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PENAL EM FOCO

Direito Penal, saúde pública e epidemia – Parte I


Notícia histórica sobre o art. 268 CP e caos regulatório no contexto da Covid-19

ALAOR LEITE
LUÍS GRECO

15/04/2020 15:28

Medidas de combate à covid-19 em Santa Catarina / Foto Leonardo Souza /PMF

O presente trabalho, cindido em duas partes, pretende examinar apenas alguns dos
plúrimos reflexos penais da crise pandêmica da Covid-19 para dois grupos de
potenciais implicados: os cidadãos comuns, que podem se ver confrontados com o
art. 268 CP, o crime de “infração de medida sanitária preventiva” (Parte I) e, mais
especificamente, os profissionais de saúde, que poderão, em face da escassez
anunciada de unidades de terapia intensiva, encontrar-se na ingrata situação de
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tipos penais eventualmente aplicáveis no atual contexto epidêmico já foi objeto de


1
lúcido artigo de Montenegro/Viana, nesta coluna .

Nesta primeira parte, convém rememorar esquecida notícia histórica a respeito da


proteção penal da saúde pública, que talvez auxilie a explicar o caos regulatório
instalado atualmente (abaixo, II.). Esse caos, que deita as suas raízes em impasse
2
constitucional que antecede o Direito Penal – objeto, aliás, da ADI 6341 –, produz
consequências para a interpretação do art. 268 CP. A rigor, a dessintonia regulatória
inviabiliza a aplicação do crime de infração de medida sanitária preventiva (abaixo
III.). Antes, ressoa oportuna uma advertência político-criminal (abaixo, I.).

I. Advertência político-criminal: “as regras por trás da


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exceção”
1. A irrupção de epidemias, como a do Covid-19, precipita reações jurídico-penais.
Legislador e intérprete são chamados a reagir com imediatez e criatividade. O
legislador é convocado a refletir a respeito da edição de novos tipos penais ou a
reformar os existentes, como se pode recolher da história legislativa dos delitos
4
contra a saúde pública .

A provisoriedade costuma ser má conselheira: a lei temporária que vigeu durante a


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especificamente da propriedade intelectual da Fifa . A emergência estimula, ainda, a
produção de um caudal regulatório – leis excepcionais, decretos, portarias –, atos
normativos que, por vezes de maneira concorrente, complementam tipos penais,
como é o caso do art. 268 CP. Ao intérprete, de lege lata, são lançados tormentosos
dilemas, que evocam categorias fundamentais da Parte Geral do Direito Penal, tais
como a causalidade, a imputação, as leis penais em branco e as causas de
exoneração de responsabilidade penal em sentido amplo, como a colisão de
deveres, o estado de necessidade e o erro de proibição. A emergência produz,
inevitavelmente, instabilidade jurídica.

2. Não surpreende que o Direito Penal se apresente como instrumento de


administração da crise epidêmica irrevogavelmente instalada. Afinal, a
responsabilidade penal – assim como o contágio – pode alcançar a todos
indistintamente: comerciantes e empresários, incertos quanto à extensão do volátil
conceito de “serviço essencial”, determinante no contexto do art. 268 CP; demais
cidadãos que não seguem recomendações ou ordens de isolamento ou imposição
de quarentena – e, talvez, quem os instiga a essa desobediência; intimoratos e
sobrecarregados médicos e profissionais da saúde, que flertam com decisões
6
trágicas e limítrofes diariamente – quem recebe o respirador? –, que podem,
eventualmente, realizar tipos penais (cf. a Parte II deste estudo).

3. Ainda assim, o papel que incumbe às proibições de natureza penal deve ser, nesse
contexto, relativamente limitado e secundário. Bem vistas as coisas, as decisões
cruciais – a definição de “serviços essenciais”, a estipulação de regras de priorização
em leitos de UTI – devem ser tomadas em outros ramos do Direito, com potenciais
reflexos jurídico-penais. Não se deve, enfim, sobrestimar a contribuição do Direito
7
Penal no enfrentamento de epidemias . Está posta a chance histórica para
provarmos que a ideia de subsidiariedade, que norteia o Direito Penal, é mais do que
arenga manualística.

4. O risco de um precipitado recurso ao Direito Penal é evidente: a emergência


acelera decisões, suaviza abusos, promove equívocos, justifica exceções. É tão
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velho quanto equivocado o adágio “necessitas non habet legem” . A exceção forja
regras – e o ventre da emergência costuma gestar monstros. O princípio da
legalidade (art. 5o XXIX CF), os critérios de interpretação das leis penais e as
categorias fundamentais do Direito Penal permanecem vigentes. A eventual
insuficiência da situação jurídico-penal atual – seja na Parte Geral, seja na Parte
Especial – deve ser a argila para a edificação do tratamento penal de epidemias
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5. Nesse contexto, convém refletir sobriamente sobre os limites do Direito Penal em


face da crise epidêmica. Uma notícia histórica a respeito da proteção penal da saúde
pública dá o tom da situação atual.

