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Avaliação da Capacidade de Gestão Democrática em Municípios Baianos

AVALIAÇÃO DA CAPACIDADE DE GESTÃO


DEMOCRÁTICA EM MUNICÍPIOS BAIANOS1
Elizabeth Matos Ribeiro*
Oscar Chassagnes Izquierdo**
Reginaldo Souza Santos***

O ensaio tem por objetivo central apresentar os resultados de uma proposta me-
todológica para avaliação da capacidade de gestão democrática em municípios
baianos2. Por capacidade de gestão democrática entende-se a competência das
municipalidades de não apenas garantir a capacidade de descentralização insti-
tucionalizada como, também, afiançar a capacidade de participação e a capacidade de
transparência, princípios fundamentais avalizados pela Constituição Federal de 1988
e ratificados em diversas legislações complementares, em particular as dirigidas para
garantir a qualidade de vida das/nas cidades.
Cabe esclarecer que uma das características centrais de qualquer processo ava-
liativo é a necessidade de se desenhar indicadores, variáveis e subvariáveis factíveis
e que expressem valores que possam ser compartilhados por todos os atores envol-
vidos e permitam alcançar índices que indiquem a avaliação almejada. Deste modo,
o desenvolvimento da proposta avaliativa exigiu um trabalho coletivo envolvendo
técnicos da SEDUR, da FEA-UFBA e consultores especializados. Nesta perspectiva, a
formulação da proposta metodológica que originou este ensaio é fruto de revisões e
debates teóricos e metodológicos sobre gestão democrática de cidades e avaliação
das ações do poder público e da sociedade3.
No que se refere ao debate sobre gestão pública municipal, observa-se que
existem, ainda, muitos conflitos acerca dos caminhos que o Estado deve seguir a fim
de alcançar um maior grau de eficiência para melhorar os resultados dos serviços e/
ou bens disponibilizados à sociedade. Ampliar os conhecimentos sobre as dificulda-
des, desafios e possíveis soluções aplicadas à administração pública (em especial em
âmbito local), em articulação estreita com a sociedade, é tarefa importante para a
consolidação de um novo padrão de gestão democrática para o Brasil. Conhecer esses
obstáculos é, sem dúvida, um passo importante em direção à busca de estratégias
concretas visando à aceleração do ritmo das ações de modernização e democratização
do Estado, em especial dos municípios, os quais têm revelado uma profunda incapa-
cidade de avançar nessa direção.
Os debates sobre os desafios do processo de descentralização institucionaliza-
da permitem afirmar que as municipalidades representam o ponto mais crítico desta
dimensão; isso porque os municípios tiveram, historicamente, um papel marginal
dentro do sistema financeiro e administrativo nacional, expondo, ainda hoje, os gra-
ves obstáculos estruturais para o seu desenvolvimento institucional, administrativo,
econômico, político e social.
*
Doutora em Ciência Política e da Administração pela Universidade de Santiago de Compostela – USC/
ES. Professora Adjunta do Departamento de Finanças Públicas da Escola de Administração da Uni-
versidade Federal da Bahia – EAUFBA, Salvador/BA/Brasil. Endereço: Av. Reitor Miguel Calmon, s/n.
Salvador/BA. CEP:40110-903. E-mail: ematos@ufba.br.
**
Mestre em Análisis y Gestión de la Innovación Tecnológica pela USC/ES. Professor do Instituto
Superior Politécnico “José A. Echevarría” de la Universidad Politécnica de Cuba – CUJAE/CU. E-mail:
chassagnes@gmail.com.
***
Doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Professor Titular do
Departamento de Finanças Públicas da EAUFBA, Salvador/BA/Brasil. E-mail: rsouza@ufba.br.
1
As bases para o desenvolvimento deste artigo foram apresentadas no ENANPAD de 2011 e recebeu
o Prêmio de terceiro melhor artigo da área de Administração Pública.
2
O desenvolvimento da proposta contou com a parceria da Secretaria de Desenvolvimento Urbano
do Estado da Bahia (SEDUR) e com o apoio da Fundação Escola de Administração da UFBA- FEA,
responsável pela gestão do Projeto. A metodologia proposta encontra-se em desenvolvimento no que
diz respeito à implementação da etapa complementar do estudo, referente à realização da pesquisa
direta em todos os municípios baianos.
3
Merece destaque a valiosa contribuição dada pelos consultores externos Fernando Cardoso Pedrão
e Celso Favero, pesquisadores com reconhecida competência no tema planejamento urbano e gestão
democrática/participativa, respectivamente.

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Acredita-se que tais entraves delineiam duas esferas de desafios que precisam
ser rapidamente superados: a carência estrutural (recursos financeiros, administra-
tivos, humanos, tecnológicos etc.), que tem determinado uma capacidade de gestão
pública deficitária; e a obsolescência das práticas de gestão da maioria dos municípios
brasileiros, que exige esforços de todas as esferas de governo e, também, da socieda-
de, no sentido de possibilitar um processo efetivo de aprendizagem e inovação para o
alcance da modernização administrativa e da inclusão social. Não há dúvida que esse
esforço deve ser permeado pela dinamização dos processos democráticos de gestão,
tendo, pois, como horizonte a ampliação e qualificação dos espaços de diálogo com
a comunidade local.
A importância da avaliação realizada está no reconhecimento de duas neces-
sidades relevantes para a promoção do desenvolvimento social local: (a) pactuar o
compartilhamento de responsabilidades entre a administração pública municipal e
a sociedade civil, em prol da construção de um diagnóstico dos problemas que têm
limitado o desenvolvimento socioterritorial; e (b) desenvolver possibilidades reais e
potenciais para a consolidação de uma cidadania ativa e ampliada, tornando públicas
estratégias e deliberações direcionadas à solução desses entraves e possibilitando,
desse modo, o advento de mecanismos efetivos de controle social no âmbito das
municipalidades baianas.
O ensaio está estruturado em quatro seções. A primeira apresenta os pres-
supostos teóricos orientadores da pesquisa, quando serão discutidas as escolhas
conceituais que fundamentaram as três dimensões de análise centrais do trabalho:
Descentralização, Participação e Transparência. A segunda seção informa sobre os
procedimentos metodológicos, o processo de construção do plano de indicadores e
a definição das variáveis correspondentes. A terceira seção apresenta a análise dos
resultados, explicitando as decisões que conduziram o processo de atribuição de valo-
res numéricos que buscam traduzir, de forma objetiva, os pressupostos da avaliação.
Finaliza-se o trabalho com as considerações finais.

Pressupostos Teórico-Metodológicos da Avaliação

Conforme apontam Santos e Ribeiro (1993 e 2004), quaisquer reflexões sobre a


capacidade de gestão pública exigem uma análise mais crítica sobre as funções e papel
do Estado, bem como sobre os condicionantes de sua reestruturação produtiva. Com
efeito, a Reforma do Estado é, hoje, um tema privilegiado dada à necessidade urgente
de se buscar padrões de eficiência na ação governamental, visando a construir uma
sociedade mais equitativa, na qual a pobreza e a exclusão devem ser enfrentadas com
decisão para alcançar padrões de desenvolvimento econômico com sustentabilidade.
No que diz respeito à modernização da administração pública, além das condi-
ções de legitimidade de um governo para empreender as transformações necessárias
(governabilidade), é preciso considerar a sua capacidade de implementá-las, abran-
gendo, portanto, as condições técnicas, administrativas e financeiras (governança).
A deterioração da imagem do serviço público, historicamente ligada à lentidão e
ineficiência, impõe ao Estado a necessidade de enfrentar os seguintes desafios: a
busca permanente do aumento de eficiência da máquina pública, por intermédio da
racionalização e incremento da produtividade; a melhoria contínua da qualidade na
prestação dos serviços públicos, visando a atender aos requerimentos da sociedade
no que diz respeito à satisfação das demandas sociais básicas e; o resgate da esfera
pública como instrumento de expressão da cidadania e fórum de aprendizado social.
Na agenda dos debates sobre a Reforma do Estado e a redefinição do seu papel,
a questão da descentralização passou a ser encarada como um dos aspectos cruciais.
A crise dos mecanismos tradicionais de representação, as novas exigências e os pro-
blemas colocados pelo processo de globalização da economia transformaram-se em
desafios para a construção de novos arranjos institucionais que permitam uma maior
flexibilização nas decisões governamentais e uma maior eficácia da ação estatal.
Ademais, a crise econômica e o acirramento das desigualdades vêm suscitando uma

