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ECONOMIA AZUL

VETOR PARA O DESENVOLVIMENTO DO BRASIL


ECONOMIA AZUL
VETOR PARA O
DESENVOLVIMENTO
DO BRASIL

Rio de Janeiro
Novembro de 2022
ECONOMIA AZUL
VETOR PARA O
DESENVOLVIMENTO
DO BRASIL

Organizadores
Thauan Santos
André Panno Beirão
Moacyr Cunha de Araujo Filho
Andréa Bento Carvalho

Patrocínio

Apoio
AGRADECIMENTOS FICHA TÉCNICA
A Diretoria-Geral de Navegação agradece o patrocínio da empresa Vale S/A, Planejamento e Coordenação
indispensável para a edição deste livro, tendo a percepção da importância do tema para Diretoria-Geral de Navegação (DGN)
o engrandecimento do País.
Também agradece o apoio da Associação de Terminais Portuários Privados – ATP e da Capitão de Fragata Alexandre Fonseca de Azeredo
Empresa Gerencial de Projetos Navais – EMGEPRON, que contribuíram diretamente para a Servidora Civil Taíssi Pepe de Medeiros Farias
produção e lançamento do mesmo. Capitão-Tenente André Leonardo Magalhães de Faria
Agradecemos especialmente ao Almirante de Esquadra Marcelo Francisco Campos, antigo Capitão-Tenente (T) Laila Freitas Müller
Diretor-Geral de Navegação da Marinha, um dos grandes propulsores desta obra. Terceiro-Sargento (ES) Luiz Fernando Bandeira da Silva
Da mesma forma agradecemos à Diretoria de Assistência Social da Marinha e à Associação Produção Editorial
Abrigo do Marinheiro, parceira responsável pela interveniência administrativa. Essential Idea Editora Ltda.
Releva mencionar a equipe da Diretoria-Geral de Navegação, responsável pelo
planejamento e coordenação do projeto: Capitães de Mar e Guerra Márcio Borges Coordenação Editorial
Ferreira, Walid Maia Pinto Silva Seba, Frederico Medeiros Vasconcelos de Albuquerque; Sonia da Silva Fonseca
Capitão de Fragata Alexandre Fonseca de Azeredo; Servidora Civil Taíssi Pepe de Medeiros Editor
Farias; Capitão-Tenente André Leonardo Magalhães de Faria; Capitão-Tenente (T) Laila Rogerio Raupp Ruschel
Freitas Müller e Terceiro-Sargento (ES) Luiz Fernando Bandeira da Silva; que contribuíram
para o sucesso desta publicação. Revisão de Texto
À equipe do Departamento Industrial Gráfico da Base de Hidrografia da Marinha em Luciana Moreira
Niterói (BHMN).
Projeto Gráfico, Diagramação e Capa
Nosso apreço à equipe técnica da Essential Idea Editora que participou desta obra com
Yvonne Sarue
dedicação e profissionalismo.
Agradecimento especial aos 83 autores que fizeram este projeto tornar-se realidade. Capa
Foto de Lazyllama
Finalização de Gráficos
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Willy Kiyoshi Okamoto
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Impressão
Economia azul : vetor para o desenvolvimento do
Brasil / organizadores Thauan Santos . . . [et al.]. Departamento Industrial Gráfico da Base de Hidrografia da
-- São Paulo, SP : Essential Idea Editora, 2022. Marinha em Niterói (BHMN)
Vários autores.
Outros coordenadores: André Panno Beirão, Moacyr C.
Araujo Filho, Andréa B. Carvalho.
Bibliografia.
ISBN 978-65-86394-07-8
Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua
1. Brasil. Marinha 2. Desenvolvimento sustentável Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.
3. Economia 4. Governança 5. Investimentos 6. Mar
7. Oceano 8. Recursos naturais I. Santos, Thauan. Os textos desta obra não refletem, necessariamente, o posicionamento institucional
II. Beirão, André P. III. Araujo Filho, Moacyr C. do patrocinador, apoiadores ou coordenadores do projeto. Trata-se de um trabalho
IV. Carvalho, Andréa B. acadêmico cujo apoio e coordenação se deu visando à difusão de debates
na temática nacional.
22-124726 CDD-333.7 Copyright © 2022 Diretoria-Geral de Navegação.
Índices para catálogo sistemático:
1. Economia azul 333.7
Eliete Marques da Silva - Bibliotecária - CRB-8 / 9380
PREFÁCIO DO MINISTRO
DE ESTADO DA ECONOMIA
Paulo Guedes
O
livro Economia Azul: vetor para o como reservas de petróleo e gás, e na zona o turismo no Brasil; e financiamentos a em- a exploração regular da biodiversidade exis-
desenvolvimento do Brasil é uma costeira se desenvolve grande parte do turis- presas desse setor. São iniciativas que pro- tente em fundos marinhos, tendo como
importante contribuição para a dis- mo brasileiro. Portanto, mapear as atividades movem o turismo de natureza no país, sen- finalidade a busca de recursos genéticos,
cussão da exploração do espaço marítimo econômicas que contribuem para o Produto do este um setor que representa importante bioquímicos e químicos para fins industriais,
nacional preservando os recursos naturais. Interno Bruto – “PIB do Mar”, mensurando oportunidade de desenvolvimento. começa a ser uma realidade em vários lu-
A Economia Azul, “o uso sustentável os respectivos aportes à economia do país, No âmbito da pesca, de grande relevân- gares do mundo. No Brasil, vários grupos
dos recursos marinhos para o desenvolvi- culminando com seu cálculo regular, é uma cia para a segurança alimentar de nossa nacionais estão investigando substâncias
mento econômico, melhoria do bem-es- importante contribuição para orientar políti- população, segundo o X Plano Setorial para isoladas em algas, fungos e invertebrados
tar social e geração de empregos, conser- cas públicas para o setor, tarefa em curso pelo os Recursos do Mar (PSRM), a ampliação da marinhos e seu potencial biotecnológico.
vando a saúde dos ecossistemas oceânicos GT PIB do Mar, coordenado pelo Ministério produção pesqueira passa por investimen- Outra área emergente relacionada à
e costeiros”1, encontra-se alinhada às neces- da Economia, no âmbito da Comissão Inter- tos na diminuição dos desperdícios na pesca Economia Azul diz respeito à utilização do
sidades de recuperação dinâmica de cresci- ministerial para os Recursos do Mar (CIRM). e na adoção de medidas de maior sustenta- potencial energético dos ventos, das ondas
mento da economia brasileira que vêm sendo Quanto à exploração de gás natural, cuja bilidade ambiental. Segundo o PSRM, esses e marés. Aqui vale mencionar a enorme
implementadas pelo atual governo. O desen- maior parte da produção nacional provém objetivos serão concretizados por meio da oportunidade da energia eólica offshore,
volvimento econômico deve ocorrer pari pas- de campos localizados no mar, em 2021 foi formação de recursos humanos, do desen- que em muitos casos aumenta a fauna ma-
su com a exploração inteligente das riquezas editada a Nova Lei do Gás, com o objetivo volvimento de tecnologias e implementação rinha local. A ameaça de “crise energética”
naturais, pois de nada adiantaria a geração de de atrair novos investidores para o setor de de medidas que reduzam as capturas de é um incentivo à diversificação das fontes
riquezas e empregos se não houvesse possibi- transporte de gás, aumentar a concorrência fauna acompanhante e de espécies amea- de energia, em especial da renovável.
lidade de sua manutenção, o que depende da e diminuir o preço para o consumidor final. çadas, tornando a atividade menos impac- Uma terceira área emergente pode ser
exploração equilibrada e sustentável. Na área de transportes, foi editada, em ja- tante do ponto de vista ecológico e reduzin- ressaltada: a mineração no mar. Nessa
Em um momento de reconfiguração das neiro de 2022, a lei que institui o Programa de do as perdas no manuseio e na conservação esfera, o X PSRM prioriza a pesquisa sobre
cadeias produtivas em nível global, a integra- Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do pescado a bordo. Isso elevará a produti- o aproveitamento dos recursos minerais da
ção da economia brasileira às cadeias globais do Mar) com a flexibilização para o uso de na- vidade e a qualidade do pescado. Amazônia Azul como alternativa às fontes
de valor deve ocorrer por meio da abertura vios estrangeiros no transporte de cabotagem Para fazer frente a esses desafios, o Go- continentais. Foca-se em fertilizantes, insu-
econômica e da criação de um bom ambiente em benefício dos consumidores e aumento verno Federal planeja implementar várias mos para a construção civil e siderurgia e
de negócios, estimulando-se o investimento da competitividade da economia nacional. medidas, como: reestruturação do Sistema insumos para a reconstrução de praias, ten-
privado no território nacional, inclusive para No setor de Turismo, o programa A Hora do Registro Geral da Atividade Pesqueira; do em vista os processos de erosão costeira.
exploração das riquezas da área marítima. do Turismo, presente no Plano Plurianual apoio à realização de cursos de formação Em suma, haja vista a importância es-
A Economia Azul abrange atividades eco- (PPA) 2020-2023, destaca algumas iniciati- profissional do pescador; combate à pesca tratégica e geopolítica da Amazônia Azul
nômicas que já geram expressivas riquezas, vas que buscam apoiar essa atividade eco- ilegal; apoio à realização de ações de com- como vetor de desenvolvimento do País,
bem como outras atividades em áreas emer- nômica com grande potencial de geração bate ao lixo no mar, entre outras. este livro veio em boa hora para subsidiar
gentes que apresentam potencial de cresci- de emprego e renda. Este programa promo- Quanto às atividades econômicas refe- a discussão de políticas públicas para a sua
mento e de geração de valor. São exemplos ve a competitividade e o desenvolvimento rentes às áreas emergentes, os ecossistemas exploração sustentável, mantendo-se um
dessas últimas a utilização do potencial sustentável do turismo brasileiro através de costeiros e marinhos brasileiros são muito equilíbrio entre o desenvolvimento socioe-
biotecnológico marinho, energias renováveis várias políticas públicas, como: qualificação diversos, com incontáveis espécies da flora e conômico e o meio ambiente.
offshore e a prospecção mineral no oceano. de pessoas no setor de turismo; promoção da fauna e constituindo-se em uma grande Brasília-DF, agosto/2022
O mar, principal via de comércio exterior de destinos e qualificação de serviços turís- oportunidade de desenvolvimento da bio- PAULO GUEDES
do país, é riquíssimo em recursos naturais, ticos; realização de obras para estruturar tecnologia marinha. Conforme o X PSRM, Ministro de Estado da Economia

1 Versão preliminar do conceito de Economia Azul, apresentada pelo Grupo Técnico (GT) PIB do Mar, na
146ª Sessão Ordinária da Subcomissão para o Plano Setorial para os Recursos do Mar (PSRM), ocorrida no
dia 6 de abril de 2022, no âmbito da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM).
MENSAGEM DO COMANDANTE
DA MARINHA
Almir Garnier Santos
Almirante de Esquadra
Comandante da Marinha
Autoridade Marítima Brasileira
E
m 5 de dezembro de 2017, a Organização das Nações Unidas (ONU) de- No momento em que os mares e oceanos alcançam inédita evidência no cenário
clarou os anos de 2021 a 2030 como a Década da Ciência Oceânica para o internacional, a Marinha orgulha-se de poder desempenhar importante papel
Desenvolvimento Sustentável. Com muitos de seus interesses vitais atrelados nas discussões em torno do conceito de Economia Azul, mantendo rumo constan-
ao mar, o Brasil encontra-se, no alvorecer desta “Década dos Oceanos”, diante de te na proteção das nossas riquezas, no trabalho em prol das atividades marítimas e
um auspicioso horizonte, descortinado, em grande parte, pelo profícuo e histórico no apoio à produção de conhecimentos que possam contribuir para o uso otimiza-
esforço da Marinha do Brasil (MB) em conhecer e evidenciar a relevância e as po- do e sustentável dos recursos naturais em nossas Águas Jurisdicionais. O presente
tencialidades do ambiente marinho para o País. Esse trabalho levou, por exemplo, livro é mais uma importante iniciativa nesse sentido, congregando dados e fontes
à adoção do termo Amazônia Azul para designar as imensas áreas marítimas sobre renomadas e propondo reflexões acerca do potencial marítimo brasileiro.
as quais o Brasil tem jurisdição e direitos exclusivos de exploração econômica, cha- Grandes desafios globais, como a segurança alimentar e energética, demanda-
mando a atenção para sua importância no tocante à biodiversidade, aos recursos rão cooperação internacional e ações sobre os recursos marinhos. Nesse cenário,
naturais, à vastidão e às vulnerabilidades, à semelhança da Floresta Amazônica. o Brasil, como grande nação costeira de inevitável vocação para o mar, se vê
diante de grandes oportunidades, que serão tão melhor aproveitadas quanto
Destinada precipuamente ao preparo e emprego do Poder Naval para a Defesa
maior for o envolvimento de todos os setores da sociedade com a construção e
da Pátria, a Marinha do Brasil também exerce as atribuições da Autoridade Ma-
condução de políticas públicas voltadas para os mares e oceanos.
rítima Brasileira (AMB), desempenhando uma ampla gama de tarefas em prol
do desenvolvimento do potencial marítimo do País, a exemplo das atividades Definitivamente, precisamos promover a saúde das nossas águas, conhecer cien-
de segurança da navegação; formação de pessoal especializado para a Marinha tífica e profundamente o patrimônio marítimo brasileiro e estimular o crescimen-
Mercante; sinalização náutica; salvaguarda da vida humana no mar e águas in- to da Economia Azul. Esses devem ser compromissos nacionais perenes. Vamos
teriores; prevenção da poluição hídrica causada por embarcações, plataformas juntos embarcar nesta missão! Sejam todos muito bem-vindos a bordo do livro
e suas instalações de apoio; combate a ilícitos, como a pesca ilegal; além das “Economia Azul: vetor para o desenvolvimento do Brasil”.
atividades de hidrografia, oceanografia e meteorologia marinha. Viva a Amazônia Azul!
A AMB também coordena a Comissão Interministerial para os Recursos do Mar Viva a minha, a sua, a nossa Marinha!
(CIRM), que presta relevante apoio às pesquisas científicas realizadas a bordo de
Tudo pela Pátria!
navios da Marinha, em nossas ilhas oceânicas e no continente antártico. Além ALMIR GARNIER SANTOS
disso, a MB, sensível à urgente e grave questão da poluição hídrica por resíduos Almirante de Esquadra
sólidos, vem se engajando em campanhas de conscientização e em ações efeti- Comandante da Marinha
Autoridade Marítima Brasileira
vas de combate ao lixo no mar.
APRESENTAÇÃO DO DIRETOR-GERAL DE NAVEGAÇÃO
Wladmilson Borges de Aguiar
Almirante de Esquadra

Tão importante quanto termos um Submarino


Convencional de Propulsão Nuclear é possuirmos
uma Economia do Mar pujante, que contribua
significativamente para o desenvolvimento nacional, o
bem comum do povo brasileiro e o fortalecimento
de suas instituições públicas e privadas.
Ilques Barbosa Júnior, 2022

O
s oceanos cobrem aproximadamente 71% da superfície terrestre, o que
equivale a 361 milhões de quilômetros quadrados, com um volume de
cerca de 1,3 bilhões de quilômetros cúbicos. Nessa imensidão, encontra-se
97% da água disponível do nosso planeta.
Nessa esteira, frisa-se que o Brasil é uma nação de vocação marítima e possui
uma das maiores Zonas Econômicas Exclusivas do mundo, uma área equivalen-
te à Amazônia Verde ou mais da metade do território nacional. Desse modo,
nosso país posiciona-se entre os maiores produtores mundiais de petróleo e gás
offshore, além de constituir um dos maiores hubs de cabos submarinos do mundo.
A partir da exploração marítima, retira-se cerca de 97% do petróleo e 86% do
gás natural produzidos, de acordo com os dados obtidos junto à Agência Nacional
do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP); pelas rotas marítimas, escoa-se
mais de 95% do comércio exterior brasileiro. Nesse aspecto, o Brasil alcançou re-
sultados significativos nos setores mencionados e pode consolidar, a curto prazo,
posição destacada nos setores emergentes relacionados ao mar, como aquicultura
marinha, energia eólica offshore, biotecnologia marinha, produtos e serviços ma-
rítimos de alta tecnologia, terminais e portos tecnológicos com alta capacidade de
exportação e importação adaptados ao e-Navigation, entre outros.
De acordo com projeções da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), o valor gerado pela indústria oceânica pode dobrar de 1,5 tri-
lhão de dólares em valor agregado, em 2010, para 3 trilhões de dólares, em 2030.
Nesse diapasão, aponta-se que a aquicultura marinha, a pesca, o processamen-
to de pescado, as atividades marítimas portuárias e eólicas offshore, es-
pecialmente, foram vistas como as de maior potencial para o crescimento.
Outrossim, destaca-se que são notórias as amplas iniciativas que têm ocorrido propicia comunicação objetiva sobre o tema junto à sociedade civil, de forma a
no âmbito global, regional e local em torno da temática dos mares e oceanos. abordar diversas áreas do conhecimento, quais sejam: Geologia, Meteorologia,
Em 2015, líderes mundiais reuniram-se na sede da ONU e decidiram um plano Oceanografia, Biologia, Engenharia, Direito, Administração, Economia, Turismo,
de ação para erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir que as pessoas Ciência Política e Relações Internacionais.
alcancem a paz e a prosperidade. Esse encontro culminou na Agenda 2030, A visão que norteia esta obra, portanto, busca conferir visibilidade à Economia
composta por um conjunto de 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Azul e aos elementos que contribuirão para o incremento do chamado Produto
Cumpre acentuar, igualmente, o ODS nº 14, de acordo com o qual se estabelece Interno Bruto (PIB) do mar, com base em estudos iniciais acerca da importância de
o compromisso de conservar e usar sustentavelmente os oceanos, os mares e os mensurar, de maneira contínua e sistemática, tal índice. Assim, objetiva-se que esse
recursos marinhos. entendimento possa repercutir positivamente nos eixos econômico, institucional,
Registra-se, ainda, que o ano de 2021 marcou o começo da Década da Ciência infraestrutura, ambiental e social da Estratégia Federal de Desenvolvimento para
Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030), também chamada o Brasil, no período de 2020 a 2031, instituída pelo Decreto nº 10.531/2020,
de “a Década do Oceano”, proposta pelas Nações Unidas, em 5 de dezembro de de tal modo que o mar seja visto como um aliado importante para suplantar os
2017. Tal iniciativa se insere no escopo da Agenda 2030, qual seja, a promoção variados desafios nacionais estipulados na referida estratégia.
de avanços científicos e tecnológicos, de forma a atingir os seguintes resultados: Com esteio nas colocações apontadas, faz-se oportuno compartilhar com
oceano limpo, saudável e resiliente, previsível, seguro, sustentável e produtivo, os estimados leitores algumas indagações: como podemos estimular a
transparente e acessível e conhecido e valorizado por todos. competitividade da economia brasileira não apenas nos setores tradicionais da
A Diretoria-Geral de Navegação (DGN), criada em 1968, é um Órgão de Direção Economia do Mar, mas também nos setores que têm emergido no contexto da
Setorial da Marinha do Brasil e atua como um elo do Poder Marítimo, com Economia Azul? Quais são as oportunidades econômicas advindas da promoção
vistas à manutenção de uma forte interlocução, com a comunidade marítima. da Economia Azul? Como pode o Brasil transicionar para uma perspectiva de
Nessa direção, a DGN apresenta diversas atuações importantes, voltadas para a Economia Azul? Quais ações políticas são necessárias para acelerar essa transição?
Amazônia Azul, no tocante às atividades marítimas, à segurança da navegação, à Tais provocações não se restringem apenas à realidade brasileira, muitos países se
salvaguarda da vida humana no mar e em águas interiores, à prevenção da poluição encontram imbuídos das mesmas reflexões ora demarcadas.
hídrica por embarcações e instalações de apoio, à hidrografia, à oceanografia Cumpre ressaltar, ainda, que a presente obra não pretende esgotar a temática, de
e à meteorologia marinha, de modo a contribuir para o desenvolvimento da modo a exaurir todas as questões referentes à Economia Azul. Contudo, almeja-se,
Economia Azul e em apoio à política externa do país. por meio desta produção científica, a construção de uma contundente contribuição
Nesse sentido, a DGN, por meio de sua Assessoria de Espaços Marinhos e à análise de questões fundamentais para o contexto marítimo brasileiro.
Mentalidade Marítima, coordenou esta obra científica inédita, intitulada Economia Por fim, objetiva-se que este livro trace seus rumos na direção de um relevante
Azul: vetor para o desenvolvimento do Brasil. Este livro foi idealizado no intuito instrumento educacional, de forma a constituir uma referência acadêmica
de acentuar a relevância da Economia Azul para o país. É embasado por quatro no âmbito do ensino nacional, com vieses aplicados ao desenvolvimento da
renomados doutores, responsáveis pela coordenação científica, e um corpo de mentalidade marítima brasileira, bem como aviste oportunidades no cenário
oitenta e três autores, espalhados pelas diversas regiões do país e diferentes econômico internacional.
instituições. Ademais, está alinhado ao ideário de promoção da conscientização Faço votos de uma excelente leitura!
cívica acerca do papel essencial que os oceanos desempenham no equilíbrio do
“O futuro do Brasil está no mar”.
planeta, o qual consta do cerne do programa “Cultura Oceânica para Todos”, da
Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO.
WLADMILSON BORGES DE AGUIAR
Desse modo, assenta-se que esta publicação apresenta dados e caminhos para Almirante de Esquadra
o aproveitamento sustentável das potencialidades da Economia Azul brasileira e Diretor-Geral de Navegação
SUMÁRIO

Seção III – O Conhecimento que Precisamos para a


Economia Azul que Queremos 374
Capítulo 19 - Observação dos Oceanos: Por que Monitorar Permanentemente
os Oceanos Atlântico Sul e Tropical? 377
Introdução 22 Capítulo 20 - Oceano e Clima: Novos Desafios Advindos com as Mudanças Climáticas 397
Perfil dos Autores 29 Capítulo 21 - Da Observação à Utilização de Dados 431
Seção I - Conceitos, Métodos e Agenda Global 36 Capítulo 22 - Tecnologias Inovadoras 459
Capítulo 23 - Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha, Bioprospecção,
Capítulo 1 – Economia e o Mar: Conceitos e Definições 38
Fármacos e Derivados 481
Capítulo 2 – Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 57
Capítulo 24 – SISGAAz, uma Visão Estratégica de Monitoramento e Proteção
Capítulo 3 – Instrumentos Econômicos e Financeiros Aplicados à Economia Azul 71
de nossa Economia Azul 505
Capítulo 4 – Amazônia Azul: A Elevação do Rio Grande como Oportunidade
Capítulo 25 - Tecnologias Nucleares para o Mar 531
para Refletir sobre a Mineração Offshore no Brasil 87
Capítulo 26 - Nova Organização Social para o Mar 549
Capítulo 5 – Economia Azul e a Agenda 2030 103
Capítulo 6 – Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 119 Seção IV – A Contabilidade Nacional Azul e as Atividades do Capital Oceânico 566
Capítulo 7 – Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 137
Capítulo 27 - O Brasil do Mar e da Costa: Uma Abordagem Econômica 568
Capítulo 8 – Cultura Oceânica para a Economia Azul 151
Capítulo 28 - Alternativa de Financiamento para a Economia Azul Brasileira 589
Seção II - Governança e Regulação do Oceano 170 Capítulo 29 - Design de Negócios Azuis (DNA): Uma Metodologia de Identificação
de Setores de Negócios para os Municípios Costeiros Brasileiros 605
Capítulo 9 - Governança do Oceano: as Balizas da História e a Estrutura
Capítulo 30 - Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás ao longo da
do Sistema Internacional 172
Margem Continental Brasileira 623
Capítulo 10 - A Governança do Oceano como Vetor de Comunicação:
Capítulo 31 - Energias Renováveis no Oceano 649
Transporte e Dados 191
Capítulo 32 - Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária: Uma
Capítulo 11 - A Regulação do Mar: Consolidação e Perspectivas 211
Perspectiva Econômica 669
Capítulo 12 - A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial Marinho para
Capítulo 33 - Indústria Naval Brasileira: Panorama Atual e Ponderações
a Economia Azul 231
para o Futuro 695
Capítulo 13 - A Gestão da Zona Costeira do Brasil e a Economia Azul 251
Capítulo 34 - Segurança, Defesa e Economia do Mar 713
Capítulo 14 - A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 277
Capítulo 35 - A Exploração Pesqueira na Zona Econômica Exclusiva Brasileira 731
Capítulo 15 - Mentalidade Marítima e Desenvolvimento Nacional 305
Capítulo 36 - Turismo Azul no Brasil: Aspectos Conceituais e Caracterização 759
Capítulo 16 - Políticas Públicas voltadas ao Mar: Um Longo Caminho já Iniciado 319
Capítulo 37 - Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas (RM) Litorâneas
Capítulo 17 - Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar no Brasil e no Mundo 341
Associadas à Economia do Mar e Costeira 779
Capítulo 18 - O Brasil no Arranjo de Poder da IMO e o Encorajamento para uma
Atuação mais Expressiva por meio do Soft Power pela Tecnologia 363 Créditos das Fotos Ilustrativas 814
INTRODUÇÃO inclusiva, plural, sob perspectivas temáticas autores internacionais. Uma obra de con-
transversais e sinérgicas, mas também regio- solidação científica, revisão por pares que
nais, que agregassem conhecimento de for- perdurou quase dois anos de elaboração
ma ampla. Assim, as quatro seções organiza- e revisão antes de seu lançamento. Dessa
das no livro (“Conceitos, Métodos e Agenda forma, é com grande satisfação que ofer-
Global”, “Governança e Regulação do Ocea- tamos essa singela contribuição à consoli-
no”, “O conhecimento que precisamos para dação da ciência e do conhecimento sobre
Thauan Santos
a Economia Azul que queremos” e “A Con- a economia azul brasileira (e sua interação
André Panno Beirão tabilidade Nacional Azul e as Atividades do internacional) e que se estrutura nas se-
Moacyr Cunha de Araújo Filho Capital Oceânico”) foram idealizadas para guintes seções e capítulos.
Andréa Bento Carvalho serem complementares buscando trazer res-
postas aos seguintes indagamentos iniciais:


SEÇÃO

O que já sabemos sobre essa nova e cres- 1


cente área científica em termos conceituais
e metodológicos, além de como a agenda
A partir de meados do século XX, é in- Entretanto, cabe destacar que essa
global bem contemplando essas discussões,
questionável a crescente relevância temática abordagem mais relacionada à identifica-
e – como inicialmente apontado – por que
que o mar vem adquirindo, seja internacio- ção de potencialidades, realidades e neces-
a temática marítima conjugando economia
nalmente, com movimentos e fluxos claros sidades de alavancagem econômica com o
e desenvolvimento sustentável é crescente?


de relevância mundial; seja nacionalmen- mar, de forma racional e sustentável, tem
te, com uma mirada mais acurada sobre sido objeto de aprofundamento teórico, Como essa magnitude de possibilidades
o quanto o mar é relevante ao desenvolvi- aplicado e de estudo recente – no Brasil e de exploração sustentável pode ser geren-
mento dos países. Internacionalmente, tal no mundo. De fato, há uma escassa biblio- ciada de forma sinérgica, o que já se regula
protagonismo vê-se presente, por exemplo, grafia internacional efetivamente focada na internacionalmente e nacionalmente?
na inclusão de objetivos do desenvolvimen-
to sustentável da chamada Agenda 2030
economia do mar. No Brasil, contudo, ela
é ainda mais escassa e recente. O desafio • Se muito já conhecemos, ainda há mui-
to por conhecer em relação ao oceano? E
da Organização das Nações Unidas (ONU), assumido na concepção e consecução da Na seção 1, são apresentadas as princi-
ainda, como a ciência e suas perspectivas
pela indicação da década 2021-2030 como presente obra, portanto, fora árduo! Tarefa pais questões teóricas, conceituais e de po-
podem ajudar nesse desenvolvimento sus-
a “Década da Ciência Oceânica para o De- desafiadora que aceitamos empreender! lítica internacional, que nortearão boa parte
tentável da economia azul?


