Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
Coordenação
WILLIAM RIBEIRO DA SILVA (UFRJ)
MARIA ENCARNAÇÃO BELTRÃO SPOSITO (UNESP)
MARIA JOSÉ MARTINELLI CALIXTO (UFGD)
PAULO PEREIRA DE GUSMÃO (UFRJ)
Comitê Científico
ARTHUR MAGON WITHACKER (UNESP)
BEATRIZ RIBEIRO SOARES (UFU)
CARLOS BRANDÃO (UFRJ)
CARMEN BELLET SANFELIU (UNIVERSITAT DE LLEIDA)
CLEVERSON REOLON (UNESP)
CRISTIAN HENRÍQUEZ (PUC/CHILE)
DENISE DE SOUZA ELIAS (UECE)
DIANA LAN (UCPBA/ARGENTINA)
DORALICE SÁTYRO MAIA (UFPB)
ELISEU SAVÉRIO SPOSITO (UNESP)
EVERALDO SANTOS MELAZZO (UNESP)
Monitores
ANA CAROLINA ALVES CARVALHO DE OLIVEIRA
3
FICHA DE CATOLOGRÁFICA
4
Índice
Autor Pág.
5
Apresentação
A realização do III CIMDEPE busca propiciar a continuidade do debate acerca
da relação entre o desenvolvimento econômico e os novos/velhos problemas da
urbanização mundial. O processo da urbanização tem demonstrado novas
nuances que atribuem novos papéis às cidades médias em todo o mundo, de tal
maneira, que elas passaram a apresentar, por um lado, novos problemas urbanos
e, por outro, novas perspectivas de desenvolvimento econômico, por meio de
investimentos de grandes empresas (indústrias, redes e franquias comerciais e de
serviços) que ampliam suas escalas de ação via cidades médias, como nós de
articulação da nova economia mundial.
Histórico
O III CIMDEPE
Jan Bitoun (UFPE), Doralice Sátiyro Maia (UFPB), Beatriz Ribeiro Soares
(UFU), Marcio Catelan (UNESP), Carmen Bellet (Universitat de
Lleida/Espanha).
8
O setor de atividades comerciais e de serviços passou por significativo processo
de crescimento nas três últimas décadas, em decorrência, inclusive, das dinâmicas
relativas à reestruturação produtiva, o que significou maiores articulações com a
produção agropecuária e industrial. Tal crescimento foi acompanhado de
significativa concentração econômica das empresas, alcançando a escala
internacional. Este processo redundou em enorme expansão espacial das redes
comerciais e de serviços, com destaque para alguns ramos, como: o de super e
hipermercados, o bancário e o de eletrodomésticos.
Paralelamente e como parte do mesmo conjunto de mudanças, capitais de
diferentes escalas, do internacional ao local, passaram a operar no setor comercial
e de serviços, de modo associado, por meio do sistema de franquias, o que
também teve como resultado enorme expansão espacial de produtos, serviços e,
sobretudo, marcas que se difundiram por diferentes países.
Tais dinâmicas trouxeram rebatimentos diretos sobre a organização das redes
urbanas, em função da redefinição na divisão interurbana e regional do trabalho e
também dos processos e formas de produção das cidades.
Se, no período anterior, os grandes capitais do setor terciário atuavam
predominantemente nas metrópoles e grandes cidades, a concentração
econômica e difusão espacial das redes promoveu uma procura por outros
estratos das redes urbanas, o que ampliou os mercados consumidores.
Todos estes movimentos podem ser analisados por meio de novas relações entre
processos, conteúdos e formas urbanas. O estudo de centralidade em suas
múltiplas escalas impõe-se, então, como um desafio.
Tendo em vista este quadro geral, que particularidades podem ser notadas nas
cidades médias quando analisamos as mudanças do setor comercial e de serviços?
De que modo se estruturam seus espaços e se redefinem suas centralidades face
às transformações recentes? Em que medida as novas estruturas espaciais
refletem velhas e/ou novas formas de segmentação socioespacial? A situação
geográfica das cidades médias é fator importante nas escolhas espaciais das
empresas? O aumento das possibilidades de transportes e comunicações reforça
interações espaciais e isso tem consequências para estas cidades? Como se
articulam produção, circulação e consumo nas redes urbanas sob os novos
arranjos espaciais?
Agronegócio e urbanização
9
Denise Elias (UECE), Gláucio Marafon (UERJ), Mirlei Fachini Vicente Pereira
(UFU)
10
Paulo Gusmão (UFRJ), Saint-Clair Trindade (UFPA), Carlos Brandão (UFRJ)
11
Eixo I Rede Urbana - Historia, Tendências e Perspectivas
12
FORMAÇÃO ESPACIAL E REDE URBANA: O SEGMENTO DE REDE
DE BARRA DO GARÇAS - MT
RESUMO
Uma rede urbana se materializa imprimindo as características da formação espacial que a
permeia, revelando suas particularidades, por meio da combinação e da recombinação dos
elementos espaciais no processo de sobreposição de tempos, no qual, a rede urbana está
associada. Tendo como recorte espacial o segmento de rede Barra do Garças-MT, mostramos
neste trabalho, os principais elementos da gênese e da evolução dessa rede, tendo como eixos
temporais, os cinco principais documentos publicados pelo IBGE a cerca das regiões de
influência das cidades do Brasil, buscando identificar os momentos privilegiados da história,
numa perspectiva diacrônica. Dadas as condições de formação espacial e a consolidação desse
segmento de rede, pensamos a cidade de Barra do Garças enquanto uma cidade média, frente
ao papel de influência regional que exerce.
1 INTRODUÇÃO
1
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Goiás – Regional Jataí,
sob orientação do professor Dr. Dimas Moraes Peixinho.
13
espacial pensando por Santos (1977), como fundamental no processo de inteligibilidade de
uma dada rede urbana, uma vez que se o conceito permite pensar sua dimensão espacial por
meio dos elementos econômicos, sociais, políticos e culturais.
Assim, este texto tem por objetivo considerar o segmento de rede urbana de Barra do
Garças-MT, frente ao processo de formação espacial que o permeia. De acordo com o REGIC
2007, Barra do Garças aparece como Centro Sub-regional A, subordinando vinte e seis
municípios entre os estados de Mato Grosso e Goiás, dos quais três – mato-grossenses – se
classificam como Centro de Zona B.
Destarte, apresentamos como os conceitos de formação espacial e rede urbana, se
entrelaçam na construção da análise geográfica de um dado segmento de rede. Tendo como
recorte espacial o segmento de rede Barra do Garças, mostramos os elementos da gênese e da
evolução dessa rede, tendo como eixos temporais, os cinco principais documentos publicados
pelo IBGE a cerca das regiões de influência das cidades do Brasil, buscando identificar os
momentos privilegiados da história, numa perspectiva diacrônica.
Tal condição espacial desse segmento de rede diante de suas características aqui
consideradas, nos leva a questionar se a cidade de Barra do Garças pode ser pensada como
cidade média. Nesse sentido, assinalamos as características socioespaciais dessa cidade,
mediante ao seu processo de formação espacial e às especificidades que definem e
caracterizam uma cidade média.
A análise de um dado segmento de rede urbana, numa escala regional, pode ser
pensada a partir do conceito de formação espacial, dada a inseparabilidade entre a produção
espacial urbano-regional e suas respectivas articulações entre os centros urbanos, resultados
dessa formação espacial.
Corrêa (2000), em seu esforço teórico nos estudos de rede urbana, buscando desvelar a
inteligibilidade da lógica espacial que cerca os elementos da rede urbana diante da estrutura
social, resgata o conceito de formação espacial desenvolvido por Milton Santos visando à
compreensão das especificidades das manifestações concretas de um dado modo de produção.
Formação espacial, além de conceito, configura-se também como uma fundamental
categoria para a análise geográfica. Santos (1979), busca sua fundamentação no conceito de
14
formação econômico-social, proposto por Marx e Lenin, questionando a possibilidade de
pensarmos a formação econômico-social, sem incluir a dimensão espacial.
Nesse empenho de incorporar o espaço no conceito de formação econômico-social, o
autor afirma que “a evolução da formação social está condicionada pela organização do
espaço, isto é, pelos dados que dependem diretamente da formação social atual, mas também
das formações econômico-sociais permanentes” (SANTOS, 2000, p. 90).
Fica evidenciado, portanto, o caráter de inseparabilidade que existe entre as realidades
e as noções de sociedade e de espaço característicos do conceito de formação social. Assim, o
autor propõe a composição de um conceito único, reiterando que não se deve falar de
formações econômico-sociais sem incluir a evolução espacial.
A materialização resultante da combinação de tempo e espaço num dado modo de
produção, expressa o caráter espacial que o autor reivindica nas análises das formações
econômico-sociais. Tempo e espaço, reconduzem-se como conceitos fundamentais, uma vez
que “os modos de produção escrevem a história no tempo, as formações sociais escrevem-na
no espaço” (SANTOS, 1979, p. 88).
A concretização do modo de produção demanda um local próprio, distinto para cada
processo, transfigurando o espaço em escala local, a cada momento histórico, por suas
especifidades e particularidades. Os objetos geográficos se concretizam nas localizações
compatíveis aos objetivos da produção num dado momento, pressupondo a concretização de
novos objetos, por influência dos primeiros, num processo de sobreposição de tempos num
dado espaço (SANTOS, 1979).
A configuração e a organização socioespacial, estará assim determinadas pela
condição de que
Cada combinação de formas espaciais e de técnicas correspondentes
constitui o atributo produtivo de um espaço, sua virtualidade e sua
limitação. A função da forma espacial depende da redistribuição, a cada
momento histórico, sobre o espaço total da totalidade das funções que uma
formação social é chamada a realizar. Esta redistribuição-relocalização deve
tanto às heranças, notadamente o espaço organizado, como ao atual, ao
presente, representado pela ação do modo de produção ou de um dos seus
momentos (SANTOS, 1979, p.89).
15
determinadas, pelo modo de produção tal como ele se realiza na e pela formação social
(SANTOS, 1979).
Baseado da dimensão teórica do conceito de formação espacial, Correa (2000), nos
ensina que uma rede urbana, pode apresentar características associadas aos diversos
momentos da formação em que está inserida, ou das diversas formações espaciais a que esteve
associada. Para o autor, o conceito de formação espacial, nos permite considerar processos,
funções e formas em suas concretizações espaço-temporais diferenciadas, sendo dessa forma,
fundamentais para a inteligibilidade da lógica espacial de uma rede urbana.
Brevemente, entende-se o conceito de rede urbana como sendo, “o conjunto de centros
urbanos funcionalmente articulados entre si” (CORREA, 1988, p.107). Ressalte-se que esses
conjuntos de centros podem se manifestar de diversas formas no espaço. Assim, as inúmeras
formas de articulação entre os centros urbanos, podem ser justificadas pelas
16
ser pensado a partir da primeira e da terceira formação espacial, destacadas pelo autor. Vale
salientar que
2
Barra do Garças está localizada na divida dos estados de Mato Grosso e Goiás.
3
Corrêa (2003), afirma que na tradição geográfica o urbano tem sido analisado em três linhas de investigação,
sendo a primeira o processo de urbanização, a segunda na escala da rede urbana e a terceira na escala do espaço
intraurbano. O mesmo autor (2007) destaca que entre as escala do urbano é possível identificar uma nova escala,
se tratando de áreas urbanizadas/conurbadas em uma dimensão não metropolitana.
17
A gênese das três cidades está fundada no garimpo de diamantes, sobretudo Barra do
Garças e Aragarças, sendo as mais antigas. Na chamada fase garimpeira, foi fundado o
primeiro povoado onde hoje está assentada a cidade de Barra do Garças em 1924. O garimpo
como principal atividade econômica atraiu grande número de migrantes, além de outras
atividades, como o comércio e a agropecuária de subsistência. Conflitos e disputas nos
garimpos, levaram um grupo de garimpeiros a atravessarem o rio Araguaia e se fixarem onde
hoje é a cidade de Aragarças. Ambos os povoados lentamente adquiriram características
urbanas que os elevaram ao status de vila ainda na década de 1930 (SANTOS, 2014).
No ano de 1943, Aragarças foi escolhida para servir de base avançada da Expedição
Roncador-Xingu que mais tarde deu lugar à Fundação Brasil Central. A referida fundação,
implantou em Aragarças infraestrutura urbana com planejamento, além de todos os
equipamentos necessários aos objetivos de integração do Oeste brasileiro à economia
nacional. Tal condição atraiu mais uma leva de migrantes que buscavam melhores condições
de infraestrutura, educação, saúde e trabalho. O fato de Aragarças possuir planta urbanística,
levou grande parte de migrantes a se instalarem em Barra do Garças, por conta dos preços da
terra urbana que eram mais acessíveis (SANTOS, 2014).
Com uma população de aproximadamente 6.000 habitantes, Barra do Garças é elevada
à categoria de município em 1948, enquanto que Aragarças só se emancipa em 1953 com
cerca de 3.000 habitantes. A construção das pontes sobre os rios Araguaia e Garças ainda na
década de 1950, irá possibilitar uma maior interação entre as duas cidades, além de facilitar as
estratégias de integração da Fundação Brasil Central.
No documento Esboço Preliminar de Divisão do Brasil em Espaços Polarizados do
IBGE de 1967, Barra do Garças e Aragarças aparecem mantendo relações diretas com a
Região Goiânia-Anápolis. Naquele momento região de Barra do Garças inicia um processo
produtivo agrícola com a rizicultura.
A cidade de Barra do Garças no inicio da década de 1970, já contava com uma
população de 26. 570 habitantes, e ocupava um território de mais de 200 mil quilômetros
quadrados no nordeste mato-grossense, limitando-se com o estado do Pará. Vale ressaltar que
nesse imenso território, existiam apenas quatro povoados: Xavantina, São Félix do Araguaia,
Luciara e Santa Terezinha.
18
No documento Divisão do Brasil em Regiões Funcionais Urbanas de 1972, o
município de Barra do Garças já classificado como um Centro Local de nível 4a 4, apresentava
influência sobre os municípios de Torixoréu e General Carneiro em Mato Grosso, bem como
em Aragarças, Baliza e Bom Jardim de Goiás em Goiás (Mapa 1). Vale ressaltar que a partir
desse período, Aragarças com 4.636 habitantes, aumenta suas relações intraurbanas com
Barra do Garças, diminuindo seu próprio crescimento e importância regional conquistados por
intermédio da Fundação Brasil Central.
4
A pesquisa utilizou para classificação da hierarquia urbana, quatro níveis: 1- metrópole, subdivididas em A, B,
C e D; 2 - centro regional, 3 - centro sub-regional e 4 - centro local de categorias A e B de acordo a intensidade
das relações (IBGE, 1972).
19
meio de projetos de colonização efetuados por grandes grupos empresariais, sobretudo do
estado de São Paulo, para implantação de agricultura intesiva e pecuária5 (SANTOS, 2014).
Essa dinâmica de carater político e econômico, apresentou duas grandes
trasnformações espaciais no município de Barra do Garças, que no Censo de 1980 apresenta
um crescimento populacional de mais de 60%, chegando assim a 43.601 habitantes. A
primeira fazer referência a infraestrutura que o município recebe, aprimorando seus
equipamentos de comércio e serviços, necessários ao papel de influência regional que a
cidade exercia, sobretudo para subsidiar o desenvolvimento dos projetos agropecuários. A
segunda refere-se ao processo de fragmentação do terriório do município, a partir da
emancipação político-administrativa de alguns povoados.
Regiões de influência das cidades, é resultado de um trabalho conluído em 1983, mas
que só fora publicado em 1987. Neste documento, Barra do Garças aprece subordinada a
Metrópole Regional Goiânia e como Centro de Zona6, subordinando os municípios de
Aragarças-GO, Bom Jardim de Goiás-GO, General Carneiro-MT, Torixoréu-MT, além de
Luciara-MT e São Félix do Araguaia-MT, que são municípios originados do território de
Barra do Garças (Mapa 2). Detalhe interessante é que a pesquisa não inclui alguns municípios
que tinham conquistado sua emancipação política, como Água Boa e Canarana que se
emancipam em 1975, Santa Terezinha em 1976 e Nova Xavantina em 1980, os quais a
história denota que haviam relações diretas com Barra do Garças.
5
Ressalte-se que nesse período acontece a chamada “Revolução Agrícola”. Em que a agricultura brasileira passa
por um rápido processo de transformação tecnológica, incorporando maquinário e insumos industriais modernos
na agropecuária, agregando novas áreas ao processo produtivo (GRAZIANO NETO, 1986).
6
Nesta pesquisa utilizou-se como níveis de classificação hierárquica, seis níveis: metrópole, centro
submetropolitano, capital regional, centro sub-regional, centro zona, centro subordinado (IBGE, 1987).
20
A década de 1980 marca a consolidação da produção agropecuária na região, o que
resultou num aumento significativo do número de centros, sobretudo no antigo território de
Barra do Garças. A partir de então o segmento de rede toma forma. Tendo as características
da formação espacial de fronteira, os centros passam a se articular por meio da abertura de
rodovias, além das tecnologias de comunicação.
Barra do Garças se firma como a principal cidade da região aumentando o número de
municípios subordinados, no entanto apresenta pequeno crescimento populacional no Censo
de 1991, atingindo a marca de 45.561, uma vez que parte da população contada no município,
passou a pertencer aos novos municípios que se desintegraram do antigo território de Barra do
Garças. De acordo com os resultados apresentados pelo documento Regiões de Influência das
Cidades de 1993, Barra do Garças sob a influência de Goiânia, classificou-se como Centro de
Nível Médio7, subordinando assim, vinte municípios (Mapa 3).
7
Nesta pesquisa, foram definidos oito níveis de centralidade na hierarquia urbana: máximo, muito forte, forte,
forte para médio, médio, médio para fraco, fraco e muito fraco (IBGE, 2000).
21
Fato interessante está no fato da cidade de São Félix do Araguaia-MT passar a manter
relações diretamente com Goiânia, classificando-se como Centro de Nível Fraco
subordinando cinco municípios e competindo com outros três a influência com Barra do
Garças8.
O desenvolvimento por meio de atividades agropecuárias, também refletiu sobre o
distrito de Pontal do Araguaia que por sua proximidade com Barra do Garças e Aragarças,
passa a desenvolver sua área urbana, com o surgimento de novos bairros e a implantação do
campus da Universidade Federal de Mato Grosso. Tal condição permitiu a conquista de sua
emancipação politico-administrativa do município de Torixoréu-MT no ano de 1991, com
uma população de aproximadamente 3.000 habitantes (SANTOS, 2014).
Nas décadas de 1990 e 2000, o segmento de rede de Barra do Garças torna-se ainda
mais robusto, com a intensificação das relações e com o surgimento de novos centros, além do
8
Este trabalho tem como recorte espacial o segmento de rede de Barra do Garças, dessa forma, as áreas que não
compõem o segmento naquele momento não são consideradas no mapeamento com a finalidade de evidenciar a
espacialidade do segmento que é nosso foco do estudo.
22
desenvolvimento de outros que passaram a desenvolver certa influência regional, ainda sob a
subordinação de Barra do Garças.
Regiões de Influência das Cidades de 2007, retrata bem essas características. Barra do
Garças aparece como Centro Sub-regional A9, subordinado pela Capital Regional A, Cuiabá,
que por sua vez, subordina-se a Grande Metrópole Nacional São Paulo. Neste contexto, Barra
do Garças subordina vinte e seis centros, com destaque para Água Boa-MT, Confresa-MT e
Vila Rica-MT, que aparecem como Centro de Zona B, como podemos observar no Mapa 4.
No Censo de 2000, o último antes do REGIC de 2007, Barra do Garças contava com
uma população de 52.092 habitantes, Aragarças 16.592 e Pontal do Araguaia 3.736, somando
72.420 de habitantes na conurbação. Os Centros de Zona B, Água Boa, Confresa e Vila Rica
contavam com 16.737, 17.841 e 15.587 habitantes, respectivamente.
9
Esta pesquisa utilizou como critério de classificação os níveis hierárquicos dos centros: metrópole, com 3
níveis (grande metrópole nacional, metrópole nacional, metrópole); capital regional, com 3 níveis (A, B e C);
centro sub-regional, com 2 níveis (A e B); centro zona, com 2 níveis (A e B); e centro local(IBGE, 2008).
23
Característica desse segmento de rede, está na formação espacial frente ao fator
territorial, nos quais estão inclusos os limites político-administrativos. Corrêa (2000) nos
lembra de que uma formação espacial não se traduz, necessariamente em uma região, e que na
realidade pode-se conceber uma mesma formação espacial recobrindo duas ou mais regiões.
Dentro dessa perspectiva, um segmento de rede urbana numa dada formação espacial
pode ultrapassar os limites e as regiões político-administrativas. Barra do Garças, constitui-se
num centro de influência regional que expressa essa condição espacial, principalmente por
conta de sua localização geográfica na divisa dos estados de Mato Grosso e Goiás.
Tomando como base, o REGIC de 2007, Barra do Garças exerce influência
principalmente sobre a Mesorregião Nordeste Mato-grossense, mesorregião esta que
compreende toda a área que era território do município até a década de 1970. Nesta
mesorregião, Barra do Garças subordina dezenove centros.
De acordo com o IBGE, a maioria dos centros subordinados por Barra do Garças têm
suas economias voltadas para o setor agropecuário, seguido pelo comércio e serviços. Vale
ressaltar que na Mesorregião do Nordeste Mato-grossense, apenas o segmento de São Félix do
Araguaia-MT que aparece como Centro de Zona A, subordinando seis centros, não se
subordina à Barra do Garças, mantendo relações diretamente com a capital Cuiabá10.
Barra do Garças exerce influência também sobre centros na Mesorregião Sudeste
Mato-grossense, onde subordina quatro centros. Já no território goiano, Barra do Garças
subordina mais quatro centros na Mesorregião Noroeste de Goiás. Assim, Barra do Garças
firma-se enquanto cidade mais importante na região, abrigando os principais equipamentos
estatais e privados, atraindo e difundindo fluxos sobre as regiões de sua influência.
10
A área dos municípios que São Félix do Araguaia subordina, é em espaço de movimentos sociais e de
consideráveis conflitos e disputas territoriais. Diferencia-se então do contexto espacial da grande propriedade
privada do agronegócio, por ser um espaço que abriga grandes áreas de terras indígenas, bem como de posseiros
e outros sujeitos do campo, dissolvendo as grandes propriedades em pequenas e médias. Tal condição espacial
pode justificar as relações diretamente com a capital, uma vez que Barra do Garças serve principalmente aos
centros do agronegócio e da grande propriedade rural.
24
Um dos primeiros critérios que nos ajuda a pensa a grandeza de uma cidade,
certamente está em sua dimensão espacial e demográfica, na qual os dados quantitativos
referentes ao contingente populacional são imprescindíveis. No entanto, o número mínimo
para definir o grupo das cidades médias, aparece com uma amplitude que compreende desde
20 mil até 250 mil habitantes, dependendo da abordagem teórico-metodológica dos autores e
das instituições.
Sposito (2007) frisa que no Brasil, podem ser consideradas cidades de porte médio
aquelas que têm entre 50 mil e 500 mil habitantes, ressaltando que não se pode conceituar
essas cidades como médias apenas aplicando o critério demográfico. Para a autora, tal critério
preponderante e isolado, atualmente, não é capaz de definir uma cidade média, visto que
desconsidera o papel de uma cidade e as funções que ela desempenha frente à rede urbana na
intermediação regional.
Dessa forma, o critério dimensional é por muitos autores, considerado insuficiente
para definir e classificar a grandeza das cidades, uma vez que “aceitar um número mínimo,
como o fizeram diversos países e também as Nações Unidas, para caracterizar diferentes tipos
de cidade no mundo inteiro, é incorrer no perigo de uma generalização perigosa” (SANTOS,
1982, p. 69-70).
Ultrapassando esse critério de dimensão espacial e de contingente populacional,
consideramos o que propõe Sposito (2001). Para a autora, na definição de cidade média deve
ser considerada além do tamanho demográfico, a situação funcional da cidade. Isto é,
considerar como essa cidade se posiciona no território e na rede, por meio do papel de
comando regional que exerce, levando em conta suas funções e articulações.
Essas cidades que se posicionam numa escala urbana intermediária, polarizando uma
dada região. Sposito (2009, p.19) salienta que
[...] o papel de intermediação entre as pequenas e as grandes, então são cidades que
comandam uma região, que polarizam uma região, que crescem em detrimento da
sua própria região ou crescem em função da sua própria região, as duas coisas
acontecem. Cidades médias que ampliam seus papéis, porque diminuem os papéis
das cidades pequenas a partir de uma série de mecanismos econômicos, ou cidades
que, em função do tipo de atividade que têm, das lideranças que ali se encontram,
são capazes de crescer e propor um projeto ou desempenhar um papel político,
econômico e social de crescimento para toda uma região (SPOSITO, 2009, p. 19).
25
[...] devem ser consideradas para identificação das cidades médias diversas
variáveis como: tamanho demográfico, qualidade das relações externas,
especialização e diversificação econômica, posição e sua importância na região e
na rede urbana de que faz parte, organização espacial e índices de qualidade de
vida, atributos que podem variar de região para região, de país para país, tendo em
vista sua formação histórico/geográfica, que é diversificada segundo sua
localização espacial. Desse modo, podemos dizer que as cidades médias ou
intermediárias são definidas pelo lugar que ocupam não apenas na rede urbana,
mas também no sistema econômico global (SOARES, 1999, p. 57).
Fica evidente que não se deve deixar de considerar critério demográfico, quando se
quer classificar as médias cidades, no entanto, deve-se atribuir maior importância ao papel
que a cidade desempenha regionalmente, exercendo forte relação com a área na qual está
situada e pela concentração e centralização econômica, tendo em vista a realidade regional
(SPOSITO, 2007).
Diante do exposto, retomamos ao questionamento inicial: seria adequado pensar Barra
do Garças como cidade média? Partindo do critério inicial que considera o quantitativo
populacional, seria sim, uma vez que assumíssemos uma amplitude demográfica como limite
mínimo até 50 mil habitantes.
Conforme já citado anteriormente, a cidade contava em 2010, 56.560 moradores.
Pensando sobre o processo de conurbação que ocorre por meio da coalescência de sua área
urbana às cidades de Aragarças-GO e Pontal do Araguaia-MT, atingimos a população que
ultrapassa os 80 mil habitantes, na mesma mancha urbana (Figura 1).
Figura 1. Mancha urbana da formada pela conurbação de Barra do Garças com Pontal do
Araguaia e Aragarças.
26
No que tange à importância regional que a cidade desempenha, Barra do Garças desde
a década de 1970, vem se firmando como um centro de controle e gestão regional, sobretudo
na rede que se formou sob seu antigo território. Levando em consideração a gênese e o
processo de formação espacial que permeia o segmento de rede de Barra do Garças, a posição
geográfica da cidade na rede urbana permite alcançar um raio de influência que ultrapassa os
600 quilômetros.
Nos estudos das regiões de influência das cidades supracitados, a cidade aparece em
1972 como Centro Local, em 1983 como Centro de Zona, em 1993 como Centro de Nível
Médio e em 2007 como Centro Sub-regional A. Reconhecendo que esses estudos foram
desenvolvidos com arcabouços teórico-metodológicos distintos, fica evidente a crescente
importância regional de Barra do Garças.
Santos e Silveira (2001) ressaltam a gradativa importância de cidades intermediárias
ao papel por elas desempenhado ao servirem de ponte entre o global e o local. Para os autores,
essas cidades passam a se especializar na oferta de serviços e bens necessários à produção
regional.
Dessa forma, podemos pensar Barra do Garças como uma cidade média, admitindo
que a cidade se avigora como um centro que exerce essa função de fornecer bens e serviços
necessários à economia agropecuária que se desenvolve em sua hinterlândia.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma rede urbana se materializa caracterizada pela formação espacial que a permeia,
revelando suas particularidades, por meio da combinação e da recombinação dos elementos
espaciais no processo de sobreposição de tempos, no qual, a rede urbana está associada. O
território brasileiro enquanto recorte escalar, apresenta grande diversidade nos segmentos de
rede que formam a rede urbana brasileira, estando associados aos diferentes contextos e as
formações espaciais aqui materializadas.
Nesse contexto, o segmento de rede de Barra do Garças, expressa suas características
mediante à combinação de seus elementos espaciais no tempo. A gênese, a posição
geográfica, o tamanho demográfico, as funções, as interações espaciais e o padrão do
segmento de rede de Barra do Garças exprimem sua materialização sob o modo capitalista de
produção, num espaço integrado “recentemente” aos processos produtivos, tendo na
27
agropecuária a força motriz para a gênese e o desenvolvimento da maioria dos centros que a
compõem.
Podemos identificar genericamente, três momentos privilegiados da história desse
segmento. O primeiro está na origem embrionária das cidades de Barra do Garças e
Aragarças, por meio do garimpo de diamantes, conferindo “espontaneamente” a posição
geográfica da principal cidade do segmento. O segundo refere-se à instalação da base da
Fundação Brasil Central em Aragarças, que incrementa a posição geográfica, e, inicia o
processo de integração aos processos produtivos. O terceiro está relacionado à instalação dos
projetos de colonização agropecuária que fragmenta o território de Barra do Garças,
originando novos centros urbanos, dando forma a um segmento de rede urbana, por meio das
funções urbanas necessárias ao desenvolvimento do agronegócio, intensificando as interações
espaciais entre os centro hierarquicamente.
No que tange às formações espaciais, o segmento de rede de Barra do Garças forma-se
sobre uma formação de fronteira, mas se consolida, com a instalação da formação espacial
fundada na grande propriedade rural, caracterizada pela pequena densidade de centros, frente
as grandes dimensões territoriais na qual se espacializa. São vinte e sete centros urbanos
bastante espaçados, que convergem suas relações para Barra do Garças, organizando num
padrão espacial de rede urbana solar.
Dadas as condições espaciais desse segmento de rede, pensamos Barra do Garças
enquanto uma cidade média, haja vista que a cidade exerce uma influência regional que
alcança um vasto território entre os estados de Mato Grosso e Goiás, servindo como o centro
de comércio e prestação de serviços que subsidiam as atividades agropecuárias na região.
Vale considerar o processo de conurbação não metropolitana, no qual Barra do Garças
tem sua área urbana coalescente com Aragarças e Pontal do Araguaia. Tal processo,
potencializa o alcance espacial mínimo, o que demanda mais fixos, que por sua vez aumenta
seu alcance espacial máximo, atraindo e difundindo novos fluxos. Assim, num movimento
dialético, Barra do Garças amplia seus espaço de atuação e mantém-se como centro de gestão
e de controle de sua hinterlândia, avigorando seu papel de uma das mais importantes cidades
do estado de Mato Grosso.
REFERÊNCIAS
28
CORRÊA, Roberto L. O estudo da rede urbana: uma proposição metodológica. Revista
Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, ano 50, n.2 p.107-124, abr./jun., 1988.
______. Rede urbana e formação espacial – uma reflexão considerando o Brasil. Revista
Território, Rio de Janeiro, ano V, n.8, p. 121-129, jan./jun., 2000.
______. Uma nota sobre o urbano e a escala. Revista Território. Rio de Janeiro, Ano VII,
n.11, 12 e 13, p.133-136, set./out. 2003.
______. Construindo o conceito da cidade média. In: SPOSITO, Maria Encarnação (Org.).
Cidades médias - espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p. 15-25
GRAZIANO NETO, Francisco. Questão agrária e ecologia. São Paulo: Brasiliense, 1986.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em:
<http://censo2010.ibge.gov.br/>. Acesso em: 10 de dezembro de 2014.
______. Regiões de influência das cidades 1993. Rio de Janeiro: IBGE, 2000.
______. Regiões de influência das cidades 2007. Rio de Janeiro: IBGE, 2008.
SANTOS, Milton. Sociedade e espaço: a formação social como teoria e método. Boletim
Paulista de Geografia, São Paulo: ABG, n.54, p.81-99, jun., 1977.
29
SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do
século XXI. 3. ed. São Paulo: Record, 2001.
______.(Org.). Cidades médias: espaços em transição. 1. ed. São Paulo: Expressão Popular,
2007.
30
Elementos do espaço periurbano – análise preliminar das urbanizações ao
longo do vetor sul de expansão da Região Metropolitana de Belo Horizonte,
considerando os eixos da BR040 e da BR356, até o aglomerado urbano de
Conselheiro Lafaiete-Congonhas-Ouro Branco.
Alfio Conti11
Alexandre Vieira12*
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo investigar as novas urbanizações, fruto do processo de
periurbanização do espaço metropolitano e perimetropolitano da capital mineira. Em
particular, é dada atenção àquelas que se desenvolveram ao longo da rodovia federal BR040 e
BR356 incorporando o aglomerado urbano chefiado pela cidade média de Conselheiro
Lafaiete e pertencente à porção sul da região leste sudeste da zona perimetropolitana de Belo
Horizonte. O trabalho pretende caracterizar as novas urbanizações presentes neste espaço,
compreender as lógicas associadas à sua distribuição espacial e de qual forma estruturam este
espaço regional que se torna cada vez mais importante para a metrópole mineira e para o
fortalecimento do aglomerado urbano em questão.
A zona perimetropolitana de Belo Horizonte (Figura 1) estudada por Conti (2009) se compõe
de regiões com redes urbanas articuladas e complexas tendo a presença de centros urbanos de
dimensões importantes, muitos dos quais em processo de crescimento, com a criação de
espaços periurbanos próprios, estimulados mais ainda pelo fato de que muitos destes centros,
em geral da mesma ordem, possuem como cenário, em uma perspectiva de curto e médio
prazo a conurbação (Figura 2).
11
Alfio Conti, Departamento de Urbanismo da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais-
EAUFMG, LABGEO Laboratório de Geoprocessamento.
12
Alexandre Vieira bolsista, graduando do curso de arquitetura e urbanismo da EAUFMG.
* O autor não apresentou o trabalho e não participou do evento.
31
Figura 1: Regiões e hierarquia urbana da zona perimetropolitana atual. Fonte: Conti, 2009.
Pode-se pensar também que, mesmo se tratando de um espaço contínuo, no que diz respeito à
estruturação do território e aos processos de polarização existentes entre a zona
perimetropolitana e a própria metrópole, a existência de periurbanizações seja decorrente, de
um lado, de processos de descentralização e/ou de periferização, ligados mais diretamente às
consequências da organização interna da metrópole, e, do outro, de processos que, embora
parecidos, desenvolvem-se em uma escala menor, sendo presentes também nos maiores
centros urbanos.
32
Figura 2: Hierarquia urbana, hierarquia funcional e fenômenos espaciais presentes nos municípios
pertencentes à zona perimetropolitana atual. Fonte: Conti, 2009.
Não se pretende sustentar a tese de que estas periurbanizações sejam distintas e diferentes do
ponto de vista estrutural, visto que a polarização da metrópole constitui um forte fator
unificador, mas apontar para esta questão como possível elemento a mais para a compreensão,
tanto dos novos elementos espaciais urbanos (territórios morfológicos/novas urbanizações)
em si, quanto para a compreensão das dinâmicas que ocorrem dentro das regiões que
compõem a zona perimetropolitana, com relação às zonas mais periféricas do modelo de
caracterização morfológico-funcional (AMORIM FILHO, 2007) dos centros urbanos
existentes.
A análise exploratória conduzida no trabalho de Conti (2009) aponta a existência de vetores
de crescimento perimetropolitano, ao longo dos quais se encontram as novas urbanizações que
se caracterizam como territórios morfológicos distintos, apresentando diferentes tipologias em
termos morfológico-funcionais e físico-morfológicos e que são claramente, em grande parte,
consequências de processos de descentralização metropolitana.
Os vetores de crescimento, ao longo dos quais são encontradas as novas urbanizações, são as
grandes artérias rodoviárias federais e estaduais que saem radialmente da metrópole. Assim,
as novas urbanizações que caracterizam o processo de difusão territorial se localizam ao longo
delas, em muitos casos aparecendo também naqueles espaços rurais que ainda existem dentro
33
dos limites administrativos dos municípios mais periféricos da RMBH. Por esta razão, poder-
se-ia afirmar que possa talvez existir uma parte da zona perimetropolitana ainda dentro dos
limites administrativos da RMBH, que mereceria ser estudada e que justifica as dificuldades
que Conti encontrou na hora da caracterização dos limiares entre a RMBH e a zona
perimetropolitana.
As novas urbanizações, localizadas ao longo destas rodovias no espaço que vai da metrópole
até os primeiros grandes centros urbanos localizados ao longo das mesmas, são aquelas que,
em geral, se caracterizam por ser resultado do processo de descentralização metropolitana.
Com isso não se pretende dizer que não sejam encontradas novas urbanizações com estas
características em localizações mais longínquas, mas que, neste caso, possa aparecer um
maior número de novas urbanizações originadas a partir de processos de periurbanização dos
próprios centros urbanos perimetropolitanos.
As novas urbanizações, resultado do processo de periurbanização dos centros
perimetropolitanos, encontram-se localizadas também ao longo de eixos viários em alguns
casos de importância menor, em decorrência da proximidade com centros urbanos maiores.
34
A introdução deste novo conceito se deve a duas razões. Em primeiro lugar, pelas escalas e
dinâmicas com as quais se dá o crescimento recente, em geral com um caráter mais territorial
e com traços dominantes de heterogeneidade e de descontinuidades espaciais. Em segundo
lugar porque, segundo os autores, as áreas periurbanas seriam constituídas pela agregação de
materiais morfológicos diversos e apresentariam também algumas formas tradicionais de
crescimento residencial ou industrial ao lado de outras formas mais novas, sendo,
materialmente, o resultado de diversas intervenções (loteamentos, urbanização, construção de
novas edificações, etc.) unitárias ou distantes no tempo, que se sobrepuseram uns aos outros
até atingir a configuração atual (FONT; CARRACEDO; VECSLIR, 2005).
A definição de “territórios morfológicos” foi elaborada na tentativa de estabelecer uma
distinção entre as dinâmicas ou tendências ao crescimento (de dispersão, de difusão,
polarização, transformação interna, etc.) e as transformações recentes, a configuração espacial
das zonas periurbanas e as formas das suas manifestações físicas, ou seja, os “territórios
morfológicos”, embora, às vezes, algumas denominações sejam consequência dos processos.
Ao se observar os elementos constitutivos dos assim chamados “territórios morfológicos”,
pode-se afirmar que, no geral, são formados por materiais urbanos tradicionais. O que os
tornam novidade são as novas formas de articulação, as modalidades de utilização e,
sobretudo, a localização territorial e as dinâmicas que determinaram seu comparecimento.
No caso da zona perimetropolitana de Belo Horizonte a investigação apontou a existência de
algumas das tipologias caracterizadas por Font, Carracedo e Vecslir (2005) e que são
reportadas em seguida. No trabalho de Conti (2009) o autor notava a ausência de duas
tipologias que não foram, por ele, encontradas como o “filamento” e a “difusão”,
provavelmente em razão das condicionantes físico-geográficas, que diferem bastante daquelas
existentes nos espaços geográficos onde se encontram estas tipologias. Entretanto uma análise
mais aprofundada efetuada no espaço geográfico considerado como estudo de caso para este
trabalho, revelou a existência da primeira.
Com relação ás outras tipologias o autor analisa a presença de cada uma.
2.1. Agregados.
35
centros existentes, podem ser confundidas com urbanizações pertencentes à periferia destes,
no entanto suas dimensões e características em termos de densidades e usos previstos torna-os
autônomos, conformando-os como urbanizações periurbanas. Estas novas urbanizações são
encontradas facilmente na zona perimetropolitana de Belo Horizonte, especialmente naqueles
centros que ocupam os níveis mais altos da hierarquia urbana e se qualificam como o
resultado de processos que conjugam a difusão urbana e populacional no território
perimetropolitano a processos especulativos de parcelamento da terra rural.
2.2. Mutações.
36
primeiras ou segundas casas, entretanto vários estudos (COSTA, 1994; MONTE-MÓR, 2003;
COSTA et al., 2006) apontam para a transformação da segunda casa em residência fixa em
muitos dos novos assentamentos próximos àqueles municípios periféricos da metrópole; e é
possível que este fenômeno esteja se alastrando, impulsionado pelo processo de recuperação
da rede rodoviária regional iniciado nos últimos anos. A recuperação e melhoria da rede
rodoviária constitui um fator determinante na difusão urbana garantindo a mobilidade e
facilitando os deslocamentos.
Não obstante estas novas urbanizações serem encontradas em todo o espaço
perimetropolitano, são particularmente concentradas ao longo das rodovias mais importantes
como a BR-040, tanto na porção sul em direção a Congonhas, quanto na porção norte
alcançando e ultrapassando Sete Lagoas, e ao longo da BR-356, que liga Belo Horizonte a
Ouro Preto, especialmente no trecho que vai de Itabirito a Ouro Preto. Neste último caso, a
presença é tão difusa que levou a se definir a hipótese de que esteja em curso um processo de
conurbação entre Itabirito e Ouro Preto, por meio deste tipo de urbanizações, baseado,
portanto, em um espaço com um uso urbano residencial de baixa densidade.
Na zona perimetropolitana de Belo Horizonte, foram encontradas algumas novas urbanizações
pertencentes a esta tipologia localizada, porém não mais às margens de rodovias, mas às
margens de represas. Esta situação é encontrada naquelas represas que não são mananciais
para captação de água da COPASA ou de outras concessionárias dos serviços de saneamento
básico, e parecem estar fortemente ligadas com os centros urbanos a elas próximos, como é o
caso de Itaúna com a Barragem do Benfica, Divinópolis com a Barragem de Carmo do
Cajuru, Formiga com a represa de Furnas etc.
2.4. Urbanizações.
Este tipo de nova urbanização configura-se como algo alternativo aos novos assentamentos,
pois surge quase que espontaneamente ao longo de uma rodovia, às vezes impulsionada pela
localização, a posteriori, de indústrias de vários portes, o que estimula seu processo de
crescimento, mas não necessariamente o processo de desenvolvimento com o ganho de
autonomia e identidade própria. É composta, em geral, por habitações individuais e por uma
população com um perfil socioeconômico de renda de media a baixa.
37
Esse tipo de nova urbanização pode ser encontrado em lugares específicos como
entroncamentos rodoviários ou entroncamentos multimodais e mesmo nesta situação a
urbanização mantém as características mencionadas anteriormente.
Esse tipo de nova urbanização está associado aos grandes eixos viários e, em muitos casos, a
partir de preexistências locais que serviram como suporte para um novo processo de
urbanização que, em geral, não chega a constituir uma entidade autônoma e fechada como a
maioria dos novos loteamentos. Trata-se de um espaço urbano que evolui de maneira lenta e
gradativa mantendo as características locais e transformando-se na medida em que adquire
equipamentos e atividades produtivas de porte variado.
Este tipo de urbanização se caracteriza pela presença de áreas de uso misto com a presença de
residências e indústrias de vários portes, estas últimas localizadas estrategicamente às
margens das rodovias.
Trata-se de um tipo de urbanização cuja presença na zona perimetropolitana de Belo
Horizonte é recente, mas não se trata de uma novidade, pois este tipo de urbanização
encontra-se já dentro do espaço metropolitano ao longo das rodovias mais importantes. O
espaço ao longo do qual se encontra uma presença significativa desta urbanização na RMBH
é, talvez, o trecho da BR-381, de Contagem até Betim. Para a zona perimetropolitana este
processo encontra-se em vários lugares, ainda em sua fase inicial, mas com uma perspectiva
de franco crescimento, e, em geral localiza-se ao longo das rodovias, em proximidade dos
centros urbanos para o caso da cidade de Conselheiro Lafaiete.
Em alguns casos as agregações lineares se caracterizam por serem compostas somente por
indústrias de vários portes, como acontece no trecho da MG-431 entre Itaúna e Pará de
Minas.Neste caso específico existe a hipótese de que este tipo de urbanização possa gerar um
tipo particular de conurbação entre os dois centros em questão caracterizada por uma baixa
densidade e um uso residencial não predominante, pelo menos por certo tempo.
38
3. O espaço geográfico do vetor sul de expansão da Região Metropolitana de Belo
Horizonte, considerando os eixos da BR040 e da BR356 até o aglomerado urbano de
Conselheiro Lafaiete-Congonhas e Ouro Branco (CL-CG-OB).
Escopo deste trabalho é enfocar o estudo das novas urbanizações decorrentes do processo de
periurbanização na escala regional envolvendo a RMBH e a zona perimetropolitana com um
maior grau de detalhe. Para poder fazer isso foi escolhido como espaço geográfico para
análise, no que tange à RMBH os eixos constituídos pela BR356 e BR040 dentro do seu, cada
vez mais importante, vetor sul de expansão, e, no que tange à zona perimetropolitana, o
aglomerado urbano de CL-CG-OB que se localiza, na sua maior parte ao longo da BR040 a
uma distância em torno de 70 km do centro metropolitano.
Trata-se de um espaço geográfico que incorpora uma parte importante da RMBH, objeto de
investigações recentes em virtudes das dinâmicas em curso (COSTA et al., 2006) e objeto das
análises e propostas para o Plano Diretor Metropolitano ainda em fase de elaboração. Os eixos
da BR040 e BR356 constituem dois dos três eixos que compõem o vetor sul da RMBH. O
terceiro é composto pela rodovia estadual MG030 que liga em direção leste a metrópole de
Belo Horizonte à cidade de Nova Lima e, continuando nesta direção liga também os
municípios de Rio Acima, Itabirito e Ouro Branco. Dos três eixos que compõem o vetor sul
aquele considerado como o mais importante é o eixo composto pela MG030 especialmente no
seu trecho entre Belo Horizonte e Nova Lima. A importância se deve ao processo de
alastramento da ocupação urbana que foi implementado principalmente através da abertura de
loteamentos/condomínios para grupos de alta renda, criando um continuum urbano que chega
ao município sede de Nova Lima, embora, de forma descontinua, este processo ocorra
também em municípios adjacentes, principalmente em Raposos e em Rio Acima. Apesar de
sua aclamada importância este eixo pode ser colocado, de fato, em um patamar inferior ao
eixo da BR040, objeto deste trabalho, principalmente no que diz respeito á potencialidade de
evolução em médio e longo prazo, já que, para o eixo da MG030, esta resulta ser limitada pela
infraestrutura rodoviária estadual que não apresenta possibilidades, até agora e possivelmente
por um bom tempo ainda, de se estender e duplicar para além da cidade de Nova Lima. Já o
eixo da BR040, no que diz respeito a estas questões desponta, apresentando grande
potencialidade de expansão e crescimento considerando:
- o processo de duplicação em curso decorrente da concessão da rodovia à iniciativa privada;
39
- a pressão imobiliária existente especialmente na região do Alphaville com a previsão da
construção de shopping centers e outlets e a implantação de indústrias de tecnologia de ponta;
- a presença de atividades produtivas de impacto como a fábrica da Coca-Cola que está sendo
ultimada;
- e, por ultimo, o fato que se trata de uma rodovia que une a metrópole mineira á metrópole
carioca, tendo ao longo dela importantes cidades na escala estadual como Juiz de Fora e
Barbacena e na escala perimetropolitana as cidades que formam o aglomerado urbano de CL-
CG-OB.
Já o terceiro eixo da BR356 que liga Belo Horizonte a Itabirito é, dos três eixos que compõem
o vetor sul, o menor, e aquele que apresenta uma possibilidade limitada de desenvolvimento
principalmente por questões associadas à topografia. Se haverá desenvolvimento deste eixo,
isso será reflexo do crescimento e consolidação do eixo da BR040.
Este espaço incorpora também uma parte importante da zona perimetropolitana pertencente à
região leste sudeste (CONTI 2009) na qual se localiza o aglomerado urbano de CL-CG-OB
(CONTI 2013). Este aglomerado urbano foi investigado por Conti (2012, 2013) apontando
como ele polarize a sub-região sul da região leste sudeste, e é composto por três cidades:
Conselheiro Lafaiete, Congonhas e Ouro Branco. Conselheiro Lafaiete é o centro de maiores
dimensões (116.527 hab.) e pertence á categoria de cidade média de nível superior 13.
Congonhas com uma população de 48.550 hab. situa-se no limiar superior do nível
hierárquico de centro emergente, podendo ser considerado como um centro emergente de
ordem superior, por última a cidade de Ouro Branco, com 35.260 hab. é, também, um centro
emergente que ocupa o nível intermediário desta categoria. O aglomerado urbano totaliza
200.337 hab. segundo o censo de 2010 e a taxa de crescimento das suas cidades é positiva e
elevada. Todas elas têm taxa de crescimento acima de 1,00% a.a., mas se as altas taxas de
crescimento não surpreendem para os centros emergentes (Congonhas tem uma taxa de
crescimento de 1,77% a.a. e Ouro Branco de 1,61% a.a.)14, surpreendente é a alta taxa de
crescimento de Conselheiro Lafaiete que, por ser uma cidade média de nível superior, é de
1,33% a.a.. É razoável pensar que um fator que contribui para manter alta a taxa de
13
Para a definição de hierarquia urbana utilizaram-se os conceitos desenvolvidos pelo professor Oswaldo Bueno
Amorim Filho.
14
As altas taxas de crescimento das cidades pertencentes à categoria de centros emergentes resultam ser um
padrão encontrado, também, na análise dos outros aglomerados urbanos que constituem a região leste sudeste, a
saber, o aglomerado urbano de Ouro Preto-Mariana e Itabirito, que polariza a sub-região central da região leste
sudeste e o aglomerado urbano de Itabira, João Monlevade, Nova Era, São Gonçalo do Rio Abaixo, Rio
Piracicaba, Bela Vista de Minas que polariza a sub-região norte da região leste sudeste.
40
crescimento deste centro urbano (o mesmo pode ser dito para o centro emergente de
Congonhas), seja sua localização estratégica às margens da rodovia federal BR040.
As altas taxas de crescimento associadas ao desenvolvimento econômico apontam para o
iminente ingresso, tanto de Congonhas, quanto de Ouro Branco, na categoria das cidades
médias propriamente ditas e para um fortalecimento, ainda maior, deste aglomerado urbano.
A base econômica do aglomerado é articulada, pois cada cidade possui uma base econômica
diferente e isso, comparado com as taxas de crescimento, é fator positivo para o
desenvolvimento e crescimento futuro do aglomerado. O setor econômico predominante em
Ouro Branco o é a indústria, que atinge um valor de 73,38% do total da economia do
município, para Congonhas a base econômica é dividida entre o setor de serviços com 53,13%
e o setor da indústria com 46,44% e para Conselheiro Lafaiete o setor econômico dominante é
dos serviços com 82,95%. A base econômica principal deste aglomerado é o setor dos
serviços com 51,81% contra o 40,70% do setor da indústria.
41
ocupação deste espaço com a consolidação destes primeiros loteamentos e o aparecimento de
um novo perfil de morador começa a partir da década de 1990. O novo morador, como afirma
Andrade, era “preocupado com a segurança e a exclusividade e portador de maiores posses”
(ANDRADE, 2006).
Figura 3: Novas urbanizações presentes no vetor sul da RMBH nos eixos da BR040 e BR356 e no
aglomerado urbano de CL-CG-OB Fonte: Organizada pelos autores e elaborada por Alexandre Augusto
Vieira.
42
A autora ressalta que, a partir dessa época, os loteamentos viraram condomínios fechados,
com o controle do acesso, com a melhoria da infraestrutura e a imagem deles acaba mudando
de uma forma definitiva. Paralelamente à valorização imobiliária que ocorre de uma forma
quase que generalizada, neste espaço, no final da década de 1980, há a criação de um mercado
imobiliário especifico com a oferta planejada de novos empreendimentos para este tipo de
público visando incorporar as exigências de controle, segurança, sofisticação e exclusividade.
Outro aspecto importante é o aparecimento de empreendimentos comerciais voltados para
atender este tipo de público (ANDRADE, 2006). Localizados nos assentamentos urbanos
mais antigos e mais estruturados como o caso do Jardim Canadá, do Vale do Sol, são
empreendimentos comerciais instalados em lugares abertos permitindo o acesso a todos os
moradores desta região. Já no final da década de 1990 na implantação do Alphaville os
empreendimentos comerciais localizados nele visam atender quase que exclusivamente os
moradores locais.
O processo de periurbanização continua na década de 2000 e na década atual com o
alastramento dos empreendimentos para localizações com acessos mais difíceis e sustentando-
se em pré-existências urbanas antigas como o caso do distrito de Casa Branca, Piedade do
Paraopeba, e do município de Moeda.
Este processo de periurbanização ocorre de maneira diferente no caso do aglomerado urbano
de CL-CG-OB.
Em primeiro lugar trata-se de um processo mais recente que começa na segunda metade da
década de 1990, (Figura 4) com o aparecimento de loteamentos em entroncamentos rodo-
ferroviários e a implantação de loteamentos em espaços predominantemente rurais.
Em segundo lugar, ao contrário de quanto foi visto para a ocupação do espaço periurbano da
capital mineira, não se trata de espaços de recreação, e o perfil de moradores não é de grupos
de alta renda. Com isso as novas urbanizações no espaço periurbano do aglomerado urbano de
CL-CG-OB se configuram com características de espaços urbanos tradicionais em um
processo de consolidação. Boa parte deste processo se desenvolve sustentado por estruturas
urbanas existentes e mais antigas como o caso de Lobo Leite que é uma ocupação iniciada no
século XVIII e Joaquim Murtinho que se desenvolve a partir de uma ocupação situada no
entroncamento da rodovia BR040 com a rodovia BR383.
43
Figura 4: Coleção de mapas das Manchas Urbanas de Conselheiro Lafaiete, Congonhas e Ouro Branco –
1978 – 1988 -1998 – 2008. Fonte: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA,
GEOMINAS.
44
mancha urbana, podendo resultar, caso consigam vingar do ponto de vista imobiliário, tanto
em novos assentamentos quanto em possíveis agregados.
Outro aspecto que chama atenção com relação a esta tipologia é o fato que se trata de uma
tipologia que se localiza na proximidade de outras tipologias sustentando-se uma com a outra,
criando coalescências de condomínios fechados, ou apoiando-se a tipologias de outra
natureza, principalmente na tipologia das urbanizações.
Figura 5: Tipologias das novas urbanizações presentes no vetor sul da RMBH nos eixos da BR040 e
BR356 e no aglomerado urbano de CL-CG-OB Fonte: Organizadas pelo autores e elaborada por
Alexandre Augusto Vieira.
45
A tipologia da urbanização é aquela que desperta maior atenção, porque, analisando sua
distribuição e localização percebe-se como seja importante, uma vez que acaba estruturando
este espaço e gerando novas centralidades na escala regional. Entre estas centralidades
destaca-se a centralidade da urbanização do Jardim Canadá, seguida por aquela da
urbanização do Alphaville e Vale do Sol, esta ultima consolidando a centralidade da
urbanização do Jardim Canadá, a qual é considerada pelos estudos do Plano Diretor
Metropolitano como uma centralidade metropolitana. Sempre nesta porção do espaço
geográfico estudado se destacam, embora em um grau menor daquelas analisadas até agora, as
urbanizações de Casa Branca e Piedade do Paraopeba. Tanto Casa Branca quanto Piedade do
Paraopeba são distritos do município de Brumadinho e assentamentos urbanos mais antigos
que constituíram, principalmente no caso de Casa Branca o suporte para a implantação de
vários condomínios fechados nesta região; região esta que se divide entre a Casa Branca e seu
conjunto de condomínios fechados e a coalescência de novos assentamentos, todos eles
condomínios fechados que fazem referência ao condomínio Retiro do Chalé. Esta
coalescência de novos assentamentos serviu de estímulo para o crescimento e consolidação de
assentamentos pontuais, surgidos a partir de antigas urbanizações rurais. Os assentamentos
pontuais localizados próximos aos condomínios fechados tem a função de atender, do ponto
de vista comercial e de mão de obra, os condomínios próximos.
Continuando com a análise da tipologia das urbanizações estas aparecem no aglomerado
urbano de CL-CG-OB situando-se no eixo CL-CG com a urbanização de Joaquim Murtinho
localizada no entroncamento da BR040 e BR383 e em forte fase de crescimento, e no eixo
CG-OB com a urbanização de Lobo Leite.
Outra tipologia importante encontrada neste espaço geográfico é a mutação. Localizada ao sul
da urbanização do Alphaville a mutação estrutura-se a partir da implantação da fábrica da
Coca-Cola e da presença do distrito industrial de Itabirito, envolvendo e estimulando o
crescimento do espaço em sua volta, gerando um conjunto composto de fábricas, residências,
usos comerciais e de serviços e criando uma nova centralidade.
A implantação da fábrica foi o fator principal que impulsionou a ocupação do Balneário Água
Limpa, um loteamento pré-existente aprovado na década de 1940, com mais de treze mil
lotes, mas que foi ocupado, desde então, só parcialmente ás margens da BR040. Atualmente
são alguns milhares os lotes ocupados, muitos de maneira irregular, após o processo de
instalação da fábrica, que ainda não está concluído. Junto a fábrica da Coca-Cola e do
Balneário Água limpa encontra-se o Ville des Lacs, um condomínio fechado pré-existente á
46
implantação da fábrica. Nas proximidades em direção ao sul, ao longo da BR040, encontram-
se três novos assentamentos, três condomínios fechados que possuem certo grau de autonomia
com relação à mutação, mas que possivelmente em prazo médio podarão, de alguma maneira,
ser afetados.
Na parte central do espaço estudado encontram-se poucas novas urbanizações. A diminuição
da presença de tipologias deve-se de um lado ao distanciamento da RMBH e do outro à
presença de grandes áreas de mineração, aliás, este é um aspecto a ser destacado, pois a
presença de áreas de mineração neste espaço geográfico é algo significativo gerando em
muitos casos conflitos entre as associações de moradores e as empresas de mineração.
A partir da parte central deste espaço destaca-se a presença da tipologia dos assentamentos
pontuais mais presentes no aglomerado urbano de CL-CG-OB, ao longo do eixo CL-CG,
onde se encontram em maior numero e ao longo do eixo CG-OB. Esta tipologia parece estar
associada a um processo de ocupação do espaço periurbano que mistura crescimento
espontâneo à implantação de loteamentos com padrões modestos para grupos de renda media
ou baixa. A presença destes elementos do periurbano ao longo das rodovias que ligam os
centros urbanos do aglomerado, se de um lado apontam para a consolidação do aglomerado
urbano em si, do outro apontam, também, para a possibilidade da materialização do processo
de conurbação entre os centros urbanos, principalmente entre Conselheiro Lafaiete e
Congonhas em médio e longo prazo. Como destacou Conti (2012) na atualidade os sinais
mais evidentes deste processo são aqueles de uma conurbação entre as novas urbanizações
entre si, podendo este constituir a primeira etapa do processo de conurbação entre os centros
urbanos.
Uma tipologia presente exclusivamente no aglomerado urbano de CL-CG-OB é aquela dos
agregados, formada por assentamentos próximos da mancha urbana, mas que possuem já certa
independência com relação ao comércio e serviços. Os aglomerados encontrados estão
localizados perto de Congonhas com o Jardim Profeta e de Ouro Branco com o conjunto de
bairros que fazem referência ao Primeiro de Maio. Uma tipologia pouco presente e localizada
distante da RMBH é aquela das agregações lineares. Os dois exemplos encontrados estão
localizados ao longo da BR040 como parte do aglomerado urbano de CL-CG-OB.
Por último cabe analisar a tipologia dos filamentos que são encontrados próximos da
coalescência de condôminos que fazem referência ao Retiro do Chalé e no aglomerado de CL-
CG-OB. Trata-se de uma tipologia que foi considerada como tipologia presente no espaço
periurbano e perimetropolitano por Conti em 2012 no trabalho que investigava o aglomerado
47
urbano de CL-CG-OB. Do ponto de vista da sua importância para a estruturação do espaço
periurbano tem que se dizer que é uma tipologia de surgimento espontâneo, na maior parte
dos casos associada a outras tipologias, principalmente novos assentamentos, assentamentos
pontuais e agregações lineares, principalmente como elemento de conexão e de possível
expansão de estruturas urbanas pré-existentes.
A coleção de mapas a seguir (Figura 6) permite uma visão de conjunto com a localização de
cada tipologia de maneira especifica.
Figura 6: Coleção de mapas das tipologias das novas urbanizações presentes no vetor sul da RMBH nos
eixos da BR040 e BR356 e no aglomerado urbano de CL-CG-OB Fonte: Organizada pelos autores e
elaborada por Alexandre Augusto Vieira.
5. Conclusões
48
- destacando como as novas urbanizações constituam elementos importantes para a
estruturação do território, tanto no espaço metropolitano quanto perimetropolitano.
Foi possível analisar a constituição deste espaço através da distribuição destes elementos,
verificando a presença de diferentes lógicas de implantação associadas ao aparecimento das
novas urbanizações e das respectivas tipologias e de como estas busquem, como objetivo
comum, estruturar este espaço com matrizes de ordem urbana cada vez mais complexas,
constituindo centralidades com polarizações regionais e metropolitanas.
Foi possível destacar também como as novas urbanizações sejam presentes no espaço
periurbano das cidades que pertencem ao aglomerado urbano de CL-CG-OB evidenciando
como estas concorrem para fortalecer a estruturação e a consolidação desta nova realidade
urbana na escala regional. Todo isso acaba sustentando a tese de que, para os aglomerados
urbanos da região leste sudeste da zona perimetropolitana de Belo Horizonte possa se falar de
novos formatos urbanos decorrentes da integração das cidades que os compõem.
Contudo, pode-se entender o papel de cada tipologia das novas urbanizações desvendando sua
importância. Tornou-se visível a importância das urbanizações e das mutações como
elementos estruturadores e catalisadores do processo de periurbanização, criando um
arcabouço espacial de suporte para as outras tipologias e constituindo-se, ao longo do tempo,
como novas e cada vez mais importantes centralidades.
Verificou-se, também, como algumas tipologias, principalmente aquela dos novos
assentamentos constitua um indicador da maturidade do processo de periurbanização, pois,
especialmente no caso dos condomínios fechados, estas aparecem como uma das últimas
tipologias. Esta situação é visível e palpável, no caso do aglomerado urbano de CL-CG-OB
apontando que, para esta realidade, o processo de periurbanização encontra-se em fase
adiantada.
Para concluir cabe afirmar que são necessárias mais investigações no espaço
perimetropolitano de Belo Horizonte para entender de maneira mais profunda sua constituição
e suas dinâmicas, sendo este espaço a nova fronteira para o desenvolvimento de um espaço
regional equilibrado que sirva de contraponto aos desequilíbrios e aos problemas estruturais
presentes na metrópole mineira, e acredita-se que isso possa ser estendido ás zonas
perimetropolitanas das metrópoles brasileiras em geral.
49
Referencias Bibliográficas
50
Cidade média e especialização funcional: o caso de viçosa-mg
Resumo
As funções das cidades médias na rede urbana brasileira são muitas e variadas, podendo se
apresentar de forma altamente especializada. Esse especialização funcional na rede urbana é o
que se pretende abordar no texto a seguir utilizando-se como estudo de caso a cidade de
Viçosa localizada na Zona da Mata de Minas Gerais. Verificou-se a especialização funcional
urbana voltada ao ensino superior e à ciência através de diversos dados correlacionados a
estudos anteriormente realizados sobre a rede urbana brasileira.
Palavras-chave: rede urbana; especialização; Viçosa
Introdução
Há na geografia brasileira uma vasta literatura sobre o tema das cidades médias com
diversos estudos de caso (ELIAS et al. 2010, Nogueira, 2003 SPOSITO et al. 2006, 2007 e
2012). Esses estudos, no entanto, trabalham com cidades médias de grande porte, ou na
compreensão de Amorim Filho (2007) de porte superior, cujas funções reticulares são
diversas e abrangentes, normalmente coordenam diversas funções na esfera produtiva e
serviços diversos. Esses trabalhos acabam por não abordar de forma prioritária a questão da
especialização funcional urbana.
A proposta desse artigo é trabalhar a questão da especialização funcional urbana que
caracteriza a cidade de Viçosa-MG e cuja principal função reticulada está vinculada a
produção de ciência e tecnologia vinculada ao ensino superior. Para tanto, primeiramente
introduziremos algumas reflexões teóricas sobre o tema e em seguida iremos expor os
argumentos para tanto.
________________________________________________________________
1
Pesquisa realizada sob orientação de Ana Lucy Oliveira Freire da Universidade Federal do Espírito Santo
1
Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Minas Gerais – Bolsista CAPES,
51
A preocupação com as cidades médias tem sua gênese extremamente vinculada ao
planejamento, fato que explica a qualificação de médias, moyennes ou metropolis d’equilibre,
mid-sized cities, o que denota tamanho médio ou porte médio, ponto de equilíbrio entre a
metrópole e os pequenos centros locais, uma noção idealista segundo Corrêa (2007). Essa
noção idealista de algo médio, e a preocupação com a reversão das tendências macrocefálicas
na França e na Inglaterra levou a uma vinculação de cidade média classificada pela faixa
populacional, um atraente aspecto de hierarquização urbana (MATOS, 2000). Atualmente a
ilusão de se classificar facilmente essas cidades por um viés populacional já foi amplamente
discutida e rebatida por Amorim Filho e Rigotti (2002), Costa (2002), Corrêa (2007), Pontes
(2001), Santamaria (2000), Soares (1998), e não cabe aqui reproduzir a totalidade desse
debate já consolidado. A variação desses critérios é gigantesca, variando entre países e
instituições. Um exemplo que podemos apontar é dados pelo CIMES (UNESCO et al., 1999),
que projeta cidades médias entre 20 mil e 2 milhões de habitantes.
O que tem realmente caracterizado as cidades médias na atualidade são suas relações com a
rede urbana. A importância que elas têm ganhado tem relação direta com as mudanças
recentes na estrutura da hierarquia urbana.
[…] uma nova divisão social e territorial do trabalho, que seleciona e transforma as
funções metropolitanas ainda preservadas, impondo, simultaneamente, novas
funções (e atributos) a cidades de diferentes tamanhos e, sobretudo, às cidades de
porte médio nos processos de modernização […]. (RIBEIRO, 2006, p. 18)
Nos anos de 1990 e nos primeiros anos do século XXI, o número de pesquisas,
publicações e eventos voltados para as cidades médias alcança uma quantidade e
uma intensidade tais que é praticamente impossível para qualquer pesquisador
acompanhar tudo que se faz nesse domínio. Por isso qualquer levantamento ou
síntese sobre a situação dos estudos das cidades médias, em todas as escalas
geográficas, deverá necessariamente contentar-se com balanços incompletos e que
se concentram nas regiões, temáticas, abordagens e autores de preferência de quem
faz o estudo. (AMORIM FILHO, 2007, p. 77)
.
Essas foram o principal grupo de cidades a receber esses investimentos descentralizados, seja
por incentivos estatais ou por movimentos mais espontâneos do capital, mas geralmente pela
presença dos dois elementos.
52
Apesar de cada autor destacar algumas características através das quais eles compreendem o
que seria a cidade média, há pontos convergentes em diversos aspectos, que torna esse objeto
real mais próximo a um objeto teórico.
As cidades médias ou intermediárias “organizam seu território e agem como centro de
referência para suas, mais ou menos imediatas, áreas de entorno (UNESCO et al., 1999, p.
44)”. Existiria uma “relação direta com a área sobre qual ela é capaz de exercer influência ou,
em outras palavras, a área da qual alguém está disposto a se deslocar até uma cidade média
para nela ter acesso ao consumo de bens e serviços (SPOSITO et al., 2007, p. 37)” através de
interações constantes e duradouras (AMORIM FILHO; SERRA, 2001). Segundo Soares
(2007, p. 466) seu papel de transmissão entre a região circundante e os níveis mais elevados
da hierarquia urbana equilibram a rede urbana.
Seguindo essa perspectiva de transmissão, Castello Branco (2006, p. 247) destaca que
Sanfeliu e Torné (2004, p. 3-7), propõem a designação de
‘intermédias/intermediárias’ para as cidades médias, por ampliar seu significado,
realçar seu papel de articulação, criando e tecendo redes; por introduzir e valorizar
aspectos mais dinâmicos e estratégicos que abrem novas possibilidades de inserção
nas escalas regional, nacional e internacional e por incorporar o conceito de sistema
urbano mais aberto, dinâmico e interativo.
Essa interação se daria também pelo fato de se apresentarem como nós nos sistemas de
transporte regionais e nacionais (UNESCO et al., 1999, p. 44), o que no caso brasileiro
representa na atualidade a presença de rodovias importantes, especialmente as rodovias
federais de pista dupla. Essa posição de nó pode ser facilitada pela posição relativa da cidade
no território (CORRÊA, 2007). O acesso à internet, reduzindo a necessidade dos
deslocamentos para diversos fins de certo modo relativiza o peso desses deslocamentos
(SPOSITO et al. 2007, p. 37).
Em sua interação com as áreas rurais circundantes elas podem significar um local de
drenagem da renda fundiária (CORRÊA, 2007, p. 31), além de serem capazes de fornecer ao
campo as inovações e produtos necessários a efetivação da produção, especialmente a
produção vinculada ao circuito internacional (AMORIM FILHO, SERRA, 2001).
Essas cidades, também podem se caracterizar pelo oferecimento, especializado ou não, de
diversos serviços e produtos. Os tipos de serviços oferecidos podem estar vinculados
diretamente com a ação do Estado, quando este elege esta ou aquela localidade para receber
unidades administrativas de órgãos públicos, sejam tribunais, escritórios, escolas, quartéis,
etc. Outros serviços e certos produtos dependem também do papel da elite local, que através
53
de suas escolhas, destacadas por Nogueira (2003), Bolay e Rabinovich (2004) e Corrêa (2007)
imputam ao local certas características.
Admite-se que é essa elite empreendedora que marca a diferença com outras cidades
com a mesma dimensão demográfica, porque é ela que estabelece um relativa
autonomia econômica e política numa cidade, criando interesses locais e regionais,
competindo em alguns setores de atividades com as grandes cidade e centros
metropolitanos. (CORRÊA, 2007, p. 39).
Uma cidade média pode, e por muitas vezes, apresentar uma grande especialização funcional.
Decorrente de seu tamanho e interações limitadas em relação à metrópole ela é incapaz de
apresentar forte presença em vários setores. Este tipo de cidade média caracteriza-se pela
concentração de atividades que geram interações espaciais a longas distâncias, pois se tratam
de atividades destinadas ao mercado nacional ou internacional (CORRÊA, 2007, p. 31).
Algumas dessas cidades no Brasil apresentam forte vinculação com o agronegócio, haja visto
o peso dessa atividade na economia nacional
Tal especialização, só se torna possível diante de uma maior interação espacial com outros
centros, capazes de complementar o que é produzido e oferecido na cidade. É elemento
característico do período técnico-científico informacional. Essa especialização funcional
também pode gerar uma dependência de um único setor econômico, que torna a posição da
cidade mais frágil diante de certas crises.
UNESCO et al.(1999), destaca que apesar de apresentarem-se muitas vezes com uma
variedade cultural interna, endogâmica, são muitas vezes centro de diversas atividades
culturais.
A capacidade de liderança regional e de gerar inovações também está fortemente
vinculada à noção em pauta. As inovações tão necessárias à competitividade, vinculadas a
centros de pesquisa, se difundem pelo território como, por exemplo, na forma de tecnopolos,
são reflexos da intelectualização da produção e também da maior divisão territorial do
trabalho. “Essa especialização se deve mais as condições técnicas e sociais do que aos
recursos naturais” (SANTOS, 2009 [1996], p. 241).
A presença de classes médias, e altas, mais letradas também não significa, pelo menos
no Brasil, uma cidade cujo governo local irá se dedicar a manter as amenidades e a qualidade
de vida, uma vez que essas elites podem se isolar nos loteamentos fechados que proliferam
54
nas cidades médias, negando a própria cidade. Esse fenômeno ocorre na Europa de forma
diversa do que no Brasil, pois lá a vinculação entre cidade média e sustentabilidade é maior
(COSTA, 2002).
Como podemos notar as cidades médias/intermediárias já apresentam uma série de
características bem pontuadas, mas ainda
Viçosa é uma cidade de 72 mil habitantes localizada na Zona da Mata de Minas Gerais que
alcança o final primeira década do século XXI como uma centralidade especializada em
oferecimento de serviços de educação, notadamente superior, e produção de ciência e
tecnologia. Essa especialização funcional se dá capitaneada pela centralidade da Universidade
Federal de Viçosa, que tem se expandido proporcionalmente a sua capacidade de oferta de
vagas atraindo estudantes de todo Brasil e do exterior. Essa consolidação da instituição e sua
centralidade se dá atrelada à capacidade de produção de ciência e tecnologia, no contexto das
possibilidades dadas pela conformação do meio técnico-científico informacional, que irá cada
vez mais privilegiar os produtos intensivos em conhecimento em relação à esfera puramente
produtiva tradicional.
Essa posição da centralidade de Viçosa se dá de forma concomitante ao seu destaque na
escala regional e ao aparecimento de algumas características típicas de cidades médias.
55
extrapola a necessidade local, e esta só se sustenta mediante a interconexão com outros
lugares. O oposto também é válido, uma vez que se a localidade não oferece as funções
suficientes para fixar uma população esta pode se ver em intensa migração pendular,
transformando as cidades em meros dormitórios. Pode-se assim dizer que esse tipo de cidade
se torna especializada no oferecimento de mão-de-obra.
No caso de Viçosa a especialização funcional se dá basicamente no setor de serviços,
especialmente na educação. Segundo o IBGE (2011) o PIB municipal era majoritariamente
baseado em serviços (81%) seguido pela indústria (15%) e agropecuária (3,2%).
Observando-se a variação absoluta na última década da PEA (IBGE, 2000 e 2010), nota-se
uma variação maior no setor de Comércio, Reparação de Veículos Automotores, Objetos
Pessoais e Domésticos, saindo de 4.319 em 2000 para 6.097 empregados em 2010. Essa
expansão, se deve principalmente ao aumento de lojas especializadas em serviços e vendas de
peças para veículos automotivos, reflexo direto da expansão das vagas na universidade. Essas
lojas se organizam especialmente em volta do eixo comercial especializado (CARVALHO,
2010).
Não pode-se deixar de notar também o aumento significativo de dois setores umbilicalmente
relacionados, o da Construção Civil, de 2.642 para 3.676 empregados, e do ramo imobiliário,
de 1.299 a 2.479. A força do setor de construção é destacada por Zachi (2009) e Honório
(2012) como vinculada à própria dinâmica das universidades. O setor de educação também
teve algum crescimento, passando de 3.551 para 4.387 empregados. Dentre os setores de
serviço, o que mais gera centralidade no entanto é a educação, notadamente superior como
veremos a seguir.
56
demandas de deslocamento são tantas que a UFV conta com uma van diária de ida e volta
para o referido escritório. A FDV e a UNIVIÇOSA contam somente com os campi locais, sem
outras estruturas externas.
Das 4.17415 vagas oferecidas no município de Viçosa para graduação a UFV é responsável
por oferecer 2.090, que são na sua totalidade ou quase, ocupadas, uma vez que a instituição
além de ser gratuita facilita através de uma forte política de assistência estudantil a fixação
dos estudantes até mesmo de baixa renda.
As faculdades particulares oferecem um maior número de vagas por curso, somando-se as
duas entradas anuais. Essas vagas não vão ser necessariamente todas preenchidas uma vez que
estas instituições não oferecem as facilidades de fixação para os estudantes como moradia,
alimentação e serviço de saúde, além é claro de cobrarem mensalidades.
Como se coloca historicamente, há uma forte presença na UFV dos cursos relacionados à
Ciências Agrárias, como Agronomia, Zootecnia, Engenharia Florestal, Engenharia Agrícola e
Medicina Veterinária. Já houve até uma tentativa de instalar um curso de Gestão do
Agronegócio, que acabou por se tornar uma área de ênfase na Economia. A ênfase em
Ciências Agrárias e Biológicas é ainda mais notória no oferecimento dos cursos de pós-
graduação stricto sensu.
Na pós-graduação, dentre os 41² cursos oferecidos, 18 estão relacionados com questões do
campo; com ênfase em pedologia, fitotecnia, zootecnia e medicina veterinária. Isso irá se
refletir imediatamente no tipo de produção científica e tecnológica da cidade.
A UFV também é responsável por ser o maior atrativo da população flutuante, estudantes de
graduação e pós-graduação, alguns dos quais estrangeiros. Segundo o Censo Demográfico
2010: educação e deslocamento (IBGE, 2012):
O deslocamento para estudar em outro município está relacionado à desigual
distribuição das unidades de ensino no Território Nacional e às grandes
concentrações urbanas contíguas existentes nas Regiões Metropolitanas. No âmbito
geral, das 59 565 188 pessoas que declararam frequentar escola ou creche, 4 301 914
(7,2%) o faziam em outro município, e 37 059 (0,06%), em país estrangeiro. (p. 81)
Ainda segundo o IBGE (2012, p.82), no Brasil, a maior parte do público que atende pelo
deslocamento para estudo se refere à faixa etária entre 15 a 24 anos, majoritariamente para
fazer a graduação ou a pós-graduação. Essa afirmação se comprova para o caso de UFV ao
analisarmos a origem dos alunos ingressantes em 2007, onde somente dois estado da
federação não contribuíram com alunos. O maior número de ingressantes provém de Minas
Gerais e estados fronteiriços, em especial do Sudeste. Os alunos dessa região compõe 91,07%
15
Dados das próprias instituições referentes à 2013.
