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Júlia Loren dos Santos Mestre em Psicologia Social. Universidade Federal de São João
Rodrigues del-Rei (UFSJ) – Brasil. julialoren12@hotmail.com.
Marcelo Dalla Vecchia Doutor em Saúde Coletiva. Universidade Federal de São João
del-Rei (UFSJ) – Brasil. mdvecchia@ufsj.edu.br.
Bento Selau Doutor em Educação. Universidade Federal do Pampa
(Unipampa) – Brasil. bentojunior@unipampa.edu.br.
Resumo: A demanda por uma “educação para morte” perpassa os debates científicos e demonstra as
dificuldades que permanecem existindo para efetivação desse projeto que é simultaneamente educativo e de
promoção e cuidado à saúde. A revisão de estudos que investigam sobre a inserção desse tópico nos currículos
universitários de cursos destinados à formação de profissionais da saúde refletem a contradição existente entre a
presença de uma demanda social de aprendizagem sobre a morte em uma cultura que escolhe negar sua realidade
e desdobramentos. Considerando esses fatos, objetiva-se refletir neste trabalho sobre a proposta de uma
“educação para a morte” a partir dos pressupostos vigotskianos sobre a psicologia da arte e educação estética,
admitindo a arte como recurso de mediação para o diálogo e tomada de consciência sobre a morte e o morrer. O
estudo desenvolvido é teórico-analítico e os resultados deste trabalho compreendem: (1) uma elucidação dos
fundamentos artísticos em Vigostski, bem como a análise da reação estética e sua função; (2) descrição
conceitual e atuais propostas interventivas de “educação para a morte”; e (3) finaliza-se apresentando uma
proposta de “educação para a morte” que utiliza a arte como recurso mediador. O estudo desenvolvido desvela a
potência da articulação entre arte e “educação para a morte”, ao passo que, também, indica a necessidade de
aprofundamento nos campos teórico-práticos que objetivam articula-las.
Palavras-chave: Psicologia da Arte; Reação Estética; Vigotski; Educação para a Morte; Psicologia Histórico-
Cultural.
Abstract: The demand for a “Death Education” permeates the scientific debates and demonstrates the
difficulties that still exist to carry out this project, which is both educational and health promotion and
healthcare. The review of studies that investigate the insertion of this topic in university curricula of courses
focused on the training of health professionals reflects the contradiction that exists between the presence of a
social demand for learning about death in a culture that chooses to deny its reality and developments.
Considering these facts, the objective of this work is to reflect on the proposal for a death education based on
Vigotski Psychology of Art and aesthetic response, taking art as a mediation resource for dialogue and awareness
of death and to die. The developed study is theoretical and analytical and the results of this work comprise: (1)
an elucidation of the artistic foundations in Vigostski, as well as the analysis of the aesthetic response and its
function; (2) conceptual description and current intervention proposals for “Death Education”; and (3) it ends
with a proposal for death education that uses art as a mediating resource. The study developed reveals the power
of the articulation between art and “Death Education”, while it also indicates the need for further study in the
theoretical and practical fields that aim to articulate them.
Keywords: Psychology of Art; Aesthetic Response; Vigotski; Death Education; Historical-Cultural Psychology.
Resumen: La demanda por una “educación para la muerte” atraviesa los debates científicos y demuestra las
dificultades que aún existen para la aplicación de ese proyecto que es simultáneamente educativo y de
promoción al cuidado de la salud. La revisión de estudios que investigan sobre la inserción de ese tópico en los
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II CONFERÊNCIA DE TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL:
CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
1 Introdução
se como algo que, ainda que adiada pelo uso de medicamentos e cuidados com a saúde
no estudo acerca da morte e do morrer junto a pacientes em fase final de vida, cita que,
“quanto mais avançamos na ciência, mais parece que tememos e negamos a realidade da
morte” (p. 11). A morte permanece como aquilo que é fundamentalmente negado, apesar de
ser invariavelmente real, sendo que os diálogos e contatos cotidianos com situações e temas
sobre a morte estão marcados pelo eufemismo e, principalmente, pelo ocultamento da dor.
