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ROBIN BLACKBURN
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Escravismo Colonial:
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1776-1848

Traducáo de
MARIA BEATRIZ DE MEDINA
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RIO DE jANEIRO • SAO PAULO

2002
Introducáo:
Escravidáo colonial no Novo Mundo
por volta de 1770

Behold the peace thar's owned by him who feels


He does no wrong, or outrage when he deals
In human flesh; or yet supplies the gold
To stir the strife, whose victims you behold ...
Perhaps the Cuban merchant too, may think
In guilt's great chain he's but the farthest link.
Forsooth, he sees not al1 the ills take place,
Nor goes in person to the human chase;
He does not hunt the negro down himself
Of course he only furnishes the pelf.
He does not watch the blazing huts beset,
Nor slips the horde at rapine's yel1, nor yet
Selects the captives from the wretched band
Nor spears the aged with rus right hand ...
He does not brand the captives for the mart,
Nor stow the cargo - 'tis the captain's part ...
His agents simply snare the victims first,
They make the war and he defrays the cost. ..
To human suffering, sympathy and shame,
His heart is closed, and wealth is all his aim."

o mercador de eSCIYlVOJ(1840), R. R. Madden

·Vede a paz que possui aquele que se lile / Que nada faz de errado, nem agride quando vende I Carne humanal
ou aiuda fornece o euro IQue anima o combate cujas vítimas contemplais ... ITalvez o mercader cubano também
pense !Na grande corrente de culpa da qual é ocio longínquo. I Aliviado, nao ve todos os males que sucedem /
Nem vai cm pessoa 11ca~a humana; / Ele próprio n~o persegue o negro; I É claro, _6 faz abrir a bolsa. I Nao
assiste ao ataque as cabanas cm fogo, I Nem passa pela horda com gritos de rapina, e nem I Aguilhoa os velhos
ccm sua mio direita ... I Ele nao separa os cativos para o mercado, / Nem arruma a carga - esta. a parte do
capitáo ... I Seus agentes apenas capturam primeiro as vltiuias, !El es fazem a guerra e ele paga o custo ... !Para o
sofrimento humano, simpatia e vergouha, I Seu cora~ao se fecha, ele 56 visa a riqueza. (N. da T.)
14 ROBIN BLACKBURN

orvolta de 1770havia quase dois milhóes e meiode escravoslabutando nos campos,


P engenhos, minas, oficinas e residencias das colonias do N ovo Mundo. A máo-
de-obra escrava produzía os artigos mais desejados e importantes do comércioatlántico
e europeu: asúcar, café, algodáo e cacau do Caribe; tabaco, arroz e anil na América
do Norte; ouro e asúcar na América do Sul espanhola e portuguesa. Essas merca-
dorías representavam cerca de um terso do valor do comércio europeu, número in-
flado por regulamentos que obrigavam o transporte de produtos coloniais para a
metrópole antes de sua reexportacáo para outros destinos. A navegacáo atlántica e a
colonizaqáo européia do Novo Mundo fizeram das Américas a fonte mais conve-
niente de produtos tropicais e subtropicais para a Europa. A taxa de crescimento do
comércio atlántico no século XVIII sobrepujou todos os outros ramos do comércio
europeu e criou fortunas fabulosas. Ainda assim, esta conexáo impressionante entre
império e escravidáo estava pata entrar em crise terminal.
O período entre 1776 e 1848 testemunhou sucessivas contestacóes dos regimes
de escravidáo colonial, le~ando a destruicáo quer da relacáo colonial, quer do siste-
ma escravista ou de ambos cm cada urna das principais colonias do Novo Mundo.
A contestacáo do império e a contestacáo da escravidáo eram, em principio, proje-
tos dessemelhantes e distintos. Todavia, neste período eles se entre lasaram quando
os colonos resistiram ao dominio imperial e os próprios escravos tentaram explorar
qualquer enfraquecimento do aparato de controle social. Todas as potencias colo-
niais perrnitiam a escravidáo e todos os sistemas escravistas estavam integrados em
um ou outro império transatlántico. A escravidáo em grande escala nas plantations
havia se desenvolvido no Caribe, no século XVII, como resultado do ernpreendi-
mento privado e da iniciativa independente; depois de algumas décadas de autono-
mía virtual, os donos de plantations conquistaram a protecáo interessada da Inglaterra
ouda Franca, potencias que tinham poder naval suficiente para manter acuados piratas,
corsários e rivais coloniais. Os novos sistemas escravistas desenvolveram-se dentro
do arcabouco colonial e geraram grandes lucros comerciais e receitas alfandegárias
para a rnetrópole imperial. Mas para que as plar/lations prosperassem, as autorida-
des imperiais tiveram de resistir a. t:enta~áode regulamentar excessivamentee sobretaxar
o comércio de seus produtos.
As estruturas do império eram vulneráveis de forma mais imediata do que as de
dorninacáo e a exploracáo de escravos. O poder dos proprietários de escravos con-
centrava-se nas Américas; o poder imperial estendia-se pelas distancias oceánicas e
dependía da alíanesamais ou menos voluntária das classes de proprietários das colo-
nias. A medida a que populacáo de colonos europeus fui se reproduzindo pelas ge-
racóes, desenvolveram-se instituiqóes e recursos que reduziam a dependencia a
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metrópole. Na segunda metade do século XVIII as elites coloniais de toda a Amé· Tabela 1 Estimativa das populasócs escravas nas colonÍas americanas em 1770
rica ganharam mais autoconfianca, estivessem ou nao envolvidas com a proprieda- Escravos PopulOfáo total
de de escravos, A vitalidade do comércio atlanricoera tal que os monopólios comerciáis
estavarn a ponto de explodir em 1770. Depois da Guerra dos Sete Anos (1756-63), América británica 878.000 2.600.000
(América do Norte británica) (450.000) (2.100.000)
todas as potencias imperiais aceitaram a pressáo por maior autonomia colonial e pro-
(Caribe británico) (428.000) (500.000)
moveram projetos de reforma. A contestacáo colonial aos funcionários e mercado-
América portuguesa (Brasil) 700.000 2.000.000
res metropolitanos representava urna aspiracáo ao autogoverno; foi ao mesmo tempo
América francesa (Caribe) . 379.000 430.000
reivindicacáo de maior liberdade económica e afirma'iao da nova identídade e da América espanhola 290.000 12.144.000
civilizacáo americana autónoma, A exigencia americana de liberdade e autodeter- (Caribe espanhol) (50.000) (144.000)
mina'lao fortaleceu os ataques a oligarquia e ao governo arbitrário no Velho Mun- (Continente espanhol) (240.000) (12.000.000)
do. Mas a rejei'laodos regimespolfticos do VelboMundo nao pressupunha mudancas Caribe holandés 75.000 90.000
fundamentáis nas instituicóes sociais. Um dos objetivos deste livro descobrir por
é Caribe dinamarqués 18.000 25.000
que a crise no modo de dominacáo política as vezes de~nou urna crise do regime
social, cm especial da instituicáo da escravidáo,
O tamanho das populacóes escravas coloniais nao retlete nem o tamanho geográfico
Esta introducáo busca fornecer um esboce dos sistemas escravistas coloniais de
dos diferentes impérios nem a primazia da colonizacáo. A Espanha, a primeira e
meados do século XVIII e estabelecer seus pontos fortes e fracos característicos, as
ainda maior potencia colonial do Novo Mundo, estava em quarto lugar como pro~
vésperas daquela "Idade da Revolucáo" na qual teriam papel tao importante.
prietária de escravos. A Grá-Bretanha e a Franca, que nao tinbam colonias com es-
cravos em 1640, agora possuíam asplantations escravistas mais florescentes do N ovo
Os sistemas de controle mercantilista buscavam dirigir o comércio colonial, e para
Mundo. A populacáo escrava total do Brasil pode ter sido maior do que a das coló-
isso empregavam dezenas de milhares de fuocionários. A Grá-Bretanha permitía
nias francesas, mas a estimativa incerta e a escravidáo estava um tanto menos con-
é
urna espécie de livre comércio imperial e náo respeitava o monopolio colonial de
centrada no setor exportador. O Brasil era colonia de Portugal, mas Portugal era
seus rivais. Mercaderes franceses tínham permissáo de reexportar sem impostes pro-
quase urna semicolónia británica, e assim grande parte do ouro produzido pelos escravos
dutos das plantations e recebiam um bónus pelos escravos que vendiam aos dones de
no Brasil acabava indo para Londres. A Crá-Bretanha e a Franca tínham vigor co-
plantatw1JJ nas Antilhas. As burocracias reais de Espanha e Portugal exigiam o con-
troledireto da prata e do ouro produzidos em suas possessóesamericanas.Em princípio, mercial para criar as colonias escravistas mais produtivas, embora as potencias ibé-
os monopólios coloniais permitíam aos mercaderes metropolitanos recolber um ex- ricas ainda rnantivessem o domínio de 'imensosimpérios continentais. E, ern contraste
cedente e impediam o comércio Interamericano. Mas o próprio vigor do comércio com os Países Baixos, a Crá-Bretanha e a Fran'ia foram capazes de mobilizar a for-
atlántico tendia a fazé-lo ultrapassar as fronteiras prescritas. O contrabando prova- 'la necessária para defender suas conquistas coloniais no Novo Mundo. Embora as
velmente respondia por pelo menos um décimo de todo comércio,apesar dos funcio- relacóes sociais capitalistas estivessem mais desenvolvidas na Grá-Bretanha do que
nários da alfandega e do tesouro e das patrulhas navais regulares. Apesar da fraqueza na Franca, o desenvolvimento vigoroso do comércio e da manufatura franceses no
de Portugal e das concessóes comerciáis feitas a Grá-Bretanha, os mercadores de século XVIII equiparon-os aos británicos. A exportacáo francesa de 3'1úcarrefina-
Lisboa e do Porto mantinham o controle do comércio brasileiro, mesmo que isso do ou de tecidos de algodáo excedeu a británica na década de 1760; matérias-pri-
significasse vender tecidos británicos em traca do ouro do Brasil. N a década de 1760 mas coloniais baratas, fornecidas com isencóes e incentivos especiais, ajudaram a
a principal raiso» d'¡tre das iLhasholandesas era como centros do comércio nao re- possibilitar um enclave de acumulacáo que utilizava máo-de-cbra escrava.
gula mentado. O uso de escravos africanos permitirá a Gra-Bretanha alcancar a primeira posi-
Os diferentes padróes de desenvolvimento colonial produziram a divisáo por terri- sao como potencia colonial americana e desenvolver suas possessóes na América até
tório da populacáo escrava do Novo Mundo cm 1770, mostrada na Tabela 1,a seguir. que suas exportacóes ultrapassaram as da América espanhola. Na década de 1770, as
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colonias escravistas das Antilhas francesas lutavarn para superar as Índias Ocidentais (_fa no hemisfério. Os proprietários de escravos teriam participacáo importante nestes
británicas. O valor anual da exportacáo colonial do início da década chegou a 5,6 milhóes levantes, quer nas 13 colonias inglesas da América do N orte na década de 1770, quer
de libras nas colonias británicas, 5,2 milhóes nas colonias francesas, 1,8 milhao no Brasil nas Antilhas francesas em 1788-93, quer na Venezuela, ern N ova Granada, no Peru e
e 4,9 milhóes em toda a América espanhola. Mercadores e fabricantes británicos no rio da Prata nas décadas de 1810 e 1820. Os proprietários de escravos do Brasil e
mantinham com ampla margem a lideranca do fornecimento dos mercados coloniais; do Caribe espanhol e británico jogaram suas cartas de forma diferente e evitaram ao
sua exportacáo para toda a América era pelo menos duas vezes maior que a dos fran- máximo os levantes, mas também rnarcaram sua presenC;a. Os senhores de escravos
ceses. O cornércio transatlántico exigía aproximadamente meio milháo de toneladas americanos deste período eram visivelmente menos conservadores que os ricos e po-
em meios de transporte marítimo e empregava mais de cem mil rnarinheiros e traba- derosos de outras regióes, fossem estes danos de minas no México ou proprietários de
!hadores nas docas. O lucro británico no comércio atlántico vinha principalmente da terras na Europa. Algumas observacóes sobre o caráter da escravidáo encontrada nas
organizacáo capitalista eficaz do transporte marítimo, do fornecimento de manufatu- Américas nesta época podem ajudar a explicar isso.
ras e das financas comerciais; o lucro comercial francés, que no todo chegava a. metade
do comércio colonial de exportacáo, dependia mais do rnonopólio mercantilista. O tipo de escravidáo que predominava nas Américas no século XVIII nao deveria
Ero. meados do século XVIll a Gra-Bretanha e a Franca eram, segundo o teste- ser considerado urna relíquia da Antigüidade ou do mundo medieval. Os sistemas
munho geral de contemporáneos, os Estados mais poderosos, esplendidos e dinámi- coloniais eram de construcáo muito recente e de caráter altamente comercial. Cru-
cos do mundo. Cada um a seu modo, Versalhes e Westminster eram os exemplos de zavam todo um oceano e estavam enredados em rivalidades. Os escravos erarn tra-
governo da época. Depois de Portugal, Espanha e Países Baixos, haviam criado uma zidos exclusivamente da África, e a grande maioria deles sujeitava-se a regimes
rede mundial de colonias e bases comerciais, Foram os primeiros impérios verdadei- durissimos de trabalho. Ero contraste, as formas anteriores de escravidáo eram menos
ramente globais e transoceánicos da história humana. O Novo Mundo era considera- extensas, menos comerciáis e mais heterogéneas. Os escravos do N ovo Mundo eram
do área crucial de testes por estadistas importantes como Pitt, o Velho, e Choiseul. Até propriedade económica, e o principal motivo para possuir escravos era a exploracáo
mesmo o abade Raynal, que apoiava a nova crítica filosófica da escravidáo, acreditava económica; com este fim, pelo menos nove décimos dos escravos americanos foram
que as plantations acucareiras haviarn substituído as minas de ouro como esteios do postas a trabalhar na producáo de mercadorias. I

