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FACULDADES SANTO AGOSTINHO

Medicina – Turma IV – 8º Período – 2020.1


Módulo: Emergências
Thálisson Ramos Leite
Problema 1
Será que é grave?

# Objetivos #
1-Estudar estupor dissociativo (transtorno dissociativo ou conversivo).
2-Estudar os diagnósticos diferenciais e os sinais clínicos destes quadros.
3-Reconhecer a hipoventilação que se segue após a hiperventilação e estudar a conduta
adequada para estes casos.
4-Discutir a melhor abordagem frente a esses casos e a atitude da equipe do pronto
socorro diante desse tipo de diagnóstico.

Objetivo 1:

➢ Transtornos dissociativos:
Em psiquiatria, a dissociação é definida como um mecanismo de defesa inconsciente envolvendo a
segregação de qualquer grupo de processos mentais ou comportamentais do resto da atividade psíquica
da pessoa. Os transtornos dissociativos envolvem esse mecanismo de modo que haja uma interrupção em
uma ou mais funções mentais, tais como memória, identidade, percepção, consciência ou comportamento
motor. O transtorno pode ser repentino ou gradual, transitório ou crônico, e os sinais e sintomas costumam
ser causados por trauma psicológico.
A amnésia gerada por conflito intrapsíquico é codificada diferentemente daquela gerada por uma
condição médica, como a encefalite. No último caso, de acordo com a quinta edição do Manual
diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5), um diagnóstico de transtorno neurocognitivo
devido a uma condição médica seria feito. No entanto, no primeiro caso, o diagnóstico seria de amnésia
dissociativa.

• Amnésia Dissociativa:
Os critérios diagnósticos do DSM-5 para a amnésia dissociativa estão listados na Tabela 12-1. A
principal característica dessa amnésia é uma incapacidade de lembrar de informações pessoais
importantes, normalmente de natureza traumática ou estressante, que é extensa demais para ser
explicada por esquecimento habitual. O transtorno não é resultado dos efeitos fisiológicos diretos de uma
substância ou de uma condição médica neurológica ou geral. Os diferentes tipos de amnésia dissociativa
estão listados na Tabela 12-2.

1.Epidemiologia:
- A amnésia dissociativa foi relatada em cerca de 2 a 6% da população em geral;
- Não há diferenças conhecidas na incidência em homens ou mulheres;
- Os casos costumam começar a ser relatados no fim da adolescência e na vida adulta;
- Ela pode ser especialmente difícil de avaliar em crianças pré-adolescentes devido a sua habilidade mais
limitada de descrever experiências subjetivas.

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2.Etiologia:
Em muitos casos de amnésia dissociativa aguda, o ambiente psicossocial no qual a amnésia se
desenvolve apresenta intenso conflito, com o paciente sentindo variações intoleráveis de vergonha, culpa,
desespero, raiva e depressão. Esses sentimentos normalmente resultam de conflitos por impulsos ou
necessidades inaceitáveis (como compulsões sexuais, suicidas ou violentas de grande intensidade).
Experiências traumáticas (como abuso físico ou sexual) podem induzir o transtorno. Em alguns casos, o
trauma é causado pela traição de um ente querido e de confiança (trauma de traição). Acredita-se que
essa traição influencie a forma como o evento é processado e lembrado.

3.Diagnóstico e quadro clínico:

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3.1.Apresentação clássica:
- O transtorno clássico é uma perturbação aberta, florida e dramática que frequentemente resulta no
paciente sendo logo encaminhado à atenção médica, sobretudo por sintomas relacionados ao transtorno
dissociativo;
- Costuma ser encontrado naqueles que sofreram trauma agudo extremo. No entanto, também é comum
se desenvolver no contexto de estresse emocional ou conflito intrapsíquico profundo;
- Os pacientes podem apresentar sintomas somatoformes ou de conversão intercorrentes, alterações de
consciência, depersonalização, desrealização, estados de transe, regressão espontânea de idade e até
amnésia dissociativa anterógrada contínua;
- Depressão e ideação suicida são relatadas em muitos casos;
- Não há perfil de personalidade ou história de antecedentes consistentemente relatados nesses
pacientes, apesar de uma história pessoal ou familiar de sintomas dissociativos ou somatoformes
apresentar predisposição individual a desenvolver amnésia aguda durante circunstâncias traumáticas;
- Muitos deles têm histórias anteriores de abuso ou trauma adulto ou infantil;
- Em casos de guerra, bem como em outras formas de transtorno de estresse pós-traumático relacionado
a combate, a variável mais importante no desenvolvimento de sintomas dissociativos parece ser a
intensidade do combate.

3.2.Apresentação não clássica:


- Esses indivíduos frequentemente procuram tratamento para diversos sintomas, tais como depressão ou
mudanças de humor, abuso de substâncias, perturbação do sono, sintomas somatoformes, ansiedade e
pânico, impulsos e atos suicidas e automutilatórios, estouros violentos, problemas de alimentação e
problemas interpessoais;
- O comportamento automutilatório e violento nesses pacientes também pode vir acompanhado de
amnésia. A amnésia também pode ocorrer para flashbacks ou episódios de reexperiência comportamental
relacionados a trauma.

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4.Diagnóstico diferencial (DDx):


O diagnóstico diferencial da amnésia dissociativa está listado na Tabela 12-4.
- Esquecimento comum e amnésia não patológica = O esquecimento comum é um fenômeno benigno
e não relacionado a eventos estressantes. Na amnésia dissociativa, a perda de memória é mais extensiva
do que na não patológica. Outras formas não patológicas de amnésia foram descritas, tais como amnésia
infantil, amnésia para sono e sonhos e amnésia hipnótica;
- Demência, delirium e transtornos amnésticos devidos a condições médicas = Em pacientes com
demência, delirium e transtornos amnésticos devidos a condições médicas, a perda de memória de
informações pessoais é incorporada em um conjunto mais extenso de problemas cognitivos, linguísticos,
comportamentais e de memória. Perda de memória sobre a identidade pessoal não costuma ser
encontrada sem evidência de uma perturbação marcante em muitos domínios da função cognitiva. As
causas dos transtornos amnésticos orgânicos incluem psicose de Korsakoff, acidente vascular cerebral
(AVC), amnésia pós-operatória, amnésia pós-infecciosa, amnésia anóxica e amnésia global transitória. A
eletroconvulsoterapia (ECT) também pode causar uma amnésia temporária marcante, assim como
problemas persistentes de memória, em alguns casos. Aqui, contudo, a perda de memória para
experiências autobiográficas não tem relação com experiências traumáticas ou graves e parece envolver
muitos tipos de experiências pessoais, especialmente aquelas que ocorrem pouco antes ou durante os
tratamentos de ECT;
- Amnésia pós-traumática = Na amnésia pós-traumática causada por lesão cerebral, uma história clara
de trauma físico, um período de inconsciência ou amnésia, ou ambos, costumam ser vistos, e há
evidências clínicas objetivas de lesão cerebral;
- Transtornos convulsivos = Na maioria dos casos de convulsão, a apresentação clínica difere
significativamente da amnésia dissociativa, com eventos e sequelas claros. Pacientes com episódios
convulsivos pseudoepilépticos também podem ter sintomas dissociativos, tais como amnésia e uma
história antecedente de trauma psicológico. Raramente, pacientes com convulsões parciais complexas
recorrentes apresentam comportamento estranho, problemas de memória, irritabilidade ou violência
contínuos, o que gera um quebra-cabeças de diagnóstico diferencial. Em alguns desses casos, o
diagnóstico pode ser esclarecido apenas por telemetria ou monitoramento ambulatorial
eletrencefalográfico (EEG);
- Amnésia relacionada a substâncias = Diversas substâncias e intoxicantes foram implicados na
produção de amnésia. Agentes ofensivos comuns estão listados na Tabela 12-4;
- Amnésia global transitória = Pode ser confundida com a dissociativa, sobretudo porque eventos
estressantes podem preceder o transtorno. Na amnésia global transitória, contudo, há o início súbito da
amnésia anterógrada completa e de habilidades de aprendizagem; amnésia retrógrada pronunciada;
preservação da memória de identidade pessoal; consciência ansiosa da perda de memória com
questionamento repetido e com frequência perseverante; comportamento geral normal; falta de
anormalidades neurológicas gritantes na maioria dos casos; e rápido retorno à função cognitiva-base, com
amnésia retrógrada curta persistente. O paciente costuma ter > 50 anos e apresenta fatores de risco para
doença cerebrovascular, apesar de epilepsia e enxaqueca terem sido etiologicamente implicadas em
alguns casos;
- Transtornos dissociativos de identidade = Indivíduos com transtorno dissociativo de identidade podem
apresentar formas agudas de amnésia e episódios de fuga. Esses pacientes, contudo, são caracterizados

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por diversos sintomas, sendo apenas alguns encontrados em pacientes com amnésia dissociativa. Em
relação à amnésia, a maioria das pessoas com transtorno dissociativo de identidade e com transtorno
dissociativo não especificado com características de transtorno dissociativo de identidade relata múltiplas
formas de amnésia complexa, incluindo blecautes recorrentes, fugas, posses inexplicadas e flutuações de
habilidades, hábitos e conhecimento;
- Transtorno de estresse agudo, transtorno de estresse pós-traumático e transtorno de sintomas
somáticos = As formas de amnésia dissociativa, em sua maioria, são mais bem conceitualizadas como
parte de um grupo de transtornos de espectro traumático que inclui os transtornos de estresse agudo, de
estresse pós-traumático (TEPT) e de sintomas somáticos. Muitos pacientes com amnésia dissociativa
cumprem todos ou parte dos critérios diagnósticos para transtornos de estresse agudo ou uma
combinação dos 3. A amnésia é um sintoma-critério de cada um desses últimos transtornos;
- Simulação e amnésia factícia = Não existe maneira absoluta de diferenciar a amnésia dissociativa da
amnésia factícia ou da simulação. Simuladores já se mostraram capazes de continuar seu fingimento
mesmo durante entrevistas facilitadas por hipnose ou barbitúricos. Um paciente que chega à atenção
médica buscando recuperar memórias reprimidas como principal reclamação provavelmente tenha um
transtorno factício ou esteve sujeito a influências sugestivas. A maior parte desses indivíduos, na verdade,
não descreve amnésia legítima quando cuidadosamente questionados, mas com frequência insistem
terem sido abusados quando crianças para explicar sua infelicidade ou disfunção atual.