senvolvimento Sustentável”, ou mesmo pela Para consolidar uma obra de tamanha das discussões que se seguem ao longo do
realização recente de duas Conferências das envergadura, complexidade e alcance, as- Como estamos em termos de conheci- livro. Para tal, o capítulo 1 apresenta os con-
Nações Unidas para os Oceanos, em 2017 pectos práticos de gestão e de financiamen- mento e mensuração do que exploramos no ceitos e as definições relacionados à eco-
e 2022. Nacionalmente, essa relevância se to, além de apoio editorial e institucional, mar, seja diretamente ou indiretamente? nomia azul, com base em pesquisa biblio-
deve por sua crescente importância – como eram necessários e, de forma bastante sinér- métrica, cobrindo mais de sessenta anos de
diz o título da obra – como vetor para o de- gica e colaboradora, foram fundamentais os Ou seja, trata-se de uma obra que con- pesquisa na temática. O capítulo 2, de modo
senvolvimento do Brasil. É inegável que este apoios de coordenação, financiamento e templa um amplo conhecimento pouco similar, evidencia os diferentes métodos e
país nasceu a partir do mar e, por conse- editoração da Diretoria Geral de Navegação consolidado no Brasil. Para isso, não havia indicadores econômicos utilizados na litera-
quência, essa porta que se abre generosa- da Marinha do Brasil (DGN-MB), de patro- como realizar uma obra superficial e não tura internacional e nas políticas voltadas ao
mente no tempo presente é fundamental, cinadores do projeto e da editora Essential científica. Por isso, é uma obra densa que mar. Ambos os capítulos são responsáveis,
tanto em termos de ligação com o resto do Idea, que já vem se consolidando com forte congrega mais de 35 capítulos, quase uma portanto, pelo enquadramento dos recortes
planeta, quanto no que se refere às oportuni- portfólio de obras na temática marítima. centena de autores, privilegiando a autoria teóricos e metodológicos que protagonizam
dades de exploração dos recursos marinhos e Nós, os quatro organizadores, procu- nacional, que conhece nossas particularida- as discussões conduzidas nos demais capí-
da promoção das atividades marítimas. ramos delinear a obra de forma bastante des, mas sem prescindir da colaboração de tulos e nas demais seções desta obra. Em

22 23
seguida, o capítulo 3 destaca os diferentes SEÇÃO ainda há longo caminho por se percorrer. Já uma de suas mais relevantes organizações
instrumentos econômicos (impostos, taxas,
encargos, subsídios, sistemas de licenças ne-
2 o capítulo 12 aprofunda-se na explicação da
necessidade de bem se conhecer o que se
internacionais específicas – a Organização
Marítima Internacional (IMO) – e como o Bra-
gociáveis, e pagamento por serviços ecossis- pode fazer e, como se pode fazer, tal ati- sil tem se posicionado nesse amplo fórum de
têmicos – PSE) e financeiros (investimento de vidade em cada lugar desse mar que nos debates. Assim, a seção procura emoldurar
impacto, dívida, equity, financiamento mis- margeia – a necessidade de um bom pla- como o globo tem balizado a economia azul
to e subsídios) aplicados à economia azul. Já nejamento espacial marinho (PEM), inclusi- e como o Brasil tem se esforçado em alavan-
o capítulo 4 analisa o caso brasileiro, desta- ve apontando como o mundo tem evoluído car essa maritimidade.
cando a relevância da Amazônia Azul, parti- nesse planejamento. O capítulo 13 passa a
cularmente no contexto da Elevação do Rio tratar uma típica solução nacional de geren- SEÇÃO
Grande (ERG), e endereça especificamente o
desafio da mineração offshore no Brasil.
ciamento das regiões urbanas litorâneas e o
mar próximo, aprofundando nas peculiari- 3
Os capítulos 5, 6, 7 e 8 lidam com grandes dades do gerenciamento costeiro nacional e
questões da agenda global. O capítulo 5, seu aproveitamento econômico sustentável.
por exemplo, destaca o papel da Agenda Por sua vez, o capítulo 14 ressalta um dos
2030 e de seus 17 Objetivos de Desenvol- A seção 2, já após a conceituação fun- maiores problemas da relação humana com
vimento Sustentável (ODS) sobre a vida e damental apresentada na seção 1, procura o mar – a poluição marinha – principalmen-
os recursos marinhos, além de sobre as mostrar como tem (e se tem) sido gerencia- te a decorrente de despejos oriundos de ter-
atividades marítimas, evidenciando sua da essa economia azul pelos diversos atores ra que, proporcionalmente, é muito superior
interface com diferentes ODS. Na sequên- partícipes dessa governança do mar, que à também decorrente de meios marítimos.
cia, o capítulo 6 reforça a necessidade de pertence, sinergicamente, tanto aos interes- O capítulo 15 remete a um clamor funda-
se promover uma governança do mar no ses nacionais quanto a todo o planeta. Isso mental – o brasileiro precisa acolher o mar 374 A ECONOMIA AZUL Uma Ciência Azul 375

contexto da Década da Ciência Oceânica se deve à crescente preocupação de que como sua prioridade, seja para conhecê-lo
para o Desenvolvimento Sustentável, tam- não basta explotar recursos, devendo essa e preservá-lo, seja como oportunidade de A seção 3 descreve a Economia Azul
bém conhecida como “Década do Ocea- utilização ser gerenciada de forma racional, desenvolvimento – por isso, evoca à menta- como uma economia baseada no “conhe-
no”, destacando as iniciativas brasileiras que atenda tanto ao desenvolvimento na- lidade marítima nacional e sua evolução. Em cimento”, na qual dados e informações
nesse contexto. Já o capítulo 7 reforça a cional quanto à sustentabilidade do planeta seguida, o capítulo 16 aponta as principais são capazes de orientar a obtenção de so-
relevância da governança e traz a contri- e às novas gerações. Para tanto, o capítulo 9 opções nacionais, expressas “no que o país luções para os desafios presentes e futuros
buição da cooperação e da diplomacia do traz essa abordagem fundamental de todos deseja para o mar”, em suas políticas públi- da nossa sociedade. O foco da seção é, por-
oceano no contexto da atual agenda de os múltiplos atores que interagem na gover- cas de mais alto nível; apresentando a com- tanto, reconhecer as diversas necessidades
desenvolvimento sustentável global; além nança do oceano, sendo essa uma tendên- plexidade de construção contínua e crescente e estimular a discussão sobre como buscar
disso, destaca oportunidades para a diplo- cia global. O capítulo 10 resgata a principal dessa regulação nacional desejada. O capítu- esses futuros usuários e motivar o maior
macia científica no contexto da economia utilização dos mares – seu meio de comuni- lo 17 mostra que esse movimento científico- nível de suporte possível para o interesse
azul pensando o caso do Brasil. Por fim, o cação de bens e pessoas – portanto, aborda -tecnológico-sustentável-econômico voltado do país mirando uma Economia Azul. No
capítulo 8 analisa as contribuições da cul- como essas linhas de comunicação têm evo- ao mar tem despertado múltiplos interesses capítulo 19 é apresentado um panorama
tura oceânica (ocean literacy) para a pro- luído, inclusive, com nova perspectiva que é e crescentes arranjos, tanto internacionais – de algumas iniciativas brasileiras em curso,
moção da economia azul, com particular o “transporte de dados” por cabos submari- exemplificados –, quanto nacionais, com di- envolvendo órgãos federais, universidades,
atenção à interface com o setor privado e nos. O capítulo 11 refaz a trajetória difícil de versos exemplos inovadores, sublimando que algumas empresas privadas, com foco nas
o comprometimento com um futuro sus- regulação internacional do uso dos mares. algumas unidades federativas têm empres- iniciativas associadas ao monitoramento
tentável. Em seguida, a próxima seção visa Mesmo cobrindo mais de 70% da superfície tado relevante esforço nessa maritimidade oceânico. É dado destaque ao Programa
a analisar a base normativa para a maioria terrestre, somente no século XX pode-se crescente. Por fim, capítulo 18 procura res- GOOS-Brasil, coordenado pela Marinha
das discussões, à luz das contribuições da considerar que essa consolidação regu- gatar como o mundo tem procurado atuar do Brasil (MB), correspondendo ao sistema
governança e da regulação do oceano. latória começou a se estruturar, mas que na regulação do uso do mar, fazendo uso de mais longevo existente em âmbito nacional,

24 25
subsidiando ações que visem à maximiza- SEÇÃO um modelo, nomeado, Design de Negó- bal Biodiversity Information Facility (GBIF)
ção dos benefícios socioeconômicos e ao
retorno seguro do investimento público na 4 cios Azuis, para identificar setores e ativi-
dades econômicas mais compatíveis aos
e a Global Fishing Watch. No capítulo 36
o turismo costeiro é destacado através de
área da Economia Azul. No capítulo 20 é territórios dos municípios costeiros. O capí- uma abordagem econômica e de identifi-
abordado, a partir de exemplos concretos, tulo 30 empenha-se em apresentar o esta- cação das áreas potencialmente beneficia-
o estado da arte da compreensão de alguns do da arte das ocorrências de hidratos de das pelo turismo azul, sem antes propor
dos principais fenômenos geofísicos asso- gás na margem continental, destacando uma definição de turismo azul de acordo
ciados às mudanças climáticas que possuem sua abundância nos oceanos e a projeção com as características das economias das
consequências importantes sobre o oceano de possível substituição progressiva do regiões brasileiras. Por fim, o capítulo 37
e o clima e, consequentemente, sobre os gás natural. No capítulo 31 destacam-se ocupa-se em expressar o perfil do traba-
diferentes setores da economia do país. O as possibilidades vislumbradas no espaço lhador associado às atividades litorâneas
capítulo 21 enfoca que processos oceânicos SEÇÃO
567
oceânico para o aproveitamento energéti- da zona costeira metropolitana brasileira.
e escalas são observados e como essas ob- 566 ECONOMIA
566 ECONOMIAAZUL
AZUL
4
OOBrasil
Brasildo
doMar
Mareeda
daCosta
Costa 567
co renovável, entre eles, as fontes de ener- Neste sentido, são abordados aspectos
servações são (ou podem ser) utilizadas para gia de onda e corrente de maré e o grande das ocupações classificadas como costei-
prover apoio à Economia Azul no Brasil. O A seção 4 da obra aprofunda-se nas interesse e planejamento de empreendi- ras e do mar, considerando variáveis como
capítulo 22 aborda algumas das principais questões mais econômicas e mensuráveis mentos em parques eólicos offshore em escolaridade, gênero, idade, salário, ad-
tecnologias inovadoras necessárias para da Economia Azul brasileira. Ressaltando diferentes países, inclusive no Brasil. O ca- mitidos e desligados à luz das estatísticas
o desenvolvimento da Economia Azul. Já que existem poucos dados estatísticos pítulo 32 é dedicado ao transporte marí- oficiais nacionais.
no capítulo 23 é analisado o potencial dos específicos sobre a contribuição do mar timo e infraestrutura portuária, evidencia Desta forma, ainda que haja um longo
biorrecursos marinhos, muitos deles ainda para a economia brasileira, reforçando a o importante papel econômico, pois ope- caminho a percorrer tanto em termos de
inexplorados, como fonte de novos produ- importância da obra. Assim, o capítulo ram, por exemplo, como meios integrado- melhor conhecermos e aproveitarmos as po-
tos e processos, e as formas que estes po- 27 apresenta estatísticas concernentes à res das cadeias logísticas locais, regionais tencialidades marítimas que se apresentam
dem ajudar o Brasil a enfrentar os desafios economia marinha e costeira brasileira, e internacionais. O capítulo 33 dedica-se a ao Brasil, dada sua privilegiada posição oce-
globais na promoção da saúde e na geração buscando apresentar, quantitativamente, apresentar um panorama da indústria de ânica, quanto em termos de mapearmos e
de alimentos e de energia. O capítulo 24 o PIB do Mar, sua contribuição ao PIB na- construção naval brasileira, destacando valorarmos toda essa intrincada rede de ex-
apresenta uma visão estratégica de proteção cional, bem como o contingente de tra- sua evolução e importância socioeconô- ternalidades, espera-se que a presente obra
e monitoramento de nossa Economia Azul. balhadores formais e informais, especial- mica para o país. No capítulo 34 são en- apresentada seja um relevante marco ao co-
No Capítulo 25 são apresentadas e discuti- mente comparando com dados anteriores fatizadas contribuições que a Segurança e nhecimento científico e em perspectiva sobre
das as diversas tecnologias, que envolvem por meio de uma Matriz Nacional de In- a Defesa prestam à atividade econômica o valor da economia azul para o desenvolvi-
reações e processos nucleares, que foram sumo-Produto que criou os setores mari- sustentável no ambiente marítimo. O ca- mento nacional. Contando com a contribui-
criadas e aprimoradas ao longo dos anos, nhos, denominada Matriz Insumo Produto pítulo 35 enfatiza a análise da distribuição ção de especialistas de diferentes áreas do sa-
seus espectros de aplicação e sua utilização do Mar do Brasil (MIPBr Mar), enfatizando espacial das frotas pesqueiras no mar bra- ber, o livro busca apresentar uma abordagem
no ambiente marinho. Por fim, no capítulo que tal método -Matriz Insumo Produto - sileiro visando a contribuição com os sub- nacional e, particularmente, interdisciplinar
26 são apresentadas as informações preli- é utilizado pelo Instituto Brasileiro de Ge- sídios para o planejamento espacial e or- para dar conta dos complexos desafios e das
minares sobre as ações empreendidas pelo ografia e Estatística (IBGE) para mensurar denamento da pescaria. É dado destaque diversas oportunidades para a promoção da
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações o PIB brasileiro. O capítulo 28 propõe uma para bases de dados como o Ocean Biodi- economia azul do Brasil como vetor de de-
(MCTI) e demais instituições com interesse na ferramenta de financiamento atual e efe- versity Information System (OBIS), o Glo- senvolvimento sustentável brasileiro.
pesquisa oceânica, em prol da qualificação tiva para a economia azul brasileira dada
de uma Organização Social (OS), cuja missão a pouca discussão da oferta firme de re-
será a de promover as ciências do mar de for- cursos financeiros, suas origens, seus ins-
ma integrada e transdisciplinar, permitindo o trumentos e as possibilidades estratégicas
enfretamento dos desafios nacionais nessa para que se garanta um retorno apropriado
área em prol de um oceano sustentável. aos projetos. No capítulo 29 é apresentado

26 27
PERFIL DOS AUTORES

Organizadores
Thauan Santos – Organizador da Seção I
Professor Adjunto de Economia do Programa de Pós-Graduação em Estudos Marítimos da Escola
de Guerra Naval (PPGEM/EGN) e Coordenador do Grupo Economia do Mar (GEM). Economista
(UFRJ), mestre em Relações Internacionais (PUC-Rio) e doutor em Planejamento Energético (COPPE/
UFRJ)
André Panno Beirão – Organizador da Seção II
Doutor em Direito Internacional pela UERJ. Mestre em Ciências Navais (EGN) e em Ciência Políti-
ca (UFRJ). Professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos Marítimos da Escola de Guerra
Naval (Mestrado e Doutorado Profissionais), Coordenador do Observatório de Políticas Marítimas.
Moacyr Cunha de Araújo Filho – Organizador da Seção III
Professor Associado do Departamento de Oceanografia e Vice-reitor da Universidade Federal
de Pernambuco – UFPE. Coordenador da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climá-
ticas Globais – Rede CLIMA.
Andréa Bento Carvalho – Organizadora da Seção IV
Professora Adjunta do Instituto de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis da Univer-
sidade Federal do Rio Grande (ICEAC/FURG). Doutora em Economia pela PUCRS (2018). Mestre
em Geografia pela FURG (2011). Economista pela Universidade Federal de Pelotas (2008).

Autores
Adolpho Herbert Augustin Aldo Aloísio Dantas da Silva
Geólogo pela UFRGS (2005). Mestre em Geo- Geógrafo. Professor Titular do Departamen-
química pela UFRGS (2007). Atua na área de to de Geografia da UFRN. Especialista e Pes-
geofísica marinha há 11 anos no IPR/PUCRS. quisador na área de Planejamento e Análise
Coordena e participa de missões oceanográfi- Territorial.
cas para coleta de dados geofísicos e amostras
de hidratos de gás. Alexandre Rocha Violante
Professor Colaborador em Relações Interna-
Adriana Isabelle Barbosa de Sá Leitão
cionais do INEST-UFF. Instrutor de Relações
Doutoranda em Direito Comercial, Direito In-
Internacionais da Escola de Guerra Naval e
ternacional e Europeu e Processo na Universi-
Coordenador Executivo do Centro de Estudos
tà di Pisa – Itália. Mestra e Bacharela em Direi-
Estratégicos e Planejamento Espacial Marinho
to pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
(CEDEPEM).
Estagiária do Centro Internacional de Direito
Ambiental Comparado (CIDCE). Pesquisadora Ana Flávia Barros-Platiau
do DIsF, do GEDAI/UFC e do CEDMAR/USP. Doutora em Relações Internacionais pela
Adriano Roessler Viana Université de Paris I (Panthéon-Sorbonne).
Geólogo pela Universidade Federal do Rio Gran- Professora Associada da Universidade de Bra-
de do Sul. Doutor em Sedimentologia e Geo- sília, no Instituto de Relações Internacionais.
logia Marinha pela Universidade de Bordeaux, Diretora do Brasilia Research Centre do Earth
França. Atua na Petrobras desde 1986 e, no System Governance. Pesquisadora do Centro
momento, na Academia da Exploração. de Estudos Globais da UnB.

29
Andrei de Abreu Sodré Polejack Legislativo no Senado Federal para as áreas de Geólogo de acompanhamento na EXLOG (Labomar) da Universidade Federal do Ceará
Pesquisador da World Maritime University Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano. (BAKER). Atualmente coordena o grupo de (UFC). Atua nas áreas de Dinâmica Oceâni-
(ONU) e Analista Sênior do Ministério da Ci- Doutorando no Instituto de Relações Interna- geoquímica de superfície no Centro de Pes- ca, Interações Oceano-Atmosfera, intercone-
ência, Tecnologia e Inovações, atuando nos cionais da Universidade de Brasília. quisas da Petrobras (CENPES). xões entre os oceanos tropicais e previsibili-
temas afetos ao papel da ciência na gover- Caroline Schio Eduardo Rodrigues Sanguinet dade climática.
nança do oceano e da Antártica. Recente- Presidente do Instituto Monitoramento Mi- Bacharel em Economia (UFSM). Mestre em Giovanni Roriz Lyra Hilliebrand
mente tem se dedicado ao estudo da diplo- rim Costeiro. Bacharela em Oceanografia. Desenvolvimento Rural (UFRGS). Doutor em Professor de Relações Internacionais no Insti-
macia científica no oceano. Pós-Graduação em Economia e Gestão Pes- Economia Aplicada (menção em Estudios Re- tuto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e
Andréia Pereira de Freitas queira. Mestre em Agroecossistemas. Douto- gionais – UCN, Chile). Doutor em Economia do Pesquisa (IDP). Doutorando em Relações Inter-
Doutora e Mestre em Economia do Desen- randa em Didática das Ciências na Universi- Desenvolvimento (concentração em Economia nacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e
volvimento pela PUCRS. Especialista em Eco- dade de Lisboa. Regional – PUCRS), Pós-Doutor em Economia membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em
nomia e Finanças pela UFRGS. Economista Cláudia Maria Resende de Souza (USP). Atualmente é Professor e Pesquisador do Segurança Internacional (GEPSI/UnB). Atua na
pela Faculdade Integrada Candido Mendes Advogada pela UCAM. MBA em Direito da Instituto de Economia Agraria da Universidad área de Política Internacional.
(FCM). Atua como pesquisadora nas áreas Economia e da Empresa pela FGV-RJ e Dou- Austral de Chile.
Giselle Pinto de Faria Lopes
de índices econômicos, mercado de traba- toranda em Biotecnologia e Biodiversidade Fabiana Abreu di Valle Ventura Piassi Biomédica. Mestre e Doutora em Ciências
lho e inovação. pela UnB. Representante em conselhos fe- Doutoranda em Ciências Jurídicas Internacio- Morfológicas (UFRJ) com Doutorado San-
Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho derais e fóruns internacionais nas áreas de nais e Europeias pela Faculdade de Direito da dwich na França. Pós-Doutora em Oncologia
Consultor Técnico da Amazul. Assessor Especial biodiversidade, biotecnologia, oceanos, ex- Universidade de Lisboa (FDUL). (INCA) e Bioprospecção (UFBA) com período
da Agência Naval de Segurança Nuclear e Qua- tensão da plataforma continental jurídica Fábio Nascimento de Carvalho Sandwich em Taiwan. Pesquisadora Associada
lidade – AgNSNQ/MB. Professor Titular (aposen- brasileira e exploração mineral marinha. Pesquisador da COPPE/UFRJ desde 1989. En- e docente da Pós-Graduação em Biotecnolo-
tado) do Instituto de Física da UFRJ. Professor Claudio Coreixas de Moraes genheiro Eletrônico. Mestre em Instrumenta- gia Marinha da UFF/IEAPM.
Colaborador do CBPF. Ex-Presidente do CNPq; Capitão de mar e guerra do Corpo da Arma- ção Oceanográfica e Doutor em Hidrodinâ- Guilherme da Silva Sineiro
ex-Diretor da ABDI, Finep, CNPEM e Inmetro. da. Comandou o AvIn GM Jansen da Escola mica. Atua em Instrumentação e coordena o Assessor Especial da AgNSNQ. Assessor do
Carlos Alessandre Domingos Lentini Naval. Mestre em Modelagem e Simulação programa Melhores Práticas na Observação Núcleo do Escritório de Desenvolvimento
Doutor em Oceanografia Física e Meteorologia em Ambientes Virtuais na Naval Postgraduate do Oceano do GOO-Brasil. Tecnológico Industrial da Marinha (NuED-
pela Rosenstiel School of Marine and Atmos- School (NPS) em Monterey, CA (EUA). Dou- Fabrice Paul Antonie Hernandez TI). Gerente Participante dos EM 19 e 20 do
pheric Science da Universidade de Miami, EUA. torando na COPPE/UFRJ em Simulação Hidro- PhD em Oceanografia. Pesquisador do Institut PROSUB. Chefe do Departamento de P&D
Desde 2007, é Professor do Departamento de dinâmica. Gerente de desenvolvimento de de Recherche pour le Développement (IRD, do IPqM. Assessor Técnico do Grupo de Es-
Física da Terra e do Meio Ambiente do Instituto simuladores da MB. França). Membro do comitê da PIRATA (Fran- pecialistas Técnicos do Regime de Controle
de Física da Universidade Federal da Bahia. Claudio da Silva Tarrisse Fontoura ça). Especialista em sensoriamento remoto, de Tecnologia de Mísseis (Missile Technology
Carlos Alberto Eiras Garcia Bacharel em Engenharia Naval (1978). Atua na oceanografia operacional e tropical. Atua no Control Regime – MTCR).
Bacharel em Física pela Unicamp. Mestre e Diretoria de Engenharia Naval – Comando da Brasil como Professor Visitante no Departa- Guilherme Lopes da Cunha
Doutor em Oceanografia pela Universidade de Marinha desde 1979. Atualmente é Assessor mento de Oceanografia da UFPE desde 2018, Professor Adjunto e Coordenador Acadêmico
Southampton (UK) e Pós-Doutor em Sensoria- da Diretoria. Cursou a ESG – Curso de Altos em colaboração com o IRD. da Divisão de Assuntos Militares da Escola Su-
mento Remoto dos Oceanos pela GSFC/NASA Estudos de Política e Estratégia (2015). Frederico Medeiros Vasconcelos De Albu- perior de Guerra (ESG), Ministério da Defesa.
(USA). Coordena o Sistema de Monitoramento Clemente Augusto Souza Tanajura querque Pós-Doutor em Relações Internacionais pelo
da Costa Brasileira (SIMCosta). Especialista em assimilação de dados oceano- Bacharel pela EN (1998). Mestre em Pesquisa Instituto de Relações Internacionais (UnB).
Carlos Henrique de Lima Zampieri gráficos e modelagem oceânica atmosférica. Operacional pela UFRJ (2011). Curso Avança- Doutor e Mestre em Economia Política Inter-
Contra-Almirante. Doutor em Ciências Navais Professor Associado do Instituto de Física da do de Estado-Maior na Escola de Guerra de nacional (UFRJ).
pela Escola de Guerra Naval. MBA de Adminis- UFBA. Vice-Coordenador da REMO e mem- Minas belgo-holandesa (EGUERMIN-2012). Gustavo Calero Garriga Pires
tração de Empresas com Ênfase em Gestão pela bro do Comitê Científico do OceanPredict. Foi Assessor de Espaços Marinhos e Mentalida- Contra-Almirante, comandou o Navio-Patru-
Fundação Getúlio Vargas. Atualmente, exerce o pesquisador do LNCC/MCTI. de Marítima da Diretoria Geral de Navegação lha Gurupá, a Fragata União, o Navio-Esco-
cargo de Subchefe de Assuntos Marítimos do Dennis James Miller em 2021 e Capitão dos Portos de Pernambu- la Brasil e o Centro Integrado de Segurança
Estado-Maior da Armada. Bacharel em Geologia pela Northern Arizo- co de 2022 a 2024. Marítima (CISMAR). Atualmente exerce o car-
Carlos Henrique Tomé na University (EUA-1984) e Mestre em Siste- Gbekpo Aubains Hounsou-Gbo go de Comandante de Operações Marítimas
Engenheiro Civil e Advogado. Consultor mas Petrolíferos pela UFRJ – COPPE (2006). Professor no Instituto de Ciências do Mar e Proteção da Amazônia Azul (COMPAAz) e

