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Zelina Cardoso 1
1
Especialista em Letras pela Universidade Estadual Paulista – UNESP, campus de Assis. Especialista em Direito do Estado pela
Universidade Estadual de Londrina - UEL. Especialista em Gestão Educacional pelo Instituto Educacional de Assis – IEDA. Bacharel
em Direito pela Fundação Educacional do Município de Assis.
RESUMO
Este trabalho foi elaborado por meio de pesquisa bibliográfica, com vistas a dar enfoque às influências do
neoliberalismo e organizações internacionais na formulação das políticas públicas educacionais. É
importante salientar que o sistema educacional em vigor foi fruto da época da hegemonia neoliberal, que
originou a legislação responsável pelas diretrizes da educação. A filosofia neoliberal embora tenha sido
defendida Friedrich Von Hayek em 1945, só tomou força em meados da década de 70, quando ruiu o
sistema econômico do liberalismo de John Maynard Keynes. Nos anos de 1980 muitos países,
principalmente os da América Latina, estavam em crise de endividamento e com isso entrou em cena o
Banco Mundial para o gerenciamento da dívida, bem como promover o desenvolvimento dos países
mediante financiamentos externos. O Banco Mundial, ao identificar na educação um fator de
desenvolvimento humano, passou a tratá-la como peça fundamental nos acordos de financiamentos. Para
isso adotou medidas duras para a diminuição dos gastos públicos, o ensino obrigatório de responsabilidade
do Estado só para o ensino básico, direcionando a educação para o setor privado, sujeita às leis de
mercado. Assim, foram recomendadas medidas para a completa reforma do sistema educacional e do
próprio papel do Estado na sua administração e financiamento, visando à melhoria da qualidade, equidade
e eficiência. Estas medidas, originadas do poder dos organismos multilaterais, fundamentadas em princípios
neoliberais, foram ganhando o convencimento e o consentimento entre as autoridades governamentais e,
de governo em governo, foram sendo incorporadas na legislação brasileira.
Palavras-chaves: Neoliberalismo - Banco Mundial – reforma educacional brasileira - políticas pública
ABSTRACT
This work has been prepared through bibliographic search to give focus to the influences of neoliberalism
and international organizations in educational policymaking. It is important to stress that the educational
system was the fruit of neoliberal hegemony season, that originated the legislation responsible education
guidelines. The neoliberal philosophy, although it has been defended Friedrich Von Hayek in l945, only took
strength in the mid-1970s, when collapsed economic liberalism system of John Maynard Keynes. In the
years 1980 many countries, especially Latin American were in debt crisis and with that came on the scene,
the World Bank debt management, as well as to promote the development of countries through external
funding; The World Bank, to identify in education a human development factor, treat it as a fundamental part
of funding agreements. To this end adopted tough measures for the reduction of public spending,
compulsory education State responsibility only for basic education, directing education for the private sector,
subject to the laws of the market. Measures were recommended to the complete reform of the educational
system and the role of the State in its administration and funding, aimed at improving the quality, equity and
efficiency. These measures, from the power of multilateral bodies, based on principles were winning the
neoliberal view and consent between governmental authorities and government in government, have been
incorporated into the Brazilian legislation.
Keywords: Neoliberalism - World Bank - brazilian educational reform - public politics
É neste contexto neoliberal que pretende- fornecido pelos governos e teriam condições de
se situar o estudo das políticas educacionais, a escolher a educação que melhor fosse para seus
partir dos princípios básicos do neoliberalismo filhos (AZEVEDO, 1997, p. 15).
para a educação que dá “[...] ênfase ao ensino Na mesma linha de pensamento, Hayek
privado, na escola diferenciada/dual e na (1983, p. 450-451, apud AZEVEDO (1997, p. 16),
formação das elites intelectuais; formação para o ao se referir à educação dita, “Na verdade,
atendimento das demandas/exigências do quanto mais conscientes estivermos do poder que
mercado” (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003, a educação pode exercer sobre a mente humana,
p. 89). mais convencidos devemos estar do perigo de
Segundo Azevedo (1997, p. 14), entregar esse poder a uma única autoridade.”
