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SANTOS, Guilherme Luis Quaresma Batista.

“Teoria Geral da Execução e o


Código de Processo Civil Brasileiro de 2015” in: DIDIER JR., Fredie (coord.)
Novo CPC – Doutrina Selecionada. v.5 (Execução). Salvador: Juspodivm,
2015. pp. 25-48. (versão eletrônica, revisada para 2ª edição).

TEORIA GERAL DA EXECUÇÃO E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL


BRASILEIRO DE 2015

Guilherme Luis Quaresma Batista Santos

Mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade do Estado do


Rio de Janeiro (UERJ). Professor Substituto da Universidade Federal Fluminense
(UFF). Advogado. Consultor Jurídico da PETROBRAS.

Sumário: 1. Introdução ao tema; 2. Direito Processual, Teoria Geral do Processo e


Teoria Geral da Execução; 3. Conceito de Execução Civil em sentido lato; 4. A
necessidade permanente de mudanças do Direito Processual Civil; 5. Estrutura da
Execução em sentido lato no Código de Processo Civil de 2015; 6. Princípios
norteadores da Execução Civil; 7. Princípios norteadores específicos da Execução Civil;
8. Liquidação de sentença; 9. Classificações da Execução Civil; 10. Conclusões sobre o
tema.

1. Introdução ao tema. Em 16 de março de 2015, após cerca de quatro anos de


discussões, de audiências públicas ao longo de todo o Brasil e de idas e vindas entre o
Senado Federal e a Câmara dos Deputados, foi promulgada a Lei n.º 13.105, que trouxe
à vida no ordenamento jurídico brasileiro o novo Código de Processo Civil.

Que as codificações não são permanentes, isto há muito tempo se sabe. No meu caso
particular, descobri durante a própria graduação na Faculdade de Direito, durante a qual
inúmeras leis modificaram os diversos Códigos nacionais, e, de modo especial, a
substituição do Código Civil de 1916 pelo atual Código Civil, sancionado e publicado
em 2002.

É verdade que a mudança sempre nos traz apreensão e incertezas, tanto aos que já
trabalham nas diversas profissões jurídicas, quanto aos que apenas começaram os seus
estudos; mas, por outro lado, as mudanças legislativas se fazem necessárias a fim de que
o Direito, como fruto de uma Sociedade, não se torne instrumento obsoleto, nem muito
menos desprezado pela população.
Ubi societas, ibi jus. Onde está a Sociedade, está o Direito. E também verdadeira é a
recícropa: ubi jus, ibi societas, uma vez que, como bem apresentado por doutrinadores
respeitáveis como MICHELE TARUFFO1 e, de modo especial, MIGUEL REALE, não é
possível a concepção de qualquer atividade social desprovida de forma e garantia
jurídicas, nem qualquer regra jurídica que não se refira à sociedade.2

Deste modo, não obstante a natural curiosidade pelas novidades legislativas sobre o
Direito Processual Civil, torna-se essencial, por outro lado, ler o novo Código de
Processo Civil levando também em consideração os fundamentos jurídicos que o
inspiram e que devem embasar a sua interpretação.

Esta é a proposta deste trabalho: fazer uma apresentação inicial da Execução Civil (em
sentido amplo) no novo Código de Processo Civil por intermédio da Teoria Geral da
Execução.

2. Direito Processual, Teoria Geral do Processo e Teoria Geral da Execução. Para


tanto, algumas premissas teóricas devem ser previamente estabelecidas acerca do que é
a “Teoria Geral da Execução”.

No ordenamento jurídico brasileiro, o Código de Processo Civil de 2015 (chamemo-lo


também, doravante, simplesmente de CPC) é, sem dúvida, o conjunto por excelência de
normas jurídicas do que se denomina de Direito Processual Civil, i.e. o complexo de
regras e princípios jurídicos que regem o processo civil, o exercício conjugado de atos
processuais praticados pelo Demandante e pelo Demandado e pelo Estado-Juiz no
exercício da jurisdição.3 Trata-se do conjunto de normas presentes tanto no CPC, como
na Constituição Federal e em Leis extravagantes que trazem regras e princípios
processuais civis.

Tais normas que compõem o Direito Processual Civil são o objeto de estudo da Ciência
do Processo Civil (ou Ciência do Direito Processual Civil), ramo da Ciência do Direito
(ou Ciência Jurídica) que tem como objetivo, como bem formulado por FREDIE DIDIER
JR., formular as diretrizes, apresentar os fundamentos e oferecer os subsídios para as
adequadas compreensão e aplicação do Direito Processual Civil. 4

1
TARUFFO, Michele. “Cultura e Processo”. In Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, Milão,
ano 63, n. 1, p. 63-92, mar 2009. Neste texto, o professor Taruffo esclarece que o processo, na sua
substância, não é apenas pura técnica e o seu conhecimento não se exaure somente na cultura técnica. A
técnica, para ele, serve apenas para fabricar o instrumento processual, enquanto que a ideologia determina
os escopos que o processo deve alcançar. Ambos são conjuntamente necessários e separadamente
insuficientes. “La tecnica senza l’ideologia è vuota, mentre l’ideologia senza la tecnica è impotente” (Em
tradução livre, a técnica sem ideologia é vã, enquanto que a ideologia sem a técnica é impotente – p. 90).
2
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 2.
3
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; et DINAMARCO, Cândido Rangel.
Teoria Geral do Processo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 40.
4
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 17. ed. Salvador: JusPodivm, 2015. v. 1. p. 35.
Percebe-se aqui a clara diferença entre o Direito Processual Civil (que se encontra em
um plano normativo) e a Ciência do Processo Civil (que, ao seu turno, localiza-se em
um plano doutrinário).5

Será a Ciência do Processo Civil que, analisando as novas normas processuais trazidas a
lume pelo CPC, dará as devidas interpretações sobre estas.

Assim como da Ciência do Direito extrai-se a Teoria Geral do Direito, o mesmo ocorre
quanto à Teoria Geral do Processo, linguagem científica oriunda da Ciência do
Processo que não tem como objetivo o estudo genérico das normas de Processo, mas
sim – e novamente se valendo das lições de DIDIER JR. – o estudo de pressupostos,
anteriores e independentes à análise do Direito positivo, porém necessários para a
compreensão do Direito Processual.6

Daí nasce a sua importância. A Teoria Geral do Processo tem como objeto de estudo
não as normas de Direito Processual, mas a Ciência do Direito Processual. Ela estuda a
Ciência que estuda as normas positivadas, de modo que, na Teoria Geral do Processo,
não se analisa as normas, mas os pressupostos gerais da Ciência do Processo para que
os estudiosos possam, com apoio desta, interpretar as normas.

Isto não significa que a Teoria Geral do Processo seja alijada por mudanças legislativas
no ordenamento processual de um país, como no nosso caso do novo CPC brasileiro.
Não há que se falar, portanto, de novas Teorias Gerais do Processo para cada mudança
legislativa,7 visto que se está diante de postulados e pressupostos científicos, aplicáveis
de forma genérica, inclusive, à Ciência Processual e, por conseguinte, aos ordenamentos
processuais de outros países.

É possível que a Teoria Geral do Processo, entendida com estudo sobre a Ciência do
Direito Processual, possa se tornar mais específica, a depender do foco de quem
empreende o estudo.

