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Capítulo 6 – Flexão Simples


6.1 – Diagramas de momento fletor e força cortante em vigas isostáticas
6.2 – Introdução à flexão
Flexão é o ato de dobrar, curvar. Quando uma estrutura fica solicitada por momento
fletor ela fica curvada. Neste caso, dizemos que a estrutura está flexionada. O objetivo deste
capítulo é obter as tensões e deformações que surgem nas estruturas quando estão solicitadas
por momento fletor. A flexão de uma estrutura pode ser pura, simples, oblíqua ou composta.

6.3 - Flexão pura

A flexão pura ocorre quando uma estrutura ou parte de uma estrutura fica solicitada
apenas por momento fletor. Este é o caso do trecho CD da viga abaixo. Neste trecho, a força
cortante é nula e o momento fletor é constante, como mostram os diagramas de esforços
internos. É interessante observar que para não ocorrer força cortante no trecho CD, as forças P
são simétricas e desprezamos o peso próprio da estrutura na presença das forças P.
Todas as estruturas que vamos abordar neste item e no próximo (flexão simples),
possuem, pelo menos, um plano de simetria longitudinal.

(a) Viga e carregamento

(b) Diagrama de momento fletor

(c) Diagrama de esforço cortante

Figura 6.1 - Viga sobre dois apoios e diagramas de esforços internos (M e V)


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P

x
z
y

Figura 6.2 – Viga em perspectiva

Hipóteses:

1- O carregamento atua em um plano de simetria longitudinal. Uma vez que queremos obter as
tensões que surgem na flexão pura, deve atuar apenas momento fletor, e se o carregamento
atuar fora do plano de simetria, a viga ficará solicitada também por momento de torção.
2- O carregamento é perpendicular ao eixo da viga. Se as forças P forem inclinadas teremos
componentes horizontais que são forças normais.
3- Seções planas permanecem planas depois de aplicado o carregamento. Esta hipótese é
chamada fundamental e deve-se ao fato que no trecho CD: T = V = 0. Estes dois esforços
provocam a deformação distorção (γ). Uma vez que no trecho CD estes dois esforços são
nulos, as seções transversais permanecem planas depois de aplicado o carregamento.
4- A maior tensão que surge na viga é a tensão de proporcionalidade. Portanto, podemos usar a
lei de Hooke.
5- O material da viga é homogêneo e os módulos de elasticidade à tração e à compressão são
iguais.
6- O carregamento é aplicado sem impacto.

Vamos analisar o trecho L - 2a, onde atua apenas momento fletor. A ação do momento
fletor faz com que este trecho da viga se curve (Figura 6.4). O momento fletor é constante neste
trecho, sendo assim, a curvatura é também constante.
A Figura 6.4 mostra que a parte inferior da viga aumentou de comprimento, enquanto a
parte superior diminuiu. Havendo variação de comprimento ∆L, temos deformação específica ε.
Portanto, podemos afirmar que o momento fletor produz tensão normal σ. Esta tensão provoca
a variação de comprimento. Uma vez que uma parte aumentou e outra diminuiu de comprimento
existe uma superfície que separa as duas regiões e não tem o seu comprimento alterado. Esta
superfície é chamada superfície neutra e está indicada na Figura 6.4 pelo arco CD.
O arco CD é dado por:

CD = r.θ
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P P

C y D
x E F
y

a L - 2a a

Figura 6.3

θ
O → centro da curvatura da
r superfície neutra.

M r → raio de curvatura da superfície


M neutra.
C D
E F

Figura 6.4

O arco EF, que está y abaixo do arco CD, é dado por:


EF = ( r + y) ⋅ θ
É interessante observar que esta variação linear de EF só é possível se a seção
transversal permanecer plana.
Por definição:
ε = ∆L L

Então, a deformação específica ε de EF é:


EF − CD
ε EF =
CD
Ou
( r + y) ⋅ θ − r ⋅ θ
ε EF =
r ⋅θ
Simplificando-se a expressão anterior, tem-se:

ε EF = y r
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Utilizando-se a lei de Hooke, σ = E ⋅ ε , pode-se obter a tensão normal que provocou o
alongamento de EF:

y
σ EF = E ⋅ (6.1)
r

A Figura 6.5 mostra um corte imaginário na viga da Figura 6.2. A linha neutra divide, na
seção transversal, as regiões tracionada e comprimida.

