Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Introdução
1O Curso EPDS/UFF teve como coordenador geral o Prof. Celso José da Costa (COMFOR) e
como vice-coordenador o Prof. Rolf Ribeiro de Souza (do Instituto do Noroeste Fluminense de
Educação Superior (INFES) e contou com financiamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação (FNDE).
Escolar (SECADI), Diretoria de Políticas de Educação em Direitos Humanos e
Cidadania (DPEDHUC) do Ministério da Educação.2
No início de 2013, após uma década da criação do Programa Bolsa
Família (PBF), a SECADI/DPEDHUC, diante das contribuições do Programa
para a redução da pobreza no Brasil, analisou dados acumulados sobre a
frequência escolar dos estudantes beneficiários do PBF, aqueles reconhecidos
pelo estado como merecedores, e somando esforços com especialistas e
representantes de universidades federais, formulou a Iniciativa Educação,
Pobreza e Desigualdade Social (IEPDS).
A IEPDS foi implementada em 26 universidades federais3 a partir da oferta
do curso nas modalidades especialização e aperfeiçoamento, com o objetivo de
“sensibilizar os profissionais da educação e outros envolvidos com políticas
sociais no que se refere às relações entre educação, pobreza e desigualdade
social”, articulando formação continuada, pesquisa acadêmica e difusão do
conhecimento. A proposta da IEPDS destaca o papel da escola no combate à
pobreza, além de apontar para a invisibilidade desses sujeitos neste espaço,
associado às práticas discriminatórias e preconceituosas que incidem sobre
eles.
Consideramos que analisar dados de pesquisa advindos desta
experiência coletiva pode lançar luz sobre as condições em que discentes de
escolas públicas beneficiários do PBF têm acesso a esse e a outros recursos
públicos; outrossim, pode contribuir para compreender como são utilizados, bem
como sinalizar a importância de se construir uma visão holística sobre o
fenômeno da pobreza pela comunidade escolar, desafio que afirma a
imprescindibilidade do acolhimento do aluno na escola.
A categoria pobreza, tal como definida nos documentos da IEPDS, é
utilizada como um adjetivo às escolas públicas: “escola pública, escola dos
pobres” (ARROYO, 2019), o que ressalta a visão naturalizada da pobreza que
UFMA, UFPI, UFES, UFMG, UFPA, UFPR, UFSC, UFRR, UFPE, UFMS, UFAM, UFT e, na
segunda fase (2018) em mais 11 universidades: UNB, UFMT, UFSE, UFAC, UFMA, UFPB,
UFAL, UFGO, UFRS e UFF.
culpabiliza os sujeitos pela reprodução de sua própria condição de
vulnerabilidade social; além de reforçar o desprezo às escolas públicas, o que
tem legitimado o preconceito aos assim reconhecidos “pobres”. Portanto, ainda
que o Curso EPDS tenha se estabelecido com o propósito de problematizar o
conceito de pobreza para dar visibilidade aos educandos, que no âmbito da
escolaridade são ocultados por serem afetados por este processo de
naturalização, nesta definição acaba-se por ressignificá-lo. Durante a
implementação do Curso, os investimentos dos pesquisadores e gestores
deram-se no sentido de situar a pobreza em um universo mais amplo e complexo
das desigualdades sociais que aqui relatamos e cuja análise dos dados da
pesquisa também procuramos salientar.
Inúmeros foram os investimentos iniciais na tentativa de consolidar uma
definição sobre o termo pobreza e se afastar de uma visão naturalizada, quase
sempre associada a uma forma de degradação da condição de vida. Sem a
intenção de dar conta dos múltiplos investimentos para defini-lo, chamamos
atenção para o sentido atribuído ao termo pela instituição financeira
mundialmente reconhecida no estabelecimento de critérios definidores da
pobreza e de beneficiários do PBF. O Banco Mundial estabelece uma medida
monetária com objetivos de criar um padrão mínimo universal de
reconhecimento da pobreza baseado no método dólar a day. Esta metodologia
de definição dos pobres vem sendo utilizada desde 1990 e ao longo dos anos
vem sofrendo atualizações. Em 2008 estabeleceu-se que são considerados
pobres aqueles que vivem com US$ 1,25 ao dia. Este critério de definição dos
pobres não abarca o consumo básico das famílias em diferentes contextos
sociais e subestima o problema da pobreza ao desconsiderar outros fatores
intervenientes nas condições de vida dos sujeitos.