II. Técnica legislativa, leis penais em branco e o caos


regulatório: o caso do art. 268 do CP
1. Notícia histórica

a) As epidemias do passado pariram os tipos penais atualmente vigentes. O Código


Penal de 1890 reduzia a proteção da saúde pública a tipos penais como os de
exercício ilegal da medicina (art. 156), de curandeirismo (art. 157) e afins. A
disseminação descontrolada de enfermidades infectocontagiosas no final do século
XIX e início do século XX parece ter sinalizado a insuficiência dos tipos penais
existentes, evocando a urgência de novelas legislativas. A devastadora “gripe
9
espanhola”, desembaraçada em nossos cais – sobretudo em Salvador e no Rio de
10
Janeiro – no primeiro quartel do século XX e que logo se alastraria indomitamente,
mobilizou discussão sobre a necessidade de uma tutela jurídico-penal que se
estendesse especificamente às epidemias – uma “omissão” a ser suprida, como
consta do item 80 da Exposição de Motivos da Parte Especial de 1940. Em 1940,
surgiria o art. 267 – nitidamente baseado pelo art. 224 do Projeto Alcântara
Machado, de 1938, que se inspirara no art. 278 do Projeto Sá Pereira de 1928 –, que
proíbe a causação dolosa ou culposa de epidemias.

b) O Direito Penal, cuja vocação máxima é precisamente a de garantir as condições


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existenciais da vida social , não poderia permanecer indiferente a epidemias
mortais, que descortinavam uma nova e mais desafiadora dimensão da tutela da
12
saúde pública . Afinal, a capilaridade dos danos em epidemias – aquele vírus
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invisível, de imerecida alcunha espanhola , vitimaria mais do que os estrepitosos
14
canhões da Primeira Grande Guerra , entre eles o então presidente da República,
15
Rodrigues Alves – fazia parecer infinitesimais os danos causados pelos
curandeiros, a quem o Código Penal dedicava um artigo. As epidemias que
grassavam por todo o território – “o Brasil era um grande hospital”, enunciaria Miguel
16 17
Pereira em 1916 – exigiam, mais do que expedições higienistas , novos tipos
penais.

c) O Direito Penal é estático por vocação. As epidemias, ao revés, urgem e clamam


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permanecer confinada à hipótese grave, bélica e mais remota da provocação dolosa


ou culposa de epidemias – pense-se na eclosão de uma “guerra biológica”. Antes,
essa proteção deveria se estender ao caso mais normal de epidemias “espontâneas”
e contra as quais o Estado deve reagir com medidas sanitárias urgentes. A Revolta
da Vacina, em 1904, documentou a insurreição do povo contra a imposição estatal
18
de medidas sanitárias – a vacinação obrigatória contra varíola –, sugerindo ao
legislador a necessidade de um tipo penal mais dinâmico, como o atual art. 268 CP,
inserido em 1940, que garantisse sob ameaça de pena a genuflexão às
“determinações do poder público”. Epidemias desaconselham sublevação, clamam
por cooperação e impõem obediência ao agir estatal. Em reação imediata aos
revoltosos, aliás, já havia sido publicado Decreto (n o. 5.156/1904), que previa pena
de prisão para quem desobedecesse imposições sanitárias, em seu art. 172, que
19
renderia um RHC 2244 julgado pelo STF . Estavam postas as condições de
surgimento do art. 268 CP, inspirado no art. 225 do Projeto Alcântara Machado. Na
doutrina, mencionam-se, como espelhos do legislador pátrio, o art. 205 do CP
20
argentino, aparentemente ainda vigente, e o revogado § 327 do CP alemão . Tão
logo surja a necessidade de reforçar imposições médicas ou sanitárias, lá estará o
art. 268 CP – como ocorreu, em 1988, por ocasião do cadastramento obrigatório de
doadores de sangue, cuja observância implicaria na aplicação do art. 268 CP (art. 9o,
L. 7.649/88).

d) O dispositivo atual, filho das epidemias do começo do século XX, tem a seguinte
redação: “Art. 268 – Infringir determinação do poder público, destinada a impedir
introdução ou propagação de doença contagiosa: Pena – detenção, de um mês a
21
um ano, e multa” . De resto, um tipo penal cuja existência parecia muito ajustada ao
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que apologetas alegavam ser o “espírito de solidarismo do Estado Novo” – como já
veremos. Com ele, estava decretada a submissão do art. 268 CP ao cambiante
humor do federalismo brasileiro.

2. Problemas de determinação: o “caos regulatório”

a) Não causa sobressalto que o legislador tenha construído o art. 268 CP, que
remete a uma “determinação do poder público”, sob o formato de lei penal em
branco. A lei penal em branco, ao lado das leis temporárias e das excepcionais (art.
3o CP), é técnica legislativa destinada a introduzir dinamismo à regulação penal –
como dito, estática por excelência –, conferindo ao Estado capacidade de reação em
face de alterações fáticas virulentas. Esses “corpos errantes à procura de alma” –
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complemento, que deve ser lido em conjunto com a norma originária, enfeixando,
enfim, a norma proibitiva completa que deve guiar o comportamento do cidadão.

b) Essa técnica legislativa excepcional, naturalmente, instaura fricção com o


mandamento de determinação que decorre do princípio da legalidade (art. 5º XXIX
24 25
CF) – para não mencionar, aqui, outras possíveis fricções . A doutrina reconhece,
contudo, a legitimidade das leis penais em branco quando o tipo penal já contém,
em si, os contornos da conduta proibida, cabendo ao ato normativo apenas uma
26
atribuição complementar ou de especificação, nunca de inauguração . O Tribunal
Constitucional Federal alemã se controverteu há pouco a respeito da legitimidade de
leis penais em branco, e não hesitou em declarar a inconstitucionalidade de tipo
penal de estrutura bastante complexa previsto na chamada Lei de Etiquetamento de
27
Carnes Bovinas (Rindfleischettiketierungsgesetz) . É difícil, entretanto, enunciar
critérios precisos e generalizáveis a respeito da legitimidade das leis penais em
branco em geral. São, ainda, raras as declarações de inconstitucionalidade nesse
setor. Mais promissor parece ser o escrutínio de cada tipo penal especificamente.
Convém avaliar a estrutura de nosso art. 268 CP.

