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Venha^ seja M inha luz

Santa Teresa de Calcutá

Venha* seja M inha luz


Os escritos privados da santa de Calcutd

Organização e comentários
Brian Kolodiejchuk

Tradução
Maria José Figueiredo

3* edição

petra
Título original: Mother Theresa: Come Be My Light

Direitos de edição da obra em língua portuguesa no Brasil adquiridos pela P e t r a


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CIP-BRASIL CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

Cl48v
3. ed.

Calcutá, Teresa de
Venha, seja minha lu z : os escritos privados da Santa de Calcutá / Teresa de
Calcutá ; organização Brian Kolodiejchuk; tradução Maria José Figueiredo. - 3. ed. - Rio
de Janeiro : Petra, 2016.

Tradução de: Mother Teresa: Come Be My Light


ISBN 978-85-8278-064-0

1. Cristianismo. 2. Catolicismo. I. Kolodiejchuk, Brian. II. Título.

16-34344. CD D : 248.4
CD U : 248.14

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la ii-fA * ^ * y ^ U < L o u ± .
Se eu alguma vez vier a ser santa, serei certamente uma santa da
"escuridão". Estarei continuamente ausente do Céu — para acender
a luz daqueles que se encontram na escuridão na terra.
S a nt a T e r e s a de C al cu t á
Para aqueles, especialmente os mais pobres dos pobres,
que se encontram em alguma forma de escuridão;
que possam encontrar consolo e encorajamento
na experiência e na fé de Madre Teresa.
Sumário

<Prefácio 11

In tro d u ç ã o 13

C a p ítu lo 1
“Segure a máo Dele e caminhe sozinha com Ele” 25

C a p ítu lo 2
Uma coisa muito bonita para Jesus 41

C a p ítu lo 3
“Venha, seja M inha luz” 53

C a p ítu lo 4
“Para levar alegria ao Coração sofrido de Jesus” 67

C a p ítu lo 5
“Não demore mais. Não me detenha” 93

C a p ítu lo 6
Rumo aos “buracos escuros” 115

C a p ítu lo 7
“A noite escura do nascimento da congregação” 133

C a p ítu lo 8
A sede de Jesus Crucificado 159
C apítu lo 9 187
“Meu Deus, quão dolorosa é esta dor desconhecida”

C apítu lo 10 215
“Cheguei a amar a escuridão”

C apítu lo 11 241
“À disposição Dele”

C apítu lo 12 273
“Deus usa o que é nada para mostrar a Sua grandeza”

C apítu lo 13 305
Irradiar Cristo

Conclusão 337

^ Ip ê n d ic e ^ í As Regras 343

.yipêndice Notas do retiro de Madre Teresa,


29 de março — 12 de abril de 1959 351

.A gradecim en to s 367

J fo ta s 373
'Prefácio

H á décadas, Madre Teresa e sua obra têm despertado grande interesse pú­
blico. Tendo em vista toda a atenção que a religiosa despertou em vida e,
em particular, na hora de sua morte aos 87 anos, uma questão se coloca:
qual era a origem da força que atraía tanta gente para ela? Madre Teresa
teria certamente preferido passar despercebida. Considerando-se apenas
“um lápis nas mãos de Deus”,* estava convencida de que Ele usava o seu
“nada” para mostrar Sua grandeza. Nunca se considerou a autora das coi­
sas que realizava e sempre tentou desviar a atenção que recebia para Deus
e para “a obra Dele” junto aos mais pobres dos pobres. Mas não estava
nos planos da Providência que ela permanecesse desconhecida. Pessoas de
todos os credos e de condições diversas reconheceram o amor altruísta e
a compaixão que a Madre tinha pelos pobres; admiraram sua simplicida-

* “Muito frequentemente me sinto como um pequeno lápis nas mãos de Deus. Ele escre­
ve, Ele pensa, Ele faz os movimentos. Eu só tenho que ser o lápis." (Discurso de Madre
Teresa - Roma, 7 de março de 1979)
12 Venha, seja M i n h a luz

de e autenticidade, sentiram-se atraídas pela alegria e pela paz que dela


irradiavam. Ao mesmo tempo, todos que entravam em contato com ela,
mesmo que apenas uma vez, ficavam com a impressão de que havia algo
mais por trás daquele olhar penetrante.
Madre Teresa náo podia esconder a obra que fazia entre os pobres,
mas conseguiu — e com espantoso êxito — manter ocultos os aspectos
mais profundos da sua relação com Deus, decidida como estava a impe­
dir que olhos mortais conhecessem esses segredos de amor. O arcebispo
Ferdinand Périer de Calcutá — já falecido — e alguns sacerdotes foram
os únicos a ter uma noção da riqueza espiritual da vida interior dessa
mulher, que, aliás, lhes suplicava constantemente que destruíssem todas
as cartas relacionadas a esse assunto. O motivo para tal insistência era a
profunda reverência que tinha por Deus e pela obra que Ele realizava nela
e por meio dela. O silêncio de Madre Teresa mostra-se agora como um
testemunho da sua humildade e da delicadeza do seu amor.
Providencialmente, os diretores espirituais de Madre Teresa conser­
varam parte das suas correspondências. Assim, quando os testemunhos e os
documentos para o processo de beatificação e canonização foram reunidos,
veio à luz a impressionante história da relação íntima que mantivera com
Jesus, da qual nem as suas colaboradoras mais próximas tinham conheci­
mento. Em contraste com a “normalidade” de Madre Teresa, suas confidên­
cias revelam profundezas desconhecidas de santidade que poderão, muito
bem, levá-la a ser colocada entre os grandes místicos da Igreja.
A vida e a mensagem de Madre Teresa continuam a fascinar as pes­
soas. Este livro é, portanto, uma resposta aos pedidos de muitos que a co­
nheceram, amaram e admiraram, e que desejam conhecer a motivação dos
atos, a origem da força, as razões da alegria, e a intensidade do seu amor. As
páginas que se seguem desvendam a sua vida interior, com toda a profundi­
dade e todo o drama que a caracterizaram, juntando uma riqueza insuspei-
tada à herança espiritual que Madre Teresa dentou ao mundo.

P e. B r i a n K o l o d i e j c h u k , M C
Postulador da causa de canonização da
Bem-aventurada Teresa de Calcutá
Diretor do Mother Teresa Center
Introdução

“Se eu alguma vez vier a ser santa, serei certamente uma santa da ‘escu­
ridão’. Estarei continuamente ausente do Céu — para acender a luz da­
queles que se encontram na escuridão na terra.”1Lidas como uma espécie
de “declaração de missão”, essas palavras de Madre Teresa são uma chave
para a compreensão da sua vida espiritual e, na verdade, de toda a sua
vida. “Venha, seja M inha luz”, tinha-lhe pedido Jesus, e a Madre esfor­
çou-se para ser essa luz do amor de Deus na vida dos que se encontravam
na escuridão. Para ela, porém, o preço paradoxal e totalmente inesperado
de sua missão foi o fato de que ela própria viveria numa “terrível escuri­
dão”. Com o escreveu a um dos seus diretores espirituais:

Agora, Padre — desde 49 ou 50 esta terrível sensação de perda —


esta escuridão indizível — esta solidão — esta ânsia permanente por
Deus — que provoca esta dor no mais fundo do meu coração. — A
escuridão é tal, que realmente não vejo nada — nem com a mente
14 Venha, seja M i n h a luz

nem com a razão. — O lugar de Deus na minha alma é um espaço


vazio. — Não há Deus em mim — Quando a dor da ânsia é tão gran­
de — só anseio e anseio por Deus — e é então que sinto — que Ele
não me quer — que Ele não está ali. — [...] Deus não me quer. — Às
vezes — apenas ouço o meu próprio coração gritar — “Meu Deus” e
não sai mais nada. — A tortura e a dor [...] eu não sei explicar.2

O objetivo deste livro

Este livro mergulha nas profundezas da vida interior de Madre Teresa,


vista sob a perspectiva daquela “declaração de missão”. Mais do que um
estudo teológico, esta obra é uma apresentação de aspectos até agora ig­
norados da sua vida interior, através dos quais passamos a ter uma per­
cepção mais completa da fé resoluta e do amor intenso que a Madre tinha
por Deus e pelo próximo.
Três aspectos da vida interior de Madre Teresa revelados no con­
texto do processo de sua canonização são: o voto privado que fez quando
ainda era freira em Loreto, as experiências místicas que rodearam a inspi­
ração para a fundação das Missionárias da Caridade e o seu íntimo com­
partilhamento na Cruz de Cristo durante os longos anos de escuridão
interior. Esses três elementos estão relacionados entre si: o voto privado
estabeleceu as bases do chamado para servir aos mais pobres dos pobres;
o novo chamado convidou-a a abraçar a realidade espiritual daqueles a
quem servia; foi, também, o voto que sustentou a sua heróica vivência da
dolorosa escuridão.
O livro está dividido em três partes. Os capítulos 1 e 2 abrangem
a vida interior de Madre Teresa antes do “chamado dentro do chama­
do”. O amor a Deus e ao próximo tinha sido plantado no seu coração
desde a primeira infância. Sua generosa resposta a esse amor, ainda em
Escópia, quando jovem, e em particular em Loreto, já como freira, uma
freira dedicada e sacrificada, atingiu seu auge no voto privado que fez
em 1942, voto esse que viria a ser, não apenas a força motriz de todos
os seus atos, mas também uma preparação providencial para o que o
futuro lhe reservara.
S a n t a Tere sa de C a lc u tá 15

Os capítulos 3 a 7 tratam da inspiração que recebeu em 10 de


setembro de 1946 para fundar as Missionárias da Caridade, o drama da
espera para dar início à nova missão e, por fim, sua saída da ordem de
Loreto e o começo da obra nas favelas. Quer na resposta ao “chamado
dentro do chamado”, quer no lento processo de discernimento que se se­
guiu, Madre Teresa enfrentou corajosamente os muitos sofrimentos pelos
quais teve de passar, mantendo-se fiel à sua nova missão.
Quando tudo parecia estar no lugar, começava então a mais difícil
de todas as provações pela qual teve de passar. Desde o momento em que
recebeu o chamado, Madre Teresa estava convencida de que sua missão
consistia em levar a luz da fé àqueles que viviam na escuridão. Mal sabia
ela que a “escuridão” viria a ser a maior provação de sua própria vida e
uma parte fundamental de sua missão. A profundidade dessa experiência
mística e o preço que teve de pagar por viver esse novo chamado e missão
são os temas dos capítulos 8 a 13.

Seu legado

Inicialmente, a experiência da escuridão a tom ou de surpresa. Tendo


conhecido um elevado grau de união com Deus, a mudança não foi
apenas surpreendente, mas foi também agonizante: incapaz de sentir a
Sua presença como anteriormente, Teresa de Calcutá sentiu-se perplexa
e receosa. Estaria seguindo “o caminho errado”? Procurando possíveis
motivos para a suposta ausência de Deus, quando a Sua presença tinha
sempre sido tão real, a princípio atribuiu essa ausência à sua própria
natureza fraca e pecadora, concluindo que a escuridão se destinava a
purificar suas imperfeições.
Com a ajuda dos diretores espirituais, começou progressivamente
a compreender que sua dolorosa experiência interior era uma parte essen­
cial da vivência da sua missão. Era um compartilhamento na Paixão de
Cristo na Cruz, com particular ênfase na sede de Jesus, enquanto mistério
de Sua ânsia pelo amor e a salvação de todo ser humano. Mais tarde, ela
reconheceu que aquele misterioso sofrimento era uma marca da Paixão de
Cristo em sua alma. Madre Teresa estava vivendo o mistério do Calvário
— do Calvário de Jesus e do Calvário dos pobres.
16 Venha, seja M i n h a luz

Sua vivência dessa experiência interior era um aspecto integral


de sua vocaçáo, a exigência mais desafiante de sua missão e a suprema
expressão do seu amor a Deus e a Seus pobres. Além de reconfortar os
abandonados e marginalizados da sociedade humana, Madre Teresa esta­
va disposta a abraçar seu sofrimento material e espiritual, sua condição
de “não serem queridos, não serem amados, não serem cuidados”, de não
terem ninguém por eles.
Embora essa intensa agonia pela qual estava passando pudesse tê-
-la abatido, a verdade é que Teresa de Calcutá irradiava uma alegria, um
amor e um entusiasmo que impressionavam. Era realmente uma teste­
munha da esperança, apóstola do amor e da alegria, porque tinha cons­
truído o edifício da sua vida sobre pura fé. Irradiava dela uma espécie de
“luminosidade”, como descreveu Malcolm Muggeridge,3 — que fluía da
sua relação com Deus. Neste livro, espero conseguir explorar e esclarecer
a dinâmica oculta dessa relação.

Os documentos

A própria Madre Teresa tinha perfeita consciência das circunstâncias in-


comuns do seu chamado e da forma extraordinária como fora desafiada
a vivê-lo. Insistiu sempre para que todos os documentos reveladores
da inspiração que estava por trás da fundação das Missionárias da Carida­
de fossem destruídos, por receio de que lhe fosse atribuída uma proemi-
nência que sabia pertencer exclusivamente a Deus.

O Padre [Van Exem] também tem muitas cartas que eu escrevi para
ele sobre a obra — quando eu ainda era uma freira de Loreto. Agora
que o plano que Jesus nos confiou está nas Constituições — essas
cartas não são necessárias. Peço que as devolva, por favor — porque
eram a exata expressão da minha alma naquele momento. Gostaria
de queimar todos os papéis que revelem qualquer coisa sobre mim.
— Peço-lhe, por favor, Excelência, suplico-lhe que me conceda este
desejo — quero que o segredo que Deus me confiou continue sendo
só nosso — o mundo não o conhece e eu quero que fique assim. —
■Santa Teresa de Ca lc ut á 17

Qualquer coisa que diz respeito à Sociedade* — Vossa Excelência tem


muito — Nunca falei — nem sequer em Confissão — sobre como se
iniciou a Congregação — O senhor e o Padre [Van Exem] o sabem
— é o suficiente. Eu fui um pequeno instrumento Dele — agora
Sua vontade ficou conhecida através das Constituições — todas essas
cartas são inúteis.4

Um ano depois, em 1957, quando o arcebispo Périer ainda


não tinha aceitado o pedido que Madre Teresa lhe fizera, ela apro­
veitou uma nova oportunidade para repetir o apelo. Também esse
segundo pedido não foi aceito. A medida que o tempo ia passando
e o interesse por sua obra ia aum entando, surgiu a possibilidade de
que Teresa de Calcutá e a obra por ela fundada se tornassem tema
de artigos e livros, o que viria a ser uma nova provação para ela. M a­
dre Teresa voltou a recear que o arcebispo Périer e o pe. Van Exem,
seu diretor espiritual desde 1944, tornassem públicos os documentos:

Fui esta manhã, mas o senhor não estava. Tenho um grande pedido
a fazer ao senhor. — Nunca lhe pedi nada pessoalmente. — Fiquei
sabendo, através do Monsenhor E. Barber, que o Cardeal Spellman
deseja escrever sobre mim e sobre a obra. O Bispo Morrow irá lhe pe­
dir todos os documentos. — Ao senhor e ao Pe. Van Exem confiei os
meus pensamentos mais profundos — o meu amor a Jesus — e o Seu
terno amor por mim — por fevor, não lhe dê nada de 1946. Quero
que a obra continue a ser inteiramente Dele. Quando o começo se
tornar conhecido, as pessoas passarão a pensar mais em mim — e
menos em Jesus. Por favor, por amor a Nossa Senhora, não conte
nem dê coisa alguma. Sei que eles querem ajudar financeira[mente] a
Congregação — não quero dinheiro — minha confiança em Deus é
cega — sei que Ele nunca me abandonará. Nesses poucos anos, pas­
saram pelas minhas mãos lakhs** de rúpias — não sei como foi que

* A Sociedade rcfcrc-sc à Congregação das Missionárias da Caridade.


** Um lakh vale 100.000 rúpias. Nesta passagem, Madre Teresa reconhece que passou pelas
suas mãos uma grande quantidade de dinheiro.
18 Ve nha, seja M i n h a luz

aqui chegaram. Sou perfeitamente feliz e grata a Deus por aquilo que
Ele dá — prefiro ser e permanecer pobre com Jesus e os Seus pobres.
— Prefiro pedir esmola e lutar com pouco. — Ele que escreva sobre
“a obra” e a nossa pobre gente sofredora. — Que me ajude a pagar
os estudos das nossas crianças pobres e dar às mais inteligentes uma
oportunidade na vida.
O Rev. Pe. Martindale S.J. também quer escrever e mandou um
recado pelo Capitão Cheshire — eu recusei. — Sou apenas um ins­
trumento Dele — por que se interessam tanto por mim — quando a
obra é toda Dele. Nada reclamo como meu. Me foi dado. [_]5

Três anos mais tarde, teve uma nova oportunidade para solicitar
que os documentos fossem destruídos. A fim de obter a aprovação pon­
tifícia para as Missionárias da Caridade, o arcebispo de Calcutá precisou
apresentar um pedido formal ao papa, descrevendo a história e a obra da
congregação que tinha sob seu cuidado. Esse novo escrutínio preocupou
Madre Teresa.

Excelência,
Agora que está examinando o arquivo da nossa Congregação
— peço que destrua quaisquer cartas que eu tenha escrito a Vos­
sa Excelência — que não sejam relacionadas à Congregação. — “O
Chamado” foi um delicado presente de Deus para mim — indigna
— não sei por que Ele me escolheu — acho que tenha sido como as
pessoas que nós apanhamos na rua — porque são as que ninguém
quer. Desde o primeiro [dia] até hoje — esta minha nova vocação foi
um prolongado “Sim” a Deus — sem me preocupar com o preço a
pagar. — Minha convicção de que “a obra é Dele” — é mais do que a
realidade. — Nunca duvidei. Só me magoa que as pessoas me tratem
como fundadora, porque sei com certeza que Ele me pediu — “Fará
isto por Mim?” Tudo foi Dele — eu apenas tive de me render ao Seu
plano — à Sua vontade. — Hoje, a obra Dele cresceu porque é Ele, e
não eu, que a faz através de mim.
Estou de tal maneira convencida disto — que alegremente daria a
minha vida para prová-lo.6
-Santa Teresa de C a lc ut á 19

Embora fosse convicção do arcebispo Périer e dos seus respecti­


vos sucessores no cargo que os documentos não deveriam ser destruídos,
Madre Teresa conseguiu destruir um bom número deles. Também o pe.
Van Exem lutou durante anos contra a insistência de Madre Teresa em
destruir os documentos, tentando persuadi-la dos benefícios que eles tra­
riam para as futuras gerações de seus seguidores. Em 1981, ele escreveria:
“Um último ponto foi um choque para mim: não sei o que aconteceu aos
documentos que estavam em poder do pe. Henry. Quando fui a Santa
Teresa, no ano passado, já não consegui encontrar nada. Onde estão os
documentos agora? Não quero, de maneira nenhuma, que isto aconte­
ça no meu caso.” Finalmente, cedeu. Em 1993, pouco antes de morrer,
o pe. Van Exem descreveu os pormenores do caso ao arcebispo Henry
D ’Souza, que era, naquele momento, o arcebispo de Calcutá:

Excelência,
Devolvo os documentos que me enviou antes de partir para Hong
Kong, pelos quais agradeço.
Com referência ao caderno de Madre Teresa, acrescento o seguin­
te: foi a própria Madre que o escreveu. Parece ser um diário, mas não
é. Foi certamente escrito, em parte, algum tempo depois dos aconte­
cimentos. Tinha a Madre algumas anotações? Eu não sei. É possível
que sim, já que incluiu muitas datas. Em alguns lugares, eu mesmo
acrescentei o mês e o ano. No começo da Congregação, depois de res­
ponder às cartas que recebia, a madre costumava entregá-las a mim,
para que eu as guardasse.
Algum tempo depois — talvez tenha sido em Creek Lane — ela
quis queimar todas as cartas que tinha me enviado. Naquela altura,
eu tinha em meu poder dois baús de cartas dela, um baú de cartas
de benfeitores e mais um baú com outras correspondências. Recusei-
-me a autorizar a destruição das cartas e disse-lhe que deveria pedi-la
ao arcebispo Périer, que era o superior geral das MCs [Missionárias
da Caridade]. A Madre recorreu ao arcebispo Périer, que lhe disse:
“Madre, escreva a história da Congregação, e o pe. Van Exem lhe dará
todas as cartas.” A Madre começou a escrever este livro, com dados
que vão desde 21 de dezembro de 1948 até 11 de julho de 1949. À
noite, estava tão cansada, que não conseguia continuar a escrever a
história por muito tempo.
20 l enha , seja M i n h a luz

Quando o arcebispo Dyer assumiu o cargo do arcebispo Périer, a


Madre o procurou com o mesmo pedido. Ele lhe perguntou o que
tinha decidido o arcebispo Périer e lhe disse para fazer a mesma coisa.
Veio depois o arcebispo Albert Vincent, que recusou, terminante-
mente, lhe dar essa autorização. Em 1969, veio para Calcutá o arce­
bispo Picachy e a Madre me pediu para eu não lhe falar nada sobre
cartas. Ela sabia perfeitamente qual seria a resposta.
Ao longo dos anos 1970 e 1980, continuou a insistir para que as
cartas fossem destruídas. A Madre era, desde 1965, a Superiora Geral
por eleição de uma Congregação Pontifícia, já não estando, portanto,
sob a jurisdição de nenhum arcebispo. Então enviei os baús de cartas
à Madre, juntamente com uma longa carta na qual explicava que
algumas daquelas cartas não pertenciam a ela, mas à Congregação.
O caderno da Madre ficou comigo até enviá-lo a Vossa Excelência.
Remeto-lhe, hoje, os documentos que recebi do senhor.7

Embora o conhecimento da inspiração recebida por Madre


Teresa permanecesse privilégio do pe. Van Exem e do arcebispo Périer,
foram, ao longo dos anos, vários os sacerdotes que ficaram sabendo sobre
a sua escuridão espiritual. Ela apenas revelou seu estado interior porque
sentia que Deus demandava que o fizesse. As suas preferências pessoais
não tinham qualquer importância; não podia recusar nada a Ele. Esses
sacerdotes foram, para ela, um auxílio valioso, verdadeiros “Simãos de
Cirene” nessa “Via Sacra”.
Os destinatários dessas cartas foram os primeiros a perceber
que a escuridão era um elemento essencial da vocação de M adre Tere­
sa, prevendo que, ao tornar-se conhecido, o fato ofereceria um precio­
so testemunho da santidade da religiosa e ajudaria na continuação de
sua missão após sua morte. O pe. Neuner explica, assim, o seu ponto
de vista:

Contra a explícita solicitação de Madre Teresa de queimar essas pá­


ginas depois de tê-las lido, achei que tinha a obrigação de preser­
vá-las porque elas revelavam um aspecto da sua vida, a verdadeira
profundidade da sua vocação, sobre o qual ninguém parecia ter co­
nhecimento. Todos viram a corajosa batalha com que ela instituíra
-Santa Teresa de Ca lc u tá 21

a sua obra, o amor que sentia pelos pobres e pelos que sofrem, a
sua atenção às Irmãs; mas a escuridão espiritual permaneceu o seu
segredo. Madre Teresa mostrava-se muito alegre na vida diária,
incansável no seu trabalho. A agonia interior não diminuiria suas
atividades. Com sua inspiradora liderança dirigia as Irmãs, abria
novos centros, tornou-se famosa; mas, por dentro, estava em um
total vazio. Estas páginas revelam o poder em que assentava a sua
missão. Seria importante para as Irmãs, e para muitas outras pessoas,
saber que a obra de Madre Teresa tinha as suas raízes no mistério da
missão de Jesus, na união com Aquele que, morrendo na Cruz, Se
sentiu abandonado pelo Pai.

Em algumas das cartas e notas referentes à sua escuridão interior,


Madre Teresa tinha escrito “questão de consciência”. Para ela, cada palavra
que escreveu sobre sua escuridão interior estava (assim indicada ou não) in­
cluída nessa categoria. Um dos sacerdotes que estava a par da sua escuridão
explica as razões para preservar e revelar esses documentos:

Será que a Madre, agora que já não se encontra entre nós, ainda teria ob-
jeções a que essas cartas tivessem sido preservadas pelo Cardeal Picachy
e fossem, agora, após a morte dos dois, tomadas públicas? É inques­
tionável que, agora, ela já tenha entendido que pertence à Igreja. Faz
parte da Tradição que os carismas místicos que Deus concede aos Seus
íntimos não se destinam prioritariamente aos próprios, mas ao bem de
toda a Igreja. Muitas pessoas que passam por provações semelhantes
poderão ganhar coragem e esperança ao lerem essas cartas. É provável
que haja mais pessoas nesse estado do que nós imaginamos — embora
com graus variados de intensidade.

Quanto à expressão “parte da minha Confissão” usada por Madre


Teresa, deve-se entender que ela não se referia ao sacramento da Recon­
ciliação. Ninguém pode receber o perdão sacramental escrevendo os
pecados num papel e enviando-o a um sacerdote. Os sacerdotes que re­
ceberam essas cartas compreendiam-no bem: a Madre tinha-lhes escrito
aquilo que não fora capaz de lhes dizer oralmente quando recorrera à
22 Çen h a. seja M i n h a luz

sua direção espiritual. Era a maneira que Madre Teresa tinha de lhes in­
dicar que o assunto era confidencial; para ela era o mesmo que “questão
de consciência”.
Além das cartas, são igualmente citados aqui trechos de outros escri­
tos de Madre Teresa, entre os quais o diário que escreveu no início da obra
que realizou nas favelas, as instruções às Irmãs e discursos públicos. Foram
ainda usadas outras fontes: trechos de cartas escritas durante o período em
que procurava discernir se o “chamado dentro do chamado” era de origem
divina, principalmente das canas escritas ao arcebispo Périer, ao pe. Van
Exem e às superioras; testemunhos reunidos durante o processo de cano­
nização de Madre Teresa, na maioria provenientes dos diretores espirituais
ainda vivos e de membros das Missionárias da Caridade; e testemunhos
sobre ela retirados de publicações.

Organização

Os documentos foram organizados em ordem cronológica. Consequen­


temente, as mesmas expressões, ou semelhantes, aparecem regularmente;
mas essas repetições, em especial nos escritos relativos ao seu estado inte­
rior, são justamente aquilo por meio do qual percebemos a progressão, a
intensidade e a duração da sua escuridão. Tratam-se, portanto, de repe­
tições extremamente valiosas. Por sua vez, Madre Teresa não podia falar
senão do que se passava dentro dela mesma e as repetidas referências à
dor e à escuridão, acompanhadas de pedidos de oração, revelam uma
compreensível necessidade de apoio. As idéias que são repetidas nos es­
critos foram frequentemente enriquecidas, com a passagem do tempo,
com novos detalhes ou novos aspectos que indicam um aprofundamento
da sua compreensão ou da sua vivência de uma faceta específica da sua
espiritualidade e missão.
Os escritos de Madre Teresa foram trabalhados o mínimo possível.
Embora tenham sido quase todos escritos em inglês, convém lembrar que
essa não era sua língua materna; esta era o albanês, sendo o servo-croata a
língua que filiava na escola e a que usava para a comunicação diária durante
a infância e a adolescência, quando vivia na Escópia. As primeiras cartas
■Santa ‘T eresa de C a lc u tá 23

que escreveu da India, a amigos e ao confessor, foram escritas em servo-


-croata; delas se procurou apresentar aqui uma tradução o mais literal
possível. Já os textos escritos em inglês, mesmo que, por vezes, a gramáti­
ca não seja a mais correta ou pudesse ter sido melhorada, foram deixados
como ela os escreveu. As palavras obviamente omitidas por engano foram
acrescentadas entre colchetes.
A utilização de letras maiúsculas é um aspecto importante do es­
tilo da escrita de Madre Teresa, que tinha o hábito de escrever com letras
maiúsculas certas palavras que normalmente não seriam escritas assim.
Naturalmente, escrevia sempre “Deus” com letra maiúscula, bem como
os pronomes a Ele referidos. Contudo, também escrevia com letra maiús­
cula tudo que se referisse ao sagrado, assim como termos que tivessem
importância para ela, como “Confissão”, “a nossa Jovem Congregação”,
“os nossos Pobres”, “um grande Sorriso” etc. Tratava-se de uma forma
de mostrar o respeito que tinha pelo sagrado e de enfatizar determinada
realidade que a impressionasse. Mas nem sempre era consistente na utili­
zação das letras maiúsculas e muitas delas foram alteradas de acordo com
o uso corrente.
Uma palavra sobre a pontuação: os escritos da Madre Teresa aqui
apresentados são comunicações particulares feitas a pessoas com quem ti­
nha relações próximas e não se destinavam à publicação. Nesta “escrita in­
formal”, o travessão é um sinal de pontuação que caracteriza o estilo dela.
Às vezes, mesmo nas cartas, mas especialmente nos diários e nas notas, o
travessão substitui todos os sinais de pontuação: representa o ponto final,
a vírgula, os dois pontos, o ponto e vírgula, o ponto de exclamação ou
de interrogação, e, finalmente, o travessão propriamente dito. Em suma,
qualquer interrupção de pensamento é assinalada com um travessão. Esta
particularidade do estilo de Madre Teresa é expressiva do dinamismo e
da vivacidade da sua personalidade, de uma certa “pressa” em passar à
tarefa seguinte, sem se deixar ocupar por coisas “não essenciais”. Embora
possam criar distrações na leitura, os travessões permanecem, por razões
de autenticidade, onde Madre Teresa os colocou. Em alguns casos em
que alterava o sentido ou o fluxo do texto, o travessão foi substituído por
sinais convencionais de pontuação.
24 Venha, seja M i n h a luz

O uso freqüente de abreviações pouco comuns é outro aspecto


típico da escrita de Madre Teresa, outra expressão da sua pressa caracte­
rística. São exemplos disso: Sagrada “Com.” (Comunhão), “S. E.” (Sua
Excelência), “Ssmo.” (Santíssimo) Sacramento, “Cal.” (Calcutá), “Nov.”
(Noviças ou Noviciado) etc. As palavras correspondentes aparecem entre
colchetes ou parênteses depois das abreviações.
Tenho a esperança de que muitos leitores se deixem inspirar pela
maneira heróica como Madre Teresa viveu a sua missão de “[acender] a
luz daqueles que se encontram na escuridão” e a continuem de acordo
com a vocação e as possibilidades de cada um. Que nas áreas de nossos
corações onde ainda haja escuridão incida uma luz intensa, irradiada pelo
exemplo, pelo amor e, agora, também, pela intercessão de Madre Teresa,
de lá do céu.
CAPÍTULO 1

“Segure a mão
Ííele, e caminhe
sozinha com He”
M issionária

Jesus, por Ti e pelas almas!


M a d re T e resa

“Segure a mão Dele, e caminhe sozinha com Ele. Siga em frente por­
que, se olhar para trás, irá voltar.”1 Estas palavras de despedida de sua
mãe ficaram gravadas no coração da jovem Gonxha Agnes Bojaxhiu, fu­
tura Madre Teresa, quando, aos 18 anos, deixava sua casa em Escópia
para dar início à sua vida como missionária. Em 26 de setembro de
1928, partia para a Irlanda, para entrar no Instituto da Bem-aventu­
rada Virgem Maria (as Irmãs de Loreto), uma congregação não clau­
surada de religiosas, dedicada, essencialmente, à educação. Tinha se
candidatado às missões em Bengala, aventura que exigia uma grande
fé e um a grande coragem, porque tanto ela como a família sabiam
perfeitam ente que, “naquele tempo, quando partiam em missão, os
missionários nunca mais regressavam”.2
26 Venha, seja M i n h a luz

A jovem Gonxha levou seis anos para se decidir por sua vocação.
Havia sido educada no seio de uma família que alimentava a piedade e a
devoção e em uma fervorosa comunidade paroquial que também contri­
buiu para a sua educação religiosa. Foi nesse ambiente que, como revela­
ria mais tarde, Madre Teresa primeiro se sentiu chamada a consagrar sua
vida a Deus:

Naquele tempo, tinha apenas 12 anos. Foi então que percebi, pela
primeira vez, que tinha vocação para os pobres, em 1922. Queria ser
missionária, queria sair e dar a vida de Cristo às pessoas que viviam nos
países com missões. No início, entre os 12 e os 18 anos, não queria ser
freira. Éramos uma família muito feliz. Mas, aos 18 anos, decidi deixar
a minha casa e me tomar freira, e desde então, ao longo desses quarenta
anos, nunca duvidei por um segundo de que havia feito a coisa certa;
era a vontade de Deus. A escolha foi Dele.3

A decisão não foi, portanto, um capricho da juventude, mas uma


escolha ponderada, fruto de sua profunda relação com Jesus. Muitos anos
depois, Madre Teresa revelaria: “Desde a infância que o Coração de Jesus
foi o meu primeiro amor.”4 A determinação que a movia ficou clara na
carta de candidatura que enviou à superiora das freiras de Loreto:

Reverenda Madre Superiora,


Queira, por favor, atender ao meu desejo sincero. Quero perten­
cer à Congregação, para poder vir um dia a ser irmã missionária, e
trabalhar por Jesus que morreu por todos nós.
Terminei o ensino médio; em termos de línguas, sei albanês, que
é a minha língua materna, e sérvio;* sei um pouco de francês, abso­
lutamente nada de inglês, mas espero, confiando no bom Deus, que
Ele me ajude a aprender o pouco de que necessito e estou começando
imediatamenre nestes [dias] a praticá-lo.

* Aqui, por sérvio, Gonxha referia-se a servo-croara, a língua que era usada na sua escola.
•Santa Teresa de C a lc u tá 27

Não tenho quaisquer condições especiais, quero apenas ir para as


missões, e para tudo o mais me submeto completamente à disposição
do bom Deus.
Escópia, 28-VI-1928
Gonxha BojaxhijeviS

Uma graça excepcional que tinha recebido no dia de sua Primeira


Comunhão alimentara o desejo de dar esse ousado passo rumo ao desco­
nhecido: “Desde os cinco anos e meio — quando O recebi [a Jesus] pela
primeira vez — que o amor pelas almas tem estado dentro de mim — Foi
crescendo com os anos — até eu vir para a índia — com a esperança de
salvar muitas almas.”5
Ao atravessar o mar Mediterrâneo, a jovem e zelosa missionária es­
crevia a seus parentes, que deixara para trás: “Rezem por sua missionária,
para que Jesus a ajude a salvar o maior número possível de almas imortais
da escuridão da falta de fé.”6 A esperança que tinha de levar a luz aos que
se encontravam na escuridão acabaria por se realizar, mas de uma forma
impossível de se prever, naquele momento em que ela se dirigia à terra
que havia escolhido.
Durante a viagem marítima, em momentos de solidão e de silên­
cio, com a alegria e a dor misturando-se em seu coração, a Irmã Teresa (de
Teresa de Lisieux, nome que tomou ao entrar para a ordem de Loreto)***
expressou num poema seus sentimentos:

* De Gonxha Bojaxhiu para a Superiora Geral de Loreto, em 28 de junho de 1928. O nome


de batismo de Madre Teresa era Gonxha Agnes Bojaxhiu. Porém, como escreveu a carta em
servo-croata, a assinou com o seu nome nessa língua, um costume em Escópia naquele tempo:
Gonxha Bojaxhijevié.
** Carmelita de Lisieux conhecida como Santa Teresinha; nascida em Alençon, França, em 2
de janeiro de 1873; falecida em Lisieux, em 30 de setembro de 1897. Era a santa padroeira
de Madre Teresa.
28 Ve n h a , seja M i n h a luz

jA d e u s

Estou deixando minha casa querida


E a minha terra amada
Para a fumegante Bengala eu vou
Para orlas longínquas.

Estou deixando meus velhos amigos


Renunciando à fam ília e ao lar
Meu coração me impele avante
A servir ao meu Cristo.

Adeus, Ó mãe querida


Que Deus esteja com todos vocês
Um Poder Mais Alto me compele
Em direção à tórrida índia.

O navio avança lentamente


Cortando as ondas do mar.
Enquanto meus olhos se voltam pela últim a vez
Para o querido litoral da Europa.

Corajosamente de pé no convés
Alegre, de semblante pacificado,
A feliz pequenina de Cristo
Sua nova noiva prometida.*

* O poema foi escrito em scrvtxroata, uma língua na qual Gonxha tinha se tomado proficiente,
como cidadã iugoslava. Em cada estrofe, na língua original, a primeira linha rima com a ter­
ceira e a segunda com a quarta. A língua era tão rica que os editores da revista adicionaram
uma nota de rodapé para explicar uma das palavras usadas por ela, pois não pensavam que um
leitor comum a entenderia. Poema traduzido para o inglês por Tom Butler e para o português
do Brasil por Vania Vieira.
•Sa n ta Te r es a d e C a l c u t á 29

Tem na mão uma cruz de ferro


Sobre a qual pende o Salvador,
Enquanto sua alma ardente lã oferece
O seu doloroso sacrifício.

“Ó Deus, aceitai este sacrifício


Como sinal do meu amor.
Ajudai, por favor, a Vossa criatura
A glorificar o Vosso Nome!

Em troca apenas Vos peço


Ó doce Pai de todos nós:
Deixai-me salvar pelo menos uma alma —
Uma que já conheceis. ”

Suaves e puras como o orvalho do verão


Suas delicadas cálidas lágrimas agora fluem .
Selando e santificando então
O seu doloroso sacrifício.

Em 6 de janeiro de 1929, após uma viagem de cinco semanas, a


Irmã Teresa chega a Calcutá. Em carta enviada para casa, compartilha
com os seus destinatários as impressões da chegada à cidade que ficaria
inseparavelmente unida ao seu nome:

Em 6 de janeiro, de manhã, navegamos do mar para o rio Ganges,


também chamado o “Rio Sagrado”. Viajando por essa rota, tivemos
oportunidade de dar uma boa olhada na nossa nova terra, Bengala. A
natureza é maravilhosa. Em alguns locais, há lindas casinhas peque­
nas, mas de resto são apenas cabanas alinhadas debaixo das árvores.
Ao vermos tudo isso, desejamos poder andar por entre elas o mais de­
pressa possível. Ficamos sabendo que há muito poucos católicos aqui.
Quando o navio atracou, cantamos em nossas almas o Te Deum.**

* O Te Deum é um tradicional hino de alegria e louvor cantado em agradecimento a Deus e


usado na liturgia da Igreja. O título vem do texto original em latim — Te Deum Laudamus
— que se traduz como: Nós Vos louvamos, ó Deus.
30 Venha, seja Dilinha luz

Nossas irmãs indianas nos esperavam lá, e foi com elas que, com
indescritível felicidade, pisamos pela primeira vez no solo de Bengala.
Na capela do convento, começamos agradecendo ao nosso que­
rido Salvador a enorme graça de nos ter conduzido sãs e salvas ao
objetivo pelo qual tínhamos ansiado. Aqui ficaremos uma semana
e em seguida partiremos para Darjeeling, onde ficaremos durante o
noviciado.
Rezem muito por nós para que sejamos missionárias boas e
corajosas.7

Pouco depois de chegar a Calcutá, a Irmã Teresa foi enviada para


Darjeeling, para continuar sua formação. Em maio, começou o novicia­
do, um período de dois anos de iniciação à vida religiosa que antecede
a primeira profissão de votos. O primeiro ano era dedicado à formação
espiritual da candidata, com ênfase na oração e na espiritualidade da or­
dem, sendo o segundo ano dedicado à missão do instituto, acompanhada
de algum treinamento apostólico. Tendo completado esse período de for­
mação, a Irmã Teresa fez a primeira profissão de votos em 23 de maio de
1931,* prometendo viver uma vida de pobreza, castidade e obediência,
e dedicar-se, com particular atenção, à instrução da juventude. Foi uma
ocasião de imensa alegria porque seu anseio de consagrar-se a Deus se
tornou realidade. Como confidenciou a uma amiga:

Se você soubesse como sou feliz, como pequena esposa de Jesus. Não
poderia invejar ninguém, nem mesmo aqueles que estão desfrutando
de uma felicidade que ao mundo parece perfeita, porque estou des­
frutando da minha completa felicidade, mesmo quando sofro qual­
quer coisa por meu amado Esposo.8

Após a profissão dos votos, a Irmã Teresa foi enviada para a com u­
nidade de Loreto de Calcutá e nomeada professora da St. Marys Benga­
li Medium School, uma escola para meninas. A jovem freira lançou-se,

* Subsequentemente, ela renovou seus votos todos os anos por trés anos e, então, uma vez a
cada trés anos, antes da profissão dos votos perpétuos.
■Santa Te resa d e C a lc u tá 31

entusiasticamente, à sua nova missão, que manteria (com apenas uma


interrupção de seis meses) até 1948, o ano em que deixou Loreto para
instituir as Missionárias da Caridade. Em carta à revista católica da paró­
quia da casa de seus pais, mostra como essa missão de serviço, com todas
as dificuldades inerentes, era para ela uma fonte de alegria genuína, pois
lhe proporcionava uma oportunidade para imitar Jesus e viver em união
com Ele:

O calor da índia é simplesmente abrasador. Quando ando pelas ruas,


tenho a sensação de que há fogo debaixo dos meus pés e de que todo
o meu corpo arde. Quando as coisas se tornam mais difíceis, consolo-
-me com a ideia de que dessa maneira as almas são salvas e de que o
meu querido Jesus sofreu muito mais por elas. [...] A vida de uma
missionária não é um mar de rosas, na realidade é mais um mar de
espinhos; mas com tudo isso, é uma vida cheia de felicidade e de ale­
gria, quando ela compreende que está fazendo o mesmo trabalho que
Jesus fez quando estava na terra, e que está cumprindo o mandamen­
to de Jesus: “Vão e façam discípulos de todas as nações!”9

Muitas coisas
“porJesus e pelas almas”

Após nove anos em Loreto, a Irmã Teresa aproximava-se de um momento


muito importante de sua vida — preparava-se para fazer a profissão dos
votos perpétuos. Naquela época, as suas superioras e suas companheiras
já estavam familiarizadas com sua piedade, sua compaixão, sua caridade
e seu zelo; apreciavam, igualmente, o seu grande senso de humor, bem
como o seu talento natural para organizar e dirigir. Em todas as coisas em
que se envolvia, dava mostras de uma rara presença de espírito, de bom
senso e de coragem, como quando afugentou um touro correndo atrás
dela na rua para proteger as suas meninas ou quando amedrontou uns
ladrões que, certa noite, tinham conseguido entrar no convento, fazendo-
-os correr de lá.
32 X enha , seja M i n h a lu z

Mas nem as irmàs, nem as alunas percebiam completamente a no­


tável profundidade espiritual que aquela freira alegre e trabalhadora tinha
alcançado em meio às suas atividades cotidianas. A profunda união que a
Irmã Teresa tinha com Jesus, e que era a fonte da sua fecundidade espiritual
e apostólica, apenas era conhecida pelos seus confessores. Ela raramente
mencionava os sofrimentos pelos quais passava, enquanto a alegria que ir­
radiava à sua volta encobria, eficazmente, todas as provações. Em carta ao
padre jesuíta Franjo Jambrekovic," seu antigo confessor na Escópia, revela
o segredo da poderosa ação de Deus em sua alma:

Caro Padre em Jesus,


Um agradecimento caloroso pela sua carta — realmente não a
esperava — peço desculpas por não ter escrito mais cedo.
Acabo de receber a cana da Reverenda Madre Geral em que me
autoriza a fazer os votos perpétuos. Será em 24 de maio de 1937. Que
graça tão grande! Realmente não posso agradecer a Deus o suficiente
por tudo o que Ele tem feito por mim. Sua para toda a eternidade!
Alegro-me agora de todo o coração por ter carregado alegremente
a minha cruz com Jesus.10 Houve sofrimentos — houve momentos
em que os meus olhos se encheram de lágrimas — mas graças sejam
dadas a Deus por tudo. Jesus e eu temos sido amigos até agora, reze
para que Ele me dê a graça da perseverança. Neste mês começo os
três meses de terciania.** Haverá então bastante e mais [para oferecer]
por Jesus e pelas almas, mas sou tão feliz. Antigamente, as cruzes me
assustavam — tinha arrepios só em pensar em sofrer — mas agora
— abraço o sofrimento mesmo antes de ele chegar, e assim Jesus e eu
vivemos no amor.
Não pense que a minha vida espiritual é um mar de rosas — essa
é a flor que raramente encontro no meu caminho. Bem pelo contrá­
rio, tenho mais frequentemente como companheira a “escuridão”.*

* Pc. Franjo Jambrekovic, S.J., (1890-1969), jesuíta croata, pároco da Paróquia do Sagrado
Coração de Jesus na Escópia, de 1925 a 1930.
“ A terciania é um período de imensa preparação para a profissão dos votos perpétuos. No
caso de Madre Teresa, isso aconteceu no convento de Loreto, em Darjeeling.
•Santa Te resa de C a lc ut á 33

E quando a noite se torna muito densa —- e parece que vou acabar


no inferno — aí, eu simplesmente me ofereço a Jesus. Se Ele quiser
que eu vá para lá — estou pronta — mas só sob a condição de que
isso O faça realmente feliz. Preciso de muita graça, de muita força
de Cristo para perseverar na confiança, neste amor cego que con­
duz somente a Jesus Crucificado. Mas sou feliz — sim, mais feliz
do que nunca. E não desejaria, a preço algum, renunciar aos meus
sofrimentos. Mas não pense, porém, que só estou sofrendo. Ah, não
— rio mais do que sofro — tanto que algumas pessoas concluíram
que eu sou a noiva mimada de Jesus, que vive com Jesus em Nazaré
— muito longe do Calvário.11 [...] Reze, reze muito por mim —
preciso muito do amor Dele.
Peço desculpas por falar tanto — mas nem eu sei como [foi que
isto aconteceu] — foi certamente Jesus que assim quis — para que o
senhor rezasse um pouco mais pela sua missionária. [...]
Mamãe me escreve com regularidade — verdadeiramente ela está
me dando forças para sofrer com alegria. A minha partida foi, de fato,
o começo da vida sobrenatural dela. Quando for para junto a Jesus,
certamente Ele a receberá com grande alegria. Meu irmão e minha
irmã continuam juntos — eles têm uma ótima vida juntos.
O senhor é certamente muito ocupado para pensar em escrever
cartas. Mas peço-lhe uma coisa: reze sempre por mim. Para isso o
senhor não precisa de tempo especial — porque o nosso trabalho é a
nossa oração.* [...]
Há uns dias, dei uma grande gargalhada — lembrando-me de
alguns incidentes que aconteceram em Letnica.*** De fato, que or­
gulhosa eu era naquela época. Nem agora sou humilde — mas pelo
menos desejo vir a sê-lo — e humilhações são para mim o mais doce
dos doces. [...]

* Ela náo queria lhe dizer que parasse de fazer suas orações formais e apenas trabalhasse. Mais
tarde, explicaria às Irmãs: “Trabalho náo é oração, oração náo é trabalho, mas devemos rezar
o trabalho por Ele, com Ele e para Ele.”
** Cidade na vizinhança da Escópia para onde a paróquia peregrinava ao Santuário de Nossa
Senhora das M ontanhas Negras.
34 l e n h a , seja M i n h a luz

Tenho que ir — a índia é quente como o inferno — mas as almas


que nela habitam sáo belas e preciosas porque o Sangue de Cristo as
cobriu como o orvalho.
Saúdo-o cordialmente e peço a sua bênção e as suas orações.
Sua em Jesus,
Irmã M. Teresa, IBVM
[Instituto da Bem-aventurada Virgem MariaJ'2

“dscuridão” - a sua companheira

Esta carta ao confessor da Escópia marca a primeira vez que, na sua cor­
respondência, a Irmã Teresa refere-se à “escuridão”. É difícil perceber exa­
tamente o que queria dizer para ela a “escuridão” nesse momento, mas,
no futuro, o termo viria a significar um profundo sofrimento interior, a
feita de consolo sensível, a aridez espiritual, uma aparente ausência de
Deus na sua vida, tudo isso combinado com uma dolorosa ânsia por Ele.
A breve descrição nos permite compreender com clareza que
a irmã raramente desfrutava da luz e do consolo da presença sensível
de Deus, mas se esforçava a viver na fé, submetendo-se, com am or e
confiança, à vontade de Deus. Tinha progredido de tal maneira nesse
amor que era capaz de se elevar acima do medo do sofrim ento:13 “Ago­
ra abraço o sofrimento mesmo antes de ele chegar, e assim Jesus e eu
vivemos no amor.”14
A escuridão interior não é uma novidade na mística católica. Na
verdade, tem sido, ao longo da história da Igreja, um fenômeno comum
a numerosos santos, que experimentaram o que São João da Cruz,* cha­
mava de “noite escura”. O mestre espiritual habilmente aplicava essa ter­
minologia para designar as dolorosas purificações a que a pessoa é sujeita
antes de atingir a união com Deus e que passam por duas fases: a “noite
dos sentidos” e a “noite do espírito”. Na primeira noite, a pessoa liberta-
-se dos apegos que a prendem ãs satisfações sensoriais, sendo atraída para

* Espanhol fundador, juntamente com Santa Teresa de Ávila, das Carmelitas Descalças; mís­
tico, poeta, Doutor da Igreja. (1542-1591)
•Santa Teresa de Ca lcutá 35

a oração de contemplação. Embora Deus mostre Sua luz e Seu amor, a


alma, imperfeita como é, não é capaz de recebê-los, experimentando-os
como escuridão, dor, aridez e vazio. Ainda que sejam apenas aparentes, o
vazio e a ausência de Deus são uma grande fonte de sofrimento. Porém, se
esse estado for a “noite dos sentidos”, e não o resultado de mediocridade,
de preguiça ou de doença, a pessoa continua a cumprir, fiel e generosa­
mente, os seus deveres, sem má vontade, sem se preocupar consigo mes­
ma, sem perturbações emocionais. Apesar de ter deixado de sentir consolo,
mantém-se uma notável ânsia por Deus, e há um aumento do amor, da
humildade, da paciência e de outras virtudes.
Tendo passado pela primeira noite, a pessoa poderá ser conduzida
por Deus à “noite do espírito” a fim de ser purgada das raízes mais profun­
das de suas imperfeições. Esta purificação é acompanhada por um estado
de extrema aridez, em que a pessoa se sente rejeitada e abandonada por
Deus. A experiência torna-se, às vezes, de tal maneira intensa que a pessoa
tem a sensação de que está sendo encaminhada para a condenação eterna.
E ainda é mais penosa pelo fato de a pessoa apenas querer a Deus, e amá-
-Lo intensamente, mas não ser capaz de reconhecer seu amor por Ele. As
virtudes da fé, da esperança e da caridade são rigorosamente postas à prova.
A oração torna-se difícil, quase impossível; o aconselhamento espiritual é
praticamente inútil; e várias provações exteriores podem aumentar ainda
mais essa dor. Por meio dessa dolorosa purificação, o discípulo é conduzido
a um total desprendimento de todas as coisas criadas e a um elevado grau
de união com Cristo, tornando-se um instrumento apto em Suas mãos, e
servindo-O de forma pura e desinteressada.
Não é de se surpreender que a Irmã Teresa, que já era uma alma
tão excepcional, fosse purificada pelo fogo desses sofrimentos místicos.
Tendo optado por confrontar essa dor profunda com confiança, entrega e
um firme desejo de agradar a Deus, ao mesmo tempo em que dava provas
de uma impressionante fidelidade aos seus deveres religiosos, já estava
estabelecendo o padrão da sua resposta às provações interiores, ainda mais
exigentes, que estavam por vir.
36 Ve n ha , seja M i n h a lu z

Sua para toda a eternidade

Após três meses de fervorosa oração e reflexão na terciania, chegou o tão


esperado dia ao qual a Irmã Teresa tinha se referido na cana ao pe. Jam-
brekovic. Em 24 de maio de 1937, de coração feliz e agradecido, Teresa se
aproximou do altar de Deus para proferir o Sim definitivo, entregando-se
a Jesus com amor esponsal para toda a vida. A cerimônia aconteceu na ca­
pela do convento de Darjeeling, sendo o celebrante o arcebispo Ferdinand
Périer, S J’ Seguindo o costume de Loreto, a Irmã passaria, a partir daquele
momento, a ser tratada por “Madre Teresa”. Além da óbvia alegria que
sentiu por ocasião da profissão definitiva, nada havia nela de extraordinário
que pudesse atrair as atenções do arcebispo ou de outra pessoa. Felizmente,
pane das suas disposições interiores chegou até nós em outra carta escrita
na época ao pe. Jambrekovic:

Caro Padre em Jesus,


Aproximam-se as festividades do Natal quando esta carta chegar
as suas mãos — estaremos todos celebrando a alegria do Menino
Jesus. Por isso envio os meus mais sinceros votos. Que o bom Deus
lhe permita realizar muitas coisas, por Ele e pelas almas. Peça-Lhe
também o mesmo para a sua missionária.
O senhor certamente já sabe que fiz os votos perpétuos. Também
pensei no senhor nesse dia; se soubesse como estava feliz porque po­
dia, de minha própria vontade, incendiar o meu próprio sacrifício.
Agora sou Dele e por toda a eternidade! Tenho a certeza de que não
consegue imaginar a antiga Gonxha, agora como esposa de Jesus. Mas
Ele foi sempre tão infinitamente bom para mim — como se quisesse
garantir a posse do meu coração. Uma vez mais, agradeço-lhe since-
ramente tudo o que o senhor fez por mim.*

* O arcebispo Périer nasceu em 22 de setembro de 1875, em Antuérpia, Bélgica. Foi


ordenado padre da Sociedade de Jesus em 1909 e tornou-se bispo em 21 de dezem bro de
1921. Foi bispo adjunto de Calcutá e o sucessor do arcebispo, tam bém de C alcutá, em
23 de junho de 1924, cargo que manteve até aposentar-se em 1960. M orreu em 10 de
novembro de 1968.
S a n t a T er es a d e C a lc u tá 37

A Irmã Gabriela está aqui. Trabalha muito bem por Jesus — o


mais importante é que sabe como sofrer, e ao mesmo tempo como rir.
Isso é o mais importante — sofrer e rir. Ela está me ajudando muito
— de muitas maneiras — pois se estivesse sozinha eu teria certamen­
te fracassado pelo caminho. Está sempre pronta a me ajudar, e eu sou
tão má que faço uso de sua bondade.
A Irmã Bernard faz os votos perpétuos em 23 de janeiro de 1938.
Graças sejam dadas a Deus por estar tudo novamente bem — Jesus
certamente a escolheu para alguma coisa especial, uma vez que lhe
enviou tantos sofrimentos. E ela é uma verdadeira heroína, tudo su­
portando corajosamente com um sorriso. [...]
Se queremos conquistar Bengala para Cristo, temos que pagar
com muitos sacrifícios. — Agora fico muito alegre quando alguma
coisa não corre segundo os meus desejos — porque vejo que Ele quer
a nossa confiança — é por isso que nas perdas devemos louvar a Deus
como se tivéssemos tudo.
Talvez mamãe tenha escrito para o senhor. Ela vive atualmente com
o meu irmão. São tão felizes. Só lhes falta uma coisa — a sua Gonxha.
Mas graças sejam dadas a Deus porque minha mãe tem outra vez uma
igreja peno e pode falar albanês. Como está feliz com isso! Minha irmã
é agora a prefeita da Irmandade de Nossa Senhora para as jovens das
escolas secundárias. Espero que faça muito por Jesus.
Com ceneza o senhor quer também algumas notícias minhas.
Uma coisa, reze muito por mim — preciso mais do que nunca de
orações. Quero ser toda só para Jesus — de verdade e não apenas
pelo nome e pelo hábito. Muitas vezes as coisas se invertem — de
maneira que o meu reverendíssimo “eu” toma o lugar mais importan­
te.* Sempre a mesma Gonxha orgulhosa. Só uma coisa mudou — o
meu amor por Jesus — daria tudo, incluindo a própria vida, por Ele.
É uma coisa bonita de se dizer, mas na realidade não é assim tão facil.
E é isso mesmo que eu quero, que não seja fácil. Lembra-se de me
dizer uma vez, na Escópia: “Gonxha, você quer beber o cálice15 até à*

* Com hum or e depredando a si mesma. Madre Teresa observou que seu orgulho Interferia na
sua total entrega a Jesus, ironicamente referindo-se ao seu “reverendo'' ou exaltado ego.
38 Xc n h a . seja M i n h a luz

última gota.” Não sei se, naquele momento, eu pensava como penso
hoje, mas agora, sim, quero e com alegria, sem uma lágrima sequer.
[...] As coisas não são muito fáceis quando a pessoa precisa estar
de pé da manhã à noite. Mas ainda assim, é tudo por Jesus; assim
tudo é belo, embora seja difícil.
Estou com muito sono esta noite, por isso perdoe-me por escrever
desta maneira — mas, se não acabar esta noite, amanhã será tarde
demais. Envie por favor, os meus mais cordiais votos ao pe. Vizjak —
mandei hoje uns livros para ele.
Reze sempre muito por mim
Fielmente em Jesus,
Irmã M. Teresa, IBV M 16

Uma vez que ansiava por uma completa união com Cristo, que
sofreu na Cruz, Madre Teresa — Sua pequena noiva — não podia deixar
de se unir a Ele no Seu sofrimento. Se não podia tirar-Lhe a dor, pelo
menos ela estaria ali, na Cruz, por assim dizer, com Ele. Tendo optado
por compartilhar o destino do seu Bem-amado, recebia de bom grado as
cruzes que acompanhavam a sua entrega permanente.
A luta diária para superar seus próprios defeitos fazia igualmente
pane da cruz de Madre Teresa. Ela confidenciou ao antigo confessor a
luta para subjugar o orgulho; no entanto, embora não tivesse consciência
disso, a verdade é que já tinha saído vitoriosa de muitas batalhas. Embora
lamentasse ver em si ua mesma Gonxha orgulhosa”, os outros ficavam
impressionados com a sua humildade. A Irmã Gabriela, uma amiga de
infância, que era nessa época sua companheira em Loreto, escrevera ao
pe. Jambrekovic no mesmo dia:

Acho que Jesus ama muito a Irmã Teresa. Vivemos na mesma casa
e eu percebo que todos os dias ela procura agradar a Jesus em tudo.
Tem muito o que fazer, mas não se poupa. É muito humilde. Cus­
tou-lhe muito chegar a isso, mas tenho a impressão de que Deus a
escolheu para grandes coisas. É certo que suas ações são inteiramente
simples, mas ela as faz com uma perfeição tal, que é exatamente o que
Jesus nos pede.17
•Santa Teresa cie Ca lc u tá 39

Madre Teresa lutava efetivamente por “beber o cálice até a última


gota”, vivendo o compromisso de “ser toda só para Jesus”. Como declara­
ra outra Irmã de sua comunidade: “Ela estava muito, muito apaixonada
por Deus Onipotente.”18

“Vou levar-lhes alegria'’

Depois de fazer os votos perpétuos, Madre Teresa retomou as suas obri­


gações em St. Mary’s com o entusiasmo que a caracterizava. Voltou a
ensinar e a realizar as costumeiras atividades cotidianas de uma freira de
Loreto. Uma das companheiras observara, referindo-se a ela: “Trabalhava
muito. Muitíssimo. Primeiro nisto, depois naquilo. Nunca se esquivava
de coisa nenhuma, estava sempre pronta.”19
Aos domingos, costumava visitar os pobres nas favelas. Esse apos-
tolado,* que fora pessoalmente escolhido pela Irmã Teresa, deixou nela
uma profunda impressão:

Todos os domingos, visito os pobres das favelas de Calcutá. Não


posso ajudá-los, porque nada tenho, mas vou levar-lhes alegria. Da
última vez, vinte pequeninos estavam ansiosamente à espera da sua
“Ma”.** Quando me viram, correram ao meu encontro, até pulando
com uma perna só. Entrei. Naquela para — que é o nome que se dá
aqui a um conjunto de casas — lá viviam doze famílias. Cada família
dispõe de apenas um quarto, com dois metros de comprimento e
metro e meio de largura. A porta é tão estreita que eu mal consegui
entrar, e o teto é tão baixo que não me permitia ficar de pé. [...] Já
não me surpreende que as minhas pobres pequeninas gostem tanto

Este termo, derivado da palavra apóstolo (aquele que é mandado cm missão), refere-se ao
trabalho de levar pessoas a Cristo c à Sua obra de salvação. A palavra “apostolado" também se
refere à obra específica feita por membros de uma congregação religiosa, como estabelecido
por seu fundador ou sua fundadora.
** Uma freira de Loreto com votos perpétuos não era chamada pelos bengalis de "Ma", mas
de “M other”, em inglês. Portanto, foi o amor da Irmã Teresa pelas pessoas que fez com que
ela, merccidamente, ganhasse o título de “Ma”, uma expressão que denotava a intimidade c a
afeição que tinham em relação a ela.
40 l e n ha , seja M i n h a luz

da escola, e que tantas sofram de tuberculose. A pobre mãe [da famí­


lia que ela fora visitar] não proferiu uma palavra de queixa pela po­
breza em que vivem. Tudo aquilo era muito doloroso, mas ao mesmo
tempo fiquei muito feliz por ver que eles ficam felizes com as minhas
visitas. Finalmente, a mãe me disse: “Oh, Ma, venha nos ver outra
vez! O seu sorriso trouxe o sol a esta casa!”20

Aos amigos da Escópia, Madre Teresa revelou a oração que m ur­


murava interiormente no caminho de regresso ao convento: “Meu Deus,
com que facilidade os faço felizes! Dá-me forças para ser sempre a luz da
vida deles, a fim de conduzi-los a Ti.”21 Mal imaginava ela que, menos
de uma década mais tarde, essa oração seria atendida; que viria a dedicar,
não apenas o seu tempo livre, mas toda a sua vida aos pobres, se tornando
para eles um farol, por via do amor e da compaixão.
CAPITULO 2

(Uma coisa muito


bonita paraJesus
O VOTO PRIVADO, UMA
LOUCURA DE AMOR

Peça a Jesus que não me permita Lhe recusar coisa


alguma, por menor que seja. Preferiria morrer.
M adre Teresa

“Isto é o que esconde tudo em m im ”

Nos anos que se seguiram à profissão perpétua, o amor apaixonado de


Madre Teresa por Jesus continuou a inspirá-la a procurar sempre novas
formas, veladas, de expressar esse amor. A mais impressionante de todas
foi um excepcional voto privado que fez em abril de 1942: “Fiz um voto
a Deus, que me compromete sob [pena de] pecado mortal, a dar a Deus
qualquer coisa que Ele possa pedir, não Lhe recusar coisa alguma’.”1Deus
inflamara nela uma crescente intensidade de amor, o que a levou a fazer
essa oferta magnânima. Só mais tarde explicaria os motivos que a tinham
levado a isso: “Queria dar a Deus uma coisa muito bonita”2 e “sem reser­
vas”.3 Esse voto, uma verdadeira loucura de amor, expressava o desejo de
42 Xnili a, seja M i n i m luz

Madre Teresa de “beber o cálice até a última gota”, decidida como estava
a dizer sim a Deus, em todas as circunstâncias.
Esse voto privado foi um dos maiores segredos de Madre Teresa.
Ninguém teve conhecimento dele, à exceção do seu confessor, a quem so­
licitou orientação e autorização nesse assunto. Bastante familiarizado com
a profundidade da vida espiritual da Madre, ele concluiu que sua ousada
solicitação de se comprometer dessa maneira não se baseava em um mero
capricho, nem visava um ideal perigoso ou impossível. Ao contrário, ti­
nha sido estruturada em sua notável fidelidade a compromissos e em um
hábito já bem firmado de sempre procurar fazer o que mais agradava a
Deus. O fato de seu confessor ter lhe dado permissão para assumir tal
compromisso confirma a confiança que tinha na maturidade humana e
espiritual de Madre Teresa.
Quando, 17 anos mais tarde, ela finalmente se referiu a esse voto,
Madre Teresa revelou o que ele significava: “Isto é o que esconde tudo em
mim.”4 Realmente, o voto escondia a profundidade do seu amor a Deus,
que era a motivação de todos os seus atos, em especial da incondicional
submissão à Sua vontade. Como explicaria mais tarde, seu encontro com
a imensidão do amor de Deus demandava sua resposta:

Por que devemos nos entregar inteiramente a Deus? Porque Deus Se


entregou a nós. Se Deus, que nada nos deve, está pronto a nos en­
tregar nada menos do que a Si próprio, responderemos apenas com
uma pane de nós? Nos entregarmos inteiramente a Deus é um meio
de recebermos o próprio Deus. Eu por Deus e Deus por mim. Eu
vivo por Deus e abdico do meu próprio ser, e, assim, eu o induzo a
viver por meio de mim. Consequentemente, para possuirmos a Deus
devemos permitir que Ele possua a nossa alma.5

.flmor com amor se paga

Ao assumir esse novo compromisso, Madre Teresa ansiava por “pagar


amor com amor” de uma forma mais radical. Um dos paradoxos do amor
genuíno é que aquele que ama deseja livremente unir-se ao amado, de
•Santa Teresa de Ca lc u la 43

forma irrevogável. Foi essa misteriosa característica do amor que levou


Madre Teresa a selar a oferta total de si mesma por meio de um voto,
exprimindo, assim, de maneira tangível, sua ânsia de se unir por com­
pleto ao seu Amado. Para uma pessoa menos avançada no caminho do
amor, essa entrega total e essa completa conformidade à vontade de Deus
poderá parecer uma completa perda da liberdade. Mas aquele que verda­
deiramente ama procura realizar os desejos do amado e dar cumprimento
às suas expectativas até o menor detalhe. Consequentemente, o voto foi,
para Madre Teresa, o meio de reforçar a ligação que estabelecera com
Aquele que amava, experimentando, assim, a verdadeira liberdade que só
o amor pode dar.
Madre Teresa teria lido sobre a prática de fazer votos privados na
literatura espiritual do seu tempo.
William Doyle,* um sacerdote jesuíta irlandês, fez inúmeros votos
privados, porque achava que essa prática o ajudava a cumprir seus pro­
pósitos. Um desses votos, feito em 1911 e renovado diariamente até ter
conseguido obter autorização do seu confessor para torná-lo permanente,
rezava assim: “Faço deliberadamente o voto, pelo qual me comprometo,
sob pena de pecado mortal, a não recusar a Jesus sacrifício algum que
percebo, claramente, que Ele me pede.”6
A irmã Benigna Consolata Ferrero** também fez uma série de vo­
tos privados, como, por exemplo, o voto de fazer tudo por amor, o voto
de abandono, o voto de perfeição e o voto de humildade. Referindo-se
a esse último, que fez pela primeira vez em 1903, escreveria: “Meu Jesus
deseja que eu faça o voto de humildade, que consiste, segundo Ele me
disse, em reconhecer que nada sou sem a ajuda de Deus, e em desejar ser
desconhecida e desprezada. E disse-me que executasse sem atrasos nem
hesitações tudo que Ele me pedisse.”7

* Nasceu em 3 de março de 1873, em Dalkey, Irlanda, e morreu em 16 de agosto de 1917,


em Flanders, enquanto servia como capelão do Exército.
** Religiosa da Ordem da Visitação de Como, Itália, nasceu em 6 de agosto de 1885 e morreu em
Io de setembro de 1916, na primeira sexta-feira do mês.
44 Ve nha, seja M i n h a luz

Uma edição da autobiografia de Santa Teresa de Lisieux que circu­


lava naquela época incluía a Bula de Canonização de Santa Teresa do Me­
nino Jesus,8 proclamada pelo Papa Pio XI, onde se declarava: “Inspirada
pelo Espírito Santo, ansiava por viver uma vida de santidade, e prometeu
seriamente não recusar a Deus nada que Ele achasse por bem pedir, uma
resolução que se esforçou por cumprir até a morte.” A leitura sobre a
promessa de sua santa padroeira, como também, sobre os votos privados
feitos pelo frei Doyle e pela irmã Benigna Consolata, sem dúvida, inspi­
rou Madre Teresa a fazer o mesmo.
O entendimento e a prática de fazer votos de Madre Teresa tam­
bém foram grandemente influenciados pelo seu passado cultural. Tendo
sido educada em uma família que se encontrava fortemente enraizada nas
suas tradições albanesas, estava familiarizada com a altamente reverencia­
da e estimada prática da besa (como é conhecida em sua língua nativa), ou
seja, da “palavra de honra”. Exigindo a fidelidade absoluta à palavra dada,
a besa tem um caráter quase sagrado; é uma espécie de juramento ou de
voto, que não pode ser violado nem ao preço da própria vida. Mais tarde,
Madre Teresa explicaria: “Eles [os albaneses] têm uma palavra, besa, que
significa que, mesmo que você tenha matado o meu pai e que a polícia
esteja atrás de você, se eu tiver dado a minha palavra a você, nem que a
polícia me mate, não revelarei o seu nome.”9À luz da educação que tinha
recebido, o voto privado que a Madre Teresa fez assumia uma gravidade
ainda maior: ela estava decidida a ser fiel à palavra que dera a Deus, mes­
mo à custa da própria vida.

“jVâo Xhe recusar coisa alguma ”

Madre Teresa vivera fielmente o voto de obediência durante quase 11


anos. Como fervorosa freira de Loreto, estava convencida de que as suas
superioras religiosas ocupavam o lugar de Cristo, e de que, portanto, ao
conformar a sua vontade e a sua opinião com as delas, e ao se submeter
às suas ordens, estava se submetendo ao próprio Cristo.* Em bora se es-

* As Constituições das Irmás dc Loreto encorajavam “perfeita obediência”, isto é, conformi­


dade com a vontade e o julgamento das superioras.
•Santa Teresa d e C a lc u tá 45

forçasse por viver com perfeição o exigente voto de obediência, isso não
era suficiente para satisfazer o desejo ardente de provar seu amor. Queria
dar ainda mais! Por isso, comprometeu-se, por meio de um voto, a “dar
a Deus qualquer coisa que Ele possa pedir — ‘Não Lhe recusar coisa al­
guma’”10 — escolhendo ser considerada responsável “sob pena de pecado
m ortal”.11
Teresa de Calcutá sabia bem que a conseqüência do pecado mortal
era a morte da vida de Deus na alma e, em última análise, na ausência de
arrependimento, a perda de Sua amizade por toda a eternidade. A ideia
de uma separação Dele, ainda que momentânea, por causa de uma única
ofensa, era insuportável. Recusar o que fosse Àquele que amava era para ela
equivalente à dor da condenação eterna. Portanto, decidiu considerar mes­
mo a menor falta voluntária, a menor recusa a submeter-se à Sua vontade,
como a maior das ofensas. “Peça a Jesus que não me permita Lhe recusar
coisa alguma, por menor que seja”, escreveria mais tarde ao seu diretor
espiritual. “Preferiria morrer.”12 Cada passo em sua vida seria uma nova
oportunidade para dar testemunho da sua fidelidade a essa promessa.
Com esse voto, Madre Teresa visava a uma perfeita submissão in­
terior àquilo que mais agradava a Deus, até nos menores detalhes. Dessa
forma, o voto demandava o compromisso de discernir, cuidadosamente,
as mais leves manifestações da vontade de Deus nas pessoas, nos eventos e
nas coisas. Essa atenção habitual e amorosa em relação ao momento pre­
sente exigia o silêncio interior e o recolhimento. “No silêncio do coração,
Deus fala”, dizia a Madre Teresa com frequência, com uma convicção que
vinha de sua constante sintonia com a voz Dele.

'tfl bem-aventurança da submissão

Madre Teresa não temia assumir um compromisso tão sério, embora isso
implicasse em renunciar à sua própria vontade a cada momento. Sabia
que Deus a amava, e confiava que Sua vontade com relação a ela seria
sempre uma expressão desse amor infalível, por muito difícil, ou mesmo
impossível que pudesse ser, às vezes, entender os Seus desígnios. Conse­
quentemente, mesmo quando parecia que o desafio ia além das suas capa-
46 X'enha, seja JSIinha luz

cidades, as experiências prévias — de que Deus nunca lhe tinha falhado


— lhe asseguravam de que ela poderia correr o risco mais uma vez. Só essa
certeza de ser incondicionalmente amada poderia ter lhe dado suficiente
confiança para abandonar-se a Deus de forma tão completa e sem reser­
vas. “Sob pena de pecado mortal” era, realmente, sem reservas.
A gravidade do compromisso não a abateu nem lhe tirou a alegria.
Pelo contrário, era “muito divertida” e “apreciava tudo o que se passava”.13
A alegria de Madre Teresa não era apenas uma questão de temperamento;
era fruto da “bem-aventurança da submissão”14 que vivia. “Quando vejo
uma pessoa triste”, ela costumava dizer, “sempre penso que está recusan­
do alguma coisa a Jesus.”15 Era em dar a Jesus tudo o que Ele pedisse que
ela encontrava a sua mais profunda e mais duradoura alegria; ao Lhe dar
alegria, ela encontrava a sua própria alegria.

A alegria é sinal de uma pessoa generosa e mortificada que, se es­


quecendo de todas as coisas, incluindo a si própria, tenta agradar ao
seu Deus em tudo o que ela faz pelas almas. A alegria é muitas vezes
uma capa que esconde uma vida de sacrifício, de contínua união com
Deus, de fervor e generosidade. Uma pessoa que tem este dom da
alegria, com grande frequência atinge um elevado grau de perfeição.
Porque Deus ama aquele que dá com alegria16 e aproxima do Seu
coração a religiosa a quem ama.17

O i?ofo na vida diária

O voto secreto de Madre Teresa abrangia todos os aspectos da sua vida


diária. Tanto os momentos comuns, como os momentos extraordiná­
rios, tornavam-se oportunidades para receber de braços abertos a von­
tade de Deus, e responder fazendo “uma coisa bonita para Deus”. Tal
como a sua padroeira, Santa Teresa de Lisieux, Madre Teresa visava
“aproveitar todas as menores coisas, e fazê-las por amor”.18 Mais tarde,
explicaria às suas Irmãs:
Sa n ta Teresa de Ca lc utá 47

Para o bom Deus nada é pequeno porque Ele é táo grande e nós tão
pequenos — é por isso que Ele se abaixa e se dá o trabalho de fazer
essas pequenas coisas para nós — para nos dar a chance de provar
nosso amor por Ele. Por que Ele as faz, elas são muito grandes. Ele
não pode fazer nada pequeno; elas são infinitas. Sim, minhas queridas
filhas, sejam fiéis nas pequenas práticas de amor, de pequenos sacrifí­
cios — da pequena mortificação interior — de pequenas fidelidades
à Regra, que construirão em vocês a vida de santidade — as tornarão
semelhantes a Cristo.19

E voltaria a insistir: “Não procurem coisas grandes, apenas façam


coisas pequenas com grande amor. [...] Quanto menor for a coisa, maior
deve ser o nosso amor.”20 Ela vivia esse princípio em tudo que fazia ao
longo do dia. Grande ou pequeno — não importava para ela; tudo o que
fazia era uma oportunidade para amar.
Movida pelo voto que fizera, Madre Teresa desenvolveu também
o hábito de responder imediatamente às exigências do momento presen­
te. O forte impulso de agir sem demora — uma vez que tinha a certeza
de que aquela era a vontade de Deus para ela — era uma característica
notável de todos os seus projetos. Às vezes, essa rapidez em agir era mal
interpretada, sendo vista como impetuosidade e falta de prudência. Mui­
tos anos mais tarde, em uma tentativa de esclarecer um mal-entendido,
explicaria ao arcebispo Périer que o motivo por trás dessa urgência era o
voto privado que tinha feito muitos anos antes.

Nunca contei a Vossa Excelência o motivo pelo qual quero agir ime­
diatamente. Em 1942 — queria dar a Jesus algo sem reservas — Com
a permissão do meu confessor, fiz um voto a Deus — comprometen­
do-me sob pena de pecado mortal — de dar a Deus qualquer coisa
que Ele possa pedir — “Não Lhe recusar coisa alguma”. Ao longo
desses 17 anos, tenho tentado [ser fiel a esse voto], e é por essa razão
que quero agir imediatamente. — Compete a Vossa Excelência impe­
dir-me — e quando Vossa Excelência diz “Não”, tenho certeza de que
o meu voto se cumpre — porque não recuso a Deus minha submis­
são — Neste ponto, nunca houve dúvida em minha alma — porque
sempre as apresentei a Vossa Excelência e ao Pe. C. Van Exem e, cada
vez, o seu “Sim” ou “Não” me satisfizeram como a vontade de Deus.21
48 \ cn h a , s( ja M i n h a htz

“Extraordinária no seu sacrifício”

Em abril de 1942, quando Madre Teresa fez esse voto extraordinário, o


envolvimento da índia na Segunda Guerra Mundial estava atrapalhan­
do bastante a vida da sua comunidade e da escola e a sua decisão de não
recusar a Deus coisa alguma seria posta à prova. O exército britânico
requisitou St. Mary’s School como hospital militar e, em conseqüência
desse fato, todas as freiras e alunas internas tiveram que deixar Calcutá.
A seção inglesa da escola foi transferida para Simla, sendo a seção ben-
gali, que tinha cerca de cem alunas internas,22 evacuada para Morapai.
Alguns meses mais tarde, a seção bengali regressou a Calcutá e retomou
as atividades da escola em um prédio alugado, onde permaneceu até
1946. Uma das alunas internas recorda o papel decisivo que a Madre
Teresa desempenhou naqueles anos difíceis:

Naquele momento, a situação financeira era muito ruim. As irmãs de


Loreto cuidavam de nós e dependíamos delas. A Madre nos ajudava
na formação escolar. Ela fazia muitas coisas pelas meninas. Quando
percebeu que na Convent Road 15 não havia espaço para dormir
nem para estudar, começou a procurar outros lugares e descobriu um
local na Canal Street, 14. O prédio tinha quatro cômodos grandes e
um corredor. Ela o alugou, e era para onde ia com as meninas todos
os dias de manhã. Ali ficavam o dia todo, tomavam banho, estuda­
vam e passavam o dia. Ao fim da tarde, quando as aulas acabavam,
a Madre nos levava outra vez para St. Mary’s [a escola que ficava na
Convent Road].23

Como o número de freiras encarregadas das alunas internas tinha


diminuído, a maioria das questões práticas relacionadas à administração
da escola recaiu sobre os ombros de Madre Teresa — além de suas já
demandadoras tarefas de dar aulas e cuidar das meninas. Após alguns
meses com essas responsabilidades, adoeceu gravemente. Em setembro de
1942, um missionário croata em Bengala reportou: “Madre Teresa esteve
muito doente, de tal maneira que não tinham grandes esperanças de que
ela sobrevivesse; mas já está outra vez de pé e trabalha por dez.”24 Uma
■Santa Teresa de Calc uta 49

das suas pupilas enriquece esse relato com alguns detalhes: “Durante a
Segunda Guerra Mundial, não havia professoras para as turmas 4 a 10.
A Madre ficou com todas as turmas e nos mantinha ocupadas, para que
pudéssemos esquecer e superar o medo que tínhamos.”
Essas dificuldades foram ainda acrescidas pela fome de Bengala
(1942-1943), que ceifou a vida de pelo menos dois milhões de pessoas.
Quando as irmãs e as alunas começaram a ser afetadas pela escassez de ali­
mentos, Madre Teresa, que tinha prometido nada recusar a Deus, confiou
que, por Sua vez, Deus nada lhe recusaria. Uma das antigas estudantes
recorda que “um dia, acabou a comida. Às 8h da manhã, a Madre [Teresa]
nos disse: ‘Vou sair, meninas, fiquem na capela e rezem.’ Às 4h da tarde,
a dispensa estava cheia de todo o gênero de legumes. Nós nem acreditá­
vamos no que estivamos vendo.”
Em 1944, a Madre Teresa foi nomeada diretora da St. Marys,
bem como superiora de fato das Filhas de Santa Ana (a congregação
bengali afiliada a Loreto). Recebeu de bom grado as novas tarefas como
vindas das mãos de Deus. Embora fosse eficiente e precisa no cumpri­
mento das suas responsabilidades, não era mais rigorosa com as outras
do que consigo mesma. O seu exemplo inspirava aqueles que a rodea­
vam. Uma das Irmãs observava: “É uma criatura completamente altruís­
ta. É extraordinária no seu sacrifício. É capaz de fazer qualquer coisa por
amor a Deus, de suportar qualquer humilhação ou sofrimento.”25
Na sua prontidão para atender a qualquer manifestação da vontade
de Deus com um ansioso “Sim”, Madre Teresa algumas vezes se aventurava
em situações muito perigosas. Em agosto de 1946, explodiu em Calcutá o
conflito hindu-muçulmano, desencadeando uma violência em massa. O
“Dia da Grande Matança”, como veio a ser conhecido, deixou cinco mil
pessoas mortas nas ruas, e, pelo menos, cinqüenta mil feridas. Todas as
atividades da cidade, incluindo a provisão de alimentos, foram suspensas.
Compelida pelas necessidades de suas alunas, a Madre Teresa decidiu deixar
a segurança dos muros do convento para ir à procura de comida.

Saí de St. Mary’s em Entally. Tinha trezentas garotas no internato


e nada para comer. Não deveríamos sair na rua, mas eu saí. Ai eu
vi os corpos nas ruas, esfaqueados, espancados, deitados cm estra-
50 Ve nha , seja M i n h a luz

nhas posições sobre seu próprio sangue seco. Tínhamos ficado atrás
dos nossos seguros muros. Sabíamos que tinha havido distúrbios.
Algumas pessoas tinham saltado o muro para dentro d o convento,
primeiro um hindu, depois um muçulmano... Nós os recebemos e
os ajudamos a fugir em segurança. Só quando eu saí nas ruas é que
vi a morte que os perseguia. Um caminhão cheio de soldados me
parou e me disseram que eu não devia estar na rua. “Ninguém devia
sair”, disseram eles. Eu lhes disse que precisara sair, correr esse risco,
porque tinha trezentas estudantes que não tinham nada para comer.
Os soldados tinham arroz, me levaram no caminhão para a escola e
descarregaram os sacos de arroz.26

Não eram as superioras de Madre Teresa que exigiam que ela cor­
resse risco de morte, nem esperavam que ela o fizesse. Nem a responsa­
bilidade que tinha pelas jovens que estavam ao seu encargo a obrigava a
enfrentar os perigos das ruas.daquela cidade banhada em sangue. Foi ela
quem decidiu ir. Deve ter percebido, nas profundezas do seu coração, o
chamado Daquele a quem tinha prometido dar tudo o que Ele lhe pedis­
se. E ela não recusaria! Confiara-se à Sua intervenção providencial e sua
confiança foi recompensada. Devem ter existido muitos momentos em
que sua fidelidade a esse voto privado foi desafiada, mas Madre Teresa
emergia de cada novo “Sim” mais intimamente unida ao Senhor a quem
estava disposta a entregar “até a própria vida”.

Só corn a graça de t>eus

Madre Teresa nunca perdeu a nítida percepção da sua própria fraqueza,


limitação e pobreza. Só o auxílio de Deus, Sua graça constante, tornaria
possível uma fidelidade sustentada. Como explicaria mais tarde, estava
completamente ciente de que “podemos recusar a Cristo como recusamos
aos outros: não Te darei as minhas mãos para trabalhares, os meus olhos
para veres, os meus pés para andares, a minha inteligência para estudares,
o meu coração para amares. Tu bates à porta, mas eu não a abrirei. Não Te
darei a chave do meu coração”.27 Por isso, Madre Teresa constantemente
pedia aos outros que a apoiassem com oração.
•Santa Teresa d( C alc utá 51

O voto da Madre Teresa foi uma providencial preparação para


a missão que tinha adiante. O compromisso de “não Lhe recusar coisa
alguma” exprimia sua firme resolução de não impor limites aos planos de
Deus para ela. Por Sua vez, Jesus tomou-a pela palavra dada. Quatro anos
mais tarde, Madre Teresa receberia um novo chamado de Jesus, no qual
Ele faria ecoar o voto que fizera.
CAPÍTULO 3

“Venha, seja
Minha luz ”
O “c h a m a d o d e n t r o
DO CHAMADO”

Vai recusar?
C r i s t o a M adr e T eresa

O dia da inspiração

Em setembro de 1946, Madre Teresa, então com 36 anos, foi mandada


para o convento de Loreto em Darjeeling, uma cidade aos pés do Him a­
laia, cerca de 600 quilômetros ao norte de Calcutá, para fazer o retiro
anual e tirar uns dias de necessário repouso. Durante a viagem de trem, na
terça-feira, 10 de setembro de 1946, teve um decisivo encontro místico
com Cristo. Embora persistisse em deixar os detalhes velados, mais tarde
revelaria o seguinte:

Foi um chamado dentro da minha vocação. Foi um segundo chama­


do. Era uma vocação para abandonar até mesmo Loreto, onde fui
54 Vi mha. seja M i n h a luz

muito feliz, e ir para as ruas servir aos mais pobres dos pobres. Foi
naquele trem, eu ouvi o chamado para abandonar tudo e segui-Lo
dentro das favelas — para servi-Lo nos mais pobres dos pobres. (...)
Eu sabia que era a Sua vontade e que tinha que segui-Lo. Não havia
dúvida que a obra seria Dele.1

Madre Teresa considerava esse dia, mais tarde celebrado como “Dia
da Inspiração”, como sendo o verdadeiro começo das Missionárias da Cari­
dade. No registro de entrada onde se anotam os dados pessoais das mulheres
que se unem à Congregação,* ela anotaria abaixo do seu próprio nome: “En­
trada na Congregação — 10 de setembro de 1946.” Como diria, bem mais
tarde, às suas Irmãs:

A forte graça de Luz e Amor Divino que a Madre recebeu na viagem


de trem para Darjeeling em 10 de setembro de 1946 é onde as MC
[Missionárias da Caridade] começam — nas profundezas do anseio
infinito de Deus por amar e ser amado.2

E explicaria mais adiante:

Foi nesse dia de 1946, no trem para Darjeeling, que Deus me fez o
“chamado dentro do chamado” para saciar a sede de Jesus servindo-O
nos mais pobres dos pobres.3

“Tenho sede”

Até o final de sua vida, Madre Teresa insistiu que a razão mais im portante
da existência da congregação que ela fundara era saciar a sede de Jesus. No
primeiro esboço das Regras (escrito vários meses após a sua experiência
no trem), que permanece essencialmente o mesmo até hoje, ela expressou
o objetivo da nova congregação: “A Finalidade Geral das Missionárias da
Caridade é saciar a sede de Jesus Cristo na Cruz de Amor e Almas.”

* Quando uma nova Irmá entra para a Congregação, suas informações pessoais são registradas
no “registro de entrada”. Uma importante informação é a data na qual a Irmã entra para as
Missionárias da Caridade.
•Santa Teresa <le C alc uta 55

O fato de a congregação ter como objetivo “saciar a sede de Jesus na


Cruz” indica que sua experiência mística aconteceu no contexto do Calvá­
rio, no momento em que Jesus, morrendo na Cruz, gritou: “Tenho sede.”4
Foi essa passagem da Escritura que ficou distinta, para ela, como um resu­
mo e uma lembrança do seu chamado. Ao instruir as Irmãs, ela explicava:

“Tenho sede”, disse Jesus na Cruz, quando estava privado de toda


consolação, morrendo em absoluta pobreza, abandonado, despreza­
do, quebrado em corpo e alma. Ele falou de Sua sede — não de água
— mas de amor, de sacrifício.
Jesus é Deus; portanto, Seu amor, Sua sede, é infinita. O nos­
so objetivo é saciar essa sede infinita de um Deus feito homem. Tal
como os anjos, que O adoram no Céu, cantam incessantemente os
louvores de Deus, assim também as Irmãs, utilizando os quatro votos
de Absoluta Pobreza, Castidade, Obediência e Caridade para com
os pobres, saciam incessantemente o Deus sedento através de seu
amor e do amor das almas que elas Lhe trazem.5

Havia por trás dessa explicação muito mais do que ela jamais reve­
lara. Mas, através de suas palavras e de seu exemplo, seus seguidores com­
preenderiam o sentido da graça que a Madre tinha recebido naquele dia.
Madre Teresa sabia que só estando unida a Maria, que fora a pri­
meira a ouvir o grito de sede de Jesus, poderia realizar sua missão. Por
isso, exortava os seus seguidores:

Vamos permanecer sempre com Maria nossa Mãe no Calvário perto


de Jesus crucificado,6 com o nosso cálice feito dos quatro votos, e
preenchê-lo com o amor do sacrifício pessoal, o puro amor, sempre
erguido próximo ao Seu Coração sofrido, para que Ele possa ficar
feliz em aceitar o nosso amor.7

A sede — uma necessidade física que almeja ser satisfeita, um do­


loroso anseio por algo que está faltando — tornou-se, para ela, sinônimo
de aspectos singulares do amor de Deus por cada pessoa. Poucos anos
antes de morrer, recordaria aos seus seguidores:
56 Íín /iíí, seja M i n h a luz

Jesus quer que eu lhes diga novamente [...] quão grande é o amor
que Ele tem por cada um de vocês — além de tudo o que vocês
possam imaginar. [...] Ele não só os ama, mais ainda — Ele anseia
por vocês. Sente saudades quando vocês não vão para perto Dele. Ele
tem sede de vocês. Ele os ama sempre, mesmo quando vocês não se
sentem merecedores. [...]
Para mim é tão claro — tudo nas MC existe apenas para saciar
Jesus. As Suas palavras, na parede de cada capela das MC,* não são
apenas do passado, mas estão vivas aqui e agora, dirigidas a vocês.
Acreditam nisso? [...] Por que Jesus diz: “Tenho sede”? O que sig­
nifica isso? Algo tão difícil de explicar com palavras — [...] “Te­
nho sede” é algo muito mais profundo do que Jesus dizendo apenas
“Amo vocês”. Até que vocês saibam, bem lá no fundo, que Jesus tem
sede de vocês — não podem começar a saber quem Ele quer ser para
vocês. Ou quem Ele quer que vocês sejam para Ele.8

Esse profundo mistério da sede de Deus de amor e de almas ficou


gravado no seu coração na viagem para Darjeeling, na qual Madre Teresa
foi chamada a revelá-lo aos mais pobres dos pobres. Nas primeiras Regras,
ela identificou esta missão especial:

A Finalidade Específica é levar Cristo às casas e as ruas das favelas, en­


tre os doentes, os moribundos, os mendigos e às criancinhas de rua.
Os doentes serão tratados, na medida do possível, em seus pobres
lares. As criancinhas terão uma escola nas favelas. Os mendigos serão
procurados e visitados nos seus buracos, fora da cidade ou nas ruas.

Posteriormente, ela elaboraria o texto de forma mais abrangen­


te, cuja formulação definitiva é a seguinte: “A nossa missão específica é
labutar para a salvação e a santificação dos mais pobres dos pobres, não
apenas nas favelas, mas também em todo o mundo, onde quer que eles

* Na parede de todas as capelas das Missionárias da Caridade, as palavras de Jesus “I thirst” sáo
colocadas ao lado do crucifixo como uma lembrança do objetivo da espiritualidade e missão
da Instituição.
•Santa Teresa de C a lc u tá 57

se encontrem.”'1Os pobres e aqueles que mais sofrem foram o objeto par­


ticular do amor da Madre Teresa. Ela sabia que só o amor, um amor que
tem Deus como origem e como fim, daria sentido e felicidade à vida de­
les. Como o Bom Samaritano,10 através de seu serviço imediato e eficaz,
ela estava determinada a tornar o amor de Deus concreto para os pobres
nas situações desesperadas com que eles se deparavam na vida cotidiana.
Através de suas simples obras de amor, ela queria ajudá-los a viver a vida
com dignidade e dar a eles a oportunidade de conhecer a Deus. A “salva­
ção e santificação dos mais pobres dos pobres”, ou a “salvação de almas”,
portanto, significava, para ela, um esforço incansável para ajudar a todos
a encontrar o amor infinito de Deus e, depois de conhecê-lo, ajudar a to­
dos a amá-Lo e servi-Lo em resposta ao Seu amor, para alcançarem, assim,
a bem-aventurança do Céu.
Além de levar a luz de Cristo aos mais pobres dos pobres, Madre
Teresa encontrava Cristo em cada um deles. Jesus escolheu identificar-
Se com os pobres e com todos os que sofrem, como Ele afirmou ao di­
zer: “Todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais peque­
ninos, foi a mim mesmo que o fizestes.”11 Madre Teresa compreendeu a
profundidade da identificação de Jesus com cada sofredor, e entendeu
a ligação mística entre os sofrimentos de Cristo e os sofrimentos dos
pobres. Sua resposta ao chamado de Jesus para saciar Sua sede foi seu
hum ilde serviço, através do qual esforçava-se para “levar almas a Deus
— e Deus às almas”.12

jfl “Voz"

Nesse mesmo 10 de setembro, Madre Teresa começou a receber uma série


de locuções13 interiores, que prosseguiram até meados do ano seguinte.
Ela estava realmente ouvindo a voz de Jesus e conversando intimamente
com Ele. Ela está entre os santos a quem Jesus falou diretamente, pedin­
do-lhes que empreendessem uma missão especial entre o Seu povo. Des­
de o princípio dessa extraordinária experiência, Madre Teresa nunca teve
dúvidas de que era Jesus que falava com ela. Mesmo assim, na maioria das
vezes, costumava se referir a essas comunicações como a “Voz”.
58 í cnh a, seja M in h a luz

Entre Cristo e Madre Teresa aconteceu um comovente diálogo de


grande beleza. Com a maior ternura, Ele dirigia-se a ela tratando-a por
“Minha esposa" ou “Minha p e q u e n i n a “Meu Jesus”, replicava Madre
Teresa, ansiando por “pagar amor com amor”. Nesse diálogo sagrado,
Jesus estava revelando o Seu Coração para ela: Sua dor, Seu amor, Sua
compaixão. Sua sede pelos que mais sofrem. E também lhe revelou Seu
plano de enviá-la como portadora do Seu amor. Essa revelação teve um
eco profundo na alma de Madre Teresa. Muitos anos antes, ao escrever
para casa, a Madre tinha expressado o desejo “de levar alegria às vidas”14
daqueles a quem fora enviada. Tinha rezado para ter “forças para ser sem­
pre a luz da vida deles, a fim de conduzi-los a Ti!”.15 Porém, o chamado
para que deixasse Loreto e fosse um sinal da presença de Cristo, uma porta­
dora do Seu amor e compaixão para os mais pobres dos pobres nas favelas,
não era o que ela esperava receber como resposta às suas orações. Mesmo
assim, a Voz continuava a pedir-lhe: “Venha, venha, leve-Me aos buracos dos
pobres. Venha, seja Minha luz. ”O convite de Jesus estava imbuído de con­
fiança; Ele contava com sua resposta.
Durante o retiro que fez em Darjeeling, Madre Teresa começou a
registrar “o que aconteceu entre Ele e eu durante os dias de muita oração”.
Mais tarde, ela se referiria a essas anotações como “a cópia da Voz desde
setembro de 1946”, e as utilizou em sua correspondência com o arcebispo
de Calcutá, citando a “Voz” que vinha ouvindo. Mas se passariam ainda
alguns meses antes de tal correspondência se iniciar.

O primeiro passo

No início de outubro, Madre Teresa regressou de Darjeeling a Calcu­


tá para retomar suas atividades na St. Marys School. Assim que teve
uma oportunidade, relatou ao diretor espiritual — o pe. Jesuíta Celeste *

* As paJavras de Jesus, mensagens interiores ouvidas por Madre Teresa, estáo cm itálico.
•Sa n t a Teresa de ( a le n ta 59

Van Exem* — o qüe tinha acontecido no trem e durante o retiro, mos­


trando-lhe “as poucas anotações escritas durante o retiro”.16
Madre Teresa desejava agir imediatamente de acordo com a sua
inspiração. Porém, devido ao fato de ter consagrado a sua vida a Deus por
meio de um voto de obediência, só poderia proceder com a aprovação dos
superiores. Para ela a bênção deles não era uma simples formalidade, mas
uma proteção e garantia de que a mão de Deus estava no seu empreendi­
mento. Apenas a permissão deles daria a ela a certeza de que esse chamado
era efetivamente a vontade de Deus e não uma falsa ilusão.
Competia ao diretor espiritual, às superioras de Madre Teresa na
ordem religiosa a que pertencia e, especialmente, ao arcebispo de Calcutá,
um jesuíta chamado Ferdinand Périer, discernir e pôr à prova esse
chamado. Se considerassem que não era autêntico, estavam obrigados
a desencorajá-lo; se achassem que era genuíno, estavam obrigados, em
consciência, a colaborar na sua concretização.
O pe. Van Exem, sendo um sábio diretor espiritual, levou a questão
muito a sério. Tinha uma grande admiração por essa freira humilde e
fervorosa e respeito pela profundidade da sua vida espiritual. Não teve
nenhuma dúvida quanto à sinceridade da Madre, mas estava ciente
dos riscos em dar demasiado crédito a tais experiências caso se provasse
que não eram de origem divina. Conhecendo a firme determinação de
Madre Teresa de fazer apenas a vontade de Deus, decidiu pôr à prova
a autenticidade das inspirações, contando com a obediência dela como
confirmação da mão de Deus nesse acontecimento extraordinário.

“<Proibiu-me até de pensar no assunto”


A primeira exigência que o pe. Van Exem fez à Madre Teresa foi a de que
parasse de pensar na inspiração, por um tempo. Em carta posterior à su­
periora geral da ordem, Madre Teresa escreveu:

Diretor espiritual de Madre Teresa desde 1944. Nasceu cm 4 de outubro de 1908, em


Elverdinge, Bélgica; ingressou na Companhia de Jesus em 1927 e foi ordenado em 1940, no
St. Mary's College, em Kurscong, índia. Depois de ajudar na fondaçáo das Missionárias da
Caridade, ele serviu por muitos anos como confessor das irmás em Calcutá. Faleceu em 20
de setembro de 1993.
60 l e n h a , seja M i n h a luz

[O pe. Van Exem] desencorajou-me — embora percebesse que era de


Deus, proibiu-me até de pensar no assunto. Durante aqueles quatro
meses [entre setembro de 1946 e janeiro de 1947], com frequência,
com muita frequência, eu pedi que me deixasse falar com Sua Excelên­
cia [o arcebispo de Calcutá], [mas] a cada vez, ele recusou.17

A renúncia que ele lhe pedira era uma forma bastante drástica de
pôr à prova o caráter genuíno do chamado, mas nada menos do que isso
o asseguraria da sua origem divina. Por isso, em obediência ao seu dire­
tor espiritual, Madre Teresa permaneceu silenciosa, em oraçáo, sem saber
qual seria o resultado.
Em janeiro de 1947, o pe. Van Exem já não tinha dúvidas de que a
inspiração de Madre Teresa vinha de Deus, e de que chegara a hora de ela
seguir em direção da concretização do chamado. Deu, portanto, permissão
para ela escrever ao arcebispo. Numa carta simples e direta, ela com uni­
cou ao arcebispo Périer aquilo que estava convencida de que Deus estava
pedindo a ela.

‘O que se passou entre tie e eu”

St. Mary’s Convent


13/01/1947

Excelência,
Desde set. passado, estranhos pensamentos e desejos têm preen­
chido o meu coração. Eles se tornaram mais fortes e mais claros du­
rante os 8 dias de retiro que fiz em Darjeeling. Ao chegar aqui, contei
tudo ao pe. Van Exem — mostrei a ele as poucas anotações que tinha
escrito durante o retiro. — Ele me disse que achava que se tratava
de uma inspiração de Deus — mas que rezasse e permanecesse em
silêncio em relação a isso. Continuei lhe contando tudo o que se pas­
sava em minha alma — em pensamentos e desejos. — Então ontem
ele escreveu o seguinte: “Não posso impedi-la de falar ou de escrever
a Sua Excelência. Escreverá a Sua Excelência como uma filha a seu
pai, com perfeita confiança e sinceridade, sem nenhum medo nem
•Santa Teresa de C alc utá 61

ansiedade, contando-lhe como tudo aconteceu, acrescentando que


falou comigo e que agora eu acho que náo posso, em sã consciência,
impedir que lhe exponha tudo.”
Antes de começar, quero dizer que, a uma palavra de Vossa Exce­
lência, estou disposta a não voltar jamais a considerar qualquer dos
estranhos pensamentos que me têm ocorrido continuamente.
Durante o ano, tenho ansiado com muita frequência por ser toda
para Jesus e fazer com que outras almas — especialmente indianas,
venham e O amem fervorosamente — identificar-me por completo
com as jovens indianas, e assim amá-Lo como nunca foi amado antes.
Pensei que fosse um dos meus muitos loucos desejos. Tinha lido a vida
da Santa M. Cabrini* — Ela fez tantas coisas pelos americanos por­
que se tornou uma deles. Por que não posso fazer pela índia o que ela
fez pela América? Ela não ficou esperando que as almas chegassem até
ela — foi até elas com suas zelosas trabalhadoras. Por que não posso
fazer o mesmo por Ele aqui? Há tantas almas — puras — santas que
anseiam por se entregar somente a Deus. As ordens europeias são ricas
demais para elas — elas tiram mais do que dão — "Não vai ajudar?”
Como posso? Fui e sou muito feliz como Freira de Loreto. — Deixar
aquilo que amo e expor-me a novos trabalhos e sofrimentos que serão
grandiosos, ser objeto de zombaria de tantos — especialmente de
religiosos — abraçar e escolher deliberadamente as coisas difíceis de
uma vida indiana — [abraçar e escolher] a solidão e a infâmia — a
incerteza — e tudo isso porque Jesus assim o quer — porque alguma
coisa me chama “a deixar tudo e a reunir o pouco — para viver a vida
Dele — para fazer a obra Dele na índia”. Esses pensamentos eram
causa de muito sofrimento — mas a voz continuava a perguntar: "Vai
recusar?” Um dia, ao receber a Sagrada Com[unhão], ouvi a mesma
voz com grande clareza — "Quero freiras indianas, vitimas do Meu
amor, que sejam Maria e Marta.™ Que estejam tão unidas a Mim que
irradiem o Meu amor por sobre as almas. Quero freiras livres, cobertas

* Santa Francisca Xavier Cabrini (1850-1917), italiana e fundadora das Irmãs Missionárias
do Sagrado Coração de Jesus, uma ordem que trabalhava com imigrantes italianos nos Esta­
dos Unidos. Fundou hospitais, orfanatos, creches e escolas. Em 1946, foi a primeira cidadã
americana a ser canonizada.
62 Venha, seja M i n h a luz

com Minha pobreza da Cruz19— Querofreiras obedientes cobertas com


Minha obediência da Cruz.20 Quero freiras cheias de amor cobertas
com a Caridade da Cruz.21 Vai recusar afazer isto por Mim?”Em outro
dia. "Você se tomou minha Esposa por Meu Amor — veio para a índia
por Mim. A sede que você tinha de almas a trouxe para tão longe. — Tem
medo de dar mais um passo pelo seu Esposo — por M im — pelas almas?
— Sua generosidade esfriou? — Estou em segundo lugar na sua vida?
Você não morreu pelas almas — é por isso que não lhe importa o que
lhes aconteça. — O seu coração nunca esteve mergulhado em dor como
esteve o de Minha Mãe. Ambos demos tudo pelas almas — E você? Tem
medo de perder a sua vocação — de se tomar secular — de faltar-lhe a
perseverança. — Não — a sua vocação é amar e sofrer e salvar almas e,
dando estepasso, realizará o desejo do Meu Coração por você — E essa a
sua vocação. — Usará roupas indianas simples ou como as que a Minha
Mãe usava — simples epobres. — O seu hábito atual é sagrado porque é
Meu símbolo — o seu sári se tomará sagrado porque será Meu símbolo. ”
Tentei persuadir Nosso Senhor de que tentaria tornar-me uma freira
de Loreto muito fervorosa e santa, uma verdadeira vítima aqui nesta
vocaçáo — mas a resposta foi novamente muito clara. "Quero Irmãs
Missionárias da Caridade indianas — que serão Meu fogo de amor entre
os muito pobres — os doentes — os moribundos — as criancinhas de rua
— Quero que Me traga os pobres — e as Irmãs que ofereçam suas vidas
como vitimas do Meu amor — trarão essas almas a Mim. Sei que você
ê a pessoa mais incapaz, fraca e pecadora, mas é precisamente porque
você é assim que Eu quero usá-la, para a Minha Gbria! Vai recusar?”
Estas palavras, ou melhor, esta voz me assustou. A ideia de comer,
dormir — viver como os indianos encheu-me de medo. Rezei du­
rante muito tempo — rezei muito — pedi a Maria Nossa Mãe que
pedisse a Jesus que afastasse tudo isto de mim. Quanto mais rezava
— mais clara a voz se tornava dentro do meu coração, de maneira
que comecei a rezar para que Ele fizesse comigo tudo o que quisesse.
Ele me pediu uma e outra vez. Então, mais uma vez, a voz foi muito
clara — "Você está sempre dizendo fa z comigo tudo o que quiseres'. —
E agora Eu quero agir — deixe-Me fazê-b — Minha pequena Esposa
— Minha pequenina. — Não tenha medo — Eu estarei sempre com
você. — Soferá e sofre agora — mas sefor a Minha pequena Esposa
— a Esposa do Jesus Crucificado — terá que suportar estes tormentos
S ant a Teresa de Ca lc u tá 63

no seu coração. — Deixe-Me agir — Não Me recuse. — Confie amo­


rosamente em Mim — confie cegamente em M im. " “Pequenina, Me
dê almas — Me dê as almas das criancinhas pobres da rua. — Como
dói — se você somente soubesse — ver estas pobres crianças manchadas
pelo pecado. Anseio pela pureza do amor delas. — Se ao menos você
respondesse ao Meu chamado — e Me trouxesse essas almas — as tirasse
das mãos do demônio. — Se somente soubesse quantos pequeninos caem
em pecado cada dia. Há conventos com muitas freiras que cuidam dos
ricos e capazes, mas para os Meus muito pobres não há absolutamente
nenhuma. Eu anseio por eles — amo-os. — Vai recusar?” "Peça a Sua
Excelência que Me dê isto em agradecimento pelos 25 anos de graça que
Eu lhe dei. ”
Foi isto que se passou entre Ele e eu durante os dias de muita oração.
— Agora tudo está claramente diante dos meus olhos como se segue —

“O chamado”
Ser indiana — viver com eles — como eles — a fim de chegar ao
coração das pessoas. A ordem começaria fora de Calcutá — Cossipo-
re — num lugar aberto e solitário ou em Sealdah de S. João, onde as
Irmãs pudessem ter uma vida verdadeiramente contemplativa duran­
te o noviciado — onde completariam um ano inteiro de verdadeira
vida interior — e outro ano em ação. As Irmãs devem abraçar uma
pobreza perfeita — a pobreza da Cruz — nada senão Deus. — Para
que as riquezas não entrem no seu coração, elas não terão nada do
exterior — mas se manterão com o trabalho das próprias mãos —
pobreza franciscana* — trabalho beneditino.**
Na Ordem, jovens de todas as nacionalidades devem ser admitidas
— mas devem passar a ter mentalidade indiana — se vestir com roupas
simples. Um hábito comprido, branco, de mangas compridas, um sári

* Sáo Francisco de Assis (1181 ou 1182-1226), italiano, fundador dos Franciscanos, era co­
nhecido por sua prática de pobreza radical.
“ Sáo Bento de Núrcia (c. 480-543), italiano, fundador do monasticismo ocidental, tinha
como lema “Ora et Labora” (Reze e Trabalhe).
64 Xcnha. s( j a M in ha luz

azul claro e um véu branco, sandálias — sem meias — um crucifixo


— cinto e terço.
As Irmãs devem adquirir um conhecimento completo da vida in­
terior — através de sacerdotes santos que as ajudem a chegar a estar
tão unidas a Deus que O irradiem quando se juntarem às missões.
Elas devem se tornar verdadeiras vítimas — sem palavras — mas em
todos os sentidos da palavra, vítimas indianas pela índia. O amor
deve ser a palavra, o fogo, que as faça viver a vida em sua plenitude.
Se forem muito pobres, as freiras serão livres para amar apenas a Deus
— para servir apenas a Ele — para serem somente Dele. Os dois anos
de perfeita solidão — devem fazê-las pensar no interior quando esti­
verem no meio do exterior.
A fim de renovar e manter este espírito — as Irmãs devem passar
um dia por semana na casa — na Casa-Mãe da cidade onde estiverem
em missão.

