro dentro de uma margem de incerteza.
( Isto introduz um conceito básico de probabilidade que é fun­
damental para o método científico. Referimo-nos às probabilidades
ue ocorrência de um evento. Num dado sentido estamos ponderando
as oportunidades de que se X for manipulado de certo modo, modi-
ficar-se-á de certa forma. A experimentação é claramente um método
para aumentar a probabilidade de que a predição seja correta.
Tomemos um exemplo simples. Se você estivesse observando um
cão beber água, provavelmente diria que o animal tinha sede, infe­
rindo, a partir de experiência passada, que o cão que bebe água esteve
privado dela e tem sede. Trata-se de uma inferência provável e possi­
velmente de uma conjectura suficientemente boa. Ainda que esta seja
a explicação mais provável para seu comportamento, também é possí­
vel que outros fatores tenham desempenhado certo papel. Por exem­
plo, uma vespa pode ter picado sua língua, ou que tenha comido algo
apimentado ou talvez esteja tentando pegar um bocado de carne que
se encontrava no fundo da vasilha. Todos estes são eventos pouco
prováveis em termos de freqüência de ocorrência, portanto, baseamos
nossa interpretação da sede do cão em nossa experiência passada.
Se desejamos aumentar a probabilidade de que nossa explicação seja
correta, precisaríamos experimentar. Prendemos o cão e o privamos de
água durante 48 horas. Ao fim desse período, poderíamos oferecer-lhe
comida e água e verificar quão ativo é o seu comportamento de beber.
Supondo que a privação tenha produzido uma necessidade fisiológica
dc água e aumentado a probabilidade de que ele beba água, podería­
mos ter mais confiança na privação como uma variável crítica no
comportamento de beber. Uma vez estabelecido isto, poderíamos vol­

30
tar às nossas explicações anteriores do comportamento do cão com
mais informações e confiança.
Deve-se ter em mente que em toda a predição há sempre um
elemento de incerteza. O cientista deve estar constantemente procuran­
do métodos para melhorar a precisão de suas predições. Quando fa­
lávamos sobre controle dos eventos era essencialmente isto que está­
vamos querendo dizer. É interessante notar que na área da predição
algumas pessoas que comumente aceitam os princípios básicos da ciên­
cia, tais como observação acurada, descrição e experimentação, sentem
ter entrado na terra do sem-fim. Sir Oliver Lodge, por exemplo, ob­
servou: “Embora um astrônomo possa calcular a órbita de um planeta
ou de um cometa ou mesmo de um meteoro, embora um físico possa
lidar com a estrutura do átomo e um químico com suas possíveis com­
binações, nenhum biólogo ou outro cientista pode calcular a órbita de
uma mosca comum”. Bem, com todo o respeito devido a Sir Oliver,
esta é uma afirmação bastante infeliz. Em primeiro lugar, quem poderá
jamais dizer que é impossível conseguir algo? Somente uma pessoa
pessimista ou de visão limitada poderia supor que as observações ou
mensurações atualmente inacessíveis permanecerão sempre além de
nosso alcance. Uma leitura cuidadosa da afirmação altissonante de Sir
Oliver sugerirá uma questão. Quem já tentou calcular a órbita de
uma mosca comum?
Estou certo de que se fosse suficientemente importante dispor
deste cálculo, iniciativas poderiam ser tomadas no sentido de tentar
e de medir. Joguemos, por um momento, com esta especulação porque
ela parece atingir o ponto central de algumas das considerações que
fizemos. Afirmamos que o comportamento obedece a leis e, assim sen­
do, se seguimos nossas crenças, a órbita de uma mosca, digamos, numa
catedral, deveria ser compreensível, desde que tivéssemos suficiente in­
formação sobre o organismo e o meio no qual está se comportando.
Como proceder para obter informação pertinente à predição da órbita
desta mosca em particular? Talvez se pudesse começar com um exame
das correntes de ar na catedral. Suponhamos que se divida a catedral
em quadros, e, ao fazer observações e mensurações acuradas, verifica-
se que no ponto B-6, que está a 30 pés do solo e a 25 pés da parede

31
ocidental, há uma forte corrente de ar, que oferece uma resistência
considerável a qualquer objeto que se encontra na referida coordenada.
Podemos considerar que seria menos provável que uma mosca voasse
para uma área de resistência, que se oporia ao seu vôo, do que para
uma outra área que lhe oferecesse menos obstáculos. Isto pode estar
completamente errado mas, pode ser, pelo menos, um começo para
calcular a órbita. Pode acontecer que, depois de algumas investigações,
descubra-se que as mudanças de temperatura constituam uma variá­
vel crítica. Certamente isto parece ser verdadeiro no cálculo da mi­
gração dos pássaros e no do comportamento de desova do salmão, os
quais Sir Oliver também poderia ter considerado além das possibili­
dades dos cientistas. Além do mais, variáveis orgânicas podem existir
tais como a presença de moscas do sexo feminino, a resistência da
mosca, o tempo decorrido desde sua última refeição, e outras que
podem parecer relevantes.
Certamente não tenho a intenção de traçar as cordenadas para
testar a idéia de que é possível predizer a órbita de uma mosca numa
catedral, mas tenho certeza de que, se isto tivesse alguma importância
em ciência, alguém poderia desenvolver um meio para fazer tal pre­
dição. Podemos simplesmente oferecer nossos respeitos a Sir Oliver e
ignorá-lo neste contexto.
Até o presente considerei os elementos da observação, experi­
mentação e predição no que se relacionam com o método científico e
os fins últimos de compreensão, predição e controle. Porém, não me
detive muito tempo no problema do controle em si mesmo. É evidente
que, quando fomos capazes de predizer os eventos com êxito, obti­
vemos um certo grau de controle sobre eles. Voltarei mais tarde a
este assunto quando discutir a manipulação experimental. No momento,
gostaria de retomar a um outro elemento básico da ciência que se
inicia, aquele que, como a observação, é básico em todas as ciências,
seja ela de tiva ou experimental. Trata-se da mensuração.
Mensi ão em ciência. — Discutindo a questão da descrição na
metodologia científica, usei vários exemplos que se referiam a eventos
tão diferentes como um vírus, uma mosca e um cão. Existem dife­
rentes níveis de descrição em ciência, variando desde a descrição da

32
atividade celular em um ser humano até a corte, feita por este mesmo
ser humano, à sua namorada. Quanto menor o foco de atividade mais
fácil é medi-lo. Por exemplo, um cientista poderá ser infinitamente
mais preciso na descrição da atividade elétrica que se verifica na mem­
brana de uma célula de uma pessoa do que na descrição de seu com­
portamento ao encontrar o namorado. Existem áreas de problemas
muito complicadas, tais como as tensões que levam à guerra e os
preconceitos raciais e religiosos, que ainda não fomos capazes de re­
solver. Não fomos capazes de resolvê-los, em grande parte, porque
eles não podem ser descritos adequadamente. Considerando estas áreas
de problemas significantes, concordo com Underwood (63), que ob­
servou: “Defenderia a proposição de que a pesquisa em psicologia
necessariamente envolve mensuração e que a rapidez com que a pes­
quisa irá abranger. .. comportamentos significantes depende de nossa
habilidade para dividi-los em partes relevantes que possam ser medi­
das”. Por exemplo, não se pode medir preconceito, que é somente um
termo geral para um grande número de atividades. Contudo, podemos
começar subdividindo preconceito em partes relevantes, catalogando o
número de hotéis e restaurantes de uma determinada comunidade que
recusam admitir membros de um grupo minoritário. Em verdade, isto
é somente um pequeno começo de mensuração mas, de qualquer for­
ma, é um começo.

As duas questões básicas em mensuração são: 1) o fenômeno


existe? e( 2) se existe, em que extensão? Quando estas questões são
colocadas em termos científicos, a primeira se refere a um tipo no­
minal de mensuração. Como o termo nominal sugere, trata-se de uma
operação de denominação que simplesmente diferencia um evento de
outro. É freqüentemente uma base de descrição da mensuração. Por
exemplo, a classificação de flores ou de pássaros é uma operação
nominal. Mas vejamos a que isto pode conduzir.
Em uma outra ilustração, a numeração dos prisioneiros num
presídio é nominal. Esta classificação básica pode ser suficiente para
as necessidades das autoridades da prisão, mas é possível que elas
desejem separar os prisioneiros em grupos de acordo com uma estima­
tiva da severidade do crime pelos quais foram condenados. Consi­

33
derando que a falsificação é um crime menos sério do que o assassi­
nato, o prisioneiro n.° 400-097 (um falsificador) é colocado num blo­
co de celas diferentes daquele no qual é colocado o prisioneiro n.°
400-789 (um assassino). Os números diferenciam os dois em uma
escala nominal, a separação em termos de gravidade do crime os
diferencia numa escala ordinal. É aparente que uma escala ordinal,
como a classificação da severidade do crime, pode ser altamente sub­
jetiva. Suponha ser possível elaborar uma escala exata de severidade
de forma que o intervalo assassinato <--» falsificação seja igual, em
severidade, ao intervalo falsificação <--» roubo em loja durante o
movimento comercial. Em termos de aumento de seriedade do crime
a escala ordinal seria roubo em loja — falsificação — assassinato.
Se esta escala fosse válida, poderia ser usada pelo juiz ao determinar
as sentenças, ou por uma comissão de liberdade condicional para me­
dir libertação condicional de prisioneiros. Quando uma escala ordinal
se divide em intervalos iguais ou graduações de tais mudanças de
intensidade, é denominada escala de intervalo igual. Um outro de­
senvolvimento na elaboração de escala seria um no qual é possível
estabelecer um ponto que corresponde a um zero absoluto na escala.
Uma escala de intervalos iguais com um ponto que corresponde a zero
absoluto é denominada escala de razão (ou proporcional).
Neste ponto gostaria de expressar uma opinião que pode levantar
alguma objeção. Diria que, em última instância, todas as mensurações
deveriam ter algum ponto de referência físico. Existem fenômenos
que são chamados subjetivos, mas se eles não podem eventualmente ser
medidos, não podem ser considerados como dados científicos. Isto não
é fazer dos métodos ou técnicas usados pela física ou outras ciências
um santuário, mas indica que enquanto os fenômenos subjetivos não
são passíveis de mensuração e quantificação, poderão oferecer reduzida
informação pouco significante. Acredito que problemas de pesquisa
como ansiedade e emoção, que sempre preocuparam os psicólogos, po­
derão ser mais frutíferos — quando estudados em termos de mudança
fisiológica e de uma medida dessa mudança. Conforme veremos no
Capítulo IV, muitas são as definições de emoção. O único fator comum
em todas essas definições é o de alguma mudança na atividade do

34
sistema nervoso autônomo, em evento fisiológico suscetível de men-
suração. Recentemente, o comportamento encoberto — freqüentemente
é indicado como inconsciente e presumivelmente não sujeito à inves­
tigação experimental — foi estudado de uma forma engenhosa e
cuidadosa por Hefferline e seus colaboradores (32). Existe uma in­
dicação clara da possibilidade de medir eventos mínimos de com-
partamento com registros fisiológicos.
Sempre se considerou correto que a informação de que um cien­
tista dispõe depende amplamente do aprimoramento dos seus instru­
mentos. Anualmente, à medida que os instrumentos de que o pesqui­
sador dispõe são aperfeiçoados, mais informações das consideradas
subjetivas são submetidas ao escrutínio da investigação experimental.
Um dos meios de começar a mensuração é através do uso de repre­
sentações físicas ou matemáticas dos objetos ou acontecimentos. — Já
mencionei o uso dos graus de temperatura para medir graduações de
quente e frio. Aceitamos um termômetro como indicação fidedigna
das gradações de temperatura.
Seria interessante recordar as origens do termômetro, sempre útil
e presente. Antes do século XVII, uma medida do tipo nominal era
considerada suficiente pará avaliar frio e quente. Parecia suficiente
dizer que alguma coisa estava quente ou fria, ou empregar alguma es­
cala comum muito grosseira, dizendo “está mais frio do que” ou “está
mais quente do que” . Conforme Asimov (2) observou, “para submeter
a temperatura à mensuração quantitativa foi necessário primeiro en­
contrar alguma mudança mensurável que parecia ocorrer dum modo
uniforme com a mudança de temperatura. Uma mudança desse tipo foi
encontrada no fato de que as substâncias se dilatam quando aquecidas
e se contraem quando resfriadas”. Ele prossegue discutindo a pesquisa
de Galileu, em 1603, que primeiro tentou usar o fato de que substân­
cias se dilatam quando aquecidas e se contraem quando resfriadas, in­
serindo um tubo de ar que tinha sido aquecido num recipiente de água.
À medida que o ar contido no tubo começa a tender para a tempe­
ratura ambiente, se contrai e a água entra no tubo, criando o primeiro
termômetro. Quando a temperatura ambiente mudou, o nível da água

35
no tubo mudou também. “Se o quarto se aquecia, o ar no tubo se
dilatava e baixava o nível da água; se o quarto esfriava, a água se
contraía e o seu nível subia. O único problema era que o recipiente da
água em que se havia inserido o tubo era exposto ao ar e a pressão
deste se modificava continuamente. Isto também fazia o nível da
água subir e descer, independentemente da temperatura, desordenando
os resultados”.
Conforme Asimov faz notar, em 1654 o Duque de Toscana fa­
bricou um termômetro que era independente da pressão do ar, con­
tendo um\ líquido fechado num bulbo ao qual foi ligado um tubo es-
treito^“ ^/ contração e expansão do próprio líquido foi usada como
indicação de mudança de temperatura. Os líquidos mudam muito
menos de volume com a temperatura do que o fazem os gases; usando
um reservatório de líquido de tamanho e forma adequados, de maneira
que o líquido somente possa se expandir através de um tubo muito
estreito, a elevação e a queda dentro do tubo, mesmo para pequenas
mudanças de volume, pode torriar-se considerável”. (2) Boyle fez
um experimento semelhante, mais ou menos ao mesmo tempo que o
do Grã-Duque de Toscana, e demonstrou que o corpo humano mantém
uma temperatura constante usualmente mais elevada do que a tempe­
ratura ambiente. A água e o álcool foram os primeiros líquidos usados
na criação dos termômetros, mas a água tendia a congelar-se e o álcool
a evaporar-se. Assim, o físico francês Amontons tentou usar mercúrio.
No termômetro de Amontons (como no de Galileu), a expansão e con­
tração do ar produziam uma elevação ou uma depressão no nível do
mercúrio. Foi em 1714 que Fahrenheit combinou o trabalho do Grão-
Duque de Toscana com o de Amontons, encerrando o mercúrio num
tubo e empregando sua própria expansão e contração com a tempera­
tura como indicador. Além disso, Fahrenheit fez outra contribuição,
acrescentando ao seu tubo de mercúrio uma escala de grau de forma
que a temperatura pôde ser lida quantitativamente. Ninguém sabe ao
certo qual foi o método pelo qual Fahrenheit chegou à escala parti­
cular que usou em seu termômetro. Conta-se que marcou zero no pon­
to em que obteve, em seu laboratório, a temperatura mais baixa, mis­
turando sal com gelo, marcando depois o ponto do congelamento da

36
água pura em 32 graus e sua ebulição em 212 graus. Embora isto
pareça um tanto arbitrário, foi eficaz porque foi mantido conseqüen­
temente.
Em 1742, Celcius, um astrônomo sueco, adotou uma escala di­
ferente. Na etapa final do seu desenvolvimento colocou-se o zero no
ponto de congelamento da água e 100 no seu ponto de fervura, subs­
tituindo o 32 e 212 de Fahrenheit. Como a escala foi dividida em
100 graus, recebeu o nome de escala “centígrada”. A diferença entre
a escala de Fahrenheit e a centígrada continua importunando os estu­
dantes que tentam recordar se é de cinco nonos mais 32 ou nove
quintos mais 32 da Fahrenheit para a centígrada. Devido ao fato de a
escala centígrada (ou, como a denominam muitos cientistas, a escala
de Celcius) ser mais conveniente, uma vez que se ajusta ao sistema
métrico, é mais amplamente usada pelos cientistas, embora a escala
de Fahrenheit seja a mais popular nos Estados Unidos nas mensura-
ções não-científicas da temperatura.
Voltando às nossas considerações originais sobre modelos, um
termômetro, seja qual for a escala de temperatura que usa, repre­
senta um modelo físico de contração e dilatação de uma entidade física
e é um reflexo das mudanças do ambiente.
Mais adiante, no Capítulo IV, falarei um pouco mais sobre o
uso das operações físicas na definição. No momento gostaria de co­
mentar mais um modelo físico que é usado como meio de mensuração
na nossa tentativa de ordenar os dados de nosso mundo. Esse modelo
é o relógio, um aparelho que tenta duplicar o movimento rítmico
aparente do sol. Com base nesse modelo fundamental de movimento,
a mudança de posição dos ponteiros de um relógio passa a significar
a passagem de tempo designada em termos de segundos, minutos e
horas. Num amplo sentido, pode ser possível começar uma conside­
ração do tempo pela escala nominal, tais como a decisão binária de
dia/noite, cedo/tarde, e assim por diante, passando, a seguir, para
gradações de mais dias ou mais noites, mais cedo ou mais tarde. As
gradações são então assinaladas em termos de unidades de tempo, em
última instância, duplicam as mensurações inerentes ao movimento apa­
rente do Sol.

37
Nem todos os modelos pretendem ser repetições tão claras de
outras operações físicas. Quando se fala do cérebro como um compu­
tador ou de um computador como um cérebro gigante, tudo o que se
pretende é ilustrar a semelhança no armazenamento de informações
e nos processos de recuperação que ocorrem em cérebros e computado­
res. Todavia, quer seja analogia, modelo, ou forma de um sistema con-
ptual, a mensuração deve basear-se, em última análise, em uma
peração física, do contrário se torna mera retórica.

38
III

Dois Métodos Fundamentais da Pesquisa:


Teórico Formal e Teórico Informal

Chegou o momento de considerar o uso (e o desuso) da teoria


em pesquisa. Até aqui nos ocupamos da metodologia e nos limitamos
a mencionar problemas relativos à formulação e teste de hipóteses.
A metodologia predominante em ciência é a abordagem teórico-
formal, envolvendo a técnica de observação (técnica empírica), a for­
mulação e teste de hipótese (através da experimentação) e a cons­
trução de uma teoria, conduzindo a leis. A maioria das pessoas equi­
para método científico com essa abordagem. Contudo, existe uma outra
escola de pensamento que assegura serem os dados e não as hipóteses
que constituem o conteúdo da ciência e, além disso, que a construção
da teoria não precisa servir de obstáculo para a investigação.
Consideremos, sucessivamente, cada uma destas abordagens, em
primeiro lugar o método tradicional de elaboração da teoria, e depois
o teórico-informal, reconhecendo que, seja quais forem as diferenças
metodológicas que apareçam na superfície, os fins da ciência perma­
necerão os mesmos: descrição, explicação, predição e controle.
Dados, hipótese, teoria e lei: o método teórico formal. A observação
é básica para o método científico e com ela começa toda a pesquisa:
Um pesquisador observa um evento, preocupa-se com ele, formula
algumas idéias iniciais sobre ele e se dispõe a testar a precisão das
suas idéias. Esses são os principais elementos: observação — hipóte­
se — experimentação — verificação. Os que estudam construção de

39
teoria usam, de modo característico, três conjuntos diferentes de ope­
rações, ou proposições, ao avaliar a teoria. Estes conjuntos são:

1) proposições empíricas, que são afirmações sobre o fato, o que o


observador viu.

