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Prefácio .......................................................................................................................................................................... 15
Rita de Cássia de Freitas Coelho
11. REFLEXÃO SOBRE ESPAÇO E TEMPO E O REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL (Porto Xavier) 163
Claudiane Marta Zamboni, Claudia Maria de Oliveira Becker Spies e Josiele Bedin
12. CONHECENDO O MUNDO ATRAVÉS DOS PASSEIOS (Quinze de Novembro) ............................... 171
Luciana dos Santos, Elisete de Jesus Kempf e Joice Prediger
13. METAMORFOSE (Campo Novo) ..................................................................................................................... 179
Jocemara da Rosa
14. TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL (Ijuí) .............. 187
Débora Dorneles dos Santos, Eleandro José Lizot, Leila Marlise Cavinato Karlinski e Valdir Jose
Sandri
15. FAMÍLIA PRESENTE NA ESCOLA: RELATO DE PRÁTICA PEDAGÓGICA (São José do Herval) ....... 199
Diana Baségio, Dorilde Nicolau Rogéri e Rosana Araldi
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Unidades Universitárias de Educação Infantil. Denise Motta Marchand
Coordenadora Geral do Projeto do Assessora- Pedagoga (PUC/RS), Especialista em Educação
mento Proinfância/UFSM. Coordenadora Ad- Infantil (UFRGS); Professora da Rede Municipal
junta e docente do Curso de Especialização em de Ensino de Ijuí, RS. Formadora no Projeto de
Docência na Educação Infantil/UFSM. Coorde- Assessoramento Proinfância/UFSM.
nadora e docente do Curso de Aperfeiçoamen-
to de Docência na Educação Infantil. Vladinei Roberto Weschenfelder
Psicólogo (UFRGS), Especialista em Psicologia
Simone Freitas da Silva Gallina Clínica (UFRGS). Assistente de Pesquisa no Pro-
Licenciada em Filosofia pela Universidade Fe- jeto de Projeto do Assessoramento Proinfân-
deral de Santa Maria (UFSM), Mestre em Edu- cia/UFSM.
cação/UFSM, Doutora em Educação pela Uni-
versidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Sussi Abel Menine Guedes
Docente do Centro de Educação no Departa- Mestre em Educação pela Universidade Fede-
mento de Administração Escolar/UFSM. Super- ral de Santa Maria (UFSM). Professora da Uni-
visora e Docente do Curso de Especialização versidade de Passo Fundo/RS. Supervisora de
em Educação Infantil/UFSM; Docente do Cur- Pesquisa do Projeto de Assessoramento Proin-
so de Especialização em Gestão Educacional/ fância/UFSM.
UFSM. Supervisora de Pesquisa do Projeto de
Assessoramento Proinfância/UFSM. Bianca Lopes Bertuol
Especialista em Mídias na Educação pela Uni-
Noeli Valentina Weschenfelder versidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
Licenciada em Geografia e Pedagogia (UNIJUÍ), GS). Pedagoga. Formadora no Projeto de As-
Mestrado em Educação (UFSM), Doutorado em sessoramento Proinfância/UFSM.
Educação (UFRGS); Professora do Programa de
Pós-Graduação em Educação nas Ciências: Mes-
trado e Doutorado (UNIJUÍ). Supervisora de Pes-
quisa do Projeto de Assessoramento Proinfân-
cia/UFSM. Coordenadora Adjunta do Curso de
Aperfeiçoamento em Educação Infantil.
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Autores dos relatos de experiência das Uni- Marli Spellmeier
dades do Proinfância: Professora da EMEI Sonho de Criança, do mu-
nicípio de Teutônia/RS.
Caroline Silveira Spanevello
Coordenadora Pedagógica da EMEI Beija-Flor Berta Carina Sippel
do município de Faxinal do Soturno/RS. Peda- Professora da EMEI Sonho de Criança, do mu-
goga e Mestre em Educação (UFSM). nicípio de Teutônia/RS.
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Nilza Maria FissScapin Elisete de Jesus Kempf
Secretária da Educação do município e profes- Pedagoga e diretora da EMEI Pequeno Polegar
sora da EMEI Dente de Leite Professora Ivani Professora Gerarda Michels Prante do municí-
Lurdes Barchet Tessele do município de Dona pio de Quinze de Novembro/RS.
Francisca/RS.
Joice Prediger
Raquel Miranda Keisman Pedagoga e Especialista em Mídias na Edu-
Diretora da EMEI Dente de Leite Professora cação (UFRGS). Professora da EMEI Pequeno
Ivani Lurdes Barchet Tessele do município de Polegar Professora Gerarda Michels Prante do
Dona Francisca/RS. município de Quinze de Novembro/RS.
12
Diana Baségio Kelly Daiane Machayewski
Professora da EMEI Primeiros Passos do municí- Monitora da EMEI Lucas Vezzaro, do município
pio de São José do Herval/RS. de Erechim/RS.
Adriane Scarmignani
Professora da EMEI Barãozinho do município
de Barão do Cotegipe/RS.
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Prefácio
15
de 0 a 5 anos de idade no período diurno, estados atuarão subsidiariamente, porém,
em jornada integral ou parcial, regulados e necessariamente, em apoio técnico e financeiro
supervisionados por órgão competente do aos municípios, consoante o art. 30, VI, da
sistema de ensino e submetidos ao controle Constituição Federal.
social. É obrigatória a matrícula na Educação A educação da criança de até 6 anos
Infantil de crianças que completam 4 ou 5 anos insere-se nas ações do Ministério da Educação
até o dia 31 de março do ano em que ocorrer (MEC) desde 1975, quando foi criada a
a matrícula. As crianças que completam 6 anos Coordenação de Educação Pré-Escolar.
após o dia 31 de março devem ser matriculadas Atualmente cabe à Coordenação-Geral
na Educação Infantil. A frequência na Educação de Educação Infantil vinculada à Diretoria de
Infantil não é pré-requisito para a matrícula no Currículos e Educação Integral da Secretaria de
Ensino Fundamental. Educação Básica do MEC propor e implementar
Nessa contextualização da Educação ações de apoio técnico à educação infantil.
Infantil no Brasil, é essencial que se destaquem Partindo das políticas já existentes, das
as competências dos entes federados, não se demandas de estados e municípios e tendo em
perdendo de vista o cumprimento do regime vista as metas e estratégias do Plano Nacional
de colaboração que deve orientar as ações de Educação, Lei nº 13.005 de 25 de junho de
educacionais voltadas para a infância. 2014, o Ministério da Educação vem atuando
Na distribuição de competências na consolidação da identidade da Educação
referentes à Educação Infantil, tanto a Infantil no âmbito do sistema educacional por
Constituição Federal quanto a LDB são meio de cinco linhas de ação comprometidas
explícitas na corresponsabilidade das três com a melhoria da qualidade:
esferas de governo – município, estado e União
• Acesso
– e da família. A articulação com a família visa,
• Currículo
mais do que qualquer outra coisa, ao mútuo
• Financiamento
conhecimento de processos de educação,
• Formação dos profissionais
valores, expectativas, de tal maneira que a
• Avaliação
educação familiar e a escolar se complementem
e se enriqueçam, produzindo aprendizagens Em relação a ampliação do acesso,
coerentes, mais amplas e profundas. Quanto o Ministério da Educação (MEC) e o Fundo
às esferas administrativas, a União e os Nacional de Desenvolvimento da Educação
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(FNDE) lançaram, em 2007, o Programa Nacional parceiros de referência como a União Nacional
de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos dos Dirigentes Municipais de Educação
para a Rede Escolar Pública de Educação (UNDIME), a União dos Conselhos Municipais de
Infantil (Proinfância), com objetivo de ampliar Educação (UNCME), as Universidades Federais,
a rede física escolar pública de atendimento da o Ministério Público e os Fóruns de Educação
Educação Infantil. O Proinfância prevê projetos Infantil.
arquitetônicos especialmente planejados Este livro apresenta a experiência de
com centralidade na criança, recursos para a trabalho conjunto do MEC/SEB/Coedi e o Centro
construção de creches e pré-escolas e aquisição de Educação, Núcleo de Educação Infantil (NDI),
de equipamentos e mobiliários visando a Unidade de Educação Infantil Ipê Amarelo da
ampliação progressiva do acesso de crianças Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),
menores de seis anos de idade à Educação no assessoramento técnico-pedagógico aos
Infantil. municípios executores do Proinfância na região
Contudo, apenas a construção do central e do noroeste do estado do Rio Grande
espaço físico não garante o direito à Educação do Sul. Foram dimensões prioritárias: docência,
Infantil e a qualidade do trabalho pedagógico currículo e espaços e tempos na Educação
desenvolvido. Desta forma, o MEC, por meio Infantil.
da Coordenação-Geral de Educação Infantil Para mim é uma alegria prefaciar este
(COEDI), implementa diferentes estratégias livro que concretiza uma experiência coletiva
de assessoramento técnico-pedagógico de colaboração entre universidade e ministério,
aos municípios executores do Proinfância: entre pesquisa e política, entre União e
reuniões técnicas estaduais, visitas in loco, municípios.
envio de material, resposta a consultas O livro traz contribuições para pensar
via e-mail ou por contato telefônico para o cotidiano da Educação Infantil. Constitui
orientações sobre estrutura e funcionamento importante subsídio para fortalecer a relação
da nova instituição, elaboração da proposta de apoio técnico e financeiro do MEC e expressa
pedagógica, regulamentação e autorização compromisso acadêmico e político de seus
de funcionamento, constituição do quadro autores.
de recursos humanos e critérios de matrícula,
entre outras. As estratégias de assessoramento, Rita de Cássia de Freitas Coelho
também, mobilizam nos estados diferentes Coordenadora-Geral de Educação Infantil
17
Apresentação
[...] é necessário que tomemos consciência de O livro está organizado em artigos prove-
que, hoje, falar de criança ou falar da infância é
nientes dos municípios representantes dos três po-
algo cada vez mais difícil e cada vez mais comple-
xo [...] há mudanças na sociedade, mudanças do los de Santa Maria, Ijuí e Passo Fundo, e tem como
tipo antropológico, do tipo cultural, mudanças eixo central a discussão de Docências na Educa-
que também afetam aos adultos que trabalham ção Infantil: Currículo, Espaços e Tempos. Divi-
com as crianças. E, aqui, a razão pela qual falar
da criança, hoje, signifique abordar um tema so- dido em duas partes, Docências nas Unidades do
bre o qual é necessário refletir muito fortemente Proinfância e Relatos de Experiências nas Unida-
e com muito empenho (Loris Malaguzzi, 1986). des do Proinfância, na primeira parte, contamos
com um artigo apresentando o Projeto de Asses-
As razões que nos levaram a produzir este
soramento e Acompanhamento Pedagógico às
livro foram a possibilidade de dar aos municí-
Redes e Sistemas de Ensino na Implementação
pios participantes do Projeto a oportunidade de
do Proinfância em Municípios da Região Central
apresentarem os processos vividos durante o as-
sessoramento, refletindo sobre suas propostas/ e do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Os
ações pedagógicas com crianças de 0 a 5 anos das textos seguintes fazem uma discussão de uma
Unidades do Proinfância da região Central, Norte Docência na Educação Infantil a partir dos Ciclos
e Nordeste do Rio Grande do Sul. Os artigos origi- Formativos e/ou da formação em Contexto reali-
naram-se de Resumos Expandidos organizados zada com os professores nas Unidades do Proin-
por professores dos municípios que foram apre- fância em vários municípios da região de imple-
sentados em uma Roda de Conversas durante o II mentação do projeto. Na segunda parte do livro,
Seminário do Proinfância – “Crianças, Infâncias e apresentamos as experiências de professores
Docências na Educação Infantil”. de Unidades do Proinfância, trazendo à discus-
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são temas como ações pedagógicas com bebês, Entrelaçados a esses temas, aprofunda-
a construção de práticas de avaliação, reflexões mos os estudos acerca das políticas para a pe-
sobre a organização de espaços e tempos, a res- quena infância em nosso país, em específico, com
significação das rotinas, a diversidade de gênero a discussão da implementação das Diretrizes
e étnico-racial (a partir das etnias presentes nas Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
unidades do Proinfância da região de abrangên- (2009) e os documentos complementares cons-
cia do projeto) na Educação Infantil, entre outros. truídos em decorrência daquelas. Nessa perspec-
Foi a partir desses temas que discutimos tiva, fica o desafio a ser enfrentado pelos municí-
entre os municípios as especificidades de uma pios de continuar com a expansão da educação
Docência na Educação Infantil, estruturada na infantil na garantia de uma educação infantil de
perspectiva da Pedagogia das Infâncias, rela- qualidade. Além disso, ficamos com a expectativa
cionada a uma concepção de infância que con- da continuidade da formação de professores para
sidere a criança como sujeito de diretos e prota- atuar junto às crianças de 0 a 5 anos, em conso-
gonista de suas ações. Desse modo, possibilita-se nância com o novo Plano Nacional de Educação
aos adultos envolvidos, a compreensão de que (2014-2024) que assegura a importância da for-
são todos corresponsáveis pelos processos pe- mação inicial e continuada de professores para
dagógicos que se estabelecem e que estão, coti- atuar nesta etapa da Educação Básica.
dianamente, envolvidos em despertar a curiosi- Esperamos que o livro possa contribuir
dade das crianças, em refletir sobre as situações para socializarmos ideias, assim, nos encorajan-
educacionais que se constituem na diversidade, do a pensar e repensar nossas práticas pedagó-
da relevância do olhar e da escuta atenta dos gicas cotidianas com as crianças de 0 a 5 anos,
adultos, da sensibilidade ética, estética e política, e reconhecendo as possibilidades de políticas
da aproximação entre crianças e comunidade, públicas de educação para esta etapa da Educa-
do estabelecimento de tempos e espaços de re- ção Básica, numa perspectiva de uma Educação
flexão e planejamento, a compreensão acerca da Infantil mais igualitária.
relevância dos registros e da documentação na Nossos agradecimentos a cada um dos
busca por uma postura investigativa entre adul- autores, e os convidamos à leitura para compar-
tos e crianças e pela construção de relações ati- tilharem críticas e contribuições.
vas, dentre outros elementos, que nos remetem
as crianças como centro de toda a proposta na Débora Teixeira de Mello
educação infantil. Aruna Noal Correa
20
PARTE I
Docências nas
Unidades do PROINFÂNCIA
1
O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E
PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
23
Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
Educação Infantil e estudos-situação que apre- tante aos ciclos formativos e autoformativos, vi-
sentam dados quantitativos reunidos de diversas sitas técnicas, devolutivas, coletivo/redes, forma-
fontes, como IBGE, TCE-RS, INEP. ção em contexto.
O segundo princípio a problematização
parte da premissa de que se algo está acontecen-
do a ponto de interferir na dimensão pedagógica
das práticas educativas na Educação Infantil, ele
foi constituído a partir de uma questão buscando
relacioná-la com pressupostos políticos, sociais e
culturais.
O terceiro princípio a investigação tem exi-
gido do grupo de trabalho uma saída do lugar
do saber constituído, impondo um movimento
de constituição de novos territórios de aprendi-
zagem sobre a educação infantil considerando o
constante confronto entre as concepções teóri-
co-práticas dos membros da equipe com aquilo
que efetivamente tem sido a prática em educa-
ção infantil, em boa parte das escolas vincula- Figura 10 – Fonte autoras
das ao Proinfância. Esse aspecto nos possibilitou
A auto-formação e a formação
constatar que é preciso entender as causas para
podermos propor experimentações educativas
O primeiro esforço do projeto foi elabo-
no tempo espaço com crianças.
O quarto princípio a criação tem a ver com rar a relação entre as abordagens qualitativa
os devires da infância, com o que caracteriza a e quantitativa da pesquisa, o quadro de refe-
infância, um devir de possibilidades, a partir da rência conceitual, tendo em vista o que propu-
criação de práticas educativas e com a docên- nha o projeto, a participação dos municípios,
cia, com crianças pequenas levando-se em con- os dados, as análises, a legislação e a política
ta que as práticas educativas com crianças são a para Educação Infantil. As estratégias metodo-
composição dos seus direitos e as possibilidades lógicas e os procedimentos selecionados para
de respeito às crianças e às infâncias. a pesquisa respondem à necessidade de com-
Tais princípios se retroalimentam, ou seja, preender a investigação em educação como
contribuem com a docência que se dá concomi- uma atividade complexa.
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
pios, fornecendo materiais didáticos e informa- Proinfância por município referência, sendo
ções gerais sobre o projeto. um deles, se possível, o município referência;
Além disso, realizou-se o levantamento e as Unidades em funcionamento a mais tempo;
tabulação de dados de cada município (dados proximidade de acesso. A proposta foi realiza-
do IBGE, TCE/RS, INEP, Censo Escolar 2012), e da em 8 municípios de cada região, totalizando
dos perfis como atividade prévia à realização 24 unidades.
das visitas. Os aspectos que compõem os da-
dos do perfil foram definidos pela equipe, de
acordo com a necessidade do grupo.
O grupo decidiu que uma das metodo-
logias seriam as visitas técnicas nos municípios
e, em função das características geopolíticas de
cada polo, cada equipe de trabalho organizou-se
de acordo com as especificidades da região. Fo-
ram organizadas visitas exploratórias, nas quais
as equipes acompanharam a organização da
estrutura e do funcionamento, do trabalho peda-
gógico desenvolvido nas Unidades, conversan-
do com docentes, crianças, os(as) gestores(as) e
secretários(as) municipais, observando as carac-
terísticas e adequações da estrutura física e co-
nhecendo os documentos oficiais das Unidades,
produções dos docentes e das crianças. Figura 11 – Fonte autoras
A realização das visitas técnicas foi reali-
Essas atividades de assessoramento
zada pelos(as) assistentes de pesquisa de cada
técnico-pedagógico realizadas in loco nas
pólo, com roteiro de observação pré-estabele-
Unidades Proinfância envolveram interações
cido. Após a realização de cada visita, os(as) as-
com crianças, familiares, docentes, coorde-
sistentes de pesquisa elaboravam um relatório
nação pedagógica, direção e gestores. As
da visita que era apresentado e discutido em
relações estabelecidas junto às Unidades
formações semanais de cada equipe.
Para isso, buscou-se estabelecer crité- Proinfância são consideradas estratégicas
rios para a definição dos municípios que rece- e ricas em possibilidades. Por esta razão, as
beriam as visitas técnicas: duas Unidades do questões de impasse, verificadas junto aos
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
contextos, foram tomadas como objeto de de Educação dos municípios escolhidos como
problematização em tempo real nas visitas, municípios referência do Polo Regional de San-
chamando os diferentes atores para uma po- ta Maria, Ijuí e Passo Fundo.
sição de reflexão e responsabilidade frente à Tendo em vista as observações realiza-
Educação Infantil. das nas Unidades e o perfil dos municípios da
As visitas técnicas definem-se como me- região visitada, os(as) professores(as) formado-
todologias participativas e sensíveis às deman- res(as) planejavam a formação nos municípios
das e singularidades locais de cada escola e sua referência de cada polo, os ciclos formativos.
comunidade, com o objetivo de acompanhar No primeiro encontro de cada ciclo formativo
a organização da estrutura e o funcionamento estavam presentes a coordenação, supervisão
das Unidades Proinfância, com vistas à imple- e professores(as) formadores(as) do Projeto.
mentação das Diretrizes Curriculares Nacionais Nos próximos ciclos, cada encontro foi realiza-
para a Educação Infantil (2009). do durante todo o dia, com a participação das
Após estudo e discussão dos relatórios professoras formadoras, de dois Coordenado-
das visitas técnicas realizadas nos municípios res(as) da Educação Infantil da Secretaria Mu-
de cada polo, construiu-se um documento nicipal de Educação e dois professores(as) de
Educação Infantil de cada município. Ao longo
base para a devolutiva e formação nas unida-
do Projeto de assessoramento, aconteceram os
des. As devolutivas das vistas técnicas se de-
Ciclos Formativos I, II, III e IV realizados nos mu-
ram com os auxiliares de pesquisa (algumas
nicípios-referência nos polos de Santa Maria,
vezes acompanhadas pela coordenadora do
Ijuí e Passo Fundo. Cabe ressaltar que, enquan-
projeto, professoras formadoras e supervisoras
to as visitas técnicas abrangeram 24 municí-
de pesquisa) nas 24 unidades do Proinfância,
pios, os ciclos formativos contemplaram parti-
com gestores, secretarias de educação, coor-
cipantes de todos os municípios assessorados.
denadores pedagógicos e docentes das uni-
A cada encontro formativo realizado no
dades. Nessas reuniões de devolutivas, foram
município referência, era proposta uma forma-
realizadas orientações para que as Unidades ção em rede nas Unidades. Os(as) coordenado-
pudessem resolver os problemas pontuados res(as), gestores(as) e professores(as) das Unida-
pela equipe técnica do Proinfância e foi solici- des de Educação presentes voltavam para seus
tado um Plano de Ação para 2014; constituição municípios com uma tarefa que consistia em or-
de rede de comunicação com as coordena- ganizar encontros formativos com a toda a equi-
ções pedagógicas das Secretarias Municipais pe de sua Unidade, a partir do que havia sido
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
ação profissional situada, referenciada, ética política de formação inicial e continuada; re-
e complexa. Uma formação do contexto para lação escola e comunidade; organização cur-
a práxis, que exige conscientização e tomada ricular; didático-pedagógico e infraestrutura e
de consciência, uma pedagogia da escuta, da foi solicitado um plano de ação com metas de
infância, com processos formativos respeitado- curto, médio e longo prazo. Os planos de ação
res das crianças e suas infâncias. foram solicitados para todos os municípios que
Dentre as ações, procurou-se realizar
participaram do projeto e principalmente para
dois encontros com os gestores (prefeitos, se-
os que receberam visita técnica, devolutiva e
cretarias de Educação, coordenações pedagó-
formação em contexto.