Assim, o estudioso da Teoria Geral do Processo pode delimitar o seu objeto de estudo a
um dos ramos da Ciência Processual (e.g. a Ciência do Processo Civil, do Processo
Penal ou do Processo do Trabalho), construindo teorias individuais do processo8 (como
a Teoria Geral do Processo Civil ou a Teoria do Processo Civil brasileiro) ou, ainda
mesmo, tratar de teorias parciais sobre conceitos jurídicos importantes para a
compreensão de parcela de determinado Direito Processual Civil positivado.9

5
Idem, ibidem.
6
Idem, ibidem.
7
Nesse sentido, critica-se aqui, e.g., a menção a uma “Teoria Geral do Processo Eletrônico”, visto que se
trata apenas de disposições práticas acerca de modos, por meio telemáticos, de praticar atos processuais.
Tampouco há como se falar em “uma nova Teoria Geral do Processo” por conta da promulgação do novo
CPC.
8
DIDIER JR. Sobre a Teoria Geral do Processo, essa desconhecida. Salvador: JusPodivm, 2003. p. 80.
9
É o que bem esclarece DIDIER JR. quando alerta que todas essas teorias parciais, verbis, “seriam
teorias construídas a partir do exame de um determinado direito positivo e apenas a ele serviriam. Ao
Direito estrangeiro, serviriam apenas para fins de comparação.” (Idem, p. 81).
Desta forma, a Teoria Geral10 da Execução no Código de Processo Civil teria, como
objeto, o estudo dos conceitos jurídicos mais relevantes para a compreensão da
Execução Civil lato sensu brasileira, prevista na nova ordem processual a entrar em
vigor em 2016.

Daí a escolha deste tema relevante, pois o CPC deve ser interpretado de forma
uniforme11 e, para tanto, o estudo dos pressupostos científicos da Ciência da Execução
se torna fundamental para uma melhor compreensão das normas processuais escritas no
texto do novo Código.

3. Conceito de Execução Civil em sentido lato. Se, por acaso, fosse possível definir a
Execução Civil em uma palavra em nosso vernáculo, esta seria satisfação. De forma
muito precisa, LUIZ FUX leciona que “executar é satisfazer”.12

Fica evidente que a satisfação da obrigação é o objetivo principal da execução civil


lato sensu. De nada adianta ao credor obter uma sentença judicial lhe assegurando certo
direito se este não lhe for, efetivamente, satisfeito pelo devedor.

A princípio, a obrigação poderia ser satisfeita espontaneamente pelo obrigado, o que se


denomina, em Direito Civil, adimplemento,13 ou seja, o cumprimento voluntário da
obrigação14 ou a execução não forçada da obrigação.15

Contudo, de pouco valia seria ao credor ter o direto a uma obrigação material (seja ela
de entregar alguma coisa ou quantia, de fazer ou de não fazer algo) reconhecido em um
instrumento contratual ou título cambiário com uma cláusula que conceda a ele o direito
de executá-la diretamente (i.e., título executivo extrajudicial) ou tê-lo reconhecido após
a necessária e demora propositura uma ação judicial, argumentação jurídica, produção
de provas a seu favor e espera pela prolação de uma decisão judicial definitiva favorável
(ou seja, obter um título executivo judicial) se, ao final, não lhe for assegurada o
cumprimento desta obrigação na hipótese - infelizmente corriqueira - de o devedor não
vir a cumpri-la voluntariamente.

10
Cabe um esclarecimento meramente terminológico ao leitor. A terminologia “Teoria Geral da
Execução” não é unânime. Utiliza-se, aqui, a mesma terminologia empregada por LEONARDO GRECO
em sua notória obra O Processo de Execução (Rio de Janeiro: Renovar, 1999. v. 1. p. 07) aplicada ao
novo Código de Processo Civil, tratando-se “geral” como amplo, de forma a abranger todas as formas de
procedimentos executórios previstos no CPC; entretanto, FREDIE DIDIER JR., na obra citada na nota de
rodapé supra, ao tratar das teorias individuais do processo, as denomina sem qualificá-las como “Gerais”,
uma vez que elas seriam restritas a determinado ordenamento processual. In verbis: “É possível conceber
uma Teoria do Processo Civil brasileiro” (Idem, p. 80).
11
Isso é novamente tratado, com maestria, por FREDIE DIDIER JR. no 1º volume de seu Curso... (Op.
cit., p. 152), onde, assim como ocorre na hermenêutica constitucional, “[o] Código deve ser interpretado
como um conjunto de normas orgânico e coerente. Surge daí o postulado interpretativo da unidade do
Código.”
12
FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 980.
13
DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 100.
14
DIDIER JR. et alii. Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Editora JusPodivm, 2009. v. 5. p. 28.
15
DINAMARCO. Loc. cit.
Nestes casos, a execução ou o cumprimento do julgado torna-se compulsório ou
forçado, devendo o credor se valer do instrumental processual a fim de se satisfazer
com a efetivação da obrigação pretendida.16

Em outras palavras, enquanto que a cognição civil tem como objetivo a justa
composição do litígio entre as partes, com a promulgação de uma sentença declaratória,
constitutiva ou condenatória, a execução civil visa, por outro lado, a justa realização de
justiça no caso concreto, i.e. a busca de uma justiça efetiva.17

Pode-se conceituar, portanto, a execução civil, segundo a lição de LEONARDO GRECO,


como a modalidade de tutela jurisdicional que consiste na prática pelo juiz (ou por
outrem sob sua supervisão) de uma série de atos coativos concretos sobre o devedor e
sobre o seu patrimônio, a fim de, à custa dele e independentemente do concurso da sua
vontade, tornar efetivo o cumprimento de prestação por ele inadimplida, desde que tais
atos coativos estejam previamente constituídos na forma da lei.18

O instrumento para o exercício desta modalidade de tutela jurisdicional, necessário para


efetivar a sanção prevista pela norma jurídica concreta oportunamente esclarecida em
sentença judicial ou declarada em outra espécie de título executivo, denominar-se-á
processo de execução ou fase de cumprimento de sentença, que objetivará a atuação
prática da norma jurídica concreta do título executivo (respectivamente, extrajudicial ou
judicial).

4. A necessidade permanente de mudanças do Direito Processual Civil. A execução


civil ainda hoje é um entrave processual não apenas no Brasil ou na América Latina,
mas em todos os países de cultura jurídica ocidental (ou europeia).19

Estudos de diversos doutrinadores ao redor do globo (no Brasil, cita-se, de modo


especial, ARAKEN DE ASSIS20 e LEONARDO GRECO)21 tentam descobrir quais seriam as

16
Como já defendido em SANTOS, Guilherme Luis Quaresma Batista. Contraditório e Execução. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2013. p. 03.
17
SAMPAIO, José Maria Gonçalves. A Acção Executiva e a Problemática das Execuções Injustas.
Lisboa: Ed. Cosmos, Livr. Arco-Íris, 1992. p. 344.
18
GRECO. O Processo de Execução. Op. cit.. p. 164.
19
Bem recentemente, por exemplo, tem havido profundas mudanças na execução civil de países como na
Itália, em Portugal (anteriores mesmo à promulgação do seu Código de Processo Civil em 2013, com a
criação e posteriores alterações da figura do “agente de execução” – vide, por todos, o artigo de
SCHENK, Leonardo Faria. “Distribuição de Competências no Processo Executivo Português
Reformado”. Revista Eletrônica de Direito Processual. Rio de Janeiro: Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Direito Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, vol. III, jan-jun 2009.
Disponível em < http://www.redp.com.br/edicao_ 03.htm >) e na França, onde entrou em vigor, em 2012,
um Código de Processos Cíveis de Execução (Code des procédures civiles d'exécution, publicado como
anexo da Ordennance n.º 2011-1895, de 19 de dezembro de 2011), destacando os procedimentos
executórios do Código de Processo Civil.
20
ASSIS, Araken de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v.
6. p. 05.
21
GRECO. “A Crise do Processo de Execução”. in Estudos de Direito Processual. Campos dos
Goytacazes: EFDC, 2005. Versão eletrônica. p. 01-02.
causas para que a execução civil não consiga alcançar o seu objetivo de assegurar a
satisfação da obrigação estipulada entre as partes ou imposta por sentença (seja judicial,
seja arbitral).