agravam o sofrimento e produzem um modo de lidar com o limite da vida que “obriga aos
doentes sofrerem às escondidas e aos que assistem a um discreto e sofrido trabalho” (Pitta,
2016, p. 38). Samuel (2018) argumenta que os maiores prejuízos associados a perda de
alguém não estão relacionados à ausência e às modificações requeridas no cotidiano, mas sim
a recusa de encarar a dor associada à perda. Dada essa realidade, requer-se analisar como
nosso modo de organizar a morte se manifesta no cenário cultural que está, portanto,
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II CONFERÊNCIA DE TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL:
CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
dois aspectos fundamentais: uma forma de negar a morte em decorrência de todo o resultado
inquietante e doloroso que permeia essa vivência e outra que diz sobre as formas políticas de
organização da morte.
que encará-la se refaz como um desafio à humanidade desde os mais antigos relatos. Os
2016) e, apesar de não serem hoje a única resposta possível frente à morte, estão presentes em
muitos discursos cotidianos que enquadram a morte como uma “vilã” (Costa & Lima, 2005)1.
Considerar as dimensões sociais da morte, por outra via, implica analisar que em uma
sociedade estruturada pela desigualdade social, o morrer não está restrito às causas naturais,
mas violentamente se expressa como resultante da atribuição de vidas que valem a pena ser
mantidas e outras que se tornam números, assumindo a concepção de uma morte que pode ser
também, um fenômeno socialmente administrado, uma forma de manejo político (Kind &
Cordeiro, 2014). Como manejo político, a morte aparece em discursos com o significado de
fatalidade – que é incontrolável –, enquanto na prática seleciona-se quais vidas serão mantidas
e quais serão negadas. Tal argumentação sugere retirar do gestor público qualquer tipo de
presidente do Brasil, Jair M. Bolsonaro, afirmou que “[i]nfelizmente algumas mortes terão.
Paciência, acontece, e vamos tocar o barco” (Lindner & Turelli, 2020, grifos das autoras); Em
sintonia com o brasileiro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse que “[e]stão
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Nos contextos da atuação profissional em saúde, sobretudo na prática médica, a morte é sentida como um
fracasso (Souza & Conceição, 2018; Borges & Mendes, 2012), como pode ser exemplificado pela fala de um
participante da pesquisa de Melo, Bevilacqua & Barletto (2013) que afirma: “Infelizmente nós não somos
preparados pra falar sobre a morte. Nós somos preparados pra curar, pra salvar vidas. A morte é quando não dá
certo. Como lidar com o fracasso? Ninguém ensina pro médico a lidar com isso. É muito frustrante. É difícil
falar. É curto o tempo destinado a tratar sobre a morte. [...] na verdade nem sempre é muito bem abordado, isso
na faculdade [...]” (p. 1228).
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CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
caráter mais desumano da vida em coletividade: a morte se torna maquiada por um discurso
pessoas pobres, negras, mulheres, trabalhadores informais, ou seja, pessoas que se situam à
margem de uma sociedade regida pelo capital (Kind & Cordeiro, 2020).
natural, não podem ser dissociados da realidade de vidas que se esgotam por não serem
reconhecidas como vidas dignas, mas precárias, e, por isso, negadas. Desse modo, ocorre,
também, outra forma de negação que é anterior morte de fato quando se atribui, pelo viés da
Considerando essa breve recuperação sobre a dinâmica das reações psíquicas e manejo
científico que se faz, em toda sua extensão, por um movimento dialético, ao passo que acessa
o aparente em direção ao concreto pensado. Com base nessa premissa, objetiva-se refletir
neste trabalho sobre a proposta de uma “educação para a morte” a partir dos pressupostos
vigotskianos sobre a psicologia da arte e educação estética, admitindo a arte como recurso de
“educação para a morte” (Kovács, 2005; Nucci, 2018), recorre-se à arte como instrumento de
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CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
mediação do contato com o real da morte. Uma mediação perpassada pela criatividade e que,
A iniciativa de propor uma “educação para a morte” a partir da arte, portanto, não está
direcionada pela falsa pretensão de doutrinar um sentido, uma vivência, uma percepção que
pode ser anteriormente formatada e, assim, psicologicamente coordenada para apreensão das
O contato com a arte produz transformação, não replica o real, mas acessa-o de outro
modo e solicita o contato com as emoções despertadas ao deparar-se com o material artístico e
resultados: (1) uma breve revisão teórica acerca da psicologia da arte e análise da reação
estética em Vigotski (1999; 2003); (2) descrição conceitual da proposta de uma “educação
proposta de “educação para a morte” que assuma a arte como um instrumento de mediação
para refletir e posicionar-se frente a finitude humana que é natural, mas também política e
social.