2) proposições hipotéticas, que são afirmações de conjectura. Com base


na proposição empírica o observador formula uma hipótese para ex­
plicar o evento observado, a ser testada em um experimento.

3) proposições teóricas, que são afirmações das relações funcionais entre


as variáveis.

Marx (36) observou:

0 tipo hipotético de proposição verbal é que forma o elo entre as pro­


posições empíricas, ou fatos, e as teorias. As implicações de uma teoria podem
ser testadas somente por meio de predições científicas ou hipótese experimental.
Estas questões devem ser respondidas empiricamente. Portanto, a hipótese é a
pedra fundamental de toda a construção de teoria científica; sem ela a confir­
mação ou rejeição das teorias seria impossível. O estabelecimento de proposi­
ções empíricas é considerado com o indutivo em contraste com o desenvolvi­
mento complementar das implicações lógicas das teorias, ou seja, com a fase
dedutiva da investigação científica.

Em resumo, isto pode ser assim delineado:

Observação Observação empírica dos jatos, dos eventos rela-


4 tados*
Hipótese Enunciado da predição (se X for feito, deve resul-
1 tar Y)
Experimento Teste feito através da manipulação das variáveis
4
Resultados Confirmação ou refutação da hipótese

Teoria Enunciado das relações funcionais entre as vanaveis

O quadro de referência teórico passa a constituir uma referência para


as futuras observações empíricas, hipóteses etc., enquanto a teoria se
mantém como um corpo vivo de conhecimentos e conjecturas, sujeito
a contínuas modificações.

40
Este sistema não parece diferir muito de outros tipos de tomada
de decisão ou de solução de problema. Uma pessoa comum que toma
uma decisão ou resolve um problema tenta colher toda a informação
que lhe seja possível (em linguagem de computador ela escruta), ava­
lia estas informações em termos da situação presente e de suas expe­
riências passadas (memória), decide sobre uma direção de ação, no
que faz uma previsão (ou hipótese) que uma determinada direção de
ação será melhor do que outra e, depois da ação, verifica sua hipó­
tese. A operação final consiste em acumular esta experiência para fu­
turas referências, em um processo de realimentar a memória: (5)

Hull (33) sugeriu quatro elementos essenciais para uma teoria


científica correta que podem ser reelaborados e modificados da se­
guinte forma:

1. Definições e postulados. Devem ser formulados sem ambi­


güidades; coerentes entre si; sua natureza deve ser tal que possibilite
deduções rigorosas.
2. Deduções derivadas destes postulados devem ser feitas com
cuidado meticuloso, expostas para serem testadas em todos os porme­
nores. Lacunas no processo dedutivo conduzem à teoria imperfeita.
3. Os teoremas significantes de um sistema científico devem
tomar a forma de enunciados específicos do resultado de experimentos
ou observações concretas. Como vimos na parte anterior relativa às
características da teoria, estas predições do resultado permitem uma
comprovação do sistema teórico.
4. Experimentos cuidadosamente controlados devem ser plane­
jados para testar os teoremas deduzidos.

41
Hull resume sua posição observando que: “A teoria científica em
um melhor sentido consiste em rigorosa dedução lógica a partir de
postulados definidos do que deve ser observado sob condições espe­
cíficas. Não há teoria quando há falta de deduções ou quando elas são
logicamente inválidas; a teoria será mais metafísica do que científica
quando as deduções envolverem condições de observação cujo atendi­
mento é impossível;. . . a teoria é falsa quando as condições são preen­
chidas e o fenômeno deduzido não é observado”. (Itálicos meus)
O ponto de vista de Hull é o de que a natureza da teoria cien­
tífica exige a determinação, por meio da observação, de sua verdade ou
falsidade. Define a verdade como uma dedução tórica que foi verifi­
cada pela observação, incluindo a experimentação rigorosa.
Hull descreveu a teoria metafísica como envolvendo condições de
observação impossíveis de serem conseguidas. Segundo esse pensa­
mento, podemos sugerir o seguinte esquema.

M etafísica: Envolve condições de observação impossíveis de serem alcan­


çadas. A teoria exige lógica e coerência mas não exige teste experimental.
As questões religiosas poderiam ser aqui incluídas; a crença em um conjunto
particular de idéias religiosas envolve fé, aceitação de lógica e coerência no sis­
tema. Em geral, não há necessidade de prova experimental nem mesmo esta
prova é possível.

Pré-ciência: Envolve deduções que podem ser estabelecidas em termos tais


que permitem a verificação experimental, embora nenhum teste experimental
tivesse ainda sido realizado. Grande parte da teoria psicanalítica pode ser in­
cluída aqui; as deduções resultantes das observações podem ser formuladas em
hipóteses testáveis para serem confirmadas ou refutadas.

Ciência: Envolve os elementos descritos acima. Deduções lógicas rigorosas


feitas a partir dos postulados definidos do que deveria ser observado em con­
dições específicas, seguido da manipulação através do teste experimental, e
rejeição de deduções falsas.

Rapoport ( 39) ofereceu alguns critérios para se testar uma teoria. M odi­
fiquei e ampliei esses critérios conform e se segue.

1. O problema da definição. Os conceitos e definições propostos na teoria


podem ser expressos de modo a serem comunicados aos outros claramente e
com precisão operacional?

2 . O problema da realidade. Os efeitos de um evento podem ser veri­


ficados por outros e mostrar que não variam em circunstâncias específicas, sendo
estáveis?

42
3 . O problema da verificação. A s afirmações feitas em relação a um
evento podem ser verificadas pela experiência e submetidas a uma previsão
acurada? É a afirmação verdadeira?

4 . O problema da dedução. A afirmação feita sobre um evento parece ser


lógica e coerente em si mesma e em relação a outras consideradas válidas,
embora não sejam diretamente experimentadas? É a afirmação válida?

5 . O problema da causalidade. Por que ocorreu o fato? Esta é uma das


questões fundamentais.

6 . O problema da comunicação. Os eventos e conceitos teóricos podem


ser descritos em linguagem (ou em outra forma sim bólica) que seja clara e
não ambígua para quem receber a informação? (Esta se relaciona com a Ques­
tão 1.) Em outras palavras, a terminologia ou outra estrutura form al usada
envolve uma com unicação vaga, mutuamente compreendida mas não claramen­
te definida ou operacionalmente significativa?

7 . O problema da parcimônia. A s explicações são econôm icas em termos


dos fatos descritos? “A navalha de Occan” exige que as explicações não sejam
mais amplas do que o necessário para explicar economicamente um evento,
assegurada a cobertura de todas as questões. Em psicologia, o usualmente de­
nominado princípio de econom ia indica que se deve preferir a explicação mais
simples entre as disponíveis.

8 . O problema da relevância. A s afirmações feitas em relação aos fatos


são pertinentes ao todo? Por exem plo, afirmações feitas em relação a eventos
particulares podem ser usadas para explicar o comportamento geral? Isto é, uma
pessoa que tivesse conversado com os habitantes de Las Vegas, Nevada, po­
deria fazer afirmações a respeito de todos os norte-americanos? O problema de
relevância é simplesmente o de determinar que afirmações específicas são rele­
vantes para um grupo, e quais são as aplicáveis a conjuntos mais amplos.

A respeito desta orientação teórica padrão em ciência torna-se


necessário fazer algumas considerações. A teoria é um estágio razoável
entre a hipótese, os resultados experimentais e a formulação de leis.
A teoria é um modelo de trabalho que deve se submeter continua­
mente à modificação. A maior objeção à teoria é a de que ela pode
se tornar um corpo cristalizado de informações ou crenças, que, em
si mesma, se torne um padrão para a avaliação de novos dados1. Neste
sentido, a teoria torna-se metafísica e a ciência dificilmente pode en­
globar teorias que ultrapassam sua utilidade como sistemas modelos.

(1 ) Um a boa teoria deve ser capaz de usar os dados que não confirmam
as hipóteses para modificar a teoria à luz dos mesmos.

43
Uma teoria começa a dominar os dados quando o cientista começa a
preocupar-se em provar que sua teoria é correta por meio da investi­
gação dos dados que podem ou não apoiá-la. Conforme Renan (42)
observou há um século: “As pessoas ortodoxas têm geralmente muito
pouca honestidade científica. Não investigam, tentam provar que al­
guma coisa necessariamente tem de ser como dizem. Os resultados
lhes foram fornecidos de antemão; este resultado é o certo, indubita­
velmente certo. A ciência nada tem a ver com isto, ela parte da dú­
vida sem saber para onde será levada e se entrega de mãos e pés
atados à crítica que, por sua vez, a conduz aonde quer que ela es­
pecifique”.
Sidman (45A) resume algumas das objeções à construção de teo­
ria da seguinte forma:

O que constitui uma disposição ordenada de resultados experimentais? A


teoria é o único método de organizar dados? A s próprias teorias estão sujeitas
a critérios de inclusão, coerência, exatidão, relevância, produtividade e simpli­
cidade. São aceitas ou rejeitadas de acordo com o número e tipo de fenôm eno
que abrangem, sua coerência de formulação quando aplicada aos vários dados,
a correção de suas previsões, a adequação lógica das conexões entre as afirma­
ções teóricas e os dados, o número de fenôm enos para os quais dirige a atenção
e o número de suposições exigidas em relação à quantidade de dados que
podem ser manipulados. Dessa lista se deduz que a construção de teoria é uma
ocupação perigosa, ainda que possa proporcionar estimulação intelectual. Isto é
particularmente verdadeiro em psicologia, onde os fenôm enos são diversos, com ­
plexos, e relativamente pouco explorados. Face a esta complexidade, a ten­
dência geral na teorização psicológica limita-se a cobrir uma pequena quantidade
de dados relativamente simples.

Uma teoria que se torna rígida obviamente não é uma boa teoria.
Mas não é incomum pessoas defenderem ou atacarem vigorosamente
uma teoria, usando os mesmos dados para fundamentar interpretações
contraditórias2. Isto está certo na medida em que os dados prevalecem

(2 ) A este respeito é interessante ver o que dizem dois pesquisadores ao


falar sobre em oção. Arnold, (1 ) discutindo as teorias recentes sobre em oções
diz: “N os últimos vinte e cinco anos a produção foi comparativamente menor.
Durante estes anos grande parte do esforço foi dedicado à experimentação e
à pesquisa clínica, sem muita preocupação com a integração ou explicação dos
dados. Muitos dados, muito poucas teorias. Brady ( 1 5 ) , contudo, observou:

44
e as teorias continuem flexíveis. Porém, o que acontece quando a teo­
ria dita a observação, quando as expectativas do que deve ocorrer
numa dada situação sobrepujam as observações reais? Um exemplo
extraído de um trabalho de Anna Freud no qual se refere a um caso
psicanalítico. Trata-se do caso de uma jovem “no período de latência,
que havia conseguido reprimir tão completamente a inveja que sentia
pelo pênis de seu irmãozinho — uma influência que dominou inteira­
mente sua vida — que mesmo na análise foi extraordinariamente di­
fícil encontrar qualquer vestígio dela”. (28) Aqui temos uma obser­
vação interessante. Foi “extraordinariamente difícil encontrar qualquer
vestígio dela”, mas a teoria dizia que ela devia estar lá. Daí a res­
posta — ela “havia conseguido reprimir tão completamente” que era
difícil — percebê-la. Isto parece-me uma “bête noire” da teoria. Não
se pode empregar o mesmo mapa rodoviário por onde quer que se
viaje.
ados, micrO-hipóteses, ordem e lei: método teórico informal. —
/\deptos do segundo método geral de pesquisa, o teórico-informal,
existe um grupo de pesquisadores que acredita que a construção da
teoria é um meio anti-econômico de realizar pesquisa, que o pesquisa­
dor precisa somente passar das suas observações para a experimen­
tação, em seguida dar alguma ordem aos dados de modo a buscar
relações funcionais entre as variáveis e, finalmente, chegar a alguma
formulação de lei organizada. Para este grupo as teorias são desne­
cessárias porque são demasiado formais. Estes pesquisadores conside­
ram que a tarefa da ciência consiste em ordenar os dados e encon­
trar entre eles as relações sujeitas a leis, e temem que as teoriajs se
solidifiquem e comecem a determinar a pesquisa ao invés de integrar
seus dados.
O teste de hipótese também é considerado anti-econômico porque
o pesquisador que trabalha com uma hipótese rigorosa sente-se obri­

“Provavelmente em nenhum outro campo da ciência psicológica tão poucos


dados empíricos ofereceram oportunidade para tanta especulação teórica com o
na área geral das “em oções”. Muita teoria, muito poucos dados. Apenas para
constar, concordo com Brady.

45
gado a segui-la implacávelmente, a despeito de o princípio informal
da ciência, enunciado por Skinner, dizer que: “quando você encontrar
algo interessante, deixe tudo de lado para estudá-lo” . (52) Os teóri­
cos informais consideram que a prossecução diligente de uma hipótese
é aceitável somente se não o impedir de ver os dados quando eles
começam a emergir. Este grupo mudaria prontamente um experimento
se na metade do mesmo surgisse algo novo (e talvez mais promissor).
Também sugerem que não há resultados negativos, ou a refutação de
uma hipótese. Para aprofundar um pouco mais, pesquisadores (tais
como Skinner) dizem que não é uma boa técnica de pesquisa especi­
ficar uma hipótese que será confirmada ou refutada. Dizem que se
alguém procede assim, a confirmação da hipótese proporciona um re­
sultado positivo enquanto que a refutação oferece um resultado nega­
tivo. Dizem não haver uma coisa semelhante a um resultado negativo
porque qualquer resultado num experimento é importante se fornece
informação. Somente estruturando uma hipótese de forma rígida e ri­
gorosa, um conceito de resultados negativos pode aparecer. Conforme
Sidman (45) destaca: “Quando simplesmente se formula uma pergun­
ta à natureza, a resposta é sempre positiva”.
O grupo de pesquisadores que não se inclina pela hipótese en­
contra alguma satisfação numa famosa citação de Newton: — Hy-
potheses non fingo — “Não faço hipótese”. Com isto Newton queria
dizer que deriva suas leis unicamente a partir da observação da natu­
reza, o que considerava um processo distinto da formulação de uma
hipótese a respeito da causa possível do fato observado. Ele tam­
bém disse: “Não me envolvo com conjecturas”. Acreditava que iima
observação cuidadosa e precisa dos eventos da natureza e um segui­
mento passo a passo3 destes eventos proporcionaria, em última ins­
tância, o material a partir do qual a teoria poderia se originar. Para
Newton tanto quanto para nós, uma teoria seria uma formulação sis­
temática das relações entre eventos. Não é inteiramente certo dizer

(3 ) U m exemplo interessante e cuidadoso do desenvolvimento passo a


passo de um experimento pode ser encontrado no artigo de Skinner Case History
in Scientific M ethod, publicado em 1956. (5 2 ).

46
que Newton não fez hipótese. O que realmente fez foi perguntar a
si mesmo sobre as relações casuais entre os gatos que observou. Suas
hipóteses foram criadas in loco, sem a costumeira formulação rigorosa
do método hipotético-dedutivo. Penso que todos os pesquisadores fa­
zem este tipo de hipótese. Alguns as denominam palpites. Escolhi
para elas a denominação micro-hipóteses (“hypothesitos” ) que em
semi-espanhol significa “pequena hipótese”.
Outro princípio-chave do grupo teórico-informal é a confianç^,
quase que exclusiva, na investigação cuidadosa do caso único e não
de um grupo grande de sujeitos. Durante o último século tornou-se
tradicional usar um grande número de sujeitos para obter o que ge­
ralmente se denomina uma amostra representativa, ou um grupo su­
ficientemente grande a partir do qual são elabaradas hipóteses gerais.
Deve-«e recordar que, ao fazer uso deste estudo de grupo, o individual
tende a ficar obscurecido. Todos os indivíduos são juntados em uma
entidade estatística que não tem existência real. Por exemplo, pode-se
falar do padrão de interesse do adolescente como se houvesse um ado­
lescente representativo de todos os membros desse grupo (uma remi­
niscência da “idéia” platônica de uma classe, tal como uma cadeira
que representa o conceito de uma cadeira). Tudo o que se está fa­
zendo é juntar os interesses mais freqüentemente encontrados (como
esportes, por exemplo) em um grupo particular e notar que o adoles­
cente médio tem este agrupamento de interesses. Isto lhe diz pouco
ou nada de um adolescente particular que vive na casa da frente^
exceto talvez o que possivelmente você pode esperar encontrar. So­
mente uma investigação do indivíduo pode lhe dizer se o seu padrão
de interesse concorda ou se desvia da média. Então, se você deseja
relacionar seu desempenho ao do grupo a que ele pertence, pode si­
tuá-lo dizendo que ele tem interesses adolescentes abaixo da média, o
que significa que ele se desvia da norma em algum grau.
Talvez uma ilustração mais específica pode ser extraída da distri­
buição da estatura de um grupo. Por exemplo, alunos de uma classe
de escola secundária têm em média a estatura de l,62m (ou (5’8’);
isto significa que, aproximadamente dois terços da classe se agrupam
ao redor desta média. Isto não eleva a estatura de um rapaz que mede

47
l,50m nem diminui a estatura de outro que mede l,70m. Poderia
ser importante conhecer a estatura média para fins tais como o pla­
nejamento de um desfile; contudo, se se quisesse encomendar unifor­
mes para a classe seria obviamente necessário tirar a medida de cada
um dos alunos.
Considerando a importância de concentrar a atenção no indivíduo,
Sidman, discutindo Skinner, comenta:

A rejeição do “nível de confiança estatístico” que Skinner expressa deriva


do interesse bem claramente exposto pelo comportamento do indivíduo. Este
interesse dita um plano experimental diferente daquele geralmente usado em
psicologia. Em lugar de manejar grupos de animais e calcular a média dos re­
sultados obtidos, torna-se necessário lidar com animais, individualmente, atra­
vés de todas as manipulações experimentais. D essa forma, cada animal cons­
titui uma réplica do experimento, o que não apenas oferece oportunidade para
detectar idiferenças entre os animais com o também impõe a obrigação de re­
latá-las todas e sempre que possível explicá-las. O procedimento de tratar
diferenças entre animais com o sujeitos a leis e não com o exem plos de ca­
prichos da natureza ou das técnicas experimentais, proporcionou a Skinner
um de seus substitutos para o tratamento estatístico. A experimentação contínua
até que as variáveis responsáveis pelo “desvio” do comportamento sejam iden­
tificadas. U m corolário deste ponto de vista é que qualquer efeito de com por­
tamento repetidamente demonstrado no m esmo animal é um fenôm eno sujeito
a leis. (5 1 )

