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Erosão hídrica e o uso da terra na Bacia Hidrográfica do Rio Pardo no

estado de São Paulo

Universidade Estadual Paulista – UNESP


Av. Renato da Costa Lima, 451, Residencial Ville de France

Resumo
Em 2015 foi criada a Agenda 2030 com o objetivo de mitigar os impactos ambientais no planeta. O objetivo 15
tem como um dos temas a conservação dos solos e a redução da degradação por processos erosivos. Nesse
contexto, este trabalho busca identificar, analisar e quantificar as áreas afetadas por erosões hídricas do tipo
linear na Bacia Hidrográfica do Rio Pardo e relacionar esses processos com o tipo de uso da terra onde são
encontrados e a pedologia do local. Com a utilização do Software SPRING foi realizado a produção do mapa de
uso e cobertura da terra e com o Software QGis 3.10, foi realizado o cruzamento dos dados de pontos de erosão
linear, classe de uso e cobertura da terra e composição pedológica. Verificou-se que as áreas de cultivo
temporário e o manejo de pastagem concentram mais da metade dos 250 pontos identificados. O manejo de
pastagem representa uma maior preocupação devido a alta concentração de processos erosivos, evidenciando a
imediata necessidade de implantação de manejos que garantam a produção econômica associada a proteção e
conservação do sistema solo.

Palavras-chaves: Erosão linear, Geoprocessamento, Bacia Hidrográfica.

1. Introdução
Em 2015 foi firmado um compromisso entre os países que compõem a Organização das
Nações Unidas (ONU), no qual, assumiram as responsabilidades em atender os objetivos da
Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Neste documento são descritos 17
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas a serem alcançadas até 2030
(ONU, 2015). O ODS número 15 assume a responsabilidade em combater a degradação do
solo e promover a recuperação de áreas já degradadas.
Segundo o relatório das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO / ONU),
realizado no ano de 2018, 33% de todo o solo do planeta apresenta-se degradado.
A classificação do solo, o uso e a cobertura da terra, a declividade do terreno e o clima,
são fatores relacionados aos processos erosivos e de degradação dos solos. Porém comumente
o processo erosivo se inicia por fatores antrópicos (GUERRA, 2014).
O processo erosivo hídrico caracteriza-se pelo transporte de material desagregado do
solo, ocasionado pelo escoamento superficial difuso, o qual pode concentrar-se nas
irregularidades do terreno e gerar processos de erosão acelerada de forma linear. A erosão
linear pode apresentar-se de três formas distintas a depender do quão avançado estejam tais
processos.
Inicia-se com o surgimento de pequenos sulcos, os quais podem, sob a ação do
escoamento d’água, evoluir para uma ravina e posteriormente boçorocas, estado mais
avançado do processo erosivo, no qual pode atingir vários metros e expor o aquífero livre
(LEPSCH, 2010), trazendo prejuízos econômicos, para recuperação da área, prejuízos
ambientais, com o assoreamento de corpos d’água e redução da qualidade da água, e prejuízos
sociais, quando ameaça uma área habitada.
Nesse contexto, este trabalho buscou-se identificar, analisar e quantificar as áreas
afetadas por erosões hídricas do tipo linear na Bacia Hidrográfica do Rio Pardo (BHRP)/SP e
relacionar esses processos com o tipo de uso da terra onde são encontrados e a pedologia do
local.
2. Área de Estudo
A Bacia Hidrográfica do Rio Pardo possui aproximadamente 4.988,663km² e está
inserida na UGRHI-17 (Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos - 17), também
conhecida como Bacia Hidrográfica do Médio Paranapanema (Figura 1).

Figura 1 - Mapa de localização da BHRP.