2 Metodologia
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CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
momento, foi realizada uma análise derivada da articulação entre os conteúdos teóricos
descritos na primeira etapa da pesquisa e a transposição desses para uma busca de uma
Psicologia da Arte, amparada nos pressupostos vigotskianos, que viabilize uma nova forma de
Acerca dos textos selecionados para compor o escopo científico que tornariam
problema psicológico da arte”; “A arte como catarse”; “Psicologia da Arte”; e “Arte e Vida”,
presentes no livro “Psicologia da Arte” (Vigotski, 1999); além desses, também incluiu-se o
texto “A Educação Estética” (Vigotski, 2003), considerando sua importância tanto para a
(2005) sobre a promoção de um ato educativo frente a realidade da finitude humana. Não foi
selecionado para isso um escopo de obras específicas, mas admitiu-se como pressuposto
básico o levantamento de textos que evidenciam conceitos-chave para este campo como: os
uma apresentação das duas temáticas fundamentais que foram supracitadas, bem como,
demonstrar relatos de pesquisas que objetivaram incluir a arte como forma de acesso e
registros de estudos que, com base nos pressupostos vigotskianos estruturaram projetos de
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intervenção pela arte, para que, assim, possamos articular novas formas, centradas nas
3 Resultados e Discussão
Arte”. Nesta obra, Vigotski realiza formulações teóricas e ensaios de análise do material
artístico e sua reação estética. Em 1926, foi publicado o livro “Psicologia Pedagógica”, no
principais erros presentes no ensino da apreciação estética da arte no contexto escolar, bem
como são enunciados pressupostos para a efetivação de uma educação para apreciação da arte.
para que se tornasse exequível o exame de um material artístico, considerando sua reação
passando pela análise funcional dos seus elementos e da estrutura, para a recriação da resposta
estética e o estabelecimento das suas leis gerais” (p. 27). Desse modo, conceitua a admissão
da própria obra de arte como objeto de análise da psicologia da arte, sem que seja necessário
recorrer ao espectador ou ao autor para que se compreenda os fundamentos que dão forma a
obra. Compreende a obra de arte como síntese dialética entre conteúdo e forma, ao passo que,
enquanto se estrutura de um modo técnico, também retrata o social de um modo criativo e que
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escapa a reprodução do real. Assume, por essa via, que “a arte é a mais importante
meio de equilibrar o homem com o mundo nos momentos mais críticos e responsáveis da
dialética que orienta a análise da reação estética em Vigotski. Para o referido autor, o
conteúdo é a aquilo que temos de mais próximo ao real, ao factível: “tudo o que o poeta usou
como já pronto – relações do dia-a-dia, histórias, casos, o ambiente, os caracteres, tudo que
existia antes da narração e pode existir fora e independente dela” (Vigotski, 1999, p. 177). Já
sentido exato do termo (...) [é] um princípio ativo de elaboração e superação do material em
suas qualidades mais triviais e elementares” (Vigotski, 1999, p. 177; 178). Partindo dessas
Segundo Vigotski (1999, p. 270) “a lei da reação estética é uma só: encerra em si a
emoção que se desenvolve em dois sentidos opostos e encontra sua destruição no ponto
culminante, como uma espécie de curto-circuito”, sendo que a partir desse ponto de destruição
(síntese dialética – negação da negação entre forma e conteúdo) manifesta-se a catarse. Essa
oposição entre os dois elementos essenciais da arte (forma e conteúdo) pode ser manifesta
pelo ritmo que produz um efeito contrário ao conteúdo, pela alteração da disposição das
palavras2, para citar alguns exemplos, mas que, em tese, demonstra-se como um “efeito
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Vigotski (1999) retrata diferentes exemplos sobre essa destruição do conteúdo pela forma e sobre como isso
pode ser organizado no material artístico. Um belo exemplo apresentado no “Psicologia da Arte” que estabelece
diálogo com o tema fundamental deste artigo é a análise do poema de Púchkin denominado “Se vago por ruas
ruidosas” (p. 278). Vigotski esclarece que “o poema se baseia na fusão de duas oposições extremas – vida e
morte: cada estrofe nos revela essa contradição, e esta posteriormente refrata de modo infinito essas duas ideias
numa e noutra direção” (p. 279). Na última estrofe, manifesta segundo Vigotski a catarse, pois nela “a vida
jovem suscita em toda parte a imagem da morte, aqui é a vida jovem que brinca à entrada da sepultura” (p. 279).