Neves (2011), analisando os fatores que constituem a condição de
existência de mendigos, chamou atenção para a necessidade de ampliarmos o
horizonte de compreensão dos atributos sociais que operam na configuração
socioeconômica daqueles definidos como pobres. Como adverte, as condições
de vulnerabilidade social desses sujeitos os colocam no centro de investimentos
políticos requalificantes que buscam minimizar os efeitos dos extremos índices
de desigualdades socioeconômicas na sociedade brasileira. Esta condição
social se reproduz entre gerações, transformando a pobreza num legado,
especialmente no caso das famílias que se valem do trabalho remunerado dos
filhos durante a infância. A reprodução social dos chamados pobres, portanto, é
marcada pela exclusão do acesso às alternativas de mudança de posição social,
“porque integram poucas chances de conhecer outras formas de inserção
social”. (NEVES, 2001, p. 149)
Neste sentido, inseridos nas escolas públicas, escolas dedicadas aos
pobres (Arroyo, 2019), permanecem ameaçados pela pobreza e são
negativamente marcados por esta imposição. O sistema escolar desempenha
papel central neste processo simbólico de reprodução de limites a outras formas
de inserção dos estudantes considerados pobres pela sua adjetivação em
termos de carência e ausência, tendo como parâmetro outros segmentos da
sociedade que pela oposição cultural a esta caracterização são idealizados.
(BOURDIEU, 2011)
Para não cair na uniformização desses princípios de aceitação passiva de
um único projeto de vida desses sujeitos, em contexto marcado pela fluidez de
relações sociais, políticas e econômicas, posicionamo-nos contrariamente ao
discurso que tem ecoado a partir dos porta-vozes de diferenciadas políticas
públicas e daqueles que têm se posicionado contrariamente à escola pública.
Ora, ser estudante de escola pública, valendo-se da agregação ou incorporação
de condições de possibilidade contextuais para elaboração de projetos de vida,
não significa que outros projetos não possam ser elaborados. Contudo, muitos
desses discentes permanecem na condição de pobreza e de vulnerabilidade por
motivos que, dentro do universo do recorte desta pesquisa, buscamos
considerar. O mapeamento dos recursos públicos que os beneficiários do PBF
têm acesso permite compreender as condições de constituição desses sujeitos
adjetivados e assim reconhecidos “pobres” na diversificação de estratégias de
reprodução social.
Pretendemos ainda evidenciar que as condições de exclusão desses
estudantes se agravaram pela imposição do isolamento social neste contexto da
pandemia da Covid-19, especialmente se considerarmos que lutam por acesso
a direitos e garantias fundamentais, como o da educação, saúde e assistência
social. A experiência do “isolamento dentro do isolamento” que se estabeleceu
com a chegada do coronavírus, evidenciou a cruel pedagogia do vírus que impõe
o drama social pelas opções de “morrer de vírus ou morrer de fome” como
salienta Santos (2020, p. 17).
abertas que versavam sobre três distintos eixos de pesquisa: a) políticas públicas e desigualdade
social; b) saúde, meio ambiente e pobreza; c) práticas educacionais e (re)produção social.
recursos a estudantes considerados “pobres” pelos critérios de reconhecimento
da pobreza segundo o PBF. Almejamos ainda compreender as condições de
inserção e de participação desses beneficiários em programas educacionais e
identificar as formas de acesso a políticas públicas voltadas para este perfil de
estudantes. Neste sentido, ao entendermos a escola enquanto espaço
privilegiado da reprodução social e cultural (Bourdieu, 2011), pretendemos
refletir sobre a eficácia das políticas sociais públicas a partir das condições de
acesso pelos seus beneficiários, no caso em tela, os estudantes do ensino médio
regular que integra a rede estadual do Rio de Janeiro.
