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FUNDAÇÃO BAHIANA PARA DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS

ESCOLA BAHIANA DE MEDICINA E SAÚDE PÚBLICA


CURSO DE PSICOLOGIA

IARA DE MENEZES PEREIRA

REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PSICÓLOGOS


NO SISTEMA PRISIONAL EM SALVADOR - BA

Salvador
2006
IARA DE MENEZES PEREIRA

REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PSICÓLOGOS


NO SISTEMA PRISIONAL EM SALVADOR - BA

Trabalho apresentado como parte dos


requisitos para a conclusão do Curso de
Graduação em Psicologia da FBDC.

Orientadora: Marilda Castelar

Salvador
2006
AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente a Deus, que me deu a chance de converter meu sonho em realidade.

Aos meus pais, José Alberto e Iara Garcez, que sempre me incentivaram a trilhar os caminhos
do conhecimento.

À minha professora e orientadora nas disciplinas Pesquisa Orientada I e II, Mirela Figueiredo,
pelo carinho, cuidado e paciência para ensinar o caminho certo.

Às minhas queridas amigas Núbia Britto e Ericka Lúci, pela amizade e incentivo genuínos.

Em especial, à minha orientadora de TCC, Marilda Castelar, pelos ensinamentos valiosos,


escuta generosa e incentivos infindáveis.

E a todos que contribuíram de alguma forma para que este trabalho fosse realizado.
RESUMO

Este artigo é resultado de uma pesquisa para se compreender a atuação dos psicólogos no
sistema prisional da cidade de Salvador, através dos significados atribuídos às suas práticas.
Teve como objetivos ressaltar e descrever as práticas realizadas por psicólogos que trabalham
no sistema prisional de Salvador; compreender os significados atribuídos à atuação
profissional a partir dos seus discursos; entender aspectos da sua identidade profissional e a
maneira como percebem a repercussão de seu trabalho no contexto em que atuam. Foram
realizadas entrevistas semi-estruturadas com três psicólogas. O método qualitativo foi
utilizado para a análise dos dados, porque permite evidenciar as crenças, valores e
significados dos sujeitos envolvidos. O discurso de psicólogos que atuam na área jurídica,
encontrado na literatura, apresenta insatisfações e questionamentos em relação ao lugar que
ocupam nas instituições jurídicas, inclusive nas prisões. Da mesma forma, existem psicólogos
frustrados com suas funções, com um discurso repleto de críticas ao sistema ao qual estão
submetidos e às limitações do trabalho desenvolvido. O presente estudo sinaliza para a
necessidade urgente de mudanças em suas práticas profissionais e repensar as políticas
públicas para o sistema prisional.

Palavras-chave: Psicologia Jurídica; Sistema Prisional; Identidade Profissional; Significado


das práticas.
ABSTRACT

This article is resulted of a research to understand the performance of the psychologists in the
prisional system of the city of Salvador, through the meanings attributed to its practical. It had
as objective to stand out and to describe the practical ones carried through for psychologists
who work in the prisional system of Salvador; to understand the meanings attributed to the
professional performance from its speeches; to understand aspects of its professional identity
and the way as they realize the repercussion of its work in the context where they act.
Interviews half-structuralized with three psychologists had been carried through. The
qualitative method was used for the analysis, because it allows to evidence the beliefs, values
and meanings of the involved citizens. The speech of psychologists who act in the legal area,
found in literature, presents no satisfactions and questionings in relation to the place that they
occupy in the legal institutions, also in the arrests. In the same way, psychologists frustrated
with its functions were detected, with a speech full of critical to the system to which is
submitted and to the limitations of the work developed. The present study signals for the
urgent necessity of changes in its practical professionals and to rethink the public politics for
the prisional system.

key words: Legal psychology; Prisional System; Professional Identity; Meaning of the
practical ones.
SUMÁRIO

1 Introdução...........................................................................................................................7

2 O psicólogo e o sistema prisional.................................................................................9

3 Método...............................................................................................................................11

4 Resultados e Discussão..................................................................................................14
4.1 Escolha do campo profissional...........................................................................................14
4.2 O sistema prisional e o lugar do psicólogo.........................................................................15
4.3 Questões éticas....................................................................................................................16
4.4 Reflexões sobre a prática profissional e trabalho em equipe..............................................18
4.5 Identidade profissional, formação e organização dos psicólogos.......................................19
4.6 Outras possibilidades de atuação........................................................................................20

5. Considerações finais.......................................................................................................24

Referências.............................................................................................................................26
1 INTRODUÇÃO

A participação da Psicologia nas questões jurídicas ocorre por meio da interface com
as disciplinas dos cursos de Direito e Medicina, a partir do século XIX. Esta aproximação
entre a Psicologia e o Direito então provê a fundamentação de um campo do conhecimento
que atualmente se denomina Psicologia do Testemunho, cujo objetivo é “verificar, através do
estudo experimental dos processos psicológicos, a fidedignidade do relato do sujeito
envolvido em um processo jurídico” (ALTOÉ, 2001:1).
Inicialmente, quando caminhava para se consolidar enquanto campo de atuação, a
Psicologia Jurídica “favoreceu o desenvolvimento de pesquisas experimentais, buscando com
isso obter dados que pudessem ser cientificamente comprovados e que servissem como
subsídio para as decisões judiciais” (BOMFIM, 1994: 288).
A tradução da reedição do livro Manual de Psicologia Jurídica de Mira y Lopez,
também pode ser considerada como outro importante marco para o surgimento do campo da
Psicologia Jurídica no Brasil – ocorrido em 1955 –, despertando o interesse de psicólogos
para a pesquisa e desenvolvimento de um novo campo de atuação (BOMFIM, 1994).
A atuação do psicólogo jurídico é determinada, em grande parte, por legislações
específicas da área1. Em relação à atuação do psicólogo em penitenciárias, fica restrita ao
cumprimento da legislação, na qual está prevista a realização de entrevistas com pessoas
(sentenciados e/ou familiares), requisição de dados e informações a respeito do condenado,
cumprimento de diligências e exames que se julgar necessário, como forma de complementar
as avaliações.

De acordo com Bomfim (1994), as atividades do psicólogo jurídico no sistema


prisional, em geral, consistem em: elaboração de laudos criminológicos; avaliação da
personalidade, nível intelectual, desenvolvimento motor e potencial educacional; elaboração
de diagnóstico do sentenciado, bem como o prognóstico criminológico (são usados diversos
testes psicológicos); recomendação de linhas de tratamento mais adequadas à evolução
positiva do caso, quando houver continuação do cumprimento da pena; realização de
entrevista de devolução ao sentenciado, quando este solicitar; elaboração de síntese dos dados

1
A Lei n.º 210 de 17 de julho de 1984 previa para o sistema penal brasileiro, no artigo 6o, a existência de uma
Comissão Técnica de Classificação, que deveria elaborar o programa individualizador e acompanhar a execução
de penas privativas de liberdade. A comissão seria composta por, no mínimo, dois chefes de serviço, um
psiquiatra, um psicólogo e um assistente social.
colhidos e participação em reuniões de síntese criminológica; orientação a detentos e seus
familiares.