Para ampliar os recursos de compreensão do exemplo, apresenta-se a última estrofe do poema supracitado: And
let it be, beside the grave's vault / That young life forever will be playing, / And impartial, indifferent nature /
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diametralmente oposto àquele suscitado pelo objeto do seu conto” (Vigotski, 1999, p. 272).
Portanto, é precisamente nesta oposição que a catarse se realiza, sendo que esta não se
apresenta como uma finalização, esclarecimento ou acalento aos aflitos que se refugiam na
arte, mas sim como contradição que suscita a vivência de emoções reais que requerem uma
vazão para além da manifestação externa, visto que busca uma resolução no campo da
imaginação; nas palavras do próprio Vigotski (1999), a catarse é o traço essencial da reação
Vigotski (2003) aponta que “ (...) na arte, a realidade está sempre tão transformada e
modificada que não é possível fazer uma transferência direta do significado dos fenômenos da
arte para os da vida” (p. 228), embora deve-se considerar que atua como um “sentimento
social prolongado” ou uma “técnica de sentimento” (Vigotski, 1999, p. 308) e, por isso, toda
vivência que se realiza a partir do contato com o material artístico é regulada pela “lei da
realidade emocional da fantasia” (Vigotski, 2003, p. 242). Essa lei define que apesar da arte
esforços concretos ao leitor que se dispõe a apreciar o material artístico; todavia, esses
esforços não implicam em manifestações externas, uma vez que “as emoções da arte são
Ao falar sobre a apreciação da arte, entende-se que se retrata uma atividade. Ação esta
que se realiza no ser humano em um contexto histórico-cultural e que, portanto, está mediada
por um conjunto de significações e é exercida por meio das funções psicológicas superiores.
Nesse ponto, torna-se importante ressaltar que tais funções são desenvolvidas considerando
Eternally be shining in beauty [E deixe estar, ao lado do cofre da sepultura / Que a vida jovem para sempre
estará brincando /E a imparcial e indiferente natureza/ Eternamente estará brilhando em beleza].