57
de todos os matriculados, sendo que destes a maioria 70,02 % são mineiros. Minas Gerais é
seguido por São Paulo, Espírito Santo e Rio de Janeiro, com 326, 182 e 136 estudantes
respectivamente.
Ainda segundo os dados fornecidos pela UFV, no nível municipal Viçosa é o município que
mais contribuí de forma isolada, com 340 alunos, representando cerca de 13% do total. Em
seguida vem Belo Horizonte, com 188, e Ponte Nova, com 103.
Podemos notar assim que a população nativa da cidade apresenta apenas uma fração do total
de alunos matriculados nesse ano especifico, o que é uma tendência histórica. Sendo assim a
grande maioria dos estudantes vem a compor uma população flutuante, ocupando os
alojamentos e se somando a estudantes de outras instituições para ocupar os inúmeros imóveis
de aluguel.
As faculdades particulares não puderam contribuir com dados numéricos, somente com
entrevistas. Segundo que foi relatado ambas tem a maioria dos alunos originadas do próprio
município e entorno, além de atraírem muitos alunos de Ponte Nova e sua respectiva região de
influência. Essa afirmação nos diz respeito a um alcance de atração para além da região de
influência imediata de Viçosa e por outro lado demonstra a deficiência de Ponte Nova em
relação ao quesito do oferecimento de cursos superiores. Essa carência leva a criação de uma
forte ligação entre os dois municípios, que pode ser notada pelo intenso tráfego de veículos ao
longo da BR-120 coincidindo com os horários de início e término de aulas, especialmente no
período noturno.
De forma complementar pode-se observar os resultados do REGIC 2007 (IBGE, 2007)
Podemos notar claramente, que nos dois mapas das páginas 166 e 154, que Viçosa se
estabelece como um centro de elevada categoria de atração no que diz respeito ao ensino
superior. Alcançando as categorias C e 3 de centralidade respectivamente.
No quesito de deslocamento para se cursar o superior, Viçosa (c) fica atrás de Juiz de Fora
(b), pois ao se incluir a graduação Viçosa conta com menos vagas, uma vez que a capital
regional conta com diversas instituições particulares. De toda forma a atratividade é
considerável em nível nacional.
No quesito de pós-graduação ela se encontra no mesmo nível da capital regional, Juiz de Fora,
e da capital do Espírito Santo, todas no nível 3. Os cursos mais consolidados em pós-
graduação na UFV são aqueles vinculados as ciências agrárias e biológicas e contam com
alguns alunos estrangeiros. Para o ano de referência, 2007, foram contabilizados 18 alunos
estrangeiros ingressantes, em especial da América Latina.
58
A atração de inúmeros estudantes para o município acaba por compor uma significativa
população flutuante, estimada em 15 mil (CENSUS, 2012), gerando um enorme impacto na
cidade. Alguns reflexos característicos são a alta demanda por imóveis de aluguel,
entretenimento voltado ao público jovem, entre outros serviços estudante-dedicados, como
serviços gráficos, transporte, alimentação, vestuário etc. Toda essa demanda fica basicamente
concentrada na área central, em frente ao campus da UFV. Alguns tipos de comércio são tão
dependes dessa população que uma greve imprevista pode fazer falir algumas pequenas
empresas.
Juntamente e concomitantemente com a atração gerada pelo oferecimento dos serviços de
ensino, a produção de ciência e tecnologia tem se destacado nos últimos anos na cidades,
como é explicitado a seguir.
16
Disponível em: < http://www.redemineirapi.com/novo/numeros-da-rede/> Acesso em: 10 dez. 2014
59
em P&D por parte das empresas, dificultando a maturação dos sistemas de inovação, ou como
denomina-se na geografia, tecnopólos.
Segundo Rapini (2007 apud. CASTRO et al., 2011, p. 102) os principais setores de interação
entre universidades e empresas no Brasil são: agricultura e agronomia; mineração e
geociências; papel e celulose com engenharia florestal; equipamentos elétricos e eletrônicos
com engenharia elétrica; metalurgia e matérias com engenharia metalúrgica; e química e
engenharia química.
No Censo de 2008 do Diretório dos Grupos de Pesquisa (DGP) do CNPq, dos 232
grupos de pesquisa da UFV, 66 afirmaram ter algum tipo de relacionamento com o
setor produtivo, ou seja, aproximadamente 30%, sendo o segundo maior índice de
interatividade do estado […] metade está na grande área de Ciências Agrárias. Mas
também há muitos grupos ligados às áreas de Ciências Exatas e da Terra e Ciências
Sociais Aplicadas. (CASTRO et al., 2011, p. 103)
Segundo a pesquisa realizada por Castro et al. (2011) 31 empresas atribuíram importância aos
grupos da UFV no desenvolvimento de suas atividades de pesquisa.
No Censo do Diretório dos Grupos de Pesquisa realizado pelo CNPq em 2004, haviam 46
grupos de pesquisa interativos na UFV. Desses 46 grupos, 33 responderam ao survey de
universidades, sendo que a principal área de concentração era a de Ciências Agrárias, com
destaque para os cursos de Agronomia, Medicina Veterinária e Engenharia Florestal.
os principais motivos para a colaboração foram: aumentar a habilidade da empresa
para encontrar e absorver informações tecnológicas; buscar conselhos de cunho
tecnológico ou consultoria; e transferência de tecnologia da universidade. Estes
quesitos foram responsáveis por 74% das respostas. Outros motivos importantes
citados por 68% das empresas foram: utilizar os recursos disponíveis nas
universidades e laboratórios de pesquisa; e contratar pesquisas complementares às
atividades inovativas da firma. (CASTRO, et al., 2011, p. 105)
Esse resultado indica uma relação assimétrica entre a UFV e as empresas, uma vez que estas
recorrem à instituição para que esta elabore ou auxilie a elaborar processos e/ou tecnologias.
Os grupos de pesquisa, por outro lado, consideram mais importante as relações horizontais
com setores de P&D das empresas.
Além da importância das instituições em si é necessário destacar um movimento ainda mais
recente em direção à especialização funcional de Viçosa, que foi a criação do Parque
Tecnológico (TecnoParq) e da recolocação do CenTev junto a ele em abril de 2011, fora do
campus universitário. Esse último movimento completa o mapa dos centros de produção
científica de Viçosa representados no Mapa 19.
O CenTev é um órgão da UFV vinculado diretamente à Reitoria, o que lhe garante grande
autonomia, sendo composto pelo Parque Tecnológico, pela Incubadora de Empresas de Base
60
Tecnológica (IEBT), pela Central das Empresas Juniores (CEMP) e pelo Núcleo de
Desenvolvimento Social e Educacional (Nudese). A função desse órgão é a de atuar em várias
frentes como suporte à criação, maturação e proteção de novas tecnologias e empresas de base
tecnológica, servindo como incentivo em especial aos spin-offs acadêmicos, que são empresas
nascentes de iniciativas de pesquisa, ou de grupos de pesquisa, dentro da universidade.
Notadamente a incubadora de empresas e o parque tecnológico tem recebido empresas na área
de biotecnologia, floresta e tecnologias da informação, seguindo o padrão de produção
científica apresentado até aqui. Segundo um dos dirigentes do CenTev, o foco do órgão é
atrair setores de P&D de empresas para se sediarem em Viçosa, estabelecendo-se assim um
mercado consumidor das tecnologias e também a criação de um ambiente de inovação. Ainda
segundo o entrevistado, atualmente o CenTev abriga majoritariamente empresas de inciativa
local com atuação regional, algumas dessas despontando nacionalmente sendo reconhecidas
em premiações de diversos tipos.
O estabelecimento do CenTev juntamente com TecnoParq significa a adaptação das funções
locais a um novo grau de modernidade. A mudança de uma situação passiva da UFV, como
fonte de consulta das empresas, para uma situação ativa, incubadora de empresas e novas
tecnologias voltadas ao mercado.
Até o momento descrevemos aqui de forma bastante detalhada as formas da especialização
funcional da cidade de Viçosa. Especialização essa que se formou especialmente na última
década, destacadamente a partir de 2003, mas ainda cabe uma discussão de caráter hierárquico
afim de complementar a noção funcional.
O resultado apresentado pelo REGIC 2007, coloca Viçosa como Capital Sub-Regional B,
imediatamente submetida à Ponte Nova, Capital Sub-Regional A. Essa submissão hierárquica
à Ponte Nova torna questionável interpretar Viçosa como uma cidade média e como uma
capital regional, ou sub-regional, relevante com as características apresentadas no Capítulo 2.
Tendo em vista o histórico de não hierarquização entre as duas cidades nos estudos anteriores
do IBGE (1972, 1987 e 2000), assim como o aumento na área de influência da cidade
apresentou no REGIC 2007 (IBGE, 2007) e as informações mostradas na seção anterior que
revelam claramente que em relação ao ensino superior, quesito importante na classificação
hierárquica, Ponte Nova é superada e é dependente de Viçosa; levam a questionar a posição
hierárquica inferior de Viçosa em relação à Ponte Nova. Diante desse questionamento
61
percorreram-se outros trabalhos produzidos no mesmo período do REGIC 2007 que chegaram
a resultados diversos.
O trabalho de Amorim Filho et al. (2007), que aponta o nível hierárquico das cidades médias
mineiras tendo o ano de 2006 como referência, coloca Viçosa no mesmo patamar que Ubá e
Ponte Nova, como “Cidade Média Propriamente Dita” caracterizada da seguinte forma:
Assim Viçosa se encaixa nesses quesitos uma vez que se colocada no eixo da BR-120,
apresenta uma forte interação microrregional e estabelece ligação direta com Belo Horizonte,
no topo da rede urbana mineira.
Pode-se notar primazia de Viçosa em relação à sua microrregião, econômica e
demograficamente, uma vez que sua população e PIB superam em muito quaisquer
municípios pertencentes à sua microrregião.
Os trabalhos de Nogueira e Garcia (2007) e Castello Branco (2007), também tem
condordância quanto a hierarquização da cidade de Viçosa como média e em um mesmo
patamar que as capitais sub-regionais vizinhas.
Nogueira e Garcia (2007) fazem uso do indicador chamado Índice de Terceirização Ajustado,
que representa “a força do setor terciário” (p. 65) naquela localidade. Através desse método os
autores apontam no território nacional as cidades médias, colocando-as em um mesmo nível
hierárquico. Já Castello Branco (2007) faz uso de uma série de indicadores para pontuar as
cidades médias no Brasil, classificando Ubá, Viçosa e Muriaé com 13 pontos, portanto Centro
Intermediários de Nível 2 (p. 109-110). Ponte Nova não aparece na listagem anexa ao artigo,
provavelmente por algum erro de edição, mas a julgar pela classificação dos centros similares
essa se encontraria no mesmo patamar.
Tendo em vista os pontos acima elencados acerca das hierarquizações entre as cidades de
Viçosa e Ponte Nova, além do fato de que a metodologia do REGIC 2007 não incluí os
elementos flutuantes das populações das cidades, que nesse caso específico também é um
62
elemento relevante, nos levam a crer que o que foi detectado no resultado do REGIC 2007
não foi uma relação de submissão, mas sim uma forte relação horizontal entre as duas cidades
com o mesmo patamar hierárquico. Essa conclusão dá a entender que Viçosa apresenta
características de uma capital sub-regional submetida hierarquicamente de forma direta à
metrópole, Belo Horizonte, e apresenta uma forte sinergia com uma cidade do mesmo nível,
Ponte Nova. Essas duas características são presentes no grupo de cidades compreendidas
como médias e/ou intermediárias, mas isoladamente são insuficientes para colocar Viçosa de
forma categórica nesse grupo.
Há ainda outras características atribuídas as cidades médias que Viçosa apresenta,
especialmente em relação à sua microrregião, como a presença de classes médias
intelectualizadas como destaca Sposito (2001) e Santos e Silveira (2001). Segundo o censo
demográfico de 2010 (IBGE, 2010) a presença da população com ensino superior em Viçosa é
absolutamente desproporcional em relação à sua microrregião, mas já com relação as capitais
sub-regionais existe uma outra relação. Viçosa conta com quase o mesmo número de
graduados que Ubá, que tem uma população absoluta na faixa dos 100 mil habitantes, o que
denota uma porcentagem maior da presença dos graduados. A presença de mestres e doutores
tem relação direta com a presença do ensino superior, do qual Ponte Nova e Ubá contam com
muito menos vagas.
A presença dessas classes médias intelectualizadas e normalmente bem remuneradas beneficia
as cidades médias, pois esse grupo gera uma série de novas demandas de produtos e serviços
locais, injetando dinheiro na economia.
Outra característica marcante das cidades médias é uma situação de qualidade de vida
elevada, que pode ser parcialmente detectada pela Tabela 1.
Nota-se na Tabela 1 a boa posição relativa de Viçosa em relação à Belo Horizonte e também
uma distância considerável das capitais microrregionais no entorno.
63
O padrão de urbanização que se processou no Brasil, nos últimos trinta anos, foi
marcado por um crescimento rápido, amplo e concentrado da população,
contribuindo e uma lado, para a emergência de grandes metrópoles, e, de outro, para
a expansão de uma diversificada rede urbana nacional, com o crescimento acelerado
de capitais regionais e sub-regionais. (BAENINGER, p. 271)
A cidade de Viçosa é uma dessas dezenas de capitais sub-regionais que se viu extremamente
modificada ao longo do tempo. O estabelecimento do meio técnico-científico informacional
possibilitou que as funções urbanas semeadas por Arthur Bernardes florescessem e se
consolidassem, assim como se consolidou a centralidade de Viçosa na rede urbana, que pode
agora ser considerada uma cidade médias caracterizada pela especialização funcional.
Entendemos que Viçosa só pode ser considerada de fato média nesse momento da rede urbana
brasileira, pois ela não foi industrial antes de ser científica-informacional, nesse momento
pela qual passa a rede urbana onde os serviços tem pesado cada vez mais na consideração da
centralidade e onde a produção do conhecimento e a circulação da informação se tornam
dados cada vez mais relevantes na compreensão da configuração territorial.
Segundo Scott (2012), os seguimentos de alta tecnologia industrial, serviços avançados e de
produtos híbridos cultural-cum-utilitarista estão cada vez mais pesando na centralidade das
grandes metrópoles, das cidades-regiões, e vemos assim como aconteceu anteriormente, essas
características das grandes cidades aparecendo em outra escala, nas cidades médias, o que
tenderá a privilegiar os centros mais preparados para essa nova fase da produção cognitiva-
cultural.
Ao mesmo tempo Castillo (2001) e Corrêa (2001) enfatizam o papel explicativo das
especializações funcionais no território.
Além da importância das funções especializadas, Trindade Jr. e Pereira (2007, p. 316)
destacam a importância do oferecimento de serviços e da distribuição de produtos aos
64
pequenos centros no entorno imediato da cidade média, fazendo com que a PEA se concentre
nesses setores, tal qual ocorre em Viçosa.
Fazemos assim o entendimento que Viçosa, se coloca na atualidade como caracterizada como
uma cidade média, em seu sentido abrangente, hierarquicamente colocada na posição de
capital sub-regional submetida diretamente à Belo Horizonte, caracterizada pela
especialização funcional no oferecimento de ensino superior e na produção de ciência e
tecnologia.
Conclusões
Referências Bibliográficas
65
AMORIM FILHO, O. B. Origens, evolução e perspectiva dos estudos sobre as cidades
médias. In: Sposito,M.E.B. (Org.). Cidades Médias: espaços em transição. São Paulo:
Expressão Popular, 2007.
AMORIM FILHO, O. B..; RIGOTTI, J. I. R.; CAMPOS, J. Os níveis hierárquicos das cidades
médias de Minas Gerais. Revista Ra'e Ga – Espaço Geográfico em Análise, Curitiba, n. 13,
p. 7-18, 2002.
ARAÚJO, Mayara Mychella Sena; MOURA, Rosa; DIAS, Patrícia Chame. Cidades médias:
uma categoria em discussão. In: PEREIRA, Rafael Henrique Moraes; FURTADO, Bernardo
Alves. Dinâmica urbano-regional: rede urbana e suas interfaces. Brasília: IPEA, 2011.
ARROYO, María Mônica. Dinâmica territorial, circulação e cidades médias. p. 71-86. In:
SPOSITO; E. S.; SPOSITO, M. E. B.; SOBARZO, O. (orgs.). Cidades médias - produção
do espaço urbano e regional. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
CORRÊA, Roberto Lobato. Construindo o conceito de cidade média. In: Sposito, M.E.B.
(Org.). Cidades Médias: espaços em transição. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2007.
COSTA, E.M. Cidades Médias: contributos para a sua definição. Finisterra, XXXVII, 74, P.
101-128. 2002.
ELIAS, Denise; SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; SOARES, Beatriz Ribeiro (orgs.)
Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional – Tandil e Uberlândia. São
Paulo: Expressão Popular, 2010.
67
FIRJAN. Índice FIRJAN de desenvolvimento sustentável 2010. Rio de Janeiro: FIRJAN,
2010. Disponível em http://www.firjan.org.br/ifdm/ Acesso em: 14 fev. 2014
_______. Região de Influência das Cidades 1978. Rio de Janeiro: IBGE, 1987.
_______. Região de Influência das Cidades 1993. Rio de Janeiro: IBGE, 2000.
_______. Região de Influência das Cidades 2007. Rio de Janeiro: IBGE, 2007.
_______. Censo demográfico 2010: educação e deslocamento. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.
68
______. A inserção das cidades médias mineiras na rede urbana de Minas Gerais. Anais
do XIII Seminário de Economia Mineira.
RIBEIRO, Ana Clara Torres. Sentidos da urbanização: desafios do presente. In: In: Sposito,
E.S;Sposito, M.E.B;Sobarzo,O. Cidades Médias: produção do espaço urbano e regional.
São Paulo: Expressão Popular, 2006.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo. Razão e emoção. 2. ed. São
Paulo: Edusp, 1996.
69
______. Meio técnico-científico e urbanização: tendências e perspectivas. Revista Resgate.
1989.
SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. Brasil: território e sociedade no início do século XXI. 5a.
ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. 473p.
SCOTT, Allen John. As cidade de terceira onda. In: Globalização, políticas públicas e
reestruturação territorial. p. 13-51. São Paulo: 7 Letras, 2013.
SPOSITO Eliseu S.; SPOSITO, Maria Encarnação B.;SOBARZO, Oscar (orgs.) . Cidades
médias - produção do espaço urbano e regional. São Paulo: Expressão Popular, 2006.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão (Org.). Cidades Médias - espaços em transição. São
Paulo: Expressão Popular, 2007.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; ELIAS, Denise; SOARES, Beatriz Ribeiro (orgs.)
Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional – Passo Fundo e Mossoró. São
Paulo: Expressão Popular, 2010.
70
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; ELIAS, Denise; SOARES, Beatriz Ribeiro (orgs.)
Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional – Chílian e Marília. São Paulo:
Outras Expressões, 2012.
TRINDADE JR.; PEREIRA. Reestruturação da rede urbana e importância das cidades médias
na Amazônia Oriental. In: Sposito, M. E. B. (Org.). Cidades Médias: espaços em transição.
São Paulo: Expressão Popular, 2007.
UNESCO, UIA, Spanish Ministry of Foreign Affairs. Intermediate cities and world
urbanization. 1999.
71
A CENTRALIDADE DE MONTES CLAROS NA REDE URBANA
NORTE MINEIRA E OS REFLEXOS NO ESPAÇO INTRAURBANO
Considerações iniciais
17
Professora do Departamento de Geociências, do Programa de Pós-Graduação em Geografia e do Programa
de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social da Universidade Estadual de Montes Claros.
18
Professor do Departamento de Geociências, do Programa de Pós-Graduação em Geografia e do Programa de
Pós-Graduação em Desenvolvimento Social da Universidade Estadual de Montes Claros.
19
Bolsista de Iniciação Científica – FAPEMIG.
* O autor não apresentou o trabalho e não participou do evento
72
mudanças ocorridas ao longo dos anos na conjuntura econômica regional. Na sequência,
realizamos uma pesquisa de campo a fim de constatar as relações que ocorrem entre a referida
cidade e os demais municípios que compõem a região Norte de Minas. Com os resultados
obtidos iniciamos uma análise do espaço intraurbano, procurando identificar elementos,
traços, formas de organização territorial que são inflexões resultantes desse domínio regional
e, ao mesmo tempo, condicionantes da centralidade. As considerações aqui elencadas são um
ponto de partida para reflexão sobre a dinâmica urbana/regional.
20
Vide estudos do IPEA (2001), IBGE (1987), Corrêa (1988, 1989, 1999, 2000, 2004 e 2006), entre outros.
73
configura em função das peculiaridades da estrutura produtiva que se manifestam de forma
distinta no território. Minas Gerais também acompanha essa lógica, sendo que:
[...] apresenta uma forte heterogeneidade em relação à hierarquia de sua rede
urbana e à tipologia de cidades. Convivem no território mineiro regiões de rede
urbana rarefeita, composta basicamente por municípios de pequeno porte, como os
vales do Jequitinhonha e Mucuri, e regiões com uma densa rede urbana, compostas
por um número considerável de centros de porte médio e grande proximidade entre
eles, como a Metropolitana de Belo Horizonte. (QUEIROZ; BRAGA, 1999, p. 9-
10).
Em Minas Gerais foi a partir dos anos de 1960 que os estudos sobre as cidades passaram a
despertar grande interesse, tanto por parte da academia quanto por organismos públicos de
planejamento. Vários são os trabalhos que encontramos sobre a rede urbana mineira, em
diferentes momentos históricos e utilizando metodologias variadas.
Desde as décadas de 1950 e 1960, nos estudos elaborados por Leloup (citado por
ARRUDA; AMORIM FILHO, 2002) sobre a rede urbana de Minas Gerais, Montes Claros é
classificada como um centro regional, embora considerado “[...] subequipado para poder
intensificar seu poder de polarização, situação que era reforçada pela fragilidade das infra-
estruturas de transportes regionais” (ARRUDA; AMORIM FILHO, 2002, p.194). A figura 1
mostra a rede urbana mineira na década 1960.
74
Em estudo sobre organização urbana da Região Leste, Lima (1965) identificava o Rio de
Janeiro e Belo Horizonte como as cidades mais importantes. Inicialmente, a autora afirma que
Montes Claros, por causa da ligação ferroviária, estava na área de influência do Rio de
Janeiro, mas, com a expansão do rodoviarismo, a cidade foi captada por Belo Horizonte. No
estudo da rede urbana, a autora citada identifica Montes Claros como um centro regional de 1ª
categoria e afirma que :
[...] localizada no médio vale do São Francisco, Montes Claros é o centro de maior
hierarquia dentro da região urbana de Belo Horizonte, atuando como intermediário
entre as zonas do centro-norte do Estado e a capital mineira e estendendo a
influência desta a trechos do sudoeste baiano. A fraca urbanização da área em que se
encontra, que tem na criação de gado sua principal atividade, garante-lhe uma
projeção muitas vezes não alcançada por centros urbanos mais bem aparelhados.
(LIMA, 1965, p. 251, grifo da autora).
21
Sobre os centros emergentes, vide estudos Minas Gerais no Século XXI, do BDMG e artigos de Amorim Filho,
Bueno e Abreu (1982).
75
comando direto de Montes Claros e formado pelos centros emergentes de Januária, Janaúba,
Bocaiúva e Pirapora”.
22
Centro de apoio é a denominação dada à cidade presente em determinadas regiões nas quais as relações
interurbanas são frágeis e não se observa centros urbanos de maior hierarquia. Coincide com a ideia de centros
emergentes trabalhada por Amorim Filho, Bueno e Abreu (1982).
76
Fonte: Arruda e Amorim Filho, 2002, p.199.
Entre 1998 e 1999, Amorim Filho e Abreu elaboraram uma hierarquia urbana de Minas
Gerais, utilizando uma técnica estatístico-cartográfica multivariada, acompanhada por vários
trabalhos de campo. Nesse estudo, os autores identificaram seis níveis de cidades: a metrópole
(Região Metropolitana de Belo Horizonte), grandes centros regionais (Juiz de Fora e
Uberlândia), cidades médias de nível superior (como Alfenas, Lavras, Montes Claros, Sete
Lagoas, dentre outras, totalizando 17 cidades), cidades médias (Araxá, Unaí, Viçosa, Teófilo
Otoni, dentre outras, totalizando 27 cidades), centros emergentes (Bocaiúva, Januária,
Janaúba, Almenara, Pirapora, Tupaciguara, dentre outras, totalizando 58 cidades) e pequenas
cidades. No nível cidades médias de nível superior, Abreu et al. (2002, p.266) consideram que
“[...] fazem parte desse nível hierárquico algumas das cidades de maior dinamismo no interior
de Minas. Suas funções de intermediação em vários tipos de fluxos e de indução de
desenvolvimento são essenciais para as regiões a que pertencem”.
Em 1999, Amorim Filho e Abreu realizaram um outro estudo sobre as cidades médias de
Minas Gerais, no qual Montes Claros aparece como cidade média de nível superior e outras
cidades da região como Bocaiúva, Janaúba, Januária, Pirapora, Salinas são consideradas
centros emergentes. Os autores destacam que Montes Claros repete seu padrão espacial de
isolamento no Norte de Minas Gerais.
77
Fonte: Abreu et al, 2002, p.265.
78
Em todos esses estudos, a cidade de Montes Claros surge como um centro regional que
comanda as áreas do seu entorno e os municípios com menor diversidade de funções. Abriga
fluxos regulares de mercadorias, pessoas, informação, interagindo com a capital estadual (que
a polariza) e com municípios vizinhos. Além de seu papel como centro do comércio regional,
é também receptáculo de migrações, o que tem gerado significativas alterações no espaço
intraurbano, a exemplo da ocupação desordenada do solo urbano, da degradação ambiental,
dos processos de segregação socioespacial e da pobreza.
2 - A rede urbana regional
O sistema urbano liderado por Montes Claros abrange extensa área territorial. De acordo com
Arruda e Amorim Filho (2002, p. 222), a localização da cidade e a rede viária nela baseada
facilitaram, de certa forma, o processo de centralização que tem um grande conteúdo
institucional – a pertinência à Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE).
Além disso, o Norte de Minas é uma região caracterizada por fraco dinamismo econômico e
baixo nível de bem-estar social, além do fato de estar distante de outros centros superiores na
hierarquia urbana. Essa ideia encontra respaldo nas palavras de Santos (1989, p.17), quando
afirma que:
[...] nas zonas onde a divisão de trabalho é menos densa, em vez de especializações
urbanas, há acumulação de funções numa mesma cidade e, conseqüentemente, as
localidades do mesmo nível, incluindo as cidades médias, são mais distantes umas
das outras.
Nessa perspectiva, percebemos uma hierarquia menos flexível de cidades, nas quais a
dinâmica dos fluxos econômicos, demográficos e informacionais é capaz de gerar diversas
funcionalidades à cidade de Montes Claros. Em contrapartida, os demais centros urbanos,
independentemente de seu tamanho, funcionalidade ou localização possuem maiores ou
menores interações com tal cidade.
Com base no nosso estudo das relações entre as cidades norte mineiras fizemos uma
proposição de uma estrutura da rede urbana regional. Levamos em consideração os principais
fluxos que são realizados, a estrutura urbana que cada cidade apresenta, a sua dinamicidade e
a sua importância na região na qual se encontra inserida. A figura 4 apresenta um
organograma dessa rede, que tem uma cidade como pólo regional, cinco cidades emergentes
e, no plano inferior, 83 centros locais, que foram divididos em centros locais mais dinâmicos
e centros locais menos dinâmicos. Nela detalhamos melhor a hierarquia dos centros.
79
Fonte: Pesquisa de campo.
Nessa representação, Montes Claros atua como a cidade mais importante, que possui maior
diversidade de serviços e de comércio, atendendo a demanda em diferentes setores de quase
todas as cidades da região, considerando principalmente a população de médio e alto poder
aquisitivo, que tem condições de consumir produtos e serviços de preços mais elevados e
também tem mais mobilidade. As entrevistas realizadas indicaram que a população tem um
comportamento espacial diferenciado dependendo do seu poder aquisitivo. Enquanto a
população de baixa renda precisa da ajuda das prefeituras para utilizar, sobretudo, os serviços
médicos em Montes Claros, há uma parcela da população nas pequenas cidades que dispõem
de condições financeiras para vir a Montes Claros para usufruir do lazer, ir ao Shopping
Center, ao cinema, usufruir da vida noturna, dentre outros.
As cidades que consideramos emergentes no Norte de Minas são aquelas que possuem um
potencial de desenvolvimento e são micro-pólos regionais, que atendem a população dos
centros menores e mais próximas que demandam por serviços que essas cidades têm
condições de oferecer. No caso do Norte de Minas, identificamos as cidades de Bocaiúva,
Pirapora, Janaúba, Januária e Salinas como centros que no enfoque microrregional
desempenham papel de cidades médias “propriamente ditas”. Janaúba, por exemplo, é a
80
cidade que tem atraído muitos investimentos, em virtude dos projetos de agricultura irrigada,
implantação de cursos superiores principalmente ligados à produção local, além de ter uma
alta população flutuante, que utiliza a cidade como ponto de referência. A infraestrutura
urbana dessa cidade ainda é precária e ela carece de serviços mais especializados,
principalmente na área da saúde. A cidade com menor potencial é Bocaiúva que, apesar de
possuir indústrias, não tem atraído investimentos, além do fato de a proximidade com Montes
Claros inibir o crescimento do setor comercial e de serviços. Para a população é mais
vantajoso adquirir produtos duráveis e não-duráveis e serviços variados em Montes Claros do
que em Bocaiúva.
Os centros identificados como locais não constituem um conjunto homogêneo. Existem
cidades com um maior crescimento e melhor infraestrutura urbana como é o caso de
Taiobeiras, Brasília de Minas, Buritizeiro, Jaíba, Várzea da Palma, Francisco Sá, Rio Pardo de
Minas e São Francisco, mas que estão próximas a outras cidades maiores que as polarizam.
Por outro lado, a maioria das cidades pequenas é um aglomerado de residências em torno de
uma praça, em geral a da igreja ou do mercado. Nessas cidades, os serviços urbanos básicos,
quando existem, são muito deficitários, o que implica uma dependência do centro urbano
maior ou mais próximo. A gestão urbana desses espaços é complicada, pois há uma cultura de
dependência do poder público municipal.
Sabemos que a organização de uma rede de cidades não pode ser vista de forma muito
simplificada, uma vez que os fluxos ocorrem sem uma ordem rigorosa, além do fato de cada
cidade possuir suas características próprias, uma cultura popular que interfere quando se
pretende compreender uma realidade complexa. Além disso, as atividades econômicas
dinamizam-se em áreas que apresentam melhores vantagens competitivas, ou seja, que
contam, entre outros, com atributos vantajosos de infraestrutura, com recursos humanos
qualificados e qualidade de vida da população aceitável, mostrando-se adequadas à instalação
de empreendimentos modernos e à geração de maiores lucros. As mudanças podem ser
rápidas se ocorrer o estímulo à adoção de posturas favoráveis ao pleno desenvolvimento das
atividades produtivas. Caso isso ocorra, as relações sociais e econômicas, a paisagem urbana e
o modo de vida nessas cidades podem ser mudados num período de tempo relativamente
curto.
Por outro lado, algumas cidades, em decorrência dos diferentes processos que contribuíram
para sua formação espacial, compreendem vestígios de várias temporalidades. Essas
reminiscências de tempos antigos se acumulam em processos lentos, se aproximando da
81
estagnação. Temos que levar em conta o fato de que o dinamismo, a busca por inovações
produtivas em uma cidade parte de necessidades, desejos ou projetos específicos e
contextualizados à conjuntura social, política e econômica e aos recursos técnicos disponíveis.
Assim, nem todas as cidades norte mineiras podem vislumbrar profundas e rápidas
transformações nas suas estruturas.
82
Ao contrário da cidade monocêntrica da década de 1980, hoje Montes Claros possui vários
subcentros, apesar de manter a funcionalidade de seu centro tradicional. Verificamos que
alguns bairros periféricos deixaram de ser totalmente dependentes dos serviços oferecidos
pelo centro. O bairro Major Prates, por exemplo, conta com uma gama de atividades
comerciais (farmácias, supermercados, postos de gasolinas, entre outros), escolas, serviços de
saúde, que atendem seus moradores e áreas adjacentes. As pessoas agora têm a comodidade
de ter ao seu alcance diversos serviços antes só encontrados no centro.
Destacamos aqui os shopping-centers, supermercados, eixos comerciais diversificados e vias
especializadas em comércio ou serviços. Essas últimas se dão com forte grau de
especialização de atividades terciárias em algumas vias do espaço intraurbano (como é o caso
da Avenida Dulce Sarmento, especializada em produtos e serviços automotivos). Atualmente
a cidade é a única na região que possui shopping-center (o Shopping Montes Claros,
Shopping Popular, Shopping Ibituruna e o Shopping Catopê), que em virtude das suas
especificidades, atraem consumidores de produtos e de lazer.
Nessa nossa reflexão entendemos a rede de serviços diversificados como objeto técnico
inserido no tecido urbano, ocupando parcelas do solo como equipamento urbano. Por isso
realizamos o mapeamento da cidade com a localização de alguns desses equipamentos, cuja
dinamicidade depende muito da demanda regional. Dada a limitação de tamanho desse artigo
apresentamos o mapa dos serviços ligados ao setor de saúde (mapa 1). O referido setor possui
expressiva demanda, incluindo atendimento médico especializado, hospitais, clínicas,
laboratórios e serviços afins. Além da localização desses serviços, os aspectos ligados aos
movimentos sociais, circulação de pessoas, mercadorias ou informações devem ser
considerados quando estamos abordando a relação cidade e região. A esse respeito,
Guimarães (2001, p. 157) considera que a rede de saúde “[...] não se trata só de uma rede de
equipamentos conectados, mas de um conjunto de atores sociais que a freqüentam em busca
de um objetivo ou para cumprir uma tarefa bem localizada territorialmente”.
83
Nessa perspectiva, podemos mesmo falar de um território da saúde (mapa 1) em Montes
Claros, devido à organização e à existência de serviços médicos especializados e uma rede de
hospitais e clínicas interligadas, sendo referência regional. Atreladas ao sistema de saúde,
84
encontramos também empresas de seguro saúde, redes de farmácias e drogarias, lojas e
magazines, especializadas na venda de artigos de diferentes origens.
Também no serviço educacional, em todos os níveis de ensino, a cidade é referência na
região. A trama social e espacial vinculada ao setor educacional cria, de forma cada vez mais
contundente, uma série de mudanças econômicas e sociais com reflexos diretos na
organização de outras atividades a ela associados, como o mercado imobiliário, os
restaurantes, o comércio, o lazer, dentre outras.
Outras análises espaciais complementam esse estudo e mostram que, em virtude da
centralidade regional o território intraurbano de Montes Claros tem se modificado e, por sua
vez, modifica as lógicas de reprodução da própria cidade. Verificamos o surgimento das
especializações sociais e funcionais dos espaços, seja na forma de incremento e adensamento
de determinados elementos, realocação de atividades produtivas, novas estratégias de
incorporações urbanas, novas práticas de consumo ou novas necessidades de fluxos.
Considerações finais
Diante do aqui exposto, fica claro o importante papel que Montes Claros representa no
contexto regional, exercendo uma centralidade em praticamente todos os setores e
polarizando uma vasta área territorial (variável conforme o tipo de serviço ofertado). Pessoas
de todas as cidades demandam por determinados tipos de serviços existentes em Montes
Claros. Em muitos casos, isso ocorre porque não há o bem ou serviço desejado, ou necessário,
na cidade de origem, mas em outros há uma clara opção em consumir na maior cidade da
região. Além disso, a ela serve de base de deslocamento para outras cidades dentro da
mesorregião, funcionando, assim, como nó na rede de fluxos de pessoas e mercadorias com
destino dentro e fora da região. Pelo estudo realizado, constatamos que há uma estreita
relação entre a centralidade regional exercida por Montes Claros e as modificações
intraurbanas, notadamente aquelas relacionadas com a dinâmica econômica.
Referências
85
ABREU, J. F. de. et al. Tipologia das regiões. In: BDMG: Minas Gerais no Século XXI –
Reinterpretando o espaço mineiro. v.2. Belo Horizonte: Rona Editora, 2002, p. 250-290.
ARRUDA, M. A.; AMORIM FILHO, O. B. Os sistemas urbanos. In: BDMG. Minas Gerais
no século XXI. Belo Horizonte: Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, Rona Editora,
2002.
______. Estudos sobre a rede urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
______. Rede urbana e formação espacial - uma reflexão considerando o Brasil. Território,
Rio de Janeiro, Garamond, n. 8, p. 121-129, jan/jun. 2000.
______. Reflexões sobre a dinâmica recente da rede urbana brasileira. In: ENCONTRO
NACIONAL DA ANPUR, 2001, Rio de Janeiro. Anais.... Rio de Janeiro: 2001, maio, p. 424-
430.
GUIMARÃES, R. B. Saúde urbana: velho tema, novas questões. Terra Livre, São
Paulo, n. 17, p. 155-170, 2. semestre 2001.
86
IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Regiões de
influência das cidades: revisão atualizada do estudo da divisão do Brasil em regiões
funcionais urbanas. Rio de Janeiro: IBGE, 1987. 183 p.
LIMA, O. M. B. de. Organização Urbana. IBGE. Geografia do Brasil – grande região leste.
Rio de Janeiro: IBGE, 1965. p. 235-271.
PEREIRA, F. M.; LEMOS, M. B. Cidades médias: uma visão nacional e regional. In:
SEMINÁRIO SOBRE ECONOMIA MINEIRA, 11., 2004, Diamantina. Anais... Diamantina:
24 a 27 ago. 2004. Disponível em <http:\\.www.cedeplar.ufmg.br>.
87
A REDE URBANA EM GOIÁS: UMA ANÁLISE DO PADRÃO
ESPACIAL NA PRIMEIRA DÉCADA DO SÉCULO XXI23
Resumo
A rede urbana corresponde à articulação de centros urbanos por meio de suas funções. A
partir das considerações acerca desse conceito, será discutido neste trabalho o padrão espacial
da rede urbana em Goiás, sendo a análise pautada em dados secundários dos estudos das
Regiões de Influência das Cidades (REGIC) e demais levantamentos divulgados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nesse sentido, o objetivo é compreender a
gênese e o desenvolvimento da rede urbana de Goiás, destacando os seus principais elementos
constitutivos. Apresenta-se como pressuposto que a presença de duas metrópoles no território
goiano – Goiânia e Brasília – fornece uma configuração particular no âmbito nacional,
evidenciando a ausência de centros urbanos intermediários (capitais regionais) como resultado
da centralidade exercida pelas duas metrópoles.
Introdução
De forma genérica, conceitua-se rede como um conjunto de entidades (objetos, pessoas, etc.)
interligado uns aos outros e que permite o fluxo de itens materiais ou imateriais. O dicionário
Eletrônico Houaiss apresenta 19 definições para o vocábulo rede, contemplando desde objetos
comuns utilizados para pesca, a anatomia e a rede de vasos sanguíneos, as redes de internet,
até o destaque para o conjunto de objetos ou pessoas articulados de alguma forma.
89
Como bem destaca Coelho Neto (2012), o conceito de rede é utilizado por diversas ciências –
informática, sociologia, antropologia, economia, física, geografia, e é um termo de ampla
propagação na contemporaneidade que busca compreender os objetos e a organização espacial
da sociedade, sendo um conceito formulado para compreensão do real.
Há uma rica revisão da literatura para o conceito em Dias (2000). A autora esclarece que “o
termo rede aparece como conceito chave e privilegiado no pensamento de Saint Simon”27.
(DIAS, 2000, p. 144). Na perspectiva dos adeptos às ideias de Simon, o conceito passa a
introduzir, com maior clareza, a noção de conexidade, todavia a relação com a urbanização,
com a divisão internacional do trabalho e a diferenciação entre as cidades não figurava uma
preocupação. Ao contrário, até então as análises eram tratadas isoladamente.
As grandes mudanças ocorridas no final do século XX permitiram que o conceito
reaparecesse de maneira renovada para as mais diversas ciências, em especial para a ciência
geográfica. Contudo, nem toda rede é necessariamente geográfica, para que uma rede seja de
fato “geográfica” é necessário que a sociedade a anime. Efetivamente, as redes geográficas
resultam da relação sociedade-natureza. A rede geográfica, por definição, é “um conjunto de
localizações geográficas interconectadas entre si por um certo número de ligações”
(CORRÊA, 1997a, p.107).
As redes geográficas fazem parte da história e, portanto, é um produto da sociedade, ou
segundo as palavras de Santos (1996, p. 209), redes são “troços instalados em diversos
momentos, diferentemente datados, muitos dos quais já não estão presentes na configuração
atual e cuja substituição no território também se deu em momentos diversos.”. Nesse sentido,
“todos estamos inseridos em mais de uma rede geográfica e, simultaneamente, excluídos ou
ausentes de um número ainda maior de redes.”. (CORRÊA, 1997, p. 109).
Dentre as redes geográficas tem destaque a rede urbana. O destaque advém do fato de a rede
urbana articular as demais redes, em especial as redes técnicas que projetadas no âmbito da
expansão capitalista, engendram a divisão territorial do trabalho. Assim, as redes geográficas
são “simultaneamente, um reflexo da e uma condição para a divisão territorial do trabalho”.
(CORRÊA, 1988, p.112, grifo do autor).
Portanto, tratar-se-á da rede urbana brasileira e sua estruturação dentro dos limites do Estado
do Goiás, visando à descrição e a compreensão da divisão territorial do trabalho, pois apesar
dos inúmeros estudos geográficos acerca do tema, para Corrêa (1988) essa discussão está
27
Saint Simon foi um conhecido filósofo e cientista francês que defendia a criação de um Estado organizado
racionalmente por cientistas e industriais. Dentre os seus discípulos, economistas, banqueiros e industriais, o
conceito de rede aparece pela primeira vez para discutir as comunicações financeiras, em especial as bancárias.
90
longe de ser esgotada, tanto pela grande dimensão territorial do Brasil e as intrínsecas
desigualdades espaço-temporais, como a intensificação e rapidez com que se criam e se
transformam as redes urbanas. Dessa forma, justifica-se a análise da rede urbana de Goiás e
suas especificidades, adotando-se a seguinte definição de rede urbana:
É a partir dessa compreensão que será tratado no próximo item os aspectos constitutivos da
rede urbana de Goiás, considerando a formação territorial do estado de Goiás, os agentes
envolvidos, os principais centros urbanos, dentre outros elementos.
Pautar a articulação dos centros urbanos em Goiás, sua estrutura e funcionamento na primeira
década do século XXI significa pensar aspectos norteadores da formação do território goiano,
pois o estudo de rede urbana é, antes de tudo, elucidativo de elementos históricos, econômicos
e políticos de uma determinada região. Nesse sentido, Raffestin (1993, p. 209) apresenta
como orientação “decifrar as redes por meio de sua história e do território no qual estão
instaladas, por meio dos modos de produção que permitiram a sua instalação e das técnicas
que lhes deram forma.”.
Primeiramente é importante ressaltar que o processo de urbanização do estado de Goiás foi
concomitante ao período de exploração do ouro. O surgimento dos primeiros núcleos urbanos
nesse contexto representa a gênese de uma rede urbana na região, pois conforme salienta
Arrais (2013, p. 31) “com a economia aurífera, formou-se uma primeira rede urbana para
sustentar as atividades econômicas, o que também ocorreu com as lavouras de gêneros
básicos e com o gado criado de forma extensiva.”.
Dessa forma, o povoamento e a urbanização do território goiano ocorreram em função de
alguns fatores, sendo possível afirmar que “a mineração, a agricultura e as estradas foram o
principal motor de todas essas transformações espaciais e, sobretudo, da organização do
espaço urbano e regional.”. (TEIXEIRA NETO, 2008, p.257).
91
Nessas condições, o desenvolvimento da rede urbana tem início com a economia aurífera e
dinamiza-se com a ferrovia, o que Arrais (2013) descreve como uma valorização fundiária da
região sudeste e sul do Estado e ampliação das trocas mercantis com Minas Gerais e São
Paulo.
Tal processo intensifica-se com a construção de Goiânia que, ainda segundo Arrais (2013),
marcou o surgimento de uma incipiente indústria de transformação, atividades de comércio e
serviços. Já a segunda metade do século XX é norteadora de mudanças na rede urbana com a
construção de Brasília, centro de gestão do território nacional, e a modernização agrícola –
incorporação capitalista do Cerrado para a produção de grãos, como a soja.
Com efeito, a modernização da agricultura nas áreas de Cerrado acarretou uma urbanização
acelerada, decorrente, sobretudo, da migração da população rural. Logo, a rede é composta
pelos grandes centros urbanos que atraem população e tem como função organizar um
terciário para suprir as demandas da economia agrária moderna; pelas pequenas cidades que
perderam população e sustentam relações em escala local; e as cidades médias que são
conhecidas como “cidades do campo”, e concentram a renda territorial oriunda das
commodities da agricultura empresarial. (CHAVEIRO; CALAÇA, 2011).
Essas transformações ratificam a importância da base técnica, que possibilita as interações
espaciais entre centros urbanos. Nessa perspectiva, a rede rodoviária do estado de Goiás
constitui um exemplo de infraestrutura técnica intencionalmente delineada para viabilizar
formas de circulação, garantindo a logística da produção e do consumo. Logo, a
caracterização desse modal de transporte contribui para corroborar o papel polarizador dos
principais centros da rede urbana de Goiás, pois como aponta Arrais (2013), as rodovias
estaduais (GO-010, GO-020, GO-030, GO-040, GO-050, GO-060, GO-070 e GO-080) partem
de Goiânia, já as rodovias federais (BR-010, BR-020, BR-040, BR-050 e BR-060) tem
origem na capital nacional, Brasília, tendo como destino diversas regiões do estado e o
Centro-Norte brasileiro. O autor ainda acrescenta que
O principal eixo de circulação longitudinal é a BR-153, que liga o
sudeste ao norte do país. A rodovia latitudinal de maior destaque é a
BR-060, que liga Brasília, Goiânia e Cuiabá, áreas com maior
densidade populacional e maior produção de grãos e manufaturados.
No Sudoeste Goiano, a rodovia BR-364, que liga São Simão a
Uberlândia, e a BR-452 que dá acesso à BR-153 no município de
Itumbiara, favorecem o transporte de cargas (caminhões),
especialmente grãos e farelo de soja, seja para os portos seja para os
armazéns, à espera de melhores oportunidades de escoamento e de
valorização dos produtos... No Noroeste e Norte do estado, verifica-se
92
uma menor densidade de rodovias federais [...]. (ARRAIS, 2013, p.
60).
Como já mencionado, a versão mais atualizada dos estudos sobre o padrão da rede urbana
brasileira apresenta algumas particularidades que permitem empreender questionamentos,
dentre os quais, o fato de existir em Goiás um verdadeiro hiato na composição hierárquica de
seus centros. Nota-se que há uma ruptura, pois Goiás não dispõe de centro regional, seja ele
A, B ou C. Possui apenas centros sub-regionais A, sendo estes: Anápolis, Itumbiara e Rio
Verde, bem como centros sub-regionais B, além de centro de zona. Nesse sentido, observa-se
que em Goiás não há capitais regionais. Na definição da Regic (2008), Capital regional são
aquelas com
Os centros sub-regionais, por sua vez, têm área de atuação mais reduzida e seus
relacionamentos com centros externos, em geral, se dão apenas com as três metrópoles
nacionais. Portanto, é a área de influência e consequentemente o nível de interações que
definem a classificação dos centros na rede.
As hierarquias imediatamente posteriores às metrópoles em Goiás são de nível de centro sub-
regional. Logo, é patente que há uma ruptura com relação às hierarquias, saltando-se de duas
metrópoles direto para um centro sub-regional, em que os centros regionais não se
desenvolveram. Em algumas situações é correto afirmar que retrocederam no escalão da rede.
93
Anápolis, Itumbiara e Rio Verde embora estejam na mesma hierarquia de centro sub-regional
A, apresentam interações específicas que serão detalhadas adiante.
Ainda a respeito da afirmativa que, em alguns casos, houve retrocesso no escalão da rede,
refere-se a Anápolis, uma vez que a trajetória desse município integra a história do estado de
Goiás, assumindo um papel fundamental no âmbito da expansão da fronteira nesse estado ao
contribuir com a implantação das Colônias Nacionais Agrícolas em Goiás (CANG).
Em tese, Anápolis poderia ser uma cidade de nível intermediário (capital regional), entretanto
o que ocorre é o contrário. Sua localização, entre Goiânia e Brasília, apesar de ter
intensificado sua função logística devido ao entroncamento rodoferroviário que possui e a
recente atração de montadoras de veículos e do parque industrial farmoquímico, não
conseguiu trazer as sedes das empresas. E, por outro lado, é importante pontuar a
concorrência com Brasília e Goiânia quanto à oferta de serviços avançados, elemento
complicador para que Anápolis assuma a posição de capital regional.
No caso de Itumbiara, o indicador econômico que sobressai é sobre as taxas de exportação.
Em 2007 e 2009 ocupou a posição de segundo e terceiro maior exportador goiano 28. A
principal atividade geradora de capital é a atividade terciária, o que é reflexo de sua
localização, na divisa com Minas Gerais ao sul do estado de Goiás, próximo ao eixo Brasília-
São Paulo. Portanto, um município cuja economia está fundamentada na cooperação com a
produção agroindustrial. No que tange a sua estrutura de ensino, nota-se que possui uma
universidade Estadual, um Instituto federal, além de três universidades particulares. Por se
tratar de uma cidade que articula regiões produtoras e consumidoras, mantêm interações
espaciais com os municípios circunvizinhos, pois funciona como um polo de distribuição
industrial, o que explica os valores elevados de arrecadação de Imposto sobre circulação de
mercadorias e serviços (ICMS), sobretudo para o comércio atacadista e distribuidor, conforme
destacado na tabela 01.
28
Secretaria de estado e Gestão de planejamento. Ranking dos municipios goianos. Disponível em:
http://www.imb.go.gov.br/. Acessado em 15/01/2015
94
2005 65.368 - -
2010 155.493 64.577 26.162
2013 159.032 44.885 33.685
Fonte: Secretaria do Estado da fazenda – SEFAZ-GO
97
políticas daí decorrentes.”. (SCHERMA e KAHIL, 2011, p. 106). Duas tendências são
verificadas: de um lado Brasília e Goiânia apresentam uma evolução mais representativa do
número de agências, já em Rio Verde, Anápolis e Itumbiara possuem poucas alterações.
Comparando-se, a diferença entre Anápolis e Brasília, por exemplo, é de 1.230%.
98
A importância que o autor atribui à elite colabora com a noção de hierarquia, que pode se
tornar vazia de sentido quando não se considera os sujeitos que, munidos de interesses,
comandam e direcionam as interações espaciais. Complementa-se assim a hipótese colocada
por Dias (2000, p. 154), da simultaneidade entre “ordem e desordem das redes”. Para a autora
referenciada, na escala planetária ou nacional as redes são portadoras de ordem, ao passo que
na escala local estas mesmas redes são portadoras de desordem, exclusão e toda sorte de
mazelas sociais.
Os centros sub-regionais existentes em Goiás (Anápolis, Itumbiara e Rio Verde) certamente
são, contraditoriamente, portadores da desordem. Não há dúvida que se sustentam nessa
categoria de sub-regionais devido a interdependência subordinada que possuem com relação
as metrópoles goianas e a paulista. De alguma maneira estes centros são equipados visando
atender alguma ordem que não é especificamente local, e sim uma demanda dos centros de
hierarquia superior. Nesse sentido,
29
Revista EXAME, Julho de 2013. Disponível em <http://exame.abril.com.br/revista-
exame/edicoes/104402/noticias/as-50-maiores-empresas-privadas-do-brasil> Acesso em 12/01/2015
99
cidade da Região Centro-Oeste. Por outro lado, possuem inúmeras de suas filiais nessa região
e em praticamente todo o território nacional. Com efeito, a descentralização é relativa. Ainda
nas palavras de Cano (1981, p. 382), “o que descentraliza, na verdade, é a fumaça; o
transporte caro, moroso e ineficiente e pago; é a carência de serviços médico-hospitalares; é a
carência habitacional popular; é a violência urbana, etc.”
Em síntese, o argumento que orbita em torno da questão central que foi proposta (a ausência
de capitais regionais), se dá pelo nível de centralidade por parte das duas metrópoles em
Goiás e a metrópole paulista. Uma presença que atraem e condicionam demandas, gerando
centros subordinados.
Considerações finais
A hierarquia dos centros aqui apresentados fora medida segundo a importância dos serviços
prestados. Por conseguinte, os graus de hierarquia decorrem da presença de serviços em certos
centros e da ausência em outros. A rigor, é a soma das potencialidades das relações de ambas
as Metrópoles que limita a ascensão dos centros sub-regionais para a categoria de centros
regionais.
Todavia, algo deve ser motivo de atenção ao analisar as hierarquias entre os centros urbanos,
uma vez que os parâmetros de qualificação das cidades brasileiras foram formulados com
base nos núcleos urbanos situados nas regiões mais populosas, o Centro-Sul brasileiro,
levando em consideração o número de habitantes e a quantidade de relacionamentos.
Conforme Deus (2002, p. 185), tais parâmetros criam “distorções nas análises realizadas nas
áreas de baixa densidade demográfica”. Assim, embora exista a ausência de capitais regionais
em Goiás conforme os parâmetros estabelecidos pela REGIC, ainda assim, aquelas
enquadradas na categoria de centro sub-regional desempenham importantes funções para com
os municípios vizinhos, bem como a Goiás como um todo.
Longe de esgotar as discussões acerca do padrão espacial da rede urbana de Goiás, o presente
trabalho buscou analisar elementos que contribuem para tal compreensão. Assim, pode-se
afirmar que o padrão espacial é um resultado das interações espaciais entre os centros urbanos
e, portanto, está diretamente imbricado com a oferta de determinadas funções urbanas. É a
partir da dimensão demográfica de cada centro urbano que surgem as demandas de tais
funções, e no caso específico do estado de Goiás as duas metrópoles – Goiânia e Brasília –
assumiram maior centralidade na rede urbana, tendo como justificativa tanto o maior
100
quantitativo populacional, quanto a existência de funções raras e atribuindo a essas interações
um padrão de múltiplos circuitos devido ao número de ligações estabelecidas entre os centros
e, consequentemente, a complexidade da rede.
Por fim, o estudo de rede urbana permitiu ponderar que a atual configuração espacial de uma
rede representa uma síntese. Essa síntese é composta por diversos elementos como, por
exemplo, o crescimento populacional, a infraestrutura técnica, as atividades econômicas. Essa
é uma síntese que perpassa desde o processo histórico de formação territorial até a
consolidação de centros urbanos na figura de metrópoles nacionais, destacando-se o
importante papel dos agentes, seja o Estado, as empresas ou os sujeitos sociais.
Não é excessivo afirmar que a divisão territorial do trabalho acentua a diferenciação entre os
centros, elegendo aqueles que, segundo seus atributos locacionais, ambientais e normativos se
adequam as demandas do capital. Demanda esta que é mutável na mesma medida da
importância atribuída aos centros. Estas argumentações nos conduzem a concluir que a
composição da rede urbana é resultado irrevogável da questão de poder outorgado a alguns
atores que, de certo modo, direcionam os padrões espaciais das interações.
Referências
CHAVEIRO, Eguimar Felício; CALAÇA, Manoel. Por uma abordagem territorial do cerrado
goiano. In: SAQUET, M Aurélio et al. (Org.). Geografia da e para a cooperação ao
desenvolvimento territorial: experiências brasileiras e italianas. São Paulo: Expressão
Popular, 2011 (no prelo).
CORRÊA, Roberto Lobato. O estudo da rede urbana: uma proposição metodológica. Revista
Brasileira de Geografia. Rio de janeiro, 50 (2), p.107-124, abr./jun. 1988.
101
______. A rede urbana. São Paulo: Editora Ática, 1994.
______. Dimensões de análise das redes geográficas. In: ______. Trajetórias Geográficas.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997a, p. 107-118.
CORRÊA, Roberto Lobato. Interações espaciais. In: CASTRO, Iná Elias de. et al. (orgs.)
Explorações Geográficas. Rio de janeiro: Bertrand Brasil, 1997b. p 279-318.
DIAS. Leila Christina Dias. Redes: Emergência e organização. In: Geografia: conceitos e
temas. (Orgs.) CASTRO, Iná Elias de. et al. (orgs.) Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2000
DEUS, João Batista de. As atuais transformações estruturais na economia goiana e os seus
desdobramentos nas mudanças socioespaciais. In: Abordagens geográficas de Goiás: o natural
e social na contemporaneidade. (org.) ALMEIDA, Maria Geralda. IESA, Goiânia, 2002
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília França. São
Paulo: Ática, 1993.
102
O PAPEL DA CIDADE MÉDIA DE CARUARU NA ESTRUTURAÇÃO
DA REDE URBANA PERNAMBUCANA
RESUMO
As cidades apresentam articulação umas com as outras através das redes urbanas, sendo que
cada rede apresenta suas peculiaridades, sejam as quantidades de cidades presentes nela, seja
o grau de intensidade das conexões entre elas ou o papel desempenhado por cada cidade nesta
rede. Neste texto fazemos uma abordagem sobre a gênese e a estruturação da rede urbana
pernambucana, dando ênfase para uma das cidades médias desta rede, a cidade de Caruaru,
localizada no interior do estado de Pernambuco, que se distancia cerca de 130 km da capital
do estado, Recife. Assim, destacaremos o papel de uma cidade média numa rede urbana,
enfatizando o seu papel de cidade distribuidora de bens e serviços para toda uma região,
destacando o quão importante tem sido Caruaru para o agreste de Pernambuco e para o estado
como um todo.
Palavras-chave: Rede Urbana; Cidades Médias; Caruaru/PE.
1. Introdução
Uma das características da humanidade é a capacidade de seus indivíduos de se
relacionarem entre si, seja através da linguagem ou da troca de bens e mercadorias, sendo
assim, esta também é uma característica inerente da principal moradia dos seres humanos na
atualidade, as cidades. A troca de informações, permuta de bens, fluxo de pessoas e o
intercâmbio de mercadorias são algumas das características presentes no relacionamento de
cidades umas com as outras.
Para Souza (2008) o Brasil, enquanto um país de grande extensão territorial e que possui
milhares de cidades, é intrínseco que haja cidades que se articulem entre si e outras não,
algumas com articulação muito forte e diretas umas com as outras, mediante meios de
comunicação e transporte, fluxos de informações e pessoas e trocas de bens e serviços, outras
através de outras cidades. Assim, da mesma maneira que o homem, que produz a cidade, a
cidade não pode existir totalmente isolada, sem ter contato com outras, isso faz com que todas
estas estejam ligadas entre si no interior de uma rede urbana.
30
Graduado em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Mestrando em Geografia pela
Universidade Estadual Paulista (Unesp) – Campus de Presidente Prudente/SP.
103
As redes urbanas são capazes de revelar que muitas cidades podem estar articuladas entre si,
sejam economicamente, culturalmente e/ou politicamente. Partindo dessas possibilidades de
articulação, é possível analisar as redes urbanas a partir de várias escalas geográficas, assim,
podem existir redes urbanas regionais, que fazem parte de uma rede nacional, que por sua vez
faz parte de um sistema maior, uma rede urbana global (SOUZA, 2008).
Considerando a possibilidade da existência de diversas escalas de redes urbanas, temos neste
trabalho por objetivo principal a análise e discussão da formação e estruturação da rede
urbana do estado de Pernambuco, na macrorregião Nordeste do Brasil, que possui uma gênese
e uma história própria. Sabendo que as redes urbanas apresentam ligações entre cidades e que
estas são os nós destas redes, destacaremos em especial um destes nós, a cidade média de
Caruaru, localizada no interior do estado, como um importante nó desta rede e o seu papel
nela. Para isto, se fará necessário fazer considerações sobre os conceitos de rede urbana e
cidade média articulando-os com a gênese, a história e a estruturação da rede urbana
pernambucana, que tem início no período colonial com a Vila de Olinda como nó principal, e
que passa a ser comandada posteriormente por Recife, fato que perdura até os dias atuais.
2. Rede Urbana e Cidades Médias
As cidades estão socialmente e economicamente interligadas e apresentam interdependência
dentro do sistema capitalista. E uma das maneiras de enxergar esta interligação é através do
estudo científico das redes geográficas, e no caso mais específico das urbes, a rede urbana se
apresenta como sua principal manifestação (CORRÊA, 2012). Para se refletir sobre esta
temática é preciso inicialmente esclarecer o que são estas redes, assim, para Corrêa (2012) a
rede geográfica é o conjunto de localizações humanas articuladas entre si por meio de vias e
fluxos, sendo tais localizações os nós destas redes.
Ao introduzir o tema das redes urbanas, Souza (2008) trata a rede urbana como um conjunto
de cidades ligadas entre si por fluxos de pessoas, bens e informações, entendendo que ao
longo destas se distribuem núcleos urbanos com tamanhos e centralidades variadas. Estas
diferenciações entre tamanhos e importâncias das cidades, estão ligadas a mecanismos de
exploração econômica e exercício de poder, o que nos leva a entender a distribuição destes
centros em uma hierarquia urbana.
Aprofundando o tema, Corrêa (1989) acrescenta que a rede urbana passou a ser o meio a
partir do qual se realizam efetivamente a produção, a circulação e o consumo, pautados no
processo de urbanização, que ao longo do século XIX passou a refletir e condicionar
mudanças decisivas na sociedade. Segundo Corrêa (2012) as redes geográficas tornaram-se
104
mais numerosas e fechadas em meados da segunda metade do século XIX, pois o
desenvolvimento do capitalismo industrial careceu e originou novas demandas que
promoveram novos meios pelos quais as redes tornaram-se mais densas e eficientes.
Em seus estudos sobre as redes urbanas no Brasil, Corrêa (1997) aponta que existem três
condições básicas para a existência da mesma:
A) É preciso que haja uma economia de mercado, com uma produção que é
negociada por outra que não é reproduzida local ou regionalmente, tendo como
pressuposto um grau mínimo de divisão territorial do trabalho;
B) Verificação de pontos fixos no território onde os negócios acima são realizados,
produzindo uma característica de polarização;
C) É preciso que haja articulação entre os pontos (CORREA, 1997, p. 67).
Essas características se referem ao fato de que a rede deve demonstrar toda a infraestrutura
que possa imprimir o transporte de matéria, de energia ou de informação, e que se encontra
em seu território.
Já em obra de síntese de sua jornada acadêmica, Corrêa (2005) tem a preocupação de
explicitar de forma genérica a rede urbana que,
Constitui-se no conjunto de centros urbanos funcionalmente articulados entre si. É,
portanto, um tipo particular de rede na qual os vértices ou nós são os diferentes
núcleos de povoamento dotados de funções urbanas, e os caminhos ou ligações os
diversos fluxos entre esses centros. (CORRÊA, 2005, p. 93)
Percebe-se então, a importância das funções urbanas para a articulação de cidades em redes e
hierarquias urbanas. Corrêa (1989) afirma que as funções urbanas referem-se a atividades que
são tipicamente realizadas na cidade, como o comércio, serviços educacionais ou bancários.
Porém, não são quaisquer atividades urbanas, apenas as que contribuem para a existência das
cidades, atividades através das quais se dão relações com outras cidades ou com a zona rural.
Sendo assim, existem atividades básicas e atividades não básicas para a existência das cidades
e da rede urbana.
Esta escolha teórica remete a Teoria das Localidades Centrais, elaborada por Walter
Christaller (1933 [1966]), que para entender o motivo da existência de cidades grandes e
pequenas, passa a tratá-las como localidades centrais. Em sua teoria, existem aglomerações
urbanas de vários tamanhos que possuem funções centrais que consistem na produção e na
distribuição de bens e serviços para consumo numa área de influência em relação a qual o
centro urbano ocupa posição central.
Ao discorrer sobre funções centrais, Corrêa (2012) diz que uma localidade central tem um
conjunto de funções que a qualificam como centro local, regional ou metropolitano que, em
cada nível, associa-se a uma específica área de influência, caracterizada, por um dado número
de habitantes e uma dada dimensão em área. Estas funções centrais ocorrem em centros
105
urbanos, assim, chamadas de funções urbanas, e são responsáveis pela existência de redes
urbanas e os seus níveis de especialização definem a hierarquia urbana. Portanto, as funções
centrais são típicas funções urbanas.
Conforme Corrêa (2007), há relações entre tamanho demográfico, funções urbanas e
organização do espaço intra-urbano que são premissas para entender as cidades médias em
suas redes urbanas. O tamanho demográfico, em um mesmo contexto regional de renda e
padrão cultural, denota menor ou maior economia de escala, que envolve a cidade e seu
espaço de atuação, permitindo menor ou maior desenvolvimento de funções urbanas ou
atividades básicas, voltadas essencialmente para fora da cidade, e de atividades não básicas,
voltadas para o consumo da própria cidade. Atividades básicas e funções urbanas são, então,
expressões sinônimas.
As funções não básicas existem para atender a população da localidade, sendo assim, efeito da
própria concentração de população, como atividades de saúde básica, ensino fundamental ou
pequenos comércios de vizinhança. As funções básicas são aquelas que fazem com que a
cidade exerça influência em sua área de influência, conectando-a com áreas que estão fora
dela, sustentando ao mesmo tempo a população da cidade e usuários que residem na região de
influência, como atividades de saúde proporcionadas por um hospital regional, centros de
ensino superior, atividades comerciais ligadas aos shoppings ou as feiras. Logo, as funções
básicas, são base para as articulações entre a cidade, a área de influência e a rede urbana.
Em busca de uma delimitação, Castello Branco (2006) afirma que a definição de uma cidade
média não está vinculada apenas a sua classificação por porte populacional, mas também por
características funcionais ou ainda, pelo papel que desempenha na rede urbana regional, como
elo entre centros locais e centros globais.
A preocupação em discorrer sobre as cidades médias como algo muito mais além de uma
cidade com um determinado número de habitantes, relativamente menor que o das grandes
cidades e das metrópoles e com um quantitativo maior do que a população de centros urbanos
locais e cidades pequenas é um esforço intelectual que exige bastante cuidado, visto que esta
expressão se tornou consagrada em meados da década de 1970 com estudos governamentais
realizados para a construção de políticas públicas de planejamento urbano e regional, que
classificou as cidades de acordo com portes populacionais.
Diante da consagração desta expressão, Sposito (2001) acredita que seja necessário dar
continuidade ao uso de tal terminologia para se facilitar o diálogo. Entretanto, se faz
106
necessário que a cidade média seja tratada não apenas como uma classificação e sim como um
conceito.
Amorim Filho e Serra (2001) explicam que as cidades médias devem deter algumas
características específicas para serem entendidas como tal:
Interações constantes e duradouras tanto com seu espaço regional
subordinado quanto com aglomerações urbanas de hierarquia superior;
Desta forma, o critério demográfico é capaz apenas de identificar o grupo ou faixa que pode
conter as cidades médias (AMORIM FILHO & SERRA, 2001). Ao realizar um levantamento
sobre as diversas classificações por padrão demográfico, Sposito (2001) propõe que para
urbanização brasileira atual, esta faixa que pode conter as cidades médias possui entre 100 mil
e 500 mil habitantes, ainda que não se possa encontrar um consenso em torno dessas
referências demográficas.
Construindo o conceito de cidade média, Corrêa (2007), elabora um quadro teórico no qual
três elementos são essenciais: a presença de elite empreendedora, a localização relativa e as
interações espaciais. Para o primeiro elemento, considera-se que a elite empreendedora seja
detentora de autonomia econômica e política, criando assim, interesses locais e regionais. O
segundo elemento, compreende a cidade média como um lugar central na hierarquia regional,
isto possibilita que sua localização relativa seja foco de vias de circulação e nós de tráfegos.
No terceiro elemento, entende-se que as interações espaciais das cidades médias sejam
intensas, complexas, multidirecionais e apresentem multiescalaridade.
Adotando uma tipologia preliminar para as cidades médias, Corrêa (2007) ressalta o papel das
elites empreendedoras locais para construção de uma localidade central. São elas, uma elite
107
comercial, que condiciona um lugar central. Elite fundiária, que condiciona um centro de
drenagem e consumo da renda fundiária. E elite empreendedora especializada, que condiciona
um centro de atividades especializadas. Entendemos que a urbanização em Caruaru é
fortemente caracterizada pela presença do primeiro exemplo, sendo assim, cabe aqui
apresenta-la como:
lugar central, caracterizado por poderosa concentração da oferta dos bens e serviços
para uma hinterlândia regional. Neste caso, trata-se do que se convencionou
denominar capital regional, foco do comércio varejista e de serviços diversificados,
dotado de amplo alcance espacial máximo (range). Na hierarquia urbana situa-se
entre metrópole regional, quem está subordinada, pois a ela recorre para procurar
bens e serviços superiores, ou dela advêm os capitais que controlam algumas de suas
atividades terciárias, e numerosos centros menores, a quem subordina por meio de
suas funções centrais. Possui uma elite comercial mercantil (CORRÊA, 2007, p. 31).
108
mercado europeu, chamadas de Feitorias, nas primeiras três décadas do século XVI
(CONDEPE, 1976; AZEVEDO, 1956). Entretanto, poucas Feitorias alcançaram o status de
povoados, posteriormente vilas e/ou cidades, como afirma Azevedo (1956).
A urbanização no Brasil inicia-se de fato após as instalações das Capitânias Hereditárias, a
partir da década de 1530, como apontam Andrade (2004), Azevedo (1956) e Corrêa (2005).
Nesse momento, surgem as primeiras Vilas, instaladas pelos Capitães Hereditários e as
Povoações e/ou Povoados, localizadas no entorno das vilas. Sendo essa ocupação delimitada a
partir da organização do sistema econômico mercantilista, que ainda visava à extração de
produtos da colônia para a metrópole, na época, porém, não apenas com exploração de
produtos naturais, como a madeira, as especiarias e as aves, mas também com a instalação de
culturas e mão de obra, como o cultivo da cana-de-açúcar (CONDEPE, 1976; ANDRADE,
2004).
A urbanização brasileira nesse período, não surgia de motivações da população local, mas de
motivações externas que atendessem a metrópole colonizadora. Os padrões dos embriões de
cidades em Pernambuco seguem os padrões dos embriões brasileiros. Há relatos de que em
1499, ainda antes do descobrimento, o navegador espanhol Vicente Pinzon teria chegado ao
Cabo de Santo Agostinho (ANDRADE, 2004; MAIOR & SILVA, 1993) e que em 1503,
Américo Vespúcio teria descoberto o Arquipélago de Fernando de Noronha (ANDRADE,
2004), porém sem a instalação de povoações.
Acredita-se que Igarassu tenha surgido decorrente de uma Feitoria (AZEVEDO, 1956;
AZEVEDO 1957) e que Olinda tenha surgido como Vila instalada por Duarte Coelho,
Capitão Donatário de Pernambuco (AZEVEDO, 1956; ANDRADE, 2004; CONDEPE, 1976).
Supõe-se ainda que tenha surgido entre 1530 e 1600: Recife, como povoação aglomerada ao
porto de Olinda, então capital pernambucana, Itamaracá, Jaboatão, o próprio Cabo, São
Lourenço da Mata, Camaragibe, Ipojuca, Sirinhaém e Goiana (Condepe, 1976). Surgiram
ainda as povoações de Paratibe, Várzea e Muribeca dos Guararapes, que ao longo dos séculos
foram anexados aos municípios de Paulista, Recife e Jaboatão dos Guararapes,
respectivamente (Fig. 1).
Figura 1: Embriões Urbanos de Pernambuco no Século XVI, com destaque para os embriões urbanos que se
tornaram municípios e para os embriões urbanos anexados a outros municípios.
109
Fonte: (CONDEPE, 1976) Com adaptações feitas por Rodolpho Dantas Gouveia e Anthony de Padua Azevedo
Almeida, 2013.
Considerando a distribuição dos primeiros embriões urbanos em Pernambuco, podemos
inferir que existe uma rede de circulação no litoral do estado, então Capitania, historicamente
determinada e por certo período parcialmente desarticulada, rudimentar e pouco desenvolvida
para os moldes capitalistas. Porém, a história do fluxo de trocas regional é bastante antiga,
datando pelo menos do período da produção e comercialização da cana-de-açúcar no Brasil.
O processo de ocupação humana colonizadora do estado de Pernambuco se deu inicialmente
pelo litoral, seguindo pela mata pernambucana, sertão e por fim o agreste. Isto parece um
contrassenso ao pesquisador que conhece tal recorte espacial, já que partindo do litoral e da
mata, chega-se primeiro ao agreste e depois ao sertão. Tal fato ocorreu, pois conforme
Condepe (1976), a conquista do sertão foi motivada por atividades econômicas
complementares e dependentes do plantation açucareiro: a produção de alimentos e de
animais de trabalho, fazendo-se necessário então o desenvolvimento do sistema agropecuário
do interior do estado, com a penetração dos colonizadores através dos vales dos rios,
circundando o Planalto da Borborema, onde então está localizado o agreste e estavam os
“índios revoltados e negros fugidos do cativeiro” (sic). Em pesquisa sobre a estruturação da
rede urbana ao longo do Rio São Francisco, Arraes (2013) aponta os caminhos de penetração
dos colonizadores (Fig. 2).
110
Figura 2: Caminhos terrestres criados nos tempos coloniais e marginais ao rio São Francisco ou a ele
convergentes para a penetração dos colonizadores
111
agreste pernambucano, que passa a exercer papel central na intermediação de produtos entre o
sertão e o litoral e passa a produzir e comercializar alimentos da policultura da região, por
meio de sua feira.
Deste modo, em um sistema ocupacional voltado para o exterior, é que vão surgir poucas
áreas polarizadoras, sendo Caruaru uma delas, que se configuravam como centros regionais
na economia baseada na policultura e no comércio nas feiras. Então, a configuração
hierárquica da rede pernambucana classifica-se como dendrítica, pois se caracteriza pela
origem colonial, apresenta relativo número de pequenos centros e pequenos pontos de venda
indiferenciados entre si e a ausência de centros intermediários ao longo de toda a rede.
Tal padrão espacial de interação principiante e centralizada compõe um esquema de drenagem
de recursos em geral, que privilegia a cidade primaz (Olinda-Recife) em detrimento da sua
hinterlândia. De acordo com Corrêa (2005), na rede dendrítica observa-se que, à medida que
se distancia da cidade primaz, os centros urbanos diminuem de tamanho populacional, no
valor de vendas e em termos de expressão política. Esta configuração, que tem início no
período colonial, passa por diversas situações conjunturais ao longo do tempo, com o
surgimento inclusive de outros centros regionais, mas sua essência é mantida na atualidade,
pois:
Observa-se que Recife possui a configuração mais densa e consolidada do Nordeste, contando com as regiões de
influência de Recife, Caruaru, Campina Grande e João Pessoa, bem como com os centros regionais de Natal e
Maceió. Assim, a metrópole pernambucana organiza o território de todo o Saliente Nordestino. (MOTTA &
AJARA, 2001, p. 19).
112
Fonte: REGIC/IBGE (2008).
A rede urbana comandada por Recife, segundo IBGE (2008) é enquadrada como a quarta
maior em população do País, com 10,3% de sua população. Deste total, 19,5% se agrupam em
Recife. Envolve os estados do Pernambuco, Alagoas e Paraíba, além do Rio Grande do Norte
(dividido com Fortaleza). Devido à divisão da área de Petrolina-Juazeiro com Salvador, a rede
de Recife avança também pelo interior da Bahia. A rede é composta pelas Capitais regionais
A de João Pessoa, Maceió e Natal; a Capital regional B de Campina Grande; as Capitais
regionais C de Arapiraca, Caruaru, Mossoró e Petrolina-Juazeiro; e outros Centros sub-
regionais A, Centros sub-regionais B e suas áreas de influência (IBGE, 2008).
4. Caruaru: a Cidade Média do Agreste Pernambucano
A urbanização começa a tomar forma em Caruaru através de três motivos principais: o
primeiro deles é a posição geográfica da antiga Fazenda Caruru que tinha seus currais
próximos ao Rio Ipojuca, um dos fatores principais para o surgimento dos embriões de
cidades, como aponta Azevedo (1957). O segundo motivo foi a presença do caminho das
boiadas passando pela fazenda, que se tornou posto de apoio e pernoite e o terceiro,
caracterizado por Ferreira (2001) como o mais importante deles, foi a construção da Capela de
Nossa Senhora da Conceição, iniciada em 1781, e que permitiria a aglomeração de residências
e população em seu entorno.
A aglomeração de pessoas nesta área permitiu o surgimento de atividades comerciais, por
meio de uma feira semanal que ficou conhecida pelo próprio nome da cidade, a Feira de
Caruaru. A função comercial de Caruaru acompanhou sua evolução urbana e aliada a outros
fatores condicionou a cidade a desempenhar papel intermediário na rede urbana regional,
sendo atualmente considerada cidade média.
113
As feiras desempenharam um importante papel na origem e crescimento de muitas cidades do
interior do nordeste brasileiro, além de transformar algumas dessas cidades em centros
regionais de intermediação, com influência relevante nas suas redes urbanas, adquirindo
assim, a condição de cidades médias.
Segundo Ferreira (2001) e Barbalho (1972) a Fazenda Caruru, localizava-se as margens do rio
Ipojuca, que tinha em seu vale o “caminho das boiadas”, que fazia a interligação do sertão
pecuário com o litoral canavieiro, para transporte de gado do interior para Olinda e Recife,
assim a fazenda passou a tornar-se ponto de apoio e “pouso obrigatório da vaqueirama em
trânsito” (CONDÉ, 1960).