“O trabalho”

O trabalho das Irmãs será ir até as pessoas. — Não haverá colégios


internos — mas haverá muitas escolas — gratuitas — só até a segun­
da série. Em cada paróquia irão duas Irmãs — uma para os doentes e
os moribundos — outra para a escola. Se o número assim o exigir, os
pares poderão aumentar. As Irmãs ensinarão os pequeninos — aju­
dando-os a terem recreações e assim mantê-los fora da rua e longe do
pecado. As escolas deverão ficar localizadas apenas nos lugares muitos
pobres das paróquias, para tirar as crianças das ruas, para ficar com
elas enquanto os pais — que são pobres — vão trabalhar. Aquela que
cuidar dos doentes — dará assistência aos moribundos — fará todo
o trabalho para os doentes — o mesmo, se não mais, do que uma
pessoa recebe no hospital — os lavará e preparará o local para a Sua
vinda. A uma hora previamente marcada, todas as Irmãs das diferen­
tes paróquias se encontrarão no mesmo lugar e irão para casa — onde
terão essa completa separação do mundo. — Isso nas cidades onde o
número dos pobres for grande. — Nas aldeias — a mesma coisa —
só que aí podem deixar a referida aldeia — uma vez que o trabalho
•Santa Teresa d( C a lc ut a 65

de instrução e serviço terminar. Para poder se locomover com grande


facilidade e rapidez, cada irmã deverá aprender a andar de bicicleta,
algumas delas a dirigir um ônibus. Isto é um pouco moderno demais
— mas há almas morrendo por falta de cuidados — por falta de
amor. Essas Irmãs — essas verdadeiras vítimas devem fazer o traba­
lho que está faltando no Apostolado de Cristo na India. E também
devem ter um hospital para crianças pequenas com doenças graves.
As Freiras desta ordem serão Missionárias da Caridade ou Irmãs Mis­
sionárias da Caridade.
Deus me chama — indigna e pecadora como sou. E eu anseio por
dar tudo pelas almas. Todos vão pensar que estou louca — depois
de tantos anos — começar algo que me trará na sua maior parte só
sofrimento — mas Ele também me chama a unir-me às poucas pes­
soas para iniciar o trabalho, para combater o demônio e privá-lo das
milhares de pequenas almas que ele destrói cada dia.
Esta carta está bastante comprida — mas contei-lhe tudo, como
teria contado à minha mãe. — Anseio por ser realmente só Dele
— por arder por completo por Ele e pelas almas. — Quero que Ele
seja ternamente amado por muitos. — Portanto se o senhor achar,
se desejar — estou pronta para fazer a Vontade Dele. Não leve em
conta os meus sentimentos — não leve em conta o preço que terei
que pagar — estou pronta — porque eu já dei o meu “todo” para
Ele. E se achar que tudo isto é um engano — também isso aceitarei
— e me sacrificarei por completo. — Envio esta carta pelas mãos
do pe. Van Exem. Dei-lhe plena permissão para usar tudo o que eu
lhe contei que esteja relacionado comigo e com Ele nesta obra. — A
minha transferência para Asansol me parece parte do plano Dele
— aí terei mais tempo para rezar e para me preparar para a chegada
Dele. Neste assunto, deixo-me completamente nas suas mãos.
Reze por mim. Para que eu me torne uma religiosa segundo o
coração Dele.
Sua devota filha em J. C. [Jesus Cristo],
Maria Teresa.“
66 Venha, seja M i n h a luz

Vai recusar?

No momento em que escrevia essa carta, Madre Teresa já era uma pessoa
de considerável santidade. Ainda que ela fosse táo sacrificada e corajo­
sa, táo generosa e compassiva com os pobres, por su^ própria iniciativa,
nunca teria considerado abandonar Loreto para fundar uma nova comu­
nidade religiosa. Mas a inspiração a compelia de tal maneira que, para
conseguir deixar de prestar atenção à “Voz”, teria que pagar um preço
exorbitante: ser infiel ao seu mais profundo amor.
Inicialmente, viu-se intimidada por essas experiências extraordiná­
rias; pensamentos perturbadores surgiram no seu coração. Questionando
sua própria capacidade para corresponder às exigências desse novo cha­
mado, expôs, com total honestidade, seu medo, sua confusão, sua relu­
tância em abraçar as dificuldades e em sofrer as zombarias dos outros que
certamente se seguiriam. Nem todos na Igreja ou na cidade aprovariam o
fato de uma freira europeia viver fora dos muros de um convento, em um
desejo de se identificar com os pobres em sua cultura e condições locais.
Ela se afligia também com a perspectiva de abandonar Loreto, apesar de
ter se oferecido para ser “uma verdadeira vítima” do Seu am or onde ela
estava. Em tudo isso, mostrava-se tão normal, tão real, e até cética em
relação à sua habilidade para executar táo importante missão.
Contudo, Madre Teresa, apaixonadamente enamorada de Jesus,
não podia ignorar Sua “Voz”, que continuava a insistir: "Vai recusar?”Esta.
penetrante pergunta teve um efeito particularmente impulsionador no
seu coração, porque ecoava o voto secreto que tinha feito quatro anos an­
tes. O apelo de Jesus, como nenhum outro, teve o poder de agitar o mais
profundo do seu ser. Deus estava conferindo honras à magnanimidade de
sua alma — e esse chamado evocou, simultaneamente, alegria porque es­
tava sendo levada a sério, e dor porque se sentia desafiada aparentemente
além da sua capacidade.
Após a luta inicial, Madre Teresa permaneceu resoluta em sua con­
vicção de que Deus a chamava para essa nova vida. Quando, em janeiro,
escreveu ao arcebispo Périer, tinha a certeza do que pretendia fazer. Ela
estava pronta para “arder por completo por Ele e pelas almas”, entregando
todo o seu ser em resposta ao chamado de Deus.
CAPITULO 4

“'Para levar alegria


ao Coração sofrido
deJesus”

A n siando por dar tu do

Se uma única criancinha infeliz passar a ser feliz


com o amor de Jesus, [...] não valerá a pena [...]
dar tudo por isso?
M a dr e T eresa

jí transferência parajflsansol

Pouco antes de escrever a sua primeira carta ao arcebispo Périer, a supe­


riora provincial* de Madre Teresa a notificou de que ela seria, muito em
breve, transferida de Calcutá para a comunidade de Loreto em Asansol,
uma cidade situada cerca de 200 quilômetros a noroeste de Calcutá. Al­
gumas Irmãs de sua comunidade tinham notado as conversas, longas e
freqüentes, que Madre Teresa tinha quando ia se confessar com o pe. Van

* Uma superiora religiosa responsável por um número de conventos na mesma região ou


“província".
68 \ ( n h a . s(ja M in h a luz

Exem nos meses que se seguiram ao retiro de Darjeeling. A partir desse


simples fato, surgiram suspeitas quanto à natureza do relacionamento en­
tre eles. Obviamente, as Irmãs não faziam a menor ideia dos motivos que
Madre Teresa tinha para esses prolongados encontros. Ainda assim, essas
Irmãs os consideraram impróprios, levando o assunto à consideração de
suas superioras religiosas que, baseadas nessas “sugestões e observações
pouco caridosas”,1 tomaram a decisão de transferir Madre Teresa para a
comunidade de Asansol.
Para a escola de St. Mary’s, a partida de Madre Teresa foi “obvia­
mente um duro golpe”2 e sua ausência foi intensamente sentida. Q uan­
to a ela, embora admitisse ter saudades de St. Mary’s e das jovens que
estavam sob sua responsabilidade, aceitou a transferência serenamente.
Apesar do sacrifício de deixar tantas coisas que amava, viu a mão de Deus
nesses acontecimentos e acreditou que a mudança era, em última aná­
lise, obra Dele. Essa reação às dificuldades, repleta de fé, era típica de
Madre Teresa. Mais tarde, o arcebispo afirmaria que, “apesar das prova­
ções pelas quais passa na vida religiosa, de vez em quando, é muito leal
ao Instituto da Bem-Aventurada Virgem Maria e nunca a ouvi queixar-se
das superioras ou das Irmãs, nem sequer quando eu sabia que havia sido
mal interpretada”.3 Na verdade, mesmo em meio a essa situação injusta,
permaneceu impressionantemente caridosa com todos.
Antes de partir de Calcutá, Madre Teresa foi informada pelo
pe. Van Exem da reação inicial do arcebispo Périer à proposta que ela lhe
fizera. Embora o padre tivesse a expectativa de que, considerando o apoio
que ele próprio dava aos planos da Madre Teresa, o arcebispo a autorizaria
a agir rapidamente, a verdade é que o arcebispo se mostrou cauteloso,
dizendo que precisava de tempo para rezar, refletir e fazer consultas.
Essa resposta inesperada foi uma nova fonte de sofrimentos para
Madre Teresa, ainda maiores do que todo o seu medo e confusão an­
teriores. Convencida do caráter genuíno do chamado que recebera e
habituada a agir assim que a vontade de Deus se tornava clara, sentia
que deveria começar imediatamente. Contudo, por mais convencida que
estivesse, não começaria sem autorização dos seus superiores religiosos,
porque acreditava que, através da obediência aos representantes de Deus,
a vontade divina acabaria por se tornar conhecida com segurança. Conse-
■Santa Teresa cie ( a le n ta 69

quentemente, apesar do anseio que tinha de dar início à nova missão e de


sua aflição por não poder fazê-lo, só lhe restava esperar.
Ao chegar a Asansol, em meados de janeiro de 1947, Madre
Teresa assumiu imediatamente suas novas atividades letivas com a absolu­
ta dedicação que a caracterizava. Uma das vantagens da transferência era
o fato de ter, agora, menos responsabilidades do que em Calcutá e, com
isso, mais tempo para a oração. Foi uma oportunidade providencial para
se preparar para a nova missão.
Seu anseio de dar início ao trabalho entre os mais pobres dos pobres de
Calcutá se tornava cada vez mais intenso. Consequentemente, nos meses que
se seguiram, Madre Teresa se engajou em uma enérgica troca de correspon­
dência com o arcebispo Périer. Ela tentava convencê-lo que a deixasse come­
çar; ele, com toda a devida prudência, insistia na necessidade de esperar.

“O anseio de dar tudo a JSÍosso Senhor ’

O arcebispo expusera ao pe. Van Exem três aspectos que o preocupa­


vam: em primeiro lugar, queria saber até que ponto a vontade própria e
o interesse pessoal de Madre Teresa estavam implicados naquele projeto;
em segundo lugar, considerara que o pedido de Jesus, que lhe fora co­
municado pela Madre, de que o arcebispo Périer aprovasse o projeto em
agradecimento por ser bispo há 25 anos, era excessivamente sentimental;*
e, finalmente, perguntava-se se não teria sido a transferência para Asansol
que provocara o pedido da Madre de deixar a ordem de Loreto para dar
início a uma nova congregação.
O pe. Van Exem tinha informado a Madre Teresa de que deveria
esperar uma resposta escrita do arcebispo à carta que ela lhe enviara. Em 25
de janeiro, essa resposta ainda não tinha chegado. Com o que lhe parecia
ser um tempo de espera muito prolongado, Madre Teresa decidiu voltar a
escrever ao arcebispo sobre as reservas preliminares por ele expressas.

* Na carta de 13 de janeiro de 1947, Madre Teresa citou o que jes


"Peça à Sua Excelência para Me oferecer isso em agradecimento pelos
70 Xenha, seja M i n h a luz

Convento de Loreto
Asansol, 25/01/1947
Excelência,
O Pe. Van Exem me informou que o senhor tinha escrito — mas
até o momento nào chegou nenhuma carta. — Acho que os correios
funcionam muito mal nesta localidade. De qualquer forma, agradeço
ao senhor por tudo o que disse a ele.
A respeito da “obra”, tenho rezado muito para ver e compreender
quanto de mim há nela, quanto de sentimentalismo há nela. Aqui
em Asansol tenho mais tempo para passar com Nosso Senhor e tenho
rezado com frequência, com muita frequência, para ver — a fim de
nem enganar nem ser enganada — e mesmo assim a “obra” continua
a ser táo clara quanto antes: o anseio de dar tudo a Nosso Senhor e
de fazer com que muitas almas façam o mesmo, continua o mesmo.
Estou convencida de que, se a obra começar — haverá muitas
humilhações, muita solidão e muitos sofrimentos para mim. — Tal
como estou, sou muito feliz e aqui especialmente — mas Nosso
Senhor não para de chamar. — Tentei deter esses pensamentos —
mas sem qualquer resultado. Não vejo em que o ego pode se benefi­
ciar com isto — sei que todo mundo vai falar contra — Não, Vossa
Excelência, perdoe-me dizer — na obra haverá total entrega de tudo
o que tenho e de tudo o que sou — não restará absolutamente nada.
— Agora, sou Dele, somente Dele — dei-Lhe tudo — há algum
tempo que não procuro o meu ego. — Sei que o senhor ama a verda­
de — e esta é a verdade. Se eu dissesse o contrário, estaria mentindo.
Deus fez tudo. Ele simplesmente tomou tudo. — Agora, sou Dele. O
senhor sabe, foi informado de tudo. — Portanto, se o senhor disser
abandone todos os pensamentos, tentarei obedecer. — Nós* fizemos
ambos a nossa parte — o assunto está agora nas suas mãos.
Quanto ao sentimentalismo — o senhor não pode negar que
Nosso Senhor fez maravilhas pelo senhor nestes 25 anos. — Então o
que Ele pede é táo natural como é sobrenatural. — Depende do se­
nhor dizer sim ou não. Deixo tudo em suas mãos. — O que o senhor
desejar, seja o que for, isso farei com a maior alegria.
A transferência para Asansol não tem absolutamente nada a ver

* Madre Teresa e o pe. Van Exem.


•Santa T c r ts a di Ca lc u ta 71

com o assunto — e, ainda mais, vejo-a como mais uma prova de que
Ele quer esta obra.
Desde os 5 anos e meio — quando O recebi pela primeira vez [na
Sagrada Comunhão] — que o amor pelas almas tem estado dentro
de mim. — Foi crescendo com os anos — até eu vir para a índia —
com a esperança de salvar muitas almas. Durante esses 18 anos, tentei
corresponder aos Seus desejos — tenho ardido com anseio de amá-Lo
como Ele nunca foi amado antes. — Tenho rezado. Em St. Mary’s,
Ele certamente me usou — foi obra Dele. Cometi muitos erros —
mas esses foram obra minha. — Amava St. Mary’s apenas por essa
única razão — o contínuo toque de Jesus nas almas. Trabalhava com
Ele nelas. Mas, quando a M. [Madre Provincial] me disse que eu de­
veria vir para cá — eu fiquei muito feliz em meu coração — porque
podia dar algo que eu amava a Jesus, e é isto que me fez continuar
sorrindo durante aqueles dias e mesmo agora. Aceitei a transferência
como enviada por Deus — para me tornar mais forte, para me pre­
parar de corpo e alma para a Sua vinda. Aqui, não tenho nada em
que pensar — exceto em como viver para os outros. O trabalho que
tenho que fazer é exatamente o que me ensinará esta lição. E então,
estes pensamentos — a voz em meu coração só começaram em set.
passado — no dia em que cessaram as dificuldades contra a fé. — Se
eu tivesse ficado em St. Mary’s teria feito a mesma coisa — escrito ao
senhor — assim que o Padre tivesse me dado a autorização. — Am­
bos tentamos tudo antes disto chegar ao conhecimento do senhor.
Escrevo-lhe — com simplicidade — e sem qualquer preocupação
— entrego-me completamente nas suas mãos quanto a este assunto.
Reze por mim — porque sou realmente indigna de tudo quanto
Ele está fazendo por mim e em mim. Pedi ao Padre que lhe contasse
todos os meus muitos grandes pecados — para que o senhor peça a
Nosso Senhor — se esta obra for para ser feita — que lhe dê uma
pessoa mais digna.
Por favor desculpe por este papel — mas não tenho outro tipo. —
Estou treinando um pouco a pobreza franciscana. É encantador ser po­
bre e livre de tantas coisas.
Reze por mim.
Sua devota filha em Jesus Cristo,
Maria TeresaA
72 Xcnha, seja M in h a luz

Além de responder às preocupações do arcebispo Périer, Madre


Teresa fez, fortuitamente, duas revelações: “há algum tempo que não pro­
curo o meu ego” e que uma singular graça de “amor pelas almas” tinha
cativado seu coração desde o dia da Primeira Comunhão. Fora essa gra­
ça excepcional que a levara a abandonar sua amada Escópia e a dar o
primeiro ousado passo rumo ao desconhecido. O mesmo “am or pelas
almas” — um esforço para levar outros ao conhecimento e ao am or de
Deus — a movia, agora, a estender a mão aos mais necessitados. Com
essas revelações e o reconhecimento de que as dificuldades contra a fé
tinham terminado assim que se iniciaram as locuções (um importante
indicador de que eram realmente de origem divina), o arcebispo pôde
perceber que se encontrava em presença de uma alma excepcional.
Tal como o pe. Van Exem, o arcebispo percebia o significado do
objetivo de Madre Teresa, mas não estava disposto a tomar uma decisão
precipitada. Agora, porém, com outra carta insistente em suas mãos, foi
levado a responder e justificar o seu prolongado processo de decisão.

Calcutá, 19/02/1947

Cara Madre M. Teresa,


1? X. [Pax Christi, a Paz de Cristo]

O principal assunto são as suas duas cartas de 13 e 25 de janeiro.


Como expliquei ao pe. Van Exem quando ele veio conversar comigo
com a sua cana, esta questão é muito importante para ser resolvida
ou apreciada na mesma hora, ou em um dia ou mesmo em um mês.
Vai exigir muita oração de sua parte e da minha, muita reflexão,
muita prudência, antes de podermos estar certos do nosso caminho,
agora e no futuro. [...) Nem sequer posso, nem direi coisa alguma
sobre este projeto antes de o Espírito Santo me iluminar. Isto não
é obra de um homem, é obra de Deus e, para termos a certeza de
que é obra de Deus, temos de aplicar ambas as nossas faculdades
intelectuais e o auxílio espiritual da oração, da meditação...
Em junho irei a Roma e, sem mencionar nomes, submeterei o
caso às autoridades de lá, ficando à espera de um encorajamento, ou
do contrário.
•Santa Teresa dt Calcuta 73

Espero regressar em setembro ou outubro. Por isso, continue re­


zando com calma e paz.
Em união de S.C. [Sagrada Comunhão] e orações, sou
Devotamente em Xt. [Cristo],
t F. Périer, SJ ’

“/Insiando ser tudo fiara todos'’

Se o arcebispo Périer tinha a esperança de que a referência a seu “[subme­


ter] o caso às autoridades” em Roma (onde esses pedidos iriam passar por
análises cuidadosas e demoradas) iria amortecer o entusiasmo da Madre
Teresa, estava enganado. Pelo contrário, Madre Teresa viu a viagem dele
a Roma como uma oportunidade perfeita para cumprir o.plano de Deus.
Escrevendo uma vez mais, ela fez um apelo para que o arcebispo levasse
o caso diretamente ao conhecimento do papa. Estava certa de que, com
a intervenção papal, sua esperança de ir avante seria logo concretizada.

Convento de Loreto
Asansol

Excelência,
Muito obrigada pela sua carta. Não me surpreende que o senhor
não atue — e que responda, a seu tempo. — Um dia ela [a autori­
zação] seguramente chegará e então o senhor será, tenho certeza, o
primeiro a dar ao jovem instituto todo o auxílio que precisará.
O senhor diz na sua carta que vai submeter o caso às autoridades
em Roma — onde a questão será cuidadosamente examinada — eu
ficaria agradecida se falasse sobre isso com o nosso Santo Padre. Ele
compreenderá. Vai depender do senhor, Vossa Excelência, contar
tudo ao Santo pe. Diga-lhe que o Instituto será especialmente para
a unidade e a felicidade da vida familiar — a vida que é tão impor­
tante para ele. Fale para ele dos inúmeros lares destruídos, aqui na
índia, em Calcutá, em toda a parte. — É para tornar felizes esses lares
infelizes — para levar Jesus nesses lares escuros que Nosso Senhor
74 l e n h a , seja M in h a luz

quer que eu e as Irmãs entreguemos a nossa vida como vítimas pelas


famílias. — Por meio de nossa pobreza, trabalho e zelo entraremos
em cada lar — reuniremos as pequenas crianças desses lares infelizes.
Diga ao Santo pe. que a cana pastoral que o senhor escreveu, há al­
gumas semanas, terá a sua resposta nas Irmãs Missionárias da Carida­
de. Seremos perfeitamente livres na Pobreza que pretendemos — ou
melhor, que Deus quer para nós. Há jovens indianas, anglo-indianas
e europeias que anseiam por dar tudo a Deus justamente assim — e
por chegar ao coração das pessoas — em qualquer país onde se en­
contrem. Fale ao Santo pe. do meu anseio de ser tudo para todos.6
Leve para ele a primeira carta que escrevi para o senhor. Não tenho
qualquer prova — mas sei que é Deus quem quer isto de nós. — Se
tudo for um fracasso — não tenho medo — Se uma única família —
se uma única criancinha infeliz passar a ser feliz com o amor de Jesus,
me diga, não valerá a pena todas nós darmos tudo por isso — e o se­
nhor ter toda esta preocupação? Excelência, eu não sei como lhe pedir
— deixo que Ele diga ao senhor o que dizer ao nosso Santo pe. — mas
diga-lhe tudo o que sabe. — Ele é o nosso Santo pe. missionário. Seu
sofrimento por causa de tantos lares infelizes é uma contínua tortura
para o seu coração paternal. Peça-lhe que nós, as Irmãs e eu — sejamos
filhas dele, que possamos levar alegria ao seu coração — levando a feli­
cidade a essas famílias infelizes.
Entre os muito pobres — que sofrimento as mães passam — por
causa dos seus filhos — por causa dos seus maridos. — As minhas
Irmãs cuidarão dos filhos delas — darão assistência aos doentes, aos
velhos e aos moribundos em seus lares. — Ensinarão as jovens es­
posas como fazer felizes os seus lares. Há muitos locais onde nem os
sacerdotes conseguem chegar — mas uma Missionária da Caridade
entrará através do seu trabalho em cada buraco — onde quer que
exista vida humana, onde quer que haja uma alma para Jesus.
O senhor me diz para rezar — rezar muito. — Sim, eu o faço — e
estou pedindo a outras pessoas para fazerem o mesmo. — O senhor
reze também. Peça a São Francisco Xavier* durante esta novena de
graça — que nos conceda a graça de fazermos o que mais agradar.

* Um dos primeiros membros da Companhia de Jesus (Jesuítas), um grande missionário na


índia e no Japáo (1506-1552).
•Santa 'Teresa do Ca lc u tá 75

Eu esperarei — esperarei o tempo que o Santo pe. quiser que eu


espere, mas também estou pronta para deixar tudo — basta uma
palavra dele — para começar uma vida de completa pobreza a fim de
poder entregar tudo a Jesus.
O senhor vai dizer onde estão as Irmãs que ingressarão. — Co­
nheço a mente de muitas jovens — e o que elas anseiam fazer por
Cristo. Isso não me preocupa. Ele tudo providenciará. — Quanto
mais confiamos Nele — mais Ele fará.
Por gentileza, diga ao Pe. Van Exem que não poderei escrever para
ele, de maneira que a minha Superiora não possa ler a carta. — Eu
costumava escrever tudo a ele — mas agora aguardarei até vê-lo em
confissão. —
Graças a Deus, tudo está muito bem em St. Marys. Eu sabia que
Deus daria o Seu melhor para aquele lugar. A M. M. [Madre Ma­
ria] Columba é uma das nossas melhores Freiras. As Irmãs aprenderão
muito com ela. Estou muito contente em saber que recebeu informa­
ções tão boas sobre elas. Espero que Asansol as veja em breve — por­
que aqui nada se faz pelos nativos — eles parecem saber muito, muito
pouco. As irmãs seriam uma grande, grande graça. Estou rezando para
que venham em breve.
Eu estou ensinando Hindi e Bengali, Higiene e Geografia. As crian­
ças são muito boas e simples — Tenho muitas saudades da simplici­
dade aberta das minhas meninas de St. Marys e do seu amor generoso
por Nosso Senhor.
Reze por mim — para que eu me torne uma religiosa humilde e
generosa — a fim de que Ele me use de acordo com o Seu agrado.

Sua devotafilha em Jesus Cristo,


Maria Teresa1

A regra de Loreto na época permitia às superioras da Madre


Teresa examinarem a sua correspondência, se tal fosse considerado
“conveniente no Senhor”; uma vez que ela fora injustamente suspeita
de m anter um relacionamento pouco saudável com o pe. Van Exem,
76 Tenha, seja Minha luz

Madre Teresa pressupunha ser razoável que qualquer correspondência


entre eles pudesse ser examinada. E como ainda não queria que nin­
guém soubesse sobre a inspiração, nem sequer suas superioras, evitava
escrever ao padre.

'Procurando a Vontade de P>eus

Jesus a chamava; como poderia permanecer indiferente e nada fazer? Ela


pensava que, se o amor de Deus se tornasse presente nem que fosse a uma
só alma, seu chamado teria sido realizado e todos os sacrifícios teriam
valido a pena. Por isso, não podia compreender por que o arcebispo não
agia mais rapidamente.
Por sua vez, como responsável pela diocese e pelo seu povo, o
arcebispo Périer precisava assegurar que a proposta de M adre Teresa
seria um empreendimento positivo e fecundo. Ele ainda estava avalian­
do se ela não estaria trocando “um bem certo por um lucro incerto”.8
Talvez, se tivesse tido conhecimento do voto privado de M adre Teresa,
o arcebispo teria compreendido sua aparente pressa. Ligeiramente inco­
modado com a insistência dela, tentou, mais uma vez, lhe explicar seu
mensurado curso de ação:

Minha cara Madre M. Teresa,


P.X

De regresso de uma visita pastoral que fiz a Santal Parganas, vi


sua carta, pela qual lhe agradeço sinceramente. Tenho a impressão,
pelo que escreve, de que a senhora acredita que me oponho às suas
propostas e de que está rezando intensamente pela conversão do
meu coração. Gostaria de mudar sua opinião sobre essas suposições
que parece tomar como certas. Não sou contra nem a favor do seu
projeto e, como arcebispo, não posso deixar de ser neutro, neste
estágio. Não é uma questão de convicção pessoal nem de entusias­
mo ou de sentimento o que deve me conduzir. [...] A questão é
importante demais para a Igreja decidir de forma imediata. Pode
levar meses, pode levar anos. [...]
•Santa Teresa de ( alc uta 77

Por enquanto, por favor, afaste da imaginação a ideia de que eu


me oponho aos seus planos. Como disse, não tenho o direito de ser
nem contra nem a favor. Deus Onipotente me mostrará a linha a seguir
e quando eu tiver a certeza moral dos meus deveres, fique certa de que
não recuarei, custe o que custar. O meu lema é “Procurar a Deus em
todos e em todas as coisas”. Não será no final da minha carreira que
abandonarei o princípio motor de toda a minha carreira religiosa. Seria
um disparate. Farei a vontade de Deus; mas esta deve estar clara para
mim. Pode ser que a senhora pense que tudo é muito fácil, quando há
quem endosse a responsabilidade, mas aquele que é responsável precisa
de discrição, oração, oração fervorosa e constante, e prontificaçáo para
cumprir a vontade de Deus, conforme lhe for manifestada.
Em união de S. S. [Santos Sacrifícios]
Devotamente em Xt.,
t E Périer, SJ9

“fípen as agradá-fg é a alegria que procuro”

Embora completamente disposta a obedecer, Madre Teresa não podia ig­


norar o apelo insistente de Jesus: “Vai recusar a fazer isto por M im?” Por
isso, quando a planejada visita do arcebispo à Europa foi adiada, aprovei-
tou-se da situação para voltar a insistir com ele:

Convento de Loreto
Asansol, 30/0311947

Excelência,
Esta carta leva-lhe os melhores votos de uma Páscoa muito feliz.
Também agradeço sua última carta que recebi há algum tempo. Es­
pero sinceramente que não se canse de mim e das minhas muitas e
longas cartas, mas como o senhor é a pessoa de quem tantas coisas
dependem, tenho que lhe contar tudo em detalhes. Gostaria de poder
dizer-lhe tudo pessoalmente, mas isso não parece ser possível.
O senhor era para ter partido no dia 26, mas parece que tudo se
alterou. Eu acho que Deus o impediu de partir para poder dar solu-
\ cnha. seja M in h a luz

ção ao Seu desejo de começar o trabalho. — Estou pronta para fazer


o que me mandarem — seja a que preço for. Pronta para ir agora ou
para esperar anos. E de sua responsabilidade me usar, me oferecer a
Deus pelos pobres. As pessoas chamam o senhor de pai dos pobres.
Excelência, me deixe ir e entregar-me por eles, me deixe oferecer a
mim mesma e àquelas que se unirão a mim por esses pobres que
ninguém quer, pelas criancinhas de rua, pelos doentes, pelos mo­
ribundos, pelos mendigos, me deixe entrar nos seus buracos e levar
àqueles lares destruídos a alegria e a paz de Cristo. Sei que tem medo
por mim. Tem medo de que tudo isso seja um fracasso. — E se assim
for? Não vale a pena passar por todos os sofrimentos possíveis, por
uma só alma? Nosso Senhor não fez o mesmo? Que fracasso foi a Sua
Cruz no Calvário — e tudo por mim, uma pecadora.
Posso dizer-lhe, sinceramente do meu coração, eu não perderei
nada. Começando pelas minhas Superioras, sei que todos rirão de
mim. Vão pensar que sou uma boba, que sou orgulhosa, louca etc. E
se o bom Deus quer o meu nome? Eu sou Dele e somente Dele. —
O resto não tem poder sobre mim. Posso passar sem todo o resto se
tenho a Ele. Não receie por mim — nem por aquelas que me segui­
rão. Ele cuidará de todas nós. Ele estará conosco. — Se por um copo
de água10 ele prometeu tanto, o que não fará por corações vítimas
entregues aos pobres? Ele fará tudo. Eu, eu sou apenas um pequeno
instrumento nas mãos Dele e, justamente porque eu não sou nada,
Ele quer me usar.
Excelência, não me permita ser infiel a Ele agora. Não gostaria
por nada, nem sequer por um segundo de um segundo, de fazer algo
menos agradável. Quero que Ele tenha todo o deleite. O anseio Dele,
o sofrimento Dele por causa dessas criancinhas, por causa dos pobres
morrendo em pecado, da infelicidade de tantas famílias desfeitas, é
grande. Eu me sinto terrivelmente impotente diante de tudo isto. —
Eu, pequeno nada, anseio por tirar tudo isso do Seu Coração.
Dia após dia, hora após hora, Ele me faz a mesma pergunta: “Vai
recusar a fazer isto por Mim?”Eu falo para Ele que a resposta está nas
mãos do senhor.
Pode ser que o senhor pense que eu apenas estou vendo a alegria
de abandonar tudo e de levar alegria ao Coração de Jesus. Sim, eu
olho principalmente isso, mas também vejo o sofrimento que o cum­
primento destes dois objetivos trará. Sou sensível por natureza, gosto
■Santa Teresa de ( ‘a lc uta 79

de coisas bonitas e agradáveis, de conforto e de tudo o que o conforto


pode dar — de ser amada e de amar. — Sei que a vida de uma Mis­
sionária da Caridade — será sem nada disso. A pobreza completa, a
vida indiana, a vida dos mais pobres implicarão um duro trabalho
contra o meu grande amor próprio. Mesmo assim, Excelência, an­
seio, de coração verdadeiro e sincero, por começar a viver esse tipo
de vida — para levar alegria ao Coração sofrido de Jesus. Me deixe
ir, Excelência. — Confiemos cegamente Nele. — Ele fará com que a
nossa confiança Nele não seja frustrada.
Enquanto ainda está em Calcutá, o senhor não poderia fazer o ne­
cessário — através do Del. [Delegado] Apostólico e depois, quando o
pequeno Instituto estiver de pé, recorrer a Roma para o reconhecimen­
to? Não sei o que diz o Direito Canônico sobre estas questões — mas,
pelo que ouvi dizer e pelo que li recentemente no livrinho sobre a M.
[Madre] Maria da Paixão,* a fundadora ffanciscana, que li recentemen­
te, não parece ter havido muitas dificuldades — De um dia para o
outro vinte Freiras livres para levarem uma vida franciscana. — Mas
no caso delas o Bispo foi o motor. Ou acha que eu deveria pedir a
aprovação através do senhor? — É por isso que uma explicação pesso­
al seria mais fácil. — Vou a Darjeeling no dia 8 de maio — mas nessa
altura o senhor já terá partido.
Não demore, Excelência, não o adie. Há almas que estão sendo
perdidas por carência de cuidados, por carência de amor. Se pergun­
tar aos párocos, sem lhes mencionar nomes, eles lhe dirão da necessi­
dade de freiras assim. Olhe o apelo que o Santo pe. fez pelas crianças
da Europa.11 O que diria ele se visse seus pobres, os pobres das favelas
de Calcutá? Faça algo antes de partir e deixe-nos tirar do Coração de
Jesus o Seu contínuo sofrimento.
Por vezes, tenho medo, porque nada tenho, nem inteligência,
nem conhecimentos, nem as qualidades que tal trabalho exige, mas,
ainda assim, eu digo a Ele que o meu coração está livre de tudo, e por
isso pertence por completo a Ele e só a Ele. Ele pode me usar como
melhor Lhe agradar. Apenas agradá-Lo é a alegria que procuro.

* Francesa, fundadora das Missionárias Franciscanas de Maria (1839-1904).


80 l e n h a , seja M i n h a luz

A índia está passando por tempos de ódio,’ Estou escutando de


novo aqui que há problemas em Calcutá. Quem dera que as Mis­
sionárias da Caridade ali estivessem para poderem sobrepujar esse
ódio com o seu amor. O senhor dirá, o que você e umas poucas
jovens indianas poderiam fazer? Nós náo poderíamos fazer nada,
mas Jesus e nós, umas poucas vítimas, podemos fazer maravilhas.
Me deixe dar início a este trabalho, que será a resposta ao seu apelo
inflamado por apóstolos.
Quando o senhor achar melhor, gostaria de ser eu a comunicar
tudo pessoalmente à Madre Geral ou à Madre Provincial. Prefiro que
o saibam por mim.
Excelência, perdoe-me ser tão cansativa com o meu apelo contí­
nuo, mas tenho de agir desta maneira. Levemos alegria ao Coração de
Jesus, e tiremos do Seu Coração esses sofrimentos terríveis. Pense no
que Jesus vai ganhar e não no que o pequeno “eu” vai perder. — Ele
tem feito tanto pelo senhor — e agora depois de tantas graças e de
tanto amor, o senhor receia oferecer uma das suas pequenas missio­
nárias para ser uma vítima Dele pelos mais pobres do seu rebanho. —
Me deixe ir para Cossipore, para a Boys Own Home, em vez de ir
para Darjeeling. Quando o senhor regressar — já teremos dado início
à solidão após a qual começará o trabalho de missão. — Há jovens,
até na Europa, que ficariam extremamente felizes em deixar tudo e
seguir a Cristo em perfeita pobreza e sacrifício.
Náo sei se o Espírito Santo encheu sua alma com estes desejos e
pensamentos, porque eu estou rezando para que o faça.
Durante estes dias de oração e penitência, reze por mim, reze mui­
to, para que eu possa amá-Lo mais.
Desejo-lhe uma vez mais uma Páscoa muito feliz.

Sua devota filha em J. C,


Maria Teresa12*

* Madre Teresa está se referindo aos distúrbios e insurgéncias civis que estavam acontecendo
no período imediatamente anterior à independência da índia, cm 15 de agosto de 1947.
** Escola localizada em Cossipore, área none de Calcutá, fundada pela Swami D. Animananda
Rewachand (1868-1945). Tinha sido desocupada no início de 1946.
■Santa Teresa de Ca lc utá 81

O “pequeno nada”, como chamava a si própria, ansiava por “le­


var alegria ao Coração sofrido de Jesus” — seu primeiro amor desde a
infância. Para isso, teria abraçado qualquer dificuldade, sem levar em
conta as suas preferências ou os sacrifícios necessários. Tudo o que de­
sejava era agradar-Lhe. Insistia em avançar porque estava convencida de
que era isso que Jesus queria. Contudo, continuava aberta à decisão do
arcebispo como a própria vontade de Deus.

“Meu í)eus, L.J supre o que falta em m im ”

O arcebispo Périer ficou surpreendido com a longa e exortativa carta de


Madre Teresa.

Casa do arcebispo, 32, Park Street


Calcutá, 7 de abril de 1947

Minha cara Madre M. Teresa,


P X.

Fiquei um tanto surpreendido ao ler em sua carta uma quantidade


de muito boas razões pelas quais não avanço no assunto que me tinha
apresentado. Pensei que tinha explicado previamente, de maneira cla­
ra, os motivos que me obrigam a mover-me muito lentamente em
questão tão importante.
Se eu visse, após fervorosa oração e reflexão madura, que a vontade
de Deus era avançar na direção para onde você deseja que eu avance
imediatamente, não hesitaria; não perderia nem um momento consi­
derando as dificuldades, os meios ou qualquer outra coisa. Para mim,
a vontade de Deus é suprema e todo o resto desaparece. Mas, para
aqueles que têm autoridade, conhecer a vontade de Deus e agir em Seu
Nome exige consultas, oração e reflexão. Estou totalmente convencido
de que você está pronta para tudo. Mas, minha cara Madre, a senhora
também, de vez em quando deve colocar-se no meu lugar. Ao repre­
sentar o seu pedido, e ao defendê-lo perante a Santa Sé, assumo uma
grande responsabilidade. Posso vir a ser, não apenas a causa da ruína de
82 Venho, seja M i n h a luz

muitas vocações, como também a causa de conduzir muitas almas para


as trevas por imprudência. Seu exemplo sobre a fundadora das Francis-
canas Missionárias de Maria náo é argumento. Em primeiro lugar, eu
sei com certeza, através de contatos pessoais com pessoas que viveram
naquela época, v. gr. [verbigratia — por exemplo], o antigo Delegado
Apostólico na índia, Monsenhor Zaleski, que as coisas não foram nada
fíceis, e sei que, até mesmo agora que a vida da fundadora está sendo
discutida com vista à sua beatificação, muitos pontos têm que ser es­
clarecidos. Além disso, naquela época, o Direito Canônico não estava
ainda codificado como hoje. Muitos novos decretos para os religiosos
foram emitidos desde então.
Outro motivo que deveria fazê-la refletir quando me pressiona
para começar imediatamente é que eu náo tenho nenhum poder para
permitir-lhe dar início a este tipo de trabalho. A sua Madre Geral
também náo tem, como eu, nenhum poder com relação a isso: o as­
sunto tem necessariamente que ir a Roma e devemos estar preparados
para responder às perguntas que nos serão feitas. Para responder a
essas perguntas, preciso ter adquirido a convicção pessoal, uma espé­
cie de certeza moral, que me permita, em sã consciência, responder
favoravelmente ou náo, ou poder dizer mais tarde que, mesmo estan­
do enganado na minha aprovação ou desaprovação, estava enganado
de boa fé, e que náo me apressei como um louco em uma questão da
qual tantos dependem.
Em teoria, o seu projeto pode ter a minha mais calorosa aprovação,
mas isso náo basta para lhe permitir começar ou para sugerir que pode
ser autorizada a começar. Se náo estou enganado, sugeri-lhe em uma
de minhas cartas anteriores que se sentasse calmamente e escrevesse,
exatamente e em detalhe, (1) o que quer fazer, (2) os meios através dos
quais deseja realizá-lo, (3) como formaria as suas discípulas etc., (4) que
tipo de pessoas recrutaria para esta obra, (5) onde ficaria o centro da
sua obra, (6) se não é possível alcançar esse objetivo através de alguma
congregação já existente, (7) se náo seria mais prático, para realizar o
que pretende, usar uma espécie de associação ou irmandade* que náo
seja de religiosas, exatamente para pôr em prática o seu projeto. Há

* A questão apontada pelo arcebispo é se um grupo de mulheres leigas poderia realizar o ob­
jetivo de Madre Teresa, sem a necessidade de tomarem para si os compromissos dos religiosos
residentes na comunidade.
•Santa Teresa de C alc utá 83

centenas de perguntas que podem ser feitas, e que devem ser examina­
das de forma séria e satisfatória. Durante a minha ausência, trabalhe no
seu plano sob a orientação do Espírito Santo. O ideal náo é dar uma
longa descrição do que a senhora acha que será capaz de fazer. O que
queremos saber é, em poucas palavras, o objetivo, os meios, as regras.
a forma de recrutamento, as possibilidades de sucesso. Não me refiro
à glória, nem às humilhações, às dificuldades etc., mas se começarmos
qualquer coisa, essa coisa deve ser capaz de atingir o objetivo para o
qual foi estabelecida — é isso que eu chamo de sucesso. Se a senhora
estiver pronta quando eu regressar de Roma em setembro será ótimo;
não pense que se trata de um período muito longo. Assuntos tão essen­
ciais exigem meditação prolongada, muita oração, reflexão e consultas.
Enquanto isso, verei na Europa como tal congregação funcionaria e
qual tem sido a experiência de outras dentro dessa mesma linha, se
seria melhor ter uma associação de leigas a ter uma congregação reli­
giosa etc. Deus a abençoe. Em união de S. C. [Sagrada Comunhão]
e orações.

Devotamente em Xt.,
t E Périer, 5 / 13

Apesar da desilusão que possa ter sentido, Madre Teresa aceitou a


ordem do arcebispo. Voltando-se a Deus em busca de ajuda, escreveu
a seguinte oração na margem da carta do arcebispo:

Meu Deus, dá-me a Tua luz e o Teu amor, para que eu seja capaz de
escrever estas coisas para Tua honra e glória. Náo permitas que a mi­
nha ignorância me impeça de fazer a Tua vontade na perfeição. Supre
o que falta em mim.N

Como o arcebispo tinha dado a entender que só consideraria a


resposta dela em setembro, quando regressasse de Roma, a Madre decidiu
esperar até seu iminente retiro e suas férias em Darjeeling (entre 8 de
maio e 14 de junho de 1947), para formular as respostas.
84 X’c n h a , seja .Minha luz

Em maio, no decurso da viagem de Asansol para Darjeeling, Madre


Teresa fez uma parada em Calcutá, e esteve por duas vezes com o pe. Van
Exem, que, sem ter conhecimento do pedido do arcebispo, lhe fez um apelo
semelhante:

Em maio, disse-lhe que era vontade de Nosso Senhor que, durante


as férias, se dispusesse a trabalhar no seu plano, explicar os objetivos
e os meios que pretendia usar para atingir seus objetivos, e que es­
crevesse igualmente as regras essenciais que me dessem a conhecer o
espírito próprio da sua obra. Logo após, e depois de eu ter pedido o
mesmo para apresentar a Vossa Excelência, ela me mostrou as cartas
que recebera de Vossa Excelência, e numa delas verifiquei que Vossa
Excelência tinha feito exatamente o mesmo pedido que acabo de
expor. Disse-lhe que respondesse às perguntas indicadas naquela
carta, a fim de ser obediente.15

Ao chegar a Darjeeling, Madre Teresa deparou-se inesperadamen-


te com uma curta mas intensa luta. No caminho de regresso a Asansol,
em junho, relatou-a ao pe. Van Exem que, por sua vez, informou o arce­
bispo Périer destes fatos:

Passou por uma terrível desolação (5 dias em maio) enquanto se


encontrava em Darjeeling, momento em que a ideia da obra lhe
pareceu uma estupidez (peço desculpas pela palavra, que me parece
ser dela), uma traição ao seu instituto e às suas superioras. Ela está
bastante amedrontada em relação a tudo isso e passou por grandes
tentações. Escreveu-me naquele momento, mas eu só pude rezar por
ela. Felizmente, a tentação deixou-a uns dias depois, e de novo tudo é
luz, alegria, confiança e a certeza de que está no caminho certo; é essa
a minha convicção depois de tê-la visto, embora sem conversar sobre
as suas consolações em minha entrevista. Quando em consolação,
não tem a menor dúvida exceto na superfície da sua alma, é destemi­
da e disposta a tudo imolar por Nosso Senhor; na desolação, duvidou
de tudo, teve muito medo, mas permaneceu disposta a imolar-se.
Mais tarde, Nosso Senhor disse-lhe que o enorme medo dela O tinha
magoado; ela foi um tanto responsável pelo que se passou.16
S a n t a Te resa d< ("a leu tá 85

O esboço da nova ordem

Passados esses dias de dúvida e confusão, e ainda durante a estada em


Darjeeling, Madre Teresa recuperou o seu habitual estado de consolo e
segurança, e dedicou-se a responder às perguntas do arcebispo Périer,
“traduzindo”, em termos concretos, as implicações das suas experiências
místicas, e acrescentando novos detalhes aos que tinha formulado em
janeiro. Desta vez, não se referiu à “Voz”, mas, especificamente, a “Nosso
Senhor” e aos pedidos que Ele lhe tinha feito. Todo o seu foco era unica­
mente Jesus: Ele era a razão para seu futuro apostolado, o modelo da sua
caridade, o padrão do seu novo estilo de vida, a garantia do seu sucesso;
Ele era o seu “Tudo”.

Convento de Loreto
Darjeeling, Festa de Corpus Christi*, 1947

Excelência,
Na sua última carta, o senhor escreveu: “Durante a minha ausên­
cia, trabalhe no seu plano, sob a orientação do Espírito Santo.”
Durante a Novena do Espírito Santo, escrevi umas poucas regras,
que poderão ser úteis. — Hoje, depois de muita oração, tentarei com
a ajuda Dele responder às suas perguntas:

I. “ O QUE QUER EXATAMENTE, E EM DETALHE, FAZER?”


Nosso Senhor quer Freiras Indianas, vítimas do Seu Amor, que
estejam tão unidas a Ele que irradiem o Seu Amor às almas — que
vivam vidas indianas, vistam-se como eles, e que sejam Sua luz, o
Seu fogo de amor entre os pobres, os doentes, os moribundos, os
mendigos e as criancinhas da rua. Eu quero satisfazer este desejo de
Nosso Senhor, tomando-me indiana e vivendo essa vida por Ele e
pelas almas dos pobres. Para estarmos completamente unidas a Ele,
devemos ser pobres — livres de tudo — aqui entra a pobreza da

* Festa litúrgica que celebra a presença real e substancial de Cristo na Eucaristia. É realizada na
quinta-feira após o Domingo da Santíssima Trindade, que, por sua vez, acontece no dom ingo
seguinte ao de Pcntccostcs.
86 i t / iha, seja M i n h a lu z

Cruz — Pobreza Absoluta — e para sermos capazes de ver Deus


nos pobres — Castidade Angélica — e para sermos capazes de estar
sempre à Sua disposição — Obediência Alegre. Através destes três
votos, as minhas irmãs e eu desejamos levar Cristo aos tristes bura­
cos das favelas dos pobres de Calcutá e mais tarde de outros lugares.

2. “ P o r q u a is m e io s d e s e ja r e a l iz á - l o ?”
Indo para o meio das pessoas — cuidando dos doentes em seus
lares — ajudando os moribundos a fazer as pazes com Deus, tendo
pequenas escolas gratuitas nas favelas para as criancinhas — visitando
os pobres nos hospitais — e ajudando os mendigos das ruas a viver vi­
das dignas. — Numa palavra, agir a caridade de Cristo entre os mais
pobres — fazendo assim com que eles O conheçam e O queiram
nas suas vidas infelizes. — Se o número de Irmãs permitir, teremos
também uma casa para os aleijados, os cegos, os marginalizados da
sociedade humana. As Irmãs percorrerão as aldeias, e lá farão o mes­
mo trabalho. — A fim de serem livres para fazer mais, as Irmãs não
ficarão permanentemente em um local — mas estarão sempre pron­
tas a fazer o trabalho que está faltando na Igreja na índia.

3. “C o m o f o r m a r ia as suas d is c íp u l a s ?”
Dando-lhes um conhecimento completo da vida espiritual — de
maneira que, na rua ou nos buracos dos pobres, ou em casa no con­
vento, elas vivam uma vida de íntima união com Deus. — O interior
deve tornar-se a força principal do exterior. — Para chegarem a isto
as Irmãs terão o primeiro ano de vida religiosa — de total contem­
plação — e perfeita solidão — que será renovado a cada seis anos,
depois de terem feito os votos. Também deverão receber, em sua vida
espiritual, toda a ajuda possível dos santos sacerdotes — de modo
que a perfeição religiosa se torne simples e fácil — como era a vida
de Maria em Nazaré. Porque, se não estiverem enamoradas de Deus
— não serão capazes de viver essa vida de permanente imolação pelas
almas. Cada uma deve compreender que se quiser ser Missionária da
Caridade — deve estar enamorada do Crucificado e ser Vítima Sua
pelas almas dos pobres.
•Santa T er es a d e C a lc u tá 87

4 . “ Q u e t i p o d e p e s s o a s r e c r u t a r ia para esta o b r a ?”
Jovens dos 16 anos em diante. — Fortes de corpo e mente, com
muito bom senso. Nenhuma qualificação especial — mas devem
ser capazes de aprender perfeitamente a língua do país. Generosas e
amorosas para com os pobres. Devem ser capazes de fazer qualquer
tipo de trabalho por mais repugnante que seja à natureza humana.
Devem ser alegres e bem-dispostas — Jovens de qualquer naciona­
lidade — mas para qualquer nação para onde entrarem a língua e os
costumes desse povo devem ser os seus. Por exemplo, se uma Tâmil
ingressar — deverá trabalhar com os Tâmeis — se for uma chinesa
com os chineses etc. Se jovens com qualificações superiores desejam
ingressar — poderão fazê-lo, mas isto não as fará de forma alguma
diferentes. Terão que ser mais uma entre as Irmãs. Se ricas — que
venham elas, mas não seu dinheiro. Eu preciso de missionárias —
almas não são compradas — Durante os anos de contemplação e
solidão devem estar dispostas a fazer penitência e a rezar muito, ao
mesmo tempo que fazem aquele trabalho manual — que elevará
naturalmente suas mentes para Deus.

5.“O n d e ficará o c e n t r o da sua obra ?”

No momento, nas favelas e nas ruas de Calcutá e, à medida que


as Missionárias da Caridade forem aumentando, em todas as gran­
des cidades da índia. Não esperaremos ser chamadas para fazer este
ou aquele trabalho, por este ou aquele Bispo ou Padre. Iremos nós
próprias à procura das almas e ofereceremos os nossos Serviços ao
bispo do local. — Faremos qualquer tipo de trabalho, à exceção do
trabalho nas escolas — isto é, as nossas escolas das favelas só irão até
a segunda série.
Para a formação das Irmãs — Cossipore — um local sossegado
e solitário com muito terreno foi o escolhido por Nosso Senhor. —
Para o segundo ano de formação, Sealdah — onde as Irmãs poderão
ter formação em Maternidade e em outras especialidades de enfer­
magem. Este local também foi escolhido. — Não conheço pessoal­
mente nenhum deles — nem os vi. Mas se as Irmãs não puderem ter
Missa e Sagrada Com. [Comunhão] diárias, então, Vossa Excelência
deverá escolher o lugar.
88 Xcnlia, seja M i n h a iuz

6. “n ã o seria po ssív e l rea lizar e ste f im através d e a l g u m a


CONGREGAÇÃO JÁ EXISTENTE?”
Não. Primeiro, porque são europeias. Quando as nossas jovens
indianas entram para estas ordens — passam a viver a vida que nelas
se vive — a comer, a dormir, a vestir-se como europeias. Em uma
palavra, como se costuma dizer, tornam-se “Mems”.* Náo têm opor­
tunidade de sentir a santa pobreza. Em segundo lugar — por mais
que essas Irmás tentem adaptar-se ao país, permanecem estrangeiras
para o povo — depois há as suas regras — que náo lhes permitem,
por assim dizer, identificarem-se com o povo. Têm suas grandes es­
colas e seus hospitais — em todos eles, são as almas que têm que
chegar até elas ou serem levadas até elas, enquanto as Missionárias da
Caridade irão à procura, viveráo os seus dias nas favelas e nas ruas.
Peno do coração das pessoas — farão as obras de Cristo nas casas
dessas pessoas — nos buracos sujos e escuros dos mendigos de rua.
Como Nosso Senhor mesmo diz: uHá muitas freiras para cuidar dos
ricos e das pessoas abastadas — mas para os Meus muito pobres náo há
absolutamente ninguém. Eu anseio por eles — amo-os. ” Ele também
pede Freiras Indianas — vestindo roupas indianas — vivendo a vida
de indianas. — Quem quiser ser Missionária da Caridade terá que se
tornar indiana, se vestir como elas, viver como elas.

7 . “N á o s e r i a m ais p r á t i c o o p t a r p o r u m a e s p é c i e d e
ASSOCIAÇÃO OU IRMANDADE?”
Para a vida que terão que levar, seculares náo serão capazes de fàzê-lo.
Para um trabalho de contínuo esquecimento pessoal e imolaçáo pelos
outros, são necessárias almas interiores — ardendo de amor a Deus e às
almas. Almas puras que vejam e procurem a Deus nos pobres. — Almas
livres — que sejam capazes de sacrificar tudo apenas por uma coisa,
levar uma alma a Deus. — O trabalho vai precisar de muita oração, pro­
funda e fervorosa oração e de muita penitência — as pessoas de uma as­
sociação não seriam capazes de levar nada disso à obra, e o trabalho náo
cumpriria o seu objetivo — “levar almas a Deus, e Deus às Almas”.

* “Mem" é a forma simplificada da palavra “Memsahib", literalmente, “mulher grande". An­


teriormente, na índia, era um termo respeitoso, usado para referir-se a uma mulher europeia,
casada. Nesse contexto, Madre Teresa queria dizer que a vida em uma ordem europeia era
diferente do estilo de vida simples e pobre que idealizara para suas Irmás.
S a n ta -Teresa d i C a lc u tá 89

8. “AS POSSIBILIDADES DE SUCESSO”


Nosso Senhor disse: “Não tenha medo — Eu estarei sempre com você
[...] Confie amorosamente em mim — confie cegamente em mim. ”
Vossa Excelência conhece o número e a necessidade que os seus
pobres têm de uma mão amável, como abandonam seus filhos ao
pecado e os deixam passar suas vidas inocentes nas ruas. Quantos
morrem sem Deus — só porque não há ninguém para dizer uma
palavra sobre a Misericórdia Dele. — Os sofrimentos dos seus corpos
fazem com que eles se esqueçam dos terríveis sofrimentos que suas
almas terão que passar por toda a eternidade. Por que será que Nosso
Senhor mesmo diz: “Como dói ver estas pobres crianças manchadas pelo
pecado. [...] Eles não Me conhecem — por isso não Me querem [...]
Como anseio por entrar nos seus buracos — seus lares escuros e tristes.
Venha, seja a vitima deles. — Na sua imolação — no seu amor por
M im — eles irão Me ver — irão Me conhecer— irão Me querer [...] ”
Não sei qual será o sucesso — mas, se as Missionárias da Carida­
de levarem alegria a uma só família infeliz — fizerem com que uma
única criança inocente das ruas se mantenha pura para Jesus — que
um único moribundo morra em paz com Deus — não lhe parece,
Excelência, que valeria a pena oferecer tudo — só por essa pessoa —
porque essa levará grande alegria ao Coração de Jesus.

9 . “C o m o a s Irm á s iria m se s u s t e n t a r ? ” ( m in h a p e r g u n t a )
Deverão ser capazes de obter da horta a maior parte do seu
alimento — venderão uma parte disso para poderem comprar as
outras coisas. Quanto às roupas — farão brinquedos e quadros
e outros trabalhos de artesanato — que serão vendidos — e com
esse dinheiro comprarão o que for mais necessário. Vamos preci­
sar de muito pouco — uma vez que pretendemos, com a graça de
Deus, manter uma pobreza absoluta nos mínimos detalhes, como
não termos imóveis próprios. Nunca precisaremos de muito dinhei­
ro. — As Irmãs também farão todos os trabalhos domésticos — en­
tão não precisarão de criadas — e quanto ao resto — ou melhor,
quanto a tudo — confio Nele! Ele estará conosco — e quando Ele
lá estiver, não precisaremos de nada.
90 Venha, seja M in h a luz

Uma coisa lhe peço, Excelência, que nos dê toda a ajuda espiritual
que precisarmos. — Se temos Nosso Senhor no meio de nós — com
a Missa diária e a Sagrada Comunhão, nada temo pelas Irmãs nem
por mim. — Ele olhará por nós. Mas sem Ele eu não posso viver —
torno-me impotente.
Já lhe contei tudo.
Reze por mim.

Sua devota filha em Jesus Cristo,


Maria Teresa}7

“Ssqueça isso, por toda a eternidade”

Madre Teresa enviou esta longa carta, juntamente com o primeiro con­
junto de Regras escritas uns dias antes," ao pe. Van Exem, para revisão
e aprovação. Ele estudou cuidadosamente as notas e ficou à espera de se
encontrar com ela em Calcutá, quando Madre Teresa fizesse a viagem de
regresso de Darjeeling para Asansol. Ao final de uma longa discussão,
em 14 de junho, o padre deu-lhe uma resposta totalmente inesperada:
ordenou-lhe que “esquecesse isso [todo o empreendimento] por toda a
eternidade”, se nem ele nem o arcebispo voltassem a tocar o assunto. Para
enfatizar a seriedade de seu pedido, ele o fez por escrito. Mais tarde, nesse
mesmo dia, em carta ao arcebispo Périer, relatària a estratégia que tinha
adotado:

Ela deve deixar toda a obra a meu encargo e ao de Vossa Excelência, e


tirar todo esse assunto de sua mente. Ela “deve esquecer isso por toda
a eternidade”, se nada mais lhe for perguntado por Vossa Excelência
ou por mim. Quanto aos escritos, não lhe disse absolutamente nada
sobre o que faria com eles, se iria queimá-los, rasgá-los, guardá-los,
ou enviá-los a Vossa Excelência. Eu disse que a Madre tinha que viver

* Ela fez um rascunho das Regras durante a novena que precedia Pentecostes. Em 1947, o
domingo de Pentecostes foi em 25 de maio. Consequentemente, a novena foi de 15 a 24 de
maio. Ver Apêndice A.
S a n ta Teresa d< C a lc u tá 91

apenas no presente e, de forma alguma, no futuro e que tinha que ser


uma Freira perfeita. Poderia desenvolver iniciativas no seu apostolado
atual, mas que teria que crescer, em especial, na virtude da prudência,
da qual ela mais precisava. Insisti na obediência, alegre, pronta, sim­
ples e cega. Assegurei-a de que nunca erraria se obedecesse. Permiti
que fizesse um pouco mais de penitência e muito mais abnegação,
mas duvido que ela seja capaz de fazer mais do que já faz. Ela nunca
recusou coisa alguma a Nosso Senhor.18

Essa não era a resposta que Madre Teresa antecipava. Tinha ansiado
por seguir e “levar alegria ao Coração sofrido de Jesus”, esperando, ansio­
samente, pelo “Sim” do arcebispo. Agora, se confrontava com mais uma
severa prova e vinda de ninguém menos do que seu diretor espiritual, em
quem tanto confiava. Contudo, fiel ao seu compromisso de não recusar
coisa alguma ao Senhor, optou por obedecer.
CAPÍTULO 5

“JÍão demore mais.


jíã o me detenha”

A n s i a n d o p o r le var
a lu z d e C r i s t o

A salvação das almas, o saciar a sede de Cristo de


amor e de almas, não é isto suficientemente sério?
M adre Teresa

{{egresso a Calcutá

Em julho de 1947, Madre Teresa regressou à comunidade de Entally,


em Calcutá. Essa alteração ocorreu através da intervenção da superi­
ora geral da ordem, que acreditava que “a Madre Provincial cometeu
um erro... na apreciação que fez de Madre M. Teresa”.1 De sua parte,
Madre Teresa limitou-se a obedecer, confiante de que, através de todos
esses acontecimentos, Deus estava realizando o Seu plano. Ao regressar
a St. M ary’s, embora já não fosse a diretora da escola, retomou a maior
parte das atividades que exercia anteriormente; começou a ensinar e a
tomar conta, parcialmente, das alunas internas. As pessoas que a rodea-
94 \ e n h a , seja M i n h a luz

vam, embora continuassem admirando sua generosidade e a influência


que tinha sobre as meninas, ainda náo faziam nenhuma ideia do novo
chamado que ela recebera.
Pouco depois de ter regressado, Madre Teresa se encontrou com o
seu diretor espiritual. Náo tinha lhe ocorrido que a ordem que ele lhe dera
em junho — “afastar, considerando como tentações, todos os pensamentos
relacionados à obra”2 — fosse apenas mais uma maneira de pôr à prova a
autenticidade do seu chamado. Apesar da luta intensa que essa ordem tinha
lhe causado, Madre Teresa obedeceu, em nova demonstração da suprema­
cia da vontade de Deus em sua vida. E confessou ao pe. Van Exem:

Disse-me para náo pensar na obra. — Sempre que os pensamentos


ardiam com o anseio de oferecer tudo — de ser Sua vítima, em todo
o sentido da palavra — usava de violência sobre mim mesma e supli-
cava-Lhe que náo permitisse que esses pensamentos me ocorressem
porque queria obedecer — e, como um Cordeirinho, Ele também
costumava obedecer. Quantas vezes, oh quantas vezes, Ele se queixou
dos atrasos — porque quando Ele pede qualquer coisa, diz Ele, as
pessoas ficam extracautelosas sobre muitas coisas — mas quando o
mundo pede, as coisas sáo feitas táo rapidamente.3

Ao tomar conhecimento do seu esforço heroico, o padre reco­


nheceu ao arcebispo: “Sei agora que ela tentou realmente obedecer e
que obedeceu mesmo.”4 Decidiu, por isso, alterar as diretrizes, dizendo-
lhe que “continuasse rejeitando todos os pensamentos sobre a obra, mas
admitindo tudo o que a fizesse unir-se mais a Nosso Senhor”.5
Náo era apenas seu diretor espiritual que exigia dela um a obe­
diência rigorosa; o mesmo fazia a “Voz” que se dirigiu a ela, em certa
ocasião, após seu regresso de Asansol. Madre Teresa confiou as palavras
de Jesus ao pe. Van Exem:

As pessoas pensam que você foi mandada para cá para ensinar, e você
o faz bem, se dedicando a essa tarefa com todo o seu coração, mas náo
foi esse o objetivo do Meu Coraçáo — Eu a trouxe aqui para estar sob
o cuidado imediato do seu diretor espiritual que a formará nos cami­
nhos do Meu amor, preparando-a, assim, para fazer a Minha vonta-
•Santa Teresa de Calcutei 95

de. Confie totalmente nele sem medo algum. Obedeça-lhe em todos


os detalhes; não será enganada se obedecer, pois ele Me pertence por
completo. — Lhe deixarei conhecer a Minha vontade através dele.6

Permanente, profunda e
violenta união com Jwsso Senhor

Antes do regresso do arcebispo, o pe. Van Exem sentiu-se, uma vez mais,
“impelido a alterar sua decisão”7 e autorizou Madre Teresa “a deter-se em
todos os pensamentos inspirados por Nosso Senhor, mas sem pensar em
vozes nem em fenômenos sobrenaturais”.8 Esperava que, com essa auto­
rização, a “Voz” regressasse e, de fato, temia que o caso se tornasse “mais
espetacular”.9 Ao explicar ao arcebispo a razão dessa preocupação, deu
um precioso testemunho sobre a vida interior da Madre Teresa:

Eu sabia que Nosso Senhor tinha elevado aquela freira a um estado de


oração superior; talvez não tenha havido propriamente êxtase, mas o
estado imediatamente anterior ao êxtase foi atingido. Era essa a mi­
nha convicção, embora vaga, no ano passado, e talvez mesmo antes.
[...] O estado de êxtase poderá ser atingido muito cedo, dado que a
união com Nosso Senhor tem sido permanente, e de tal maneira pro­
funda e violenta, que o arrebatamento não parece estar muito longe.
Nunca lhe digo uma palavra sobre isso, mas é, sem dúvida, por aí que
as coisas vão. Sinto-me um pouco receoso disso, já que, então, as coi­
sas poderão se tornar mais espetaculares, tanto para ela, quanto para
mim. Ela tem um medo mortal de tudo que chame a atenção para a
sua pessoa e parece muito solidamente firmada na humildade. [_]10

Embora não haja qualquer registro de que Madre Teresa tenha


passado pela experiência do estado místico de êxtase,* é muito provável

é
* No contexto da vida espiritual, o êxtase um fenômeno místico, no qual a mente fica fixa­
da em Deus ou em outra figura religiosa e a atividade normal dos sentidos é interrompida;
intensa alegria e visões podem acompanhar a experiência. O êxtase é característico do estágio
“unitivo" da vida espiritual, no qual a pessoa alcança a união com Deus, diferentemente dos
estágios “purificativo" e “iluminativo" que o precedem.
96 í ( tilia, seja Minha luz

que tal coisa tenha acontecido. Durante esses meses, M adre Teresa teve
um intenso grau de união com Nosso Senhor, incluindo visões imagi­
nativas que são tão arrebatadoras que — segundo Santa Teresa de Ávila
— “produzem quase sempre o êxtase”.11 Anos mais tarde. Madre Teresa
recordaria esse período extraordinário: “Antes de se iniciar o trabalho
[1946-1947], havia tanta união — amor — fé — confiança — oração
— sacrifício.”12 E em outra ocasião, lembrando-se das graças recebidas,
expressou sua nostalgia em relação àquela intimidade: “Ali [em Asansol]
foi como se Nosso Senhor se entregasse a mim — por completo. A doçura
e o consolo e a união daqueles seis meses passaram depressa demais.”13
O pe. Van Exem continuava impressionado com o fervor sempre
crescente de Madre Teresa e com o seu desejo de uma união mais íntima
com Deus. Tao apaixonado era seu amor, que andava sempre à procura
de maneiras de expressá-lo. Foi, novamente, ao arcebispo Périer que o
diretor espiritual revelou os anseios secretos da religiosa:

Ela me fez diversos pedidos, um para fazer mais penitência, coisa que
deseja ardentemente, outro para se comprometer por um voto a me
obedecer14 e outro para rezar à noite. Ela escreveu: “A atração pelo
Santíssimo Sacramento era por vezes tão intensa. Ansiava pela Sagra­
da Com. [Comunhão]. Noite após noite, o sono desaparecia — e só
para passar aquelas horas ansiando pela chegada Dele. Isto começou
em Asansol em fev. — e, agora, todas as noites, durante uma ou duas
horas, reparei que de 11 a 1, o mesmo anseio interrompe o sono.”15

O padre não permitiu suas “extravagantes” solicitações. Esforçan-


do-se por restringir o seu fervor, Madre Teresa teve que seguir as práticas
regulares da vida do convento e de procurar outros meios de expressar o
seu amor ardente. E precisava esperar. Durante essa dolorosa espera, sua
sede Dele só aumentava.

“Quanto anseio por me im olar”

No final de setembro, o arcebispo Périer regressou da sua longa viagem


à Europa. Nos cumprimentos que, cortesmente, enviou a Madre Teresa
•Santa Teresa de Calc ata 97

pelo dia de sua festa,* aconselhava-lhe: “Ainda vai demorar um pouco


antes que eu possa concluir todo este assunto.”16 Apesar da advertência,
Madre Teresa aproveitou a oportunidade para retornar à sua causa. O
diretor espiritual a havia deixado livre para ponderar sobre os pensa­
mentos inspirados por Nosso Senhor. Então, ela se sentiu à vontade
para procurar um encontro com o arcebispo, na esperança de que seu
projeto fosse para frente.

St. Marys
Convento de Loreto, Entally
1 de outubro de 47

Excelência,
Muito obrigada pelos votos e as orações no dia da minha festa — é
maravilhoso como Santa Teresinha responde às orações. Eu tinha pe­
dido a ela que me concedesse apenas umas poucas linhas do senhor
no 50° aniversário da entrada dela no Céu — e aconteceu mesmo.
Eu sei que o senhor não se esqueceu da causa e espero que esse
“curto prazo” passe depressa — e rezo para que as coisas se decidam
de tal maneira — que Ele tenha todas as alegrias, toda a glória. Não
pense em mim — porque sou muito pecadora e totalmente indigna
do Seu amor — mas pense apenas Nele e no amor que receberia das
Irmãs e das almas sob os cuidados delas. — Eu disse ao Pe. Van Exem
que lhe contasse tudo e, como não escondo nada dele, ele poderá
contar tudo para o senhor.
Desde 13 de janeiro de 47, tenho rezado muito pelo senhor, para
que estes mesmos desejos que Deus me confiou, a mim, a menos dig­
na das filhas Dele, entrem no seu coração com a mesma força.
Não acho que seja possível vê-lo, porque o senhor deve estar sim­
plesmente cheio de trabalho — mas assim que lhe parecer apropria­
do, ficaria agradecida se pudesse conversar com o senhor.

* Refere-se à festa de Santa Teresinha, também conhecida como Santa Teresa do M enino Jesus
e da Sagrada Face, e, ainda. Santa Teresa de Lisieux.
98 Xcnha, seja M i n h a luz

Eu sabia que haveria muitas complicações, mas a minha confiança


Nele náo se abala. Quanto mais dificuldades e sofrimentos houver em
relação à causa, maior será a prova de que é de Sua Vontade que o traba­
lho se inicie no 50.° aniversário da entrada de Santa Teresinha no céu e,
da sua, na Companhia de Jesus. Que este seja também o primeiro ano
das Missionárias da Caridade. Se o senhor soubesse quanto anseio por
me imolar por completo nessa Pobreza absoluta e então levar a luz de
Cristo para dentro dos tristes lares dos pobres das favelas.
Reze por mim —

Sua devota filha em Jesus Cristo,


Maria Teresa17

O quinquagésimo aniversário da morte de Santa Teresinha era em


30 de setembro e o aniversário da entrada do arcebispo Périer para a
Companhia de Jesus em 3 de outubro, dia em que, naquele tempo, a festa
de Santa Teresinha era celebrada. A “Voz” a estava chamando “com tanto
amor e tanta força”18 e o seu anseio por respondê-la estava se tornando
cada vez mais intenso com o passar dos meses. Por essa razão, Madre
Teresa queria dar início ao trabalho naquele ano memorável.

“Sua Excelência não está interessado


nas 'Vozes' nem nas ‘Visões

As súplicas de Madre Teresa não tiveram o efeito desejado; o arcebispo


Périer ainda náo estava pronto para recebê-la. Em vez disso, expressou
uma série de reservas ao diretor espiritual dela, pedindo mais esclareci­
mentos em relação a alguns pontos. O pe. Van Exem transm itiu direta­
mente à Madre Teresa todos os pontos que o arcebispo havia levantado. E
ela empenhou-se em responder a cada um deles.

19/10/47
Padre,
Como começaremos a trabalhar amanhã eu lhe dou minha res­
posta à sua carta — Se lhe parecer conveniente, pode enviar esta
■Santa T( ri xa de Ca lc ul a 99

resposta a Sua Excelência.


1. O trabalho em Calcutá é tão grande — que nunca haverá Freiras
o suficiente para realizá-lo por completo — mas há pelo menos algumas
para fazê-lo, enquanto que para os pobres das favelas — ninguém.
2. O “Sim” dele [do arcebispo Périer] não é suficiente para dar
início ao trabalho — é verdade — mas é necessário para eu começar a
agir junto a Roma. Nosso Senhor tudo fará, mas para a realização ma­
terial do Seu plano — segundo as regras e os regulamentos do Direito
Canônico, dos quais sou totalmente ignorante — o “Sim” de Sua
Excelência é necessário. — Dará início ao trabalho junto a Roma.
3. Nunca estive em Cossipore. Ouvi dizer que é um lugar grande,
aberto e sossegado. Desde o princípio, Cossipore e Sealdah estão na
lista. Ouvi dizer que o Sr. Animananda R. I. P. [descanse em paz]
deixou a “Boys own home” em testamento a S. E. [Sua Excelência].
Quanto há de verdade nisso, eu não sei. — Na minha carta de Cor­
pus Christi — escrevi que deixava a escolha do local a S. E., porque
não podemos ficar sem o Ssmo. [Santíssimo] Sacramento.
4. A Igreja não corre “riscos”, mas é freqüente usar meios, meios
humanos, para realizar a sua Missão Divina. Era isso o que aquelas pes­
soas queriam dizer.
5. A vida que quero viver com as minhas Irmãs, eu sei, será uma
vida difícil — quer para Irmãs europeias, quer para Irmãs indianas.
— Mas nada é difícil para quem ama. Quem poderá ultrapassar a
Deus em Sua generosidade — se nós, pobres seres humanos, Lhe
entregarmos tudo e submetermos todo o nosso ser ao Seu serviço?
— Não — Ele não deixará de estar ao nosso lado, e conosco, porque
tudo em nós será Dele.
6. Quando eu deixar a vida no IBVM [Instituto da Bem-Aven­
turada Virgem Maria], na minha pobreza e castidade estarei total­
mente comprometida a Deus — em Obediência — por enquanto,
obedecerei a Sua Excelência em tudo — até que Roma pense de outra
forma. Ninguém pode me separar de Deus — estou consagrada a Ele
e como tal desejo morrer — não sei o que diz o Direito Canônico
a este respeito — mas sei que Nosso Senhor nunca Se permitirá ser
separado de mim — nem permitirá que alguém me separe Dele. —
S. E. precisa de uma “razão séria” para me apoiar em Roma. A salva­
ção das almas, o saciar a sede de Cristo de amor e de almas — não é
100 Venha, seja M i n h a luz

isto suficientemente sério?


7. O senhor deve rezar muito — quando chegar o momento de fa­
lar— Também isso confio ao Espírito Santo — que certamente ajudará
a minha ignorância e mostrará Sua força. — Naturalmente, não tenho
o menor medo de S. E. e isto me ajudará a falar mais livremente.
8. Fico feliz que S. E. não está interessado nas “vozes” nem nas
“visões”, que vieram sem serem pedidas e se foram. Não mudaram a
minha vida. Elas me ajudaram a ter mais confiança e a me aproximar
mais de Deus. Fizeram aumentar o meu desejo de ser cada vez mais a
Sua pequena criança. Obedeci ao senhor ao pé da letra em relação
a elas — por isso nada temo. Não lhes atribuo importância em
relação ao chamado porque o meu desejo de me imolar era igualmente
forte antes de elas virem. Náo sei por que foi que vieram — nem tento
saber. Fico feliz em deixá-Lo fazer em mim o que mais Lhe agradar.
9. Com ref. às cartas — guarde-as — precisarei delas. — Diga a
S. E. tudo o que ele quer saber — e se ele desejar ficar com algumas
partes deixe-me copiá-las ou, se lhe for possível fazê-lo — será me­
lhor. Náo destrua nenhuma das cartas que sáo relacionadas à obra.*
10. S. E. tem razão. — Tudo, ou melhor, muitas das coisas que
vêm de mim sáo resultado de meus muitos pecados e fraquezas. O
senhor sabe disso táo bem quanto eu. Só posso estragar a obra Dele,
os planos Dele — mas quero tanto ser-Lhe muito agradável e se por
causa da minha estupidez e dos meus pecados a obra de Deus se es­
tragar ou for feita com menos perfeiçáo — Ele sabe quais são os meus
desejos em relaçáo a Ele. — Sim, náo me poupe em nada — que haja
cada vez menos e menos de mim em tudo.
11. O pe. Moyerseon tem duas candidatas, e há duas iugoslavas
em Roma e mais 3 jovens indianas e eu própria.
12. A troca seria prejudicial a ambas as partes no momento. Pre­
cisamos das Filhas [de Santa Ana] para a educação futura das nossas
pessoas de classe média. — Quando estivermos todas mais fortes,
haverá mais unidade entre as duas ordens.
13. Sobre o Pe. Cre. [Creusen]** é inteiramente verdade — não
me diz respeito.

M. Teresa 19

* Madre Teresa mudou sua opinião sobre destruir as cartas, uma vez que a Congregação fosse
estabelecida; antes, pensava que as canas náo teriam mais utilidade.
** O Pe. Joseph Creusen, S.J. (1880-1960), foi Professor na Universidade Gregoriana, em
Roma. Madre Teresa tinha perguntado se ele tinha visto a Regra e, em caso positivo, qual
tinha sido a opinião dele. De acordo com o arcebispo, isso náo dizia respeito a ela.
•Sanla ■Teresa de C a lc u tá 101

As respostas de Madre Teresa às preocupações do arcebispo foram


seguras e ousadas — em especial quando ela se refere ao papel das vozes e
das visões. Tais fenômenos incomuns não eram atraentes para o prudente
e prático arcebispo, que não estava interessado neles. Isso não preocupava
Madre Teresa porque, embora essas graças extraordinárias a ajudassem,
não as considerava essenciais ao chamado.
Quanto às “razões sérias” de que o arcebispo Périer precisava para
apoiar o seu plano, nada parecia tão sério a ela como “a salvação das almas,
o saciar a sede de Cristo”.20 A sede de Jesus que se encontrava no coração
do seu chamado era, em última análise, a razão suprema para prosseguir.
Havia um ponto em que Madre Teresa e o arcebispo Périer
estavam de acordo: as fraquezas dela. Ambos receavam que “o ego
estivesse envolvido” em tudo aquilo, embora cada um deles tivesse
uma ideia diferente sobre a forma como o “ego” poderia estar influen­
ciando os esforços dela. Enquanto o arcebispo receava que o “ego” es­
tivesse pressionando indevidam ente o lançam ento do projeto, M adre
Teresa tem ia que o “ego” pudesse estar im pedindo-o.
Ingenuamente, o pe. Van Exem entregou as respostas de Madre Te­
resa ao arcebispo, juntamente com uma longa carta sua, de apoio à causa.
Algum tempo antes, tinha proferido a seguinte apreciação positiva:

No exame que fiz das vozes, nada encontrei nelas que perturbasse a mi­
nha fé. Estou convencido de que provêm de Deus. Não existe absoluta­
mente nenhum elemento nelas que possa fazer-me duvidar disso.21

De vez em quando, ele achava oportuno defender sua posição fa­


vorável, que se baseava, exclusivamente, nos frutos de santidade que tinha
observado na vida de Madre Teresa.

Para informação de Vossa Excelência, tenho que deixar claro que,


na direção espiritual que dei, nunca conferi grande importância aos
acontecimentos estranhos. Não foram, de maneira nenhuma, nem
as vozes, nem as visões, que me fizeram acreditar na autenticidade
do chamado; mas foi a autenticidade do chamado o que me levou
a acreditar que deveria dizer ao senhor o que eu pensava sobre as
vozes e as visões. [...] A minha convicção da realidade do chamado
102 X'cnha, seja M i n h a luz

nunca se baseou neles [nos fenômenos estranhos]; estava baseada no


meu conhecimento da excepcional virtude de X [Madre TeresaJ, bem
como dos dotes naturais de X [Madre Teresa] para responder ao cha­
mado com sucesso, nas terríveis provas que prepararam o chamado
e o acompanharam durante muito tempo e na manifesta atuação da
graça divina naquela alma. Eu sei que não estou enganado nestas
quatro coisas."

Quando o arcebispo percebeu que o pe. Van Exem tinha mencionado


a Madre Teresa os detalhes da conversa entre eles dois, náo ficou satisfeito;
alguns dos detalhes se destinavam apenas ao padre. Embora tivesse pedido
desculpas ao arcebispo pela indiscrição, Van Exem continuou sendo o “advo­
gado” de Madre Teresa, reafirmando a sua convicção de que “tudo aquilo veio
de Deus e do Coração Imaculado de Maria”.23
O arcebispo Périer estava decidido a agir apenas quando pudesse
fazê-lo com a consciência tranqüila. Até aquele m omento, nem as mui­
to insistentes cartas de Madre Teresa nem a convicção pessoal do diretor
espiritual da religiosa eram razões suficientes para o arcebispo dar o
seu consentimento. Missionário experiente e zeloso, bispo há 25anos,
recusava-se a tomar uma decisão até poder “declarar perante a minha
consciência e perante a Deus que fiz tudo para chegar à decisão corre­
ta”. “E possível”, acrescentou, em carta ao pe. Van Exem, “que, para ela
[Madre Teresa], tudo seja claro como a luz do dia. Eu não posso afirmar
o mesmo em relação a mim.”24

“í)eixe-me ir.... Enquanto isso,


almas estão sendo perdidas”

O ardente desejo que Madre Teresa tinha de saciar a sede de Jesus a impe­
lia a continuar pressionando. Receava que esse lento procedimento fosse
um sinal de indiferença à dor de Jesus e um obstáculo à salvação das
almas. Ignorando que aquela insistência estava gerando alguma tensão
entre o arcebispo e o padre, continuou a suplicar ao arcebispo para agir
mais rapidamente.
•Santa Teresa de Calc utú 103

Convento de Loreto
Entally, 24/10/1947

Excelência,
Na última carta que me enviou por ocasião da minha festa, o se­
nhor escreveu: “Ainda vai demorar um pouco antes de poder concluir
todo este assunto.” Imploro-lhe, Excelência, em Nome de Jesus e pelo
amor de Jesus, que me deixe ir. Não demore mais. Não me detenha.
Quero começar esta vida na Véspera de Natal. Temos muito pouco
tempo, de agora até lá, para fazer os preparativos restantes. Por favor,
deixe-me ir.
O senhor ainda tem medo. Se a obra for toda humana, morrerá
comigo;25 mas, se for toda Dele, viverá durante séculos. Enquanto
isso, almas estão sendo perdidas. Deixe-me ir com a sua bênção —
com a bênção da obediência com que desejo começar todas as coisas.
Não tema por mim. Pouco importa o que me aconteça.
Excelência, tudo que pedirmos ao Pai em nome de Jesus é conce­
dido.26 Foi em nome de Jesus, o mesmo Nome, que eu lhe pedi —
Por favor, deixe-me ir.
Reze por mim.
Sua devotafilha em J. C ,
Maria Teresa27

Uns dias mais tarde, em carta ao pe. Van Exem, Madre Teresa
repetia algumas das mensagens recebidas da “Voz” — mensagens que
transmitira anteriormente ao arcebispo Périer e, também, sublinhava os
motivos de sua saída de Loreto. Seu desejo de corresponder ao chamado
misturava-se com os seus sentimentos de inadequação, mas estava dispos­
ta a aventurar-se, corajosamente, no mundo da “pobreza absoluta”:

O senhor sabe que não quero deixar Loreto, eu não tenho razão pes­
soal qualquer, absolutamente nenhuma — mas o chamado, a vida e
a obra que Deus quer que eu faça é tão diferente da vida e da obra de
Loreto, que não estaria cumprindo a Sua vontade se aqui ficasse.
Ele fez o chamado a uma criancinha — que é incapaz de realizá-lc
104 l e n h a , seja M i n h a luz

— que já está unida a Ele por tantos laços de amor, por tanta fraqueza
de sua parte e, no entanto, Ele coloca esses grandes desejos no coração
desta criancinha que quase se perde neles. Sempre fui muito feliz onde
estou. Vim para a índia só com a esperança de salvar muitas almas e
de conquistar a palma do Martírio; o trabalho que tenho feito durante
todos estes anos tem ajudado muito para realizar este desejo. E agora,
no ano passado, Ele veio com outro chamado dentro do chamado. Se
tornou tão forte, tão luminoso, a cada Missa e Sagrada Comunhão.
Com frequência fico admirada com os caminhos Dele. [...]
O mundo é rico demais para os pobres. — Precisamos ser muito,
muito pobres em todos os sentidos da palavra para conquistarmos
para Cristo o coração dos pobres. — Os pobres são amargurados e
sofrem porque não têm a felicidade que a pobreza deveria trazer se
suportada por Cristo. [...]
A Pobreza absoluta que Nosso Senhor quer tanto estaria fora das
regras aqui [em Loreto] — o serviço contínuo e o misturar-se com os
mais pobres dos pobres também estaria contra.
Sua Excelência tem medo por mim — que essa vida seja impos­
sível para mim e para as minhas. Santa Clara não teve que enfrentar
tanto por querer entregar-se, e às suas filhas, completamente a Deus
em absoluta Pobreza?28

Madre Teresa não estava ciente de todos os passos que o arcebispo


Périer estava dando nos bastidores. Embora estivesse avançando em dire­
ção a uma resposta positiva, a ela parecia que a sua proposta chegara a um
beco sem saída. Ao mesmo tempo, seu desejo “de se entregar em pobreza
absoluta a Cristo e aos Seus pobres sofredores”29 continuava crescendo.
Sem se deixar deter pelas recusas anteriores do arcebispo, duas semanas
mais tarde voltava a apelar:

Convento de Loreto
Calcutá, 7/11/1947
Excelência,
Como a mulher no Evangelho,30 aqui venho novamente lhe im­
plorar que me deixe ir. Perdoe-me por cansá-lo com tantas cartas,
perdoe esta sua filha — que anseia com muitos desejos tudo aban­
donar por Deus, entregar-se em Pobreza absoluta a Cristo e aos Seus
•Santa Tcrrsa d( C a lr u ta 105

pobres sofredores.
Excelência, o senhor está aqui no lugar do Santo Padre. Conhece os
desejos do Papa; sabe o quanto este trabalho estaria de acordo com o
coração dele. Mais ainda, o senhor está no lugar de Nosso Senhor. Lem­
bre-se do Seu amor pelos pobres sofredores. — Por favor, Excelência,
deixe-me ir logo. Nada me acontecerá, apenas aquilo que Ele preparou
na Sua grande misericórdia. — A minha fraqueza e os meus pecados,
a minha incapacidade, a minha carência de tantas coisas devem causar-
-lhe tanto medo como causam a mim — mas eu estou muito segura
de Deus. — Confio no Seu amor. — Espero muitas coisas, ou melhor,
espero tudo Dele. — Isto é o que me fez ousar chegar até aqui. Nele e
com Ele posso fazer tudo quanto Ele quer que eu faça.31
O Rev. Pe. Van Exem diz-me que a vida que escolhi é difícil. É
Nosso Senhor que quer essa pobreza — por causa das muitas riquezas
pelas quais Ele foi privado de tanto amor. Quanto menos tivermos de
nosso, mais teremos para dar — porque o amor fundado no sacrifício
certamente aumenta. Ele quer “freiras pobres cobertas com a pobreza
da Cruz”. Ali na Cruz Ele nada tinha de Seu. É exatamente isso que
queremos fazer — amar a Deus por Ele Mesmo e aos pobres por Ele,
Nele, com Ele.
Excelência, por favor, confie todo o assunto ao Imaculado Cora­
ção de Maria. — Ela está fazendo maravilhas em outras terras. — Ela
fará isso pela arquidiocese do senhor. — Ela tomará especial cuidado
das Missionárias da Caridade de Vossa Excelência, pois, ao servir aos
pobres, o nosso objetivo é levá-los a Jesus através de Maria, utilizando
o Terço em família como arma principal. Que desejos ela expressou
em Fátima* sobre a conversão dos pecadores. Queremos fazer o papel
de Nossa Senhora nas favelas. — Deixe-me ir, em nome dela e para
glória dela. Com ela como nossa Mãe, e para maior glória dela, Nosso
Senhor não permitirá que esta obra de amor e sacrifício seja um fra­
casso — do ponto de vista Dele.
Eu sou tremendamente indigna de todas as muitas graças que Ele
tem me dado durante todos estes anos, sem qualquer mérito meu,

* Em Fátima, a Bem-aventurada Virgem Maria apareceu para três crianças durante um pe-
-ríodo de seis meses, que se iniciou em maio de 1917. Suas mensagens foram conversão,
penitência c devoção ao seu Imaculado Coração.
106 Venha, seja M i n h a luz

mas, por favor, me diga, o Bom Deus dá esses desejos sem querer que
se tornem realidade? Já se passou mais de um ano desde que eles vie­
ram; e foram aumentando a cada Santa Missa e Sagrada Comunhão.
Eu anseio, eu desejo levar a Ele muitas, muitas almas — fazer com
que cada alma ame o Bom Deus com um amor ardente — levar o
Seu amor a cada rua e a cada favela, a cada lar e a cada coração. — O
senhor dirá que posso fazer isso como freira de Loreto, mas eu não
posso viver a vida que Ele quer que eu viva, não posso levá-Lo às
favelas, onde Ele quer estar.
Uma vez mais, eu lhe imploro, Excelência, por favor, deixe-me dar
início à vida para a qual Nosso Senhor está me chamando. — Deixe
que eu me ofereça para a obra que Ele escolheu para mim.
Excelência, gostaria de pedir-lhe que reze muito por mim, para
que a minha indignidade não seja um obstáculo à obra Dele — aos
desejos Dele.
Implorando a sua bênção,

Sua devota filha em Jesus Cristo,


Maria Teresa*1

Madre Teresa parecia ter um inesgotável núm ero de razões pe­


las quais deveria ir, e ir logo. Estava segura da futura fecundidade das
Missionárias da Caridade, confiança que se baseava, exclusivamente, na
fé que tinha em Deus e na presença ativa de Maria. Era essa a solução
que apresentava para as numerosas perguntas e reservas do arcebispo. A
lógica dela era uma “lógica centrada em Deus”, uma lógica de segurança
e confiança.
Não existem registros de qualquer resposta do arcebispo Périer a
essa cana. Talvez ele tenha desistido de tentar se explicar a essa zelosa
suplicante. Menos de um mês depois, Madre Teresa decidiu voltar a es­
crever. Usando as anotações que tinha guardado, apresentou ao arcebispo
— tal como tinha feito em janeiro — o diálogo entre a “Voz” e ela: o
persistente convite de Jesus, as Suas firmes exigências e mesmo as Suas
censuras, juntamente com as respostas dela, as suas objeçóes e as orações
que Lhe dirigia. À descrição do ano anterior, acrescentou comunicações
recebidas de Jesus durante o ano de 1947, bem como relatos das três vi-
•S ant a Teresa de C a l c u l a 107

sões, sobre as quais o arcebispo só tivera conhecimento através do pe. Van


Exem. Com esses detalhes, ela esperava convencer o arcebispo de que a
inspiração era de Deus.

Festa de São Francisco Xavier■*

Caro Padre,

Ficaria agradecida se entregasse estes papéis a Sua Excelência.

Setembro de 1946
Durante o ano tive frequentemente aquele anseio de ser toda
para Jesus e de fazer com que outras almas — especialmente indianas
venham e O amem fervorosamente, mas como pensei que isso era
um dos meus desejos coloquei-o de lado várias vezes. Estaria fora
de questão identificar-me tanto com as jovens indianas. Depois de
ler sobre a vida de Santa Cabrini — a ideia continuava a me ocorrer
— por que não posso fazer por Ele na índia o que ela fez por Ele na
América — por que ela foi capaz de se identificar de tal maneira com
os americanos que se tornou um deles? Ela não esperou que as almas
chegassem a ela, foi à procura delas com suas zelosas trabalhadoras.
— Por que não posso fazer o mesmo por Ele aqui? Como poderia?
Tenho sido muito feliz como Freira de Loreto. — Abandonar aquilo
que amo e expor-me a novos esforços e a sofrimentos que serão
grandes, ser motivo de chacota para tantos — especialmente reli­
giosos, abraçar e escolher deliberadamente as coisas penosas da vida
indiana — [abraçar e escolher] a solidão e a infâmia — a incerteza
— e tudo porque Jesus o quer — porque algo me chama a abando­
nar tudo e a reunir as poucas pessoas — para viver a Sua vida — para
fazer a obra Dele na índia. Em todas as minhas orações e Sagradas
Comunhões Ele me pergunta continuamente: "Vai recusar? Quando
se tratou da sua alma, Eu não pensei em M im, mas Me entreguei
livremente por você na Cruz e agora o que você vai fazer? Vai
recusar? Quero Freiras indianas vítimas do Meu amor, que sejam
M aria e M arta, que estejam tão unidas a M im que irradiem

* 3 dc dezembro.
108 Venha, seja M i n h a luz

o Meu amor sobre as almas: quero freiras livres, cobertas com


a minha pobreza da Cruz — quero fe ir a s obedientes, cobertas
com a minha obediência na Cruz. Quero freiras cheias de amor
cobertas com a Minha caridade da Cruz. — Vai recusar fazer
isto por M im?”
Meu Jesus — o que Me pedes está além de mim — mal consigo
compreender metade das coisas que Tu queres — sou indigna — sou
pecadora — sou fraca. — Vai, Jesus, e procura uma alma mais digna,
uma mais generosa.
“Tomou-se Minha Esposa por Meu Amor — veio para a índia por
Mim. A sede que você tinha de almas a trouxe para tão longe. — Tem
medo, agora, de dar mais um passo pelo seu Esposo — por M im — pelas
almas? Sua generosidade esfriou?— Estou em segundo lugar na sua vida?
Você não morreu pelas almas — épor isso que não lhe importa o que lhes
aconteça. — O seu coração nunca esteve mergulhado em dor como esteve
o de Minha Mãe. — Ambos demos tudo pelas almas — e você? Tem
medo de perder a sua vocação — de se tomar secular — de faltar-lhe a
perseverança. — Não — a sua vocação é amar e sofrer e salvar almas
e, dando este passo, realizará o desejo do Meu Coração por você. Usará
roupas indianas simples ou melhor, como as que Minha Mãe usava —
simples epobres. O seu hábito atual é sagrado porque é Meu símbolo — o
seu sári se tomará sagrado porque será Meu símbolo. ”
Dá-me luz. — Envia-me o Teu próprio Espírito — que me en­
sinará a Tua própria Vontade — que me dará forças para fazer as
coisas que Te sáo agradáveis. Jesus, meu Jesus, náo permitas que eu
seja enganada. — Se és Tu que queres isto, dá prova disso, senáo,
permite que isto abandone a minha alma. — Confio cegamente em
Ti — vais permitir que a minha alma se perca? Tenho tanto medo
Jesus — tenho um medo terrível — náo permitas que eu seja en­
ganada — tenho tanto medo. — Este medo mostra-me o quanto
amo a mim mesma. — Tenho medo do sofrimento que virá — por
viver essa vida indiana — vestindo como eles, comendo como eles,
dormindo como eles — vivendo como eles e nunca ter nada do meu
jeito. Como o conforto tomou posse do meu coração.
"Você está sempre dizendo faz comigo tudo o que quiseres’ Agora
Eu quero agir, deixa-Me fazê-lo. — Minha pequena Esposa, Minha
pequenina — Não tenha medo — Eu estarei sempre com você. Você
sofrerá e sofre agora — mas sefor a Minha pequena esposa — a esposa
•Santa Teresa ele Ca lc u tá 109

do Jesus Crucificado — terá que suportar estes tormentos no seu coração.


— Deixe-Me agir. — Não Me recuse. — Confie amorosamente em Mim
— confie cegamente em Mim. ”
Jesus, meu Jesus — sou somente Tua — sou tão ignorante — náo
sei o que dizer — mas faz comigo o que desejares — como desejares
— enquanto desejares. Não Te amo pelo que dás, mas pelo que tiras.
Jesus — por que não posso ser uma freira de Loreto perfeita — uma
verdadeira vítima do Teu amor — aqui — por que náo me deixas ser
como todas as outras? Olha para as centenas de freiras de Loreto —
que Te serviram perfeitamente, que estão agora Contigo. Por que não
posso percorrer o mesmo caminho e chegar a Ti?
"Quero Freiras indianas. Missionárias da Caridade, que sejam ofogo
do Meu amor entre os pobres, os doentes, os moribundos e as criancinhas.
Quero que Me tragas os pobres e as Irmãs que ofereçam suas vidas como
vítimas do Meu amor — trarão essas almas a Mim. Eu sei que você é a
pessoa mais incapaz — fraca e pecadora, mas éprecisamente porque você
é assim — que Eu quero usá-la, para a Minha Glória! Vai recusar?
Pequenina, Me dê almas — Me dê as almas das criancinhas pobres
da rua. — Como dói — se você apenas soubesse — ver estas pobres
crianças manchadas pelo pecado. — Anseio pela pureza do amor de­
las. — Se ao menos você respondesse ao Meu chamado e Me trouxesse
essas almas — as tirasse das mãos do demônio. Se soubesse quantos
pequeninos caem em pecado todos os dias. Há muitas freiras que cui­
dam dos ricos e capazes — mas para os Meus muito pobres não há ab­
solutamente ninguém. Eu anseio por eles — amo-os — Vai recusar?”

1947
“Minha pequenina — venha — venha — Me leve aos buracos onde
vivem os pobres. — Venha, seja Minha luz. — Eu não posso ir sozinho
— eles não Me conhecem — por isso não Me querem. Você venha —
venha, vá no meio deles. Me leve com você para junto deles. — Como
anseio por entrar nos buracos onde eles vivem — seus lares escuros e tris­
tes. Venha, seja a vítima deles. — Na sua imolaçáo — no seu amor por
M im — eles irão Me ver, irão Me conhecer, irão Me querer. Ofereça mais
sacrifícios — sorria com mais ternura, reze com mais fervor e todas as
dificuldades desaparecerão.
110 Xciiha, seja iSlinha luz

“Tem medo. Como o seu medo me magoa. — Não tenha medo. Sou
Eu quem está lhe pedindo que faça isto por Mim. Não tenha medo. —
Mesmo que o mundo inteiro esteja contra você, ria de você, que as suas
companheiras e as suas Superioras a menosprezem, não tenha medo —
sou Eu em você, com você, por você.
“Vai sofrer— sofrer muito — mas lembre-se de que Eu estou com você.
— Mesmo que todo o mundo a rejeite — lembre-se de que você é Minha
— ede que Eu sou somente seu. Não tenhas medo. Sou Eu. — Apenas obe­
deça — obedeça alegremente e prontamente e sem perguntas — somente
obedeça. Eu nunca a deixarei — se obedecer. ”
1) Vi uma grande multidão — todo tipo de pessoas — muito
pobres e também havia crianças ali. Todos eles tinham suas mãos
erguidas para mim — em pé no meio deles. Eles clamavam: “Venha,
venha, salve-nos — leve-nos a Jesus.”
2) Novamente aquela grande multidão — podia ver grande triste­
za e sofrimento nos seus rostos — eu estava ajoelhada junto de Nossa
Senhora, que estava voltada para eles. — Eu não via o rosto dela, mas
a ouvi dizer: “Cuide deles — são meus — traga-os a Jesus. — Leve
Jesus a eles — Não tenha medo. Ensine-os a rezar o Terço — o Terço
em família — e tudo ficará bem. — Não tenha medo — Jesus e eu
estaremos com você e com as suas crianças.”
3) A mesma grande multidão — estavam cobertos pela escuridão.
Mas eu podia vê-los. Nosso Senhor na Cruz. Nossa Senhora a uma
pequena distância da Cruz — e eu própria, como uma criança peque­
na diante dela. A sua mão esquerda pousada no meu ombro esquerdo
— e a sua mão direita segurando meu braço direito. Estávamos am­
bas voltadas para a Cruz. Nosso Senhor disse — “Eu lhe pedi. Eles lhe
pediram e ela, a Minha Mãe, lhe pediu. Vai recusarfazer isto por M im
— tomar conta deles, trazê-los para Mim?”
Eu respondi — Tu sabes, Jesus, que estou pronta para ir assim que
me disserem.
Desde [este momento] — nunca mais ouvi nada nem vi nada,
mas sei que tudo o que escrevi — é verdade. — Como lhe disse, não
é nisto que me baseio — mas sei que é verdade. Se não falasse disto
— se tentasse matar estes desejos no meu coração — seria culpada
diante de Nosso Senhor. — Por que foi que tudo isto chegou a mim
-Sa n t a T er es a d e C a l c u t á 1 11

— a mais indigna das Suas criaturas — não sei — e tentei tantas vezes
convencer Nosso Senhor a procurar outra alma, uma mais generosa
— uma mais forte, mas Ele parece gostar da minha confusão, da
minha fraqueza. — Estes desejos de saciar o anseio de Nosso Senhor
pelas almas dos pobres — por vítimas puras do Seu amor — con­
tinuam crescendo a cada Missa e Sagrada Com. [Comunhão]. Todas
as minhas orações, em uma palavra, todo o meu dia — estão cheios
deste desejo. Por favor, não demore mais. Peça a Nossa Senhora que
nos dê esta Graça no dia 8, na festa dela.*
Se houver mais alguma coisa que eu lhe tenha dito, mas de que
não me lembro neste momento, por favor, conte a Sua Excelência isso
também. — Eu lhe disse que apenas desejava obedecer e fazer a Santa
Vontade de Deus. — Agora não tenho medo, entrego-me completa­
mente em Suas Mãos. — Ele pode dispor de mim como Ele desejar.
Por favor, fale a Sua Excelência sobre as duas jovens iugoslavas em
Roma. Depois, há seis jovens bengalis — a jovem belga no Sul — e
também aquela que o senhor conhece na Bélgica. — As vocações
virão. Não tenho medo quanto a isso — embora todos achem que
sou muito otimista, mas sei quanto amor e generosidade há nos cora­
ções bengalis, se lhes derem os meios para chegarem ao mais alto. A
negação de si própria e a abnegação serão os meios para o nosso fim.
— Haverá desilusões — mas o bom Deus apenas quer o nosso Amor
e a nossa confiança Nele.
Por favor, reze por mim durante a sua Santa Missa.
Sua sinceramente em N. S. [Nosso Senhor],

M. Teresa33

P. S. — Explique, por favor, a Sua Excelência o que eu queria dizer


quando afirmei que não me baseava nem acreditava em visões —
queria dizer que mesmo que essas coisas não tivessem acontecido
— os meus desejos seriam igualmente fortes — e a prontidão para
fazer a Sua Santa Vontade igualmente fervorosa.