5.Curso e prognóstico:
Pouco se sabe sobre o curso clínico da amnésia dissociativa. A amnésia dissociativa aguda
costuma se resolver de maneira espontânea quando a pessoa é afastada com segurança das
circunstâncias traumáticas.
No outro extremo, alguns pacientes desenvolvem formas crônicas de amnésia localizada
generalizada, contínua ou grave, sendo profundamente deficientes e exigindo altos níveis de apoio social,
tais como monitoramento em uma casa de repouso ou cuidado familiar intenso. Os médicos devem tentar
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lhes restaurar as memórias perdidas à consciência assim que possível; do contrário, a memória reprimida
pode formar um núcleo na mente inconsciente, levando a episódios amnésicos futuros.

6.Tratamento:
- Terapia cognitiva = A terapia cognitiva pode ter benefícios específicos para indivíduos com transtornos
traumáticos. Identificar as distorções cognitivas específicas que se baseiam no trauma pode proporcionar
uma entrada na memória autobiográfica para a qual o paciente sofre a amnésia. Conforme ele se torna
apto a corrigir distorções cognitivas, particularmente sobre o significado de traumas anteriores, memórias
mais detalhadas dos eventos traumáticos podem surgir;
- Hipnose = A hipnose pode ser utilizada de diversas maneiras diferentes no tratamento da amnésia
dissociativa. De modo específico, as intervenções hipnóticas podem ser usadas para conter, modular e
titular a intensidade dos sintomas; facilitar a lembrança controlada de memórias dissociadas; proporcionar
apoio e fortalecer o ego do paciente; e promover o trabalho e a integração do material dissociado. Além
disso, o indivíduo pode aprender a auto-hipnose para aplicar técnicas de contenção e de tranquilização em
sua vida cotidiana. O uso bem-sucedido de técnicas de contenção, sejam elas facilitadas por hipnose ou
não, também aumenta a noção do paciente de que pode exercer maior controle sobre a alternância entre
sintomas intrusivos e amnésia;
- Terapias somáticas = Não há farmacoterapia conhecida para amnésia dissociativa além das entrevistas
facilitadas por fármacos. Diversos agentes foram usados para esse propósito, incluindo amobarbital
sódico, tiopental, benzodiazepínicos orais e anfetaminas. Entrevistas facilitadas por fármacos com uso de
amobarbital ou diazepam intravenosos são utilizadas sobretudo em amnésias agudas e reações de
conversão, entre outras indicações, em geral em serviços hospitalares médicos e psiquiátricos. Esse
procedimento também é ocasionalmente útil em casos refratários de amnésia crônica dissociativa quando
os pacientes não respondem a outras intervenções. O material descoberto em uma entrevista facilitada por
fármacos precisa ser processado pelo paciente em seu estado consciente habitual;
- Psicoterapia em grupo = As psicoterapias em grupo por tempo limitado ou por longos períodos já se
mostraram úteis para veteranos de guerra com TEPT e para sobreviventes de abuso infantil. Durante as
sessões em grupo, os pacientes podem recuperar memórias para as quais têm amnésia. Intervenções de
apoio pelos membros do grupo ou pelo terapeuta (ou por ambos) podem facilitar a integração e o domínio
do material dissociado.

• Transtorno de Despersonalização/Desrealização:
A despersonalização é definida como o sentimento persistente ou recorrente de desapego ou de
estranhamento do próprio eu. O indivíduo pode relatar se sentir como um autômato ou como se estivesse
se assistindo em um filme. A desrealização tem alguma relação e se refere a sentimentos de irrealidade ou
de afastamento do próprio ambiente. O paciente pode descrever sua percepção do mundo exterior como
um ambiente no qual falta lucidez ou emoção, como se estivesse em um sonho ou morto.
A definição atual do DSM-5 do transtorno de despersonalização pode ser vista na Tabela 12-5.

1.Epidemiologia:
- São extremamente comuns em populações sadias e clínicas;
- Esses são os sintomas psiquiátricos mais relatados, depois de depressão e ansiedade;

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- Uma pesquisa encontrou uma prevalência em 1 ano de 19% na população em geral;


- Tais experiências são comuns em pacientes com convulsões e enxaqueca. Também podem ocorrer com
o uso de drogas psicodélicas, em especial maconha, dietilamida do ácido lisérgico (LSD) e mescalina, e,
com menos frequência, como efeito colateral de alguns fármacos, como os agentes anticolinérgicos;
- Essas experiências foram descritas após certos tipos de meditação, hipnose profunda, observação
estendida em um espelho ou cristal e experiências de privação sensorial;
- Também são comuns após lesões leves ou moderadas na cabeça, em que há pouca ou nenhuma perda
de consciência, mas são bem menos prováveis se a inconsciência durar mais de 30 minutos. Ainda, são
observadas após experiências potencialmente fatais, com ou sem lesão corporal grave;
- A despersonalização é encontrada de 2 a 4 vezes mais em mulheres do que em homens.

2.Etiologia:
- Psicodinâmica = As formulações psicodinâmicas tradicionais enfatizavam a desintegração do ego ou
viam a despersonalização como uma resposta afetiva em defesa do ego. Essas explicações destacam o
papel de experiências extremamente dolorosas ou de impulsos conflitivos como eventos provocadores;
- Estresse traumático = Uma proporção substancial, via de regra de 1/3 a metade, dos pacientes em
casos de despersonalização clínica relata histórias de trauma significativo. Diversos estudos de vítimas de
acidentes verificaram que até 60% dos que sofreram experiências potencialmente fatais relataram ao
menos despersonalização transitória durante o evento ou logo depois. Estudos do treinamento militar
relataram que sintomas de despersonalização e desrealização costumam ser evocados por estresse e
fadiga, e que estão inversamente relacionados ao desempenho;
- Teorias neurobiológicas = A associação da despersonalização com enxaquecas e maconha, sua
resposta em geral favorável aos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) e o aumento nos
sintomas de despersonalização visto com a depleção de L-triptofano, um precursor de serotonina,
apontam para um grande envolvimento da serotonina. A despersonalização é o sintoma dissociativo
primário elicitado pelos estudos de questionamento de fármacos descritos na seção sobre teorias
neurobiológicas da dissociação. Esses estudos implicam fortemente o subtipo do receptor de glutamato N-
metil-D-aspartato (NMDA) como central para a origem dos sintomas de despersonalização.

3.Diagnóstico e quadro clínico:


- Diversos componentes distintos compõem a experiência da despersonalização, incluindo um senso de:
* Alterações corporais.
* Dualidade do eu como observador e * Distanciamento dos outros.
ator. * Distanciamento das próprias emoções.
- Os pacientes que vivenciam a despersonalização com frequência têm grandes dificuldades para
expressar o que estão sentindo. Tentando expressar seu sofrimento subjetivo com frases banais, tais
como “Eu me sinto morto”, “Nada parece real” ou “Estou fora de mim”, os pacientes despersonalizados
podem não transmitir de forma adequada o sofrimento que passam. Enquanto reclamam amargamente
sobre como isso arruína suas vidas, eles ainda assim podem parecer bastante tranquilos.

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4.Diagnóstico diferencial (DDx):


A diversidade de condições associadas com a despersonalização complica o diagnóstico
diferencial desse transtorno. A despersonalização pode resultar de uma condição médica ou neurológica,
da intoxicação ou da abstinência de drogas ilícitas, como efeito colateral de medicamentos, ou pode estar
associada com ataques de pânico, fobias, TEPT ou transtorno de estresse agudo, esquizofrenia ou outro
transtorno dissociativo.
Uma avaliação médica e neurológica completa é essencial, incluindo estudos de laboratório, um
EEG e qualquer exame de drogas indicado. A despersonalização relacionada a drogas costuma ser
transitória, mas a despersonalização persistente pode acompanhar um episódio de intoxicação com
diversas substâncias, entre elas maconha, cocaína e outros psicoestimulantes.
Diversas condições neurológicas, incluindo transtornos convulsivos, tumores cerebrais, síndrome
pós-concussiva, anormalidades metabólicas, enxaqueca, vertigem e doença de Ménière, foram relatadas
como causas. A despersonalização causada por condições orgânicas tende a ser principalmente sensorial,
sem as descrições elaboradas e sentidos personalizados comuns a etiologias psiquiátricas.

5.Curso e prognóstico:
A despersonalização após experiências traumáticas ou intoxicação costuma entrar em remissão de
maneira espontânea após a remoção das circunstâncias traumáticas ou o fim do episódio de intoxicação.
Aquela que acompanha transtornos do humor, psicóticos ou outros transtornos de ansiedade
frequentemente entra em remissão com o tratamento definitivo dessas condições.
O transtorno de despersonalização em si pode ter um curso episódico, de relapso e de remissão,
ou crônico. Muitos pacientes com despersonalização crônica podem ter um curso caracterizado por grave
prejuízo no funcionamento ocupacional, social e pessoal. A idade média de início costuma ser no fim da
adolescência ou no início da vida adulta, na maioria dos casos.