Algumas delas podem ser enumeradas, de modo que qualquer modificação da legislação
deveria trazer formas de combater tais fatores da crise da execução civil: (a) o alegado
excesso de processos em todas as nações ocidentais;22 (b) os custos e a morosidade do
aparato judicial ao credor, fato notoriamente conhecido por todos, em todo o mundo; 23
(c) a inadequação dos procedimentos executórios diante das mudanças culturais e
econômicas, gerando ineficiência do Poder Judiciário, retardos desnecessários aos
processos e benesses involuntárias aos devedores; (d) o surgimento de um novo
ambiente econômico e sociológico no qual, associado à volatilização da riqueza, há um
claro estímulo consumerista que leva ao empobrecimento e consequente endividamento
das pessoas onde os devedores passaram a encontrar justificativa à sua mora, como se
fosse algo natural, de modo que, como bem notado por LEONARDO GRECO, o
inadimplemento das obrigações pelo devedor deixou de ser vexatório e reprovável,
multiplicando as ações de cobrança e execuções (fator a, citado supra), através das
quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens, à custa do credor;24 e, por fim, (e) como
consequência destas mudanças sociais experimentadas no comportamento das
sociedades ocidentais e de eventuais benefícios que os legisladores acabaram
outorgando aos devedores,25 a ineficiência das coações processuais.

Infelizmente, sem a devida coação (dentro, claro, dos limites previstos em lei e sem
afronta à dignidade da pessoa humana), os devedores não cumprem as suas obrigações,
tornando-se necessária a existência de instrumentos processuais eficazes para a
satisfação do crédito, dentro dos limites impostos por um devido processo legal. 26

22
Realmente, o excesso de processo não é uma realidade apenas brasileira. De forma similar, por
exemplo, verificou em Portugal que “[c]om o advento da liberdade política e o desenvolvimento
económico e social, a breve trecho o país [...] desenvolveu-se, aumentando a oferta e a procura de bens
de consumo e, naturalmente, os litígios, com a consequente procura da tutela judiciária, circunstância
que, dentro em pouco, viria a revelar as insuficiências do sistema ao nível da resposta, impondo a
necessidade de uma reforma do processo civil na sua globalidade.” (RIBEIRO, Virgínio Costa. As
Funções do Agente de Execução. Coimbra: Almedina, 2011. p. 13).
23
No Brasil, é conhecida a conclusão do Projeto Florença liderado por MAURO CAPPELLETTI e
BRYAN GARTH quanto a este fator: “...qualquer tentativa realística de enfrentar os problemas de
acesso deve começar por reconhecer esta situação: os advogados e seus serviços são muito caros.”
(Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002. p. 18).
24
GRECO. Op. ult. cit.p. 02.
25
Por exemplo, nos ordenamentos jurídicos ocidentais, as coações sobre a pessoa do devedor são cada
vez mais raras. No Direito Brasileiro, por força do Pacto de São José da Costa Rica (a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, incorporada no ordenamento nacional pelo Decreto n.º 678/1992), as
prisões por dívida têm sido abolidas pela jurisprudência, mantendo-se ainda, por força constitucional e
legal, as prisões por inadimplemento de obrigações alimentícias.
26
Vide, neste sentido, o cap. 3.1.4 de Contradição e Execução. Op. cit. pp. 41-46, bem como no artigo
de minha autoria “Algumas Notas sobre o Contraditório no Processo Civil”. in Revista de Processo, São
Paulo, ano 36, n. 194, abr 2011, em especial pp. 81-88.
5. Estrutura da Execução em sentido lato no Código de Processo Civil de 2015. Apesar
de longe de ser perfeita ou completamente eficaz, inclusive diante das causas listadas
acima, a execução civil é o instrumento jurídico que o Processo Civil dispõe para que,
diante da resistência do devedor em cumprir as obrigações concretamente estipuladas
em um contrato, em um título cambiário ou em uma sentença, possa-se realizar efetiva e
faticamente o direito do credor à obrigação (de dar, de pagar, de fazer ou de se abster de
fazer) que o devedor se obrigou ou foi condenado a cumpri-la.27

Se o conceito do que consiste a Execução Civil (vide capítulo 4, supra) compete à


Ciência do Processo Civil, a sua sistematização e o estudo de seus conceitos competem,
ao seu turno, à Teoria Geral da Execução Civil.

No entanto, torna-se essencial descobrir como a Execução Civil se estrutura no novo


Código de Processo Civil.

Com a substituição do Código de Processo Civil de 1939 pelo de 1973, a unificação da


execução e da ação executiva em um único processo executório, tanto para o título
judicial, como para os títulos extrajudiciais, foi celebrada como grande avanço do nosso
Direito Processual Civil, aderindo o Processo Civil brasileiro à posição adotada, à
época, pela maior parte dos países europeus.28

No entanto, diversos problemas práticos (como a necessidade de uma nova citação no


processo executório e de novas intimações pessoais para a penhora e, claro, o
consequente “desaparecimento” dos executados ou a necessidade de nomeação de bens
à penhora pelo devedor para o prosseguimento da execução, dentre outros) deram
origem a importantes modificações das normas do CPC-1973 por intermédio das Leis
n.º 11.232/2005 (que modificou a estrutura executória dos títulos judiciais no Processo
Civil brasileiro) e n.º 11.382/2006 (que modificou, por sua vez, a estrutura normativa do
processo de execução dos títulos extrajudiciais).

Esta estrutura trazida pelas Leis n.º 11.232/2005 e n.º 11.382/2006 foi mantida no novo
CPC, de modo que, a depender da natureza do título executivo, o procedimento
executório será distinto.

Assim, no novo CPC, quando se tratar de título executivo judicial29 (por exemplo, a
sentença cível e a sentença arbitral cujo cumprimento será exigido em Juízo), haverá a

27
SANTOS. Contraditório e Execução. Op. cit.. p. 3
28
GRINOVER, Ada Pellegrini. “Nota Introdutória”. in LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o
Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Bushatsky, 1976. p. 31
29
Os títulos executivos judiciais, que dão fundamento à fase processual de cumprimento de sentença, são
assim denominados porque se originam de um juízo, qual seja, uma cognição prévia realizada em fase
processual cognitiva ou em outro processo de conhecimento que tenha sido realizado por autoridade
judiciária sem competência cível (no caso da sentença penal condenatória), por autoridade judiciária
estrangeira, sem jurisdição no território brasileiro (sentenças e decisões interlocutórias estrangeiras
homologadas no Brasil pelo Tribunal competente, hoje o Superior Tribunal de Justiça - STJ), pela
Administração (inscrições de dívida ativa na hipótese de execução fiscal - Lei n.° 6.830, de 1980) ou
mesmo por particulares (na específica hipótese de execução de sentença arbitral). Estão previstos no art.
515, CPC os títulos executivos judiciais dos procedimentos executórios ordinários. Em boa hora, os
“acórdãos” proferidos pelo denominado Tribunal Marítimo foram excluídos do rol de títulos executivos
instauração de uma fase processual de cumprimento de sentença (ou, se o título não for
proveniente da mesma autoridade judiciária brasileira com competência para julgar
assuntos de natureza cível - como no caso de uma sentença arbitral ou estrangeira que
não foi voluntariamente cumprida -, de um processo de cumprimento de sentença). É o
que está previsto no CPC nos arts. 513 ao 527 (quando se tratar de obrigação de pagar)
e do art. 536 ao 538 (quando se tratar de obrigação de fazer, não fazer ou de entregar
bem).

No entanto, em se tratando de um dos títulos executivos extrajudiciais previstos no


CPC,30 far-se-á necessária a propositura de um processo de execução de título
extrajudicial, nos moldes do Livro II do CPC (arts. 771 ao 925).