Como previa a Lei de Execuções Penais, o trabalho do psicólogo no sistema prisional


deveria ser realizado junto a uma equipe multidisciplinar, composta por psiquiatras,
assistentes sociais e criminólogos, a denominada Comissão Técnica de Classificação - CTC.
O trabalho dessas comissões era colocar em prática os fundamentos da individualização da
pena, como descreve Brito (1999): “inicialmente, constata-se que o programa individualizador
tem como objetivo a tentativa de humanização do Sistema Penal, por desejar adequar a pena
às necessidades de cada preso”.

O presente artigo busca, destarte, compreender a atuação de psicólogos no sistema


prisional, através dos significados atribuídos por esses profissionais às práticas desenvolvidas
nesse contexto. Pretende-se com isso, destacar e descrever as práticas realizadas por
psicólogos atuantes no sistema prisional de Salvador; compreender os significados atribuídos
à atuação profissional, a partir do discurso dos mesmos; entender aspectos da sua identidade
profissional e a maneira como percebem a repercussão de seu trabalho no contexto em que
atuam. Igualmente, procura-se contemplar explanações acerca da Psicologia Jurídica,
especificamente a abordagem sobre Psicologia Carcerária – uma dentre as diversas
possibilidades nessa área – e aspectos da atuação do psicólogo no contexto prisional.
A motivação principal para realização da pesquisa foi a possibilidade de desenvolver
um trabalho sobre uma área pouco explorada em instituições de ensino da Psicologia. A
discussão a respeito da formação profissional também pode ser encontrada neste trabalho,
uma vez que as práticas mais tradicionais dessa área do conhecimento como Psicologia
Organizacional, Psicologia Educacional e, principalmente, a Psicologia Clínica, ainda são as
principais escolhas enquanto campo de atuação de muitos alunos de graduação. Essa questão
fica bastante evidenciada no discurso de psicólogos atuantes na área Jurídica, que discutem
sobre a carência de sua formação e as muitas possibilidades, limitações e produções neste
campo.
O discurso de psicólogos jurídicos, conforme encontrado na revisão de literatura,
demonstra que estes se encontram insatisfeitos e questionam o lugar que ocupam nas
instituições jurídicas como um todo, inclusive nas prisões. Dessa forma, foi possível averiguar
as significações e concepções que psicólogos atuantes no sistema prisional têm sobre o
trabalho que desenvolvem, o lugar que lhes é designado e aquele que realmente ocupam.
Destaca-se também a possibilidade de se conhecer os limites de atuação desses
profissionais e ainda contribuir para as reflexões sobre o papel desempenhado pelo psicólogo
em contexto diferenciado.

2 O PSICÓLOGO E O SISTEMA PRISIONAL

A psicologia jurídica oferece diversas possibilidades de frentes de atuação


profissional. Propriamente neste estudo, o contexto prisional será enfocado como um lugar no
qual o psicólogo se insere. Desse modo, deve-se começar pela sua caracterização, que tipo de
trabalho o psicólogo realiza, a quem serve e o que esta instituição demanda de seus
profissionais.
Cabe então partir para a análise in loco, onde o profissional em pauta exerce suas
funções. Este é um local que tem duas funções primordiais: punir e ressocializar. Assim
sendo, sua própria estrutura e forma de coerção estão voltadas para esses dois objetivos e sua
finalidade é “reformar” o sujeito que cometeu o delito (FOUCAULT, 2003:196).
Goffman (1999) enquadra as prisões na classificação das instituições totais, assim
como os manicômios e os conventos, pela sua característica peculiar de privação de liberdade
e regime de normas estabelecidas verticalmente. A prisão é um tipo de instituição total,
organizada a fim de resguardar a sociedade dos perigos intencionais. Desse modo, todas as
atividades realizadas pelo sujeito, antes de cometer o delito, passam a ser controladas e
regidas pelas normas da prisão. São estabelecidos horários para comer, dormir, o que antes
poderia ser feito quando o sujeito bem desejasse. A individualidade fica suprimida pelo olhar
coletivo que os dirigentes voltam para os sentenciados, como aponta Goffman (1999): “o
controle de muitas necessidades humanas pela organização burocrática de grupos completos
de pessoas – seja ou não uma necessidade ou meio eficiente de organização social nas
circunstâncias – é o fato básico das instituições totais” (p. 18).
Além do caráter punitivo e ressocializador das prisões, também encontramos a questão
do poder, ou seja, daqueles que o detêm e o exercem sobre aqueles sujeitos submetidos às
sanções do sistema jurídico. Foucault (2003), em seus escritos sobre a prisão, discute tal
questão ao inferir que:
Ela [a prisão] se constituiu fora do aparelho judiciário, quando se elaboraram, por
todo o corpo social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los
espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo, e o maior de forças,
treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa
visibilidade sem lacuna, formar em torno deles um aparelho completo de
observação, registro e anotações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se
centraliza (p. 195).

É nesse contexto institucional que se encontra o psicólogo, compondo o quadro da


equipe responsável por atender aos requisitos do judiciário, como forma de fazer com que o
sistema cumpra suas funções. Sua inserção acontece devido à necessidade de um profissional
diferenciado, seja pelas suas técnicas, seja pelo seu olhar voltado para além do que está posto,
contrariando a objetividade do sistema jurídico:

Em nossa formação [clínica] ouvimos, o tempo todo, que temos que ouvir os
pacientes despidos de nossos valores, sem nos preocupar jamais com o que é certo
ou errado. Fica então fortemente expressa a contradição entre o modo de pensar do
psicólogo e do advogado. O Direito, no caso de um crime, busca saber quem foi o
criminoso para puni-lo, enquanto que ao psicólogo interessa saber o que o motivou
ao crime, como é o mundo mental daquele indivíduo (ANAF, 1999, p. 92).

A função primordial do psicólogo no sistema prisional tem sido apenas a de atender


aos requisitos do Juiz, realizando exame criminológico com a população carcerária, emitindo
pareceres na função de perito para progressão de regime ou realizando psicoterapia breve na
função de clínico.
A identidade profissional de psicólogos que atuam em prisões é construída, portanto,
em meio a muitos questionamentos, visto que estes se encontram em constante reflexão sobre
qual papel desempenhar, qual a relevância do seu trabalho e se, de fato, suas técnicas e
métodos fazem diferença no local em que atuam. A restrição quanto às práticas desenvolvidas
também é outro ponto importante, visto que estas se resumem à elaboração de laudos e
pareceres com o objetivo de conceder ou não benefícios aos sentenciados. Dessa forma,
Rosalice Lopes2, psicóloga do Departamento de Saúde do Sistema Penitenciário do Estado de
São Paulo, discute a limitação da atuação do psicólogo:

Pudemos perceber que os psicólogos que trabalham nos presídios já se deram


conta de que está tudo muito desagradável e não podemos continuar nessa
situação profissional. Ainda hoje, tudo o que se espera é que o psicólogo cumpra
de maneira geral aquilo que a instituição necessita, ou seja, a realização do
exame criminológico para a concessão de benefícios penais. Com isso, não há
um investimento na relação e cada vez que o preso vai conversar com o
psicólogo ele inventa um novo ‘personagem’ para tentar conseguir o que deseja
(Jornal CRPSP, nov./dez 1995).