comentando Frieedman (1984), as políticas E ainda,
sociais, tidas como não lucrativas, mantidas pelos Hoje, como as tradições e
instituições da educação universal
governos, tem efeitos nefastos, devido a estão firmemente implantadas e
como a maioria dos problemas
sobrecarga nos orçamentos, causando déficits criados pela distância já foi
resolvida pelo transporte moderno,
públicos. Com os programas sociais os governos não é mais necessário que a
educação seja não só financiada
hipertrofiam as máquinas burocráticas, aumentam mas também ministrada pelo
governo. Hayek (1983, p. 450-451,
os gastos, tendo assim necessidade de maiores apud AZEVEDO, 1997, p. 16)
receitas, quando vão buscá-las na sobrecarga
dos impostos e dos encargos, o que é É o chamado “[...] Estado Mínimo [...],
completamente nocivo à economia. segundo Ghiraldelli (2002, p. 11), ou, em outras
Por outro lado, o neoliberalismo, ao palavras, a minimização das atividades do
condenar o exercício das políticas públicas Estado, concretizando-se a transferência da
sociais pelos governos, não exclui totalmente a educação para a iniciativa privada com
educação. Desse modo, a corrente neoliberal tem financiamento do Estado, defendido pela doutrina
a educação como fator de redução da pobreza e neoliberal a partir dos anos de 1970 e durante os
das desigualdades sociais. Não obstante a essa anos de 1980.
visão, ele atribui aos governos a responsabilidade No liberalismo clássico havia entre os
apenas com o ensino básico. A par disso culpa as direitos do homem, o direito à educação e o
políticas educacionais dos Estados, pelas crises conteúdo político da cidadania. No neoliberalismo
por que vem passando os atuais sistemas prevalece o direito do consumidor e esse era
educacionais. Além disso, considera que a avesso aos investimentos públicos nos
educação, para ser bem sucedida, deve ter “[...] programas sociais. Isto representa virar as costas
por orientação principal os ditames e as leis que para os direitos sociais e políticos do homem. O
regem os mercados, o privado” (AZEVEDO, 1997, neoliberalismo prega a modernização, ou seja, a
p. 14-17). reforma do Estado para enquadrá-lo no “Estado
Os neoliberais postulam, portanto, um Mínimo”, reformar o sistema educacional para
tratamento específico para o sistema educacional adaptá-lo aos novos ideais (GHIRALDELLI, 2002,
em que parte da responsabilidade administrativa p. 44).
deve recair no âmbito privado. A finalidade seria Com o discurso de colocar o Brasil “[...]
provocar a competitividade, estimular o mercado na nova ordem mundial [...]”, dentro da inexorável
da educação e manter a boa qualidade do ensino. globalização da economia internacional, o
As famílias não ficariam adstritas ao ensino governo brasileiro e de muitos outros países,
Latina, e em especial o Brasil, trata-se geralmente João Goulart, sucessor do Presidente Jânio
da descentralização como um instrumento de Quadros.
maior eficiência administrativa recomendada não De acordo com dados de Antonio Bosco
só pelo Banco Mundial (BM), mas também pelo de Lima e Edaguimar Orquizas Viriato, baseados
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no Projeto de Pesquisa “As políticas de
Comissão Econômica para a América Latina descentralização, participação e autonomia:
(CEPAL) e Organização das Nações Unidas para desestatizando a educação pública” (2002), a
a Educação (UNESCO), no transcorrer dos anos política de descentralização no Estado de São
de 1990 (MILITÃO, 2003). Paulo remonta ao Governo de André Franco
Neste sentido, Silvio César Nunes Montoro (1983-1986) com programas como o
Militão (2003), fazendo menção à PROFIC (Programa de Formação Integral da
descentralização não deixa de citar Winklern Criança), construções escolares, municipalização
(1994), que disse: da merenda, ciclo básico.
