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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL, ENGENHARIA MECÂNICA

Análise Acústica do Espectro de Frequências


Emitido por um Violino
Lucas Ramos Vieira†, Carlos Eduardo de Almeida† ,William Henrique Vanoni† ,Willian Maia de Oliveira†


Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul - RS, Brasil

Resumo
Algo pouco explorado por músicos iniciantes são os diferentes de timbres alcançados, em um instrumento de cordas, em diferentes
posições e maneiras de se tocar uma mesma nota. Neste trabalho são apresentados os espectros de frequência da nota Lá executada de
maneiras distintas em um violino. Seus respectivos gráficos foram obtidos com a utilização do aplicativo de celular Advanced Spectrum
Analyzer PRO e de um Script no software Matlab. Posteriormente, os resultados obtidos com os dois recursos são comparados entre si.
Um dos resultados a ser destacado é o fato da amplitude do Lá fundamental, cuja frequência vale 442 Hz neste trabalho, ficar abaixo da
amplitude das demais frequências de pico quando é tocada a uma oitava acima (884 Hz), ou quando é executado seus harmônicos. Nas
comparações entre Matlab e o Spectrum Analyzer PRO, com relação aos valores de frequências que mais se destacam, os resultados
obtidos foram muito parecidos. Já para as amplitudes, algumas diferenças notáveis ocorreram e são mais detalhadamente discorridas ao
longo deste relatório.

Palavras-chave
Análise Acústica, Transformada Rápida de Fourier, Violino, Espectro Frequencial
padrão segue até dar origem ao seguinte sistema de afinação,
I. INTRODUÇÃO chamado de sistema pitagórico, ou sistema não temperado [1].
Na música ocidental, convencionou-se dividir a faixa de uma
frequência f0 até seu dobro (2*f0) em 12 notas musicais. A
distância entre uma nota e a seguinte é chamada de semitom, e
dois semitons formam um tom. Existem principalmente duas
formas de caracterizar a progressão de sons que o ouvido
humano ocidental pode perceber: a escala diatônica e a escala
cromática. Tabela 1: Escala Pitagórica