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maior pressão dos diversos grupos sociais, cujas demandas crescentes o Estado vê-
-se incapaz de atender, face à crise de financiamento e à insuficiência de um aparato
burocrático pesado e centralizador.
Por tudo isso, refletir sobre capacidade de gestão democrática como modelo/prática
que deve (re)orientar as relações entre os diversos atores sociais interessados nos proble-
mas coletivos/públicos implica pensar sobre uma forma própria de administrar, de modo
que possibilite alcançar os padrões ideais de participação, transparência e democracia.
Nesse sentido, discorrer sobre Gestão Democrática de Cidades impõe abordar
temas que envolvem o direito à cidade. A regulação dos direitos à cidade reflete, por sua
vez, a relevância/atenção que as questões locais têm demandado na contemporaneidade.
Tomando como base as reflexões apontadas por Alessandri (2005), avaliar a
Capacidade de Gestão Democrática em Municípios impõe refletir, de forma crítica, so-
bre o seguinte problema: até que ponto o projeto de “gestão democrática da cidade”
tem contemplado, de fato, a potencialidade da noção de “direito à cidade” no Brasil,
de modo a fundamentar não apenas um pensamento utópico, mas que contribua,
efetivamente, para as mudanças de práticas que consolidem a participação, transpa-
rência e democracia?
Para a autora, responder a essa questão impõe considerar três planos de análise
articulados e integrados entre si: (a) a prática socioespacial, em que emergem os
movimentos sociais; (b) o plano do Estado, que define o planejamento espacial por
meio de políticas públicas; e (c) a análise do conhecimento desses processos, a partir
dos conceitos de cidadania e direito à cidade (ALESSANDRI, 2005).
No que se refere aos movimentos sociais urbanos, como primeiro plano do
atual processo de ‘inovação’ da gestão democrática de cidades, alguns estudos4 têm
destacado que essa dinâmica apresenta diferentes conteúdos, o que revela, portanto,
exigências diferenciadas: enquanto existem demandas que se orientam para o aten-
dimento de questões urgentes (como habitação, emprego, serviços públicos etc.),
algumas se vinculam aos desafios e complexidades da produção da cidade, a partir
do questionamento das políticas públicas e do planejamento que têm comprometido
a qualidade dos bens e serviços oferecidos, aumentando as desigualdades; e outras
focalizam suas críticas na própria existência da propriedade do solo urbano - tema
que implica os embates mais acirrados.
O mais importante, nessa discussão, é constatar que a luta pelo direito à cidade
surge antes como necessidade, isto é, como negação das desigualdades, do que como
decorrência imediata do direito. A questão fundamental a ser considerada aqui, portanto,
é compreender (avaliar) as consequências da generalização da urbanização pautada no
paradigma de desenvolvimento da cidade, considerando as complexidades que funda-
mentam o atual padrão de relações sociais de produção e distribuição do capitalismo.
O déficit habitacional, a precariedade das moradias e o crescimento de mora-
dores de rua nos centros urbanos produziram, ao longo do tempo, uma crise refletida
nos fortes embates observados na sociedade brasileira, nas últimas décadas. É nesse
ambiente que surgem os movimentos urbanos em confronto com o Estado, estimu-
lando o governo a conceber e implementar uma reforma urbana. Esse movimento deu
origem, pois, a uma legislação complexa que conforma o direito à cidade, apoiada
em uma nova base jurídica comprometida com o desenvolvimento urbano, a susten-
tabilidade e a inclusão social.
Conforme destacado por Santin (2003, p. 122), a Constituição de 1988 e o Estatuto
da Cidade (Lei 10.257/2001) define Gestão Democrática de Cidades como o padrão de
gestão que, diante do atual estado de degradação do cenário urbano brasileiro, propõe-
-se a alcançar “como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre,
justa e solidária, bem como a erradicação da pobreza e da marginalização, reduzindo
as desigualdades sociais e regionais para, com isso, buscar uma vida digna para todos.
Com base nesses princípios, o Artigo 2º, inciso II do referido Estatuto, reafir-
ma que a gestão democrática municipal deve ser obtida mediante “a participação da
população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na
formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desen-
4
Ver Fleury (1999; 2002); Jamur (1997); Costa (1997); Alvarenga (1991).

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volvimento urbano” (BRASIL, 2001). No Artigo 43, fica estabelecido que a garantia da
participação da população na gestão municipal dar-se-á mediante debates, audiências,
consultas públicas, iniciativa popular de projetos de lei e de planos, programas e pro-
jetos de desenvolvimento urbano, bem como pela constituição de órgãos colegiados de
política urbana e conferências sobre assuntos de interesse público (urbano), a serem
desenvolvidos nos três entes federativos. Entretanto, cabe destacar que o referido
artigo não é exaustivo, deixando em aberto possibilidades da utilização de qualquer
outro meio de participação que se faça necessário.
Segundo a definição clássica de Marshall (1967), o conceito de cidadania que
fundamentaria a gestão democrática da cidade teria como conteúdo fundamental o
acesso aos direitos civis, políticos e sociais. Entretanto, Carvalho (2004) afirma que
essa tese, ainda que possa servir para uma compreensão do processo histórico da
“cidadania plena”, própria dos países desenvolvidos, não consegue dar conta dos
processos que abrangem sociedades de desenvolvimento econômico e democracia
retardatárias, como é o caso das nações latino-americanas. O que implica concluir que,
ainda que se reconheçam os avanços do processo de institucionalização do “direito à
cidade”, nos anos recentes no Brasil, faz-se necessário observar que a consolidação
dessas expectativas não tem se confirmado, particularmente, nos municípios que
integram regiões menos desenvolvidas do país.
Segundo Carvalho (2004), é possível haver cidadania em determinadas socieda-
des sem que esses direitos estejam plenamente presentes e/ou consolidados. O autor
ressalta que a existência simultânea desses direitos consagraria o que denomina de
“cidadania plena”, apresentado como horizonte ideal para as sociedades ocidentais,
mas como uma meta quase inalcançável pela maioria das sociedades, particularmente
as que ainda têm que enfrentar sérios problemas econômicos, políticos e sociais. No
caso brasileiro, a garantia da vigência plena desses direitos depende da competência
institucional, administrativa e organizacional do Estado (Administração Política), de
modo a permitir que a sociedade se (re)organize politicamente (estimulando a par-
ticipação, transparência e democracia) para diminuir os excessos gerados pelo atual
sistema econômico (capitalismo) e reduzir a desigualdade, garantindo, desse modo,
o bem-estar e justiça social para todos (SANTOS; RIBEIRO, 2005).
Nos termos aqui colocados, a cidadania e o direito à cidade só podem ser reali-
zados dentro da sociedade capitalista respeitando sua expressão lógica; o que implica
afirmar que a potencialidade do que se concebe por cidadania limitar-se-ia à existência
de uma sociedade civil forte, comprometida com o desenvolvimento e preservação do
próprio capitalismo. Nesse sentido, Annick Osmont (2002) defende que o projeto de
gestão democrática da cidade surge no atual contexto como condição da reprodução
do sistema capitalista em sua nova etapa de desenvolvimento. Para o autor, o conceito
de governança, como fundamento da gestão democrática, foi retomado pelo Banco
Mundial, no final dos anos 80 do século passado, com o objetivo de operacionalizar
a construção de um novo padrão de ação que permitisse o ajuste das economias dos
países em desenvolvimento em atendimento aos princípios neoliberais.
Em linhas gerais, a instrumentalização para a concretização e consolidação da
participação política nas cidades implica a superação do modelo capitalista de so-
ciedade, conforme aponta Heller (apud Alessandri, 2005, s.p.), a realização de uma
cidadania plena e ilimitada “se sitúa más allá del horizonte de la sociedad capitalista
y de sus instituciones políticas”.

Alessandri ressalta ainda que


(…) esta ciudadanía sólo puede ser realizada dentro del estado capitalista, como su
expresión lógica. De este modo, la potencialidad de la noción de ciudadanía se limitaría
a la existencia de la sociedad civil surgida con el desarrollo del capitalismo y, lo que
es más importante, para su preservación. Entonces, la conquista de la ciudadanía
sería esencial para la realización de la sociedad capitalista. Es así que el proyecto de
una “gestión democrática de la ciudad” surge en la actualidad como condición de la
reproducción capitalista en su nueva etapa de desarrollo. (ALESSANDRI, 2005, s.p.).