Com a nascente nas proximidades do Município de Pardinho/SP, o rio principal percorre
264 km do interior paulista, e atravessa os territórios de 14 municípios, até chegar a sua foz,
localizada no Município de Salto Grande/SP, e finalmente desaguar no rio Paranapanema,
contribuindo na recarga de dois importantes aquíferos livres, o Bauru e o aquífero Serra
Geral, além de possuir áreas de recarga do aquífero confinado Guaraní (PIROLLI, 2013).
Considerado um rio com águas de classe dois (CETESB, 2019), indica seu elevado índice
de qualidade da água (IQA), a qual pode ser destinada ao abastecimento para consumo
humano após tratamento convencional, de acordo com a resolução 357 do Conselho Nacional
de Meio Ambiente (BRASIL, 2005).
Devido tais características, a água do Rio Pardo é utilizada para o abastecimento da rede
pública dos municípios de Pardinho, Botucatu, Santa Cruz do Rio Pardo e Ourinhos,
atendendo mais de trezentas mil pessoas (CAVALCHUKI, 2015).
A origem de seu nome é devido ao predomínio de Latossolo Vermelho, o qual é
responsável por atribuir a coloração parda as águas do rio, devido o transporte de sedimentos
de solo pelo corpo hídrico (PIROLI, 2011).
Inserida na zona climática Tropical Brasil Central subquente (IBGE, 2010), possui
pluviometria relativamente bem distribuída ao longo da bacia, com índices médios de
precipitação anual variando entre 1300 mm e 1500 mm (CPRM, 2011).
Por localizar-se em área de transição vegetacional, encontram-se duas vegetações
predominantes, a Floresta Estacional Semidecidual próximo das nascentes a montante e no
entorno da foz a jusante, e a vegetação típica de savana (cerrado) na porção central da bacia
(IBGE, 2010).
3. Procedimentos Metodológicos
Os dados das incidências de erosão foram obtidos do banco de dados do Instituto de
Pesquisas Tecnológicas (IPT, 2012).
As áreas das bacias hidrográficas do Paranapanema, Médio Paranapanema e do rio Pardo,
foram obtidas a partir do banco de dados da Agência Nacional de Águas (ANA), bem como a
hidrografia da área de estudo.
Foram utilizadas imagens do satélite Sentinel-II com resolução espacial de 10 metros,
disponibilizadas gratuitamente no site da USGS. Foram coletadas 3 imagens do satélite, sendo
uma datada de 29/11/2019 e outras 2 datadas de 26/12/2019. A escolha das imagens respeitou
o critério de temporalidade, conservando a qualidade da classificação das classes de uso da
terra.
Foram escolhidas as bandas 8, 4 e 3, do Sentinel-II, representando as cores Infravermelho
próximo, Vermelho e Verde, para gerar a imagem falsa cor utilizada para a realização da
segmentação e classificação por meio do Software SPRING versão 5.5.6.
A classificação do uso da terra foi realizada por meio do método de classificação
supervisionada de Bhattacharya (SANTOS et al., 2010). A segmentação por regiões da área
de estudo foi realizada em 2 etapas devido a temporalidade entre as imagens de satélite. A
similaridade entre os pixels foi definida em 5% e a área mínima a ser segmentada em 1000
pixels. Assim foi gerado um mapa de segmentação altamente detalhado.
A classificação de uso e cobertura da terra foi realizada respeitando as definições
estabelecidas no Manual Técnico de Uso da Terra do IBGE com escala na proporção de
1:100.000 (IBGE, 2013).
Com a utilização da ferramenta Interseção do software QGis 3.10, foi realizado o
cruzamento dos dados de erosão linear, de classe de uso e cobertura da terra, e de pedologia.
A partir do cruzamento dos dados foi gerada uma tabela de atributos exportada para o
software excel, possibilitando quantificar e relacionar os pontos de erosão com as demais
características.

