1 - Analise o papel da Economia Política Internacional
considerando duas das opções abaixo:
A) Seu papel histórico na formação da Economia Política e da
história do pensamento econômico;
B) Seu papel como elemento de compreensão da crise dos anos
setenta;
C) O papel da “hegemonia” enquanto conceito componente das
relações internacionais.
A criação da Economia Política deve ser entendida observando as
transformações dialéticas em curso no século XVIII e XIX. A ascensão da classe burguesa - a controladora dos meios de produção - o advento do sistema fabril e do modo de produção capitalista geraram mudanças colossais a ponto de novas perguntas serem feitas para explicar tais mudanças.
Edgar Decco em sua obra A Ciência da Produção: Fábrica Despolitizada
diz que a Economia Política nasceu inicialmente como uma ciência burguesa, fruto da classe dominante, preocupada em legitimar a criação das fábricas e desqualificar a ação dos trabalhadores "quebradores de máquinas", os famosos luddistas. Para esses intelectuais orgânicos da burguesia, ir contra as fábricas era praticamente como ir contra o curso normal da História e da natureza.
Decca identifica ainda que a ascensão da burguesia e sua fixação como
classe dominante e dirigente não se deve apenas a questões meramente materiais e econômicas, mas também a um longo processo de mudança cultural e imposição ideológica de dominação. Durante os períodos de ápice da exploração, uma série de revoltas operárias se iniciou. Uma delas foi o luddismo, a ideia de que as fábricas são as causadoras dos problemas atuais de exploração, logo elas deveriam ser destruídas. Muitos incêndios e violência contra patrões se iniciaram a partir daí. Essa ação foi por muito tempo criticada, inclusive por Marx em O Capital, como sendo uma ação de cunho pouco político.
Com essa ideia de progresso e modernidade propagada pela Economia
Política sobre as fábricas, uma série de acusações morais era feita àqueles que não se encaixavam no novo padrão de dominação mundial. Adjetivos como: preguiçoso, vagabundo e arruaceiro eram frequentemente atribuídos aos trabalhadores fabris como forma de desmoralização das ações dos mesmos como comenta Edgar Decca em sua obra:
“Nesse período de intensa agitação social, entre a segunda metade do século
XVIII e os meados do século XIX, nasce uma nova ciência – a Economia Política – que vai fazer a defesa da fábrica, elaborando argumentos para convencer os setores amedrontados da sociedade de que os trabalhadores ingleses lutavam contra a irreversibilidade de uma lei da própria História. E mais, a economia política nasce como um saber que pretende oferecer respaldo aos patrões no interior de uma sociedade que vê com olhos profundamente desconfiados a vitória do sistema de fábrica.”
Foi com esse discurso pautado na pretensa ideia de ciência e progresso
que o controle dentro dos muros das fábricas era exercido. E em meio a esse monopólio da técnica e progresso das fábricas, nasce a Economia Política, sempre se autodefinindo como uma ciência independente, porém exercendo o papel de porta-voz dos interesses burgueses ao defender que toda a sociedade deveria se focar no econômico, ou seja, nas fábricas.
É interessante comentar, que embora a Economia Política tenha surgido
como uma ciência burguesa, alguns autores tentaram, por sua vez, criar uma espécie de Economia Política dos oprimidos, ou seja, uma análise a partir de outro ponto de vista ideológico. Marx, autor de clássicos como O Capital, foi um dos fundadores da teoria valor-trabalho. Para ele, o preço de algum produto é determinado em última instância pelo seu caráter quantitativo, ou seja, quanto mais trabalho, mais valor agregado terá um produto. Embora essa teoria tenha começado com David Ricardo e Adam Smith, clássicos da Economia Política, Marx procurou analisá-la sob outro aspecto, com a ideia de que o preço decorre do tempo de trabalho socialmente necessário para sua produção, o que significa valor de uso mais valor de troca.