2
Rosalice Lopes também foi membro do CRP-06, atuou como conselheira na gestão de 1995 a 1997.
Como profissional que se insere neste contexto, com o objetivo de atender aos
requisitos do juiz, o psicólogo cumprirá o papel do agente da ressocialização, através das suas
ações no resgate da cidadania do sentenciado. Dessa forma, o psicólogo perito deve atentar
para o descumprimento dos direitos humanos dentro das instituições penais e, ainda, conciliar
a questão da ética profissional, que inclui o sigilo e o cuidado quanto à adição de informações
nos laudos entregues ao juiz.
Por outro lado, o psicólogo precisará atender às demandas do jurídico sem fazer com
que seu trabalho seja mais um instrumento de controle e estigma social. Portanto, suas ações
não podem se limitar apenas à confecção de um documento, dando ênfase à técnica,
desconsiderando os sujeitos envolvidos, que se constituem no verdadeiro veículo para as
ações desse profissional.
Brito (1999) destaca as críticas impostas à Psicologia, onde “os conteúdos encontrados
nos laudos criminológicos não passavam de moralistas, preconceituosos e aprisionadores” (p.
92). Corroborando com esta mesma linha de pensamento encontram-se os estudos de Rauter
(1994:21 apud ALTOÉ, 2001:5) ao revelarem que “a maior parte do conteúdo destes laudos
era bastante preconceituosa, bem estigmatizante, e nada tinha de científico... Os laudos
repetiam os preconceitos que a sociedade já tem com relação ao criminoso, com relação a
alguém que vai para a prisão”.
Levando-se em consideração um instrumento que norteia as ações do psicólogo, no
caso o Código de Ética Profissional, vale ressaltar um dos seus princípios fundamentais para o
exercício dessa profissão: “o psicólogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica
e historicamente a realidade política, social e cultural”. Tomando a prisão como palco, onde
tal realidade é circunscrita, torna-se dever do psicólogo basear a sua atuação nesta análise da
realidade social, como forma de assegurar um trabalho ético, compromissado e de qualidade.
A atuação dos psicólogos em instituições penais, portanto, tenderá a se voltar para a
promoção da saúde mental e resgate da cidadania. Assim sendo, o diagnóstico perde sua
exclusividade e as possibilidades de atuação se ampliam.
Bock (1999), ao falar da identidade profissional dos psicólogos e de desafios futuros,
inclui como principal tarefa um maior compromisso desses profissionais com a realidade
social, dando ênfase às demandas da maioria da população brasileira. A partir dessa
concepção, a autora discute a ação psicológica interferindo diretamente na sociedade,
desmistificando a idéia de que “o mundo psicológico nada tem a ver com o mundo social” (p.
326). E complementa:
Assumir compromisso social em nossa ciência é buscar estranhar o que hoje já
parece familiar; é não aceitar que as coisas são porque são, mas sempre duvidar e
buscar novas respostas. Compromisso social é estranhar, é inquietar-se com a
realidade e não aceitar as coisas como estão (BOCK, 1999, p.327).

Nesse cenário, o psicólogo tende a perder parte de seu discurso romântico e passa a
sentir-se impotente diante do maquinário jurídico. O ambiente que o acolhe como profissional
diferenciado poderá transformá-lo, ao longo dos anos de atuação, em profissional impotente
diante da realidade apresentada.

3 MÉTODO

Foi utilizado o método qualitativo para a análise dos dados, por este permitir a
consideração das crenças, dos valores e significados dos sujeitos envolvidos. A partir do
relato das entrevistadas, vieram à tona questões subjetivas que possibilitaram compor a
trajetória pessoal de cada uma delas.

Partiu-se de uma informante-chave que atua numa unidade do Complexo Penitenciário


do Estado da Bahia – C.P.E. B e esta indicou outras duas psicólogas que se prontificaram a
participar da pesquisa. Foram entrevistadas três psicólogas que atuam no C.P.E. B, na cidade
de Salvador, entre setembro e dezembro de 2005.
Solicitou-se ao Conselho Regional de Psicologia – CRP-03, uma listagem de
psicólogos da área jurídica, que contém uma relação de 20 profissionais ativos existentes em
seus arquivos. Esta listagem ficou à disposição como reserva, caso fosse necessário acessar
outros participantes.
As profissionais que fizeram parte da pesquisa foram aquelas que atuavam em
unidades do C.P.E.B3 há mais de sete anos. Foram entrevistadas três psicólogas, todas
concursadas, sendo que apenas uma não possui outra atividade profissional, conforme
demonstra o quadro a seguir que define o perfil das entrevistadas:

3
O Complexo Penitenciário do Estado da Bahia está localizado na estrada da Mata Escura s/n, Salvador/Ba, é
composto pelas seguintes unidades: Casa do Albergado e Egressos, Centro de Observação Penal – COP,
Penitenciária Feminina, Penitenciária Lemos Brito – PLB e Presídio de Salvador.
Psicóloga Idade Ano de formação Instituição Forma de Tempo de Outras
Ingresso atuação atuações

A 41 1988 UFBA Concurso 7 anos Clínica


público/SJDH

B 42 1989 UFBA Concurso 8 anos Não


público/SJDH

C 37 1992 UFBA Concurso 11 anos Docência


público/SJDH Consultoria
Quadro 1 – Perfil das entrevistadas

Durante a realização das entrevistas utilizou-se um roteiro semi-estruturado, por


permitir que as entrevistadas pudessem relatar suas experiências de forma mais livre e
espontânea, conduzidas a partir de algumas perguntas. As entrevistas foram gravadas, após o
consentimento4 das informantes e posteriormente transcritas. Através do recurso da gravação,
a fala integral foi preservada, o que garantiu a qualidade de informações obtidas para posterior
análise do discurso de cada profissional, organizado a partir dessa transcrição.
Procedeu-se à análise de discurso temática, através da leitura flutuante, como forma de
entendimento do discurso das psicólogas e para a compreensão da identidade profissional dos
psicólogos que atuam no sistema prisional. Da análise dos discursos mencionados, temos as
seguintes categorias: escolha do campo profissional, o sistema prisional e o lugar do
psicólogo, questões éticas, reflexões sobre a prática profissional e trabalho em equipe,
identidade profissional, formação e organização dos psicólogos e outras possibilidades de
atuação. Os resultados mais significativos foram organizados nas seis categorias descritas
anteriormente.