império. Em suaHistoire des Deu» Indes (Historia das duas Índias} (1770), Raynal ins- Em outras 'sociedades, a escravidáo teve urna capacidade camaleónica de se adap-
ta as autoridades espanholas a promoverem a economía de plantation em Cuba para tar a. formacáo social circundante; como uma perna mecánica social, ampliou o poder
que rivalizassem com as conquistas dos proprietários da Virgínia, que forneciam taba- dos proprietários de escravos de forma apropriada a cada sociedad e - talvez pelo
co a Europa, ou de Sao Domingos, que supriam de acúcar metade da Europa. aumento de urna linhagem ou fornecendo um núcleo de administradores de confían-
O Atlantico e o Caribe agigantara m-se nas guerras do século xvm. A Grá-Bretanha ~a. Nas Américas do século XVIII o uso de escravos na agricultura e na mineracáo
e a Franc;a protegiam seus impérios com marinhas que compreendiam, cada urna, de ajudou a ampliar o alcance do capital mercantil e manufatureiro e forneceu a regióes
sessenta a oitenta "navios de linha" e um enxame de embarcacóes menores; a fursa em industrializacáo matérias-primas e mercados. Elizabeth Fax Genovese e Eugene
naval da Espanha era apenas um pouco menor e incluía os eficientes guarda-costas do Genovese identificaram o impulso para a acumulacáo mercantil como forca propulso-
Caribe. Os Países Baixos, derrotados no Brasil no século XVII, eram apenas urna potencia ra por tris do surgimento dos novas sistemas escravistas. A parceria de mercadores e
americana menor. As conquistas inglesas e francesas no Caribe só furam sustentadas donos de plantations no N ovo Mundo levou a. criacáo de um empreendimento rnanu-
devido ao uso macice do poder naval e da disponibilidade de uro fluxo constante de fatureiro e agrícola integrado. As próprias plantations escravistas incorporaram os avan~os
emigrantes. Depois do Tratado de Ryswick em 1697, houve poucas alteracóes territoriais na técnica agrícola compatíveis com o trabalho em turmas coordenadas. Em geral, os
no Caribe, mas a ameac;a ainda existia. No entanto, em 1770 chegou-se a uro impor- empresários que as dirigiam dispunham-se a adatar métodos de processamento ino-
tante ponto crítico. As vitórias da Crá-Bretanha na Guerra dos Sete Anos permiti- vadores e tinham recursos para com prar os produtos da indústria capitalista e da agri-
rarn-lhe expulsar os franceses da América do Norte. Desta época em diante, os levantes cultura comercial. O dono da plantation do Novo Mundo, ao comprar implementos
internos sobrepujaram e deslocaram a rivalidade imperial do papel-chave na mudan- como parte da troca das mercadorias que fornecia, podia aumentar a producáo, em
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res posta as pressóes de mercado, de forma muito mais rápida que os senhores feudais expansáo do fomecimento só dependia do custo de limpar aterra, adquirir escravos e
da Europa oriental e com base numa complementaridade maior com o capital manu- equipamento e pagar supervisores assalariados.A demanda européia de mercadorias exóticas
fatureiro. A pr6priaplantation representava uma &<Janhada organizacáo e da fiscali- era tal que esses custos podiam ser cobertos com folga."
za<Jaoda producáo. As turmas de escravos nos campos e as equipes de escravos nos A caracterizacáo aquí apresentada refere-se as formas predominantes de escra-
engenhos eram mobilizadas para um trabalho que era realizado sob coacáo, de forma vidáo americana no século XVIII N a América espanhola e no Brasil portugués,
intensa e continua. Manuel Moreno Fraginals examinou as formas pelas quais o en- havia também resíduos de um padráo anterior e rnais difuso. É necessário distin-
genho de a<Júcarantecipou alguns métodos de um industrialismo capitalista emergente, guir entre a escravidáo acessária do início do colonialismo espanhol ou portugués e
com sua calibragem precisa da rnáo-de-obra e subordinacáo a uro ritmo mecánico. O a escravidáo sistemica, ligada as plantations e a producáo de mercadorias, que se tor-
processo de trabalho altamente coordenado da "pla11Ialion" acucareira do final do sé- nou dominante no século XVIII A "escravidáo acessória" dos espanhóis nao en-
culo XVIII lernbra em parte a "planta" ou instalacáo industrial do futuro.' volvía colonias com maioria escrava, a exclusáo dos escravos de todos os cargos de
Todavia, esses autores marxistas distinguem cor.retamente a escravidáo do Novo responsabilidade nem a nega<Jao de atributos humanos ao cativo. A introducáo de
Mundo de um regime de producáo generalizada de mercadorias, As empresas escravistas escravos ajudou a consolidar uma superestrutura imperial de exploracáo que nao se
ainda tinham raízes na chamada "economia natural" - o cultivo de subsistencia e tra- baseava principalmente em máo-de-obra escrava. A riqueza e o poder espanhóis
balho interno, "náo-comercializado". Os escravos plantavam a maior parte de sua pIÓ- derivavam da conquista e da exploracáo dos POyOS indígenas do continente; tentou-
pria comida, construíam suas próprias cabanas e assim, diferentemente do trabalhador se a escravizacáo total dos ameríndios, que se mostrou impossível ou tao destrutiva
assalariado, nao dependiam principalmente de bens comprados no mercado. Normal- a ponto de ser contraproducente. As comunidades indígenas do século XVI nas ilhas
mente aplantation escravista poderia sobreviver, se necessário, através de seu préprio cultivo do Caribe e no litoral foram dilaceradas e desmoralizadas pela invasáo e pelo exces-
e manufatura de subsistencia. O fato de que os donos das plantaticns dispunham desta so de trabalho; seus povos foram destruídos por terríveis epidemias ou absorvidos
"reserva" de economia natural, como a denominou Jacob Gorender, reforcava sua capa- quando os conquistadores tomaram para si as mulheres indígenas. Alguns fugiram
cidade de sobreviver aos tempos de guerra, revolucáo ou depressáo comercial.' Assim para pantanos inóspitos e afastados ou mantiverarn-se em ilhas rochosas e na selva
como o camponés ou pequeno fazendeiro, e ao contrario do fabricante ou do mercader; mais distante. Mas no continente os conquistadores espanhóis conseguiram substi-
o dono da platltation podia se retirar do mercado por longos periodos e manter seu em- tuíro estrato dominante anterior dos impérios inca e asteca e explorar as comunida-
preendimento. Mas, em fases de expansáo, ele nao se lirnitava aos recursos da proprie- des indígenas, que erarn subjugadas, mas nao escravizadas,
dade; com um mercado receptivo, suas perspectivas s6 eram limitadas pela capacidade Os cativos africanos foram introduzidos na América espanhola para compensar o
de comprar mais escravos, implementos e equípamento, quando necessário. Os campo- despovoamento das áreas mais atacadas e para fortalecer a presen<Jada potencia colo-
neses europeus ou senhores feudais, ao contrário, estavam limitados pela "economía natural" nizadora¡ para sustentar centros administrativos e linhas de comunicacáo e para aten-
e restringidos pelo tamanho da familia ou da máo-de-obra disponível na propriedade. der as necessidades pessoais dos conquistadores. O uso de escravos na América espanhola
Oracas ao capital investido na plantation; seu proprietário nao tendia a cair na autarquía. no século XVID reteve algo des te antigo padráo. Os escravos africanos trabalhavam
A construcáo e a rnanutencáo de urna plantation envolvia custos económicos permanen- como criados domésticos, porteiros, gerentes, estivadores, costureiras, barbeiros, jar-
tes, que agiam como um aguilhao para a producáo renovada de mercadorias sempre que dineiros, artesáos; havia escravos trabalhando nas minas de ouro de Nova Granada,
possível¡ e o valor económico dos escravos era tal que o produtor que nao pudesse lucrar nas propriedades acucareiras de Cuba e nas lavouras de cacau da Venezuela, mas estes
com eles era induzido a vende-los a alguém que o fizesse. Mais urna vez, nem o campo- eram ainda enclaves 'bastante modestos na economia imperial espanhola de 1770. A
nes nem o senhor feudal estavam sujeitos a urna pressáo económica comparável. Já que prata era extraída por trabalhadores assalariados, cuja maioria era de origem indíge-
os escravos cobriam suas necessidades de subsistencia em apenas dois dias de trabalho na, mas com alguns negros ou mestices, ou por trabalhadores enviados como tributo
por semana, incluindoquase todo o seu pouco "tempo Iivre", a taxa de extra<Jaode exce- por aldeias índias. A administracáo imperial na América espanhola promovia e coor-
dente e lucro bruto era muito alta. Assim, o dono de urna plantation escravista era um denava diretarnente a atividade económica; administradores do rei supervisionavam o
empreendedor com capacidade e rnotivacáo para responder as pressóes do mercado. A fornecimento de alimento e máo-de-obra as minas, distribuíam concessóes de mine-
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rasao, compravam tabaco e cuidavam do fluxo de prata de volta para a Europa. Havia ouro no Brasil no final do século XVII deu a monarquía portuguesa um forte in·
falhas, naturalmente, mas este sistemaextensivo de exploracáo imperial contrastava com centívo para manter os mecanismos de exploracáo imperial "extensiva". As frotas
o regime intensivo de microexploracáo das plantatio"s escravistas no restante da Amé- facilitavam o controle imperial e a cobranca de impostes, além de oferecerem prote-
rica. Também ajudava a inibir a elite crioula, que sabia muito bem que o Estado im- ~ao. Mas com a exportacáo de ouro transportada em seguranca em comboios para a
perial era um fator direto e crucial da extraqáo de trabalho excedente dos produtores Europa, o comércio de at;úcar foi estrangulado. Os escravos brasileiros continua-
fundamentais. Pelo contrario, os donos de plantations dirigiam um processo indepen- ram a produzir acúcar; mas nesta economia quase fechada muitos também eram
dente de extracáo de excedentes, ero que era papel do Estado colonial recolher impos- utilizados no fornecimento de alimentos e manufaturas ao mercado local. As poten-
tos, criar regulamentos desastrados e fornecer protecáo externa. Em 1770as minas de cias ibéricas obrigaram os mercadores a viajar corn a frota anual até a década de
prata da América espanhola exploravam veios fabulosos - daí o valor impressionan- 1760; o crescimento espontáneo da agricultura comercial foi inibido, e assim abriu-
te da exportacáo colonial espanhola -, mas, grasas a isso, os proprietários de minas se mais espaCiopara holandeses, ingleses e franceses. s
estavam muito menos interessados na autonomía colonialdo que os donos deplanUltions. A largada para a producáo em grande escala das planiations foi dada no Caribe
A escravidáo brasileira na década de 1770, com propriedades acucareiras no pelos produtores británicos e franceses, apoiados por mercadores holandeses inde-
Nordeste, minas de ouro no Sul e uso disseminado de escravos em oficinas, resi- pendentes, porvolta de 1640-50. A escravidáo sistémica tinha de ter caráter colonial
dencias, fazendas e ranchos em todas as provincias, refletia a variedade da história porque as plantations escravistas precisavam de garantías navais e militares que as
da colonia. Os portugueses comecaram a instalar engenhos de acücar no Brasil no protegessem de rivais e da ameaca de revolta escrava, Embora a escravidáo acessó-
final do século XVI e, com a ajuda holandesa, desenvolveram as principais caracte- ria tenha ajudado a reproduzir o império, o império ajudou a reproduzir a escravi-
rísticas da propriedade escravista comercial. No Brasil, assim como no Caribe, as dáo sistémica. Aplantation era administrada como uma empresa integrada com acesso
comunidades indígenas foram dizimadas por doencas e expulsas pela conquista. Os privilegiado ao mercado europeu; em poueo tempo, todas as tarefas bracais passa-
mercadores portugueses foram os primeiros a desenvolver o comércio atlántico de ram a ser realizadas por escravos. A instabilidade e a guerra retardaram o desenvol-
escravos, fornecendo escravos mais baratos de seus próprios entrepostos comerciais vimento dasplantations na Jamaica e em Sao Domingos até que a Paz de Utrecht,
na costa africana. Para os recém-chegados da África, a fuga era muito mais dificil e em 1713, criou condicñes mais favoráveis tanto para este desenvolvimento quanto
perigosa do que para os amerindios. Além disso, os cativos africanos vinham de para a organizacáo do tráfico negreiro em grande escala.
sociedades em que a agricultura, a mineracáo e as relacóes sociais da escravizacáo As colonias británicas e francesas, assim como o Brasil, mas diferentemente da
eram muito mais desenvolvidas do que no caso dos ameríndios do Brasil, do Caribe América espanhola, tornaram-se regióes povoadas pelos colonizadores depois que
ou do litoral norte-americano. O Brasil atraiu urna torrente de colonos portugue- os habitantes originais foram morros, marginalizados ou expulsos. A própria agri-
ses, mas os proprietários de terras (fazendeiros) acharam mais fácil explorar os ca- cultura de exportacáo ajudou a financiar a colonizacáo.já que os mercadores conce-
tivos africanos do que negar todos os direitos a servos emigrados da Europa. A forsa diam transporte a serves europeus dispostos a trabalhar nas plantations por tres ou
de trabalho no engenho brasileiro do início do século XVII continuou a ser mista, e cinco anos. Mais da metade dos emigrantes brancos para a América do Norte colo-
combinava fileiras de servos africanos e índios com uma dúzia ou mais de imigran- nial vieram como servos contratados; o Caribe francés e británico também ahsor-
tes portugueses; e o processamento nao era integrado com o trabalho agrícola, já veu dezenas de milhares destes trabalhadores cativos, que podiam ser comprados a
que a maior parte da cana era fornecida por agricultores independentes (Javradores preso mais baixo que os escravos. No total, cerca de 350.000 servos foram embar-
a
de cana). O termo pla"tation nao se aplicava propriedade asucareira brasileira. cados para as colonias británicas até a década de 1770. Os servas b~ncos ou engagés
Os primeiros colonosdo Brasil demonstraram a lucratividade do cultivo do acúcar; podiam ser violentamente explorados, mas nao ofereciam ao proprietário da plantation
e usavam urna forca de trabalho mista corn predominancia crescente de escravos a oportunidade de construir uma forca estável de trabalho. Servos brancos ou engagés
africanos. O avance posterior rumo a uma escravidáo sistémica completa foi blo- por fim seriam libertados; os africanos estavam condenados a uma vida inteira de
queado pela demanda irregular da Europa, pelas invasóes e pela ocupacáo holande- cativeiro. N as primeiras décadas do século XVIII os donos de plantations de tabaco
sa (1624-54) e porum sistema caro e complicado de frotas anuais. A descoberta de da Virgínia e de Maryland também passaram a preferir cada vez mais o trabalho
24 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848 2S

