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Resumo: Investigaram se as condições de trabalho docente na pandemia afetaram a saúde mental dos professores
brasileiros quanto à depressão, ansiedade e estresse. Participaram do estudo 733 professores que lecionam em
diferentes níveis de ensino, sendo 583 do sexo feminino. Foram utilizados um questionário com dados
sociodemográficos, um survey com questões relacionadas à pandemia e a DASS-21 que avalia o estresse, a ansiedade
e a depressão. Os instrumentos ficaram disponíveis nos meses de setembro e outubro de 2020. Todas as condições
investigadas se mostraram presentes no cotidiano de 92% dos professores e correlacionaram positivamente com
maiores escores de estresse, ansiedade e depressão. Os dados demonstraram que osparticipantes manifestaram
discordância em relação ao trabalho on-line, piorando as condições de adoecimento mental, bem como revelaram a
necessidade da ampliação do cuidado com a saúde mental do professor em período pandêmico.
Palavras-chave: Saúde mental,saúde do professor, COVID-19.
Abstract: They investigated whether the working conditions of teachers in the pandemic affected the mental health of
Brazilian teachers in terms of depression, anxiety and stress. A total of 733 teachers who teach at different levels of
education participated in the study, 583 of whom were female. A questionnaire with sociodemographic data, a survey with
questions related to the pandemic and, the DASS-21 that assesses stress, anxiety, and depression were used. The
instruments were available in September and October 2020. All conditions investigated were present in the daily lives of
92% of teachers and positively correlated with higher scores for stress, anxiety, and depression. The data showed that
participants disagreed with online work, worsening the conditions of mental illness, as well as revealing the need to expand
care for the mental health of teachers during a pandemic period.
Key-Words: Mental health, teacher health, COVID-19.
Resumen: Investigaron si las condiciones laborales de los docentes enla pandemia afectaronlasalud mental de los docentes
brasileñosen términos de depresión, ansiedad y estrés. Enelestudioparticiparonun total de 733 docentes que enseñanen
diferentes niveles educativos, de loscuales 583 eranmujeres. Se utilizóuncuestionariocondatossociodemográficos, una
encuestacon preguntas relacionadas conla pandemia y el DASS-21 que evalúaelestrés, laansiedad y ladepresión. Los
instrumentos estuvierondisponiblesenseptiembre y octubre de 2020. Todas las condiciones investigadas estuvieron
presentes enla vida diariadel 92% de los docentes y se correlacionaron positivamente conpuntuaciones más altas de estrés,
ansiedad y depresión. Los datosmostraron que los participantes no estaban de acuerdoconeltrabajoen línea, empeorandolas
condiciones de enfermedad mental, además de revelar lanecesidad de ampliar laatención a lasalud mental de los docentes
durante un período pandémico.
Palabras clave: salud mental, salud docente, COVID-19.
1
Professora da Faculdade de Tecnologia e Ciências de Petrolina, Petrolina, Pernambuco, Brasil.
jackeline.souza1@gmail.com. https://orcid.org/0000-0003-3402-3481
2
Docente do Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino, São João da Boa Vista, São Paulo,
Brasil.betaniadellagli@gmail.com. https://orcid.org/0000-0002-8805-2838
3
Doutorando em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano do Instituto de Psicologia da Universidade de
São Paulo, São Paulo, Brasil. rodney@usp.br. https://orcid.org/0000-0003-1149-5718
4
Docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo,
Brasil.lmcaetano@usp.br.https://orcid.org/0000-0003-2068-7375
vírus ocorreu na China em dezembro de 2019 contando com mais de 45.161 participantes
e rapidamente se espalhou para outros demonstrou que durante a pandemia, 40,4%
países (SCHMIDTet al., 2020). Após 18 meses das pessoas se sentiram frequentemente
do primeiro diagnóstico foram confirmados tristes ou deprimidos, e 52,6%
mais de 170 milhões de infectados pelo frequentemente ansiosos ou nervosos; 43,5%
mundo e quase três milhões de mortes. No relataram início de problemas de sono, e
Brasil foram mais de 16 milhões de casos e 48,0% problema de sono preexistente
cerca de 500 mil mortes (WHO, 2021). agravado (BARROSet al., 2020).