4
Cada participante assinou um termo de consentimento livre e esclarecido. A pesquisa realizada esteve pautada
nos princípios defendidos na resolução do Conselho Nacional de Saúde – CNS. Como forma de assegurar os
direitos das participantes, incluindo seu anonimato, todos os sujeitos assinaram termo de consentimento,
considerando os princípios éticos postulados pelo Conselho Federal de Psicologia – CFP 016/2000, que trata
sobre a realização de pesquisas com seres humanos em Psicologia.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Escolha do campo profissional

Existe o consenso de que a Psicologia, desde o seu reconhecimento como profissão em


1962, sempre esteve atrelada aos interesses das elites. A inserção de psicólogos, nos diversos
campos de atuação, deu-se através de um ideário individualista, comprometido basicamente,
no reforço das relações de poder e na reconstrução das estruturas sociais. (BOTOMÉ, 1996,
GIL, 1985; MARTIN-BARÓ, 1997 apud DIMESTEIN, 2000). Tal postura pode ser entendida
pela grande quantidade de profissionais que enveredaram para o exercício solitário nas
clínicas, visto que, no âmbito social, o psicólogo ainda é reconhecido por esse modelo de
atuação, sendo essa imagem a mais respeitada pelos graduandos em Psicologia.
(DIMESTEIN, 2000, p.6).
Com as mudanças sociais e o aumento do número de psicólogos em diferentes
contextos, estes foram buscando novas inserções, o que inclui o âmbito jurídico. A escolha
pelo campo de atuação para as três profissionais, por sua vez, esteve relacionada à busca por
um vínculo empregatício, através de concurso público para a Secretaria de Justiça e Direitos
Humanos, visto que a inserção neste campo de atuação não esteve atrelada às perspectivas
durante a graduação. Somente uma delas relatou que pretendia desenvolver trabalhos sociais,
o que, de fato, lhe aproximou da realidade em que atua.
A motivação para ingressar nessa área esteve relacionada à garantia de estabilidade
num emprego público, ponto bastante frisado em diversos momentos por uma entrevistada:

[...] foi uma escolha por um vínculo empregatício; eu queria ingressar no Estado.
Na verdade, eu queria trabalhar na Secretaria de Saúde, mas no momento não
estava tendo concurso para Secretaria de Saúde e eu acabei me inscrevendo nesse
que era para a SJDH (Psicóloga A.).

Da mesma forma, a segunda entrevistada também relatou que não optou por trabalhar
em instituições prisionais; prestou o concurso com a pretensa idéia de obter estabilidade num
emprego público e, quando aprovada, foi informada de que seria para atuar em unidade
prisional, o que lhe provocou um assombro; porém, decidiu se enveredar por essa nova
realidade profissional:
[...] me motivava muito a curiosidade de conhecer essa realidade nova, eu sempre
achei que o sistema penitenciário era um lugar muito farto de trabalho [...] achava
que eu podia ser útil; durante anos eu me dediquei muito ao trabalho, sempre
busquei fazer meus laudos, sempre bem feitos. Na entrevista sempre busquei ter
uma escuta muito respeitosa, muito ética, pelo menos naquele momento oferecer
minha escuta de uma forma aberta, de coração realmente aberto, sem julgar o
crime e nada (Psicóloga B).

Apenas uma delas relatou que, desde a graduação, tinha interesse em realizar um
trabalho voltado para uma população diferenciada, tendo prestado o concurso sabendo onde
iria atuar. “Eu sabia que provavelmente iria trabalhar no sistema prisional” (Psicóloga C).
De acordo com essa entrevistada, a questão da estabilidade foi apontada como um dos fatores
motivacionais para seguir desempenhando as suas funções: “Eu tinha a necessidade,
precisava trabalhar, é um emprego que tem segurança profissional... O Estado paga pouco,
mas paga” (Psicóloga C).
As relações estabelecidas com o local onde atuam e ocupam na instituição prisional
baseiam-se na estabilidade oferecida por um emprego público:

[...] há alguns anos atrás eu estava querendo um emprego público, só atendia em


clínica particular; queria uma estabilidade e surgiu a oportunidade de fazer esse
concurso [...] nem sabia que era para trabalhar em unidade prisional, só sabia que
era para a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Psicóloga B).

Pode-se dizer que, neste contexto, conforme o apontado anteriormente, manteve-se a


postura individualista reconhecida na história da Psicologia, o que, de fato, ajuda a construir a
imagem dos seus profissionais e a definir suas práticas e valores vigentes.

4.2 O sistema prisional e o lugar do psicólogo

O discurso das profissionais é semelhante àquele sustentado pela categoria a qual


pertencem – psicólogos jurídicos. Encontram-se insatisfeitos com a situação de trabalho, falta
de recursos, baixos salários, desinteresse por parte do Estado e, principalmente, a falta de
liberdade para atuar que o psicólogo encontra nos presídios.

[...] Eu não sabia que era psicólogo perito e isso, de certa forma, me frustrou um
pouco, porque quem queria fazer alguma coisa social, realmente como perito não
faz. [...] Faz um trabalho muito mais voltado para a questão jurídica propriamente
dita, é bom; ajuda eles [os presos] de alguma forma, mas a mim não me satisfaz,
tanto que eu fui trabalhar na questão social no terceiro setor (Psicóloga C).
Este relato confirma o que foi encontrado nos artigos relacionados à área de Psicologia
Jurídica, os quais enfatizam o questionamento sobre o lugar do psicólogo em instituições
prisionais, bem como nas outras diversas áreas jurídicas. Todas as entrevistadas apontaram
para as atividades realizadas como psicólogas peritas, como sendo restritas à demanda do
Juiz, após a mudança na Lei de Execuções Penais, em dezembro de 2004, que excluiu a
obrigatoriedade da realização do exame criminológico com todos os sentenciados.
Atualmente, segundo as três profissionais, são encaminhados alguns casos, nos quais se
procede à avaliação, devendo constar se o sentenciado sofre ou não de algum transtorno
mental ou comportamental.
Ao responderem às solicitações do Juiz, cabe ao profissional posicionar-se diante das
limitações da sua prática e da ética, de acordo com o que foi ressaltado pelas profissionais:

[...] o lugar do psicólogo no sistema prisional é um lugar bastante delicado, porque


não podemos ter realmente uma atuação como nós gostaríamos [...] é um trabalho
meio mecanicista, no sentido de que nós fazemos essas avaliações psicológicas,
damos esses pareceres. (Psicóloga A).

[...] acho complicadíssimo a atuação do psicólogo num lugar desses, aliás, acho
impossível, é um lugar “do cão”, como chamamos aqui, embora a palavra seja
pesada [...] eu me queixo que o trabalho é muito limitado a exame criminológico.
(Psicóloga B).

Eu acho que é lamentavelmente uma farsa, não acho que o psicólogo atue
efetivamente [...] É uma atuação que não traz nada de significativo. (Psicóloga C).

Por restringir-se a uma demanda preestabelecida, o trabalho do psicólogo torna-se


previsível, mecânico e burocrático. Além da realização de suas práticas, os profissionais se
deparam com as questões éticas, que permeiam todo o trabalho desenvolvido.