Sidman acredita que o controle dos dados na pesquisa não de­


pende de reunir um grupo de sujeitos ou mesmo amostras amplas
de um indivíduo. Afirma: “Devemos considerar nossa ciência imensu-
ravelmente enriquecida toda vez que alguém submeter outra amostra
de comportamento ao controle experimental preciso”. (46) Acredita
que a adequação da técnica em psicologia experimental deveria ser
avaliada em termos da fidedignidade e da precisão de controle que ela
alcança. Isto não significa, necessariamente, que aparelhos (como uma
extensão das operações humanas) sejam a resposta. Os aparelhos so­
mente fazem aquilo que o ser humano determina. Um experimentador
pode contar o número de vezes que um pombo bica uma chave, mas
sua precisão é duvidosa dada a velocidade com que o pombo pode
bicar — mais de 15 vezes por segundo. É mais exato e simples ligar
um interruptor à chave de modo que cada vez que o pombo bica fecha
o circuito e produz um impulso acionando um contador que registra

48
as rápidas bicadas. Naturalmente, isto pode aplicar-se aos registrado­
res gráficos, aos cronômetros e às outras peças de equipamento usadas
para fins diversos.
A questão crucial é o tipo de dado desejado e a precisão do con­
trole conseguido. Sidman oferece uma boa ilustração disto num relato
do estudo de uma droga:

H á grande interesse nas relações entre o comportamento e a ação dos agen­


tes farm acológicos. U m aspecto importante de uma droga é o tempo de dura­
ção de sua ação. Para ilustrar, vam os estabelecer uma linha de base para o
comportamento de esquiva tendo com o sujeito um rato branco. O animal re­
cebe um choque leve cada 20 segundos se não pressionar uma barra. Cada vez
que pressiona a barra retarda por 20 segundos o choque seguinte. N estas cir­
cunstâncias o rato aprenderá a pressionar a barra e o fará numa freqüência
suficientemente alta para evitar a maioria dos choques. A pós alguma expe­
riência o animal alcançará um ritmo constante de pressão à barra que per­
manecerá estável por períodos de seis ou mais horas. U m a vez que o comporta­
mento de esquiva tenha alcançado este nível estável podem os ministrar uma
droga ao animal, por exem plo, o sulfato de anfetamina, (com um ente conhecido
por Benzedrina). N osso registro do comportamento de pressão à barra apre­
sentará uma série de diferenças na aparência do sujeito normal. Pouco depois
de ter sido ministrada a droga, o rato com eçará a pressionar a barra com
velocidade crescente e o registro mostrará uma ligeira aceleração no ritmo
da sua linha de base. A freqüência alcançará um valor limite, 'digamos de
três a quatro vezes mais alto do que o usual, permanecendo neste nível por
duas ou três horas. Então, começará a decrescer e o registro indicará um pau­
latino retom o ao nível da linha de base. Mas, o animal não retornará sim ­
plesmente à freqüência anterior com que pressionava a barra. Esta freqüência
declinará abaixo do nível de sua linha de base e permanecerá neste estado por
várias horas. «

A fim de acompanhar as relações temporais entre uma droga e o com por­


tamento, é necessário manter o comportamento em um nível estável durante
longos períodos de tempo. A lém disso, as medidas empregadas para caracte­
rizar o comportamento devem ser potencialmente variáveis em ambas as dire­
ções. Isto é, a medida, além de ser estável quanto ao tempo, deve poder au­
mentar ou diminuir amplamente de m odo a prover um teste sensível da ação da
droga. U m a técnica de controle de comportamento que possui estas proprie­
dades permitirá o registro m inucioso de curso temporal da ação da droga. (4 7 )

Acrescente-se que seria possível, no estado acima mencionado,


fazer registros fisiológicos, tais como de pressão do sangue ou de con­
tração dos músculos, simultaneamente com os registros do comporta­
mento, de modo a se poder estabelecer uma clara correlação entre as

49
mudanças no comportamento e o funcionamento fisiológico por um
período de tempo controlado e sob condições claramente especificadas.
O controle dos dados é essencial em qualquer metodologia, quer
seja a teórica-formal quer seja a teórica-informal, devendo-se tomar
as medidas necessárias para assegurar este controle. No capítulo se­
guinte considerarei o problema crucial da definição. Há necessidade de
sepecificar as variáveis com as quais o experimentador está trabalhan­
do. A definição dos termos é um meio básico de controle.

50
IV

O Problema da Definição

Em nossa discussão anterior vimos que a mensuração é básica


para o método. científico e que ela é também de dois tipos funda­
mentais. Primeiro, o tipo nominal que propõe a questão “o fenômeno
existe?” e o segundo, o tipo de mensuração que propõe a questão “se
o fenômeno existe, em que extensão existe; qual é sua magnitude ou
intensidade?” Para poder formular alguma espécie de mensuração para
uma fenômeno, deve-se defini-lo clara e inequivocamente. Isto nos
conduz a um dos problemas básicos do método científico: a definição
das variáveis, fenômenos ou eventos com os quais o cientista tra­
balha.
Considerado superficialmente este problema parece relativamente
simples. Nossa vida cotidiana está repleta de nomes e definições de
objetos. Porém, é justamente nesta enganosa simplicidade que reside o
problema real da definição. Estamos tão acostumados com as-defini­
ções do dicionário que tendemos a considerá-las como sendo claras,
inequívocas e reais. Neste ponto gostaria de observar que um dos
maiores erros, no método científico, é o de transferirem definições de
dicionário para método científico sem fazer crítica, já que as defi­
nições de dicionário não são elaboradas de modo científico. Skinner
(58) salientou que: “Teorias do significado usualmente lidam com
róis correspondentes de palavras e de coisas. Como as entidades lin­
güísticas, por um lado, correspondem às coisas ou eventos que, por
outro lado, lhes dão significados, qual é a natureza da relação entre

51
elas denominada “referência”? À primeira vista, os dicionários pa­
recem sustentar a noção desses róis. Mas os dicionários não dão sig­
nificados; na melhor das hipóteses oferecem palavras que têm o mes­
mo significado”. No entanto, deve existir alguma operação clara pela
qual estas palavras podem ser relacionadas. Isto será discutido mais
adiante no presente capítulo, cabendo aqui somente uma breve ob­
servação.
Três níveis da definição. Continuando a discutir o problema da
definição, quero sugerir que existem três níveis de definição que de­
nomino cotidiano, poético e científico. A definição cotidiana é univer­
salmente aceita, existindo uma compreensão geral em relação à mesma.
A definição poética não precisa ser universalmente aceita nem geral­
mente compreendida; é considerada como pertencente ao âmbito da
liberdade e da criatividade individual. A definição científica é restrita
a um grupo limitado para o qual ela deve ter um significado específico.
Por exemplo, suponha que definimos a lua do ponto de vista da co­
municação cotidiana, poética e científica. A definição cotidiana da lua
poderia ser “um corpo redondo e pesado que gira ao redor da terra,
que reflete a luz solar e torna-se cheio uma vez por mês”. A defini­
ção poética poderia ser algo semelhante a “uma esfera prateada e
resplandecente que se destaca do negro manto do céu”. Finalmente,
uma definição científica poderia ser algo como “um corpo pesado,
um satélite do planeta terra (o terceiro planeta do sistema solar) em
torno do qual desenvolve uma órbita de 28 dias, situando-se a apro­
ximadamente 384.000 quilômetros da terra; com um diâmetro apro­
ximado de 3.477 quilômetros e que reflete a luz solar”.
Pode-se notar que uma definição precisa da lua, do ponto de
vista científico, deve começar inevitavelmente por definir coisas como
planeta e sistema solar (que é uma estrela do tipo G O ), e asisim
por diante. Obviamente, os três tipos de definição diferem quanto à
clareza e à especificidade. Conforme mencionei, o erro maior é a
transferência de uma definição cotidiana (ou, o que é menos provável,
de uma definição poética) para o uso científico. Um astrônomo difi­
cilmente poderia fazer mensuração usando conceitos que seriam acei­
táveis na conversação diária, tais como “tornando-se cheia uma vez

52
por mês”. A definição científica deve lidar com descrições específicas
e inequívocas. Neste ponto deve-se observar também que a transfe­
rência da comunicação científica para o âmbito cotidiano ou poético
seria igualmente inadequada. O enamorado às margens de um lago
que descrevesse a lua para a sua namorada como o satélite do ter­
ceiro planeta do sistema solar (a terra) provavelmente teria tão pouco
êxito como um astrônomo poético em um simpósio científico. Na
conversação diária tais descrições são consideradas pedantes.
O Problema da clareza. Não é demais frizar que um dos maiores erros
no método científico é usar as definições cotidianas. No entanto, este
problema é muito freqüente em certos tipos de pesquisa, especialmen­
te naquelas que se ocupam do comportamento humano e de proble­
mas clínicos. Por exemplo, considere a palavra “ansiedade”, uma pa­
lavra corrente para a qual existe uma definição cotidiana suficien-
temente clara. Mesmo uma palavra como personalidade, que tem nu­
merosos significados1, é relativamente pouco clara em certos contextos,
embora esses usos difiram. Por exemplo, às vezes, personalidade é al­
guma coisa que uma pessoa pode ter (“ele tem muita personalidade” ).
O fato de se poder falar de “muita” sugere que há alguma escala apro­
ximada de magnitude que vai do pouco ao muito. É algo que pode
ser tratado com um julgamento de valor ( “Eu não gosto de sua per­
sonalidade” ). Designa certas características de identificação tais como
“ele é uma personalidade de Hollywood”. Todas estas são definições
cotidianas que têm relativa clareza dentro dos usos específicos para
os quais foram elaboradas. Como a palavra ansiedade, o vocábulo
personalidade conduz à confusão quando se procura fazer uma pes­
quisa científica. Falar de “desajustamento de personalidade” sugere
que alguma coisa foi perturbada, mas o que? Somente sujeitando um

(1 ) Provavelmente, muitos significados ou “significados em excessos no


sentido de Reinchenbach (4 1 ). Marx (3 6 ) com entou isto observando que os
conceitos com excesso de significados podiam ser “tolerados no desenvolvi­
mento pré-científico inicial de uma disciplina mas que a sua substituição por
constructos mais íntima e necessariamente ligados aos dados deve ocorrer para
que sê verifique progresso científico”. Este é o principal ponto tratado neste
capítulo.

53
termo cotidiano vago, como personalidade, a um significado e a uma
definição científica pode-se tentar uma pesquisa significativa.
Certamente os compêndios não servem como árbitros finais, con­
forme pode-se ver na seguinte definição de ansiedade, extraída de um
livro de texto-padrão de psiquiatria (26): “Num certo sentido, ansie­
dade é o mecanismo que adverte o ego de que existe alguma coisa
errada na personalidade. O próprio ego usa a ansiedade para indicar
que algo no id ou no super-ego ameaça o ego” . Embora possa existir
certa compreensão geral desta afirmação, é claro que a compreensão
científica nunca poderia emergir dela. Para tornar semelhante defini­
ção significativa é preciso definir de modo claro e inequívoco os ter­
mos ego, super-ego, personalidade, id e mesmo ansiedade, de modo
a poder relacioná-los aos fatos demonstráveis e replicáveis vinculados
aos dados. Mensionei que uma definição da lua poderia exigir, em
última análise, outras definições de planeta, satélite e outros termos
usados em uma definição científica. Mas isto é diferente no caso de
termos como id, ego, e personalidade. A primeira definição (da lua)
pode ser relacionada a eventos observáveis e demonstráveis, enquanto
que os termos personalidade, id e ego permanecem como símbolos
verbais formais. À medida que continuarmos nossa discussão, volta­
remos a este tópico.
Uma fase deste problema de definição pode ser resumida numa
citação de Quine (38) que observou que: “quanto menos avançada é
uma ciência, tanto mais sua terminologia tende a repousar em uma
suposição acrítica de compreensão mútua”. Quando indivíduos comu­
nicam observações com termos mutuamente compreendidos mas va­
gos (tais como personalidade), ao invés de usar termos baseados em
fundamentos científicos, a pesquisa é retardada. Considere outro exem­
plo: Se alguém pretendesse fazer pesquisa em psicoterapia (difusa­
mente definida como o tratamento de problemas emocionais), logo se
depararia com o termo ‘melhora’, amplamente usado para indicar uma
mudança no comportamento da pessoa. Contudo, raramente se encon­
tra qualquer definição clara do que seja melhora. Se você perguntasse
a uma psicoterapeuta o que entende por esta palavra ele poderia dizer:
“Bem, todos sabem o que melhora significa”, assim como poderia

54
dizer “todos sabem o que ansiedade” significa ou “todos sabem o que
significa personalidade” . Isto ilustra o uso das definições cotidianas,
mutuamente compreendidas e universalmente aceitas em uma situação
que exige definição científica. Dizer que “todos sabem. . . ” é re­
petir a pergunta e evitar o assunto principal da clareza e precisão
da definição. Conforme Quine sugeriu, a suposição mútua de com­
preensão é realmente uma abordagem imatura do método científico.

Uma tentativa de clareza e certeza: a definição operacional. O que


vem a ser uma definição científica significativa? A definição operacio­
nal é fundamental a todo método científico. Embora existam problemas
em relação à definição operacional, é claro que dela depende o método
científico. Rapoport (40) a define nos seguintes termos: “Uma defi­
nição operacional diz-nos o que fazer para experimentar a coisa de­
finida. Solicitado a definir o coeficiente de fricção, um físico dirá al­
guma coisa como: Se um bloco de determinado material for arrastado
horizontalmente sobre uma superfície, a força necessária para arras-
tá-lo será, dentro de certos limites, proporcional ao peso do bloco.
Desta forma, a razão da força para arrastá-lo pelo seu peso é uma
quantidade constante. Esta quantidade é o coeficiente de fricção entre
as duas superfícies. O físico define o terço dizendo (tcomo proceder e
o que observar.” A definição operacional de um petisco, como foi
sugerido, é sua receita.
No método científico precisamos de termos que permitam uma de­
finição operacional, embora indubitavelmente seja verdadeiro que a
própria natureza da linguagem, por si mesma, impeça um operacio-
nismo completo. É importante frisar a necessidade de se tentar alcan­
çar este alvo eliminando os termos mutuamente compreendidos (no
sentido atribuído por Quine), mas vagos, que impedem a comunicação
adequada. O fato disto constituir um problema na comunicação psi­
quiátrica pode ser ilustrado na seguinte citação extraída do Diagnostic
and Statistical Manual: Mental Disorders, publicado pela American
Psychiatric Association (24 ), na qual se descreve a síndrome cerebral
crônica: “As síndromes cerebrais orgânicas crônicas resultam de uma
lesão difusa relativamente permanente, mais ou menos irreversível, da
função do tecido cerebral.

55
Diria que para esta definição ter alguma utilidade genuína como
uma afirmação verbal e ter significado operacional, seria necessário
que se definisse operacionalmente os aspectos qualificativos: “relativa­
mente permanente” e “mais ou menos irreversível”.
É evidente que a definição operacional começa com observação.
O observador registra e relata os fatos e tenta comunicá-los de modo
a dar o máximo de clareza possível. Uma das objeções ao máximo de
clareza é a de que o número de definições envolvidas pode se tornar
excepcionalmente incômodo. Por outro lado, quanto mais nos aproxi­
mamos da certeza e da clareza, mais específicos e particulares nos
tornamos, enquanto que, em última análise, a própria ciência deve
conduzir à generalidade e predição. Não creio que esta objeção ao
uso da definição operacional seja legítima. Penso que o número de
definições exigidas depende de circunstâncias específicas. Bridgman
(16) sugeriu que o uso comum prefere a ambigüidade, e um número
pequeno de palavras, em lugar da clareza e de um (grande número
de palavras.

Mas isto não é inteiramente verdadeiro. Por exemplo, em nossa


cultura existe apenas uma palavra para designar neve, embora pos­
samos emprestar-lhe qualidades como dura, macia, gélida ou fofa;
comumente se prefere a ambigüidade a um grande número de palavras
descrevendo neve. Contudo, entre os esquimós, para os quais a vida e a
sobrevivência dependem de um conhecimento preciso do tipo de neve,
existem 30 palavras para descrever diferentes tipos de neve, cada
uma das quais com üma forma diferente, tais como o esquimó enfatiza
as descrições discriminativas de neve. Notou que a língua inglesa “é
muito descriminativa em relação ao comportamento grupai: falamos
de Scholls of jish, herds of catle, flocks of sheep, covey of quail, pride
of lionsf etc.” Podemos somente supor que uma cultura que favorece
esta discriminação entre agrupamentos tem necessidade dessas distin­
ções, enquanto que outras culturas parecem contentar-se com indicar
que há “muitas” ovelhas ou muito gado.
Uma palavra isolada pode ser usada em muitos contextos dife­
rentes sempre que haja uma clara especificidade operacional para cada

56
uso. Por exemplo, a palavra “chave” tem, em inglês, ;mais de vinte
significados, cada um dos quais relacionado a um referente opera­
cional específico (música, fraternidade, casa, etc). Talvez isto tam­
bém pudesse ser feito com maior clareza operacional com a palavra
personalidade que tem muitos significados.
De certa forma, isto foi feito através de uma espécie rudimentar
de análise fatorial, por um grupo de psicólogos (64), que tentou en­
contrar algum significado coerente na palavra “emoção”, e quando
encontraram mais de vinte definições. Quando estes psicólogos fatora-
ram o elemento comum a todas as definições de emoção verificaram
que uma característica aparecia em todas elas: atividade alterada do
sistema nervoso autônomo. É evidente que uma definição de emoção
de um leigo poderia conter aquela frase particular, mas sua descrição
do comportamento envolvido, provavelmente, indicaria um aumento no
ritmo cardíaco ou na transpiração, ou algo semelhante na atividade
fisiológica. Estas são atividades alteradas do sistema nervoso autônomo
e assemelham-se às descrições apresentadas em termos mais profis­
sionais. Quando é possível apontar um fator, isto oferece o começo
de uma definição mais satisfatória de uma palavra como emoção.
Temos algo que é mensurável. (E você já sabe como aprecio as
coisas que são mensuráveis).
As observações devem começar sempre com uma definição espe­
cífica, clara e restrita. Somente com esta base é possível fazer um
movimento no sentido de obter uma correlação de observações espe­
cíficas que contribuam para um corpo de conhecimento mais amplo.
Uma objeção freqüentemente feita à definição operacional é a de
que, no final, ela encurrala o definidor num canto. Rapoport (39) co­
mentou este fato valendo-se de um exemplo divertido no qual mostra
que um positivista lógico estrito, aferrado a seus princípios e que se
ativesse somente a eles, não poderia dizer: “Há uma ovelha preta”.
Ele somente poderia dizer: “Vejo uma ovelha preta, um lado da mes­
ma é preto”. Se lhe perguntarem se realmente não acredita que a
ovelha seja preta ele responderá: “Minha experiência anterior com
ovelhas que tinham um lado preto me faz esperar que, se a presente
ovelha se virasse, eu poderia receber dados sensoriais semelhantes”.

