Você está na página 1de 7

Chove. É dia de Natal.

 
Lá para o Norte é melhor: 
Há a neve que faz mal, 
E o frio que ainda é pior. 
Fernando Pessoa

Para onde levaste a criança que foste 


Em vez da tua voz que ciprestes sã o estes 
Como dizer Natal se te nã o vejo hoje 
Como dizer Natal agora que morreste 

David Mourão-Ferreira, in 'Cancioneiro de Natal'

Quando na mais sublime dor, 


A mulher dá à luz, 
Há sempre um Anjo Anunciador 
A murmurar-lhe ao coraçã o — Jesus! 
António Manuel Couto Viana, in 'Mínimos' 

Cada criança é o Céu que vem 


Pra nos remir do pecado 
E as palhas d’oiro de Belém 
Espalham-se no berço, como um Sol espelhado 

António Manuel Couto Viana, in 'Mínimos' 

É Natal, nunca estive tã o só. 


Nem sequer neva como nos versos 
do Pessoa ou nos bosques 
da Nova Inglaterra. 
Deixo os olhos correr 
entre o fulgor dos cravos 
e os dióspiros ardendo na sombra. 

Eugénio de Andrade, in 'Rente ao Dizer' 


Natal, antes e agora 
imutável. Feliz 
noite branca sem hora 
no pátio da Matriz. 
Natal: os mesmos sinos 
de repiques iguais. 
Brinquedos e meninos, 
Natal de outros natais. 

Mauro Mota, in 'Itinerário' 

Hoje é dia de ser bom.


É dia de passar a mã o pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

António Gedeã o

NATAL...Natal...
Na província neva.
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados.
Coraçã o oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
'Stou só e sonho saudade.

Fernando Pessoa

E bastou
Esse palmo de sonho
Para encher este mundo de alegria;
Para crescer, ser Deus;
E meter no inferno o tal das tranças,
Só porque ele nã o gostava de crianças.

Miguel Torga

Natal Natal (diziam). E acontecia.


Como se fosse na palavra a rosa brava acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcã o. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.

Manuel Alegre

Dai-nos, Senhor, a paz que vos pedimos


A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos

A paz sem vencedor e sem vencidos


Sophia de Mello Breyner

Recado para o menino Jesus


Menino Jesus do céu
Dá-me um aviã o
Ou um automóvel
Ou mesmo um balã o
Um barco a motor
O que te der jeito
Qualquer prendazita
Fico satisfeito
Menino Jesus do céu
Escrevi-te lindo postal
Para me mandares brinquedos
No dia de Natal

-“ Minha mã e, por que Jesus,


Cheio de amor e grandeza,
Preferiu nascer no mundo
Nos caminhos da pobreza?
Por que nã o veio até nós
Entre flores e alegrias,
Num berço todo enfeitado
De sedas e pedrarias”?
- “Acredito, meu filhinho,
Que o mestre da caridade,
Mostrou em tudo e por tudo,
A luminosa humildade!…
À s vezes penso também,
Nos trabalhos deste mundo,
Que a manjedoura revela
Ensino bem mais profundo!”
E a pobre mã e de olhos fixos
Na luz do céu que sorria,
Concluiu com sentimento
Em terna melancolia:
- “Por certo, Jesus ficou
Nas palhas, sem proteçã o,
Por nã o lhe abrirmos na Terra
As portas do coraçã o”.

Joã o de Deus

Eu hei-de dar ao Menino


Eu hei-de dar ao Menino
Uma fitinha pró chapéu;
E ele também me há-de dar
Um lugarzinho no céu.