Tais procedimentos (cumprimento de sentença e processo de execução de título


extrajudicial) são os procedimentos executórios ordinários ou comuns do CPC.

Todavia, o CPC ainda prevê hipóteses em que a execução dar-se-á de modo


diferenciado, a depender da natureza do título a ser executado. Trata-se dos
procedimentos executórios especiais que, no CPC, são dois: (a) a execução de
alimentos, devido à importância de se assegurar a dignidade da pessoa (mormente,
criança, adolescente ou idoso) que necessita de tal verba (arts. 528 ao 533, CPC se o
título for judicial, e arts. 911 ao 913, CPC, se o título for extrajudicial); e (b) as
execuções de créditos de particulares em face da Fazenda Pública (seja no caso de
execução contra a Fazenda Pública, denominação guardada no novo CPC somente para
as execuções fundadas em títulos extrajudiciais em face da Administração Pública
Direta, conforme o art. 910, seja na hipótese denominada no CPC de cumprimento de
sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa pela
Fazenda Pública, fundada em título judicial, com normas previstas nos arts. 534 e 535,
CPC).

A previsão destes procedimentos executórios no CPC não impede que outros


procedimentos especiais sejam previstos em leis esparsas. Por exemplo, quando a
Fazenda Pública for credora (seja de tributos, seja de outros créditos, como penalidades
e multas impostas), ela terá à sua disposição o procedimento especial denominado
execução fiscal, previsto na Lei n.º 6.830/1980, em vigor. Tais procedimentos previstos

judiciais, uma vez que, apesar do nome dado a este órgão administrativo, o Tribunal Marítimo não é
órgão do Poder Judiciário, mas colegiado administrativo vinculado ao Ministério da Defesa (mais
especificamente, ao Comando da Marinha), cujos atos administrativos de julgamento dos acidentes e fatos
da navegação, eventualmente, podem ser subordinados ao controle de legalidade pelo Poder Judiciário.
Cabe ressaltar, assim, que a parte final do art. 516, III, CPC não tem força, visto que o art. 515, X, CPC
foi vetado, o que não pôde ser feito quanto ao art. 516, III, CPC, uma vez que no ordenamento jurídico
brasileiro atual não é mais permitido o veto parcial de palavras ou expressões, mas somente do texto
integral de artigos, parágrafos e incisos pela Presidência da República (art. 66, § 2º da Constituição
Federal de 1988).
30
A seu turno, os títulos executivos extrajudiciais são, a contrario sensu, aqueles que não nascem de um
juízo, mas de “atos negociais celebrados entre dois ou mais sujeitos dotados de capacidade, no exercício
de sua liberdade negocial” (DINAMARCO. Instituições de Direito Processual Civil. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2009. v. 4. p. 212). O rol dos títulos executivos extrajudiciais se encontra hoje no art. 784,
CPC.
fora do CPC, contudo, não serão objeto de estudo neste artigo, mas cabe ressaltar que
tais procedimentos estão também subordinados ao pressupostos da Teoria Geral da
Execução.

6. Princípios norteadores da Execução Civil. Além das normas fundamentais aplicáveis


a todo o Processo Civil (arts. 1º ao 12, CPC) serem também aplicáveis31 na Execução
Civil em sentido lato (seja na fase de cumprimento de sentença, seja no processo de
execução de títulos extrajudiciais, seja em qualquer um dos procedimentos executórios
especiais), sobre esta também incidem princípios próprios da Execução Civil que devem
ser observados em qualquer procedimento, seja ele ordinário ou especial.

Usar-se-á neste texto o conceito de princípio inspirado em CLAUS-WILHEM CANARIS,32


entendido como normas que trazem valores ao ordenamento jurídico, de modo que se
tornam fundamentos às regras, guiando o intérprete da Lei na aplicação da norma a cada
pessoa da sociedade (que ocorre, por excelência, no exercício jurisdicional por
intermédio do processo).

Uma das dificuldades para a enumeração destes princípios norteadores da Execução


Civil é o fato de que o seu tratamento e o seu reconhecimento são bastante recentes na
doutrina.

De fato, em obras clássicas de Direito Processual Civil, como, por exemplo, nos
“Principii di Diritto Processuale Civile” (1923) de GIOSEPPE CHIOVENDA; no “Manuale
di Diritto Processuale Civile” (1957) e no “Processo de Execução” (1968) de ENRICO
TULLIO LIEBMAN; e no “Processo de Execução” (1957) do professor português JOSÉ
ALBERTO DOS REIS não há menção expressa a princípios próprios do processo de
execução.33

Deste modo, não raro encontrar-se-ão divergências entre doutrinadores a respeito de


alguns destes princípios.

Torna-se necessário adotar um critério para que se possa classificar e tratar dos
princípios norteadores da Execução Civil. Para tanto, os princípios aqui tratados
enumerados como norteadores da Execução Civil foram enumerados em obra

31
De modo especial, deve-se ressaltar a aplicabilidade integral do princípio do contraditório na Execução
Civil, como defendido em minha dissertação de mestrado Contraditório e Execução. Op. cit. Capítulo 3.
pp. 33-46.
32
Para CANARIS, princípio pode ser definido como “(...) o ponto intermédio entre o valor, por um lado,
e o conceito, por outro: ele exerce aquele por estar já suficientemente determinado para compreender
uma indicação sobre as consequências jurídicas e, com isso, para possuir uma configuração
especificamente jurídica e ultrapassa este por ainda não estar suficientemente determinado para
esconder a valoração.” (Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. Lisboa:
Calouste Gulbenkian, 1996, pág. 87).
33
Pesquisa realizada durante a elaboração do artigo “Um Estudo de Direito e Literatura: a busca dos
princípios norteadores da execução em Shakespeare”. in Revista Eletrônica de Direito Processual. Rio de
Janeiro, v. 6, jul-dez 2010. Disponível em < http://www.redp.com.br/edicao_06.htm >. p. 366.
notoriamente reconhecida sobre o tema da Execução Civil na qual se tenha aprofundado
devidamente o tema.

Para este fim, será utilizada a conhecida obra do professor LEONARDO GRECO, o seu
livro denominado “O Processo de Execução”, no qual, no primeiro volume, os
princípios do processo de execução foram classificados em princípios gerais e em
princípios específicos.

Para o prof. GRECO, os princípios gerais da execução civil são as grandes diretrizes que
informam o sistema normativo dessa espécie de processo.34 São eles os princípios: (a)
da iniciativa; (b) do impulso processual oficial; (c) do contraditório; (d) dispositivo; (e)
da livre convicção; (f) da publicidade; (g) da lealdade; e (h) da oralidade. Tais princípios
encontram-se hoje dispostos tanto na Constituição Federal brasileira, como no
tratamento das normas fundamentais do Processo Civil na Parte Geral do CPC (arts. 1º
ao 12).

Já os princípios específicos da execução civil são aqueles típicos da atividade


executória, não compartilhados com outras modalidades de tutela jurisdicional. São
princípios específicos do processo de execução: (a) o que toda execução pressupõe um
título (nulla executio sine titulo); (b) o que a execução se realiza no interesse do credor;
(c) o da disponibilidade da execução; (d) o da fungibilidade do meio executório; e (e) o
que a execução se dará no modo menos gravoso ao devedor. Estes princípios serão
objeto de análise nas próximas linhas deste trabalho.

7. Princípios norteadores específicos da Execução Civil. Passando-se à análise dos


princípios específicos da execução, o princípio de que toda execução pressupõe um
título (nulla executio sine titulo) exige, até os dias de hoje, que aquele que se diz
credor de outra pessoa comprove a veracidade de sua própria situação jurídica, com a
apresentação de um título, com todas as formalidades exigidas em lei.