30 31
de Subchefe de Operações do Comando de mestre em Estudos Estratégicos (PPGEST/UFF). científicos nas temáticas de gerenciamento Luiz Frederico Rodrigues
Operações Navais. Pesquisadora do Núcleo de Avaliação da Con- costeiro e geoprocessamento. Doutor em Química Analítica pela UFSM
Gustavo Inácio de Moraes juntura (NAC) da Escola de Guerra Naval; e do Karen de Oliveira Silverwood Cope (2010). Pós-Doutor em Geoquímica Isotópica
Doutor em Economia Aplicada pela ESALQ- Grupo Economia do Mar (GEM), no subgrupo Especialista em Políticas Públicas e Gestão pela UFF (2016). Foi Geoquímico na PUCRS
-USP. Mestre em Desenvolvimento Econômico de Construção e Reparação Naval. Governamental do Ministério da Economia (2010-2022). Atualmente é Professor Visitan-
pela UFPR (2005) e Bacharel em Ciências Eco- João Batista Barbosa no Governo Federal em temas relacionados te da FURG na Escola de Química e Alimentos.
nômicas pela FEA-USP (1999). Atualmente é Comandante do Navio Patrulha Poti e do ao meio ambiente e mudança do clima des- Marcelo Francisco de Nóbrega
Professor Doutor da PUCRS. Navio Patrulha Roraima. Capitão dos Portos de 2009. Atualmente é Coordenadora-Geral Biólogo. Doutor em Oceanografia Biológica pela
Ilques Barbosa Júnior de Sergipe. Assessor de Defesa no Itamaraty. de Oceano, Antártica e Geociências no Mi- Universidade Federal de Rio Grande. Atualmen-
Na Marinha do Brasil, exerceu 15 cargos de Comandante do Centro Integrado de Segu- nistério de Ciência, Tecnologia e Inovações. te é Professor do Departamento de Oceano-
Comando e Direção, entre os quais Coman- rança Marítima. Atualmente é o Comandan- Karina Simone Sass grafia da Universidade Federal de Pernambuco.
dante-em-Chefe da Esquadra, Diretor-Geral te do Centro de Operações Marítimas (CO- Bacharela em Ciências Econômicas (UFPR). Atua na área de geoprocessamento e dinâmica
do Pessoal da Marinha, Chefe do Estado pMar), cumulativamente com o Comando Mestra em Desenvolvimento Econômico populacional de estoques pesqueiros marinhos.
Maior da Armada e Comandante da Mari- Local do Controle Operativo Brasil. (UFPR). Doutora em Economia do Desenvol- Marcelo José das Neves
nha. Atualmente é assessor da Presidência João Luiz Nicolodi vimento (USP). Atualmente é Pesquisadora na Doutorando em Estudos Marítimos pela Es-
da Transpetro. Doutor em Geociências pela Universidade Fe- Universidade dos Açores (Portugal). cola de Guerra Naval. Mestre em Direito pela
Israel de Oliveira Andrade deral do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor Leandra Regina Gonçalves Universidade Católica de Santos. Pós-Gradua-
Professor universitário. Pesquisador do Insti- do Instituto de Oceanografia da Universidade Professora no Instituto do Mar e da Univer- ção em Direito Marítimo pela Fundação Getú-
tuto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA. Federal de Rio Grande (FURG). Coordenador sidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Bió- lio Vargas – FGV/RJ. Bacharel em Direito pela
Atua em assuntos de soberania e defesa na- do Grupo de Pesquisa vinculado ao CNPq – loga e Doutora em Relações Internacionais. Universidade de Taubaté. Professor de Direito
cional, economia de defesa, base industrial de Grupo de Ações Integradas em Gerenciamen- Há mais de 10 anos pesquisa as diferentes Marítimo na Escola de Formação de Oficiais
defesa e economia azul. Organizador de livros to Costeiro – GAIGERCO. dimensões da gestão e governança costeira da Marinha Mercante (EFOMM/RJ).
e autor de capítulos e artigos científicos sobre João Marcelo Medina Ketzer e marinha. Marcio Borges Ferreira
defesa e segurança, no Brasil e no exterior. Bacharel em Geologia pela Universidade Fe- Doutor em Oceanografia. Capitão de Mar e
Letícia Cotrim da Cunha
Jade Moreira deral do Rio Grande do Sul (1994) e Mestre Professora associada de Oceanografia Quí- Guerra da Marinha do Brasil e Chefe da Di-
Bacharela e licenciada em Geografia pela Pon- em Geociências pela mesma universidade mica da UERJ. Foi coautora do 6º Relatório visão de Pesquisas do Colégio Interamerica-
tifícia Universidade Católica do Rio Grande (1997). Doutor pela Universidade de Uppsa- de Avaliação do Clima do IPCC. Integra a no de Defesa em Washington, D.C. Exerceu
do Sul – PUCRS (2013). Mestre em Geogra- la (Suécia-2002) e Pós-Doutor pelo Instituto Rede Clima desde 2018 e colidera a Rede a função de Assessor de Espaços Marinhos e
fia pela Universidade Federal do Rio Grande Francês do Petróleo (2004). Atualmente é Brasileira de Pesquisa sobre Acidificação dos Mentalidade Marítima na DGN.
– FURG (2021). Atualmente é Doutoranda em Professor Titular do Departamento de Biolo- Oceanos.
gia e Ciências Ambientais da Universidade de Mariana Graciosa Pereira
Geociências – Geologia Marinha pela Univer-
Linnaeus (Suécia). Lohengrin Dias de Almeida Fernandes Mestre em Economia pela Universidade de
sidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Pesquisador-chefe da Divisão de Biotecno- Brasília. Analista Ambiental do IBAMA na Di-
Jaílson Bittencourt de Andrade Jorge Eduardo Lins Oliveira logia Aplicada. Líder do grupo de Microbio- retoria de Licenciamento Ambiental. Atuou
Professor Titular e Pró-reitor de Pesquisa e Doutor em Ciências. Professor Titular da Uni- logia Marinha/Plâncton e Professor do Pro- na Divisão de Assuntos Oceânicos e Direito do
Pós-Graduação do Centro Universitário SENAI versidade Federal do Rio Grande do Norte. grama de Pós-Graduação em Biotecnologia Mar da Organização das Nações Unidas e no
CIMATEC. Pesquisador do CNPq desde 1988, José Antonio Cupertino Marinha IEAPM/UFF. Departamento de Áreas Protegidas do Minis-
atualmente está no nível 1A. Bacharel em Geologia (1978). Doutor em Ci- tério do Meio Ambiente.
Luan Santos
Janice Romaguera Trotte-Duhá ências (D.Sc.) na área de estratigrafia (2000). Pós-Doutor em Economia do Clima e do Meio Marinez Eymael Garcia Scherer
Oceanógrafa, com 36 anos de serviços na MB, Atualmente desempenha a função de asses- Ambiente (Universität Graz, Áustria). Doutor Bióloga. Doutora em Ciências do Mar. Profes-
em cargos no Brasil e no exterior (COI – UNES- sor de pesquisa do Instituto do Petróleo e dos e Mestre em Planejamento Energético e Am- sora e Pesquisadora da Universidade Federal
CO) ligados às Observações Oceânicas. De 2011 Recursos Naturais/PUCRS. biental (PPE/COPPE/UFRJ). Bacharel em Mate- de Santa Catarina (UFSC). Coordenadora do
a 2013, cedida ao MCTI, participou de discus- José Maurício de Camargo mática (IME/UFF) e em Administração (FACC/ Laboratório de Gestão Costeira Integrada –
sões para a criação da OS-INPO. Na DGDNTM, Geógrafo. Técnico Agrimensor e Técnico UFRJ). Professor da Faculdade de Administra- LAGECI. Suas principais áreas de interesse são
contribuiu para a criação da ComTecPolÓleo. em Informática. Mestre em Gerenciamen- ção e Ciências Contábeis (FACC/UFRJ) e do Gestão Integrada da Zona Costeira, Planeja-
Jéssica Pires Barbosa Barreto to Costeiro e Doutor em Geografia. Atua Programa de Engenharia de Produção (PEP/ mento Espacial Marinho, Gestão com Base
Mestre em Estudos Marítimos (PPGEM/EGN) e em consultoria ambiental e projetos técnico- COPPE/UFRJ). Escossistêmica e Gestão da Orla.

32 33
Matheus Assis de Oliveira Fluvial pela Universidade Estadual Paulista UNESP Geodésica e Geomática pela University of Coordenadora do Projeto Meio ambiente
Bacharel em Biologia pela Universidade Fede- – Faculdade Tecnologia de Jahu (FATEC-Jahu). New Brunswick (Canadá). costeiro face a crise do sargassum – Proc.
ral de Pernambuco. Atualmente integra o La- Paschoal Prearo Junior 2019/22201-4 FAPESP. Bolsista de Produtivi-
Rodrigo Fernandes More
boratório de Avaliação e Geoprocessamento Advogado. Pós-Graduado em Direito Am- dade em pesquisa CNPq.
Professor do Instituto do Mar da Universidade
de Estoques Pesqueiros, pesquisando a diver- biental (UCAM). Doutorando em Sistemas de Federal de São Paulo. Taíssi Pepe de Medeiros Farias
sidade taxonômica e funcional da ictiofauna Gestão Sustentáveis (UFF). Professor da Uni-
Rogério de Oliveira Gonçalves Bacharela em Relações Internacionais (UFF).
em Pernambuco na Pós-Graduação em Ocea- versidade Veiga de Almeida (UVA) e da Fun-
Advogado (UnB) e Pós-graduando em Direito Mestra em Estudos Marítimos (PPGEM – Es-
nografia (mestrado) – UFPE. dação de Estudos do Mar (FEMAR). Consultor
Marítimo e Portuário (MLAW, Brasil). Capitão cola de Guerra Naval). Assessora na DGN-MB,
Maurício Pires Malburg da Silveira Técnico-Jurídico e Auditor. tendo atuado no setor marítimo e em institui-
de Mar e Guerra (RM1) da Marinha do Brasil.
Diretor do CASNAV (2017 a 2020). Encarrega- Paulo Nobre ções e empresas públicas, CEPE-MB/AMAZUL
Research Fellow no CEDMAR/USP.
do da Divisão de Sistemas da Subchefia de BS. USP; M.Sc. INPE; Ph.D. University of e EMGEPRON, com participação direta na
Operações do Comando de Operações Na- Ronaldo Adriano Christofoletti fundação do Cluster Tecnológico Naval do RJ.
Maryland, EUA (1993) Meteorologia, Pós-Dou-
vais (2011 a 2017). Responsável pelo desen- Professor do Instituto do Mar da Universidade
tor pela Columbia University, EUA (1999) Ocea- Tiago Vinicius Zanella
volvimento do SisNC2 entre os anos de 1997 Federal de São Paulo (IMAR – UNIFESP). Coor-
nografia. Prof. M.Sc., Dr. INPE; Coordenador de Professor da Escola de Guerra Naval (EGN).
e 2007. Bacharel e Pós-Graduado em Tecnolo- denador do Programa Maré de Ciência. Membro
Projetos PIRATA-BR; SisMOM/MCTI. Membro do Doutor em Ciências Jurídico-internacionais e
gia da Informação. Curso Superior da Escola de do Programa Ocean Literacy With All – Unesco.
Safe Landing Climate Lighthouse Activity WCRP. Europeias pela Faculdade de Direito da Uni-
Guerra Naval. Ricardo Coutinho
Raquel Costa versidade de Lisboa. Presidente do IBD Mar
Miguel Marques Geóloga marinha com especialização em Ci- Pesquisador Titular do Instituto de Estudos do (Instituto Brasileiro de Direito do Mar). Con-
Especialista internacional em assuntos do mar. ências da Educação. Formadora de professo- Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM). Chefe sultor Jurídico da UNODC (Escritório das Na-
Autor de dezenas de estudos internacionais res, editora e revisora de artigos de Literacia do Departamento de Biotecnologia Marinha. ções Unidas para drogas e crimes).
sobre o estado da economia do mar e funda- do Oceano. Coordena o programa nacional Coordenador da Pós-Graduação em Biotec-
Tarin Cristino Frota Mont’Alverne
dor do primeiro centro de excelência mundial Escola Azul do Ministério da Economia e do nologia Marinha do IEAPM/UFF. Pesquisador
Professora da Faculdade de Direito da Univer-
dedicado à economia azul. Mar de Portugal e integra a coordenação do IB (CNPq). Ph.D em Biologia pela University
sidade Federal do Ceará (UFC). Coordenadora
All Atlantic Blue School. of South Carolina (1987). Pós-Doc pela Duke
Milad Shadman do Módulo Jean Monnet. Coordenadora do
University (2003) e WHOI (2004), EUA.
Professor Visitante do Programa de Engenha- Regina Rodrigues Rodrigues Projeto de Pesquisa “Estratégias para a gestão
ria Oceânica da COPPE/Universidade Federal Professora Associada da UFSC na área de Oce- Segen Farid Estefen sustentável dos resíduos plásticos nos mares e
do Rio de Janeiro (UFRJ-2020) pela COPPE/ anografia Física e Coordenadora da Sub-rede Professor Titular de Estruturas Oceânicas e oceanos: contribuições para um diálogo entre o
UFRJ. Faz pesquisas relacionadas à análise das Desastres Naturais da Rede CLIMA. Membra Engenharia Submarina da COPPE – Universi- nacional, o regional e o internacional”, financia-
turbinas eólicas flutuantes, projeto e controle do WGIII do IPCC, do Comitê Científico do dade Federal do Rio de Janeiro. Coordenador do pelo CNPQ. Bolsista por produtividade – PQ.
dos conversores de energia de onda. Programa PIRATA e do corpo editorial da re- do Grupo de Energia Renovável no Oceano.
Vínicius França Machado
vista Nature Comms. Earth & Env. Coordena Fellow American Society of Mechanical Engine-
Natalia Ramos Corraini Gerente Geral de Pesquisa, Desenvolvimento
o Painel Regional do Atlântico do CLIVAR e a ers e Society for Underwater Technology. Mem-
Bacharela em Ciências Biológicas, com habili- e Inovação no CENPES, Centro de Pesquisas
Atividade Meu Risco Climático do WCRP. bro da Academia Brasileira de Engenharia.
tação em Biologia Marinha e Gerenciamento da Petrobras. Bacharel em Engenharia Civil.
Costeiro pela Universidade Estadual Paulista Renato Machado Cotta Sérgio Ricardo da Silveira Barros Pós-Graduado em Engenharia do Petróleo.
(UNESP). Mestre em Oceanografia pela Uni- Engenheiro Mecânico/Nuclear (UFRJ). PhD Mech. Professor Associado da Universidade Fede- MSc em Engenharia Civil pela COPPE e MBA
versidade Federal de Santa Catarina (UFSC). & Aerospace Eng. NCSU (EUA). Doctor Hono- ral Fluminense no Departamento de Análise Executivo pela Fundação Dom Cabral. Atua
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação ris Causae pela Université de Reinms (França). Geoambiental do Instituto de Geociências e há 18 anos em P,D & I nas áreas de Exploração
de Geografia da Universidade Federal de San- Membro da Academia Brasileira de Ciências, da do Programa de Pós-Graduação em Sistemas e Produção de Petróleo.
ta Catarina (UFSC). Academia Nacional de Engenharia e da World de Gestão UFF. Coordenador da REMADS –
William de Sousa Moreira
Academy of Sciences (TWAS). Membro do Con- Rede UFF de Meio Ambiente e Desenvolvi-
Newton Narciso Pereira Professor Doutor do Programa de Pós-Gra-
selho Nacional de Política Energética (CNPE). mento Sustentável.
Professor Adjunto da Universidade Federal Flu- duação em Estudos Marítimos da Escola de
minense lotado na Escola de Engenharia Indus- Rodrigo de Campos Carvalho Solange Teles da Silva Guerra Naval (EGN). Capitão de Mar e Guerra
trial Metalúrgica de Volta Redonda (EEIMVR). Oficial da Marinha do Brasil. Bacharel em Professora da Faculdade de Direito – Gradu- (RM1), é assessor de CT&I da EGN. Doutor em
Pós-Doutor, Doutor e Mestre em Engenharia Eletrônica pela Escola Naval. Graduado no ação e Programa de Pós-Graduação stricto Ciências Navais (EGN) pelo sistema de Ensino
Naval e Oceânica pela USP. Engenheiro de Pro- Curso de Hidrografia pela Diretoria de Hidro- sensu em Direito Político e Econômico – da Naval e Doutor em Ciência Política pela Uni-
dução pela Universidade Guarulhos e Tecnólogo grafia e Navegação. Mestre em Engenharia Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). versidade Federal Fluminense.

34 35
SEÇÃO CONCEITOS, MÉTODOS
1 E AGENDA GLOBAL

36 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 37


1

2. Ciência Econômica e o mar


ECONOMIA E O MAR: CONCEITOS E DEFINIÇÕES
Focando no comportamento dos atores refino: combustíveis hidrocarbonetos), L72
e no conceito de escassez, a percepção da (Mineração, extração e refino: outros re-
Thauan Santos
Ciência Econômica acerca dos diferentes cursos não renováveis), L83 (Esportes, jogos
recursos mudou. Nesse sentido, os mares de azar, restaurantes, recreação e turismo),
e o oceano, que têm papel essencial no O13 (Agricultura, recursos naturais, energia,
1. Introdução desenvolvimento socioeconômico, político meio ambiente, outros produtos primários),
e cultural das sociedades, deixaram de ser Q22 (Pesca e aquicultura), Q25 (Água), Q42
Apesar de ser uma discussão relativamen- bibliométrica1 conduzida em Santos
apenas vias para o comércio internacional (Fontes alternativas de energia), Z32 (Turis-
te recente na literatura da Ciência Econômi- (2021a, 2022), uma vez que tal método au-
e/ou meio para viabilizar a pesca. Conse- mo e desenvolvimento), por exemplo.
ca, que, efetivamente, ganha relevância a xilia na identificação de tendências do co-
quentemente, para além de constituírem No sistema JEL, não existe nenhuma
partir dos anos 2000, existe muita confusão nhecimento e das temáticas/abordagens de
um link entre os diferentes Estados e con- menção aos termos “marinho”, “marí-
da área acerca da real contribuição sobre o determinada disciplina, dispersão de cam-
tinentes, o (re)conhecimento das diferen- timo”, “azul”, “rio”, “mar”, “oceano”,
mar e o oceano. De fato, há uma diversida- pos científicos, autores e instituições mais
tes riquezas presentes nesses ambientes “costa” ou “offshore”, por exemplo. Esses
de de conceitos relacionados à economia do produtivas, e periódicos mais utilizados na
fez com que, há vinte anos, já se afirmasse termos serão discutidos a seguir, dada sua
mar que envolve diferentes atores, setores e disseminação da pesquisa em determinada
que em um futuro (próximo) sua estrutura estreita relação com a Economia do Mar.
políticas. Justamente por isso, é necessário área do conhecimento. O escopo da pes-
fosse comparada aos sistemas produtivos São poucas, inclusive, as menções relativas
começar esta obra esclarecendo tal confusão quisa cobre o período de 1959 a 2020,2 in-
em terra em termos de diversificação e ao termo “água”, recurso natural essencial
e, para isso, é necessário que haja uma defi- cluindo 1.351 documentos, e as seguintes
volume de recursos (SOUVOROV, 1999). a tantas atividades econômicas e industriais.
nição clara sobre esses conceitos. O capítulo perguntas impulsionam os principais resul-
Dessa forma, e pela relativamente recente O termo aparece nos seguintes códigos: L95
seguinte fará exatamente o mesmo esclareci- tados:quais países são mais relevantes em
noção de que os mares e o oceano pode- (Concessionárias de gás, gasodutos, serviços
mento a respeito dos métodos e dados eco- termos de publicações e citações, e como
riam desempenhar uma fonte de riqueza públicos de água.), Q25 (Água), Q53 (Polui-
nômicos para mensuração da economia do isso tem evoluído ao longo do tempo?
e renda ainda maior, o desenho político e ção do ar, poluição da água, ruído, resíduos
mar, de modo que ambos são essenciais para (1) quais são as principais fontes?
a abordagem conceitual para lidar com a perigosos, resíduos sólidos, reciclagem).
a plena compreensão dos debates levados a (2) quais são as palavras-chave mais rele-
questão já nascem eminentemente com- Por toda essa complexidade de ques-
cabo nos demais capítulos deste livro. vantes e frequentes?
plexos e interdisciplinares. tões, existem inúmeras confusões concei-
O termo “economia do mar” foi usado (3) quais são as linhas de pesquisa mais pro-
Pelo fato de a Economia do Mar possuir tuais acerca da Economia do Mar. Com
pela primeira vez na academia na primeira missoras para o trabalho futuro?
interfaces com tantas áreas e subáreas con- pouca literatura nacional sobre o tema, a
metade do século XIX, em publicações de Como resultado dessas perguntas, fa-
sagradas na Ciência Econômica, bem como maioria dos trabalhos se encontra em lín-
Petersen e Jensen (1913) e Clarke (1935). No z-se um mapeamento geral da pesquisa
por permitir estudos de diferentes naturezas gua inglesa e faz menção, muitas vezes,
início da discussão, a abordagem tinha uma relacionada a esta agenda, que permiti-
metodológicas, inexiste um método padro- indiscriminadamente aos seguintes ter-
natureza biológica explícita, que evolui gra- rá compreender a natureza qualitativa de
nizado de classificação da literatura acadê- mos, conceitos e/ou áreas: economia do
dualmente ao longo do tempo. Atualmente, cada conceito. Portanto, este capítulo está
mica no campo econômico no sistema de mar, economia marinha, economia maríti-
conceitos como economia azul, economia estruturado da seguinte forma: após esta
classificação Journal of Economic Literature ma, economia azul, economia oceânica e
marítima, economia marinha, economia breve introdução, a próxima seção apresen-
(JEL) (SANTOS, 2019). Consequentemente, economia costeira, por exemplo.
costeira, economia oceânica e governança ta como a Ciência Econômica tradicional-
os estudos acabam dispersos, dificultando a Após essa breve apresentação do como
do oceano têm sido utilizados como sinôni- mente considera o mar, trazendo os prin-
consolidação de um grupo de profissionais mares e oceano são contemplados nas te-
mos, confundindo discussões na literatura, a cipais resultados da pesquisa bibliométrica.
e pesquisadores do tema. É possível encon- orias e nos métodos econômicos, segue
compreensão da sociedade sobre o assunto Em seguida, são discutidos os conceitos e
trar atividades relacionadas à Economia do resumo dos principais resultados da pes-
e a formulação de políticas públicas. as definições para cada um dos termos utili-
Mar nas seguintes classificações: F13 (Polí- quisa bibliométrica conduzida em Santos
Com o objetivo de contribuir para a com- zados pela literatura, focalizando questões,
tica Comercial, Organizações Internacionais (2021a, 2022).3 Apenas quatro documen-
preensão conceitual desses termos, este atores e agendas correlatas a cada concei-
do Comércio), L71 (Mineração, extração e tos estão em português e foram publicados
capítulo sintetiza resultados da pesquisa+ to. Por fim, segue-se algumas conclusões.

38 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 39


como artigos científicos (3) e editoriais (1). jam muito transversais a diferentes ativida-
Embora 36 de todos os documentos consi- des econômicas, a Figura 1 mostra que as Figura 2. Produção científica no Scopus e WoS, por ano, 1959-2020*
derados (2,7% do total) mencionem “Bra- publicações estão concentradas no hemis-
sil” em seu resumo, apenas dois (0,1% do fério norte, particularmente na América do
total e 5,6% dos que mencionam o Brasil) Norte (EUA, Canadá e México), Europa (Rei- 350

mencionam a Amazônia Azul – razão pela no Unido, Itália, Espanha, Alemanha, Gré-
qual não é possível fornecer uma análise cia, Noruega e Portugal), Ásia (China, Índia, 300

detalhada do caso deste país neste capítu- Rússia, Paquistão, Japão e Tailândia). Do
lo, baseando na pesquisa bibliométrica.4 hemisfério sul, destacam-se países da Oce- 250

ania (Austrália e Nova Zelândia), América


2.1. Distribuição espacial e temporal Latina (Brasil, Peru, Argentina, Chile, Pana- 200

má e Jamaica), África (África do Sul, Quê-


A pesquisa bibliométrica encontrou um nia, Nigéria, Namíbia, Gana, Tanzânia e Egi-
150
total de 1.351 documentos com base nos to) e Oriente Médio (Arábia Saudita, Omã
critérios da pesquisa. Embora os temas se- e Irã). As áreas cinzentas indicam países
100

50

Figura 1. Distribuição geográfica da produção científica,


por país, 1959-2020* 0

1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020*
Fonte: Santos (2021a, 2022)

que não tiveram nenhuma publicação iden- baixa produção sobre o tema; (ii) 2001-
tificada neste estudo. 2010, com um leve aumento da produ-
Quando se trata dos países mais citados, ção; e (iii) 2011-2020*, com crescimento
há uma considerável assimetria nesta análi- exponencial em publicações sobre o tema,
se, com os EUA muito à frente do segundo especialmente após a Conferência das
país no ranking. Entre os 5 países mais ci- Nações Unidas sobre o Desenvolvimento
tados, destacam-se os EUA (2.508 citações), Sustentável (Rio+20), em 2012. A última
Reino Unido (649), Austrália (628), Canadá década foi responsável por 84,2% das pu-
(582) e Itália (311), respectivamente. O Bra- blicações na área, destacando a crescente
sil ocupa a 13ª posição, com 167 citações. relevância da agenda dos mares e oceano
Considerando os 20 países mais citados, nos últimos anos.
apenas China (281), Brasil (167), Taiwan
(92) e Jamaica (77) estão localizados fora da 2.2. Principais fontes
América do Norte ou Europa.
A Figura 2 mostra o crescimento da A Figura 3 apresenta as 10 fontes mais
produção no tema ao longo do tempo. A relevantes acumuladas sobre o assunto,
série cronológica pode ser dividida em três concentrando 84,7% dos estudos. Consi-
Fonte: Santos (2021a, 2022) períodos particulares: (i) 1959-2000, com derando o total acumulado no período de

40 ECONOMIA
40 ECONOMIA AZUL
AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 41
1959 a 2020*, destacam-se os seguintes 1982. Ambos os journals concentram as Figura 4. Nuvem de palavras das 50 palavras mais frequentes baseadas em
journals, respectivamente: Marine Policy publicações desta natureza até meados dos palavras-chave extraídas dos artigos contemplados, 1959-2020*
(178 artigos, 30,6%), Journal of Coastal anos 1990, quando a Ocean and Coastal
Research (110, 18,9%), Ocean and Coastal Management publicou pela primeira vez na
Management (62, 10,7%), Frontiers in Ma- área, em 1994. Apesar de ter sua primeira
rine Science (31, 5,3%) e Maritime Policy publicação sobre o tema em 2015, o Jour-
and Management (24, 4,1%). nal of Coastal Research mais do que tripli-
Como no caso dos países mais citados e cou suas publicações entre 2019-2020*.
mais relevantes, a concentração desta variá- Embora o número de periódicos neste
vel analisada é novamente clara. Só a fonte assunto tenha aumentado nas últimas dé-
mais relevante é responsável por quase um cadas, o tema foi concentrado neste Top
terço das publicações acumuladas na área. 5 journals, já que a participação de outros
Se somadas à segunda posição, alcançam estava diminuindo ao longo do tempo em
metade das publicações da área; somadas, termos percentuais: 1990 (50,0%), 2000
as 5 primeiras representam quase 70% da (38,7%), 2010 (40,5%) e 2020 (30,4%).
produção acumulada do tema. Além disso, permanece o aumento signi-
Marine Policy é o journal que por mais ficativo acumulado de publicações sobre o
tempo publica sobre o tema, tendo sua pri- assunto, particularmente nas duas últimas
meira publicação em 1980, seguido pela décadas 2001-2010 (+117,6%) e 2011-
Maritime Policy and Management, cuja 2020* (+646,2%). Nos últimos anos, o nú-
primeira publicação sobre o tema data de mero de publicações sobre o tema cresceu
Fonte: Santos (2021a, 2022)

Figura 3. Top 10 fontes de artigos mais relevantes, valores acumulados,


1959-2020* desde que a Agenda 2030 entrou em vigor. lo (ZHANG et al., 2015). A Figura 4 mostra
Especialmente pelo Objetivo de Desenvolvi- nuvem de palavras das 50 baseadas na fre-
MARINE POLICY mento Sustentável (ODS) 14, mares e ocea- quência de palavras-chave extraídas de arti-
89
JOURNAL OF COASTAL RESEARCH
no têm mais relevância nesta agenda (SAN- gos contemplados neste estudo. Entre elas,
TOS, 2019; SANTOS; CARVALHO, 2020a; destacam-se palavras-chave que serviram de
OCEAN AND COASTAL MANAGEMENT UN, 2017; UNCTAD, 2016), o que fica claro base para a criação dos grupos de palavras
178
13 pelo aumento cumulativo de publicações so- utilizadas na pesquisa inicial das bases de
FRONTIERS IN MARINE SCIENCE
14
bre o tema no período 2011-2015 (+95,9%) dados Scopus e WoS, como economia azul,
MARITIME POLICY AND MANAGEMENT
17 e 2016-2020* (+207,9%). governança oceânica, crescimento azul,
21
COASTAL MANAGEMENT economia marinha e economia marítima.
JOURNAL OF THE INDIAN OCEAN REGION 2.3. Palavras-chave relevantes e O crescimento exponencial do termo
23 frequentes “governança oceânica” se destaca, prin-
OCEAN DEVELOPMENT AND cipalmente no período de 1999-2018.
INTERNATIONAL LAW
24 As palavras-chave são geralmente forne- Entretanto, desde 2015 (e especialmen-
SUSTAINABILITY (SWITZERLAND) cidas pelos autores para sintetizar e mostrar te a partir de 2018), o termo “economia
31
INTERNATIONAL JOURNAL OF MARINE brevemente as principais ideias do docu- azul” tornou-se o mais frequentemente
110
AND COASTAL LAW mento e “palavras-chave mais” (keywords utilizado. No período de 2016-2020*, a
62
OTHERS
plus) vêm de títulos de referências citadas de frequência do termo economia azul au-
documentos analisados, fornecendo depois menta (871,4%), assim como aquicultu-
Fonte: Santos (2021a, 2022) uma estrutura conceitual do artigo/capítu- ra (720,0%), crescimento azul (569,2%),

42 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 43


43
Como na Figura 4, é notável que diferen- aumento de frequência a partir de 2010,
Figura 5. Redes baseadas nas palavras-chave dos autores, 1959-2020* tes palavras-chave introduzidas na pes- precisamente a partir de 2015.
law of the sea quisa bibliométrica aparecem como nós Há uma pequena mudança na discus-
biodiversity principais, mostrando que cada conceito são, na agenda ou em termos espaciais. Na
marine protected areas
realmente apresenta um conjunto preciso segunda metade dos anos 1990, as discus-
ecosystem-based management e particular de temas associados. De fato, sões de gestão e planejamento se desta-
policy
ecosystem approach fica evidente que eles não são necessaria- caram, mais focadas no caso dos EUA. O
mente termos sinônimos. termo “engenharia oceânica” mostra que
ocean fisheries management
mediterranean sea
high seas
se tratava de uma agenda mais técnica,
climate change
conservation
2.4. Temas de tendência distante das ciências humanas e sociais. Na
primeira década dos anos 2000, as discus-
ocean governance Quando se trata de analisar os temas sões sobre projeto de navios, construção
marine spatial planning unclos
governance
ecosystem services fisheries marine conservation
de tendência com base em “palavras-cha- naval, transporte de carga e portos e por-
marine oceans governance ve mais” que cobrem o período de 1994 tos lideraram o debate. Na segunda déca-
coastal management
aquaculture marine governance
a 2020* (quando o volume de publicações da dos anos 2000, a agenda se expandiu,
sobre este assunto aumentou), a escolha pois considera a cooperação internacional,
blue growth blue economy de keywords plus se justifica porque ma- a política marítima, as sociedades e as insti-
sustainability
maritime security peia adequadamente a base de referência tuições. Embora ainda esteja muito focada
sustainable development das publicações consideradas na pesquisa. nos EUA, as questões relacionadas à Ásia
maritime spatial planning
oceans
marine policy Em linha com outras análises, é claro seu estão aumentando progressivamente.
south africa

sustainable development goals


european union china
Figura 6. Temas de tendências com base em keywords plus, 1994-2020*
maritime economy indian ocean
ocean economy 1990 2000 2012 2021 2030
Planejamento Economia marítima Economia azul Década do Oceano
estratégico Oceano limpo
Ship Design Cooperação
innovation marine economy internacional Oceano saudável e
Engenharia Oceânica
Construção e resiliente
maritime shipping reparação naval Governança oceânica Oceano previsível
development
maritime cluster Transporte de carga Instituições Oceano seguro
Oceano sustentável e
maritime economics Portos Políticas públicas
competitiveness produtivo
marine industry
PEM Oceano transparente
strategic management e acessível
Fonte: Santos (2021a, 2022) Gestão das zonas Oceano conhecido e
costeiras valorizado
economia marinha (485,7%) e desenvolvi- A Figura 5 mostra redes baseadas nas
Mudança climática
mento sustentável (440,0%). Deve haver palavras-chave dos autores e no algoritmo Engajamento global
uma estreita relação com o aumento da fre- de agrupamento de Lovaina, totalizando Gestão e conservação
Consolidação da
ambiental
quência das “mudanças climáticas”, “desen- 50 nós. Há seis agrupamentos de palavras, agenda
volvimento sustentável”, “sustentabilidade”, apresentando os seguintes nós: “economia Desenvolvimento
“planejamento espacial marinho”, “aquicul- azul” (cor verde), “governança oceânica” sustentável
tura” e “pesca” com a implementação da (vermelho), “crescimento azul” (roxo), “eco- Deferentes ciências
Agenda 2030, seus 17 SDGs, bem como nomia marinha” (azul), “cluster marítimo”
com a Década do Oceano (2021-2030). (marrom) e “mudança climática” (laranja). Fonte: Santos (2021b)

44 ECONOMIA
44 ECONOMIA AZUL
AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 45
Mais recentemente, os anos de 2010 rentes indicam questões e agendas distin-
testemunharam um aumento nos temas, tas. Entretanto, é possível argumentar que Figura 7. Conceitos relacionados à Economia Azul
atores e sua frequência. Ao contrário das a década de 2010 é o período que compre-
análises temporais anteriores, é difícil iden- ende a discussão a partir da abordagem de
tificar a discussão (e sua natureza) que con- governança, destacando sua relevância nas
duz o período, uma vez que termos dife- seguintes questões:

. Econômico: crescimento econômico, petróleo offshore, recursos marinhos,


competitividade e comércio; gestão ambiental e proteção ambiental;

. Políticas: políticas públicas, política . Mudança climática e poluição: con-


marinha, planejamento espacial, gestão trole de emissões, plâncton, eutrofiza-
de ecossistemas, tomada de decisões, ção e poluição marinha; e
abordagem integrada, gestão da zona
costeira e gestão de projetos;
. Atores e instituições: China, União
. Sustentabilidade na exploração de
Europeia (UE), EUA, Austrália, Cana-
dá, Oceano Pacífico, Mar Báltico e Di-
recursos marinhos: pesca, aquicultura, reito do Mar.

