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Francisco Beltrão – PR
2020
GABRIEL GOULART DA SILVA
Francisco Beltrão – PR
2020
APRESENTACÃO DO ACADÊMICO À BANCA QUALIFICADORA DO TCC.
Orientador Acadêmico
Teço minhas gratulações iniciais à Causa universalíssima de tudo o que existe, o Ser
que é a causa universal e receptáculo de toda perfeição e donde qualquer natureza ou forma
adquire perfeição pelo fato de que é em ato em relação a esse Ser absoluto. O ato primeiro e
último constituidor da perfeição do homem dotado de racionalidade, diferenciando-o das
demais criaturas, nutritivas e sensitivas. Fonte e origem de todo saber, que em sua
complacência capacitou-me, Ele em sua perfeição e infinitude eu em minha pequenez e
limitação, intelectual e racional. A esse Ser perfectissimum ofereço o labor de minha pesquisa
acadêmica, como oferta de louvor e gratidão.
Em segundo, quero agradecer a meus pais Ailton Goulart de Oliveira e Idelir Lentz
da Silva, que pela Graça de Deus se uniram pelo santo sacramento do matrimônio, do qual
deram quatro frutos, Reginaldo Goulart de Oliveira (Irmão Bento José Maria), Elton Goulart
da Silva, Daniel Goulart da Silva (meu irmão gêmeo), a este estendo meus agradecimentos
também pelo apoio e carinho de irmãos e aqueles pelo imenso esforço para possibilitar meu
crescimento em sabedoria e graça e pela vida que me deram. Elevo minhas preces a Deus por
eles. Sem que seja ingrato agradeço a todos meus familiares a qual não caberia nominar pela
extensão que seria, que de um modo ou de outro, contribuíram de alguma forma em minha
vida. Nomino apenas meus avós paternos (Agenor e Verginia) e maternos (Santos e Maria
Lenir) que deram a vida a meus pais.
Em terceiro expresso minha gratidão em palavras, mesmo que insuficientes, à
verdadeira Igreja de Cristo, a Igreja Católica Apostólica Romana, representada na pessoa de
Dom Sergio de Deus Borges, Bispo da Igreja Particular de Foz do Iguaçu, que unido a Sé de
Pedro nos une a Cristo. A Diocese de Foz remerceio por ter acolhido meu chamado Divino e
me encaminhado para a formação presbiteral junto ao seminário nas etapas necessárias para o
mesmo, por subsidiar toda a formação espiritual, humana, material. Seria deveras ingrato se
alguns nomes não fossem citados e neles agradeço aos outros que colaboraram. Meu pároco
Padre Clodoaldo Isidoro Frassetto, a Dom Dirceu (in memoriam), ao Padre Valdir Antônio
Riboldi, Padre Márcio Marangoni, Padre Lídio José Stachelski, Padre Estevão José Maria e
Padre Aldo Dal Pozzo.
Em quarto quero agradecer ao seminário de filosofia Bom Pastor, na pessoa do Padre
Aldemir Francisco Belaver (reitor) e do Padre Cesar Pogeri (diretor espiritual), por esses três
anos de convivência e formação. Ao passo que estendo ao Instituto Sapientia de Filosofia e a
todo corpo docente meu agradecimento por minha formação acadêmica na Padre Geraldo
Macagna. Com isso agradeço a todos os meus colegas, irmãos seminaristas aqueles que já
convivemos e seguiram o caminho e por aqueles que neste ano convivemos, em especial à
minha turma de terceiro (Fabio Gotz de Lima, João Henrique, Emerson Froder, Claudir Catto,
Janderson Vieira da Cruz, Thiago Manoel Gomes, Gabriel Souza da Silva e Patrick Dias
Teixeira).
E por último e muito importante ao meu orientador e leitor deste trabalho de
conclusão, que desprenderam um enorme tempo e dedicação para auxiliar-me na elaboração
desse trabalho. E a todos que de uma forma ou de outra, seja por livros emprestados, auxilio
na problematização, nos questionamentos levantados sobre os temas, as dúvidas partilhadas,
os colóquios levantados. A todos muito obrigado.
Tudo para a maior Gloria de Deus!
Em resumo, a filosofia pressupõe um tão grande
amor à verdade que leva o homem a tomá-la
como o fim a ser buscado em si, o fundamento de
todos os valores. Ora, isto exclui ipso facto o
mentiroso, o caluniador, o vanglorioso professor
cuja atividade consiste em induzir os discípulos a
venerá-lo como a um guru, o retórico embusteiro,
o sofista ávido por vencer em debate a qualquer
custo, fazendo uso dos mais deploráveis
expedientes e truques.
Sidney Silveira
RESUMO
A busca pela verdade e o alcance do conhecimento nos traz uma realidade e uma dúvida, se o
que encontramos esgota o que desejamos conhecer ou se há algo a mais a ser descoberto. De
forma que, se é possível que a busca pela verdade leve ao progresso do conhecimento, ou da
ciência, é certo também, que a realidade se centra em constantes mudanças e que essas
mudanças são demonstradas por meio de afirmações proferidas por meios que são dignos de
crédito, como a ciência, que em períodos próximos ou distantes, afirmam novas teorias,
reafirmam outras e negam outras tantas. Karl Popper apresenta uma resposta a essa questão,
define que a ciência é formada por conteúdo experimental, que poderá vir a ser, transformar-
se, completar-se ou refutar-se. Essa é a pretensão desse trabalho, apresentar no campo
científico filosófico o pensamento popperiano sobre a busca da verdade e do conhecimento,
que é uma atividade constante. Bem como, o método proposto para esse objetivo e como por
meio desse processo possibilitamos o avanço do conhecimento. A ciência é como uma
nascente de um rio, deveras pequena no princípio, que em seu curso natural ganha largueza e
profundidade, tornando-se imponente. O que se pode extrair do resultado desse processo
investigativo, é a respeito de um conhecimento que é marcado por seu período, que pode vir a
perdurar por muito tempo, porém não ser absoluto. Um conhecimento que surge da
imaginação e chega à razão. Destarte, o progresso será sempre um passo à frente do anterior,
ou seja, a teoria da corroboração de conteúdo de informação, que será formado gradualmente,
sendo elaborado de acordo com o método da crítica, da eliminação de erros, do constante vir a
ser de uma hipótese. Por isso, a verossimilhança é uma consequência do caminhar da ciência.
O progresso da ciência, segundo a linha Popperiana de pensamento, se dá pela busca da
verdade. Uma verdade que não se sabe se é alcançada. Porém, deve ser buscada mesmo que
atinjamos algo próximo a ela, uma verossimilhança. A ciência desta forma se constrói passo a
passo, de forma gradual, mas sempre a caminho.
The search for truth and the reach of knowledge brings us a reality and a doubt, if what we
find exhausts what we want to know or if there is something more to be discovered. So that, if
it is possible that the search for truth leads to the progress of knowledge, or of science, it is
also true that reality is centered on constant changes and that these changes are demonstrated
through statements made by means that are worthy credit, like science, which in the near or
distant periods, affirm new theories, reaffirm others and deny many others. Karl Popper
presents an answer to this question, defines that science is formed by experimental content,
which may become, transform, be completed or be refuted. This is the intention of this work,
to present in the philosophical scientific field the Popperian thought about the search for truth
and knowledge, which is a constant activity. As well as, the method proposed for this
objective and how through this process we enable the advancement of knowledge. Science is
like a spring of a river, very small in the beginning, which in its natural course gains breadth
and depth, becoming imposing. What can be extracted from the result of this investigative
process, is about a knowledge that is marked by its period, which may last for a long time, but
not be absolute. A knowledge that arises from the imagination and reaches reason. Thus,
progress will always be a step ahead of the previous one, that is, the theory of corroboration of
information content, which will be gradually formed, being elaborated according to the
method of criticism, the elimination of errors, the constant becoming of a hypothesis.
Therefore, verisimilitude is a consequence of the progress of science. The progress of science,
according to the Popperian line of thought, occurs through the search for truth. A truth that is
not known if it is achieved. However, it must be pursued even if we reach something close to
it, a verisimilitude. Science in this way is built step by step, gradually, but always on the way.
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 10
2 OS PASSOS DA CIÊNCIA ATÉ POPPER .................................................................. 13
2.1 Filosofia da ciência .......................................................................................................... 13
2.2 Moritz Schlick – antecedentes do positivismo............................................................... 16
2.3 Visão unificada do mundo: círculo de viena. ................................................................ 18
2.4 Os problemas fundamentais tratados pelo Círculo de Viena ...................................... 20
2.5 Positivismo lógico: uma investigação indutiva.............................................................. 25
2.6 O princípio de verificabilidade de Carnap .................................................................... 28
2.7 Popper e a filosofia da ciência ........................................................................................ 29
3 CIÊNCIA E PSEUDOCIÊNCIA.................................................................................... 32
3.1 A ciência popperiana ....................................................................................................... 32
3.2 Pseudociência ................................................................................................................... 36
3.3 Modus Tollens .................................................................................................................. 40
3.4 Popper e o problema de Hume ....................................................................................... 44
3.5 O critério de demarcação ................................................................................................ 47
3.6 Problema da base empírica............................................................................................. 50
3.7 A dedução ......................................................................................................................... 53
3.8 A legitimidade do conhecimento .................................................................................... 56
3.8.1 Falseabilismo................................................................................................................... 56
3.8.2 Testabilidade ................................................................................................................... 57
3.8.3 Fundamentalismo de Popper ........................................................................................... 58
4 VERDADE E O PROGRESSO DA CIÊNCIA ............................................................. 60
4.1 Teorias e problemas – um critério de progresso........................................................... 60
4.2 Verossimilhança............................................................................................................... 64
4.3 Senso comum .................................................................................................................... 67
4.4 Ciência, conjectura e refutação ...................................................................................... 69
4.5 A teoria de verdade e correspondência de Tarski ........................................................ 71
4.6 Verdade como correspondência com os fatos ............................................................... 73
4.7 Balde mental..................................................................................................................... 76
4.8 A verdade como caminho do progresso da ciência ....................................................... 77
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 80
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 84
10
1 INTRODUÇÃO
De onde vem e para onde vai a verdade que a ciência possui? Bem como seu
princípio e sua justificativa. De início, trata-se de um processo rigoroso, calcada sobre a
experiência, controlada e observada. Fruto de um laborioso e constante trabalho de
investigação e coleta de dados, oriundo de inúmeras repetições, um conhecimento adquirido
por um processo sistemático de pesquisa. Essas considerações (rigorosidade, laboriosidade)
são fundamentais para formar um perfil sobre como a ciência age. Sem o qual, e com toda
certeza, não possuiria seu crédito. E, de fato, ela é esse processo meticuloso de pesquisa, mas
não se reduz apenas a isso, ela vai além, ela busca justificar suas justificações, ela deve pôr
em dúvida seu saber. É fundamental – como veremos –, que haja por detrás de toda pesquisa
científica uma atitude crítica, pautada sobre a eliminação de fragilidades que venha a possuir
em comparação à robustez do mundo. Busca-se por meio dela sempre a verdade contida nas
coisas, verdades que apontam outras, por isso levanta-se a questão: Pode a busca da verdade
possibilitar o progresso da ciência? O contexto do desenvolvimento do pensamento filosófico
dá-se por essa busca, em uma análise da história da filosofia, pode-se constar isso.
A ciência configura-se à medida que avança no conhecimento, em sua capacidade de
conhecer e, consequentemente, em sua força de transformar. É o instinto de sobrevivência em
um ambiente inóspito e hostil que conduziu nossos ancestrais a aperfeiçoarem-se na utilização
da própria natureza em sua sobrevivência. Um desenvolvimento sempre contínuo marcado
por peculiaridade de cada período da história. Os Jônicos com uma questão naturalista;
período socrático uma questão antropológica; Platão com seu mundo das ideias; Aristóteles
com sua sistematização do conhecimento, entre inúmeros outros períodos onde podemos
perceber uma derrocada de pensamentos que vão surgindo de acordo com a necessidade do
homem.
Destarte, podemos arguir algo daquilo que não vemos? Ou dele descrever algo?
Assim, pensavam os estudiosos no século XIX, os chamados “positivistas” que pautavam seus
critérios científicos na indução, ou seja, na capacidade que as repetições têm em explicar o
mundo. Apoiados no pensamento do aforisma 7 do Tractatus Logico-Philosophicus (1922) de
Wittgenstein: “Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar.” A grande marca de
pensamento é o abandono do metafísico. Todavia, como veremos Popper levanta algumas
objeções sobre as ideias indutivistas dos positivistas. De forma que, a ciência sempre estaria
esperando que suas afirmações se realizassem. Sempre seria dependente de uma afirmação
11
indutiva para confirmar suas sentenças anteriores e assim se formariam dentro de um círculo
infinito.
As pretensões científicas, estarão sujeitas ao tempo em que foram desenvolvidas e ao
futuro a qual serão projetadas. Por esse motivo, não se estabelece uma verdade universal, mas
uma candidata a verdade pois, tendo resistido a inúmeros asserções de refutação, ainda sim
tratar-se-á de uma aproximação da verdade, uma verossimilitude. A nova teoria precisará
mostrar seu grau de importância em relação a uma teoria já existente no campo científica. Isto
só será possível, se, e somente se, o conteúdo informativo presente nela, for melhor e mais
completo do que a teoria vigente. Por esse motivo para Popper, a importância da teoria está
em seu conteúdo e não nas inúmeras ocorrências que podem ter sido observadas. Esse
conteúdo deve ser julgado pela crítica.
