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27/06/2021 Folha de S.

Paulo - Mamonas excessivas - 4/2/1996

  São Paulo, domingo, 4 de fevereiro de 1996

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Mamonas excessivas
DALMO MAGNO DEFENSOR

ESPECIAL PARA A FOLHA

Há cerca de duas semanas, na maratona de reprises do "Onze e Meia",


assisti à pioneira entrevista de Jô Soares com os Mamonas
Assassinas, realizada em maio de 95.
Vestidos de Chapolim Colorado, alter-ego super-heróico de Chaves,
do SBT, eles falaram abobrinhas de toda espécie, fizeram macaquices
e tocaram "Robocop Gay" e "Vira-Vira".
Poucas risadas e minutos depois, me ocorreu que quem assistiu à
primeira exibição da entrevista dificilmente teria profetizado o
estrondoso sucesso do grupo, simplesmente porque é da natureza das
piadas, mesmo as muito engraçadas, só o serem na primeira audição.
Porém, Disraeli já disse, há mais de século, que "nenhuma
generalização é inteiramente verdadeira -nem esta"; e disse o
Beakman, um dia desses, que uma explosão "é quando as coisas
ficam muito grandes, muito depressa". Pois os Mamonas, juntando a
sapiência de um e de outro, explodiram.
Em pouco mais de seis meses, os rapazes de Guarulhos venderam
mais de 1,5 milhão de discos, fizeram mais de cem shows, tiveram
suas canções decoradas por legiões de crianças e adolescentes e
tornaram-se os queridinhos da TV -por atraírem audiência como pães
doces atraem abelhas.
Se algo havia de profético, na entrevista dos Mamonas a Jô Soares,
eram suas fantasias. Chapolim Colorado sempre aparece atendendo a
um dramático apelo: "E agora, quem poderá nos defender?".
Pois os programas musicais e paramusicais, uma vez esgotado o filão
"sertanejo", andavam carentes de um imã de audiência -e os
Mamonas vieram defendê-los.
Caso exemplar: em 4 de dezembro de 95, segunda-feira, o "Programa
Livre" com os Mamonas teve um pico de audiência de 21 pontos,
segundo o Ibope. De terça a sexta-feira, na mesma semana, a média
do programa foi de apenas 5 pontos.
Alguém pode argumentar que não se deve misturar pico e média, por
ser uma heresia estatística que costuma dar encrenca; bem o sabem os
formuladores de planos econômicos, que convertem preços por um
critério e salários pelo outro, e passam meses ouvindo reclamações
dos assalariados.
Troco, então, o exuberante pico de 21 pontos pelos ainda notáveis 15,
média de audiência na noite dos Mamonas. É comparável, e é o triplo
da média dos outros dias: dá e sobra para demonstra o "efeito
Mamonas".
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/2/04/tv_folha/4.html 1/2
27/06/2021 Folha de S.Paulo - Mamonas excessivas - 4/2/1996

Não foi por acaso que, em 21 de dezembro, eles estiveram novamente


no "Programa Livre"; no dia 22, no especial da Xuxa; no dia 23, no
"Sabadão" do Gugu, tendo duplas sertanejas na preliminar (maior
prova de prestígio, impossível); no dia 24, no "Domingo Legal"; e, no
dia 31, no "Réveillon do Faustão".
Antes da maratona de fim de ano, já haviam aparecido, além do
"Onze e Meia", em todos os telejornais, no "Domingão do Faustão",
na MTV e na estréia do "Ponto G", de Adriane Galisteu.
E teriam estado no "Nossa Língua Portuguesa", da Cultura, se o
professor Pasquale houvesse feito um "Especial Palavrão" de fim de
ano.
Assim como outras centenas de milhares de pais, comprei o CD dos
Mamonas atendendo a insistentes pedidos da prole.
Não sendo dotado de surdez seletiva, não tive como não conhecer
bem a obra: é um compêndio de baixaria e preconceitos.
A cada execução de "Pelados em Santos" ou "Vira-Vira", hits no toca-
discos e na TV, me lembro de minha adolescência, quando fiz a
família quase decorar "School's Out", do Alice Cooper, e "July
Morning", do Uriah Heep, e arranjo carga suplementar de tolerância.
Mas, que me perdoe o grande DJ lá de cima, ainda acho que é muito
castigo para pouco crime.

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