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O Inverno para as Crianças Pequenas

A passagem das estações do ano traz para a


criança pequena uma vivência física do grande
ciclo anual de respiração da terra. O inverno
marca com seus dias curtos, suas noites longas,
temperaturas mais baixas, ventos, chuvas e
geadas. Em algumas regiões o tempo fica mais
seco, em outras regiões o tempo fica bem úmido.
Em geral o chamado é para o recolhimento e
auto-cuidado! Somos convidados a recolher as
forças para um trabalho interior, de maior
concentração.
As crianças vivenciam fisicamente esses
processos de frio e introspecção. O frio contrai
os músculos, que ficam mais rígidos. Para
manter a temperatura o corpo também trabalha
mais, requer mais combustível. O brincar tende
a ser mais concentrado. Mas correr e pular
ajudam a esquentar!!!! Vamos aproveitar!!!
Brincar no Inverno

Dias claros com vento ameno chamam para o


movimento externo, no quintal, no parque
(quando seguro) ou mesmo na varanda ou na
janela. Observar junto com as crianças o
movimento das nuvens, o balanço das folhas das
árvores, o voo dos pássaros, tudo isso é
encantador. Veja e ouça!!! Você vai se
maravilhar!!! Cataventos, pequenas birutas e
bolinhas de sabão são sempre uma boa pedida.
Para quem possui habilidade vale a pena arriscar
a construção de pipas de vários tipos. As
crianças aproveitam para vestir capas e brincar
com argolas de fitas enquanto correm contra o
vento!

Dentro de casa podemos contar mais histórias.


Além dos contos de fadas temos muitos contos
terrenos bonitos, cheios de elementos da
natureza que convidam a criança a brincar, pois
alimentam a fantasia interior. Você sabia que as
crianças pequenas adoram ouvir histórias da
nossa infância? É maravilhoso contar com
carinho aquela doce recordação de férias de
inverno ou de fim de semana, ou uma aventura
especial. Não precisa ser uma história longa, nem
muito cheia de detalhes. O melhor é que seja
algo bem simples e que se atenha a fatos
concretos. Elas adoram imaginar os detalhes e
vão perguntar mil coisas durante vários dias. As
boas memórias afetivas são doces presentes
para nossos pequenos.

Em casa também podemos proporcionar bons


momentos contando histórias com músicas
simples, rimas, versos e gestos.
Brincadeiras gostosas para o Inverno

Cabana de tecidos – deixar tecidos grandes a


disposição pode ser uma boa opção. Os tecidos
transformam-se em telhado da cabana, tapete,
cama pra boneca, túnel, etc.

Rolinho ou Panqueca de Criança – podemos usar


os tecidos grandes para brincar de panqueca ou
rolinho. Enrolamos a criança bem firme, mas de
vagar, com cuidado. Tem que atentar ao
garantir espaço para respirar com tranquilidade.
Observar se criança estiver desconfortável e,
se for o caso, parar logo. Mas geralmente eles
gostam muito. Você pergunta: “De que será o
recheio desta panqueca?” Quando ela responder
você coloca ela no meio do pano e enrola de
vagar. A brincadeira é bem livre, você pode
criar um enredo gosto. O objetivo é
proporcionar o desenvolvimento do tato em toda
superfície do corpo, principalmente na barriga,
costas, ombros e laterais dos braços e pernas.
Mas cuidado pra não ser desconfortável.
Túnel do Coelhinho – num tubo de tecido
maleável podemos criar brincadeiras em que a
criança precisa atravessar o túnel. Esta
brincadeira proporciona sensação tátil em toda a
superfície corporal, principalmente nas costas,
nuca, cabeça e braços.

Cestos e caixotes viram barcos, naves, carros,


trens... tem que ser de um bom tamanho que dê
para a criança entrar dentro. Tenha disponível e
observe como vão usar.
Capas, bolsas, chapéus, vestes e pantufas são
parte do enredo. Ter poucas peças que sejam
diversas e estejam disponíveis no local do
brincar ajudam a compor o enredo da
brincadeira a partir dos 4 anos e meio.
Alimentação

Com o clima seco e frio podemos fazer bom uso


de chás, sopas, e frutas doces e frutas secas.
Cuidar para não abusar dos laticínios nem dos
farináceos, pois tendem a promover acúmulo de
mucosidade nas vias respiratórias.