c) A primeira frase do art. 268 CP padece de altíssimo nível de indeterminação: a


ação proibida é descrita como a infração de “determinação do poder público”. Não
há especificação de em que consistiria o ato normativo complementar, a
“determinação” – se lei, se portaria, se resolução –, com o que tampouco se
identifica a autoridade regulatória, o “poder público”, de que emanaria o
complemento. Reinasse sozinha essa primeira frase e estaria o art. 268 CP
irrecorrivelmente condenado à inconstitucionalidade. Não haveria como divisar os
contornos da norma proibitiva, cuja inauguração estaria nas mãos – genericamente
– do “poder público”, a quem o Direito Penal renovaria os votos de subserviência
cega. A segunda frase do art. 268 CP, contudo, acaba por oferecer um mínimo
parâmetro, que reduz – mas não expunge – o grau de indeterminação do tipo penal,
ao enunciar que as tais determinações devem estar destinadas a “impedir
introdução ou propagação de doença contagiosa”. A norma proibitiva ganha, assim,
28
algum contorno, se bem que, como veremos, ainda insuficiente . A formulação
legal, seja como for, acaba por abrir espaço para a instauração de um caos
regulatório em situações de “doença contagiosa” – um risco que, de fato, realizou-se
no contexto do Covid-19.

d) Em face da inexistência de lei geral que regule as relações jurídicas em tempos de


29
epidemias – como há em outros países –, logo surgiu a L. 13.979/20 – lei
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todos os complementos do art. 268 CP, estariam provavelmente atendidas as


exigências de determinação, ao menos enquanto durasse o estado de emergência. A
lei, contudo, a despeito de mencionar as medidas de isolamento, de quarentena e as
medidas de realização compulsória em seu art. 3o, não exaure a matéria e foi
complementada pela Portaria n. 356 do Ministério da Saúde – que remete a novos
complementos, como a prescrição médica para a decretação de isolamento ou o ato
administrativo em caso de quarentena, também objetos da Portaria 454 do mesmo
30
Ministério, de 20.3.20 , que declarou a “transmissão comunitária” –, que, por sua
vez, é complementada pela Portaria Interministerial n. 5., que, por fim, remete em
seu art. 4o à norma original, o art. 268 CP. A plêiade de remissões é complexa. Não
haveria melhor designação para esse quadro do que “cascata de normas” –
31
expressão recordada, nesse contexto, por Montenegro/Viana . Se o atendimento ao
mandamento de determinação depende da “leitura conjunta” da norma proibitiva, o
quadro é desolador: é penosa a navegação nesse rio caudaloso de normas.

e) O caos regulatório atual é agravado pela existência de complementos


concorrentes dissonantes emanados pela União, pelos Estados e Municípios, que
atingem, por exemplo, o conceito de “serviço essencial” – com independência de sua
conveniência política ou permissibilidade jurídica, questão que atine aos
32
constitucionalistas, posta em debate no STF na ADI 6341 .

Talvez os redatores do art. 268 CP tivessem em mente o “Direito Penal do Estado


33
Novo” – título do famoso estudo de Hungria, de 1941 –, que não se constrangia
em concentrar a competência para edição de “determinações do poder público” nas
mãos do poderoso Executivo, que não se encontrava fragmentado num regime
federalista. “Poder público”, no Estado Novo centralizante, que conferia à União
34
amplo direito de intervir nos Estados (art. 9º da Constituição de 1937 ), era algo
35
relativamente monolítico , embora Hungria viesse posteriormente, em 1958, a
36
interpretar “poder público” como “autoridades federal, estadual e municipal” .
Atualmente, contudo, ainda que se observem apenas os atos normativos federais, a
situação é insatisfatória. A “cascata de normas” federais – que não se confunde com
a opinião do chefe do Executivo da União – avoluma-se e ganha a companhia de
37 38
decretos : Tangerino/Rodrigues falam em “epidemia de decretos” . Decreto federal,
por exemplo, regulamentou com maior detalhamento o relevante conceito de
“serviço essencial” (Dec. nº. 10.282/20), e foi, poucos dias após, completado por
outro Decreto presidencial, que regulava especificamente as atividades de imprensa
39
(Dec. nº. 10.288/20) .
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De outro lado, os Estados e Municípios podem adotar medidas mais ou menos


restritivas, como de fato fizeram. Pense-se em um dono de loteria ou um sacerdote
que continuam a realizar suas atividades, porque o Decreto federal de nº. 10.282, de
20.3.2020, em seu art. 3º XXXIX e XL as define como “serviços públicos essenciais”,
mas que se deparam com discurso de governador ou de prefeito ameaçando
inclusive de prisão quem realizar tais atividades, ou, mais do que isso, com decreto
estadual impondo a suspensão de “eventos e atividades com a presença de público,
ainda que previamente autorizadas, que envolvem aglomeração de pessoas, tais
como: eventos desportivos, shows, feiras, eventos científicos, comícios, passeatas e
afins” (art. 4 I, Decreto nº. 46.970, de 13.03.2020, do Governador do Rio de Janeiro).
O resultado, naturalmente, é a instauração de situações de dúvida objetiva quanto a
elemento que, a rigor, pode definir a realização do art. 268 CP.

f) Parece ser incontroversa a existência de um caos regulatório que deságua no art.