gicas das Secretarias de Educação e equipes
diretivas das unidades do Proinfância nos Mu- Além das visitas técnicas, ciclos formati-
nicípios) nos polos de Santa Maria Ijuí e Passo vos e auto-formativos, tivemos também duas
Fundo, pois ao longo do ano de 2013, a parti- edições do Seminário Regional Proinfância: Ci-
cipação nos ciclos formativos apresentou alta clo Formativo e Auto Formativo dos Coletivos,
rotatividade, em cada encontro uma represen- II Seminário do Curso de Especialização em
tação e isso implicava a ruptura e não a consoli- docência na Educação Infantil. As temáticas
dação do coletivo/redes. Retomou-se a adesão abordadas foram relacionadas ao Currículo na
ao projeto e o compromisso com a formação Educação Infantil e Linguagens. O número de
continuada dos sujeitos que atuam nas Uni- participações, inscrições foi de (340) pessoas
dades do Proinfância, com a importância de por município. A participação efetiva, entretan-
qualificar o quadro docente e manter os pro- to, registrou 450 participantes, pois alguns mu-
fessores nas Unidades, pois havia uma prática
nicípios trouxeram mais participantes do que
de anualmente mudar as pessoas de Unidades
o previsto pelo projeto. O Seminário Regional
e inclusive de nível de escolaridade. Nesses en-
do Projeto contou com a participação de todos
contros procurou-se também estabelecer um
diálogo com o Ministério Público e com o Tri- os polos e com a participação das três equipes
bunal de Contas do Estado, pois muitas são os e de dois representantes de cada município.
questionamentos dos municípios e a busca por As temáticas desenvolvidas nos Seminários
respostas junto a esses órgãos. surgiram das necessidades identificadas tanto
Num desses encontros foi trabalhado nas visitas técnicas quanto no 1º ciclo forma-
o resultado do diagnóstico realizado com os tivo à luz das Diretrizes Curriculares Nacionais
municípios em 2013, as metas e as ações para da Educação Infantil e também a partir da reu-
Educação Infantil nas seguintes dimensões: nião com os representantes do Ministério da
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
Educação, em janeiro, na UFRGS. Sendo que o der e revelar”. E logo após uma mesa redonda: As
II Seminário Regional Proinfância: Crianças, in- crianças e as artes, Sandra Regina Simonis Rich-
fâncias e Docências na Educação Infantil bus- ter, Mário Balentti, Maria Carmen Silveira Barbosa.
cou contemplar as temáticas que emergiram Buscamos compartilhar essa experiência
do processo de assessoramento, aquelas que vivida pelos bebês no teatro aos professores e
de algum modo demonstravam ser as mais re- gestores como uma oportunidade dos corpos
levantes para os docentes e gestores de serem desses adultos se colocarem nas estéticas e poé-
pontuadas na formação. ticas de linguagem, numa tentativa de reencan-
O II Seminário Regional Proinfância, III Se- tamento do mundo, de uma linguagem, que os
minário do Curso de Especialização em Docên- permita voar, viajar e alçar voos através da arte.
cia na Educação Infantil e I seminário do Curso Uma relação mais estésica da linguagem, que
de Aperfeiçoamento em Docência na Educação nos faça sair de nós, que nos revele como sujeitos
Infantil “Crianças, Infâncias e Docências na Edu- únicos, numa dimensão criadora e inventiva, nos
cação Infantil” buscou contemplar as temáticas interrogando sobre a linguagem, sobre o que
que emergiram do processo de assessoramento, oferecer a criança em termos de experiência poé-
aquelas que de algum modo demonstravam ser tica e estética com crianças pequenas.
as mais relevantes para os docentes e gestores O II Seminário Regional exigiu a contra-
de serem pontuadas na formação. As temáticas
como Políticas Públicas para Educação Infantil;
Relações Etárias entre crianças pequenas da Edu-
cação Infantil; Organização do Espaço e Pedago-
gia das relações, da diferença e da escuta; Produ-
ção das Infâncias e das Culturas: brinquedos e
brincadeiras; Crianças, Infâncias: qual docências
para a Educação Infantil; Formação em Contexto.
Iniciamos com o Cuco: a linguagem dos
bebês no teatro, dirigido por Mário Balentti, Figura 13 - Teatro Cuco
onde mostra o encantamento dos bebês, das
partida das unidades de produzir um relato de
crianças pequenas com os atores, com a música,
experiência para compor as Rodas de conversa
com a arte, com a poética do espetáculo na expe-
durante as sessões do Seminário, essa exigência
riência estética dos bebês no jogo entre “ escon-
foi atribuída principalmente àquelas vinte quatro
35
Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
(24) unidades contempladas com as visitas técni- relações entre as Universidades (UFSM, UNI-
cas, devolutivas e formação em contexto. A fina- JUÍ, UPF) exigindo que a equipe atendesse a
lidade das Rodas de conversa foi de estabelecer formação das três regiões, com características
relações de conhecimento sobre as práticas de- culturais e sociais muito diversas, e os quais
senvolvidas em outras unidades. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que buscavam fazer
podemos afirmar que a propositiva dessa ativida- um movimento de inserção, e intervenção na
de foi extremamente relevante para a percepção realidade das unidades, acreditamos que seu
dos desdobramentos das ações do projeto de protagonismo deveria responder ao pressu-
assessoramento às redes e sistemas. posto epistemológico que orientou os princí-
O protagonismo de docentes e gestores foi pios formativos.
evidenciado nos momentos de exposição de suas Assumir esse projeto de Cooperação
vivências a partir do contexto formativo e auto- Técnica das Universidades nos permitiu esta-
-formativo que o projeto deflagrou nas unidades. belecermos diálogo a fim de contribuir com
o fortalecimento das Políticas de Educação
Infantil e, ao mesmo tempo, perceber a ne-
cessidade de manter esses processos de coo-
peração técnica, assim como, os cursos de es-
pecialização e aperfeiçoamento em docência
na Educação Infantil para que possamos qua-
lificar a educação nos municípios e garantir
que as práticas com crianças pequenas pos-
sam ser processos formativos de respeito às
crianças e suas infâncias.
Mais do que nunca o desejo é de que
seja possível uma docência na educação infan-
Figura 14 – Foto do Seminário Regional em Santa Maria 2015.
til que escape do mesmo, do lugar da repro-
Apontamentos da trajetória do asses- dução de concepções, a qual sabe-se não dão
soramento conta da complexidade que envolve a infância
na contemporaneidade, neste sentido é preci-
O projeto, através da sua equipe e ao so dialogar com os elementos teórico-práticos
longo do processo, estreitou e qualificou as que permeiam a docência na Educação Infantil.
36
O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
A metodologia adotada exigiu dos su- âmbito das formações continuadas realizadas
jeitos uma contrapartida de auto organização nas escolas).
das redes formativas, para tanto, reafirma-se, Cabe ainda, continuar os estudos acerca
ao concluir o projeto, a importância do copro- das Diretrizes Curriculares da Educação Infan-
tagonismo dos docentes, das equipes diretivas, til (2009), de modo que todos os segmentos
gestores das Unidades do Proinfância e das Se- da escola possam apropriar-se delas e, cole-
cretarias de educação, numa prática de forma- tivamente, qualificar as ações desenvolvidas
ção em contexto, de formação continuada e de em prol das crianças. Sendo assim, entende-
uma formação no âmbito de suas realidades. mos que na Educação Infantil prioritariamen-
Aos municípios, cabe retomar as escutas te: cada sala de aula necessita ter professor
atentas dos docentes e equipes diretivas das em turno integral, e não auxiliar respon-
Unidades do Proinfância que se expressam dendo como professor; que os professores
nas seguintes questões: repensar as funções tenham formação em Pedagogia; quadro de
de coordenação pedagógica, em particular, professores de Educação Infantil, com conhe-
no âmbito da escola de educação infantil; a cimento na área de Educação Infantil; pro-
formação continuada: rever as estratégias fessores concursados, garantindo concurso
utilizadas (por exemplo, palestras), as quais na área. Professores que foram concursados
muitas vezes acabam por restringir o espaço para os Anos Iniciais precisam desejar atuar
para que as educadoras possam compartilhar na etapa de ensino que lhes interessa; quadro
experiências e refletir coletivamente a partir permanente de professores nas escolas. Evitar
da análise do contexto da escola; continuida- trocas anuais de professores de uma escola
de dos professores na mesma instituição, na para outra, pois não se apropriam e não se im-
mesma etapa da educação básica em função plicam com seus fazeres; respeito aos direitos
da alta rotatividade; possibilitar tempos espa- das crianças; superar a compreensão de que o
ços para que as educadoras possam ter aces- tempo das crianças deve ser pensado em fun-
so a pesquisas e materiais pedagógicos como ção das crianças e não dos adultos.
livros, revistas, etc. Por exemplo, citamos a Essas demandas levantadas nas Uni-
utilização de ferramentas da web como blogs dades vão ao encontro da necessidade dos
com links para sites (MEC, revistas eletrônicas, municípios pensarem em um planejamento
sites com indicações de leituras que possam a curto, médio e prazo para atender as me-
subsidiar os estudos e reflexões realizados no tas da CONAE (2014) de universalização do
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Viviane Ache Cancian e Simone Freitas da Silva Gallina
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O PROJETO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO E PEDAGÓGICO EM UNIDADES DO PROINFÂNCIA
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OS CICLOS DE FORMAÇÃO NO PROJETO PROINFÂNCIA
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Débora Teixeira de Mello e Aruna Noal Correa
Nestes termos, nos remetendo a Faria É, portanto, a partir desse contexto que
(1999), a autora ressalta a importância do prota- o projeto procurou ampliar a discussão com
gonismo atribuído às crianças pequenas como professores da educação infantil, das dire-
prova inconteste de suas potencialidades e trizes e princípios que orientam uma prática
saberes, bem como da importância de que os pedagógica com crianças pequenas de 0 a 6
espaços coletivos de sua educação pratiquem
anos. E nessa perspectiva, que o projeto pro-
uma adequada pedagogia da infância. O reco-
pôs uma reflexão da prática/ação pedagógica
nhecimento desta criança pequena como um
a partir da formação de professores em um es-
ser de cultura e que produz cultura, estende-
-se àquelas na faixa etária de até 6 anos1, ma- paço que permitiu aos professores criar uma
terializando a concepção afirmada pela CF/88 forma de refletir, falar e reconhecer seu papel
em relação ao direito da família e da criança ao de professor da educação infantil.
atendimento em creche e pré-escola. O projeto teve como proposta trazer
Com a aprovação da CF/88 e da LDBEN para discussão temáticas da Educação Infan-
9394/96, de 1996, o Ministério da Educação til que implicam na formação de professores/
apresenta um conjunto de documentos que educadores, entre elas: projeto pedagógico e
vão, gradativamente, compondo um conjun- educação infantil; planejamento/ação peda-
to de materiais orientadores que oferecem gógica com crianças pequenas; currículo na
diretrizes para esta oferta no campo educa-
Educação Infantil; organização do espaço e
cional e induzem estados e municípios a ade-
do tempo; perspectivas da avaliação e docu-
quarem suas políticas públicas. Os Referen-
mentação e registros na Educação Infantil. A
ciais Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil – RCNEI (1998), Resolução CNE/CEB medida que o projeto avançava permitia aos
01/99, que vigorou por dez anos, foram se- professores refletir, estudar, pesquisar e pla-
guidos por diversos outros documentos, até nejar em conjunto, o que possibilitava uma
chegarmos às atuais Diretrizes Curriculares ação-reflexão da prática pedagógica, tornan-
Nacionais da Educação Infantil (2009), esta- do-a mais qualificada.
belecidas pela Resolução CNE/CEB 05/2009 e Durante o desenvolvimento do proje-
demais documentos. to optou-se pelo desenvolvimento de Ciclos
Formativos integrando diversos municípios
1 As autoras fizeram a opção por delimitar a faixa etária de 0
a 6 anos de idade, assim incluindo as crianças que completaram
de uma mesma região, e a partir das temáti-
6 anos após a data de 31 de março e estão matriculadas na edu-
cação infantil.
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DOCÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: REFLEXÕES SOBRE OS CICLOS DE FORMAÇÃO NO PROJETO PROINFÂNCIA
cas selecionadas elaborou-se súmulas com os Assim, procuramos discutir com o gru-
conceitos a serem estudados com os profes- po, durante os Ciclos de Formação, qual o
sores e gestores das unidades, sempre tendo significado dos momentos da rotina para as
como base as DCNEIs (2009). crianças, questionando as rotinas engessadas,
O primeiro Ciclo implementado teve horários rígidos, procurando esclarecer cultu-
como Súmula I: Concepções de infância e suas ralmente o que significa cada momento da ro-
implicações para o trabalho pedagógico junto tina para as crianças desde o almoço, a ida ao
às crianças de até seis anos de idade. As crian- banheiro, o momento do pátio, o momento
ças em sua diversidade nas culturas contem- do brincar livre. Refletimos sobre como tornar
porâneas em diferentes tempos e espaços na estes espaços e rotinas mais qualificados para
educação infantil (creches e pré-escolas) nas as crianças, tornando-as protagonistas nestes
Unidades do Proinfância. Entendendo o espa- espaços.
ço como mais um educador, conforme Mala- No decorrer deste trabalho, algumas
guzzi (1999), e da importância da qualidade questões foram surgindo, tais como: qual a
do espaço oferecido às crianças na educação melhor forma de dispor os jogos e brinque-
infantil, buscamos refletir com os professores dos ao alcance das crianças, como ampliar o
e gestores das unidades do Proinfância sobre espaço dos berçários, diminuindo o número
cada momento da rotina das unidades, tra- de berços e bebês conforto e deixando o am-
balhando com imagens e observações gera- biente mais acolhedor, de que forma qualificar
das nas próprias unidades, a partir de visitas o espaço dos banheiros para promover a au-
técnicas2 e através da análise de registros tonomia das crianças, como organizar o pátio
documentais como observações, fotos e do- externo com mais brinquedos e permitindo
cumentos como projeto pedagógico e regi- o deslocamento das crianças em segurança,
mento. como reorganizar a disposição do mobiliário
no espaço das salas permitindo as crianças fá-
cil acesso aos materiais e com espaço para a
2 Visitas Técnicas de assessoramento e acompanhamento à exposição das produções das crianças.
organização da estrutura e do funcionamento das unidades do
PROINFÂNCIA em 24 (vinte e quatro) municípios distribuídos em
03 três polos entre a Região Central , Norte e Noroeste/RS.
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Débora Teixeira de Mello e Aruna Noal Correa
Para nossas reflexões, partimos da análise seguimos, junto com os professores, elencar
das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educa- alguns elementos do espaço e das rotinas que
ção Infantil (BRASIL, 2009). Tendo em vista que o apresentavam situações que dificultam a or-
mesmo é um documento considerado de extre- ganização e o protagonismo das crianças em
ma relevância para uma ação/prática pedagógi- relação aos espaços: o excesso de mobiliários
ca de qualidade, discutimos com os municípios nas salas comprometendo o espaço de movi-
retomando os princípios das DCNEIs sobre o mentação das crianças; os jogos e brinque-
tema espaços e tempos. dos fora do alcance das crianças; os brinque-
Nas reuniões regionais com os municí- dos existentes muito desgastados e inclusive
pios na discussão deste tema, ao apresentar- alguns danificados; a falta de materiais, brin-
mos estas questões problematizadoras con- quedos e jogos/livros adequados para todas
as idades atendidas; o espaço de circulação
para as crianças limitado, devido a presença
de muitos móveis dispostos na sala; a ênfase
em materiais (brinquedos) com pouco atenção
as relações, interações e brincadeiras que se
acontecem para além do brincar com brinque-
dos; a confecção massificada de cartazes indi-
cando silêncio, os modos de comportamento,
o ajudante do dia, chamada, como está o dia.
Com este diagnóstico inicial e a partir das
visitas técnicas consolidamos dados de uma
pesquisa realizada junto as unidades em fun-
cionamento nos municípios, conseguimos jun-
to com professores e gestores produzir alguns
indicadores de ações a serem implementadas
para qualificar os espaços das unidades para as
crianças, entre eles: ampliar a pracinha e o nú-
mero de brinquedos neste espaço, providenciar
material e mobiliário adequado a faixa etária de
A simbologia da massa de modelar na escola da pequena infância. cada grupo de crianças possibilitando a elas o
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Dentre as possibilidades despertas pelos materiais oferecidos, a menina interage com o jogo de encaixe.
juntar um brinquedo, vestir um casaco, calçar as crianças submetidas aos tempos dos adultos
um tênis, um sapato... Então, no decorrer dos com a possibilidade da criança ir desenvolvendo
encontros, refletimos sobre estes tempos nas sua autonomia nas suas atividades cotidianas.
unidades do Proinfância: que proposta de ro- Nossas observações e discussões com
tina menos engessada, seria possível? Como os municípios foram possibilitando fazermos
adequar os horários (a rotina) aos interesses das algumas considerações sobre os tempos/as ro-
crianças? Como flexibilizar momentos como o tinas nas unidades, e nossas reflexões giraram
horário do sono, conforme a necessidade das em torno de como podemos tornar as crian-
crianças? Nossas reflexões eram em torno de re- ças protagonistas nestes espaços quando nós
pensar o tempo a favor das crianças, respeitan- adultos organizamos a distribuição do tempo
do as suas características, respeitando o ritmo nos espaços coletivos, e nestes termos esclare-
das atividades realizadas por elas, sem deixar ce Fortunati (2014, p. 19):
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construção de uma nova rotina mais flexível, A proposta pedagógica das instituições
de Educação Infantil deve ter como objeti-
que respeite os tempos das crianças e fomos
vo garantir à criança acesso a processos de
estabelecendo alguns princípios norteadores apropriação, renovação e articulação de co-
para qualificar as práticas/ações pedagógicas nhecimentos e aprendizagens de diferentes
neste cotidiano: a) adequar os horários (roti- linguagens, assim como o direito à proteção,
à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito,
nas) as necessidades das crianças; b) executar à dignidade, à brincadeira, à convivência e à
diariamente planejamento conjunto com as interação com outras crianças.
crianças, oportunizando a tomada de decisões
para compor a rotina, negociando os tempos, Neste sentido, as diferentes linguagens
retomando, antecipando e encadeando even- foram consideradas e construídas também na
tos através de uma rotina ilustrada com foto- relação entre seus tempos e espaços, e estru-
grafias, desenhos ou objetos significativos; c) turados em decorrência das necessidades que
conscientizar os professores da importância emergiam destas interações, amparados por
do registro através de reuniões, onde se te- diálogos entre a pedagogia e a arquitetura em
nha embasamento teórico que fundamente busca de “fazer brotar e a reafirmar os direi-
esta prática, iniciando registros; d) aumentar a tos de autodeterminação da infância” (CABA-
frequência dos registros e das produções das NELLAS, ESLAVA E TEJADA, 2005, p. 145).
crianças; e) diminuir o tempo de TV; f ) propor- Assim, buscamos construir com os
cionar mais atividades diversificadas; g) revisar profissionais envolvidos com o cotidiano das
os horários do sono – compreendendo que unidades do Proinfância, uma abordagem di-
nâmica de reflexão acerca do que representa o
nem todas as crianças têm necessidade de
desenvolvimento de propostas que abarquem
sono ao mesmo tempo.
as múltiplas linguagens das crianças pequenas.
O segundo ciclo foi permeado pela pro-
Dentre os elementos ressaltados em momentos
posta da Súmula II - Linguagens Infantis – As
de formação evidenciamos a ênfase, com base
especificidades do trabalho com os bebês e com
nas DCNEIs (BRASIL, 2009), na promoção do
as crianças de 4 a 6 anos em função das áreas de
conhecimento de si e do mundo aliado a am-
conhecimento no Currículo. Com isso, objetiva-
pliação das experiências sensoriais, expressivas,
mos refletir sobre essa dimensão de trabalho corporais, com base na possibilidade de movi-
orientados pelas Diretrizes Curriculares Nacio- mentação ampla, expressão da individualidade
nais para a Educação Infantil (BRASIL, 2009) e respeito pelos ritmos e desejos das crianças.
que orientam em seu artigo 8º que:
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A espécie humana pode exprimir-se em uma “as experiências não são mais colocar em rela-
pluralidade de linguagens. Todas as lingua-
ção somente a percepção visual mas se trans-
gens se constroem em condições de recipro-
cidade e se desenvolvem através da experiên- formam em oferta de polisensorialidade3 tátil,
cia. Todas as linguagens têm o poder de gerar sonora, gustativa, olfativa etc” (HOYUELLOS,
outras linguagens, novas lógicas e potenciali- 2004, p.120).
dades criativas. São linguagens das milhares
de representações que as crianças devem
indagar como prolongamento do próprio eu
(HOYUELLOS, 2004, p.123). 3 Polisensorialidade no sentido de que “a qualidade de
um ambiente é resultado de uma multiplicidade de fatores:
influencia a forma do espaço, a organização funcional, sobre a
Buscando, com isso, enfatizar no de- percepção sensorial (luz, cor, regime acústico e microclimático,
sugestão tátil). A lógica que regula tal percepção não é única [...]
correr dos ciclos formativos, que nem todas as O ambiente deve ser concebido como um espaço polisensorial,
culturas, em especial escolares, valorizam as não tanto no sentido de ser rico de estimulação, quanto no
sentido de ser envolto de diferentes valores sensoriais na
mesmas linguagens e oferecem para todos a direção em que cada um possa sintonizar-se segundo a própria
oportunidade de desenvolvê-las. Dessa forma, característica individual” (CEPPI e ZINI, 2011, p. 16. Original em
italiano. Tradução livre das autoras).
