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GRUPO EDUCACIONAL GENOMA

Disciplina: Estudo dos Recursos Hídricos CH: 56 h

Professor: M.Sc. Iuri Machado Nahon


Curso: Técnico em Meio Ambiente

Abaetetuba-PA
2007
SUMÁRIO
1 Introdução ao estudo dos recursos hídricos...........................................................................................1
2 Ciclo hidrológico, balanço hídrico e vazões de cursos de água.............................................................4
2.1 Resposta de uma bacia hidrográfica...............................................................................................5
2.2 Balanço Hídrico .............................................................................................................................7
2.2.1 Generalidades .......................................................................................................................7
2.2.2 Importância da água, de sua quantidade: Balanço Hídrico Mundial.....................................7
2.2.3 Balanço Hídrico – Conceitos e Aplicações...........................................................................9
2.3 Extensões de Séries de Vazões.....................................................................................................11
2.3.1 Utilização de fórmulas de correlação..................................................................................12
2.3.2 Utilização do Balanço Hídrico............................................................................................13
2.4 Vazões de cursos de água.............................................................................................................16
3 Bacias hidrográficas: conceito, classificação e elementos físicos .......................................................22
3.3 Delimitação da bacia ....................................................................................................................24
3.4.1 Forma da Bacia...................................................................................................................26
3.4.2 Relevo.................................................................................................................................28
3.4.3 Padrões de drenagem ..........................................................................................................32
3.4.4 Cobertura vegetal da bacia..................................................................................................35
3.5 Características Geológicas ...........................................................................................................35
3.6 Transporte de Sedimentos ............................................................................................................36
3.7 Características Térmicas ..............................................................................................................36
3.8 Ocupação e Uso do Solo ..............................................................................................................36
4 Bacias regionais brasileiras .................................................................................................................38
4.1 Região Hidrográfica Amazônica..................................................................................................38
4.2 Região Hidrográfica Tocantins–Araguaia....................................................................................39
4.3 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental .....................................................................40
4.4 Região Hidrográfica Parnaíba ......................................................................................................40
4.5 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental........................................................................40
4.6 Região Hidrográfica São Francisco..............................................................................................41
4.7 Região Hidrográfica Atlântico Leste............................................................................................41
4.8 Região Hidrográfica Atlântico Sudeste........................................................................................42
4.9 Região Hidrográfica Paraná .........................................................................................................42
4.10 Região Hidrográfica Atlântico Sul ...............................................................................................43
4.11 Região Hidrográfica Uruguai .......................................................................................................43
4.12 Região Hidrográfica Paraguai ......................................................................................................43
5 Usos Múltiplos, Classificação, Parâmetros e Índices de Qualidade dos Recursos Hídricos ...............45
5.1 Usos múltiplos da água ................................................................................................................45
5.1.1 Abastecimento humano ......................................................................................................45
5.1.2 Abastecimento industrial ....................................................................................................46
5.1.3 Irrigação..............................................................................................................................46
5.1.4 Geração de energia elétrica.................................................................................................47
5.1.5 Navegação ..........................................................................................................................47
5.1.6 Diluição de despejos...........................................................................................................48
5.1.7 Preservação da flora e fauna ...............................................................................................48
5.1.8 Aqüicultura .........................................................................................................................48
5.1.9 Recreação ...........................................................................................................................48
5.1.10 Usos diversos da água e conflitos .......................................................................................49
5.2 Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA e a classificação dos corpos de água..................50
5.3 Parâmetros de qualidade da água .................................................................................................52
5.3.1 Parâmetros físicos...............................................................................................................52
5.3.2 Parâmetros químicos...........................................................................................................56
5.3.3 Parâmetros biológicos.........................................................................................................72
5.4 Índices da qualidade da água........................................................................................................74
5.4.1 Índice usado pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB)..............74
6 Principais fontes e processos poluidores dos recursos hídricos...........................................................79
6.1 Tipos de poluição .........................................................................................................................80
6.1.1 Poluição natural ..................................................................................................................80
6.1.2 Poluição industrial ..............................................................................................................80
6.1.3 Poluição urbana ..................................................................................................................81
6.1.4 Poluição agropastoril ..........................................................................................................81
6.2 Quantificação de cargas poluidoras..............................................................................................82
6.2.1 Cargas Geradas por Esgotos Domésticos ...........................................................................84
6.2.2 Características de efluentes industriais ...............................................................................85
7 Modificações naturais dos recursos hídricos degradados....................................................................88
7.1 Demanda Bioquímica de Oxigênio ..............................................................................................91
7.2 Oxigênio Dissolvido.....................................................................................................................93
7.3 Modelagem Matemática da Qualidade da Água ..........................................................................96
7.3.1 Modelo de Streeter-Phelps..................................................................................................97
7.3.2 Modelo QUAL2E ............................................................................................................. 100
7.4 Formas de Controle da Poluição por Matéria Orgânica ............................................................. 101
8 Ocorrência, movimento e aproveitamento dos recursos hídricos subterrâneos ................................. 104
8.1 Funções dos Aqüíferos ............................................................................................................... 106
8.1.1 Função estocagem e regularização ................................................................................... 106
8.1.2 Função filtro ..................................................................................................................... 106
8.2 A Gestão Sustentável da Água ................................................................................................... 106
8.3 O Papel Estratégico das Águas Subterrâneas ............................................................................. 107
8.4 A Gestão das Águas Subterrâneas.............................................................................................. 108
9 Aspectos Legais sobre a gestão dos aos recursos hídricos no Brasil................................................. 114
9.1 Dos fundamentos, dos objetivos e das diretrizes gerais de ação da Política Nacional de Recursos
Hídricos ................................................................................................................................................ 116
9.2 Dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos.................................................... 117
9.2.1 Os planos de recursos hídricos ......................................................................................... 117
9.2.2 O enquadramento dos corpos de água .............................................................................. 119
9.2.3 A outorga de direito de uso de recursos hídricos.............................................................. 119
9.2.4 A cobrança pelo uso de recursos hídricos......................................................................... 122
9.2.5 O Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos ........................................................ 124
9.2.6 A compensação a Municípios ........................................................................................... 124
9.3 O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) .............................. 125
9.3.1 O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) ...................................................... 126
9.3.2 A Secretaria de Recursos Hídricos (SRH) ........................................................................ 127
9.3.3 A Agência Nacional de Águas (ANA) ............................................................................. 127
9.3.4 Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos (CERH) ........................................................ 128
9.3.5 Comitê de Bacia Hidrográfica (CBH) .............................................................................. 128
9.3.6 Agências de Água e entidades delegatárias ...................................................................... 129
9.3.7 Demais componentes do SINGREH................................................................................. 130
9.4 Legislação de Recursos Hídricos do Estado do Pará.................................................................. 133
10 Regularização de vazões e controle de enchentes e inundações dos cursos de água......................... 134
10.1 Regularização de vazões ............................................................................................................ 134
10.2 Controle de enchentes e inundações........................................................................................... 135
10.2.1 Definição .......................................................................................................................... 135
10.2.2 Causas............................................................................................................................... 135
10.2.3 Distribuição das enchentes e inundações durante o ano ................................................... 135
10.2.4 Métodos de combate às enchentes .................................................................................... 136
11 Sistemas cartográficos informatizados de bacias hidrográficas ........................................................ 138
11.1 Exemplo de um sistema cartográfico no software ArcView 3.2 da Bacia do Alto Iguaçu (Paraná)
................................................................................................................................................... 139
12 Referências Bibliográficas ................................................................................................................ 140
1

1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS RECURSOS HÍDRICOS


A água encontra-se disponível sob várias formas e é uma das substâncias mais
comuns existentes na natureza, cobrindo cerca de 70% da superfície do planeta. É
encontrada principalmente no estado líquido, sendo um recurso natural renovável por
meio do ciclo hidrológico. Todos os organismos necessitam de água para sobreviver e
sua disponibilidade é um dos fatores mais importantes para moldar os ecossistemas. É
fundamental que os recursos hídricos apresentem condições físicas e químicas
adequadas para sua utilização pelos organismos. Eles devem conter substâncias
essenciais à vida e estar isentos de outras substâncias que possam produzir efeitos
deletérios aos organismos que compõem as cadeias alimentares. Assim, disponibilidade
de água significa que ela está presente não somente em quantidade adequada em uma
dada região, mas também que sua qualidade seja satisfatória para suprir as necessidades
de um determinado conjunto de seres vivos (biota).
Há duas formas de caracterizar os corpos hídricos: com relação à sua quantidade e
com relação à sua qualidade, sendo que estas características são totalmente interligadas.
A qualidade da água depende diretamente da quantidade existente para dissolver, diluir
e transportar as substâncias benéficas e maléficas para os seres que compõem as cadeias
alimentares.
Estima-se que a massa de água total existente no planeta seja aproximadamente
igual a 265.400 trilhões de toneladas, distribuídas conforme apresentado na Figura 1.
Figura 1 – Distribuição percentual da massa de água do planeta

Fonte: Sabio (2007)


2

Portanto, apesar de existir em abundância no planeta, nem toda água é diretamente


aproveitada pelo homem. Um exemplo é em relação às águas salgadas dos oceanos que
não pode ser diretamente utilizada para abastecimento humano, pois as tecnologias
atualmente disponíveis para dessalinização são ainda um processo com custo bastante
elevado quando comparados com processos de tratamento de águas doces normalmente
utilizados para o uso doméstico. A água existente nas geleiras também é outra que não
tem viabilidade de ser consumida, pois estas se localizam muito distantes dos centros
consumidores, o que implica em altos dispêndios com transporte. Outro problema é
quanto às águas subterrâneas muito profundas, que também se torna um fator limitante
economicamente.
Do total de água do planeta (265.000 trilhões de toneladas), somente 0,5%
representa água doce explorável sob o ponto de vista tecnológico e econômico, que
pode ser extraída dos lagos, rios e aqüíferos. É necessário ainda subtrair aquela parcela
de água doce que se encontra em locais de difícil acesso ou aquela já muito poluída,
restando assim, para utilização direta, somente 0,003% do volume total de água do
planeta. Isso significa que se toda água do planeta correspondesse a 100 litros, a parcela
diretamente utilizável corresponderia a apenas 0,003 litros, ou meia colher de chá.
Além disso, a água doce é distribuída de forma bastante heterogênea no espaço e no
tempo. Essa distribuição heterogênea no espaço pode ser observada pela existência de
desertos, caracterizados por baixa umidade, e das florestas tropicais, caracterizadas por
alta umidade. Existe também a variabilidade temporal da precipitação em função das
condições climáticas, que variam devido ao movimento de translação da Terra.
Além das variações naturais características das fases do ciclo hidrológico,
importantes alterações têm ocorrido nas fases desse ciclo devido a intervenções
humanas, intencionais ou não. Por exemplo, a ocorrência de vapor atmosférico pode ser
alterada pela presença de reservatórios, pela modificação da cobertura vegetal e também
por alterações climáticas causadas por gases estufa, em que tais modificações podem
acarretar mudanças no regime de precipitações, afetando, portanto a disponibilidade de
água.
O uso do solo é fator de importância fundamental na ocorrência natural de água. O
desmatamento e a urbanização podem modificar o ciclo hidrológico ao diminuírem, por
exemplo, a evapotranspiração. Com o desmatamento há maior presença da umidade no
solo e sua capacidade de infiltração também diminui. Deste modo, existe uma tendência
de aumento do escoamento superficial durante eventos chuvosos, o que amplia a
3

freqüência de ocorrência de cheias. Tal fato tende a tornar-se gradativamente mais


intenso pela diminuição da proteção do solo contra a erosão e a conseqüente diminuição
de sua permeabilidade devido ao desmatamento.
Nas áreas urbanas ocorre a impermeabilização do solo por meio das construções e
da pavimentação das ruas. Assim, quando a precipitação atinge o solo, ocorre
escoamento superficial mais intenso devido a pouca ou nenhuma capacidade de
infiltração disponível. Essa impermeabilização do solo pela urbanização é uma das
principais causas das inundações nos centros urbanos.
4

2 CICLO HIDROLÓGICO, BALANÇO HÍDRICO E VAZÕES DE CURSOS


DE ÁGUA
A água constitui recurso natural renovável através dos processos físicos do ciclo
hidrológico. Movida pela ação da energia solar evapora-se dos oceanos, lagos, rios e da
superfície terrestre. Precipita-se sob forma de chuva, neve ou gelo, Corre pela
superfície, infiltra-se no subsolo, escoa pelos corpos de água superficiais e pelos
aqüíferos subterrâneos. É absorvida pelas plantas que a transpiram para a atmosfera, da
qual torna a precipitar-se e assim sucessivamente. A Figura 2 mostra as fases principais
do ciclo hidrológico.

Figura 2 – Fases do Ciclo Hidrológico

Fonte: Sabio (2007)

Precipitação
A precipitação compreende toda a água que cai da atmosfera na superfície da Terra.
As principais formas são: chuva, neve, granizo e orvalho. A precipitação é formada a
partir dos seguintes estágios:
 Resfriamento do ar à proximidade da saturação
 Condensação do vapor de água na forma de gotículas
 Aumento do tamanho das gotículas por coalizão e aderência até que
estejam grandes o suficiente para formar a precipitação
5

Escoamento superficial
A precipitação que atinge a superfície da Terra tem dois caminhos por onde seguir:
escoar na superfície ou infiltrar no solo. O escoamento superficial é responsável pelo
descolamento da água sobre o terreno, formando córregos, lagos e rios e eventualmente
atingindo o mar. A quantidade de água que escoa depende dos seguintes fatores
principais:
 Intensidade da chuva
 Capacidade de infiltração do solo
Infiltração
A infiltração corresponde à água que atinge o solo, formando os lençóis de água. A
água subterrânea é grandemente responsável pela alimentação dos corpos de água
superficiais, principalmente nos períodos secos. Um solo coberto com vegetação (ou
seja, com menor impermeabilização advinda, por exemplo, da urbanização) é capaz de
desempenhar melhor as seguintes importantes funções:
 Menos escoamento superficial (menos enchentes nos períodos chuvosos)
 Mais infiltração (maior alimentação dos rios nos períodos secos)
 Menos carreamento de partículas do solo para os cursos de água
Evapotranspiração
A transferência da água para o meio atmosférico se dá através dos seguintes
principais mecanismos, conjuntamente denominados de evapotranspiração:
 Evaporação: transferência da água superficial do estado líquido para o
gasoso. A evaporação depende da temperatura e da umidade relativa do ar.
 Transpiração: as plantas retiram a água do solo pelas raízes. A água é
transferida para as folhas e então evapora. Este mecanismo é importante,
considerando-se que em uma área coberta com vegetação a superfície de
exposição das folhas para a evaporação é bastante elevada.

2.1 Resposta de uma bacia hidrográfica


O estudo do ciclo hidrológico nos mostra que a água que passa por uma seção
qualquer de um curso de água tem sua origem na água precipitada. Denomina-se bacia
hidrográfica à área de drenagem a montante de uma determinada seção no curso de água
da qual aquela água é tributária. Essa área é limitada por um divisor de águas que a
separa das bacias adjacentes e que pode ser determinado nas cartas topográficas. As
6

águas superficiais, originárias de qualquer ponto da área delimitada pelo divisor, saem
da bacia passando pela seção definida e a água que precipita fora da área da bacia não
contribui para o escoamento na seção considerada.
A maneira pela qual se dão as variações de vazão em uma seção em relação à chuva
precipitada é denominada resposta de uma bacia. Uma bacia responderá diferentemente
à tempestades de intensidade e duração diferentes, assim como com chuvas idênticas, se
a condição antecedente variar. Pode-se observar o comportamento da bacia em relação a
uma chuva específica, analisando o hidrograma no período, ou seja, o gráfico da vazão
versus o tempo. A Figura 3 mostra um exemplo de um hidrograma típico de cheia.

Figura 3 – Exemplo de Hidrograma de Cheia

Ele representa a variação da vazão em uma seção de um curso de água para um


evento isolado de chuva. Note-se que geralmente pode-se traçar o hidrograma de uma
bacia mesmo para nenhuma precipitação, devido à perenidade dos rios. Esta perenidade
é causada pelo abastecimento de água feito a partir do escoamento subterrâneo (deflúvio
básico), onde o nível do rio está abaixo da superfície freática. Portanto, o pico do
hidrograma de cheia será mais acentuado quanto maior for a contribuição do
escoamento superficial direto, resultante da chuva em relação ao deflúvio básico. Isto se
dará para solos com pouca capacidade de infiltração, para bacias com declividade
acentuada, com influência de sua forma e do tipo de vegetação e também da distribuição
espacial da chuva na bacia. É interessante observar que a forma de um hidrograma vai
depender tanto das características físicas da bacia como também das características da
precipitação. Os estudos baseados na análise do hidrograma compreendem um dos
métodos conceituais usados na determinação de parâmetros de projeto, na
transformação da chuva em vazão.
7

2.2 Balanço Hídrico

2.2.1 Generalidades
Quando se consideram as condições disponíveis no meio ambiente, torna-se
evidente que a humanidade, a civilização e a tecnologia estão sendo rapidamente
ameaçadas em seus limites de desenvolvimento. Os limites resultam das reservas
naturais de matérias-primas, produção de alimentos e energia e o suprimento de água
potável. Em um planejamento sistemático para o futuro, o suprimento e a demanda de
água devem ser consideradas conjuntamente de forma a se equilibrar esse balanço, com
a ajuda da qual será possível o desenvolvimento do homem e do mundo.

2.2.2 Importância da água, de sua quantidade: Balanço Hídrico Mundial


Um dos recursos mais importantes da Terra é a água. Ela ocorre em três estados da
matéria: na forma sólida, como o gelo; na forma líquida, como a água; na forma gasosa,
como o vapor.
A água tem uma função crítica em quase todas as esferas da vida. Sua importância
pode ser ilustrada por meio de alguns exemplos:
 A água é um elemento construtivo na fotossíntese das plantas e é um
constituinte dos organismos;
 A água é um solvente para os nutrientes do solo;
 A água é de necessidade vital: o ar seco extrai de 1 a 2 kg de água
diariamente do corpo humano;
 A água é um condutor de energia (utilizada na geração de energia, causadora
de danos por enchentes);
 A água é um meio de transporte (águas residuárias, canais de drenagem,
navegação);
 A água é o mais importante regularizador de energia no balanço energético
da Terra; sem a evaporação, a vida na Terra na sua forma atual seria
impossível;
Nas zonas úmidas da Terra há um superávit de água, sendo que seu valor foi
subestimado por muito tempo. As zonas áridas da Terra, onde há sempre (ou por longos
períodos no ano) escassez de água, esta é considerada por seus habitantes como uma
preciosidade.
8

A Tabela 1 apresenta uma estimativa feita por N. Meinardus (1928) e H. Hoinkes


(1968) da quantidade de água disponível no planeta Terra. O volume total da água como
uma fração do volume da Terra (1,082 x 1012 km3) é de cerca de 1:777,2 ou 0,00129.
Uma parte da reserva de água está em circulação contínua e compõe uma
transferência, pois evapora das superfícies líquidas e do solo e após a condensação na
atmosfera é depositada novamente nas superfícies como precipitação líquida ou sólida.
Pela precipitação, a evaporação e o escoamento superficial são sempre repostos
como água potável (Tabela 2). O vapor de água em circulação na atmosfera formaria
com sua completa condensação e precipitação uma camada de água de somente 2 a 3
cm de profundidade na superfície da Terra. Comparando-se com a média de
precipitação anual na Terra (97cm), deduz-se que a vida média de uma molécula de
água na atmosfera é de cerca de 10 dias.
Tabela 1 - Volumes de água na Terra
Fonte Volume (km3) Porcentagem(%)
Oceanos 1.348.000.000 97,39
Gelo polar, geleiras, icebergs 27.820.812 2,01
Água subterrânea, umidade do solo 8.062.000 0,58
Lagos e rios 225.000 0,02
Atmosfera 13.000 0,001
Soma 1.384.120.000 100,00
Água potável 36.020.000 2,60

Tabela 2 - Água potável como porcentagem do seu total


Fonte Porcentagem (%)
Capa de gelo polar, icebergs, geleiras 77,23
Água subterrânea (até 800m de profundidade) 9,86
Água subterrânea (800 a 4000m) 12,35
Umidade do solo 0,17
Lagos (água potável) 0,35
Rios 0,003
Minerais hidratados 0,001
Plantas, animais, seres humanos 0,003
Atmosfera 0,04
Soma 100,00

A água disponível para uso na superfície da terra, da qual a humanidade, a economia


e a indústria dependem, constitui apenas uma fração da água total da terra e é renovada
pelo ciclo hidrológico.
9

2.2.3 Balanço Hídrico – Conceitos e Aplicações


Devido ao fato de que a quantidade total de água disponível na Terra é finita e
indestrutível, podemos encarar o ciclo hidrológico global como sendo um sistema
fechado. Um balanço hídrico pode ser desenvolvido para explicar os componentes
hidrológicos. De modo ilustrativo pode-se imaginar um sistema simples e altamente
restrito como o da Figura 4.

Figura 4 - Modelo simplificado de um sistema hidrológico

Considere uma superfície plana inclinada e completamente impermeável (a água não


pode passar através da superfície), confinada pelos quatro lados e com uma saída no
canto A. Desde que a superfície seja assumida como sendo completamente plana, não
haverá depressões nas quais a água poderá se armazenar. Se uma chuva for aplicada a
este sistema hidrológico simplificado, surgirá em A uma vazão de saída, denominada
escoamento superficial direto. Pode-se representar o balanço hídrico para este sistema
pela seguinte equação:
dS
I −Q = (1)
dt

onde:
I é a vazão de entrada;
Q é a vazão de saída;
dS/dt é a variação no armazenamento do sistema por unidade de tempo.
A vazão de saída não pode ocorrer até que se acumule água a uma profundidade
mínima para fornecer carga necessária ao escoamento, mas devido à intensidade da
chuva, a profundidade da água retida (retenção superficial) aumenta. Com o cessar da
precipitação, a água retida na superfície se transforma em vazão de saída do sistema. No
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exemplo citado, toda a entrada se transforma em saída, negligenciando-se a pequena


quantidade de água retida eletricamente na superfície e também qualquer evaporação
ocorrida durante o período (uma suposição razoável para o sistema descrito). Esta
ilustração elementar deve sugerir que qualquer sistema hidrológico pode ser descrito por
um balanço hídrico para se poder explicar a disposição das entradas de água no sistema
e a variação no armazenamento. A simplicidade do balanço hídrico é, no entanto,
freqüentemente enganosa, pois como será visto adiante, os termos da equação não
podem ser quantificados facilmente ou adequadamente.
Uma versão mais generalizada do balanço hídrico poderá explicar os vários
componentes de um ciclo hidrológico e fornecer a visão de técnicas de resolução de
problemas em regiões hidrológicas complexas. Tais regiões podem estar definidas pela
topologia, limitadas politicamente ou especificadas arbitrariamente. Uma bacia é uma
área definida topograficamente, drenada por um rio ou sistema de rios tal que toda a
vazão é descarregada em uma única saída. Os estudos de recursos hídricos eram
conduzidos no passado em bacias, pois estas áreas simplificam a aplicação do balanço
hídrico. Teoricamente, um balanço é possível para qualquer tipo de região, embora a
possibilidade de dados e o grau de refinamento dos métodos analíticos determina a
aplicabilidade daquele em um senso prático.
O balanço hídrico de uma área unitária da superfície da Terra é formado pelos
seguintes componentes:
P = precipitação;
E = evaporação;
Q = descarga, escoamento;
R = reserva, armazenamento;
U = uso, consumo;
A equação da continuidade se apresenta na seguinte forma:

P = E + D + R +U (2)

onde:
D pode significar o escoamento superficial ou subterrâneo;
R é o armazenamento temporário de água no solo;
U é a água utilizada física ou quimicamente.
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Em uma média de longo período pode-se admitir que R e U sejam constantes, de


forma que as flutuações dessas quantidades tornam-se insignificantes no balanço
hídrico, que pode ser simplificado para:

P = E +Q (3)

A dificuldade em se resolver problemas práticos repousa principalmente na


inabilidade em se medir ou estimar adequadamente os vários termos da equação do
balanço hídrico. Para estudos locais, são feitas freqüentemente medidas seguras, mas a
avaliação em uma escala global é usualmente grosseira. A precipitação é avaliada por
medidores dispostos em uma área. O escoamento superficial pode ser medido de várias
formas, tais como medidores em barragens, medidores de velocidade de fluxo, etc. Em
boas condições, estas medições são freqüentemente 95% precisas, mas grandes vazões
não podem ser medidas pelos métodos tradicionais. A umidade do solo pode ser
determinada usando-se provas de nêutrons e métodos gravimétricos; a infiltração
determinada localmente por infiltrômetros ou estimada através dos dados de chuva-
escoamento. Contudo as estimativas de umidade do solo e infiltração são geralmente
muito pobres. Também a determinação da quantidade de água evaporada e transpirada é
extremamente difícil no atual estágio de desenvolvimento da ciência.
A equação do balanço hídrico é um instrumento extremamente útil e que pode ser
usado de várias maneiras para estimar a magnitude e distribuição no tempo das
variáveis hidrológicas.

2.3 Extensões de Séries de Vazões


Já foi dito que o estabelecimento da vazão de projeto em um rio é realizado através
do estudo probabilístico de dados de vazões levantados previamente, em quantidade e
qualidade suficiente, para que se possam fazer as inferências necessárias a um nível de
precisão compatível com a responsabilidade do empreendimento. Esses estudos
requerem a realização de uma série de observações de vazões por um período de tempo
muito longo.
Poucos rios dispõem de séries de vazões observadas cumprindo esse requisito. De
fato, muitos dos empreendimentos são realizados em locais onde nunca se mediram
vazões. Mesmo quando existem dados de vazões, pode haver períodos na série em que
os dados se apresentam sabidamente incorretos, ou mesmo inexistentes. Há a
12

necessidade então de se estudar técnicas que permitem conhecer o comportamento das


vazões na seção de interesse, ao longo dos anos.

2.3.1 Utilização de fórmulas de correlação


Um caso importante é quando se conhecem vazões em um ponto próximo ao
estudado. Este ponto define outra bacia que deve ser muito semelhante à primeira para
que se estabeleça uma correlação aceitável entre ambas. As bacias devem ter
semelhança geométrica quanto à área, forma, declividade e relevo, semelhança
hidrológica quanto à precipitação, natureza do solo, armazenamento nos leitos fluviais e
semelhança geológica em relação aos fatores que influenciam o escoamento
subterrâneo.
A evaporação média anual de uma bacia para um período de longa duração varia
relativamente pouco. Em climas temperados oscila entre 400 e 600 mm, dependendo da
temperatura média, latitude, das precipitações e do grau de continentalidade do clima. A
relativa constância da evaporação média anual, resulta da interação de numerosas
variáveis que a condiciona e da dupla limitação, de um lado pelo poder de evaporar da
atmosfera e de outro, pela quantidade de água disponível, altura de precipitação.
A constância da evaporação média anual para zonas relativamente homogêneas,
levou ao estabelecimento de fórmulas empíricas, relacionando-a com elementos
meteorológicos de mais fácil determinação. Os mais importantes e os mais facilmente
acessíveis são:
 A temperatura média anual T do ar, que caracteriza na falta de elementos
melhores, o poder de evaporar da atmosfera;
 A precipitação P que representa bem ou mal a disponibilidade da água do
solo e seu estado de saturação.
Fórmulas de evaporação média em função da precipitação e da temperatura
• Fórmulade M. Coutagne
A evaporação média anual (em metros) se deduz da altura média anual da
precipitação P (em metros), e da temperatura anual T (em graus Celsius) pela fórmula:

Em = P − cP 2 (4)

1
c= (5)
(0,8 + 0,14T )
Esta fórmula se aplica para P compreendido entre (1/8c) e (1/2c).
13

 Se as precipitações forem inferiores a (1/8c), a evaporação média é igual à


precipitação e não ocorre escoamento;
 Se elas são superiores a (1/2c), a evaporação média é praticamente
independente de P.
• Fórmula de M. Turc
M. Turc adaptou às famílias de curvas Em = f(P,T), em mm, obtidas a partir de
observações feitas sobre 254 bacias situadas em todos os climas do planeta, a
expressão:
P
Em = (6)
(0,9 + P 2 / L2 )

O parâmetro L é dado pela expressão:

L = 300 + 25T + 0,05T 3 (7)

2.3.2 Utilização do Balanço Hídrico


A equação do balanço hídrico é uma ferramenta alternativa que o hidrólogo dispõe
para a obtenção de dados de vazão. A Tabela 3 mostra dados de 15 anos de vazão e
precipitação médias anuais medidos na represa de Guarapiranga (SP). Os dados de
vazão foram transformados de metros cúbicos (m3) para milímetros (mm) de
precipitação. Isto se consegue facilmente dividindo-se o valor da vazão pela área da
bacia e multiplicando-se pelo número de segundos de um ano.
14

Tabela 3 - Valores de precipitação e evaporação médias anuais da bacia do Guarapiranga


Bacia do Guarapiranga: Área = 630 km2
(I) (II) (III) (IV) (V) (VI) (VII) (VIII)
ANO Q Q P R ΣP ΣQ ΣR
3
(m /s) (mm) (mm) (mm) (mm) (mm) (mm)
1914 8,8 441 1429 130 1429 441 130
1915 7,2 360 1218 0 2647 801 130
1916 8,1 405 1266 3 3913 1206 133
1917 10,3 516 1323 -51 5236 1722 82
1918 9,9 496 1222 -132 6458 2218 -50
1919 10,9 546 1330 -74 7788 2764 -124
1920 10,7 536 1529 135 9317 3300 11
1921 10,3 516 1212 -162 10529 3816 -151
1922 12,1 606 1498 34 12027 4422 -117
1923 15,7 786 1758 114 13785 5208 -3
Soma 5208 13785

Pode-se determinar a evaporação média anual através da equação do balanço


hídrico, colocada em termos de somatória:

∑ P = ∑Q + ∑ E + ∑ R ≅ ∑Q + ∑ E (8)

Nota-se que o último termo da equação, que representa a soma das quantidades
acumuladas a cada ano, tende a se anular com o aumento dos termos da somatória, pois
o nível médio das águas subterrâneas permanece constante. Então:

Em = ∑ E / T = (∑ P − ∑ Q) / T (9)

Para o período de 10 anos observados tem-se:

Em = (13785 − 5208) / 10 = 858mm / ano (10)

Na Figura 5, pode-se observar a variação da precipitação e da vazão ao longo do


tempo. Ela mostra que as maiores vazões nem sempre coincidem com as maiores
precipitações. Isso ocorre devido à recarga e à evaporação variáveis ao longo de cada
ano. Pode-se dizer então que as variáveis chuva e precipitação não são diretamente
proporcionais (não se correlacionam linearmente), devendo-se considerar também a
influência das variáveis evaporação e recarga, como faz a equação do balanço hídrico.
15

Figura 5 - Gráfico de vazão e precipitação ao longo do tempo

Considerando-se que a evaporação anual seja aproximadamente constante e igual à


evaporação média, estimam-se os valores da recarga:

P=E+Q+R (11)

R=P–Q–E (12)

R = P – Q – Em (13)

A coluna (V) da Tabela 3 do exemplo foi calculada utilizando-se a equação 13.


A Figura 6 mostra um gráfico relacionando vazões e precipitações acumuladas.
Nota-se uma correlação linear entre as variáveis acumuladas, como sugere a equação 8
se considerar que o acréscimo na evaporação a cada ano se dê aproximadamente como
se fossem acréscimos constantes de evaporação média. De fato, pela análise de
regressão obtém-se:
Q = 0,3879P – 247
(14)
r2 = 0,999
Usando agora os dados de precipitação para o período seguinte, pode-se obter as
respectivas vazões acumuladas através da equação 14 e, por diferença, os valores das
vazões anuais. A Tabela 4 mostra isso para os 5 anos seguintes à série, comparando-se
com os valores observados no período.
16

Tabela 4 - Valores de vazão calculados e observados


(I) (II) (III) (IV) (V) (VI)
Ano Precipitação ΣP ΣQ Vazão obtida Vazão real
(mm) (mm) (mm) (mm) (mm)
1924 1029 14814 5499 291 417
1925 1452 16266 6063 564 462
1926 1784 18050 6755 692 548
1927 1735 19785 7428 673 695
1928 1502 21287 8010 582 643

Vale observar ainda que 1 mm de precipitação significa uma unidade de volume que
equivale para esta bacia (área = 630 km2) e V = 0,001.630.106 = 0,63 milhões de m3.