Partindo dos argumentos defendidos por Alessandri (2005), o “direito a cidade”


assumiria, assim, uma necessidade que emerge como contracorrente do processo

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histórico que transforma a propriedade em potência abstrata na sociedade capitalista.


Esse pensamento converge com a análise feita por Balduíno (apud Alessandri, 2005,
s.p.) que, inspirado em Lefebvre, ressalta que os movimentos sociais, no campo
brasileiro, mobilizam-se pelo “direito a terra” com vistas a alcançar “dignidade, dis-
tribuição, festa, poesia, alegria de viver”, sentido último da ideia de “direito a cidade”.
Nessa direção, a atual legislação brasileira define como princípios fundamentais
que deverão nortear o alcance e consolidação da Gestão Democrática de Cidades os
conceitos de descentralização, participação e transparência. Essas dimensões servi-
rão, portanto, como base conceitual e metodológica fundamental para o desenho e
desenvolvimento da pesquisa avaliativa proposta.
A dimensão da descentralização refere-se aos aspectos institucionais da gestão
democrática de cidades, manifesta tanto na delegação da elaboração e execução de
políticas públicas, quanto na manifestação dos aspectos institucionais, administrativos
e organizacionais que envolvem os processos decisórios e as ações do poder público.
No que se refere ao processo de descentralização, cabe destacar que a dimensão
político-administrativa pode significar a criação de mecanismos de redistribuição de
recursos e de poder entre diversos entes administrativos, ou entre diferentes níveis
de uma mesma organização. Tal processo implica uma reorganização institucional em
que órgãos ou setores administrativos perdem ou ganham poder e recursos. O impacto
sobre a realidade político social pode traduzir-se em uma melhoria do atendimento
das demandas da sociedade, ou em um melhor funcionamento dos serviços; mas,
dificilmente, acarretará mudanças nas relações Estado-Sociedade.
A segunda dimensão da descentralização é um processo que não se esgota na
esfera administrativa, com a simples transferência de responsabilidade e recursos,
mas que se traduz, igualmente, em uma modificação do modelo de administração
política, do modelo de gestão, e do sistema decisório, com implicações na relação
Estado/Sociedade. Além da autonomia na gestão de recursos, ampliam-se os direitos
dos cidadãos de participar da definição das políticas governamentais, da sua execução
e do controle dos recursos públicos. Esta concepção valoriza a questão da cidadania,
paralelamente a uma melhor adequação do planejamento à realidade econômico-social
mais próxima e a uma utilização mais eficaz e equitativa dos recursos governamentais.
Uma terceira dimensão tem sido especialmente ressaltada no que diz respeito
à descentralização recente do Brasil, desencadeada com a redemocratização e com
a Constituição de 1988, após o longo período de orientações técnico-burocráticas e
centralizadoras do período autoritário. Revalorizando as instâncias subnacionais, em
especial os municípios, os defensores desse processo consideram-no como um meca-
nismo indiscutível para o alcance de uma maior igualdade e justiça social, extensão
dos direitos de cidadania, participação dos cidadãos sobre as decisões e as ações
governamentais que afetam a coletividade e controle sobre o setor público5.
Na falta de uma política de descentralização coordenada, persistem diversas
atribuições concorrentes entre as distintas instâncias do governo, ao lado do vazio de
ações em algumas áreas. Estados e municípios não definem, com clareza, seus papéis
nessas competências concorrentes e, muitas vezes, não dispõem de condições finan-
ceiras ou político-administrativas para assumirem novas responsabilidades. Acirra-se,
5
Na verdade, associado a esse processo de mudança, houve uma redistribuição de recursos e de
responsabilidades do poder central para estados e municípios. Algumas prefeituras instituíram certos
fóruns de participação e desenvolveram experiências inovadoras e mais exitosas no que diz respeito
ao enfrentamento de determinados problemas, como o da infância marginalizada. Mas, no Brasil, tanto
os efeitos como a própria trajetória da descentralização têm se mostrado problemáticos, especialmen-
te no campo social e em decorrência de uma série de condições adversas, entre as quais se podem
destacar: (a) a ausência de uma coordenação geral desse processo (crise do modelo de administração
política), associada à crise econômica e às novas prioridades do governo federal; (b) os padrões cul-
turais e práticas políticas poderosas e corruptas, tanto em termos locais como nacionais, adversas às
transferências de recursos, de capacidade decisória e do poder implícitos em uma descentralização
efetiva, assim como avessa também à democratização do aparato estatal; e (c) a enorme heteroge-
neidade territorial, econômica, social e política do país, com pesadas implicações sobre os estados e
municípios, particularmente os menos desenvolvidos, que tem se revelado, especialmente, negativa no
caso daquelas regiões menos desenvolvidas. Sobre esse tema ver Abruccio (1994); Almeida (1995);
Arretche (2000); Carvalho (2004), entre outros.

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com isso, o conflito federativo. Embora as instâncias subnacionais, particularmente


os municípios, tenham ampliado significativamente os seus gastos, inclusive na área
social, esta ampliação está muito longe de cobrir as imensas necessidades atuais,
especialmente em áreas mais pobres, como o Nordeste, onde a grande maioria dos
municípios encontra-se em condições de alto grau de dependência financeira e indi-
gência social (SANTOS; RIBEIRO, 2004a).
Como sinônimo do exercício de governo do povo, a gestão democrática implica
a efetivação de novos processos de organização e gestão baseados em uma dinâmica
que favoreça os processos coletivos e participativos de decisão. Nesse sentido, a parti-
cipação constitui um dos princípios fundamentais a ser implementado pelos diferentes
atores que constroem o cotidiano social (espaço público). Segundo esse princípio, a
efetiva participação da sociedade, na gestão da coisa pública, viabiliza a realização
da gestão democrática. Entretanto, é fundamental considerar que a participação na
gestão pública só será efetivada mediante a atitude direta dos cidadãos, assim como
por meio da consolidação de instâncias representativas e instrumentos efetivos de
integração social, tais como: conselhos, associações sociais, eleições diretas e outros
instrumentos do gênero.
Como afirma Alessandri (2005, s.p.), “sem democracia não existirá participação
e sem a participação da comunidade não se pode dizer que a gestão seja democrática
ou participativa”. Afirma a autora que qualquer avaliação sobre capacidade de gestão
democrática impõe colocar algumas questões relevantes, a saber: “[o] que se deve fazer
para consolidar o processo de gestão democrática? Como motivar os atores sociais para
participarem da gestão da cidade/sociedade?” (ALESSANDRI, 2005, s.p.). Pode-se con-
cluir que a abordagem participativa na gestão da cidade demanda maior envolvimento
de todos os interessados no processo decisório, de modo a mobilizá-los para a realiza-
ção das múltiplas ações que envolvem a gestão e a gerência dos interesses públicos.
Entretanto, para que os gestores públicos (municipais) possam assumir o
papel de incentivadores da gestão democrática no âmbito municipal, é necessário,
em primeiro lugar, que estejam convencidos de que esse modelo de gestão é o mais
adequado para enfrentar as dificuldades encontradas na gestão local e, em segundo
lugar, é fundamental que os gestores/agentes públicos estejam capacitados para as-
sumirem o desafio de estimular, potencializar e coordenar a participação. Os gestores
públicos municipais, enquanto articuladores desse processo político e social, devem
compreender, pois, que o papel político do poder público deve estar intrinsecamente
integrado aos interesses dos cidadãos e da sociedade, de modo que possam atender
aos anseios e expectativas da população. Mas, o que se observa na prática da gestão
pública brasileira é que a participação da comunidade encontra enormes obstáculos
para concretizar-se, conforme apontam diversos estudos6. Razão pela qual um dos
requisitos básicos e preliminares para a promoção e consolidação de uma gestão
democrática é, antes de tudo, estar convencido da relevância e da necessidade da
participação dos cidadãos e da sociedade.
Por outro lado, é preciso reconhecer que a sociedade brasileira não está pre-
parada, ainda, para a participação cidadã plena, revelado pelo desconhecimento
da importância que o comprometimento de cada indíviduo tem para a melhoria da
qualidade da gestão municipal. Como ressalta Andrade (2002), essa realidade impõe
reconhecer que a participação deve ser provocada, procurada, vivida, aprendida e
apreendida por todos. Como tem demonstrado a realidade nacional e local, a gestão
democrática não pode ser efetivada por decreto ou qualquer outro tipo de imposição
legal, precisa ser construída e exercitada, cotidianamente, por meio dos diversos
instrumentos de participação previstos na Constituição Federal de 1988 e em outros
instrumentos legais complementares.
Já o princípio da transparência diz respeito ao campo dos processos de gestão e
reflete a qualidade do funcionamento das instituições, permitindo, pois, medir a quali-
dade do processo de descentralização e o nível de participação da gestão municipal. O
conceito de transparência na gestão pública surge nos anos 70 com a implementação
da administração pública gerencial, na Inglaterra, mas, só ganha maior expressão a
6
Ver Simões (1992); Teixeira (2002).