57
Esta descrição pode parecer ridícula uma vez que o observador parece
ser excessivamente compulsivo em sua descrição. Mas se alguém subs­
tituir a palavra ovelha por lua, o assunto fica diferente. Até recente­
mente, um observador somente poderia dizer que “ ali está a lua, em
um dos lados tem crateras”. Isto porque ninguém tinha visto o outro
lado da lua e a, experiência nos limitava a conjecturar sobre o outro
lado. Em outras palavras, vimos muitos lados de ovelhas e temos a
experiência que nos possibilita inferir (com alto grau de probabilida­
de) que uma ovelha terá a mesma cor de ambos os lados. Conquanto
houvesse certamente um bom grau de probabilidade de que do outro
lado da lua também existiam crateras, não havia qualquer experiência
que nos permitisse fazer semelhante inferência. A definição operacional
ou a descrição lógica positivista da lua tinha que restringir-se à des­
crição do que era comumente observado.

Ocasionalmente, outra objeção à definição operacional é apre­


sentada e se refere à possibilidade de dar definições operacionais a
entidades simbólicas, e dessa forma revestir a definição de clareza
operacional. Realmente este não é um problema significante na medida
em que a ciência lida sempre com dois tipos de proposições que
foram descritas como empíricas e formais. Stevens (59), por exemplo,
discutindo o método operacional, observou que “as hipóteses. . . são
somente afirmações formais — operacionalmente vazias — até serem
demonstradas”. Esclarecendo isto, faz uma distinção entre proposições
empíricas e formais, dizendo que as formais são simbólicas e não têm
qualquer referência empírica” ; são elas a linguagem, a matemática e a
lógica como tais”. Por exemplo, é possível afirmar em uma propo­
sição formal que X = a - f- b 2 sem qualquer referência aos objetos ou
fatos descritos por X, a ou b.
Por outro lado, as proposições empíricas “são aquelas nas quais
estes conjuntos de símbolos foram identificados como fatos observa­
dos”. Rapoport (40) descreveu isto também em termos de uma fun­
ção proposicional, advertindo que este tipo de função proposicional
permite fazer uma afirmação hipotética tal, como V é verde. É im­
possível dizer se esta afirmação formal é verdadeira ou falsa. Se X
for erva, existe uma verdade demonstrável; se X for leite, ela pode

58
ser considerada falsa. Como um todo, os símbolos matemáticos não
precisam de referências empíricas imediatas mas podem existir dentro
de uma estrutura puramente formal.
Os símbolos formais podem aparecer em definições operacionais
como no exemplo que se segue. Um psicólogo, descrevendo as con­
dições sob as quais realizou certo experimento, faz notar, ao definir
fome (uma definição cotidiana objetiva que ele tenta tornar operacio­
nal) : “Neste experimento os ratos foram privados de alimento durante
um período de 72 horas”, um procedimento aceito para fazer com
que o animal fique faminto. A palavra hora é uma palavra formal
simbólica que tem uma relação com um evento físico puro, ainda que
um tanto remoto. Já discutimos (pág. 37) este aspecto quando con­
sideramos os níveis de mensuração, mas uma breve revisão do prin­
cípio, nesta área diferente, poderá ser útil. O psicólogo usa o termo
hora, um símbolo verbal, formal e não-físico, que se converteu em
um sinal que designa uma passagem específica de tempo indicado pelo
movimento de um par de ponteiros ao redor do mostrador de um re­
lógio. O movimento dos ponteiros é uma operação física a que se deu
uma designação simbólica (segundo, minuto, hora). A operação física
final é o movimento dentro do próprio relógio que produz o movi­
mento dos ponteiros. Um relógio é um modelo físico do movimento
rítmico aparente do sol. Desta forma, quando um psicólogo diz que
privou um rato de alimento por 72 horas (definindo assim a fome)
está usando uma definição verbal simbólica relacionada com dois
outros níveis de definição de movimentos — ambos físicos — signifi­
cando a passagem do tempo e o modelo do relógio. Não precisa es­
pecificar isto quando faz a sua afirmação porque isto já é conhecido.

O ponto crítico apresentado nesta ilustração é o de que as de­


finições ou termos verbais simbólicos podem ser usados sempre que
existam certos dados aos quais podem se relacionar, e que os dados
sejam operações físicas. Definir ansiedade, no exemplo anteriormen­
te dado, em termos de egos, ids e personalidade, meramente, mistura
o problema porque não existe qualquer operação física à qual estes
símbolos puramente verbais e formais possam ser relacionados.

59
Conceitos inferidos e inventados. Intimamente relacionada com o ex­
posto anteriormente está a questão dos conceitos inferidos e inventados.
É evidente que muitos dos conceitos com os quais o cientista trabalha
são inferidos de dados e que outros são construídos para descrever
certos eventos observados. Por exemplo, o átomo é um conceito inferi­
do que tem sua origem em dados observados que, presumivelmente,
existem realmente. A descoberta ou a observação do próprio átomo de­
penderá do desenvolvimento de mensurações cada vez mais precisas.
E, assim, ainda que o termo átomo possa ter propriedades formais
e estar diferencialmente relacionado a eventos físicos, em última ins­
tância ele poderá ser um evento fisicamente observado. O termo cons-
tructo hipotético tem sido usado para descrever este tipo de conceito
inferido, cuja existência se supõe e cuja descoberta poderá ocorrer
como resultado de experiência.

Em contraste com o constructo hipotético ou conceito inferido,


existe o conceito inventado (que freqüentemente se denomina variá­
vel interveniente), empregado pelo experimentador para explicar os
fatos que observou. Hereditariedade e aprendizagem se incluem entre
estas variáveis intervenientes. Nem a hereditariedade nem a apren­
dizagem pode ser vista num sentido físico, mas todavia são operacio­
nalmente definidos como conceitos inventados. Para ilustrar melhor
isto, a hereditariedade é uma variável interveniente que foi inventada
para explicar certos fenômenos físicos observados. Num dado momen­
to da história, o gen e cromossoma eram constructos hipotéticos infe­
ridos como mecanismos da transmissão da hereditariedade. Os gens e
os cromossomas têm realidade física, e como tal podem ser desco­
bertos. A hereditariedade não é um evento físico mas um conceito
criado para explicar operações físicas. Aprendizagem também é uma
variável interveniente; mas uma mudança na estrutura neurofisiológica
do cérebro, cuja ocorrência pode ser inferida durante a aprendizagem,
ainda não foi claramente isolada e continua a ser um constructo hipo­
tético. Está arraigada nos dados e presume-se que exista como uma
operação física. Pesquisas ulteriores poderão fornecer mais informa­
ções.

60
Para resumir este aspecto da discussão dos métodos operacionais,
gostaria de voltar a Feigl (27), que estabeleceu os seguintes critérios
para métodos operacionais, que modifiquei da seguinte forma:

1. Devem ser logicamente coerentes, isto é, logicamente derivados uns dos


outros e relacionados a outras definições operacionais.

2. Devem ser definidos, preferivelmente baseados e ligados de forma quan­


titativa.

3. D evem estar empiricamente baseados e ligados ao observável.

4. Devem ser tecnicamente possíveis, submetidos à manipulação expe­


rimental.

5. Devem ser inter-subjetivos, replicáveis, demonstráveis em diferentes


espécies e reproduzidos em diferentes experimentos.

6. Devem visar a criação de conceitos que possibilitarão a formulação de


leis e teorias de grande predicabilidade.

É óbvio, a patrir do exposto, que o conceito de metodologia ope­


racional de Feigl está relacionado com nossa discussão anterior de
teoria e sua construção, no sentido de envolver uma terminologia coe­
rente, logicamente derivada para dados mensuráveis, baseada na ob­
servação, sujeita à manipulação em teste, replicável de sujeito para
sujeito e de experimentador para experimentador e, finalmente, que
visa a criação de um tipo de ordem ou coesão de fatos em um sis­
tema.
Freqüentemente ouve-se dizer que a natureza tem todas as res­
postas disponíveis e que cabe ao experimentador propor a pergunta
adequada. Muita verdade existe neste clichê e eu gostaria de sugerir
que é somente através do uso da clareza na definição operacional das
variáveis que se torna possível propor questões adequadas.

61
O Laboratório e o “Mundo Real”:
Pesquisa com Animais e Seres Humanos

Algumas pessoas parecem acreditar que os resultados obtidos no


laboratório, em geral com organismos inferiores tais como os ratos
brancos, não são realmente aplicáveis aos problemas práticos huma­
nos. Num dos últimos capítulos (pág. 78) discutiremos, com maiores
pormenores; o conceito de Egon Brunswik de “planejamento repre­
sentativo”, mas a sua relevância pode ser aqui considerada. Em re­
sumo, um planejamento representativo caracteriza um experimento que
tem um mínimo de artificialidade e um máximo de controle. É um pla­
nejamento ideal porque reúne os problemas do “mundo real” com os
métodos exatos do laboratório experimental. Como acontece freqüen­
temente com os ideais, muitos experimentos carecem de perfeição,
porém isto não significa que o critério ideal deva ser desconsiderado.
Alguns compromissos são sempre experimentados na aplicação dos mé­
todos de laboratório aos problemas mais amplos, mas como vimos
(pág. 29) isto é parte da metodologia da ciência pela qual o expe­
rimentador, através de procedimentos controlados, estabelece qual é
a probabüidade de uma explicação particular ser correta. Idealmente,
se alguém desejasse verificar o que o povo de uma determinada cidade
diz sobre um candidato durante as eleições, deveria entrevistar cada
um dos cidadãos. Um compromisso com tal ideal se torna necessário
pela impossibilidade de tal tarefa; somente o tempo requerido para en­
trevistar, digamos, um milhão de pessoas, seria proibitivo. I>esta for­
ma, o perito em levantamento de opinião pública toma uma amostra
representativa, esperando conseguir um segmento da população que re­
presente um corte transversal do todo, com um número suficiente de
operários, comerciantes, profissionais liberais etc., de modo a formar
um microcosmos da cidade. O fato de ele ser ou não bem sucedido
em sua amostra representativa constitui sempre um problema para o
pesquisador da opinião pública, mas ilustra o uso do procedimento
de laboratório numa situação real para estabelecer probabilidades da
ocorrência de um evento, isto é, a probabilidade de um candidato sair
vitorioso em relação a outro. Com base em sua sondagem, afirma que
suas previsões são corretas, dando a conhecer as possíveis percenta­
gens de votos, talvez 55 por cento para o Candidato A, 40 por cento
para o B e cinco por cento de Indecisos. Os múltiplos fatores que
podem influir na variação destas percentagens são levados em consi­
deração até o último momento da eleição. Indubitavelmente, estas son­
dagens representam uma adaptação do procedimento de amostragem
usado no laboratório, mas carecem da precisão do laboratório no to­
cante ao controle das variáveis após a seleção da população que ser­
virá como sujeito.
Freqüentemente se criticam os estudos de laboratório por se re­
ferirem a fatos triviais. Conforme vimos (pág. 32) quanto mais li­
mitado for o foco da atividade, mais fácil se torria medir, e a objeção
apresentada é a de que os resultados do laboratório não são soluções
para problemas, mas somente fatos abstratos e de pouca importância.
Por exemplo, em psicologia pode-se perguntar: qual a importância
para os multiformes problemas do comportamento humano saber se
um rato vira para a esquerda num labirinto ou se um pombo aprende
a discriminar um círculo de um quadrado? Além de qualquer possí­
vel importância para problemas da aprendizagem humana, há ainda
uma outra consideração: a ciência progride acumulando unidades entre
fatos aparentemente diversos e díspares. Assim, é pela descoberta do
que pode parecer superficialmente um pormenor sem importância que
a ciência constrói sua super-estrutura de teoria. Talvez a questão mais
importante de todas seja o fato de que uma descoberta leva a outra
assim como um resultado indica outro problema. A ciência é uma dis­

64
ciplina regeneradora onde um fato conduz a outros eventos possíveis
num turbilhão crescente de novas informações. Conforme Bronowski
(19A ) afirmou:

N ão penso que a verdade se tom e mais primitiva se a procurarmos nos


fatos mais simples. Pois nenhum fato no mundo é instantâneo, infinitesimal
e último, um marco isolado. Considero que não existem fatos atômicos; na lin­
guagem da ciência cada fato é um campo.

Mas por que animais? Ainda persiste a questão — por que animais?
Supondo que uma pessoa se dedique à psicologia como carreira ou se
matricule num curso de psicologia porque está interessada em com­
portamento humano, por que tem que desviar-se e trabalhar com o
onipresente rato branco? E o que isto tem a ver com o comportamen­
to humano? Skinner (51 A) discutiu essa questão:

Estudamos o comportamento de animais porque é mais simples. Os pro­


cessos básicos são revelados mais facilmente e podem ser registrados por pe­
ríodos de tempo mais longos. N ossas observações não são complicadas pelas
relações sociais entre o sujeito e o experimentador. A s condições podem ser
melhor controladas. Podemos arranjar histórias genéticas para controlar certas
variáveis e histórias de vida especiais para controlar outras — por exem plo,
se estamos interessados em saber com o um organismo aprende a ver, podemos
criar um animal no escuro até que o experimento com ece. Também podemos
controlar circunstâncias correntes numa magnitude nem sempre fácil de realizar
no comportamento humano, por exem plo, podemos variar os estados de priva­
ção numa grande variedade de modos. Estas são vantagens que não deveriam ser
rejeitadas ante a afirmação a priori de que o comportamento humano é inevita­
velmente um conjunto à parte, um campo separado. . . Seria temerário afirmar,
neste ponto, que não existe diferença essencial entre o comportamnto humano
e o comportamento das espécies inferiores; mas até que se tenha feito uma
tentativa para lidar com ambos nos mesmos termos, seria igualmente tem e­
rário afirmar que ela existe.

Nessa citação, Skinner ilustra alguns aspectos do uso de animais


em pesquisa, particularmente as possibilidades de fazer certos tipos
de experimentos com animais, os quais não poderiam ser convenien­
temente realizados com seres humanos, coletando fatos que podem se
tornar progressivamente relevantes e importantes para o comportamen­
to humano. Também afirma um ponto crítico vinculado à questão das
diferenças entre o comportamento humano e o comportamento animal:

65
não podemos nos precipitar e afirmar a existência de similaridades
ou diferenças até que tenhamos dados para tanto.
Portanto, uma razão para a pesquisa com animais é a exeqiiibi
lidade de se conduzir com animais pesquisas que não poderiam ser
feitas com sujeitos humanos. Por exemplo, o funcionamento do cére­
bro não é uma área tão esclarecida como certos textos a apresentam,
obedecendo a interesses de simplicidade. Volumes foram escritos sobre
fatos cotidianos, tais como sono e consciência, sem se dar uma defi­
nição verdadeira, clara detsses eventos. Grande parte do trabalho rea­
lizado no importante estudo do funcionamento do cérebro foi feito
com animais, cujas áreas do cérebro foram removidas, estimuladas
com corrente elétrica, ou submetidas a lesão química e cirúrgica, tudo
isto tendo em vista encontrar respostas para a estrutura e a função
do cérebro e do sistema nervoso central. Estes experimentos poderiam
ter sido feitos com seres humanos? É claro que não. Não se poderia
fazer nenhuma extirpação cirúrgica sistemática ou implantação de
elétrodos no cérebro de um ser humano com o objetivo de estudar
questões tais como o efeito da estimulação elétrica dos centros ce-
*

rebrais. E assim, para a solução de questões cruciais como a das causas


da epilepsia e de outros distúrbios neurológicos, tais como esclerose
múltipla, devem ser realizados experimentos que somente são possíveis
com animais. \
A questão relativa a que animal usar num experimento constitui
um outro assunto. Alguns experimentos tendem a ditar a espécie a
ser usada. Por exemplo, os ratos carecem de visão para cor e um expe-
rimento que exigesse este tipo de discriminação não os poderia usar
como sujeitos. Por outro lado, os pombos têm excelente capacidade
visual, incluindo a visão de cores e poderiam ser bons sujeitos para
tais experimentos. Sua freqüência excepcionalmente alta de resposta
de bicar uma chave, numa câmara experimental, tem óbvias vanta­
gens em um experimento que exige alta freqüência de resposta. Ma-
- •’*
cacos e chimpanzés também têm boa freqüência de, resposta e seu
tamanho e similaridade com seres humanos em muitos aspectos os
tornam animais experimentais importantes. Ao se desejar usar um
animal cujo comportamento se aproxime mais do comportamento hu­

66
mano (em parte pelas características da espécie e em parte pelo ín­
timo contato com os seres humanos) provavelmente dar-se-á preferên­
cia ao cão. A independência do gato não se confina ao lar e ao
coração. Os gatos são conhecidos como recalcitantes sujeitos experi-
nentais na pesquisa de comportamento.
Os estudos genéticos de espécies com duração de vida pequena.
) que permite acompanhar muitas gerações, somente podem ser feitos
com animais como a mosca-de-fruta (drozófila). Seria impossível para
um experimentador acompanhar mais do que duas ou três gerações de
seres humanos em um estudo genético, e lhe seria impossível mani­
pular fatores genéticos para estudo. Isto pode ser feito com animais.
É verdade que, a despeito de todas as razões intelectuais para usar
certos animais experimentais, um pesquisador pode desenvolver pre­
ferências por uma espécie e verificar que muitos dos seus experimentos
são ditados pelo seu animal favorito. Confesso ser um homem de
pombos, muitos dos meus experimentos são realizados tendo estes
pássaros como sujeitos. Alguns experimentos — com drogas, por /

exemplo — podem ser melhor realizados com ratos, e eles se tornam


os sujeitos. Uma outra área de investigação na qual me envolvi é a
do estudo do comportamento verbal, um projeto que necessariamente
requer sujeitos humanos.
O estudante interessado em pesquisa deve aproveitar-se de qual­
quer oportunidade que apareça para trabalhar com espécies diferentes
em diferentes tipos de experimentos, e deixar que sua própria história
de reforçamento (em termos que ache mais recompensador) o oriente.
Voltando à afirmação de Skinner de que é muito cedo para afir­
mar diferenças ou semelhanças entre o comportamento animal e hu­
mano, vamos considerar um aspecto importante dessa questão. Os
críticos das extrapolações do comportamento animal para o compor­
tamento humano vêem uma lacuna que não pode ser preenchida entre
o comportamento dos seres humanos e dos animais. Contudo, aqueles
que, como nós, vêem a importância para o comportamento humano
de alguns trabalhos com animal, freqüentemente sugerem que existem
mais proposições universais do que pode parecer óbvio. Encontramos

67
um exemplo na instrução programada e nas máquinas de ensinar usa­
das com estudantes, cujas bases se encontram em pesquisas anteriores
sobre aprendizagem, tendo pombos como sujeitos. Com a necessida­
de de se fazer mais experimentos sobre as leis básicas da aprendiza­
gem, o problema pode, na melhor das hipóteses, ser acadêmico, mas
um fato ressalta claramente e merece atenção: existe-uma abordagem
errada por analogia entre o comportamento humano e animal que so­
mente serve para aumentar a confusão. Esta abordagem por analogia
baseia-se na suposição de que, para estudar, nos animais, um fenô-
nômeno que se relaciona com o comportamento humano, é necessá­
rio estabelecer condições completamente análogas — por exemplo,
para estudar o comportamento psicótico, precisamos tomar o rato
psicótico. Vamos considerar o erro analógico com maiores pormenores
por tratar-se de um problema central.