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manais; e ainda, proporcionar momentos de para tornar o espaços das unidades espaços
formação voltados ao estudo das atividades, de vivências, de experiências mais enrique-
projetos e outros documentos referentes ao cedoras para as crianças onde elas possam
desenvolvimento do trabalho com as crianças conhecer, interagir e produzir cultura a partir
e aumentar a frequência dos registros e das das experiências proporcionadas nestes espa-
produções das crianças. ços.
E em relação a mudanças nas práticas Numa interpretação de currículo na
pedagógicas cotidianas (rotinas e currículo) educação infantil fundamentado nas práticas
elegemos algumas prioridades: adequar os sociais, superando a ideia de currículo como
horários (rotinas) as necessidades das crian- um programa preestabelecido de ações para
ças; melhorar o desenvolvimento do currículo produzir resultados. Fortunati (2014) conside-
por meio de acompanhamento sistematizado ra que um currículo a partir do protagonismo
do setor pedagógico da SME (Secretaria Mu- das crianças deve advir:
nicipal de Educação); diminuir o tempo de
TV; tornar a rotina flexível e com atividades (...) da “nova imagem” da criança tão ligada a
pedagogia de Malaguzzi, a qual a reconhece
diversificadas; promover um diálogo constan-
como sujeito “rico” significa uma criança que é
te entre professores, pais e escola; estimular e competente e curiosa, sociável e forte, e ativa-
incentivar as crianças para que desenvolvam mente engajada na criação de experiências e
sua autonomia; continuar com as formações na construção de sua própria identidade e de
seu próprio conhecimento (2014, p.20).
dos docentes sobre a importância e as formas
de organização da rotina, ponderando que
esta deve vir para organizar e planejar o tem- E nesta perspectiva, acreditamos que
po e as atividades pedagógicas, sem engessá- podemos superar práticas pedagógicas com
-las; estimular os docentes para que ofereçam currículos pensados a partir de conquistas de
sempre mais o contato das crianças com ele- habilidades e conteúdos a serem desenvolvi-
mentos da natureza; inclusive os bebês serem dos com as crianças por faixa etária, currículos
levados ao pátio e poderem ter contato com a que muitas vezes apresentam como eixo cen-
terra, grama, até mesmo com a areia e promo- tral as datas comemorativas, se distanciando
ver passeios em bibliotecas, museus. Estes são da referência de uma criança que aprende na
alguns aspectos que consideramos relevantes interação com seu contexto cultural e social.
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das no decorrer das formações anteriores, des- o contexto que os cercam. Postura que pode
construindo as “[...] certezas sobre as crianças estar relacionada a imersão do adulto no mun-
incompletas, incapazes, “não falantes”, que do das palavras ou na imagem preconcebida
pensam somente com 9 anos, egocêntricas, da ausência de linguagem antes da fala.
pesquisadas no contexto mãe-filho [...] que, Ainda, durante este Ciclo de Formação,
apesar de não falarem, [...] inusitadamente se enfatizamos que as oportunidades para o de-
comunicam entre elas de muitas maneiras” senvolvimento das crianças bem pequenas são
(MELLO; BARBOSA, 2011, p. x). infinitas, destacando a organização dos espa-
Aspecto este, que instigou a reflexão ços, com base em Emmi Pikler (2010), para pro-
e diálogo sobre a capacidade que as crianças moção do movimento livre dos bebês e crian-
bem pequenas possuem de se comunicar, e ças pequenas, tal como o excesso de berços,
da centralidade do papel do adulto nestas mesas e cadeiras nas salas, a eleição estratégi-
construções, na medida em que promovem ca dos materiais, sugerindo que o excesso de
situações e implementam ambientes favorá- informação não é condizente com um espaço
veis (GOLDSCHMIED e JACKSON, 2007; PIKLER, rico e que eleger os materiais significa que os
2010) ao desenvolvimento integral. Isto, em adultos debruçam-se em pesquisas de mate-
oposição ao fato de deixar os bebês “presos” riais que sejam instigantes, para além das for-
em cadeiras, carrinhos ou dentro de berços, mas plásticas que temos encontrado.
por exemplo, impedindo o contato e a relação Demais reflexões estiveram conectadas
com o espaço e o mundo que os cerca. ao tempo de distanciamento entre crianças e fa-
Isto nos sugeriu, sobremaneira, a miliares e o prolongado período de tempo que
construção de um circuito de comunicação as crianças passam, grande parte de seus dias,
(HOYUELLOS, 2004), que enaltecesse o sentido dentro das instituições. É neste tempo que as
da escuta, e que resgatasse nos adultos e nas crianças se encontram aprendendo sobre o mun-
crianças, como co-protagonistas deste pro- do, sobre as relações humanas, sobre si e sobre o
cesso de constituição das escolas da pequena outro e, por isso, a necessidade de nos dedicar-
infância, os diferentes sentidos incorporados mos a pensar sobre as condições criadas a elas
às linguagens das crianças. Aprofundando as e a forma como permitimos que elas atuem e se
discussões acerca de nossa incompletude para desenvolvam plenamente, pois os materiais que
compreender os bebês e as crianças pequenas possibilitamos às crianças fazem emergir novos
e as diferentes formas de estar em contato com direcionamentos à suas explorações.
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e projetos; espaços para repouso em separado todas as turmas; espelhos baixos nas salas de
daquelas que permanecem acordadas; bebês berçários; as crianças participando na organi-
ocupando a pracinha e espaços para além da zação de hortas, dentre outros elementos per-
sala de aula; momentos de integração com meados pelo cotidiano das Unidades.
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Mudanças que demonstraram uma sando qual o currículo a ser desenvolvido com
maior preocupação com as intencionalidades o grupo de crianças de 0 a 6 anos, e acerca do
pedagógicas planejadas para e com as crian- processo de aprendizagem dessas crianças.
ças, acrescidas agora da comunidade escolar. Nesse sentido, acreditamos que esses encon-
Com isso, nossa compreensão foi de que, nesse tros entre professores permitirá aos grupos a
processo, os professores tornaram-se atentos à realização da sua formação continuada, com
atividade das crianças, procurando responder pesquisas sistemáticas sobre o seu fazer peda-
seus questionamentos, suas necessidades. gógico, refletindo sobre o seu trabalho diário
Durante esse processo de escuta das ne- com as crianças, sobre planejamento e currícu-
cessidades destes coletivos, o adulto passou lo na educação infantil.
a agir como memória do grupo, discutindo a
documentação registrada durante o desen- Considerações Finais
volvimento dos projetos, o que permitiu às
crianças, ao fazer parte destas propostas, revi- Refletindo sobre os Ciclos de Forma-
sitar suas observações e percepções, para um ção esperamos que eles tenham permitido a
resgate mais aprofundado do conhecimento construção de subsídios teóricos e práticos
elaborado durante os projetos e atividades para consolidar uma prática/ação pedagógica
elaboradas. E, assim, os professores passaram com crianças de 0 a 6 anos na Unidades do
a estimular e desafiar as crianças para que en- Proinfância.
contrem hipóteses sobre suas dúvidas e sobre Foi a partir da reflexão sobre o cotidia-
a temática desenvolvida (EDWARDS, 1999). nos das instituições de Educação Infantil, que
Emergiram, então, aliado a estes proces- conseguimos junto aos professores, gestores
sos, uma documentação e registro sistemáti- construir uma nova imagem de infância/crian-
cos dos professores, sobre o desenvolvimento ça como um sujeito de possibilidades e prota-
dos projetos pedagógicos com as crianças que, gonista de suas ações desde os primeiros me-
posteriormente discutidos com o grupo geral ses de vida.
de professores, passou a permitir um acompa- É numa perspectiva de uma identidade
nhamento do desenvolvimento de suas ações pedagógica, social, cultural e política destas Uni-
pedagógicas, refletindo constantemente sobre dades, que devem ter como foco a criança que
ela. E, nesse momento, os professores também desenvolvemos este projeto. Assim, procuramos
passaram a constituir-se pesquisadores, repen- auxiliar no desafio constante de consolidar e sus-
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poderia ser classificado como uma abordagem niões de sistematização, representadas como
de devolução. O dinamismo próprio e as carac- um espaço privilegiado ao qual poucas pes-
terísticas singulares presentes neste momento soas tinham acesso. Estas questões, aliadas ao
desconstroem a ideia de uma leitura unilateral pressuposto de democratização do acesso aos
da realidade e uma transmissão vertical de co- espaços de interlocução e reflexão, trouxeram
nhecimentos, onde os sujeitos estão supostos gradualmente a necessidade de revisar o for-
a um saber e a uma avaliação externa. mato operacional do assessoramento.
O processo de sistematização buscou Então, a partir do segundo ano do pro-
suporte em um exercício de problematização, jeto, a imersão dos formadores no cotidiano
onde os traços de uma análise diagnóstica fo- da escola foi substituída pelos encontros de
ram emergindo como resultado de um proces- formação em contexto. Neste momento, es-
so coletivo de discussão, em um esforço com- tabelecemos um contraponto significativo
partilhado de leitura da realidade, articulando em relação à metodologia postulada por Oli-
um debate onde as Diretrizes Curriculares Na- veira-Formosinho e Araújo (2013), que vem
cionais para a Educação Infantil (2009) e os In- caracterizada pelo envolvimento continuado
dicadores de Qualidade (2009) exercem posi- e progressivo entre uma professora e um pes-
ção de centralidade. Este movimento permitiu quisador externo, em uma relação dual.
realizar a investigação de questões significati- O projeto de assessoramento subverte
vas junto ao contexto das escolas da amostra. esta premissa de relação dual, propondo a ins-
Permitiu também o mapeamento de questões tituição de espaços coletivos de interlocução e
que não estavam previstas inicialmente, e que reflexão em nível de equipe, apoiados na inves-
tiveram a oportunidade de emergir como cate- tigação sistemática das práticas pedagógicas e
gorias de análise a partir do discurso dos sujei- das concepções que oferecem sustentação a
tos e das interações com o contexto. estas práticas.
As trocas com o conjunto da equipe no Nestes encontros de formação em con-
decorrer das visitas técnicas eram enriquece- texto, que eram negociados e agendados pre-
doras, mas permaneciam restritas a contatos e viamente com a direção, as escolas suspen-
interações pontuais, sem a potencialidade do diam o atendimento às crianças para realizar
debate coletivo. Desse modo, prevalecia um uma série de atividades formativas com o con-
sentimento de desconexão com o processo junto da equipe, desde a direção e a coordena-
de assessoramento e a mistificação das reu- ção pedagógica, as auxiliares e monitoras, até
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A FORMAÇÃO EM CONTEXTO E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE EM DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Horn, 2008), com objetivos claros e uma abor- de habilidades e competências sociais, afeti-
dagem participativa, focada na construção de vas, intelectuais e motoras das crianças, além
um processo mais do que em resultados. Nesta de referências ao trabalho desenvolvido para
situação as crianças tinham papel ativo, sendo alcançar estes objetivos. É clara a relação com
buscada uma articulação das experiências e uma concepção de aprendizagem focada em
dos saberes destes pequenos sujeitos com os resultados e na explicitação dos métodos para
elementos apresentados pela professora, em se atingir estes resultados.
um contexto de pesquisa e sistematização. A Ao longo de todo o assessoramento foi
investigação e discussão destes elementos ao realizado um movimento de interlocução, re-
longo do assessoramento permitiu testemu- fletindo sobre esta noção pontual de registro
nhar uma movimentação crescente em torno e avaliação, buscando desconstruir a ideia de
do planejamento autônomo nos diferentes um foco restrito à criança e ampliando a aná-
grupos, com processos um pouco mais flexí- lise para o contexto das relações e das práti-
veis, em sucessivas aproximações e diálogos cas pedagógicas. O registro e avaliação com
com as crianças. o foco nos processos é um movimento de di-
fícil compreensão e assimilação ao cotidiano.
d) Registro e avaliação As discussões realizadas buscaram suporte
nas concepções de documentação pedagógi-
As concepções e experiências de regis- ca (Dahlberg, Moss e Pence, 2003; Gandini e
tro e avaliação encontram no plano ideal, do Goldhaber, 2002), de modo a incorporar uma
mesmo modo que o planejamento, estreita dimensão mais reflexiva e democrática para
relação com a proposta pedagógica. Naquilo as práticas pedagógicas, especialmente no
que se refere à avaliação, as experiências en- trabalho com as crianças em idade precoce
contradas não são muito diversificadas. A ela- no berçário e no maternal, favorecendo uma
boração de parecer descritivo individual e a ampliação do olhar. O entendimento de que
organização de cadernos ou pastas constituem existe a possibilidade de integrar os atos de
as principais estratégias para acompanhamen- observação e registro, e também os atos de
to do trabalho pedagógico e para avaliação da refletir, analisar e compartilhar parece abrir
evolução das crianças. O formato predominan- rotas alternativas nas relações com as crian-
te de parecer é aquele focado em aspectos de ças, com o conjunto da equipe e, fundamen-
desenvolvimento, com atenção ao domínio talmente, com as famílias.
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Noeli Valentina Weschenfelder, Denise Motta Marchand e Vladinei Roberto Weschenfelder
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A FORMAÇÃO EM CONTEXTO E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE EM DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
equipe; uma articulação com as famílias e com um território. Neste sentido, a sala do grupo
a comunidade onde a escola encontra-se inse- e a escola são mais do que simplesmente um
rida, em uma relação com o currículo e com o espaço onde as coisas acontecem. Trata-se de
contexto vivo; uma articulação entre a teoria e um ambiente que exerce função simbólica,
a prática, desafiando a documentação, a socia- que favorece ou limita o desenvolvimento in-
lização e reflexão sobre as experiências; e, fun- telectual, a imaginação, a criatividade e a troca
damentalmente, uma articulação e um diálogo com outras crianças e com os adultos.
com os sujeitos infantis. Esta discussão nas escolas remete a
Esta noção de formação em contex- uma percepção inicial de empobrecimento.
to organiza um endereçamento ao lugar da As próprias professoras reconhecem os gran-
coordenação pedagógica. Ao distanciar-se do des espaços planos e vazios, ou então espaços
pressuposto de um interlocutor ou pesquisa- povoados por mesas, classes e cadeiras, em
dor externo, permite fazer uma aproximação uma perspectiva de escolarização que limita
com o pressuposto de um interlocutor inter- e despotencializa as vivências lúdicas, afetivas
no, integrante da própria equipe. Ao fazer este e intelectuais das crianças. Outro aspecto que
movimento, a formação em contexto abre um emerge da análise diz respeito à estética das
conjunto de possibilidades mais próximas da salas, marcada por uma carência quase abso-
realidade, demarcando um empoderamento luta de expressão das identidades e das cul-
local e, por isso mesmo, trazendo uma dimen- turas infantis. Muitos espaços eram coloridos
são de responsabilidade que gera certa inse- e repletos de adereços decorativos, com uma
gurança em algumas profissionais. Trata-se de onipresença de modelos produzidos e massi-
um elemento que nos faz pensar na importân- ficados pela cultura de consumo. Os espaços
cia de estratégias de formação continuada e educativos que escapavam desta impressão no
de instrumentalização teórica e técnica para as início do projeto eram excepcionais.
coordenações pedagógicas. É muito interessante acompanhar no
assessoramento o modo como o discurso dos
g) A construção de territórios sujeitos vai buscando uma apropriação destes
códigos de leitura da realidade, nas preocu-
As crianças possuem uma característica pações conceituais, que vão produzindo no-
inerente de interagir com os pares e com os vos sentidos para experiências tão enraizadas.
ambientes onde se encontram, constituindo Uma apropriação que não é rápida e nem asse-
83
Noeli Valentina Weschenfelder, Denise Motta Marchand e Vladinei Roberto Weschenfelder
gurada na partida, que precisa ser carinhosa- riais naturais coletados no ambiente externo,
mente acolhida como um processo, de modo registros de investigações e pesquisas, bem
a compreender juntamente com os sujeitos as como as referências pessoais e familiares, que se
contradições em nível de discursos e de prá- apresentam no discurso, nos traços de memó-
ticas. Existe uma dificuldade em reconhecer ria, nas fotografias e em outros objetos trazidos
estas contradições como aspectos de um pro- do contexto familiar. Passa fundamentalmente
cesso que exige um tempo de assimilação e pelo reconhecimento da criança, mesmo em
elaboração. E, por outro lado, uma dificuldade idade precoce, como sujeito curioso, que obser-
em se reconhecer o papel da coordenação pe- va e brinca, que ao brincar constrói hipóteses e
dagógica no mapeamento e reflexão coletiva aprende, na relação com o outro e com o mun-
sobre estas contradições. do, um sujeito que tem imaginação e, por isso
mesmo, fantasia, deseja, constrói sua identida-
de e produz cultura. Neste sentido, percebe-se
h) A infância que transborda
ao longo do assessoramento um movimento
progressivo de diálogo onde as identidades e
É da condição humana esta busca pelo
as culturas infantis vão muito lentamente cons-
outro, especialmente na infância. Curiosamen-
truindo pequenos territórios.
te, este movimento perseguido insistentemen-
te pelas crianças, através do brinquedo, do
Considerações finais
faz de conta, através da conexão com o outro,
acaba colocando-se como transgressivo, sub- O processo de formação em contexto
vertendo a tarefa proposta em algo colorido, não diz respeito simplesmente a um conjunto
divertido. O desejo das crianças realmente pa- de atividades formativas realizadas junto à rea-
rece maior. Transborda para além das tarefas lidade concreta da escola. Diz respeito funda-
propostas, como se transitasse por caminhos mentalmente a um trabalho onde o contexto
diferentes. Como se a infância fizesse resistên- e as microrrelações emergem como objetos de
cia, entrincheirada na fantasia. problematização, desafiando a desconstrução
Neste sentido, o diálogo com as culturas de um sistema de pensamento fechado onde
infantis passa necessariamente pela valorização as crianças são tomadas como objeto passivo
das produções individuais e coletivas das crian- de uma prática pedagógica apoiada na trans-
ças, sejam elas pinturas, colagens, desenhos, missão. Um sistema de pensamento onde o
adulto encontra-se em posição de centralida-
rabiscos, esculturas de barro ou sucata, mate-
de, e não a criança.
