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INSTITUTO FEDERAL DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO DO RS– CAMPUS CAXIAS DO SUL

APNP – LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA III

Profa. Dra. Silvana Kissmann


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Nome: Fernando Soso Girardi e Leonardo Por


Guarese
Turma: 3º TQ - Tarde
Disciplina: Lingua Portuguesa e Literatura
Brasileira III
Professor(a): Silvana Kissmann

Atividade: Leitura e compreensão de texto

No Retiro da Figueira1

01 Sempre achei que era bom demais. O lugar, principalmente. O lugar era… era maravilhoso.
02 Bem como dizia o prospecto: maravilhoso. Arborizado, tranquilo, um dos últimos locais –
03 dizia o anúncio – onde você pode ouvir um bem-te-vi cantar. Verdade: na primeira vez que
04 fomos lá ouvimos o bem-te-vi. E também constatamos que as casas eram sólidas e bonitas,
05 exatamente como o prospecto as descrevia: estilo moderno, sólidas e bonitas. Vimos os
06 gramados, os parques, os pôneis, o pequeno lago. Vimos o campo de aviação. Vimos a
07 majestosa figueira que dava nome ao condomínio: Retiro da Figueira
08 Mas o que mais agradou à minha mulher foi a segurança. Durante todo o trajeto de
09 volta à cidade – e eram uns bons cinquenta minutos –, ela falou, entusiasmada, da cerca
10 eletrificada, das torres de vigia, dos holofotes, do sistema de alarmes – e sobretudo dos
11 guardas. Oito guardas, homens fortes, decididos – mas amáveis, educados. Aliás, quem nos
12 recebeu naquela visita, e na seguinte, foi o chefe deles, um senhor tão inteligente e culto
13 que logo pensei: “ah, mas ele deve ser formado em alguma universidade”. De fato: no
14 decorrer da conversa ele mencionou – mas de maneira casual – que era formado em Direito.
15 O que só fez aumentar o entusiasmo de minha mulher.
16 Ela andava muito assustada ultimamente. Os assaltos violentos se sucediam na
17 vizinhança; trancas e porteiros eletrônicos já não detinham os criminosos. Todos os dias
18 sabíamos de alguém roubado e espancado; e quando uma amiga nossa foi violentada por
19 dois marginais, minha mulher decidiu – tínhamos de mudar de bairro. Tínhamos de procurar
20 um lugar seguro.
21 Foi então que enfiaram o prospecto colorido sob nossa porta. Às vezes penso que
22 se morássemos num edifício mais seguro o portador daquela mensagem publicitária nunca
23 teria chegado a nós, e, talvez… Mas isto agora são suposições. De qualquer modo, minha
24 mulher ficou encantada com o Retiro da Figueira. Meus filhos estavam vidrados nos pôneis.
25 E eu acabava de ser promovido na firma. As coisas todas se encadearam, e o que começou
26 com um prospecto sendo enfiado sob a porta transformou-se – como dizia o texto – num
27 novo estilo de vida.
28 Não fomos os primeiros a comprar a casa no Retiro da Figueira. Pelo contrário; entre
29 nossa primeira visita e a segunda – uma semana após – a maior parte das trinta residências
30 já tinha sido vendida. O chefe dos guardas me apresentou a alguns dos compradores. Gostei