Não existe tratamento alopático com A fim de evitar a perda do ano letivo as
resultados cientificamente reconhecidos para escolas – da educação infantil ao superior –
COVID-19 (WHO, 2021) e estamos precisaram mudar em um curto período de
vivenciando o início da imunização com a tempo seu projeto didático pedagógico para
vacina no Brasil.As autoridades de saúde contemplar essa nova realidade: o ensino
orientaram políticos e governantes a que antes era ministrado pelo professor
estabelecerem medidas de contenção com o presencialmente passou a ser ofertado pela
objetivo de “achatamento” da curva de modalidade on-line.Um dos desafios dessa
propagação da doença (ANDERSONet al., adaptação foi o tempo, pois toda alteração
2020). As medidas de contenção mais de projeto pedagógico necessita de tempo
adotadas de forma voluntária ou não na para ser implantado, algo que o imediatismo
maioria dos países são: ficar em casa, ou imposto pela imprevisibilidade da pandemia
isolamento social (JIAet al., 2020; WU, não permitiu (CASTAMAN; RODRIGUES,
Chaominet al., 2020; WU, Joseph et al., 2020).
2020), distanciamento social quando em Portanto, se os aspectos destacados
espaços públicos (LEWNARD; LO, 2020) e uso anteriormente, como o medo de ser
de máscaras (FENGet al., 2020; HORWELL; acometido pela doença, o isolamento social e
MCDONALD, 2020). A adesão a tais medidas as incertezas da pandemia, possuem
pode evitar a sobrecarga dos sistemas de potencial de gerar angústia e de afetar a
saúde (GIORDANOet al., 2020; KRAEMERet saúde mental da população (SILVA; SANTOS;
al., 2020; MATRAJT; LEUNG, 2020). SOARES, 2020), pensamos que a profissão
Essas medidas provocaram uma docente que já possuía anteriormente à
reestruturação no modo de vida das pandemiaum conjunto de fatores de risco
pessoas.As reações mais frequentes nesse desencadeadores de altos índices de
período são o medo (de contrair e doença e adoecimento (FERREIRA-COSTA; PEDRO-
de infectar outras pessoas), a angústia, a SILVA, 2019), pode estar vivenciando
solidão, a tristeza e a insônia, sendo que, dificuldades ainda ampliadas.
dentre as doenças mentais se destacam a
ansiedade e o estresse (SILVA; SANTOS; O ADOECIMENTO PSÍQUICO DO PROFESSOR
SOARES, 2020). Estudos revelam implicações
psicológicas e psiquiátricas, provocando No caso dos professores o processo de
principalmente um aumento no número de adoecimento psíquico já era conhecido
pessoas com doenças mentais, tais como os (Organização Internacional do Trabalho,
transtornos ansiosos e depressivos 1984). Isso pode ser constatado, na medida
(ORNELLet al., 2020). Pesquisa brasileira em que, segundo dados do Departamento de
Perícias Médicas do Estado de São Paulo, no docência (CODO, 1999; FERREIRAet al., 2015;
ano de 2018 ocorreram 53.162 afastamentos GASPARINI; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2006;
de professores da rede pública estadual SILVA, E. P. 2015; SOUZA; COSTA, 2011;
devido à transtornos mentais e SOUZAet al., 2011); ausência de união entre
comportamentais. Esse número equivale a os educadores (SILVA, E. P. 2015; SIMPLÍCIO;
mais de 40% das licenças emitidas naquele ANDRADE, 2011; SOUZAet al., 2011); falta ou
ano, sendo a principal causa da ausência do dificuldade de diálogo com a direção e a
professor no exercício de sua função coordenação pedagógica da escola
(GIAMMEI; POLLO, 2019). (CARRARO, 2015; CODO, 1999; ELIAS, 2014;
A incidência elevada de docentes da GASPARINI; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2006;
educação básica adoecidos psiquicamente foi SIMPLÍCIO; ANDRADE, 2011).
verificada em diversos outros Estados como Corroborando essa relação com o
apresentados nos estudos de Baldaçaraet al., agravamento do estado mental dos
(2015), realizado em Palmas (TO); Ceballos e educadores, Ferreira-Costa e Pedro-Silva
Santos (2015), em Jaboatão dos Guararapes (2018) verificaram que professores que
(PE); Gasparini, Barreto e Assunção (2006), vivenciavam essas características mais
em Belo Horizonte (MG); Reiset al. (2005), intensamente em sua rotina de trabalho
em Vitória da Conquista (BA); Souzaet al. apresentavam níveis maiores de sintomas
(2011), em Salvador (BA); Tibúrcio e Moreno ansiosos e/ou depressivos.Portanto, no caso
(2009), em Tubarão (SC) e Valle (2011), em desses profissionais, a manifestação de
Poços de Caldas (MG). doenças mentais ocorre em decorrência do
Utilizando como principal ferramenta desgaste ocasionado pela dinâmica do
de coleta de dados o próprio relato dos trabalho (SELIGMANN-SILVA, 2011; VICENTE,
professores, pesquisadores da temática 2015).