Para esse julgamento far-se- á uso do método dedutivo, do qual parte-se da própria
premissa a ser refutada, para levantar o conteúdo a ser usado contra ela. Isto ocorre porque,
em nossa mente somos capazes de projetar a teoria para o futuro e observar sua resistência. A
pretensão de Popper não é uma ciência que trabalhe em um aspecto positivo do pensamento,
mas atue em uma dimensão negativa. Uma ciência não como um campo de certezas e
verdades incontestáveis, absolutas – que tende ao dogmatismo – mas, como um campo que
possui seus acertos e erros. De forma que, aprenda mais com seus erros e avance com seus
acertos.
A demonstração que Popper quer realizar é que por mais forte que se apresente a
teoria, ela poderá ser substituída, como ocorreu com as teorias de Giordano Bruno, Kepler,
Galileu e Isaac Newton quando surgiu a teoria de Einstein. Não é apenas eliminação – seria
um termo errôneo – mas o que ocorre é que, a nova teoria engloba as demais e as unifica em
seu corpo teórico, fornecendo assim, um conteúdo com maior informação. Ocorre desta
forma, uma junção de informações antigas e novas. Não significa que estejamos trabalhando
com uma pseudociência, mas com teorias sempre abertas a melhorias ou a eliminação. Ele
ainda afirma que o cientista que deseja trilhar esse caminho, não poderá se prender a amarras
indutivista, que visa apenas um carimbo científico, para ter credibilidade em sua tese.
O aspecto por definição que a ciência deve assumir é o progresso, que se faz
mediante uma continua substituição de teorias. Tal substituição ocorre por meio dos testes que
se infere à teoria. Nisto pode-se compreender um dos pontos de toda a monumental obra
popperiana. Uma ciência que não exclui a metafísica, porque ela é uma das fontes das quais se
pode extrair conhecimento. De uma simples intuição pode-se criar teorias que mudam a forma
de enxergar o mundo.
12
Para que se pudesse chegar à ideia de verdade e progresso, algumas etapas foram
necessárias. No primeiro capítulo foi trabalhado o conceito de ciência desenvolvida em Viena,
baseados nas ideias de Carnap, Schlick, conhecido como positivismo lógico ou movimento do
Círculo de Viena que basearam seu método de demarcação científica na indução, buscando a
completa eliminação da metafísica, bem como a implantação de uma lógica formal, pautada
sobre a matemática, em especial na física. Finalizando essa primeira parte com as críticas de
Popper a esse movimento e à retomada do valor da metafísica como fonte de saber.
No segundo capítulo, já dentro da filosofia popperiana, foi abordada a concepção de
ciência para Popper, que está em averiguar não tanto o que é, mas o que não é. Trata-se de
uma ciência negativa, não no sentido expresso do termo, mas como aquela que busca eliminar
seus erros por meio da refutação. Assim, é possível definir o que não é ciência, ou seja, a
pseudociência, Adler, Marx e Freud, bem como também a astrologia. A ciência popperiana
busca uma demarcação que não exclua nenhuma classe de saber, para esse fim usa-se a
crítica. O conhecimento necessita ser legítimo para ser científico e para isso deve ser testado
pelo falseamento e resistir.
Se a hipótese resistir, é uma candidata à verdade e, desta forma faz com que a ciência
progrida, aumente seu conteúdo informacional, problema que será abordado no terceiro
capítulo. O progresso na ciência se dá mediante um aumento no conteúdo informativo. Ela
confrontará teses que buscam explicar determinado fenômeno e delas formará um
conhecimento maior. Não é o acúmulo de dados, mas uma substituição por uma mais geral.
Pois, não somos capazes de possuir a verdade, apenas buscá-la, este seria o motivo do
progresso, uma busca continua. É necessário conjecturar para encontrar e, é preciso refutar
para definir. De forma que, a ciência se faz mediante acertos e erros, onde aprende-se com os
erros e progrede-se com os acertos.
13
Quando se refere ao homem (termo que designa a humanidade como um todo, sexo
masculino e feminino), deve-se compreendê-lo como um ser antagônico (paradoxal). É um ser
que supera a própria natureza, a transcende. Escapando da ordem dos sistemas já prescritos
pela natureza, como é com os animais. O homem se torna desta forma um enigma para si e
para os outros. Pois, é um ser pensante e que coloca tudo em dúvida. Indaga sobre seu mundo
e sobre si. Questionando o próprio pensamento, abandona os sistemas de crenças. É na busca
de sua compreensão que o homem, modifica o mundo e o transforma, consequentemente,
transformando-se. À medida que transforma o mundo é tomando pelo espanto e admiração.
Há um constante desejo humano de conhecer as verdades do mundo.
Esse interesse constante e sempre crescente sobre o mundo que o rodeia – quanto
mais descobre mais deseja buscar outros conhecimentos mais profundos. A própria natureza
racional conduz a essa busca. Aristóteles em sua metafísica diz: “Todos os seres humanos
naturalmente desejam o conhecimento.” (ARISTÓTELES, 980a,22). A capacidade e o desejo
de conhecer – perguntar e questionar – tudo, o distingue dos animais, os supera. Dilthey em
sua obra “Introdução ao estudo das ciências humanas” (1883) afirma que “explicamos a
natureza, mas compreendemos o homem”, mostrando assim a incapacidade que possuímos em
conter ou adquirir o todo sobre o homem.
Na medida em que homem evolui no conhecimento, novos termos de linguagem se
fazem necessários para expressar aquilo que acabara de ser descoberto. Não se trata apenas de
uma questão epistemológica ou hermenêutica, mas de uma linguagem formal, que possibilita
de forma clara e eficaz a expressão correta do fato, para que esse possa ser levado a
conhecimento de todos. Isto é, um conhecimento que perdura na história. O que caracterizava
o período medieval, era uma linguagem ortodoxa; no período do iluminismo (séculos XVII e
XVIII) o racionalismo emergia em uma linguagem matemática. Os cientistas passam a partir
desses séculos a ocupar o topo da pirâmide do saber.
O homem descobriu a própria capacidade de mudança e percebeu que esse
conhecimento surge da capacidade reflexiva sobre o sujeito e o objeto, garantindo-nos o título
de seres únicos entres os viventes. O homem desta forma, caminha rumo a evolução, sendo,
necessárias a elaboração e construção de métodos que possibilitem ainda mais nesse
progresso. Métodos esses que possibilitarão avançar no conhecimento, onde linguagens como
14
a matemática, física e lógica, são perfeitos representantes desses métodos. Sobretudo nos anos
do século XX, onde a ciência passa a ter um papel fundamental no desenvolvimento do
conhecimento científico.
A ciência adquire um papel fundamental na sociedade pois, esta “vê na ciência a
provedora de um conhecimento aplicável que permite ao homem o domínio da natureza, sem
o qual a história da civilização certamente teria sido diferente.” (ARAÚJO, 2003, p. 14).
Todavia, não se pode ver a ciência como uma simples manipuladora da natureza, ela está além
disso, é um método coerente e consistente de extrair e adquirir novos conhecimentos.
Os métodos e as técnicas estabelecem relações que resultam em avanços formidáveis
em ambos os casos – homem e mundo. “A ciência constitui-se em um processo de articulação
entre duas dimensões da realidade, a teórica ou virtual [...] e a empírica ou efetiva.”
(SCHORN, 2012, p. 14). A filosofia assume um papel importante nesta ciência, pois é ela que
irá refletir e analisar os métodos efetivamente empregados pelos cientistas, em suas
explicações, que visam a distinção do método e sua abrangência na pesquisa.
O filósofo não visa explicar ou ensinar o cientista como proceder em seus
experimentos, ou seja, não visa a própria pesquisa, mas busca “os por quês” de cada pesquisa
e cada método a ser empregado na pesquisa científica.
É claro que, seja qual for o método que possamos usar, nossas oportunidades de
encontrar regularidades verdadeiras são escassas, e nossas teorias conterão muitos
enganos que nenhuns misteriosos ‘cânones de indução’, básico ou não, nos impedirá
de cometer (POPPER, 1975, p. 22).
15
Poder-se-ia dizer acerca da filosofia da ciência, que ela consiste em uma análise
racional da realidade estrutural, ou seja, de seu sentido – o que diz e o que se pretende afirmar
– epistemológico e/ou hermenêutico. De forma a não ficar somente em seu caráter empírico,
ou seja, experenciável, mas abrangendo ao mesmo tempo uma dimensão a priori, que pensa e
projeta a hipótese para o futuro. A filosofia se apresenta como: verificadora, questionadora
dos métodos a serem usados. “Um cientista, seja teórico ou experimental, formula enunciados
ou sistemas de enunciados e verifica-os um a um.” (POPPER, 2007, p. 27).
A extração de informações que a ciência faz do mundo – onde está constituída – é
amparada pela filosofia. Que simboliza que cada teoria deve ser alicerçada por componentes
que não se contrariem, constituindo assim uma forma lógica de ser, donde “[..] cada teoria
constitutiva deve individualmente estar amparada em referencias que lhe garantam
credibilidade.” (SCHORN, 2012, p. 14). Amparada por uma linguagem que conceda clareza à
imagem do mundo que está sendo gerada.
O mundo foi, e ainda é, um campo muito fértil de conhecimentos. Palco de inúmeras
descobertas que transformam o modo de ver as coisas, de interpretá-las. À medida de
exemplo, temos a revolução de Copérnico que conduziu ao sistema newtoniano, que substitui
a imagem teocêntrica que havia do mundo. O surgimento da lógica e a crise do sistema
newtoniano pelas teorias de Einstein – a teoria da relatividade e da física quântica – são
exemplo memoráveis das transformações que ocorreram no mundo das ciências. Sobre o que
sabíamos a respeito do mundo e que devido as novas teorias, foram substituídas. Esses são os
caminhos do mundo científico.
Poderia ser levantada a pergunta sobre a necessidade de tais métodos no mundo
científico, ou ainda, se existiria uma teoria científica que fosse capaz de predizer qual método
deve ser usado em determinada circunstâncias. Todavia, tal resposta dar-se-ia conforme a
maneira que se estabelece a relação com a ciência. Podendo ser tomada por exemplo, segundo
a visão dos positivistas, que a encarariam como um sistema empírico lógico, por meio da
verificabilidade experimental, fazendo uso de um método que observa a frequência da
ocorrência dos fenômenos, ou segundo aqueles que a encaram como sendo, um sistema de
enunciando passíveis de serem sucessivamente verificados pela crítica.
Ademais, a ciência se torna assim, digna de crédito por ser considerada metódica.
Por isso, é capaz de fornecer conjuntos de enunciados que expressam a realidade, permitindo
a obtenção de explicação acerca do cosmo, que, por outro lado, são suscetíveis de serem
excluídos ou confirmados, afim de demonstrar sua validade. Desta forma é possível ver a
função da filosofia na ciência:
16
Schlick junto com Carnap, Neurath e Philipp Frank, integravam um grupo chamado
“Sociedade Ernst Mach”, que eram inspirados por Wittgenstein, em sua obra Tractatus
Logico-Philosophicus (1922). Com a morte de Ernst Mach (19 de fevereiro 1916), Schlick
(1882-1936) foi convidado pela Universidade de Viena a ocupar a cátedra de filosofia das
ciências indutivas, no lugar de Ernst Mach, cultivando as mesmas ideias de seu antecessor,
sobre a demarcação entre ciência e metafísica, elevou suas ideias ao máximo da rejeição à
metafísica e a uma constante formulação de uma linguagem unificada e formal do mundo.
Desta forma, o grupo mais tarde ficaria conhecido por “Círculo de Viena”. Schlick seria o
representante máximo do movimento.
A compreensão de Schlick sobre a teoria do conhecimento permeia a diferença entre:
conhecimento imediato (a intuição) e o conhecimento próprio, (o científico). O conhecimento
imediato consiste na relação sujeito e objeto, de forma a despertar intuição e arguição nesta
relação. No conhecimento próprio, o objeto e algo a ser descoberto. “Conhecer algo é
reconhecer características em um certo dado.” (STEGMULLER apud BASTOS &
CANDIOTTO, 2008, p. 29). Moritz Schilck, trabalha a natureza do conhecimento em três
conferências proferidas em 19321. Demonstrado por Oliveira em seu trabalho intelectual:
1
Moritz Schlick, “Form and Content: An Introduction to Philosophical Thinking” (From M. Schlick,
Gesammelte Aufsätze 1926-1936. Wien 1938, pp. 151-249; revised), Philosophical Papers. Vol II, ed. cit., pp.
285-369.
17
Assim, o conhecimento e a realidade se exaurem nos fatos que são dados pela
experiência rumo ao conhecimento científico. O que é demostrado é o que é assumido nas
descrições científicas, de um lado o interesse da ciência pela verdade e a comprovação
18
empírica de seus enunciados e, por outro lado, apresenta-se a filosofia que busca dar um
significado completo ao que é descrito, demonstrando assim o real significado dos
enunciados. Sendo desta forma, “Tudo é acessível ao homem: e o homem é a medida de todas
as coisas.” (BASTOS & CANDIOTTO, 2008, p. 49).
Essa reestruturação da ciência, parte de pensadores como Hans Hanh, Phillipp Frank,
Otto Neurath, Schlick e Carnap, que se reuniam sob o nome de Sociedade de Ernst Mach,
buscavam por meio da influência dos pensamentos deste filósofo e de Wittgenstein,
reorganizar a filosofia, em atenção à demarcação entre ciência e metafísica. Como resultado
dessa busca de unificação, surge o que ficou conhecido como: Círculo de Viena, angariando o
19
positivista, de forma que só existe conhecimento a partir da experiência baseada nos dados
observados imediatamente. Assim, se estabelece a demarcação do conteúdo científico
legitimo. Desta forma, o enunciado adquiria caráter científico quando for possível a
verificabilidade e verdadeiro quando for objetivo.