As principais atividades econômicas da região, formada por uma grande área rural, era o
trabalho com o gado, tanto o que vinha do sertão nordestino, quanto os primeiros rebanhos
instalados no agreste pernambucano e a agricultura de subsistência pautada na policultura,
diferente da região da mata pernambucana, no auge da monocultura canavieira. As atividades
econômicas rurais são as primeiras responsáveis por acumular população na região, que irão
aglomerar-se em alguns povoados, entre eles um gerado na Fazenda Caruru.
Administrada por José Rodrigues de Jesus a partir de meados do século XVIII, a Fazenda
Caruru, ponto de apoio, passou a receber viajantes, tangerinos, tropeiros e mascates, que
passaram a pedir refeições e dormitórios aos moradores da fazenda. Assim, iniciava-se o
comércio na fazenda, e o desenvolvimento da futura feira (FERREIRA, 2001).
Diante da capela, foi crescendo aos poucos a feira livre da fazenda, e por isso passou, aquele
local, a se chamar Rua do Comércio. A comercialização de frutas, cereais, gado bovino,
artesanato e utensílios, produzidos manualmente, atraíam cada vez mais vendedores e
compradores. Com o desenvolvimento da Feira, fora‐se formando em torno da capela o
povoado, com as primeiras casas e ruas (IPHAN, 2006).
Neste recorte histórico de Caruaru, sinalizamos a presença de embrionárias funções urbanas
econômicas (comércio, através da feira) e culturais (religião). Essas funções inserem em
Caruaru, o incipiente papel de localidade central em sua região.
A comercialização na feira passou a fazer com que a Fazenda Caruru passasse a ser ponto de
convergência de novos moradores. A atividade religiosa passou a se expandir e na fazenda
instalou-se um Distrito de Paz. Surgiu também a Igreja de Nossa Senhora das Dores, que
passou a condição de Igreja Matriz (FERREIRA, 2001).
Em 16 de agosto de 1848, a Lei Provincial nº 212 elevou Caruaru a categoria de vila. Ano
estampado no brasão do município. Analisando documentos deste período, Barbalho (1972)
114
notou a diferenciação do nome do lugar, que em alguns papéis era chamado de Caruru e em
outros de Caruaru. Um ano mais tarde, é instalada a Câmara Municipal, que passa a
concentrar a liderança política da região (BARBALHO, 1972).
Neste período, a evolução das atividades comerciais e religiosas fez com que a elite
comercial local passasse a pressionar sua emancipação política, passando a condição de Vila
de Caruaru e menos de dez anos após, a condição de cidade. Os serviços públicos político-
administrativos são então, as principais funções urbanas deste período, que passam a
transformar Caruaru em localidade central de fato.
Em 18 de maio de 1857 a Lei Provincial nº 416 elevou a Vila de Caruaru à categoria de
cidade. Esta é a data em que atualmente se comemora seu aniversário. Na condição de cidade
e sede de município, Caruaru vê sua feira crescer dia após dia, assim como o suas atividades
comerciais. Entretanto, é a partir dos finais do século XIX que uma atividade econômica rural
influencia a urbanização caruaruense, o cultivo do algodão. Segundo Andrade (2007), o
cultivo do algodão no agreste nordestino, dinamizou a economia.
O “ouro branco”, como foi chamado por alguns anos o algodão, conseguiu fazer frente ao
plantation da cana-de-açúcar e foi responsável pelo crescimento de algumas cidades no
Agreste. Em Pernambuco, a instalação da ferrovia da companhia inglesa Great Western, foi
fruto da cotonicultura e propiciou o crescimento de várias cidades ao longo de sua rede
ferroviária.
Na obra de Condé (1960), há uma preocupação em falar sobre Caruaru, cidade do Agreste
pernambucano, durante o auge do algodão em toda a região. Assim, o autor preocupa-se em
ambientar a cidade de Caruaru na década de 1920, dando destaque ao algodão:
Situada num planalto da Borborema e contornando o monte Bom Jesus, a cidade
crescia naqueles anos da década de vinte. Da caatinga – brotando, nativo entre
mandacarus, xiquexiques, e palmatórias – vinha a seiva que lhe dava vigor ao corpo:
o algodão. Fortunas começaram a surgir da noite para o dia: ergueram-se palacetes
na Rua da Matriz, surgiram novas ruas; os primeiros automóveis e caminhões
começaram a varar as estradas poeirentas abertas nos carrascais. Os caminhos que
vinham das plantações para o burgo, desembocavam diretamente nos escritórios dos
intermediários ou nos armazéns de beneficiamento, onde maquinarias estavam
sendo instaladas em ritmo acelerado. (CONDÉ, 1960, p. 27).
115
surgimento de estabelecimentos secundários e terciários, nos outros trechos em negrito da
citação acima.
Em outro trecho do capítulo da obra de Condé (1960), seguem descrições de como foram
mudando as condições sociais, culturais e econômicas de Caruaru. Há exemplos de migração
rural-urbano, do crescimento da própria cidade e da nova classe social que se instalara durante
o período. Vejamos:
Com o dinheiro ganho, coronéis erguiam residências suntuosas, janelas abertas para
jardins floridos, mobiliário das melhores lojas da Capital, cortinas de seda pura,
tapetes, cristais; compravam carros “Ford” e “Overland”; adquiriam patentes da
Guarda Nacional e se faziam fotografar envergando fardas de major ou coronel. Mal
sabiam ler e falar, porém os filhos estudavam nos colégios do Recife e do Rio. A
fazenda de gado passara a ser lugar de recreio. Se antigamente vinham do campo
para a cidade apenas uma vez por semana – ver a feira de sábado e ouvir a missa de
domingo – agora faziam exatamente o contrário: moravam na rua; o campo se
transformara em pouso tranquilo para dias de ócio, banhos de açude e pescarias, para
o leite ao pé da vaca e o requeijão fresco, para as grandes tachadas de canjica de
milho verde. (CONDÉ, 1960, p. 28).
Em Caruaru, houve a instalação de uma Estação Ferroviária, que ligava Caruaru ao Recife
através da ferrovia da Companhia Great Western, de origem inglesa, principal meio de
escoamento da produção do algodão (Fig. 4).
Figura 4: Estação ferroviária e depósito de uma das primeiras manufaturas de algodão de Caruaru em meados da
década de 1930.
116
a partir da cidade de Santa Cruz do Capibaribe, Toritama e Caruaru, quando nasce a Feira da
Sulanca – cognome da confecção têxtil local (LIRA, 2011). Cresce então, o Polo de
Confecções do Agreste.
Os serviços de educação, saúde, rede bancária e a pequena atuação industrial em relação com
o comércio são destacados por Cardoso (1965). Desde então, os serviços de saúde ampliaram-
se e especializaram-se, tanto na esfera pública, quanto na privada (SILVA, 2007). Agentes
econômicos externos intervêm por meio de Shoppings Centers, em 1998 e 2009. Agentes
econômicos regionais instalam Centros de Compras (LIRA, 2011). A educação também se
expande, através do ensino superior público e privado. Surgem ainda, empresas do setor
imobiliário, responsáveis pela verticalização, aeroporto de pequeno porte, ampliação de
atividades turísticas voltadas para o artesanato, principalmente o barro do Mestre Vitalino, e
por fim, espaços para a realização de eventos, como as festas juninas de São João, que atraem
um público superior a 1 milhão de pessoas e conferem a Caruaru o título de Capital do Forró.
Assim, Caruaru passou a desempenhar as principais características de uma cidade média,
apontadas por Amorim Filho & Serra (2001), com interações constantes e duradouras tanto
com seu espaço regional subordinado quanto com Recife, sua principal aglomeração urbana
de hierarquia superior. Apresenta tamanho demográfico e funcional suficiente para oferecer
um leque de bens e serviços ao espaço microrregional a elas ligado, ou seja, sua hinterlândia,
portanto desempenhando o papel de centro de crescimento econômico regional e engendrando
economias urbanas necessárias ao desempenho eficiente de atividades produtivas. Dispõe de
capacidade de receber e fixar migrantes de cidades menores e/ou da zona rural, por meio do
oferecimento de oportunidades de trabalho, funcionando como ponto de interrupção do
movimento migratório na direção das grandes cidades, seja Recife ou metrópoles do Sudeste
brasileiro. E por fim, detém considerada diferenciação do espaço interurbano, com um centro
funcional bem individualizado e uma periferia dinâmica.
5. Considerações Finais
A rede urbana pernambucana é caracterizada inicialmente por sua origem colonial dendrítica
e por relativo número de pequenos centros, desenvolvendo-se e fortalecendo-se ao longo dos
séculos por meio de ações de diversos agentes sociais, tornando-se uma das redes urbanas
mais importantes do país, através da metrópole recifense, que hierarquicamente a comanda.
As atividades econômicas terciárias são os principais fatores que levaram Caruaru a condição
de cidade média, ao longo de sua história. Surgem várias funções urbanas básicas para o seu
papel de intermediação regional. Na cronologia da cidade, entre diversos outros fatores
117
conjunturais, seguem-se a ampliação e instalação da rede de transportes rodoviário e
ferroviário, respectivamente, condicionados pela expansão do comércio e consumo e pelo
sistema agropecuário policultura-algodão-gado. Sempre com o crescimento da função
terciária, que ainda permanece atualmente. Por fim, a reestruturação do capitalismo, no último
quartel do século XX, traz variados processos que elevam a condição de função terciária de
Caruaru e colocam esta cidade como importante nó da rede urbana pernambucana, fazendo
com que Recife possa exercer influência, através de Caruaru, em cidades que estão
diretamente articuladas com esta.
Referências
AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno.; SERRA, Rodrigo Valente. Evolução e perspectivas do
papel das cidades médias no planejamento urbano e regional. In: ANDRADE, Thompson A.;
SERRA, Rodrigo Valente (org.). Cidades Médias Brasileiras. Rio de Janeiro: IPEA, 2001,
p. 1-34.
ANDRADE, Manoel Correia de. Pernambuco: Cinco Séculos de Colonização. João Pessoa:
Grafset, 2004.
ANDRADE, Manuel Correia de. A Terra e o Homem no Nordeste: contribuição ao estudo
da questão agrária no nordeste [1963]. 7ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Cortez Editora,
2007.
ARRAES, Esdras. Rio dos currais: paisagem material e rede urbana do rio São Francisco
nas capitanias da Bahia e Pernambuco. Anais do Museu Paulista. São Paulo. n. Sér. v.21.
n.2. p. 47-77. jul.- dez. 2013.
AZEVEDO, Aroldo de. Vilas e Cidades do Brasil Colonial: Ensaio de Geografia Urbana
Retrospectiva. Boletim da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de
São Paulo. n. 208. São Paulo, 1956.
AZEVEDO, Aroldo de. Embriões de Cidades Brasileiras. Boletim Paulista de Geografia. n.
25. São Paulo, mar. 1957, p. 31-69.
BARBALHO, Nelson. Caruru Caruaru: Nótulas subsidiárias para a história do agreste
de Pernambuco. Recife: Editora Universitária UFPE, 1972.
118
CARDOSO, Maria Francisca T. C. Caruaru: A Cidade e sua Área de Influência. Revista
Brasileira de Geografia. Ano 27, n. 4. out/dez., 1965. p. 537-614.
CHRISTALLER, Walter. Central Places in Southern Germany. Englewood Cliffs:
Prentice-Hall Inc., [1933] 1966.
CONDÉ, José. Terra de Caruaru. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1960.
CONDEPE, Instituto de Desenvolvimento de Pernambuco. O Processo de Ocupação do
Espaço Pernambucano. Recife: CONDEPE, 1976.
CORRÊA, Roberto Lobato. A Rede Urbana. São Paulo: Ática, 1989.
CORRÊA, Roberto Lobato. Interações espaciais. In: CASTRO, Iná Elias de. et al. (Orgs.).
Explorações Geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p. 279-318.
CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2005.
CORRÊA, Roberto Lobato. Redes Geográficas: reflexões sobre um tema persistente.
Cidades. Presidente Prudente, Vol. 9, n. 16, 2012. p. 199-218.
FERREIRA, Josué Euzébio. Ocupação Humana do Agreste Pernambucano: Uma
Abordagem Antropológica para a História de Caruaru. João Pessoa: Edições FAFICA,
2001.
INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN).
Dossiê Feira de Caruaru: Inventário Nacional de Referência Cultural. Recife: IPHAN,
2006.
119
SÁ, Márcio. Feirantes: Quem São e Como Administram seus Negócios. Recife: Editora
Universitária UFPE, 2011.
SILVA, Kleber Costa. Dinâmicas regionais de cidades de porte médio: um estudo de caso
sobre a concentração de serviços de saúde em Caruaru – PE. Recife: Dissertação de
Mestrado em Geografia – Universidade Federal de Pernambuco, 2007.
SOUZA, Marcelo Lopes de. ABC do Desenvolvimento Urbano. 4ª ed. Rio de Janeiro:
Bertrand do Brasil, 2008.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. As cidades médias e os contextos econômicos
contemporâneos. In: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. Urbanização e Cidades:
perspectivas geográficas. Presidente Prudente/SO: FCT/UNESP, 2001. p. 609-643.
120
CIDADES MÉDIAS: UM VIÉS PELOS DESLOCAMENTOS
PENDULARES
Resumo:
As cidades médias caracterizam-se, entre outros aspectos, pela importância de suas funções
urbanas e, consequentemente, pelos papéis que desempenham em âmbito regional. Tais
centros exercem forte atratividade sobre seu entorno em decorrência de suas amplas ofertas de
trabalho, atividades de comércio e de serviços especializados, configurando um cenário de
constante movimento. Levando-se em conta este cenário, neste trabalho analisa-se os
deslocamentos pendulares, tomando-se por base os microdados da amostra dos censos
demográficos de 2000 e de 2010, disponibilizados pelo IBGE. Seis cidades médias
localizadas nos estados de São Paulo e Paraná são enfocadas. Os resultados mostram que o
cenário urbano-regional, mesmo no interior do país, tem se tornado gradativamente mais
complexo no que se refere aos deslocamentos entre municípios. A crescente concentração das
atividades econômicas nas principais cidades do país tem reforçado mudanças de hábito da
população, resultando num aumento dos deslocamentos convergentes a elas, mas mais que
isso, configurando um cenário complexo de interações espaciais.
Palavras-chave: Cidades médias; deslocamentos pendulares; interações espaciais.
Introdução
31
Doutor em Geografia, com pós-doutorado em andamento junto à UNESP – Univ Estadual Paulista, Presidente
Prudente. Pesquisador do Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GAsPERR), da
Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), do Observatório das Cidades e do Laboratório de
Estudos Regionais (LABER), vinculado ao Grupo de Estudos Fronteiriços (GEF). Bolsista da Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sob processo n. 2012/24563-1.
32
Doutor em Geografia, com pós-doutorado em andamento junto à UNESP – Univ Estadual Paulista, Presidente
Prudente. Pesquisador do Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GAsPERR), da
Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe) e do Observatório das Cidades. Bolsista da Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), sob processo n. 2014/01067-4. Professor da
Universidade Federal de Uberlândia, Campus Pontal.
121
As cidades médias caracterizam-se, entre outros aspectos, pela importância de suas funções
urbanas e, consequentemente, pelos papéis que desempenham em âmbito regional. Tais
centros exercem forte atratividade sobre seu entorno em decorrência de maiores ofertas de
trabalho, de atividades de comércio e de serviços especializados. Sendo assim, torna-se
fundamental apreender a dinâmica atrelada ao deslocamento pendular realizado em função de
tais atividades.
Considerando-se estes aspectos, este trabalho tem como objetivo analisar a dinâmica atinente
aos movimentos pendulares de origem e destino a seis cidades médias brasileiras, localizadas
no interior dos estados de São Paulo e Paraná: Marília, Presidente Prudente, São Carlos,
Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e Londrina (Figura 01).
A escolha destas cidades está fundamentada nas concepções de um projeto de pesquisa maior,
intitulado Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e
consumo, em que se busca compreender as relações entre reestruturação urbana e
reestruturação das cidades, tomando-se como referência o consumo. Embora os dados aqui
apresentados não contemplem necessariamente atividades ligadas ao consumo, trata-se de
122
uma primeira aproximação para se compreender a dinâmica espacial existente no entorno
dessas cidades no que se refere aos deslocamentos pendulares e ao alcance destes.
Para implementação da análise foram utilizadas informações provenientes do banco de
microdados dos censos demográficos nacionais de 2000 e de 2010, disponibilizados pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foram tabulados, analisados e
mapeados os dados relativos aos deslocamentos por motivo de trabalho e/ou estudo para estes
dois anos.
Este texto está estruturado em três partes principais, além desta breve introdução:
primeiramente, aborda-se alguns elementos teóricos e conceituais concernentes às cidades
médias e aos deslocamentos pendulares; em seguida, enfoca-se os dados empíricos que
serviram de base às análises das cidades selecionadas e respectivos entornos. Por fim, a partir
dos resultados apresentados, pontuam-se as principais constatações no que se refere, de um
lado, às características e especificidades de cada centro urbano em relação aos movimentos
pendulares e, de outro, à importância de se compreender os deslocamentos de caráter
cotidiano para análise das cidades médias.
124
Do ponto de vista do mercado consumidor, as cidades médias
continuam a desempenhar o papel de pólos para os quais moradores
de cidades menores e de áreas rurais estão dispostos a se deslocar
para realizar o consumo de bens e serviços mais sofisticados do que
aqueles a que tem acesso nas cidades de menor porte.
O consumo não é evocado nas argumentações anteriormente citadas por acaso, uma vez que
se trata de um elemento de fundamental importância quanto à estruturação das redes urbanas,
contudo, em âmbito microrregional, outros aspectos concorrem para estruturar ou tornar não
apenas mais densas, como também mais complexas, as interações espaciais entre as cidades.
Assim, especificamente quanto aos deslocamentos exercidos pela população, além do motivo,
aspectos como a frequência, a distância, o meio de transporte utilizado, entre outros –
propriamente, a combinação deles –, têm peso importante para a caracterização do tipo de
deslocamento. A título de exemplo, pode-se citar o caso da distância, em que se tem detectado
mudanças importantes em relação à disposição dos consumidores quanto ao deslocamento,
como apontam Sposito et al. (2007 et al., p. 49)33 – tratando, inclusive, da atração exercida
pelas cidades médias:
33
A combinação entre a distância e o tempo do deslocamento certamente revelaria maior complexidade quanto à
dinâmica dos deslocamentos, embora isso seja mais verdadeiro às grandes aglomerações urbanas do que às
cidades médias.
125
estabelecimentos da indústria de transformação. Além disso, aplicando a mesma metodologia
de investigação às atividades comerciais e de serviços, esse mesmo autor evidencia que as três
primeiras cidades destacam-se, também, como polos de importantes áreas de concentração de
empregos e/ou de estabelecimentos de alguns grupos de atividades desses setores (REOLON,
2014). Portanto, do ponto de vista da atração de fluxos populacionais, são muitos os fatores
que convergem para que as cidades médias projetem-se e, assim, estimulem um complexo
conjunto de interações espaciais.
Além dos motivos – não obstante, inegavelmente subjacentes a eles –, a frequência dos
deslocamentos também é fundamental à compreensão das interações espaciais que se
configuram em direção e no entorno destas cidades. Enquanto o consumo de bens e de alguns
serviços especializados, como os médico-hospitalares, tendem a conformar fluxos esporádicos
ou eventuais, fatores como trabalho e estudo, por outro lado, ensejam deslocamentos mais
frequentes. Nesse sentido, muitos autores têm se debruçado sobre o estudo do contexto
regional de diferentes cidades médias, recorrendo, na maioria dos casos, aos dados
apresentados pelo IBGE, levantados no âmbito de pesquisas tais como o Região de Influência
de Cidades – REGIC ou derivadas desse estudo. Tais análises são essenciais para se
compreender a centralidade e o alcance espacial das cidades, uma vez que considera os
deslocamentos em escala regional, envolvendo, por exemplo, aqueles decorrentes de
demandas esporádicas em busca bens ou de serviços especializados. No entanto, considera-se
fundamental também atentar-se, justamente, para os deslocamentos cotidianos, geralmente
motivados pelo trabalho ou estudo, que caracterizam os movimentos denominados
pendulares.
Oliveira (2011), ao analisar as transformações ocorridas na mobilidade espacial da população
a partir da década de 1980, destaca que os deslocamentos pendulares ganharam importância,
deixando de ser um fenômeno meramente metropolitano.
Em si, do ponto de vista das análises regionais, essa modalidade de deslocamento é
caracterizada por se realizar “entre o município de residência e outros municípios, com
finalidade específica” (MOURA, CASTELLO BRANCO; FIRKOWSKI, 2005, p. 124) e
cotidianamente. Ou seja, entende-se que os deslocamentos pendulares compreendem os
movimentos diários da população entre diferentes municípios. Apesar de poderem designar
movimentos motivados por hábitos corriqueiros diversos, tais como exercício de lazer ou
compras, normalmente estão associados às obrigações diárias34, como trabalho e estudo.
34
Ressalta-se que o uso do termo obrigações, neste caso, remete a situações circunstanciais.
126
Cabe reiterar que, embora esses movimentos geralmente sejam relacionados aos
deslocamentos realizados no interior de aglomerações urbanas (MOURA, CASTELLO
BRANCO, FIRKOWSKI, 2005), principalmente das metropolitanas, neste trabalho
privilegiou-se a análise das interações existentes entre seis cidades médias e seus respectivos
entornos. Contudo, mesmo considerando-se o amplo conjunto de interações espaciais
potencialmente existentes em decorrência dos papéis urbanos desempenhados pelas cidades
médias, em âmbito regional, neste trabalho estabeleceu-se como foco a análise dos
movimentos pendulares motivados pelo trabalho e/ou estudo. A intenção, neste caso, é
averiguar e mensurar a importância das interações consubstanciadas por esses movimentos,
ponderando-se os contextos regionais em que se inserem. Em outras palavras, poder-se-ia, tal
como fazem Pereira e Herrero (2009), dizer que esses deslocamentos pendulares são tomados
como elemento central à compreensão das dinâmicas regionais de integração urbana.
Propriamente no caso das análises dos movimentos pendulares35 em que se toma por base os
microdados do IBGE, os deslocamentos estimulados pelo consumo de bens e de serviços está
apenas parcialmente evidenciado no questionário de amostragem dos censos demográficos,
especificamente, tratando-se dos deslocamentos para estudo. Por outro lado, o formulário
contempla objetivamente o tema trabalho. Contudo, há diferenças entre os questionários
aplicados em 2000 e 2010. Quanto ao primeiro, a questão aufere em que local o entrevistado
trabalhava ou estudava, não diferindo entre um e outro. Já no Censo Demográfico de 2010, as
perguntas sobre o local de trabalho e estudo são distintas, podendo-se identificar e mensurar
separadamente os estudantes e os trabalhadores, portanto. Todavia, a comparação de ambos os
anos demanda uma forçosa agregação das informações geográficas mais detalhadas, obtidas
mediante a melhoria do questionário do último recenseamento.
Uma outra questão imanente ao Censo Demográfico de 2000 diz respeito à própria concepção
de deslocamento pendular induzida pelas informações levantadas, processadas e
disponibilizadas pelo IBGE. O próprio IBGE (2000, p. 67) já ensaiou uma problematização a
respeito disso, argumentando que, em função do modo como as perguntas do Censo
35
Ressalta-se que embora se admita que os movimentos pendulares – no âmbito das discussões teóricas,
metodológicas e conceituais – englobem um conjunto mais amplo e complexo de elementos, como já destacado
por Pereira e Herrero (2009) e demostrado no subitem anterior, nesta análise, considerar-se-á a definição
utilizada pela fonte de dados disponível para o tema, no caso, o IBGE.
127
Demográfico de 2010 foram formuladas, “tanto os deslocamentos diários [...] quanto os de
maior duração, como exemplificado pelos estudantes de nível superior, que permanecem
vários meses afastados de seus municípios de residência, são tratados da mesma forma.” O
instituto chega a mencionar, inclusive, inclusive, o exemplo de cidades com forte presença
universitária que atraem expressivos contingentes de estudantes que residem em municípios
distantes, enfatizando os casos dos 161 residentes no Estado do Rio de Janeiro que, na
ocasião, estudavam em Viçosa/MG e dos 661 paranaenses e 99 de goianos de que estudavam
em Marília/SP. Tudo indica que essa questão permanece subjacente ao Censo Demográfico de
2010, já que fluxos de longa distância, supostamente pendulares, continuam sendo
identificados no bojo do microdados. Desse modo, assim como em Reolon (2007), de modo a
conciliar o material empírico ao arcabouço teórico, o recorte territorial respectivo à
abrangência das áreas de deslocamento foi estipulado em função da definição de um raio de
50 quilômetros, medido a partir da sede dos municípios enfocados, notadamente: Marília,
Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Carlos e São José do Rio Preto, localizadas no
interior do estado de São Paulo, e Londrina, situada no norte do estado do Paraná. Entende-se
que os deslocamentos de curta distância possuem grande possibilidade de configurarem
movimentos pendulares, enquanto aqueles superiores ao corte estabelecido, estejam
associados aos movimentos periódicos.
Como já exposto anteriormente, a escolha dessas cidades se deve a um projeto de pesquisa
mais amplo, intitulado Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades
médias e consumo, em que se que busca compreender as relações entre a reestruturação
urbana e reestruturação das cidades, tomando-se por referência o tema do consumo. No
âmbito desse projeto, fica evidente a importância do contexto regional no que respeita à
apreensão das dinâmicas e processos relativos ao consumo de bens e serviços, seja em relação
às atividades cotidianas quanto àquelas esporádicas.
Em termos demográficos, as seis cidades apresentam portes distintos, sendo que Marília,
Presidente Prudente e São Carlos possuem pouco mais de 200 mil habitantes, enquanto as
demais contam com mais de 400 mil habitantes (Tabela 1).
Mesmo diante dessa diferença quanto ao tamanho demográfico, essas seis cidades de fato
desempenham importantes papéis regionais, haja vista as classificações designadas no REGIC
(2008): capitais regionais, no caso das cidades de Londrina, Marília, Presidente Prudente,
Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, e, no caso de São Carlos, centro sub-regional.
Não obstante, assim como o porte, a diferença dos níveis hierárquicos denota não ser possível
a realização de uma comparação direta entre os deslocamentos existentes no entorno de cada
uma destas cidades e em direção ou a partir delas próprias. A título de exemplo, enquanto São
José do Rio Preto apresenta uma área de influência territorialmente mais extensa e com maior
densidade de centros urbanos menores, São Carlos, por sua vez, está situada num contexto
complexo de interações espaciais, caracterizado pela presença de cidades de porte médio e
com níveis expressivos de centralidade em seu entorno (REGIC, 2008). Um outro exemplo é
configurado pelo caso de Londrina, que, considerando-se seu porte demográfico e a
conformação de uma aglomeração urbana que inclui cidades de porte médio, apresenta
características muito distintas das de Marília, por exemplo, onde a quantidade de movimentos
pendulares entre os municípios é menor. Tais fatores precisam ser ponderados nesta análise e
podem ser observados nas figuras 1 e 2, que apresentam o número total de deslocamentos por
motivo de trabalho e/ou estudo para os anos de 2000 e 2010, considerando-se o raio de 50
quilômetros a partir das seis cidades analisadas. Sob tal perspectiva, de modo a proporcionar
ênfase não apenas à comparação espacial das informações, como também temporal, as
classificações dos cartogramas dos pares decenais foram compatibilizadas, ou seja, tanto os
intervalos de classe das informações representadas em cada recorte territorial quanto aquelas
que designam os anos de 2000 e 2010 foram associados. É preciso chamar atenção, entretanto,
ao fato de que isso pode resultar em problemas de interpretação no caso de se realizar uma
leitura convencional desses cartogramas, propriamente, em que as classes de valores das
legendas são construídas de modo a representar exatamente a amplitude dos dados de cada
conjunto. Para melhor visualização e leitura dos mapas a seguir, recomenda-se ao leitor a
consulta aos cartogramas dos apêndices A e B.
129
Figura 2 – Áreas de estudo. Movimentos pendulares. 2000
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2000; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados na Figura 3
130
Figura 3 – Áreas de estudo. Movimentos pendulares. 2010
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2010; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados na Figura 2
131
Observa-se diferenças significativas em relação às quantidades de deslocamentos existentes
entre os municípios das diferentes áreas de estudo. Isso chama atenção ao fato de que, ao
contrário do que se poderia supor, esses dados não estão apenas relacionados ao tamanho
demográfico. A propósito dos casos de Presidente Prudente e de São José do Rio Preto, por
exemplo, nota-se que apresentam uma configuração espacial do conjunto de movimentos
pendulares bastante semelhantes, com forte convergência à cidade principal, embora tenham
portes demográficos diferentes. Por outro lado, Londrina e Ribeirão Preto, que conformam as
cidades de maior porte demográfico do conjunto analisado, são caracterizadas não só pela
maior quantidade de deslocamentos, como também pela existência de polos secundários ao
centro urbano principal. São Carlos, por sua vez, ilustra um caso diferente dos demais, devido
à forte relação que mantém com Araraquara – cidade localizada a menos de 40 quilômetros e
que é superior em termos demográfico e mais importante quanto ao nível hierárquico
projetado no âmbito da rede urbana. A propósito, além desta vinculação entre estes dois
centros, é notória a ligação existente entre estes com cidades de seu entorno imediato, como
nos casos de Ibaté com São Carlos e Américo Brasiliense com Araraquara. Por fim, fica
evidente que Marília é menos expressiva em relação à quantidade de deslocamentos
pendulares, embora apresente uma quantidade significativa de centros urbanos em seu
entorno.
Comparando-se os cartogramas das figuras anteriores, respectivos aos anos de 2000 e 2010,
dois aspectos chamam atenção: 1) houve ampliação da intensidade dos fluxos de maior
distância, considerando-se as respectivas áreas de estudo; 2) ocorreu uma consolidação dos
vetores de deslocamentos mais importantes. Quanto ao primeiro aspecto enumerado, chama
atenção o fato de que se trata de uma afirmação menos verdadeira para o caso de Marília e de
seu entorno, embora fique evidente um fortalecimento do eixo conformado pela rodovia
Comandante João Ribeiro de Barros. No que diz respeito ao segundo ponto, destacam-se a
consolidação dos vetores relativos a: Presidente Prudente e Álvares Machado; Jardinópolis,
Serrana e Cravinhos em relação a Ribeirão Preto; Cambé e Ibiporã em relação a Londrina; e
Mirassol e São José do Rio Preto. No âmbito desse conjunto, cabe ressaltar o caso de
Araraquara36 que embora não seja enfocado por este estudo, mantém importante ligação com
Américo Brasiliense. Diante deste quadro, constata-se a necessidade de dar maior ênfase aos
deslocamentos pendulares cujo destino compreende as cidades enfocadas nesta pesquisa.
36
Uma explicação para isso advém do fato de Araraquara constituir-se num importante centro regional da rede
urbana regional, possuindo uma população de pouco mais de 200 mil habitantes e uma centralidade que supera o
nível hierárquico da própria São Carlos.
132
Um enfoque sobre os movimentos convergentes às cidades médias selecionadas
133
Figura 4 – Marília, Presidente Prudente e São Carlos.
Movimentos pendulares convergentes. 2000
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2000; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados nas figuras 5, 6 e 7.
134
Figura 5 – Londrina, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto.
Movimentos pendulares convergentes. 2000
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2000; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados nas figuras 4, 6 e 7.
135
Figura 6 – Marília, Presidente Prudente e São Carlos.
Movimentos pendulares convergentes. 2010
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2010; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados nas figuras 4, 5 e 7.
136
Figura 7 – Londrina, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto.
Movimentos pendulares convergentes. 2010
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2010; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados nas figuras 4, 5 e 6.
Quanto ao primeiro conjunto, pode-se ressaltar os casos de Ribeirão Preto, de São José do Rio
Preto e de Presidente Prudente, em que alguns fluxos ampliaram-se de modo a ocupar os
intervalos de classe de maior quantidade de movimentos pendulares. Os deslocamentos entre
Ibiporã e Cambé com destino a Londrina igualmente chamam atenção, mas em decorrência do
número e não, necessariamente, em função de mudanças estruturais no período – cabe
ressaltar, neste caso, que Ibiporã e Cambé estão situadas no entorno próximo de Londrina. A
137
propósito do segundo grupo, houve apenas uma alteração, inerente ao maior destaque que
passou a ter os fluxos com origem em Rolândia para Londrina. Finalmente, a respeito do
terceiro grupo, os dados ratificam as constatações anteriores, sobre a ampliação das interações
espaciais de maiores distâncias, particularmente, evidenciando que o mesmo ocorreu no caso
dos deslocamentos convergentes às cidades médias analisadas.
É preciso ponderar, todavia, que do ponto de vista espacial, o grau de complexidade das
interações varia, como se pode averiguar com base na comparação entre os casos de Londrina
e Ribeirão Preto, por exemplo, que diferem consideravelmente de Marília e São Calos.
Entende-se que as razões dessas disparidades podem estar variando em função de algumas
particularidades regionais que merecem investigações mais aprofundadas. Por exemplo,
conjugados aos seus portes populacionais, os casos de Marília e São Carlos parecem se
diferenciar das demais cidades médias pesquisadas em função de dois importantes aspectos: o
peso do setor industrial na estrutura produtiva do município e entorno; e à situação geográfica
que possuem no âmbito regional, notadamente localizadas relativamente próximas a outros
centros que desempenham importante papel no âmbito da rede urbana. De qualquer forma,
tratam-se de hipóteses, que demandam estudos específicos com maior detalhamento sobre o
tema.
Guardadas as devidas proporções, todas as análises até então realizadas corroboram as
evidências de que as cidades médias analisadas de fato constituem-se em importantes polos de
atração de fluxos característicos dos movimentos pendulares. Esta constatação é reforçada
pelos resultados obtidos por meio dos cartogramas que representam os saldos dos
deslocamentos de origem sobre os de destino realizados no âmbito dos recortes territoriais
definidos no bojo deste estudo. Estes últimos mapeamentos mostram especificamente que as
cidades médias constituem-se nos principais receptores dos deslocamentos pendulares,
enquanto os municípios de seu entorno imediato são caracterizados como evasores, ou seja,
aqueles que apresentam maiores saídas do que entradas. Entretanto, estes mesmos
mapeamentos põem em cheque a hipótese de que a centralidade destas cidades,
exclusivamente no que se refere à atração de fluxos pendulares originadas em seus entornos,
tenham se ampliado exponencialmente em relação aos demais municípios. Em 2010, as
cidades médias analisadas continuam sendo atrativas, mas, na comparação com 2000, os
saldos dos deslocamentos de origem sobre os de destino, apesar de continuarem sendo
positivos, revelam-se menores do que já foram.
138
Figura 8 – Áreas de estudo. Saldos dos deslocamentos de origem sobre os de destino. 2000
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2000; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados na Figura 9.
139
Figura 9 – Áreas de estudo. Saldos dos deslocamentos de origem sobre os de destino. 2010
Fonte: IBGE. Microdados da Amostra. Censo Demográfico, 2010; Base cartográfica: IBGE, 2010.
Nota: os intervalos de classe da legenda desses cartogramas foram compatibilizados
com os dos cartogramas representados na Figura 8.
140
Problematizando essa questão, é possível apreender que tal característica constitui-se em
um indicativo de que a dinâmica dos deslocamentos pendulares torna-se mais complexa em
certos casos, uma vez que outros centros passam a atrair fluxos em detrimento da
exclusividade anteriormente conferida às cidades médias. Como exemplos dessas
mudanças, destaca-se os casos de 1) Apucarana, para onde passa a convergir parte
significativa dos deslocamentos inerentes à área de estudo de Londrina; 2) Araraquara, que
destacadamente passa a superar o saldo positivo de São Carlos; 3) Sertãozinho, que passa
de receptor, em 2000, a evasor, em 2010, no entorno de Ribeirão Preto.
Obviamente,
Considerações finais
141
Portanto, as análises empíricas proporcionaram a contemplação de um panorama geral das
relações estabelecidas entre as cidades médias selecionadas e seus respectivos entornos,
assim como fundamentaram uma análise comparativa tanto do ponto de vista espacial, entre
elas, quanto temporal, entre os anos de 2000 e 2010. Algumas hipóteses imanentes a essa
comparação puderam ser levantadas, todavia, estudos mais detalhados precisariam ser
realizados de modo a averiguá-las. Os diversos mapas apresentados também permitem a
realização de uma leitura e interpretação paralela das dinâmicas espaciais em curso,
permitindo que cada leitor possa trilhar um caminho próprio nesse sentido. Por fim,
recomendar-se-ia que pesquisas complementares fossem realizadas levando-se em conta a
ponderação dos fluxos em relação às respectivas populações municipais e, nesse mesmo
sentido, o crescimento demográfico total deveria ser analisado em paralelo ao aumento dos
movimentos pendulares, tomando-se, talvez, a taxa geométrica de crescimento anual para
tanto. Certamente, essas medidas proporcionariam novos vieses sobre as dinâmicas
populacionais em foco.
Referências
142
OLIVEIRA, A. T. R. Algumas abordagens teóricas a respeito do fenômeno migratório. In:
OLIVEIRA, L. A. P; OLIVEIRA, A. T. R. (org.) Reflexões sobre os deslocamentos
populacionais no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2011, p.11-27.
PEREIRA, R. H. M.; HERRERO, V. Mobilidade pendular: uma proposta teórico-
metodológica. Texto para discussão, Rio de Janeiro, Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada, n.1395, 2009. Disponível em:
<https://www.econstor.eu/dspace/bitstream/10419/91056/1/597728801.pdf>. Acesso em:
20 jan. 2015.
REOLON, C. A. A aglomeração urbana da soja: Cascavel e Toledo no contexto da
metropolização na mesorregião oeste paranaense. 244f. 2007. Dissertação (mestrado em
Desenvolvimento Regional e Agronegócio). Universidade Estadual do Oeste do Paraná,
Campus Toledo.
REOLON, C. A. Produção industrial e comando do capital no Brasil. Uma análise
espacial. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013.
REOLON, C. A. O consumo no espaço: a distribuição dos equipamentos de comércio e
serviços no Brasil. Presidente Prudente, 2014 – Relatório de Pós-doutorado em Geografia
apresentado à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
SPOSITO, M. E. B. O chão em pedaços: urbanização, economia e cidades no Estado de
São Paulo. 2004. 508f. Tese (Livre Docência). Faculdade de Ciências e Tecnologia,
Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente.
SPOSITO, M. E. B.; ELIAS, D.; SOARES, B. R.; MAIA, D. S.; GOMES, E. T. A. O
estudo das cidades médias brasileiras: uma proposta metodológica. In: SPOSITO, M. E. B.
(org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
143
Apêndice A – Marília, Presidente Prudente e São Carlos.
Identificação das principais sedes municipais e ligações rodoviárias
144
Apêndice B – Londrina, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto.
Identificação das principais sedes municipais e ligações rodoviárias
145
ZONEAMENTO MORFOLÓGICO FUNCIONAL DA CIDADE DE
TEÓFILO OTONI – MINAS GERAIS
37
Doutorando do Programa de Pós-graduação em Geografia – Tratamento da Informação Espacial – PUC
Minas - Projeto TOR – Teófilo Otoni e Sua Região. Orientador: Professor Dr. Leônidas Conceição Barroso.
E-mail do autor: ottonicarvalho@gmail.com
146
1. Introdução
O estudo de cidades médias tem nas últimas duas décadas se tornado cada vez mais
frequente. Além da importância inerente ao tema específico e, como subtema dos estudos
mais gerais de geografia urbana, as cidades médias brasileiras apresentam algumas
características importantes que tornam sua observação e análise proposições de grande
valor e se configuram como ricas contribuições para o entendimento das questões urbanas.
Seja na escala das próprias cidades médias quanto em centros urbanos em geral, na medida
em que as cidades médias têm cada vez mais apresentado problemas e questões urbanas que
poderíamos classificar como metropolitanos. Uma das características mais marcantes das
cidades médias é o seu papel mediador e regulador entre os grandes e os pequenos centros
urbanos, principalmente pelo relevante papel que desempenham no funcionamento e
equilíbrio das redes urbanas e regionais.
Numa cidade média os elementos estruturais, morfológicos e funcionais geralmente
são mais facilmente identificáveis que aqueles dos grandes centros, bem como os processos
históricos e de evolução do desenvolvimento se tornam mais explícitos e se refletem mais
claramente nos tecidos urbanos das cidades deste porte. Esses processos e a própria história
da cidade, desde sua gênese até os dias atuais, devem ser considerados de maneira conjunta
e simultânea, no sentido de tornar possível uma descrição e uma análise de interações de
natureza múltipla tais como físicas, ambientais, econômicas e sociais.
Neste sentido a cidade de Teófilo Otoni, Minas Gerais, tem se mostrado um excelente
objeto de estudo, onde vários elementos podem ser identificados, estudados e analisados
numa linha de tempo consideravelmente elástica que se desenvolve ao longo de mais de
150 anos de história.
1.1.Aspectos Teóricos e Metodológicos
O objetivo específico deste artigo é propor um zoneamento morfológico-funcional da
cidade de Teofilo Otoni, Minas Gerais, lembrando que a proposição de um zoneamento
morfológico-funcional de uma cidade não se faz sem uma abordagem mais ampla, onde
figuram uma análise do sítio e situação, alguns aspectos estruturais e o histórico de
desenvolvimento da cidade em questão, os quais se configuram como objetivos de natureza
mais geral.
147
Com efeito, à guisa de estrutura metodológica, o roteiro acima proposto deverá ser
seguido apresentando inicialmente a localização do município de Teófilo Otoni em
conjunto com o seu contexto regional, procedendo-se uma caracterização sintética da
cidade em seus aspectos gerais, da sua gênese até os dias atuais. Num segundo momento se
seguirá uma análise do Sítio, com destaque para as questões físicas e uma análise da sua
Situação ou Posição, levando-se em conta sua condição de cidade pólo numa região de
contato típica e de cidade entroncamento ou Carrefour, em relação a suas principais vias de
acesso. Para tanto, foram consultadas as contribuições de HARRIS AND ULLMAN (1945)
e seu Modelo Multi-Nuclear, Pierre GEORGE (1969), John S. ADAMS (1970), Roger
BRUNET (1972), DOLLFUS (1982), PELLETIER & DELFANTE (1997), BEAUJEU-
GARNIER (1997) e CÔRREA (2004). Finalmente será proposto um zoneamento
morfológico funcional da cidade, com base no modelo de zoneamento morfológico-
funcional para cidades médias de AMORIM FILHO (2005) e uma análise das
características desta cidade média, também segundo AMORIM FILHO (1976) e AMORIM
FILHO, TAITSON BUENO e ABREU (1982).
Os mapas foram confeccionados no software Arcgis 10, com bases obtidas no sítio do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010). Para a confecção dos gráficos e
tabelas, utilizou-se o programa Microsoft Office 2010.
2. Caracterização Geral da Cidade de Teófilo Otoni
148
Mapa
1 – Localização do Município de Teófilo Otoni
Todo o comércio do médio e alto vale dos rios Jequitinhonha e Pardo se fazia a partir
de Diamantina através da Estrada Real até o Rio de Janeiro e Paraty. Esta rota histórica,
além de gerar um alto custo financeiro e uma grande demanda de tempo no transporte de
cargas era particularmente prejudicial à produção do norte do estado, princialmente no que
toca a então pujante cultura do algodão já bem desenvolvida na região de Minas Novas.
Ocupada então pelos índios e por alguns estabelecimentos militares e/ou destinados
ao degredo de condenados, somente a partir de 1830 observaremos algum interesse oficial
em mapear ou mesmo desbravar os sertões dos Vales do Mucuri e do São Mateus. Objeto
de uma expedição pioneira realizada em 1836, liderada pelo Engenheiro Pedro Victor
Renault, a região tem então sua primeira incursão expedicionária. Por se tratar de um
território de difícil escrutínio e travessia por conta de suas características físicas, o relatório
da expedição ainda permanecia, na sua conclusão em 1837, com grandes lacunas no que
toca a descrição e o mapeamento da região.
Assim continuará até a segunda metade da década dos anos 1840, quando por
iniciativa dos irmãos Teófilo e Honório Ottoni e uma diretriz política do Segundo Império,
se observará o início de um processo tardio de colonização e desbravamento desta região.
149
Munidos do relatório de Renault, os irmãos Ottoni decidem empreender no Mucuri,
realizando assim diversas expedições exploratórias durante toda a década dos anos 1840 a
partir do povoado de São José do Porto Alegre (hoje a cidade de Caravelas, BA), até a
localidade de Cachoeira de Santa Clara (hoje a cidade de Nanuque, MG) e além, através
dos sertões do Mucuri, até as planícies do seu afluente principal, o rio Todos os Santos. Ali
se encontraram as bandeiras vindas de Minas Novas, Serro e do sul da Bahia. O centro
urbano de Philadélfia, atual cidade de Teófilo Otoni, será fundado nas baixadas do Rio
Todos os Santos em 1853, com o intuito de abrigar um centro colonizador e os armazéns
centrais do que seria a futura Companhia de Navegação e Comércio do Vale do Mucury.
Mesmo antes da fundação da então Philadélfia esta região já se caracterizava
historicamente por características profundamente marcadas pelo meio físico. Suas
características físicas bastante peculiares já se apresentavam como uma forte razão para a
sua condição inóspita tardia, que acabaria por exigir um modelo de ocupação diferente de
outras microrregiões de Minas Gerais e mesmo do Brasil.
A Cia. de Navegação do Mucury, fundada pelos irmãos Ottoni que surge como
espinha dorsal do processo de colonização e desenvolvimento regional, sucumbirá às
condicionantes físicas da região, as quais impedem a navegação completa dos rios Todos os
Santos e Mucuri até sua foz, a despeito do relatório do Eng. Victor Renault (1837), que
dava estes rios como totalmente navegáveis. A navegação só se faz possível em um trecho
do rio Mucuri devido à ocorrência de corredeiras. A impossibilidade de navegação do
Todos os Santos e do Mucuri acaba por exigir a construção de uma estrada de rodagem com
27 léguas de extensão inaugurada em 1857, denominada Estrada Santa Clara, considerada
como a primeira estrada de rodagem do Brasil.
O trecho entre Filadélfia e Cachoeira de Santa Clara era feito em lombo de animais de
carga, através da estrada Santa Clara até o porto fluvial da Cia. em Nanuque, seguindo
então finalmente no vapor até o porto marítimo em São José do Porto Alegre, determinando
assim um aumento importante de tempo e custo no processo de transporte das mercadorias
realizado pela Cia. de Navegação do Mucury, o que finalmente fragilizaria a empresa
financeiramente e que culminará com a encampação da mesma pelo Império em 1860.
O histórico de desenvolvimento desta região é marcado por uma sucessão de ciclos
econômicos que se iniciam com a fundação da Companhia de Navegação do Mucury em
150
1853, obrigada a construir as 27 léguas da estrada Santa Clara, os armazéns centrais em
Philadélfia (Teófilo Otoni), um porto fluvial em Cachoeira de Santa Clara (Nanuque) e um
porto marítimo em São José do Porto Alegre (Caravelas). O primeiro ciclo de
desenvolvimento se dá pela extração de madeira e minerais, escoados inicialmente pela
Santa Clara e posteriormente pela Estrada de Ferro Bahia-Minas iniciada em 1868 e
finalizada em 1879. As condições naturais geralmente são “exploradas pela construção de
redes de transporte e de circulação, readaptando a função Carrefour a cada novo sistema
de relações, isto é, as estradas e os canais primeiro, as vias férreas a partir de meados do
séc. XIX, atualmente as redes de auto estradas” (GEORGE, 1969).
O segundo ciclo se inicia com a introdução maciça da agricultura, destacando-se a
cultura do café em finais do século XIX e que entra em colapso com a crise global de 1929.
Após breve período de instabilidade se dá a criação de um novo ciclo, o da bovinocultura
de corte e leite de caráter extensivo, iniciado no vácuo das terras até então cultivadas com
café ou desmatadas no primeiro ciclo e que simplesmente são abandonadas com a falência
do mercado internacional a partir da década de 1930.
Finalmente, já em meados do século XX, a fragilidade dos modelos adotados acaba
por encurralar a cidade de Teófilo Otoni e sua região de influência direta dentro dos limites
restritos do setor terciário local, ainda em formação. Com a falência do ciclo agro-pecuário,
que entra definitivamente em declínio a partir do último quartel do século XX, torna-se
notório a preponderância do setor terciário que atualmente sustenta a atividade econômica
regional, com inclusive alguma ocorrência de atividades que poderiam já ser classificadas
como do setor quaternário ou terciário superior, como a educação, tecnologia e informação,
mas ainda em estágio embrionário.
Conforme evidenciado, o surgimento e o desenvolvimento local estiveram sempre
vinculados à noção de contato entre regiões diversas e acaba por surgir como uma opção de
transporte alternativo em relação à Estrada Real e aos eixos tradicionais de escoamento da
produção da região norte do estado de Minas Gerais. Primeiro com a estrada de rodagem
Santa Clara (1857) e posteriormente com a Ferrovia Bahia/Minas inaugurada em 1879 e
desativada em 1966, quando se iniciam as obras de asfaltamento da antiga estrada do Boi,
finalizada em 1980, recebendo então a denominação oficial de BR – 418, além da BR 116
151
(Rio-Bahia) reconhecido como um grande eixo de ligação nacional o qual passa pela
cidade.
3. O Binômio de Localização: Análise de Sítio e Posição (Situação).
152
define que a Situação “evolui em função de um conjunto de relações estabelecidas levando
em conta outros pontos e outros espaços”, (p. 9), evidencia que o sítio é o próprio
“receptáculo” do espaço geográfico.
A situação ou a posição certamente aparece como um componente importante do
estudo das cidades, uma vez que o sítio pode favorecer uma posição ou agir negativamente
para desvalorizá-la. Certamente o sítio é passível de atingir uma situação de “caducidade”
devido ao seu envelhecimento, causando “um entrave ao desenvolvimento da cidade, (...),
pois o valor do sítio envelhece muito mais depressa que o da posição porque o primeiro é
mais estreitamente ligado à técnica específica de utilização do espaço”, (GEORGE, 1969,
p.2). Essa posição dá à cidade uma importância ímpar, dentro de uma região.
GEORGE (1969) também analisa diferentes situações de cidades em seu trabalho.
Dentre os diversos tipos analisados por ele, o tipo Carrefour ou Encruzilhada, aparece
neste contexto como o mais importante sendo subdividido basicamente em três situações. A
primeira é a de Carrefour em Regiões Homogêneas, onde essa homogeneidade é dada pelo
sítio. A segunda subdivisão seria posição em Carrefour de Contato de Regiões Naturais
Diferentes, que estimularia a união de regiões diferentes. E a terceira surge como a Cidade
de Margens de Rios que pode ser a um só tempo, tanto um facilitador de desenvolvimento
quanto um obstáculo, devido a sua travessia e suas áreas de inundações ou corredeiras.
A posição ou situação de uma cidade também ajuda a definir o grau hierárquico de
um determinado centro urbano e, por consequência, sua importância regional, o que pode
determinar uma maior ou menor influência em uma rede ou sistema urbano.
Sítio e Posição são conceitos diversos, mas certamente complementares e que
mantêm uma relação simbiótica entre si. Enquanto o Sítio se refere aos aspectos
topográfico-físicos da cidade, tanto do seu local específico de criação como de evolução de
ocupação, a Situação ou Posição está diretamente relacionada com o sistema de ligações e
inter-relações externas de vizinhança e tem a ver diretamente com seu nível hierárquico
regional. Os dois conceitos se relacionam positiva ou negativamente, interferindo
substancialmente no processo de desenvolvimento de uma cidade. No caso específico de
Teófilo Otoni, esses elementos são determinantes no seu processo de fundação e
desenvolvimento ao longo da sua história.
3.1.O Sítio da Cidade de Teófilo Otoni
153
Conforme apontado anteriormente, os aspectos físicos do Vale do Mucuri foram
determinantes em todos os períodos da sua história. Um sítio extremamente acidentado e
uma cobertura vegetal praticamente inexpugnável, além da ferocidade das nações indígenas
que ali habitavam, foram as causas do retardamento de seu difícil processo de colonização e
transformação, ambos bastante marcados pelas características físicas da região. A própria
Cia. De Navegação do Mucury teve seu insucesso, em grande medida, ligado às enormes
dificuldades que enfrentou em seu processo de consolidação enquanto empreendimento
logístico. A impossibilidade de navegação entre o porto fluvial em Santa Clara até os
armazéns centrais da companhia em Filadélfia exigiu a construção, com um custo bastante
elevado, da Estrada Santa Clara. O processo de colonização regional através do
recrutamento de colonos europeus, idealizado por Ottoni também foi difícil e custoso, tanto
em vidas como em termos financeiros, exatamente pelas condicionantes físicas e climáticas
da região. Todos os ciclos de desenvolvimento históricos da cidade foram afetados pelas
questões físico-ambientais regionais, determinadas por sua vez, por um sítio de relevo
bastante acidentado e de difícil apropriação e ocupação.
Assim descreve o relevo e a geologia da cidade o Professor Edésio Carvalho, em seu
estudo realizado para o Plano Diretor Municipal aprovado em 2008: “O relevo da área
pode ser descrito como o de um planalto dissecado com formas predominantes de espigões
alongados e colinas, estas às vezes chegando a ser isoladas, com vertentes convexas ou,
não raramente, côncavas. Também nos espigões as ver tentes convexas coexistem com
vertentes côncavas. As declividades são em geral acentuadas, predominando as mais altas
nas bases das vertentes, que se atenuam gradualmente para os topos, às vezes formando
dorsos abaulados de considerável extensão. São frequentes as situações de altas vertentes
côncavas, em forma de anfiteatros, dando lugar para baixo a rampas de colúvio de perfis
mais ou menos retilíneos ou a intumescências, que sugerem eventos de deslizamentos
antigos, casos em que elas seriam formadas pelos escombros de movimentos de massa e
não de simples acumulação de materiais erodidos. Essas formas positivas são no todo ou
em parte contornadas por planícies aluviais de variada expressão. O nível de base local é
dado pelo leito do rio Todos os Santos, que tem, no trecho urbano, as margens contidas
por gabiões e um perfil de declividade longitudinal moderada, com energia suficiente para
154
o transporte de sedimento fino” (CARVALHO, 2008, p.151). Ainda descreve
CARVALHO: “O conteúdo geológico ou, mais propriamente, o fato geológico, na área
urbana de Teófilo Otoni, é representado pelo substrato de idade proterozóica (COMIG -
Projeto Leste), pelo Quaternário Pré-Tecnogênico e pelo Tecnogênico. Apenas o substrato
proterozóico é formalmente descrito na bibliografia consultada, enquanto o quaternário é
rapidamente citado e o tecnogênico não é referido. O substrato proterozóico é
relativamente homogêneo, compreendendo rochas granito-gnáissicas com componentes
alcalinos, classificadas como tonalito (Tonalito São Vítor), envolvendo ou em contato com
biotita gnaisse granítico e xisto do Grupo Rio Doce (Formação Tumiritinga)”
(CARVALHO, 2008, p. 152).
1 – Leito do Rio Todos os Santos, 2 – Planície Aluvial do Todos os Santos e tributários, 3 – Vertente total ou
parcialmente urbanizada, 4 – Topos Urbanizados, 5 – Porção inferior da alta vertente (solo coluvial e/ou
residual), 6 – Porção superior da alta vertente e crista (solo residual, em geral imaturo, afloramentos
rochosos).
38
Retirado do Plano Diretor Municipal Participativo de Teófilo Otoni – 2008. Anexo VI.1 – Estudos
Geológicos, p. 152 e adaptado pelo autor.
155
de Cidade em Margens de Rios, que pode ser um facilitador de desenvolvimento, como
também um possível obstáculo, devido a sua travessia, suas áreas de inundações ou
corredeiras.
A posição de Contato de Regiões Naturais Diferentes se dá pela interseção de três
regiões completamente diferentes sob diversos aspectos. A região litorânea do sul do estado
da Bahia e norte do estado do Espírito Santo, a região do Norte do estado de Minas gerais e
o Vale do rio Doce. A outra subcategoria a coloca nas margens do rio Todos os Santos, que
deveria servir como potencializador de sua posição, mas que acaba por configurando-se
como um obstáculo.
Vários são os momentos e situações determinados pela posição da cidade. Quando da
fundação da cidade, enquanto único centro urbano de toda uma macrorregião, sua situação
era privilegiada e de absoluto destaque e importância. As primeiras atividades econômicas
da Cia. De Navegação do Mucury a colocam na posição de entreposto entre o norte de
Minas e Sul da Bahia, como ponto fulcral do processo de colonização regional e como
ponta de lança do processo de exploração de recursos naturais de toda a região. Num
segundo momento o desenvolvimento regional peculiar e a construção da Ferrovia Bahia-
Minas, partindo de Araçuaí e indo até Ponta de Areia (Caravelas) passando por Teófilo
Otoni, garante uma posição de centralidade e controle de toda a região.
Tanto o leito dos rios Todos os Santos e Mucuri quanto a estrada Santa Clara e
posteriormente a ferrovia Bahia-Minas, basicamente seguem o mesmo eixo de
deslocamento e se conformam como a espinha dorsal do desenvolvimento regional que tem
seu fluxo e sentido de deslocamento voltado para o mar. Esta lógica de deslocamento em
grande medida não permitirá que sejam estabelecidas importantes relações do Mucuri com
o resto do estado de Minas Gerais de forma que a região se desenvolve de costas para
Minas, buscando sempre, conforme a idéia original do seu fundador, a saída para o mar.
O fechamento da ferrovia, em 1967 pelo então governo militar, vai desarticular esta
lógica de desenvolvimento regional, gerando ainda mais instabilidade para o Mucuri que se
vê obrigado a fazer parte de uma nova proposta de integração, que passa a contar apenas
com a BR 116. A construção da BR-418 (estarada do Boi) e seu asfaltamento em 1980
retoma a lógica do fluxo original ligando a cidade de Teófilo Otoni ao sul do estado da
156
Bahia, mas já não garante a recomposição do processo de desenvolvimento estabelecido
pela ferrovia desde o século XIX até 1967.
A mesorregião do Mucuri é marcada essencialmente pelo conceito de
descontinuidade, conforme definido por BRUNET (1972), que postula “que a região, como
objeto do estudo geográfico, na verdade seria descontínua por excelência”, e afirma
também que “A região concebida como um conjunto é uma realidade viva e descontínua,
pois mesmo em regiões aparentemente homogêneas a presença da descontinuidade é
visível”.
Além dessa descontinuidade brutal sofrida pela região, que será obrigada a se
integrar tardiamente ao resto do estado de Minas Gerais, perdendo suas conexões originais
de maneira radical, a cidade de Teófilo Otoni e todo o Vale do Mucuri e do Jequitinhonha
sempre apresentaram problemas históricos graves de conexão interna, gerados pela falta de
estradas ou pelo péssimo estado das conexões viárias existentes. Apenas a partir da década
dos anos 2000, o programa Pró-Acesso do Governo de Minas vai garantir uma melhoria na
rede viária intraregional, aumentando sua capilaridade. Ainda assim, BARROSO (2013)39
vai analisar a rede viária do Mucuri por meio da Teoria dos Grafos classificando-a como
um grafo conexo, mas acíclico e em forma de árvore, com extrema dependência do sistema
com relação a cidade de Teófilo Otoni, que se configura como o ponto central do grafo,
tratando-se, portanto, de um sistema viário frágil.
A posição de contato da cidade de Teófilo Otoni e sua condição de entroncamento,
além do seu alto grau hierárquico regional, garantem uma situação de destaque da cidade
no contexto meso e macrorregional, conforme evidenciado por CARVALHO, C. O. (2006).
A este respeito lembramos GEORGE, (1969) “O problema geográfico fundamental da
geografia urbana é um problema de geografia da circulação, qualquer que seja a atividade
preponderante da cidade, ela está subordinada às facilidades de deslocamentos de homens
e de mercadorias (...)”.
39
BARROSO.L.C.; BARROSO. M.M.A. Estudo da Rede Rodoviária da Mesorregião do Vale do Mucuri-MG por
meio da Teoria dos Grafos. Disponível em:
www.iiis.org/CDs2013/CD2013SCI/CISCI_2013/PapersPdf/CA194CG.pdf
157
4. Zoneamento morfológico-funcional de Teófilo Otoni
Quando tratamos da estrutura intraurbana de uma cidade alguns modelos devem ser
considerados em seu processo evolutivo. Tomando-se como exemplo os modelos de
evolução urbana produzidos nos Estados Unidos a partir dos anos 1920, consideremos de
maneira preliminar o modelo concêntrico de Burgess (1929), seguido pelo modelo setorial
de Hoyt (1939) e posteriormente pelo modelo polinuclear ou multinuclear de Harris e
Ullman (1945) (ver figura 1). Estes modelos são complementares na medida em que
evoluem, de modo que cada novo modelo agrega novas considerações, elementos e
aspectos presentes nos modelos anteriores, evoluindo assim de um modelo monocêntrico
para um policêntrico ou polinucleado.
Figura 2 - Modelos de zoneamento. Fonte: Racine (1971) adaptado por Amorim Filho (2005).
158
Figura 3 - Modelo morfológico de Corrêa (1989). Fonte: Corrêa (1989).
Outra grande contribuição a ser considerada vem da Escola Francesa, nos modelo
propostos por Yves Gervaise, Bernard Quirin e Elizabeth Crémieu (1997) em seu livro "Le
Nouvel Espace Economique Français". O modelo propõe a divisão intraurbana em quatro
grandes zonas concêntricas, como se seguem: uma Zona Central, uma Zona Pericentral,
uma Zona periférica e, finalmente, uma Aréola Periurbana (fazendo a transição entre os
espaços rurais).
A abordagem e descrição propostas por Amorim Filho (2005) ordenam o modelo
proposto para a cidade de Teófilo Otoni. Este modelo para cidades médias adapta as zonas
propostas por Borde, et al e Gervaise, et al, procedendo a descrição de quatro grandes
zonas, além de uma descrição de zonas periféricas organizadas e desorganizadas, eixos
ordenadores de circulação e ocorrência de subcentros regionais.
159
Figura 4 - Modelo genérico para cidades médias mineiras segundo Amorim Filho (2005).
160
Mapa 2 - Zoneamento Morfológico-Funcional da cidade de Teófilo Otoni.
Zona Central Zona Pericentral Zona Periférica Zona Periurbana
161
A zona central da Zona pericentral Zona periférica também Zona de transição
cidade de Teófilo Otoni extensa em relação à bastante extensa em gradual para o meio
é bem delimitada e já Zona Central, relação as outras zonas. rural. Recentemente há
demonstra sinais claros apresentando muitos Caracterizada o surgimento de áreas
de saturação. subcentros principalmente por descontínuas
Corresponde ao núcleo especializados e zonas periféricas organizadas do tipo
original de fundação da polifuncionais, integradas loteamentos e de
cidade, originalmente principalmente ao longo desorganizadas do tipo equipamentos
entre as Praças dos dos eixos viários mais vilas e favelas. Presença industriais e especiais,
Imigrantes e Tiradentes. importantes e de alguns equipamentos como o aeroporto e
Há um claro entroncamentos, em comerciais e de clubes campestres,
predomínio da função especial o encontro serviços de alcance localizados nos
comercial e de serviços entre os bairros de local nos subcentros extremos urbanos ao
em relação à função Fátima e Bela Vista, no periféricos, além de longo dos eixos
residencial. Forte encontro entre a BR eventuais equipamentos rodoviários. O destaque
presença de 116 e a BR 418. especializados. desta zona é a
equipamentos de grande Presença muito forte de Ocorrência recente de ocorrência de áreas
alcance regional, como equipamentos especiais, zonas contínuas descontínuas
bancos e serviços como rodoviária, vários organizadas do tipo desorganizadas do tipo
administrativos e maior estabelecimentos loteamento. vilas e favelas,
volume urbano, com universitários e completamente
ocorrência de muitas hospitais, também com destacadas do tecido
construções rede de comércio e urbano (bairros
verticalizadas. Centro serviços bastante Gangorrinha, São
bastante diversificado e diversificada e com Benedito e Taquara).
com amplo alcance amplo alcance
mesorregional. mesorregional.
Tabela 1 – Descrição das Zonas morfológico-funcionais da cidade de Teófilo Otoni
Considerações Finais
162
demográfico ressaltando a importância da posição ou situação da cidade, sua hierarquia
regional e principalmente a dimensão temporal ou histórica de sua evolução urbana.
Com efeito, a cidade de Teófilo Otoni vai apresentar todas as características propostas
por AMORIM FILHO (1976, págs. 25 e 26) que caracterizam as cidades médias de uma
maneira bastante clara. Ela cumpre importante papel de intermediação, estabelecendo
claras relações constantes e duradouras tanto com seu espaço regional, quanto com as
aglomerações urbanas de nível superior. Possui um tamanho demográfico e funcional
destacado dentro da região de modo a garantir um conjunto de equipamentos, bens e
serviços bastante diversificado para o espaço mesorregional que domina. Sempre atuou
como importante centro no que se refere a receber e fixar migrantes, mesmo que de maneira
incipiente, além de apresentar um alto grau hierárquico e uma condição centralizadora que
sempre lhe garantiu a capacidade de dinamizar e ditar o ritmo de desenvolvimento regional,
mesmo que de maneira lenta. Em seu espaço interno observam-se todas as zonas descritas
por AMORIM FILHO (2005), apresentando uma zona central bem delimitada e com forte
presença do setor terciário, uma zona pericentral extensa com ocorrências de subcentros
funcionais e especializados, uma zona periférica dinâmica, além de apresentar uma
evolução aos moldes dos grandes centros urbanos, através da geração de novos núcleos
e/ou assimilação de núcleos mais antigos. Sua estratificação social é explícita, apresentando
muitos problemas metropolitanos como desemprego, pobreza, aumento dos índices de
criminalidade, dificuldades institucionais de planejamento e oferta deficiente de
infraestrutura urbana.
No que se refere à classificação ou hierarquização de cidades médias o estudo
"Cidades de porte médio e o programa de Ações Sócio-educativo culturais para as
populações carentes do meio urbano de Minas Gerais" (Amorim Filho, Taitson Bueno e
Abreu, 1982, pag.27), identifica quatro grupos diferenciados hierarquicamente entre 102
cidades mineiras consideradas como médias, descritos como se segue: Os grandes centros
regionais (na transição para o nível das grandes cidades); Cidades médias de nível superior;
Cidades médias propriamente ditas; e Centros urbanos emergentes (na transição entre as
pequenas e as médias cidades). A este respeito, a cidade de Teófilo Otoni aparece
classificada como uma Cidade Média de Nível Superior (AMORIM FILHO e ABREU,
2007).
163
Além das zonas acima descritas a cidade de Teófilo Otoni apresenta um traçado
viário intraurbano ortogonal rígido, inadequado para o tipo de relevo acidentado conforme
descrito no plano diretor e citado acima na análise do sítio, apresentando-se assim como
uma quadrícula ortogonal clássica basicamente em todas as áreas da cidade, exceto em
algumas áreas periféricas. Raramente se detecta, em suas zonas central e pericentral, a
ocorrência de um desenho mais orgânico que obedeça à configuração morfológica do sítio.
A quebra da rigidez ortogonal do desenho urbano e das vias em geral, acontece apenas nas
periferias desorganizadas e num trecho da Av. Luiz Boali onde o rio Todos os Santos não
foi retificado e que aparece como um dos principais eixos ordenadores e indutores do
crescimento urbano em direção à zona leste da cidade.
O modelo morfológico-funcional da cidade de Teófilo Otoni realizado a partir de
condicionantes históricas, da análise do seu sítio posição e da análise de sua estrutura e
morfologia interna, mostra claramente aspectos importantes da realidade urbana deste
importante centro regional. A descontinuidade de seus ciclos de desenvolvimento,
determinada em grande medida pelas condicionantes físicas e ambientais regionais e sua
estratificação social intensa explicitada no espaço intraurbano, são características típicas de
uma cidade média propriamente dita de um país em desenvolvimento. Estas características
somadas à falta de planejamento, uma baixa oferta de infraestrutura de saneamento e
orçamentos inadequados, determinam um espaço profundamente marcado pelos contrastes
sociais refletidos e identificados no tecido urbano municipal.
Assim podemos identificar uma preponderância das zonas Integradas
Desorganizadas, das Zonas Descontínuas Desorganizadas e das Zonas Descontínuas
Desorganizadas Mal Integradas, que se caracterizam como vilas e favelas. O destaque
ficando para as Zonas Descontínuas Desorganizadas Mal Integradas, localizadas na porção
Sul da cidade, às margens da BR 342 e completamente destacadas do tecido urbano
podendo ser classificadas, dadas as suas características gerais, como favelas rurais (bairros
Taquara e São Benedito). Com estas mesmas características identifica-se também, no
extremo oeste da cidade, o bairro da Gangorrinha.
Os novos subcentros mais dinâmicos aparecem recentemente e em sua maioria, ao
longo dos eixos ordenadores principais e nos entroncamentos destes, sendo que sua
ocorrência deve ser cada vez mais frequente na medida em que a área central mostrar sinais
164
mais intensos de saturação. É clara a tendência de crescimento da cidade em direção ao
setor leste, ocupando grandes vazios urbanos existentes entre a zona pericentral e a Av.
Coronel Mário Cordeiro, no extremo leste da cidade, onde deve se instalar o Distrito
Industrial Municipal. Também há uma tendência de crescimento de novos loteamentos
destinados aos estratos sociais mais elevados para o norte ao longo da BR 116, além de ao
longo da BR 342 na porção sul, que liga Teófilo Otoni a cidade de Frei Gaspar, onde se
deve observar a ocorrência de loteamentos de caráter popular dedicados a populações de
mais baixo nível de renda. A porção oeste da cidade não deve assistir a grandes processos
de ocupação devido à sua dificuldade de acesso e implantação de infraestrutura, além de
maneira geral apresentar altas declividades, observadas ao longo de toda borda municipal
no sentido Noroeste – Sudoeste.
O zoneamento morfológico-funcional aqui apresentado auxilia de maneira importante
a identificação de diversos aspectos estruturais e morfológicos que seguem uma lógica
sistêmica estabelecida pelo escopo teórico adotado e seguido neste trabalho, capaz de
explicitar elementos determinantes da sua estrutura e organização geral intraurbana, alguns
eixos indutores do seu crescimento, a formação de subcentros regionais e suas dinâmicas de
expansão.
Referências Bibliográficas
AMORIM FILHO, O.B. BUENO, M.E.T. e ABREU, J.F. Cidades de porte médio e o
programa de ações sócio-educativas-culturais para as populações carentes do meio urbano
em Minas Gerais. Boletim de Geografia Teorética., 12 (23-24); Rio Claro, 1982, p. 33-46.
AMORIM FILHO, O.B. Um esquema metodológico para o estudo das cidades médias.
Anais do II Encontro Nacional de Geógrafos. : IGC/UFMG. Belo Horizonte, 1976, p. 6-15.
AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno. RIGOTTI, José Irineu Rangel. CAMPOS, Jarvis
Campos. Os níveis Hierárquicos das cidades médias de Minas Gerais. R. RA E GA. N. 13.
Editora UFPR. Curitiba, 2007, p. 7-18. Disponível em:
<http://www.ufjf.br/ladem/files/2009/05/oswaldo-bueno.pdf>. Acesso em 03, jan 2015.
AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno. SENA FILHO, Nelson de. A morfologia das cidades
médias. Goiânia: Ed. Vieira, 2005. p. 116.
BANCO DE DESENVOLVIMENTO DE MINAS GERAIS. Minas Gerais do século XXI:
volume 2: reinterpretando o espaço mineiro : capítulo 6: tipologia de regiões. Belo
Horizonte, 2002, p. 253-296. Disponível em:
<http://intranet.uemg.br/comunicacao/arquivos/MG-XXI-Volume%20II.pdf>. Acesso em:
03 dez, 2014.
165
BARROSO, L.C.; Projeto TOR – Teófilo Otoni e sua Região. Revista e-xacta, v. 5, n. 2,
2012. p. 7-17. ISSN: 1984-3151. Disponível em: www.unibh.br/revistas/exacta/
SANTOS, Milton. Manual de Geografia Urbana. São Paulo: Hucitec, 1981. 203 p.
166
INTERAÇÕES ESPACIAIS NA DEFINIÇÃO DOS PAPEIS
EXERCIDOS POR CIDADES MÉDIAS: O CASO DE CHAPECÓ/SC
Crislaine Motter40
RESUMO
Considerando a importância que as cidades médias adquiriram na rede urbana brasileira,
juntamente com os novos meios técnicos que possibilitam uma gama de interações
marcadas por relações multidirecionais e pela multiescalaridade, buscamos, neste trabalho,
apresentar as relações espaciais que envolvem a cidade de Chapecó, localizada no oeste de
Santa Catarina, a fim de entender como os papéis de intermediação são fundamentais para a
caracterização de cidades classificadas como médias.
1. INTRODUÇÃO
Durante muito tempo o território brasileiro foi marcado pela inexistência de redes
que permitiam a articulação entre os diversos aglomerados urbanos. Com o advento da
industrialização, fundamental no processo de urbanização e no investimento massivo, por
parte do governo, na implantação de infraestruturas, foi possível visualizar uma nova rede
urbana, mais articulada e dotada de centros funcionalmente mais articulados entre si. É
nesse contexto que emergem inúmeros centros metropolitanos, cidades médias e
cristalizam-se vários centros, considerados como pequenas cidades (CORRÊA, 2007).
Desse modo, as novas formas que o capitalismo adquiriu com o rompimento das
hierarquias rígidas, a especialização flexível e os sistemas de produção verticalmente
desintegrados, foram acompanhadas, como ressalta Santos (2009), por uma mobilidade
40
Mestranda no programa de Pós-Graduação em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia
E-mail: crislaiine.m@gmail.com. Orientador: Professor Doutor Vitor Ribeiro Filho.
167
acelerada do capital, propiciada pelo meio técnico-científico-informacional. Nesse contexto
de transformações, ressalta-se que os papéis regionais associados às cidades médias, às
vezes denominadas cidades regionais (SPOSITO, 2007), sofreram intensas transformações.
Diferentemente dos períodos anteriores, onde a área de influência dessas cidades se dava
apenas entre o seu espaço rural imediato e entre as cidades de menor porte de sua região, as
redes de relações foram intensamente modificadas, ampliando a sua rede de relações.
Para realizar estudos sobre as cidades médias, assim, não basta apenas considerar
critérios quantitativos, mas buscar compreender as relações estabelecidas por esse grupo de
cidades. Para tanto, buscamos neste trabalho, analisar as relações espaciais estabelecidas
pela cidade de Chapecó, localizada no oeste catarinense, a fim de entender como os papéis
de intermediação são fundamentais para a sua definição como cidade média no contexto
atual. Para isto, utilizamos como metodologia a análise dos documentos elaborados pelo
IBGE, especificamente o estudo sobre a Região de Influência das Cidades – REGIC; o
fluxo aéreo e rodoviário no município, além de relatar um histórico com os principais
agentes produtores do espaço urbano de Chapecó.
Nas palavras de Milton Santos, o Brasil foi por muitos séculos, “um grande
arquipélago, formado por subespaços que evoluíram segundo lógicas próprias” (SANTOS,
2009, p. 29). Entretanto, com as novas lógicas espaciais e as novas possibilidades dadas
pelo atual meio técnico-científico-informacional (SANTOS, 2009), o que observamos hoje
é a consolidação de redes que se articulam no território nacional bem como permitem
relações em escala global. Conforme Castells, as:
A história da construção da rede urbana brasileira foi, de tal modo, marcada pela
associação entre o processo de urbanização juntamente com o processo de integração do
168
mercado nacional (DIAS, 2010). Segundo Santos (2009), após a Segunda Guerra Mundial,
a integração do território brasileiro tornou-se possível através da interligação de estradas de
ferro, construção de estradas de rodagem e programas de infraestruturas. Assim,
[...] seja através de uma produção própria, seja, sobretudo, funcionando como
redistribuidora, a cidade média representa um ponto de difusão da produção e dos
valores dos sistemas sócio-econômico de que faz parte (AMORIM FILHO, 1984,
p. 12).
41
Segundo Sposito (2001), aceita-se, para a realidade brasileira atual, a ideia de que são cidades de porte
médio as cidades de porte populacional entre 100 mil e 500 mil habitantes. A diferenciação desse termo ao de
cidade média reside em sua fragilidade no sentido em que está sujeito a mudanças no decorrer do tempo e de
variações segundo as redes urbanas as quais se aplica esta classificação.
170
tamanho. São as atividades, as funções e os papéis que se colocam em posições
diferentes no âmbito das redes urbanas, o que depende de fatores diversos,
decorrentes de suas relações em múltiplas escalas (CATELAN, 2013, p. 25).
Admite-se, de tal modo, que além de uma localização relativa, as cidades médias
apresentam também relações espaciais intensas, complexas, multidirecionais e marcadas
pela multiescalaridade (CORRÊA, 2007). Neste sentido, devemos considerar os atuais
meios técnicos-informacionais que viabilizam comunicações de longa distância, via
satélite, por redefinirem as relações espaciais, como aponta Sposito (2001), visto que a
proximidade e a contiguidade não são mais as únicas determinantes da vida de relações de
uma cidade. Assim, apresentaremos a seguir um breve histórico da cidade de Chapecó para
entendermos as atuais configurações intraurbanas e as relações apresentadas por esta
cidade.