3. Principais conceitos e definições

Baseado principalmente nos resulta- 3.1. Economia do Mar


dos da subseção anterior, é apresentada
uma discussão conceitual mais detalhada Nos anos 1970 e 1980, os conceitos
baseada nos resultados da análise biblio- de economy of the sea (GESSNER, 1971) e
métrica, contextualizando-a a partir dos sea economy (ANTIA, 1989; DOLMIERSKI;
debates centrais na literatura especializa- NITKA, 1976) lideraram a discussão. Mais
Fonte: Santos (2021b)
da. Em relação à Figura 5, é possível tirar recentemente, o conceito tem sido utiliza-
várias conclusões, que até motivaram a do para analisar metodológica e quantitati-
pesquisa e justificaram algumas das ques- vamente o caso brasileiro (SANTOS, 2019; (2020) e Chen e Zhou (2020). Em alguns ca- criado o Grupo Técnico (GT) “PIB do Mar”,
tões orientadoras deste capítulo. 2020, 2021a, 2021b, 2022; ALERJ, 2021; sos, tal discussão aparece como “financia- sob coordenação do Ministério da Econo-
A Figura 7 sintetiza as principais temá- REGAZZI et al., 2021; SANTOS; CARVA- mento azul” (YOSHIOKA et al., 2020; BER- mia. O GT tem como finalidade: “Definir
ticas relacionadas a cada um desses concei- LHO, 2020a; 2020b; PwC, 2019; CARVA- GLOF; VELASCO, 2019) ou “financiamento o conceito de economia azul/do mar para
tos, que, novamente, não devem ser enten- LHO, 2018). Embora não apareça como um oceânico” (WABNITZ; BLASIAK, 2019). o Brasil; identificar seus setores e ativida-
didos como sinônimos. Ela foca nos quatro termo-chave na Figura 6, o aumento das No caso brasileiro, ainda não existe des; elaborar proposta de metodologia para
conceitos mais usados, nomeadamente: publicações recentes sobre a interface entre uma definição oficial de economia azul, mensurar o PIB do Mar do Brasil; e apre-
economia azul, economia do mar, econo- financeirização e questões relacionadas a economia do mar, economia costeira e/ou sentar sugestão para consequente institu-
mia marítima e economia marinha. mares e oceano é notável, como em An e Li economia oceânica. Em julho de 2020, foi cionalização”. Sendo assim, o país adotará

46 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 47


o conceito de “economia do mar” e, no conceito político-estratégico amplamen- heterogêneas do conceito, o que dificulta as ocean-based industries (como a nave-
âmbito deste GT, está discutindo formas te utilizado pelo setor de defesa nacional. sua comparação internacional (SURÍS-RE- gação, a pesca, a eólica offshore, a biotec-
de mensuração e definindo quais setores Porém, ainda é pouco conhecido pela so- GUEIRO; GARZA-GIL; VARELA-LAFUENTE, nologia marinha), mas também os ativos
estarão contemplados no “PIB do Mar”, ciedade brasileira em geral, sem que haja 2013). Wang (2020) e Yang e Cai (2020) naturais e os serviços ecossistêmicos que
integral ou parcialmente (SANTOS, 2021b). uma definição objetiva sobre as atividades analisam a estrutura industrial, Zhou e Qu o oceano fornece (peixes, rotas marítimas,
Sobre o país, existe uma tese de douto- econômicas consideradas, nem quais regi- (2020) e Wang, Lim e Lyons (2019) abordam absorção de CO2 e similares).
rado que propõe o conceito de economia ões são consideradas. o tema a partir de uma perspectiva ecoló- No entanto, há muito considerado o do-
do mar do Brasil, considerando atividades gica, enquanto outros autores expandem mínio tradicional da navegação, da pesca e
direta e indiretamente relacionadas ao mar, 3.2. Economia marítima essa percepção, considerando o turismo e – desde os anos 1960 – do petróleo e do gás
abrangendo 12 setores econômicos de 17 os setores portuários, respectivamente. offshore, estão surgindo novas atividades
estados e 280 municípios defrontantes ao Considerando as redes de conceitos e a Com frequência, o termo faz referên- que estão se remodelando e diversificando
mar. Com base nos dados de 2010, a região literatura especializada, a “economia ma- cia à vida e aos recursos marinhos (vivos) as indústrias marítimas. Dessa maneira, a
Nordeste do Brasil se destaca em termos de rítima” está mais diretamente ligada ao (MORRISSEY, 2017), possuindo forte influ- nova “economia oceânica” é impulsionada
população litorânea (47,9%), com destaque transporte marítimo e à inovação, portanto, ência de estudos da área da Biologia e Oce- por uma combinação de crescimento popu-
para os Estados da Bahia e Ceará, enquanto é bastante específico e setorial. Este concei- anografia e, inclusive, possuindo estreita lacional, aumento da renda, diminuição dos
o Sudeste concentra a maior participação no to também está muito associado ao clus- relação com a sustentabilidade e a biodiver- recursos naturais, respostas às mudanças cli-
PIB do litoral (56,3%) e total de empregos ter marítimo, à competitividade e à gestão sidade. Dessa maneira, é comum ver tanto máticas e tecnologias pioneiras.
formais (47,4%), com destaque para o Es- estratégica, portanto, está mais focado em o termo associado às indústrias relacionadas Ainda de acordo com a organização,
tado do Rio de Janeiro. No total, represen- logística e infraestrutura portuária e ques- ao mar quanto aos recursos marinhos pro- enquanto as indústrias marítimas tradicio-
tam cerca de 17% da população nacional, tões marítimas (MONIOS; WILMSMEIER, priamente ditos. É possível encontrar o ter- nais continuam a inovar a um ritmo acele-
19% dos empregos nacionais e 21% do PIB 2020; CULLINANE, 2011; EVERS; KARIM, mo, que, novamente, é amplo e usado de rado, são as indústrias oceânicas emergen-
nacional, com destaque para os setores de 2011; STOPFORD, 2009). modos distintos, ligado à gestão (política tes que estão atraindo a maior parte da
serviços, energia offshore e defesa nacional Por sua vez, a noção de cluster está mais e legal) das atividades relacionadas ao mar atenção. Essas indústrias incluem energia
(CARVALHO, 2018). relacionada à política ou modelo de gestão, (NORDQUIST et al., 2017). eólica offshore, energia das marés e das
Recentemente, o GT do “PIB do Mar” intimamente relacionada a questões de efi- ondas; exploração e produção de petróleo
apresentou uma proposta preliminar ciência e tecnológicas, já que o escopo es- 3.4. Economia oceânica e gás em águas ultraprofundas e ambien-
do conceito, que pode sofrer eventuais pacial levaria à complementaridade de em- tes excepcionalmente severos; aquicultura
ajustes ao longo das negociações em presas e instituições em um determinado Alguns autores e algumas instituições offshore; mineração de fundos marinhos;
curso. Assim, a economia do mar con- setor (PORTER, 1998; 2000). Mesmo que fazem uso do termo ocean economy para turismo de cruzeiro; vigilância marítima e
templaria o total de bens e serviços, em pareça espontâneo, políticas (públicas) dife- se referir à questão. É o caso, por exemplo, biotecnologia marinha. O potencial a lon-
valores monetários, destinados ao con- rentes podem estimular e apoiar este arran- de OECD (2019, 2016) e Colgan (2013). go prazo de inovação, criação de empre-
sumo final e produzidos nos setores eco- jo. Santos e Carvalho (2020a), Yin, Fan e Li Embora pareça sinônimo, alguns autores gos e crescimento econômico oferecido
nômicos associados ao mar. (2018) e Amdam e Bjarnar (2015) utilizam usam o termo no plural, usando o termo por estes setores é impressionante. Cabe
Embora ainda não haja dados oficiais esta abordagem, analisando o Brasil, a Chi- economics of the oceans (HALLWOOD, destacar, ainda, que a atividade econô-
sobre a economia do mar brasileira, em na e a Noruega, respectivamente. 2014; WILKINSON, 1979). mica no oceano também é caracterizada
2004 o Almirante-de-Esquadra Roberto de No caso de OECD (2016), texto de re- por uma complexa variedade de riscos
Guimarães Carvalho, então comandante da 3.3. Economia marinha ferência sobre a questão, a economia oce- que precisam ser enfrentados, como ex-
Marinha do Brasil (MB), criou o conceito de ânica é essencial para o bem-estar e para ploração excessiva dos recursos marinhos,
“Amazônia Azul” (SANTOS, 2019; VIDIGAL A “economia marinha” está mais dire- a prosperidade futuros da humanidade, poluição, aumento da temperatura e dos
et al., 2006). Com cerca de 5,7 milhões de tamente relacionada à indústria e às polí- sendo uma fonte essencial de alimentos, níveis do mar, acidificação dos oceanos e
km2, que compõem as águas jurisdicionais ticas marítimas, abordando temas como energia, minerais, saúde, lazer e transporte, perda de biodiversidade (Ibid., p. 3).
brasileiras e correspondem a quase 70% da a aquicultura, a pesca e os serviços ecos- da qual dependem centenas de milhões de No caso dos EUA, por exemplo, a Natio-
área continental brasileira, trata-se de um sistêmicos. Entretanto, existem definições pessoas. A economia oceânica abrangeria nal Oceanic and Atmospheric Administration

48 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 49


(NOAA) define a economia oceânica como 3.6. Economia azul “crescimento” na Europa, com ênfase es- governança relacionados ao tema, bem
composta por seis setores econômicos que pecial na União Europeia (UE) e no Mar Me- como de enfrentar desafios mais imedia-
dependem total ou parcialmente dos oce- Finalmente, o conceito de “economia diterrâneo (LAVIDAS; DE LEO; BESIO, 2020; tos decorrentes da mudança climática no
anos e/ou dos Grandes Lagos5 (sendo um azul” parece ser o mais amplo, por ter re- DA-ROCHA; GUILLEN; PRELLEZO, 2019). meio marinho. Sendo assim, embora seja
subconjunto da Economia Costeira), con- lações não apenas com a abordagem eco- É importante analisar o nó “mudança utilizado por diferentes autores, o termo
templando os seguintes setores: recursos nômica do assunto, apresentando relações climática” que emerge da análise (ver Fi- “economia azul sustentável” acaba sen-
vivos; transporte marítimo; construção de estreitas mesmo com conceitos já apresen- gura 5), muito associado e próximo aos do quase que uma repetição de ideias a
navios e barcos; construção naval; recur- tados. Assim, pode ser entendido como nós “governança oceânica”, “economia partir do uso de termos distintos.
sos minerais offshore; e turismo e recrea- um “conceito guarda-chuva”, consideran- azul”, e “crescimento azul”. O termo Assim como no caso de “economia
ção. Utilizam-se as estatísticas da Economia do diretamente agendas como segurança está diretamente ligado a governança, do mar”, recentemente o GT do “PIB
Oceânica dos EUA para descrever o valor marítima (VOYER et al., 2018), sustentabi- biodiversidade, oceano e política, o que do Mar” também apresentou uma pro-
econômico das atividades diretamente rela- lidade (GERHARDINGER et al., 2020), pla- destaca a relevância da questão climática posta preliminar do conceito de “eco-
cionadas ao uso dos recursos oceânicos ou nejamento espacial marítimo (HASSAN; na atual política/governança para os ma- nomia azul”, que pode eventualmente
ao acesso a eles. ASHARF, 2019), e ODS (LUENGO FRADES res e oceano. A ligação secundária com sofrer ajustes ao longo das negocia-
et al., 2020). Justamente por sua natureza a “mudança climática” não é menos im- ções em curso. Dessa maneira, a eco-
3.5. Economia costeira geral, é o conceito que mais tem sido uti- portante, com os seguintes termos: áre- nomia azul seria o uso sustentável dos
lizado para tratar amplamente de questões as marinhas protegidas, UNCLOS, pesca, recursos marinhos para o desenvolvi-
De acordo com a NOAA, dos EUA, a relacionadas à agenda dos mares e oceano aquicultura e serviços ecossistêmicos. mento econômico, melhoria do bem-
economia costeira é composta por todos – já que não se limita a uma abordagem Aqui, fica ainda mais clara a estreita re- -estar social e geração de empregos,
os setores econômicos atividade que se econômica teórico-metodológica particular. lação entre a mudança climática e a ne- conservando a saúde dos ecossistemas
desenvolve na área geográfica definida A União Europeia (UE) utiliza o conceito de cessidade de lidar com os acordos de oceânicos e costeiros.
como “Condados Costeiros” (Coastal economia azul sustentável para demarcar,
Shoreline Counties). Utilizam-se as esta- com clareza, a estreita relação do conceito 4. Conclusão
tísticas da Economia Costeira ao discutir a com a sustentabilidade.
economia e a população que se beneficia Em linha com a economia azul, dado Em linha com Santos e Carvalho 2018), sendo substituído desde 2015 (e
direta ou indiretamente da atividade na que é integrante, o conceito de “governan- (2020a), Ido e Shimrit (2015) e Arieff (2008) especialmente a partir de 2018) por “eco-
zona costeira, dado que a economia cos- ça oceânica” está mais diretamente relacio- e Seele (2007), agora é possível argumen- nomia azul”. Além disso, a estreita relação
teira identifica o que está em risco de mu- nado à gestão (planejamento espacial mari- tar que “o azul é o novo verde”. O cres- entre o aumento da frequência do termo
dar a partir das condições ambientais nos nho, gestão costeira e abordagem ecossis- cimento do debate com base no número mudança climática, desenvolvimento sus-
oceanos e ao longo das costas. De acordo têmica) e a suas diferentes partes interessa- de publicações, diversidade de abordagens tentável, sustentabilidade, planejamento
com o Ocean Conservancy, quase 40% da das (lei do mar e a Convenção das Nações e expansão da agenda fica evidenciado espacial marinho, aquicultura e pesca pa-
população dos EUA vive na costa e, além Unidas sobre o Direito do Mar – UNCLOS). com base na pesquisa bibliométrica e na rece estar intimamente relacionada com a
de apoiar milhões de empregos e meios Entretanto, devido a sua natureza mais am- revisão bibliográfica. Há uma concentração implementação da Agenda 2030 (2016-
de subsistência, os estados costeiros con- pla, está também relacionada com os con- expressiva de publicações nos países mais 2030), seus 17 ODS, bem como a Década
tribuem com mais de US$ 16 trilhões para ceitos de “crescimento azul” e “economia citados, nos países mais relevantes, nas re- do Oceano (2021-2030).
a economia do país. azul” (EHLERS, 2016). O conceito de “cres- vistas que mais publicam sobre o tema e na Em relação às discussões conceituais, a
Dessa maneira, fica claro que este con- cimento azul” está intimamente ligado às autoria. Cabe ressaltar, contudo, que, devi- ocorrência de diferentes palavras-chave in-
ceito apresenta uma relação mais direta atividades relacionadas à exploração dos do aos critérios da pesquisa bibliométrica, troduzidas na pesquisa bibliométrica como
com a questão espacial. Assim, contempla mares e oceano, tais como pesca, aquicul- as questões linguísticas e de indexação po- os principais nós de análise justifica este
todas as atividades realizadas, direta e in- tura e serviços ecossistêmicos, diretamen- dem comprometer a percepção mais geral tipo de análise, já que cada conceito tem
diretamente na região costeira, não neces- te ligados ao desenvolvimento sustentável das publicações na área. uma agenda particularmente associada.
sariamente tendo relação imediata com o (CHEN; ZHOU, 2020). Além disso, há uma Destaca-se o crescimento exponencial Com base na análise cruzada dos tópicos
mar e/ou oceano. relevância particular dessa questão do do termo “governança oceânica” (1999- de tendências com a análise conceitual, foi

50 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 51


possível identificar que a discussão sobre a tornou-se o conceito mais utilizado e é CHEN, X.; ZHOU, Y. Sustainable Develo- HASSAN, D.; ASHRAF, A.A. Institutional
perspectiva econômica dos mares e oceano o mais amplo, pois está relacionado não pment and Blue Growth of Fisheries. In: Arrangements for the Blue Economy: Ma-
começa muito concentrada na gestão e pla- apenas à abordagem econômica. Então, CHEN, X.; ZHOU, Y. (eds). Brief Introduc- rine Spatial Planning a Way Forward. Jour-
nejamento, muitas vezes analisando os EUA apresenta relações estreitas mesmo com tion to Fisheries. Singapore: Springer, p. nal of Ocean and Coastal Economics, v.
(1990). Entretanto, no século XXI, esta dis- outros conceitos analisados (tais como 181-223, 2020. 6, n. 2, p.1-26, 2019.
cussão é ampliada, de modo que, na primei- governança oceânica, crescimento azul, CLARKE, G.L. Sunshine and the Economy IDO, S.; SHIMRIT, P.-F. Blue is the new gre-
ra década, ela se concentra na “economia economia marinha e economia marítima), of the Sea. The American Scholar, v. 4, en: Ecological enhancement of concrete
marítima” (primeira metade dos anos 2000), podendo ser entendida como um “con- n. 1, p. 118-123, 1935. based coastal and marine infrastructure.
começando a se dirigir a novas regiões. ceito guarda-chuva”. Portanto, é claro COLGAN, C. S. The ocean economy of the Ecological Engineering, v. 84, p. 260-
Os anos de 2010 testemunharam um que durante o período analisado, a dis- United States: Measurement, distribution, 272, 2015.
aumento de temas, atores e abordagens. cussão não só está se expandindo em re- & trends. Ocean & Coastal Manage- LAVIDAS, G.; DE LEO, F.; BESIO, G. Blue
Ao abordar o tema com base na gover- lação à sua relevância e à sua quantidade ment, v. 71, n. 1, p. 334-343, 2013. Growth Development in the Mediterrane-
nança, cresce a relevância da perspectiva de publicações, mas também do ponto de CULLINANE, K. (ed.) International Han- an Sea: Quantifying the Benefits of an In-
econômica, políticas, sustentabilidade da vista da agenda e das partes interessadas, dbook of Maritime Economics. Chelte- tegrated Wave Energy Converter at Genoa
exploração de recursos, mudança climá- afastando-se de uma abordagem biológi- nham-Northampton: Edward Elgar, 2011. Harbour. Energies, v. 13, 4201, 2020.
tica e poluição e atores e instituições. ca, voltada cada vez mais para uma abor- DA-ROCHA, J.-M.; GUILLEN, J.; PRELLEZO, LUENGO FRADES, J.; GARCÍA BARBA,
Mais recentemente, a “economia azul” dagem sustentável de governança. R. (Blue) Growth accounting in small-scale J.; NEGRO, V.; MARTÍN-ANTÓN, M.; SO-
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52 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 53


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crossing the T’s on the fifty shades of blue first global integrated marine assessment.
Notas
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UN Ocean Decade. Ocean and Coastal UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE 1 A bibliometria permite uma avaliação quan- em pesquisa bibliométrica, portanto é pos-
Research, 2021a, no prelo. AND DEVELOPMENT – UNCTAD. Goal 14: titativa de artigos científicos e outros traba- sível que algumas publicações acadêmicas
SANTOS, Thauan. Economia do Mar: life below water. Official website, 2016. lhos publicados, incluindo detalhes sobre os relevantes e/ou relatórios técnicos não cober-
Agenda global e o caso do Brasil. GEM VIDIGAL, A. A. F.; CUNHA, M. B. da; FER- autores, sobre as revistas nas quais os traba- tos pelos parâmetros da pesquisa não sejam
lhos foram publicados e sobre o número de incluídos – inclusive por conta de questões
Policy Brief, n. 1, v. 1, p. 4-11, 2021b. NANDES, L. P.; MENDES, F. de A.; SILVA, N.
vezes que são citados posteriormente, sendo linguísticas, uma vez que a pesquisa foca em
SANTOS, Thauan. Blue Economy beyond da; OLIVEIRA, L. L.; CUNHA JÚNIOR, O. B.;
o termos cunhado por Pritchard (1969). publicações em língua inglesa.
Maritime Economics. In: KENNED, G.; ALBUQUERUQE, A. T. A.; ALMEIDA, J. de 2 Com base nos parâmetros da pesquisa 4 Além disso, todas as análises gráficas terão
BENBOW, T.; MOREIRA, W. S. Nothing, A. N. de. Amazônia Azul: o mar que nos bibliométrica, 1959 foi o primeiro ano em um “*” em 2020, já que não cobrem o ano
but the Sea: Global dialogues on maritime pertence. Rio de Janeiro: Record, 2006. que houve publicação considerando econo- inteiro (até 5 de novembro deste ano).
domain. Routledge: UK, 2022, no prelo. VOYER, M.; SCHOFIELD, C.; AZMI, K.; mia do mar. Para mais detalhes, ver Santos 5 Portanto, contempla águas interiores e,
SANTOS, T.; CARVALHO, A.B. “Blue is WARNER, R.; MCILGORN, A.; QUIRK, G. (2021a, 2022). consequentemente, não se limita às ativida-
the New Green”: The Economy of the Maritime security and the Blue Economy: 3 Os resultados são baseados exclusivamente des realizadas no litoral.

54 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Definições 55


2

ECONOMIA E O MAR: MÉTODOS E


INDICADORES

Andréa Bento Carvalho

1. Introdução

Na literatura internacional, encontram- 1) classificação das indústrias pertencentes à


-se diversos estudos que utilizam diferentes economia oceânica;
conceitos e metodologias para apontar a 2) apurar os dados destas indústrias utilizan-
contribuição do mar para a economia nacio- do os dados das contas nacionais;
nal, estadual e/ou local. É deveras relevante 3) determinar a participação das atividades
pontuar que cada país ou região pode elabo- relacionadas ao mar do total da atividade
rar metodologia própria para definir a eco- econômica;
nomia relacionada ao mar, além dos setores 4) estimar os gastos, emprego, salários na
que serão computados como atividades ma- economia do mar; e
rítimas e, por conseguinte, sua participação 5) comparar as estimativas oficiais do gover-
no Produto Interno Bruto (PIB), ocupações, no com outras fontes de dados industriais.
salários, entre outras variáveis econômicas. Neste sentido, os passos 3 e 4 envolvem a es-
Destacamos, por exemplo, os estudos colha e a aplicação de métodos econômicos
de Allen Consulting (2004), Pugh (2008), e estatísticos para o alcance dos resultados,
INE/DGPM (2014), Girard e Kalaydjian logo, são o objeto de análise deste capítulo.
(2014), Vega e Hynes (2014), Zhao et al. Assim, o objetivo deste capítulo con-
(2014), ECORYS (2014) e NOEP (2016), siste em apresentar determinados méto-
que quantificaram e analisaram a Econo- dos econômicos e estatísticos passíveis
mia do Mar, tanto nacional quanto esta- de serem utilizados para a quantificação
dual para Austrália, Reino Unido, Portugal, da economia relacionada ao mar, e/ou na
França, Irlanda, China, Reino Unido e Es- mensuração de seus impactos, sem objeti-
panha, Estados Unidos, respectivamente. var esgotar o tema. Para alcançar o objeti-
Kildow e Mcllgorm (2010) indicam que vo proposto, a metodologia utilizada será
as abordagens dos países no que diz respei- baseada em revisão bibliográfica dos prin-
to à mensuração da economia oceânica ou cipais estudos nacionais e internacionais
costeira, em geral, são: que tratam da referida temática.