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produzir arte e ao dela se apropriar, funções psicológicas dos sujeitos também são formadas e
essencialmente uma ação que se realiza no plano social, a criatividade que se manifesta na
da arte, viabiliza a enunciação daquilo que é o elemento singular da arte: ela “recolhe da vida
o seu material, mas produz acima desse material algo que ainda não está nas propriedades
desse material” (Vigostski, 1999, p. 308). Desse modo, o sentimento individual generaliza-se
alertando que não se deve tomar a arte como recurso para um ensino que a reduza ao ensino
de regras morais3, como uma precisa ferramenta de análise da conjuntura social4 e ou como
dessa crítica, argumenta que “a obra de arte não é acessível, de forma alguma, à percepção de
todos, e que a percepção de uma obra artística representa um trabalho psíquico difícil e árduo”
(Vigotski, 2003, p. 229), de forma que, inclusive, a reação estética produzida para obra de arte
não pode ser tomada como uma reação comum, visto que a forma de construir e organizar a
3
Embora valores morais possam ser transmitidos pela arte, o ensino não deve reduzi-la a um único significado de
regulação da ação e pensamento. Ao pensar sobre o possível efeito moral de uma obra é importante compreender
que essa reação está orientada por processos cognitivos internos como o direcionamento do foco da atenção, que
essa reação é secundária e casual, ou seja, não pode se constituir como fundamento, nem pode ser prevista de
antemão. Desse modo, “uma sociedade que extrai suas convicções dos romances e poesias, dos conhecimentos
históricos das óperas e das antigas canções, bem como da moral das fábulas, nunca atinge um nível sólido e
firme em cada um desses terrenos”. (Vigotski, 2003, p. 234)
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Apesar da arte poder lançar luz sobre a história vivida concretamente, a arte é sempre uma criação e não um
retrato
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imputa. A busca pela arte não pode ser explicada como uma forma de economia de esforços,
excitações nervosas que existem no ser humano, mas que são maiores que as suas
possibilidades de ação concreta. Para sustentar essa argumentação, Vigotski (2003) recorre ao
apaziguar, esclarecer e, nunca, sobre reproduzir vivências, mas sim e essencialmente sobre
indagar, revelar, ampliar, contrapor e criar, ou seja, produzir uma reação inquietante, ao passo
que também possibilita a “eliminação das excitações não-realizadas na vida” (p. 232)
propor uma educação estética, Vigotski (2003) em diálogo com suas fundamentações teóricas
resposta à proposta teórico-analítica deste trabalho, foi realizada uma busca por pesquisas que
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práticas que ilustram caminhos para a articulação entre arte e educação, embora não tratem
precisamente da temática “morte”. A primeira pesquisa foi relatada por Souza, Dugnani e
interventiva “promover reflexão dos jovens sobre o trabalho e futuro” e utilizaram como
[telas/pinturas]” (Souza, Dugnani & Reis, 2018, p. 381). Para viabilizar o contato com arte
realizaram questionamentos como “O que vocês veem?” / “Como se sentem diante dessas
com essas obras?” (Souza, Dugnani & Reis, 2018, p. 382). A pesquisa conseguiu demonstrar
contato com a oposição presente na arte, contudo não relata ter desenvolvido uma etapa inicial
de educação sobre a técnica presente na arte que apesar de não ser a chave para a apreciação
A segunda pesquisa, relatada por Bien e Barroco (2020), aborda o relato de uma
mulheres que estavam na lista de espera para atendimento de uma Unidade Básica de Saúde e
que traziam diferentes queixas: “uma por enfrentamento a um câncer, duas devido ao
sofrimento oriundo da viuvez, três devido às relações familiares conflituosas e uma não
apresentava queixa, participou do grupo porque vinha acompanhando a mãe, que possui
pouca mobilidade” (p. 324). Conduziram os grupos na modalidade de grupos focais e tinham
pinturas como instrumento que foram utilizados visando a suscitar emoções e elaboração dos
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II CONFERÊNCIA DE TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL:
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técnico presente nas obras, contudo fizeram de forma a orientar e ampliar os recursos de
acesso à apreciação estética e não como via de responder as inquietações suscitadas pelo
arte como instrumento para práticas educativas e terapêuticas a serem conduzidas pelo
entre a arte e a educação. Sinalizam, a partir da análise tecida, possibilidades de construir vias
de reflexão mediadas pela arte, de forma que a proposta de uma “educação para a morte” que
caráter histórico desse conceito em sua dimensão humana e social. Sabe-se que o morrer é
vida. Para a criança pequena, a morte é costumeiramente vista como algo não permanente
(Kübler-Ross, 2017). Von Hohendorff (2009) aponta que somente ao alcançar o estágio
irreversibilidade da morte. Segundo o mesmo autor, na vida adulta, a morte costuma ser
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temida, pois representa finalização de projetos que efetivamente começam a ser realizados,
enquanto, na terceira idade, a percepção da aproximação da morte impera uma maior presença
Hohendorff (2009) apesar de trazerem marcas da aparência das concepções de morte em vida,
não podem ter um fim em si mesmas, uma vez que não alcançam aquilo que Vigotski denota
como “método de análise que desmembra em unidades” (Vigotski, 2009, p. 8) e que, assim
que é auxiliado com teoria, compreender as múltiplas relações que se estabelecem no seu
interior.