O erro analógico. Quando um psicólogo trabalha tendo animais como


sujeitos num experimento, alguém pode dizer: “Isto tudo é muito in­
teressante mas o que tem a ver com o comportamento humano? É
muito agradável saber que conseguiu produzir úlceras em ratos bran­
cos, mas o que isto nos diz sobre as úlceras em pessoas?” Este é o
ponto vital do erro analógico: a suposição de que deve existir uma
relação biunívoca entre os dois eventos. Se desejamos estudar compor­
tamento desorganizado em animais, erroneamente se supõe que de­
vemos reproduzir o mesmo tipo de comportamento desorganizado que
encontramos nos seres humanos. Mas como Sidman (48) observou:
“ . . . por que deveríamos esperar que a psicose do rato apresente
qualquer semelhança aparente com a psicoce de um ser humano?” Ele
prossegue sugerindo que uma certa classe de fatores pode levar uma
pessoa a viver numa caverna (o que, em nossa cultura, poderia ser
considerado uma conduta psicótica), enquanto que a mesma classe de
fatores no rato poderia levá-lo a continuar a pressionar a barra para
obter alimento muito tempo depois do alimentador ter sido removido.
Nosso problema não é criar no rato um comportamento psicótico aná­
logo ao do homem, mas, como Sidman (49) destacou, obter “sufi­
ciente compreensão tanto dos homens como dos ratos, de modo a
poder reconhecer as semelhanças nos processos de comportamento.

68
Precisamos ser capazes de classificar nossas variáveis de tal maneira
a poder reconhecer semelhanças nos seus princípios de operação, a
despeito do fato de suas especificações físicas serem bastante dife­
rentes”.
Permita-me apresentar um exemplo mais pormenorizado desta
abordagem, considerando um problema de comportamento humano
muito comum — a depressão. Se tivesse que descrever uma pessoa
que está deprimida, provavelmente diria, entre outras coisas, que ela
está indiferente, perdeu o apetite, que não se esforça, parece triste,
vai dum lado para outro na casa ou senta e olha fixamente para os
próprios pés, fala em voz baixa e monótona, se é que fala). Todas
estas constituem descrições de comportamentos que podem se agrupar
sob uma classe geral de atividade reduzida e de ausência de resposia.
Suponha que sejamos capazes de determinar se um evento se associa
a esta ausência de resposta generalizada, por exemplo, a perda de
sua noiva. O observador relata que a pessoa recebeu uma carta de
sua noiva, rompendo o noivado, e começou a exibir um comporta­
mento semelhante ao descrito anteriormente. Não queria comer, pres­
tava pouca atenção aos amigos, faltava às aulas, passava grande parte
de seu tempo deitado na cama, olhando fixamente para o teto, geral­
mente parecendo triste. Na terminologia técnica, podemos dizer que
um reforço generalizado foi suprimido e apareceu uma ocasião para
a redução: “Sua noiva rompeu cóm ele e ele está deprimido”.
É manifestamente impossível reproduzir exatamente estas con­
dições no laboratório, isto é, ter um macaco que receba uma carta:
“Querido João. . . ” Mas, podemos programar um estudo no qual pos­
sam ser investigados processos de comportamento e que poderiam ter
alguma relação com o anterior. Comecemos com um modelo de com­
portamento do estudante: S representa o estímulo e P a pessoa, o
estudante. O esquema pode ser esboçado assim:

51 (sua noiva)
5 2 (alimento)

S i (aulas)
Sn (outros estímulos que atuam sobre ele)

69
Sua noiva, Si, foi removida, interrompendo o ritmo de x resposta
a este tipo particular de estimulação. O efeito da extinção (retirada do
reforço positivo ou das conseqüências agradáveis da relação) se es-
tênde a outros estímulos, de modo que o jovem deixa de responder
a S2, S3, S4 e Sn. A amplitude do efeito do condicionamento e extinção
é bemJ conhecida nas pesquisas de aprendizagem. Desta forma, temos
agora o começo de um modelo. Podemos elaborá-lo um pouco mais
e considerar outros aspectos a estudar. Antes do rompimento do com­
promisso, é possível que existissem fatos que indicavam uma pertur­
bação nas relações entre o estudante e a sua noiva. Talvez um dia
ele a tiveisse visto (passeando no parque de mãos dadas, com um ho­
mem. Provavelmente, este seria um evento perturbador, um estímulo
que o advertiu sobre a iminência de eventos desagradáveis. Seu com­
portamento em face de um estímulo de advertência, como o referido,
pode ter-se tornado agitado, preocupado ou mau humorado. A carta
informando-o do término do noivado seguiu-se a este estímulo de
advertência e pode ser considerada como o fato desagradável final que
suscitou a depressão. Desta forma podemos ampliar nosso modelo,
acrescentando um estímulo de advertência no sistema: Sa (para es-
ítmulo de advertência) aparece entre o estudante e Sx (sua noiva).

Sa
H iM if W

Ê>1

Sa

Agora podemos tomar este modelo e ver que processos de com­


portamento podem ser estabelecidos no laboratório para estudá-lo,
criando condições apropriadas ao problema e manipulando essas con­
dições. Conforme mencionei, seria impossível programar um expe­
rimento no qual a noiva de um macaco o abandonasse, mas podemos
programar um experimento no qual o macaco receba um reforço ge-
neralizado forte, talvez mesmo um outro companheiro. O segundo ma­
caco seria associado ao maior número possível de eventos agrada­
velmente reforçadores. Conforme Sidman (50) diz ao comentar este
estudo: “Uma vez que as relações desejadas tenham sido estabelecidas

70
entre os dois macacos, o segundo poderá ser removido, privando o
primeiro da fonte de muitos de seus reforçamentos. Então poderíamos
observar as mudanças subseqüentes no comportamento do animal ex­
perimental. Poderíamos até usar um estímulo de advertência para si­
nalizar o iminente desaparecimento do reforço generalizado e observar
comportamento do nosso macaco em presença deste estímulo.”
Por exemplo, o estímulo de advertência poderia ser uma luz ver­
melha que se acendesse antes do segundo macaco ser removido. Neste
caso, teríamos um macaco deprimido? Não importa qual a denomina­
ção que se empregue. Não importa o nome dado a este processo de
comportamento desde que se possa estabelecer se existe semelhanças
entre a sua ocorrência no homem e no animal, ante a remoção de um
estímulo reforçador forte. O macaco pode recusar alimento ou em­
panturrar-se com bananas, o homem pode recusar alimentos ou em­
bebedar-se. O que nos interessa é o processo de comportamento de
ambos em presença de condições similares.
Em resumo, o ponto crucial do erro analógico é não distinguir
semelhança de analogia. Se alguém que está mendigando na rua apren­
de que, vestindo roupas esfarrapadas, aparentando (ou realmente ten­
do) uma deformação física e apresentando um semblante que cause
piedade, pode obter mais dinheiro, então podemos dizer que seu com­
portamento foi modelado de modo a ele poder obter maior recompensa.
Se um urso num zoológico aprende que ficar em pé sobre as suas
patas traseiras e apresentar-se com as partes dianteiras ligeiramente
dobradas faz com que os visitantes lhe dêem mais guloseimas, pode­
mos dizer que seu comportamento também foi modelado por ser o
mais recompensado. Existe uma semelhança — um padrão particular
de comportamento é bem sucedido e mantido. Podemos dizer que
tanto a pessoa esfarrapada como o urso que fica em pé estão men­
digando, mas isto pode ser interpretado como uma abordagem an­
tropomórfica da mendicância.

71
VI

Considerações Éticas na Pesquisa

Preocupação do público com a pesquisa. — Não há dúvida de que


um dos problemas mais árduos enfrentados pelo pesquisador é o de
obter um máximo de informação sobre os sujeitos usados no estudo
dentro do quadro de referência de ética humana. Os procedimentos
de pesquisa constituíram, freqüentemente, uma fonte de preocupação
e, mesmo, de alarme para as pessoas que não trabalham em ciência.
A imagem que o leigo faz do cientista (questão que será explorada
mais amplamente no capítulo seguinte) usualmente não é precisa. As
idéias errôneas mais comuns sobre a ciência e o cientista são aquelas
relativas aos procedimentos experimentais. Ocasionalmente, os cientis­
tas recebem cartas de pessoas que leram acerca de uma pesquisa
(usualmente em jornais) e que expressam uma grande preocupação
quanto ao procedimento usado. Freqüentemente não são apresentadas
informações suficientes nos relatos feitos nos jornais para permitir
uma compreensão adequada dos propósitos, das técnicas e, em par­
ticular, dos cuidados humanos tomados para evitar a dor e o des­
conforto desnecessários dos animais usados na pesquisa. Um exemplo
desta situação pode ser extraído da experiência de um colega meu que
estava trabalhando em desenvolvimento da visão, um problema crucial
de grande importância para o bem-estar humano e para a ciência.
Uma senhora leu sobre os experimentos que estavam sendo feitos,
nos quais gatinhos foram usados como sujeitos devido à semelhança
entre o desenvolvimento visual que apresentam e o dos seres huma­
nos e à viabilidade de se realizar estudos intensivos das modificações

73
em um animal que alcança sua maturidade rapidamente. Essa senhora,
indiscutivelmente uma sincera amante dos animais, encontrou tempo
para escrever uma carta para a universidade na qual essas pesquisas
estavam sendo realizadas, protestando contra o que ela acreditava
serem práticas de laboratório cruéis e desnecessárias. A carta foi a
seguinte:

Tom ei conhecimento dos experimentos realizados com indefesos gatinhos


e gatos nos laboratórios de sua Universidade, financiados com o dinheiro dos
contribuintes de impostos. Estou certa de que o senhor não tem conhecim en­
tos dos mesmos.
Colocaram lentes de contato nos olhos dos pequenos gatinhos sem aneste­
siá-los, depois as células do nervo visual de seus cérebros foram ligadas a
micro-elétrodos, para compará-las com as de gatos que tinham tido experiências
visuais enquanto cresciam.
Muitas pessoas, algumas das quais fam osas, usam lente de contato com
muito êxito há muito tempo. Realmente, foi uma coisa cruel, um gasto des­
necessário de tempo, dinheiro e trabalho.
Indubitavelmente muitos outros experimentos cm éis estão sendo feitos em
sua Universidade, uma nódoa negra no seu bom nome. Qual é o efeito disto
sobre o caráter dos experimentadores?

O relato do jornal foi escrito com alto grau de precisão e, na


luralmente, tinha um certo valor de interesse humano e algum humor
ao descrever um cientista polindo lentes de contato para gatinhos. O
que não estava claramente exposto no artigo era o objetivo geral dos
experimentos. A carta que foi escrita à senhora, em resposta, tentou
fornecer-lhe as necessárias idéias básicas e informações:

Apreciamos sinceramente sua preocupação com os animais usados na pes­


quisa, e desejamos assegurar-lhe que, sob nenhuma circunstância, os animais so­
frem qualquer dor. Os micro-elétrodos sobre os quais a senhora leu são usados
para estudar as células nervosas e não diferem muito dos estudos eletroencefa-
lográficos, feitos em seres humanos nos hospitais, para detectar a presença de
tumores cerebrais ou da epilepsia. O objetivo das lentes de contato, que não
chegam a oferecer qualquer desconforto para os gatinhos, não é verificar se
dão bom resultado ou não — certamente, com o a senhora mesmo indicou,
elas têm se mostrado úteis há muito tempo. O objetivo de usar lentes de
contato é meramente o de controlar os sinais visuais recebidos por um animal-
zinho em desenvolvimento, de m odo a obter informações realmente muito ne­
cessárias acerca do desenvolvimento da visão. Ainda uma vez gostaria de dizer
que estes gatos não sofreram desconforto e, certamente, nem dor motivada pelo

74
uso das lentes de contato, que foram polidas com grande precisão pelo pes­
quisador muito capaz e responsável pelo projeto.
Este tipo de experimento não é cruel e certamente não é inútil. Conhece­
mos muito pouco sobre o desenvolvimento da visão, e os tipos de experimento
que o D t .-------------- e outros estão realizando nos podem fornecer informações
extremamente úteis sobre a vista, e esperam fornecer informações que auxilia­
riam a corrigir defeitos visuais e talvez m esm o evitar sérios defeitos, tais com o
a cegueira em crianças. N ão se pode usar seres humanos nestes experimentos
porque, em grande parte, o desenvolvimento da criança é muito mais lento
do que o dos gatinhos. Os gatinhos, com o a senhora sabe, em cerca de um
ano se desenvolvem, tornando-se adultos; além disso, as mudanças na sua
acuidade visual e as diferentes espécies de percepção ocorrem de uma ma­
neira semelhante à do hom em , embora num ritmo muito m ais rápido, e eles
são mais sucetíveis a um estudo cuidadoso.

É importante para o leigo estar suficientemente preocupado com


o bem-estar dos animais e seres humanos envolvidos em pesquisa e
elevar suas vozes para criticar (ou para apoiar); é também importante
para eles ter suficientes informações que os capacite a fazer perguntas
sensatas. Nisto, a disposição do cientista de se comunicar e de coo­
perar com o pessoal do meio de comunicação de massa e com os
cientistas, conforme veremos no capítulo seguinte, é uma parte essen­
cial da comunicação ide informações relevantes e apropriadas.

Considerações éticas na pesquisa com animais. Em muitas áreas


cruciais da ciência a pesquisa somente se tornou possível com janimais.
Estima-se que haja 30.000.000 de diabéticos no mundo hoje vivendo
e tendo uma esperança de cura eventual,, em grande parte devido aos
trabalhos originais realizados por Banting em cães. O cientista segue
um código de ética rígido quanto ao tratamento dos animais experi­
mentais, como, por exemplo, o que foi estabelecido pela National
Society for Medicai Research. Este grupo inclui representantes de
renomadas sociedades tais como a American Psychological Association,
a American Medicai Association, a Federation of American Society
for Experimental Biology e a American Society for the Prevention
of Cruelty to Animais (ASPCA). Eis seis regras estabelecidas, em
1962, pela comissão de Precaution and Standards in Animal Expe-
rimentation, da American Psychological Association:

75
1. Todos os animais usados para fins experimentais devem ser adquiridos
legalmente e sua retenção deve estar estritamente de acordo com as
leis e regulamentos federais e locais.

2. O cuidado da alimentação de todos os animais experimentais deve


estar de acordo com as práticas de laboratório aceitas, com a devida
consideração do seu bem-estar físico, de um tratamento bondoso, em
um ambiente sanitariamente adequado.

3. D eve-se fazer todo esforço para evitar desconforto desnecessário aos


animais de experimento. Pesquisas que submetem animais a descon­
forto somente devem ser feitas quando um cientista experimentado es­
tiver convencido de que este desconforto é exigido e é justificado pelo
significado da pesquisa.

4. Os procedimentos cirúrgicos devem ser feitos sob adequada anestesia,


e sob anestesia local. Quando a natureza de um estudo requer que o
animal sobreviva, devem ser seguidas, rigorosamente, técnicas para evi­
tar infecção. Quando o estudo não exige a sobrevivência do animal,
deve-se dispor do mesmo de uma maneira humana, após a conclusão da
operação.

5. O cuidado post-operatório do animal deve reduzir o seu desconforto


durante a convalescência, de acordo com práticas aceitas.

6. Quando os animais são usados por estudantes para sua educação e


seu estudo de ciência, este trabalho deve ser feito sob a direta su­
pervisão de um professor ou pesquisador experiente. A s regras para
realizar este trabalho deverão ser as mesmas usadas para realizar a
pesquisa.

U m a cópia destas regras deve ser colocada em todas as salas em que os


animais vivam ou nas quais se realizam os experimentos.

Os que violarem as regras acima deverão ser prontamente denunciados ao


diretor do laboratório, o qual levará o fato ao conhecim ento das autoridades
administrativas se julgar necessário.

Podemos concluir que, do ponto de vista ético, a consideração


mais importante ao realizar pesquisa com animais é o uso de proce­
dimentos padronizados e aceitáveis.

Considerações éticas na pesquisa com seres humanos. Quando os


sujeitos são seres humanos, ampliam-se não só os problemas de proce­
dimentos éticos padronizados de pesquisa como os examinados quando
se usa animais, mas surgem considerações especiais ainda mais rele­
vantes. Esforçamo-nos para que os experimentos sejam reais e con-

76
trolados, e isto está diretamente envolvido no planejamento e execução
ética da pesquisa. Há 'alguns anos atrás, um grupo bem treinado de
psicólogos das forças armadas foi censurado por fazer pesquisas
sobre tensão em condições de combate simulado. Um de seus expe­
rimentos foi realizado aproximadamente da esguinte forma: um
recruta era conduzido a uma área de “combate” e deixado ;numa ca­
verna com instruções para permanecer nela enquanto ocorres­
sem explosões. Na caverna ele estaria protegido de qualquer perigo
resultante da explosão. Ele foi equipado com um rádio que
poderia receber mas não transmitir. Algum tempo depois, ocorria
uma explosão; através do rádio, foi informado de que a explosão
havia obstruído a entrada da caverna mas que ele não de­
veria preocupar-se. Todos os esforços estavam sendo feitos para
tirá-lo de lá. Foi informado, nesse momento, que, se desejasse arran­
jar o rádio de modo a poder transmitir e pão só receber, deveria
seguir as seguintes instruções. Recebia então instruções radiofônicas
aproximadamente assim: “pegue aquele cabo azul que sai do terminal
marcado com um C e ligue-o ao terminal vermelho. . . ” e assim por
diante, instruções explícitas para que o rádio pudesse se transformar
num transmissor.