171
os indígenas e a população que habitavam a região, conforme Pertile (2008), passaram a
sofrer influência dos tropeiros, e a partir de então, as atividades ligadas à pecuária e ao
tropeirismo marcaram a história da região. De acordo com a autora, foram os tropeiros que
“possibilitaram a expansão das fronteiras, criaram vilas e cidades e contribuíram para a
integração do país” (PERTILE, 2008, p. 34).
Após o fim de disputas territorial que envolviam a região oeste de Santa Catarina –
a “Questão de Missiones” e a “Guerra do Contestado” – o município de Chapecó foi então
criado pelo governo de Santa Catarina, através da lei nº 1.147, de 25 de agosto de 1917. A
partir de então, esse território passou a fazer parte do projeto de colonização feito pelo
governo estadual, que objetivava a colonização de todo o Oeste de Santa Catarina,
considerado pelas autoridades da época como um vazio demográfico (ALBA, 2002).
172
De acordo com Alba (2002), até os anos 1940 a colonização do município esteve
por conta das empresas colonizadoras, que a partir dos anos 1920 começaram a ocupação
do Oeste. Nesse primeiro momento de colonização, aponta Alba (2002), o urbano formado
não passava de uma pequena vila, onde sua função urbana estava restrita apenas às
necessidades imediatas da população, que se encontrava muito dispersa. Peluso Júnior
(1991) acrescenta que a superioridade do município em relação às demais aglomerações de
seu entorno era manifesta, mas a existência em Chapecó da autoridade municipal era fator
de progressão da cidade, pois além das estradas da colonização, o município procurava
ligar a sede à sua hinterlândia. A sua clientela não ia muito além dos limites do seu distrito,
mas a sua área era a mais rica, sendo sua renda estadual em 1938 a maior da região Oeste.
Chapecó, portanto, levava vantagens sobre as demais aglomerações, oferecendo serviços
administrativos que forçavam numerosas pessoas da região a procurá-la.
A economia do município, incialmente marcada pela prática da agricultura de
subsistência, permitiu a comercialização dos excedentes pelos agricultores e, segundo
Pertile (2007, p. 158),
[...] foi o que possibilitou aos comerciantes constituírem seu capital inicial,
contribuindo para o desenvolvimento da cidade de Chapecó em seus primórdios.
Posteriormente, os frigoríficos começaram a se destacar como principais agentes
produtores do espaço urbano de Chapecó e também do espaço agrário em seu
entorno e diversos municípios do Oeste Catarinense.
173
agroindústrias Sadia, Perdigão, Coopercentral, Seara e SAIC já firmavam como as maiores
do estado de Santa Catarina.
174
rural. Essa maior concentração de habitantes no meio rural durou até a década de 1970, que
apresentava, respetivamente, 58,91% de sua população ainda residindo no campo.
Destacamos aqui que as taxas negativas de crescimento populacional das décadas de 1960 e
1970 se devem a emancipação de alguns municípios que pertenciam à Chapecó.
Após a década de 1970, entretanto,
A acumulação capitalista que resultou nesta nova dinâmica espacial também esteve
estritamente ligada a uma intervenção política e econômica de grupos que se
desenvolveram. Esta intervenção política, através de instituições, reuniu juntamente uma
acumulação da riqueza e do saber. A acumulação do saber, segundo Alba (2002), esteve
centralizada nas diferentes instituições criadas pelo Estado com o objetivo de pesquisar e
desenvolver técnicas de produção, principalmente agrícola. Essa acumulação possibilitou
diretamente a acumulação de riqueza por parte das agroindústrias que “se apropriaram
desse saber e, principalmente, dos resultados do mesmo; incrementaram sua produção e sua
produtividade e, consequentemente, seu capital e seu poder de concentração e
centralização” (ALBA, 2002, p.42).
Com o aumento do consumo interno e a criação de infraestrutura que possibilitou o
desenvolvimento das agroindústrias, outras indústrias foram criadas para produzir os
insumos básicos para suprir as necessidades desses complexos agroindustriais, bem como
para atender ao mercado de maneira geral. Esse processo acentuou-se a partir da década de
80, quando as empresas passaram a incorporar o processo de desverticalização empresarial,
processo esse que repercutiu diretamente no desenvolvimento de novas empresas que
visaram atender às demandas das empresas maiores (ALBA, 2002).
Nessa nova estrutura de produção, o que nos chama atenção nesse contexto,
conforme Alba (2002), é a complexa expulsão de milhares de agricultores do campo e a
concentração de capital por parte das agroindústrias. Ainda segundo a autora, essa expansão
175
agroindustrial fez de Chapecó um pólo atrativo de mão de obra, que não deriva somente do
meio rural do próprio município, mas de toda região Oeste e dos estados vizinhos, Paraná e
Rio Grande do Sul. Dessa forma,
176
Partindo do pressuposto que para realizar estudos sobre as cidades médias não basta
apenas considerar o seu espaço intraurbano, mas também sua relação com outras cidades,
analisaremos o papel que Chapecó apresenta na hierarquia urbana brasileira. Pois, como
afirma Sposito (2006), o reconhecimento da inserção de uma cidade em termos de rede
urbana, dado o período de transformações como o que vivemos, tornou-se extremamente
mais complexo, e apesar da cidade compor a estrutura de uma rede hierárquica na qual seus
papéis intermediários se definem, existe um vasto conjunto de possibilidades de
estabelecimento de relações com outras cidades e espaços que não compõem, de fato, a
rede que pertence essa cidade.
A centralidade expressa por esse município pode ser analisada através da pesquisa
Região de Influência de Cidades – REGIC, desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE, que tem por objetivo principal definir a organização
espacial dos centros hierárquicos brasileiros e suas áreas de influência, visando subsidiar o
planejamento territorial e as decisões quanto à localização dos investimentos em atividades
econômicas de produção, consumo privado e coletivo, e implantação de serviços (públicos
e privados) em bases territoriais. A relevância dessa pesquisa é dada em relação ao
conjunto de dados que permitem o conhecimento das relações sociais vigentes e dos
padrões espaciais que delas emergem, formando um quadro de referência para a avaliação
das condições de acesso da população aos serviços, como aponta o próprio documento.
Apresentaremos, abaixo, o quadro referente à classificação da cidade de Chapecó, tomando
como base às edições de 1987, 2000 e 2008 dos estudos da REGIC. Sabe-se que houve
alterações nas metodologias desses estudos, mas ainda assim eles são importantes como
“ponto de partida” para as análises interurbanas envolvendo a cidade de Chapecó.
177
Muito Forte 24
Forte 35
Forte Para Médio 108
Médio 141
Médio para Fraco 195
Fraco 250
Muito Fraco 3.733
1 3
Níveis de Gestão
do Território
2 7
3 44
3
4 101
5 215
6 341
Grande Metrópole Nacional 1
Metrópole Nacional 2
2008 100
Hierarquia Urbana
Metrópole 9
Capital Regional A 11
Capital Regional B 20 Capital
Capital Regional C 39 Regional B
Centro Subregional A 85
Centro Subregional B 79
Centro de Zona A 192
Centro de Zona B 364
Fonte: REGIC (1987; 2000; 2008) Organizado pela autora.
179
Transportes e Turismo Ltda, Empresa Ouro e Prata, Empresa Planalto de Turismo S/A,
Medianeira Transportes e Turismo e a empresa Hélios de Transporte Ltda.
A infraestrutura viária que o município apresenta (Figura 03) também é um dado
importante nessa análise, pois demonstra uma das formas de articulação desse município.
Assim, podemos observar que o município é servido por uma rodovia estadual (BR 282)
que faz a ligação entre o litoral e o extremo Oeste do Estado, além das rodovias estaduais
que ligam a cidade à sua hinterlândia e ao estado vizinho do Rio Grande do Sul,
apresentando a situação infraestrutural que o município está inserido. Tal sistema viário
confere à Chapecó uma posição geográfica estratégica no que se refere à circulação, o que
os geógrafos tradicionais franceses chamaram de “posição de Carrefour”, por apresentar
conexões com eixos rodoviários que permitem várias conexões.
Além das ligações que a cidade tem com o seu entorno imediato, destaca-se também
a variável do fluxo aéreo, da qual podemos tecer considerações que dizem respeito às
ligações que a cidade desempenha com centros de hierarquia igual ou superior à Chapecó.
O Aeroporto Municipal Serafim Enoss Bertaso é administrado pela prefeitura Municipal, e
está localizado à 10km do centro da cidade. Atualmente, operam no aeroporto as
companhias aéreas Gol Linhas Aéreas, NHT Linhas Aéreas, Trip Linhas Aéreas, Avianca e
Azul Linhas Aéreas. Segundo dados do ano de 2014 fornecidos pela prefeitura municipal, o
aeroporto tem registrado aproximadamente 17000 passageiros/mês entre embarques e
desembarques e um movimento de cerca de 600 pousos/decolagens ao mês, fazendo dele
um dos aeroportos mais movimentados do sul do país.
180
Figura 03: Principais eixos rodoviários
Considerando as cidades dos voos que apresentam escalas, a cidade com que
Chapecó mantém maior ligação aérea é Florianópolis, com uma frequência de 32 voos
semanais, realizados pelas empresas Gol, Trip e Avianca (Quadro 02). A dimensão desse
fluxo pode ser entendida se retornarmos as considerações tecidas pela rede de influência
das cidades, que apontamos anteriormente, pois a posição hierárquica de Florianópolis é
superior à região de Chapecó, exercendo grande influência na cidade.
Os voos regulares no aeroporto municipal de Chapecó também compreendem
ligações com as capitais Curitiba/PR, com escala em Francisco Beltrão/PR; Porto
Alegre/RS com escalas Erechim e Passo Fundo/RS; Campo Grande/MS, com escalas em
Londrina e Maringá, no estado do Paraná; Campinas/SP; e São Paulo/SP, com escalas em
Florianópolis/SC.
181
Quadro 02: Fluxo aéreo do Aeroporto Municipal de Chapecó
Frequência Destino/Orige
Empresa Escala
semanal m
São Paulo Florianóp
GOL 13
olis
5 Curitiba
Porto Alegre Erechim /
NHT
6 Passo
Fundo
Campo Grande Londrina
Partidas
6 /
TRIP Maringá
Porto Alegre Florianóp
6
olis
AZUL 7 Campinas
São Paulo Florianóp
Avianca 13
olis
São Paulo Florianóp
GOL 13
olis
Curitiba Francisco
NHT 5
Beltrão
6 Porto Alegre
Chegadas
TRIP Campo Grande Maringá/
6
Londrina
AZUL 7 Campinas
São Paulo Florianóp
Avianca 13
olis
Fonte: Prefeitura Municipal de Chapecó/2014.
182
distantes, pois não é possível reconhecer o papel de intermediação que estas cidades
desempenham sem avaliar as relações que elas estabelecem com cidades de porte maior e
menor, entre cidades do mesmo porte e os espaços rurais com os quais mantêm uma vida de
relações.
De tal modo, a cidade de Chapecó apresenta significativo papel de intermediação
entre os diferentes níveis hierárquicos da rede urbana, como mencionamos anteriormente, o
que lhe denota uma condição própria de uma cidade média. A condição de pólo prestador e
de irradiador de bens e serviços apresentada por Chapecó resulta da variada gama de
equipamentos urbanos que disponibiliza em seu espaço urbano, o que remete
consequentemente as funções urbanas apresentadas por esta cidade.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Definir cidade média, não é, de forma alguma, tarefa trivial. Apesar da ausência de
uma definição concreta do que seja esse grupo de cidades, é possível compreender algumas
características básicas das funções que exercem na rede urbana a qual fazem parte. Dentre
os critérios possíveis, buscamos demostrar, neste trabalho, a importância de interações
espaciais na definição dos papéis exercidos pelas cidades médias, com base na cidade de
Chapecó.
Desse modo, pudemos constatar a importância que a cidade tem no contexto da
região oeste de Santa Catarina, e algumas das relações exercidas por Chapecó tanto em seu
entorno imediato, com cidades de hierarquia superior na rede urbana, bem como com
cidades que não compreendem, de fato, a rede que pertence essa cidade. Destacamos
também, que além das ligações visíveis apresentadas pelo fluxo aéreo e rodoviário, a cidade
apresenta também ligações que compreendem os fluxos imateriais, representados pelas
redes de comunicação e informática, que vão além do território nacional. Assim, não
pretendemos encerrar esse tipo de pesquisa, mas permitir sua continuidade através da
articulação com outras variáveis.
183
REFERÊNCIAS
184
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. O desafio metodológico da abordagem interescalar
no estudo das cidades médias no mundo contemporâneo. Cidades (Presidente Prudente), v.
3, p. 143-157, 2006.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. Cidades Médias: Reestruturação das cidades e
Reestruturação Urbana. In: SPOSITO. M. E. B. (org.). Cidades médias: espaços em
transição. São Paulo: Expressão popular, 2007, p. 3-67.
185
DE LA SELVA A LOS “DERRICKS”. COLONIZACIÓN Y
TRANSFORMACIÓN DEL PAISAJE DE BARRANCABERMEJA 1880
- 1930.
ABSTRACT:
“El hombre tiene historia porque transforma la naturaleza. Y asimismo, la naturaleza propia del
hombre consiste en tener tal capacidad. La idea es que, de todas las fuerzas que ponen al hombre en
movimiento y lo hace inventar nuevas formas de sociedad, la más profunda es su propia capacidad
de transformar sus relaciones con la naturaleza, transformando la misma naturaleza”.
Maurice Godeliere43.
42
Candidata a Magíster en Historia (Universidad Nacional de Colombia) Bogotá – Colombia. Artículo
basado en la Tesis de Maestría de la Línea de Histórica Ambiental E-mail: dayana8410@hotmail.com /
daya8410@gmail.com. Tutora: Dra. Lucía Duque
43
GODELIER, Maurice. Lo ideal y lo material: Pensamientos, economías, sociedades; Ed. Taurus Humanidades. España;
1989, p. 18.
186
derecha del río Magdalena, entre los ríos Carare y Sogamoso, fue convirtiendo este lugar en
una “vía obligada” que comunicó el interior Colombiano con la costa Atlántica, sirviendo
de terminal en la red de las comunicaciones, transportes y de antesala a algunas ciudades de
Santander, así como Bogotá, Tunja entre otras. Esta condición, hizo que la historia de este
municipio, estuviese marcada por los procesos continuos de colonización y ocupación de
territorios baldíos44; fenómeno que se caracterizó por ser relativamente continuo de forma
dispersa y espontánea asociado entre otros, al auge de la economía cafetera de los
Santanderes, la explotación de recursos naturales, las migraciones de campesinos
santandereanos y especialmente, al proyecto liberal de apertura de caminos hacia el río
Magdalena como principal vía de comunicación entre la Costa Atlántica y el interior del
país.
44
Que no sólo fue un fenómeno asociado a la colonización antioqueña, si no que ha sido una constante en la configuración
de las regiones del país.
45
MACHADO, Absalón. Ensayos para la historia de la política de tierras en Colombia: De la colonia a la creación del
Frente Nacional. Ed. Facultad de Ciencias Económicas. Centro de Investigaciones para el Desarrollo, CID, Universidad
Nacional de Colombia; 2009; pág., 11
187
lograr diversos objetivos, puesto que las tierras constituían la única riqueza y fuente de
poder del Estado, que ha futuro, permitió la generación de grandes fortunas por ser un bien
valorizable. “La tierra se entregó en su gran mayoría a hombres de empresa y capitalistas;
los colonos obtuvieron la parte marginal, con grandes dificultades y altos costos de
transacción. Provincias, cantones, colegios, parroquias, personas y compañías accedieron a
la propiedad pública mediante diversos mecanismos”46.
46
Ibíd; pág. 54
47
Ante las condiciones geográficas desfavorables, el aislamiento de las regiones y la ausencia de infraestructura de
transporte
188
A estos procesos, se le suma el naciente desarrollo en la región de la industria petrolera.
Con el descubrimiento de los pozos petroleros en “Infantas” y el traspaso de estos terrenos
a la Tropical Oil Company, se empezó todo un proceso de transformación del paisaje
natural de Barrancabermeja para dar paso a la explotación petrolera. Los derricks, las
máquinas de extracción del crudo se instalaron en el hábitat natural de las comunidades
indígenas Yariguíes, Opones y Carares y de algunos colonos, quienes fueron
desapareciendo de la zona al paso de la petrolera norteamericana. El paisaje rivereño de
esta parte del Magdalena, poco a poco se fue transformando en una zona de acopio y
extracción del combustible.
Con todo esto, podemos analizar a la luz de trabajos como Henry Lefebvre, Milton Santos,
David Harvey entre otros48; que Barrancabermeja, es un ejemplo claro que sostiene la tesis
que las ciudades nacieron bajo una perspectiva económica, pues el paisaje natural, de selva
virgen del siglo XIX plasmados en los relatos de viajeros y cronistas de la época, se fue
transformando y mutando con el paso del tiempo de acuerdo a las exigencias de orden
económico, es decir de las relaciones de producción; además de caracterizarse por ser un
proceso de integración espacial tardío, como parte del desarrollo geográficamente desigual;
circunstancias que puede ser vistas y analizadas desde la perspectiva de Fernand Braudel de
la "larga duración".
En esta dirección, el siguiente escrito se vincula con los procesos mencionados desde la
perspectiva teórica y metodológica de la Geohistoria, con la finalidad de comprenderlos e
interpretarlos como fenómenos complejos y totales que se relacionan con la dinámica
política y económica, articulada a las dimensiones geográficas (territoriales) e históricas,
bajo una perspectiva de la larga duración. Por tanto, se tiene como objetivo abordar la
historia de la configuración socio-económica del paisaje de Barrancabermeja, dando a
conocer los procesos, cambios y transformaciones del paisaje natural hasta el
48
LEFEBVRE, Henry. Espacio y Política: Historia, Ciencia y Sociedad. El Derecho a la Ciudad II. Ed: Península,
Barcelona; 1970, pág. 7.
189
establecimiento de Barrancabermeja como municipio petrolero de Colombia, motivado por
las dinámicas socioeconómicas (la apertura de caminos, el impacto del establecimiento de
la economía de enclave, de exportación y comercialización de materias primas) y políticas
(concesiones y adjudicaciones de tierras) que confluyeron en la remodelación de este
espacio geográfico en un periodo comprendido entre 1880-1930.
En esta perspectiva, Braudel afirma que el objeto de estudio de la geohistoria son las
sociedades en el pasado, así como sus respectivas estructuras geográficas en donde se
encuentran, conformando así, una relación dinámica y permanente sin ninguna clase de
condicionamientos. De este modo, menciona que a lo largo del tiempo, las sociedades han
logrado desarrollar técnicas y tecnologías que le han permitido transformar, manipular,
destruir y construir los distintos espacios geográficos donde habitan. El desarrollo de estas
técnicas y tecnologías constituyen uno de los principales logros históricos y geográficos de
la “vida material” de las sociedades, civilizaciones e imperios. De este modo, el espacio, y
dentro de éste las sub-categorías de territorio, paisaje y región, no solo son un telón de
49
ORELLA UNZUÉ, José Luis. Geohistoria. En:
http://www.ingeba.org/lurralde/lurranet/lur33/33orellaateneo/33orelateneo.pdf
190
fondo en el cual se desarrollan los hechos históricos, sino que interactúan activamente con
estos, influenciándolos algunas veces en grado tal, que es posible considerar la idea de un
pasado geográfico50. De esta forma, Sauer, afirma que la única forma que podemos
construir una idea del paisaje en términos de sus relaciones, es bajo la interrelación de una
dimensión temporal y espacial51.
Entonces, al hablar de paisaje natural, implica una reafirmación del lugar de la geografía
física, la geomorfología, la geología, fisiología, el clima, etc., factores que si bien sirven
como instrumento para el análisis y la conexión de las formas, a su vez conduce hacia la
concepción de paisaje cultural. De esta forma, podemos analizar que el paisaje, tiene
significación dual, la primera como espacio real, como realidad física y la otra como
producto de construcción social que parte de la representación que culturalmente la
sociedad hace de ella. El paisaje, hace referencia a una superficie terrestre que ha sido
modelada por las sociedades que la habitan a lo largo de décadas o de siglos; “[…] no sólo
nos presenta el mundo tal como es, sino que es también, de alguna manera, una
construcción de este mundo, una forma de verlo. Es, en buena medida, una construcción
social y cultural, siempre anclado –eso sí– en un substrato material, físico”52. Visto de esta
forma, el paisaje como combinación definida entre elementos físicos y culturales donde se
entrecruzan el tiempo y la causa53, es considerado como “una escritura sobre otra”54, ya que
constituye el conjunto de elementos producidos y heredados de momentos históricos
diferentes que es percibido, pero a la vez generalizado, mediante la observación de diversos
escenarios individuales expuesto al cambio.
El paisaje, como realidad física (fisiológica, morfológica, geológica, etc.) y como producto
de las interrelaciones y transformaciones sociales, económicas y culturales que las
sociedades construyen con el medio natural, no ha sido un tema frecuente dentro de la
historiografía colombiana. Si bien es cierto que los temas relacionados con la configuración
y fundación de pueblos, la colonización y propiedad de la tierra, es suficientemente
conocido entre los historiadores colombianos y extranjeros; no son muchos los trabajos
existentes sobre el proceso de transformación del paisaje de Barrancabermeja durante el
periodo de este análisis.
Por esta razón, para poder abordar la temática propuesta, se hizo indispensable recurrir a las
fuentes primarias, con el propósito de conocer las descripciones geográficas y paisajísticas
de la zona de Barrancabermeja realizada por cronistas, viajeros, geógrafos y cartógrafos
desde la época colonial y republicana hasta el siglo XX, para recrear el ambiente natural
50
DELGADO ROZO, Juan David. La construcción social del paisaje de la sabana de Bogotá. Tesis de Maestría en
Historia. Universidad Nacional de Colombia, 2010. pág. 17
51
SAUER, Carl. Morfología del Paisaje. En: http://es.scribd.com/doc/130024719/SAUER-Carl-Morfologia-del-Paisaje
52
NOGUÉ, Joan. Paisaje, Territorio y Sociedad Civil. (Landscape, Territory and Civil Society). Revista da ANPEGE, v.
7, n. 7, p. 3-12 , Jan./Jul. 2011. ISSN 1679-768 X; 2003, Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Geografia. Todos os direitos reservados. En: www.anpege.com.br
53
SAUER, Carl. Óp, Cit; pág. 18.
54
SANTOS, Milton. La naturaleza del espacio. Ed. Ariel S.A; Barcelona; 2000, pág. 64.
191
antes de efectuarse su proceso de transformación tras el impacto de estas oleadas
migratorias y de colonización promovidas por los procesos de modernización y,
principalmente, tras el auge de la economía petrolera a finales del siglo XIX y comienzos
del siglo XX. De esta manera, una de las características que sobresalen consiste en que las
fuentes encontradas, dan cuenta de una relación entre la historia de la creación de este
municipio con el entorno cercano, sobresaliendo su vinculación importante y estratégica
con el río Magdalena y con la región circundada por el Estado Soberano de Santander, más
específicamente con el municipio de Zapatoca, a quien la historiografía la señala como
fundadora de los procesos de colonización inicial de Barrancabermeja.
1. GEOGRAFÍA
Sus límites político-administrativos son, al norte con el municipio de Puerto Wilches, al sur
con los municipios de Puerto Parra, Simacota y San Vicente de Chucurí, al oriente con el
municipio de San Vicente de Chucurí y Girón, y al occidente con el río Magdalena. Es un
territorio rico en hidrocarburos, gas, oro, agua, carbón, arcillas de excelente calidad, así
como arenas silíceas, entre otros.
192
2. Antecedentes históricos: Primeras descripciones del paisaje natural y cultural
de Barrancabermeja.
Las primeras referencias historiográficas que se tienen sobre el paisaje de esta zona del
país, se encuentran en varios relatos de viajeros colombianos y extranjeros que recorrieron
el río grande de la Magdalena, los cuales dejaron plasmados en sus testimonios una
descripción geográfica de sus recorridos y a la vez, la representación de un territorio vacío
y homogéneo, caracterizado por su abundante flora y fauna, habitado por unos pocos
indígenas errantes, que se encontraban en las laderas del río.
El río Magdalena, por su posición geográfica fue desde tiempos precolombinos una ruta de
incursión hacia el interior del país debido a la condición geológica que presenta un relieve
de difícil acceso. Los conquistadores españoles que llegaron al país a principios del siglo
XVI utilizaron el río y en particular las riberas del río YUMA, denominado luego como río
grande de la Magdalena por Rodrigo de Bastidas en el año 1501, para comunicarse con el
interior del país. El valle medio del río magdalena, descubierta por los colonizadores
españoles, era un territorio de encuentro de dos grandes culturas indígenas la Chibcha y la
Caribe: 1) Los Guanes hacia la región de Vélez, considerados de parte de la gran familia
Chibcha; 2) Muzos en la región de la Belleza, Jesús María y Florián, quienes el Cacique
Tizquizoque dominaron la hoya del río Minero; 3) Carares y Opones en la región
occidental, habitaban las zonas selváticas de lo que va a ser posteriormente la Concesión de
Mares; 4) Yariguíes, en lo que hoy los territorios de Zapatoca y San Vicente de Chucurí.
Estos tres grupos finales, básicamente Caribes55.
Fueron varios los conquistadores quienes hicieron contacto con las tierras del Magdalena
Medio, como la expedición comandada por Antonio Lebrija en 1529 y el grupo de
españoles bajo el comando del alemán Ambrosio Alfinger. Sin embargo, en la crónica
realizada por Juan de Castellanos “Elegías de varones ilustres de indias” publicado en 1847,
se encuentra que fue la expedición del español Gonzalo Jiménez de Quesada en 1536, quien
tuvo acceso a la zona de La Tora posteriormente llamado Puerto Santander y luego
Barrancabermeja, cruzando ciénagas, manglares y desembocaduras de ríos, hasta llegar en
Octubre de 1536 a La Tora (Barrancabermeja), lugar donde confluyen gran variedad de
ríos.
55
VARGAS VELÁSQUEZ, Alejo. Magdalena Medio Santandereano. Colonización y Conflicto Armado Regional. Ed.:
CINEP; 1992; pág. 25
193
En su relato, además de narrar las características y penalidades que sufrió la expedición en
su travesía, se describe esta zona como un paisaje de selva denso, agreste e infranqueable
de lado a lado, habitado por escasos pobladores, de clima caluroso y hostil cubierto de
espesura que se abría en las orillas debido a la gran masa de juncos y plantas herbáceas
típicas del pantano y de un terreno cenagoso, húmedo y movedizo por las continuas lluvias,
poblado de animales desconocidos, que tan sólo en algunas ocasiones les permitía
alimentarse, entre los que se caracterizaban diversos anfibios e insectos con los cuales
tuvieron que convivir, junto con las enfermedades que fueron adquiriendo con el paso de
los días. “Luchando contra los obstáculos que la naturaleza les presentaba, con el hambre
que les obligaba a matar los caballos, dieron al fin vista a una población situada donde unos
barrancos de color bermejo”56. “El pequeño caserío, de apenas trece habitaciones rústicas,
llevaba una existencia primitiva, entre lo grandioso de la selva y el río. Alrededor,
lozaneaban algunas sementeras de gramíneas y raíces alimenticias. Sus habitantes no
habían traspasado aún la etapa de “cazador”, pero ya comenzaban a fijarse a la tierra por las
labores agrícolas. Viajaban a las sierras en busca de sal y de telas, o en rápidas excursiones
de carácter bélico57 .
Los relatos de cronistas de indias reflejan el encuentro de los invasores a través del río
grande de la Magdalena, con una diversidad paisajística y geográfica destacándose en
algunas zonas la presencia de montañas, cumbres y valles característicos de la geografía
nacional. El paisaje característico de la ladera del río grande de la Magdalena, es descrito
por Castellanos como un lugar de selva frondosa con abundante flora y niebla que impedía
la visibilidad del cielo, razón por la cual fueron abriendo paso empleado el uso de machetes
para cortar los árboles y dar continuidad al descubrimiento del interior del territorio.
Indudablemente, las descripciones demuestran un paisaje exótico a la vista del español,
infestado de caimanes, murciélagos, sabandijas, mosquitos, sapos, culebras, hormigas,
garrapatas y avispas con predominancia de un clima húmedo y con lluvias fuertes
característico de los lugares de tierra caliente58. La Tora, entonces se convirtió por muchos
años en una base y lugar de estancia donde los colonizadores partieron después para cruzar
la región del Opón llegando a las tierras de los Agataes hasta Bacatá, donde se fundaría
posteriormente Santafé. Desde allí, La Tora fue adquiriendo un papel importante como sitio
de escala de los movimientos expedicionarios
Sin embargo, éste territorio de ladera al río solitaria y agreste con dos islas paralelas que
forma el río y en donde había un pueblo deshabitado que se componía de 30 casas, fue
desde el siglo XVI al XIX, fue territorio de resistencia de los pueblos indígenas Yariguíes,
56
OTERO D’COSTA, Enrique. En: VALBUENA, Martiniano. Memorias de Barrancabermeja. Ed: El Frente;
Bucaramanga; 1947.Pág. 16
57
GALÁN GÓMEZ, Mario. Geografía Económica de Colombia. Tomo VIII, Santander, Contraloría General de la
República; Bucaramanga, 1947. En: VARGAS VELÁSQUEZ, Alejo. Óp. Cit.; pág. 27
58
Ibíd., pág. 87.
194
Opones, Carares y Cimarrones frente al proceso de conquista y colonización española. Las
selvas del Carare y las orillas del río Magdalena, fueron escenarios de luchas y
enfrentamientos entre los españoles e indígenas. Las diversas fuentes etnohistóricas de
cronistas y viajeros narran las acciones que emprendieron éstos indígenas (emboscadas,
ataques sorpresivos en el río, entre otros), como respuesta ante la invasión y en defensa de
su territorio al sometimiento por parte de los españoles; tal como lo comentó el oidor Luis
de Henríquez en 1601: “Estos indios han sido valientes y siempre muy pocos en número.
Salían de la ribera del río Grande, y como al subir las canoas van siempre arrimadas a la
ribera, echan unos cuantos garabatos de palos muy llenos de plumas, con que detenían la
canoa y luego flechaban a los indios negros que venían bogando en la proa y la popa con
unas yerbas”59 .
59
ALONSO, Manuel Alberto. Conflicto armado y configuración regional del Magdalena Medio. Ed.: Universidad de
Antioquia; 1997, pág. 9.
60
La resistencia por años a los colonos comandada por el cacique Pipatón es uno de los símbolos históricos más
sobresalientes dentro de la literatura histórica de Barrancabermeja. Pipatón, fue apresado en 1601 siendo víctima del corte
de sus talones, a pesar de lo cual pudo escapar y volver aMapa Tomado
encabezar de: ACEVEDO
la resistencia contra LATORRE, Eduardo.
los españoles. (comp.).
Sin embargo, al Atlas
de mapas antiguos de Colombia siglos XVI a XIX. Ed.
final de su vida, se entregó a las autoridades coloniales y fue enviado a Santa Fe con destino a un convento de frailes,Litografía
donde posteriormente fallecería después de 1612. Arco; Tercera Edición, Bogotá; 1986, pág. 68-69.
195
expedicionarios que se internaban en las selvas en busca de recursos naturales como la
tagua y la quina; así como a las campañas colonizadoras, concesión de tierras para la
apertura de caminos, entre otros, se extendieron hasta una gran parte del siglo XIX.
Además de la resistencia indígena, se suma la inconformidad de los bogas, hombres
encargados de mover los bongos, champanes y canoas que se desplazaban por el río,
quienes a veces se resistían al régimen de trabajo desertando en pleno viaje, retardando los
itinerarios del viaje o una vez contratados no se presentaban a la hora o el día acordados,
como lo señalaba Aquileo Parra en 1845: “algunas veces no se presentaban del todo,
cuando entonces tratar de seguir al fugado es una pérdida de tiempo, ya que es casi
imposible ubicarlo, y sieso se logra, ya no tiene el dinero. Una vez en el río, muchos
viajeros tal vez compartían el sentimiento de Felipe Pérez: "estábamos a merced de
aquellos beduinos de las aguas”61 .
De esta forma, las grandes extensiones de tierras de frontera, bosques y selvas fueron
concebidos por los viajeros europeos y las clases dominantes del siglo XIX, como zonas
desérticas o territorios vacíos, que no tenían propietarios ni tampoco ningún desarrollo
productivo propio de la “civilización”. Por consiguiente, las riberas del río grande de la
Magdalena empezaron a ser consideradas como malsanas por ser zonas donde abundaban
toda clase de insectos, plagas, paludismo, fiebre amarilla y todo tipo de enfermedades;
imagen que les fue útil a las élites en años posteriores, para emprender un proceso de
domesticación de los indígenas a quienes consideraban como “salvajes”, dando paso a una
época de “civilización” y “progreso” motivada por la explotación, producción y
exportación de materias primas y bienes agrícolas. De esta forma, el paisaje percibido y
plasmado por estos cronistas y viajeros, refleja el encuentro de los extranjeros con una
geografía desconocida y diferente a la europea, configurando así un discurso particular que
no se separa de la idea de lo exótico, lo inhabitual y lo primitivo con lo cual se caracterizó
durante siglos a tierras de clima caliente, mientras que las tierras altas, debido a su clima,
vegetación, suelos y paisajes similares a los europeos, fueron sinónimos de civilización,
apareciendo como elementos ordenadores de territorios y poblaciones.
La idea de paisaje, por tanto, fue instrumentalizada hacia estos propósitos, pues aspectos como un
“clima frío” y la presencia de fauna y flora nórdicas, era evidencia de una mayor cernía de la Sabana
62
TOVAR ZAMBRANO, Bernardo. La historiografía al final del milenio. Ed. Universidad Nacional de Colombia,
Facultad de Ciencias Humanas. Departamento de Historia, Bogotá 1994. Por otra parte, en las narraciones de los cronistas
de indias, es frecuente encontrar una idea de temor que fue infundido y propagado entre los nuevos colonos, quienes
catalogaron a estas tribus indígenas como caníbales, lo cual les sirvió posteriormente para justificar su exterminio. "Dice
la relación y tradición antigua que por debajo de la lengua agujereaban el paladar a los españoles y les echaban una
cabuya, y los traían por sus borracheras, ya otros les iban cortando de la carne y pasándola en su presencia, y de la
calavera hadan totumas para Beber [...] Hacen de las canillas de las piernas y brazos de los españoles flautas que llaman
fatutes…” Informe del Oidor Hernández. FORERO DURAN, Luis. "La guerra contra los indios del Carare", en Revista
Javeriana, V. XLI, núm. 203, Bogotá; 1954, pág. 238 – 239.
63
Algunos elementos como el clima, la geomorfología, los suelos, la vegetación y la fauna aparecen como aspectos
ordenadores de territorios y poblaciones desde el punto de vista del determinismo geográfico, asociadas al regionalismo y
al racionalismo geográfico. Visto de esta manera, las zonas altas aparecen en estos discursos como paisajes civilizados y
ordenados, dado en cierta medida a sus similitudes estéticas y climáticas con paisajes que pueden encontrarse en lugares
determinados del Viejo Mundo.
197
con Europa, y por ende, con la civilización. Asimismo, este discurso europeizante no se queda
simplemente en el plano de la ideas, pues acompaña y refuerza una transformación material de las
“tierras frías” colombianas que, al poseer características climáticas similares a las de latitudes
templadas, permitió que la biota y las formas europeas de producción, particularmente la ganadería,
64
llegaran a ser dominantes en el paisaje .
Durante el siglo XIX, tal como se evidencia en la historiografía del país, Colombia se
encontraba fraccionada en cinco grandes zonas con características poblacionales y
culturales diferentes: Santander, Antioquia, la Costa Atlántica, el Altiplano
Cundiboyacense y Cauca; conformando así, históricamente un archipiélago de regiones
configurado por grupos poblacionales económicamente aislados, separados por áreas
64
VANEGAS, Julio Arias. Nación y diferencia, en el siglo XIX Colombiano. Orden nacional, racialismo y taxonomías
poblacionales. Universidad de los Andes; Bogotá, 2007. En: DELGADO ROZO, Juan David. Óp Cit; pág. 59.
198
despobladas y fronteras de difícil acceso por las condiciones geográficas agrestes. “[…] el
quebrado territorio nacional contaba con una precaria red de vías, apropiadas para el paso
de animales de carga y caminantes mas no de vehículos, y con un sistema de transporte
fluvial demasiado primitivo”65. “He aquí uno de los dramas de Colombia: nuestra geografía
se ha interpuesto al comercio y las regiones, aisladas por la naturaleza, desarrollaron un
modelo basado en el abastecimiento con escaso intercambio regional e internacional hasta
la segunda década del siglo XIX”66.
De este modo, uno de los problemas que saltan a la vista es la falta de reconocimiento de la
región ya que se evidencia un vacío cartográfico hasta mediado del siglo XVIII, pues
siguiendo a Jaques Aprile-Gniset “los mapas del siglo XVI recortan cien o más kilómetros
del río entre Honda y Tamalameque como si no existiera el Opón-Carare”67. Sin embargo,
en algunos trabajos cartográficos y geográficos del río Magdalena debido a su importancia
económica tan grande y decisiva en la vida de la nación (además de ser uno de los
accidentes geográficos colombianos con mayores estudios y elaboraciones cartográficas, ya
que fue el camino real obligado de las comunicaciones con el interior del territorio y el eje
del desarrollo económico y de la integración social y cultural del país), se pueden ubicar
Barrancabermeja en la ladera del río, por ser considerado como lugar de estratégico de
paso. Tanto en los trabajos de Caldas, Humboldt68 y Codazzi, se pueden observar, que de
forma relativamente temprana, se emprendió la necesidad de hacer bosquejos topográficos
y cartográficos buscando la elaboración de una carta nacional, pero debido a la frecuencia
de las guerras civiles y las luchas partidistas su progreso fue muy lento; razón por la cual
los trabajos por Codazzi69 y la Comisión Corográfica entre 1850 y 1859 fueron
intermitentes. Empero, fue Codazzi quien diseñó el croquis de Barranca delineando los
primeros trazos de la región frente al interés de construir el camino de Vélez. Así pues, a lo
largo del siglo XIX, las imágenes y representaciones del territorio y de la geografía
regional, empezaron a construirse a partir de las descripciones que hacían los viajeros y de
algunos ensayos históricos y geográficos, en los cuales se nombraba las características
particulares de lugares del territorio colombiano, el cual se estaba gestando como proyecto
político regional.
65
BUSHNELL, David. Colombia: Una nación a pesar de sí misma. Ed. Planeta; Bogotá, 2007 pág. 112
66
SALAMANCA URIBE, Juana. Navegación fluvial, caminos, cable aéreo. La aventura extrema de los transportes.
Revista Credencial. Agosto 8 de 2011. http://www.revistacredencial.com/credencial/content/navegaci%C3%B3n-fluvial-
caminos-cable-a%C3%A9reo-la-aventura-extrema-de-los-transportes
67
APRILE, Jacques, Génesis de Barrancabermeja. Ed: Instituto Universitario de la Paz; Bucaramanga; 1997 pág, 11.
68
Uno de los grandes trabajos realizados por Humboldt, fue durante los meses de abril, mayo y junio de 1801, cuando el
barón remontó el río Magdalena y durante su travesía obtuvo datos necesarios para realizar un plano sobre el río.
ACEVEDO LATORRE, Eduardo. (comp.). Óp. Cit.
69
Es de resaltar que además de Humboldt y Codazzi, el avance en el conocimiento geográfico y cartográfico provino del
aporte de extranjeros, que fueron de gran importancia para la elaboración de las cartas regionales, la cual se encuentra
presente hasta nuestros días; siendo el legado de varios autores colombianos, políticos y no políticos que incursionan en
éste campo, como fueron Efraín Sánchez, José Manuel Restrepo, José María Samper, Santiago Pérez, Felipe Pérez, Tomás
Cipriano de Mosquera, y posteriormente en el período de la hegemonía conservadora Rafael Uribe Uribe, Rafael Reyes, y
Carlos Martínez Silva.
199
Las formaciones político administrativas de las provincias y municipios de esta región
durante el siglo XIX, se vincularon directamente con la tenencia de la tierra, la firma de
tierras concesionadas, la construcción de caminos hacia el río Magdalena, etc., vinculando
estos procesos con las relaciones de carácter político y económico entre políticos,
comerciantes y empresarios nacionales y extranjeros quienes terminaron por afianzar su
dominio y poderío en las actividades comerciales de la región, apropiándose así de tierras
baldías, recursos naturales y mano de obra; llevando a la vez una política de exterminio y
pacificación de los indígenas moradores de las selvas. Es así, como los procesos de
colonización en Santander durante los siglos XVIII al XIX, se encontraron ligados a la
construcción de caminos, vías férreas, apertura de puertos fluviales, etc., que fueron
estratégicamente situados, especialmente en zonas con abundante riqueza natural.
Hacia 1820, Barrancabermeja seguía siendo un pequeño caserío con condiciones precarias
y pocos habitantes. Sin embargo, por su localización geográfica estratégica, fue
convirtiéndose en un terminal de paso obligado para el transporte de mercancías y materias
primas. Su importancia fue tal, que en un lapso de 14 años (1823- 1847), se elaboraron
diferentes decretos, leyes y contratos para definir un orden político administrativo, así como
para la adjudicación de obras públicas para la construcción de caminos. De esta manera,
con el incremento del transporte y del comercio, Barrancabermeja fue transformando su
paisaje de selva virgen, en una zona comercial de “desembarcadero” debido al aumento de
comercio en la región, erigiéndose en 1847 a la categoría de Parroquia70, estableciendo al
mismo tiempo la administración de correos que duraría hasta 1857 debido a los múltiples
ataques de los indígenas en la región. Ya, para 1863 el empresario de caminos, el alemán
Geo Von Lengerke, propuso al Estado la construcción de una vía, para superar las
dificultades de transporte en la zona durante el invierno. Con la respuesta positiva del
gobierno, se dio paso a esta vía en 1867, que a la par del negocio próspero de la
explotación de las quinas y de otros productos como el caucho, las maderas, raicilla, añil,
perillo y palmas de tagua apetecidas por los comerciantes, hizo que proviniera una nueva
era de prosperidad. Entre ires y venires político - administrativos que evidencian la
dinámica política y la situación socioeconómica del país, en un lapso de cincuenta años, en
varias oportunidades se estableció y suprimió el corregimiento, quedando finalmente
establecido en 1881 Puerto Santander por el presidente Solón Wilches amigo de Von
Lengerke71.
70
El primer intento de constitución del distrito parroquial de Barrancabermeja, se produjo el 10 Julio de 1848 por parte
del gobernador de la provincia de Socorro Zoilo Silvestre, estableciendo límites bien definidos y segregando de su
territorio del de San Vicente de Chucurí, ordenando a la vez alrededor de ocho mil fanegadas de tierras baldías concedidas
por el Poder Ejecutivo Nacional, para el fomento del poblamiento de Barrancabermeja, separando cien fanegadas para
trazar el poblado. Sin embargo, al parecer este distrito no fue creado, pues hacia 1860 se registra a Barrancabermeja como
una sección del distrito parroquial (división territorial más pequeña de esta época) de la provincia de Zapatoca.
MARTÍNEZ GARNICA, Alberto y RUEDA CARDOZO, Juan Alberto. La Provincia de Mares: Orígenes de sus
poblamientos urbanos. Colección de Historia, Ed.: Universidad Industrial de Santander;1996, pág. 95-96.
71
En 1868 una ley dictada en Socorro había nombrado el lugar de Puerto Santander, elevándolo a corregimiento, poco
después se anuló esta decisión, retomándola nuevamente en 1873 ahora con la categoría de corregimiento a través de la
200
Así pues, a partir del siglo XIX, se percibe un incremento de las colonizaciones en esta
región, tras el desarrollo de proyectos como el mantenimiento y construcción de caminos
que conectasen la ribera del magdalena con la cordillera oriental. De esta manera, sobresale
la construcción del camino a Barrancabermeja72, que pasó a convertirse en una “tierra de
promisión” que atrajo comerciantes, empresarios y políticos que tenían un interés
geoestratégico por la apropiación de tierras cercanas a las orillas del río Magdalena y de
paso, articular la comercialización de productos extraíbles como la quina y añil con lo cual
se motivó los procesos de colonización de la zona y la formación de asentamientos
agrícolas. De ahí, que el interés de Geo Von Lengerke, fuera construir circuitos
comerciales, fundando asentamientos a su paso y dinamizando la llegada de colonos en
algunos tramos de las vías que construyó.
Puede decirse entonces, que fueron varias las condiciones con las cuales se induciría a la
penetración foránea en la región. Los contratistas de las compañías responsables de la
apertura de caminos, se comprometieron con el Estado a fundar puertos, generar el proceso
de poblamiento de estas tierras, expandir los cultivos de café, cacao, maíz, plátano, arroz y
pastos para ganadería y construir poblaciones que tuviera casa de gobierno, servicios
públicos necesarios, escuela, iglesia y cementerio. Por estas razones, tal como lo evidencia
la historia e historiografía sobre Barrancabermeja, este municipio no tuvo una fundación
propiamente dicha, sino que nace como parte de un proyecto político-económico
característico del periodo de la República, el cual tiene sus raíces desde el siglo XVIII
cuando los mercaderes radicados en Bogotá, buscaban rutas alternas como la del Opón-
Carare, para acortar las distancias desde Cartagena y reducir los costos del flete fluvial de
Honda. De ahí, que el proceso de poblamiento inicial y sus transformaciones paisajísticas
se relacionen principalmente con estas actividades de carácter comercial y económico, de
explotación y extracción de recursos.
ley 11 de 1873 del Estado Soberano de Santander. Sin embargo, nuevamente esta ley fue suprimida con la ley 42 de 1876
en donde se suprime el corregimiento, la cual es recreada posteriormente en 1881 por el presidente Solón Wilches,
quedando así establecido oficialmente el corregimiento de con una jurisdicción ampliada donde se indicaba que su
cabecera sería el punto denominado Puerto Santander. APRILE, Jacques, Óp, Cit; pág. 47
72
ALFONSO LEÓN, Daniel. Camino a Barrancabermeja: antecedentes del proceso de colonización en San Vicente de
Chucurí 1864-1900. Anuario Historia Regional y de las Fronteras. Universidad Industrial de Santander, Vol 17, No 2;
2012. Pág. 4. En: http://revistas.uis.edu.co/index.php/anuariohistoria/article/view/3067
201
lugar como puerto fluvial de transporte con el surgimiento del comercio entre Europa con
Bucaramanga y otros centros urbanos del país tras el fortalecimiento de la economía de la
Quina y de la Tagua, más tarde como un poblado de colonos recolectores, hasta la
configuración del centro industrial tras la llegada de la economía de enclave petrolero, que
incide en la remodelación completa del hábitat comarcal surgiendo así la creación del
municipio de Barrancabermeja como ciudad petrolera en 1922. Empero, se puede dar
tentativamente la génesis del poblado hacia 1870 a partir de su papel económico como
bodega-puerto fluvial leñero, ligado con el camino terrestre, consolidándose hacia 1881
como organización administrativa, el cual incluía cuartel de policía y corregidor 73; de ahí
que a partir de los años 1890 – 1900, el corregimiento empieza a aparecer en los archivos
documentales oficiales. Sin embargo, con la caída del negocio de las quinas y los múltiples
conflictos civiles de la época, se ve un descenso poblacional en esta zona, ya que muchos
de los moradores que habían llegado emigraron nuevamente a otros lugares del país.
El paisaje de inicios del siglo XX, era la imagen de un caserío de selva húmeda incipiente
con escasos habitantes, compuesto por un puerto real donde se encontraba la inspección de
policía y una calle única llamada calle del comercio. Era un total de 32 viviendas, 3
bodegas (una de ellas, una vieja bodega de Lengerke) y 1 edificio público74, habitado
alrededor de unas 150 personas. De esta forma, el continuo ordenamiento y reajuste
territorial de esta zona del país, obedece a la sucesión ininterrumpida de procesos y ciclos
económicos, los cuales transforman radicalmente el paisaje natural y ribereño de
Barrancabermeja. Tal como lo afirma Jacques Aprile,
[…] en la trayectoria del proceso urbano colombiano, Barrancabermeja no obedece a los modelos
clásicos; es más bien un caso singularmente atípico […] Es la historia de un territorio que se va
modelando al calor de tensiones sociales y de la cual se desprenden la colonización de los baldíos, el
exterminio de etnias aborígenes, la conquista del siglo XIX y la navegación a vapor, el saqueo de
medios naturales de producción, la intrusión del colonialismo de rapiña, los antagonismos entre
imperialismos impactando unas selvas colombianas, la política arrodillada de la oligarquía indígena,
el ambiente fétido de la corrupción generalizada del aparato estatal en Bogotá, la delincuencia de
cuello blanco en los círculos de poder, y la persistencia durante cien años o más de un clima bélico
nutrido por la codicia y el afán de enriquecimiento75.
73
APRILE, Jacques. Óp. Cit.; pág. 49.
74
MOSSERI HANE, Jacques. Barrancabermeja Plan de Ordenamiento Urbano, Tomo II, Universidad de los Andes,
Bogotá, 1969; pág. 6
75
APRILE, Jacques. Óp. Cit.; pág. 257. - 254
76
MOSSERI HANE, Jacques. Óp Cit.; pág. 8
202
próspera en el siglo pasado. Sin embargo, el negocio prometedor del monopolio
perteneciente a la empresa East Magdalena Explotation desde la firma de su concesión
(Decreto Legislativo 34 del 10 de Febrero de 1905) para la explotación y extracción de los
recursos forestales no duró mucho. En 1909, la compañía entró en liquidación y con el
advenimiento de la primera guerra mundial se paralizó por completo el negocio de la tagua
y por ende, la vida de sus habitantes. Abrir un nuevo tipo de mercado era fundamental para
esta época, pues los productos de exportación como el algodón, añil, cacao, habían
declinado y la quina y el tabaco habían perdido peso dentro de la economía nacional 77. Sin
embargo, un nuevo producto encontrado en la frondosa selva húmeda desde tiempos de la
conquista transformaría por completo el rumbo de este puerto, encaminándolo hacia su
modernización, el petróleo. Así pues, tras el descubrimiento de los pozos petroleros de
“Infantas” al finalizar la Guerra de los Mil Días en 1902, José Joaquín Bohórquez (a quién
se le reconoce como el “descubridor de los yacimientos de Barrancabermeja), le presentaría
a Roberto de Mares unas muestras de dicho campamento, lo que posteriormente,
desencadenaría toda una historia de querellas, conflictos, despojos y atropellos por la
propiedad de la tierra, hechos que emergieron como consecuencia de una política
contradictoria en el contexto de la Hegemonía Conservadora, pues sus gobernantes
favorecieron los baldíos nacionales a empresarios y compañías privadas bien fuese mineras,
agrícolas, constructoras, etc.
De Mares obtuvo una concesión a treinta años, tras la firma del Decreto Legislativo 34 y la
Ley 6 de 1905, en la zona aledaña a Barrancabermeja, aprovechando su cercana amistad
con el presidente Rafael Reyes78. Sin embargo, De Mares se vio obligado a postergar en
varias ocasiones el inicio de la explotación petrolera por no contar con los recursos
suficientes; razón por la cual viajó a Estados Unidos en donde conoció a unos empresarios
77
TAPIAS COTE, Carlos Guillermo. De la Concesión de Mares y TROCO, hasta ECOPETROL. Revista Credencial;
Bogotá, Febrero 2012,
78
Para Eduardo Sáenz Rovner, “De Mares obtuvo una concesión a treinta años en la zona aledaña a Barrancabermeja,
aprovechando su cercana amistad con el presidente Rafael Reyes, su padrino de bodas, mientras Barco se hacía a otra
concesión similar en el Catatumbo. Bohórquez no tuvo tanta suerte, ya que sólo recibió una pensión por parte del Estado
durante los últimos años de su vida. De Mares se vio obligado a postergar varias veces el inicio de la explotación petrolera
por no contar con los recursos suficientes. En 1915, y de manera casual, De Mares conoció al especulador norteamericano
John Leonard, quien se interesó en el negocio. Leonard viajó a lo que se conocería como la Concesión De Mares, y de
regreso a su país interesó a tres de sus compatriotas: George Crawford, Joseph Trees y Michael Benedum. Años más tarde
este último narraba la fascinación que les causó el potencial de la zona en donde "la tierra olía a petróleo", aunque se
preguntaban sobre cómo se las "arreglarían con los cazadores de cabezas de la región, las serpientes venenosas y las boas
constrictoras". En 1916 Crawford, Trees y Benedum fundaron la Tropical Oil Company en Wilmington, Delaware. Tres
años después, el gobierno colombiano aprobó el traspaso de la Concesión a la Tropical y cuatro años más tarde las
acciones de ésta fueron vendidas a la International Petroleum Company de Toronto, una subsidiaria de la poderosísima
Standard Oil de New Jersey. Así, la Standard se hizo a los promisorios campos petrolíferos de la Concesión de Mares, que
en 1927 representaban su principal fuente de explotación fuera de los Estados Unidos. SÁENZ ROVNER, Eduardo. La
Industria Petrolera en Colombia: Concesiones, Reversión y Asociaciones, Revista Credencial; Edición 49, Enero de 1994,
Bogotá. […] “el campo Cira-Infantas, tras sucesivos traspasos quedó finalmente en manos de la Tropical Oil Company,
cuyas acciones pertenecían a la Standard Oil de New Jersey. Finalmente, luego de numerosas disputas legales que
involucraron tanto a magistrados de la Corte Suprema de Justicia como a ex presidentes de la República, esta concesión
revirtió al estado en agosto de 1951, siendo manejada por la compañía petrolera creada por el gobierno en 1948 con ese
propósito”. En: MAYORGA GARCÍA, Fernando. La industria petrolera en Colombia. Lo que va de las concesiones a las
asociaciones, Tomado de: Revista Credencial Historia. Edición 151, (Bogotá - Colombia).Julio de 2002
203
petroleros con los cuales años después, le traspasaría la Concesión a la Tropical Oil
Company (TROCO) con autorización del gobierno, cuyas acciones cuatro años más tarde
fueron vendidas a la International Petroleum Company de Toronto, subsidiaria de la
Standard Oil de New Jersey. De esta forma, con la Concesión De Mares, la TROCO obtuvo
un terreno con más de medio millón de hectáreas: “En el documento original se decía que la
concesión abarcaba los terrenos baldíos de la nación comprendida desde la desembocadura
del Río Sogamoso en el Magdalena, aguas arriba por este río hasta la desembocadura del
Río Carare, siguiendo aguas arriba hasta encontrar el pie de la cordillera hasta encontrar el
Río Sogamoso y por el crudo de éste hasta el punto de partida” 79. Así pues,
geográficamente la franja territorial de la concesión pertenecía a cinco municipios entre los
cuales están: Simacota, Landázuri, Cimitarra, San Vicente de Chucurí y Betulia. Sin
embargo, solo bastó el 2% de ese total para que la petrolera adquiriera enormes beneficios
con baja inversión, de esta forma la Concesión de Mares se convertiría por un lado en el
“Paraíso de la Tropical”, y por el otro, en el Infierno de los nativos al ser desalojados y
expulsados de sus territorios.
79 VEGA CANTOR, Renán. Gente Muy Rebelde. Protesta Popular y Modernización capitalista en Colombia (1909-
1929). Tomo 1: Enclaves, Transportes y Protestas Obreras. Capítulo 2. Sangre y Petróleo en Barrancabermeja. Ed.
Pensamiento Crítico. Bogotá; 2002; p. 209 - 212
80
APRILE- GNISET, Jacques. Op Cit. p. 65-66
81
Ibíd., págs. 147- 148
82
Dentro de este aspecto, la cartografía se convierte en un elemento fundamental para describir el proceso de poblamiento
espacial, logrando divisarse que en menos de medio siglo se fue modelando la comarca bajo el imperativo de la industria
extractiva, de ahí que se conviertan en la mejor imagen de la transformación territorial producida por el petróleo y la
nueva formación espacial regional del enclave petrolero. Después de 1940, es posible divisar con claridad algunos sitios
204
Poco a poco el paisaje selvático y portuario de Barrancabermeja, se fue sustituyendo con la
instauración de zonas de extracción, transporte, procesamiento, transformación del crudo y
exportación, mientras se empezaban a configurar asentamientos de algunos sectores
urbanos en forma lineal a lo largo del río Magdalena y a los alrededores de Cira-Infantas84
donde vivieron los primeros obreros de TROCO, los cuales no pasaban en ese entonces de
226 chozas de bahareque, tablas,
techos de paja y zinc, que
posteriormente, conformarían los
campamentos Centro y Puerto Galán
organizados por la misma empresa.
A los ingenieros extranjeros
tampoco les fue fácil adaptarse, ni en
Barranca ni en Infantas, debido a las
condiciones climáticas, la
proliferación de enfermedades
tropicales, además de las
enfermedades de los pobladores,
Foto tomada de: ECOPETROL, Energía limpia para el Futuro.
quienes se encontraban en un estado Ed. Villegas Editores; Bogotá, 2011
avanzado de desnutrición ocasionado
por las extensas jornadas de trabajo.
Así pues, la economía de enclave, fue modelando el paisaje natural, transformándolo a sus
propias necesidades y en beneficio del capital privado, provocando el deterioro de los
ecosistemas de selva virgen e impulsando la construcción de vías, caminos, ferrocarriles85,
etc. Los árboles fueron sustituidos por grandes máquinas de acero, los derricks,
arquitectura nunca antes vista en el país, los cuales fueron “[…] construidos con fines
pragmáticos, y en un espacio natural, primero desnudado y vuelto desierto. Los derricks no
fueron concebidos para la contemplación o la admiración. Más bien prepotentes o
agresivas, estas catedrales del capitalismo no surgieron de la fe, pero sí de la plusvalía”86.
De esta forma, con la llegada de la TROCO, con toda su política y megaestructura lograba
poblados con toponimias diferentes Campo Escondido, Campo Zarzal, entre otros, los cuales hacen referencia a los
lugares donde se encuentran exploraciones y perforaciones de pozos abandonados o en producción, campamentos de
obreros, ferrovías, estaciones, sistemas de señalización, caminos, estaciones de bombeo, etc.
83
Al respecto, el historiador Eduardo Sáenz Rovner menciona para los historiadores oficiales de la Standard Gibb y
Knowlton, la multinacional se veía más que como una compañía comercial, como un agente civilizador que llevaría el
“progreso a la región” En la Revista The Lamp, revista institucional de la Standard, fue explícita esta clase de calificativos
cuando publicó un artículo sobre la Concesión titulado "Civilización en la selva". En: SÁENZ ROVNER, Eduardo. Óp.
Cit. Ver también: GIBB & KNOWLTON. The resurgent years history of Standard Oil Company. Harper; 1956.
84
Hacia 1916, los pozos Infantas 1 y 2 en El Centro producían más de 2.000 barriles por día..
85
Proyecto que surgió como una estrategia para solucionar los problemas económicos de la región Santandereana.
NORIEGA, Teófilo. Ferrocarril de Barrancabermeja. Ed. Imprenta de la Cruzada; República de Colombia, Bogotá;
1914.
86
APRILE- GNISET, Jacques. Op Cit; pág 148
205
modelar y reorganizar un territorio a favor de las fuerzas productivas que se convertiría en
la zona con mayor concentración obrera en ese momento en el país.
Barrancabermeja ilustra de manera nítida y ejemplar esta tesis que se parece perogullada: todas las
ciudades colombianas nacieron de una perspectiva económica. [...] Lo cual significa que la forma
religiosa, administrativa o militar que adquirió la ciudad, es decir su configuración y su fisonomía, su
contextura urbanística y su trazado, sus múltiples hitos arquitectónicos [...] Son elementos visibles y
tangibles que tienden a ocultar la esencia de su contenido, el cual radica en la captación y
concentración de determinados flujos de productos y mercancías generadores de dinero y poder87.
La “fiebre del oro negro”, con toda su racionalidad económica y productiva, alteró
completamente tanto la vida de hombres y mujeres como los paisajes naturales. La
multinacional exigía un nuevo tipo de administración. Era necesario establecer un cambio
significativo para albergar cerca de 5.000 habitantes que en ese momento se presentaba en
el centro industrial, además concebían la importancia de que Barrancabermeja no tuviera
rasgos de caserío. Se requería una administración política como la de un municipio, con un
alcalde, personería, juzgados municipales, una fuerza armada, que velara por el
levantamiento de edificios públicos, carreteras y un mínimo de salubridad para la
población; todo esto con el fin de brindar un proceso de modernización para la nueva
ciudad. Empero, lo que se buscaba era establecer todo un aparato judicial, económico,
político y militar que defendiera los intereses y brindara seguridad a la compañía. Así pues,
la economía del petróleo dio paso una explosión demográfica de grandes magnitudes que
atrajo a pobladores de diferentes partes del país como de la Costa Atlántica, Santander,
Antioquia y Boyacá; a la vez que fueron diezmados y eliminados los rastros indígenas de la
región. Para ello, “se desmontó selva allí donde era necesario, se abrieron trochas de
penetración, se talaron árboles para construir campamentos y viviendas, se perforaron
pozos, se construyeron carreteras y tramos férreos, se empalmaron líneas telegráficas y
telefónicas, se erigieron cercas y mallas metálicas y se construyeron oleoductos”88, para dar
paso a paso al montaje de la refinería.
206
Foto tomada de: ECOPETROL, Energía limpia para el Futuro. Ed.
Villegas Editores; Bogotá, 2011
desigualdad económica y social fue profundizándose como confluencia de la acumulación
de capital, lo cual incidió en el desarrollo disímil en la región, mientras el desalojo de
campesinos, colonos, indígenas aumentaba por el control del subsuelo ante posibles
competidores internacionales y la monopolización de la economía regional para asegurarse
el abastecimiento de la fuerza de trabajo obrera; circunstancias que decantarían en la
consolidación de luchas y movimientos sociales obreros en los años 20’s con la creación de
la Unión Sindical Obrera (USO). En conclusión, Barrancabermeja es el resultado evidente
de “la acción de la burocracia estatal y la distribución del espacio según las exigencias del
sistema de producción (capitalista), es decir, de la reproducción de las relaciones de
producción”90.
Es así, que ordenar para controlar, puede ser el eslogan que caracterizaría la secuencia
geohistórica del proceso de transformación paisajística de enormes magnitudes ocasionada
por el impacto de la dinámica de los flujos capitales y la acción política y social típica de
las economías de enclave, razones por las cuales se puede comprender la historia del
surgimiento de este municipio, como capital petrolera de Colombia.
Bibliografía:
90
LEFEBVRE, Henri. Óp Cit; pág. 9
207
GODELIER, Maurice. Lo ideal y lo material: Pensamientos, economías,
sociedades; Ed. Taurus Humanidades. España; 1989
LEFEBVRE, Henry. Espacio y Política: Historia, Ciencia y Sociedad. El Derecho
a la Ciudad II. Ed: Península, Barcelona; 1970
LUNA GARCÍA, Jairo Ernesto. Configuración de la Salud Obrera en la Tropical
Oil Company: Barrancabermeja 1916-1951. Tesis Doctoral del Programa
Interfacultades de Doctorado en Salud Pública; Facultad de Medicina, Bogotá,
Colombia; Universidad Nacional de Colombia, 2011
MACHADO, Absalón. Ensayos para la historia de la política de tierras en
Colombia: De la colonia a la creación del Frente Nacional. Ed. Facultad de
Ciencias Económicas. Centro de Investigaciones para el Desarrollo, CID,
Universidad Nacional de Colombia; 2009
MARTÍNEZ GARNICA, Alberto y RUEDA CARDOZO, Juan Alberto. La
Provincia de Mares: Orígenes de sus poblamientos urbanos. Colección de Historia,
Ed.: Universidad Industrial de Santander;1996
MAYORGA GARCÍA, Fernando. La industria petrolera en Colombia. Lo que va
de las concesiones a las asociaciones, Tomado de: Revista Credencial Historia.
Edición 151, (Bogotá - Colombia).Julio de 2002
MOSSERI HANE, Jacques. Barrancabermeja Plan de Ordenamiento Urbano,
Tomo II, Universidad de los Andes, Bogotá, 1969.
NOGUÉ, Joan. Paisaje, Territorio y Sociedad Civil. (Landscape, Territory and
Civil Society). Revista da ANPEGE, v. 7, n. 7, p. 3-12 , Jan./Jul. 2011. ISSN 1679-
768 X; 2003, Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia.
Todos os direitos reservados. En: www.anpege.com.br
NORIEGA, Teófilo. Ferrocarril de Barrancabermeja. Ed. Imprenta de la Cruzada;
República de Colombia, Bogotá; 1914
ORELLA UNZUÉ, José Luis. Geohistoria. En:
http://www.ingeba.org/lurralde/lurranet/lur33/33orellaateneo/33orelateneo.pdf
POSADA CARBO, Eduardo. Bongos, champanes y vapores en la navegación
fluvial colombiana del siglo XIX. Boletín Cultural y Bibliográfico Número 21
Volumen XXVI, Banco de la República; Bogotá, 1989. En:
http://www.banrepcultural.org/blaavirtual/publicacionesbanrep/boletin/boleti5/bol2
1/bongos.htm
SÁENZ ROVNER, Eduardo. La Industria Petrolera en Colombia: Concesiones,
Reversión y Asociaciones, Revista Credencial; Edición 49, Enero de 1994, Bogotá.
SALAMANCA URIBE, Juana. Navegación fluvial, caminos, cable aéreo. La
aventura extrema de los transportes. Revista Credencial. Agosto 8 de 2011.
http://www.revistacredencial.com/credencial/content/navegaci%C3%B3n-fluvial-
caminos-cable-a%C3%A9reo-la-aventura-extrema-de-los-transportes
SANTOS, Milton. La naturaleza del espacio. Ed. Ariel S.A; Barcelona; 2000
208
SAUER, Carl. Morfología del Paisaje. En:
http://es.scribd.com/doc/130024719/SAUER-Carl-Morfologia-del-Paisaje
TAPIAS COTE, Carlos Guillermo. De la Concesión de Mares y TROCO, hasta
ECOPETROL. Revista Credencial; Bogotá, Febrero 2012.
TOVAR ZAMBRANO, Bernardo. La historiografía al final del milenio. Ed.
Universidad Nacional de Colombia, Facultad de Ciencias Humanas. Departamento
de Historia, Bogotá 1994
VALBUENA, Martiniano. Memorias de Barrancabermeja. Ed: El Frente;
Bucaramanga; 1947.Pág. 16
VANEGAS, Julio Arias. Nación y diferencia, en el siglo XIX Colombiano. Orden
nacional, racialismo y taxonomías poblacionales. Universidad de los Andes;
Bogotá, 2007
VARGAS VELÁSQUEZ, Alejo. Magdalena Medio Santandereano. Colonización y
Conflicto Armado Regional. Ed.: CINEP; 1992; pág. 25
VEGA CANTOR, Renán. Gente Muy Rebelde. Protesta Popular y Modernización
capitalista en Colombia (1909-1929). Tomo 1: Enclaves, Transportes y Protestas
Obreras. Capítulo 2. Sangre y Petróleo en Barrancabermeja. Ed. Pensamiento
Crítico. Bogotá; 2002
209
AS PARTICULARIDADES DAS CIDADES MÉDIAS NA REDE
URBANA BRASILEIRA
Resumo: Por meio de um estudo comparativo de duas cidades médias brasileiras, Marília-
SP e Mossoró-RN, situadas nas regiões Sudeste e Nordeste do país, respectivamente,
buscamos observar suas particularidades a partir da análise de suas situações geográficas e
das formações socioespaciais nas quais se inserem. Por terem origem em diferentes
formações socioespaciais, as quais reúnem condições concretas diversas para a
materialização dos processos gerais, sejam condições do passado ou produzidas pelas
mudanças mais recentes, é possível identificar trajetórias políticas, sociais, econômicas e
espaciais que garantem particularidades a estas cidades frente ao desenvolvimento
capitalista brasileiro.
Palavras-chave: Marília; Mossoró; estudo comparativo.
1. Introdução
A redefinição dos espaços e das relações sociais, as quais muitas vezes atendem
aos interesses hegemônicos do modo capitalista de produção, atingem diferentes
proporções conforme o jogo de forças políticas entre as diversas frações de classe em um
dado território, gerando mudanças com intensidades, velocidades e qualidades diferentes.
No contexto das transformações que vêm ocorrendo na rede urbana brasileira, com
diferentes divisões do trabalho, regionais ou internacionais, as cidades médias tiveram seus
papéis urbanos e regionais alterados na medida em que as relações, sobreposições e
articulações entre escalas foram intensificadas mediante processos e dinâmicas recentes,
entendidos a partir da discussão sobre a reestruturação urbana e a reestruturação das
cidades (SPOSITO, 2007).
91
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da
Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Presidente Prudente, São Paulo, sob orientação do prof.
Dr. Everaldo Santos Melazzo. É membro da Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), do
Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GAsPERR) e do Grupo de Pesquisa
Globalização, Agricultura e Urbanização (Globau). O trabalho foi realizado com apoio do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes).
210
As interações que as cidades médias estabelecem com cidades de maior ou menor
porte, entre si e com os espaços rurais, associadas ao seu processo de estruturação
intraurbana e aos diferentes interesses de classes envolvidos na produção do espaço, nos
ajudam a compreender seus novos papéis e funções a partir das suas situações geográficas
na rede urbana brasileira e das formações socioespaciais nas quais se inserem.
Deste modo, propomos um estudo comparativo entre duas cidades médias:
Marília, localizada no Estado de São Paulo, e Mossoró, no Estado do Rio Grande do Norte,
situadas em diferentes regiões do país, Sudeste e Nordeste, respectivamente. Ambas estão
inseridas no contexto de mudanças na produção do espaço urbano e no consumo e são
componentes e resultados de um mesmo processo de expansão capitalista e de divisão
internacional do trabalho no país. Entretanto, em virtude de seus contextos regionais, das
formações socioespaciais nas quais estão inseridas e das diferentes temporalidades dos
processos no território brasileiro, essa participação se dá de maneiras distintas, gerando
particularidades e singularidades.
Nosso objetivo é estabelecer as relações entre a reestruturação urbana e das
cidades, articulando processos gerais às consequências distintas que suscitam em cada
cidade, inclusive do ponto de vista das rearticulações que se processam na escala
intraurbana. Não temos o intuito de esgotar aqui todas as possibilidades de análise, porém,
aportamos algumas considerações a partir dos resultados preliminares da pesquisa em
desenvolvimento, com a análise das situações geográficas das duas cidades e das suas
inserções em distintas formações socioespaciais.
211
Pensamos as singularidades como características que não existem em outras
formações socioespaciais, são únicas; porém, dialeticamente, definir o que há de singular
em cada cidade requer uma observação daquilo que se constitui como geral, ou seja, dos
fenômenos e processos que se repetem (CHEPTULIN, 1982).
O singular e o geral são interdependentes, manifestando-se por meio de formações
particulares, com características próprias a determinada cidade. As particularidades
representam a unidade do que é singular e do que é geral, não evidenciando apenas o que é
único, mas estabelecendo características que identificam e distinguem as cidades
(CHEPTULIN, 1982).
Assim, este estudo comparativo entre as cidades de Marília – SP e Mossoró – RN,
apresentando suas particularidades frente a processos gerais que ocorrem no país – como a
expansão do consumo e a mudança nos padrões de produção das cidades, por exemplo –,
está baseado em dois elementos importantes à análise: a situação geográfica e a formação
socioespacial.
Nosso ponto de partida é o que caracteriza fortemente as duas cidades,
despertando, inclusive, nosso interesse em estudá-las: a produção de seus espaços a partir
dos seus importantes papéis de intermediação na rede urbana regional e nacional,
estabelecendo intensas interações espaciais em múltiplas escalas, tal como já foi destacado.
No estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
sobre a hierarquia dos centros urbanos brasileiros, que resultou na publicação “Regiões de
Influência das Cidades” (REGIC), Marília e Mossoró, por seu porte demográfico e nível de
relações que estabelecem, foram classificadas como Capital Regional C, isto é, assim
[...] como as metrópoles, também se relacionam com o estrato superior da rede
urbana. Com capacidade de gestão no nível imediatamente inferior ao das
metrópoles, têm área de influência de âmbito regional, sendo referidas como
destino, para um conjunto de atividades, por grande número de municípios
(IBGE, 2008, p.11).
Com base na REGIC, Elias e Pequeno (2010) apontam alguns aspectos que
reforçam a centralidade mossoroense, corroborando com nossa análise:
“Entre os 39 municípios sob influência de Mossoró, no que se refere aos aspectos
demográficos, verifica-se uma forte concentração populacional em Mossoró, com
mais de um terço do total” (p.118);
212
“[...] o produto interno bruto municipal equivale a mais de 43% do total dos
municípios que compõem sua região de influência; do total de impostos arrecadados
pelos municípios que compõem o PIB, mais de 65% são apurados em Mossoró [...]”
(p.119);
“[...] de um total de 72 tipos de atividades comerciais indicados pela Classificação
Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), 67 encontram-se presentes em
Mossoró, assim como 104 tipos de serviços do total de 158 possíveis” (p.119);
“[...] o volume de ativos bancários contabilizados em Mossoró, ao final de 2004,
correspondeu a quase 60% do total da região; mais de 80% dos domínios de internet
na região encontram-se em Mossoró” (p.119).
No que diz respeito à Marília, Melazzo (2012) enfatiza que, de acordo com a
REGIC, a cidade tem sob sua influência regional um conjunto de 43 centros urbanos e
mantém importantes níveis de centralidade de gestão do território e concentração de
diferentes serviços. Tal centralidade é reforçada em documento divulgado recentemente
pelo IBGE (2014), sobre redes e fluxos do território nacional, apontando indicadores
semelhantes para Marília e Mossoró no que diz respeito à gestão pública, à gestão
empresarial, aos fluxos, aos serviços avançados de apoio às empresas e à centralidade da
gestão do território.
Outra pesquisa que ratifica nossa argumentação, destacando o papel das cidades
estudadas na rede urbana brasileira é a Tipologia das Cidades Brasileiras (BITOUN;
MIRANDA, 2009). De acordo com a metodologia adotada foram definidos 19 tipos de
municípios,
sendo os quatro primeiros compostos por cidades com mais de 100 mil habitantes
e aglomerações urbanas (que incluem as regiões metropolitanas oficiais), nove
tipos de cidades entre 20 e 100 mil habitantes e seis tipos de cidades com menos
de 20 mil habitantes (BITOUN; MIRANDA, 2009, p.130).
213
[...] uma que parte dos territórios, enfatizando a diversidade e as densidades
econômicas que os caracterizam, mensurados por meio do estoque de riquezas
acumuladas e da dinâmica da criação de novas riquezas; e outra que parte da
análise da rede de cidades e de sua capacidade de estruturar o território em
regiões polarizadas (FERNANDES, 2009, p.80).
214
produção que acaba por reforçar a especificidade dos lugares, uma vez que “os modos de
produção tornam-se concretos sobre uma base territorial historicamente determinada”
(SANTOS, 1977, p.87), caracterizando, assim, diferentes formações socioespaciais.
Na compreensão das cidades médias brasileiras em si e dos processos que nelas se
manifestam, duas dimensões articulam-se e são relevantes na análise: a primeira refere-se
às condições gerais do desenvolvimento capitalista no país, e a segunda, diz respeito aos
“[...] desdobramentos, evoluções, continuidades e rupturas daqueles processos presentes na
origem da cidade” (MELAZZO, 2012, p.273)
Considerando as formações socioespaciais onde se inserem as cidades de Marília e
Mossoró, apresentamos na seção seguinte algumas características das formações nas quais
estão inseridas as duas cidades, indicando elementos que contribuem para a compreensão
das particularidades no contexto mais amplo de transformações.
215
açucareira, e à emergência de outras atividades agropecuárias – o cultivo do algodão e a
pecuária extensiva –, tornando-se importante entreposto comercial em meados do século
XIX92. Enquanto isso, a origem de Marília está associada à expansão da economia cafeeira
e à ocupação e comercialização de terras no Oeste paulista, em fins do século XIX e início
do século XX.
Uma primeira diferença relaciona-se às bases econômicas regionais e à natureza e
origem do capital. Ao discorrer sobre as condições de formação das classes dirigentes da
economia açucareira e cafeeira, Furtado (2005) assinala diferenças entre elas: na primeira,
dominava uma mentalidade ruralista, mantida por uma classe que não tinha uma
consciência clara de seus próprios interesses, uma vez que apenas cumpriam decisões
tomadas por monopólios comerciais portugueses ou holandeses sem nenhum domínio sobre
o conjunto da economia açucareira, já que a produção e a comercialização funcionavam
isoladamente. Como destaca Furtado (2005, p.117), com o tempo esta classe dirigente foi
92
Importante destacar que o surgimento de Mossoró não se insere diretamente no contexto da economia
canavieira, sendo um espaço complementar e periférico. Mas ela tem origem com o aparecimento de outras
atividades, como a algodoeira e a pecuária extensiva, no contexto de declínio da cana-de-açúcar, adquirindo
assim algumas características desta economia regional, associadas às classes dirigentes, à origem dos capitais,
questões fundiárias, tipo de mão-de-obra etc.
216
E sim que hajam utilizado esse controle para alcançar objetivos perfeitamente definidos de
uma política” (FURTADO, 2005, p.118).