Figura 6 - Gráfico de precipitação x vazão acumuladas

2.4 Vazões de cursos de água


A vazão do curso de água é uma variável de extrema importância para estudos
hidrológicos, tendo grandes influências em simulações de modelos de qualidade de
água. Justifica-se, portanto, a obtenção do valor da vazão tão preciso quanto possível.
A utilização de modelos de qualidade de água (simulação de oxigênio dissolvido)
pode ser feita com quaisquer das vazões seguintes, dependendo dos objetivos:
 Vazão observada em um determinado período
 Vazão média (média anual, média do período chuvoso, média do período
seco)
 Vazão mínima
A vazão observada em um determinado período é utilizada quando se deseja calibrar
um modelo, isto é, ajustar os coeficientes do modelo, para que os dados simulados
sejam os mais próximos possíveis dos dados observados (medidos) no curso de água no
período de análise.
17

A vazão média é adotada quando se deseja simular as condições médias


prevalecentes, quer durante o ano, durante os meses chuvosos ou durante os meses
secos.
A vazão mínima é utilizada para o planejamento da bacia hidrográfica, para a
avaliação do atendimento aos padrões ambientais do corpo receptor e para a alocação de
cargas poluidoras. Assim, a determinação das eficiências requeridas para os tratamentos
dos esgotos nos diversos lançamentos deve ser determinada nas condições críticas.
Estas condições críticas no corpo receptor ocorrem exatamente no período de vazão
mínima, em que a capacidade de diluição é menor.
A vazão crítica deve ser calculada a partir de dados fluviométricos históricos do
curso de água. Os seguintes métodos têm sido adotados para a determinação da vazão
de referência:
 Q90 (ou Q95): vazão em que 90% (ou 95%) dos dados diários de vazão da
série são superiores a ela, ou seja, 10% (ou 5%) das vazões diárias são
inferiores. Também pode ser entendida como a vazão em que 90% (ou 95%)
do tempo se tem vazões superiores a ela. Corresponde ao percentil 10%
(ou 5%).
 Q7,10: vazão mínima com um período de retorno de 10 anos e príodo de
duração mínima de 7 dias consecutivos (o período de retorno é o tempo
médio, em anos, necessário para que ocorra o evento – no caso, uma vazão
menor ou igual a um certo valor – uma vez, em um ano qualquer.
a) Vazão de referência Q90 (ouQ95)
Esta vazão tem sido utilizada por alguns órgãos ambientais em estudos de avaliação
de impacto ambiental e atendimento à legislação. Ela é mais fácil de ser determinada e
compreendida do que a Q7,10. Algumas agências utilizam o conceito de Q90, ao passo
que outras utilizam o conceito mais restritivo de Q95. Estas vazões são extraídas de uma
curva de permanência, na qual estão plotadas as vazões e as probabilidades de
ocorrência de vazões iguais ou superiores.
No cálculo destas vazões, deve ser utilizada toda a série histórica dos dados,
compreendendo todas as medições diárias (total de dados = N). Os dados são ordenados
de forma decrescente, e atribuído um número de ordem para cada um, na seqüência
decrescente: m=1 para o maior, m=2 para o segundo maior, ..., m=N para o menor. Para
cada par (m, Qm), está associada uma probabilidade de que haja uma vazão superior a
ela. Esta probabilidade é dada por P=m/N. Assim, para a maior vazão da série (m=1), a
18

probabilidade da ocorrência de uma vazão superior é 1/N, para a segunda maior vazão é
2/N, e assim por diante, até se ter a menor vazão, que tem associada a ela a
probabilidade de excedência de N/N=1.
Na coluna de probabilidades, procura-se o valor mais próximo a 0,90 (90%). A
vazão associada a ela é a vazão Q90 (90% das vazões são iguais ou superiores, e 10%
são inferiores). Como as medições são diárias, pode-se dizer que, em 90% do tempo
tem-se vazões iguais ou superiores à vazão Q90.
Pode-se também determinar facilmente os valores de Q90 (ou Q95), sem a
necessidade do ordenamento dos dados e dos cálculos das probabilidades, utilizando as
funçõA vazão Q7,10 tem sido utilizada em diversas legislações ambientais de proteção da
qualidade de corpos de água, bem como em estudos de abastecimento de água e outorga
pelo uso da água.
A vazão Q7,10 pode ser entendida como o valor que pode se repetir,
probabilisticamente, a cada 10 anos (período de retorno de 10 anos), compreendendo a
menor média obtida em 7 dias consecutivos. Assim, em cada ano da série histórica,
precede-se à análise das 365 médias diárias de vazão. Seleciona-se, em cada ano, o
período de 7 dias consecutivos que resulta na menor média de vazão (média de 7
valores). Este é um conceito de média móvel, pois a média é calculada para 7 termos,
mas vai se movendo (dias 1 a 7; 2 a 8; dias 3 a 9 etc.). Com os valores da menor média
de 7 dias de cada ano procede-se a uma análise estatística de ajuste a uma distribuição
de freqüência, que permite interpolar ou extrapolar o valor para o tempo de retorno de
10 anos.
A razão de se ter, em cada ano, a menor média de 7 dias consecutivos, e não o
menor valor absoluto da vazão, visa a não tornar o critério excessivamente restritivo,
baseando-se em um único e menor valor de vazão. Desta forma, usa-se o conceito de
média móvel, que suaviza as séries históricas. No entanto, a influência do período de
duração da mínima é relativamente pequena, sendo que a maior influência está no
período de retorno. Isto porque, no período de seca, a variabilidade da vazão é bem
baixa, e os valores médios de 7 dias podem ser bem próximos ao menor valor
encontrado.
Usualmente a vazão Q7,10 é mais restritiva (menores valores) do que as vazões Q90 e
mesmo Q95. No entanto, a relação entre ela depende do regime hidrológico do curso de
água.
c) Período de retorno
19

O inverso da probabilidade de ocorrência de um evento hidrológico qualquer é


denominado em Hidrologia de período de retorno ou intervalo de recorrência.
Assim se uma determinada grandeza hidrológica tem a probabilidade de ser igualada
ou excedida igual a 5% (p = 0.05) seu período de retorno será:
T = l/p = l/0,05 = 20 anos
O período de retorno é expresso em anos. Assim se um evento hidrológico, como
por exemplo, uma cheia, é igualada ou excedida em média a cada 20 anos terá um
período de retorno T = 20 anos.
Em outras palavras, diz-se que esta cheia tem 5% de probabilidade de ser igualada
ou excedida em qualquer ano.
Se uma obra hidráulica for projetada para durar somente 1 ano (uma ensecadeira por
exemplo) o risco de que ela seja ultrapassada por uma cheia é igual a probabilidade
desta cheia.
Obras que devam durar vários anos, expõe-se todo ano a um risco igual à
probabilidade de ocorrência de vazão de projeto.
O risco de a obra falhar uma ou mais vezes ao longo da sua vida útil pode ser
deduzido dos conceitos fundamentais da teoria das probabilidades e é igual a:
onde:
T. é o período de retorno (ou tempo de recorrência) em anos
n. é a vida útil da obra em anos
R. é o risco permissível
Normalmente, adota-se para o vertedor das grandes barragens de terra ou de
enrocamento, como a barragem de Tucuruí um período de retorno de 10.000 anos e para
vertedouros de barragens de concreto 1.000 anos. Para canalizações de rios e esgoto
pluvial em zonas urbanas o tempo de recorrência adotado fica geralmente entre 20 a 100
anos.
d) Regionalização de vazões e descarga específica
Deve-se ter em mente, no entanto, que, com muita freqüência, a inexistência de
registros fluviométricos nas seções fluviais em estudo não permite a estimativa das
vazões mínimas de referência pelos métodos descritos. Nesses casos, é forçosa a
alternativa da regionalização de vazões, por meio da qual as informações provindas de
estações fluviométricas existentes e associadas a bacias de drenagem com características
similares à da área estudada são adimensionalizadas e analisadas em seu conjunto, para
20

que, em seguida, possam ser espacializadas e, finalmente, empregadas para se estimar as


vazões características em locais não medidos.
Mesmo que no curso de água em estudo haja uma estação fluviométrica, é bastante
provável que o trecho a ser analisado, após o lançamento dos esgotos (por exemplo),
seja em outro local, com uma vazão distinta da obtida na estação fluviométrica.
Em ambos os casos citados acima, uma abordagem que pode ser adotada é a da
utilização do conceito de descarga específica (l/s.km2). Conhecida a área de drenagem
no ponto de lançamento, e adotando-se um valor da descarga específica (advinda dos
estudos de regionalização), o produto de ambos conduz à vazão do curso de água.
A Figura 7 ilustra esta situação, na qual deseja-se estimar a vazão no curso de água
1, tendo por base os dados da estação fluviométrica do rio 2. Admite-se que as bacias
hidrográficas tenham características similares (ao menos da área), e que possibilitem a
utilização dos dados de descarga específica da estação fluviométrica do rio 2 para a
bacia do rio 1. Por exemplo, caso a vazão Q7,10 tenha sido determinada em uma estação
fluviométrica como 15,6 m3/s = 15.600 l/s, e sabendo-se que a área de drenagem a
montante da estação fluviométrica é A2 = 7.200 km2, tem-se que a descarga específica
da bacia 2 é, portanto, (15.600 l/s)/(7.200 km2) = 2,17 l/s.km2. Na bacia 1, no ponto de
lançamento dos esgotos, a área da bacia de drenagem é A1 = 300 km2. Admitindo-se que
a descarga específica da bacia 2 possa ser aplicada para a bacia 1, tem-se a seguinte
vazão do rio 1 no ponto de lançamento dos esgotos: 300 km2 x 2,17 l/s.km2 = 651 l/s =
0,651 m3/s.
21

Figura 7 - Exemplo de utilização de dados de vazão de uma bacia hidrográfica para outra bacia

Estação
flluviométrica

Rio 2

Lançamento
de esgotos

Rio 1

2
- Área de drenagem A2 (km )
2
- Descarga específica: x l/s.km 2
- Área de drenagem A1 (km )
2
- Descarga específica: x l/s.km

Fonte: Adaptado de VON SPERLING (2005)


Os valores da descarga específica variam grandemente de região para região, em
função do clima, topografia, solo, cobertura vegetal, etc. Para condições de Q7,10, tem-se
as faixas de variação apresentadas na Tabela 5.
Tabela 5 - Faixas de descarga específicas em função das condições de disponibilidade
hídrica
Disponibilidade Faixa de descarga específica em Q7,10 (l/s.km2)
Baixíssima < 0,1
Baixa 0,1 a 1,0
Intermediária 1,0 a 5,0
Alta 5,0 a 10,0
Bastante alta > 10,0
Obs: interpretado com base em faixas apresentadas em Hidrosistemas/Copasa (1993)
22

3 BACIAS HIDROGRÁFICAS: CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO E


ELEMENTOS FÍSICOS
3.1 Introdução
A bacia hidrográfica pode ser entendida como uma área onde a precipitação é
coletada e conduzida para seu sistema de drenagem natural isto é, uma área composta de
um sistema de drenagem natural onde o movimento de água superficial inclui todos os
usos da água e do solo existentes na localidade (Magalhães, 1989).
Os limites da área que compreende a bacia hidrográfica são definidos
topograficamente como os pontos que limitam as vertentes que convergem para uma
mesma bacia ou exutório.
As bacias hidrográficas caracterizam-se pelas suas características fisiográficas,
clima, tipo de solo, geologia, geomorfologia, cobertura vegetal, tipo de ocupação,
regime pluviométrico e fluviométrico, e disponibilidade hídrica.

3.2 Conceitos aplicáveis ao estudo de Bacias Hidrográficas


– Pequenas Bacias
O conceito de pequenas bacias é controverso. Não está somente associado ao
tamanho (área) das mesmas, mas ao objetivo dos estudos que serão aplicados. Ponce
(1989) citado por Goldenfun (2001) relata as seguintes propriedades para se definir uma
bacia hidrográfica como pequena:
- uniformidade da distribuição da precipitação em toda a área da bacia;
- uniformidade da distribuição da precipitação no tempo;
- o tempo de duração da chuva geralmente excede o tempo de concentração da
bacia;
- a produção de água e sedimentos ocorre em grande parte nas vertentes da bacia e o
armazenamento e o fluxo concentrados nos cursos de água não são significativos.
Estas propriedades são estabelecidas com o objetivo de facilitar a modelagem do
processo de transformação chuva-vazão. Contudo, há um problema que não pode ser
desconsiderado, que é a questão da variabilidade, principalmente espacial, dos eventos
de precipitação e da capacidade de infiltração de água no solo, que combinados,
produzirão grande variação na geração do escoamento superficial.
Portanto, o conceito de homogeneidade também deve ser considerado,
especialmente em função dos objetivos a serem alcançados. Estes devem ser norteados
em função de uma melhor compreensão das relações físicas e matemáticas que
envolvem os vários componentes do ciclo hidrológico.
23

– Bacias Representativas
Tais bacias são definidas de forma que possam representar uma região homogênea.
São instrumentadas com aparelhos para monitoramento e registro dos eventos
hidrológicos e climáticos. Estas bacias são utilizadas para estudos hidrológicos sem que
haja alteração de suas características fisiográficas, em especial solo e cobertura vegetal,
que são mantidas estáveis. Assim sendo, há necessidade de grandes séries históricas em
especial de vazão e precipitação.
O principal objetivo de bacias representativas instrumentadas é produzir
informações hidrológicas e meteorológicas para toda uma região homogênea a que
pertencem. Além de longos períodos de análise são feitos estudos climáticos,
hidrogeológicos e pedológicos. Enfim, bacias representativas instrumentadas têm como
objetivos científicos, os seguintes estudos:
- avaliação detalhada dos processos físicos, químicos e biológicos do ciclo
hidrológico, necessitando-se de longas séries históricas e mínima alteração do meio;
- desenvolvimento de modelos para predição de eventos hidrológicos associados ao
escoamento superficial, água no solo e evapotranspiração da região homogênea, que a
bacia representa;
- análise dos efeitos de mudanças naturais de aspectos fisiográficos no ciclo
hidrológico.
– Bacias Experimentais
São bacias hidrográficas que visam basicamente a estudos científicos dos
componentes do ciclo hidrológico e eventuais influências de manejos neste. Neste caso,
pode-se produzir alterações intencionais nas características de uso do solo e vegetação
na bacia. Normalmente, por constituírem-se em áreas destinadas estritamente a
pesquisa, havendo-se necessidade de aquisição da área, o tamanho destas bacias não
ultrapassa 4 km2, sendo, portanto, de pequenas dimensões. Os principais objetivos das
bacias experimentais são:
- avaliar a influência de manejos como desmatamento e influência de diferentes usos
do solo na produção de erosão e no ciclo hidrológico;
- testar, validar e calibrar modelos de previsão hidrológica;
- treinamento de técnicos e estudantes com os aparelhos de medição hidrológica
(medidores de vazão, linígrafos, molinetes, etc) e climática;
- como em bacias representativas, estudos detalhados de processos físicos, químicos
e biológicos do regime hídrico das bacias;
24

Normalmente, busca-se o estudo comparativo dos efeitos de manejos, portanto, é


necessário que haja mais de uma bacia monitorada.
– Bacias Elementares
São bacias de pequena ordem, constituindo-se na menor unidade geomorfológica
onde podem ocorrer, de maneira completa, o ciclo hidrológico (Goldenfun, 2001).
Apresentam áreas inferiores a 5 km2, permitindo as seguintes considerações:
- uniformidade em toda área dos eventos pluviométricos;
- características de vegetação e pedologia semelhantes em toda a bacia;
- controle sobre a entrada de sedimentos provenientes de outras áreas;
- identificação rápida e precisa de mudanças no horizonte superficial dos solos que
constituem as bacias;
- não haja efeitos significativos da concentração de água e sedimentos nas calhas
dos cursos de água, quando comparada à produção destes nas vertentes.
Se houver condições de comprovação de tais premissas, pode-se fazer estudos
numéricos precisos do ciclo hidrológico, que ajudarão no entendimento dos processos
envolvidos com o mesmo. Segundo Goldenfum (2001) em bacias experimentais e
elementares pode-se fazer estudos cuja necessidade de informações variem de um
período extenso de análise (grandes séries históricas) ou períodos bastante curtos, tudo
dependendo dos objetivos. Por exemplo: na avaliação dos efeitos de diferentes práticas
agrícolas pode-se trabalhar com períodos curtos de análise; já na avaliação dos efeitos
de desmatamento ou função hidrológica de diferentes coberturas vegetais, há
necessidade de uma série maior de dados para se chegar a resultados conclusivos.

3.3 Delimitação da bacia


A delimitação de cada bacia hidrográfica é feita numa carta topográfica, seguindo as
linhas das cristas das elevações circundantes da seção do curso de água em estudo. Cada
bacia é assim, sob o ponto de vista topográfico, separada das restantes bacias vizinhas.
Esta delimitação que atende apenas a fatores de ordem topográfica “define uma
linha de cumeada a que poderíamos chamar linha de divisão das águas”, pois ela é que
divide as precipitações que caem e, que, por escoamento superficial, seguindo as linhas
de maior declive, contribuem para a vazão que passa na seção em estudo (Figura 8).
25

Figura 8 - Área de contribuição de uma bacia.

No entanto, as águas que atingem a seção do curso de água em estudo poderão


provir não só do escoamento superficial como também do escoamento subterrâneo, que
poderá ter origem em bacias vizinhas. E, inversamente, parte do escoamento superficial
poderá concentrar-se em lagos ou lençóis subterrâneos que não tem comunicação com o
curso de água em estudo, não contribuindo para a sua vazão.
Concluiu-se que, além da delimitação topográfica, deve-se observar a delimitação da
bacia sob o ponto de vista geológico e em formações características, calcárias ou de
geologia especial. Raramente as duas delimitações coincidem (Figura 9).

Figura 9 - Linhas divisórias freática e topográfica

3.4 Características Fisiográficas


As características fisiográficas de uma bacia são obtidas dos dados que podem ser
extraídos de mapas, fotografias aéreas e imagens de satélite. São: área, comprimento,
declividade e cobertura do solo, que podem ser expressos diretamente ou, por índices
que relacionam os dados obtidos.
26

3.4.1 Forma da Bacia


A forma da bacia não é, normalmente, usada de forma direta em hidrologia. No
entanto, parâmetros que refletem a forma da bacia são usados ocasionalmente e têm
base conceitual.
As bacias hidrográficas têm uma variedade infinita de formas, que supostamente
refletem o comportamento hidrológico da bacia. Em uma bacia circular, toda a água
escoada tende a alcançar a saída da bacia ao mesmo tempo (Figura 10).
Figura 10 - Bacia Arredondada e as características do escoamento nela originado por uma
precipitação uniforme

Uma bacia elíptica, tendo a saída da bacia na ponta do maior eixo e, sendo a área
igual a da bacia circular, o escoamento será mais distribuído no tempo, produzindo
portanto uma enchente menor (Figura 11).
Figura 11 - Bacia elíptica e as características do escoamento nela originado por uma
precipitação uniforme

As bacias do tipo radial ou ramificada são formadas por conjuntos de sub-bacias


alongadas que convergem para um mesmo curso principal. Neste caso, uma chuva
uniforme em toda a bacia, origina cheias nas sub-bacias, que vão se somar, mas não
simultaneamente, no curso principal. Portanto, a cheia crescerá, estacionará, ou
diminuirá a medida em que forem se fazendo sentir as contribuições das diferentes sub-
bacias (Figura 12).
27

Figura 12 - Bacia ramificada e as características do escoamento nela originado por uma


precipitação uniforme

a) Fator de Forma: fator de forma - Kf - é a relação entre a largura média e o


comprimento axial da bacia. Mede-se o comprimento da bacia (L) quando se segue o
curso de água mais longo desde a desembocadura até a cabeceira mais distante da bacia.
A largura média (L) é obtida quando se divide a área pelo comprimento da bacia.
L
Kf = (15)
L

A
L= (16)
L

A
Kf = (17)
L2

O fator de forma é um índice indicativo da tendência para enchentes de uma bacia.


Uma bacia com um fator de forma baixo é menos sujeita a enchentes que outra de
mesmo tamanho, porém com maior fator de forma. Isso se deve ao fato de que numa
bacia estreita e longa, com fator de forma baixo, há menos possibilidade de ocorrência
de chuvas intensas cobrindo simultaneamente toda sua extensão; e também numa tal
bacia, a contribuição dos tributários atinge o curso de água principal em vários pontos
ao longo do mesmo, afastando-se, portanto, da condição ideal da bacia circular discutida
no item seguinte, na qual a concentração de todo o deflúvio da bacia se dá num só
ponto.
b) Coeficiente de Compacidade: coeficiente de compacidade ou índice de Gravelius
- Kc - é a relação entre o perímetro da bacia e o perímetro de um círculo de área igual á
da bacia.

A
A = π .R 2 → R = (18)
π
28

P
Kc = (19)
2πR

Substituindo (18) em (19), tem-se:


0,28 P
Kc = (20)
A

onde P e A são respectivamente perímetro em km e área da bacia em km2. Este


coeficiente é um número adimensional que varia com a forma da bacia,
independentemente do seu tamanho; quanto mais irregular for a bacia, tanto maior será
o coeficiente de compacidade. Um coeficiente mínimo igual à unidade, corresponderia a
uma bacia circular. Se os outros fatores forem iguais, a tendência para maiores
enchentes é tanto mais acentuada quanto mais próximo da unidade for o valor desse
coeficiente.

3.4.2 Relevo
Diversos parâmetros foram desenvolvidos para refletir as variações do relevo em
uma bacia. Os mais comuns são:
a) Declividade da bacia. Apesar de haver diversos métodos para estimar a
declividade da bacia, o mais comum é simular o da Equação 21, sendo que a diferença
de cota (H) deve se referir a toda bacia e não apenas ao canal. Há ainda o método das
quadrículas associadas a um vetor. Esse método é mais completo que o anterior e
consiste em determinar a distribuição percentual das declividades do terreno por meio
de uma amostragem estatística das declividades normais às curvas de nível em um
grande número de pontos na bacia. Esses pontos devem ser locados num mapa
topográfico da bacia por meio de um quadriculado que se traça sobre o mesmo.
b) Curva Hipsométrica. É a representação gráfica do relevo médio de uma bacia.
Representa o estudo da variação da elevação dos vários terrenos da bacia com referência
ao nível médio do mar. Essa variação pode ser indicada por meio de um gráfico que
mostra a porcentagem da área de drenagem que existe acima ou abaixo das várias
elevações. A curva hipsométrica pode ser determinada pelo método das quadrículas
descrito no item anterior ou planimetrandose as áreas entre as curvas de nível.
29

Figura 13 - Curva Hipsométrica

A Tabela 6 apresenta os passos utilizados para o cálculo de uma curva hipsométrica,


a qual é mostrada na (Figura 13).
Tabela 6 - Curva Hipsométrica
1 2 3 4 5 6
Área
Ponto Médio
Cota (mm) Área (km2) Acumulada % Acumulada
(m)
(km2)
940-920 930 1,92 1,92 1,08 1,08
920-900 910 2,90 4,82 1,64 2,72
900-880 890 3,68 8,50 2,08 4,80
880-860 870 4,07 12,57 2,29 7,09
860-840 850 4,60 17,17 2,59 9,68
840-820 830 2,92 20,09 1,65 11,33
820-800 810 19,85 39,94 11,20 22,53
800-780 790 23,75 63,69 13,40 35,93
780-760 770 30,27 93,96 17,08 53,01
760-740 750 32,09 126,05 18,10 71,11
740-720 730 27,86 153,91 15,72 86,83
720-700 710 15,45 169,36 8,72 95,55
700-680 690 7,89 177,25 4,45 100
Total 177,25

c) Elevação média da bacia. A variação da altitude e a elevação média de uma


bacia são, também, importantes pela influência que exercem sobre a precipitação, sobre
as perdas de água por evaporação e transpiração e, consequentemente, sobre o deflúvio
30

médio. Grandes variações da altitude numa bacia acarretam diferenças significativas na


temperatura média a qual, por sua vez, causa variações na evapotranspiração. Mais
significativas, porém, são as possíveis variações de precipitação anual com a elevação.
A elevação média é determinada por meio de um retângulo de área equivalente à
limitada pela curva hipsométrica e os eixos coordenados; a altura do retângulo é a
elevação média.
Outro método é o de utilizar a equação

E=
∑ e.a (21)
A

onde E= elevação média


e= elevação média entre duas curvas de nível consecutivas
a= área entre as curvas de nível
A= área total
Outro fator importante no estudo das elevações da bacia é a Altura Média da Seção
de Controle (Desembocadura), a qual representa uma carga potencial hipotética a que
estão sujeitos os volumes de excesso de chuva e constitui um fator que afeta o tempo
que levariam as águas para atingir a seção de controle. Essa altura é determinada pela
diferença entre a elevação mediana e a elevação do leito na desembocadura.
d) Declividade de álveo. A velocidade de escoamento de um rio depende da
declividade dos canais fluviais. Assim, quanto maior a declividade, maior será a
velocidade de escoamento e bem mais pronunciados e estreitos serão os gráficos vazão
x tempo das enchentes.
Obtém-se a declividade de um curso de água, entre dois pontos, dividindo-se a
diferença total de elevação do leito pela extensão horizontal do curso de água entre
esses dois pontos.
A declividade do canal pode ser descrita como:
∆H
S= (22)
L

onde S é a declividade (m/m), H é diferença de cota (m) entre os pontos que


definem o início e o fim do canal, L é o comprimento do canal entre estes pontos.
Na Figura 14 é apresentado um perfil longitudinal de uma bacia, onde a declividade
entre a foz e a nascente está representada pela linha S1. Traça-se S2, tal que, a área
compreendida entre ela e a abscissa seja igual á compreendida entre a curva do perfil e a
31

abscissa. Traçando-se S3, que representa a declividade equivalente constante, tem-se


uma idéia sobre o tempo de percurso da água ao longo da extensão do perfil
longitudinal.

Figura 14 - Perfil longitudinal do Ribeirão do Lobo

Uma outra forma de determinar a declividade é utilizada para terrenos com


declividade constante, podendo-se até determinar através desta declividade o tempo de
percurso da precipitação. Caso o curso de água tivesse uma declividade constante igual
a declividade equivalente, o tempo de percurso seria determinado da seguinte maneira:
Considerando-se que o tempo de percurso varia em toda a extensão do curso de água
com o recíproco da raiz quadrada da declividade, dividindo-se o perfil de álveo em um
grande número de trechos retilíneos, tem-se que a raiz quadrada da declividade
equivalente constante é a média harmônica ponderada da raiz quadrada das declividades
dos diversos trechos retilíneos, tomando-se como peso a extensão de cada trecho.
Logo,

S 31 / 2 =
∑L i

L  (23)
∑  S i 
 i 
onde

S i = Di (24)

sendo,
Di= declividade de cada trecho, logo:
32

2
 
 
 
S3 = 
∑ Li  (25)
  Li 
 ∑ 
  Di 
  
onde Li = distância real medida em linha inclinada

3.4.3 Padrões de drenagem


A velocidade do escoamento em canal é usualmente maior que a velocidade de
escoamento superficial. Portanto, o tempo de deslocamento do escoamento em uma
bacia na qual o comprimento de escoamento superficial é pequeno em relação ao
comprimento do canal seria menor do que em uma bacia com trechos longos de
escoamento superficial. O tempo de deslocamento do escoamento em uma bacia é um
dado de extreme importância para diversos estudos hidrológicos, como será mostrado a
seguir. O padrão de drenagem é um indicador das características do escoamento de uma
precipitação. Alguns parâmetros foram desenvolvidos para representar os padrões de
drenagem.
a) Ordem dos Cursos de Água
a.1) Método de Horton
Esta metodologia pode ser resumida da seguinte forma:
- Cursos de água de 1ª Ordem: são aqueles que não possuem tributários;
- Cursos de água de 2ª Ordem: formados pela união de 2 ou mais cursos de 1ª
ordem;
- Cursos de água de 3ª Ordem: formados pela união de 2 ou mais cursos de 2ª
ordem, podendo receber cursos de água de 1ª ordem.
Silveira (2001) resume este método da seguinte forma: um canal de ordem u pode
possuir tributários de ordem u-1 até 1. Isto significa designar a maior ordem ao rio
principal, desde a seção de controle até sua nascente. O mesmo raciocínio é valido para
cursos de água de 2ª ordem, ou seja, desde a junção com um de 3ª ordem até sua
nascente. Portanto, tem-se uma subjetividade associada com a localização desta
nascente. Existe um método para separar a nascente do tributário de ordem 1, que
consiste em passar uma perpendicular pela junção dos canais e adotar o canal
determinado pelo menor ângulo. Exemplificando (Figura 15):
33

Figura 15 – Exemplo Método de Horton

Como o ângulo y é menor que x, tem-se que o canal principal (ordem 2) passa a ser
o de cor azul.
a.2) Método de Strahler
- Cursos de água de 1ª Ordem: são todos os canais sem tributários, mesmo que
corresponda à nascente dos cursos de água principais;
- Cursos de água de 2ª Ordem: são formados pela união de 2 ou mais cursos de 1ª
ordem, podendo ter afluentes de 1ª;
- Cursos de água de 3ª Ordem: são formados pela união de 2 ou mais cursos de 2ª
ordem, podendo receber cursos de água de 2ª e 1ª ordens.
Da mesma forma, resume-se este método da seguinte maneira: um canal de ordem u
é formado por 2 canais de ordem u-1, podendo receber afluência de qualquer ordem
inferior. Observa-se que a subjetividade a respeito de nascentes deixa de existir neste
método. Pode-se analisar também que, o método de Horton apresentará um menor
número de canais. No exemplo anterior, a classificação seria dada da seguinte forma
(Figura 16):

Figura 16 – Exemplo Método de Strahler


34

O canal de 2ª ordem começa na junção dos de 1ª ordem, ou seja, não há designação


de nascentes.
A ordem a rede de drenagem fornece uma noção do grau de ramificação e permite
inferir-se sobre o relevo da bacia. De modo geral, quanto mais ramificada for a rede de
drenagem, mais acidentado deve ser o relevo.
Figura 17 - Ordem dos cursos de água segundo Horton e Strahler

Para uma bacia hidrográfica, a ordem principal é definida como a ordem principal
do respectivo canal. A Figura 17 mostra a ordenação dos cursos de água de uma bacia
hipotética.
Neste caso, a ordem principal da bacia é 3.
Densidade de Drenagem
A densidade de drenagem (D) é a razão entre o comprimento total dos cursos de
água em uma bacia e a área desta bacia hidrográfica. Um valor alto para D indicaria
uma densidade de drenagem relativamente alta e uma resposta rápida da bacia a uma
precipitação.
LT
D= (26)
A
onde LT é a extensão total dos cursos de água e A é a área da bacia hidrográfica.
Exemplo: A área da bacia é 115 km2, a extensão total dos cursos de água é 29 km. A
densidade de drenagem é, portanto:
35

LT 29
D= = = 0,25km / km 2
A 115

Segundo SWAMI (1975), índices em torno de 0,5 km/km2 indicaria uma drenagem
pobre, índices maiores que 3,5 km/km2 indicariam bacias excepcionalmente bem
drenadas.

3.4.4 Cobertura vegetal da bacia


A cobertura vegetal, e em particular as florestas e as culturas da bacia hidrográfica,
vêm juntar a sua influência à de natureza geológica dos terrenos, condicionando a maior
ou menor rapidez do escoamento superficial.
Para além disso, a sua influência exerce-se, também, na taxa de evaporação da
bacia, com uma ação regularizadora de caudais, sobretudo nos climas secos. No caso de
grandes cheias com elevados caudais a sua ação é, no entanto, praticamente nula. Além
da influência que exerce na velocidade dos escoamentos e na taxa de evaporação, a
cobertura vegetal desempenha papel importante e eficaz na luta contra a erosão dos
solos.