* Dia 8 de dezembro é o dia da solenidade da Imaculada Conceição da Bem-aventurada


Virgem Maria.
112 X'cuha. seja M in h a luz

./Is visões

Esse é o único momento na correspondência em que Madre Teresa revela


essas visões, ou quaisquer outras. Suas descrições posteriores de Jesus na
Cruz dão uma ideia de quão vividas foram essas cenas. As visões estavam
relacionadas umas com as outras, cada uma baseada na anterior.
Na primeira visão, encontrou-se no meio de uma multidão de pes­
soas “muito pobres e também havia crianças ali”. Desta vez, a voz não
era a de seu amado Jesus, pedindo-lhe “Venha — venha — Me leve aos
buracos onde vivem os pobres — Venha, seja Minha luz. ” Era, agora, a voz
suplicante da “grande multidão” chamando: “Venha, venha, salve-nos —
leve-nos a Jesus.” Esse duplo convite, de Jesus e da multidão — “Venha”
— continuaria ecoando no seu coração até o final de sua vida.
Na segunda visão, ela penetra mais profúndamente na “grande
tristeza e sofrimento” da “grande multidão”. Não estava sozinha; estava
na companhia de Nossa Senhora. Era agora a vez de Maria lhe pedir:
“Traga-os a Jesus — Leve Jesus a eles.” Maria estava lhe encorajando a
responder aos dois apelos, dando os meios para que tudo “fosse bem” —
ensinar os pobres a rezar o Terço em família e a garantia de que Nossa
Senhora estaria presente.
Na terceira visão, o sofrimento da grande multidão intensifica-se:
estão “cobertos pela escuridão”. Madre Teresa podia vê-los, mas também
podia ver Jesus na Cruz. O papel de Maria também se intensifica: Ela é
a Mãe atrás de sua “criança pequena”, apoiando-a enquanto ambas con­
templam Jesus na Cruz. A voz era a de Jesus, recordando à Madre Teresa:
“Eu lhe pedi. Eles lhe pediram, e ela, a Minha Mãe, lhe pediu." E volta a
perguntar: “Vai recusarfazer isto por Mim?"
Na seqüência dessa tripla lembrança e da pergunta que ecoava o
seu compromisso secreto, ela responde: “Tu sabes, Jesus, que estou pronta
para ir assim que me disserem.” A certeza que Madre Teresa tinha de que
estava sendo chamada por Deus e o seu desejo de fazer a vontade Dele
dava-lhe coragem para persistir. Ignorar ou negar esse chamado a tornaria
culpada perante a Deus. Porém, antes de poder agir, ela ainda tinha que
esperar pela resposta do arcebispo.
S a nt a Teresa d( Calc utá 113

“Poclo avançar”

O arcebispo Périer tinha percebido a força do caráter e a grandeza de


coração que estavam por trás da persistência de Madre Teresa. Lendo o
“plano de ação” e as primeiras Regras da nova congregação, havia visto
que a Madre tinha idéias claras, propostas concretas e uma firme deter­
minação. Com suas respostas diretas a todas as apreensões dele, tinha
provado que não era uma sonhadora, uma idealista, mas uma pessoa com
os pés no chão e completamente centrada em seu elevado objetivo.
Foi por ter levado Madre Teresa e as propostas por ela feitas tão
a sério que o arcebispo se manteve fiel à decisão de levar seu meticulo­
so processo de discernimento até o fim, apesar dos freqüentes apelos da
religiosa. Durante sua viagem à Europa, em junho do ano anterior, ti­
nha consultado um teólogo muito considerado em Roma. Ao regressar à
índia, pedira conselho a mais dois padres familiarizados com a situação
local. Esses teólogos avaliaram o projeto sem terem em conta as “cha­
madas exigências de Nosso Senhor”34 e “independentemente de vozes e
visões”35 e, segundo os conselhos deles, o arcebispo poderia “dar a sua
autorização sem cometer uma grave imprudência”.36
Depois de muita oração e deliberação, o arcebispo sentiu-se livre
para dar autorização a Madre Teresa, para levar a cabo aquele projeto.
“Estou profundamente convencido”, escreveria posteriormente à Supe­
riora Geral de Loreto, Madre Gertrude, “de que, não dando o meu con­
sentimento, estaria impedindo a realização, através dela, da vontade de
Deus. Penso que não poderia ter feito nada mais para me esclarecer.”37
A decisão que ele tomara não se baseara nos fenômenos extraordinários
que Madre Teresa tinha vivido, mas sim, na profundidade de sua vida de
oração, sua obediência e zelo, bem como na percepção de que o seu plano
de ação e Regras propunham uma solução concreta para uma necessidade
crítica na Igreja. “Pode avançar” foram as suas — muito esperadas — pa­
lavras, quando se encontrou com ela depois da Missa, no Convento de
Loreto. Era 6 de janeiro de 1948, o décimo nono aniversário da chegada
dc Madre Teresa à índia.
CAPÍTULO 6

fijimo aos “buracos


escuros ”

Vou de livre e espontânea vontade, com a bênção


da obediência.
M a dr e T eresa

“fiara a glória do Sou nome”

Com o consentim ento do arcebispo, Madre Teresa tinha agora liberda­


de para dar o passo seguinte no sentido da realização do chamado. De
acordo com as normas da Igreja, precisava da autorização da Superiora
Geral de Loreto, Madre Gertrude Kennedy, para pedir ao papa autori­
zação para deixar Loreto e dar início à sua nova missão. Na petição que
dirige à M adre G ertrude, escrita apenas quatro dias depois de ter recebi­
do a bênção do arcebispo, Madre Teresa não menciona as locuções nem
as visões, mas apresenta uma sinopse do seu novo chamado, enfatizando
o objetivo espiritual da futura congregação.
116 \ cn h a, seja M i n h a luz

Convento de Loreto
Entally, 10/01/1948

Queridíssima Madre Geral,


O assunto desta carta é muito sagrado para mim, de maneira que
lhe imploro que mantenha o seu conteúdo em segredo. Enviarei uma
cópia desta carta à Madre Provincial, caso a senhora desejar comuni­
car-se com ela sobre o assunto, entretanto não desejo que nenhuma
outra freira saiba disto.
Em set. de 1946, fui de férias a Darjeeling e lá também fiz os meus
oito dias de retiro. De regresso a Calcutá, informei o meu diretor
espiritual do seguinte:
Que Deus quer que eu me entregue completamente a Ele
em absoluta pobreza, que me identifique com as jovens indianas, em
suas vidas de sacrifício e imolação, cuidando dos pobres das favelas,
dos doentes, dos moribundos, dos mendigos que vivem em buracos
sujos e das criancinhas de rua. Numa palavra — que eu me entregue
sem qualquer reserva a Deus nos pobres das favelas e das ruas.
O diretor espiritual me desencorajou. — Embora tivesse percebi­
do que era de Deus, proibiu-me até de pensar no assunto. Durante
aqueles quatro meses, pedi frequentemente, muito frequentemente,
que ele me deixasse falar com Sua Excelência, [mas] ele recusou sem­
pre, até o dia 8 de janeiro de 1947, quando me deu autorização para
colocar todo o assunto diante de Sua Excelência. Assim o fiz em de­
talhes. Sua Excelência o reteve durante um ano inteiro. Rezou muito
para ver a Vontade de Deus. No dia 6 de janeiro de 1948, veio cele­
brar uma Missa aqui no convento e depois disse-me: “Pode avançar.”
E me autorizou a lhe escrever e a lhe falar do chamado.
Agora querida Madre Geral, desejo executar o plano da melhor
forma, para glória do Seu nome. Dirijo-me à senhora, para que me
ajude a cumprir a Sua santa Vontade em relação a mim.
Quero deixar Loreto assim que possível para a Sagrada Congrega­
ção me conceder a anulação dos votos e o Indulto de Secularização,*
ato pelo qual desejo ser livre para viver a vida de uma indiana na

* Mediante um indulto de secularização, um(a) religioso(a) recebe dispensa de seus votos re­
ligiosos, tornando-se, consequentemente, uma pessoa leiga. Por um indulto de exclaustraçáo,
■Santa Teresa de Calcutá 117

India e trabalhar nas favelas. Peço-lhe autorização para apresentar à


Sagrada Congregação o pedido para ser dispensada dos meus votos.
Entrei para Loreto em out. de 1928 e fiz meus votos perpétuos em
maio de 1937.
Querida Madre Geral, estou certa de que é a santa Vontade de
Deus que eu vá fazer esta obra. Por que Ele me chamou, a mim, a
mais indigna e pecadora, uma pessoa tão cheia de fraquezas, de mi­
séria e de pecado, não sei. Nada posso responder — a não ser que os
caminhos Dele são um mistério para mim. Rezei, rezei muito sobre
isto, o olhei por todos os ângulos e a resposta continua sendo a mes­
ma — deixar tudo e segui-Lo ainda mais profundamente nessa vida
de total abandono e imolação, por Ele e pelos Seus pobres. Sei que
ficará preocupada comigo — mas peço-lhe que não me afaste do
caminho que Ele quer que eu siga. Se vivesse na índia, se visse o que
tenho visto durante tantos anos, o seu coração também ansiaria
por tornar Nosso Senhor mais conhecido dos pobres que sofrem
os mais terríveis sofrimentos e depois a eternidade também na
escuridão, porque não há freiras que lhes estendam uma mão nos
buracos escuros onde vivem. Deixe-me ir, querida Madre Geral.
Sei que sou uma das suas filhas mais indignas, mas confio-lhe o
dom que Deus me confiou, e tenho a certeza de que me ajudará
a fazer a Sua Vontade. Por favor, não me impeça de me entregar a
Ele e aos Seus pobres.
Previ muitas das dificuldades que essa vida me trará — mas confio
cegamente no bom Deus e sei que Ele não me decepcionará, mesmo
que eu cometa algum erro.
Como lhe disse antes, Sua Excelência, o Arcebispo de Calcutá,
sabe de tudo e para evitar qualquer íàlatório envio esta carta por ele.
Reze por mim, querida Madre Geral, por favor reze por mim, e peça
às queridas freiras mais velhas da Abadia que façam o mesmo por mim.

Sua afetuosa filha em Jesus Cristo,


Maria Teresa Bojaxhiu1

o(a) religioso(a), formalmcntc, continua sendo membro de sua instituição religiosa, ligado(a)
a ela por votos religiosos, mas vive fora da instituição propriamente dita. Desta forma, muitos
direitos c deveres cessam.
118 Venha, seja M i n h a luz

“£/a tem certeza absoluta”

Tal como Madre Teresa tinha previsto,2 daí em diante, o arcebispo Périer
tornou-se o seu mais tenaz defensor e o seu principal guia. Naquele mo­
mento, sua tarefa era ajudá-la a avançar no processo de ser dispensada das
obrigações como freira de Loreto.
Uma questáo importante era se Madre Teresa continuaria — ou
náo — a ser membro da ordem de Loreto, uma vez que começasse a viver
fora do convento. Na carta que escreveu à Madre Gertrude, Madre Teresa
revelou sua intenção de solicitar a anulação dos votos (ou secularização).
Ao mesmo tempo, embora estivesse convencida de que seria necessária
uma completa separação de Loreto, estava determinada a permanecer
consagrada a Jesus como religiosa, como acentuara anteriormente:

Ninguém pode me separar de Deus — estou consagrada a Ele e como


tal desejo morrer — não sei o que diz o Direito Canônico a este res­
peito — mas sei — que Nosso Senhor nunca Se permitirá ser separa­
do de mim — nem permitirá que alguém me separe Dele.3

Madre Teresa pediu ao arcebispo que lhe garantisse que ela conti­
nuaria totalmente ligada a Cristo:

Também quero ter a certeza de que, logo que os meus votos como
freira de Loreto sejam anulados, o senhor permitirá que eu me com­
prometa por votos que me mantenham sendo Dele a partir daquele
mesmo instante. Náo desejo que passe nem um minuto sem que todo
o meu ser Lhe pertença.4

O pe. Van Exem tinha recomendado a exclaustraçáo, que lhe per­


mitiria manter os votos como freira de Loreto e regressar à ordem se o
projeto náo desse certo. Por sua vez, Madre Teresa insistia em solicitar a
secularização. Quanto à necessidade de, por medida de segurança, dei­
xar entreaberta a porta de Loreto, estava confiante de que isso não seria
necessário: “[S]e a inspiração vem de Deus, e estou convencida disto, o
fracasso está fora de questão.”5
•Santa T(rcsa d< Calcutá 119

O arcebispo Périer veio em defesa de Madre Teresa. Também ele


considerava mais prudente optar pela exclaustraçáo. No entanto, depois
de ter lidado com ela durante o ano anterior, compreendia e respeitava a
sua posição: sendo a inspiração de Deus, Ele tomaria conta do caso. Con­
sequentemente, não desejava interferir nas preferências dela:

Quanto à questão de escolher entre a exclaustraçáo e a seculariza-


ção, é possível que você [pe. Van Exem] tenha razão em preferir a
primeira. Mas devo admitir que esta boa pessoa [Madre Teresa] é
lógica em aderir à segunda opção. Se ela tem a certeza absoluta de
que Nosso Senhor quer que faça essa obra para Ele, o fracasso está
fora de questão, assim como o seu regresso à antiga ordem. Com­
preendo bem isso [e] é por isso que não desejo influenciá-la nesse
ou naquele sentido.6

Por razões de confidencialidade, o arcebispo Périer encarregou-se


da correspondência de Madre Teresa com as suas superioras de Loreto.
Ao receber do pe. Van Exem a carta que ela escrevera à Madre Gertrude,
o arcebispo observou ao confrade jesuíta, com a sabedoria cheia de fé que
o caracterizava: “O nosso trabalho termina aqui. Competia-nos examinar
se podíamos autorizá-la a seguir adiante. O resto é inteiramente obra de
Deus e nós apenas participaremos como instrumentos. E esse é o lugar
certo para nós nas obras ad extra de Deus.”7
No dia seguinte, o arcebispo enviou a carta para Dublin, junta­
mente com seu próprio relatório, no qual delineava o seu processo de
discernimento durante o ano anterior e expressava a elevada consideração
que tinha pela freira de Loreto, ao fazer esta rara solicitação.

Devo acrescentar ainda que, durante todo este período, fui exami­
nando a Irmã, e ouvindo as informações do diretor espiritual e de ou­
tros. Estou ciente de que Madre Teresa nem sempre foi bem compre­
endida e de que, na opinião de alguns, não é altamente considerada,
talvez nem sequer favoravelmente, devido, sobretudo, à sua educação
anterior, diferente em muitas formas da ministrada em outros países
120 l e n h a , seja M i n h a luz

da Europa: Madre Teresa é iugoslava de nacionalidade.* Eu a conheço


há vários anos, desde o tempo em que fez o seu noviciado na índia. E
posso dizer, sem exageros ou quaisquer questões de consciência, que,
apesar dos indubitáveis defeitos exteriores, ela tem um ideal muito
elevado em sua vida religiosa, é intimamente unida a Nosso Senhor,
humilde e submissa, obediente e extremamente zelosa, inteiramente
esquecida de si.8

it(Um instrumento í)elef e nada m a is”

Madre Teresa esperava, ansiosamente, a resposta da M adre Gertrude; e


como nada tinha chegado em menos de três semanas, começou a ficar
preocupada. Náo era realista que o pedido chegasse, fosse considerado e
respondido tão rapidamente, mas Madre Teresa ardia por ir avante. Ten­
do conversado com a Madre Provincial (a superiora máxima da ordem
em Calcutá) sobre sua inspiração, em antecipação à decisão que deveria
chegar, insistiu com o arcebispo para que acelerasse o processo.

Convento de Loreto
Entally, 28/01/48
Excelência,
Vinha querendo escrever-lhe já há algum tempo, mas não conse­
guia arranjar tempo. Continuo ansiando por cumprir a minha pala­
vra a Deus. E quero que ela se faça realidade rapidamente. Até agora,
a demora foi necessária, mas agora que o senhor viu que o Bom Deus
quer a obra, que as almas estão esperando as Missionárias da Carida­
de, por que me fazer esperar tanto tempo? As minhas superioras já
sabem tudo que precisavam saber. A reunião com a Madre Provin­
cial correu muito bem. Ela não me repreendeu nem tentou me fazer
mudar de opinião, foi extremamente amável e gentil — e o resto o
pe. Van Exem deve ter lhe contado. — Há mais de três semanas que
escrevi à Madre Geral.* Quanto tempo devo esperar? Eu não poderia

* Como Madre Teresa era da Iugoslivia, o inglês náo era sua primeira língua; portanto, suas
superioras náo lhe davam a tarefa de dar aulas em inglês.
■Santa Teresa de Calcutá 121

escrever de novo ou diretamente a Roma? Haverá atrasos suficientes


quando o assunto chegar a Roma. — Por que atrasar agora? Perdoe-
-me escrever assim, mas o anseio de me oferecer a Deus nos Seus
pobres está crescendo mais e mais.
A outra coisa é que — se o senhor aprovar — desejo manter o pe.
Van Exem como meu diretor espiritual nas novas circunstâncias, se­
jam quais forem. — E a razão para fazer isto — é que ele me conhece
bem, e também sabe tudo sobre a obra — mas se o senhor desejar que
seja de outra maneira, obedecerei alegremente.
Estão em Roma duas jovens da Iugoslávia, que deviam ter entrado
para Loreto, mas lhes disseram para esperar porque no momento o
Noviciado está fechado. Ambas querem se oferecer por completo por
Bengala. Uma delas é enfermeira formada, a outra é professora. —
Posso escrever-lhes, ou pedir ao Pe. Van Exem que lhes escreva sobre
o trabalho nas favelas?**
Há outra pergunta — que ficaria agradecida se pudesse saber em re­
lação à pobreza absoluta, até que ponto o senhor insistiria em abrandar
ou melhor, facilitar essa pobreza — que deve ser para nós o meio para
atingir o nosso fim? Por pobreza absoluta quero dizer pobreza real e
completa — não morrermos de fome — mas passarmos necessidade —
termos só exatamente aquilo que têm os verdadeiros pobres — estarmos
realmente mortas para tudo quanto o mundo reclama como seu. — Até
que ponto o senhor tentará nos íâzer mudar quanto a isso. — [...]
Quantas temos que ser para termos o Santíssimo Sacramento
entre nós? — O trabalho que teremos que fazer será impossível
sem a Sua contínua graça proveniente do sacrário. — Ele terá que
fazer tudo. — Nós apenas teremos que segui-Lo.
Reze por mim, por favor, para que eu faça as coisas que Lhe são
agradáveis.
Sua devota filha em J. C ,
Maria Teresa**

* Na verdade, haviam se passado menos de três semanas, porque sua cana à madre G enrude
tinha sido escrita em 10 de janeiro e essa cana, ao arcebispo, em 28 de Janeiro.
** Nenhum a dessas moças entrou para a Congregação, mas isso demonstra a confiança de
Madre Teresa de que haveria muitas vocações.
122 l en h a , seja M i n h a lu z

Madre Teresa permanecia firme com o arcebispo na observância


da “pobreza absoluta” na sua futura comunidade, uma observância que,
em virtude do objetivo da nova congregação, seria muito mais rigorosa
que a vivida na ordem a que pertencia naquele momento. Jesus tinha pe­
dido "freiras cobertas com a M inha pobreza da C ruz".10Por essa razão,
ela tentava prevenir qualquer esforço do arcebispo para refrear a pobreza
rigorosa que a Madre tinha em vista para as irmãs.
O arcebispo, embora apoiando, achou Madre Teresa apressada de­
mais e encorajou-a a ser um instrumento dócil e a esperar pelo tem po de
Deus.

Casa do arcebispo
32, Park Street
Calcutá, 29 de janeiro de 1948.

Cara Madre M. Teresa,


P.X
Recebi a sua cana do dia 28 do corrente. A sua carta foi enviada
para a Irlanda no dia 12, e por isso quero que aguarde até ao final
desta semana antes de dar a notícia em Calcutá. Presumo que a Ma­
dre G. [Geral] tenha recebido a carta no dia 18 ou 19. Ter recebido
sua resposta agora significaria que ela não tinha mais nada a fazer a
não ser escrever para a senhora imediatamente, sem refletir. Talvez
estivesse doente ou em visitação. Dê-lhe um pouco mais de tempo. Se
Nosso Senhor deseja fazer milagres neste caso, Ele pode certamente
fazê-los, mas não temos qualquer direito de esperar que eles aconte­
çam e Ele não faz milagres sem ter uma boa razão. Seja paciente. Se a
senhora mesmo escrever a Roma agora, poderá estragar todo o resul­
tado da sua petição. Talvez a R. [Reverenda] Madre Geral já lhe tenha
escrito. Apenas espere a resposta. Não apresse as coisas e não espere
que os outros as apressem também. Compreenderia perfeitamente se
a Rev. Madre Geral quisesse rezar pedindo luz, refletir antes de to­
mar uma decisão. A senhora escreveu sob a sua responsabilidade, eu
escrevi sob a minha responsabilidade, e é natural que esperemos que
ela faça o mesmo. A Madre Geral tem que dar por feito tudo o que
•Santa Teresa de Calcutá 123

a senhora e eu lhe escrevemos. Fiquei muito satisfeito por ler que a


Rev. Madre Prov. [Provincial] recebeu a sua petiçáo tão amavelmente.
Ela, é claro, desejará também rezar pedindo luz, talvez fazer consul­
tas, sem mencionar nomes. No devido tempo, a resposta chegará,
permaneça calma. Reze muito e viva intimamente com Nosso Senhor
J. C , pedindo por luz, forças, decisão; mas não antecipe a OBRA
DELE. Tente não colocar em tudo isto nada de si mesma. A senhora
é um instrumento Dele, e nada mais. Também eu, certamente, rezo,
mas ficaria desapontado se talvez as coisas andassem depressa demais.
Deixe cada um fazer seu trabalho conscientemente, sem pressa. Não é
necessário demorar indevidamente, mas também não há necessidade
de precipitar as coisas indevidamente. Se Nosso Senhor quer que isto
seja feito depressa, Ele pode fazer com que isto aconteça; entretan­
to, sendo criaturas humanas, devemos agir de acordo com os nossos
meios. Deus a abençoe. Em união de orações,

Devotamente em Xt„
f E Périer, SJ"

Os sublinhados da carta são da própria Madre Teresa, e consti­


tuem um a indicação do impacto que essas palavras tiveram sobre ela.
Madre Teresa entregou esta carta ao pe. Van Exem, com umas anotações
de seu próprio punho e letra nas margens:

Destrua por favor — copiei as partes de que preciso. A carta é sim­


plesmente linda. O senhor precisa rezar por mim — para eu apren­
der a libertar-me do ego em mim e a viver intimamente com Ele. O
senhor me ensinará como fazer isto, não é?
Reze por luz para que eu veja e [por] coragem para afastar da obra
tudo o que seja de mim mesma. Tenho que desaparecer por completo
— se quero que Deus tenha tudo.12

Qualquer possibilidade de estragar a obra de Deus era intolerável


para ela, de maneira que, uma vez mais, rendeu-se, obedeceu e ficou es­
perando a resposta.
124 V e n h a . seja M i n h a luz

“O seu desejo... é muito nobre e louvável”

Apenas três dias após Madre Teresa escrever para o arcebispo, ele re­
cebeu a resposta de Dublin. O que pareceu a ela um longo período
foi, levando-se em conta as circunstâncias, surpreendentem ente rápido.
Madre Gertrude tinha tomado a decisão no dia seguinte ao recebimen­
to do pedido:

Percebendo, realmente, a longa consideração e a séria oração de Vos­


sa Excelência com relação a este assunto, bem como as opiniões de
outras pessoas bem qualificadas para apreciar o caso de Madre Teresa,
parece-me que não posso senão aquiescer, ou estaria não concordan­
do com a Vontade de Deus.13

Além de dar autorização a Madre Teresa, Madre Gertrude ainda


louvava o objetivo pelo qual a ordem de Loreto iria perder membro tão
valioso.

25 de janeiro de 1948

Queridíssima Madre Teresa,


O seu desejo de imolar-se completamente ao serviço dos pobres
de Deus é muito nobre e louvável e, embora considere a sua saída
uma verdadeira perda para o nosso Instituto, a senhora me deu tantas
razões para acreditar que o seu chamado vem de Deus que não posso
recusar o seu pedido.
Uma coisa: seria mais sensato obter um decreto de exclaustração
por enquanto e, mais tarde, se tudo correr bem, a dispensa dos votos.
Não mencionarei este assunto a ninguém, nem sequer à Madre
Provincial, e a senhora também não precisa fazê-lo. O meu consenti­
mento é suficiente.
Que Deus a guie e a proteja sempre. Estará presente em minhas
orações. Tenha-me presente nas suas.
Muito afetuosamente em J. C„
M. Gertrude (Superiora Geral)XA
-Santa 'Teresa d( Calcutá 125

Com esta aprovação, uma porta a mais se abria para Madre Teresa. O
passo final que tinha que dar antes de poder sair às ruas de Calcutá era soli­
citar autorização à Santa Sé. Madre Teresa explicou os seus planos em uma
carta cerimoniosa, dirigida à Sagrada Congregação para os Religiosos.

Convento de Loreto
Entally, Calcutá 15
índia
0710211948

A Sua Eminência
O Cardeal Prefeito da S. C. [Sagrada Congregação] para os Religiosos
Roma

Eminência,
Com a autorização e o consentimento da Reverendíssima Madre
M. Gertrude, Superiora Geral do Instituto da Bem-aventurada Vir­
gem Maria (em Rathfarnham, Irlanda), eu peço, humildemente, li­
cença para dirigir esta petição a V. E. [Vossa Eminência], a saber, para
obter o Indulto de secularização, desta forma liberando-me dos votos
que me ligam ao referido Instituto.
Desde setembro de 1946 que Deus Onipotente me chama para
dedicar-me, inteiramente, a uma pobreza completa, seguindo o exem­
plo do grande Santo de Assis, e ao total serviço dos Pobres das favelas
e dos becos da cidade e de outros locais, para cuidar dos doentes e dos
moribundos, para tirar as criancinhas de rua do pecado e do mal, a aju­
dar os mendigos e os famintos. Para poder fazer esse tipo de trabalho,
é necessário uma vida de oração e de sacrifício: para abordar os mais
pobres entre os pobres devemos nos tornar como eles; para atrair os
pobres a Cristo, é essencial uma pobreza completa.
Expus estes meus desejos e muitos outros ao meu diretor espiri­
tual. Ele me obrigou a esperar muito tempo: rezou e pediu orações
para descobrir se era esta a vontade de Deus. Após vários rfleses, per­
suadido de que eu não agia por motivos humanos, mas pelo desejo
de corresponder a uma vocação genuína, autorizou-me a expor tudo a
Sua Excelência, o arcebispo de Calcutá. Após um ano inteiro, Sua Ex­
celência me deu licença para escrever à nossa Reverendíssima Madre
126 Venha, seja M i n h a luz

Geral e, com seu consentimento, estou agora enviando este pedido a


V. E. Eu sinto que se devo servir os mais pobres entre os indianos é ne­
cessário que eu viva como uma indiana com os indianos, portanto não
podendo permanecer no Instituto da Bem-aventurada Virgem Maria.
Ao dar o seu consentimento, a nossa R. [Reverendíssima] Madre Ge­
ral acrescenta que em sua opinião seria mais sensato eu solicitar uma
“exclaustração” à S. C. de Religiosos de modo a poder mais tarde, se as
coisas correrem bem, solicitar uma dispensa para “secularização”. Estou
inclinada a pensar que se a inspiração vem de Deus, e estou convencida
de que vem, não haverá lugar para o fracasso e consequentemente so­
licito a imediata secularização. Posso estar enganada no meu ponto de
vista e, como não tenho qualquer outro desejo senão o de cumprir a
Vontade de Deus, submeto-me antecipadamente ao que Vossa Emi­
nência decidir com relação a isto.
Entrei para o Instituto da Bem-av. [Bem-aventurada] Virgem Ma­
ria em outubro de 1928, fiz os primeiros votos em 1931 e a minha
profissão perpétua em 1937, em Darjeeling. Tenho trabalhado na
índia (em Bengala) desde 1931. Sou albanesa de nascimento mas
residia com os meus pais na Iugoslávia.
Com toda a sinceridade admito não possuir virtude e nem ter méri­
to. É para mim um mistério que o Bom Deus queira isto de uma pobre
como eu. Durante todos esses anos da minha vida religiosa, tenho sido
perfeitamente feliz como membro do Instituto da Bem-av. V. M. e a
ideia de deixá-lo parte o meu coração. Não sei por que motivo Deus
Onipotente me chamou agora para esta nova vida, mas quero apenas
fazer a Sua Santa Vontade sem qualquer reserva, seja qual for o custo.
Quero reunir outras almas à minha volta para fazerem o mesmo tra­
balho e juntas servirmos aos pobres nos seus mais humildes, mais rejei­
tados e mais desprezados membros. Há milhões que vivem nas cidades
e aldeias indianas, ignorantes sobre Deus e sobre Cristo, em abominável
condição de pecado. Nós os levaremos a Cristo e Cristo a eles.
Eminência, eu sou apenas uma humilde freira, e não sei me expres­
sar como deveria. V. E. terá a bondade de me perdoar, estou certa, e
enquanto considera minha petição, reze e abençoe-me paternalmente.
A humilde serva de Vossa Eminência em Cristo,
Irm ãM . Teresa IBVM
No mundo, Gonxha Bojaxhiun
Santa T e n s a cU Calcutá 127

Uma carta de apresentação do arcebispo Périer acompanhava esta


petição. Além de explicar o seu prolongado processo de discernimento,
ele confirmava sua alta consideração por Madre Teresa.

A pedido da Irmã Maria Teresa [...] dirijo a Vossa Eminência a carta


anexa. Não me compete pronunciar-me sobre matéria tão delicada.
Tudo que posso dizer é que, quando o diretor espiritual desta reli­
giosa me falou do desejo que tinha de abandonar o instituto acima
mencionado a fim de se consagrar exclusivamente aos mais pobres
dos pobres, não manifestei qualquer precipitação em dar a ela uma
resposta. Queria perceber se tal desejo era sério. [...]
Conheço pessoalmente a Irmã Maria Teresa há vários anos; na
verdade, conheço-a desde a sua chegada à índia. É uma pessoa muito
dotada, sempre foi profúndamente humilde e submissa, e tem nos
deixado muito satisfeitos pelo espírito religioso que sempre manifes­
tou. É muito apegada ao instituto ao qual pertence e a separação lhe
será muito dolorosa. Eu creio que é muito mortificada e muito gene­
rosa. Como um todo, posso dizer que percebo que tem bom juízo.
É de origem eslava e, consequentemente, eu temo que seja, às vezes,
um pouco exagerada, talvez agitada. Mas, é apenas uma impressão
pessoal e eu teria dificuldade em provar as razões dessa impressão.
Estou, então, submetendo o caso à consideração e decisão de Vos­
sa Eminência.16

“Quão difícil é para mim esperar”

Embora compreendesse que não era de se esperar uma resposta rápida


de Roma, a espera foi, no entanto, difícil para Madre Teresa, como ela
própria confessa ao arcebispo Périer:

Em breve fará quase dois meses que escrevi para Roma e ainda, como
sabe, nenhuma resposta chegou. — Não pretendo de maneira algu­
ma antecipar a Sua vontade nem a Sua obra, só reze para que a minha
indignidade e os meus pecados não sejam a causa do atraso Dele.
Na sua última carta, o senhor escreveu que ficaria desapontado se as
coisas andassem depressa; é possível que Nosso Senhor esteja fazendo
128 l e n h a , seja M i n h a luz

isto para lhe agradar. — Mas se o senhor apenas soubesse quão difícil é
para mim esperar e continuar como se nada estivesse acontecendo, pe­
diria a Nosso Senhor que viesse depressa e me levasse — para as favelas
e para os Seus pobres.r

Com o passar dos meses, o arcebispo corretamente antecipou


que Madre Teresa tentaria apressar as coisas. Em maio, chegou a espe­
rada solicitação:

Convento de Loreto
Entally, 13/05/1948

Excelência,
Não lhe parece que já é hora de fazermos um apelo mais fervoroso
a Roma? Já se passaram quase quatro meses desde que o senhor en­
viou a minha carta. — Por que não respondem? Não lhe parece que
é falta de zelo de nossa parte pela obra Dele se eu só ficar esperando?
É verdade que eu não desejo antecipar Sua Santa Vontade um minu­
to que seja, mas, por favor, Excelência, não me deixe esperar só por
acharmos que já fizemos o suficiente. Escrevi-lhe tantas cartas antes
de o senhor me dar o seu consentimento, possivelmente é necessário
fazer o mesmo com Roma. Eles não conhecem a índia. Eles não sa­
bem o quanto Calcutá necessita das Missionárias da Caridade. Por fa­
vor, Excelência, escreva de novo, e se for preciso, deixe que chegue ao
Santo Padre. Ele compreenderá claramente, porque isto é exatamente
o que ele quer. Por favor, Excelência, vamos fazer um apelo mais forte
a Roma, porque eu devo ir — e ir depressa. Por que tanta reflexão
sobre mim que sou tão pequena, tão pecadora, tão fraca? Por favor,
não demoremos mais — deixe-me ir. Almas estão sendo perdidas nas
favelas e nas ruas, o Sagrado Coração de Jesus está sofrendo mais e
mais — e aqui estou eu esperando — por apenas um único “Sim” que
tenho certeza de que o Santo Padre daria, se soubesse disso.
Por favor, escreva por correio aéreo — para que a resposta possa
chegar durante este mês de Maria,* a quem as Missionárias da Cari­
dade irão pertencer — de corpo e alma.
Perdoe-me, não sei o que mais devo dizer, mas por favor, deixe-me
■Santa Teresa de Calcutá 129

começar logo. Utilize todos os meios que o bom Deus lhe concedeu,
e apele a Roma com um zelo maior — ou diga-me o que devo fazer.
Estou pronta para fazê-lo, mas para esperar — náo me diga. Sou
capaz de suportar isto com a Sua ajuda e graça, mas é muito, muito
difícil, quando a mente e o coração de alguém são cativados por dese­
jos tão fortes, continuar vivendo como se tudo continuasse o mesmo.
Deixe-me ir, Excelência, por favor.
Tenha a bondade de rezar pelo meu irmão, que está gravemente
doente.— [...]
Por favor, reze por mim.

Sua devota filha em Jesus Cristo,


Maria Teresa18

O arcebispo apressou-se a corrigir a convicção de Madre Teresa de


que fora a persistência dela o que suscitou o seu consentimento.

Compreendo perfeitamente que se sinta de algum modo inquieta de­


vido a longa demora entre a sua cana à S. C. [Sagrada Congregação]
para os Religiosos e a resposta deles. Primeiro de tudo, deixe-me cor­
rigir uma ideia incorreta que menciona na sua carta, a saber, que foi
o número de cartas que me escreveu que determinou a minha decisão
de lhe permitir escrever para Roma. Devo dizer que a quantidade de
cartas não fez nada disso, e mais do que uma vez eu disse ao pe. V E.
[Van Exem] que queria tempo para refletir e nada mais.19

A tenacidade da Madre desafiara a natureza deliberativa e meticu­


losa do arcebispo, mas não tinha afetado o seu processo de decisão. Por­
tanto, ele se mostrava cético de que implorar ao Vaticano tivesse qualquer
efeito sobre as autoridades lá: “Não acho que fàrá o seu caso avançar nem
um centímetro”,20 adveniu-a.*

* O mês dc maio é, tradicionalmenrc, dedicado a Nossa Senhora.


130 Venha, seja M i n h a lu z

Também salientou que o processo levava tem po e q u e não havia


qualquer motivo para ficar preocupada. Garantindo-lhe q u e não era falta
de zelo da parte dela esperar pacientemente, ele, entretanto, deu-lhe auto­
rização para escrever de novo. Naquele m om ento, Madre Teresa decidiu
não agir. Contudo, em julho, ambos concordaram que deveriam contatar
a Santa Sé novamente; enviaram, assim, a petição que ela escrevera em
fevereiro do ano anterior, acompanhada de um a carta de cada um.

“Vou de livre e espontânea vontade ”

Em 8 de agosto de 1948, Madre Teresa finalmente recebeu notícias de


Roma: por intermédio da Sagrada Congregação para os Religiosos, o
Papa Pio XII tinha lhe dado autorização para deixar Loreto e dar início à
sua nova missão. Em vez do solicitado indulto de secularização, tinha lhe
sido concedido um indulto de exclaustração, autorizando-a a permanecer
fora do convento de Loreto “durante um ano ou menos, se for suficiente um
período mais curto”21 e a manter os votos religiosos, como freira de Loreto,
sob a autoridade do arcebispo Périer. Na realidade, o indulto tinha sido assi­
nado em 12 de abril de 1948,* mas, por motivos desconhecidos, o documen­
to só chegou a Calcutá em agosto.
Madre Teresa ansiara por uma resposta positiva; teria finalmente
“a alegria de abandonar tudo e de levar alegria ao Coração de Jesus”.22 An­
tes de receber autorização de Roma, previra que a transição não seria sem
dor: “a ideia de deixar isto parte o meu coração”,23 tinha dito ao Cardeal
Prefeito em fevereiro. Chegara agora o momento de fazer esse sacrifício
heroico, de abandonar a segurança do convento e mergulhar em um futu­
ro imprevisível nas favelas. O arcebispo foi a única pessoa a quem revelou
como lhe custava dar o passo que estava prestes a dar.

* Em homenagem a esse importante dia, Madre Teresa escolheu essa data como o dia da pro­
fissão final do primeiro grupo das Missionárias da Caridade, bem como para um bom número
de grupos subsequentes.
•Santa Teresa de Calcutá 131

Convento de Loreto
Entally, 15/08/1948
Excelência
Em primeiro lugar quero agradecer tudo o que o senhor tem feito
por mim — para me ajudar a seguir este novo chamado. Fui a causa
de muito trabalho extra e de muita preocupação — e espero realmen­
te que o bom Deus o recompense à maneira Dele.
Parto na terça-feira à noite no correio de Punjab.* — Está tudo
muito obscuro — cheio de lágrimas — mas vou de minha livre e
espontânea vontade com a bênção da obediência. — Por favor, reze
por mim para que eu tenha a coragem de completar o meu sacrifício
como Ele me deu a inspiração e a graça para começar. [...]
Por favor, reze — eu tenho muito pouca coragem — mas confio
Nele cegamente, apesar de todos os sentimentos.

Sua filha dedicada em J. C ,


Maria Teresa

P. S. — Em Patna serei apenas “Maria Teresa”.24

Em 17 de agosto de 1948, usando um sári branco com uma borda


azul, M adre Teresa — um a freira europeia, sozinha na índia, que acabara
de se tornar independente — partiu para dar início à vida de Missionária
da Caridade. Seu estilo de vida seria tão inovador como o hábito que
vestia. Considerando a “pobreza absoluta” essencial para a sua nova mis­
são, decidiu partir com apenas cinco rúpias. Este era todo o capital dessa
“mulher solitária [...] vestindo somente um sári [...] [uma] freira mas
que não parecia um a freira”.25Sua riqueza, porém, estava no seu coração:
uma fé inabalável em Deus e um a confiança absoluta na promessa que Ele
tinha feito a ela dois anos antes: aNáo tenha medo — Eu estarei sempre
com você [ ...] — C onfie amorosamente em M im — confie cegamente
em M im . ”

* Rcfere-se ao trem dos Correios de Punjab.


CAPITULO 7

“,c/l noite escura do


nascimento
da congregação ”

O PLANO DE N o s s o SENHOR
ESTÁ SENDO CUMPRIDO

Meu Deus, dá-me coragem agora — neste momento


— para perseverar seguindo Teu chamado.
M a d r e T eresa

“Custoa-me muitíssimo ”
Só Deus conhecia o elevado preço do sacrifício de Madre Teresa no m o­
mento em que saía com passos firmes pelo portão do seu bem-amado
Loreto. O seu destino era o Hospital da Sagrada Família das Irmãs da
Missão Médica de Patna, onde deveria aprender as noções básicas de en­
fermagem de que precisaria para servir aos pobres. Embora estivesse de­
terminada a seguir o seu novo chamado, nem por isso deixava de achar
que era “m uito mais duro deixar Loreto do que foi deixar a minha famí­
lia”.1Após chegar a Patna, Madre Teresa escreveu ao arcebispo Périer:
134 l e n h a , seja M i n h a luz

Terminou o primeiro passo rumo às favelas. Custou muitíssimo, mas


sou grata a Deus por ter me dado a graça de fazê-lo e também por me
mostrar como sou fraca.2

A carta termina com um pedido que chama a atenção para as as­


pirações do seu coração: “Por favor, reze por mim para que eu continue
olhando para Ele alegremente.”3
A oração que copiou na primeira página do seu caderno médico tam­
bém reflete sua dor ao deixar Loreto e se adaptar ao novo estilo de vida:

Ó Jesus, único amor do meu coração, desejo sofrer o que sofro e tudo
o que Tu quiseres que eu sofra, por Teu puro amor, não pelos méritos
que eu possa adquirir, nem pelas recompensas que Tu me prometeste,
mas apenas para Te agradar, para Te louvar, para Te dar graças, tanto
na dor quanto na alegria.**

jlm igas para sempre

A partida de Madre Teresa de Loreto teve um grande impacto em todos


os que a conheciam, em especial em suas Irmãs. Durante seus vinte anos
em Loreto, tinha estabelecido relações fortes e calorosas. De Calcutá até as
cidades circundantes, suas antigas amigas lhe escreveram cartas e bilhetes de
encorajamento, o que, naqueles dias de dor, ela apreciou profundamente:

As minhas mais sinceras felicitações pela sua decisão e todos os meus


melhores desejos e orações pelo sucesso A.M.D.G. [AdMajorcm Dei
Gloriam, Para Maior Glória de Deus]’* do seu projeto. Tenho certeza
de que terá oportunidade de aplicar todo o seu zelo nesta nova vida
que está começando e quero que saiba que poderá sempre contar co-

* Esta oraçáo, ditada por Jesus à Irmã Benigna Consolata Ferrero (1883-1916) da Ordem
da Visitação, foi copiada por Madre Teresa na primeira página de seu C aderno Médico, em
Patna, datado de 1948. Nele, além de termos médicos e doenças e seus devidos tratamentos,
ela escreveu receitas de vários biscoitos e nomes c endereços de benfeitores em geral.
** O lema de Santo Inácio de Loyola.
•Sa u t a 'Teresa de C a lc ut á 135

nosco para lhe ajudar com nossas orações. E se pudermos fazer mais
alguma coisa pela senhora, por favor, nunca hesite em pedir. — Sei
que Deus a chama para este trabalho, por isso não precisa ter medo
do futuro; e é, verdadeiramente, com um sentimento de alegria e
confiança, que a vejo partir para realizar a obra de Cristo entre os
pobres e os abandonados.4

Desejavam-lhe felicidades, prometiam-lhe orações e acrescenta­


vam observações engraçadas que amigas entendem.

Queridíssima M.M. [Madre Maria] Teresa —


Minha pequena amiga (Apêndice!)* para sempre.
Este bilhete leva o meu carinho e a garantia das minhas orações.
Que Deus a acompanhe no novo trabalho que Ele tem reservado para
você. Quando ouvi falar disto, fiquei atônita, mas não surpreendida.
Deus quer que use os Dons que Ele lhe deu à maneira Dele, isto
é a sua facilidade para aprender a língua do país — (e não o inglês).
A influência que tem sobre as pessoas desta terra vai agora ajudá-la a
ir em frente e a obter uma grande colheita de Almas para o Céu —
Pergunto-me se, olhando para nós duas às Portas do Céu, S. Pedro
não dirá quem é quem? porque eu a terei ajudado com as minhas
orações durante todo o seu caminho — Por favor, lembre-se também
de mim — preciso de orações —

Sua amiga sempre, in Deo —


Maria José, IB V M 5

A separação foi particularmente dolorosa para Madre Gabrielle,


sua amiga de infância da Escópia:

Minha muito querida Irmã,


Hoje é o dia da sua festa e eu rezei muito por você; muito obrigada
pela sua carta, que me fez muito feliz. Minha Irmã, escrevi para você
a noite passada, quando ouvi que nos tinha deixado. Ah, se soubesse,

Um termo afetivo, inferindo uma situação que as duas entendiam.


136 Ten ha , seja M i n h a luz

quando li a sua carta, chorei o dia todo e vejo que é a vontade de Deus.
Rezo todos os dias por você e as minhas orações nunca lhe faltarão.
Se quer saber, todas as Irmãs falaram bem de você; nem uma só
falou mal de você. Todas estão pensando em você. Ele, o glorioso,
quer mostrar a Sua vontade em você — Quão abençoada você é, que
Deus a escolheu para fazer esse grande sacrifício, porque Dele sempre
recebeu coragem, é por isso que Deus a entregou para esse caminho
difícil; Ele sabe que será capaz de carregar a Cruz Dele — [... ]
Espero que não mude de nome —
Muito carinho e saudações e saiba que nunca a esquecerei.

Sua pequena Irmã,


Maria Gabrielle6

Embora sentisse a dor da separação, Madre Teresa escreveria, de


Patna, ao pe. Van Exem: “Minha alma, no momento, está em perfeita
paz e alegria.”7 Prática, como sempre, já estava à procura de um local para
ficar alojada ao regressar a Calcutá. O pe. Julien Henry,* um sacerdote
jesuíta que era o pároco da igreja de Santa Teresa, em Calcutá, tinha
sugerido que fosse a Krishnagar** como ajudante em troca de moradia.
A primeira reação da Madre a essa proposta foi a de que “seria o melhor
remédio para extrair de mim qualquer gota de orgulho; matará bem as
minhas tendências naturais”.8 Alegrava-lhe a ideia de viver como viviam

* Nasceu em 18 de agosto de 1901, em Dampremy, Bélgica. Entrou para a Sociedade de


Jesus em 1918 e foi ordenado em 1931. Em 1938, foi para a índia c, em 1940, começou seu
apostolado na paróquia de Santa Teresa. Também serviu como pai espiritual da Irmandade
das meninas, em Entally, Calcutá. Apoiou Madre Teresa desde o início de sua obra entre os
mais pobres dos pobres e foi conselheiro e confessor das MCs de 1949 até o final de sua vida,
em 1979.
** Madre Teresa refere-se a um convento nessa cidade, na índia.
•Sa n ta Tuv,sa dv Ca lcuta 137

os pobres, sendo “apenas e só uma j h i ”’ — é disso que eu gostaria mesmo


— também me ajudaria a conhecer o jeito e as dores dos pobres vivendo
com eles, fazendo o mesmo trabalho que eles.”9
Embora disposta a viver a humilhação de ir para lá como freira de
Loreto exclaustrada e ansiosa por desempenhar as tarefas de uma serviçal,
Madre Teresa percebeu que o tratamento especial que receberia em um
local onde era conhecida não lhe permitiria viver a “absoluta pobreza”:

Krishnagar não será bom pelo seguinte, porque eu conheço as Supe­


rioras e a maior parte das freiras e das professoras. Há uns anos, eu
tive que fazer algo para elas, então tentarão facilitar tudo. O senhor
precisa encontrar um lugar onde eu seja totalmente desconhecida.
Que tal Gobra?*** Não conheço ninguém lá. — Não lhes diga nada,
diga-lhes apenas que conhece uma serviçal que está à procura de tra­
balho e que ficaria satisfeita arranjando qualquer coisa. — Eu teria
também a oportunidade de entrar em contato com leprosos, que te­
nho certeza que encontrarei entre os mendigos.

Dependendo completamente das orientações divinas, Madre Teresa


escreveria nessa mesma carta ao pe. Van Exem: “Se Gobra não precisar de
uma j h i — peça a Nossa Senhora que faça com que precisem — Vão se
surpreender com o rosto branco, mas diga-lhes que sou indiana desde o mês
passado.” Segundo o desígnio da Providência, não haveria lugar em nenhum
desses dois lugares e ela teve que continuar procurando.
De Patna, ela também tinha escrito, perguntando se poderia ficar no
edifício vazio de Loreto em Tengra se voltasse a Calcutá. Tendo inicialmente
recebido reações positivas das suas antigas companheiras, Madre Teresa ficou
surpreendida quando viu a solicitação ser recusada pela Madre M. Pauline
Dunne, IBVM, a recém-eleita Superiora Geral da Ordem.

Palavra bcngali que significa “mulher serviçal”.


** Madre Teresa refere-se a um convento em uma área pobre de Calcutá, naquela época.
138 Venlui, seja M i n h a luz

Abadia de Loreto,
Rathfamham, 29 de outubro de 1948

Caríssima M. M. Teresa,
Lamento muitíssimo que a minha primeira carta para a senhora
vai lhe trazer um desapontamento, mas estou certa de que a aceitará
como Vontade de Deus.
Deve ter se esquecido de que as nossas Constituições proíbem a
alienação de propriedade e que, consequentemente, não era da al­
çada da Madre Dorothy lhe conceder tal autorização, como a que a
senhora pediu em sua última carta. Portanto, ela teria que enviar o
caso ao Conselho-Geral.
As minhas Conselheiras e eu lhe desejamos todas as bênçãos e
todo o sucesso nesse novo trabalho para a salvação das almas, para
o qual está, neste momento, preparando-se, em Patna. Contudo,
gostaríamos que compreendesse que Loreto não está relacionada à
nova Ordem que tem a esperança de fundar, nem é responsável por
ela. Admitir outra Ordem religiosa a viver em uma casa ou nos ter­
renos de qualquer um dos nossos Conventos estaria em oposição
aos costumes e ao espírito do nosso Instituto. Tengra não pode ser
dada à senhora. Rezaremos intensamente para que logo encontre
acomodações adequadas.
Eu fui uma das conselheiras da Rev. M adre Gertrude, e fiquei
com a impressão de que a senhora pretendia viver como nativa en­
tre os mais pobres dos pobres de Calcutá, e que, pelo seu exemplo
lá, esperava atrair outras pessoas a se unirem à senhora.
Espero que continue bem, pois a vida em Patna deve ser uma
grande mudança para a senhora. Lembro-me de tê-la visto na Aba­
dia, antes de a senhora partir para a índia. Esteve aqui durante algu­
mas semanas, e penso que não falava inglês.
Com amor e os melhores desejos de felicidades,

Afetuosamente em Jesus Cristo,


M. Pauline Dunne, Superiora Gerat0
•Santa Teresa d e C a lc u tá 139

Dado o fato de que as Superioras de Loreto tinham a responsa­


bilidade de proteger os membros da ordem desse em preendimento “ex­
perimental”, a decisão era compreensível. Sua resposta desafiava Madre
Teresa a ser responsável pelo passo que tinha dado. Mesmo assim, isso
não deixou de ser uma enorme desilusão para ela. Sua resposta à Madre
Pauline revela, uma vez mais, sua prudência e bom senso, bem como sua
confiança em Deus.

Hospital da Sagrada Família


Cidade de Patna, 09/111948

Querida e Reverenda Madre Geral,


Muito obrigada pela sua carta de 29 de out. Por favor, não se pre­
ocupe se teve que me recusar, algum bem virá com certeza disso.
Receio não ter sido suficientemente clara na carta que escrevi à
Madre Dorothy. Não pedi o prédio como uma estadia permanente
— mas apenas até conseguir um local mais adequado — e também
não queria que me fosse dado, mas alugado. — Mas, como a senhora
diz que isso iria contra os costumes e o espírito do Instituto, eu tam­
bém não gostaria de ficar com o prédio.
Nunca pensei nem penso por um segundo que o Loreto estivesse
relacionado à nova obra ou fosse responsável por ela — sei que ainda
sou uma Freira de Loreto, mas isso não significa que a obra esteja
ligada à Loreto. Suponho que a senhora ficou com a impressão de
que quero continuar agarrando-me a Loreto — bem, é apenas natu­
ral que assim seja. Você não pode desfazer os laços com algo que você
amou durante vinte anos. Mas se a senhora desejar que eu não escreva
a nenhuma das Freiras, nem mantenha um grande interesse por tudo
o que Loreto faz, basta dizê-lo que eu assim o farei.
É pura verdade que pretendo viver como uma indiana e, no en­
tanto, uma religiosa por inteiro, com a graça de Deus, mas isso não
significa que eu possa trazer minhas jovens companheiras e lança­
das cegamente ao duro trabalho, sem primeiro lhes dar o objetivo
do seu trabalho abnegado. Foi para elas que pedi a casa onde po-
140 Ve nha , seja ISIinha luz

deriam ficar bem protegidas e ao mesmo tempo se preparar para o


trabalho; mas não tem importância. — Quando o Rei dos Reis e Sua
Bem-aventurada Mãe procuraram um local onde ficar, “não havia lugar
na estalagem”.11 Por que deveria haver um lugar para nós? Também
nós encontraremos um estábulo e começaremos o trabalho pelas almas.
Sim, estive na Abadia há muitos anos — aqueles foram dias felizes,
como foi cada um dos dias dos vinte anos da minha vida em Loreto.
Sou igualmente feliz agora em fazer a Santa Vontade de Deus. Custe o
que custar. O mais provável será ficar aqui com as Irmãs até 13 de dez.
e então fazer os meus oito dias de retiro em Calcutá.
Pude obter muita ajuda das Irmãs que me tratam como se fosse
uma delas. Certamente Deus as abençoará por sua caridade.
Todo começo tem suas muitas cruzes, mas reze por mim e pelas
que ingressarem, para que tenhamos a coragem de fazer este tra­
balho pelas almas. O estilo de vida e de trabalho não encontrarão
certamente a aprovação de todos, embora no momento cada pessoa
que encontrei tenha sido totalmente a favor. Mas o trabalho é Dele,
não é meu e mesmo que eu morra antes de ele ter a chance de come­
çar, sei que respondi ao chamado e que dei o passo rumo aos Seus
esquecidos pobres e indigentes. — Sucesso ou fracasso, quaisquer
que sejam os planos Dele — o primeiro é Dele — o segundo será
meu. Será tudo por Ele.
Gostaria de continuar em contato com a senhora — só para obter
orações, mas se não desejar, reze por mim do mesmo modo — eu rezo
pela senhora todos os dias.
Quando estive em Asansol, Madre Concepta falou-me muito so­
bre a senhora. Ela é uma Superiora de primeira classe e tem uma
comunidade fervorosa.
Queira gentilmente transmitir os meus melhores votos à querida
Madre Gertrude e à Madre Rozario.

Feliz Natal e feliz Ano Novo.

Sua filha afetuosa [em] J. C.


M. Teresan
•Santa 'Teresa de Ca lc ut á 141

Em dezembro, graças à competente formação ministrada pelas Ir­


mãs da Missão Médica, Madre Teresa estava preparada para dar início ao
trabalho nas favelas. Regressou a Calcutá no dia 9, instalando-se com as
Irmãzinhas dos Pobres, no Convento de São José. Antes de começar a
missão, fez um retiro de oito dias, dirigido pelo pe. Van Exem.

“Qiie sofrimento, que falta de fàeus”

Finalmente, em 21 de dezembro, Madre Teresa foi pela primeira vez às


favelas como Missionária da Caridade. Ao longo das dificuldades pelas
quais passara nos últimos dois anos, mantivera-se fiel ao seu chamado, e
tinha finalmente alcançado o seu objetivo: “os buracos escuros onde vi­
vem os pobres”. Uma das suas primeiras seguidoras mais tarde observaria:
“Vê-la pobremente vestida com um simples, humilde sári, com um terço
na sua mão, era como ver o Evangelho ganhar vida, fazendo Jesus presen­
te entre os mais pobres. Podia-se dizer que uma Luz tinha alvorecido na
escuridão das favelas.”13
A Calcutá com a qual Madre Teresa agora se confrontava tinha
sido muito afetada em conseqüência da Segunda Guerra Mundial, da
fome de 1943 e das freqüentes rebeliões que aconteceram na cidade. Ime­
diatamente após a independência da índia, o fluxo de pessoas para a capi­
tal de Bengala foi enorme. A cidade que era conhecida pelos seus palácios
viu aum entar as zonas ocupadas pelas favelas. Os pobres que tinham con­
dições de alugar pequenos barracos (um espaço frequentemente muito
pequeno, sem janelas, nos quais se apertavam com seus escassos perten­
ces) sobreviviam quase sempre com um mínimo reduzido de alimentos
e praticamente sem apoio médico. A educação dos filhos estava além de
suas possibilidades. O número de moradores de rua — a quem faltava
até mesmo esse m ínim o — estava crescendo; eram pessoas que viviam à
mercê da doença, da fome e da inanição.
Ao relatar esse primeiro dia, Madre Teresa descreve a dolorosa rea­
lidade com a qual se deparou:
142 Vculio, se ja M inha laz

8 da manhã. Sai de S. José. (...) Passei por Sta. Teresa (...) peguei
Verônica’ comigo e partimos.
Começamos em Taltala e fomos a todas as famílias católicas. — As
pessoas ficaram satisfeitas — mas tinha crianças e crianças por todo o
lado — e que sujeira e miséria — que pobreza e sofrimento. — Falei
muito, muito pouco, apenas lavei algumas feridas, fiz uns curativos,
dei medicamentos a alguns. — O velhinho deitado na rua — que
ninguém queria — completamente sozinho, doente e moribundo. —
Dei-lhe amebicida e água e o velhinho ficou tão estranhamente grato.
(...) Depois fomos para o Bazar de Taltala e havia uma mulher muito
pobre morrendo eu penso que de fome mais do que de tuberculose.
Que pobreza. Que sofrimento tão real. Dei-lhe algo que a ajudará a
dormir — mas a mulher está ansiando para que cuidem dela. Eu me
pergunto quanto mais tempo resistirá — naquele momento apenas
estava com 35 graus e meio [de temperatura). Pediu algumas vezes
pela Confissão e a Sagrada Comunhão. — Eu senti ali minha própria
pobreza também — pois não tinha nada para dar àquela pobre mu­
lher — fiz tudo o que podia mas se tivesse podido lhe dar um copo de
leite quente ou qualquer coisa assim, seu corpo frio teria recuperado
um pouco de vida. — Devo tentar estar em algum lugar perto das
pessoas onde eu poderia conseguir as coisas com facilidade.14

Cada dia passado nas favelas trazia novos desafios. Além da po­
breza, das dificuldades e da insegurança. Madre Teresa tinha que se con­
frontar com as críticas que havia antecipado. Nem todos compreendiam
seus esforços, nem os benefícios do trabalho por ela desenvolvido entre os
pobres. Nada disso a alarmava. A sua confiante resposta — precursora de
respostas futuras — é uma prova da sua determinação:

Acredito que alguns estão dizendo para que serve trabalhar entre os
mais inferiores dos inferiores — quando os grandes, os cultos e os ri­
cos estão prontos para vir [então] é melhor dar todas as energias para
eles. Sim, deixe que todos eles o façam. — O Reino deve ser pregado

* Verônica Gomes, membro da Irmandade em Santa Teresa, trabalhava naquela paróquia; era
a ''guia” de Madre Teresa nas áreas pobres da cidade.
■Santa Teresa d< Calcula 143

a todos.IS Sc os ricos hindus e muçulmanos podem receber todo o


serviço e devoção de tantas freiras e padres, certamente que os mais
pobres dos pobres e os mais inferiores dos inferiores podem receber o
amor e a devoção de alguns de nós. Chamam-me “Irmã das favelas” e
sou feliz por ser apenas isso, por Seu amor e para Sua glória.16

Com o passar do tempo, para continuar sendo a “Irmá das fave­


las”, Madre Teresa precisaria de um prolongamento da condição de freira
exclaustrada. Ela percebeu que o fato de ter continuado sendo religio­
sa, situação que a princípio considerou desnecessária, foi providencial;
uma freira inspirava confiança nas pessoas e nas jovens que pensassem em
unir-se a ela. Assim, em fevereiro de 1949, escrevia ao arcebispo Périer:

De minha livre escolha, desejo continuar trabalhando pelos pobres


nas favelas e a viver esta vida. Peço-lhe, portanto, Excelência, que me
permita solicitar à Sagrada Congregação que prolongue o Indulto de
Exclaustração até serem aprovadas a vida e as Constituições das Irmãs
Missionárias da Caridade.17

Apesar dos sofrimentos e da persistente tentação de regressar à se­


gurança de Loreto, Madre Teresa continuava seguindo o difícil caminho
que Deus tinha preparado para ela. O fato de esse caminho ser imensa­
mente difícil é evidente nas anotações de 16 de fevereiro do diário:

Hoje aprendi uma boa lição — a pobreza dos pobres deve ser fre­
quentemente tão dura para eles. Quando andava por ali à procura
de uma casa — caminhei e caminhei até doerem minhas pernas e
meus braços — pensei como devem também doer o corpo e a alma
deles procurando casa — comida — ajuda. — Então a tentação tor-
nou-se mais forte — os palacetes de Loreto vieram impetuosamente
à minha mente — todas as coisas belas e os confortos — as pessoas
com as quais elas se misturam — numa palavra tudo — “Basta
dizer uma palavra e tudo aquilo será seu novamente” — ficou di­
zendo o tentador. De [minha] livre escolha Meu Deus e por amor
a Ti — desejo permanecer e fazer o que for a Tua Santa Vontade a
meu respeito. — Não deixei que caísse uma só lágrima. — Mesmo
144 V e n ha , seja M i n h a luz

que sofra mais do que agora sofro — ainda quero fazer a Tua Santa
Vontade. — Esta é a noite escura do nascimento da Congregação
— Meu Deus, dá-me coragem agora — neste momento — para
perseverar seguindo o Teu chamado.

Tal como Madre Teresa tinha previsto, essa nova vida estava tra­
zendo “em sua maior parte, só sofrimentos”.18 Mas ela aceitava que tinha
que ser assim porque essa era a “noite escura do nascimento da Congrega­
ção”. “A pobreza dos pobres” estava se tornando a sua própria pobreza. Ao
mesmo tempo, Deus supria a coragem de perseverar, pela qual a Madre
tinha rezado.
Após dois longos meses de procura, Deus respondeu ao seu pedido
de uma nova casa. Os Irmãos Gomes, dois dos quais viviam em Bangla­
desh, puseram à disposição dela o terceiro andar da casa que tinham na
Creek Lane n° 14, que se tornaria “a primeira casa das Missionárias da
Caridade”,19 para onde Madre Teresa se mudou no final de fevereiro. Mas
as provações persistiam:

Hoje — meu Deus — que torturas de solidão. — Pergunto-me


quanto tempo o meu coração aguentará isto. — O Pe. Bauwens, SJ,
o Pároco de Santa Teresa veio abençoar a casa. — As lágrimas corriam
e corriam. — Todos veem a minha fraqueza. Meu Deus, dá-me cora­
gem agora para eu combater meu ego e o tentador. Não me permitas
voltar atrás do sacrifício que fiz por minha livre escolha e convicção.
Coração Imaculado de minha Mãe, tem piedade da tua pobre filha.
Por amor de ti quero viver e morrer MC.20

Era pouco comum para Madre Teresa, uma pessoa geralmente


controlada, permitir que os outros a vissem sofrer. Apenas há duas sema­
nas, embora sujeita a provas e a tentações, não tinha permitido que lhe
“caísse uma só lágrima”.21 A sua habilidade de suportar a dor e a solidão
tinha agora atingido o seu limite. Segura de que, pelas suas próprias for­
ças, não seria capaz de resistir, voltou-se para Deus em oração.
■Santa Teresa de Calc utá 145

O crescimento da “pequena semente”


Contando apenas com a ajuda de voluntários, Madre Teresa auxiliava um ele­
vado número de pobres em diversos pontos de Calcutá. Avaliando a extensáo
das necessidades e querendo fazer mais, implorou à Virgem Maria que lhe
enviasse seguidoras para expandir a obra:

Fico dizendo a ela: “Não tenho filhas” — assim como há muitos


anos ela disse a Jesus: “Não tem vinho” 22 — deposito toda a minha
confiança no seu Coração. Tenho a certeza de que a seu jeito ela me
dará [filhas].23

Sua oração foi logo atendida. Algumas das alunas que tivera na
St. Mary’s interessaram-se pela sua nova missão. Madre Teresa já tinha
provocado um impacto sobre elas como professora e, agora, no exemplo
que dava com essa nova vida de serviço segundo o Evangelho aos mais
necessitados, elas viram um ideal pelo qual valia a pena deixar tudo. Em
19 de março de 1949, Shubashini Das, a futura Irmã Agnes, veio unir-se
a ela.24 Ao longo dos meses seguintes, foram chegando mais candidatas.
Em junho de 1950, a comunidade contava com doze Irmãs.
Em junho de 1949, Madre Teresa confidenciava ao arcebispo Périer:

Quanto mais se expande o trabalho, mais claro se torna [que é] a Sua


Vontade. Em breve fará um ano [que ela partira de Loreto] — em­
bora tenha havido muito sofrimento e muitas lágrimas, não houve
um só momento de arrependimento. Sou feliz por fazer a vontade
de Deus.25

Até aquele momento, as autoridades de Roma não tinham res­


pondido à solicitação que ela enviara em março, para a renovação de sua
condição de freira exclaustrada. Embora acreditasse que estava onde Deus
queria que ela estivesse, sua incerteza quanto ao futuro era real: “A po­
bre Irmã M. Teresa não compreende porque nenhuma resposta é dada à
solicitação que enviou, e se pergunta, angustiadamente, se terá que aban­
donar todo esse maravilhoso trabalho e regressar ao Instituto”,26 escrevia
146 \ c n h a . seja M i n h a luz

o arcebispo Périer à Santa Sé, no momento em que o indulto dc um ano


estava prestes a expirar. Alívio e gratidão chegaram quando, poucos dias
após o arcebispo ter enviado essa carta, Madre Teresa recebeu a autoriza­
ção da Santa Sé para prosseguir durante mais três anos.
Era notável o que a Madre Teresa tinha realizado em pouco mais
de um ano. Quando, em março de 1950, escreveu a Pio XII para solicitar
a aprovação da nova congregação como instituto diocesano, ela apresen­
tou, ao mesmo tempo, um impressionante relatório das atividades reali­
zadas pela sua comunidade:

Ao regressar de Patna, fiz um retiro de oito dias, depois, em 21 de dez.


de 48, comecei o trabalho. Fui visitando e assistindo as pessoas nos
seus escuros lares e buracos. Tantas crianças pobres e abandonadas me
rodeavam por todos os lados. Devagar, com a ajuda de algumas leigas,
reuni as crianças de duas favelas. Depois em março a primeira jovem
de Bengala ingressou. Neste momento somos sete. Trabalhamos em
cinco centros diferentes. Temos dispensários onde os pobres recebem
tratamento e medicamentos gratuitos de generosos médicos católicos
e hindus — que tiveram a generosidade de oferecer gratuitamente
os seus serviços. Visitamos as famílias de rua em rua. Aos domin­
gos levamos as crianças pobres das favelas à Missa. Em maio passado
começamos um centro de Catequese com 26 crianças. Atualmente
temos mais de 350. [...] Levamos os abandonados que encontramos
frequentemente nas ruas para os diversos hospitais.27

Em julho de 1950, em carta ao arcebispo Périer, Madre Teresa


fazia uma alusão ao preço oculto das suas realizações: “Por favor, reze por
mim, Excelência, para que eu possa fazer a Santa Vontade de Deus em
todas as coisas, seja a que preço for.”28

Mal-entendidos com as freiras de .Cgreto

No convento de Loreto, entretanto, surgiram inquietações e tensões por


causa das alunas da St. Marys que decidiram unir-se à obra de Madre
Teresa. O apoio que recebera inicialmente das antigas companheiras de
■Santa Teresa de ( ale nta 147

Loreto foi interrompido por uma advertência da superiora geral. Madre


Teresa confidenciava ao arcebispo:

A Madre Geral tem receio de que eu seja um grande perigo para as


Freiras de Loreto — então proibiu a todas de terem qualquer coisa
a ver comigo. — Foram empregados todos os meios para que não
me dessem qualquer ajuda. — Cada vez que chega uma novata, a
angústia se deixa sentir no Convento de Entally. — Foi por isso
que tomei providências para que as Irmãs estudem em casa para o
exame de aptidão e mesmo para a formação superior. — Com tudo
o que está sendo feito para impedir que elas ingressem, são mais e
mais as jovens que querem ingressar. — Nada digo a ninguém so­
bre Loreto, de maneira que nem a M. Prov. [Madre Provincial] foi
capaz de encontrar um motivo para fazer qualquer comentário.29

Esses mal-entendidos, suscitados por um alegado desvio das voca­


ções, faziam aumentar o peso do seu sacrifício, mas ela continuava sendo
íntegra e caritativa com as freiras de Loreto.

O nascimento da nova congregação

Com autorização da Santa Sé, em 7 de outubro de 1950 — festa de


Nossa Senhora do Rosário — o arcebispo Périer instituiu oficialmente a
Congregação das Missionárias da Caridade na arquidiocese de Calcutá.
Na presença das pessoas reunidas na minúscula capela, o arcebispo, que
agora se tornava responsável pela nova comunidade, proclamou solene­
mente o decreto:

Há mais de dois anos que um pequeno grupo de jovens mulheres,


dirigidas pela Irmã M. Teresa, religiosa legalmente exclaustrada do
Instituto da Bem-Aventurada Virgem Maria, se dedica, com coração
generoso e enorme benefício para as almas, a ajudar os pobres — as
crianças, os adultos, os idosos e também os doentes, nesta Nossa Ci­
dade Metropolitana.
148 Xcnha, seja M i n h a luz

Quando nos pediram o favor de erigir seu Grupo em Congrega­


ção religiosa, nós analisamos com grande cuidado seu modo de viver
e de trabalhar, e consideramos, diligentemente, o propósito que elas
têm em vista. Essa análise ponderada levou-nos à conclusão de que
nenhuma outra Congregação já existente responde ao propósito visa­
do por este novo Instituto e que, consequentemente, a sua elevação
à Congregação religiosa, para alívio de tantas e tão urgentes necessi­
dades, redundará em maior Glória de Deus em vantagem para a Fé
Católica na nossa Arquidiocese.
Em conseqüência, nós, pelo presente Decreto, e para maior Gló­
ria de Deus e promoção nesta área do Reino de Verdade, Justiça,
Caridade e Paz de Cristo Salvador, instituímos a Congregação reli­
giosa que terá como:
seu Nome ou Titub\ Congregação das Irmãs Missionárias da Ca­
ridade
sua Santa Padroeira: O Imaculado Coração da Bem-aventurada
Virgem Maria
seu Objetivo: Saciar a sede que Nosso Senhor Jesus Cristo tem pela
salvação das almas, através da observância dos três Votos de Pobreza,
Castidade e Obediência, e de um quarto Voto adicional de se dedi­
carem com abnegação ao cuidado dos pobres e dos necessitados que,
esmagados pela necessidade e pela indigência, vivem em condições
que não correspondem à dignidade humana. Aquelas que aderirem
a este Instituto estão, portanto, decididas a se consumirem incessan­
temente, procurando, em cidades e aldeias, mesmo em ambientes
esquálidos, os mais pobres, os abandonados, os doentes, os enfermos,
os moribundos; cuidando deles, prestando-lhes auxílio, visitando-
-os assiduamente e instruindo-os na Doutrina Cristã, esforçando-se
ao máximo para que se convertam e se santifiquem... E realizando
quaisquer outros trabalhos e serviços apostólicos similares, por mais
insignificantes e depreciáveis que pareçam.30

O chamado de Jesus que Madre Teresa ouvira no dia 10 de se­


tembro de 1946 era agora reconhecido e confirmado pela Igreja. Ela se
sentiu indigna ao ver tudo o que Deus tinha realizado, como comentava
em carta ao arcebispo:
S a nt a Teresa cie Ca lcutá 149

O pensamento da minha indignidade diante de todos os Seus presen­


tes a mim e às minhas filhas é cada vez mais profundo e mais nítido.
Nas minhas meditações e orações, que são atualmente tão cheias de
distrações — uma coisa se destaca com grande clareza — minha fra­
queza e Sua grandeza. Receio tudo da minha fraqueza — mas confio
cegamente na Sua grandeza.31

Além da estabilidade que esta aprovação oficial por parte da Igreja


garantia à sua comunidade religiosa, havia outra razão para a alegria de
Madre Teresa naquele dia: a autorização, há muito desejada, para ter o
Santíssimo Sacramento presente na capela do convento. A Madre tinha
escrito ao arcebispo: “Em breve, Nosso Senhor estará conosco — Então,
tudo será fácil — Ele estará aqui pessoalmente.”32 Agora, era dela o con­
solo da Presença Eucarística de Jesus no minúsculo convento. Decidiu,
então, que fariam um dia inteiro de Adoração Eucarística, em ação de
graças por esse evento singular na vida da nova congregação.

Pagar o preço pelas almas

O notável trabalho realizado náo o fora sem custos para Madre Teresa e
para as jovens que a acompanhavam. O trabalho nas favelas era exigen­
te. Tinham que caminhar longas distâncias, sua alimentação era pobre
e, às vezes, tinham que mendigá-la. Ao mesmo tempo, muitas das jo­
vens tinham que continuar seus estudos. “Temos que pagar o preço pelas
almas”,33 repetia a fundadora às jovens Irmãs.
Na sua Explicação das Constituições Originais, escreveu o se­
guinte:

Jesus disse: “Em verdade vos digo, se o grão de trigo não cair
na terra e não morrer, permanece sozinho. Mas se morrer dará
m uito fruto.”34 A missionária deve morrer diariamente, se quiser
levar almas a Deus. Deve estar disposta a pagar o preço que Ele pa­
gou pelas almas, andar pelo caminho que ele andou em busca de
almas.35
150 \ c n h a , seja M i n h a luz

O objetivo do novo instituto não estava sendo realizado apesar


das dificuldades e dos sofrimentos, mas, justamente através deles. Madre
Teresa não queria evitar o sacrifício nem eliminá-lo de sua vida ou da
vida de suas seguidoras. “Agarre a oportunidade de oferecer alguma coisa
a Jesus”, era o conselho insistente que dava às Irmãs. Ela sabia que seus
sofrimentos dariam frutos. Quando o arcebispo Périer objetou que aquela
vida poderia ser excessivamente dura para as candidatas que não fossem
indianas, ela respondeu:

Gostaria muito de algumas [candidatas não indianas] porque vai ser


duro para elas, e quantos mais sacrifícios houver na Congregação,
mais depressa se realizará o nosso objetivo de saciar a sede Dele. O
nosso trabalho pelas almas é grande, mas sem penitência e muito
sacrifício seria impossível. — Temos que fazer muito mais penitência
do que fazem as Carmelitas, devido à proximidade do pecado.36

Os desafios não desencorajavam Madre Teresa. Pelo contrário,


impressionava aqueles que a rodeavam com sua alegre disposição. Era
uma opção consciente; ela queria “continuar sorrindo apesar de tudo”37 e
“sempre dar a Nosso Senhor tudo com um sorriso alegre”.38 Esquecendo
as próprias dores, escolheu espalhar a alegria, confirmando a resolução
que tomara na juventude: “beber o cálice até a última gota”.39 Naquele
momento, exprimiu essa determinação, de forma mais radical, em uma
carta ao arcebispo:

Quero me tornar uma verdadeira escrava de Nossa Senhora40 — be­


ber apenas o cálice da dor Dele e dar à Santa Madre Igreja verdadeiras
santas. Sei que aquilo que quero está além das minhas forças — mas
Aquele que me deu o desejo me dará também as forças para fazer o
impossível. [...] Excelência, por favor, reze por mim, para que eu
possa dar a Nosso Senhor tudo quanto Ele pede, sem pensar em mim
mesma.41

Nossa Senhora era a sua companheira indispensável, e o terço, um


meio simples mas poderoso de permanecer unida a ela:
Sa n ta Teresa de ( a lr ut á 151

Somos ensinadas a amar e a rezar o Terço com grande devoção; se­


jamos muito fiéis a este nosso primeiro amor — pois ele nos aproxi­
mará mais da nossa Mãe Celestial. A nossa regra exige de nós nunca
irmos às favelas sem termos primeiro recitado os louvores da Mãe; é
por isso que temos que rezar o Terço nas ruas e nos buracos escuros
das favelas. Agarremo-nos ao Terço como a planta trepadeira se agarra
ao tronco da árvore — pois sem Nossa Senhora não conseguiremos
nos manter.42

Em 11 de abril de 1951, o primeiro grupo de Irmãs deu início ao


noviciado como Missionárias da Caridade. Esse importante passo, junta­
mente com progresso espiritual das Irmãs, deu grande satisfação a Madre
Teresa, como ela própria relataria ao arcebispo uns meses mais tarde:

As Irmãs mantêm o bom espírito. — Há uma grande competição


pela virtude. O único objetivo delas parece ser encontrarem meios e
formas de saciar a sede ardente de Jesus. — Quando as vejo, sinto que
o plano de Nosso Senhor está sendo cumprido. — Mas ainda falta
uma parte, é aquela em que eu terei que sofrer muito. — Apesar de
tudo que se passou nesses últimos anos, sempre houve perfeita paz e
alegria no meu coração. — Nosso Senhor sabe que eu estou ao Seu
serviço. Pode fazer de mim exatamente tudo o que desejar.43

Por mais estranho que pareça, a verdade é que Madre Teresa re­
ceava que os muitos e variados sofrimentos que experimentava não cor­
respondessem, ainda, à “promessa” que tinha recebido no momento da
inspiração — de que sofreria muito. O arcebispo Périer voltava a dar-lhe
sábios conselhos:

Quanto aos sofrimentos, não precisa ir à procura deles. De.us Oni­


potente os proporciona diariamente: nem sempre são o que nós
imaginávamos, sofrimentos físicos e coisas desse tipo, mas sofri­
mentos interiores, contradições, fracassos nos nossos planos, preo­
cupações com a comunidade, com o trabalho, mal-entendidos nas
nossas relações com outros religiosos, ou com famílias, oposições às
vezes inesperadas etc.44
152 X'cnha, seja M i n h a luz

Entretanto, as acusações e os rumores contra ela continuavam a


difundir-se entre as freiras de Loreto e as Filhas de Santa Ana.4S Madre
Teresa confidenciou ao arcebispo essa nova onda de sofrimento:

Houve uma tempestade em Entally. — As Filhas [de Santa Ana]


ficaram muito incomodadas com o fato da M. M. [Madre Maria]
Bernard ter vindo para aqui. — Eu me tornei algo terrível para Lore­
to. Sou comparada com o demônio e a obra com as obras dele e por
aí afora. Um dia, tudo se tornará claro. Agradeço a Deus por tudo.
— Amo Loreto tanto como o amei durante muitos anos, se nào mais.
— Rezo muitas vezes por elas, e sua “perseguição” me faz amar mais a
minha nova vocação.46

As observações feitas por algumas das Irmãs incomodavam Madre


Teresa, não apenas por virem das antigas companheiras, mas atribuírem
ao demônio o trabalho da jovem congregação era um ataque direto à
origem divina do seu chamado, minando todos os esforços dela e o terno
amor de Deus pelos Seus pobres. A convicção de que estava fazendo a
“obra de Deus” era a âncora que lhe permitia enfrentar essa tempestade.
A fim de responder a essas falsidades. Madre Teresa decidiu es­
crever à Provincial de Loreto, Madre Francisco Xavier Stapleton, “por
simples sentido de dever para com a nossa Congregação”.47 Percebendo a
gravidade da situação e dos sofrimentos provocados por algumas de suas
freiras, a Provincial respondeu-lhe imediatamente, garantindo a Madre
Teresa que tomaria uma atitude: “A senhora já conhece a minha opinião
sobre o seu trabalho que Deus abençoa visivelmente. [...] Lamento que
tenha sido objeto de qualquer ressentimento e farei tudo o que estiver
ao meu alcance para corrigir a situação.”48 Com o passar dos tempos,
estabeleceu-se, entre as duas congregações, um clima de compreensão e
de colaboração mútua.
•Santa Teresa de Ca lcutá 153

Tomar-se santa e ciar santas


As necessidades das Irmãs e dos pobres foram-se tornando mais exigentes.
Em fevereiro de 1952, Madre Teresa confidenciava ao arcebispo que “não
tinha um m inuto”49 para si mesma. Contudo, em meio de todas essas
ocupações, não perdia o foco nem se esquecia do propósito da pequena
Congregação. Uma carta, escrita em abril de 1952, revela a motivação
que a sustentava:

Quero ser santa, saciando a sede de Jesus de amor e de almas. — E te­


nho outro grande desejo — dar à Santa Madre Igreja muitas santas da
nossa Congregação. — Estas duas coisas são as únicas pelas quais rezo,
trabalho e sofro. Reze por mim, por favor, para que eu possa realizar o
Seu desejo em relação à nossa Congregação e a mim mesma.50

O objetivo das Missionárias da Caridade e a procura da santidade


ocupavam o primeiro lugar em sua mente e em seu coração. A sua bus­
ca da santidade não era por motivos de autoglorificação; ao contrário,
era uma expressão da profundidade de sua relação com Deus. A Madre
esforçava-se por difundir os mesmos desejos nas suas Irmãs. O meio para
atingir esse fim era o serviço, gratuito e de todo coração, aos mais pobres
dos pobres: “É maravilhoso ver nas nossas jovens Irmãs este desejo de
saciar a sede de Jesus de almas”, escrevia ao arcebispo. “Nada lhes pare­
ce excessivamente difícil ou impossível, quando se trata das almas.”31 A
quantidade de trabalho realizado por cerca de vinte Irmãs refletia, de fato,
um zelo impressionante.

J l ucasa cio tesouro'" da congregação


Q uando percorria a cidade para atender às necessidades dos pobres,
Madre Teresa encontrava, frequentemente, pessoas m orrendo nas
ruas. Por serem consideradas “casos sem esperança”, os hospitais não
aceitavam essas pessoas que estavam destinadas a se confrontarem , so­
zinhas, com o térm ino de suas vidas, desprezadas e abandonadas por
154 Ve nh a , seja M i n h a luz

todos. Madre Teresa procurou uma casa onde elas fossem recebidas
com amor e tratadas com dignidade, pelo menos nos últim os m om en­
tos de suas vidas. A câmara de Calcutá providenciou um dos abrigos
para peregrinos do Templo de Kali, a que M adre cham ou N irm al
Hriday, que, em bengali, significa “coração puro”, em hom enagem
ao Coração Imaculado de Maria.* Era para lá que ela e as Irmãs leva­
vam os m oribundos que encontravam nas ruas, proporcionando-lhes
alojamento, cuidados médicos básicos e, sobretudo, um terno amor.
Dois meses após sua inauguração, em 22 de agosto de 1952,
festa do Imaculado Coração de Maria, o arcebispo Périer foi visitá-
-la. Habitualmente reservado nas suas apreciações, expressou a alta
consideração que tinha pelo serviço dedicado que ali se prestava:

Fiquei extremamente satisfeito de ter ido ontem visitar o seu hospi­


tal para indigentes e moribundos. Não escondo que me senti pro-
fúndamente impressionado e comovido ao ver tanta miséria, mas
também tanta generosidade por parte de seu pequeno grupo de
religiosas. Deus Onipotente deve olhar para elas com amor e agra­
do. Grande, extremamente grande, será a recompensa dessas boas
freiras no Céu. Nosso Senhor inspirou-a quando pediu esse hospi­
tal e as suas freiras foram inspiradas quando o aceitaram tão gene­
rosamente. Esperemos que seja uma lição duradoura de caridade
para todos verem. Os leigos que as ajudam também são admiráveis.
Deus os abençoe com abundância! E tudo o que posso dizer, porque
recompensa alguma deste mundo lhes retribuiria.52

Madre Teresa não era indiferente à opinião do arcebispo. Sendo


seu superior, portanto o representante de Deus, a aprovação e o elogio
dele eram mais um sinal da bênção de Deus sobre o trabalho. A Madre
não podia negar a satisfação que sentiu, embora atribuindo todo o mérito
às suas Irmãs e não a si própria:

* Em agradecimento a Nossa Senhora, Madre Teresa queria que todas as suas Casas tivessem
nomes que homenageassem o Imaculado Coração de Maria.
•Sfl/i/rt Teresa de C a lc u ta 155

Li a sua carta às nossas Irmãs e elas receberam um novo impulso para


amar a Nosso Senhor com amor mais generoso.
Sim, Nosso Senhor deu-me graças tremendas ao dar-me estas fi­
lhas espirituais. [...] Algumas me deixam envergonhada quando vejo
como, em pouco tempo, já estão a serviço do bom Mestre e que pro­
gresso têm feito em suas vidas espirituais — e aqui estou eu, com os
meus 24 anos de religiosa.53

Madre Teresa considerava Nirmal Hriday a “Casa do Tesouro” da


Congregação. Os esquecidos, os rejeitados, os indesejados que ali acolhia
eram semelhantes ao sofrido Cristo — “Cristo no disfarce angustiante”54
— e lhe davam a possibilidade de “colocar o seu amor em ação”. Os in­
tensos sofrimentos deles, em especial os sofrimentos interiores, estavam se
tornando os seus próprios, unindo-a a Cristo na Sua Paixão e aos mais
pobres dos pobres em sua dor.

“O segundo eu”

Madre Teresa era cheia de iniciativas no seu apostolado. As dificuldades e


os desafios no trabalho com frequência proporcionavam a ela oportuni­
dades de inovação. Foi o que aconteceu com Jacqueline de Decker, uma
enfermeira e assistente social belga que desejava entrar para as Missioná­
rias da Caridade, mas não podia porque tinha uma saúde fraca. Madre
Teresa encontrou um a solução: já que não podia trabalhar com os pobres
em Calcutá, Jacqueline participaria no apostolado tornando-se o “segun­
do eu”55 de Madre Teresa — uma gêmea espiritual que ofereceria a Deus
suas orações e sofrimentos por Madre Teresa e pela fecundidade do seu
trabalho. Por sua vez, Madre Teresa ofereceria suas orações e boas obras
por Jacqueline. Jacqueline e outros que não podiam participar diretamen­
te no trabalho (“os colaboradores doentes e sofredores”, como viriam a ser
designados) juntariam os seus esforços aos das Irmãs para cum prir o ob­
jetivo comum de saciarem a sede de Jesus. Madre Teresa acreditava que o
fato de encontrarem um propósito para o seu sofrimento lhes daria novo
incentivo para o aceitarem e seguirem suas vidas: “O amor exige sacrifí-
156 X c n h a , seja M i n h a luz

cio. Mas, se amarmos até doer, Deus nos dará a Sua paz e a Sua alegria.
[...] Em si mesmo, o sofrimento nada é; mas o sofrimento partilhado
com a Paixão de Cristo é um dom maravilhoso.”

Essa esperança de expandir o trabalho da sua missão de amor,


fazendo-o chegar aos que pareciam, inicialmente, incapazes de nele par­
ticipar, era uma fonte de alegria e de consolo para Madre Teresa, que
explicava, assim, a Jacqueline, o seu entendimento da vocação das Mis­
sionárias da Caridade:

Estou muito feliz porque está disposta a unir-se aos membros so­
fredores das Missionárias da Caridade. — Você entende o que eu
quero dizer? — Você e outros que se unirão irão partilhar em todas
as nossas orações, nos nossos trabalhos e em tudo o que fizermos
pelas almas — e vocês farão o mesmo para nós, com as suas orações
e os seus sofrimentos. Veja bem, o objetivo da nossa Congregação é
saciar a sede de Jesus na Cruz por amor das almas, trabalhando para
a salvação e a santificação dos pobres das favelas. — Quem melhor
do que você e os outros que sofrem como você para fazer isto? O seu
sofrimento e as suas orações serão o cálice em que nós, os membros
ativos, derramaremos o amor das almas que reunimos. Consequente­
mente, são tão importantes e necessários para o cumprimento desse
objetivo. — Para saciar Sua Sede, precisamos de um cálice — e você
e os outros — homens, mulheres, crianças, idosos e jovens, pobres e
ricos — serão todos bem-vindos para formar o cálice. Na realidade,
podem fazer muito mais de seu leito de dores do que eu, correndo
com os meus pés, mas vocês e eu — juntos — podemos fazer tudo
Naquele que nos fortalece.'’6
[...] Mas devemos ter uma coisa em comum, o espírito da nossa
Congregação — o total abandono a Deus, a confiança amorosa e a
alegria perfeita. — Através disso serão conhecidos como Missionários
da Caridade.
Toda e qualquer pessoa que deseje ser Missionária da Caridade
— portadora do amor de Deus — é bem-vinda, mas eu quero, cm
especial, os paralíticos, os aleijados e os doentes incuráveis porque sei
que eles trarão muitas almas aos pés de Jesus. De nosso lado, cada
•Santo T( r< so dc Calcula 157

u m a das Irm ã s terá u m a irm ã q u e rezará p o r ela, p e n sará nela, sofrerá


p o r ela, escre v e rá p a ra ela e p o r aí vai — u m se g u n d o eu. E n te n d e ,
q u e rid a irm ã? O n o sso tra b a lh o é m u ito difícil. Se estiver c o n o sco
— re z a n d o e s o fre n d o p o r nós e p elo tra b a lh o — serem os capazes d e
fazer g ra n d e s coisas p o r a m o r D ele — p o r cau sa d e vocês.
[...] Pessoalm ente, sin to -m e m u ito feliz e a m in h a alm a encheu-se
d e novas forças ao p e n sar q u e você e o u tro s se u n irão esp iritu alm en te
à C o n g re g a çã o . A gora, c o m você e co m o u tro s tra b a lh a n d o conosco, o
q u e n ã o farem os, o q u e n ão po d eríam o s fazer p o r Ele? Q u a n to a você,
su a v id a é c o m o u m a lu z a rd e n te q u e está se n d o c o n s u m id a pelas
a lm a s .157 [...]

O auxílio espiritual dos seus “colaboradores” doentes e sofredo­


res veio a constituir um apoio encorajador em momentos de dificulda­
de: “Quando as coisas estão difíceis, a minha alma é encorajada com a
ideia de ter você rezando e sofrendo por mim”, escrevia a Jacqueline.
“Então, me parece fácil, e o sorriso para o bom Deus surge muito mais
depressa.”58

.// missão florescente e o seu preço


No final de 1952, o terceiro andar da casa da família Gomes tornara-se
excessivamente pequeno para a comunidade, que contava agora com vin­
te e seis membros. Madre Teresa foi obrigada a procurar uma casa maior
para acomodar o crescente número de Irmãs. Depois de uma tempestade
de orações que sacudiu o Céu, encontrou uma casa na Lower Circular
Road, que é, ainda hoje, a Casa-Mãe das Missionárias da Caridade e para
onde a comunidade se mudou em fevereiro de 1953.
A inspiração de 1946 era agora uma “realidade viva”59— uma co­
munidade florescente que servia aos mais pobres dos pobres de Calcutá.
Os desafios e os sofrimentos que isso implicara tinham valido a pena. Mas
não tinham terminado. Havia uma provação especial, para a qual Madre
Teresa procurou, repetidamente, ajuda espiritual. Algum tempo depois,
revelou, finalmente, essa dolorosa provação interior, já então implantada
profundamente em sua alma.
C A PÍTU LO 8

t ,•/! sede deJesus


Crucificado

Quero sorrir— mesmo para Jesus — e assim ocultar


mesmo a Ele — se possível— a dor e a escuridão da
minha alma.
M adre T eresa

jfl revelação da escuridão

18/03/53

Excelência,
[...] Por favor, reze especialmente por mim para que eu não estra­
gue a obra Dele e para que Nosso Senhor Se mostre — pois há dentro
de mim uma escuridão tão terrível, como se tudo estivesse morto.
Tem sido assim mais ou menos desde o momento em que dei início
à “obra”. Peça a Nosso Senhor que me dê coragem.
Por favor, dê-nos a Sua bênção,

Sua devota filha em J. C ,


M. Teresa, M O
160 X'cnha, seja Mi n h a luz

Após vários anos sofrendo em silêncio, apenas com ocasionais e


vagas referências ao seu estado interior, Madre Teresa revelou, finalmente,
ao arcebispo Périer a grande dor que atormentava sua alma desde o início
de sua missão com os pobres. O arcebispo, entretanto, não parecia com­
preender exatamente pelo quê ela estava passando interiormente, uma
vez que, a honesta, mas breve descrição da Madre pouco esclarecia essa
supostamente inexplicável condição. Ele presumiu que a Madre se referia
às dificuldades de conduzir a nova congregação. Suspeitando que a incli­
nação que tinha para a “pressa” — e que era uma permanente fonte de
tensão entre os dois — fosse uma possível causa desse estado, aconselhou-
-lhe moderação.

Deus a conduz, cara Madre; a senhora não está tão às escuras quanto
pensa. O caminho a seguir poderá não ser sempre imediatamente
claro. Reze por luz; não decida com demasiada rapidez, escute o que
os outros têm a dizer, leve em consideração suas razões. Sempre en­
contrará alguma coisa que a ajude. A senhora tem fatos externos sufi­
cientes para ver que Deus abençoa o seu trabalho. Portanto, Ele está
satisfeito. Guiada pela fé, pela oração e pela razão, com a intenção
correta, a senhora tem o suficiente. Os sentimentos não são necessá­
rios e frequentemente podem ser enganadores.2

“Tenfei não recusar nada a t)eus”


Um mês depois de revelar sua provação ao arcebispo, Madre Teresa fazia
seus votos perpétuos como Missionária da Caridade ao mesmo tempo em
que as primeiras dez Irmãs faziam os seus primeiros votos. A feliz ocasião
lhe trouxe gratidão e humildade. Ao arcebispo Périer escreveu:

Quando penso em 10 de set. de 46 — só agradeço a Deus, do fundo


do coração, tudo o que Ele tem feito. Não reivindico qualquer parte
da “obra” que foi, é, e sempre permanecerá Dele. Peço ao senhor que
me aponte os meus defeitos para que eles não estraguem a obra Dele.
Sei que houve coisas que podiam ter sido melhores, mas com toda
a sinceridade, tentei não recusar nada a Deus e responder a todos os
Seus chamados.
-Santa -Teresa de ('alenta 161

Nosso Senhor pediu “Freiras cobertas com a pobreza da Sua Cruz”.


[...] já existem as dez primeiras. Elas têm vivido essa vida generosa e
alegremente. [...] Se eu tivesse sabido que era isto que Nosso Senhor
me daria, teria tido medo de responder ao chamado, por náo ser dig­
na de ser Madre delas. O meu coração está hoje muito cheio de grati­
dão a Deus e ao senhor, por tudo quanto fez pela nossa Congregação,
em especial por ter tomado “a obra” sob o seu próprio cuidado pessoal
e amor. A única maneira que temos de lhe mostrar a nossa gratidão [é]
tomando-nos verdadeiras Missionárias da Caridade. [...]
Excelência, por favor, reze por mim para que eu possa me entregar
completamente a Nosso Senhor.3

Comovido com o testemunho desse grupo de religiosas jovens e


fervorosas, o arcebispo respondeu a Madre Teresa no dia da profissão,
expressando o seu enérgico apoio à nova comunidade:

Essa longa aspiração e chamado de Deus tornaram-se realidade passa­


dos alguns anos, não apenas como um começo, mas como instituição
testada e confirmada, capaz de viver, dotada de forte vitalidade e de
capacidade para um apostolado duradouro e fecundo. [...] Compar­
tilhei, sinceramente, sua alegria nesta manhã. Aleluia.4

Mais tarde, admitiria: “Sou profúndamente grato a Deus, que me


permitiu ser Seu instrumento para dar início a este trabalho grandioso, atra­
vés da senhora e de suas irmãs.”5

“Muitas almas foram


trazidas de v>olta para focus”
A atividade daquela comunidade começava a atrair admiração e louvor,
na medida em que artigos descrevendo seu trabalho começaram a ser pu­
blicados, local e internacionalmente. Madre Teresa partilhava, assim, suas
preocupações com o arcebispo:
162 \enha, seja Mi nha laz

Estou com medo de que estejamos recebendo muita publicidade. —


Ouvi algumas coisas esta tarde que me gelaram de medo. Deus nos
preserve. Por favor, reze por mim — para que eu não seja nada para
o mundo e o mundo não seja nada para mim.0

Em face desse perigo, sua humildade bem firmada, a persisten­


te escuridão e as inúmeras necessidades do trabalho que continuava a
expandir-se a ajudaram a impedir que o seu coração fosse tomado pelo
orgulho e por um espírito mundano. O fato de ela e as Irmãs, às vezes,
correrem riscos físicos reais a ajudava a manter “os pés no chão”:

Voltamos a ter problemas em Kalighat [Nirmal Hriday] — disseram-


-me muito friamente que devo dar graças a Deus pelo fato de, até
o momento, não ter levado nenhum tiro nem ter levado uma surra
deles, já que, para todos os que trabalharam para eles, a morte foi a
recompensa. Tranquilamente respondi a eles que estava pronta para
morrer por Deus. Aproximam-se tempos difíceis, rezemos para que a
nossa Congregação resista ao teste da Caridade.7

Em meio a todas essas provas, Madre Teresa sentia-se fortalecida


pelo fervor das Irmãs, conforme escrevia ao arcebispo:

Hoje, a nossa pequena Irmã Maria Goretti partiu para junto de Nos­
so Senhor. A maior alegria da vida dela foi ter sido Missionária da
Caridade,* e tão verdadeiramente o foi — que muitas vezes quando a
via ou falava com ela, eu me sentia feliz por ter sacrificado Loreto —
para ter me tornado Mãe de uma filha assim. Agora está com Jesus —
a primeira MC a entrar no céu. [...] Agora com a Irmã no céu vamos
conseguir muitas vocações.8

Embora passasse por dificuldades, o trabalho de Madre Teresa en­


tre os pobres prosseguia com resultados notáveis. A Madre tinha cons-

* Madre Teresa quis atender ao pedido dessa aspirante de fazer sua profissão religiosa antes de
morrer, o que não foi possível porque ela ainda não era noviça. No entanto, Madre Teresa a
considerava como uma Missionária da Caridade, mesmo não sendo esse o caso.
•Santa Tvrosa de Calcutá 163

ciência de que era a “obra de Deus”; de que ela era apenas um instrumen­
to para “levar as Almas a Deus — e Deus às Almas”.9 Para tal missão, ora­
ção e sacrifício eram essenciais: unidos ao sofrimento redentor de Jesus, a
oração e o sacrifício fermentavam o trabalho pelos pobres. Essa visão de
fé a guiou no estabelecimento dos seus “colaboradores doentes e sofredo­
res”, como explicava ao arcebispo Périer:

Não sei se disse ao senhor que dei início a uma relação espiritual com
os doentes. Cada Irmã tem um segundo eu — para rezar e sofrer por
ela — e as Irmãs compartilharão as suas boas obras e as suas orações
com ela. — Espiritualmente, são filhos da Congregação — assim,
tenho alguns na Inglaterra, em Bruxelas, na Antuérpia, na Suíça,
em Calcutá, que entraram para a Congregação, homens, mulheres,
crianças. — Eles gostariam de ter umas pequenas orações para reza­
rem em união conosco. A senhorita de Decker e Nicholas Gomes
são o meu segundo eu. Atualmente, são 18 na lista. Por favor, daria a
sua bênção a este trabalho? — São as orações e os sofrimentos deles
que estão abençoando o nosso apostolado. Os faz tão felizes ter al­
guém por quem sofrer — serem Missionários da Caridade — embora
sejam cegos, coxos, TB [tuberculosos], aleijados, cancerosos. Com
frequência, quando percebo que o trabalho está muito difícil, ofereço
o sofrimento destes meus filhos e descubro que a ajuda chega logo.
— Acho que muitos dos nossos doentes e sofredores se santificariam
muito mais depressa se sofressem para saciar a sede de Jesus. Quando
o senhor vier, explicarei melhor.
[...] Estou há 23 anos na vida religiosa — por favor, agradeça a
Deus por tudo o que Ele fez por mim.10

A medida que a escuridão interior ia se tornando mais difícil de


suportar, os aniversários de datas significativas recordavam-lhe as “inter­
venções” de Deus na curta história do pequeno grupo. Nessas ocasiões,
Madre Teresa não podia deixar de reconhecer os resultados do seu “Sim” a
Deus e de exprimir a profunda gratidão que sentia:

No dia 21 de dez. fará cinco anos que começou o trabalho nas fave­
las e quero agradecer a Vossa Excelência todo o seu interesse pessoal
164 t e n h a , seja M i n h a luz

e o amor paternal que demonstrou à jovem Congregação. Muitas


almas foram trazidas de volta para Deus. Muitos moribundos foram
enviados para Deus, muitas crianças foram ensinadas a amar a Deus,
muitos doentes foram reconfortados e ensinados a sofrer por amor
a Deus, e, sobretudo, a vida generosa e sacrificada das nossas jovens
Irmãs deve ter dado muita reparação ao Sagrado Coração. — E por
tudo isso lhe imploro que dê graças a Deus comigo."

“jl minha própria alma


permanece em uma escuridão profunda”

Em meio à fecundidade tão evidente, quase um ano após a sua primeira


revelação ao arcebispo, Madre Teresa voltou a informar que “a minha pró­
pria alma permanece em uma escuridão e desolação profundas. Não, não
me queixo — que Ele faça comigo o que Ele quiser”.12 Abandonando-se
mais uma vez, estava disposta a sacrificar a consolação de se sentir unida
a Jesus pelo desafio de viver puramente de fé. Essa experiência a tornava
ainda mais compreensiva e compassiva com os outros, habilitando-a a
oferecer encorajamento e conselhos práticos.

Quando for muito difícil para você — apenas esconda-se no Sagrado


Coração — onde o meu coração com o seu encontrarão toda a força
e o amor. Você quer sofrer em puro amor — diga antes, no amor que
Ele escolher para você. — Precisa ser uma “hóstia imaculada”.13

Apesar dessa noite interior, Jesus era o único centro da vida de


Madre Teresa; ela O amava e queria estar unida a Ele, em especial na
Sua Paixão. Um verdadeiro retrato de sua alma — não influenciada por
sentimentos, mas firme na fé — emerge da explicação que deu a srta. de
Decker sobre o chamado de uma Missionária da Caridade.
Sa n ta -Teresa do Calcutá 165

17/10/1954

L. D. M. [Laus Deo Mariaeque, Glória a Deus através de Maria]

Minha irmã Jacqueline Theresa,’


A sua muito bem-vinda carta de 11 foi recebida com muita ale­
gria. Estava ansiosa por receber notícias suas.
Como o bom Deus a ama, minha querida irmãzinha, quando a
aproxima tanto da Sua Cruz. — Se você náo fosse o meu segundo eu,
acho que teria inveja de você, mas, desta forma, alegro-me porque é
o meu segundo eu. Você sofre muito e a sua alma está crucificada de
dor — mas não é que Ele está vivendo a Sua vida na Sua Jacqueline?
— Que vocação tão bela a sua — uma Missionária da Caridade —
uma portadora do amor de Deus. — Levamos no corpo e na alma
o amor de um Deus infinitamente sedento. — E nós, você e eu, e
todas as nossas queridas Irmãs e os segundos eus saciaremos essa sede
ardente — vocês com seu sofrimento inexpressível, nós com trabalho
árduo. Mas não somos todos o mesmo? — um? — “como Tu, Pai,
em M im e Eu em Ti", disse Jesus.14
Você aprendeu muito. Saboreou o cálice da Sua agonia — e qual
será a sua recompensa minha querida irmã? Mais sofrimento e uma
semelhança mais profunda com Ele na Cruz. Sinto-me indigna de
ser sua irmã, então quando rezar, peça a Jesus que me aproxime mais
Dele na Cruz para que aí nós duas sejamos uma. [...]
Querida Marguerite — que duro deve ser para ela ser completamen­
te cega — mas pode ver melhor a Jesus — e isso [é] a única coisa que
importa. [...]
Por favor, diga ao nosso querido irmão Clement que ele pode
ser um verdadeiro João Batista1s — porque o nosso trabalho é exa­
tamente isso, preparar o caminho — depois de nós, outras freiras e
amigos entrarão no campo das almas. — Estou muito orgulhosa de
você — uma verdadeira Missionária da Caridade. — Seja corajosa e

* Madre Teresa tinha adicionado seu próprio nome ao de Jacqueline.


166 Venh a, seja M i n h a luz

continue sorrindo. — Você sabe que Ele a ama com um Amor terno
e infinito. [...]
Reze por mim — tenho muito que fazer.