A segunda forma dessa concepção científica incidia na distinção que seu método de
análise lógica possuía. A ciência almejava alcançar seus alvos aplicando esse procedimento de
análise lógica do material empírico, do universal observável para o particular inculto. Uma
ferramenta poderosa da ciência consistia na lógica simbólica. De forma que podemos ver uma
reviravolta no cenário filosófico do período do século XIX, já em seu fim, estando em curso
uma transição da era moderna para o período contemporâneo do pensamento científico. Nesse
que período a ciência adota um caráter mais crítico, voltado ao pensamento lógico e
epistemológico. Bochenski afirma:
Para essa revolução mais radical do que aquela produzida pelo Renascimento, quatro
crises foram fundamentais, para a liquidação da modernidade e a abertura deste novo período
científico. Todos os problemas de fundamentos partem do meio pelo qual se interpreta a
concepção do mundo, adotando como característica singular desse estudo do mundo o rigor
lógico e as ideias antimetafísicas. Busca-se deste modo qual método a ser adotados para que
os conceitos científicos pudessem ser verificados. De que pontos parte tais problemas
fundamentais? Partem basicamente das evidências coletadas das observações em campo, que
são controladas e sistemáticas, resultantes das experiências de análise obtidas por meio do uso
da lógica.
Mesmo assim mantiveram-se certas dificuldades neste trabalho de superar a crise dos
fundamentos da aritmética. Pois, nesta época existiam três proposições opostas neste mesmo
âmbito: O logicismo de Bertrand Russell e Alfred North Whitehead, o formalismo de David
Hilbert, que concebia a aritmética como um jogo de fórmulas com regras determinadas e o
intuicionismo de Luitzen Brouwer, segundo qual o conhecimento aritmético se baseava em
uma intuição na reduzível. No caso do Círculo de Viena, os debates entorno desses três
problemas, despertaram interesse de seus membros.
22
O empirismo lógico explica esta situação contrastante pela capacidade que têm
exclusivamente as ciências de exercer algum tipo de controle sobre seus juízos e
proposições. As ciências da lógica controlam logicamente seus enunciados, por
meio de regras de cálculos que obedecem a critérios praticados universalmente, de
forma a permitir a aceitação ou a rejeição de proposições pelo puro raciocínio lógico
(ARAÚJO, 2003, p. 41/42).
A indução não é apenas um método para se obter proposições gerais, mas é também
um meio para a justificação, quer dizer, uma teoria científica está justificada na
medida em que existam proposições de base, deduzidas das proposições gerais que a
confirmam. E vale também dizer que um grande número de proposições de base
pode justificar a indução que se faz para uma proposição geral. (PINTO, 2007, p.
16).
Até metade dos anos 30, o Círculo de Viena, de modo muito claro sua filosofia
exerceu uma intensa influência no cenário cultural da Europa. Com a ascensão do nazismo,
consequentemente, ocorre mudança de Carnap e outros membros para os Estados Unidos,
conjuntamente as mortes de Hahn, Schlick e Neurath, e inúmeras contradições internas, levam
o movimento a se dispersar. Todavia, suas teses, ainda hoje, são debatidas. Inúmeros autores
trabalham o tema do progresso da ciência em distintas abordagens. Com a intenção de
construir um mural da filosofia da ciência que permita-nos entender melhor o mundo e seus
28
ciência possam ser relacionados por uma tradução logicamente construída fazendo uso de
uma linguagem lógica universal. “O fisicalismo de Carnap, assim, pode ser entendido como
um projeto para a construção de uma linguagem – a linguagem fisicalista.” (CUNHA, 2008,
p. s/n). Assim, do ponto de vista lógico seria realizado a partir da ambição empirista do
Círculo de Viena e de Carnap, de que todo conhecimento está ligado a experiência.
[...] meu objetivo, tal como o vejo, não é o de provocar a derrocada da Metafísica. É,
antes, o de formular uma caracterização aceitável da ciência empírica ou de definir
os conceitos ‘ciência empírica’ e ‘metafísica’ de maneira tal que, a propósito de
determinado sistema de enunciados, possamos dizer se seu estudo mais aprofundado
coloca-se ou não no âmbito da ciência empírica. Meu critério de demarcação deve,
portanto, ser encarado como proposta para que se consiga um acordo ou se
estabeleça uma convenção. (POPPER, 2007, p. 38).
30
O fato de juízos de valor permearem minhas propostas não quer dizer que estou
incidindo no erro de que acusei os positivistas – o de procurar matar a Metafísica,
desconsiderando-a. Não chego nem mesmo a asseverar que a Metafísica careça de
importância para a ciência empírica. (POPPER, 2007, p. 39).
pois a leis que regem a cientificidade não podem ser reduzidas à experiência ou a um
problema de base empírica.
[...] as leis científicas também não podem (como na Metafísica) serem reduzidas a
enunciados elementares de experiência. Se coerentemente aplicado, o critério de
significatividade, proposto por Wittgenstein, leva a rejeitar como desprovidas de
sentido as leis naturais, [...] elas nunca podem ser aceitas como enunciados genuínos
ou legítimos”, “[...] dessa maneira, o critério de significatividade, de Wittgenstein,
coincide com o critério de demarcação dos positivistas. (POPPER, 2007, p. 37).
3 CIÊNCIA E PSEUDOCIÊNCIA
essas teorias forem dadas por verdadeiras – e venha a cabo que a expressão "todos" foi
aplicado corretamente e todos os cisnes sejam brancos. Contudo, tempos depois vier ocorrer
um evento atmosférico e o sol passe a não nascer todo dia ou ele desapareça; ou ainda algo
mais simples, que surja no mundo um cisne de outra cor, tudo o que era tido por verdade
absoluta será derrubada e a ciência perderá seu crédito.
A concepção de ciência que Popper possui como já se pode perceber diverge em
relação aos positivistas. Popper possui um pensamento original e polêmico, pois tece
inúmeras críticas a este movimento que possuía uma credibilidade solidificada dentro da
sociedade vienense e no mundo. No pensamento de Popper não há preferências por hipóteses
mais prováveis, fruto de repetições, sendo isto “um mito2”. Todavia, o que paira sobre a teoria
popperiana é “a ideia de que o objetivo do conhecimento genuíno é não tanto saber o que é,
como averiguar o que não é.” (MOULINES, 2015, p. 30). Trata-se do método denominado
como racionalismo crítico ou falseabilidade ou refutabilidade. Popper enxerga o método
empírico como:
Método empírico deve ser caracterizado como um método que exclui exatamente
aquelas maneiras de evitar a falseabilidade que, tal como insiste corretamente meu
imaginário crítico, são logicamente possíveis. Segundo minha proposta, aquilo que
caracteriza o método empírico é sua maneira de expor à falsificação, de todos os
modos concebíveis, o sistema a ser submetido a prova. (POPPER, 2007, p. 44).
Desta forma, o “[...] teórico interessado pela verdade deve estar também interessado
pela falsidade, porque descobrir que uma asserção é falsa é o mesmo que descobrir que sua
negação é verdadeira” (POPPER, 1975, p. 24). Ao passo que não pode alicerçar seu saber em
uma empiricidade indutiva, pois estaria colocando-a sobre um círculo infinito de retornos.
Assim:
2
“A forma de uma crença por meio de repetição é um mito.” (POPPER, 1975, p. 33).
34
3
Ora, eu sustento que as teorias científicas nunca são inteiramente justificáveis ou verificáveis, mas, que, não
obstante, são suscetíveis de se verem submetidas a prova. Direi, consequentemente, que a objetividade dos
enunciados científicos reside na circunstância de eles poderem ser intersubjetivamente submetidos a teste.
(POPPER, 2007, p. 46).
35
4
Segundo Popper: o método “pseudoempírico – ou seja, um método que, apelando embora para a observação e a
experiência, não atinge, todavia, critérios científicos. Este último método pode ser exemplificado pela astrologia
[...]” (POPPER, 2018, 86).
36
O que, por conseguinte, me preocupava, não era o problema da verdade, pelo menos
nessa fase, nem o problema da exatidão ou mensurabilidade. Era, antes, o facto de
eu sentir que essas outras três teorias, dando embora ares científicos, tinham, na
realidade, mais em comum com os mitos primitivos do que com a Ciência. [...] Com
efeito, estas teorias pareciam explicar praticamente tudo. [...] O que quer que
acontecesse, confirmava-a sempre. [...] Desta forma, sua verdade parecia manifesta.
(POPPER, 2018, p. 87).
3.2 Pseudociência
A tendência que os cientistas e até mesmo os que não são, possuem de querer
encontrar regularidades na natureza as enquadrando em leis que realizem essa função, e
quando não é possível observar tais fenômeno de regularidade, acaba-se por concluir que se
trata dos “ruídos de fundo”, e mesmo após a verificação do rompimento com o padrão, ainda
sim os cientistas se prendem nessas ideias dormaticas. Popper, crê que é importante esse
dogmatismo, mas, como ponto de partida, não pode o pesquisador se agarrar fortemente, se
dando por “satisfeito” – com conclusões simplistas – se assim for feito, conteúdos importantes
deixaram de ser comunicado e exposto a estudo. Tal dogmatismo “[...] permite-nos ir
elaborando uma boa teoria por fases, por meio de aproximações.” (POPPER, 2018, p. 109).
No campo da ciência apresentam-se dois tipos de crenças: as nominadas fortes e as
fracas. A ciência não pode se fundamentar (agarrar-se) em crenças que sejam fortes, pois esse
37
tipo de crença é segundo a teoria de Hume e a teoria popular fortes, pois são produtos dos
padrões das repetições. Pelo contrário, a ciência deve partir das crenças mais fracas, pois são
frutos de uma atitude mais crítica, abertas a serem modificadas, testadas e exigem que sejam
falseadas. Popper critica fortemente a ciência que se apoia nessas atitudes de incontroláveis
regularidades:
[...] mas daí decorre que somos animais argutos, precariamente colocados num
ambiente que difere grandemente de quase qualquer outro ponto do universo:
animais que lutam corajosamente para descobrir, por algum método, as verdadeiras
regularidades que regem o universo e, portanto, o nosso ambiente. É claro que, seja
qual for o método que possamos usar, nossas oportunidades de encontrar
regularidades verdadeiras são escassas, e nossas teorias conterão muitos enganos
que nenhuns misteriosos ‘cânones de indução’, básico ou não, nos impedirá de
cometer. (POPPER, 1975, p. 22).
A ciência tem, por conseguinte, de começar por mitos e pela crítica de mitos, não
pela coleção de observações, nem pela invenção de experiências, mas sim, pela
discussão crítica de mitos e de técnicas e práticas mágicas. [...] A crítica é, como
disse, uma tentativa de encontrar os pontos fracos de uma teoria, e esses pontos só
podem, regra geral, ser encontrados as consequências lógicas mais remotas que dela
possam derivar. (POPPER, 2018, p. 111/112).
Toda a ciência mesmo que se apoie nessa atitude crítica, não pode ceder à tentação
de pensar que já é portadora da verdade, pois, já foram realizados muitos testes e todos
contribuem para a afirmação da hipótese, se pensar assim correrá o risco de sua ciência ser
dogmática. Pelo contrário, deve sempre permanecer como provisória. Deve dar segurança,
mas ao mesmo tempo sabendo que pode ser melhorada ou refutada. Assim, como foi a teoria
de Copérnico, superada por Newton e esta superada por Einstein. Esta última aguarda o dia
em que será superada.
Todavia, é necessário ainda verificar as diferenças de abordagem que uma teoria
possui em comparação a outra. Com a finalidade de ver a distinção peculiar entre a
pseudociência e a ciência. As teorias de Marx, Freud e Adler, demonstram uma capacidade
imensa de explicar todos os diferentes comportamentos humanos – ou a pessoa sofria de
repressão (Freud), ou sofria de sentimento de inferioridade (Adler), ou era oprimido (Marx).
Em cada caso, se observava o fenômeno que, (quando se abria o jornal, no bar, nas ruas, no
rádio, em diversos meios de informação) corroborava com a veracidade dessas teorias, não
havia corrente contrária que a fizesse regredir.5 Não há novidades, mas conformidades das
teorias.
5
Popper em seu livro Conjecturas e Refutações, deixa bem claro tal tendência, cito ele: “O elemento mais
característico desta situação parecia-me ser o incessante caudal de confirmação, de observações que “verificam”
as teorias em questão. E este ponto era constantemente salientado pelos seus partidários. Um marxista não podia
abrir um jornal sem descobrir, em cada página, provas confirmativas de sua interpretação da história, não apenas
nas notícias, mas também na sua apresentação – que revelava a tendência de classe de jornal – e, sobretudo,
39
O conhecimento deve evoluir (se tornando cada vez mais completo, deve projetar-se
além) e para isso deve ser excluído o que um dia foi considerado conhecimento. O verdadeiro
cientista é aquele que “[...] elabora teorias e as coloca em prova.” (SCHORN, 2012, p. 15). Se
não ocorrer “a ciência perde seu caráter.” (SCHORN, 2012, p. 22). O conhecimento científico
não é acúmulo de conteúdo que corrobore com as teorias anteriores, mas sim, de eliminação
ou substituição de uma teoria por outra melhor. A pseudociência é caracterizada pela contínua
justificação de teorias, é dotada de uma capacidade de explicar relativamente tudo no que diz
respeito a sua área, isso se aplica não apenas a Marx, Freud e Adler, mas inúmeras teorias que
apresentam com essas características. A ciência verdadeira busca aperfeiçoar suas teorias,
como é óbvio, naquilo que o jornal não dizia. Os psicanalistas freudianos enfatizavam que as teorias eram
constantemente confirmadas pelas suas “observações clínicas.” No que diz respeito a Adler [...] “por causa de
minha experiência de mil casas semelhantes.” (POPPER, 2018, p. 88).
6
Essa teoria exerce grande influência no pensar de Popper, sobretudo após os anos de 1919.
40
mesmo à custa do sacrifício de outra teoria que é tida como universal, correta. “À admissão da
verdade de asserções de testes às vezes permite justificar a alegação de que uma teoria
explanativa universal é falsa.” (POPPER, 1975, p. 18).