3.5 Características Geológicas


O estudo geológico dos solos e subsolos tem por objetivo principal a sua
classificação segundo a maior ou menor permeabilidade, dada a influência que tal
característica tem na rapidez de crescimento das cheias. A existência de terrenos quase,
ou totalmente, impermeáveis, impede a infiltração facilitando o escoamento superficial
e originando cheias de crescimento repentino. Já os permeáveis ocasionam o
retardamento do escoamento devido à infiltração, amortecendo as cheias (Figura 18).
Bacia Impermeável - ao receber uma certa precipitação, dá origem a um escoamento
superficial com elevada ponta; Bacia Permeável - dá origem a um escoamento
superficial de forma achatada e cuja ponta máxima é bastante retardada em relação ao
início da precipitação.
Figura 18 - Características da vazão de um rio de acordo com a permeabilidade do solo.
36

3.6 Transporte de Sedimentos


A existência de maior ou menor transporte de sedimento, depende da natureza
geológica dos terrenos. O seu conhecimento é fundamental, visto que a erosão e
sedimentação das partículas alteram a topografia do leito do rio, podendo essa
transformação chegar ao ponto de aniquilar a obra projetada pela diminuição do
potencial hídrico do curso de água e assoreamento da barragem, por vezes apenas
recuperável, mediante o dispêndio de somas incomportáveis.

3.7 Características Térmicas


O estudo hidrológico de uma bacia deverá, pois, comportar a análise das suas
características térmicas, análise esta em que deverá intervir observações de trocas de
calor entre solo e atmosfera, superfície da água e atmosfera, etc.
A localização geográfica da bacia hidrográfica é determinante das suas
características térmicas.
Assim, a variação da temperatura faz-se sentir com:
• latitude - a amplitude térmica anual está também relacionada com a latitude, - é
máxima nos pólos e mínima no equador;
• proximidade do mar - as maiores amplitudes térmicas verificam-se nas zonas
continentais, áridas, enquanto que em regiões submetidas à influência marítima
apresentam uma certa uniformidade térmica;
• altitude - a temperatura diminui com a altitude. De uma forma geral, poderemos
dizer que as regiões mais elevadas apresentam temperaturas mais baixas;
• vegetação - por ação da menor fração de energia solar que atinge o solo e do calor
absorvido pela evapotranspiração das plantas, a temperatura média anual de uma região
arborizada pode ser inferior em 10 ºC ou 20 ºC à uma região desarborizada;
• tempo - a temperatura começa a elevar-se ao nascer do sol e atinge o máximo 1 a 3
horas depois do sol ter atingido a altitude máxima. A variação da temperatura faz-se
sentir também durante o ano segundo as estações, sendo maior ou menor conforme a
localização geográfica, como atrás foi referido.

3.8 Ocupação e Uso do Solo


Quando ocorre uma chuva rápida, as pessoas freqüentemente procuram abrigo sob
alguma árvore que esteja próxima. Admite-se que a árvore será uma proteção
temporária, já que ela intercepta a chuva na fase inicial do evento. Poder-se-ia concluir
37

que uma bacia coberta por uma floresta produziria menos escoamento superficial do que
uma bacia sem árvores.
O escoamento em telhados é outro exemplo do efeito do tipo de cobertura da bacia
sobre o escoamento. Durante uma precipitação, o escoamento em calhas de telhados
começa logo depois de iniciada a chuva. Telhados são superfícies impermeáveis,
inclinados e planos, portanto, com pouca resistência ao escoamento. O escoamento em
uma vertente gramada com as mesmas dimensões do telhado terá início bem depois do
escoamento similar no telhado. A vertente gramada libera água em taxas e volumes
menores porque parte da água será infiltrada no solo e devido a maior rugosidade da
superfície gramada, o escoamento será mais lento conclui-se então que o escoamento
em superfícies impermeáveis resulta em maiores volumes e tempos de deslocamento
menores do que o escoamento em superfícies permeáveis com as mesmas dimensões e
declividades.
Estes dois exemplos conceituais servem para ilustrar como o tipo de ocupação do
solo afeta as características do escoamento em uma bacia. Quando as outras
características da bacia são mantidas constantes as características do escoamento tais
como volume, tempo e taxas de vazões máximas podem ser bastante alteradas. Portanto,
o tipo de ocupação da bacia e uso do solo devem ser definidos para a análise e projeto
em hidrologia.
O tipo de cobertura e uso do solo é especialmente importante para a hidrologia.
Muitas questões problemáticas em projetos hidrológicos resultam da expansão urbana.
A percentagem do solo impermeabilizado é comumente usada como indicador do grau
de desenvolvimento urbano. Áreas residenciais com alta densidade de ocupação têm
taxas de impermeabilização variando entre 40 e 70%. Áreas comerciais e industriais são
caracterizadas por taxas de impermeabilização de 70 a 90%. A impermeabilização de
bacias urbanas não está restrita à superfície: os canais de drenagem são normalmente
revestidos com concreto, de modo a aumentar a capacidade de escoamento da seção
transversal do canal e remover rapidamente as águas pluviais. O revestimento de canais
é muito criticado, já que este tipo de obra transfere os problemas de enchentes de áreas à
montante do canal para áreas à jusante.
38

4 BACIAS REGIONAIS BRASILEIRAS


Atualmente, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, de acordo com a Resolução
nº 32, de 15 de outubro de 2003, divide o Brasil em 12 regiões hidrográficas (Figura
19): Região Hidrográfica Amazônica; Região Hidrográfica Tocantins–Araguaia; Região
Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental; Região Hidrográfica Parnaíba; Região
Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental; Região Hidrográfica São Francisco; Região
Hidrográfica Atlântico Leste; Região Hidrográfica Atlântico Sudeste; Região
Hidrográfica Paraná; Região Hidrográfica Atlântico Sul; Região Hidrográfica Uruguai;
e Região Hidrográfica Paraguai. A seguir, relata-se algumas características dessas
Bacias.

Figura 19 – Regiões hidrográficas brasileiras

4.1 Região Hidrográfica Amazônica


A bacia do rio Amazonas envolve todo o conjunto de recursos hídricos que
convergem para o rio Amazonas. Essa bacia hidrográfica faz parte da região
hidrográfica do Amazonas, uma das doze regiões hidrográficas do território brasileiro.
A bacia amazônica abrange uma área de 7 milhões de km², compreendendo terras de
vários países da América do Sul (Peru, Colômbia, Equador, Venezuela, Guiana, Bolívia
e Brasil). É a maior bacia fluvial do mundo.
39

De sua área total, cerca de 3,8 milhões de km² encontram-se no Brasil, abrangendo
os estados do Acre, Amazonas, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Pará e Amapá.
A bacia amazônica é formada pelo rio Amazonas e seus afluentes. Estes estão
situados nos dois hemisférios (no hemisfério norte e no hemisfério sul) e, devido a esse
fato, o rio Amazonas tem dois períodos de chuvas, pois a época das chuvas é diferente
no hemisfério norte e no hemisfério sul.
O Rio Amazonas nasce na cordilheira dos Andes, no Peru. Possui 6.868 km, sendo
que 3.165 km estão em território brasileiro. Sua vazão média é da ordem de 109.000
m³/s e 190.000 m³/s na estação de chuvas. É um rio típico de planície, ele e muitos de
seus afluentes são navegáveis, o que é muito importante para a população da Amazônia,
que se serve do rio como meio de locomoção.
O rio é divido em três partes:
 ainda nos países andinos, recebe o nome de rio Marañón
 ao entrar no Brasil, recebe o nome de rio Solimões
 ao receber as águas do rio Negro passa a ser chamado de rio Amazonas
A largura média do rio Amazonas é de aproximadamente 5 quilômetros. Em alguns
lugares, de uma margem é impossível ver a margem oposta, por causa da curvatura da
superfície terrestre. No ponto onde o rio mais se contrai – o chamado "Estreito de
Óbidos" – a largura diminui para 1,5 quilômetro e a profundidade chega a 100 metros.
As terras amazônicas, como se disse, formam uma planície no sentido atual da
palavra, ou seja, um território formado pela sedimentação. A norte e a sul essa planície é
limitada pelos escudos das Guianas e Brasileiro, respectivamente. Uma divisão
elementar das terras da bacia amazônica permite classificá-las em:
 várzeas: terras próximas ao rio, que são inundadas pelas enchentes anuais,
ou mesmo diariamente;
 terras firmes: nunca são alagadas pelas enchentes.

4.2 Região Hidrográfica Tocantins–Araguaia


Possui uma área de 967.059 km², abrangendo os estados de Goiás, Mato Grosso,
Tocantins, Maranhão, Pará e também o Distrito Federal. Os principais rios da bacia são
o Tocantins e seu afluente Araguaia. A vazão média conjunta da bacia é de 15.432 m³/s.
Os principais biomas da região são a Amazônia ao norte e o Cerrado ao sul. Apesar
da região possuir pequena densidade populacional, alguns fatores contribuíram para a
40

devastação destes biomas, como a construção da rodovia Belém-Brasília, a Usina


hidrelétrica de Tucuruí e a expansão das atividades agropecuárias e de mineração.
O maior aglomerado urbano da bacia é formado pela Região Metropolitana de
Belém, no Pará.

4.3 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental


Possui uma área de 254.100 km², que engloba grande parte do estado do Maranhão e
uma pequena região no leste do estado do Pará, abrangendo 223 municípios.
Em seu território estão contidas as bacias hidrográficas dos rios Gurupi, Turiaçu,
Pericumã, Mearim, Itapecuru, Munim e a o litoral do Maranhão, apresentando uma
vazão média conjunta de 2.514 m³/s.
A região é caracterizada por ser uma transição entre os biomas da Amazônia e do
Cerrado, apresentando também formações litorâneas.
O principal centro urbano inserido na bacia é a capital maranhense de São Luís.

4.4 Região Hidrográfica Parnaíba


A bacia do rio Parnaíba é uma das doze regiões hidrográficas do território brasileiro,
abrangendo quase totalmente o estado do Piauí, parte do Maranhão e uma pequena área
do Ceará, totalizando 344.112 km².
O Rio Parnaíba é o principal da região, com aproximadamente 1.400 km de
extensão.
Apesar de o bioma predominante na bacia ser a Caatinga, esta é uma região de
transição entre a Caatinga, a Floresta Tropical e a vegetação litorânea.
O maior adensamento urbano da região é a capital piauiense de Teresina. Toda a
região é caracterizada por índices críticos de abastecimento de água, esgotamento
sanitário e tratamento de esgotos. A escassez hídrica é historicamente apontada como
causa do atraso econômico e social da região.

4.5 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental


Possui uma área de 287.348 km², abrangendo em seu território 5 importantes
capitais da Região Nordeste do Brasil: Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife e Maceió.
Esta região sofreu, ao longo da história brasileira, grandes pressões antrópicas,
responsáveis não só pelo desmatamento da Mata Atlântica para implantação da cultura
de cana-de-açúcar, como também pela degradação dos manguezais e lagoas da zona
costeira decorrente do avanço da urbanização e pela devastação da caatinga em virtude
da expansão da atividade pecuária no sertão brasileiro.
41

A Bacia do Atlântico Nordeste Oriental caracteriza-se pela ausência de grandes rios,


configurando um cenário de baixa disponibilidade hídrica com relação às demandas,
principalmente em períodos de estiagem.
A vazão média conjunta da bacia é de cerca de 813 m³/s. Destacam-se os rios
Capibaribe, Paraíba e Jaguaribe.

4.6 Região Hidrográfica São Francisco


A região abrange terras de 521 municípios, distribuídos em sete Unidades da
Federação: Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Bahia, Goiás, Minas Gerais e Distrito
Federal.
O Rio São Francisco é o principal curso de água da bacia, com cerca de 2.700 km de
extensão e 168 afluentes.
Os principais biomas da região são a Caatinga no nordeste da Bahia, o Cerrado entre
Minas Gerais e o sudoeste baiano, e a Mata Atlântica, onde se encontram as nascentes
do São Francisco na Serra da Canastra. Em virtude da forte ocupação da bacia, estes
biomas apresentam-se ameaçados.
O principal adensamento populacional da bacia do São Francisco corresponde à
Região Metropolitana de Belo Horizonte, na região do Alto São Francisco.
Uma das curiosidades em relação à hidrografia brasileira é o fato do rio São
Francisco ser conhecido como o "Nilo Brasileiro", devido a similaridades entre os dois:
ambos passam por regiões de clima árido e beneficiam as regiões onde passam com suas
cheias, sendo importantes economicamente para as localidades que atravessam.

4.7 Região Hidrográfica Atlântico Leste


Possui uma área de 374.677 km², englobando 526 municípios dos estados de
Sergipe, leste da Bahia, nordeste de Minas Gerais e norte do Espírito Santo. Dentro de
seus limites encontram-se a Região Metropolitana de Salvador e a capital sergipana de
Aracaju, além de outros centros regionais importantes.
Sua vazão média conjunta é de 1.400 m³/s, englobando as bacias hidrográficas dos
rios Paraguaçu, de Contas, Salinas, Pardo, Jequitinhonha, Mucuri dentre outros.
Os biomas característicos da bacia do Atlântico Leste são a Mata Atlântica e a
Caatinga, além de pequenas porções de Cerrado. Em virtude da grande pressão
antrópica sofrida historicamente pela região, a Mata Atlântica encontra-se atualmente
ameaçada pela expansão urbana e pela cultura de cana-de-açúcar e a Caatinga pelas
42

atividades pecuárias. Além disso, os rios Jequitinhonha, Salinas e Pardo apresentam


concentrações de metais pesados resultantes do garimpo e dragagem para mineração.

4.8 Região Hidrográfica Atlântico Sudeste


Possui uma área de 229.972 km², distribuída por terras dos estados do Espírito
Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e o litoral do Paraná.
As principais bacias hidrográficas desta região são as dos rios Doce e Paraíba do
Sul. Outras bacias inseridas na região do Atlântico Sudeste são as dos rios São Mateus,
Itapemirim, Itabapoana e Ribeira de Iguape.
A região do Atlântico Sudeste é caracterizada por seu expressivo contingente
populacional, localizando-se numa das regiões mais industrializadas e urbanizadas do
Brasil. Possui importantes adensamentos populacionais, dentre os quais se destacam as
regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, de Vitória e da Baixada Santista, chegando a
ultrapassar 13.000 hab./km² em São João de Meriti (Baixada Fluminense).
O bioma principal da região é a Mata Atlântica, já fortemente desmatada. As áreas
de maior conservação deste bioma encontram-se nas enconstas das serras do Mar e da
Mantiqueira nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. As áreas de maior
degradação ambiental da região hidrográfica do Atlântico Leste são as baías de Santos,
da Guanabara e de Vitória.

4.9 Região Hidrográfica Paraná


A região abrange uma área de 879.860 km², distribuídos em sete Unidades da
Federação: Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa
Catarina e o Distrito Federal.
O Rio Paraná é o principal curso d'água da bacia, mas de grande importância
também são seus afluentes e formadores como os rios Grande, Paranaíba, Tietê,
Paranapanema, Iguaçu, dentre outros.
As principais coberturas vegetais da região eram a Mata Atlântica, o Cerrado e a
Mata de Araucárias, que foram fortemente desmatados ao longo da ocupação da região.
A bacia do Paraná é a região mais industrializada e urbanizada do país. Nela reside
quase um terço da população brasileira, destacando-se como principais aglomerados
urbanos as regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e de Curitiba.
Trata-se da bacia hidrográfica com a maior capacidade instalada de energia elétrica
do país e também a de maior demanda. Destacam-se as usinas de Itaipu, Furnas, Porto
Primavera, dentre outras.
43

4.10 Região Hidrográfica Atlântico Sul


A região hidrográfica do Atlântico Sul inicia-se próxima à divisa dos estados de São
Paulo e do Paraná, estendendo-se até o Arroio Chuí, no Rio Grande do Sul. A área total
da região é de 185.856 km², abrangendo terras de 451 municípios, dos quais se
destacam Paranaguá, Joinville, Florianópolis, Caxias do Sul, Pelotas e a Região
Metropolitana de Porto Alegre.
Na região hidrográfica Atlântico Sul predominam rios de pequeno porte que correm
diretamente para o Oceano Atlântico. As principais exceções são os rios Itajaí e
Capivari, em Santa Catarina, que apresentam maior volume de água. Na região do Rio
Grande do Sul ocorrem rios de grande porte como o Taquari-Antas, Jacuí, Vacacaí e
Camaquã, ligados aos sistemas lagunares da Lagoa Mirim e Lagoa dos Patos.
O principal bioma da região é a Mata Atlântica, muito desmatada pela ocupação
humana. Também podem ser encontradas manchas de Mata de Araucária em áreas
acima de 600m de altitude. Na costa litorânea, ocorrem manguezais e restingas.

4.11 Região Hidrográfica Uruguai


Possui uma área de 385.000 km², dos quais 174.612 km² situam-se dentro do Brasil,
abrangendo 384 municípios dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. As
principais cidades brasileiras localizadas na bacia são Lajes, Chapecó, Uruguaiana,
Bagé e Santana do Livramento.
A região hidrográfica do Uruguai apresenta um grande potencial hidrelétrico, com
uma capacidade total de produção de 40,5 KW/km², considerando os lados brasileiro e
argentino, uma das maiores relações energia/km² do mundo.
São importantes fontes de contaminação das águas superficiais e subterrâneas na
região os efluentes da suinocultura e avicultura no oeste catarinense e os agrotóxicos,
utilizados principalmente na rizicultura.
A bacia é formada pelo rio Uruguai e por seus afluentes, desaguando no estuário do
rio da Prata já fora do território brasileiro.

4.12 Região Hidrográfica Paraguai


Possui uma área de 1,1 milhão de km², abrangendo não apenas os estados do Mato
Grosso e do Mato Grosso do Sul como também outros países vizinhos do Brasil, como a
Argentina, o Paraguai e a Bolívia. O principal rio da bacia é o Paraguai, que nasce em
território brasileiro na Chapada dos Parecis. A vazão média conjunta da bacia é de
363.445 m³/s.
44

A bacia do Paraguai pode ser dividida em duas regiões distintas: o Planalto, com
terras acima de 200 m de altitude, e o Pantanal, de terras com menos de 200 m de
altitude e sujeitas a inundações periódicas, funcionando como um grande reservatório
regularizados das azões dos rios da bacia.
Os biomas predominantes na bacia são o Cerrado (na região de planalto) e o
Pantanal. Em virtude da expansão das atividades agro-industriais e da mineração, os
desmatamentos vêm acentuando os processos de erosão, contribuindo para o
assoreamento dos rios da região, principalmente o Taquari e o São Lourenço, afluentes
do rio Paraguai.
O principal centro urbano localizado na região hidrográfica do Paraguai é a capital
matogrossense de Cuiabá.
45

5 USOS MÚLTIPLOS, CLASSIFICAÇÃO, PARÂMETROS E ÍNDICES DE


QUALIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS
A água é um dos recursos naturais mais intensamente utilizados. É fundamental para
existência e manutenção da vida e, para isso, deve estar presente no ambiente em
quantidade e qualidade apropriadas.
O homem tem usado a água não só para suprir suas necessidades metabólicas, mas
também para outros fins, como mostra a Figura 20. Existem regiões no planeta com
intensa demanda de água, tais como grandes centros urbanos, pólos industriais e zonas
de irrigação. Essa demanda pode superar a oferta de água, seja em termos quantitativos,
seja porque a qualidade da água local está prejudicada devido à poluição. Tal
degradação da sua qualidade pode afetar a oferta de água e também gerar graves
problemas de desequilíbrio ambiental.

Figura 20 – Usos da água

5.1 Usos múltiplos da água

5.1.1 Abastecimento humano


Dentre os vários usos da água, este é considerado o mais nobre e prioritário, uma
vez que o homem depende de uma oferta adequada de água para sua sobrevivência. A
qualidade de vida dos seres humanos está diretamente ligada à água, pois ela é utilizada
para o funcionamento adequado de seu organismo, preparo de alimentos, higiene
pessoal e de utensílios. Usamos a água também para irrigação de jardins, lavagens de
veículos e pisos, usos esses com exigências menores em relação à qualidade.
46

A água usada para abastecimento doméstico deve apresentar características


sanitárias e toxicológicas adequadas, tais como estar isenta de organismos patogênicos e
substâncias tóxicas, para prevenir danos à saúde e ai bem-estar do homem. Organismos
patogênicos são aqueles que transmitem doenças pela ingestão ou contato com a água
contaminada, como bactérias, vírus, parasitas, protozoários, que podem causar doenças
como disenteria, febre tifóide, cólera, hepatite e outras. A Organização Mundial de
Saúde estima que, das 13.700 pessoas que morrem por dia devido a doenças
transmitidas pela água, mais da metade são crianças com menos de 5 anos de idade.
Essas doenças são facilmente evitáveis com a existência de saneamento básico
adequado.
Água potável é aquela que não causa danos à saúde nem prejuízo aos sentidos. Deve
haver uma preocupação com a aparência da água porque um consumidor insatisfeito
com o aspecto da água oferecida pode utilizar água de outro manancial com melhor
aspecto. Todavia, não existe uma relação biunívoca entre aspecto e qualidade da água,
de modo que uma água com melhor aspecto pode ser mais nociva à saúde do que outra
com mau aspecto, dependendo das substâncias dissolvidas e organismos patogênicos
existentes em ambas.

5.1.2 Abastecimento industrial


A água é usada na indústria em seu processo produtivo, por exemplo, como solvente
em lavagens e processos de resfriamento. Não existe um requisito de qualidade da água
genérico para todas as indústrias, pois cada uso específico apresenta requisitos
particulares. Indústrias que processos produtos farmacêuticos, alimentícios e de bebidas
estão entre aquelas que precisam de qualidade elevada. Indústrias que utilizam a água
para resfriamento devem usar água isenta de substâncias que causem o aparecimento de
incrustações e corrosão nos dutos. Indústrias envolvidas com processos de tingimento
de tecidos e louças devem ter à disposição água isenta de produtos que propiciem o
aparecimento de manchas no produto final.

5.1.3 Irrigação
A qualidade da água utilizada na irrigação depende do tipo de cultura a ser irrigada.
Por exemplo, para o cultivo de vegetais que são consumidos crus, a água deve estar
isenta de organismos patogênicos que poderão atingir o consumidor desse produto. Essa
água também deve estar isenta de substâncias que sejam tóxicas aos vegetais ou aos
seus consumidores.
47

Outro aspecto de importância fundamental diz respeito ao teor de sais dissolvidos na


água empregada para a irrigação. Excesso de sais dissolvidos pode afetar a atividade
osmótica das plantas, bem como prejudicar o aproveitamento de nutrientes do solo,
influir diretamente no metabolismo das plantas e ainda reduzir a permeabilidade do
solo, dificultando a drenagem e a aeração. Esquemas de irrigação mal-operados
arruinaram grandes áreas de solo originalmente férteis devido ao efeito da salinização e
encharcamento dos solos.
É importante observar também que a irrigação representa o uso mais intenso dos
recursos hídricos, sendo responsável por aproximadamente 70 por cento do consumo de
água doce do mundo. Além disso, ela pode carrear para os corpos de água superficiais e
subterrâneos as substâncias empregadas para o aumento de produtividade da agricultura.
Entre tais substâncias destacam-se os fertilizantes sintéticos e os defensivos agrícolas,
causadores da eutrofização dos corpos aquáticos.

5.1.4 Geração de energia elétrica


A água é utilizada para fins energéticos por meio da geração de vapor de água nas
usinas termoelétricas ou pelo aproveitamento de energia potencial ou cinética da água
nas usinas hidrelétricas. Em ambos os casos, os requisitos de qualidade da água são
pouco restritivos, a não ser pelo controle de substâncias que possam afetar a
durabilidade e manutenção dos equipamentos utilizados.
O aproveitamento dos recursos hídricos para fins energéticos pode introduzir uma
série de impactos ambientais no meio aquático. As usinas termoelétricas podem
despejar calor nos corpos de água, afetando o ecossistema de várias maneiras. As usinas
hidrelétricas dependem em geral da existência de uma barragem que crie um desnível
entre as superfícies livres de água localizadas nos lados a montante e a jusante. Como
conseqüência, o rio a montante da barragem transforma-se num lago, o que altera o
ecossistema aquático, pois ele passa de um ambiente de altas velocidades e alta
turbulência (rio) para um ambiente de baixas velocidades e baixa turbulência (lago).

5.1.5 Navegação
O transporte de carga e passageiros por via fluvial, lacustre e marítima é
freqüentemente uma alternativa bastante interessante sob o ponto de vista econômico.
Para isso, a água existente no meio deve estar isenta de substâncias que sejam
agressivas ao casco e condutos de refrigeração das embarcações e/ou que propiciem a
proliferação excessiva de vegetação, causando inconvenientes à navegação.
48

A navegação pode perturbar o meio ambiente ao despejar substâncias poluidoras das


embarcações no meio aquático, seja de modo deliberado ou acidental. Os portos
também são um potencial poluidor pela mesma razão. Por exemplo, o caso de terminais
petrolíferos, os quais podem ocorrer os vazamentos de petróleo.
A navegação fluvial requer um leito adequado em termos de profundidade e curvas
para o deslocamento das embarcações. A velocidade do curso de água é outro fator
importante para a viabilização desse tipo de navegação. Assim, para a implantação da
navegação fluvial podem ser necessárias alterações no canal como, por exemplo, a
implantação de barragens com obras de transposição de nível (eclusas).

5.1.6 Diluição de despejos


Os corpos de água podem ser utilizados para transportar e diluir os despejos neles
lançados. A jusante do lançamento, as concentrações do poluente dependerão em parte
da razão de diluição, isto é, da relação entre a vazão do rio e a vazão do despejo. Se a
razão de diluição for alta, as concentrações podem ser baixas o suficiente para não
causar impactos sobre outros usos de água. A diluição, no entanto, não deve ser
recomendada em substituição ao tratamento dos despejos, devendo somente ser
utilizada para a carga residual das estações de tratamento. O comportamento dos corpos
de água como receptores de despejos varia em função de suas características físicas,
químicas e biológicas e da natureza das substâncias lançadas.

5.1.7 Preservação da flora e fauna


O equilíbrio ecológico do meio aquático deve ser mantido, independentemente dos
usos que se façam dos corpos de água. Para isso, deve-se garantir a existência de
concentrações mínimas de oxigênio dissolvido e de sais nutrientes na água. Ela não
deve conter substâncias tóxicas acima de concentrações críticas para os organismos
aquáticos.

5.1.8 Aqüicultura
A criação de organismos aquáticos de interesse para o homem requer padrões de
qualidade da água praticamente idênticos aos necessários para preservação da flora e da
fauna, havendo possivelmente algumas consideraçõRecreação
Os corpos de água oferecem várias alternativas de recreação ao homem, seja por
meio de atividades como a natação e esportes aquáticos ou outras atividades como a
pesca e a navegação esportiva. O contato com a água pode ser primário, como o que
ocorre quando há um contato físico proposital com a água, como na natação. É evidente
49

que a água não deve apresentar organismos patogênicos e substâncias tóxicas em


concentrações que possam causar danos à saúde pelo contato com a pele ou por
ingestão. O contato secundário ocorre de forma acidental em atividades como a
navegação esportiva.
Do ponto de vista estético, os corpos de água poluídos são inconvenientes ao
homem devido à liberação de odores desagradáveis, presença de substâncias flutuantes e
turbidez excessiva. Freqüentemente tais corpos de água estão próximos de centros
urbanos, não sendo utilizados para fins recreativos. Existe um valor econômico bastante
expressivo associado ao aspecto estético da água. Por exemplo, são bastante valorizadas
as propriedades próximas a corpos de água. Problemas com a água desvalorizam essas
propriedades, prejudicando o uso de rios e lagos como recursos paisagísticos.

5.1.10 Usos diversos da água e conflitos


Observa-se que os recursos hídricos podem ser utilizados de diversas maneiras,
atendendo a várias necessidades simultaneamente. Essa é uma exigência importante não
só do ponto de vista econômico, mas também do ponto de vista do abastecimento, em
função da crescente escassez da oferta de recursos hídricos diante da demanda sempre
crescente. Assim, podem surgir conflitos quanto à utilização dos recursos hídricos,
como por exemplo:
 A diluição de despejos de origem humana, industrial e agrícola pode
degradar a qualidade das águas, afetando outros usos tais como o
abastecimento humano, industrial, a irrigação, a preservação do meio
ambiente e a recreação;
 A necessidade de ajustar a variação temporal da oferta natural de água à sua
demanda pode levar á necessidade da criação de um reservatório. Todavia,
reservatórios podem provocar impactos ambientais significativos. Além
disso, uma das funções do reservatório pode ser o controle de cheias pela
criação de um espaço vazio adequado disponível para receber e armazenar
água durante o período de vazões altas. Essa água ficará retida no
reservatório para impedir a ocorrência de inundações nas áreas situadas a
jusante da barragem. A manutenção de um espaço vazio no reservatório
conflita com a necessidade de armazenamento de água adequado para
satisfazer os usos acima discriminados.
50

 Determinados usos dos recursos hídricos fazem com que parte da água que é
utilizada não retorne ao corpo de água do qual foi retirada. Tais usos são
denominados consuntivos. Exemplos de usos consuntivos são a irrigação (na
qual parte da água fornecida é retirada para a constituição da vegetação ou
sofre evapotranspiração), o abastecimento urbano (no qual existe uma perda
de água significativa durante o sistema de distribuição) e o abastecimento
industrial ( no qual também ocorrem perdas no sistema de distribuição ou
então incorporação da água ao produto manufaturado). Usos consuntivos em
geral conflitam com quaisquer outros usos em função da retirada da água que
provocam no sistema aquático.

5.2 Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA e a classificação dos corpos de


água.
A preocupação com a preservação ambiental, incluindo a qualidade da água resulta
na Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/81) com o objetivo de garantia do
meio ambiente equilibrado, utilizando-se de critérios e padrões de qualidade ambiental
definidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, órgão consultivo e
deliberativo pertencente ao Sistema de Gestão Ambiental brasileiro.
Em 18 de junho de 1986, o CONAMA estabelece os critérios e padrões de qualidade
de água de acordo com parâmetros e indicadores específicos para a proteção da saúde, o
bem-estar humano e o equilíbrio ecológico aquático. A Resolução vai além dos
parâmetros de balneabilidade e recreação definidos pela Portaria MINTER 13/76 e fixa
metas para garantia dos diversos usos preponderantes da água e diretrizes para a
utilização do enquadramento dos corpos d’ água como instrumento de planejamento que
permita atingir gradativamente os objetivos permanentes, por meio do estabelecimento
de objetivos de qualidade não necessariamente baseados no estado atual dos corpos de
água, mas naquele que estes deveriam possuir para atender às necessidades da
comunidade.
A Resolução, atualmente revogada pela Resolução CONAMA 357/05, representa
um marco no sistema de enquadramento de corpos de água e pela primeira vez a
legislação brasileira conceitua o que seriam os padrões e condições de qualidade de
água, instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, definindo em seu art. 2,
alíneas “a” e “b”:
a) CLASSIFICAÇÃO: qualificação das águas doces, salobras e salinas com base
nos usos preponderantes (sistema de classes de qualidade).
51

b) ENQUADRAMENTO: estabelecimento do nível de qualidade (classe) a ser


alcançado e/ou mantido em um segmento de corpo de água ao longo do tempo.
São estabelecidas classes para grupo de usos de água que incluem a preservação do
equilíbrio natural das comunidades aquáticas, abastecimento doméstico com ou sem
tratamento, recreação, irrigação de hortaliças, cultura arbórea, cerealíferas e forrageiras,
aqüicultura, pesca armadora, dessedentação de animais, navegação e harmonia
paisagística. Cada classe passa a ter de respeitar condições e parâmetros específicos que
devem ser monitorados pelo órgão competente, parâmetros modificados pela Resolução
CONAMA 357/05.
Com o estabelecimento de padrões de qualidade, defini-se poluição – lançamento de
matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos, conforme
definição do art. 3, III da PNMA – dos corpos hídricos. E passa a ser poluição o
lançamento de efluentes que confiram ao corpo receptor características em desacordo
com o enquadramento feito com base nas suas diretrizes de classes, ou ações cinegéticas
dos parâmetros definidos nas classes, capazes de causarem efeitos letais ou alteração de
comportamento, reprodução ou fisiologia da vida (arts. 12 c/c 23 da Resolução do
CONAMA 20/86).
Além das metas para o enquadramento, a fim de controlar a poluição a legislação
prevê condições mínimas para o lançamento de efluentes nos corpos hídricos e as
indústrias passam a ter que adequar suas instalações e projetos de tratamento a essas
novas exigências.
Com a definição do sistema de classes pela Resolução CONAMA 20/86 surgem
novas obrigações e competências para os órgãos ambientais com o objetivo de assegurar
não só a quantidade, mas também a qualidade da água. Os órgãos responsáveis pelo
monitoramento e controle passam a ter de desenvolver novos métodos de coleta e
análise da água, aumentam as possibilidades de aplicação de penalidades e interdição de
atividades para garantir água em qualidade.
Além disso, passa a ser necessário enquadrar as águas para garantir a qualidade e
estabelecer programas de controle de poluição para sua efetivação, a fim de garantir que
corpos de água com condições em desacordo com as classes sejam recuperados. Os
corpos de água já enquadrados passam a ter que se adequar à Resolução, sendo
considerados classes 2 todos os corpos de água ainda não enquadrados (previsão
mantida na Resolução do CONAMA 357/05).
52

Até a instituição de política específica de gestão da água – Política Nacional de


Recursos Hídricos – a água era gerida pelos órgãos pertencentes ao Sistema Nacional do
Meio Ambiente – SISNAMA, que inclui o Ministério do Meio Ambiente - MMA,
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, Instituto Brasileiro dos Recursos
Naturais – IBAMA e órgãos estaduais e municipais ambientais. De forma que, o
enquadramento das águas federais deveria ser precedido pela Secretaria Especial do
Meio Ambiente (SEMA), antigo MMA, ouvidos o Comitê Especial de Estudos
Integrados de Bacias Hidrográficas – CEEIBH – comitê federal de caráter consultivo,
sendo o enquadramento de águas estaduais efetuado pelo órgão estadual competente.