6.Tratamento:
Os médicos que trabalham com pacientes que apresentam transtorno de
despersonalização/desrealização com frequência os consideram um grupo refratário ao tratamento.
Algumas evidências sistemáticas indicam que os antidepressivos ISRSs (como a fluoxetina, podem ajudar
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esses pacientes). Alguns indivíduos respondem, na melhor das hipóteses, esporádica e parcialmente aos
grupos habituais de fármacos, isolados ou combinados: antidepressivos, estabilizadores do humor,
neurolépticos típicos e atípicos, anticonvulsivantes, e assim por diante.
Muitos tipos diferentes de psicoterapia foram usados para tratar o transtorno de despersonalização:
psicodinâmica, cognitiva, cognitivo-comportamental, hipnoterapêutica e de apoio. Muitos desses pacientes
não têm uma resposta robusta a esses tipos específicos de psicoterapia-padrão.
Estratégias de administração do estresse, técnicas de distração, redução de estímulos sensoriais,
treino de relaxamento e exercícios físicos também podem ajudar alguns indivíduos.

• Fuga Dissociativa:
A fuga dissociativa foi suprimida como uma das principais categorias diagnósticas do DSM-5 e
agora é diagnosticada como um subtipo (especificador) da amnésia dissociativa. Ela pode ser vista em
pacientes com amnésia dissociativa e com transtorno dissociativo de identidade. O transtorno continua
sendo um diagnóstico distinto na 10ª edição da Classificação internacional de doenças e problemas
relacionados à saúde, (CID-10) e é discutido como uma entidade à parte no Compêndio devido a sua
relevância clínica.
A fuga dissociativa é descrita como uma viagem súbita e repentina para longe de casa ou do seu
lugar de vivência costumeiro, com incapacidade de lembrar de parte ou de todo o passado. Isso vem
acompanhado de confusão sobre a própria personalidade ou até da apropriação de uma nova identidade.
O episódio não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância ou de uma condição
médica geral. Os sintomas devem causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes do funcionamento.

1.Etiologia:
Circunstâncias traumáticas (i.e., estupro, combate, abuso sexual infantil recorrente, deslocamentos
sociais massivos, desastres naturais), que levam a um estado de consciência alterado dominado por um
desejo de fuga são as causas subjacentes da maioria dos episódios de fuga.
Em alguns casos, vê-se uma história de antecedentes semelhante, apesar de um trauma
psicológico não estar presente no início do episódio de fuga. Nesses casos, em vez de (ou além de)
perigos ou traumas externos, os pacientes costumam estar lutando contra emoções ou impulsos extremos
(i.e., medo, culpa, vergonha ou impulsos sexuais, suicidas ou violentos de grande intensidade) que estão
em conflito com os ideais de sua consciência ou seu ego.

2.Epidemiologia:
- Acredita-se que o transtorno seja mais comum durante desastres naturais, tempos de guerra ou períodos
de grande deslocamento social ou violência, apesar de não haver dados sistemáticos neste momento;
- Não existem informações adequadas para demonstrar algum viés de gênero para esse transtorno;
contudo, a maior parte dos casos descreve homens, principalmente no exército;
- A fuga dissociativa costuma ser descrita em adultos.

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3.Diagnóstico e quadro clínico:


- A fuga dissociativa é descrita como um transtorno capaz de durar de minutos a meses;
- Alguns pacientes relatam múltiplas fugas. Na maioria dos casos em que isso foi descrito, um transtorno
dissociativo mais crônico, como um transtorno dissociativo de identidade, não foi excluído;
- Em alguns casos extremos de TEPT, os pesadelos podem acabar com uma fuga real, em que o paciente
corre para outra parte da casa ou foge para fora;
- Crianças ou adolescentes podem ser mais limitados do que adultos em sua habilidade de fuga. Portanto,
as fugas nessa população podem ser breves e envolver apenas distâncias menores;
- Após o término da fuga, o paciente pode sofrer de perplexidade, confusão, transe, despersonalização,
desrealização e sintomas de conversão, além de amnésia. Alguns podem terminar a fuga com um episódio
de amnésia dissociativa generalizada;
- Conforme começa a ficar menos dissociado, o indivíduo com fuga dissociativa pode exibir sintomas de
transtorno do humor, ideias intensas de suicídio e sintomas de TEPT ou de transtorno de ansiedade;
- Nos casos clássicos, uma outra identidade é criada sob cujos auspícios o paciente vive por um período
de tempo;
- Muitos desses casos anteriores são mais bem classificados como transtorno dissociativo de identidade
ou, usando o DSM-5, como outro transtorno dissociativo especificado com características de transtorno
dissociativo de identidade.

4.Diagnóstico diferencial (DDx):


Indivíduos com amnésia dissociativa podem vagar confusos durante um episódio de amnésia. Na
fuga dissociativa, contudo, há uma fuga propositada do lar ou do local de vivência costumeiro do indivíduo,
normalmente preocupado com uma única ideia que vem acompanhada de um desejo de fugir.
Pacientes com transtorno dissociativo de identidade podem apresentar sintomas de fuga
dissociativa, que costumam ser recorrentes ao longo de suas vidas. Esses pacientes apresentam múltiplas
formas de amnésias complexas e, em geral, múltiplas outras identidades que se desenvolvem, começando
na infância.
Em convulsões parciais complexas, pacientes já exibiram comportamentos de fuga perambulatória
ou semiproposital, ou ambos, durante convulsões em estados pós-ictais, para os quais ocorre amnésia
subsequente. Contudo, os pacientes convulsivos em uma fuga epiléptica frequentemente exibem
comportamento anormal, incluindo confusão, perseverança e movimentos anormais ou repetitivos. Outras
características das convulsões costumam ser relatadas na história clínica, tais como uma aura,
anormalidades motoras, comportamento estereotipado, alterações de percepção, incontinência e estado
pós-ictal. EEGs seriais ou telemétricos, ou ambos, costumam mostrar as anormalidades associadas com
patologia comportamental.
O comportamento divagante durante diversas condições médicas, transtornos tóxicos e
relacionados a substâncias, delirium, demência e síndromes amnésicas orgânicas poderia ser confundido,
teoricamente, com fuga dissociativa. Na maioria dos casos, contudo, os transtornos somáticos, tóxicos,
neurológicos ou relacionados a substâncias podem ser incluídos pela história, exame físico, testes de
laboratório ou rastreamento toxicológico. O uso de álcool ou de substâncias pode estar envolvido na
precipitação de um episódio de fuga dissociativa.

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As fugas divagantes e propositais podem ocorrer durante a fase maníaca do transtorno bipolar ou
esquizoafetivo. Pacientes que são maníacos podem não se lembrar de comportamentos que ocorreram no
estado eutímico ou deprimido, e vice-versa. Na fuga proposital devida à mania, porém, o indivíduo
costuma estar preocupado com ideias grandiosas e chamar atenção para si mesmo em razão de seu
comportamento inadequado. Não ocorre apropriação de uma identidade alternativa.
De maneira semelhante, o comportamento peripatético pode ocorrer em alguns pacientes com
esquizofrenia. As memórias dos eventos durante episódios divagantes nesses pacientes podem ser
difíceis de verificar devido a seu transtorno de pensamento. Pacientes com fuga dissociativa, entretanto,
não demonstram um transtorno de pensamento psicótico ou outros sintomas de psicose.
A simulação da fuga dissociativa pode ocorrer em indivíduos que estão tentando fugir de uma
situação envolvendo dificuldades legais, financeiras ou pessoais, bem como em soldados que estão
tentando evitar combate ou outros deveres militares desagradáveis. Não há teste, bateria de testes ou
conjunto de experimentos que sejam capazes de distinguir invariavelmente os sintomas dissociativos da
simulação. A simulação de sintomas dissociativos, tais como relatos de amnésia para fuga proposital
durante um episódio de comportamento antissocial, pode ser mantida mesmo durante entrevistas
facilitadas por hipnose ou por fármacos. Muitos indivíduos que simulam confessam de forma espontânea
ou quando confrontados. No contexto forense, o examinador deve sempre considerar cuidadosamente o
diagnóstico de simulação quando se alega fuga.

5.Curso e prognóstico:
A maioria das fugas é relativamente breve, durando de horas a dias. A maior parte dos indivíduos
parece se recuperar, apesar de amnésia dissociativa refratária poder persistir em casos raros. Alguns
estudos descreveram fugas recorrentes na maioria dos indivíduos que apresentam um episódio de fuga
dissociativa.

6.Tratamento:
A fuga dissociativa costuma ser tratada com uma psicoterapia eclética, orientada
psicodinamicamente, que se concentra em ajudar o paciente a recuperar a memória da identidade e
recuperar da experiência recente. A hipnoterapia e as entrevistas facilitadas por fármacos são técnicas
adjuntas frequentemente necessárias para auxiliar a recuperação de memória. Os pacientes podem
precisar de tratamento médico para lesões sofridas durante a fuga, assim como de alimento e descanso.
Os médicos devem estar preparados para a emergência de ideias e impulsos suicidas ou
autodestrutivos, conforme as circunstâncias traumáticas ou estressantes pré-fuga forem reveladas. A
hospitalização psiquiátrica pode ser indicada se o paciente for ambulatorial.
Os problemas familiares, sexuais, ocupacionais ou legais que faziam parte da matriz original que
gerou o episódio de fuga podem ser substancialmente exacerbados quando a identidade original do
paciente e sua situação de vida forem revelados. Assim, tratamento familiar e intervenções de serviços
sociais podem ser necessários para ajudar a resolver essas dificuldades complexas.
Quando a fuga dissociativa envolve a apropriação de uma nova identidade, é útil conceitualizar
essa identidade como algo psicologicamente vital para a proteção da pessoa. Experiências traumáticas,
memórias, cognições, identificações, emoções, ambições, autopercepções ou uma combinação destas,
tornaram-se tão conflituosas e, ainda assim, tão definitivas que a pessoa só consegue resolvê-las

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incorporando-as em uma outra identidade. O objetivo terapêutico, nesses casos, não é nem a supressão
da nova identidade, nem uma explicação fascinada de todos os seus atributos. Assim como no transtorno
dissociativo de identidade, o clínico deve apreciar a importância da informação psicodinâmica contida na
outra personalidade e a intensidade das forças psicológicas que necessitaram de sua criação. Nesses
casos, o desfecho terapêutico mais desejável é a fusão das identidades, com a pessoa trabalhando por
meio das memórias das experiências que precipitaram a fuga e integrando-as.