escravo aos servos contratados da Inglaterra. Serves brancos tinham direitos legaís peso em 1700 para 220 milhóes em 1775. E~ 1700 havia cerca de 100.000 escravos nas
definidos e alguma expectativa de encontrar apoio na comunidade de colonizado- colonias británicas e JO.OOO nas francesas; nesta época nao deveria haver mais de 100.000
res, tanto por parte das autoridades quanto do POyo. Mricanos cativos tinham pou· escravos em toda a América espanhola, ou mais de 150.00000 Brasil. Assim, apesardas
cos direitos e, na prática, nenhurna capacidade de garantí-los. Podiam provocar piedade, taxas de mortalidade apavorantes, a populaqáo escrava das Américas multiplicou-se seis
mas nao solidariedade de brancos que nao possuíam escravos. Colonos brancos vezes, dos cerca de 400.000 indivíduos em 1700 para 2.400.000 em 1770, e as popula-
gozavam de urn nível de liberdade desconhecido no Velho Mundo, enquanto os negros c;6esescravas das colonias británicas e francesas expandiram-se com maior rapidez,"
eram sujeitos ao sistema de escravizacáo mais sistemático e feroz que já existira. Por que foram as Américas o lugar de sta expansáo fenomenal e por que envol-
A escravidáo colonial do N ovo Mundo desenvolveu-se no alvorecer do avance veu a escravidáof O deseovolvimento capitalista na Europa gerou novas necessida-
capitalista na Europa do século XVII. Na década de 1760, cerca de 600.000 escravos 'des que nao poderiam ser atendidas com recursos europeus. O Novo Mundo tinha
eram levados para as Américas todo ano, qua se dez vezes a quantidade anual da déca- o clima e o solo necessários para cultivar os produtos exóticos desejados pelos euro-
da de 1650 e cinqüenta vezes o número introduzido por ano por Espanha e Portugal peus, e o transporte marítimo era barato. Mas as Américas nao eram povoadas por
nas décadas de 1560 e 1570. Antes de 1580, é provável que os imigrantes europeus agricultores dedicados a producáo de mercadorias, Na verdade, as regióes costeiras
tenham sobrepujado em número os escravos levados para o Novo Mundo; entre 1580 subtropicais mais adequadas para o cultivo desses produtos foram severamente des-
e 1650 o número de cativos africanos que chegavam a cada ano era mais ou menos o povoadas depois do impacto desastroso da conquista européia. O cultivo de produ-
mesmo que o de imigrantes europeus. Com o surgimento da escravidáo "sistémica", a tos de plantation envolvia o tipo de trabalho que espantava o migrante voluntário;
"importacáo" de escravos cresceu tanto em termos proporcionais quanto absolutos. A especialmente porque a abundancia de terras no Novo Mundo oferecia uma alter-
rimeira colonia do Novo Mundo onde os escravos tornaram-se maioria da popula- nativa preferida ao trabalho na plantation - mesmo que, como muitas vezes acon-
ao foí a ilha británica de Barbados, porvolta de 1645, seguida de perto pelas outras tecia, isso significas se lutar com os habitantes indígenas pela posse da tena. Mercadores
ilhas controladas por británicos e franceses nas Pequenas Antilhas, depois pela Jamaica, portugueses, holandeses, británicos e franceses descobriram que era agradavelmen-
a década de 1660, e Sao Domingos, na de 1690. Os cativos africanos só comecaram te lucrativo patrocinar o desenvolvimento de plantations, mas só conseguiram supri-
~
a ser embarcados em grande quantidade para a América do Norte nas primeiras déca- las de rnáo-de-obra por meio da garantia de fornecimento de escravos da costa da
das do século XVIII. A descoberta de ouro no Brasil no final do século XVII mais África. A competicáo no mercado atlántico afogou quaisquer escrúpulos que tives-
que duplicou a importacáo anual de escravos naquele território. Com o desenvolvi- sem a respeito do comércio de africanos escravizados, de forc¡á-los a trabalhar nas
mento do Caribe británico e francés, o número de escravos africanos desembarcados plantations ou de ganhar dinheiro com o que os escravos produzissem. É espantoso
no Novo Mundo excedeuo número de imigrantes europeus, no período entre 1650 e que antes de 1760 teoha havido poucos protestos contra a escravizacáo em massa de
1700. Mas foi apenas DOséculo XVIII que apareceu urna imensa disparidade, com ajj:jaoos-apesar de, como veremos no próXimO capífiiréi, a escravldao há-muitóJá· -
cerca de seis milhóes de cativos africanos chegando ao Novo Mundo, cinco ou seis ter desaparecido do noroeste da Europa. A escravidáo do Novo Mundo resolveu o
vezes o número de europeus. Pelo menos uro milháo de escravos morreram só nesse problema colonial de máo-de-obra em urna época em que nao havia outra solucáo a
sécúlo durante a famosa "rota do meio", ou travessia da África para o N ovo Mundo, vista. Assim, ela provou ser muito coerente com a acumulacáo comercial e manu-
e uro número incoatável morreu antes sequer de chegar a costa africana. fatureira nos centros do avance capitalista na Europa ocidental; em primeiro lugar
Este inchac;o do comércio negreiro refletiu um vasto aumento da producáo das nos da Gra-Bretanha, dos Países Baixos e da costa atlántica francesa e seu interior.
plantations escravistas. A prodU<jaototal de ac;úcardo Brasil em 1620 fora de apenas 15.000 Como se mantinha a demanda pela produqáo dos escravos? Os produtos das plantaiions
toneladas por ano, número que provavelmente nao fui excedido até a década de 1750; a eram prazeres populares, e freqüentemente a demanda de acúcar e tabaco funcionava
minúscula ilha de Barbados produziu sozinha 15.000 toneladas durante a década de 1670. como isca que atraía círculos cada vez maiores da populacáo para a economía de merca-
Em 1760 as colonias escravistas británicas e francesas produziam 150.000 toneladas de do; os impostos cobrados sobre estes produtos também representavam urna arrecadacáo
ac;úcarporano, e chegaram a 290.000 toneladas entre 1787 e 1790. A producáo de taba- útil para os principais Estados. O novo padráo de relacóes sociais tez com que a renda
co das plantaiions escravistas da Virgínia e de Maryland subiu de 20 milhóes de libras- passasse dos generos para o dinheiro; bebidas adocadas e tabaco eram tanto uro consolo