O chá de camomila é o melhor amigo das


crianças pequenas. Já observaram como as
camomilas são delicadas?
O Aquecimento do Corpo no Inverno

Mesmo em dias de clima ameno ou ensolarado, ao


final da tarde a temperatura costuma cair
rapidamente. Logo ao baixar o sol chega uma
friagem que rapidamente toma o corpo todo. As
crianças tendem a não perceber esses processos
de resfriamento, principalmente se estiverem
envolvidas em alguma brincadeira. É importante
ficarmos atentos para garantir que não percam
calor no início da manhã nem ao fim do dia. Para
acompanhar a variação de temperatura durante
o dia é bom vestir as crianças em camadas que
podem ser retiradas no meio do dia, para
aproveitarem o sol e receberem os raios solares
diretamente na pele dos braços e pernas. E ao
declinar do sol vamos recolocando as camadas de
roupa uma a uma. As camadas de roupa também
ajudam a educar a percepção tátil das crianças.
Aos poucos elas mesmas vão aprendendo a
perceber as necessidades.
Cuidado especial com a friagem que entra no
corpo pelas extremidades. É importante dar
liberdade aos pés e mãos nos horários mais
quentes do dia, deixar pisar no chão, sentir
texturas, tocar, experimentar, porém temos que
ficar atentos para não extrapolar. Pés e mãos
devem estar sempre quentinhos.

Proteger a região abdominal também é muito


importante. Esta região, ao contrário das
extremidades, é a última a esfriar
externamente, mas internamente sofre grande
desgaste das suas funções metabólicas para
compensar a friagem recebida de fora.

Durante a noite também é importante observar


se as crianças estão se mantendo aquecidas.
Muitas crianças se mexem muito durante o sono
e tendem a se livrar dos cobertores e até
mesmo das peças de roupa. Nesses casos a
criança pode perder calor e vitalidade. O frio
noturno influencia na qualidade do sono e pode
até mesmo levar a pesadelos, motivados pelo
desconforto físico. Nesses casos temos que
ser criativos para vestir roupas que sejam
confortáveis e ao mesmo tempo possam manter a
criança aquecida, mesmo que ela se revire na
cama. Um cobertor mais firme e largo pode
trazer aconchego e resistir ao revirar,
permitindo um espaço interno sem ser lançado
fora da cama.

É desejável oferecer tecidos naturais, texturas


diversas e agradáveis ao toque.
É muito bom quando as crianças possuem ao
menos uma peça de roupa feita pelas mãos de
alguém que a ama. Os materiais naturais unidos
ao calor das mãos que confeccionam a roupa
trazem sensação real de calor e afeto para o
corpo da criança.
O INVERNO PARA OS ADULTOS

O inverno é a estação que traz a força da


introspecção. Com as temperaturas mais baixas,
dias mais curtos e noites mais longas a tendência
natural é de nos mantermos mais concentrados.
As poucas horas do dia em que o sol se faz
presente são aproveitadas para suprir as
necessidades de expansão e de realização de
tarefas externas. Porém tendemos a dormir
mais, comer mais e exercer atividades de maior
concentração, como leituras, culinária e artes
manuais. Também fica mais fácil meditar,
escrever, planejar. Animicamente ocorrem
processos de maior reflexão e interiorização.
Costuma-se atribuir ao inverno um caráter
melancólico, justamente por ser este um aspecto
humano de forte interiorização, profundidade,
densidade e, até mesmo, certa frieza. O que
significa a melancolia em desequilíbrio? Em
excesso, a melancolia pode levar à depressão e
paralisar a força de ação humana. Em
contrapartida a sua falta, provoca a
superficialidade, falta de atenção, falta de
presença e pode nos levar a processos de
excitação, ou euforia, que está relacionado a
ausência de eu. Neste outro polo nós
encontramos com a ansiedade. Enquanto na
depressão nos vemos presos a processos densos
e enraizados no passado, na ansiedade nos vemos
extasiados e vivendo ou sofrendo por algo que
ainda não chegou: o futuro.

Como evitar desequilíbrios estando este inverno,


por conta da quarentena, para muitos de nós, tão
mais introspectivo? Como vivenciar os processos
internos dentro do contexto de pandemia e
isolamento social, sem sucumbir à depressão nem
à ansiedade?