Linha neutra → Intersecção da


superfície neutra com a seção
transversal

L z N

Figura 6.5

Vamos impor a condição que:

∫ σ ⋅ dA = 0
A

Esta condição deve-se ao fato de não existir força normal atuando na seção transversal.
Uma vez que σ ⋅ dA = dF , a soma de todas as forças elementares dF é igual a zero.
Colocando-se a equação (6.1) na equação acima, tem-se:

E⋅y

A r
⋅ dA = 0

Por hipótese, o módulo de elasticidade E é o mesmo à tração e à compressão, portanto,


não varia na área. Sendo assim, a expressão acima pode ser colocada da seguinte forma:

E
r ∫A
⋅ y ⋅ dA = 0

Como o módulo de elasticidade E não pode ser igual a zero e o raio r não pode ser
infinito (neste caso não haveria flexão), tem-se que:


A
y ⋅ dA = 0

A integral acima é, por definição, o momento estático da área da seção transversal em


relação à linha neutra. O momento estático de uma área em relação a qualquer eixo que passa
pelo centróide é igual a zero. Portanto, a linha neutra passa pelo centróide da área da seção
transversal.
A outra condição a ser imposta é que:

∫ A
σ ⋅ y ⋅ dA = M
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Esta condição deve-se ao fato que σ ⋅ y ⋅ dA = dM e somando-se o momento de todas
as forças elementares tem-se o momento fletor aplicado. Ou, em outras palavras, a toda ação
corresponde uma reação em sentido contrário. A reação ao momento fletor aplicado é produzida
pela soma de todos os momentos das forças elementares. Colocando-se a equação (6.1) na
equação acima, tem-se:

E⋅y
∫A r
⋅ y ⋅ dA = M

Ou
E
⋅ ∫ y 2 ⋅ dA = M (6.2)
r A
Por definição:
∫A
y 2 ⋅ dA = I z

O eixo y tem origem na linha neutra da área da seção transversal, sendo assim, o
momento de inércia I z , calculado pela expressão acima, é o momento de inércia da área da
seção transversal em relação ao eixo horizontal do centróide.
Colocando-se a expressão acima em (6.2), o momento fletor assume a forma:

E
M= ⋅Iz
r
Isolando-se o raio da curvatura r, tem-se:

E ⋅ Iz
r=
M
Substituindo-se a expressão de r na expressão (6.1), tem-se:

E⋅y
σ=
E ⋅ Iz
M
Ou:
M⋅y
σ= (6.3)
Iz

Portanto, a tensão normal referente ao momento fletor varia linearmente em uma seção
transversal.

6.4 – Flexão simples

A flexão simples ocorre quando uma estrutura ou parte de uma estrutura fica solicitada
por momento fletor e força cortante. Este é o caso dos trechos AC e DB da estrutura da
apresentada na Figura 6.1. Vamos admitir, a priori, que a tensão normal nos trechos AC e DB,
da mesma forma que no trecho CD, varie linearmente.
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P P

f g f g
M M + dM
C D
x
y
A B
f g f g
dx dx

Figura 6.6

O momento fletor varia ao longo do comprimento dx. A tensão normal nas seções
transversais f-f e g-g são, respectivamente, dadas pelas expressões:

M⋅y ( M + dM) ⋅ y
σ= e σ=
Iz Iz
A força normal resultante na seção transversal é nula, conforme já visto. Entretanto, tem-
se força resultante em uma área genérica A | . A força resultante F (Figura 6.7) é dada pela
expressão:

M⋅y
F = ∫ | σ ⋅ dA = ∫ dA
A A| Iz
e a força resultante F + dF dada por:

F + dF = ∫
(M + dM ) ⋅ y dA
|
A IZ

F + dF

L N
|
A dx
A| dx
.
F

(a) (b)
Figura 6.7

Nas três faces externas do elemento da Figura 6.7(b) não ocorre nenhuma ação.
Portanto, no plano de corte e no sentido da força F existem tensões cisalhantes τ que mantêm o
equilíbrio de forças (Figura 6.8).
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F + dF

τ
F F + dF
dx
F
dx

Figura 6.8

O equilíbrio de forças na direção da força F fornece a expressão:

F + τ ⋅ b ⋅ dx − (F + dF) = 0
onde b representa a largura da seção transversal.
Colocando-se as expressões de F e de F+ dF na equação acima, tem-se:

My (M + dM ) y dA = 0
∫A| Iz
dA + τ b dx − ∫ |
A Iz
Simplificando a expressão anterior, tem-se:

dM y
τ b dx − ∫ dA = 0
A| Iz

O momento fletor e o momento de inércia não variam na área, isto é, dependem apenas
da coordenada x. Sendo assim, a expressão acima pode ser colocada da seguinte forma:
1 dM
b ⋅ I z dx ∫A|
τ= ⋅ ⋅ y ⋅ dA

A integral acima é, por definição, o momento estático da área A | em relação ao eixo z. A


derivada do momento fletor em relação à coordenada x fornece a força cortante, então:
V⋅Q z
τ= (6.4)
b ⋅ Iz
Uma vez que as tensões cisalhantes são iguais nos planos perpendiculares entre si
(Teorema de Cauchy), a seção transversal também está solicitada por τ (Figura 6.9). Estas
tensões τ produzem a deformação distorção (γ) fazendo com que as seções transversais
inicialmente planas não permaneçam planas depois de aplicado o carregamento.