268 CP. É natural que seja assim: um tipo penal nascido precisamente para reforçar
as genéricas “determinações do poder público” dificilmente assumiria uma postura
crítica em relação a elas. A questão mais complexa, portanto, diz respeito às
consequências dessa constatação para a interpretação do tipo penal de lege lata – o
que, de lege ferenda, pode sugerir a necessidade de reforma legislativa (abaixo IV.).

III. Uma proposta de solução em quatro níveis:


perspectiva de lege lata
a) Fato é que o art. 268 CP, com suas vicissitudes, existe e pode vir a ser aplicado.
Alguns decretos do poder público remetem a esse tipo penal (por ex., o art. 7º,
Decreto nº. 46.996, de 11.03.2020, do Governador do Rio de Janeiro). É
compreensível que o art. 268 CP passe a servir de reforço às medidas concretas
adotadas pelo Estado no enfrentamento à crise. De outro lado, o quadro caótico,
originado já fora do Direito Penal, não pode ser definitivamente resolvido pelo
penalista. O Direito Penal herda o impasse federalista em torno da repartição de
competências para legislar sobre a saúde pública e apenas pode torcer por solução
mais uníssona, menos ruidosa. Ao penalista, cumpre, contudo, oferecer linhas de
orientação para que ao menos o manejo do art. 268 CP ocorra de forma racional.
Propomos, de lege lata, uma solução em quatro níveis: um mundo ideal, em que não
vivemos, optaria pelo primeiro nível; o segundo nível, ainda que ostente a condição
de plano B, é satisfatório; já as soluções no terceiro e no quarto níveis devem ser
entendidas como de natureza emergencial, supletiva. O porquê dessas qualificações
ficará claro no curso das reflexões.

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em relevo: não se sabe em que consiste a “determinação”, nem quem é o “poder


público” (acima 5.), o que, aliado ao quadro regulatório caótico que se instaurou –
com ou sem razão de ser –, gera uma situação de insegurança dificilmente tolerável
para os cidadãos. Essa solução, contudo, é demasiado idealista, por uma série de
razões.

aa) Primeiramente, porque ela pressupõe um modelo de Direito Penal que lança aos
tipos penais exigências bastante altas, em um nível de que ainda não dispomos.
Existem situações de caos similares, por exemplo, na seara ambiental,
40
principalmente com o art. 68 da L. 9605/98, sem que isso até hoje, passados 22
anos, tenha sido ocasião para declarar qualquer inconstitucionalidade. A rigor,
também em outros países há enorme resistência à declaração de
inconstitucionalidade de tipos penais por violação do mandamento de
determinação.

bb) Segundo, porque é improvável que, justamente numa situação de emergência


pública, venha à tona a consciência em torno de princípios limitadores do poder
estatal que não eram reconhecidos nem mesmo no contexto de normalidade. A
emergência, como dito, costuma ser má conselheira (acima, I.). A solução idealista,
ainda que correta, não será implementada no tempo presente. É importante,
contudo, enunciá-la, para que, tão logo retorne a situação de normalidade,
retornemos à tarefa de submeter a escrutínio as normas penais em branco de nossa
41
legislação – um meticuloso trabalho ainda por fazer, que apenas começamos.

cc) Em terceiro lugar, porque ninguém conseguiu enunciar com precisão quais são
as exigências constitucionais de determinação a serem atendidas por normas
penais em branco. Porém, quaisquer que sejam, parece-nos que elas estarão
descumpridas numa situação como a que hoje existe no Brasil. Nem se replique que
o problema é menos o art. 268 CP e mais o caos extrapenal que o antecede: ainda
que isso seja verdadeiro, a norma penal vigente recepciona sem qualquer filtro essa
situação caótica, e isso é inadmissível em um setor do direito cuja consequência
jurídica pode ser uma sanção privativa de liberdade.

c) Como o art. 268 CP muito provavelmente não será declarado inconstitucional, é


necessário buscar uma solução para o caos em um outro nível, que ofereça um filtro
jurídico-penal para a recepção das regras primárias. Esse segundo nível será o do
42
tipo objetivo: o de interpretar restritivamente (ou mesmo reduzir teleologicamente )
o art. 268 CP, de modo a que a situação de caos se torne, ao menos, tolerável para o
cidadão. Várias soluções seriam aqui imagináveis. A brevidade que desejamos
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apresentar e a defender a nossa proposta, que consiste em levar a sério, quase que
literalmente, o termo “determinação”: de determinação só se poderá falar na
presença de três pressupostos, quais sejam, de um comando (aa) determinado, no
sentido de preciso, tanto subjetivamente, isto é, em relação ao destinatário (bb),
quanto objetivamente, isto é, no que diz respeito ao comportamento demandado
(cc).