Muito amor da sua irmã em Jesus,


M. Teresa16

“Uma portadora do amor de Deus”, “o amor de um Deus infini­


tamente sedento” — era este o elevado conceito que Madre Teresa tinha
de uma Missionária da Caridade. As Irmãs que se entregavam a um traba­
lho árduo e os seus “colaboradores” que sofriam doenças e deficiências se
uniam no objetivo comum de saciar a sede ardente de Jesus na Cruz.

“Ssposa deJesus Crucificado ”


A escuridão interior era o modo privilegiado que a Madre Teresa tinha
de penetrar no mistério da Cruz de Cristo. Ciente de que o sofrimento
deveria ser esperado como parte do chamado de uma Missionária da Ca­
ridade, escrevia a uma das Irmãs:

Minha querida Filha,


Obrigada pela bonita e consoladora carta do dia 14. Continue
olhando para o Sagrado Coração. — Por que se preocupa se será tu­
berculose ou não? — Você é Dele e isso é um presente Dele para você,
a Sua esposa. Não foi a Madre quem lhe ensinou a dizer para pro­
fissão dos votos: “Desejo tornar-me esposa de Jesus Crucificado”?
— Não é Jesus glorificado, nem no presépio, mas na Cruz — sozi­
nho — despido — sangrando — sofrendo — morrendo na Cruz.
Por isso, se você for a primeira da Congregação que Ele escolhe para
estar sozinha no leito da Cruz, bem, minha filha, devemos dar gra­
ças a Deus por tudo — por este amor especial por você, por mim e
pela Congregação. Você ainda é uma criança e a vida é bela — mas
o caminho que Ele escolheu para você é o caminho verdadeiro. —
Por isso sorria — sorria à Mão que lhe bate — beije a Mão que a
está pregando na Cruz. — Não acredito assim como você não acre­
dita que tenha tuberculose — mas deixe-os fazerem com você tudo
•Santa 'Teresa de Calc utá 167

o q u e q u is e r e m . — S e ja c o m o um c o rd e irin h o — so rrin d o a to d o

m u n d o . N ão se p re o c u p e , q u e e u v o u p e d ir o d in h e ir o e v o u v ê -la

lo g o q u e a I r m ã m e d ê n o tíc ia s m a is c o n c r e ta s .

“Q u e e le s e rg a m os o lh o s e v e ja m s ó J e s u s .” * P r o m e ti a N ossa

S e n h o ra 2 5 .0 0 0 M e m o r a r e s 17 p e l a s u a c u r a e d e v e m o s c u m p r i - l o a o

lo n g o d e s te s 9 d ia s . P o r fa v o r, a g ra d e ç a à M . R o s e p o r s u a g e n tile z a

p a ra c o m você. S ou m u ito f e liz c o m tu d o o q u e D e u s faz c o m to d a s

voces — sã o to d a s D e le .

A m e a Je su s e m a n te n h a um c o r a ç ã o s o r r i d e n t e p a r a E le . — T o­

d o s esses p e n s a m e n to s p e rtu rb a d o re s v ê m d o d e m ô n io — ig n o r e - o s .

D e u s a a b e n ç o e , m i n h a filh a .

Madre™

“cLhna profunda solidão no meu coração”


Em janeiro de 1955, quase um ano depois da última vez que citara a
escuridão ao arcebispo Périer, Madre Teresa nota um novo elemento em
sua experiência: uma profunda solidão. Essa solidão, que será a partir
desse momento a sua “companheira de viagem”, resultara da sua aparente
separação de Deus e daqueles em quem mais confiava. Essa sensação de
alienação tornava sua cruz mais dura de carregar.

Excelência,
Agradeço muito a Vossa Excelência por vir — sempre sinto o far­
do um pouco mais leve depois de o senhor ter vindo. — Não sei, mas
há uma solidão tão profunda no meu coração que não posso expressá-
-la. — Há meses que não consigo falar com o pe. Van Exem e cada
vez é mais e mais difícil falar. Durante quanto tempo permanecerá
Nosso Senhor longe?
Por favor, reze por mim.

Sua agradecida filha em J. C.


M. Teresa, M O 9

Da oração Irradiando a Cristo, feita, diariamente, pelas MCs, após a Missa.


168 Xenha, seja M i n h a luz

Nessa angústia, Madre Teresa ansiava pelo regresso de Jesus, mas


parecia que Ele tinha se afastado dela.
O arcebispo respondeu-lhe com uma longa carta, encorajando-a
e apresentando possíveis razões para esse estado interior. Sugeriu-lhe que
a experiência poderia ser uma provação temporária: “Deus parece escon-
der-se durante algum tempo. Esse estado pode ser doloroso e, se durar
muito tempo, torna-se um martírio. Santa Teresinha passou por isso, bem
como a grande Santa Teresa,* e podemos dizer que a maioria, senão todos
os santos.”20 Mas também a advertiu de que poderia tratar-se de uma ten­
tação do demônio, destinada a desencorajá-la da boa obra em que estava
empenhada. Sem deixar de tocar sua típica nota de cautela e prudência, o
arcebispo aludiu, mais uma vez, ao que considerava ser “precipitação” da
parte dela. Não percebendo a profundidade da aflição de Madre Teresa,
chegou a sugerir que aquele estado poderia ser resultado de um excesso
de trabalho ou de cansaço físico. Embora ela tivesse respondido que os
considerara “muito úteis”,21 os conselhos dados não atingiram as raízes de
sua dificuldade.

“Oferecemo-nos, uns aos outros,


a Cristo pelas almas ”
Madre Teresa continuava sendo alegre e entusiasta. A sua alegria não era
superficial, mas profúndamente espiritual. Em carta de encorajamento
aos colaboradores doentes e sofredores, a Madre explicava as razões por
trás desse estado de espírito:

Meus muito queridos Irmãs e Irmãos,**


Há muito tempo que tenho vontade de escrever e toda vez o cor­
reio vai embora sem eu ter escrito. Mas, tenham a certeza de que

* Santa Teresa de Ávila (1515-1582). Doutora da Igreja, reformadora carmelita espanhola,


escritora mística.
** Esta é a forma com a qual Madre Teresa se dirige aos colaboradores doentes e sofredores
nesta carta.
•Santa Teresa de Calc uta 169

c a d a u m a d e n ó s a p re s e n ta o a m o r d e v o cês d ia n te d o tr o n o d e D e u s

e de q u e lá , t o d o s o s d ia s o s o f e r e c e m o s , o u m e lh o r , o f e r e c e m o -n o s ,

u n s a o s o u tro s , a C ris to p e la s a lm a s . N ó s , M is s io n á r io s d a C a r id a d e ,

q u á o a g ra d e c id o s d e v e m o s e s ta r — v o cês p o r so fre re m e n ó s p o r tra ­

b a lh a rm o s . — C o m p le ta m o s u n s n o s o u tro s o que f a l t a a C r i s t o . 22

Q u e b e la vocação é a n o ssa , se rm o s p o rta d o re s do am or de C ris to

n a s fa v e la s . — A v id a d e s a c r if íc io d e v o c ê s é o c á lic e , o u m e lh o r , o s

n o s s o s v o to s sã o o c á lic e e o s o f r im e n to d e v o c ê s e o n o s s o tr a b a lh o

sã o o v in h o — a h ó s tia im a c u la d a . F ic a m o s ju n to s s e g u ra n d o o m e s ­

m o c á lic e c a s s im , c o m o s A n jo s e m a d o ra ç ã o , s a c ia m o s a S u a S e d e

a r d e n te d e a lm a s .

Meus muito queridos filhos — vamos amar a Jesus com todo o


nosso coração e a nossa alma. Vamos levar muitas almas a Ele. —
Continuem sorrindo. Sorriam para Jesus no seu sofrimento — pois,
para serem verdadeiros MCs, devem ser vítimas alegres. — Como
sou feliz por ter todos [vocês]. — Vocês me pertencem tanto quanto
cada Irmã aqui me pertence, e com frequência quando o trabalho se
torna muito duro, penso em cada um de vocês — e digo a Deus —
olha meus filhos que sofrem e por amor a eles abençoa este trabalho
— e o resultado é imediato. Portanto, como veem são a nossa casa do
tesouro — a central elétrica das MC. [...]
Rezem por mim, queridos segundos eus e continuem sorrindo
por Jesus e por mim.23

A dor interior de Madre Teresa não havia diminuído. Ela ansiava


por abrir a alma com alguém em quem confiasse, mas não o fazia. Tinha
cada vez mais dificuldade em se comunicar com o pe. Van Exem, seu
diretor espiritual. Sua enorme reverência pela ação de Deus em sua alma,
em especial pelas experiências místicas relacionadas ao chamado que rece­
bera, fazia com que ela relutasse em abrir a alma a qualquer outra pessoa.
Por isso, preferiu sofrer essa prova em silêncio, em vez de revelar o segredo
do “meu amor a Jesus — e [d]o Seu terno amor por mim”.24 Restava-lhe
apenas escrever ao arcebispo Périer.
170 \ c n h a , seja M i n h a luz

Terminamos hoje o nosso sexto dia.* Quanto mais rezo, mais claro se
toma o desejo de Cristo por uma “semelhança íntima com Ele” — e
isto fazer através de mais amor materno, afeto e apego a cada uma das
Irmãs — e da doçura e amabilidade mesmo no tom de voz com todos
— em especial quando faço alguma observação ou quando tenho que
recusar os pobres.
Neste ano tenho sido, com frequência, impaciente e algumas ve­
zes até mesmo ríspida nas minhas observações — e notei a cada vez
que fazia menos bem às Irmãs — consigo sempre mais delas quando
sou amável. — Há uma coisa que me preocupa — quando às vezes
confrontada com alguma dificuldade a respeito de algumas Irmãs —
tive que falar com o Pe. Van Exem ou com o Pe. Cordeiro. Até que
ponto isto é contra a caridade? Posso guardar silêncio? Se falei com
o Pe. Van Exem é porque ele está no lugar do senhor — e com o pe.
Cordeiro, porque ele ajuda com a instrução e porque os conselhos
dele sempre foram muito sábios — e eu tenho uma grande necessi­
dade de aprender. Sempre que fiz isso com qualquer um dos dois, fui
me confessar. — O que devo fazer? Para mim isto é falta de caridade,
mas eu preciso encontrar a resposta para as dificuldades que por ve­
zes surgem devido aos diferentes temperamentos das Irmãs etc. No
entanto, Excelência, como temos que agradecer a Deus pelas nossas
boas Irmãs — apesar de todos os seus defeitos são muito fervorosas e
generosas. — Deus deve estar muito satisfeito com a grande quanti­
dade de sacrifícios que estas jovens Irmãs fazem todos os dias. Deus
as conserve assim.
[...] Antes eu costumava obter tanta ajuda e consolo na direção
espiritual — desde que começou o trabalho — nada. — Eu mesma
não tenho nada a dizer — pelo que parece. Gostaria muitíssimo de
ter — pelo menos uma vez — uma conversa séria — mas a ideia de
ter que contar tudo o que está relacionado ao Chamado me impede
— e por isso não falo com ninguém. — Por favor, perdoe-me por
escrever tudo isto — o senhor tem tanto o que fazer. —
Por favor, reze por mim, para que eu O responda generosa­
mente. [...]25

* Sexto dia de retiro.


•Santa Teresa de Calcula 171

“<? só aquela fé cega que me sustenta”


Sendo o arcebispo Périer seu superior, Madre Teresa tinha a obrigação de
lhe escrever, pelo menos uma vez por mês, um relatório sobre sua vida
espiritual, as preocupações da comunidade, e o apostolado que as Irmãs
realizavam. A Madre também procurava seus conselhos ou autorizações
em relação a determinados pontos. Na maior parte dessa correspondên­
cia, ela o informava dos detalhes da vida cotidiana, mas, de vez em quan­
do, ela mencionava a sua escuridão. Estas referências, aparentemente for­
tuitas, nos proporcionam um vislumbre das profundezas da sua provação
interior e da magnanimidade da sua resposta.

15/12/1955
Excelência,
Em 1956 vai fazer dez anos que Jesus falou da “obra”. Pode­
mos fazer do próximo ano um “Ano Eucarístico” para a nossa Con­
gregação? Tentaremos espalhar pelas favelas o amor e a verdadeira
devoção ao Santíssimo Sacramento em ação de graças pela nossa
Congregação.
Foi muito bonito o dia 12. — Obrigada por ter vindo — 130
pequeninhos — as palavras de Nosso Senhor estão realmente sendo
cumpridas — “os cegos — os aleijados — os doentes — os pobres
— Eu os quero”.26 Tivemos 12 de Shishu Bhavan.* —
Incluo o relatório do trabalho das Irmãs em 1956. Escrevi tudo
o que elas fazem — para dar ao senhor ter uma melhor apreciação
do trabalho.
Deus tem sido muito maravilhoso usando os pobres instrumentos
para a obra Dele. Posso dizer com todo o meu coração — que nada,
absolutamente nada reivindico como meu em tudo isto, apenas digo
que as Irmãs e eu permitimos que Deus nos usasse por completo. —
Ficaria muito feliz se o senhor escrevesse uma carta a todas as
Irmãs. Iria ajudá-las muito. Temos mais direito que qualquer outra
Congregação ao amor e aos cuidados do senhor, porque nós somos
suas mesmo. É por causa do senhor que nós existimos.

* Casa para crianças dirigida pelas Missionárias da Caridade.


172 \ c n h a . seja M i n h a luz

Para o ano parece que haverá cerca de dez ou 12 vocações —


quando me escreverem, oficialmente, escreverei ao senhor.
As Irmãs estão muito bem. — Até a Irmã M. [...] mudou por
completo. Tenho, de fato, muito a agradecer a Deus.
Escrevo muito antes do Natal porque durante esse período o se­
nhor tem muito que fazer.
O senhor vai conseguir vir rezar a Santa Missa no dia 28? Posso
levar as Irmãs para Bandel em 31 de dezembro?
Vamos fazer a nossa festa de Natal em St. Laurence — Teremos
muito que fazer, para preparar para 2.400 pessoas e arranjar trans­
porte para todos eles. Deus proveu, e proverá de novo. As senhoras
da Congregação Mariana trouxeram roupas novas para 1.212 crian­
ças católicas das favelas. Às crianças hindus vamos dar em setembro,
durante o Pujas e às crianças muçulmanas no Idd.*
Ganhamos um órgão novo. — Posso mandar-lhe o antigo — para
alguma missão? — Estava em bom estado, mas o Rev. pe. Bouwens
guardou-o em Sta. Teresa durante muito tempo — e já não está tão bom.
Há um maravilhoso espírito de sacrifício entre as Irmãs — a
manjedoura já está quase cheia de palha. Para o Natal vamos man­
dar-lhe alguma para a sua manjedoura.**
O Cap. [Capitão] Cheshire deu-me uma relíquia de primeira clas­
se de Santa Teresinha, que lhe foi dada por Celine. Em troca, dei-lhe
o meu Terço. O trabalho dele e o nosso trabalho irão se completar,
um ao outro. Ele ficou muito impressionado com Nirmal Hriday.
Reze por mim — porque dentro de mim tudo é frio como o gelo.
— É só aquela fé cega que me sustenta porque na realidade para mim
tudo é escuridão. Desde que Nosso Senhor tenha todo o deleite — eu
não conto para nada.
Eu imploro que me renove a permissão geral — para dar —
para receber — para gastar — para as Irmãs e para a Congregação
— para os nossos pobres e todos os que precisam da nossa ajuda e

* Madre Teresa refere-se às celebrações religiosas dos hindus e dos muçulmanos.


** Durante o Advento, uma manjedoura vazia e uma cesta cheia de palha eram colocadas na
capela, ao lado do altar. As Irmás colocavam uma palhinha na manjedoura simbolizando cada
sacrifício feito durante a preparação para a vinda de Jesus, no Natal.
•Santa Teresa de Calcutá 173

d ep en d em d e n ó s . Q u e ir a d a r- m e ta m b é m p e rm issã o — p a ra d a r as

n e c e s s á ria s p e rm is s õ e s às Irm ã s — e peço p a ra se r a d m o e s ta d a p o r

to d a s as m in h a s fa lta s .

Sua devota filha em J. C.,


M. Teresa, M O 1

“Vou saciar a Tua seclc de almas”


Só em fevereiro de 1956 é que Madre Teresa deu ao arcebispo Périer uma
descrição mais detalhada da sua experiência espiritual, apresentando-lhe
um quadro mais completo de uma aflição interior para a qual parecia que
as ajudas humanas não podiam proporcionar nenhum remédio.

Excelência,
Quero dizer-lhe uma coisa — mas não sei como expressá-la. An­
seio — com uma ânsia dolorosa, ser inteiramente para Deus — ser
santa de tal maneira que Jesus possa viver plenamente a Sua vida
em mim. Quanto mais O quero — menos sou querida. — Quero
amá-Lo como Ele nunca foi amado — porém, existe esta separa­
ção — este vazio terrível, este sentimento de ausência de Deus.
— Há mais de quatro anos que não encontro auxílio na direção
do Rev. Pe. C. Van Exem. Mas lhe obedeço cegamente. Fui com
frequência ao confessionário na esperança de conseguir falar, mas
nada sai. — No ano passado, falei ao Padre sobre isso — e ele me
disse que isso deveria ser apresentado ao senhor. — Não estou me
queixando — apenas quero percorrer todo o caminho com Cristo.
Não lhe escrevo como a Sua Excelência — mas ao pai de minha
alma — pois para o senhor, e do senhor, nunca escondi coisa al­
guma. Diga-me o que deve fazer a sua filha — quero obedecer a
qualquer preço — e se me disser que continue assim até ao fim da
vida estou pronta a obedecer com alegria.[...]
Por favor, Excelência, reze por mim — para que eu possa me
aproximar muito de Deus.
Sua devotafilha em J. G,
M. Teresa, M O 18
174 Vímha. s( ja M i n h a luz

A esse desnudar da alma, o arcebispo respondeu com um curto


resumo dos ensinamentos de São João da Cruz sobre a “noite escura”,
embora sem se referir diretamente a ela:

Não há, no que me revela, nada que não seja conhecido na vida
mística. É uma graça que Deus lhe concede, o anseio de ser intei­
ramente Dele sem compensação no eu ou nas criaturas, de viver
por Ele e Nele, mas esse anseio que vem de Deus nunca poderá ser
satisfeito neste mundo, pela simples razão de que Ele é infinito e
nós somos finitos.29

Ele volta a se referir ao enorme sucesso da missão como um si­


nal da presença de Deus. “A bênção de Deus está sobre o seu trabalho,
agradeça-Lhe por isso”,30 escreveu, recomendando-lhe que rezasse: ‘“FAZ
o que quiseres comigo’ [...] e não Lhe recuse nada.”31
Sem saber, o arcebispo ecoava o voto privado que a Madre tinha fei­
to 14 anos antes, de não recusar a Deus coisa alguma, sob pena de pecado
mortal, tocando no elo secreto que tudo escondia dentro dela. Teria Madre
Teresa percebido a mão de Deus nessa exortação, uma mão que a encoraja­
va a prosseguir pelo caminho que Ele tinha escolhido para ela?
Como essa excruciante dor interior persistisse. Madre Teresa ti­
nha a esperança de tirar uns dias de repouso no retiro que se aproxi­
mava. Em resposta ao arcebispo. Madre Teresa deu provas de sua de­
terminação em dar toda a liberdade a Jesus e de aceitar tudo o que Ele
permitisse, a fim de saciar Sua sede de almas:

Por favor, reze por mim, para que seja do agrado de Deus dissipar esta
escuridão de minha alma nem que seja durante alguns dias. Porque,
às vezes, a agonia da desolação é tão grande e, ao mesmo tempo o
anseio pelo Ausente é tão profundo, que a única oração que ainda
consigo dizer é — “Sagrado Coração de Jesus, eu confio em Ti — vou
saciar a Tua sede de almas”.32
■Sonia Teresa de Calcutá 175

“Sorrir para bean


O retiro dirigido pelo padre jesuíta Lawrence Trevor Picachy' em abril de
1956 náo lhe proporcionou o esperado alívio, mas foi a ocasião de um
encontro decisivo. Só anos mais tarde é que Madre Teresa revelaria ao pe.
Picachy o significado desse encontro:

Há uns anos, quando pregou o retiro às Noviças — e eu o fiz com


elas — Nosso Senhor obrigou-me a falar com o senhor e a abrir-me
e então, como se para aprovar o meu sacrifício, fez do senhor nosso
confessor.”

Embora tenha sido legítimo, naquelas circunstâncias, procurar


ajuda ou alívio, Madre Teresa salientou, em diversos momentos, que fora
apenas por insistência de Deus que tinha deixado o pe. Picachy conhecer
seu estado interior. “Não sei por que”, escreveria mais tarde, “Ele quer
que eu lhe abra a minha alma — faço-o porque não posso recusar.”34
Para o arcebispo. Madre Teresa narrou o conforto que recebera
do retiro da seguinte maneira: “Fiquei feliz por ser de novo uma das pos­
tulantes porque assim tive muitas horas de oração.”35Os propósitos que
fez durante esses dias de oração abrangiam aspectos importantes de sua
vida: sua atitude quando era humilhada, sua caridade pelos outros e seu
“sorriso” — como expressão de sua disposição amorosa para com Deus
— apesar de seus sentimentos.

O meu propósito — Io é seguir a Jesus mais de perto nas humilhações


Com as Irmãs — amável — muito amável — mas firme na
obediência

* Nasceu em Lebong, índia, em 8 de julho de 1916. Entrou para a Companhia de Jesus cm


1934 e foi ordenado cm 1947. Foi reitor do St. Xavier, em Calcutá, de 1954 a 1960; pároco
cm Basanti, de 1960 a 1962; recebeu Ordcnaçáo Episcopal cm Golmuri, Jamshedpur, em 9
de setembro de 1962; tornou-se arcebispo de Calcutá em 10 de julho de 1969; e, em 1976,
foi nomeado cardeal. A partir de 1979, serviu como um dos presidentes do Sínodo dos Bis­
pos sobre a Família, em Roma. Deixou seu posto em 1986 e morreu em Calcutá, em 29 de
novembro de 1992.
Com os pobres — gentil e atenciosa
Com os doentes — extremamente amável
2o Sorrir para Deus.
Reze por mim para que eu dê glória a Deus no primeiro e no
segundo propósito.’6

Em vez de endurecê-la, sua correspondência com Jacqueline de


Decker mostra que o sofrimento a tornara mais amável. Encorajava os
outros a sorrir na dor, como ela própria fazia:

Minha querida Jacqueline Teresa,


Pergunto-me o quão desapontada você deve estar com o meu si­
lêncio — mas perdoe-me, por favor — porque náo paro o dia todo.
— Por favor, agradeça em meu nome [...] a todos que doaram táo
generosamente — Utilizei o dinheiro para o convento.
Você gostará de saber que conseguimos uma casa nova para as
professas. — Era um prédio de aspecto miserável — mas agora está
realmente bonito. Também tem a nossa capela — espero que um dia
venha à índia e veja a nossa linda capela. Os sacerdotes gostam de vir
celebrar a Santa Missa aqui. [...]
Como está a minha irmãzinha? Você não sabe como confio em você,
no seu amor a Jesus e às almas. Parece que me esqueço de você — mas
acho que não passa um só dia sem que eu me una a você. — Portanto,
que importa se escrevo ou não — você sabe que no Sagrado Coração de
Jesus somos uma. — Sorria, então, com aquele abandono total, aquela
confiança amorosa e aquela alegria perfeita que é o espírito da nossa
Congregação — para, assim, levar muitas, muitas almas para Cristo.
Ame a Jesus — viva com Jesus para poder viver para Jesus.

M. Teresa37

O arcebispo Périer continuava aconselhando Madre Teresa em re­


lação à escuridão, que, naquela altura, interpretava como forma de puri­
ficação e de proteção contra o orgulho perante a notável fecundidade do
seu trabalho.
•Santa Teresa de Calcutá 177

Em relação ao sentimento de solidão, de abandono, de não ser que­


rida, de escuridão na alma, é um estado bem conhecido dos autores
espirituais e dos diretores de consciências. É um estado desejado por
Deus a fim de nos apegarmos somente a Ele, um antídoto contra as
nossas atividades exteriores, e também, como qualquer tentação, uma
forma de nos mantermos humildes em meio aos aplausos, à publi­
cidade, aos elogios, aos louvores etc., e ao sucesso. Sentir que nada
somos, que nada podemos fazer, é perceber um fato. Sabemos que
assim é, dizemos que assim é, e algumas pessoas sentem-no. Por isso,
mantenha-se unida a Deus e, como escreveu a pequena Bernadette*
no final do seu último retiro: “Só Deus, Deus em toda a parte, Deus
em todos e em todas as coisas, Deus sempre.”
E pode acrescentar como Santo Inácio:** “O meu único anseio e
desejo, a única coisa que almejo ter humildemente é a graça de amar
a Deus, de amar só a Ele. Nada mais peço além disso.”
Desejo-lhes uma feliz festa de Santo Inácio. Deus abençoe a todas.38

Madre Teresa levou esses conselhos a sério, mas compreendeu que


o seu sacrifício tinha um propósito além disso: era o preço que estava pa­
gando para que outros se aproximassem mais de Deus. Dois meses mais
tarde, pedia ao arcebispo: “Por favor, reze por mim, pois agora mais do
que nunca, compreendo quão perto de Deus devo chegar se quero levar
as almas a Ele.”39

“jVos buracos escuros onv>e vivem os pobres —lá


JVosso Senhor está sempre realmente presente”

Desde que a escuridão se instalara, abafando o sentimento da presença de


Jesus, Madre Teresa O vinha reconhecendo no disfarce angustiante dos
pobres: “Quando atravesso as favelas ou entro nos buracos escuros onde

* Santa Bernadette Soubirous (1844-1879), para quem Nossa Senhora apareceu em 1858,
cm Lourdes, na França.
** Santo Inácio de Loyola (1491-1556), fundador da Companhia de Jesus.
178 X( n h a , s( ja M i n h a luz

vivem os pobres — lá Nosso Senhor está sempre realmente presente.”"’


Os “buracos escuros onde vivem os pobres” tinham se tornado o local
privilegiado de encontro com Ele. Era lá que ela queria amá-Lo até o fim:

Quanto a mim — há um único desejo — amar a Deus como Ele nun­


ca foi amado — com um profundo amor pessoal. — No meu coração
parece não haver nenhuma outra coisa senão Ele — nenhum outro
amor senão o Dele: as ruas, Kalighat, as favelas e as Irmãs tornaram-
-se lugares onde Ele vive a Sua própria vida de amor por inteiro. Reze
por mim. Excelência, para que realmente haja “só Jesus” em mim. *1

Dois meses mais tarde, na primeira carta dirigida ao pe. Picachy,


Madre Teresa tenta comunicar o que estava sofrendo:

Hoje — nós, as professas, tivemos um lindo dia de oração. Me fez


bem ver as minhas filhas rezarem com tanto fervor. — Temos muito
que agradecer a Deus por estes jovens corações. Se o senhor soubesse
o que eu estou passando... — Ele está destruindo tudo em mim. —
Mas como não reclamo nenhum direito sobre mim mesma — Ele tem
liberdade para fàzer seja o que for. Reze por mim, para que eu continue
sorrindo para Ele.42

Ciente de que Deus, cuja presença não sentia, era “responsável”


pela sua dor, submetia-se à obra de Deus dentro de sua alma. Entretanto,
apreciava a nova oportunidade que lhe era concedida de partilhar os seus
pensamentos mais profundos com uma pessoa em quem confiava; dava-
-Ihe uma sensação de alívio.

“fíeliz por não ser ninguém


— nem mesmo para fòeus”

Em bora o pe. Picachy fosse agora o confessor de Madre Teresa, ela


continuava a fazer confidências ao arcebispo Périer com impressionan­
te transparência.
E x c e lê n c ia ,

Por que é que s ã o to d o s tã o b o n s c o n o s c o ? — N ã o te n h o re sp o sta ,

m a s u m a p r o fu n d a g ra tid ã o . [ ...]

H á ta n ta c o n tra d iç ã o d e n tro da m in h a a lm a . — U m a n s e io tã o

p ro fu n d o por D eus — tã o p ro fu n d o que é d o lo ro s o — um s o f ri­

m e n to c o n tín u o — e, c o n t u d o , n ã o se r q u e rid a p o r D e u s — re p e lid a

— v a z ia — sem fé — sem am o r — sem z e lo . — A s a lm a s não

a tra e m — o C éu nada s ig n ific a — p a ra m im p a re c e um lu g a r v a ­

z io — a id e ia d o C éu n a d a s ig n ific a p a ra m im e — c o n tu d o — e s te

a n s e io to r tu r a n te p o r D e u s . — R e z e p o r m im , p o r fav o r, p a ra q u e e u

c o n tin u e s o r r i n d o - L h e a p e s a r d e tu d o . P o is s o u a p e n a s D e le — e n tã o

E le te m t o d o s o s d i r e i t o s s o b r e m i m . S o u p e r f e i t a m e n t e f e liz p o r n ã o

ser n in g u é m — nem m e s m o p a ra D e u s. [ ...]

Sua devota filha em J. C,


M. Teresa, M O 3

A sensação de que os próprios pilares de sua vida — a fé, a esperan­


ça, o amor — tinham desaparecido deve ter sido agonizante. A escuridão
tinha velado a certeza do amor de Deus por ela, bem como a realidade
do Céu. O ardente zelo pela salvação das almas que a tinha levado para a
índia tinha-se, aparentemente, desvanecido. Ao mesmo tempo, parado­
xalmente, Madre Teresa agarrava-se firmemente à fé que professava e, sem
uma gota de consolo, trabalhava com todo o coração no seu serviço diário
aos mais pobres dos pobres.
Madre Teresa declara-se “perfeitamente feliz por não ser ninguém
— nem mesmo para Deus”. Em 1947, tinha escrito ao arcebispo Périer:
“Sou sensível por natureza, gosto de coisas bonitas, de conforto e de tudo
o que o conforto pode proporcionar — de ser amada e de amar.”44 De
uma maneira geral, guardava silêncio acerca de qualquer falta de amor,
embora a sentisse de forma intensa.45 Quão mais sensível deveria ter sido
aos sinais do amor de Deus — ou à aparente ausência deles. O anseio
que tinha de sentir a proximidade Dele tornava a escuridão ainda mais
excruciante. Entretanto, tinha alcançado uma maturidade espiritual que
a ajudava a assumir, humilde e generosamente, o último lugar, alegrando-
-se em ser “ninguém — nem mesmo para Deus”.
180 \ en h a. seja M i n h a luz

“'Tomar-me uma apóstola ela alegria ”


Durante os retiros anuais, Madre Teresa revia a sua vida e renovava o
compromisso de lutar pela santidade — e era muito exigente consigo
mesma. Em abril de 1957, fez com que o arcebispo soubesse da sua de­
terminação de erradicar os defeitos de sua forte personalidade. Mantendo
sua resolução feita no ano anterior, tomou a decisão de superar as suas
imperfeições por via da mansidão e da humildade:

Conto as minhas faltas — às vezes tenho sido excessivamente rápida


e ríspida na voz para corrigir as Irmãs. Mesmo com outras pessoas fui
impaciente algumas vezes — por estas e todas as minhas outras faltas
peço humildemente perdão e penitência — e solicito a renovação
das minhas permissões gerais (de dar, receber, comprar, vender, pedir
emprestado, emprestar, destruir, de dar essas permissões às Irmãs em
dinheiro em espécie) para as Irmãs e para todas as obras da Con­
gregação, e peço ao senhor que me admoeste por todas as minhas
faltas.” Quero ser uma santa de acordo com o Seu Coração manso
e humilde,46 consequentemente, nestas duas virtudes de Jesus vou
tentar dar o meu melhor.
O meu segundo propósito é o de tornar-me uma apóstola da ale­
gria — consolar o Sagrado Coração de Jesus através da alegria.
Por favor, peça a Nossa Senhora que me dê o coração dela — para
que eu possa, com maior facilidade, cumprir o desejo Dele em mim.
Quero sorrir — mesmo para Jesus — e assim ocultar mesmo a Ele
— se possível — a dor e a escuridão da minha alma.
As Irmãs estão fazendo um retiro muito fervoroso. — Temos mui­
to para agradecer a Deus, por nos ter dado Irmãs tão generosas.47

Comprometer-se a ser “uma apóstola da alegria” quando, huma­


namente falando, ela devia estar se sentindo à beira do desespero, era
realmente heroico. Mas ela podia fazê-lo porque a sua alegria estava en-

M adre Teresa refere-se a uma prática tradicional da vida religiosa, na qual uma Irmá
falava de suas faltas e renovava as permissões gerais através de seu(sua) superior(a), uma
vez por mês.
•Santo Teresa de ( a l c u t á 181

raizada na certeza da bondade do plano amoroso de Deus em relação a


ela. E, embora a fé que tinha nessa verdade não tocasse a sua alma com
consolações, continuava a enfrentar os desafios da vida com um sorriso.
A sua alavanca era a confiança cega que tinha em Deus.
O magnânimo desejo de ocultar a sua dor, até mesmo de Jesus, era
uma expressão do seu enorme e delicado amor. Madre Teresa fazia todo o
possível para não sobrecarregar os outros com os seus sofrimentos e dese­
java menos ainda que seus sofrimentos fossem um fardo para seu Esposo,
Jesus. Comparada aos sofrimentos Dele e aos dos pobres, não considerava
que a sua dor fosse digna de atenção. Pelo contrário, aspirava consolar
Seu coração através da alegria. Para isso, contava com o apoio de Maria.

“Ofereci-me I...Í para passar


até mesmo a eternidade neste
sofrimento terrível”
Nas cartas ao arcebispo Périer, Madre Teresa tinha alcançado um ponto
em que era capaz de descrever com maior profundidade o seu sofrimento
interior. E era às torturas do inferno que comparava, agora, a total sepa­
ração de Deus que sentia:

Reze por mim, reze para que eu tenha a coragem de continuar sor­
rindo para Jesus — compreendo um pouco as torturas do inferno
— sem Deus. Não tenho palavras para expressar o que quero dizer
e, contudo, na última Primeira Sexta-Feira’ — consciente e volunta­
riamente, ofereci-me ao Sagrado Coração — para passar até mesmo
a eternidade neste sofrimento terrível, se isso Lhe desse agora um
pouco mais de satisfação — ou o amor de uma única alma. Quero
falar — mas não sai nada — não tenho palavras para expressar as
profundezas da escuridão. Apesar de tudo isso — sou a Sua peque­
nina — e O amo, — não por aquilo que Ele dá — mas por aquilo
que tira. [...]48

' O Sagrado Coração dc Jesus é tradicionalmentc venerado na primeira sexta-feira do mês.


182 \ d i h a , seja M i n h a Inz

Aproximadamente dez anos antes, quando esperava a autorização


para sair de Loreto e dar início à sua missáo nas favelas, Madre Teresa
tinha escrito acerca dos “pobres que sofrem os mais terríveis sofrimentos
e, depois, a eternidade também na escuridão, porque não há freiras que
lhes estendam uma mão nos buracos escuros onde vivem”.49 Tinha insis­
tido: “não vale a pena passar por todos os sofrimentos possíveis, por uma
só alma?”50 e “oferecer tudo — só por essa pessoa — porque essa levará
grande alegria ao Coração de Jesus”.51 Agora que suportava “as torturas
do inferno”, a disposição de ir ainda mais longe no amor confirmava que
as afirmações anteriores não tinham sido feitas num momentâneo excesso
de zelo. Oferecia-se “consciente e voluntariamente” para passar a pró­
pria eternidade nessa escuridão terrivelmente dolorosa, se isso agradasse a
Jesus e fizesse com que uma só pessoa O amasse. O amor que tinha a
Deus e o amor que tinha ao próximo caminhavam lado a lado.
Na mesma carta, revela outro profundo sofrimento do seu coração:

Recebi uma longa carta da minha velha Mãe. Tiveram finalmente no­
tícias minhas — e só agora é que ela foi informada das Missionárias
da Caridade. Em 1948, tinha ouvido dizer que eu saíra de Loreto —
e a seguir mais nada — então pensou que eu tinha morrido.
Por favor, reze por mim.52

Após ter sido informada das intenções da filha — de dar início a


uma nova missão entre os pobres — a mãe de Madre Teresa, Dona Drana,
ofereceu todo o seu apoio e encorajamento. Havia se passado 11 anos sem
que pudessem escrever uma para a outra por causa da situação política na
Albânia, o que constituíra um terrível sofrimento para ambas, mas Madre
Teresa nunca falou sobre isso.

“yl escuridão está se


tornando mais intensa”

Os esforços que Madre Teresa empreendia para ajudar os mais necessitados


continuavam a atrair as atenções e o reconhecimento da imprensa local:
•Santa fo r m a d( Calcutá 183

Madre Teresa não precisa de apresentação em Calcutá. Seu zelo e


sua compaixão tocaram os mais remotos cantos da cidade. Enfren­
tou a oposição e a exasperante indiferença pelo imenso problema
do sofrimento humano neste país com uma coragem que surpre­
ende, levando-se cm conta a sua fragilidade. Mãe de inúmeras
crianças abandonadas, companheira dos moribundos e dos desti­
tuídos, socorro dos doentes, ela empreendeu uma batalha contra o
sofrimento em domínios nunca antes considerados e praticamente
desconhecidos.53

Ao mesmo tempo, partilhava com o arcebispo Périer detalhes de


sua crescente luta interior:

Reze por mim, por favor — o anseio por Deus é tremendamente


doloroso e, contudo, a escuridão está se tornando mais intensa.
Que contradição reina na minha alma. — A dor interior é tão
grande — que a publicidade e as conversas das pessoas não me
afetam em nada. Por favor, peça a Nossa Senhora que seja minha
Mãe nesta escuridão.54

Embora se encontrasse na escuridão, Madre Teresa reconhecia e


agradecia, sem hesitar, as graças que recebia, compartilhando-as com seus
confessores:

Quando fui à sua capela agradecer a Jesus — recebi uma graça tre­
menda. Conto-lhe na próxima quinta-feira. Por favor, agradeça a
Jesus pelo que Ele deu.55

Em junho de 1958, em carta ao pe. Picachy, reconhece outra


graça:

O senhor deve ter rezado muito por mim — encontrei a verdadeira


felicidade no sofrimento, mas a dor é, às vezes, insuportável. — Não
imagina quão miserável e quão nada eu sou.56
184 Xcnha. seja M i n h a luz

Madre Teresa não gostava do sofrimento em si; na verdade, acha­


va-o quase insuportável. Mas apreciava a oportunidade que assim lhe era
concedida de estar unida a Jesus na Cruz e de demonstrar o amor que
tinha por Ele. Os “loucos desejos” que tivera quando se encontrava no
auge da consolação, nos meses que se seguiram à inspiração de 1946,
continuavam a arder dentro do seu coração: “Reze por mim para que eu
ame a Deus com um amor — com o qual Ele nunca foi amado. — Que
desejo absurdo.”5'

“O sorriso c uma grande capa”


Esses “loucos desejos”, combinados com a convicção de que “a obra é
Dele”, davam à Madre Teresa a força de que precisava para seguir em
frente. Tendo testemunhado, durante quase dez anos, a ação de Deus na
jovem congregação que fundara e sentindo-se grata por tudo o que Deus
estava fazendo por meio dela, aproveitava todas as oportunidades para
fazer progredir a “obra Dele” entre os pobres. Em 1958, manifestava a
esperança de poder abrir um centro para leprosos chamado Shanti Nagar
— “Cidade da Paz”. Sentindo intensamente a dor da sua própria rejeição,
mostrava-se extremamente solidária com a experiência de rejeição dos
leprosos, que não eram queridos nem amados por ninguém.

Excelência,
Sabendo que está cheio de trabalho, não tenho escrito. — [...]
No outro dia enviei os Sagrados Relatórios’ ao Rev. Mons. Barber
e não pude deixar de me ajoelhar e dar graças a Deus por tudo. Há
dez anos o “chamado” não era mais do que um anseio — e hoje é
uma realidade viva. A Congregação vive com a vida Dele — trabalha
com o Seu poder. — Amo a Congregação com todas as forças da
minha alma — mas é a convicção de que é inteiramente Dele que
me confirma, em espírito e sentimentos, que eu sou o Seu pequeno
instrumento — o Seu pequeno nada. É Ele quem age, não eu.*

* Os Sagrados Relatórios eram as estatísticas das atividades religiosas submetidas a cada ano,
por párocos ou religiosos (as) superiores, ao bispo ou ao vigário geral.
-Santa Teresa de Calcuta 185

A s c o n d iç õ e s e m q u e v iv e m a s f a m ília s d o s le p ro s o s s á o te rr ív e is .

— G o s ta ria de lh e s d a r c a s a s m e lh o r e s — d e e le v á -lo s e a p r o x im á -

lo s d o S a g rad o C o ração — de m o s tra r-lh e s q u e ta m b é m s á o filh o s

am ados de D e u s e d e lh e s d a r ra z õ e s p e la s q u a is v iv a m . [ ...] Q u e r o

c o n s t r u i r l e n t a m e n t e u m a p e q u e n a c i d a d e p a r a e le s o n d e p o s s a m v i­

v e r u m a v id a n o r m a l. [ ...]

S e N o s s a S e n h o r a r e a l m e n t e q u i s e r is s o — E la p r o v e r á . — G o s ta ­

r ia d e c h a m á - l a “ S h a n t i N a g a r ” ( C i d a d e d a P a z ). T u d o is to se V o ssa

E x c e lê n c ia a p ro v a r.

S e im a g in a s s e o q u e se p a ssa d e n tr o d o m e u c o ra ç ã o . — À s vezes a

d o r é tã o g r a n d e q u e e u t e n h o a s e n s a ç ã o d e q u e a s c o is a s v ã o d e s m o r o ­

n a r. O s o r ris o é u m a g r a n d e c a p a q u e e n c o b re u m a m u ltid ã o d e d o res.

R e z e p o r m im , p o r fav o r.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M C 8

O sorriso que encobria “uma multidão de dores” não era uma másca­
ra hipócrita. Madre Teresa tentava ocultar as suas dores — mesmo de Deus
— para evitar que os outros, em especial os pobres, sofressem por causa de­
las. Ao prometer mais “algumas orações e sorrisos”59 para uma de suas ami­
gas, aludia a um sacrifício extremamente custoso e doloroso: rezar quando a
oração lhe custava tanto e sorrir quando seu sofrimento era agonizante.
Enquanto sua provação interior continuava, suas Irmãs lhe davam
novas forças: “As novas Irmãs estão desabrochando em santidade. — To­
das elas são uma grande alegria para mim. — Só de olhar para elas, sou
capaz de fazer o dobro do trabalho”,60 escrevia a uma amiga.

QJm oásis no deserto


Em outubro de 1958, Madre Teresa recebeu, inesperadamente, uma
grande graça, por ocasião da Missa de Réquiem pelo papa Pio XII,* como
relatou ao arcebispo Périer:*

* O papa Pio XII morreu cm 9 dc outubro dc 1958.


186 Xcn ha. seja M in l ta luz

O senhor gostará de saber que no dia em que Vossa Excelência ofe­


receu a sua Santa Missa pela alma do Santo Padre na Catedral — eu
pedi a ele que me mandasse uma prova de que Deus está satisfeito
com a Congregação. Naquele preciso momento desapareceu a pro­
longada escuridão, a dor da perda — da solidão — aquele estranho
sofrimento de dez anos. Hoje, a minha alma está cheia de amor e de
uma alegria indescritível — de uma inquebrantável união de amor.
Por favor, dê graças a Deus comigo e por mim.61

Essa experiência foi como um oásis no deserto. Além de ser uma


confirmação palpável “de que Deus está satisfeito com a Congregação”,
foi também um alívio para aquela alma fatigada, reafirmando a sua con­
vicção de que Deus era o responsável pelo seu estado interior, o que a
encorajou a uma confiança ainda mais acentuada.
Mas, essa consolação durou pouco tempo, como ela mesma conta
ao arcebispo:

Nosso Senhor achou melhor que eu me mantivesse no túnel — e, aí,


voltou a desaparecer — deixando-me sozinha. — Sinto-me muito
grata pelo mês de amor que me deu. Por favor, peça a Nossa Senhora
que me mantenha peno Dela para que eu não perca o caminho nesta
escuridão.62

Ao entrar por completo no âmago da sua vocação — o mistério


da sede de Jesus Crucificado — Madre Teresa aceitou de bom grado o
regresso ao “túnel”, a uma escuridão que a tudo envolvia. O que real­
mente lhe importava era o fato de amar a Deus, quer Ele lhe concedesse
o consolo e a alegria de sentir a Sua presença, quer não. E Cristo preferia
uni-la, como unira Sua Mãe, Sua sofrida Mãe, à “terrível sede” que Ele
próprio sentira na Cruz. Madre Teresa encarnaria esse amor sedento de
Jesus pelos pobres e pelos sofredores a quem servia. Sem saber quando a
luz voltaria, agarrou-se a Maria, confiando que, com a ajuda dela, não se
perderia no caminho.
c a p itu lo 9

“Meu ífeus, quão


dolorosa é esta
dor desconhecida”
U ma marca da paixão

O que estás fazendo, Meu Deus, a alguém tão


pequeno?
M adre T eresa

“M r li mais profundo segredo”


Madre Teresa tinha revelado o seu estado espiritual ao pe. Picachy durante
o retiro em que o sacerdote tinha pregado à comunidade em abril de 1956.
Além da impressionante abertura que marcava as relações de Madre Tere­
sa com todos os seus diretores espirituais, uma notável espontaneidade ao
compartilhar sua dor marcou, também, sua relação e sua correspondência
com o pe. Picachy. Estava abrindo a alma a uma pessoa em quem confiava,
náo apenas como diretor espiritual, mas, também como amigo.

15/08/1957

Caro Padre,
Quero expressar-lhe a minha gratidão — não por aquilo que me
deu mas pela maneira como foi dado. [...]
188 Vr n/in. s( j a Al in h a hi z

P e rd o e -m e p o r p e rg u n ta r — N osso S e n h o r n ão q u e r q u e o sen h o r

fa le à m i n h a a lm a ? O s e u e n c o r a ja m e n to n a s c o n fis s õ e s fo i u m a a ju d a

— m a s e s to u a b s o lu ta m e n te d is p o s ta a re n u n c ia r m e s m o a is s o —

p e la s a lm a s .

N enhum s a c e rd o te ,’ à e x c e ç ã o d o pe. V an E xem e do sen h o r co­

nhece a e s c u rid ã o em m im — se a c h a r q u e o s ilê n c io L h e a g ra d a rá

m a is , f ic a r e i m u i t o f e liz e m m a n tê - lo p a ra o re s to d a m in h a v id a .

R e ze p o r m im .

Sua em Jesus,
M. Teresa, MO

Ao pe. Picachy ela confiara o seu “mais profundo segredo”, em­


bora insistindo no fato de que seu caráter sagrado deveria ser protegido:

O senhor conhece o meu mais profundo segredo — por favor, por


Ele, guarde tudo o que ler como uma questão de consciência. Confiei
cegamente no senhor. Hoje queria dar-lhe uma coisa bonita — este
foi o meu presente para o senhor. Guarde-o para Jesus.2

Apesar da confiança que tinha no pe. Picachy, continuava exis­


tindo um espaço na via de comunicação que ela, aparentemente, não
conseguia atravessar. Quando percebeu isso, o sacerdote aconselhou-a a
escrever sobre a sua experiência interior. Visava, não apenas familiarizar-
-se com o estado espiritual dela e estar em melhor posição para orientá-
-la, mas, sobretudo, ajudá-la a enfrentar esse sofrimento terrível. Graças
à preservação da correspondência que se seguiu, podemos compreender
melhor a intensidade do sofrimento de Madre Teresa:

Aqui vão as três cartas.*


** Leia-as, por favor — e se achá-las sem senti­
do — destrua-as. Perdoe-me, por favor — não ter sido capaz de dizer
o que eu queria que soubesse. Estou simplesmente cheia — não sabia

* Madre Teresa náo incluiu o Arcebispo Périer porque ele era o bispo e seu superior religioso.
** Essas cartas náo foram preservadas.
•Santa Tcrcaa de Calcutá 189

que o amor podia fazer alguém sofrer tanto. — Aquele era o sofri­
mento da perda — este é o do anseio — de uma dor humana mas
causada pelo divino. Reze por mim — mais agora do que nunca.3

Madre Teresa estava ciente de que era o amor que lhe tornava o so­
frimento tão agudo. A ausência do seu Amado tinha se transformado em
um anseio torturante por Ele. Estava dilacerada entre o sentimento de ter
perdido a Deus e um insaciável desejo de alcançá-Lo. Era um verdadeiro
martírio de desejo.
Embora perplexa, não se sentia desorientada por essa escuridão
interior. Ao contrário, transformava-a em uma bênção, oferecendo essa
dor pelos pobres a quem servia.

Nossa amiga, a jovem de Punjab,* sofre terrivelmente. — Quando a vi,


chorava copiosamente. Fui embora quando a mãe dela chegou. Rezemos
muito por ela. Gostaria de poder soffer mais espiritualmente — se isso
a aliviasse. — Que contraste entre os ricos e os pobres. — Os meus de
Kalighat são mártires vivos e, contudo, nem uma palavra. — Um rapaz
jovem que sofria dores horríveis — disse finalmente — que tinha pena
de morrer — porque acabava de aprender a soffer por amor a Deus.4

Por possuir um amor firme e ardente — o mesmo amor que tinha


a impressão de ter perdido — , Madre Teresa podia optar por sofrer por
aqueles a quem amava — os pobres. A dedicação que lhes tinha esti­
mulava nela uma maior generosidade no oferecimento de seus próprios
sofrimentos. Tal como eles, aceitava o “martírio” interior em silêncio,
ocultando-o daqueles que estavam mais próximos dela, e oferecendo-o
por amor a Deus e às pessoas que ela dizia serem suas.

tí(£)eus encherá aquilo que esvaziou”


Durante dez anos — com a exceção de um intervalo de um mês — a es­
curidão não abrandou em sua alma. Às vezes, uma curta frase nas leitu­
ras que fazia reacendia a esperança de que a escuridão terminasse, como

’Estado no noroeste da índia.


190 Xc n h a , s<j a M i n h a l uz

confidenciava ao pe. Picachy: “Li uma coisa muito bonita dita pelo
ir. Bento SJ — ‘Chegará um tempo em que Deus encherá aquilo que
esvaziou’”.5 O estado da alma do irmão Bento no período final de sua
vida — um estado de total desolação e desesperança — descrito em sua
biografia, deve ter parecido a Madre Teresa muito semelhante ao seu.

Até Deus parecia esquivar-se dele. Tal como anteriormente, na época


do noviciado, quando Deus se ocultava por detrás do Seu dom de
frustração e vazio. Também seria Deus hostil? [...] Impossível. Deus
era justo, quaisquer que fossem os Seus desígnios para as almas de­
soladas. Chegaria um tempo em que Ele encheria aquilo que tinha
esvaziado — disso Bento tinha certeza, embora não conseguisse ter
esperança de ver esse tempo chegar — quando a escuridão da noite
seria dissipada pelos raios da misericórdia de Deus.6

Essa era também a sua esperança.


Percebendo que a responsabilidade de Madre Teresa pela sua comu­
nidade em crescimento acelerado e pelo seu apostolado lhe impunha pe­
sadas exigências e ciente do sofrimento interior dela, o pe. Picachy a acon­
selhou a fazer um longo retiro, na esperança de que proporcionasse algum
repouso e alívio. A princípio, ela se recusou a aceitar essa potencial fonte de
consolo, considerando que a caridade para com as Irmãs tinha precedência
sobre o seu próprio conforto.

Rezei e pensei bem — seria um verdadeiro prazer para mim fazer


um longo retiro — entretanto, não me parece que seja correto fazê-
-lo. — O meu lugar é junto das noviças. — Sempre faço o meu retiro
com elas — elas precisam muito mais de mim — do que o 3o Ano.*
Como sempre faço — estarei presente na maior parte das instruções
e meditações para poder ajudar as Irmãs — [...] Reze por mim muito
e com frequência.7

'As Irmás nesse período de formação eram conhecidas como tercianas. As tcrcianas às quais
Madre Teresa se refere são as dez primeiras Irmãs do primeiro grupo. Esse retiro aconteceu
pouco antes de seus votos perpétuos.
■Santa Teresa d e C a l c u tá 191

Disposta a aceitar novos sacrifícios, Madre Teresa não hesitava em


renunciar ao conforto e ao apoio que os conselhos do pe. Picachy lhe pro­
porcionavam, a fim de obter graças para outros: “O senhor parece seguir a
política de Jesus. — Estou muito feliz por esse pequeno consolo humano
também ter ido embora — A China precisa de cada gota. [,..]”8

U(Posso tomar parte dos sofrimentos £)ele”


O prolongado retiro ministrado pelo pe. Picachy às tercianas teve lugar
entre 29 de março e 12 de abril de 1959. Tendo mudado de opinião,
Madre Teresa decidiu fazer esse retiro. Porém, tinha medo de que ele
fosse um período de maior solidão e dor ainda mais profunda, porque a
aparente ausência de Deus seria sentida de forma mais intensa e o anseio
pelo “Ausente”, de maneira mais pungente:

Meu coração está tão vazio. — Tenho medo de que o retiro seja um
prolongado sofrimento — mas é melhor não pensarmos nisso. —
Quero fazer um retiro fervoroso. [...]’

Apenas alguns dias antes do retiro, escrevia ao arcebispo Périer:


“Penso que o pe. Picachy vai pregar às Irmãs um retiro cheio de fervor.” E
acrescentava: “Por favor, reze por mim durante este tempo santo**— o meu
coração está tão cheio de escuridão e de solidão e uma dor contínua.”10
A cada dia do retiro o pe. Picachy entregava um roteiro datilogra­
fado às irmãs, que as ajudava nas meditações e nos exames de consciência.
Nesses papéis Madre Teresa escrevia as suas respostas.** Elas apresenta­
vam um retrato vivido e honesto de sua alma, colocando, em relevo, sua
humildade e santidade. As respostas, diretas e despretensiosas, retratam
igualmente a percepção que a Madre tinha de sua própria vida espiritual,
constituindo uma impressionante profissão de fé por parte de uma pessoa
que sentia ter perdido de vista a sua fé.

Rcfcrc-sc à Semana Santa, não ao retiro. Madre Teresa escreveu essa cana no sábado, 21 de
março de 1959, um dia antes do Domingo de Ramos c do início da Semana Santa.
* Vide Apêndice B — notas de retiro de Madre Teresa. Suas respostas aparecem em itálico.
192 Xcnlia. seja Mi n h a luz

Alguns dias após o início do retiro, escrevia ao arcebispo Périer:


“O retiro que o Rev. Pe. T. Picachy está pregando às Irmãs em preparação
para os votos perpétuos — é o retiro mais prático que eu já ouvi em trinta
anos de vida religiosa, apesar de ele se manter rigorosamente fiel aos exer­
cícios espirituais de Sto. Inácio.”11
Embora fosse um grande sacrifício para ela, Madre Teresa entregou
suas anotações ao pe. Picachy. No terceiro dia do retiro, escreveu: “Entre­
gar-lhe estes papéis é um dos maiores sacrifícios do retiro, a minha oferta
pelas Irmãs.” Tratava-se, contudo, de mais uma oportunidade para “agar­
rar”, como costumava dizer às Irmãs, e oferecer esse custoso sacrifício para
o benefício espiritual das suas seguidoras.

V/Ibandono absoluto à Santa Vontade de Dens”


Esse retiro culminou na cerimônia da profissão final do primeiro grupo
de Irmãs, que teve lugar em 12 de abril de 1959. Comovida, com lá­
grimas de alegria por todas as bênçãos que tinha testemunhado, Madre
Teresa escreveria ao arcebispo Périer no final da cerimônia:

Tenho o coração cheio de gratidão a Deus Todo-poderoso por ter me


chamado, e às Irmãs, para este trabalho — à Igreja por ter aceitado
o nosso oferecimento definitivo e ao senhor, nosso pai e amigo, por
tudo que fez, está fazendo e está disposto a fazer. [...] Acabo de der­
ramar umas boas lágrimas porque Deus fez tanto por nós. — Tenho
os pensamentos e o coração cheios de gratidão.12

D urante o retiro, tinha escrito ao arcebispo, preocupada com a


possibilidade de que o seu sucessor não compreendesse e não respeitasse
— como ele — o carisma das Missionárias da Caridade. Ela sugeriu,
devido à idade avançada e à saúde delicada dele, que fosse concedi­
do à congregação o governo independente previsto nas constituições,
embora permanecesse sob a orientação dele. O arcebispo concordou e
nomeou Madre Teresa superiora geral. Ela aceitou, humildemente, essa
nova responsabilidade:
'Santa T er esa d e C a l c u t á 193

Através de ti, ó Mãe de Deus, ofereço o meu abandono absoluto à


Santa Vontade de Deus agora, aceitando esta nomeação com fé e
amor e alegria. — Faz comigo tudo o que quiseres — estou à tua
disposição. — Teu pronto instrumento.13

O arcebispo também tinha aprovado a proposta de Madre Teresa


de iniciar fundações fora de Calcutá. Consequentemente, no final daquele
ano, foram abertas duas novas missões, em Ranchi e em Delhi. Com es­
sas fundações, a “pequena semente” estava crescendo e tornando-se uma
árvore frutífera. O desejo que Madre Teresa tinha de espalhar o fogo do
amor de Deus entre os pobres, os doentes, os moribundos e as criancinhas
estava se realizando. Com gratidão e admiração ela reconhecia esse extra­
ordinário crescimento e o seu desejo de fazer sempre mais:

Esta carta leva os melhores desejos e as orações de todas — das 83 Irmãs


e das 15 que estão para chegar, das pessoas e das crianças, dos doentes e
dos moribundos e dos leprosos dos nossos 52 centros de Calcutá.
O que devemos a Vossa Excelência — só no Céu poderemos pa­
gar. — Há dez anos, éramos apenas três. Foi o senhor quem confiou
nesta pequena semente tão cegamente. — Hoje quando as nossas
Irmãs partem — no meu coração há uma confiança cega no Sagrado
Coração. — Ofereço cada uma delas só a Ele. — Espero que um dia
Ele nos ajude a acender o fogo da caridade em todas as cidades da
índia — onde houver pobres vivendo nas favelas.
Uma pessoa caridosa levou todas as nossas coisas de caminhão
para Ranchi. A companhia ferroviária nos deu um desconto de 50%.
— Para terem a certeza de que regressarei, também me deram o des­
conto para a volta. Que tão maravilhoso é Deus no Seu simples e
infinito amor. Vou arranjar todos os papéis, conforme o senhor disse
ao Rev. Pe. V. E. [Van Exem].14

Em vez de abafar o seu impulso missionário, a escuridão parecia


revigorá-lo. Madre Teresa compreendia a angústia da alma humana que
sentia a ausência de Deus e almejava acender a luz do amor de Cristo no
“buraco escuro” que havia em cada coração enterrado na destituição, na
solidão ou na rejeição. Reconhecia que, qualquer que fosse o seu estado
194 Xenh a, seja M in h a luz

interior, o terno cuidado de Deus estava sempre presente, manifesto atra­


vés dos pequenos favores que os outros lhe faziam ou de conveniências
inesperadas que acompanhavam os seus empreendimentos.
Um dos frutos do retiro que tinha feito com o pe. Picachy fora
uma maior aceitação de seu misterioso sofrimento interior. O abandono
estava se tornando uma das principais virtudes de sua vida.

Por favor, padre, reze muito por mim, para que eu não estrague a
obra Dele.
Reze por mim para que eu me esqueça completamente de mim
nesse abandono absoluto à Santa Vontade de Deus. — Utilizo o pro­
pósito do retiro como oração. — Não sei quão mais profunda será
esta provação — quanta dor e sofrimento me trará. — Isto já não me
preocupa mais. Deixo isto para Ele, como deixo todo o resto. Quero
me tornar uma santa segundo o Coração de Jesus — manso e humil­
de. E tudo o que realmente importa para mim neste momento.
A I. M . [Irmã Maria] Agnes está indo muito bem — todas elas
receberam de bom grado a nomeação.* Graças a Deus. Ela é uma
criança santa. Deus fará coisas grandes por meio dela.
As Irmãs fizeram um retiro realmente fervoroso — e agora os fru­
tos estão aparecendo. — Uma das virtudes que está se destacando
muito — desde o retiro — é a humildade. Obrigada, padre, por tudo
o que fez. — A única maneira que tenho de lhe mostrar a minha
gratidão é oferecendo tudo em mim pelas suas intenções. A escuridão
— a solidão e a dor — a perda e o vazio — da fé — do amor — da
confiança — são tudo o que tenho e os ofereço com toda a simplici­
dade a Deus pelas suas intenções como prova de gratidão.
Reze por mim — para que eu não “recuse a Deus” — para aceitar
tudo e qualquer coisa em absoluto abandono à Santa Vontade de
Deus — agora — e para toda a vida.
Por favor, destrua qualquer carta ou qualquer coisa que escrevi. —
Deus quer que eu lhe abra o meu coração — eu não recusei. Não estou
tentando descobrir o motivo — só lhe peço que destrua tudo.
Não se incomode em escrever — 15

* A Irmã Agnes tornou-se assistente geral e superiora local da Casa-Máe.


•Santa Teresa do Calcutá 195

“Quem sou ou para que Tu mo abandones?”

Ha carta que escreveu ao pe. Picachy em 3 de julho de 1959, Madre Tere­


sa voltou a insistir que era em obediência a uma orientação de Deus que
estava revelando-lhe o estado interior em que se encontrava:

Incluo também este papel. Pensamentos colocados no papel propor­


cionam um breve alívio. [...] Por que Ele quer que eu lhe diga tudo
isto, eu não sei — gostaria de poder recusar fazê-lo. — Recusaria de
bom grado.16

O papel a que aqui se refere,17 escrito sob a forma de uma oração


e enviado ao pe. Picachy, constitui uma das descrições mais longas e de­
talhadas da sua experiência de escuridão.

Matéria de confissão.
Na escuridão...
Senhor, meu Deus, quem sou eu para que Tu me abandones? Sou
a criança do Teu amor — e que agora se tornou a mais odiada — aque­
la que jogaste fora como indesejada — como não amada. Eu chamo,
agarro-me, quero — e não há Ninguém que responda — Ninguém a
Quem possa agarrar-me — não, Ninguém. — Sozinha. A escuridão
é tão escura — e eu estou sozinha. — Indesejada, abandonada. —
A solidão do coração que quer amor é insuportável. — Onde está
a minha fé? — mesmo lá no fundo, bem lá dentro, não há nada a
não ser vazio e escuridão. — Meu Deus — que dolorosa é esta dor
desconhecida. Dói sem cessar. — Não tenho fé. — Não me atrevo a
proferir as palavras e os pensamentos que povoam o meu coração —
e me fazem sofrer uma agonia inexpressável. Tantas perguntas sem
resposta vivem dentro de mim — temo trazê-las à luz — por causa
da blasfêmia. — Se houver Deus, por favor perdoa-me. — Confian­
ça em que tudo acabará no Céu com Jesus. — Quando tento elevar
o pensamento para o Céu — há um vazio tão acusador que esses
mesmos pensamentos regressam como punhais afiados e ferem a mi­
nha própria alma. — Amor — a palavra — nada traz. — Dizem-me
que Deus me am a — e — contudo — a realidade da escuridão e da
196 \ cnha, seja M in ha luz

frieza e do vazio é tão grande que nada toca a minha alma. Antes de
se iniciar a obra — havia tanta união — amor — fé — confiança
— oração — sacrifício. — Terei cometido um erro ao submeter-me
cegamente ao chamado do Sagrado Coração? O trabalho não é uma
dúvida — porque estou convencida de que é Dele e não meu. —
Não sinto — nem sequer um único simples pensamento ou tentação
entra no meu coração para me apropriar coisa alguma do trabalho.
O tempo todo sorrindo — as Irmãs e as pessoas fazem tais comen­
tários. — Acham que a minha fé, confiança e amor enchem o meu
próprio ser e que a intimidade com Deus e a união à Sua vontade
devem estar absorvendo o meu coração. — Se eles soubessem — e
como a minha alegria é a capa com a qual cubro o vazio e a miséria.
Apesar de tudo — esta escuridão e este vazio não são tão dolo­
rosos como a ânsia por Deus. — Temo que a contradição irá me
desequilibrar. — O que estás Tu fazendo meu Deus a alguém tão
pequeno? Quando me pediste para imprimir a Tua Paixão no meu
coração — é esta a resposta?
Se isto Te traz glória, se Tu obténs uma gota de alegria com isto —
se as almas são levadas a Ti — se o meu sofrimento saciar a Tua Sede
— aqui estou Senhor, com alegria aceito tudo até ao final da vida — e
sorrirei à Tua Face Oculta — sempre.18

O temor que Madre Teresa tinha — de que esse sofrimento in­


terior a desequilibrasse — não se concretizou. De acordo com uma de
suas primeiras seguidoras, “a Madre era uma pessoa muito equilibrada
e ficava alegre quando as coisas corriam bem; mas, mesmo quando as
coisas corriam mal, não dava mostras de depressão nem de mau-humor.
A qualquer tempo era alegre.”19Após a morte de Madre Teresa, observava
uma colaboradora de longa data: “Em minha opinião, o equilíbrio era
um dos grandes atributos da Madre. Também era tão estável. [...] Nunca
permitia que as mágoas e os sofrimentos interferissem no seu amor por
Jesus. Esse amor lhe dava muita alegria. Era capaz de tudo suportar.”
A sua proximidade de Deus — que ela própria não podia per­
ceber — estava na raiz da disposição estável e serena que os outros
admiravam nela. O vigor, a alegria e o entusiasmo com que vivia as
suas responsabilidades influenciavam poderosamente todos que entra-
•Santa Teresa de Calc ula 197

vam em contato com ela, em especial as suas Irmãs e os pobres a quern


servia. Mas o seu sorriso radiante escondia um abismo de dor, ocultava
um Calvário interior.
“Quando me pediste para imprimir a Tua Paixão no meu coração
— é esta a resposta?”20 A sua pergunta angustiada a Jesus permanecia sem
resposta. Madre Teresa limitava-se a aceitar a viver, em silêncio, o mistério
da Cruz que Cristo a chamava a compartilhar.
O grand finale dessa “confissão” foi um novo e magnânimo ofe­
recimento de amor e abandono. Dando mais um passo, aparentemente
além das suas próprias forças, prometia sorrir à Sua Face Oculta, em meio
ao sofrimento, até o final dos seus dias. A fé, a esperança e o amor que
não percebia dentro de si estavam bem ativos na sua alma. A devastadora
escuridão O havia ocultado, mas não havia obscurecido a realidade da
identidade dela. A Madre era agora, mais do que nunca, “a criança do
Seu Amor”.
Madre Teresa dava a impressão de que a sua relação com Jesus a
enchia de consolação. Na realidade, era a sustentadora graça de Deus,
a sua determinação inexorável e a sua força de caráter que lhe propor­
cionavam a energia necessária para vencer a si própria e viver a alegria
que não sentia. Ela desafiava as Irmãs a encararem as dificuldades da
mesma maneira:

Minha querida Irmã,


Fiquei muito triste por vê-la esta manhã tão caída e triste. Você
sabe como Jesus a ama — sabe como Ele tem demonstrado o Seu
amor por você através da Madre — quanto e com que cuidado a
Madre a ajudou a amar Jesus. Seja boa, seja santa — se anime. Não
permita que o demônio leve o melhor de você. — Sabe o que Jesus e
a Madre esperam de você. — Apenas fique alegre. — Irradie Cristo
no hospital. — Por favor, tenha cuidado como diz e o que diz aos
que a rodeiam.
Envio-lhe a Santa Face — olhe para a Face Daquele que a ama.

Deus a abençoe.
Madre21
198 Ve nh a, seja M i n h a luz

fior quê?

Por mais resignada que estivesse com essa provação interior, Madre Teresa
não conseguia deixar de pedir ao pe. Picachy:

Diga-me, Padre, por que há tanta dor e escuridão na minha alma? Al­
gumas vezes me pego dizendo “Não aguento mais” e, com o mesmo
alento, digo “Desculpa, faz comigo o que quiseres”."

Enquanto lutava por continuar abandonando-se à escuridão que


a dominava, tinha que reafirmar repetidamente a sua decisão de seguir o
caminho que Ele estava traçando para ela. E, assim, prosseguia a batalha
entre a tentação de recusar e a determinação de aceitar. Algumas semanas
mais tarde, Madre Teresa voltava a escrever: “Reze por mim — para que
eu não recuse a Deus. — A coisa chega ao ponto de ruptura e então, não
se rompe. — Gostaria de ser capaz de dizer ou de escrever o que anseio
por dizer — mas não encontro palavras.”23
Imersa na escuridão, incapaz de compreender o porquê, tentada a
recusar e com a impressão de que não conseguia exprimir adequadamente
aquilo pelo qual estava passando, Madre Teresa voltou a fazer uma forte
afirmação de sua fé e de sua obediência cega à vontade de Deus. Um mal-
-entendido havia surgido entre ela e o arcebispo Périer e ele o atribuiu,
novamente, à “pressa” da Madre. Em carta destinada a clarificar a sua
posição, Madre Teresa revelou ao arcebispo o voto secreto que motivara
as suas ações. As interrogações quanto ao propósito da dor e da escuridão
em que se encontrava imersa eram agora silenciadas em um ato de obedi­
ência suprema à vontade de Deus.

01/09/1959
Excelência,
A última vez que falei com Vossa Excelência — compreendi —
que o senhor acha que tenho agido por conta própria — mas posso
lhe dizer — com sinceridade — que a minha consciência não me
acusa — pois sei com segurança que desde 17 de ago. de 48 tento
obedecer, não apenas obedecer ordinariamente, — mas com minha
■Santa 'Teresa de Calcutá 199

mente e meu julgamento. Se Vossa Excelência tivesse me escrito


como falou comigo no outro dia — eu não teria dado um único
passo. Vossa Excelência aprovou tudo. — Abençoou tudo — ficou
satisfeito com cada passo que dei. — Tenho as suas cartas que me
animaram e me ajudaram quando a cruz era muito pesada.
Nunca contei a Vossa Excelência o motivo pelo qual quero agir ime­
diatamente. Em 1942, queria dar a Jesus algo sem reservas — Com a
permissão do meu confessor, fiz um voto a Deus — comprometendo-
-me sob pena de pecado mortal — de dar a Deus qualquer coisa que Ele
possa pedir — “Não Lhe recusar coisa alguma”. Ao longo desses 17 anos,
tenho tentado [ser fiel a esse voto], e é por esta razão que quero agir ime­
diatamente. — Compete a Vossa Excelência impedir-me — e quando
Vossa Excelência diz “Não”, tenho certeza de que o meu voto se cumpre
— porque não recuso a Deus minha submissão — Passei e ainda estou
passando por provações espirituais — mas a esse respeito, nunca houve
dúvida em minha alma — porque sempre as apresentei a Vossa Excelên­
cia e ao pe. C. Van Exem e, cada vez, o seu “Sim” ou “Não” me satisfez
— como a vontade de Deus. A nossa ligação com o senhor é muito
maior — pois das outras Congregações o senhor é o seu Ordinário
— mas para nós é o nosso pai — porque Deus usou-lhe como Seu
instrumento para trazer à vida esta Sua menor Congregação. — As
mudanças exteriores feitas em abril passado por Vossa Excelência
— não fizeram qualquer mudança na minha atitude de ação ou nos
meus sentimentos. — Para mim e eu acho que para cada Irmã da
Congregação, Vossa Excelência continua a ser a Cabeça — [o] pai
da Congregação — como foi desde 10 de set. 46. — Durante todos
estes anos apenas quis uma coisa — conhecer e fazer a Vontade de
Deus. E agora, mesmo em meio a esta dura e profunda escuridão
— continuo querendo só isso. Ele tirou todo o resto — e acho que
destruiu tudo em mim. — A única coisa que me mantém na super­
fície — é a obediência. —
Por favor, Excelência, não se sinta desagradado comigo, os erros
que cometo não são voluntários — devem-se à minha ignorância. —

Isto è, tentava obedecer, em mente e pensamento, em conformidade com a mente e os pen­


samentos dc seus superiores c não apenas cm atos que atendiam a comandos.
200 \ eiiha. seja Mi nha laz

Tenho muitas coisas a aprender e isso leva tempo. — Desde a infância


sempre fui guiada pela minha mâe ou pelo confessor e agora tenho
que guiar tantos...
No dia 10 de set., por favor, reze por mim. —

Sua devota filha em J. C.


M. Teresa, M C 24

“jVfzo Te importes
com os meus sentimentos”
Além da luta constante por permanecer fiel ao seu voto, Madre Teresa
sentia-se atormentada pela sua incapacidade de se exprimir, mesmo àque­
les em quem mais confiava. Essa circunstância fazia aumentar o seu sen­
timento de alienação, que aceitava como parte do sofrimento que Deus
queria para ela. Em setembro de 1959, escrevia ao pe. Picachy:

Disse-me que lhe escrevesse — mas eu nada posso expressar. —


Não sei por que é assim — quero falar— porém, náo encontro
palavras que exprimam a minha dor. Não permita que eu o iluda.
— Deixe-me — sozinha. — Deus deve estar querendo esta solidão
de mim. Reze por mim. — Apesar de tudo — quero amar a Deus
por aquilo que Ele tira. — Ele destruiu tudo em mim. Reze por
mim. Tentarei falar na confissão ou depois — se o senhor não tem
receio de ser iludido.25

Por outro lado, quando se dirigia a Jesus — isto é, em oração —


conseguia expressar-se com facilidade. Correspondendo a um pedido do
confessor, enviou-lhe uma carta dirigida a Jesus, que anexou à carta datada
de 3 de setembro de 1959:

Parte da minha confissão de hoje


Meu Jesus, desde a minha infância que me chamaste e me guar-
daste para ser Tua — e agora quando ambos tomamos a mesma estra­
da — agora Jesus — eu vou no sentido errado.
San ta Teria a de Calcula 201

Dizem que as pessoas no inferno sofrem uma dor eterna devido à


perda de Deus — que passariam por todo esse sofrimento se apenas
tivessem uma pequena esperança de possuir a Deus. — Na minha
alma sinto justamente essa dor terrível de perda — de Deus não me
querer — de Deus náo ser Deus — de Deus não existir realmente
(Jesus, por favor, perdoa as minhas blasfêmias — disseram-me que
escrevesse tudo). Esta escuridão que me rodeia por todos os lados —
não posso elevar a minha alma para Deus — nem luz nem inspiração
alguma entram na minha alma. — Falo do amor pelas almas — de
um terno amor a Deus — as palavras passam pelas minhas palavras
[sic, lábios] — e eu anseio, com uma ânsia profunda, acreditar nelas.
— Para que trabalho? Se não houver Deus — não pode haver alma.
— Se não há alma, então Jesus — também Tu não és verdade. — O
Céu, que vazio — nem um só pensamento do Céu entra na minha
mente — pois não há esperança. — Tenho medo de escrever todas es­
tas coisas horríveis que me passam pela alma. — Devem magoar-Te.
No meu coração não há fé — nem amor — nem confiança — há
tanta dor — a dor do anseio, a dor de não ser querida. — Quero a
Deus com toda a força da minha alma — porém, aí entre nós — há
esta separação terrível. — Não rezo mais — pronuncio palavras das
orações da comunidade — e tento tudo o que posso para obter de
cada palavra a doçura que ela tem para dar. — Mas a minha oração
de união não está mais lá. — Já não rezo mais — A minha alma não é
uma’ Contigo — contudo, quando sozinha pelas ruas — falo Conti­
go durante horas — do meu anseio por Ti. — Quão íntimas são essas
palavras — e, no entanto, tão vazias, pois me deixam longe de Ti. —
O trabalho não contém alegria, nem atrativo, nem zelo. Lembro-me
de dizer à Madre Provincial que saía de Loreto — pelas almas — por
uma única alma — e ela náo podia entender as minhas palavras. —
Faço o melhor que posso. — Me consumo — mas estou mais do que
convencida de que a obra não é minha. Náo duvido de que foste Tu
quem me chamou, com tanto amor e tanta força. — Foste Tu — eu
sei. É por isso que a obra é Tua e és Tu inclusive agora. — Mas não
tenho fé — não acredito. — Jesus, náo permitas que a minha alma
seja enganada — não permitas que eu engane a ninguém.
No chamado disseste que eu teria que sofrer muito. — Dez anos
— meu Jesus. Fizeste comigo segundo a Tua vontade — e Jesus ouve
202 Ir nha, stja Min ha luz

a Minha oração — se isto Te agrada — se a minha dor e o meu so­


frimento — a minha escuridão e a minha separação Te dão uma gota
de consolo — meu Jesus, faz comigo o que quiseres — enquanto
quiseres, sem nem sequer um olhar para os meus sofrimentos e a
minha dor. Sou Tua. — Imprime na minha alma e na minha vida
os sofrimentos do Teu Coração. Não Te importes com os meus sen­
timentos. — Não Te importes sequer com a minha dor. Se a minha
separação de Ti, — levar outros a Ti e no seu amor c na sua com­
panhia Tu encontrares alegria e agrado — Jesus, estou disposta com
todo o meu coração a sofrer tudo o que sofro — não apenas agora
— mas para toda a eternidade — se tal for possível. Tua felicidade
é tudo o que eu quero. — Quanto ao resto — por favor, não Te in­
comodes — mesmo que me vejas desmaiar de dor. — Tudo isto é a
minha vontade — quero saciar a Tua Sede com cada gota de sangue
que possas encontrar em mim. — Não me permitas fazer-Te mal de
maneira alguma — tira de mim o poder de Te magoar. — De alma
e coração trabalharei pelas Irmãs — porque são Tuas. Cada uma e
todas elas — são Tuas.
Imploro-Te apenas uma coisa — por favor, não Te incomodes em
regressar depressa. — Estou disposta a esperar por Ti para toda a eter­
nidade. —
A Tua pequenina.26

Juntamente com essa carta dirigida a Jesus, enviava também uma


nota, pedindo orientações ao pe. Picachy acerca daquilo que tinha escrito:

Envio-lhe aquilo que me pediu. [...] Pode escrever ou falar comigo


sobre o assunto se quiser. [...]
Não foi tão difícil de escrever. — Se quiser explicar-me as coisas
— estarei em casa toda a tarde. —
[...] Não se esqueça de rezar por mim em 10 de set.27

A profundidade do amor de Madre Teresa por Jesus fica salientada


neste contraste entre a dor que sentia e a maneira como decidira agir, guia­
da somente pela fé. Tinha relutância em falar sobre sua escuridão — que
•Santa Teresa de Calcuta 203

comparava às dores do inferno — porque tinha medo de magoar Jesus’


com o que pensasse ou escrevesse. Paradoxalmente, quanto mais despida de
fé se sentia, mais aumentava a sua reverência e o seu amor a Deus.
Madre Teresa sempre tinha mantido ocultas as mais profundas
ações da graça de Deus na sua vida — o voto privado que fizera, os deta­
lhes da inspiração e, agora, a escuridão interior em que estava mergulhada
— devido ao delicado respeito que tinha pela sua própria relação com
Deus e pela obra de Deus em sua alma, que tratava como algo sagrado e
que apenas revelava aos diretores.
A carta que escreve a Jesus é uma oração cheia de ternura, de
transparência e de simplicidade de criança. Se dirige a Jesus como no
momento da inspiração, quando se encontrava no auge das consolações:
“Meu Jesus”; e, em vez de escrever o seu nome, assina a carta como “ATua
pequenina”. A intim idade da relação tinha, certamente, aprofundado-se,
ainda que a oração fosse agora acompanhada de aridez e não de doçura. A
única coisa que almejava era a Sua felicidade; queria saciar a Sua sede com
cada gota do seu sangue. E estava disposta a esperar, se necessário fosse,
por toda a eternidade por Aquele em Quem acreditava, mas que sentia
não existir, por Aquele a Q uem amava mas Cujo amor não percebia.
Em abril de 1959, durante o retiro, afirmara com absoluta
franqueza:

Amei-O cegamente, totalmente, somente. Uso todo o poder em mim


mesma — apesar dos meus sentimentos, para fazer que Ele seja pes­
soalmente amado — pelas Irmãs e pelos outros.
Vou deixá-Lo ter toda a liberdade comigo e em mim.28

Escritas em um m om ento em que a escuridão era de tal maneira


intensa que ela não era capaz de atravessá-la para “elevar” a alma para
Deus — e até chegava mesmo a ter a sensação de que não havia Deus

* Como sua padroeira, Santa Teresa de Lisicux, durante sua provação de fé nos últimos 18 anos
de sua vida, Madre Teresa remia que seus pensamentos fossem blasfêmias. Santa Teresa raramen­
te fiilou sobre sua provação de fé, exceto com sua irmã, Pauline (Madre Agnes de Jesus), porque
receava que suas palavras pudessem ser motivo de escândalo ou tentação para outros.
204 l e n h a , seja M i n h a luz

— essas declarações constituem um extraordinário ato de fé. Só através


dessa fé é que Madre Teresa podia saber que Jesus estava presente, embora
permanecesse em silêncio. Mas essa fé não eliminava, nem o sentimento
de irremediável solidão, nem a devastadora escuridão em que ela se en­
contrava mergulhada. Nessa agonia espiritual, sentindo a falta de uma
palavra de ânimo do seu diretor espiritual, Madre Teresa não hesita em
confessar: “Estava esperando que me escrevesse umas poucas linhas. —
Também o senhor, tal como Ele, permanece na via silenciosa.”29

é preferirei “cometer erros com amabilidade"


do que “fazer milagres com indelicadeza'

Algumas semanas depois de entregar essas cartas reveladoras ao diretor


espiritual, na primeira carta geral que escreve às Irmãs, Madre Teresa exor­
tava-as a crescer nas virtudes às quais ela própria estava mais atenta, devido
“à escuridão”.

Sejam amáveis umas com as outras. — Prefiro que cometam er­


ros com amabilidade — do que façam milagres com indelicadeza.
Sejam amáveis em palavras. — Vejam o que amabilidade de Nossa
Senhora trouxe para ela, vejam como ela falava. — Poderia facil­
mente ter revelado a São José a Mensagem do Anjo30 — mas não
disse uma palavra — E então Deus mesmo interveio.31 Guardou
todas aquelas [coisas] no seu coração.32 — Quem nos dera poder­
mos guardar todas as nossas palavras no coração dela. Tanto sofri­
mento — tantos mal-entendidos e para quê? Só por uma palavra
— um olhar — uma ação fortuita — e a escuridão preenche o
coração de sua irmã. Peçam a Nossa Senhora durante esta novena
que encha o seus corações de doçura.33

Recusando-se a permitir que o sofrimento interior fosse uma des­


culpa para faltar com a caridade, Madre Teresa esforçava-se por ter um
sorriso imediato, uma palavra amável, um gesto acolhedor para com to­
dos. E esperava o mesmo de suas Irmãs.
•Santa Teresa de Calcutá 205

A segunda virtude em que insistia era o silêncio. Envolver em si­


lêncio a obra de Deus na sua alma, como Maria fizera na Anunciação,
era para Madre Teresa uma expressão de reverência e confiança. Maria,
que “guardou todas estas coisas no seu coração”,34 era o seu modelo; e, tal
como acontecera com Maria, Madre Teresa esperava que Deus interviesse
no momento e da maneira que Lhe parecesse mais adequada.
Além de m anter um silêncio sagrado para ocultar os seus sofri­
mentos interiores, Madre Teresa tinha a impressão de que Deus estava
fazendo a mesma coisa — de que as muitas graças que derramava sobre
o seu trabalho eram a maneira que Ele tinha de disfarçar o segredo dela\
“Estou muito melhor e parto para Delhi no sábado — com um bilhete de
3/* — com um ótim o lugar para dormir todo o caminho”, escrevia ao pe.
Picachy. “Veja como Deus me estraga exteriormente com mimos e assim
os olhos das pessoas ficam sem ver.”35

Receosa de recusar a í)eus

Ao mesmo tem po em que continuava orientando as suas Irmãs com


vigor e sabedoria, pedia ajuda ao seu diretor espiritual, embora sempre
estivesse disposta a renunciar mesmo a tal apoio, apesar da dor que
pudesse vir a resultar:

Posso pedir-lhe que faça apenas uma coisa por mim? — Por favor,
coloque por escrito todas as coisas que me diz — para que eu possa
relê-las. — Escreva como eu escrevi — a Jesus — e também não
precisa assinar. Acho que me ajudará — mas se acha que Ele não vai
gostar — não o faça. Eu sei que reza por mim.36

Apreciava profundam ente a assistência que o pe. Picachy lhe pro­


porcionava:

*Três rúpias — ccrtamentc um desconto ou uma doaçáo.


206 l e n h a , seja M i n h a luz

Sou grata ao senhor por toda a amabilidade e ajuda que nos dá, às mi­
nhas Irmãs e a mim. A minha oração, ainda que miseravelmente seca
e gelada, frequentemente é oferecida pelo senhor c pelo seu trabalho
pelas almas. O conflito na minha alma está aumentando — que dor
inexpressável. — Reze por mim —

O conflito resultava, em parte, do medo de que a dor interior pudesse


condicionar sua resposta a Deus e de que, em um momento de fraqueza, sem
realmente o desejar, retrocedesse em relação ao compromisso de nunca Lhe
recusar coisa alguma. Ela escreveu ao pe. Picachy:

Reze por mim, padre — dentro de mim há tanto sofrimento. — Reze


por mim para que eu não recuse a Deus nesta hora. — Não quero
fazê-lo, mas tenho medo de que possa fazê-lo.38

Madre Teresa continuava executando o seu apostolado com grande


interesse e zelo e, embora não obtivesse nenhum tipo de consolação através
dele, alegrava-se com a alegria dos outros, como escrevia ao pe. Picachy:

Graças a Deus, tudo correu bem ontem — as Irmãs, as crianças, os


leprosos, os doentes e as nossas famílias pobres, fícaram todos muito
felizes e contentes este ano. Um verdadeiro Natal. — Contudo, den­
tro de mim — nada além de escuridão, conflito, solidão tão terrível.
Estou perfeitamente feliz de ficar assim até o final da vida — 39

“67e me tirou mais um amparo humano ”


Em abril de 1960, o pe. Picachy foi transferido do seminário São Fran­
cisco Xavier, em Calcutá, para Basanti* e, assim, Madre Teresa o perdeu
como diretor espiritual. Como tinha percebido previamente que Deus
insistia para que abrisse o seu coração ao pe. Picachy, também percebia,
agora, que Ele a desafiava a abrir mão desse importante apoio. Na carta
de despedida que escreve ao seu confessor, ela admitiu que a transferência

* Cidade cerca de 80 quilômetros ao sul de Calcutá.


•Santa 'Teresa d e ( ‘a l r n tú 2 07

do pe. Picachy era um verdadeiro sacrifício. Contudo, aceitou o fato gra­


ciosamente, com serenidade e gratidão por toda a ajuda que ele lhe dera.

Caro Rcv. Pe.,


Há uns anos, quando pregou o retiro às noviças — e eu o fiz com
elas — Nosso Senhor obrigou-me a falar com o senhor e a me abrir —
e depois, como que aprovando o meu sacrifício, fez do senhor nosso
confessor. — Abri-lhe a minha alma com todas as suas provações e
escuridão — e a ação de Deus, como o senhor diz. — Cada confissão,
cada escrito ou cada falar com o senhor foi um grande sacrifício — só
que eu tinha certeza de que não podia recusar. — Falei com o senhor
— e agora apenas quero lhe agradecer por todas as amabilidades para
comigo — e a sua paciência — pois o senhor aguentou todas as minhas
provações — eu sempre me repetindo — mas o senhor nunca parecia
cansado de tudo isso.
Guarde a minha alma com toda a sua escuridão e solidão, os seus
anseios e a dor torturante perto do altar. — Reze por mim — muito e
com frequência — pois agora parece que Ele me tirou mais um amparo
humano, e me deixou sozinha — para caminhar sozinha na escuridão.
Reze por mim — para que eu possa manter o sorriso de dar sem re­
servas. — Reze para que eu possa encontrar coragem para caminhar
corajosamente e com um sorriso. Peça a Jesus que não me permita
recusar-Lhe coisa alguma por menor que seja — preferiria morrer.
Imploro-lhe um favor: destrua tudo o que lhe escrevi. — Escrevi
tudo isso porque tinha que fazê-lo — mas já não são mais necessárias
agora. Por favor, pe., destrua-as.
Pedir-lhe que venha — penso que não o farei, mas se Jesus lhe
pedir que venha — por favor, venha — ficarei agradecida.
Obrigada por todo o bem que fez às Irmãs — e pela forma ma­
ravilhosa como as conduziu sempre com o olhar fixo em Jesus e nas
nossas regras.
A minha oração pelo senhor será diária para que possa tornar-se
mais e mais como Jesus — e leve muitas almas a Ele.
Deus o abençoe, padre.

Sua em Jesus,
M. Teresa MO°
208 Venha, seja M i n h a lu z

“Os sacrifícios são apenas


ama forma cie provar seu amor ”

Antes de partir para sua nova missão, o pe. Picachy adoeceu, razão pela
qual a data da partida foi adiada. Isso proporcionou a M adre Teresa uma
oportunidade para voltar a escrever:

Caro Rev. Pe.,


Como o senhor deve estar feliz com o dom de Sto. Inácio. Mas em
Basanti terá muitos sacrifícios prontos para o senhor. — Mas para o
senhor — que ama a Jesus e às almas — os sacrifícios são apenas uma
forma de provar seu amor.
O senhor começa bem a sua vida missionária, sendo primeiro um
paciente. Espero mesmo que esteja melhor — e que encontrem logo
a maneira de curá-lo. Em todas as casas as Irmãs estão rezando pelo
senhor e eu só continuo a “sorrir” pelo senhor. — O dia do seu santo
padroeiro não vai demorar — as Irmãs e eu lhe enviamos os nossos
melhores desejos e orações e que S. Lourenço* obtenha para o senhor
as graças que pede para si próprio.
Comigo, a luz da escuridão é brilhante. Reze por mim.
Se puder — as Irmãs ficariam alegres se o senhor viesse no dia 13.
Nesse dia começamos a novena pela nossa Congregação — por favor,
una-se a nós. —
Procurei uma imagem para o dia do seu santo padroeiro — mas
esta é a única que tenho aqui. — Ele me ajudou muito — e fará o
mesmo pelo senhor. — As palavras que estão acima — eram o meu
programa para 1960. Corte-as.
Reze pelas Irmãs com frequência — ainda são muito jovens — na
vida espiritual e nas outras coisas. — Reze por mim para que eu as
ajude a procurar e a encontrar apenas Jesus.
Espero que melhore depressa.

Deus esteja com o senhor,


Sua em Jesus,
M. Teresa M C '

A festa de Sáo Lourenço, diácono de Roma no século III, mártir, nome do Pe. Picachy,
celebrada em 10 de agosto.
■Santa Teresa de Calcutá 209

À semelhança do pe. Picachy, também Madre Teresa tinha “muitos


sacrifícios prontos” esperando-a nas décadas que se aproximavam. Nessa
época, tinha cinqüenta anos, e ia dar início a uma nova fase de sua vida
— e espalhar a sua missáo de amor — o que a obrigaria a fazer inúmeras
viagens por todo o m undo. “O amor prova-se com obras; quanto mais
nos custam, maior é a prova do nosso amor.”42 Essas viagens cobrariam
o seu preço, em tempo, em fadiga e na necessidade de falar em público e
serviriam como mais um a demonstração do seu amor.

y j primeira viagem ao exterior

Em julho de 1960, a Catholic Relief Services de Nova York, convidou


Madre Teresa, em nome do Conselho Nacional de Mulheres Católicas,
para participar da convenção anual da organização, em Las Vegas. A prin­
cípio, Madre Teresa declinou:

Lamento ter que dizer — “Obrigada, mas não poderei ir.” Não sou
de ir a encontros e a convenções. Falar em público e eu, não combi­
nam — Minha amiga, a senhorita Eileen Egan, fará o que for preciso
muito melhor — em meu lugar.43

Dias mais tarde, tendo recebido um segundo, e depois um terceiro


convite, consultou o arcebispo Périer pedindo-lhe orientação. Estava “re­
zando para que ele dissesse que não”,44 mas teve que mudar sua posição,
como conta à sua amiga Eileen Egan:*

Perguntei a Sua Excelência — e me disse que deveria ir — portanto


[...] irei à Convenção. Graças a Deus tenho muito o que fazer — se­
não, a partir de agora, estaria aterrorizada com esse enorme público.45

* Eileen Egan (1911-2001) conheceu Madre Teresa durante uma missão dos Trabalhos Ca­
tólicos de Ajuda em Calcutá, em 1955. Ela viajou várias vezes com Madre Teresa por mais de
30 anos c sc tornou colaboradora de Madre Teresa na América, em 1971. É a autora do livro
Such a Vision o f the Street: Mother Teresa, the Spirit and the Work.
210 Ven ha, seja M i n h a luz

“t'stive à beira de dizer —não”


Uns dias antes de partir para Las Vegas, Madre Teresa escrevia ao pe.
Picachy:

Parto sozinha com Jesus e por Jesus — no dia 25 de out. às 6 da


manhã e chegarei em Los Angeles — no dia 26. A senhorita Bracken
estará lá à minha espera. Na viagem de regresso, pararei na Inglaterra,
na Alemanha e na Itália.
Reze por mim — [...]
Tive que rir quando li que o senhor aproveitou o meu propósito.
— Quem o faz e quem o cumpre? — Como o senhor é feliz em estar
tanto com Jesus — e tão perto Dele. Eu estive à beira de dizer — Não.
Tem sido muito difícil. Aquele anseio terrível continua aumentando
— e sinto como se algo fosse se quebrar dentro de mim um dia — e
depois, essa escuridão, essa solidão, esse sentimento de terrível isola­
mento. O Céu está fechado de todos os lados. — Até as almas que me
tiraram da minha casa, de Loreto, como se não existissem — foi-se o
amor por tudo e por todos — e contudo — anseio por Deus. Anseio
por amá-Lo com cada gota de vida em mim — quero amá-Lo com
um profundo amor pessoal. — Não posso dizer que esteja distraída
— a minha mente e o meu coração estão habitualmente com Deus.
— Como isto deve parecer-lhe uma tolice por causa da contradição.
— Para minha meditação estou usando a Paixão de Jesus. — Receio
que eu não faça meditação nenhuma — mas apenas olho Jesus sofrer.
— e fico repetindo — “Deixa-me compartilhar contigo a Sua dor!”
Quando visitar Jesus — faça um fervoroso ato de amor por mim
— já que eu não consigo fazê-lo —
As palavras não vêm. Não tenho mais nada para escrever — apesar
do fato de que gostaria de escrever mais — nada vem.46

Na mais profunda escuridão, quando o anseio por Deus era quase


insuportável e se encontrou à beira de dizer “Não”, Madre Teresa afirma
que está constantemente unida a Deus. Sem essa lembrança habitual,
não teria conseguido viver aqueles anos de escuridão. Não era apenas
uma condição prévia para a participação mística na Cruz de Cristo; era,
igualmente, uma confirmação da verdadeira origem da prova pela qual
estava passando.47
•Saula Teresa de Calcula 211

“O mais difícil ato de obediência ”

Em 25 de outubro de 1960, “sozinha com Jesus e por Jesus”,48 Madre Te­


resa parte da índia pela primeira vez desde que, em janeiro de 1929, de­
sembarcara em Calcutá. Em Las Vegas, mais de três mil mulheres esperam
ansiosamente para ver a “pequena missionária simples e desconhecida”,49
essa “pobre pequena Missionária sem qualquer atrativo natural”,50 na des­
crição que Madre Teresa faz de si própria. “Imagine-me nos EUA diante
de milhares de pessoas importantes. Morreria de medo e de vergonha”,51
escrevera antes da viagem. Contudo, uma vez lá, em um longo discurso
falou da “sua gente” e do trabalho nas favelas, e acabou convidando todas
as presentes a participarem nas “obras do amor”:

Para mim — eu nunca tinha falado em público. Esta é minha primeira


vez — e estar aqui com vocês — e ser capaz de falar-lhes da história
de amor da misericórdia de Deus pelos mais pobres dos pobres, é uma
graça de Deus. [...] Estou feliz em dizer que, com todo o meu coração,
eu lhes ofereço participar nessas obras de amor.52

Dos Estados Unidos, Madre Teresa foi para a Inglaterra, a Ale­


manha, a Suíça, chegando, finalmente, à Itália. De Roma, revela a uma
amiga seu desejo de ver as suas Irmãs:

Conto as horas que faltam para ver os seus rostos sorridentes. — Foi
uma longa viagem e muito útil, mas estou muito feliz por poder re­
gressar à minha vida simples de Missionária da Caridade.53

De regresso a Calcutá, em I o de dezembro de 1960, confidencia


ao arcebispo Périer: “A m inha ida aos EUA — foi o mais difícil dos atos
de obediência que jamais tive que oferecer a Deus.”54 E também envia um
relato completo a Eileen Egan:

Minha querida Eileen,


Foi uma viagem animada. Chegamos a Cal. [Calcutá] pelas 5h30
da tarde. A senhorita Mailey e 3 Irmãs estavam me esperando. — Nem
imagina como estavam felizes as Irmãs quando cheguei em casa. —
212 l e n h a , seja M i n h a lu z

Acho que as vozes delas foram ouvidas em toda a Cal. [Calcutá]. Gra­
ças a Deus aqui tudo está bem. [...]
Espero que esteja mesmo melhor do seu resfriado — e que esteja
se cuidando. As observações das Irmãs foram muitas — “bonita, mais
jovem etc. etc. — mas sobretudo a sua querida Madre”. Você pode
imaginar as coisas que me fizeram? — Não pude deixar de sentir a
plenitude do amor delas. — Eu lhes disse que em todo [o] grande
mundo — embora tão belo e grandioso — não há lugar algum que
se compare com 54A.**[...]
Vou pedir-lhe um grande sacrifício — No livro que está escre­
vendo — por favor, omita tudo que se refere a mim pessoalmente.
— Pode contar tudo sobre as Irmãs e sobre o trabalho. — Mas que­
ro que me deixe a mim e a minha família fora. Comece a partir de
1948 — será uma bela história do terno amor de Deus pelos Seus
filhos. — Eileen, eu sei que isso vai estragar o livro. — Mas prefiro
isso a ter uma só alma que fite os seus olhos mais em mim do que na
maravilhosa obra de Deus. [...] Se você é o meu Segundo Eu, deve
sentir pela obra de Deus o mesmo que eu sinto — amor e respeito
profundo — algo muito sagrado.
Será algo por Sua Excelência — algo m uito grande.
Os melhores desejos e orações para todos os de sua casa e para
Howard. (É assim que se soletra o nome dele ?)

Deus a ama.
M. Teresa, M C 5

Referência ao endereço da Casa-Máe das Missionárias da Caridade, 54A Lower Circular


Road, Calcutá.
** Esse pedido foi mais uma referência ao seu amor ao “maravilhoso trabalho de Deus”.
Ela era apenas um instrumento e não queria atrair a atenção para a sua pessoa; apenas
atrapalharia o trabalho. “O amor terno de Deus pelos Seus filhos” era a única coisa que
queria que fosse narrada.
*** Gcralmentc pegava o trem noturno para essas visitas (sem reservas para cabines), para
não perder tempo, c passava o dia após a viagem com as Irmãs, sem descanso, como se não
tivesse viajado. Retornava ã Calcutá depois de alguns dias, normalmcnte no trem noturno
de novo e continuava com seu horário habitual.
•Santa Tensa de Calcula 213

rJ\'ovamente “ ri beira de recusar”


Logo que regressou a Calcutá, Madre Teresa retomou as visitas regulares às
casas de missão da congregação.*** Nessa época, tinha comunidades em De­
lhi, em Jhansi e em Ranchi. Inúmeras responsabilidades, fadigas e doenças
aumentavam o peso da já pesada cruz. E ao pe. Picachy — que estivera em
Calcutá enquanto ela se encontrava fora — que confidencia as suas lutas:

Muito obrigada pela sua carta do dia 12. Estou feliz em estar de volta.
Que experiência. — Graças a Deus que terminou — e que cada
momento tenha sido apenas para Ele. [...]
Lamento de ter me desencontrado do senhor. — Tive que ir visi­
tar as Irmãs das outras Casas — e a semana em Delhi, Jhansi e Ranchi
tirou mais de mim do que os 33 dias fora. — Em Ranchi peguei um
forte resfriado — mas como se aproxima a festa de Natal das crian­
ças — tenho que andar sempre de um lado para o outro. E já pode
imaginar o resto.
Tenho estado muitas vezes à beira de “recusar”. Se o senhor sou­
besse como é difícil. — Quero escrever mas não tenho nada a dizer.
— Reze por mim.
Feliz Natal e Ano Novo.56

É possível que Madre sentisse que estava a ponto de “recusar”, mas


não conseguia recusar ninguém, exceto a si própria, colocando Deus e a
Sua obra, as irmãs e as pessoas, na frente de si própria. Esta disponibilida­
de total para Deus e para o trabalho de Deus entre os pobres — mais do
que as penitências extraordinárias — era o espírito que pretendia infundir
nas Irmãs. E pediu ao pe. Picachy que a ajudasse:

Insista [quando instruindo as irmãs] que na nossa Congregação


Nosso Senhor não quer que usemos a nossa energia em fazer pe­
nitência — em jejuar etc. pelos nossos pecados — mas, em vez
disso, em nos consumirmos dando Cristo aos Pobres e para isso
precisamos de Irmãs fortes de corpo e mente. — Se Deus enviar
a doença — é coisa Dele — mas não me parece que tenhamos [o]
direito de estragar a nossa saúde — e de nos sentirmos miseráveis
por causa da fraqueza na hora em que chegarmos aos pobres. — É
214 l e n h a , seja M i n h a luz

melhor comermos bem e termos muita energia para sorrirmos bem


aos pobres e trabalharmos por eles.s’

“jVão compreendo que prazer


8le pode tirar desta escuridão ”

O pe. Picachy, então em Basanti, visitava ocasionalmente Calcutá. Mas


quando tinha oportunidade de falar com ele, Madre Teresa sentia-se inca­
paz de fazê-lo. Após um desses encontros, escrevia-lhe pedindo que rezasse
para que ela continuasse alegre:

Caro pe. Picachy,


Estava esperando com ansiedade a sua visita — e depois nada. —
Nosso Senhor tirou-me até a capacidade de falar. Não compreendo
que prazer Ele pode tirar desta escuridão — mas como o senhor disse
— vou dar-Lhe toda a liberdade. — Não sei exprimir — mas quero
querer como Ele o quer. Apenas reze para que eu mantenha a alegria
exteriormente. Engano as pessoas com esta arma — até as minhas
Irmãs. Porque falei com o senhor — é um mistério para mim — mas
sei que não fui capaz de recusar.
O senhor tem as suas dificuldades. — E eu não quero que as
minhas sejam um fardo para o senhor — por isso, apenas reze muito
por mim — e da próxima vez que vier aqui espero conseguir dizer-lhe
mais alguma coisa — e não apenas não dizer nada. [...]
A minha mesa está cheia de cartas para responder. — Reze por
mim — para que eu possa ser Jesus para as almas. ...
Reze por mim muito e com frequência. Se tiver tempo escreva —
se não, por favor, não se preocupe.
Sua em Jesus,
M. Teresa M C 6

Embora decidida a dar a Deus toda a liberdade, Madre Teresa não


conseguia deixar de perguntar “que prazer Ele pode tirar desta escuri­
dão?” O sentido e a razão de ser dessa provação interior, que a Madre
tinha aceitado com total abandono, iriam ainda ser descobertos.
CAPÍTULO 1 0
I

“Cheguei a
amar a escuridão ”

O LADO ESPIRITUAL DA OBRA

Pela primeira vez ao longo destes 11 anos — cheguei


a amar a escuridão — pois estou agora convencida
de que é uma parte, uma parte muito, muito pe­
quena da escuridão e da dor de Jesus neste mundo.
O senhor ensinou-me a aceitá-la [como] um “lado
espiritual da \sua obra"', como o senhor escreveu.
M ad re Teresa

“Se a minha escuridão for luz para alguma alma'

Em 1957, o padre jesuíta Joseph Neuner’ publicava em uma revista das


missões alemãs — Die Katholischen Missionen — um artigo sobre Madre*

* Nasceu cm 19 dc agosto dc 1908, cm Fcldkirch, Áustria. Entrou para a Companhia de Jesus


em 1926, foi ordenado em 1936, em Munique, Alemanha, e foi para a índia em 1938 para ensi­
nar Teologia, cm Pune. Durante a Guerra, ficou cm um internato na índia. Dc 1948 a 1950, fez
o seu Doutorado em Teologia, cm Roma, e retornou à índia cm 1950. Participou do Concilio
do Vaticano II como teólogo, servindo em Comissões sobre formação de pc.s, atividade missio­
nária e a relação da Igreja com religiões não cristãs. De 1960 em diante, lecionou no Morning
Star, um seminário da Arquidiocese dc Calcutá, mantendo-se em contato com Madre Teresa. A
correspondência entre eles continuou até 1980.
216 Ven ha. s( ja M i n h a Inz

Teresa e o seu trabalho. Pouco tempo depois, Madre Teresa pedia-lhe ajuda
para responder às cartas que os leitores da revista lhe haviam escrito. Alguns
anos mais tarde, os contatos pessoais entre os dois assumiram um novo
rumo. O pe. Neuner, que era professor de teologia em Pune, na índia, ia
ocasionalmente a Calcutá dar aulas no seminário Morning Star e dirigir
retiros. Em abril de 1961, foi convidado para pregar um retiro às Missio­
nárias da Caridade de Calcutá. Madre Teresa participou desse retiro c falou
pessoalmente com o sacerdote. O pe. Neuner recorda o encontro:

Em nossos encontros, Madre Teresa começou a falar das provações da


sua vida interior e da sua incapacidade de revelá-las a alguém. Por isso,
eu pedi que escrevesse essas experiências, coisa que ela fez de forma
mais explícita do que eu esperava. Entregou-me os papéis com a soli­
citação explícita de que os queimasse assim que os tivesse lido. Fiquei
profundamente impressionado com a honestidade e a simplicidade do
seu relato e com a profunda ansiedade pela qual ela estava passando,
em total escuridão: estava no caminho certo ou havia se tornado ví­
tima de uma rede de ilusões? Por que Deus a teria abandonado por
completo? Por que essa escuridão, quando, anteriormente, estivera tão
peno de Deus? A Madre tinha que orientar as suas Irmãs, iniciá-las no
amor a Deus e em uma vida de oração, que tinha sido completamente
varrida da vida dela, já que ela vivia em um vazio total: teria se tornado
uma hipócrita descarada, que falava aos outros dos mistérios divinos,
que, no entanto tinham desaparecido por completo do seu próprio
coração? — Está tudo contido no documento, não preciso explicá-lo.1

Esse documento, do qual o pe. Neuner achou por bem preservar*


a maior parte, trata de forma concisa dos pontos principais do percurso
espiritual de Madre até aquele momento:

Eu era muito feliz em Loreto, padre. — Acho que era a freira mais
feliz. — Então veio o chamado. — Nosso Senhor pedia diretamente
— a voz era clara e cheia de convicção. — Incessantemente me pe-*

* O pe. Neuner removeu do texto o pouco que considerava irrelevante.