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partir dos anos 90 do século passado, passando a integrar, definitivamente, a agenda


governamental (HEALD, 2003).
Segundo o entendimento de Fox (2007), uma das principais razões que impul-
sionou as discussões e o aumento das iniciativas em torno de uma maior transparência
na gestão pública foi a preocupação de possibilitar aos cidadãos maior conhecimento
sobre a qualidade da administração pública, com o objetivo de avaliar, com critérios
mais realistas, o desempenho dos políticos, punindo, se for comprovado, o envolvi-
mento em corrupção e outras formas de condutas ilegais ou antiéticas.
Já para outros autores, como Bellver e Kaufmann (2005), o acesso à informa-
ção e à transparência também pode ser considerado como um dos direitos humanos
fundamentais. Em concordância com essa análise, Stiglitz (1999) afirma que existe
um direito básico de conhecer, de ser informado sobre o que o governo está fazendo
e por quê.
Em síntese, pode-se concluir que uma gestão transparente, que tem como
principais características o acesso às informações compreensíveis para todo o cidadão,
garante a efetividade da participação no governo e assegura, desse modo, um maior
controle social da sociedade sobre a ‘coisa pública’. Por outro lado, na medida em
que disponibiliza informações sobre todas as atividades realizadas pela administração
pública, garante o acompanhamento e a avaliação do cumprimento dos princípios e
dos objetivos da descentralização. Muitas vezes, transparência tem sido confundida
com a ampliação da publicidade governamental; mas, para que essa publicização
assuma caráter de transparência, é fundamental que as informações disponibilizadas
sejam capazes de comunicar o sentido real que expressam, de modo a não distorcer
a realidade dos fatos e criar falsas expectativas.
Para Icerman e Sinason (1996), o nível de transparência na prestação de in-
formações sobre os atos da administração pública (accountability) está relacionado
a três elementos: sociopolíticos, regras de planejamento e execução orçamentária e
normas de apresentação de relatórios financeiros externos. Os autores consideram que
a divulgação de informações acerca dos atos da gestão pública não deve limitar-se à
disponibilização de relatórios já previstos em dispositivos legais (em geral relatórios
fiscais e financeiros), mas devem priorizar a disponibilização de informações qualitati-
vas que permitam avaliar desempenho, projetos e atendimento de metas das políticas
públicas de saúde, educação, cultura, transporte, saneamento, entre outras. Essa
avaliação é corroborada por Matias-Pereira (2006), quando afirma que a transparência
do Estado efetiva-se por meio do acesso do cidadão à informação governamental, o
que torna mais democráticas as relações entre o Estado e a sociedade civil7.
A construção das bases filosóficas e teóricas da gestão democrática e da gestão
democrática de cidades, com base nos princípios apontados acima – descentralização,
participação e transparência –, envolve, portanto, um complexo e, muitas vezes, lento
processo de transformação. Essa mudança passa, inicialmente, pela ruptura com o
modelo de gestão autoritário (centralizador) que ainda marca a administração pública
brasileira e, também, a cultura social, com especial destaque para a gestão municipal,
espaço onde os resquícios do patrimonialismo ainda preservam-se com expressiva força.
Como já mencionado anteriormente, muitos estudos8 apontam que a gestão pública
(local) brasileira é, ainda, fortemente marcada por elementos patrimonialistas, o que
implica afirmar que essa relação tem sido, frequentemente, traduzida por ações cliente-
listas, impedindo ou dificultando a consolidação de uma gestão participativa/democrática.
A partir das fundamentações explicitadas acima, reconhece-se, pois, que a
avaliação do desempenho e impacto da gestão pública municipal têm sido avalizados
como instrumentos fundamentais para subsidiar as correções de rumo dos ciclos que
integram as políticas públicas, bem como para aperfeiçoar os instrumentos jurídicos
e administrativos que balizam as novas modalidades de gestão de serviços públicos
previstos pela Reforma Administrativa do Estado Brasileiro, iniciada nos anos 80 e
intensificada a partir de 1995 (SANTOS; RIBEIRO, 1993; 2004)

7
Ver Pinho; Sacramento (2009); Pinho (2008).
8
Ver Santos; Ribeiro (1993; 2004; 2004a); Abruccio (1994).

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Definindo o conceito de avaliação

Ainda que o termo avaliação reflita quase sempre o mesmo significado para a
maioria dos estudos consultados9, isto é, expressão de um juízo de valor de alguma
coisa, observa-se que há uma grande variação e imprecisão em relação a esse conceito.
Essa indefinição decorre, fundamentalmente, do fato de que para que o conceito ganhe
algum sentido (inteligibilidade) necessita vir acompanhado de outros termos que lhe
dê significado, indicando, por exemplo, objeto, sujeitos a serem avaliados, bem como
exige identificar propósitos, objetivos e modos de proceder (GUIMARAES et al., 2004).
Entretanto, é importante destacar que as controvérsias sobre essa questão
situam-se no plano da prática social, isto é, estão relacionadas, diretamente, à forma
como a sistemática de avaliação deve ser conduzida; o que significa pensar sobre a
seleção do foco, métodos, grau de objetividade e instrumentos que permitirão siste-
matizar a avaliação pretendida.
Por outro lado, a literatura consultada revela que o conceito de avaliação ainda
está em processo de evolução, o que implica concluir que sua compreensão muda
de acordo com o contexto e incorpora tanto concepções anteriores como novas pers-
pectivas de análise. Essa dinâmica torna o processo avaliativo mais complexo em
informações e mais sofisticado em termos de propósitos (PESTANA, 2002).
Diante do exposto, convém identificar as tipologias avaliativas que orientaram
os procedimentos metodológicos com vistas a avaliar a capacidade de gestão demo-
crática em municípios baianos com base na síntese apresentada por Draibe (2001),
a saber: (a) a natureza e o tipo de avaliação adotada se aproximam do conceito de
pesquisa interessada (Policy Oriented), que tem por objetivo identificar dificuldades e
obstáculos e recomendar agendas propositivas (correção de rumos e/ou disseminação
de aprendizagens e geração de inovações), com vistas a contribuir para a melhoria
da qualidade e desempenho das políticas; e (b) foco na capacidade de gestão, o que
significa adotar metodologia de avaliação de processo, baseada em instrumentos ava-
liativos que tenham como base de análise a observação das condições, o desenho da
organização e como são desenvolvidas as ações planejadas - o que possibilita detectar
os fatores que têm facilitado ou impedido que a gestão pública (democrática) alcance
seus objetivos e resultados; e (c) esse tipo de avaliação impõe definir premissas/pres-
supostos formulados com base nos objetivos definidos pelos avaliadores e outros atores
interessados envolvidos - o que implica construir acordos com a indicação de proposi-
ções que contribuam, de forma efetiva, para a transformação das práticas avaliadas.