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SCLIAR, Moacyr in LADEIRA, Julieta de Godoy (org.). Contos brasileiros contemporâneos. São Paulo: Moderna, 1991. p. 59-61 .
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31 deles: gente como eu, diretores de empresa, profissionais liberais, dois fazendeiros. Todos Por
32 tinham vindo pelo prospecto. E quase todos tinham se decidido pelo lugar por causa da
33 segurança.
34 Naquela semana descobri que o prospecto tinha sido enviado apenas a uma
35 quantidade limitada de pessoas. Na minha firma, por exemplo, só eu o tinha recebido. Minha
36 mulher atribuiu o fato a uma seleção cuidadosa de futuros moradores – e viu nisso mais um
37 motivo de satisfação. Quanto a mim, estava achando tudo muito bom. Bom demais.
38 Mudamo-nos. A vida lá era realmente um encanto. Os bem-te-vis eram pontuais: às
39 sete da manhã começavam seu afinado concerto. Os pôneis eram mansos, as aléias
40 ensaibradas estavam sempre limpas. A brisa agitava as árvores do parque – cento e doze,
41 bem como dizia o prospecto. Por outro lado, o sistema de alarmes era impecável. Os
42 guardas compareciam periodicamente à nossa casa para ver se tudo estava bem – sempre
43 gentis, sempre sorridentes. O chefe deles era uma pessoa particularmente interessada:
44 organizava festas e torneios, preocupava-se com nosso bem-estar. Fez uma lista dos
45 parentes e amigos dos moradores – para qualquer emergência, explicou com um sorriso
46 tranquilizador. O primeiro mês decorreu – tal como prometido no prospecto – num clima de
47 sonho. De sonho mesmo.
48 Uma manhã de domingo muito cedo – lembro-me que os bem-te-vis ainda não
49 tinham começado a cantar – soou a sirene de alarme. Nunca tinha tocado antes, de modo
50 que ficamos um pouco assustados – um pouco, mas não muito. Mas sabíamos o que fazer:
51 nos dirigimos, em ordem, ao salão de festas, perto do lago. Quase todos de roupão ou
52 pijama.
53 O chefe dos guardas estava lá, ladeado por seus homens, todos armados de fuzis.
54 Fez-nos sentar, ofereceu café. Depois, sempre pedindo desculpas pelo transtorno, explicou
55 o motivo da reunião: é que havia marginais nos matos do redor do Retiro e ele, avisado pela
56 polícia, decidira pedir que não saíssemos naquele domingo.
57 – Afinal – disse, em tom de gracejo – está um belo domingo, os pôneis estão aí
58 mesmo, as quadras de tênis…
59 Era mesmo um homem muito simpático. Ninguém chegou a ficar verdadeiramente
60 contrariado.
61 Contrariados ficaram alguns no dia seguinte, quando a sirene tornou a soar de
62 madrugada. Reunimo-nos de novo no salão de festas, uns resmungando que era segunda-
63 feira, dia de trabalho. Sempre sorrindo, o chefe dos guardas pediu desculpas novamente e
64 disse que infelizmente não poderíamos sair – os marginais continuavam nos matos soltos.
65 Gente perigosa; entre eles, dois assassinos foragidos. À pergunta de um irado cirurgião o
66 chefe dos guardas respondeu que, mesmo de carro, não poderíamos sair; os bandidos
67 poderiam bloquear a estreita estrada do Retiro.
68 – E vocês, por que não nos acompanham? – perguntou o cirurgião.
69 – E quem vai cuidar das famílias de vocês? – disse o chefe dos guardas, sempre
70 sorrindo.
71 Ficamos retidos naquele dia e no seguinte. Foi aí que a polícia cercou o local:
72 dezenas de viaturas com homens armados, alguns com máscaras contra gases. De nossas
73 janelas nós os víamos e reconhecíamos: o chefe dos guardas estava com a razão.
74 Passávamos o tempo jogando cartas, passeando ou simplesmente não fazendo
75 nada. Alguns estavam até gostando. Eu não. Pode parecer presunção dizer isto agora, mas
76 eu não estava gostando nada daquilo.
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77 Foi no quarto dia que o avião desceu no campo de pouso. Um jatinho. Corremos Por
78 para lá.
79 Um homem desceu e entregou uma maleta ao chefe dos guardas. Depois olhou para
80 nós – amedrontado, pareceu-me – e saiu pelo portão da entrada, quase correndo.
81 O chefe dos guardas fez sinal para que não nos aproximássemos. Entrou no avião.
82 Deixou a porta aberta, e assim pudemos ver que examinava o conteúdo da maleta. Fechou-
83 a, chegou à porta e fez um sinal. Os guardas vieram correndo, entraram todos no jatinho. A
84 porta se fechou, o avião decolou e sumiu.
85 Nunca mais vimos o chefe e seus homens. Mas estou certo que estão gozando o
86 dinheiro pago por nosso resgate. Uma quantia suficiente para construir dez condomínios
87 iguais ao nosso – que eu, diga-se de passagem, sempre achei que era bom demais.
88

Responda ao que se pede:

1. O narrador é um narrador observador ou um narrador personagem? Transcreva um


enunciado que comprove sua resposta.
R. Narrador personagem. Exemplo: “Quanto a mim, estava achando tudo muito bom. Bom
demais.”