Este é um excelente teste da habilidade para desempenhar uma


tarefa regularmente complicada, sobre tensão. Dizer-lhe que estava em
perigo (um estímulo de tensão) e em seguida dar-lhe uma tarefa para
desempenhar, como a da instalação do rádio, é uma idéia engenhosa —
o experimentador podia registrar objetivamente o momento em que
transmitiu o estímulo de tensão e medir, com precisão, o tempo que
passou entre o radiografar da tensão e o instante em que o sujeito
inicia sua transmissão própria. Trata-se realmente de um estudo enge­
nhoso e realista de tensão. Tinha também variáveis cuidadosamente
controladas, e por isso satisfez os requisitos de um problema realista
e cuidadoso controle de variáveis, ilustra o caso de um planejamento
representativo excelente para um experimento. Infelizmente, é tam­
bém altamente discutível do ponto de vista ético. Os experimentadores
deixaram de levar em consideração a necessidade de obter o consen­
timento do sujeito para participar de semelhante experimento. Embora

77
se tratasse de um bom procedimento, os riscos que envolvia para a
saúde do sujeito tornou-o duvidoso do ponto de vista de um procedi­
mento aceitável. Inerente a isto existe o problema da irreversibilidade
do dano. Não sabemos o suficiente sobre os efeitos da tensão em um
ser humano para dizer que semelhante experimento não produziria
mudanças fisiológicas que poderiam ser permanentes e nocivas, mesmo
sem considerar o elemento do risco de fatalidade que pode ser um
resultado de severa tensão.
Esta técnica de colocar uma pessoa em situação que ela acredit;
ser de perigo mortal é, evidentemente, mais eficaz do que perguntar
lhe como se comportaria em tais circunstâncias ou dizer-lhe para dm
matizar tal situação. A simulação da tensão é sempre um problema
Por exemplo, se um estudo fosse feito em submarinos para testar
o efeito de viver em ambientes limitados, sob condições difíceis, poi
longo tempo, o estudo não seria válido se o submarino estivesse sub
merso mas preso a um mole, e os marinheiros estudados soubessem
que, em uma emergência, poderiam voltar à superfície e obter auxílio
O conceito de planejamento representativo aqui é apropriado. Brum
wik (20) sugeriu termo para descrever o ótimo em planejamento e\
perimental, um mínimo de artificialismo e um máximo de controK
das variáveis, isto é, o problema estudado deveria ter realidade e a*
variáveis deveriam ser cuidadosamente controladas. Nesta situação
de tensão, a questão de planejamento representativo, é importante al
cançar uma realidade honesta arriscando vidas, ou produzindo grav
perturbação no comportamento (como no caso da caverna), ou sacri
ficar a realidade e usar uma técnica menos perigosa?
Encontramos uma resposta num artigo de Berg (14) em que o
autor apresenta três elementos básicos de ética na pesquisa com se­
res humanos.

Consentimento, confidência e procedimento aceitável ou padrão.


Em primeiro lugar é sempre necessário obter o consentimento do su­
jeito para o experimento. “Quando a informação solicitada é al­
tamente pessoal ou quando o experimento envolve alguma dor, des­
conforto ou risco, o sujeito deve ser plenamente informado do que ele

78
está consentindo, pelo menos em linhas gerais” . No caso de pacientes
em hospitais psiquiátricos nem sempre é possível ou significativo obter
o consentimento de um paciente mental porque ele é legalmente in­
capaz de dar esse consentimento. Nestes casos, é possível obter o
consentimento do médico do paciente, de sua família ou de alguma
pessoa responsável pelo seu bem-estar, antes de atuar como sujeito num .

projeto de pesquisa. Com respeito ao uso de registros, tais como os
registros de casos de hospital, freqüentemente não é possível obter
o consentimento do paciente ou do médico. O uso destes registros
em pesquisas (ou, talvez em um livro de texto) é ético. . “se as
pessoas envolvidas não são prejudicadas pelo uso de seus registros ou
se suas identidades não são reveladas publicamente. .
Isto se relaciona diretamente com o segundo aspecto ético na
utilização de seres humanos como sujeitos: a confidência. Nenhum
sujeito gostaria que outros soubessem de seu desempenho em certas
tarefas ou, no caso de questionário sobre crenças pessoais, quais fo­
ram as suas respostas. Se ele sente que pode confiar no experimen­
tador, que não revelará nada sobre ele, pode funcionar mais efetiva­
mente como sujeito. O psicólogo está obrigado a respeitar o princípio
da confidência em seu trabalho. Se ele deseja usar os resultados de
um estudo particular e publicá-los, deve assegurar-se de que nenhum
de seus sujeitos será identificado. Os dois primeiros princípios, con­
sentimento e confidência, são ilustrados no conhecidíssimo relatório de
Kinsey sobre comportamento sexual. Kinsey usou voluntários no seu
estudo sobre práticas sexuais — cada sujeito sabia de antemão exa­
tamente o tipo de perguntas que teria de responder e tinha a oportu­
nidade para se apresentar ou não como voluntário. Além disso, os
relatos foram cuidadosamente preparados de forma a não ser possí­
vel identificar os que tivessem participado no estudo. Manter a con­
fidência dos dados de pesquisa que envolve sujeitos humanos é da
maior relevância para que haja uma relação de confiança entre o
público e o cientista.
V

O terceiro princípio básico que disciplina o uso de sujeitos hu­


manos na pesquisa, segundo Berg, é o referente ao uso de procedi­
mentos padronizados ou aceitáveis. Este princípio supõe que o ex-

79
perimentador seja treinado e competente para usar, na pesquisa, pro­
cedimentos que seus colegas aceitam como padrão, isto é, “que tenham
sido testados muitas vezes pór muitos investigadores”. Isto, porém,
apresenta um problema especial, porque, obviamente, a pesquisa não
pode empregar os mesmos procedimentos, repetidas vezes, em todos
os casos, se se deseja que ela mostre alguma originalidade. No caso
de procedimentos novos ou originais não padronizados, eles devem ser
considerados como aceitáveis por outros pesquisadores competentes.
Às vezes se torna necessário ocultar aos sujeitos o verdadeiro
objetivo do experimento. Isto é sempre uma fonte de preocupação
para o experimentador. Por exemplo, em um experimento bem plane­
jado, relatado por Hefferline e colaboradores (32), os investigadores
desejavam ver se podiam condicionar um sujeito e emitir uma resposta
de contração muscular mínima que o sujeito não percebia tê-la pro­
duzido. Para registrar essa diminuta contração do polegar, colocaram
um elétrodo e o ligaram a um eletromiógrafo que registra, eletrica­
mente, e amplia a atividade muscular. Durante o experimento os su­
jeitos ouviam música, à qual se superpunha um ruído. Podiam in­
terromper o ruído por uma contração muscular “inconsciente”. Os su­
jeitos foram condicionados a esta contração muscular que não per­
cebiam, mas que conseguia fazer parar o ruído desagradável que in­
terferia com seu prazer de ouvir música. Quando se disse aos sujeitos,
em uma outra fase do experimento, para contrair um músculo de seu
polegar e interromper o ruído, foram incapazes de produzir uma res­
posta exigida suficientemente pequena.
Se os sujeitos tivessem sido originalmente informados do propósito
do experimento, teria sido impossível verificar se poderiam ser con­
dicionados a emitir uma resposta de esquiva inconsciente. O conheci­
mento do propósito te-los-ia tomado conscientes e, como vemos, eles
foram incapazes de manter a resposta suficientemente diminuta quan­
do o tentaram conscientemente. Este é um procedimento novo e, num
certo sentido, os sujeitos foram enganados, pelo experimentador, em
suas instruções. Consentiram em um experimento sem conhecer as
suas exatas condições, mas esta não é, de forma alguma, uma prática
não-ética. Os experimentadores obtiveram um consentimento geral dos

80
sujeitos para participar, não violaram sua vida privada, não os subme­
teram ao desconforto, mantiveram a confidência (embora este tipo de
experimento não envolvesse respostas altamente pessoais) e, o mais
importante em vista da natureza original da técnica, se restringiram a
um procedimento que seria considerado altamente aceitável por todos
os psicólogos componentes.
Uma última consideração sobre os procedimentos padronizados e
aceitáveis. O psicólogo que dirige a pesquisa é obrigado a assegurar-se
completamente de que todas as precauções foram tomadas em todos
os seus procedimentos. Se está usando um aparelho elétrico, é vital
que se assegure de que todos os cabos estejam adequadamente isolados,
que o equipamento esteja adequadamente instalado, e assim por dian­
te. Se o experimento exige esforço físico ou tensão, é vital que obtenha,
de um médico, um atestado da saúde física do sujeito. As precauções
normais e a cortesia evitarão a maioria dos possíveis problemas que
poderiam surgir no uso de sujeitos humanos em pesquisa.
Os problemas até agora discutidos em relação à pesquisa com
seres humanos tornam-se mais críticos quando a pesquisa é feita uti­
lizando-se crianças como sujeitos experimentais. Aqui aplicam-se os
mesmos princípios, mas é evidente que os adultos estão em melhor
posição para compreender os propósitos da pesquisa e as tarefas
envolvidas. Certamente, um adulto estaria em uma posição de dar seu
consentimento a um procedimento experimental, enquanto que o mes­
mo não ocorre com a criança. Portanto, o experimentador deveria
conseguir antes o consentimento dos pais da criança, ou de algum
adulto responsável por ela, antes de começar um experimento. Baldwin
(6) discute estes problemas amplamente em um manual sobre pesquisa
com crianças. Destaca a necessidade de explicação dos objetivos e pla­
nos da pesquisa aos pais da criança e de responder, com honestidade,
a quaisquer questões por eles formuladas. O experimentador não pode
permitir-se o luxo de considerar que os temores dos pais são infun­
dados, mesmo quando sabe que nada potencialmente prejudicial poderá
ocorrer durante a pesquisa. Ao realizar a pesquisa, o experimentador
p

também deve evitar a desnecessária interrupção das horas de aula e


de brinquedo das crianças. A conveniência dos sujeitos deve merecer

81
maior consideração do que a melhor conveniência do esquema do ex­
perimentador.
O aspecto confidencial do material obtido na pesquisa com crian­
ças é tão importante quanto o é com sujeitos adultos, talvez até mais,
porque danos incalculáveis podem ser causados a uma criança por um
experimentador bem intencionado, que forneça aos pais informações
sobre seus filhos, não estando eles aptos a compreende-los ou usá-los
objetivamente. Isto é particularmente verdadeiro quando a pesquisa é
conduzida por experimentadores inexperientes, ou quando o material
usado é constituído por testes psicológicos que são usados tanto em
pesquisas com crianças como com adultos. Este uso ou abuso dos testes
psicológicos também ocorre nas clínicas ou em situações escolares,
independente de pesquisa, e é descrito por S to n e (ó l): “ . . . Parece
haver um reconhecimento geral da grande flutuação e do pouco valor
de previsão dos testes individuais pré-escolares. Ainda mais, é tão geral
o reconhecimento da duvidosa precisão de previsão de um teste indi­
vidual, mesmo para crianças de mais idade, que hoje em dia é muito
menos freqüente encontrar psicólogos que comunicam aos pais o QI
de seu filho, para que o usem como símbolo de honra ou de vergonha.
Contudo, ainda existe um número de psicometristas menos cuidadosos
e de aplicadores de testes escolares (freqüentemente não-psicólogos)
que comunicam este tipo de dado não-qualificado com demasiada li­
berdade e, desta forma, freqüentemente produzem danos incalculáveis
à imagem que a criança faz de si mesma ou na apreciação que dela
íazem seus pais”. Isto também pode se aplicar aos resultados obtidos
nas situações de pesquisa em que não se usam testes.
Os problemas éticos da pesquisa, tanto com adultos como com
crianças, se resumem nas práticas de interação entre pessoas humanas
e outras ponderadas simples. Catherine Landreth, em uma carta di­
rigida à revista American Psychologist, publicada em setembro de
1961, invocou a imagem de Ana em The King and I (Ana e o Rei de
Sião), dizendo que compreender crianças e realizar pesquisa com
elas é, “em grande parte, questão de: chegar a conhecê-las, chegar
a querê-las, estando com elas conseguir saber o que dizer, ver à ma­
neira delas, tanto quanto mostrar-lhes a sua maneira de ver, porém
carinhosamente.”

82
VII

O Cientista e a Ordem Social

Nas revistas sensacionalistas e nas novelas de segunda categoria,


o cientista é, às vezes, descrito como um louco desgrenhado, diabólico,
cruel, que está pronto a cair sobre a presa e cujo objetivo na vida é
controlar o mundo. A própria expressão “cientista louco” evoca ima­
gem como a de um laboratório no cume de uma montanha, com luzes
ofuscando, dispositivos elétricos mágicos, e talvez algumas pessoas
gritando em grandes redomas de vidro esperando para serem submeti­
das a algum experimento terrificante. Ou, talvez, no outro extremo do
espectro, a imagem de um cientista distraído que esquece seu guarda-
chuva, que passa a vida a derrubar ácido em sua roupa (cheia de
nódoas), não diabólico, mas também pouco eficiente.
Estes dois retratos são rematados absurdos. Mas, em relação ao
psicólogo, em particular, nos últimos anos, em alguns ambientes, chega
a ser considerado como um manipulador profundo, um manipulador
de mentes humanas. No seu livro The Hidden Persuaders, Packard
tentou retratar alguns psicólogos como invasores da intimidade de
nossas mentes. Adicione-se a isto o conceito lavagem cerebral, e uma
pessoa está preparada a pensar que é possível controlar sua mento
sem que ela seja capaz de resistir eficazmente. Acrescente-se a isto
o preparo que o público recebeu em outros casos correlatos, como
no de Bridey Murphy, e a impressão é reforçada. Em outro traba­
lho (4) comentei o seguinte:

Packard deixou-nos com um termo tão dramático e deprimente com o lava-

83
gem cerebral — referiu-se aos que pesquisam m otivação com o ‘'manipuladores
profundos”, um termo elaborado para cair em solo fértil, preparado para o pú­
blico pela “manipulação profunda” do inconsciente mágico, demonstrado no
livro Three faces of Eve (A s três faces de E va ) ou pelo contrário hipnótico
difundido pela obra Search for Bridey M urphy. Cçrtamente, o psicólogo adota
uma atitude crítica diante destes acontecimentos. Pode oferecer explicações al­
ternativas para a “personalidade múltipla” de Eva e indicar as falsidades na
misteriosa “reencarnação” de Bridey Murphy. Mas, mesmo depois de escla­
recidas estas coisas, na mente do público persiste o saliente pensamento de que
a pessoa tem um inconsciente desconhecido até para si mesma, de que ela não
tem controle consciente (idéia esta reforçada no livro A s Três faces de Eva,
onde as “personalidades lutam entre si para obter o controle” ), e que uma
•outra pessoa, por meio de lavagem cerebral ou por hipnose, pode controlá-la.

Estes são problemas mencionados sob a rubrica da imagem que


o público tem do psicólogo o que as pessoas pensam dele e de seu
trabalho. Embora longe de estarem fortemente arraigadas, as crenças
sobre as qualidades do cientista louco ou do manipulador profundo
atribuídas ao psicólogo não lhe fazem justiça e constituem um des­
serviço para a ciência em geral.

A comunicação do cientista com o público. A necessidade de definições


operacionais em ciência (Capítulos 3 e 4) produz problemas especiais
na comunicação do trabalho do cientista a audiências não-científicas.
Deve-se alcançar um terreno comum entre a linguagem técnica da ciên­
cia e a linguagem não-técnica da vida cotidiana. Contudo, esta con­
versão deve ser realizada de forma a não falsear as afirmações técnicas.
É uma tarefa difícil e daí resultar, freqüentemente, que muitas re­
vistas simplesmente não se preocupam em assegurar uma completa
eqüivalência do significado.
Fale com qualquer cientista e você, provavelmente, encontrará um
homem que foi cauterizado pela popularização. Em nossa cultura, os
jornais não se destinam a difundir a informação científica. Eles cons­
tituem primariamente uma fonte de entretenimento e de notícias. Ge­
ralmente, a informação científica aparece (exceto em jornais como o
The New York Times) na sessão de rotogravura do jornal de domingo,
manifestamente, não como uma sessão de notícias mas sim como um
suplemento de entretenimento. As fontes de notícia popular tendem a
dar ao leitor uma cápsula de educação em ciência, que, freqüentemente,

84
constitui um relato ilusoriamente simples da teoria da relaticidade ou
da pesquisa médica. Por exemplo, as explicações popularizadas do efei­
to de drogas que produzem estados semelhantes ao psicótico, relatos
que dizem mais ou menos o seguinte: “A Nova Alma de Cary Grant
Através da Milagrosa Droga Mental o Ácido Lisérgico”.
Desta forma, ao lado da história de uma estrela do cinema ita­
liano, talvez o relato do desaparecimento do juiz Crater, de receitas
para o dia de Graças, e das piadas favoritas de um cômico da TV,
aparece alguma coisa sobre ciência, usualmente envolta em uma mística
peculiar e esta popularização com chavões como “milagre”, “espanto­
so” e “maravilhoso” apresentando a “nova” conquista da ciência. O
pesquisador, cujo trabalho preliminar sobre um dispositivo protético
para amputados aparece relatado numa revista popular sob o título
“Ciência traz novas esperanças para o amputado”, no qual as vanta­
gens de uma nova mão artificial “milagrosa” são lançadas em cores,
não é adequadamente apresentado.

Com um amigo meu ocorreu exatamente isto. Uma revista sema­


nal de grande circulação ouviu falar sobre o trabalho que conduzia
em seu laboratório sobre esta nova mão artificial, e pediu seu consen­
timento para divulgar o fato. Ele entendeu que seria um relato de
natureza preliminar sobre o trabalho experimental que estava reali­
zando para investigar e desenvolver um dispositivo protético. Ao invés
disto, a investigação foi exposta como um fait accompli, um milagre
forjado no laboratório. Uma conseqüência trágica desta divulgação
irresponsável de história foi um dilúvio de telefonemas para o labora­
tório e para a clínica na qual o dispositivo estava sendo desenvolvido.
Veteranos amputados, irados e desenganados que haviam sido trata­
dos na clínica, queriam saber porque lhes tinham ocultado esse mila­
gre. Foi uma tarefa difícil explicar que o aparelho estava ainda nos
primeiros estágios de pesquisa. É este tipo de experiência que faz com
que, tão freqüentemente, os pesquisadores se mostrem temerosos ao
comunicar informaçõs ao público.
A percepção do cientista pelo público é freqüentemente distor­
cido de tal modo que é impossível para um cientista não se afetar, de

85
algum modo, pelo impacto social de sua pesquisa. Como fiz notar
num outro trabalho ( 4 A ) :
. . . o cientista tem sido considerado com o algo semelhante a um servo de
Deus, a que se oferece homenagem, mas do qual se espera que produza os
milagres que forem pedidos. E, com o acontece com todos os deuses ineficientes,
o simulador cientista é, freqüentemente, vilipendiado e repudiado pelo seu povo,
fato este que pode tom ar o cientista cada vez menos interessado em deixar
seu laboratório e assumir sua responsabilidade social. É inevitável que uma
descoberta científica, em última análise, se expresse numa mudança social e é
também inevitável que o cientista deva eventualmente perceber seu trabalho
dentro de um contexto social.