descrevem os principais fatores que explicam Desgaste pode ser definido como a
o adoecimento docente: desvalorização perda da capacidade potencial e/ou efetiva
social da profissão (COSTA, 2014; INOCENTE, corporal e psíquica resultante do processo de
2005; SIMPLÍCIO; ANDRADE, 2011);baixos adaptação dos trabalhadores frente às
salários (INOCENTE, 2005; SIMPLÍCIO; demandas e interações decorrentes de suas
ANDRADE, 2011); indisciplina dos estudantes funções (LAURELL; NORIEGA, 1989;
(CODO, 1999; GASPARINI; BARRETO; SELIGMANN-SILVA, 2011). Assim, além da
ASSUNÇÃO, 2006; SIMPLÍCIO; ANDRADE, singularidade observada no processo de
2011; SOUZA ; COSTA, 2011); ações violentas ensino-aprendizagem de cada aluno, as
praticadas por educandos e pais em relação exigências do magistério obrigam o professor
aos docentes (GASPARINI; BARRETO; a enfrentar desafios que, muitas vezes,
ASSUNÇÃO, 2006; SIMPLÍCIO; ANDRADE, excedem suas funções na escola ou suas
2011); sobrecarga de funções, como a de capacitações construídas ao longo de sua
organização dos materiais, elaboração das formação (FERREIRA-COSTA; PEDRO-SILVA,
aulas e correções das lições e provas 2018).
(CARRARO, 2015; CODO, 1999; ELIAS, 2014; A constante necessidade de adaptações
FERREIRAet al., 2015; REISet al., 2005; para responder às demandas características
SOUZAet al., 2011); ambiente físico e da profissão docente (OIT, 1984) ampliaram-
materiais inadequados para o exercício da se de modo significativo na pandemia, pois
e para diversas faixas etárias. Na DASS-21, os participar da pesquisa aconteceu via mídias
participantes apontam o grau de intensidade sociais (WhatsApp, Facebook, Instagram)
dos sintomas descritos em cada item da enviando um link do Google Forms contendo
escala durante a semana anterior. É uma os instrumentos da pesquisa. Utilizamos a
escala do tipo Likert de 4 pontos, sendo 0 técnica “bola de neve” (VINUTO, 2014) na
(não se aplicou de maneira alguma) e 3 qual o participante além de responder o
(aplicou-se muito, ou na maioria do tempo). questionário também era convidado a
Depressão, ansiedade e estresse são divulgar para outros sujeitos que atendessem
indicados pela soma dos escores dos 21 itens. aos critérios de inclusão e exclusão do
Cada subescala contém sete itens para estudo.
avaliar o estado emocional de depressão, No formulário constava o Termo de
ansiedade e estresse. No estudo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) na
validação, todas as subescalas tiveram níveis primeira página.O participante só poderia
adequados de consistência interna, sendo avançar ao clicar na opção: “li, desejo
0,92 para depressão; 0,90 para estresse; 0,86 participar da pesquisa e estou de acordo com
para ansiedade. No que se refere à medida o conteúdo descrito nesse termo”,que
de confiabilidade da estrutura fatorial, as significava a concordância com a participação
autoras encontraram valores aceitáveis no estudo epossibilitava a continuidade do
sendo 0,86 estresse, 0,83 ansiedade e 0,90 acesso às questões. Foi solicitada, de forma
depressão. O escore é obtido pela soma dos optativa, a inserção do e-mail para o envio da
itens em cada subescala e para calcular o devolutiva coletiva do estudo.
escore final o total de cada subescala é Para análise dos dados, foram
multiplicada por 2. Nesse estudo utilizados recursos da estatística descritiva e
trabalhamos apenas com os escores de inferencial com o auxílio do software
estresse, ansiedade e depressão estatístico SPSS. A partir da análise descritiva
separadamente. foram realizadas análises a partir da média,
frequência e porcentagem das respostas e
PROCEDIMENTO para verificar a associação entre as diferentes
variáveis foram realizados o teste T de
O projeto foi aprovado pelo Comitê de comparação de médias entre dois grupos e o
Ética em Pesquisa (CEP) com Seres Humanos teste de correlação de Pearson.
