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Academia Módulo III Tópico 1
Academia Módulo III Tópico 1
Já tivemos oportunidade de mencionar aqui mesmo em nosso curso que, até meados
do século XX, a decisão sobre o que abordar no ensino de Língua Portuguesa cabia a
filólogos e gramáticos, que tinham como preocupação maior o estabelecimento de uma
gramática normativa que respeitasse as origens históricas da nossa língua e privilegiasse o
uso do padrão culto de linguagem. A Gramática, disciplina de origem grega, sempre teve
um caráter normativo, na medida em que se preocupa em estabelecer como devem
expressar-se as pessoas “de boa educação”. Não se ensinava gramática no curso de Letras
das universidades, porque se pressupunha que os que ali chegavam eram pessoas “bem
educadas”, que tinham pleno domínio do manejo do padrão culto da língua. Tinha-se como
pressuposto que a escola existia para uns poucos privilegiados e, como decorrência, que as
variedades não prestigiadas da língua devem ser ignoradas, por serem “erradas”.
O advento da Linguística deitou nova luz sobre o tema. Para os linguistas, a língua
é fenômeno histórico, social, político e ideológico. Nossa leitura do mundo varia de acordo
com a língua que falamos. Ela é instrumento de interação com o mundo, ela dá significado
ao que vemos. Impormos nossa língua a outrem é impor-lhe nossa visão de mundo.
Considerar o padrão culto da língua como único digno de ser objeto de estudo é postura
preconceituosa. O português do Brasil abrange variedades regionais e diferentes variantes
correspondentes à estratificação socioeconômica da população brasileira.
Se estão certas até aqui as nossas considerações, é óbvio que entre a linguística e a
etnologia há um estreito ar de família; uma e outra estudam artes coletivas.
(Mattoso Câmara 1944:30)
Há, entretanto, certas condições que tornam a língua como uma coisa à parte em
face dos fatos não vocais de cultura. (Mattoso Câmara 1972: 268)
Das práticas escolares, a mais questionada nesse novo contexto é a do velho método
do ensino de gramática. Entre outras coisas, é válido lembrar que os objetos linguísticos
com que lidamos no dia-a-dia são sempre textos, nunca sentenças isoladas, que é o que
povoa nossos manuais de linguagem. As gramáticas descrevem uma língua sem existência
real.
O aluno pode perfeitamente estar senhor de todas as regras da gramática, e
não dizer o que pensa e o que sente. A gramática, abstrata e árida, com que se
cansa o cérebro das crianças, não ensina a escrever. Ninguém cuida de lhe negar
utilidade e valor: mas querer habituar o aluno ao manejo da língua só com o
estudo da gramática e começar esse ensino pelas regras abstratas da lexicologia e
da sintaxe é o mesmo que querer ensinar matemática só como o estudo da
geometria analítica. (Olavo Bilac)
Bibliografia
POSSENTI, Sírio – Campinas, SP, – Porque não ensinar Gramática nas escolas. –
Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil, 1996.
POSSENTI, Sírio – in: uma proposta para o ensino de língua portuguesa - PUC Rio
www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0115421_03_cap_07.pdf
BAKHTIN, M. – Os gêneros do discurso. In: ____ Estética da criação verbal. São Paulo:
Martins Fontes, 1992, pp. 277-326.