84
A FORMAÇÃO EM CONTEXTO E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE EM DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Derrida (1999) discute esta ideia de des- cem excluídas ou reprimidas, quase invisíveis,
construção como um quase-conceito, que não sendo lançadas à margem e, por isso mesmo,
carrega em si uma definição precisa ou definiti- assumindo um caráter transgressivo neste que
va. Assim, mais do que um método, diz respei- parece ser o lugar da boa educação.
to a um gesto e uma postura ética e política, Esta interlocução vai desenhando suas
profundamente preocupada com a alteridade. bordas na relação com o outro e, por isso mes-
Este exercício de desmontagem do discurso mo, envolve um exercício de alteridade (Der-
abre a possibilidade de revelar os elementos rida, 1999). Trata-se de um exercício que de-
que estão dissimulados ou que permanecem manda certo estranhamento de si mesmo. Um
invisíveis na leitura da realidade e nas boas afastamento daquelas certezas construídas ao
práticas, demonstrando os lapsos, os espaços longo da trajetória pessoal e profissional.
em branco, e desvelando os infinitos discursos Não se trata de um movimento simples,
que estão por trás da aparente unidade. Neste pois requer o estabelecimento de um discerni-
sentido, o autor vislumbra a necessidade de re- mento crítico e reflexivo sobre as próprias prá-
conhecer o não-dito tanto quanto aquilo que é ticas e concepções. Desse modo, trata-se de
expressamente dito em um discurso. uma desconstrução. Muitas professoras refe-
Aqui tomamos o discurso em sua ma- rem desconforto e sofrimento ao vivenciarem
terialidade, em uma dimensão mais ampla, este processo. Elas sofrem e não estão conten-
não somente nas falas, nos documentos pro- tes. A percepção de que as suas práticas peda-
duzidos pelas professoras e nos registros das gógicas com as crianças estão articuladas com
crianças. Mas também nos planejamentos, na uma concepção específica de sujeito produz
escolha das literaturas infantis, na organização interrogações no campo ético e político, que
dos espaços e materiais, nos tempos e rotinas, desestabilizam algumas convicções que estão
nas concepções de identidade presentes no profundamente enraizadas. Convicções que
contexto e na estética das salas. Discursos que orientam, consciente ou inconscientemente,
constituem o território e que fazem a coloni- as decisões que são tomadas no cotidiano.
zação da infância. Uma colonização que usual- Nem todos os sujeitos colocam-se da
mente não reconhece os desejos e as culturas mesma forma diante deste processo. Algumas
infantis e, não reconhecendo, deixa de dialogar professoras parecem simplesmente imper-
com estes pequenos sujeitos. Trata-se de um meáveis a este tipo de interlocução e não fa-
discurso onde as culturas infantis permane- zem o distanciamento necessário para analisar
85
Noeli Valentina Weschenfelder, Denise Motta Marchand e Vladinei Roberto Weschenfelder
o seu fazer e o seu pensar, reiterando práticas se pressuposto de processos coletivos, onde a
mecânicas e descontextualizadas. Outras pro- coordenação pedagógica da escola constitui
fessoras, ao sentirem balançar suas referências, uma referência de articulação e de responsa-
fazem um rápido movimento na busca de sub- bilidades. Uma coordenação pedagógica com-
sídios para operar conceitualmente sobre a petente e qualificada de um ponto de vista
realidade, alcançando um efeito notável sobre teórico e técnico para operar dialogicamente.
as suas práticas e suas relações com as crianças. Desse modo, o debate sobre o desen-
Por outro lado, aquelas professoras que já pos- volvimento profissional das professoras pas-
suem uma trajetória profissional e intelectual sa necessariamente pela construção de uma
identificada com estes pressupostos, parecem identidade de docência integrada a um sujei-
exercer um efeito de convergência na relação to pensante, com a possibilidade de articula-
com os pares, constituindo pequenos núcleos ção teórica e contextualização da realidade.
de articulação e de trocas significativas. Trata- Assim, retomando o argumento central da
-se de um diálogo que desafia o pensamento discussão, destacamos esta capacidade de
sobre as concepções e a transformação não so- análise crítica sobre as próprias práticas e so-
mente das práticas pedagógicas, mas também bre as concepções que suportam estas práti-
do próprio processo de assessoramento onde cas, fundamentando uma práxis que estabe-
opera esta interlocução. lece a base da identidade de docência para
Este movimento não acontece em uma a Educação Infantil, em um exercício que se
esfera abstrata. Vem apoiado em um trabalho assume como elemento chave nos processos
sistemático de registro, socialização, discussão de formação continuada, em especial da for-
e análise com pares e com as famílias. Assim, mação em contexto.
ao tomar o cotidiano como objeto de conheci- Trata-se de uma reflexão significativa,
mento, abre-se a possibilidade deste cotidiano que aposta no protagonismo intelectual co-
ser investido de uma intencionalidade, tanto nectado ao contexto. Um processo em posi-
naquilo que diz respeito às práticas pedagógi- ção de centralidade no trabalho da professora,
cas quanto àquilo que diz respeito aos proces- proporcionando uma inserção profissional ca-
sos de trabalho. paz de transformar a si mesma e a realidade na
Compreendemos, a partir da experiência qual se encontra inserida.
de assessoramento, que as possibilidades de
transformação da realidade vêm apoiadas nes-
86
A FORMAÇÃO EM CONTEXTO E A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE EM DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
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Noeli Valentina Weschenfelder, Denise Motta Marchand e Vladinei Roberto Weschenfelder
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90
4
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE
FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO
DA DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
91
Sussi Abel Menine Guedes e Bianca Lopes Bertuol
vem utilizando em diferentes momentos a me- Nesse sentido, o autor ainda, destaca
mória como “elemento metodológico” na for- que a memória, como elemento metodológi-
mação em nível de graduação, na, extensão e co, auxilia tanto o acadêmico a pensar sobre o
na pesquisa , e isso se vislumbra – por meio seu processo de formação, especialmente no
dos estudos e trabalhos sobre a formação de Curso de Pedagogia (teoria e prática), como
professores, realizadas e coordenadas pelo também o instrumentaliza a pensar sobre a
Professor Benincá (1981, 1996, 2002) e seus
prática pedagógica e as implicações no pro-
sucessores (Tedesco (Org.) 2002; Sartori e Wes-
cesso de ensinar e aprender no momento em
chenfelder (org.) (2007), Mühl (2004), professo-
que realizam o estágio em Anos Iniciais ou
res e pesquisadores da Faculdade de Educação
Educação Infantil. Já no âmbito da formação
(FAED) da referida Universidade.
Ao contextualizar sobre a importância continuada, as dimensões da pesquisa e da ex-
da memória como recurso pedagógico na for- tensão, possibilitam aos professores iniciantes
mação de professores da UPF - Faculdade de ou experientes na carreira docente a constituí-
Educação, Benincá (2002) destaca que, na sua rem-se pesquisadores da sua própria prática.
origem, a memória já havia sido utilizada como Nesse contexto, a proposta de que os profes-
uma proposição de observação, de registro e sores se tornem pesquisadores de sua própria
avaliação das experiências vivenciadas no inte- prática (BENINCÁ, 2002, p.109) desenvolveu-se,
rior da sala de aula pelos professores no início no sentido idealizado pelo autor, através do re-
da década de 1980. Em 1995, o autor desenvol- curso da memória em aula – registro e reflexão
ve projeto de pesquisa denominado: no trabalho e do trabalho docente.
No decorrer dos anos, nos processos de
“A relação teoria e prática no cotidiano dos
professores” envolvendo três campos de formação de professores, na graduação, pós-
ação: a prática de ensino e estágios supervi- -graduação e nas atividades de extensão, a
sionados, a educação continuada-extensão
memória tem contribuído em alguns momen-
e sala de aula. Seus participantes observam,
sistematizam a prática através do recurso da tos como elemento metodológico articulador
memória, formando-se em um processo re- das discussões sobre a prática pedagógica
flexivo que contribui para a qualificação da
na FAED/UPF. Observa-se que nas atividades
ação do sujeito e, consequentemente, para a
transformação dos universos de trabalho do- desenvolvidas em nível de graduação e nas
cente. atividades de extensão, a memória se consti-
92
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO DA
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
93
Sussi Abel Menine Guedes e Bianca Lopes Bertuol
A UPF/RS tem inserção significativa na zarmos a memória como fonte dos registros da
formação inicial e continuada de professores produção de pesquisadoras e professores das
para Anos Iniciais e Educação Infantil na região unidades de educação infantil, de gestores das
norte do estado. Muitos dos municípios envol- Secretarias de Educação, das visitas técnicas
vidos na pesquisa já participaram em algum realizadas nas unidades de educação infantil
momento de cursos de formação inicial ou destacadas no estudo. A memória como recur-
continuada de professores e assim, tendo uma so metodológico cumpriu também a função
apropriação da metodologia da memória. de registrar as aprendizagens coletivas das
O projeto de Assessoramento Pedagógi- professoras formadoras e elaboraram junto
co, no cumprimento ao objetivo de qualificar com educadores nos encontros de formação.
as ações pedagógicas no interior das unidades A concepção de memória nesse caso
de educação infantil - do programa Proinfân- está indicada em Benincá (2002, p. 64):
cia, envolvendo as redes de ensino dos muni-
cípios da região, desenvolveu através da me- A memória deve ser uma interlocução entre
o próprio processo de formação e a constru-
todologia da memória uma forma de realizar a
ção dos conhecimentos sobre essa formação.
extensão das experiências a serem analisadas, A memória é um processo de construção das
discutidas em seus elementos político-peda- compreensões dos dados ou fatos que os re-
gógicos e divulgadas no contexto do projeto gistros apresentam [...].
94
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO DA
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
95
Sussi Abel Menine Guedes e Bianca Lopes Bertuol
gar no mundo, de onde elas vêm, como vivem. O respeito incondicional ao brincar e à brin-
cadeira é uma das mais importantes funções
Estes elementos tomados como referentes da
da educação infantil, não somente por ser no
concepção de criança e infância no escopo do tempo da infância que essa prática social se
projeto Proinfância geraram questionamen- apresenta com maior intensidade mas, justa-
tos que mobilizam alguns profissionais da mente, por ser ela a experiência inaugural de
sentir o mundo e experimentar-se, de apren-
educação, deslocando sua forma de enxergar
der a criar e inventar linguagens através do
a criança como ser que desde que nasce inter- exercício lúdico da liberdade de expressão.
roga o mundo, aprende com os outros e com Assim, não se trata apenas de um domínio da
o ambiente no qual está inserida. Nesse sen- criança, mas de uma expressão cultural que
especifica o humano.
tido, percebe-se que os sujeitos participan-
tes do projeto Proinfância foram instigados a
buscar outras práticas para além daquilo que No processo vivenciado no assessora-
já vinham reproduzindo com base nas refe- mento do Proinfância, o recurso metodológico
rências da docência da escola fundamental, da memória constituiu-se em um elemento pe-
baseadas estas em práticas tradicionais de dagógico que auxiliou a análise e reflexão das
ensino-aprendizagem, ensino formal de con- experiências vividas por ambos sujeitos, e sua
ceitos e baseado em “produtos” ao final de utilização ocorreu durante todo processo de
cada situação de aprendizagem como, por auto-formação e formação dos coletivos. Sua
exemplo, as folhas xerografadas, atividades função também foi a de oportunizar o diálogo
com cartilhas, etc., sem relação alguma com entre as diferentes realidades das unidades an-
as funções contemporâneas a serem desem- tes, durante e depois dos encontros formativos,
penhadas pelas instituições de educação o que potencializou a reflexão entre as pessoas
destinadas às crianças menores de seis anos. a partir da constatação das diferenças entre as
Estamos nos referindo aos eixos articulado- práticas político-pedagógicas das instituições
res de toda proposta curricular da educação de educação infantil, e as concepções que sus-
infantil (BRASIL, 2009), cuja sustentação está tentam tais práticas. Por conseguinte, o diálo-
amplamente abordada no Relatório práticas go deixava marcas nos sujeitos, registradas nas
cotidianas na Educação Infantil - Bases para memórias produzidas durante os encontros
a reflexão sobre as orientações curriculares formativos pelas quais se lançavam novos de-
(BRASIL,2009, p.70), segundo o qual: safios aos sujeitos visando ora modificar suas
concepções, ora visando ascender a patamares
96
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO DA
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
PROINFÂNCIA - COLETIVOS
UFSM
ESCOLA
E SEU POLOS
UFSM POLO COLETI- REPRE- COLETI-
UFSM SENTANT COLETIVO
POLOS VO EM VO DAS
COORD. E NO INTER
MUNIC. CADA ESCOLAS
COLETIVOS COLETIVO
COM SEU MUNICÍ- MUNICI- MUNICIPAL
POLOS MUNICI- MUNICIP
PAIS COLETIVO PIO PAIS
AL
SEMINÁRIO
Figura A – Esquema de constituição dos Coletivos. FINAL
Fonte: Projeto Proinfância UFSM, 2012.
97
Sussi Abel Menine Guedes e Bianca Lopes Bertuol
98
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO DA
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
Portanto, o trabalho foi iniciado, mas a memórias para a continuidade dos trabalhos.
cada encontro era reforçada a necessidade de Nesse aspecto, Saraiva (2007) auxilia ao lem-
se construir o registro e a memória e de conti- brar da evolução que se tem ao produzir tex-
nuar o fluxo formativo projetado no esquema tos: “é a questão do exercício das habilidades
dos coletivos, pois esta dinâmica era crucial de ouvir, falar, ler e escrever” (p.67).
para que o assessoramento fosse acompanha- Nesse sentido, percebe-se a dificuldade
do pela Unidade como um todo, reunindo sob de comunicação dos professores em expressar-
os mesmos pressupostos teóricos e metodoló- -se, expor suas ideias e suas propostas e práti-
gicos a equipe gestora, os docentes e agentes cas pedagógicas a um grupo maior de pessoas,
da política pública na Secretaria de Educação. distinto daquele de seu contexto conhecido de
Ao se construir uma memória a partir de trabalho. Isso pode ocorrer pelo receio de se-
uma vivência, é possível realizar a reflexão so- rem criticadas de uma maneira negativa, sem
bre os discursos e narrativas feitas pelos sujei- se darem conta que poderá ser, por outro lado,
tos. A estratégia da memória reporta a prática muito rica e oportuna a contribuição que ocor-
da escrita, conduzindo a uma reflexão e toma- re na troca de saberes.
da de consciência sobre os conhecimentos e os Além disso, a memória cria a possibilida-
fazeres pedagógicos relacionados à situação de de diálogos ao ser lida em outro momento,
em estudo, ou à realidade que está em análise. de retomar pontos que foram conduzidos, re-
Durante as formações nos municípios fletidos e que precisam de continuidade para
participantes do Projeto Proinfância UPF - Polo serem desenvolvidos e sistematicamente trata-
Norte, percebeu-se o receio desta produção dos proporcionando avanços para outra etapa,
por parte de alguns profissionais envolvidos, fundamentada teoricamente. As reelaborações
considerando-a desnecessária, ou demons- teóricas nos permitem ter uma ressignificação
trando não perceber o cunho pedagógico que dos conceitos e do processo desencadeado
isso poderá proporcionar, com contribuições nos coletivos.
para elaborarem novamente suas ações-refle- Nesse sentido, com a escolha das memó-
xões-ações e, consequentemente, as transfor- rias como opção metodológica nas formações foi
mações necessárias. possível perceber a continuidade dos trabalhos
Assim, tornou-se necessário, no momen- nos coletivos dos municípios, pois as aprendiza-
to inicial, que houvesse a conscientização por gens dos agentes que participavam dos encon-
parte dos participantes da importância das tros formativos do Projeto Proinfância – gestores
99
Sussi Abel Menine Guedes e Bianca Lopes Bertuol
e professores de cada um dos 54 municípios par- que ela necessita” (Trecho retirado de uma me-
ticipantes, reorganizavam suas aprendizagens mória de Formação do IV ciclo Passo Fundo RS
para repassar aos seus pares a partir das contri- 29/04 /2014. Água Santa).
buições e experiências vivenciadas. A equipe de assessoramento percebeu
Além disso, a própria prática cotidia- os benefícios e o sucesso da escolha metodoló-
na pode ser repensada na medida em que a gica do registro memória, também pela forma
equipe de formação trouxe elementos novos, que foi utilizada dessa prática como uma estra-
outros modos de pensar, ponderações e con- tégia na continuidade dos ciclos de formação
tribuições que podem qualificar a práxis peda- nos coletivos da formação e reflexão nos mu-
gógicas dos professores das Unidades de edu- nicípios, qualificando o trabalho desenvolvido
cação infantil do Proinfância, e dos sistemas nas escolas, alcançando, assim, os objetivos
municipais de educação. propostos pelo projeto.
Como exemplo dessa evolução da prá-
tica educativa com as crianças, podemos citar Referências bibliográficas
algumas atitudes tomadas pelas equipes das
unidades educativas como: a reorganização
BRASIL, MEC . BARBOSA, Maria Carmen Silvei-
dos horários de sono, respeitando as caracterís-
ra. Práticas cotidianas na Educação Infantil:
ticas de cada criança; o olhar mais direcionado
bases para a reflexão sobre as orientações
ao letramento das crianças, e menos pelas prá-
curriculares. Brasília, DF: MEC/SEB, 2009. Dis-
ticas concebidas como pré-alfabetização, que
ponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdo-
comumente são descontextualizadas; a valo-
cuments/relat_seb_praticas_cotidianas.pdf>.
rização da produção da criança, no lugar dos
Acesso em: 21/06/2010.
trabalhos xerocopiados; a disposição de brin-
quedos ao alcance das crianças; a organização BENINCÁ, Elli. A memória como elemento edu-
dos tempos priorizando momentos lúdicos; o cativo in: Tedesco, João Carlos. Usos de Memó-
olhar pedagógico direcionado ao berçário. A rias. Passo Fundo/RS: Editora da UPF, 2002.
percepção dessa mudança pode ser identifi- BENINCÁ, Elli et al. A Memória como elemento
cada no registro de uma das participantes dos educativo. In; MüHL, Eldon Henrique et al (org.)
encontros formativos, em que afirma “O tempo O diálogo ressignificando o cotidiano esco-
da criança é diferente do nosso, devemos dar lar. Passo fundo: UPF, 2004. p. 52-87.
ou favorecer a criança o seu tempo, o tempo
100
A CONTRIBUIÇÃO DA MEMÓRIA NOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DO EDUCADOR INFANTIL E NA ELABORAÇÃO DA
DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA
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PARTE II
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Caroline Silveira Spanevello e Lisandra Locateli Pereira
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RESSIGNIFICANDO SABERES A PARTIR DO PROJETO DE ASSESSORAMENTO PROINFÂNCIA UFSM/MEC
“Para haver aprendizagem, é preciso organi- alunos ambientes mais ricos em interação,
zar um currículo que seja significativo para as com atividades de pintura livre com diferen-
tes materiais, experimentação com várias
crianças e também para os professores”. sensações (quente, frio, duro, mole, sabores,
Partindo desses pressupostos algumas cores...). O projeto “Os Sentidos” propiciou
ações foram sendo implementadas na EMEI ao explorar com maior propriedade o manu-
longo deste projeto, seguindo a metodologia seio de diferentes materiais, em especial a
tinta. Este projeto, de um modo geral, visava
proposta pela Assessoria Proinfância UFSM/MEC perceber o mundo através de uma redesco-
e considerando a definição de currículo que traz berta intra e interpessoal através dos órgãos
o Parecer CNE/CEB nº 20/2009, em seu Art. 3º: dos sentidos, enriquecendo e desenvolven-
do habilidades. (Professora G.B – MI)
O currículo da Educação Infantil é concebido Outro relato que traz experiências seme-
como um conjunto de práticas que buscam lhantes é o da Professora (G.U – BI):
articular as experiências e os saberes das
crianças com os conhecimentos que fazem
parte do patrimônio cultural, artístico, am-
biental, científico e tecnológico, de modo
a promover o desenvolvimento integral de
crianças de 0 a 5 anos de idade.
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Caroline Silveira Spanevello e Lisandra Locateli Pereira
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RESSIGNIFICANDO SABERES A PARTIR DO PROJETO DE ASSESSORAMENTO PROINFÂNCIA UFSM/MEC
crianças com a Lulu, o que foi muito positivo e faltando na casinha? Use sua criatividade
significativo dentro do projeto proposto. e ajude seu filho nesta construção, somen-
te com alguma coisa, pois esta casinha irá
visitar outros coleguinhas. Amanhã esta-
A outra proposta foi desenvolvida pela remos ansiosos aguardando a surpresa. A
Professora (D.C – MIII) onde ela relata: partir daí iniciou a casinha nas casas dos
alunos. Em aula, orientei-os sobre o que
Apropriei-me de um livrinho da histó- deveriam contar para os pais (cuidadores).
ria (3 Porquinhos), encapei uma caixa de Fui surpreendida com o tamanho do en-
sapatos com papel pardo e pelo lado de volvimento e dedicação dos mesmos em
dentro da caixa colei o seguinte bilhete: realizar a atividade solicitada. A minha
Papai e Mamãe! Estamos aprendendo na intenção era oportunizar momentos pra-
escola que a família é a base de tudo. E a zerosos de aprendizagem junto da família
prof. disse que os três porquinhos decidi- da criança, incentivando a curiosidade e
ram morar juntos porque o lobo assoprou estimulando a criatividade.
a casa dos irmãos mais novos. Mas a casa
nova não está pintada, não tem o que A partir desse relato, assim como do an-
comer, nem onde cozinhar e dormir. Por
isso estamos pedindo ajuda: O que está
terior, é possível perceber que o trabalho está
pautado nas DCNEI (2009), tendo a brincadeira
Figura 2 – Crianças do MIII em interação com a casinha construída a partir da participação das famílias
111
Caroline Silveira Spanevello e Lisandra Locateli Pereira
como eixo norteador, que envolve não só as onde as crianças puderam observar o processo
crianças mas também as famílias. E esta, por de preparo da terra, plantar, regar para que a
plantinha pudesse nascer. Após essas descober-
sua vez, tem desempenhado um papel cada tas, realizamos a construção de uma horta na
vez mais importante e significativo na constru- escola. Os canteiros foram construídos repre-
ção das aprendizagens infantis, sendo impor- sentando as figuras geométricas pelos próprios
tante colaboradora da escola. alunos e professora utilizando garrafas pets e
água com guache colorido, onde foi explorado
A família, “[...] Moderna, principalmente
o tamanho das garrafas, cores, texturas, bem
a partir do século XVI, redefine seu papel pe- como a exploração sobre a textura do solo, chei-
rante a criança, assumindo uma função edu- ro, umidade. A seguir realizamos o plantio de di-
cativa [...] O eixo da família moderna passa a ferentes sementes e mudas (temperos, verduras)
na horta; por meio deste projeto, as crianças pu-
ser a criança, transformada em objeto de seus
deram compreender a importância das plantas,
cuidados, de seu amor e de seu controle [...]” desenvolveram o raciocínio lógico, a linguagem
(BACHA, 2002 apud SOMMERHALDER, 2011, oral, a coordenação motora fina e grossa, o uso
p.32). Esta afirmação justifica a importância de material reciclável, o trabalho em equipe,
a interação social, o respeito mútuo, além de
assumida pelas propostas de ambas as profes-
despertar o interesse pela preservação do meio
soras, e o envolvimento imediato e intenso das ambiente, assim como as formas de vida e sua
famílias nas atividades, já que as crianças são sobrevivência”. (Professora L.B – MIV). “Confec-
capazes de influenciar diretamente nas ações cionamos um cartaz com personagens da histó-
ria. Todos pintaram com tinta guache. Colamos
das famílias. Outra proposição realizada pelas
girassóis no cartaz. Depois plantamos o girassol
educadoras e que merece destaque, foram as em potes de iogurte. As crianças felizes levaram
atividades voltadas à exploração do meio am- a semente de girassol plantada no pote, para
biente, especialmente as plantas. casa. Depois de uns vinte dias trouxeram de
volta e transplantamos para o pátio da escola.
Através da história A viagem da sementinha (Professora I.C – MIV)
(Maria Saiderberg/adaptado por Àlvaro Cos-
ta), as crianças desenvolveram a consciência
de que necessitamos um meio ambiente sau- A partir destes relatos de ações torna-se
dável. Realizamos dramatizações, construí- possível a visualização do quão significativas
mos painel coletivo sobre o que a sementinha
foram as construções produzidas a partir da
necessita para nascer, onde a professora foi o
escriba; realizamos experiências com bonecos proposta das assessorias, das práticas pedagó-
ecológicos utilizando meia, alpiste e serragem, gicas implementadas e da importância que este
112
RESSIGNIFICANDO SABERES A PARTIR DO PROJETO DE ASSESSORAMENTO PROINFÂNCIA UFSM/MEC
Figura 3 – Crianças do MIV em atividade junto a horta construída por elas, a partir do tema proposto pelas professoras.