4.3 Questões éticas

As entrevistas revelaram também uma preocupação com a questão ética, porquanto os


documentos emitidos muitas vezes são questionados, porque as avaliações são pontuais, ou
seja, existe um prazo de ‘validade’ para eles, conforme se observa a seguir:

[...] a gente vai estar simplesmente rotulando pessoas, enquadrando pessoas em


determinados perfis, identificando traços disso, traços daquilo, bom, e aí? E
depois, o que é que vai ser feito com esse trabalho? (Psicóloga A).
[...] Colocam a gente numa posição que a gente chama de ‘juizes ocultos’, daquela
coisa da gente estar assumindo uma responsabilidade que ninguém quer assumir...
A pergunta é: ‘ ele vai reincidir?’ Então o Juiz não pode dizer, ninguém pode dizer,
vamos ver se esse profissional com as suas técnicas pode dizer, a partir da
avaliação da personalidade [...] Inclusive tem um comentário que eles se irritam
com os nossos pareceres que a gente diz assim: ‘até o momento o preso... ’; bom,
mas a gente só pode dizer ‘até o momento. (Psicóloga A).

De acordo com Rauter (1994, apud BRITO, 1999), o psicólogo não pode fazer
previsões futuras, por não possuir ‘bola de cristal’. Tal afirmação recai sobre a especificidade
dos instrumentos de avaliação psicológica, uma vez que estes são retrospectivos, somente
descrevem aspectos das ações realizadas pelo indivíduo, até o momento presente. Além disso,
as entrevistas para avaliação podem se constituir num momento de escuta da qual o
sentenciado dispõe para retratar seu confinamento e, até mesmo, se queixar de maus tratos;
porém, o objetivo principal da avaliação não é a escuta.

[...] eu gosto muito dessas entrevistas; então, sem querer, eu tendo a criar um clima
de empatia, termino gerando um clima de confiança, o que eu às vezes não acho
bom, porque assim, ele vai, vai gostando e vai soltando tudo, e é preciso escrever
um laudo pericial, é preciso mandar para o Juiz (Psicóloga B).

Neste sentido, o sigilo profissional, ponto reconhecido e difundido das práticas


psicológicas, perde lugar numa conjuntura em que as informações obtidas definirão a vida dos
sujeitos em conflito com a lei. Além disso, o encontro com esse profissional é previsto pela
instituição, ou seja, o sujeito não opta por encontrar com o psicólogo, como na clínica; a
demanda não é do sujeito e sim da instituição. O psicólogo representa o Estado e a instituição
para a qual trabalha, como descreve uma das entrevistadas:

Ele (o psicólogo) representa sempre o controle estatal; a gente está a serviço do


Juiz, sempre o interno vai olhar para você vendo um Juiz, ele não vai ver o
psicólogo, não é como na clínica que a pessoa vai te procurar porque quer sua
ajuda, ele não está pedindo sua ajuda aqui, ele é obrigado a vir (Psicóloga B).

A questão ética está envolta na atuação dos psicólogos peritos, pois estes são
convocados a emitir laudos periciais. Portanto, sua função é de técnico, apesar de ser um
profissional que atua na área da saúde e clínica. Outras formas de atuação como psicoterapia
breve com os sentenciados deve ser realizada por outro profissional, pois esta conduta é
considerada antiética.

As técnicas e formas de atuação do psicólogo no sistema prisional são questionadas


e vão de encontro à forma de atuação do campo de saber com o qual interage, o Direito. Ao
contrário das ações do judiciário, os instrumentos utilizados pelo psicólogo, neste contexto,
não podem servir como meios de punição.
4.4 Reflexões sobre a prática profissional e trabalho em equipe

As entrevistadas retrataram o passado com saudosismo e, em outros momentos,


apontaram para a falta de coletividade da categoria que atua no mesmo contexto na
atualidade. Diferente das áreas mais tradicionais, como é difundido entre os graduandos e
profissionais de Psicologia, essa prática reflete-se também na escassez de publicações; os
conteúdos das existentes estão repletos de indagações e insatisfações quanto à própria
atuação, conforme afirma esta entrevistada:

[...] eu acho um lugar muito difícil; eu acho que os psicólogos, a gente precisa
abrir um espaço de discussão sobre isso, acho que a gente precisa se apoiar, que o
psicólogo precisa construir uma rede de proteção do psicólogo que atua nesses
lugares, proteção psicológica e proteção formal mesmo (Psicóloga B).

[...] Ela (a Lei de Execuções Penais) mudou porque o que estava proposto não era
feito na prática exatamente: uma situação ideal, principalmente em função do
número de sentenciados. O trabalho é uma avaliação que pode ser feita pelo
psicólogo ou pelo psiquiatra, onde avaliaremos se o interno tem algum transtorno
mental que o impeça de conviver com a sociedade, voltar para a sociedade ou não
(Psicóloga A).

Outra profissional ressaltou bastante o momento de transição pela qual a unidade em


que atua passou há um ano e descreveu as atividades, antes realizadas por uma equipe
multiprofissional:
[...] a gente aqui tinha uma CTC - Comissão Técnica de Classificação. Tinha um
trabalho muito bom, cada profissional na sua área, fazia seu laudo. E a gente
reunia todo esse pessoal para fazer um trabalho interdisciplinar e discutia cada
caso, mesmo sabendo que isso não tinha efeito nenhum, os relatórios eram pouco
lidos ou nem eram lidos, mas a gente fazia como um exercício profissional,
gostávamos desse exercício. Os laudos eram enormes, ricos, detalhados, a gente
discutia caso por caso, fazia indicações (Psicóloga B).

Esse discurso reforça a necessidade de atuação junto a uma equipe multiprofissional,


como forma de realizar um atendimento integral ao sentenciado e ainda tirar das mãos dos
psicólogos a responsabilidade pelas decisões judiciais. As três psicólogas ressaltaram a
importância da extinta CTC, dando ênfase aos momentos de reunião, onde eram discutidos
casos e apontados encaminhamentos. Cada profissional que compunha a comissão
confeccionava um laudo e cada documento era discutido e, a partir da revisão de cada um, era
enviado um laudo para o juiz. Dessa foram, as decisões eram tomadas em conjunto e o
psicólogo contribuía com seus saberes e técnicas, de forma complementar e não totalmente
decisiva.
4.5 Identidade profissional, formação e organização dos psicólogos