aa) Determinação só há onde houver comando, ordem, isto é, uma prescrição cuja
obrigatoriedade é independente da vontade daqueles a quem ela se dirige. Por ex., o
art. 4º do Dec. nº. 64.881 de 22.03.2020, do Governo de São Paulo, reza: “Fica
recomendado que a circulação de pessoas no âmbito do Estado de São Paulo se
limite às necessidades imediatas de alimentação, cuidados de saúde e exercícios de
atividades essenciais”. Uma recomendação não é uma ordem nesse sentido, porque
ela não pretende viger com independência da vontade dos destinatários. O
mencionado dispositivo não é determinação, nos termos do art. 268 CP.

bb) A determinação tem de ser subjetivamente determinada, vale dizer, determinada


em relação ao destinatário. Isso significa haverá determinação na hipótese de
comando dirigido pelo poder público a um indivíduo concreto. Isso porque, diante do
caos, é principalmente o indivíduo destinatário de um comando a ele concretamente
dirigido que está em condições de saber o que o Direito dele espera – da
compulsoriedade da medida de isolamento, por ex., o sujeito tem de ser
pessoalmente comunicado (art. 4o, §1o da Portaria Interministerial n. 5). Nessa
hipótese pode o Direito Penal recepcionar as ordens vindas de outros ramos do
Direito e reforçá-las com a sua ameaça sancionatória, sem que essa ameaça seja
um castigo por um comportamento que o indivíduo mal tinha como saber que dele
era esperado.

Isso significa, concretamente, que haverá determinação do poder público, nos


termos do art. 268, quando houver ordem individual de isolamento ou medida médica
obrigatória, nos termos na leitura conjunta dos arts. 268 CP; art. 3o, I e III da L.
13.979; art. 3o, I e art. 6o da Portaria 356 do Ministério da Saúde; art. 4o, §1o da
Portaria Interministerial n. 5. Claro que se pode questionar se medida médica é
determinação “do poder público”. Diríamos, por ora, que a resposta é positiva, porque
é a própria lei, no art. 3o, III e seu §1o , complementada pelo art. 3o, §1o da Portaria
356, que “investe” o médico e o agente de vigilância epidemiológica, ainda que
particulares, de função pública (talvez inclusive transformando-os em funcionários
públicos, nos termos do art. 327 caput CP).

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natureza geral, em princípio, não podem servir de complemento para o art. 268 CP.
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Há, contudo, uma importante exceção: o das ordens de natureza geral unívocas. Por
ex., o art. 2º I do já mencionado Decreto do Governo de São Paulo afirma que “fica
suspenso… o atendimento presencial ao público em… academias e centros de
ginástica”. Os administradores de academias que continuarem a atender o público
realizam, assim, o tipo objetivo do art. 268 CP. Qualquer dúvida, entretanto, tem de
ser resolvida no sentido de que falta a determinação exigida pelo tipo. Se, por ex., A é
um personal trainer, que recebe os clientes em sua casa, não fica claro se a norma
incide sobre ele ou seu comportamento (“academias e centros de ginástica”?).

cc) Por fim, tem de haver determinação em sentido objetivo, isto é, precisão quanto
ao objeto do comando, ao comportamento que não pode ser realizado. Ainda no
caso de nosso personal trainer: não é claro que sua atividade configura “atendimento
presencial ao público”, de forma que o tipo do art. 268 CP não pode, segundo a
interpretação aqui proposta, ser a ele aplicado.

d) Ainda que não resolva a desordem jurídica que se estabeleceu fora do Direito
Penal, essa solução ao menos opera como um dique, impedindo que ela contamine
também esse ramo do Direito. A despeito de não ser ela a solução ideal, ela nos
parece, como plano B, satisfatória, uma vez que oferece uma solução geral, que
protegerá o cidadão de arcar com os custos da incerteza que se instaurou. Se a
segunda solução é satisfatória, as próximas duas, nos dois seguintes níveis,
provavelmente não podem satisfazer integralmente. Elas configuram os planos C e
D, soluções supletivas, emergenciais, para impedir abusos punitivos, não mais de
forma geral, mas, ao menos, no caso concreto.

Se não se aceitar nem a inconstitucionalidade do art. 268 CP, nem a sua restrição do
tipo objetivo a determinações do poder público imperativas, subjetiva e
objetivamente determinadas, chega-se ao terceiro nível, o do tipo subjetivo. O caos
jurídicos significa, para o tipo subjetivo, a possibilidade de situações de erro, que, a
nosso ver, deverá ser entendido já como erro de tipo, excludentes do dolo (art. 20
caput CP), o que exclui a punição pelo art. 268 CP, que só conhece forma dolosa.
Isso porque apenas o conhecimento – não a cognoscibilidade, que geraria culpa –
das determinações do poder público cuja infração realiza o tipo objetivo oferece ao
cidadão um indício do ilícito material que está a realizar, cumprindo a chamada
“função de apelo” da realização do tipo objetivo. Não podemos, na presente sede,
estender-nos sobre a difícil distinção entre erro de tipo e erro de proibição diante de
43
elementos normativos e normas penais em branco . O que parece decisivo é que,
em regra, quem desconhece o complemento de norma penal em branco não apenas
ignora que o que faz é ilícito (art. 21 CP), mas sequer sabe o que faz (art. 20 caput
OCP).
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A solução no terceiro nível não é, como dito, de todo satisfatória, por uma série de
razões. Primeira e mais fundamentalmente, ela entende que o errado é o indivíduo, e
não o ordenamento em si caótico, de modo que traslada a responsabilidade pelo
45
caos para as costas de cada cidadão . Em segundo lugar, porque há notória reserva
em aplicar dispositivos sobre o erro, ainda que eles sejam lei vigente. Por fim, pode
dar-se uma situação em que o indivíduo conheça a ordem do poder público, mas
ainda assim tenha dúvidas quanto a se ela se aplica a seu caso – a situação de
nosso sacerdote, pastor ou dono de casa lotérica, acima descrita. Aqui, o sujeito
sabe o que faz, sabe que seu comportamento não corresponde ao que uma das
instâncias do poder público dele espera, mas crê, ainda assim, ser seu
comportamento lícito, porque se arrima em o que outras dessas instâncias lhe
indicam como permitido.

e) Em situações como a que acabamos de descrever-se, será impossível uma


solução no terceiro nível. Nelas, chega-se ao quarto nível, superando-se o tipo
subjetivo, para entrar na culpabilidade, no erro de proibição (art. 21 CP).