113
Caroline Silveira Spanevello e Lisandra Locateli Pereira
Deste modo, pode-se aferir que os resul- mada da discussão teórica, da reflexão sobre
tados obtidos foram extremamente positivos a prática e da ressignificação de saberes para
e trouxeram importantes contribuições para o que todo o trabalho desenvolvido ao longo
fazer pedagógico das professores envolvidas, das assessorias não se perca em meio à força
principalmente nas questões relacionadas ainda presente na formação/prática docente,
a não mais a utilização de folhas impressas de uma trajetória histórica de educação infantil
para que as crianças pintassem um desenho que se confunde com assistencialismo e esco-
padronizado ou reproduzissem letras e núme- larização.
ros, o abecedário preso à parede, tomando o Nessa mesma linha de pensamento se-
lugar que poderia ser das produções autôno- gue a preocupação da rede municipal e do po-
mas das crianças. der público em garantir aos docentes todas as
O tempo de espera que subtraía os mo- políticas educacionais capazes de dar-lhes sub-
mentos de brincadeiras no pátio ou dentro de sídio ao trabalho como um todo. Assim, desde
sala, questões relevantes que foram sendo dis- o início do ano de 2014, os professores contam
cutidas e trabalhadas a partir da assessoria do com a disponibilidade de um terço de sua car-
Proinfância. Nesta mesma linha, destacamos ga horária para planejamento, conforme prevê
também a compreensão por parte das docentes a legislação brasileira. Esses passos são dados
da importância de se respeitar as necessidades pensando na promoção da escola de educa-
das crianças e não impor-lhes as vontades dos ção infantil como espaço de aprendizagens
adultos. Exemplo disso foi a aceitação de que em que os professores necessitam deste tem-
cada criança terá seu horário de sono em tem- po, em serviço, para estudos, planejamentos e
pos diferentes, ou não terá horário de sono na reflexões coletivas com seus pares.
escola, prática que antes era entendida como
algo comum à todos ao mesmo tempo. Conclusões
Contudo, há que se considerar que este
é um processo em construção. Muito embora Face ao exposto, é possível concluir que
existam vários relatos de práticas que conside- o trabalho desenvolvido na EMEI, baseado nas
ram a criança como centro do processo traba- assessorias e na proposição de um plano de
lhando à partir da perspectiva da construção ação, apresentou dados importantes e signifi-
do conhecimento, temos percebido, em de- cativos para o entendimento de que a reflexão
terminados momentos, a necessidade da reto-
114
RESSIGNIFICANDO SABERES A PARTIR DO PROJETO DE ASSESSORAMENTO PROINFÂNCIA UFSM/MEC
115
6
A MÚSICA COMO PROPOSTA DE CANTO E ENCANTO
NA EDUCAÇÃO INFANTIL
117
Patricia Storck Ghisleni, Neide Inez Werle e Marcia Spezia
Nessa direção, entendemos que a mú- entre a música e o ser. Considerando que desta
sica na educação infantil, de um modo geral, interação resulta uma produção musical, Bri-
sofreu (e ainda sofre) com conceitos equivo- to (2003) nos sugere que a mesma ocorra por
cados, sendo utilizada para condicionar mo- meio de dois eixos, sejam estes a criação e a
mentos do cotidiano como a hora do lanche, reprodução, que garantem três possibilidades
de dormir, de ir embora, tornando essa expe- de ação: interpretação, improvisação e com-
riência musical vazia e sem significado, uma posição. Assim, durante o desenvolvimento do
vez que a criança somente estará reproduzin- projeto, nos preocupamos em realizar experi-
do o que lhe fora ensinado, sem uma reflexão mentações e oportunizar situações que des-
ou experimentação possível. Neste sentido, as sem conta destes eixos.
ponderações desta natureza nos mobilizaram Ainda, de acordo com a autora, é rele-
para qualificarmos nossa prática cotidiana. vante conceituar que a interpretação se ca-
racteriza pela qualidade da apropriação do
O nascimento do projeto de música conhecimento musical e sua relação com suas
vivências e experiências afetivas, não se tra-
Aliando a importância de realizar um tra- tando apenas de uma simples imitação. O que
balho de qualidade com a linguagem musical, nos faz refletir acerca de práticas que reforçam
sentíamos a necessidade de também desen- a preocupação em as crianças repetirem músi-
volver práticas coletivas que integrassem os cas da forma exata como estas lhe são repassa-
grupos de crianças e possibilitassem a intera- das, sem permitir que estas envolvam-se com a
ção das diferentes idades. Segundo as Dire- música, sensibilizando-se com esta.
trizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil (2010, p. 25), “as práticas pedagógicas Os seres humanos estão imersos no ambiente
sonoro desde antes do seu nascimento. Estu-
da educação infantil devem ter como eixos
dos demonstram que os bebês desenvolvem
norteadores as interações e brincadeiras”. Par- capacidades surpreendentemente precoces
tindo deste pressuposto, consideramos a pre- de percepção e compreensão dos fenômenos
valência do lúdico enquanto organizador das sonoros, ainda dentro do útero materno. Ao
nascer, as crianças iniciam sua participação
ações que estaríamos realizando.
num mundo repleto de sons e música, que
Passamos a acreditar, a partir dos apro- durante toda a vida integrarão suas formas
fundamentos teóricos (BRITO, 2003), que o fa- de se comunicar e de falar (OLIVEIRA, 2012,
zer musical acontece quando existe interação p.144).
118
A MÚSICA COMO PROPOSTA DE CANTO E ENCANTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
119
Patricia Storck Ghisleni, Neide Inez Werle e Marcia Spezia
dem totalmente, elas vão e vem transforman- jetos do cotidiano, por instrumentos musicais
acústicos, elétricos (...)”. (Brito, 2003, p. 59).
do-se, exercitando a imaginação a capacidade
de criação e transformando em som aquilo que
deseja. Como forma de abordar a improvisação Desta forma, utilizamos uma variedade
foram oportunizados momentos de criação li- de materiais sonoros, como chocalhos, reco-
vre para as crianças reelaborarem cantigas que -reco, clavas e sinos, estimulando as crianças a
lhes eram familiares e também exploradas em inicialmente explorarem os instrumentos e os
nosso dia-a-dia, criando paródias. Como, por sons produzidos por estes, para posteriormen-
exemplo, com a cantiga “Atirei o pau no gato” te iniciarem a criação e improvisação.
onde as crianças substituíam palavras a partir De acordo com Maffioletti (1998, p.118):
das combinações feitas.
As crianças precisam ter experiências concre-
Segundo Brito, a composição caracteri- tas com objetos que emitem sons, instrumen-
za-se pelo registro musical na tentativa de pre- tos musicais ou outros e formar um vocabulá-
servá-lo, pressupondo o entendimento daque- rio específico para se referir a eventos sonoros.
le que a lê. A criança representa graficamente o
som de uma forma próxima a que ela percebe Através do manuseio destes materiais
e executa, seja pelo registro na memória, por construímos diversas aprendizagens, tais como
gravação ou ainda notação (BRITO, 2013). Com a classificação de sons (forte, fraco), sequências
o intuito de desenvolver práticas relacionadas (pandeiro, violão, pandeiro, flauta, pandeiro),
ao registro musical consideramos como regis- noção temporal (antes, depois), duração (mui-
tro a apropriação da canção ou utilizando re- to, pouco tempo).
cursos simbólicos como sinais, uma vez que Segundo Brito (2003), na educação infantil
nossos pequenos ainda não se apropriaram da é possível reunir uma grande variedade de mate-
linguagem escrita convencional. riais sonoros, sendo, inicialmente, indicados ins-
Assim, através de construções coletivas, trumentos musicais pelos quais os sons são pro-
realizamos alguns registros musicais com linhas, duzidos pelo próprio corpo dos instrumentos,
decalques de mãos e pés, figuras recortadas, de- como chocalho, reco-reco, clavas, sinos e outros.
senhos de símbolos, entre outras situações. A autora ainda sugere que, posteriormente, ati-
vidades com materiais que necessitam de maior
Chamamos de fontes sonoras todo e qualquer coordenação motora são interessantes por esti-
material produtor e propagador de sons: pro- mularem a criança para a criação e improvisação.
duzidos pelo corpo humano, pela voz, por ob-
120
A MÚSICA COMO PROPOSTA DE CANTO E ENCANTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
IMAGEM 2: Alunos do Maternal manuseando instrumentos musicais convencionais e outros construídos com materiais alternativos.
121
Patricia Storck Ghisleni, Neide Inez Werle e Marcia Spezia
122
A MÚSICA COMO PROPOSTA DE CANTO E ENCANTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
de acordo com Brito (2003), para o entendi- quais eram os recursos disponíveis, bem como
mento de questões elementares referente a a evolução destes materiais sonoros. Também
produção dos sons e suas qualidades, sendo foi proporcionado momentos de exploração
que a construção de instrumentos estimula a de instrumentos originais, como o pandeiro,
pesquisa, a imaginação, o planejamento, a or- clavas, tambor, violão, com os quais foram rea-
ganização e a criatividade. lizados momentos de cantigas, exploração e
Em acordo com a autora, esta constru- manuseio pelas crianças.
ção pode ser mais rica se estabelecemos rela- Segundo Brito (2003), as crianças, por
ções com a história deste instrumento, com volta de quatro a cinco anos, passam a expres-
seu papel nas diferentes culturas, refazendo o sar-se através do jogo simbólico, representan-
caminho traçado pela humanidade na busca de do em suas brincadeiras a realidade, que está
meios para a expressão musical. (BRITO, 2003). diretamente relacionada às suas vivências afe-
O que foi estabelecido durante a construção e tivas. Inclusive, utilizando-se, nesses jogos de
efetivação do projeto, em situações de rodinha, faz de conta, da representação de sons e ges-
nas quais buscamos conversar com as crianças tos, que fazem parte de suas vivências, como
sobre a criação dos primeiros instrumentos quando imitam o som de um carro, ao mesmo
pela humanidade, como eram confeccionados, tempo em que brincam de dirigi-lo.
123
Patricia Storck Ghisleni, Neide Inez Werle e Marcia Spezia
124
A MÚSICA COMO PROPOSTA DE CANTO E ENCANTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Aprendizagens para além do projeto: BRITTO, Teca Alencar de. Música na Educação
considerações finais Infantil, propostas para a formação integral
da criança. São Paulo: Pierópolis, 2003.
Acreditamos que muito ainda temos para MAFFIOLETTI, Leda de Albuquerque. Práticas
construir, a fim de ampliar a formação musical musicais na escolar infantil. In: CRAIDY, Car-
de nossos pequenos, uma vez que o estudo rea- mem Maria e KAERCHER, Gladis Elise Pereira
lizado a partir do projeto Proinfância, da Univer- da Silva. Educação Infantil: p’ra que te quero?
sidade Federal de Santa Maria, nos possibilitou Porto Alegre: UFRGS/Governo do Estado do RS,
esclarecer o quanto esta linguagem é importan- 1998.
te para o desenvolvimento integral de nossas
OLIVEIRA, Zilma Ramos de (org.) O trabalho
crianças. Concordamos que temos o compro-
do professor da Educação Infantil. São Pau-
misso de continuar investindo neste trabalho.
lo: Biruta, 2012.
Assim, acreditando que é na ação e re-
flexão de nossas práticas, aliada a discussão PIZZATO, Miriam Suzana. Brincando com a
com nossos pares na escola, que poderemos escuta musical na educação infantil. Revista
ampliar e aprimorar o que já fazemos, temos a Pátio – Educação Infantil, Ano XI nº35, abr/jun,
convicção de que necessitamos continuar em 2013.
nosso processo de busca para conhecer ainda
mais os elementos que compõem essa lingua-
gem e as possibilidades metodológicas que
possam favorecer o desenvolvimento musical
das crianças. Pois, com o pouco que fizemos,
podemos visualizar o tanto que ainda podere-
mos fazer.
125
7
OS BEBÊS NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
TRANSFORMAÇÕES NA AÇÃO PEDAGÓGICA
127
Neusa Maria Gregory, Marli Spellmeier e Berta Carina Sippel
128
OS BEBÊS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: TRANSFORMAÇÕES NA AÇÃO PEDAGÓGICA
berçário, inclusive explorando espaços diversos. mos almofadas, cortinas coloridas, tapetes com
Oportunizando, ainda, interações qualificadas diferentes texturas, como forma de organizar o
entre os bebês e nós professoras, bem como ambiente a fim de propiciar a exploração e tam-
dos bebês entre eles (STAMBAK et al., 2011). bém a interação dos bebês. Porque, segundo
Assim, procuramos oferecer experiências Fortuna e Silva (2013, p.5) “para promover o brin-
com brinquedos de texturas diferenciadas, tra- car das crianças bem pequenas, é essencial um
zendo materiais como retalhos de madeiras e ambiente apropriadamente estimulante e uma
blocos para construção, que puderam ser ma- interação qualificada”. Que instigue a interação
nipulados, empilhados, jogados, rolados, expe- dos bebês com os espaços e materiais oferecidos.
rimentados em diferentes posições e composi- Com o intuito de oferecer uma maior
ções. Chocalhos, latas com pedrinhas e garrafas gama de experimentações, promovemos ex-
pet pequenas, objetos usados como brinquedos plorações com gelatinas de vários sabores, cre-
sonoros que foram manipulados e explorados mes com maizena para que eles colocassem
em diferentes possibilidades de sons e ritmos. as mãozinhas ou tintas, sentindo as texturas
Com estes materiais objetivamos, em e temperaturas (mole, duro, gelado e mor-
especial, despertar diferentes interesses nos no), como também experimentar os sabores e
bebês, ampliando suas experiências, estimu- nos dias de calor também proporcionamos o
lando os sentidos, a fim de que, ao explorar e
experimentar os objetos, entendam o mundo
em que vivem. Construímos móbiles que opor-
tunizavam diferentes propostas e objetos ao
alcance das crianças que poderiam ser movi-
mentados por elas ou apenas admirados em
seus movimentos, cores e formas, feitos com
fios ou elásticos, bichinhos para morder, den-
tre outros elementos que promovessem a ex-
ploração sensorial dos bebês, inclusive com a
boca, pois é pertinente que consideremos que
é, em geral, através da boca, que o bebê faz
suas primeiras experimentações sensoriais.
Construímos cantinhos nos quais dispo- IMAGEM1: Crianças manuseando tintas.
129
Neusa Maria Gregory, Marli Spellmeier e Berta Carina Sippel
brincar com areia e água, sempre instigando a e caminhões que passavam, gatos e cachorros
curiosidade das crianças bem pequenas. que caminhavam no nosso trajeto.
Tendo a intenção de oportunizar experi- Realizamos alguns passeios particular-
ências em espaços diferentes ao que a turma mente interessantes a um parque próximo a
estava acostumada, incorporamos, na rotina escola. E foi predominante, durante estes mo-
dos bebês, passeios nos arredores da escola, mentos, um clima de festa, pois brincavam e
para isso utilizamos uma carretinha, onde os interagiam com a terra e a areia, apreciando os
mesmos eram “puxados” pelas professoras. canteiros de flores e aquilo que encontravam
Fazendo várias paradas no caminho, para que pelo caminho. O que nos chamou atenção foi
instigássemos com perguntas sobre o meio que as crianças ficavam maravilhadas ao en-
ambiente, estimulando a observação e a aten- contrarem pequenos insetos como formigas,
ção a tudo o que nos rodeia, como árvores, flo- borboletas e também minhocas, dando gritos
res, casas, pessoas caminhando na rua, carros e risadas de alegria, querendo pegá-los. Então,
aproveitamos a oportunidade para realizar ob-
servações e conversações, mostrando a eles que
a natureza é linda e devemos amá-la e cuidá-la,
construindo uma perspectiva de cidadãos parti-
cipativos e conscientes. O que salientamos com
130
OS BEBÊS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: TRANSFORMAÇÕES NA AÇÃO PEDAGÓGICA
131
Neusa Maria Gregory, Marli Spellmeier e Berta Carina Sippel
explorados como outros quaisquer (ORTIZ, a fruta do conde, mas mesmo assim, tiveram a
CARVALHO, 2012, p.126).
curiosidade de experimentá-las.
A partir do material e do vídeo sobre o O mesmo trabalho realizamos com as
“Cesto dos Tesouros” (GOLDSCHMIED, 2005) verduras, momento no qual demonstraram
realizamos um trabalho de releitura da pro- curiosidade em ver a professora cortar o pepi-
posta, relacionando à alimentação saudável, no, observando as sementinhas. Desfolhar o pé
construindo o cesto dos tesouros com frutas, de alface também envolveu a todos. Vimos as
inserindo variados tipos de frutas, oferecidas as mais diversas reações nos rostinhos dos bebês,
crianças para a exploração dos sentidos, como cheirando, mordendo, experimentando outros
a visão, a partir da observação, com o tato, e sabores, mas também se negando a experi-
a percepção das texturas, do olfato e o aroma mentar certas frutas e verduras.
das frutas, e logo mostraram interesse em ex-
perimentar, explorando o paladar e desenvol- Discussão dos Resultados
vendo suas preferências sobre a alimentação.
No decorrer da exploração com a cesta das fru- Foi possível observar que, a cada dia, os
tas, observamos que muitos bebês não conhe- bebês avançavam e se desenvolviam em todos
ciam algumas frutas como o maracujá, a lima e os sentidos. Percebemos isso durante as diver-
sas explorações realizadas, através das brinca-
deiras direcionadas para despertar a curiosida-
de e dentre as brincadeiras organizadas pelos
bebês, o que nos fez refletir sobre a contribui-
ção que nossa prática/ação docente possibilita
aos bem pequenos, na direção de descobrir o
mundo, formando pessoas conscientes, com
amor e respeito aos seus desejos e, mesmo as-
sim, possibilitando uma relação de proximida-
de, entrelaçada pela afetividade.
Compreendemos que é no cotidiano
com os bebês que vamos construindo nosso
fazer pedagógico, identificando o que pode
IMAGEM 5: Cesto dos Tesouros das frutas. ser feito a mais ou mesmo de forma diferente.
132
OS BEBÊS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: TRANSFORMAÇÕES NA AÇÃO PEDAGÓGICA
Fomos construindo e criando novas ações no ir muito além do que, costumeiramente, está-
decorrer do nosso trabalho cotidiano com os vamos habituadas. Tínhamos o desejo de poder
bebês, intervindo de forma a construir possi- incentivar e desafiar nossos bebês e isso nos
bilidades de brincadeiras, facilitando e promo- motivou a buscar alternativas, tornando nossa
vendo as interações entre as crianças. As quais, rotina bem mais divertida e também proveitosa.
já demonstram iniciativas a fim de criar e in- Contudo, estamos sentindo a necessi-
ventar, convidando os parceiros para a brinca- dade de, além de ampliar estas possibilidades,
deira, utilizando objetos variados em suas ex- também repeti-las constantemente. Assim,
perimentações, iniciando jogos simbólicos em acreditamos que além de podermos observar
seu faz de conta, imitando ações dos colegas, reações diversas, também estaremos possibili-
familiares e professoras. tando a ampliação de aprendizagens.
Outro aspecto observado diz respeito a É importante ressaltar que todas as expe-
interação com os demais alunos da Escola, pois rimentações realizadas, nos permitiram perceber
inicialmente os bebês demonstravam muito interesses e necessidades das crianças, fazendo
receio em sair de sua sala e estar em meio a co- com que, cada vez mais, nos sintamos motivadas
legas maiores. Hoje já solicitam, a sua maneira, a criar e promover novas situações de aprendi-
o desejo de irem ao pátio ou de brincarem com zagens. Assim, também, buscar fundamentação
outras crianças, aprimorando sua socialização. para compreender com maior clareza o desen-
O desenvolvimento integral vem acontecendo volvimento da criança e as formas mais instigan-
de muitas formas, acreditamos que, em parte, tes de mediação como educadoras.
devido à variedade de espaços nos quais po-
dem andar, correr, brincar, vencendo obstácu- Referências bibliográficas
los que em sala de aula pouco teriam oportu-
nidade.
BARBOSA, Maria Carmem. Especificidades da
ação pedagógica com os bebês. In: Anais... I
Conclusão
Seminário Nacional: Currículo em Movimento
– Perspectivas atuais. Belo Horizonte, 2010.
Ao iniciarmos nosso trabalho com o gru-
po de bebês da escola, fomos descobrindo, COUTINHO, Angela Scalabrin. A prática do-
principalmente junto a estes, suas potencialida- cente com os bebês. Revista Pátio – Educação
des e assim percebendo o quanto poderíamos Infantil. Ano XI, nº35 ABR/JUN, 2013.