56 ECONOMIA AZUL Economia ee oo Mar:


Economia Mar: Métodos
Métodos ee Indicadores
Indicadores 57
57
Dessa forma, o capítulo será divido em 3 sobre a contribuição deste “setor econômico”, Quadro 1. Matriz Insumo-Produto simplificada para uma economia de dois setores
seções, além desta introdutória. A segunda assim como evidencia dois avanços na apli-
seção apresenta e define as metodologias fre- cação do modelo Insumo-Produto e Sistema Compras
quentemente identificadas em estudos da Eco- de Contas Nacionais para contas oceânicas. Consumo Demanda Final
Total Produto
nomia do Mar/Costeira ou Azul. A terceira se- Por fim, são apresentadas as considerações Intermediário
ção dedica-se a sintetizar os principais estudos finais do capítulo, seguida das referências.
Setor 1 Setor 2 C I G E
Setor 1 Z11 Z12 C1 I1 G1 E1 x1
2. Insights dos métodos utilizados na mensuração da contribuição e Vendas
Setor 2 Z21 Z22 C2 I2 G2 E2 x2
quantificação de impactos econômicos

Estatísticas voltadas à avaliação da perceber os fluxos intra e interindustriais. Valor Trabalho l1 l2 L


economia do mar e costeira são cada vez Por isso, será iniciada a concisa explana- Adicionado
mais desenvolvidas por pesquisadores e ção metodológica na primeira subseção. Capital n1 n2 N
Bruto
governos que já reconheceram sua im-
Importações m1 m2 M
portância para a economia nacional. Des- 2.1. Modelo Insumo-Produto (IO)
de a década de 1980, foram realizados x’ x1 x2 C I G E X
ao redor do mundo diversos estudos com É o nome dado para estrutura analítica de- Fonte: Adaptado de Miller e Blair (2009)
a finalidade de dimensionar a contribui- senvolvida por Wassily Leontief em meados
ção e o impacto econômico desta porção dos anos 1930. Sua proposta de estrutura Onde: impactos diretos e indiretos decorrentes de
da economia para regiões, nações e, até fundamental é analisar a interdependência Z = consumo intermediário; alterações na demanda final de uma eco-
mesmo, continentes (CARVALHO, 2018). das indústrias em uma economia (MILLER; C = consumo das famílias; nomia (CONSIDERA et al., 1997).
Para entender melhor a evolução dessa BLAIR, 2009). Ou seja, indica a atividade de I = investimento das empresas; Segundo Ramos (1996), a tabela de con-
temática ao longo dos anos, é fundamen- um grupo de indústrias que produzem pro- sumo intermediário expõe para cada produto
G = consumo do governo;
tal lançar luz de algumas metodologias dutos (outputs) e consumem bens de outras (linhas) o valor a preço de consumidor consu-
E = exportações;
empregadas para o alcance dos resulta- indústrias (inputs) no processo produtivo, mido por cada atividade econômica (colunas)
L = trabalho;
dos. Vale destacar que alguns métodos condensando as informações em uma tabela durante o processo de produção. A demanda
podem mensurar a economia relacionada de transações interindustriais (Quadro 1). O N = capital; final, de acordo com Miller e Blair (2009), é
– direta e indiretamente – ao mar e su- modelo IO, através da Matriz Insumo-Produ- X = total de produção dos setores. composta pelos setores exógenos da econo-
plementarmente quantificar os impactos to (MIP), é geralmente construído a partir de O modelo IO estabelece-se como um mia, sendo eles: consumo das famílias (C),
sociais e econômicos inerentes. O’Donou- dados econômicos observados para uma re- conjunto de tabelas e quadros – também formação bruta de capital fixo e variação dos
gue et al. (2021) citam que metodologias gião geográfica específica e medição anual. conhecido por Matriz Insumo-Produto estoques (I), consumo do governo (G) e, por
para avaliar impactos devem focar em Dessa forma, ao exibir as ligações dos setores (MIP) – que pode ser dividido em dois gru- fim, a exportações (E). Ramos (1996) ainda
uma miríade de dimensões econômica, com a economia – conhecidas por “ligações pos, a saber: 1º- Tabelas básicas, nomea- comenta que o valor adicionado é o consu-
social, espacial e ambiental, e a tendência intersetoriais”, “encadeamentos” ou “liga- das Tabelas de Recursos e Usos (TRUs); mo intermediário menos o valor de produção.
é a adaptação para considerar o máximo ções para frente e para trás” –, contribui para 2º- Tabelas que resultam da aplicação do O VAB, consequente do processo de produção,
de variáveis em conjunto, formando mo- o melhor entendimento da estrutura econô- modelo sobre as informações contidas nas é dividido entre os fatores de produção, tra-
delos mais complexos e completos. Nesse mica, assim como de sua transformação ao tabelas básicas. As TRUs incorporam dados balho (l) e o capital (n), além do governo (G).
sentido, os autores apontam que os mo- longo dos anos, o que, por conseguinte, é da produção das atividades econômicas, Igualmente, podemos demonstrar que
delos insumo-produto (IO, sigla em inglês) fundamental na concepção de politicas pú- consumo intermediário, salários pagos, en- o modelo IO apresenta as identidades ma-
são os mais utilizados, possibilitando a blicas (ZHAO et al., 2014). Ainda segundo o cargos sociais, investimentos das empresas croeconômicas, para tanto utilizaremos as
mensuração da economia total ou de um autor, a MIP é muito utilizada em várias disci- e outros. Do segundo grupo de tabelas, representações do Quadro 1. Somando a úl-
setor específico, além de avaliar os impac- plinas da economia e largamente emprega- a mais conhecida é a Matriz de Leontief. tima linha e coluna do Quadro 1, obtemos as
tos em setores, agentes e economias e da por pesquisadores e policymakers. Por intermédio desta, é possível calcular os equações (1) e (2), respectivamente:

58 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 59


quanto um setor compra de outros seto- nacional e o resto do mundo”. Chamamos a
Xi= x 1 + x 2 + C + I + G + E ( 1 ) res, ou seja, representa a demanda dos se- atenção para as Tabelas TRUs, já citadas na
= x 1 + x 2 + L + N + M (2) tores em relação aos demais; e (ii) forward Seção 2.1, por habilitarem a estimação do
Igualando (1) e (2): linkages (índice de ligação para frente), que Produto Interno Bruto (PIB).
explicitam as vendas desses setores, isto é, Ainda no âmbito das Contas Nacionais,
x 1 + x 2 + C + I+ G+ E = x 1 + x 2 + L + N + M demonstram a oferta desses setores para destacamos as chamadas Contas Satélites
C + I + G + E = L + N + M (3) os demais setores da economia. Índices (CS). Uma Conta Satélite é uma estrutura
Rearranjando (3), uma das identidades macroeconômicas é obtida: acima de 1 denotam que os setores estão estatística que se concentra em determina-
acima da média da economia nacional, o do contexto industrial, por exemplo, incor-
L + N = C + I + G + (E - M ) ( 4 )
que, na prática, seriam setores principais porado nas contas nacionais. Além disso,
Onde: para o crescimento da economia. Assim, possibilitam a combinação de dados eco-
C + I + G + ( E - M ) = Produto Interno Bruto (PIB) Olinto (2014) pondera que a matriz é uma nômicos e ambientais (OCDE, 2019).
L + N = Renda Nacional Bruta (RNB) fórmula, mas a análise das informações nela O IBGE classifica a CS da seguinte for-
contidas fornece dados para que tenhamos ma: “As contas satélites são uma exten-
O modelo geral IO é representado pela Equação (5), permitindo calcular a produção (X)
uma radiografia da economia em seus di- são do Sistema de Contas Nacionais. Elas
necessária para atender à demanda final ( f ) .
versos setores e desdobramentos. permitem a elaboração de análises sobre o
X = ( I - A ) - 1 f ( 5 ) perfil e a evolução de um setor de forma
Onde: 2.2 Sistema de Contas Nacionais comparável ao total da economia, medido
X = produção total do setor j; (SCN) e Contas Satélites (CS) pelas Contas Nacionais”. Neste escopo, o
IBGE publica a Conta Satélite Saúde, por
I = matriz identidade;
A Contabilidade Social trata da mensu- exemplo, informando o perfil das ativida-
A = matriz de coeficientes técnicos diretos (insumo da atividade i consumida pela ração da atividade econômica e social de des de saúde no Brasil contribuindo para a
atividade j ) ; um país, englobando sistemas contábeis e sua valoração.
( I - A ) - 1 = Matriz inversa de Leontief; instrumentos estatísticos – Contas Nacio-
f = demanda final. nais, Contas Satélites e alguns indicado- 2.3 Modelo econométrico
res socioeconômicos. As Contas Nacionais
oferecem as referências básicas de classifi- Os modelos econométricos são utiliza-
A Matriz de Leontief, portanto, possibi- com diferentes setores – diretos, indiretos cação de atividades e de setores institucio- dos largamente para avaliar relações de
lita calcular as variações na produção dos e induzidos de produção, renda, emprego, nais, definições sobre a fronteira econômi- causalidade, também conhecida por in-
setores que são necessárias para atender impostos, entre outros, bem como as liga- ca e conceitos para definir e classificar uni- ferência causal. Kedong e Xuamei (2018)
a variações na demanda final, ou seja, por ções interindustriais, sendo, neste caso, os dades estatísticas e suas transações (FEIJÓ; pontuam a existência da análise científica
exemplo, qual é o nível de produção ne- encadeamentos ou setores chaves dos se- RAMOS; YOUNG, 2013). nomeada Econometria Marinha: “É um sis-
cessário para satisfazer a necessidade de tores econômicos. No âmbito das Contas Nacionais, há o tema de estimativa metodológica que utili-
um ou mais componentes da demanda fi- Os índices de ligações interindustriais, Sistema de Contas Nacionais (SCN), que za teoria econômica, estatística e métodos
nal. Cabe destacar que o modelo IO não segundo Guilhoto e Picerno (1995), in- está orientado nas Contas Econômicas In- matemáticos para revelar relações causais
atende apenas à mensuração de indicado- dicam quais setores dentro da economia tegradas (CEIs) e nas Tabelas de Recursos e entre vários fatores envolvidos nos fenô-
res econômicos e sociais, mas também se teriam maior poder de encadeamento, Usos (TRUs). De acordo com Instituto Bra- menos econômicos oceânicos (KEDONG;
presta a estimar e quantificar impactos – considerando a perspectiva de Rasmussen sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), “O XUAMEI, 2018, p. 20).
calculando os multiplicadores temos uma (1956) e Hirschman (1958). Os índices que SCN apresenta informações sobre a gera- Cameron e Trivedi (2005), aprofundan-
ferramenta que poderá subsidiar de infor- permitem indicar o poder de encadeamen- ção, a distribuição e o uso da renda no País. do a análise econométrica, dedicam-se ao
mações projetos e/ou políticas que depen- to – as ligações interindustriais da economia Há também dados sobre a acumulação de estudo da microeconometria, caracterizan-
dam de dados relacionados a impactos de – são de dois tipos: (i) backward linkages ativos não financeiros, patrimônio finan- do-a como um conjunto de métodos em-
diferentes eventos, considerando os links (índice de ligação para trás), que informam ceiro e sobre as relações entre a economia píricos desagregados ao nível do indivíduo,

60 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 61


famílias e firmas, podendo incluir dados de simplificação para exibir uma FP com
regionais e/ou locais. Smith (2010) cita dois insumos (Equação 6) e uma FP carac-
que a inferência causal, através da mi- terística CES (Equação 7).
croeconometria, pode informar tanto a
configuração de políticas espaciais quan- (6)
Y=F (K,L)
to a avaliação dessas políticas. Ou seja,
permite estimar e entender a eficiência e Onde:
o impacto de políticas públicas anterior- Y = produto;
mente a sua implementação, propiciando K = capital;
a oportunidade para aprimoramentos e L = trabalho.
alterações a menores custos econômicos, (7)
ambientais e sociais. Y ( K , L ) = ( α K ρ + b L ρ) 1/ρ
Embora seja utilizado com menor
Onde:
frequência, cabe destacar os métodos
microeconométricos para a área da eco- Y = produto;
nomia relacionada ao mar, por exemplo, K = capital;
em modelagens setoriais. Nesse sentido, L = trabalho; 3. Do método à prática: estudos da economia relacionada ao mar
Smith (2010) propôs em seus estudos a e b = coeficientes de distribuição dos Analisando a literatura internacio- tificação de contribuições econômicas diretas
análises espaciais quantificando aspectos insumos; nal da Ciência Econômica relacionada à nos resultados de pesquisas realizadas por ins-
relacionados ao esforço de pesca e dis-
p = parâmetro. temática “mar”, “costeira” e “azul”, é titutos nacionais de estatística e/ou pesquisas
tância de viagem para captura; impac-
possível registrar diversos estudos que se especializadas ad hoc; modelagem econômi-
tos socioeconômicos aos pescadores na
dedicam a quantificar a economia e os ca de impactos diretos, indiretos e induzidos
estruturação de políticas públicas sobre A CES pode se assumir as formas de
respectivos impactos que invariavelmen- por meio de modelos de insumo-produto; e
a constituição de zonas de exclusão de outras FP, por exemplo, Cobb-Douglas ou
te se espraiam em diversos segmentos desenvolvimento de contas satélites da eco-
pescas, reservas marinhas e áreas para Leontief1 em função dos valores assumi-
socioeconômicos e ambientais. Contudo, nomia oceânica de acordo com o sistema de
determinadas pescas. dos pelo parâmetro, maior sensibilidade
no caso brasileiro, apesar de apresentar contas nacional. Internacionalmente, dados
na relação capital-trabalho, retornos cons-
umas das maiores extensões costeiras do consistentes e comparáveis estão disponíveis
2.4 Função de produção constant tantes de escala,2 por exemplo. Isto, por si,
mundo, há um reconhecimento mais re- para poucas atividades econômicas oceânicas
elasticity of substitution (CES) ou a torna diferenciada e complexa. Ao esta-
cente da importância desta temática. Vale (JOLLIFE et al., 2021, p. 6).
elasticidade constante de substituição belecer todas as variáveis que contribuem
destacar o esforço de Carvalho (2018);
para a economia total de um país, pode-se Para a análise da economia relaciona-
Carvalho e Moraes (2021) e o tomo 4 da
De acordo do Pindyck e Rubinfeld derivar da equação (7) o PIB total do país/ da direta e indiretamente ao mar, inde-
presente Obra, mensurando a economia e
(2012), uma função de produção (FP) indi- região ou então de um setor da economia. pendentemente do método empregado,
os setores relacionados ao mar.
ca o máximo de produção para cada com- Assim, destaca-se que os métodos su- Kildow e Mcllgorm (2010) apontam que
Jollife et al. (2021) acenam que ainda
binação específica de insumos, destacando pracitados são passíveis de utilização para os indicadores setoriais mais comumente
ocorrem grandes dificuldades nas medições
que produção e insumos são fluxos e que a avaliar a contribuição econômica e social, utilizados são: Produto Interno Bruto (PIB),
atuais da atividade econômica oceânica em
FP permite que os insumos sejam combina- e/ou estimação de impactos inerentes. Valor Adicionado Bruto (VAB) e ocupações.
suma pelo desafio de isolar as atividades
dos em proporções variadas, consequente- Contudo, grifa-se que há vários outros Na Tabela 1, estão compilados alguns estu-
econômicas relacionadas ao oceano nas es-
mente há uma miríade de possibilidades de modelos, embora com menor capacidade dos relacionados a atividades econômicas
tatísticas agregadas das nações. Sobre isso
obtenção do produto. de expressar, por exemplo, os fluxos e os do mar. Nela, pode-se notar autores pio-
As FP assumem diferentes tipos, entre engajamentos multissetoriais, que são uti- [...] os métodos adotados nos estudos neiros na temática, assim como tendências
elas, a conhecida elasticidade constante de lizados para os fins considerados no obje- nacionais da atividade econômica oceânica na adaptação de algumas metodologias
substituição (CES). Utilizando a estratégia tivo do trabalho. tendem a se enquadrar em três grupos: iden- apontadas na seção 2.

62 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 63


Tabela 1. Síntese de estudos da economia relacionada direta e indiretamente ao mar maior desagregação do modelo com dados (GREALIS et al., 2015)); (iv) possível uso para
s(ano)País(ano)
País(ano)
Fonte País(ano)
Fonte
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Fonte
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Fonte
Fonte
Fonte
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Metodologia Metodologia
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Metodologia
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Metodologia
Metodologia
Estudo
Estudo
Estudo Indicadores
Estudo
Estudo Indicadores
Indicadores Indicadores
Indicadores
Indicadores
Indicadores
Indicadores de 2010 para mais setores da economia do avaliação dos impactos oriundos da atuali-
mar (GREALIS et al., 2015); (iii) extensão do zação do planejamento marítimo integrado
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Global Global Global
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Construction Inquiry;
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Activity
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Business
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Classificação Business Activity
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Moraes
Moraes Moraes (GPV); Payments;
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Imports; Occupations,
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Exports;
Occupations,
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na (2010)
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Chinese
China
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National Accounts;
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Input-Output Input-Output
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Input-Output
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Matriz .Zhaoetetal.al. Zhao
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Matrix
Produto
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Industry
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China (2000-China Annual
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ChinaChinaChinese(2000-
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Annual
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Chinese
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Industry Annual Chinese ConstantConstant
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ConstantConstant Jiang et al . etetalal
Jiang
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al.al. PIB (GDP); PIB Capital;
PIB
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(GDP); PIBPIB;
Capital; Capital;
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China
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China Annual
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China
China (2000-
(2000-Chinese
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(2000-
Yearbook; Yearbook;
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Annual
Annual
Annual Chinese
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Chinese
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Capital;
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Capital; Capital;
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Ocupações Seafood
2011) 2011) 2011) China2011)2011)
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(2000- Annual
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Annual
Annual
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Marine
Marine
Marine Chinese
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Occupations Occupations Occupations Culture
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YearbookYearbookYearbook Yearbook
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YearbookYearbook Yearbook
Marine Yearbook
Yearbook
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Ireland (2007)
Ireland Irish Irlanda
Central
Ireland
Ireland(2007)
(2007) (2007)
Irish(2007)
Statistics
IrishCentral Irish
Central
Yearbook Irish Central
Central
Statistics
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Statistics Input-Output Input-Output
Input-Output Modelo
Input-Output Insumo-
Morrissey and O’Donoghue
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and
and ande O’Donoghue
O’Donoghue
O’Donoghue VAB (GAV) VAB; (GAV)
VAB (GAV) ; VAB;
VAB; (GAV) Ocupações
; Fonte: Adaptado de O’Donougue et al., (2021)
Office;(2007)
Irlanda Census
Office; ofCensus
Office;
Irish Office;
industrial
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Census
Central Census
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industrial
Statistics industrial
Model Model
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Model
Insumo- Morrissey e O’Donoghue Occupations VAB;Occupations
Occupations
Occupations Ocupações
production; Annual
production;
production;
Office; production;
production;
AnnualofAnnual
Annual
Census Annual
industrial Produto O SEEA-EA é um avanço do System of En- ecossistêmicos e vincular essas infor-
Services
Services
Services Inquiry; Services
Services
Inquiry;
Inquiry;
Census
production; Inquiry;
Inquiry;
ofCensus
Census
Annual Census
ofofCensus of of vironmental-Economic Accounting (SEEA), mações a medidas de atividade econô-
Building and Building
Building andBuilding
Building
and
Construction
Services andand
Construction
Construction
Inquiry; Construction
Construction
Census of
Building and Construction Tabela 1. Síntese de estudos da economia relacionada direta e indiretamente ao mar. ano 2012, habilitando a agregação de variá- mica e humana. Foi desenvolvido para
Fonte: Adaptado de Tabela Nicolls et 1. al., (2021);
Síntese Grilli et da
de(2021);
estudos al.,economia
(2021); Carvalho
relacionada e Moraes
direta e(2021); Carvalho
indiretamente ao (2018);
mar. Vega e veis físicas e monetárias e a comparação com responder a uma série de demandas e
Fonte:
Fonte:de
Fonte: Adaptado Adaptado Fonte:
Adaptado
Fonte:
Nicolls de
et Adaptado
Adaptado
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Nicolls
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Nicolls
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al.,al.,
Grilli (2021);
Grilli
(2021);
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(2021); al., Grilli
Grilli
(2021);
(2021);
Carvalho et
etetal.,al.,
eCarvalho
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(2021);
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Moraes e Moraes
(2021);
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Moraes
Carvalho Carvalho (2021);
Carvalho
(2021);
(2018); Carvalho
(2018);
Carvalho
Vega(2018);Vega
Vega
e Hynes (2018);
(2018);
eeeHynes
Hynes
(2017); Vega
Vega e (2016);
(2017);
OCDE(2017);Hynes
e HynesOCDE
OCDE (2017);
(2017);
(2016);OCDE
(2016);
Zhao OCDE Zhao
Zhao
etGOAP
al., (2016);
(2016);
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(2014); ZhaoZhao
(2014);
al., (2014);
Jiang et al.,
Jiang
et al.,Jiang (2014);
(2014); Jiang
Jiang
Hynes (2017); OCDE (2016); Zhao al., (2014); Jiang et al., (2014); Morrissey O’Donoghue (2013); (s/a).
Fonte: Adaptado de Nicolls et al., (2021); Grilli
et al., etetet
(2014); al.,
al.,(2021);
(2014);
al., et Carvalho
(2014);
Morrissey et al.,
Morrissey
eMorrissey
al., e Moraes
(2014);
(2014);
O’DonoghueeMorrissey(2021);
Morrissey
eO’Donoghue
O’Donoghue Carvalho
eGOAP
O’Donoghue
e O’Donoghue
(2013); (2013);
(2013); (2018);
GOAP(2013);
GOAP
(s/a). Vega
(2013);
(s/a).
(s/a). e Hynes
GOAP
GOAP (2017);
(s/a).
(s/a). OCDE (2016);
*Em construção à época. Zhao et al., (2014); Jiang os dados do contas nacionais. De acordo com desafios de políticas com foco em tor-
et al., (2014);*Em
*Emmodelos Morrissey
*Emconstrução
construção e O’Donoghue
*Em
construção
à*Em construção
época. àépoca.(2013);
àconstrução
época. àGOAP
época.(s/a).
à época. a ONU (2021, p. 1), pode ser entendido como: nar visíveis as contribuições da natureza
Com relação aos avanços em uma contabilidade linkando o ecossistema
*Em construção à época. para a economia e as pessoas.
dedicados à economia do mar, destacare- a atividades econômicas. [...] uma estrutura estatística integra-
mos: o Irlandês Bio-Economy Input-Output O’Donougue et al., (2021) pontuam as apli- da de base espacial para organizar in- Assim, até o presente momento, o SEE-
(BIO model),3 proposto com base em um cações do BIO model e seus respectivos au- formações biofísicas sobre ecossistemas, A-EA leva em conta as seguintes perspecti-
modelo IO nacional; System of Environ- tores, a partir de desagregações da MIP na- medir serviços ecossistêmicos, rastrear vas ecossistêmicas: (i) espacial: o número de
mental-Economic Accounting – Ecosystem cional: (i) desagregação do setor de frutos do mudanças na extensão e condição dos ecossistemas em determinado território;
Accounting (SEEA – EA) desenvolvendo mar (VEGA; HYNES, 2014); (ii) atualização e ecossistemas, avaliar serviços e ativos (ii) ecológica: medição de sua integridade,

64 ECONOMIA
64 ECONOMIA AZUL
AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 65
saúde e condição ecológica; (iii) benefício de custos de degradação (ONU, 2021). A Figura 2 proporciona melhor entendimento das relações entre as contas e os ecossiste-
para a sociedade: benefícios para as pessoas, Contudo, não é trivial a integração de mas considerados. Cabe destacar que o ecossistema marinho ser avaliado no referido escopo.
a economia e a sociedade – abrange tam- variáveis caracterizadas como estoques
bém um viés econômico ao incorporar os (em geral, abrangem dados do ecossis- Figura 2. A relação entre as contas do SEEA-EA
serviços ecossistêmicos; (iv) valor de ativos: tema) a variáveis fluxos (em especial, as ECOSYSTEM TYPES
ativos que fornecem serviços e benefícios no monetárias), o que desperta a atenção e
futuro, dependendo de seu estado ecológico evidencia o grande potencial do sistema Forests I Wetlands I Coral reefs I Agricultural land I ...
ACCOUNTS
e das demandas sociais por serviços ecossis- contábil em elaboração. A Tabela 2 apre-
têmicos; e (v) propriedade institucional: con- senta as relações das contas do SEE-EA, Opening and closing area
Extent account Ecosystem conversions
teúdos pertinentes a governança e alocação em termos físicos e monetários.
Tabela 2. As contas ecossistêmicas
Condition account Opening and closing condition
Contas
Conta Variáveis
Variáveis Propostas
Propostas
Ampliação do ecossistema Físicas Indicadores de composição e mudança nos
Ecosystem services Supply & Use Provisioning / Regulating & maintenance /
tipos de ecossistemas
flow accounts Cultural services
Condição do ecossistema Físicas Medição da capacidade de um ecossistema de
(Physical & Monetary
fornecer diferentes serviços ecossistêmicos; Used by: Business / Governments / Households

Integridade ecológica
Fluxo de serviços Físicas As TRUs registram os fluxos de serviços Monetary ecosystem Opening and Closing Values
asset account Ecosystem enhancement and Ecosystem degradation
ecossistêmicos ecossistêmicos finais fornecidos por ativos
ecossistêmicos e usados por unidades
Fonte: ONU (2021)
econômicas
4. Considerações finais
Registro de fluxos de serviços intermediários
entre ativos ecossistêmicos O escopo do presente capítulo foi Ao transformarem dados em informações,
apresentar uma concisa revisão de lite- as análises advindas de tais modelagens ha-
Fluxo de serviços Monetárias Estimativas de serviços ecossistêmicos são
ratura no que tange às principais meto- bilitam, por exemplo, a alteração, ou então,
ecossistêmicos baseadas na estimativa de preços de serviços dologias empregadas para contabilizar a criação de políticas públicas mais eficientes
ecossistêmicos individuais multiplicados pelas economia relacionada ao mar e quanti- para zonas costeiras e municípios litorâneos.
quantidades físicas registradas na conta de ficar seus impactos em países pioneiros Entre os métodos apontados, dois destacam-
e emergentes na referida temática. Os -se, sejam eles: Modelo IO e o Sistema de
fluxo de serviços ecossistêmicos físicos
principais objetivos que justificam a men- Contas Nacionais. Embora tenham suas limi-
Ativos do ecossistema Monetárias Registrar informações sobre estoques e suração da contribuição, quantificação e tações, como a não incorporação de mudan-
monetário variações de estoques dos ativos análise dos impactos inerentes dão-se no ças comportamentais dos agentes, ainda são
Tem por base a avaliação monetária dos âmbito da tomada de decisões por atores os mais utilizados e com grande capacidade
serviços ecossistêmicos a partir do VPL4
governamentais, players e a sociedade. preditiva, fazendo uso das Contas Nacionais.

Alterações nos valores dos ativos, vistas o Referências


aprimoramento do ecossistema ou degradação
ALLEN CONSULTING. 2004. The Econo- CAMERON, C. TRIVEDI, P. 2005. Microeco-
também são inclusos
mic Contribution of Australia’s Marine nometrics: Methods and Applications. New
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Valor Presente Líquido.