Assim, para Popper, a falsificação torna-se um juiz crítico dotado de critérios que
predizem o conteúdo (como veremos no próximo capítulo ela projeta a teoria para o futuro em
uma análise de possíveis critérios que poderão refutá-la) empírico de um enunciado científico
universal. Tornando possível desta forma a refutação empírica de uma preposição. Rompe
desta forma com a barreira que pretendia absolutizar a indução como único critério de
demarcação. Tornando possível que a metafísica seja uma geradora de novas teorias. Isto se
dá, porque o critério de demarcação passa ser o da falseabilidade, ou seja, a busca pelo
falseamento do enunciado proposto. Adota-se o modus Tollens, uma das duas regras7 da
lógica formal. “É o caso que mais interessa a Popper, porque, para ele, esse modo particular
de raciocínio representa o núcleo essencial da metodologia científica.” (MOULINES, 2017, p.
37).
7
“Duas das regras mais importantes e de mais frequente aplicação na lógica são o Modus Pones e Modus
Tollens. Desempenham um papel de primeira ordem em nossos raciocínios explícitos ou implícitos, tanto na vida
cotidiana como na Matemática e nas ciências empíricas.” (MOULINES, 2017, p. 34).
41
ciência e pela qual ela se desenvolve. “Para Popper, o cientista honesto é aquele que decide
questionar a lei geral.” (MOULINES, 2017, p. 38).
De que modo o cientista emprega a crítica à sua teoria? Segundo Popper, fazendo uso
de proposições básicas, ou seja, uma série de proposições particulares, seguras em relação à
sua informação. Isso significa dizer que: ele efetuará críticas à lei geral (universal, por
exemplo: Pedro é um ser humano!). Utilizando proposições particulares, que estejam
assentadas, ou seja, que não possui caráter duvidoso de seu conteúdo (exemplo: Pedro nasceu
da união de um óvulo e de um espermatozoide). Ao fazer tais argumentações lógicas, o
cientista deve “[...] tentar por meio da formulação de hipóteses gerais, alcançar um
conhecimento verdadeiro da natureza, e não se limitar a definir um modo de falar.”
(MOULINES, 2017, p. 40).
Todavia, vale ressaltar que não são proposições indiscutíveis. Em seu livro A lógica
da pesquisa científica (1934) Popper acentua o caráter temporário de uma proposição:
Importa acentuar que uma decisão positiva só pode proporcionar alicerce temporário
à teoria, pois subsequentes decisões negativas sempre poderão constituir-se em
motivo para rejeitá-la. Na medida em que a teoria resista a provas pormenorizadas e
severas, e não seja suplantada por outra, no curso do progresso científico[...]
(POPPER, 2007, p. 34).
A clareza que um cientista deve possuir perante sua teoria é de que a teoria um dia
será substituída por outra melhor, o que garante sua estabilidade momentânea é um marco
temporal8, “[...] o êxito do passado está longe de assegurar o êxito do futuro.” (POPPER,
1975, p. 73). Isso deve ser tão claro quanto sua teoria o é naquele momento. “Por mais intenso
que seja um sentimento de convicção, ele jamais pode justificar um enunciado.” (POPPER,
2007, p. 48). Não se pode pensar que a ciência não é digna de credibilidade, pelo contrário,
teorias científicas que se deixam averiguar-se por esse racionalismo crítico – verdadeira
concepção filosófica – são dignas de confiança; “O pensamento objetivo [...] consiste em
formular sistemas de enunciados para, no momento seguinte, submetê-lo à crítica e, quando
há pretensões cientificas, testá-los à luz da empiria.” (SCHORN, 2012, p. 114).
O ponto de partida da ciência é dedutivista, esta é a ideia de Popper ao demostrar que
devemos partir do universal para o particular e, por meio dos particulares, fazer o caminho
8
No ponto de vista popperiano o que pode ser tido como conhecimento é positivo, à medida que está preso e
ameaçado pelo futuro. Popper diz: a meu ver, tudo quanto pode ser possivelmente ‘positivo’ em nosso
conhecimento científico só é positivo até onde certas teorias, em certos momentos do tempo, sejam preferidas a
outras, à luz de nossa discussão crítica, que consiste de refutações tentadas, inclusive testes empíricos.
(POPPER, 1975, p. 30).
42
Quero, apenas que todo enunciado científico se mostre capaz de ser submetido a
teste: Em outras palavras, recuso-me a aceitar a concepção de que, em Ciência,
existam enunciados que devamos resignadamente aceitar como, verdadeiros,
simplesmente pela circunstância de não parecer possível, devido a razões lógicas,
submetê-los a teste. (POPPER, 2007, p. 50).
sua justificação, isso se obtem por meio de um conhecimento científico que venha a ser
objetivo, a hipótese se torna científica à medida que apresenta uma corroboração9. Bem como,
o cientista deve se interpelar a respeito do número de teste que a tese sofreu bem como o nível
de cada um deles.
Porém, não se trata de uma disputa entre teorias, para ver qual delas deve assumir o
status de ciência. Pois, uma teoria corre o perigo de ser refutada mesmo que seja a única de
sua categoria. Todavia, uma teoria que passou por esse crivo será ainda mais segura desde
que, não perca essa abertura a investigação, a testes, ou seja, esse caráter investigativo.
“Porque, para ele, as leis ou teorias científicas estão longe de atingir a meta da ciência, que é
buscar a verdade.” (FILHO, 2005, p. 43).
Pois, pode acontecer que nossas asserções de testes refutem algumas, mas não todas,
teorias concorrentes; e como estamos procurando uma teoria verdadeira, preferimos
aquelas cujas falsidades não fram estabelecidas. (POPPER, 1975, p. 19).
Ou ainda:
9
[...] corroboração de uma teoria entendo um relato conciso avaliando o estado (num certo tempo) da discussão
crítica de uma teoria com respeito ao modo por que ela resolve seus problemas; seu grau de testabilidade; a
severidade dos testes que experimentou; e o modo pelo qual reagiu a esses testes. (POPPER, 1975, p. 28).
44
Quanto à experiência passada, pode-se admitir que ela provê informação imediata e
segura apenas acerca dos precisos objetos que lhe foram dados, e apenas durante
aquele preciso período de tempo; mas por que se deveria estender essa experiência
ao tempo futuro ou a outros objetos que, por tudo que sabemos, podem ser
semelhantes apenas em aparência? Essa a questão fundamental sobre a qual
desejaria insistir (HUME, 2000, p. 63).
Ele considera que não pode haver argumentos lógicos válidos que nos permitam
demostrar que “aqueles casos de que não tivemos qualquer experiência assemelham
àqueles de que tivemos”. Consequentemente, “mesmo após a observação de uma
frequente ou constante conjunção de objetos, não temos nenhuma razão para fazer
46
O que Popper quer demostrar a refutação que Hume faz à indução, em que as teorias
que forem propostas não podem ser frutos de enunciados de observações ou justificadas por
elas. Porém, resolvida a questão lógica, Hume, tende para um psicologismo, de forma que, em
forma de costume e hábito, que está no fato de acreditarmos nas leis. Ou seja, a repetição se
da como teoria aceita, por que, a prova que se estabelece se dá pelo hábito ou costume e vê-se
justificados neles. Tudo que se tem na teoria se apoia nesse critério. Se trata de uma teoria do
senso comum ou de uma psicologia popular e não de uma questão científica. É o simples
acreditar por acreditar, por ocorreu assim, porque há mil anos assim ocorreu. “Mas não
obstante meu apreço por Hume e pelo senso comum, estava convencido de que esta teoria
psicológica estava errada [...]” (POPPER, 2018, p. 100).
Três são os problemas que Popper elenca sobre a psicologia popular de Hume. (i) o
resultado típico da repetição; (ii) a génese dos hábitos; e (iii) formas de comportamento que
podem ser descritas como acreditamos numa lei. (Cf. POPPER, 2018, p. 100). A descrição do
primeiro problema dá-se por uma questão de consciente que pelo hábito torna-se inconsciente.
Como por exemplo andar de bicicleta. O segundo procede segundo a origem dos hábitos ou
costumes, que são anteriores a esses. E, por último, o risco de romancear uma hipótese, de que
acontecimentos tendem a se repetir para se firmar como leis, que não é o caso de um filhote
de cães, que foge ao rever um cigarro ou o que acredita ser um. Em tudo pode-se dizer que se
trata de argumentos que se baseiam em similaridade de ocorrências.
Popper afirma que: “[...] a espécie de repetição considerada por Hume não pode
nunca ser perfeita; os casos que ele tem em mente não podem ser casos de perfeita identidade
– são apenas casos de similaridade.” (POPPER, 2018, p. 103). O que se tem é um ponto visto
de outros diferentes pontos. Ele rompe com a indução, mas abraça o senso comum, baseado
no hábito que sorrateiramente permite a inserção da indução novamente. A proposta de
Popper é uma inversão de papeis. Em Hume, esperamos que os fenômenos imprimam padrões
de repetições em nós; em Popper ocorre ao contrário, somos nós que buscamos impor leis de
regularidade ao mundo. Leis essas que poderão mais tarde poderão ser abandonadas se nossas
observações mostrarem que estamos errados.
47
Esta era uma teoria de ensaio e erro – de conjecturas e refutações. Tornou possível
compreender por que motivo as nossas tentativas de impor interpretações ao mundo
são logicamente anteriores à observação de similaridade. Uma vez que havia razões
lógicas por detrás deste processo, pensei que ele se poderia aplicar também ao
domínio da Ciência; mas, sim, invenções – conjecturas ousadamente avançadas para
serem postas à prova e eliminadas no caso de colidirem com as observações.
Observações essas que raras vezes eram acidentais, mas, antes, geralmente levadas a
efeito com o intuito definido de testar uma teoria e obter, se possível, uma decisiva
refutação. (POPPER, 2018, p. 105).
O caráter crítico que está sobre a base empírica, paira na afirmativa de que a ciência
não pode basear-se sobre proposições que a levarão a regressões infinitas. Destarte, teorias
autenticamente científicas, não deve surgir de observações e serem justificadas por elas.
Retornaria assim ao problema psicológico de Hume, que para Popper, se trata de uma série de
explicações baseadas no costume ou hábito – enunciados padrões regulares ou acontecimentos
que são constantemente associados. A teoria que se funda apoiada no costume ou habito,
configura-se mais como linguagem comum sendo, está livre de possuir uma construção lógica
e, consequentemente, impossível de ser refutada.
Fruto de uma condição natural humana, em creditar ao futuro os créditos do passado.
Isto porque as condições passadas levarão a ser assim. Todavia, sem que haja garantias de que
as afirmações serão frutuosas, muitos arriscam o caráter científico nessas afirmações. A esse
respeito afirma Popper:
errada e que era, na verdade, refutável por razões puramente lógicas.10 (POPPER,
2018, p. 100).
10
A psicologia de Hume – que é a psicologia popular – estava, considerei eu, enganada em pelo menos três
pontos distintos: (a) o resultado típico da repetição; (b) a génese dos hábitos; e, em especial, (c) o caráter
daquelas experiências ou formas de comportamento que podem ser descritas como “acreditando numa lei” ou
“esperando uma sucessão regrada de acontecimentos”. (a) O resultado típico da repetição – por exemplo, a
repetição de uma passagem difícil no piano – é que movimentos que inicialmente requereriam atenção acabam
por ser executados mesmo sem ela. Poderíamos dizer que o processo é radicalmente abreviado e deixa de ser
consciente: torna-se automático, “fisiológico”. Uma tal transformação, longe de criar uma expectativa consciente
de uma sucessão ordenada de movimento, ou crenças numa lei, pode, pelo contrário, começar com uma crença
consciente e destruí-la em seguida, tornando-a supérflua. Ao aprender a andar de bicicleta, podemos começar
com a crença de que é possível evitar as quedas se dirigirmos o guiador na direção em que ameaçamos cair, e
esta crença podemos esquecer a regra – em todo caso, já não precisamos dela. Por outro lado, ainda que seja
verdade que a repetição pode criar expectativas inconscientes, elas só se tornarão conscientes se alguma coisa
correr mal (podíamos não estar ouvindo o tique-taque do relógio, mas podemos ouvir que ele parou). (b) os
hábitos ou costumes não têm, por via de regra, origem na repetição. Mesmo o hábito de andar, de falar, ou de
comer a certas horas, tem início antes que a repetição possa desempenhar qualquer papel. Podemos dizer, se
quisermos, que os “hábitos” ou “costumes” só merecem ser assim chamados depois de a repetição ter
desempenhado o seu típico papel, descrito em (a); mas não devemos dizer que as práticas em questão se
originaram em consequência de muitas repetições. (c) A crença numa lei não é exatamente o mesmo que um
comportamento que traduza a explicativa de uma sucessão regrada de acontecimentos; mas estão ambos
suficientemente próximos para serem tratados em conjunto. Podem, talvez, em casos excecionais, resultar de
uma mera repetição de impressões dos sentidos (como no caso do relógio que para). [...] “um cigarro acesso foi
posto perto do nariz dos jovens cachorrinhos”, relata F. Bages. Eles farejaram-no uma vez, viraram as costas, e
não houve meio de os convencer a regressar à fonte do cheiro e a farejar de novo, alguns dias mais tarde,
reagiram à mera visão de um cigarro, ou até de um pedaço enrolado de papel branco, saltando para trás e
espirrando, se tentarmos explicar casos como este mediante a postulado de um vasto número de longas
sequências repetitivas numa idade ainda precoce, estaremos não só a romancear, como a esquecer que, nas curtas
vidas destes espertos cachorrinhos, teve de haver espaço não apenas para a repetição, mas também para uma
grande dose de novidade e, consequentemente, de não-repetição. (POPPER, 2018, p. 100-102).