5.3 Parâmetros de qualidade da água


A qualidade da água pode ser expressa através de diversos parâmetros, que
traduzem as suas principais características físicas, químicas e biológicas. Os itens
seguintes descrevem os principais parâmetros de forma sucinta, apresentando seu
conceito, sua origem (natural ou antropogênica), sua importância sanitária, sua
utilização e a interpretação dos resultados de análise. Todos esses parâmetros são de
determinação rotineira em laboratórios de análise de água.
Os parâmetros abordados neste item podem ser de utilização geral, tanto para
caracterizar águas de abastecimento, águas residuárias, mananciais e corpos receptores.
É importante esta visão integrada da qualidade da água, sem uma separação estrita entre
as suas diversas aplicações.
Os padrões de qualidade da água no Brasil são regulamentados pelas seguintes
legislações:
 Padrão de potabilidade: Portaria 518 (2004), do Ministério da Saúde
 Padrão de corpos de água: Resolução CONAMA 357 (2005) do Ministério
do Meio Ambiente e eventuais legislações estaduais
 Padrão de lançamento: Resolução CONAMA 357 (2005) do Ministério do
Meio Ambiente e eventuais legislações estaduais

5.3.1 Parâmetros físicos


Cor
Conceito: Responsável pela coloração na água
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos
53

Origem natural:
 Decomposição da matéria orgânica (principalmente vegetais – ácidos húmicos e
fúlvicos)
 Ferro e manganês
Origem antropogênica:
 Resíduos industriais (ex: tinturarias, tecelagem, produção de papel)
 Esgotos domésticos
Importância
 Origem natural: não representa risco direto à saúde, mas consumidores
podem questionar a sua confiabilidade, e buscar águas de maior risco. Além
disso, a cloração da água contendo a matéria orgânica dissolvida responsável
pela cor pode gerar produtos potencialmente cancerígenos (trihalometanos –
ex: clorofórmio)
 Origem industrial: pode ou não apresentar toxicidade
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
Unidade: uC (unidades de cor)
Interpretação dos resultados
 Deve-se distinguir entre cor aparente e cor verdadeira. No valor da cor
aparente pode estar incluída uma parcela devido à turbidez da água. Quando
esta é removida por centrifugação, obtém-se a cor verdadeira.
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água:
 águas com cor acima de 15 uC podem ser detectadas em um corpo de
água pela maioria dos consumidores
 valores de cor da água bruta inferiores a 5 uC usualmente dispensam a
coagulação química; valores superiores a 25 uC usualmente requerem a
coagulação química seguida por filtração
 águas com cor elevada implicam em um mais delicado cuidado
operacional no tratamento da água
 Padrão de Potabilidade (=15 uC)
 Em termos de corpos de água
 Padrão para corpos de água
Turbidez
54

Conceito: A turbidez representa o grau de interferência com a passagem da luz


através da água, conferindo uma aparência turva à mesma
Forma do constituinte responsável: Sólidos em suspensão
Origem natural:
 Partículas de rocha, argila e silte
 Algas e outros microrganismos
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
 Microrganismos
 Erosão
Importância:
 Origem natural: não traz inconvenientes sanitários diretos. Porém, é
esteticamente desagradável na água potável, e os sólidos em suspensão
podem servir de abrigo para microrganismos patogênicos (diminuindo a
eficiência da desinfecção)
 Origem antropogênica: pode estar associada a compostos tóxicos e
organismos patogênicos
 Em corpos de água: pode reduzir a penetração da luz, prejudicando a
fotossíntese
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Controle da operação das estações de tratamento de água
Unidade: uT (Unidade de Turbidez)
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água:
 Numa água com turbidez igual a 10 uT, ligeira nebulosidade pode ser
notada; com turbidez igual a 500 uT, a água é praticamente opaca
 Valores de turbidez da água inferiores a cerca de 20 uT podem ser
dirigidas diretamente para a filtração lenta, dispensando a coagulação
química; valores superiores a 50 uT requerem uma etapa antes da filtração,
que pode ser a coagulação química ou um pré-filtro grosseiro
 Padrão de potabilidade (variável em função da origem da água e do tipo
de tratamento)
55

 Em termos de corpos de água


 Padrão para corpos de água
Sabor e odor
Conceito: O sabor é a interação entre o gosto (salgado, doce, azedo e amargo) e o
odor (sensação olfativa).
Forma do constituinte responsável: Sólidos em suspensão, sólidos dissolvidos,
gases dissolvidos
Origem natural:
 Matéria orgânica em decomposição
 Microrganismos (ex: algas)
 Gases dissolvidos (ex: gás sulfídrico H2S)
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
 Gases dissolvidos (ex: gás sulfídrico H2S)
Importância:
 Não representa risco à saúde, mas consumidores podem questionar a sua
confiabilidade, e buscar águas de maior risco. Representa a maior causa de
reclamações dos consumidores.
 Valores especialmente elevados podem indicar a presença de substâncias
potencialmente perigosas
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
Unidade: Concentração limite mínima detectável
Interpretação dos resultados:
 Na interpretação dos resultados, são importantes a identificação e a
vinculação com a origem do sabor e do odor
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água:
 Padrão de Potabilidade (odor e gosto são considerados não “objetáveis”)

Temperatura
Conceito: Medição da intensidade de calor.
Origem natural:
56

 Transferência de calor por radiação, condução e convecção (atmosfera e


solo)
Origem antropogênica
 Águas de torres de resfriamento
 Despejos industriais
Importância:
 Elevações da temperatura aumentam a taxa das reações físicas, químicas e
biológicas (na faixa usual de temperatura)
 Elevações da temperatura diminuem a solubilidade dos gases (ex: oxigênio
dissolvido)
 Elevações da temperatura aumentam a taxa de transferência de gases (o que
pode gerar mau cheiro, no caso da liberação de gases com odores
desagradáveis)
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de corpos de água
 Caracterização de águas residuárias brutas
Unidade: ºC
Interpretação dos resultados:
 Em termos de corpos de água
 A temperatura deve ser analisada em conjunto com outros parâmetros,
tais como oxigênio dissolvido
 Em termos de tratamento de águas residuárias
 A temperatura deve proporcionar condições para as reações bioquímicas
de remoção de poluentes
 Padrão de Lançamento de efluentes
Resíduo total
A utilização do resíduo total ou sólido total como indicador de qualidade das
águas tem mostrado pouca utilidade prática e sua maior aplicação tem-se restringindo
aos cálculos do índice de qualidade das águas (IQA). O significado desse parâmetro em
termos ambientais se limita à água para fins de abastecimento público, sendo o padrão
de 500 mg/l para água bruta.

5.3.2 Parâmetros químicos


pH
57

Conceito: Potencial hidrogeniônico. Representa a concentração de íons hidrogênio


H+ (em escala antilogarítmica), dando uma indicação sobre a condição de acidez,
neutralidade ou alcalinidade da água. A faixa de pH é de 0 a 14.
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos, gases dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de rochas
 Absorção de gases da atmosfera
 Oxidação da matéria orgânica
 Fotossíntese
Origem antropogênica
 Despejos domésticos (oxidação da matéria orgânica)
 Despejos industriais (ex: lavagem ácida de tanques)
Importância:
 Não tem implicação em termos de saúde pública (a menos que os valores
sejam extremamente baixos ou elevados, a ponto de causar irritação na pele
ou nos olhos)
 É importante em diversas etapas do tratamento da água (coagulação,
desinfecção, controle da corrosividade, remoção da dureza)
 pH baixo: potencial de corrosividade e agressividade nas tubulações e peças
das águas de abastecimento
 pH elevado: possibilidade de incrustações nas tubulações e peças das águas
de abastecimento
 Valores de pH afastados da neutralidade: podem afetar a vida aquática (ex:
peixes) e os microrganismos responsáveis pelo tratamento biológico dos
esgotos.
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Caracterização de águas residuárias brutas
 Controle da operação de estações de tratamento de água (coagulação e grau
de incrustabilidade/corrosividade)
 Controle da operação de estações de tratamento de esgotos (digestão
anaeróbia)
 Caracterização de corpos de água
Unidade: -
58

Interpretação dos resultados:


 Geral
 pH < 7: condições ácidas
 pH = 7: neutralidade
 pH > 7: condições básicas
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água:
 Diferentes valores de pH estão associados a diferentes faixas de atuação
ótima de coagulantes
 Freqüentemente o pH necessita ser corrigido antes e/ou depois da adição
de produtos químicos no tratamento
 A variação do pH influencia o equilíbrio de compostos químicos
 Em termos de tratamento de águas residuárias
 Valores de pH afastados da neutralidade tendem a afetar as taxas de
crescimento dos microrganismos
 A variação do pH influencia o equilíbrio de compostos químicos
 Valores de pH elevados possibilitam a precipitação de metais
 Em termos de corpos de água
 Valores elevados de pH podem estar associados à proliferação de algas
 Valores elevados ou baixos podem ser indicativos da presença de
efluentes industriais
 A variação do pH influencia o equilíbrio de compostos químicos
Reações e equações de importância:
H2O  H+ + OH-
pH = - log [H+]
Alcalinidade
Conceito: Quantidade de íons na água que reagirão para neutralizar os íons
hidrogênio. É uma medição da capacidade da água de neutralizar os ácidos
(capacidade de resistir às mudanças de pH: capacidade tampão). Os principais
constituintes da alcalinidade são os bicarbonatos (HCO3-), carbonatos (CO32-) e os
hidróxidos (OH-). A distribuição entre as três formas na água é função do pH.
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de rochas
59

 Reação do CO2 com a água (CO2 advindo da atmosfera ou da decomposição


da matéria orgânica)
Origem antropogênica
 Despejos industriais
Importância:
 Não tem significado sanitário para a água potável, mas em elevadas
concentrações confere um gosto amargo para a água
 É uma determinação importante no controle do tratamento de água , estando
relacionada com a coagulação, redução de dureza e prevenção da corrosão
em tubulações
 É uma determinação importante no tratamento de esgotos, quando há
evidências de que a redução do pH pode afetar os microrganismos
responsáveis pela depuração
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Caracterização de águas residuárias brutas
 Controle da operação de estações de tratamento de água (coagulação e grau
de incrustabilidade/corrosividade)
Unidade: mg/l de CaCO3 (também em miliequivalentes /l = equivalente/m3; os
valores são diferentes dos expressos em mg/l)
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 A alcalinidade, o pH e o teor de gás carbônico estão inter-relacionados
 pH > 9,4: hidróxidos e carbonatos
 pH entre 8,3 e 9,4: carbonatos e bicarbonatos
 pH entre 4,4 e 8,3: apenas bicarbonato
 Em termos de tratamento de águas residuárias
 Processos oxidativos (como a nitrificação) tendem a consumir
alcalinidade, a qual, caso atinja baixos teores, pode dar condições a valores
reduzidos de pH, afetando a própria taxa de crescimento dos microrganismos
responsáveis pela oxidação
Reações e equações de importância:
Equilíbrio do carbonato
CO2 + H2O  H2CO3
60

H2CO3  H+ + HCO3-
HCO3-  H+ + CO32-
Cálculo da alcalinidade:
Alcalinidade (mg/l) = 100 x {[(HCO3-)/(61x2)] + [(CO32-)/60] + [(OH-)/(2x17]}
Na faixa usual de pH, próxima à neutralidade, a maior contribuição para a
alcalinidade é dos bicarbonatos. Assim: Alcalinidade (mg/l) ≈ (HCO3-)/1,2
Acidez
Conceito: Capacidade de a água resistir às mudanças de pH causadas pelas bases. É
devido principalmente à presença de gás carbônico livre (pH entre 4,5 e 8,2).
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos e gases dissolvidos (CO2,
H2S)
Origem natural:
 CO2 absorvido da atmosfera ou resultante da decomposição da matéria
orgânica
 Gás sulfídrico
Origem antropogênica
 Despejos industriais (Ácidos minerais ou orgânicos)
 Passagem da água por minas abandonadas, vazadouros de mineração e
borras de minério
Importância:
 Tem pouco significado sanitário
 Águas com acidez mineral são desagradáveis ao paladar, sendo recusadas
 Responsável pela corrosão de tubulações e materiais
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento (inclusive industriais) brutas e
tratadas
Unidade: mg/l de CaCO3 (também em miliequivalentes /l = equivalente/m3; os
valores são diferentes dos expressos em mg/l)
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 O teor de CO2 livre (diretamente associado à acidez), a alacalinidade e o
pH estão inter-relacionados
 pH > 8,2: ausência de CO2 livre
 pH entre 4,5 e 8,2: acidez carbônica
61

 pH < 4,5: acidez por ácidos minerais fortes (usualmente resultantes de


despejos industriais)
Reações e equações de importância:
Equilíbrio do carbonato (ver alcalinidade)
Reações com enxofre:
H2S  H+ + HS-
H2S + 2O2  H2SO4
Dureza
Conceito: Concentração de cátions multimetálicos em solução. Os cátions mais
freqüentemente associados à dureza são os cátions bivalentes Ca2+ e Mg2+. Em
condições de supersaturação, esses cátions reagem com ânions na água, formando
precipitados. A dureza pode ser classificada como dureza carbonato (associada a
HCO3- e CO32-) e dureza não carbonato (associada a outros ânions, especialmente Cl-
e SO42-). A dureza correspondente à alcalinidade é a dureza carbonato, enquanto que
as demais formas são caracterizadas como dureza não carbonato. A dureza
carbonato é sensível ao calor, causando precipitação em elevadas temperaturas.
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de minerais contendo cálcio e magnésio (ex: rochas calcáreas)
Origem antropogênica
 Despejos industriais
Importância:
 Não há evidências de que a dureza cause problemas sanitários e alguns
estudos realizados em áreas com maior dureza na água indicaram uma menor
incidência de doenças cardíacas.
 Em determinadas concentrações, causa um sabor desagradável e pode ter
efeitos laxativos
 Reduz a formação de espuma, implicando num maior consumo de sabão
 Causa incrustação nas tubulações de água quente, caldeiras e aquecedores
(devido à maior precipitação nas temperaturas elevadas)
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento (inclusive industriais) brutas e
tratadas
62

Unidade: mg/l de CaCO3 (também em miliequivalentes /l = equivalente/m3; os


valores são diferentes dos expressos em mg/l)
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 Dureza < 50 mg/l CaCO3: água mole
 Dureza entre 50 e 150 mg/l CaCO3: dureza moderada
 Dureza entre 150 e 300 mg/l CaCO3: água dura
 Dureza > 300 mg/l CaCO3: água muito dura
Reações e equações de importância:
Ver alcalinidade
Equilíbrio do carbonato:
CaCO3  Ca2+ + CO32-
Ca2+ + 2 HCO3-  CaCO3 + CO2 + H2O
Cálculo da dureza total:
Dureza (mg/l) = 50 x {(Ca2+)/20 + Mg2+)/12,2}
Ferro e manganês
Conceito: O ferro e o manganês estão presentes nas formas insolúveis (Fe3+ e Mn4+)
numa grande quantidade de tipos de solos. Na ausência de oxigênio dissolvido (ex:
água subterrânea ou fundo de lagos e represas), eles se apresentam na forma solúvel
reduzida (Fe2+ e Mn2+). Caso a água contendo as formas reduzidas seja exposta ao ar
atmosférico (ex: na torneira do consumidor), o ferro e o manganês voltam a se
oxidar às suas formas insolúveis (Fe3+ e Mn4+), que precipitam, o que pode causar
cor na água, além de manchar roupas durante a lavagem.
Forma do constituinte responsável: Sólidos em suspensão ou dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de compostos do solo
Origem antropogênica
 Despejos industriais
Importância:
 Tem pouco significado sanitário nas concentrações usualmente encontradas
nas águas naturais
 Em pequenas concentrações causam problemas de cor na água
 E certas concentrações, podem causar sabor e odor (mas, nessas
concentrações, o consumidor já terá rejeitado a água, devido a cor)
63

Utilização mais freqüente do parâmetro


 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
Unidade: mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 Padrão de potabilidade (= 0,3 mg/l para ferro e 0,1 mg/l para manganês)
 Em termos do tratamento de águas residuárias
 Atentar-se aos padrões de lançamento estabelecidos pela Resolução do
CONAMA Nº 357/05
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05
Reações e equações de importância:
Oxidação do ferro e manganês
2Fe2+ + ½ O2 + 5H2O  2Fe(OH)3 + 4H+
Mn2+ + ½ O2 + H2O  MnO2 + 2H+
Cloretos
Conceito: Todas as águas naturais, em maior ou menor escala, contêm íons
resultantes da dissolução de minerais. Os cloretos (Cl-) são advindos da dissolução
de sais (ex: cloreto de sódio).
Forma do constituinte responsável: Sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de minerais
 Intrusão de águas salinas
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
 Águas utilizadas em irrigação
Importância:
 Em determinadas concentrações imprime um sabor salgado à água
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas
 Caracterização de esgotos tratados usados para irrigação
Unidade: mg/l
64

Interpretação dos resultados:


 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 Padrão de potabilidade (= 250 mg/l)
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05
Nitrogênio
Conceito: Dentro do ciclo do nitrogênio na biosfera, este se alterna entre várias
formas e estados de oxidação. No meio aquático, o nitrogênio pode ser encontrado
nas seguintes formas: (a) nitrogênio molecular (N2), escapando para a atmosfera, (b)
nitrogênio orgânico (dissolvido e em suspensão), (c) amônia (livre NH3 e ionizada
NH4+), (d) nitrito (NO2-) e (e) nitrato (NO3-)
Forma do constituinte responsável: Sólidos em suspensão e sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Constituinte de proteínas e vários outros compostos biológicos
 Nitrogênio de composição celular de microrganismos
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
 Excrementos de animais
 Fertilizantes
Importância:
 O nitrogênio na forma de nitrato está associado a doenças como a
metahemoglobinemia (síndrome do bebê azul)
 O nitrogênio é um elemento indispensável para o crescimento de algas e,
quando em elevadas concentrações em lagos e represas, pode conduzir a um
crescimento exagerado desses organismos (processo denominado
eutrofização)
 O nitrogênio, nos processos bioquímicos de conversão da amônia a nitrito e
deste a nitrato, implica no consumo de oxigênio dissolvido do meio (o que
pode afetar a vida aquática)
 O nitrogênio na forma de amônia livre é diretamente tóxico aos peixes
 O nitrogênio é um elemento indispensável para o crescimento dos
microrganismos responsáveis pelo tratamento de esgotos
65

 Os processos de conversão do nitrogênio têm implicações na operação das


estações de tratamento de esgotos, em termos de consumo de oxigênio,
consumo de alcalinidade e sedimentabilidade do lodo
 Em um corpo de água, a determinação da forma predominante do nitrogênio
pode fornecer informações sobre o estágio da poluição (poluição recente está
associada ao nitrogênio na forma orgânica ou de amônia, enquanto uma
poluição mais remota está associada ao nitrogênio na forma de nitrato)
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Caracterização de águas residuárias brutas e tratadas
 Caracterização de corpos de água
Unidade: mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos de tratamento e abastecimento público de água
 Padrão de potabilidade (= 10 mg/l para nitrato e 1 mg/l para nitrito)
 Em termos do tratamento de águas residuárias
 É necessário um adequado balanço C:N:P no esgoto para o
desenvolvimento dos microragnismos (cerca de 100:5:1 em termos de
DBO:N:P)
 Atentar-se aos padrões de lançamento (amônia)
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05 (amônia, nitrato, nitrito e, em certas condições,
nitrogênio total)
Reações e equações de importância:
Formas do nitrogênio:
N total = N orgânico + N amônia + NO2- + NO3-
Equilíbrio da amônia:
NH3 + H+  NH4+
Oxidação da amônia a nitrito:
2NH4+ + 3O2  2NO2- + 4H+ + 2H2O + Energia
Oxidação do nitrito a nitrato:
2NO2- + O2  2NO3- + Energia
Oxidação da amônia a nitrato (nitrificação) (reação global):
66

NH4+ + 2O2  NO3- + 2H+ + H2O + Energia


Redução do nitrato a nitrogênio gasoso (equivalentes de oxigênio e H+)
2NO3- + 3H+  N2 + 2,5O2 + H2O
Fósforo
Conceito: O fósforo na água apresenta-se principalmente nas formas de ortofosfato,
polifosfato e fósforo orgânico. Os ortofosfatos são diretamente disponíveis para o
metabolismo biológico sem necessidade de conversões a formas mais simples. As
formas em que os ortofosfatos se apresentam na água (PO43-, HPO42-, H2PO4-,
H3PO4) dependem do pH, sendo a mais comum na faixa usual de pH o HPO42-. Os
polifosfatos são moléculas mais complexas com dois ou mais átomos de fósforo.
Forma do constituinte responsável: Sólidos em suspensão e sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Dissolução de compostos do solo
 Decomposição da matéria orgânica
 Fósforo de composição celular de microrganismos
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
 Detergentes
 Excrementos de animais
 Fertilizantes
Importância:
 O fósforo não apresenta problemas de ordem sanitária nas águas de
abastecimento
 O fósforo é um elemento indispensável para o crescimento de algas e,
quando em elevadas concentrações em lagos e represas, pode conduzir a um
crescimento exagerado desses organismos (eutrofização)
 O fósforo é um nutriente essencial para o crescimento dos microrganismos
responsáveis pela estabilização da matéria orgânica
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas residuárias brutas e tratadas
 Caracterização de corpos de água
Unidade: mg/l
Interpretação dos resultados:
67

 Em termos de tratamento de águas residuárias


 É necessário um adequado balanço C:N:P no esgoto para o
desenvolvimento dos microrganismos (cerca de 100:5:1 em termos de
DBO:N:P)
 Em lançamentos de efluentes a montante de represas com problemas de
eutrofização, freqüentemente se limita o P total em 1,0 a 2,0 mg/l
 Em termos dos corpos de água
 Os seguintes valores de P total podem ser utilizados como indicativos
aproximados do estado de eutrofização de lagos (lagos tropicais
provavelmente aceitam concentrações superiores): (a) P< 0,01-0,02 mg/l:
não eutrófico; (b) P entre 0,01 – 0,02 e 0,05 mg/l: estágio intermediário; (c)
P> 0,05 mg/l: eutrófico
Oxigênio dissolvido
Conceito: O oxigênio dissolvido (OD) é de essencial importância para os
organismos aeróbios (que vivem na presença de oxigênio). Durante a estabilização
da matéria orgânica, as bactérias fazem uso do oxigênio nos seus processos
respiratórios, podendo vir a causar uma redução da sua concentração no meio.
Dependendo da magnitude deste fenômeno, podem vir a morrer diversos seres
aquáticos, inclusive os peixes. Caso o oxigênio seja totalmente consumido, tem-se
as condições anaeróbias (ausência de oxigênio), com possível geração de maus
odores.
Forma do constituinte responsável: Gás dissolvido
Origem natural:
 Dissolução do oxigênio atmosférico
 Produção pelos organismos fotossintéticos
Origem antropogênica
 Introdução de aeração artificial
 Produção pelos organismos fotossintéticos em corpos de água eutrofizados
Importância:
 O oxigênio dissolvido é vital para os seres aquáticos aeróbios
 O oxigênio dissolvido é o principal parâmetro de caracterização dos efeitos
da poluição das águas por despejos orgânicos
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Controle operacional de estação de tratamento de esgotos
68

 Caracterização de corpos de água


Unidade: mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos do tratamento de águas residuárias
 É necessário um teor mínimo de oxigênio dissolvido (> 1 mg/l ou
eventualmente mais) nos reatores dos sistemas aeróbios
 Em termos dos corpos de água
 A solubilidade do OD varia com a altitude e a temperatura. Ao nível do
mar, na temperatura de 20°C, a concentração de saturação é igual a 9,2 mg/l
 Valores de OD superiores à saturação são indicativos da presença de
algas (fotossíntese, com geração de oxigênio puro)
 Valores de OD bem inferiores à saturação são indicativos da presença de
matéria orgânico (provavelmente esgotos)
 Com OD em torno de 4-5 mg/l morrem os peixes mais exigentes; com
OD igual a 2 mg/l praticamente todos os peixes estão mortos; com OD igual
a 0 mg/l tem-se condições de anaerobiose
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05
Reações e equações de importância:
Oxidação da matéria orgânica (consumo de oxigênio):
C6H12O6 + 6O2  6CO2 + 6H2O + Energia
Fotossíntese (produção de oxigênio):
6CO2 + 6H2O + Energia  C6H12O6 + 6O2
Oxidação da amônia a nitrato (nitrificação) (consumo de oxigênio):
NH4+ - N + 2O2  NO3- - N + 2H+ + H2O + Energia
Redução do nitrato a nitrogênio gasoso (liberação de oxigênio)
2NO3- - N + 2H+  N2 + 2,5O2 + H2O
Matéria orgânica
Conceito: A matéria orgânica presente nos corpos de água e nos esgotos é uma
característica de primordial importância, sendo a causadora do principal problema
de poluição das águas: o consumo do oxigênio dissolvido pelos microrganismos nos
seus processos metabólicos de utilização e estabilização da matéria orgânica. Os
principais componentes orgânicos são os compostos de proteína, os carboidratos, a
gordura e os óleos, além da uréia, surfactantes, fenóis, pesticidas e outros em menor
69

quantidade. A matéria carbonácea (com base no carbono orgânico) divide-se nas


seguintes frações: (a) não biodegradável (em suspensão e dissolvida) e (b)
biodegradável (em suspensão e dissolvida). Em termos práticos, usualmente não há
necessidade de se caracterizar a matéria orgânica em termos de proteínas, gorduras,
carboidratos etc. Ademais, há uma grande dificuldade na determinação laboratorial
dos diversos componentes da matéria orgânica nas águas residuárias, face à
multiplicidade de formas e compostos em que esta pode se apresentar. Em assim
sendo, utilizam-se normalmente métodos indiretos para quantificação da matéria
orgânica, ou do seu potencial poluidor. Nesta linha, existem duas principais
categorias: (a) medição do consumo de oxigênio (Demanda Bioquímica de Oxigênio
– DBO; Demanda Química de Oxigênio – DQO) e (b) medição do carbono orgânico
(Carbono Orgânico Total – COT). A DBO e a DQO são os parâmetros
tradicionalmente mais utilizados.
Forma do constituinte responsável: sólidos em suspensão e sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Matéria orgânica vegetal e animal
 Microrganismos
Origem antropogênica
 Despejos domésticos
 Despejos industriais
Importância:
 A matéria orgânica é responsável pelo consumo, pelos microrganismos
decompositores, do oxigênio dissolvido na água
 A DBO e a DQO retratam, de uma forma indireta, o teor de matéria orgânica
nos esgotos ou no corpo de água, sendo, portanto, uma indicação do
potencial do consumo de oxigênio dissolvido
 A DBO e a DQO são os parâmetros de maior importância na caracterização
do grau de poluição de um corpo de água
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas residuárias brutas e tratadas
 Caracterização de corpos de água
Unidade: mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos do tratamento de águas residuárias
70

 A DBO dos esgotos domésticos está em torno de 300 mg/l e a DQO em


torno de 600 mg/l
 A DBO e a DQO dos esgotos industriais variam amplamente, com o tipo
de processo industrial
 A DBO e a DQO efluentes do tratamento são função do nível e do
processo de tratamento
 Atentar-se aos padrões de lançamento estabelecidos pela Resolução do
CONAMA Nº 357/05
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05
Reações e equações de importância:
Conversão aeróbia da matéria orgânica (oxidação):
C6H12O6 + 6O2  6CO2 + 6H2O + Energia
Conversão anaeróbia da matéria orgânica:
C6H12O6  3CH4 + 3CO2 + Energia
Micropoluentes inorgânicos
Conceito: Uma grande parte dos micropoluentes inorgânicos é tóxica. Entre estes,
têm especial destaque os metais. Entre os metais que se dissolvem na água incluem-
se o arsênio, cádmio, cromo, chumbo, mercúrio e prata. Vários destes metais se
concentram na cadeia alimentar, resultando num grande perigo para os organismos
situados nos níveis superiores. Felizmente as concentrações dos metais tóxicos nos
ambientes aquáticos naturais são pequenas. Vários metais, em baixas concentrações,
são nutrientes essenciais para o crescimento de seres vivos. Além dos metais, há
outros micropoluentes inorgânicos de importância em termos de saúde pública,
como os cianetos, o flúor e outros.
Forma do constituinte responsável: sólidos em suspensão e sólidos dissolvidos
Origem natural:
 A origem natural é de menor importância
Origem antropogênica
 Despejos industriais
 Atividades mineradoras
 Atividades de garimpo
 Agricultura
71

Importância:
 Alguns elementos e compostos, em baixas concentrações, são nutrientes para
seres vivos
 Vários elementos e compostos, em determinadas concentrações, são tóxicos
para os habitantes dos ambientes aquáticos, para os consumidores da água e
para os microrganismos responsáveis pelo tratamento biológico dos esgotos
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Caracterização de águas residuárias brutas e tratadas
 Caracterização de corpos de água
Unidade: µg/l ou mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos do tratamento e abastecimento público de água
 Atentar-se aos padrões de potabilidade estabelecidos pela Portatira
Nº 518 do Ministério da Saúde (vários elementos e compostos)
 Em termos de tratamento de águas residuárias
 Em determinadas concentrações, podem causar inibição no tratamento
biológico de esgotos
 Atentar-se aos padrões de lançamento estabelecidos pela Resolução do
CONAMA Nº 357/05
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05
Micropoluentes orgânicos
Conceito: Alguns compostos orgânicos são resistentes à degradação biológica, não
integrando os ciclos biogeoquímicos, e acumulando-se em determinado ponto do
ciclo (interrompido). Entre estes, destacam-se os defensivos agrícolas, alguns tipos
de detergentes (ABS, com estrutura molecular fechada) e um grande número de
produtos químicos. Uma grande parte destes compostos, mesmo em reduzidas
concentrações, está associada a problemas de toxicidade.
Forma do constituinte responsável: sólidos dissolvidos
Origem natural:
 Vegetais com madeira (tanino, lignina, celulose, fenóis)
Origem antropogênica
72

 Despejos industriais
 Detergentes
 Processamento e refinamento do petróleo
 Defensivos agrícolas
Importância:
 Os compostos orgânicos incluídos nesta categoria não são biodegradáveis
 Vários compostos, em determinadas concentrações, são tóxicos para os
habitantes dos ambientes aquáticos, para os consumidores da água e para os
microrganismos responsáveis pelo tratamento biológico dos esgotos
Utilização mais freqüente do parâmetro
 Caracterização de águas de abastecimento brutas e tratadas
 Caracterização de águas residuárias brutas e tratadas
 Caracterização de corpos de água
Unidade: µg/l ou mg/l
Interpretação dos resultados:
 Em termos do tratamento e abastecimento público de água
 Atentar-se aos padrões de potabilidade estabelecidos pela Portatira
Nº 518 do Ministério da Saúde (vários compostos)
 Em termos de tratamento de águas residuárias
 Atentar-se aos padrões de lançamento estabelecidos pela Resolução do
CONAMA Nº 357/05
 Em termos dos corpos de água
 Atentar-se aos padrões de classes de água estabelecidos pela Resolução
do CONAMA Nº 357/05

5.3.3 Parâmetros biológicos


A relação dos microrganismos de interesse na Engenharia Sanitária e Ambiental
(bactérias, algas, fungos, protozoários, vírus e helmintos), como mostra a Tabela 7.
73

Tabela 7 – Principais microrganismos de interesse na Engenharia Ambiental


Microrganismo Descrição
Bactérias • Organismos unicelulares
• Apresentam-se em várias formas e tamanhos
• São os principais responsáveis pela conversão de matéria orgânica
• Algumas bactérias são patogênicas, causando principalmente
doenças intestinais
Arqueobactérias • Similares às bactérias em tamanho e componentes celulares básicos
(archaea) • A parede celular, material celular e composição do RNA são
diferentes
• Importantes nos processos anaeróbios
Algas • Organismos autotróficos, fotossintetizantes, contendo clorofila
• Importantes na produção de oxigênio nos corpos de água e em
alguns processos de tratamento de esgotos
• Em lagos e represas, podem proliferar em excesso, causando uma
deterioração da qualidade da água
Fungos • Organismos predominantemente aeróbios, uni ou multicelulares,
não fotossintéticos, heterotróficos
• Também de importância na decomposição da matéria orgânica
• Podem crescer em condições de baixo pH
Protozoários • Organismos unicelulares sem parede celular
• A maioria é aeróbia ou facultativa
• Alimentam-se de bactérias, algas e outros microrganismos
• São essenciais no tratamento biológico para a manutenção de um
equilíbrio entre os diversos grupos
• Alguns são patogênicos
Vírus • Organismos parasitas, formados pela associação de material
genético (DNA ou RNA) e uma carapaça protéica
• Causam doenças e podem ser de difícil remoção no tratamento da
água ou do esgoto
Helmintos • Animais superiores
• Ovos de helmintos presentes nos esgotos podem causar doenças

Fonte: Silva & Mara (1979), Tchobanoglous & Schroeder (1985), Metcalf & Eddy (1991)

Os microrganismos desempenham diversas funções de fundamental importância,


principalmente as relacionadas com a transformação da matéria orgânica dentro dos
ciclos biogeoquímicos. No tratamento biológico dos esgotos, os microrganismos são os
responsáveis pelas reações de conversão da matéria orgânica e inorgânica.
Um outro aspecto de grande relevância em termos da qualidade biológica da água é
o relativo à possibilidade da transmissão de doenças.
A determinação da potencialidade de uma água transmitir doenças pode ser efetuada
de forma indireta, através dos organismos indicadores de contaminação fecal,
pertencentes principalmente ao grupo de coliformes.
Os organismos do grupo coliforme, até então, têm se mostrado melhores indicadores
da possível presença de seres patogênicos (causadores de doenças ao homem)
A investigação de seres patogênicos é na prática inviável, haja vista o grande
número dos mesmos. Os coliformes, por sua vez, além da vantagem de terem resistência
74

igual ou maior que os seres patogênicos, estão presentes em grandes quantidades nas
fezes dos animais de sangue quente. Eles são facilmente isolados e identificados na água
e as técnicas bacteriológicas são simples, rápidas e econômicas.
A determinação deste indicador é baseada em termos probabilísticos, sendo o
resultado expresso através do número mais provável (NMP) de organismos do grupo
coliforme por 100 ml de amostra.