O erro de proibição deixa o dolo intacto, mas exclui a consciência da ilicitude. Como
dispõe a lei (art. 21 CP), ele, “se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-
la de um sexto a um terço”. O problema central será, assim, a evitabilidade desse
erro, que será determinada pela violação de um dever de informação concreto, eficaz
e cujo cumprimento é, ao agente, possível. A rigor, cai-se em um problema bastante
debatido nos últimos anos, que é o da dúvida sobre a proibição, no qual, outra vez,
não podemos nos aprofundar na presente sede – remetemos o leitor à monografia
46
do primeiro autor.

47
Ainda que muito seja objeto de controvérsia, começa a formar-se um consenso
quanto a que, em situações de caos normativo, em que o cidadão se encontra diante
de comandos contraditórios, sem que lhe seja possível, ao momento de sua
atuação, recorrer a qualquer pessoa ou instância que supere essa situação de
dúvida – que pode, portanto, ser chamada de objetiva – o cidadão atuará sem
culpabilidade. O caso se assemelha às hipóteses de jurisprudência claudicante ou
48
contraditória sobre determinado tema, debatidas na doutrina .

Quem poderá o nosso sacerdote ou o nosso dono de casa lotérica consultar, que
seja capaz de oferecer certeza quanto à qualificação de seu comportamento como
lícito ou ilícito? Nem mesmo o mais capacitado dos juristas será capaz de lhe
oferecer uma resposta inabalável, pelo simples fato de que a situação de incerteza é
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quem tem de arcar com os custos da incerteza, de forma que há que se reconhecer
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que há erro de proibição e que ele é inevitável, ficando excluída a culpabilidade nos
termos do art. 21 CP.

Essa solução no quarto nível tampouco satisfaz plenamente, porque os dois


primeiros problemas apontados no nível anterior também aqui se colocam, e de
forma acentuada. Há, igualmente, certa renitência dos aplicadores do Direito em
reconhecer erros de proibição inevitáveis. Por fim, a solução pressupõe que o
indivíduo se comportou de forma penalmente antijurídica, o que gera
consequências, por ex., para a teoria da participação. É solução, portanto, supletiva.

IV. Observação final: perspectivas de lege ferenda


A notícia histórica a respeito do art. 268 CP (II. 1.) e os seus graves problemas de
determinação (II. 2., 3.) convidam, finalmente, a uma breve reflexão de lege ferenda.
Tal como está, o tipo penal do art. 268 CP impõe ao Direito Penal uma obediência
cega às voláteis regulações primárias de natureza sanitária, emanadas por um
plantel de autoridades igualmente voláteis. Às incertezas médicas somam-se
incertezas jurídicas. De lege lata, tentamos construir uma espécie de filtro para a
recepção das regras primárias.

De lege ferenda, o art. 268 CP seria bem substituído por um tipo penal que
remetesse a uma vindoura lei federal que regulasse de forma geral situações
extremas de epidemia e de pandemia – o art. 268 CP fala genericamente apenas em
“doença contagiosa”, o que explica a pena reduzida –, conferindo ao Estado
instrumentos flexíveis para reagir à crise, mas delimitando com precisão os deveres
cuja violação enseja a realização de crime.

Os complementos da lei penal em branco emanariam de lei federal, suavizando o


déficit de legitimidade que se pode, hoje, imputar ao art. 268 CP e evitando um
futuro caos regulatório, como o atual. Não parece um modelo inatingível. Por ora,
estamos entregues à parcimônia judicante.

***As ideias deste breve estudo foram estimuladas pelo debate online ocorrido no
dia 8 de abril de 2020, parte das atividades do IDP, organizado por Rodrigo
Mudrovitsch, Guilherme Pupe e Felipe Carvalho, de que participaram, além do
primeiro subscritor, Fábio Tofic, Carolina Ferreira, Gustavo Badaró e Rodrigo de
Grandis.

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1 Montenegro/Viana, Coronavírus: um diagnóstico jurídico-penal, in:

https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/penal-em-foco/coronavirus-um-
diagnostico-juridico-penal-23032020 ; cf. também Tofic Simantob, Os tipos penais
incriminadores na pandemia, in: https://www.migalhas.com.br/depeso/324377/os-
tipos-penais-incriminadores-na-pandemia

2 Cf. também as ADP 669 e 672.

3 Assim o título de trabalho do segundo subscritor, Greco, As regras por trás da

exceção: reflexões sobre a tortura nos chamados “casos de bomba-relógio”, in:


Revista Brasileira de Ciências Criminais 78 (2009), p. 7 e ss.