133
Neusa Maria Gregory, Marli Spellmeier e Berta Carina Sippel
134
136
8
RESSIGNIFICANDO AS PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO
NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Introdução
Para a Educação Infantil a avaliação é concebi-
da como um processo de acompanhamento
Falar em avaliação sempre mobiliza os do desenvolvimento individual e coletivo do
professores. Por mais que se estude, se discu- aluno nos aspectos social, afetivo, cognitivo e
ta, reflita, o assunto nunca se esgota e sem- psicomotor, sempre tendo como referência as
fases evolutivas da criança, respeitando o de-
pre parece novo. Sempre é tarefa difícil, para senvolvimento e progresso de cada um den-
qualquer profissional da educação, por repre- tro do seu próprio tempo (PPP, 2012).
sentar uma responsabilidade muito grande
em função de seu caráter subjetivo. Compro- Desta forma, ao “olharmos” criticamen-
metendo e envolvendo o professor, pois ele te, para os registros de avaliação que conti-
irá estabelecer com cada criança, maiores ou nuamente estamos produzindo, procuramos,
menores, vínculos intelectuais e afetivos. Esta primeiramente, contemplar nossa Proposta
Pedagógica, mas também buscamos funda-
tomada de consciência é relevante para po-
mentação nas Diretrizes Curriculares para a
der refletir e não incorrer em preconceitos e
Educação Infantil (BRASIL, 2009) e materiais
prejulgamentos.
oferecidos pela assessoria do projeto Proinfân-
Na Educação Infantil não é diferente,
cia, da Universidade Federal de Santa Maria.
pois a avaliação, não possui a finalidade de pro- Quando iniciamos nossa caminhada
moção, como no Ensino Fundamental. Como em 2011, antes mesmo de termos elaborado
aponta nossa Proposta Pedagógica: nossa Proposta Pedagógica e Regimento
137
Cornélia Maria Spies Danzer, Mara Regina Leidemer e Renata Fabiana Larssen
próprio, fomos orientados pela Secretaria devido ao fato de que, muitas vezes, a criança
de Educação para, em conformidade com o reage de diferentes formas com uma e com
Regimento Municipal, as avaliações seriam outra e também devido às diferentes percep-
trimestrais e em forma de relatórios. Hoje, ções. O que para uma pode chamar atenção,
isso está contemplado em nossa Proposta para outra pode passar despercebido. Assim, é
Pedagógica: importante haver a possibilidade de encontro
entre essas pessoas, para discussão e compar-
A avaliação será feita mediante acompanha- tilhamento das percepções sobre cada criança.
mento, intervenção, registros individuais de
O que vem funcionando muito bem são
seu desenvolvimento e considerando os di-
ferentes instrumentos de avaliação, sem o os registros em forma de anedotário, onde
objetivo de promoção, mesmo para acesso ao todas têm acesso e podem registrar suas per-
ensino fundamental e registrado em forma de cepções em relação às crianças, o que tem sido
relatórios de avaliação, entregues trimestral-
muito útil na hora de elaborar os relatórios. Nos
mente aos pais (PPP, 2012).
primeiros relatórios construídos, percebia-se
uma predominância em relação ao comporta-
Desde o início, as professoras e monitoras
mento e a convivência no grupo, aspectos cog-
foram orientadas para ter um caderno na sala
nitivos apareciam em alguns momentos. Con-
onde todas as profissionais teriam acesso para
tudo, se enfocava o que a criança ainda não
registrar tudo o que acontece, tanto no período
tinha atingido, não sendo mencionado o que
da manhã, quanto no da tarde. Além dos acon-
ela já dominava e, ainda, seu desenvolvimento
tecimentos da rotina também deveriam ser ano-
quase não era mencionado.
tados observações quanto ao desenvolvimento
Tivemos algumas formações através do
e conquistas das crianças e também atividades e
Projeto Proinfância e da Secretaria Municipal
brincadeiras realizadas. Então, a cada trimestre,
de Educação, refletindo sobre o tema em en-
as professoras, em parceria com as monitoras,
contros com os profissionais das escolas de
elaboraram os relatórios que eram entregues
Educação Infantil analisamos e reescrevemos
à direção que os revisava e fazia as devolutivas
diferentes relatórios e com isso aprendemos
para ajustes necessários.
muito. A partir disso, a escrita dos relatórios
Em função de que para que se construa
seguintes já obteve uma melhora significativa.
uma boa avaliação, se faz necessário a partici-
Percebeu-se um olhar mais atento, uma descri-
pação de todas as pessoas que trabalham com
ção das reações e evoluções de cada criança
a criança, tanto professoras quanto monitoras,
na sua individualidade. Ainda, sentiu-se a ne-
138
RESSIGNIFICANDO AS PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
139
Cornélia Maria Spies Danzer, Mara Regina Leidemer e Renata Fabiana Larssen
Então, analisando o que uma criança é Sendo assim, a avaliação está sempre pre-
capaz de fazer em cada faixa etária, de acordo sente no fazer pedagógico. Quando o professor
com as fases do desenvolvimento infantil, per- observa e percebe se as crianças aprenderam o
cebe-se quando as situações que estão sendo que se pretendeu no planejamento ou se apren-
oferecidas contribuem para o seu desenvol- deram outras coisas igualmente interessante, se
vimento. Assim como, o que necessita de um é preciso introduzir outras atividades, ou ainda
replanejamento, a fim de que a criança possa se a atividade programada deve ser adiada. As-
continuar avançando. Isso vem ao encontro do sim, estará em constante busca de alternativas,
que defende Vygotsky: para alcançar seus objetivos.
O professor não deve levar em conta, como Para Jussara Hoffmann (2012, p. 14 e 15):
ponto de partida para a ação pedagógica,
apenas o que a criança já conhece ou faz,
Mesmo que se acompanhe e conheça todas
mas, principalmente, deve levar em conta
as reações de uma criança, não se estará ava-
suas potencialidades cognitivas, fazendo ou-
liando, no sentido pleno, se a intenção não
tros desafios e mais exigentes no sentido de
for a de auxiliá-la, de um fazer pedagógico
envolvê-las em novas situações de modo a
que contribua para o seu desenvolvimento.
provocá-las, permanentemente, à supera-
Avaliar, na concepção mediadora, portanto,
ção cognitiva (VYGOTSKY apud HOFFMANN,
engloba, necessariamente, a intervenção pe-
2012, p. 21).
dagógica. Não basta estar ao lado da criança,
observando-a. Planejar atividades e práticas
É preciso sempre se deixar uma porta pedagógicas, redefinir posturas, reorganizar
aberta e mostrar confiança nas possibilidades o ambiente de aprendizagem e outras ações,
com base no que se observa, são procedi-
das crianças, refletindo sobre o que agora ain-
mentos inerentes ao processo avaliativo. Sem
da não é capaz de realizar, mas o que podemos a ação pedagógica, não se completa o ciclo da
fazer para que mais tarde ela consiga. avaliação na sua concepção de continuidade,
De acordo com Bassedas (1999 p. 178 - 179): de ação-reflexão-ação.
É preciso recolher dados, observar, obter in- Nesse sentido, os relatórios de avaliação
formações sobre o que as crianças são capa- representam, ao mesmo tempo, reflexo do traba-
zes de fazer, porém, o que realmente importa
lho, reflexão e abertura a novas possibilidades.
é que tais informações sejam úteis para poder
tomar decisões, para poder ajudar os meninos Ao registrar o que observa, o professor reflete so-
e as meninas e para propor-lhes um ensino bre a evolução de seu trabalho e revela a dimen-
cada vez mais ajustado às suas necessidades.
140
RESSIGNIFICANDO AS PRÁTICAS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
são qualitativa do seu agir pedagógico, de suas panhar o trabalho realizado e apreciar seus
concepções e posturas diante dos seus alunos. filhos interagindo em diferentes situações, até
Assim, com base no acompanhamento se surpreendendo em ações que em casa não
que temos realizado, tanto do trabalho, pla- são propostas ainda, tais como a participação
nejamento e registros, é possível que perce- na organização, autonomia quanto à alimenta-
bamos as necessidades de ações, reflexões e ção, trocas de roupas, amarrar cadarços, entre
estudos junto ao grupo de educadoras. Tendo outros. Ainda se realiza o registro em forma de
como objetivo principal a qualificação de nos- vídeos que são utilizados em sala para que as
sas práticas pedagógicas e, por conseguinte a crianças possam se ver em cena.
qualidade de nosso atendimento às crianças. Os registros em fotos e vídeos passaram
a ser selecionados e compactados para serem
Discussão de Resultados apresentados para os pais em momentos de
reuniões nas entregas de avaliações. Isso refor-
Durante nossa caminhada, com os apro- ça a confiança e fortalece o vínculo entre es-
fundamentos teóricos a partir dos estudos rea- cola e família, pois uma vez que a família toma
lizados e com a orientação do grupo da UFSM, conhecimento do trabalho que é feito na esco-
através do Projeto Proinfância, percebemos la, a satisfação aumenta e para a escola é moti-
que houveram muitos avanços em relação vação para melhorar cada vez mais.
à avaliação das crianças e também do fazer No retorno dos questionários envia-
pedagógico das educadoras. Aprendemos a dos aos pais isso foi perceptível com a grande
relacionar melhor a teoria com a prática, a es- maioria sugerindo que se continuasse o bom
tabelecer objetivos mais claros e a registrar as trabalho que já vem sendo realizado, enalte-
situações, reações e evoluções das crianças, cendo o trabalho com a horta e o contato com
utilizando diferentes subsídios para tal. a natureza, os momentos de dramatizações e
Adotamos o anedotário onde cada contato com a literatura, brincadeiras coleti-
criança tem um espaço específico num cader- vas, as integrações entre escola e famílias. Com
no e cada educadora tem acesso para fazer o isso tudo, se percebe o grupo de profissionais
registro de suas percepções em relação a cada motivado a buscar ainda mais conhecimentos
uma delas. Também intensificamos o regis- através da leitura e momentos de formação
continuada para aprimorar o trabalho na edu-
tro por fotos, expostas em painéis pela Escola
cação infantil.
onde os pais e a comunidade podem acom-
141
Cornélia Maria Spies Danzer, Mara Regina Leidemer e Renata Fabiana Larssen
Conclusão
Referências bibliográficas
142
9
POR UM MUNDO MAIS COLORIDO: CONHECENDO E
APRENDENDO MAIS SOBRE DIVERSIDADE RACIAL
145
Moira Poema Closs Gaspar, Janete Cândida Sulzbach Bilo e Miriam Beatriz Röhsler dos Santos
Figura 1 As crianças explorando dedoches construídos a partir de Literatura Infantil sobre a temática da Diversidade Racial.
146
POR UM MUNDO MAIS COLORIDO: CONHECENDO E APRENDENDO MAIS SOBRE DIVERSIDADE RACIAL
Assim, ao ser definido o projeto anual, crianças, e suas curiosidades e necessidades, sem
fica a critério do professor trabalhar a temática deixar de contemplar os objetivos da proposta.
do projeto central dividindo-a em pequenos A partir das Diretrizes Curriculares da
projetos ao longo do ano letivo que abranjam Educação Infantil (BRASIL, 2009) buscou-se as-
a temática proposta anualmente. As temáticas segurar o “reconhecimento, a valorização, o
são trabalhadas de maneira integral através respeito e a interação das crianças com as his-
da ludicidade e de atividades do cotidiano. As tórias e as culturas africanas, afro-brasileiras,
atividades desenvolvidas buscam a integração bem como o combate ao racismo e à discrimi-
das turmas e equipe pedagógica, buscando nação”. A dignidade da criança como pessoa
uma formação integral. humana e a proteção contra qualquer forma
Dessa forma, nesta proposta aqui apresen- de violência – física ou simbólica – e negligên-
tada, buscamos trabalhar os conceitos de diversi- cia no interior da instituição ou praticadas pela
dade, de respeito, de conhecimento, de direitos família, prevendo os encaminhamentos de vio-
e de igualdade, respeitando a faixa etária das lações para instâncias competentes.” (BRASIL,
2005).
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Moira Poema Closs Gaspar, Janete Cândida Sulzbach Bilo e Miriam Beatriz Röhsler dos Santos
Assim, traçaram-se como objetivos: abor- todo o processo da proposta buscamos reno-
dar o preconceito contra os afro-brasileiros e var as atividades e adaptá-las aos resultados
trabalhar a temática de forma a combatê-lo; que vínhamos coletando.
instigar a construção de conhecimento sobre a O projeto utilizou como instrumentos
Temática Afro-brasileira já a partir da Educação materiais diversos, como revistas, literatura in-
Infantil; possibilitar a construção de uma rede fantil, bonecas, materiais de uso pedagógico
de conhecimento sobre a cultura afro-brasilei- para produção de material, músicas, massa de
ra; desenvolver uma proposta inovadora, que modelar, vídeos do Youtube, culinária, pesquisa
contemple ludicidade, criatividade e conhe- de interesse junto aos pais e construção de bo-
cimento de forma integral; respeitar a criança neco. Os materiais eram disponibilizados pela
como um ser social construtor e propagador turma, alguns pela escola e alguns dos pais.
de identidade e cultura; explorar as curiosida- Durante toda a proposta íamos perce-
des, ansiedades e dúvidas das crianças em re- bendo as necessidades das atividades e pla-
lação a diversidade racial, desvendando os pre- nejando os materiais de apoio. Muitas vezes
conceitos e transformando-os em sementes de era preciso um replanejamento adaptando os
conhecimento; trabalhar a temática de forma a materiais conforme os valores disponibilizados
propiciar a construção de uma rede de conhe- para o desenvolvimento, a disponibilidade em
cimentos entre escola, família e sociedade, ins- nosso bairro e a capacidade de compreensão
tigando conhecimentos e a propagação deles. das crianças no uso do material ou em sua
Ao propor traçar esses objetivos para a manipulação. Apresentamos a proposta para
proposta pedagógica buscamos sempre estar os alunos a partir de uma necessidade da tur-
consciente das necessidades da turma, da ma, pois percebeu-se que as crianças, algumas
escola e do bairro e da relevância de buscar vezes, utilizavam de termos pejorativos ao se
alcançá-los nas atividades desenvolvidas, para referirem aos colegas negros ou alguém negro
que de forma geral, todas as atividades viessem (professora, mãe de colegas, pai de colegas,
ao encontro dos objetivos, dialogando entre si etc.). Falavam por exemplo “a mãe negrinha”;
e buscando objetivos comuns. “ela é pretinha”; “mas ela é preta né?”, ou até
Para organizar a proposta estudamos mesmo nas brincadeiras quando optavam por
sobre a temática em diversas fontes de ma- sentar ao lado de outros colegas.
teriais, e após o aporte teórico, planejamos e Partindo disso, em um momento de in-
traçamos os passos principais de desenvolvi- tervenção de uma dessas percebeu-se que o
mento da proposta com as crianças. Durante tema estava latente e precisando ser trabalha-
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POR UM MUNDO MAIS COLORIDO: CONHECENDO E APRENDENDO MAIS SOBRE DIVERSIDADE RACIAL
do com as crianças. Enquanto não nos debruçá- forma mais metafórica, onde distribuíamos as
vamos na proposta íamos observando as falas bonecas livremente e apenas observávamos as
e as interações da turma para perceber quais crianças em suas brincadeiras, percebendo as
seriam as reais necessidades da proposta. evoluções do tema nas brincadeiras de faz-de-
Iniciamos a proposta com uma pesquisa -conta. Outra atividade que desenvolvemos foi
junto aos pais, com um questionário, pergun- a exploração de literaturas Infantis que abor-
tando sobre a cultura negra, o que conheciam, dam a temática da diversidade racial, focada
se já haviam presenciado algum caso de pre- principalmente na cultura negra.
conceito e de como passavam as informações Abordamos os livros Infantis diversifica-
e conhecimentos relativos a diversidade racial dos como Manuela (Regina Rennó), Menino
para as crianças. Os pais colaboraram e retor- Marrom (Ziraldo), Bruno e a Galinha d’ Angola
naram o questionário com participação. (Geralga de Almeida), Minha família é colorida
A segunda atividade, que partiu dessas (Georgina Martins), A bonequinha Preta (Alaí-
respostas coletadas com os pais, baseou-se em de Lisboa de Oliveira), Minha mãe é negra sim!
ofertar duas bonecas as crianças, uma boneca (Patrícia Santana), As cores de Mateus (Marisa
branca e uma negra, e pedir que as crianças Lopez Soria), Betina (Wilma Lino Gomes), entre
manipulassem ambas em uma roda de conver- outros livros infantis (O cabelo de Lelê, As pan-
sa. Primeiramente oferecemos a boneca branca quecas de Mama Pany, As tranças de Bintou).
e orientamos que deveriam tocá-la (deixamos Nas literaturas exploramos o enredo, os per-
que cada criança pegasse e tocasse a boneca sonagens e construímos registros como dese-
de sua forma) e depois oferecemos a boneca nhos, pintura e dedoches.
negra e orientamos sob o mesmo enfoque. Construímos também um boneco gran-
Após, em uma roda de conversa fala- de “João da Silva” que visitou as crianças em
mos sobre como foi a reação das crianças e se suas casas como um convite ao diálogo sobre a
aconteceram diferentes contatos nas duas bo- diversidade racial e o preconceito, envolvendo
necas, explorando a observação e as análises os pais. Os pais se mostraram participativos, e
das crianças. Algumas crianças hesitaram em entusiasmados com a proposta. A parceria dos
encostar-se à boneca negra e isso foi apontado pais nos projetos e propostas precisa sim ser
pelas demais, e então, intervimos e repetimos bem enfatizada e construída, pois quando se
a atividade. Essa atividade sempre foi retoma- deixa a desejar na constituição desse elo, per-
da durante o processo, mas algumas vezes de de-se um dos objetivos do projeto que é esse
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Moira Poema Closs Gaspar, Janete Cândida Sulzbach Bilo e Miriam Beatriz Röhsler dos Santos
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POR UM MUNDO MAIS COLORIDO: CONHECENDO E APRENDENDO MAIS SOBRE DIVERSIDADE RACIAL
(mesmo que algumas vezes tendo que serem trabalhados, dentro do plano de ação e meto-
chamados para um compromisso maior e de dologia do projeto uma educação voltada para
maior dedicação frente aos nossos objetivos) a cidadania, a diversidade e a isonomia. Dentro
e conseguimos conjuntamente atingir os do desenvolvimento da proposta pedagógi-
objetivos propostos. ca foram alcançados os objetivos, dentro das
Os maiores resultados estão nas crianças, possibilidades e alcances da faixa etária e da
pois perceber no cotidiano as ricas aprendiza- comunidade escolar. Foi construída uma rede
gens e experiências por elas vivenciadas, e a de conhecimentos sobre a cultura afro-brasi-
transformação por elas construida é algo que leira, que possibilitou explorar as ansiedades e
por si só mostra o quão relevante foi a temática dúvidas das crianças em relação a diversidade
e a proposta para eles e as familias. O elo que racial, desvendando os preconceitos e trans-
construimos, como professora com os pais, formando-os em sementes de conhecimento.
e as crianças com as educadoras e seus pais, Ainda durante toda a proposta conseguimos,
permitiu crescermos juntos e criamos uma com um olhar atento, respeitar a criança como
“missão” de conhecimento. Esse projeto serviu um ser social construtor e propagador de iden-
como um dispositivo que pode contribuir no tidade e cultura, acompanhando e instigando
processo de formação das crianças como cida- o seu desenvolvimento dentro de sua faixa etá-
dãs de uma sociedade voltada para a diversi- ria e de seus desejos. A proposta ainda conse-
dade racial. guiu envolver a comunidade escolar nos seus
objetivos, propagando a temática e ampliando
Conclusão sua rede de alcance, engajando um grupo de
sujeitos capazes de potencializar a proposta e
Destarte, com a realização da proposta fazê-la tornar forma e força. A realização deste
pedagógica explorando a temática da Diversi- trabalho demonstra a relevância da temática, a
dade Racial, e assim contemplando Diretrizes efetivação do Currículo para Educação Infantil
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil dentro de uma proposta ativa e que respeite a
(2009) pode-se visualizar e vivenciar transfor- faixa etária, envolvendo a comunidade e per-
mações e construções de conhecimentos a par- mitindo avanços reflexivos.
tir do desenvolvimento do projeto. Como tra-
çado inicialmente como objetivo geral foram
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Moira Poema Closs Gaspar, Janete Cândida Sulzbach Bilo e Miriam Beatriz Röhsler dos Santos
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154
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EDUCAÇÃO INFANTIL:
UM NOVO OLHAR
Falar da creche ou da educação infantil é muito A iniciativa inspirou duas outras: uma no
mais do que falar de uma instituição, de suas
Colégio Menezes Vieira (Rio de Janeiro -1875) e
qualidades e defeitos, da sua necessidade so-
cial ou da sua importância educacional. É falar no Caetano de Campos (São Paulo - 1896), que
da criança. De um ser humano, pequenino, adaptou a pedagogia de Fröebel para a reali-
mas exuberante de vida (DIDONET, 2001). dade brasileira. Em 1924, já eram 47 as institui-
ções entre creches e jardins de infância pelo
As primeiras instituições brasileiras de Brasil, principalmente nas capitais. A partir daí,
atendimento às crianças de zero a cinco anos, muitas creches foram instaladas para atender
segundo RUIZ (2011), surgiram ainda no Império aos filhos dos operários, sempre ligadas à As-
com intuito de amparar as que eram abandona- sistência Social, embora houvesse, em muitos
das nas ruas das cidades, como os orfanatos, os casos, profissionais da área pedagógica orien-
asilos para pobres e a Santa Casa de Misericórdia. tando seu funcionamento.
Um dos pioneiros nessa experiência no A partir de 1980 a sociedade passa a dis-
exterior foi o médico Friedrich Fröebel - ideali- cutir a possibilidade de inclusão das pré-esco-
zador dos Jardins de Infância. Essa ideia chega las na Educação Básica, intenção concretizada
ao Brasil na década de 1870, com divulgação na Constituição de 1988. A Lei de Diretrizes e
no jornal do médico Carlos Costa, e é aplicada Bases da Educação Nacional 9394 de 1996, ra-
na sala de jardim de infância aberta ao lado de tifica essa decisão, enfatizando que a Educação
uma igreja protestante americana instalada é um direito da criança e que deve, portanto,
em São Paulo. ser universal.