do Instituto de Psicologia da USP, sob o
número CAAE RESULTADOS
35356120.2.0000.5561.Portanto, essa
pesquisa está embasada nos parâmetros Investigando a opinião dos professores
éticos descritos na resolução 466/12 do brasileiros acerca da pandemia pela COVID-
Conselho Nacional de Saúde. 19, 20% desses profissionais responderam
A coleta de dados aconteceu via ser essa problemática real e grave; 4%
formulário on-line e o mesmo esteve descreveram esse problema como sendo de
disponível durante um mês e dez dias gravidade moderada e somente 1% da
(setembro e outubro de 2020), com novas amostra se distribuiu entre a opinião de que
divulgações para recrutar participantes a essa pandemia possui pouca gravidade
cada semana.A divulgação e convite para (0,7%) ou emitiram uma avaliação de que
Tabela 2 – Escores médios dos fatores de depressão, ansiedade e estresse e a comparação dessas
medidas em função das dificuldades relatadas pelos professores brasileiros.
Depressão Ansiedade Estresse
Média T p Média T p Média T P
Enfrentou Não 0,50 0,36 0,66
3,78 0,000 4,80 0,000 7,24 0,000
dificuldades Sim 0,83 0,72 1,25
Dificuldade na Não 0,67 0,59 1,02
-4,63 0,000 -3,49 0,000 -6,03 0,000
didática Sim 0,92 0,78 1,35
Dificuldade pelo Não 0,73 0,63 1,11
não acesso dos -2,76 0,006 -2,25 0,025 -3,12 0,002
Sim 0,88 0,75 1,29
alunos
Dificuldade por Não 0,70 0,61 1,09
-5,09 0,000 -4,34 0,000 -5,35 0,000
trabalhar em casa Sim 1,01 0,87 1,42
Dificuldade Não 0,72 0,60 1,10
-4,27 0,000 -4,82 0,000 -4,84 0,000
material Sim 0,97 0,89 1,40
Conhecimento Não 0,78 0,64 1,17
p>
limitado sobre Sim 0,84 -1,09 0,78 2,34 0,02 1,25 -1,41 p > 0,05
0,05
ambiente virtual
Dificuldade com as Não 0,73 0,62 1,12
câmeras -3,06 0,001 -3,14 0,001 -3,15 0,001
Sim 0,90 0,79 1,31
Dificuldade de Não 0,76 0,66 1,17
relacionamento Sim 1,11 -4,21 0,001 0,98 -3,41 0,001 1,43 -3,01 0,001
com os pais
Dificuldade no Não 0,76 ,66 1,16
relacionamento
Sim 1,15 -4,51 0,000 ,93 -2,85 0,000 1,50 -3,75 0,000
com os
coordenadores
Fonte: elaborada pelos autores com dados da pesquisa
Para além das dificuldades materiais, (53%), também não concordavam (65%) –
informacionais ou de relacionamento, os pelo menos não concordavam com a forma
professores enfrentaram o fato de atuarem como isto foi implantado e executado nesse
em um formato de ensino com o qual além momento. Essa atuaçãoprofissional contrária
de não se sentirem preparados tecnicamente à concordância também esteve associada
de verificar se houve ou não a ampliação do BARROS, Marilisa B. A.; LIMA, Margareth G.;
adoecimento dessa amostra que não foi MALTA, Deborah C.; SZWARCWALD, Célia L.;
considerada pelo presente estudo. AZEVEDO, Renata C. S.; ROMERO, Dalia;
Como outra sugestão de estudos SOUZA JÚNIOR, Paulo R. B.; AZEVEDO, Luis
futurosconsideramos importante investigar O.; MACHADO, Ísis E.; DAMACENA, Giseli N.;
GOMES, Crizian S.; WERNECK, André O.;
quais fatores individuais se correlacionam
SILVA, Danilo R. P.; PINA, Maria de Fátima;
com professores saudáveis, ou seja, se as GRACIE, Renata. (2020). Relato de
condições laborativas dos professores tristeza/depressão, nervosismo/ansiedade e
representam um contexto com tendência ao problemas de sono na população adulta
adoecimento, seria muito importante brasileira durante a pandemia de COVID-
identificar fatores protetivos. Desse modo, 19. Epidemiologia e Serviços de Saúde,
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