A escala diatônica é composta por 8 notas, sendo a oitava Entretanto, este sistema de afinação apresenta um problema
igual a primeira, que seguem um padrão de distâncias quando deseja-se transpor melodias de uma tonalidade para
composto por 5 tons e 2 semitons. A disposição destes tons e outra, devido aos intervalos não serem constantes. Para
semitons dentro da escala dá origem aos 7 modos gregos: resolver este problema definiu-se um intervalo i constante
Jônio, Dórico, Frígio, Lídio, Mixolídio, Eólio e Lócrio. entre cada uma das 12 notas da escala cromática. Isto é, após
os 12 semitons da escala, a razão de frequências deve ser 2/1,
Já a escala cromática é composta pela sucessão de todas as ou matematicamente i¹² = 2/1. Resolvendo para i obtém-se i =
12 notas existentes. Pode-se então dizer que a escala diatônica 2(1/12)*f ≅ 1,05946*f. Esta forma de afinar as notas chama-se
é um caso especial da escala cromática. sistema temperado [2]. Assim, é possível transpor músicas
Para o ouvido humano, a razão 2:1 de duas frequências entre todas as tonalidades sem implicar em intervalos
tocadas juntas possui um agradável efeito de harmonia. diferentes. O intervalo da nota de base, chamada de tônica, até
Fisicamente isso significa que a cada ciclo da nota que atinge o a quinta nota chama-se quinta justa neste sistema, em oposição
ouvido, dois ciclos da nota uma oitava acima são ouvidos. à quinta pura do sistema não temperado.
Outras razões igualmente harmônicas são 3:2 e 4:3, chamadas Muitos instrumentos são construídos a partir do sistema
de quinta pura e quarta pura respectivamente. Essas harmonias temperado, exemplificando, o piano, o violão e o acordeão.
inspiraram Pitágoras a criar um sistema de afinamento musical. Muitos outros, entretanto, usam o sistema não temperado,
Partindo-se de uma nota qualquer, sua frequência será a base como é o caso do violino, do trompete e do teremin. Na
para afinar as outras notas, ou seja, determinar suas prática, ambos os tipos de instrumentos podem coexistir
frequências. Seja f a frequência de uma dada nota, a quinta e a harmonicamente em uma orquestra, contanto que sejam
quarta nota deverão possuir uma frequência de 3/2*f e 4/3*f corretamente afinados. Isso significa que o músico que toca o
respectivamente. As outras quatro notas são afinadas a partir instrumento não temperado deve utilizar o intervalo contínuo
destas duas. A segunda nota obtém-se descendo uma quarta a que dispõe para se aproximar ao máximo das notas discretas
partir da quinta pura, ou seja (3/2*f)/(4/3) = 9/8*f. A sexta nota dos instrumentos temperados. Além disso, convencionou-se o
é uma quinta acima da segunda, (9/8*f)*(3/2) = 27/16*f. Este Lá 440 Hz como nota de referência para afinar todas as outras
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notas [2], embora seja possível fugir dessa regra em função do exatamente no meio;
objetivo da peça musical executada. I. O segundo harmônico de Lá foi tocado na corda de Ré,
deixando-se o dedo levemente sobre a corda à ⅓ da
Com este trabalho pretende-se avaliar as frequências pestana;
emitidas por um dado violino tocando a nota Lá de diferentes J. O terceiro harmônico de Lá foi tocado na corda de Sol.
formas. As gravações sonoras são tratadas e analisadas caso a Para tanto, a corda foi pressionada a uma distância de
caso, utilizando gráficos gerados através de um Script do 1/9 a partir da pestana e outro dedo foi deixado
software Matlab e também do aplicativo Advanced Spectrum levemente sobre ¼ do restante da corda;
analyzer PRO. Posteriormente, os gráficos são confrontados K. O Lá 884 Hz foi tocado pressionando-se a corda de Lá
para verificar se há similaridade entre eles. Utilizando dos exatamente na metade;
conhecimentos adquiridos ao longo da disciplina, correlaciona- L. O Lá 884 Hz foi tocado pressionando-se a corda de Mi
se os dados obtidos com a realidade subjetiva percebida da à uma distância de ¼ a partir da pestana.
audição.
A figura 2 representa visualmente a vibração das cordas que
II. MATERIAL E MÉTODOS cada uma das modificações mencionadas provoca. O ícone da
estrela indica as posições onde o dedo pressiona e/ou repousa
O violino da figura 1 indica as partes principais deste
sobre a respectiva corda.
instrumento e apresenta as cordas em cores, servindo de
auxílio para o texto que segue.
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As cordas do violino normalmente são afinadas com um
intervalo de quinta pura entre si, ou seja, 3 tons e um semitom Dois comentários sobre a figura 2 se fazem necessários.
Pitagóricos [4]. A corda azul, um Sol, foi afinada na frequência Primeiramente, como mencionado, as cordas do violino
de 196,44 Hz (G3). Na sequência, a corda verde é afinada em foram afinadas com intervalos de quinta pura, ou seja,
Ré a 294,67 Hz (D4). A corda amarela é o Lá 442 Hz (A4). utilizando o sistema não temperado. Além disso, todas as
Finalmente, a corda vermelha é um Mi 663 Hz (E5). modificações também implicam na utilização de intervalos
fracionários. A frequência fundamental das modificações
de A à G é sempre 442 Hz, enquanto o restante excita
primeiramente o Lá 884 Hz.

Fig. 1: Cordas do violino.