Baptista (2003) define identidade individual como o conjunto de características


capazes de fazer com que uma pessoa se reconheça como idêntica a si mesma. Levando essa
concepção para o entendimento da identidade coletiva, esta compreende as características de
componentes de um mesmo grupo, em determinado tempo histórico, onde estes se entendem
como iguais a si mesmos e, logo, diferentes dos demais grupos.
A identidade profissional, por sua vez, é definida como “faceta da identidade pessoal,
composta pelo conjunto de papéis profissionais que a pessoa assume no decorrer de sua vida
ativa” (BAPTISTA, 2003, p. 2). Para Habermas (1990, apud BAPTISTA, 1999), a construção
da identidade profissional ocorre através da aprendizagem de papéis sociais, que contribuirão
na adoção de normas e valores válidos para todos os componentes do grupo.
Ciampa (1990) entende que a vivência de uma identidade preestabelecida resultará
numa reprodução de uma identidade pressuposta, o que chamou de “mesmice”.
Quanto à atuação do psicólogo no contexto das prisões, relataram, num discurso
repleto de críticas, que não se sentem confortáveis no lugar que ocupam, tendo identificado
limitações nas suas atuações e dificuldades de desempenhar suas funções.
Quanto à percepção em relação ao lugar em que estão inseridas, apontaram diversos
problemas, bastante discutidos, principalmente em relação às más condições de trabalho, à
própria periculosidade às quais estão expostas, aos baixos salários e, principalmente, pela
indefinição e limitação imposta pelo próprio sistema, como apontaram:

[...] Acho que a unidade não sabe o que demandar do psicólogo, só sabe o que está
ali no papel, e aquilo é muito pouco [...] acho que o próprio Conselho, a própria
comunidade de psicólogos, a própria classe dos psicólogos desconhece essa função
do psicólogo jurídico. Agora que isso está sendo discutido, muito recentemente.
(Psicóloga B).

[...] eu acho que tem que criar regras, talvez leis. [...] Se o psicólogo escolar, o
psicólogo organizacional tem regras, tem uma regulamentação, a gente também
precisa, sobretudo com relação até estudar um pouco qual é a postura que o
psicólogo deve ter numa perícia [...] (Psicóloga B).

A instituição prisional tem uma proposta que fracassou desde o começo. Eu acho a
proposta de recuperação enquanto correção; essa proposta é um discurso que
sempre foi vazio, em todas as sociedades, desde o advento da instituição prisional
no século XVI; mas eu acho que a prisão, muito pouco recupera o sujeito, acho que
foi ao contrário, uma instituição muito cheia de vícios, só mesmo aqueles que
conseguem trabalhar lá dentro é que conseguem viver a prisão de uma outra forma
[...] eu só vejo a prisão como castigo e segregação, hoje, como sempre. (Psicóloga
C).
O local que o psicólogo ocupa no sistema prisional também foi definido como
inexistente, onde o psicólogo estaria compactuando com uma farsa, visto que seu trabalho não
é representativo, não tem sentido de existir. Identifica-se, neste ponto, o ápice da insatisfação
em relação às atribuições do psicólogo inserido nas prisões, lugar este que não lhe dá
subsídios para desenvolver suas práticas e contribuir para o bom andamento das questões
judiciais:
[...] Nós estamos lá ancorados no discurso da ressocialização, esse discurso
lamentavelmente é vazio; ele tem uma função de existir, ele precisa existir, mas
enquanto discurso, enquanto prática não. Nós estamos ocupando um lugar que é o
de sustentar esse discurso para aparentar que existe uma prática [...] Essa prática
é uma falácia, não existe. (Psicóloga C).

Percebe-se, portanto, a insatisfação do psicólogo no sistema prisional, que revê a


própria atuação a partir das limitações que lhe são impostas. Esses argumentos a respeito da
realidade profissional vivida necessitam ser descolados do plano das idéias para o plano das
ações.

4.6 Outras possibilidades de atuação

Para França (2004), outras formas de atuação, além das perícias, são possíveis, pois “o
psicólogo jurídico pode atuar fazendo orientações e acompanhamentos, contribuir para
políticas preventivas, estudar os efeitos do jurídico sobre a subjetividade do indivíduo, entre
outras atividades e enfoques de atuação”. Popolo (1996, apud FRANÇA, 2004), por sua vez,
defende que a Psicologia Jurídica deve transcender às demandas jurídicas, transformando-se
em instrumento para melhor exercício do Direito.
A insatisfação em relação ao lugar em que ocupam não gerou apenas críticas ao
sistema prisional e ao Estado, mas também possibilidades de mudança da realidade de
trabalho disponível. A partir da discussão a respeito das limitações em relação à atuação no
Complexo, foram sugeridas pelas psicólogas algumas possibilidades de mudança do quadro
atual, no que se refere à realização de perícia, assim como à emissão de pareceres técnicos:

A gente não ficaria só nesse lugar de perícia, poderia até existir esse lugar, mas a
gente faria muito mais do que isso; poderia fazer várias coisas: trabalhos de
grupos, reflexões com os presos, não aquela terapia tradicional, mas a psicoterapia
breve, onde pudesse estar criando um espaço para se discutir as questões da vida,
dos conflitos psíquicos, proporcionando esse amadurecimento que a gente tanto
quer ver quando a gente faz a avaliação. Mas se nunca é criado nenhum tipo de
trabalho, para que isso ocorra... A gente teria de criar diante das condições, do
possível (Psicóloga A).

É notória a relevância dada à necessidade de atuação junto à população carcerária,


apesar do discurso pressupor a dúvida quanto a quem servir: ao Estado ou aos internos? O
psicólogo que ingressa no sistema prisional como técnico, tende a realizar as atividades de
exame criminológico e se limitar a essa tarefa, atendendo às demandas do primeiro, embora
assumam que os segundos carecem de suas intervenções enquanto profissionais.
Altoé (2001) frisa a necessidade de o psicólogo atuar de forma multidisciplinar,
embora precise ser capaz também de estabelecer suas funções nos diversos âmbitos do
sistema judiciário, apontando que “sair do lugar de técnico ou de perito, implica num
exercício profissional crítico e na busca de alternativas”.
Tais alternativas ou outras formas de atuação podem ser comparadas às chamadas
“linhas de fuga”, segundo as palavras de Bandeira (2005), onde os psicólogos peritos estão
cada vez mais repensando a própria atuação, buscando outras formas de abordagem, não se
permitindo apenas ocupar o lugar que o Judiciário os convoca, apesar de serem
comprometidos com o trabalho técnico que precisa ser realizado.

[...] levar essa pessoa [o sentenciado] a refletir alguma coisa sobre a vida dela,
pela primeira vez, fazendo com que ela saia daqui com uma centelha de reflexão,
uma centelha de necessidade de mudança de consciência [...] ser útil a essa pessoa
também, não ser útil só ao juiz, fazer com que esse trabalho possa ter um benefício
subjetivo (Psicóloga B).

A função principal do psicólogo no sistema prisional seria o trabalho em prol da


ressocialização, criando oportunidades para que os sentenciados aprendessem uma profissão,
trabalhassem se ocupassem no decorrer da pena, aprendessem a ler e a escrever, uma vez que
a maioria só sabe ‘desenhar o próprio nome’.