Segundo a interessante metáfora de FRANCESCO CARNELUTTI, citada por ARAKEN DE


ASSIS, o título executivo funciona como se fosse um bilhete de ingresso à execução, 35
de modo que deve ser tratado como pressuposto de validade, cuja ausência acarreta a
nulidade da execução.

Requisito oriundo do direito italiano desde a Alta Idade Média, quando os comerciantes
de cidades mercantis, como Veneza, começaram a criar documentos de dívida que
dariam origem aos atuais títulos de crédito (como a letra de câmbio e, bem
posteriormente, a nota promissória e o cheque), buscando-se o ponto de equilíbrio entre
as exigências da certeza e de celeridade,36 o título executivo37 hoje é exigido pelo CPC

34
O Processo de Execução. Op. cit. p. 252.
35
Lezioni di Diritto Processuale Civile – Processo di Esecuzione. Padova: Cedam, 1932. v. 1, n.º 109, p.
222 apud ASSIS, Araken de. Cumprimento de Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 35.
36
GRECO. O Processo de Execução. Op. cit. v. 2. p. 104.
como pressuposto processual (de existência) do processo de execução lato sensu,38
tendo sua violação sido, inclusive, a gênese do incidente processual informal que até
hoje denominamos de exceção (ou objeção) de pré-executividade39 (a qual,
lamentavelmente, deixou de ser devidamente regulamentada no CPC, contando com
mera menção no art. 525, § 11 e no art. 917, § 1º ao direito do executado de arguir, por
simples petição, “questões relativas a fato superveniente ao término do prazo para
apresentação da impugnação, assim como aquelas relativas à validade e à adequação da
penhora, da avaliação e dos atos executivos subsequentes” no prazo de 15 dias a contar
de ciência comprovada do fato ou da intimação do ato).

Isto porque, junto com o inadimplemento do devedor, o título executivo é um dos


requisitos da execução, exigidos para que o credor possa legitimamente exigir o
provimento jurisdicional.40

Ou seja, além de o devedor não ter cumprido voluntariamente a obrigação, o exequente


deve apresentar um título que dê lastro ao seu processo de execução ou fase de
cumprimento de sentença.

Os títulos executivos devem estar revestidos de certeza da existência de crédito e de


liquidez ou quantificação para que possa a execução civil ter existência juridicamente
válida.

Além de ser requisito para o exercício do direito de execução, o título executivo tem
especial importância no Direito Processual Civil brasileiro pelo fato que é, a partir dele,
que se escolherá qual será o procedimento executório aplicável a cada hipótese fática.

Caso se trate de um dos títulos executivos judiciais previstos no art. 515, CPC, o
procedimento será o de cumprimento de sentença, previsto nos arts. 513 ao 527 (quando

37
Por fidelidade ao leitor, cabe informar que, até hoje, é discutida em doutrina qual seria a natureza
jurídica dos títulos executivos, havendo quem entenda se tratar: (i) de documento ou de “prova proferida
com a particular eficácia do título legal” (CARNELUTTI. Instituciones del Proceso Civil. Buenos Aires:
El Foro, 1997. v. 3. p. 4); (ii) de ato jurídico (LIEBMAN. Processo de Execução. Op. cit. p. 19); ou (iii)
ambos (teoria mista, defendida por CHIOVENDA, ASSIS e, por todos, GRECO. O Processo de
execução. Op. cit. v. 2. p. 103).
38
GRECO. Op. ult. cit. pp.59 e 103-110. Cabe ressaltar que o prof. LEONARDO GRECO defende, nesta
obra, que se trata de pressuposto processual da Execução Civil, sendo esta classificação complementada
por mim neste trabalho com a afirmação de que o título executivo é pressuposto processual de existência.
39
Explica-se: a denominada exceção de incompetência tem como berço o famoso Parecer que PONTES
DE MIRANDA elaborou em 1966 para subsidiar o processo de falência da Companhia Siderúrgica
Mannesmann (aos que interessarem, MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. “Parecer n.º 95”. Dez
Anos de Pareceres. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975. vol. 4. p. 132). Neste parecer, ele imaginou o
uso de uma simples petição, sem a necessidade de prévia penhora, na qual fosse possível “a alegação de
inexistência, da invalidade ou da ineficácia da sentença (...) antes da expedição do mandado de
penhora.” Especificamente, no caso concreto, aquela Companhia buscava uma forma de alegar a
falsidade de títulos que instruíam demandas executivas diversas, inclusive através de requerimentos de
falência, dentro do sumário prazo de vinte e quatro horas após a sua citação e sem necessitar nomear bens
à penhora ou realizar depósito judicial da quantia que constava naqueles títulos controversos (apud
SANTOS. Contraditório e Execução... Op. cit. p. 151). A ideia original de PONTES DE MIRANDA (que
dele não recebeu o nome pelo qual é conhecida até os dias de hoje) permanece até os dias de hoje na
jurisprudência, porém, no novo CPC, deixou ainda de ser devidamente regulada.
40
CINTRA; GRINOVER; et DINAMARCO. Op. cit. p. 256.
se tratar de obrigação de pagar) e do art. 536 ao 538 (quando se tratar de obrigação de
fazer, não fazer ou de entregar bem) do CPC; se, ao revés, for um título executivo
extrajudicial (art. 784, CPC), o procedimento será, a seu turno, o processo de execução
de título extrajudicial regulado no Livro II do CPC.

O segundo princípio específico da Execução Civil é o da unilateralidade do interesse


na atividade executória, ou seja, a execução deve-se realizar apenas no interesse do
credor; em outras palavras, por força do título executivo, o credor é o titular do direito
de executar seu crédito em face de seu devedor.

Isto significa que quem deve iniciar e dar prosseguimento à execução é tão-somente o
credor, com o auxílio do Poder Judiciário e de eventuais auxiliares do juízo (judiciais ou
não); entretanto, é importante ressaltar que, quando se tratar de obrigação de fazer, não
fazer (arts. 536 e 537) ou de entregar coisa (art. 538), permitir-se-á que haja a ordem ex
officio de cumprimento da sentença, visto que o não cumprimento pelo devedor da
ordem de fazer, deixar de fazer ou de entregar algo no prazo estipulado em sentença (ou
em decisão interlocutória de mérito) viola, por si só, a dignidade da Justiça.

Porém, deve restar claro que, no cumprimento de sentença que condena o devedor ao
pagamento de quantia certa (art. 513, § 1º, CPC), inclusive no caso de alimentos (art.
528), não cabe ao magistrado dar início ou prosseguimento à execução no lugar do
credor, único interessado na atividade executória, sob violação do princípio da inércia e
do contraditório, sob a faceta da paridade de armas.

É verdade que, quando se fala em paridade de armas, não se deve apenas consentir,
como bem observado por NICOLA PICARDI, com a participação das partes em pé de
igualdade, mas também se deve assegurá-las idênticas possibilidades técnico-
processuais de condicionar o convencimento o juiz, assumindo a iniciativa necessária de
contradizer as deduções e alegações alheias. Trata-se, portanto, de assegurar um
equilíbrio dinâmico de todo o processo, inclusive da fase executória, com equivalência
abstrata de chances entre as partes.41

Todavia, a defesa da paridade de armas, compreendida como igualdade de chances de


convencimento do Juízo acerca de suas alegações, não pode ser estendida
indevidamente a ponto de ferir a inércia e a imparcialidade do Juízo em favor do credor.

Deste modo, em relação à fase de cumprimento de sentença de pagar quantia certa, sob
pena de violação do princípio da inércia judicial e do princípio específico da
unilateralidade do interesse na atividade executória, o magistrado não poderá dar início
ao cumprimento de sentença de ofício, sem aguardar a iniciativa de seu maior
interessado: o credor do crédito assegurado em sentença.