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Nilza Maria FissScapin e Raquel MirandaKeisman
156
EDUCAÇÃO INFANTIL, UM NOVO OLHAR
do-a de brincar e até mesmo de ser criança. E humanos estava dentro do esperado, mas e a
a escola, enquanto instituição encarregada de parte pedagógica? Como desenvolveríamos a
formar tais sujeitos, precisa rever seus padrões nossa prática que além de cuidar deveria prin-
pedagógicos. cipalmente educar?
Desfazer a linearidade que forma a es-
cola tradicional, e transformá-la numa escola Educar significa, portanto, propiciar situações
de cuidados, brincadeiras e aprendizagens
dinâmica, crítica-reflexiva e construtiva, o que
orientadas de forma integrada e que possam
se torna um desafio a ser vencido pelos pro- contribuir para o desenvolvimento das capaci-
fissionais da educação. Para que pudéssemos dades infantis de relação interpessoal, de ser e
atender a este novo modelo de Educação In- estar com os outros, em uma atitude de acei-
tação, respeito e confiança, e o acesso pelas
fantil, fomos em busca não só de uma nova
crianças, aos conhecimentos mais amplos da
metodologia de trabalho, mas também de um realidade social e cultural (BRASIL, 1998a, p. 23).
novo espaço, onde pudéssemos atender a to-
dos com o mínimo de qualidade indispensável Sobre o cuidar, estávamos cientes que
ao desenvolvimento infantil. deveria ser entendido como parte integrante
Fomos contemplados através do Gover- da educação, demandando a integração de vá-
no Federal com o novo modelo de creche do rios campos de conhecimentos e a cooperação
Proinfância. E em junho de 2012 inauguramos de profissionais de diferentes áreas. Mas como
a tão sonhada Escola de Educação Infantil a Es- fazer tudo isto?
cola Municipal de Educação Infantil Dente de Foi então que recebemos a assessoria
Leite Professora Ivani Lurdes Barchet Tessele. pedagógica do programa Proinfância, atra-
Realmente um sonho! Tudo tão bonito... As sa- vés da Universidade Federal de Santa Maria -
las lindas, mobiliário lindo, tudo perfeito! Mas UFSM, para auxiliar-nos nesta importante fase
como seria nosso trabalho que, de um dia para de transição. A cada visita gerava-se uma crise
o outro, passou de 40 para 100 crianças, pois na escola. A sensação de que toda uma cami-
a educação infantil foi centralizada. Teríamos nhada desenvolvida junto as nossas crianças
que nos adequar a nova realidade, pois de iní- estava sempre errada nos causava desconfor-
cio passamos a atender quatro turmas com alu- to. O novo nos assustava.
nos em dois turnos e outros em turno integral, Sabemos do nosso compromisso em
a maioria com um professor e uma atendente assumir a responsabilidade na educação co-
por turma. A parte física, a parte de recursos letiva das crianças, complementando a ação
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Nilza Maria FissScapin e Raquel MirandaKeisman
das famílias. Sabemos que a criança é um su- tir de dramatizações, contações de histórias,
jeito histórico e de direitos que se desenvolve etc. Percebemos que nós professores temos
nas interações, relações e práticas cotidianas na experiência conjunta com elas a excelente
a ela disponibilizada e, nessas condições ela oportunidade de nos desenvolvermos como
faz amizades, brinca, deseja, aprende, obser- pessoa e como profissionais e, que o importan-
va, conversa, experimenta, constrói sentidos te é apoiar as crianças desde cedo e ao longo
e conceitos sobre o mundo e produz cultura. de suas experiências na Educação Infantil de
Mas como realizar, no dia a dia, atividades pe- modo, a proporcioná-las, diferentes experiên-
dagógicas que concretizassem esta realidade, cias de interações que lhes possibilitem cons-
pois tínhamos o conhecimento nos faltava a truir saberes, fazer amigos, aprender a cuidar
coragem para agir? de si e a conhecer suas próprias preferências e
Com as assessorias conseguimos, aos características, possibilitando sua participação
poucos, ir vencendo as barreiras e começamos em diversas formas de agrupamentos forma-
um trabalho diferente com nossas crianças. dos com base em critérios estritamente peda-
Passamos a compreender melhor que cada gógicos.
criança apresenta um ritmo e uma forma pró- Além desta caminhada, estamos cientes
pria de se relacionar e de interagir. Manifesta que muitos são os desafios que ainda temos
suas emoções e expressa suas curiosidades de que enfrentar em prol de uma educação infan-
forma diferente. E, aos poucos, em nossas reu- til de qualidade tais como: recursos financeiros
niões pedagógicas íamos assumindo nossos para serem aplicados nesta modalidade de
verdadeiros papéis de educadoras e inovando ensino; atendimento a todas as crianças nes-
nosso ambiente de trabalho. ta faixa etária; formação inicial e continuada
E passamos a preparar o nosso ambiente do professor que priorize a integração entre
a cada dia de forma diferente para esperá-los; os cuidados e a educação da criança pequena;
as nossas práticas já não são mais as mesmas; ludicidade como elemento fundamental na or-
nossas salas já não possuem mais classes; pra- ganização do trabalho pedagógico; espaço físi-
teleiras são da altura dos nossos pequenos, fo- co contendo mobiliário e material pedagógico
tocópias eventualmente fazem parte das nos- adequado à idade das crianças; articulação en-
sas atividades pois buscamos intensificar as tre esse nível de ensino e os anos iniciais do en-
atividades que favoreçam às crianças produzi- sino fundamental. Afinal, o nosso maior desa-
rem suas próprias criações, por exemplo, a par- fio será assumir a nossa responsabilidade por
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EDUCAÇÃO INFANTIL, UM NOVO OLHAR
Referências bibliográficas
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POLO DE IJUÍ
11
REFLEXÃO SOBRE ESPAÇO E TEMPO
E O REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
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Claudiane Marta Zamboni, Claudia Maria de Oliveira Becker Spies e Josiele Bedin
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REFLEXÃO SOBRE ESPAÇO E TEMPO E O REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
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Claudiane Marta Zamboni, Claudia Maria de Oliveira Becker Spies e Josiele Bedin
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REFLEXÃO SOBRE ESPAÇO E TEMPO E O REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
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Claudiane Marta Zamboni, Claudia Maria de Oliveira Becker Spies e Josiele Bedin
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12
CONHECENDO O MUNDO ATRAVÉS DOS PASSEIOS
O valor do trabalho com a natureza não está Esta experiência foi realizada com uma
em experimentos sofisticados, mas sim na turma de pré-escola, com crianças de idade
simplicidade das descobertas [...] a coisa não
entre 4 e 5 anos, junto à EMEI Pequeno Polegar
está nem na saída, nem na chegada, mas sim
na travessia[...] (MORAES, 2012). - Professora Gerarda Michels Prante, no Municí-
pio de Quinze de Novembro. Trata-se de uma
O projeto Conhecendo o mundo através pequena comunidade, onde a interação com es-
dos passeios surgiu no início do ano de 2014, paços abertos e o contato com a natureza é favo-
a partir da fala das crianças que, nas rodas de recido. Assim, o objetivo do projeto passou por
conversas e diálogos paralelos, convidavam interagir com o ambiente natural e social com
uns aos outros para passear e conhecer suas autonomia, com a possibilidade de construir a
casas, em discussões animadas sobre itine- identidade de maneira saudável, explorando
rários e outras questões interessantes. Deste aspectos da comunidade por ora desconheci-
modo, a experiência teve origem nas inquie- dos pelas crianças. Estas práticas permitem uma
tações infantis, onde todas as pessoas envol- articulação entre as experiências e saberes das
vidas, desde as crianças, as professoras e até crianças com os aqueles conhecimentos que
mesmo as famílias, tiveram a oportunidade de constituem o patrimônio da humanidade em
construir laços e pertencimentos, permitindo diferentes campos e linguagens, aproximando-
que as aprendizagens fossem mais significati- -se da ideia de currículo para a Educação Infantil
vas e próximas da realidade. (DCNEI, Parecer 20/2009).
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Luciana dos Santos, Elisete de Jesus Kempf e Joice Prediger
172
CONHECENDO O MUNDO ATRAVÉS DOS PASSEIOS
Passeio nos arredores da escola: “eu vou, eu vou, passear agora eu vou...”
173
Luciana dos Santos, Elisete de Jesus Kempf e Joice Prediger
nidade e o meio onde vivem. Os passeios nas dos afetos, percepções e movimentos, permitem
imediações da escola permitiram o conheci- a apropriação de mundo e estão diretamente re-
mento de mundo e diferentes trocas de sabe- lacionadas ao currículo da Educação Infantil.
res. Neste processo as crianças foram desafia-
das a interagir com a natureza, a realizar trocas Essa visão propicia a passagem de uma pers-
pectiva da aprendizagem individual e racio-
de conhecimentos e relações de cooperação e
nal para uma perspectiva social e multidi-
solidariedade. Os diferentes obstáculos e traje- mensional. Destaca-se a concepção de que
tos permitiram o movimento das crianças e a os processos de aprendizagem são racionais,
ampliação da coordenação, bem como a inves- sensoriais, práticos, emocionais e sociais ao
mesmo tempo, isto é, todas as dimensões da
tigação e a descoberta.
vida – a emoção, a cognição, a corporeidade
Todos os passeios foram aguardados com – estão em ação quando se aprende. Portan-
expectativa e curiosidade pelas crianças, que to, as práticas educativas devem levar em
discutiam os itinerários antes mesmo de sair. Ao conta os vários aspectos humanos quando
o objetivo é auxiliar os alunos a interpretar e
chegar aos lugares programados conseguiam
compreender o mundo que os circunda e a si
fazer relação com o que tinham investigado em mesmos. Nesse sentido, para provocar apren-
sala anteriormente e também com as vivências dizagens, é preciso fazer conexões e relações
das famílias. As atividades posteriores, de siste- entre sentimentos, ideias, palavras, gestos e
ações (BARBOSA & HORN, 2008, p. 26).
matização e reflexões sobre os passeios, a partir
174
CONHECENDO O MUNDO ATRAVÉS DOS PASSEIOS
Entendemos que a escola, quando as- artista Romero Britto. A partir desta interação,
sume o papel de mediadora destas vivências, iniciamos o projeto de artes onde analisamos
permite à criança a exploração do mundo que diferentes linguagens, como artes gráficas,
a cerca e amplia suas possibilidades sem um esculturas, modelagens, colagens e pinturas.
tempo e espaço que a limite. Para a evolução Realizamos diferentes trabalhos com olhar
deste processo o conhecimento de si e as ex- sensível e investigativo, culminando em uma
periências são essenciais, pois o conhecimento viagem de estudos a um museu referência em
se constrói com as experiências, permitindo artes plásticas da região, o Museu de Artes Vi-
para a criança formar vínculos com a comuni- suais Ruth Schneider, onde visitamos as exposi-
dade onde vive, colaborando ativamente para ções e realizamos uma oficina de modelagem.
preservar a sua história, a cultura e o ambiente Quando a visita era realizada na casa de
em que está inserida. algum colega, os familiares recepcionavam o
grupo e guiavam o passeio, emprestando os
Passeio e visitas: ao Museu e à brinquedos e apresentando os espaços para
Mostra de antiguidades livre exploração pelas crianças, e oferecendo o
lanche, que era sempre aguardado com gran-
Em visita ao Museu as crianças pude- de expectativa pelas crianças.
ram conhecer materiais produzidos por nossos
antepassados e hoje sem uso na sociedade
tecnológica. O penico, a lamparina e a bota
do gigante que morava na região no século
passado permearam as conversas na sala por
muito tempo. A partir disso muitas investiga-
ções começaram a ser realizadas, despertando
a curiosidade por conhecer o tamanho do pé e
da mão, a altura, o peso, entre outras questões
muito interessantes.
Em visita ao Centro de Referência em
Assistência Social do Município, entre tantos
passeios significativos, tiveram contato com
pinturas dos alunos que estavam estudando o
Passeio na casa de um aluno: “nooossa profe... quantos bichinhos”.
175
Luciana dos Santos, Elisete de Jesus Kempf e Joice Prediger
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CONHECENDO O MUNDO ATRAVÉS DOS PASSEIOS
Referências bibliográficas
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13
METAMORFOSE
Jocemara da Rosa
179
Jocemara da Rosa
Estamos enquanto grupo de trabalho vi- Diante deste desafio, demos início a dois
venciando um pouco deste processo. A partir grandes processos de mudança na escola, en-
da realização de diferentes momentos em for- volvendo todas as pessoas que estão presentes
mações, discussões, estudos e planejamentos, nesse cotidiano, desde as professoras, as auxi-
estamos começando a traçar em conjunto com liares, o administrativo, a cozinha e a limpeza, a
todos os profissionais da escola as estratégias de equipe gestora e até mesmo os pais.
mudança. Estamos conseguindo agregar mais O primeiro processo de mudança foi
qualidade ao trabalho realizado com as crianças. em relação aos espaços das salas. Realizamos
Os resultados estão presentes em dife- adequações, como a instalação de biombos
rentes dimensões da instituição, mas estes só se articulados com as paredes, permitindo mo-
tornaram possíveis por que a equipe inteira se bilidade e versatilidade no uso dos espaços e
comprometeu com a mudança que vem ocor- a tão desejada construção de áreas de interes-
rendo. Em determinados aspectos a mudança é se. Nestes espaços as professoras instalaram
visível, pois diz respeito à adequação de espa- cantinhos temáticos, com pequenos cenários,
ços, mobiliários e materiais. Em outros aspectos onde as crianças têm encontrado a oportuni-
a mudança é lenta, mas contínua, pois diz res- dade de brincar e explorar das mais diferentes
peito a rever concepções e práticas pedagógi- formas. Além da qualificação dos ambientes
cas presentes na relação com as crianças. existentes em cada sala, foi realizada a estrutu-
180
METAMORFOSE
ração de uma brinquedoteca para uso coletivo. em áreas de interesse e também a elaboração
Estas modificações foram levando a uma pro- coletiva de um Plano de Ação com estratégias
gressiva transformação da nossa relação com claras e objetivas, definindo as pessoas res-
o espaço e com os materiais, permitindo tam- ponsáveis e os prazos de realização das ações
bém uma organização diferente dos recursos e tarefas. Este trabalho de fortalecimento tam-
existentes nas salas, de modo mais acessível às bém nos permitiu perceber a necessidade de
educadoras e às crianças. Estas adequações fo- construir com os pais um conjunto de combi-
ram realizadas com o envolvimento efetivo dos nações sobre o cotidiano escolar, demarcando
pais, desde o planejamento, a aquisição e até responsabilidades e favorecendo a aproxima-
mesmo nas atividades de marcenaria, pintura e ção entre a escola e as famílias. O espaço pri-
instalação, em um esforço solidário de respon- vilegiado onde este trabalho tem acontecido
sabilidades compartilhadas com a escola. são as reuniões pedagógicas, que vêm aconte-
O segundo processo de mudança diz cendo mensalmente, possibilitando uma refle-
respeito à reorganização pedagógica da es- xão continuada sobre todos esses aspectos da
cola. Este processo é complexo, envolvendo escola, deixando claro para todas as pessoas
estratégias em duas linhas de trabalho simul- envolvidas esta dimensão de responsabilidade
tâneas. A primeira linha de trabalho consiste compartilhada e de protagonismo.
em um acompanhamento individualizado de A apresentação das questões ao lon-
cada professora no momento do planejamen- go deste artigo possui uma característica de
to e na elaboração dos projetos a serem desen- sistematização e reflexão que não consegue
volvidos com as crianças. A segunda linha de alcançar o dinamismo e a complexidade da
trabalho consiste em um fortalecimento dos realidade vivida com o grupo. Também não
espaços de discussão com o grupo de profes- consegue captar a profundidade dos tensio-
soras e auxiliares, trazendo para as reuniões namentos que foram enfrentados ao longo
pedagógicas o exercício de avaliar as práticas deste processo, exigindo de todas as pessoas
que realmente estão sendo desenvolvidas na envolvidas um grande esforço colaborativo. As
escola, retomando as discussões e a análise so- DCNEI (2009) nos serviram de horizonte nesta
bre o planejamento, a organização e a execu- caminhada, permitindo buscar consistência e
ção das atividades com as crianças. coerência nos momentos de impasse, em rela-
Este trabalho de fortalecimento do grupo ção à organização efetiva das rotinas das crian-
nos permitiu avaliar como adequar os espaços ças, em relação à utilização de agendas para
181
Jocemara da Rosa
182
METAMORFOSE
as crianças. Este é um ponto interessante e que tado inicialmente pelas professoras como co-
tem trazido uma nova dinâmica para a escola, brança, passa a ser experimentado como inte-
pois as professoras da Educação Infantil, espe- resse e estreitamento de laços.
cialmente de 0 a 3 anos, não eram cobradas ou Diante dos desafios e das necessidades
interrogadas sobre a sua função como educa- de mudança que têm sido apresentadas à es-
doras. As conversas com os pais eram limitadas cola, constata-se que o agente fundamental
somente aos aspectos de cuidar, alimentar e é realmente a professora. Se esta não se reco-
higienizar a criança. Ao que parece, as famílias nhece e não se coloca como parte do processo,
vêm se apropriando deste espaço representa- a mudança não ocorre. É a postura da profes-
do pela escola, construindo um conhecimen- sora que faz a diferença. A escola pode ter salas
to e um conjunto de expectativas em relação amplas e iluminadas, variedade brinquedos,
ao trabalho, mesmo com as crianças em idade jogos e literaturas, móveis adequados, entre
precoce. E aquilo que vinha sendo experimen- outras coisas. Mas se a professora não possi-
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Jocemara da Rosa
184
14
TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA:
UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
187
Débora Dorneles dos Santos, Eleandro José Lizot, Leila Marlise Cavinato Karlinski e Valdir Jose Sandri
LDBEN (BRASIL, 1996), como sendo destinada (...) compreender, conhecer e reconhecer o
jeito particular das crianças serem e estarem
às crianças de até cinco anos de idade, com a
no mundo é o desafio que se apresenta às
finalidade de complementar a ação da família instituições de educação infantil. Embora os
e da comunidade, objetivando o desenvolvi- conhecimentos vindos da psicologia, antro-
mento integral da criança nos aspectos físicos, pologia, sociologia, medicina, etc., serem de
grande importância para desvelar o universo
psicológicos, intelectuais e sociais.
infantil, apontando algumas características
comuns de ser das crianças, elas permanecem
O acesso à Educação Infantil como direito únicas em suas individualidades e diferenças
assegurado pela educação pública a todas e por isso merecem o reconhecimento de se-
as famílias que assim o desejarem, esta meta res únicos (Parecer CMEI nº 02/2008).
precisa ser clara e equalizada de forma aberta,
pois garantir acesso com qualidade é com-
promisso de todos os brasileiros com nossas
crianças (ORTIZ, 2012, p.26). Atualmente na rede municipal de ensino
de Ijuí estão integradas dez escolas de Educa-
O conceito de infância repercute for- ção Infantil e duas escolas do Ensino Funda-
temente no papel da Educação Infantil, pois mental que atendem do berçário ao quinto
redimensiona todo o atendimento prestado à ano do Ensino Fundamental. A Educação Infan-
criança, e tal conceito tem sua evolução mar- til integra o “Programa Ser Criança”1, mantido
cada pelas transformações sociais que origina- pela Secretaria Municipal de Educação, que or-
ram um novo olhar sobre e a partir da criança. ganiza o atendimento nas escolas da rede com
A infância está relacionada a um determinado garantia de um trabalho de qualidade.
tempo e espaço, sendo histórica e socialmente Nesse novo contexto em que a Educação
construída. Infantil está incluída, o cuidar e o educar assu-
Considerar que a criança vive um mo- mem caráter de indissociabilidade. É preciso
mento específico de sua existência significa
dizer que a infância é um dos períodos que
1 Programa de Atendimento à criança na escola de Educação
caracteriza a vida humana e, como tal, tem es- Infantil que a Secretaria Municipal de Educação de Ijuí mantém.
pecificidades que precisam ser conhecidas e Abrange e integra crianças na faixa etária de zero a cinco anos,
matriculadas nas escolas da Rede Municipal de Ijuí, com o obje-
respeitadas, tanto no olhar ao sujeito que vive tivo de garantir um trabalho de qualidade na Educação Infantil,
este período, como à sociedade que cultural- contemplando as especificidades da infância, considerando-a
como categoria social e plural em sua constituição nas diferen-
mente lhe dá significado. tes realidades que compõem a abrangência das escolas da Rede
Municipal.
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TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
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Débora Dorneles dos Santos, Eleandro José Lizot, Leila Marlise Cavinato Karlinski e Valdir Jose Sandri
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TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
deve estar envolvido com o desenvolvimento va, a formação continuada conquistou espaço
da criança, com o planejamento, o contato com privilegiado, por permitir a aproximação en-
a família, a observação e o acompanhamento tre os processos de mudança que se deseja
periódico do processo através do registro. fomentar no contexto da escola e a reflexão
intencional sobre as consequências destas
A formação continuada consiste de ações de mudanças.
formação dentro da jornada de trabalho (...).
Ela se faz por meio do estudo, da reflexão, da
A mudança de que a escola precisa é uma mu-
discussão e da confrontação das experiências
dança paradigmática. Porém, para mudá-la,
dos professores. É de responsabilidade da ins-
é preciso mudar o pensamento sobre ela. É
tituição, mas também do próprio professor,
preciso refletir sobre a vida que lá se vive, em
porque o compromisso com a profissão requer
uma atitude de diálogo com os problemas e
que ele tome para si a responsabilidade com a
as frustrações, os sucessos e os fracassos, mas
própria profissão (LIBÂNEO, 2004, p. 229).
também em diálogo com o pensamento, o
pensamento próprio e dos outros (ALARCÃO,
2001, p. 15).