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26 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMOCOLONIAL: 1776-1848 27

quanto um aguilháo, enquanto tecidos leves,laváveis e brilbantes tomavam a vida mais seus próprios negócios e o funcionalismo colonial tinha a tarefa de ministrar a regu-
amena e saudável. A sede da Europa por produtos das plantations, que parecia irnpossí- lamentacáo mercantilista. Mas Pelo menos as tropas coloniais davam-lhes algurna
vel de mitigar, fez com que, ero uma década, o fornecimento de a~úcar, café, tabaco e protecáo. Os proprietários de escravos tendiam a uro antagonismo mais acirrado
algodáo duplicas se sem queda de p~o. Comerciantes e donos deplantatwns eram enco- com os mercadores metropolitanos e seus agentes locais, especialmente quando, como
rajados a buscar as perspectivas quase ilimitadas de expansáo que levaram a construcáo acontecía amiúde, tinharn dívidas para corn eles. Levar umaplantation escravista ao
das plantatwns escravistas. A nova cultura do consumo comercializado nao tinha consci- ponto em que se pudesse vender a colheita era um eropreendimento demorado, caro
encia do custo humano acarretado por seus prazeres.? e arriscado. Os proprietários de plantations m uitas vezes precisavam recorrer ao crédito
para comprar escravos, equipamento ou provisóes. Com freqüéncia caíam nas gar-
Quais eram as tensóes internas geradas pela escravidáo colonial? Em 1770 as auto- ras dos mercadores depois que urna guerra, um furacáo ou urna revolta de escravos
ridades británicas e francesas enfrentavam o risco de rebelióes de colonos. Os colo- lhes destruía a colheita ou alguma epidemia levava metade ou mais do contingente
nos británicos e franceses e seus descendentes nao acreditavam que, por serem colonos, de escravos. Ero geral o mercader cobrava juros altos nos eropréstimos aos dones
pudessem ser privados de direitos; esta sensacáo era, naturalmente, mais forte nas de plantations e podia justificá-Ios com os riscos envolvidos. Mas com tudo isso, O
colonias británicas mais antigas da América do Norte, mas era encontrada também dono de urna plantation escravista dava ao mercador-credor a primazia sobre os
nas Antilhas francesas. superlucros que ainda nao tinham sido apurados. O próprio dinheiro gasto na com-
A forsa específica da escravidáo colonial británica e francesa era o aparato descen- pra de um escravo representava um descontó sobre o excedente futuro a ser apro-
tralizado e controlado pelo dono da planiatio« para conter os escravos, A forsa da coloni- priado quando se colocasse o escravo para trabalhar. Havia aqui uro nexo antagónico
zasao ibérica estava concentrada em centros administrativos nas próprias colonias. entre dono de plantation e mercador que, com freqüéncia, intensificava a hostilidade
A escravidáo colonial criou seus próprios antagonismos sociais característicos, para com os sistemas coloniais que privilegiavam monopólios mercantis nacionais.
Mesmo o rnais sabio dos ministros acharia dificil distribuir privilégios e penalidades Ero geral os mercadores locais despertavam menos suspeita ou ódio,já que podiam
de forma eficaz e coerente, dada a espontaneidade da economia atlántica e suas rea- ser parceiros na fuga as restricóes mercantilistas e aos credores metropolitanos. Mas
~6es imprevisíveis a mudanca de gosto e de métodos de producáo, Os produtores de a relacáo entre donos de plantations e mercadores nunca foi tranqüila. Ela incluía o
tabaco da Virgíoia, os donas de plantatwns acucareiras das Antilbas francesas e os con- antagonismo com os comerciantes de escravos, sempre que os donos de plantations
cessionários de minas de ouro do Brasil tinham a desvantagem de que seus produtos sentiam que poderiam pros seguir sem novas compras de cativos. Poderia até provo-
haviam atingido alto grau de visibilidade, Expostos de qualquer maneira a atencáo de car uro sentimento de impaciencia para com a própria escravidáo, um tipo de desejo
mercadores e funcionários do Tesouro, estavam suieitos a restricóes mercantilistas que desesperado do proprietário de escravos e de plantations de se encantar com um se-
faziam com que se sentissem, como descreveu Washington, «tao miseravelmente opri- nhor de terras agrícolas mais importante e com maior soberania.
midos quanto nossos pr6prios negros". Os proprietários de plantations das Índias A relacáo entre donos de plantations e outras camadas da populacáo livre das
Ocidentais británicas aceitavam sua posicáo com mais facilidade.já que sabiam que o colonias, embora também ambivalente, admitía mais cordialidade. Os grandes pro-
sistema colonial lhes abria um mercado metropolitano protegido, poupando-os da prietários compravam provisóes de pequenos fazendeiros e alguns suprimentos de
necessidade de competir em igualdade de condicóes com as plantatwns francesas, mais fabricantes locais. Empregavam o serviqo de feitores, guarda-livros, advogados,
eficientes. Da mesma forma, os produtores de acúcar da América espanhola ou mes- médicos e outros. Na própria zona de plantations, o grande proprietário era reco-
mo do Brasil ainda nao eram dinámicos o bastante para sentir urna frustracáo muito nhecido como líder da comunidade local e assumia cargos como magistrado ou co-
aguda; mas nao fui este o caso dos produtores de cacau da Venezuela, que enfrentaram ronel da milicia local. Apesar das tensóes associadas ao patronato, em geral os donos
as pretensóes monopolistas da Companhia de Caracas e delas escaparam de todo jeito de plantations conseguiam o apoio de outros colonos livres em confrontos com a
conhecido até forcarem seu fechamento na década de 1780. metrópole. Este eixo dominado pelo grande proprietário era mais forte na zona de
Fora alguns grandes privilegiados, os proprietários de escravos do Novo Mun- plantations da América, mas encontrava-se também onde quer que houvesse desen-
do sentiam viva inirnizade pelos funcionários coloniais,já que desejavam cuidar de volvimento de plantations. As potencias metropolitanas foram obrigadas a permitir
28 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848 29

que as colonias desenvolvessem sua própria capacidade militar, quer como seguran- dinástico e nacional, a Franca mantinha grande estrutura naval e colonial; setores
Cjacontra revoltas de servos, quer como auxílio as forcas metropolitanas durante as da aristocracia e da burguesia encontraram para si um nicho no sistema colonial.
guerras de rivalidade imperial. Mas os conseii: coloniais franceses eram tao ciosos de seus direitos quanto os parlements
Em toda a América os donos de plantations, proprietários de escravos e mercaderes metropolitanos e, provavelmente, mais representativos das classes proprietárias 10-
locais a eles ligados foram súditos impacientes e insubmissos. Isso foi tio verdadeiro na cais. A Crá-Bretanha e a Franca extraíam um excedente comercial de suas colonias,
América do Su! e no Caribe quanto na América do Norte. Mas, naturalmente, o equili- mas nao recebiam delas grande arrecadacáo direta. Os governos reais de Espanha e
brio predominante das fo~as sociais e o vigor da economia baseada na escravidáo enco- Portugal tinham urna base européia muito mais fraca e passaram a confiar na arre-
rajaram variacóes dos objetivos específicos e dos métodos adotados. A posse de escravos cadacáo americana, gerada pela economia mineira e por algum comércio de produ-
conferiastatus, e a administracáo daplantation trazia o hábito do comando. Os donas de tos de plantatians. Na verdade, o fluxo de receitas coloniais para Madri e Lisboa
plantations do continente tendiam a ser mais ousados ao enfrentarem as autoridades im- tanto exigia quanto financiava urna estrutura colonial cuja coluna vertebral era a
periais; os do Caribe, empoleirados em grandes maiorias escravas, eram mais ferozes casta militar aristocrática. Escravos africanos e pessoas de cor livres eram ainda usados
nas palavras do que nos atos e, muitas vezes, preferiam ojogo de influencias para pres- como forca auxiliar para reforcar fortificacóes imperiais, arsenais, estaleiros e ca-
sionar os centros imperiais. Mas, independentemente de sua localizacáo, os donos de municacóes. Em 1770 faltava quase inteiramente a Espanha e Portugal o vigor au-
plantauons tendiam a ver-se como agentes autónomos com um objetivo racional e escla- tónomo dos territórios ingleses e franceses; a elite nascida no local ("crioula") tinha
recido na vida. O tipo de racionalidade económica quase capitalista incorporada aplantation importancia no máximo secundária no governo e em geral, fora dos enclaves de
escravista estimula va este ponto de vista e muitas vezes o levava em uma direcáo antimer- plantations, estava mergulhada em torpor provinciano.
cantilista. N a luta para conseguir um retomo com petitivo com sua propriedade, o dono Os proprietários de escravos mais independentes e vigorosos das Américas en-
da plantation contrariava-se com as restricóes comerciáis que o impediam de comprar contravam-se na América do Norte inglesa e no Caribe francés, perto do final do sé-
suprimentos mais baratos e vender a qualquer consumidor disponível. Os donas de culo XVIII alguns donos de plantatio«: do Brasil portugués e do Caribe espanhol
plantations das Índias Ocidentais británicas sentiam essa contrariedade menos intensa- comeCJarama imita-les. O arco da resistencia dos proprietários de plantations ao con-
mente porque o livre comércio do irnpério lhes permitia comprar suprimentos baratos trole imperial- que passou dos primeiros para estes últimos - é um dos temas deste
norte-americanos, implementos de metal e tecidos ingleses de baixo preso e encontrar livro. Comecou com as colonias británicas da América do Norte, em parte porque os
mercado para todo o acúcar que conseguissem produzir. Os donos de plantations da Virgínia proprietários de lá tinham uma posicáo mais forte, mas também porque o poder impe-
e de Maryland tinham um ponto de vista diferente porque, se vendessem o fumo dire- rial há muitovinha tolerando a autonomía colonial. interna. Os Estados atlánticos mais
tamente para a Europa, poderiam economizar a comissáo do intermediário. Os grandes fortes, Grá- Bretanha e Fransa, haviam concedido rnais espac;opara o autogoverno colonial
proprietários das Antilhas francesas e dos enclaves de plantation da América espanhola do que Espanha e Portugal, rnais fracos enquanto potencias européias, mas com for-
sabiam que os mercadores metropolitanos pagavam-lhes menos por causa de seus privi- midáveís burocracias im periais. N o ano de 177Oa escravidáo colonial era mais forte
légios monopolistas e gostariam de ter acesso direto as manufaturas británicas e aos su- onde a autoridade imperial era mais mea, nas colonias inglesas. De forma semelhan-
primentos da América do Norte. Os proprietários de concess6es de minas do Brasil sentiam te, a escravidáo era mais fiaca na América espanhola, onde a autoridad e metropolita-
tais contrariedades de forma menos intensa, em parte porque suas concess6es dependiam na era exercida de maneira mais dirigista. Franca e Portugal ocupavam posicóes
de licenqa real e em parte porque na década de 1770 a economia mineira estava em declínio interroediárias. Como a escravidáo era inversamente proporcional ao exerdcio da au-
com a exaustáo das jazídas. toridade metropolitana, nao surpreende que o primeiro exercício de independencia
O irnpério colonial da Crá-Bretanha nas Américas permitia urna boa medida daria urna grande contribuicáo ao crescimento dos sistemas escravistas.
de autogoverno colonial. O império mantinha-se unido por sua pr6pria coeréncia O império británico, embora menos rigoroso e restritivo, era também menos
comercial, pela forsa da Marinha Real e pelo medo de índios e franceses. Com ex- útil para os donas de plantations da América do N orte do que as metrópoles de ou-
cec¡ao do tabaco da Virgínia, a Crá-Bretanha absorvia com folga a maior parte da tros impérios coloniais. A partida dos franceses, que levaram consigo a necessidade
produqáo das plantations de suas próprias colonias. Por razóes de engrandecimento de protecáo militar británica, também revelou que há muito faltavam ao império os