Sa n ta Teresa de ( alcutá 217

diu em 1946. — Eu sabia que era Ele. Medo e sentimentos terríveis


— medo de ser enganada. — Mas como sempre vivi na obediência
— apresentei tudo aquilo ao meu diretor espiritual — esperando o
tempo todo que ele dissesse — era tudo uma enganação do demônio,
mas não — tal como a voz — ele me disse — é Jesus que está-lhe
pedindo. — E aí o senhor sabe como tudo aconteceu. — As minhas
Superioras enviaram-me para Asansol [em] 1947 — e ali foi como se
Nosso Senhor tivesse Se entregado a mim — por inteiro. A doçura, a
consolação e a união daqueles 6 meses — passaram depressa demais.
E depois começou o trabalho — em dez. de 1948. — Em 1950, o
número de Irmãs crescia — o trabalho crescia. — Agora pe. — desde
49 ou 50 esta terrível sensação de perda — esta escuridão inexpressá-
vel — esta solidão — esta ânsia permanente por Deus — que provoca
esta dor no mais fundo do meu coração. — A escuridão é tal, que
realmente não vejo nada — nem com a mente nem com a razão. —
O lugar de Deus na minha alma é um espaço vazio. — Não há Deus
em mim — Quando a dor da ânsia é tão grande — só anseio e anseio
por Deus — e é então que sinto — que Ele não me quer — que Ele
não está ali. — Céu — almas — são meras palavras — que nada sig­
nificam para mim. — A minha própria vida parece tão contraditória.
Ajudo as almas — a irem para onde? — Por que tudo isto? Onde está
a minha própria alma no meu próprio ser? Deus não me quer. — Às
vezes — apenas ouço o meu próprio coração gritar — “Meu Deus”
e não me vem mais nada. — A tortura e a dor [...] eu não sei expli­
car. — Desde a infância eu tenho o mais terno amor por Jesus no
Santíssimo Sacramento — mas também isso sumiu. — Nada sinto
diante de Jesus — Contudo, não deixaria de receber a Sagrada Com.
[Comunhão] por nada.
Veja, pe., a contradição na minha vida. Anseio por Deus — quero
amá-Lo — amá-Lo muito — viver apenas por amor a Ele — só amar
— porém não há senão dor — anseio sem amor algum. — Alguns
anos atrás — há mais ou menos 17 anos* — quis dar a Deus uma coisa

* Em sua correspondência anterior. Madre Teresa claramente afirma que tinha feito o seu voto
privado em 1942. Consequentemente, sua afirmação aqui — há mais ou menos 17 anos é
um número aproximado.
218 \ c n h a , seja M i n h a la z

muito bonita — e comprometi-me sob pena de pecado mortal a náo


Lhe recusar coisa alguma. — E desde então cumpri a promessa — e
quando, às vezes, a escuridão é muito escura — e eu estou à beira de
dizer “Náo a Deus” — a ideia dessa promessa me anima.
Só quero Deus na minha vida — “a obra” é real e unicamente
Dele. — Ele pediu — Ele me disse o que queria que eu fizesse_
Ele conduziu todos os passos — dirige todos os movimentos que eu
empreendo — coloca as palavras na minha boca, me faz ensinar o
caminho às Irmãs. — Tudo isso e tudo o que há em mim é Ele. — É
por isso que quando o mundo me elogia — nada toca — nem sequer
a superfície — da minha alma. Sobre a obra — estou convencida de
que é tudo Ele.
Antigamente podia passar horas diante de Nosso Senhor —
amando-O — conversando com Ele — e agora — nem sequer a
meditação vai bem — nada senão “Meu Deus” — e às vezes nem isso
me vem. — Contudo, lá no fundo em algum lugar no meu coração,
esse anseio de Deus continua a atravessar a escuridão. Quando fora
— no trabalho — ou quando estou com pessoas — há uma presença
— de alguém que vive**muito perto — em mim mesma. — Não sei
o que é isto — mas é muito freqüente e mesmo diário — esse amor
de Deus em mim torna-se mais real. — Me pego dizendo a Jesus —
inconscientemente — estranhas palavras de amor. —
Padre, abri-lhe o meu coração. — Ensine-me a amar a Deus —
ensine-me a amá-Lo muito. Não sou erudita — náo sei muitas coisas
sobre as coisas de Deus. — Quero amar a Deus como o que Ele é para
mim, “Meu Pai”.
Muitas vezes anseio por aproveitar o alimento que dou às minhas
Irmãs’* — mas nunca consigo fazê-lo — o mesmo com relação aos
livros espirituais.
Todas estas coisas eram tão naturais para mim antigamente — até
Nosso Senhor entrar por completo na minha vida — amava a Deus

* O pc. Ncuncr comenta que parece que ela primeiro escreveu “loving” — no contexto, tradu­
zido como “que ama” c, depois, corrigiu para “living" — no contexto, “que vive”.
** Refere-se às instruções que geralmente dava às Irmãs, diariamente.
•Santa Teresa de ( a l c u t a 219

com todas as forças de um coração de criança. Ele era o centro de


tudo quanto eu fazia e dizia. — Agora, Padre — [está] tão escuro,
tão diferente e, contudo, meu “tudo” é Dele — apesar de Ele não me
querer, como se fosse, não se importar comigo.
Q u a n d o c o m e ç o u o tra b a lh o — e u s a b ia o q u e t u d o is to s ig n ific a ria .

— Mas com todo o meu coração aceitei tudo nesse momento. — Eu fiz
apenas uma oração — que me desse a graça de dar santas à Igreja.
As minhas Irmãs, pe., são o presente de Deus para mim, são sa­
gradas para mim — cada uma delas. É por isso que as amo — mais
do que amo a mim mesma. — Elas são uma parte muito grande da
minha vida.
O meu coração e a minha alma e o meu corpo pertencem só a
Deus — que Ele jogou fora como indesejada a criança do Seu Amor.
— E sobre isto, pe., fiz este propósito neste retiro — Estar à Sua
disposição.
Que Ele faça comigo o que quiser, como Ele quiser, por quanto
tempo quiser. Se a minha escuridão é luz para alguma alma — mes­
mo se não for nada para ninguém — sou perfeitamente feliz — em
ser a flor do campo de Deus.2

Este resumo do chamado é o único momento em que Madre


Teresa revela alguma coisa da inspiração de 1946 a uma terceira pessoa
— além do arcebispo Périer e do pe. Van Exem. Levando em considera­
ção as profundas experiências espirituais que teve durante os meses que
se seguiram a 10 de setembro de 1946, poderia ter revelado muito mais
coisas sobre si mesma; porém, com a sua habitual humildade, comparti­
lhou com o pe. Neuner — que começava a assumir o papel de seu diretor
espiritual — apenas o suficiente para que ele compreendesse o percurso
espiritual dela e pudesse ajudá-la.
O que revela é significativo e muito pessoal: o comovente relato
da “escuridão inexpressável” pela qual estava passando desde que tinha
iniciado o trabalho, do seu voto privado e do impacto que ele tivera
na sua vida e a recordação do período em que podia passar horas com
Jesus, am ando-O.
A realidade da sua relação com Jesus era verdadeiramente paradoxal.
Ele vivia nela e através dela sem que ela conseguisse saborear a doçura da Sua
220 X'cnha. seja M i n h a luz

presença. Em oraçáo, voltava-se para Jesus, exprimindo o doloroso anseio que


tinha por Ele. Mas, era apenas quando estava com os pobres que percebia
vivamente a Sua presença. Era aí que O sentia tão vivo e tão real.
Tendo compreendido que o pe. Neuner captara o padrão da ação
de Deus em sua alma. Madre Teresa revelou-lhe detalhes de sua infância
que não tinha contado aos anteriores diretores, como, por exemplo, o seu
amor pela Eucaristia, que manifestara desde muito cedo. Embora tivesse
deixado de sentir a presença de Jesus, não “deixaria de receber a Sagrada
Com. [Comunhão] por coisa alguma”. Uma das irmãs mais antigas, es­
pectadora diária dos atos de Madre Teresa, testemunha a enorme fé que
tinha na Eucaristia:

A Madre recebia diariamente a Sagrada Comunhão com enorme


devoção. E se acontecesse de uma segunda Missa ser celebrada na
Casa-Mãe em determinado dia, tentava sempre assistir, mesmo que
estivesse muito ocupada. Escutava-a dizer em tais ocasiões: “Que bo­
nito é receber Jesus duas vezes hoje.” A profunda reverência que a
Madre tinha pelo Santíssimo Sacramento era um sinal da fé profunda
que tinha na Presença Real de Jesus sob as aparências de pão e de vi­
nho. Sua atitude de adoração, gestos como genuflexóes, até com am­
bos os joelhos na presença do Santíssimo Sacramento exposto, mes­
mo quando já estava bem idosa, as suas posturas tais como ajoelhar-se
e juntar as mãos, a preferência por receber a Sagrada Comunhão na
boca — tudo isso são provas da fé que tinha na Eucaristia.

Madre Teresa recorda, em tom nostálgico, o amor e a união que


conhecera. Apesar disso, estava ciente de que a percepção que tinha do
seu próprio estado espiritual de escuridão era apenas uma parte da rea­
lidade. Ela podia captar um vislumbre do seu amor a Deus, que estava
se tornando mais real, suscitando-lhe espontaneamente na consciência
“estranhas palavras de amor”. E, embora sentisse que era “como se” Deus
não a quisesse, continuava a identificar-se como “criança do Seu Amor”.
Anos mais tarde, o pe. Neuner resumiria da seguinte maneira a
reação que teve ao ler estas notas da Madre Teresa:
■Santa Teresa de Calcutá 221

A resposta que dei à confissão contida nestas páginas foi simples: não
havia qualquer indicação de falta grave da parte dela que pudesse ex­
plicar a aridez espiritual. Tratava-se simplesmente da noite escura, um
estado conhecido por todos os mestres da vida espiritual — embora
eu nunca tivesse visto nenhuma tão profunda nem tão prolongada
como a dela. É um estado contra o qual não há remédio humano
e que só se consegue suportar com a garantia da presença oculta de
Deus e da união com Jesus que, na Sua Paixão, teve que suportar o
fardo e a escuridão do mundo pecador pela nossa salvação. O sinal
seguro da presença oculta de Deus nessa escuridão é a sede de Deus,
o anseio dc um raio que seja da Sua luz. Uma pessoa não pode ansiar
por Deus a não ser que Deus esteja presente em seu coração. De ma­
neira que a única reação possível a essa provação é o abandono total
a Deus e a aceitação da escuridão em união com Jesus.3

“Cheguei a amar a escuridão”


O pe. Neuner conseguiu passar para Madre Teresa um inestimável conhe­
cimento com relação à provação pela qual estava passando, fato que ela
agradeceu imensamente.

Caro Padre,
Não sei exprimir em palavras — a gratidão que sinto pela sua
amabilidade comigo. — Pela primeira vez ao longo desses 11 anos
— cheguei a amar a escuridão. — Pois agora acredito que é parte,
uma parte muito, muito pequena da escuridão e da dor de Jesus neste
mundo. O senhor ensinou-me a aceitá-la [como] um “lado espiritual
da ‘sua o bra”, como escreveu. — Hoje senti realmente uma profunda
alegria — que Jesus já não pode passar pela agonia — mas que quer
passar por ela em mim. — Abandono-me a Ele mais do que nunca.
— Sim — mais do que nunca estarei à Sua disposição. —
Suas instruções e meditações também foram de uma grande força
para mim. — Pois embora as minhas instruções às Irmãs não sejam
tão belas e completas como as suas — são o mesmo alimento — um
alimento de amor e confiança — um alimento de amor pessoal a
222 \ cnlia, seja M i n h a luz

Cristo. — Agora sinto que é Ele e náo eu quem ajuda estas Irmãs._
Sim, elas são o meu tesouro — a minha força e o presente que Deus
me deu. — São Dele.
Uma vez mais, obrigada pela sua prontidão em ajudar. — Eu não
acredito, pe., nesse contínuo remexer na vida espiritual de alguém
— com visitas e conversas freqüentes. A ajuda que me deu — vai me
conduzir por muito tempo. — Nossa vida espiritual deve permanecer
simples — para podermos compreender a mente dos nossos pobres.
Deve ter sido muito difícil para o senhor colocar-se no nosso nível
— e fazer as coisas tão belas e fáceis para que nós as possamos com­
preender — Deus lhe pague.
Caro Rev. Pe. Neuner — náo sei quais são as normas relativas às
suas despesas — mas, por favor, aceite isto para a viagem de trem.
As minhas Irmãs e eu agradecemos todo o bem que nos fez.
Reze por mim.
Sua em Jesus,
M. Teresa, MC

Gostaria de me confessar — antes de começar a receber as Irmãs. —


Ainda há um grande grupo à espera. Todas elas querem a bênção da
obediência para os seus propósitos — então eu tenho que participar
em suas alegrias e dores.4

Graças ao pe. Neuner, a compreensão que M adre Teresa tinha


do seu estado interior aprofundara-se consideravelmente, permitin­
do-lhe compreender que a escuridão era o lado espiritual de sua obra,
o com partilhar do sofrimento redentor de Cristo. Independentemen-
te da forma como a tivesse compreendido, essa provação de fé, es­
perança e am or não era uma purificação dos defeitos característicos
dos principiantes na vida espiritual, ou sequer dos defeitos comuns
às pessoas mais adiantadas no caminho da união com Deus. Na épo­
ca da inspiração, a Madre afirmara ao arcebispo Périer, com toda a
franqueza: “há algum tempo que não procuro a mim mesma”.5 Além
disso, nos meses que antecederam a inspiração de 10 de setembro,
encontrava-se, na estimativa do confessor, perto do estado de êxtase.
■Santa T e n s a de Calcula 223

A escuridão era uma identificação com aqueles a quem servia; a


Madre estava sendo misticamente atraída para a profunda dor que eles ex­
perimentavam por se sentirem indesejados e rejeitados e, acima de tudo,
por viverem sem fé em Deus. Anos antes, mostrara-se disposta a oferecer-
-se como vítima por apenas uma alma. Agora estava sendo chamada a
unir-se na dor, não apenas a uma alma, mas a uma multidão de almas que
sofriam nessa terrível escuridão.
Posteriormente, o pe. Neuner voltou a lançar luz sobre a transfor­
m a ç ã o que teve lugar na alma de Madre Teresa:

A experiência redentora da sua vida foi ter compreendido que a noi­


te que vivia no seu coração era uma maneira especial de partilhar
a paixão de Jesus. [...] Percebemos, assim, que a escuridão era, na
realidade, o elo misterioso que a unia a Jesus. Era o contato do anseio
íntimo por Deus. Nada mais pode preencher a sua mente. Tal anseio
só é possível através da presença oculta do próprio Deus. Não pode­
mos ansiar por algo que não nos seja intimamente próximo. A sede
é mais do que a ausência de água. É algo que não é experimentado
pelas pedras, mas apenas pelos seres vivos, que dependem da água
para viver. Quem sabe mais acerca da água viva, a pessoa que abre a
torneira todos os dias sem pensar muito no assunto, ou o viajante do
deserto, torturado pela sede, que busca uma fonte de água?f>

A partir desse momento, Madre Teresa passou a amar a escu­


ridão, vendo-a como parte integrante do seu chamado. Tendo rezado:
“Deixa-me compartilhar contigo a Sua dor”, reconhecia agora que essa
oração fora atendida. Jesus permitia-lhe reviver a Sua agonia e, como era
Dele, a Madre estava disposta a tomá-la sobre os seus ombros.
Aparentemente, o pe. Neuner teria sugerido que se encontrassem
com mais frequência, a fim de poder orientá-la melhor. Satisfeita com aqui­
lo que tinha recebido, a Madre Teresa recusou. Nem sequer por razões de
direção espiritual se permitia afastar-se da pobreza dos pobres. A ajuda sim­
ples que Deus lhe proporcionara seria suficiente para lhe permitir ir adian­
te. Essa confiança total na divina providência para tudo — incluindo suas
próprias necessidades espirituais — era uma marca de sua vida.
226 Xcnha. seja M i n h a luz

O senhor sabe que rezo pelo senhor todos os dias.11'

Havia quase vinte anos que Madre Teresa vivia fielmente o voto
privado que fizera de não recusar a Deus coisa alguma, aspirando estar
completamente à disposição de Deus. Tinha perfeita consciência das im­
plicações do seu “caloroso ‘sim’ a Deus”: além de confirmar o compromis­
so que assumira com Ele, exprimia também sua decisão de responder, de
forma ainda mais generosa e com todo o seu coração, à vontade Dele em
todos os detalhes da sua vida.
“Um grande ‘Sorriso’ para todos” não queria dizer que aprovas­
se tudo. Embora fosse calorosa e amorosa, era, às vezes, firme e exigen­
te, com as irmãs e os amigos. Não queria que as energias e os esforços
deles fossem “desperdiçados” em coisas inferiores ao próprio Deus. Ele
era tudo para ela: Seu amor, Seus interesses, Seus planos, Sua vontade
eram de suprema importância para ela, e Madre Teresa desejava que
fosse igual para todos aqueles a quem amava.

Parte da redenção
Com o auxílio do pe. Neuner, Madre Teresa tinha chegado a um ponto
em que era capaz de se alegrar com os seus sofrimentos e de repetir as
palavras de São Paulo: “Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa
causa e completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo
pelo Seu Corpo, que é a Igreja.”11 Uma expressão clara da nova compreen-
-sáo que tinha de sua provação oculta — como parte da missão redentora
de Jesus e parte da sua missão pelos pobres — aparece nos conselhos que
dava às Irmãs na carta geral que escreveu em julho de 1961:

Tentem aprofundar o seu conhecimento deste Mistério da Reden­


ção. — Este conhecimento as conduzirá ao amor — e o amor as fará
compartilhar através dos seus sacrifícios na Paixão de Cristo.
Minhas queridas filhas — sem o nosso sofrimento, o nosso traba­
lho seria apenas um trabalho social, muito bom e muito útil, mas não
•S'aula Teresa <ie ( ‘alcula 227

seria a obra de Jesus Cristo, nem parte da redenção. — Jesus quis nos
ajudar compartilhando a nossa vida, a nossa solidão, a nossa agonia
e a nossa morte. Tudo isso tomou sobre Si mesmo, e o carregou na
noite mais escura. Só sendo “um” conosco é que Ele nos redimiu. Nós
podemos fazer a mesma coisa. Toda a desolação das pessoas pobres,
não apenas sua pobreza material, mas também sua destituição espi­
ritual, precisa ser redimida e nós devemos ter a nossa parte nisso. —
Rezem assim quando o acharem difícil — “Desejo viver neste mundo
que está tão longe de Deus, que se afastou tanto da luz de Jesus, para
ajudá-los — para tomar sobre mim um tanto do sofrimento deles.”
— Sim, minhas queridas filhas — compartilhemos os sofrimentos —
dos nossos pobres — pois só se formos “um” com eles — poderemos
redimi-los, isto é, levarmos Deus à vida deles e levá-los a Deus.12

Embora muito antes já tivesse tido uma certa noçáo do signifi­


cado da sua provação, Madre Teresa precisara de mais de uma década
para compreendê-lo. O grau de abandono e de confiança que essa nova
compreensão lhe permitiu alcançar reflete-se, igualmente, em sua corres­
pondência com o pe. Picachy:

Quanto a mim — graças a Deus que nos foi dito que seguíssemos a
Cristo. — Como não tenho que ir à frente Dele, mesmo na escuridão
o caminho é seguro.
Quando certos dias são acima da média — apenas fico como uma
criança muito pequena e espero pacientemente que a tempestade
acalme. [...] Reze por mim.13

Mesmo na escuridão, o percurso era seguro: não era preciso ir “à


procura do caminho”, bastava “seguir o caminho” que Jesus já tinha per­
corrido. Era esta a convicção que transmitia às irmãs:

Uma vez vi uma Irmã sair para o nosso apostolado com o rosto mui­
to triste, então, chamei-a ao meu quarto e perguntei-lhe: “O que disse
Jesus, que carregássemos a cruz na frente Dele ou que O seguíssemos?”14
Com um grande sorriso, ela olhou para mim e respondeu: “Que O
seguíssemos.” Então eu perguntei: “Por que tenta ir à frente Dele?” E
ela saiu do meu quarto sorrindo. Tinha compreendido o que signifi-
224 Xa i l ia, s c j a i Slinlia l uz

Na segunda carta (que é na realidade uma curta nota) que escreve


ao pe. Neuner durante o mesmo retiro, a Madre menciona uma graça
que recebeu, ao mesmo tempo em que reafirma o seu total abandono à
vontade de Deus.

Caro Rev. Pe. Neuner,


Obrigada pelas suas orações. Não preciso me forçar a ser feliz ou
a manter um rosto sorridente na frente dos outros — sou muito feliz
porque o bom Deus me deu uma grande graça — abandonei-me por
completo — estou à disposição Dele.
“Um caloroso ‘Sim’ a Deus e um grande sorriso para todos.”* Reze
para que eu cumpra o Seu desejo — eu vou falar com o senhor —
logo que acabar meu trabalho com as Irmãs.

Sua em Jesus,
M. Teresa1

Algumas semanas mais tarde, escreveria uma carta calorosa a dois


colaboradores de Inglaterra:

Recebi dois ou três pacotes de Revistas Cat. [católicas] — e hoje che­


gou o seu livro sobre S. João da Cruz. — Estou justamente lendo as
suas obras. Como ele escreve sobre Deus maravilhosamente! [...]
Tivemos um retiro tão maravilhoso — o Rev. Pe. Neuner falou
apenas de Deus, Seu amor — nosso amor — e os Pobres de Deus.
Tudo estava tão bem entrelaçado — que agora na verdade nem parece
tão difícil — amar a Deus com todo o nosso Coração. —
Vocês sabem — que rezo frequentemente por vocês e toda vez
peço a mesma coisa — que os faça santos. O resto penso que Ele dará
se tiverem a Santidade Dele — o amor Dele.
[...] Continuem sorrindo — [...] — Rezem juntos — e Jesus irá
sempre encher o coração de vocês com o Seu amor — um pelo outro.8

Embora tivesse escrito ao pe. Neuner que não conseguia tirar

* Esse propósito, feito no referido retiro, foi o mesmo que ela havia feito no retiro do ano
anterior.
Sa nta Tores a do Calcutá 225

proveito dos livros espirituais, ela pôde tirar proveito das obras de São
João da Cruz. E um fato significativo e o que chamava a atenção de
Madre Teresa não era a extraordinária descrição da purificação interior
durante a “noite escura”, mas tudo o que o místico espanhol escrevera
sobre Deus. Embora conhecesse bem o pensamento do santo carme­
lita, não rotulava o seu próprio sofrimento de “noite escura”. Tinha a
intuição, e agora a confirmação do diretor espiritual, de que, embora
os sofrimentos fossem semelhantes, o propósito era diferente.9 Os seus
amigos não sabiam a que ela estava se referindo quando aludia à mu­
dança dentro dela: “Agora na verdade nem parece tão difícil.”

“'■Um caloroso ‘Sim’


a (Òeus e um grande ‘Sorriso’para todos”
A escuridão não abrandou, a dor não diminuiu, mas uma paz maior
e uma aceitação mais serena tornou-se evidente na alma de Madre
Teresa. O pe. N euner a conduzira a um momento decisivo na com­
preensão e na vivência da escuridão. Por mais úteis que o arcebispo
Périer e o pe. Picachy tivessem sido, seus conselhos tinham sido mais
um apoio e um encorajam ento do que, propriamente, uma luz sobre
o seu estado interior. Apesar disso, Madre Teresa sentia a falta dessa
ajuda, como escrevia ao pe. Picachy:

Todas as vezes em que o senhor esteve em Calcutá não consegui


encontrá-lo — mas o Senhor deve querer assim. — Ele quer ter a
certeza de tirar de mim cada gota do meu ego. — Também me tirou
aquelas ajudas semanais, então a escuridão é tão escura e a dor tão
grande, mas apesar de tudo isso — o propósito que fiz no retiro foi
o mesmo:
Um caloroso “sim” a Deus e um grande “Sorriso” para todos e
me parece que estas duas palavras são a única coisa que me mantém
seguindo adiante. —
[...] Da próxima vez que o senhor vier a Calcutá espero estar
aqui. [...]
Reze por mim pe., para que eu possa cumprir as duas palavras
“Sim” e “Sorriso”.
226 X enfia, seja M i n h a luz

O senhor sabe que rezo pelo senhor todos os dias.10

Havia quase vinte anos que Madre Teresa vivia fielmente o voto
privado que fizera de náo recusar a Deus coisa alguma, aspirando estar
completamente à disposição de Deus. Tinha perfeita consciência das im­
plicações do seu “caloroso ‘sim’ a Deus”: além de confirmar o compromis­
so que assumira com Ele, exprimia também sua decisão de responder, de
forma ainda mais generosa e com todo o seu coração, à vontade Dele em
todos os detalhes da sua vida.
“Um grande ‘Sorriso’ para todos” não queria dizer que aprovas­
se tudo. Embora fosse calorosa e amorosa, era, às vezes, firme e exigen­
te, com as irmãs e os amigos. Não queria que as energias e os esforços
deles fossem “desperdiçados” em coisas inferiores ao próprio Deus. Ele
era tudo para ela: Seu amor, Seus interesses, Seus planos, Sua vontade
eram de suprema importância para ela, e Madre Teresa desejava que
fosse igual para todos aqueles a quem amava.

Parto da redenção
Com o auxílio do pe. Neuner, Madre Teresa tinha chegado a um ponto
em que era capaz de se alegrar com os seus sofrimentos e de repetir as
palavras de São Paulo: “Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa
causa e completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo
pelo Seu Corpo, que é a Igreja.”11 Uma expressão clara da nova compreen-
-são que tinha de sua provação oculta — como parte da missão redentora
de Jesus e parte da sua missão pelos pobres — aparece nos conselhos que
dava às Irmãs na carta geral que escreveu em julho de 1961:

Tentem aprofundar o seu conhecimento deste Mistério da Reden­


ção. — Este conhecimento as conduzirá ao amor — e o amor as fará
compartilhar através dos seus sacrifícios na Paixão de Cristo.
Minhas queridas filhas — sem o nosso sofrimento, o nosso traba­
lho seria apenas um trabalho social, muito bom e muito útil, mas náo
S ant a Teresa <le Calcutá 227

s e ria a o b r a d e J e s u s C r is t o , n e m p a rte d a re d e n ç ã o . — Je su s q u is n o s

a ju d a r c o m p a r tilh a n d o a n o s s a v id a , a n o s s a s o lid ã o , a n o s s a a g o n ia

e a n o ssa m o rte . Tudo is s o to m o u so b re Si m e sm o , e o c a rre g o u na

n o ite m a is e s c u r a . S ó s e n d o “ u m ” c o n o s c o é q u e E le n o s r e d im iu . N ó s

podem os fa z e r a m e s m a c o is a . T o d a a d e s o la ç ã o d a s p e sso a s p o b re s ,

não ap en as sua p o b rez a m a te ria l, m a s ta m b é m s u a d e s titu iç ã o e s p i­

r i t u a l , p r e c is a s e r r e d i m i d a e n ó s d e v e m o s te r a n o s s a p a r te n is s o . —

R ezem a s s im q u a n d o o a c h a re m d ifíc il — “ D e s e jo v iv e r n e s te m u n d o

q u e e s tá tã o lo n g e d e D e u s , q u e se a fa s to u ta n to d a lu z d e J e s u s , p a ra

a ju d á -lo s — p a ra to m a r s o b re m im um ta n to d o s o f r i m e n t o d e le s .”

— S im , m in h a s q u e r id a s filh a s — c o m p a rtilh e m o s o s so frim e n to s —

d os n o sso s p o b res — p o is s ó se f o rm o s “u m ” c o m e le s — p o d e re m o s

r e d i m i - l o s , i s t o é , l e v a r m o s D e u s à v i d a d e l e s e l e v á - l o s a D e u s . 12

Embora muito antes já tivesse tido uma certa noção do signifi­


cado da sua provação, Madre Teresa precisara de mais de uma década
para compreendê-lo. O grau de abandono e de confiança que essa nova
compreensão lhe permitiu alcançar reflete-se, igualmente, em sua corres­
pondência com o pe. Picachy:

Quanto a mim — graças a Deus que nos foi dito que seguíssemos a
Cristo. — Como não tenho que ir à frente Dele, mesmo na escuridão
o caminho é seguro.
Quando certos dias são acima da média — apenas fico como uma
criança muito pequena e espero pacientemente que a tempestade
acalme. [...] Reze por mim.13

Mesmo na escuridão, o percurso era seguro: não era preciso ir “à


procura do caminho”, bastava “seguir o caminho” que Jesus já tinha per­
corrido. Era esta a convicção que transmitia às irmãs:

Uma vez vi uma Irmã sair para o nosso apostolado com o rosto mui­
to triste, então, chamei-a ao meu quarto e perguntei-lhe: “O que disse
Jesus, que carregássemos a cruz na frente Dele ou que O seguíssemos?”14
Com um grande sorriso, ela olhou para mim e respondeu: “Que O
seguíssemos.” Então eu perguntei: “Por que tenta ir à frente Dele?” E
ela saiu do meu quarto sorrindo. Tinha compreendido o que signifi-
228 Ve n ha , seja M i n h a lu z

cava seguir Jesus.15

“Qiicinto mais escura for a escuridão,


mais doce será o meu sorriso para (foeus”

Tendo Madre Teresa seguido Jesus na escuridão, Ele proporcionou-lhe


a ajuda e o apoio de que ela precisava. A Madre estava atenta aos sinais
do Seu amor no percurso da sua caminhada, como conta ao pe. Neuner:

A sua carta foi uma resposta a um desejo por mim expresso — “quem
me dera que o Padre escrevesse porque eu não tenho tempo” — o que
foi um pequeno brinde da Sua consideração. [...]
O Internúncio* e o nosso Arcebispo querem que eu vá ao en­
contro de Superiores. Realmente é um ato de obediência cega para
mim, é um grande sacrifício. [...] Seria maravilhoso se pudesse ver
o senhor.
Quanto a mim, Padre — nada tenho a dizer — porque a escuri­
dão é tão escura, a dor é tão dolorosa. As vezes, o aperto da dor é tão
grande — que eu posso ouvir a minha própria voz clamando — Meu
Deus, ajuda-me. Quando ajudo as minhas Irmãs a se aproximarem
muito de Jesus — quando as ensino a amarem-No com um amor
profundo — dedicado — pessoal — anseio por ser capaz de fazer o
mesmo. — Vejo as Irmãs bem diante dos meus próprios olhos aman­
do a Deus — se aproximando tanto Dele — se tornando diaria­
mente tão parecidas com Ele — e eu, pe. — estou “sozinha” — vazia
— excluída — simplesmente indesejada. E, contudo, com toda a
sinceridade do meu coração — sou feliz por vê-Lo amado — por ver
que as Irmãs vão se parecendo com Ele. Sou feliz por amá-Lo através
delas. — O Rev. Pe. Van Exem esteve aqui por oito dias pregando o
retiro às Superioras — e não me saiu uma palavra. — Magoou-me —
porque nunca ocultei nada dele. — Mas neste momento não tenho
mesmo nada a dizer. — No entanto, é tão doloroso estar sozinha por
Deus. Fielmente cumpri o propósito que fiz no retiro. — Quanto

* Representante diplomático do Papa, nomeado por ele para representá-lo perante a governo
do país para o qual é designado.
•Santa Teresa cie Calcutá 229

maior for a dor e quanto mais escura for a escuridão mais doce será
o meu sorriso para Deus — Reze por mim para que eu possa amar
a Jesus.
Por favor, peça aos seus teólogos* que rezem pelas suas Missioná­
rias da Caridade. As Irmãs ficaram muito contentes ao receberem a
sua carta.16

A solidão continuava a atormentá-la, e a Madre nada podia fazer


para aliviá-la. C ontinuava a magoá-la profundamente o fato de ser inca­
paz de se comunicar, m esmo com o pe. Van Exem, para quem tinha sido
“um livro aberto”. Sentia um a grande solidariedade por outras pessoas em
situação parecida: “Deve ser uma terrível tortura para ele*’ — querer falar
e não conseguir”,17 escreveu à sua amiga Eileen. Também ela passava por
essa “terrível tortura”; o distanciamento de Deus e o distanciamento das
pessoas eram o seu pão de cada dia.
Ao decidir que “quanto maior for a dor e quanto mais escura for a es­
curidão, mais doce será o meu sorriso para Deus”,18 fazia ecoar as palavras de
sua padroeira, Santa Teresa de Lisieux.19 Era como se, tal como ela, também
Madre Teresa descobrisse sempre uma maneira de dar ainda mais a Deus.

“Graças a í)eus que Ele continua


Se inclinando para tirar de mim ”

No primeiro Capítulo geral, em outubro de 1961, Madre Teresa foi eleita


superiora geral — título que só reafirmava o profundo elo espiritual que
existia entre ela e as irmãs. A Madre era a guia e o modelo delas, mas era,
acima de tudo, a sua “m ãe”. Por sua vez, ela não aspirava a outro papel,
como deixa claro na carta que escreve ao pe. Neuner:

Caro Padre J. Neuner,


Muito obrigada pela sua carta. Ainda bem que gostou das notícias
impressas. — Felicita-me por ter sido eleita Madre Geral. — É o pri-

Aqui, “teólogos” rcferc-sc aos seminaristas que estudavam teologia como preparação para a
ordenação.
Um amigo de Eileen Egan.
230 Vi tiha, h<ja M i n h a luz

meiro a fazê-lo — e espero que seja o último. Para as Irmãs e para mim
é apenas um título para os documentos oficiais, mas para nós não faz
diferença alguma. — Eu quero ser para elas o que Maria foi para Jesus
— a mãe delas. —
Estou ansiosa pela minha visita a Mumbai. Os encontros têm um
terrível efeito sobre mim. — Para mim são um verdadeiro sacrifício e
um ato de obediência cega. — Gostaria muito de ir a Poona pedir a
esses quatrocentos teólogos que rezem por mim e pelas nossas Irmãs,
mas sua proposta de que eu fale diante deles me deixa gelada. — O
senhor escreve pedindo que náo diga NÃO antes de considerar o as­
sunto. A minha consideração — é perguntar a Sua Excelência o que
deseja que eu faça — Se ele disser que Sim — farei o que o senhor
quer que eu faça — irei e falarei e lhes direi sobre a obra linda que
Deus fez.
Não, Padre, não estou sozinha. — Tenho a escuridão Dele —
tenho a dor Dele — tenho este anseio terrível por Deus — de amar
e não ser amada. Sei que tenho Jesus — nesta união inquebrantável
— porque a minha mente está fixada Nele e apenas Nele, por minha
vontade.
No caso de não ir a Poona — por favor, não se incomode de ir a
Mumbai, a viagem náo vale a pena — se vier e eu não tiver nada a
dizer. — Agora Ele também me tirou isso. E assim, eu Lhe dou um
grande sorriso em troca. Graças a Deus que Ele continua Se inclinan­
do para tirar de mim. —
Mando-lhe um C. P. [cartão postal] se Sua Excelência disser
que sim.
Reze por mim.
Sua em Jesus,
M. Teresa, MO°

Em resposta a uma observação que o pe. Neuner havia feito so­


bre o sentimento de solidão dela, Madre Teresa fez uma de suas mais
explícitas declarações de fé sobre a escuridão. A escuridão náo era apenas
a escuridão “dela”, era a “escuridão Dele”, ela estava compartilhando a
S ant a Teresa de Calcutá 231

“dor Dele”. Com base na pura fé, sabia que se encontrava em um estado
de “união inquebrantável” com Ele, porque percebia que tinha os pen­
samentos “fixados Nele c apenas Nele”. Estava firmemente unida a Jesus
por sua vontade, embora os sentimentos lhe dissessem o contrário. A dor
que nunca a abandonava lembrava-lhe constantemente que Jesus estava
ali, embora a única coisa que ela sentia dessa “união inquebrantável” fosse
a Sua agonia, a Sua Cruz.
Seguindo o propósito que fizera, aceitava com um grande sorriso a
sua incapacidade de falar sobre sua escuridão, grata por ser considerada dig­
na da atenção de Deus, mesmo que isso apenas significasse ser privada de
algo precioso; nesse caso, o apoio dos diretores espirituais era um pequeno
presente que ela ainda podia Lhe dar.

“/Iceito tudo aquilo que deres”


Depois de ter recebido essa carta, o pe. Neuner ofereceu-se para se encon­
trar com Madre Teresa em Mumbai, mas ela objetou:

Não tenho quaisquer compromissos, dado que não conheço ninguém


em Mumbai. — Estou só pensando naqueles três dias compridos —
sentada durante horas em reuniões. — Seja como for, também isso
pode ser para M. G. D. [Maior Glória de Deus].
Não venha — não tenho nada para dizer. Mas por favor reze por
mim. Estou feliz. Hoje fiz uma nova oração — Jesus, aceito tudo aqui­
lo que deres — e dou-Te tudo aquilo que tirares. — Não há sentido
nas minhas palavras, mas tenho a certeza de que Ele entenderá. — Se o
senhor escrever — isso me basta — mas, por favor, não venha. — 21

Essa oração, uma das favoritas de Madre Teresa, foi forjada nas
profundezas de sua escuridão. Era fruto da sua experiência vivida, era um
ato de vontade que se opunha aos seus sentimentos. Mais tarde, seria
transformada num a exortação frequentemente repetida: “Toma tudo
aquilo que Ele der e dá tudo aquilo que Ele tirar com um grande sor­
riso.”22 Essa oração resume a sua maneira de viver através da escuridão.
232 X on ha . seja M i n h a luz

exprimindo o espírito da sua congregação: total abandono, confiança


amorosa e alegria. Ela articulava a mesma resolução em outro de seus
freqüentes conselhos: “Dê a Jesus toda a liberdade e permita que Ele lhe
use sem consultar-lhe.”23
Madre Teresa lamentou ter recusado a visita do pe. Neuner. Mas, como
se sentia um “bloco de gelo”, considerou que não seria adequado aproveitar-se
da disponibilidade do sacerdote e faze-lo perder tempo. Mas não deixou de se
mostrar agradecida pela carta que ele lhe escreveu:

Acabo de receber a sua carta — que me fez muito feliz. —


Graças a Deus, Padre, eu não tenho que falar. Tenho pena das
Freiras e dos padres que têm que falar diante de tanta gente. —
Mas graças a Deus eles têm tudo escrito — assim não será tão
difícil.
Lamento ter dito para que não viesse — mas na verdade não vale
a pena porque a minha alma é um perfeito bloco de gelo — não
tenho nada a dizer. — O senhor diz que Ele está “tão perto que a
senhora não consegue vê-Lo nem ouvi-Lo, nem sequer saborear a Sua
presença”. Não compreendo isso, pe. — mas quem me dera ser capaz
de compreender. Não sei o que se passa realmente comigo — porque
mesmo agora, quando estou rodeada por tantas freiras e pessoas, com
coisas que poderiam preocupar-me completamente — pe., a minha
mente — o meu coração — todos os meus pensamentos e sentimen­
tos parecem estar muito longe — tão longe que eu não sei onde estão,
mas quando me recomponho descubro que estão com Deus.
O senhor diz que teve “a sensação de um encontro no meio
do deserto”. Deve ter sido doloroso para o senhor que está tanto
com Jesus no amor pessoal que tem por Ele. — O fato de amar
a Deus como ama ajudou-me. — Foi uma alegria encontrar uma
pessoa que ama a Deus como eu anseio amá-Lo — mas não con­
sigo fazê-lo. [...]
O Rev. Pe. Miranda lhe contará o que eu disse. — Falei como se
o meu coração estivesse enamorado de Deus — com um amor terno
e pessoal. — Se o senhor estivesse no lugar do pe. Miranda — teria
dito — que hipocrisia. A maioria das freiras agradeceu-me por ter
•Santa Teresa de Calcutá 233

falado — e eu fiz isso porque o senhor me escreveu que o fizesse. —


Nem sei dizer-lhe como estas Irmás têm sido amáveis. — Que amor
recebi no Colégio Santa Sophia — e tudo porque pertenço a Deus.

Desculpe-me a letra, é que estou escrevendo no trem em mo­


vimento.2'1

Madre Teresa continuava a interrogar-se sobre o paradoxo que era


a sua vida: como podia Deus estar tão próximo, tal como mantinha o pe.
Neuner, se os sentimentos que tinha indicavam o contrário? No entanto,
embora seus sentimentos continuassem nesse “jogo” traiçoeiro, ela não
podia negar que todo o seu ser estava fixado Nele. Os outros eram atra­
ídos para ela precisamente por perceberem essa proximidade com Deus.
E, embora continuasse com medo de ser uma hipócrita, a verdade é que
Madre Teresa testemunhava uma fé resoluta e uma genuína caridade —
frutos de uma íntima união com Deus que não podia sentir. Conside­
rando-se incapaz de “chegar” a Deus, continuava alegrando-se por poder
ajudar a outros a aproximarem-se Dele.

“J l alegria de nada ter”

Na correspondência de Madre Teresa com o pe. Neuner, apenas encon­


tramos, a partir desse m om ento, observações esparsas sobre sua agonia
interior. Além de ser incapaz de dizer mais, ela estava convencida de
que um par de linhas bastaria para lembrá-lo de sua dor constante e sua
necessidade de orações:

Esta lhe levará os melhores desejos de todas na Congregação — e


dos nossos pobres. — Vamos todos rezar pelo senhor. — Reze
por nós, pe. — para que os nossos corações sejam a manjedoura
que Nossa Senhora escolha para o Seu Menino. [...] Por mim —
apenas reze — agora quero que seja apenas assim — porque Jesus
assim o quer.25
Em vez de se concentrar no seu próprio sofrimento, compartilha a
234 V í/i/iíí, seja :M in h a luz

alegria resultante do crescimento firme da comunidade, uma recordação


permanentemente da obra de Deus e dos Seus cuidados:

Caro Padre Neuner,


Recebemos mais 13 postulantes em jan. passado e já parecem es­
tar cheias da alegria de sofrerem pelos pobres de Deus. — leremos
um bom grupo para maio se Deus quiser. — E eu mc limito a olhar
e me maravilhar.
Nada entra. Percebi uma coisa nestes dias. Já que Deus quer que
me abstenha da alegria das riquezas da vida espiritual — entrego todo
o meu coração e a minha alma para ajudar as minhas Irmãs a apro­
veitá-la plenamente. Vejo-as crescer dia a dia em santidade — vejo-as
crescer no amor a Deus — e o fato de vê-las me faz feliz. Quanto a
mim, tenho apenas a alegria de nada ter — nem sequer a realidade
da Presença de Deus. — Nem oração, nem amor — nem fé — nada
a não ser a dor contínua de ansiar por Deus. — Estes dias sei que
Jesus tem dado maravilhosas colocações às Irmãs. — Depois das Ins­
truções fiz todo o possível para recapturar esses pensamentos e essas
palavras que passavam por mim — mas não podia recordar um só
pensamento. Quero escrever — mas nada mais tenho a dizer — a não
ser pedir que reze por mim. — Com todo o meu coração quero que
seja simplesmente assim — porque Ele o quer. [...]

Sua em Jesus,
M. Teresa, M O G

Nesse momento de sua vida. Madre Teresa chegava até mesmo a


tirar alegria espiritual da sua provação interior: a alegria dela era “a alegria
de nada ter”, da “pobreza absoluta”, da “pobreza da Cruz”, à qual aspirava
desde o começo.
As recém-chegadas à vida das Missionárias da Caridade tinham
amplas oportunidades de sacrifício. A dureza de viverem em um prédio
cheio de pessoas, sem qualquer privacidade, a comida simples e o duro
trabalho manual a serviço dos pobres, contavam-se entre os muitos desa­
fios. Madre Teresa estava muito satisfeita em ver que suas seguidoras com­
partilhavam a sua “alegria de sofrer pelos pobres de Deus”. Vendo que a
•Santa ■Teresa de ('a le n ta 235

sua prolongada aridez espiritual se mantinha, aceitava de bom grado ser


privada de “consolações” enquanto ajudava as irmãs a “banquetearem-se”
com elas. Deus a estava usando como canal para derramar o Seu amor
sobre Suas filhas.

“t'u quero apenas ser uma verdadeira


Missionária da Caridade”
Alguns dias depois de ter escrito ao pe. Neuner, reafirmava, em
carta enviada à sua amiga Eileen, a atitude com que aceitava prêmios e
outras honras:

Estou certa de que ficará muito feliz por saber que o Governo da ín­
dia me deu e, através de mim, à Congregação o título “Padma Shri”,*
pelo trabalho que estamos fazendo. Acredito que isto é muito bom
para a Igreja — enquanto que para mim, pessoalmente, nada signi­
fica. Eu quero apenas ser uma verdadeira Missionária da Caridade,
como foi Nossa Senhora.27

O “Padma Shri” foi o primeiro prêmio importante que Madre


Teresa recebeu, um a honra que não a deixou orgulhosa porque se tinha
colocado acima desse perigo, como explicava o pe. Neuner:

[A sua união com Jesus] dava-lhe uma liberdade que a tornava in­
dependente de elogios e censuras. Quando começaram a chover so­
bre ela grandes honras, provenientes de todo o mundo, nada disso a
afetou minimamente. Madre Teresa tinha abandonado tudo a Deus,
todo o seu ser. Era essa a íntima fonte de vida de sua espiritualidade,
que senti que devia ser preservada para as suas Irmãs.28
A M adre aceitou esse reconhecimento, como aceitaria os futuros,

* O “Padma Shri” é um prêmio conferido a cidadãos indianos pela distinção de seus serviços
em vários campos de atividades. Madre Teresa está, na realidade, referindo-se ao anúncio da
premiação que, posteriormente, recebeu no dia 28 de abril de 1962, em Nova Delhi.
236 \'c n ha , seja M i n h a lu z

com gratidão, em nome e em benefício dos pobres. O seu único objeti­


vo era permanecer uma verdadeira Missionária da Caridade, como fora
Nossa Senhora, a quem chamava de “a primeira Missionária da Carida­
de”. “Tal [como Nossa Senhora]”, exortava as irmãs, “vamos nos encher
de zelo para levar apressadamente Jesus aos outros.”29

"Se alguma vez vier a ser santa ,


serei com certeza uma santa da ‘escuridão
Depois de tê-la dirigido durante quase um ano, chegara a vez do pe. Neu-
ner ficar sem saber o que dizer perante a provação espiritual da Madre.
Isso não a entristeceu, pois tinham, ambos, a mesma atitude em relação à
misteriosa ação de Deus na sua alma.

Esta carta leva os melhores desejos de todas em 54 A* — de uma Fes­


ta muito feliz e muito santa. As nossas orações, os nossos sacrifícios e
o nosso trabalho serão pelo senhor durante todo este dia.
Esperava de fato do senhor — não que me consolasse — mas que
me ajudasse — e fico muito contente por ver que não tem realmente
[nada] a dizer. No dia em que lhe escrevi — sentia como se não pudesse
sofrer mais — mas S. Paulo deu-me a resposta na epístola do Dom.
[Domingo] da Sexagésima e a sua cana também — por isso fico feliz
por sofrer ainda mais e com um grande sorriso também. Se eu alguma
vez vier a ser santa, serei cenamente uma santa da “escuridão”. Estarei
continuamente ausente do Céu — para acender a luz daqueles que se
encontram na escuridão na terra. — Continue rezando por Kanpur,
Amravati, Raigarh, Bhagalpur. — Essas, talvez, serão as nossa futuras
casas de missão. Reze muito por mim, reze com frequência — para que
eu faça as coisas que Lhe são agradáveis, a Ele que me chamou.30

Num dia particularmente difícil, envolvida em uma escuridão


profunda, Madre Teresa encontrou luz em 2 Coríntios 11,19-23 e 12,

* Referência a Casa-Mác das MC, que tem como endereço: 54A Lower Circular Road, Cal­
cutá.
■Santa -Teresa dr Calcula 237

1-9. Teria gostado que a escuridão — o espinho da sua vida — lhe fosse
retirada, mas, tal como São Paulo, compreendia que a aceitando, ela po­
dia confiar na garantia do Senhor: “Basta-te a Minha graça.”31
No momento em que teve a impressão de que chegara ao limite
das suas forças, formulou aquilo a que se poderia chamar de sua decla­
ração de missão: “Se eu alguma vez vier a ser santa, serei certamenteuma
santa da escuridão’. Estarei continuamente ausente do Céu — para acen­
der a luz daqueles que se encontram na escuridão na terra”. Em vez de
ansiar pelas alegrias do paraíso, via no céu uma nova oportunidade para
amar, para chegar a cada “buraco escuro” e acender nele a luz do amor de
Deus. O seu zelo não tinha diminuído. Fortalecida na fornalha do sofri­
mento, estava disposta a prosseguir a sua missão até ao final dos tempos.

“{{ealmente remos apenas


Jesus em nós?”
A bênção de Deus sobre os seus esforços continuava sendo uma garantia
de Sua presença e de Sua direção no meio daquele deserto interior. Escre­
via Madre Teresa à sua amiga Eileen: “Deus é tão maravilhoso ao abençoar
as Suas próprias obras de tantas maneiras. Agora mais do que nunca não
sinto apenas mas sei com certeza — que a obra é realmente Dele.”32 Era
a partir desse conhecimento e dessa convicção que era capaz de, cheia de
confiança, encorajar os seus colaboradores a viverem em união com Ele:

Os Amados de Cristo
Eileen pediu-me que escrevesse — pois todos votaram para receber
algumas linhas minhas para o encontro de março. Deve ter havido al­
guma coisa errada nessa votação. — Não tem importância, me agrada
voltar a aproximar-me de vocês e penso que ainda posso ver aquele
ardente desejo de santidade que vi em seus rostos quando estive com
vocês.* Deus o mantenha ardendo. Rezamos diariamente para “que eles
ergam o rosto e apenas vejam Jesus”, mas quantas vezes olhamos para
dentro e vemos apenas Jesus cm nós? O vemos usando nossos olhos,
238 X cilha, seja M i n h a luz

nossa mente e nosso coração, como Dele mesmo? Estamos tão entre­
gues a Ele — que percebemos os Seus olhos olhando através dos nos­
sos, a Sua língua falando, Suas mãos trabalhando, os Seus pés andando,
o Seu Coração amando? Realmente vemos apenas Jesus em nós?
Vocês devem estar no mundo mas, não ser do mundo.33 A luz que
dão deve ser tão pura, o amor com que amam deve ser tão ardente
— a fé com que creem deve ser tão convincente — que ao vê-los, eles
realmente vejam apenas Jesus. O apostolado de vocês é belíssimo —
dar Jesus. Mas só podem dá-Lo — somente se tiverem se rendido por
completo a Ele. — Com frequência, com muita frequência, rezo por
vocês — para que sejam o fruto do amor de Cristo no mundo — para
que cresçam em santidade — para que em vocês a alegria de Cristo se
realize. Na nossa Congregação dizemos muitas vezes a Nossa Senhora
— que Ela é a Causa da nossa Alegria — porque nos deu Jesus. —
Tomara que nos tornemos a causa da alegria dela — porque damos
Jesus aos outros.
Mantenham-se perto de Jesus com um rosto sorridente.34

“jlqueles que ninguém quer, que ninguém


ama , que ninguém reinvindica ”
Enquanto prosseguia sua missão de difundir o amor de Deus entre os
pobres, o vivido “quadro” diário do sofrimento deles impresso no espírito de
Madre Teresa parecia-lhe a única maneira adequada de descrever o estado
de sua própria alma. Algumas semanas após ter escrito aos colaboradores,
escrevia ao pe. Neuner:

Foi uma grande amabilidade da sua parte — rezar por mim — e


escrever-me. [...]
Tenho lido “A Freira” Sta. Margarida Maria* e o Sagrado Coração
de Margaret Trouncer.35 — O seu amor por Jesus deu-me um anseio
tão doloroso de amar como ela O amava. Que frio — que vazio —

* Madre Teresa se referia à reuniáo com seus colaboradores que aconteceu após sua estada em
Las Vegas.
S o n ia Teresa de Calcuta 239

q u e d o lo rid o e s tá o m eu c o ra ç ã o . — A S a g rad a C om unhão — a

S a n ta M is s a — to d a s a s c o is a s s a n ta s d a v id a e s p ir itu a l — d a v id a d e

C ris to e m m im — s ã o t o d a s t ã o v a z ia s — tã o fria s — tã o in d e s e ja d a s .

A s itu a ç ã o fís ic a d o s m e u s p o b r e s a b a n d o n a d o s n a r u a , d a q u e le s q u e

n in g u é m q u e r, q u e n in g u é m am a, que n in g u é m re iv in d ic a — é o

v e rd a d e iro q u a d ro d a m in h a v id a e s p ir itu a l, d o m e u a m o r a Je su s e,

n o e n ta n to e s ta d o r te rr ív e l n u n c a m e fez d e s e ja r q u e fo sse d ife re n te .

— M a is a in d a , q u e ro q u e s e ja a s s im e n q u a n t o E le o q u is e r . —

T a lv e z e m ju n h o v á a M u m b a i. S e N ir m a la a in d a q u is e r v e r-m e

— e s ta re i b e m d is p o s ta e m ir a P o o n a o u q u e e la v e n h a a o C o n v e n to

em M u m b a i. — A s s im ta m b é m lh e d a r ia o p o r tu n id a d e d e v e r o tr a ­

b a lh o . R e z e p o r m im — p a ra q u e e u p o ssa c o m a m a b il id a d e e a le g ria

p a ssar fa z e n d o o b e m . 36

Sua em Jesus,
M. Teresa, M O 1

A situação dos pobres das ruas de Calcutá, rejeitados por todos


e abandonados à sua dor, era — afirmava Madre Teresa — “o verdadei­
ro quadro da m inha vida espiritual”. Tinha atingido o ponto de total
identificação com o “seu povo”, com a miséria, a solidão e a rejeição
daquelas pessoas.
Também ela se sentia indesejada — não pelas pessoas que precisa­
vam dela, mas por Aquele que significava para ela mais do que a própria
vida, pelo seu Deus. Também não se sentia amada — não pela multidão
que se aglomerava ao seu redor, mas por Deus, a quem amava com todas
as forças da sua alma. Também ela sentia que Ninguém a reivindicava —
não se referia aos pobres, que viam nela uma mãe, mas a Deus, de Cujo
amor declarava ser a criança.
A escuridão interior conferia a Madre Teresa a capacidade de com­
preender os sentimentos dos pobres. “O maior de todos os males é a falta
de amor e de caridade, a terrível indiferença em relação ao próximo que
vive à beira da estrada, assaltado pela exploração, pela corrupção, pela
pobreza e pela doença”,38 diria mais tarde.
E fazia a sua parte, consumindo-se por completo para ajudar a*

* Santa Margaret Mary (1647-1690) foi uma religiosa da Ordem da Visitação, cm Paray-le-
Monial (França). Foi uma apóstola de devoção do Sagrado Coração de Jesus.
240 Xcnha, seja M i n h a luz

modificar a assustadora situação em que viviam os pobres. Além de ir ao


encontro das suas necessidades materiais, oferecia-lhes mais, porque sabia
que “atualmente, as pessoas têm fome de amor, de um amor compreensi­
vo, que é muito maior e que é a única resposta para a solidão e para uma
grande pobreza”.39 Aqueles a quem servia sabiam que ela os amava, com­
preendia, sofria com eles. Sentiam que, para ela, eram, naquele momen­
to, a única pessoa que existia no mundo. Não se tratava apenas da ajuda
material, mas era especialmente o seu amor que fazia a diferença.
Ela insistia com as suas irmãs, que não compreenderiam os pobres
a não ser que tivessem a experiência pessoal da pobreza:

Jesus foi enviado pelo Pai aos pobres40 e para ser capaz de compreen­
der os pobres, Jesus teve que conhecer e experimentar essa pobreza
no Seu próprio Corpo e na Sua Alma. Também nós devemos expe­
rimentar a pobreza se quisermos ser verdadeiras portadoras do amor
de Deus. Para sermos capazes de proclamar a Boa-nova aos pobres
devemos saber o que é a pobreza.41

Sem a escuridão interior em que vivia, sem ter conhecido tal an­
seio de amor, bem como a dor de não ser amada e sem essa radical iden­
tificação com os pobres, Madre Teresa não teria conquistado a confiança
e os corações deles conforme o fez.
O sofrimento de Madre Teresa era no nível mais profundo possí­
vel: o de sua relação com Deus. E, no seu zelo pela salvação dos outros,
estava totalmente disposta a abraçar por completo esse sofrimento, para
que os pobres que amava experimentassem toda a medida do amor de
Deus. Consequentemente, a escuridão veio a ser a sua maior bênção: o
seu “mais profundo segredo” era, na realidade, o seu maior dom.
CAPITULO 1 1

j y i disposição í)ele”

S er esse “a l g u é m ”

Estou disposta a aceitar tudo aquilo que Ele der


e a dar tudo aquilo que Ele tirar, com um grande
sorriso.
M a d r e T eresa

“Qiiero, com todo o meu coração, o que Ele quiser”

Em meados de 1962, Madre Teresa entrou em um período de sua vida


durante o qual teria, como única ajuda, algumas cartas dos seus diretores
espirituais, e uns raros encontros com eles. Continuava correspondendo-
-se com o pe. Neuner e com o pe. Picachy. As cartas não sáo detalhadas,
mas recordatórias de fatos que eles já conheciam; essas cartas expressam
mais a resignação da Madre Teresa do que a sua dor.
Uma vez que considerava o pe. Picachy um amigo, quando ele lhe
confidenciou, em maio de 1962, as dificuldades de sua missão em Basan-
ti, Madre Teresa tomou-as como suas:

As suas dificuldades e as minhas — devemos oferecê-las a Jesus pelas


almas. — Tenho a certeza de que o senhor se pergunta, tal como eu
— quanto tempo isto tudo durará. Sei que quero, com todo o meu
242 V( iiha. seja M i n h a luz

c o ra ç ã o , o que E le q u is e r , c o m o E le q u is e r e e n q u a n to E le q u is e r.

C o n tu d o , p a d re — e s ta s o lid ã o é d u r a . A ú n ic a c o is a q u e p e r m a n e c e

é a p r o f u n d a e fo rte c o n v ic ç ã o d e q u e a o b r a é D e le . — C o m to d a s

a s c o is a s q u e a c o n te c e r a m em D e lh i* — não tiv e u m ú n ic o pensa­

m e n to d e a u to s s a tis fa ç ã o — fo i m a is u m d o lo r o s o s a c r if íc io a faz er.

A s c o is a s d e B a s a n ti d e v e m se r m u ito d o lo r o s a s p a ra o s e n h o r — e

re z o m u ita s v e ze s p a ra q u e tu d o a c a b e d e p re ssa .

G o s ta ria d e lh e e s c re v e r m a is — m as há ta n to a fazer — ta n ta s

c a r ta s q u e e screv e r — que te n h o de p ô r tu d o is s o à fre n te do m eu

p ró p rio e u .1

Mesmo em intenso sofrimento, o senso de humor de Madre Tere­


sa não a abandonava, levando-a a expressar, em tom ligeiramente brinca­
lhão, a sua maneira de seguir a Jesus na escuridão: “Só me resta fazer uma
coisa, seguir de perto os passos do meu dono, como um cãozinho. Reze
para que eu seja um cãozinho alegre”,2 escreveu ao pe. Picachy algum
tempo depois.
Em julho de 1962, soube que o pe. Picachy se tornaria bispo. Em­
bora tivesse ficado muito feliz com a nomeação. Madre Teresa sentiu que
o distanciamento entre ambos era cada vez maior. “Vai ser difícil tratá-lo
por ‘Excelência’”,3 escrevia-lhe, “— mas terei que fazê-lo. [...] Na sua
nova vida, não se esqueça de rezar por mim.”4

ii(Por que £le dá tudo isto mas não dá a Si próprio?"


O trabalho das Missionárias da Caridade estava colocando Madre Teresa
cada vez mais sob o olhar do público, e percebia que isso também era a
vontade de Deus para ela. O distanciamento das suas Irmãs e dos pobres,
conseqüência da sua necessidade de viajar com mais frequência, acen­
tuava nela a sensação de isolamento, especialmente quando se via sozinha
entre desconhecidos, como escreve à sua amiga Eileen:

* Refere-se à premiaçáo “Padma Shri” cm 28 de agosto de 1962.


•Satila Teresa de Calcula 243

Estou aqui sozinha. — como gostaria que você estivesse aqui —


Mas não se pode ter tudo o que é bom. —
Esta tarde voo para Manila, onde ficarei na casa das Filhas da
Caridade. — Pessoalmente, preferiria estar com a minha gente —
mas o Senhor tem os Seus próprios planos. — E como eu quero que
Ele tenha total liberdade para me usar como Lhe agradar, sou feliz
tanto aqui como ali. O “Padma Shri”, agora o “Magsaysay”* ajuda­
ram muitas pessoas, especialmente o[s membros do] Gov. [governo]
a compreenderem o amor da Igreja pela índia e que os missionários
são o melhor presente que a Igreja pode dar a um país.5

As honras que eram conferidas a ela e ao seu trabalho acentuavam


a ausência de intimidade com Jesus, pela qual ansiava, como confiden­
ciou ao pe. Neuner:

Reze por mim, por favor. Quem me dera poder dizer — mas também
isso é vazio — e parece que não tenho nada para dizer ao senhor. —
Pergunto-me o que tira Ele de tudo isto — quando nada há em mim.
Tive que ir a Manila receber o prêmio “Magsaysay”. Foi um gran­
de sacrifício. Por que Ele me dá tudo isto mas não dá a Si próprio? Eu
quero Ele, não os Seus presentes nem as Suas criaturas. —
Não devo escrever assim — porque priva a Deus da alegria de ser
livre para fazer o que quiser comigo. — Não estou apenas disposta,
mas também feliz em estar à Sua disposição. Deixe que Ele tire tudo,
até a Si Próprio — se isso Lhe agrada mais. — Em troca, peço-Lhe
que faça santas as minhas Irmãs.
Reze por mim.6

Quando o angustiado “porquê” que lhe perturbava o coração es­


capava de sua caneta, ela o retirava assim que acabava de escrever, por
medo de que ele diminuísse sua determinação de dar seu “Sim” a Deus e

* Madre Teresa recebeu o Prêmio Ramon Magsaysay pela Compreensão Internacional, em 31


de agosto de 1962, em Manila, Filipinas.
244 X e u ha . seja A l in h a luz

“u m g r a n d e ‘S o r r i s o ’ p a r a t o d o s ” . A s s i m , p e r m a n e c i a , a l e g r e m e n t e , à S u a

d is p o s iç ã o , m e s m o e s ta n d o a p a r e n te m e n te p r iv a d a d e D eu s.

“òoa tudo o que £le tira ”


Em setembro de 1962, em carta ao já Bispo Picachy, Madre Teresa salien­
tava como o seu estado interior era. Nos momentos mais críticos, quando
se encontrava à beira de dizer “Não”, Maria, a quem chamava com tanta
frequência e ternura de “Mãe”, vinha em seu auxílio.

Excelência,
Os meus pensamentos, orações e sacrifícios estiveram o tempo
todo com o senhor no dia 9. Gostaria muito de ter estado lá — mas
o Senhor tem os Seus próprios planos. Obrigada pela foto — [...]
Com frequência pergunto-me o que realmente Deus obtém de
mim neste estado — sem fé, sem amor — nem sequer em senti­
mentos. No outro dia nem imagina como me senti mal. — Houve
um momento quando quase me recusei a aceitar. — Peguei delibe-
radamente no Terço e — muito devagar — sem sequer meditar nem
pensar — rezei-o lenta e calmamente. O momento passou — mas a
escuridão é tão escura, e a dor tão dolorosa. — Mas aceito tudo o que
Ele dá e dou tudo o que Ele tira. As pessoas dizem que são atraídas
para mais perto de Deus — vendo a minha forte fé. — Não é isto
enganar as pessoas? Cada vez que quero dizer a verdade — “que não
tenho fé” — as palavras simplesmente não me vêm — a minha boca
permanece fechada. — Porém continuo ainda sorrindo para Deus e
para todos.
Agora que o senhor é Bispo — tenho que me manter afastada —
porque o senhor tem muitos outros trabalhos mais importantes que
fazer. — Agradeço-lhe, querido Padre — toda a ajuda que me deu
durante todos esses anos, e reze por mim — mesmo que eu tenha que
me manter afastada.7

Não tendo a sensação de acreditar, Madre Teresa continuava de­


batendo-se com medo de estar enganando aos outros. Mas, quando tinha
•Santa Teresa de Calcuta 245

vontade de revelar a sua aparente falta de fé, ficava privada da capacidade


de fazer isso. Também isso era uma ação de Deus na sua vida: Ele não
permitia que ela dissesse algo que não era verdade. Madre Teresa tinha
fé, uma fé bíblica, uma fé cega, uma fé que fora posta à prova e testada
na fornalha do sofrimento e que abria caminho em direção a Ele através
da escuridão. Não se deixando deter pelos sentimentos, ela continuava
vivendo pela fé que sentia haver perdido.
Madre Teresa vivia o seu compromisso de obediência total em to­
das as situações da sua vida, mesmo quando lhe atribuíam a difícil tarefa
de falar em público. Embora se sentisse à vontade quando instruía as
Irmãs, sentia-se intimidada e inadequada quando tinha que se dirigir a
outras pessoas. Em janeiro de 1963, escrevia ao pe. Neuner, recusando o
convite que ele lhe tinha feito para falar aos seminaristas:

O Senhor está jogando o Seu próprio jogo — eu Lhe dou o que Ele
tira. Ele não parece querer que eu tenha a consolação humana que de­
rivaria de conversar com o senhor. — E eu sou feliz com o que mais
Lhe agradar. Aceito tudo o que Ele dá.
Nada tenho a dizer — nem tenho capacidade nem os conheci­
mentos necessários para falar a futuros sacerdotes. As minhas Irmãs
são [como] eu — por isso não preciso procurar por palavras difíceis.
— Eu simplesmente abro o meu coração — e Ele fala.
Se quiser, pode perguntar ao Arcebispo D’Souza* o que ele pensa.
Se ele me disser para fazê-lo — eu não tenho nada a dizer — o farei.8

O Bispo Picachy tinha garantido que ela podia continuar con­


tando com sua ajuda. E Madre Teresa agradeceu-lhe por esse apoio tão
importante:

Foi uma grande amabilidade de sua parte ter escrito e lembrar-se de re­
zar por mim. Pensei que agora que é Bispo com uma grande diocese
— se esqueceria. — Graças a Deus que não se esqueceu e que reza
por mim.

* Albert Vincent D ’Souza (1904-1977) foi arcebispo de Calcutá, de 8 de agosto de 1962 a


29 de maio de 1969.
246 Xcnlia, seja M i n h a luz

Lamento ter me desencontrado do senhor todas as vezes — por­


que gostaria de ter tido a oportunidade de me confessar. Quase a
cada duas semanas me confesso com um sacerdote diferente — e
nunca consigo falar — e também não tenho nada a dizer. — Quanto
tempo agirá o bom Deus desta maneira, não sei — c sou feliz por Ele
saber. E a única coisa que faço neste momento — “dar-Lhe toda a
liberdade”. Ele pode fazer o que Ele gosta e como Ele gosta. — Reze
por mim.9

“jrffrcigrâncici da alegria de Cristo”


A ideia de que suas imperfeições pudessem ser a causa desse prolongado
sofrimento nunca a abandonou por completo. “Eu devo ter estado tão
cheia de mim durante todos esses anos — uma vez que Deus demora tan­
to para me esvaziar. — Espero que um dia quando estiver completamente
vazia Ele venha”,10 escrevia ao Bispo Picachy, em fevereiro de 1963.
Dado que tinha a impressão de que Deus a estava esvaziando, a ima­
gem de João Batista11 surgia vivamente em seu pensamento; a alegria dele
seria também a sua, escreveu Madre Teresa depois de um dos encontros
com o pe. Neuner:

Ontem à noite, tentei lembrar tudo o que me disse e consegui lem­


brar apenas de uma coisa — que pertenço somente a Deus. — Tomei
tanto do seu tempo e não tirei proveito nenhum dele. Estou mais
decidida do que nunca a espalhar alegria onde quer que eu vá — a
fragrância da alegria de Cristo. Uma vez que elas [as Irmãs] não são
minhas — eu serei um S. João Batista para Jesus. — Eu me alegrarei
porque o Noivo tem a Sua noiva.12Jesus tem o amor das minhas Ir­
mãs e logo, se Deus quiser, também o amor dos Irmãos. — pe., se for
possível, escreva-me de vez em quando assim como falou — eu quero
[ser] somente para Deus. [...]
Por favor, continue a pedir aos seus futuros sacerdotes que rezem
por mim e pela Congregação — e também que — quanto mais santos
se tornarem, mais santas farão as nossas Irmãs quando eles virarem os
seus guias espirituais. Peça-lhes que rezem muito especialmente pelo
■Santa Teresa de Calcutá 247

25 de março.
Agradeço-lhe ter possibilitado a minha ida a Poona para ver o seu
grande trabalho — e por ser tão paciente comigo.
Deus esteja com o senhor — 13
Os Irmãos Missionários da Caridade, o primeiro ramo masculino
da Família das Missionárias da Caridade, começaram em 25 de março de
1963, Solenidade da Anunciação do Senhor. Madre Teresa tinha inves­
tido todo o seu coração nessa fundação e foi com alegria que informou
o Bispo Picachy dessa expansão do seu serviço aos pobres. Como asso­
ciara suas lutas interiores ao rápido crescimento e ao sucesso das Irmãs,
também se perguntava agora que “preço” teria de pagar pelos Irmãos. E
mostrava-se disposta a dar ainda mais.

Ficará muito satisfeito por saber que no dia 25 de março — para Nossa
Senhora — será feita a primeira oferta dos Irmãos Missionários da Ca­
ridade. Por isso reze, por favor, para que tudo seja apenas por Jesus.
Pergunto-me o que Jesus vai me tirar por eles, uma vez que já me
tirou tudo pelas Irmãs. Estou disposta a aceitar tudo o que Ele me der
e dar tudo o que Ele tirar com um grande sorriso.14

Continuando a lamentar o fato de não poder abrir o coração ao seu


diretor espiritual “oficial”, Madre Teresa pedia ajuda ao bispo Picachy,
seu antigo confidente e diretor espiritual:

Caro Bispo Picachy,


O pe. Van Exem foi meu diretor espiritual desde 1944. — Penso —
que ainda o é — mas às vezes sinto que preciso de alguém com quem
falar. Há alguns anos que acho difícil fazer isso com ele. — Não sei
o porquê.
Posso pedir-lhe que me ajude — enquanto Deus quiser — como
Diretor esp. [espiritual]? Uma vez que o Senhor Bispo já sabe quase
tudo. Se precisar mais alguma coisa — eu tentarei dizer.
Reze por mim —
Sua em Jesus
M. Teresa, M C 15
248 \ c n h a . seja M i n h a luz

"Taz-me compartilhar Contigo a Tua dor ”


“Dar toda a liberdade a Jesus”16 continuava sendo a medida da sua auto
entrega. “Fiquei muito feliz por me confessar — mas, como sempre, nada
a dizer. Reze por mim — para que eu permaneça à disposição Dele”,17 es­
crevia ao Bispo Picachy. Essa constante entrega era acompanhada por uma
regular partilha da dor de Jesus. Em abril de 1963, Madre Teresa escrevia
ao pe. Neuner:

Foi uma grande amabilidade sua escrever. Sim, pe., a Quaresma


está quase acabando. — A Paixão de Jesus passou — sem sequer
tocar a minha alma. As minhas meditações são como todo o resto
— completamente sem sentido. — Dia após dia — repito a mesma
coisa — talvez apenas com os meus lábios — “Faz-me sentir o que
Tu sentiste. Faz-me compartilhar Contigo a Tua dor.”* Quero estar
à disposição Dele.
A inauguração foi muito bonita. — Temos um irmão — o 2o
chega no Domingo de Páscoa. É maravilhoso ver e ouvir as reações
dos sacerdotes aqui. — É estranho — mas todos eles se mostram
satisfeitos e ao mesmo tempo estavam esperando que um dia isto
acontecesse. Estou rezando por Nirmala — Jesus tomará conta dela
porque ela O ama no disfarce angustiante [dos] Seus pobres. Pode
ser que um dia ela volte a Poona como MC e faça grandes coisas por
Deus — com a sua natureza generosa.
Estou contente que o senhor está de férias. — Nós começamos as
nossas férias espirituais — retiro no dia 13 para as noviças e 16 para
as professas e as Superioras. Não vou fazer o meu desta vez. — De­
sejaria poder ir para algum lugar sozinha — para estar sozinha com
Deus mesmo que Ele possa não querer estar sozinho comigo. [...]
Graças a Deus que o senhor continua bem. — A minha garganta
me deu e continua me dando problemas. — Ainda bem que não
dói quando falo — só quando bebo — por isso continuo dando

* Do hino Stabat Mater, na reaiidade dirigido à Bem-aventurada Virgem Maria. Aqui, parece
que Madre Teresa está dirigindo-se a Jesus.
•Santa Teresa de Calcutá 249

to d a s a s in s t r u ç õ e s — às vezes são 3, 4 ou 5 in s tr u ç õ e s p o r d ia . —

A s Irm ã s fic a r a m e n c a n ta d a s c o m a s in s tr u ç õ e s q u e lh e s d e i s o b r e a

c a s tid a d e . N ão sei d e o n d e v e io tu d o a q u ilo — m a s fez c o m que o

v o to d e c a s tid a d e fo sse — o v o to m a is a m á v e l e m a is n a tu r a l p a ra

u m a r e lig io s a faz er. Q u e m m e d e r a p o d e r s e n t i r o q u e e la s s e n te m .

— M as tu d o b em — so u m u ito fe liz e c o n t i n u o com um g ran d e

s o rriso p a ra to d o s . —

R e ze p o r m im — e p e ç a a o s te ó lo g o s q u e re z e m p o r m i m . 18

Ao longo de toda a Quaresma e, na realidade, ao longo de sua vida


como Missionária da Caridade, a oração de Madre Teresa estava sendo res­
pondida: “Faz-me sentir o que Tu sentistes. Faz-me compartilhar Contigo
a Tua dor.” Não estava ela experienciando a agonia de Jesus e a agonia dos
pobres também?
Enquanto passava por essa provação, que o ardente desejo que
tinha de Deus tornava ainda mais difícil, cumpria todos os seus deveres
com a habitual fidelidade e alegria, encorajando sua amiga Eileen a fazer o
mesmo: “Viva a sua vida de amor a Jesus com grande alegria — porque o
que você tem é presente Dele — use tudo para maior glória do Seu nome.
[...] Mantenha-se perto de Jesus sempre com um rosto sorridente — para
que — possa aceitar tudo quanto Ele der e der tudo o que Ele tirar.”19

“£/e continua jogando o Seu jogo”

Em setembro de 1963, foi enviada para Roma a solicitação de aprovação


pontifícia de sua congregação. Ela não foi capaz de esconder do pe. Neu-
ner a satisfação que sentia:

Muito obrigada pela sua amável carta —


Estou muito feliz que o senhor esteja indo a Roma e que rezará
por mim e pelas Irmãs e Irmãos. O senhor vai se alegrar de saber que
há outra coisa que vai para Roma — a petição do nosso arcebispo,
as cartas de todos os Bispos onde as Irmãs se encontram, a minha
petição e o meu relatório sobre a vida e o trabalho da Congregação. A
petição é para obter o direito pontifício para a Congregação. Pe., não
250 l e n h a , seja M i n h a lu z

se sente feliz? A pequena semente de Deus está crescendo lenramente


— porém é tudo Dele. — A única coisa que me faz continuar — é a
convicção de que a obra — as Irmãs, a Congregação — tudo é Dele
somente — nada reivindico. [...]
Estão todos bem e dando o melhor que têm. Reze para [que Ele]
esvazie o meu vazio. — Ele continua jogando o Seu jogo — e eu
continuo sorrindo durante a Sua brincadeira.20

“Os meus sentimentos são tão traiçoeiros”

A abertura de uma comunidade das Missionárias da Caridade em


Jamshedpur, na diocese do Bispo Picachy, foi uma oportunidade para
Madre Teresa se encontrar com ele face a face e lhe contar sobre suas
persistentes lutas interiores, uma vez que, em um mom ento em que já
tinha dificuldade em falar, ter que confidenciar a sua provação a um novo
diretor espiritual seria um tremendo desafio.

A caminho de casa*
811164
Excelência,
Não posso agradecer o suficiente, ao senhor e aos seus, por toda a
amabilidade, e por todo o afeto que o senhor e eles demonstraram às
nossas jovens Irmãs. — Espero que elas sejam uma causa de verdadei­
ra alegria para o senhor — e que levem muitas almas a Jesus. — As
nossas Irmãs são jovens — cuide delas, porque são Dele. Conduza-as
ao fervor e à santidade — e quanto mais santas elas se tornarem mais
capazes serão de irradiar o amor de Deus entre os Seus Pobres. Estou
muito agradecida a Deus — por ter me dado a oportunidade de tra­
balhar com o senhor na sua jovem diocese.
Deve ter rezado muito fervorosamente por mim — porque faz
mais ou menos um mês que há no meu coração uma união muito
profunda com a Vontade de Deus. Aceito não com os meus senti-

* A caminho de casa, de Jamshedpur, no trem.


S a nt a Teresa de Calcutá 251

méritos — mas com a minha vontade, a Vontade de peus. — Aceito


a Sua vontade — não só por um tempo mas,po^ toda eternidade. —
Na minha alma — não sou capaz de dizer — como está escuro, como
é doloroso, como é terrível. — Os meus sentimentos são muito trai­
çoeiros. — Tenho a sensação de “recusar a Deus” e, contudo, o pior
e mais difícil de suportar — é este terrível anseio por Deus. — Reze
por mim, para que eu não me transforme em um Judas21 para Jesus
nesta dolorosa escuridão. Eu estava ansiosa para falar com o senhor.
— Eu simplesmente anseio por falar — e também disso Ele parece
ter tirado minha capacidade. — Não me queixarei. — Aceito Sua
Santa Vontade tal como ela vem a mim. Se tiver tempo, por favor,
escreva-me e não se preocupe com a minha incapacidade de falar com
o senhor — pois eu queria falar — mas não pude. [...]
Por favor, desculpe o papel e a letra. Obrigada por toda a sua ama-
bilidade comigo e com as minhas.22

É difícil imaginar de que forma poderia Madre Teresa abandonar-


se ainda mais a Deus, mas, de acordo com suas próprias palavras, sua
conformidade com a vontade de Deus tinha se tornado mais completa.
Estava disposta a aceitar permanecer na escuridão por toda a eternidade,
embora temesse vir a ser “um Judas para Jesus”. Mas a escuridão não era
o mais doloroso.
“O pior e mais difícil de suportar”, insistia Madre Teresa, era
“este terrível anseio por Deus.” Ainda mais dolorosa do que a própria es­
curidão era esta sede de Deus. Na realidade, estava experimentando algo
da sede de Jesus na Cruz, a mesma sede com a qual ela fora confrontada
em 10 de setembro de 1946. E, à medida que a escuridão aumentava,
aumentava igualm ente a sua sede por Aquele que essa escuridão oculta­
va, bem como a sede de “irradiar o amor de Deus entre os Seus pobres”.
Essa sede “terrível” de Deus exprimia-se em uma ardente sede de almas,
em especial das almas dos mais pobres dos pobres. A Madre estava en­
carnando assim o carisma que recebera.
O crescente zelo de Madre Teresa pelas almas refletia-se na rápi­
da difusão de sua missão. Eis o relato feliz que faz à sua amiga, Eileen,
do crescente núm ero de fundações: “Contando com o Céu, onde temos
252 t e n h a , seja M i n h a luz

quatro Irmãs — temos agora 15 casas — e uma de Irmãos com nove


Irmãos.”23 Esse zelo ajudava a esquecer as suas próprias necessidades e
sofrimentos e a uni-los aos sofrimentos dos pobres que servia. “Não se
preocupe comigo”, acrescentava na mesma carta a Eileen, “— a minha
garganta está melhor — e é bom ter alguma coisa [que sofrer] — para que
eu possa compartilhar um pouco a dor com os meus pobres em Nirmal
Hriday. [...] Anseio por acender a luz do amor no coração de cada cria­
tura de Deus.”24

“Qiie mundo terrível é este


—sem o amor de Cristo”

O desejo que Madre Teresa tinha de semear amor era especialmente posto
à prova em momentos de hostilidade. Quando os sofrimentos dos po­
bres aumentavam, aumentava igualmente a compaixão dela. Quando, em
1964, explodiram os confrontos em Calcutá que deixaram uma centena
de mortos e quatrocentos feridos, tudo o que ela podia ver era o terrível
efeito do pecado:

Partiria o seu coração ver milhares de pessoas ficarem sem casa — de


um dia para o outro. Houve problemas entre os hindus e os mu­
çulmanos. Reze pela nossa gente. [...] Quanto dano o pecado pode
fazer. Que mundo terrível é este — sem o amor de Cristo. Simples­
mente não consigo compreender porque o fizeram. Por que causar
tanta dor aos Pobres? Reze por eles.25

“Terrível é o ódio quando começa a tocar os seres humanos”,26


escreveu a Madre ao Bispo Picachy. E, enquanto a violência da guerra ia
ceifando as suas vítimas, a Madre via o ódio em ação e buscava perma­
nentemente formas de substituí-lo pelo amor. É novamente com Eileen
que compartilha os seus sentimentos:

Reze pela nossa gente — a índia está passando por momentos muito
difíceis. — Precisamos de muitas orações e sacrifícios de vocês em
outros países. [...]
S a n ta Teresa de Calcutá 253

Sei que isto vai entristecê-la profundamente — porque o seu co­


ração está cheio de trabalho pela paz — mas minha querida Eileen
__ofereça tudo e reze muito para que sejamos capazes de apagar esta
chama de ódio — que está se propagando. [...]27

US6 Ocus pode pedir sacrifícios como estes”

Ser um canal da paz de Deus e espalhar o Seu amor através da expansão


da missão exigia muitos sacrifícios de Madre Teresa. De regresso de Ca-
rambolin, onde fora abrir uma casa, a Madre confidenciou ao pe. Neuner
um sacrifício particularmente exigente:

As Irmãs estão em Carambolin e já começaram o trabalho entre os


pobres de Deus. Reze por elas para que o façam bem e levem muitas
almas a Deus. São maravilhosamente corajosas. Fico feliz por abrir
todas as casas que o bom Deus queira e por acender o fogo do amor
em outras tantas cidades — mas toda vez que deixo as Irmãs — uma
parte de mim, como se fosse, fica fora de mim causando grande sofri­
mento. — Só Deus pode pedir sacrifícios como estes. [...]
Reze por mim — porque a vida dentro de mim está mais difícil
de viver. Estar enamorada e — contudo — não amar, viver de fé e
— contudo — não acreditar. Gastar-me por completo e — contudo
— estar em total escuridão. — Reze por mim.28

Se a despedida das suas Irmãs era dolorosa, os encontros que tinha


ocasionalmente com elas proporcionavam-lhe grande alegria:

Tive todas as superioras em Cal. [Calcutá] para o retiro. — Foi


maravilhoso tê-las comigo — todas juntas. Não sei o que sentem
as outras pessoas — mas eu amo as minhas Irmãs como amo a
Jesus — com todo o meu coração, a minha alma e a minha mente e
as minhas forças. [...] Continue rezando por mim — como eu faço
pelo senhor. — Amemos a Jesus com todo o nosso coração, a nossa
alma e a nossa mente.29
254 V'cnha. seja M i n h a luz

Madre Teresa reconhecia que a escuridão em que vivia era o preço


a pagar por acender “o fogo do amor”. Estava disposta a pagar esse pre­
ço e encorajava as superioras das suas comunidades a fazerem o mesmo,
embora não desse qualquer indicação de que estivesse falando por expe­
riência própria:

Vocês estão aí para as suas Irmãs — as irmãs não estão aí para vo­
cês. Devem estar prontas para qualquer sacrifício — para serem
devoradas, por assim dizer, pelas suas Irmãs. E possível que sintam,
às vezes, uma grande solidão — mas esse é um dos sacrifícios que
podem fazer pelas suas Irmãs. Acontece com frequência que aqueles
que passam o tempo dando luz aos outros permanecem, eles pró­
prios, na escuridão.30

“O bom fàeus chamou e eu disse ‘Sim’”


Enquanto ponderava no pedido de reconhecimento pontifício apresenta­
do por Madre Teresa, a Santa Sé solicitou um breve resumo histórico da
origem e do desenvolvimento do instituto. Madre Teresa, que tinha tido
particular cuidado em manter secreto o começo da sua congregação, con-
frontava-se agora com a questão de decidir o que revelar. Ela apresentou
um extenso relatório sobre o desenvolvimento e as atividades correntes
de sua comunidade, mas, em relação ao chamado que recebera, escreveu
apenas: “Quanto à origem — foi muito simples — o bom Deus chamou
e eu disse ‘Sim’”.31
Mantendo o seu “Sim” a Deus, a Madre continuava aberta à Sua
vontade, manifestada nos menores detalhes e abandonando-se sempre,
de novo, não importando o que Ele lhe pedisse. E isso, frequentemente,
significava sacrifício pessoal. “Gostaria muito de ter ido — porque queria
muito conversar com o senhor”, escrevia ao diretor espiritual em quem
tanto confiava, “mas o Senhor quer as coisas do jeito Dele.”32

“Que terrível é estar sem t>eus”


Embora tivesse compreendido o significado de sua contínua escuridão
interior, isso não queria dizer que fosse mais fácil conviver com ela.
•Santa Tcrvsa de Calcutá 255

D eu s a d e s p o ja v a de to d o s os a p o io s , n a tu ra is e s o b re n a tu ra is : o is o la ­

m e n to em q u e se e n c o n tra v a e ra de ta l m o d o a b s o lu to , q u e e la s ó c o n ­

s e g u ia c o m p a r á - l o co m o in fe rn o . A p ó s m a is d e 15 anos de e s c u r id ã o ,

a p re s e n to u a o p e . N e u n c r a s e g u in te d e s c r iç ã o d o s e u e s ta d o :

Quanto a mim — o que vou dizer-lhe? Nada tenho — uma vez que
não tenho a Ele — a Quem o meu coração e a minha alma anseiam
por possuir. O isolamento é tão grande. — Nem por dentro nem por
fora — não encontro ninguém a quem recorrer. — Ele tirou não so­
mente as ajudas espirituais, mas até mesmo as humanas. — Não pos­
so falar com ninguém e mesmo que o faça — nada entra na minha
alma. — Ansiava por conversar com o senhor em Mumbai — mas
nem sequer tentei tornar isso possível. — Se há inferno — Este deve
ser um. Que terrível é estar sem Deus — nem oração — nem fé —
nem amor. — A única coisa que ainda permanece — é a convicção de
que a obra é Dele — de que as Irmãs e os Irmãos são Dele. — E eu
me agarro a isto como a pessoa que nada tem se agarra à palha — an­
tes de afundar. — E contudo, pe. — apesar de tudo isto — quero ser-
-Lhe fiel — quero esgotar-me por Ele, quero amá-Lo não por aquilo
que Ele dá mas por aquilo que tira — quero estar à Sua disposição.
— Não Lhe peço que mude a Sua atitude para comigo ou os planos
para mim. — Peço-Lhe apenas que me use — para ensinar e ajudar as
minhas Irmãs e os meus Irmãos e os nossos Pobres a amá-Lo, já que
eu não posso amá-Lo. — Como as Irmãs e os Irmãos amam a Deus
lindamente! — Como tentam ser capazes de corresponder a tudo
aquilo que Ele lhes dá através de mim. —33

“Que terrível é estar sem Deus”, escrevia Madre Teresa. E, ain­


da mais terrível era para ela — que tinha estado tão perto Dele — ter,
por assim dizer, perdido por completo o senso da Sua presença. Nos
desígnios de Deus, fora perm itido à Madre experienciar a terrível re­
alidade de um a vida sem Deus, que ela comparava com o inferno, a
conseqüência da rejeição definitiva do Seu amor e da Sua misericór­
dia. Essa experiência alim entava sua sede insaciável de salvar almas,
ajudando cada pessoa a conhecer a Deus e o amor de Deus, e a amá-
Lo em retorno. Ju n tam en te com o serviço que prestava, de todo co-
256 \ cn h a. seja M i n h a luz

ração, aos pobres, a Madre oferecia a Deus a sua agonia secreta, para
que outros pudessem aproximar-se mais Dele. Nas interpretações dos
sentimentos de Jesus que apresentava às irmãs, ela refletia igualmente
as profundezas de sua aceitação da Cruz de Jesus:

Na Encarnação, Jesus tornou-Se igual a nós em todas as coisas exceto


no pecado; mas no momento da Paixão, tornou-se pecado." — To­
mou sobre Si os nossos pecados e é por isso que foi rejeitado pelo Pai.
Eu penso que esse foi o maior de todos os sofrimentos por que Ele
teve de passar e aquilo que mais temia na agonia do Jardim." Essas
Suas palavras na Cruz36 foram uma expressão da profundidade da Sua
solidão e da Sua Paixão — que até mesmo o Seu próprio Pai não o
reconheceu como Seu Filho. Que, apesar de todos os seus sofrimentos
e angústia, Seu Pai não O reconheceu como Seu Filho amado, como
tinha feito no Batismo por S. João Batista37 e na Transfiguração.38
E podemos perguntar: “Por quê?” Porque Deus não pode aceitar o pe­
cado e Jesus tinha tomado o pecado sobre Si — tinha-se tornado peca­
do. Relacionam os seus votos com esta Paixão de Jesus? Percebem que,
ao aceitarem os votos, estão aceitando o mesmo destino de Jesus?39

Por meio da sua vida de serviço consagrado aos pobres. Madre


Teresa tinha abraçado a mesma sorte que Jesus. À semelhança de outros
santos chamados para ajudar aqueles que serviam a aproximarem-se de
Deus, a Madre foi chamada a compartilhar a sorte dos pobres. De certa
maneira, teve que lutar e resistir às tentações deles, para que pudessem
emergir vitoriosos dessa batalha.40 E a batalha era intensa. Sua afirmação:
“se há inferno — este deve ser um”, não questionava a existência do infer­
no, porém, demonstrava “quão escura” era sua escuridão. Ela acreditava,
firmemente, que a possibilidade de ir para o inferno era uma terrível rea­
lidade. Já em 1946, ansiava por sair de Loreto para “tornar Nosso Senhor
mais conhecido dos pobres que sofrem os mais terríveis sofrimentos e
depois a eternidade também na escuridão”. Ela era agora uma com essa
“grande multidão [...] coberta na escuridão” das visões que tivera no co­
meço da nova vocação que recebera, dessa multidão que lhe suplicava:
“Venha, venha, salve-nos — leve-nos a Jesus.”41 Ao abraçar a escuridão
em que viviam. Madre Teresa os estava levando para a luz — Jesus.
•Santa Teresa de Calcutá 257

Até o consolo de ver as suas Irmãs e Irmãos aproximarem-se cada


vez mais de Deus se misturava com desapontamento. As dificuldades de
sua vida e do trabalho com os pobres exigiam uma grande fortaleza e
dedicação, mas nem todos perseveravam. Em abril de 1965, por ocasião
do abandono da congregação por parte de duas irmãs, escrevia ao Bispo
Picachy: “Nunca senti uma tristeza como esta, mas foi uma grande lição
para todas nós. Reze por elas.”42

“£7e tira cada gota de


consolação de minha alma ”
Em Io de fevereiro de 1965, as Missionárias da Caridade receberam a
tão esperada aprovação pontifícia (Decreto de Louvor), por via da qual
a congregação passava a estar diretamente sujeita à autoridade papal, em
vez de estar sujeita ao Bispo diocesano. Foi um passo decisivo na vida da
“jovem Congregação”. Esse sinal de favor divino levou Madre Teresa a
pensar em São João Batista. Suas palavras — “Importa que Ele cresça e
que eu diminua”43 — eram não apenas sua inspiração, mas sua aspiração,
já que desejava que todas as atenções estivessem concentradas em Jesus e
não no Seu instrumento. Ela expressou ao pe. Neuner a alegria que sentiu
com a aprovação pontifícia:

Obrigada pela sua amável carta. — Deus tem o Seu próprio jeito em
todas as coisas. — Lentamente vou aprendendo a aceitar tudo exata­
mente como Ele o dá. Sua ausência de Goa foi justamente um desses
atos — mas estou feliz que Ele fez assim — ainda tenho muitas,
muitas coisas para aprender. —
Tivemos um dia lindo em 2 de maio. Foi o nosso dia de ação de
graças por todas as graças que a nossa pequena Congregação tem re­
cebido — em especial o Decreto de Louvor. — E agora somos uma
Congregação Pontifícia. — Veja o que Nosso Senhor faz. — Ele se
derrama a Si próprio sobre a pequena Congregação — mas tira cada
gota de consolação de minha alma. — Fico feliz que seja assim —
porque eu apenas quero que Jesus seja na Congregação mais e mais
e que eu seja menos e menos.
258 X ( nha , seja M i n h a luz

O Internúncio veio lá de Delhi só para isto — e falou muito


bem. — Resumiu a Congregação em três palavras — Dependên­
cia, Desprendimento, Dedicação. Reze para que possamos estar à
altura disto.44
Dado que o internúncio, o arcebispo James Robert Knox, era o
representante oficial do Papa, Madre Teresa aproveitou a ocasião da visita
para lhe revelar o seu estado de escuridão — o sustentáculo de sua união
com Jesus:

No Ceiláo,’ o senhor me disse que estava no lugar do nosso Santo pe..


— Eu amo o Santo padre. — Talvez seja por isso que me sinto melhor
por ter falado com o senhor. — E porque quero acreditar, aceito a es­
curidão da fé com maior alegria e confiança. Obrigada por me ensinar
isso. Reze por mim.45

Estando o arcebispo Knox no lugar do próprio Papa, os seus con­


selhos significavam mais para Madre Teresa do que os dos confessores ou
dos diretores espirituais.
Com o seu habitual senso de humor, a Madre chegava mesmo
a fazer jogos de palavras quando se referia aos seus sofrimentos. Nessa
mesma carta ao Internúncio, escrevia ainda: “O calor aqui é simplesmen­
te abrasador. — Uma grande consolação para mim — já que não posso
arder com o amor a Deus — pelo menos deixe-me arder com o calor de
Deus — e assim, desfruto do calor.”46
Foi também com o arcebispo Knox que compartilhou a alegria
que sentia pela abertura da primeira fundação fora da índia — na Vene­
zuela — um marco que assinalava um passo importantíssimo na vida da
nova congregação. Embora feliz com o fato de esse desejo tão aguardado
ter se realizado, concluía a sua carta com um pedido de apoio na oração:
“Reze por mim — por favor — preciso de Nosso Senhor”.47 Ao Bispo
Picachy escrevia uma nota em que fazia, novamente, uma ligeira referên-*

* País hoje chamado de Sri Lanka.


•S'anta T( rcsa <l( (.'alcula 259

cia à sua dor: “Estou tentando ser muito corajosa e alegre — apesar de
tudo o que há dentro de mim. Reze por mim muito e com frequência.”48

“f{eze por mim —


para que também eu seja corajosa”
Em suas cartas ao arcebispo Knox, Madre Teresa continuou sempre
informando-lhe do crescimento do jovem instituto, acrescentando, fre­
quentemente, uma ou outra linha com alusões ao seu sofrimento. “Estava
ansiosa por falar com o senhor no aeroporto — mas náo me saíam as
palavras — a pequena nota que me deu está comigo — leio-a com frequ­
ência — eu sei que o senhor reza.”49 Uma semana mais tarde, escreveu ao
arcebispo da recém-inaugurada casa da Venezuela, pedindo-lhe novamen­
te com insistência: “Reze por mim — para que também eu seja corajosa*
— terei muitas coisas para lhe contar quando regressar.”50
Madre Teresa compartilhava com o arcebispo a alegria de poder
ajudar as suas Irmãs a amar a Deus (enquanto afirmava que, ela própria,
náo podia fazer isso!), ao mesmo tempo que lhe relatava incidentes como­
ventes de sua vida com os pobres:

Lamento não ter podido estar no encontro no Mater Dei. Cerca de


sessenta Irmãs estavam no retiro — que tinham assim [a] oportuni­
dade de conversar com a Madre.** É tão consolador ajudar os outros
a amar a Deus — já que eu própria náo consigo. — Que profunda e
humilde gratidão devo a Deus — pois que tesouros que Ele me deu
nas minhas filhas. [...]
Há três dias recolhemos da rua duas pessoas sendo comidas vivas
por vermes. Tinham a agonia da Cruz no rosto. — Que terrível a
pobreza é, quando não se é amado. — Depois de os termos acomo­
dado confortavelmente — precisava ver a mudança. O velhinho me
pediu um cigarro e que consideração da parte de Deus — eu tinha

Madre Teresa referia-se à coragem das Irmãs de sua nova congregação cm Cocorotc, Venezuela.
** Madre Teresa frequentemente referia-se a si própria na terceira pessoa, náo apenas em cartas
para as Irmãs ou em instruções, mas, também, quando escrevia para outros.
260 Xenha , seja M i n h a luz

na bolsa dois maços de [os] melhores cigarros. Um homem rico me


deu naquela manhã na rua. Deus pensou nos desejos desse velhinho.
Por que lhe escrevo todas estas coisas bobas — quando o senhor
tem tantas outras coisas importantes com que se ocupar? — Porque
este é o primeiro artigo do credo dos nossos pobres.*’1

O “primeiro artigo do credo dos nossos pobres” era a evidência do


terno amor de Deus por cada um deles, manifestado nos menores deta­
lhes. A Madre o testemunhava diariamente e não conseguia deixar de se
maravilhar com isso.

“Jfão temos razões para estar tristes ”


A consciência que Madre Teresa tinha da Providência de Deus, quer no
seu ministério, quer na sua vida espiritual, a ajudava nos períodos de
maiores dificuldades. “Graças a Deus, não servimos a Deus com os senti­
mentos, do contrário náo sei onde estaria. — Reze por mim”,52 escreveu
ao Bispo Picachy. Mas resistia a cair na armadilha da autocomiseração.
Em cana ao pe. Neuner, mostrava essa mesma retidáo:

Caro Padre Neuner,


Fiquei muito satisfeita de receber a sua cana — e por ver que, ape­
sar das muitas coisas grandes que o senhor tem de fazer pela Igreja de
Deus — continua lembrando-se de mim. O senhor está triste por mim
— mas a verdade é que náo temos razões para estar tristes. Ele é o Se­
nhor. — Ele pode dispor de mim como só a ele pode agradar. — Eu
já náo conto. — E — contudo — dói tanto. — Hoje li uma coisa em
“Sofrer por Cristo" de D. Marmion: “Quando este fogo (o amor de
Deus) entra em contato com a imperfeição, produz sofrimento”. Deve
haver tanto “nada” em mim, e por isso este fogo provoca tanta dor. [...]
Reze por mim.53

Na sua humildade, Madre Teresa continuava a achar que ainda


precisava ser purificada de suas imperfeições. Na realidade, sua agoni-
■Santa -Teresa de Calcula 261

zante e interminável escuridão era reparadora, em vez de expiativa. Era


uma participação na missão de salvar almas; a Madre seguia o exemplo
de Jesus, seu Mestre, e de Sua Bendita Mãe, que sofreram imensamente,
não para serem purificados do pecado, mas para salvarem os pecadores.54
Na sua correspondência com o arcebispo Knox, mais do que des­
crever a escuridão, Madre Teresa exprime a sua determinação nessa luta
sem tréguas: “Reze por mim — para que beije com amor e alegria ‘a
mão’ que fere. — ”55 Ao mesmo tempo, estava agradecida pelo apoio do
arcebispo: “A sua carta foi de grande ajuda. Quem me dera que no meu
coração houvesse tanto calor como está aqui fora. Reze por mim.”56
Em carta ao Bispo Picachy, continuava aludindo à sua agonia inte­
rior: “Reze por mim — para que eu possa continuar dando com alegria”.57
Muitas vezes, limitava-se a pedir orações ou a reafirmar o seu “Sim” a
Deus: “Q uanto a mim tenho muito pouco, se é que tenho alguma coisa
a dizer. Quero fazer a Sua Santa Vontade — Isso é tudo. Ainda que mal
a compreenda”.58
Junto com a escuridão, também a doce recordação da origem do
seu chamado tinha lugar na sua correspondência confidencial. Ao arce­
bispo Knox, por exemplo, pedia orações no vigésimo aniversário da ins­
piração: “Por favor, reze por mim no dia 10 de set., o ‘Dia da Inspiração’
como chamam as Irmãs — vinte anos de Graça, de trabalhos e de amor.”59

“£<?/ que isto são apenas sentimentos”

Como andasse cada vez mais atarefada, o desejo que Madre Teresa tinha
de se encontrar com os seus diretores espirituais ficava muitas vezes sem
se realizar. “Desejaria poder vê-lo, nem que fosse umas horas — mas o
Senhor tem os Seus próprios planos e eu devo aceitar a Sua vontade —
como o senhor disse. Reze muito por mim.”60 Como se tornara habitual,
quando se encontrava com o arcebispo Knox, o Bispo Picachy ou o pe.
Ncuner, ficava sem palavras.
262 l e n h a , seja M i n h a luz

LDM
Trem para Mumbai, 24/7/67

Caro Padre,
Foi muito amável de sua parte ter vindo aqui e ter me dado tanto
do seu tempo — pois o senhor tem muito mais almas mais dignas
dos seus cuidados e do seu amor do que a minha, que é tão pequena
e tão vazia e tão fraca.
Perdoe-me ter pedido que viesse e depois não ter lhe dito nada.
— Isso mostra como minha alma está terrivelmente vazia — mas
não tenho medo. — Ele fez maravilhas por mim — Santo é o Seu
nome.61 — Reze por mim para que nesta escuridão eu não acenda a
minha própria luz — nem preencha este vazio com o meu próprio
ego. — Quero com toda a minha vontade apenas Jesus. —
Padre, queria dizer-lhe — como a minha alma anseia por Deus
— e apenas por Ele, como é doloroso estar sem Ele — como os meus
pensamentos são apenas sobre as Irmãs e os Pobres. — Serão distra­
ções [ou] serão estes pensamentos a causa da minha oração? — Eles
são minha oração — eles são minha própria vida. — Amo-os como
amo a Jesus — e agora, como não amo a Jesus — também não amo a
eles. Sei que isto são apenas sentimentos — porque a minha vontade
está firmemente unida a Jesus e por isso às Irmãs e aos Pobres.
Na sua instrução falou do “Pai”. — Eu poderia ter ficado ali senta­
da durante muito, muito tempo, só [ouvindo]. — Embora seja muito
pouco o que fica registrado dentro de mim — ainda assim, mesmo que
fosse só aquela vez. —
Estou muito feliz de que as Irmãs estejam em Poona — porque
terão muito apoio espiritual e também, toda vez que eu for lá talvez
tenha oportunidade de vê-lo. — “Motivação egoísta”. O trabalho em
Poona é bonito — e eu penso que é um grande bem — tanto para os
ricos como para os pobres.
Ficaria agradecida se me indicasse alguns livros bons. — Quando
olho para a nossa biblioteca — tenho dificuldade em escolher o livro
que preciso.
Padre, pode me explicar — quando tiver tempo — como crescer
na “profunda união pessoal do coração humano com o coração de
•Santa Teresa de Calcula 263

Cristo”? Desde a infância que o Coração de Jesus é meu primeiro


amor. — Cada sexta-feira é a festa do Sagrado Coração para mim.
Amo a Missa do S. C. [Sagrado Coração] — pois nas palavras do
ofertório ecoam as palavras de 10 de set. — “Fará isto por Mim?”
Estas MC sáo somente obra Dele. Eu só aceitei fazer isso por Ele.
— Tenho tentado seguir o plano Dele para a Obra — até a última
palavra. Cada fundação é toda vez outro 10 de set. pois é o fazer Dele.
É por isso que eu penso que nada do que se disser se registra na minha
alma* — por causa Dele. — Por favor lembre da “Obra Dele” em 10
de set. — Tenho a certeza de que Ele virá mais uma vez — antes da
minha morte — e eu ouvirei a Sua voz — As nossas Irmãs em Poona
têm um santo confessor. Não receio por elas. Farão um grande traba­
lho se forem guiadas adequadamente.
Parto para Amravati no dia 26 à noite e de lá para Bhopal, Jhansi,
Agra, Delhi, Ambala e volto para casa. — Reze por mim — para
que eu dê Jesus por onde quer que eu vá. — Se escrever, por favor,
escreva para Cal. [Calcutá], pois espero estar lá o mais tardar por
volta de 10 de ag. [...]
Por favor reze por mim.
Sua em Jesus,
M. Teresa, M O 2

Ao pedir desculpas, novamente, por não ter conseguido falar por


causa do “vazio” interior, Madre Teresa revelava, também, a sua percepção
de que Deus, devido às “maravilhas que Ele fez” por ela, estava, de alguma
forma, ativo em tudo isso. Tal como Maria no Magnificat,** também ela
louvava a Deus pelos Seus presentes. Não temia o vazio propriamente
dito, mas estava preocupada com a possibilidade de esse estado a levar a
voltar-se para dentro de si mesma e a preencher esse vazio com algo que
não fosse Deus.