Procedimentos Metodológicos

Com base no entendimento do que é gestão democrática da cidade (ou “gestão


democrática urbana”)10 e de acordo com os modos/padrões de avaliação que devem
mensurar como deve ser concebida e implementada, definiu-se como base metodoló-
gica a construção de três indicadores centrais e um índice pleno que permitirão definir
uma tipologia dos municípios baianos em termos de capacidade de gestão democrática,
considerando, pois, a realidade atual das municipalidades avaliadas.
A partir da análise desse conjunto de propostas metodológicas e das limitações
que apresentam para atender ao escopo proposto neste estudo, entendeu-se que o

9
Ver também Figueiredo; Figueiredo (2002), dentre outros.
10
A partir da leitura crítica sobre avaliação da gestão pública municipal (democrática), identificou-se
que este tema tem despertado crescentes e instigantes reflexões acadêmicas e técnicas. O crescimento
desse perfil de pesquisa tem ganhado maior dimensão a partir dos anos zero (século XXI), quando se
assiste a valorização progressiva dos instrumentos de monitoramento e avaliação de políticas públicas
no Brasil, tendo o governo federal como líder desse movimento. Para efeito de ilustração, podem ser
destacadas algumas metodologias que se aproximam do objetivo central deste ensaio, convergindo
na avaliação das seguintes dimensões: capacidade de gestão pública (DOS SANTOS, 1998; ANDRA-
DE, 2002 ; IPEA, 2001; PRODETUR, 2010, dentre outros), gestão participativa ou gestão popular (DE
CARVALHO, 2009; FEDOZZI, 2001; HARVEY, 2005; LAGO, 2004, MARICATO,1994, dentre outros),
accountability e transparência (PINHO; SACRAMENTO, 2009; PINHO, 2008, dentre outros).

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Avaliação da Capacidade de Gestão Democrática em Municípios Baianos

desenho da pesquisa avaliativa deveria ser estruturado considerando duas dimensões


distintas, porém não excludentes, que refletem o amplo e complexo espaço da pro-
dução das políticas públicas (envolvendo os ciclos de concepção, institucionalização,
implementação, avaliação e meta-avaliação), a saber: (1) a dimensão institucional
da gestão democrática; e (2) a dimensão da ação sociopolítica. Entendeu-se, pois,
que a dimensão institucional pode ser traduzida em indicadores de descentralização,
enquanto a dimensão da ação sociopolítica se expressa melhor nas referências que
se associam a participação e transparência.
Essa escolha teórico-metodológica implicou considerar como precária, para a
realização de uma pesquisa com um elevado perfil de subjetividade, qualquer análise
que pretendesse construir índices tomando como referência apenas indicadores e
variáveis institucionais da gestão municipal, já que a avaliação feita com base nesses
instrumentos não possibilitaria definir o que se compreende por gestão democrática
de cidade. Entretanto, como se compreendia que avaliar esta capacidade exigiria um
grande esforço teórico-metodológico, optou-se por iniciar este estudo pela realização
de diagnóstico da disponibilidade e qualidade dos dados secundários existentes.
A partir desta definição metodológica, decidiu-se dividir a pesquisa em dois sub-
-campos, articulados e complementares entre si, a saber: (1) pesquisa com base em
dados secundários, que compreendeu, essencialmente, a dimensão institucional das
políticas e permitiu a produção de índices mensuráveis sobre a capacidade de gestão
democrática, objeto privilegiado da análise deste ensaio; e (2) pesquisa qualitativa,
que possibilitará, em uma etapa posterior do estudo, avançar em uma análise mais
aprofundada e contextualizada acerca dos processos de produção das políticas pú-
blicas e do próprio fazer democrático no âmbito da gestão pública municipal baiana.
A adoção do IBGE como principal fonte do estudo justifica-se pelo fato de a
constituição da base de dados ser a referência mais importante para a maioria dos
estudos consultados sobre o perfil e desempenho da gestão municipal. Entretanto,
uma análise mais criteriosa das diversas versões da MUNIC (2001, 2002, 2004, 2005
e 2006) revelou a insuficiência e, em alguma medida, a baixa qualidade dos dados
secundários disponibilizados para o alcance do objetivo deste trabalho.
O ensaio foi estruturado de modo a avaliar dois campos de análise distintos,
embora não excludentes, que integram o complexo ‘espaço de produção’ das políticas
públicas locais, a saber: a dimensão institucional e a dimensão da ação sociopolítica.
Parte-se do pressuposto, portanto, de que o campo institucional da gestão democrá-
tica de cidades pode ser traduzido em termos de capacidade e qualidade do processo
de descentralização, podendo ser medido, inicialmente, por dados secundários; en-
quanto o campo da ação sociopolítica expressa-se pelos conceitos de participação e
transparência, que exigem investimentos em pesquisas qualitativas devido ao caráter
subjetivo desses indicadores.
Como a finalidade fundamental desta análise implicava em mensurar o grau de
desenvolvimento das relações existentes entre a sociedade civil e o poder municipal, a
partir da avaliação crítica dos dados secundários, foi imprescindível avançar no desenho
metodológico integrando, a esse esforço inicial, variáveis qualitativas que contribuirão
para complementar a avaliação proposta em outra etapa do estudo. Com esse fim,
foram definidos, como já visto, três indicadores básicos de análise - descentralização,
participação e transparência - que permitirão, por sua vez, alcançar índices parciais
de gestão democrática (IDI, IP e IT, respectivamente). Essa medição será feita a
partir da definição de variáveis correspondentes a cada indicador, de modo a alcançar
um índice geral que reflita o padrão/perfil da capacidade de gestão democrática das
municipalidades baianas (IGDM).
Para viabilizar a análise proposta em um universo tão amplo, diverso e marcado
por contradições socioeconômicas e culturais, optou-se por dividir as municipalidades
em faixas, de modo a separar os municípios por desempenho/perfil de capacidade de
gestão pública. Para fazer essa divisão, valemo-nos dos dados disponibilizados pelo
censo da Superintendência de Estudos e Informações da Bahia (SEI/BA), através da
seleção de três indicadores básicos: Índice de Desenvolvimento Social (IDS), Índice
de Desenvolvimento Econômico (IDE) e Índice de Saneamento Básico (ISB), os quais
funcionaram como proxys para determinar a linha de corte predefinida, conforme as
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três faixas indicadas a seguir11: Faixa 1 - Municípios com Capacidade Instalada de


Gestão Democrática e PIB Alto (77 municipalidades); Faixa 2 - Municípios com Inci-
piente Capacidade de Gestão Democrática e PIB Alto (15 municipalidades); e Faixa
3 - Municípios com Baixa Capacidade de Gestão Democrática e PIB Baixo (as 317
municipalidades restantes).
A princípio, ainda que o estabelecimento de uma linha de corte e formação de
grupos distintos de municípios tenha privilegiado as municipalidades mais desenvol-
vidas, abriu-se espaço, também, para a descoberta de outros dados relevantes sobre
os padrões, desafios e potencialidades da gestão pública local em todos os níveis de
desenvolvimento das municipalidades baianas. Esse recorte metodológico ganha maior
relevância para um estudo que tem um viés propositivo e que pretende contribuir
para que os agentes públicos e outros atores sociais tenham acesso aos indicadores
e índices que possibilitem monitorar e avaliar a gestão pública municipal. Baseado
nas premissas mencionadas, a linha de corte para os municípios que tiveram suas
boas práticas pesquisadas foi determinada pelo seguinte critério: Faixa 1 - Municípios
que estivessem no primeiro quartil (a rigor, classificados nas 100 primeiras posições
entre os 417 municípios) no ranking dos três indicadores adotados (IDS, IDE e ISB);
Faixa 2 - Municípios que estivessem entre os 30 (trinta) primeiros colocados em pelo
menos um dos três rankings estabelecidos (IDS ou IDE ou ISB); e Faixa 3 - Os de-
mais municípios estariam, naturalmente, no limite daqueles considerados de baixa
capacidade de gestão.
A partir dos indicadores e variáveis identificados acima, será possível construir
o Índice de Capacidade de Gestão Democrática Municipal (ICGDM) que deverá sinte-
tizar, quando for concluída a pesquisa qualitativa, os valores das competências que
norteiam, segundo esta proposta metodológica, a Capacidade de Gestão Democrática
em Municípios Baianos: descentralização, participação e transparência (conforme
sintetizado no Diagrama 1).

DIAGRAMA 1

Em linhas gerais, a análise crítica dos achados partiu da definição e princípios


formais estabelecidos no Estatuto da Cidade, conforme indicado nas variáveis selecio-
nadas, para medir cada uma das dimensões definidas: Descentralização, Participação
e Transparência. Na próxima seção, serão apresentados os resultados referentes a
análise da dimensão institucional da capacidade de gestão democrática dos municípios
baianos, a partir da avaliação das seguintes variáveis: V1.1 - Existência de canais
11
Essas três faixas reúnem 99 municípios selecionados para uma possível amostra da pesquisa direta
a ser realizada em uma etapa posterior do estudo, bem como integra os 318 municípios restantes que
compõem a Faixa 3.