A busca por equilíbrio deve ser sempre nossa


meta! E como cada ser humano por si só já
possui em sua constituição uma mescla própria e
única de passado e futuro, cada um vai se
defrontar com seus próprios desafios internos e
também por si só vai encontrar o seu caminho de
equilíbrio, e percorrê-lo de maneira diferente.

A arte sempre nos acolhe e acalenta em


processos de vida. Ela nos permite vivenciar e
impulsionar nosso desenvolvimento humano de
maneira mais leve e fluida. Assim, segue um
convite para nos ajudar a olhar o caminho de
introspecção invernal como uma visita a um
jardim muito especial: o Jardim da nossa Alma.
CUIDANDO DO MEU JARDIM NO INVERNO

- Entrar no Jardim é necessário! Não se pode


cuidar de um Jardim sem adentrá-lo, sem
colocar a mão na terra úmida, sem se sujar, ao
menos um pouco. O Jardim invernal costuma
ficar frio e úmido e muitas vezes encontramos
muito lodo, mofo, dependendo do cultivo
anterior a terra pode estar bem desvitalizada.
Não adianta brigar com o frio e a umidade. Não
podemos abandonar o Jardim no inverno e
esperar esplendor e florescência na Primavera.
Temos que nos lembrar dos belos dias já vividos
e acreditar na força da Primavera que virá. Só
assim conseguiremos preparar o terreno: limpar,
remexer a terra, semear, cuidar, observar. Sem
esperar colheita ou florescência imediata, pois a
ansiedade traz a força da antecipação, um
desequilíbrio da nossa época. Resistir à
tentação de nos anteciparmos lançando mão de
fertilizantes, sabendo que estes podem
comprometer a florescência natural e a saúde da
terra, é tão importante quanto resistir ao
desânimo diante do mal tempo, que pode nos
levar a abandonar os cuidados com o Jardim para
apreciar as flores artificiais. Se conseguirmos
resistir a essas duas forças opostas e cuidarmos
bem no nosso Jardim invernal hoje, então
poderemos colher as flores naturalmente belas
que ele nos ofertará na próxima Primavera.

- Surpresas do Jardim! Ao adentrar cada


cantinho do nosso Jardim podemos encontrar o
lodo, assim como delicadas flores invernais. É
preciso apreciar as flores e iluminar o lodo. Para
iluminar o lodo devemos olhar e agir com calma e
amorosidade. Autocuidado e auto perdão são
essenciais. É preciso aceitar que o lodo é
natural e até necessário. Porém se o lodo
estiver te sufocando, pare, respire, afaste um
pouco, mude o olhar, contemple as flores,
aprecie suas cores, suas formas, sinta seu
perfume. Descanse, dê um volta. Só então,
quando se sentir renovado e entusiasmado, volte
para o lodo. E seja generoso com ele. Muitas
flores se alimentam dos nutrientes provenientes
do lodo. Às vezes é preciso admitir que o lodo
não precisa ser removido, somente iluminado,
pois se for removido poderá comprometer todo
o seu jardim.

- Talvez seja bom contar com a ajuda de um bom


jardineiro! Existem pessoas muito queridas e
especiais que já cuidaram de muitos jardins de
todos os tipos. A experiência e o amor com que
se dedicam a seus Jardins devem ser
considerados na hora da escolha de um bom
jardineiro para nos ajudar a observar e cultivar
nosso jardim. Tem jardim que gosta de sentir o
calor de muitas mãos ao seu redor, outros não.

- Cuidar do Jardim é uma arte! E a arte em si é


um adubo natural para os nossos Jardins, por
isso tente cuidar do seu jardim de várias formas
diferentes: cantando, dançando, pintando,
desenhando, modelando, jardinando, rezando,
conversando, contemplando belas obras de arte,
recitando e fazendo versos, mas também
sorrindo, chorando, dormindo e sonhando.

- Diário de Jardinagem! Uma


boa dica de jardinagem é a
elaboração de um diário.
Podemos usar uma linguagem
poética, como esta. Mas
tente ser objetivo nas
descrições dos fatos.
Caracterizar o ambiente
externo de maneira direta e
fazer uma breve
retrospectiva ajuda a apurar
o olhar sobre os fatos que
estão afetando o
desenvolvimento do Jardim.
O principal é ajudar a
investigar e detectar quais
são as necessidades
essenciais deste Jardim.
E as Crianças? Como elas participam do
Nosso Jardim?