Ajudar na ressocialização, porque presídio, penitenciária ainda é um lugar de


depósito, totalmente joga aqui dentro tudo que não presta, a idéia de que os
governantes têm é essa, tanto que a violência tem sido uma coisa muito discutida,
um dos primeiros pontos da pauta de preocupação do país é a questão da violência,
mas momento nenhum você ouve falar de projetos paralelos para humanizar os
presídios; você ouve falar de projetos para aumentar o número de presídios, no
sentido de construir presídios de segurança máxima, mas de humanizar você não
ouve. Então, pelo amor de Deus, tem tanta gente, mas tanta gente, que vem para cá
por bobagem, pessoas que precisam de uma força para dar uma guinada, é um
absurdo o que se faz com esse pessoal (Psicóloga B).
Para Bandeira (2005, p.4), “uma prática comprometida com os princípios dos direitos
humanos e com a ética profissional poderá criar dispositivos que acionem novos processos de
subjetivação de modo a potencializar a vida das pessoas presas”. Tais dispositivos deveriam
ser semeados durante o período de clausura, para depois a sociedade colher os frutos da
diminuição da violência e da criminalidade. A partir dessa concepção, a prisão passaria a
cumprir o papel do ciclo punição-ressocialização a que se propõe.
Como principal desafio encontrado no exercício profissional, destaca-se a ausência de
oportunidade para desenvolver projetos, alterando a rotina de trabalho, possibilitando outras
formas de atuar, a partir daquela já prevista.

[...] No decorrer desses onze anos, quando eu saí (de uma unidade do Complexo
para outra), eu peguei uma pilha de projetos que eu fiz e nunca, nenhum foi
absorvido pelo Estado, nunca houve interesse [...], eu desisti do Estado, eu faço
meus projetos como consultora para organizações não-governamentais, porque o
governo, realmente, não se interessou (Psicóloga C).

Um dos desafios encontrados por uma das psicólogas no desempenho da sua função
foi o de servir à demanda do Juiz e, ao mesmo tempo, contribuir de alguma forma para que
aquele indivíduo volte recuperado para a sociedade. Durante a entrevista de avaliação, disse
acreditar que nesse momento, mesmo que curto, ele (o sentenciado) poderá refletir sobre a
necessidade de mudança, produzindo assim um benefício, considerado por ela como sendo
subjetivo.
A discussão de profissionais da área em relação aos limites de atuação, portanto, gira
em torno da submissão às questões jurídicas e da falta de espaço e liberdade para desenvolver
outras práticas voltadas para projetos junto à população carcerária, aos agentes penitenciários,
à família dos sentenciados, dentre outros. É preciso que esses profissionais se agreguem em
torno de uma pauta, a fim de discutirem suas práticas, o lugar em que estão inseridos,
tentando reverter a realidade de muitas instituições penais, muito mais preocupadas com a
objetividade de suas decisões, afastando-se assim do seu objetivo primordial: a
ressocialização. Isto sim estaria de acordo com as leis brasileiras, onde não há prisão perpétua,
e os criminosos então confinados, voltariam ao convívio social.
Fato é que a atuação do profissional no sistema prisional, da forma como se configura,
gera insatisfação nesses mesmos profissionais que demonstram interesse na inclusão social
dos detentos, haja vista que o mesmo sistema reforça o paradoxo do caráter repressor e
excludente, impedindo assim a garantia de cidadania e direitos humanos preconizada pela
Carta Magna. Basta se ater à quantidade de denúncias de maus-tratos e mortes ocorridas nas
prisões brasileiras.
Diante disso, constata-se que, no seu exercício profissional em presídios, o psicólogo
praticamente fica impedido de cumprir o pressuposto no Código de Ética. Sobre o assunto,
Atoé (2001) destaca:

O que passou a nortear esta formação (psicologia jurídica) é um dos indicadores


dispostos no Código de Ética Profissional dos Psicólogos. No capítulo que trata
“Das responsabilidades e relações com instituições empregadoras e outras”, artigo
4, parágrafo 1o., define este Código :
O psicólogo atuará na instituição de forma a promover ações para que esta possa se
tornar um lugar de crescimento dos indivíduos, mantendo uma posição crítica que
garanta o desenvolvimento da instituição e da sociedade (grifo nosso. p.5-6).

Como instrumento de transformação de indivíduos a que se propõe, a instituição penal


tende cada vez mais a se distanciar de tal proposta. Pode-se perceber que a instituição
prisional é limitadora, e impede que o psicólogo tenha autonomia. Sendo assim, as críticas ao
sistema tornam-se quase inevitáveis. A insatisfação com a instituição penal também se reflete
na insatisfação com o trabalho desenvolvido.

Se eu fosse gestora, fosse o Ministro da Justiça ou da Secretaria de Justiça, eu iria


reposicionar completamente, aproveitar quem pode fazer projetos bons, iria buscar
recursos, fazer vários projetos, movimentar aquilo ali, mas não se tem dinheiro, não
tem recurso, não tem motivação. (Psicóloga C).

[...] o sentimento da gente, não só meu como acho de todos os psicólogos que eu já
vi no sistema, é de frustração [...] o terceiro setor consegue fazer coisas boas, a
pastoral carcerária, por que não o governo? (Psicóloga C).

As possibilidades de intervir na realidade social são inúmeras, como foi apontado