Nos últimos anos, tem aumentado acentuadamente o financiamen­


to disponível para a pesquisa científica, particularmente com o aumen­
to de fundos destinados para esse fim, tanto pelo governo federal como
por fundações particulares. Com este aumento de meios, contudo, há
uma curiosa convicção mantida por muitas pessoas de que o dinheiro
é a resposta para as indagações científicas. Isto pode relacionar-se com
o que anteriormente denominei de qualidade simuladora do cientista —
como um mágico ele deveria ser capaz de realizar milagres desde que
tenha suficiente dinheiro. A cura do câncer é um dos problemas ver­
dadeiramente difíceis de nossa época e a procura de uma solução
para esta doença exige dinheiro para aparelhos, laboratórios e pessoal
para realizar a pesquisa. Mas, nem dinheiro e nem a habilidade de
cientistas dedicados é suficiente, ainda que ambos sejam necessários.
Pois, além do dinheiro e da pesquisa dedicada em qualquer área, cada
ciência depende de outros cientistas para a obtenção de novas infor­
mações — por exemplo, o microscópio eletrônico abriu novas fontes
de informação para a neurologia, o computador eletrônico tornou mais
fácil do que nunca o processamento de dados. O avanço em uma ciên­
cia pode causar progresso em outras, mas isto é, na melhor das hi­
póteses, um desenvolvimento irregular. A procura de uma cura para
o câncer pode vir inesperadamente de um laboratório em que se está
investigando problemas de desordens em vírus, ou de outros cientis­
tas cujos esforços não estejam imediatamente orientados para esta
área especial da pesquisa. É necessário integrar vários fatores antes
que uma “conquista” se torne possível. Seling Hecht discute isto em
relação ao desenvolvimento da bomba atômica (31 A ):

86
Deveríamos saber que todo o dinheiro do mundo não poderia ter construído
uma bomba atômica em 1936. Conhecia-se a energia atômica e se compreendia
muitas de suas propriedades. N os laboratórios ela tinha sido liberada em pe­
quenas quantidades e se havia estudado sua liberação em grandes quantidades
no sol e nas estrelas. Mas a informação e a direção básicas para liberá-la em
grandes quantidades na terra não existiam em 1936, e ninguém poderia usar
dois bilhões de dólares para fazer, naquela época, uma bomba atômica. É
isto que é importante para compreender as relações da ciência com a indústria,
com a medicina e com o público. Era preciso conhecê-la antes de aplicá-la.
Em um dado estágio do desenvolvimento científico, o conhecimento teórico
crítico passa a existir. Antes desse momento — que ninguém pode prever —
o conhecimento não pode ser aplicado. Após esse momento a aplicação é ra-
roavelmente certa e somente precisam ser elaboradas as técnicas especiais para
sua utilização.

Descrevi o lado negativo da comunicação aos leigos somente para


explicar porque muitos cientistas relutam ao apresentar informações
de pesquisa para o consumo popular. Felizmente, há um outro lado
da história representado por divulgadores da ciência, por jornais e
revistas altamente responsáveis. Estas pessoas e os meios de comuni­
cação representam o que os franceses denominaram de haute vulgari-
sation (literalmente, vulgarização de alto nível). Tentam apresentar a
informação científica de uma fcrma compreensível ao público inteli­
gente e tão compreensivelmente quanto possível sem alterar a infor­
mação. Revistas como a Scieníific American se dedicam a esse fim
com êxito. Muitos excelentes divulgadores da ciência existem que ten­
tam equilibrar a precisão com a apresentação interessante. Entre estes
autores se distinguem, por exemplo, John Pfeiffer, Michael Amrine,
Emma Harrisson e Earl Ubell.
Sem dúvida, o cientista tem a responsabilidade de comunicar sua
pesquisa, primeiro aos seus colegas, e depois ao público. Ernest Renan,
em 1848, escreveu: “O rá6/o-especialista, longe de abandonar a ver­
dadeira arena da humanidade, é um dos que trabalham mais eficaz­
mente para o progresso do intelecto, pois vê que somente pode propor-
cionar-nos os materiais para essa construção. Mas suas pesquisas não
podem ser um fim em si mesmas, pois, elas não contribuem para
tornar o seu autor mais perfeito, elas não têm qualquer valor até que
sejam introduzidas na grande corrente”. Jean Rostand fez eco a estas
palavras, em 1960, ao observar que “o ideal da popularização da ciên­

87
cia (e nisto reside seu valor moral) é desenvolver e assistir a comu­
nidade de pensamento”.

A comunicação do cientista com outros cientistas. A necessidade de


comunicação entre os cientistas é, talvez, até de maior importância do
que a comunicação de informações científicas ao público. Em toda a
extensão deste livro foram feitas referências à maneira pela qual gran­
de parte da comunicação científica é feita através dos jornais, livros
e trabalhos apresentados nas reuniões científicas, e nos contatos sociais
informais. Existem revistas que, em grande parte, se limitam à matéria
específica da ciência, tais como: o Journal of the Experimental Ana-
lysis of Behavior, o Journal of Comparative and Physiological Psy-
chology e o American Psychologiüt, no campo da psicologia; o N u­
clear Physics, o Journal of the Optical Society of America e o Journal
of Biochemistry, apenas para dar alguns exemplos de outras discipli­
nas científicas. Os cientistas tendem a publicar em revistas de sua
própria disciplina ou em revistas cujos leitores têm interesses simila­
res. Por exemplo, um psicólogo que trabalha na área da pesquisa sobre
visão pode muito bem publicar seu trabalho no Journal of Optical So­
ciety of America, ou, talvez, um bioquímico envolvido em pesquisa
sobre a química do cérebro pode apresentar seus artigos à revista
Experimental Neurology. Além disso, diversas revistas existem que al­
cançam um público mais generalizado tais como a Scientific American,
na qual cientistas de várias disciplinas podem escrever uns para os
outros de forma compreensível também para as pessoas que não são
cientistas. Outra revista semanal, Science, publicada pela American
Association for the Advancement of Science, (Sociedade Norte Ameri­
cana para o Desenvolvimento da Ciência), publica pesquisas de todas
as ciências. Hoje mais do que nunca, existe uma imensa quantidade
de literatura disponível sobre ciência. Isto por si mesmo cria'um pro­
blema significante para o cientista que não pode facilmente estar a
par do vasto material que aparece em revistas especializadas. Nos
últimos anos, esse problema, considerado como um exercício em arma­
zenamento e recuperação de dados, por meio de computadores eletrô­
nicos, para a leitura cotidiana do cientista médio, tornou-se um com­
promisso necessário com o ideal de ler tudo. Seleciona talvez algumas

88
revistas para ler regularmente, examina criticamente os resumos da li­
teratura publicada e passa a depender, em certo grau, de seus colegas
para mencionar artigos que ele tenha deixado de ver.
O que acontece com a pesquisa quando publicada? É provável,
por um lado, que as pessoas que têm interesse especial na área abran­
gida pela pesquisa avaliem o relatório em termos de sua própria ex­
periência, particularmente se ele se desvia significantemente de outros
resultados. Provavelmente os leitores examinarão os dados e o plane­
jamento da pesquisa com olho altamente crítico para ver se qualquer
falha neles pode contradizer os resultados. Como vimos na discussão
do ponto de vista operacional em pesquisa (págs. 55 ss), é importante
que o experimentador especifique claramente o que ele fez, de modo
que um outro experimentador possa, se o desejar, replicar o seu ex­
perimento.
À medida que cresce o corpo de literatura em uma área parti­
cular, o interesse dos pesquisadores é estimulado e diferentes aspectos
da área são submetidos a estudos mais intensivos. À medida que um
corpo de informações é desenvolvido e surge evidência a favor ou
contra um certo conceito ou teoria, os pesquisadores tornam-se mais
convencidos de que um ponto de vista é melhor do que outro, ou de
que certos conjuntos de fatos indicam que a Condição A é que pre­
valece e não as Condições B ou C. Embora idealmente este processo
ocorra com completa imparcialidade, com a integridade e a raciona­
lidade tão apreciadas com marcos da pesquisa científica, desenvolve-se,
às vezes, uma tendência humana para desejar estar certo, apesar das
evidências em contrário. Quando isto ocorre, a resistência dos cientis­
tas à comunicação dos outros não pode deixar de afetar a dissimina-
ção e a aplicação da informação. Já (pág. 21) nos referimos à “orto­
doxia da teimosia em ciência” para descrever a tendência dos cientis­
tas a resistir à informação nova e diferente, ao mesmo tempo indi­
cando que esta resistência era necessária no interesse do tempo, pois
não se pode esperar que cientistas qualificados disponham de tempo
para refutar cada teoria, descabida ou não, que apareça. Conforme
sugeri anteriormente, compete ao inovador comprovar sua afirmação
enquanto à comunidade científica cabe a responsabilidade de ouvi-lo.

89
Desta forma a comunidade científica estabelecida deve ter mente tão
aberta quanto o autor ou inovador reputável. A reputação dos expe­
rimentadores é de importância primordial na avaliação dos dados,
pois, como Sidman (5ÒA) ressalta:

. . . os dados experimentais não são independentes do experimentador.


Seus experimentos passados e presentes não são independentes um do outro.
O experimentador constitui um fio de correlações que passa por todos eles,
uma correlação que não surge da presença física ou do nome do experimen­
tador, mas de suas técnicas de controle experimental.

Dada a integridade do cientista e a necessidade de alguma re­


sistência em termos de interesse do tempo, por que há ocasiões em
que os cientistas resistem ao desafio dos dados? Barber (6A ), em um
artigo sobre a história da resistência científica à descoberta, distingue
diversos tipos de resistência cultural. Um deles é o das concepções e
teorias substantivas pré-concebidas, que, freqüentemente, retarda as
descobertas. Mesmo no caso dos cientistas mais laboriosos esta forma
de resistência pode ocorrer conforme vimos no “Caso das Orelhas
caídas de Coelhos”, discutido no Capítulo I.

Crenças religiosas podem também desempenhar um papel. Sem­


pre que se pensa sobre conflitos entre a crença religiosa e a científica
é usual destacar a posição do leigo religioso ou do teólogo que se
opõe à idéia contrária a um sistema religioso; porém, também é possí­
vel para um cientista profundamente religioso se opor a teorias ou
dados que podem contradizer suas próprias crenças. Poder-se-ia espe­
rar, por exemplo, de um cientista da época vitoriana, devotado re­
ligioso, uma oposição a uma teoria como a de Darwin, que desafia
suas crenças em relação às origens do homem.
Barber enumera ainda outra fonte de resistência possível, encon­
trada na interação social dos cientistas; quando observa (6B ):

Em geral, o mais alto nível profissional é alcançado em çiência pelos mais


competentes, aqueles que demonstram sua capacidade, criando ou julgando as
descobertas dos outros. Mas, às vezes, quando as descobertas são feitas por
cientistas de categoria mais inferior, encontram resistências dos cientistas de
nível mais elevado devido em parte à autoridade que a posição mais elevada lhes
confere.

90
Por muitos anos, o monge Mcndel foi ignorado, devido ao fato
de não ter status profissional; as sociedades científicas de então não
estavam interessadas nessas idéias excêntricas, não-científicas, sobre
genética
A maior parte dos exemplos de resistência à descoberta científica
ocorreram no século XIX ou antes. Por exemplo, Barber refere-se às
dificuldades encontradas por Faraday, Galton, Lavoisier e Copérnico,
entre outros, mas estes foram centistais que desafiaram idéias estabe­
lecidas em uma época em que a comunicação era bastante limitada.

A resistência pode ocorrer e, certamente, ocorre hoje, mas acre­


dito que seja muito menos provável devido à própria natureza da
ciência, que se transformou de um empenho limitado e aristocrático —
algo como um passatempo de cavalheiro — para se constituir num
sistema verdadeiramente democrático no qual as oportunidades para
obter status e sucesso são principalmente contingentes à capacidade.
É, no entanto, uma tendência contra a qual se deve estar rigorosamente
de guarda. Barber (6C) resume o problema:

O fato de ocorrer alguma resistência, derivada da cultura e interação so­


cial, que pode, em certa extensão, ser inevitável, não constitui prova de que
haja mais resistência do que aceitação na ciência ou de que os cientistas não
são mais respectivos do que os outros homens. Pelo contrário, a poderosa nor­
ma de receptividade em ciência, os testes objetivos pelos quais conceitos e teo­
rias freqüentemente podem ser avaliados, e os mecanismos sociais para asse­
gurar a com petição entre as novas e velhas idéias — tudo isto constitui um
sistema social no qual a objetividade é maior do que em outras áreas sociais
e em que a resistência é menor. O desenvolvimento da ciência moderna de­
monstra sempre claramente isto. Todavia, alguma resistência permanece e é
isto que tentamos compreender e assim talvez red u zir.. . Com o homens na
sociedade, os cientistas são, às vezes, agentes, às vezes objetos, de resistência
às suas próprias descobertas.

Em resumo, deve então haver um equilíbrio na comunicação cien­


tífica a outros cientistas, da mesma forma que deve haver um equi­
líbrio na comunicação com o público em geral. A comunidade dos
cientistas não deve ser tão fechada a ponto de ser uma oligarquia, nem
tão completamente aberta, a ponto de ser uma anarquia. Conforme
Bronowski (19B) afirmou:

91
A sociedade dos cientistas deve ser uma democracia. Somente pode manter-
se viva e crescer por meio de uma constante tensão entre a dissenção e o
respeito, entre a independência da perspctiva dos outros e a tolerância para
com elas. O ponto crucial do problema ético é fundir estas necessidades, as
particulares e as públicas.

Nessa sociedade, que é uma réplica em miniatura da sociedade


maior, da qual a ciência moderna é tanto quanto o produto, os cien­
tistas não são mais do que cidadãos que compartilham uma cultura
comum; contudo, cuidados devem ser tomados para que não sejam me­
nos do que cientistas, seguindo aquela tradição especial (e especiali­
zada) indicada por Bronowski (19C), de independência, originalidade
e, como um produto destas qualidades, de dissensão.
É absolutamente imperativo que os cientistas comuniquem seus
conhecimentos tão bem quanto possam, aceitando a responsabilidade
social de educação sugerida por Renan e Rostand e pelo arcebispo de
York, que, certa vez, disse à Britisch Associaton for the Advancement
of Science (Associação Inglesa para o Desenvolvimento da Ciência),
que os cientistas “devem educar seus compatriotas para que usem
corretamente as invenções que lhes proporcionarem, e devem ex­
por claramente os terríveis resultados que poderiam advir de seu uso
incorreto” .
É muito fácil perceber a importância da afirmação do arcebispo
em relação à física nuclear e à ameaça de aniquilamento, mas isto
também é importante para a psicologia. Numa alocução feita na Ame­
rican Psychological Association (Associação Norte Americana de Psi­
cologia) em 1955, o brilhante físico Robert Oppenheimer fez a se­
guinte observação sobre física e psicologia:

N os últimos dez anos os físicos se apresentam extraordinariamente ruidosos


em relação aos imensos poderes que, em grande parte, através dos seus esforços,
mas também dos de outros, chegaram às mãos do homem poderes notáveis
e extraordinários para uma muito ampla e pavorosa destruição. Falam os de
nossas responsabilidades e nossas obrigações para com a sociedade em termos
que me parecem muito provincianos, porque o psicólogo dificilmente pode fazer
alguma coisa sem perceber que a aquisição de conhecimento traz à d :scussão
as perspectivas mais aterradoras de controlar o que as pessoas fazem, com o
pensam, com o se comportam e com o sentem. Isto é verdadeiro para todos os
que entre vocês estão envolvidos com a prática, e à medida que o corpo da

92
psicologia progride em confiança, sutileza e habilidade, eu posso ver que as
súplicas do físico no sentido de que o que ele descobre seja usado com huma­
nidade e seja usado com prudência parecerão um tanto triviais comparadas
àquelas súplicas que terão que fazer e pelas quais terão que ser responsáveis.

Ciência e a ordem social. No último capítulo, a parte relativa às con­


siderações éticas referiu-se principalmente aos procedimentos éticos
no planejamento e na execução da pesquisa. Desde que as preocupa­
ções éticas experimentadas pelos cientistas na pesquisa se baseiam na
responsabilidade social, seria útil examinar a ética do cientista em re­
lação ao sistema social em que ele trabalha e vive. A ciência, um
domínio tão universal quanto a música, é também como esta afetada
pela cultura na qual desenvolve.
Como se avalia uma cultura? Uma maneira eficaz é examinar as
N

características particulares de uma sociedades que a distinguem de


outras. Por exemplo, Kingsley e Davis (22A) retrataram as carac­
terísticas de nossa sociedade de classes abertas em uma análise so­
ciológica do sistema ético que ela desenvolveu. Ele diz que esta ética
de classe aberta é:

1. Democrática no sentido de favorecer igual oportunidade para a as­


censão social com base nos méritos próprios e não no nascimento.

2. Profana ao enfatizâr a importância dos valores terrenos tais com o:


o exercício de uma vocação, acúmulo de riquezas e a busca de uma
posição social.

3. Ascética — ao mesmo tempo, dá ênfase, abstinência física, austera


sobriedade, econom ia, trabalho e prudência.

4. Individualista ao responsabilizar o próprio indivíduo pelo seu destino


econôm ico, político e religioso, e por acentuar a ambição pessoal, a
auto-confiança, a empresa particular e a habilidade empresarial.

5. Racionalista e empírica ao supor um mundo ordenado que pode ser


descoberto através da observação sensorial da natureza.

6. Utilitária ao perseguir fins práticos valendo-se dos melhores meios dis­


poníveis, e por conceber o bem-estar humano em termos seculariza-
dos com o algo que pode ser alcançado pela ação e pelo conheci­
mento humano.

Davis sugere que esse sistema ético está funcionalmente relaciona­


do com uma sociedade de classes abertas como a nossa. Também é

93
óbvio que as características de semelhante código de ética são parte
e parcela da ciência que se desenvolveu dentro de nossa sociedade; a
ênfase que dá à verdade, ao trabalho, à razão e à integridade, tão
apreciadas em nossa cultura, alcança resultado em sua expressão
científica. A ciência como um sistema adotou a ética e os valores da
sociedade, em troca contribuiu notavelmente para o desenvolvimento
e prática dessa ética e valores. Ê talvez também verdade que a ciência
seja como cabeça da sociedade ao enfatizar o indivíduo. A integri­
dade não é uma abstração na ciência — é um aspecto crucial do com­
portamento diário de cada cientista como uma pessoa. Como tal, os
elementos individuais tendem a personalizar e a humanizar o abstrato
código de ética. Conforme Bronowski (19D) observou:
. . . com o as outras atividades criadoras que se desenvolveram a partir
do renascimento, a ciência humanizou os nossos valores. Os homens clamaram
por liberdade, justiça e respeito, precisamente à medida que o espírito cien­
tífico se disseminava entre eles. O dilema de hoje não está no fato de que os
valores humanos não podem controlar uma ciência mecânica. É precisamente
o contrário: o espírito científico é mais humano do que a máquina dos go­
vernos . . . Nossa conduta, com o foi afirmado, apega-se a um código de auto-
interesse que a ciência, com o a humanidade, há muito abandonaram. O corpo
da ciência técnica nos oprime e ameaça porque estamos tentando empregar o
corpo sem o espírito, estamos tentando comprar o cadáver da ciência.