5.4 Índices da qualidade da água


As tentativas de sintetizar as informações de qualidade de água, de modo a torná-las
facilmente interpretáveis, remontam a 1948, quando, na Alemanha, tentou-se relacionar
o nível de pureza da água e a poluição com a ocorrência de determinadas comunidades
de organismos macro e microscópicos (peixes, organismos bentônicos e plantas). Em
lugar de atribuir um valor numérico à qualidade de água, esses sistemas categorizavam
os corpos de água em uma classe – entre as várias – de poluição. Os índices que
utilizam uma escala numérica para representar os vários níveis de qualidade de água
começaram a surgir mais recentemente, por volta de 1965. O primeiro deles foi o índice
de Horton. Há vários tipos de índices, entre os quais se podem citar:
 De qualidade de água em geral;
 Para usos específicos;
 Para planejamento; e
 Aqueles desenvolvidos segundo abordagens estatísticas.
Sabe-se que a água admite uma variedade de usos, e como os requisitos de
qualidade variam em função do uso, buscou-se desenvolver índices voltados para usos
específicos. Entretanto, com base na hipótese de que a qualidade de água é um atributo
geral das águas superficiais, independentemente do uso que delas se faz, foram
desenvolvidos índices gerais de qualidade de água, tais como: o índice de Horton, o
índice de qualidade da National Sanitation Foundation, o índice de poluição implícito de
Prati, o índice de poluição de rios de McDuffie e o sistema de contabilidade social de
Dinius.

5.4.1 Índice usado pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB)


O índice de qualidade das águas utilizado pela CETESB (São Paulo) é uma
adaptação do índice de qualidade de água da National Sanitation Foundation (NSF). Em
1970, Brown, Mc Clelland, Deininger e Tozer apresentaram um índice de qualidade de
75

água bastante similar em sua estrutura ao índice de Horton. O trabalho para o


desenvolvimento deste índice foi financiado pela National Sanitation Foundation.
O índice de qualidade de água (IQA) da NSF foi obtido a partir de um procedimento
formal para combinar as opiniões de um grande painel de 142 especialistas de todas as
partes dos Estados Unidos, baseado na técnica de Delphi, da Rand Corporation.
Segundo esta abordagem, os membros do painel foram inquiridos por correio, através
de questionários foram tabulados e retornados a cada participante, permitindo-lhes
comparar sua resposta com aquelas dadas pelos demais participantes. A seguir, cada
membro foi novamente inquirido a fim de se chegar a um consenso final. Os criadores
desse índice acreditavam que tal procedimento ajudaria a minimizar os problemas
associados com o julgamento arbitrário, incorporado nos índices previamente
desenvolvidos.
Os profissionais que participaram da pesquisa indicaram as variáveis de qualidade
de água que deveriam ser medidas, o peso relativo das mesmas e a condição em que se
apresentava cada uma delas, segundo uma escala de valores – rating.
Das 35 variáveis indicadoras de qualidade de água inicialmente propostas, foram
selecionadas nove. Para essas, a juízo de cada profissional, foram estabelecidas curvas e
a variação da qualidade da água, de acordo com o estado ou condição de cada variável.
Os julgamentos dos profissionais foram sintetizados em um conjunto de curvas médias,
uma para cada parâmetro, as quais são mostradas na Figura 21 e utilizadas pela
CETESB.
76

Figura 21 - Curvas Médias de Variação de Qualidade das Águas


77

O IQA é determinado pelo produtório ponderado das qualidades de água


correspondentes às variáveis: OD, DBO, coliformes fecais, temperatura, pH, nitrogênio
total, fósforo total, turbidez e resíduo total.
A seguinte fórmula é utilizada para esse fim:

IQA = pi . qi wi (27)

Onde i=1.
IQA  índice de qualidade das águas. Um número entre 0 e 100;
qi  qualidade da i-ésima variável, obtido do respectivo gráfico de qualidade, em
função de sua concentração ou medida (resultado da análise);
wi  peso correspondente à i-ésima variável fixado em função de sua importância
para a conformação da qualidade, isto é, um número entre 0 e1
78

n  o número de variáveis que entram no cálculo (indicadas nos gráficos da Figura


21, onde no presente caso n = 9)
pi  produtório de i variando de 1 a n (q1w1. q2w2..... qnwn)
A variável temperatura é levada em conta no IQA como um desvio, seja qual for o
nível da temperatura de equilíbrio. Essa temperatura de equilíbrio é aquela que ocorre
naturalmente, quando não há influência de descargas aquecidas ou resfriadas. Nas
aplicações em campo, duas temperaturas são medidas: uma no local de amostragem e
outra em algum ponto a montante, livre de descargas frias ou quentes. Em termos
práticos, não havendo referência específica sobre desvios de temperatura, será
considerado dt = 0 (q6 = 93).
É necessário prestar atenção às unidades em particular ao OD, que normalmente é
dado em mg O2/l, enquanto a curva de qualidade q9 está em % do OD de saturação. A
transformação pode ser feita com base na Tabela 8 em função da altitude do ponto de
amostragem e da temperatura da amostra.
A qualidade das águas interiores (doces), indicada pelo IQA numa escala de 0 a 100,
pode ser classificada em faixas da seguinte forma (critério CETESB).
Tabela 8 – Categoria e ponderação do IQA
Faixas de IQA Qualificação
79 < IQA ≤ 100 Ótima
51 < IQA ≤ 79 Boa
36 < IQA ≤ 51 Regular
19 < IQA ≤ 36 Ruim
IQA < 19 Péssima
79

6 PRINCIPAIS FONTES E PROCESSOS POLUIDORES DOS RECURSOS


HÍDRICOS
Entende-se por poluição da água a alteração se suas características por quaisquer
ações ou interferências, sejam elas naturais ou provocadas pelo homem. Essas
alterações podem produzir impactos estéticos, fisiológicos ou ecológicos. O conceito de
poluição da água tem-se tornado cada vez mais amplo em função de maiores exigências
com relação à conservação e ao uso racional dos recursos hídricos.
A alteração da qualidade da água não está ligada somente a aspectos estéticos, já
que a água de aparência satisfatória para um determinado uso pode conter
microrganismos patogênicos e substâncias tóxicas para determinadas espécies, e águas
com aspecto desagradável podem ter determinados usos. A noção de poluição deve estar
associada ao uso que se faz da água.
É importante distinguir a diferença entre os conceitos de poluição e contaminação,
já que ambos são às vezes utilizados como sinônimos. A contaminação refere-se à
transmissão de substâncias ou microrganismos nocivos à saúde pela água. A ocorrência
da contaminação não implica necessariamente um desequilíbrio ecológico. Assim, a
presença na água de organismos patogênicos prejudiciais ao homem não significa que o
meio ambiente aquático esteja ecologicamente desequilibrado. De maneira análoga, a
ocorrência de poluição não implica necessariamente riscos à saúde de todos os
organismos que fazem uso dos recursos hídricos afetados. Por exemplo, a introdução de
calor excessivo nos corpos de água pode causar profundas alterações ecológicas no
meio sem que isso signifique necessariamente restrições ao seu consumo pelo homem.
Os efeitos resultantes da introdução de poluentes no meio aquático dependem da
natureza do poluente introduzido, do caminho que esse poluente percorre no meio e do
uso que se faz do corpo de água. Os poluentes podem ser introduzidos no meio aquático
de forma pontual ou difusa (Figura 22). As cargas pontuais podem ser introduzidas por
lançamentos individualizados, como os que ocorrem no despejo de esgotos sanitários ou
de efluentes industriais. Cargas pontuais são facilmente identificadas e, portanto, seu
controle é mais eficiente e mais rápido. As cargas difusas são assim chamadas por não
terem um ponto de lançamento específico e por ocorrerem ao longo da margem dos rios
como, por exemplo, as substâncias provenientes de campos agrícolas, ou por não
advirem de um ponto preciso de geração, como no caso de drenagem urbana.
80

Figura 22 – Exemplo de fontes poluidoras pontuais e difusas

6.1 Tipos de poluição


A poluição das águas basicamente origina-se de quatro tipos de fontes, descritos a
seguir:

6.1.1 Poluição natural


Trata-se de um tipo de poluição não associada à atividade humana, causada por:
 Chuvas e escoamento superficial;
 Salinização; e
 Decomposição de vegetais e animais mortos
Este tipo de poluição costuma fugir ao alcance de medidas controladoras diretas, o
que justifica a não realização de um levantamento específico para o caso.

6.1.2 Poluição industrial


Constitui-se de resíduos líquidos gerados nos processos industriais de uma maneira
geral. É quase sempre o fator mais significativo em termos de poluição e, portanto, será
abordado em detalhes o levantamento deste tipo de fonte. As principais indústrias
poluidoras são as seguintes:
 Papel e celulose;
 Refinarias de petróleo
 Usinas de açúcar e álcool;
 Siderúrgicas e metalúrgicas;
 Químicas e farmacêuticas;
 Abatedouros e frigoríficos;
 Têxteis; e
 Curtumes.
81

6.1.3 Poluição urbana


É aquela proveniente dos habitantes de uma cidade, que geram esgotos domésticos,
lançados direta ou indiretamente nos corpos de água.
É um tipo de fonte que dispõe de tecnologia de controle, cujo levantamento será
abordado mais adiante.

6.1.4 Poluição agropastoril


Poluição decorrente de atividades ligadas à agricultura e à pecuária através de
defensivos agrícolas; de fertilizantes; de excrementos de animais e de erosão.
Este tipo de fonte é de difícil controle e necessita de um esquema de conscientização
elevado, de modo a se obter resultados positivos.
Além desses quatro tipos, existe e deve ser considerada a poluição dita acidental,
decorrente de derramamentos de materiais prejudiciais à qualidade das águas. A
poluição, em caso de acidentes, pode ocorrer tanto na fase de produção como nas
operações de transportes que é, aliás, onde este tipo mais acontece. As ações de
controle, neste caso, são de emergência, mas é imprescindível uma preparação baseada
na experiência existente, aliada a medidas de caráter preventivo.
A Tabela 9 lista as principais fontes de poluentes, concomitantemente com os seus
efeitos poluidores mais representativos.
Tabela 9 – Poluição, fontes, impactos e parâmetros indicadores
Poluição Fonte Impacto Parâmetros indicadores
Áreas agrícolas,
Redução de OD;
Matéria orgânica pecuária, efluentes DBO, DQO e OD
mortandade de peixes
doméstico e industrial
Transmissão de doenças
Esgoto bruto ou como cólera, disenteria
Coliformes totais e
Patogênico parcialmente tratado, e esquistossomose e
fecais (termotolerantes)
excremento de animais proibição de usos nobres
da água
Proliferação excessiva
de algas resultando em
redução de OD;
liberação de toxinas do
sedimento; redução de
diversidade da
Agricultura, pecuária,
comunidade de
Nutrientes esgoto doméstico e Nitrogênio e fósforo
invertebrados e
industrial
vertebrados; mortandade
de peixes; risco de
redução da capacidade
de transporte de
oxigênio no sangue dos
recém-nascidos
82

Redução da população
de peixes devido falha
Descargas industriais,
na reprodução; efeito
lodo de estações de
letal nos invertebrados;
tratamento de esgoto,
diversos problemas à Mercúrio, cádmio,
Metais pesados efluente de minas de
saúde humana, como: chumbo, cromo, etc.
carvão, deposição
disfunção dos rins,
atmosférica, aterro
problemas nos ossos ou
sanitário
no sistema nervoso,
dependendo do metal
Crescimento e
Escoamento sobrevivência reduzidos
superficial urbano e de alevinos; doenças nos
Substâncias tóxicas rural, descargas peixes; aumento no Pesticidas, amônia
doméstica e industrial, risco de câncer no
infiltração. cólon, rins e bexiga nos
seres humanos
Diminuem a
transparência da água,
reduz as taxas de
Escoamento
fotossíntese, prejudica a
superficial urbano e
Sólidos em suspensão procura de alimentos Turbidez e sólidos
rural, descargas
para algumas espécies,
doméstica e industrial
prejudica as espécies
bentônicas e a
reprodução de peixes
Diminui a concentração
de OD, favorece o
desenvolvimento
excessivo de seres
Despejos industriais, termófilos, alterar a
Calor Temperatura
usinas termoelétricas cinética de reações
químicas, favorecer
alguns sinergismos
nocivos ao meio
ambiente
Crescimento e
sobrevivência reduzidos
Radioatividade Descargas industriais de alevinos; doenças nos Substâncias radioativas
peixes; aumento no
risco de câncer
Fonte: Irani et al. (2001)

6.2 Quantificação de cargas poluidoras


Para a avaliação do impacto da poluição e da eficácia das medidas de controle, é
necessária a quantificação das cargas poluidoras afluentes ao corpo de água. Para tanto,
são necessários levantamentos de campo na área em estudo, incluindo amostragem dos
poluentes, análises de laboratório, medição de vazões e outros. Caso não seja possível a
execução de todos estes itens, pode-se complementar com dados de literatura.
83

Informações típicas a serem obtidas em um levantamento sanitário de uma bacia


hidrográfica são (Mota, 1998):
 Dados físicos da bacia: aspectos geológicos; precipitação pluviométrica e
escoamento; variações climáticas; temperatura; evaporação, etc.
 Informações sobre o comportamento hidráulico dos corpos de água: vazões
máxima, média e mínima; volumes de reservatórios; velocidades de
escoamento; profundidade, etc.
 Uso e ocupação do solo: tipos; densidades; perspectivas de crescimento;
distritos industriais; etc.
 Caracterização sócio-econômica: demografia; desenvolvimento econômico,
etc.
 Usos múltiplos das águas
 Requisitos de qualidade para o corpo de água
 Localização, quantificação e tendência das principais fontes poluidoras
 Diagnóstico da situação atual da qualidade da água: características físicas,
químicas e biológicas.
Como comentado, de maneira geral, os poluentes são freqüentemente originários das
seguintes fontes principais:
 Esgotos domésticos
 Despejos industriais
 Escoamento superficial
 Área urbana
 Área rural
Em vários cálculos, a quantificação dos poluentes deve ser apresentada em termos
de carga. A carga é expressa em termos de massa por unidade de tempo, podendo ser
calculada por um dos seguintes métodos, dependendo do tipo de problema em análise,
da origem do poluente e dos dados disponíveis (nos cálculos, converter as unidades para
se trabalhar sempre em unidades consistentes, como por exemplo, kg/d):
 Carga = concentração x vazão
 Carga = contribuição per capita x população
 Carga = contribuição por unidade produzida (kg/unid produzida) x produção
(unid produzida/dia)
 Carga = contribuição por unidade de área (kg/km2.dia) x área (km2)
84

Esgotos domésticos e industriais


Carga = concentração x vazão
Carga (kg/dia) = concentração (g/m3) . vazão (m3/dia)
1000 (g/kg)
Obs: g/m3 = mg/l
Esgotos domésticos
Carga = população x carga per capita
Carga (kg/dia) = população (hab) . carga per capita (g/hab.dia)
1000 (g/kg)
Esgotos industriais
Carga = contribuição por unidade produzida x produção
Carga (kg/dia) = contribuição por unidade produzida (kg/unid) x produção (unid/dia)
Drenagem superficial
Carga = contribuição por unidade de área x área
Carga (kg/dia) = contribuição por unidade de área (kg/km2.dia) x área (km2)

6.2.1 Cargas Geradas por Esgotos Domésticos


Na Tabela 10 seguinte são apresentadas as características principais, em termos de
cargas geradas e concentração resultante, dos esgotos domésticos brutos. Esses valores
poderão ser utilizados como referência em estudos e projetos, como por exemplo, em
análises de solicitações de outorga para esse tipo de efluente.
Tabela 10 - Características dos Esgotos Domésticos Brutos (carga gerada)
Contribuição per capita
Parâmetro Concentração
(g/hab/dia)
Faixa Típico Unidade Faixa Típico
Sólidos Totais 120 - 220 180 mg/l 700 - 1350 1100
Em suspensão 35 - 70 60 mg/l 200 - 450 400
- Fixos 7 - 14 10 mg/l 40 - 100 80
- Voláteis 25 - 60 50 mg/l 165 350 320
Dissolvidos 85 - 150 120 mg/l 500 - 900 700
- Fixos 50 - 90 70 mg/l 300 - 550 400
- Voláteis 35 - 60 50 mg/l 200 - 350 300
Sedimentáveis mg/l 10 - 20 15
Matéria Orgânica
Determinação indireta
85

DB05 40 - 60 50 mg/l 200 - 500 350


- DQO 80 - 130 100 mg/l 400 - 800 700
- DBO última 60 - 90 75 mg/l 350 - 600 500
Determinação direta
- COT (Carbono
30 - 60 45 mg/l 170 - 350 250
Orgânico Total)
Nitrogênio Total 6,0 - 112,0 8,0 mgN/l 35 - 70 50
Nitrogênio orgânico 2,5 - 5,0 3,5 mgN/l 15 - 30 20
Amônia 3,5 - 7.0 4,5 mgNH3-N/l 20 - 40 30
Nitrito ~0 ~0 mgNO2-N/l ~0 ~0
Nitrato 0,0 - 0,5 ~0 mgN03-N/l 0-2 ~0
Fósforo 1.0 - 4,5 2.5 mgP/l 5 - 25 14
Fósforo orgânico 0,3 - 1,5 0,8 mgP/I 2-8 4
Fósforo inorgânico 0,7 - 3,0 1,7 mgP/l 4 - 17 10
pH - - - 6,7 - 7,5 7,0
Alcalinidade 20 - 30 25 mgCaCO3/l 110 - 170 140
Cloretos 4-8 6 mg/l 20 - 50 35
Óleos e Graxas 10 - 30 20 mg/l 55 - 170 110
Fonte: Arcevala (1981), Pessoa e Jordão (1982), Qasim (1985), Metcalf & Eddy (1991), apud
Von Sperling (1996)

6.2.2 Características de efluentes industriais


A Tabela 11 apresenta informações gerais sobre a poluição orgânica gerada por
determinadas indústrias, inclusive os equivalentes populacionais e as cargas de DBO
por unidade produzida.
Deve-se observar a grande variabilidade dos dados da Tabela 11, refletida nas faixas
de valores bastante amplas, retratando a real variabilidade existente, mesmo dentro de
uma mesma tipologia industrial. O processo industrial empregado, a idade da indústria e
dos equipamentos da linha de produção, a adoção de práticas conservacionistas, a
reciclagem de compostos e outros fatores explicam a ampla variabilidade.
Por esta razão, sempre se incentiva a obtenção de dados reais nas indústrias em
análise, através de questionários, medições, amostragens e análises, ao invés de se
adotar dados gerais da literatura. Ao se realizar medições e amostragens, deve-se fazer
medições de vazão e coletas de amostras compostas ao longo do turno operacional,
visando obter os dados mais representativos possíveis.
Tabela 11 - Características das Águas Residuárias de Algumas Indústrias - DBO
Gênero Tipo Unidade de Carga de DBO Equiv. popul. de Concentração de
produção (kg/unid) DBO (hab/unid) DBO (mg/l)
Alimentícia Conservas (frutas/legumes) 1 ton 30 500 600 - 7.500
Doces 1 ton 2-8 40 - 150 200 - 1.000
Açúcar de cana 1 ton açúcar 2.5 50 250 - 5.000
86

Laticínio sem queijaria 1000 l leite 1-4 20 - 70 300 - 2.500


Laticínio com queijaria 1000 1 leite 5 - 40 90 - 700 500 - 4.000
Margarina 1 ton 30 500 1.500
Matadouros 1 boi/2,5 porcos 4 - 10 70 - 200 15.000 - 20.000
Produção de levedura 1 ton 1.100 21.000 7.500
Bebidas Destilação de álcool 1 ton 220 4.000 3.500
Cervejaria 1 m3 8 - 20 150 - 350 500 - 4.000
Refrigerantes 1 m3 3-6 50 - 100 600 - 2.000
Vinho 1 m3 025
Têxtil Algodão 1 ton 150 2.800 200 - 1.500
Lã 1 ton 300 5.600 500 - 600
Rayon 1 ton 30 550 500 - 1.200
Nylon 1 ton 45 800 350
Poliéster 1 ton 185 3 700 1.500 - 3.000
Lavanderia de lã 1 ton 100 - 250 2.000 - 4.500 2.000 - 5.000
Tinturaria 1 ton 100 – 200 2.000 - 3.500 2.000 - 5.000
Alvejamento de tecidos 1 ton 16 250 - 350 250 - 300
Couro e Curtume 1 ton pele 20-150 1.000 - 3 500 1.000 - 4.000
Curtume Sapatos 1000 pares 300 3.000
Polpa e Papel Fáb. de polpa sulfatada 1 ton 30 600 300
Fabricação de papel 1 ton 10 100 - 300
Polpa e papel integrados 1 ton 60 - 500 1. 000 - 10.000 300 - 10.000
Indústrias Tinta 1 empregado 1 20 10
Químicas Sabão 1 ton 50 1.000 250 - 2.000
Refinaria de petróleo 1 barril (117 l) 0,05 1 120 - 250
PVC 1 ton 10 200 800
Indústria Vidro e subprodutos 1 ton - - -
não-metálica Cimento (processo seco) 1 ton
Siderúrgica Fundição 1 ton gusa 0,6 – 1,6 12-30 100 - 300
Laminação 1 ton 0,4-2,7 8-50 30 - 200
Fonte: CETESB (1976), Braile e Cavalcanti (1977), Arcelvala (1981), Hosang e Bischof
(1984), Salvador (1991), Weltzenfeld (1984)

Equivalente populacional
Um importante parâmetro caracterizador dos despejos industriais é o equivalente
populacional (E.P.). Este traduz a equivalência entre o potencial poluidor de uma
indústria (comumente em termos de matéria orgânica) e uma determinada população, a
qual produz essa mesma carga poluidora. Assim, quando se diz que uma indústria tem
um equivalente populacional de 20.000 habitantes, equivale a dizer que a carga de DBO
do efluente industrial corresponde à carga gerada por uma localidade com uma
população de 20.000 habitantes. A fórmula para o cálculo do equivalente populacional
de DBO é:
87

c arg a de DBO da indústria ( kg / d )


E.P.( equivalent e populacion al ) = (28)
contribuiç ão per capita de DBO ( kg / hab.d )

Caso se adote o valor frequentemente utilizado na literatura internacional de


54 g DBO/hab.d, tem-se:
c arg a de DBO da indústria ( kg / d )
E.P.( equivalent e populacion al ) = (29)
0,054 DBO ( kg / hab.d )

Ao se reportar um dado de equivalente populacional, é importante explicitar-se a


carga per capita usada como referência (54 g DBO/hab.d ou outro valor, mas aplicável à
região em análise).
Deve-se lembrar que o equivalente populacional retrata apenas o potencial poluidor
em termos de matéria orgânica. Uma determinada indústria poderá ter um grande
impacto em termos de outros poluentes, mas ter um baixo equivalente populacional,
pelo fato da carga de DBO lançada ser baixa.
Equação da mistura
As condições no ponto de lançamento dos esgotos em cursos de água são as
condições iniciais utilizadas em modelos de qualidade das águas. A equação da mistura
é simplesmente uma média ponderada das concentrações com as respectivas vazões dos
dois componentes que se misturam (rio-esgoto, ou mesmo rio principal – afluente) A
concentração de um constituinte qualquer (OD, DBO, N, P, CF, etc.) pode ser obtida
por meio de:
Q e .C e + Q r .C r
Cm = (30)
Qe + Q r
Onde,
Cm: Concentração do parâmetro após a mistura (mg/l)

Qe: Vazão do efluente (m3/s)

Ce: Concentração do parâmetro no efluente imediatamente a montante do ponto de


mistura (mg/l)

Qr: Vazão do rio (m3/s)

Cr: Concentração do parâmetro no rio imediatamente a montante do ponto de mistura


(mg/l)
88

7 MODIFICAÇÕES NATURAIS DOS RECURSOS HÍDRICOS


DEGRADADOS
O lançamento de poluentes orgânicos nos corpos hídricos consome oxigênio
dissolvido (OD) dos mesmos, através da oxidação química e principalmente da
bioquímica, via respiração dos microorganismos, depurando assim a matéria orgânica
(VALENTE et al., 1997).
Um corpo hídrico poluído por lançamentos de matéria orgânica biodegradável sofre
um processo natural de recuperação denominado autodepuração, que se realiza por
processos físicos (diluição, sedimentação), químicos (oxidação) e bioquímicos
(oxidação da matéria orgânica por microrganismos heterotróficos). Deve-se ressaltar
que os compostos orgânicos biorresistentes e os compostos inorgânicos (incluso os
metais pesados) não são afetados por esse processo (BRAGA et al., 2002).
Quando a carga dos esgotos lançados excede essa capacidade de autodepuração, o
rio fica sem oxigênio, provocando problemas estéticos e liberação de odor, e assim,
impede a vida de peixes e outros seres aquáticos, que morrem não por toxicidade, mas
por asfixia. Todos os organismos dependem de uma forma ou de outra do oxigênio para
manter os processos metabólicos de produção de energia e de reprodução. A quantidade
de despejos orgânicos assimiláveis lançada ao corpo de água deve ser proporcional à
sua vazão ou ao seu volume, isto é, à sua disponibilidade de oxigênio dissolvido
(VALENTE et al., 1997). Logo, a poluição orgânica de um curso de água pode ser
avaliada pelo decréscimo da concentração de oxigênio dissolvido e/ou pela
concentração de matéria orgânica em termos de concentração de oxigênio necessário
para oxidá-la, pois o OD embora não seja o único indicador de qualidade da água
existente, é um dos mais usados por estar diretamente relacionado às espécies que
podem sobreviver em um ecossistema aquático. Por exemplo, algumas espécies
necessitam de uma concentração mínima de 2 mg/l para sua existência e outras mais
exigentes precisam do dobro dessa quantidade para conseguir sobreviver (BRAGA et
al., 2002).
Portanto, o conhecimento do fenômeno de autodepuração de corpos hídricos é de
grande importância, já que este pode ser considerado na assimilação de efluentes, sem
que cause problemas ambientais. É totalmente justificável a utilização deste processo
como complementação dos tratamentos de esgotos nos países em desenvolvimento,
devido à carência de recursos financeiros. Todavia, deve ser feito com parcimônia e de
acordo com critérios técnicos seguros e bem definidos, ou seja, sua utilização deve ser
89

até um ponto aceitável e não prejudicial (VON SPERLING, 1996). É importante


ressaltar que conforme o CONAMA (2005), pode-se utilizar a capacidade de
autodepuração do corpo receptor como complementação ao tratamento de efluentes,
caso os limites de DBO estabelecidos para as águas doces de classes 2 e 3 sejam
ultrapassados, contudo, é necessário demonstrar que as concentrações mínimas de
oxigênio dissolvido previstas não serão desobedecidas, nas condições de vazão de
referência, com exceção da zona de mistura.
Segundo Braga et al. (2002), a matéria orgânica é consumida pelos decompositores
aeróbios, que transformam estes compostos mais complexos (proteínas e gordura) em
cadeias mais simples (amônia, aminoácidos e dióxido de carbono). O mecanismo da
autodepuração pode ser dividido em duas etapas:
1ª etapa: Decomposição
A quantidade de oxigênio dissolvido na água necessária para a decomposição da
matéria orgânica é chamada Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), ou seja, a DBO
é o oxigênio que vai ser respirado por organismos decompositores aeróbios para a
decomposição da matéria orgânica lançada na água. Indiretamente, é uma medida da
quantidade de matéria orgânica biodegradável na água.
2ª etapa: Recuperação do Oxigênio Dissolvido ou Reaeração
Há duas fontes contínuas que adicionam oxigênio na água: atmosfera e fotossíntese.
As trocas atmosféricas são mais intensas quanto maior for a turbulência no curso de
água. Então, na etapa de decomposição o consumo de OD é maior que a reposição pelas
fontes. Portanto, somente quando cessa a decomposição e os decompositores morrem é
que o OD começa a se recompor e sua concentração aumenta novamente. Caso a
quantidade de matéria orgânica lançada seja muito grande, pode haver o esgotamento
total do OD na água. A decomposição será feita então pelos decompositores anaeróbios,
que prosseguem as reações de decomposição, utilizando o deslocamento de hidrogênio
para a quebra das cadeias orgânicas e transformando em metano, gás sulfídrico e outros.
A decomposição anaeróbia não é completa, tendo que ser continuada pela
decomposição aeróbia quando o rio começar a se recompor em termos de OD.
Conforme Von Sperling (1996), o processo de autodepuração também pode ser
ilustrado por zonas como mostra a Figura 23 e está descrito nos tópicos abaixo:
1ª Zona: Degradação
Esta zona tem início logo após o lançamento de efluentes com característica
doméstica no curso de água. Apresenta uma alta concentração de matéria orgânica,
ainda em seu estágio complexo, mas potencialmente decomponível.
90

2ª Zona: Decomposição Ativa


Após a fase inicial de transtorno do ecossistema, este começa a se organizar, com os
microrganismos exercendo ativamente suas funções na decomposição da matéria
orgânica. Conseqüentemente, os reflexos no corpo hídrico alcançam seus níveis mais
marcantes e a qualidade da água fica em seu estado mais deteriorado. Nesta zona, o
oxigênio dissolvido atinge a sua menor concentração, podendo ser totalmente
consumido pelos microrganismos, caso a quantidade de efluente biodegradável lançada
tenha sido considerável em relação à vazão do rio.
3ª Zona: Recuperação
Após a fase de intenso consumo de matéria orgânica e de degradação do ambiente
aquático, inicia-se a etapa de recuperação. A água já se encontra mais clara e sua
aparência geral apresenta-se bastante melhorada. Grande parte da matéria orgânica já
está estabilizada, ou seja, transformada em compostos inertes, reduzindo o consumo de
oxigênio através de respiração bacteriana. Assim, paralelamente à introdução de
oxigênio atmosférico na massa líquida, aumentam os teores de oxigênio dissolvido (a
produção de oxigênio pela reaeração atmosférica passa a ser maior que o consumo de
oxigênio para a estabilização da matéria orgânica), trazendo uma nova mudança na flora
e na fauna aquática.
4ª Zona: Águas Limpas
As águas voltam ao estágio de como eram anteriormente ao lançamento do poluente
em relação ao oxigênio dissolvido, à matéria orgânica e aos teores de bactéria e,
provavelmente, aos organismos patogênicos. Devido à mineralização ocorrida na zona
anterior, as águas são, nesta fase, mais ricas em nutrientes do que antes da poluição,
ocorrendo uma maior produção de algas. A diversidade de espécie é grande, o
ecossistema encontra-se estável e a comunidade atinge novamente o clímax.
91

Figura 23 - Perfil longitudinal do processo de autodepuração

Fonte: Porto1, apud Rodrigues (2005)

7.1 Demanda Bioquímica de Oxigênio


Neste item, serão apresentados somente os principais processos que ocorrem com a
DBO carbonácea.
Oxidação da matéria orgânica carbonácea
A oxidação da matéria orgânica carbonácea corresponde ao principal fator de
consumo de oxigênio, pois esta serve como uma fonte de energia para os organismos
heterotróficos para os processos de respiração e decomposição (CHAPRA, 1997). Esse
consumo de oxigênio é chamado de Demanda Bioquímica de Oxigênio Carbonácea
(DBOc), que usualmente é denominado apenas por Demanda Bioquímica de Oxigênio,
não representando a fração de oxigênio consumida no processo de oxidação da matéria
nitrogenada. Os principais produtos finais da oxidação da matéria orgânica carbonácea
são o dióxido de carbono (CO2), amônia e a água (H2O) (RODRIGUES e PORTO,
2003). A taxa de degradação da matéria orgânica no meio líquido é representada pelo

1
PORTO, M. Material de aula da disciplina Qualidade da Água, PHD – 5004. São Paulo:
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo – Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária,
1997.
92

coeficiente de desoxigenação K1, que depende das características da matéria orgânica,


além da temperatura e da presença de substâncias inibidoras. Na Tabela 12, encontram-
se valores típicos de K1 e seus respectivos valores médios. (VON SPERLING, 1996;
RODRIGUES, 2005)
Tabela 12 – Valores típicos do coeficiente de desoxigenação, K1 (dia-1), base “e” a 20 ºC
Origem K1 (dia-1) K1 médio (dia-1)
Água residuária concentrada 0,35 – 0,45 0,40
Água residuária de baixa concentração 0,30 – 0,40 0,35
Efluente primário 0,30 – 0,40 0,35
Efluente secundário 0,12 – 0,24 0,18
Rios com águas limpas 0,09 – 0,21 0,15
Água para abastecimento público <0,12 -
Fonte: Von Sperling (1996)

Sedimentação
A sedimentação é um processo físico, onde ocorre a separação da água (pela
sedimentação gravitacional) das partículas suspensas que são mais pesadas que esta.
(TCHOBANOGLOUS, 1991).
O coeficiente de sedimentação (K3), que interfere no balanço de DBO nos corpos de
água é dado pela Equação (31).
Vs
K3 = (31)
H
Onde,
K3: coeficiente de sedimentação (dia-1);
Vs: Velocidade de sedimentação do poluente (m/dia);
H: profundidade média do leito do rio (m).