* O que quer que seja dito em louvor a ela ou ao trabalho.


** Hino de louvor entoado por Maria, quando ela visita sua parente, Isabel (Lucas IAC-55).
264 X c n h a , seja A l i n h a l a :

A sua sede por Jesus a impelia a procurar ajuda a fim de crescer


em uma “profunda uniáo pessoal do coraçáo humano com o coração de
Cristo”.63 Seu pedido para aprender mais acerca dessa “união” assume
mais importância à luz da sua afirmação de que, “desde a infância que o
Coração de Jesus tem sido o meu primeiro amor”.64 Jesus foi o primeiro
amor de Madre Teresa e o seu único amor, em uma relação que foi se
tornando mais intensa em cada período de sua vida. Seu coração seria
atraído com singular intensidade para o coração de Cristo até o dia de
sua morte.* Uma das melhores descrições de Madre Teresa a apresenta
como uma mulher “totalmente, apaixonadamente, loucamente enamo­
rada de Jesus”.

“j\linca tive dúvida "


"Fará isto por M im ? ” foram as palavras que Jesus lhe dirigiu no trem
para Darjeeling, em 10 de setembro de 1946. Nesse encontro com Cris­
to, Madre Teresa recebeu o chamado e o carisma das Missionárias da
Caridade. A certeza de que provinham diretamente de Jesus e de que o
seu trabalho “era apenas a obra Dele” permitiu-lhe suportar os anos de es­
curidão. Mesmo quando sentia ter perdido a sua fé em Deus, não poderia
questionar a autenticidade dessa experiência.
Um jornalista querendo, persistentemente, saber mais sobre a ex­
traordinária experiência de “uma pessoa com quem Deus tinha falado
pessoalmente” perguntou: “A senhora não teve dúvida, por um segundo
que fosse? Afinal, o próprio Cristo teve momentos de dúvida. Por exem­
plo, no Getsêmani.”65 Madre TeresaTespondeu convictamente:

Não. Não houve dúvidas. Foi só por um momento que Ele sentiu
incerteza. Isso foi como ser humano. Era natural. No momento em
que você aceita, no momento em que se abandona, isso é a convic-

* Madre Teresa morreu na primeira sexta-feira do mês de setembro, um dia, tradicionalmente,


dedicado ao Sagrado Coraçáo de Jesus.
•Santa Teresa de Calcula 265

çáo. Mas pode significar a morte para você, náo é? A convicção surge
no momento em que a pessoa se abandona. Então não há dúvida. No
momento em que Jesus disse: “Pai, estou àTua disposição, seja feita a
Tua vontade”, Ele tinha aceitado. Essa foi a Sua agonia. Ele sentia to­
das as coisas que o senhor e eu sentiríamos como seres humanos. Foi
por isso que Ele foi como nós em todas as coisas, exceto no pecado.
[Quando a incerteza se mantém] esse é o momento de se ajoelhar,
não é? [...] Nessa oração, Deus não pode nos enganar, porque essa
oração vem de dentro de nós. E o momento em que O queremos mais.
Quando temos Deus dentro de nós, é para sempre. Não há dúvidas.
Podemos ter outras dúvidas, náo é? Mas essa dúvida em particular
nunca mais existirá. Não, nunca tive dúvida. [...] Mas estou conven­
cida de que é Ele e não eu. De que é a obra Dele, e não a minha obra.
Eu apenas estou à Sua disposição. Sem Ele nada posso fazer. Mas nem
sequer Deus pode fazer coisa alguma por alguém que já está repleto.
Temos que estar completamente vazios para deixá-Lo entrar para fa­
zer o que Ele quiser. Essa é a parte mais bela de Deus, não é? Sendo
todo-poderoso, mas náo Se impondo a ninguém.66

“Seja esse ‘alguém ’ que irá saciar a Sua sede”


“O insulto despedaçou-me o coração e tornou-o incurável; esperei com­
paixão, mas em vão, alguém que me consolasse, mas não encontrei”, reza
o versículo do Ofertório (Salmo 68:21)* usado na Missa da Festa do Sa­
grado Coração e nas Missas votivas do Sagrado Coração fora da Páscoa.
Esse versículo trazia à memória de Madre Teresa o encontro crucial com
Jesus no trem, e era um permanente desafio para ela: “ser esse ‘alguém’”.
Anos mais tarde, em um santinho do Ecce homo** que, com as seguintes
palavras impressas: “procurei alguém que me consolasse, mas não encon­
trei”, escreveria a Madre: “Seja esse alguém”. Ela amava olhar essa ima-

* Tradução da Bíblia de Douay-Rheims Bible, usada na Missa, naquele tempo. Na Versão


revisada c em outras traduções, o versículo é Salmo 69:20.
** Imagem dc Jesus após as chicotadas c a coroação com os espinhos. Vide João 19.5.
266 I'vnha. seja M i n h a luz

gem, que lhe recordava o seu chamado e dar cópias dela mesma aos seus
seguidores, como incentivo para prosseguirem.
E costumava encorajar as Irmãs com palavras como as seguintes:

Diga a Jesus: “Eu serei esse ‘alguém’”. Irei reconfortá-Lo, encorajá-


Lo e amá-Lo. [...] Fique com Jesus. Ele rezou e rezou, e depois
foi procurar consolo, mas não encontrou nenhum. [...] Eu escrevo
sempre esta frase: ‘Procurei alguém que Me consolasse, mas não
encontrei ninguém.
E depois escrevo: “Seja esse alguém”. Portanto, agora, seja esse
alguém. Tente ser esse alguém que compartilha com Ele, que O
conforta, que O consola. Por isso, peçamos a Nossa Senhora que
nos ajude a compreender.6’

Uma das irmãs lembra outro conselho similar:

Seja esse alguém. [...] seja esse alguém que saciará a Sede. Em vez
de dizer “Tenho sede” diga “seja esse alguém" [...] faça tudo o que
você acreditar que Deus está lhe pedindo para fazer para você ser esse
alguém que O sacie.

Uma vez que todas as fundações eram para Madre Teresa um novo
10 de setembro, a pergunta "Fará isto por Mim?" continuava ressoan­
do em seu coração. Como podia ela recusar? A lembrança das palavras
de Jesus dava-lhe forças para superar-se a si mesma, e para O consolar,
esforçando-se por acender o fogo do amor de Deus no coração de cada
pessoa, apesar da terrível escuridão que tinha dentro de si. Ansiava pelo
regresso de Jesus e queria que Ele a encontrasse sendo “esse alguém”, que
O reconfortava nos Seus irmãos e nas Suas irmãs mais pobres, já que era
na vida deles que ela via a Sua Paixão ser revivida, como explicava à sua
amiga Eileen:

Obrigada por sua carta de 25/8 que chegou — A sua carta é tão boni­
ta. — Sim, bastaria que voltássemos ao espírito de Cristo — bastaria
que vivêssemos a vida eucarística, bastaria que percebêssemos o que
•Santa Teresa de Calc ula 267

é o Corpo de Cristo — não haveria tanto sofrimento — tanto do


que temos hoje. — A Paixão de Cristo está sendo revivida mais uma
vez em toda a sua realidade — Devemos rezar muito pela Igreja — a
Igreja no Mundo — e o mundo na Igreja. — Aqui na índia continu­
amos lutando contra a fome e então vêm os dias difíceis de escassez
de alimentos e então as inundações tomam conta de tantos lugares —
há tanto sofrimento — tantos mal-entendidos — que trazem tanto
ódio e tudo quanto o ódio pode trazer e dar. — Graças a Deus que o
nosso Santo pe. fez deste ano — um ano de fé — na verdade nunca
precisamos de tanta fé como agora.
Se tudo correr bem, parto para a África em 17 de set. mas — do
jeito que as coisas estão por aqui me pergunto se poderei ficar fora de
casa neste momento. Você não deve chorar por Jim — ele está com
Deus. — Estamos aqui para ir para lá — para casa junto de Deus — e
lá não há infelicidade, mas apenas Shanti — uma verdadeira “Shanti
NagarV Por isso por que você ficaria triste — se Shanti é agora a
companheira dele? [...]
Graças a Deus estamos nas mãos de Deus. Ele tomará conta de
nós — na verdade nós agora temos que confiar cegamente Nele.68

ti(Um anseio profundo por t>eus e pela morte”


Confiando que a Providência de Deus poderia tirar coisas boas de que qual­
quer circunstância. Madre Teresa reconhecia, em cada sofrimento, uma
oportunidade de progresso espiritual. Eis o que escrevia a uns amigos:

[O] sobrinho de vocês tal como tantos outros nestes tempos duros e
tristes de luta pela fé — está passando por sua purificação — se ele
apoiar-se no Cristo vivo — na Eucaristia. Sairá da escuridão em que
se encontra radiante com uma nova luz — Cristo. [...]
Agora devem rezar muito — porque a nossa pequena Congrega­
ção continua crescendo — e nós mais e mais devemos ser Sua Luz
— Seu caminho — Sua vida — Seu Amor nas favelas.69

‘Shanti" significa paz c “nagar" significa cidade. Cidade da Paz.


268 \( t i h ( i . seja M i n h a luz

Agradecia as oportunidades que tinha de conversar com o pe. Neu-


ner, embora náo tivesse nada de novo a comunicar, exceto a cada vez mais
forte determinação de seguir em frente, custasse o que custasse.

Fiquei grata a Deus por ter me dado a oportunidade de falar com o


senhor — porque me sinto realmente muito melhor. — Sei que Ele
nunca quebrará a Sua promessa se eu cumprir a palavra que Lhe dei.
Quero amá-Lo como Ele nunca foi amado antes — com um amor
terno, pessoal e íntimo. Reze por mim.70

Enquanto o amor de Madre Teresa a Deus se tornava cada vez


mais ardente, mais aguda se tornava a dor de se encontrar separada Dele.
Nessa tensão constante, sentia necessidade de Deus e de apoio humano.
Ela própria recordava ao Bispo Picachy:

É tão estranho o senhor não escrever pelo Natal — bem como não
responder às cartas. — Talvez náo estivesse em Jamshedpur quando
as minhas cartas chegaram. [...] Espero mesmo que venha a Calcutá
e então poderei ter uma boa conversa. Tenho um anseio tão pro­
fundo por Deus e pela morte. [...] Reze por mim para que eu use a
alegria do Senhor como minha força. — 71

Um anseio profundo por Deus e um anseio profundo pela morte


eram dois lados da mesma moeda. Para ela, a morte era “ir para casa
junto de Deus”. E, em um momento em que o desejo Dele era quase
insuportável, e que náo se via a luz no final do túnel, ela ansiava pela
eternidade, náo para pôr fim a seus sofrimentos, mas para voltar final-
mente a unir-se a Ele.

“<Sejam felizes, pois


compartilhamos a Paixão cie Cristo
Haviam se passado mais de vinte anos desde que Madre Teresa dera
início a sua missão entre os pobres. Agora, falava muito pouco sobre a
•Santa Teresa de ( alenta 269

sua própria escuridão interior, mas não perdia nenhuma oportunidade


de relacionar a realidade do sofrimento humano com que se confron­
tava aos sofrimentos de Jesus. O seu coração era “uno” com o Dele.
As chagas de Jesus estavam de tal maneira impressas em sua alma, que
tinham se tornado as dela. Sofria imensamente ao ver os sofrimentos
daqueles que amava, mas continuava salientando o valor e o sentido do
sofrimento hum ano como forma de compartilhar a Paixão de Jesus. Em
agosto de 1969, escreveu:

Mantenham a luz da fé sempre acesa — pois só Jesus é o caminho que


conduz ao Pai. Só Ele é a vida que habita no nosso coração. Só Ele é
a luz 2 que ilumina a escuridão.73 Não tenham medo. — Cristo não
nos enganará. [...]
Não se preocupem comigo. — Minha cabeça* não me incomoda
nada. — Só me sinto um pouco cansada de manhã — mas isso não é
nada se vocês vissem o que sofrem os nossos pobres sem alívio.
[...] Tenho o coração cheio de dor porque todos vocês, tão queri­
dos para mim e para o Coração de Jesus, têm que sofrer tanto, mas
sejam felizes, pois compartilhamos a Paixão de Cristo e assim através
da nossa participação damos ao mundo mais uma prova de que Cris­
to é o mesmo ontem — hoje — amanhã74 na Sua Igreja.73

As palavras de Jesus no Evangelho de São Mateus — “o que f i ­


zestes ao mais pequenino [...] a M im o fizestes" — eram a rocha so­
bre a qual assentavam as suas convicções. Ciente de que Jesus não podia
enganá-la, agarrava-se às Suas palavras: a Sua presença entre os pobres
continuava sendo um farol na sua noite. Madre Teresa escreveu à sua
amiga Eileen:

Escreve tão pouco sobre si mesma — e no entanto o seu coração deve


estar cheio. — Mas sabe — tão bem como eu — que Cristo não
pode nos enganar. — Por isso tudo o que fizermos ao menor — é

* Muito provavelmente, uma referência às suas crônicas dores de cabeça.


270 X'cnha, seja M i n h a luz

a Ele que fazemos.76 Que a alegria do Senhor seja a sua força.77__


Porque só Ele é o caminho78 que vale a pena seguir, a luz7'* que vale
a pena acender, — a vida que vale a pena viver80 — e o am or81 que
vale a pena amar. Tenho muita vontade de ver você — parecc-me que
há anos desde a última vez que a vi.
[...] Se nos sentimos assim — me pergunto o que Jesus deve ter
sentido durante a Sua agonia, quando passou por todas aquelas cha­
gas ocultas...
[...] Se imaginasse como anseio por acender o fogo do amor e da paz
pelo mundo. — Reze por mim — para que Ele me use plenamente.82

8la hcivia encontrado o seu caminho


Uma carta que Madre Teresa escreveu ao pe. Neuner em novembro de
1969 lhe dava conhecimento de que não havia grandes novidades em
sua alma:

Muito obrigada por sua amabilidade de lembrar-se de mim. — A sua


cana com as palavras de S. João era muito bonita. — E ficará com
ceneza surpreendido em saber que as obras de S. João da Cruz me pa­
recem ser livros que sou capaz de compreender um pouco e de apreciar
algumas vezes. — O escritos dele me fazem ter fome de Deus e então
me confronto com a terrível sensação de ser “indesejada” por Ele.83

Como não havia mais nada para compartilhar sobre seu estado in­
terior, Madre Teresa podia prosseguir sem o apoio dos diretores espirituais.
Durante esse período, a correspondência com o pe. Neuner foi praticamen­
te suspensa. Quando lhe escrevia, a Madre dava-lhe notícias da congrega­
ção, mas raramente havia uma linha sobre si mesma. O próprio pe. Neuner
percebeu o que se passava, como recordou posteriormente:

Acompanhei Madre Teresa durante muitos anos à distância, encon-

* Em maio de 1969, o bispo Picachy foi designado arcebispo de Calcutá.


■Sanla Teresa de Calculo 271

trando-me ocasionalmente com ela em Calcutá. Em suas cartas, era


freqüente referir-se à escuridão interior, que se mantinha. Mas eu
senti que ela tinha encontrado o seu caminho e já não precisava mais
do meu apoio. Por esse motivo, a correspondência terminou — mas
eu guardei as cartas porque elas refletiam um pouco da sua vida inte­
rior durante aqueles anos.84

Também ao bispo Picachy, que por essa época era arcebispo de


Calcutá,* Madre Teresa deixou de se referir a sua escuridão; as cartas,
então, passaram a tratar, principalmente, de questões práticas. Porém,
numa carta escrita em 21 de dezembro de 1969, Madre Teresa recorda ao
prelado uma data importante na vida dela: “No dia de hoje no ano 1948
— fui pela primeira vez às favelas — meu primeiro encontro com Cristo
no Seu disfarce angustiante. Reze por mim.”85
Que diferença entre aquele primeiro dia — quando trabalhava
como freira sozinha nas favelas — e o momento em que escreveu essa
carta — quando contava com uma florescente comunidade religiosa com
dois ramos. No começo, tinha apenas a promessa de Deus para se segurar;
vinte e um anos mais tarde, tinha quase trezentas irmãs em trinta e três
comunidades espalhadas por todo o mundo. Ela sabia que se tratava da
obra de Deus. Embora Cristo parecesse tê-la rejeitado e esquecido, ela
continuava servindo a Ele, fiel e amorosamente, no disfarce angustiante
dos mais pobres dos pobres. E era através dos sofrimentos dela que Ele
lhes levava a luz do Seu amor.
capítulo 12

i “E)eiis usa o que é nada


para mostrar
a Sua grandeza ”

U m in s t r u m e n t o n a s Su as m ãos

Eu me maravilho com a Sua imensa humildade e a


minha pequenez — o meu nada. — Acredito que é
aqui que Jesus e eu nos encontramos. — Ele é tudo
para mim — e eu — a Sua pequenina — tão inca­
paz — tão vazia — tão pequena.
M adre T eresa

Em 1975, as Missionárias da Caridade, que já eram mais de mil Irmãs,


em 85 casas presentes em 15 países, celebravam as bodas de prata da
Congregação. Os anos seguintes seriam marcados por sua rápida ex­
pansão em todo o m undo e pela atenção crescente da mídia em Madre
Teresa e na obra que ela tinha iniciado na obscuridade das favelas de
Calcutá. Em bora a Madre não fizesse referência a esse estado há seis anos,
a escuridão continuava sendo uma presença constante em sua alma.
Foi nessa época que Madre Teresa conheceu o pe. Michael van der
Peet\ que era membro dos Sacerdotes do Sagrado Coração. Em outubro *

* Nasceu em Alkmaar, Holanda, em 1924. Em 1953, foi ordenado na Congregação de Sacer­


dotes do Sagrado Coração de Jesus (SCJ). De 1955 até 1970, lecionou cm seminários de sua
comunidade nos Estados Unidos. De 1970 a 1986, trabalhou, integral mente, no ministério
de retiros.
274 Xrn ha, s(j(i M in h a luz

de 1975, quando atravessava lima rua em Roma, ele viu Madre Teresa em
um ponto de ônibus, em companhia de outra Irmã. “O meu primeiro
impulso foi de ir até ela, mas depois eu disse a mim mesmo: ‘Deixe a
mulher em paz. Todo mundo está sempre olhando para ela.’ Por isso,
segui em frente, com o coraçáo batendo com toda a força. Mas de
repente pensei: ‘Ela é uma santa e eu sou um pecador. Deixe o pecador ir
ao encontro da santa e pedir-lhe que reze por ele’.” Por isso, voltou para
trás. Após um rápido cumprimento, Madre Teresa pediu-lhe — como
era de seu costume — que fosse dar uma conferência sobre oração às suas
noviças dentro de dois dias. Depois da conferência no convento situado
nos subúrbios de Roma, o pe. van der Peet aceitou o convite que Madre
Teresa lhe fez para pregar um retiro à comunidade em novembro.

“jÇembre o meu rosto diante deJesus"


A primeira cana de Madre Teresa ao pe. van der Peet foi, na realidade,
uma nota, que escreveu durante esse retiro, onde professava o seu vazio e
a sua pequenez, e questionava a utilidade de procurar ajuda espiritual em
tal estado. Pedindo-lhe que rezasse por ela, fazia também alusão ao voto
privado que a sustentara durante aquela luta agonizante.

Caro Padre Michael,


Deus o ame por todo o amor que deu a cada uma de nós. —
Mantenha a alegria de dar apenas Jesus a todos os que entrarem
em contato com o senhor. —
Ficaria agradecida se pudesse recorrer ao senhor para alguma aju­
da espiritual, mas sou absolutamente pequena e vazia. — Só Jesus
pode abaixar-Se tanto para enamorar-se de alguém como eu.
Reze por mim para que “Não” não passe pelo meu
coração nem pelos meus lábios — quando Jesus pedir.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M O
•Santa T< r( sa <l< Calcutá 275

As impressões com que o pe. van der Peet ficou desse e de subse­
quentes encontros com Madre Teresa não deixam qualquer dúvida quan­
to à santidade e à união com Deus que dela irradiava.

Sempre que me encontrava com a Madre, toda preocupação comigo


mesmo me deixava. Sentia-me imediatamente à vontade: ela irradia­
va paz e alegria, mesmo quando compartilhava comigo a escuridão
da sua vida espiritual. Fiquei muitas vezes espantado com o fato de
uma pessoa que vivia tão perto do sofrimento e passava, ela própria,
por uma noite escura, ainda conseguir sorrir e fazer com que você se
sentisse feliz. [...] Creio que posso afirmar que me sentia na presença
de Deus, na presença da verdade e do amor.
Só conseguia pensar: Aqui está uma pessoa que Deus idealizou no
Paraíso, um verdadeiro toque de Deus. No entanto, devo dizer que,
ao mesmo tempo, ela era uma das pessoas mais com os pés no chão
que já conheci.

Esse espírito prático vinha à tona, em especial, na maneira como a


Madre dirigia sua congregação e conseguia ter controle do grande núme­
ro de solicitações que muitas pessoas, de dentro e de fora de sua família
religiosa faziam, que demandavam o seu tempo. Porém, apesar das nume­
rosas atividades, das freqüentes viagens destinadas a visitar um número
crescente de Casas, das crescentes necessidades dos pobres com que se
confrontava diariamente, e da persistente escuridão interior que a inco­
modava, sua fidelidade à oração era categórica:

Caro Padre Michael,


A sua carta de Natal e esta de 26/2 [26 de fevereiro] trouxeram-me
uma grande alegria — pelo presente que o senhor continua me dan­
do — rezando por mim. Eu penso que faço o mesmo pelo senhor.
Desculpe-me o atraso, mas não consegui responder mais cedo. —
Passei todo o mês de jan. viajando pelo Sul [da índia]. — Todo o mês
de fev. em Calcutá e nos arredores e agora vou novamente para o Sul
por mais 2 semanas para concluir as casas que faltam.
Faço minha hora santa com Jesus logo após a Missa — para poder
ter as 2 horas com Jesus antes de as pessoas e das Irmãs começarem a
me usar. — Deixo que Ele me use primeiro. —
276 \'r nha . seja M i n h a luz

O senhor escreve tão bonito sobre o nada, nós — e o tudo — Deus.


— E pensar que um e outro se encontram tão distantes — contudo, a
humildade de Deus fez com que fossem um só — Jesus. [...]
Mantenha a alegria de amar só a Jesus — pelo senhor c por mim.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M O

A fidelidade incondicional de Madre Teresa à oração era uma vir­


tude que as suas irmãs de Loreto já tinham observado nela e que impres­
sionou, também, às suas primeiras seguidoras. Essa sua virtude continuou
impressionando gerações de Missionárias da Caridade e, nos últimos anos,
os inúmeros visitantes que iam à capela da Casa-Mãe. “As pessoas ficavam
fascinadas em ver a Madre rezar. Ficavam sentados lá e vendo-a, eram
atraídos para aquele mistério”, observa uma de suas seguidoras. Ouvi-la
rezar em voz alta e clara, ou ver o seu olhar penetrante fixo no sacrário,
deixava uma impressão de grande intimidade com Deus. Mal sabiam as
pessoas que ela não gozava dos frutos dessa intimidade havia décadas.
Na realidade, um dos grandes desafios da escuridão era essa ausên­
cia de uma viva sensação da presença de Deus na oração, algo pelo qual
Madre Teresa continuava ansiando. Em setembro de 1959, a pedido do
pe. Picachy, havia escrito a Jesus:

Não rezo mais — pronuncio palavras das oraçóes da comunidade —


e tento tudo o que posso para obter de cada palavra a doçura que ela
tem para dar. — Mas a minha oração de união não está mais lá. — Já
não rezo mais — A minha alma não é “uma” Contigo.3

Nesse momento, a oração da Madre, que ela afirmava ser “mise­


ravelmente seca e gelada”,4 provou ser eficaz e obteve muitas graças para
outros. Uma carta revela uma de suas formas de rezar durante os anos de
impenetrável escuridão: “frequentemente durante a Adoração — rostos
de pessoas que conheci passam diante de mim e eu lembro a Jesus delas.
— Faça isto por mim como eu faço pelo senhor — lembre o meu rosto
diante de Jesus.”5
•Santa 'Teresa de ( alenta 277

“Trio indefesa —tão vazia —tão pequena”


As cartas de Madre Teresa ao pe. van der Peet não mostravam detalhes da
sua provação interior, como os escritos aos seus diretores espirituais anterio­
res tinham feito. Havia, contudo, breves alusões aos fatos, em cartas mais
centradas no trabalho da sua comunidade; alusões reveladoras, como ele
recordaria mais tarde:

[As cartas da Madre] refletem muitas coisas belas, mas ela também
mencionava esse vazio, essa escuridão. Não era em todas as cartas,
mas era definitivamente um tema que ocorria.6

0 mistério da grandeza de Deus e da sua pequenez tinha-se tornado


um tema recorrente quando falava e escrevia. A sua pequenez — um ele­
mento essencial da forma com que se relacionava com Deus e com os outros
— dera formato à sua maneira de rezar e de agir, à sua própria vida. Chegava
mesmo a acolher a crescente publicidade como vinda das Suas mãos, uma vez
que, na sua pequenez, não fazia quaisquer exigências, nem desejava colocar
quaisquer obstáculos à Sua ação.

Caro Padre Michael,


Obrigada pela sua carta de 23/5. Foi uma grande amabi-
1 idade sua ter escrito. Quero escrever — mas nada tenho a
dizer, a não ser que me maravilho com a Sua imensa humildade e
a minha pequenez — o meu nada. —Acredito que é aqui que Jesus
e eu nos encontramos. — Ele é tudo para mim — e eu — a Sua
pequenina — tão indefesa — tão vazia — tão pequena. Sou tão pe­
quena que todas essas coisas que as pessoas continuamente derramam
sobre mim e à minha volta — não conseguem entrar em mim. Talvez
seja devido à escuridão que eu não as vejo.— Talvez simplesmente Ele
quer que seja assim. Deixo-O fazer do Seu jeito. — Sorrio ao ver que
a caixa de papelão* vai se enchendo de todo o tipo de coisas — de
coisas grandes a maior parte das quais não compreendo. Mas sei que

* Essa “caixa dc papelão” era a caixa onde ela guardava seus prêmios, graus honorários e outras
honrarias. Os prêmios serviram o propósito de proclamar a presença dos pobres e ela estava
convencida de que eles pertenciam aos pobres.
278 Xcnlui, seja M i n h a luz

estou sendo usada — apenas — para e por eles, para que proclamem
a existência dos pobres — e a preocupação das pessoas pelos pobres,
de maneira que tudo aceito com um sorriso em nome deles. —
Parto para Roma no dia 3 e terei oportunidade de fazer o meu re­
tiro com as Nov. [Noviças] — e tenho profissão no dia 14. — Regres­
so a N. Y. [Nova York] no dia 17 para poder participar no tríduo* de
preparação para a Festa do Sagrado Coração, quando esperamos dar
início a um novo ramo “As Irmãs da Palavra”.** Reze muito por isto.
Seria ótimo se o senhor pudesse conseguir estar presente. [...] Estou
ansiosa para regressar à índia — mas sei que é aqui que Ele quer que
eu esteja agora — e por isso aceito com um grande sorriso.
Queria escrever uma carta verdadeiramente espiritual — mas mais
do que isto não me vem. —
Rezo pelo senhor para que deixe Jesus usá-lo sem o consultar. Faça
o mesmo por mim —

Sua em Jesus,
M. Teresa, M C

Madre Teresa tinha chegado a um ponto de sua vida em que já


não se aventurava a adentrar nem questionar o mistério de sua persistente
escuridão. Aceitava-o, como aceitava tudo o mais que Deus desejasse ou
pelo menos permitisse, “com um grande sorriso”. Embora a dor fosse fi­
cando mais profunda com o passar dos anos, tinha se tornado amiga dela
e tinha mesmo chegado a amá-la.8
Aspirando a estar inteiramente à disposição de Deus, maravilha-
va-se com a humildade com que Ele usava o “nada” dela. O seu lugar de
encontro com Deus era a sua própria pobreza. Estava convencida de que

* Três dias dc oração.


** O ramo contemplativo das Irmãs Missionárias da Caridade. No ano seguinte, o nome foi
mudado para Irmãs Contemplativas Missionárias da Caridade.
•Santa ‘Teresa de Calcutá 279

Ele usava essa pobreza para chegar aos outros:


O Seu jeito é táo bonito — em pensar que temos a Deus Onipotente
se inclinando tão baixo para amar a você e a mim e fazer uso de nós
— e nos faz sentir que Ele realmente precisa de nós. — À medida que
vou envelhecendo a minha admiração de Sua humildade vai aumen­
tando mais e mais e O amo não por aquilo que Ele dá — mas por
aquilo que Ele c — [o] Pão da Vida — o Faminto.9

“Q uero que £le nem sequer Se preocupe


com a escuridão que O rodeia em mim”
Madre Teresa tinha se tornado tão vazia de si mesma que, nas cartas que
escrevia, estava constantemente desviando, de forma espontânea, o foco
de atenção, de si própria para Jesus, para a obra Dele entre os pobres, ou
para a comunidade dela. Essa atitude era evidente, não apenas em sua
correspondência, mas também em suas conversas. E as Irmãs foram as
primeiras a perceber isto:

Ela fazia tudo como dizia: “Devemos mantê-Lo continuamente nos


nossos corações e nas nossas mentes.” Acho que, para onde quer que
fosse e o que quer que fizesse, fazia [tudo], muito conscientemente,
talvez não de forma muito ostensiva, mas muito conscientemente, para
se tornar uma ponte entre as pessoas e Deus e para lhes levar a sal­
vação de Deus e para levá-las a Deus. Então, mesmo nas pequenas
coisas que fazia, ela queria falar de [Jesus]; e as pessoas comentavam:
“Daqui a dois minutos, já está falando de Jesus.” Era esse, diria eu, o
constante fio orientador da sua vida.

Estar absorvida em Jesus requer esquecer-se de si, como explicava


às Irmãs:

Só quando percebemos o nosso nada, o nosso vazio, é que Deus pode


nos encher com Ele mesmo. Quando nos tornamos cheias de Deus
então podemos dar Deus aos outros, porque da plenitude do coração
fala a boca.10
280 Xenha. seja M i n h a luz

A correspondência de Madre Teresa com o Pe. van der Peet refletia o


grande desejo do seu coração: amar a Jesus mais pro fundamente, apesar da po­
breza e da pequenez que sentia.

Caro Padre Michael,


Espero que tudo esteja bem com o senhor e que o seu amor a Jesus
continue crescendo e dando muitos frutos. [...]
O senhor precisa rezar muito por isto para que a Congregação
esteja totalmente à disposição da Igreja. Mando, em anexo, a oração a
Jesus que escrevi para as nossas Irmãs. — Elas estão tentando colocar
uma música nela. — Talvez o senhor pudesse ajudá-las quando for
lá em agosto.
Meu amor por Jesus continua crescendo de forma mais simples e
mais, creio eu, pessoal — Como nossos Pobres, tento aceitar minha
pobreza de ser pequena, indefesa, incapaz de um grande amor. Mas
quero amar Jesus com o amor de Maria, e ao Pai com o amor de Jesus.
— Sei que o senhor está rezando por mim. — Quero que Ele esteja
à vontade comigo — que não se preocupe com os meus sentimentos
— desde que Ele se sinta bem — que nem sequer se preocupe com
a escuridão que O rodeia em mim — mas que apesar de tudo Jesus
seja tudo para mim e que eu não ame ninguém senão a Jesus. — Reze
no dia 25.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M C '

No final da década de 1970, os pensamentos angustiantes que ti­


nham desconcertado Madre Teresa no início da década de 1950 e a tinham
atormentado durante a década de 1960, haviam dado lugar à serenidade
e à paz. Em sua relação com Jesus, ela queria que Ele estivesse à vontade
com ela, sem se preocupar sequer com os seus sentimentos. Embora a do­
lorosa escuridão persistisse, uma profunda alegria permeava suas palavras
e obras. Ela conseguia comunicar aos outros a sua compreensão das coisas,
encorajando-os a se renderem por completo, como se percebe nesta carta
que escrevera a um sacerdote quase dois anos antes:
Santa Teresa de Calcula 281

Caro Colaborador em Cristo,


O senhor tinha dito “Sim” a Jesus — e Ele acreditou na sua pala­
vra. — A Palavra de Deus tornou-se Homem'2 — Pobre. — A pala­
vra do senhor a Deus — tornou-se Jesus — Pobre — e daí o terrível
vazio que experiencia. Deus náo pode encher o que está cheio. — Ele
apenas pode encher o vazio — uma pobreza profunda — e o seu
“Sim” é o começo de ser ou de se tornar vazio. Náo é quanto real-
mente nós “temos” para dar — mas quão vazios nós estamos — a fim
de podermos recebê-Lo por inteiro em nossa vida e de O deixarmos
viver a vida Dele em nós.
No senhor hoje — Ele quer reviver Sua completa submissão ao
Pai — permita-Lhe fazer isso. Pouco importa o que o senhor sente —
desde que Ele se sinta bem no senhor. Tire os seus olhos de si mesmo
e alegre-se por não ter nada — por não ser nada — por não poder
fazer nada. Dê a Jesus um grande sorriso — cada vez que o seu nada
o assustar.
Esta é a pobreza de Jesus. O senhor e eu devemos permitir-Lhe
viver em nós e através de nós no mundo.
Agarre-se a Nossa Senhora — pois ela também — antes de poder
se tornar cheia de graça — cheia de Jesus — teve que passar por essa
escuridão. “Como pode ser isso?” — Mas no momento em que disse
“Sim”, teve necessidade de ir apressadamente dar Jesus a João e à
família dele.13
Continue dando Jesus ao seu povo não pelas palavras mas pelo seu
exemplo — por estar enamorado de Jesus — por irradiar a santidade
Dele e espalhar Sua fragrância de amor onde quer que o senhor vá.
Apenas mantenha a alegria de Jesus como sua força. — Seja fe­
liz e esteja em paz. — Aceite tudo aquilo que Ele der — e dê tudo
aquilo que Ele tirar com um grande sorriso. — O senhor pertence a
Ele — diga-Lhe sou Teu e se me cortares em pedaços, cada um desses
pedaços será somente e todo Teu.
Deixe que Jesus seja a vítima e o sacerdote no senhor.
Comecei a minha ronda pelas nossas casas da índia — então passo
horas maravilhosas sozinha com Jesus no trem.
Reze por mim como eu rezo pelo senhor.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M C 4
282 Xcnha, s (ja M i n h a luz

Essas palavras nos permitem ter um vislumbre da forma como


Madre Teresa viveu esses longos anos de escuridão: o abandono incondi­
cional a esse doloroso esvaziamento de si mesma, o esforço de permitir
que Deus vivesse a Sua vida nela, o esquecimento de si mesma na difusão
do amor Dele aos outros.

“Mantenha a luz, Jesus, acesa ”


“Reze por mim — para que eu continue segurando a mão Dele e percorra
todo o caminho só com Ele”,15 escrevia Madre Teresa ao Cardeal Picachy
em junho de 1976. Quase cinqüenta anos depois, as palavras com as
quais sua mãe se despedira dela continuavam a instigar a Madre a uma
fidelidade amorosa a Jesus. Através da espessa escuridão, tinha mantido a
mão de Jesus bem apertada na sua e caminhava sozinha com Ele, resistin­
do à tentação de acender a sua própria luz. Recusando-se corajosamente
a ceder aos sentimentos, seguia o caminho que Deus havia traçado para
ela, encorajando os outros a fazer o mesmo:

Mantenha a luz, Jesus, acesa em você com o óleo de sua vida. As


dores que você tem nas costas — a pobreza que sente são gotas de
óleo que mantêm a luz, Jesus, acesa e afastam a escuridão do peca­
do — onde quer que você vá. Não faça nada que leve a aumentar
a dor — mas aceite com um grande sorriso o pouco que Ele lhe dá
com grande amor.'6

Sua longa experiência de escuridão, a sensação de rejeição, a so­


lidão, o terrível e insatisfeito anseio por Deus, cada sacrifício e cada
dor tinha se tornado para ela mais uma “gota de óleo” que oferecia
prontamente a Deus para manter a lamparina — a vida de Jesus dentro
dela — acesa, irradiando o amor Dele para os outros e afastando, assim,
a escuridão.
■Santa Teresa de Calcutá 283

"Sua terna preocupação comigo e meu nada”


Como a correspondência se mantivesse, o pe. van der Peet alegrava-se
muito com o privilégio dessa troca de cartas com Madre Teresa. “Foi
um presente de Deus, pelo qual me sinto muito agradecido”, admitiria
mais tarde.

A impressão que eu tinha era a de que estava lidando com uma mu­
lher que, de alguma forma, via Deus e sentia Deus no sofrimento dos
pobres, uma mulher que tinha uma fé imensa na luz e na escuridão.
Madre Teresa via o sofrimento de Cristo, mas não é que fosse levada
ao êxtase ou coisa assim — isso não fazia parte da sua vida, embora,
provavelmente, algumas pessoas se sentissem tentadas a pensar assim.
[...] Eu real mente acredito que a razão pela qual Madre Teresa teve que
passar por tanta escuridão na sua vida foi porque isso lhe proporciona­
ria uma maior identificação com os pobres.17

O fato de a escuridão ser um meio de “maior identificação com os


pobres” fora uma apreciação do Pe. Neuner, quando Madre Teresa estava
sob sua orientação. O Pe. van der Peet apontava na mesma direção, o que
ajudava Madre Teresa a ter confiança nele. O seu contato com ele foi,
também, um presente de Deus, oferecendo a ela uma nova demonstração
do Seu terno amor, uma confirmação dos Seus cuidados no meio daquela
permanente provação interior.

L.D.M.
A caminho da Índia, 26/11/76
Caro Padre Michael,
O senhor já deve ter recebido a nota que lhe enviei e o livro.
— Desde então tive que vir a Roma tratar de um assunto urgente. [...]
O senhor pergunta por que Jesus queria que se encontrasse co­
migo naquele dia em Roma. — Nós já recebemos muito pelo fato
de termos aceitado aquele encontro — sem termos sido consultados
nem preparados. Não sei como Ele faz com o senhor — mas comigo
Ele sempre faz assim — simplesmente para eu perceber Sua terna
preocupação comigo e com meu nada — Sua grandeza e o meu vazio
284 Ve n h a , se ja M i n h a lu z

— Seu infinito amor e meu amor de criança. Não permita que sua
infidelidade [aos exercícios espirituais e aos deveres religiosos de cada
dia] e hesitação, como o senhor diz, o preocupem — mas, aceite tudo
o que Ele dá, e dê tudo o que Ele tira com um grande sorriso. Porque
isso é a santidade — fazer a vontade Dele com um grande sorriso.
Estou muito feliz que o senhor visitou as Irmãs de Union Ave* —
eu sinto que Jesus vai usá-las para maior glória de Seu Pai. — Ainda
bem que a cruz nos leva ao Calvário e não a uma sala de estar. — A
Cruz — o Calvário foi muito real durante algum tempo. Já não me
dói a dor, mas a dor que a pessoa inflige a si mesma. Compreendo
melhor o que Jesus disse a Santa Margarida Maria sobre a dor que
sentia por causa daqueles que Lhe pertenciam — (...)
Os dias nos EUA, em especial na Filadélfia,*’ foram tão cheios
de sacrifícios. Vivi realmente “A Missa” — tudo aquilo foi um ato
de obediência cega. — Começo a compreender as Estações da Cruz
com um significado mais profundo. A polícia, as multidões, tudo pa­
recia como se o Calvário [estivesse] sendo hoje encenado novamente.
— Jesus deu-me uma graça muito grande — aceitar tudo com um
grande sorriso.
Há uns dias atrás, um jovem sacerdote falou de como as MC são
um testemunho da existência de Deus — e se Ele não existisse, o nos­
so trabalho não teria qualquer sentido, e como as MC tornaram a sua
fé [dele] viva e fecunda. Da próxima vez que escrever, envie-me, por
favor, a oração a Jesus e a música porque não as temos na Casa-Máe
— Começo a aprender mais e mais porque Jesus quer que apren­
damos com Ele a ser mansos e humildes de coração. Porque sem a
mansidão nunca seremos capazes de aceitar os outros nem de amar os
outros como Ele nos ama. — Então, antes de aprendermos a humil­
dade, sem a qual não podemos amar a Deus — temos que aprender a
amar-nos uns aos outros. — Precisamos da mansidão e da humildade
para poder comer o Pão da vida. — Precisamos da mansidão c da hu-

1070 Union Avenue, Bronx — endereço das Irmãs Contemplativas Missionárias da Cari­
dade em Nova York.
*' Madre Teresa esteve presente no XLV Congresso Eucarístico, na Filadélfia, cm 6 de agosto
de 1976.
•Santa Teresa de Calcula 285

mildade se quisermos alimentá-Lo no Faminto. Gostaria muito que


o senhor escrevesse sobre a fome do homem e o Páo da vida, a fome
de Deus e do Faminto no angustiante disfarce dos Pobres.
Na Casa-Máe, uma vez que temos 10 grupos de Irmãs, 8 de no­
viças e 2 de professas temos 10 horas de Adoração em duas capelas.
Aqui reside a nossa força e a nossa alegria. [...]
Não lhe peço que reze por mim porque eu sei que reza por mim.
— Mas peço-lhe que diga a Jesus — quando pelas suas palavras o
Pão se transforma no Seu Corpo e o vinho se transforma no Seu
Sangue18 — que mude o meu coração — que me dê o Seu próprio
Coração — para que eu possa amá-Lo como Ele me ama. Santo e
Feliz Natal — para caso eu não ter oportunidade de escrever.

Sua em Jesus,
M. Teresa, M O 9

Madre Teresa não faz referência à sua escuridão nesta carta, mas
os frutos da referida experiência eram evidentes. “A mansidão e a hu­
mildade do Coração de Jesus”,20 que ela tentava imitar há vários anos,
podiam ser testemunhadas através da sua forma de vida. O terno amor e
a preocupação de Deus por ela, que a comoviam como da primeira vez,
tinham suavizado sua vontade de ferro, sem diminuir sua determinação,
mas enriquecendo-a de ternura. A Madre era como uma criança em seu
amor e em sua vida. Uns anos antes, tinha escrito a Malcolm Muggeridge,
encorajando-o no combate espiritual que ele travava:

Acho que agora o compreendo melhor — Receio não ter podido res­
ponder ao seu profundo sofrimento — [...] não sei por quê, mas para
mim você é como Nicodemos21 e tenho a certeza de que a resposta é
a mesma — “Se não vos tornardes como crianças”.22 Estou certa de
que compreenderá bem tudo — se vier a “tornar-se” uma criancinha
nas mãos de Deus.
O seu anseio por Deus é tão profundo, e — contudo — Ele se
mantém longe de você. — Ele deve estar Se forçando a isso — por­
que o ama tanto — a ponto de entregar Jesus à morte por você e por
286 Vculia, seja M i n h a luz

mim. — Cristo anseia por ser o seu Alimento. Rodeado da plenitude


do alimento vivo, você se permite morrer de fome. — O amor pessoal
que Cristo tem por você é infinito. — A pequena dificuldade que
você tem em relação à Sua Igreja é finita. — Ultrapasse o finito com
o infinito. — Cristo o criou porque o queria. Sei perfeitamente o que
sente — anseio terrível — com um vazio escuro — e — contudo — é
Ele que está enamorado de você.23

Madre Teresa conhecia efetivamente aquele “anseio terrível —


com um vazio escuro”. Embora desejasse arder de amor, apenas sentia
uma escuridão fria como o gelo. Apesar disso, abraçara o seu estado
com uma simplicidade e uma confiança de criança. Era a mesma atitu­
de que a levava a encorajar o Pe. van der Peet a não se deixar perturbar
pelas suas próprias infidelidades e hesitações.
Ser uma figura pública era um verdadeiro sofrimento — um “Cal­
vário” — para Madre Teresa e ela lutava intensamente para superar as suas
tendências naturais. Contudo, o seu sorriso — a “capa” que cobria essa
dor — também impedia que os outros percebessem o quanto custava vi­
ver sob a luz dos holofotes. Sorrir exigia um esforço, como explicava, com
o seu humor característico, em um discurso proferido em 1977:

Lembro-me de que, há algum tempo, veio dos Estados Unidos um


grande grupo de professores que me pediu: “Diga-nos qualquer coi­
sa que nos ajude.” E eu respondi: “Sorriam uns aos outros”. E acho
que devo ter dito isto de uma forma muito séria, porque um deles
perguntou-me: “A senhora é casada?” E eu respondi: “Sou, e às ve­
zes tenho dificuldade em sorrir a Jesus porque Ele sabe ser muito
exigente.”24

Inúmeras pessoas vinham a ela, atraídas pela sua amabilidade e


simplicidade; para cada pessoa tinha tempo, uma palavra, um sorriso.
E também sabia reconfortar, porque era Jesus quem ela queria dar a
todos:

* Madre Teresa refere-se a Jesus como o Páo da Vida na Eucaristia.


■Santa Teresa de Calcula 287

Reze — eu devo ser capaz de dar só Jesus ao mundo. As pessoas esráo


famintas de Deus. Que encontro terrível teríamos com o próximo se
apenas lhe déssemos a nós mesmos.2^

.// dor, o sofrimento, a solidão


são “um beijo deJesus”
Uma maneira importante de Madre Teresa ajudar as pessoas a encontra­
rem a Deus era ajudá-las a descobrirem a Sua presença em meio aos sofri­
mentos pelos quais passavam. Ela compartilhou com a sua amiga Eileen
Egan um conceito sobre o sofrimento que tirara das leituras que fazia.26

A tristeza, o sofrimento, Eileen, nada mais sáo do que um beijo de


Jesus — um sinal de que vocc chegou táo perto de Jesus que Ele
pode beijá-la. — Eu acho que esta é a mais bela definição do sofri­
mento. — Por isso, fiquemos felizes quando Jesus se inclina para
nos beijar. — Espero que estejamos suficientemente perto para que
Ele possa fazê-lo.27

Com palavras semelhantes encorajava igualmente uma das suas


Irmãs:

O sofrimento, a dor, o fracasso — nada mais são do que um beijo de


Jesus, um sinal de que você chegou tão perto de Jesus na Cruz que
Ele pode beijá-la. — Por isso, minha filha, seja feliz. [...] Não se desa­
nime [...] responda com um sorriso. [...] Para você é uma belíssima
oportunidade de se tornar completa e totalmente toda para Jesus.28

E explicava ainda às suas seguidoras: “Os seus pais devem tê-las


beijado como um verdadeiro sinal do seu amor. Se eu sou a esposa de Jesus
crucificado, Ele tem que me beijar. Naturalmente, os pregos me machu­
carão. Se eu me aproximar da coroa de espinhos, esta me machucará.”29
Procurando recorrer a todos os meios para levar o amor de Jesus a
todos, a fim de construir um mundo mais feliz, aconselhava até os doen-
288 Xen h a, seja M i n h a luz

tes a participarem nesse esforço: “Sei que você náo pode mais viajar, mas
náo desista onde quer que esteja — e recorra à caneta sempre que tiver
oportunidade. — Devemos encher o mundo com o amor e a compaixão
de Jesus e de superar todo o ódio e a escuridão.”30

“Deixe que as pessoas o devorem"

Ao mesmo tempo que encorajava outras pessoas em suas batalhas, Madre


Teresa também sentia necessidade de procurar ajuda e pedir orações. Em
junho de 1977, escrevia ao Pe. van der Peet: “Minha oração está muito
perto do senhor. — Espero realmente que me mantenha perto em sua
oração — e que ame a Jesus por mim — por todas as vezes em que meu
coração se encontra frio e vazio.”31 Alguns meses mais tarde, após o Pe.
Michael ter lhe informado de que se preparava para fazer um retiro, a
Madre aproveitou a oportunidade para lhe escrever novamente:

Quo Pe. Michael,


Quando esta carta lhe chegar — talvez esteja “a sós com Jesus”
[em retiro]. E algo bem seu pedir para passar três meses a sós com
Jesus. — Mas se durante esse período a fome de Jesus — no coração
do Seu povo — for maior do que a sua fome de Jesus, náo deve ficar
sozinho com Jesus durante todo o tempo. Deve permitir que Jesus
faça do senhor pão para ser consumido por todos aqueles com quem
entra em contato. Deixe que as pessoas o devorem. — Pela Palavra e
pela presença, o senhor proclama a Jesus.
Estarei em St. Louis em 21 de abril, para os encontros da “Vida
Religiosa”. — Desejaria que o senhor estivesse lá. Podíamos talvez ter
adoração todos os dias e assim levar e tecer nossas vidas com o Pão
da Vida. — Maior amor nem sequer Deus poderia dar do que o de
entregar a Si Mesmo como Pão da Vida — para ser partido, para ser
consumido para que o senhor e eu possamos comer e viver — pos­
samos comer e assim saciar nossa fome de amor. — E Ele ainda náo
parece satisfeito, pois Ele também tinha fome de amor. — Por isso Ele
se tornou o Faminto, o Sedento, o Despido, o Desabrigado e continua
•Santa ’Teresa de Calcula 289

clamando — tive fome, estava despido e desalojado. Foi a Mim que o


fizestes.32 — O Pão da Vida e o Faminto — mas um único amor — só
Jesus. Sua humildade é tão maravilhosa. Posso compreender Sua ma­
jestade, Sua grandeza porque é Deus — mas Sua humildade está além
do meu entendimento, porque Ele Se faz o Pão da Vida para que até
uma criança tão pequena como eu possa consumi-lo e viver. — Há uns
dias — quando estava dando a Sagrada Comunhão às nossas Irmãs na
Casa-Máe, percebi, de repente, que estava segurando Deus entre dois
dedos. A grandeza da humildade de Deus. Realmente não há amor
maior — amor maior do que o amor de Cristo.33 — Estou certa de
que o senhor deve sentir com frequência o mesmo quando — às suas
palavras — nas suas mãos — o pão se transforma no Corpo de Cristo,
o vinho se transforma no Sangue de Cristo. — Que grande deve ser
o seu amor por Cristo. — Não há amor maior — do que o amor do
sacerdote por Cristo seu Senhor e seu Deus.
Estou em viagem de regresso de Manila onde fui abrir um novi­
ciado. [...] Então, na noite de 22 de fev. tivemos um retiro de cinco
dias. — O sacerdote limpou nossas almas de nossos pecados — e de­
pois nos deu apenas Jesus. — No dia da confissão eu confessei todos
os meus pecados — e Jesus pegou todos os meus pecados. — Depois
da confissão ouvi o meu coração cantando — Obrigada, Jesus, por
ter pagado os meus pecados. Ele, realmente e simplesmente, os tirou
todos. E tão maravilhoso o espírito no novo noviciado. — Talvez um
dia o senhor possa pregar-lhes um retiro e eu espero estar lá para fazê-
-lo com elas. [...]
Estou voltando a Calcutá para o retiro de 8 dias que começamos
no dia 19 à noite [...] então vou ter vários dias a sós com Jesus e aí
compartilharei a alegria do senhor. — Estou à disposição Dele —
Ele pode fazer comigo exatamente como Lhe agradar, sem sequer
pensar em me consultar. Eu só quero ser a Sua pequenina — se Ele
assim quiser, pois de outra maneira ficarei feliz em ser apenas nada
e Ele tudo.
Reze por mim.

Sua em Jesus,
M. Teresa, MC*
290 \ c n h a , seja M i n h a luz

Com essas palavras, Madre Teresa dava testemunho da realidade


da presença de Deus dentro dela. De sua escuridão, dava luz aos outros.
Não conseguia deixar de se maravilhar com as ações de Deus, nem deixar
de ser cativada por Seu amor. Se era considerada ou se era, aparentemen­
te, ignorada por Deus, não importava mais.
Embora não fosse capaz de sentir a presença de Jesus, nem em seu
próprio coração, nem na Eucaristia, agarrava-se a Ele pela fé, com todas
as suas forças. Admirava-se com “a grandeza da humildade de Deus”,
não apenas ao fazer-Se “Pão da Vida” para saciar a fome que tinha de
Seu amor, mas também por tornar-se presente no angustiante disfarce
dos mais pobres dos pobres. Servindo e alimentando os pobres, ela podia
servi-Lo, alimentá-Lo, exprimindo, desse modo, o seu amor.
Sua espiritualidade profúndamente eucarística era tão mística
quanto prática. Ela acreditava que “a nossa vida deve ser tecida com a
Eucaristia”. Da percepção de que Deus se entrega por completo ao ho­
mem na Eucaristia brotou o seu desejo de se entregar totalmente a Ele no
serviço aos outros. A Madre colocava uma exigência radical, a si própria e
às Irmãs: “Não temos o direito de recusar nossa vida aos outros, nos quais
entramos em contato com Cristo.”35 E insistia:

Permitam que os pobres e as pessoas as devorem. [...] Permitam


que os pobres “mordam” o seu sorriso, o seu tempo. Vocês, às ve­
zes, podem preferir nem sequer olhar para uma pessoa com quem
tiveram algum desentendimento. Então, não apenas olhem, deem
um sorriso. [...] Aprendam de cor: devem deixar que as pessoas
as devorem.36

As Irmãs percebiam a profundidade com que a Madre vivia aquilo


que ensinava. Uma delas recordava: “Ela nunca pensava em si própria,
mas sempre pensava nos outros. Sua saúde precária não a impedia de estar
disponível para os pobres. ‘Deixem que as pessoas as devorem.’ A Madre
viveu essa frase plenamente até ao final de sua vida.”
•Santa Teresa d( Calc uta 291

U'N(io sou on quo vivo,


é Cristo que vive em mim”

A correspondência de Madre Teresa com os seus diretores espirituais du­


rante esses anos reflete a genuína simplicidade e o esquecimento próprio
a que tinha chegado. Seu foco continuava sendo Jesus e a obra Dele:

Ohrigada pelo seu amor compreensivo. — Acho que foi a sua vinda
que trouxe este presente. Obrigada por ter explicado na vida — a
pobreza de Jesus — o mistério do amor de Deus. Sim, quero ser po­
bre como Jesus — que sendo rico se tornou pobre por amor a nós.37
Obrigada por ter explicado de maneira táo simples — Não sou eu
que vivo mas Cristo que vive em mim.38
Obrigada por rezar por mim — eu preciso rezar — eu quero rezar
— eu tento rezar. O amor de Deus pela Congregação tem sido tão
maravilhoso. — Este ano fizemos mais 11 fundações. — Que grande
é a humildade Dele, que permite ser usado desta maneira. Tantos
tabernáculo novos — tantas horas diárias de Adoração.39

“Estou crucificado com Cristo! Já não sou eu que vivo, é Cristo


que vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho
de Deus, que me amou e Se entregou por mim”,40 escreveu São Paulo,
em palavras que descrevem, apropriadamente, a realidade da união de
Madre Teresa com Deus: Cristo estava, de fato, vivendo e agindo nela, es­
palhando o Seu amor pelo mundo. A Madre comentava com frequência:
“Deus ainda ama o mundo hoje através de você e através de mim”,41 e ela
permitia que Ele fizesse isso.
Em cada novo “tabernáculo” — como chamava às novas fundações
— a Madre via “um grande presente de Deus ao mundo que está morren­
do por Deus e pelo Seu amor — e contudo — não quer Deus”.42 Cada
convento era mais um santuário onde as Irmãs, alimentadas pelo “Pão da
Vida”, eram impelidas a sair à procura do “Cristo faminto” escondido nos
mais pobres dos pobres, e a oferecerem-Lhe os seus humildes serviços. A
oração e o serviço fluíam da mesma contemplação da presença de Jesus
sob esses dois “disfarces”. Era por isso que Madre Teresa nunca se cansava
292 \ ciiha. seja M i n h a luz

de repetir: “Nós não somos assistentes sociais. Somos contemplativas no


coração do mundo. Estamos com Jesus 24 horas por dia”.4'
Maria era o modelo de Madre Teresa, não apenas na oração c no
serviço, mas em todos os aspectos de sua vida. A seguinte nota de agrade­
cimento ao Cardeal Picachy nos permite ter um vislumbre do que era a
relação da Madre com Nossa Senhora:

A fidelidade ao Rosário trará muitas almas a Deus. A [imagem de]


Nossa Senhora de Fátima é para sua mesa. — Eu sei quanto o senhor
ama a Nossa Senhora. Com frequência rezo a ela pelo senhor — e o
passarinho* — deve lembrar-lhe que reze por mim. — E aí que eu
quero estar — aos pés dela.
Obrigada por todo o amor e todas as atenções que sempre de­
monstrou pela nossa jovem Congregação. — Por toda a orientação
espiritual que me deu durante tantos anos. — Reze por mim e comi­
go — para que eu possa me tornar toda só para Jesus.44

“Indefesa mas ousada”

Com a modéstia que a caracterizava, Madre Teresa considerava que se


encontrava ainda muito longe da união com Jesus que desejava alcançar.
As cartas que escreveu ao Pe. van der Peet revelavam sua humildade mais
do que seu sofrimento.

Caro Pe. Michael,


Perdoe-me o prolongado silêncio. Recebi suas três cartas. O amor
do senhor por Jesus é tão maravilhoso, tão cheio do amor puro de
Maria. Agradeço a Deus e especialmente a Nossa Senhora por amar a
Jesus no senhor e, através do senhor, a todas as pessoas com quem en­
tra em contato por meio dos seus retiros. No ano passado celebramos
o jubileu de prata de Jesus** oferecendo-Lhe 25 tabernáculos. Beirute

* Madre Teresa refere-se ao pequenino passarinho que está aos pés de Maria, na base da ima­
gem de Nossa Senhora de Fátima.
** Como as Irmãs, em 1975, a Casa para os Moribundos (Kalighat), em 1977, e o primeiro
grupo de Irmãs, em 1978, celebraram seus jubileus de prata, Madre Teresa decidiu dar a Jesus
um jubileu de prata também, abrindo 25 novas instituições, cm 1978.
•Santa Teresa de Calcutá 293

foi a 23a fundação. Compreendo cada vez menos a humildade de


Deus feito homem por amor a nós. [...]
Sei que reza muito por mim — eu preciso do amor de Jesus.
Rezemos —

Deus o abençoe,
M. Teresa, MG'**

Vários meses depois, voltava a escrever:

Caro Pe. Michael,


Sua carta de 28 de maio estava me aguardando e creio que alguém
já lhe escreveu. [...]
Por favor — reze ao Pe. Leo Dehon" pela nossa Congregação
— em especial durante os próximos dias em que estamos nos pre­
parando para o nosso Capítulo. Teremos o Cap. Ger. [Capítulo Ge­
ral] em 21 de nov. Peça a Nossa Senhora que tome conta de nossa
Congregação — que nasceu a pedido dela e cresceu sob os seus cui­
dados. — Gostaria muito de ser apenas uma simples Irmã. — Não
pedirei. — Que Jesus faça o que quiser sem me consultar, porque
eu pertenço a Ele. —
Tive tanta pena no dia da profissão de tê-los deixado, ao senhor e
aos outros. — Foi realmente um ato de obediência completa ter que
ir com o Cardeal à reunião sobre os refugiados nos barcos.” O mar se
transformou em um Calvário aberto onde a Paixão de Cristo está sen­
do revivida. Não fomos capazes de acolher nenhum deles na índia.
Em Manila, a nossa casa para os doentes e os moribundos tinha algu­
mas pessoas sofrendo. — Você se pergunta como as pessoas podem
sofrer tanto e nunca se quebrar. Ao olhar para eles, sinto uma dor
física bem no meu coração. — A profissão foi realmente uma coisa
bonita para Deus — e agora temos uma Comunidade Contemplativa

* Pe. Leo Dchon (1843-1925), francês, fundador da Congregação de Sacerdotes do Sagrado


Coração (Pc.s Dchonianos).
** Tradução do inglês — boat people — termo que se refere aos refugiados que deixam seus
países cm barcos para escapar da opressão política ou da pobreza. O termo foi primeiramente
usado referindo-se aos milhares de vietnamitas que fugiram do Vietnã em pequenas embarcações
(frequentemente precárias c com um número de pessoas acima da capacidade) no final da década
de 1970, após a guerra no Vietnã c da queda do governo sul-vietnamita. Muitas dessas pessoas
morreram no mar de desidratação, fome, afbgamcnto ou fbram vítimas de piratas.
294 \ cn ha . s(ja M i n h a Inz

MC — um presente de Deus.
Que feliz que o senhor deve se sentir por ter este dom maravilhoso
de dar Jesus às almas através dos seus retiros. E como os seus Sup.
[Superiores] têm sido bons, dando-lhe autorização para fazer isso.
Jesus lhe têm um amor especial — porque o senhor é tão com­
pletamente Dele, que vive — não o senhor — mas é Jesus que vive
no senhor e, através do senhor Ele prova o amor Dele pelo mundo.
Quanto a mim — o silêncio e o vazio são tão grandes que eu olho e
não vejo, escuto e não ouço. — A língua se move mas não fala. —
Indefesa mas ousada — Quero que reze por mim — para que eu
Lhe dê toda a liberdade — e mesmo que Ele decida me cortar em
pedaços, que cada um desses pedaços, por muito pequeno que seja,
seja só Dele. —
Na C. M. [Casa-Máe] temos mais de trezentas noviças tão belas,
tão cheias de alegria. — Faz bem simplesmente olhar para elas e apre­
ciar o presente de Deus, o amor delas. — Sei que o senhor reza por
mim — peça a Nossa Senhora que cuide de mim como [cuidou] de
Jesus.

Deus o abençoe,
M. Teresa, M O 6

Assistindo aos horríveis sofrimentos pelos quais as pessoas passa­


vam diariamente, Madre Teresa refletia sobre “como as pessoas podem
sofrer tanto e nunca se quebrar?” A mesma pergunta poderia ter sido feita
à própria Madre: Como podia sofrer tanto e não se quebrar, ela que olhava
e escutava, mas nem via nem ouvia Aquele que procurava? Apenas havia
silêncio e escuridão para tornar a sua solidão dolorosa e assustadora. No en­
tanto, apesar de se sentir “indefesa”, era verdadeiramente “ousada”, porque
estava mais decidida do que nunca a dar-Lhe “toda a liberdade”.
Além de não se quebrar, Madre Teresa era alegre em seus sofrimen­
tos. Considerando-se o que agora conhecemos do seu estado interior, a
habitual alegria da Madre é ainda mais extraordinária, como observa uma
Irmã mais antiga:

A Madre sempre nos disse: “Deus ama aquele que dá com alegria.47
•Santa Teresa de Calcutá 295

Se náo vamos às pessoas com uma cara alegre, apenas aumentamos


sua escuridão e suas misérias e suas aflições.” Por isso a Madre ti­
nha a alegria espiritual. [...] E surpreendente para nós pensar que a
Madre foi capaz de continuar com uma expressão agradável e com uma
só determinação: de se agarrar a Jesus, seu grande e único amor, sem
nunca nos deixar perceber aquilo pelo qual estava passando.

Como carregava o próprio sofrimento e dor em silêncio e em


paz, podia encorajar os outros, eficazmente, a percorrer o mesmo ca­
minho. Quaisquer que fossem os fracassos ou os desapontamentos com
os quais ela própria ou os outros se confrontassem, sempre encontrava
uma maneira de olhar para eles sob a perspectiva de Deus e de tirar
coisas boas deles.

Eu sei como se sente — esse [é] realmente o sentido pleno da po­


breza de Jesus. Ele que era rico se fez pobre.48 Renunciou à riqueza
da companhia de Seu Pai ao tornar-se homem como nós em todas
as coisas exceto no pecado.49 — O senhor também está passando
pela experiência desse “renunciar” por amor a Ele. Náo tenha medo.
— Tudo vai ficar bem. — A semente precisa morrer — se deve dar
fruto.’’0 — Estou mais do que certa de que Jesus quer, sem dúvida
nenhuma, que os M. P. [Irmãos Missionários da Palavra] existam — e
toda esta solidão é o começo de um grande amor. O senhor não está
sozinho — “Jesus e o senhor”. [O] Sacrário é a coisa mais bela para
a qual deve olhar quando se sentir sozinho. Náo tenha medo. — Ele
está aí — apesar da escuridão e do fracasso. — Foi assim para Jesus
no jardim — “Nem sequer pudestes vigiar uma hora?”51 Ele Se sen­
tiu tão sozinho naquela noite. Náo tenha medo. Dê a mão a Nossa
Senhora e caminhe com Ela. —52

Madre Teresa aceitava de bom grado ser privada “da riqueza da


companhia” de Jesus para que outros conhecessem essa delícia. Com base
em sua própria experiência de solidão, desilusão, escuridão e pobreza, podia
reafirmar às suas Irmãs que Cristo estava presente em meio ao sofrimento:

A Vontade do Pai foi aquela terrível solidão no Jardim [de Getsêmani],


na Cruz. — Ele estava completamente só. Se formos verdadeiramente
296 K'cnha. seja M i n h a luz

seguidoras de Jesus, também nós devemos ter a experiência da solidão


de Cristo. — Ele suou sangue.'3— Foi tremendamente difícil para Ele
passar pela humilhação de Sua Paixão.'4

“// Mim o fizestes ”

Em novembro de 1979, no quarto capítulo geral das Missionárias da


Caridade, Madre Teresa foi novamente eleita superiora geral. Embora
ansiasse por “ser apenas uma simples Irmã”, aceitou essa decisão como a
Vontade de Deus.
Pouco tempo depois, no dia 11 de dezembro de 1979, Madre
Teresa recebia o Prêmio Nobel da Paz. Por essa época, já tinha aprendido
que “Calcutá está em toda a parte”. Tal como acontecera na seqüência das
três visóes que havia tido em 1947, fora progressivamente levada a com­
preender níveis cada vez mais profundos de pobreza — material, social e
espiritual — de tal maneira que, na sua missão entre os pobres, foi con­
duzida progressivamente a se identificar e a se preocupar, não apenas com
a pobreza material, mas também com as formas de pobreza que existem,
igualmente, entre as pessoas ricas dos países afluentes.
Foi sobre seus pobres que falou a um público atento no discurso
de aceitação do Prêmio Nobel da Paz, desafiando todos os que ali se en­
contravam a irem à procura daqueles que viviam a agonizante pobreza
de não serem desejados, de não serem amados ou de não serem cuidados
pelos seus. Começando em casa, amando e cuidando de todos e de cada
um, qualquer pessoa podia ser “missionária da caridade”, afirmou. Atra­
vés do humilde amor e do humilde serviço, podiam descobrir o rosto de
Jesus por detrás do disfarce angustiante dos necessitados.

[Jesus] se faz o faminto, o despido, o desabrigado, o doente, o preso,


o que está só, o que ninguém quer, e afirma: “A Mim o fizestes”.5'
Ele tem fome do nosso amor e essa é a fome dos nossos pobres. Essa
é a fome que você c eu devemos encontrar e que pode estar dentro de
nossa própria casa. [...]
■Santa Teresa de Calcutá 297

Eu [...][fui visitar] um asilo onde havia todos esses pais idosos.


[...] Eu vi que naquele asilo tinham de tudo [...] mas que todos esta-
vam sempre olhando para a porta. [...] Virei para a irmã e perguntei:
(... ] “Como é que todas estas pessoas que têm tudo aqui estão sempre
olhando para a porta, por que não estão sorrindo?” Estou tão acos­
tumada a ver os sorrisos da nossa gente, até os moribundos sorriem.
E ela disse: “Isto acontece quase todos os dias. [...] Eles têm a espe­
rança de que um filho ou uma filha venha visitá-los. Estão magoados
porque foram esquecidos.” [...] É aqui que entra o amor. [...] Talvez
dentro da nossa própria família tenhamos alguém que se sente só,
que está doente, que está preocupado. [...] Estamos presentes para
receber essas pessoas? [...]
Fiquei surpresa no Ocidente, ao ver tantos rapazes e moças en­
tregues às drogas e tentei descobrir o porquê. [...] “Porque não há
ninguém na família que os receba.” O pai e a mãe estão tão ocupados,
não têm tempo. [...] A criança volta para as ruas e se envolve em
alguma coisa. [...] Essas são coisas que destroem a paz.
Mas sinto que o maior destruidor da paz hoje é o aborto, porque é
uma guerra direta, uma morte direta, um assassinato direto, pela pró­
pria mãe. E nós lemos na Escritura, pois Deus nos diz muito claro:
“Ainda que a mãe se esquecesse do menino que amamenta, Eu nunca
te esqueceria. Eis que Eu te gravei nas palmas das Minhas mãos.”56
Aquela criança não nascida foi gravada nas mãos de Deus [...]
Muitas pessoas estão muito, muito preocupadas com as crianças
da índia, com as crianças da África, onde muitas morrem, talvez de
desnutrição, de fome e por aí afora, mas milhões morrem delibera-
damente pela vontade da própria mãe. E isso é o maior destruidor da
paz hoje. Por que se uma mãe é capaz de matar o seu próprio filho,
o que falta para eu matar você e você me matar? Não falta nada.
[...] Vamos nos assegurar neste ano de que faremos com que todas
as crianças nascidas e por nascer, sejam queridas. [...] Fizemos real-
mentc com que as crianças fossem queridas? [...]
Pegamos [um homem] abandonado em um esgoto, meio comido
pelos vermes, e o levamos para o abrigo conosco: “Vivi como um animal
na rua, mas vou morrer como um anjo, amado e bem cuidado.” E foi
tão maravilhoso ver a grandeza daquele homem, que era capaz de falar
daquela maneira, que era capaz de morrer daquela maneira sem culpar
298 \ c n h a , seja iSlinha luz

ninguém, sem amaldiçoar ninguém, sem comparar nada. Como um


anjo — é essa a grandeza da nossa gente.
E é por isso que acreditamos naquilo que Jesus disse: “Eu tive
fome, estava despido, não tinha casa, não era querido, não era amado,
ninguém cuidava de mim — e tu fizeste-Me isso.'”’7

Madre Teresa era extremamente solidária com aqueles que se sen­


tiam rejeitados e indesejados: os pais rejeitados, abandonados nos lares para
idosos, os jovens solitários cujas famílias não se preocupavam com eles ou
com elas e, muito especialmente, com as crianças não nascidas. “Eu acho
que as crianças não nascidas são os mais pobres dos pobres hoje — os
menos amados — os menos queridos, os rejeitados pela sociedade.”SHEla
lutou por defender o precioso dom da vida e esse se tornou um dos temas
recorrentes dos seus discursos.

Mas o que nos diz Deus? Ele nos diz: “Ainda que a mãe se esque­
cesse do menino que amamenta, Eu nunca te esqueceria. Eis que
Eu te gravei nas palmas das Minhas mãos.” Nós somos gravados
na palma da Sua mão; essa criança por nascer foi gravada na mão
de Deus desde a concepção e é chamada por Deus a amar e a ser
amada, não apenas agora nesta vida, mas para sempre. Deus não é
capaz de nos esquecer.59

Madre Teresa percebeu que o Prêmio Nobel da Paz tinha “aju­


dado muitas pessoas a encontrarem o caminho para os Pobres”60 e isso
a impeliu a pedir orações para um maior amor e um maior zelo ao
servirem aos pobres. “Continue rezando para que nós não estrague­
mos a obra de Deus — mas para que através de nós e em nós — e
conosco e com os nossos pobres, o amor e a compaixão de Deus sejam
proclamados”,61 escreve ao Pe. Neuner. Dirigindo-se às suas próprias
Irmãs, explicou: “A obra é obra de Deus e não nossa obra e é por isso
que devemos fazê-la bem. Quantas vezes estragamos a obra de Deus e
tentamos ficar com a glória para nós?”62 Essa possibilidade a assustava,
e ela rezava constantemente, para ser protegida dessa presunção. Nesse
desafio, a percepção do seu nada era a sua proteção, como o Pe. Van der
Peet testemunhava posteriormente:
•Santa Teresa de Calcutá 299

Eu me sentia suficientemente à vontade com Madre Teresa para lhe


fazer algumas perguntas pessoais, tais como: “Para onde quer que a
senhora vá, as pessoas a seguem como se fosse uma estrela de cinema.
A senhora recebeu todos esses prêmios de prestígio. O Santo Padre a
aprecia muito, a senhora já esteve com Indira Ghandi, a rainha Elizabe­
th, o presidente e Nancy Reagan. [...] Como é que a senhora lida com
esse tipo de admiração?” Nas diferentes conversas que tivemos, Madre
Teresa tinha várias respostas a isso. A resposta mais bonita de que me
lembro foi: “Padre, Jesus me deu uma graça muito grande que é: uma
profunda convicção do meu absoluto nada. Se Ele pudesse encontrar
uma mulher mais pobre para através dela fazer a Sua obra, não me esco­
lheria, escolheria essa mulher.” Outra resposta foi (e ela frequentemente
sorria quando dizia essas coisas): “Sou pequena demais para compre­
ender isso tudo”, ou então: “Pe., entra por aqui (e apontava para os
ouvidos) e sai por ali; passa direto por mim.” Outra reação [...] a toda a
admiração das pessoas: “É uma verdadeira crucificação.”

Úoença muito maior é


não ser querido, não ser amado

Em outubro de 1980, Madre Teresa foi convidada a participar do Sínodo


dos Bispos. De Roma, escreveu o seguinte ao Pe. van der Peet:

Caro Pe. Michael,


Sua carta veio comigo até o Sínodo. — Obrigada. — Deus o ama.
— Desculpe-me o grande atraso em escrever. Um bispo me disse que
vou passar o meu purgatório escrevendo cartas — porque sou péssi­
ma para responder. — Por mais prolongado que o purgatório venha a
ser — há sempre a maravilhosa esperança de ver Jesus um dia.
O senhor deve estar a sós com Jesus [em retiro] no Canadá neste
momento — e tenho certeza de que deve estar rezando por mim —
porque nem imagina o que é estar aqui neste Sínodo, no meio de
todas estas pessoas importantes da Igreja. Tive que falar — e pedi
ao Santo Pe. que nos desse sacerdotes santos se quer que as famílias
300 X c n h a , se ja M i n h a lu z

sejam santas. Muitos dos bispos me disseram: “Obrigado.” Jesus —


mais uma vez — foi Jesus que fez isso — à Sua maneira.
Sua bela carta tão cheia de Jesus foi um presente Dele para mim.
O amor de Cristo é mais forte do que tudo o que temos ou somos.
Cresçamos cada vez mais na semelhança com Cristo — de maneira
que todos os que encontrarmos — quando olharem para nós vejam
apenas Jesus em nós e através de nós.
Considero — esta pequena oração — de grande ajuda: “Jesus no
meu coração, acredito no Teu amor fiel por mim. Te Amo,” ou: “Em
união com todas as Missas que estão sendo oferecidas em todo o
mundo, ofereço-Te o meu coração. Faz com que ele seja manso e
humilde como o Teu.” Reze esta oração por mim de vez em quando
— pois eu apenas peço isso — que o meu coração seja como o Seu
coração manso e humilde. [...]
Reze muito por mim — como eu rezo pelo senhor.
Mantenhamos no coração a alegria de amar a Jesus e partilhemos
esta alegria com todos aqueles com quem nos encontramos.

Sua em Jesus,
M. Teresa, MO*

A segurança de que “o amor de Cristo é mais forte do que tudo quan­


to temos ou somos” a ajudava a não sucumbir à escuridão interior e à dor do
nada. Foi nesse estado, quando sentia que não havia em seu coração “nem fé
— nem amor — nem confiança”,64 que a Madre formulara a oração: “Jesus
no meu coração, acredito no Teu amor fiel por mim. Te Amo.” Mais tarde,
alteraria a oração, substituindo “fiel” por “terno”.
Embora se sentisse um tanto embaraçada por ter que se dirigir
às “pessoas importantes” que se encontravam no Sínodo, Madre Teresa
estava convencida de que Jesus a estava usando para proclamar o enorme
amor de Deus pelos Seus pobres. A sua simples, mas eloqüente, mensa­
gem era um resumo daquilo que vivia há trinta anos. Através da sua escu­
ridão interior, estava bem familiarizada com a sensação de não ser queri­
da, de não ser amada, de não ser cuidada; e sabia que essa dor profunda
era muito pior do que qualquer doença física. No seu discurso, apontou,
em especial, à solidão, como um novo tipo de pobreza:
■Santa Tores a do Calcula 301

Recentemente, um homem se encontrou comigo na rua e me pergun­


tou: “A senhora é a Madre Teresa?” Eu respondi: “Sou.” Então ele
me disse: “Por favor, mande alguém a minha casa. A minha mulher
está meio louca e eu estou meio cego. Mas almejamos ouvir o som
amável de uma voz humana.” Eram pessoas abastadas. Tinham tudo
em casa. Porém, estavam morrendo de solidão, morrendo por ouvir
uma voz amável.
Como sabemos que alguém assim não vive do lado de nossa
casa? Sabemos quem são, onde estão? Vamos encontrá-las e, quando
as encontrarmos, vamos amá-las. Então, quando as amarmos, as
serviremos.
Hoje Deus ama tanto o mundo que entrega a vocês, me entre­
ga, para amarmos o mundo, para sermos o amor Dele, a compaixão
Dele. E um pensamento tão bonito para nós — e uma convicção —
de que vocês e eu podemos ser esse amor e essa compaixão.
Sabemos quem são os nossos próprios pobres? Conhecemos os nos­
sos vizinhos, os pobres da nossa área? É tão fácil falar e falar sobre os
pobres de outros lugares. Muitas vezes, temos os que sofrem, temos os
que estão sozinhos, temos as pessoas — idosas, indesejadas, sentindo-
se miseráveis — e estão perto de nós e nós nem sequer as conhecemos.
Nem sequer temos tempo para sorrir para eles.
A tuberculose e o câncer não [são] as grandes doenças. Penso
que uma doença muito maior é não ser querido, não ser amado. A
dor que estas pessoas sofrem é muito difícil de se compreender, de
se penetrar. Acho que isto é o que nossa gente em todo o mundo
está passando, em cada família, em cada casa.
Esse sofrimento repete-se em cada homem, em cada mulher e
criança. Penso que Cristo está sofrendo a Sua Paixão novamente.
E é você e sou eu que temos que ajudar-lhes — temos que ser Ve­
rônica,* ser Simão** para eles.

* Reza a tradição que Verônica enxugou a face de Jesus com o seu véu quando Ele estava a
caminho do Calvário.
** Simáo dc Cirenc ajudou a Jesus carregando a Sua cruz a caminho do Calvário (cf. Lucas
23,26).
302 \ c n h a , seja M i n h a luz

Os nossos pobres são gente fantástica, gente muito amável.


Não precisam da nossa pena nem da nossa simpatia. Precisam do
nosso amor compreensivo e precisam do nosso respeito. Nós pre­
cisamos dizer aos pobres que eles são alguém para nós, que eles
também foram criados pela mesma mão amorosa de Deus, para
amarem e serem amados.65

Nesse sofrimento, seu próprio e dos seus pobres. Madre Teresa re­
conhecia Cristo revivendo, mais uma vez, a Sua Paixão, agora nesse disfar­
ce angustiante. No começo do trabalho entre os mais pobres dos pobres,
encorajara o pequeno grupo de suas seguidoras a “encontrarem Jesus nos
buracos sem luz das favelas, nas mais deploráveis misérias dos pobres”.66
Agora, vinha encontrá-Lo também na solidão dos mais abastados.

W ão sei qual Sede é maior,


a 'Üele ou a minha por 8le”

Com uma fé que penetrava a escuridão da dor, Madre Teresa era capaz de
ir além das aparências e de perceber o rosto de Deus. Essa contemplação
da Paixão de Jesus, revivida nos pobres e no seu próprio coração, a con­
duzira, mais profrindamente, a uma compreensão e a uma experiência de
Sua sede. Em dezembro de 1980, escreveu ao Pe. Neuner:

Fico realmente muito feliz por saber que o senhor está perto de
mim na sua oração. Eu acho que é essa a força de que preciso
constantemente. — Durante este ano tive muitas oportunidades
de saciar a Sede de Jesus por amor — por almas. Foi um ano cheio
da Paixão de Cristo. — Não sei qual Sede é maior, a Dele ou a
minha por Ele.67

Em 1980, tendo em conta o grande número de comunidades de


Missionárias da Caridade espalhadas por todo o mundo, foi decidido
dividir essas Casas em doze regiões, e nomear uma superiora regional
correspondente, para ajudar Madre Teresa no governo da congregação.
■Santa -Teresa de Calcula 303

O trabalho pelos pobres florescia e doze novas fundações foram abertas


nesse ano. No entanto, ela escrevia ao Pe. Neuner: “Foi um ano cheio da
Paixão de Cristo.”í,H
E muito provável que o pe. Neuner tivesse pensado que a afirma­
ção se referia, antes de mais nada, à sua escuridão. Contudo, junto com
essa provação interior, a verdade é que ela se referia, também, à dolorosa
percepção de que nem todas as suas seguidoras estavam vivendo inteira­
mente de acordo com sua elevada vocação. Jesus não estava sendo amado
e servido nos pobres tão ardentemente como a Madre desejava que fosse.
Além disso, havia falhas no amor das Irmãs, umas pelas outras. Todas
essas deficiências a magoavam profundamente, sem que, no entanto, a
Madre desse nenhuma pista sobre essa dor na carta que escrevera ao Pe.
Neuner. Mas quando escrevia às Irmãs, carta após carta, levava a mesma
mensagem:

Minhas queridíssimas filhas,


Esta carta lhes leva o amor e a bênção da Madre — mas especial­
mente a alegria da certeza de que Jesus as ama, e apenas peço que se
amem umas às outras como Jesus ama cada uma de vocês — porque
ao se amarem umas às outras estão amando apenas a Jesus. [...]69

O u então:

Esta carta lhes leva o amor, a bênção e a oração da Madre para cada
uma de vocês, para que possam crescer cada vez mais na semelhança
com Cristo através da mansidão e da humildade, a fim de que as
Irmãs na comunidade e os pobres a quem servem sintam a Sua pre­
sença e o Seu amor em vocês e através de vocês, e aprendam de vocês
como amar Jesus, uns nos outros.70

Sendo as viagens que fazia mais freqüentes e também mais exi­


gentes, Madre Teresa tinha a impressão de que não estava dando atenção
suficiente às Irmãs, quando mais precisavam dela. Por essa razão, pediu ao
Papa que a liberasse dos compromissos públicos. Ela comunicou às suas
irmãs a resposta do Sumo Pontífice:
304 \ cnhu, scja Minlui luz

Depois de o Santo Padre ter feito um grande discurso às pessoas, eu


disse: “Santo Pe., quero falar com o senhor cinco minutos.” Ele se
sentou ali mesmo; e eu me sentei aos pés dele. Ele cruzou os braços
e pousou a cabeça sobre eles assim, olhando para mim. E me disse:
“A senhora tem problemas.” Eu respondi: “Santo Padre, estou tendo
grandes dificuldades. Tenho tantas Irmãs, são agora 342 na Casa-
-Mãe, na índia, elas precisam de mim e eu preciso delas, mas agora
estas contínuas solicitações.* E a sua vontade, eu sei, eu vou fazer
tudo o que o senhor disser, mas o que quer que eu faça?” E ele disse:
“Continue fazendo o que está fazendo. Não recuse a Jesus. Nunca
Lhe recusou nada antes, não recuse agora. Rezarei por você e darei
uma resposta na próxima vez que nos encontrarmos.” E foi assim,
com a simplicidade de uma criança. Foram essas as palavras que o
Santo Pe. me disse: “Não recuse a Jesus.” 71

O Santo Pe., a seu tempo, mandou-lhe uma nota: “Preste os cui­


dados necessários às Irmãs e cuidados amorosos aos pobres e às pessoas.”
E Madre Teresa observava: “Vejam, Irmãs, as coisas não são fáceis para a
Madre.” Não era, efetivamente, nada fácil dar menos tempo às suas Irmãs
e sair para o mundo. Mas a Madre escolheu “não recusar a Jesus”, que a
tinha desafiado, dessa vez, através do Seu representante na Terra. Era “re­
almente obediência cega”, afirmava ela. Escreveu ao Cardeal Picachy para
lhe fazer um pedido especial: “Quando vir o Santo Padre — peça-lhe que
reze por mim — desta vez a obediência é um Sacrifício.”72
Com a bênção da obediência, Madre Teresa prosseguia sua missão
de serviço aos pobres deste mundo. Instrumento dócil nas mãos de Deus,
deixava-O usar o seu nada para mostrar Sua grandeza, encarnando assim
a oração73 que, para ela, exprimia o objetivo de uma Missionária da Cari­
dade: espalhar a Sua fragrância por onde quer que fosse, ser o Seu brilho,
a Sua luz, e ser “apenas Jesus” para cada pessoa que encontrasse. Em tudo
isso, estava saciando a Sua sede de amor e de almas.

* Madre Teresa fazia referência aos inúmeros pedidos por sua presença em uma grande varie­
dade de eventos.
c a p ít u l o 13 I

Irradiar Cristo

JÁ NÁO EU, MAS APENAS JESUS

A alegria de amar a Jesusprovém da alegria de com­


partilhar os sofrimentos Dele. Por isso, não se deixem
perturbar ou angustiar, mas acreditem na alegria da
Ressurreição. Na vida de todos, assim como na vida
de Jesus, a Ressurreição chegará, a alegria da Páscoa
amanhecerá.
M adre T eresa

As duas últimas décadas da vida de Madre Teresa foram um período de


atividade intensa, mesmo enquanto sua saúde se deteriorava. Dotada
de uma energia extraordinária, ela percorria o mundo, proclamando a
boa nova do amor de Deus e da Sua presença nos mais pobres dos pobres.
Seu amor e zelo por Deus e pelas almas era ilimitado, inspirando-a a
abrir numerosas fundações em todo o mundo. Sua presença e suas palavras
tinham uma influência tal que, em 1985, Javier Pérez de Cuellar, o Secre-
tário-Geral das Nações Unidas, a considerou a mulher mais poderosa do
mundo. Entretanto, a terrível escuridão permanecia.
306 X n i h a , seja Alinh a luz

Jesus é a luz que eu acendo

Nada podia impedi-la de espalhar a luz do amor de Deus pelos lugares


mais turbulentos do mundo. Em agosto de 1982, aventurou-se a ir ao
Líbano — entáo devastado pela guerra — de onde escreveu às Irmãs:

Acabamos de deixar Beirute. — Tem sido uma contínua ação de


Deus, amando a nós e à Sua gente — através de contínuos atos de
amor em ternura e amor. — Trouxe comigo um grande círio pascal
com a imagem de Nossa Senhora com o Menino. — Na quinta-
-feira, os bombardeios foram terríveis. — Acendi o círio naquela
tarde por volta das 4 horas. — Às 3 horas, [tudo] parou de repente.
— Desde entáo há uma perfeita calma. — Atravessamos e trouxe­
mos 38 criancinhas deficientes físicas e mentais. — O círio acabou
na noite passada. — Se tiverem um círio pascal, acendam-no, por
favor, diante de Nossa Senhora em ação de graças — o resto eu lhes
contarei quando regressar.1

Em 1983, quando se encontrava em Roma visitando as casas da


congregação, caiu da cama e foi hospitalizada. Uma grave deficiência no
coração foi providencialmente detectada. Enquanto se encontrava no
hospital, Madre Teresa escreveu sua resposta íntima à pergunta que Jesus
faz em Mateus 16:15: “E vós, quem dizeis que Eu sou?”

Tu és Deus.
Tu és Deus de Deus.
Tu és Gerado, não criado.
Tu és Um em substância com o Pai.
Tu és o Filho do Deus Vivo.
Tu és a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade.

Tu és Um com o Pai.
Tu estás no Pai desde o princípio:
Todas as coisas foram feitas por Ti e pelo Pai.
Tu és o Filho Bem-Amado
■Santa Tore na de Calcutá 307

em Quem o Pai é complacente.


Tu és o Pilho de Maria,
concebido pelo Espírito Santo no ventre de Maria.

Tu nasccste cm Belém.
Tu foste embrulhado em faixas por Maria
e colocado na manjedoura cheia de palha.
Tu foste aquecido pela respiração do burro
(que transportara Tua Mãe Contigo no ventre).
Tu és o Filho de José,
o Carpinteiro, como era conhecido pelas pessoas de Nazaré.
Tu és um homem comum, sem grandes conhecimentos,
segundo o juízo dos sábios de Israel.

Q uem é J esus tara m im ?

Jesus é o Verbo Encarnado.


Jesus é o Pão da Vida.
Jesus é a Vítima oferecida pelos nossos pecados na Cruz.
Jesus é o Sacrifício oferecido na Santa Missa
pelos pecados do mundo e pelos meus.
Jesus é a Palavra — para ser falada.
Jesus é a Verdade — para ser dita.
Jesus é o Caminho — para ser percorrido.
Jesus é a Luz — para ser acesa.
Jesus é a Vida — para ser vivida.
Jesus é o Amor — para ser amado.
Jesus é a Alegria — para ser compartilhada.
Jesus é o Sacrifício — para ser oferecido.
Jesus é a Paz — para ser dada.
Jesus é o Pão da Vida — para ser comido.
Jesus é o Faminto — para ser alimentado.
Jesus é o Sedento — para ser saciado.
Jesus é o Despido — para ser vestido.
Jesus é o Desabrigado — para ser acolhido.
Jesus é o Doente — para ser curado.
Jesus é o Solitário — para ser amado.
Jesus é o Indesejado — para ser desejado.
308 l e n h a , seja M i n h a laz

Jesus é o Leproso — para as chagas limparmos.


Jesus é o Pedinte — para um sorriso lhe darmos.
Jesus é o Bêbado — para o escutarmos.
Jesus é o Deficiente Mental — para o protegermos.
Jesus é o Pequenino — para o abraçarmos.
Jesus é o Cego — para o conduzirmos.
Jesus é o Mudo — para por ele falarmos.
Jesus é o Aleijado — para com ele caminharmos.
Jesus é o Dependente de Drogas — para seu amigo nos tornarmos.
Jesus é a Prostituta — para do perigo a afastarmos e sua amiga nos
tornarmos.
Jesus é o Preso — para ser visitado.
Jesus é o Idoso — para ser servido.

Para mim
Jesus é o meu Deus.
Jesus é o meu Esposo.
Jesus é a minha Vida.
Jesus é o meu único Amor.
Jesus é o meu Todo em Tudo.
Jesus é o meu Tudo.
Jesus, eu o amo com todo o meu coração, com todo o meu ser.
Dei-Lhe tudo, até os meus pecados,
e Ele me desposou em ternura e amor.
Agora e por toda a minha vida
sou a esposa do meu Esposo Crucificado.
Amém.2

Embora a Madre tivesse se recuperado, suas forças começavam a


falhar, e, a partir desse momento, nunca mais voltou a passar grandes perí­
odos sem estar doente ou com dores físicas. Porém, permanecia continua-
mente ativa e ainda mais decidida — a qualquer preço — a dar o seu “Sim”
a Deus e “um grande sorriso para todos”. Manteve a mesma agenda ocu­
pada,’ praticamente até o final da vida, vivendo, plenamente, o seu quarto
voto de serviço gratuito e de todo coração aos mais pobres dos pobres.
O seu corpo começava a fraquejar, mas o espírito permanecia infatigável.
Queria conquistar o mundo com amor, como recorda uma das Irmãs:
•Santa -Teresa de ( ‘alcuta 309

Certo dia, a Madre trouxe um mapa da Europa e o abriu na minha


frente. Naquela época, a União Soviética ainda não tinha se desmem­
brado, e metade da Europa estava sob o domínio comunista, negando
vistos de entrada a missionários enquanto missionários. Mas a Madre
ia passando o dedo de país para país, dizendo: “França, estamos aqui.
Alemanha, estamos aqui. Áustria, estamos aqui. Hungria, ainda não.
Bulgária, ainda não.” Então, ela continuou. Depois, começou a con­
tar com os dedos onde “ainda não” estávamos. Ela estava seriamente
determinada a abrir “um tabernáculo” (ou seja, uma Casa) em cada
país do mundo. A Madre tinha uma visão ampla daquilo que queria
dar ao seu Senhor e seu Deus.

‘.y/ convicção do meu nada”

Nos últimos anos da sua vida, Madre Teresa dedicou grande parte do
seu tempo e de suas energias ao crescimento e desenvolvimento dos
ramos masculinos de sua família religiosa. O ramo dos Missionários
da Caridade Contemplativos, constituído por sacerdotes e Irmãos, foi
fundado em 19 de março de 1979, festa de São José. Um movimento
internacional destinado a promover a santidade dos sacerdotes — e de­
signado por Movimento Corpus Christi — foi oficialmente reconheci­
do pela Sagrada Congregação para o Clero, em 26 de junho de 1981,
festa do Sagrado Coração de Jesus; e os Pe.s Missionários da Caridade
tiveram início em 13 de outubro de 1984, em Nova York.
Em 1983, nas vésperas do quinto capítulo geral, Madre Teresa
voltou a expressar seu desejo de ser liberada das responsabilidades de
superiora geral e seu anseio por ser “apenas uma simples Irmã na co­
m unidade”, pensamentos que compartilhou com o cardeal Picachy:

Já escrevi às nossas Irmãs pedindo que rezem e que votem em outra


pessoa no meu lugar. Há muitas Irmãs que podem fazer ainda me­
lhor. Já fiz com a graça de Deus — muito — porque dei total liber­
dade a Jesus — sabendo que não sou capaz de fazer coisa nenhuma
por mim mesma. — A convicção do meu nada tornou a obra e toda
a Congregação complctamente Suas. Ele fará coisas ainda maiores se
310 \ cn ha . seja M i n h a laz

encontrar alguém que seja mais nada do que eu. (Não acho que tal
pessoa exista.) Eu ficarei feliz, muito feliz de ser liberada — e de ser
apenas uma simples Irmã na Com. [comunidade] — depois de quase
35 anos. — Anseio por isso. — Farei sempre o que a Igreja — através
do Santo Pe. e do senhor — quiserem que eu faça, mas anseio por ser
toda só para Jesus — através de Maria, uma simples M C .'

Mas não eram esses os planos que Deus tinha para ela. A Madre
foi reeleita superiora geral, uma decisão que aceitou como vinda das mãos
de Deus. Tal como fazia anteriormente, não se cansava de pedir orações
para a sua família religiosa: “Por favor, reze por nós em especial durante
a Santa Missa — para que não estraguemos a obra de Deus — que con­
tinue a ser Dele.”s
Foi nessa época que Madre Teresa decidiu revelar as suas lutas in­
teriores a outro sacerdote, o padre jesuíta Albert Huart,* da Província de
Calcutá. Recorda esse sacerdote:

Foi, muito provavelmente, no retiro que antecedeu o Capítulo Geral


de 1985. A Madre veio [...] me falar sobre a excruciante noite de sua
alma. Não era uma fase passageira, mas de um estado que se prolon­
gava há anos. O que me chamou a atenção imediatamente foi o que
ela acrescentou à descrição dessa noite dolorosa e prolongada: “Pe.,
sei que, quando abro a boca para falar com as Irmãs ou com as pesso­
as sobre Deus e a obra de Deus, isso lhes traz luz, alegria e coragem.
Mas eu não tiro nada daí. Dentro só há escuridão e a sensação de que
estou totalmente separada de Deus.” Aquilo me soou como João da
Cruz, pura e simplesmente.
O contraste entre sua noite interior e a capacidade que tinha de
comunicar Deus aos outros em palavras e obras me permitiu fazer tudo
o que estava ao meu alcance para lhe garantir que Deus operava po­
derosamente nela, e para animá-la a aceitar a escuridão como parte da
Sua obra. Mas nesse tipo de noite, algumas palavras bem-intencionadas
não permitem aliviar a dor, pelo menos de forma significativa.6

* Nascido cm 28 de março dc 1926, cm Namur, Bélgica. Entrou para a Sociedade de Jesus cm


10 de agosto de 1943, foi para a índia em 3 de novembro de 1953 e foi ordenado pe. cm abril
dc 1957. Pregou no retiro do Capítulo Geral, cm 1985. Foi confessor das M C na Casa-Mác,
de 1984 a 1998. Até hoje, continua sendo confessor em várias comunidades em Calcutá.
S a n ta Tcrr.sa de Ca lc utá 311

A “noite” continuava a ser tão escura como sempre. O pe. Huart


propõe uma metáfora, particularmente adequada, para a experiência pela
qual Madre Teresa passava:

Ao ouvi-la, a imagem que me ocorreu foi a de uma simpática casi­


nha exposta aos raios quentes e luminosos do sol, rodeada por uma
vegetação luxuriante e por flores, mas, lá dentro, completamente
escura e fria.7

A Madre tinha deixado de escrever sobre a escuridão e raramente


falava sobre o assunto, mas sofria por causa dela com a mesma intensida­
de com que sofrerá nos últimos 35 anos. Entretanto, apesar e por causa
disso, continuava sendo uma fonte de luz e de inspiração para outras
pessoas.

“Onde está Jesus?”


Houve outro sacerdote que, nos últimos anos da vida de Madre Tere­
sa, tom ou conhecim ento da profundidade de sua provação interior. O
pe. William G. Curlin,* naquela época em uma paróquia de Washington
D. C., recorda:

Tive o privilégio de dirigir diversos retiros espirituais a Madre Tere­


sa, em Calcutá, e mais tarde nos Estados Unidos, e recordo-me de
como era intensa a sua fome de aprofundar sua relação com Jesus
Cristo. Lembro-me em particular de um certo final de tarde, em que
Madre Teresa e eu estávamos discutindo sobre a aridez espiritual. Uma
das Irmãs ouviu a conversa e observou: “A Madre deve receber muita
consolação de Deus em apoio à sua missão entre os mais pobres dos

Bispo W illiam G. Curlin, nascido cm 30 dc agosto dc 1927, cm Portsmouth, Virginia,


EUA. Foi ordenado cm maio dc 1957 para a Arquidiocese dc Washington, onde sc tornou
bispo auxiliar cm dezembro dc 1988. Em abril dc 1994, tornou-sc Bispo da Diocese dc Char­
lotte, C arolina do Norte, tendo renunciado cm 2001.
312 X’c n ha . seja M i n h a luz

pobres.” Mais tarde, nesse mesmo dia, durante a Hora Santa, um dos
membros de sua Família religiosa me entregou uma nota escrita por
Madre Teresa. Eu li suas palavras e então olhei para onde estava senta­
da na Capela. A Madre me devolveu o olhar e em seguida ajoelhou-se
e voltou-se para o Santíssimo Sacramento, exposto no Sacrário. Aquele
gesto confirmou suas palavras: “Caro Pe., reze por mim. Onde está
Jesus?” Ao longo dos anos de minha amizade com Madre Teresa, ela
fez referências freqüentes à secura espiritual que acompanhava seu tra­
balho como Missionária da Caridade.8

Testemunha da primazia do amor


Embora estivesse em permanente contato com o sofrimento humano,
Madre Teresa nunca se habituou a ele. Deparar-se com um pobre sofrendo
provocava um verdadeiro impacto sobre ela e a fazia repetir: “Nunca vi tanto
sofrimento.” Madre Teresa via a grandeza de Deus na capacidade que os po­
bres tinham de suportar tantas dificuldades sem se queixarem e o testemunho
deles era fonte de força para ela, como expõe ao Pe. van der Peet:

Que amabilidade da sua parte ter escrito, apesar de eu não escrever —


mas sei que suas orações estão sempre comigo, bem como as minhas
pelo senhor, para que o senhor possa ser mais e mais humilde como
Maria e santo como Jesus. No dia de Natal fui a Adis [Abeba] — Etió­
pia, para estar com as nossas Irmãs e os seus Pobres. Não tinha me
lembrado de que o Natal deles é na realidade hoje. Nunca vi tanto so­
frimento — tanta dor e sem uma queixa. — Vi somente um Calvário
aberto — onde a Paixão de Cristo estava sendo revivida no corpo das
multidões e multidões de pessoas.
Já temos 4 casas e a 5a é um acampamento, com 8.000 pessoas
para alimentar e 600 homens, mulheres e crianças enfermos, alei­
jados, doentes mentais. Nossas Irmãs são, realmente, a presença de
Jesus para eles, o toque delas é tão suave, tão cheio de amor. — Reze
para que eu possa enviar mais algumas Irmãs. — São 7 milhões de
pessoas passando por esse sofrimento.9
■Santa Teresa de Calcutá 313

Muito mais honrarias continuavam sendo concedidas a Madre


Teresa, mas, a maior e mais querida, em sua opinião, foi a visita do papa
João Paulo II a Nirmal Hriday em Kalighat (a Casa dos Moribundos de
Calcutá), no dia 3 de fevereiro de 1986. Depois de ter cumprimentado
cada um dos doentes, o Santo Pe. fez uma breve reflexão, que resumia
todo o empenho de Madre Teresa:

Agradeço a Deus que a minha primeira parada em Calcutá tenha sido


em Nirmal Hriday Ashram, um lugar que testemunha a primazia
do amor. Através de Madre Teresa e das Missionárias da Caridade,
e através de muitos outros que aqui prestam serviço, Jesus tem sido
profundamente amado em pessoas que a sociedade considera serem
“os menores dos nossos Irmãos”. Nirmal Hriday é um lugar de sofri­
mento, uma casa familiarizada com a angústia e a dor, um lar para os
destituídos e os moribundos. Mas ao mesmo tempo, Nirmal Hriday
é um lugar de esperança, uma casa construída sobre a coragem e a fé,
um lar onde reina o amor, um lar cheio de amor. [...] Em Nirmal
Hriday, o mistério do sofrimento humano encontra-se com o misté­
rio da fé e do amor.10

Desejosa de estar perto de todos os diferentes “Calvários” nos


quais Jesus revivia — sob as mais diversas aparências — Sua Paixão, Ma­
dre Teresa também estava muito atenta às novas formas de sofrimento e
de pobreza no mundo. No final da década de 1980, os doentes de AIDS
eram objeto da sua especial preocupação e solidariedade, como escrevia
ao Pe. van der Peet, contando com suas orações:

Sei que continua rezando por mim, pois só isso me permite continuar.
O trabalho para a “AIDS” continua crescendo e a dar frutos. Nin­
guém morreu sem Jesus. Há tanto sofrimento entre os nossos pobres
em todo o mundo. — Estamos atualmente em 77 países com mais de
350 casas. Já pensou — pobres entrando no Céu por todos os lados
— [...] em Nova York — já são mais de 50 os que tiveram uma boa
morte — [...]
A princípio, S. Pedro não teria me deixado entrar no Céu, porque
no céu não havia favelas. — Mas agora o céu está cheio de gente das
314 Xc nha , seja M i n h a lu z

favelas. Jesus deve estar muito feliz por ter estes milhares chegando
até Ele, com amor de Calcutá —
Sei que vai gostar desta história do evangelho em toda sua realidade.
Por favor, reze por mim para que eu seja toda só para Jesus através
de Maria."