Outros aspectos pertinentes às economias regionais estão associados a questões
fundiárias, ao tipo de mão de obra, aos sistemas técnicos de produção e à origem e os
fluxos de inversões.
Além de ser uma atividade cujo grau de capitalização é muito alto (importação de
maquinário, de materiais de construção, de mão de obra escrava, compra de gado para
tração, lenha para as fornalhas etc.), a economia açucareira necessitava de grandes
latifúndios (que se expandiam territorialmente ao longo do litoral, porém não tinham suas
estruturas alteradas), controlados por poucos senhores de engenho. A base num regime
escravocrata – indígena e africano – conferia a esta economia importantes elementos para o
processo de formação da renda e de acumulação de capital, ampliando ainda mais a
produtividade e as margens de capitalização do sistema. No entanto, os lucros gerados
mantinham-se concentrados nas mãos dos “empresários”, cujos gastos eram intensivos nas
importações de artigos de luxo, e mínimos em mudanças estruturais no próprio sistema e na
colônia, comprometendo a possibilidade efetiva de expansão e de evolução estrutural da
atividade açucareira (FURTADO, 2005). O referido autor aponta fatores limitadores da
capacidade de autofinanciamento na expansão da atividade, sendo um deles as formas de
investimento dos recursos financeiros, argumentando:
[...] que não eram utilizados dentro da colônia, onde a atividade econômica não-
açucareira absorvia ínfimos capitais. Tampouco consta que os senhores de
engenho invertessem capitais em outras regiões. A explicação mais plausível para
esse fato talvez seja que parte substancial dos capitais aplicados na produção
açucareira pertencesse aos comerciantes. Sendo assim, uma parte da renda, que
antes atribuímos à classe de proprietários de engenhos e de canaviais, seria o que
modernamente se chama renda de não-residentes, e permanecia fora da colônia
(FURTADO, 2005, p.54).
217
de obra escrava93 (da região da antiga mineração, sobretudo em sua gestação), produção
para exportação etc..
Além disso, a atividade mantinha um baixo grau de capitalização, aproveitando-se
de recursos preexistentes e subutilizados, cujas necessidades de reposição eram menores,
mais simples e em sua maioria, de fabricação local (diferentemente da atividade açucareira,
a qual necessitava de grandes montantes investidos nas importações) (FURTADO, 2005).
Outro fator que contribuiu para o desenvolvimento da cafeicultura foi a transição
de um regime de trabalho escravo para o trabalho assalariado. Com a eliminação do
trabalho escravo e a intensificação dos fluxos migratórios, dentro e fora do país
(principalmente de imigrantes europeus) alargou-se a oferta de mão de obra e o consumo no
mercado interno foi impulsionado. Simultaneamente, alavancou-se o mercado externo com
a exportação do café, acompanhado de políticas de valorização do produto, como o
convênio de Taubaté em 190694.
Portanto, verifica-se que a economia cafeeira contou com diversos fatores
favoráveis à sua expansão, num momento em que o Brasil passava por uma transição
capitalista, com a abertura comercial e financeira no início do século XX e com a passagem
de um país agrário-exportador para um país urbano-industrial, representando um novo
papel na divisão internacional do trabalho. Diante disto, Sposito (2004, p.435) afirma que a
formação socioespacial paulista
93
Para mais informações sobre diferentes consequências da eliminação da mão de obra escrava na economia
açucareira e cafeeira, ver o capítulo O problema da mão-de-obra IV: eliminação do trabalho escravo
(FURTADO, 2005).
94
Para mais informações ver Sposito (2004) e Furtado (2005).
218
De acordo com a autora, este era “[...] mais um componente do fortalecimento dos
papéis desempenhados pelas cidades na nova divisão territorial do trabalho” (SPOSITO,
2004, p.423), papéis estes que reforçaram a importância de Marília e Mossoró em suas
regiões de influência. Em Marília e Mossoró as primeiras casas bancárias datam da
primeira metade do século XX: em Mossoró, o Banco do Brasil no ano de 1918, o Banco
de Mossoró S.A.95, em 1937, o Banco do Nordeste, em 1958, entre outros (FELIPE, 1982);
e em Marília, a Casa Bancária Almeida96, em 1934, que na década seguinte transformou-se
no Branco Brasileiro de Descontos – BRADESCO (MELAZZO, 2012).
Por fim, e não menos importante, outro elemento que ajudou na comparação entre
as duas formações socioespaciais, a partir de aproximações e distinções, são os sistemas de
integração territorial, dos quais destacamos a ferrovia.
Desde o princípio, a construção da ferrovia em Mossoró foi sinônimo de progresso
e esteve diretamente associada a questões econômicas, para o escoamento de mercadorias
da indústria do sal, do algodão e de outros produtos. Prova disto é que a primeira tentativa
de construção de uma estrada de ferro na cidade97, em meados do século XIX, partiu de um
comerciante, o suíço Jonh Ulrich Graff98.
Em busca do desenvolvimento econômico, juntamente com outros integrantes de
uma elite mossoroense, ele adotou um discurso político que atribuía a construção da
95
Este banco era de capital local (FELIPE, 1982).
96
“[...] voltada inicialmente ao financiamento da produção agrícola local/regional” (MELAZZO, 2012,
p.173).
97
A estrada de ferro partiria do Porto Franco até o rio São Francisco.
98
Maciel (2012, p. 11) afirma que “Muitas concessões para a construção de uma estrada de ferro, partindo da
cidade de Mossoró ao interior do Norte/Nordeste não passaram de utopias modernas. Mas mesmos esses
sonhos e desejos foram concebidos no início de 1870. Nesse ano, Luiz José da Silva e João Carlos
Greenhalgly possuíram uma concessão para uma ferrovia partindo de Areia Branca (porto) a cidade de
Mossoró. Dois anos depois, foi a vês de João Pedro de Almeida, do qual a estrada sairia de Mossoró à cidade
de Souza (Paraíba), próximo a ribeira do rio do Peixe. Em 1875/76 viria à concessão imperial ao suíço João
Ulrich Graf, representando posteriormente o grande sonho e ideal dessa estrada por setores da elite
mossoroense. Nos anos finais do Império (1888/89) um plano foi criado pelo engenheiro João Chrockatt de Sá
com o destino final da ferrovia nas margens do rio São Francisco. Ocorreram ainda, os projetos de “Francisco
Sólon (1889-1911), o de João Pereira da Silva Monteiro, Francisco Lopes Ferraz Sobrinho e Augusto Severo
de Albuquerque Maranhão” para construção de uma estrada saindo de Areia Branca até Luiz Gomes (Decreto
Estadual nº 51 de 22 de setembro de 1890) que acabou sendo esquecida. No início dos novecentos (1903), ano
de seca no Estado do Rio Grande do Norte, novamente o engenheiro Chrockatt de Sá, juntamente com Pereira
de Castro e Mateus Nogueira Brandão, pediram concessão para a construção de uma estrada que “partindo do
porto de Mossoró e com uma dupla opção de itinerário, um buscando Cajazeiras na Paraíba, outro, Pajeú de
Flores em Pernambuco. Igualmente não foi adiante” (GUERRA, 1996: 15)”. GUERRA, Otto. A Verdadeira
Transnordestina. Coleção Mossoroense, Série “A”, nº 87, 1996.
219
ferrovia à chegada do progresso, e ademais, seria a solução de um problema natural pelo
qual a cidade passara diversas vezes por sua posição geográfica: a seca.
Assim, o discurso político modernizador da economia se justificou por meio de um
caráter social, e conforme afirma Lima (2011, p.56), desvirtuou “[...] a ferrovia de sua
finalidade econômica, para associá-la como uma obra de socorros contra as asperezas da
seca”, o que manteria a população imigrante oriunda de regiões castigadas pela seca
ocupada na construção da ferrovia. Em março de 1915 o primeiro trecho da ferrovia foi
inaugurado, e paradoxalmente, em tempos de abundância de chuvas99, foi concluída
somente na década de 1950, tendo seu ponto final na cidade de Souza, na Paraíba.
Também atrelada a interesses econômicos privados associados a interesses
fundiários (comercialização de terras), a ferrovia chegou à Marília no início do século XX,
em 1928, durante o movimento de expansão e consolidação da economia cafeeira no Oeste
paulista. Conforme destaca Zandonadi (2008, p.39)
[...] a região da Alta Paulista e a cidade de Marília tiveram sua ocupação inicial
profundamente influenciada pelas atividades econômicas preponderantes no
período, tais como, a expansão da cultura do café e a comercialização das terras
“virgens” do Oeste Paulista. O avanço da lavoura cafeeira, assim como a
intensificação da comercialização das terras, impulsionaram a chegada da
ferrovia, o que acentuou ainda mais a ocupação, o crescimento e o
desenvolvimento econômico da região.
99
Para mais informações ver Lima (2011).
220
concentravam ao longo da via férrea. Todavia, em favorecimento ao transporte rodoviário e
à indústria automobilística no Brasil, com o sucateamento das ferrovias, ela foi perdendo
espaço até ser desativada nos anos de 1980. O pequeno trecho que segue 100 relata um pouco
este processo.
100
Texto extraído de blog mossoroense “Blog do Gemaia”. Autor desconhecido. Acesso em: 19/3/14.
Disponível em: http://www.blogdogemaia.com/geral.php?id=146&#t.
221
de que as desigualdades regionais sempre foram muito presentes no Brasil, do ponto de
vista econômico, social, político, urbano. Oliveira (1981, p.28) enfatiza estas diferenças
afirmando que
4. Considerações finais
Acreditamos que o estudo da situação geográfica das duas cidades na rede urbana
e as suas inserções em formações socioespaciais distintas – as quais reúnem condições
concretas diversas para a materialização dos processos gerais, sejam condições do passado
ou produzidas pelas transformações recentes – nos ajuda a apreender as particularidades de
101
De acordo com os estudos de Oliveira (1981, p.29), uma “região” seria “[...] o espaço onde se imbricam
dialeticamente uma forma especial de reprodução do capital, e por consequência uma forma especial de luta
de classes, onde o econômico e o político se fusionam e assumem uma forma especial de aparecer no produto
social e nos pressupostos da reposição”.
222
cada uma delas, explicando determinados processos e dinâmicas que ali ocorrem, como por
exemplo, a expansão do consumo e os padrões recentes de produção da cidade,
combinando fatores políticos, econômicos e espaciais que se expressam de modos
diferentes.
Esta expressão das particularidades é percebida, por exemplo, no grau de
polarização e de inserção na rede urbana: considerando a posição geográfica de Mossoró
entre duas capitais nordestinas, a 277 km de Natal – RN e a 260 km de Fortaleza – CE, e
numa rede urbana dispersa, onde muitos centros locais estão sob sua influência direta, nota-
se que Mossoró aparece como a segunda cidade mais importante do Rio Grande no Norte,
sendo seu Produto Interno Bruto (PIB) municipal inferior apenas ao da capital potiguar.
Já Marília localiza-se numa rede urbana bastante densa, composta por importantes
centros urbanos num raio aproximado de 200 quilômetros, cujas dinâmicas populacionais e
econômicas são relevantes no nível da região e do Estado de São Paulo. Em contrapartida,
esta posição na rede urbana paulista não tem o mesmo peso que o da cidade de Mossoró na
rede urbana potiguar e até mesmo nordestina, pois embora o município de Marília apresente
um destaque na sua região de influência direta, não há uma forte concentração econômica
ou populacional, diluída numa rede urbana muito mais complexa, como a paulista.
Reforçamos que, para além da posição na rede urbana, a situação geográfica destas
duas cidades é ainda mais reveladora no sentido de compreender suas particularidades, pois
envolve questões que vão desde o sítio urbano às interações espaciais interescalares
estabelecidas no âmbito das redes urbanas, no que tange à produção e ao consumo.
Tão importante quanto, é analisar o processo histórico de produção do espaço
urbano destas duas cidades em seus contextos regionais, observando elementos recentes
que tornam este processo mais complexo diante da incorporação de estratégias
diferenciadas e desiguais de valorização dos espaços, paralelamente à adoção de lógicas
financeiras determinadas por interesses fundiários e imobiliários.
É necessário também analisar o conjunto de forças em múltiplas escalas que se
combinam de modos diferentes em cada cidade, ou seja, em suas particularidades, pela
atuação de agentes econômicos diversos que se instalam ali e alteram a dinâmica da
produção e do consumo, reestruturando as cidades do ponto de vista social e espacial.
223
O esforço de realizar uma análise comparativa entre Marília e Mossoró possibilita
a compreensão de um conjunto de determinações que, em diferentes condições históricas e
socioespaciais, caracterizam redes urbanas complexas, conferindo pontos de partida
diferentes e heterogêneos ao processo de reestruturação urbana e de reestruturação das
cidades médias brasileiras. De modo a contribuir para os estudos realizados pela Rede de
Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), apontamos caminhos possíveis de se
entender o momento atual pelo qual passam estas cidades, sem perder de vista a
complexidade e a abrangência espacial dos processos.
5. Referências bibliográficas
224
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 32. Ed. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 2005.
LIMA, Alysson Paulo Holanda. Estrada de ferro em Mossoró: uma historia singular no
sertão do Rio Grande do Norte. In: Revista Sertões, Mossoró-RN, v.1, n.2, p.53-67,
jul./dez/, 2011.
OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste. Planejamento
e conflitos de classes. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
SANTOS, Milton. Sociedade e Espaço: Formação Espacial como Teoria e como Método.
Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, n. 54, p. 81-99, jun. 1977.
______. Cidades médias: reestruturação das cidades e reestruturação urbana. In: ______
(org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
p.233-253.
225
El ROL DE LAS CIUDADES INTERMEDIAS EN LA DINÁMICA DEL
SISTEMA URBANO DE LA PROVINCIA DE ENTRE RÍOS ENTRE
1947 Y 2010
Gustavo Peretti
Mariano Varisco
Mariela Demarchi
Pablo Donadío
RESUMEN
226
1.INTRODUCCIÓN
La provincia de Entre Ríos, comparte junto a otras jurisdicciones pampeanas la
impronta que dejó la migración transoceánica de mediados de siglo XIX y principios del
XX. La política activa de colonización atrajo a numerosos colonos y artesanos europeos y a
nativos de otras provincias, constituyendo el período de 1820 a 1870 el más dinámico en
cuanto al crecimiento de la población de Entre Ríos (Carbonetti y otros, 2012).
En las primeras décadas del siglo XX el crecimiento poblacional comienza a
lentificarse, hasta alcanzar saldos migratorios negativos muy notorios entre 1947 y 1970. A
partir de esta fecha se produce una recuperación en el ritmo de crecimiento, aunque a
niveles moderados cercanos al 1% anual, acompañado de un cambio en el tipo de
asentamiento poblacional que se plasma a través de un incremento de la población urbana
en detrimento de la rural. Este cambio cobra importancia, según lo planteado por Graciela
Mera (2001), a la luz de los nuevos parámetros que adquiere en las últimas décadas las
formas de distribución, siendo protagonista los espacios urbanos quienes experimentan
importantes transformaciones socio-territoriales. En el marco de procesos vinculados a la
globalización de la economía, la sociedad y la cultura, y a la emergencia de nuevas
modalidades de producción y organización capitalista, se manifiesta una redefinición de las
estructuras y dinámicas urbanas: el desarrollo de nuevas desigualdades territoriales, formas
espaciales discontinuas, y una preeminencia de las especificidades y microdiferencias
territoriales por sobre las grandes continuidades, homogeneidades y macrodiferencias que
solían primar en el pasado.
A los efectos de analizar si dicha dinámica poblacional presenta divergencias al interior
del territorio provincial, se agrupan a las unidades políticas departamentales en cuatro áreas
según lo establece el Instituto Nacional de Estadísticas y Censos de Argentina: Costa Oeste,
Costa Este, Costa Sur y Área Central.
De cada una de las áreas predichas se analiza para el período comprendido entre los
años 1960 y 2010: a) el ritmo de crecimiento poblacional, b) la representatividad de cada
área en el total poblacional provincial, c) la evolución de la cantidad y de la magnitud de las
localidades urbanas ubicadas en las mismas.
Las características y los cambios suscitados en sistema urbano de Entre Ríos serán
analizados a la luz de lo acaecido en el sistema urbano nacional. En este sentido, varios
estudios dan cuenta que durante la segunda mitad del siglo XX el sistema de asentamiento
experimentó algunas transformaciones, dadas estas por una disminución de la macrocefalia
urbana aunque con mantenimiento de la primacía (Vapñarsky, C. y Gorojovsky, N.:1990;
Vapñarsky, C.:1995; Erbiti, C.: 1996; Lindemboim, J. y Kennedy, D.: 2003). Es decir, a
227
pesar que la diferencia en la magnitud poblacional de la aglomeración Buenos Aires en
relación a la segunda ciudad continúa manteniéndose, su ritmo de crecimiento fue inferior
al experimentado por el resto de las localidades del sistema urbano. Las localidades más
dinámicas están representadas por las denominadas “aglomeraciones de tamaño
intermedio” –ATIs- (Vapñarsky, C.:1995). Desde el punto de vista cuantitativo la
definición de ciudades intermedias varían según los países para su consideración,
dependiendo en la mayoría de los casos de la robustez de la red de localidades lo que
refiere tanto y a la magnitud poblacional de las mismas. En este sentido, para el caso
argentino Cecilia Erbiti (1996) clasifica a las localidades en base a umbrales poblacionales
de la siguiente manera: a) Pueblos grandes (2.000 a 19.999 habitantes), b) Ciudades
pequeñas (20.000 a 49.999 habitantes), c) ATIs menores (50.000 a 399.999 habitantes), d)
ATIs mayores (400.000 a 999.999 habitantes), e) Aglomeraciones de más de 1.000.000
habitantes (con la sola presencia de la aglomeración Buenos Aires, Gran Córdoba y Gran
Rosario. Por otra parte, César Vapñarsky (1995) propone la siguiente clasificación: a)
Pequeñas aglomeraciones de tamaño intermedios(50.000 a 500.000 habitantes), b) Grandes
aglomeraciones de tamaño intermedio (más de 500.000 habitantes exceptuando a la
aglomeración Buenos Aires), c) Aglomeración Buenos Aires.
Los autores acuerdan al analizar la dinámica del sistema urbano argentino, que durante
la segunda mitad del siglo XX el mayor ritmo de crecimiento demográfico lo experimentan
las localidades que se ubican entre los 50.000 y 500.000 habitantes. A su vez, César
Vapñarsky (1995) puntualiza que en el conjunto de estas localidades son las que se
localizan en provincias extra-pampeanas las que presentan mayor protagonismo.
En este marco de análisis se focalizará la atención en los cambios y continuidades que
se dan al interior de un Estado provincial –Entre Ríos-. Cabe aclarar que las localidades
más importantes del sistema urbano entrerriano -Paraná, Concordia, Gualeguaychú y
Concepción del Uruguay- son consideradas en el contexto nacional por los autores
mencionados como “ciudades de tamaño intermedio menores o pequeñas”.
La categoría de ciudades intermedias distingue desde lo demográfico una franja de
asentamientos, y así mismo facilita una entrada para el análisis del comportamiento del
sistema urbano. En el marco de nuevos contextos que incentivan las relaciones económicas
globalizadas, la retirada de los Estados centrales de ciertos roles y la difusión de las
denominadas tecnologías de la información y comunicación, entre otros aspectos, las
ciudades intermedias son convocadas como importantes actores en las estrategias de
desarrollo (Michelini y Davies: 2009).
229
Cuadro 1. Evolución de la población de la Provincia de Entre Ríos. Período 1797/2010.
Año Población Fuente
1797 11700 Félix de Azara
1820 20056 Censo Provincial
1849 47736 Censo Provincial
1857 79284 Censo Conferal
1860 92746 Censo Provincial
1869 134271 Censo Nacional
1895 292019 Censo Nacional
1914 425373 Censo Nacional
1947 787362 Censo Nacional
1960 805357 Censo Nacional
1970 811691 Censo Nacional
1980 908313 Censo Nacional
1991 1020257 Censo Nacional
2001 1158147 Censo Nacional
2010 1236300 Censo Nacional
Fuente: Elaboración propia en base a datos del Censo de Félix de Azara, Censos Provinciales y Nacionales.
Fuente: Elaboración propia en base a datos del Censo de Félix de Azara, Censos Provinciales y Nacionales.
.
2.1- Dinámica demográfica según áreas
Con el propósito de analizar si la dinámica poblacional presenta divergencias al interior
del territorio provincial, se procede a agrupar las unidades políticas departamentales en
230
cuatro áreas según lo establece el Instituto Nacional de Estadísticas y Censos: a) Costa
Oeste, b) Costa Este, c) Costa Sur y d) Área Central (Cuadro 2 y Mapa 1).
Las áreas establecidas presentan similitud en cuanto a su extensión territorial, hecho
que no se vislumbra en los montos poblacionales, lo que ocasiona diferencias notorias en
las densidades de población. Con valores que se ubican en densidades de menos de 10
hab./km2 se encuentra el “Área Central” y la “Costa Sur”; por el contrario, las “costas este
y oeste”, presentan cifras que superan los 20 hab./km2. La alta densidad de la “Costa
Oeste” se explica en mayor medida por la presencia de la ciudad capital de la provincia –
Paraná-; en cambio, los valores de la “Costa Este” tienen su justificación en la existencia de
un rosario de ciudades medianas ubicadas sobre la ribera del río Uruguay, entre las que se
pueden mencionar en orden decreciente de importancia de magnitud demográfica a:
Concordia, Gualeguaychú, Concepción del Uruguay, Chajarí, Colón y Federación.
231
Concordia
Colón
Costa Este Federación 493249 24227 20,3
Gualeguaychú
San Salvador
Uruguay
Gualeguay
Costa Sur Islas del Ibicuy 84245 18500 4,5
Victoria
Federal
Feliciano
Central Nogoyá 152787 21806 7
Tala
Villaguay
Fuente: Elaboración propia
232
3.1- La localidad como elemento constitutivo del sistema urbano: algunas
consideraciones teóricas y metodológicas.
En el análisis del sistema urbano de Entre Ríos se consideran como unidades de
análisis a las localidades que superan los 2.000 habitantes según el censo 2010, es decir a
los centros urbanos. Estimamos conveniente realizar, antes de avanzar con la
caracterización de los cambios y continuidades acaecidos en el sistema urbano entrerriano,
algunas consideraciones teóricas y metodológicas. En este sentido, cabe mencionar que
desde que se efectuó en la Argentina el primer censo nacional de población, la definición de
“localidad” parte de un mismo criterio, el criterio físico, para referirse a la unidad espacial
que pretende captar. Según este criterio, una localidad es una porción de la superficie de la
tierra con edificación compacta interconectada por una red de calles. En la Argentina, a tal
unidad espacial de alcance local se la suele denominar “poblado” si es pequeña, “pueblo” si
no lo es tanto, o “ciudad” si es grande (INDEC, 1998).
Por vaga que sea la imagen que se forma en quien recorre en persona u observa
desde la altura un poblado, pueblo o ciudad, algo le es inherente: en la imagen no cuentan
los límites político-administrativos. Tampoco en el criterio subyacente a todos los censos
argentinos para definir “localidad” (Peretti, G.; Varisco, M.: 2013). En los dos primeros
censos -1869 y 1895- dicho criterio está explícito, en los cuales de denomina “centro
poblado” a una localidad y se caracteriza como “urbana” a la población de cualquier
“centro poblado” por pequeño que fuera. El criterio se mantiene en el censo de 1914,
aunque se introduce, y mantiene hasta la actualidad, el umbral mínimo de los 2.000
habitantes para que un centro poblado sea considerado como “urbano”. A partir del censo
de 1960 se produce un cambio terminológico, al reemplazar la denominación “centro
poblado” por el de “localidad”.
Si bien el criterio de definición de “localidad es el mismo en rasgos generales en
todos los censos, no implica necesariamente que su definición haya sido siempre precisa y
su aplicación uniforme.
En los censos de 1869 y 1895 se pretende registrar hasta el más insignificante de los
“centros poblados” aunque con resultados diferentes según las provincias, como por
ejemplo, en la nómina del censo de 1895 la población de todos los centros poblados de un
mismo partido de la provincia de Buenos Aires es asignada a un solo centro poblado, al
único que figuraba en la nómina: la “cabecera”. En la nómina de 1914, se omiten los
centros poblados por debajo del umbral de 2.000 habitantes. En la nómina del censo de
1947 se retoma la práctica de incluir a todos los “centros poblados”, aunque no alcanzaran
los 2.000 habitantes. La misma definición, ya no de “centro poblado” sino de “localidad”,
se mantiene en el censo de 1960. En la nómina de 1960 aparecen muchas incongruencias
siendo la más deficiente de todos los censos argentinos. Cientos de lugares allí registrados
como localidades responden al criterio físico de definición, pero otros responden al criterio
jurídico, y otros aún a ningún criterio de definición reconocible. En los censos de 1970 y de
1980 se registran solo las localidades que superan los 1.000 habitantes.
233
Es por este motivo que con el propósito de tratar de minimizar dichos
inconvenientes y permitir la comparabilidad, se analiza en este trabajo la evolución de la
magnitud poblacional del sistema urbano considerando solo a las localidades que superan
en el año 2010los 2.000 habitantes.
Cuadro 3. Población total de las localidades de más de 2000 habitantes según áreas.
Período 1960/10.
1960 1970 1980 1991 2001 2010
Centro 48522 58898 72557 88957 107154 116858
Este 165078 206106 260510 332063 401069 447724
Oeste 164880 199895 250398 320132 379078 408545
Sur 37441 43224 49905 60104 71562 80391
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991, 2001 y 2010.
Cuadro 4.Población total de las localidades de más de 2000 habitantes según áreas.
Período 1960/10 (%).
1960 1970 1980 1991 2001 2010
Centro 11,7 11,6 11,5 11,1 11,2 11,1
Este 39,7 40,6 41,1 41,4 41,8 42,5
Oeste 39,6 39,3 39,5 40,0 39,5 38,8
Sur 9,0 8,5 7,9 7,5 7,5 7,6
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991, 2001 y 2010.
234
Este 2,21 2,31 2,19 1,88 1,22
Oeste 1,93 2,24 2,22 1,69 0,83
Sur 1,43 1,43 1,68 1,74 1,29
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991, 2001 y 2010.
235
Sub-total 230.554 279.957 351.297 450.563 525.879 565.922
Cohorte II. Localidades de 10.000 a 50.000 habitantes
Gualeguay 16.542 20.401 24.883 30.389 35.963 40.507
Villaguay 12.463 15.591 18.699 23.546 29.103 32.881
Chajarí 9.075 10.720 15.242 20.816 28.303 32.734
Victoria 15.108 17.046 18.883 22.931 27.812 30.623
La Paz 11.028 12.299 14.920 16.577 22.722 24.307
Colón 6.813 10.122 11.648 15.623 19.288 23.150
Nogoyá 10.911 12.877 15.862 18.831 21.339 22.824
Crespo 5.706 7.615 10.668 13.584 17.465 19.536
Diamante 10.948 12.686 13.464 15.842 18.285 19.142
Santa Elena 8.174 11.525 14.655 17.065 17.658 17.791
Federación 4.247 4.876 7.259 9.073 12.260 16.658
San José 2.188 4.046 6.800 10.535 13.406 16.336
Federal 5.256 6.977 9.222 11.244 14.478 16.075
Rosario del Tala 7.350 8.005 9.552 11.530 12.747 12.801
San Salvador 2.108 4.529 4.342 6.025 11.237 12.733
San José de Feliciano 3.721 3.884 4.986 6.478 8.958 10.282
Villa Elisa 2.715 3.227 4.106 6.108 8.351 10.266
Sub-total 134.353 166.426 205.191 256.197 319.375 358.646
Cohorte III. Localidades de 5.000 a 10.000 habitantes
Basavilbaso 6.614 7.338 7.657 8.421 9.005 9.485
Viale 3.873 4.411 5.635 6.972 7.638 9.383
General Ramírez 3.203 4.439 5.393 6.676 8.181 8.868
Urdinarrain 3.484 4.577 5.472 6.580 7.525 8.580
Bovril 1.955 2.988 4.735 5.957 7.608 8.577
María Grande 2.819 3.431 4.517 5.679 6.873 7.557
Villa Libertador San
809 1.863 3.008 3.808 5.015 6.312
Martín
Larroque 1.993 2.138 3.138 4.696 5.435 6.180
Maciá 2.674 2.015 3.482 4.347 5.260 5.870
Hernandarias 2.788 2.735 3.002 3.588 4.604 5.373
Cerrito 1.147 1.307 2.084 3.189 4.365 5.310
Sub-total 31.359 37.242 48.123 59.913 71.509 81.495
Cohorte IV. Localidades de 2.000 a 5.000 habitantes
Hasenkamp 1.789 1.950 2.804 3.317 4.214 4.805
General Galarza 2.435 2.704 3.057 3.404 3.964 4.741
Ibicuy 3.356 3.073 3.082 3.380 3.823 4.520
Lucas González 1.145 3.085 3.015 3.790 4.207 4.364
San Jaime de la
1.997 2.517 2.811 3.189 3.817 4.143
Frontera
Seguí 2.161 2.232 2.586 3.049 3.398 3.695
Los Charrúas 933 594 1.226 1.842 2.581 3.306
General Campos 1.400 1.475 1.877 2.227 2.810 2.994
Sauce de Luna 501 1.161 1.655 2.174 2.806 2.845
236
Villa Clara 1.557 1.736 1.860 2.236 2.627 2.726
Villa del Rosario 505 700 1003 1490 2289 2.720
Pueblo Arrúa (Est.
376 1.518 1.465 1.774 2.115 2.410
Alcaraz)
Aldea Valle María 553 703 905 1.119 1.627 2.149
Gobernador Mansilla 947 1050 1.413 1.592 1.812 2.046
Sub-total 19.655 24.498 28.759 34.583 42.090 47.464
Total 415.921 508.123 633.370 801.256 958.853 1.053.527
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991, 2001 y 2010.
237
distribución de las localidades, donde la más populosa se ubica en la “Costa Oeste” y las
tres que le siguen en importancia en el “Este” (Cuadro 11).
El índice macrocefalia refuerza además las características de desconcentración del
sistema urbano, ya que el Gran Paraná concentra solo un tercio de la población total de las
localidades consideradas, situación que se mantiene entre 1960 y 2010 (Cuadro 12). Dicha
desconcentración se acentúa además en el último período intercenso -2001/10-, al
descender los dos índices trabajados (Cuadros 11 y 12 y Figura 4), situación que se explica
por formar parte el Gran Paraná de la cohorte poblacional que exhibe el ritmo de
crecimiento más bajo durante los últimos años.
Cuadro 8. Población total por cohortes poblacionales (en miles) de las localidades de más
de 2000 habitantes según cohortes poblacionales. Período 1960/01.
1960 1970 1980 1991 2001 2010
Cohorte I 230 280 351 450 526 566
Cohorte II 134 166 205 256 319 359
Cohorte III 31 37 48 60 71 81
Cohorte IV 20 24 29 35 42 47
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991 y 2001.
Cuadro 9. Población total por cohortes poblacionales de las localidades de más de 2000
habitantes según cohortes poblacionales (%). Período 1960/01.
1960 1970 1980 1991 2001 2010
Cohorte I 55,4 55,1 55,5 56,2 54,8 53,7
Cohorte II 32,3 32,8 32,4 32,0 33,3 34,0
Cohorte III 7,5 7,3 7,6 7,5 7,5 7,7
Cohorte IV 4,7 4,8 4,5 4,3 4,4 4,5
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991 y 2001.
Cuadro 10. Ritmo de crecimiento de las localidades de más de 2000 habitantes según
cohortes poblacionales. Período 1960/10.
1960/ 1970 1980 1991 2001
70 /80 /91 /01 /10
Cohorte I 1,96 2,28 2,24 1,54 0,81
Cohorte II 2,10 2,10 2,00 2,19 1,29
Cohorte III 1,72 2,56 1,98 1,76 1,46
Cohorte IV 2,18 1,62 1,67 1,96 1,34
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991 y 2001.
238
2.Concordia 57 72 94 118 138 149
3.Gualeguaychú-
30 41 51 65 75 81
Pblo.Gral.Belgrano
4.C. del Uruguay 36 39 46 56 65 72
Total 2+3+4 123 152 191 239 278 302
Indice de primacía 0,87 0,84 0,84 0,89 0,89 0,87
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1960, 1970,
1980, 1991 y 2001.
0,8
0,7
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
1960 1970 1980 1991 2001 2010
Fuente: Elaboración propia en base a datos de los Censos Nacionales de Población y Vivienda de 1869, 1895,
1914, 1947, 1960, 1970, 1980, 1991, 2001 y 2010.
Conclusiones
La dinámica demográfica de la provincia de Entre Ríos se caracteriza por presentar un
elevado crecimiento poblacional durante el período 1820/1870 en coincidencia, en la mayor
parte del mismo, con la política migratoria fomentada por las autoridades provinciales y los
gobiernos nacionales de la segunda mitad del siglo XIX. Luego desde los inicios del siglo
XX, el ritmo de crecimiento demográfico experimenta una disminución notoria, aunque con
239
diferencias importantes al interior del territorio provincial, produciendo una disminución en
valores absolutos en la zona central y sureña.
En cuanto al sistema urbano entrerriano presenta una forma equilibrada, en sentido
contrario a las características del sistema urbano nacional, ya que el Gran Paraná no logra
alcanzar a lo largo de todo el período considerado -1960/10- a la población que totalizan
Concordia, Gualeguaychú-Pueblo Gral. Belgrano y Concepción del Uruguay. Dicho
equilibrio se evidencia además en la distribución de las localidades, donde la localidad más
populosa se asienta en el área “Oeste” y las tres que le siguen en importancia en el “este”
provincial. Por otra parte, se produce un tenue pero sostenido incremento de las localidades
ubicas en sobre la ribera uruguaya.
Por otra parte se puede constatar la relevancia que adquieren las denominadas en el
plano nacional “pequeñas ciudades de tamaño intermedio” en la estructuración del sistema
urbano entrerriano. En el contexto provincia (entrerriano), estas se presentas como las más
pobladas. La suma poblacional de las mismas –Gran Paraná, Concordia, Gualeguaychú-
Pueblo Belgrano y Concepción del Uruguay- concentran durante todo el período analizado
concentran más de la mitad de la población total del sistema urbano provincial. La otra
mitad se asienta mayoritariamente en las localidades de 10.000 a 50.000 habitantes.
Bibliografía
Almará, Juan Luis; Maranzana de Almará, María Viviana (1997) Entre Ríos a
partir de un análisis de las Ciencias Sociales. Paraná, Entre Ríos.
Almará, José Antonio (1989) Historia de 10 pueblos entrerrianos. Banco de Entre
Ríos. Paraná, Entre Ríos.
Carbonetti, Adrián y otros (2012) Dinámica y diferenciación interna de la estructura
demográfica de la Región Centro. Revista Nordeste Nro. 26. Serie Investigación y
Ensayos. Segunda Epoca. Revista de la Facultad de Humanidades de la Universidad
Nacional del Nordeste. Resistencia.
Erbiti, Cecilia (1996) Transformaciones del sistema urbano argentino a fines del
siglo XX: desafíos para la gestión del territorio. Centro de Estudios Sociales de
América Latina (CESAL). Universidad Nacional del Centro de la Provincia de
Buenos Aires. Tandil.
INDEC (1998) El concepto de localidad: definición, estudios de caso y fundamentos
teóricos metodológicos. Censo Nacional de Población y Vivienda 1991, Serie D,
Nro. 4. Buenos Aires.
Marcos, Mariana (2010) Distribución espacial de la población: conceptos y medida.
Serie Materiales Didácticos, Documento Nro. 20. Cátedra Demografía Social.
Universidad de Buenos Aires. Buenos Aires.
Mazzeo, Victoria (1995) Dinámica demográfica de Argentina en el período 1947-
1991. Análisis de sus componentes y diferenciales. II Jornadas Argentina de
Estudios de la Población. Buenos Aires.
Mera, Gabriela; Marcos, Mariana (2001) La distribución de la población urbana:
alcances y limitaciones de datos censales e indicadores cuantitativos. Proyecto
UBACYT “Dos dimensiones de la Argentina migratoria contemporánea:
240
inmigrantes mercosureños y emigrantes argentinos. Aspectos demográficos,
políticos y sociales”. Directoral: Susana Novick. Buenos Aires.
Lindenboim, Javier; Kennedy, Damián (2003) Cambios y continuidades en la
dinámica urbana de Argentina. Centro de Estudio de Población, Empleo y
Desarrollo, IIEFCE-UBA. Buenos Aires.
Peretti, Gustavo; Varisco, Mariano (2013) Proceso de envejecimiento de la
población de las localidades urbanas de la provincia de Entre Ríos. Período 1991-
2001. Revista Entrevistas (temas de debates), Edición 4. ISSN 1853-6077. Instituto
Superior Ntra. Sra. del Carmen. Villa Mercedes. San Luis.
Torrado, Susana (1992) Estructura Social de la Argentina 1945-1983. Ediciones de
la Flor. Buenos Aires.
Toro Labe, Fernando (1996) Distribución espacial de la población. En INDEC,
Aspectos teóricos y metodológicos relativos al diseño conceptual de la célula
censal. Serie D Nro. 2 Tomo 2. Publicaciones del INDEC, Buenos Aires.
Vapñarsky, César (1995) Primacía y macrocefalia en la Argentina: la
transformación del sistema de asentamiento humano desde 1950. Revista Desarrollo
Económico, Vol. 35, Nro. 138. Buenos Aires
Vapñarsky, César; Gorojovsky, Néstor (1990) El crecimiento urbano en la
Argentina. Instituto Internacional de Medio Ambiente y Desarrollo (IIED-América
Latina) Grupo Editor Latinoamericano, Buenos Aires.
Michelini, J. y Davies, C. (2009) Ciudades Intermedia y desarrollo territorial: un
análisis exploratorio del caso argentino. En: documentos de trabajo grupo de
estudios sobre desarrollo urbano nro 5. ISSN 1989-555550 Santa Fe
241
GESTÃO DEMOCRÁTICA E O MEIO AMBIENTE URBANO
AMAZÔNICO.
Resumo
O presente trabalho busca analisar a Gestão Democrática como instrumento trivial ao advento
da Cidade Sustentável na Amazônia face aos problemas urbanos emergentes de uma
sociedade cosmopolita em desenvolvimento. O espaço urbanístico, como um direito de todos,
deve proporcionar aos citadinos um meio ambiente urbano ecologicamente equilibrado capaz
de preservar o patrimônio ambiental. Por isso, a participação popular, interiorizada pelas
ideias de democracia e cidadania, existentes formalmente no ordenamento positivo brasileiro,
é importantíssima na busca incansável pela concretização da justiça social urbana.
Abstract
This paper analyzes the Democratic Management as trivial instrument to the advent of
Sustainable City in the Amazon against the emerging urban problems of a cosmopolitan
society in development. The urban space as a right for all, must provide city dwellers an
ecologically balanced urban environment capable of preserving the environmental heritage.
Therefore, popular participation, internalized by democracy and citizenship ideas, formally
existing in the Brazilian positive system, is important in the tireless search for the realization
of urban social justice.
1 INTRODUÇÃO
102
Advogado (OAB/PA), especialista em Direito Ambiental e em Docência para o Magistério Superior. Docente
no Programa de Ciências Jurídicas, Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA (Av. Mendonça Furtado,
Campus Amazônia, nº 2946, bairro Fátima, Santarém/PA). E-mail: jcarllos2001@yahoo.fr
242
Essa realidade tem demonstrado que para a assunção da qualidade de vida nas cidades
necessária se faz a “aplicação tanto das normas ambientais como das urbanísticas”, conforme
assevera Figueiredo (2011, p. 103), redirecionando os rumos dessas cidades, porquanto, têm a
seu favor o incipiente desenvolvimento econômico e o fato de que os recursos públicos
necessários para a aplicação na política urbana são consideravelmente inferiores àqueles que
devem ser aplicados nas metrópoles.
Conforme o processo de urbanização103 avança nas cidades medianas, como muitas na
Região Amazônica, em processo de crescimento e desordenamento urbano, faz-se necessário
adequá-lo a condições que conservem o meio ambiente ecologicamente equilibrado sem
degradá-lo e garantindo o direito à cidade.
Não resta dúvida, a cidade é o lugar em que os citadinos devem desfrutar de forma
confortável das melhores condições de vida como moradia decente, saúde, lazer etc., o que
necessita estar congruentemente interligado à preservação do meio ambiente.
Por isso, os institutos de Cidadania e Democracia, pilares da Gestão Democrática, são
fundamentais para a edificação da Cidade Sustentável a partir da participação popular,
notadamente, consubstanciado nos instrumentos previstos na Lei nº 10.257/2001 (doravante
com a denominação de “Estatuto da Cidade”) e no Texto Constitucional, conforme adiante se
vê.
103
Bastante elucidativa a lição de Carvalho Filho (2009, p. 8) quando afirma que a urbanização, enquanto
processo de transformação social, “está marcada por um lado doce e por outro amargo. Doce, no brilho dos
‘néons’ e no aceno ao consumo; amargo, nos gravíssimos problemas que as concentrações urbanas vão
provocando em cada momento de seu curso”.
243
O art. 182, da CRFB/88, visando assegurar o pleno desenvolvimento das funções
sociais das cidades e o bem-estar dos citadinos, dispõe sobre a Política de Desenvolvimento
Urbano que deve ser executada pelo Poder Público municipal. Como bem observa Oliveira
(2010, p. 229), criou-se “um direito à cidade e, para tal, o cumprimento de suas funções
sociais, que visam, em última análise, garantir o bem-estar de seus habitantes”.
Como um importante instrumento da política urbana tem-se, de forma obrigatória, a
aprovação do plano diretor (matéria regulamentada pelos arts. 39 usque 42, da Lei nº
10.257/2001 – Estatuto da Cidade) para os municípios com mais de vinte mil habitantes,
conforme estabelece o § 1º do art. 182, da CRFB/88. O Plano Diretor se traduz em lei,
instrumento basilar da política de desenvolvimento e expansão urbana, logo submetido ao
rigor do comezinho princípio da legalidade.
De conseguinte, resulta na participação ativa dos cidadãos nos processos decisórios da
esfera pública municipal, conforme se depreende do disposto nos incisos I a III do § 4odo art.
40 do Estatuto da Cidade que vazados a seguir transcreve-se, in verbis:
244
forçoso admitir que tal conteúdo sofrerá variações conforme os
objetivos a serem perseguidos por cada governo municipal.
104
A matéria encontra-se disciplinada nos arts. 9º usque 14, da Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade).
105
A partir da vigência da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) o Direito
Ambiental foi alçado à condição de ciência do Direito, uma vez que o referido diploma legal trouxe no seu bojo
os requisitos capazes de converter o Direito Ambiental em ciência jurídica independente.
106
Não há consenso entre os estudiosos quanto a autonomia do Direito Urbanístico. Alguns doutrinadores
afirmam se tratar de ramo próprio da ciência jurídica, ao passo que outros acabam o situando como ramo do
Direito Administrativo. Contudo, dada a sua multidisciplinaridade, congrega normas de Direito Constitucional,
Administrativo, Civil, Tributário, Econômico e até mesmo Penal. Neste sentido é a opinião de Silva (2008, p. 48-
49) e Carvalho Filho (2009, p. 6-7), para os quais o Direito Urbanístico é ramo do Direito Público, pois
disciplina os interesses gerais da coletividade e caracteriza-se pela imperatividade de suas normas.
245
Vale observar que a doutrina pátria é unânime na afirmação de que o direito
urbanístico – ramo jurídico regente do Estatuto da Cidade – assume natureza eminentemente
interdisciplinar. Por essa razão, não pode ser tratado de forma isolada e compartimentada.
Conforme assevera Silva (2008, p. 44), o direito urbanístico brasileiro encontra-se
ainda em formação, e por isso, é de se compreender que os princípios informadores desta
disciplina ainda não se tenham tornado insigne. Não obstante, já se delineiam, de maneira
expressiva, no Direito Comprado.
Oportuno é trazer a lição do jurista espanhol Fernández (apud SILVA, 2008, p. 45),
que enuncia:
246
construído influencia o ambiente natural e vice-versa. Torres (2007, p. 199) discorre de forma
muito elucidativa sobre essa questão:
Torres (2007, p. 197), ainda lembra, que a referida Lei “não apresenta formalmente
conceitos, nem requisitos claros, e muito menos impõe obrigações específicas para a proteção
ambiental”. Pelo contrário, o Estatuto da Cidade “é uma lei geral de direito urbanístico, mas
não é todo o direito urbanístico [...]”, conforme bem observa Silva (2008, p. 17).
A preocupação cêntrica do Estatuto da Cidade são as questões urbanísticas, cujo
objetivo, além de regulamentar os arts. 182 e 183 da CRFB/88, é reforçar os instrumentos do
Direito Urbanístico que já vinham sendo aplicados em diversos municípios brasileiros.
Urge observar que alguns municípios brasileiros utilizavam institutos jurídicos de
forma contrária aos preceitos esculpidos no próprio texto da Constituinte de 1988, o que
provocava dúvidas tanto na doutrina, quanto nos tribunais, acerca da natureza jurídica de suas
imposições. Contudo, com o advento do Estatuto da Cidade, pacificou-se essa indagação.
De modo induvidoso, faz-se necessário dar maior concretude ao Estatuto da Cidade,
para a assunção e manutenção do meio ambiente urbano ecologicamente equilibrado,
derruindo a possibilidade o assinalar como uma carta de intenções, sem operacionalidade.
Essa contextualização possui diversas vertentes, entre as quais o enfrentamento dos
instrumentos e institutos de Política Urbana, albergados no Estatuto da Cidade, que de certa
maneira, busca amoldar-se às demandas da sociedade no que pertine à assunção da cidade
sustentável, pela qual a persecução deve ser regular e contínua no sentido de alcançar o meio
ambiente urbano equilibrado.
A intervenção do Poder Público, mediante instrumentos de Direito Urbanístico
adequados, constitui condição fundamental para o desenvolvimento das atividades
econômicas que ocorrem nas cidades, direcionando-as, inclusive, para serem compartilhadas
por todo o organismo social.
Dentre os institutos que merecem destaque e estudo mais acurado, tem-se a Gestão
Democrática da Cidade, devidamente positivado no Estatuto da Cidade, que será visto mais
adiante nesse trabalho.
247
Mas, de igual forma, pode-se destacar, ainda, a Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992
(“Lei da Improbidade Administrativa”)107, que atribui sanções ao Gestor Municipal pelo não
cumprimento das obrigações que são impostas à municipalidade, in verbis:
2 CIDADE SUSTENTÁVEL
É cediço que as cidades vêm se modificando ao longo da história, aumentando de
forma gradativa a deplorável divisão entre os que as usufruem confortavelmente, e aqueles
para os quais o acesso é extremamente custoso, resultando hodiernamente, sobre o que não há
dúvida, nos fenômenos sociais deletérios: violência urbana; formação de favelas com absoluta
ausência de saneamento básico, crescimento desordenado das cidades etc.
Mas, o texto fundante reconhece a necessidade de se “erradicar a pobreza e
marginalização, bem como reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, III, da
107
O referido diploma legal, publicado no Diário Oficial da União, de 03 de junho de 1992, dispõe sobre as
sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo,
emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional.
248
CRFB/88), resultantes do processo de transformação social decorrente da urbanização das
unidades edilícias108.
O surgimento da cidade sustentável, conforme outrora aduzido (NASCIMENTO,
2014, p. 129) “se deu a partir da adoção de medidas que propiciaram o aperfeiçoamento dos
mecanismos de política pública voltada para o desenvolvimento urbano justo”, notadamente
com o advento do Estatuto da Cidade com arrimo na política urbana prenunciada na Carta
Política de 1988.
Mas, para que uma cidade seja considerada “sustentável” precisa ser adotada uma
série de medidas eficazes109 volvidas para a melhoria da qualidade de vida dos citadinos,
promoção do desenvolvimento econômico e, principalmente, a preservação do meio ambiente.
Embora não se encontre uma cidade que seja totalmente sustentável, algumas pelo Brasil
afora, como Porto Alegre/RS, Santo André/SP, Curitiba/PR etc., possuem experiências
interessantes no que diz respeito ao urbanismo.
Na Região Amazônica destaca-se a cidade de Paragominas/PA, que há anos era
considerada como município sinônimo de desmatamento, mas ao implementar “o projeto
‘Município Verde’, lançado pelo governo federal entre 2007 e 2008, para municípios da
Amazônia” a situação mudou o que tornou o município exemplo de sustentabilidade na
prática (PROGRAMA CIDADES SUSTENTÁVEIS, 2015).
Desvela-se que a sustentabilidade das cidades funda-se num desenvolvimento
sustentável que satisfaça as necessidades das gerações autuais sem comprometer a capacidade
das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, pois “as cidades jamais
sobreviverão sem um entorno que lhes forneçam matéria-prima e produtos de consumo
improdutivos no meio ambiente urbano” (NASCIMENTO, 2014, p. 130).
No cotejo, pode-se afirmar que o desenvolvimento sustentável das cidades deve ser
não só sustentável ambientalmente, mas deve ser socialmente sustentável e economicamente
viável, pois a “cidade sustentável é exatamente a que observa o mencionado equilíbrio”
(CARVALHO FILHO, 2009, p. 36) (g. o.).
108
Expressão utilizada por Silva (2008, p. 26) para se referir ao “conjunto de edificações em que os membros da
coletividade moram ou desenvolvem suas atividades produtivas, comerciais, industriais ou intelectuais”.
109
Como exemplos de práticas adotadas pelas cidades sustentáveis, pode-se citar: ações voltadas para a
diminuição da emissão de gases do efeito estufa, combatendo o aquecimento global; manutenção dos bens
naturais comuns; planejamento e qualidade nos serviços de transporte público, principalmente utilizando fontes
de energia limpa; aplicação de programas educacionais voltados para o desenvolvimento sustentável;
planejamento urbano eficiente; ações que visem o uso racional da água e seu reaproveitamento; programas
voltados para a arborização das ruas e espaços públicos; etc.
249
3 MEIO AMBIENTE URBANO ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
O caput do art. 225 da atual Carta Magna (1988) assegura a todos o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Essa é a primeira vez na história do Brasil
que uma constituição dedica um capítulo inteiro ao meio ambiente – ainda que consistente em
um único artigo e seus diversos incisos e parágrafos –, sufragado e robustecido no princípio
do desenvolvimento sustentável110 contido no “Relatório Brundtland”111.
Embora não esteja explícito entre os direitos e garantias fundamentais previstos no art.
5º da CRFB/88112 a doutrina reconhece o caráter fundamental do direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado chamando em si a liberdade do ser humano. Nesse sentido, são as
palavras de Derani (1998, p. 97):
110
Segundo preleciona Santilli (2005, p. 30) o desenvolvimento sustentável é entendido como “aquele que
satisfaz as necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer as
suas próprias necessidades”. Nesse mesmo sentido é a Lei nº 6.938/81 (Política Nacional de Meio Ambiente).
111
Relatório das Nações Unidas (1987) intitulado “Nosso futuro comum”, coordenado por Gro Brundtland,
então primeira-ministra da Noruega, que utilizou e defendeu pela primeira vez o conceito de desenvolvimento
sustentável (SANTILLI, 2005, p. 30).
112
O § 2º do art. 5º, da CRFB/88, estabelece que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotada, ou dos tratados internacionais em que a
República federativa do Brasil seja parte”.
113
O meio ambiente artificial compreende todo o espaço construído, bem como todos os espaços habitáveis pelo
homem, de forma que esse aspecto do meio ambiente está diretamente relacionado ao conceito de cidade
(FIORILLO, 2009, p. 21).
114
Cumpre ressaltar que o Direito Urbanístico, no seu âmbito, não só disciplina o uso do solo urbano e
urbanizável, como também a de qualquer outra área, elemento ou atividade da zoa rural, que interfira no
agrupamento urbano.
250
revelando não ser da União, dos Estados, dos Municípios ou do Distrito Federal, cabendo a
estes e aos particulares a manutenção do seu equilíbrio, diante do interesse público e à sadia
qualidade de vida dos citadinos.
O meio ambiente urbano recebeu da atual Constituinte (1988) proteção de forma
mediata, nos termos das disposições contidas no art. 225 da CRFB/88 que traz proteção geral,
e de forma imediata, positivada de forma inovadora116 no art. 182, caput, do mesmo diploma
legal, que vazados a seguir transcreve-se in verbis:
115
Nesse sentido é a lição do Fiorillo (2009, p. 21). Entretanto, cabe ressaltar que o meio ambiente artificial não
se restringe somente ao espaço urbano, alcança as áreas rurais, pois estas também atendem às necessidades de
moradia do homem.
116
O dispositivo suso é novidade no ordenamento jurídico pátrio sendo a primeira vez que o Texto Fundante
insere um capítulo específico sobre a política urbana. O desiderato das disposições contidas no referido artigo
encontram-se regulamentadas pela Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade).
251
dispõe que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente”(g. n.).
Forte nessas lições resta evidenciado que a participação dos citadinos para dar
materialidade à praxi jurídica de um Estado Democrático de Direito é de extrema relevância
para o irrompimento da Gestão Democrática da Cidade, propagando-se a discussão
teleológica da justiça social e do bem estar da coletividade.
Inconteste a relação entre a Gestão Democrática e a Cidade Sustentável, posto que
na medida em que se criam condições objetivas para aperfeiçoar os mecanismos de política
pública voltada para o desenvolvimento urbano justo, as comunidades locais buscam soluções
para seus mais diversos problemas.
O art. 43 do Estatuto da Cidade dispõe, in verbis:
252
Infere-se, portanto, que nos instrumentos aduzidos alhures encontram-se
interiorizadas as ideias de democracia e cidadania, existentes formalmente no ordenamento
positivo brasileiro, mas questionáveis no espaço fenomênico, decorrente da dinâmica social.
Incipiente trazer os ensinamentos de Dallari (2004, p. 22) acerca da Cidadania, que
com a lucidez que lhe é peculiar assevera:
S. f.
Governo do povo.
Regime político que se funda na soberania popular, na liberdade
eleitoral, na divisão de poderes e no controle da autoridade.
Conforme ensina Kelsen (apud LISBOA, 2006, p. 77) “democracia significa que a
vontade representada na ordem jurídica do Estado é idêntica à vontade dos sujeitos”. Logo, é
a vontade do povo governa o Estado, baseado nos princípios da soberania popular numa
distribuição igualitária do poder.
De clareza solar que o exercício da Cidadania, no enfoque da consciência de direitos e
na luta pela participação e acesso ao espaço público e, a Democracia Participativa como
instituto que viabiliza o exercício destes direitos, são pontos cruciais num debate que traz a
lume a ideia da fustigada justiça social e bem estar coletivo praticado no Estado Brasileiro.
253
Assim, albergado nas noções de cidadania e democracia, estamentos do Estado
Democrático de Direito, e, de modo repercutivo, a discussão teleológica da justiça social e do
bem estar da coletividade, através dos meandros do regramento normativo urbanístico
brasileiro, agasalhado, principalmente, no Estatuto da Cidade, conduz para que se possa ter na
Região Amazônica a edificação das cidades sustentáveis com um desenvolvimento
sustentável, possibilitando aos seus habitantes melhor qualidade de vida.
E, para o controle direto das atividades das regiões metropolitanas e aglomerações
urbanas117 e o pleno exercício da vergastada cidadania o legislador infraconstitucional
estabeleceu a obrigatoriedade de inclusão da participação popular como meio eficaz para
efetividade e promoção da justiça social.
Desse modo, tem-se insculpido no art. 45 do Estatuto da Cidade ipsis litteris:
117
Conforme ensina Carvalho Filho (2009, p. 310) as regiões metropolitanas “se caracterizam por serem
compostas por um Município-pólo e vários outros a ele interligados e com certo grau de acessoriedade”, ao
passo que as aglomerações urbanas “retratam um conjunto de Municípios limítrofes que apresentam basicamente
urbanização contínua com a aparente exteriorização de uma só unidade urbanística”.
254
Carvalho Filho (2009, p. 299), pois sintetiza o exposto prelecionando:
Portanto, tem-se que a Gestão Democrática da cidade, permite dar efetividade à tutela
do meio ambiente artificial através da participação direta dos citadinos, o que será feito não só
no âmbito institucional – inciso I, do art. 43, do Estatuto da Cidade –, como através de
iniciativa popular de projeto de lei – inciso IV, do art. 43, do Estatuto da Cidade –,
materializando assim o acesso à Cidade Sustentável.
CONCLUSÃO
Em razão de as cidades medianas encontrarem-se em fase embrionária de
crescimento, estimula, ainda mais, a operacionalização do Estatuto da Cidade, à inteligência e
aplicação de diversos institutos, notadamente a Gestão Democrática da Cidade para a
edificação de cidades sustentáveis na Região Amazônica.
Engendrados com a ideia de Cidadania e Democracia haverão de se mobilizar em
prol da implantação de toda a estrutura proposta pelo Estatuto da Cidade, reivindicando sua
operacionalização por meio da Gestão Democrática, pois somente através desta e da praxi
proposta pelo Estatuto, com a aplicabilidade de novas diretrizes, haverá um profícuo
desenvolvimento urbano com qualidade de vida para as presentes e vindouras gerações.
Sobremais, é necessário possibilitar a participação crítica dos citadinos no sistema
político para que os mesmos, por meio dessa atuação, possam ter mais oportunidades para
lutar por uma sociedade urbana com uma melhor qualidade de vida.
E, a política pública urbana, por tratar-se de afirmação de direitos humanos, pura e
aplicada, traduz a participação popular, significando o pleno exercício da cidadania política,
aprofundando e consolidando, dessa forma, a democracia como direito inalienável dos
cidadãos, que pode ser exercido de forma individual, coletiva, homogênea e até difusa.
Dessa forma, o direcionamento de uma política pública mais humana e mais justa
com o escopo de multiplicar o direito à informação, trazendo os citadinos para uma ampla
255
participação no processo de decidibilidade jurídica e tomada de consciência dos seus reais
direitos como habitantes do espaço urbano se traduz na Gestão Democrática Cidade.
REFERÊNCIAS
ACQUAVIVA, M. C. (org.). Dicionário Jurídico Acquaviva. 2ª ed. São Paulo: Rideel, 2008.
FIGUEIREDO, G. J. P. de. Curso de Direito Ambiental. 4º ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011.
FIORILLO, C. A. P. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
GUIMARÃES, D. T. (org.). Dicionário Técnico Jurídico. 12ª ed. São Paulo: Rideel, 2009.
256
LISBOA, M. M. G. O Conceito de Democracia em Hans Kelsen. 2006.122p. Dissertação
(Mestrado em Direito) - Curso de Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006.
OLIVEIRA, F. M. G. de. Difusos e Coletivos: Direito Ambiental. 2ª ed. São Paulo, Revista
dos Tribunais, 2010.
SILVA, J. A. da. Direito Urbanístico Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
VARELA, C. A. Comentários sobre os artigos 182 e 183 da Constituição Federal. In: COSTA
MACHADO, A. C. da (Org.); FERRAZ, A. C. da C (Coord). Constituição Federal
Interpretada: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. 3ª ed. Barueri, SP: Manole, 2012.
257
CIDADES MÉDIAS DA AMAZÔNIA: A CENTRALIDADE SUB-
REGIONAL DE MACAPÁ E SUA ÁREA DE INFLUÊNCIA
José F. C. Ferreira120*,
José A. Tostes121*
RESUMO
Este artigo discute a centralidade sub-regional de Macapá, historicamente construída no
recorte espacial do estado do Amapá e das ilhas paraenses do Golfão Marajoara. O objetivo
geral é analisar o papel de Macapá em sua região de influência. A metodologia utilizada
considera dados obtidos de obras de referência sobre o estado do Amapá e a cidade de
Macapá, juntamente com a abordagem realizada pela REGIC/IBGE, que classifica Macapá
como capital regional C, revelando seu alcance sub-regional. A justificativa para esta
abordagem concerne ao fato da cidade de Macapá estar sobrecarregada, pois atende a uma
demanda muito grande de sua área de influência, fato que tem comprometido a qualidade de
vida deste centro sub-regional amazônico. É neste sentido que o planejamento e a gestão
urbana e regional devem atuar de maneira a amenizar esta concentração de demandas sociais,
econômicas, políticas e até mesmo cultural.
ABSTRACT
This paper discusses sub-regional centrality of Macapá, historically built on the spatial area of
the state of Amapá and Pará islands of Golfão Marajoara. The main objective is to analyze the
role of Macapá in its influence area. The methodology considers data from reference works
about the State of Amapá and the city of Macapá, along with the approach carried out by
REGIC / IBGE, which ranks Macapá as regional capital C, revealing its sub-regional scope.
The justification for this approach concerns the fact that the city of Macapá is overloaded
because it meets a very high demand for its influence area, a fact that has compromised the
quality of life of this Amazonian sub-regional center. This is why planning and urban and
118
Licenciado e Bacharel em Geografia. Especialista em Docência do Ensino Superior. Mestrando no Programa de Pós-
Graduação/Mestrado em Desenvolvimento Regional da UNIFAP. E-mail: joaopauloamorim30@gmail.com.
119
Licenciado e Bacharel em Geografia. Mestrando no Programa de Pós-Graduação/Mestrado em Desenvolvimento Regional
da UNIFAP. E-mail: romario_geo@yahoo.com.br
120
Doutor em Geografia e Planejamento Territorial. Pós-doutorando em Desenvolvimento Regional na UNIFAP (Bolsista
PNPD/Capes). Colaborador do CICS/NOVA da FCSH da Universidade Nova de Lisboa. E-mail: zfcofer@gmail.com.
121
Doutor em História e Teoria da Arquitetura. Pós-Doutor em Planeamento Urbano e regional. Professor na UNIFAP. E-
mail: tostes.j@hotmail.com
* O autor não apresentou o trabalho e não participou do evento
258
regional management should act in order to mitigate this concentration of social, economic,
political and even cultural demands.
1 Introdução
259
(SANTOS, 2005). A região nordeste e a Amazônia ficaram à mercê dessa urbanização,
concentrada no centro-sul do Brasil, fato exponencialmente concebido na estruturação da rede
urbana do país.
No caso específico da Amazônia, a urbanização está ligada ao processo de colonização
efetuada desde a época de seu descobrimento, o chamado “Brasil-colônia”, quando de início
se desenvolveu uma política de ocupação e defesa do território. Duas estratégias geopolíticas
foram utilizadas por Portugal para promover o domínio territorial do vale amazônico: a
construção de fortes (conquista militar) e o estabelecimento de missões religiosas (conquista
espiritual) (AMARAL, 2010).
O contexto urbano regional em que se encontra a Amazônia, hoje, possui uma
realidade de processos bastante complexos em sua estrutura, que necessita de um
entendimento por parte da comunidade científica em que pese o novo papel desenvolvido por
suas novas cidades médias. Desde a década de 1960, o processo de urbanização regional está
atrelado à apropriação capitalista da fronteira, intensificada pela ação combinada entre o
capital e o Estado na criação e recriação do espaço regional (SANTOS, 2012).
O novo papel do Estado na Amazônia deve levar em consideração a diversidade
regional, com novos atores, novos e diferentes interesses e demandas (BECKER, 2004). A
urbanização na Amazônia tem sido produzida sob a égide do poder das metrópoles regionais
Belém e Manaus, provocando um desenvolvimento das cidades médias na região (RIBEIRO,
2001). Na Amazônia Oriental em particular, Marabá e Santarém, no Pará, e Macapá, no
Amapá, ganham expressão, pois polarizam um considerável número de cidades e, assim,
cumprem papel importante em sua região.
Este complexo de especificidades locais precisam de um melhor entendimento no que
tange à introdução de políticas de desenvolvimento pelo Estado e efetivação do planejamento
urbano regional, a partir da condição de centro sub-regional de cidades como Macapá. Com
base nisso, este artigo será construído na linha de articulação teórica entre as discussões
acerca do planejamento urbano regional para a Amazônia e a condição de cidade média
exercida por Macapá, pois é notável a sua importância para a sua rede de proximidade
territorial122 e rede de proximidade relativa123, decorrendo daí o exercício de sua centralidade
sub-regional.
122
A rede de proximidade territorial é formada por redes materiais, como a de circulação. Contudo, quando falamos em redes
materiais, nos referimos apenas às redes de transporte viário, pois não podemos incluir a rede de circulação aérea, já que essa
só se materializa nos aeroportos. É a dimensão dessas redes e sua capacidade de fluidez que redimensionam a distância entre
os lugares (LENCIONE, 2006).
260
Mapa 01: Localização de Macapá na Amazônia Setentrional Amapaense.
123
A rede de proximidade relativa diz respeito às redes imateriais, como a rede de informação e comunicação, que requerem
infraestrutura material, como os cabos de fibra ótica implantados no sub solo. As redes imateriais permitem que o que está
territorialmente distante fique próximo (LENCIONE, 2006).
261
2 Centro e centralidade na produção urbana
262
centro-periferia acompanhada, entretanto, do reforço da dependência de alguns centros locais
em relação a outros níveis da hierarquia urbana.
O fenômeno de centralidade urbana decorre da integração/articulação intra e
interurbana, onde o centro é marcado pelo processo de verticalização, cercado pela
aglomeração de indústrias e com mão de obra farta à disposição das indústrias. Com o
excesso de aglomeração causado, principalmente, por perda de amenidades físicas, transporte
deficitário e caótico, aumento do preço da terra e impossibilidade de extensão da área central,
criam-se sub-centros urbanos para atender a demanda de consumo e produção desse espaço
urbano saturado (CORRÊA, 1989).
Sobre centro e centralidade urbana, Trindade Jr (2011), valendo-se de Spósito (2001),
afirma que é preciso estabelecer a diferença entre centro e centralidade, onde o centro
constitui os pontos fixos em determinada parcela do espaço urbano e a centralidade seria a
circulação (sistema de fluxos) de serviços e mercadorias. O centro denota a concentração
espacial destes pontos fixos, enquanto a centralidade seria a capacidade de circulação dos
elementos presentes no centro urbano.
É nesses termos, do (des)encontro entre a análise do centro (fixos) e o exercício da
centralidade (os fluxos, as relações), da escala urbana (intraurbano) e da escala regional
(interurbano), que se estabeleceu histórica e dialeticamente a centralidade urbana sub-regional
de Macapá que polarizou e polariza um número significativo de pequenas cidades do estado
do Amapá e do golfão Marajoara, pertencente ao estado do Pará.
A sociedade não se inscreve fora do espaço, logo, não existe sociedade a-espacial,
desprovida desse elemento condicionante. Por outro lado, o espaço é ativo na constituição das
relações sociais, daí poder-se falar em formação socioespacial, onde os elementos históricos
se reproduzem no espaço, articulando a formação econômico social e a dimensão espacial
(SANTOS, 1982).
O processo de formação socioespacial da Amazônia, anterior à colonização portuguesa
na região,
já ocorria a partir das ações produtivas materiais e simbólicas
dos diversos povos pré-colombianos que ocupavam essa região.
Inclusive, os locais selecionados para a construção de
fortificações e das futuras vilas e cidades seguiram na maioria
das vezes, a localização já adotada pelos indígenas para a
263
construção de suas aldeias. Pode-se afirmar que os primeiros
sistemas de objetos e ações da espacialidade amazônica foram
estabelecidos por seus primeiros povos e, passaram a orientar o
estrangeiro em sua empreitada mercantil além mar (SANTOS,
2012, p. 115).
A cidade de Macapá, no Estado do Amapá, fundada em 1751 como Vila de São José
de Macapá, no período pombalino e, posteriormente, como cidade em 1856, teve sua
fundação ligada a dois projetos da coroa portuguesa. O primeiro diz respeito à Vila de São
José de Macapá com seu desenvolvimento baseada nas fortificações, ou seja, como base de
defesa territorial e geopolítica. O segundo era voltado para a exploração econômica, através
da produção agrícola e povoamento da região. Neste sentido, a centralidade sub-regional da
cidade de Macapá remonta a este contexto, quando “passou a resguardar a entrada norte do
vale amazônico (Cabo Norte) perante ameaças estrangeiras junto aos domínios dos
portugueses” (SANTOS, 2012, p. 08).
A partir da criação do Território Federal do Amapá, em 1943, e da posterior
transferência de sua capital da cidade do Amapá para Macapá, houve demandas significativas
por infraestrutura que comportasse a sede administrativa e política recém-criada. Nesse
processo, já na década de 1950, ocorreu a instalação da ICOMI- Indústria Comércio de
Minérios S.A. em Serra do Navio, em 1953, e o início da produtividade da empresa em 1957,
já como sociedade anônima (PORTO, 2003). Em 1955 é divulgado o Plano de
industrialização do Território Federal do Amapá. Em 1956 é criada a Companhia de
Eletricidade do Amapá - CEA. Todos esses fatores reforçam a importância de Macapá como
centro polarizador e irradiador de serviços e infraestrutura no Amapá.
Enquanto Território Federal, o Amapá criou estruturas políticas, econômicas, sociais e
administrativas internas que, em muito, contribuíram para a sua estadualização (PORTO,
2003). Em 1988, com a criação do Estado do Amapá, pela Constituição do mesmo ano, e a
criação da Área de Livre Comércio de Macapá e Santana (ALCMS), em 1991, que oferece
incentivos fiscais para a instalação de empresas nas cidades de Macapá e Santana, é gerada
uma expectativa de geração de empregos no Estado, cuja consequência é o aumento da
imigração para o Estado, principalmente de paraenses e nordestinos. Por outro lado, durante
os anos 1990 são criadas extensas áreas de preservação ambiental no Estado, o que força a
concentração das forças produtivas econômicas em torno das duas cidades, neste período,
afirmando sua importância no contexto amapaense.
264
Sobre o crescimento urbano de Macapá mais recente, Amaral (2010) destaca que
existe um processo de verticalização mais intenso no centro da cidade, com predomínio das
classes sociais mais abastadas, que se utilizam dos serviços e comércio oferecidos, e, nas
periferias, uma maior horizontalidade, que outrora possuía, em sua maioria, populações com
baixo poder aquisitivo, mas que vem sendo ocupada por classes sociais com maior poder
econômico, em virtude da ocupação de lotes residenciais.
O início da verticalização no centro da cidade de Macapá indica um dos aspectos da
materialidade das atividades urbanas, indicada por Silva (2013). Este afirma que o centro é
uma área de máxima concentração de atividades econômicas dentro do tecido urbano, as
quais, no caso de Macapá, são parte considerável de sua centralidade urbana sub-regional.
Essa transformação no centro de Macapá, que também se estende por toda a cidade,
expressa sua condição de centro sub-regional, pois, em termos teóricos, há reflexos desse
processo, tanto na escala regional quanto na urbana (VILLAÇA, 1998). Além das
transformações na paisagem urbana, há que considerar o contexto da cidade com a região e as
políticas federais pensadas para a Amazônia e para o estado do Amapá, pois estes eventos são
decisivos para a produção do espaço da cidade.
Essas dinâmicas produzem novas formas de apropriação do espaço urbano e novas
formas de centralidade, a partir de transformações econômicas, que são portadoras de
preferências de localização para a produção e consumos de bens e serviços na estrutura
interna das cidades. Nessa conjuntura urbana existem níveis de especificidade que devem ser
estudados a partir de cada formação socioespacial e cada conjuntura econômica (SPOSITO,
1991; 1993).
Neste contexto, a cidade de Macapá se destaca por sua centralidade no que diz respeito
ao consumo de bens e serviços. No entanto, a partir da discussão de Corrêa (1989), não possui
as características de centralidade urbana típica das cidades industrializadas124. Macapá, no
entanto, aparece como centro urbano sub-regional, no que concerne à dinâmica econômica,
pois está atrelada à Metrópole regional de Belém e, em simultâneo, polariza um número
significativo de cidades em sua órbita.
Compreender Macapá como cidade média é muito importante para a discussão de sua
centralidade sub-regional. Sobre este nível hierárquico de cidade, os primeiros estudos no
Brasil consideraram essencialmente o atributo demográfico. Assim, as discussões sobre
124
Se se considerar São Paulo e sua expressão metropolitana, há primazia da metrópole relacional, que se traduz no comando
da metrópole via fluxos econômicos, sociais e políticos, em detrimento a metrópole fabril do passado, cuja produção
industrial era força propulsora da expressão metropolitana.
265
cidades médias produzidas por Filho et al. (2002), por exemplo, realizadas nas cidades
mineiras em três diferentes momentos, destacaram os limiares demográficos125, chegando a
hierarquias e tipologias consistentes sobre as cidades médias mineiras relacionadas às suas
regiões (pequenas cidades do entorno).
Para Santos (2005), as cidades médias encontram-se no intervalo demográfico entre
100 mil e 500 mil habitantes, considerando os novos rumos da urbanização brasileira marcada
por processos como a desconcentração industrial (disseminação da atividade industrial para
outras partes do país), a metrópole dispersa (presença da metrópole por todo o território
nacional) e a involução metropolitana (processo relacionado ao maior crescimento da região
em relação à metrópole).
As cidades médias assumem um determinado papel na estrutura urbana regional como
centro sub-regional, não sendo simplesmente centros locais, mas núcleos urbanos com
capacidade de polarizar e influenciar um número significativo de cidades menores e articular
relações de toda ordem (TRINDADE Jr., 2011). Segundo Amaral (2010, p. 136) elas são
caracterizadas
125
Para Filho et al. (2002) são três os limiares demográficos: 20 mil, 10 mil e 14 mil habitantes.
126
O golfão marajoara tem seu início nas proximidades do Porto de Moz e da Ilha Grande de Gurupá, no estado do Pará.
Nessa sub-região da planície do grande rio Amazonas encontra-se a larga embocadura do mesmo, entre o Amapá e a Ilha de
Marajó, o estreito de Breves, a oeste desta ilha, e, no sentido leste-nordeste, a baía das Bocas seguida pelo rio Pará, o baixo
Tocantins e a baía de Marajó (SANTOS, 2012, p. 50).
266
Quadro 01: Hierarquia dos centros urbanos na rede urbana do Brasil, em 2007
Hierarquia dos
Processos urbanos e regionais
centros urbanos
a. Grande metrópole nacional – São Paulo (maior conjunto urbano do País, com 19,5
milhões de habitantes): primeiro nível da gestão territorial; b. Metrópole nacional – Rio
de Janeiro e Brasília (população de 11,8 milhões e 3,2 milhões): primeiro nível da gestão
Metrópoles
territorial; c. Metrópole – Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Curitiba, Goiânia e Porto Alegre (população que que varia entre 1,6 de Manaus e 5,1
milhões de Belo Horizonte): segundo nível da gestão territorial.
a. Capital regional A – constituído por 11 cidades, com medianas de 955 mil habitantes
e 487 relacionamentos; b. Capital regional B – constituído por 20 cidades, com
Capital Regional
medianas de 435 mil habitantes e 406 relacionamentos; c. Capital regional C –
constituído por 39 cidades com medianas de 250 mil habitantes e 162 relacionamentos.
a. Centro sub-regional A – constituído por 85 cidades, com medianas de 95 mil
Centro Sub-
habitantes e 112 relacionamentos; b. Centro sub-regional B – constituído por 79
Regional
cidades, com medianas de 71 mil habitantes e 71 relacionamentos.
a. Centro de zona A – 192 cidades, com medianas de 45 mil habitantes e 49
relacionamentos. Predominam os níveis 5 e 6 da gestão territorial (94 e 72 cidades,
respectivamente), com nove cidades no quarto nível e 16 não classificadas como
Centro de Zona
centros de gestão; b. Centro de zona B – 364 cidades, com medianas de 23 mil
habitantes e 16 relacionamentos. A maior parte, 235, não havia sido classificada como
centro de gestão territorial, e outras 107 estavam no último nível daquela classificação.
As demais 4473 cidades cuja centralidade e atuação não extrapolam os limites do seu
Centro Local município, servindo apenas aos seus habitantes, têm população inferior a 10 mil
habitantes (mediana de 8133 habitantes).
Fonte: IBGE/REGIC, 2007. Organização dos autores.
268
Fonte: IBGE/REGIC (2008).
127
O vetor de crescimento urbano de Macapá, que até 1964 apresenta o seu núcleo confundindo-se com seu centro comercial
e de serviços, a partir da criação da Rodovia Juscelino Kubitscheck, Rodovia Duque de Caxias e BR – 156, se expande para
norte, oeste e sul da capital. As rodovias apresentam a função de conexão regional, pois possuem atividades comerciais e de
serviços voltados para o mercado regional (AMARAL, 2010).
128
Com a transformação do Ex-Território do Amapá em Estado, a partir de 1988, criaram-se vários pequenos municípios no
interior do Estado, o que reforçou a centralidade econômica e urbana de Macapá, pois como não possuíam infraestrutura e
atividades econômicas intensas, estes municípios estavam atrelados, de forma direta, à produção econômica da capital
amapaense.
270
Quadro 03: Centralidade urbana sub-regional de Macapá e sua importância.