Portanto, o K3 depende da velocidade de sedimentação, que por sua vez está


diretamente interligada com o tamanho das partículas e suas densidades. A Tabela 13
mostra as velocidades de sedimentação, conforme o tamanho e a densidade das
partículas e a Figura 24 mostra os tipos e tamanhos de algumas partículas.
93

Tabela 13 - Velocidade de sedimentação (m/dia) a 20ºC

Tamanho das Densidades das Partículas (g/cm3)


Partículas (µm) 1,8 2,0 2,5 2,7
Areia Fina
300 300 400 710 800
50 94 120 180 200
Silte
50 94 120 180 200
20 15 19 28 32
10 3,8 4,7 7,1 8
5 0,94 1,2 1,8 2,0
2 0,15 0,19 0,28 0,32
Argila
2 0,15 0,19 0,28 0,32
1 0,04 0,05 0,07 0,08
Fonte: Kiser2, apud Chen (2001)

Figura 24 – Escala de tamanho das partículas

Átomos e Colóides Partículas suspensas


moléculas

Algas

Bactérias
Difração Microscópio Ultra- Microscópio
com raio X eletrônico micros óptico
Bitola do papel de filtro médio
(µm) 0,001 0,01 0,1 1 10 100 1000

Fonte: Adaptado de Di Bernardo3, apud Nuvolari (2003)

Conforme pode ser observado na Figura 24, os tamanhos das partículas


sedimentáveis começam a partir de 1µm.

7.2 Oxigênio Dissolvido


No processo de autodepuração do corpo hídrico há um balanço de massa entre as
fontes de consumo e as fontes de produção de oxigênio. Quando a taxa de consumo é
superior à taxa de produção, a concentração de oxigênio tende a decrescer, ocorrendo o
inverso quando a taxa de consumo é inferior à taxa de produção. O balanço completo de
OD é um fenômeno bastante complexo onde ocorrem várias reações, conforme Figura
25.

2
KISER, D. L. Cesium transport in Four Mile Creek of the Savannah River Plant,
Savannah River Laboratory. Aiken, South Carolina, dp-1528, april 1979.
3
DI BERNARDO, L. Métodos e técnicas de tratamento de água. vol. I, Rio de Janeiro,
ABES, 1993, 496 p.
94

Figura 25 – Balanço de oxigênio dissolvido no meio aquático

Fonte: Adaptado de JAMES (1984)

Portanto, serão detalhados somente os principais fenômenos interagentes no balanço


do oxigênio dissolvido em um corpo hídrico, de acordo com a Tabela 14.
Tabela 14 – Principais fenômenos interagentes no balanço do OD
Consumo de oxigênio Produção de oxigênio
Oxidação da matéria orgânica Reaeração atmosférica
Demanda Bentônica Fotossíntese
Nitrificação -
Fonte: Von Sperling (1996)

Primeiramente, apresentam-se os processos que interferem no consumo de oxigênio


baseado na Tabela 14, sendo que a oxidação da matéria orgânica já foi descrita no
tópico 7.1.
Demanda Bentônica de Oxigênio
A descarga de efluentes com componentes sedimentáveis nos corpos receptores
podem resultar na formação de um “banco de lodo” ou depósitos de material orgânico
imediatamente após o lançamento. Esses depósitos podem se acumular em um período
de tempo se as velocidades forem muito baixas para evitar o espalhamento do fundo do
corpo de água. Como a profundidade dos sólidos depositados aumenta, começa a
decomposição anaeróbia do material orgânico nas camadas mais profundas. Os produtos
desta decomposição [dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e sulfeto de hidrogênio
(H2S)] seguem para cima da camada de lodo e entram na água. Se a produção de gás no
lodo de fundo for alta, pode resultar em um severo problema estético bem como numa
depleção passageira de oxigênio dissolvido. A camada superficial do lodo em contato
direto com a água geralmente sofre decomposição aeróbia, removendo oxigênio das
95

águas, isto é, o OD se propaga na camada superficial do sedimento por oxidação


aeróbia. A demanda de oxigênio originada por este conjunto de fatores gerados pelo
lodo de fundo é denominada demanda bentônica. (THOMANN e MUELLER, 1987)
Esta demanda é expressa em g O2/m2.dia, sendo exercida pela área superficial do
leito do rio. A Tabela 15 mostra as variações e médias da demanda de oxigênio do
sedimento dependendo do leito e local.
Tabela 15 – Valores associados à demanda de oxigênio da camada bentônica
Demanda Bentônica
Tipo de leito e situação local (g O2/m2.dia) a 20°C
Variação Média
Lodo de esgoto – nas proximidades do ponto de
2 – 10 4
lançamento
Lodo de esgoto – a jusante do ponto de lançamento 1–2 1,5
Leito estuarino 1–2 1,5
Leito arenoso 0,2 - 1,0 0,5
Leito de solo mineral 0,05 - 0,1 0,07
Fonte: Thomann & Mueller (1987)

Nitrificação
A nitrificação é o processo de oxidação das formas nitrogenadas, que transforma
amônia em nitritos e estes em nitratos. Os microrganismos envolvidos neste processo
são autótrofos quimiossintetizantes, para os quais o dióxido de carbono é a principal
fonte de carbono, e a energia é obtida através da oxidação de um substrato inorgânico,
como a amônia.
Em ambas as reações (a que transforma amônia em nitrito e a que transforma nitrito
em nitrato), há consumo de oxigênio, denominado demanda nitrogenada ou demanda de
segundo estágio, por ocorrer numa fase posterior a das reações de desoxigenação
carbonácea. Isso ocorre porque as bactérias nitrificantes possuem uma taxa de
crescimento menor que as bactérias heterotróficas (VON SPERLING, 1996)
Após exposto os meios de consumo de oxigênio dissolvido, será explanado nos itens
abaixo seus principais processos de produção.
Reaeração atmosférica
Segundo Von Sperling (1996), a reaeração atmosférica é usualmente o processo
fundamental responsável pela introdução de oxigênio no corpo de água.
A transferência de gases é um fenômeno físico, que ocorre entre as moléculas de
gases do meio líquido e sua interface com o ar. Este intercâmbio resulta num aumento
da concentração do oxigênio na fase líquida, caso esta não esteja saturada com o gás.
Isso acontece no corpo hídrico quando os níveis de oxigênio dissolvido se reduzem
96

através dos processos de estabilização da matéria orgânica, fazendo com que o meio
aquático busque uma nova situação de equilíbrio por intermédio da absorção de
oxigênio pela massa líquida. A taxa de reaeração atmosférica é dada pelo coeficiente
K2. Conforme Rodrigues (2005), o valor de K2 pode ser calculado através de fórmulas
empíricas e semi-empíricas vinculadas a dados hidráulicos do sistema, ou por técnicas
de medição (esses métodos exigem trabalhos de campo e de laboratório, além de
equipamentos e corpo técnico especializado). A Tabela 16 apresenta algumas fórmulas
empíricas para determinação do coeficiente de reaeração.
Tabela 16 – Equações e faixas de aplicação dos coeficientes de reaeração, K2 (dia-1), a 20ºC
Autores Equações Faixa de aplicação
0, 5
U 0,6m < H < 4,0m
O’Connor e Dobbins (1958) 3,95
H1,5 0,05m/s < U < 0,8m/s
U 0,969 0,6m < H < 4,0m
Churchill et al. (1962) 5,03 1, 673
H 0,8m/s < U < 1,5m/s
U 0,67 0,1m < H < 0,6m
Owens et al. (1964) 5,34 1,85
H 0,05m/s < U < 1,5m/s
U: velocidade média no trecho (m/s) H: profundidade média no trecho (m)
Fonte: Adaptado de Brown & Barnwell (1987)

Fotossíntese
A presença de plantas aquáticas nos corpos hídricos pode ter um profundo efeito nas
fontes de OD e na variabilidade de OD durante um dia ou no dia a dia.
Todas as formas de plantas aquáticas são importantes porque têm a capacidade de
realizar fotossíntese. A essência do processo de fotossíntese está na clorofila contida nas
plantas, que pode utilizar a energia radiante do sol para converter água e dióxido de
carbono em glicose e oxigênio. A reação da fotossíntese pode ser escrito conforme
Equação (32). (THOMANN e MUELLER, 1987)

6 CO2 + 6 H2O → C6H12O6 + 6 O2 (32)

7.3 Modelagem Matemática da Qualidade da Água


Modelagem consiste na representação simplificada da realidade através de hipóteses
sobre a estrutura ou sobre o comportamento de um sistema físico, tornando-se
instrumentos úteis para avaliar o seu nível de conhecimento, as relações causas e efeitos
e para a organização das informações disponíveis no sistema.
Logo, a modelagem matemática surge como uma ferramenta de grande importância
para o gerenciamento dos recursos hídricos, pois esta pode prognosticar quais
97

alternativas de manejo são melhores, baseadas nas respostas do modelo matemático a


diversos lançamentos de efluentes. Além disso, podem-se verificar quais eficiências de
tratamento são necessárias para que os efluentes não ultrapassem a capacidade de
autodepuração do corpo hídrico, bem como sua classe de uso estabelecida.
(RODRIGUES, 2005)
O que difere os modelos matemáticos é o nível de complexidade dependente dos
processos e formulações adotadas por estes. Com base nisso, nos itens a seguir serão
descritos os dois modelos utilizados neste trabalho (Streeter-Phelps e QUAL2E)

7.3.1 Modelo de Streeter-Phelps


Em 1925, Streeter e Phelps formularam equações matemáticas para representação da
qualidade de água, utilizando a previsão do déficit de OD para casos de poluição por
matéria orgânica biodegradável, que atualmente é conhecido por Modelo de Streeter-
Phelps (BRAGA et al., 2002).
Segundo CHAPRA (1997), o balanço de massa para a DBO no corpo de água pode
ser escrito conforme Equação (15), assumindo que a geometria, a vazão e o coeficiente
cinético são temporariamente constantes, além de transporte advectivo e as reações de
primeira ordem de decomposição da matéria orgânica e o processo de sedimentação da
mesma.
∂L ∂L
=− U − KrL (33)
∂t ∂x
Onde,
L: concentração de DBO remanescente (mg/l);

U: velocidade (m/s);

x: distância (km);

Kr: taxa de remoção total da matéria orgânica (dia-1).

O coeficiente Kr considera tanto a decomposição da matéria orgânica (K1), como o


processo de sedimentação (K3) e é dado pela Equação (34).

K r = K1 + K 3 (34)
Onde,
K1: coeficiente de desoxigenação (dia-1);

K3: coeficiente de sedimentação (dia-1).

No estado estacionário (“steady-state”), a Equação (15) se torna:


98

dL
0 =− U − KrL (35)
dx

Integrando a Equação (35), analiticamente resulta na Equação (36).


− ( K1 + K 3 )
x
L = L 0 .e U (36)

Sendo a distância (x) dividida pela velocidade (U) igual ao tempo de percurso “t”,
geralmente dado em “dia”, a Equação (36) passa a ser:

L = L 0 .e − ( K1 + K 3 ).t (37)

Segundo VON SPERLING (1996), no modelo de Streeter-Phelps se considera


apenas a desoxigenação e a reaeração atmosférica no balanço do oxigênio dissolvido,
portanto, a taxa de variação do déficit de OD com o tempo pode ser expressa pela
Equação Erro! Fonte de referência não encontrada.):
dD
= K 1 .L − K 2 .D (38)
dt

Onde,
D: déficit de oxigênio dissolvido (mg/l);

K2: coeficiente de reaeração (dia-1).

Integrando a Equação Erro! Fonte de referência não encontrada. e substituindo L


pela Equação (37), chega-se na Equação (Erro! Fonte de referência não encontrada.):
K 1 .L 0U
Dt = .(e −( K1 + K 3 ).t − e − K 2 .t ) + (OD sat - C 0 ).e − K 2 .t (39)
K 2 − (K 1 + K 3 )

Onde,
C0: concentração de oxigênio dissolvido (mg/l) após a mistura com o despejo.

L0U: concentração remanescente de DBO última, logo após a mistura (mg/l)

O cálculo da demanda última de oxigênio (L0U) é feito através da multiplicação da


concentração de DBO5 logo após a mistura (L0) por uma constante de transformação,
que é calculada pela Equação (40).
DBO U 1
KT = = (40)
DBO5 1 − e −5 K1

Onde,
DBOU: Demanda Bioquímica de Oxigênio última (mg/l)
99

KT: constante para transformação da DBO5 a DBO última (DBOU)

Através da Equação Erro! Fonte de referência não encontrada., que expressa a


variação do déficit de oxigênio em função do tempo, obtém-se a curva da concentração
de OD (ODt) demonstrada na Equação (41):
OD t = OD sat − D t (41)
Onde,
ODt: oxigênio dissolvido ao decorrer do tempo (mg/l);

ODsat: concentração de saturação de oxigênio dissolvido (mg/l).

Substituindo Dt, obtém-se a Equação (42) referente à concentração de OD ao


decorrer do tempo:

 K 1 .L 0U − (K + K 3 ). t − K 2 .t − K 2 .t 
OD t = C s −  .(e 1 −e ) + (OD sat - C 0 ).e  (42)
 K 2 − (K 1 + K 3 ) 

Nesse modelo, considera-se que a mistura completa de um determinado parâmetro


de qualidade de água (biodegradável ou conservativo) no corpo hídrico ocorre na seção
transversal do ponto de lançamento do efluente, de acordo com o descrito na Equação
(43):
Q m .C m = Q e .Ce + Q r .C r (43)
Onde,
Qm: Vazão da mistura (m3/s)

Cm: Concentração do parâmetro após a mistura (mg/l)

Qe: Vazão do efluente (m3/s)

Ce: Concentração do parâmetro no efluente (mg/l)

Qr: Vazão do rio (m3/s)

Cr: Concentração do parâmetro no rio (mg/l)

Sabe-se que a vazão da mistura é igual a vazão do efluente somada a vazão do rio
( Q m = Q e + Q r ).
Na realidade, esta mistura completa do efluente com o corpo de água não ocorre no
ponto de lançamento, tratando-se de uma simplificação dos modelos unidimensionais. A
mistura completa do efluente no corpo hídrico depende de certos fatores, como largura,
profundidade, velocidade do curso de água, além das características dos parâmetros que
100

se deseja analisar. No Anexo I encontra-se uma abordagem mais detalhada sobre


comprimento de mistura.

7.3.2 Modelo QUAL2E


Conforme BROWN e BARNWELL (1987), o modelo de qualidade de água
QUAL2E é utilizado para estabelecer Alocações de Cargas de Efluentes (WLAs),
determinações de licença de lançamento de efluentes e avaliações de outros poluentes
convencionais nos Estados Unidos. Desde a introdução do QUAL-II em 1970, foram
desenvolvidas várias versões diferentes do modelo, como por exemplo, o QUAL2E-
UNCAS. Tanto o QUAL2E, como o QUAL2E-UNCAS foram desenvolvidos através de
acordos da cooperativa entre o Conselho Nacional para Melhoria dos Rios e do Ar ou
“National Council for Air and Stream Improvement” (NCASI), o Departamento de
Engenharia Civil da Universidade Tufts e a EPA.
O QUAL2E é um modelo de qualidade de água em rios compreensivo e versátil. Ele
permite simular até 15 parâmetros indicativos de qualidade (como DBO, OD,
temperatura, coliformes, ciclo do nitrogênio, ciclo do fósforo, biomassa de algas e
substâncias conservativas) em cursos de água ramificados e bem misturados. O modelo
é unidimensional, já que os principais mecanismos de transporte, advecção e dispersão,
são considerados significativos apenas ao longo da direção principal do escoamento
(eixo longitudinal do curso de água). Permite simular múltiplas descargas pontuais,
afluentes (tributários), captações e incrementos relacionados às fontes difusas.
Hidraulicamente, limita-se ao regime permanente de vazões, ou seja, considerando que
as vazões do modelo são constantes.
O QUAL2E pode operar no estado estacionário e dinâmico, tornando-se uma
ferramenta muito útil para o planejamento da qualidade da água. No estado estacionário,
pode ser usado para avaliar o impacto na qualidade das águas do corpo receptor,
decorrentes de descargas contínuas pontuais e de não pontuais (difusas). No estado
dinâmico, permite a simulação dos efeitos das variações diárias dos dados meteorológicos
na qualidade das águas, relativos aos parâmetros oxigênio dissolvido e temperatura, assim
como, as variações diárias ocorridas pelo crescimento e respiração das algas.
Para remoção da matéria orgânica (simulação da DBO), o modelo considera os
processos de degradação e sedimentação, resultando na Equação (44), mesma adotada
pelo modelo de Streeter-Phelps.
101

dL
= −K1L − K 3 L (44)
dt

Já a concentração de oxigênio dissolvido na água resulta de um balanço entre a


quantidade consumida, a quantidade produzida e a quantidade injetada pelos tributários.
As principais fontes de produção de oxigênio são: a reaeração atmosférica, fotossíntese
e cargas afluentes. E a depleção de oxigênio se dá geralmente pela oxidação bioquímica
da matéria orgânica carbonácea e nitrogenada, demanda bentônica, processo de
respiração e tributários com menor concentração de OD. Logo, o modelo QUAL2E usa
a Equação (45) para calcular o oxigênio dissolvido na água. (RODRIGUES, 2005)
dC K
= K 2 (OD sat − C 0 ) + (α 3µ − α 4 ρ)A 1 − K 1 L − 4 − α 5β1 N 1 − α 6 β 2 N 2 (45)
dt H
Onde,
α3: produção de oxigênio por crescimento de algas (mg O) / (mg A);

µ: taxa de crescimento de algas (dia-1);

α4: taxa de consumo de oxigênio por respiração por unidade de algas (mg O/mg A);

ρ: taxa de respiração algal (dia-1);

A1: concentração de biomassa algal (mg A/l);

K4: taxa de demanda de oxigênio do sedimento (g/m2 dia);

H: profundidade média (m);

α5: taxa de consumo de oxigênio por oxidação de nitrogênio amoniacal, NH3, (mg
O)/(mg N);

β1: coeficiente de oxidação de amônia (dia-1);

N1: concentração de nitrogênio amoniacal (mg N/L);

α6: taxa de consumo de oxigênio por oxidação de nitrito, NO2-2, (mg O) / (mg N);

β2: coeficiente de oxidação de nitrito (dia-1);

N2: concentração de nitrito (mg N/l).

7.4 Formas de Controle da Poluição por Matéria Orgânica


Conforme Von Sperling (1996), as principais alternativas disponíveis para o
controle da poluição por matéria orgânica nos corpos aquáticos são as seguintes:
 Tratamento dos esgotos: trata-se da remoção de poluentes dos efluentes;
102

 Regularização de vazão do curso de água: consiste geralmente em se


construir uma barragem a montante do lançamento para aumentar a vazão
mínima do curso de água através da regularização;
 Aeração do corpo hídrico: consiste em prover a aeração do corpo hídrico em
algum ponto à jusante do lançamento, mantendo a concentração de OD em
valores superiores ao mínimo permissível;
 Aeração dos esgotos tratados: forma de aumentar as concentrações de OD
após os devidos tratamentos por uma aeração simples, que pode ser feita por
vertedores, que pode contribuir para que o efluente seja lançado com uma
concentração de OD mais elevada;
 Alocação de outros usos para o curso de água: em caso de impossibilidade
(principalmente econômica) de se controlar os focos poluidores para
preservar a qualidade dos corpos aquáticos em função dos seus usos
previstos, pode-se avaliar a realocação de usos para este corpo de água ou
para trechos deste.
Sendo que dessas alternativas, o tratamento dos efluentes é freqüentemente a
principal, e na maioria das vezes, a única estratégia de controle. Entretanto, deve-se
analisar o maior número possível de estratégias para melhoria dos corpos de água, com
o objetivo de se obter a solução técnica favorável de menor custo.
Conforme a Resolução do CONAMA Nº 357/05, em seu Art. 24, “os efluentes de
qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente, nos
corpos de água, após o devido tratamento e desde que obedeçam às condições, padrões e
exigências dispostos nesta Resolução e em outras normas aplicáveis”.
Os dois incisos desse artigo descrevem que o órgão ambiental competente pode a
qualquer momento:
“I - acrescentar outras condições e padrões, ou torná-los mais restritivos, tendo em
vista as condições locais, mediante fundamentação técnica”; e
“II - exigir a melhor tecnologia disponível para o tratamento dos efluentes,
compatível com as condições do respectivo curso de água superficial, mediante
fundamentação técnica.”
Diversos tipos de tratamentos de efluentes domésticos e as faixas típicas de remoção
de DBO encontram-se na Tabela 17.
103

Tabela 17 – Eficiências típicas de sistemas de tratamento na remoção de DBO


Sistemas de tratamento Eficiência na remoção de DBO (%)
Tratamento preliminar 0-5
Tratamento primário 35-40
Lagoa facultativa 70-85
Lagoa anaeróbia – lagoa facultativa 70-90
Lagoa aerada facultativa 70-90
Lagoa aerada de mistura completa –
70-90
lagoa de decantação
Lodos ativados convencional 85-93
Lodos ativados (aeração prolongada) 93-98
Lodos ativados (fluxo intermitente) 85-95
Filtro biológico (baixa carga) 85-93
Filtro biológico (alta carga) 80-90
Biodiscos 85-93
Reator anaeróbio de manta de lodo 60-80
Fossa séptica – filtro anaeróbio 70-90
Infiltração lenta no solo 94-99
Infiltração rápida no solo 86-98
Infiltração subsuperficial no solo 90-98
Escoamento superficial no solo 85-95
Fonte: Adaptado De Von Sperling (1996)
104

8 OCORRÊNCIA, MOVIMENTO E APROVEITAMENTO DOS RECURSOS


HÍDRICOS SUBTERRÂNEOS
A água subterrânea é a parcela da água que permanece no subsolo, onde flui
lentamente até descarregar em corpos de água de superfície, ser interceptada por raízes
de plantas ou ser extraída em poços. Tem papel essencial na manutenção da umidade do
solo, do fluxo dos rios, lagos e brejos. A água subterrânea é também responsável pelo
fluxo de base dos rios, sendo responsável pela sua perenização durante os períodos de
estiagem. Essa contribuição em todo o mundo é da ordem de 13.000 km3/ano (World
Resources Institute, 1991 in Rebouças, 1999), quase 1/3 da descarga dos rios.
Em determinadas áreas, como regiões áridas e certas ilhas, a água subterrânea pode
ser o único recurso hídrico disponível para uso humano. Geralmente ela dispensa
tratamento, economizando na execução de grandes obras como barragens e adutoras.
Mais da metade da população do mundo depende da água subterrânea para suprimento
de suas necessidades de água potável.
As águas subterrâneas estão contidas nos solos e formações geológicas permeáveis
denominadas aqüíferos. Existem três tipos primários de aqüíferos (Figura 26)

Figura 26 - Tipos de aqüífero

Fonte: UNESCO, 1992, Ground Water. Environment and Development - Briefs. Nº 2. -


traduzida e adaptada pelo DRM/RJ

Aqüífero poroso - aquele no qual a água circula nos poros dos solos e grãos
constituintes das rochas sedimentares ou sedimentos;
Aqüífero cárstico – aquele no qual a água circula pelas aberturas ou cavidades
causadas pela dissolução de rochas, principalmente nos calcários;
Aqüífero fissural - aquele no qual a água circula pelas fraturas, fendas e falhas nas
rochas.
105

Aqüíferos Livres e Confinados


As formações geológicas portadoras de água superpostas por camadas impermeáveis
são denominadas aqüíferos confinados. O seu reabastecimento ou recarga, através das
chuvas, dá-se somente nos locais onde a formação aflora à superfície. Neles o nível
hidrostático encontra-se sob pressão, causando artesianismo nos poços que captam suas
águas (Figura 27). Já os aqüíferos livres são aqueles constituídos por formações
geológicas superficiais, totalmente aflorantes, portanto, com a recarga no próprio local,
em toda a extensão da formação (Figura 28). Os aqüíferos livres têm a chamada recarga
direta e os aqüíferos confinados, a recarga indireta.

Figura 27 - Aqüífero confinado e artesianismo

Fonte: Fetter, C.W. Applied Hidrogeology. New Jersey, 1994 - traduzida e adaptada
pelo DRM/RJ

Figura 28 - Aqüífero livre

Fonte: Fetter, C.W. Applied Hidrogeology. New Jersey, 1994 - traduzida e adaptada
pelo DRM/RJ
106

8.1 Funções dos Aqüíferos


Além da função de produção, os aqüíferos podem cumprir algumas outras funções,
como:

8.1.1 Função estocagem e regularização


Corresponde à utilização do aqüífero para estocar excedentes de água que ocorrem
durante as enchentes dos rios, correspondentes à capacidade máxima das estações de
tratamento durante os períodos de demanda baixa, ou referentes ao reuso de efluentes
domésticos e/ou industriais. Esses volumes infiltrados serão bombeados durante as
picos sazonais de demanda durante períodos de escassez ou situações de emergência
resultantes de acidentes naturais como avalanches, enchentes e outros tipos de acidentes
que reduzem a capacidade do sistema básico de água da metrópole.

8.1.2 Função filtro


Corresponde à utilização da capacidade filtrante e de depuração biogeoquímica do
maciço natural permeável. Para isso são implantados poços a distâncias adequadas de
rios perenes, lagoas, lagos ou reservatórios, para extrair água naturalmente clarificada e
purificada, reduzindo substancialmente os custos dos processos convencionais de
tratamento.

8.2 A Gestão Sustentável da Água


A água é um dos recursos naturais mais importantes, cuja utilização deve ser feita de
maneira a não comprometer a disponibilidade para as gerações futuras. Sua
disponibilidade é hoje limitada não apenas quanto à quantidade, mas também pela
qualidade. Um dos maiores desafios atuais para o desenvolvimento sustentável será
minimizar os efeitos da escassez permanente ou sazonal e da poluição da água. A água
para a conservação dos ecossistemas também deverá receber mais atenção como tema
sócio-político. Será imprescindível que os novos projetos para atender a demanda sejam
concebidos dentro de uma perspectiva de sustentabilidade econômica, social e
ambiental. A solução vai exigir tanto a exploração cuidadosa de novas fontes, quanto
medidas para estimular o uso mais eficiente da água (Salati, Lemos e Salati, 1999).
Para enfrentar os desafios da escassez e da poluição, a grande ferramenta será a
gestão do suprimento e da demanda de água. A gestão do suprimento significa a adoção
de políticas e ações relativas à quantidade e qualidade da água desde sua captação até o
sistema de distribuição. A perspectiva de suprimento a partir de águas de superfície vem
se tornando cada dia mais difícil, em virtude do crescimento dos custos de construção,
107

devido às distâncias cada vez maiores dessas fontes, exigindo obras de grande porte e
complexidade, além de acirrada oposição dos ambientalistas. A gestão da demanda trata
do uso eficiente e de ações para evitar o desperdício. Dessa forma além de medidas para
reduzir o índice elevado de perdas nas redes públicas, mas também a adoção de práticas
e técnicas mais racionais de uso, a exemplo da irrigação por gotejamento na agricultura
(Salati, Lemos e Salati, 1999).

8.3 O Papel Estratégico das Águas Subterrâneas


Perfazendo 97,5% da água doce acessível pelos meios tecnológicos atuais, com um
volume de 10,53 milhões de km3, armazenado até 4.000 metros de profundidade
(Rebouças, 1999), as águas subterrâneas tornam-se estratégicas para a humanidade.
Além de mais protegidas contra a poluição e os efeitos da sazonalidade, apresentam em
geral boa qualidade, decorrente do “tratamento” obtido da sua percolação no solo e
subsolo. Seu aproveitamento tem se revelado uma alternativa mais econômica, evitando
custos crescentes com represas e adutoras e dispensando tratamento, na maioria dos
casos.