5

66 ECONOMIA AZUL
66 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 67
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68 ECONOMIA AZUL Economia e o Mar: Métodos e Indicadores 69


3

INSTRUMENTOS ECONÔMICOS E
FINANCEIROS APLICADOS À ECONOMIA AZUL
Mariana Graciosa Pereira
Luan Santos

1. Introdução

A realização de atividades econômi- mercados falham, diferentes instrumentos


cas possui estreita relação com o meio no podem ser aplicados para solucionar o
qual estão inseridas e sua execução pode problema e aumentar a eficiência da eco-
gerar efeitos de longo prazo no ambiente, nomia. No caso em que falhas de merca-
os quais podem ser irreversíveis e prejudi- do podem gerar degradação ambiental ou
car não somente a própria atividade eco- esgotamento de recursos naturais, a socie-
nômica, mas também a sociedade como dade depende de políticas públicas para
um todo. O processo produtivo demanda garantir a proteção do meio ambiente. As
recursos naturais (matéria-prima) e gera estratégias a serem adotadas devem ser di-
resíduos que podem causar degradação recionadas às falhas de mercado que neces-
ao meio ambiente. O consumo de bens e sitam ser corrigidas. As políticas públicas e
serviços produzidos também gera resídu- os instrumentos para correção de falhas de
os que podem causar degradação ao meio mercado incluem, de forma geral, políticas
ambiente. O estado geral do meio ambien- de comando e controle e políticas baseadas
te no qual o sistema econômico está inse- em mercados (instrumentos econômicos).
rido pode, por sua vez, impactar tanto o Ambas as estratégias visam mudar o
processo de produção quanto o bem-estar comportamento das pessoas (famílias) e
dos consumidores (SANTOS, 2014; MUEL- das empresas (firmas), e a primeira foca
LER, 2007). no estabelecimento de instrumentos legais
Os efeitos causados pelas atividades e fiscalização. Já as políticas baseadas em
econômicas no meio ambiente (seja pelo instrumentos econômicos (ou de mercado)
consumo de bens e serviços, seja pela gera- fornecem incentivos ou penalidades eco-
ção de resíduos e poluição), por vezes, não nômicas objetivando induzir os agentes
são contabilizados nos custos de produção poluidores a determinado comportamen-
e resultam em falhas de mercado como to, internalizando os custos que impõem
externalidades e direitos de propriedade à sociedade pela poluição que produzem
mal definidos ou mal distribuídos. Quando ou compensando os benefícios gerados

70 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 71


Instrumentos Econômicos e Financeiros 71
por determinadas ações (MANKIW, 2017; melhoria da qualidade ambiental mediante e de provisão e, em menor escala, de re- 57 países implementaram 209 instrumen-
MUELLER, 2007). a seleção da tecnologia a ser adotada e do gulação – e considerando principalmente tos econômicos relevantes para os ocea-
Sob a ótima econômica, os instrumentos momento de sua implantação (PERMAN et o valor de uso direto. Caminhos para o nos, dos quais 188 estão atualmente em
caracterizam-se como econômicos quando al, 1996; THOMAS; CALLAN, 2010). aprimoramento desse instrumento incluem vigor (OCDE, 2020). O instrumento mais
afetam o cálculo de custos e benefícios das Neste sentido, no presente capítulo serão a execução de estudos de alta qualidade, comumente utilizado são os impostos, re-
atividades, influindo sobre o processo de- abordados diferentes tipos de análises e ins- comparáveis e com descrição precisa dos presentando pouco mais da metade dos
cisório, no sentido de produzir melhorias trumentos econômicos, bem como mecanis- cenários; ampliação da valoração para além instrumentos relevantes para os oceanos
na qualidade ambiental (SANTOS, 2014). mos financeiros, que podem ser aplicados às dos ambientes costeiros, tendo em vista a no banco de dados do PINE, seguido por
Comparativamente aos mecanismos regu- diferentes atividades econômicas que ocor- tendência da indústria em se expandir para taxas e encargos. Os impostos relevantes
latórios (comando e controle), os instru- rem no oceano. Busca-se, dessa maneira, áreas profundas; ampliar a valoração de para a sustentabilidade dos oceanos gera-
mentos econômicos têm a seu favor a flexi- apoiar os países na criação de incentivos que serviços ecossistêmicos de regulação e su- ram pelo menos 4 bilhões de dólares em
bilidade permitida aos agentes poluidores, geram receitas para a conservação e para o porte; e aprimorar a determinação do valor 2018, sendo os impostos sobre poluição
isto é, procuram assegurar-lhes liberdade uso sustentável do oceano, favorecendo a de opção e valor de não uso. relacionada aos oceanos, ao transporte e
para escolher economicamente a melhor continuidade destas atividades garantindo a OCDE (2017) destaca que é necessá- à energia os que mais geram receita.
alternativa para alcançar os objetivos de qualidade ambiental do meio marinho. rio um amplo conjunto de instrumentos
de política para enfrentar eficazmente as 2.1. Impostos, taxas e encargos
2. Instrumentos econômicos aplicados à Economia Azul pressões sobre o oceano e garantir que o
oceano, os mares e os recursos marinhos Uma vez que sejam atribuídos valores
O ambiente marinho é um ativo que for- oceânicas devem ser mensurados e even- sejam conservados e gerenciados de forma monetários a ativos disponibilizados pelos
nece uma variedade de bens e serviços aos tualmente compensados. sustentável. Destaca, nesse contexto, al- ecossistemas marinhos e costeiros, é pos-
processos de produção e consumo, que in- A valoração ambiental consiste em um guns tipos de instrumentos econômicos de sível estabelecer, por exemplo, cobranças
cluem as matérias-primas necessárias para a conjunto de métodos utilizados para atribuir política disponíveis, dentre eles: impostos, pelo seu uso e/ou eventual perda por con-
produção e demais serviços ecossistêmicos valor a bem ou serviço ambiental que ain- taxas e encargos (por exemplo, taxas de ta da realização de atividades econômicas
que possibilitam a realização destas ativida- da não possui valor de mercado (CASTRO; entrada em parques marítimos); sistemas que resultem em impactos negativos sobre
des. Assim, as indústrias baseadas nos oce- NOGUEIRA, 2019). Os ativos, bens e serviços de gestão baseados em direitos, também o ambiente. Impostos/taxas/cobranças são
anos utilizam matérias-primas dos ecossiste- ecossistêmicos podem apresentar diferentes conhecido como sistemas de licenças ne- encargos cobrados das empresas como for-
mas marinhos (como petróleo, gás natural, grupos de valores econômicos, os quais são gociáveis (por exemplo, quotas individual- ma de internalizar as externalidades nega-
recursos pesqueiros) e devolvem ao ambiente representados pelo Valor Econômico Total, mente transferíveis para a pesca); subsídios tivas geradas pelo processo de produção.
resíduos e rejeitos, decorrentes do processo que é composto pelo valor atribuído aos di- para promover a biodiversidade e a reforma Esses tipos de cobranças podem ser apli-
de produção (ex.: efluentes de navios, resí- ferentes tipos de uso de determinado am- de subsídios prejudiciais ao meio ambiente; cados diretamente a empresas que emitem
duos sólidos), que podem causar degradação biente (OCDE, 2019). A estratégia de valorar pagamentos por serviços ambientais (PSA); gases de efeito estufa (GEE) e, assim, redu-
ambiental, o que pode prejudicar as próprias bens e serviços provenientes do meio mari- compensações para a biodiversidade; pe- zir os efeitos das mudanças climáticas sobre
atividades econômicas que dependem do nho oferece subsídios na tomada de decisão nalidades por não conformidade; multas o ambiente marinho; taxas sobre produtos
oceano (como o turismo) e a sociedade como em relação às ações que impactem o am- por danos (por exemplo, derramamento de plásticos vêm sendo recomendadas como
um todo (PEREIRA, 2020). biente marinho, trazendo clareza em relação petróleo); e impostos sobre plásticos de uso forma de desencorajar seu consumo e fa-
Serviços ecossistêmicos prestados pelo ao custo-benefício quanto à eventual perda único (por exemplo, sacos plásticos). A Ta- vorecer a redução do lixo marinho, tendo
oceano são fundamentais à manutenção ou proteção destes habitats. bela 1 sumariza as principais características em vista que o plástico é o principal com-
da qualidade de vida dos seres vivos e ga- Segundo Torres e Hanley (2016), a de cada um desses instrumentos. ponente desses resíduos; além disso, taxas
rantem a subsistência de diferentes comu- valoração ambiental de serviços ecossis- Neste capítulo, vamos nos concentrar também podem ser cobradas no âmbito da
nidades ao longo da costa. Sendo assim, têmicos prestados no meio marinho vem na análise dos instrumentos mais relevan- indústria do turismo como forma de anga-
sua utilização e eventual redução da pres- crescendo ao longo dos anos, tendo sido tes e de maior uso. Vale destacar, entretan- riar recursos para conservação dos atribu-
tação desses serviços em virtude de impac- focada nos serviços denominados “cul- to, que, a partir dos dados da OECD Policy tos naturais que são atrativos aos turistas
tos ambientais causados pelas indústrias turais” (especialmente valor recreacional) Instruments for the Environment (PINE), (HILMI ., 2019; OOSTERHUIS et al, 2014).

72 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 73


Quanto às taxas, a cobrança deve ser es- exclusão das populações locais das áreas
Tabela 1. Instrumentos econômicos tabelecida em um nível que possa resultar de uso tradicional. Isso pode levar a con-
aplicados à Economia Azul de fato na mudança de comportamento, flitos entre as comunidades locais e estas
devendo, assim, considerar a elasticida- áreas, prejudicando a fiscalização da área
Instrumento
Instrumento Descrição e principais
Descrição características.
e principais características de-preço do produto; deve ser levado em protegida e, portanto, seu impacto ecoló-
Impostos Com base no princípio do poluidor-pagador, os impostos conta, ainda, o fato de que nem sempre re- gico (POLLNAC et al, 2010).
colocam um custo adicional no uso do recurso natural ou na ceitas levantadas através de tributação am- Muitos países utilizam um sistema de
emissão de um poluente para refletir as externalidades biental irão diretamente financiar ativida- taxas em dois níveis e cobram dos visitan-
ambientais negativas que estes geram. Como tal, os impostos des de proteção de ecossistemas marinhos tes estrangeiros taxas mais altas, como é o
criam incentivos para que tanto produtores quanto e taxas estabelecidas localmente podem re- caso das taxas de entrada nas Áreas Prote-
consumidores se comportem de forma mais ambientalmente
sultar no deslocamento dos impactos para gidas Marinhas no Quênia (OCDE, 2017).
sustentável. Exemplos incluem os impostos sobre o despejo de
resíduos e sobre outros poluentes no mar. outras regiões (OOSTERHUIS et al, 2014). Em algumas áreas, os turistas pagam mais
Como exemplo de aplicação, pode- do que os residentes. Finalmente, fatores
Taxas e encargos Consistem em um pagamento solicitado a um governo geral, mos destacar que muitas áreas protegi- institucionais também podem dificultar ou
ou seja, o pagador da taxa recebe algo em troca que é das sofrem de subfinanciamento crônico até mesmo impedir a implementação de
mais ou menos proporcional a essa taxa. Eles podem ser (WATSON et al, 2014; GILL et al, 2017), taxas de usuários. Em Antígua e Barbuda,
usados para controlar o acesso a recursos através da extração
de preços, por exemplo, por meio de uma taxa de licença de
impactando sua capacidade de proteger por exemplo, três agências governamentais
pesca ou taxa de entrada para uma área marinha protegida. a biodiversidade e fornecer serviços ecos- compartilham a responsabilidade de ad-
sistêmicos. Dada a correlação direta entre ministrar as áreas de proteção marítimas.
Subsídios Os governos pagam subsídios aos produtores para apoiar os níveis de financiamento e a eficácia da Uma delas não tem autoridade para co-
a produção de certos bens ou serviços. Os subsídios podem ter conservação e do uso sustentável da bio- brar taxas na região que administra, como
um impacto ambiental negativo se aumentarem o nível de
diversidade (WALDRON et al, 2017), as os outros dois órgãos governamentais, de
uma atividade prejudicial ao meio ambiente, por exemplo, a
extração de areia para construção. Por outro lado, os subsídios políticas para lidar com as deficiências de modo que algumas áreas de proteção marí-
motivados pelo meio ambiente têm a intenção de ter um financiamento das áreas de proteção marí- timas cobram taxas de acesso e outras não.
impacto positivo, diminuindo o custo de atividades timas são uma prioridade. Nesse sentido, as Além disso, as taxas coletadas são frequen-
econômicas que têm menor impacto ambiental. taxas provaram ser um instrumento eficaz temente devolvidas ao orçamento central,
não apenas para gerar receita para ajudar enfraquecendo o incentivo para que os ge-
Pagamentos por Serviços Com base no princípio do beneficiário pagador, os PSEs
Ecossistêmicos (PSE) são transações voluntárias entre usuários e prestadores de
a cobrir o custo de gerenciamento das áre- rentes as coletem.
serviços que estão condicionados a regras acordadas de as marinhas protegidas, mas também para
gestão de recursos naturais. Um exemplo seria um esquema controlar o acesso a áreas marinhas de alto 2.2. Subsídios
que paga pela restauração de manguezais para armazenar valor (OCDE, 2017).
carbono (por exemplo, pagamentos de carbono azul) e Há desafios e oportunidades no uso Os subsídios sobre a redução das
melhorar a proteção costeira contra enchentes. de taxas e encargos. A falta de pontos emissões de poluição ocorrem quando
Compensações para a Com base na hierarquia de mitigação, a compensação é um de acesso definidos às áreas marítimas uma autoridade pública paga ao poluidor
biodiversidade processo pelo qual os impactos inevitáveis do desenvolvimento são pode dificultar a implementação de taxas pela redução de certa quantidade, por
compensados pela criação de um novo habitat que é equivalente de usuários nas áreas de proteção marí- exemplo, de toneladas de poluição emi-
a áreas destruídas. As compensações de biodiversidade podem timas. Isso cria problemas de fiscalização, tida, ou quando tal autoridade encoraja
ser utilizadas, por exemplo, para compensar o desenvolvimento pois geralmente elas podem ser acessadas os poluidores a instalarem equipamentos
da infraestrutura relacionada ao turismo, portos e à extração de
por todos os lados e o custo da fiscaliza- para abaterem suas emissões (PEARCE;
recursos naturais.
ção pode ser alto (OCDE, 2017). Fatores TURNER, 1989; FIELD; FIELD, 2014). Este
Fonte: OCDE (2017) sociais também podem reduzir a eficá- instrumento funciona como uma análise
cia das taxas sobre as áreas de proteção do custo de oportunidade, pois quando o
marítima, por exemplo, se elas levarem à poluidor opta por emitir uma unidade de

74 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 75


poluição, está em vigor a renúncia ao re- de novas tecnologias para o mercado, tor- entanto, instrumentos econômicos que fo- Sob a ótica econômica, recursos pes-
cebimento do subsídio que ele poderia ter nando-o mais competitivo, e destrutivos, quem na questão da ausência de direitos queiros provenientes do oceano são exem-
ganhado, caso ele tivesse escolhido não quando utilizados por muito tempo, crian- de propriedade sobre estes bens. plos de “recursos comuns”, sendo de-
poluir esta uma unidade (SANTOS, 2014). do interesses que são difíceis de serem re- De acordo com Faucheux e Noël (1995), nominados “rivais” (a utilização intensa
Dessa forma, os subsídios, assim como solvidos no futuro (EEA, 2005). o funcionamento dos sistemas de licenças pode vir a esgotar os recursos pesqueiros)
as taxas, também podem ser utilizados A adoção subsídios – bem como de ta- negociáveis se dá da seguinte forma: o Es- e “não excludente” (a princípio, é difícil
para conduzir a mudança de comporta- xas – como estratégias para mudança de tado, ou o órgão de controle, decide de controlar ou impedir o acesso de pessoas
mento, mas ao contrário das cobranças, comportamento e eventual redução dos antemão sobre a quantidade de poluição aos recursos pesqueiros oceânicos) (FIELD;
que servem para frear um tipo de con- danos sobre o ambiente marinho deve aceitável no meio ambiente e os distribui FIELD, 2014; STERNER; CORIA, 2012; TIE-
duta, os subsídios podem ser implemen- considerar, no entanto, efeitos que podem ou os põe à venda no mercado de títulos TENBERG; LEWIS, 2015). Exemplos de ins-
tados para incentivar comportamentos e resultar na ineficiência e falta de efetivida- os direitos de poluição. Cada detentor trumentos econômicos para este tipo de
adoção de métodos produtivos ambien- de de resultados. Dessa forma, as políticas desses títulos ou certificados terá, portan- falha de mercado são as cotas de utilização
talmente sustentáveis. Eles podem ser devem ser desenhadas de modo a gerar to, o direito de emitir uma quantidade de de recursos naturais, programas de licenças
adotados, por exemplo, para o incentivo incentivos que não sobrecarreguem ainda poluição correspondente ao montante de negociáveis e cap-and-trade. Por meio des-
ao desenvolvimento de energias oceâni- mais o meio ambiente marinho e, logo, não títulos detido. A diferença, caso ele polua ses instrumentos, o direito de utilização de
cas renováveis, à reutilização de embala- se tornem os chamados “subsídios perver- mais do que o permissível, considerando- recursos naturais é distribuído entre aque-
gens plásticas com sistemas de depósito- sos”. Um exemplo deste tipo de subsídio -se o total de licenças possuídas, ele de- les que o fazem até um determinado limi-
-reembolso, implantação de sistemas de foram aqueles destinados ao setor pesquei- verá abater (despoluir). Resumindo, este te e podem ser negociados em mercados.
controle de poluição em embarcações e ro pela redução de preços de combustíveis mercado de licenças de emissão funciona Na Economia Azul, estes têm sido aplicados
eliminação/redução de tarifas de “bens ou incentivo a aquisição de novas embar- no formato cap-and- trade, isto é, fixa-se para a utilização de recursos pesqueiros, vis-
ambientais” (FLYNN, 2015; KUWAHA- cações e foram considerados prejudiciais, um standard (cap), divide-o em licenças, to que sua utilização sem regulação pode
TA; MONROY, 2011; OOSTERHUIS et al., pois promovem o excesso de capacidade de que conferem “direito” a poluir, e existe levar ao esgotamento das espécies-alvo e,
2014; UNCTAD, 2014). frota e sobre-explotação de estoques pes- a possibilidade de compra e venda dessas eventualmente, inviabilização da própria in-
Os subsídios podem tomar a forma de queiros, via redução de custos da atividade licenças (trade). A partir disso, as empresas dústria pesqueira.
transferências diretas de fundos (emprésti- pesqueira, os quais permitem que a pesca decidirão como agir no mercado, de acor- Programas como esses estabelecem,
mos, por exemplo), isenções fiscais, apoio continue em níveis econômicos ineficientes do com o confronto entre o custo marginal por exemplo, “total de captura permiti-
à pesquisa e desenvolvimento (P&D) etc. (BANCO MUNDIAL, 2016). de abatimento e o preço das licenças (PE- da”, “cotas individuais”, “cotas individuais
O seu objetivo é alcançar a redução das ARCE; TURNER, 1989; FAUCHEUX; NOËL, transferíveis”, “cotas individuais por em-
emissões pelos agentes, mas pode tam- 2.3. Sistemas de licenças negociáveis 1995; PERMAN et al, 1996). barcação” ou até “cotas comunitárias”,
bém incentivar o desenvolvimento e a di- Faz-se importante destacar que a abor- visando deixar clara a alocação de direitos
fusão de novas tecnologias mais limpas, Embora não destacado por OCDE dagem deste instrumento econômico se de captura total de uma pescaria para um
ajudar a criar novos mercados para recur- (2017), os sistemas de licença negociáveis difere da utilizada pelas taxas e pelos sub- indivíduo ou grupo (os grupos podem ser
sos e serviços ambientais, além de encora- também se configuram como um impor- sídios, na medida em que os mercados de baseados na comunidade), que geralmente
jar novos comportamentos dos consumi- tante instrumento econômico no contexto licença de emissões trabalham com quan- pode ser compartilhada ou negociada em
dores (SANTOS, 2014). da Economia Azul. Taxas e subsídios são tidades, ao invés de considerar os preços. mercados. Em um programa de compar-
Percebe-se, entretanto, que os subsí- instrumentos comumente aplicados para A mesma abordagem também é adotada tilhamento de captura, são estabelecidos
dios se tornam ineficientes se a sua exis- a correção de externalidades (positivas ou pelos instrumentos de comando e contro- limites de captura em toda a pescaria, sen-
tência levar a uma superprodução do pro- negativas) do processo produtivo, visando le, que limitam as emissões de poluição do, então, atribuídas porções da captura,
duto subsidiado ou se esses criarem lucros internalizar custos e benefícios sociais ge- através dos standards, no entanto, o que ou partes, aos participantes e que devem
indevidos para indivíduos ou partes do rados pela realização de atividades. Porém, diferencia os mercados de licença de emis- permanecer dentro do limite (HOLLAND et
mercado. Ou seja, estes devem ser tem- outros tipos de falhas de mercado, por sões deste instrumento é a possibilidade de al, 2015; JARDINE; SANCHIRICO, 2012).
porários, pois ao mesmo tempo são cons- exemplo, a utilização de recursos comuns transferência das permissões pelo mercado No Brasil, foram estabelecidas cotas
trutivos, quando usados para a obtenção como insumos na produção, requerem, no (PERMAN et al, 1996). para a pesca da tainha (Mugil liza) no sul

76 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 77


e no sudeste do país. Desde 2018, o limite visando à comercialização de créditos de devem ser definidas as questões legais diversos atores envolvidos. O embasa-
de captura é estabelecido por temporada carbono configura-se como uma opor- sobre propriedade das áreas, direitos de mento científico também é fundamental
e por modalidade, sendo também estabe- tunidade para conservação e restaura- uso e quem seriam os interessados que na implementação desses tipos de estra-
lecidas cotas individuais por embarcação ção desses ambientes, assegurando a poderiam receber pagamentos pela con- tégias, especialmente quanto a métricas
(BRASIL, 2018). Tal estabelecimento foi continuidade de prestação desse serviço servação dessas áreas, que geralmente para aferir o montante de sequestro de
adotado a partir da necessidade de ges- ecossistêmico e de outros serviços pres- são públicas. Outro ponto importante é carbono pelas áreas, as quais devem ser
tão pesqueira deste importante recurso do tados, além de gerar renda para aqueles o envolvimento e o engajamento das co- condizentes com práticas das agências
qual dependem pescadores artesanais e a que atuam na conservação e restauração munidades locais no desenho do projeto, acreditadoras. Outros estudos também
pesca industrial, apostando-se fundamen- desses ambientes (BANCO MUNDIAL; de modo a reduzir conflitos por conta devem considerar avaliação de custo-be-
talmente na estratégia de limitação de uma 2017; LAU, 2013; THOMAS, 2014; VAN- do uso da área. Aliado a isso, o projeto nefício desde o planejamento do projeto
cota total de captura visando reduzir a so- DERKLIFT et al, 2019). deve ter uma estratégia de governança e a viabilidade econômica e ambiental a
bre-explotação e permitir a recuperação do O carbono azul é, neste sentido, uma fortalecida para trazer transparência aos longo prazo (BEESTON et al, 2020).
estoque (STEENBOCK, 2019). mercadoria comercializável, medida através
As cotas e os limites de captura são de uma métrica padrão (tonelada de dióxido 3. Instrumentos financeiros aplicados à Economia Azul
instrumentos amplamente adotados em de carbono equivalente – tCO2e) e comer-
diferentes países, mas têm caráter espe- cializada dentro de uma cadeia de valor que Para desenvolver ainda mais a Economia As finanças oceânicas podem desem-
cífico para determinados compartimen- vai desde aqueles que atuam para garantir Azul, uma combinação de diferentes tipos penhar um papel vital no apoio ao desen-
tos do ecossistema, como a recuperação a prestação desses serviços (comunidades, de financiamento sustentável vem sendo volvimento sustentável da economia do
dos estoques de espécies-alvo da pesca proprietários, instituições) até os comprado- utilizada, incluindo novos mecanismos e ins- mar ao direcionar os investimentos para
ou redução de emissão de gases de efeito res (instituições privadas ou públicas emis- trumentos financeiros orientados à agenda atividades, políticas e ações que minimi-
estufa (GEE). Um instrumento econômi- soras de gases de efeito estufa) (THOMAS, da sustentabilidade. Ao contrário dos inves- zem os riscos oceânicos e maximizem a
co que vem crescendo nos últimos anos 2014; VANDERKLIFT et al, 2019). timentos tradicionais, que são impulsiona- equidade social e a sustentabilidade am-
e tem potencial para contribuir com a O mercado de créditos de carbono azul dos principalmente pelos retornos financei- biental. Com o crescimento desses instru-
proteção de habitats marinhos de forma (ou seja, proveniente de regiões costeiras e ros e pelo desempenho geral da carteira, a mentos, uma importante iniciativa foi lan-
mais ampla são os pagamentos por servi- marinhas) ainda está em fase de estabele- Economia Azul requer investimentos para çada em 2018: os Princípios para o Finan-
ços ecossistêmicos. cimento, e em alguns exemplos em anda- atender às metas ambientais e sociais, bem ciamento da Economia Azul Sustentável
mento os créditos são negociados no mer- como às metas financeiras. (The Sustainable Blue Economy Finance
2.4. Pagamento por serviços cado voluntário em troca da proteção desses Nesse sentido, os instrumentos finan- Principles), os quais são a primeira estru-
ecossistêmicos (PSEs) ecossistemas. Este tipo de comercialização ceiros usados para financiar uma econo- tura de orientação global do mundo para
tem potencial de crescimento e traz como mia do mar sustentável, ou como base bancos, seguradoras e investidores finan-
Pagamentos por serviços ecossistê- benefícios a conservação como um todo para gerar novo capital financeiro para ciarem uma Economia Azul sustentável
micos buscam criar incentivos (fonte de dos ecossistemas costeiros (e não somente promover o uso sustentável dos recursos (SANTOS; PEREIRA, 2021).
receita) para garantir a manutenção e o de espécies-alvo) para garantir a continuida- oceânicos, incluem empréstimos e subsí- Alguns dos investimentos necessários
aprimoramento do fornecimento de bens de da prestação de outros serviços além do dios tradicionais, mercados de carbono e em uma economia do mar sustentável são
e ativos ambientais (TIETENBERG; LEWIS, sequestro de carbono (como proteção con- instrumentos de seguro, doações filantró- suscetíveis de gerar retornos competitivos
2015). No que se refere às áreas costeiras tra eventos extremos e berçários naturais) e picas, investimento de impacto, emissão no mercado e, portanto, capazes de atrair
e marinhas, a capacidade de sequestro e uma alternativa de renda para comunidades de obrigações, títulos azuis (blue bonds), financiamento privado, enquanto outros
armazenamento de carbono por ambien- costeiras (PEREIRA, 2020). entre outros (SUMAILA et al, 2021). A investimentos são capazes de gerar retor-
tes costeiros, como manguezais, prada- Alguns pontos de atenção são levan- implantação desses diferentes tipos de nos positivos, mas abaixo dos retornos do
rias e marismas, é um importante serviço tados, no entanto, como possíveis entra- capital depende do retorno esperado do mercado. Para que esses investimentos
ecossistêmico prestado por esses ambien- ves para a expansão desses tipos de pro- investimento, que, por sua vez, depende sejam atraentes para o setor privado, se-
tes. O desenvolvimento de programas de jetos e devem ser observados quando do das equações de risco-retorno enfrenta- ria necessária alguma forma de cofinan-
pagamento por serviços ecossistêmicos desenho de tal arranjo. Primeiramente, das pelos investidores. ciamento público ou filantrópico ou de