4 Cf. abaixo II., 1.

5 A esse respeito, ver o brevíssimo artigo de Leite, Quem votou em Joseph Blatter?,

in: https://www1.folha.uol.com.br/paywall/login.shtml?
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/05/1450430-alaor-leite-quem-
votou-em-joseph-blatter.shtml

6 Cf. as considerações de Streck, in: https://www.conjur.com.br/2020-abr-

02/senso-incomum-covid-19-consequencialismo-dilema-trem-matar-gordinho

7 Nesse sentido se manifestaram Bottini/Arruda Botelho, Direito Penal e

coronavirus: um alerta durante a pandemia, in: https://www.conjur.com.br/2020-


abr-04/bottini-botelho-alerta-direito-penal-pandemia ; cf. também
Fernandes/Marchioni, in: https://www.conjur.com.br/2020-abr-11/opiniao-virus-
autoritarismo-pandemiado-coronavirus?
utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook

8 Sobre a história das figuras do estado de necessidade ver o livro do primeiro

subscritor, Leite, Notstand und Strafe, Berlin, 2019.

9 Ver Cruz de Souza, A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em

tempos de epidemia, Rio de Janeiro, 2007.

10 Goulart, Revisitando a espanhola: a gripe pandêmica de 1918 no Rio de Janeiro,

in: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
59702005000100006&lng=pt&tlng=pt ; ver também Goulart, Um cenário
Omefistofélico: a gripe
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https://www.historia.uff.br/academico/media/aluno/417/projeto/Dissert-adriana-
da-costa-goulart.pdf

11 Roxin/Greco, Strafrecht, Allgemeiner Teil, 5ª ed., Munique, 2020, § 2 nm. 7 e ss.

12 A respeito da dimensão coletiva da “saúde pública”, com interessantes notas ao

direito português, ver Aires de Sousa, Saúde pública, direito penal e “abate
clandestino”, in: https://itercriminis.blog/2020/04/13/saude-publica-direito-penal-
e-abate-clandestino/?fbclid=IwAR0QUpAgLonv5OED6jndY0-
Uwd1lViOnYxirFDhee0iDnEdKVFOdJ-ZQ-tk

13 Goulart, Revisitando a espanhola: a gripe pandêmica de 1918 no Rio de Janeiro,

in: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
59702005000100006&lng=pt&tlng=pt

14 Cf. o estudo de Correia/Luck/Verner, Pandemics depress the economy, public

health interventions do not, in: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?


abstract_id=3561560

15 Ver https://www.migalhas.com.br/quentes/323030/ha-102-anos-gripe-

espanhola-paralisou-o-brasil

16 Schwarcz/Starling, Brasil: uma biografia, São Paulo, 2015, p. 329.

17 Cf. Schwarcz/Starling, Brasil: uma biografia, p. 330.

18 Schwarcz/Starling, Brasil: uma biografia, p. 328 e ss.

19 Como noticia, em saboroso texto, Boselli: https://www.conjur.com.br/2020-mar-

29/hc-inicio-seculo-20-impediu-prisao-febre-amarela . O RHC 2244 pode ser


acessado in: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?
servico=sobreStfConhecaStfJulgamentoHistorico&pagina=rhc2244

20 Cf. Hungria, Comentários ao Código Penal, vol. IX, Rio de Janeiro, 1958, p. 100 e

ss., que, contudo, não menciona os projetos nacionais que antecederam o CP de


1940.

21 “Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário


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22 Palavras de Hungria, O Direito Penal do Estado Novo, Revista Forense (1941), p.

265 e ss., p. 272.

23 Binding, Die Normen und ihre Übertretungen, vol. I, 1872, p. 161-162.

24 Cf. por todos, Batista, Introdução crítica ao Direito Penal brasileiro, 11a ed., Rio de

Janeiro, 2007, p. 73 e ss.

25 Ver, no Brasil, as monografia de Alflen da Silva, Leis penais em branco e o direito

penal do risco, Rio de Janeiro, 2004 e de Falavigno, A deslegalização do Direito Penal,


Florianópolis, 2020.

26 Cf., com as devidas referências, Greco, A relação entre o Direito penal e o Direito

Administrativo no Direito Penal Ambiental: uma introdução aos problemas da


acessoriedade administrativa, in: Revista Brasileira de Ciência Criminais 58 (2006), p.
152 e ss. (p. 165 e ss.).

27 BVerfGE 143, 38, de setembro de 2016; a respeito, com ulteriores referências,

Roxin/Greco, Strafrecht, Allgemeiner Teil, § 5 nm. 68a, 77c e ss.

28 Cf. Montenegro/Viana, in: https://www.jota.info/opiniao-e-

analise/colunas/penal-em-foco/coronavirus-um-diagnostico-juridico-penal-
23032020: “A cláusula ‘destinada a impedir introdução ou propagação de doença
contagiosa’ é também excessivamente ampla: ela se aplicaria para quaisquer
determinações sobre doenças contagiosas, independentemente da gravidade e
velocidade de propagação?”.