50
O problema da base empírica está em aplicar caráter científico onde não existe. Isto
porque a tese proposta não é passível de refutação. A refutação não necessita de teorias que
sejam necessariamente observáveis empiricamente – como queriam os positivistas – mas estas
devem se encontrar com o real, possuindo atitude lógica em sua descrição e não fantasiosas
ou psicológicas. “Ao contrário da observação, um sistema de enunciados será científico se, e
somente se, este sistema fizer afirmativas que se chocam com a observação.” (BASTOS e
CANDIOTTO, 2008, p. 86). Ou estará centrada na indução de Hume que está associada aos
problemas de costume e hábitos.
O que está no centro do problema da base empírica, é a teoria Hume. Ou seja, a
noção de “[...] repetição baseada na similaridade (ou semelhança).” (POPPER, 2018, p. 104).
Somos conduzidos a pensar de tal forma, que as experiências sensórias de outrem, devem ser
idênticos às nossas, por sua paridade. A confusão que Hume faz é em querer equivaler as
experiências de todos – mesmo peso e mesma medida. “Mas deveríamos compreender que,
numa teoria psicológica como a de Hume, só a repetição-para-nós, baseada na similaridade-
para-nós, pode ter efeito sobre nós.” (POPPER, 2018, p. 104). Assim, a teoria valeria
unicamente para o indivíduo envolvido diretamente no ato, e não com outrem – como queriam
51
11
Sobre as ideias inatas Popper afirma em seu livro conjecturas e refutações: “Penso que a teoria das ideias
inatas é absurda. Mas todos os organismos têm reações e respostas inatas; e, entre elas, respostas adaptadas a
acontecimentos iminentes.” (POPPER, 2018, p. 107). Todavia, tal tema não constitui o objetivo deste trabalho,
assunto que se estendera longamente. Apare-se do afirmar que o conhecimento científico surge de uma
expectativa em relação a determinada hipótese. Afrente compreenderemos que se trata de um senso comum.
“Nós nascemos, por conseguinte, com expectativas; com um ‘conhecimento’ que, apesar de não válido a priori, é
psicológica ou geneticamente a priori, isto é, anterior a toda a experiência de observação. Umas das mais
importantes destas expectativas é a de encontrar um padrão de regularidade. Está ligada a uma propensão inata
52
considerando absurda. Tomado como ponto de partida o bebê que é incapaz de prover
alimento sozinho e usa o choro como instrumento para esse fim. Para Popper, o choro não é
um conhecimento inato de que ao fazê-lo iria ganhar o peito para se alimentar, mas um
mecanismo usado pelo bebê para ganhar comida. Se essa afirmação fosse uma verdade
absoluta, o número de crianças até 5 anos que morrem de fome em 2017, não seria de 5,4
milhões12. Se o princípio lógico fosse o choro, sem dúvida elas não morreriam de fome se
fosse abandonada. Todavia, o que ocorre é que na medida em que o choro aflui, a criança tem
a expectativa de que alguém mais capacitado que ela – os pais, por exemplo - a alimentará e
cuidará dela.
Existe um interesse na criança que chora, no animal que foge ou busca comida, de
igual modo existe um interesse no cientista que busca respostas para suas dúvidas e
questionamentos – ligados a motivos externos e fenômenos culturais da época – frutos dos
enfrentamentos pelos quais passa. Popper é enfático nessa questão:
Assim, pontua-se que o problema da base empírica indutiva, não está em sua lógica
formal – pois segue inúmeras leis de construção – mas reside em seu conteúdo. Um cientista
que está ‘interessado’ em provar que sim, a criança consegue sobreviver se for abandonada,
buscará formular sua hipótese seguindo rigorosamente as regras de formulação, obtendo uma
conclusão favorável à sua pesquisa. E, para provar ainda mais sua teoria, recorrerá a outra
construção indutiva, assim ad infinitum, sempre necessitando de outra construção indutiva,
excluindo assim a possibilidade de ser falseada.
Afastando-se da tradição linguística de Carnap, Popper destaca em especial três
problemas na concepção deste. A primeira delas é a reductio ad absurdum, que segundo
para procurar regularidades, ou a uma necessidade de encontrar regularidades, como podemos verificar pelo
prazer de uma criança que satisfaz essa necessidade.” (Ibidem, p. 107).
12
Dados estriados da ONU. Cerca de 6,3 milhões de crianças com menos de 15 anos morreram em 2017 em
função de doenças, fatalidades ou violência, segundo estimativas divulgadas nesta semana (17) pela Organização
Mundial da Saúde (OMS), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Grupo Banco
Mundial. Isso significa que, no ano passado, a cada cinco segundos, morria um jovem da faixa etária analisada.
Maioria dos óbitos — 5,4 milhões — ocorreu entre meninos e meninas com até cinco anos de idade. Disponível
em: https://nacoesunidas.org/onu-uma-crianca-morre-a-cada-5-segundos-no-mundo/ Acessado em: 22 de junho
de 2020.
53
3.7 A dedução
Em vista das ideias da ciência popperiana, como sendo aquela que não se faz por
meio das simples observação e experiências, mas sim como aquela que caminha em busca da
verdade, por meio de conjecturas e refutações. O método dedutivo usado por Popper, como
critério de demarcação para se chegar a enunciados que são suscetíveis de serem submetidos à
prova. Por isso, “[...] o sucesso da Ciência não se baseia em regras de indução, mas depende
da sorte, do engenho e das regras puramente dedutivas da discussão crítica.” (POPPER, 2018,
p. 116).
A ousada pretensão de Popper, com tal alegação é estabelecer ou distinguir as
fronteiras entre sistemas e teorias científicas de sistemas filosóficos e metafísicos. Com isso
torna-se possível e compreensível a diferenciação entre a teoria de Einstein sendo, essa
científica e a psicanálise e o marxismo como algo distinto do campo da ciência. Considerando
as três objeções de Popper a Hume. São essas, 1) as atribuições de repetições em observações
experimentais, que para Popper constitui antecipações; 2) considerar as leis naturais como
hábitos; e 3) o irracionalismo, acreditando em crenças como conteúdo científico.
O critério de demarcação nada mais é do que o método dedutivo de falsear, como
expresso no modus Tollens; consistindo em averiguar, falsear e testar o sistema empírico, com
inferências dedutivas. Sendo que “[...] o método da ciência é o método crítico.” (POPPER
1975, p. 75). Por esse método, torna-se possível a separação da ciência de outros meios de
conhecimento. Em relação ao método popperiano não se pode conceber que ele rejeita todo
54
tipo de enunciado científico pelo contrário, exige-se apenas uma coisa, que esses enunciados
estejam abertos à verificação.
[...] não exijo que todo enunciado científico tenha sido efetivamente submetido teste
antes de merecer aceitação. Quero apenas que todo enunciado científico se mostra
(em sua forma lógica) capaz de ser submetido a teste”. (POPPER, 2007, p. 50).
Por que as teses devem ser submetidas a esses testes? Isso serve para que as
hipóteses ao serem submetidas a estes testes rigorosos e se, e somente se, sobreviverem a
esses testes, serão aceitas no campo científico. Ao passo que, para continuarem em busca de
verdade, sempre estarão dispostas a se sacrificarem. Nestas circunstâncias para Popper o
cientista deve preferir uma teoria não refutada à uma refutada, desde que essa última esclareça
bem os pontos refutados. “Pois pode acontecer que nossas asserções de testes refutem
algumas, mas não todas, teorias concorrentes; e como estamos procurando uma teoria
verdadeira, preferimos aquelas cujas falsidades não foi estabelecida.” (POPPER, 1975, p. 19).
No método dedutivo não existe teoria que seja tão boa que não possa ser refutada. O
que por meio desse método se conclui é que a verdade é algo difícil de se encontrar e às vezes
será encontrada, mas muitas vezes ignorada como verdade por não se saber que se trata de tal.
O que acaba por ser encontrado é a verossimilitude. O conhecimento sim é um produto
humano, mas que segue as leis naturais, não ficando sobre nosso controle. Podemos conhecer,
mas não o possuir totalmente. Isto porque:
Mesmo que, a tarefa do cientista consista em estabelecer hipóteses que ele mesmo
muitas vezes não verá ser provado como algo verdadeiro. Ele deve se esforçar ao máximo
para propor sua hipótese, suas ideias e suas imaginações e junto com elas se submeterem a
falseabilidade. Realizando assim, um procedimento racional, baseado em um método seguro e
eficaz. Excluindo o medo de não se arriscar e se apoiando em experimentos que possuem
regularidade. Feito isso:
Não haverá então procedimento mais racional do que o método de ensaio e erro – da
conjectura e refutação: de ousadamente propor teorias; de tentar o nosso melhor para
55
A ciência tem, por conseguinte, de começar por mitos e pela crítica de mitos; não
pela coleção de observações, nem pela invenção de experiências, mas sim, pela
discussão crítica de mitos e de técnicas e práticas mágicas. [...] a atitude crítica, a
atitude da livre discussão das teorias, que tem por finalidade descobrir os seus
pontos fracos no sentido de as aperfeiçoar, é a atitude da razoabilidade, da
racionalidade. (POPPER, 2018, p. 111/112).
Teorias que sucumbem aos testes de falseamento deverão ser suprimidas e trocadas
por conjecturas especulativas subsequentes com maior resistência e poder explicativo. O que
se tem hoje é a melhor teoria possível, não a definitiva, pois amanhã outra será o que a
anterior foi – a melhor explicação. Isso ocorre porque o método dedutivo apresentado por
Popper vê a ciência como um conjunto de teorias provisórias (hipótese) que são propostas
com o objetivo de descrever ou explicar. “O que tentamos em ciência é descrever e (até onde
possível) explicar a realidade.” (POPPER, 1975, p. 48). Acuradamente o comportamento de
um certo aspecto do mundo ou do universo.
As hipóteses científicas devem ser falsificáveis permitindo a discussão. Há uma
insistência de Popper em relação à crítica porque, se as afirmações acerca do mundo ou do
universo forem infalsificáveis, então o mundo pode ter quaisquer propriedades, pode
comportar-se de qualquer maneira, sem contrapor-se a qualquer afirmação de como o
universo se organiza. Uma lei ou teoria científica, pretende fornecer informações sobre como
o mundo de fato se comporta, que o impossibilitaria de comportar-se de outra maneira.
56
3.8.1 Falseabilismo
Para se chegar ao conhecimento deve-se entender como é possível garantir que esse
conhecimento possua a verdade ou que ainda se está no caminho para encontrá-la. Pois, o
contéudo verdadeiro pode estar em um único ponto dentro de toda teoria acerca dela. É
necessário que ela seja legítima, amparado por uma lei e explicada pelo bom senso da razão.
Essa lei parte do falseabilismo, que se compõe de inferências dedutivas que buscam subjugar
a tese. Como também não excluir os enunciados que não tenham sido testados.
[...] não exijo que todo enunciado científico tenha sido efetivamente submetido teste
antes de merecer aceitação. Quero apenas que todo enunciado científico se mostra
(em sua forma lógica) capaz de ser submetido a teste. (POPPER, 1975, p. 50).
A isso fixa a necessidade de possuir métodos que auxiliem para estabelecer e a fazer
com que o conhecimento progrida, isso se dá unicamente segundo Popper por intermédio da
crítica. Diferente é a ideia daqueles que pensam a ciência como aquela que satisfaz alguns
critérios lógicos. Desta forma, a verão unicamente com significatividade ou verificabilidade.
A necessidade desse teste se estabelece devido ao fato de que nem um tipo de observação se
dá de forma pura, desinteressada e livres de teoria. Como há uma contaminação do foco da
observação o cientista estará determinado apenas por seus interesses. Esse teste buscr olhar
para o foco de outra perspectiva, uma perspectiva que visa o conhecimento universal. “Uma
teoria deve ser passível de refutação, pois uma teoria que não pode ser refutada não faz uma
afirmação sobre o mundo.” (LAW, 2008, p. 332). É na tentativa de negar uma teoria (no
sentido de provar sua falsidade) que irá torná-la científica, mesmo que venha a ser uma
hipótese falsa. O que é falso também é científico desde que sua falsidade tenha sido obtida
57
pela crítica e refutação. Dentro desse processo de denarcar se uma teoria é científica, está a
busca pela verdade. Por isso, é necessário ser capazes de dar razão ao que busca, mesmo que
seja apenas intuitivamente chegar a uma proximidade com a verdade. O que irá determinar se
for encotrada tal tese verossímil são as asserções dedutivas falsificadoras. Como tal processo
é feito dentro das hipóteses? Popper em seu livro: conhecimento objetivo, o demostra.
Popper assim determina que, para estabelecer hipóteses ou teorias mais próximas da
verdade devemos partir do conteúdo de verdade e o conteúdo de falsidade. Onde o primeiro
refere-se às consequências (produtos, resultados) verdadeiras existentes na teoria e o segundo
trata das consequências (produtos, resultados, efeitos) falsas. Originados dentro do processo
dedutivo com asserções falseadoras.13 Popper, trata a ciência não como arquivo de dados, mas
aquela que fornece a teoria mais geral sobre determinado assunto. Há graus de testabilidade e
isso segundo Popper é importante para a seleção de teorias.
3.8.2 Testabilidade
Sendo o objetivo falsear uma teoria ou hipótese, neste caso aquela que apresentar o
maior conteúdo explicativo. Isso significa dizer que há um número maior de asserções a
serem feitas – enunciados básicos. Se houver duas teorias, e a primeira apresentar maior grau
de ser falseável em comparação à segunda, prefera-se a primeira, pois diz mais sobre o
mundo, apresentando uma gama maior de conteúdo. Ou seja, apresenta-se como uma lei mais
geral. Desta forma, o conteúdo empírico (verossímil) da teoria cresce à medida que é falseada.