78 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 79


Equity (Public Equity e O capital social envolve a Setor financeiro privado, por
Investimento em Ações – tomada de uma participação exemplo, investidores de
Fundos de Investimento) em um investimento. Alguns capital, capitalistas de risco,
tipos de ações são de alto bancos comerciais, fundos de
risco, de alto retorno e podem pensão.
oferecer maior retorno do que
o mercado. A escala do
patrimônio líquido é muito
financiamento misto (blended finance). mentos teriam que ser pagos por meio de variável, variando de
Finalmente, os investimentos que são ne- fontes públicas e/ou filantrópicas. Instrumentos/Tipo
Instrumentos/Tipode Descrição
Descrição e Principais
ea investimentos
Principais Principais
Descrição Atores/
microfinanças
Capital Características Atores/Provedores
cessários para apoiar certas funções im- A Tabela 2 apresenta um resumo dos de Capital Características
multimilionários. Provedores
portantes do ecossistema, mas que são principais tipos de capital e dos principais Investimento de Impacto Geralmente, são Fundações filantrópicas,
Financiamento Misto (Blended Combina a assistência oficial Os mesmos fornecedores que
incapazes de gerar qualquer retorno de provedores destes capitais no contexto dos (Investimento em investimentos de longo prazo, ONGs, instituições financeiras
Finance) ao desenvolvimento com para dívida, capital próprio e
mercado dificilmente atrairiam financia- instrumentos financeiros aplicados à Eco- Responsabilidade Social mas em pequena escala em internacionais, corporações,
outros recursos privados ou capital de impacto.
mentos privados. Neste caso, os investi- nomia Azul (SUMAILA et al, 2021). Corporativa, Subsídios comparação com tipos agências de assistência oficial
públicos, a fim de "alavancar"
públicos, Subsídios maiores de finanças ao desenvolvimento (ODA).
fundos adicionais de outros
filantrópicos, Financiamento comerciais. As taxas de
atores. Geralmente fornece
público e Assistência oficial ao retorno esperadas são
taxas de retorno abaixo do
desenvolvimento) geralmente inferiores às taxas
Tabela 2. Breve descrição dos principais mercado.
de mercado.
instrumentos financeiros Subsídios Ajuda financeira, comumente Ajuda financeira, comumente
Dívida (Empréstimos e Tipos de capital de baixo risco Setor privado e público, por
fornecida por governos, a um fornecida por governos, a um
Obrigações) e baixo retorno que oferecem exemplo, governos, empresas,
Instrumentos/Tipo
Instrumentos/Tipo de Descrição
Descriçãoe Principais
e Principais Principais Atores/
Descrição setor econômico, a fim de setor econômico, a fim de
taxas de retorno baixas ou de bancos multilaterais de
Capital Características Atores/Provedores promover a política promover a política
de Capital Características Provedores mercado. São variáveis em
econômica e social.
desenvolvimento. Agências de
econômica e social.
escala, desde microfinanças ODA, blue bonds, crowd
Investimento de Impacto Geralmente, são Fundações filantrópicas,
até empréstimosFonte:
corporativos funding.
OCDE (2017) e Friends of Ocean Action (2020)
(Investimento em investimentos de longo prazo, ONGs, instituições financeiras
em larga escala.
Responsabilidade Social mas em pequena escala em internacionais, corporações,
Corporativa, Subsídios comparação com tipos agências de assistência oficial Equity (Public Equity e O capital social envolve a Setor financeiro privado, por
públicos, Subsídios maiores de finanças ao desenvolvimento (ODA). Dentre os em
Investimento exemplos
Ações – de mecanismos
tomada de fi- que estão isentos
uma participação do investidores
exemplo, imposto de de renda,
filantrópicos, Financiamento comerciais. As taxas de nanceiros orientados
Fundos de Investimento) para área marinha, permitindo
em um investimento. Alguns assim
capital, capitalistas de risco, em
que os investidores
público e Assistência oficial ao retorno esperadas são os títulos azuis (blue bonds) vêm
tiposganhan-
de ações são projetos
de alto verdes, comocomerciais,
bancos transporte marítimo
fundos de
desenvolvimento) geralmente inferiores às taxas risco, deAzul.
alto retorno e podem pensão.
do destaque na agenda da Economia verde, contratem empréstimos a taxas de
de mercado. oferecer maior retorno
Esse tipo de investimento apoia especifica- juros do que
reduzidas (geralmente ~2% abaixo
o mercado. A escala do
Dívida (Empréstimos e Tipos de capital de baixo risco Setor privado e público, por mente projetos que contribuem diretamen- das taxas comerciais). Esses fundos verdes
patrimônio líquido é muito
te para o desenvolvimento de um variandoholandeses
ambiente já atraíram mais investimentos
Obrigações) e baixo retorno que oferecem exemplo, governos, empresas,
variável, de
taxas de retorno baixas ou de bancos multilaterais de marinho sustentável. Os títulos azuis podem do que podem ser utilizados nos esquemas
microfinanças a investimentos
mercado. São variáveis em desenvolvimento. Agências de ser na forma de títulos-soberanos, como os disponíveis – um sinal encorajador para as
multimilionários.
escala, desde microfinanças ODA, blue bonds, crowd
títulos emitidos pela República das Seiche- perspectivas futuras de tais instrumentos.
até empréstimos corporativos funding. Financiamento Misto (Blended Combina a assistência oficial Os mesmos fornecedores que
em larga escala. les, em 2018, para criar um plano de gestão Por fim, outro tipo de financiamento
Finance) ao desenvolvimento com para dívida, capital próprio e
da pesca e melhorar as práticas de pesca. que mais recentemente vem ganhando
outros recursos privados ou capital de impacto.
Equity (Public Equity e O capital social envolve a Setor financeiro privado, por Outros tipos de títulos podem públicos, a fim dedestaque
ser emiti- "alavancar" é o seed investing, focado prin-
Investimento em Ações – tomada de uma participação exemplo, investidores de dos, por exemplo, por instituições adicionaiscipalmente
fundos finan- de outros na inovação das indústrias
Fundos de Investimento) em um investimento. Alguns capital, capitalistas de risco, ceiras para apoiar projetos dessa natureza.
atores. Geralmente oceânicas.
fornece Atualmente, existem diferen-
tipos de ações são de alto bancos comerciais, fundos de taxas decomo
retorno abaixo do
Bancos e Instituições Multilaterais, tes instituições que atuam como finan-
risco, de alto retorno e podem pensão. mercado.para ciadores de empresas em estágio inicial,
oferecer maior retorno do que Banco Mundial, Banco Interamericano
o mercado. A escala do oSubsídios
Desenvolvimento (BID), BancoAjuda
Europeu de contribuindo com o seed investing, capi-
financeira, comumente Ajuda financeira, comumente
patrimônio líquido é muito Investimentos (BEI), dentre outros, possuem
fornecida tal de risco
por governos, a um e fornecida
apoio depor negócios
governos, viaa um
incu-
variável, variando de setor econômico,badoras
linhas específicas para desenvolvimento a fim de e aceleradoras. Taisa instituições
setor econômico, fim de
microfinanças a investimentos econômico sustentável em oceanos.
promover a políticadirecionam investimentos a setores como
promover a política
multimilionários. Em termos de iniciativas emeconômica
nível na-e social.
biotecnologia econômica
marinha, epesca
social. e aquicul-
Financiamento Misto (Blended Combina a assistência oficial Os mesmos fornecedores que cional, destaca-se que a Holanda fornece tura sustentável, gerenciamento de resí-
Finance) ao desenvolvimento com para dívida, capital próprio e fundos especiais de investimento verde duos (PEREIRA, 2020).
outros recursos privados ou capital de impacto.
públicos, a fim de "alavancar"
80 ECONOMIA AZUL fundos adicionais de outros Instrumentos Econômicos e Financeiros 81
atores. Geralmente fornece
taxas de retorno abaixo do
4. Considerações finais e recomendações relativamente alto dos setores econômicos -chave do ambiente para apoiar a transição
relacionados. Para transformar esses desafios para uma Economia Azul que seja susten-
em oportunidades, logo, os setores público tável. Nesse sentido, novas ferramentas de
Uma Economia Azul sustentável requer Correspondentemente, existem oportuni- e privado precisam criar e mobilizar melhor financiamento e acesso ao mercado de ca-
uma série de intervenções para melhorar dades significativas para o investimento pri- um conjunto completo de ferramentas e pitais são necessárias para agir como um in-
a governança, a ciência e a gestão, de tal vado em setores emergentes da Economia abordagens financeiras, seguros, incentivos centivo positivo para atividades sustentáveis,
modo que as áreas econômica e financeira Azul no reino do investimento de impacto fiscais e de mercado e fortalecer aspectos- inclusivas e resilientes à Economia Azul.
são importantes vetores para promover este e do capital de risco; escala e tolerância ao
desenvolvimento. Há uma grande expectati- risco fazem do investimento de maior es-
va de crescimento das indústrias marinhas,
Referências
cala (como os títulos azuis) a exceção, ao
e as medidas adotadas devem priorizar o invés da regra. Redirecionar os fluxos de ca-
crescimento econômico aliado ao uso sus- pital existentes para a prática sustentável e BEESTON, M., CUYVERS, L.,; VERMILYE, 249-269. 2015.
tentável dos recursos naturais, asseguran- incorporar as considerações de sustentabili- J. Blue Carbon: mind the gap. Geneva: FRIENDS OF OCEAN ACTION. The Oce-
do a continuidade da prestação de serviços dade no setor financeiro são particularmen- Gallifrey Foundation, 2020. an Finance Handbook - Increasing
ecossistêmicos dos quais dependem as ativi- te relevantes para os setores estabelecidos BRASIL, Portaria da Presidência da Re- finance for a healthy ocean. Washing-
dades produtivas baseadas nos oceanos. da Economia Azul. pública nº 24, de 15 de maio de 2018. ton, DC: Friends of Ocean Action, 2020.
Quanto aos instrumentos econômicos, Destaca-se também que os fundos de Estabelece normas, critérios e padrões Disponível em: https://www3.weforum.
é importante considerar na implementação pensão, fundos soberanos e grandes in- para o exercício da pesca em áreas deter- org/docs/WEF_FOA_The_Ocean_Finan-
os custos e benefícios do estabelecimento vestidores passivos precisam ser parceiros minadas para a captura de tainha (Mugil ce_Handbook_April_2020.pdf.GILL, D.A.;
desses mecanismos, aplicabilidade para de- no esforço para alcançar uma economia liza), no litoral das regiões Sudeste e Sul MASCIA, M.B.; AHMADIA, G.N.; GLEW,
terminados setores e resultados obtidos em do mar sustentável. Eles podem usar sua do Brasil e estabelece cota de captura da L; LESTER, S.E.; BARNES, M.; CRAIGIE, I.;
experiências anteriores, de forma a avaliar influência como investidores significativos espécie para o ano de 2018. Brasília, DF: DARLING, E.S.; FREE, C.M.; GELDMANN,
se houve efetiva mudança de comporta- em muitos setores extrativistas; o poder de Presidência da República, 2018. J.; HOLST, S.; JENSEN, O.P.; WHITE, A.T.;
mento para práticas mais sustentáveis. Rela- “bloqueio” que isso proporciona aos inves- CASTRO, J. D. B.; NOGUEIRA, J. M. Valo- BASURTO, X.; COAD, L.; GATES, R.D.;
tivamente aos instrumentos financeiros, ve- tidores institucionais lhes dá uma influência ração econômica do meio ambiente: GUANNEL, G.; MUMBY, P.J.; THOMAS, H.;
rifica-se que, mesmo com a disponibilidade significativa para impactar a política corpo- teoria e prática. Curitiba: CRV, 2019. WHITMEE, S.; WOODLEY, S.; FOX, H.E. Ca-
existente de modelos de investimento para rativa em questões que vão desde políticas EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY. pacity shortfalls hinder the performance of
a Economia Azul, a escala de investimento de sustentabilidade até governança corpo- Market-based instruments for environ- marine protected areas globally. Nature,
em sustentabilidade é baixa e permanece rativa. O documento Ocean Sustainability mental policy in Europe. Technical report United Kingdom, v. 543/7647, pp. 665-
dominada pela filantropia e pela ajuda ofi- Expectations, emitido pelo Norges Bank da Copenhagen, Aug. 2005. Disponível em: 669, 2017.
cial ao desenvolvimento, particularmente Noruega, que administra um dos maiores https://www.eea.europa.eu/publications/ HILMI, N.; OSBORN, D.; ACAR, S.; BAM-
em setores emergentes. Isso está de acor- fundos soberanos do mundo, estabelece technical_report_2005_8. Acesso em: 15 BRIDGE, T.; CHLOUS, T.; CINAR, M.; DJOU-
do com estudos recentes que sugerem como os conselhos de administração das fev. 2022. NDOURIAN, D.; HARALDSSON, G.; LAM
que o Objetivo de Desenvolvimento Susten- empresas que operam nos setores oceâ- FAUCHEUX, S.; NOËL, J.. Economia dos V.W.Y.; MALIKI, S.; MANTUANO, A.M.;
tável (ODS) 14 – Vida na Água recebeu a nicos devem considerar as consequências Recursos Naturais e do Meio Ambiente. MARSHALL, N.; MARSHALL, P.; PASCAL,
menor quantia de investimento entre todos sociais e ambientais de suas atividades co- Lisboa: Instituto Piaget, 1995. N.; RECUERO-VIRTO, L.; REHDANZ, K.;
os ODS, sugerindo que o sistema financeiro merciais sobre a sustentabilidade oceânica. FIELD, B. C.; FIELD, M. K. Introdução à SAFA, A. Socio-economic tools to mitigate
continua a lutar para reconhecer e valorizar A partir das análises, pode-se concluir economia do meio ambiente. 6. ed. the impacts of ocean acidification on eco-
o capital e os serviços prestados pelo ocea- que as principais barreiras que impedem o Porto Alegre: AMGH, 2014. nomies and communities reliant on coral
no e dependentes dele. financiamento adequado de uma Economia FLYNN, B. Ecological modernisation of a reefs - a framework for prioritization. Re-
Ressalta-se que existem oportunidades Azul incluem um ambiente fraco para atrair ‘Cinderella renewable’? The emerging po- gional Studies in Marine Science, Ams-
significativas para o investimento privado financiamento, investimento público e priva- litics of global ocean energy. Environmen- terdam, v. 28, n. 100559, 2019.
em setores emergentes da Economia Azul. do insuficiente no tema e o perfil de risco tal Politics, [Arcata, CA], v. 24, n. 2, p. HOLLAND, D. S.; THUNBERG, E.; AGAR,

82 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 83


J.; CROSSON, S.; DEMAREST, C.; KAS- PEREIRA, M.G. Economia Azul: o cami- Mugilidae): uma análise histórica recente Genebra; UNCTAD, 2014.
PERSKI, S.; PERRUSO, L.; STEINER, E.; nho para eficiência econômica, social e de aspectos relacionados à política de WALDRON, A.; MILLER, D.C.; REDDING, D.;
STEPHEN, J.; STRELCHECK, A.; TRAVIS, M. ambiental das atividades produtivas ba- cotas. Revista CEPSUL – Biodiversida- MOOERS, A.; KUHN, T.S.; NIBBELINK, N.;
US catch share markets: a review of data seadas nos oceanos. 2020. Dissertação de e Conservação Marinha, Itajaí, v. 8, ROBERTS, J.T.; TOBIAS, J.A.; GITTLEMAN,
availability and impediments to transpa- (Mestrado em Economia – Gestão Econô- e2019003, 2019. J.L. Reductions in global biodiversity loss
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84 ECONOMIA AZUL Instrumentos Econômicos e Financeiros 85


4

AMAZÔNIA AZUL: A ELEVAÇÃO DO RIO


GRANDE COMO OPORTUNIDADE PARA REFLETIR
SOBRE A MINERAÇÃO OFFSHORE NO BRASIL
Rodrigo Fernandes More
Claudia Maria Rezende de Souza

1. Introdução

O termo Amazônia Azul nasceu em almirante conclui destacando a importân-


2004, nas páginas da Folha de S.Paulo do cia de a Marinha ter meios para vigiar, pro-
dia 25 de fevereiro. Na seção Tendências e teger e fazer valer os direitos do Brasil no
Debates, o então comandante da Marinha mar, a partir de políticas para exploração
do Brasil, Almirante de Esquadra Roberto de sustentável dos recursos vivos e não vivos.
Guimarães Carvalho, apresentou uma asso- Este é um excelente ponto de partida
ciação comparativa muito feliz e profunda para destacar a Amazônia Azul como um
entre as riquezas do mar e as da Amazônia conceito multidimensional. Há pelo menos
Verde: “Entretanto, há uma outra Amazô- cinco dimensões-chave que impulsionam
nia, cuja existência é, ainda, tão ignorada por a expansão do Brasil para o oceano: geo-
boa parte dos brasileiros quanto o foi aquela gráfica, econômica, ambiental, científica e
por muitos séculos. Trata-se da ‘Amazônia tecnológica e jurídica.
Azul’ que, maior do que a verde, é inimagi- A dimensão geográfica é delimitada
navelmente rica. Seria, por todas as razões, pela região costeira, pelas águas e espaço
conveniente que dela cuidássemos antes de aéreo sobrejacente ao mar territorial, zona
perceber as ameaças” (FOLHA, 2004). contígua e zona econômica exclusiva, bem
O texto segue destacando as dimensões como pelo solo e subsolo marinhos com-
geográficas da Amazônia Azul: a concen- preendidos pela plataforma continental ju-
tração da ocupação do território costeiro rídica brasileira (PCJB). A área de superfície
(80% da população vivia numa faixa de até de águas compreende cerca de 3,5 milhões
200 km do mar); a importância do trans- de km2; a área de superfície da plataforma
porte marítimo e dos portos para o comér- continental, cerca de 5,5 milhões de km2,
cio; o petróleo; a pesca; e a mineração. O já considerada a área além das 200 milhas

86 ECONOMIA AZUL Amazônia


Amazônia Azul:
Azul: aa Elevação
Elevação do
do Rio
Rio Grande
Grande 87
marítimas em análise na Comissão de Li- na União Europeia, mostram que a bioeco- mar territorial, zona econômica exclusiva 1.100 km da costa do Rio Grande do Sul
mites da Plataforma Continental.1 Esta di- nomia do mar pode despontar na econo- e plataforma continental, com destaque e a 4.000 m de profundidade, apresenta
mensão delimita a jurisdição do Brasil sobre mia da Amazônia Azul, com destaque aos para areia, calcário, carvão, fosfato, ilme- grande potencial e oportunidade de ex-
pessoas e recursos. fármacos e cosméticos. nita, sais de potássio e sal-gema (SIGMINE/ ploração, tanto mineral quanto biotecno-
A dimensão econômica destaca a impor- Finalmente, à dimensão jurídica cabe ANM, 2022). O Serviço Geológico do Bra- lógica, ambos com expressivo valor agre-
tância da Amazônia Azul como provedora criar um ambiente de normas (no sentido sil ou Companhia de Pesquisa de Recursos gado e grande interesse econômico.
de bens e serviços, geração de empregos, amplo) favorável ao investimento privado, à Minerais (SGB-CPRM)2 estima que mapeou O que torna atrativa a ERG como foco
produção de alimentos, geração de energia pesquisa científica e tecnológica, enfim, às somente aproximadamente 8% da PCJB, de estudo é seu imenso e incalculável po-
não renovável (petróleo e gás) e renovável demais dimensões-chaves, como uma mol- portanto, há um enorme potencial de tencial minerário, que pode, ou deveria,
offshore (maremotriz, eólica e solar), aqui- dura que deve ser o mais simples possível crescimento da mineração offshore e, animar os legisladores a começar a orde-
cultura, recursos biotecnológicos, navega- para destacar uma pintura de imenso valor, com ela, de oportunidades de desenvol- nar a legislação minerária offshore no Brasil
ção de cabotagem e longo curso, logística, sem o pecado de ser percebida. Hoje, a bu- vimento sustentável com a geração de para torná-la mais atrativa ao investimen-
(eco)turismo costeiro, pesca e exploração rocracia, o número insano de normas, os empregos e riquezas. to e à pesquisa, enfim, para promover
mineral. O mar é a nova fronteira no pro- entraves jurídicos ao investimento no Brasil Em complemento, as crostas mape- não apenas as cinco dimensões-chaves da
cesso de desenvolvimento econômico sus- e à pesquisa e ao desenvolvimento tecno- adas ricas em cobalto foram localizadas Amazônia Azul como também novas pers-
tentável das nações. lógico têm mais destaque que a riqueza da nas elevações submarinas da Cadeia pectivas que a oportunidade da ERG deve
A dimensão ambiental conecta a eco- obra natural da Amazônia Azul. Fernando de Noronha, da Cadeia Vitó- descortinar a partir do estado da arte da
nomia à sustentabilidade. A ocupação cos- A razão de existir dessas dimensões-cha- ria-Trindade, na plataforma continental mineração de mar profundo no Brasil.
teira, a poluição de origem costeira e da ves é uma só: as pessoas, os brasileiros. A do estado da Bahia e na Elevação do Rio Assim, este estudo tem como objetivo, a
navegação, as mudanças climáticas, o au- ideia de sustentabilidade traduz muito bem Grande (ERG), mapeadas em torno de 36 partir de uma perspectiva multidimensional
mento do nível dos oceanos, a pesca pre- essa centralidade: os povos têm de prosperar mil km2. De forma ainda mais pontual, da Amazônia Azul, apresentar as principais
datória, ilegal, não reportada ou não regu- e viver nas futuras gerações. A degradação num grau exponencial ainda mais ele- particularidades do espaço territorial da
lada, são elementos de uma nova consci- de qualquer dimensão-chave não é com- vado de dificuldades e particularidades ERG, seu potencial minerário e os desafios
ência ambiental disseminada nos últimos pensada na outra: impossibilita as demais. da mineração offshore de crostas ricas impostos, imediatos, a curto, médio e lon-
anos, que contribuiu para a endogenei- Dentre as diversas atividades econômi- em cobalto, a Elevação do Rio Grande go prazos, decorrentes da sua nova condi-
zação da sustentabilidade nas estratégias cas no mar, este estudo escolheu a minera- (ERG): uma elevação submarina com área ção jurídica. Ao final, o estudo apresenta
de negócios e planos de desenvolvimento ção offshore para destacar as cinco dimen- igual à da Venezuela ou do Egito (1 mi- algumas reflexões e recomendações para o
baseados no oceano. sões-chaves da Amazônia Azul. Isso porque lhão de km2), distante aproximadamente desenvolvimento do potencial da ERG.
A dimensão científica e tecnológica res- talvez seja a menos conhecida, a mais cara,
ponde ao grande desafio de descoberta a de maior desafio científico e tecnológico,
dos oceanos. Para o Brasil se assenhorar da a ambientalmente mais incerta, a de mol- 2. A mineração offshore no Brasil
Amazônia Azul, será necessário investir, pe- dura jurídica menos atrativa, embora dian-
sadamente e por anos, em capacitação de te de todas essas desvantagens compara- Não há como falar de mineração sem de capitais. A mineração é parte desta
recursos humanos, no amálgama da ciência tivas já esteja geograficamente delimitada considerar os impactos sociais e à biodiver- complexa equação que busca constante
acadêmica pura com as ciências aplicadas pela área da Amazônia Azul. sidade e as questões voltadas à mitigação balanceamento.
das empresas, em inteligência artificial, em A mineração offshore não é recente no e à adequação às mudanças climáticas. A Acidentes marcam. A questão é que não
inovações que respondam às mudanças Brasil. Segundo a base de dados do Sistema necessidade de redução de emissões de temos boas recordações sobre os impactos
também para renovações estruturais na de Informação Geográfica da Mineração, CO2, o desenvolvimento sustentável em da mineração sobre o meio ambiente. Se
natureza das atividades marítimas ligadas da Agência Nacional de Mineração (SIGMI- suas múltiplas dimensões e efeitos, os no- falhas e danos ocorrem em terra firme, à
à navegação, ao comércio, à pesquisa e às NE/ANM), a primeira concessão de lavra de vos padrões de produção, investimento e vista dos olhos de todos, o que dizer da
múltiplas formas de uso dos recursos do mineral no mar do Brasil é de 1967: sal- consumo baseados em impactos ambien- mineração no mar profundo?
mar para o desenvolvimento econômico. As -gema, na Bahia (SIGMINE/ANM, 2022). tais, sociais e de governança têm se tor- A atividade de mineração é, e sempre
experiências mundo afora, especialmente Atualmente, são 765 áreas oneradas no nado fatores decisivos para o movimento foi, necessária para a sobrevivência humana,

88 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul: a Elevação do Rio Grande 89


pois envolve as águas e o desenvolvimen- e reúso do produto. Gradativamente, logo A redução das emissões de CO2 depen- relevantes para a agricultura e o agronegó-
to: fertilizantes, aço, computadores de alto não bastará propagandear “sou ambien- derá de mais mineração, não menos. Em cio no Brasil e têm demanda crescente no
desempenho, equipamentos médicos, ba- tal e socialmente correto”, será preciso recente estudo, Cox et al. (2022) relatam mercado mundial. Estão presentes em jazi-
terias, enfim, a maior parte da nossa tecno- evidenciar isso, com custos altos de inves- que “a tecnologia utilizada na produção das concentradas no Saara Ocidental (74%
logia depende de minerais. O que está mu- timento em tecnologias limpas. Até que de energia renovável está resultando em no Marrocos e na Mauritânia).
dando é a forma pela qual as mineradoras isso aconteça, um passo de cada vez, a um aumento significativo na demanda por A pesquisa minerária na plataforma
estão sendo avaliadas pelo mercado, inves- mineração não deixará de existir nem de- muitos minerais e metais”. No mesmo sen- continental jurídica do Brasil está a cargo,
tidores e pessoas impactadas não apenas sacelerará, ou alguém está a fim de ficar tido e nomeando os minerais, Herrington principalmente, do SGB-CPRM. O SGB-
pelas atividades de prospecção e lavra de sem a bateria do telefone celular para mo- (2021) aponta que “a revolução da energia CPRM e a Secretaria de Geologia, Mineração
jazidas minerais e minas, mas de descarte ver suas causas ideológicas? verde depende fortemente de matérias-pri- e Transformação Mineral do Ministério de
mas, como cobalto e lítio”, que repousam Minas e Energia (SGM-CPRM) participam
Figura 1. Exploração minerária marítima no Brasil no fundo do mar do Brasil, além dos co- no Plano de Levantamento da Plataforma
nhecidos petróleo e gás natural. Continental Brasileira (LEPLAC) e executam,
Assim, se o futuro do desenvolvimen- do ponto de vista técnico e operacional,
to sustentável e a prosperidade econômica dois grandes programas nacionais no
não apenas do Brasil, mas do planeta, pas- âmbito da Comissão Interministerial para
sam pela redução das emissões de CO2, cuja os Recursos do Mar (CIRM):
tecnologia depende de minerais como terras
I. Programa de Avaliação da Potenciali-
raras, cobalto e lítio, encontrados no fundo
dade Mineral da Plataforma Continen-
do mar de áreas sobre as quais o Brasil detém
tal Jurídica Brasileira (REMPLAC), coor-
direitos soberanos para fins de exploração e
denado politicamente pelo Ministério
aproveitamento econômico, então, quais são
de Minas e Energia, com o objetivo de
os planos do país para estabelecer, desenvol-
avaliar a potencialidade mineral da pla-
ver e prosperar com a mineração offshore?
taforma continental, a fim de possibili-
No mar, o Brasil tem reservas e depósitos
tar a utilização sustentável dos recursos
importantes de minerais pesados, como a
não vivos, sua contribuição para o Pro-
monazita e o rutilo, ricos em elementos de
duto Interno Bruto – PIB nacional e o
terras raras; granulados siliciclásticos (casca-
desenvolvimento e a consolidação da
lho e areias) e granulados bioclásticos (car-
Economia Azul (X PSRM); e
bonatos); depósitos hidrogênicos, (fosforitas,
nódulos polimetálicos e crostas cobaltíferas); II. Programa Área Internacional do
depósitos hidrotermais (na forma de sulfetos Atlântico Sul Equatorial (PROAREA),
polimetálicos e depósitos de evaporitos), car- cuja coordenação política é do Ministé-
vão mineral e hidratos de gás (ver Figura 1). rio das Relações Exteriores, tendo como
As terras raras contam com reservas em objetivo identificar e avaliar o potencial
regiões limitadas e com um consumo insa- mineral de regiões com importância
ciável pela indústria de microeletrônica. O econômica e político-estratégica loca-
cobalto, principal insumo para baterias, tem lizadas na Área, com vistas à elabora-
a República Democrática do Congo como ção de proposta para exploração de
maior player, cuja instabilidade interna recursos minerais, a ser apresentada
afeta o mercado internacional do cobalto. à Autoridade Internacional dos Fundos
Fosforitos e polifosfatos são componentes Marinhos, e à realização de pesquisas
Fonte: CIRM essenciais para a fabricação de fertilizantes em águas profundas (X PSRM).

90 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul:


Amazônia a aElevação
Azul: Elevaçãodo
do Rio
Rio Grande
Grande 91
Incluídos nesses programas, os princi- IV. Levantamento e mapeamento de áre- Figura 2. Delineação da Proposta Parcial Revista da Margem Oriental e Meridional.
pais projetos de geologia marinha do SG- as com ocorrências de depósitos de fos- Em destaque, a Elevação do Rio Grande (ali denominada “Rio Grande Rise”)
M-CPRM, concluídos ou em fase de exe- foritas marinhas na região, com ênfase
cução, com destaque para o objeto deste na plataforma continental de Santa Ca-
estudo no item (vii), são: tarina e Rio Grande do Sul (Projeto Fos-
I. Geologia do Atlântico Sul, com da- forita), especialmente no terraço do Rio
dos organizados em Sistema de Infor- Grande, cujos resultados foram apresen-
mação Geográfica, mais reconhecida tados no Informe de Recursos Minerais
por sua sigla em inglês: GIS (Geogra- Marinhos com denominação “Projeto de
phic Information System); prospecção e exploração de depósitos de
fosforitas marinhas na plataforma conti-
II. Geologia da Plataforma Continen-
nental jurídica brasileira (REMPLAC)”.4
tal Jurídica Brasileira e áreas Oceânicas
Adjacentes, com dados também orga- V. Levantamento, mapeamento geoló-
nizados em GIS; gico e avaliação da potencialidade mi-
neral de áreas de importância econômi-
III. Levantamento geológico e avaliação
ca e estratégica para o Estado brasileiro,
da potencialidade mineral área costeira
em especial visando mapear os depósi-
e plataforma continental rasa (isóbata
tos de crostas cobaltíferas da Elevação
de 30 metros), em especial de agrega-
do Rio Grande e outras substâncias mi-
dos marinhos siliciclásticos e bioclásti-
nerais, e de dados relacionados à evo-
cos (Projeto Plataforma Rasa do Brasil),
lução geológica, paleoceanográfica e
em execução nos estados: Ceará, Rio
geofísicas (PROERG- REMPLAC).
Grande do Norte, Paraíba, Pernambu- Figura 3.
co, Alagoas e na plataforma insular do VI. Levantamento e identificação de lo- No destaque
Arquipélago de Fernando de Noronha. cais de ocorrência de fontes hidrotermais em amarelo,
Resultados parciais publicados nos In- próximas ao eixo da dorsal mesoatlân- localização
formes de Recursos Minerais Marinhos tica equatorial e as falhas transforman- aproximada
e nos mapas com o potencial dos gra- tes associadas. Projeto de Prospecção e dos blocos de
nulados marinhos das áreas pesquisa- Exploração de Sulfetos Polimetálicos da exploração de
crostas ricas em
das, disponíveis no Repositório Institu- Cordilheira Meso-Atlântica – PROCORDI-
cobalto na ERG
cional de Geociências da CPRM;3 LHEIRA – PROAREA.