2. Os dois primeiros parágrafos integram o estado inicial. Que função exercem?


R. De nos apresentar os personagens e uma leve indicação da trama(no caso do conto a
mudança da familia) para nos chamara a atenção para dar continuidade.

3. Quanto à complicação da narrativa:


a) identifique-a;
R. A narrativa se complica no momento que o alarme toca pela primeira vez, no
parágrafo que se inicia na 48ª linha.

b) reconheça o vocábulo que a introduz no texto.


R. O vocábulo “assustados” introduz a complicação da narrativa.

4. Que fato corresponde à resolução da narrativa?


R. Foi no pouso do jatinho no campo de pouso.

5. O texto apresenta desfecho surpreendente. Explique.


R. Sim, pois fomos indagaados a acreditar que o Retiro da Figueira era um lugar seguro,
justamente por que era o que a familia buscava, e também aparentava ser, até o desfecho,
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em quem nós acreditarmos estar protegendo estava na verdade cometer tal crime que a
Por
familia(e os outros moradores) estavam fujindo.

6. Por que “o prospecto tinha sido enviado apenas a uma quantidade limitada de pessoas”
(linhas 34-35)?
R. Pois o sequestro devia ser apenas de pessoas com certa importância social, como o
próprio protagonista diz: “Gostei deles: gente como eu, diretores de empresa, profissionais
liberais, dois fazendeiros.” Para assim eles ganharem mais em cima disso.

7. O chefe dos guardas “fez uma lista dos parentes e amigos dos moradores” (linhas 45-46).
Que explicação deu aos habitantes do Retiro da Figueira? O que realmente o levou a
elaborar essa lista?
R. Sua desculpa para fazer a lista foi de que seria usada para emergências mas, foi usada
para descobrir as pessoas que eles teriam que extorquir.

8. No parágrafo situado entre as linhas 21 e 27, há duas substituições vocabulares da


expressão “o prospecto” (linha 21). Indique-as.
R. “mensagem publicitária(linha 22)” e “o texto(linha 26)”.

9. Qual é o referente da substituição vocabular “o fato” (linha 36)?


R. O fato de que o prospecto foi enviado para um número limitado de pessoas inclusive, o
protagonista.

10. O vocábulo “lá” possui o mesmo referente nas linhas 39 e 79? Por quê?
R. Não, pois na linha 39 se refere ao Retiro da Figueira e na linha 79 ao salão de festas.

11. O emprego da expressão “o transtorno” (linha 55) corresponde uma substituição vocabular,
a uma nominalização ou a uma pronominalização? Justifique.
R. Substituição vocabular, pois ele substitui a explicação de tudo o que ocorreu
anteriormente e já foi citado no texto, para que não ocorra a repetição.

12. Quanto ao pronome “isto” (linha 76):


a) qual é seu referente?
R. O referente é a frase que vem logo em seguida, sendo ela “eu não estava gostando
nada daquilo”.
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Por
b) seu referente corresponde a um elemento precedente ou subsequente?
R. Subsequente.

c) como se classifica esse recurso de coesão lexical?


R. Pronominalização.

13. Reconheça o referente dos pronomes “as” (linha 5), “ela” (linha 16), “(d)eles” (linha 44) e
“eles” (linha 66).
R. As, referente as casas. Ela, referente a mulher do protagonista. (D)eles, referente aos
marginais.

14. Nos enunciados “O chefe dos guardas fez sinal para que não nos aproximássemos. Entrou
no avião. Deixou a porta aberta, e assim pudemos ver que examinava o conteúdo da maleta.
Fechou-a, chegou à porta e fez um sinal. Os guardas vieram correndo, entraram todos no
jatinho. A porta se fechou, o avião decolou e sumiu” (linhas 82-85), ocorre a elipse do sujeito
dos verbos destacados, o que não impede, no entanto, sua recuperação pelo leitor. Quem
realizou as ações expressas pelos verbos?
R. O chefe dos guardas.

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