13
A vantagem dessa noção consiste, sobretudo, em permitir comparar os méritos de distintas hipóteses rivais, de
acordo com o seu grau de verossimilhança, e escolher a melhor. A título de exemplo, consideremos como
hipóteses rivais a teoria geocêntrica de Ptolomeu e a teoria heliocêntrica de Copérnico. A primeira defende a
ideia de que os planetas, o sol e a lua giram em círculo à volta da terra. A segunda argumenta que a lua gira em
círculo à volta da Terra, mas que todos os planetas incluindo a Terra, giram em círculo à volta do Sol. Ambas as
teorias foram refutadas, pois os planetas não giram em círculos, mas em elipses. E ambas têm algumas
consequências verdadeiras, por exemplo, que os planetas giram e que a Lua gira à volta da Terra. No entanto a
teoria copernicana é mais verossímil que a ptolomaica, porque, apenas da sua falsidade, tem pelo menos uma
consequência verdadeira que a teoria ptolomaica não tem – que os planetas, incluindo a Terra, giram à volta do
Sol. Por conseguinte, é preferível a teoria copernicana, a passagem da primeira teoria para a segunda representou
um progresso científico. (MOULINES, 2015, p. 47).
58
A testabilidade se aplica nas teorias que se dizem científicas, que segundo Popper
são as atribuições a fenômenos que se extrãem por observações e associações de ideias. O
cientista é capaz de inventar ciência. “As teorias são nossas invenções, nossas ideias não se
impõem a nós.” (POPPER, 2018, p. 144). Todavia não se delega oficialmente a esse
conhecimento um certificado científico, onde se tornam especulações descritivas das coisas.
“E todo o nosso conhecimento é impregnado de teoria, inclusive nossas observações.”
(POPPER, 1975, p. 75). E cabe testá-las para retirar delas aquilo que é falso, deixando apenas
o que pode contribuir com a ciência. Faz-se necessário um adendo, o conteúdo falso. Também
contribui com a ciência. Serve de base para as teorias que vão progredindo.
Através do teste a ciência assume a “[...]ideia de que o objeto do conhecimento
genuíno é não tanto saber o que é, como averiguar o que não é[...]” (MOULINES, 2015, p.
31). Esse é como Popper afirma seu o critério de demarcação científica, diferente da indução.
A testabilidade parte de um enunciado existente que demonstra um fato logicamente aceitável
e possível e, que desperta um conflito com outra teoria existente. Isto porque é uma proibição
lógica que ela estabelece e que pode ser observada.
choque entre pontos de vista e as alterações que decorrem disso, são fundamentais/necessários
para o crescimento/desenvolvimento do conhecimento científico. Popper propõe “[...] que se
adotem as regras que assegurem a possibilidade de submeter a prova os enunciados
científicos, o que equivale a dizer a possibilidade de aferir sua falseabilidade.” (POPPER,
2007, p. 51). Para assim, abre-se a possibilidade de correr atrás da verdade, mesmo que jamais
a alcancemos, todavia ainda podemos buscá-la.
Esse fundamentalismo popperiano, se assim pode der nominado surge, da crescente
dúvida que se deve ter do que se é conhecido e do que é considerado científico. São princípios
rigorosos que Popper estabelece em relação ao que era considerado científico e ao que viria a
ser. Tudo segundo Popper é fonte de conhecimento sendo as observações sempre seletivas.
Por isso, o homem que deseja é capaz de nos libertar de velhas crenças e conhecimentos.
60
Quando o tema é verdade (verdade como conhecimento) dos fatos, ou seja, aquilo
que realmente é o objeto, pelo qual se volta a atenção do cientista e direcionada e onde não
pode haver abandonos ou esquecimentos de fatores que corroboram com o entendimento. Isso
se dá pelas raízes do senso crítico – de algo que vem dos Gregos, que é, a racionalidade crítica
sobretudo, expressa por meio dos debates. Como exemplo disso, apresentam-se a maiêutica
socrática e a dialética aristotélica. Porém, já bem antes, com Tales já se pode falar de uma
tradição racionalista, que expressa audaciosas teorias sobre o mundo. Assim, na escola jônica,
que surge com as teorias de Tales, porém, sem prender-se a elas – motivado pelo próprio
Tales – surgem as teorias de Anaximandro, e de Anaxímenes, entre outros, em contraste ao do
mestre. Popper faz notar que a cosmogonia dos pré-socráticos se assemelha aos
desenvolvimentos teóricos racionais futuros.
A análise de Popper sobre a linha histórica da filosofia, mostra-nos que cada teoria é
uma porta aberta para outra. De tal forma, que não se fala da mesma, em termos diferentes,
mas é uma versão com maior conteúdo informativo (desde que não tenha sido refutada nos
testes). São conjecturas que possuem maior conteúdo informativo do que sua antecessora
61
sobre determinado aspecto do mundo, uma lei geral. Ao passo que sendo desta forma a
ciência, não fica fechada em sim, mas se abre à refutação, ao progresso. Esse conteúdo
informativo, ou seja, uma lei que por sua característica tende a ‘obrigar’ os fenômenos a
ocorrerem de determinada forma, se aprimora e se aperfeiçoa mediante o progresso continuo
do qual a ciência é dotada se dá pela busca continua da refutação mediante o método dedutivo
de falseabilidade.
satisfatória. Neste contexto o que se percebe é que, por mais clara que se possa ser uma teoria
– aqui levamos em conta os testes de refutação que resistiu, todo o conteúdo universal que
possui em relação a sua adversária – mesmo assim, ela possuirá erros, mesmo que
pequeninos. Assim, caberá a dedução encontrar e eliminar esses erros de seu interior. A tese
se apresenta em um corpo multifacetado, complexo e intrigante que se vai ao longo da história
descobrindo e compreendendo. O que Popper não admite é que a ciência não se desenvolva.
Esse caráter transitório das teses científicas é que possibilita o avanço da ciência. É o
navegar continuado entre os ‘conhecimentos’ disponíveis para novos conhecimentos, que
reafirmam seu caráter empírico-racional, que a capacita escolher a melhor entre as teorias.
Isso gera dois movimentos: o primeiro averiguar o quanto os testes aplicados são eficientes na
refutação e o segundo é estabelecer novos testes de eliminação de erros. Onde, a primeira
necessita da segunda e a segunda se faz mediante a aplicação da primeira.
A grande questão que surge é de uma compreensão geral do mundo. Sendo assim,
como descrevê-lo, de tal forma que, aquilo que é dito é verdadeiramente o que é observado e,
aquilo que é observado é de fato um conhecimento? A compreensão do mundo culmina na
própria intelecção do homem. Que se estabelece naquela profunda relação já descrita no
primeiro capítulo da necessidade de subsistência. É preciso conhecer para dominar e
transformar. A pretensão de Popper, é estudar o desenvolvimento do conhecimento geral do
mundo, e para ele a melhor forma de o fazer é por meio do estudo do desenvolvimento da
ciência.
Popper salienta que esse avanço se dá pela correção de erros, ou seja, a ciência é a
única que crítica sistematicamente seus erros, buscando corrigí-los no tempo e por meio deles
se aprende algo novo. Após essa explanação cabe ainda questionar, o que possibilita o
progresso científico, essa substituição por uma teoria mais satisfatória? A resposta parte da
63
ideia que se tem deo progresso, o termo é tratado no dicionário como evolução, um constante
movimento. O progresso no âmbito da ciência caracteriza-se pela aprendizagem obtida por
meio da correção dos erros, uma correção clara e judiciosamente (sensatez e prudência).
Esse progresso é possível porque existe uma intenção de progresso. E isso significa
que mesmo antes de uma teoria ser submetida a teste empírico – em uma ação a priori – o
cientista consegue dizer se ela representará ou não um progresso em relação a outras teorias
que conhecemos. Ainda mais, por que essa afirmação se refere a condição de que a teoria
ultrapasse determinados testes basilares. “E é esse conhecimento (meta-científico) que torna
possível falar de progresso em Ciência e de uma escolha racional entre teorias.” (POPPER,
2018, p. 364). Isso ocorre devido ao fato de a teoria conseguir apresentar um potencial, em
características fundamentais: um índice mais elevado de informação, com isso um maior
poder explicativo e preditivo. Ou seja, ela dever ser mais ousada e altamente informativa. A
teoria é apresentada e tem sua importância à medida que seu conteúdo empírico apresenta
resistência aos testes de refutação. “Todas estas características que, segundo parece, nós
desejamos numa teoria podem ser demonstravelmente reduzidas a uma única e mesma coisa:
um grau mais elevado de conteúdo empírico ou testabilidade.” (POPPER, 2018, p. 365).
O trabalho com a busca da verdade implica em teorias que podem vir a acontecer, e
nesse caso há uma probabilidade (referente ao cálculo de probabilidade) que isso ocorra.
Desta forma, quanto maior é o conteúdo disponível a respeito de um assunto, menor será a
probabilidade de isso ser verdadeiro e resistir ao teste empírico. Deveras, um determinado
assunto com menor conteúdo haverá maior probabilidade de resistir a testes e ser considerada
científica. Destarte, o menor conteúdo não significa informações vagas ou incompletas, mas
explicações concisas. Desta forma, uma probabilidade (no sentido de cálculo de
probabilidade) elevada não deve ser o objetivo da Ciência, caso contrário seria uma tese
indutivista do acúmulo de observações; que quanto maior o conteúdo de probabilidade mais
forte será a teoria. Se for trabalhado com o avanço da teoria não podemos trabalhar com um
conteúdo de probabilidade maior.
Todavia, cabe ainda desenvolver um pouco melhor, por se crer que aqui está a chave
de compreensão da teoria de progresso de Popper. Até o momento, a ciência apresenta-se
como uma criança que está aprendendo a andar. Ela dá um passo após passo o outro de forma
cambaleante, até conseguir se afirmar, de um passo mais frágil a outro mais firme. O
progresso apresenta-se como de uma teoria mais ‘fraca’ para outra mais razoável e de uma
razoável a uma forte. Recordando que “as teorias são invenções nossas, sãos ideias nossas.
64
Não são impostas de fora – são antes os instrumentos autofabricados do nosso pensamento.”
(POPPER, 2018, p. 213). De forma que vai se adquirindo uma verossimilitude mais forte.
4.2 Verossimilhança
especial nos casos em que sabemos que precisamos trabalhar com teorias que são, na
melhor das hipóteses, aproximações (BASTOS & CANDIOTTO, 2008, p. 94).
Três razões: a primeira, de caráter lógico, é que as observações são sempre inexatas,
ao passo que a teoria possui formulações absolutamente exatas; as observações são
feitas em condições muito especiais, ao passo que a teoria é aplicável a todas as
circunstancias possíveis. A segunda, de caráter histórico, é falsa poque os
precursores da teoria – já havia lançado mão de hipóteses muito aquém de dados
observacionais ao estilo baconiano. Kant mesmo já havia observado que a razão “só
pode compreender o que ela cria de acordo com o seu próprio desenho; que
precisamos obrigar a natureza a responder nossas perguntas[...]. com efeito,
observações puramente acidentais, feitas sem qualquer plano concebido
previamente, não se podem associar em conformidade com [...] uma lei – que é o
que a razão busca”. A terceira, baseada na crítica de Hume, é de que a indução é
impossível porque a classe das observações passadas não é garantia de qualquer
observação futura logicamente possível. (BASTOS & CANDIOTTO, 2008, p. 91-
92).
A assertividade de uma teoria está em seu poder de previsão – por isso Popper
declara que uma teoria deve ser ousada e logicamente testável. Desta forma seu conteúdo
66
assume um papel importante, quanto melhor for o conteúdo melhor será o teste a ela aplicado.
Destarte, sua verificabilidade aumenta à medida que seu conteúdo aumenta e assim, sua
corroborabilidade. Seu texte não se limita aos testes empíricos, muito menos a leis de uma
observação acidental. Mas, com o desenho que a mente cria em relação aquilo que se observa
cuidadosamente. Com isso se estabelece que as teorias partem de uma concepção a priori e
são desenvolvidas no plano prático. Portanto, as teorias assumem um papel corroborativo,
uma vez que “[...] a ciência se constrói por probabilidade (conjecturas ousadas) e pela busca
de falseamento por experimentos novos, e não por confirmação indutiva.” (BASTOS &
CANDIOTTO, 2008, p. 92).
O assunto da verossimilhança não está relacionado a eliminação de uma teoria por
definitivo, mas em sua substituição por outra melhor. De tal forma que, os velhos
experimentos mantêm sua validade, como se fossem um limite para as novas teorias. A
verossimilhança pode ser compreendida como aquela que mais próximo da verdade está – não
é a verdade. A mente utiliza esse mecanismo para lançar uma teoria antiga no campo da
imaginação, que a projeta para o futuro. Pois, “[...]a história da Ciência, tal como a história de
todas as ideias humanas, é uma história de sonhos irresponsáveis, de obstinação e de erro.”
(POPPER, 2018, p. 363). Busca-se analisar e verificar a resistência das hipóteses aos testes a
ela aplicado. Donde os testes retiram do produto de nossa mente o que há de erro e
contradição, ao mesmo tempo que assume o conteúdo que resistiu como mais próximo da
verdade. A própria refutação tem por corroborar na validade da mesma. Essa substituição é a
busca das respostas que as antigas teorias já não podiam responder.
Na prática, Popper descreve a aplicação da tese do progresso da ciência, ao longo da
história. Por exemplo as teorias desenvolvidas por Kepler e Galileu, foram substituídas pelas
de Newton. As de Fresnel e Faraday foi superada pela de Einstein. As novas que ocuparam o
lugar das antigas possuem um conteúdo mais informativo, contemplando a de seus
idealizadores e apresentando um conteúdo novo, audaciosas e improváveis previsões.
fenômenos do mundo se concretizem. A tradição científica não pode afirmar com exatidão
como começou ou como começaram os primeiros pesquisadores do mundo. Mas sim, por
onde e de que forma iniciaram a análise e até em que ponto chegaram. De forma que,
partimos do ponto já iniciado e assumimos aqueles que vão surgindo. “Em ciência, queremos
fazer progressos, e isso significa que temos de nos empoleirar nos ombros dos nossos
predecessores. Temos que continuar uma certa tradição.” (POPPER, 2018, p. 230). O que foi
construído serve de bússola orientadora, às vezes não satisfatória, mas útil para nos informar
as coordenadas para exercer as capacidades de examinar, criticar e desta forma provocar o
progresso.