Contemporâneos a Marx encontram-se os marginalistas, da conhecida
Revolução Marginalista. Para eles, o preço de um produto decorre principalmente da sua utilidade para o consumidor, ou seja, esses pensadores ignoram o trabalho e o tempo de trabalho existente para a produção. Para exemplificar essa ideia, seria o mesmo que vender uma fatia de queijo para um homem morto de fome em um deserto. A primeira fatia teria uma grande utilidade, já a segunda, também teria, porém menos. A trigésima fatia quase não teria utilidade nenhuma, a centésima poderia até ter uma utilidade marginal negativa.
A Economia Política Internacional, que veio da Economia Política clássica,
tem como objetivo entender a relação entre o nacional e o internacional no que diz respeito à economia e política. Para exemplificar, explicação de Jean Coussy mostra bem a definição da EPI:
“A Economia Política Internacional é o ‘estudo das interações (interplays) do
econômico e do politico na arena mundial’”. Ela propõe-se então a analisar ao mesmo tempo as interações entre o político e o econômico e as relações entre o nacional e o internacional. Ela é às vezes denominada economia política global ou economia mundial para dar conta da erosão das nações. ‘’
No artigo O Valor do Conceito de Hegemonia Para as Relações
Internacionais de Luiz Augusto Estrella Faria, o conceito de hegemonia nas relações internacionais é tratado a partir de uma ótica gramsciana. O autor começa fazendo uma introdução à ideia gramsciana de hegemonia. Para Gramsci, o que caracteriza a dominação na sociedade capitalista ocidental, não é apenas o controle do aparato repressivo do aparelho estatal, mas também um consenso entre os dominados, o que Marx chamaria de ideologia da classe dominante, ou seja, uma falsa visão da sociedade caracterizada pela deformação da realidade concreta em prol da classe dominante. Gramsci chama esse duplo processo de hegemonia, ou seja, a criação de um bloco hegemônico da classe dominante que usa o poder coercitivo e é legitimada pelo consenso.
Luiz Augusto Estrella Faria ainda comenta sobre a concepção marxista de
origem do Estado, presente na obra A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado de Engels. Para Engels a acumulação de terras foi em um primeiro momento devido à coerção física, porem para legitimar tal “conquista” foi criada posteriormente uma justificativa religiosa, o que se encaixa na fórmula de Gramsci para a longevidade de um Estado: armas e religião.
Estrella Faria tenta transpor essa relação de hegemonia para as relações
internacionais. Começa fazendo uma análise das diferentes relações entre os Estados desde o Império Romano. Observa que a partir da emergência da sociedade capitalista do interior da sociedade feudal, uma nova forma de governar começa a surgir. Estabelece o Tratado de Vestefália como um marco na historia das relações internacionais, pois a partir desse evento, uma especie de direito internacional fora criado, um consenso entre os impérios, o que resultou em uma melhor forma de exercício da dominação:
“O desenvolvimento desse novo ambiente para as relações entre as
nações abre um espaço original para a afirmação de seus poderes, aquele da criação da norma e aquele da sua obediência. Como lembrou Susan Strange (1994), o exercício do poder tem um aspecto relacional, a capacidade de obrigar o comportamento do outro, e um aspecto estrutural, a capacidade de decidir as regras do jogo. Esse passo adiante na evolução do sistema interestatal, a criação de um direito internacional como resultado da evolução das relações entre as nações, foi abrindo espaço à instauração do tipo de ordem internacional prevalente desde o século XIX, uma ordem em que o recurso da força vai sendo pouco a pouco substituído pela ideologia: a ordem hegemônica.” Com o advento da globalização e da mundialização do capital e seu respectivo modo de produção capitalista, percebe-se então a criação desse direito internacional, válido para todas as nações com raríssimas exceções. A questão da hegemonia nas relações internacionais deve também ser tratada com muita cautela, pois ela é uma análise deveras estruturalista, ou seja, ela enxerga a realidade da maneira mais generalizante possível afim de abstrair um entendimento geral da sociedade. O conceito de hegemonia passado para as relações internacionais é fundamental para entender a macroeconomia mundial, seja na visão da escola inglesa de Susan Strange, seja na visão de tradição marxista de Robert Cox.