Bondi (14A) discutiu a« qualidades humanas dos empreendimen­


tos científicos destacando, em particular, a necessidade de se testar a
falibilidade humana; sugere que a ciência, mais do que qualquer outro
empreendimento, conta com o erro humano, “porque qualquer um
pode estar errado, não faz sentido mencionar a autoridade, pois os
grandes cientistas não podem estar menos errados do que os outros. . .
é devido a esta insistência na verificação que a ciência se tornou uni­
versal”. (14B) As teorias devem ser elaboradas de modo que possam
ser testadas, de modo que as pessoas possam colaborar para construir
o conhecimento. É especialmente esta quabdade de trabalhar em cola­
boração que torna a ciência humanizada, o que Bronowski e Bondi
ressaltaram. Bondi (14C) prossegue observando que:

N ão faz muito tempo uma personalidade escreveu, em uma revista de


educação, que ele acreditava que desde que os problemas atuais são, em grande
parte, problemas de relações humanas, uma educação humanística, que se preo­

94
cupasse com os seres humanos, prepararia melhor pessoas para este mundo do
que uma educação científica, que lida com fatos. Esta afirmação não tem sen­
tido. A ciência é um empenho humano e, mais do que isto, é o empenho
humano no qual a ampla cooperação mundial teve mais êxito do que em
qualquer outro. É um esforço humano singularmente bem talhado para as
habilidades e deficiências humanas. Se algo pode ensinar você a cooperar com
outros seres humanos, independentemente de raça ou religião, ideologia ou na­
cionalidade, então é ciência. Neste sentido ela é, talvez, um assunto mais
humano* do que as assim denominadas humanidades, -e referir-se a ela como
algo que se ocupa impessoal e solitariamente com fatos é uma tão grosseira
incompreensão daquilo que a ciência é, choca saber que tais pontos de vista
ainda possam ser mantidos.

Afirmar, como Bondi o faz, que ciência, às vezes, é mal com-


prendida, não é pleitear uma aceitação vaga e a crítica dos não-cien-
tistas, mas, antes, indicar a responsabilidade do não-cientista de fazer
uma tentativa genuína para compreender. A personalidade a que Bon­
do se refere expõe, como um leigo fora da ciência, um julgamento
não-crítico, pois é sua responsabilidade compreender a ciência e os
cientistas da mesma forma que vimos ser responsabilidade do cientis­
ta fazer-se compreender.
Um dos propósitos deste pequeno livro c, além de introduzir al­
guma informação sobre a metodologia científica, familiarizar o não-
cietista com algumas das características do cientista e da vida cientí­
fica. Não é mais do que umá introdução ao rigor, à flexibilidade, à
diversão, à frustração, aos mecanismos e à humanidade da pesquisa.

95
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8. Ibid., p. 130.
9. Ibid., p. 131.

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Psychology, 1, janeiro, 1956, p. 8.
52. S k i n n e r , B. F ., “A case history in scientific m ethod”, em: Com m ula-
tive Record. N ew York, M acmillan, 1956, p. 81.
53. S k in n e r , B. F., Science and Human Behavior, N ew York, M acmillan,
1953, p. 13.
5 4 . Ibid., p. 12.
55. Ibid., p. 12.
56. Ibid., p. 13.
57. Ibid., p. 13.
57a. Ibid., pp. 38-39.
5 8 . S k i n n e r , B. F., Verbal Behavior, N ew York, Appleton-Century-Crofts,
1957 pp. 8-9.
5 9 . S t e v e n s , S. S., “Psychology and the science of science”. Psychological
Bulletin, 36, 1939.
60. S t e v e n s o n , Ian P., The Evidence for Survival From Claim ed M e­
mories of Former Incarnations, Surrey, England: M . C. Peto, 1961. (Publicado
originalmente em Journal of the Am erican Society for Psychical Research, abril
e julho, 1960).
61. S t o n e , L. J., “Recent developments in diagnostic testing o f children”,
em: Recent Advances in Diagnostic Psychological Testing, Springfield: Thomas,
1950, pp. 82-83.
6 2 . S t r u p p , H. H ., “Patient-doctor relationships: The Psychoterapist in
the therapeutic processes”, em B a c h r a c h (Referência 3 ).
6 3 . U n d e r w o o d , B. J., Psychological Research, N ew York, Appleton-
Century-Grofts, 1957, p. 19.

100
64. W e n g e r , Marion, J o n e s , F. N ., e J o n e s , M. H., Physiological Psy­
chology, N ew York, Holth, Rinehart, and Winston, 1956.
65. Y o u n g , J. Z., D ou bt and Certainty in Science. Oxford: Clarendon
Press, 1951, pp. 1-2.

Sugestões para outras leituras

Além dos livros que aparecem na Bibliografia, há muitos outros que po­
dem ser do interesse dos leitores que desejem uma análise mais pormenorizada
e avançada do método científico e da pesquisa. A lista seguinte oferece um grupo
variado destes livros:

B ernard, C. A n Introduction to the Study o f Experimental Medicine, ,New York,


Collier Books, 1961.

W. I. B. The A rt of Scientific Investigation, N ew York, Random


B e v e r id g e ,
H ouse, Vintage Books, 1957.

Egon. The Conceptual Framework of Psychology, Chicago, U n i­


B r u n s w ik ,
versity o f Chicago Press, 1952.

C annon, W., The Way of An Investigator, N ew York, W. W. N orton, 1945.

E del, A. The Theory and Practice of Philosophy, N ew York, Harcourt, Brace,


1946.

F rank, Philipp. M odern Science and its Philosophy, Cambridge, Mass., Harvard
University Press, 1949.

F reedm an,P. The principles of Scientific Research (2 .a ed.) N ew York, Per­


gamon Press, 1960.

H all, A. R. e H all, M. B. A Brief History of Science, N ew York, Signet,


1964.

J orgensen, Jorgen. The D evelopm ent of Logical Empiricism, Chicago, U n i­


versity of Chicago Press, 1951.

Koch, Sigmundo (E d .), P sychology: A Study of a Science, N ew York, McGraw-


Hill, 1959, 7 volumes.

M arx, M. H. e H i l l i x , W. A. Systems and Theories in Psychology, N ew


York, M cGraw-Hill, 1963.

O sgood, C. E. M ethod and Theory in Experimental Psychology, N ew York,


Oxford University Press, 1953.

Psychological Abstracts, Washington, American Psychological A ssociation”, desde


1927, bimensal.

101
R H. The Rise of Scientific Philosophy. Berkeley: University o f
e ic h e n b a c h ,
California Press, 1951.

S te v e n s, S. S. (E d .), Handbook of Experimental Psychology, N ew York, Wiley,


1951.

W oodw orth, E. S. e S c h o l b e r g , Harold. Experimental Psychology (ed. rev.),


N ew York, Holth, 1954 (1 9 3 8 ).

102
ÍNDICE DE AUTORES E ASSUNTOS

American M edicai Assoe., 75. Cannon, Walter B., 6.


American Psychiatry Assoc., 55. Cartilagem, exame de, 10, 12-13, 15.
American Psychological Assoc., 75 ss, Causalidade, problema da, 42s.
92. Celsius, Anders, 37.
American Psychologist, 80. Centígrada, escala, 36-37.
Amontons, Guilhaume, 36. Cérebro, estudo do, 66.
Amostragem, procedimento de, 64. Ciência, 42
Animal, pesquisa com , 64-68, 75-76; ortodoxia da, 20, 21;
aspectos éticos, 2; pura, 27,
razões para, 64-66; Cientistas, 83-93;
escolha de animais, 66-67. características, 3-4, 19;
Ansiedade, 34, 53-54. comunicação ao público, 84-87;
Aparelho, plano de, 4, 48-49. comunicação entre, 86-90;
Aprendizagem, 59-60; contactos entre os, 8, 11-12;
programada, 68. crenças religiosas, 90;
Arnold, Magda, 44. curiosidade, 2-5;
Artigos Científicos, 55, 87. imagem pública dos, 83-84, 85-86;
Asim ov, Isaac, 35. mente preparada, 4-6;
Astronomia, 28. ordem social, 92-95;
Atitude Científica, 20. reputação do, 84
resistência à descoberta, 89-91.
Bachrach, Arthur, J., 84, 86. Clareza, 53-61;
Bacon, Roger, 22. definição operacional, 51-61;
Baldwin, Alfred L., 81. problema de, 53-55.
Barber, Bernard, 8-13, 89-91. Coelhos, o caso dos coelhos de orelhas
Bennett, W illiam E., 16. caídas, 8-14; 90.
Berg, Irwin A ., 78-79. Com portam en to,
Bibliografias, 5-6. animal e humano, 64-69;
Bomba atômica, 87. definições, 53-54;
Bondi, Hermann, 94. descrição, 33-34;
Boyle, Robert, 36. esquiva, 49;
Brady, Joseph V., 44. estudo com drogas, 49-50;
Bridgman, Percy W., 56. estudo do, 19-28.
Bronowski, Jacob, 22-25, 28, 61, 91, leis diretoras do, 28-32;
92-93. mensuração do, 19-28;
Brunswik, Egon, 63,78. verbal, 6-8.

103
Compreensão, 21. verbal, termos simbólicos, 59-60.
Computadores, 38. de Ford, Charles S., 27.
Comunicações científicas, 42-43, 83-91. Depressão, estudo de, 68-70.
Conceitos inferidos e inventados, 60-61. Descartes, René, 22.
Confusão dos cientistas, 3-4. Descobertas acidentais, 1, 7-8.
Constructos hipotéticos, 59-61. Descrições, 22-23, 31-32.
Controle de dados, 21, 31-32, 48-50. níveis de, 32-33.
Convenções científicas, 8. Dicionário, definições de, 52.
Copeland, Paul L., 16. Diferenças de tratamento, 47-48.
Crianças, Discussões informais, 6-10, 11.
pesquisa usando, 81-83. Droga, estudo de, 49-50.
consentimento paterno, 82.
Cuidadoso casual, 4-69. Economia, princípio de, 43.
Cultura, avaliação da, 92-93. Einstein, Albert, 16-17, 22, 26.
Curiosidade, do cientista, 1-5. Emoções,
Curvas, 47. definições, 34-35;
pesquisa sobre, 35;
Dados, teoria das, 44.
científicos, 1, 19-21; Equipamento, 80.
coleta de, 2; Erro analógico, 68-97.
conceitos inferidos e inventados, Ética,
59-61; aspectos éticos da pesquisa, 2, 73-83,
construção de teoria, 39-45; na pesquisa animal, 75-76.
controle de, 21-31; na pesquisa humana, 75-83.
estabelecimento de relações funcio­ Eventos, uniformidade dos, 26.
nais, 1-3; Experimentação, 19, 21-30, 27-29;
fenôm eno subjetivo, 34-35; apresentação dos resultados, 5.
linguagem dos, 23-24; controle dos dados, 48-50;
respeito pelos, 17; erro analógico, 67-72;
significância dos, 2; manipulação, 25;
terminologia consistente, 61; pela ordem e lei, 27-29;
Davis, Kingsley, 93. planejamento, 5, 77-78;
Davis, R. C., 24. planejamento representativo, 63,
Decisão, tomada de, 40-41. 77-78;
Definições de termos. predição a partir da, 29-32;
certeza e clareza, 41-42, 51-61, procedimentos de controle, 41, 61;
51-59; repetição de, 22-24;
científica, 51-55; resultados negativos, 12, 16-17;
cotidianos, 51-55; variabilidade, 24.
de variáveis, 51;
dicionário, 51; Fahrenheit, Gabriel, 36-37.
especificidade, 52; Fatos,
fenôm eno ou evento, 51; aceitação dos, 19-20;
operacional, 54-58; paranormais, 24-26.
poética, 51; Feigl, Herbert, 60-61.
problemas de, 51-61; Fenômeno subjetivo, 34-35.
três níveis de, 52-53; Fleming, Sir Alexander, 1-3, 5.

104
Fome, definição de, 59. Laboratório,
Fox, Renée C., 8-13. aplicações no mundo cotidiano,
Freud, Anna, 45-46. 63-71;
Galileu, 15, 35, 36. crítica ao, 64;
Gardner, Martin, 4, 20, 27; discussões informais 8-9, 11,
Gatos e cães, métodos de, 63-71,
uso em pesquisa, 66-67. Lagrange, Joseph Louis, 20.
Geologia, 22. Landreth, Catherine, 80,
Greenspoon, Joel, 24, 27. Leis,
Grupo, estudo de, 6-7, 46-47. dos fatos, 27-30;
científicas, 3-4, 22, 28-29, 45-46.
Harford, R.A., 35. Lodge, Sir Oliver, 30-32.
Hecht, Seling, 86. Lua, definição operacional, 57-58.
Hefferline, Ralph F., 35. Luz, mensuração da velocidade da,
Heisenberg, Werner, 23. 15-16.
Hereditariedade, 59-60.
Hipóteses, 2, Macacos e chimpanzés, 66, 70-71.
formulação e teste de, 2, 14, 39, Margenau, Henry, 23 (nota)
45-46;
Marte, descrição de, 4.
miopia, 14-17.
Marx, Melvin H., 40, 53n.
Honestidade em ciência, 19-20.
M étodo científico.
Hora, definição de, 37-38, 59.
busca de ordem, 20, 22, 25-26, 27-29;
Hull, Clark L., 41-42.
características, 19-21, 24;
Humildade, necessidade de, 19, 20-21.
coleta de dados, 2;
definições operacionais, 54-59;
Idéias, estabelecimento de relações funcio­
pré-concebidas, 10, 14-17; nais, 2;
troca de, 8. observação, 21-29;
Incerteza, princípio da, 22-23. M étodo teórico, 40-42;
Indivíduo, pesquisa com, 47-48. formal, 40-45;
Informação, troca de, 8.
informal, 45-50;
Instrümentalização, 22-23, 24, 35-36;
Mensuração, 21-22, 32-38;
validade, 15-16. base da operação física, 37;
Interpretação dos resultados, 16-17. descrição e, 32-35;
Introspecção, 23-24,
escala de intervalos iguais, 34;
Investigações,
escala de razão, 34;
de grupi, 46-47; níveis de, 59;
de grupo, 46-47; nominal, 33-34;
relógio, 37-38, 59;
Jones, F.N ., 56-57.
termômetros, 35-37;
Jones, M .H., 56-57.
tipos de, 51.
Journal o f Experimental Medicine, 13.
Michelson, Albert A., 15-16.
Keenan, B., 35, Micro-hipóteses, 47.
Kellner, Aaron, 9. M odelos de comportamento humano,
Kinsey, relatório, 79, 69-71.
Kluckhohn, Clyde 56, Morley, Edward W., 15-16.
Koch, Robert 27, N ewton, Isaac, 46, 47.

105
Objetivos da Ciência, 21. publicação de, 88;
Observações, 2, 4, 21-27, 25; psicologia, 1;
correlação de observações específi­ registro de, 78-79.
cas, 56; Pombos, pesquisa usando, 66-67.
definição de, 21; Postulados, 41-42.
experimentos, e, 21-27; Predição, 21-22, 22-23;
fora das fronteiras científicas, 26; definição, 30;
predição e controle a partir de 29- observação e experimentação 29-32;
32; órbita de uma mosca, 30-32;
réplica de, 23-28; precisão da, 30.
requisitos, 23. Probabilidade, o conceito de, 30.
Operacional, definição, 54-51. Problema, solução de, 39-41.
começa com a observação, 55-56 Procedimento de pesquisa, 79-81.
critério para, 60-61;
Processo indutivo, 41.
objeções à, 57-59;
Proposições, 39-41;
perspectiva, 51-61, 84,
empíricas, 39-41, 58;
símbolos formais, 59.
formais, 58;
Oppenheimer, Robert, 92.
hipotéticas, 39-41;
Ordem,
teóricas, 39-41;
busca de, 20, 22, 25-26, 27-30;
ciência e, 92-95. Prova, acúmulo de, 26-27.
Psicologia,
controle de dados, 48;
Packard, Vance, 83. construção de teoria, 45;
Parapsicologia, 25. experimental, 48-49;
Parcimônia, o problema da, 42. Falta de uma linguagem baseada nos
Pasteur, Louis, 5, 21, 27. dados, 23-25, 51;
Pauling, Linus, 1. física e, 92-93;
Penicilina, a descoberta da, 2-4. metodologia científica, 26-27.
Psicólogo, imagem pública de, 83-84.
Percepção extra-sensorial, (PES 24-
Psicoterapia, definição de, 54-55.
2 6 ).,
Pesquisa,
aspectos agradáveis da, 6-8, Quine, Willard, 54.
como carreira, 8;
confiança do sujeito, 79-81 Rapoport, Anatol, 42, 55, 57, 58.
consentimento do sujeito, 77-78; Ratos, experimentos com, 63, 65, 66,
estímulo para a, 4, 5; 68 .
financiamento, 86-87; Relógio, 37-38.
leis da, 5; Reforçadores, 5-7.
material confidencial, 80; Registros de pesquisa, 78-79.
métodos de, 39-50; Reichenbach, Hans, 53n.
método teórico informal, 39-45; Relevância, problemas de, 43.
origem e desenvolvimento, 1, 3; Renan, Ernest, 87, 92.
planejamento, 4-5; Resultados,
preocupações, 80-81; apresentação de, 6;
preocupações do público com 73-76; de pesquisa, 16-17:
procedimentos padronizados de, 79- interpretação, 16-17:
80; negativos, 11, 16-17, 46.

106
Revistas, método formal, 39-45:
científicas, 5, 88; metafísica, 42;
forma de artigos, 5. m odificações de, 43-44;
Rostand, Jean, 87, 92. objeções a 44-45;
Ryle, Gilbert, 27. proposições empíricas, 39-40;
proposições hipotéticas, 40-41;
Science, 88 proposições teóricas, 40-41;
Scientific American, 88. psicanalítica, 42;
“Serendipity”, 8-14; verdade ou falsidade, 41-42;
definição de, 5-6. verificação 42-44.
Sidmam, Murray, 28-29, 44, 46, 48- T eorias
49, 68, 70, 90. reconhecimento das, 20-21;
Similaridade, diferenças entre analo­ resultados conflitivos das, 16-17;
gia e, 70-71. significado das, 2.
Simpósios, científicos, 8, 11, Termômetros, 35-37.
Skinner, B.F., 3, 19-20, 46-48, 65. Testes psicológicos, 81-82.
Stevens, S. S., 58. Thomas, Lewis, 9-14.
Stevenson, Ian P., 26. Toscana, Duque de, 36.
Stone, L. J., 82.
Swift, Jonathan, 5. Underwood, B. J., 33.
Uniformidade dos eventos, 27-28.
Técnicas estatísticas, 1, 64.
Variáveis, 30, 49-50, 64-65;
Telepatia, 24, 25.
definição de, 51;
Telescópio, 4-5, 15.
interveniente 59-61.
Temperatura mensuração da, 35-37. Verdade científica, 27-28, 42.
Tensão, pesquisa sobre, 76-77 Visão, estudo da, 73-74.
T eoria
construção de, 39-40; Wenger, Marion, 57.
critério para teste de, 42-44;
dados de, 39-45. York, Arcebispo de, 92.
essência da, 45; Young, J. Z., 3.

107

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