A descentralização compreende Já no governo de Quércia (1987-1990) é
uma redefinição do papel do
governo central com uma maior definido o programa da municipalização da pré-
ênfase na fixação de políticas, no
financiamento e no fortalecimento escola com a devida descentralização da equipe
de uma prestação de serviços
eficiente e eqüitativa por parte do de apoio administrativo da rede pública de ensino.
governo regional e local (WINKLER,
1994, apud MILITÃO, 2003, p. 31). A isso se soma a implantação da jornada única
docente e discente no ciclo básico. Na
Por oportuno, reportando-se a oportunidade o ensino oficial passou a ser
descentralização do ensino é importante que se responsabilidade do município.
faça referência a discussão quando da Com o governo de Fleury Filho (1991-
apresentação do anteprojeto da LDB, em 1994) adveio o programa de reforma educacional
1948,frente aos interesses das escolas com as Escolas-Padrão, cuja meta era um ensino
particulares. Segundo interesses dos seus de qualidade. Com isso a jornada escolar passou
dirigentes, no caso na maioria congregações a ser ampliada para cinco horas diárias e,
religiosas “[...] a escola leiga não educa, apenas consequentemente, o aumento das horas
instrui” (ARANHA, 1996, p. 204). Tudo isso levou atividades do educador. Além disso, o Conselho
a que a Lei n. 4.024 só fosse publicada em 1961. de Escola passou a ter maior poder de decisão,
Inclusive, “[...] a lei atende também as escolas repasses de recursos diretamente da Secretaria
privadas” (idem, 1996, p. 204), conforme Artigo de Educação com a criação da Caixa de Custeio.
95, que dita, “A União dispensará a sua Para isso o então governador submeteu o Estado
cooperação financeira ao ensino sob a forma de: a um empréstimo junto ao Banco Mundial.
[...] c) financiamento a estabelecimentos mantidos No governo de Mário Covas, com dois
pelos estados, municipais e particulares (grifo mandatos (1995-2002), a preocupação com a
nosso) [...] (p. 204-205).” qualidade do ensino, de acordo com as diretrizes
Pelo que se observa no dispositivo legal a educacionais são determinadas pela “[...] reforma
descentralização do ensino é mantida, no entanto e racionalização da estrutura administrativa” e
com o uso do dinheiro público. Portanto o “mudanças nos padrões de gestão”, passando a
interesse pela descentralização remonta aos responsabilidade do Estado para setores não
tempos do governo do Presidente da República estatais, o que determina a efetiva
descentralização no âmbito do Estado.
Por oportuno, merecem destaque as foi colocado à disposição dos professores para
palavras de Militão (2003), a seguir: sua avaliação final, “[...] sob a coordenação do
[...] a política de descentralização é CNE/CEB.”, que o encaminhou à SEF. Não cabe
concebida apenas como uma forma
de passar a responsabilidade do no momento apontar as conclusões do voto do
provimento e financiamento dos
serviços públicos para as relator, pois essas vão servir de base em uma
comunidades locais, livrando desta
maneira o Estado de arcar com o próxima oportunidade. Segundo Maria Inês
ônus financeiro desta tarefa, como
preconiza o ideário neoliberal. Pestana, diretora responsável pela avaliação
básica do Inep e pelo Saeb, com a terceirização
O objetivo da política, com o argumento dos PCN o Estado deixou de envolver-se com o
da eficiência da administração pública e melhoria operativo, o que possibilitou a oportunidade dele
da equidade, qualidade e controle, é a pretensão deparar-se com outras frentes necessárias na
de manter com o governo central, segundo Peroni educação.
(2003, p. 12), De acordo com as propostas
[...] controle ideológico da educação
através dos parâmetros curriculares recomendadas pelo Banco Mundial, há
da avaliação institucional e, ao
mesmo tempo, para um processo
claramente a sua interferência nas políticas
de descentralização da oferta e dos públicas que definiram as políticas educacionais
recursos, inclusive desobrigando a
União para com o financiamento da brasileiras, com a incorporação dos seus
educação básica.
postulados na legislação brasileira e que será
A autora ainda acrescenta que “O tratada em um outro artigo.
movimento de descentralização foi acompanhado
de mecanismos que levaram à privatização, CONSIDERAÇÕES FINAIS
terceirização e publicização dos serviços O neoliberalismo é contrário a
públicos”. investimentos em políticas públicas sob a
Assim, com a publicização se concretiza bandeira de que estas não trazem lucros,
a “[...] transferência da gestão administrativa da acarretam aumento da burocracia, aumento das
esfera pública para a esfera privada”. Neste despesas e, em consequência, podendo gerar
aspecto seria incoerente falar em déficits públicos que acabam em aumento de
descentralização, sem abrir um maior espaço carga tributária, esta completamente nociva à
dando lugar a um breve comentário sobre o economia.