O contexto social das escolas abarcadas pela pesquisa e a proximidade
com a região metropolitana do Rio de Janeiro não podem ser desconsiderados
sob pena de perder de vista as múltiplas possibilidades de captação de recursos
e de confluência de políticas públicas direcionadas aos estudantes da rede
pública de ensino. Tomamos como pressuposto que a especificidade de oferta
desses recursos e de sua objetificação pode corresponder a elaboração de
projetos pautados na perspectiva da mudança social (SANTOS, 2015) que se
preconiza para estes estudantes.
Advogamos que o papel da escola na reprodução dos efeitos simbólicos
e econômicos da distribuição desigual do capital cultural, ao mesmo tempo que
dissimula e os legitima, compõe uma “pedagogia de privação” que converte
hierarquias sociais em hierarquias escolares. (BOURDIEU, 2011, p. 311) Neste
sentido, o sistema escolar cumpre uma função de legitimação que reproduz o
sistema de relações sociais desiguais, evidenciando a necessidade de promover
o debate e o conhecimento aprofundado do lugar social de origem de crianças,
adolescentes e jovens que integram o sistema de ensino público no país.
9No ano de 2019 o benefício foi interrompido por decisão do Governo do Estado do Rio de
Janeiro.
O Programa Minha Casa Minha Vida, visa, na faixa 1, atender famílias
com renda mensal de até R$ 1.600,0010, com objetivo de subsidiar a aquisição
da casa própria pelas consideradas mais pobres. O governo federal propõe
compatibilizar o valor das prestações com a capacidade de pagamento destas
famílias. Além disso, o Programa Tarifa Social, criado em 2016, concede
descontos de até 100% a famílias inscritas no Cadastro Único até o limite de
50kWh de energia elétrica consumidos por mês.
Os programas educacionais são decorrentes de investimentos públicos
para melhoria da qualidade da educação, mediante a promoção da inclusão
social e redução da pobreza e da formação de profissionais para o mercado de
trabalho. No caso do Programa Autonomia, o público alvo são discentes fora do
padrão idade-série e tem como foco ações para acelerar os estudos. No caso da
iniciativa Cinema para Todos, o objetivo é estimular e democratizar o acesso aos
estudantes da rede estadual de ensino às salas de cinema mediante a
distribuição de vales-ingressos. O Programa Escola Aberta refere-se a
proposição de ocupação do espaço escolar nos finais de semana, mediante a
oferta de atividades educativas, esportivas e culturais para estudantes e também
para seus familiares, integrando atividades como prática de esportes, ensino de
idiomas e instrumentos musicais (banca escolar) e teatro. Cabe destacar que,
dentro da perspectiva de uma política de incentivo à profissionalização dos
jovens, o Jovem Aprendiz, corresponde a uma forma de contratação de
estudantes, na faixa etária entre 15 e 18 anos, em seu primeiro emprego que,
diferentemente do estágio, assegura a eles todos os direitos trabalhistas, além
de prepará-los para inseri-los no mercado de trabalho.
Demais programas de oferta de recursos educacionais, como é o caso da
merenda, do livro didático, do uniforme, do transporte escolar e da saúde na
escola, correspondem a investimentos em atendimento a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (Lei n° 9.394/96) que define o dever do estado com a
educação escolar pública mediante a garantia do atendimento das necessidades
dos estudantes por meio de programas suplementares.
10Este valor corresponde ao valor da faixa 1 do Programa no ano de 2018, ano em que ocorreu
o curso EPDS.
Condições de acesso a recursos públicos por beneficiários do PBF
Algumas considerações
Referências bibliográficas