Buscando transcender a aparência, mas sem dela abster-se, visto que se constitui
que se manifesta” (p. 209). Desse modo, os aspectos culturais e sociais que marcam as
concepções de morte também são elementos importantes para o acesso, análise e síntese desse
rupturas e permanências no modo de conceber esse fenômeno (Kovács, 2003). Algo que se
mantém na cultural ocidental é o posicionamento de negação da morte, visto que esse tema
Kovács, 1992). No que tange as rupturas, observa-se uma mudança do paradigma explicativo
tomando como referência a análise de Pitta (2016), observa-se que, na Antiguidade, a morte
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era tratada com certo romantismo, apesar de ser também temida; na Idade Média há uma
valorização dos rituais de morte, enquanto que, na atualidade, a morte denota um fracasso no
projeto de manutenção da vida por meio de recursos tecnológicos, tais como, aparelhos,
hospitalares, nos quais busca-se a cura, sendo que o paciente em fase final de vida também
seja “visto como um fracasso, sendo comum pensar que o importante é vencer a doença a
Segundo ensina o livro dos mortos tibetano aquele que está para
morrer deverá enfrentar a morte não só lúcida, calma e heroicamente,
mas com o intelecto corretamente treinado e dirigido, transcendendo
mentalmente, se for necessário, os sofrimentos e enfermidades do
corpo, como se tivesse praticado eficientemente a arte de viver.
No Ocidente onde a Arte de Morrer é pouco conhecida e raramente
praticada, pelo contrário, há uma relutância comum em morrer (p. 44).
de morte encefálica (Kovács, 2003) – e controle da morte por uma esfera tecnológico-
idealizada por Cecily Saunders em 1967, estrutura-se, também, uma nova forma de cuidado
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II CONFERÊNCIA DE TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL:
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em fase final da vida, como uma “filosofia do cuidado da pessoa em processo de finitude com
o objetivo de aliviar o sofrimento físico, psicológico, social e espiritual com o propósito final
de cuidar e não de curar” (Malta, Rodrigues & Priolli, 2018). Em diálogo com os princípios
(Hossne, 2006), a prática em cuidados paliativos objetiva ofertar um morrer com dignidade.
vida, os resultados da pesquisa de Jorge et al. (2019) trazem a luz a necessidade de retomar as
condições concretas da existência ao elaborar planos de cuidado à saúde. Apontam, acerca das
predileções de idosos sobre o processo final da vida, que 52,2% deles escolheram como local
de preferência para a morte a própria casa, sendo que as Instituições de Longa Permanência
para Idosos (ILPI) constituem-se enquanto o lugar “menos preferido”, conforme nomeação
adotada pelos autores do artigo, para a morte. Além disso, o estudo demonstra que “o fato de
querer ser sempre informado sobre o tempo de vida limitado” estabelece uma associação
familiar ou amigo como o local menos preferido de morte” (Jorge et al., 2019, p. 4318).
Jorge et al. (2019) concluem o artigo em defesa da ampliação e inclusão curricular dos
estudos acerca dos cuidados paliativos para profissionais de saúde, bem como, salienta a
que envolvem a morte e morrer e sobre cuidados paliativos e incentivá-las a conversar com os
clínicos sobre as suas vontades e preferências em fim de vida” (Jorge et al., 2019, p. 4320).