Deve-se atentar ao fato que a iniciativa de iniciar a execução do crédito é pessoal do


credor, não podendo o juiz substituir a sua vontade (que, algumas vezes, pode ser
justamente a de não executar, por ora, seu devedor por algum motivo particular ou por

41
PICARDI, Nicola. Manuale de Processo Civile. 3. ed. Milão: Giuffrè, 2012. p. 231.
busca de uma solução amigável para o pagamento da dívida declarada) por pretensa
função jurisdicional que não lhe compete. Mesmo que a sentença seja do juiz, o crédito
(ou melhor, o direito ao crédito) será sempre do credor, de modo que somente a ele
compete escolher quando pretenderá dar início à respectiva fase de cumprimento da
dívida.42

Este princípio encontra exceção, como visto acima, quando se tratar de cumprimento de
sentença de fazer, de não fazer ou de entrega coisa (arts. 536, caput e § 1º, e 538, § 3º,
CPC) nas quais o juiz poderá, de ofício ou a requerimento do exequente, determinar as
medidas necessárias à satisfação deste. Tal possibilidade provém do poder geral de
cautela do magistrado que, diante do risco de perecimento do direito do exequente ou de
impossibilidade de seu cumprimento pelo devedor, poderá determinar, a qualquer tempo
(inclusive na fase processual anterior de cognição) e independentemente de
requerimento da parte interessada, a realização de medida necessária para a satisfação
da obrigação – repita-se – de fazer, de não fazer ou de entregar coisa.

Torna-se importante ressaltar que a excepcional atuação ex officio do juiz para assegurar
o cumprimento de obrigação de fazer, de não fazer ou de entrega coisa somente poderá
ocorrer em fase processual de cumprimento de sentença, onde tenha sido proferida
sentença pela mesma autoridade judiciária concedendo a obrigação ao exequente; caso
o credor tenha que ajuizar processo (de execução, caso seja título extrajudicial,43 ou de
cumprimento de sentença, caso se trate de título judicial oriundo de outra autoridade
judiciária ou de particulares), naturalmente o magistrado não terá como atuar de ofício
(sob pena de violação ao princípio geral de inércia jurisdicional), uma vez que
dependerá sempre da distribuição do processo executório lato sensu pelo credor, no qual
poderá formular eventuais requerimentos de tutela de urgência.

Outrossim, não se pode ignorar que é inegável que o devedor ou executado tenha
também interesse no que venha a ocorrer com ele e seus bens em um processo movido
em face dele; porém, esse interesse não se iguala ao interesse de seu credor, pois, como
esclarece LEONARDO GRECO, o interesse do devedor, em tais situações, não é um
interesse autônomo, mas sim subordinado, derivado da sujeição dos seus bens aos atos
que se destinam a satisfazer à pretensão do credor.44

O princípio da disponibilidade da execução, por sua vez, assegura ao exequente, a


qualquer tempo, o direito de dispor, i.e., de desistir voluntariamente da execução ou de

42
Vide Contraditório e Execução, Cap. 6.3, in fine (pp. 115-116). No mesmo sentido, é válida a lição
oriunda de Portugal de JOSÉ MARIA GONÇALVES SAMPAIO, perfeitamente aplicável em nosso
sistema processual civil quanto às obrigações de pagar quantia certa: assim como ocorre na fase
processual cognitiva, também na execução civil, por força do princípio dispositivo, é ao titular do direito
violado que incumbe requerer ao tribunal o meio de tutela jurisdicional adequada à reparação do seu
direito, de modo que o juiz não pode, por iniciativa própria, suprir sequer a negligência ou a inépcia das
partes. (A Acção Executiva e a Problemática das Execuções Injustas. Op. cit. p. 345-346).
43
Vide, por exemplo, os arts. 806 a 823, CPC, que se silenciam a respeito da possibilidade de atuação ex
officio do juiz nestas hipóteses de ajuizamento de processo de execução de título extrajudicial.
44
GRECO. Loc. cit. pp. 305-306.
algumas de suas medidas executórias, sem necessitar de qualquer concordância de seu
executado.

Ao contrário do que ocorre na fase processual de conhecimento, como a satisfação do


crédito é de interesse unicamente do credor, não há necessidade de o devedor aquiescer
com eventual desistência integral ou parcial do direito de crédito por parte do credor.

É claro que tal desistência não atingirá os atos e decisões judiciais já operadas no
processo. Ademais, cabe ressaltar que se houver alguma impugnação, em sentido lato, à
execução iniciada pelo credor (seja por impugnação na fase de cumprimento de
sentença – art. 525, CPC; seja pela oposição de embargos à execução no processo
executório de títulos extrajudiciais – arts. 914 a 920, CPC), aquela somente será extinta
juntamente com a execução, sem a concordância do executado, caso se o objeto de
impugnação tiver apenas sido acerca questões processuais (art. 775, CPC, aplicável
tanto ao cumprimento de sentença, como aos embargos à execução).

A fungibilidade do meio executório é o princípio específico da execução que permite a


busca do melhor meio para a execução do crédito pelo magistrado, pois o que identifica
a demanda executória não é a providência jurisdicional pleiteada pelo exequente, mas
a prestação constante do título.45

A escolha da melhor forma de execução pelo magistrado não se confunde com violação
ao princípio da inércia visto logo acima, pois não se trata necessariamente de atuação de
ofício do Juízo (permitida apenas, como visto acima, nas fases de cumprimento de
sentença de obrigação de fazer, de não fazer ou de entregar coisa), mas de ato
processual de efetividade da prestação jurisdicional praticado pelo juiz sobre ato
processual anteriormente praticado pelo credor. Em outras palavras, se houver um meio
mais eficaz de se obter a satisfação do crédito, será permitida a fungibilidade do meio
executório, inclusive pelo juiz. Por exemplo, se houver o pedido genérico de penhora
pelo credor, mas sem especificá-lo, é possível ao magistrado realizar a penhora online
nas contas bancárias do devedor por aplicação do princípio da fungibilidade do meio
executório. Veja que, neste exemplo, não se trata de atuação ex officio (uma vez que a
penhora foi requerida pelo exequente, mesmo que incompleta ou de forma ineficaz).

Este princípio, aliás, está intimamente ligado ao último do rol dos princípios
norteadores da execução civil, o da menor onerosidade possível (ou, para HUMBERTO
DALLA BERNARDINA DE PINHO, de menor sacrifício possível para o executado),46
inscrito agora no art. 805, CPC. Trata-se de consequência lógica do dever constitucional
de preservação da dignidade da pessoa humana, onde se permite, outrossim, a
possibilidade de escolha pelo juiz, dentre os vários meios que o exequente tenha à
disposição para promover a execução, o que seja menos gravoso ao executado.

45
GRECO. Loc. cit., p. 307.
46
PINHO. Humberto Dalla Bernardina de. Direito Processual Civil Contemporâneo. São Paulo: Saraiva,
2012. v. 1. p. 513.
Para evitar nocivos excessos de direito praticados que possam vir a ser praticados pelo
credor na perseguição da realização de seu crédito, deve o magistrado, com uso do
contraditório e, quando possível, da oralidade, sopesar os interesses em conflito e buscar
a satisfação do crédito, respeitando a dignidade do devedor.

É inegável, aqui, a existência de conflito e, logo, de uma jurisdição contenciosa, onde os


interesses tanto do credor, como do devedor, podem, algumas vezes, ultrapassar as raias
do razoável (ainda mais considerando que se está em um processo ou em uma fase
processual cujo objetivo é concretizar o direito já obtido por força de um título, judicial
ou não); deste modo, devem os ânimos das partes ser sempre contidos por um julgador
que não seja nem passivo, nem tampouco omisso.47

O Poder Judiciário tem a árdua tarefa de assegurar a ambas as partes, exequente e


executado, as garantias individuais ao longo de todo o processo, inclusive na sua fase de
cumprimento de sentença, na qual devem os atos executórios ser praticados a favor do
credor, mas com a menor onerosidade possível ao devedor.