• Transtorno Dissociativo de Identidade:


O transtorno dissociativo de identidade tem sido o transtorno dissociativo mais pesquisado de
todos. Ele se caracteriza pela presença de 2 ou mais identidades distintas ou estados de personalidade.
As identidades ou os estados de personalidade, às vezes chamados de alters, autoestados, alter
identidade ou partes, entre outros termos, diferem uns dos outros na forma como cada um se apresenta
com um padrão próprio de percepção, relacionamento e pensamento sobre o ambiente e o eu. Em suma,
sua própria personalidade. Trata-se da psicopatologia dissociativa paradigmática, já que os sintomas de
todos os outros transtornos dissociativos são em geral encontrados em pacientes com transtorno
dissociativo de identidade: amnésia, fuga, despersonalização, desrealização e sintomas semelhantes.

1.Epidemiologia:
- São poucos os dados existentes sobre o transtorno dissociativo de identidade;
- A proporção de mulheres para homens de 5:1 e de 9:1, em casos diagnosticados.

2.Etiologia:
O transtorno dissociativo de identidade é fortemente ligado a experiências graves de trauma
infantil, via de regra maus-tratos. Os índices de trauma infantil grave para pacientes crianças e adultos
com transtorno dissociativo de identidade variam de 85 a 97% dos casos. Abuso físico e sexual são
relatados com maior frequência como fontes de trauma infantil.

3.Diagnóstico e quadro clínico:


A característica principal no diagnóstico deste transtorno é a presença de 2 ou mais estados
distintos de personalidade. No entanto, há muitos outros sinais e sintomas que definem o transtorno, e, em
razão da grande diversidade, isso torna o diagnóstico difícil. Eles estão listados na Tabela 12-6, que
descreve os muitos outros sintomas associados comumente encontrados em pacientes com transtorno
dissociativo de identidade.
- Exame do estado mental = Um exame do estado mental cuidadoso e detalhado é essencial para
realizar o diagnóstico. É fácil confundir pacientes que apresentam esse transtorno com pessoas sofrendo
de esquizofrenia, transtorno da personalidade borderline ou simplesmente simulando. A Tabela 12-7 lista
as perguntas que os clínicos devem formular para realizar o diagnóstico;
- Memória e sintomas de amnésia = Perturbações dissociativas de memória se manifestam de várias
maneiras básicas e são com frequência observadas em ambientes clínicos. Como parte do exame do
estado mental geral, os médicos devem rotineiramente perguntar sobre experiências de perda do tempo,
períodos de apagão e grandes falhas de continuidade na memória de informações pessoais. Experiências
de perda do tempo dissociativas são muito extensas para serem explicadas pelo esquecimento normal e

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em geral têm um início e um fim bem demarcados. Pacientes com transtorno dissociativo costumam
relatar falhas significativas na memória autobiográfica, especialmente para eventos da infância. Essas
falhas costumam ser bem demarcadas e não se enquadram no declínio normal na memória autobiográfica
para idades mais jovens;
- Alterações dissociativas clínicas na identidade podem começar a se manifestar por estranhas
referências a si mesmo em 1ª pessoa do plural ou 3ª pessoa = Além disso, os pacientes podem se
referir a si mesmos usando seu primeiro nome ou fazendo autorreferências despersonalizadas, tais como
“o corpo”, ao se descreverem e falarem de outros. Eles frequentemente descrevem um profundo senso de
divisão interna concretizada ou de conflitos internos personalizados entre partes de si. Em algumas
instâncias, essas partes podem ter nomes próprios ou podem ser designadas por seu efeito ou sua função
predominante, por exemplo, “o furioso” ou “a esposa”. Os pacientes podem mudar de repente a forma
como se referem aos outros, por exemplo, “o filho” em vez de “meu filho”;
- Outros sintomas associados = A maioria dos pacientes com transtorno dissociativo de identidade se
enquadra nos critérios diagnósticos para um transtorno do humor, em geral um dos transtornos do
espectro depressivo. Alterações rápidas e frequentes de humor são comuns, mas elas costumam ser
causadas por fenômenos dissociativos de estresse pós-traumático, e não por um verdadeiro transtorno
cíclico do humor. Pode haver sobreposição considerável entre sintomas de ansiedade do TEPT, sono
perturbado, sintomas de transtorno do humor e disforia. Traços de personalidade obsessivo-compulsivos
são comuns no transtorno dissociativo de identidade, e sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo
(TOC) intercorrentes são frequentemente encontrados em pacientes com transtorno dissociativo de
identidade, com um subgrupo manifestando sintomas graves de TOC. Os sintomas do TOC costumam ter
uma qualidade pós-traumática: verificar várias vezes para se certificar de que ninguém possa entrar na
casa ou no quarto, lavar-se compulsivamente para aliviar a sensação de sujeira devido a abuso e contar
ou cantar mentalmente repetidas vezes para se distrair da ansiedade de sofrer abuso, por exemplo;
- Apresentações em crianças e em adolescentes = As crianças e os adolescentes manifestam os
mesmos sintomas dissociativos principais e fenômenos clínicos secundários que os adultos. As diferenças
relacionadas à idade em autonomia e estilo de vida, contudo, podem influenciar significativamente a
expressão dos sintomas dissociativos nos jovens. As crianças pequenas, em especial, têm uma noção de
tempo menos linear e menos contínua e com frequência não são capazes de autoidentificar
descontinuidades dissociativas em seu comportamento. Muitas vezes, informantes adicionais, como
professores e parentes, estão disponíveis para ajudar a documentar comportamentos dissociativos.
Diversos fenômenos normais da infância, como um companheiro imaginário e devaneios elaborados,
devem ser diferenciados da dissociação patológica nas crianças menores. A apresentação clínica pode ser
a de um companheiro imaginário elaborado ou autônomo, que assume o controle do comportamento da
criança, frequentemente vivenciado por meio de experiências de influência passiva ou pseudoalucinações
auditivas, ou ambas, que comandam o comportamento da criança de certas formas.

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4.Diagnóstico diferencial (DDx):


A Tabela 12-8 lista os transtornos mais comuns que devem ser diferenciados do transtorno
dissociativo de identidade.

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- Transtorno dissociativo de identidade factício, imitativo e simulado = Relata-se que os indicadores


de transtorno dissociativo de identidade falsificado ou imitativo incluem indicadores típicos de outras
apresentações factícias ou simuladas. Estes incluem exagero de sintomas, mentiras, uso de sintomas para
isentar-se de comportamento antissocial (p. ex., amnésia apenas para mau comportamento), amplificação
de sintomas quando sob observação, recusa em permitir contatos colaterais, problemas legais e
mitomania. Os pacientes com transtorno dissociativo de identidade genuíno costumam se sentir confusos,
conflituosos, envergonhados, preocupados com seus sintomas e história de trauma. Aqueles sem o
transtorno genuíno em geral apresentam pouca disforia quanto a esse transtorno.

5.Curso e prognóstico:
Pouco se sabe sobre o histórico natural do transtorno dissociativo de identidade não tratado.
Acredita-se que alguns indivíduos nessa situação continuem a se envolver em relacionamentos abusivos
ou subculturas violentas, ou ambos, que possam resultar no trauma de seus filhos, com o potencial de
transmissão adicional do transtorno à família. Muitos autores acreditam que uma porcentagem dos
pacientes com transtorno dissociativo de identidade não tratado ou não diagnosticado morra por suicídio
ou como resultado de seus comportamentos de alto risco.
O prognóstico é pior em pacientes com transtornos mentais orgânicos comórbidos, transtornos
psicóticos (transtorno não dissociativo de identidade, pseudopsicose), doenças clínicas graves, abuso
refratário de substâncias, transtornos alimentares, personalidade antissocial, atividade criminosa atual,
abuso contínuo e vitimização atual, com a recusa de deixar relacionamentos abusivos.
Traumas adultos repetidos com episódios recentes de transtorno de estresse agudo podem
complicar o curso clínico.