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institucionais de participação da sociedade na Gestão Pública - os Conselhos Gestores


de Saúde e Educação; V1.2 - Existência de Conselho de Desenvolvimento Urbano; e
V1.3 - Existência de Estatuto de Impacto de Vizinhança (EIV).
Estas variáveis foram selecionadas por representar, dentro do conjunto dos
dados disponibilizados pela MUNIC/IBGE, as informações mais consistentes para
medir o universo avaliado, tomando, pois, como referência a existência de canais
institucionais de participação da sociedade na gestão pública municipal baiana, o que
permitiu avaliar o perfil do processo de descentralização institucionalizada mediante,
conforme já destacado, a presença de Conselhos Gestores em cada municipalidade
per si e em cada faixa de município.

Análise e Discussão dos Resultados

Ao definir Capacidade de Gestão Democrática em Municípios Baianos como


uma dimensão analítica importante, conclui-se que o melhor estágio da modernização
administrativa, como meta a ser perseguida pelo poder público municipal, pressupõe
a necessidade de ampliação do universo organizacional, incorporando a esse proces-
so de inovação administrativa indicadores que permitam avaliar, também, o índice
de modernização política e social municipal. Tal esforço permitirá reconhecer, com
alguma clareza, quais graus de modernização carregam os instrumentos de políticas
públicas criados, com vistas a contribuir para a consolidação da gestão democrática
dos municípios. Não há dúvida, portanto, que medir relações tão subjetivas impõe
avaliar as funções que essas organizações têm assumido no desenvolvimento de po-
líticas públicas mais participativas e buscar, assim, aferir o impacto que suas ações
têm produzido no contexto socioterritorial.
Com base na análise dos dados, foi possível deduzir apenas que a presença
dessas organizações nas municipalidades indica uma tendência positiva da emergência
e consolidação de formas participativas de organização social nos territórios. Avançar
em interpretações mais consistentes que permitam identificar um dado padrão/perfil
de gestão democrática nos municípios avaliados, exigirá, portanto, avançar no (re)
desenho dos instrumentos de avaliação propostos, de modo a integrar elementos que
permitam fazer uma leitura mais crítica e contextualizada dos municípios. Apesar dos
avanços obtidos, acredita-se que somente a integração de pesquisa direta permiti-
rá avaliar, de fato, em que medida a presença (institucionalização) dos Conselhos
Municipais tem estimulado um processo efetivo e consequente de aprendizagem e
proporcionado inovação das práticas de gestão pública e gestão social capaz, assim,
de instigar o exercício de uma cidadania ativa.
Certamente, essa carência de dados pode ser complementada por diversas aná-
lises disponibilizadas em uma vasta literatura que aborda, de forma crítica, o papel,
as funções, os resultados e os impactos advindos da implementação dos Conselhos
Municipais como instrumentos relevantes para garantir a qualidade da gestão pública
local/territorial12. Os estudos reconhecem, pois, que existem diversas razões que podem
explicar as falhas desses instrumentos de Políticas Públicas não apenas no processo de
institucionalização da participação, mas, principalmente, como caminho efetivo para
a redução das assimetrias econômicas, sociais e políticas que ainda marcam as rela-
ções sociais de produção e distribuição no Brasil e na Bahia, em particular. Conforme
destacou Schedler (1999), enquanto perdurar essas assimetrias, é fictício vislumbrar
qualquer cenário de participação social visto que a manutenção do controle de poder
impede processos efetivos de mudanças sociais e políticas.
Como já assinalado, uma das formas para avaliar o nível de existência de canais
institucionais de participação da sociedade na Gestão Pública municipal foi a análise
do comportamento - criação, existência e funcionamento - dos Conselhos Gestores,
fator representativo da capacidade institucional (descentralização do poder) das ad-
ministrações públicas locais. Entretanto, a partir desse diagnóstico inicial, foi possível
definir outras ferramentas metodológicas de perfil qualitativo para avaliar a qualida-
12
Ver De Carvalho (2009); Fedozzi (2001); Lago (2004), entre outros.

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de do desempenho democrático dessas instituições, tomando como referência, por


exemplo, a frequência das reuniões como aspecto ligado ao funcionamento dessas
instâncias fiscalizadoras, estudar a abrangência demonstrando o perfil e/ou a qualidade
no cumprimento de suas funções sociais, medir o impacto real que essas instâncias
têm tido nas comunidades, entre outras (ver sugestão de variáveis complementares
indicadas no Anexo).
No que diz respeito à construção da variável V1.1 - Existência de Canais Insti-
tucionais de Participação da Sociedade na Gestão Pública: Os Conselhos Gestores –,
foram coletados dados sobre a existência de quatro Conselhos Gestores: Conselho
Municipal de Educação, Conselho Municipal de Saúde, Conselho Municipal do Meio
Ambiente e Conselho Municipal de Política Urbana, Desenvolvimento Urbano, da Cidade
ou similar), constituídos e em funcionamento nos municípios.
Com relação a essa variável, observou-se um comportamento positivo nas três
faixas de municípios. Os melhores resultados foram obtidos pelos municípios da Faixa
2, que registraram 71,67% de seus Conselhos formados, seguido pela Faixa 1, que
revelaram um índice de 64,47% de Conselhos formados e, por último, os municípios
da Faixa 3, com 53,99% dos Conselhos em suas municipalidades. No âmbito do es-
tado da Bahia, constata-se que 56,53% dos Conselhos pesquisados foram criados,
demonstrando, pois, que há ainda muito esforço a ser empreendido para alcançar um
percentual maior de institucionalização do processo de descentralização da gestão
democrática no estado.
A análise seria diferente se o parâmetro usado fosse medir a quantidade mínima
de Conselhos existentes por município. Entretanto, uma apreciação mais cuidadosa
desta variável permite fazer algumas considerações, como, por exemplo: deduzir que
o grau de disseminação dessas entidades permitiria medir o grau de institucionali-
dade da Capacidade de Gestão Democrática nas municipalidades selecionadas. Para
alcançar esta posição, os municípios deveriam possuir, no mínimo, três dos Conselhos
estudados. Assim, o foco de análise passou a ser a propagação nos municípios de
instituições que fomentam a participação social. Nesse aspecto, os resultados dos
municípios da Faixa 2 alcançaram os melhores resultados, registrando a presença de
60% dos Conselhos propagados, seguidos pelos municípios da Faixa 1, com 56,58%.
Já nos municípios da Faixa 3, os mais pobres e com menor capacidade técnica do
estado, apenas 34,05% dos Conselhos conseguiram disseminar-se. Considerando
que nessa faixa encontram-se a maioria dos municípios do estado, é possível afirmar
que a propagação dos Conselhos Gestores na Bahia ainda é muito baixa (39,09%).
Das quatro entidades analisadas, a que teve maior propagação foi o Conselho
Municipal de Saúde, instalado em 399 dos 417 municípios do estado, revelando, pois,
que esta entidade tem uma alta difusão em todas as faixas de municípios avaliados.
Constatou-se, também, que o Conselho de Saúde é o que teve maior grau de institu-
cionalidade, alcançando uma relativa homogeneidade nas municipalidades; particular-
mente, no que se refere ao perfil da paridade e à frequência das reuniões. Entretanto,
cabe destacar que as fontes de dados disponibilizadas não permitem analisar o caráter
das funções que desempenham, o que indica a necessidade de complementar essa
informação em estudos qualitativos.
Observando a variável V1.2 - Existência de Conselho de Desenvolvimento Urba-
no, constata-se que a instituição com menor propagação foi o Conselho Municipal de
Política Urbana, Desenvolvimento Urbano/da Cidade ou similar, presente em apenas
34 dos 417 municípios do estado. É interessante observar que sua difusão é compa-
rativamente maior nos municípios da Faixa 2, que registram 40% das municipalidades
com algum tipo de Conselho na área urbana; enquanto os municípios da Faixa 1 têm
10,53% e os da Faixa 3 registram apenas 6,13%. Uma análise comparativa da exis-
tência do Conselho Municipal de Saúde em relação ao Conselho Municipal de Política
Urbana (e/ou similares) revela a baixa representatividade deste segundo. Verificação
que demonstra a necessidade de políticas que estimulem a institucionalização de po-
líticas urbanas, principalmente para os municípios com maior população. Com base
nesses achados, pode-se concluir, pois, que se os Conselhos de Política Urbana ou
similares são relevantes para a consolidação de uma gestão democrática, esta meta
ainda está distante de ser alcançada na maioria dos municípios baianos.