Entretanto, o magistrado deve fazê-lo sem assumir um papel paternalista (no qual acabe
colocando em desvantagem o credor e dificultando a realização de seu crédito),
tampouco sem relegar em segundo plano o justo pleito do credor de receber o que lhe
fora assegurado em sentença.

Como bem explicado por DIDIER JR., CUNHA, BRAGA e OLIVEIRA, não se pode
confundir o princípio da menor onerosidade do devedor com a sua compreensão
equivocada de que seria uma suposta “cláusula geral de proteção ao executado”, uma
vez que o princípio de menor onerosidade possível ao devedor, previsto no art. 805,
CPC, é uma cláusula geral que serve, na verdade, para coibir o abuso do direito pelo
exequente, mas não para eximir o devedor de sua obrigação.48

É por esta razão que o novo CPC, no parágrafo único do art. 805, exige que o devedor,
ao alegar a gravidade da medida executiva sofrida ou prestes a sofrer, indique outros
meios que se mostrem mais eficazes e menos onerosos para a satisfação do credor, sob
pena de os atos executivos já determinados serem mantidos.

Em resumo, para que um processo executório ou um processo em fase de cumprimento


de sentença seja considerado um processo justo (ou équo), não basta que seja dado
razão a quem tenha razão, mas que este reconhecimento de quem tem razão em seus
pedidos e em seus argumentos seja prestado mediante um devido processo legal, 49 com

47
Vide a respeito, Contraditório e Execução. Op. cit. Cap. 4 (pp. 47-52).
48
DIDIER JR.; et alii. Curso de Direito Processual Civil. 2. ed. Salvador, Editora JusPodivum, 2009. v.
5. p. 56.
49
RODRIGUES, Marcelo Abelha. “O Devido Processo Legal e a Execução Civil” in SANTOS, Ernane
Fidélis; WAMBIER, Luiz Rodrigues; et WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (orgs). Execução Civil. São
Paulo: RT, 2007. p. 113.
efetivo diálogo ou contraditório entre exequente, executado e magistrado50 e respeito à
dignidade da pessoa tanto do credor, como do devedor.

8. Liquidação de sentença. O ideal seria que toda sentença proferida que condenasse ao
pagamento de determinada quantia tivesse, em seu bojo, este valor já líquido ou
facilmente calculável; em algumas situações, entretanto, a sentença acaba por ser
proferida de forma ilíquida (art. 491, parte final do caput e incisos), uma vez que é
possível julgar o pedido procedente, mas sem que o juiz tenha aos autos elementos que
o auxiliassem a quantificar a condenação em quantia certa a ser paga pelo devedor.

Para estas situações, quando não estiver determinado na sentença, nem puder ser
determinável por simples cálculos o valor da obrigação a ser adimplida, o CPC prevê
nos seus arts. 509 a 512 a instauração de uma fase processual de liquidação de sentença.

Todavia, ao contrário do que ocorria no CPC-1973 anteriormente à sua reforma de


2005, a fase de liquidação é excepcional, devendo sempre ser dispensada quando a
liquidez da sentença for possível com a mera apresentação de cálculos aritméticos (art.
509, § 2º, CPC).

Aliás, corrigindo equívoco existente por conta de algumas omissões existente no texto
dos artigos acrescidos ao Código de 1973 pela Reforma de 2005, que foram aos poucos
sendo reparadas pela doutrina e pelos julgamentos reiterados nos Tribunais Superiores,
o credor somente poderá iniciar a fase executória, segundo a dinâmica do novo CPC,
caso liquide o valor da dívida, devendo sempre apresentar memória de cálculos
discriminada e atualizada (art. 524, CPC).

A novidade é que, para isso, o exequente contará com programa de atualização


financeira que, segundo o art. 509, § 3º, CPC, será posto à disposição das pessoas pelo
Conselho Nacional de Justiça, o que facilitará a rápida solução de conflitos, pois haverá
um instrumento, com o mesmo critério de cálculos, que poderá ser utilizado comumente
tanto pelos litigantes, como pelo Juízo.

Duas são as hipóteses de liquidação no novo CPC: a liquidação por arbitramento, que
terá lugar quando houver determinação em sentença, convenção das partes ou decorrer
da própria natureza do objeto da liquidação (art. 509, I); e a liquidação pelo
procedimento comum, quando for necessário alegar e provar fatos novos, não tratados
na fase processual de conhecimento (art. 509, II), mas sem discutir novamente a lide já
julgada, nem modificar a sentença (art. 509, § 4º).

Caso seja necessária a instauração da fase processual de liquidação em uma das


hipóteses acima mencionadas, vale recordar que ela pode ser iniciada inclusive na
pendência de recurso, mesmo que, excepcionalmente, o recurso apresente efeito
suspensivo (art. 512, CPC). Nestes casos, a liquidação será processada em autos

50
Contraditório e Execução. Op. cit. p. 49
apartados no juízo de origem, enquanto os autos principais são remetidos ao órgão
recursal.

O mesmo ocorre na hipótese de haver, na sentença, uma parte líquida e outra ilíquida,
situação na qual o credor poderá promover, ao mesmo tempo, a execução daquela
primeira parcela nos próprios autos e a liquidação da parte ilíquida em autos apartados
(art. 509, § 1º, CPC). Trata-se de consequência do princípio da unilateralidade do
interesse na atividade executória, visto supra, uma vez que o credor não é obrigado a
aguardar a liquidação de parte de seu crédito para que possa iniciar a execução de outra
obrigação ou crédito também concedido em sentença.

9. Classificações da Execução Civil. As primeiras classificações já foram,


incidentalmente, expostas no capítulo 6, supra. Assim, a execução civil pode ser
classificada quanto ao título do qual se origina, bem como quanto à especialidade
da execução.

Quanto ao título, a fase processual executória denominada no CPC como cumprimento


de sentença (arts. 513 ao 527 e arts. 536 ao 538) tem justamente como finalidade dar
cumprimento às obrigações previstas em título executivo judicial (em regra, a sentença
da fase cognitiva do processo do qual a fase de cumprimento se originou) e ainda se
diferencia, basicamente, do processo de execução apenas quanto aos atos iniciais,51
tanto que, segundo os arts. 513 e 771, CPC, ao cumprimento de sentença aplicar-se-ão
subsidiariamente as regras previstas no Livro II do CPC, que trata, justamente, do
processo de execução.52

Por outro lado, o processo de execução tem lugar quanto se tratar de execução dos
títulos executivos extrajudiciais, consoante exposto expressamente no art. 771, CPC.

A grande diferença entre os dois modelos de execução, em nossa opinião, continua


sendo a dispensa de nova citação no cumprimento de sentença quando se tratar de fase
de continuação do mesmo processo.53

Já quanto à especialidade, em regra, a execução civil (seja por título executivo


judicial, seja por extrajudicial) encontrará lugar dentre os procedimentos executórios
ordinários ou comuns previstos no CPC.

51
DIDIER JR. et alii. Curso... Op. cit. p. 505.
52
Ou seja, todo o procedimento de penhora, avaliação e satisfação do exequente (seja com a adjudicação,
seja com a alienação do bem penhorado), regido nos arts. 831 ao 909 do CPC (Livro II), aplicar-se-ão
tanto na fase de cumprimento de sentença, como no processo de execução.
53
Salvo, por evidente, quando se tratar de títulos produzidos ou homologados fora de um processo
nacional de natureza civil, como, e.g., a sentença penal condenatória transitada em julgado, a sentença
arbitral e a sentença (ou decisão interlocutória) estrangeira devidamente homologada. No caso destes
títulos, aplica-se a regra do art. 515, § 1º, CPC, segundo a qual “[n]os casos dos incisos VI a IX, o
devedor será citado no juízo cível para o cumprimento da sentença ou para a liquidação no prazo de 15
(quinze) dias.”
Há casos, contudo, que, devido a características especiais da obrigação a ser executada,
o Direito Processual tenha regras que lhe confira tratamento diferenciado.