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aQ ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVlSMOCOLONIAL: 1776-1848 31

principies produtivos intrínsecos que ainda se mantinham, em maior ou menor grau, mais liberdade para fornecer couros e peles a mercaderes europeus. Os que ti~
nos outros grandes impérios. O absolutismo francés concedia privilégios aos mer- nham concessóes de minas operadas por escravos em Nova Granada e os daDOS
cadores de Bordéus e Nantes, mas também auxiliava os proprietários deplantations de plantations de cacau da Venezuela faziam muito contrabando, mas, ainda as-
das Antilhas. O comércio de escravos era subsidiado, proprietários com títulos de sim, ressentiam-se do controle metropolitano.
nobreza eram isentos de impostos e as guarnicóes coloniais ajudavam a manter as
estradas, os portos e os sistemas de irrigacáo que tornavam Sao Domingos tao pro- A manutencáo da escravidáo colonial produziu padr6es diferentes de privilégio ra-
dutiva. Os donas de plamalions do Nordeste brasileiro também poderiam compilar cial, com diversos potenciais de conflito. Em todas as colonias, os brancos gozavam
urna lista semelhante de favores imperiais na década de 1760, quando Pombal ten- deslatus e vantagens especiais, Em 1770 todos os escravos americanos erarn negros,
tou patrocinar a economia deplantations. Ao contrário, a infra-estrutura do império embora nem todos os negros fossem escravos. Os brancos de classe mais baixa e os
impunha-se aos donos de planlalions da Virgínia mais como restricáo do que como americanos nativos deviam sua liberdade a resistencia comunitaria. Os donas de
apoio. Isto nao quer dizer que motivos estritamente económicos ditaram o padriio e escravos apelavam para a solldariedade racial dos brancos e as vezes clamavam até
a seqüéncia da rebeliáo colonial; mas enquanto fossem eficazes, as estruturas aqui aos Indios para ajudá-los a manter a escravizacáo dos negros; mas apenas nas colo-
mencionadas teriam seu impacto na mentalidade e também no cálculo económico. nias inglesas a populacáo negra livre era tao pequena que quase todos os negros eram
Quanto aos proprietários de minas da América espanhola, estavam em débito maior escravos. Na América portuguesa e espanhola, escravos ou seus descendentes ti~
para com as autoridades coloniais do que qualquer dono de plantalion, já que de- nham obtido alforria em quantidade suficiente para criar urna populacáo apreciável
pendiarn delas, como observado anteriormente, para conseguir suprimentos, máo- de negros e mulatos livres. As vezes os negros e mulatos livres erarn considerados
de-obra, licencas e transporte. I . pelas autoridades um contrapeso, tanto em relacáo aos escravos quanto a elite crioula;
No Velho Mundo, o desenvolvimento comercial e manufatureiro "intensivo" ocupavam uma posicáo intermediaria no sistema de castas e era-lhes permiti-
dos Países Baixos levara a um choque momentoso com o império "extensivo" entáo da uma identidade separada, embora subordinada. No Brasil os portugueses formaram
mais poderoso, o dos Habsburgo espanhóis; impulso similar para a libertasao nacional regimentos negros com oficiais negros em sua luta para expulsar os holandeses¡ os
surgiu nas regióes do N ovo Mundo onde havia intenso desenvolvimento do comér- espanhóis também formaram milicias negras no século XVIII. Com freqüéncia, as
cio, da agricultura e das plantauons. fileiras de Henriques brasileiros ou dos batalhóes pardos ou negros da América es-
A escravidáo nas-Américas estava pesadamente concentrada na zona tropical panhola eram formadas por escravos com prados pelo Estado, aos quais se oferecia a
e subtropical do Caribe e na área circunvizinha ao litoral atlántico das Américas liberdade em troca de um tempo mais longo de engajamento. Por ser cara a compra
do Norte e do Su!' Embora ainda houvesse regióes imensas que nao haviam efe- de escravos para as forcas armadas, eles eram, as vezes, capturados de inimigos da
tivamente sido colonizadas nem controladas por nenhuma potencia imperial, ha- Coroa. No Caribe frances e holandés as pessoas de cor livres eram quase tao nume-
vía também setores das economias coloniais nos quais a escravidáo tinha papel rosas quanto os colonos brancos e recebiam algum reconhecimento oficial como
secundário ou insignificante. Os cerca de 25.000 escravos negros da Nova Ingla- contrafortes auxiliares do sistema escravista colonial. A complexa hierarquia social
terra em 1775 nao erarn cruciais para a agricultura ou a construcáo de navíos; a das colonias espanholas, portuguesas e francesas contrastava com o sistema bipolar,
cooperagáo forcada da turma de escravos nao tinha, na produtividade das peque- negro ou branco, das colonias inglesas, com sua populacáo comparativamente grande
nas fazendas mistas e da manufatura, a mesrna influencia importante que apre- de colonos brancos, N as colonias de plantation da América do Norte, a maioria branca
sentava no cultivo e no processamento dos produtos das plantations. No entanto, mal tolerava a presenc;ade negros livres; nas Índias Ocidentais británicas, com sua
os mercadores, pequenos fazendeiros e capitáes de navios da Nova Inglaterra macica maioria negra, os brancos acharam aconselhável aceitar uro pouco rnelhor
descobriram que os donos de escravos e plantations eram bons fregueses e .repeliam os negros e mulatos livres. Ero todas as colonias, negros e mulatos livres podiam
tentativas de limitar seu comércio com as Índias Ocidentais¡ até entáo era pouco possuir seus próprios escravos, mas nas colonias inglesas isso era bastante raro. A
a
o que podiam fornecer Europa. Os criadores de gado da América do Sul muitas escravidáo do Novo Mundo codificou a pele "negra" como característica de escra-
vezes utilizavam alguns escravos ~ vendiam carne-seca as ptantaüons e queriam vOS¡pessoas de cor livres podiam ser levadas a negar sua cor - ou a negar a escra-
32 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848

vidáo, Donos de escravos de ascendencia parcialmente africana compartilhavam com cio negreiro de enormes proporqóes para manter ou aumentar o nível populacional. Nao
os "brancos" a preocupacáo por seus direitos que os impelia a esta dificil opcáo, fosse por este afluxo, a populacáo escrava das colonias do Caribe teria-se reduzido em
dais, tres ouquatro por cento ao ano ero meados do século XVIII. Os donas deplantations
Ero 1770 os escravos das Américas eram explorados mais intensamente do que qualquer do Caribe compravam mais homens do que mulheres por nao estarem dispostos a arcar
outro grupo do mesmo tamanho em toda a história. Todavía, a ameaca imediata ao com as despesas da reproducáo natural. Entre 1700 e 1774, meio milháo de escravos
império nao vinha dos explorados, mas de urna alianca colonial que incluía muitos foram levados para a Jamaica, mas, ainda assim, a populacáo escrava só aumentou em
exploradores. Embora as guarnicées e esquadras coloniais as vezes estivessem dis- 150.000 indivíduos entre essas duas datas. O fato de que o escravo recém-chegado ao
poníveis para subjugar revoltas de escravos e para conter os maroons, os donas de >11< Caribe tinha urna expectativa de vida de apenas sete ou dez anos e de que os contingen-
plantations preferiam esmagar a resistencia por meio de suas próprias patrulhas e tes das plantations eram continuamente refeitos pela compra tornou mais dificil a cons-
milícias. As forcas metropolitanas tinham como principal funCSaoproteger as colo- trufjao e a transmissáo de urna nova identidade coletiva. Por outro lado, a perspectiva
nias de ataques externos. É por essa razáo que a vitória británica na América do tenebrosa da vida naplanliltion encorajou fugas individuais e ocasionais revoltas em massa.
Norte em 1763 foi abrangente demais para seu próprio bem; libertou os colonos de As condicóes de vida dos escravos e a seguranca da plantation variavam muito
seu medo dos franceses e espanhóis, entre as colonias. Os 450.000 escravos da América do Norte inglesa estavam sujei-
Os que construíram, em cada colonia, os empreendimentos baseados em escra- tos a vigilancia estrita e cuidadosa de seus proprietários, que em geral possuíam apenas
vos estavam unidos pela língua, pela identidade cultural e pelo interesse económi- algumas dezenas de escravos, se tanto. A chibata, o livro de oracóes e o controle dos
ca; e tinham recursos para contratar empregados e garantir aliados junto a populacáo alimentos pelo proprietário ajudavam a manter os escravos no trabalho árduo do
livre sem escravos. Estes últimos, pelo contrario, haviam sido arrancados de partes nascer ao pór-do-sol, senda as noites m uitas vezes dedicadas ao processamento ou a
diferentes de um continente imenso, falavam línguas diferentes e tinham diferentes manufatura. No entanto, o clima mais ameno, a abundancia de terra para o cultivo
tradicóes, A seqüéncia de captura, venda e travessia era por si sé traumática. Os de alimentos frescos e as exigencias menos intensas do cultivo de tabaco evitara m

cativos africanos que vinham das regióes mais desenvolvidas eram mais vulnerá- que a populacáo escrava norte-americana tivesse as taxas de rnortalidade extrema-

veis, por terem mais familiaridade com a escravidáo e menos familiaridade com a mente altas características das plantations acucareiras; os negros da América do Norte

vida na floresta do que osbosquímanos, que parecem ter formado urna parcela des- multiplicaram-se qua se tao depressa quanto os brancos. Os donas deplantations norte-
proporcional dos maroons. Fez-se todo o possível para impedir que os escravos de- americanas pagavam preso mais alto pelos escravos, mas taxas de juros muíto mais

senvolvessem uro objetivo ou interesse em comum, semeando-se a divisáo dentro baixas, o que lhes dava incentivo para encorajar a reproducáo natural da máo-de-

das plantations e impedindo a comunicacáo entre elas. A populacáo escrava era sem- obra escrava. Os VÍnculos familiares tomaram os escravos da América do N arte menos
propensos a fugir ou revoltar-se do que os do Caribe.
pre fonte de apreensáo para os senhores; mas este medo nao paralisou os danos de
A baixa taxa de sobrevivéncia dos africanos em boa parte do Novo Mundo re-
escravos, que acreditavam estar mais bem informados do que os funcionários da
fletia parcialmente o fato de que estavam concentrados nas planícies tropicais, ande
metr6pole a respeito das necessidades dos cativos.
as doencas cobram seu pesado preCfode todos os imigrantes. Mas certamente o ex-
As colonias com grande rnaioria escrava nao poderiam sobreviver por mais de urn
cesso de trabalho e o conseqüente descuido coro a subsistencia ajudaram a matar os
século caso nao reproduzissem com eficácia a sujeic_saodos que eram utilizados em traba-
escravos. Pelo menos dais tercos dos africanos que chegaram ao N ovo Mundo fo-
lhos forcados, O Impero destrutivo e a lucratividade extraordinaria da plantation recria-
varo continuamente urna forca de trabalho que tinha pouca oportunidade de se descobrir.
ram enviados para plantations asucareíras. N o Caribe e no Brasil, as plantations
afjucareiras impunham regularmente aos escravos urna jornada de trabalho de 16
Os contingentes de escravos condenados a trabalhar nas plantations das zonas tropicais e
ou até de 18 horas por día; havia trabalho noturno no engenho e, chovesse ou fizes-
subtropicais tinham mortalidade tao alta e fertilidade tao baixa que exigiam urn comér-
se sol, trabalho no campo de dia durante o longo ciclo de plantio e colheita. Os es-
cravos recebiam racsoes magras e esperava-se que se alimentassem com o fruto do
·Comunidad~s de negros fugidos da escravidáo que se formaram em várias rcgióes do Caribe e viviam nas mon-
tanbas ou na selva, as vezes cm associacáo com Indios remanescentes, (N. da. T.) trabalho de urn dia ou UOl día e meio por semana em roesas a eles destinadas para
34 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848 35