Figura 29 - Distribuição da água doce no planeta e a participação das águas subterrâneas

Fonte: Shiklomanov (1998) apud Rebouças (1999)

A UNESCO avalia que 75% do abastecimento público da Europa seja feito por água
subterrânea, índice que chega de 90 a 100% na Alemanha, Áustria, Bélgica, Holanda e
Suécia. Após o acidente nuclear de Chernobyl, seu uso tende a crescer por terem se
revelado uma via mais segura. Nos Estados Unidos são extraídos mais de 120 bilhões de
108

m3/ano, atendendo mais de 70% do abastecimento público e das indústrias. No Brasil,


um grande número de cidades de pequeno e médio porte do sul do país, suprem suas
necessidades de água a partir do Aqüífero Guarani, o maior do mundo, com uma reserva
de 48.000 km3 (Rebouças, 1999), sendo 80% de sua ocorrência em território brasileiro.
Capitais estaduais como São Luís, Maceió e Natal são abastecidas por água subterrânea,
assim como 80% das cidades do Estado de São Paulo.

8.4 A Gestão das Águas Subterrâneas


A gestão das águas subterrâneas não pode ser dissociada da das águas superficiais,
haja vista as duas possuírem uma inter-relação na fase líquida do ciclo hidrológico.
Nesses termos, as duas poderiam ser consideradas como tão somente a água em suas
fases superficial e subterrânea. Ou seja, a água subterrânea tanto pode tornar-se
superficial nas nascentes de um rio ou alimentando-o pela base, como um rio pode
alimentar um reservatório natural de água subterrânea, como costuma acontecer em
certas regiões de clima seco. Este pressuposto sustenta a moderna visão de gestão
integrada da água, entrando os dois tipos de água na contabilidade geral das
disponibilidades hídricas (Figura 30).
109

Figura 30 - Interação entre água superficial e água subterrânea

Fonte: Fetter, C.W. Applied Hidrogeology. New Jersey, 1994 - traduzida e adaptada pelo
DRM/RJ
Apesar de abundante, a água subterrânea não é inesgotável e, como qualquer recurso
natural, tem que ser conservada e usada adequadamente para assegurar a disponibilidade
no futuro. No seu caso particular, a conservação deve compatibilizar o uso com as leis
naturais que governam a sua ocorrência e reposição. A água subterrânea pode ser
retirada de forma permanente e em volumes constantes, por muitos anos, dependendo
do volume armazenado no subsolo e das condições climáticas e geológicas de
reposição. A água contida em um aqüífero foi acumulada durante muitos anos ou até
séculos e é uma reserva estratégica para épocas de pouca ou nenhuma chuva. Se o
volume retirado for menor do que a reposição a longo prazo, o bombeamento pode
continuar indefinidamente, sem provocar efeitos prejudiciais. Se, por outro lado, o
bombeamento exceder as taxas de reposição natural, começa-se a entrar na reserva
estratégica, iniciando um processo de rebaixamento do lençol freático, chamado
superexplotação, conforme mostra a Figura 31. Quando a captação localiza-se em áreas
110

litorâneas todo o cuidado deve ser tomado para evitar a intrusão da água do mar
infiltrada, provocando a salinização da água dos poços e, em alguns casos de todo o
aqüífero na faixa costeira.
Figura 31 - Superexplotação de aqüíferos

Fonte da Figura: UNESCO, 1992, Ground Water. Environment and Development - Briefs. Nº 2.
- traduzida e adaptada pelo DRM/RJ
Embora mais protegidas, as águas subterrâneas não estão a salvo da poluição e seu
aproveitamento envolve um planejamento técnico criterioso, com base no conhecimento
de cada ambiente onde se localizam e de suas condições de circulação. Atividades
humanas como agricultura, indústria e urbanização podem degradar sua qualidade
(Figura 32). Dependendo da sua natureza e localização espacial, os aqüíferos podem ter
maior ou menor grau de vulnerabilidade, mas quando ocorre, a poluição é de mais
difícil e dispendiosa remediação, entre outras razões, devido ao fluxo lento (centímetros
por dia) das águas subterrâneas. A poluição da água subterrânea pode ficar oculta por
muitos anos e atingir áreas muito grandes.
Sabe-se que as águas subterrâneas resultam da infiltração das águas das chuvas,
portanto é necessário proteger essa ponta do processo. Nos aqüíferos confinados o
reabastecimento ocorre somente nos locais onde a formação portadora de água aflora à
superfície (zonas de recarga). Estas áreas precisam ser preservadas. Nenhuma atividade
potencialmente poluidora deve nelas se instalar, a exemplo de distritos industriais,
agricultura tradicional, aterros sanitários, cemitérios, etc.
111

Figura 32 - Contaminação de aqüíferos.

Fonte da Figura: UNESCO, 1992, Ground Water. Environment and Development - Briefs. Nº 2.
- traduzida e adaptada pelo DRM/RJ

Já nos aqüíferos livres, a recarga é direta, isto é, ocorre em toda a superfície acima
do lençol freático. Neste caso as medidas de proteção podem variar de acordo com o
ambiente geológico e em relação as diversas atividades poluidoras. Em lugares onde o
lençol freático for muito próximo à superfície, o uso de fossas sépticas pode ser
pernicioso, porque o efluente não inteiramente tratado é lançado diretamente no lençol,
contaminando-o. A Figura 33 mostra um exemplo de contaminação de água subterrânea
por fossa séptica.
112

Figura 33 – Exemplo de contaminação de água subterrânea por fossa séptica

A - Embora a água contaminada atravesse mais de 100 metros antes de alcançar o Poco 1, a
água move-se muito rapidamente através do calcário cavernoso para ser purificada;
B - Como a descarga da fossa séptica percola através de um arenito permeável, ela é purificada
em uma distância relativamente curta.
Fonte da Figura: UNESCO, 1992, Ground Water. Environment and Development - Briefs. Nº 2.
- traduzida e adaptada pelo DRM/RJ

Uma grande preocupação são os postos de gasolina (Figura 34). Os casos de


vazamento em tanques ou na linha tem sido comuns em qualquer parte do mundo.
Segundo a USEPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos) os acidentes
chegam a 1.000 por ano naquele país. No Brasil, estima-se que existam 5.700 casos de
vazamentos. Soma-se aos vazamentos a contaminação de cursos de água e do solo
resultante da lavagem dos carros. Para evitar esses danos, torna-se necessário a
implantação de normas técnicas, cercando de máxima impermeabilização os tanques e
pisos desses postos e implantando drenagens e sistemas de tratamento para os efluentes
da lavagens de carros.
113

Figura 34 - Contaminação da água subterrânea por postos de gasolina.

Fonte: Jornal da ABAS - Janeiro/2001


Corrigir problemas resultantes do uso inadequado pode demandar soluções
tecnológicas caras e muito tempo. Assim, os meios mais econômicos e eficazes para
assegurar o suprimento de água subterrânea limpa são a proteção e o cuidadoso
gerenciamento destes recursos.
114

9 ASPECTOS LEGAIS SOBRE A GESTÃO DOS AOS RECURSOS


HÍDRICOS NO BRASIL
A partir da Constituição Federal de 1988, o país acelera o processo de
transformações político-institucionais nos mais diversos campos da vida em sociedade,
a começar pela redemocratização, que ganha bases e contornos jamais vistos na história
republicana.
Desde logo é preciso enfatizar que as transformações se expressam em aspectos da
mais alta relevância, os quais buscam colocar em evidência a coletividade e o cidadão e
sua capacidade de definir seus próprios destinos.
Assim, muito mais do que apenas retórica, é profunda a mudança contida no artigo
1o, parágrafo único, cuja redação abre imensas possibilidades para novas formas de
participação social na definição de políticas públicas e do exercício do poder. Ao dizer
que “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou
diretamente, nos termos desta Constituição”, redação que valeu à nossa Carta a
denominação de “Constituição Cidadã”, efetivamente está lançada a base para a
conformação de um novo aparato legal e institucional, capaz de se estender,
capilarmente, a todos os sistemas que regulam a administração pública e as relações
desta com os cidadãos, assim como entre estes.
Dentre outros aspectos inovadores, por exemplo, a Carta Magna estabelece
princípios e normas atinentes às relações da sociedade com a natureza, sobretudo
incorporando princípios já manifestos em âmbito internacional, cuja importância
também vinha sendo pouco a pouco percebida pela cidadania nacional, como é o caso
dos princípios da precaução, da prevenção e do compromisso intergeracional, todos
abrigados sob o conceito maior relativo à necessidade de assegurar a sustentabilidade da
vida no planeta. Assim, o enunciado do artigo 225 impõe ao poder público e à
coletividade o dever de preservar e proteger o meio ambiente para as presentes e as
futuras gerações.
A consagração do meio ambiente como “bem” constitucionalmente protegido se
revelou como um marco de extraordinária relevância para o país, quer seja nas relações
interiores, pelos desdobramentos legislativos em âmbito infraconstitucional, quer seja
no contexto internacional, considerando-se que nossas extensas fronteiras se situam em
ecossistemas e bacias hidrográficas altamente sensíveis.
115

É consenso que as progressivas mudanças no arcabouço legal e administrativo, no


trato da problemática ambiental, determinam uma evolução conceitual, doutrinária e
metodológica atinente à gestão dos recursos naturais, entre eles as águas, especialmente.
As águas brasileiras encontram-se repartidas entre as que integram o domínio da
União e as que pertencem aos Estados e ao Distrito Federal. Dentre aquelas da União,
encontram-se, de acordo com o artigo 20, incisos III e VI, da Constituição Federal, os
lagos, os rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem
mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território
estrangeiro ou dele provenham, bem como o mar territorial.
Quanto aos Estados, encontram-se sob seu domínio, de acordo com o artigo 26,
inciso I, da Constituição Federal, as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes,
emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de
obras da União. Com isso, extinguiu-se a categoria águas de propriedade privada.
Persiste com a União, tal como no passado, a competência privativa para legislar
sobre águas, cabendo aos Estados legislar em matéria de seu poder-dever de zelar pelas
águas do seu domínio, assim como a competência comum, com a União, o Distrito
Federal e os Municípios, para registrar, acompanhar e fiscalizar a exploração de
recursos hídricos em seus territórios.
Ainda que já houvesse uma legislação anterior considerada avançada, a Constituição
Federal foi específica ao determinar à União a competência de instituir o Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir critérios de outorga de
direitos de uso, em clara manifestação da importância das águas, sobretudo quando
tomadas na espécie que lhes atribui o significado de recurso natural a ser usado pelos
cidadãos para fins diversos.
É evidente que essas disposições demonstram o interesse e a preocupação do
Constituinte em tornar claro o espírito do federalismo de cooperação e evitar que a
dicotomia do domínio público-administrativo sobre as águas possa vir a gerar situações
de desequilíbrios regionais ou, pior, a competição entre Estados, com base nas enormes
diferenças existentes entre disponibilidades hídricas nas regiões do país.
Contudo, tão-somente após a sanção da Lei no 9.433, de 8 de janeiro de 1997, é que
se pode dizer que tivemos significativas modificações legais no tocante aos recursos
hídricos nacionais; seu advento traduz a inovadora Política Nacional de Recursos
Hídricos.
116

9.1 Dos fundamentos, dos objetivos e das diretrizes gerais de ação da Política
Nacional de Recursos Hídricos
Diferentemente da legislação consubstanciada no Código de Águas instituído pelo
Decreto no 24.643, de 10 de julho de 1934, que desde então presidia a classificação, os
usos e o gerenciamento dos recursos hídricos, a Lei da Política Nacional de Recursos
Hídricos avança e opera uma verdadeira transformação no mundo jurídico das águas
brasileiras, efetivamente. Rompeu conceitos e paradigmas arraigados na tradição
legislativa pátria em matéria de recursos hídricos, a começar, por exemplo, pelo
reconhecimento expresso de sua finitude ao dizer, em seu artigo 1o, que “a água é um
recurso natural limitado, dotado de valor econômico”.
O legislador brasileiro, durante muitos anos, não percebia esse problema, o que, com
efeito, nada mais refletia senão o desconhecimento acerca da finitude e da escassez das
águas, bem como da complexidade de seu ciclo hidrológico freqüentemente fragilizado
em virtude das ações danosas ao meio ambiente, tais como os desmatamentos, as
queimadas, a destruição das matas ciliares e nascentes, o assoreamento e a
contaminação dos rios e dos córregos mediante o lançamento de esgotos e resíduos
sólidos.
A Política Nacional de Recursos Hídricos é clara e objetiva na definição de
diretrizes gerais de ação (capítulo III, artigo 3o, incisos I a VI), as quais se referem à
indispensável integração da gestão das águas com a gestão ambiental. Outros avanços
confirmam o caráter de bem essencial à vida, eis que, em situações de escassez, o uso
prioritário é o consumo humano e de animais, devendo a gestão dos recursos hídricos
proporcionar sempre o uso múltiplo das águas.
Além disso, a Lei elegeu ainda outros dois fundamentos essenciais a que se referem
os incisos V e VI do seu artigo 1o: a bacia hidrográfica como unidade territorial para
implementação da Política de Recursos Hídricos, bem como a determinação legal de
que sua gestão deve ser descentralizada e contar com a participação de todos – poder
público, usuários e sociedade civil.
Os fundamentos da Lei no 9.433/1997, que, como se vê, nos dão conta de novos
rumos em matéria de gestão das águas, a começar pelo entendimento jurídico-legal de
que a superação dos graves problemas ecológicos atuais e a condução do
desenvolvimento econômico rumo a cenários sócio-ambientais sustentáveis passa pelo
cruzamento das questões ecológicas, das questões socioeconômicas e das questões
político-financeiras de sustentabilidade do sistema de gestão dos recursos hídricos.
117

Requer, portanto, a acuidade e o debate democrático permanentes e representa a razão


prática que confirma a necessidade crescente da participação de todos – comunidades,
empresários e órgãos públicos – no planejamento e na gestão das águas, e, assim,
redundará numa maior eficácia de seus resultados. Esta é, em suma, a tarefa básica do
SINGREH, criado igualmente pela Lei em apreço.
Entre os objetivos da Política, encontram-se: assegurar à atual e às futuras gerações
a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos
respectivos usos; promover a utilização racional e integrada dos recursos hídricos,
incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável; e efetivar
a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou
decorrentes do uso inadequado dos recursos hídricos.
Outros tantos princípios e diretrizes consignados na Lei da Política Nacional de
Recursos Hídricos são inéditos, tais como a integração da gestão de recursos hídricos
com a gestão do uso do solo, tendo em vista necessariamente os ditames do ciclo
hidrológico e as diferentes demandas que se apresentam, seja no âmbito da ecologia,
seja no da economia ou no da satisfação plena das necessidades humanas.

9.2 Dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos


Para a Política Nacional, segundo a Lei no 9.433/1997, são definidos os instrumentos
legais necessários à plena eficácia dessas ações, quais sejam: os planos de recursos
hídricos, neles incluídos o Plano Nacional, os Planos dos Estados e os de Bacia
Hidrográfica; o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo seus usos
preponderantes; a outorga de direito de uso; a cobrança pelo uso de recursos hídricos; o
sistema de informação sobre recursos hídricos; bem como a compensação a Municípios,
cujas disposições no texto da Lei foram vetadas.

9.2.1 Os planos de recursos hídricos


Os planos de recursos hídricos são o primeiro instrumento citado na Política
Nacional de Recursos Hídricos e, de acordo com o disposto no artigo 6o da referida Lei,
são planos que visam a fundamentar e a orientar sua implementação e o gerenciamento
desses recursos. O conteúdo mínimo desses planos encontra-se definido no artigo 7o da
Lei no 9.433/1997, sendo essa definição legal complementada pelas Resoluções no
17/2001 e no 22/2002 do CNRH.
A primeira estabelece as diretrizes para os planos por bacia hidrográfica, detalhando
os tópicos que integram seu conteúdo mínimo recomendado, além de apresentar um
118

fluxograma do processo de elaboração desses planos. A segunda contempla diretrizes


para a inserção dos estudos sobre águas subterrâneas nos Planos de Recursos Hídricos,
incorporando a temática dos múltiplos usos dessas águas, as peculiaridades dos
aqüíferos e os aspectos relacionados a sua qualidade e quantidade.
No que diz respeito às responsabilidades pela execução e pela elaboração dos Planos
de Recursos Hídricos, cabe mencionar o Decreto no 5.776, de 12 de maio de 2006, que
estabelece a competência da Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio
Ambiente para coordenar a elaboração e auxiliar no acompanhamento da
implementação do Plano Nacional de Recursos Hídricos.
Já o acompanhamento da execução e a responsabilidade pela aprovação são
atribuídos ao CNRH. No âmbito dos Estados, cabe às respectivas leis de recursos
hídricos a definição dos entes responsáveis pelo exercício dessas atribuições.
Os Planos de Recursos Hídricos de Bacias Hidrográficas serão elaborados pelas
Agências de Água e submetidos à apreciação e à aprovação dos respectivos Comitês,
conforme o artigo 38, III, e 44, X. Enquanto não houver Agências de Água ou entidade
delegatária das funções de Agência, os Planos de Bacia poderão ser elaborados pelas
entidades gestoras, detentoras do poder outorgante, sob supervisão e aprovação dos
respectivos Comitês. No caso de não existir Comitê de Bacia, as competentes entidades
ou os órgãos da administração pública encarregados da gestão de recursos hídricos serão
responsáveis, com a participação dos usuários de água e das entidades civis de recursos
hídricos, pela elaboração da proposta de Plano de Bacia, bem como deverão
implementar as ações necessárias à criação do respectivo Comitê, que será responsável
pela aprovação do referido Plano.
De acordo como o Documento Definição dos Limites de Abrangência do Escopo do
Plano Nacional de Recursos Hídricos (SRH/OEA, 2005), dada a abrangência dos Planos
de Recursos Hídricos, nos âmbitos nacional, estadual, distrital e regional (por bacia),
bem como a evidente superposição territorial, é mister destacar que a abordagem e a
concepção desses instrumentos devem considerar a divisão de responsabilidades,
cabendo notar o caráter de integração a ser incorporado.
O mencionado documento reforça essa orientação e ressalta a importância da
descentralização, que é um dos pilares da Política Nacional de Recursos Hídricos,
sempre que estiverem em questão as definições relativas às divisões de trabalho e de
responsabilidade entre os entes encarregados do Plano Nacional, dos Planos Estaduais e
dos Planos de Bacia. Assim, a atuação do Plano Nacional, bem como dos Planos
119

Estaduais e Distrital, distingue-se, preponderantemente, como estratégica e nacional (ou


estadual), enquanto os Planos de Bacia se caracterizam como predominantemente
operacionais e regionais (ou locais).

9.2.2 O enquadramento dos corpos de água


O enquadramento é um instrumento de planejamento que visa a indicar as metas de
qualidade das águas a serem alcançadas em uma bacia hidrográfica, em determinado
período temporal, a classe que os corpos de água devem atingir, ou em que classe de
qualidade de água deverão permanecer para atender às necessidades de uso definidas
pela sociedade. Esse instrumento vem sendo implementado no país desde 1986, quando
o Conama, por intermédio da sua Resolução no 20 (atual Resolução no 357/2005),
identificou as classes de uso em que os corpos de água podem ser enquadrados, com
correspondentes parâmetros de qualidade. Os procedimentos para o enquadramento dos
corpos de água são definidos pela Resolução CNRH no 12/2001.
Com o advento da Lei no 9.433/1997, que possui, entre seus objetivos, “assegurar à
atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água em padrões de
qualidade adequados aos respectivos usos”, esse instrumento foi incorporado à política
de recursos hídricos. De acordo com a referida Lei, o enquadramento deve ser
estabelecido pelo CNRH ou pelos Conselhos Estaduais, mediante proposta apresentada
pela Agência de Bacia Hidrográfica ao respectivo Comitê de Bacia Hidrográfica (artigo
44, XI, a).
Como instrumento de gestão dos recursos hídricos, representando, portanto, um
elemento de articulação e integração da gestão ambiental com a gestão dos recursos
hídricos, o que encontra respaldo no artigo 10 da Lei no 9.433/1997, a saber: “As classes
de corpos de água serão estabelecidas pela legislação ambiental”. Portanto, sua
implementação passará a exigir a articulação das instituições de gerenciamento e dos
colegiados dos dois sistemas, o SINGREH e o Sisnama.

9.2.3 A outorga de direito de uso de recursos hídricos


O Código de Águas estipulava que as águas públicas não poderiam ser derivadas
para as aplicações da agricultura, da indústria e da higiene sem a existência de
concessão administrativa, no caso de utilidade pública, e, não se verificando esta, de
autorização administrativa, que seria dispensada, todavia, na hipótese de derivações
insignificantes.
120

As concessões ou autorizações para derivação que não se destinassem à produção de


energia hidroelétrica seriam outorgadas pela União, pelos Estados ou pelos Municípios,
conforme seu domínio sobre as águas a que se referisse ou conforme os serviços
públicos a que se destinasse a mesma derivação, de acordo com os dispositivos deste
Código e as leis especiais sobre os mesmos serviços.
As concessões ou autorizações para derivação que se destinassem à produção de
energia hidroelétrica seriam atribuições dos Estados ou da União, na forma e com as
limitações estabelecidas no Livro III do Código, no qual estavam especificadas todas as
condições para o aproveitamento das “forças hidráulicas”.
O Código, de modo minucioso, inaugurou o que se pode considerar como um
inovador ramo especializado do direito, por meio de uma clara manifestação de
interesse da administração na gestão do uso das águas para múltiplos fins, com ênfase
na produção de energia. Dedicou 65 artigos às condições para o funcionamento da
indústria hidroelétrica, outros quatro a resguardar a navegação, e apenas um para
assegurar o uso para as primeiras necessidades da vida. O Código, no entanto,
determinava considerar a possibilidade da múltipla utilização das águas.
Revogados, tacitamente, os instrumentos do Código de Águas (POMPEU, 1999), a
Lei no 9.433/1997, sem lhes alterar a essência, mas sem distingui-los em espécies,
estabelece a outorga de direito de uso como aquele instrumento que tem como objetivos
assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água, superficiais ou
subterrâneas, e o efetivo exercício dos direitos de acesso a ela.
A outorga é, assim, o ato administrativo pelo qual a autoridade outorgante concede
ao outorgado o direito de uso de recurso hídrico, por prazo determinado e de acordo
com os termos e as condições expressas no ato. A outorga não representa alienação
(venda) das águas, posto que são inalienáveis, porém tem o condão de separar das águas
genericamente consideradas como bem de uso comum do povo a parcela outorgada,
conferindo prioridade ao outorgado, passível de suspensão nos casos previstos no artigo
15 da Lei no 9.433/1997, entre eles as situações em que estiver ameaçado o interesse
público e a prioridade ao abastecimento humano e a dessedentação de animais.
Observa-se o sentido de instrumento preventivo, ou resolutivo, de conflitos de uso,
comuns na inexistência ou na inaplicação de tal instrumento.
Segundo Kelman (apud MACHADO, 2001), a outorga visa a dar garantia ao usuário
outorgado quanto à disponibilidade de água como insumo básico de processo produtivo.
121

Salienta também que a outorga tem valor econômico para quem a recebe, na medida
em que oferece garantia de acesso a um bem limitado.
A emissão de outorgas também pode ser trabalhada na perspectiva de garantir
vazões para a manutenção dos ecossistemas.
Estão sujeitos à outorga os seguintes usos:
I Derivação e captação de parcela da água existente em um corpo de água para
consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo.
II Extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de
processo produtivo.
III Lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos,
tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final.
IV Aproveitamento de potenciais hidrelétricos.
V Outros usos que alterem o regime, a quantidade e a qualidade da água existente
em um corpo de água.
Além dos referidos usos, também são passíveis de outorga as intervenções que
alterem o regime dos corpos de água.
A Lei, em seu artigo 12, §1o, também enumera os usos que não dependem de
outorga, ou seja, os destinados ao abastecimento de pequenos núcleos rurais, as
derivações, as captações e as acumulações de água, como também os lançamentos de
efluentes considerados insignificantes. Vale ressaltar que mesmo os usos dispensados de
outorga são passíveis de cadastramento.
Conforme visto, estão sujeitos à outorga não somente os usos decorrentes da
extração e da derivação da água, mas também os decorrentes da utilização dos cursos e
dos corpos d’água como assimiladores de efluentes. Um caso particular diz respeito à
outorga e à utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica,
quando estarão subordinadas ao Plano Nacional de Recursos Hídricos e a
condicionantes e procedimentos específicos tratados em resolução do CNRH.
A efetivação das outorgas dar-se-á por meio de ato da autoridade competente do
Poder Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal, em função do domínio
administrativo ao qual estão submetidas as águas. Quanto às águas de domínio da
União, a competência para emissão das outorgas é da Agência Nacional de Águas
(ANA), de acordo com a já mencionada lei de sua criação, podendo ser delegada aos
Estados e ao Distrito Federal (artigo 14, § 1o da Lei no 9.433/1997), cabendo sempre
considerar a determinação legal pela articulação da União com os Estados tendo em
122

vista o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum (artigo 4o da Lei no


9.433/1997).
Nos Estados a competência para emitir outorgas em rios de sua dominialidade é da
respectiva entidade gestora de recursos hídricos.
Ressalta-se a interdependência da outorga com os outros instrumentos da Política de
Recursos Hídricos. Os Planos de Recursos Hídricos devem conter as prioridades para
outorga dos direitos de uso, e o enquadramento é essencial na análise dos pedidos de
outorga, para lançamento de efluentes. Embora sejam de determinação complexa, as
demandas requeridas para a manutenção dos ecossistemas não podem ser esquecidas,
dada a proteção constitucional que os contempla. A Lei, por outro lado, determina que
os usos de recursos hídricos a serem cobrados são aqueles sujeitos à outorga e, ademais,
os valores a serem fixados para a cobrança são diretamente relacionados com
parâmetros utilizados para outorgas no âmbito de uma bacia hidrográfica. A relação da
outorga com o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos advém da importância
que os dados e as informações que integram o Sistema têm na análise de seus pedidos.
Além das Resoluções do CNRH, referentes a procedimentos, critérios e diretrizes
gerais para aplicação da outorga, têm sido realizados debates, no âmbito da Câmara
Técnica de Integração de Procedimentos, Ações de Outorga e Ações Reguladoras (CT-
POAR), referentes aos procedimentos para a emissão das outorgas no país, aos critérios
utilizados e às possibilidades de integração com outros instrumentos previstos na
legislação. De acordo com a ANA (2005h), inclui-se a discussão de proposta de
resolução sobre a integração de procedimentos de outorga e do licenciamento ambiental.

9.2.4 A cobrança pelo uso de recursos hídricos


A cobrança pelo uso dos recursos hídricos, segundo Mendonça (2002), não é
novidade introduzida pela Lei no 9.433/1997, pois já estava prevista no Código de Águas
de 1934, em seu artigo 3o, § 2o – “o uso comum das águas pode ser gratuito ou
retribuído, conforme as leis e regulamentos da circunscrição administrativa a que
pertencem”.
De acordo com a Lei, entretanto, percebe-se a preocupação de definir-lhe o caráter e
a que se destina: a cobrança pelo uso de recursos hídricos tem como objetivo reconhecer
a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor. O valor
da água é uma função da quantidade e da qualidade existente e do uso a que se destina.
Ademais, a cobrança objetiva incentivar a racionalização do uso da água, bem como
123

obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e das intervenções


contemplados nos Planos de Recursos Hídricos.
A Lei prevê que esses recursos sejam aplicados prioritariamente na bacia
hidrográfica em que forem gerados (artigo 22, caput, da Lei no 9.433/1997).
A doutrina é pacífica ao entender a cobrança como um preço público e como uma
retribuição que o usuário faz à sociedade por utilizar privativamente um bem que é de
uso comum (GRANZIEIRA, 2001), mas segundo Barth (1987), a cobrança pelo uso dos
recursos hídricos precisa ser vista em um contexto mais amplo que a relacione com
outros instrumentos jurídicos como outorga de direitos de uso, licenciamento ambiental,
sistema de informações, monitoramento, fiscalização, etc.
De fato, o sucesso da implementação da cobrança tem na integração com os outros
instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos sua base. Como a cobrança se
dá sobre os usos outorgáveis, é direta a inter-relação entre os dois instrumentos e deles
com os Planos de Recursos Hídricos.
Além disso, o texto legal é explícito ao imprimir o caráter de negociação social ao
instrumento da cobrança, o que impede a adoção, pela administração, de um caráter
meramente arrecadador, quando define, no artigo 38,VI, da Lei no 9.433/1997, que
compete aos Comitês de Bacia “estabelecer os mecanismos da cobrança pelo uso de
recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados”.
Além disso, nesse mesmo artigo, inciso V, é explicitada a competência dos Comitês
em propor aos Conselhos Estaduais e ao Conselho Nacional os usos de pouca
expressão, a serem isentos de outorga e, conseqüentemente, da cobrança. Assim,
pressupõe-se um amplo processo de negociação para a implantação da cobrança, que
terá nos Comitês de Bacia seu principal ambiente.
Nesse mesmo contexto, a cobrança poderá ser entendida e aplicada como
instrumento eficaz de política pública quanto ao ordenamento territorial, especialmente
considerando o caráter estruturante da atividade econômica que têm as águas,
fortemente impulsionador de desenvolvimento e ao mesmo tempo assegurador de
qualidade de vida das comunidades de uma bacia hidrográfica.
Também com relação à cobrança, tal qual acontece com relação à outorga, há
especificidade digna de nota no caso do uso de recursos hídricos para a geração de
energia elétrica. É que a Lei no 9.984/2000 define a forma de cálculo de valor a ser
cobrado pelo uso que faz o setor elétrico na produção de hidroeletricidade analogamente
à compensação financeira paga pelo mesmo setor, a qual é calculada como sendo um
124

percentual da receita da atividade, e que passou a ser majorada de 0,75% a esse título,
devendo ser destinada ao Ministério do Meio Ambiente e utilizada na implementação
do SINGREH. Desse modo, a cobrança do uso de recursos hídricos para esta finalidade
específica é feita desconsiderando-se o domínio em que se situam, isto é, se da União ou
dos Estados.
Outrossim, cabe registrar que o ordenamento jurídico brasileiro não prevê a
possibilidade de comercialização e mercantilização da água por particulares, visto se
tratar de bem público inalienável, de domínio da União ou dos Estados.

9.2.5 O Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos


O Sistema de Informações tem como objetivo principal produzir, sistematizar e
disponibilizar dados e informações que caracterizam as condições hídricas da bacia em
termos de quantidade e qualidade da água para os diversos usos e em termos das
condições do ecossistema, traduzido pelas pressões antrópicas nela existentes.
O desenho, a implantação, a administração e a manutenção de Sistemas de
Informações sobre Recursos Hídricos não são uma atividade recente no país. O antigo
Dnaee vinha, há décadas, administrando um sistema de informações hidrológicas que
permitiu desenvolver a imensa maioria dos estudos hidrológicos já executados no país.
Esse sistema é atualmente operado pela ANA. Cabe às entidades outorgantes –
ANA e entidades estaduais – organizar, implantar e gerenciar o Sistema de Informações,
no âmbito nacional e estadual, respectivamente. No âmbito da bacia hidrográfica, caberá
à Agência de Água gerir o respectivo sistema.
O Sistema de Informações de Recursos Hídricos vai além do Sistema de
Informações Hidrológicas idealizado pelo Dnaee, abrangendo também o Cadastro
Nacional de Usuários de Recursos Hídricos (CNARH).
Vale registrar a importância desse instrumento em um modelo de gestão pautado na
participação da sociedade no processo decisório. Além de as informações sobre os
recursos hídricos serem basilares para a aplicação de todos os instrumentos da política, a
disseminação de informações confiáveis será peça fundamental para a tomada de
decisões seguras e responsáveis por parte das comunidades, dos usuários e do poder
público.

9.2.6 A compensação a Municípios


A redação original do artigo 24 da Lei no 9.433/1997 previa que:
125

Poderão receber compensação financeira ou de outro tipo os Municípios que tenham


áreas inundadas por reservatórios, ou sujeitas a restrições de uso do solo com finalidade
de proteção de recursos hídricos.
Ao argumento principal de que o estabelecimento desse mecanismo compensatório
aos Municípios não encontra apoio na Constituição Federal, o caput e os três parágrafos
do artigo 24 foram vetados pelo presidente da República.
No entanto, a “compensação a Municípios” continua a figurar como instrumento da
Política Nacional de Recursos Hídricos, posto que o inciso V da Lei não foi vetado.
Evidentemente, ele assim não pode ser utilizado enquanto não forem superadas as
razões do veto à sua regulamentação e até que esta seja estabelecida.