Toda criança possui um jardim pessoal, mas este


ainda não está totalmente disponível para o
cultivo. As crianças pequenas estão muito
ocupadas, crescendo e amadurecendo
fisicamente, toda sua força vital está
direcionada para estes processos. A criança vive
no nosso jardim, no jardim da alma dos adultos
que a cercam, com todo amor nos acompanham,
porém a principal tarefa da criança não é
jardinar e sim ser planta vivente deste nosso
jardim. Como se ela fosse uma árvore especial.
Enquanto cultivamos nosso jardim da alma,
harmonizamos todo o ambiente ao redor da
Árvore Criança que cresce e se desenvolve.
Tudo que cuidamos no jardim da nossa alma se
reflete no corpo da criança de maneira bem
concreta. O pulso das sensações e sentimentos
que vivenciamos é carregado para os fluxos
sanguíneos, ritmos respiratórios, formação de
tecidos moles e estruturas físicas mais densas.
Só no futuro se transformam em condutas e
atitudes de jardineiro.

Enquanto nos acompanham no cultivo do nosso


Jardim, as crianças percebem e sentem todo o
processo. Captam a forma como cuidamos dos
nossos jardins, seja no inverno ou nas demais
estações, se acolhemos bem as estações, se
encaramos os desafios com amorosidade, se
contemplamos os frutos do trabalho...

As crianças são ótimas observadoras!!! Muitas


vezes elas nos ajudam na jardinagem, pois são
capazes de encontrar uma ervinha daninha que
ainda não havíamos percebido. Porém, com toda
a certeza, são elas as primeiras a verem as
borboletas se achegando. Também são as
crianças as mais aptas para se encantarem com
todas as flores... Até mesmo os singelos dentes
de leão as fazem felizes. São grandes
companheiras e seu amor por nosso jardim é
incondicional.
Que a Árvore Criança possa ser cultivada
também com amor, beleza e verdade. Para mais
tarde florescer no Jardim da Vida!

Fica uma história bonita para alimentar nosso


jardim de adulto!!!
Jardineiros e Jardins

Francisco Marques

O jardineiro Jardel observa o seu jardim:


algumas plantas sufocando as plantas menores;
outras plantas roubando o espaço das plantas
mais vagarosas; aquelas plantas desengonçadas,
espalhafatosas... Conclusão: o jardim de Jardel
era um verdadeiro matagal. Numa bela manhã de
chuva, o jardineiro Jardel ouviu a seguinte
notícia pelo rádio: — Você sabia que o Jardineiro
Jasmim cuida de jardins há oitenta anos? Se
você deseja alguma orientação, não se
desoriente. Procure o jardineiro Jasmim na Rua
da Surpresa, pertinho da Praça da Descoberta.
Ainda naquela bela manhã, o jardineiro Jardel
foi visitar o jardim de Jasmim. Foi chegando e
logo se admirando: — O que significa isto? Então
eu ouço falar de um experiente jardineiro e,
chego aqui, o senhor está tratando as plantas
com uma tesoura? O jardineiro Jasmim não se
admirou com a admiração do visitante: — Muitas
vezes, meu amigo, as plantas lançam tantos
galhinhos pra lá e pra cá, tantos raminhos pra cá
e pra lá, que acabam perdendo a força para
crescer. Quando isso acontece, vou com a minha
tesoura e corto, com muito carinho, os galhos e
ramos que estão sobrando. — Ah... Estou
entendendo. — Muitas vezes, meu amigo, as
plantas crescem tanto, de maneira tão
exagerada, que acabam roubando o sol e a terra
das outras plantas. Quando isso acontece, vou
com a minha tesoura e corto, com muito carinho,
o exagero das plantas. O jardineiro Jardel
agradeceu as orientações, deu um beijo na testa
do jardineiro Jasmim e foi embora repleto de
sabedoria. Seis meses depois..., o jardim de
Jardel, que era um verdadeiro matagal, virou um
verdadeiro deserto.

O que essa história nos ensina? Existe uma atuação


ponderada para cuidar do jardim entre o matagal e o
deserto? Que tal você continuar essa história? ...
"Mas quando falo dessas pequenas felicidades
certas, que estão diante de cada janela, uns
dizem que essas coisas não existem, outros que
só existem diante das minhas janelas, e outros
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para
poder vê-las assim..."

Cecilia Meireles
Educação infantil

Agosto de 2020

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