A esse respeito, Popper impacta seus leitores quando afirma que todos possuem uma
filosofia, sabendo ou não e, que ela não possui grande valor. Todavia, o impacto que ela pode
causar sobre nossas ações e vidas são enormes. Poder-se-ia perguntar como Newton chegou
às teorias que chegou? Tratam de assuntos que para sua época foram extraordinários e
fundamentais para o desenvolvimento da atual ciência. “A resposta de Popper é que não se
chega a elas por nenhum procedimento racionalmente controlável: são ou produto da
imaginação ou da inspiração [...].” (MOULINES, 2015, p. 45). De forma que a “[...] ciência, a
filosofia, o pensamento racional, todos devem partir do senso comum.” (POPPER, 1975, p.
42).
No campo da ciência surge a necessidade de partir de algo, porque a ciência não
surge do acaso, podendo surgir de uma experiência repentina ou de um longo estudo, mas não
do nada. Por esse ponto pode-se cogitar que a ciência de inicio se compreende por uma frágil
base. Todavia, corre-se o risco de se equivocar se a tese que é aplicado for a que é aplicado
for a de que o conhecimento que a ciência busca é sempre estável e forte. Não podendo ficar
nele, muito menos construir algo sobre esse tipo de conhecimento. Por se tratar de algo vago,
que varia entre o conteúdo adequado, verdadeiro, inadequado ou falso, por se tratar de
opiniões e/ou instintos. De forma que, a ação que se deve tomar em relação a elas é a crítica
constante. Tal crítica pode, frequentemente, obter êxito, como por exemplo: a teoria da terra
ser plana, que remonta sua concepção antes do início do período clássica se derrubada por
Pitágoras (sec. VI a.C), que propôs a ideia de uma terra esférica.
O realismo é importante ao senso comum, pois em se tratando do senso comum
esclarecido, devemos ter uma clara distinção entre aparência e realidade. Isto porque, o real
68
A ideia que reside nesta questão, é a de que uma Teoria A (T¹) pode estar mais longe
da verdade do que uma Teoria B (T²). Ou seja, a t² e mais verossímil do que t¹. A primeira
serviu de base para a segunda. Onde, em uma teoria se possui um conteúdo de verdade e outro
de falsidade. Todos os conteúdos – verdadeiros ou falsos – possuem um sub-conteúdo, em
que estão todas as consequências verdadeiras. Esse conteúdo que a crítica irá extrair para
gerar uma asserção com maior conteúdo de verdade. Popper a respeito do Senso comum diz:
O senso comum, disse eu, é sempre nosso ponto de partida, mas deve ser criticado.
E, como se poderia esperar, não é muito bom quando vem a refletir-se em si mesmo.
De fato, a teoria de senso comum do conhecimento de senso comum é uma
trapalhada ingênua. Contudo, tem fornecido o alicerce sobre o qual se tem origem
até mesmo as mais recentes teorias filosóficas (POPPER, 1975, p. 66).
O senso comum, deve ser concebido como fruto da imaginação do homem que busca
interpretar o homem, no sentido de descrever e interpretar o mundo, em um primeiro olhar,
superficial. E desse olhar infere-se as primeiras premissas de um ‘saber ingênuo’. Popper o
apresenta como sendo uma teoria que possui uma estrutura simples para ser criada. Trata-se
de uma teoria simples, como ele próprio diz, basta utilizar os sentidos.
O que torna a ciência um campo rico de teorias é a sua abertura ao exame crítico de
suas colocações – a ciência do ponto de vista popperiano, possui esse caráter de crítica e de
teorias corroboradas, ela se enriquece a cada nova descoberta. Testes cada vez mais
elaborados que sua antecessora sucumbiria nos primeiros instantes. Não é apenas no critério
dedutivista, que reside a racionalidade da ciência, mas na escolha de novas teorias. Fato que
impossibilita a utilização da indução, que observa a teoria científica em um conjunto e
esquece de suas partes, sem a qual estaria fragmentada e dificilmente arguiria algo, e, se o
fizesse poderia declarar como metafísico. Em regra geral, a ciência deve analisar conforme o
critério apresentado, teoria por teoria, podendo ser no âmbito individual como também na
comparação ou no confronto de ambas. É o que formaliza a ideia de que é possivel aprender
com nossos erros e falhas.
mais dois é igual a quatro. Não que isso não seja verdadeiro, mas ele ambiciona se referir a
uma ‘verdade interessante’. Uma verdade que seja possível aprender com os erros. Diz ele:
Nós [falibilistas] queremos mais do que a mera verdade: aquilo que procuramos é
uma verdade interessante – uma verdade que é difícil de encontrar. [...] Não nos
contentamos com ‘dois vezes dois são quatro’ ainda que seja verdade; [...] A mera
verdade não é suficiente: o que procuramos são respostas para nossos problemas.
(POPPER, 2018, p. 383. Colchetes do autor).
Como se conclui, não se pode chegar à verdade absoluta, se o fizer uma dúvida se
levantaira acerca da sua completa exatidão, se realmente seria a plena verdade. Mas o que
Popper pretende afirmar é que de uma teoria deve-se extrair o máximo de verdades que ela
possa ter. Por esse motivo o cientista conjectura, levanta hipótese, teorias e explicações,
projetando-a numa perspectiva futura. Com o objetivo de averiguar se resistira aos testes e, se
dela se obterá uma resposta negativa, que mesmo assim, com ela se aproximará mais da
verdade. O fato de se creditar à verdade ou à falsidade, não exclui sua existência. Se uma
teoria for classificada como verdadeira por um período longo ou curto poderá em outro ser
refutada. Se falsa servirá de ‘solo’ para acender a outras teorias mais explicativas.
Nós preferimos a conjectura porque acreditamos que é deste modo que podemos
aprender com os nossos erros; e acreditamos que, ao descobrir que era falsa, teremos
aprendido muito sobre a verdade e ficado um pouco mais próximos dela (POPPER,
2018, p. 384).
O que se extrai de tal perspectiva é a visão de uma ciência que caminha, por
caminhos sempre novos e complexos, pouco familiar e muito menos entendido. Uma
caminhada que exigirá do pesquisador esforço contínuo e muito trabalho. Uma visão futurista
e dinâmica. Se cabe uma comparação, uma teoria científica é como uma planta frondosa
plantada em um pequeno vaso. Com o passar do tempo faz-se necessário a substituição por
um recipiente maior ou a plantação direto em um terreno, para que assim possa crescer.
Todavia, depende da coragem, da motivação e do empenho cultivador. Se não realizar essa
troca, a planta sufocará com o tempo. Se o cientista não estiver disposto a sacrificar a
comodidade que uma teoria proporciona, jamais à verá se desenvolver.
Tal como vimos, progresso em Ciência significa progresso em direção a teorias mais
interessantes, menos banais e, nessa medida, menos ‘prováveis’(sendo ‘provável’
tomado num qualquer sentido – como o de falta de conteúdo, ou o de maior
frequência estática – que satisfaça o cálculo de probabilidade), e isso significa, regra
geral, progresso em direção a teorias menos familiares e menos cômodas ou
plausíveis (POPPER, 2018, p. 393).
71
Desta forma, deve-se caminhar pelos caminhos que Popper trilhou para compreender
o desenvolvimento de sua teoria. Popper não fazia uso do termo ‘verdade’, antes de conhecer
a teoria de Alfred Tarski pois, acreditava não ser possivel expressar profundamente e
corretamente o que realmente corresponderia com tal termo. Após, tomar conhecimento da
teoria de Tarski, ele mudou de opinião. Como ele mesmo diz: somente pela descoberta da
verdade que se apercebe falível e por ela que se aprende com os erros.
(...) sempre devemos relacionar a noção de verdade, assim como a sentença, a uma
linguagem específica; pois é óbvio que a mesma expressão que é uma sentença
verdadeira em uma linguagem pode ser falsa ou sem sentido em outra (TARSKI
apud PEREIRA, 2009, p. 49).
Apresenta-se uma forte dedução que se apresenta dentro da teoria de Tarski, em que
trabalha os casos particulares. Pois, em diversas línguas é possivel se ter diferentes
significados. O objetivo de Tarski nessa relativização da linguagem é eliminar os conceitos
72
que ele denomina ‘primitivos’, onde nenhum conceito é suficientemente seguro para ser
utilizado.
Não pretenderemos de todo dar aqui uma definição geral do termo [“sentença
verdadeira”]. O problema que nos interessa será dividido numa série de problemas
separados, cada um dos quais relativos a uma só linguagem (TARSKI apud
PEREIRA, 2009, p. 49).
por meio da língua formal se pretende a não se contradizer em uma afirmação científica. A
demonstração assume uma nova noção, a de uma lingual formal.
considera as relações dos signos com os objetos a que eles se referem, que é a relação de
designação.” (ABBAGNANO, 2007, p. 869). Na correspondência com os fatos a relação que
se estabelece se dá entre a fala e fato. Popper se vale de dois exemplos:
Para nós, por conseguinte, a Ciência não tem nada que ver com a procura de certeza,
probabilidade ou fiabilidade. Nós não estamos apenas interessado em criticá-las e
testá-las, na esperança de descobrir onde é que nos enganámos; de aprender com
nossos; e, se tivermos sorte, de avançar para teorias melhores. (POPPER, 2018, p.
382).
De tal forma, que se isso não for possível é porque segundo Popper, se cria uma
crença verdadeira, originária de dois problemas: de uma ideia intuitiva extremamente simples
com uma prática complexa e, por segundo, o dogma da verdade satisfatória. Donde o dogma
se trata de um problema para o cientista, pois o fecha para crítica. No dogma não se
manifestam claramente as teorias rivais da correspondência. (i) a teoria da coerência, que
confunde consistência com verdade; (ii) a teoria da evidência, que confunde conhecimento
como verdade; e, (iii) a teoria pragmática ou instrumentalista, que confunde utilidade como
verdade; (iii). Trata-se de teorias subjetivas (epistêmicas) que se distância da objetiva
(metalógica). A teoria objetiva se faz fundamental, pelo fato de por meio dela ser possível
realizar asserções, com um olhar futurístico. De forma que:
Uma teoria pode ser verdadeira ainda que ninguém acredite nela, e ainda que não
tenhamos qualquer razão para pensar que ela é verdadeira. E uma outra teoria pode
ser falsa, apesar de termos razões relativamente boas para aceitar. (POPPER, 2018,
p. 376/377).
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Não se pode iludir pela beleza de uma teoria, que não tenha sido testada que, só é
possível realizar tal feito, se for teoria por teoria. E ainda, tais asserções seriam
autocontraditórias (falsas) nos olhares de qualquer teoria subjetiva ou epistêmica. Todavia, na
teoria objetiva isso não ocorre, porque não só as teorias verdadeiras como também as que
foram falseadas (as que não correspondem com os fatos) são coerentes como também são
verdadeiras. Pois, qualquer teoria que se apresenta seria conjecturável. Isto porque, se uma
teoria se prova falsa ela e verdadeira não pela correspondência com os fatos, mas pelo
contrário porque ela afirma-se não corresponder de forma positiva com a asserção. Mas,
corrobora para que o conteúdo verdadeiro progrida, não correndo o risco de retornar ao
mesmo erro.
A tese de Popper difere da ideia tradicional de crenças verdadeiras, que estão bem
fundamentadas sobre hábitos, heranças, costumes e alguma espécie de saber que chama
“ciência popular”. Ponde-se desta forma, sobre uma sabedoria comum, que possui maior força
e adesão de seus ouvintes. Porém, é um saber distante dos critérios que a ciência deve almejar,
que é crítica. Isso permite dizer com segurança que o cientista/filósofo, não é a imaginação ou
senso comum – mas sim, produto da crítica a essas idias iniciais aplicadas – pois, busca a
verdade, a deseja e a quer. Porém, tendo a consciência de que nunca saberá quando a
encontrará e se encontrar não saberá afirmar do que se trata. Mas, o que faz é assumir um
ideal de verdade que será o norte de busca. Mesmo que essa Verdade não possa ser obtida, o
cientista deve persistir em seu desejo. Pois, a persistência e a insistência fazem parte desse
processo do conhecimento objetivo da Ciência. “Somos buscadores da verdade, mas não
somos seus possuidores.” (POPPER, 1975, p. 53). É a ideia da existência de uma verdade que
motiva a caminhada dos cientistas.
A ideia de verdade na figura no pico da montanha, apresenta-se como algo sempre
encoberto do algo – no caso da montanha as nuvens – que nos dará a incerteza de tela atingido
ou não. Mesmo que a força de uma teoria apresente clareza e consistente, não servirá para
eliminar a dúvida de que realmente chegamos a última verdade. Não sendo a clareza e a
consistência um critério decisório para a verdade. De forma que a chegada a um cume, não
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significa o fim da escalada e que é o último pico. Pois, como se ve em teorias já citadas
anteriormente – Giordano Bruno, Kepler, Newton – apresentavam um conteúdo de alta
demonstrabilidade com argumentos consistentes, que al longo do tempo foram substituídas
por uma de maior conteúdo explicativo.
Há dois pontos que se faze necessário para compreender a verdade da ciência e
conjuntamente seu progresso. Primeiro de onde ela surge? E o outro, sobre a teoria do balde
mental. Da primeira pouco foi falado, apenas alguns lampejos em relação ao seu surgimento
pela imaginação e donde iniciou, com os pré-socráticos. Do segundo, necessita-se debruçar
com maior vigor para o compreender.