6.Tratamento:
- Psicoterapia = Para ter sucesso com o paciente que apresenta transtorno dissociativo de identidade, a
psicoterapia requer que o médico se sinta confortável com diversas intervenções psicoterapêuticas e
esteja disposto a trabalhar ativamente para estruturar o tratamento. Essas modalidades incluem

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psicoterapia psicanalítica, terapia cognitiva, terapia comportamental, hipnoterapia e uma familiaridade com
psicoterapia e com o manejo psicofarmacológico do paciente traumatizado. Conforto com tratamento
familiar e teoria de sistemas é útil ao trabalhar com um paciente que sente subjetivamente que é um
sistema complexo de identidades, com alianças, relacionamentos familiares e conflitos intragrupo.
Fundamentos em trabalho com indivíduos que apresentam transtornos de sintomas somáticos também
podem ajudar a compreender os diversos sintomas somáticos com os quais essas pessoas em geral se
apresentam;
- Terapia cognitiva = Muitas distorções cognitivas associadas com transtornos dissociativos de identidade
respondem lentamente a técnicas de terapia cognitiva, e intervenções bem-sucedidas podem levar a
disforia adicional. Um subgrupo de pacientes com transtorno dissociativo de identidade não progride além
de um tratamento de apoio a longo prazo inteiramente direcionado à estabilização de suas múltiplas
dificuldades multiaxiais. Uma vez que possam ser tratados, esses pacientes requerem um tratamento a
longo prazo com foco na contenção dos sintomas e na administração de sua disfunção geral de vida,
como seria o caso com qualquer outro paciente psiquiátrico com doença grave e persistente;
- Hipnose = As intervenções hipnoterapêuticas frequentemente podem aliviar impulsos autodestrutivos ou
reduzir sintomas, tais como flashbacks, alucinações dissociativas e experiências de influência passiva.
Ensinar auto-hipnose ao paciente pode ajudar com crises fora das sessões. A hipnose pode ser útil para
acessar estados de alter personalidades específicos e seus afetos e memórias. Ela também é empregada
para criar estados de relaxamento mental, nos quais eventos negativos podem ser examinados sem
grande ansiedade. Os médicos que utilizam a hipnose devem ser treinados em seu uso em populações
com trauma. Eles devem estar cientes das controvérsias atuais sobre o impacto da hipnose no relato
preciso das memórias e devem usar consentimento informado adequado para tal;
- Intervenções psicofarmacológicas = Os medicamentos antidepressivos costumam ser importantes na
redução da depressão e na estabilização do humor. Diversos sintomas de TEPT, sobretudo os intrusivos e
de excitabilidade aumentada, são parcialmente responsivos aos medicamentos. Os médicos relatam
algum sucesso com ISRSs, antidepressivos tricíclicos e inibidores da monoaminoxidase, β-bloqueadores,
clonidina, anticonvulsivantes e benzodiazepínicos na redução de sintomas intrusivos, excitabilidade
aumentada e ansiedade em pacientes com transtorno dissociativo de identidade. Pesquisas recentes
apontam que o α1-adrenérgico antagonista prazosina possa ser útil para pesadelos de TEPT. Relatos de
caso indicam que a agressividade pode responder a carbamazepina em alguns indivíduos se
anormalidades no EEG estiverem presentes. Pacientes com sintomas obsessivo-compulsivos podem
responder a antidepressivos com eficácia antiobsessiva. Estudos abertos relatam que a naltrexona pode
ajudar a melhorar os comportamentos recorrentes de um subconjunto de pacientes traumatizados. Os
neurolépticos atípicos (como risperidona, quetiapina, ziprasidona e olanzapina), podem ser mais efetivos e
mais bem tolerados do que os neurolépticos típicos para ansiedade extrema e sintomas intrusivos de
TEPT em pacientes com transtorno dissociativo de identidade. Algumas vezes, um paciente extremamente
desorganizado, arrasado e cronicamente doente com transtorno dissociativo de identidade que não
respondeu aos testes de outros neurolépticos responde de maneira favorável a um teste de clozapina;
- Eletroconvulsoterapia = Para alguns pacientes, a ECT ajuda a melhorar transtornos refratários do
humor sem piorar problemas dissociativos de memória. Um quadro clínico de depressão maior com
características melancólicas refratárias e persistentes ao longo de todos os estados alterados prediz uma
resposta positiva à ECT.

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7.Tratamentos adjuntos:
- Terapia em grupo = Em grupos de terapia que incluem pacientes de psiquiatria geral, o surgimento de
alter personalidades pode atrapalhar o processo do grupo ao gerar fascínio excessivo ou assustar outros
pacientes. Relata-se que os grupos de terapia compostos apenas de pacientes com transtorno dissociativo
de identidade são mais bem-sucedidos, embora os grupos devam ser cuidadosamente estruturados, ter
limites firmes e se focar, de maneira geral, nas questões mais imediatas sobre como lidar e se adaptar à
situação;
- Terapia de família = Terapias de famílias ou de casais costumam ser mais importantes para a
estabilização a longo prazo e para tratar processos familiares e conjugais patológicos que são comuns em
pacientes com transtorno dissociativo de identidade e seus familiares. A educação da família e demais
interessados sobre esse transtorno e seu tratamento pode ajudar os membros da família a lidarem de
modo mais efetivo com o transtorno e com os sintomas de TEPT em seus entes queridos. Intervenções
em grupo para educar ou apoiar familiares também oferecem benefício. A terapia sexual pode ser uma
parte importante do tratamento dos casais, porque indivíduos com o transtorno podem ficar intensamente
fóbicos de manter contato íntimo por períodos de tempo, e os cônjuges podem não ter muita ideia de como
lidar com isso de maneira produtiva;
- Grupos de mútua ajuda = Pacientes com transtorno dissociativo de identidade em geral apresentam
desfecho negativo para grupos de mútua ajuda ou grupos de 12 passos para sobreviventes de incesto.
Diversas questões problemáticas podem surgir, incluindo intensificação dos sintomas de TEPT devido à
discussão do material traumático sem salvaguardas clínicas, exploração do paciente com transtorno
dissociativo de identidade por membros predatórios, contaminação da memória do paciente por
discussões do trauma pelo grupo e um sentimento de alienação até dos outros pacientes que sofreram
trauma e dissociação;
- Terapias expressivas e ocupacionais (como a a arteterapia e a terapia de movimento) = Provaram
ser particularmente úteis no tratamento de pacientes com transtorno dissociativo de identidade. A
arteterapia pode ser usada para ajudar a conter e estruturar o transtorno dissociativo de identidade grave e

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sintomas de TEPT, assim como para permitir a esses indivíduos maneiras mais seguras de expressar
seus pensamentos, sentimentos, imagens mentais e conflitos, os quais podem ter dificuldades de
verbalizar. A terapia de movimento pode facilitar a normalização das sensações corporais e da imagem
corporal para esses pacientes gravemente traumatizados. A terapia ocupacional pode auxiliar o paciente
com atividades focadas e estruturadas que podem ser completadas com sucesso, bem como ajudar no
foco e na administração dos sintomas;
- Dessensibilização e reprocessamento por movimentos oculares (EMDR) = A EMDR foi
recentemente proposta como tratamento adjunto de TEPT. Há discordâncias na literatura quanto à
utilidade e à eficácia dessa modalidade de tratamento, e estudos publicados sobre sua eficácia são
discrepantes. As diretrizes para o tratamento dessa condição, da International Society for the Study of
Trauma and Dissociation preconizam que a EMDR só pode ser usada nessa população por médicos que
realizaram treinamento avançado de EMDR, têm conhecimento e habilidade no tratamento fásico de
trauma para transtornos dissociativos e receberam supervisão no uso de EMDR em transtorno dissociativo
de identidade.

➢ Transtorno de sintomas neurológicos funcionais (Transtorno conversivo):


O transtorno conversivo, também denominado transtorno de sintomas neurológicos funcionais, no
DSM-5, é uma doença de sintomas ou déficits que afetam funções motoras ou sensoriais voluntárias,
sugerindo outra condição clínica, mas que aparenta ser causada por fatores psicológicos, pois é precedida
por conflitos ou outros estressores. Os sintomas do transtorno conversivo não são produzidos de modo
intencional e não são causados pelo uso de substância, não estão limitados a sintomas dolorosos ou
sexuais, e o ganho é primariamente psicológico, e não social, financeiro ou legal (Tab.13.4-1).

A síndrome hoje conhecida como transtorno conversivo foi originalmente combinada com a
síndrome chamada de transtorno de somatização e foi referida como histeria, reação conversiva ou reação
dissociativa. Paul Briquet e Jean-Martin Charcot contribuíram para o desenvolvimento do conceito de
transtorno conversivoobservando a influência da hereditariedade no sintoma e a associação comum com

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um evento traumático. O termo “conversão” foi introduzido por Sigmund Freud, que, com base em seu
trabalho com Anna O, formulou a hipótese de que os sintomas do transtorno conversivo refletem conflitos
inconscientes.

• Epidemiologia:
- Alguns sintomas do transtorno conversivo que não são suficientemente graves para justificar o
diagnóstico podem ocorrer em até 1/3 da população em geral em algum momento durante suas vidas;
- As taxas reportadas desse transtorno variam de 11 em 100 mil a 300 em 100 mil em amostras da
população em geral;
- Entre populações específicas, sua ocorrência pode ser ainda mais alta, talvez fazendo dele o transtorno
de sintomas somáticos mais comum em algumas populações;
- Vários estudos reportaram que 5 a 15% das consultas psiquiátricas em um hospital geral e 25 a 30% das
internações em um hospital para veteranos de guerra envolvem pacientes com diagnóstico de transtorno
conversivo;
- A proporção de homens e mulheres entre os pacientes adultos é de pelo menos 2 para 1 até 10 para 1;
entre as crianças, é vista uma predominância ainda maior em meninas;
- Os sintomas são mais comuns no lado esquerdo do que no lado direito do corpo em mulheres;
- Mulheres que apresentam sintomas conversivos têm maior probabilidade de desenvolver posteriormente
transtorno de sintomas somáticos do que aquelas que não os tiveram;
- Existe uma associação entre transtorno conversivo e transtorno da personalidade antissocial em homens;
- Homens com transtorno conversivo com frequência estiveram envolvidos em acidentes ocupacionais ou
militares;
- O início do transtorno se dá geralmente no fim da infância até o início da idade adulta, sendo raro antes
dos 10 anos de idade ou após os 35 anos, mas já foi relatado o início na década dos 90 anos;
- Quando os sintomas sugerem um transtorno conversivo com início na meia-idade ou na velhice, a
probabilidade de uma condição neurológica ou outra condição clínica oculta é alta;
- Sintomas conversivos em crianças com menos de 10 anos costumam estar limitados a problemas com a
marcha ou convulsões;
- É mais comum entre as populações rurais, pessoas com baixo grau de instrução, com baixo quociente de
inteligência, em grupos com nível socioeconômico baixo e em militares que foram expostos a situações de
combate;
- Esse transtorno é mais comumente associado a diagnósticos comórbidos de transtorno depressivo
maior, transtornos de ansiedade e esquizofrenia e apresenta frequência aumentada em parentes de
probandos que o apresentam;
- Dados limitados sugerem que sintomas conversivos são mais observados em parentes de pessoas com
transtorno conversivo;
- Há risco aumentado de sua ocorrência gêmeos monozigóticos, mas não nos dizigóticos.