processo de terceirização na elaboração dos Quanto à educação, os ideais neoliberais
PCN. Segundo Peroni (1990, p. 105) “Para a não são completamente contra a
elaboração dos PCN, uma equipe foi contratada responsabilidade e o investimento público. Ao
pela Secretaria de Ensino Fundamental do MEC, contrário, o neoliberalismo até vê na educação
em 1995.” Com isso a equipe passou a ser um potente elemento de redução da pobreza e,
integrada por “[...] professores com exercício no por efeito, um gerador de desenvolvimento
ensino fundamental, especialistas, assessores e econômico. Mas, só o ensino básico, que no
por consultores nacionais e estrangeiros.” Brasil se sacramentou como ensino fundamental,
O trabalho iniciou com um “[...] seria de responsabilidade do Estado.
levantamento dos currículos [...]” de determinadas Em que pese o distanciamento do poder
capitais brasileiras, inclusive de outros países. público dos investimentos no ensino
Após uma análise sobre o assunto, passados dois profissionalizante, médio e superior, preconizado
anos, foi emitido o parecer n. 3/97. O documento pela corrente neoliberal, procura favorecer os
estudantes sem recursos com empréstimos para pobres que estavam sendo incluídos na nova
serem pagos após a formatura e o financiamento ordem mundial.
por meio de “cupons” de acordo com programas
pré-definidos. Entendendo a educação como
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
sujeita às leis de mercado, a competitividade
ARANHA, M. L. A. História da Educação. São
geraria a boa qualidade do ensino. A qualidade
Paulo: Editora Moderna Ltda., 1996.
geraria a escolha da melhor educação que os
pais prefeririam para os filhos. AZEVEDO, J. L. A Educação como Política
A crise do endividamento dos países da Pública. São Paulo: Editora Antunes
América Latina, inclusive o Brasil, que acarretou Associados, 1997. v. 56.
forte crise nas economias, com desemprego,
BIANCHETTI, R. G. Modelo Neoliberal e
incapacidade de pagamentos, déficits públicos,
Políticas Educacionais. 2.ed. São Paulo:
pobreza, passou a ser gerenciada pelo FMI e o
Cortez Editora, 1996.
Banco Mundial, visando a reestruturação das
economias desses países. Ela teve um legado BRASIL INSTITUTO Nacional de Estudos e
negativo que, em virtude dos métodos ortodoxos Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP.
momento em que o Banco Mundial vislumbrou na BRASIL. Presidência da República. Casa Civil.
educação um aspecto capaz de influir na redução Subchefia para Assuntos Jurídicos. Emenda
da pobreza, esse teve um papel positivo na Constitucional n. 14, de 1996. Disponível em:
melhoria do nível educacional nos países em <www.pedagogia.pro.br/ec14_96.htm>. Acesso
desenvolvimento. Como a educação na América em: 28 mar. 2009.
Latina nos anos 1970 apresentava condições
GHIRALDELLI JUNIOR., P. Infância, Educação
críticas, com um grande número de repetência,
e Neoliberalismo. 3.ed. São Paulo: Cortez,
baixo aprendizado, evasão escolar, a partir das
2002. (Coleção Questões da Nossa Época: v.
mudanças houve uma sensível melhora no
61).
sistema educacional. Resultado: investimentos na
área educativa, nos anos de 1991 a 1994, HADDAD, S. O Banco Mundial e as Políticas
atingindo 29% do total dos empréstimos, o que Educacionais. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2000.
Por outro lado, o Banco Mundial não tinha LIBÂNEO, J. C.; OLIVEIRA J. F.; MIRZA, S. T.
outra maneira senão formular suas políticas de Educação Escolar: políticas, estrutura e
maneira uniforme para todos os países organização. São Paulo: Cortez Editora, 2003.
envolvidos, haja vista a impossibilidade de se
MILITÃO, S. C. N. O ideário neoliberal e as
regionalizar. Outro elemento significativo eram as
políticas educacionais para a América Latina.
necessidades das diversas regiões. Tudo isso, o
2003. Tese (Mestrado). UNESP, Campos de
levou a utilizar os parâmetros com base nas
Marília, São Paulo.
literaturas dos autores do seu conhecimento, no
caso estrangeiros, que de acordo com sua ótica,
seriam aplicáveis e necessárias para países