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Débora Dorneles dos Santos, Eleandro José Lizot, Leila Marlise Cavinato Karlinski e Valdir Jose Sandri
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TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
Neste sentido, no ano de 2010 o grupo tos para a reorganização da Proposta Curricu-
de professores da Educação Infantil foi desa- lar, para o planejamento das Formações Con-
fiado a socializar as práticas pedagógicas reali- tinuadas e Seminários de Práticas, subsidiando
zadas nas escolas da rede municipal de ensino na escolha dos nomes de Palestrantes para
através de Seminário de Práticas Pedagógicas. provocar a discussão.
O Seminário de Práticas Pedagógicas acontece Além dos momentos propostos pela
anualmente e traz a possibilidade de visualizar, Mantenedora, as equipes das escolas são desa-
discutir e refletir a prática da Educação Infantil fiadas a pensar formações continuadas especí-
na rede municipal e provoca a necessidade de ficas para o grupo de trabalho, respeitando as
rever a proposta curricular Tempo e Espaço de peculiaridades e a proposta político-pedagógi-
Ser Criança. ca de cada instituição. No âmbito escolar, a for-
mação continuada passou a ser vista como ele-
mento qualificador do processo educativo que
envolve todos os segmentos da escola. Portan-
to, planejar, organizar e executar um plano de
formação continuada torna-se essencial aos
profissionais que atuam na educação. Dessa
forma, a formação continuada, incentiva, viabi-
liza e organiza momentos com tempo privile-
giado para estudos coletivos e individuais em
todos os níveis e modalidades de ensino.
O projeto de assessoramento do Proin-
fância veio a contribuir com as discussões e A formação realizada no interior das insti-
tuições por meio do compartilhamento dos
reflexões acerca da Educação Infantil. A pos-
saberes exige também forte parceria com o
sibilidade de estar especificamente voltando coordenador pedagógico condutor da for-
os olhares para a Educação Infantil, refletindo mação, como aquele que pode ajudar mais
e analisando possibilidades foi muito significa- porque tem maior conhecimento das didá-
ticas, porque tem um olhar mais abrangente
tivo. Da mesma forma, a participação nos Se-
sobre as necessidades formativas do grupo.
minários do Proinfância enriqueceram e desa- No entanto, o coordenador pedagógico não
fiaram o repensar da organização da Educação pode realizar nada se não for alimentado pelo
Infantil em nosso munícipio, trazendo elemen- olhar do professor sobre as crianças e sobre o
próprio trabalho (ORTIZ, 2012, p.56).
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Débora Dorneles dos Santos, Eleandro José Lizot, Leila Marlise Cavinato Karlinski e Valdir Jose Sandri
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TEMPO E ESPAÇO DE SER CRIANÇA: UMA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
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POLO DE PASSO FUNDO
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FAMÍLIA PRESENTE NA ESCOLA:
RELATO DE PRÁTICA PEDAGÓGICA
Diana Baségio
Dorilde Nicolau Rogéri
Rosana Araldi
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Diana Baségio, Dorilde Nicolau Rogéri e Rosana Araldi
zagem, conscientizando a comunidade escolar seguidas, buscando propor soluções que per-
acerca de sua importância na participação das mitissem a solução do problema diagnosticado.
propostas curriculares desenvolvidas e forta- Optou-se por oportunizar momentos
lecendo, dessa forma, os laços afetivos entre a que permitissem a presença dos familiares na
criança, a família e o meio escolar. escola, os quais deveriam participar ativamente
dos momentos lúdicos de aprendizagem. Neste
contexto, desenvolveram-se inúmeros projetos,
METODOLOGIA cada um deles destinados a uma faixa etária es-
pecífica. Dentre estes, destaca-se o projeto “Era
O presente estudo pode ser definido uma Vez”, pela multiplicada de ações envolvidas
como um estudo de campo inferencial, marca- e, especialmente, pelos resultados positivos al-
do pela constante avaliação do projeto desen- cançados no transcorrer do mesmo.
volvido, a fim de que os objetivos alcançados O Projeto “Era uma Vez” foi realizado com
parcialmente pudessem ser repensados e re- as turmas do Berçário (crianças de zero a um ano
construídos de maneiras alternativas, visto que e meio), Maternal I (crianças de um ano e meio
os resultados alcançados somente poderiam ser a três) e Pré A (crianças de quatro a cinco anos),
mensurados ao longo do processo. O campo de tendo como objetivo estimular a imaginação das
estudo foi uma Escola de Educação Infantil, lo- crianças e da família através das histórias infan-
calizada em município do Alto da Serra do Bo- tis. O marco inicial das atividades foi um convite
tucaraí, interior do estado do Rio Grande do Sul. enviado às famílias, solicitando que um mem-
A referida escola conta com oitenta e bro da família viesse à escola em um momento
seis alunos matriculados nos diferentes níveis oportuno para contar à turma uma história que
da Educação Infantil, distribuídos entre o Ber- conhecesse. Ficou combinado que a família po-
çário, o Maternal e a Pré-escola. dia se organizar no dia em que eles tivessem um
O projeto “Família Presente na Escola” tempo disponível para comparecer na escola, no
teve duração de seis meses, sendo desenvol- período determinado pelo projeto.
vido em duas etapas: a primeira iniciou-se no
mês de março, com a realização do diagnóstico RESULTADOS E DISCUSSÕES
da fragilidade e, a partir deste, a construção do
Plano de Ação e a segunda etapa teve inicio no A primeira mãe que compareceu na es-
mês de abril, com o desmembramento do Plano cola contou a história infantil “Cinderela”, adap-
de Ação e a construção de projetos específicos tando o clássico a uma nova realidade, mais
por turmas, para definir as estratégias a serem próxima do universo atual das crianças. Para
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FAMÍLIA PRESENTE NA ESCOLA: RELATO DE PRÁTICA PEDAGÓGICA
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Diana Baségio, Dorilde Nicolau Rogéri e Rosana Araldi
Construção de materiais e jogos a partir das histórias. Registro das autoras, 2014.
mento dos pais ou familiares à escola, muitos percebeu-se que a participação da família na
dos quais realmente encontram dificuldade em vida escolar das crianças é de suma importân-
virtude de compromissos profissionais. cia para o desenvolvimento integral do edu-
O Projeto “Era uma Vez” pode ser definido cando. Verificou-se que, quando os pais acom-
como extremamente positivo, dados os resul- panham a criança em todo o seu processo de
tados alcançados. Contudo, apesar dos resul- desenvolvimento, desde a Educação Infantil,
tados positivos, percebe-se que a participação esta sente-se valorizada e passa a entender
da família na escola ainda é uma realidade que a escola como um local importante para seu
precisa de estudos e reconstrução constante, desenvolvimento.
visto que menos de um terço das famílias aten- Pode-se afirmar que existem inúmeras
deram ao chamado escola, apesar do contínuo maneiras dos pais participarem desse proces-
chamamento para que estas comparecessem so e, quanto maior for a parceria entre escola e
ao ambiente escolar. família, mais positivos e significativos serão os
resultados, pois é notório que o envolvimento
CONCLUSÃO da família no processo educacional da criança,
principalmente na Educação Infantil, melho-
Ao analisar-se s diferentes ações desen- ra a imagem da escola e o seu vínculo com a
volvidas ao longo do projeto “Era uma Vez” comunidade. Tal envolvimento significa uma
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FAMÍLIA PRESENTE NA ESCOLA: RELATO DE PRÁTICA PEDAGÓGICA
educação de sucesso, já que a aprendizagem te na Educação Infantil, mas também nas de-
não acontece só na escola. mais etapas da educação básica.
Neste contexto, pode-se afirmar que o
presente projeto, desenvolvido buscando-se
mesclar o papel formativo da família e esco- Referências bibliográficas
la, visto que ambas são de importância ímpar
para o desenvolvimento do cidadão, alcançou
BRASIL. Ministério da Educação. PARECER CNE/
os objetivos propostos inicialmente e configu-
CEB nº 20/2009 de 11 de novembro de 2009.
ra-se como uma experiência eficaz de cons-
Diretrizes curriculares nacionais para a edu-
trução da aprendizagem e da cidadania, pois
cação infantil. Brasília: Conselho Nacional de
além de todos os resultados obtidos, acrescen-
Educação. Câmara de Educação Básica. Nov.
ta-se o orgulho dos filhos com a presença dos
2009.
pais da escola, condição sem dúvida essencial
RAU, Maria Cristina Trois Dorneles. Educação
à formação do educando como agente social
Infantil práticas pedagógicas de ensino e
em construção. Sendo assim, pode-se afirmar
aprendizagem. Curitiba: Ibpex, 2011.
que o desenvolvimento de ações objetivando
a presença dos pais na escola é uma estratégia
que pode – e deve – ser explorada, não somen-
203
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BRINQUEDOTECA:
UM ESPAÇO DE BRINCADEIRAS E VIVÊNCIAS
Adriane Scarmignani
Franciele Gromann Ribeiro
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Adriane Scarmignani e Franciele Gromann Ribeiro
brincadeiras não devem ter horário nem lugar significativo da criança. Primeiramente reali-
fixo para acontecer, principalmente quando se zou-se um estudo para decidir o melhor local
diz respeito à Educação Infantil. O brincar está para a instalação da mesma. Este deveria ter
presente em todas as dimensões da existência um bom espaço para a mobilidade das crian-
do ser humano e, muito especialmente, na vida ças, bem como ser aconchegante e agradável
das crianças. Pode-se afirmar que “brincar é vi- para elas. Ver figura 1.
ver”, pois a criança aprende a brincar brincando
e brinca aprendendo. A criança brinca porque
brincar é uma necessidade básica, assim como
a nutrição, a saúde, a habitação e a educação
são vitais para o desenvolvimento do potencial
infantil. Para manter o equilíbrio com o mundo,
a criança necessita brincar, jogar, criar e inven-
tar. Estas atividades lúdicas tornam-se mais sig-
nificativas à medida que se desenvolve, inven-
tando, reinventando e construindo.
Sabendo da importância do brincar na
Educação Infantil e após os encontros de for-
mação continuada realizados com os profissio-
nais do Proinfância, os educadores da escola
perceberam a necessidade de construir um
Figura 1. Brinquedoteca.
espaço com ambiente diferenciado que pro-
porcione o desenvolvimento integral dos es-
tudantes por meio da ludicidade, promovendo Durante as reuniões de planejamento
ações de reaproveitamento e a confecção de mensal, iniciou-se o trabalho com o corpo do-
brinquedos com materiais recicláveis. cente, que foi desafiado a confeccionar brin-
Desta forma, através da elaboração quedos de sucata com os estudantes. E também
do “Plano de Ação” orientado pelo Projeto da houve a mobilização das famílias para que doas-
Proinfância decidiu-se então, montar a brin- sem brinquedos, sapatos, roupas, fantasias, len-
quedoteca, considerando o brincar como pro- ços, chapéus e maquiagens para ajudar a mon-
cesso fundamental para o desenvolvimento tar a brinquedoteca com objetos diversificados.
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BRINQUEDOTECA: UM ESPAÇO DE BRINCADEIRAS E VIVÊNCIAS
Em meio a essa mobilização da comu- Quando a criança está brincando, ela faz
nidade escolar, as educadoras das turmas do relações com o real e o imaginário, desenvol-
Pré-B realizaram uma atividade muito signifi- vendo seus aspectos afetivo, social, cognitivo
cativa que veio de encontro com a proposta e físico. Durante a realização das brincadeiras
da brinquedoteca. Trabalhou-se a história “O o educador deve possibilitar que todos parti-
homem que amava caixas” do autor Stephen cipem e principalmente o educador também
deve brincar estimulando e incentivando as-
Michael King explorando-a por meio da hora
sim seus estudantes. De acordo com Machado
do conto, da expressão oral e dos registros li-
(1994, p.26 e 27),
vres. Porém, o mais significativo deste trabalho,
foi a confecção de um brinquedo com caixas ...a criança que brinca livremente e no seu
diversas como tema de casa juntamente com nível, a sua maneira, está não só explorando
os pais. Os trabalhos ficaram maravilhosos e fo- o mundo ao seu redor, mas também comu-
ram expostos na escola. Após serem expostos, nicando sentimentos, ideias, fantasias, inter-
cambiando o real e o imaginário num terceiro
foram deixados à disposição dos estudantes espaço, o espaço do brincar e das futuras ati-
na brinquedoteca para explorarem de diversas vidades culturais [...] Brincar é viver criativa-
maneiras. Ver figura 2. mente no mundo. Ter prazer em brincar é ter
prazer em viver.
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Adriane Scarmignani e Franciele Gromann Ribeiro
Resultados/discussão
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BRINQUEDOTECA: UM ESPAÇO DE BRINCADEIRAS E VIVÊNCIAS
de interagir com outras crianças bem como de VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente.
brincar livremente, daí a necessidade de privile- São Paulo: Martins Fontes, 1984.
giarmos na Educação Infantil, o brincar.
Desta forma, através desta significativa
experiência adquirida com a construção da
brinquedoteca, através da exploração da mes-
ma bem como da interação entre estudantes e
educadoras, observa-se que é necessário e fun-
damental para o desenvolvimento dos estu-
dantes proporciona-lhes um ambiente rico em
atividades lúdicas. É relevante mencionar que
o brincar nesses espaços educativos precisa
estar num constante quadro de inquietações e
reflexões dos educadores que o compõem.
Conclui-se assim que é necessário ao
educador assumir o papel de mediador de um
currículo que privilegie as condições facilitado-
ras de aprendizagens que a ludicidade contém
nos seus diversos domínios assumindo-a como
meta da escola.
Referências bibliográficas
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DA CURIOSIDADE À APRENDIZAGEM
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Andréia Scarpin Noetzold, Angela Eliane Scarpin Toqueto e Silvane Cadore Piva
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DA CURIOSIDADE À APRENDIZAGEM
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Andréia Scarpin Noetzold, Angela Eliane Scarpin Toqueto e Silvane Cadore Piva
A participação dos pais torna-se uma parceria que todos se assemelhavam com o formato
valiosa em todos os sentidos. Para que eles humano, possuindo todos os membros, alguns
possam acompanhar os trabalhos escolares,
observaram que nem todos possuíam articula-
é importante que a escola os mantenha in-
formados sobre os projetos que estão sendo ções, pois alguns não conseguiam dobrar seus
realizados pelas crianças e os temas estuda- joelhos e pernas ou sentar-se. Em uma das tur-
dos para que possam participar na seleção e mas que possui uma criança cadeirante, com
no envio de materiais, na proposição de expe- deficiência física, as crianças também percebe-
riências, na partilha de saberes (BARBOSA &
ram que alguns bonecos se identificavam com
HORN, 2008, p. 90).
ela, pois não conseguiam ficar em pé (Foto 2).
A partir da construção dos bonecos
Ao efetivar e garantir a participação dos
foi possível explorar a identidade a partir do
familiares para a realização desta atividade, foi
proporcionado um tempo para que pais ou
familiares, juntamente com seus filhos, pudes-
sem concretizar a tarefa sugerida. A participa-
ção foi unânime, houve envolvimento de todas
as famílias, sendo que todas as crianças vieram,
na data marcada, com suas produções.
Na oportunidade que os bonecos foram
apresentados por seus criadores para a turma,
aproveitamos para fazer algumas reflexões so-
bre as diferenças, pois cada boneco foi construí-
do com material diferente, sendo que alguns
chamaram mais a atenção pela criatividade, ti-
vemos bonecos construídos com materiais de
sucata (chuveiro, suporte de isopor para gar-
rafas, latas, caixas, potes, lâmpada queimada,
garrafas pet...), haviam bonecos construídos
com tecidos e outros com madeira.
Apesar das diferenças existentes entre
Foto 3: Boneco montado pelas crianças enquanto a história era
os bonecos, as crianças chegaram a conclusão contada.
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DA CURIOSIDADE À APRENDIZAGEM
nome, e cada criança criou um nome para seu colegas. Também foi criado um porquinho com
boneco, trabalhamos as partes do corpo, e as material reutilizável, como um dos persona-
crianças puderam fazer a análise de seu pró- gens da história, ele passou a circular entre as
prio corpo em frente ao espelho e proporcio- famílias dos alunos com o objetivo de incenti-
nado o contato com o esqueleto humano e o var a leitura. A primeira família que recebeu o
dorso para que as crianças pudessem observar “Porquinho Leitor” em sua casa, recebeu junto
do que nosso corpo é formado. um livro para ser lido e um caderno no qual foi
Paralelo às atividades citadas acima, feito o registro da leitura. Ao retornar para a
foram trabalhados outros conteúdos nas di- escola a criança devolveu o livro emprestado e
ferentes áreas do conhecimento e como cul- trouxe outro como sugestão de leitura para ou-
minância foi realizado uma apresentação em tro coleguinha, assim seguiu a atividade suces-
vídeo elaborado por nós a partir dos registros sivamente até que todas as famílias tivessem a
feitos através de fotos, filmagens e relatos das oportunidade de realizar a proposta.
falas dos alunos, propiciando que as crianças
pudessem visualizar suas construções e a dos
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Andréia Scarpin Noetzold, Angela Eliane Scarpin Toqueto e Silvane Cadore Piva
Referências
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A ROTINA DA EDUCAÇÃO INFANTIL:
UMA POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO
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Kely Daiane Machayewski, Manoela Oldra e Eloir Cima
na escolha das atividades, dos materiais e dos quisa sobre as obras de maior destaque em
espaços, o que possibilitou maior autonomia e nosso país e no mundo, para que ampliásse-
envolvimento na realização do trabalho. mos o repertório de conhecimentos de crian-
ças e adultos envolvidos no projeto. E, no de-
Metodologia correr da pesquisa, optamos por trabalharmos
com aquelas em que os desenhos do artista se
Percebemos que, durante o primeiro assemelhavam com os desenhos das crianças,
semestre, as crianças se divertiam com as ati- em função da curiosidade dos pequenos quan-
vidades de pintura. A partir desta observação, to a estas imagens.
as professoras do Maternal II organizaram um Para a unidade, o projeto intitulado “Fa-
projeto envolvendo atividades de Artes para zendo arte com as cores” teve três importantes
serem desenvolvidas durante um mês. Inicial- etapas: estudo das obras e história do autor,
mente construímos com as crianças uma pes- reprodução e releitura de algumas obras apre-
ciadas pelas crianças e exposição. Na primeira
etapa, as crianças conheceram a vida do autor
e suas principais obras, através de história com
fantoches e slides com imagens das obras. Na
segunda etapa, elas manifestaram suas prefe-
rências, fizemos a seleção das obras que iría-
mos reproduzir. Na terceira etapa, realizamos a
exposição das obras reproduzidas pelas crian-
ças com visitação dos pais.
Discussão
220
A ROTINA DA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO
acontecer durante o dia, ela também não pode No decorrer da realização do projeto
se tornar algo previsível e sem surpresas. Ou identificamos a necessidade de implementar
seja, as crianças precisam de momentos inespe- algumas mudanças quanto a rotina que se fi-
rados, recheados com o inusitado e com magia. zeram necessárias, como por exemplo, a adap-
De acordo com Barbosa (2006, p. 201-202), tação de horários. Para isso, ficou estabelecido
com elas uma parceria e um diálogo, onde as
Fazem parte das rotinas todas aquelas escolhas entre o que, quando e como fazer
atividades que são recorrentes ou reite-
deveriam ser discutidas com as crianças. Esses
rativas na vida coletiva, mas que nem por
isso, precisariam ser repetidas, isto é, fei- momentos tornaram o projeto ainda mais en-
tas da mesma forma todos os dias. Além cantador, pois as crianças foram aprendendo
de fornecer a sequência das atividades a respeitar a opinião dos colegas e a tomarem
diárias, a rotina, na sua constituição, uti-
decisões no coletivo.
liza-se de elementos que possibilitam a
sua manifestação, como a organização O desenvolvimento do projeto trouxe sig-
do ambiente, os usos do tempo, a seleção nificado para a rotina das crianças. Uma das mu-
e a proposição de atividades e a seleção e danças ocorridas foi a introdução do “faz de con-
a construção materiais.
ta” nas atividades de rotina semanal. Para essa
atividade, realizamos a coleta com as famílias
Tendo em vista a sua importância e sa-
de alguns materiais como: utensílios de cozinha,
bendo que ela deve ser pensada para e com as
fantasias, maquiagens, acessórios, entre outros.
crianças, a rotina passou a ser discutida com
Estes materiais foram selecionados e
todas as crianças do Maternal II, considerando
organizados juntamente com as crianças e se-
suas opiniões e necessidades. Elaborávamos
parados em caixas. No decorrer das semanas
as propostas do dia, que eram sempre discuti-
estes materiais foram utilizados pelas crianças
das na roda de conversa juntamente com elas.
a fim de trabalharmos com o jogo simbólico.
Neste momento realizávamos as escolhas das
Pois, para Freire (2011, p.25) “é através do jogo
atividades, a interferência nos espaços, tempos
simbólico, do “faz-de-conta”, que a criança as-
e materiais que seriam utilizados e a programa-
simila a realidade externa – adulta - à sua reali-
ção do dia seguinte. O planejamento do dia e
dade interna”.
as mudanças no projeto foram acontecendo
Essa atividade tornou-se encantadora e
naturalmente.
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Kely Daiane Machayewski, Manoela Oldra e Eloir Cima
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A ROTINA DA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA POSSIBILIDADE DE CONSTRUÇÃO
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