FALAVAM-ME DE AMOR
Quando um ramo de doze badaladas se espalhava nos móveis e tu vinhas
solstício de mel pelas escadas de um sentimento com nozes e com pinhas,
menino eras de lenha e crepitavas
porque do fogo o nome antigo tinhas
Natália Correia

NATAL À BEIRA-RIO
É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infâ ncia ressurrecta.
David Mourã o-Ferreira

Batem leve, levemente,


como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

Augusto Gil in Luar de Janeiro

– Oh mãe, estou pr’a ver


Que prendas vou ter.
Que prendas terei?
– Não sei, não sei…
Num qualquer lado,
Esquecido, abandonado,
O Deus-Menino
Murmura baixinho:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

João Coelho dos Santos in Lágrima do Mar 


O sono está a chegar.
Tantos restos por mesa e chão!
Cada um vai transportar
Bem-estar no coração.
A noite vai terminar
E o Menino, quase a chorar:
– Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

João Coelho dos Santos in Lágrima do Mar 

Os três reis Magos seguiram


Uma estrela até Belém
Onde estava o Deus Menino,
José e Maria sua Mãe.
Um curral, tanta pobreza!
Exemplo de humildade
Foi aquilo que Jesus quis
Transmitir à Humanidade
Ouro, incenso e mirra
Ofereceram a Jesus
Ele que é o Rei do Mundo
E que a todos dá a Luz!

 Oração de Natal

Vamos ver a Estrela!


Sairemos pelas estradas, cantando,
Sairemos de mãos dadas,
E acordaremos as brancas e tímidas ovelhas.
Iremos surpreendê-Lo, Pequenino e Simples,
Sua Inocência Iluminará os caminhos felizes, dormindo.
Vamos ver a Estrela!

Augusto Frederico Schmidt in Poemas em Louvor de Jesus Cristo

Noite clara em Belém. Canta em surdina


o luar no firmamento constelado.
Natal – noite de luz, noite divina.
Cristo – um lírio na treva do pecado.
Brilha agora, no céu da Palestina,
meigo, intenso clarão abençoado:
do espaço, a estrela aos simples ilumina
o berço do Senhor recém-chegado.
Os reis magos e os cândidos pastores
dão-lhe incenso, ouro e mirra, hinos e flores…
e o Menino, alegrando-se, sorria…
José fitava o céu, todo ventura.
E as estrelas, chorando de ternura,
cintilavam nos olhos de Maria.

Anderson Braga Horta

Os crescidos dizem
que o Pai Natal não pode estar em todas as lojas
ao mesmo tempo.
Mas eu acho que isso é um disparate,
porque toda a gente sabe
que os Pais Natais das lojas são a fingir!

Nathalie Delebarre in Eu sei tudo sobre o Pai Natal

Estando a Virgem
À borda do rio
Lavando os cueirinhos
Do seu Bento filho
A Virgem lavava
São José estendia
O Menino chorava
Com frio que fazia
A Virgem ao peito
O foi conhecer
E logo o Deus Menino
Deixou de chorar.
Cantiga dos pastores

Menino Jesus, que nasces


Quando eu morro,
E trazes a paz
Que não levo,
O poema que te devo
Desde que te aninhei
No entendimento,
E nunca te paguei
A contento
Da devoção,
Mal entoado,
Aqui te fica mais uma vez
Aos pés,
Como um tição
Apagado,
Sem calor que os aqueça.
Com ele me desobrigo e desengano:
És divino, e eu sou humano,
Não há poesia em mim que te mereça.

Antonio Gedeão
Descalço venho dos confins da infância,
E a minha infância ainda não morreu…
Em face e atrás de mim ainda há distância.
Ó Menino Jesus da minha infância,
Tudo o que tenho (e nada tenho!) é Teu!

Pedro Homem de Mello

Prelúdio de Natal
Tudo principiava
pela cúmplice neblina
que vinha perfumada
de lenha e tangerinas
Só depois se rasgava
a primeira cortina
E dispersa e dourada
no palco das vitrinas
a festa começava
entre odor a resina
e gosto a noz-moscada
e vozes femininas
A cidade ficava
sob a luz vespertina
pelas montras cercada
de paisagens alpinas
David Mourão-Ferreira

Você também pode gostar