este propósito. As plantations do Caribe continham, em geral, centenas de escravos - e ao fazé-lo também davam a seu dono os recursos para comprar um novo escra-
cada urna; os feitores e capatazes brutalizados aos quais eram confiados nao tinham va jovem e, assim, perpetuar seu papel de proprietário de escravos.
sequer a razáo dúbia do proprietário para tratar com algum cuidado os seus escra- Os proprietários de escravos americanos julgaram conveniente promover urna
vos, ou seja, que eles perderiam valor caso nao fossem bem tratados. Na América camada de escravos mais permanentes, talentosos ou responsáveis que haviam do-
espanhola e portuguesa, em geral o destino do escravo daplanlalion nao era melhor, minado as complexas exigencias da agricultura de planta/ion, e nela confiar. Esses
e, na verdade, o dos escravos das minas de ouro era ainda pior - neste último caso, escravos recebiam pequenos privilégios e, em troca, esperava-se que ajudassem a
nao havia sequer um ciclo de colheita para limitar o excesso de trabalho, e a exposi- vigiar ou dirigir seus colegas nas turmas de escravos, Os membros da elite escrava
<Jaoa água e as intempéries provocava alta mortalidade, O pre~o relativamente bai- tinham rasOesextras, podiam escolhera parceirae gozavam pelo menos de urna margem
xo pelo qual se compravam noves cativos dos mercaderes e o alto valor da producáo de manobra para negociar o ritmo e o volume de trabalho na plantatio«. Com fre-
dos escravos - fosse a~úcar ou ouro - conferiram uma lógica comercial terrível a qüéncia os donas de planta/ions do Caribe passavam para os "cabecas" escolhidos
prática de consumir a vida dos escra.vosem poucos anos de trabalho intenso. E en- todas as roupas, alimentos e rum destinados ao contingente inteiro de escravos. Desta
quanto o contingente de escravos fosse dizimado pela doenqa e pelo excesso de tra- forma a elite escrava tinha interesse na manutencáo da estrutura de autoridad e da
baiho, seria dificil para eles resistir coletivamente a opressáo, plantation. É importante reconhecer a forsa interna deste regime. Em principio,
Em toda a zona de plantations os escravos eram sujeitos a a~oitamentos repeti- cada plantation era. um mundo em si mesmo, e normalmente só os escravos mais
dos, e com eles ameacados, além de outras formas de punicáo; as escravas eram es- privilegiados tinham permissáo de relacionar-se com outras plantat¡ons. Até os es-
tupradas pelos brancos; e a comunidade daplantati'on, se assim podemos chamá-la, cravos do campo tinham motivos para temer a vida nas áreas selvagens e sentir-se
era abandonada a subnutricáo e a doenca, ao desanimo e a lassidáo, quando nao ligados a propriedade, ande podiam ter suas fOIJase suas relasoes pessoais. A resis-
galvanizada pela fOflJabruta para atender ao ritmo implacável do trabalho. As con- tencia escrava ao regime da plantatio« era endémica e assumia tanto a forma refor-
dilJOesmateriais da existencia do escravo eram, sem dúvida alguma, piores no Caribe mista quanto a revolucionária. Os escra.vosnegociariarn, por meio dos capatazes e
e no Brasil do que na América do Norte, onde o clima e o tipo de cultura era.mmenos feitores, hortas maiores ou urna noite extra para trabalhar para si mesmos. O abso-
rigorosos. Por outro lado, o grande tamanho das plantations do Caribe diminuiu o lutismo da categoria jurídica da escravidáo pode nos impedir de ver todas as carac-
impacto cultural dos proprietários de escravos¡ este fator favorecen a sobrevivéncia terísticasda verdadeira condicáo do escravo,importantes para os escravospropriamente
de tras os africanos e, afinal, a descoberta de novas fontes de identidade comunitá-
í
. ditos. Embora o regime da plantaiio« fosse um choque para o recém-chegado, os
ria. Em todo o Caribe as línguas e dialetos crioulos, pesadamente influenciados pelo ·rr habituados a ele viera.m a distinguir boas e más condicóes, bons e maus capatazes
>
vocabulário e estrutura das línguas africanas, tornaram-se o principal meio de co- •f ou feitores. Ainda desejariam a liberdade, mas outros objetivos podiam parecer mais
municacáo. As grandes plan/ations de arroz da Carolina do Sul tenderam a este úl- imediatos e práticos - uma roca maior ou complicar a vida de um feitor odiado. Aa
timo padriio, e os habitantes daquela regia o desenvolveram uma língua própria, trabal harem de forma lenta ou Ilestúpida" ou aparentarem indiferenca em relagáo a
chamada gullah, assim como os habitantes das ilhas em várias partes do Caribe. ameacas e punicóes, os escravos as vezes podiam barganhar condicóes melhores. Os
O padriio diversificado e tradicional da escravidáo na América espanhola e, em danos de planlations e as autoridades locais tinham poder de fogo superior e usariam
menor grau, no Brasil encorajou os escravos mais privilegiados a desenvolver sua de toda brutalidade para manter a subordinaqáo servil, mas os proprietários e ad-
própria incorporacáo subordinada a sociedade colonial e a esperar o dia em que eles, ministradores as vezes descobriam que a negociasao era a melhor forma de conse-
ou seus filhos, seriam libertados. Irmandades religiosas especiais proporcionavam guir completar a colheita; as tristes alternativas disponíveis para os negros limitavam
um meio cultural e uma forma de previdéncia social para a comparativamente gran- severamente as barganhas em que podiam ter sucesso.
de populacáo negra e mulata livre.? Nas colónias espanholas e portuguesas havia Nas ilhas asucareiras francesas e británicas, onde os escravos represcntavam de
um número considerável de escravos semi-autónomos que trabalhavam no comér- 80 a 90% da populacáo, os proprietários estavam evidentemente muito mais atentos
cio ou na terra sob sua própria supervisáo. Coro permissáo de reter parte de seus a garantía oferecida pelo Estado colonial do que no continente. Em último caso,
ganhos, podiam comprar a liberdade, sua ou de um parente, ern cerca de vinte anos sempre poderiam pedir ajuda as guarnicóes e aos "navíos de linha" da metrópole,
,
I

36 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848 :n

mesmo que preferissem contar apenas com suas pr6prias forcas, Na prática, o ta- para o lado do progresso e pelo menos alguns deles ascenderam como os principais
manho pequeno das colonias do Caribe e a proximidad e das tropas da milicia redu- líderes revolucionários da época. Com a revoluqáo industrial ainda em sua primeira
ziam grandemente as oportunidades de revolta ou fuga de escravos. A preocupaqáo infancia em 1770, nao havia nada no mundo atlántico que se comparasse ao espan-
com a seguransa e as vantagens comerciais poderiam, no entanto, colocar os donos toso crescimento da producáo e do comércio das plantatrons no século e meio anteriores.
deplantatrons do Caribe contra sua metrópole nacional. Durante a Guerra dos Sete Em termos socioeconómicos, os senhores de escravos do N ovo Mundo criaram
Anos, a Grii-Eretanha conseguiu ocupar setores do Caribe francés e espanhol com uro novo tipo de escravidáo e foram obrigados a inventar, praticamente do nada, as
a colaboracáo ativa dos proprietários locais. bases legais e ideológicas de uro sistema escravista. Esta experiencia histórica do-
Todo o processo colonial, através do qual certos Estados da Europa ocidental tou-os de certa confianca em sua própria capacidade. No entanto, nao haveria ne-
conquistaram impérios nas Américas e neles desenvolveram minas eplantations, pode nhuma Declaracáo dos Direitos dos Senhores de Escravos. Os revolucionários donos
ser descrito como um crescimento prodigioso das forsas sociais, algurnas delas co- de escravos preferiram reforcar outras identidades e outros interesses comuns, em
ordenadas por Estados, muitas outras propelidas por centros privados de riqueza e geral os que unissem todos os cidadáos livres. Alguns revolucionários donos de
poder. Os cativos afiicanos foram introduzidos em urna formacáo social em que o plantations repudiaram náo só o comércio negreiro, como também a escravidáo como
dono de escravos nao dispunha apenas do poder de fogo de seus capangas, mas também incoerentes com as liberdades civis e a integridad e nacional; descartaram aquele aspecto
do apoio de seus vizinhos e clientes. Sem os alimentos adquiridos pelo proprietário de sua dupla ou tripla identidade que achavam mais dificil justificar e preferiram
ou seu administrador, poderia haver fome. Os proprietários de plantations e funcio- ver-se como cidadáos e homens de empresa e cultura. Mesmo para uro senhor de
nários coloniais controlavam os sistemas locais de informacñes ~ faziam de negros escravos, nao era dificil compreender o fato de que a escravidáo era o lado feio do
desobedientes vítimas de violencia exemplar. Até a populacáo ameríndia era, com progresso do N ovo Mundo. A escravidáo já era considerada degradante muito tempo
freqüéncia, hostil aos negros rebeldes ou fuj6es. / antes de moralistas e economistas explicarem suas próprias objecóes.
Em tempos normais o escravo estava preso a urna estrutura'de opressáo insidiosa
e m ultifacetada, na qual os proprietários dispunham de recursos económicos e ideo- Em seu estudo clássico sobre A C1'a da ,"evolufÍÚJ, E. J. Hobsbawm examinou o im-
lógicos além de garantias políticas e militares; em contraste, os cativos estavam di- pacto economico da revolucáo industrial da Crá-Bretanha e o impacto politico da Revo-
vididos por seu hist6rico e pela situacáo, afastados de suas origen s mas isolados lusao Francesa. Há muita coisa no desenvolvimento europeu e americano subseqüente
no novo ambiente e enredados em um sistema vasto e complexo de controle territorial, e no mundo moderno que pode ser rastreada até as conseqüéncias monumentais desta
troca económica e rnobilizacáo soci¡1-t/ "dupla revolucáo". N o en tanto, a história da escravidáo do Novo Mundo exige atensao
para outro conjunto de forqas e impulsos: aqueles gerados pelo impacto e exemplo
A rivalidade entre os vários impérios ajudou a armar o cenário para as tentativas polftico do Estado hanoveriano, principal potencia atlántica, e o impacto econémica
dos colonos de assegurar urna esfera maior de autonomia e criou algumas oportuni- dos acontecimentos revolucionários na América do Norte, no Caribe e na América
dades para a resistencia dos escravos; apenas urna década entre 1660 e 1770 nao foi do Su!' Mesmo aqueles que combateram a Crá-Bretanha hanoveriana encontraram
marcada pela guerra entre uro .ou outro dos Estados atlánticos, nela muito que admirar; suas instituicóes políticas, como veremos, seriam ampla-
O mercantilismo colonial protegera a infancia dos sistemas escravistas e os co- mente imitadas no mundo atlántico da época e vieram a ser associadas a coexisten-
mércios negreiros nacionais, mas a producáo cresceu com mais vigor quando os cia desconfortável da escravidáo dapla1Jtation com um abolicionismo ainda imaturo.
monop6lios oficiais foram desmantelados e suspensas as restricóes mercantilistas. Da mesma forma, as revolucñes de 1776, 1789 e posteriores tiveram conseqüéncias
Alguns donos de plantations sentiram confianca suficiente em sua posiqáo para exi- prodigiosas para o futuro económico da escravidáo nas Américas. Elas romperam
gir o autogoverno e a liberdade comercial para as colonias; outros preferiram patro- barreiras mercantilistas para a expansáo das plantations e deram impulso a dissemí-
cinar a mudanca dentro da metrópole. Alguns poucos eram reacionários com posicáo nasao da escravidáo no continente; ao mesmo ternpo, criaram oportunidades para
contrária a mudancas, ocupando um nicho privilegiado na ordem predominante. urna sucessáo de graves sublevacóes contra a escravidáo no Caribe. A literatura so-
Os donos de escravos nao tinham objetivos ou situacóes uniformes, mas tendiam I bre a "Era da Revolucáo" tende a concentrar-se na Europa, embora R. R. Palmer e