• Comorbidade:
Frequentemente ocorrem distúrbios clínicos e, sobretudo, neurológicos entre pacientes com
transtornos conversivos. O que costuma ser visto nessas condições neurológicas ou clínicas comórbidas é
uma elaboração dos sintomas provenientes da lesão orgânica original.

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Transtornos depressivos, de ansiedade e de sintomas somáticos são especialmente observados


por sua associação com o transtorno conversivo.
Transtornos da personalidade também acompanham com frequência um transtorno conversivo, em
especial o tipo histriônico (em 5 a 21% dos casos) e o tipo passivo-dependente (9 a 40% dos casos).
Entretanto, podem ocorrer transtornos conversivos em pessoas sem predisposição para um problema
clínico, neurológico ou psiquiátrico.

• Etiologia:
1.Fatores psicanalíticos:
De acordo com a teoria psicanalítica, o transtorno conversivo é causado pela repressão de um
conflito intrapsíquico inconsciente e pela conversão da ansiedade em um sintoma físico. O conflito
acontece entre um impulso instintivo (p. ex., agressão ou sexualidade) e a proibição de sua expressão.
Os sintomas possibilitam a expressão parcial do desejo ou ímpeto proibidos, mas a disfarçam, de
modo que os pacientes podem evitar o confronto consciente com seus impulsos inaceitáveis; isto é, o
sintoma do transtorno conversivo tem uma relação simbólica com o conflito inconsciente, por exemplo,
vaginismo protege a paciente de expressar desejos sexuais inaceitáveis.
Esses sintomas também permitem aos pacientes comunicarem sua necessidade de atenção e de
tratamento especiais. Os sintomas podem funcionar como um meio não verbal de controlar ou manipular
os outros.

2.Teoria da aprendizagem:
Em termos da teoria da aprendizagem condicionada, um sintoma conversivo pode ser visto como
um comportamento aprendido condicionado classicamente. Os sintomas de doença, aprendidos na
infância, são suscitados como um meio de enfrentamento de uma situação que de outra forma seria
impossível.

3.Fatores biológicos:
Cada vez mais os dados implicam fatores biológicos e neuropsicológicos no desenvolvimento de
sintomas de transtorno conversivo. Estudos preliminares de imagem cerebral encontraram
hipometabolismo do hemisfério dominante e hipermetabolismo do hemisfério não dominante e envolveram
uma comunicação prejudicada entre os hemisférios na causa desse transtorno. Os sintomas podem ser
causados por uma excitação cortical excessiva que desencadeia circuitos de retorno negativo entre o
córtex cerebral e a formação reticular do tronco encefálico. Por sua vez, níveis elevados de débito
corticofugal inibem a consciência do paciente da sensação corporal, o que pode explicar os déficits
sensoriais observados em alguns indivíduos afetados. Testes neuropsicológicos, algumas vezes, revelam
prejuízos sutis na comunicação verbal, na memória, na vigilância e na atenção, bem como incongruência
afetiva nesses pacientes.

• Diagnóstico:
O DSM-5 limita o diagnóstico de transtorno conversivo àqueles sintomas que afetam uma função
motora ou sensorial voluntária, isto é, sintomas neurológicos. Os médicos não conseguem explicar os
sintomas neurológicos unicamente com base em uma condição neurológica conhecida. O diagnóstico de
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transtorno conversivo requer que os clínicos encontrem uma associação necessária e crítica entre a causa
dos sintomas neurológicos e fatores psicológicos, embora os sintomas não possam resultar de simulação
ou transtorno factício.
O diagnóstico de transtorno conversivo também exclui sintomas de dor e disfunção sexual e
sintomas que ocorrem somente no transtorno de sintomas somáticos. O DSM-5 permite a especificação do
tipo de sintoma ou déficit visto no transtorno conversivo (por exemplo, com fraqueza ou paralisia, com
movimentos anormais ou com ataques ou convulsões).

• Quadro clínico:
Paralisia, cegueira e mutismo (recusa em falar) são os sintomas mais comuns no transtorno
conversivo. Ele pode estar mais comumente associado a transtorno da personalidade passivo-agressiva,
dependente, antissocial e histriônica. Sintomas de transtornos depressivo e de ansiedade com frequência
acompanham os sintomas do transtorno conversivo, e os pacientes afetados estão em risco de suicídio.

1.Sintomas sensoriais:
- Anestesia e parestesia são comuns, especialmente das extremidades;
- Todas as modalidades sensoriais podem estar envolvidas e a distribuição do transtorno costuma ser
incompatível com doença neurológica central ou periférica. Assim, os clínicos podem ver a característica
anestesia tipo meia-e-luva das mãos ou dos pés ou a hemianestesia do corpo começando precisamente
ao longo da linha média;
- Os sintomas envolvem os órgãos dos sentidos e podem produzir surdez, cegueira e visão de túnel.
Esses sintomas podem ser unilaterais ou bilaterais, mas a avaliação neurológica revela caminhos
sensoriais intactos. Na cegueira do transtorno conversivo, por exemplo, os pacientes circulam sem colidir
ou se machucar, suas pupilas reagem à luz e seus potenciais corticais evocados são normais.

2.Sintomas motores:
- Os sintomas motores incluem:
* Movimentos anormais.
* Distúrbio da marcha (astasia-abasia, que é uma marcha extremamente atáxica e cambaleante
acompanhada por movimentos truncais grosseiros, irregulares, movimentos espasmódicos truncais
e de balanço dos braços).
* Fraqueza.
* Paralisia.
* Tremores rítmicos grosseiros.
* Movimentos coreiformes.
* Tiques.
* Espasmos.
* Paralisia e paresia envolvendo 1, 2 ou os 4 membros, embora a distribuição dos músculos
afetados não se conforme aos caminhos neurais. Os reflexos permanecem normais. Os pacientes
não têm fasciculações ou atrofia muscular (exceto depois de paralisia conversiva de longa data).
Os achados eletromiográficos são normais.
- Os movimentos costumam piorar quando a atenção é voltada para eles;

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- Os pacientes raramente caem e, se ocorrer, geralmente não se machucam.

3.Sintomas convulsivos:
- Pseudoconvulsão é outro sintoma no transtorno conversivo. Os clínicos podem achar difícil diferenciar
uma pseudoconvulsão de uma verdadeira convulsão por meio da observação clínica isolada. Além do
mais, aproximadamente 1/3 das pseudoconvulsões também tem um transtorno epiléptico coexistente.
Morder a língua, incontinência urinária e lesões após uma queda podem ocorrer em pseudoconvulsões,
embora esses sintomas em geral não estejam presentes;
- O reflexo pupilar e o reflexo de mordedura são mantidos após uma pseudoconvulsão, e os pacientes não
têm aumento de prolactina pós-convulsão.

4.Outras características associadas:


Vários sintomas psicológicos também foram associados ao transtorno conversivo.
- Ganho primário = Os pacientes obtêm ganho primário ao manter os conflitos internos fora de sua
consciência. Os sintomas têm valor simbólico. Representam um conflito psicológico inconsciente;
- Ganho secundário = Os pacientes acumulam vantagens e benefícios tangíveis como resultado de
estarem doentes, por exemplo, ser dispensado de obrigações e situações vitais difíceis, recebendo apoio e
assistência que de outra forma não estariam disponíveis e controlando o comportamento de outras
pessoas;
- La belle indifférence = É uma atitude inapropriadamente arrogante de um paciente em relação a
sintomas graves, isto é, ele parece estar despreocupado com o que parece ser um prejuízo importante. A
indiferença branda também é vista em alguns pacientes médicos com doença grave que desenvolvem
uma atitude estoica. A presença ou ausência de la belle indifférence não é patognomônica de transtorno
conversivo, mas com frequência está associada à condição;
- Identificação = Pacientes com transtorno conversivo podem moldar seus sintomas de forma
inconsciente conforme os de alguém importante para eles. Por exemplo, um genitor ou uma pessoa que
morreu recentemente podem servir como modelo para um transtorno conversivo. Durante a reação de luto
patológico, as pessoas enlutadas costumam ter sintomas do morto.

• Diagnóstico diferencial (DDx):


Um dos problemas principais no diagnóstico do transtorno conversivo é a dificuldade de descartar
definitivamente uma condição clínica. Problemas médicos não psiquiátricos concomitantes são comuns em
pacientes hospitalizados com transtorno conversivo, e evidências de um distúrbio neurológico atual ou
prévio ou uma doença sistêmica que afete o cérebro foram reportados em 18 a 64% desses pacientes.
Estima-se que 25 a 50% dos indivíduos classificados com transtorno conversivo acabem recebendo
diagnósticos de problemas médicos neurológicos ou não psiquiátricos que poderiam ter causado seus
primeiros sintomas. Dessa forma, é essencial uma avaliação clínica e neurológica minuciosas em todos os
casos. Se puderem ser resolvidos por meio de sugestão, hipnose ou amobarbital parenteral ou lorazepam,
os sintomas provavelmente são o resultado de transtorno conversivo.
Distúrbios neurológicos (p. ex., demência e outras doenças degenerativas), tumores cerebrais e
doença dos gânglios da base devem ser considerados no diagnóstico diferencial, por exemplo:

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- Fraqueza pode ser confundida com miastenia grave, polimiosite, miopatias adquiridas ou esclerose
múltipla;
- Neurite óptica pode ser diagnosticada erroneamente como cegueira relacionada a transtorno conversivo.