dx
b

Figura 6.9

Entretanto, em alguns casos, a força cortante desempenha um papel secundário. Sejam,


por exemplo, as duas vigas da Figura 6.10. As duas vigas têm a mesma altura h e estão
solicitadas pela mesma força cortante (P). Na viga da Fig. 6.10(a), onde L >> h, o momento
fletor é predominante, desta forma as seções planas permanecem praticamente planas depois
de aplicado o carregamento.
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(a) (b)

Figura 6.10
Ensaios em laboratórios mostram que as expressões (6.3) e (6.4) podem ser usadas nas
estruturas em que:
L
≥5
h
Nas estruturas em que a relação acima é verificada são chamadas vigas.
OBS.: No cisalhamento puro (Fig. 6.10(b)), conforme já visto, a tensão de cisalhamento é dada
por: τ = F/A. Na flexão simples (M+V) a tensão cisalhante é dada pela equação (6.4).

6.5 – Distribuição das tensões de cisalhamento

A força cortante V, o momento de inércia I z e a largura b, no caso geral variam segundo


a coordenada x. Sendo assim, em uma seção transversal qualquer a tensão de cisalhamento
varia apenas em função do momento estático.

• Seção transversal retangular


O momento estático de uma área A | é dado por:
_
Q = A| ⋅ y
_
Onde y é a distância do centróide da área A | até o centróide da figura. Uma vez que o
momento estático tem variação parabólica a tensão cisalhante também varia segundo uma
equação do segundo grau. Nos pontos com coordenadas y = h/2 e y = −h/2 a tensão cisalhante
é nula. O valor máximo da tensão cisalhante é obtido nos pontos com coordenada y = 0, isto é,
a tensão cisalhante é máxima na linha neutra e seu valor é calculado da seguinte forma:
3V
τ máx =
2A

Figura 6.11 – Gráfico referente à distribuição das tensões σ e τ


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• Seção transversal em forma de " T" e " I"

c
τmáx

σ τ

c
τmáx

σ τ
Figura 6.12 – Gráfico referente à distribuição das tensões σ e τ

6.6 – Módulo elástico de resistência à flexão ( W )

Em uma viga solicitada por momento fletor a maior tensão normal é dada por:
M máx ⋅ d M máx
σ máx = =
I I
d
onde I é o momento de inércia da seção transversal e d é a distância da linha neutra até um
ponto localizado na superfície da viga. Por definição:
I
W=
d
M máx
Então: σ máx =
W
Se a seção transversal não tiver eixo de simetria horizontal é evidente que: Ws ≠ Wi .

Dimensão do módulo elástico de resistência à flexão ( W ): [L] 3


Para vigas com seção transversal retangular, tem-se:

bh 3
bh 2
Ws = Wi = 12 → Ws = Wi =
h 6
2
Para vigas de seção transversal circular, tem-se:

πD 4
πD 3
Ws = Wi = 64 → Ws = Wi =
D 32
2
Para uma viga com seção transversal em forma de “ T ”, com as dimensões mostradas na figura
abaixo, o momento de inércia em relação ao eixo z é igual a 6,15 x 10 − 3 m4. Então:
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6,15 x 10 − 3
Ws = → Ws = 2,83 x 10 − 2 m 3
0,217

6,15 x 10 − 3
Wi = → Wi = 1,61 x 10 − 2 m 3
0,383

6.7 – Deformações na flexão

Linha elástica: Por definição, linha elástica é a curva na qual se transforma o eixo da viga
depois de aplicado o carregamento.
P

o x d
vd
v d’ linha elástica

Onde:
v d : deflexão (flecha) do ponto d (componente vertical do deslocamento do ponto d).

A deflexão é uma função da coordenada x.

Métodos de cálculo
Método da integração direta
Método da energia
Métodos numéricos
Outros métodos.

Hipóteses
• Despreza-se a contribuição da força cortante no cálculo das deflexões;
• As deflexões são pequenas quando comparadas com as dimensões da viga (base,
altura e comprimento);
• É válida a Lei de Hooke.
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Método da integração direta

Para ΕΙ constante e analisando-se o sinal da segunda derivada (considerando-se o


sentido do eixo das deflexões ( v ) positivo para baixo), tem-se:

E I v| | ( x ) = − M ( x )

Condições de contorno (ou condições de extremidades)

v=0

v = v| = 0

Exemplos de deflexões (flechas) de vigas isostáticas com ΕΙ constante


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Contra-flecha

Durante a construção de uma viga recomenda-se provocar deslocamentos em sentido


contrário aos deslocamentos que ocorrerão quando for aplicado o carregamento. Este
procedimento é chamado de contra-flecha.

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