9.3 O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH)


No que se refere à criação do SINGREH, a iniciativa da União, aprovada pelo
Congresso Nacional, em cumprimento ao disposto na Constituição, conforme
mencionado inicialmente, resultou na estrutura contida no artigo 33 da Lei no
9.433/1997, acrescida da Agência Nacional de Águas, criada pela Lei no 9.984, de 17 de
julho de 2000:
• o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH);
• a Agência Nacional de Águas (ANA);
• os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal;
• os Comitês de Bacia Hidrográfica e suas respectivas Agências de Água ou
entidades delegatárias;
• os órgãos e as entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, cujas competências se relacionem com a gestão dos recursos hídricos.
Os objetivos do SINGREH expressos na lei são:
I Coordenar a gestão integrada das águas.
II Arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos.
III Implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos.
IV Planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos
hídricos.
V Promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos.
No uso de suas atribuições previstas no artigo 35, inciso VI, da Lei no 9.433/1997, o
CNRH vem estabelecendo diversos critérios, prioridades e diretrizes atinentes à gestão
das águas, mediante suas resoluções.
126

No entanto, ainda estão em curso discussões sobre a regulamentação de importantes


aspectos da Política.
Assim, o trabalho das Câmaras Técnicas do CNRH tem sido intenso – 55
Resoluções emitidas até novembro de 2005, ao mesmo tempo em que se encontram em
tramitação no Congresso Nacional inúmeros projetos de lei afetos a esses mesmos
temas, visando a regulamentar e a aprimorar a legislação em vigor, por exemplo, e
apenas para citar um deles, o PL 1.616/1999, cujas discussões envolvem matérias tais
como: o regime de racionamento e a fiscalização do uso de recursos hídricos; a
sistemática de outorga e cobrança pelo uso desses recursos; a regulamentação das
Agências de Água, bem como a disciplina dos contratos de gestão.
Ademais, a ANA tem a atribuição de participar da elaboração do Plano Nacional de
Recursos Hídricos e supervisionar sua implementação conforme previsto no Decreto no
3.692, de 19 de dezembro de 2000, em seu artigo 2o, III, do anexo I.

9.3.1 O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH)


O CNRH é o órgão superior do SINGREH, composto por Ministérios e Secretarias
da Presidência da República com atuação no gerenciamento ou no uso das águas, bem
como por representantes dos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, representantes
dos setores usuários e da sociedade civil, sendo sua presidência exercida pelo ministro
do Meio Ambiente e sua Secretaria Executiva a cargo do secretário de Recursos
Hídricos do Ministério do Meio Ambiente.
Compete a este órgão, segundo o artigo 2o da Lei no 9.984/2000, promover a
articulação dos planejamentos nacional, estaduais e dos setores usuários elaborados
pelas entidades que integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos e formular a Política Nacional de Recursos Hídricos, nos termos da Lei no
9.433/1997.
Ao CNRH incumbe arbitrar, em última instância administrativa, os conflitos
existentes entre Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; deliberar sobre os projetos
de aproveitamento de recursos hídricos cujas repercussões extrapolem o âmbito dos
Estados em que serão implantados; deliberar sobre as questões que lhe tenham sido
encaminhadas pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos ou pelos Comitês de
Bacia Hidrográfica; aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica
e estabelecer critérios gerais para a elaboração de seus regimentos; estabelecer critérios
gerais de outorga e cobrança pelo uso das águas; e ainda aprovar o Plano Nacional de
127

Recursos Hídricos e acompanhar sua execução, determinando as providências


necessárias ao cumprimento de suas metas.
O Conselho tem seu funcionamento operacional baseado na Secretaria de Recursos
Hídricos do Ministério do Meio Ambiente e em dez Câmaras Técnicas temáticas,
criadas por resoluções do próprio Conselho. Assim, por exemplo, para a elaboração do
Plano Nacional de Recursos Hídricos, o CNRH houve por bem criar, conforme citado
anteriormente, na forma de sua Resolução no 4/1999, uma câmara técnica permanente, a
CTPNRH, cuja composição se encontra estabelecida pela Resolução no 33/2003,
compreendendo representantes do governo federal, dos Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos, dos usuários e das organizações civis de recursos hídricos.

9.3.2 A Secretaria de Recursos Hídricos (SRH)


A SRH integra a estrutura básica do Ministério do Meio Ambiente, tendo suas
atribuições regulamentadas pelo Decreto no 5.776, de 12 de maio de 2006, incumbindo-
lhe monitorar o funcionamento do SINGREH; promover a integração da gestão de
recursos hídricos com a gestão ambiental; coordenar a elaboração e auxiliar no
acompanhamento da implementação do Plano Nacional de Recursos Hídricos;
promover a cooperação técnica e científica relacionada com a Política Nacional de
Recursos Hídricos; promover, em articulação com órgãos e entidades estaduais, federais
e internacionais, os estudos técnicos relacionados aos recursos hídricos e propor o
encaminhamento de soluções; coordenar, em sua esfera de competência, a elaboração de
planos, programas e projetos nacionais referentes a águas subterrâneas e monitorar o
desenvolvimento de suas ações, dentro do princípio da gestão integrada dos recursos
hídricos.

9.3.3 A Agência Nacional de Águas (ANA)


A ANA, criada pela Lei no 9.984/2000, tem por finalidade precípua implementar a
Política Nacional de Recursos Hídricos, em articulação com os órgãos públicos e
privados integrantes do SINGREH, destacando-se, entre suas atribuições legais, a
supervisão, o controle e a avaliação das ações e das atividades decorrentes do
cumprimento da legislação federal sobre as águas, bem como a outorga e a fiscalização
dos usos de recursos hídricos de domínio da União, implementando, em articulação com
os Comitês de Bacia Hidrográfica, a cobrança pelo uso desses recursos.
Compete-lhe também planejar e promover ações destinadas a prevenir ou a
minimizar os efeitos de secas e inundações, em articulação com o órgão central do
128

Sistema Nacional de Defesa Civil, em apoio aos Estados e aos Municípios, e promover
a elaboração de estudos para subsidiar a aplicação de recursos financeiros da União em
obras e serviços de regularização de cursos d’água, de alocação e distribuição de água e
de controle da poluição hídrica, em consonância com o estabelecido nos planos de
recursos hídricos.
Compete-lhe ainda definir e fiscalizar as condições de operação de reservatórios por
agentes públicos e privados, visando a garantir o uso múltiplo dos recursos hídricos,
conforme os planos das respectivas bacias, além de promover a coordenação das
atividades desenvolvidas no âmbito da rede hidrometeorológica nacional, em
articulação com órgãos e entidades públicas ou privadas que a integram, ou que dela
sejam usuários, bem como organizar, implantar e gerir o Sistema Nacional de
Informações sobre Recursos Hídricos, estimular a pesquisa e a capacitação de recursos
humanos para a gestão de recursos hídricos, prestar apoio aos Estados na criação de
órgãos gestores de recursos hídricos, e outras atribuições especificadas na lei de criação
da Agência, já citada.

9.3.4 Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos (CERH)


No que se refere aos CERH, cada ente político-federativo estadual possui seu
correspondente órgão colegiado deliberativo e normativo em matéria de política e
gestão das águas de seu domínio, assim como o Distrito Federal.
Os CERH possuem importante função deliberativa sobre os critérios e as normas
atinentes às diretrizes da Política Estadual de Recursos Hídricos a serem observadas
pelos Planos Estaduais correspondentes e pelos planos de bacia hidrográfica, bem como
sobre os critérios e as normas relativos à outorga e à cobrança pelo uso dos recursos
hídricos e demais instrumentos de gestão. Compete-lhes ainda a aprovação da
instituição de comitês em rios de seu domínio.

9.3.5 Comitê de Bacia Hidrográfica (CBH)


Os Comitês de Bacia são órgãos colegiados locais cujas atribuições, a teor do
disposto no § 1o do artigo 1o da Resolução CNRH no 05/2000, devem ser exercidas na
bacia hidrográfica de sua jurisdição, incumbindo-lhes promover o debate das questões
relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação das entidades intervenientes, bem
como arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos
recursos hídricos, aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia, acompanhar sua
execução e sugerir as providências necessárias ao cumprimento de suas metas.
129

É também de sua competência legal propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos


Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações, as derivações, as captações e os
lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga
de direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes, bem como
estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos, sugerindo os
valores a serem cobrados, e ainda estabelecer critérios e promover o rateio de custos das
obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo.
A gestão eficiente dos recursos hídricos reclama soluções a curto, médio e longo
prazos, por meio do planejamento e da execução de programas, projetos e ações
coletivas de cunho sócio-ambiental, neles compreendidos simultaneamente seus
aspectos antrópicos, físicos e biológicos. Tais soluções, planos e ações coletivas,
envolvendo a participação de todos os interessados, devem necessariamente ser
buscados nos CBH, cuja composição e funcionamento devem igualmente abarcar a
representação e a participação efetiva dos vários segmentos sociais, dos setores
econômicos e dos entes federativos envolvidos: as comunidades e suas organizações
civis, os usuários diversos e os poderes públicos, para garantir as condições de acesso
universal e uso múltiplo das águas, bem como o debate democrático necessário ao
gerenciamento participativo e descentralizado desses recursos.
Nos termos do parágrafo único do artigo 37 da Lei no 9.433/1997, as decisões dos
Comitês de Bacia Hidrográfica sujeitam-se a recurso ao CNRH ou aos CERH, de
acordo com sua esfera de competência.

9.3.6 Agências de Água e entidades delegatárias


No que concerne às Agências de Água, várias são suas atribuições de caráter
técnico-operacional no âmbito do SINGREH, preconizadas pela já citada Lei da Política
Nacional de Recursos Hídricos, cujo rol constante de seu artigo 44 enumera nada menos
que 14 itens.
Apenas para citar algumas dessas atribuições legais, incumbe-lhes, em sua área de
atuação, gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos; manter atualizados o
cadastro de uso/usuários e o balanço da disponibilidade hídrica; promover os estudos
necessários para a gestão das águas; elaborar e atualizar o Plano de Recursos Hídricos a
ser aprovado pelo CBH; propor ao CBH o rateio dos custos das obras de uso múltiplo e
o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso a ser submetido ao CNRH ou
aos conselhos estaduais de acordo com a dominialidade dos recursos hídricos.
130

Agências de Água são, pois, entidades dotadas de personalidade jurídicas, criadas


para dar suporte administrativo, técnico e financeiro aos Comitês de Bacia, sendo
requisitos essenciais para sua instituição a prévia existência do Comitê e sua viabilidade
financeira, assegurada pela cobrança do uso de recursos hídricos. O que se deve buscar
na instituição dessas unidades executivas descentralizadas é a modelagem de entidades
eficientes, dotadas de autonomia gerencial, sem que, contudo, possam ser confundidas
suas atribuições com as prerrogativas e as funções desenvolvidas pelos demais
integrantes do SINGREH. Ou seja, tais agências não devem sobrepor-se nem confundir-
se com os Comitês de Bacia Hidrográfica: estes são órgãos normativos, deliberativos e
ordinatórios da política e do gerenciamento dos recursos hídricos na sua área territorial
de atuação; aquelas são órgãos de apoio administrativo, técnico e financeiro,
constituindo-se em fiéis executores das ações, dos planos e dos projetos previamente
aprovados pelos Comitês.
As Agências de Água deverão ser criadas pela União e pelos Estados, detentores da
dominialidade da água, sob qualquer uma das formas legalmente permitidas.
Enquanto esses organismos não estiverem constituídos, a Lei no 9.433/1997
autorizou, em seu artigo 51, que o Conselho Nacional ou os Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos deleguem competência a uma das entidades listadas no artigo 47, por
prazo determinado, para o exercício de funções inerentes às Agências de Água, à
exceção da função prevista no artigo 44, inciso III, da Lei no 9.433/1997, de efetuar a
cobrança pelo uso de recursos hídricos, em virtude do disposto no artigo 2o, inciso VI,
da Lei no 10.881/2004.
Faz-se mister ressaltar que a Lei no 10.881, de 9 de junho de 2004, permitiu a essas
entidades delegatárias firmarem contratos de gestão com a ANA, por prazo
determinado, funcionando, assim, como Agência de Água, sendo asseguradas a estas as
transferências da ANA provenientes da cobrança pelo uso de recursos hídricos em rios
de domínio da União.

9.3.7 Demais componentes do SINGREH


Quanto aos demais órgãos e entidades dos poderes públicos federal, estaduais, do
Distrito Federal e municipais, a que se refere o artigo 33, inciso IV, da Lei no
9.433/1997, há de se destacar a importância da efetiva participação dos Municípios.
Com efeito, a gestão do meio ambiente local, mediante, por exemplo, a elaboração dos
planos diretores, o controle e a fiscalização ambiental do parcelamento, o uso e a
131

ocupação do solo urbano, o controle e a prevenção de erosões tanto na cidade como no


campo dá-nos conta da inegável relevância municipal e sua interface necessária no
planejamento e na gestão das águas.
Não menos importante é a participação, no âmbito do SINGREH, dos órgãos
federais e estaduais de meio ambiente, condição sine qua non para a integração de ações
requeridas na gestão de ambos os sistemas, bem como, à evidência, dos órgãos gestores
de recursos hídricos dos Estados, haja vista os vários instrumentos gerenciais a seu
cargo, tais como os planos de recursos hídricos, o enquadramento dos corpos de água
em classes segundo os usos preponderantes da água, a outorga, a cobrança e a
fiscalização do uso das águas e os demais procedimentos legais de comando e controle.
Evidentemente, não se poderá pretender destacar esse ou aquele integrante do
SINGREH, haja vista seu próprio caráter sistêmico e aglutinador das atribuições
inerentes a cada órgão e entidade.Todos esses órgãos e entidades têm suas atribuições
específicas e devem operacionalizar suas atividades de modo integrado.
Se, por um lado, não se pode atribuir maior relevância a nenhum dos órgãos e das
entidades integrantes do SINGREH isoladamente, por outro lado, é forçoso reconhecer,
no atual estágio de implementação deste sistema, a dimensão gerencial e a
responsabilidade técnica sobremaneira acentuadas que se revestem os Comitês de Bacia
Hidrográfica e suas agências executivas: a estas incumbe a função de prestar o suporte
técnico-operacional às decisões dos Comitês.
Com efeito, as inter-relações que se devem estabelecer entre os Comitês de Bacia
Hidrográfica e suas agências ou entidades delegatárias são a comprovação dessa
simbiose organizacional (MATTIOLI, 2004). Os Comitês de Bacia, no âmbito do
SINGREH, são órgãos de fundamental importância no que se refere ao planejamento e à
gestão dos recursos hídricos, porquanto deles partirão as decisões políticas sobre a
utilização das águas no âmbito de cada bacia. Contudo, sem o necessário apoio
financeiro, técnico e administrativo a ser prestado pelas agências de água e as entidades
delegatárias, muito pouco avançar-se-á.
De suma importância para o aprimoramento do SINGREH é, portanto, a
necessidade do reconhecimento ou da compreensão exata da diferença entre
“compartimentar” e “compartilhar”.
O “compartimentar” é distribuir por vários indivíduos ou lugares atribuições e
competências exclusivas e estanques, criando compartimentos e estabelecendo partes
distintas; o “compartilhar” ou “compartir”, ao contrário, é participar ou “co-laborar” no
132

desenvolvimento e na consecução dessas mesmas atribuições e competências,


compartilhando-se procedimentos e responsabilidades. Com efeito, as novíssimas
normas de proteção dos bens naturais que se editaram nestes últimos anos, seja no plano
federal, seja nos Estados, dentre elas as de gerenciamento dos recursos hídricos, dão-nos
conta da emergência de novos modelos de gestão.
Assim é que, não obstante o fato de serem pessoas jurídicas de direito público
distintas, cada ente político-administrativo que participa dessas atividades, ainda que
detenha suas atribuições e competências específicas, participa e integra, com efeito, um
mesmo sistema de gestão de recursos hídricos, aliás, vários sistemas de gestão que se
devem inter-relacionar, igualmente. Como decorrência, percebe-se a necessidade de se
integrarem os vários agentes públicos que têm atuação na matéria hoje denominada
“desenvolvimento sustentável”.
Não menos importantes são as inter-relações a serem estabelecidas ou mesmo
consolidadas, conforme o caso, entre os partícipes desse mesmo desenvolvimento que
se pretende sustentável.
Logo, sua complexidade, atualização e revisão são fundamentais para incorporar as
novidades e os avanços que se apresentam referentes às possibilidades de otimização e
integração dos trabalhos de gestão em curso.
O Município, bem como o Estado e a União devem todos entender que não são
“níveis” de hierarquia, mas, ao contrário, “esferas” federativas de governo e sistemas de
sistemas.
É necessário compreender a unicidade federativa dos diversos entes político
administrativos: os Municípios, os Estados e a União (cf. artigo 1o, caput, CF, verbis:
“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal...”) cuja expressa competência constitucional de
proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de sua formas, com efeito,
lhes é comum.
Segundo Mattioli (2004), a noção triádica de justaposição e completamento de
interesses e objetivos comuns quanto aos entes federativos anteriormente mencionados
se deve estender igualmente à sistemática legal deliberativa da gestão das águas nos
colegiados. Ou seja, são os órgãos colegiados normativos e deliberativos das questões
atinentes às políticas públicas e gestão das águas brasileiras, quer o nacional ou o dos
Estados e os de bacia hidrográfica, um conjunto institucional novo, cuja existência se
justapõe a cada um de seus membros ou segmentos, que deve operar suas atribuições e
133

competências legais de modo que se contemplem todos os três vetores a que se refere a
Política Nacional de Recursos Hídricos – o poder público, os setores usuários e a
sociedade civil, no sentido de efetivamente se implantar em todo o país uma gestão
integrada, participativa, descentralizada e sustentável.
Faz-se necessário equalizar de modo efetivo e generalizado, no âmbito dos referidos
sistemas, a participação da sociedade civil no tocante a suas atribuições normativas e
deliberativas, diminuindo-se as distorções existentes e, em conseqüência, reforçando-se
sua participação.
Com efeito, a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, ao dizer em seu artigo
1o,VI, que “a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a
participação do poder público, dos usuários e das comunidades”, o fez sem eleger
distinções entre os segmentos componentes do SINGREH.
De igual modo importante para o aprimoramento dos sistemas de gestão das águas
tanto na esfera federal quanto nos Estados e no Distrito Federal é a necessidade de
reforçar a atuação institucional dos Comitês de Bacia Hidrográfica mediante sua
capacitação e mesmo a definição exata de conceitos e critérios gerais mais claros sobre
o papel desses colegiados, bem como a necessidade de efetivo envolvimento e
compromisso estatais (poder público) atinente à implantação dos sistemas em apreço.
É, pois, em suma, inadiável a necessidade de se reforçar a atuação institucional dos
componentes do SINGREH mediante sua capacitação, bem como apoio e
operacionalização de deliberações dos colegiados, por meio das unidades executivas
descentralizadas, e mesmo a definição de conceitos e critérios mais claros sobre o papel
desses colegiados locais de bacia hidrográfica, bem como também inadiável a
necessidade de efetivo envolvimento e compromisso do Estado no que se refere à
implementação e ao funcionamento dos sistemas de gestão de recursos hídricos.

9.4 Legislação de Recursos Hídricos do Estado do Pará


As legislações básicas que tratam sobre a gestão dos recursos hídricos no Estado do
Pará são:

 Lei nº 6.381/2001 – Dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos e


instituí o Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos
 Decreto nº 5.565/2002 – Define o órgão gestor da Política Estadual de
Recursos Hídricos
 Decreto nº 2.070, de 20/02/2006 - Regulamenta o Conselho Estadual de
Recursos Hídricos – CERH.
134

10 REGULARIZAÇÃO DE VAZÕES E CONTROLE DE ENCHENTES E


INUNDAÇÕES DOS CURSOS DE ÁGUA
10.1 Regularização de vazões
A variabilidade temporal das vazões fluviais tem como resultado visível a
ocorrência de excessos hídricos nos períodos úmidos e a carência nos períodos secos.
Nada mais natural que seja preconizada a formação de reservas durante o período úmido
para serem utilizadas na complementação das demandas na estação seca, exercendo um
efeito regularizador das vazões naturais.
Em geral, os reservatórios são formados por barragens implantadas nos cursos de
água. Suas características físicas, em especial a capacidade de armazenamento,
dependem das características topográficas do vale no qual estará situado.
Como a ocorrência das vazões é aleatória, ou seja, não há possibilidade de previsão
de ocorrências em longo prazo, não é também possível prever-se com precisão o
tamanho da reserva de água necessária para suprimento das demandas de períodos de
seca no futuro. Isto leva o planejador de recursos hídricos a duas situações ineficientes:
superdimensionar as reservas, à custa de investimentos demasiados no reservatório de
acumulação ou, subdimensionar as reservas à custa de racionamento durante o período
seco. Entre essas duas dimensões estaria aquela ótima.
No entanto, a situação é mais complexa do que o acima exposto, exatamente porque
as vazões são aleatórias. Assim, existirão períodos nos quais determinadas dimensões de
reservatório será suficiente e outros em que não. A exceção ocorre nos casos extremos
em que seja implantado um reservatório excessivamente grande, que permita atender
sempre a demanda, ou excessivamente pequeno, que nunca o faça. A dimensão ótima
para um reservatório deverá ser considerada em função de um compromisso entre o
custo de investimento na sua implantação e o custo da escassez de água durante os
períodos secos. O primeiro custo é diretamente proporcional e o segundo é
inversamente proporcional à dimensão do reservatório Quanto menor for a capacidade
útil de acumulação de água, ou seja, aquela que pode ser efetivamente utilizada, mais
provável é a ocorrência de racionamento.
Portanto, apenas na situação de extrema aversão ao racionamento seria ótima a
decisão de construir-se um reservatório que sempre pudesse acumular água para atender
à demanda.
Há um risco de que o raciocínio previamente elaborado leve à errônea conclusão
que, para o atendimento a qualquer demanda hídrica seja suficiente a construção de um
135

reservatório com capacidade útil suficientemente grande de acumulação. Isso porque,


obviamente, a capacidade útil de acumulação de um reservatório poderá ser
efetivamente utilizada se houver durante algum período úmido água suficiente para
enchê-lo. Já se introduziu um número suficiente de complexidades ao problema para ser
aconselhável iniciar a apresentação das soluções práticas. Mas, apenas para constar, e
com risco de assustar o estudante, é possível citar-se outras mais: a demanda pode
também ser variável e mesmo, aleatória como a vazão, e existem perdas de água em um
reservatório, por evaporação, infiltração e vazamentos. O fato é que o estudo de um
reservatório, de regularização de vazões exige o conhecimento de sua dimensão, das
vazões afluentes, da demanda a ser suprida e das perdas que poderão ocorrer.

10.2 Controle de enchentes e inundações

10.2.1 Definição
 Enchente: caracteriza-se por uma vazão relativamente grande de
escoamento superficial.
 Inundação: caracteriza-se pelo extravasamento do canal.

10.2.2 Causas
Enchente
 Excesso de chuva
 Descarregamento de qualquer volume de água acumulado a monte
(rompimento de uma barragem ou a abertura brusca das comportas de um
reservatório).
Inundação
 Excesso de chuva
 Existência, à jusante da inundação, de qualquer obstrução que impeça a
passagem de vazão de enchente (bueiro mal dimensionado que remansa o
rio).

10.2.3 Distribuição das enchentes e inundações durante o ano


As enchentes e inundações quando causadas pelo excesso de precipitação, têm suas
distribuições sazonais semelhantes a do fenômeno que as geraram, sendo portanto,
necessário o estudo das características das precipitações (origem, distribuição temporal
e espacial) da região onde se situa a bacia em questão).
É importante lembrar que em um país de dimensões continentais como o Brasil,
vários devem ser os sistemas organizadores de convecção, que, atuando isoladamente
136

ou em conjunto, são responsáveis, pela estação chuvosa de setores distintos do país.


Aqui só nos deteremos na Região Nordeste do Brasil, e em especial, ao seu setor norte,
onde se situa o Estado do Ceará.

10.2.4 Métodos de combate às enchentes


Os danos causados pelas enchentes podem ser evitados de três modos diferentes:
 Pela construção de obras de proteção
 Mediante a redução do nível de cheia, sem modificação apreciável de
descarga de pique.
 Mediante a redução dos fluxos de cheia por meio de acumulação,
modificação do uso da terra ou métodos semelhantes.
Proteção contra inundações
A proteção contra inundações é proporcionada, principalmente por meio de diques e
muralhas construídas ao longo das margens, que dão apenas proteção local à população
e às propriedades que se localizam ao alcance das águas da enchente. Sua finalidade é
confinar aquelas águas dentro do canal natural do rio. Assim fazendo, eles elevam o
nível de água nos pontos à montante (devido ao represamento das águas) e à jusante
(devido ao acréscimo de descarga, resultante da redução da acumulação).
Este método embora proporcione, muitas vezes, proteção satisfatória contra
inundações mais freqüentes, ele acarreta um perigo. Graças a sensação de proteção
gerada pela presença de diques e muralhas de proteção, novas edificações são
construídas em áreas antes evitadas. Um dique protege somente enquanto não é
ultrapassado; depois disso torna-se completamente inútil. Em conseqüência, quando
uma cheia excepcional ocorre e transborda dos diques, a devastação resultante e as
perdas de vida são, provavelmente, maiores do que se nada tivesse sido construído.
Redução do nível
O risco de inundação pode ser reduzido, sem a redução da vazão de enchente, pelo
abaixamento do nível. Isto pode ser conseguido através de:
 A retificação e a drenagem do leito do rio. A dragagem pode ser feita para
eliminar os depósitos de fundos e das margens, aumentando assim a área da
seção do canal. A retificação permite um aumento de declividade do canal
com conseqüente aumento da capacidade de escoamento. Normalmente, a
retificação deve ser seguida por revestimento ou consolidação das margens
(VILLELA, 1975).
137

 Construção de um "by-pass", ou canal adicional de enchente.


Freqüentemente, grandes cidades localizam-se junto de rios ou de outras
massas de água. É aí que, por causa dos estrangulamentos provocados pelas
pontes, edifícios e áreas aterradas, cria-se um funil. Não se pode alargar o
canal do rio, devido ao alto custo. Não é raro, entretanto, que se possa
construir, em torno da cidade, um canal para enchentes a custo razoável.
Ex: rio Mississipi em Nova Orleans.
Redução da descarga de pique
As vazões de enchentes podem ser reduzidas por meio de acumulação temporária de
uma parte do escoamento superficial até depois que o máximo da cheia tenha ocorrido.
A redução por acumulação pode ser feita através de: um grande número de
pequenos reservatórios individuais localizados nas cabeceiras do curso d'água
principal ou de seus afluentes; terraços que detenham o escoamento durante tempo
suficiente para permitir a infiltração no solo; e por meio de grandes reservatórios,
localizados nos vales mais a jusante.
Independentemente das dimensões do reservatório, a dois tipos de acumulação:
controlada e não controlada. Na controlada, as comportas das estruturas de barragem
podem regular o deflúvio, do modo que julgar conveniente. Na acumulação não
controlada, não há regulação da capacidade de deflúvio. Essas estruturas geralmente
dispõem de sangradouro para o deflúvio e as únicas vantagens delas, nas cheias,
resultam dos efeitos da modificação e retardamento da armazenagem.
OBS: Terraços são pequenos reservatórios de retenção, construídos acompanhando
as curvas de nível do terreno, com base de 1,50 a 1,80m de largura e altura usual de 15 a
20cm. São suficientemente próximos uns dos outros para que retenham o escoamento
superficial sem transbordamento.
138

11 SISTEMAS CARTOGRÁFICOS INFORMATIZADOS DE BACIAS


HIDROGRÁFICAS
Existem hoje no mercado várias ferramentas SIG (Sistemas de Informação
Geográfica) que auxiliam nos trabalhos cartográficos. O SIG possibilita a integração de
dados gráficos ou espaciais e dados não-gráficos ou não-espaciais. Cada tabela de um
banco de dados possui atributos (os campos da tabela) e registros (os dados
armazenados na tabela). Um SIG permite fazer relacionamento ou associação entre
tabelas ou entre registros de uma tabela com pontos, linhas ou áreas de uma imagem. É
através destes relacionamentos que se consegue ampliar mais as informações ligadas a
uma imagem e a tornar a análise mais completa.
Uma ferramenta SIG pode ser definida como um sistema gerenciador de dados
geográficos, pois possui associado um Sistema Gerenciador de Banco de Dados
(SGBD).
Um SIG ou sistema de geoprocessamento consiste em um sistema computacional
que reúne um poderoso conjunto de ferramentas para a entrada, armazenamento,
recuperação, transformação, análise e representação de dados do mundo real para um
conjunto particular de propósitos. O princípio fundamental de funcionamento de um
SIG é o georreferenciamento, ou seja, a indexação ou codificação geográfica de
informação utilizada através de um sistema de referência cartográfica. Outra
característica é a possibilidade de integrar informações espaciais e não espaciais de
natureza, origem e forma diversas numa única base de dados, possibilitando a geração
de novas informações derivadas e sua visualização na forma cartográfica. (ARONOFF,
1991; BURROUGH, 1992; CÂMARA, 1993)
O processamento de dados em SIG pressupõe que os mesmos estejam organizados
em planos de informação individuais, de acordo com a natureza dos diversos temas a
serem representados, como forma de efetuar análises que possam considerar
separadamente as características específicas de cada um. A informação de cada plano é
composta de basicamente duas partes. Uma delas é a informação espacial, referenciada
a um sistema de coordenadas e com a localização e delimitação das classes da área de
interesse. A outra parte é composta pelos atributos não espaciais e reúne dados
descritivos de natureza diversa sobre classes, geralmente tabulados e organizados em
um sistema gerenciador de bancos de dados (BURROUGH, 1992).
A possibilidade oferecida pelo geoprocessamento de integrar os dois tipos de
informação e de executar qualquer tipo de operação sobre a mesma base de dados fez
139

com que a análise ambiental experimentasse nos últimos anos um grande salto
metodológico, passando a contar com a possibilidade de considerar correlações
espaciais, relações de causa e efeito e aspectos temporais que antes eram impraticáveis
pelos meios tradicionais existentes (TOWNSHEND, 1992; XAVIER DA SILVA,
1992).

11.1 Exemplo de um sistema cartográfico no software ArcView 3.2 da Bacia do


Alto Iguaçu (Paraná)
Em sala de aula
140

12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRAGA, B.; HESPANHOL, I.; CONEJO, J. G. L.; BARROS, M. T. L. De; VERAS Jr.,
M. S.; PORTO, M. F. do A.; NUCCI, N. L. R.; JULIANO, N. M. de A.; EIGER, S.
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Paulo, Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária. São Paulo: Prentice Hall,
2002.

CONAMA - CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução Nº 357, de


17 de março de 2005. Dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes
ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de
lançamento de efluentes, e dá outras providências. Diário Oficial da União n. 53,
Brasília, 18 mar. 2005.

DERISIO, J. C. Introdução ao controle de poluição ambiental. 2. ed. São Paulo:


Signus Editora, 2000.

DRM-RJ (Departamento de Recursos Minerais do Rio de Janeiro). Águas


Subterrâneas. Disponível em: http://www.drm.rj.gov.br/projeto.asp?chave=6. Acesso
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www.grh.ufba.br/download/2005.2/Apostila(Cap2).pdf. Grupo de Recursos Hídricos -
Universidade Federal da Bahia. Acesso em:10 out. 2007.

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Panorama e estado dos recursos hídricos do Brasil: Volume 1. Secretaria de
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NAHON, I. M. Sistema de apoio à análise de outorga de lançamento de efluentes


para a variável Demanda Bioquímica de Oxigênio: Estudo de caso da Bacia do
Alto Iguaçu. Curitiba: Universidade Federal do Paraná. 2006. (Dissertação)

NUNES, V. Ciclo Hidrológico. Disponível em:


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SANTOS, I.; FILL, H. D.; SUGAI, M. R. V. B.; BUBA, H.; KISHI, R. T.; MARONE,
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o Desenvolvimento, 2001.
141

TUNDISI, J. G. Água no Século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: RIMa,


IIE, 2003.

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In:_____. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos. 2.
ed. Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental;
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VON SPERLING, M. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos.


3ª edição. Belo Horizonte. Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental;
Universidade Federal de Minas Gerais, 2005.

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