As 12 gravações foram enumeradas de acordo com o que foi
tocado:
A. A corda de Lá 442 Hz, foi tocada solta, passando-se o
arco do violino à meia distância entre o cavalete e a
escala, e nenhuma outra corda foi impedida de vibrar. Fig. 2: Vibração das cordas.
Esta gravação é tida como a referência para a
As imagens extraídas do aplicativo foram agrupadas na
comparação com as outras gravações;
figura 3, e as FFTs geradas pelo Script encontram-se na
B. O mesmo Lá é tocado, mas desta vez o arco foi
passado mais próximo ao cavalete; figura 4.
C. Novamente o Lá da segunda corda, mas com o arco Diferenças entre as medições do aplicativo e do Script
passando mais próximo à escala;
D. O Lá é tocado na corda de Ré, pressionando-se a corda A figura 4, gerada pelo script do Matlab, parece filtrar
à uma distância de ⅓ à partir da pestana; melhor os ruídos de fundo, pois percebe-se nitidamente
E. A mesma situação que em D., entretanto a corda de Lá os picos nas frequências que compõem o som da nota
foi abafada com um dedo da mão esquerda de modo tocada. Por outro lado, a figura 3 apresenta uma curva
que não vibre; contínua onde as frequências sobem e descem de
F. O Lá é tocado na corda de Sol, pressionando-se a corda maneira mais suave. Isto pode ser explicado pelo fato de
à uma distância de 5/9 à partir da pestana; o aplicativo usar janelas móveis grandes para obter a
G. A mesma situação que em F., entretanto a corda de Lá média das frequências.
foi abafada com um dedo da mão esquerda de modo
Diferenças entre as amplitudes das frequências de pico
que não vibre;
H. O primeiro harmônico de Lá foi tocado na corda Lá, também podem ser notadas. No aplicativo observa-se
deixando-se o dedo levemente sobreposto a corda e que a amplitude da frequência de 442 Hz fica em um
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valor muito próximo ou acima das outras nas Finalmente, as modificações (K) e (L) também excitam
modificações de (A) à (G), já no Matlab ele fica abaixo em primeiramente o Lá 884 Hz e são percebidos como mais
(B), (C), (D) e (F). No restante também nota-se diferenças agudos que (A). É difícil, entretanto, diferenciá-las entre si.
nas amplitudes. Em (J), por exemplo, a frequência com Possivelmente, a contribuição das frequências mais graves
mais alta amplitude é a de 884 Hz na figura 3, porém na auxiliam o ouvido humano na diferenciação dos timbres, e
figura 4 essa passa a estar na faixa de 2.652 Hz. visto que o Lá 442 Hz não vibra nesses dois casos, a faixa
de frequência disponível para o ouvido é menor. A julgar
Um motivo que pode estar contribuindo fortemente pelas figuras 4.a) e 4.l), há uma presença de picos maiores
para essas diferenças nas amplitudes pode ser o fato de o para as frequências a partir de 3.094 Hz no caso de (K).
aplicativo gerar os gráficos do espectro das frequências Novamente, a explicação pode se dar pela interação
diretamente pelo som captado pelo celular, enquanto o destrutiva da corda de Lá que vibra junto com a corda de
Matlab utiliza-se de uma gravação, que nesse caso foi Mi.
coletada por outro aparelho onde podem haver algumas
outras discordâncias, como a distância entre o dispositivo IV. CONCLUSÕES
e o instrumento no momento da execução da nota, por
exemplo. As frequências de pico detectadas, tanto no aplicativo
quanto no Script do Matlab, representam o que era
Comportamento das frequências.
esperado conforme a teoria envolvendo a nota avaliada,
Primeiramente, é trivial perceber a presença dos n no caso a frequência de 442 Hz e seus múltiplos.
harmônicos do Lá 442 Hz de referência nas figuras 3 e 4.
Ambas as metodologias de avaliação das FFTs
Os picos sempre aparecem nas frequências múltiplas da
produziram resultados equivalentes no que diz respeito
fundamental, ou seja, n*442, onde n = 1,2,3,... No caso da