Acerca disso, reflete-se também sobre a necessidade de expandir o campo de diálogo sobre a
morte para a vida cotidiana, visto que documentos como as Diretivas Antecipadas de Vontade
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(no qual é possível optar pela utilização ou não de recurso médicos/tecnológicos em situações
de adoecimento grave e/ou permanente, bem como selecionar um procurador para decisões
referente aos cuidados em fase final de vida), ainda são pouco conhecidos5 e carecem de uma
morrer serem conhecidas por uma pequena e privilegiada parcela da população, reflete-se que,
ainda mais grave do que a denúncia da falta de acesso à informações, a dinâmica vida-morte
se representa também pelas mortes que ocorrem em vida, mortes simbólicas decorrentes da
restrição de diretos e de acesso àquilo que julga-se ser o mais básico para sobrevivência. Por
isso, alinhado aos pressupostos de uma psicologia que se propõe histórica e crítica, demanda-
se que ao falar sobre a morte deve-se ter a ciência que esse diálogo
serviços de saúde e a suspensão dos ritos fúnebres” (p. 15) e demonstram, assim, que fatores
determinantes para compreensão da morte estão para além de uma visão de morte natural,
mas que se deve acessá-la, também, como uma forma de administração dos corpos e da vida
coletiva. Aprofundando esse olhar político sobre morte, Kovács (1992, p. 40-41) convoca à
ocidental não sabe o que fazer com os seus mortos, com esses estranhos corpos que deixaram
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Atualmente, é possível fazer um registro gratuito das diretivas antecipadas de vontade e uma plataforma
de armazenamento de testamentos vitais do Brasil: http://rentev.com.br/
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inclusive, por um manejo estatístico e numérico das mortes por Covid-19, que se por um lado
angústia de saber que quem morre é “Miosetes Barbosa de Souza” e que “sua porta estava
sempre aberta para quem precisasse; fosse de uma oração, de uma ajuda ou de uma palavra de
não são apenas educativas e de cuidado à saúde integral, mas também críticas/políticas, pois
morte e da presença desse fenômeno na sociedade, Kovács (2005) indica, como iniciativas de
“educação para a morte”, a realização de: (1) discussões sobre o tema da morte nas escolas –
junto aos usuários e profissionais de serviços de saúde; (3) assessoria aos meios de
comunicação, visando a orientar sobre as ações e impactos que promovem uma banalização
profissionais da saúde.
ocorrer durante a vida, como, por exemplo, fases do desenvolvimento, perda de pessoas
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significativas, doenças, acidentes, até o confronto com a própria morte” (Kóvacs, 2005, p.
486), para que assim seja ampliada a reflexão sobre a morte que é cotidianamente admitida
subjetividade como elemento que marca a potência reflexiva e analítica do ser humano;
subjetividade que é, por isso, tomada como um aspecto estruturante para a constituição do
4 Considerações Finais
“educação para a morte”, inspira e orienta a formulação de uma ação que integra as duas
dimensões. Frente a isso, almeja-se desenvolver algumas considerações que finais que se
que acolham a arte como instrumento de “educação para a morte”, mas, agora, precisamente,
ao futuro, uma orientação para o futuro, uma exigência que talvez nunca venha a concretizar-
se, mas que nos leva a aspirar acima da nossa vida o que está por trás dela” (Vigotski, 1999, p.
320) e, desse modo, se torna um recurso de elaboração psíquica para o conteúdo “morte”.
Partindo da lei da destruição do conteúdo pela forma, depreende-se que a catarse promovida
pelo encontro com os sentimentos opostos que são apresentados em obras literárias, pinturas,
modos de estabelecer contato com a morte, inclusive acessando seu caráter social/político.
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II CONFERÊNCIA DE TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL:
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fundamentais com base nos pressupostos vigotskianos acerca da reação e educação estética.
Primeiramente, as obras selecionadas devem ter como critério serem produções artísticas que
trabalhem com a oposição entre forma e conteúdo. Nesse ponto, Vigotski (1999) se traduz
severamente crítico a ideia de que qualquer produção que envolva a ficção ou imaginação
possa ser tomada como arte. Para ele “a arte verdadeira transforma a impressão nela inserida”
(p. 296), pois somente assim será possível alcançar a catarse, ou seja, a reação estética que
consequências catárticas realizadas pela arte, entretanto, Vigotski (1999) destacava que essa
organização não deve implicar na retirada da inquietação provocada, ou seja, a explicação não
deve anular as emoções suscitadas, pois, “do contrário, correríamos o risco de criar um
conflito, e em vez de produzir a catarse a obra de arte produziria uma ferida” (p. 322).