I
38 ROBIN BLACKBURN A QUEDADO ESCRAVISMOCOLONIAL: 1776-1848

J. Godechot tenham ressaltado O impulso democrático revolucionário das 13 colo- ma semelhante, falando o idioma nao marxista, considera-se que o avance da racio-
nias norte-americanas. Mas os acontecimentos na zona de plantations depois de 1776 nalizacáo ou da sociedade industrial ou das relacóes de mercado expulsou a forma
- o surgimento de novas propriedades baseadas na escravidáo ou a disseminacáo social primitiva da escravizaqáo. Se a escravidáo desenvolveu-se na aurora do capi-
da revolucáo e da emancipacáo do Haití para a América espanhola - nao recebe- talismo, como insisti antes, como é que o avance capitalista também despertou im-
I
raro atencáo compatível com sua importancia. O presente estudo, por dedicar-se a ., pulsos antiescravistas? No decorrer deste livro, tentar-se-á resolver o paradoxo de
um capítulo essencial da história da escravidáo no N ovo Mundo, vai explorar esta como o capitalismo, em primeiro lugar, precisou de regimes de trabalho forcado e,
I
dimensáo americana um tanto negligenciada."
É claro que nao há entendimento consensual sobre a "Era
mesmo entre os marxistas. A obra de Hobsbawm
da Revolucáo" na Europa,
foi notável por abordar a complexi-
rI mesmo assim, libertou forcas que ajudaram a combater a escravidáo americana.
Em Capitalismo e esc1'O.vidáo (1944), Eric Williams desenvolveu
de que a escravidáo pertencia ao velho mundo do mercantilismo
o argumento
colonial e que se
dade internacional de um processo continental e influente de "revolucáo burguesa" I tornou redundante com o surgimento do trabalho assalariado na metrópole e com a
no qual a política e a economia avanc¡aram em contraponto e nao em uoíssono. As lu- disseminacáo do domínio colonial europeu na Asia e na África. Ao mesmo tempo
tas de classes desta época náo ficaram de forma alguma confinadas a luta de uma nas- em que contém muitos argumentos poderosos e exemplos roaravilhosos, Capitalis-
1
cente classe capitalista contra o feudalismo obsoleto. Pequenos produtores, trabalhadores mo e escravidáo propóe urna explicacáo do abolicionismo segundo a qual os capita-
assalariados, artesáos, pequenos funcionários públicos, "burgueses" nao capitalistas, I listas industriais desfizeram-se do comércio negreiro e da escravidáo colonial por
todos tiveram seu papel. As vezes fizeram aliancas com os interesses capitalistas ou I .motivos essencialmente económicos. Faz-se referencia a tensóes sociais mais amplas
ajudaram a remo-ver obstáculos ao avanco capitalista. Mas uma característica distinti- .¡ e a revoltas de escravos, mas o peso principal da explicacáo recai sobre o interesse
va da "Era da Revolucáo' é que as forc¡as populares também intervieram para prote- económico capitalista. A abolicáo británica é abordada como se fosse um processo
ger seus próprios interesses o melhor que puderam. Esta época de progresso "burgués" nacional bastante auto-suficiente, e o destino da escravidáo na América indepen-
acabou por produzir estruturas de Estado nacional rnais adequadas a. acum ulacáo de dente nao é investigado, nem como teste de sua tese nem como influencia sobre a
capital do que os anciens régimesj mas também trouxe a luz os movimentos e institui- emancipaqáo británica. Williams nao ignora o fato de que o desenvolvimento do ca-
'loes democráticos que agiram como freio ao poder do capital. O curso dos acontecí- pitalismo e da escravidáo foram intimamente relacionados. Mas minimizou o pro-
mentas nas Américas apresentaria complexidade semelhante, marcada pela luta de classes blema da explicacáo ao sustentar que a escravidáo produzira o capitalismo, e nao o
popular e pela revolucáo burguesa. Este processo secular e contestado levou os se- contrario. Em contraste com o entendimento marxista das origens do capitalismo,
nhores de escravos americanos aos píncaros da riqueza e do poder em determinado Williams nao levou em conta a acumulacáo de capital agrario, manufatureiro e
momento apenas para despedacé-los no momento seguinte. mercantil na época pré-industrial. Para ele, os sistemas escravistas do N ovo Mun-
O fato de que os senhores de escravos, do Chesapeake ao Rio de Janeiro, pu- do, longe de serem urna conseqüéncia do desenvolvimento capitalista, foram urna
dessem ser protagonistas da "revolucáo burguesa" e do desenvolvimento capitalista escada descartável pela qual ele subiu. No final, seu esquema "dialético" de um
é, claro, totalmente paradoxal,já que eles mesmos nao eram burgueses nem capita- capitalismo que usou urna escravidao descartável é mecánico e insatisfatório,
listas, ainda que seus parceiros rnercantis pudessem ser assim descritos. E há ainda Em The Problem of Slavery in the Age of Reuolutio« 1776-1823 (1975), David
o problema de que, embora o surgimento do capitalismo na Europa nos séculos xvn ).
, Brion Davis apresenta uma investigacño mais comparativa e complexa dos aboli-
e XVIII tenha manifestamente promovido o desenvolvimento dos sistemas escravistas cionistas, esclarecendo os caminhos pelos quais eles ajudaram a construir uma nova
no Novo Mundo, ainda assim parece haver algum vínculo entre o capitalismo e o hegemonia burguesa, ainda que se movendo contra um modo de exploracáo mais
surgimento do antiescravismo. Em vários estudos notáveis, a abolicáo da escrava- primitivo na zona de plaMations. Esta obra admirável focaliza principalmente a ideologia
tura ou do tráfico negreiro foi identificada com os objetivos ou os princípios de urna do abolicionismo, apresentando de forma apenas resumida algumas das lutas ante-
nova civilizacáo capitalista e imperialista. Já se argumentou que a crítica da escravi- riores sobre a emancipacáo. Embora as controvérsias metropolitanas sejam muito
dio preparou o caminho para os regimes de máo-de-obra industrial assalariada ou bem esclarecidas, o padráo de resistencia e acomodacáo dos próprios escravos nao é
para a irnposicáo da hegemonia burguesa a todas as camadas da sociedade. De for- integrado a. análise. A experiencia e as aspiracóes dos escravos desta época sao mui-
11
'1
I
40 ROBIN BLACKBURN A QUEDA DO BSCRAVISMOCOLONIAL: 1776-1848 41
t

to mais difíceis de identificar e documentar do que o pensamento dos principais


I da escravidáo e do antiescravismo nas Américas pode dar sua própria contribuicáo ao
abolicionistas, mas isto nao nos dispensa de tentar.
I sugerir sua inadequacáo, como este livro renta fazer."
O ensaio notivel de Eugene Genovese, R"Om Rebellion lo Reoolutio« (1979), ex- Embora os historiadores do abolicionismo tendam a ignorar os acontecimentos
plora o desenvolvimento do antiescravismo dos próprios escravos e argumenta que i na zona de plantations, há também urna escola florescente de "estudos da escravi-
seu alcance e sua trajetória foram transfurmados durante a época da revolucáo demo- dáo" que se abstrai do contexto fornecido pela política e pela economia da metrópo-
1.
crática burguesa. Nestas substanciosas obras de interpretacáo, baseadas em amplas le. A vida dos escravos e a resistencia negra sao estudadasisoladamente, sem referencia
pesquisas, Davis e Genovese qualificam e matizarn a tese que vincula o antiescravismo
I a seu impacto sobre as decis6es metropolitanas. A especializacáo académica e a di-
ao surgimento da sociedade burguesa. Davis mostra que os abolicionistas visavam com
freqüéncia mais do que urna revisáo puramente capitalista das relacóes sociais, enquanto I visáo do trabalho tem suas justificativas, mas as razóes da destruicáo da escravidáo
colonial nao podem ser percebidas se a abolicáo metropolitana e as lutas da zona de
Genovese apresenta as formas pelas quais a resistencia escrava veio a prevalecer sobre plantations forem alocadas em departamentos diferentes do conhecimento.
o egoísmo burgués e Iembra-nos de que a revolucáo democrática burguesa na própria O modelo ainda nao superado para a compreensáo da luta contra a escravidáo é
!'
Europa assistiu várias vezes as forcas populares impondo o progresso democrático a Tbe Black Jacobins: 1bussaintl'Ouverture and the San Domingo Reoohaion, de C. L. R.
urna burguesía relutante, tímida ou traicoeira, Davis e Genovese chamam a atencáo
para as tensóes ~ contradicóes que isso provocou e colocam o surgimento dos movi-
I James (1938). Nesta obra, James determina o impacto da revolucáo no Caribe so-
bre os acontecimentos na metrópole e explora a fusáo extraordinária de tradicóes e
mentos abolicionistas e a Iegalizacáo e o resultado final da emancipacáo em um con- I impulsos diferentes conseguida em Sao Domingos na década de 1790. A hist6ria de
texto de luta de classes tanto na zona de plantatwm quanto na metrópole. Com base r James esclarece o funcionamento essencial do capitalismo, do racialismo, do colo-
nessas abordagens, o presente livro busca construir urna narrativa marxista das ver- nialismo e da escravidáo - e as complexas lutas de classes que provocara m em Sao
dadeiras lutas de libertacáo nas várias regióes das Américas e estabelecer até que pon- Domingos; transmite urna sensacáo maravilhosa de irrupcáo das massas na histó-
to o antiescravismo, em intencáo ou resultado, transcendeu a dinámica democrática . , ría. Com sensibilidade afinada com as furcsascosmopolitas da época, ele segue o im pulso
ou capitalista burguesa. A reconstrucáo narrativa oferecida também busca reconhe- i revolucionário transatlántico a cruzar o oceano de Sao Domingos a Paris e de volta
cer a contribuicáo dos senhores de escravos ao processo revolucionário burgués mais r ao Caribe. Como explicacáo, é mais satisfatória e, como narrativa, muito mais atra-
i
amplo, ao desmantelamento da escravidáo colonial e ao nascirnento de novos sistemas ente do que aqueles relatos de lutas ligadas a escravidáo colonial que nunca olham
~
escravistas. Isto envolveu reunir a política colonial e metropolitana em um relato do para fora das plantauons ou, pior ainda, nunca abandonam as salas de visita ou os
destino da escravidáo em cada colonia durante a época revolucionária, país por país. salóes de debate na metr6pole. Em alguns círculos, supóe-se que a historia narrati-
Na década de 1980 há sinais de que o estudo do abolicionismovem se tomando va tem pouco a oferecer e incapaz de identificar as estruturas profundas da econo-
é

um ramo especializado e desligado da historia da escravidáo. O abolicionismo é visto mia, da mentalidade ou da vida política. 12 O presente livro foi escrito com a conviccáo
I
" como urna expressáo importante da reforma da classe média em vez de urna resposta
a
~ as lutas na própria zona de plantations. O fato de que o abolicionismo levou emanci-
de que, se sao reais e efetivas, tais estruturas também seráo visíveis no nível dos eventos.
E com a crenca adicional de que as forcas socioeconómicas e os discursos ideológi-
pac;ao dos escravos tende a ser aceito sem investigacáo. Assim, o abolicionismo é en- cos sao tao inerentemente antagónicos e contraditórios que abrem espaso para a opsao
tendido como justificativa do avance capitalista, da propagacáo de um modelo de e a ac;ao políticas, as quais também devem ser registradas caso se queira apreender a
sociedade de mercado e da confianca burguesa no progresso. Em uro trabalho assim, dinámica do desenvolvimento histórico. Assim, a tentativa de construir urna narra-
o foco tende a cair sobre a evolucáo do pensamento e do sentimento social nas classes tiva p6e a prova interpretacóes conflitantes. Pode ser útil estabelecer o peso e o sig-
médias metropolitanas. Pouca atencáo se dá a luta de classes metropolitana ou as dis- nificado respectivos das diferentes for~s e fatores em asao. Nos relatos a seguir,
putas relativas ao objetivo e ao caráter do Estado; e concede-se ainda menos atencáo tentei colocar em contexto as lutas relativas a escravidáo colonial e mostrar que o
aos acontecimentos na própria zona deplantations, a resistencia escrava e ao papel dos antiescravismo foi muitas vezes imposto por pressóes externas aos agentes de deci-
ex-escravos na determinacáo do resultado do processo de emancipacáo, Embora a crítica sao na metrópole. A pesquisa marxista, em obras de escritores como James, Genovese,
teórica dessas abordagens seja necessária, urna narrativa que identifique os avances a
Gorender e Fraginals,já deu urna contribuicáo notável nossa compreensáo da for-
A QUEDA DO ESCRAVISMO COLONIAL: 1776-1848 43
ROBIN BLACKBURN