29 Por exemplo, a Lei de Proteção contra infecções existente na Alemanha (Gesetz

zur Verhütung und Bekämpfung von Infektionskrankheiten beim Menschen),


acessível em: https://www.gesetze-im-
internet.de/ifsg/BJNR104510000.html#BJNR104510000BJNG000100310. Sobre
a situação alemã ver Lorenz/Turhan, in: https://www.faz.net/einspruch/corona-
krise-verantwortungslosigkeit-kann-strafbar-sein-16689724/polizisten-
patrouillieren-16689745.html ; Lorenz/Oglakcioglu, Keine Panik im Nebenstrafrecht,
KriPoZ 2/2020, p. 108 e ss., disponível in: https://kripoz.de/wp-
content/uploads/2020/03/lorenz-oglakcioglu-zur-strafbarkeit-wegen-
verstoessen-gegen-sicherheitsmassnahmen-nach-dem-ifsg.pdf

30 Cf.fazAmore/Cardoso, in: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/direito-


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11042020

31 Montenegro/Viana, in: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/penal-

em-foco/coronavirus-um-diagnostico-juridico-penal-23032020

32 Ver as considerações de Caputo Bastos/Pacheco Bastos, in:

https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-covid-19-e-a-inconstitucional-
relativizacao-do-federalismo-brasileiro-14042020 ; ver também as reflexões de
Duque, in: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/emergencia-sanitaria-
constitucional-no-contexto-federativo-12042020

33 Hungria, Revista Forense (1941), p. 265 e ss

34 Transcrevemos o que nos parece pertinente: “O Govêrno Federal intervirá nos

Estados mediante a nomeação, pelo Presidente da Republica, de um Interventor, que


assumirá no Estado as funcções que pela sua Constituição competirem ao Poder
Executivo, ou as que, de accordo com as conveniencias e necessidades de cada
caso, lhe forem attribuidas pelo Presidente de Republica: … b) para restabelecer a
ordem gravemente alterada, nos casos em que o Estado não queira ou não possa
fazel-o; …”

35 Cf., em detalhe, Machado Cabral, Federalismo, autoridade e desenvolvimento no

Estado Novo, in: Revista de Informação Legislativa, ano 48, n. 189 (2011), p. 133 e
ss., que também recorda o art. 9 da Constituição de 1937 (p. 142).

36 Hungria, Comentários ao Código Penal, vol. IX, p. 101.

37 Confira-se o Decreto português, n. 2-A/2020, acessível em:

https://dre.pt/application/conteudo/130473161

38 Tangerino/Rodrigues, in: https://www.conjur.com.br/2020-abr-01/tangerino-

brezinski-crime-infracao-medida-sanitaria?fbclid=IwAR3MZFWoP-
cQprQCTdhlwWfvkvlt46UwpSlHnZXYe0NCMFaG2PNjR1YCncg

39 Ver o interessante artigo de Daud, Uma interpretação de “serviços públicos e

atividades essenciais”, in: https://www.jota.info/especiais/o-direito-no-combate-


ao-coronavirus-03042020

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multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem
prejuízo da multa.“

41 Destaquem-se, entretanto, as monografias citadas acima, nota 27.

42 Enquanto a interpretação restritiva se move na chamada zona de penumbra,

excluindo da incidência de determinada norma um caso duvidoso, mas


possivelmente compreendido pelo sentido literal de seus termos, a redução
teleológica exclui dessa incidência um caso univocamente compreendido por esses
termos. Sobre essa diferença, que aqui não precisa ser aprofundada, Larenz/Canaris,
Methodenlehre der Rechtswissenschaft, 3a. ed. 1995, p. 210 e ss. (há traduções para
o espanhol e para o português); T. Möllers, Juristische Methodenlehre, 2017, § 6 nm.
115 e ss.; cf., ademais, Schünemann, Espiral ou ovo estrelado? Modelos de aplicação
do direito: do modelo hermenêutico ao modelo da filosofia analítica da linguagem,
trad. D. Campos, in: Schünemann, Estudos de direito penal, direito processual penal e
filosofia do direito, São Paulo, 2013, p. 285 e ss.

43 Cf. apenas Roxin/Greco, Strafrecht, Allgemeiner Teil, § 12 nm. 100 e ss.; em

português, consulte-se Horta, Elementos normativos das leis penais e conteúdo


intelectual do dolo. Da natureza do erro sobre o dever extrapenal em branco, Madrid
etc., 2016.

44 Roxin/Greco, Strafrecht, Allgemeiner Teil, § 12 nm. 111a, com ulteriores

referências.

45 Sobre esse problema, vide as considerações fundamentais de Naucke,

Staatstheorie und Verbotsirrtum, Festschrift für Roxin, Berlim, 2001, p. 503 e ss.

46 Leite, Dúvida e erro sobre a proibição no Direito Penal, 2a ed., São Paulo, 2014; cf.

também Roxin/Greco, Strafrecht, Allgemeiner Teil, § 21 nm. 29 e ss.

47 Há quem sustente que, nesses casos, falta mesmo lei que regule o caso; ou

quem entenda que o problema não é de erro de proibição, e sim de inexigibilidade


(referências nos trabalhos citados na nota anterior).

48 Mais detalhes em Leite, Dúvida e erro sobre a proibição no Direito Penal, p. 105 e

ss., p. 117 e ss.

49 Ver
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ALAOR LEITE – Docente-Assistente junto à Cátedra de Direito Penal, Direito Processual Penal, Direito penal
Estrangeiro e Teoria do Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Humboldt, de Berlim; Doutor
e LL. M. em Direito (LMU Munique).

LUÍS GRECO – Professor Catedrático de Direito Penal, Direito Processual Penal, Direito penal Estrangeiro e
Teoria do Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Humboldt, de Berlim; Doutor e LL. M. em
Direito (LMU Munique).

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