Fundação da vila Sede de grandes Concentra a Sede do Aeroporto Relação com o IIRSA e
de São José de empresas, firmas, estrutura internacional. ENID (instalação de
Macapá (1758) e empreiteiras e político- Serviços de saúde, infraestrutura de
construção da lojas. administrativa educação e portos, aeroportos,
Fortaleza de São Maior oferta de do Estado. infraestrutura. estradas que
José de Macapá. empregos tanto no Os centros de Rede de serviços fomentem o
Política colonial setor público decisão e de formais e informais desenvolvimento e
da Coroa quanto privado. ação no Estado na área do lazer, integração sul
Portuguesa para Captação da partem de turismo, etc. americana na região).
a Amazônia. produção agrícola Macapá para os Polo de saída e Porta de entrada
A criação do TFA das pequenas outros chegada de (aeroviária), junto com
e a transferência cidades de seu municípios; transportes a cidade de Santana
da capital para entorno e ilhas rodoviários entre (portuário) do Polo
Macapá. próximas. os municípios do Turístico Maracá-
ALCMS (1991) Distribui e fornece Estado. Cunani.
gera imigração alimentos e
muito forte. vestuário para os
municípios do
interior do Estado;
Fonte: Amaral (2010), Porto (2003; 2014), Santos (2012), Tostes (2006; 2013), Tostes; Pelaes (2012).
271
No que diz respeito aos planos de desenvolvimento para a Amazônia, a partir da
década de 1990, ressalta-se os Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento (ENID) que
tinham como objetivo a integração das diferentes economias regionais, sob a ótica do
desenvolvimento institucionalista. Segundo Serra e Fernandéz (2004), o território nacional foi
dividido em nove Eixos, a saber: Arco-Norte; Madeira-Amazonas; Araguaia-Tocantins;
Oeste; Sudoeste; Transnordestino; São Francisco; Rede Sudeste; e Sul.
Dos nove eixos definidos, quatro impactam na Amazônia Legal e destes dois são
amazônicos e representam corredores logísticos de integração nacional e internacional da
região. O Madeira – Amazonas, como saída para o Atlântico, e o Arco Norte, como saída para
o Caribe (PORTO, 2014). Estes eixos contemplam o Estado do Amapá e destacam os projetos
de ligação entre Amapá e Guiana Francesa por rodovias pavimentadas, o que reforça o papel
de Macapá como centro sub-regional e a importância do Porto de Santana como escoador
internacional de produtos. No entender de Tostes (2006), isso possibilitará a utilização do
Porto de Santana por outros países para intercâmbio comercial, a circulação entre a capital
(Macapá) e a fronteira, e a redução de gargalos infraestruturais.
Macapá é nó da rede urbana regional, com destaque no setor de bens, serviços e
infraestrutura na composição transfronteiriça entre as nações, diante da fraca capacidade de
concentração destes serviços pela cidade de Oiapoque, que geograficamente sedia a ponte
binacional entre os dois países, mas que, pela deficitária rede de serviços presentes, ainda
possui considerável articulação com a capital Macapá.
Além dessas conexões mais externas, Macapá estabelece interações com o seu próprio
Estado, principalmente pela via rodoviária e, numa escala bem menor, ferroviária (AMARAL,
2010). Tanto que Tostes e Pelaes (2012) afirmam que a condição de capital e a infraestrutura
aeroviária e hidroviária, juntamente com Santana – cidade conurbada a Macapá – lhe confere
importância funcional como porta de entrada do Polo Roteiro Maracá-Cunani.
4 Considerações finais
Uma das visões correntes nos estudos sobre a Amazônia a tratam como fronteira do
capital, fato que proporcionou e proporciona na cotidianidade regional, juntamente com
outros processos, a passagem da urbanização da população à urbanização do território, o que
viabilizou o surgimento de cidades médias na Amazônia, dentre elas a cidade de Macapá,
272
conforme indicam aspectos de sua centralidade sub-regional a partir da definição proposta
pela REGIC e por nuances de seu processo de formação socioespacial.
Os processos socioespaciais, desde a gênese da formação de Macapá (fundação da
Vila de São José e construção da Fortaleza de São José), principalmente a partir da criação do
Território Federal, quando é transformada em capital, ganharam significativas repercussões na
região. Esses elementos geraram demandas por infraestrutura urbana. Posteriormente, com a
transformação do Ex-Território em Estado a partir de 1988, associada à criação da ALCMS, a
cidade de Macapá sofreu um segundo momento de crescimento urbano e populacional,
intensificando as atividades de distribuição no setor de comércio e serviços.
Neste processo, a partir da criação de novos municípios no Estado, Macapá tem
reforçada sua centralidade urbana por apresentar primazia nas relações comerciais com estes
municípios, que apresentavam uma incipiente estrutura econômica e urbana para atender às
demandas sociais ocasionadas pelas mudanças em sua estrutura política.
Sob a ótica do desenvolvimento de Macapá como cidade média, destaca-se o
crescimento urbano e populacional da cidade nos últimos anos, em decorrência da expansão
das atividades do setor terciário; a migração intra e inter-regional; o crescimento da oferta de
empregos no setor administrativo estadual e a expansão do circuito inferior da economia,
como contraponto à precariedade de absorção da mão de obra vinda de outros estados, em
busca de oportunidades de emprego no setor público e na procura de vagas proporcionadas
pelo setor de exploração mineral.
A centralidade urbana de Macapá, no contexto de sua região, exprime a necessidade
em reconhecê-la como cidade média, fato que passa pelas políticas públicas pensadas para
esta cidade e sua região. Neste contexto, o planejamento urbano e regional deve considerar
esta particularidade aquando a elaboração dos planos de desenvolvimento urbano e regional,
pois há toda uma trajetória de produção do espaço urbano-regional que se tem negligenciado e
que deve ser conhecida.
Pensar Macapá como cidade média representa um esforço de assimilação empírica de
sua importância para as cidades que lhes são tributárias. Desta forma, considerar sua
centralidade urbano-regional, para além dos limites territoriais, é imprescindível, pois
algumas cidades paraenses localizadas no Golfão Marajoara também estão na órbita de
interações espaciais de Macapá, revelando o grau de articulação política, social e econômica
deste centro sub-regional amazônico.
273
Nesse sentido, deve-se avançar nos estudos da relação entre Macapá e as cidades de
sua região, pois isso interfere diretamente na qualidade de vida de várias pequenas cidades e
da própria capital, muito pressionada pelo grande contingente demográfico concentrado em
seu tecido urbano, pela inércia das políticas de desenvolvimento local e regional e pelo
descompasso das ações/articulações entre o poder público municipal, estadual e federal. Há,
portanto, a necessidade de mais articulação institucional, objetivando a desconcentração
econômica e demográfica, juntamente com novos equipamentos urbanos de natureza social,
que ocasionem a cisão do estrangulamento da macrocefalia urbana na cidade de Macapá.
Pensar e executar políticas públicas compartilhadas e articuladas pelas diferentes
esferas, da municipal à federal, é condição para o fortalecimento da rede urbana da Amazônia
Setentrional Amapaense e das cidades que a compõem. Desta forma, é necessário partir para
um modelo de desenvolvimento pautado nas potencialidades do lugar e nas expressões
materiais e simbólicas que lhes dão vida.
5 Referências
274
LENCIONI, Sandra. Da cidade e sua região à cidade-região. In: SILVA, J. B; LIMA, L. C;
ELIAS, D. Panorama da Geografia Brasileira. São Paulo: Annablume, 2006.
PORTO, Jadson L.R. Desenvolvimento Geográfico Desigual da faixa de fronteira da
Amazônia setentrional brasileira: Reformas da condição fronteiriça amapaense (1943-
2013). Porto: Blumenau, FURB/PPGDR, 2014.
_______. Amapá: Principais Transformações Econômicas e Institucionais (1943-2000).
Macapá: SETEC. 2003.
RIBEIRO, M. A. A rede urbana amazônica – da rede dendrítica à configuração de uma rede
complexa. In: SPOSITO, M. E. B. Urbanização e cidades: perspectivas geográficas.
Presidente Prudente (SP): UNESP, 2001.
SANTOS, Milton. Por uma geografia nova: da crítica da geografia a uma geografia
crítica. 6°ed. São Paulo: Edusp, 2008.
_______. A urbanização brasileira. 5ª ed. São Paulo: Edusp, 2005.
_______. Espaço e Método. São Paulo: Nobel, 1982.
_______. O espaço dividido. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
SANTOS. E. R. C. Amazônia Setentrional Amapaense: do “mundo” das águas às
florestas protegidas. Tese (Doutorado), FCT-UNESP, São Paulo: Presidente Prudente, 2012.
SERRA, M. A.; FERNANDEZ, Ramón Garcia. Perspectivas de Desenvolvimento da
Amazônia: Motivos para o Otimismo e para o Pessimismo. Sociedade Brasileira de
Economia Política - SEP, 2004, Uberlândia, 2004.
SILVA, Oséias T. O conceito de centro e centralidade como um instrumento de compreensão
da realidade urbana. XIII Simpósio Nacional de Geografia Urbana. Rio de Janeiro,
novembro, 2013.
SPOSITO, Maria E. B. As cidades médias e os contextos econômicos contemporâneos. In:
SPOSITO, Maria E. B. (Org.) Urbanização e cidades: perspectivas geográficas. São Paulo:
UNESP, 2001b. p.609-43.
_______. A gestão do território e as diferentes escalas da centralidade urbana. Revista
Território, ano 111, nº 4, jan./jun. 1993.
_______. O centro e as formas de expressão da centralidade urbana. Revista Geografia. São
Paulo, Vol. 10, p 1-18, 1991.
TOSTES, J. A.; PELAES, F. M. A. Planejamento e Estrutura no Polo Turístico Maracá-
Cunani. VI Encontro Nacional da Anppas 18 a 21 de setembro de 2012, Belém - PA –
Brasil.
TOSTES. José A. Transformações e dinâmicas urbanas ocorridas nas cidades do Estado do
Amapá no período de 1950 A 2010. In: PORTO, Jadson L. R.; NASCIMENTO, Durbens M.
(orgs.). Dinâmicas periférico-estratégicas da fronteira da Amazônia Setentrional: das
políticas públicas e redes institucionais à integração espacial. Rio de Janeiro: Publit, 2013.
_______. Planos Diretores no estado do Amapá: Uma contribuição para o
Desenvolvimento Regional. Série Arquitetura e Urbanismo na Amazônia. Editor: TOSTES,
J. A., Macapá-AP, 2006.
TRINDADE JR. Saint-Clair C. Cidades médias na Amazônia Oriental: das novas
centralidades à fragmentação do território. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e
Regionais. V. 13. n° 2. p. 135-151. Novembro, 2011.
275
VILLAÇA, F. Espaço intra-urnano no Brasil. São Paulo: Nobel, Fapesp, 1998.
276
AS CIDADES MÉDIAS DO HINTERLAND AMAZÔNICO PARAENSE:
URBANIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EM PERÍODO RECENTE
RESUMO
A definição de cidades médias sempre esteve associada de imediato ao seu porte demográfico,
porém, estudos recentes apontam a necessidade de identificar fatores qualitativos associados
as suas funções e os papéis desempenhados por elas, além disso, ainda existe a dificuldade de
encontrar um valor quantitativo que identifique cidade média, já que a escala populacional
varia de acordo com a análise. O presente estudo tem como objetivo investigar se as cidades
paraenses com população superior 100 mil habitantes, vivendo em áreas urbanas, não
pertencentes à região metropolitana, desempenham papéis de cidades médias. Dessa forma,
serão abordados estudos urbanos referentes à temática, com a apresentação dos conceitos e
suas limitações, logo em seguida, será exposta uma breve contextualização do processo de
urbanização na Amazônia brasileira, e por último será analisado se as cidades consideradas
são capazes de desempenharem papéis de cidades médias.
Palavras-chaves: Cidades Médias; Urbanização; Cidades Paraenses.
INTRODUÇÃO
O estado do Pará, ao longo das três últimas décadas, vem sofrendo um processo de
transformação estrutural que tem sido observado por meio do crescimento da sua população -
resultante da forte imigração – e também do crescimento e surgimento das novas cidades e
municípios. Parte-se, neste artigo, da premissa de que está em curso uma tendência de
urbanização com grande volume da população em um número reduzido de cidades, e que as
cidades médias ganharam relevância neste processo.
O presente artigo tem como objetivo investigar as cidades paraenses com população
superior a 100 mil habitantes vivendo em área urbana, que não pertençam a Região
Metropolitana de Belém. Questiona-se se as cidades paraenses selecionadas, como alvo da
129
Professor da Faculdade de Economia e do Programa de Pós-graduação em Economia (PPGE/UFPA),
Coordenador do Grupo de Pesquisa Analise Fiscal, Desenvolvimento Regional e Políticas Públicas.
130
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Economia (PPGE/UFPA), Pesquisadora do Grupo de Pesquisa
Analise Fiscal, Desenvolvimento Regional e Políticas Públicas.
* O autor não apresentou o trabalho e não participou do evento
277
pesquisa, cumprem o papel de cidades médias na primeira década do século XXI. Embora
seja um número pequeno destas cidades, ainda assim, participam com elevado percentual da
população e das atividades econômicas do Estado do Pará.
O critério demográfico tem sido o mais aplicado para identificar as cidades médias,
porém é reconhecido como insuficiente. Assim, discute-se atualmente, os critérios para sua
classificação, centrados não apenas na dimensão demográfica, mas na utilização de outros
aspectos como: localização na rede urbana, funções que a cidade em estudo exerce nas
relações externas, dinâmica e estrutura interna, a forma como ela estabelece relações com as
diversas cidades componentes da sua rede urbana, entre outras.
A fim de verificar se de fato as referidas cidades cumprem o papel de cidades médias,
foram selecionadas algumas variáveis que indicam a capacidade das cidades medias de ofertar
bens e serviços não somente para sua população, mas para os municípios próximos os seus
limites. O artigo está dividido em cinco seções, além desta introdução: inicialmente se discute
os aspectos teóricos que embasam a definição de cidade média; a segunda seção trata da
dinâmica urbana brasileira, suas contradições e, especialmente, a conformação do perfil das
cidades médias nacionais; a terceira seção estabelece parâmetros amazônicos para análise e,
finalmente, na quarta seção, tratamos da dinâmica econômica e demográfica das cidades
médias paraenses.
279
Segundo Sposito (2004) para considerarmos determinada cidade como média é
necessário que esta possua além da dimensão populacional urbana correspondente a este
porte, desempenhem papéis intermediários entre as cidades pequenas e as metrópoles. A
população das cidades pequenas, polarizadas por uma cidade média, realizam parte do
consumo de bens e serviços, necessários a produção e a vida, nestas cidades. Através destas
cidades é possível observarmos que elas também apresentam as melhores condições para,
dado os ajustes do sistema fordista para o sistema flexível de produção, abrigarem novas
unidades de produção, cumprindo assim não somente o papel de atendimento ao mercado
regional, mas desempenhando importantes funções como elos de um sistema produtivo
global.
Consideramos neste estudo que o termo cidade média é uma construção econômica,
demográfica e geopolítica. A cidade média, desde um certo porte demográfico, que para nós
situa-se entre cem mil e quinhentos mil habitantes, detém condições necessárias a estruturação
de mercados e atração industrial, de comércio e serviços; por outro, exerce funções de
intermediação, cumprindo papel de ofertante de infraestrutura em diversas áreas para o seu
entorno, isso possibilita o exercício de relações de poder ou polarização em termos
territoriais.
280
mais ampla definição, como processo social complexo, incluindo a formação de um mercado
nacional e também os esforços de dotar de logística e infraestrutura produtiva o território
nacional. A dinâmica da urbanização brasileira nos anos 50 é resultado das altas taxas de
crescimento vegetativo da própria população urbana e do grande fluxo migratório
populacional do tipo rural-urbano, conforme Martine et al (1990). Neste contexto, a
modernização industrial, alguns dos resultados do Plano de Metas (1956-1960) - a expansão
rodoviária e a construção de Brasília - e o início da modernização agrícola, junto à ocupação
de novas fronteiras de recursos acompanharam essa dinâmica de urbanização.
Contudo, será somente a partir da década de 1970 que o Brasil deixou de ser
efetivamente rural, onde naquela década a população urbana representava 55,9%. Após 40
anos, em 2010, no Brasil, são 160.997.894 pessoas vivendo nas cidades, o que nos remete a
um percentual de urbanização de 84,4 %. De 1980 até 2010, as cidades expandiram seu
contingente populacional em 71.753.093 habitantes. Nesse sentido autores, como Abramovay
(apud Andrade e Serra 2001), consideraram que durante as últimas décadas houve um
processo de “desruralização” da população brasileira.
O processo de urbanização no Brasil se deu de forma mais acelerada se comparado
com os países capitalistas mais avançados, “na segunda metade do século XX, a população
urbana passou de 19 milhões para 138 milhões, multiplicando-se 7,3 vezes, com uma taxa
média anual de crescimento de 4,1%. Ou seja, a cada ano, em média, mais de 2,3 milhões de
habitantes foram acrescidos à população urbana” (BRITO, 2006, p. 223). A sociedade
brasileira passava por profundas transformações, as cidades que mais receberam migrantes
nesta nova dinâmica foram as metrópoles, ocasionando um inchaço nestas cidades. Segundo
Trindade (1997) os principais fatores responsáveis para o inchamento das metrópoles era a
falta de uma efetiva reforma agrária e de desenvolvimento das regiões interioranas. Essas
migrações internas que estavam ocorrendo no Brasil se constituíam no elo maior entre as
mudanças estruturais pelas quais a sociedade e a economia passava e a aceleração do processo
de urbanização.
Esse processo de urbanização gerou uma significativa rede urbana, diferentemente de
outros países latino-americanos que se caracterizam por uma menor densidade de malhas
citadinas (Faria, 1983; BAENINGER, 1998). Conforme a Tabela 1, entre 1950 e 1970
passou-se de 1.826 cidades, no início do período, para 3.850, ao seu final. No entanto, do total
de cidades em 1970, a grande maioria era constituída pelas cidades pequenas (com menos de
20 mil habitantes) que respondiam por 92,83% do total das cidades brasileiras, concentrando
281
apenas 26,20% da população. Em contraposição, nas 10 cidades brasileiras acima de 500 mil
habitantes residiam 43,47% da população nacional. Em conjunto, as cidades médias e grandes
(99 localidades) alocavam, em 1970, aproximadamente 63% da população residente em
cidades do País.
< 20 5.747 1.745 35,30 13.849 3.574 26,20 21.471 3.736 19,30 32.679 3.915 17,13 4,50 2,10 2,24
Entre 20 e 50 1.623 55 10,00 5.632 177 10,60 13.807 438 12,40 31.379 1.043 16,45 6,40 4,40 4,42
Entre 50 e 100 1.215 16 7,50 3.430 49 6,50 11.357 160 10,20 22.264 324 11,67 5,30 5,90 3,61
Entre 100 e
250 787 4 4,80 4.832 34 9,10 15.896 100 14,30 27.606 184 14,47 9,50 5,80 2,95
Entre 250 a
500 1.237 3 7,60 1.865 6 3,50 11.218 33 10,10 20.962 61 10,99 2,10 8,90 3,35
Entre 500 e
2.000 630 1 3,90 8.363 8 15,80 18.262 20 16,50 28.209 32 14,79 13,80 3,80 2,31
>2.000 5.038 2 31,00 14.935 2 28,20 18.980 4 17,10 27.637 6 14,49 5,60 1,10 2,00
Total Brasil 16.277 1.826 100% 52.906 3.850 100% 110.991 4.491 100% 190.736 5.565 100% 6,10 3,60 2,89
Fonte: IBGE, Censos Demográficos: 1950, 1970, 1991 e 2010. Elaboração própria.
No período 1950/70 as cidades com mais de 500 mil habitantes foram as que mais
contribuíram para o crescimento urbano brasileiro, alcançando os 44% desta população em
1970, contra aproximadamente 35% em 1950. Nesse período, o Brasil passa por várias
transformações tais como a consolidação do parque industrial brasileiro, o padrão locacional
vigente, sobretudo das indústrias de bens de capital e de duráveis (ANDRADE&SERRA,
1998, p. 2). No período posterior 1970/91 a população ainda se encontra bastante concentrada
nos grandes centros urbanos, mas é evidente que a população urbana brasileira passa por um
também notável processo de reversão de sua polarização, no qual as cidades médias (cidades
entre 100 e 250 mil habitantes) cumprem um papel decisivo. O número destas cidades chega
em 100, representando 14,30% da população nacional, em 1991. O período de 1991/2010
marca uma nova inflexão na estrutura de crescimento e disposição espacial da população
brasileira, por mais que ainda permaneça bastante concentrada nas grandes cidades, observa-
se nesse período um aumento no número de núcleos urbanos em todos os intervalos de
tamanho, isto porque entre 1991/2010 foram criados vários municípios. Analisando o período
mais detalhadamente veremos que o número de centros urbanos com tamanho entre 20 e 50
mil; e 50 e 100 mil habitantes dobraram. Destaque para os centros urbanos entre 20 e 50 mil
habitantes que obtiveram uma taxa de crescimento populacional (4,42) bem superior que a do
Brasil (2,89).
282
Vale reforçar que a dinâmica econômica e demográfica recente reforça o perfil médio
das cidades brasileiras, sendo que apesar das metrópoles continuarem crescendo,
proporcionalmente mais que o país, observou-se uma forte diminuição no ritmo de
crescimento e “as cidades de porte médio, com população entre 100 mil e 500 mil habitantes,
crescem a taxas maiores do que as metrópoles nos anos 80 e 90 (4,8% contra 1,3%)”
(MARICATO, 2000, p.24). Diversos estudos demonstram a crescente importância das cidades
médias enquanto polos de influências do seu entorno e centros de atração de migrantes. As
cidades médias da Amazônia, por exemplo, funcionavam como cidades de passagem para a
população rural migrante até seu deslocamento definitivo dentro da região ou para algum
centro nacional de grande porte. Penal (2001), por exemplo, aponta em relação as cidades
médias do Rio de Janeiro, a hipótese de que várias dessas cidades possam vir a se instituir em
importantes polos regionais intraestaduais, considerando uma distribuição de benefícios do
crescimento econômico de modo mais progressivo e sustentável. Dessa forma, quanto maior o
número de cidades médias na rede urbana, maior a possibilidade de investimento
disseminado, dada às vantagens locacionais para atividades industriais e, portanto, maior a
oferta de empregos.
Verifica-se que nas cinco décadas analisadas a população urbana do Brasil triplicou,
enquanto que a população urbana da Região Norte e da Amazônia Legal aumentaram
aproximadamente em sete e seis vezes, respectivamente. Confirmando o que Becker (2005) já
283
havia afirmado em relação à disparidade do crescimento da população urbana da Amazônia
com as demais regiões e do próprio Brasil.
Tabela 2 - Taxas de crescimento da população no Brasil, Norte e Amazônia Legal 1970-2010
Taxa Médias Anuais de Crescimento da População (%)
Períodos Brasil Região Norte Amazônia Legal
Total Urbana Rural Total Urbana Rural Total Urbana Rural
1970/80 2,7 4,4 -0,6 5,0 6,4 3,7 4,5 6,7 3,0
Fonte
1980/91 1,9 3,0 -0,7 5,0 6,3 3,4 3,6 5,5 1,7 :
1991/00 1,6 2,4 -1,3 2,8 4,8 -0,6 2,5 4,9 -1,4 IBGE
2000/10 1,2 1,6 -0,6 2,1 2,6 0,8 1,9 2,5 0,7 /SID
RA
entre 1970-2010. Elaboração Própria.
284
como se dá o crescimento urbano na Amazônia Legal esteve centralmente determinado pelo
modelo econômico primário-exportador que define a dinâmica econômica da região.
Tabela 3 - Evolução da população e densidade demográfica do Brasil, região Norte e dos
estados do Amazonas e Pará, a partir da década de 1900 a 2010.
Anos Brasil Norte Amazonas Pará
População Dens. População Dens. População Dens. População Dens.
1900 17.438.434 2,05 695.112 0,18 249.756 0,16 445.356 0,36
1920 30.635.605 3,60 1.439.052 0,37 363.166 0,23 953.507 0,79
1940 41.236.315 4,84 1.627.608 0,42 438.008 0,28 944.644 0,76
1950 51.944.397 6,10 2.048.696 0,53 514.099 0,33 1.123.273 0,90
1960 70.992.343 8,34 2.930.005 0,76 721.215 0,46 1.550.935 1,24
1970 93.134.846 11.10 3.603.679 1,09 955.203 0,61 2.266.998 1,76
1980 119.011.052 14,23 5.880.706 1,76 1.430.528 0,92 3.403.498 2,81
1991 146.825.475 17,26 10.030.556 2,66 2.103.243 1,34 4.950.060 4,15
2000 169.799.170 19,92 12.900.704 3,35 2.812.557 1,79 6.192.307 4,96
2010 186.989.271 22,43 15.864.454 4,43 3.483.985 2,23 7.581.051 6,07
Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 1900-2010. Elaboração própria.
A Tabela 3 acima nos apresenta dados dos Censos Demográficos realizados no Brasil.
Observa-se que em um período de 110 anos, 1900 a 2010, a população brasileira foi
multiplicada por 10,72 vezes, passando de 17.438.434 para 186.989.271 habitantes. No
mesmo período, a região Norte teve sua população multiplicada 22,82 vezes e os estados do
Amazonas e Pará, respectivamente, por 13,95 e 17,02 vezes. O aumento do número de
cidades e as mais elevadas taxas de crescimento da população urbana na Amazônia paraense
têm ocorrido na fronteira de colonização e expansão da pecuária do Sudeste (Marabá,
Parauapebas e Redenção); na fronteira do cultivo da soja e da criação da pecuária no Baixo
Amazonas (Santarém) e nas cidades vizinhas a Região Metropolitana de Belém (RMB) tais
como Castanhal (entreposto comercial) e Barcarena (cidade industrial e portuária). O processo
de urbanização da Amazônia assume formas distintas entre a parte Norte e Sul da região. No
Estado do Amazonas a população urbana está concentrada na cidade de Manaus, como uma
consequência do Distrito Industrial, já no Estado do Pará a concentração da população urbana
está dividida entre a RMB e cidades de médio porte.
Os municípios foram multiplicados, de tal forma que, em 2010, a região amazônica já
possuía 771 cidades, número bem superior do que se tinha na década de 1950 que era de 182,
sendo que até a década de 1970 observa-se certa estabilidade nas classes de tamanho dos
municípios. Naquela década, predominaram os municípios com menos de 20 mil habitantes,
no total a maioria era menor que 50 mil habitantes, apenas as cidades de Cuiabá (MT) e
Santarém (PA) estavam no grupo entre 100 e 250 mil habitantes, já São Luís (MA) e Manaus
(AM) estavam no grupo entre 250 e 500 mil habitantes, somente a cidade de Belém (PA)
285
estava situada entre 500.000 e 2.000.000 de habitantes, mas ainda com população inferior a 1
milhão, concentrando 633.374 habitantes.
Na Tabela 4 a seguir pode-se observar que o grupo de cidades médias, que em 1970
correspondiam a 15 cidades, já na década seguinte ascendia para 31 cidades, crescendo mais
de 100% no período, alcançando em 2010, 58 cidades. Em relação aos pequenos e médios
núcleos a desconcentração é constituída pela multiplicação destes, em 1970 em conjunto eles
correspondiam 94% (311) e aglomeravam 65% (4.615.898) da população total na região, já na
década de 2010 correspondem 88% (682) dos municípios e concentravam 42% (10.291.266)
da população total da Amazônia. Os pequenos e médios núcleos segundo Becker (2005), em
conjunto, constituem a maioria dos núcleos regionais, que correspondem a um padrão móvel e
instável de urbanização, por apresentarem declínios na sua população à medida que se
verificam o deslocamento das frentes de trabalho e a expropriação dos pequenos lavradores,
ou também por apresentarem um forte crescimento e transformação em núcleo dotado de
funções de pequenos centros de serviços e de centros de circulação e reprodução da força de
trabalho.
O processo de urbanização recente na Amazônia é marcado pelo aparecimento de
novas cidades e pela mudança do tamanho das existentes. Sendo que a dimensão das
mudanças urbanas ocorridas vai além das novas relações econômicas, já que a reestruturação
urbana e intra-regional implica também em uma mudança do modo de vida que influencia
também o meio rural. As cidades vinculadas às indústrias de mineração, madeireira,
siderúrgica e de construção civil têm experimentado novo dinamismo que estão alterando a
rede urbana Amazônica seja através de novos núcleos urbanos, planejados ou espontâneos,
seja pela condição de antigas cidades alcançaram a categoria de centros urbanos regionais.
286
Tabela 4 - População (1000 hab.) e número de municípios da Amazônia Legal, segundo as classes de tamanho 1950-2010
HINTERLAND PARAENSE
es (1000 Pop. Pop. Nº Pop. Pop. Nº Pop. Pop. Nº Pop. Pop. Nº Pop. Pop. Nº Pop. Pop. Nº de Pop. Total Pop. Nº de
hab.) Total Urban de Total Urban de Total Urbana de Total Urban de Total Urbana de Total Urban mun. Urbana mun.
a mun a mun mun a mun mun. a
< 20 1.454 236 . 13 1.88 385 . 17 2.516 527 . 23 2.532 711 . 21 3.196 1.26 300 4.795. 2.41 527 4.659 2.499 495
2 7 8 8 9 9 8
Entre 20 a 1.098 177 41 1.67 350 57 2.103 501 73 3.068 1.00 10 4.306 1.91 140 4.964 2.70 165 5.632 3.239 187
50 3 3 0 9 6
Entre 50 a 348 101 6 773 152 11 1.052 354 15 2.030 800 31 2.960 1.57 43 3.008 1.98 43 3.963 2.646 58
287
100 0 1
Entre 100 259 184 2 440 306 3 237 150 2 1.355 812 9 1.484 1.13 11 1.794 1.42 12 2.889 2.302 20
a 250 0 5
Entre 255 241 1 399 378 1 577 489 2 449 247 1 1.232 1.01 4 2.010 1.82 6 2.466 2.294 7
250 a 6 6
500
Entre
500 a 633 603 1 1.567 1.43 2 2.95 2.10 3 3.55 3.50 3 4.761 4.674 4
2000 6 3 2 6 7
3.414 939 18 5.17 1.57 25 7.118 2.62 33 11.001 5.00 36 16.131 9.00 501 20.127 13.8 756 24.370 17.65 771
Total
2 2 1 0 4 1 9 2 6 63 4
131
O município de Ananindeua possui 471.980 habitantes e está a uma distância de 15 km de Belém, já
Benevides está localizado a 30 Km da capital paraense e concentra 51.651 habitantes, Marituba concentra
108.246 habitantes e está localizado a 20 km de Belém e Santa Barbara do Pará possui 17.141 habitantes,
localizada a 34 km de Belém.
288
Observa-se que no período entre 2000 e 2010 a população urbana do município de
Parauapebas cresceu a uma taxa média de 8,9% ao ano, isto significa dizer que sua população
não somente cresceu a uma taxa superior a do Estado (2,3%), mas como também sua
população urbana mais do que dobrou, enquanto que a população rural cresceu a uma taxa
média de 2,1%. A população rural de Castanhal cresceu a uma taxa superior a da urbana
(4,1% contra 2,4%), o mesmo aconteceu com Marabá (3,5% contra 3,3%), já no caso de
Santarém aconteceu o contrário, a taxa de crescimento da população urbana foi superior a da
rural (1,5% contra 0,3%). Em 1991, Castanhal possuía grau de urbanização de 91%, caindo
para 89% em 2010, o mesmo acontecendo com Marabá, no início do período o município
possuía grau de urbanização de 83% e ao final passa a ter 80%. Em relação a Parauapebas e
Santarém o grau de urbanização é crescente, o primeiro apresenta grau de urbanização de 51%
no início do período, ao final ascende para 90%, no caso de Santarém o grau de urbanização
passa de 68% para 73% ao final do período considerado, porém o padrão santareno ainda é
marcadamente rural, enquanto que Parauapebas rapidamente subordina seu mundo rural ao
urbano.
Tabela 5 - Evolução da população, segundos os municípios das microrregiões 1991 - 2010
Taxa de Crescimento
1991 2000 2010
2000/2010 em %
Municípios
Rural % Urbana % Total Rural % Urbana % Total Rural % Urbana % Total Rural Urb. Total
Castanhal 9.219 9 92.852 91 102.071 13.247 10 121.249 90 134.496 19.771 11 153.378 89 173.149 4,1 2,4 2,5
Marabá 21.233 17 102.435 83 123.668 33.647 20 134.373 80 168.020 47.399 20 186.270 80 233.669 3,5 3,3 3,3
Parauapebas 25.892 49 27.443 51 53.335 12.308 17 59.260 83 71.568 15.218 10 138.690 90 153.908 2,1 8,9 8,0
Santarém 85.044 32 180.018 68 265.062 76.241 29 186.297 71 262.538 78.790 27 215.790 73 294.580 0,3 1,5 1,1
Pará 2.353.672 48 2.596.388 52 49.50.060 2.073.864 33 4.122.101 67 6.195.965 2.387.415 31 5.193.636 69 7.581.051 1,4 2,3 2,0
289
de 82.340 habitantes. Segundo o DATASUS na cidade de Marabá nasceram 42.154 habitantes
e morreram 9.527 e em Parauapebas nasceram 26.922 e morreram 3.754 habitantes no
período de 2001-2009. Isto quer dizer que na cidade de Parauapebas mais de 70% do
incremento populacional recebido na última década é oriundo de outras localidades. Outra
diferença, entre a composição da população nas quatro cidades, é que do total da população de
Santarém apenas 20,6% não são naturais. Em Castanhal, os nãos naturais correspondem a
38,7%. No caso de Marabá esse percentual chega a ser um pouco mais da metade (51%), já
em Parauapebas o percentual atinge 73%. Tanto em Castanhal como em Santarém a maioria
dos imigrantes é oriunda do Estado do Pará, em relação a Marabá e Parauapebas a maioria dos
imigrantes é de outros Estados brasileiros.
Como antes desenvolvido, para considerarmos determinada cidade como média é
necessário que esta, além da dimensão populacional urbana correspondente a este porte,
desempenhe papéis intermediários entre as cidades pequenas e as metrópoles, sendo centro de
referência para o atendimento de demanda de bens e serviços necessários a produção e a vida,
não só dela mesma, mas como também das cidades pequenas no seu entorno. Dessa forma, no
Quadro 1 foram selecionados alguns serviços e bens, a fim de verificar se as quatro cidades
paraenses que já possuem o limiar populacional urbano considerado para serem cidades
médias são capazes de ofertar bens e serviços para sua população e das cidades em seu
entorno. Com isso, selecionamos as cidades pertencentes às microrregiões correspondentes a
cada uma delas, visto que as cidades menores são polarizadas pelas cidades médias, tornando-
se assim um elo de atração para população destas localidades.
No Quadro 1 abaixo, aponta-se dez indicadores de serviços disponibilizados nestas
cidades que vão desde as atividades de lazer e cultura, assim como os serviços especializados
como a formação de profissionais em instituições de nível superior, exames com diagnósticos
complexos na área da saúde e de transportes. Observa-se que as cidades médias paraenses
apresentam capacidades pouco diferenciadas em ofertas de bens e serviços. A cidade de
Santarém, por exemplo, apresentou bom desempenho nos dez itens selecionados, seguida de
Marabá e Castanhal que apresentaram bom desempenho em nove itens, cada uma. Enquanto
que a cidade de Parauapebas foi a que apresentou pior desempenho, mas deixando lacuna
apenas em dois itens. Nos itens que as três cidades apresentaram lacunas, acabam causando
um vazio na satisfação de sua população e das cidades menores que buscam esses serviços.
Os itens de melhor desempenho nas quatro cidades médias foram as Instituições de
Ensino Superiores e as Agências Bancárias, sendo que Marabá se sobressai as demais cidades.
290
Dessa forma, as diferentes Instituições de Ensino Superiores localizadas nestas cidades,
possibilitam a produção de conhecimentos especializados e formação de profissionais mais
qualificados para o mercado de trabalho, assim como acabam atraindo habitantes das cidades
menores de seu entorno em busca da possibilidade de cursar um curso de graduação. Apesar
de algumas cidades menores apresentarem Instituições de Ensino Superiores, mas ainda sim é
um número reduzido nestas localidades, assim como a variedade de cursos oferecidos por elas
também é reduzida, a maioria dos cursos são voltados para licenciaturas, tornando-se um fator
de migração desses habitantes para as cidades médias em busca de outros Cursos.
O município de Parauapebas conta apenas com dois dos cinco serviços selecionados
na área de saúde e, Castanhal oferece três destes serviços, já os municípios de Marabá e
Santarém oferecem todos os cinco serviços selecionados. Por outro lado, as cidades
selecionadas que são polarizadas por Marabá, Santarém e Parauapebas, nenhuma apresentou
qualquer um dos serviços de saúde selecionados. Enquanto que a cidade de Santa Isabel do
Pará, polarizada por Castanhal, apresentou um dos cinco serviços (Raio X mais de 500mA).
Diante desses resultados, ou seja, da falta destes serviços nas cidades polarizadas pelas
cidades médias paraenses, as pessoas que precisam destes serviços buscam atendimento nas
cidades médias.
Em relação aos serviços de comunicação prestados pelas cidades médias paraenses,
Santarém apresenta o baixo percentual de domicílios com microcomputador com acesso à
internet (12,4%) e Marabá o melhor percentual (15,3%). Parauapebas possui menor
percentual de domicílios com linha telefônica fixa instalada (11,8%), já Santarém possui o
melhor percentual (19,7%). As quatro cidades apresentaram estações de rádio FM e geradoras
de TV possibilitando a difusão das informações de forma mais rápida. Quanto ao acesso aos
serviços de saneamento adequado, o melhor desempenho apresentado entre os municípios das
cidades médias foi Parauapebas (38,5 %), superando em duas vezes a média percentual
estadual (19,0%). Seguido pelo município de Santarém com 27,3%, Marabá ocupa a terceira
posição com 15,7% e por último Castanhal com 14,4% (IBGE, 2010).
291
Quadro 1 – Oferta de bens e serviços nos municípios das cidades médias paraenses e municípios das microrregiões.
Municípios Agências Instituições Serviços de Estação Geradora Aeroporto Teatros ou Domicílios com Domicílios com Transporte
bancárias de nível saúde de Rádio de TV salas de linha telefônica microcomputador com coletivo por
superior especializados* FM espetáculos Instalada acesso a internet ônibus
intramunicipal
CASTANHAL 9 11 3 Sim Sim Não Sim 14,5% 14,8% Sim
Bujaru 0 1 0 Não Não Não Não 2,8% 3% Sim
Inhangapi 0 0 0 Não Não Não Não 3,5% 3,4% Sim
Santa Isabel do 3 0 1 Não Não Não Não 5,5% 5,7% Não
Pará
Santo Antônio do 0 0 0 Não Não Não Não 1% 1,9% Não
Tauá
MARABÁ 12 18 5 Sim Sim Sim Não 14,3% 15,3% Sim
Brejo Grande do 0 1 0 Não Não Não Não 5,1% 2% Não
Araguaia
Palestina do Pará 0 0 0 Não Não Não Não 5,9% 2,9% Não
São Domingos do 1 0 0 Não Não Não Não 3,9% 2,4% Sim
Araguaia
São João do 0 0 0 Não Não Não Não 1,9% 0,3% Não
Araguaia
PARAUAPEBAS 12 11 2 Sim Sim Sim Não 11,8% 12,9% Não
Água Azul do 0 0 0 Sim Não Não Não 3,2% 1,5% Sim
Norte
Curionópolis 1 0 0 Sim Não Não Sim 5,2% 4,2% Não
Eldorado dos 1 2 0 Não Não Não Não 1,8% 2,6% Não
Carajás
SANTARÉM 9 15 5 Sim Sim Sim Sim 19,7% 12,4% Sim
Alenquer 3 1 0 Sim Sim Não Não 4,5% 2,7% Não
Monte Alegre 2 2 0 Sim Não Não Não 1,3% 3,6% Não
Prainha 0 0 0 Não Não Não Não 0,9% 0,1% Sim
Fontes: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros 2009, Censo Demográfico 2010; www.ibge.gov.br/cidadesat; http://emec.mec.gov.br/ e http://www.infraero.gov.br.
* Foram considerados serviços especializados: Mamógrafo com estéreo-taxia, Raio X para densitometria óssea, Tomógrafo, Ressonância magnética e Raio X mais de 500mA.
292
CONSIDERAÇÕES FINAIS
292
As cidades de Castanhal, Marabá e Santarém tiveram sua instalação no período que
antecede a década de 1960, diferente de Parauapebas que teve sua promulgação no ano de
1988. Portanto, as três primeiras cidades já desempenham de muito tempo importantes papéis
na rede urbana regional. Outra variável investigada foi saneamento básico, na qual constatou-
se que as cidades de Castanhal, Marabá, Parauapebas e Santarém apresentaram maior
percentual de domicílios possuidores de saneamento adequado em relação as cidades das suas
respectivas microrregiões. Vale ressaltar que as duas últimas cidades, apontaram percentual
superior a média estadual, proporcionando uma melhor qualidade de vida para a população
urbana dessas cidades. Entretanto, esse percentual não alcança nem a metade dos domicílios
pertencentes a estas cidades.
Com relação a ideia defendida por alguns autores (SANTOS 2010; ANDRADE;
SERRA, 2001 apud PEREIRA, 2005) de que as pessoas migram para as cidades médias por
que vêem nelas oportunidades de empregos. Neste contexto, apenas Castanhal tem a
capacidade de fixar migrante, as demais cidades apresentaram número de migrantes
superiores em relação a oferta de empregos, no período de 2005 a 2010, ocasionando certa
frustração para as pessoas que migraram com esse objetivo.
Com relação à importância destas cidades diante dos municípios menores, as cidades
de Marabá, Parauapebas e Santarém servem de base para o deslocamento para outras cidades
dentro das suas mesorregiões e com a capital do estado, pois somente estas apresentam
aeroportos. Já a população da microrregião de Castanhal utiliza o aeroporto de Belém, já que
essa cidade está posicionada a um raio menor de 100 km da capital paraense.
Por fim, diante das informações obtidas na presente pesquisa, fica comprovado que as
quatro cidades selecionadas são capazes de ofertar bens e serviços para os municípios das
suas microrregiões. Dessa forma, preenchem uma lacuna existente entre as pequenas cidades
e a metrópole, ou seja, exercem papel intermediário na rede urbana das quais são
pertencentes, colaborando na dinâmica dos fluxos da rede urbana no estado do Pará.
294
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMORIM FILHO, O.; SERRA, R.V. Evolução e perspectivas do papel das cidades médias no
planejamento urbano e regional. In: ALMEIDA, T; SERRA, R. (Org.). Cidades médias
brasileiras. Rio de Janeiro: Ipea, 2001, p. 1-34. Disponível em:
http://desafios.ipea.gov.br/sites/000/2/livros/cidadesmediabrasileiras/capitulo1_evolucao.pdf.
Acesso em: 04 de agosto de 2011.
ANDRADE, T. A.; SANTOS, A. M. S. P; SERRA, R. V. Fluxos migratórios nas cidades
médias e regiões metropolitanas brasileiras: a experiência do período 1980/96. Rio de
Janeiro: IPEA, 2000. (Texto para discussão, n. 747). Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/pub/td/2000/td_0747.pdf. Acesso em: 26 de maio de 2011.
ANDRADE, T. A.; SERRA, R. V. O recente desempenho das cidades médias no
crescimento populacional urbano brasileiro. Rio de Janeiro: Ipea, 1998. (Texto para
Discussão, n. 554). Disponível em: http://www.ipea.gov.br/pub/td/td0554.pdf. Acesso em: 04
de agosto de 2011.
BAENINGER, R. A nova configuração urbana no Brasil: desaceleração metropolitana e
redistribuição da população. In: XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, Anais...
Caxambu, MG, Abep, 1998, p. 729-772. Disponível em:
http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/PDF/1998/a150.pdf. Acesso em: 12 de maio de
2012.
BECKER, B. K. Dinâmica Urbana na Amazonia. In: Diniz, C. C.; Lemos, M. B.. (Org.).
Economia e Território. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais,
2005, p. 401-428.
BRITO, F. O deslocamento da população brasileira para as metrópoles. Estudos Avançados,
v. 20, n. 57, p. 221-236. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ea/v20n57/a17v2057.pdf.
Acesso em: 11 de junho de 2012.
CASTRO, E. Urbanização, pluralidade e singularidade das cidades amazônicas. In: Castro, E.
(Org.). Cidades na floresta. São Paulo: Annablume, 2008, p. 13-39.
CORTÊS, J. C.; D’ANTONA, A. O. Reconfiguração do Meio Rural no Oeste do Pará: uma
abordagem multiescalar da mobilidade e distribuição da população, e da mudança no uso-
cobertura da terra. In: V Encontro Nacional da Anppas, 2010, Florianópolis. Disponível em:
http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/artigos/GT14-376-907-20100903222640.pdf. Acesso
em: 20 de maio de 2011.
COSTA, E. M. da. Cidades médias: contributos para sua definição. Finisterra – Revista
Portuguesa de Geografia, Lisboa, XXXXVII, n. 74, p. 101-128, 2002. Disponível em:
http://www.ceg.ul.pt/finisterra/numeros/2002-74/74_05.pdf. Acesso em: 24 de junho de 2011.
HARVEY, D. A Condição pós-moderna. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1993.
MARICATO, E. Urbanismo na periferia do mundo globalizado: metrópoles brasileiras. São
Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.14, n.4, p.21-33, out./dez. 2000. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/spp/v14n4/9749.pdf. Acesso em: 9 de maio de 2012.
MATOS, R. Aglomerações urbanas, rede de cidades e desconcentração demográfica no
Brasil. In: ENCONTRO DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 12., 2000, Caxambu. Anais...
295
Caxambu: ABEP, 2000. v. 1, Disponível em:
http:<//www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/>. Acesso em: 9 de maio de 2012.
MONTE-MÓR, R. L. O que é o urbano, no mundo contemporâneo. In: Revista Paranaense
de Desenvolvimento, Curitiba, n.111, p.09-18, jul./dez. 2006. Disponível em:
http://www.ipardes.pr.gov.br/ojs/index.php/revistaparanaense/article/view/58/61. Acesso em:
09 de maio de 2012.
PEREIRA, F. M.; LEMOS, M. B. Cidades médias brasileiras: características e dinâmicas
urbano-industriais. In: Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v.33, n.1, p.
127-165, abr. 2003. Disponível em:
http://www.ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/view/88/63. Acesso em: 24 de junho de
2011.
PEREIRA, J. C. M. Importância e significado das cidades médias na Amazônia: uma
abordagem a partir de Santarém (PA). 2004, 139 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento
do Desenvolvimento). Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará,
Belém, 2004. Disponível em:
http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/Cidades_medias_amazonia.pdf. Acesso em: 20
de maio de 2011.
REBELLO, F. K. et al. Dinâmica populacional na AMAZÔNIA: o caso dos Estados do
Amazonas e Pará. In: Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e
Sociologia Rural, 47, 2009, Porto Alegre. Disponível em:
http://www.alice.cnptia.embrapa.br/bitstream/doc/903565/1/909.pdf. Acesso em: 20 de maio
de 2011.
REIS, D. S. dos. As redes para além dos rios: urbanização e desequilíbrios na Amazônia
Brasileira. 2009, 204 f. Tese (Doutorado em Demografia do Centro de Desenvolvimento e
Planejamento Regional). Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 2009. Disponível em:
http://www.cedeplar.ufmg.br/demografia/teses/2009/Douglas_Sathler.pdf. Acesso em: 22 de
maio de 2012.
SÁ, M. E. R. de; COSTA, S. M. G. da; TAVARES, L. P. O. O rural-urbano em Santarém:
interfaces e territórios produtivos. In: CARDOSO, A. C. D. (Org.). O rural e o urbano na
Amazônia: diferentes olhares em perspectivas. Belém: EDUFPA, 2006, p. 113-157.
SANTHLER, D.; MONTE-MÓR, R. L.; CARVALHO, J.A.M. de. As redes para além dos
rios: urbanização e desequilíbrios na Amazônia brasileira. Nova Economia, Belo Horizonte,
v. 19, n. 1, p. 11-39, janeiro-abril. 2009.
SANTOS, A. M.S.P. Urbanização Brasileira: um olhar sobre o papel das cidades médias na
primeira década do século XXI. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, São
Carlos, V. 12, N. 2 / Novembro de 2010, p. 103-119. Disponível em:
http://www.anpur.org.br/revista/rbeur/index.php/rbeur/article/view/256/240. Acesso em: 25
de maio de 2012.
SANTOS, M. A Urbanização Brasileira. 5. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 2008.
SERRA, M. A.; FERNÁNDEZ, R. G. Perspectivas de desenvolvimento da Amazônia:
motivos para o otimismo e para o pessimismo. Economia e Sociedade, Campinas, v. 13, n. 1,
p. 22, jan./jun. 2004. Disponível em:
http://www.eco.unicamp.br/docdownload/publicacoes/instituto/revistas/economia-e-
sociedade/V13-F2-S23/Serra_Fernandez.pdf. Acesso em: 21 de maio de 2012.
STEINBERGER, M.; BRUNA, G. C. Cidades médias: elos do urbano-regional e do público-
privado. In: ALMEIDA, T; SERRA, R. (Org.). Cidades médias brasileiras. Rio de Janeiro:
296
Ipea, 2001, p. 1-34. Disponível em:
http://agencia.ipea.gov.br/sites/000/2/livros/cidadesmediabrasileiras/capitulo2_cidademedias.
pdf. Acesso em: 7 de junho de 2011.
SPOSITO, M. E. B. As cidades médias e os contextos econômicos contemporâneos. In:
SPOSITO, M. E. B. (Org.). Urbanização e cidades: perspectivas geográficas. Presidente
Prudente: UNESP/FAT: GASPERR, 2001. p. 609-643.
————. Capitalismo e urbanização. 15. ed. São Paulo: Contexto, 2008.
297
PEQUENAS CIDADES DA REDE URBANA BRASILEIRA
RESUMO
Este artigo pretende investigar o papel das pequenas cidades na rede urbana brasileira. As
cidades pequenas são a maioria dos centros urbanos do país e estão nos níveis mais baixos da
hierarquia urbana, atendendo as necessidades funcionais mínimas de sua população. Essas
cidades possuem um menor reconhecimento de seu papel dentro da organização do território
brasileiro e existem poucos estudos sobre o tema. A fim de colaborar com a discussão, uma
abordagem sobre os estudos existentes sobre as cidades pequenas é construído. Antes disso,
para o entendimento da constituição da Rede Urbana Brasileira, são estudados os dados
estatísticos históricos que tratam da evolução do quadro urbano do país, através da publicação
do IBGE denominada Região de Influência das Cidades -REGIC.
132
Arquiteta e Urbanista. Mestranda em Planejamento Urbano e Regional na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Contato: arq.juguma@gmail.com.
Professores Orientadores deste trabalho: Profa. Dra. Heleniza de Ávila Campos, professor adjunto na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul no Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e no
Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional; e Profa. Dr. Maria Soares de Almeida,
integrante da rede nacional de pesquisa Urbanismo no Brasil e professora convidada do Programa de Pós-
Graduação em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - PROPUR.
298
INTRODUÇÃO
299
Para o estudo dessas pequenas cidades dentro da Rede Urbana do Brasil as
informações são buscadas junto a publicações oficiais de institutos do governo brasileiro e a
estudiosos do tema, em sua maioria geógrafos. A primeira parte do trabalho apresenta a Rede
Urbana Brasileira, principalmente, através dos dados estatísticos oficiais do IBGE, num
apanhado histórico dos REGIC – Regiões de Influência das Cidades publicados ao longo das
últimas décadas. Estes estudos trazem dados qualitativos e quantitativos importantes, pois
classificam a rede urbana tanto pelos critérios demográficos e estatísticos, quanto pelos fluxos
materiais e imateriais dentro da rede. Ainda, são informações importantes também por serem
levantadas pelo instituto oficial que subsidia os dados utilizados nas políticas públicas do país.
Na segunda etapa, as “cidades pequenas e cidades locais” são abordados através do
referencial teórico estudado. A discussão inicia com a tentativa de identificação e
reconhecimento das características definidoras de uma unidade conceitual para os pequenos
centros urbanos e seu papel dentro do sistema de cidades. Depois disso, a questão das
emancipações que originaram muitos desses pequenos municípios é trazida com uma visão
predominantemente econômica que termina em uma interessante reflexão sobre os prós e os
contras da existência dessas pequenas cidades. Por fim, são apresentados critérios que podem
auxiliar no estudo da temática deste trabalho.
300
A problemática da organização do espaço é bastante complexa. No Brasil, o número
de municípios aumentou de 1.574 em 1940, para 5.565 em 2008. Em 68 anos foram criados
3.991 municípios. E a população urbana brasileira que representava 30% na década 40, hoje
chega aos 85%. Dados do censo IBGE de 2010, indicam que o Brasil possui mais de 190
milhões de habitantes, destes mais de 160 milhões residem em área urbana e 29 milhões na
área rural. Transformações que precisam ser absorvidas de forma adequada pela estrutura
urbana e social do país.
Um panorama dessa evolução da rede urbana brasileira pode ser apreendida através
dos estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE que em 30 anos publicou
três levantamentos das Regiões de Inflluências das Cidades – REGIC. Tais publicações tem o
objetivo de “(...) subsidiar o planejamento estatal e as decisões quanto à localização das
atividades econômicas de produção, consumo privado e coletivo, bem como prover
ferramentas para o conhecimento das relações sociais vigentes e dos padrões espaciais que
delas emergem” (REGIC, 2007, p. 9).
A primeira publicação com esse propósito data de 1972, denominada Divisão do
Brasil em Regiões Funcionais Urbanas, que teve como base dados de 1966. Em 1987 foi
publicado um novo relatório, com dados da pesquisa realizada em 1983, já com a
denominação de Regiões de Influência das Cidades, tendo como coeditor o Ministério da
Habitação, Urbanismo e Meio Ambiente.
O estudo de 1987 teve como referência a Teoria das Localidades Centrais, formulada
por Christaller na década de 1930133, e a análise de centralidade das cidades foi realizada
através de questionário aplicado em 1416 sedes municipais previamente selecionadas.
133
“O presente estudo tem como quadro de referência inicial a teoria das localidades centrais ou da centralidade. Formulada por Christaller
na década de 1930, a teoria em questão considera o conjunto de centros de uma região ou país – cidades, vilas, povoados e estabelecimentos
comerciais isolados na zona rural – em seu papel de distribuição varejista e de prestação de serviços para uma população neles residentes.
Estes centros são denominados localidades centrais e a centralidade de que dispões é derivada de seu papel como centros distribuidores de
bens e serviços, ou seja, das funções centrais que desempenham.” (REGIC, 1987, p.11)
301
atividades seriam consideradas como funções centrais. (REGIC, 1987,
p.16).
134
“Segundo Raffestin (1993, p.200), as redes que, de forma genérica, envolvem o movimento de seres e bens são denominadas redes de
circulação. Aquelas que envolvem a transferência de informações são as redes de comunicação. Ainda de acordo com o mesmo autor, o par
circulação-comunicação está presente em todo e qualquer “transporte” , sendo que a primeira é, por englobar tudo aquilo que é mobilizavel,
mais geral que a segunda.” (REGIC, 1993, P.12)
302
Forte 35 Predominantemente de Capital Regional
Forte para médio 106 Predominantemente de Centro sub-regional
Médio 141 Tendendo a Centro Sub-regional
Médio para fraco 195 Predominante
Fraco 250 Tendendo a Centro de Zona (ou centro local)
Muito fraco 3.733 Municípios subordinados
Fonte: IBGE. Diretoria de Geociências. Departamento de Geografia
Quadro 1- Fonte: REGIC 1993, P. 26.
Centro de zona Cidades de menor porte e com A e B, com medianas de 45mil 556
303
atuação restrita à sua área e 23 mil habitantes,
imediata; exercem funções de respectivamente.
gestão elementares.
Para os municípios denominados Centros Locais, que não foram identificados como
centros de gestão, o IBGE realizou um levantamento específico. A rede de agências do IBGE
investigou, através de questionário, quais eram as principais ligações de transporte regular
desses municípios principalmente até os centros de gestão e os principais destinos dos
moradores dessas localidades para obtenção de produtos e serviços.
Ressalta-se a posição das pequenas cidades, foco deste artigo, que localizam-se nos
níveis mais baixos dessa classificação. De um universo de 5 564 municípios vigentes em
2007, foram pesquisados 5.280, dos quais cerca de 85% têm menos de 20 000 habitantes.
Porém, considerando o tamanho demográfico, apesar da grande quantidade de
municípios pequenos e do extenso território por eles ocupado, apenas aproximadamente 20%
dos brasileiros vivem nesses locais. Segundo dados do IBGE, a soma da população que vivia
em municípios com até 20 mil pessoas representava no ano 2000 apenas 19,6 % da população
brasileira; 7,5% da população vivia em municípios com até 10 mil habitantes; e apenas 2,2%
da população em municípios com até 5 mil habitantes.
A classificação em Município Subordinado, Centro de Zona ou Centro Local, não é de
todo negativa pois, na maioria das vezes, significa que essas cidades se aproximam das áreas
rurais e se afastam dos problemas encontrados em centros maiores. Assim, o fato de estarem
no nível mais baixo na hierarquia urbana, se bem aproveitado, pode resultar em grande
qualidade de vida para a população.
304
Como já foi visto, é grande o número de cidades pequenos que foram sendo criados no
território brasileiro, principalmente, ao longo do século passado. Muitas delas hoje possuem
importância local, alguma centralidade e dinamismo urbano. O que não acontece em outras
que mantém estruturas precárias, dependência total das cidades vizinhas, do Estado e da
União e nenhum tipo de relevância fora do seu espaço intra-urbano.
Essas cidades formam a Rede Urbana e, por isso, precisam ser estudadas e entendidas.
Conforme afirmam SPOSITO e SILVA:
Para isso, questionar como se configuram caracterizam essas cidades se faz necessário
para que um conceito seja construído e de colabora no entendimento da diversidade espacial
brasileira. Essa definição de cidade pequena pode indicar um caminho mais adequado para o
estudo, ..planejamento e gestão dessas cidades.
Trazendo algumas variáveis para definição, Morales (2013, p.45), afirma que o debate
sobre os pequenos municípios não pode ficar restrito as questões populacionais, ele precisa
tratar das “relações sociais e simbólicas que se estabelecem nestes espaços e pela análise das
dinâmicas hierárquicas que se configuram no âmbito das redes urbanas.” Ainda, atesta que:
Alimentando a discussão, para Sposito e Silva (2013, p.31) a cidade pequena possui
uma materialidade, uma forma e uma imaterialidade. A primeira característica diz respeito ao
seu plano espacial, complementado pela segunda que trata do processo de urbanização.
Associado a isso, aparece a terceira, que seriam os fluxos políticos, econômicos, sociais e
305
culturais. Já Marcelo Lopes de Souza, indica que para tal caracterização é necessário que se
analise os “aspectos populacionais, funcionais e econômico-espaciais dos núcleos urbanos”.
O mesmo autor define que a centralidade de uma cidade como de natureza
predominantemente econômica, pois trata da “sua capacidade de ofertar bens e serviços para
outros centros urbanos, estabelecendo, desse modo, uma área de influência”. Ainda, segundo
Melo e Silva (2010), as mudanças socioeconômicas vão alterando os papéis das pequenas
cidades e podem transforma-las em centros de produção industrial, comercial, agrícola e
turística.
Essa preocupação conceitual sobre o que é uma cidade ou, ainda, quais agrupamentos
humanos podem ser classificados como espaços urbanos, é presente no estudo das pequenas
cidades. São frequentes também os questionamentos sobre densidade demográfica e
populacional mínimas para caracterização desses espaços.
Neste mesmo sentido, Soares e Melo (2010) indicam que é preciso se discutir essas
questões, tanto para elaboração de um diagnóstico ou para dotação de recursos para cumprir a
legislação. Os autores indicam que “é preciso adotar critérios que se baseiem em variáveis
específicas que possam auxiliar na compreensão do urbano.” (SOARES; MELO, 2010, p.240)
O primeiro critério é o Tamanho Populacional. Adotado pela facilidade na obtenção
dos dados estatísticos para estudos comparativos e análises evolutivas, assim como projeções
com certo grau de precisão. É preciso pensar o urbano não só demograficamente, mas
também pelo “nível de desenvolvimento, as funções, a diversidade regional, o modo de vida,
as relações políticas, entre outros aspectos”.
A questão econômica é o segundo critério, no qual são utilizados dados
socioeconômicos diversos. Soares e Mello indicam que
307
Média (2010, p. 236) “deve ser pensada em sua relação com seu território e, principalmente,
com as pequenas cidades que compõem sua região”.
A análise da dinâmica desses pequenos centros urbanos colabora para o
entendimento da organização espacial do território brasileiro. Como pudemos observar, a rede
urbana brasileira é formada majoritariamente por municípios com menos de 45mil habitantes
e, a maioria, no nível mais baixo de centralidade dentro do processo de urbanização do país.
Muitas dessas cidades surgiram espontaneamente para responder as novas necessidades
primárias e imediatas da população, como escreveu Milton Santos:
135
Análise de Envoltória de Dados (DEA), GASPARINI e MIRANDA apud MAGALHÃES, 2008. Fonte original: GASPARINI, C. E.; MIRANDA, R.
B. Análise da equidade e da eficiência das ações municipais – uma avaliação usando Análise de Envoltória de Dados (DEA). Ipea, 2006
(Relatório de Pesquisa, n. 3).
309
3. o alto custo de produção nas menores cidades, especialmente no setor saúde, faz que a
provisão de serviços tenha que ser subsidiada;
4. a transferência de receitas tributárias originadas nos municípios grandes para os municípios
pequenos reduz a capacidade das prefeituras das grandes cidades em realizar programas
sociais e suprir serviços, como transporte, saneamento, segurança e pesquisa básica, o que
reduz, por consequência, os incentivos à produção;
5. essa nova alocação de receitas provavelmente não estimula na mesma proporção a
produção nos municípios pequenos;
6 os benefícios diretos da criação de municípios atingem uma pequena parte (não
necessariamente a mais pobre) da população brasileira que vive nas cidades pequenas, mas
prejudica a maior parte da mesma população, que habita outras cidades, cujos recursos se
tornaram mais escassos.136
Nesse sentido, IPEA (2008, p.20) identifica alguns benefícios indiretos do processo de
emancipação de novos municípios, que cria novas pequenas cidades. Esses indicadores
positivos estão listados abaixo de forma resumida:
1. a realocação dos recursos públicos para regiões pouco exploradas é capaz de desenvolver
ou aprimorar potencialidades locais das regiões em processo de esvaziamento populacional;
2. o desenvolvimento incentiva os moradores a permanecerem com suas famílias e evita,
assim, o êxodo para os centros maiores;
3. diminui vários custos de aglomeração aos grandes centros urbanos que deixam de gastar
com programas e políticas para resolver problemas sociais advindos do processo imigratório;
4. ganhos de escala espaciais, os gastos com políticas públicas e infraestrutura acontecem com
uma população menos aglomerada (como nas favelas), o que garante maior efetividade;
136
Os itens 4, 5 e 6 referem-se a estudos de GOMES e MacDOWELL apud MAGALHÃES, 2008. Fonte original: GOMES, G. M.; MAC DOWELL,
M. C. Descentralização política, federalismo fiscal e criação de municípios: o que é mau para o econômico nem sempre é bom para o social.
Brasília: Ipea, fev. 2000 (Texto para Discussão, n. 706).
310
5. o aumento de recursos financeiros para a comunidade emancipada, que pode melhorar suas
condições qualidade de vida e de acesso aos serviços públicos;
6. a “aproximação dos moradores de seus representantes políticos” já que agora as estruturas
políticas estão próximas e facilitam a representatividade local, sem intermediações.
Dessa forma, pode-se concluir, que a rede urbana é totalmente interligada, entre outros
fatores, pelas questões político-administrativas. Tal constatação vem fortalecer a necessidade
de estudo de todos os entes federativos, incluindo as pequenas cidades, as cidades locais.
312
“O rural pode ser entendido como uma representação social que está
presente na pequena cidade através dos hábitos, costumes, valores e
tradições dos moradores. Nesses espaços há intensa interação entre os
valores rurais e urbanos na vida dos moradores.” (SOARES e
MELLO, 2010, p. 244)
Observar todas essas questões pode ser um método viável e útil para se compreender a
realidade das cidades pequenas e do papel que elas ocupam na Rede Urbana em que estão
inseridas. E, a partir disso, definir qual método de trabalho, caminho de investigação ou
diretriz de política pública adotar para intervir positivamente nesse contexto.
313
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não se pretendeu identificar e esclarecer por completo o papel das pequenas cidades
na Rede Urbana Brasileira, tão pouco, esgotar a discussão sobre a temática. Sabemos que,
para essa escala de abordagem, outras questões precisariam ser tratadas e inúmeras
investigações seriam possíveis. Este trabalho é só o início de discussão na busca pelo
entendimento das cidades pequenas na rede urbana do Brasil. Não entramos, por exemplo no
questionamento da relação entre as pequenas cidades e os espaços rurais ou na discussão
sobre o que verdadeiramente pode ser considerado cidade. Essas discussões já estão mais
difundidas no campo teórico e englobam outros saberes que não caberiam no escopo/ tempo
de trabalho.
Com a análise dos dados estatísticos oficiais e o estudo teórico, percebemos que esse
campo do conhecimento ainda é pouco explorado. As preocupações se concentram,
principalmente no estudo dos grandes e médios centros urbanos, o que é perfeitamente
justificável. Porém, os esforços para a compreensão e caracterização da realidade das
pequenas cidades dariam uma dimensão mais completa da Rede Urbana Brasileira, que, como
vimos, é um sistema integrado e interdependente.
Assim, entendemos que a indefinição desse objeto e a consequente falta de
metodologia de estudo para tal, são alguns dos motivos pelos quais não se tenham rumos
oficiais para as políticas públicas dentro desses territórios. E, além disso, demonstra que não
temos domínio teórico-conceitual suficiente para atuarmos junto aquelas que representam a
maior parcela das cidades brasileiras: as pequenas.
Por fim, apesar da breve investigação, entendemos o importante papel dessas cidades
pequenas como centros locais urbanos para o desenvolvimento de relações humanas e
socioeconômicas. Tudo isso em um contexto totalmente diferente do vivido nos grandes
centros e metrópoles, mas não isolado destes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MELLO E SILVA, Sylvio Bandeira de. Cidades pequenas e médias: reflexões teóricas e
aplicadas. In: Cidades médias e pequenas: teorias, conceitos e estudos de caso. / Diva Maria
314
Ferlin Lopes, Wendel Henrique (organizadores). Salvador: SEI, 2010. 250 p. il. (Série estudos
e pesquisas, 87).
SOUZA, Marcelo Lopes de. ABC do Desenvolvimento Urbano. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2010. 5ª edição.
Redes e Fluxos do Território – Gestão do Território 2014 – IBGE – Rio de Janeiro, 2014.
Regiões de influência das cidades 1993/ IBGE, Departamento de Geografia. Rio de Janeiro:
IBGE, 2000. 230p.
315
MAGALHÃES, João Carlos. Emancipação Político-Administrativa de Municípios no Brasil.
In: Dinâmica dos Municípios. Alexandre Xavier Ywata Carvalho, Carlos Wagner
Albuquerque, José Aroudo Mota, Marcelo Piancastelli (organizadores). IPEA: Brasília, 2008.
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/pdf/analise_estimativas_2014.pdf,
acessado em 30/07/14
316
PERIODIZAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO ESPACIAL NO SEGMENTO DE
REDE URBANA NO TOCANTINS
Kelly Bessa137
1. Introdução
Deffontaines (1944, p. 141) inicia sua discussão de “como se constituiu no Brasil a
rede das cidades” com questões relevantes: “como uma região foi dotada de aglomerações
urbanas? Como nasceram elas, onde se instalaram, por que progrediram? Como se cria uma
rede urbana [...]”. Tais questionamentos estão diretamente relacionados com o surgimento e a
evolução de centros urbanos em uma determinada região e, consequentemente, com o
processo de estruturação de suas respectivas redes.
Nessa perspectiva, apoiado em uma abordagem histórico-geográfica, que permite
analisar sistematicamente a constituição do território, busca-se estabelecer a periodização do
segmento de rede urbana no Tocantins, considerando os processos de diferenciação entre seus
centros desde o século XVIII, quando surgem os primeiros núcleos urbanos, no antigo norte
da capitania de Goiás, até a edificação da capital estadual, Palmas, no final do século XX.
Para tanto, recorreu-se à elaboração de uma periodização, tendo em vista que a
constituição da rede urbana é susceptível de ser temporalizada. Essa periodização, por sua
vez, evidencia os momentos de relativa estabilidade e de reestruturação do padrão espacial da
rede, por meio da variabilidade de um conjunto de elementos peculiares à natureza desse tipo
de rede, engendrada pela desigual espaço-temporalidade dos processos políticos, econômicos
137
Profa. Dra. dos Cursos de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em Geografia e em Ciências do
Ambiente da Universidade Federal do Tocantins (UFT).
317
e socioculturais em curso. Ademais, revela a diferenciação entre os centros, destacando
aqueles que desempenham papéis intermediários.
138
Em 1809, instalou-se a Comarca de São João das Duas Barras (Comarca do Norte), composta pelos julgados
de Traíras (Tupiraçaba), Cavalcante, São Félix, Arraias, São João da Palma (Paranã), São Luís (Natividade) e
Porto Real (Porto Nacional) (Palacin; Moraes, 2008). Desses julgados apenas os quatro últimos pertencem ao
atual estado do Tocantins.
139
Há registro de quatro aldeamentos nos séculos XVIII e XIX: Dianópolis (Duro e Formiga), Pedro Afonso
(Travessa dos Gentios) e Tocantínia (Piabanha). Já no início do século XX, foi instalado o aldeamento de Itacajá
(1938).
318
A presença desses pequenos núcleos de povoamento, praticamente indiferenciados, é
uma primeira e necessária fase do processo de elaboração da rede urbana. Esses núcleos se
constituíram no embrião da rede de arraiais do antigo norte goiano ainda no século XVIII,
pois, já em 1778, a capitania de Goiás estava constituída por 13 julgados, pertencentes à
comarca de Vila Boa de Goiás, entre os quais apenas os julgados de São Luís (Natividade),
Ouro Podre (Arraias) e Conceição pertencentes ao atual estado do Tocantins. Na época, esses
julgados contavam com um conjunto de 16 arraiais, que são os primeiros núcleos de
povoamento.
Com esses núcleos iniciais de povoamento, não se formou, de forma efetiva, uma rede
de arraiais. A mineração estabeleceu intercâmbios com regularidade, porém não havia outras
atividades capazes de gerar interações. Ademais, pela ausência de diferenciação funcional
entre esses arraiais, não se estabeleceram com regularidade interações no interior da região,
porque não havia uma real divisão interna do trabalho.
A vida de relações estava direcionada pela rede mercantil da mineração e pela
incipiente rede de abastecimento dessas aglomerações. Os intercâmbios eram realizados, por
meio das rotas terrestres e fluviais, com São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Belém (Mapa
2). A principal rota de circulação de metais preciosos ocorria no sentido Mato Grosso/Goiás -
Triângulo Mineiro - São Paulo/Rio de Janeiro, e, no sentido inverso, dava-se o retorno com
mercadorias necessárias aos núcleos da mineração (Holanda, 1989). Conforme Magalhães
(2004, p. 52-53), os comerciantes dessas capitanias prontificaram-se em atender as demandas
das minas goianas, “[...] oferecendo todos os tipos de produtos para a subsistência, além de
artigos de luxo destinados ao segmento social mais abastado [...] até equipamentos para a
mineração”.
A distância e as condições precárias dos acessos dificultavam e oneravam o
abastecimento da região. A Estrada do Anhanguera foi aberta, pelos paulistas, em 1730,
constituindo-se, inicialmente, no único caminho entre São Paulo e as minas goianas e mato-
grossenses. No apogeu da Idade do Ouro, a partir da Estrada Real, foram abertos dois outros
caminhos ligando Vila Rica e São João Del Rei às minas goianas, conhecidos como Picada de
Goiás (1736) e Picada Nova de Goiás (1739), que tornavam mais acessível o mercado do Rio
de Janeiro. De Salvador, havia o Caminho da Bahia, que dava acesso às minas do norte da
capitania de Goiás e, destas, à Vila Boa, pois foi aberto o caminho entre Vila Boa e o arraial
de Porto Real, conectando um conjunto de arraiais no norte goiano. Esses, apesar das
319
condições precárias, eram responsáveis pela comunicação entre os litorais paulista, carioca e
baiano e as regiões oeste e norte da Colônia.
320
321
322
292
A navegação fluvial, especialmente nos rios Tocantins e Araguaia, foi
responsável pela conexão entre os arraiais do sul e do norte da capitania, e via de acesso
ao mercado de Belém, no Pará. O rio Tocantins era a principal via de comunicação da
região com Belém, de onde se exportava o ouro. Todavia a navegação no Tocantins foi
proibida durante a fase de alta rentabilidade do ouro (1733 a 1782), como parte das
políticas de controle territorial português, restringindo a atividade de comércio com São
Paulo, Rio de Janeiro, Cuiabá e centros na Bahia e Minas Gerais.
Com o estabelecimento regular de intercâmbios nas rotas terrestres, a atividade
mercantil de abastecimento foi-se instalando, de forma incipiente, nos principais pontos
de circulação. Entre 1736 e 1752, a maior concentração de lojas, vendas, tabernas e
boticas estava em São Luís (Natividade) e Arraiais (Leitão, 2012). A Coroa promoveu, a
partir de 1732, a instauração de registros e de presídios nos povoados junto aos
principais caminhos, para garantir o controle e a fiscalização do território. Entre esses,
destacaram-se São Luís (Natividade), São José do Duro (Dianópolis) e Porto Real
(Porto Nacional).
Com o reestabelecimento da rota de comércio norte-sul no rio Tocantins, em
1791, instalou-se um destacamento militar junto à margem direita do alto Tocantins, a
partir do qual se desenvolveu Porto Real (Porto Nacional). A diferenciação desse núcleo
foi marcada pela posição privilegiada na região mineradora do antigo norte goiano e
pelas interações comerciais, sobretudo, com o Pará, por via fluvial, com a Bahia, por via
terrestre, passando por São Luís (Natividade) e Duro (Diánopolis), e com Vila Boa, ao
sul, passando por Arraias.
No caso de Porto Real, sua localização na margem direita do rio Tocantins
conferiu uma excelente posição, garantindo o acesso e o controle da navegação no alto e
médio Tocantins. Tal arranjo espacial possibilitou um acúmulo de funções ligadas ao
incremento da navegação, orientando uma primeira fase de estruturação da rede
embrionária de arraiais. Tratava-se, contudo, de articulações pouco complexas, gerando
uma rede bastante simples, marcada por frágeis relações internas, porque as atividades
da mineração pouco beneficiavam a região; e por relações externas, com a rede de
Belém, por via fluvial, e com as redes de São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, através
dos caminhos coloniais, cujos pontos de intermediação eram Vila Boa e Pirenópolis, ao
sul, Duro (Dianópolis), à sudeste, e Porto Real, ao norte.
A precária estrutura comercial refletia-se na estrutura da rede, já que a posição
das aglomerações expressava sua inserção nas redes de comercialização da mineração e,
324
em menor escala, nas redes de abastecimento. Esses arraiais, aldeamentos e vilas
figuravam, nas redes mercantis de Belém, São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador,
simplesmente como núcleos elementares e pouco diferenciados, pois as interações eram
inteiramente dependentes da mineração, que mobilizava os excedentes de valores
produzidos pela economia da mercantil, dificultando a diversificação das atividades e o
processo de diferenciação funcional dessas aglomerações. Tratava-se de redes que
estabeleciam solidariedades desiguais entre o sertão e o litoral. Essas fortaleciam as
principais cidades, pela manutenção de relações assimétricas entre as core areas no
litoral e as áreas periféricas no sertão.
140
Cabe comentar que muitos dos arraiais da mineração deixaram de existir, quando do fim da
exploração do ouro no norte goiano, a exemplo de Bom Jesus do Pontal, Chapada dos Negros, Pontal da
Natividade e Taboca.
325
atavismos de dominação política, conforme Moraes (1977), e práticas de apropriação da
terra (concessão ou posse) e de acumulação espoliativa, como percebeu o viajante-
naturalista Saint Hilaire (1975) ainda no século XIX, resultando em forte concentração
de riqueza.
Nesse contexto, ocorreu a lenta expansão das atividades agropastoris e do
estrativismo vegetal, com a dispersão da população pelo espaço rural. A atividade
agropastoril tradicional desenvolveu-se, em fins do século XVIII e no século XIX, no
vale do Tocantins e na porção sudeste do atual estado, com correntes vindas do Planalto
Central e do meio norte, determinando a ocupação do território141.
A presença de criadores de gado e de roceiros já se fazia próximo às minas,
abastecendo os mineiros com produtos de primeira necessidade, apesar de essas
atividades terem sido proibidas pela Coroa. Como o abastecimento dessas áreas era
bastante difícil, dada às distâncias e à precariedade dos caminhos, já em 1735, teve-se
indicação da presença de fazendeiros ocupando as pastagens naturais no baixo
Tocantins e seguindo, em direção norte, para Arraias, Palma (Paranã), Conceição e São
Luís (Natividade). Nesses, desenvolvia-se agricultura de subsistência rudimentar, que,
lentamente, foi se transformando numa pequena lavoura mercantil, pela comercialização
de escassos volumes de gêneros alimentícios. A criação extensiva de gado era a
atividade mais viável, pela presenca das pastagens naturais e por exigir pouca mão-de-
obra e pouco investimento de capital. Ademais, o gado era uma mercadoria
autotransportável, que vencia a precariedade dos caminhos coloniais.