4. Resultados
Foram identificadas 250 incidências de erosão linear na área de estudo. Dentre todos os
pontos identificados apenas 20 pontos foram classificados como ravinas, as quais podem
atingir alguns metros de profundidade no solo e sua extensão em comprimento pode superar
dezenas de metros (IPT, 2012).
Um dado preocupante diz respeito aos 230 processos erosivos que se encontram em
estado de voçorocas, ou seja, trata-se de processos erosivos bastante intensos podendo atingir
dezenas de metros de profundidade e largura, e centenas de metros de extensão em seu
comprimento (PICHLER, 1953). As voçorocas atingem o nível das águas subsuperficiais do
terreno o que resulta em acentuado aceleramento do processo erosivo. Os danos causados
pelas voçorocas vão desde a perda de solo agrícola, destruição de equipamentos urbanos,
como estradas, prédios e infraestrutura hidráulica, causam assoreamento dos corpos d’água,
além de outras perdas ambientais.
Foi identificado que a BHRP possui 372.851 ha com a presença de latossolos, o que
corresponde a 75% de toda a área (Figura 2). A classe Latossolo apresenta a maior quantidade
de processos erosivos, com 120 pontos de erosão, seguido pelas regiões com Argissolo que
apresentam 85 pontos, Nitossolos 27, Gleissolos 2, Neossolos apenas 1 ponto de erosão. Há
também regiões nas quais os solos não foram classificados, que correspondem a 15 pontos e
encontram-se todos inseridos nas áreas urbanizadas (Tabela 1).
Figura 2 - Mapa pedológico da BHRP
Já no mapa de uso e cobertura da terra (Figura 3) é possível identificar o predomínio das
áreas ocupadas pela classe de cultivo temporário, as quais estão associadas com o cultivo de
plantas perenes como a cana de açúcar, que abastece as usinas sucroalcooleiras da região.

Figura 3 - Mapa de uso e cobertura da terra da BHRP


Observa-se também que as áreas ocupadas pela classe de vegetação natural acompanham
os corpos d’água, o que pode ser relacionado com a proteção das Áreas de Preservação
Permanentes (APP) por meio da lei 4.771, de 1965 a qual foi reformulada em função da lei
12.651, de maio de 2012.
Dos 491 mil hectares (ha) classificados, mais de 186 mil ha são destinados ao cultivo
temporário o que corresponde a maior classe de uso encontrada, ocupando 37,4% da área
(Tabela 1).

Tabela 1 - Relação de pontos de erosão com dados de uso e cobertura da terra, e pedologia.

Constata-se 80 pontos de erosão nas áreas de cultivo temporário, os quais correspondem


a 32% do total de processos erosivos encontrados na bacia. Apenas 11 foram identificados
nos cultivos permanentes, o que correspondendo a apenas 4,4% dos pontos de erosão. Nas
áreas de pastagem são encontrados 81 pontos, representando 32,4% sendo assim a maior
porcentagem de pontos de erosão catalogados (Tabela 1).
A vegetação natural é afetada por 36 pontos de erosão, 14,4% do total, o que supera
outras classes de uso e cobertura da terra, contrariando a expectativa.

5. Conclusão
As áreas destinadas à pastagem são as mais afetadas por processos erosivos lineares,
apresentando três vezes mais processos erosivos por hectare do que as áreas de cultivo
temporário.
Relação semelhante pode ser observada quanto à pedologia da bacia. Embora os números
absolutos indiquem maior quantidade de processos erosivos em solos da ordem latossolos,
em termos proporcionais, a classe de solo mais afetada por esses processos é da ordem dos
argissolos, os quais apresentam um ponto de erosão para cada 991 hectares de área, enquanto
os latossolos, com um ponto de erosão para cada 3107 hectares, apresentam-se
proporcionalmente menos afetados por tais processos.
Conclui-se que as áreas de pastagem e de cultivo temporário necessitam de maior atenção
e aplicação de manejos mais conservacionistas em busca de mitigar a degradação ambiental,
bem como garantir a produtividade em longo prazo dessas áreas de grande interesse
econômico.

6. Referências
BRASIL. Resolução nº 357, de 17 de Março de 2005. Publicada no DOU nº 053, de
18/03/2005. p. 58-63
CAVALCHUKI, L. C. Rio Pardo Vivo: movimento social de defesa do rio pardo contra
instalação de usinas hidrelétricas. Unesp, Ourinhos, 2015. 85 p.
COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). Relatório de
qualidade das águas interiores do estado de São Paulo - Apêndice M. CETESB. São
Paulo. 2019. 333p
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Unesp, Ourinhos, 2011. 23 p.
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