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Avaliação da Capacidade de Gestão Democrática em Municípios Baianos

Independentemente das limitações existentes para uma maior eficiência do papel


social desempenhado pelos Conselhos, a simples existência dessas instituições, ainda
que apresentem um desempenho limitado, representa, na perspectiva deste estudo,
um avanço indiscutível no processo de institucionalização da participação social. Esta
conclusão se fundamenta na ampliação crescente de espaços potenciais de debates
sobre a capacidade e qualidade da gestão pública local, a partir de 2003.
A análise do comportamento da V1.3 - Existência de Estatuto de Impacto de
Vizinhança, revela, ainda, a baixa disseminação da lei na maior parte dos municípios
baianos, registrados em apenas em 8,87% das municipalidades avaliadas. A existência
desse instrumento é um pouco maior nos municípios da Faixa 2, 20% das municipali-
dades baianas em relação aos municípios da Faixa 1 (que alcançaram 19,74%) e muito
maior em relação aos da Faixa 3 (que não atingiu 5,87% dos municípios). O Estudo
de Impacto de Vizinhança (EIV) é um dos instrumentos de política urbana previstos
no Estatuto da Cidade que visa adequar o empreendimento ao meio ao qual ele fará
parte, com a ajuda da fiscalização dos efeitos negativos e positivos da iniciativa ou
atividade, bem como quanto à qualidade de vida da população residente na área e
em suas proximidades. Para os municípios baianos per si e para o estado da Bahia, de
modo geral, esta Lei constitui um instrumento para a tomada de medidas preventivas
(pelo ente estatal e pela sociedade), a fim de evitar novos problemas para a gestão
dos interesses coletivos.
O objetivo do instrumento é, portanto, evitar que se somem novos problemas
aos já existentes com relação ao desequilíbrio do crescimento urbano e garanta, des-
sa forma, condições mínimas de ocupação dos espaços habitáveis. Pode, também,
contribuir para evitar ou minimizar os efeitos de uma urbanização desordenada que
já revela reflexos negativos, em especial nos grandes centros urbanos (a exemplo das
enchentes, dos congestionamentos, das ocupações desordenadas, da falta de segu-
rança, dos transportes ineficientes, dos investimentos públicos equivocados etc.). Essa
política torna possível, pois, a ação popular contra ato lesivo ao patrimônio público,
inclusive quanto ao patrimônio histórico e cultural.
Ainda que a ausência de outras variáveis qualitativas reduza, em parte, a eficácia
na avaliação do comportamento do Indicador de Descentralização Institucionalizada
(IDI), é possível analisar seu desempenho de acordo com as variáveis disponíveis.
Desse modo, os achados evidenciam uma situação precária para a grande maioria
dos municípios do estado da Bahia, a maior parte deles localizada na Faixa 3. Entre-
tanto, problemas desta natureza são, também, visíveis nos municípios da Faixa 1.
Mais uma vez, as melhores condições produzem-se nos municípios da Faixa 2, onde
o comportamento das variáveis tem se revelado mais estável.

Tabela 1 -Indicador de Descentralização Institucionalizada (IDI)

Valor das Variáveis (em média)


Tipos de Municípios
V1.1 V12 V1.3 I1
Faixa 1 - Municípios com Capacidade Instalada de Gestão
64,47 10,53 19,74 31,58
e Alto PIB
Faixa 2 - Municípios com Níveis Incipientes de Gestão e
71,67 40,00 20,00 43,89
Alto PIB
Faixa 3 - Municípios com Baixos Níveis de Gestão e Baixo PIB 53,99 6,13 5,83 21,98
TOTAL NO ESTADO 56,53 8,15 8,87 24,52
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados disponibilizados no estudo do IBGE, Perfil dos Municípios
Brasileiros, 2001, 2006 e 2008.

Os valores do Indicador de Descentralização Institucionalizada (IDI) expressam


a média de aplicação de três (3) variáveis e corresponde à seguinte fórmula:

I1 (IDI) = (V1.1+V1.2+V1.3)/3

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Os dados trazem alguns elementos importantes para análise da capacidade de


gestão democrática em municípios baianos. Em primeiro lugar, contata-se que, na
variável Existência de Canais Institucionais de Participação da Sociedade na Gestão
Pública (V1.1), ao se observar o desempenho das três faixas de municipalidades ana-
lisadas, o número de criação de instituições de participação - Conselhos Municipais - é
crescente. Entretanto, avaliar as implicações desse processo de institucionalização e
a qualidade dos novos instrumentos de participação social para a consolidação de um
padrão qualitativo e inclusivo de gestão democrática nos municípios baianos implica,
como já ressaltado anteriormente, avançar no desenho metodológico proposto, me-
diante a integração de pesquisa qualitativa (através da realização de censo em todos
os municípios baianos) em uma segunda etapa da pesquisa (conforme indicado no
Anexo).
Em segundo lugar, foi constatado que, dos 417 municípios analisados, apenas 34
têm Conselho Municipal de Política Urbana ou conselhos similares, o que sugere pensar
que as bases para a institucionalidade da gestão democrática, na maioria dos municípios
baianos é, ainda, bastante incipiente. Segundo dados do IBGE e de outros estudos sobre
o desenvolvimento regional da Bahia13, 90% dos municípios do Estado estruturam-se
ainda como territórios rurais, revelando que quase todos os municípios têm Conselho
de Desenvolvimento Rural (ou equivalente) ou aprovaram o Plano de Desenvolvimento
Rural; o que permite concluir que a gestão democrática de cidades ainda não existe
como problema sociopolítico para a maioria das municipalidades baianas.
Em terceiro e último lugar, cabe destacar, no que se refere aos desafios do pro-
cesso de construção da cidadania, que os dados apontam para uma tendência predo-
minante de baixa disseminação da mobilização para a participação cidadã em quase
todos os municípios baianos. Essa constatação sugere a necessidade de se promover
uma melhor relação entre a Administração Pública Municipal e a Sociedade, median-
te a construção de instrumentos que possibilitem a consolidação das bases de uma
democracia participativa, através das seguintes ações: (a) desenvolver programas de
‘empoderamento’ das populações; (b) implantar conselhos cidadãos como uma forma
de atrair investimentos privados para o município; (c) garantir a permanente verifica-
ção do perfil da paridade e da frequência das reuniões dos conselhos; (d) disseminar
a prática da pactuação de responsabilidades entre a administração pública municipal
e a sociedade civil; (e) criar mecanismos para a consolidação de uma cidadania am-
pliada; e (f) difundir mecanismos efetivos de controle social.

Considerações Finais

A partir da constatação da existência de quantidade expressiva de instituições de


participação social (mediante a criação de Conselhos), na maioria das municipalidades
baianas, é possível apresentar três questionamentos importantes que possibilitarão
tanto a continuidade deste estudo como, também, estimularão o desenvolvimento de
novas pesquisas mais aprofundadas sobre o tema, a saber: (a) Qual a relevância que
esse indicador pode trazer para a avaliação da Capacidade de Gestão Democrática em
municípios baianos? (b) Como estabelecer uma correlação dos indicadores de gestão
democrática para a arena das práticas sociais e políticas (âmbito dos Conselhos)? e
(c) Como tratar a democratização, a partir de um contexto/universo tão heterogêneo
e diverso como o território baiano?
Acredita-se que uma reflexão crítica sobre as questões apontadas acima exigirá,
pois, um investimento em pesquisa direta com vistas a aprofundar temas relaciona-
dos à compreensão e apreensão do grau de democratização dos processos de gestão
ou, mais precisamente, identificar o perfil de democratização das ações concretas da
gestão pública local.
Outro aspecto importante resultante deste trabalho refere-se à necessidade
de se reconhecer e apreender qual a contribuição dessas organizações (Conselhos)
para a ampliação da democratização da sociedade. Nesse sentido, caberia desdobrar
13
Ver IEA/USP (2001); Favero (2009); Pedrão (1998; 2009; 2008).