Essas atividades promoveram o surgimento de alguns núcleos urbanos no século
XIX, entre os quais Tocantinópolis, Taguatinga, Marianópolis, Lizarda, Itaguatins,
Araguatins, Filadélfia, Araguaína, Aurora do Tocantins, Santa Rosa do Tocantins,
Brejinho de Nazaré, Ananás, Ponte Alta do Tocantins e Ponte Alta do Bom Jesus.
Portanto, teve-se, no norte goiano, uma geração de centros urbanos próprios da criação
extensiva de gado e da agricultura de alimentos para a subsistência.
Vale ressaltar que, em 1835, ocorreu nova divisão do território, ficando a
Comarca do Norte dividida em duas comarcas - Cavalcante e Porto Imperial (apenas a
última pertencente ao atual Tocantins). Alguns dos arraiais existentes no norte goiano já
haviam sido elevados à condição de vila - Palma, Porto Imperial, Natividade e Arraias.
Entre 1850 e 1861, ocorreu outra reestruturação e a região passou contar com três
141
Prado Júnior (1986, p. 53) afirma que “[...] à pecuária se deve a ocupação de boa parte do território
da colônia, e calculado em área efetivamente colonizada, ela ultrapassa a mineração”.
326
comarcas - Cavalcante, Porto Imperial e Carolina (apenas a segunda citada pertencente
ao atual Tocantins). Nesse período, ocorreu a elevação de outros arraiais à condição de
vila - Dianópolis, e a elevação de três vilas à condição de cidade - Palma, Porto Imperial
e Arraias. Já em 1872, o então norte goiano, contava com nove comarcas, sendo três
pertencentes ao atual Tocantins: Palma, Porto Imperial e Boa Vista.
A população desses arraiais, vilas e cidades dedicava-se à agricultura para o
autoconsumo e, havendo um pequeno excedente, para abastecer o limitado comércio
interno e, em pequena escala, o comércio inter-regional. Gêneros alimentícios, como
milho, feijão, arroz, mandioca, cana-de-açúcar, farinha, açúcar e aguardente, eram
produzidos, de forma rudimentar e escassa, em todos os arraiais e vilas, o que limitava a
atividade comercial. Nas palavras de Estevam (1997, p. 27), “a maioria dos habitantes
plantava para o autoconsumo e pouquíssimos produtos eram enviados para fora da
região [...]”. A atividade comercial era quase inexistente e estava limitada à produção
desses gêneros alimentícios. Há registros, entre 1819-1843, de transações comerciais em
Arraias e em Boa Vista (Tocantinópolis) (Magalhães, 2004). O gado, atividade mais
rentável, era comercializado com as províncias da Bahia e do Pará. Dos mercados da
Bahia e do Pará, eram importados produtos como sal, tecidos, bebidas e ferragens
(Magalhães, 2004; Estevam, 1997).
Com o incremento da navegação no Tocantins, estabeleceu-se uma rota
comercial com Belém. Há, relatórios da província, de 1858, que demonstraram a
movimentação de mercadorias entre Porto Imperial (Porto Nacional) e Belém
(Magalhães, 2004; Estevam, 1997). Há, documento demonstrativo do comércio no rio
Tocantins, de 1861, que expressou os gêneros exportados (couros e peles cruas) e
importados (sal, vinho, ferragens e louças) através de Porto Imperial (Flores, 2009).
Todavia, durante o século XIX, tais atividades comerciais foram incipientes devido à
fraca inserção na divisão territorial do trabalho.
327
relações entre esses núcleos de povoamento, caracterizada pela comercialização dos
produtos regionais e de gêneros e bens de consumo não produzidos localmente, gerando
escassos fluxos no interior da região, entre um conjunto de arraiais que desenvolviam
atividades agropastoris e alguns núcleos ribeirinhos no Tocantins e Araguaia; e fluxos
exteriores à região, com centros no Pará, no sul goiano, na Bahia, no Maranhão e no
Piauí.
O padrão de rede urbana resultante, não mais embrionário, mas ainda não
solidamente estabelecido, tinha na antiguidade e na localização ribeirinha de seus
centros os principais fatores de distinção, pois, com a predominância da atividade
agropastoril e de formas de produção pré-capitalistas, num longo período de estagnação,
não havia grandes diferenciações funcionais entre os núcleos urbanos, resultando numa
“integração intrarregional fraca” (Machado, 1979, p. 80).
Nesse contexto, diferenciaram-se Porto Nacional e Tocantinópolis, principais
portos fluviais, responsáveis pela circulação dos produtos regionais, demonstrando o
comando exercido pela rede fluvial no processo de interconexão das aglomerações. Em
decorrência da posição ribeirinha, esses centros alcançaram certa relevância no norte do
estado de Goiás. Através desses portos fluviais, exportavam-se produtos agropastoris
(gado, charque, couros, peles, óleos vegetais, borracha de mangabeira) e importavam-se
produtos como sal, querosene, ferramentas, tecidos, produtos farmacêuticos e até
manufaturados europeus. Com isso, retomaram-se as interações comerciais após
décadas de isolamento, caracterizadas, por Palacín (1979), como o período de letargia
que se seguiu após a decadência da mineração.
A partir de 1940, uma nova atividade, a garimpagem de cristal de quartzo
promoveu o surgimento de alguns pequenos núcleos urbanos (Pium, Dois Irmãos do
Tocantins, Cristalândia, Pequizeiro, Araguaçu, Dueré, Itaporã, Formoso do Araguaia,
Xambioá, Araguanã, Arapoema, Araguatins e Ananás), ampliando o dinamismo na
região entre os rios Tocantins e Araguaia. O cristal extraído era transportado, por via
aérea, para o Rio de Janeiro para exportação. A presença dos garimpos estimulou a
produção de alimentos para abastecer a população mineradora e dinamizou a área e os
centros já existentes entre os vales do Araguaia e Tocantins, entre os quais Araguaína.
Com a retração da comercialização do cristal de quartzo e a consequente decadência
desses garimpos, as populações dessa região dedicaram-se ao extrativismo vegetal e à
agropecuária tradicional.
328
Com o desenvolvimento da atividade agropastoril, foram surgindo
estabelecimentos para o beneficiamento primário dos produtos regionais. As máquinas
de beneficiar arroz instalaram-se em Porto Nacional, Miracema do Norte, Pedro Afonso,
Filadélfia e Tocantinópolis. Os matadouros situaram-se próximo aos grandes rebanhos,
que, nesse período, encontravam-se nos vales dos rios Tocantins e Araguaia, sendo
importante destacar a presença de frigoríficos em Pedro Afonso e Araguacema. Em
Tocantinópolis, havia uma fábrica de óleo para o beneficiamento da amêndoa do
babaçu. A atividade industrial era bastante inexpressiva e tinha caráter artesanal,
destacando-se a transformação de produtos alimentares e bebidas, a exemplo das “casas
de farinha” e das “engenhocas” para a fabricação de farinha, rapadura, aguardente e
açúcar, e pequenos estabelecimentos de fabricação voltados para atividades urbanas,
como cerâmicas, olarias, tecelagens e sapatarias, que se destinavam ao mercado local
(IBGE, 1959).
A atividade industrial tinha papel secundário. As atividades agropastoris, ao
contrário, eram fundamentais, pois, a partir dos excedentes, estabeleciam-se
intercâmbios permanentes entre o campo e os principais centros coletores e expedidores
da produção agropecuária. Paradoxalmente, é por meio das atividades agropastoris,
especialmente a pecuária, que se introduz formas capitalistas de produção (Machado,
1979). Em contrapartida, esses centros eram responsáveis pela distribuição de bens e
serviços para os centros menores e para o campo, criando um novo padrão de rede
urbana, marcado pelas relações cidade-campo. A partir dessas, foram criadas as bases
para a conversão de uma economia rural agrária em uma economia urbana de base
agrária.
Com base nesses intercâmbios gerados pelo comércio e serviços, o norte goiano
participava de redes mais amplas que encontravam, ao sul, Anápolis e Goiânia; ao norte,
Marabá e Belém; à sudeste, Barreiras e Salvador; e, à nordeste, Carolina e Imperatriz.
Num conjunto espacial mais amplo, esses centros estabeleciam contatos com São Paulo,
Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, São Luís e Teresina (IBGE, 1959).
Na década de 1950, a rede urbana do norte goiano caracterizava-se pela presença
de 14 centros, que desempenhavam papéis como sedes de município e, portanto, com
funções urbanas vinculadas às atividades administrativas municipais, e pela existência
de 28 distritos e 70 vilas e povoados (IBGE, 1959). Entre esses núcleos, apenas seis
contavam com população superior de 10.000 habitantes (Porto Nacional, Pedro Afonso,
329
Tocantinópolis, Araguacema, Filadélfia e Natividade), que juntos concentravam 72,5%
da população regional, que, em 1950, totalizava 204.041 habitantes (IBGE, 1950).
Até o final da década de 1950 e início da década de 1960, o padrão de rede no
norte goiano estava associado às atividades agropastoris, às atividades comerciais e de
prestação de serviços e à circulação fluvial. A presença dos portos fluviais,
destacadamente Porto Nacional e Tocantinópolis, atuou como um vetor interno da
organização espacial. O comando sobre o sistema de transporte fluvial acelerou a
diferenciação desses núcleos, que passaram a influenciar vasta área agropecuarista, com
as quais mantinham um movimento de trocas desiguais, pela capacidade de organização
e pelo controle dos excedentes regionais.
330
Os investimentos da política de integração do governo federal na Amazônia
Legal incorporaram áreas junto à BR-153, no antigo norte goiano, impulsionando os
núcleos urbanos regionais e redefinindo seus papéis “[...] como catalizadores do
processo de ocupação” (Machado, 1979, p. 65). Tais investimentos financiaram projetos
para a instalação de infraestruturas econômicas (transporte, energia e armazenamento),
para o desenvolvimento agrícola e da pecuária (Polo Agropecuário do Araguaia-
Tocantins, Polo Gurupi), para o desenvolvimento agroindustrial (frigorífico e loja de
insumos agrícolas em Araguaína, fábrica de implementos agrícolas em Miracema do
Norte, usina de beneficiamento de arroz em Gurupi, frigorífico em Araguaçu), para a
melhoria de infraestruturas e equipamentos urbanos, assim como estimularam o crédito,
notadamente linhas de financiamento rural (Machado, 1979).
Nesses centros regionais, ampliaram-se e diversificaram-se as funções
comerciais e de prestação de serviços, especialmente nos pontos de interseção com a
BR-153, indicando, segundo Machado (1979, p. 71), uma “[...] urbanização relacionada
ao crescimento comercial dos núcleos urbanos”. Também se aumentou a própria escala
de urbanização, como resultado das políticas de concentração de terras, de imigração e
de desenvolvimento urbano. O índice de população urbana saltou de 12,9%, em 1950,
para 39,7%, em 1980 (IBGE, 1950 e 1980). Nos centros juntos à BR-153, tal processo
foi mais expressivo - Araguaína (66,5%), Colinas do Tocantins (77,7%), Gurupi
(79,9%), Miranorte (67,7%) e Paraíso do Tocantins (72,5%).
Nesse momento, as vias de transporte rodoviários e os investimentos produtivos
agropecuários, agroindustriais e urbanos surgiram como os motores da reorganização
espacial, atuando como imperativos para reorganização da rede, colocando, inclusive, a
região sob a influência direta da capital estadual, Goiânia, e, secundariamente, da capital
federal, Brasília. Tais centros, contudo, caracterizavam-se como lugares centrais, pelas
funções de comercialização da produção rural e pela atuação na distribuição de bens e
de serviços, com uma discreta estrutura industrial.
Assim, verificaram-se mudanças na rede urbana, marcadas pela criação de novos
centros, estagnação dos centros pré-existentes, sobretudo os com localização ribeirinha,
evolução da população urbana, com a ascensão de Araguaína e Gurupi, que, segundo
Machado (1979, p. 157), desempenhavam papéis como centros regionais, inclusive pelo
“[...] comando da expansão capitalista na região”. Desse modo, desenhou-se uma nova
geografia dos comandos e das decisões da vida regional, marcadamente pela existência
de uma rede hierarquizada de localidades centrais, que “[...] organiza os fluxos de
331
produtos excedentes no sentido de assegurar sua captação e circulação” (Machado,
1979, p. 4).
Antes, com uma divisão interna do trabalho menos densa e com o governo
federal protegendo os interesses de oligarquias locais, os controles regionais estavam
associados a Porto Nacional. Porém, com a emergência de políticas de Estado, em nível
federal, que contrariaram os interesses das oligarquias locais, em prol da expansão do
capital industrial, e com o alargamento da divisão interna do trabalho, Araguaína e
Gurupi apareceram exercendo papéis de controle sobre o espaço e sobre parcelas da
produção regional. Ambos na BR-153, que passou a sustentar a densificação dos
padrões de articulação espacial.
332
crescente divisão do trabalho, que resulta em alterações hierárquicas e qualificações
mais específicas, com destaque para os papéis exercidos pelos centros de zona, centros
regionais e pela capital estadual.
Tais mudanças estão diretamente relacionadas com os desdobramentos ocorridos
a partir da constituição do estado e da criação de sua capital, envolvendo a ampliação
das infraestruturas de transporte rodoviário, ferroviário, aéreo e hidroviário, que visa
consolidar novos corredores de exportação, e a implantação de projetos hidrelétricos.
Não obstante, abarcam a implantação de projetos agropecuários que, desde o final dos
anos de 1970, promovem incentivos à melhoria da pecuária e ao desenvolvimento da
agricultura e fruticultura. Observa-se a chegada de grandes corporações nacionais e
multinacionais do agronegócio, que são responsáveis pela implantação da usina
produtora de açúcar e bioenergia da Bunge Alimentos, em Pedro Afonso, e do
complexo industrial da Granol, em Porto Nacional, afora a implantação de filiais e de
unidades de armazenagem em vários centros. Sobressaem indústrias frigoríficas, além
de abatedouros e curtumes. No setor terciário, as alterações são marcadas pelas
modernas estruturas do comércio varejista e atacadista, especialmente pela difusão dos
supermercados, hipermercados e shopping centers, e pelas novas atividades associadas à
prestação de serviços.
Há de se ressaltar o papel do Estado na criação e instalação, tanto na capital
como em outros centros, de um número crescente de instituições, fundações e órgãos
estatais ligados à gestão político-administrativa direta e à prestação de serviços
públicos. A presença desses órgãos implica num ponderável campo de trabalho e, por
essa razão, esses centros, sobretudo a capital, têm atraído parte da população migrante,
tendo em vista o peso do setor público como principal empregador no mercado formal
de trabalho.
Portanto, esses centros apresentam-se como focos da vida político-administrativa
e como pontos de atração de empresas industriais, comerciais e prestadoras de serviços.
Entre esses, sobressaem-se, por sediar atividades vinculadas às demandas regionais e às
modernas formas de expansão capitalista, Palmas, Araguaína, Gurupi, Paraíso do
Tocantins, Porto Nacional, Guaraí e Colinas do Tocantins. Outros centros também se
destacam: Araguatins, Dianópolis, Miracema do Tocantins, Formoso do Araguaia,
Pedro Afonso, Miranorte, Alvorada, Araguaçu e Tocantinópolis.
A presença dessas atividades reforça a tendência à urbanização concentrada em
poucos centros e a natureza hierárquica das relações interurbanas. Em 2010, o estado já
333
contava com 139 centros, que exerciam papéis como sedes de município, dos quais
apenas 10 com população superior a 20.000 habitantes (Palmas, Araguaína, Gurupi,
Porto Nacional, Paraíso do Tocantins, Araguatins, Colinas do Tocantins, Guaraí,
Tocantinópolis e Miracema do Tocantins). Esses centros, juntos, concentravam 49,0%
da população estadual, que, em 2010, totalizava 1.383.453 habitantes (IBGE, 2010),
revelando o processo de concentração da população em poucos centros urbanos.
Nota-se que essas atividades, tanto associadas às demandas regionais como às
modernas formas de expansão capitalista, são responsáveis por um aumento quantitativo
e qualitativo das interações espaciais, que passam a ocorrer por meio da combinação de
relações que se articulam em escalas regional, nacional e, até mesmo, internacional.
Nesses centros, diversificaram-se e avolumaram-se as relações interurbanas nas
respectivas áreas de influência, e as relações de longa distância, especialmente na
capital, nos centros regionais, nos centros de zona e, em função da presença de
atividades especializadas, em centros como Pedro Afonso, Campos Lindos, Formoso do
Araguaia e Xambioá.
Nesse contexto, a concretude das interações mantidas pelos centros urbanos
desse segmento de rede revela-se por meio de dois recortes espaciais: um que opera
num espaço contínuo, delimitando os contornos regionais por meio da criação de
horizontalidades que definem as redes e as intencionalidades regionais; e outro que
opera num amplo espaço descontínuo, marcado por interações extrarregionais e pela
descontiguidade territorial, originando verticalidades. Tais recortes determinam os
papéis de cada um desses centros, bem como seus níveis de integração em escala
regional, nacional e internacional, porque estão associadas às redes criadas pelas
funções urbanas básicas, às especializações funcionais e às atividades exercidas pelos
atores hegemônicos vinculados às corporações nacionais e globais, envolvendo uma
gama cada vez mais complexa de interações materiais e imateriais.
Desse modo, esses centros inserem-se na rede urbana por meio de uma forte
centralidade regional, assim como se inserem como centros que sediam importantes
capitais extrarregionais, gerando uma rede com múltiplos circuitos, caracterizada por
horizontalidades e verticalidades. Esses recortes espaciais expressam a existência de
uma parcela de comando regional diretamente subordinada a uma base de comando
externo sobre a produção e a circulação demandada pelas grandes corporações. Assim,
percebe-se o controle regional apenas sobre parcelas das atividades, a continuidade da
reprodução dos capitais locais, o aprofundamento das articulações com os capitais
334
externos, os investimentos em infraestruturas e a inserção nas novas racionalidades da
atual divisão territorial do trabalho.
Tais condições afiançaram a ampliação e a diversificação dos papéis urbanos,
resultando numa rede urbana complexa, com múltiplos circuitos e hierarquizada. Nota-
se que essa rede continua em fase de elaboração de um novo arranjo espacial. Neste,
verifica-se que Palmas desempenha papel como Capital Regional (Mapa 3), pois vem
articulando um segmento de rede próprio, por meio das ações de seus agentes sociais,
políticos e econômicos, contando com relativas funções urbanas, entre as quais se
destacam a gestão política, a comercial e a de prestação de serviços. Ademais,
sobressaem Araguaína, exercendo papel como Centro Macro-Regional, e Gurupi,
desempenhando papel como Centro Regional, ambos estruturados em torno de
fornecimento de bens e serviços para atendimento à população local e regional.
Destacam-se ainda Porto Nacional, Paraíso do Tocantins, Dianópolis e Araguatins, que
desempenham papéis como Centros Sub-Regionais. Observam-se alguns centros de
zona, entre os quais: Colinas do Tocantins e Guaraí, que exercem papéis como Centros
Macro-Zonais; e Tocantinópolis, Miracema do Tocantins, Pedro Afonso, Alvorada,
Arraias, Taguatinga, Formoso do Araguaia, Augustinópolis, Miranorte, Araguaçu e
Xambioá, que cumprem papéis como Centros de Zona propriamente ditos, estruturados
em torno de um fornecimento de bens e serviços básicos, para atendimento à sua
população local e microrregional. Mantém-se, na base dessa rede, um importante
número de pequenas aglomerações urbanas, que desempenham papéis subordinados.
335
336
Esses principais centros urbanos do Tocantins, integrados nas redes produtivas,
mercantis e financeiras da economia nacional e internacional, e inseridos numa trama de
relações que ultrapassa o local, pela presença de firmas hegemônicas, com novos
agentes no processo produtivo, com forte influência sobre o Estado, sofrem
modificações notáveis diante das exigências e das demandas requeridas, mudando de
conteúdo, distinguindo-se dos demais centros, uma vez que respondem por relações
socioeconômicas distintas, expressando uma nova fase de estruturação da rede urbana.
3. Considerações finais
A diferenciação entre os centros de uma dada rede urbana está inexoravelmente
relacionada com os processos de mudança social e suas espaço-temporalidades distintas.
Nesses processos, está a base para a explicação das diferenças entre os centros urbanos
e da diversidade de suas redes.
A essência das análises não deve apenas permanecer situada na descrição dos
aspectos da mudança, ao contrário, deve centrar-se nas racionalidades que deflagram o
processo de transformação, bem como nos contextos espaciais e históricos, levando em
conta a noção de rede urbana como dimensão socioespacial. A rede urbana, sendo uma
dimensão socioespacial, crescentemente diferenciada e complexificada, passa a ser
submetida a tensões numerosas e profundas que se impõem sobre seu funcionamento e
sua estrutura. Tais tensões podem levar a mudanças, por vezes, lentas, orientadas por
uma continuidade especiosa, a exemplo das vagarosas alterações ocorridas no antigo
norte goiano entre o final do século XVIII e o início do século XX; por vezes, rápidas,
fundamentadas em princípios diferentes dos anteriores, notadamente presentes nas
transformações no segmento de rede urbana no norte de Goiás a partir de 1960, quando
se impôs uma modificação na hierarquia dos centros, quando centros como Araguaína e
Gurupi passaram a desempenhar papéis de intermediação, alterando, gradativamente, a
configuração da própria rede urbana; e, não raro, brutais, rompendo, de forma radical,
com os padrões precedentes, como no caso da criação de um novo estado e de sua
capital, responsáveis por mudanças drásticas no padrão de articulação do segmento da
rede urbana do Tocantins após de 1989.
Trata-se, respectivamente, de mudanças com continuidade e mudanças com
descontinuidade, posto que, a cada momento histórico e a cada contexto espacial, se tem
o embate entre tais processos, caracterizando a incessante renovação da sociedade e, por
conseguinte, a recriação constante de diferencialidades espaciais.
337
Nessa perspectiva, faz-se necessário entender a natureza da rede urbana e os seus
complexos processos de formação e transformação. No Tocantins, a dinâmica do
segmento de rede urbana revela alterações significativas, reflexo das transformações
políticas, econômicas e socioculturais por que vem passando a região, sobretudo, depois
da separação política do estado de Goiás e da inserção na Amazônia Oriental em 1989.
Tais transformações resultaram em novos padrões geográficos, em que se verifica
crescente diferenciação entre os centros, marcada pela criação de novos núcleos, pela
mudança na estrutura hierárquica, com destaque para os papéis de intermediação que
alguns centros passam a desempenhar, pela modificação e ampliação das funções
urbanas, pela intensificação das interações espaciais, que passam a ocorrer por meio de
horizontalidades e verticalidades, resultando na modificação e na complexificação do
próprio segmento de rede.
Referências
BERTRAN, P. História da terra e do homem no planalto central: eco-história do
planalto central: do indígena ao colonizador. Brasília: Solo, 1994.
FLORES, Kátia M. Caminhos que andam: o rio Tocantins e a navegação fluvial nos
sertões do Brasil. Goiânia: Ed. da UCG, 2009.
338
LEITÃO, Tania Maria de Maio. Abastecimento alimentar na primeira metade do
século XIX. 2012. 142 f. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal de
Goiás, Goiânia, 2012.
REIS FILHO, Nestor G. Evolução urbana do Brasil. São Paulo: Instituto de Física.
1971.
339
AMAZÔNIA OCIDENTAL: A PRODUÇÃO DA REDE URBANA
DISPERSA, CONCENTRADA E A REGIÃO METROPOLITANA.
Resumo:
Manaus se constituiu historicamente em um núcleo que expandiu para si
mesmo, pelas condições estabelecidas pela política e os incentivos fiscais, fazendo dela
uma região metropolitana diferenciada, dispersa e concentrada. Todavia, os núcleos
urbanos das sedes municipais e distritos não apresentavam em sua totalidade as
condições que permitisse afirmar em sua realidade socioespacial a existência de um
processo de metropolização do espaço.
I. A urbanização da Amazônia
Os núcleos urbanos das sedes municipais e distritos, (com exceção de Iranduba
por ser a mais próxima da capital, muito embora tivesse o rio Negro como obstáculo de
descontinuidade espacial antes da ponte), não apresentavam em sua totalidade as
condições que permitisse afirmar em sua realidade socioespacial a existência de um
processo de metropolização do espaço, formando com Manaus áreas contínuas e de
trocas e fluxos intensos, pois a localização das cidades, bem como a extensão dos
municípios, permite afirmar que as manchas urbanas apresentam um padrão que se pode
considerar como uma espécie de arquipélago, formado por ilhas de manchas urbanas.
______________________________________________________________________¹
Orientador e Prof. Dr. Titular da Universidade Federal do Amazonas. Departamento de
Geografia – DEGEO.
²Estudante de Graduação de Geografia da Universidade Federal do Amazonas.
340
A noção de arquipélago que apontamos aqui não se refere ao tradicional aspecto
de isolamento contido nas ilhas por serem cercadas por águas, pois mesmo estas
apresentam conexão com outras ilhas e lugares. No contexto desta análise, as manchas
urbanas dos municípios da RMM, como de resto da própria Amazônia Ocidental, foram
produzidas historicamente com limites definidos no contexto de territórios extensos, o
que fez com que não apresentassem a mesma dinâmica de outras regiões do Brasil do
ponto de vista do processo de ocupação e das dimensões municipais.
No contexto do que hoje constitui a RMM houve historicamente expansões das
manchas das sedes municipais e demais áreas urbanas, mas nenhuma de forma tão
evidente quanto na capital, mesmo assim não sendo suficiente para conurbar com outra
sede ou outra área urbana. Tampouco se estabeleceu um sistema de trocas e movimentos
diários intensos entre esses núcleos urbanos, o que corrobora para a realidade urbano-
regional de manchas urbanas distintas no que hoje é a maior RM do ponto de vista
territorial existente no Brasil.
Dessa forma, Manaus se constituiu historicamente em um núcleo que expandiu
para si mesmo, tornando-se metrópole pelas condições que serão analisadas à frente.
Isso fez com que se produzisse uma configuração urbana desproporcional entre esta
metrópole e as demais cidades da Amazônia Ocidental, o que inclui as cidades de sua
região metropolitana.
A Amazônia Ocidental em seu processo de urbanização deve ser entendida não
como parte de uma única urbanização amazônica, homogênea, surgida a partir de 1616
com o Forte do Presépio, que daria origem à cidade de Belém e marco inicial de
ocupação na calha dos grandes rios que levavam ao sertão da floresta tropical. O padrão
de ocupação e posterior estabelecimento de cidades ocorreu primeiramente a partir dos
rios, formando uma rede urbana que Corrêa [1989] e Ribeiro [2001] denominam de
dendrítica.
A formação da rede urbana dendrítica na Amazônia pode ser entendida como
produto de estratégias estabelecidas nos períodos colonial, imperial e republicano no
Brasil, vinculadas ao processo de acumulação que ocorria em nível mundial. Isto pode
ser entendido a partir das sustentações de Becker de que na “verdade, o povoamento da
Amazônia a partir da colonização se fez sempre em surtos devassadores vinculados à
341
expansão capitalista mundial” [1997, p. 11]. Becker sustenta ainda que o primeiro
desses devassamentos foi aquele da exploração da floresta tropical para a busca das
drogas do sertão, visando sustentar um império colonial já deficitário como o português.
Os devassamentos seguintes apontados pela autora são o ciclo da extração da borracha,
as frentes pioneiras agropecuárias e finalmente o ordenamento territorial promovido
pelo estado brasileiro, especialmente à época dos governos militares, que no caso
específico da Amazônia Ocidental vai estabelecer a Zona Franca de Manaus.
É importante destacar o fato de que mesmo iniciando o processo de ocupação da
Amazônia pelos portugueses em pleno período de União Ibérica e para além do limite
de Tordesilhas, foi em meados do século XVIII que se observa com mais ênfase uma
estratégia do poder colonial relacionada especificamente a um processo de criação de
povoados e vilas com as políticas pombalinas. Muitas povoações e aldeamento
missionários, após a expulsão dos Jesuítas, segundo Oliveira [1988] foram elevados à
categoria de vila. Ainda que esse processo tenha ocorrido de forma impositiva e até
certo ponto artificial, visto que o objetivo era garantir o controle do território reclamado
pelos espanhóis, não se pode deixar de reconhecer, como também sustenta Mattos
[1980] que foi uma estratégia e que a partir dela ocorreu o aumento do número de vilas,
bem como o incremento demográfico oriundo da permissão legal da miscigenação entre
portugueses e indígenas.
Corrêa em texto clássico sobre a formação da rede urbana na Amazônia [1987,
p. 45] vai apontar que:
Entre 1750 e 1780, aproximadamente, a rede urbana amazônica,
até então embrionária, passaria por uma fase de relativo
desenvolvimento. Contudo, este desenvolvimento não derivou
da incorporação de novas áreas à economia colonial e o
consequente aparecimento de novos núcleos dotados de funções
urbanas. Derivou, principalmente, da expansão das atividades
produtivas nas áreas já incorporadas economicamente, bem
como de uma política explícita de Portugal que tinha nos
pequenos núcleos preexistentes um dos meios para a realização
de sua política colonial.
342
especialmente no século seguinte, com a procura pela borracha.
Durante o período da política Pombalina vários núcleos foram elevados à
categoria de vila, dentre os quais se pode destacar Borba (1756), Barcelos (1758), Serpa
(1759), que depois passou a se chamar Itacoatiara e hoje faz parte da RMM, Silves
(1759), São Paulo de Olivença (1759), Ega, atual Tefé (1759), e São Francisco Xavier
de Tabatinga, atual Tabatinga (1759). A periodização desses núcleos, juntamente com os
primeiros ainda do século XVII e os surgidos no século XIX, com a economia gumífera,
podem ser observados no mapa abaixo.
343
Induzir a um processo de urbanização na Amazônia significava a manutenção e
controle do território para a coroa portuguesa, como deixa claro na disposição dos
núcleos urbanos no mapa acima. Fica evidente também que para que isso ocorresse era
necessário o incremento populacional de fala e religião portuguesas, o que fez aparecer
a figura do caboclo amazônico, fruto de casamentos incentivados entre portugueses e
indígenas. Ressalte-se que este processo induzido de criação de novos núcleos, que
depois seriam cidades, não pode ser confundido com a urbanização que se concebe
atualmente, pois não se pretendia estabelecer um modo de vida urbano como o
concebemos atualmente, e tampouco os fortes e missões religiosas, a despeito de
constituírem aglomerados humanos, não possuíam funções consideradas urbanas, o que
viria a ocorrer somente mais tarde. Se pretendia, a partir das políticas pombalinas,
somente ocupar e garantir a posse do território amazônico, estabelecendo novas
povoações e elevando outras já existentes à categoria de vila.
Processos induzidos parecem acompanhar a trajetória de ocupação e produção
do espaço na Amazônia. Reforçando, isto não significa afirmar que a região não
produziu de forma autônoma seus próprios processos socioespaciais, pois segundo
Renan Freitas Pinto [2006] a Amazônia participou de todos os grandes momentos e
movimentos da história do Brasil, ainda que de forma menos expressiva que em outras
regiões. Contudo, há também em sua história os surtos devassadores já apontados por
Becker. O período gumífero pertence a uma sequência da inserção amazônica ao
capitalismo mundial, bem como do incremento demográfico e aumento do número de
cidades na região, contribuindo para a ampliação e fortalecimento da rede urbana, num
primeiro momento dendrítica, e de uma urbanização dispersa e concentrada em poucos
núcleos que se destacaram mais que outros, como Belém e Manaus.
Nesse período de farta exportação da borracha a Amazônia passa a fazer parte
de um circuito de acumulação como região subordinada ao capitalismo internacional.
Isso está na base da formação urbana e demográfica da Amazônia atual.
Já na década de 1840 a indústria européia com os princípios do liberalismo
econômico começava a despontar. Mas o lançamento comercial da borracha começa
antes, pois segundo Mattos [1980, p. 82]:
Samuel Peal, em 1791, consegue registrar a primeira patente de
um processo de fabricação de abrigos impermeáveis usando
como matéria-prima do novo produto uma solução de látex e
terebintina. A patente indica a produção de sapatos. Começa daí,
na Europa, o lançamento comercial da borracha.
344
Antes do advento da indústria dos pneumáticos a borracha já era utilizada para
fabricação de expressivo número de objetos como calçados, tecidos impermeáveis,
ligas, suspensórios, tubos cirúrgicos, dentre outros. Mas a grande demanda pelo látex
amazônico ocorre com a descoberta do processo de vulcanização nos Estados Unidos,
por Goodyear no ano de 1839. A partir daí surge de fato a necessidade da borracha de
forma mais intensa para alimentar a indústria de calçados e outros objetos no início e
depois da indústria dos pneumáticos. A borracha amazônica não era a única no mundo
pois em outras regiões tropicais como da Índia, Malásia e Indonésia ela também existia.
Mas a qualidade da borracha amazônica, a Hervea Brasiliensis, era superior às outras,
portanto, a preferida pelo mercado mundial. Este contexto iria alterar expressivamente o
padrão urbano e demográfico da região e as mudanças que já haviam iniciado no século
anterior iria ser ampliada nestes aspectos.
Corrêa [1987] vai definir dois segmentos temporais de cidades e sua
organização espacial na região. O primeiro ele denomina de segmentos “velhos”,
resultantes de um tempo espacial longo, de formação mais antiga, sendo que o segundo
vai denominar de segmentos “novos”, resultantes de dinâmicas mais recentes de
produção do espaço. Para o autor esse processo “[...] exemplifica-se com as cidades
ribeirinhas, de um lado, e as cidades e os embriões urbanos que surgiram recentemente
ao longo dos grandes eixos rodoviários que rasgaram a Amazônia”. [p. 40].
Poderíamos ainda acrescentar um terceiro segmento, mais recente,
metropolitano, surgido a partir das possibilidades jurídicas da Constituição de 1988.
Este segmento mais recente pode ser exemplificado pela institucionalização de três
regiões metropolitanas amazônicas, como as de Macapá (2003), Manaus (2007) e
Santarém (2012).
O segmento mais antigo apontado por Corrêa, fruto do processo de ocupação
via calha dos grandes rios, formou o padrão que acompanha os meandros e a
sinuosidade dos rios, que por sua vez representam a conexão dessas cidades com o
mundo por meio da navegação fluvial. Este segmento existe desde o século XVII onde
vários núcleos urbanos surgiram em posições estratégicas na calha dos rios. Durante
esse período surgiram, além de Belém, (1616), Souza Caeté (atual Bragança), em 1633,
e Villa Viçosa de Santa Cruz do Cametá, em 1635, no atual estado do Pará.
As missões e aldeamentos religiosos também tiveram papel fundamental no
aparecimento de cidades na Amazônia. São exemplo de cidades que surgiram a partir de
345
missões e aldeamentos: Santarém, Óbidos, Alenquer, Faro, Monte Alegre, no Pará, e
Tefé, Silves, Itacoatiara, Coari e Barcelos, no Amazonas, todas localizadas nas margens
dos principais rios como Amazonas, Trombetas, Tapajós, Japurá e Negro. Em 1669 é
construída a fortaleza de São José do Rio Negro, que daria origem à cidade de Manaus.
Esse período antecede a extração da borracha, estando ainda vinculado à extração das
drogas do sertão, no governo colonial. Vale ressaltar que entre 1755 e 1760, 46 aldeias
missionárias foram elevadas à categoria de vilas.
O segmento posterior diz respeito ao período da borracha, quando houve o
incremento do número de cidades localizadas nos altos cursos dos rios como Madeira,
Purus e Juruá na Amazônia Ocidental. Corrêa [1987, p.47] aponta que:
346
indústria mundial sedenta pelo ouro branco extraído do caule da seringueira. Ainda hoje
os barcos de recreio demoram entre dez e quinze dias para percorrer de Manaus a
Eirunepé, no rio Juruá, visto que se trata de um rio bastante meandrante, o que significa
afirmar que ali se percorre muito e avança-se pouco, sem deixar de considerar a
distância significativa do percurso em linha reta.
No nível econômico há a atração de capitais estrangeiros vinculados à
navegação e ao comércio. Os rios são liberados à navegação nacional e estrangeira e as
antigas embarcações a vela foram substituídas pelos barcos a vapor, mais rápidos e com
maior capacidade de transporte de pessoas e cargas.
A urbanização da Amazônia Ocidental vai ser incrementada, além da dinâmica
vinculada à exportação da borracha, também ao aumento populacional advindo da
migração primeiramente de paraenses entre 1850 e 1870 e depois da migração induzida
de nordestinos para os sertões amazônicos na segunda metade da década de 1870. Essa
migração é resultado da escassez de mão de obra para trabalhar nos seringais, que levou
à indução via subsídios estatais, especialmente para o transporte dos nordestinos, em
sua maioria cearenses.
A economia gumífera contribuiu para o surgimento de vários núcleos que
posteriormente seriam sedes municipais, nos atuais estados do Amazonas e Acre.
Destacam-se, Xapuri, Brasiléia e Sena Madureira, no alto Purus (Acre), Feijó, Tarauacá
e Cruzeiro do Sul (Acre), no alto rio Juruá, dentre os demais surgidos no Amazonas já
mostrados no mapa acima.
Contudo, de todos os núcleos urbanos surgidos na Amazônia ocidental, a antiga
Vila da Barra do Rio Negro, surgida da fortaleza de São José em 1669, se tornaria a
cidade mais importante na região. No princípio da farta exportação da borracha as
firmas de Belém se estabeleceram em Manaus fundando ali filiais. Posteriormente a
capital do Amazonas passa a rivalizar diretamente com sua congênere paraense pelo
controle e escoamento da produção da borracha.
Após o declínio da exportação da borracha amazônica há também um
decréscimo populacional nos principais núcleos urbanos. De acordo com dados
mostrados em Santos [2002] entre os anos de 1872 a 1940 as duas principais cidades
da região Belém (oriental) e Manaus (ocidental) apresentaram crescimento de sua
população entre 1872 e 1920, sendo que entre 1920 e 1940 há um decréscimo em
ambas, de acordo com os dados da tabela abaixo.
Tabela 01 – População de Belém e Manaus entre 1872 e 1940.
347
1872 1890 1900 1920 1940
348
Tabela 02 – População de Manaus e Belém em relação aos respectivos estados.
1872 1890 1900 1920
349
ideologia do rodoviarismo142 que se instalou no Brasil vai produzir agora cidades à beira
de estradas, seja por via “espontânea” ou produzidas por empresas que se estabeleciam
na região com o objetivo de explorar seus recursos. Ressalte-se que esse processo foi
mais evidente na Amazônia Oriental, pois na parte ocidental ele foi bem menor.
As ações que visavam à ocupação e controle do território na Amazônia tiveram
algumas características apontadas por Becker [1997], no que se refere às redes de
integração espacial. São destacadas quatro principais redes: 1) rede rodoviária, com a
produção de grandes eixos transversais como Transamazônica e Perimetral Norte, e
eixos intra-regionais como as rodovias Cuiabá-Santarém e Porto Velho-Manaus (BR-
319); 2) rede de integração de telecomunicações comandada por satélite, permitindo a
difusão de valores urbanos pela TV e a integração via telefonia; 3) rede urbana, como
concentradora das funções de comando político, econômico e ideológico; 4) rede de
hidroelétricas, que iria permitir a produção de energia à nova fase em que a região
estava adentrando. Observa-se que todas as redes são complementares, sendo a rede
urbana o lócus de onde emanavam as decisões e a infraestrutura basal para as demais
redes. A rede rodoviária iria permitir a ampliação de núcleos populacionais que
posteriormente iriam se tornar urbanos, dando origem a várias cidades no decorrer das
décadas de 1970 e 1980.
Mesmo que a urbanização, de acordo com Santos [2002] se desenvolva a partir
do século XVIII no Brasil, para a Amazônia como um todo ela ocorreu mesmo com
mais evidência a partir das ações induzidas pelo Estado Brasileiro, notadamente a partir
da década de 1970, ainda que no século XVIII, como já sustentado anteriormente, as
políticas pombalinas tenham estabelecido na região significativo número de vilas e no
período gumífero outras tenham surgido também. Trata-se, portanto, para a região, de
processo recente se for considerada a urbanização brasileira em outras regiões, que já
vinha se acelerando desde a década de 1940.
Na Amazônia Ocidental o fenômeno da urbanização vai ocorrer de forma
desigual, dispersa e concentrada. Na capital do Amazonas, os números após a Zona
Franca mostram a ampliação da concentração populacional que já vinha dos períodos
anteriores, conforme pode ser aferido na tabela abaixo, a partir dos censos
demográficos.
Tabela 03 – Taxa de crescimento populacional de Manaus 1950/2010.
350
Censo População Taxa de Crescimento %
143 As ocupações irregulares de terras públicas e/ou privadas são conhecidas pelo termo pejorativo
de “invasões”. A mídia contribui bastante para a popularização do termo ao veiculá-lo como se fosse
algo natural. No entanto, camufla a realidade de uma cidade que apresenta níveis de segregação
expressivos entre os que podem ter ou pagar por uma moradia e os que não podem, ampliando, dessa
forma, as fileiras daqueles que, ao terem alguma oportunidade, partem para as ocupações de terras que
juridicamente não lhes pertence.
351
os países do Terceiro Mundo em sua função na Divisão Internacional do trabalho. Para
Corrêa [1987, p.59] a região passa à condição de fronteira do capital, quando é
incorporada ao processo geral de expansão capitalista no Brasil, e os resultados desta
condição geraram a urbanização desigual, especialmente na parte oeste. Dessa forma
“Esta urbanização concentrada reflete, o papel do Estado através da criação nas capitais
de um número crescente de instituições vinculadas às novas atividades implantadas e
em implantação na Amazônia”.
O Estado, portanto, possuiu papel fundamental na ampliação da urbanização
dispersa e concentrada. Pode-se sustentar que mesmo esse fenômeno de concentração
foi o produto histórico de processos de indução à ocupação e controle do território na
Amazônia desde seu período colonial, com ampliação a partir da segunda metade do
século XX. Becker [1997, p. 52] vai afirmar ser a urbanização da Amazônia uma
estratégia de ocupação, constituindo:
[…] uma estratégia básica do Estado para a ocupação regional:
sustenta a mobilidade permitindo atrair migrantes sem lhes dar
acesso à propriedade da terra, e inicia a articulação dos antigos e
novos núcleos urbanos entre si e com o mundo exterior. A
importância da urbanização como instrumento de ocupação se
relaciona assim a três papéis fundamentais exercidos pelos
núcleos urbanos: a atração dos fluxos migratórios, a organização
do mercado de trabalho e o controle social, o que atribui à
urbanização um novo significado.
352
propunham que, ao invés de se utilizar o método clássico
de desenvolvimento de regiões despovoadas, baseado na
prospecção de recursos naturais e posterior assentamento
da população para sua exploração, se urbanizasse primeiro
a região para que a própria população realizasse as
prospecções e adaptações necessárias à exploração dos
recursos [Idem, p. 53].
353
atrasado, podendo acarretar preconceitos e anuviando o processo histórico-espacial pelo
qual a região, com processos induzidos ou a partir de sua própria dinâmica, passou e
passa desde o período do contato. E isso se refere também ao processo de urbanização
ocorrido na região, que mesmo disperso, com municipalidades extensas, e muitas vezes
induzido, também possui dinâmica própria para uma região extensa e pouco povoada.
No que se refere às migrações, também é bom que se esclareça que, em sua
dimensão interna, ou seja, do próprio interior do Amazonas para a capital, no período da
implantação da Zona Franca, não ocorreu somente pelo fato das condições precárias no
interior, mas pelo fato de que a cidade representava a ilusão de uma busca, uma
ideologia de que o meio urbano daria as condições do ser moderno, inserido num
mundo melhor, mundo das oportunidades, mesmo que onde esse migrante vivia lhe
permitisse produzir e reproduzir as condições básicas e até para além disso. Muitos
vendiam terras, gado, propriedades, etc, e vinham “aventurar” na capital que se lhes
apresentava como forma de ser moderno e urbano, sem dimensionar que sua busca
terminava ainda no porto, de onde ele percebia que não tinha para onde ir ou para onde
voltar, posto que de tudo se tinha desfeito.
O resultado disso? Aumento de uma população que para se inserir, ter o direito
à cidade, utilizou a estratégia cotidiana de viver onde as condições lhes permitiam,
ocupando as margens dos igarapés, fundos de vale ou encostas. A expressão espacial
que a capital tomou foi a de uma cidade cuja maioria dos bairros surgiu a partir de
ocupações irregulares e de urbanismo precário ou inexistente. Ou seja, a miséria desse
interiorano se inicia na cidade e não necessariamente no local de onde veio, como a
maioria da literatura que aborda o período sustenta.
A rede urbana, a partir das políticas de ocupação induzida do território
amazônico e do avanço do grande capital, vai gerar cidades que não mais estão
vinculadas aos rios. É o rompimento com o padrão dendrítico da rede urbana
amazônica. A construção de estradas e a descoberta de áreas de exploração mineral
estão na base do surgimento de núcleos urbanos cuja realidade se vincula agora à
exploração de recursos produzindo um “(...) espaço urbano complexo, constituído de
múltiplos núcleos complementares organizados em torno da 'cidade da companhia'
(Becker, 1997, p.72). A cidade da companhia é a Company Town.
A Company Town constitui um espaço hierarquizado internamente, cujas
relações são artificializadas, visto que mesmo se estando no lugar, não há um
sentimento de pertencer a ele, pois a permanência ali está mediatizada pela relação que
354
se tem com as empresas. Planejado e hierarquizado, tal é a realidade das cidades que
surgem na Amazônia, com maior frequência na Amazônia Oriental, mas também
existente na Ocidental.
Quanto a essa nova realidade urbana que vai se estabelecer e romper o padrão
tradicional de cidades ribeirinhas na região, em sua parte oriental, Becker vai afirmar
que:
Dois núcleos foram planejados, com função complementar: a
Vila de Carajás, localizada no topo da Serra, projetada para
abrigar os funcionários da companhia envolvidos diretamente
com a extração de minério, e Parauapebas, localizada no sopé da
serra, como depósito de mão-de-obra para a construção de
Carajás e suas estradas de acesso, e ao mesmo tempo como
lugar capaz de reter a migração no sopé da cidadela. Aí, uma
guarita com um posto da Polícia Federal, a “portaria” para a
CVRD e a “barreira” para a população extramuros, controla
pessoas e mercadorias [Idem, p.72-73].
355
Entretanto, não somente as Company Town surgiram em função de um
processo maior e formal de extração mineral. Os garimpos também foram responsáveis
pelo surgimento de núcleos urbanos na Amazônia Oriental. Assim:
Do ponto de vista da empresa e do Estado, os garimpos têm,
pois, exercido importante papel de “rastreador” de minérios, e o
garimpo, o de válvula de escape à tensão social como emprego
alternativo à população móvel. Cumpre ainda notar seu papel de
povoamento, inclusive na origem e/ou expansão das cidades. Se
alguns garimpos estagnam ou desaparecem, outros permanecem
fazendo crescer o núcleo em que se apoiaram, e outros que lhes
prestam serviços, como é o caso da Serra Pelada, e de
Curionópolis e Eldorado, localizados no seu sopé [Idem, p. 77].
144 Povo indígena do grupo lingüístico Karib que habita terras no norte do Amazonas e sul de
Roraima. Tiveram conflitos com o Exército Brasileiro quando suas terras foram cortadas ao meio para a
construção da rodovia BR-174, que liga Manaus a Boa Vista e esta à Venezuela e ao Caribe. A rodovia foi
construída entre os anos de 1974 e 1977. Também foi estabelecido em suas terras o Projeto Pitinga, do
grupo Paranapanema, cujo objetivo era de extrair a cassiterita. Do projeto foi construída a Company
Town.
356
ocorra de forma rígida no que concerne ao circular. Trata-se de uma grande clareira no
meio da floresta, dentro de uma área indígena. Reproduz as condições de uma cidade
em sua reduzida escala, mas lhe falta a dimensão do pertencimento, visto que seus
habitantes apenas estão ali, não sendo dali. Considerando que boa parte dos habitantes é
oriunda de outros estados brasileiros, estão ali somente enquanto durar seu vínculo com
a empresa. O padrão linear que mostra prévia estratégia de organização urbanística na
Vila de Pitinga pode ser observado na figura abaixo.
Figura 02 - A Vila Pitinga revela uma espacialidade que não traz a dimensão de pertencimento, seja pela
hierarquização interna de sua configuração, seja pelo fato de ali só se viver enquanto durar o vínculo com
a empresa mineradora. Trata-se de um núcleo não mais vinculado à realidade de produção do espaço
tradicional na Amazônia. Fonte: www.skyscrapercitu.com
Diferentemente de Carajás, Pitinga não possui outro núcleo que lhe seja
próximo ou complementar como Parauapebas. Mesmo constituindo um distrito de
Presidente Figueiredo, as relações de Pitinga com esta cidade não apresentam
complementaridade em níveis significantes, estando no meio da floresta, com acesso
restrito e dentro de uma terra indígena. Mas cumpre importante função como núcleo que
comporta a mão de obra da mineração, portanto, base para a exploração do capital que
se dá na fronteira.
E novamente se utiliza o termo fronteira para expressar o papel da região como
fornecedora de minérios, mas é importante salientar neste caso a condição da Amazônia
357
como região incorporada e explorada tanto em função do processo de acumulação
capitalista no nível nacional quanto internacional.
Contudo, é pertinente admitir que não se trataria apenas de uma condição de
fronteira do capital145, como se tem sustentado exaustivamente tanto em trabalhos
geográficos quanto não geográficos.
A Amazônia constitui historicamente uma fronteira política, como de resto a
região Sul também é. Portanto já é fronteira estabelecida há tempos, quando o Brasil
realiza os acordos e incorporações junto aos países vizinhos. Foi uma região de reserva
nacional para a acumulação internacional desde a extração das drogas do sertão, na
colônia, quanto na borracha (quando não se falava ainda em fronteira do capital),
posteriormente, e mais recentemente com os minérios e projetos de incentivos fiscais.
Conceber a região como fronteira num sentido de que só recentemente foi
incorporada ao capital, corresponde a resgatar e sustentar a velha visão de um eldorado,
do exótico, do distante, do desconhecido, deixando de considerar que ela sempre, em
períodos de maior culminância, esteve presente alimentando necessidades do processo
de acumulação, seja do capitalismo comercial, quanto industrial e mais recentemente o
monopolista. Portanto, nada é novo, ou fenômeno recente o fato de sua incorporação ao
capital, ainda que a inserção na fase do capitalismo atual seja de longe mais intensa e
complexa que antes.
Não se trata de uma fronteira do capital apenas. Trata-se de uma região que
sempre esteve inserida ao capital, ainda que de uma forma subordinada. O que se tem
considerado como fronteira do capital na verdade constitui uma nova face de
incorporação da região a uma também nova face do capitalismo em níveis nacional e
internacional.
Outra questão diz respeito às concepções de cidade na/da floresta ou cidade na
selva que na verdade podem imprimir um título atraente e curioso, mas também, caso
não sejam devidamente esclarecidas, podem levar a uma visão exótica, como se a
cidade e a floresta constituíssem um único objeto. Há esclarecimentos quanto a isto em
trabalhos como os de Trindade Jr. [2010, p. 117] que diferencia a utilização dos termos
“cidades na floresta” e “cidades da floresta”, sustentando que:
Ao utilizarmos a expressão “cidades na floresta” procuramos
145 O questionamento que se faz aqui do termo fronteira vai no sentido de que ele, se não
devidamente esclarecido, pode ampliar noções produzidas e reproduzidas durante os cinco séculos
desde o contato, quais sejam, as de região distante, selvagem, inóspita, despovoada, dentre outras
noções. Não é uma crítica à sua real condição de fronteira política.
358
fazer a diferenciação face a outro tipo de cidade, as “cidades da
floresta”, que, acreditamos, terem predominado até meados do
século XX, quando então a Amazônia passou a vivenciar seu
processo de efetiva integração territorial ao Nordeste e ao
Centro-Sul brasileiros. Assim, definir a cidade na Amazônia
para além da paisagem pressupõe levar em conta elementos
outros que considerem a relação das mesmas com seu respectivo
entorno e com os processos que a região vivenciou a partir de
sua efetiva integração nacional.
359
A cidade que foi produzida historicamente na região, portanto, estruturalmente
faz parte do processo de produção de um território, das estratégias de ocupação e
manutenção do mesmo, ou ainda de políticas de povoamento e desenvolvimento
induzidos, num primeiro momento mais voltadas para o entorno e posteriormente
atendendo às demandas externas.
A tentativa de tornar exótico o processo de urbanização da Amazônia,
comparando o urbano à floresta, ou ainda denominando a região de floresta urbanizada,
como também é comum nas análises geográficas para a região, mais uma vez,
repetimos, se trata de uma visão que pode produzir equívocos interpretativos, onde
menos que se considerar o fenômeno urbano em sua especificidade regional, tenta-se
ampliar a diferenças via resgate de uma visão exótica.
A urbanização da Amazônia, mais que se afirmar a cidade ser ou estar na
floresta, ou ainda afirmar ser a região uma floresta urbanizada, poderia ser analisada à
luz dos processos componentes da própria região e como estes se relacionaram com os
processos maiores de produção. A Amazônia não constitui uma floresta urbanizada, nem
pelos critérios demográficos, que expressam a concentração, quanto pelo fato de ali o
urbano ser mais restrito, quer seja pelas condições menos evidentes de infraestrutura,
que o impede de predominar totalmente, quer seja pelas dimensões da escala espacial,
que de tão ampla seria ingênuo acreditar que as cidades possuem ali um controle tão
evidente no cotidiano de pessoas, ou ainda da pouca inserção mesmo dessas cidades,
num circuito mais amplo do meio técnico-científico-informacional, que se não pode
afirmar inexistente ali, por outro lado, para a realidade urbana da Amazônia Ocidental,
exceto a metrópole a alguns núcleos urbanos mais expressivos, está distante de ser
como concebido geralmente e de forma generalista.
Entender o processo de urbanização da Amazônia é fundamental para daí se
partir para a análise de um processo mais recente e que na Amazônia Ocidental está se
estabelecendo via indução, ou seja, o processo de metropolização do espaço, com a
institucionalização da Região Metropolitana de Manaus em 2007. Este processo pode
ser entendido a partir de três dimensões distintas, mas complementares, que parecem
acompanhar a produção do espaço. Para além de se entender a geografia, neste caso, é
preciso entender o geográfico que se pensa e produz no contexto da RMM. Essas
dimensões já apontadas formam a tríade analítica e pertencem ao político, ao jurídico e
ao ideológico, dimensões escolhidas aqui como formadoras da produção do espaço.
A metropolização induzida do espaço na Amazônia Ocidental difere da que
360
ocorreu na Amazônia Oriental, daí virmos diferenciando essas duas Amazônias, visto
que nas análises mais correntes sobre a região quase sempre ela é concebida como uma,
mas na realidade sua história, produção espacial e urbanização, mesmo com as
semelhanças, também são diferentes. Isso foi ampliado com as políticas de
desenvolvimento para a região a partir da década de 1960, onde na parte oriental a
exploração mineral e a construção de rodovias foram os protagonistas no processo de
surgimento de novos núcleos urbanos, sendo que na parte ocidental foram as políticas
de incentivos fiscais que acabaram por concentrar e centralizar em Manaus a população
e as riquezas do modelo, trazendo também as consequências de um crescimento rápido e
urbanisticamente pouco ordenado.
Como resultado de duas formas de desenvolvimento dessas Amazônias, foi
estabelecida uma urbanização diferenciada, dispersa e concentrada, pois enquanto no
estado do Pará, sem contar a metrópole Belém, onze municípios, sendo quatro
pertencentes à RMB, estão acima dos cem mil habitantes, no estado do Amazonas
apenas um, Parintins e que não pertence à RMM ultrapassa essa estimativa.
Do ponto de vista do processo de urbanização não é possível entender a
Amazônia como se fosse uma única região, ou ainda uma floresta urbanizada, mesmo
que os dados apontem para isso, considerando que números constituem uma realidade,
mas não apontam por si só o cotidiano, mesmo o das cidades. Tampouco revelam a
realidade da distribuição dos núcleos urbanos dispersos na imensidão regional.
Na parte ocidental, particularmente no Amazonas, este processo de
urbanização, do ponto de vista político, econômico, e populacional, ocorreu de forma
mais concentrada, agravado pela indução a partir das políticas de incentivos fiscais da
Zona Franca de Manaus. Se Belém, na Amazônia Oriental concentra 18, 38% da
população paraense, e sua região metropolitana 35%, de acordo com dados do censo de
2010 do IBGE, Na parte ocidental Manaus concentra mais de 50% da população
estadual e sua região metropolitana mais de 60%, o que equivale a afirmar que a
urbanização ali é mais concentrada, muito embora, no que se refere à distribuição dos
núcleos urbanos, ela seja dispersa. Por esse aspecto já se percebe a diferença quando se
analisa o processo de urbanização amazônico, especialmente o ocidental, o que não
permite analisar a urbanização da região como um processo único, mas específico.
As políticas de desenvolvimento para a região, com os projetos mineralógicos
no Pará e com a política de incentivos no Amazonas acabaram por dar a forma e os
porcentuais atuais do grau de urbanização na atualidade. Se na parte oriental há maior
361
diversificação populacional e de áreas vinculadas ao processo produtivo, na parte
ocidental toda a concentração nesses aspectos está na metrópole, e atualmente em sua
região metropolitana. Da mesma forma, se consideradas as duas regiões metropolitanas,
ainda que as diferenças do ponto de vista espacial e temporal sejam amplamente
constatadas, o grau de diferenciação também é expressivo, considerando os contextos
em que as duas RM's foram instituídas. Isto requer análise contextual do que vem a ser
metrópole, metropolização e região metropolitana, situando a realidade que se apresenta
atualmente na Amazônia Ocidental, com a Região Metropolitana de Manaus, nesses
processos.
362
Referências
AGASSIZ, Louis; AGASSIZ, Elisabeth. Viagem ao Brasil – 1865-1866. São Paulo: Paz
e Terra, 1979.
SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. 5a. ed. São Paulo: Edusp, 2009.
SANTOS, Milton. Manual de Geografia Urbana. 3a. ed. São Paulo: Edusp, 2008.
363
A QUESTÃO ESCALAR E A CONFORMIDADE ESPACIAL DO
CIRCUITO SUPERIOR SUPERMERCADISTA NO BRASIL
CONTEMPORÂNEO
1. Introdução
O grande capital é indissociável da atuação na escala global, pois quanto maior é a sua
abrangência, mais expressivas se tornam as possibilidades de acumulação. A atividade
supermercadista é uma das que melhor representa as interações multiescalares,
principalmente por meio de três tipos de relações. 1) Suas relações com os fornecedores;
2) Suas relações intra grupo; e 3) Suas relações com os clientes, com as duas primeiras
estabelecendo redes de maior amplitude que são as bases da sua atuação frente ao
mercado consumidor. Dessa forma, as escalas distantes, de onde emanam as decisões e
produtos, estão em permanente ligação e dependência com as escalas próximas.
As grandes superfícies comerciais, como os supermercados147, vêm, ao longo do tempo
assumindo cada vez mais responsabilidade na produção do espaço, reorientando os
sentidos dos fluxos e dos fixos no espaço intra-urbano e sendo dotados de grande
146
Mestrando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) – Presidente Prudente e membro do Grupo
de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GAsPERR). Esse trabalho é fruto das discussões
realizadas na pesquisa de uma dissertação de mestrado sob orientação do Prof. Dr. Arthur Magon Whitacker
147
Para facilitar a fluência do texto, nos momentos em que nos referirmos ao ramo ou atividade supermercadista,
estamos considerando todo seu conjunto de atividades. A partir do item 3.1 realizamos uma diferenciação, na qual
separamos a tipologia das lojas (supermercado de vizinhança, super/hipermercado e atacarejos) de acordo com as
classificações dos próprios grupos analisados quanto aos seus estabelecimentos. Os supermercados e hipermercados
são na maior parte das vezes classificadas sob a mesma bandeira, daí a nossa opção de unifica-los sob um mesmo
conjunto.
364
potencial não só de aproveitamento, mas de interferência na rede urbana
preestabelecida. Assim, a centralidade passa a ser cada vez mais constituída com auxílio
das ações de tais grupos, que com isso passam a se postular como indicativos da
influência de uma cidade perante a região.
Nosso trabalho se debruça sobre a ação dos grupos supermercadistas de capital
internacionalizado que atuam de forma mais extensa no território brasileiro,
considerando principalmente a escala de atuação da rede urbana. Para tal, selecionamos
os três maiores grupos desse tipo com atuação multi-formato, a partir de supermercados
de vizinhança, super/hipermercados e atacarejos148, são eles: Cia. Brasileira de
Distribuição, Carrefour Com. Ind. Ltda., e Walmart Brasil Ltda. Além desses grupos,
adicionamos em nossa análise o Makro Atacadista S/A, já que, desde o início de nossa
pesquisa os atacarejos se mostraram especialmente importantes à análise da relação
entre os movimentos da rede urbana e o setor supermercadista. Realizamos neste
trabalho a coleta e análise dos dados de localização de todas as lojas das empresas
contempladas, a partir dos quais, buscamos contribuir para a elucidação das formas de
inserção no espaço. Nossa base teórica parte dos Circuitos da Economia Urbana de
Santos (2004).
No primeiro tópico expomos os desafios impostos para um aproveitamento adequado da
questão escalar no objeto analisado. No segundo, colocamos, em linhas gerais, os
principais movimentos de ordem mundial e nacional que promoveram a difusão e a
estruturação do setor supermercadista tal como se encontra hoje. No último tópico
realizamos a comparação dos dados da RAIS/MTE e de localização dos
estabelecimentos com os de contingente populacional e de inserção na rede urbana do
REGIC (2007) para as cidades que recebem operações das empresas analisadas.
148
Atacarejo é um modelo de serviço que une características do atacado, como menor preço, organização da loja mais
simples e possibilidade de venda em maiores quantidades, com características do varejo, como o autosserviço e a
venda a consumidores finais. É voltado a vendas de pequenas e médias quantidades atendendo tanto pessoas físicas,
quanto pessoas jurídicas. As principais bandeiras dessa forma comercial com atuação no Brasil são o Atacadão, o
Assaí Atacadista, o MaXXi Atacado e o Makro.
365
Geografia, no seu desenvolvimento deu menos importância à discussão desse conceito
do que deveria para algo que é basilar em suas ações. Apenas nas últimas décadas é que
a escala vem sendo promovida à sua merecida relevância com o aprofundamento
epistemológico dos debates da academia.
Parte dos trabalhos que tratam a questão da escala inicia a discussão expondo a
concepção de escala à priori, versus a concepção de escala a posteriori, com a primeira
implicando em um recorte prévio e rígido por parte do pesquisador sobre a realidade
analisada e a outra tomando conta de que a escala - ao menos em princípio - não é
decorrente de uma opção metodológica, mas própria a cada realidade que se impõe ao
pesquisador.
Com isso, o ponto divisório entre a escala cartográfica e a escala geográfica se apresenta
desde o início das concepções. No primeiro entendimento o espaço é tido como uma
questão essencialmente dimensional em que a representação e interpretação do real se
faz a partir do raciocínio matemático (CASTRO, 1992 p. 120, 121), logo, o pesquisador
é quem define os seus limites de apreensão. O uso e interpretação da escala como noção
cartográfica é referente a uma concepção de espaço geométrico (SILVEIRA, 2004,
p.88), desse modo, a escala é tida como uma medida comum a todas as partes. Esse
entendimento se aplica principalmente no estabelecimento da proporção entre as coisas,
bem como de uma homologia entre a realidade e as coisas. (MELAZZO; CASTRO,
2007, p. 136).
Já na segunda concepção a escala é fundamentalmente uma questão fenomenal, ainda
que com uma importante dimensão metodológica na pesquisa. Nessa visão, fica claro
que a escala é intrínseca ao fenômeno analisado e que apenas com sua apreensão
adequada é que o pesquisador passa a ter condições de definir corretamente seu objeto
de análise, visto que o uso de uma escala não condizente com o objeto (falha comum
com a imposição escalar à priori) produz limitações em sua leitura.
Dois equívocos basilares decorrem da transposição da noção de escala cartográfica aos
estudos geográficos: O primeiro é que a escala não é algo dado por si só, mas uma
construção permanente, conforme Brenner (2013) chama atenção ao par analítico
escalonamento149/reescalonamento. Além disso, a função da escala é representar
processos, não os recortar de forma arbitrária. Sendo assim, são os processos dos quais
decorrem as questões de escalonamento que são, desde o início, fundamentais à análise
149
No nosso entendimento a escala pode ser entendida como uma fotografia de um filme em exibição e construção
contínuas.
366
do pesquisador. Entendendo que são os fenômenos que exprimem as escalas adequadas
à sua compreensão e rechaçando a ideia de que o pesquisador é o seu definidor à priori,
consideramos a escala como produto da realidade social que se impõe. Sendo tal
realidade constantemente produzida por uma ampla gama de agentes dotados de
diferentes motivações, chegamos ao fato de que a escala não é um simples dado, mas
um fruto social de processualidade constante. Nesse sentido:
Se uma noção de escala geográfica pode ser construída, ela será, sobretudo, uma noção
de tempo, os tempos nos lugares. Periodizações mundiais, nacionais e regionais serão
assim fundamentais para descortinar as funcionalidades do tempo. (SILVEIRA, 2004, p.
94)
150
Exemplificamos a correlação escala-tempo com o paulatino enfraquecimento do alcance espacial máximo dos
primeiros supermercados do circuito superior instalados em uma cidade após a abertura de concorrentes semelhantes,
já que os consumidores que antes eram impelidos a um maior deslocamento para uma única opção do tipo, passam a
ter cada vez mais opções de abastecimento (e mais próximas), enfraquecendo a força atrativa dos primeiros
supermercados nas porções compreendidas por novos concorrentes.
151
Caminhando a partir dos "desencaixes espaço-temporais" de Giddens (1991) em que a produção do espaço passou
a ser cada vez menos resultado dos interesses e ações circunscritos a si e cada vez mais ligada e determinada pela sua
relação com a rede de trocas globais, consideramos útil a ideia de "tempo intemporal" de Castells (1995, p. 556), que
a propõe para representar o tempo correlato, mas, sobretudo conduzido pelo espaço de fluxos a partir dos movimentos
que interligam espaços descontínuos e os engendram em uma mesma lógica.
367
império”) consiste a força do passado e dos arranjos pretéritos que delimita a certa
medida as possibilidades da escala de ação (SILVEIRA, 2004, p. 92). Considerar tais
dimensões implica pensar na questão escalar a possibilidade de refutação das mudanças
com base nos arranjos anteriores, bem como a convivência e a renovação com/pelas
ações mais novas.
Racine; Raffestin; Ruffy (1983, p. 129) afirmam que a realidade ao ser analisada deve
ser entendida como uma problemática intencional por parte dos sujeitos que a
interpretam. Concordamos com essa afirmação e consideramos que a compreensão
disso se soma ao fato de que não apenas o objeto, mas também a ciência e o pesquisador
que a estudam são construções sociais (FOUREZ, 1995) e, como tais, não-neutros frente
ao objeto da pesquisa.
Os expostos até então nos mostram que se é verdade que a escala em que se expressa
um fenômeno é uma condição prévia ao pesquisador, também é real o fato de que a
interpretação do mundo se dá a partir de uma matriz não-neutra e que este, é
ininteligível em sua totalidade, requerendo o parcelamento para o procedimento da
análise. Isso, somado à multiplicidade das escalas e das relações escalares são
fundamentos que a nosso ver, possibilitam e justificam o parcelamento para o enfoque
em determinados recortes escalares. Contudo, ressaltamos que a compreensão da
processualidade deve ser a primeira constatação de uma pesquisa, pois a partir dela
decorre a verificação da construção dos diferentes níveis escalares (e das relações entre
elas) que envolvem o objeto de pesquisa. A partir daí é que o pesquisador tem abertas as
possibilidades para o enfoque em um ou outro nível. No caso específico da nossa
pesquisa, o entendimento da reestruturação econômica da década de 1970 é de suma
importância para a compreensão das ações de difusão da atividade supermercadista no
mundo e das escalas envolvidas em tal processo.
Nesse período, Harvey (2013), frisa que a economia mundial passava por uma intensa
crise de sobreacumulação em que os capitais experimentavam uma perda de retorno
oriunda da queda das taxas de lucros nas aplicações tradicionais. Tal crise se somava à
acentuação da perda do poder de classe capitalista, iniciada na década de 1920. A
alternativa encontrada foi a promoção de ajustes espaço-temporais, que atuam na
absorção dos excedentes em uma reorientação temporal por meio de investimentos de
longo prazo ou gastos sociais e/ou a partir de reorientações espaciais na abertura de
novos mercados, objetivando suas capacidades produtiva e de consumo (HARVEY,
2006, p.3).
368
Tais ajustes espaciais promovem um rearranjo da desigualdade espacial por meio de
dois processos: O primeiro é a convergência (PIKETTY, 2014, p. 74), segundo o qual,
conforme afirmado pela economia neoclássica, trata-se de um mecanismo que, em tese,
aproximaria o desenvolvimento dos países pobres ao dos países ricos, visto que o
capital oriundo destes últimos buscaria novos espaços para a acumulação e, ao encontrar
uma taxa de retorno melhor nos países pobres, acabaria por desenvolvê-los. Por sua vez,
Smith (1988) argumenta que as forças de convergência promovem também nesses
novos lócus de acumulação, uma tendência de queda das taxas de lucros rumo a uma
igualização (por baixo) da mesma, o que motivaria de forma constante a migração do
capital a novas áreas capazes de lhe trazer um retorno diferenciado. Essa força de
divergência é indissociável da força de convergência e, atuando em conjunto,
caracterizam um movimento de vai-e-vem. Dessa forma, o capital ao entrar e sair
promove tanto a igualização quanto a diferenciação.
Tal fato faz com que a haja um constante crescimento dos mercados por meio de uma
frente de expansão geográfica da sociedade capitalista (SMITH, 1988, p. 172) trazendo
consigo suas formas de trabalho e consumo152, permitindo com isso a retomada e/ou a
aceleração da acumulação nessas “novas” áreas. Se a lógica do grande capital com sua
tendência expansionista está consolidada, se as tecnologias de informação e transportes
que permitem a integração de diferentes mercados com maior rapidez e eficiência
passam a estar disponíveis e se o ambiente político favorece a sua mobilidade na escala
mundial, tem-se dadas as principais motivações do seu alastramento rumo novos
mercados. Ressaltamos que não são apenas as formas do capital (empresas) que se
difundem, mas todo o conjunto de relações de produção, circulação, distribuição e
consumo subjacentes.
Esses movimentos produziram a partir da década de 1970, uma desestabilização nos
antigos arranjos nacionalizados pela reorientação das forças de acumulação de capital
rumo a uma atuação cada vez mais internacional das instituições, organizadas em
arranjos cada vez mais dispersos e dispostos em múltiplos níveis e escalas (BRENNER,
2013, p. 206). Tal redisposição escalar não é um mero resultado, mas um meio pelo qual
se sustenta e materializa os processos de acumulação no atual estágio do capitalismo.
Nesse sentido, Melazzo, Castro (2007, p. 139) afirmam que:
152
Ainda que discordemos da ênfase excessiva dava por Smith (1988) à produção face o consumo, inclusive no que
tange a integração de tais etapas, consideramos que sua ideia de desenvolvimento desigual é profícua ao
entendimento da forma pela qual o modo capitalista de produção produz suas respectivas escalas de atuação.
369
[...] a dinâmica do capital cria um espaço-economia cada vez mais integrado e
organizado e essa integração e organização só pode ser compreendida através das
escalas geográficas. As escalas são assim, produtos do capital, instâncias de
concretização e de negação de seus movimentos internos. São diferenciações do espaço
produzidas e necessárias ao capital para superar momentaneamente suas contradições.
Mesmo que o formato supermercadista tenha se difundido pelo mundo logo após seu
surgimento, não houve, de início, a formação de capitais avolumados de atuação na
escala internacional. Como exposto a seguir, foi apenas nas últimas décadas que os
maiores grupos do setor consolidaram sua força no fomento de novos arranjos espaciais
com sua atuação global.
370
Por volta da década de 1970, algumas iniciativas do Estado contribuíram para modificar
sua estrutura no país, como, em um recorte mais restrito, a institucionalização da
atividade com a Lei Municipal 7208/68 da cidade de São Paulo; o redirecionamento –
conforme o ocorrido com a Cia Brasileira de Alimentos (COBAL) e a criação – a
exemplo da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) - de órgãos que visavam
a modernização da distribuição de alimentos pela difusão dos supermercados,
(PINTAUDI, 1981, p. 68, 69) e, principalmente em âmbito nacional, o I Programa de
Modernização e Reorganização da Comercialização (PMRC). Este programa visava a
modernização e reorganização do comércio, na área de produtos manufaturados e
semimanufaturados (BRASIL, 1971) promovendo por meio de financiamentos do
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) a modernização e a difusão
da atividade supermercadista. Como seu foco eram as empresas já consolidadas, suas
ações permitiram a elas a abertura de novas lojas e a aquisição de outros grupos de
menor poder153. Tal medida veio em um momento em que a concentração econômica já
proporcionava que alguns grupos como o Pão de Açúcar, o Superbom e o Peg-Pag
passassem a obter ganhos de escala que lhes proporcionassem vantagens concorrenciais.
Ressaltamos que mesmo que tais iniciativas governamentais tenham proporcionado a
concentração do capital supermercadista e ampliado a escala de atuação de alguns
grupos, não se deu a formação de nenhuma empresa com atividades em âmbito nacional
no período. Ainda que o PMRC também tenha proporcionado crescimento a alguns
grupos sediados fora do Sudeste, estes também tiveram seu crescimento concentrado
espacialmente. A predominância dos capitais endógenos no ramo supermercadista foi
sua principal marca até o início da década de 1970.
A internacionalização do setor foi, a nosso ver, tardia, visto que grande parte de seus
maiores grupos só iniciaram tal processo após as décadas de 1980 e 1990154.
Destacamos alguns fatores de grande importância para esse relativo atraso: 1) A lenta
concentração de capital na atividade comercial155 (PINTAUDI, 2010); 2) A formação
tardia do ramo supermercadista; 3) Demora maior na implantação de melhorias
comunicacionais e de transporte que possibilitassem retornos vantajosos à expansão
153
Tal programa integrava o I Plano Nacional de Desenvolvimento no qual o governo federal buscava a melhoria da
competitividade nacional, inclusive por meio do fomento à iniciativa privada. O plano: "objetiva o gradual acesso do
comércio brasileiro à nova tecnologia, criando modernas estruturas de comercialização e distribuição de
manufaturados, realizando fusões de emprêsas, implantando novos métodos de gestão e contrôle, e introduzindo, no
país, consórcios de exportação" (BRASIL, 1971, Grifo nosso).
154
A título de exemplo, destacamos os anos iniciais da internacionalização dos seguintes grupos: Carrefour (1969);
Casino (1976); Auschan (1981); Aeon (1984); Walmart (1991) e Tesco (1994).
155
Considerando apenas o período posterior à ascensão do capitalismo industrial pós século XIX.
371
dessa atividade de pequena margem de lucro156; 4) Consolidação, pós 1980, do cenário
político-econômico neoliberal que favoreceu a abertura comercial e o Investimento
Estrangeiro Direto (IED) no contexto internacional.
Em outras palavras, a formação tardia da atividade, oriunda provavelmente de pequenas
iniciativas, fez com que demorasse algumas décadas para se avolumar157 capitais que
permitissem uma expansão internacional, consolidada de fato apenas com a apropriação
do cenário tecnológico e a cooptação das novas possibilidades de âmbito político. Em
geral, nos países subdesenvolvidos:
Supermarkets have been around for half a century in several developing countries, but
the phenomenon was limited mainly to large cities, upper-middle-class or rich consumer
segments, and domestic capital chains. In contrast, a supermarket revolution in
developing countries took off in the early-to-mid-1990s. (REARDON, GULATI, 2008,
p. 5)
Tal revolução apontada por Reardon; Gulatti (2008) pode ser definida pela
internacionalização das maiores redes supermercadista na década de 1990, que
fundamentadas na saturação dos seus mercados domésticos, se lançaram na busca de
novos mercados para sua operação, principalmente, no Sudeste Asiático, na América
Latina e no Leste Europeu, onde a participação dos supermercados na distribuição de
mercadorias era reduzida. Neles, seu crescimento se deu por meio da abertura de lojas
próprias e com fusões e aquisições de empresas nacionais, alcançando com isso,
margens de lucro maiores e fomentando um processo de convergência nas formas de
abastecimento da população, aproximando-a rapidamente ao padrão dos países
desenvolvidos (REARDON, BERDEGUÉ, 2002).
Além da busca por novos mercados consumidores, algumas políticas nacionais e
internacionais de liberalização do IED e uma regulação do comércio favorável à difusão
da atividade nos países onde passaram a se instalar, influenciaram e proporcionaram
pelo lado da oferta, uma maior rapidez e intensidade ao processo. Por parte da demanda,
o aumento da população urbana - cada vez mais inserida em relações capitalistas de
trabalho e de consumo, o aumento da participação feminina no mundo do trabalho e o
aumento da renda per capita, veio constituindo nestes países desde a década de 1960,
potenciais quantitativos de consumo e hábitos de culturais atrativos ao grande capital
156
Segundo Morita (2011) o ramo supermercadista tem uma margem de lucro líquida de 2,7 % atualmente.