Outras doenças que podem causar confusão nos sintomas são a síndrome de Guillain-Barré, a
doença de Creutzfeldt-Jakob, a paralisia periódica e as manifestações neurológicas precoces da AIDS.
Ocorrem sintomas de transtorno conversivo na esquizofrenia e em transtornos depressivos e de
ansiedade, porém esses outros transtornos estão associados a seus próprios sintomas distintos que, por
fim, possibilitam o diagnóstico diferencial.
Sintomas sensório-motores também ocorrem no transtorno de sintomas somáticos, mas ele é uma
doença crônica que começa no início da vida e inclui sintomas em muitos outros sistemas orgânicos. Na
hipocondria, as pessoas não têm perda real ou distorção da função. As queixas somáticas são crônicas e
não estão limitadas aos sintomas neurológicos, e as atitudes e crenças hipocondríacas características
estão presentes. Se os sintomas do indivíduo estiverem limitados à dor, pode ser diagnosticado transtorno
doloroso. Pacientes cujas queixas estão limitadas à função sexual são classificados com uma disfunção
sexual em vez de com transtorno conversivo.
Na simulação e no transtorno factício, os sintomas estão sob o controle voluntário consciente. A
história de um simulador é, em geral, mais inconsistente e contraditória do que a de um paciente com
transtorno conversivo, e o comportamento fraudulento simulador é claramente direcionado para o objetivo.
A Tabela 13.4-2 lista exemplos de testes importantes que são relevantes para sintomas de
transtorno conversivo.

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• Curso e prognóstico:
- O surgimento do transtorno conversivo costuma ser agudo, mas a sintomatologia também pode ir se
manifestando em um crescendo;
- Os sintomas ou déficits são, em geral, de curta duração;
- Cerca de 95% dos casos agudos têm remissão espontânea, geralmente em 2 semanas em pacientes
hospitalizados;
- Se os sintomas estão presentes há 6 meses ou mais, o prognóstico para sua resolução é menos do que
50% e vai diminuindo conforme o tempo que estiverem presentes;
- Ocorre recorrência em 1/5 a 1/4 das pessoas no espaço de 1 ano do episódio. Assim, um episódio é um
preditor de episódios futuros;
- Bom prognóstico = É esperado se houver início agudo, presença de estressores claramente
identificáveis na época do início, intervalo curto entre o início e a instituição do tratamento, inteligência
acima da média, paralisia, afonia e cegueira;
- Mau prognóstico = Tremor e convulsões.

• Tratamento:
A resolução do sintoma do transtorno conversivo é, em geral, espontânea, embora provavelmente
seja facilitada por terapia de apoio orientada para o insight ou terapia comportamental. A característica
mais importante da terapia é uma relação com um terapeuta atencioso e confiável.
Com pacientes resistentes à ideia de psicoterapia, os médicos podem sugerir que esta se
concentre nos temas de estresse e enfrentamento. Dizer a esses pacientes que seus sintomas são
imaginários com frequência os faz piorar.
Hipnose, ansiolíticos e exercícios de relaxamento corporal são eficazes em alguns casos.
Amobarbital ou lorazepam parenteral podem ser úteis na obtenção de informações adicionais da história,
sobretudo quando o indivíduo recentemente vivenciou um evento traumático.
As abordagens psicodinâmicas incluem psicanálise e psicoterapia orientada para o insight, nas
quais os pacientes exploram conflitos intrapsíquicos e o simbolismo dos sintomas do transtorno
conversivo. Formas breves e diretas de psicoterapia de curta duração também já foram usadas para tratar
o transtorno. Quanto mais longa a duração do papel de doente desses pacientes e quanto mais
regrediram, mais difícil será o tratamento.

Objetivo 2:

➢ Crises epilépticas:
*** Estudar pelo livro Semiologia Neurológica – Unicamp – Semiologia das Síndromes Epilépticas
(Capítulo 21). ***

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Objetivo 3:

➢ Distúrbios da ventilação:
No indivíduo sadio o nível arterial de dióxido de carbono (PaCO2) é mantido entre 37 e 43 mmHg
ao nível do mar. Todos os distúrbios de ventilação resultam em alteração nas medições da PaCO2.
As doenças que alteram VCO2 frequentem ente são agudas (sepse, queimadura ou pirexia, por
exemplo). Os distúrbios ventilatórios crônicos envolvem caracteristicamente níveis insuficientes de
ventilação minuto ou aumento na fração de espaço morto. A caracterização desses distúrbios requer a
revisão do ciclo respiratório normal.
O ciclo espontâneo alternando inspiração e expiração é automaticamente gerado no tronco
encefálico. Há 2 grupos de neurônios importantes localizados no interior do bulbo:
- Grupo respiratório dorsal (GRD);
- Coluna respiratória ventral (CRV).

Esses neurônios apresentam projeções amplas, incluindo aquelas descendentes pela medula
espinal contralateral, onde realizam várias funções. Elas iniciam a atividade no nervo frênico/diafragma,
projetam-se aos grupos musculares nas vias respiratórias superiores e neurônios medulares respiratórios
e inervam os músculos intercostais e abdominais que participam da respiração normal.
O GRD atua com o ponto inicial de integração para muitos nervos aferentes trazendo informações
sobre pressão parcial de oxigênio arterial (PaO2), PaCO2, pH e pressão arterial de quimiorreceptores e
barorreceptores (localizados nas artérias carótidas e aorta) para o SNC. Além disso, o nervo vago leva
informações de receptores de estiramento e receptores justacapilares pulmonares (no parênquima
pulmonar) e na parede torácica para o GRD. O ritmo respiratório é gerado dentro do CRV, assim como no
grupo respiratório parafacial (GRpF) localizado em posição mais a frente, particularmente importante para
a geração da expiração ativa.
Uma área especialmente importante dentro do CRV é o assim chamado com plexo pré-Botzinger.
Essa área é responsável pela geração de várias formas de atividade inspiratória, e a lesão do complexo
pré-Botzinger leva à total cessação da respiração. A emissão (output) neural dessas redes bulbares da
respiração pode ser voluntariam ente suprimida ou aumentada por impulso (input) de centros cerebrais
mais altos e pelo sistema nervoso autônomo. Durante o sono normal observa-se atenuação da resposta à
hipercapnia e à hipoxemia resultando em leve hipoventilação noturna que se corrige com o despertar.
Uma vez que o input neural tenha sido transmitido às bombas musculares da respiração, a troca
normal de gases requer força muscular suficiente dos músculos respiratórios para vencer as cargas
elástica e de resistência do sistema respiratório. Nos indivíduos sadios, a força dos músculos respiratórios
vence facilmente, e a respiração normal se mantém indefinidamente. A redução do impulso respiratório ou
da competência neuromuscular ou, ainda, o aumento substancial da carga respiratória podem reduzir a
ventilação minuto, resultando em hipercapnia (Fig. 264-IB). Alternativamente, se a força dos músculos
respiratórios for normal e houver aumento do impulso respiratório, haverá hiperventilação alveolar levando
à hipocapnia (Fig. 264-IC).

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• Hipoventilação:
1.Quadro clínico:
As doenças que reduzem a ventilação minuto ou aumentam o espaço morto podem ser
classificadas em 4 categorias principais:
- Doenças do parênquima pulmonar e da parede torácica;
- Distúrbios respiratórios do sono;
- Doenças neuromusculares;
- Distúrbios do impulso respiratório.

As manifestações clínicas das síndromes de hipoventilação são inespecíficas (Tabela 264-1) e


variam em função de gravidade da hipoventilação, velocidade com que se desenvolve a hipercapnia, e
distúrbio subjacente.
Pacientes com doença de parênquima pulmonar ou de parede torácica se apresentam com
encurtamento da respiração e menor tolerância aos exercícios. Episódios de aumento de dispneia com

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aumento na produção de escarro indicam doenças pulmonares de padrão obstrutivo (como a DPOC),
enquanto dispneia progressiva e tosse são comuns nas doenças intersticiais pulmonares.
Sonolência excessiva durante o dia, sono de má qualidade e roncos durante o sono são comuns
entre os pacientes com distúrbios respiratórios do sono. Distúrbios do sono e ortopneia também são
descritos nas doenças neuromusculares.
À medida que aumenta a fraqueza neuromuscular, os músculos respiratórios (incluindo o
diafragma) ficam em desvantagem mecânica quando o paciente se encontra em posição supina
considerando o deslocamento para cima do conteúdo abdominal. A ortopneia recente é sinal de redução
na força dos músculos respiratórios. Contudo, nas doenças neuromusculares (como esclerose lateral
amiotrófica [ELA] ou distrofia muscular), é mais com um que a perda de força nos membros e os sintomas
bulbares surjam antes dos distúrbios do sono. Os pacientes com distúrbios do impulso respiratório não
apresentam sintomas distintivos de outras causas de hipoventilação crônica.
A evolução clínica dos pacientes com hipoventilação crônica causada por doença neuromuscular
ou da parede torácica tem um a sequência característica: há um estágio assintomático no qual a PaO2 e a
PaCO2 diurnas são normais e seguidas por hipoventilação noturna (inicialmente durante a fase de sono
REM e posteriormente no sono não REM). Finalmente, se a capacidade vital cai ainda mais, ocorre
hipercapnia diurna. Os sintomas podem surgir em qualquer ponto dessa progressão e frequentemente
dependem da velocidade de declínio da função dos músculos respiratórios. Independentemente da causa,
a marca de todas as síndromes de hipoventilação é aumento na PCO2 alveolar (PaCO2) e, portanto, da
PaCO2. A acidose respiratória resultante leva a aumento compensatório na concentração plasmática de
bicarbonato. O aumento na PaCO2 resulta em redução obrigatória da PaO2, frequentemente levando a
hipoxemia. Se for intensa, a hipoxemia manifesta-se clinicamente na forma de cianose podendo estimular
eritropoiese e, desta forma, induzir eritrocitose secundária. A combinação de hipoxemia crônica e
hipercapnia também pode induzir vasoconstrição pulmonar levando finalmente a hipertensão pulmonar,
hipertrofia ventricular direita e insuficiência cardíaca direita.