aos picos de frequência, mas não no caso das amplitudes.
figura 4a), a frequência com a maior amplitude é o próprio
Isso pode ser explicado pelo fato de as gravações terem
Lá 442 Hz. Para as modificações (B) e (C), onde variou-se
sido executadas em aparelhos diferentes. De fato, a
apenas a posição do arco, a frequência fundamental perdeu
amplitude frente às outras frequências. A modificação (B) sensibilidade dos microfones para cada faixa de
é percebida como um som “metálico”, ou duro, enquanto a frequência pode variar entre modelos de smartphones.
(C) é um som mais “doce”. Isso pode ser atribuído à uma Além disso, a proximidade e a direção de cada aparelho
distribuição aproximadamente gaussiana na figura (4.b) não foi levada em conta.
em torno de 2.210 Hz, enquanto que na figura (4.c) No Script do Matlab pode-se visualizar melhor os picos
percebe-se uma marcação muito forte em 1.326 Hz. de frequências envolvidas no espectro, pois o software
A mudança de timbre provocada pelo Lá tocado na consegue filtrar de maneira adequada os ruídos de fundo.
corda de Ré e de Sol é perceptível, mesmo para um ouvido Já o aplicativo acaba detectando todos os sons do
não treinado. De fato, a modificação (F) soa mais “limpa” ambiente e não somente as notas envolvidas nas
que a (D), o que é corroborado pelas figuras (4.d) e (4.f), gravações.
pois nesta última as amplitudes até 1.768 Hz têm De modo geral, observa-se que as diferenças
aproximadamente o mesmo valor. Entretanto, quando a encontradas entre uma modificação e outra nos
corda de Lá é impedida de vibrar nas modificações (E) e
espectros gerados também se faz perceptível de forma
(G), dificilmente um ouvido não experiente poderia notar a
subjetiva ao ouvido humano.
diferença. As figuras (4.e) e (4.g) mostram que a diferença
mais marcante, em comparação com as figuras (4.d) e AGRADECIMENTOS
(4.f), foi um ganho na amplitude do Lá fudamental. Os autores gostariam de agradecer Anabel Röhrig pela
Possivelmente o fato de deixar a corda de Lá vibrar execução e gravação das notas no violino, e pelas
ocasiona interferências destrutivas com o Lá 442 Hz das informações valiosas sobre o instrumento.
cordas de Ré e Sol.
V. BIBLIOGRAFIA
Para as modificações (H), (I) e (J), nas quais os
harmônicos naturais de Lá são tocados em cordas [1] Iazzetta, F . (2000) . Http: // www3ecauspbr / escola de publicação
diferentes, o som é marcadamente mais agudo. Isso é e artes . Recuperado em 12 julho de 2020, de
http://www2.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/acustica/escalas/pit
explicado pelo fato de se tratar do Lá 884 Hz, como agorica.html
mencionado anteriormente. As figuras (4.h), (4.i) e (4.j)
[2] Iazzetta, F . (2000) . Escola de comunicações e artes da universidade de
denunciam o fato de o Lá 442 não participar do espectro
são paulo . Recuperado em 12 de julho de 2020, de
sonoro. (I) e (J) soam muito parecidos, mas a impressão é http://www2.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/acustica/escalas/tempera
que (H) é mais “limpo”. Novamente, olhando a figura da.html
(4.h), percebe-se que as amplitudes do espectro são mais [3] Iso . (1975) . CATÁLOGO DE NORMAS . Recuperado em 12 de julho de
uniformes em comparação com (4.i) e (4.j). Algo muito 2020, de https://www.iso.org/standard/3601.html
semelhante aconteceu com a modificação (3). [4] Nave, R . (c2016) . Hiperfísica . Recuperado em 12 de julho de 2020, de
http://hyperphy sics.phy-astr.gsu.edu/hbase/Music/violin.html
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Fig. 3:Imagem das 12 telas gráficas extraídas do Aplicativo


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b) c
a )
)

d) e f)
)

g h i)
) )

j) l) m
)

Fig. 4:Imagem das 12 telas gráficas extraídas do Software Matlab

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