ma<;áo e da derrubada da escravidáo nas Américas. Mas a relacáo deste conjunto de impacto deste último sobre os escravos e seus senhores, sobre os estrategistas do
império e sobre o meio flutuante de aventureiros e revolucionários renta remediar
obras com a corrente dominante do desenvolvimento capitalista e da luta de dasses
esta deficiencia, com a ajuda da bem-vinda enxurrada de monografias de historia-
ainda nao foi suficientemente apreciada, o que fornece uma razáo adicional para o
presente estudo. As conclusóes aqui oferecidas continuam a ser parciais e experi- dores do Caribe sobre o assunto. Espero mostrar que é quase impossível exagerar o
impacto da revolucáo haitiana sobre o destino da escravidáo colonial.
mentais, em um campo no qual a pesquisa e o debate avancam a passos rápidos.
Esta e curras conclusóes emergem de capítulos que delineiam o progresso da es-

o primeiro capítulo examina as fontes do antiescravismo no mundo atlántico de mea- cravidáo e do antiescravismo nos Estados Unidos, na América espanhola e portugue-

dos do século XVIII - no sentimento popular, na resistencia dos escravos e na filo- sa, nas Índias Ocidentais británicas e nas Antilhas francesas. Eles destacam o paradoxo
sofia. Mas foi necessária a crise do império para que o antiescravismo se tornasse uma de que, embora este período de revolucáo "democrática burguesa" e de avan<jo capi-

questáo da política prática; capítulos subseqüentes tracam a irrupcáo de temas anties- talista tenha fortalecido e ampliado a escravidáo em algumas partes do Novo Mundo
\
cravistas nas crises imperiais e revoJucionárias que se alternaram na hist6ria das po- (sul dos Estados Unidos, Cuba e Brasil), tambérn armou o cenário para as correntes
tencias atlánticas até meados do século XIX. Os sistemas de escravidáo colonial se antiescravistas que garantiram substanciais emancipacóes de escravos em quase todas
desfizeram quase na ordem inversa de sua formacáo, com a crise dos sistemas británi- as décadas de 1780 até 1840, e ainda depois. Nao pode haver dúvida de que esta cor-
co e francés precedendo, e ajudando a precipitar, a das potencias ibéricas. Já fui suge- relacáo paradoxal apresenta um grande desafio a explicacáo histórica.
rido que a escravidáo americana tinha um ímpeto expansionista geralmente frustrado Recentemente alegou-se que o compromisso com o progresso histórico nao podía
pelo mercantilismo colonial, e portanto nao surpreende que a crise dos sistemas colo- mais ser mantido. Certamente a história da escravidáo do Novo Mundo nao permi-
niais tenha sido provocada pelo crescimento e nao pela contracáo, Foi totalmente apro- te uma concepcáo simples ou linear do avan<jo histórico. Mas quando se levam em
priado que a Grii-Bretanha hanoveriana, engrandecida pelo comércio ligado aos escravos, conta todas as tendencias e contradicóes, os movimentos americanos pela indepen-
tenha sido o primeiro Estado a ser humilhado p0r seus próprios colonos, em 1776-83, dencia, pelas liberdades republicanas e pela emancipacáo dos escravos representam
e depois, na década de 1790, o primeiro a ser derrotado por escravos rebelados. Os conquistas épicas da história humana e da formacáo do mundo moderno. Apesar
donos de platltations da América do Norte inglesa nao eram os mais ricos do N ovo dos resultados heterogéneos do antiescravismo da época, os sacrificios de escravos
Mundo, mas incorporavam-se a formacáo social colonial mais dinámica e estavam em rebeldes, abolicionistas radicais e democratas revolucionários nao foram em váo. Eles
melhor situacáo para desafiar o poderio metropolitano. Os Capítulos 2 a 4 examina m mostram como foi possível enfrentar, e algumas vezes derrotar, a opressáo que me-
o antiescravismo na Crá-Bretanha e na América do Norte, colocando tanto a Revolu- drou como anverso horrível do crescimento da capacidade e do poder sociais huma-
liao Americana quanto o surgimento da abolicáo no contexto da ordem política e da nos no mundo atlántico do início do período moderno. Em termos mais gerais, sao
cultura da qual emergiram. Nos capítulos seguintes a derrubada da escravidáo colo- de interesse por esclarecerem as maneiras como, embora de forma incompleta ou
nial francesa é, de forma similar, considerada ero seu contexto, o da crise do ancie» imperfeita, os interesses de emancipacáo podem prevalecer contra as leis e os costu-
régime e da irrupcáo das forcas revolucionárias na Franca e no Caribe. mes antigos e o espírito de impiedosa acumulacáo,

G
Com freqüéncia os relatos da abolicáo e da escravidáo no N ovo Mundo passam
epressa demai~ pelo impact~ ~ausado sobre elas pc;las revolucóes no Caribe fran-
s e pelo aparecunento do Haiti, um Estado negro. E quase como se o Black Jacobins Notas
de James os dispensasse de levar ero conta os importantes aspectos concomitantes e
as conseqüéncias da única revolta de escravos bern-sucedida na hist6ria. Na verda- 1. Sobre as muitas variedades de escravidáo, ver Orlando Patterson, Slavcry and Social
de, a obra de James deveria ser uma inspiracáo para identificar o impacto da "pri- Death, Cambridge, Mass., 1982; tento definir esta instituicáo variável em uma contri-
meira emancipacáo" sobre as lutas posteriores contra a escravidáo colonialem outras bui~ao em Leonie Archer, org., Slavcry, Londres 1988.
partes das Américas. O relato detalhado, nos Capítulos S a 9, da desintegracáo do 2. Elizabeth Fax Genovese e Eugene Genovese, Fruits ofMcrchant Capital; Slavc,-yand

poder dos senhores de escravos em Sao Domingos, do nascimento do Haiti e do Bourgcois Property in /hc Riso and Expansion ofCapitalism, Oxford e Nova York, 1983;
44 ROBIN BLACKBURN

Manuel Moreno Fraginals, El Ingenio, 3 vols., Havana, 1978; ver também Richard S. I
Dunn, Sugar a"¿ Sleoes, Chapel Hill, 1972; Michael Craton eJames Walvin, A Jamaica
Plan/olio", Toronto, 1970; Gabriel Debien, Les Esclaoes aa» AntilleJ Fran~aises; XVII- As origens do antiescravismo
XVIII Siee!e, Basse 'Ierre, Guadalupc, 1974.
3. Jacob Gorender, O escrawmo eokmiai, Sao Paulo, 1978 (p. 242 para a discussáo citada).
4. Estas e outras características da forma~¡¡oda escravidáo colonial no Novo Mundo até
1776 sedo exploradas sistematicamente em uma seqüéncia da presente obra intitulada
11Ie mst and the Ris« of S/awry.
-
Branco diz o preto furta
S. J. H. P.irry, TIte Spanisn Sea-horne Empire, Londres, 1966; James Lockhart e Stuart
Preto furta com razao
Schwartz, Early Lolin-Ameriea, Cambridge, 1983, pp. 98-101, 18 1-2S2; James Lang, Sinhó branco também furta
Portuguese Brln;l: TIte KingJ Planta/ion, Nova York, 1979, pp. 115-52, 20S-18. Sobre o Quando faz a escravidáo
contexto mais amplo, ver Eric Wolf, Europe and the People WiJhou/ HisJory, Londres,
1984. Ca,,~iJo brasileira dos tempos da escravidíJo
6.. Os dados neste parágrafo e nos anteriores foram extraídos de Ralph Davis, Th« Rise of i
tne Atlantie Ecosomies, Londres, 1973, pp. 257, 264-5; Fraginals, El Ingenio, J, p. 41; r [...] the king and bis other Iprd[ ...] found there [Mile End]
Paul E. Lovejoy, "The Volume of the Atlantic SlaveTrade. A Synthesis", Joumal of threescore thousand men of divers villages and of sundry countries
Africa" Hislof'y, vol 23, 1983, pp. 473-501; David Eltis, "Free and Coerced Transatlantic in England. So the king entered in among them and said to them
Migrations", American Historical &-view, vol. 88, n". 2, abril de 1983, pp. 251-80. sweetly,'Ah, ye good people, J am your king. What lack ye? What
7. Sobre I dinámica do consumo por tris do desc:nvolviment~ da plantolion, ver Sidney will ye say?' Then such as understood him said: 'We will that ye
Mintz, Sweetness and Pouu«, Londres, 1985. make us free for ever ourselves, our heirs and our lands, and that
~. PAra um exame esclarecedor das formas pelasquais os impérios impuseram a coorde-
we be called DOmore bond, nor so reputed', 'Sirs', said the king. 'I
am well agreed thereto, Withdraw ye home into your own houses
Da~aOprodutiva, ver Michael Mano, The Sources of Social Posoer, Cambridge, 1986, j.
and into sueh villages as ye came from [...] and 1sball cause
pp. 14S-55, 150-98.
writings to be made and seal them with my seal[ ...] containing
9. A. J. R. Russell Wood, 1ñe Black Ma1J i1JSlawry and Fmdom ¡n Colonial Brazil, Lon-
everything that ye demand'[ ...] These words appeared welI to the
dres, 1982, pp. 128-60; mas ver também Ronaldo Vainfas,[deoltJgiae eJcravidiío, Petrópolis, l· commom people, such as were simple, good, plain men."

10.
1986, pp. 93·115.
Embora o próprio Hobsbawm certamente registre, de forma breve mas enfática, esta
I Froissard's Chronic/e (l381)
dimensiio americana; ver Tñs AgtJ of Rewlutíon, Londres, 1964, pp. 69, 110..
11. Para um exemplo desta abordagem, ver Thomas Haskell, "Capitalism and the Origins
r
ofthe Humanitarian Sensibility,Part 1", America" HistoricaJ Review, vol. 90, nO.2, abril
de 1985, "PArt2", America" Hisumcal &-view, vol. 90, na. 3, junho de 1985; ver tam- I
bém o "Forum" sobre estés artigos emAmerica1JHistoricalRrview, vol. 92, n", 4,1987, i
pp. 797.878, com criticas de David Brion Davis eJob.n Ashworth e a resposta de Thomas
Haskell.
12. Frao!fois Furet, I"terpreti"g /he Frenen Rewlution, Cambridge, 1985, pp. 184-204. l·
I [... ) o rei e seus outros lordes [...] ellcontraraml6 (em Mile End] sessenta mil homens de aldeiu de mergulha-
°
dores e de diferentes regi6es da Inglaterra. E ent§o rei foi parajullto dele. e di.se-Ihe, docemente: "Ah, boa
!. gente, .ou vosso rei. O que vos faltal O que direisl" Entdo oquele, que o compreenderalll disseram: "Desejamos
¡ que nos tornei. li"res, a nó., nossos hcrdeiros e no•• ao terra., c que nAo aejamo, mai, chamadoa calivos, ncm

¡
assim considerados." "Senhores", di.se o rei, "utou bem de acordo com i,.o. Retirai-vo. para vossoslarn, para
\losso., próprias casas e para os .Ideias de onde \liestes [... ] e eu r.rti com que 01 textos sejam t9crilos e selé-Ios-
·Obra que acabou por intitular-U! Tlle Md:/"K oISltl'IJe,.,IN Ihe No'!}) Rflrld, e que aerá publicada pela R~cord, un ti com meu selo (...] conlendo ludo o que pedis." [ ...] T.i. palavr .. ,oaralll bem para I gente do PO\lO,que eram
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breve, tom o título A (ollSlrllfllQdo Ucrll'IJ/stJlO No'IJoM.,"',: }492-1800 homcns comuna, bons, simple •.

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