"Diga à Madre *Teresa: ‘Tenho sede’”

A missão que Madre Teresa tinha iniciado estava se desenvolvendo a


tal ponto e de tal maneira, que ultrapassava, e m uito, todas as suas
perspectivas iniciais. A Madre via a boa-nova do am or de Deus ganhar
vida no trabalho de sua comunidade. Ao mesmo tem po, sentia-se muito
angustiada ao pensar que ela e as Irmãs não estavam correspondendo,
inteiramente, ao pedido de Jesus:

Minhas filhas, vocês não sabem a terrível dor que há no meu coração
por não poder responder por completo à terrível sede que Jesus me
pediu que saciasse através da Congregação, através de cada uma de vocês.
Se eu estou me sentindo assim, pergunto-me como o Coração de
Jesus deve sentir. Não é neste momento novamente, como Ele fez em
10 de set., não está Ele olhando para cada uma de nós? “A escolhi e a
chamei para ser uma Missionária da Caridade para saciar a minha do­
lorosa sede, e onde está você?” Jesus disse a um sacerdote em Roma:
“Diga à Madre Teresa: ‘Tenho sede.’” Minhas filhas, ouçam o seu
próprio nome. Ele o está dizendo a vocês.12

Esse sacerdote, que era o confessor do noviciado em Roma, revela­


ria as circunstâncias da mensagem que transmitiu a Madre Teresa:

No Domingo de Ramos de 1987, eu estava sentado na capela de ora­


ção, em nossa casa geral. [...] Era uma sala pequena, especificamente
destinada à oração, mas não tinha o Santíssimo Sacramento presente.
Enquanto estava rezando a Oração da Manhã, em silêncio, com a Li­
turgia das Horas, um pensamento veio, subitamente, à minha mente
— como se alguém tivesse falado, mas eu não o tivesse ouvido com
•Santa Teresa de Calcutá 315

os meus ouvidos. Mas parecia bastante clara: “Diga à Madre Teresa:


‘Tenho sede.”’ “Que estranha interrupção na minha oração”, pen­
sei comigo mesmo. Sem pensar mais sobre isso, continuei rezando
o ofício. Minutos depois, “ouvi”, novamente (no meu pensamento):
“Diga à Madre Teresa: ‘Tenho sede.’” E voltei a pensar: “Que estra­
nho!” Então ergui os olhos para o enorme crucifixo pendurado na
parede e disse (não em voz alta): “O Senhor está falando comigo?” E
“ouvi” novamente (sob a forma de um nítido pensamento entrando
na minha mente): “Diga à Madre Teresa, ‘Tenho sede.’”
Naquele momento, senti que a inspiração vinha de Jesus, e a ouvi
não como um pedido, mas como uma ordem. Devo esclarecer aqui
que nunca tinha tido nenhuma experiência assim antes — e que
nunca mais voltei a ter outra. Não tenho tendência para me deixar
sugestionar. Nunca tive, e não espero ter visões nem locuções. Se sou
alguma coisa, sou por natureza desconfiado de manifestações “sobre­
naturais”. Contudo, me senti fortemente movido a responder a essa
inspiração específica. Por isso, fui para o meu quarto e escrevi uma
carta, à mão, a Madre Teresa, dizendo que talvez ela achasse que eu
estava louco, mas que me sentia movido a comunicar a minha expe­
riência. [...]
Quando me encontrei com Madre Teresa, a primeira pergunta
foi: “É o senhor que ouviu Jesus dizer: “Diga à Madre Teresa: ‘Tenho
sede’?” Eu respondi que sim, e que tinha lhe escrito uma carta sobre
a minha experiência. Ela olhou para mim por um momento e depois
me perguntou: “O que mais Ele disse?” Eu fiquei surpreendido com
a pergunta, mas respondi imediatamente: “Mais nada. Isso foi tudo
o que ‘ouvi’.” Então ela me perguntou: “E o que é que Ele quis dizer
com isso?” Ao que eu respondi: “Não sei. Eu só sei que me senti mo­
vido a lhe comunicar isso. Sou apenas o mensageiro.”

A “Voz” que ela ouvira pela primeira vez na viagem de trem para
Darjeeling estivera em silêncio durante muito tempo. Ela ansiara por vol­
tar a ouvi-la — e, agora, embora essa “Voz” amada não tivesse se dirigido
a ela diretamente, a Sua mensagem era clara: Ele continuava sedento e à
procura de alguém que O consolasse. E a Madre continuava ardendo por
“ser esse alguém”.
316 Vet ih a. seja Mi n h a luz

yix pessoas tem tanta fome de bens ”

No final de 1989, teve início uma nova fase na vida de Madre Teresa.
Devido ao agravamento dos problemas cardíacos, ela esteve, várias vezes,
às portas da morte. Em dezembro de 1989, depois de receber um marca-
passo permanente, a Madre escrevia ao Irmáo Roger deTaizé: “Uma coisa
muito boa foi fruto da minha doença — o mundo todo rezou ao mesmo
Deus para minha melhora.”13 Era importante para Madre Teresa que as
pessoas fossem atraídas para Deus e, se a sua doença ajudasse a fazer com
que isso acontecesse, ela ficava agradecida. Logo que recuperou um pouco
as forças, estava novamente em pé, espalhando o amor de Deus, de todas
as maneiras possíveis.
Na década de 1990, com o colapso do sistema comunista na Euro­
pa Oriental, recomeçaram as sua viagens, apesar do problema de coração
e contrariando os conselhos dos médicos. Ansiosa como estava por levar
a luz do amor de Deus aos países da Europa Central e da Europa O rien­
tal, que tinham sofrido restrições à liberdade religiosa, abriu fundações
na maioria dos países da antiga União Soviética, incluindo várias na
Rússia, naTchecoslováquia, na Hungria, e, finalmente, na Albânia. “As
pessoas têm tanta fome de Deus”, repetia, depois de testem unhar o pro­
fundo desejo por Deus, reprimido durante muitos anos nesses países.
Depois de ter visitado a Albânia, escreveria às Irmãs: “Tenho o senti­
mento de que Jesus e Maria me querem aqui nesta época de abertura de
igrejas no país da Albânia onde o amor de Deus tem sido tão rejeitado
por muitos anos e onde as pessoas estão espiritualmente famintas.”14

Ser toda só para Jesus através de Maria

Embora Madre Teresa viajasse intensamente, a congregação tinha se difun­


dido de tal maneira, que já não era fisicamente possível alcançar todas as
Irmãs, como desejava. Ela ficava ansiosa por estar presente com elas através
das cartas gerais que escrevia cada mês. Suas cartas eram cheias de gratidão,
encorajamento, conselhos e recomendações. Tinha muito a dizer às suas
Irmãs e Irmãos, e o tempo estava se esgotando. A Madre era uma guia, uma
mestra, um exemplo — mas era sempre, em tudo, uma mãe.
•Santa Teresa de Calcutá 317

LDM
Junho de 1990

Meus queridos filhos, Irmás, Irmãos, Sacerdotes, Missionários Lei­


gos, Colaboradores,
Esta carta lhes traz as minhas orações e a minha bênção a cada um
de vocês — o meu amor e a minha gratidão por cada um por tudo o
que foram c fizeram durante esses 40 anos — para compartilharem a
alegria de se amarem uns aos outros e aos mais Pobres dos Pobres.
A presença e o trabalho que vocês têm feito pelo mundo todo para
a glória de Deus e para o bem dos Pobres tem sido um milagre vivo
do amor de Deus e de vocês em ação. Deus mostrou a Sua grandeza
utilizando o nada — permaneçamos, então, sempre no nosso nada
— para darmos a Deus toda a liberdade de nos usar sem nos consul­
tar. Vamos aceitar tudo o que Ele nos der e dar tudo o que Ele tirar,
com um grande sorriso.
À medida que se aproximam as datas do Capítulo Geral, o meu
coração enche-se de alegria e de expectativa — das coisas belas que
Deus fará através de cada um de vocês, aceitando, com alegria, aquela
que Deus escolheu para ser a nossa Superiora Geral. Belos são os ca­
minhos de Deus se O deixarmos que nos use como quer.
Ainda estou na Europa Oriental. Os autênticos milagres que Deus
tem feito durante esses dias têm sido uma prova do Seu terno amor pe­
las suas MC e pelos nossos Pobres. Que a nossa gratidão seja uma firme
resolução de ser todo só para Jesus, através de Maria. Sejamos puros e
humildes como Maria e, certamente, seremos santos como Jesus.
A humildade é sempre a raiz do zelo pelas almas e da caridade.
Vemos isso em Jesus — na Cruz e na Eucaristia. Vemos em Maria
[que] foi, apressadamente, servir como uma serva15 — e não como
Mãe de Deus.
É muito importante, então, que nós, os MC, sejamos puros e
humildes. Um MC não pode viver uma verdadeira vida de MC nem
viver o 4o voto, sem um coração puro e humilde. Porque um coração
puro pode ver Deus nos Pobres16— um coração humilde pode amar
c servir a Jesus nos Pobres.
318 Ve nha , seja M i n h a luz

Lembrem-se dos cinco dedos* — A — Mim — o — fizestes.1’


Lembrem-se — o amor começa em casa — nossa comunidade —
nossa família.
Lembrem-se — as obras de amor são obras de paz.
Agradeçamos a Jesus por esses quarenta anos de terno amor que
Dele recebemos uns dos outros — e rezemos para crescer neste
amor uns pelos outros e pelos Pobres — aprofundando o nosso
amor pessoal e íntimo por Jesus e nos apegando mais a Jesus através
da oração e do sacrifício.
Tentem ser o amor de Jesus, a compaixão de Jesus, a presença de
Jesus, uns para os outros e para os Pobres que servem.
Tudo isto será possível se se mantiverem unidos a Maria, a Mãe
de Jesus e nossa Mãe. Ela os guiará e os protegerá e os guardará todos
só para Jesus.
Que nada nem ninguém os separe jamais do amor de Jesus18 e
de Maria, — Foi por súplica dela que a Congregação nasceu. —
Que seja novamente por sua súplica que a Congregação dê santos
à Santa Madre Igreja.
Lembrem-se onde quer que estejam — as orações, o amor, e a
bênção da Madre estarão sempre com vocês.

Deus os abençoe,
M. Teresa, M O 9

Nesta carta, Madre Teresa toca muitos aspectos centrais da vida


dos Missionários da Caridade, entre os quais se conta o “Evangelho dos
cinco dedos”— como ela gostava de lhe chamar: “A — Mim — o — fi­
zestes” — uma palavra para cada dedo (em inglês). Com isso, pretendia
que os Missionários da Caridade se lembrassem dos pobres — não se
limitando a respeitar a dignidade de filhos de Deus de cada um deles,
mas percebendo, também, a realidade sobrenatural da presença de Deus
em cada um deles.
Ela também queria que eles se lembrassem que “o amor começa
em casa”. Tinha insistido, em muitas das suas cartas e instruções, no fato

* Forque, em inglês, a frase seguinte tem cinco palavras: You did it to me.
■S'anta Teresa de Calcutá 319

de que só amando, primeiramente, aqueles que estavam mais próximos


é que sua família religiosa seria a construtora da paz que ela queria que
fosse. Costumava distribuir uns cartõezinhos, aos quais se referia como
“cartões de visita”, com um dos seus famosos dizeres impresso, mostrando
o caminho para a paz:

O fruto do silêncio é a oração.


O fruto da oração é a fé.
O fruto da fé é o amor.
O fruto do amor é o serviço.
O fruto do serviço é a paz.20

£m nome de L>eus e em nome dos 'Pobres

Madre Teresa foi intrépida missionária durante toda sua vida. Tinha ou­
vido a Voz de Deus, que a chamava a servir aos pobres. Tinha-se tornado,
por sua vez, uma voz que pedia em nome dos pobres. Armada com a fé,
náo tinha medo de enfrentar e desafiar os dirigentes mundiais para de­
fender os interesses dos membros mais vulneráveis da sociedade humana.
Uma carta aberta que escreveu aos chefes de estado dos Estados Unidos
e do Iraque, na esperança de que a guerra, então iminente, pudesse ser
evitada, é um exemplo eloqüente de sua coragem e de sua determinação:

2 dejaneiro de 1991

Caros Presidentes George Bush e Saddam Hussein,


Dirijo-me aos dois, com lágrimas nos olhos e com o amor de
Deus no coração, para suplicar-lhes pelos pobres e aqueles que se
tornarão pobres se a guerra, que todos receamos e tememos, vier a acon­
tecer. Imploro-lhes, com todo o meu coração, que trabalhem, que se
esforcem pela paz de Deus e por se reconciliar um com o outro.
Ambos têm razões para defender e um povo para cuidar, mas, por
favor, ouçam primeiro Aquele que veio ao mundo nos ensinar a paz.
Os senhores têm poder e força para destruir a presença e a imagem de
Deus, os Seus homens, as Suas mulheres e as Suas crianças. Atendam,
320 X c n h a , sa j a M i n h a l uz

por favor, à vontade de Deus. Deus nos criou para sermos amados
pelo Seu amor e não para sermos destruídos pelo nosso ódio.
A curto prazo, poderá haver vencedores e vencidos nesta guerra que
todos tememos, mas ela nunca poderá justificar — e nunca justificará
— o sofrimento, a dor e a perda de vidas que as suas armas provocarão.
Dirijo-me aos dois em nome de Deus, do Deus que todos ama­
mos e partilhamos, para implorar pelos inocentes, os nossos pobres
do mundo e aqueles que se tornarão pobres por causa da guerra. São
eles os que mais sofrerão porque não têm possibilidade de fugir. De
joelhos suplico por eles. Eles vão sofrer e, quando isso acontecer, sere­
mos nós os culpados por não termos feito tudo o que estava ao nosso
alcance para protegê-los e amá-los. Suplico por aqueles que ficarão
órfãos, viúvos ou sozinhos, por lhes terem matado os pais, os mari­
dos, os irmãos e os filhos. Imploro, por favor, que os salvem. Suplico
por aqueles que ficarão incapacitados e desfigurados. Eles são filhos
de Deus. Suplico por aqueles que ficarão sem casa, sem alimentos
e sem amor. Por favor, pensem neles como se fossem seus filhos. Fi­
nalmente, suplico por aqueles a quem será tirada a coisa mais pre­
ciosa que Deus pode dar, a vida. Imploro que salvem os nossos
Irmãos e as nossas Irmãs, seus e nossos, porque eles nos foram dados
por Deus para amar e proteger. Não nos é permitido destruir aquilo
que Deus nos deu. Por favor, por favor, permitam que a mente e a
vontade dos senhores sejam a mente e a vontade de Deus. Os se­
nhores têm o poder de trazer a guerra ao mundo, ou de construir a
paz. POR FAVOR, ESCOLHAM O CAM INHO DA PAZ.
Eu, as minhas Irmãs e os nossos pobres estamos rezando muitíssimo
pelos senhores. O mundo inteiro está rezando para que abram os seus co­
rações em amor a Deus. Poderão ganhar a guerra, mas qual será o preço
em termos de pessoas que são destruídas, incapacitadas, perdidas.
Apelo aos dois — ao amor de vocês, seu amor por Deus e por seu
próximo. Em nome de Deus e em nome daqueles que os senhores vão
empobrecer, não destruam a vida e a paz. Deixem triunfar o amor e a
paz e que os seus nomes sejam recordados pelo bem que fizeram, pela
alegria que espalharam e pelo amor que compartilharam.
Por favor, rezem por mim e pelas minhas Irmãs, que tentamos
amar e servir aos pobres porque eles pertencem a Deus e são amados
■Sanla T i r c s a r/r C al c u la 321

a Seus o lh o s , com o nós e os nossos p o b re s e s ta m o s re z a n d o p e lo s

s e n h o re s . R e z a m o s p a ra q u e a m e m e s u s te n te m a q u ilo q u e D e u s tã o

a m o r o s a m e n te c o n fio u a o s se u s c u id a d o s .

Q u e D e u s o s a b e n ç o e , a g o ra e se m p re .

Deus os abençoe,
M. Teresa, MCA

Madre Teresa não pregava apenas por palavras. Pregava, mais ain­
da, através de seus atos. Sempre que havia algum desastre ou ocorria uma
tragédia, lá estava ela com as Irmãs. Não julgava nem criticava; amava e
ajudava, de forma simples, mas eficaz. Em junho de 1991, escrevia à sua
família religiosa, de Bagdá — onde tinha aberto uma casa para crianças
deficientes e dado início a uma clínica móvel:

Bagdá 2316191

Meus queridos filhos de todo o mundo, cada um de vocês, Pe.s, Ir­


mãos, Irmãs, Colaboradores e leigos Missionários da Caridade,
Esta carta leva-lhes o amor, a bênção e as orações da Madre, para
que cresçam em santidade através do amor de uns aos outros e pelos
pobres a quem servem.
É um autêntico milagre do terno amor de Deus que tenhamos
sido autorizados pelo Governo do Iraque a entrar e estabelecer o
Convento das MC no coração da cidade de Bagdá em uma casa ofe­
recida pelo Gov. [Governo]. [...]
Os frutos da guerra são terríveis. Não se consegue entender
como pode um ser humano fazer tal coisa a outro ser humano — e
para quê? Rezemos para que o nosso trabalho de amor traga paz,
unidade e alegria.
No momento, há grande escassez de comida e medicamentos
e, como há centenas e centenas de casas que foram destruídas, não
sei quanto tempo demorará a reconstrução — por isso incluamos o
Iraque na nossa oração diária. [...]
Olhando para o povo — o Antigo Testamento toma-se tão vivo.
322 Xc nli a. seja M i n h a luz

Amanhã vamos visitar a “Babilônia”. Quem teria pensado que as


MC viriam até estes lugares — para proclamar a Palavra de Deus por
meio de obras de amor? Nunca pensei que a nossa presença desse
tanta alegria a milhares de pessoas. — Tanto sofrimento por toda a
parte — [...]
Olhando para o terrível sofrimento e os frutos da guerra — a
mesma coisa, eu estava pensando, poderá acontecer em conseqüên­
cia da falta de caridade em palavras e obras. — Nós não destruímos
edifícios — mas destruímos o próprio coração do amor, da paz e da
unidade quebrando assim o belo edifício que é a nossa Congregação
— construído com tanto amor por Nossa Senhora. —
Sei que todos amam a Madre e que fariam fosse o que fosse para
demonstrar o seu amor e a gratidão. Peço de vocês apenas uma coisa:
que sejam verdadeiros Missionários da Caridade e saciem a sede de
Jesus por amor, por almas, trabalhando pela salvação e a santificação
de sua comunidade e de sua família, os pobres que servem. Rezemos.

Deus os abençoe.
Madre22

“Scicio a Taa sede com o meu


amor e o sofrimento do meu coração”

Na sua mensagem para a Quaresma de 1993, o Papa João Paulo II insistia


na necessidade de ouvir a voz de Jesus que, “atormentado pela fadiga e
pela sede, diz à Samaritana junto ao poço de Jacob: ‘Dá-me de beber’
(João 4:7). Contemplai Jesus pregado na cruz, expirando, e escutai a sua
voz quase imperceptível: ‘Tenho sede’ (João 19,28). Hoje Cristo repete o
Seu apelo e revive os tormentos da Sua agonia nos nossos Irmãos e Irmãs
mais pobres”. Essas palavras impressionaram muitíssimo Madre Teresa:

Depois de ter lido a carta do Santo Padre sobre “Tenho sede”, fiquei
muitíssimo impressionada — não consigo nem expressar para vocês
o que senti. Sua carta fez com que eu me desse conta, mais do que
nunca, de como nossa vocação c bonita. Como é grande o amor de
•Santa Teresa de Ca lru ta 323

Deus por nós, ao ter escolhido a nossa Congregação para saciar essa
sede de Jesus por amor, por almas — nos dando o nosso lugar espe­
cial que ocupamos na Igreja. Ao mesmo tempo, estamos relembran­
do o mundo da sede Dele, algo que estava sendo esquecido. Escrevi
ao Santo Pe. para lhe agradecer. A carta do Santo Pe. é um sinal
para toda a nossa Congregação — para aprofundarmos mais naquilo
que é esta grande sede de Jesus por cada um. E também é um sinal
para a Madre, chegou o momento de falar abertamente do presente
que Deus deu em 10 de set. — de explicar o melhor que eu puder o que
significa para mim a sede de Jesus.23

Nos primeiros anos, Madre Teresa falava frequentemente às Irmãs


sobre saciar a sede de Jesus como sendo o único objetivo do seu trabalho.
Nos últimos anos, insistia nos meios de saciar a sede de Jesus. Depois da
mensagem de Quaresma do Papa, a sede de Jesus foi se tornando nova­
mente um tema mais recorrente nas cartas e instruções que Madre Teresa
escrevia aos seus seguidores, compartilhando com eles aquilo que vivia.
Todo o seu trabalho, os seus sofrimentos e as suas alegrias, não eram mais
do que meios para esse fim. A Madre tinha voluntariamente abraçado e
oferecido até a sua dolorosa escuridão interior para saciar a sede Dele,
e estava disposta a fazê-lo com “cada gota de sangue”.24
O aspecto mais difícil da continuada escuridão interior era a sua
insaciável sede por Deus. Tinha descoberto o significado dessa escuridão e
aprendido a viver em paz com ela, mas ainda não era capaz de satisfazer a
sede que tinha Daquele “que o meu coração e a minha alma anseiam por
possuir”.25 O desenvolvimento da congregação, o sucesso da missão, os
louvores do m undo — nada disso conseguia aplacar essa sede de Deus.
A Madre entendia muito bem essas palavras de Jesus: “Tenho
sede”, pois tinha encarnado um pouco da sede Dele por almas durante
mais de trinta anos. Sabia o que Jesus tinha sentido e, apesar da idade —
tinha, então, oitenta e três anos — queria saciar a sede que Jesus tinha por
amor e por almas. Ela podia deixar dc falar da sua escuridão, mas não era
capaz de deixar de falar sobre a sede Dele.
Um ano depois de ter sido publicada aquela mensagem de Quares­
ma do Santo Pe., estava no Vietnã abrindo uma nova casa para a comuni-
324 Xcn ha, s ( ja M i n h a luz

dade. Como se encontravam na Semana Santa, Madre Teresa aproveitou


esse momento especial para encorajar toda a sua comunidade a escutar,
com atençáo, a sede de Jesus:

L. D. M.
Vietnã, 29/03/1994

Minha querida Ir. M. Frederick e todas as que vivem na Casa-Mãe e


por todo o mundo,
Esta carta leva as orações, o amor e a bênção da Madre.
Espero e rezo para que sejam todas um só coração, cheio de amor,
no coração de Jesus por meio de Maria.
Como esta semana é um período especial para Jesus e para nós, de
maior amor e maior união, tentemos de forma especial aproximar-
-nos do Coração de Jesus tanto quanto [o] coração humano consegue
e tentemos compreender o melhor possível a terrível dor de Jesus cau­
sada pelos nossos pecados e a Sua Sede do nosso amor. — Ele nunca
sentiu esta dor tanto como durante esta semana tão preciosa para Ele
e para nós. — Não é de estranhar que sobressaísse tão claramente
nos últimos momentos da Sua vida humana quando disse: “Tenho
sede.” Graças a Deus que Nossa Senhora ali estava para compreender
inteiramente a sede de Jesus por amor. — Ela deve ter respondido
imediatamente: “Eu irei saciar-Te a sede com o meu amor e os sofri­
mentos do meu coração.”
“Jesus, meu Jesus, Te amo” — com que clareza. O total abandono,
a amorosa confiança dela, devem ter saciado a Sua sede por amor por
almas. — É por isso que é muito importante permanecer muito per­
to de Nossa Senhora, como fizeram S. João e Sta. Maria Madalena.26
Pergunto-me com frequência o que terão eles sentido quando ouvi­
ram Jesus dizer “Tenho sede”. É por isso, meus filhos, que esta sema­
na é tão importante para a vida da nossa Congregação c [a] razão dc
nossa existência como MC, saciar a sede de Jesus na Cruz por amor,
por almas, trabalhando pela salvação e a santificação dos mais pobres
dos pobres. — Quem são os mais pobres dos pobres? — As minhas
Irmãs, os meus Irmãos, os meus Pe.s, cada membro da nossa família
MC É aí que este maravilhoso presente de amor — dc saciar a sede
de Jesus por amor, por almas — começa.
•Santa Teresa de Calcutá 325

E por isso, meus filhos, que devemos aprofundar o nosso conhe­


cimento da sede de Jesus na Cruz, na Eucaristia e em cada alma que
encontramos, porque este conhecimento irá nos ajudar a sermos san­
tas como Jesus e como Maria. [...]
Espero que estejam todos bem, onde quer que estejam fazendo
a obra de Deus com grande amor. — Peço-lhes, novamente — por
favor, pelo amor de Deus e pelo amor da Congregação, esforcem-se
por ser santos. Tudo por Jesus através de Maria.
Uma Santa e Feliz Páscoa para todos.

Deus os abençoe.
Madre27

Muitos anos antes, Madre Teresa tinha pedido ao Pe. Neuner que
a ajudasse a crescer em uma “profunda união pessoal do coração humano
com o coração de Cristo”.28 Ela fora atraída para o Sagrado Coração de
Jesus e tinha experienciado Sua sede. Com seu amor, seu serviço, e, em
especial, sua escuridão, saciava o Coração sedento de Cristo. Consumia,
agora, as últimas gotas de sua energia para inculcar o mesmo anseio nos
membros de sua família religiosa.
Insistia para que as Irmãs permanecessem “muito perto de Nossa
Senhora”, afirmando, frequentemente, que “foi da sua súplica [da Bem-
-Aventurada Mãe de Deus] que a Congregação nasceu e por sua contínua
intercessão que cresceu”.29 Durante muitos anos, Madre Teresa deixou as
Irmãs perguntando a si próprias sobre a origem dessa declaração. Somen­
te depois da sua morte passariam a ter conhecimento das três visões que
Madre Teresa teve, nas quais Nossa Senhora lhe suplicava que respondes­
se ao chamado de Jesus e ao chamado dos pobres.
O Pc. Van Excm ajudara generosamente Madre Teresa c as Mis­
sionárias da Caridade desde o início, e continuou sendo um fiel diretor e
um apoio seguro até o fim. Na última carta que escreve a Madre Teresa,
que se encontrava no hospital em estado crítico, o sacerdote recorda-lhe
o papel essencial que Nossa Senhora desempenhara na última parte da
viagem dela:
326 \ c n h a , seja Mi n h a luz

Cara Madre,
Amanhã de manhã rezarei a Santa Missa
1. para que a senhora não tenha que ser operada
2. para que possa estar na China em 7 de outubro de 93
3. para que o Senhor me leve e não a senhora, se for essa a Sua
Vontade. A Vontade Dele e não a minha.
Estou com a senhora e com as Irmãs, com todas elas.
Há um Calvário para cada Cristão. Para a senhora, o caminho
para o Calvário é comprido, mas Maria veio ao seu encontro na estra­
da. A senhora não subiu a colina, isso fica para mais tarde.
Eu adoro ao Santíssimo Sacramento, que estou certo de que tem
no seu quarto.
Reze por mim e por todos os meus companheiros, em especial
pelos companheiros de Jesus com quem estou.

Sinceramente seu em N. 5. [Nosso Senhor]


C Van Exem, 5 /°

O pe. Van Exem morreria quatro dias depois.

•Sem levar em conta o preço

Madre Teresa tinha se dado por inteiro para responder ao chamado de


Deus, sem levar em conta o preço. A fecundidade do seu apostolado cus­
tara muitos anos de sacrifício — fato que as Irmãs que viviam mais perto
dela não podiam deixar de perceber:

Ela deve ter passado um martírio. Suas extensas viagens em trens


lotados, apenas terceira classe, suas caminhadas diárias às favelas, no
meio do pó e da sujeira, cansada, com fome, com sede, sem qual­
quer privacidade — a porta do quarto dela estava sempre aberta — ,
sem ventilador, nem sequer no auge do calor, quartos pequenos, ca­
pelas pequenas, uma cama de ferro estreita e dura: tudo isso e mais,
sem uma única queixa! [...] Limitava-se a dizer, quase diariamente:
“Tudo por Jesus” — só isso, sem comentários, nada. [...] E, quan-
•Santa Teresa de Calcutá 327

d o passava po r p r o v a ç õ e s e s p e c ia is , o u c o is a s a s s im , n o s e n s in a v a :

“ S a b e m , e is to é a o p o r tu n id a d e d e u m a m o r m a io r .”

E esses eram apenas os sacrifícios que os outros observavam. Os


excruciantes sofrimentos interiores, esses ela mantivera bem escondidos,
de maneira que até as pessoas que viviam mais perto dela só tiveram opor­
tunidade de comentá-los em retrospectiva:

Jesus usou todos os sofrimentos pelos quais a Madre passou na noite


escura do espírito para abençoar o trabalho. A obra Dele prospera­
va, mas a Madre sofria imensamente. Mas a Madre estava totalmen-
tc abandonada àquilo que o Senhor quisesse.

Em meio a todas as suas atividades e a uma constante dor interior,


Madre Teresa estava plenamente envolvida na vida de comunidade com
as sua Irmãs. Durante as extensas viagens, às vezes chegava ao destino
depois da meia-noite, mas nem por isso deixava de se levantar às 4h40 da
manhã, ser a primeira na capela para as orações da manhã e pronta para
cumprir o exigente horário de trabalho preparado para aquele dia. Essa
rotina prosseguiu até pouco antes de sua morte:

Durante os anos de 1994 e 1995, a Madre levou uma vida normal,


mantendo todos os horários da comunidade, recebendo visitas, aten­
dendo ao telefone etc. De vez em quando, tinha acessos de tosse e
resfriados, malária etc. Tinha quebrado uma clavícula e fraturado três
costelas devido a uma queda em Roma, mas isso não era suficiente
para deixar a Madre na cama. Estava sempre com pressa de dar Jesus;
nunca pensava cm si mesma. Com mais de oitenta anos, certamente
não era fácil ter um dia tão intenso para depois, todas as noites, se
ocupar com a correspondência. Mas a Madre entregava-se por com­
pleto.

Q uando ia visitar as casas da congregação, participava com as ou­


tras Irmãs da realização das tarefas mais simples. Seu exemplo falava com
mais eloqucncia do que as suas palavras, como testemunha uma Irmã:
328 X'cnha, s e j a M i n h a l uz

L e m b ro -m e d e q u e , c e rta v ez e m q u e a M a d r e v e io a B a to n R ouge,

eu o b se rv a v a c a d a p a sso da M a d re . D e p o is d e te rm o s a lm o ç a d o , a

M a d re a ju d o u -n o s a la v a r a lo u ç a e fo i a p r im e ir a a pegar o pano

p a ra ir lim p a r a m e s a . H a v ia um a m u ltid á o de pesso as lá f o r a por

c a u s a d a M a d r e e a q u i e s ta v a e la , f a z e n d o o s m a is h u m ild e s tra b a ­

lh o s , c o m o q u a lq u e r Irm ã .

Madre Teresa aceitava todos os sofrimentos — interiores ou exte­


riores — que Deus lhe enviava como um privilégio, aproveitando-os para a
realização do objetivo de sua congregação. Mas não vivia com uma atitude
de resignação passiva ou de incapacidade pessoal, mas irradiava a alegria de
pertencer a Deus, de viver com Ele. Ela sabia que, após a dor da Paixão, a
alegria da ressurreição amanheceria.

“j.ligo realmente belo para (£)eiis”


Nos últimos anos de sua vida, a correspondência que a Madre mantinha
ficou quase toda reduzida a curtas notas, mas que transmitiam, de forma
sucinta, os seus pensamentos, os seus desejos e as suas orações. Muitas
vezes, eram apenas exortações de encorajamento, a sua expressão simples
ocultando uma sabedoria profunda:

Deus está enamorado de nós e continua se entregando ao mundo —


através de você — através de mim. [...]
Que continue a ser um raio do sol do Seu amor para os seus, fa­
zendo assim, de sua vida, algo realmente belo para Deus.31

Fazer “algo realmente belo para Deus” não era apenas um lema
atrativo; era como ela tentava, desde há muitos anos, demonstrar o seu
amor por Jesus, fazendo tudo da forma mais bela que podia para Ele.
Considerava a possibilidade de abraçar o mistério da cruz em sua vida
como uma oportunidade de fazer algo realmente belo para Deus e de le­
var o Seu amor aos que viviam na escuridão. Ela passava esse ensinamento
a uma das suas colaboradoras:
■Santa Teresa de Calcula 329

Neste momento da Quaresma, um momento de maior amor, quan­


do olhamos para tudo o que Jesus escolheu sofrer por amor a nós,
para nos redimir, rezemos por toda a graça de que precisamos para
unirmos os nossos sofrimentos aos Dele, a fim de que muitas almas,
que vivem na escuridão e na miséria, possam conhecer o Seu amor e
a Sua vida.
[...] Que Nossa Senhora seja uma mãe para você e a ajude a per­
manecer junto à Cruz com muito amor.
Rezo para que nada possa enchê-la de dor e tristeza, a ponto de
você esquecer a alegria de Jesus Ressuscitado.32

“talou muito feliz por Sfie dar este presente”


Aos oitenta e cinco anos, Madre Teresa continuava ansiosa por receber
conselhos e orientações espirituais com humildade e simplicidade. O bispo
Curlin testemunhou essa sua característica:

Lembro-me especialmente do último encontro que tivemos em Char­


lotte, quando ela aqui esteve, em 1995. Nessa noite, conversamos em
particular durante uma hora, discutindo sua vida espiritual. Quando
eu sugeri que oferecesse aquela aridez espiritual a Deus como um pre­
sente especial, reagiu com grande entusiasmo, repetindo várias vezes:
“Que presente tão maravilhoso de Deus, permitir-me oferecer-Lhe
o vazio que sinto. Estou muito feliz por Lhe dar este presente.” [...]
Nas conversas telefônicas que se seguiram ao nosso último encontro,
ela dizia invariavelmente que continuava oferecendo aquele presente
interior e secreto.33

Assim, apenas dois anos antes de sua morte, Madre Teresa aceitava
prontamente a sugestão de oferecer a Deus aquela inseparável “companhei­
ra de viagem”. Desde o início da década de 1960 que o fazia como pane do
seu chamado a identificar-se com Jesus e com os mais pobres dos pobres.
Agora, ratificava uma vez mais esse oferecimento. De acordo com as evidên­
cias existentes, permaneceu naquele estado de fé “escura” e total abandono
até sua morte, oferecendo até o fim esse presente oculto e maravilhoso.
330 X’c n l n j. seja M i n h a luz

Ela oferecia a Deus, não apenas a escuridão em que vivia, mas


também a memória da luz que Ele lhe tinha concedido no início do
chamado para servir aos pobres. Uma das Irmãs recorda:

Certa tarde em que eu estava sozinha com a Madre, disse-lhe que se


aproximava o Jubileu de ouro do nosso Dia da Inspiração. E a Madre
disse: “Sim, mas — que estranho que ninguém tenha me perguntado
sobre a Inspiração. Mas é muito difícil de explicar. Eu disse [a Jesus]
que levasse tudo, para que eu não tivesse que explicar. Sei, compre­
endo, mas não consigo explicar. Quando tornamos algo público, ele
perde a santidade.” Isso me deu uma pista sobre a profundidade da
humildade e do desprendimento da Madre. E também me fez com­
preender por que a Madre mudava sempre de assunto quando lhe
pedíamos que nos falasse da Inspiração.

“<?/« fica só olhando , e olhando ,


p olhando para aquela caixa ”

Em 1996, a saúde de Madre Teresa deteriorou-se visivelmente, e houve


períodos em que foi necessário interná-la no hospital. Um dos sacerdotes
da Congregação recorda os seus sofrimentos e as forças que retirava da
Eucaristia naqueles momentos difíceis:

Na sua última enfermidade [em 1996], ficou com frequência no hos­


pital. Estava literalmente presa na cama, pregada à cruz. Quando re­
cuperava a consciência, tentava imediatamente fazer o sinal da cruz
— mesmo quando tinha o braço cheio de agulhas das máquinas etc.
Ela me falou como poderia tornar-me um sacerdote santo: “A primeira
coisa de manhã”, disse-me, “beije o crucifixo. Ofereça-Lhe tudo o que
disser ou fizer ou pensar durante aquele dia. Ame-O com um amor
profundo, pessoal, íntimo — e se tornará um sacerdote santo.”
Nos últimos anos da sua vida, a Madre recebeu a graça de ter o
Santíssimo Sacramento no quarto do hospital, e queria tê-Lo sempre
consigo. [...] [Em agosto] teve outra parada cardíaca ali mesmo na
nossa frente. Um tubo foi colocado em seus pulmões, para ajudá-la a
respirar c aliviar a pressão do coração.
■Santa T e n s a de Calcula 331

Antes de os tubos serem finalmente retirados, [o médico] disse:


“Pe., vá para casa e traga aquela caixa para a Madre.” Por momentos,
eu fiquei sem saber o que ele queria dizer: “Que caixa — a caixa dos
sapatos?” Ele respondeu: “Aquela caixa, aquele templo que costumam
trazer-lhe e que colocam no quarto, para onde a Madre está sempre
olhando. Se o senhor o trouxer e o colocar aqui no quarto, a Ma­
dre ficará calmíssima.” Percebi que ele se referia ao Tabernáculo com
o Santíssimo Sacramento. Ele me disse: “Quando a caixa está aqui no
quarto, ela fica só olhando, e olhando, e olhando para aquela caixa.” O
médico hindu foi uma testemunha involuntária do poder que a Euca­
ristia tinha sobre nossa Madre.34

queroJesus”

No final daquele ano, Madre Teresa voltou a estar às portas da morte. A


agonia foi testemunhada por outro membro da sua família religiosa:

Em dezembro de 1996, os problemas de saúde da Madre atingiram


um clímax, e o mundo inteiro estava muito preocupado com o seu
estado crítico. Madre Teresa também sofria muito, náo só em corpo,
mas também em espírito e parecia triste e abatida. Estava claro, para
os que a tinham conhecido ao longo dos anos, que seu espírito estava
passando por uma espessa névoa e que o demônio estava tentando se
aproveitar daquele momento oportuno. De tal maneira que, na ma­
nhã de um certo dia de dezembro, depois da Santa Missa no quarto
dela, eu me preparava para ir embora, quando ela me disse em voz
muito baixa: “Jesus está pedindo um pouco demais.” Era como se
seu bem-amado Jesus estivesse revivendo a Sua agonia nela, a fim de
voltar a redimir o mundo da escuridão do pecado. Depois de rodas
as dificuldades e dos sacrifícios pelos quais Madre Teresa passara ao
longo de anos pelo seu bem-amado Esposo, era de se esperar que
tivesse um fim mais sereno e tranqüilo. Mas, em vez disso, lá estava
ela, uma mulher de tristeza, conhecedora do sofrimento, suportando
as dores e os fardos da Congregação e dos mais pobres dos pobres.
332 X u i h a . s ( ja M i n h a luz

Tinha as mãos azuis, como se suportasse as chagas que os pregos ha­


viam deixado na carne de Jesus. Tal como “nas Suas chagas nós fomos
curados”, assim também agora nas chagas dela, nas dores dela, nós
éramos curados e reconfortados.'"

Madre Teresa tinha admitido, com toda a simplicidade: “Jesus está


pedindo um pouco demais”; mas ainda aceitava tudo o que Ele lhe pedia.
Ela pertencia a Ele e Ele era o seu único desejo. As Irmãs que cuidaram
dela durante aquele período ficaram impressionadas com o tanto de sofri­
mento que a Madre era capaz de suportar. Porém, ficaram ainda mais edi-
ficadas com o fato de, no que parecia ser a agonia final, ela apenas querer
Jesus. Uma das Irmãs, que também é médica, recordaria mais tarde:

Nesse ano [1996], que sofrimento ela passou! Nunca vi, em toda a
minha vida, sofrimentos físicos como aqueles que a Madre suportou.
Não conseguia falar, não conseguia se mexer porque tinha o respira-
dor e o tubo bronquial presos com fita. Ela fez um sinal para pedir
uma caneta, mas não conseguiu escrever corretamente o meu nome.
Por dois ou três dias o tentou. Por fim, certo dia de manhã, a Madre
escreveu: “Eu quero Jesus.” Pedimos ao Pe. Gary que viesse aquela
manhã, bem cedo, às 5h da manhã. Depois da Missa, ele conseguiu lhe
dar uma gota do Precioso Sangue. A Madre começou a melhorar. E
isso foi uma pista. [...] Todos, crentes e não crentes, perceberam que
as forças dela vinham de Jesus e de que apenas com Ele, em amor e
união, ela era capaz de passar por aquela dor e agonia terríveis.36

Outra Irmã que assistiu a esse episódio reflete igualmente sobre o


significado seu:

Mas o mais comovente de tudo foi quando ela escreveu em um


papel, certo dia de manhã cedo, o número de telefone da Casa-Máe
e as palavras: “Eu quero Jesus.” Aquelas palavras significavam
volumes inteiros sobre o sofrimento da Madre e o amor que ela
tinha por Deus.
•Santa Teresa de ( a le n ta 333

“-W uma vítima 1)elo


—estar à Sua disposição”

Madre Teresa acabou se recuperando dessa doença quase fatal, perma­


necendo à frente da congregação até março de 1997 (seis meses antes de
morrer), momento em que, para sua grande alegria, a Irmã M. Nirmala
Joshi foi eleita para sucedê-la. Em maio, contrariando os conselhos dos
médicos, Madre Teresa partiu para aquela que seria a sua última viagem
a Roma, Nova York e Washington, D.C. A Irmã Nirmala tinha cons-
-ciência da gravidade da situação, mas também conhecia as motivações
que estavam por trás da determinação de Madre Teresa:

[O médico] mostrou-se absolutamente contrário à viagem da Madre


aos EUA, porque era perigoso demais para a vida dela. Eu compre­
endi como eram importantes as Profissões religiosas das Irmãs para a
Madre. Pois, em cada Profissão, ela oferecia a Jesus muitas almas con­
sagradas para saciar Sua sede por elas e pelas almas. [...] Era, talvez,
a última vez que a Madre teria oportunidade de fazer isso. Essa era a
sua missão de saciar a sede de Jesus por amor e pelas almas. Eu sabia
que devia apoiar a decisão da Madre de ir aos EUA com esse propó­
sito, mesmo correndo risco de morrer. Se a Madre tivesse perdido a
vida durante a viagem, isso teria significado a consumação de sua vida
no cumprimento de sua missão, para a qual Jesus a tinha chamado.
Isso seria sua alegria e sua glória.37

Q uando, em julho, regressou a Calcutá, após uma viagem intensa


e m uito fatigante, Madre Teresa comentou simplesmente a uma amiga:
“O meu trabalho está concluído.” Estava radiante por “voltar a casa”, à
Casa-Mãe, à sua bem-amada Calcutá, onde sempre desejara morrer. Uma
das Irmãs observou: “Depois da sua volta de Roma [...], a Madre andava
extremamente feliz, alegre, otimista c conversadora. Tinha o rosto sempre
radiante, m uito divertida. O Senhor deve ter lhe revelado que o fim da
sua vida era iminente.”
Alguns dias antes da morte de Madre Teresa, uma das Irmãs assis­
tiu a uma cena que confirma sua heróica fidelidade ao voto privado que
fizera de nada recusar a Deus:
334 Vcn h a , seja M i n h a luz

Vi a Madre sozinha, voltada [...] para uma imagem da Sagrada Face


[...] e estava dizendo: “Jesus, nunca Te recusei nada.” Pensei que ela
estava falando com alguém. Voltei a entrar. E voltei a ouvir a mesma
coisa: “Jesus, nunca Te recusei nada.”38

Madre Teresa cumprira a promessa que fizera a Deus. T inha conse­


guido não recusar nada a Jesus durante 55 anos, recebendo cada situação
como uma nova oportunidade de ser fiel ao amor a que se comprometera.
Desde os primeiros tempos da congregação sempre se esforçara
por instruir as suas seguidoras para que nada recusassem a Deus e para
que oferecessem as suas vidas a Ele, sem reservas. A visão que tinha de
uma verdadeira Missionária da Caridade era realmente exigente, como
ela própria escrevia na Explicação das Constituições Originais da ordem:

O verdadeiro amor é abandono. Quanto mais amamos, mais nos


abandonamos. Se amamos realmente as almas, temos que estar pron­
tas a tomar o seu lugar, a tomar sobre nós os seus pecados e a en­
frentar a ira de Deus. Só assim nos tornamos meios para elas, e elas
se tornam o nosso fim. Temos que ser holocaustos vivos, porque o
mundo precisa de nós como tais. Porque ao dar o pouco que possuí-
-mos, damos tudo — e não há limites para o amor que nos impele a
dar. Entregar-se completamente a Deus é ser Vítima Dele — vítima
do Seu amor indesejado — do amor que fez o coração de Deus amar
tanto os homens. Este [é] o espírito da nossa Congregação — um
espírito de completa entrega a Deus. Não podemos ficar satisfeitos
com o que é comum. O que é bom para outros religiosos pode não
ser suficiente para nós. Temos que saciar a sede de um Deus infini­
to, morrendo de amor. Só o abandono total pode satisfazer o desejo
ardente de uma verdadeira Missionária da Caridade. Ser uma vítima
Dele — estar à Sua disposição.39

Era isto que ela própria era há várias décadas — uma verdadeira
Missionária da Caridade, uma vítima pelos outros. E através de todos os
sofrimentos que isso implicava, vivia com uma alegria profunda, originada
na resposta de todo coração que dera ao chamado de Jesus. Embora os
últimos dias de sua vida continuassem a ser marcados pela dor, física e
•Santa Teresa de C alc uta 335

espiritual, os que a rodeavam percebiam que ela estava se preparando


conscientemente para o momento de seu encontro com Deus, e que o
pensamento de “ir para casa, para Deus”, a enchia de alegria. Uma das
Irmãs recorda esse período:

No final, a Madre falava [...] tanto do Céu e dava mostras de um in­


teresse tão profundo por cada Irmã. [...] A Madre era muito amorosa
e afetuosa; e estava muito alegre e radiante.

E um dos sacerdotes Missionários da Caridade recorda, também:

À medida que se aproximava do final da vida, quando falava, se po­


dia escutar na sua mensagem um anseio (sede) por estar com Jesus,
um anseio de “ir para casa, para Deus”. Se alguém lhe implorava:
“Madre, não nos deixe. Não podemos viver sem você”, ela respondia
apenas: “Não se preocupem. A Madre poderá fazer muito mais por
vocês quando estiver no Céu.”40

No dia 5 de setembro de 1997, por volta das 20h, a Madre se


queixou de uma aguda dor nas costas, situação que logo se agravou por­
que também não conseguia respirar. As Irmãs da Casa-Mãe alarmaram-se,
tendo feito tudo o que era possível para ajudá-la. Chamaram um médico
e um sacerdote. Inesperadamente, faltou energia elétrica e a casa ficou
com pletamente no escuro. Prevendo uma emergência, as Irmãs dispu­
nham de duas fontes de eletricidade independentes, mas ambas caíram ao
mesmo tempo — o que nunca tinha acontecido antes. Os socorros médi­
cos, imediatos e especializados, nada puderam fazer, pois não era possível
ligar o respirador. Eram 21h30. Com Calcutá mergulhada na escuridão,
extinguia-se a vida terrena daquela que tanta luz levara a essa cidade e a
todo o m undo. Mas sua missão não acabou: do Céu, ela continua respon­
dendo ao chamado de Jesus: “Venha, seja Minha luz. ”
Conclusão
Em um tempo de escuridão, ela é uma luz ardente
e brilhante; em um tempo de crueldade, é uma
encarnação viva do evangelho de amor de Cristo;
em um tempo sem Deus, é o Verbo que habita no
meio de nós, cheio de graça e de verdade. Por isso,
todos os que tiveram o inestimável privilégio de
conhecê-la, pessoalmente ou não, devem se sentir
eternamente gratos.
M alco lm M u g g e rid g e 1

“Venha, seja Minha luz —leve-Me


aos buracos oncle vivem os pobres ”

“Madre, você foi uma fonte de luz neste mundo de escuridão”, procla­
mava um dos inúmeros cartazes que os cidadãos de Calcutá ergueram no
funeral de Madre Teresa. O tema deste livro foi o segredo da abundante
luz e amor que Madre Teresa irradiava.
Tal segredo está baseado na profundidade e na intimidade de sua
relação com Deus. Tratava-se de uma mulher “apaixonada por Deus” e,
mais ainda, de uma mulher que sabia que “Deus estava apaixonado por
ela”. Tendo tido a experiência do amor de Deus por ela, desejava, ardente-
mente, amá-lo em resposta — como Ele nunca tinha sido amado antes.
No início do seu “chamado dentro do chamado”, Madre Teresa
fora inundada de luz. A Voz que tinha ouvido proferia ternas palavras de
amor, inundando-lhe a alma de consolação, e, quanto mais ela se sentia
338 \ c n h a . s( ja M i n h a luz

atraída por Ele, mais ansiava por Ele. A luz de Sua presença foi rapida­
mente velada pela escuridão de Sua aparente ausência. Táo intensa quan­
to a consolação tinha sido, foi a desolação que se seguiu.
Madre Teresa foi chamada a compartilhar de forma específica o
mistério da Cruz, a tornar-se uma com Cristo na Sua Paixão e uma com
os pobres a quem servia. Através dessa união, foi conduzida a uma pro­
funda compreensão da “dolorosa sede” no Coração de Jesus pelos mais
pobres dos pobres.
A escuridão que experienciou e descreveu em suas cartas — através
das quais brilha a força e a beleza de sua alma — foi um torm ento terrível
e constante, praticamente sem paralelo na vida dos santos; apenas a expe­
riência pela qual passou São Paulo da Cruz* é comparável com a dela, em
termos de longevidade.
Através dessa provação, Madre Teresa permaneceu firme e fiel ao
chamado que tinha recebido, ocupando-se, ininterrupta e alegremente,
na missão que lhe fora confiada. Erguendo-se acima da dor de “não se
sentir amada nem desejada” por Jesus, fez tudo o que estava ao seu alcan­
ce para demonstrar o amor que tinha por Ele, o bem-amado de sua alma,
e para Lhe dar alegria através de tudo o que fazia. Procurou-O em cada
pessoa com quem se encontrava, em especial nos mais pobres dos pobres,
segurando-se, fortemente, nas palavras de Cristo: “Tudo o que fizestes a
um destes Meus Irmãos mais pequeninos, a Mim o fizestes.”
Sua dolorosa escuridão misteriosamente a uniu a seu Esposo C ru­
cificado, de uma forma tão íntima, que Ele se tornou o único “objeto de
seus pensamentos e afetos, o tema de suas conversas, o objetivo de suas
ações e o modelo de sua vida”. Seu total abandono à vontade de Deus e
sua determinação de nada Lhe recusar permitiram-Lhe manifestar, atra­
vés dela, Seu amor por cada pessoa que ela encontrava. Em meio a sua
escuridão pessoal, era a luz e o amor do próprio Jesus o que dela irradiava
e era isso que tinha um enorme impacto sobre os outros.
Tendo abraçado sua escuridão interior, M adre Teresa se tornou
“uma santa da escuridão”. O chamado que Jesus lhe dirigira — “Venha

* Místico italiano, fundador da Congregação da Paixão de Jesus Cristo — os Passionisras


(1694-1775).
S a n t a Teresa de C a lc u tá 339

— leve-Me aos buracos onde vivem os pobres. Venha, seja Minha luz" —
impeliu-a a entregar-se “sem qualquer reserva, a Deus, nos pobres das fa­
velas e das ruas”.2 Ignorando o seu próprio sofrimento, aproximava-se dos
outros, cujo sofrimento lhe parecia ser maior do que o dela, levando a luz
do amor de Deus aos indefesos e aos desesperados, aos mais pobres dos
pobres. Embora tivesse levado Jesus a muitos “buracos escuros”, restavam
ainda muitos; e, mesmo quando suas forças físicas começaram a falhar,
seu espírito continuava decidido. Ela continuava seguindo.

-Sempre nos conduziu aJesus

Madre Teresa era capaz de erguer aqueles que tinham caído, encorajar os
desfalecidos, reacender a esperança no coração dos desalentados.

Ela parecia deleitar-se em você. Não era uma coisa de caridade, que
se torna um fardo, que destrói a dignidade dos pobres, mas algo
que ela se deleitava em fazer. [...] Você tinha a sensação de que
ela considerava um privilégio fazer isso. Ela nos confortava quando
estávamos tristes. Ela nos animava quando duvidávamos de que pu­
déssemos fazer algo.

O u tro de seus seguidores observa: “Ela sempre nos conduziu a


Jesus, especialmente em momentos muito difíceis.” Todos ficaram abis­
mados ao saberem que Madre Teresa tinha vivido em um sofrimento ago­
nizante durante quase cinqüenta anos, agarrando-se a Jesus em pura fé.
Suas colaboradoras mais íntimas não tinham a menor noção disso, como
com partilha sua sucessora, Irmã Nirmala:

Desde maio de 1958 que vivo com a Madre e posso testemunhar


que nenhuma de nós podia imaginar aquilo que a Madre estava pas­
sando interiormente. Exteriormente, a Madre era uma mulher cheia
de vida, como qualquer Missionária da Caridade. Deus abençoava o
trabalho: Vocações chegavam, estava abrindo casas na índia e fora da
índia e a obra era reconhecida e muitíssimo apreciada. E a Madre teve
que pagar o preço por isso.
340 \ ( n h a , soja M i n h a luz

Não foram os sofrimentos pelos quais passou que fizeram dela


uma santa, mas o amor com o qual viveu sua vida em meio a todos
esses sofrimentos. Ela sabia que, com a graça de Deus e uma vontade
decidida, qualquer pessoa pode chegar à santidade, não do mistério do
sofrimento que acompanha cada vida humana, mas através dele. A Ma­
dre conseguiu transmitir essa convicção a seus seguidores, como relata
um deles:

Em momentos difíceis, ela costumava me dizer: “Não se entregue


aos seus sentimentos. Deus está permitindo isto.” Isso me ensinou
que, tanto o melhor como o pior da vida acabam passando e que,
se eu aprender a aceitar a cruz, em silêncio, com humildade e com
esperança, tudo irá passar. Renovando a esperança em mim, con­
segui superar aquele período sem fazer maus juízos, como faria se
tivesse agido com base nos sentimentos.

^tí promessa da Madre

Madre Teresa estava convencida de que a sua missão continuaria além da


morte, como afirma claramente na declaração que faz da sua missão: “Se
eu alguma vez vier a ser santa, serei certamente uma santa da escuridão’.
Estarei continuamente ausente do Céu — para acender a luz daqueles
que se encontram na escuridão na terra.”3As palavras de encorajamento que
dirige às Irmãs em uma instrução transmitem a mesma convicção:

A Madre está aqui para ajudá-las, guiá-las e conduzi-las a Jesus. Está


se aproximando o momento em que a Madre tem também que ir
para junto de Deus. Então a Madre será capaz de ajudar mais a cada
uma de vocês, guiá-las mais, e obter mais graças para vocês.3

A ajuda, a orientação e a intercessão de Madre Teresa são para


todos, em especial para aqueles que, por qualquer razão, se encontram na
escuridão. Tal como tinha prometido, ela estará “ausente do Céu”, para
levar-lhes luz.
■Santa 'Tore.sa do (' a le n t a 341

Tendo tomado diligentemente as palavras de Jesus — “amai-vos


uns aos outros como Eu vos amei” — , e tendo-as tornado realidade em
sua vida, ela nos convida a percorrer o mesmo caminho:

E hoje Deus continua amando o mundo. Continua enviando — a você


e a mim — aos pobres para provar que ama o mundo, que ainda tem a
mesma compaixão pelo mundo. Somos nós que devemos ser o amor
Dele, a compaixão Dele no mundo de hoje. Mas, para sermos capazes
de amar, devemos ter fé, porque fé em ação é amor, e amor em ação
é serviço.15

A vida de Madre Teresa nos mostra que a santidade pode ser alcan­
çada por meios simples. Começando por amar os que não são amados, os
que não são queridos, os solitários que se encontram mais perto de nós,
em nossa própria casa, nas nossas comunidades e nos nossos bairros, po­
demos seguir o seu exemplo de amar até doer, fazendo sempre um pouco
mais do que aquilo que nos sentimos dispostos a fazer.

,<// luz que ela acendeu


na minha vida continua brilhando

Em um livro que faz ecoar, em todas as páginas, a voz de Madre Teresa,


parece-nos adequado conceder-lhe a última palavra. A história que se se­
gue foi uma história que ela própria contou e que exprime de forma ma­
ravilhosa o coração de sua vida e de sua missão, ao mesmo tempo em que
convida todas as pessoas a “serem Sua luz”, realizando obras humildes de
amor e compaixão, que poderão parecer insignificantes, mas que são, na
realidade, nada menos do que meios de irradiar o amor de Deus a todas
as pessoas com quem nos encontramos, assim transformando, pouco a
pouco, a escuridão do mundo em Sua luz:

Nunca mc esquecerei da primeira vez que fui a Bourke visitar as Ir­


mãs. Fomos à periferia de Bourke. Havia uma grande reserva onde
todos os aborígenes viviam, em pequenas cabanas construídas com
342 Xc n h a , seja M i n h a luz

folhas de latão, de papelão velho etc. Então entrei em um desses pe­


quenos cômodos. Chamo de casa, mas trata-se de um único cômodo,
onde fica tudo. Disse ao homem que ali vivia: “Por favor, deixe-me
arrumar sua cama, lavar a roupa, limpar a casa.” E ele ficava dizendo:
“Eu estou bem, eu estou bem.” Então eu lhe disse: “Mas ficará ainda
melhor se me deixar fazer isso.” Por fim, me deixou. Ele me deixou
e de tal maneira que, quando acabei, tirou do bolso um envelope
velho, e outro envelope, e mais um. Começou a abri-los, um após o
outro, e bem no fundo, havia um pequeno retrato do pai que ele me
deu para ver. Eu olhei para a fotografia, depois olhei para ele e disse:
“Você é tão parecido com seu pai!” Ele ficou felicíssimo por eu poder
ver a semelhança do seu pai em seu rosto. Abençoei a fotografia e a
devolvi, e, de novo um envelope, segundo envelope, terceiro envelope
e a fotografia voltaram ao bolso, junto ao seu coração. Depois de eu
ter limpado o cômodo, descobri em um canto uma grande lamparina
toda suja e disse: “Você não acende esta lamparina, tão bonita, não a
acende?” Ele replicou: “Para quem? Passam-se meses e meses e meses
sem que ninguém venha aqui. Para quem vou acendê-la?” E eu disse:
“Não a acenderia se as Irmãs viessem aqui?” E ele disse: “Sim.” Então
as Irmãs começaram a visitá-lo, apenas 5 ou 10 minutos por dia, mas
começaram a acender aquela lamparina. Algum tempo depois, ele
adquiriu o costume de acendê-la. Devagarzinho, devagarzinho, deva-
garzinho, as Irmãs deixaram de ir à casa dele. Mas costumavam passar
de manhã e vê-lo. Aí, eu me esqueci completamente disso, e então,
dois anos depois, ele mandou dizer: “Digam à Madre, minha amiga,
que a luz que ela acendeu na minha vida continua brilhando.”6
^ p ên d ice^ l

Regras manuscritas por Madre M. Teresa, MC, em apêndice à carta


escrita ao arcebispo F. Périer, SJ, datada da Festa de Corpus Christi de
1947.

Jls regras

1. A Finalidade
A Finalidade Geral das Missionárias da Caridade é saciar a sede
de Jesus Cristo na Cruz por amor e por almas, [através] de uma pobreza
absoluta, de uma castidade angelical, de uma obediência alegre.
A Finalidade Particular é levar Cristo às casas e às ruas das favelas,
[entre] os doentes, os moribundos, os mendigos e as criancinhas da rua.
Os doentes serão tratados, na medida do possível, em seus pobres lares.
As criancinhas terão escolas nas favelas. Os mendigos serão procurados e
visitados nos buracos onde eles vivem, fora da cidade ou nas ruas.
2. Para poderem fazer tudo isto — as Irmãs deverão primeiramen­
te aprender a viver uma verdadeira vida interior de íntima união com
Deus — e de procurá-Lo e vê-Lo em tudo o que fizerem pelos pobres.
3. Não haverá quaisquer diferenciações entre as Irmãs — todas
elas deverão aprender — a trabalhar no campo, a cozinhar, a cuidar dos
doentes e também um pouco de ensino — e de estar sempre dispostas a
fazer qualquer desses trabalhos, se a obediência assim exigir.
344 Vcnha . s e j a iSlinha luz

O hábito

4. As Irmãs usarão um vestido indiano simples na índia. Um há­


bito branco de mangas compridas e um sári azul claro — véu branco,
sandálias, cinto e um crucifixo.

,/Is aspirantes
5. Jovens católicas a partir dos 16 anos, cheias de am or e de zelo.
Mulheres capazes de amar de tal maneira a Deus e aos pobres que se es­
queçam por completo de si mesmas. Que possuam uma vontade forte,
que sejam capazes de viver sem nada, a fim de viverem apenas para Deus.
Devem ser almas de oração e penitência e cheias da simplicidade do Cris­
to Menino.
6. Precisam ser saudáveis de corpo e de mente, a fim de serem capa­
zes de suportar as dificuldades de uma contínua abnegação pelas almas.
7. Se houver jovens ricas e com formação superior que desejem
entrar para a congregação — poderão ser aceitas, mas nem a riqueza nem
a formação farão diferença alguma — elas serão iguais às outras Irmãs.
8. As almas que desejem consagrar a sua vida como vítimas — mas
que por falta de saúde não possam unir-se às forças de combate — tam­
bém serão aceitas, pois devido aos seus permanentes sofrimentos o traba­
lho das Irmãs dará fruto.
9. Serão aceitas jovens de qualquer nacionalidade — apenas de­
vem aprender corretamente a língua do país para onde forem trabalhar.
10. Antes de entrarem, as aspirantes devem passar três meses no
campo de missão com as Irmãs, para que ambos os lados possam fazer a
sua opção.
11. Devem ser bem avaliadas por um sacerdote que conheça o
espírito das Missionárias da Caridade.

,(/Is noviças e o noviciado


12. No momento, o noviciado começará em Cossipore, onde as
Irmãs poderão ter uma separação completa do m undo e passar um ano
•Santa Teresa de Ca lc utá 345

em contemplação e trabalho manual. Por essa razão, não serão admitidos


seculares — nem sequer familiares — nesta casa.
13. No segundo ano, as noviças irão para uma casa em Calcutá
Sealdah, se possível, onde poderão receber uma rápida formação em ma­
ternidade e outras especialidades de enfermagem, e em ensino.
14. Um mês antes do final deste segundo ano, as Irmãs farão um
retiro de um mês, [preparando] assim o seu coração para a tomada dos
três votos — pobreza absoluta, castidade angelical e obediência alegre. Só
então receberão o hábito do Instituto.
15. As noviças deverão ser bem instruídas na vida interior — e na
sua religião. Devem receber todos os cuidados possíveis para compreen­
der e viver vidas de íntima união com Deus. Devem aprender a ser con­
templativas, tanto nas ruas e nas favelas, como nos conventos.
16. Antes de fazerem os votos, devem ser bem avaliadas — de
maneira que a Irmã compreenda bem o que é uma vida de total esque­
cimento de si própria e de abnegação pelas almas — e se está disposta a
viver alegremente tal vida.

Os votos

17. Pobreza Absoluta — Por meio deste voto, a Irmã compro­


mete-se a um a pobreza absoluta. Renuncia ao direito de possuir abso­
lutam ente seja o que for como seu. Estará como morta para as coisas
tem porais deste mundo.
18. As roupas serão guardadas, lavadas e remendadas em comum.
E as Irmãs comerão, dormirão e trabalharão em comum.
19. Os alimentos serão cozidos e servidos de acordo com as regras
do país onde viverem.
20. As Missionárias da Caridade não possuirão edifícios próprios,
dependendo para o alojamento da caridade do bispo em cuja diocese
trabalharem. — O melhor cômodo e o melhor do que tiverem deverão
[ser] usados para a capela.
21. A casa poderá ter um ônibus, uma bicicleta, um barco, que as
Irmãs aprenderão a usar quando estiverem no campo em missão.
346 V( nh a , seja M i n h a luz

22. A Superiora, com outra Irmá, irá às vezes pedir comida, roupa e
medicamentos para os pobres. Nada disso deve ser utilizado pelas Irmãs.
23. Para sua própria manutenção, as Irmãs trabalharão no campo,
farão diferentes coisas que possam vender, sendo o dinheiro utilizado para
prover alimentos e roupa para as Irmãs. — De nada mais precisamos.
24. As coisas que facilitem que o mundo penetre não deverão ser
aceitas por ninguém — nem sequer pelas Superioras. Devemos ser livres
de tudo. As coisas que forem mais necessárias serão cuidadosa e amavel­
mente providenciadas pela Superiora.
23. Se alguma Irmá adoecer, deve ser dado tudo quanto o médico
considerar necessário. — Ela deve ser instalada num quarto onde tenha
facilidade em ouvir a Santa Missa e em receber diariamente a Sagrada
Comunhão, se assim desejar.
26. As Irmãs não terão empregadas. — Elas deverão fazer todos os
trabalhos domésticos. — E se o número o permitir — tanto os hábitos
como os alimentos devem ser fruto das suas mãos.
27. Castidade Angelical— Por meio deste voto, a Irmã comprome-
te-se a permanecer virgem e a abster-se de qualquer ato que se oponha
à castidade.
28. A pureza angelical deve ser o objetivo de todas as Irmãs que, a
fim de a preservarem, deverão ter um amor pessoal ao Puríssimo Coração
de Maria, e manter o coração livre de qualquer afeto, por m enor que seja.
Porque um coração puro não terá dificuldade em ver a Deus nos seus
pobres e em esquecer-se de si mesma.
29. Quaisquer dificuldades ou tentações que resultem dos perma­
nentes contatos com os pobres deverão ser reveladas ao confessor com
sinceridade e simplicidade.
30. Obediência Alegre— Por meio deste voto a Irmã compromete-
se a obedecer à Superiora como tal constituída — em todas as coisas que
digam respeito à sua vida como Missionária da Caridade.
31. As Irmãs obedecerão alegremente, prontamente, cegamente e
com simplicidade. Devem lembrar que não é a ela que obedecem, mas a
Ele, Jesus Cristo, por quem obedecerão em tudo.
32. A obediência perfeita — poderosa guardiã da paz, leva alegria
aos corações e une a alma intimamente a Deus — à Sua Vontade Santa.
•Santa Teresa rie Calcutá 347

t'xercicio h esp iri ta a is

33. Dado que cada Irmã deve fazer o trabalho de um sacerdote


— ir aonde os sacerdotes não podem ir, fazer o que eles não podem
fazer, devem estar embebidas do espírito da Santa Missa, que é um
espírito de total abandono e oferecimento. Por essa razão, a Santa
Missa deverá ser o lugar diário de encontro, onde Deus e a Sua cria­
tura se oferecem um ao outro, um pelo outro e pelo mundo.
34. As Irmãs devem usar todos os meios para aprender e fazer cres­
cer esse terno amor por Jesus no Santíssimo Sacramento.
35. Sendo a confissão um dos melhores meios de fortalecer a
alma — deve ser usada de acordo com as necessidades e as opções das Ir­
mãs. Estas devem ser como crianças na confissão — simples e abertas.
36. As Irmãs farão diariamente meia hora de Meditação. Duas ve­
zes por dia, exame de consciência. — O Rosário inteiro, as ladainhas de
Nossa Senhora e dos Santos e meia hora de leitura espiritual. A quinta-
-feira e ao domingo a hora de reparação.
37. As Irmãs passarão um dia por semana, uma semana por mês,
um mês por ano, um ano de seis em seis anos na Casa-Mãe onde, em
contemplação e penitência, junto com a solidão, poderão recuperar a
energia espiritual que poderão ter gasto no serviço aos pobres. Quando
estas Irmãs estiverem em casa, as outras tomarão o seu lugar no campo
da Missão.

<Penitência e abnegação

38. Dado que cada Irmã deverá ser uma vítima de Cristo e fazer
a Sua obra, compreenderá o que Deus e o Instituto esperam dela. Não
meias medidas. — Devemos dar a Deus tudo ou nada e manter esse aban­
dono total — custe o que custar.
Na prática das penitências corporais, as Irmãs serão exclusivamen­
te guiadas pela opinião do confessor. Para as penitências públicas será
necessária a autorização da Superiora.
348 l e n h a , seja M i n h a luz

O trabalho entre os pobres de unia cidade

39. Após a Santa Missa e a Comunhão, as Irmás partirão aos pares


para as diferentes favelas de Calcutá.

J l escola

Com a ajuda do pároco — deverão arranjar uma casinha na favela,


ou lá perto, onde possam reunir os pequeninos da localidade. Primeiro
hão de limpá-los — atender as suas pequenas necessidades — ensinar
pequenas orações e em especial como amar a Deus — brincar com eles
— ensinar-lhes muitos cânticos — algo de leitura, escritura e um pouco
de aritmética. Prepará-los para os Sacramentos, e aos domingos levá-los
à igreja. — Em algum dia de festa, pedir ao sacerdote que vá celebrar a
Missa junto deles.

Cuidados médicos em casa

O outro par visitará os doentes de casa em casa. — Lavarão e cui­


darão dos doentes — e se a pessoa não tiver ninguém que cuide dela, pre­
pararão as refeições para esse dia, limpando e varrendo o quarto. Se for
necessário, as outras duas irmãs auxiliarão as mães a dar à luz, verificando
que a mãe e o filho recebem todos os cuidados e as atenções necessárias.
— Animarão os doentes, mesmo os que não estejam morrendo, a solicitar
a Sagrada Comunhão — para a qual levarão também as coisas necessárias,
preparando o local e o doente para a chegada de Nosso Senhor. Devem
avisar o sacerdote com tempo, informando-o de quantas pessoas desejam
receber Nosso Senhor.

Os moribundos

As Irmás usarão de toda a ternura e amor com aqueles que se pre­


param para deixar este mundo — para que o amor de Jesus os atraia e os
•Santa Teresa de Calcata 349

leve a fazerem as pazes com Ele. — Devem rezar junto aos moribundos e
garantir que o sacerdote seja chamado a tempo. — Se a pessoa não tiver
ninguém — as irmãs prepararão o corpo para o enterro. — Deverão pe­
dir dinheiro aos vizinhos pobres para mandar celebrar Missa na manhã
seguinte, à qual a família e os vizinhos devem ir com as irmãs.

Os mendigos

O utras duas Irmãs visitarão os mendigos — cuidarão deles e


atenderão às suas necessidades, se estiverem doentes. — Nas suas visitas
aos buracos onde habitam, procurarão gradualmente ensinar-lhes o res­
peito por si mesmos e o desejo de se sustentarem. — Àqueles que tiverem
aprendido essa lição devem ser dados trabalhos no campo — para onde
poderão também levar as famílias.

j l casa para os proscritos


da sociedade humana

Há pessoas que não são desejadas entre os pobres — os aleijados


— os cegos — os doentes. — Para esses, quando o bispo achar que é ade­
quado — será aberta uma casa — e lá as irmãs cuidarão de seus corpos e
almas. — Isto é, naturalmente, apenas para as criancinhas.

40. O Trabalho nas Aldeias — Nas aldeias, as irmãs farão o mes­


mo trabalho. Irão de povoado em povoado — com o missionário —
que fará o seu trabalho sacerdotal enquanto as irmãs assistem os do­
entes, ensinam as criancinhas e preparam os adultos para receberem os
Sacramentos. Enquanto aí estiverem, as Irmãs devem usar a cabana que
também servirá de igreja. Não deverão fazer estadia permanentemente
cm nenhum a das aldeias. Se o sacerdote achar que a colheita é grande
— pode pedir ajuda às Irmãs de Sta. Ana, em cujas mãos o trabalho será
alegremente entregue, para que lhe deem continuidade. Devem regres­
sar a casa para a quarta semana.
350 \ c n h a . s e ja M i n h a lu z

41. As Irmãs nunca aceitarão trabalho em colégios internos, nem


em escolas primárias ou secundárias — pois devem ser livres para ir em
busca de almas e não ficar presas a umas poucas pessoas.
42. Se houver órfãos pobres — devem comunicá-lo ao pároco,
que certamente cumprirá os seus deveres para com eles. — As Irmãs não
se deixarão prender por esse tipo de obrigações.

Todas as coisas para Maior Glória de Deus.

Glória ao Pai, ao Filho e ao Espirito Santo.

Amém.
Apêndice <Ê
Notas do retiro de Madre Teresa,
29 de março — 12 de abril de 1959

(As respostas de Madre Teresa aparecem em itálico.)

Primeiro dia*
Sob a direção de Jesus Cristo, Nosso Senhor Ressuscitado

Perceber mais profundamente que o objetivo da minha vida é


O b je tiv o :
fazer a Santa Vontade de Deus.

E xam e: Tentar responder com sinceridade às seguintes perguntas:

1. Procuro realmente louvar, reverenciar e servir a Deus? Quero,


mas não ofaço.
Ponho isto em prática todos os dias? Não.
Em TODAS as minhas ações? À exceção do primeiro oferecimento
ao S. C. [Sagrado Coração] de manhã — o resto do dia é como uma pedra.
Contudo, o meu coração ê todo e somente Dele — a minha mente e a minha
vontade estão fixas Nele — o tempo todo.**

* O retiro começou na tarde do Domingo de Páscoa, 29 de março de 1959, com pontos de


meditação para a manhã seguinte. O retiro foi pregado pelo Pc. Picachy, sacerdote jesuíta,
seguindo os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola.
** O primeiro oferecimento ao Sagrado Coração a que Madre Teresa se refere é a oração que
as Missionárias da Caridade rezam quando se levantam: “Ó Jesus, por meio do puríssimo
Coração de Maria, ofereço-Tc as orações, as obras, as alegrias e as dores deste dia por todas as
intenções do Teu Divino Coração. Em união com todas as Missas que são oferecidas em todo
o M undo Católico, ofcreço-Te o meu coração. Torna-o manso e humilde como o Teu." Esta
oração proporcionava-lhe um certo consolo.
352 Xí ii h a , s ( ja M i n h a lu z

2. Valorizo a salvação da minha alma? Não acredito que tenho alma.


Nada há em mim.
Estou trabalhando seriamente pela salvação das almas dos ou­
tros? Havia na minha alma um zelo ardente pelas almas desde a infância, até
que eu disse “Sim ”a Deus e então tudo desapareceu. Agora não acredito.*
3. Com o estou usando as criaturas? Não tenho apego."
4. Sou verdadeiramente indiferente ao meu trabalho, às compa­
nheiras com quem trabalho, à minha saúde, ao meu sucesso, ao meu
fracasso? Sim.
Sou indiferente ao amor e ao afeto das m inhas companheiras e
das pessoas para quem trabalho? Sim.
L e i t u r a s : Livros dos Salmos, Capítulo 3 2 .
I m i ta ç ã o d e C r i s t o : Livro 1 , Capítulo 2 0 ; Livro 3 , Capítulos 9 e 10.
R e f l e x ã o p a r a o d l a : Sto. Agostinho escreveu estas palavras be­
líssimas: “Fizestes-nos para Ti e o nosso coração está inquieto enquanto
não descansa em Ti.”
O bs.: As Leituras são opcionais. O Exame deve ser c u id ad o sam en ­
te feito todos os dias.

Segundo dia
Sob o patrocínio do meu Anjo da Guarda.

O b je tiv o : Adquirir os sentimentos necessários a um Ato de C on­


trição perfeito.*

' Comparando com os dados provenientes da correspondência restante de M adre Teresa, é


manifesto que a afirmação “Agora não acredito” retrata os sentimentos que tinha, e não uma
efetiva descrença.
** Embora se encontrasse em profunda escuridão. Madre Teresa não recorria aos outros para
compensar a falta de consolação pela qual passava. O fato de se mostrar tão desprendida
mostra que tinha alcançado um grau considerável de m aturidade emocional e liberdade
interior.
S a n t a 'Teresa cie C a lc u tá 353

Exam e:
1. Percebo que o pecado é uma possibilidade para mim e que devo
estar perm anentem ente em guarda? Sim.
2. Quais são as ocasiões perigosas de pecado mortal a que estou
exposta? Os olhos.
3. Devo perceber quais são os hábitos e as inclinações que, se não
examinar, me levarão a cometer pecados graves. Tenho inclinação para ser
rude e de reação rápida. Inclinada a olhar. Medo de enganar e ser enganada.
Tento superar os pecados veniais semideliberados? Sim.
4. As m inhas regras foram-me dadas por Deus para me resguardar
de todos os perigos. Sou habitualmente negligente em alguma delas? Não,
mas algumas vezes caí. Q ue soluções devo empregar para melhorar as coi­
sas? Guardar os olhos — doçura.'
L e i t u r a s : Livros dos Salmos, Capítulo 11.
I m i t a ç ã o d e C r i s t o : Livro 1, Capítulos 21 e 25; Livro 3, Ca­
pítulo 52.
R e f l e x ã o p a r a o d i a : — O Q U E FIZ por Cristo? A m ei-0 cega­
mente, totalmente, somente.
— O Q U E ESTOU FAZENDO por Cristo? Utilizo todas as mi­
nhas forças — apesar dos meus sentimentos — para fazê-lo amado pessoal­
mente pelas Irmãs e pelas outras pessoas.
— O Q U E DEVO FAZER por Cristo? Dar-Lhe toda a liberdade
comigo e em m i m ''

Guia-me, meiga luz, pela escuridão circundante. Guia-me!


A noite é escura e de casa estou distante. Guia-me!
Conduza os meus pés, não peço para ver o cenário distante
— apenas um passo é suficiente para mim.
[Cardeal John Henry Newman]*

* O profundo autoconhecimento dc Madre Teresa era acompanhado por um verdadeiro ar­


rependimento pelas suas próprias faltas e imperfeições; a Madre identificava imediatamente a
solução prática para as suas fraquezas.
Apesar dos sentimentos que tinha, que não fazia qualquer tentativa para ocultar, todas
as suas reações eram baseadas em uma fé c cm um amor notáveis, que a orientaram c a
preservaram durante todo o período de provação.
354 l e n h a , seja M in h a luz

'Terceiro dia
Sob o patrocínio de Sta. Maria Madalena

O b je tiv o : Purificar o meu coração.


Exa m e :
1. Utilizo os meios de Purificação que Deus me deu? Tenho dificul­
dades com isso mas aceito.*
2. Como faço o Exame de Consciência? Muitas vezes negligente­
mente e poucas vezes ofiz muito mal. Detecto as coisas que fiz errado e passo
o tempo pedindo perdão a Deus.
Insisto na Contrição Perfeita de forma pouco fervorosa e no Firme
Propósito de Emenda? Nem sempre.
3. Como faço o Exame Particular? Não assinalo*’ — mas mantenho
um ponto "Doçura de Jesus”por muitos anos.
Sou sincera na Confissão? Sim. Sou humilde? Também quero [ser].
4. Manifestação de Consciência. Sou perfeitamente sincera com a
minha Superiora? Tenho cada vez mais dificuldade em falar. — Está fecha­
do pura e simplesmente. Dar-lhe estes papéis é um dos maiores sacrifícios do
retiro, o meu presente pelas Irmãs.***
L e i t u r a s : Evangelho de S. Lucas, Capítulo 7, versículos 36 a 50;
Capítulo 15, versículos 11a 32.
I m i ta ç ã o d e C r i s t o : Livro 1, Capítulos 2 2 , 2 3 e 2 4 .
R e f l e x ã o p a r a o d i a : “São-lhe perdoados os seus muitos pecados,
porque muito amou” (S. Lucas, Cap. 7, vers. 47).
Porfavor, destrua todos os papéis que lhe dou.

* Embora tivesse a impressão de que não tinha fé, era a fé que a levava a considerar o sofrimen­
to interior como um “meio de purificação” e a render-se a ele. Mas M adre Teresa não negava
que isso lhe exigia uma grande luta.
** No contexto dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola, Madre Teresa refere-se à
prática de manter um diário onde se assinalam os êxitos e os firacassos no combate a determinado
defeito que a pessoa decidiu ultrapassar ou a uma virtude em que optou por crescer.
*** O sacrifício que fez pelas Irmãs continua a dar frutos para todos os que tem o privilégio
de se beneficiar dele.
■Santa T tn a a (It Calc uta 355

Qiiarto dia
Sob o patrocínio de Sto. Inácio

O b j e t i v o : Adquirir um desejo intenso e uma firme determinação


de seguir a Cristo meu Rei, para onde quer que Ele possa me conduzir.
“Mestre, seguir-Te-ei para onde quer que fores” (S. Mateus, Cap.
8, vers. 19).
Exam e:
1. Como cumpro os meus exercícios diários de piedade? Muito mal.
Respeito o tempo prescrito? Sim.
Tenho reverência, internaeexterna? Sim*
2. Considero realmente que a Santa Missa é a ação mais importan­
te do meu dia? Quero mas não é assim.
Recebo a Sagrada Comunhão com fé e amor? Não.
3. Ao visitar o Santíssimo Sacramento, vou realmente visitar Jesus
como meu Amigo, contando-Lhe tudo? Ele sempre foi Aquele com Quem
compartilhei, que conhecia tudo em detalhe — mas agora, não é assim.**
4. Rezo o Terço com fervor? Quero amá-la [Nossa Senhora], mas
nenhum amor me entra no coração.***
L e i t u r a s : Evangelho de S. Lucas, Capítulos 1 e 2.
I m i t a ç ã o d e C r i s t o : Livro 2, Capítulos 7 e 8; Livro 3, Capítulo 13.
R e f l e x ã o p a r a o d i a : Jesus diz-me: “EU SOU O CAMINHO, A
VERDADE E A VIDA” [João 4:6].
Um rio! Os seus canais alegram a cidade de Deus,
a mais santa entre as moradas do Altíssimo.
Deus está no meio dela, não pode vacilar;
Deus vem em seu auxilio desde o raiar da manhã. *

Embora pudesse declarar com sinceridade que “O meu coração é todo c apenas Dele —
tenho a mente e vontade fixadas Nele — em cada momento” c, embora cumprisse rigo­
rosamente os momentos prescritos e as manifestações externas de reverencia, ainda assim,
a avaliar pelos seus próprios sentimentos, Madre Teresa tinha uma fraca opinião das suas
práticas devocionais.
** É possível detectar a solidão e a nostalgia pela Sua presença sentida nas entrelinhas dessa
afirmação, pois Aquele que “conhecia tudo em detalhes" parece ter desaparecido.
***Até a relação que mantinha com Maria foi afetada pela escuridão. Apesar disso, o terço era
nessa altura — c foi até ao final da vida — uma de suas devoções preferidas.
358 Ve nha , seja M i n h a luz

— Demonstro a minha humildade através de uma sinceridade


perfeita com a minha Superiora e com o meu Confessor? Sim.
Escondo-lhes coisas? Não —
— Evito tentar “brilhar” na presença de pessoas de fora? Nenhuma
oportunidade de me ocultar.
— Tento parecer melhor do que realmente sou? Não.
— Tenho obediência da vontade e dos juízos? Sim.
— Desejo cargos humildes, ser ignorada e humilhada? Todos os
nossos trabalhos são desse tipo.
— Que reações tenho quando sou pura e simplesmente esquecida
pelas minhas Irmãs ou pelas pessoas de fora? Sou muito feliz.
L e itu r a s : Constituições: Capítulo 13, N .os 97-132.
L iv r o d o s S a lm o s : Salmos 107, 128.
I m i ta ç ã o d e C r i s t o : Livro 3, Capítulo 54.
R e f le x ã o : “Aprendei de Mim, que sou manso e hum ilde de cora­
ção” (Mateus 11:29).

O Pe. Joseph Rickaby escreve. “ Como sofre a obra de Deus nas minhas
mãos? Trata-se da pergunta das perguntas a colocar durante um Retiro. No
meu Retiro, quero chegar aos fatos, pensar retamente, descobrir agora a ver­
dade que se erguerá diante de mim no momento da morte, compreender com
a maior precisão possível em que posição me encontro diante do meu Deus,
dissecar as minhas relações com o meu Criador.”

Nesta fase do Retiro convém começar a preparar os Propósitos:


Esses propósitos devem ser 1) adaptados às atuais necessidades da mi­
nha alma. 2) Algo que poderá parecer trivial aos outros, mas que é de vital
importância para mim neste momento. 3) Coisas práticas que eu possa levar
imediatamente à prática.
S a n t a Teresa de Calc utá 359

Oitavo dia*

Sob o patrocínio dos Santos Apóstolos

O b j e t i v o : Fazer o meu plano de Vida para os anos que se segui­


rem à Profissão Perpétua. Esse plano deve ser feito com grande clareza,
coragem e visão sobrenatural.
E x a m e : Caridade Fraterna. As Regras 1** e 86*** eram as Regras
que eu mais apreciava. Nelas estavam o meu coração e a minha alma. Mas
agora nada.

1. Observo as minhas Regras N .os 86 e 87? Amo cada uma das


m inhas Irmãs com um amor intenso, sem me preocupar minimamente
com a respectiva nacionalidade ou posição social? Antigamente havia tan­
to amor e verdadeira ternura pelas Irmãs e pelas pessoas — agora sinto que o
meu coração é de pedra.
2. Regra 104: Tento tornar felizes as crianças que ensino? Respeito
o bom nom e dos meus alunos, não falando descuidadamente dos seus
defeitos?
3. Regra 106: Com que espírito visito os doentes e cuido deles?
Sou um anjo de conforto e consolo? Às vezes chego a ser rude. *
4. Regra 112: Os meus cuidados aos Moribundos.
5. Regra 120: O meu amor aos pobres. É Cristo que irradia e vive
a Sua vida em mim nas favelas. (Regra 86)
6. Regra 123: Visão sobrenatural no meu trabalho — ver Jesus em
todos os desconhecidos.
— Procuro animar as minhas Irmãs, tornando-as felizes? Sim.

* Faltam as notas do sétimo dia do retiro.


** Regra 1: “O objetivo geral da Congregação é saciar a sede de Jesus Cristo na Cruz pelo
amor das almas, através da observância, por pane das Irmãs, dos quatro Votos de absoluta
Pobreza, Castidade, Obediência e da sua dedicação ao trabalho entre os pobres de acordo com
as Constituições”.
*** Regra 86: “Uma vez que cada Irmã desta Congregação deverá ser uma colaboradora de
Cristo Nas favelas, terá de compreender o que Deus c a Congregação esperam dela. Q ue
Cristo irradie c viva Sua Vida nela c, através dela, nas favelas. Que os pobres a vejam ser atraída
para Cristo c O convidem a entrar cm sua casa c na sua vida. Que os doentes e os que sofrem
vejam nela um verdadeiro anjo de conforto e consolação; que as crianças de rua se apoiem nela
porque ela lhes recorda Cristo, o Amigo das criancinhas.”
360 Venha, seja M i n h a luz

— Considero-me a serva delas em Cristo? Não — uma mãe.


— Aceito as pequenas dificuldades inevitáveis na vida comunitária
com paciência? com espírito de perdão? com senso das proporções e senso
de humor?
— Sou caridosa com as minhas Superioras? procurando com o
meu comportamento diminuir o peso do fardo; defendendo as suas deci­
sões em vez de criticá-las?
L e i t u r a s : Imitação de Cristo, Livro 1, Capítulos 14 e 16. S. Lucas:
Capítulo 10, versículos 25-37.
R e f l e x ã o : “Sempre que fizestes isto a um destes Meus irmãos
mais pequeninos, a MIM o fizestes” [Mateus 25:40].

Em 1942 creio que fo i neste dia que comprometi-me com Deus


sob pena de pecado mortal a não Lhe recusar coisa alguma. E isso que
esconde tudo em mim. **

jVono dia

Sob o patrocínio dos Santos Mártires e das Virgens

O b je tiv o : Concluir todos os propósitos e absolutamente certa so­


bre o que Cristo espera de mim.
E x a m e : O s meus deveres de Estado:

* Esta declaração evoca dolorosamente a memória das intensas consolações e o efeito que elas
tiveram nos sentimentos de caridade de Madre Teresa pelos outros.
** Este comentário foi escrito no alto da nona página. O retiro teve início em 29 de março de
1959, com o ponto de meditação para o dia seguinte. O primeiro dia do retiro foi o dia 30 de
março. O nono dia foi, portanto, o dia 7 de abril de 1959. Em 1942, a Páscoa foi no dia 5
de abril; assim sendo, Madre Teresa fez o voto privado a que se refere na terça-feira de Páscoa,
7 de abril de 1942. Foi por esta altura que a seção bengali da escola de St. Mary foi evacuada
para Morapai devido à guerra; desconhece-se a data precisa (ver Madre M. Colmcille, I. B.
V. M., First the Blade, Calcutá, Firma K. L. Mukhopadhyay, 1968). Embora tenham sido
o contexto, e talvez mesmo a ocasião para fazer o voto, essas circunstâncias dramáticas não
foram, de maneira nenhuma, a causa de Madre Teresa ter se comprometido de forma tão
radical, como se verifica pelo papel crucial que o voto desempenhou ao longo da sua vida.
•Santa Teresa de Calc utá 361

— Observo todas as minhas Regras? Há uma regra que não observo


que é a de sair com uma companheira. Faço-o de propósito — qualquer Irmã
ficaria muito cansada etc., se tivesse de ir a tantos lugares.**
— Empenho todo o meu esforço nas diferentes tarefas? e nos trabalhos
que me foram designados? Cuido da correspondência com um grande esforço."
— Mostro preferência por algum trabalho em detrimento de ou­
tros? Não. Dou a entender a todas as pessoas se o trabalho que tenho não
me agrada? Não
— Evito interferir no trabalho das outras pessoas? Sim —
— Rezo pelo sucesso do trabalho das outras Irmãs? Muito.
L e i t u r a s : Imitação d e Cristo, Livro 3 , Capítulo 5 4 .
R e f l e x ã o : “Sede perfeitos como o vosso Pai Celestial é perfeito”
[Mateus 5:481.
Por amor de Jesus, por favor, destrua todos os papéis. Não sei porque
quer Ele que eu lhe abra a minha alma — faço-o porque não posso “recusar".

(Décimo dia

Com Jesus na Sua Agonia

O b j e t i v o : Passar um dia em reparação pelos sofrimentos que fiz


Jesus suportar por mim.
Exame: O meu espírito de Mortificação:
Penitência exterior
— Realizo todas essas penitências com espírito de fé? Sim.
— Com o aceito os incômodos devidos ao clima, à falta de saúde,
à vida em comum, à pobreza etc. [...]? Como parte do chamado.*

* A regra exigia que as irmãs nunca saíssem do convento senão acompanhadas por outra
irmã. Madre Teresa era capaz de colocar a caridade acima da letra da regra. Para além da sua
enorme preocupação e consideração para com as Irmãs, o trabalho que realizava e o zelo com
que a ele se entregava eram impressionantes. As outras irmãs pouco mais tinham do que vinte
anos e ela aproximava-se dos cinqüenta — mas mesmo assim não conseguiam acompanhá-la.
** Ao longo de toda a sua vida, Madre Teresa escreveu milhares de canas. O “grande esforço”
que empenhava nessa atividade era outra conseqüência do voto privado que fizera e uma
expressão do seu amor.
362 \ 'c n h a , s ( j a M i n h a lu z

Penitência interior
— Estou interiormente resignada às provações que Deus me en­
via? Como presentes. **
— Tento esconder os pequenos sofrimentos da minha vida diária?
S im .'"
— Aceito a Desolação como aceito a Consolação? Aceito a aridez
na Oração como uma graça de Deus? Estando sempre na escuridão — não
tenho oportunidade de escolha.
— Aceito os defeitos dos outros? Sim.
Por favor, Pe., não deixe que eu lhe engane — a tortura que tenho
dentro de mim é grande. — Graças a Deus.
L e i t u r a s : Imitações de Cristo, Livro 2 , Capítulos 1 1 e 12 . Evange­
lho de S. João: Capítulos 14 e 17.
R e f l e x ã o p a r a o d i a : “Pai, se quiseres afasta de Mim este cálice;
não se faça, contudo, a Minha vontade, mas a Tua” [Lucas 22:42].

"Eu posso [aliviar] os sofrimentos de Jesus.


Eu posso tirar-Lhe uma parte desse sofrimento. ”
Obrigada por me dizer. — Foi uma tremenda graça para mim.

* Em 1947. quando solicitava ao Arcebispo Périer que a autorizasse a dar início à sua nova
vida. Madre Teresa tinha escrito: “Pode ser que o senhor pense que eu apenas estou vendo a
alegria de abandonar tudo, c de alegrar o Coração de Jesus. Sim, eu olho principalmente isso,
mas também vejo o sofrimento que o cumprimento destes dois objetivos trará. Sou sensível
por natureza, gosto de coisas bonitas e agradáveis, de conforto e de tudo o que o conforto
pode dar — de ser amada e de amar. — Sei que a vida de uma Missionária da Caridade —
será sem nada disso. A pobreza completa, a vida indiana, a vida dos mais pobres implicarão
um duro trabalho para o meu enorme amor próprio. Mesmo assim. Excelência, anseio, de
coração verdadeiro c sincero por começar a viver esse tipo de vida — para levar alegria ao
Coração sofrido de Jesus. Me deixe ir, Excelência — confiemos cegamente Nele. — Ele fará
com que a nossa fé Nele não seja em vão." Esta previsão tornara-se realidade, c a resposta que
Madre Teresa dava nesse décimo dia de retiro confirmava a consciência que tinha do fato.
** Aceitar o sofrimento como um dom era a atitude da própria Madre Teresa, e a atitude que
ela encorajava os outros a terem. O que não significava que não se esforçasse por suprimir
o sofrimento. Na realidade, Madre Teresa passou a maior parte da sua vida tentando aliviá-
lo. Mas o primeiro passo é aceitar o sofrimento. Em suma, “aceitar, oferecer e (dependendo
das circunstâncias) agir” é uma expressão concisa da reação de Madre Teresa quando se
confrontava com o sofrimento.
A formação religiosa que havia tido encorajava a sofrer em silêncio em união com
Jesus Crucificado; a pessoa não devia chamar a atenção para as dores por que passava; pelo
contrário, devia ocultá-las. Madre Teresa lutava pela perfeição nessa prática. O sorriso era um
dos dispositivos mais eficazes a que recorria para ocultar o sofrimento.
'Simla -Teresa de Calcutá 363

bccimo primeiro dia


Com Maria, a Mae das Dores

O b j e t i v o : Passar o dia em união com a dor de Jesus e de Maria a


fim de tornar mais firmes os meus propósitos.
E xam e: O meu desejo de morrer para o mundo e para o amor-
-próprio: Tenho um grande e profundo desejo de nada ser para o mundo e de
que o mundo nada seja para mim.
— Respeito minha Regra N° 88?* Esta Regra diz-me que ame tão
profundamente a humildade, que aceite as humilhações prontamente, até
com alegria? Sim.
— Recebo as correções e admoestaçóes com espírito de fé, sem
desculpas nem queixas? Quando as Irmãs dizem coisas rudes e que magoam
lamento por elas — mas pessoalmente sinto-me muito feliz. **
— Estou disposta a aceitar o sofrimento por amor a Jesus e a
Maria? Sim — A humildade tem um grande peso na minha alma. Não me
parece que seja humilde porque estou convencida da minha pequenez e do
meu nada, mas anseio por ser mansa e humilde de coração como oéo Coração
de Jesus. Não sei há quantos anos tento fazer minha esta mansidão e humil­
dade do Coração de Jesus — até agora nada.
L e i t u r a s : Livro de Isaías, Capítulo 33.
I m i t a ç ã o d e C r i s t o : Livro 3, Capítulo 19. Qualquer passagem da
Paixão de Cristo (Novo Testamento).
R e f l e x ã o p a r a o d i a : “Ó meu povo, o que... ‘

Obrigada, Padre — o senhor me ajudou. Estou decidida a me


tornar uma santa do Sagrado Coração — mansa e humilde. Peça
a Jesus uma graça apenas — que me dê “o rosto sorridente de
uma criança ”. Talvez a escuridão seja mais profunda, a solidão
mais dura, mas quero que assim seja — porque essa é a Sua
Santa Vontade. **

* Regra 88: "Que amem táo profundamente a humildade, que aceitem as humilhações pron­
tam ente e com alegria. Devem, portanto, receber as correções e admoestaçóes com espírito de
fé, sem desculpas nem queixas.”
** Esta atitude era fruto da humildade da Madre, a quem agradava assemelhar-se a Jesus na
humilhação de Sua Paixão e na Sua benevolência para com o ofensor.
362 Ve nha , seja ISIinha luz

Penitência interior
— Estou interiormente resignada às provações que Deus me en­
via? Como presentes. **
— Tento esconder os pequenos sofrimentos da minha vida diária?
Sim. ***
— Aceito a Desolação como aceito a Consolação? Aceito a aridez
na Oração como uma graça de Deus? Estando sempre na escuridão — não
tenho oportunidade de escolha.
— Aceito os defeitos dos outros? Sim.
Por favor, Pe., não deixe que eu lhe engane — a tortura que tenho
dentro de mim égrande. — Graças a Deus.
L e i t u r a s : Imitações de Cristo, Livro 2 , Capítulos 11 e 12. Evange­
lho de S. João: Capítulos 14 e 17.
R e f l e x ã o p a r a o d i a : “Pai, se quiseres afasta de Mim este cálice;
não se faça, contudo, a Minha vontade, mas a Tua” [Lucas 22:42].

“Eu posso [aliviar] os sofrimentos de Jesus.


Eu posso tirar-Lhe uma parte desse sofrimento. ”
Obrigada por me dizer. — Foi uma tremenda graça para mim.

* Em 1947, quando solicitava ao Arcebispo Périer que a autorizasse a dar início à sua nova
vida. Madre Teresa tinha escrito: “Pode ser que o senhor pense que eu apenas estou vendo a
alegria de abandonar tudo, e de alegrar o Coração de Jesus. Sim, eu olho principalmente isso,
mas também vejo o sofrimento que o cumprimento destes dois objetivos trará. Sou sensível
por natureza, gosto de coisas bonitas e agradáveis, de conforto e de tudo o que o conforto
pode dar — de ser amada e de amar. — Sei que a vida de uma Missionária da Caridade —
será sem nada disso. A pobreza completa, a vida indiana, a vida dos mais pobres implicarão
um duro trabalho para o meu enorme amor próprio. Mesmo assim. Excelência, anseio, de
coração verdadeiro c sincero por começar a viver esse tipo de vida — para levar alegria ao
Coração sofrido de Jesus. Me deixe ir. Excelência — confiemos cegamente Nele. — Ele fará
com que a nossa fé Nele não seja em vão.” Esta previsão tornara-se realidade, e a resposta que
Madre Teresa dava nesse décimo dia de retiro confirmava a consciência que tinha do fato.
**Aceitar o sofrimento como um dom era a atitude da própria Madre Teresa, e a atitude que
ela encorajava os outros a terem. O que não significava que não se esforçasse por suprimir
o sofrimento. Na realidade, Madre Teresa passou a maior pane da sua vida tentando aliviá-
lo. Mas o primeiro passo é aceitar o sofrimento. Em suma, “aceitar, oferecer e (dependendo
das circunstâncias) agir" é uma expressão concisa da reação de Madre Teresa quando se
confrontava com o sofrimento.
"** A formação religiosa que havia tido encorajava a sofrer em silêncio em união com
Jesus Crucificado; a pessoa não devia chamar a atenção para as dores por que passava; pelo
contrário, devia ocultá-las. Madre Teresa lutava pela perfeição nessa prática. O sorriso era um
dos dispositivos mais eficazes a que recorria para ocultar o sofrimento.
•Santa Teresa de C a lc ut á 363

bee into primeiro dia


Com Maria, a Mãe das Dores

O b j e t i v o : Passar o dia em união com a dor de Jesus e de Maria a


fim de tornar mais firmes os meus propósitos.
E x a m e: O meu desejo de morrer para o mundo e para o amor-
-próprio: Tenho um grande e profundo desejo de nada ser para o mundo e de
que o mundo nada seja para mim.
— Respeito minha Regra N° 88?* Esta Regra diz-me que ame tão
profundamente a humildade, que aceite as humilhações prontamente, até
com alegria? Sim.
— Recebo as correções e admoestações com espírito de fé, sem
desculpas nem queixas? Quando as Irmãs dizem coisas rudes e que magoam
lamento por elas — mas pessoalmente sinto-me muito feliz.**
— Estou disposta a aceitar o sofrimento por amor a Jesus e a
Maria? Sim — A humildade tem um grande peso na minha alma. Não me
parece que seja humilde porque estou convencida da minha pequenez e do
meu nada, mas anseio por ser mansa e humilde de coração como o é o Coração
de Jesus. Não sei há quantos anos tento fazer minha esta mansidão e humil­
dade do Coração de Jesus — até agora nada.
L e i t u r a s : Livro de Isaías, Capítulo 53.
I m i t a ç ã o d e C r i s t o : Livro 3, Capítulo 19. Qualquer passagem da
Paixão de Cristo (Novo Testamento).
R e f l e x ã o p a r a o d i a : “ Ó m e u p o v o , o q u e .. .*

Obrigada, Padre — o senhor me ajudou. Estou decidida a me


tomar uma santa do Sagrado Coração — mansa e humilde. Peça
a Jesus uma graça apenas — que me dê “o rosto sorridente de
uma criança.". Talvez a escuridão seja mais profunda, a solidão
mais dura, mas quero que assim seja — porque essa é a Sua
Santa Vontade. **

* Regra 88: “Q ue amem táo profundamente a humildade, que aceitem as humilhações pron­
tamente e com alegria. Devem, portanto, receber as correções e admoestações com espírito de
fé, sem desculpas nem queixas."
** Esta atitude era fruto da humildade da Madre, a quem agradava assemelhar-se a Jesus na
humilhação de Sua Paixão e na Sua benevolência para com o ofensor.
364 Ven ha , seja M i n h a luz

(Décimo segundo dia


Sob o patrocínio de Maria, a Rainha do Céu

O b j e t i v o : Uniáo com Jesus Ressuscitado na Sua grande glória.