157
Em um cenário em que a baixa concentração de capital intra setorial produziu poucos agentes de grande poder
econômico e no qual a pequena maturidade da atividade ainda não atraiu interesses de outros capitais, consideramos
que nessa fase o papel da centralização do capital ainda era restrito no ramo supermercadista.
372
supermercadista (REARDON, GULATTI, 2008). No entanto, essa considerável
demanda solvável permaneceu por mais 30 anos praticamente inexplorada pelos grupos
internacionalizados do ramo.
Já para a situação brasileira da década de 1990, consideramos excessivo o termo
"Supermarket Revolution" de Reardon; Gulatti (2008), por três motivos: 1) A
participação dos supermercados na distribuição de alimentos no Brasil já era na década
de 1980, bem próxima a dos países desenvolvidos, atingindo 84% do total (ROJO,
1998, p 2); 2) No Brasil, a internacionalização da década de 1990 acelerou um processo
que estava em marcha há pelo menos duas décadas, pois muito antes de tal período -
Makro (1972), Carrefour (1974) e Sonae (1989) - o país recebia grandes somas de
investimentos estrangeiros; 3) O ramo supermercadista já era antes de tal período,
representado por uma série de grupos com forte atuação regional, tais como o Bom
Preço (SE), o G.Barbosa (SE), o Sendas (RJ), o Disco (RJ), o Eldorado (SP), o Nacional
(RS), o Condor (PR), e em especial o Pão de Açúcar (SP) e o francês Carrefour (BNDS,
1996), além de outros grupos de menor poder econômico.
A partir da década de 1990 toma uma forma mais clara o cenário concorrencial atual da
atividade no Brasil. Destacamos o rápido crescimento do capital internacionalizado no
setor, representado pelas ações do CBD, do Carrefour, e do Walmart, que em conjunto
com o Cencosud Brasil Com. Ltda., constituíram um grupo de empresas do circuito
superior de atuação internacionalizada (CSI). O crescimento rápido das empresas desse
grupo verificado na referida década se deu tanto por meio de expansão orgânica, quanto
pela aquisição e fusão com outros grupos tradicionais de capital nacional, neste último
caso, conforme contido em Souza (2013, p. 18-21). Frisamos que estes grupos são
atualmente os quatro de maior faturamento no Brasil no ramo.
Em um nível inferior de concentração econômica e dispersão territorial das atividades
encontra-se uma série de grupos do circuito superior, de capital nacional. Destacamos
que estes grupos, ao contrário daqueles referidos acima158, possuem dispersão no
máximo em âmbito regional159. São grupos com faturamento bilionário, com grande
quantidade de lojas - sendo geralmente lojas com extensas áreas de venda - e que focam
suas operações em dois níveis: 1) Atuação preferencial nas capitais de Estado ou em
158
De acordo com os dados de localização contidos nos sítios institucionais, o Makro e o Carrefour são as empresas
que possuem estabelecimentos em um maior número de estados do país, são 24 além do Distrito Federal. Por sua vez,
o Walmart e a Cia. Brasileira de Distribuição possuem lojas do ramo em respectivamente 19 e 17 estados além do
Distrito Federal.
159
A leitura da topologia dos referidos grupos foi feita com base nos endereços das lojas contidos nos respectivos
sítios institucionais.
373
suas regiões metropolitanas, a exemplo do Zaffari & Bourbon (RS), do Condor (PR), do
Joanin (SP), do Sonda (SP), do Guanabara (RJ), do Zona Sul (RJ), do Carvalho (PI) e
do Y.Yamada (PA) e; 2) Atuação preferencial em cidades distantes de capitais de
estado, ainda que possam operar nelas de forma incipiente, a exemplo Angeloni (SC),
do Cidade Canção (PR), do Super Muffato (PR), do Villareal (SP), do Sagevnago (SP),
do Bahamas (MG), do Bonanza (PE). Além dessa disposição, as lojas desses grupos
estão via-de-regra, instaladas em apenas um ou dois estados brasileiros.
Abaixo deles constam os grupos do circuito superior marginal. Ao contrário de Santos
(2004, p.103), que desconsidera a existência de tal circuito no comércio moderno,
concluímos em Gomes (2013, p. 122-125) não só possível, mas um fato a sua
existência. Supermercados como os das bandeiras Viscardi e Supergolff com atuação
majoritária em Londrina (PR), bem como o Laranjão e o Proença em São José do Rio
Preto (SP) fogem ao mesmo tempo da simplicidade organizacional e do baixo nível de
capital constante do circuito inferior, inserindo-se em uma lógica burocrática,
centralizada e com um viés que busca satisfazer seus anseios de acumulação por meio
da expansão territorial das atividades, de forma semelhante ao circuito superior
destacado anteriormente160. Ainda que a lógica seja a mesma, ressaltamos que sua
dispersão das atividades é mais restrita espacialmente do que a dos grupos do circuito
superior, se restringindo a uma ou poucas cidades próximas.
Na base, mais larga, figura as atividades do circuito inferior da economia urbana.
Conforme analisado em Gomes (2013), o circuito inferior supermercadista é fruto da
recriação constante da pobreza, tanto no que envolve as inciativas empresariais, quanto
no seu público consumidor majoritário, sendo suas atividades geralmente marcadas por
iniciativas de pequenos capitais locais, empregados de forma unilocalizada. Dois fatos
sinalizam uma ampla dispersão dele na rede urbana: 1) a multiplicidade dos agentes
independentes e que empreendem pequenos montantes - relativo à atividade - de capital
para sua operação, bem como a própria pequena dimensão da atividade, requer para a
reprodução familiar e do negócio, - principal motivadora do circuito inferior face à
acumulação conforme Santos (2004) - menores públicos consumidores161. Essas
160
Conforme a importante presença do referido circuito nas cidades de cidades de Londrina (PR), Ribeirão Preto (SP)
e São José do Rio Preto (SP), que são objeto de estudo de nossa dissertação, levantamos a hipótese de que as cidades
médias são lócus de consolidação e crescimento, tanto de grupos que foram fundados nas cidades próximas e que
nelas operam, quanto de grupos que nelas foram fundados e que expandem suas operações para as cidades próximas
de âmbito regional.
161
Pelo fato de que grande parte (25.204 ou 79,20%) dos estabelecimentos do ramo em 2013 tenham de acordo com a
RAIS/MTE (2015) entre 0 e 49 ocupados, e que as operações de pequeno porte sejam uma importante característica
do circuito inferior, consideramos que grande parte dos supermercados no Brasil sejam de tal circuito.
374
características indicam que é o circuito inferior da economia urbana, aquele de maior
penetração nas cidades pequenas.
Consideramos que a coexistência dessa miríade de agentes e forças no cenário
concorrencial é a principal marca do setor supermercadista brasileiro. Esses diferentes
enquadramentos na teoria dos circuitos da economia urbana são a nossa proposta
analítica para os estudos que tenham seus 31.281 estabelecimentos em 2013
(RAIS/MTE, 2015) como objeto. No próximo tópico analisamos a inserção do circuito
superior de atuação internacionalizada na rede urbana brasileira a partir da leitura das
operações dos três maiores grupos de capital internacionalizado e do Makro Atacadista
S/A.
375
A concentração econômica é o pilar na diferenciação das operações do circuito superior.
Ela se expressa de forma clara em quatro fatores que em nossa opinião são as principais
marcas operacionais do CSI do ramo supermercadista, são eles: 1) Organização
burocrática; 2) Alto nível tecnológico; 3) Dispersão territorial; 4) Formação de relação
multiescalar direta (fornecedores, consumidores e organização interna ao grupo).
Todos os grupos analisados são marcados pela concentração econômica, que amplia
suas possibilidades de expansão topológica, mas requer uma organização burocrática e
centralizada para o controle da atividade. Seu alto nível tecnológico se explica por
necessidades organizacionais, como a busca por controle de toda a extensa rede
estabelecida pelo grupo; econômicas, ao otimizar o uso de trabalho vivo e, por último,
necessidades de atração de consumidores por meio do efeito-demonstração e pelos
signos agregados à tecnologia. Além disso, tais grupos estabelecem relações
multiescalares com seus fornecedores, consumidores e intra-grupo, dispersando suas
lojas de forma seletiva conforme as diferenciações socioespaciais constituídas
historicamente.
A diferenciação socioespacial manifesta-se tanto na escala da rede urbana quanto no
intra-urbano (WHITACKER, 2009, 2010), sendo resultado de práticas espaciais de
ações tomadas por agentes sociais. Enquanto na primeira escala tal diferenciação se faz
relacionada ao papel destacado da cidade na rede urbana, na segunda diz mais respeito à
divisão econômica e à divisão social do espaço (CORREIA, 2007). A presença ou não
de grupos supermercadistas no abastecimento das cidades brasileiras é a primeira
distinção que destacamos quanto ao escalonamento da atividade no nível da rede
urbana. Por maior que seja a necessidade do serviço ao cotidiano, não são todos os
municípios que são atendidos diretamente por ele (Tabela 1).
Números absolutos
1041 3818 1590 920 626 199 31 10 3969 5565
Porcentagem do total (%)
162
A RAIS/MTE (2015) realiza a tabulação de dados por município, não por cidade.
376
18,71 68,61 28,57 16,53 11,25 3,58 0,56 0,18 71,32 100,00
163
Conforme verificado em trabalhos de campo realizados em Londrina (PR) e São José do Rio Preto (SP), quase
todos os supermercados visitados com área de venda superior a 1.500 m² ocupam mais de 100 trabalhadores. Esses
estabelecimentos de maior tamanho eram via-de-regra do circuito superior, ou em alguns casos, do circuito superior
marginal.
164
Apenas 19 municípios brasileiros com mais de 100.000 habitantes não possuem estabelecimentos acima de 100
ocupados. Destes, Timon (MA) e Itapecerica da Serra (SP) são os de maior população, contando com
respectivamente 161.721 e 163.363 habitantes.
377
operações do CSI são de super/hipermercados ou de atacarejos, (Tabela 3) que ao longo
de nossa pesquisa se mostraram formatos de grande ocupação de trabalhadores -
especialmente nos casos do CSI - se encaixam com os dados da Figura 2, que
apresentam a pequena inserção dos grupos analisados neste trabalho, em cidades de
reduzido contingente populacional.
Ainda que dotados de grandes volumes de capital e facilidade de acesso ao
financiamento, o circuito superior aplica grandes recursos na produção de suas
estruturas (SANTOS, 2004), sobretudo, nos super/hipermercados e atacarejos165. Sendo
assim, erros oriundos de má escolha locacional devem ser minimizados ao máximo e
com isso, apenas as cidades e suas respectivas porções que possibilitem suficiente
rapidez na rotação do capital é que são tidas como capazes de recebê-lo.
A seletividade espacial166 dos grupos do ramo desencadeia um duplo movimento
expresso na complementaridade das escalas do urbano167. No intra urbano são múltiplas
as áreas visadas pelo circuito superior do setor, que tradicionalmente busca se instalar
em porções de elevados rendimentos domiciliares, maiores densidades populacionais,
centralidade já constituída e de boa acessibilidade, como São Paulo (PINTAUDI, 1981)
e Londrina (PR) (GOMES, 2013). Por outro lado, as grandes superfícies comerciais
vêm nas últimas décadas rompendo com a antiga lógica mono/multicêntrica face as
atuais multi(poli)centralidades168 (SPOSITO, 2010 e 2013), redirecionando o sentido
dos fluxos, bem como a expansão dos fixos para áreas distantes do centro principal e
não raro descontínuas da mancha urbana consolidada, o que facilita também a
acessibilidade no plano regional.
165
De acordo com uma série de levantamentos sobre os recentes investimentos dos grandes grupos em Londrina
(PR), a abertura de uma loja de grande porte pelo circuito superior supermercadista movimenta em média uma
quantia de 30 a 40 milhões de reais.
166
Segundo Santos (2003, p. 126), a seletividade espacial se manifesta tanto no plano econômico quanto no social, no
que tange ao consumo, ela "responde a forças de dispersão, mas a seletividade social age como um freio sobre essa
dispersão porque a capacidade de consumir varia qualitativa e quantitativamente através do espaço". Essas distintas
capacidades de consumir, menos individuais, e mais as coletivas, são em nossa opinião um dos principais fatores a
serem considerados na dispersão dos grupos da atividade supermercadista.
167
Os escritos de Corrêa (2003, p. 136) sobre a indissociabilidade das escalas do espaço urbano e da rede urbana vão
ao encontro de nossos apontamentos do primeiro tópico. Segundo o autor: “As duas escalas conceituais, a da rede
urbana e a do espaço urbano não estabelecem uma dicotomia, cindindo o urbano em duas partes que não se tocam.
Lembremo-nos que a dicotomia não é um dado do mundo real, mas uma deformação intelectual. A operação escalar
não introduz essa visão deformada, geradora de dicotomia, mas, ao contrário, ressalta as possibilidades de se analisar
o mundo real, o urbano no caso, em dois níveis conceituais complementares”.
168
A multicentralidade é ao ver de Sposito (2010, p.205-206), a existência de mais de um centro, já a policentralidade
é decorrente da concentração econômica de grandes grupos comerciais tais como os hipermercados e os shoppings
centers bem como os produtores imobiliários que passam a orientar suas escolhas locacionais a porções fora do tecido
urbano. As áreas que constituem tal policentralidade, não são hierarquicamente inferiores ao centro principal em
termos de diversidade e especialização da oferta, mas suas competidoras (SPOSITO, 2013, p. 75). Somadas, multi e
policentralidades constituem as multi(poli)centralidades.
378
Um exemplo dessa situação é a ocorrida após a abertura do Catuaí Shopping Center,
junto com um hipermercado Carrefour no início da década de 1990 em Londrina (PR)
nas proximidades da interseção da Rodovia PR-445 com a Rodovia Mábio Gonçalves
Palhano, em uma área de uso quase exclusivo rural e relativamente afastada da mancha
urbana consolidada até então. Silva (2008) aponta esses elementos como importantes na
redefinição da centralidade na cidade de Londrina.
Na escala da rede urbana, a condição de diferenciação que constitui a atratividade para a
abertura de lojas no setor supermercadista se expressa, em linhas gerais, com uma
presença maior e mais profunda da atividade conforme maior for a população (Figura 2)
e, sobretudo, o nível de centralidade da cidade (Figura 4). Ao se inserir buscando
receber/atrair fluxos regionais, as grandes superfícies comerciais tem o potencial de
desencadear movimentos de centripecidade sobre os fluxos regionais, captando-os para
a cidade que atuam. Consideramos que essa é a base dos processos de expansão do
circuito superior supermercadista ao visar principalmente as cidades com um maior
nível de centralidade regional (Figura 4). Nelas, são aproveitadas tanto o mercado
consumidor formado pela população de tal cidade e que constitui a base mais larga de
seu alcance espacial mínimo169, mas também organizado um alcance espacial máximo
em âmbito regional se aproveitando dos mercados das cidades menores. Se um
estabelecimento busca no início aproveitar-se da centralidade pré-constituída na
formação de seu alcance espacial, com a consolidação das suas operações frente aos
consumidores da região, a atividade passa a reforçar a centralidade da cidade polo.
Esses são os aspectos mais gerais da inserção topológica da atividade supermercadista.
Três dos quatro grupos analisados (CBD, Carrefour e Walmart), expandiram
destacadamente suas atuações por meio de "enxertos topológicos", visto que com a
aquisição de outras empresas, a exemplo dos processos de concentração colocados em
marcha na década de 1990 (SOUZA, 2013), incorporaram também - ao menos parte das
- suas lógicas locacionais cristalizadas e com isso, suas topologias. Logo, não há um
entendimento único que possa dar conta de toda a sua lógica locacional, ainda que em
nossa opinião, tanto as lojas oriundas da expansão orgânica, quanto aquelas adquiridas e
que foram mantidas operando - considerando que assim continuaram por terem sido
169
Em citação literal de Corrêa (1992), Sposito (2003, p. 181-182) expõe que o alcance espacial máximo na teoria
christalleriana é uma "("área determinada por um raio a partir da localidade central", dentro da qual os consumidores
efetivamente deslocam-se para a localidade central visando a obtenção de bens e serviços"), e alcance espacial
mínimo ("área em torno de uma localidade central que engloba o número mínimo de consumidores que são
suficientes para que uma atividade comercial ou de serviços, uma função central, possa economicamente se instalar").
379
passíveis de enquadramento na lógica organizacional e locacional da empresa que os
adquiriu - formam um conjunto coerente aos propósitos atuais da empresa da qual
fazem parte. A Tabela 3 mostra o universo de lojas analisadas.
Figura 2: Brasil. Cidades com lojas do circuito superior internacionalizado por faixa
populacional - 2013 (%).
170
Os dados de localização das lojas foram coletados nos sítios institucionais dos grupos pesquisados entre
20/06/2014 e 29/09/2014.
380
Acima de 1 milhão
500.001 - 1 milhão
300.001 - 500.000
200.001 - 300.000
150.001 - 200.000
100.001 - 150.000
50.001 - 100.000
25.001 - 50.000
Abaixo de 25.000
0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 60,00 70,00 80,00 90,00 100,00
381
As cidades nessa condição estão em sua grande maioria em relação de proximidade (até
100 quilômetros de distância), ou constituindo uma aglomeração urbana com cidades de
maior porte populacional e nível de centralidade. Nossa hipótese é a de que as cidades
de menor população que possuem lojas do CSI se beneficiam da proximidade das
cidades de maior porte que já as possuem. Essas últimas, muitas das quais, cidades
médias, não são apenas concentradoras desse tipo de serviço, mas difusoras frente às
cidades da região. A proximidade geográfica e as favoráveis condições de acessibilidade
permitem que as mesmas vias e o mesmo centro de distribuição utilizado para o
abastecimento das unidades das cidades maiores seja compartilhado, não implicando em
acréscimos significativos de custos para o atendimento desses mercados consumidores
menores, fato este, que não ocorre caso essas cidades de menor porte populacional
encontrem-se a maiores distâncias de cidades de maior porte populacional. Destacamos
que quase todas as cidades nessa primeira situação são das regiões Sul e Sudeste do
Brasil171. A Figura 3, expressa essa situação a partir da demonstração da topologia da
Cia. Brasileira de Distribuição no Estado de São Paulo.
171
As únicas cidades com menos de 200.000 habitantes que possuem super/hipermercados do CSI e se localizam fora
do Sul e Sudeste são: Candeias (BA), Itaparica (BA) e Cabedelo (PE).
382
Figura 3: Estado de São Paulo. Super/hipermercados da Cia. Brasileira de Distribuição por município. 2014.
383
A Figura 3172 mostra que municípios como Ribeirão Preto e São José do Rio Preto,
localizados no Norte do estado de São Paulo e que possuem respectivamente três e
quatro estabelecimentos, possuem em suas proximidades, municípios de porte
populacional inferior a 200.000 com estabelecimentos, como Barretos, Bebedouro,
Catanduva, Guaíra, Olímpia e Orlândia. Outras situações semelhantes foram verificadas
para municípios localizados nas proximidades de São José dos Campos, como Lorena e
Guaratinguetá, além de Brotas, Leme e Porto Ferreira, sendo estes três últimos
localizados próximos à Araraquara e São Carlos. Chamamos a atenção também para
casos de municípios com menos de 200.000 habitantes localizadas na ou nas
proximidades da Região Metropolitana de São Paulo e no litoral paulista. Ressaltamos
que tal disposição foi constatada para a Cia. Brasileira de Distribuição, outros grupos
podem possuir lógicas semelhantes173 ou distintas da observadas na Figura 3.
Por último, frisamos que é mais comum que as cidades entre 100.000 e 200.000
habitantes - a exemplo de Lages (SC), Uruguaiana (RS), Umuarama (PR) - que possuem
lojas do CSI, estejam em condições de maior isolamento de outras cidades maiores, do
que aquelas com menos de 100.000 habitantes, - situação verificada apenas para
Sant’Anna do Livramento (RS) - ainda que todas essas possuam condições de
acessibilidade favoráveis e se localizem no Sul e no Sudeste. Isso indica que quanto
maior é o contingente populacional interno, mais provável é o fato de que a cidade se
torne independente das demais da rede urbana para receber as atenções dos CSI.
Nossa pesquisa vem apontando que os atacarejos são os mais seletivos quanto a sua
inserção na rede urbana, tendo uma presença mais profunda quanto maior for o
contingente populacional das cidades, sendo quase onipresentes naquelas acima de
500.000 habitantes, mas, por outro lado, tendem a ser os mais raros nas faixas
inferiores, notadamente abaixo de 150.000 habitantes. Esta situação nos indica que tal
formato poderia requerer para a sua atividade um maior público consumidor, próprio ao
centro urbano analisado, ou em sua região de influência imediata. Para uma verificação
172
Consideramos nesse levantamento apenas as lojas das bandeiras Extra Supermercado, Extra Hipermercado e Pão
de Açúcar. Em virtude das lojas de vizinhança ser um formato com inserção facilitada em cidades de menor porte
populacional, optamos por não inclui-las neste levantamento. Além disso, como a hipótese construída nesse trabalho
nos indica que os super/hipermercados são via-de-regra mais voltados à população interna da cidade do que os
atacarejos, preferimos desconsiderar esses últimos neste levantamento.
173
Outros grupos do circuito superior regional expressam situações semelhantes, como o Irmãos Muffato & Cia
Ltda., com 08 lojas em Londrina (PR) e outras em cidades de menor porte populacional da sua aglomeração urbana,
como Apucarana (PR), Cambé (PR) e Ibiporã (PR) no caso do A.Angeloni & Cia. Ltda., que possui lojas em cidades
próximas à Florianópolis (SC) ou Joinville (SC), a exemplo de Balneário Camboriú (SC), Biguaçu (SC) e Tubarão
(SC).
384
mais aprofundada de sua relação com a centralidade das cidades, realizamos uma leitura
dos estabelecimentos com base na classificação REGIC174 (Figura 4).
Como verificado para os super/hipermercados, boa parte dos atacarejos instalados em
cidades abaixo de 200.000 habitantes encontram-se dispostos em aglomerações urbanas
ou nas proximidades de cidades de maior porte e com boa acessibilidade. Por outro
lado, um maior número de cidades, tais como Sinop (MT), Lages (RS), Guarapuava
(PR), Rio Verde (GO) e Chapecó (SC) os possuem mesmo estando mais isoladas de
outras cidades de maior porte populacional. O caráter de maior independência do
formato também se constata com a sua maior inserção nas capitais do Centro-Oeste e do
Norte, – onde é por vezes a única manifestação do CSI do setor – onde constam
respectivamente 1,4 e 0,93 super/hipermercados por atacarejo, ao passo que nas demais
regiões brasileiras a média é de 4,2 super/hipermercados por atacarejo.
Capital regional A
Capital Regional B
Capital Regional C
Centro de Zona A
Centro de Zona B
Centro Local
0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 60,00 70,00 80,00 90,00 100,00
174
O REGIC (Região de Influência das Cidades) é um estudo que analisa e classifica hierarquicamente os centros
urbanos da rede urbana brasileira a partir de suas respectivas regiões de influência em aspectos de gestão políticas e
econômica (dos setores público e privado), bem como da prestação de serviços e da dotação de equipamentos
(BRASIL, 2007).
385
importância para a sua presença e reforça nossa ideia de que é a população local
(mesmo que pequena) que satisfaz suas exigências locacionais.
Os super/hipermercados por sua vez, marcam mais presença conforme maior for
o nível de centralidade das cidades, tendo participação quase unânime nas metrópoles e
grande presença nas Capitais Regionais, sobretudo as de maior hierarquia. Nos níveis
inferiores a elas, são poucas as cidades que recebem tais estabelecimentos.
Reforçando a nossa hipótese, a análise pela classificação REGIC mostra uma
relação mais íntima entre os centros urbanos de maior centralidade e os atacarejos. Estes
se fazem presentes na maioria das Capitais Regionais C enquanto os
super/hipermercados operam em apenas metade dessas cidades. Além disso, nos
estratos inferiores a Centro Sub Regional B, no qual os supermercados ainda estão
presentes, os atacarejos quase inexistem. Outro fator que pesa nessa ocorrência é que
comumente existem mais super/hipermercados do CSI em uma única cidade do que
atacarejos.
Enquanto isso, os super/hipermercados parecem mais vinculados à população de
porções da própria cidade já que nos centros urbanos de menor centralidade (inferiores à
Centro Sub Regional A), são igual ou mais presentes do que os atacarejos, levantamos a
hipótese de que estes últimos requerem um alcance espacial mínimo mais amplo,
comportando a instalação de menos concorrentes semelhantes sob ameaça de saturar o
cenário concorrencial. Consideramos que é a maior movimentação de mercadorias,
vendidas em grande parte para pessoas jurídicas e o menor preço unitário dos produtos
garantem a esse formato um maior alcance espacial máximo, caracterizando uma
amplitude na rede urbana muito maior do que nos demais formatos.
4. Considerações finais
386
ainda terem uma presença relativamente restrita no território nacional, as maiores
empresas do setor vêm se integrando cada vez mais com diferentes territórios e públicos
consumidores por meio de uma ampla gama de formatos.
A seletividade, fruto das práticas desses agentes, expressa-se na rede urbana brasileira a
partir de uma lógica locacional bem delimitada. Até mesmo as exceções compartilham
características que as mantém unidas e expressam a visão topológica das empresas.
Frisamos as importantes diferenciações entre as lógicas locacionais de cada tipo de
estabelecimento.
Como hipótese final, nossa pesquisa aponta que, mesmo que a inserção dos
super/hipermercados na rede urbana seja, à primeira vista, semelhante à dos atacarejos,
suas operações são, via de regra, mais voltadas aos consumidores da própria cidade e de
porções dela, ainda que tirem grande proveito do consumidor das demais cidades da
região, ao passo que o atacarejo é um formato que, por ter intrinsecamente uma maior
abrangência territorial, também dispõe de maior potencial no aproveitamento e reforço
da centralidade urbana, sendo, por isso, um melhor indicador desse fenômeno. Já os
supermercados de vizinhança se mostram com maior independência de situações de
polarização na rede urbana, vinculando-se mais à dinâmica econômica e demográfica
interna à cidade, mesmo que pequena.
5. Referências Bibliográficas
BNDS. Comércio Varejista - Supermercados. 1996. Disponível em:
<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/s
ites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/relato/supmerca.pdf>. Acesso
em 01. Fev. 2015.
______. REGIC - Regiões de influência das cidades. Brasília: [s.n] 2007. 201 p.
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. 10. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2012. 698
p.
387
CASTRO, Iná. Elias de. Análise geográfica e o problema metodológico da escala. In: I
Workshop de Geociências, 1992, Rio de Janeiro. Anais do I Workshop de
Geociências. 1992.
______. Uma nota sobre o urbano e a escala. Território. Rio de Janeiro, n. 11, 12, 13.
p. 133-136, set-out. 2003.
______. Para uma leitura das formas de comércio varejista na cidade. Cidades.
Presidente Prudente, v. 7, n. 11, p. 179-190, 2010.
388
RACINE, J.B; RAFFESTIN, C. RUFFY, V. Escala e ação, contribuições para uma
interpretação do mecanismo de escala na prática da Geografia. Revista Brasileira de
Geografia, Rio de Janeiro, v. 1, n. 45, p. 123-135, Jan-mar. 1983.
ROJO. Francisco José Grandis. Qualidade total: uma nova era para os supermercados.
Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v.38, n.4, p.26-36, out-dez. 1998.
SANTOS, Milton. Economia Espacial. 2. Ed. São Paulo: Edusp, 2003. 207 p.
SILVEIRA. Maria Laura. Escala geográfica: da ação ao império? Terra Livre. Goiânia.
V.2, n.23, p.87-96, jul-dez. 2004.
389
______. Segregação socioespacial e centralidade urbana. In: VASCONCELOS, P. de
A.; CORRÊA, R. L.; PINTAUDI, S. M. (Orgs). A cidade contemporânea –
Segregação espacial. São Paulo: Contexto, 2013. p. 60 - 93.
390
REDE URBANA NO RIO GRANDE DO NORTE/BRASIL:
CIRCULAÇÃO DE INSUMOS E PRODUTOS AGROPECUÁRIOS
ENVOLVENDO A CIDADE DE MOSSORÓ
ABSTRACT
The urban network presuppose a set of relation between urban centers by means of a
complex system of movement of people, goods, capital and information. Thus, this
study intends to analyze the Rio Grande do Norte’s urban network from the agricultural
input and products involving the city of Mossoró/RN. For this purpose, it was carried
out bibliographical and documentary research, surveys, analyzes and systematization of
secondary data from bodies such as the IBGE and MTE, being presented through tables,
charts and cartograms. It is perceived that Mossoró is an important center of
commercialization of agricultural inputs and agribusiness products, having its network
participation in a complex system of flows and fixed.
175
Graduando em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Faz parte do grupo de
pesquisa Unidade Interdisciplinar de Estudos sobre Habitação e Espaço Construído como bolsista PIBIC
(IC) CNPq. O presente trabalho resulta das reflexões empreendidas no desenvolvimento do Projeto
Casadinho/PROCAD (UFRN/FCT-UNESP-Presidente Prudente/SP) “A reestruturação produtiva e a
dinâmica urbano-regional do Rio Grande do Norte (1990-2010)”, coordenado pelo Professor Dr.
Francisco Fransualdo de Azevedo – Universidade Federal do Rio Grande do Norte – orientador do
presente trabalho.
391
1. Introdução
392
resultando da força de trabalho exercida pelo homem enquanto sujeito da história.
Porém as articulações entre diferentes áreas se tornaram mais expressivas, ganhando
novos conteúdos e significados, no período técnico-científico-informacional.
De acordo com Corrêa (1989, p.5), “no processo de urbanização [...] a rede
urbana passou a ser meio através do qual produção, circulação e consumo se realizam
efetivamente”. Assim, é admissível que a formação de redes esteja intrínseca à inúmeros
processos que ocorrem de forma articulada espaço-temporalmente, sendo resultante das
ações dos agentes, que em distintos lugares, exerceram suas funções nos diferentes
momentos da história (SPOSITO, 2008).
No período histórico atual a essência das redes veio a tomar novos significados,
especialmente mediante o surgimento de novos sistemas de objetos e sistemas de ações
(SANTOS, 1996) proporcionando maior fluidez no espaço. A partir do pós-guerra o
capitalismo presenciaria e contribuiria para maior fluidez frente ao seu objetivo de
expansão, diminuindo barreiras no sentido de circulação de pessoas, mercadorias,
capital e informações.
O surgimento de novas técnicas e tecnologias ocasionou uma dinamicidade
maior dos fluxos ligados ao sistema de produção, resultando na configuração de redes
dotadas de dinamicidades. A exemplo aparecem os sistemas de telecomunicações, sendo
importantes ferramentas que configuram fluxos, tornando possível a diminuição dos
custos de circulação entre diferentes áreas.
Subjacente ao sistema de redes, alguns centros urbanos configuram-se como
particularidades regionais, exercendo influência àquelas áreas que não apresentam um
sistema satisfatório à realização das intencionalidades. Assim, ao estudar a rede urbana
é necessário atentar para a influência exercida por cidades dotadas de centralidades
(REGIC, 2008), incluindo novos agentes, processos, conteúdos e novas áreas ao
cotidiano local.
A cidade é entendida, então, como uma materialidade resultante de processos de
trabalho, de uma divisão técnica, e até mesmo social, sendo “um grande meio de
produção material e imaterial, lugar de consumo, nó de comunicação” (SANTOS, 2009,
p.114).
Sobre a evolução da rede urbana brasileira, Corrêa (2001) ressalta que os
períodos posteriores aos anos 1960 foram marcados por intensas transformações na
configuração da rede urbana do país. O autor ressalta três principais características da
rede urbana naquele momento, sendo elas a “pequena” complexidade funcional dos
393
centros urbanos, as interações predominantemente regionais e o padrão espacial em que
a rede estava estruturada.
Sobre a primeira característica, a partir da leitura de Christaller (1996)176, Corrêa
defende que os centros urbanos brasileiros apresentavam-se como lugares centrais,
evidenciando uma nítida hierarquia: São Paulo e Rio de Janeiro como metrópoles
nacionais, influenciando todo o território brasileiro; a presença de metrópoles regionais
consolidadas como Belém, Porto Alegre, Recife e Salvador, bem como aquelas em
processo de formação como Belo Horizonte, Curitiba e Fortaleza e, escala de influência
menor, as “inúmeras capitais regionais, centros sub-regionais, centros de zona e os
centros locais” (CORREÂ, 2001).
A segunda característica se refere às interações espaciais de âmbito regional, ou
seja, “o país estava estruturado em torno de metrópoles regionais já consolidadas ou em
formação” (CORRÊA, 2001, p. 425). As hinterlândias eram áreas das principais
relações econômicas, convergindo um foco principal para os grandes centros, a exemplo
das redes ferroviárias articuladas em âmbito regional e do setor bancário.
A terceira característica se remete aos dois padrões espaciais que caracterizava a
rede urbana no respectivo período. As interações de cunho inter-regional eram
realizadas quase que exclusivamente pelas metrópoles regionais. Assim, a rede urbana
se caracterizava em dois tipos: uma em forma dendrítica, trazendo marcas do passado,
de conquista colonial, mediante um ponto principal no litoral do país, e outra do tipo
Christalleriano, esta entendida a partir da presença de lugares centrais dotados de
hierarquia, mesmo que possuindo sua matriz dendrítica (CORREÂ, 2001).
O Brasil frente à reestruturação produtiva, esta advinda de estratégias capitalista
pela superação de crises em seu sistema, traduzindo-se em transformações nos diversos
vetores sociais e econômicos (AZEVEDO, 2013), ocasionariam uma série de mudanças,
resultando numa nova realidade. Tais mudanças resultaram numa nova realidade de
crescimento populacional nas áreas urbanas; maior fluidez em relação à circulação de
pessoas, mercadorias, capital e informações devido ao aperfeiçoamento dos sistemas de
transporte e comunicação; a entrada de multinacionais vinculadas, também, ao setor de
comércio e serviços; e, dentre outras mudanças, a inserção da agroindústria modificando
a realidade produtiva do campo do país (CORRÊA, 2001).
176
CHRISTALLER, W. (1996) – Central Places in Soithern Germany. Englewood Cliffs, Prentice-Hall
Inc.
394
Esses e outros processos evidenciam o quanto a reestruturação produtiva
implicou na reconfiguração do território brasileiro, resultando na característica atual das
interações socioespaciais, estas ainda mais dinâmicas mediante as articulações tanto
entre lugares próximos, quanto longínquos, até mesmo de forma simultânea frente ao
atual sistema de técnicas presentes na realidade mundial.
2.1. A atual rede urbana na perspectiva do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística
No estudo da rede urbana brasileira, é importante se atentar para as pesquisas
realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a partir da segunda
metade do século passado, com estudos sobre a Divisão do Brasil em Regiões
Funcionais Urbanas (1966), posteriormente atualizada em 1978 e 1993, resultando na
pesquisa sobre as Regiões de Influência das Cidades (REGIC) para 2007, publicada em
2008, tendo como principal objetivo definir a hierarquia dos centros urbanos brasileiros.
Na classificação da hierarquia dos centros urbanos brasileiros “levou em conta a
classificação dos centros de gestão do território, a intensidade de relacionamentos e a
dimensão da região de influência de cada centro, bem como as diferenciações regionais”
(REGIC, 2008, p. 11). Não obstante, na classificação dos centros177 “privilegiou-se a
função de gestão do território, avaliando níveis de centralidade do Poder Executivo e do
Judiciário no nível federal, e de centralidade empresarial, bem como a presença de
diferentes equipamentos e serviços”.
Assim, as cidades no território brasileiro foram classificadas de acordo com a
hierarquia dos centros urbanos em metrópoles (subdividida em Grande Metrópole
Nacional, Metrópole Nacional e Metrópole), Capitais Regionais (Capital Regional A, B
e C), Centros Sub-Regionais (A e B), Centros de Zonas (A e B) e, por fim, Centro
Local.
É válido admitir que essa classificação da hierarquia dos centros esteja intrínseca
à rede urbana, esta sendo entendida a partir da realidade do território a qual está
inserida. Porém, trata-se de uma fragilidade em relação a essa classificação, pois essa
não equivale, por exemplo, àquela apresentada por Corrêa (2001) para o período que
envolve a década de 1960. Ao caracterizar a rede urbana brasileira hoje, é necessário
entende-la como resultado de diversos processos que ocorreram em diferentes tempos
177
A metodologia utilizada pelo IBGE para a pesquisa encontra-se, na integra, no documento
disponibilizado através do link: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/regic.shtm.
395
históricos, onde as complexidades se diferenciaram em cada tempo, surgindo novos
nexos e novas combinações, paulatinamente, mudando a hierarquia urbana.
O que se verifica hoje no Brasil, em escala maior em diversos países, é um
contato cada vez mais intenso entre os lugares, onde os centros se articulam sem,
necessariamente, a intermediação de um centro de maior hierarquia, sendo motivados
pelos instrumentos técnicos da realidade atual, configurando relações diretas com outros
lugares consideravelmente longínquos, até mesmo de forma simultânea.
É admissível que a essência da pesquisa realizada pelo IBGE represente
significativamente as relações estabelecidas entre os centros urbanos brasileiros, sendo
os dados disponibilizados a partir do seu banco de dados imprescindíveis para a
realização de outros estudos e pesquisas. Contudo, a questão das classificações dos
centros em níveis hierárquicos deve ser repensada, visto que a hierarquia presente na
atualidade, não se configura em uma estrutura exclusivamente piramidal (no sentido de
todas as articulações partirem necessariamente dos centros urbanos maiores em direção
aos pequenos centros).
Sobre a atual realidade urbana brasileira, podemos direcionar maior importância
em termos de influência a São Paulo, esta tida como “uma metrópole onipresente em
todo o território nacional, sendo também o lugar em que são mais fortes e significativas
as relações internacionais” (SANTOS, 2009). Em escala menor, porém por também ser
foco de influência para todo o país, destacam-se as metrópoles Rio de Janeiro e Brasília.
Não obstante, aparecem Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Curitiba, Goiânia e Porto Alegre, exercendo uma dinâmica urbana significativa, onde
mantem fortes relações com as capitais estaduais e demais centros urbanos.
Nesse escopo, deve-se atentar para o fato de que relações tecidas entre as áreas
urbanas são complexas, evolvendo diversos agentes, estando inseridos em diferentes
formas espaciais, sendo fundamentais para a dinâmica da rede. É nessa perspectiva que
se insere a relação campo-cidade, estando intrínseco ao processo de configuração do
território e das redes, sendo um importante meio para a análise espacial geográfica.
3. Ressalvas sobre a relação campo-cidade
396
está restrito à produção agropecuária e a cidade se volta à produção industrial e ao
fornecimento de bens e serviços para a população nela residente e no seu entorno”
(HESPANHOL, 2013, p.106).
Torna-se pertinente não dissociar essas áreas como se fossem distintos espaços,
visto que este se trata de uma totalidade, envolvendo relações múltiplas de produção e
reprodução do capital. Nesse sentido, Locatel (2013, p. 87) argumenta a partir da leitura
de Dickinson (1961)178 que
não se pode entender a cidade unicamente a partir de sua área
administrativa, que normalmente é definida de forma arbitrária.
Da mesma forma não se pode entender o campo enquanto
espaço produzido somente a partir da lógica das relações sociais
e de produção nele existentes. Esses dois subespaços devem ser
compreendidos como parte orgânica de uma mesma totalidade,
uma mesma lógica social, ou seja, é fundamental levar em conta
que ambos fazem parte de uma unidade geográfica, econômica,
social, cultural e política, da qual depende seu desenvolvimento.
É evidente que as articulações que envolvem o campo-cidade, bem como seus
conteúdos, as ruralidades e urbanidades, devem ser consideradas ressaltando o grau de
interdependência existente entre um e outro, bem como suas coexistências.
As relações de poder, suas diversas dimensões, nas diferentes escalas que os
eventos ocorrem no território podem ser elementos consideráveis quando pensada as
relações entre campo-cidade (HESPANHOL, 2013). Assim, a partir da análise do
território é possível entender a interdependência entre ambas as formas espaciais, já que
o mesmo “é o lugar de todas as relações, trunfo, espaço político onde há coesão,
hierarquia e integração através do sistema territorial” (SAQUET, 2009, p.79).
A magnitude das ações vivenciadas nas áreas rurais e urbanas direcionam à sua
indissociabilidade, deixando ainda mais claro a relação que as envolvem e
complementam, ocorrendo o encontro em um determinado tempo das relações de
produção, tornando perceptível essa a complementariedade entre as categorias.
Há de se admitir que haja uma diferenciação em relação às formas espaciais
campo e cidade. Intrínseco a isso, a concentração demográfica é um elemento
importante na análise, pois é o quantitativo populacional e sua distribuição sobre uma
área que normalmente irá defini-la. A cidade é caracterizada pela sua concentração
demográfica. Diferentemente, no campo a população encontra-se distribuída de forma
dispersa sobre uma dada extensão territorial (SPOSITO, 2010). Diante isso, é evidente
178
DICKINSON, Robert. Ciudad, región y regionalismo. Contribuição geográfica a la ecologia humana.
Barcelona, Omega, 1961. 384 p.
397
que se trata de uma diferenciação espacial de áreas, onde as formas se diferenciam,
porém os conteúdos estão envolvidos por ações de solidariedade.
Sob esse ponto de vista da diferenciação das formas espaciais, ao analisar a
relação cidade-campo diante dos aspectos sociais, Sposito (2010, p.116) argumenta que
a cidade, marcada pela concentração [...], é espaço propício à
realização de atividades que requerem encontro, proximidade ou
possibilidade de comunicação, especialização e
complementaridade de papéis e funções. O campo, marcado
mais pela extensão e dispersão, atende técnica e
economicamente ao desempenho de outras atividades. No
entanto, não é demais lembrar que não há divisão técnica ou
econômica, que não seja também divisão social do trabalho.
Sobre a complementação entre essas formas espaciais, é aceitável afirmar que a
produção realizada pela indústria não seria completa sem a matéria prima proveniente
do campo. No mesmo sentido, a produção agrícola muitas vezes não seria
eficientemente satisfatória em auferir resultados econômicos sem seu complemento a
partir da utilização de insumos como fertilizantes, pesticidas e vacinas, assim como de
instrumentos técnicos que são produzidos, sobretudo, na cidade.
A intensificação dos fluxos, como de pessoas, mercadorias, capital e
informações, evidenciam a atual realidade de uma economia dita global, corroborando
para o entendimento das formas espaciais e como se configuram as articulações entre as
ruralidade e urbanidades. Acrescente-se, então, o consumo do que é produzido no
campo, sendo marcado pelo papel que a cidade desempenha enquanto lócus do consumo
de uma diversidade de produtos industriais e agrícolas.
A produção agrícola e os insumos utilizados para a produção realizada no campo
passam a ser de interesse no estudo das relações campo-cidade, constituindo-se diversos
fluxos em diferentes escalas, contribuindo em certo nível para a configuração da rede
urbana, esta envolvendo diversos agentes e elementos que configuram o espaço
geográfico, sendo o foco da presente análise.
4. A rede urbana do Rio Grande do Norte/Brasil: enfoques sobre a cidade de
Mossoró
398
A rede urbana do Rio Grande do Norte se configura no contexto de interações
espaciais, com a presença de cidades consideradas centralidades regionais, estas por sua
vez exercendo influência sobre pequenas cidades circunvizinhas e também em áreas
consideravelmente longínquas, localizadas até mesmo em outras unidades federativas.
De acordo com a REGIC (2008), Natal – localizada na mesorregião Leste
Potiguar – apresenta notável importância, concentração e distribuição no território de
uma diversificada gama de bens e serviços relacionados aos diversos vetores
econômicos do estado, sendo foco de influência para todo o estado (Cartograma 1). Sua
região metropolitana apresenta considerável dinâmica sobre os processos produtivos,
como atividades relacionadas ao setor industrial, incluindo aí o ramo da construção
civil, bem como dos setores do comércio e serviços.
A região metropolitana concentra também materialidades que apoiam a
economia estadual, como rodovias estaduais e federais, bem como o Aeroporto
Internacional Aluísio Alves, localizado em São Gonçalo do Amarante, possibilitando o
intercâmbio de passageiros e mercadorias, não obstante a presença do Porto de Natal
administrado pela Companhia Docas do Rio Grande do Norte.
Cartograma 1: Rio Grande do Norte: Regiões de influência das cidades,
2007.
399
localizados na mesma mesorregião Oeste potiguar, especialmente com os centros Açu e
Pau dos Ferros, também portadores de centralidade. Em escala de influência menor
encontram-se os centros Caicó e Currais Novos, localizados na região Central do estado,
especificamente na microrregião do Seridó potiguar, bem como João Câmara e Santa
Cruz localizados no Agreste Potiguar.
Destarte, não se distanciando da realidade das demais unidades federativas
brasileiras, encontram-se presentes do território potiguar pequenos centros que se
estabelecem contatos mediante diversas intencionalidades, contribuindo
significativamente para a configuração da rede urbana e do territorial potiguar.
4.1. Mossoró: uma centralidade urbana
Mossoró como o segundo centro de maior influência do Rio Grande do Norte
(REGIC, 2008), está localizado no Oeste Potiguar, apresentando significativo
crescimento em relação à sua população total municipal nas últimas décadas, sendo
atualmente a segunda maior concentração populacional do estado, apresentando, de
acordo com o Censo IBGE para 2010, um total de 259.815 habitantes (Tabela 1) e
possuindo uma densidade demográfica de 123,76 habitantes/km².
Tabela 1: Evolução da população de Mossoró/RN, 1980 – 2010.
1980 1991 2000 2010
Urbana 122.936 177.331 198.301 237.241
Rural 23.045 14.936 14.756 22.574
Total 145.981 192.267 213.057 259.815
Fonte: IBGE – Dados Demográficos.
É observado um significativo crescimento da população urbana de Mossoró,
evoluindo de 84,21% em 1980 para 91,31% em 2010, ou seja, um crescimento relativo
de 7,1 % da população urbana em relação a total do município. Já a população rural
apresentou uma retração relativa nesse período, apresentando um total de 15,78% em
1980, declinando para 8,68% em 2010, se acentuando especialmente dentre 1980 e
1991, vindo a se elevar dentre 2000 e 2010.
A cidade torna-se polarizadora de diversas atividades econômicas desenvolvidas
tanto nas áreas urbanas sobre sua influência, como nas áreas rurais, sendo uma das
realidades brasileiras que evidencia a difusão do meio técnico-científico-informacional
mediante a presença do agronegócio na realidade produtiva regional (ELIAS, 2007).
Mossoró mantinha relações diretas com outros municípios 39 no ano de 2007,
todos sob sua influência (REGIC, 2008). Assim, “configura-se uma rede de cidades
onde despontam aquelas associadas às principais atividades econômicas da região [...]
400
cuja condição de atendimento às demandas por atividades comerciais e de serviços
mostra-se aumentada e fortalecida” (ELIAS, 2010, p.107).
A dinâmica urbana do centro urbano regional, bem como sua capacidade de
influência sobre os demais municípios é evidente a partir da quantidade de
estabelecimentos e vínculos empregatícios presente no município por vetores de
atividades, concentradas especificamente na cidade (Quadro 1).
Quadro 1: Mossoró. Estabelecimentos e Vínculos empregatícios por vetores
econômicos (2013)
Indústri Construçã Comérci Serviço Agropecuári
Total
a o Civil o s a
Estabelecimento
561 501 2.311 1.842 97 5.312
s
Vínculos 63.06
11.641 6.490 14.895 26.634 3.406
empregatícios 6
Fonte: RAISCAGED/MTE - 2013.
Mossoró apresenta uma realidade que corresponde à maioria dos centros urbanos
brasileiros, havendo uma predominância do setor de comércio e serviços, se
sobressaindo em relação à quantidade de estabelecimentos dos demais vetores
econômicos. No município em questão há uma maior quantidade de estabelecimentos
do setor de comércio em relação ao setor de serviços, este, porém, apresentando maior
número de vínculos empregatícios.
De acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE
2.0) para 2013, o maior número de estabelecimentos está relacionado aos segmentos de
comércio varejista de artigos de vestuário e acessórios (236 estabelecimentos e 931
vínculos), e comércio varejista de ferragens, madeira e materiais de construção (221
estabelecimentos e 1.372 vínculos), este segmento refletindo na dinâmica a qual a
município, em especial a cidade de Mossoró, vem apresentando nos últimos anos no que
se refere à evolução e crescimento da construção civil. Assim, a maior quantidade de
estabelecimentos referentes ao setor de comércio compreende o vetor do comércio
varejista, chegando ao entorno de dois mil estabelecimentos.
Já em relação ao setor de serviços tem-se em maior quantidade, levando em
consideração um único segmento, estabelecimentos como restaurantes e outros
estabelecimentos de serviços de alimentação e bebidas (258 estabelecimentos e 1.611
vínculos). Os demais encontram distribuídos sobre os diversos segmentos desse setor.
A dinâmica interna do município de Mossoró, envolvendo as relações que
permeiam as áreas urbanas e rurais, se destacando sua centralidade urbana, exerce uma
401
atração em relação aos agentes dos municípios situados no estado, especialmente em
sua proximidade, influenciando a escala regional a qual a cidade está inserida. Porém,
sua área de influência não obedece aos limites políticos administrativos do estado,
chegando a ultrapassar esses limites, isso sendo evidenciado a partir das
402
representando 21% da população do Rio Grande do Norte (ELIAS, 2010 Apud IBGE,
2008), refletindo na segunda maior dinâmica regional do estado (a primeira sendo a
região metropolitana de Natal).
A sua condição de centralidade configura Mossoró como uma cidade de
representatividade no que se refere ao seu contexto regional, estadual e até mesmo no
sistema econômico global, visto que sua área de influência reflete em trocas comerciais
e em certo grau na dinâmica econômica global. Assim, é necessário que se entenda
essas trocas comerciais levando em consideração que
403
Rico – (48,67% do valor gerado pelas exportações) e para a provisão/abastecimento de
navios e aeronaves.
A representatividade em termos de participação de Mossoró no mercado global,
incluindo a produção realizada em sua área de influência, ganha destaque sobre os
demais centros regionais do estado, inclusive da capital potiguar (Natal) que exerce
influência sobre todo território estadual em diferentes vetores. Configura-se como um
centro urbano localizado na mesorregião Oeste potiguar que apresenta infraestruturas
favoráveis a concentração de atividades, seja da indústria, agropecuária, construção
civil, comércio e serviços, refletindo numa dinamicidade significativa, principalmente
para a região a qual está inserido, contribuindo para economia potiguar.
404
A pesquisa do IBGE, para 2007, questionou nos municípios de influência de
Mossoró, especificamente aos produtores rurais, qual a origem dos insumos utilizados
nas principais produções – sendo elencados como feijão, milho, castanha de caju,
melão, banana, melancia, algodão arbóreo, cana-de-açúcar, manga e leite –
evidenciando a formação de fluxos a partir da comercialização com 117 municípios
(Cartograma 2).
Observa-se que os fluxos estabelecidos entre Mossoró e as áreas rurais dos
demais municípios em relação à comercialização de insumos agropecuários, apontam
para a questão de uma não dicotomia entre campo e cidade, como se fossem áreas
distintas e sem articulações entre elas. Entende-se ainda que não necessariamente os
fluxos de insumos apresentem características lineares (saindo de Mossoró para as áreas
rurais), visto que os centros urbanos também podem se caracterizar por intermediador.
Cartograma 2: Insumos agropecuários destinados à produção nos
municípios.
405
de vida rural e urbano se articulam, envolvendo solidariedade entre um e outro,
configurando os fluxos entre as formas espaciais campo e cidade.
São nove principais segmentos que possuem diferentes quantidades de
estabelecimentos e vínculos empregatícios em Mossoró relacionados ao setor
agropecuário, sendo eles: atividades de apoio à agricultura; atividades de apoio à
pecuária; fabricação de alimentos para animais; fabricação de adubos e fertilizantes;
fabricação de máquinas e equipamentos para a agricultura e pecuária, exceto para
irrigação; comércio atacadista de animais vivos, alimentos para animais e matérias-
primas agrícolas, exceto café e soja; comércio atacadista de máquinas, aparelhos e
equipamentos para uso agropecuário; comércio atacadista de defensivos agrícolas,
adubos, fertilizantes e corretivos do solo; aluguel de máquinas e equipamentos agrícolas
sem operador. Todos esses segmentos possuem juntos 37 estabelecimentos, resultando
em 125 vínculos empregatícios (RAISCAGED/MTE, 2013).
Assim, é evidenciado as possíveis relações que podem ser formadas a partir de
estruturas localizadas, principalmente, na cidade de Mossoró, fabricando,
comercializando e prestando serviços às atividades desenvolvidas no campo,
envolvendo relações de trabalhos, evidente aqui a partir dos vínculos empregatícios.
Essa dimensão de relações realiza-se, também, pela produção agropecuária auferida
nos municípios que destinam a maior parte de sua produção para o centro urbano
Mossoró, configurando fluxos/redes no território potiguar.
Assim, concordando com o que Marafon (2014, p.23) defende para a realidade do
estado do Rio de Janeiro
A comercialização agrícola é uma face das interações cidade-
campo de extrema importância porque representa de forma
material a expansão do capital, com a construção de “novos”
ambientes para a acumulação e/ou a determinação de novos
significados. [...]. Nesse sentido, abandonamos a dicotomia
campo-cidade para compreendermos, em conjunto, o processo
de interação entre o urbano e o rural como formas sociais e a
cidade e o campo como formas materiais.
406
campo em múltiplas redes, busca abarcar as formas sociais e espaciais desse processo”
(MARAFON, 2014 p.17).
Sendo assim, os principais produtos provenientes do campo, de 98 municípios, que
são comercializados com Mossoró são: feijão, milho, castanha de caju, melão, bananas,
melancia, mandioca, abacaxi e leite (Cartograma 3).
Ao relacionar os municípios que comercializavam a maior parte de sua produção,
em 2007, com a quantidade em toneladas179 produzida nos mesmos municípios no ano
de 2013 (IBGE, 2013), observa-se uma coerência das relações estabelecidas entre os
municípios e Mossoró. Porém, é evidente que alguns produtos não desemprenham uma
expressividade tão significativa como antes em termos de quantidade produzida, a
exemplo da mandioca em Cerro Corá que em 2007 resultava em 10.500 toneladas,
havendo um declínio acentuado em 2013, produzindo apenas 800 toneladas.
Cartograma 3: Municípios que comercializavam a maior parte da produção com
Mossoró, 2013.
179
Neste trabalho foram considerados os municípios que apresentaram uma produção superior a 100
toneladas, visto que muitos municípios apresentavam valores pouco expressivos.
407
O setor agropecuário apresenta, assim, uma dinâmica produtiva diversificada no
Rio Grande do Norte, envolvendo diversos agentes e diferentes escalas produtivas. Os
408
produtos ora mensurados, ao serem comercializados com o centro urbano Mossoró,
passam a suprir não apenas a população interna ao município, mas também toda
população que tem esse centro urbano como lócus do consumo, sejam através das redes
de mercados, feiras-livres e demais formas de comercialização.
Assim, configura-se o motivo pelo qual os estudos relacionados ao setor de
comércio e serviços tem sido foco de pesquisadores que trabalham com a dinâmica
urbana, pois o interesse principal é o entendimento da dinâmica interna da cidade, bem
como o destino daquele produto/mercadoria ali encontrado. Por isso, o presente trabalho
se propôs a esta análise, da origem dos produtos agropecuários encontrados na cidade,
elucidando a relação campo-cidade, fundamental para formação de redes geográficas,
em especial a rede urbana, do Rio Grande do Norte, onde Mossoró encontra-se como
um dos pilares de apoio a sua configuração.
5. Considerações Finais
A análise das relações entre o campo e a cidade direciona para uma não
dicotomia entre essas formas espaciais, sendo pertinente trabalha-las a partir de suas
ações de complementariedade e solidariedade. Sendo assim, torna-se necessário
perceber o campo e a cidade enquanto formas espaciais e seus conteúdos dotados de
interações de interdependência, envolvendo diversos agentes sociais.
É nessa perspectiva que o centro Mossoró torna por estabelecer contatos diretos
não apenas com sua própria área rural, mas também as outras, dos demais municípios
sobre sua influência. A cidade passa, então, a comercializar insumos destinados
principalmente à produção de feijão, milho, castanha de caju, melão, banana, melancia,
algodão arbóreo, cana-de-açúcar, manga e leite, estas produzidas no campo, este situado
nos municípios localizados na mesma mesorregião.
Além disso, torna por polarizar a maior parte da produção agropecuária
realizada, também, principalmente, nos municípios situados na mesma mesorregião,
sendo elas feijão, milho, castanha de caju, melão, bananas, melancia, mandioca, abacaxi
e leite. Assim, Mossoró passa da condição de influenciador, chegando a ser influenciado
por outros centros e até mesmo por áreas rurais, especialmente aquelas que se
encontram em sua proximidade numa escala regional.
Contudo, a partir da comercialização de insumos agropecuários, é evidente que a
cidade de Mossoró se relaciona com outras áreas urbanas, configurando a rede urbana,
bem como estabelece relações diretas com as áreas rurais de outros municípios. Essa
409
articulação é evidenciada ainda mediante a comercialização dos produtos agropecuários
oriundos do campo, sendo destinados a esse centro urbano, configurando uma
verdadeira rede geográfica.
Torna-se pertinente que sejam realizados estudos periódicos sobre as regiões de
influência das cidades, visto que ao decorrer dos anos alguns vetores e segmentos das
atividades econômicas passam a não apresentar mais expressividades na formação dos
fluxos, bem como passam a surgir e reorganizar interações, imbuídas as velocidades
avançadas de realização das ações, configurando a rede brasileira.
Referências
AZEVEDO, Francisco Fransualdo de. Reestruturação Produtiva no Rio Grande do
Norte. Mercator, Fortaleza, v. 12, número especial (2)., p. 113-132, set. 2013.
CHESNAIS, François. A mundialização do capital. Tradução Silvana Finzi Foá – São
Paulo: Xamã, 1996.
CORRÊA, Roberto Lobato. A rede urbana. São Paulo: Ática, 1989. DIAS, L. C. OS
SENTIDOS DA REDE: notas para discussão. In: DIAS, L. C.; SILVEIRA, R. L. L. da
(Org.). Redes, sociedades e territórios. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2005. p. 11-28.
CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. São Paulo: Ática, 1989.
_____. Reflexões sobre a dinâmica recente da rede urbana brasileira. In: Anais do
IX Encontro Nacional da ANPUR, Rio de Janeiro, 2001. vol. 1, (p.424-430).
ELIAS, Denise. O meio técnico-científico-informacional e a reorganização do espaço
agrário nacional. In: MARAFON, Gláucio; RUA, João; RIBEIRO, Miguel Ângelo
(Org.) Abordagens teórico-metodológicas em geografia agrária. Rio de Janeiro:
Eduerj, 2007.p. 49-66.
ELIAS, Denise; PEQUENO, Renato. Mossoró: o novo espaço da produção globalizada
e aprofundamento das desigualdades socioespaciais. In: Agentes econômicos e
reestruturação urbana e regional: Passo Fundo e Mossoró. SPOSITO, Maria
Encarnação Beltrão; ELIAS, Denise; SOARES, Beatriz Ribeiro. (Org). 1ª ed. São
Paulo: Expressão Popular, 2010.
HESPANHOL, Rosangela Ap. de Medeiros. Campo e cidade, rural e urbano no Brasil
contemporâneo. In: Mercator, Fortaleza, v. 12, número especial (2), p. 103-112, set. 2013.
410
_____. Sistema IBGE de recuperação automática (SIDRA). Disponível em:
<http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/listabl.asp?z=t&c=1612>. Acesso em 19 de
Dezembro de 2014 às 16hrs.
LÉFÈBVRE, Henri. A cidade do capital. Rio de Janeiro: DP&A, 1999 [1972], 212 p.
MARAFON, Gláucio José; SEABRA, Rogério. Relações campo-cidade e a comercialização agrícola:
notas sobre o espaço fluminense. Geo UERJ. Rio de Janeiro - Ano 16, nº. 25, v. 2, 2º
semestre de 2014, pp.9-36.
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. SP: Ática, 1993 (1980).
SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: Hucitec, 1996.
_____. Metamorfoses do Espaço Habitado. São Paulo: Hucitec, 1988. 112 p.
_____. Os circuitos espaciais da produção. In: SANTOS, Milton; SOUZA, Maria
Adélia A. (Org.). A construção do espaço. São Paulo: Nobel, 1986a.
_____. Por uma Economia Política da Cidade: o caso de São Paulo. 2ª ed. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 2009.
SAQUET, Marcos Aurelio. Por uma abordagem territorial. In: Território e
territorialidades: teorias, processos e conflitos. SAQUET, Marcos Aurelio; SPOSITO,
Eliseu Savério. (Org). 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2009.
SPOSITO, Eliseu Savério. Redes e Cidades. São Paulo: Editora UNESP, 2008.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. A questão cidade-campo: perspectivas a partir da
cidade. In: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; Whitacker, Arthur Magon. (Org).
Cidade e Campo: relações e contradições entre urbano e rural. 2 ed. São Paulo:
Expressão Popular, 2010.
411
O ATACADÃO E SUA IMPORTÂNCIA REGIONAL EM
DOURADOS-MS
RESUMO: Este trabalho está sendo desenvolvido junto ao grupo PET do Curso de
Geografia da UFGD. Tem como objetivo colaborar para a discussão da centralidade
regional de Dourados, para com o centro-sul do estado de Mato Grosso do Sul. A
contribuição do trabalho está no estudo da relação do Hipermercado Atacadão e de sua
importância para compreendermos Dourados como cidade média e centro regional, haja
vista que este objeto de pesquisa funciona como reforço ao papel que o município
exerce regionalmente e assegura a sua condição de cidade média.
PALAVRAS-CHAVES: 1) Atacadão 2) Varejistas 3) Cidade Média
ABSTRACT: This work is being developed by the PET group of UFGD Geography
Course. Aims to contribute to the discussion of regional centrality of Dourados, towards
the south-central state of Mato Grosso do Sul. The contribution of this work is the study
of the Supermarket Atacadão relationship and its importance for understanding
Dourados as mean and city regional center, considering that this research object
functions as strengthening the role the city plays regionally and ensures your average
city condition.
KEYWORDS:1) Atacadão 2) Retailers 3) average city
I. Introdução
Conforme já apontada, este estudo objetiva analisar a importância do
Hipermercado Atacadão para o município de Dourados e de outras cidades da região sul
do estado, destacando seu papel para os comerciantes.
_____________________________________________________________________
UFGD/FCH – Caixa Postal 533. 79.840-970 – Dourados – MS. Email: Wiliammoreno_17@hotmail.com.
¹Bolsista do Programa de Educação Tutorial – PET do Curso de Geografia. Orientadora Maria José
Martinelli Silva Calixto². Doutora em Geografia pela UNESP. Docente do Curso de Graduação e do
412
Programa de Pós-Graduação, Mestrado e Doutorado, em Geografia UFGD. Email:
mjmartinelli@yahoo.com.br.
Orientador: Maria José Martinelli Silva
O referido hipermercado atacadista passou a pertencer ao grupo francês
Carrefour em 2007. Está presente no território nacional, com 92 lojas espalhadas por 22
estados no Brasil. Foi fundado na década de 1960 por Alcides Parizotto. Na época era
um comércio familiar, que se expandiu e tornou o que é hoje.
Em março de 2002 o Atacadão chegou a Dourados, sendo o único atacadista-
alimentício de grande porte na região sul do estado, atraindo pequenos comerciantes e
varejistas.
Vale destacar que Dourados é um centro que desempenha centralidade regional,
haja vista o seu papel na porção sul do estado de Mato Grosso do Sul, particularmente
nos setores de saúde, educação, comércio e serviços especializados. Quando
consideramos a rede urbana regional, podemos perceber que Dourados concentra fluxos
provenientes de 33 municípios do estado e 02 do estado do Paraná (Guaíra e Terra
Roxa), assegurando a sua importância como centro comercial e prestador de serviços.
Se considerarmos o contingente populacional urbano do conjunto de municípios
da rede urbana de Dourados, em 2008, temos mais um elemento que nos possibilita
dimensionar o seu papel regional, haja vista que reúne cerca de 500 mil habitantes
urbanos.
Por meio de pesquisa de campo, identificamos que os proprietários de comércios
de pequeno e médio porte se deslocam de suas cidades para comprar no hipermercado
Atacadão, reforçando sua importância. Assim, serão apresentados, neste trabalho,
elementos que comprovem o seu papel regional.
Por outro lado, também é importante destacar que o referido hipermercado conta
com mais de 230 funcionários, além de muitos outros que participam de empresas
prestadoras de serviços para o Atacadão.
Portanto, é de suma importância conhecer e entender a relação deste
hipermercado, não somente para a região como também para a cidade de Dourados.
413
A pesquisa de campo se deu, sobretudo, no pátio do hipermercado Atacadão,
valendo destacar que, além de entrevista com o gerente de vendas do hipermercado
Atacadão de Dourados, realizamos entrevistas com alguns comerciantes e clientes do
referido hipermercado, o que nos permitiu levantar alguns elementos que asseguram seu
papel regional.
Também destacamos que realizamos um levantamento procurando quantificar o
fluxo de clientes que entrava no Atacadão em determinado período de tempo. Neste
levantamento, quantificamos, numericamente, a quantidade de carros que adentrava o
pátio do Atacadão, nos dias de maior movimento (segundo o gerente de vendas, entre os
dias 2 e 8 de cada mês). Em um período de sete dias, foram contados, durante meia hora
cada dia, a entrada de 754 carros no local. Desses, 530 (70,3%) eram carros com placas
de Dourados e 224 (29,7%) tinham placas pertencentes à cidades da região.
414
“espaços vazios” do território nacional, como também ocupar áreas de fronteira e
integrá-las ao território brasileiro. (SILVA, 2011, p.38)
Mas a medida política de grande destaque, para a formação econômica e social
urbana do estado de Mato Grosso do Sul, com destaque para Dourados, foi a criação do
programa de governo de integração nacional, por meio de projetos de colonização com
o nome de Colônias Agrícolas Nacionais, nascido na década de 1940, que objetivava
ocupar territórios ainda “vazios”, além dessa medida ter uma preocupação de se manter
seguras as fronteiras ali próximas, ocorrendo uma migração de muitas famílias para as
terras do estado do ainda então Mato Grosso.
O município de Dourados em 1942, por determinação do Ministério da
Agricultura, recebeu a criação de uma Colônia Agrícola, pelo motivo de ter uma boa
localização, no centro do sul do estado, pela qualidade das terras e pelas condições
naturais e hidrográficas. Silva destaca este acontecimento:
Assim, em 28 de outubro de 1943 foi criada a Colônia Agrícola
Nacional de Dourados – CAND. Entre as várias medidas políticas públicas que
posteriormente terão como alvo o então estado de Mato Grosso do Sul,
certamente a CAND, se destaca por ser a pioneira e por seus grandes impactos
socioculturais, econômicos, agrários, intra e inter-urbanos, principalmente na
porção sul do estado de Mato Grosso do Sul. A CAND foi instituída a partir do
decreto lei n° 5.941, com o objetivo de realizar a distribuição de 6.500 lotes
entre 20 e 50 hectares, para atender a pequenos lavradores comprovadamente
pobres. (2011, p.40)
Com o passar dos anos, Dourados se destaca cada vez mais no cenário regional,
com apoio de mais medidas políticas do governo federal, como o II Plano Nacional de
Desenvolvimento (II PND, 1975/1979), que visava controlar o movimento migratório
excedente das metrópoles do sudeste brasileiro, criando polos de desenvolvimento em
regiões mais periféricas. Foi após estes programas do governo que se configurou o
termo Região da Grande Dourados, com o objetivo de atrair investimentos para o
município, que se fato ocorreu, pois a cidade foi palco de grandes transformações no
espaço urbano e no campo, com o crescimento da oferta da variedade de prestação de
serviços, aumento do comércio e de investimentos na saúde e na educação.
Devamos ressaltar que parte do dinamismo da cidade de Dourados está
vinculada ás políticas públicas de planejamento, mas não foi o único motivo
responsável por deixar o município nesta condição atual de centro regional. Um
agravante para este processo foi também a agroindústria, que funcionou como o
415
principal veículo portador e disseminador de novo conteúdo de ciência, técnica e
informação regional. O município concentra, além da agroindústria, os serviços de
ensino superior e prestação de serviços médico-hospitalares, atuando, desse modo,
como importante polo concentrador, principalmente para a região sul do estado,
mediante as suas atividades econômicas relacionadas à agricultura, indústria, comércio e
serviços.
Mapa 1
MAPA DA REGIÃO DA GRANDE DOURADOS NO ESTADO DE MATO GROSSO
DO SUL.
417
A ilustração abaixo, demostra como se configura uma rede urbana, para que
possamos entender melhor a questão de Dourados.
Figura 1
419
apresenta aqui no município de Dourados, haja vista que o hipermercado Atacadão se
localiza em área de fácil acesso, na principal avenida da cidade, facilitando para os
varejistas.
O comercio de atacado também passa a ser classificado em especialidades.
Rosalem e Santos (2010) afirmam que existem vários tipos de atacado no Brasil, se
diferenciando devido à forma de atendimento ao cliente.
Os atacados são: Atacadista distribuidor, Atacadista de balcão, Atacadista
Operador Logístico, Atacadista de Broker e, por último, o Atacadista de Auto Serviço,
que é o caso do hipermercado Atacadão.
O Atacadão tem loja na categoria Atacadista Distribuidor e o Atacadista de Auto
Serviço, que se apresenta em Dourados. Este tipo de atacado é caracterizado pelo seu
baixo preço, devido ao corte de custos, como por exemplo: embalagens, infraestrutura
barata (o prédio do hipermercado Atacadão é um barracão muito simples), o cliente é
que leva suas mercadorias, assim, o hipermercado não tem despesas com transporte de
entrega.
A imagem que segue, esta disponível no site oficial do Atacadão e comprova o
hipermercado na categoria de atacado distribuidor, o que demonstra um prédio de
estrutura simples, o modelo arquitetônico das lojas Atacadão que são padronizadas em
todo o país.
Figura 2
420
V. O hipermercado atacadão e seu papel regional: alguns apontamentos
A empresa ocupa uma posição de destaque no cenário nacional, o Atacadão está
entre as melhores e maiores empresas do seu segmento no País, com 110 lojas de
autosserviço, 20 centrais de distribuição estrategicamente localizadas e mais de 32 mil
colaboradores.
Atuando em atividades comerciais fundamentais, como o atacado de distribuição
e as lojas de autosserviço, disponibiliza aos seus clientes uma variada gama de produtos,
que totalizam aproximadamente 10 mil itens, distribuídos em alimentos em geral, frios e
laticínios, hortifrúti, bebidas, conservas e enlatados, doces e biscoitos, higiene pessoal,
limpeza, bazar, pet shop, automotivo, entre outros.
O cliente sempre encontra um mix de produtos que atende suas necessidades, as
lojas de autosserviço são o melhor negócio para o comerciante em geral e o consumidor.
Esta em destaque no site do Atacadão a sua filial em Campo Grande, como uma
loja teste de 1.000m², com grandes corredores, produtos em fardos e a preço de atacado
originou o autosserviço, que seria o “futuro do atacado”. Aprovado, o modelo foi para
São Paulo em abril de 1985, ano em que inauguramos nossa sede na capital paulista. Em
1985 e 1986 Maringá (PR), Londrina (PR) e Cuiabá (MT) também ganharam filiais
semelhantes. No atacadão de Dourados a tem o mesmo modelo, com grandes
corredores, se assemelhando á um barracão. A empresa é muito bem renomada, sendo
bem qualificada neste setor, pois em 1989 e 1990, conquistaram o prêmio de “Melhor
Empresa do Ano”.
O Atacadão começou a renovar o seu marketing, mas ainda é pouco utilizado o
recurso da propaganda, no entanto, em outubro de 1990 a empresa resolveu contar com
a ajuda dos correios, enviando aos clientes, por mala direta, o vosso jornal de ofertas.
No ano de 1991, aconteceu a saída do fundador do Atacadão da empresa, Alcides
Parizotto. Os diretores Paulo Rubens de Lima, Farid Curi e Herberto Uli Schmeil
comandaram a empresa até 2007, ano da venda para o Carrefour.
O Atacadão aumentou a oferta de produtos no autosserviço. Até o começo dessa
década, as filiais só vendiam itens não perecíveis. Os principais eram os da cesta básica,
refrigerantes, cervejas, uísques, enlatados, sabão e leite em pó, biscoitos e doces. No
ano de 1994 chegaram aos atacarejos as prateleiras refrigeradas, os refrigeradores e a
seção de hortifrúti.
As mercadorias já eram entregues em todo o país, mas o Atacadão direcionou
investimentos para ampliar sua rede de lojas e, assim, estar mais perto dos clientes.
421
Entre os anos 2000 e 2007, abriram 23 lojas em seis estados, iniciando as operações em
três deles. A primeira nova praça foi Pernambuco, hoje com quatro filiais.
Com 34 lojas no país e uma equipe dinâmica e produtiva, chamam a atenção de
várias redes mundiais e, em 2007, fechamos negócio com o Carrefour. O grupo francês
viu a oportunidade de expandir o modelo de negócio “cash & carry” para outros países.
Em 2008 e 2009, o Grupo Carrefour fez um grande investimento no Brasil, o qual foi
destinado principalmente à ampliação da área de atuação do Atacadão no país e no
exterior. Até 2010, a empresa passou de 34 para 63 lojas de autosserviço e aumentaram
o número de empregados de 7.800 para 17.800.
Começaram também com a expansão internacional, e atualmente está presente na
Argentina, com a bandeira Carrefour Maxxi, na Espanha, com a bandeira Supeco, e no
Marrocos, sua primeira franquia, com a bandeira Atacadão. O conceito de todas as
bandeiras é baseado no modelo de negócio do Atacadão.
O fato de o hipermercado Atacadão ser o único de caráter atacadista da região
faz com que haja certo monopólio, fazendo com que os varejistas não tenham outra
opção de compra.. Essa realidade, também ocorre em outras cidades.
Silva (2010), em sua pesquisa sobre Comércio Atacadista de Auto Serviço vai
identificar uma relação semelhante na região oeste do estado de São Paulo, no
município de Presidente Prudente (município que oferece expressiva quantidade de
emprego para a região e também se destaca na prestação de serviços).
Os municípios da região oeste de São Paulo apresentando alguma dependência
em relação a Presidente Prudente, na área comercial, industrial e prestação de
serviços como por exemplo: as universidades, os supermercados, comércios
atacadistas e varejistas. (SILVA, 2010, p.10).
422
a cidade de Dourados para se implantar, o mesmo aponta que o Atacadão escolheu
Dourados, realmente, pelo fato de ser um centro comercial, de serviços e de empregos
para a região. O gerente afirmou ainda que como nunca se tem certeza do sucesso, ao
abrir uma empresa, o Atacadão “escolhe a dedo” as cidades onde serão instaladas suas
lojas. O Mapa a seguir demonstra as cidades na qual o Atacadão está presente no estado
de Mato Grosso do Sul.
Mapa 2
423
Destacamos que também foram realizadas entrevistas com comerciantes de
cidades da região. Celso Falinski, dono de um mercado na cidade de Caarapó-MS, se
dispões a colaborar com a pesquisa e apresentou números que demonstraram que
comprar do fornecedor assegura maior margem de lucro, com a revenda, se comprasse
em grande quantidade. Um exemplo é a Coca-Cola, em que o representante da marca
faz visitas frequentes em seu estabelecimento e apresenta números menores, em
compras de grande quantidade, e números maiores, em pequena quantidade, e que se
igualam ao do Atacadão. Contudo, o fator transporte influencia muito, haja vista que
pode demorar até cinco dias uteis para a chegada do produto. Isso faz com que o
comerciante preferira comprar no Atacadão, pois a viagem leva apenas 30 minutos.
Tais entrevistas, permitem identificar o motivo dos varejistas buscarem o
hipermercado Atacadão: a facilidade de poder comprar o que quiser, na quantidade
necessária e no mesmo lugar. Em contrapartida, o fabricante economiza com
distribuição e logística. Percebemos que o varejista Celso, busca um comercio de
atacado em outra cidade, e que isso se torna mais barato e recompõe seu estoque mais
rapidamente.
A partir de tais levantamentos podemos apontar alguns elementos que nos
permite destacar a importância do hipermercado Atacadão, tanto regionalmente, quanto
para a cidade de Dourados.
424
concentrar fluxos de pessoas, bens, serviços, ideias, capital etc., assegurando e
reforçando seus papeis urbanos e, consequentemente, sua condição regional.
Sendo assim, é importante considerar que, ao mesmo tempo em que a presença
de um comércio atacadista, por exemplo, reforça a sua centralidade, Dourados depende
da demanda regional para que essa condição seja assegurada. Essa realidade revela,
entre Dourados e seu entorno, uma relação de complementaridade e diversidade que
pretendemos discutir e aprofundar no decorrer desta pesquisa.
425
XAVIER, M. A reprodução do atacado distribuidor como um elo entre os dos
circuitos da economia urbana. no Brasil. GEOUSP. São Paulo, N° 29, p. 3-17,
2011.
SITES ACESSADOS
www.atacadao.com.br Acessado em 5 de fevereiro de 2015.
http://www.douradosnews.com.br/arquivo/atacadao-abre-suas-portas-em-dourados.
Acessado em 8 de março de 2014.
426
427