2.Diagnóstico:
Na ausência de depleção de volume a elevação do bicarbonato plasmático sugere hipoventilação.
A gasometria arterial revelando aumento da PaCO2 com pH normal confirma o diagnóstico de
hipoventilação alveolar crônica.
A investigação subsequente para identificar a etiologia deve inicialmente se concentrar em
determinar se o paciente é portador de doença pulmonar ou de alguma anormalidade de parede torácica.
Exame físico, estudos de imagens (radiografia e/ou TC do tórax) e provas de função pulmonar são
suficientes para identificar a maioria dos distúrbios de pulmão/tórax que levam à hipercapnia. Se esses
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exames não forem conclusivos, o médico deve proceder ao rastreamento para apneia obstrutiva do sono
(AOS), o distúrbio do sono que mais frequentemente leva à hipoventilação crônica. Diversos instrumentos
de rastreamento foram desenvolvidos para identificar os pacientes em risco para AOS. O Questionário de
Berlin foi validado em ambiente de atenção primária e identifica pacientes com probabilidade alta de AOS.
O Epworth Sleepiness Scale (ESS) e o questionário STOP-Bang não foram validados em cenário
ambulatorial de atenção primária, mas são rápidos e fáceis de usar. No ESS mede-se a sonolência diurna,
sendo que pontuações > 10 identificam os indivíduos com indicação de investigação complementar. O
questionário STOP-Bang foi usado em período pré-operatório para identificar pacientes em risco para
AOS. Nessa população, sua sensibilidade foi de 93% com valor preditivo negativo de 90%.
Se o aparato ventilatório (pulmões, vias respiratórias, parede torácica) não for responsável pela
hipercapnia crônica, o foco deve ser deslocado para o impulso respiratório e os distúrbios
neuromusculares:
- Nos distúrbios do impulso respiratórios observa-se aumento atenuado da ventilação minuto em resposta
à elevação do CO ou à redução no O2. Essas doenças são difíceis de diagnosticar e devem ser suspeitas
quando pacientes com hipercapnia demonstrem força normal da musculatura respiratória, função
pulmonar normal e diferença normal entre PO2 alveolar/arterial. A hipoventilação é maior durante o sono
nos pacientes com falha no impulso respiratório e a polissonografia frequentem ente revela apneia,
hipopneia ou hipoventilação de origem central. A aquisição de imagem do encéfalo (TC ou RM) algumas
vezes identifica anormalidades estruturais na ponte ou no bulbo que resultam em hipoventilação. Uso
crônico de narcóticos ou hipotireoidismo significativo também podem deprimir o impulso respiratório central
levando à hipercapnia;
- A fraqueza dos músculos respiratórios deve ser profunda para que haja comprometimento dos volumes
pulmonares com evolução para hipercapnia. Normalmente, o exame físico revela redução de força nos
principais grupos musculares antes que haja hipercapnia. As pressões inspiratória e expiratória máximas
ou a capacidade vital forçada são medidas que podem ser usadas para monitorar o envolvimento dos
músculos respiratórios nas doenças com fraqueza muscular progressiva. Esses pacientes também
apresentam risco aumentado de distúrbios respiratórios do sono (incluindo hipopneia, apneias central e
obstrutiva, e hipoxemia). A oximetria noturna e a polissonografia são úteis para mais bem caracterizar os
distúrbios do sono nessa população de pacientes.

3.Tratamento:
A ventilação com pressão positiva não invasiva (VPNI) noturna tem sido usada com sucesso no
tratamento de hipoventilação e das apneias, tanto central quanto obstrutiva, em pacientes com distúrbios
neuromusculares e da parede torácica. Demonstrou-se que a VPNI noturna é capaz de melhorar a
hipercapnia diurna, prolongar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida relacionada com a saúde, nos
casos em que há comprovação de hipercapnia diurna. As diretrizes da ALS recomendam VPNI noturna se
houver sintomas de hipoventilação + 1 dos seguintes critérios estiver presente:
- PaCO2 ≥ 45 mmHg;
- Oximetria noturna demonstrando saturação de oxigênio < 88% por 5 minutos consecutivos;
- Pressão inspiratória máxima < 60 cm H2O;
- CVF < 50% do valor predito.

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Contudo, no momento as evidências são inconclusivas para indicar VPNI noturna preventiva em
todos os pacientes com distúrbio neuromuscular e da parede torácica que apresentem hipercapnia
noturna, mas não diurna. De qualquer forma, em algum momento haverá indicação para instituir suporte
ventilatório em tempo integral, regulado por pressão ou volume, nos pacientes com distúrbios
neuromusculares progressivos. Há menos evidências para direcionar a melhor oportunidade dessa
decisão, mas insuficiência ventilatória com necessidade de ventilação mecânica e infecções pulmonares
relacionadas com tosse ineficaz são indicadores frequentes para a necessidade de instituição de suporte
ventilatório contínuo.
O tratamento da hipoventilação crônica por doenças pulmonares ou neuromusculares deve ser
direcionado ao distúrbio subjacente. Agentes farmacológicos que estimulam a respiração (como
medroxiprogesterona e acetazolamida), foram pouco estudados na hipoventilação crônica e não devem
substituir o tratamento do processo de doença subjacente.
Independentemente da causa, a alcalose metabólica excessiva deve ser corrigida, uma vez que
níveis plasmáticos de bicarbonato elevados desproporcionalmente ao grau de acidose respiratória crônica
podem resultar em hipoventilação adicional.
Quando indicada, a administração de oxigênio suplementar é efetiva para atenuar hipóxia,
policitemia e hipertensão pulmonar.
A estimulação do nervo frênico ou do diafragma é um a terapêutica potencial para pacientes com
hipoventilação causada por lesões medulares cervicais altas ou por distúrbios do impulso respiratório.
Antes do implante cirúrgico, os pacientes devem realizar estudos da condução nervosa para assegurar o
funcionamento bilateral do nervo frênico. Estudos de casos em pequenas séries sugerem que a
estimulação efetiva do diafragma é capaz de melhorar a qualidade de vida desses pacientes.

• Hiperventilação:
1.Quadro clínico:
Define-se hiperventilação como ventilação além das necessidades metabólicas (produção de CO2)
levando à redução na PaCO2. A fisiologia dos pacientes com hiperventilação crônica não está bem
compreendida, e não há uma apresentação clínica característica.
Os sintomas incluem dispneia, parestesias, tetania, cefaleia, tontura, distúrbios visuais e dor
torácica atípica. Exatamente pela diversidade dos sintomas, os pacientes portadores de hiperventilação
crônica se apresentam a diversos profissionais de saúde, incluindo clínicos gerais, neurologistas,
psicólogos, psiquiatras e pneumologistas.
É útil pensar na hiperventilação como tendo fatores desencadeantes e mantenedores. Alguns
pesquisadores acreditam que um evento inicial leve ao aumento da ventilação alveolar com queda na
PaCO2 a ~ 20 mmHg, o que desencadearia a instalação alarmante de dor torácica, falta de ar e parestesia
ou alteração no nível de consciência.
O aumento resultante na ventilação minuto para aliviar esses sintomas agudos serve apenas para
agravar os sintomas que, com frequência, são erroneamente atribuídos pelo paciente e pelo profissional
de saúde a algum distúrbio cardiopulmonar. A investigação inconclusiva da causa desses sintomas muitas
vezes resulta em pacientes ansiosos e temerosos de outras crises.

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É importante ressaltar que os transtornos de ansiedade e crises de pânico NÃO são sinônimos de
hiperventilação. A ansiedade pode ser fator desencadeante e mantenedor na patogênese da
hiperventilação crônica, mas não é obrigatória para o desenvolvimento de hipocapnia crônica.

2.Diagnóstico:
A associação de sintomas respiratórios e hiperventilação aguda pode ser a manifestação inicial de
doenças sistêmicas (como cetoacidose diabética).
Há necessidade de excluir as causas agudas de hiperventilação antes de firmar o diagnóstico de
hiperventilação crônica. Para confirmação de hiperventilação crônica a gasometria arterial deve revelar
alcalose respiratória compensada (pH próximo do normal, PaCO2 baixa e redução do bicarbonato
calculado). Será necessário diagnosticar e tratar outras causas de alcalose respiratória (como asma leve)
antes de se considerar o diagnóstico de hiperventilação crônica. Deve-se manter alto índice de suspeita
uma vez que pode ser difícil perceber aumento da ventilação minuto no exame físico. Uma vez instalada a
hiperventilação crônica, a manutenção de elevação de 10% na ventilação alveolar será suficiente para
perpetuar a hipocapnia. Esse aumento na ventilação pode ser obtido com alterações sutis no padrão
respiratório, como suspiros ocasionais ou bocejos duas a três vezes por minuto.

3.Tratamento:
Há poucos estudos bem controlados sobre tratamento de hiperventilação crônica considerando
suas características diversas e falta de processo diagnóstico universalmente aceito. Os médicos com
frequência gastam muito tempo identificando os fatores desencadeantes, excluindo diagnósticos
alternativos e conversando com os pacientes sobre suas preocupações e temores. Em alguns casos, um
discurso tranquilizador e um a discussão franca sobre hiperventilação podem ser libertadores.
A identificação e eliminação de hábitos que perpetuem a hipocapnia, (como bocejos frequentes ou
suspiros profundos), podem ajudar. Há algumas evidências a sugerir que exercícios respiratórios e
condicionamento do diafragma podem ser benéficos para alguns pacientes.
As evidências corroborando tratamento farmacológico de pacientes com hiperventilação são
escassas. Os betabloqueadores podem ser úteis àqueles com sintomas de mediação simpática (como
palpitações e tremores).

• Referências:
- Compêndio de Psiquiatria – Kaplan;
- Semiologia Neurológica – Unicamp;
- Medicina Interna – Harrison.

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