Adquirir maior confiança na bondade e na grandeza do meu Redentor.
E x a m e : O meu amor à Igreja. Estou decidida a demonstrar o meu
amor pela Igreja tomando-me muito santa.
— Considero realmente que a Igreja é o “Corpo Místico de Cris­
to”? Nada — Ardo de zelo por tornar a Igreja conhecida e amada por
todos os homens? dentro de mim.
— Tento conformar os meus juízos com as orientações dadas
pela Igreja através das Encíclicas, das Cartas Pastorais, das Orientações
etc. [...] Sim. Em igualdade de circunstâncias, escolher o mais difícil.
Ninguém me obrigará a ser santa. Está nas minhas mãos e serei inferior,
moderada ou muito fervorosa, a opção é minha. Mas há Quem se im­
porte — Jesus Cristo.
L e i t u r a s : Salmo 65.
Evangelho de S. Mateus, Capítulo 28.
Evangelho de S. Marcos, Capítulo 16.
Evangelho de S. Lucas, Capítulo 24.
Evangelho de S. João, Capítulos 20 e 21.
Imitação de Cristo: Livro 3, Capítulo 49.*

* Referencia a um hino chamado “Impropérios” (baseado em Miqueias 6), que é cantado du­
rante a Adoração da Cruz, na liturgia de Sexta-Feira Santa: Meu Povo, que te fiz Eu? Em que
te contristei? Responde-me. Libertei-te da terra do Egito e tu preparaste uma cruz para o teu
Salvador. Meu Povo, que te fiz Eu? Em que te contristei? Responde-me. — Deus Santo! Deus
Fone! Deus Imortal, tende piedade de nós! — Guiei-te durante quarenta anos pelo deserto,
alimentei-te com o maná, levei-te para a terra prometida; e tu preparaste uma cruz para o teu
Salvador. — Deus Santo! Deus Forte! Deus Imortal, tende piedade de nós! — Que mais podia
Eu fazer por ti? Plantei-te como vinha formosa c escolhida e tu foste para Mim uma fonte de
amargura; quiseste matar-me a sede com vinagre e com uma lança atravessaste o lado do teu
Salvador. — Deus Santo! Deus Forte! Deus Imortal, tende piedade de nós!
** O fruto desse retiro foi uma maior determinação de se tornar santa e um maior abandono
à vontade de Deus, embora a escuridão e a solidão só aumentassem.
R e fl ex õ e s :
“Rainha do Céu, alegrai-vos, aleluia
Porque Aquele que merecestes trazer em vosso puríssimo seio, aleluia
Ressuscitou como disse, aleluia
Rogai a Deus por nós, aleluia. "*

Quando formos, mais cedo ou mais tarde, julgados por Ele, as


perguntas que nos fará não serio: **
“O que fizeste?” nada, Deus. Apenas tentei ser um instrumento
disponível.
ou “Como o fizeste?” O melhor que pude.
mas “Porque o fizeste?” Apenas por ti.

í)écimo terceiro dia


Sob o patrocínio do Imaculado
Coração de Maria, Causa da nossa Alegria

O b j e t i v o : Colocar-me na disposição adequada ao meu ofereci­


mento definitivo.
E x a m e : Estou disposta a fazer este oferecimento definitivo com
verdadeiro amor e total abandono? Sim.
“Tomai, Senhor, e recebei toda a minha liberdade,
A minha memória, o meu entendimento e toda a minha vontade.
Tudo o que tenho e possuo; Vós me destes;
a Vós, Senhor, o restituo.
Tudo é vosso, disponde de tudo,
segundo a vossa inteira vontade.

O “Rainha do Céu” (Regina Coelt) é um antigo hino mariano da Igreja


Católica, cantado entre o Domingo de Páscoa e o Domingo de Penrecostcs.
** A Madre Teresa riscou a palavra “náo” e escreveu por cima “se fossem”; dá a impressão de
que pretendia dizer: “se as perguntas que nos fará fossem...”
366 Venha, aeja M i n h a luz

Dai-me o vosso amor e graça,


que esta me basta.” Amém *

Imitação d e Cristo, Livro 3 , Capítulo 10.


L e itu ra s :
Que eu tenha inteira confiança no Sagrado Coração de
R e f le x ã o :
Jesus e no Imaculado Coração de Maria, Causa da nossa Alegria.

Rezar fervorosamente a seguinte oração.**

* Oração de Santo Inácio de Loyola.


** Falta a página seguinte das notas do retiro, que era a última.
ylgradecimentos

Só foi possível escrever um livro como este com a colaboração de muitas


pessoas. Por isso, quero expressar aqui os meus profundos agradecimen­
tos a todos que contribuíram, de maneiras diversas, para tornar este
livro uma realidade.
Em primeiro lugar, temos uma enorme dívida de gratidão para com
os Jesuítas e outros, que tiveram a previdência de preservar as cartas de
Madre Teresa para as gerações futuras de Missionárias da Caridade (MC)
e para toda a Igreja. Felizmente, o desejo de Madre Teresa — de que tão
abundante e precioso material fosse destruído — não se concretizou. Um
agradecimento sincero vai igualmente para os que enriqueceram os nossos
conhecimentos e a nossa compreensão da Fundadora da família MC, par­
tilhando conosco as recordações que dela guardavam.
Estou em dívida com as irmãs MC que trabalham no gabinete e
nos arquivos da postulação, e que passaram muitas horas transcrevendo e
organizando documentos. Estou profundamente agradecido às irmãs M C
que trabalham nos Centros Madre Teresa de Tijuana, Kolkata e Roma,
sem cujo auxílio generoso e diligente este livro não teria sido o que é.
Um agradecimento especial para Claudia Cross do Sterling Lord
Literistic por todo o apoio, cuidado e auxílio especializado que nos
prestou. Foi uma alegria trabalhar com Bill Barry, editor, e com Trace
Murphy, diretor editorial da Doubleday Religion. Ambos se mostraram,
desde o princípio, entusiasmados com o projeto, tendo visado sempre,
ao longo da sua concretização, a um nível de excelência. Os nossos ami­
gos Henry Hockeimer, Jamie Bischoff, Corey Field e Stephen Kim, da
368 Venha, seja M i n h a luz

Ballard Spahr Andrews e Ingersoll, deram o seu generoso contributo em


todo este processo — obrigado.
Foram várias as pessoas que reviram partes do livro, fazendo su­
gestões construtivas. Entre elas, gostaria de agradecer especialmente ao
pe. Matthew Lamb, a Jim Towey, ao pe. Paul Murra, OP, ao Pe. Thomas
Dubay, SM, ao pe. Frederic Groeschel, CFR, ao pe. Pascual Cervera e a
Tim S. Hackey, bem como ao professor doutor Tom Butler, que passou
várias horas traduzindo o poema da Madre Teresa.
Estou particularmente agradecido à Ir. Nirmala, M C, a sucessora
de Madre Teresa como Superiora Geral das Irmás Missionárias da Cari­
dade, que apoiou as atividades do Centro Madre Teresa, bem como este
projeto; às Irmás MC, aos Irmãos MC, quer ativos, quer contemplati­
vos, e aos meus próprios confrades dos Padres MC, em especial ao Pe.
Robert Conroy, MC, pelo apoio e encorajamento fraterno de que deram
provas. Uma especial palavra de gratidão para o ramo contemplativo das
Irmãs MC, e para as muitas pessoas que apoiaram esta obra por via das
suas orações e dos seus sacrifícios.
Estou muito grato ao arcebispo Lucas Sirkar, SDB, de Calcutá,
por me ter autorizado a citar cartas do arcebispo Ferdinand Périer, SJ,
ao Pe. George Pattery, SJ, Provincial da Província de Calcutá da Con­
gregação de Jesus, por me ter autorizado a citar cartas do pe. Celeste Van
Exem, SJ, ao pe. Joseph Neuner, SJ, ao pe. Albert Huart, SJ, aos Jesuítas da
Província da Croácia, ao pe. Michael van der Peer, SCJ, e ao Bispo William
G. Curlin, DD, pela valiosa contribuição e auxílio prestado. As Irmãs
de Loreto sempre corresponderam com prontidão às nossas solicitações,
tendo tido a gentileza de nos autorizar a usar diversas cartas constantes
dos seus arquivos, pelo que estamos profundamente gratos. Agradecemos
àTAN Books and Publishers, Inc., as citações do pe. Reginald Garrigou-
-Lagrange, OP; a Ravindra Kumar, diretor de The Statesman, Ltd., e às
Nachiketa Publications, por nos terem autorizado a utilizar material das
entrevistas a Desmond Doig; à David Higham Associates, que representa
o patrimônio literário de Malcolm Muggeridge, por ter autorizado o uso
de suas palavras; e aos diretores da Reviewfo r Religious, da Catholic Leader
•Santa Teresa de Ca lc u tá 369

e do Milwaukee Catholic Herald, por nos terem autorizado a usar excertos


de diversos artigos publicados.
E bem possível que, apesar de todas essas ajudas, tenha havido
erros, pelos quais sou o único responsável.
Centro Madre 'Teresa de Calcutá

O Centro Madre Teresa de Calcutá — uma organização sem fins lucra­


tivos criada e dirigida pelas Missionárias da Caridade, a família religiosa
fundada por Madre Teresa de Calcutá — é uma extensão do Gabinete da
Postulação de Madre Teresa.
É seu objetivo promover uma devoção genuína à Bem-Aventu­
rada Teresa, bem como o conhecimento da sua vida e obra, da sua es­
piritualidade e mensagem, através da organização e publicação dos seus
escritos, da distribuição de material de devoção (folhetos, panfletos,
fotografias, medalhas etc.), e da manutenção do site oficial na internet
(www.motherteresa.org). O Centro é também responsável pela preser­
vação das palavras e da imagem da Madre Teresa contra quaisquer abu­
sos ou usos indevidos delas.
Quaisquer informações ou pedidos de autorização para a utiliza­
ção das palavras ou do nome da Madre Teresa poderão ser obtidos pelo
seguinte endereço: mtc@motherteresa.org.
Jfotas

In trodu ção

1. D e M a d re M . T e re sa , M C , p a ra o Pe. J o s e p h N e u n e r, S J, 6 d e m a rç o d e 1 9 6 2 .

2. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. J o s e p h N e u n e r, S J, s e m d a ta , m u ito p ro v a v e lm e n te

e s c r ita d u r a n te o r e tiro d e a b ril d e 1 9 6 1 .

3. M a lc o lm M u g g e rid g e , Something Beautifulfor God, N o v a Y o rk , H a r p e r e R o w ,

1 9 7 1 , p. 18.

4. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 8 d e f e v e re ir o d e 1 9 3 6 .

3. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 5 7 .

6. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 1 8 d e d e z e m b r o d e 1 9 6 0 .

7. D o P e . C . V a n E x e m , S J , p a r a o a r c e b i s p o H . D ’S o u z a , 1 2 d e m a r ç o d e 1 9 9 3 .

C apítulo 1
“S e g u r e a m ã o Dele, e c a m i n h e s o z i n h a c o m t i e ”

1. I n s tr u ç õ e s d e M a d re T e re sa às Irm ã s , 2 4 d e m a io d e 1 9 8 4 .

2. I n s tru ç õ e s d e M a d re T e re sa às Irm ã s, 1 9 9 2 .

3. D e M a d re T e re sa p a ra M a lc o lm M u g g e rid g e , c ita d o e m M a lc o lm M u g g e rid ­

ge, Something Beautifulfor God, N o v a Y o rk , E v a n s to n , S ã o F ra n c is c o , L o n d r e s ,

H arp er e R ow , 1971, p. 84.

4. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 2 4 d e ju lh o d e 1 9 6 7 .

5. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 2 5 d e j a n e i r o d e 19 4 7 .

6. D a I rm ã T e re sa , d o m a r M e d ite rrâ n e o , p a ra o Blagovijest ( u m a re v is ta c a tó lic a

d c E s c ó p ia ), 2 5 d e m a rç o d e 1 9 2 9 , p . 3 -4

7. D a Irm ã T e re sa p a ra o KatolickeMisije ( a r e v is ta d a s m is s õ e s p u b lic a d a p e lo s J e s u í-


374 \ c n h a . seja M i n h a luz

ta s n a I u g o s lá v ia ) , 6 d e ja n e ir o d e 1 9 2 9 , p . 5 8

8. D a Irm á T e re sa p a ra A n k a C a v c ic , 1 9 3 1 .

9. D a I r m ã T e r e s a p a r a o B la g o v ije s t , n o v e m b r o d e 1 9 3 2 . C f . M a t e u s 2 8 : 1 9 .

10. C f M a te u s 1 6 :2 4 .

11. C f L u c a s 2 :5 1 e M a te u s 2 7 : 3 3 .

12. D a Irm ã T e re sa p a ra o Pe. F ra n jo J a m b r e k o v ic , 8 d e fe v e re iro d e 1 9 3 7 . A Irm ã

T e re sa c o s tu m a v a a s s in a r n a lín g u a e m q u e e s ta v a e s c r e v e n d o . P a r a e v ita r c o n ­

fu sõ e s, a p a re c e s e m p r e o o rig in a l “T e re sa ” .

13. P e . R e g i n a l d G a r r i g o u - L a g r a n g e , O P , T h e T h ree A g e s o f I n te r i o r L ife , v o l . 2 , t r a d ,

[ p a r a i n g l ê s ] I r m á M . T i m o t h e a D o y l e , O P , R o c k f o r d , 111., T a n B o o k s, 1 9 8 9 ,

pp. 4 6 3 -6 4 : “N a m e sm a p ro p o rç ã o e m q u e a u m e n ta a c a rid a d e , d im in u i o

m e d o d o s o frim e n to e a u m e n ta o m e d o d o p e c a d o , se m e n fra q u e c im e n to d a

c o n fia n ç a .”

14. D a I r m ã T e re s a p a ra o P e . F r a n jo J a m b r e k o v ic , S J , 8 d e f e v e re ir o d e 1 9 3 7 .

15. C f M a te u s 2 0 :2 2 ; 2 6 :3 9 ; e 4 2 .

16. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. J a m b r e k o v ic , 2 5 d e n o v e m b r o d e 1 9 3 7 .

17. D a I rm á G a b r ie la p a ra o P e. J a m b r e k o v ic , 2 5 d e n o v e m b r o d e 1 9 3 7 .

18. I rm á F ra n c is M ic h a e l L y n e , IB V M

19. Irm á M a rie -T h é rè se , c ita d o e m N a v i n C h a w l a , M o t h e r Teresa , R o c k p o r t , E l e -

m e n te B o o k s, 1 9 9 6 , p . 12.

20. D e M a d re T ere sa p a ra o Katolicke Misije, 2 5 d e o u tu b r o d e 1 9 3 7 .

21. I b id .

C a p ítu lo 2
U n i a c o is a m u i t o b o n i t a p a r a J e s u s

1. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 1 d e s e t e m b r o d e 1959. Em o u tra s

d u a s r e f e r ê n c ia s q u e fà z a o v o to , a M a d r e T e re s a e m p r e g a a e x p r e s s ã o c o r r e n t e

“s o b p e n a d e p e c a d o m o r t a l ” .

2. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n c r, 12 d e m a io d e 1 9 6 2 .

3. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 4 d e a b ril d e 1 9 6 0 .

4. N o ta s d e R e tir o d a M a d re T e re sa , m a rç o - a b r il d e 1 9 5 9 , p . 2 6 9 .

5. E x p lic a ç ã o d a s C o n s titu iç õ e s O rig in a is d a s M is s io n á r ia s d a C a r id a d e , e s c rita

p o r M a d r e T e r e s a , s e m d a t a , p . 2 8 . A M a d r e T e r e s a e s t á a q u i a c i t a r P. J o h a n n s ,

S J , T h e L i t t l e W a y , L i g h t o f t h e E a s t S e r i e s , n . ° 1 5 , C a l c u t á , F. G . G o m e s a t t h e

B e n g a l L ith o P re ss, p p . 9 0 , 9 1 ,9 2 .

6. A l f r e d O ’R a h i l l y , F a th e r W i l l i a m D o yle, SJ, A S p i r i t u a l S tu d y , L o n d r e s , N o v a
■Santa Teresa de C alc utá 375

Y o rk , T o r o n t o , L o n g m a n s , G r e e n a n d C o ., 1 9 2 5 , p . 2 8 8 . E s te v o to é i g u a lm e n te

r e f e r i d o n a o b r a M e r r y in G o d ( F a t h e r W i llia m D o y le , S J ), L o n d r e s , N o v a Y o rk ,

T o r o n t o , L o n g m a n s , G r e e n a n d C o ., 1 9 3 9 , p . 1 3 7 , o b r a q u e M a d r e T e re s a le u .

7. C i r c u l a r d a C o m u n i d a d e d e C o m o , t r a d u z i d a [ p a r a in g lê s ] p o r M . S . P i n e , S ister

B e n ig n a C o n s o la ta Ferrero, C h i c a g o , J o h n P D a l e i d e n C o m p a n y , 1 9 2 1 , p p . 4 1 , 1 2 8 .

8. P a p a P i o X I , V e h e tn e n te r e x u lta m o s h o d ie , B u l a d e C a n o n i z a ç ã o d e S a n t a T e r e s a

d o M e n i n o J e s u s , i n S a i n t T herese o f L is ie u x : T h e L i ttle F b w e r o f Jesus, t r a d , [ p a r a

i n g l ê s ] R e v . T h o m a s N . T a y l o r , P. J . K e n n e d y e S o n s , N o v a Y o r k , 1 9 2 7 , p . 2 7 9 .

9. I n s tr u ç õ e s d e M a d r e T e re s a à s Irm ã s , 19 d e ja n e ir o d e 1 9 8 3 .

10. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . N e u n e r, 1 2 d e m a io d e 1 9 6 2 .

11. Ib id . U m pecado m o r ta l é “u m a i n f r a ç ã o g r a v e à le i d e D e u s . D e s v i a o h o ­

m em d e D e u s , q u e é o s e u ú lti m o f im , a s u a b e m - a v e n tu r a n ç a , p r e f e r in d o u m

bem in f e r io r ” ( C a te c is m o d a Ig re ja C a tó lic a , 1 8 5 5 ; d a q u i e m d ia n te , a b re v ia d o

p a r a C I C ) . S e o p e c a d o m o r ta l “n ã o f o r r e s g a ta d o p e lo a r r e p e n d im e n to e p e lo

p e r d ã o d e D e u s , o r ig in a r á a e x c lu s ã o d o R e in o d e C r is t o e a m o r te e te r n a n o

i n f e r n o ” ( C I C , 1 8 6 1 ) . P a r a h a v e r p e c a d o m o r t a l , é p r e c is o q u e s e ja m v e rif ic a d a s

a s s e g u in te s c o n d iç õ e s : m a té r ia g ra v e , p le n a c o n s c iê n c ia e p r o p ó s ito d e lib e r a d o

(C IC , 1 8 5 8 -5 9 ).

12. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 4 d e a b ril d e 1 9 6 0 .

13. I rm ã M a rie -T h é rc s e , IB V M , c ita d o e m N a v i n C h a w l a , M o th e r Teresa, R o c k p o r t ,

E le m e n t B o o k s, 1 9 9 6 , p . 11.

14. F a l a n d o p o r e x p e r i ê n c i a , n a s i n s t r u ç õ e s q u e d a v a à s i r m ã s , i n s i s t i a e m q u e “p a r a

u m a p e s s o a q u e e s tá a p a ix o n a d a , a s u b m is s ã o é m a is d o q u e u m d e v er, é u m a

b e m - a v e n t u r a n ç a ” . N a r e a lid a d e , e s ta v a p a r a f r a s e a n d o u m p e n s a m e n t o — que,

com o p a ssa r d o te m p o , se to rn a ra se u — r e t i r a d o d e L o u i s C o l l i n s , C . S S . R .:

“ P a r a u m a p e s s o a q u e e s tá a p a ix o n a d a , a r e n d iç ã o é m a is d o q u e u m d e v e r, é m a is

d o q u e u m a n e c e s s i d a d e ; t e m u m g o s t o d e b e m - a v e n t u r a n ç a ” ( T h e P ra ctice o f th e

R u le , C o r k , I r e l a n d , T h e M e r c i e r P re s s L i m i t e d , 1 9 6 4 , p . 1 1 ).

15. I n s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s, 31 d e m a rç o d e 1 9 8 7 .

16. C f. 2 C o n n tio s 9: 7 .

17. E x p lic a ç ã o d a s C o n s titu iç õ e s O rig in a is .

18. S a n t a T e r e s a d o M e n i n o J e s u s e d a S a n t a F a c e , H is tó r ia d e u m a a lm a . M a n u s c r i ­

to s a u to b io g r á fic o s , t r a d , p o r t u g u e s a N i c o l e D e v y e J o r g e V a z , o c d , P a ç o d ’A r c o s ,

E d iç õ e s C a r m e lo , 2 0 0 0 , p . 2 5 2 .

19. D e M a d r e T e r e s a p a r a a s I rm ã s M C , P r im e ir a S e x ta -F e ira , n o v e m b r o d e 1 9 6 0 .
376 \ c n h a , s e ja M i n h a l u z

20. I n s tr u ç õ e s d e M a d r e T e re sa às Irm ã s , 3 0 d e o u tu b r o d e 1 9 8 1 .

21. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P c r ie r , 1 d e s e t e m b r o d c 1 9 5 9 .

22. C f . K a to lic k e M i s i j e , f e v e r e i r o d e 1 9 4 2 .

23. D e c la ra ç ã o d a I rm ã L e titia , D S A .

24. D o P e . A n te G a b r ic , S J , c ita d o e m J u r a j G u s ic , S J , M a jk e O d b a c e n ih , Z a g r e b ,

C r o á c ia , p u b lic a ç ã o p a rtic u la r, 1 9 7 6 , p . 5 4 .

25. I r m ã F r a n c e s c a , I B V M , c i t a d a e m N a v i n C h a w l a , M o t h e r T eresa , R o c k p o r t , E l e ­

m e n t B o o k s, 1 9 9 6 , p. 14.

26. C ita d o e m E i l e e n E g a n , S u c h a V is io n o f th e S tr e e t: M o t h e r Teresa — U se S p i r i t

a n d th e W o rk, N o v a Y o rk , I m a g e D o u b le d a y , 1 9 8 5 , p . 2 4 .

27. E x p lic a ç ã o d a s C o n s t itu iç õ e s O r ig in a is .

C a p ítu lo 3
“Venha, s e ja M i n h a l u z ”

1. D a M a d re T ere sa p a ra M a lc o lm M u g g e rid g e , c ita d o e m M a lc o lm M u g g e rid g e , S o ­

m e th in g B e a u tifu lfo r G od, N o v a Y o rk , H a r p e r e R o w P u b l i s h e r s , 1 9 7 1 , p p . 8 5 - 8 6 .

2. D e M a d re T e re sa p a ra a s I rm ã s M is s io n á r ia s d a C a r id a d e , 2 4 d e a b r il d e 1 9 9 6 .

3. D e M a d re T ere sa p a ra o s C o la b o ra d o re s , N a ta l d e 1 9 9 6 .

4. J o ã o 1 9 :2 8 .

5. E x p lic a ç ã o d a s C o n s t itu iç õ e s O r ig in a is . D e s d e o p r in c í p io q u e a M a d r e T e r e s a e

a s irm ã s r e la c io n a v a m a p ro fis s ã o d o s se u s v o to s c o m s a c ia r a s e d e d e J e s u s ; p o r

e x e m p lo , d e s e n h a m u m a c ru z c o m a s p a la v ra s “ T e n h o s e d e ” n a p a r te s u p e r i o r

d a fo lh a d e p a p e l o n d e e s c re v e m o s v o to s q u e p r o fe s s a m n a c e r im ô n ia .

6. C f. J o ã o 1 9 :2 5 -2 7 .

7. E x p lic a ç ã o d a s C o n s t itu iç õ e s O r ig in a is .

8. D e M a d re T ere sa p a ra as Irm ã s, o s Irm ã o s e o s p a d re s M C , 2 5 d e m a rç o d e

1993.

9. C o n s titu iç õ e s d a s M is s io n á r ia s d a C a r id a d e , 5 .

10. C f L u ca s 1 0 :3 3 -3 5 .

11. M a te u s 2 5 :4 0 .

12. D e M a d r e T e re s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, F e s ta d e C o r p u s C h r i s t i , 5 d e j u n h o

de 1947.

13. A s lo c u ç õ e s ( o u p a la v ra s s o b r e n a tu r a is ) s ã o “ m a n if e s ta ç õ e s d o p e n s a m e n to d e

D eu s” q u e p o d em c h e g a r a o s h o m e n s a tra v é s d e p a la v r a s , q u e r o u v id a s e x te r ­

n a m e n te (ca so e m q u e se c h a m a m lo c u ç õ e s e x te rn a s o u a u ric u la re s ), q u e r n a
S a n ta Teresa de C alc ula 377

im a g in a ç ã o (c a so e m q u e se d e s ig n a m p o r lo c u ç õ e s im a g in a tiv a s in te r io r e s ) , o u

d e f o r m a im e d ia ta , s e m p a la v r a s (c a s o e m q u e s ã o c h a m a d a s lo c u ç õ e s in te le c tu a is

i n t e r i o r e s ) . C f . R e g i n a l d G a r r i g o u - L a g r a n g e , O P , T h e T h ree A g e s o f th e S p i r i t u a l

L ife : P r e lu d e o f E t e r n a l L i f e , v o l . 2 , S t . L o u i s , M O , B . H e r d e r B o o k s , C o . , 1 9 4 8 ;

R o c k f o r d , I I I ., T a n B o o k s , 1 9 8 9 , p p . 5 8 9 - 9 0 ; b e m c o m o A u g u s tin P o u la in , S J,

R e v e la tio n s a n d V isio n s: D i s c e r n i n g th e T r u e a n d C e r ta in f r o m th e F a lse o r th e

D o u b tfu l, t r a d , [in g le s a ] L . L . Y o rk e S m i t h , 1 9 1 0 ; r e e d ., N o v a Y o rk , A lb a H o u s e ,

1 9 9 8 , p p . 1 - 1 8 . M a d r e T e r e s a r e c e b e u lo c u ç õ e s im a g in a tiv a s in te r io r e s .

14. D e M a d r e T e r e s a p a r a o K a t o l i c k e M is ije , f e v e r e i r o d e 1 9 3 5 , p . 2 5 .

15. D e M a d r e T e r e s a p a r a o K a t o l ic k e M i s i j e , o u t u b r o d e 1 9 3 7 .

16. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 7 .

17. D e M a d re T ere sa p a ra a M a d re G e rtru d e K en n e d y , IB V M , 10 d e ja n e ir o d e

1 9 4 8 . T r a ta - s e d a r e a ç ã o c lá s s ic a d e u m c a tó lic o à s m a n if e s ta ç õ e s e x tr a o r d in á r ia s

d a p r e s e n ç a d iv in a . É o p in iã o u n â n im e d o s m e s tr e s d e e s p ir itu a lid a d e q u e , p a ra

p ô r à p r o v a ta is c o m u n ic a ç õ e s , o p r im e ir o p a s s o c o n s is te e m a fa s ta r-s e d e la s , e m

r e c u s a r - s e a d e ix a r - s e o b c e c a r p o r e la s . S e f o r e m g e n u í n a s , c o n t i n u a r ã o p e la s u a

p r ó p r ia fo rç a . S e n ã o f o re m , a c a b a r ã o p o r se d e sv a n e c e r.

18. C f. L u c a s 1 0 :3 8 -4 2 .

19. C f. M a te u s 2 7 :3 5 .

20. C f . F ilip e n s e s 2 :8 .

21. C f. L u c a s 2 3 :3 4 - 4 3 .

22. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 7 .

C apítulo 4
ii(P a r a l e v a r a l e g r i a a o C o r a ç ã o s o f r id o d e J e s u s ”

1. D a M a d r e M . G e r t r u d e p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 2 5 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

2. D o a rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d re G e r tr u d e , 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

3. Ibid.
4. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 2 5 d e ja n e ir o d e 1 9 4 7 .

5. D o a r c e b is p o P é r ie r p a r a a M a d r e T e r e s a , 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 7 .

6. C f. 1 C o r ín tio s 9 :2 2 .

7. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b i s p o P é r ie r , e m d a t a a n t e r i o r a 7 d e m a r ç o d e 1 9 4 7 .

8. D o P e . J o s e p h C r e u s e n , S J , p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 2 8 d e ju n h o d e 1 9 4 7 .

9. D o a r c e b is p o P é r ie r p a ra a M a d r e T e re s a , 7 d e m a rç o d e 1 9 4 7 .

10. C f. M a te u s 1 0 :4 2 .
378 Xcnlia, scja iSlinha luz

11. M a d r e T e re s a e s tá se r e f e r in d o à e n c íc lic a Q u e m a d m o d u m ( S ú p lic a p a ra q u e

se p ro c e d a a o C u id a d o d a s C ria n ç a s I n d ig e n te s d o M u n d o ) , d o P a p a P io X II,

p r o m u lg a d a a 6 d e ja n e ir o d e 1 9 4 6 .

12. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 4 7 .

13. D o a r c e b is p o P é rie r p a ra M a d r e T e re s a , 7 d e a b ril d e 1 9 4 7 . A n u m e r a ç ã o e o s

s u b lin h a d o s c o n s ta n te s n e s ta c a r ta sã o d e M a d re T e re sa .

14. I b id .

13. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o d e P é rie r, 1 4 d e j u n h o d e 1 9 4 7 .

16. I b id .

17. D e M a d r e T e r e s a p a r a o a r c e b is p o P é rie r, n a F e s ta d o C o r p u s C h r i s t i , 3 d e j u ­

nh o de 1947.

18. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o d e P é rie r, 1 4 d e j u n h o d e 1 9 4 7 .

C a p ítu lo 5
“jV óo d e m o r e m a is . J f ã o m e d e t e n h a ”

1. D a M a d r e G e r t r u d e p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 2 5 d e j a n e i r o d e 1 9 4 8 .

2. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 8 d e a g o s t o d e 1 9 4 7 .

3. Ib id . ( O P e . V a n E x e m e s tá c i t a n d o p a la v r a s d a M a d r e T e r e s a , e m c a r t a d e s t a a o

a rc e b is p o .)

4. I b id .

5. I b id .

6. Ib id

7. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 2 6 d e o u t u b r o d e 1 9 4 7 .

8. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o P é rie r, 8 d e a g o s t o d e 1 9 4 7 .

9. I b id .

10. I b id .

11. T h o m a s D u b a y , F ir e W i t h i n : S t. Teresa o f A v ila , S t. J o h n o f t h e C ross, a n d th e

G o sp el — o n P ra y e r, S á o F r a n c i s c o , I g n a t i u s P r e s s , 1 9 8 9 , p . 2 6 5 .

12. D e M a d re T ere sa p a ra N o s s o S e n h o r, se m d a ta .

13. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. J o s e p h N e u n e r, S J, se m d a ta , m a s e s c rito q u a s e c o m

c e rte z a d u r a n te o r e tiro d e a b ril d e 1 9 6 1 . A d o ç u r a , o c o n s o lo e a u n iã o s ã o a l­

g u n s d o s e f e ito s d a s lo c u ç õ e s e v is õ e s g e n u í n a s . O P e . A u g u s tin P o u la in , S J, c ita

S ã o J o ã o d a C r u z : “ O s e f e ito s q u e e s ta s v is õ e s ( im a g in a t iv a s ) p r o d u z e m n a a l m a

s á o a p a z , a ilu m in a ç ã o , u m a a le g r ia s e m e l h a n te à d a g ló r ia , d o ç u r a , p u r e z a ,

a m o r , h u m il d a d e , e a in c lin a ç ã o o u e le v a ç ã o d a m e n te p a r a D e u s .” A lg u n s d e s -
•Santa T e r e sa d e C a l c u t á 379

se s fa v o re s e s p e c ia is e ra m e v id e n te s n a a lm a d e M a d r e T e re s a , o q u e c o n s titu í a

m a is u m in c e n tiv o p a ra o P e. V a n E x e m e s ta r c o n v e n c id o d e q u e o c h a m a d o e ra

a u t ê n t i c o . C f . A u g u s t i n P o l a i n , R e v e la tio n s a n d V isio n s, N o v a Y o r k , A l b a H o u s e ,

1998, p. 16.
14. C o m o in d ic a a c a r ta d a ta d a d e 8 d e a g o s to d e 1 9 4 7 ao Pe. V an E x em , a m o ­

tiv a ç ã o d e M a d r e T e r e s a a o p e d ir a u to r iz a ç ã o a o c o n fe s s o r p a ra fa z e r e s te v o to

r a d i c a v a c m u m a l o c u ç ã o q u e t i n h a r e c e b i d o n o r e g r e s s o a C a l c u t á : " T r o u x e -lh e

a q u i — p a r a e s ta r a o c u i d a d o i m e d i a to d o seu d ir e c to r e s p ir itu a l. [ . . . ] O b e d e ç a -lh e

e m to d o s os p o r m e n o r e s , n ã o serás e n g a n a d a se obedeceres, p o is ele M e p e r te n c e p o r

c o m p le to . — D e i x a r e i v o c ê c o n h e c e r a M i n h a v o n ta d e a tr a v é s d ele. ”

15. D o P e . V a n E x e m p a r a o a r c e b is p o P é r ie r , 8 d e a g o s to d e 1 9 4 7 .

16. D o A rc e b is p o P é r ie r p a ra a M a d r e T e re sa , 2 4 d e o u tu b r o d e 1 9 4 7 .

17. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 d e o u t u b r o d e 1 9 4 7 .

18. M a d re T ere sa e sc re v e n d o a Je su s e m 1959.

19. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. V an E x e m , 1 9 d e o u tu b r o d e 1 9 4 7 .

20. Ib id .

21. D o P e . V a n E x e m p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 8 d e a g o s to d e 1 9 4 7 .

22. D o P e . V a n E x e m p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 0 d e o u t u b r o d e 1 9 4 7 .

23. D o P e . V a n E x e m p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 6 d e o u tu b r o d e 1 9 4 7 .

24. D o A r c e b is p o P é r ie r p a ra o P e . V a n E x e m , 2 8 d e o u tu b r o d e 1 9 4 7 .

25. C f . A to s 5 :3 8 - 3 9 .

26. C f. Jo ã o 1 4 :1 3 .

27. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 4 d e o u t u b r o d e 1 9 4 7 .

28. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. V an E x em , 2 8 d e o u tu b ro d e 1 9 4 7 .

29. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 7 d e n o v e m b r o d e 1 9 4 7 .

30. C f . L u c a s 1 8 :2 - 8 .

31. C f . F ilip e n s e s 4 :1 3 .

32. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 7 d e n o v e m b r o d e 1 9 4 7 .

33. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 3 d e d e z e m b r o d e 1 9 4 7 .

34. D o P e . C r e u s e n p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 8 d e j u n h o d e 1 9 4 7 .

35. D o P e . J e r o m e S a n d e r s , S J , p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 8 d e d e z e m b r o d e 1 9 4 7 .

36. D o P e . C r e u s e n p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 8 d e ju n h o d e 1 9 4 7 .

37. D o A rc e b is p o P é r ie r p a r a a M a d r e G e r tr u d e , 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .
380 X'cnha, seja M i n h a luz

C apitulo 6
{(l im o a o s “b u r a c o s e s c u r o s "

1. D e M a d re T ere sa p a ra a M a d re G e r tr u d e , 10 d e ja n e ir o d e 1948.

2. “ T e n h o a c e r te z a d e q u e u m d ia e la [a a u to r i z a ç ã o ] c h e g a r á , e e n t ã o o s e n h o r

se rá c o m c e r te z a o p r im e ir o a d a r a o jo v e m i n s t i t u t o t o d o o a u x ílio d e q u e e le

p r e c is a r.” D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, m u i t o p ro v a v e lm e n te e m

d a ta a n te r io r a 7 d e m a rç o d e 1 9 4 7 .

3. D e M a d re T eresa p a ra o Pe. V an E x em , 19 d e o u tu b r o d e 1 9 4 7 .

4. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 8 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

3. I b id .

6. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra o P e . V a n E x e m , 1 2 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

7. I b id .

8. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d r e G e r tr u d e , 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

9. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 2 8 d e j a n e i r o d e 1 9 4 8 .

10. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 3 d e ja n e ir o d e 1 9 4 7 .

11. D o A rc e b is p o P é r ie r p a ra a M a d r e T e re s a , 2 9 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

12. Ib id .

13. D e M a d r e G e r t r u d e p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 5 d e j a n e ir o d e 1 9 4 8 .

14. D e M a d re G e r tr u d e p a ra M a d re T ere sa, 2 5 d e ja n e iro d e 1 9 4 8 .

15. D e M a d r e T e re s a p a ra o C a r d e a l P r e fe ito d a S a g r a d a C o n g r e g a ç ã o p a r a o s R e li­

g io s o s , 7 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 8 .

16. D o A rc e b is p o P é rie r p a r a o C a r d e a l P r e fe ito d a S a g r a d a C o n g r e g a ç ã o p a ra os

R e lig io s o s , 2 0 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 8 , t r a d u ç ã o [ p a r a in g lê s ] d o o r i g i n a l f ra n c ê s .

17. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 4 d e a b r il d e 1 9 4 8 .

18. D e M a d r e T e re s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 3 d e m a io d e 1 9 4 8 .

19. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d r e T e re s a , 1 8 d e m a io d e 1 9 4 8 .

20. I b id .

21. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a R e v e r e n d a M a d r e M . C o l u m b a , I B V M , d a ta d a d e

7 d e a g o s to d e 1 9 4 8 .

22. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 4 7 .

23. V er a C a n a D e M a d re T e re sa p a ra o C a rd e a l P re fe ito d a S a g ra d a C o n g r e g a ç ã o

p a r a o s R e lig io s o s , 7 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 8 .

24. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 5 d e a g o s to d e 1 9 4 8 .

25. T e s te m u n h o d e N a v in C h a w la .
•Santa Te resa de Ca lc u la 381

C apítulo 7
y i n oite escu ra d o n a sc im e n to d a c o n g r e g a ç ã o "

1. E ile e n E g a n , Such a V is io n o f t h e S tr e e t , N o v a Y o r k , I m a g e D o u b l e d a y , 1 9 8 3 ,

p. 32.

2. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 4 d e a g o s to d e 1 9 4 8 .

3. Ib id .

4. D e M a d re M . E m m a n u e l, IB V M p a ra M a d re T e re sa , 15 d e a g o s to d e 1 9 4 8 .

5. D e M a d re M . Jo se p h , IB V M p a ra M a d re T e re sa , 15 d e a g o s to d e 1 9 4 8 .

6. D e M a d re M . G a b rie lle , IB V M p a ra M a d re T ere sa, 3 d e s e te m b ro d e 1 9 4 8 . N a

v e rd a d e , o d ia d o o n o m á s tic o d e M a d re T ere sa — a fe sta d e S a n ta T e re s in h a —

e r a a 3 d e o u t u b r o , p e lo q u e é p o s s ív e l q u e M a d r e G a b r ie lle se te n h a e n g a n a d o

a o d a ta r a c a rta .

7. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. V a n E x e m , 1 7 d e s e te m b ro d e 1 9 4 8 .

8. Ib id .

9. Ib id .

10. D e M a d re M . P a u lin e D u n n e , IB V M p a ra a Irm á T ere sa, 2 9 d e o u tu b ro de

1948.

11. C f. L u c a s 2 :7 .

12. D a M a d r e T e re s a p a ra a M a d r e P a u lin e , 9 d e n o v e m b ro d e 1 9 4 8 .

13. T e s te m u n h o d a Irm á M . G e rtru d e , M C

14. R e g is tr o d o s P r im e ir o s D ia s , e s c rito e n tr e 2 1 e 2 3 d e d e z e m b ro d e 1 9 4 8 .

15. C f. L u c a s 4 :4 3 .

16. D iá rio d a M a d re T e re sa , 2 4 d e ja n e iro d e 1 9 4 9 (d a q u i e m d ia n te , D iá rio ). F o i o

A rc e b is p o P é rie r q u e m lh e o r d e n o u q u e p r o c e d e s s e a e s te r e g is tro d o s e v e n to s ,

q u e f o i e s c r i t o e n t r e o N a t a l d e 1 9 4 8 e 11 d e j u n h o d e 1 9 4 9 .

17. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 0 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 9 .

18. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 3 d e j a n e ir o d e 1 9 4 7 .

19. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 1 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 9 .

20. D iá r io , 2 8 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 9 .

21. D iá r io , 1 6 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 9 .

22. C f. J o ã o 2 :3 .

23. D iá r io , 2 d e f e v e re ir o d e 1 9 4 9 .

24. D iá rio , 1 9 d e m a rç o d e 1 9 4 9 .

25. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 9 d e j u n h o d e 1 9 4 9 .
382 V e n h a , se ja iSIinlia lu z

26. D o A rc e b is p o P é r ie r p a r a o C a r d e a l P r e fe ito d a S a g r a d a C o n g r e g a ç ã o p a ra o s

R e lig io s o s , R o m a , 4 d e a g o s to d e 1 9 4 9 , tr a d u z id a d o f ra n c ê s [ p a r a in g lê s ],

27. D e M a d re T e re sa p a ra o P a p a P io X II, 1 d e m a rç o d e 1 9 5 0 .

28. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 3 d e j u lh o d e 1 9 5 0 .

29. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 1 d e j u n h o d e 1 9 5 0 .

30. D e c re to d e E re ç ã o d a n o v a C o n g re g a ç ã o d a s Irm ã s M is s io n á ria s d a C a r id a d e .

31. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 3 d e s e te m b r o d e 1 9 5 0 .

32. Ibid.
33. T e s te m u n h o d a Irm ã M . D o ro th y , M C

34. J o ã o 1 2 :2 4 -2 5 .

35. E x p lic a ç ã o d a s C o n s t itu iç õ e s O rig in a is .

36. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 0 d e ja n e ir o d e 1 9 5 1 .

37. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 0 d e m a r ç o d e 1 9 5 1 .

38. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 6 d e o u t u b r o d e 1 9 5 0 .

39. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. J a m b re k o v ic , 2 5 d e n o v e m b ro d e 1 9 3 7 .

40. M a d re T e re sa refe re -se à d e v o ç ã o a M a ria p re s e n te e m S ã o L u ís d e M o n t f o r t ,

a u to r d e O Segredo de Maria, q u e “c o n s i s t e e m a p e s s o a s e a b a n d o n a r a M a r i a , e

a J e s u s p o r m e io D e la , c o m a titu d e d e u m e sc ra v o , e e m s e g u id a re a liz a r to d a s as

suas ações c o m M a ria , e m M a ria , p o r M a ria e p a ra M a ria ” . S ã o L u ís d e M o n t-

fo rt. The Secret of Maria, N o v a Y o rk , T h e M o n tf o r t P u b l ic a tio n s , 1 9 8 4 , p . 2 4 .

41. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 5 d e a b r il d e 1 9 5 1 .

42. E x p lic a ç ã o d a s C o n s t itu iç õ e s O rig in a is .

43. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 3 0 d e j u l h o d e 1 9 5 1 .

44. D o A rc e b is p o P é r ie r p a ra a M a d r e T e re s a , 3 1 d e j u lh o d e 1 9 5 1 .

45- As Filhas de Santa Ana eram o ramo religioso filiado a Loreto que Madre Teresa
tivera ao seu cuidado quando estava em St. Marys Entally.
46. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 3 0 d e j u l h o d e 1 9 5 1 .

47. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 11 d e a g o s to d e 1 9 5 1 .

48. D a M a d r e F r a n c is X a v ie r S t a p le to n , I B V M p a ra M a d re T e re sa , 9 d e a g o s to d e

1951.

49. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 8 d e f e v e re ir o d e 1 9 5 2 .

50. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 4 d e a b r il d e 1 9 5 2 .

51. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 6 d e j u l h o d e 1 9 5 2 .

52. D o A rc e b is p o P é r ie r p a r a a M a d r e T e re s a , 1 d e o u t u b r o d e 1 9 5 2 .

53. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 6 d e o u t u b r o d e 1 9 5 2 .
S a n t a ‘Teresa de C a lc u tá 383

54. D is c u r s o p r o f e r i d o p e la M a d r e M . T e r e s a , M C , e m R o m a , n o S ín o d o d o s B is­

p o s q u e a c o n te c e u e m o u tu b r o d e 1 9 8 0 .

55. M a d r e T e r e s a fo i b u s c a r o c o n c e i t o d e “s e g u n d o e u ” a A lp h o n s u s R o d r ig u e z :

“ E s te [ a m a r o a m ig o c o m o a si p r ó p r io ] f a z -m e o lh a r p a ra o m e u a m ig o c o m o

o m eu segundo eu, e p a ra m im com o um segundo eu d e l e ; e p o r f i m , f a z d e a m ­


bos um s ó .” V . E A lp h o n s u s R o d r ig u e z , The Practice of Christian and Religious
Perfection, v o l . 1, Q u a r to T r a ta d o , C a p ítu lo 1, D u b lin , J a m e s D u ffy a n d S o n s ,

1882, p. 155.

56. C f . F ilip e n s e s 4 :1 3 .

57. D e M a d re T e re s a p a ra J a c q u e lin e d e D e c k e r, 1 3 d e ja n e iro d e 1 9 5 3 .

58. D e M a d re T e re s a p a ra J a c q u e lin e d e D e c k e r, 15 d e m a rç o d e 1 9 5 3 .

59. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 1 5 d e j u lh o d e 1 9 5 8 .

C a p ítu lo 8
f<fl s e d e d e J e s u s C ru c ific a d o

1. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 8 d e m a r ç o d e 1 9 5 3 .

2. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d re T e re sa , 2 0 d e m a rç o d e 1 9 5 3 .

3. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 d e a b r il d e 1 9 5 3 .

4. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d re T e re sa , 1 2 d e a b ril d e 1 9 5 3 .

5. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d re T e re sa , 2 2 d e d e z e m b ro d e 1 9 5 4 .

6. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 7 d e a b r il d e 1 9 5 3 .

7. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é r ie r , 6 d e a g o s to d e 1 9 5 3 .

8. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 8 d e s e te m b r o d e 1 9 5 3 .

9. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, F e s ta d e C o r p u s C h r is t i, 5 d e ju n h o

de 1947.

10. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 3 d e o u t u b r o d e 1 9 5 3 .

11. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é r ie r , 1 9 d e d e z e m b r o d e 1 9 5 3 .

12. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 2 6 d e f e v e re ir o d e 1 9 5 4 .

13. D e M a d re T e re sa p a ra J a c q u e lin e d e D e c k e r, 2 5 d e m a rç o d e 1 9 5 4 .

14. C f. J o ã o 1 0 :3 8 .

15. C f. M a te u s 3 :1 -3 .

16. D e M a d re T e re sa p a ra Ja c q u e lin e d e D e c k e r, 1 7 d e o u tu b r o d e 1 9 5 4 .

17. T ra ta -s e d e u m a o ração p o p u la r a N o s s a S e n h o r a : “ L e m b ra i- V o s , ó P iís s im a

V irg e m M a ria , d e q u e n u n c a se o u v iu d iz e r q u e a lg u m d a q u e le s q u e te m re ­

c o r r id o à V o s s a p r o te ç ã o , im p l o r a d o a V o ssa a s s is tê n c ia o u r e c la m a d o o V o sso
384 \ c n h a . seja M i n h a luz

s o c o rr o fo sse p o r V ó s d e s a m p a r a d o . A n im a d o e u , p o is , c o m ig u a l c o n f ia n ç a ,

a V ó s, V ir g e m e n tr e to d a s s in g u la r , c o m o a M ã e r e c o r r o , d e V ó s m e v a lh o e,

g e m e n d o s o b o p e s o d o s m e u s p e c a d o s , m e p r o s tr o a V o sso s p é s. N ã o d e s p re z e is

a s m in h a s s ú p lic a s , ó M ã e d o F ilh o d e D e u s E n c a r n a d o , m a s d ig n a i- V o s d e as

o u v ir p r o p íc ia , e d e m e a lc a n ç a r o q u e V o s ro g o . A m é m .” O títu lo é a p rim e ira

p a la v ra d a o r a ç ã o e m la tim , “ M e m o r a r e ” .

18. D e M a d re T ere sa p a ra a Irm ã M a rg a re t M a ria , M C , 15 d e ja n e iro d e 1 9 5 5 .

19. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 2 1 d e ja n e i r o d e 1 9 5 5 .

20. D o A rc e b is p o P é r ie r p a r a a M a d r e T e re s a , 2 3 d e ja n e ir o d e 1 9 5 5 .

21. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 3 1 d e ja n e i r o d e 1 9 5 5 .

22. C f . C o l o s s e n s e s 1 :2 4 .

23. D e M a d re T ere sa p a ra o s C o la b o ra d o re s D o e n te s e S o fre d o re s , 9 d e m a rç o d e

1955.

24. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o P é r ie r , 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 5 7 .

25. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o P é rie r, 4 d e a b r i l d e 1 9 5 5 .

26. C f . L u c a s 1 4 :1 2 - 1 4 .

27. D e M a d re T e re sa p a ra o A rc e b is p o P é r ie r , 1 5 d e d e z e m b r o d e 1 9 5 5 .

28. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b is p o P é r ie r , 8 d e f e v e r e ir o d e 1 9 5 6 .

29. D o A rc e b is p o P é rie r p a ra a M a d r e T e re s a , 9 d e f e v e re iro d e 1 9 5 6 .

30. Ibid.
31. Ibid.
32. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 7 d e m a r ç o d e 1 9 5 6 .

33. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 4 d e a b ril d e 1 9 6 0 .

34. A n o ta ç õ e s d o r e tiro q u e a M a d r e T e re s a fez e m m a rç o - a b r il d e 1 9 5 9 , p . 2 6 9 .

35. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 0 d e a b r il d e 1 9 5 6 .

36. Ibid
37. D e M a d re T ere sa p a ra J a c q u e lin e d e D e c k e r, 18 d e ju lh o d e 1 9 5 6 .

38. D o A rc e b is p o P é r ie r p a r a a M a d r e T e re s a , 2 9 d e j u lh o d e 1 9 5 6 .

39. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 5 d e s e t e m b r o d e 1 9 5 6 .

40. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 2 1 d e j u n h o d e 1 9 5 0 .

41. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 7 d e n o v e m b r o d e 1 9 5 6 .

42. D e M a d r e T e re sa p a ra o P c. P ic a c h y , 2 6 d e ja n e ir o d e 1 9 5 7 .

43. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 8 d e f e v e re ir o d e 1 9 5 7 .

44. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 4 7 .

45. Q u e M a d r e T e r e s a e r a s e n s ív e l a p e q u e n a s e x p re s s õ e s d e a t e n ç ã o p o r p a r t e d o s

o u tr o s to r n a - s e n o tó r io p e la m a n e ir a c o m o r e a g iu a o f a to d e o A r c e b i s p o P é r ie r
■Santa Teresa de Calcula 385

n ã o tê -l a f e li c it a d o n o d ia d o s e u s a n to : “ S e n ti a f a lta d e u m a c a r ta s u a n o d ia

d o m e u s a n t o . E m 2 0 a n o s , fo i a p r i m e i r a v e z q u e is s o a c o n t e c e u .” ( D e M a d r e

T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 4 d e o u t u b r o d e 1 9 5 6 .)

46. C f . M a te u s 1 1 :2 9 .

47. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 8 d e a b r il d e 1 9 5 7 .

48. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 2 d e s e t e m b r o d e 1 9 5 7 .

49. D e M a d r e T e re sa p a ra a M a d re G e r tr u d e , 10 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

50. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 3 0 d e m a r ç o d e 1 9 4 7 .

51. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, F e s ta d e C o r p u s C h r i s t i , 5 d e j u n h o

de 1947.

52. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 2 d e s e t e m b r o d e 1 9 5 7 .

53. Y e ti, “ B a t t l e i n B u s t e e l a n d ” , The Statesman, 2 2 d e ja n e ir o d e 1 9 5 8 .

54. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 2 9 d e j a n e ir o d e 1 9 5 8 .

55. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 2 5 d e a b ril d e 1 9 5 8 .

56. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 2 8 d e ju n h o d e 1 9 5 8 .

57. Ibid.
58. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 5 d e j u l h o d e 1 9 5 8 .

59. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 15 d e m a io d e 1 9 5 8 .

60. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 2 0 d e ju lh o d e 1 9 5 8 .

61. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 7 d e n o v e m b r o d e 1 9 5 8 .

62. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 1 6 d e n o v e m b r o d e 1 9 5 8 .

C a p ítu lo 9
“M e u f)e u s , q u ã o d o lo r o s a é e sta d o r d e s c o n h e c id a ”

1. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 15 d e a g o s to d e 1 9 5 7 .

2. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 2 2 d e n o v e m b ro d e 1 9 5 7 .

3. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 6 d e n o v e m b ro d e 1 9 5 8 .

4. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 2 3 d e n o v e m b ro d e 1 9 5 8 .

5. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 2 d e d e z e m b ro d e 1 9 5 8 . A M a d r e T e re sa

refere-se à o b ra Garlicfar Pegasus, d a a u t o r i a d o P e . W i l f r e d P. S c h o e n b e r g , S J


6. S c h o e n b erg , Garlicfor Pegasus: The Life of Brother Benito de Goes ofthe Society of
Jesus, W e s tm in s te r, M D , N e w m a n P re ss, 1 9 5 5 , p . 1 9 4 .

7. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 2 4 d e ja n e ir o d e 1 9 5 9 .

8. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 7 d e m a rç o d e 1 9 5 9 .

9. Ibid
386 V en ha, seja ÍSlinha luz

10. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 1 d e m a r ç o d e 1 9 5 9 .

11. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é rie r, 5 d e a b r il d e 1 9 5 9 .

12. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 2 d e a b r il d e 1 9 5 9 .

13. A c e ita ç ã o d a n o m e a ç ã o , a n e x a d a à C a r ta D e M a d r e T e re s a p a ra o A r c e b is p o

P é rie r, 1 5 d e a b r il d e 1 9 5 9 .

14. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 2 8 d e m a i o d e 1 9 5 9 .

15. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 6 d e a b ril d e 1 9 5 9 .

16. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 3 d e ju lh o d e 1 9 5 9 .

17. A p e n a s n o s c h e g a r a m tr ê s c a r ta s e s c r ita s p o r M a d r e T e r e s a a o P e . P ic a c h y q u e se

r e fe re m a u m a d e s c r iç ã o e s c r ita d o s e u e s ta d o in te r io r : a c a r ta d e 6 d e n o v e m b r o

d e 1 9 5 8 , e m q u e s e re f e r e à s “tr ê s c a r ta s ” ; a c a n a d e 3 d e s e t e m b r o de1959, à

q u a l ju n ta a c a r ta d ir ig id a a Je su s; e e s ta c a n a d e 3 d e j u lh o d e 1 9 5 9 . E m u ito

p o u c o p r o v á v e l q u e o “p a p e l ” s e m d a t a q u e e n v i o u c o m a c a rta d e 3 d e ju lh o ,

e q u e c o m e ç a c o m a s p a la v r a s “ N a e s c u r id ã o ” , s e ja u m a d a s tr ê s c a r ta s m e n c i o ­

n a d a s n a c a n a d e 3 d e ju l h o . S e ja c o m o f o r, e s te “p a p e l ” f o i n i t i d a m e n t e e s c r i t o

d u r a n te e s te p e r ío d o .

18. D e M a d re T ere sa p a ra o S e n h o r, s e m d a ta .

19. T e s te m u n h o d a Irm ã M a rg a re te M a ria .

20. E s ta p e r g u n ta é ta lv e z u m a r e f e r ê n c ia à s p a la v r a s d e J e s u s c o n tid a s n a s c a r ta s d e

1 2 d e j a n e i r o e d e 3 d e d e z e m b r o d e 1 9 4 7 : “ Você sofrerá ejá sofre — mas sefor a

minha pequena Esposa — a Esposa deJesus Cruáficado — terá que suportar estes
tormentos no seu coração.” O u t a l v e z f o s s e m p a l a v r a s d e J e s u s q u e a M a d r e t i v e s s e
e s c r ito e m a n o t a ç õ e s s u a s , m a s n ã o tiv e s s e i n c l u í d o e m n e n h u m a c a n a .

21. D e M a d re T ere sa p a ra a Irm ã M a rg a re te M a ria , 1 9 5 9 .

22. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 d e a g o s to d e 1 9 5 9 .

23. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 5 d e a g o s to d e 1 9 5 9 .

24. D e M a d r e T e re s a p a r a o A rc e b is p o P é rie r, 1 d e s e te m b r o d e 1 9 5 9 .

25. C a n a d e M a d re T ere sa a J e su s, a n e x a d a à c a rta p a ra o P e. P ic a c h y , 3 d e s e te m b ro

de 1959.

26. Ibid
27. Ibid
28. V er A p ê n d ic e B .

29. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 6 d e s e te m b r o d e 1 9 5 9 .

30. C f . L u c a s 1 :2 8 - 5 7 .

31. C f M a te u s 1 :2 0 - 2 3 .

32. C f . L u c a s 2 :1 9 ; 5 1 .
S a n ta Teresa de Ca le utá 387

33. D e M a d re T e re sa p a ra as Irm ã s M C , 2 0 d e s e te m b ro d e 1 9 5 9 .

34. C f . L u c a s 2 :5 1 .

35. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 2 7 d e o u tu b r o d e 1 9 5 9 .

36. Ib id .

37. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 2 1 d e n o v e m b ro d e 1 9 5 9 .

38. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 1 3 d e d e z e m b ro d e 1 9 5 9 .

39. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 2 6 d e d e z e m b ro d e 1 9 5 9 .

40. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 4 d e a b ril d e 1 9 6 0 .

41. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. P ic a c h y , 7 d e a g o s to d e 1 9 6 0 .

42. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. E d w a rd L e J o ly , S J , c i t a d o cm E d w a r d L e J o ly ,

S J , M o t h e r Teresa o f C a lc u tta : A B io g ra p h y , S ã o F r a n c i s c o , C a m b r i d g e , H a g e r s ­

t o w n , N o v a Y o rk , F ila d é lf ia , L o n d r e s , C i d a d e d o M é x ic o , S ã o P a u lo , S i n g a p u r a ,

S y d n e y , H a r p e r e R o w , P u b lis h e rs , 1 9 8 5 , p . 1 7 9 .

43. D e M a d re T e re s a p a ra M o n s e n h o r M c C a rth y , 2 9 d e ju lh o d e 1 9 6 0 .

44. D e M a d r e T e re s a p a r a u m a a m ig a , 1 0 d e a g o s to d e 1 9 6 0 .

45. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 9 d e a g o s to d e 1 9 6 0 .

46. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 0 d e o u tu b r o d e 1 9 6 0 .

47. N o e s tu d o q u e fa z d a n o ite r e p a r a d o r a d o e s p ír ito , e r e c o rr e n d o a o e x e m p lo d e

S ã o P a u lo d a C r u z , o f u n d a d o r d a O rd e m P a s s io n is ta , a fir m a o P e . R e g in a ld

G a r r i g o u - L a g r a n g e , O P : “A l e i t u r a d a s o b r a s d e S ã o J o ã o d a C r u z l e v o u - m e a

c o n s i d e r a r q u e a n o i t e d o e s p í r i t o é e s s e n c i a l m e n t e u m a p u r if ic a ç ã o p a s s iv a d e

n a tu r e z a p e s s o a l, q u e p r e p a r a a a lm a p a ra a u n iã o p e rf e ita c o m D e u s , a c h a m a d a

u n i ã o tr a n s f o r m a d o r a . E s ta p u r if ic a ç ã o , q u e n o s e u a s p e c to p a s s iv o é u m e s ta ­

do m ís tic o e q u e p r e s s u p õ e a c o n te m p l a ç ã o in f u s a , m o s tra -s e a s s im n e c e s s á ria

p a r a a fa s ta r o s d e fe ito s d a s a lm a s m u it o a v a n ç a d a s , a q u e m o a u to r se re fe re e m

A N o ite E scura ( L iv ro I I , c a p . 1 0 ). [ . . . ] A v id a d e a lg u n s d o s g r a n d e s s e rv o s d e

D e u s e s p e c ia l m e n t e d e d ic a d o s à r e p a r a ç ã o , à im o la ç ã o p e la s a lv a ç ã o d a s a lm a s

o u a o a p o s to la d o p o r v ia d o s o f r i m e n t o in te r io r, fa z e m - n o s p e n s a r, c o n tu d o ,

num p r o lo n g a m e n to d a n o ite d o e s p ír ito m e s m o a p ó s te re m e n tra d o n a u n iã o

d e tr a n s f o r m a ç ã o . N e s s e s c a s o s , a p r o v a ç ã o d e ix a d e se r p r in c ip a lm e n te p u r i-

fic a d o ra , p a s s a n d o a se r s o b r e tu d o re p a ra d o ra . [ ...] A o p in iã o c o m u m é que

o s se rv o s d e D e u s s ã o e s p e c ia l m e n t e te n ta d o s , s e ja p o r q u e p r e c is a m de um a

p u r if ic a ç ã o m a is p r o f u n d a , s e ja p o r q u e , s e g u in d o o e x e m p lo d e N o s s o S e n h o r ,

té m d e e m p r e g a r o s m e io s q u e E le e m p r e g o u e m p ro l d e u m a g ra n d e cau sa

e s p ir itu a l, c o m o a fu n d a ç ã o d e u m a o rd e m re lig io s a o u a s a lv a ç ã o d e m u ita s

o u t r a s a lm a s ." A p r o lo n g a d a d u r a ç ã o d a p r o v a ç ã o é u m d o s m a is n o tá v e is tr a ç o s
388 \ r n h a . se ja M i n h a lu z

c o m u n s e n tr e a n o ite d e S ã o P a u lo d a C r u z e a d a M a d r e T e re sa . V er R e g in a ld

G a rrig o u -L a g ra n g e , O P , Tl)e T h r e e A g e s o f I n te r io r L ife : P r e lu d e o f E te r n a l life ,

v o l. 2 , t r a d , [ p a r a in g lê s ] Irm ã M . T im o th e a D o y l e , O P , R o c k f o r d , 111., T a n

B o o k s, 1 9 8 9 , p p . 5 0 2 -3 , 5 0 4 .

48. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. P ic a c h y , 2 0 d e o u tu b r o d e 1 9 6 0 .

49. D e M a d re T e re sa p a ra K ay B ra c k a n , 1 0 d e a g o s to d e 1 9 6 0 .

50. D e M a d r e T e re s a p a r a E ile e n E g a n , 2 d e o u tu b r o d e 1 9 6 0 .

51. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 2 4 d e ju lh o d e 1 9 6 0 .

52. M a d re T e re sa , C o m u n ic a ç ã o à X III C o n v e n ç ã o N a c io n a l, C o n s e lh o N a c io n a l

d e M u lh e re s C a tó lic a s , L as V eg as, 1 9 6 0 .

53. D e M a d r e T e r e s a p a r a A n n B la ik ie , 2 9 d e n o v e m b r o d e 1 9 6 0 .

54. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b i s p o P é r ie r , 1 8 d e d e z e m b r o d e 1 9 6 0 .

55. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 1 9 6 0 .

56. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. P ic a c h y , 2 0 d e d e z e m b ro d e 1 9 6 0 .

57. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , s e m d a ta .

58. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 3 d e ja n e ir o d e 1 9 6 1 .

C a p ítu lo 10
“C h e g u e i a a m a r a e s c u r id ã o ”

1. T e s te m u n h o d o Pe. N e u n e r s o b re a M a d re T ere sa.

2. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, se m d a ta , m u ito p ro v a v e lm e n te e s c rita

d u r a n te o r e tiro d e a b ril d e 1 9 6 1 .

3. T e s te m u n h o d o Pe. N e u n e r.

4. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . N e u n e r , m u i t o p r o v a v e lm e n te 11 d e a b r il d e 1 9 6 1 .

5. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A rc e b i s p o P é r ie r , 2 5 d e j a n e i r o d e 1 9 4 7 .

6. Pe. Jo se p h N e u n e r, S J, “M o th e r T ere sas C h a ris m ”, Review for Religious, 5

(2 0 0 1 ), p p . 4 8 4 -5 .

7. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, d a ta d a d e 1 9 6 1 .

8. D e M a d r e T e re sa p a ra o s C o la b o r a d o r e s , 2 2 d e a b ril d e 1 9 6 1 .

9. “ Q u a n d o a n o ite d o e s p ír ito é c s s c n c ia lm e n te p u r if ic a d o r a , s o b a in f lu ê n c ia d a

g ra ç a , q u e se e x e rc e p r in c ip a lm e n te p e lo d o m d a c o m p r e e n s ã o , a s v ir tu d e s te o ló ­

g ic a s e a h u m il d a d e s ã o p u r if ic a d a s d e to d o o la s tr o h u m a n o . [ . . . ] A s s im p u r i f i ­

c a d a , a a lm a p o d e p a s s a r p a ra a lé m d a s f ó r m u la s d o s m is té r io s e e n t r a r “ n a s p r o ­

f u n d e z a s d e D e u s " , c o m o d iz S ã o P a u lo (cf. 1 C o r í n t i o s 2 , 1 0 ). E n t ã o , a p e s a r d e

to d a s a s te n ta ç õ e s c o n tr a a fé e a e s p e r a n ç a , a a lm a a c r e d it a f ir m e m e n te , p o r u m
•Santa Teresa dc Calcuta 389

a c to d i r e c to c d a f o r m a m a i s p u r a e s u b l i m e , q u e u l t r a p a s s a a t e n t a ç ã o ; e a c r e d i t a

p e lo m o ti v o m a is p u r o q u e se p o d e a tin g ir s o b r c n a tu r a lm e n tc : a a u to rid a d e d e

D e u s q u e r e v e la . E t a m b é m e s p e r a , p e la s i m p l e s r a z ã o d e q u e E le é s e m p r e b o m ,

a M is e r ic ó r d ia in f in ita . E a m a - O n a m a is c o m p l e t a a r id e z , p o r q u e E le é in f in i-

r a m e n te m e lh o r e m Si m e s m o d o q u e to d o s o s d o n s q u e p u d e sse n o s c o n ce d er.

( . . . ] Q u a n d o e s s a p r o v a ç ã o é e s s e n c i a l m e n t e r e p a r a d o r a , q u a n d o te m c o m o fim

p r in c ip a l fa z e r c o m q u e a a lm a já p u r if ic a d a tr a b a lh e p e la s a lv a ç ã o d o p r ó x im o ,

e n t ã o p r e s e r v a a s m e s m a s c a r a c te r ís tic a s e le v a d a s a trá s d e s c r ita s , m a s a s s u m e o u ­

tr o c a rá te r, q u e re c o rd a c o m m a is p r e c is ã o o s s o f rim e n to s ín tim o s d e Je su s e d c

M a r i a , q u e n ã o p r e c is a m d e se r p u r if ic a d o s .” R e g in a ld G a r r ig o u -L a g ra n g e , O P ,

lh e T im e A ges o f In te r io r L ife , v o l. 2 , t r a d , [ p a r a in g lê s ] I r m ã M . T i m o t h e a

D o y l e , O P , R o c k f o r d , 111., T a n B o o k s , 1 9 8 9 , p p . 3 0 8 - 9 . T u d o l e v a a c r e r q u e

e ra e s ta a s itu a ç ã o d e M a d r e T e re s a , q u e , c o m a a ju d a d o P e. N e u n e r, c o m e ç o u

a c o m p r e e n d e r q u e a p r o v a ç ã o p o r q u e p a ssa v a e ra n a r e a lid a d e u m a o p o r tu n i­

d a d e p a r a s e e x e r c e r m a i s i n t e n s a m e n t e n a c a r i d a d e , t e n d o p o r is s o c o m e ç a d o

a a m a r a e s c u rid ã o .

10. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. P ic a c h y , ju n h o d e 1 9 6 1 .

11. C o lo s s e n s e s 1 :2 4 .

12. D e M a d r e T e r e s a p a r a a s I rm ã s M C , P r im e ir a S e x ta -F e ira d e ju lh o d e 1 9 6 1 .

13. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . P ic a c h y , 1 d e s e te m b ro d e 1 9 6 1 .

14. C f . M a te u s 1 6 :2 4 .

15. I n s tr u ç õ e s d a M a d r e T e re s a às I rm ã s M C , 1 7 d e m a io d e 1 9 8 1 .

16. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 16 d e o u tu b r o d e 1 9 6 1 .

17. D e M a d r e T e r e s a p a r a E ile e n E g a n , 2 7 d e fe v e re ir o d e 1 9 6 1 .

18. D e M a d re T eresa p a ra o Pe. N e u n e r, 16 d e o u tu b ro d e 1 9 6 1 .

19. “ M a s , c o m o te s te m u n h a r á o s e u A m o r , já q u e o A m o r se p r o v a c o m a s o b ra s ?

P o i s b e m , a c r i a n c i n h a la n ç a r á flo r e s , p e r f u m a r á c o m o s se u s aro m a s o tr o n o

r e a l, e c a n ta r á com a su a v o z p ra te a d a o c â n tic o d o s C â n tic o s . S im , m eu

B e m - A m a d o ! A s s im se c o n s u m ir á a m in h a v id a . N ã o te n h o o u tr o m e io d e T e

p r o v a r o m e u a m o r , s e n ã o o d e la n ç a r flo re s , is to é , n ã o d e ix a r e s c a p a r n e n h u m

pequeno s a c r if íc io , nenhum o lh a r, nenhum a p a la v ra ; a p ro v e ita r to d a s as

m a is p e q u e n a s c o is a s c f a z ê -la s p o r a m o r . Q u e r o s o f r e r p o r a m o r c g o z a r p o r

a m o r . A s s im la n ç a r e i flo re s d ia n te d o te u tr o n o . N ã o e n c o n tr a r e i n e n h u m a

sem a d e s fo lh a r p a r a T i . E d e p o i s , a o l a n ç a r a s m i n h a s f lo r e s , c a n t a r e i [ . . . ] ,

m e s m o q u a n d o tiv e r d c c o lh e r as m in h a s flo re s n o m e io d e e s p in h o s ; e o m e u

c a n ta r se rá ta n to m a is m e lo d io s o q u a n to m a io r e s e m a is a g u d o s fo re m os

e s p i n h o s [ ê n f a s e m i n h a ] . ” S a n ta T e r e s a d o M e n i n o J e s u s e d a S a n t a F a c e , H is -
390 Ve n ha , seja M i n h a luz

t ó r i a d e u m a a l m a . M a n u s c r i t o s a u to b io g r á fic o s , t r a d , p o r t u g u e s a N i c o l e D c v y

e J o r g e V a z , o c d , P a ç o d ’A r c o s , E d i ç õ e s C a r m e l o , 2 0 0 0 , p . 2 5 2 .

20. D e M a d re T eresa p a ra o Pe. N e u n e r, 2 3 d e o u tu b ro d e 1 9 6 1 .

21. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 3 d e n o v e m b ro d e 1 9 6 1 .

22. I n s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 5 d e o u tu b r o d e 1 9 8 4 .

23. In s tr u ç õ e s d a M a d r e T e re sa à s Irm ã s M C , 13 d e m a io d e 1 9 8 2 .

24. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, d e 8 d e n o v e m b ro d e 1 9 6 1 . M a d re T ere sa

f a z ia u m g r a n d e e s fo r ç o p o r a p r o v e ita r o te m p o o m e lh o r p o s s ív e l, e s c r e v e n d o

g r a n d e p a r t e d a s s u a s c a r ta s e n q u a n t o v ia ja v a .

25. D e M a d re T eresa p a ra o Pe. N e u n e r, 18 d e d e z e m b ro d e 1 9 6 1 .

26. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . N e u n e r , 1 7 d e f e v e re ir o d e 1 9 6 2 .

27. D a M a d r e T e r e s a p a r a E ile e n E g a n , 2 1 d e fe v e re ir o d e 1 9 6 2 .

28. D e c la ra ç ã o d o P e. N e u n e r.

29. C f . L u c a s 1 :3 9 .

30. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. N e u n e r, 6 d e m a rç o d e 1 9 6 2 .

31. C f . 2 C o r ín ti o s 1 2 :9 .

32. D a M a d re T e re sa p a ra E ile e n E g a n , 2 0 d e m a rç o d e 1 9 6 2 .

33. C f . J o ã o 1 5 :1 9 .

34. D e M a d r e T e re s a p a r a E ile e n E g a n , 2 0 d e m a r ç o d e 1 9 6 2 .

35. A M a d r e T e re s a re f e r ia -s e a M a r g a r e t T r o u n c e r, The Nun, N o v a Y o rk , A ll S a in ts

P re ss B o o k G u ild P re ss, 1 9 6 5 .

36. C f . A to s 1 0 :3 8 .

37. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. N e u n e r, 1 2 d e m a io d e 1 9 6 2 .

38. C ita d o e m M a lc o lm M u g g e rid g e , Something Beautifulfor God, N o v a Y o rk , E v a n ­

s to n , S ã o F ra n c is c o , L o n d r e s , H a r p e r e R o w , 1 9 7 1 , p p . 7 3 - 7 4 .

39. D e s m o n d D o ig , Mother Teresa: Her People and Her Work, N o v a Y o rk , H a r p e r e

Row , 1976, p. 159.

40. C f. L u ca s 4 :1 8 .

41. M a d r e T e re s a , C a r id a d e : A a lm a d a m is s ã o , 2 3 d e j a n e ir o d e 1 9 9 1 .

C a p ítu lo 11
“</t d is p o s iç ã o t)e le "

1. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 18 d e m a io d e 1 9 6 2 .

2. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 7 d e ju n h o d e 1 9 6 2 .

3. Q uando o P e. P ic a c h y fo i c o n s a g r a d o b is p o , M a d re T e re sa p a s s o u a tr a tá - lo
S an ta Teresa de Calcutá 391

p o r V o s s a E x c e lê n c ia , m a s n á o d e ix o u d e lh e p e d ir : “ P o r fa v o r, n ã o m e t r a t e

p o r ‘R e v e r e n d a , p o r q u e e u c o n t i n u o a c o n s i d e r á - l o o m e u d i r e t o r e s p i r i t u a l . ”

( D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , 2 0 d e a g o s to d e 1 9 6 3 .)

4. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. P ic a c h y , 2 0 d e ju lh o d e 1 9 6 2 .

5. D e M a d r e T e re s a p a r a E ile e n E g a n , 2 9 d e a g o s to d e 1 9 6 2 .

6. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 10 d e s e te m b ro d e 1 9 6 2 .

7. D e M a d r e T e re sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 21 d e s e te m b ro d e 1 9 6 2 .

8. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. N e u n e r, 15 d e ja n e ir o d e 1 9 6 3 .

9. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , 3 d e fe v e re iro d e 1 9 6 3 .

10. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , 1 3 d e fe v e re iro d e 1 9 6 3 .

11. C f. M a te u s 3 :1 -6 .

12. C f. J o ã o 3 :2 9 .

13. D e M a d r e T e re s a p a r a o P e . N e u n e r , 2 5 d e fe v e re iro d e 1 9 6 3 .

14. D e M a d r e T e re s a p a ra o B isp o P ic a c h y , 2 3 d e m a rç o d e 1 9 6 3 .

15. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , s e m d a ta ; e s ta c a r ta v a i d ir ig id a a o B is p o

P ic a c h y , p o r ta n t o te m d e te r s id o e s c rita d e p o is d e 9 d e s e te m b ro d e 1 9 6 2 , q u e

fo i o d ia e m q u e o P e . P ic a c h y fo i c o n s a g r a d o b is p o . N o a rq u iv o q u e c o n té m

a s c a r ta s d a M a d r e T e r e s a p a ra P ic a c h y , fo i a rq u iv a d a a s e g u ir a c a r ta d e 2 3 d e

m a rç o d e 1 9 6 3 .

16. N o ta s d e R e tir o d a M a d r e T e re sa , a b ril d e 1 9 5 9 .

17. D e M a d r e T e re s a p a ra o B is p o P ic a c h y , 7 d e a b ril d e 1 9 6 3 .

18. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . N e u n e r , 11 d e a b r i l d e 1 9 6 3 .

19. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 1 d e s e te m b ro d e 1 9 6 3 .

20. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. N e u n e r, 3 d e s e te m b ro d e 1 9 6 3 .

21. C f. M a te u s 2 6 , 4 7 .

22. D e M a d r e T e re s a p a ra o B is p o P ic a c h y , 8 d e ja n e ir o d e 1 9 6 4 .

23. D a M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 8 d e ja n e ir o d e 1 9 6 4 .

24. Ibid.
25. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 2 4 d e ja n e ir o d e 1 9 6 4 .

26. D e M a d r e T e re s a p a ra o B isp o P ic a c h y , 2 0 d e m a rç o d e 1 9 6 4 .

27. D a M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 15 d e a b ril d e 1 9 6 4 .

28. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. N e u n e r, 1 7 d c m a io d e 1 9 6 4 .

29. D e M a d r e T e r e s a p a r a E ile e n E g a n , 4 d e o u tu b r o d e 1 9 6 4 . C f . M a rc o s 1 2 :3 0 .

30. D e M a d re T e re sa p a ra as S u p e rio ra s M C , 17 d e n o v e m b ro d e 1 9 6 4 .

31. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o Ja m e s R . K n o x , 2 7 d c d e z e m b ro d e 1 9 6 4 .

32. D e M a d re T e re sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 2 9 d c d e z e m b ro d e 1 9 6 4 .
392 Ve nh a, seja M i n h a lu z

33. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. N e u n e r, a n te s d e 8 d e ja n e ir o d e 1 9 6 5 .

34. C f . 2 C o r ín ti o s 5 :2 1 ; 1 P e d r o 2 :2 4 .

35. C f. M a te u s 2 6 :3 6 - 4 5 .

36. C f M a te u s 2 7 :4 6 .

37. C f M a te u s 3 :1 7 .

38. C f M a te u s 1 7 :5 .

39. In s tru ç õ e s d e M a d re T ere sa às Irm ã s , 1 d e a b ril d e 1 9 8 1 .

40. “ N e s te c a so [d a n o ite re p a ra d o ra ] o s o frim e n to n o s re c o rd a a s itu a ç ã o d o na-

d a d o r - s a lv a d o r q u e , e m n o ite s d e te m p e s ta d e , se d e b a te h e r o ic a m e n te p a r a s a l­

v a r d a m o r te o s q u e e s tã o p r e s te s a a f u n d a r . O s n a d a d o r e s - s a lv a d o r e s d a v id a

e s p iritu a l — c o m o S ã o P a u lo d a C r u z — n ã o lu ta m a p en a s d u ra n te h o ras o u

d u ra n te m eses, m a s às vezes d u ra n te a n o s, p a ra a rra n c a re m a s a lm a s à m o r te

e te r n a ; e e s ta s a lm a s tê m , d e c e r ta m a n e ir a , d e r e s is tir à s te n ta ç õ e s d a s a lm a s q u e

p r o c u r a m s a lv a r, a f im d e p o d e r e m a c o r r e r e f i c a z m e n t e e m s u a a j u d a . ” R e g i n a l d

G a rrig o u -L a g ra n g e , O P , The Three Ages of Interior Life, v o l . 2 , tr a d , [ p a r a in g lê s ]

I r m ã M . T i m o t h e a D o y l e , O P , R o c k f o r d , 111., T a n B o o k s , 1 9 8 9 , p . 5 0 9 .

41. D e M a d r e T e r e s a p a r a o A r c e b is p o P é rie r, 3 d e d e z e m b r o d e 1 9 4 7 .

42. D e M a d re T e re sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 4 d e a b ril d e 1 9 6 5 .

43. J o ã o 3 :3 0 .

44. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. N e u n e r, 15 d e m a io d e 1 9 6 5 .

45. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 1 9 d e ju n h o d e 1 9 6 5 .

46. Ibid,
47. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 1 d e ju lh o d e 1 9 6 5 .

48. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , 11 d e j u l h o d e 1 9 6 5 .

49. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 2 0 d e ju lh o d e 1 9 6 5 .

50. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 2 8 d e ju lh o d e 1 9 6 5 .

51. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 13 d e o u tu b r o d e 1 9 6 5 .

52. D e M a d re T ere sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 1 6 d e m a io ( m u ito p r o v a v e lm e n te d e

1 9 6 5 o u 1 9 6 6 ).

53. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. N e u n e r, 3 0 d e m a rç o d e 1 9 6 6 .

54. “ [ Q J u a n to m a is a s a lm a s p r o g r id e m n a v id a e s p ir itu a l, m a is o s s e u s s o f r i m e n t o s

in te r io re s se a s s e m e lh a m a o s d e J e s u s e M a ria . A o p in iã o c o m u m é a d e q u e os

s e rv o s d e D e u s s ã o e s p e c ia lm e n te te n ta d o s , s e ja p o r q u e tê m n e c e s s id a d e d e u m a

p u r i f i c a ç ã o m a is p r o f u n d a , s e ja p o r q u e , s e g u i n d o o e x e m p l o d e N o s s o S e n h o r ,

t ê m d e t r a b a l h a r p o r v ia d o s m e s m o s m e io s a q u e E le r e c o r r e u e m p r o l d e u m a

g r a n d e c a u s a e s p iritu a l, c o m o a f u n d a ç ã o d e u m a o r d e m r e lig io s a o u a s a lv a ç ã o
■Santa 'Teresa de Ca lc ut á 393

d e m u ita s o u tr a s a lm a s . O s f a to s d e m o n s tr a m c la r a m e n te q u e S á o J o ã o d a C r u z

c S a n ta T e re sa e x p e r im e n ta r a m e s ta r e a lid a d e d e f o r m a q u a s e c o n tín u a .” R e g i­

n a ld G a rr ig o u -L a g ra n g c , O P , The Three Ages of Interior Life, v o l. 2 , t r a d , [ p a r a

i n g l ê s ] I r m ã M . T i m o t h e a D o y l e , O P , R o c k f o r d , 111., T a n B o o k s , 1 9 8 9 , p . 5 0 4 .

55. D e M a d re T e re sa p a ra o A rc e b is p o K n o x , 9 d e m a io d e 1 9 6 6 .

56. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 6 d e ju n h o d e 1 9 6 6 .

57. D e M a d re T e re sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 2 d e s e te m b ro d e 1 9 6 6 .

58. D e M a d re T e re sa p a ra o B isp o P ic a c h y , 8 d e o u tu b r o d e 1 9 6 6 .

59. D e M a d re T ere sa p a ra o A rc e b isp o K n o x , 8 d e se te m b ro d e 1 9 6 6 .

60. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o P ic a c h y , 4 d e f e v e re ir o d e 1 9 6 7 .

61. L u c a s 1 :4 9 .

62. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. N e u n e r, 2 4 d e ju lh o d e 1 9 6 7 .

63. D e M a d re T e re s a p a ra o P e. N e u n e r, 2 4 d e ju lh o d e 1 9 6 7 .

64. Ibid.
65. D e M a d r e T e re s a p a r a o a u to r, in D e s m o n d D o ig , Mother Teresa: Her People and
Her Work, N o v a Y o rk , H a r p e r e R o w , 1 9 7 6 , p p . 2 3 - 2 4 .

66. Ibid.
67. I n s tr u ç õ e s d a M a d r e T e r e s a à s I r m ã s M C , 2 4 d e f e v e re ir o d e 1 9 8 9 .

68. D e M a d re T e re sa (n o tre m p a r a B h a g a lp u r, P a tn a , R a n c h i) p a ra E ile e n E g a n ,

2 d e s e te m b ro d e 1 9 6 7 .

69. D e M a d re T e re s a p a ra P a tty e W a rre n K u m p , 1 d e d e z e m b ro d e 1 9 6 7 .

70. D e M a d re T e re sa p a ra o P e. N e u n e r, 2 8 d e ja n e ir o d e 1 9 6 8 .

71. D e M a d r e T e re sa p a ra o B is p o P ic a c h y , 8 d e ja n e ir o d e 1 9 6 9 . C f. N e e m ia s 8 , 10 .

72. C f . J o ã o 1 4 :6 .

73. C f. J o ã o 8 :1 2 .

74. C f . H e b r e u s 1 3 :8 .

75. D e M a d r e T e re s a p a r a P a tty e W a r r e n K u m p , 2 2 d e a g o s to d e 1 9 6 9 .

76. C f. M a te u s 2 5 :4 0 .

77. C f. N e e m ia s 8 :1 0 .

78. C f . J o ã o 1 4 :6 .

79. C f. J o ã o 8 :1 2 ; 9 :5 .

80. C f . J o ã o 1 4 :6 ; 1 1 :2 5 .

81. C f. 1 J o ã o 4 :8 :1 6 .

82. D e M a d r c T e re sa p a ra E ile e n E g a n , 1 3 d e o u tu b r o d e 1 9 6 9 .

83. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 2 7 d e n o v e m b ro d e 1 9 6 9 .

84. T e s te m u n h o d o P e. N e u n e r.
394 l e n h a , seja M i n h a luz

85. D e M a d r e T e re s a p a ra o a rc e b is p o P ic a c h y , 2 1 d e d e z e m b r o d e 1 9 6 9 .

C a p ítu lo 12
" D eu s u sa o q u e e n a d a p a r a m o s tr a r a S u a g r a n d e z a ”

1. D e M a d r e T e re sa p a ra o P e. M ic h a e l v a n d e r P e e r, S . C . J ., 1 6 d e n o v e m b r o d e

1975.

2. D e M a d r e T e re s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 6 d e m a r ç o d e 1 9 7 6 .

3. C a r ta d a M a d re T ere sa a Je su s, a n e x a à c a rta d e M a d re T e re sa p a ra o Pe. P ic a c h y ,

3 d e s e te m b ro d e 1 9 5 9 .

4. D e M a d r e T e re s a p a r a o P e. P ic a c h y , 2 1 d e n o v e m b r o d e 1 9 5 9 .

5. D e M a d r e T e r e s a p a r a o B is p o R a n s c h , 2 5 d e f e v e re ir o d e 1 9 7 6 .

6. M a r g a r e t P le v a k , “ C h a n c e e n c o u n t e r le d to 2 2 - y e a r f r i e n d s h ip ; L o c a l p r ie s t

in R o m e w o rk in g o n M o th e r T e re sa s s a in th o o d c a u s e ” , M ilw a u k e e C a th o lic

H e r a ld , 1 3 3 , n . ° 8 (2 1 d e f e v e r e ir o d e 2 0 0 2 ) , p . 9 .

7. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 2 9 d e m a io d e 1 9 7 6 .

8. V er p ig . 2 2 1 , D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, m u ito p r o v a v e lm e n te e m 11

d e a b ril d e 1 9 6 1 .

9. D e M a d re T eresa p a ra u m sa c e rd o te , 13 d e d e z e m b ro d e 1 9 7 6 . C f. J o á o 6 :3 5 ,

4 8 ; M a te u s 2 5 :3 5 .

10. I n s tr u ç õ e s d a M a d r e à s I rm ã s M C , 1 7 d e m a io d e 1 9 7 8 . C f . M a te u s 1 2 :3 4 .

11. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 1 9 d e j u n h o d e 1 9 7 6 . C a r t a

e s c r i t a “a c a m i n h o d e N o v a Y o r k ” , i s t o é , n o a v i ã o .

12. C f . J o á o 1 :1 4 .

13. C f . L u c a s 1: 3 4 - 4 1.

14. D e M a d r e T e re s a p a r a o P e . D o n K rib s , 7 d e f e v e re ir o d e 1 9 7 4 .

15. D e M a d r e T e re sa p a ra o C a r d e a l P ic a c h y , 2 7 d e ju n h o d e 1 9 7 6 .

16. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. D o n K rib s, 2 3 d e ju lh o d e 1 9 7 6 .

17. h ttp : / / w w w .c h n o n l i n e .o r g / 2 0 0 2 / 2 0 0 2 - 0 2 - 2 1/n e w s s to r y 3 .h tm l.

18. C f. M a te u s 2 6 :2 6 - 2 8 ; L u ca s 2 2 :1 9 - 2 0 .

19. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 2 6 d e n o v e m b r o d e 1 9 7 6 .

20. N o ta s d e R e tir o d a M a d r e T e re sa , m a rç o - a b r il d e 1 9 5 9 , p p . 3 5 4 - 5 5 .

21. C f . J o á o 3 :1 s s.

22. C f . M a te u s 1 8 :3 .

23. D e M a d re T ere sa p a ra M a lc o lm M u g g e rid g e , 1 2 d e n o v e m b ro d e 1 9 7 0 .

24. D is c u rs o d a M a d r e T e re sa , C a m b r id g e , 1 0 d e ju n h o d e 1 9 7 7 .
•Santa Teresa d e C a lc u tá 395

25. D e M a d re T e re sa p a ra a I rm ã M a ria d a T r in d a d e , O P , s e m d a ta .

26. “ Li q u e a d o r e o s o f r im e n to s ã o o b e ijo d e J e s u s . S ã o o p r e s e n te D e le — por

s e rm o s D e le ” ( d a M a d r e T e re sa p a ra a I rm ã M . J o h n F r a n c is , S . S . N . D ., 3 d e

a g o s to d e 1 9 7 6 ) . M u it o p r o v a v e lm e n te , te r á lid o e s ta id e ia e m P a u l d e Ja e g h e r,

S J , T h e V i r t u e o f L o v e , N o v a Y o r k , P. J . K e n n e d y e S o n s , 1 9 5 5 , p . 1 2 3 : “ O s n o s s o s

s o f rim e n to s , s u p o r ta d o s c o m o d e v e m sê -lo , sã o , p o is , c o m o d is s e m o s , b e ijo s d a ­

d o s a o n o s s o Je s u s c ru c if ic a d o . M a s o s o f r im e n to ta m b é m é o b e ijo d e J e s u s c r u ­

c ific a d o à n o s s a a lm a . A s a lm a s c o m u n s n a d a m a is c o s tu m a m v e r n o s o f r im e n to

d o q u e u m c a s tig o d e D e u s , u m a p ro v a d a S u a in ju s tiç a o u d o S e u d e s a g r a d o . A

a lm a g e n e r o s a , p e lo c o n tr á r io , e n c o n tr a n o s o f r im e n to u m a p r o v a d o a m o r d e

D e u s p o r e la , n ã o v e n d o a c r u z d e s p id a , m a s v e n d o J e s u s c ru c if ic a d o n e la , J e s u s

q u e a a b ra ç a c o m a m o r e q u e d e la e s p e ra , e m tr o c a , u m a s s e n tim e n to g e n e r o s o e

a m o r o s o . [ . . . ] A m im , a ú n ic a c o is a q u e m e fa z s o f re r é a C r u z d e Je s u s . O s b e ijo s

d e Je s u s à m in h a a lm a — p o r m u it o e s tr a n h o q u e is to p o s s a p a re c e r — sáo os

n u m e r o s o s s o f r i m e n t o s m in ú s c u lo s d a m in h a v id a d iá r ia .”

27. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 1 4 d e d e z e m b ro d e 1 9 7 6 .

28. D e M a d r e T e re s a p a ra u m a I r m ã M C , 8 d e a b ril d e 1 9 7 7 .

29. In s tr u ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 9 d e m a io d e 1 9 7 9 .

30. D e M a d r e T e re s a p a r a u m a a m ig a , 2 9 d e m a rç o d e 1 9 7 7 .

31. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 2 0 d e j u n h o d e 1 9 7 7 .

32. C f. M a te u s 2 5 :3 5 -4 0 .

33. C f. J o ã o 1 5 :1 3 .

34. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 1 7 d e fe v e re ir o d e 1 9 7 8 .

35. C o n s titu iç õ e s d a s M C , 2 9 .

36. In s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 5 d e o u tu b r o d e 1 9 8 4 .

37. C f . 2 C o r ín ti o s 8 :9 .

38. C f. G á la ta s 2 :2 0 .

39. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . N e u n e r , 2 3 d e j u n h o d e 1 9 7 8 ; c f. G á l a ta s 2 :2 0 .

40. G á la ta s 2 :2 0 .

41. M a d r e T e re s a , A C a r id a d e : A lm a d a M is s ã o , 2 3 d e ja n e ir o d e 1 9 9 1 .

42. D e M a d r e T e re s a p a ra E ile e n E g a n , 1 d e ju lh o d e 1 9 7 8 .

43. D is c u rs o d e M a d r e T e re sa n o R e g in a M u n d i I n s titu te , R o m a , 2 0 d e d e z e m b ro d e

1979.

44. D e M a d re T e re sa p a ra o C a rd e a l P ic a c h y , 3 0 d e n o v e m b ro d e 1 9 7 8 .

45. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 3 0 d e a b ril d e 1 9 7 9 .

46. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P c . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 2 2 d e s e t e m b r o d e 1 9 7 9 .
396 Vc n h a , seja A l in h a luz

47. C f . 2 C o r ín ti o s 9 :7 .

48. C f . 2 C o r ín ti o s 8 :9 .

49. C f H e b re u s 4 :1 5 .

50. C f J o ã o 1 2 :2 4 .

51. M a te u s 2 6 :4 0 .

52. D e M a d r e T e re s a p a ra o P e. S e b a s tia n , M C , 1 2 d e o u tu b r o d e 1 9 7 9 .

53. C f L u c a s 2 2 :4 4 .

54. I n s tr u ç õ e s d a M a d r e à s I r m ã s M C , 1 5 d e f e v e re ir o d e 1 9 8 3 .

55. M a te u s 2 5 :4 0 .

56. C f Isa ía s 4 9 :1 5 - 1 6 .

57. D is c u r s o d e a c e ita ç ã o d o P r ê m io N o b e l, p r o f e r id o p o r M a d r e T e re s a e m O s lo ,

n a N o r u e g a , 11 d e d e z e m b r o d e 1 9 7 9 .

58. D e M a d re T ere sa p a ra u m m é d ic o , 12 d e o u tu b r o d e 1 9 8 8 .

59. D is c u rs o d a M a d re T e re sa n o C a fé d a m a n h ã N a c io n a l d e O ra ç ã o , q u e te v e

lu g a r e m W a s h in g t o n , D . C , e m 3 d e fe v e re ir o d e 1 9 9 4 .

60. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 9 d e ja n e iro d e 1 9 8 0 .

61. Ibid.
62. In s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 1 7 d e o u tu b r o d e 1 9 7 7 .

63. D e M a d r e T e re s a p a r a o P e . M ic h a e l v a n d e r P e e t, 1 8 d e o u t u b r o d e 1 9 8 0 .

64. C a n a d e M a d re T ere sa p a ra Je su s, a n e x a d a à c a rta d e M a d re T e re sa p a ra o Pe.

P ic a c h y , 3 d e s e te m b r o d e 1 9 5 9 .

65. D o s d is c u r s o s q u e M a d r e T e re sa p r o f e r iu d u r a n te o S ín o d o d e 1980, em The


Catholic Leader, d a ta d o d e 2 6 d e o u tu b r o d e 1 9 8 0 .

66. E x p lic a ç ã o d a s C o n s titu iç õ e s O r ig in a is .

67. D e M a d re T ere sa p a ra o Pe. N e u n e r, 15 d e d e z e m b ro d e 1 9 8 0 .

68. Ibid.
69. C a r ta d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 15 d e m a rç o d e 1 9 8 0 .

70. C a r ta d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 2 3 d e n o v e m b ro d e 1 9 8 0 .

71. In s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C (C o n te m p la tiv a s ), 18 d e ju n h o de

1981.

72. D e M a d r e T e re sa p a ra o C a r d e a l P ic a c h y , 2 8 d e s e te m b r o d e 1 9 8 1 .

73. “ Q u e r id o Je su s, a ju d a -m e a d if u n d ir a T u a fra g râ n c ia p a ra o n d e q u e r q u e vá.

I n u n d a a m in h a a lm a c o m o T e u E s p ír ito e a T u a V id a . P e n e tra e p o s s u i to d o o

m e u se r d e f o rm a tã o c o m p le ta , q u e a m in h a v id a p o s s a n ã o s e r m a is d o q u e u m a

r a d iâ n c ia d a T u a . B r ilh a a tra v é s d e m im e e s tá d e ta l m a n e ir a e m m im , q u e to d a s

a s a lm a s c o m quem e u m e re la c io n a r p o s s a m s e n tir a T u a p re s e n ç a n a m in h a
•Santa •Teresa do C a lc ul a 397

a lm a . Q u e , q u a n d o o lh a re m p a ra m im , já n ã o m e v e ja m a m im , m a s a p e n a s a

Je su s! F ic a c o m ig o , e e u c o m e ç a r e i a b r ilh a r c o m o T u b r ilh a s , d e m o d o a b r ilh a r e

a s e r u m a lu z p a r a o s o u t r o s . A lu z , ó J e s u s , v ir á t o d a e la d e T i , n ã o s e n d o a b s o l u ­

ta m e n t e n a d a m in h a . S e rá s T u b r ilh a n d o p a r a o s o u tr o s a tra v é s d e m im . P e r m ite -

- m c a s s im lo u v a r- T c d a m a n e ir a q u e m a is T e a g ra d a , b r ilh a n d o p a r a q u a n to s m e

r o d e ia m . Q u e e u T e p r e g u e s e m p re g a r, n ã o c o m p a la v ra s , m a s a tra v é s d o e x e m ­

p l o , p e la f o r ç a c o m u n i c a t i v a , p e la i n f l u ê n c i a c o m p a s s i v a d a q u i l o q u e fiz e r , p e la

e v id e n te p le n itu d e d o a m o r p o r T i q u e se a lb e rg a n o m e u c o ra ç ã o . A m é m ” .

C a p ítu lo 13
I r r a d ia r C risto

1. D e M a d r e T e re s a p a ra as I rm ã s M C , 1 9 d e a g o s to d e 1 9 8 2 .

2. M e d ita ç ã o d e M a d re T e re sa n o h o s p ita l d e R o m a , 1 9 8 3 .

3. M a d r e T e r e s a le v a n ta v a - s e to d o s o s d ia s à s 4 h 4 0 d a m a n h ã e , a p ó s a s o r a ç õ e s

c o m u n itá ria s e a m e d ita ç ã o , q u e tin h a m lu g a r e n tr e a s 5 h e as 6 h d a m a n h ã ,

a s s is tia à S a n ta M is s a . A s e g u ir p a r a o c a fé d a m a n h ã , a M a d r e T e re sa e as irm ã s

davam i n í c i o a o a p o s t o l a d o n a s f a v e la s , v is i t a n d o f a m í lia s o u p r e s t a n d o s e r v i ç o

n a s C a s a s d e M o r ib u n d o s o u d e C r ia n ç a s , o u e m v á rio s d is p e n s á rio s . ( N o s ú l­

tim o s a n o s d a s u a v id a , a M a d r e T e re sa já n ã o c o n s e g u ia ir c o m re g u la r id a d e às

fa v e la s n e m à s c a sa s d o s p o b r e s , d e v id o à s s u a s m u it a s v ia g e n s , à s n e c e s s id a d e s

d a s ir m ã s e d a a d m in is tr a ç ã o d a c o n g re g a ç ã o a q u e tin h a d e a te n d e r, e à s in ú ­

m e r a s v is i ta s q u e r e c e b ia .) À s 1 2 h 3 0 , fa z ia u m a o r a ç ã o c o m u n i t á r i a , s e g u id a d o

a lm o ç o , d e m e ia h o r a d e r e p o u s o e d e m e ia h o r a d e le itu r a e s p ir itu a l. D e p o is ,

e la e a s ir m ã s r e g r e s s a v a m a o tr a b a lh o c o m o s p o b r e s . À s 1 8 h , fa z ia m u m a h o r a

d e a d o r a ç ã o d ia n te d o S a n tís s im o S a c r a m e n t o ( d e s d e 1 9 7 3 ) , a q u e se s e g u ia a

o r a ç ã o d a ta r d e c o m a litu rg ia d a s h o r a s , e o ja n ta r . D e p o is d a re fe iç ã o d a n o ite e

d e m e ia h o r a d e re c re io , o d ia d a s ir m ã s te rm in a v a à s 21 h c o m a o r a ç ã o d a n o ite .

E r a f r e q ü e n t e M a d r e T e r e s a fic a r a in d a b a s ta n t e te m p o a c o r d a d a , a r e s p o n d e r à s

c a r ta s q u e lh e e n v ia v a m .

4. D e M a d r e T e re s a p a ra o C a r d e a l P ic a c h y , 1 6 d e s e te m b r o d e 1 9 8 3 .

5. D e M a d r e T e r e s a p a r a o C a r d e a l P ic a c h y , 1 7 d e f e v e re ir o d e 1 9 8 6 .

6. T e s te m u n h o d o Pe. A lb e rt H u a r t, S J, C a lc u tá , ín d ia .

7. P c . A lb e r t H u a r t, S J , " M o th e r T e re sa : J o y in th e n ig h t” . Reviewfor Religious,


v o l. 6 0 , n .° 5 ( S e t.- O u t . 2 0 0 1 ) .

8. T e s te m u n h o d o B isp o C u r lin .
398 Ve n h a , seja M i n h a luz

9. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . v a n d e r P e e t, 7 d e ja n e ir o d e 1 9 8 3 .

10. E x c e r to s d a s d e c la ra ç õ e s d o P a p a J o ã o P a u lo II q u a n d o d a s u a v is ita a N ir m a l

H rid a y , LOsservatore Romano, e d iç á o s e m a n a l, 1 0 d e fe v e re iro d e 1 9 8 6 .

11. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . v a n d e r P e e t, 1 d e ja n e ir o d e 1 9 8 8 .

12. D e M a d re T e re sa p a ra as Irm ã s M C , 10 d e o u tu b r o d e 1 9 8 8 .

13. D e M a d re T ere sa p a ra o Irm ã o R o g er, 16 d e d e z e m b ro d e 1 9 8 9 .

14. D e M a d r e T e re s a p a ra a s I rm ã s M C , 2 3 d e a b ril d e 1 9 9 1 .

15. C f. L u c a s 1 :3 9 -5 6 .

16. C f. M a te u s 6 :8 .

17. C f. M a te u s 2 5 :4 0 .

18. C f . R o m a n o s 8 :3 5 - 3 9 .

19. D e M a d r e T e re s a p a ra a s Irm ã s , Irm ã o s , S a c e r d o te s , M is s io n á r io s L e ig o s , C o l a ­

b o ra d o re s M C , ju n h o d e 1 9 9 0 .

20. C a n a G e ra l d e M a d re T e re sa p a ra as Irm ã s M C , 3 1 d e ja n e ir o d e 1 9 8 0 .

21. C a r ta A b e r ta a o s P r e s id e n te s G e o r g e B u s h e S a d d a m H u s s e in , 2 d e ja n e ir o d e

1991.

22. D e M a d r e T e r e s a p a r a a s u a f a m ília re lig io s a , 2 3 d e j u n h o d e 1 9 9 1 .

23. D e M a d r e T e re s a p a ra a s I rm ã s , I rm ã o s e S a c e rd o te s M C , 2 5 d e m a r ç o d e 1 9 9 3 .

24. C a r ta d a M a d re T ere sa a Je su s, a n e x a d a à C a r ta d e M a d re T e re sa p a ra o Pe.

P ic a c h y , 3 d e s e te m b ro d e 1 9 5 9 .

25. D e M a d re T e re sa p a ra o Pe. N e u n e r, ja n e ir o d e 1 9 6 5 .

26. C f. J o ã o 1 9 :2 5 -2 6 .

27. D e M a d r e T e re s a p a r a a I r m ã M . F re d e ric k , M C , e a s I rm ã s M C , 2 9 d e m a r ç o d e

1994.

28. D e M a d re T ere sa p a ra o P e. N e u n e r, 2 4 d e ju lh o d e 1 9 6 7 .

29. D e M a d re T ere sa p a ra as Irm ã s M C , 15 d e m a io d e 1 9 9 5 .

30. D o Pe. v a n E x e m p a ra a M a d re T ere sa, 1 6 d e s e te m b ro d e 1 9 9 3 .

31. D e M a d r e T e r e s a p a r a o P e . v a n d e r P e e t, 2 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 3 .

32. D a M a d r e T e r e s a p a r a u m a a m ig a , 2 5 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 4 .

33. T e s te m u n h o d o B isp o C u r lin .

34. T e s te m u n h o d o P c. G a ry , M C

35. T e s te m u n h o d o P e. S e b a s tia n , M C

36. T e s te m u n h o d a Irm ã G e r tr u d e .

37. T e s te m u n h o d a Irm ã M . N irm a la , M C

38. T e s te m u n h o d a Irm ã M a rg a re t M a ria .

39. E x p lic a ç ã o d a s C o n s titu iç õ e s O r ig in a is .

40. T e s te m u n h o d o P e. G ary .
S a n t a 'Teresa de Calc utá 399

C o n c lu s ã o

1. M a lc o lm M u g g e r i d g e , S o m e th in g B e a u tifu lf o r G od, N o v a Y o rk , E v a n s to n , S á o

F r a n c is c o , L o n d r e s , H a r p e r e R o w , 1 9 7 1 , p . 1 4 6 .

2. D a M a d r e T e re s a p a ra a M a d re G e r tr u d e , 1 0 d e ja n e ir o d e 1 9 4 8 .

3. D e M a d re T eresa p a ra o Pe. N e u n e r, 6 d e m a rç o d e 1 9 6 2 .

4. In s tru ç õ e s d a M a d re T ere sa às Irm ã s M C , 1 d e o u tu b r o d e 1 9 7 7 .

5. D is c u rs o d e M a d re T ere sa e m R o m a , 31 d e o u tu b ro d e 1 9 8 2 .

6. D is c u rs o d e M a d r e T e re s a n o C o r p u s C h r is ti C o lle g e , e m M e lb o u rn e , 8 de

o u tu b r o d e 1 9 9 1 .
D ire ç ã o g e ra l

Antônio Araújo

D ire ç ã o e d ito ria l

Daniele Cajueiro

E d ito r re sp o n sá v e l

Hugo Langone

P ro d u ç ã o e d ito ria l

Adriana Torres
Daniel Borges do Nascimento

R e v is ã o

Jaciara Lima

D ia g r a m a ç ã o e P r o je to g rá fic o

Gabriella Rezende

C apa

Maquinaria Studio

E s te liv ro fo i im p r e s s o e m 2 0 1 6 , p a r a a P e tra .

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