Popper, aplica essa teoria do balde mental, aos empiristas ingênuos, que acreditam no
conhecimento a partir do acúmulo de informações. Pois, segundo eles o verdadeiro
conhecimento está livre de críticas, ele é formado pela experiência pura e simples. Há uma
contestação, por parte de Popper, dessa teoria, que a ciência está além de percepções, baseia-
se na observação.
No prefácio de sua obra conjecturas e refutações, Popper, diz que nossas conjecturas
podem e vão apresentar uma segura e sólida por terem resistidos à crítica e superado suas
antecessoras. Todavia, não podem ser consideradas como verdades indubitáveis. Isto, se
afirmar por dois problemas que ao longo deste trabalho se apresentaram: (i) porque, não se
tem a certeza de ter atingido a verdade, sempre ficara a dúvida se atingimos o pico mais alto
da montanha ou se esta no pico certo da montanha; e, (ii) não é o número de ocorrências que
garantirá sua verdade – se assim for o pensamentos se estará pensando de forma indutivista.
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O que a ciência não pode possuir ou buscar é a certeza absoluta das coisas, o que se
tem é uma garantia de uma maior aproximação com a verdade – uma verossimilitude. “O alvo
da ciência é a verdade, no sentido de maior aproximação com a verdade ou maior
verossimilitude.” (SCHORN, 2012, p. 28). De tal modo, se o cientista esquecer que o rumo da
ciência é a Verdade e que ela [a verdade] é difícil de ser perseguida, não poderemos alcançá-
la e se fosse possível não se saberia. Porém, o pesquisador jamais deverá deixar de desejá-la,
sem ela o progresso não aconteceria. “O conhecimento deve continuamente progredir, caso
contrário, a ciência perde seu caráter.” (SCHORN, 2012, p. 22).
O homem, deve sempre desejar a verdade, para cumprir uma necessidade natural de
sua racionalidade, que anseia conhecer. E nesse interesse está ligado o desejo de perseguir,
juntamente com suas nuanças de acertos e erros. Ele se propõe à árdua tarefa de substituição
de uma teoria por outra melhor, mesmo que tenha que sacrificar o tempo dedicado a teoria
que pretende substituir. Isto porque:
[...] quer encontrar uma nova teoria, capaz de explicar determinados fatos
experimentais – factos que as teorias anteriores lograram explicar e factos pelos
quais elas foram efetivamente falsificadas. A nova teoria deverá também resolver, se
possível, algumas dificuldades teóricas. (POPPER, 2018, p. 400).
Para o progresso, Popper, ainda apresenta três requisitos são necessários: O primeiro
requisito é que: a nova teoria deve surgir de uma ideia unificadora simples, nova e poderosa,
que deve possuir uma conexão ou relação entre coisas e fatos até aí inconexos. Essa teoria
deve unir o que antes era separado, buscará uma interpretação única para as conjecturas que
eram divididas. O segundo requisito: é o de simplicidade, que se traduz para Popper na ideia
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Pode-se dizer que a busca da verdade possibilita o progresso científico, desde que,
cumpra os requisitos. Devendo apresentar-se como fruto da imaginação de processos da
racionalidade, promovidos por aquilo que os instintos captam. Que é processado pela
racionalidade e submetido a julgamento e testado pela refutação. Aonde apresentará a sua
resistência e se persevera estará mais próximo da verdade do que sua antecessora. O progresso
é possível se, e somente se, apresenta um conteúdo inovador, uma interpretação que não
exclua os conteúdos de verdade que a teoria anterior possui, elimine os erros e proponha
novos conteúdo a ela.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entre todos os objetivos que o homem deseja alcançar, um deles – se não o mais
importante – é alcançar a verdade. Uma das hipóteses para isso é o desejo de ser feliz.
Todavia, uma dúvida surge, se essa verdade que é desejada é possível e se sim, é possível
conte-la? A frente de trabalho à qual é proposta é o pensamento popperiano sobre o progresso
da ciência que, só é possível se ela perseguir a verdade. Como há ainda uma evolução e
inúmeras descobertas, desde nossos ancestrais no pensamento crítico. Se verifica que ainda
não se encontrou a plena verdade. Com isso, se pressupoe dois motivos: primeiro, que a
verdade não existe; e segundo ela existe, mas não é acessível ao homem; ainda, outra pode
surgir, tão capazes de encontrá-la que se acaba por duvidar dela, se não existe algo depois
dela.
A verdade à qual se objeta não é e não se trata de uma simplória verdade – uma
verdade comum. Mas, se busca uma Verdade maior. Que não tenha apenas uma relação com
os fatos, mas seja o próprio fato em sim, o objeto em seu todo, desnudado de seus mistérios.
Por isso, não há explicações que justifiquem a exclusão da metafísica. A relação sujeito-
objeto transcende o visível o palpável. O homem busca o que dá ao objeto, aquilo que o
define, tal qual, como o percebemos. Por exemplo: a maçã, o que a define como tal são suas
características físicas: seu formato, textura, gosto e aroma, é o que a define como maçã e não
pêra (tal ideia já partindo de um pré-conhecimento do que se tratam as duas frutas). De forma,
que ao conhecer os motivos dessa realidade, ainda se perguntará, se há algo a mais a ser
conhecido? Se foi possível chegar a um conteúdo com maior explicação do que aquela que se
iniciou, então se tem uma teoria com maior verossimilhança.
A pretensão de Popper ao elaborar suas observações e criar sua teoria, é demonstrar
quão frágil são as teorias do homem. Uma criação de conjecturas, de preposições que irão
necessitar de lapidação ou descarte. Conhecimento que não está dado por completo, não é
pleno. É necessária que se faça uma retomada de toda a ciência existente e realize uma
análise, compreender seu conteúdo, julgá-lo, realizar a complementação de uma teoria a outra
e se necessário excluir o que for necessário. Para que, dessa forma se atinja uma unificação
desse conhecimento – que em muitos casos estão divididos em diversos saberes. Ele quer
demonstrar que existe um único objetivo no conhecimento científico a de explicar o mundo. E
que todas as áreas de saber auxiliam para que isso ocorra. Por isso, não podemos excluir nem
uma fonte de saber, mesmo que esta apenas goteje algo.
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O que Popper ensina em sua teoria das conjecturas e refutações que o mundo é um
conjunto de trabalho. E que sim, é possível obter conhecimento naquilo que está além da
matéria. Basta saber como! E preciso levantar teorias – pois, elas são de interesse – como
fizeram com os mitos. Mitos não são verdades em absoluto, mas apresentam informações que
se bem trabalhadas poderão vir a ser. Eles demonstram o quão interessado é o homem em
colocar explicações nos fenômenos que o assunta e o espanta. Deve haver um início para a
pesquisa. Todo o conhecimento teve um início, não como possuímo-lo hoje, mas rudimentar.
As refutações, são o contínuo polir desse conhecimento. Ela irá retirar o que não
pode ser verdade e apresentará o que é verossímil. A teoria da crítica apresentada por Popper,
demonstra quão seria é a ciência. Isso se observa quando propõe sua longa e dura pesquisa ao
tribunal da falseabilidade. Em que por asserções dedutivas será buscada a eliminação da
teoria. É possível realizar uma ciência nos moldes que desejaria Popper? Por que não? Se
observar a história da humanidade vera que ela é cercada de erros e acertos e foram as dúvidas
que fizeram com que se percebe-se o erro e busca-se soluções. Poderia Ptolomeu saber que
sua tese: “a terra no centro do universo” estava errada. Naquele tempo não. Anos depois quem
demonstrou o erro foi Giordano Bruno com sua teoria heliocêntrica. Assim foi com Isaac
Newton que foi superado por Albert Einstein com sua teoria da relatividade e o que virá
depois dele? Apenas o tempo dirá.
Uma verdadeira teoria que pretende ser científica deve estar aberta a ser superada.
Com o objetivo de um dia em um determinado tempo se chegar à verdade ou a uma
verossimilitude. O tempo é fundamental na história da ciência, é em seu curso que ela se
desenvolve e compreende-se a si mesma. O que causa essas superações é a complexa relação
que os homens mantêm com o mundo. O mundo se apresenta a ele com algo que quer ser
descoberto e explicado. Faz parte do amadurecimento da humanidade a evolução. É preciso
explicar, não há como fugir desse desejo de conhecer.
A ciência popperiana, busca em tudo um saber superior, não absoluto e
dogmatizante, mas que seja o mais geral possível. Um saber de autoridade, que determina
como ocorrem as coisas. Ele busca superar a perigosa e instável segurança que a indução
causava, pois a qualquer momento aquilo que se afirmava com veemência poderia ser tido
como falso. O sol poderia deixar de nascer. Ele é regido por leis que fogem ao controle
científico. Um fato curioso se instaura com Popper, o de não possuir qualquer domínio sobre
as coisas. Esse deve ser o motivo que afirma não se chegar à verdade, pois sendo mais
complexa do que se pensa ser, não podemos possuí-la.
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O homem se torna apenas um item dentro deste imenso universo inalcançável. Que
não pode controlar as leis que o rege, por mais que seja o único animal com polegar opositor e
cérebro altamente desenvolvido. A ciência é infinita, pois não somos assim. Um ser finito
afirma ser a ciência infinita, este ser finito já não existe mais, outro ser finito afirma a mesma
coisa, sabendo-o de seu fim. Todavia, o conteúdo que estudo servirá para: (i) dar apoio as
verdades por ele descoberta e (ii) para que novas teorias surjam, sem que se caia no mesmo
erro. Se afirma ser infinito aquilo que jamais alcançaremos e sempre haverá algo novo a ser
descoberto, destronando o que acreditávamos ser a verdadeira ciência.
Se as proposições lógicas poderão afirmar com clareza e exatidão o que se busca
entender, não será essa a demonstrar a pequenez de nossa sabedoria. Ela demonstra a quão
bela é a arte da ciência, mas cabe ao método apresentar a dificuldade de entendê-la. Ao
observar um objeto pela primeira vez jamais o observara da mesma forma pela segunda, ou
pela terceira. Sempre haverá algo novo a se ver. Não era essa a ideia dos positivistas. Esse
algo novo se apresentará como aquilo que poderá excluir as informações iniciais que se
obteve ao olhar pela primeira vez, assim a forma como o objeto se apresenta muda. Um sol
que nasce no verão e igual ao que nasce no inverno. Mas, a forma como nasce é diferente e a
reação que se tem também. No verão ele nasce vigoroso, quente por demasia, logo nos
primeiros raios, com isso se busca esconde; no inverno apresenta-se tão fraco na aurora, que
se busca-o em algum espaço para se aquecer junto de seus fracos raios. Aqui se vê porque se
deve apresentar e disponibilizar à crítica uma teoria. Porque os pontos de vistas são diferentes
e isso fará com que as asserções sejam dos mais diferentes pontos e perspectivas.
Se deve considerar que o pensamento de Popper pauta-se em considerar, conservar e
retomar problemas fundamentais ao ser humano, que dá suporte ao início de toda a enorme
gama de discussões racionais envolvendo a Cosmologia. Ou seja, questões que envolvem o
universo e o mundo, sobretudo sua origem, dos quais derivarão as demais. Neste caminho, se
eleva a concepção integrada do conhecimento, onde o racionalismo, o empirismo e o
conteúdo metafísico são dependentes e complementares. A concepção de Popper sobre o
mundo é indeterminista por haver uma realidade de três mundos: o físico, o subjetivo e o
objetivo são reais e interagem linguisticamente.
O novo de Popper, está na relação recíproca entre as três dimensões da realidade, que
ocorre na linguagem. Popper não pretende averiguar o significado, as definições e a evolução
ou involução de termos. Deseja analisar a linguagem de modo que foque nas funções,
empregos, detecção de erros e na purificação (depuração) do enunciado, tornando-a, então,
refletida e aprimorada. Assinala que, atualmente, o conhecimento científico não deve se
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apartar da filosofia, por necessitar de conteúdos sentenciais. Popper aponta que a linguagem é
a forma permanente, incontornável e adequada ao debate crítico, além de ser veramente
apropriada às corretas inferências, negações, definições, reordenamentos sentenciais. Enfim, a
ampliação do que o homem conhece ou, modestamente, pensa conhecer sobre si e o mundo
ora tripartido e multi-relacional.
Popper, quer ensinar que a verdade não consiste apenas em uma linguagem formal,
mas, que seja uma lacuna aberta dentro pensamento humano, que se pergunta o real motivo de
crer em algo. A verdade é forte é imponente, algo que não posso conter unicamente dentro do
pensamento científico. Há outras áreas de conhecimento. O conhecimento sempre será
substituível, pois não reter todas as informações inerentes ao mundo.
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REFERÊNCIAS
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ARISTÓTELES. METAFÍSICA. Tradução: Edson Bini – 2ª ed. São Paulo: Edipro, 2012.
LAW, Stephen. Guia ilustrado Zahar – Filosofia. Rio de Janeiro: ed. Zahar, 2008.
MOULINES, Ulises C. Popper e Kuhn: dois gigantes da filosofia da ciência do século XX.
Tradução: Denise Camargo. São Paulo: Ed. Salvat, 2015.
PINTO, Ivan Luiz Gonçalves. O Círculo de Viena. Rio de Janeiro: PUC. Disponível em:
https://www.maxwell.vrac.pucrio.br/colecao.php?strSecao=resultado&nrSeq=9607@1&msg=
28#. Acesso em: 01 de novembro de 2020
________, Conhecimento Objetivo. Tradução Milton Amado. Belo Horizonte: Itatiaia: São
Paulo, 1975.
ZILLES, Urbano. Teoria do conhecimento e teoria da ciência. São Paulo: Paulus, 2005.