Vinculado ao papel do crítico, compreende-se que “é impossível penetrar até o fundo em uma
produção artística quando se é totalmente alheio à técnica de sua linguagem” (Vigotski. 2003,
p. 238), por conseguinte, aquele que se dispõe à função pedagógica no campo da educação
estética, deve “valorizar as qualidades estéticas da obra em questão” (Vigotski, 1999, p. 323),
ao passo também se compreende que não é possível mecanizar tanto a reação estética
arte, embora, sobre esta última seja possível “contribuir para a sua formação e manifestação”
não a reduz à técnica, mas depende dela para realizar-se em toda a sua potência. Localiza-se,
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CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
assim, uma crítica importante aos modelos anteriores de utilização da arte como instrumento
de “educação para a morte”6. Afinal, como foi realizada a preparação para recepção do
conteúdo artístico? A técnica não deve reduzir a percepção, mas ela é imprescindível uma vez
ao final do item 3.1, bem como de uma nova proposta que objetiva uma educação estética
para a morte, produz-se tal iniciativa por compreender que o ser humano posiciona-se
reiteradamente em busca de uma explicação para aquilo que encontra no mundo e percebe em
si mesmo. Vigotski (2003) aponta que a criança procura por essas explicações na fábula,
enquanto o adulto a busca na religião, na ciência e/ou na arte. Anseia-se, desde a tenra
infância, por um significado, por uma resposta, ainda que essa requeira a fantasia, a fé, a
“educação para a morte”, se refaz enquanto síntese em meio aos diferentes recursos de
compreensão sobre a vida e suas manifestações concretas e simbólicas. Portanto, a arte não se
propõe a ser apenas mais uma explicação conclusiva ao (in)compreensível, pelo contrário,
realidade das emoções suscitadas, o que não exclui nem a religião, nem a ciência, nem a
6
Não foi localizada nenhuma pesquisa que buscasse relatar ou propor estratégias de educação para a morte com
base nos pressupostos epistemológicos e metodológicos da Psicologia Histórico-Cultural. Contudo, a inserção da
arte como recurso para refletir sobre a morte aparece em alguns trabalhos, a citar: Balduino, Silva, Machado e
Teixeira (2016) recorrem a arte para desenvolver uma disciplina de introdução à psicologia no ensino
fundamental com base nos pressupostos da psicanálise; Pires, Spagno, Brito, Gazzinelli e Montenegro (2009)
que relataram uma experiência de utilização da arte no ensino da disciplina de administração em saúde e que as
“técnicas de ensino utilizadas procuraram motivar a capacidade reflexiva, de criação, de abstração ética e estética
nos discentes” (p. 63); e Santos, Lins e Menezes (2018) relatam o trabalho desenvolvido com acadêmicos do
curso de medicina para auxiliá-los na compreensão de temáticas relacionadas à bioética e à finitude. Solicitaram
a leitura da obra “As intermitências da morte” de José Saramago e propuseram como instrumento de análise de
apreensão do conteúdo que os estudantes respondessem um questionário discursivo após a leitura da obra.
Frente a leitura da proposta vigotskiana do estudo em “Psicologia da Arte” e “Educação Estética” depreende-se
que algumas das propostas desenvolvidas demonstram-se pouco efetivas em termos de toda potência resguardada
à arte, pois não desempenham a função principal de acompanhar o desenvolver e ascender da reação estética, ao
passo que em um dos casos, como o da pesquisa de Santos, Lins e Menezes (2018), não foi nem mesmo utilizado
da dialogicidade e acesso aos sentimentos estéticos como estratégia de aproximação dos efeitos produzidos pela
arte.
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CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE
fantasia, mas também na elaboração real das coisas, dos objetos e das situações“ (Vigotski,
2003, p. 239). Desse modo, estudar e investigar a morte pela arte, não é uma busca por
sentimentos e da imaginação.
sofrimento do próprio indivíduo, visto que “a obra de arte e sua apreciação não produz
emoção no sujeito que se empreende em sua leitura, mas faz a emoção que está nele viver,
vida” (Souza, Dugnani & Reis, 2018, p. 380-381). Incide, por esta via, na proposta de uma
“educação para a morte” mediada pela arte, vê-la representada para além da experiência
sensorial realizada na vida cotidiana, visto que, ao ver a morte pela arte não se busca
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