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o universo organizacional, representado pelo quantitativo de Conselhos Municipais


existentes nos municípios per si e por faixas, de forma a reconhecer, por um lado, quais
dessas organizações são, efetivamente, reconhecidas pelo Poder Público local como
instrumento efetivo de participação, e, por outro, identificar quais delas se propõem a
estabelecer ou, efetivamente, têm conseguido estabelecer relações sociais produtivas
(críticas) junto ao poder público local.
Os resultados da análise dos dados permitem considerar, ainda, que a carência
estrutural e as deficiências das práticas de gestão dos municípios baianos têm reflexos
imediatos na capacidade de gestão democrática. No primeiro caso, os dados analisados
para a definição metodológica das três faixas de municípios selecionadas demonstram
que a composição dos orçamentos e/ou a capacidade de investimento (calculado pelo
desempenho do PIB) revela-se como um indicador relevante da deficiência estrutural
da gestão municipal na maioria dos municípios baianos. Essa carência tem reflexos
perversos em outras áreas, a exemplo da baixa capacidade de investimento em ações
de modernização administrativa, valorização e qualificação continuada de servidores,
entre outras políticas que têm efeito, direto ou indireto, na consolidação e qualificação da
gestão local. Essa apreciação permite deduzir, pois, que existe um problema de grande
monta no que se refere à ordem estrutural e que tem interferência direta na melhoria
continuada da capacidade de gestão e gestão democrática dos municípios baianos.
No segundo caso, em relação à baixa capacidade de gestão e gerência municipal,
é importante não perder de vista que a transição entre o que Harvey (2005) chama
de governança da administração para a governança do empreendedorismo - conceito
compreendido, aqui, como “gestão democrática” - é algo novo no Brasil. Há que se
considerar, portanto, que, se os grandes centros urbanos, os quais dispõem de me-
lhores condições estruturais, ainda estão à procura do modelo ideal de gestão urbana
e gestão democrática, para as médias e pequenas municipalidades, que apresentam
carências estruturais ainda mais graves, como é o caso da maioria dos municípios
baianos, essa meta ainda está muito distante de se concretizar. Tal realidade permite
pressupor os enormes desafios que o Estado da Bahia tem para avançar em padrões
mais democráticos de gestão de cidades.
Finalmente, cabe destacar as contribuições metodológicas que o ensaio agrega
à discussão sobre o campo da avaliação de políticas públicas com ênfase no desenho
de novos indicadores e índices que permitam mensurar, de forma crítica e contextu-
alizada, a capacidade de gestão pública (participativa). O maior desafio do trabalho
foi, portanto, desenhar instrumentos que permitissem realizar a avaliação da capaci-
dade de gestão democrática municipal tomando como base três dimensões de análise
principais: descentralização, participação e transparência. O contato inicial com os
dados secundários indicou, entretanto, as limitações dessa base informacional para o
alcance dos objetivos do estudo. Vencido esse primeiro obstáculo, referente ao dese-
nho metodológico do estudo, foi imprescindível avançar na superação das limitações
observadas, particularmente em relação à insuficiência e qualidade das informações
disponibilizadas pelo IBGE, através dos estudos sobre o Perfil dos Municípios Brasileiros
(MUNIC). Esse esforço inicial possibilitou ampliar, entretanto, o espectro do estudo
na medida em que estimulou e inspirou o redesenho da metodologia mediante a in-
tegração de variáveis qualitativas (ver Anexo).
Em síntese, os resultados alcançados abrem possibilidades para a continuidade
do estudo e novas perspectivas de análise, de modo a explorar (incidir) sobre o que
se define como o campo do fazer, isto é, o campo das relações sociais concretas que
permitirá estabelecer uma comparação possível entre as duas dimensões que integram
a relação complexa da gestão democrática de cidades: o campo das práticas sociais
e o campo das formas. A dimensão da ação sociopolítica exige, pois, a construção e/
ou atualização de indicadores, variáveis e subvariáveis que permitam avaliar/medir as
ações de mobilização, de capacitação, de educação para a participação, a interlocução,
a publicidade, enfim, a criação de uma cultura de participação e transparência efetiva
dos cidadãos e da sociedade.

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ANEXO

1. Variáves Qualitativas de Avaliação da Capacidade


de Descentralização Institucionalizada

Com base na análise dos dados secundários utilizados para medir/avaliar o


Indicador e Índice (Parcial) de Descentralização Institucionalizada (ICDI e I), foi
possível definir seis (6) novas variáveis qualitativas que complementam o desenho
metodológico proposto e quando aplicadas permitirão medir, de forma mais critica e
contextualizada, a capacidade de gestão democrática em municípios baianos, a saber:
• V1.4 Existência institucionalizada de espaços participativos na área da gestão
urbana;
• V1.5 Existência de normas que instituem e regulamentam processos participativos;
• V1.6 Existência de previsão de recursos orçamentários para a participação social;
• V1.7 Existência de previsão de ações de capacitação para a descentralização;
• V1.8 Existência institucionalizada de mecanismos para a publicidade dos atos
públicos;
• V1.9 Existência de Ouvidoria.

2. Desenho do Indicador de Participação (IP)

A ausência de dados secundários que permitissem medir a participação da co-


munidade na gestão pública local impossibilitou a análise do Indicador de Participação
da Comunidade na Gestão Pública (IP) na primeira etapa do estudo. Entretanto, a
partir do desenho metodológico e da análise dos indicadores de descentralização, foi
possível avançar na definição de algumas variáveis que fundamentarão a complemen-
tação deste estudo mediante a realização de pesquisa direta (censitária ou amostral)
pesquisa direta. Nesse sentido, os valores desse Indicador (IP) poderão expressar a
média de aplicação de 9 variáveis e responder à fórmula:

I2 (IP) = (V2.1+V2.2+V2.3+V2.4+V2.5+V2.6+V2.7+V2.8+V2.9)/9

Variáveis que integram esse indicador:


• V2.1 Realização de audiências públicas (obrigatórias) para a elaboração/aprova-
ção do Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e do Orçamento Anual
(PPA, LDO e LOA);
• V2.2 Participação de representantes da sociedade civil em ações de capacitação
para a participação;
• V2.3 Realização de conferências, fóruns, audiências, consultas e debates públicos
para tomada de decisões sobre planos, programas e projetos de desenvolvimento
urbano;
• V2.4 Apresentação de Projetos de Lei de Iniciativa Popular;
• V2.5 Nível de participação das organizações na Gestão Municipal;
• V2.6 Realização de atos para a avaliação das políticas públicas;
• V2.7 Execução dos procedimentos para a Participação Democrática (execução de
procedimentos para a “eleição” dos membros dos Conselhos Gestores, execução
de procedimentos para a escolha dos participantes em fóruns, audiências etc.);
• V2.8 Realização de ações de mobilização, por parte da sociedade civil o do poder
público, para a participação da comunidade na gestão municipal;
• V2.9 Realização de ações de acompanhamento, por parte da sociedade civil, nos
processos de execução (implementação) das políticas públicas.

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3. Desenho do Indicador de Transparência


da Gestão Pública (It)

Do mesmo modo do indicador anterior (Capacidade de Participação), a ausência


de dados secundários também impossibilitou a análise do Indicador de Transparência
da Gestão Pública (IT). Entretanto, a partir do desenho metodológico e análise dos
indicadores secundários de descentralização e do desenho de variáveis para avaliação
futura do Indicador de Participação da Comunidade, foi possível avançar na definição de
algumas variáveis que poderão fundamentar a complementação do estudo, mediante
a realização de pesquisa direta (censitária ou amostral). Nesse sentido, os valores
desse Indicador (I3) expressam a média de aplicação de 5 variáveis e respondem à
seguinte fórmula:

I3 (IT) = (V3.1+V3.2+V3.3+V3.4+V3.5)/5

Variáveis que integram esse indicador:


• V3.1 Funcionamento da Ouvidoria;
• V3.2 Publicação periódica dos relatórios contábeis;
• V3.3 Publicação periódica das atas de reuniões do legislativo;
• V3.4 Acesso dos cidadãos aos processos;
• V3.5 Publicação periódica no site da Prefeitura de relatórios e resultados da
Gestão Municipal.

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