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Investigação de falha no VLS-1

deverá se limitar ao acidente


da Folha de S. Paulo

Os procedimentos de investigação da falha que destruiu o terceiro protótipo do VLS-1 na sexta-


feira serão os mesmos usados nos dois fracassos anteriores com o foguete. Com isso, apenas o
lado técnico do problema deverá ser contemplado, sem uma avaliação do futuro do programa.

A comissão investigadora, estabelecida pela Aeronáutica e composta por engenheiros do CTA


(Centro Técnico Aeroespacial), do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e militares, terá
em princípio 30 dias para apresentar conclusões.

Os trabalhos já foram iniciados, sob o comando do coronel-aviador Antônio Carlos Cerri, diretor do
IAE (Instituto de Aeronáutica e Espaço) do CTA, localizado em São José dos Campos (SP).

Os especialistas estão trabalhando inicialmente com o material de vídeo produzido durante o


acidente. Até agora, as principais suspeitas estão sobre uma falha no sistema responsável pela
ignição de algum dos propulsores do primeiro ou segundo estágios.

O incêndio causado pela queima das 41 toneladas de propelente sólido dos quatro estágios do VLS-
1 matou 21 pessoas. Elas trabalhavam na preparação do veículo para uma tentativa de
lançamento, que deveria ser hoje.

Seria a terceira tentativa de lançar um satélite usando o foguete brasileiro. As duas anteriores,
ocorridas em 1997 e 1999, também falharam, mas os problemas aconteceram durante o vôo, e sua
destruição não provocou vítimas.

Nas duas ocasiões, uma comissão nos moldes da que se configura agora foi formada, com a
mesma organização, o mesmo enfoque e o mesmo prazo. Os resultados se concentraram no lado
técnico das falhas. Nada foi dito a respeito de problemas estruturais do projeto, que são ligados a
gerenciamento, orçamento e segurança.

Os relatórios deveriam servir para evitar os mesmos problemas nos protótipos seguintes. O sucesso
foi parcial e sintomático da natureza técnica e específica dos documentos: os defeitos de fato
foram diferentes em cada veículo, mas todos ocorreram no sistema pirotécnico, ligado à ignição.
Os relatórios nada disseram sobre a possibilidade de o programa induzir erros estruturalmente.

Em programas espaciais estrangeiros, as comissões investigadoras de acidentes normalmente vão


além dos aspectos técnicos e buscam as causas mais profundas dos problemas -- em especial
quando ocorrem mortes.

É o que foi visto nos EUA na destruição dos ônibus espaciais Challenger (1986) e Columbia (2003),
que juntos mataram 14 astronautas -- sete a menos que o acidente em Alcântara. Além de
determinar a causa imediata dos acidentes, a comissão, formada por pessoas independentes do
programa e não só engenheiros aeroespaciais ou militares, aponta que vícios e cultura interna
podem levar a Nasa (agência espacial americana) a negligenciar o nível de segurança adequado.

O impacto desses relatórios é visível. Após a investigação do Challenger, em 1986, os americanos


tiveram não só de corrigir o defeito dos propulsores que causaram a explosão, o que interrompeu
as missões por quase três anos, como foram obrigados a expandir o orçamento dos ônibus
espaciais para ampliar as verificações de segurança e rever a forma com que estavam conduzindo
os procedimentos que antecediam os vôos.

Depois disso, os ônibus espaciais voaram por 17 anos sem incidentes fatais, até a perda do
Columbia, em fevereiro deste ano. O relatório da comissão independente que investiga o caso nos
EUA deve ser divulgado nesta terça-feira. Antes mesmo do relatório, a Nasa já iniciou um processo
para que informações vitais de segurança cheguem mais facilmente aos tomadores de decisão.

Antes do incêndio em Alcântara, alguns engenheiros do CTA e do Inpe já trocavam impressões e


temiam o fracasso da missão, até mesmo um desastre. Entrevistados antes do acidente,
integrantes da Agência Espacial Brasileira e do CTA disseram que não havia razão para tais
temores

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