É o caso dos procedimentos executórios especiais, que têm sede tanto no próprio CPC
(como na execução de prestação de alimentos e das execuções de particulares contra a
Fazenda Pública, que se submete ao rito próprio), como em leis esparsas (e.g. a
execução fiscal, onde a Fazenda Pública é credora, prevista em lei própria).

Há, entretanto, outras classificações. Uma classificação importante da fase processual


de cumprimento de sentença é aquela quanto aos efeitos práticos. Segundo este
critério, o cumprimento de sentença pode ser classificado como sendo provisório ou
definitivo.

O cumprimento provisório de sentença poderá ser promovido pelo exequente quando se


tratar de sentença judicial cível que ainda não transitou em julgado, mas que esteja
pendente de julgamento de recursos desprovidos de efeito suspensivo (art. 520, CPC).

O principal efeito de provisoriedade do cumprimento de sentença é que ele correrá por


iniciativa e também por conta e responsabilidade do exequente (art. 520, § 1º, CPC). Em
outras palavras, caso a sentença seja reformada em sede recursal, o exequente se
obrigará a reparar eventuais danos que o executado tenha sofrido, que deverão ser
liquidados, por procedimento comum, nos mesmos autos.

Por outro lado, será definitivo o cumprimento quando a sentença tiver transitado em
julgado.

Em ambas as hipóteses de cumprimento de sentença, serão devidos a multa legal de


10% e honorários advocatícios também em 10% sobre o valor executado se não houver
o depósito (no caso do cumprimento provisório) ou o pagamento (no caso do
cumprimento definitivo) no prazo de 15 dias (art. 520, § 2º e 523, §1º, respectivamente).
Trata-se de mudança em relação ao sistema anterior, no qual a multa e os honorários
não eram devidos no cumprimento provisório da sentença.

Apesar de óbvio, é importante notar que esta classificação não tem serventia no
processo de execução de títulos extrajudiciais, visto que sempre será definitiva a
execução levada a efeito por meio deste procedimento.54

Por fim, uma classificação também muito importante por conta de seus efeitos práticos
é a que leva em conta a natureza jurídica da obrigação a ser cumprida.

Os procedimentos de execução civil em sentido lato podem ser divididos em espécies de


execução com base na natureza da obrigação ou da prestação devida.

54
No entanto, no processo de execução de títulos executivos extrajudiciais, o devedor poderá reduzir os
honorários advocatícios pela metade caso pague integralmente a dívida nos três dias contados da sua
citação (cf. art. 827, § 1º).
Segundo o Direito Civil, as obrigações são classificadas em obrigações de fazer (arts.
247 a 249 do Código Civil - CC), de não fazer (arts. 250 e 251, CC) e de dar (arts. 233
e seguintes, CC).

Se a prestação devida na relação material que originou a execução era de fazer, tratar-
se-á de um processo de execução (arts. 815 a 821, CPC) ou de uma fase de
cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de uma obrigação de fazer; do
mesmo modo, se a obrigação era de não fazer, deverá o exequente se valer do processo
de execução (arts. 822 e 823, CPC) ou fase de cumprimento de sentença que condenou a
uma obrigação de não fazer. Quando se tratar de fase de cumprimento de sentença,
ambas serão reguladas pelas normas dos arts. 536 e 537, CPC.

Porém, em se tratando de obrigação de dar, um segundo critério deverá ser usado para
distinguir as espécies executivas que têm origem em relações materiais cuja prestação é
a entrega de algum bem. E esse critério é justamente qual tipo de bem deveria ter sido
entregue, ou seja, o objeto a ser demandado em cumprimento de sentença ou em
processo de execução.

Se o bem já era do credor por direito de propriedade ou de posse,55 mostrar-se-á


adequado a execução “lato sensu” para entrega de coisa certa (art. 498 e arts. 806 a
810, CPC) ou de coisa incerta (isto é, coisas determináveis ou, segundo o art. 498,
parágrafo único, e o art. 811, CPC, determinadas pelo gênero e pela quantidade).

No entanto, se recair sobre dinheiro ou valores pecuniários, estar-se-á diante de hipótese


de execução, em sentido lato, para o pagamento de quantia certa (arts. 520 a 527 e arts.
824 a 909, CPC).

As execuções civis lato sensu por quantia certa ainda se subdividem, pela última vez, de
acordo com a condição econômica e patrimonial do devedor, quando este for pessoa
física.

Assim, a lei prevê, de um lado, a hipótese de solvência do executado, cuja execução se


dará normalmente por intermédio da fase de cumprimento de sentença ou de processo
executivo de pagamento de quantia certa contra devedor solvente, cujas normas foram
discutidas ao longo deste trabalho; todavia, por outro lado, caso o devedor se encontre
insolvente, dever-se-á, neste caso, dar procedimento nunca a uma fase de cumprimento
de sentença, mas a um processo de execução por quantia certa contra devedor
insolvente ou à sua insolvência civil (ainda reguladas pelos arts. 748 a 786-A, do antigo
CPC-1973, até que, consoante regra expressa no art. 1.052, CPC, haja a edição de lei
específica que trate das execuções contra devedor insolvente).

A grande diferença entre estas duas modalidades de execução é que, enquanto o


cumprimento de sentença ou o processo executório por quantia certa contra devedor
solvente é individual e singular (isto é, diz respeito apenas ao polo exequente e atinge
apenas os bens necessários para satisfazer o seu crédito), a insolvência civil, por outro

55
DINAMARCO. Instituições... Op. cit. p. 464.
lado, além de ser feita em um processo de execução próprio (cf. antigo art. 754, CPC-
1973), a ser instruído por um dos seus credores com o título judicial ou extrajudicial que
comprova a existência da dívida, é coletiva e universal, assemelhada a um processo de
recuperação judicial ou de falência de uma pessoa jurídica, pois todos os credores são
chamados a satisfazerem os seus créditos diante de todo o patrimônio disponível do
devedor.

10. Conclusões sobre o tema. O novo Código de Processo Civil brasileiro precisa ser
lido e interpretado com mentes abertas, desarraigadas de preconcepções e de
preconceitos oriundos do Código anterior. Trata-se de um novo momento no Processo
Civil brasileiro, com mudanças de regras processuais (em alguns casos, drásticas e
radicais), as quais não podem mais ser interpretadas como eram no modelo processual
anterior.

Não obstante, isto não significa que tenhamos uma “nova” Teoria Geral do Processo,
nem mesmo uma nova Teoria (Geral) da Execução.

Além das garantias e dos princípios processuais previstos tanto na Constituição Federal,
como no Capítulo do CPC acerca das normas fundamentais do Processo Civil, a
Execução Civil – seja qual for o seu procedimento – deve se pautar também nos seus
próprios princípios norteadores que, felizmente, também se encontram normatizados no
texto do CPC.

Trata-se importante conhecer a fundo a Teoria Geral do Processo e, de modo especial, a


Teoria Geral da Execução. Ao prezado leitor, espero que este trabalho tenha cumprido,
mesmo que sucintamente, esta função de fazer uma introdução da Execução Civil no
novo Código de Processo Civil de 2015 sob os fundamentos da Teoria Geral da
Execução de modo a auxiliá-lo a melhor compreender o tema, bem como os demais
trabalhos a respeito das diversas espécies de procedimentos executivos previstos no
CPC.

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