pelas profissionais entrevistas. Cabe ao psicólogo rever suas práticas, como atualmente já o
faz e traçar um novo caminho a ser trilhado nas instituições prisionais.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do que foi discutido neste estudo, percebe-se que a Psicologia Jurídica é um
campo de saber e atuação muito amplo. Apesar de bastante atrelada às questões do judiciário
e de unir-se a este pela necessidade da avaliação das questões subjetivas que permeiam a
execução das leis, é visível que a área está cada vez mais buscando seu papel para a promoção
da cidadania, de modo a perceber e respeitar as pessoas envolvidas no processo jurídico seja
ele de qualquer natureza.
Existiu ainda a diferença entre os objetos de estudo da Psicologia e do Direito e a
principal questão é saber reunir ambos os saberes, a fim de se validar as decisões do mundo
jurídico, sem desconsiderar os seus sujeitos. Observa-se a identidade do profissional atuando
em instituições de justiça que se perguntam ‘qual papel deve desempenhar, o de clínico para o
qual foi preparado, ou o de membro de uma equipe do judiciário?’. Tais inquietações remetem
à complexidade tanto do sistema quanto da atuação do profissional junto ao poder judiciário,
na sua prática cotidiana de trabalho e os atores sociais nele envolvidos.
Para entender o que pensavam as psicólogas das instituições prisionais sobre sua
própria atuação, se fez necessário entender primeiramente o contexto em que estavam
inseridas. As instituições carcerárias de Salvador, assim como tantas outras do nosso país, não
oferecem boas condições de trabalho para seus profissionais, incluindo os psicólogos. O
ambiente de trabalho, por si só, acarreta insegurança, submissão às autoridades que regem o
sistema e limitações quanto ao trabalho desenvolvido que, neste caso, muitas vezes se resume
à confecção de um laudo a ser entregue ao juiz.
Essas questões emergiram do discurso das profissionais entrevistadas e serviram de
base fundamental para o desenvolvimento da pesquisa. Foi possível avaliar que, na sua
maioria, as atribuições do psicólogo jurídico (previstas em lei), conseguem ser realizadas na
prática, apesar das barreiras encontradas, das limitações e dificuldades in loco no exercício
profissional.
Notou-se que o discurso dessas profissionais está de acordo com a discussão de outros
profissionais da Psicologia Jurídica estudados. Discurso esse repleto de questionamentos e
insatisfações com o trabalho desenvolvido, com o lugar que ocupam e o sistema ao qual estão
subjugadas. Percebeu-se um tom de discurso pessimista, reflexo das situações reais às quais
estavam submetidas.
A princípio, esperava-se que o discurso encontrado, a partir do relato das
entrevistadas, fosse outro, voltado para a questão da garantia dos direitos humanos e não um
relato de insatisfações e idéias que não podem ser executadas. Como profissional que tem o
ser humano como principal objeto de estudo, o psicólogo deve estar compromissado com a
garantia de uma atuação que beneficie a sociedade.
A falta de liberdade para atuar foi um dos pontos principais encontrados no relato das
entrevistadas, pois a atuação desse profissional, nesse contexto, já está de antemão subjugado
a outro campo de saber, mais tradicional e consolidado – o Direito, que aponta o
encarceramento como única e imediata solução, como eficácia de controle social para a
questão da criminalidade.
Existe uma importante contradição quanto ao discurso de duas áreas do conhecimento
que divergem no olhar sobre o mesmo objeto – o sujeito submetido às sanções do judiciário.
O Direito, com seu olhar objetivo, se ocupa em averiguar os fatos e enquadrar os sujeitos nas
leis específicas; o psicólogo, por sua vez, adentra os portões das prisões buscando
compreender as motivações subjetivas que levaram o sujeito a cometer os crimes.Até que
ponto essa visão é deformada, quando se conhece as atuais funções do psicólogo no contexto
prisional? Neste cenário, o psicólogo atua de forma limitada e pouco contribui na
transformação da realidade que se apresenta.
Encontramos psicólogos frustrados com suas funções, com um discurso repleto de
críticas ao sistema ao qual estão submetidos e às limitações do trabalho desenvolvido. O
presente estudo aponta então para uma necessidade urgente de mudanças em suas práticas
profissionais e de repensar as políticas públicas para o sistema prisional.
Antes de encerrar, não se pode descartar aqui o fato de que é imprescindível atentar
para a valorização desses profissionais, para que lhes possa ser franqueado o poder de
reflexão crítica e inovadora, de forma a legitimar seu trabalho e contribuir para a tão
preconizada e urgente inclusão social, se quisermos fazer parte de um sistema mais justo e
eqüitativo.
Esta parceria multidisciplinar, principalmente, com o campo do direito, deve acrescer
saberes e, ao mesmo tempo, convalidar autonomia das funções dentro do sistema judiciário.
No entanto este processo de diálogo e de convívio de saberes necessariamente deve se dar
dentro de um complexo entendimento de que tudo está intrinsecamente interligado, em
contínua transformação.
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em: jun.2006.
Parecer sobre o Trabalho de Conclusão de Curso de Iara de Menezes Pereira, intitulado:
REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PSICÓLOGOS NO SISTEMA PRISIONAL EM
SALVADOR – BA, FBDC – Curso de Psicologia da EBMSP - Escola Baiana de Medicina
e Saúde Pública da FBDC – Fundação Baiana para o Desenvolvimento das Ciências.

Indico o trabalho para publicação on-line e ao prêmio Silvia Lane principalmente pela
relevância do tema. As observações e preocupações manifestas neste trabalho são de extrema
importância, para que futuros psicólogos possam buscar outras possibilidades concretas de atuação. É
preciso estimular iniciativas de reflexão realizadas apenas por uma parcela ainda restrita de
profissionais, incluindo os de psicologia, que só agora começam a repensar suas práticas nas prisões
para além da Avaliação Psicológica. A luta será longa e precisamos ter coragem para produzir a crítica
necessária que viabilize e implemente a inclusão social. A sensibilização para a realidade das
condições de trabalho e o potencial de atuação do psicólogo nas prisões necessita atingir o poder
público e principalmente a sociedade, que apresenta uma rejeição imensa ao tema, dificultando as
discussões para outras soluções que não sejam apenas as de enclausuramento de pessoas. A iniciativa
da autora, dentre outras dão continuidade a uma discussão responsável sobre o sistema prisional. Vale
lembrar que a população de origem afro - descendente tem sido a mais atingida pela perversidade do
sistema; e a Psicologia necessita se posicionar, apresentar propostas concretas e produzir
conhecimento específico envolvendo a população carcerária e principalmente possibilitar que
psicólogos e outros profissionais envolvidos possam rever seus conceitos e suas práticas contribuindo
para um trabalho de inclusão social.
O artigo apresentado atende aos objetivos do TCC, idealizados pelo Curso de Psicologia da
FBDC. Contêm considerações relevantes em relação ao problema, aos objetivos do estudo, a
metodologia e a bibliografia encontrada, abordando aspectos importantes sobre a prática do psicólogo
no sistema prisional. Considero que foram realizados levantamentos básicos sobre a prática do
psicólogo, que indicam a necessidade de investimentos efetivos na formação do profissional de
psicologia, para atender a uma demanda de pessoas que sofrem os mais perversos tipos de tratamento
no cotidiano, reduzindo suas possibilidades de reintegração social. A autora conseguiu visualizar
mudanças para este campo de atuação dos psicólogos, ainda tão pouco explorado frente o potencial de
nossa categoria. Concluo desejando que as reflexões e críticas apresentadas neste artigo possam
repercutir positivamente na trajetória profissional de pessoas envolvidas nesta atuação e contribuir de
fato com mudanças no campo da Psicologia Jurídica.

Salvador, 30 de março de 2007.

Profa Dra Marilda Castelar


FUNDAÇÃO BAHIANA PARA O DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS
ESCOLA BAHIANA DE MEDICINA E SAÚDE PÚBLICA
CURSO DE PSICOLOGIA

Salvador, 30 de junho de 2006

À Coordenação do Curso de Psicologia da FBDC


A/C Profa Maria Rosália Correia Dias
Assunto: Encaminhamento de TCC

Encaminho para a Coordenação do Curso de Psicologia as quatro cópias referentes ao


Trabalho de Conclusão de Curso da aluna Iara de Menezes Pereira, intitulado
“REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA DE PSICÓLOGOS NO SISTEMA PRISIONAL
EM SALVADOR - BA”. Na oportunidade informo que os professores sugeridos para
composição da Banca Examinadora são Milton B. Almeida Filho e Luciano Alberto Lima

Costa sendo Edmary Urpia indicada como suplente.

Atenciosamente,

Marilda Castelar

Professora Orientadora do TCC

Obs:
Contatos com Luciano Costa Fone: (71) 33313870 /88433870
luclcosta@yahoo.com.br

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