3. ERG: as particularidades do espaço territorial


A ERG está destacada pela poligonal plataforma continental do Brasil, como
vermelha na Figura 2. Trata-se de uma fei- um prolongamento natural da margem
ção geológica positiva, ou seja, uma eleva- continental, conforme proposta apresen-
ção, que se projeta por 4.000 m do fun- tada pelo Brasil à Comissão de Limites da
do do oceano até uma profundidade de Plataforma Continental (CLPC) em 2018
600 m da superfície adjacente, localizada (BRASIL, 2018).
aproximadamente a 1.100 km da costa Entre novembro de 2015 e dezembro Fonte: Brasil, 2018
do Rio Grande do Sul. A área estimada de 2021, a exploração de crostas ricas em
é de 1 milhão de km2. A ERG integra a cobalto na ERG foi objeto de um contrato Fonte: BRASIL (2018),
com destaque dos autores

92 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul:


Amazônia a aElevação
Azul: Elevaçãodo
do Rio Grande 93
Rio Grande
de exploração5 entre o SGB-CPRM e a Au- e a Elevação do Rio Grande (ERG). Como Ao longo do contrato (2015-2021), o Cavalcanti et al. (2014) concluíram que a
toridade Internacional dos Fundos Mari- se percebe na Figura 3, a poligonal apre- SGB-CPRM analisou dados pretéritos, re- ERG “surge como uma alternativa poten-
nhos (Autoridade – ISA, sigla em inglês), sentada pelo Brasil abrangeu todos os colheu amostras e apurou dados e infor- cial para o Brasil na exploração de fosfato
com patrocínio do Brasil. O contrato de blocos contratados entre o SGB-CPRM e a mações cujas análises integraram os re- (P2O5), oligoelementos (Co, Ni, Pb, Zn, Ba e
2015 abrangia uma área representada por Autoridade em 2015. latórios anuais contratualmente exigidos V) e principais óxidos de Mn e Ti.”.
150 blocos, com 20 km2 cada um, perfa- Assim, segundo More (2018), a partir pela Autoridade, como parte do dever de Ao analisar amostras colhidas pelo
zendo o total de 30.000 km2, conforme da Proposta de 2018, a ERG passou do re- compartilhamento de conhecimento cien- SGB-CPRM na ERG, Souza (2019) con-
destacado em amarelo na Figura 3. gime jurídico da Área para o regime jurídi- tífico. Embora ainda haja relatórios e aná- cluiu que o “conteúdo de metais base
No contexto do contrato entre o SGB- co da plataforma continental. O bário (Ba), lises pendentes pelo SGB- CPRM, mesmo se assemelha ao conteúdo de crostas hi-
-CPRM e a Autoridade, dada sua posição cério (Ce), cobalto (Co), cobre (Cu), chum- após o advento da denúncia do contrato, drogenéticas de outras partes do mun-
geográfica, a ERG estava inserida em um bo (Pb), manganês (Mn), níquel (Ni), tório o potencial minerário da ERG foi apenas le- do (Co=0,65-1,04% em peso, Zn=0,04-
regime jurídico territorial estabelecido pela (Th) telúrio (Te), titânio (Ti), vanádio (V) e vemente riscado na superfície. 0,06% em peso, Cu=0,02-0,06% em peso
Convenção das Nações Unidas sobre o Di- zinco (Zn) incrustados nas crostas ricas em Os levantamentos executados pelo SGB- e Ni=0,29-0,48% em peso) e o conteúdo
reito do Mar (CNUDM) sem incidência de cobalto da ERG passaram à jurisdição e so- -CPRM ainda devem gerar, e gerarão, rele- de Ce (1425-1929 ppm), Th (25-47 ppm) e
soberania e jurisdição de qualquer Estado, berania do Brasil. Consequentemente, o vante conhecimento sobre depósitos mine- Te (60-95 ppm) é alto nas crostas da ERG”.
um espaço denominado “Área”, no qual contrato perdeu objeto, fato que se con- rários na ERG, seja a partir da própria equipe Ainda não se tem uma estimativa pre-
os recursos, solo e subsolo são considera- sumou em dezembro de 2021 com a de- técnica do SGB-CPRM, seja pela academia. cisa do volume de crostas ricas em cobalto
dos “patrimônio comum da humanidade”, núncia pelo SGB-CPRM, simultaneamente A ERG é rica em crostas ferromangane- na ERG, tampouco da quantidade de bário
conforme os artigos 1 (1), 133 e 136 (a), à retirada do patrocínio pelo Brasil. síferas abundantes em cobalto, com possí- (Ba), cério (Ce), cobalto (Co), cobre (Cu),
todos da CNUDM. Neste ponto é importante destacar: até veis ocorrências de cobre e níquel (SOUZA chumbo (Pb), manganês (Mn), níquel (Ni),
Este regime jurídico da ERG foi alterado que a Proposta de 2018 seja definitivamen- et al., 2009). Com base em dados apre- tório (Th) telúrio (Te), titânio (Ti), vanádio
por um fato superveniente em dezembro te esgotada pelo Brasil perante a Comissão sentados pelo SGB-CPRM à Autoridade na (V) e zinco (Zn), que jazem ou podem ser
de 2018, que três anos mais tarde (2021) de Limites da Plataforma Continental, a ERG fase preliminar ao contrato de 2015, cons- recuperados das crostas numa projeção
justificaria e resultaria na decisão do Brasil está sob jurisdição e soberania do Brasil. A tantes no Plano de Trabalho proposto, Dias economicamente viável.
em retirar o patrocínio ao contrato com a ERG não mais está jurídica e geograficamen-
Autoridade e, simultaneamente, na denún- te sob os poderes e funções da Autoridade. 5. Os desafios da nova situação jurídica da ERG
cia do contrato pelo SGB-CPRM. Isso significa que todos os recursos vivos e
Se a mineração marítima no Brasil não para identificar condições jurídicas e econô-
Em dezembro de 2018, o Brasil apre- não vivos da ERG, portanto, todos os mine-
é recente nem novidade, o que animaria o micas de financiamento e investimento em
sentou uma Proposta Parcial Revista da rais, estão, de forma exclusiva, sob o direito
Estado, agora, a olhar com atenção para tecnologias que permitam que a ERG seja ex-
Margem Oriental e Meridional (Proposta de de soberania do Brasil conforme preceitua
a ERG e suas crostas ferromanganesíferas plorada e explotada não apenas pelo Estado,
2018) à Comissão de Limites da Plataforma o artigo 77 da CNUDM. Como decorrência
ricas em cobalto? Além de uma necessária mas pela academia e pela iniciativa privada,
Continental, conforme preveem o artigo da localização geográfica da ERG para além
mudança de abordagem estratégica para especialmente a brasileira. Por que um plano
76 da CNUDM e o artigo 8 do Anexo II da do limite de 200 milhas marítimas, há, tam-
contornar o dilema do “cobertor curto”, específico? Porque a mineração na ERG,
mesma Convenção. A proposta tem como bém, o dever de pagar uma contribuição à
ou de visões a prazo de quatro anos, a dada sua localização, profundidade e outras
objeto a região da Cadeia Vitória-Trindade Autoridade na forma do artigo 82, quando
nova situação jurídica da ERG tem diferen- características únicas, demandará normas
(na altura do Espírito Santo), o platô de San- e da forma como vier a ser definida pelos
tes relevâncias temporais, com caminhos a especiais para viabilizá-la não apenas eco-
ta Catarina (na altura de Santa Catarina) Estados partes.

. Ações imediatas . Ações a curto prazo


serem considerados. nomicamente, mas desde as pesquisas.
4. Os potenciais recursos minerários da ERG
De imediato, há uma decisão de Esta- A curto prazo, é imperativo se criar um
O que se sabe sobre o potencial mine- 2010, como estudos preparatórios que in- do a ser considerada: estabelecer, a partir banco de dados, materiais e estudos, even-
rário da ERG? O SGB-CPRM realiza levanta- tegraram o Plano de Trabalho do contrato do Plano Nacional de Mineração 2050, tualmente gerenciado pelo SGB-CPRM,
mentos e pesquisas minerais na ERG desde que firmou em 2015 com a Autoridade. que está em elaboração, um plano de ação que já detém expertise e presença na ERG,

94 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul: a Elevação do Rio Grande 95


com recursos humanos para interpretá-los (a experiência do Brasil no petróleo e gás meio marinho, bem como a construção, a Desafios tecnológicos
e orientá-los estrategicamente, dentro de evidencia quão dispendiosas são essas ativi- operação e o uso de todos os tipos de ilhas
um plano de ação e, portanto, em conso- dades em tempo, capital e formação de re- artificiais, instalações e estruturas sobre o Os desafios tecnológicos decorrentes da
nância com uma política minerária, cientí- cursos humanos), o Brasil precisará aprimorar solo e subsolo; o direito de colocação de exploração do mar dependem basicamente
fica, tecnológica e energética para o mar um necessário plano de ação inicial para ge- dutos e cabos submarinos; a criação de de duas variáveis: (i) a distância da costa e
do Brasil, que deve integrar não apenas o renciar, sob uma abordagem político-estraté- ilhas artificiais, instalações e estruturas, zo- (ii) a profundidade da jazida, neste caso, a
Plano Nacional de Mineração 2050 como gica, inclusive, o risco da proposta de exten- nas de segurança de largura razoável, nas distância entre a lâmina-d’água e o fundo
estar adequado, e ser considerado, na re- são da plataforma continental na ERG junto quais pode tomar medidas adequadas para do mar. A distância interfere diretamente
visão em curso da Política Nacional para os à ONU se estender indefinidamente, ou ser garantir tanto a segurança da navegação nos custos de logística e das instalações,
Recursos do Mar (Decreto 5.377/2005). abandonado por uma inviabilidade técnica. como a das ilhas artificiais, instalações ou enquanto a profundidade condiciona o de-
Ainda a curto prazo, o Brasil possui ape- Mas, acima de tudo, o Brasil precisará deci- estruturas tendo em conta as normas in- sempenho do equipamento e sua eficiên-
nas um navio hidroceanográfico de primei- dir que sorte quer dar às futuras gerações de ternacionais aplicáveis (artigos 60 (4) e (5) cia em operar com custos competitivos.
ra linha, equipado para executar as ativi- brasileiros em relação às riquezas do mar. da CNUDM); e o direito de realizar patrulha A exploração em águas com até 80
dades e os levantamentos necessários, que naval nessas zonas de segurança. metros de profundidade se dá nas con-
Desafios jurídicos
precisa receber recursos, gestão e projetos Além disso, em razão da jurisdição ter- dições mais convencionais de dragagem
para navegar e pesquisar não só na ERG: Um passo relevante para favorecer as ritorial, é importante lembrar que sobre a do material do fundo do mar, a exemplo
o NPqHo Vital de Oliveira, comissionado oportunidades de investimentos e pesqui- ERG incidem todas as demais leis do Brasil, do que ocorre com a exploração de ouro
na Marinha. Ademais, o Estado brasileiro sa, especialmente a médio e longo prazos, um conjunto numeroso e muitas vezes de- no Alasca, pedras preciosas em alguns
precisará contar com equipamentos de mar diante da nova situação jurídica da ERG, é sordenado e ininteligível de leis, decretos e países africanos e calcário na França. A
profundo, como veículos de operação re- considerar a construção de uma moldura normas infralegais. Essa imensa confusão partir dessa profundidade de até 200 me-
mota (do inglês ROV – Remotely Operated jurídica favorável à ocupação, ao uso e à ex- jurídica gera imprecisão, insegurança e in- tros, a exigência de equipamentos passa
Vehicle), veículos submarinos autônomos ploração sustentável dos recursos da ERG. certezas para todos, desde as autoridades a ser mais sofisticada e os riscos ambien-
(da sigla em inglês AUV – Autonomous Un- Isso leva tempo, tanto pelo volume de licenciantes até universidades e empresas tais são maiores. Ainda assim, para essa
derwater Vehicle), perfuratrizes (Rock Drill), normas que incide de forma intercruzada que buscam licenças de pesquisa ou explo- modalidade de mineração, a tecnologia
dentre outros, bem como a garantia de or- sobre a atividade econômica, indistintamen- ração, por exemplo. Como será o licencia- atual está madura, e os problemas, de
çamento que assegure suas manutenções te, para atividades em terra ou mar, quan- mento ambiental de atividades na ERG, a um modo geral, podem ser resolvidos
e operações, além de equipe devidamente to pelo trâmite do processo legislativo que 4.000 m de profundidade e 1.000 km da com o equipamento concebido a partir
treinada para operar esses equipamentos. uma eventual reforma de normas deman- costa? Certamente, a experiência operacio- da perfuração de poços de óleo e gás.
Enfim, o Brasil precisa de um plano para daria: seriam dezenas, senão centenas de nal do Brasil com a Petrobras e a exploração Desafios tecnológicos maiores se co-
“ocupar” a ERG o mais brevemente possí- normas em revisão, incidindo competências de petróleo e gás em águas ultraprofundas locam quando as áreas prospectadas vão
vel, que a permita ser estudada com mais de várias comissões na Câmara e Senado. ensinará muito às atividades no mar pro- além de 500 metros de profundidade,
foco e intensidade, além de ser monitorada. É preciso começar a enfrentar essa fundo do Brasil, como a ERG. Considerar a como no megaprojeto de mineração a
mais de 1.600 metros de profundidade,
. Ações a médio e longo prazos
É preciso “fincar-se uma bandeira” lá.6 longa caminhada. O Brasil pode legislar revisão da legislação brasileira para o mar é
sobre a ERG. uma medida necessária, senão obrigatória. na plataforma continental da Papua-Nova
Como a ERG é parte da plataforma Sem segurança jurídica, não existe Guiné. Em fase ainda experimental, esse
A médio e longo prazos, o Brasil enfren-
continental (MORE, 2018), segundo o ar- investimento. E a exploração minerária investimento de uma grande mineradora
tará desafios político-estratégicos, jurídicos
tigo 76 e 77 da CNUDM, o Brasil pode do mar em geral, não apenas da ERG, canadense provoca muita celeuma, pois se
e tecnológicos. A seguir, serão analisados
estabelecer em seu espaço geográfico, de demandará vultosos investimentos em trata de uma adaptação para o fundo do
cada um desses desafios individualmente.
forma exclusiva, normas e regulamentos tempo, tecnologia, inovação e recursos mar da exploração feita em terra, realiza-
fixando: o exercício de direitos de sobera- humanos, que se espera que sejam fei- da por veículos gigantescos (escavadeiras
Desafios político-estratégicos
nia na forma do artigo 77 da CNUDM; a tos pelo próprio Estado, suas estatais ou e perfuradoras), operados remotamente.
Dado o alto grau de investimento espe- regulamentação da investigação científica companhias mistas, empresas privadas, A polêmica se torna mais forte quando se
cialmente para a exploração do mar profundo marinha, a proteção e a preservação do pela academia ou em parcerias. presume que o impacto no solo marítimo

96 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul: a Elevação do Rio Grande 97


seria similar ao de uma mina em terra. do Brasil, é uma commodity de merca-
de jazidas para que atores privados e pú- . Criação de um banco de dados, mate-
blicos sejam incentivados a investir em riais e estudos, eventualmente gerenciado
Embora haja dúvidas sobre a viabilidade do. Há um jogo maior de concorrência
prospecção de negócios e possam anali- pelo SGB-CPRM, com recursos humanos
econômica do empreendimento, a com- a ser considerado em relação a custos
sar a viabilidade de projetos. Resta, neste para interpretá-los e orientá-los estrategi-
panhia (Nautilus Minerals) projeta receitas de pesquisa e extração, por exemplo. O
ponto, mais uma confirmação da necessi- camente, dentro de um plano de ação e,
anuais próximas a 30 bilhões de dólares, Estado mantém o controle sobre autori-
dade de criação de um cenário favorável portanto, em consonância com uma políti-
basicamente com a extração de cobre. zações para bens extraídos de sua pla-
ao investimento. O Brasil está atrasado. ca minerária, científica, tecnológica e ener-
A relação entre viabilidade econômica- taforma continental, enquanto gera um

. Otimizar o uso e gestão de equipamentos


O mundo já o faz. gética para o mar do Brasil;
-comercial, sustentabilidade e capacidade ambiente jurídico favorável às empresas
Correndo atrás do tempo perdido:
tecnológica marca todos os empreendi- investirem, explorarem e gerarem rique-
prospecções patrocinadas pela União
mentos de mineração em águas profundas. zas e empregos para o país. como o navio hidroceanográfico, o NPqHo
Europeia (ROZEMEIJER et al., 2018) su-
As tentativas atuais ainda são incipientes, Vital de Oliveira, provendo-lhe recursos,
A questão ambiental como fator gerem roteiros para compreensão dos li-
mas revelam enormes dificuldades para gestão e projetos para navegar e pesquisar
econômico e de investimento mites e das possibilidades da mineração
essa modalidade de mineração, a começar
. Construir ou reorganizar uma moldura
não só a ERG, mas todo o mar do Brasil;
em águas profundas, em especial quanto
pelas condições do oceano (enorme pres- Finalmente, há o fator ambiental, que
às tecnologias disponíveis e como deve
são, profundidade, ausência de dados e de é atemporal e caminha consistentemente
se dar sua utilização para alcançar novas jurídica favorável à ocupação, ao uso e à ex-
informação sobre componentes e caracte- para se tornar um fator onipresente no
jazidas com um mínimo de dano ambien- ploração sustentável dos recursos da ERG e
rísticas), pelos limites tecnológicos e gran- mundo dos negócios. Os riscos e poten-

. Adotar ao lado de abordagens tradicio-


tal e razoável competitividade em relação dos recursos do mar em sentido mais amplo;
de volume de recursos a serem investidos. ciais danos ambientais inerentes a toda
à exploração em terra. Toda barreira ao
Esse quadro, ainda que brevemente atividade minerária, em terra ou no mar,
negócio, seja jurídica, política, econômi-
descrito, caracterizou a mineração em são elementos cada vez mais relevantes na nais políticas, estratégicas e jurídicas uma
ca, tecnológica, seja de qualquer nature-
águas profundas como uma atividade que avaliação de padrões chamados critérios abordagem de mercado sobre os recursos
za merece ser considerada na exploração
ainda precisa de tempo de maturação e, de “ESG”,7 ou de uma série de iniciativas minerais marinhos. Tratá-los como com-
de um ambiente marinho tão exclusivo,
consequentemente, regulamentação. A privadas que compõem uma “sopa de le-
. Prover ajustes mencionados nos itens
modities que são;
único e mesmo inóspito quanto o lunar.
consolidação e a ampliação das ativida- trinhas” conectadas à redução de emissões
De tudo, algumas reflexões podem ser
des atualmente desenvolvidas pelo SGB- de carbono, como os SBT.8

. Elaboração de um plano de ação para


extraídas dessas nossas considerações: anteriores, e outros, de modo a melhorar a
-CPRM, em especial as relacionadas ao ESG e SBT não são normas jurídicas obri-
percepção dos negócios pelas pessoas e mer-
mapeamento das condições geológicas da gatórias, são parâmetros de conduta, percep-

. Aquisição de novos navios devidamente


cados sob a ótica dos critérios como ESG; e
plataforma continental, podem ajudar a ção e valoração de ativos e negócios que não identificar condições jurídicas e econômi-
abreviar esse amadurecimento. podem ser desconsiderados, ou “minados” cas de financiamento e investimento em
por uma legislação confusa, esparsa e com- tecnologias que permitam que a ERG seja equipados para execução dos levantamentos
Commodities no fundo do mar
plexa como a do Brasil, especialmente em se explorada e explotada não apenas pelo e demais atividades relacionadas aos estudos
Outro fator relevante neste cenário tratando de avaliação de riscos, custos para Estado, mas pela academia e pela iniciati- do meio ambiente marinho, de exploração
de desafios a médio e longo prazos é investimentos, enfim, de competição em va privada, especialmente a brasileira; e explotação mineral nos fundos marinhos.
que o cobalto da ERG, ou qualquer ou- mercados minerários globais e voláteis, mas
tro mineral da plataforma continental inexoravelmente relevantes e necessários.

6. Considerações finais Referências

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claramente, uma oportunidade concreta e A exploração de minerais da plata-
Agência Nacional de Mineração, [202-]. BRASIL. Diretoria de Hidrografia e Navega-
rica para animar nossos legisladores e o go- forma continental implica conhecimento
Disponível em: https://geo.anm.gov.br/ ção. Continental Shelf and UNCLOS
verno a organizar a mineração no mar, na prévio do volume de reservas e localização

98 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul: a Elevação do Rio Grande 99


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Três anos depois, em abril de 2007, o Brasil recebeu 6 Em 2007 a Rússia fincou uma bandeira no fundo
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100 ECONOMIA AZUL Amazônia Azul: a Elevação do Rio Grande 101


5

ECONOMIA AZUL E A AGENDA 2030

Thauan Santos

1. Introdução

Apesar de ainda haver resistência à ques- Agenda 2030, particularmente devido a


tão, é possível afirmar que o desenvolvimen- sua natureza transversal e intersetorial.
to sustentável já assume um papel central Dessa maneira, o presente capítulo es-
na agenda global. Com tímidos movimentos treitará o diálogo entre Economia Azul e
a partir da década de 1970, é no início do desenvolvimento sustentável, evidencian-
século XXI que a sociedade presencia o pri- do o papel estratégico que os recursos
meiro grande esforço global para promover marinhos e as atividades marítimas têm no
o desenvolvimento sustentável. Em 2000, atual contexto da agenda de desenvolvi-
surgiram os Objetivos de Desenvolvimento mento global, incluindo países desenvolvi-
do Milênio (ODM), que totalizavam 8 obje- dos e em desenvolvimento nesse processo.
tivos, 18 metas e 48 indicadores. Após 15 Para tal, apresentará inicial e brevemente
anos, é lançada a Agenda 2030, com seus a Agenda 2030, bem como seus 17 ODS
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e, em seguida, fará uma breve revisão da
(ODS), totalizando 17 objetivos, 169 metas literatura acerca do conceito de Economia
e 232 indicadores. Azul. Essas duas discussões iniciais servem
Tendo interface com diferentes temas, de suporte à análise seguinte, que desta-
os mares e o oceano são frequentemente cará o papel-chave do mar e do oceano na
associados apenas ao ODS 14 (SANTOS, Agenda 2030.
2020, 2021a). Não obstante, este capítulo Analisando-se, particularmente, o caso
visa criticar esta perspectiva, já que é limi- do Brasil, destaca-se que se trata de um
tada e inconsistente com a própria Agenda grande player regional e global, que possui
2030 – que pretende ser ousada, transver- a segunda maior economia e população do
sal e interligada. Neste sentido, propõe-se continente americano, apresentando 7.491
uma visão mais ampla dos recursos mari- km de litoral voltados para o Oceano Atlân-
nhos e oceânicos a partir do conceito de tico. Essa peculiaridade geográfica coloca-o
Economia Azul; ao contrário de nos con- na condição de economia marítima por na-
centrarmos apenas na vida marinha, colo- tureza, razão pela qual merece ser estudado
camos os mares e o oceano no centro da em mais detalhes (SANTOS, 2021a).

102
102A ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Economia Azul
Economia Azul ee aa Agenda
Agenda 2030
2030 103
2. Agenda 2030 e seus 17 ODS logotipo dos ODS é alterado, mas o deba- et al. (2019) reuniram os ODS 13, 14 e 15

Em 2015, a Agenda 2030 foi aprovada, .. 14.1 poluição marinha; te acadêmico sobre a necessidade de en-
frentar e compreender a Agenda 2030 de
em um cluster de sistemas terrestres que de-
sejam identificar as sinergias e trade-offs no
levando ao estabelecimento dos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que .. 14.2 oceano saudável;
14.3 acidificação oceânica;
forma integrada e conjunta é ampliado.
Diferentes atores, como os subnacionais,
encontro de vários ODS simultaneamente,
através de um Modelo de Avaliação Integra-
entraram em vigor a partir de 1º de janei- 14.4 pesca sustentável – sobrepesca e nacionais ou supranacionais, públicos e/ou da (IAMs, sigla em inglês). Em consonância
ro de 2016. Com 17 objetivos interligados, pesca ilegal, não declarada e não regula- privados, precisam considerar suas ativida- com estes autores que propõem diferentes
169 metas e 232 indicadores associados, a
ambiciosa Agenda 2030 foi adotada pela ..mentada (IUU, sigla em inglês);
14.5 áreas marinhas protegidas;
des como parte de um todo a ser alcança-
do, e não como um objetivo em si. Diante
estruturas para estruturar e agrupar os ODS,
Niestroy (2016) sugere três círculos concên-
Organização das Nações Unidas (ONU) para
enfrentar os grandes desafios do século . 14.7
14.6 subsídios à pesca;
benefícios econômicos para Peque-
deste dilema, cresce o debate sobre o agru-
pamento dos ODS, bem como a identifica-
tricos como uma ferramenta para agrupar
os ODS com base no bem-estar (ODS 1, 3,
XXI. O conjunto de objetivos, metas e in- nos Estados Insulares em Desenvolvimento ção e a medição de sua interdependência e 4, 5 e 10), na produção, distribuição e entre-
dicadores foca nas pessoas, no planeta, na (SIDS, sigla em inglês) e Países Menos De- influências mútuas, positivas ou negativas. ga de bens e serviços (ODS 2, 6, 7, 8, 9, 10
prosperidade, na paz e nas parcerias (co-
nhecidos como “os 5Ps”) e pode ser enten- ..
senvolvidos (LDCs, sigla em inglês);
14.a conhecimento e tecnologia;
Como será visto na seção 4 deste capí-
tulo, na prática existem diferentes interli-
e 12) e no ambiente natural (ODS 13, 14 e
15). Como já mencionado, os ODS 16 e 17
dido como uma abordagem mais holística
do que os ODM. . 14.b pesca em pequena escala; e
14.c desenvolvimento e implementação
gações e trade-offs entre os 17 objetivos
(ALLEN et al., 2018; BREUER et al., 2019;
são “colocados fora do círculo como meta
subjacente aos Meios de Implementação e
A agenda trata de diferentes tópicos, de leis. LU et al., 2015; LUSSEAU; MACINI, 2019; outras metas relacionadas à governança”
como pobreza (ODS 1), fome (ODS 2), MOYER; BOHL, 2019; NERINI et al., 2018; (NIESTROY, 2016, p. 10).
boa saúde e bem-estar (ODS 3), educação Portanto, o foco na perspectiva bio- PRADHAN, 2019; SANTOS; 2020, 2021; Apesar dessas abordagens alternativas,
de qualidade (ODS 4), igualdade de gê- lógica e ambiental do ODS 14 é bastante SANTOS; SANTOS, 2017; SCHERERER et muitas delas ainda reproduzem os proble-
nero (ODS 5), água limpa e saneamento evidente, o que também considera a assi- al., 2018). Portanto, o sucesso da Agenda mas que se propõem a resolver e superar,
(ODS 6), energia limpa e acessível (ODS metria entre diferentes estados no sistema 2030 depende do alcance conjunto dos di- tornando evidente a lógica segmentada dos
7), trabalho decente e crescimento eco- internacional ao abordar especificamente ferentes ODS, mesmo porque eles precisam ODS. Assim, como os ODS são influenciados
nômico (ODS 8), indústria, inovação e in- os SIDS e os PMDs (UN, 2016). Cabe des- ser pensados coletivamente. Em alguns ca- pelos ODM, dividindo os temas em dife-
fraestrutura (ODS 9), desigualdades (ODS tacar que este ODS também tem uma es- sos, como será demonstrado, a realização rentes objetivos, metas e indicadores, pode
10), cidades e comunidades sustentáveis treita relação com os objetivos da Década de uma meta específica associada a alguns ser limitado lidar com os atuais desafios do
(ODS 11), consumo e produção respon- do Oceano da ONU (UN, 2017) – objeto de ODS pode comprometer ou mesmo impe- sistema internacional em transição em dife-
sáveis (ODS 12), ação climática (ODS 13), discussão do próximo capítulo. dir a realização de outra meta, o que jus- rentes áreas com base na mesma lógica e
vida marinha (ODS 14), vida na terra (ODS De fato, a maioria dos trabalhos que tra- tifica esta complexa abordagem conjunta. instrumentos pré-existentes (SANTOS; SAN-
15), paz, justiça e instituições fortes (ODS ta da relevância dos mares e do oceano na Galvão (2020, p. 11) argumenta que “as TOS, 2017). Os desafios se tornam ainda
16) e parcerias para os objetivos (ODS Agenda 2030 tende a se concentrar exclu- interações sinérgicas dos ODS (ODS-Si) va- mais complexos em certas agendas, devido
17). Vale notar que o ODS 17 tem uma sivamente no ODS 14. A visão social e eco- riariam desde a parada (a interação mais a sua governança multinível e a sua natu-
natureza particular, pois lida com meios nômica associada às atividades que depen- negativa) até a inseparável (a forma mais reza transversal. Nesses casos, é necessário
de implementação (MoI, sigla em inglês), dem diretamente dos mares e do oceano é forte de interação positiva)”. considerar diferentes níveis de hierarquias,
como finanças, tecnologia, capacidade, desacreditada, aparecendo apenas margi- A abordagem do nexo pode proporcionar reunindo trade-offs entre coordenação do-
comércio, Coerência de Políticas para o nalmente nas metas 14.4, 14.6 e 14.b (que uma maior integração horizontal e vertical méstica e internacional. Este é precisamente
Desenvolvimento Sustentável (PCSD, si- tratam da pesca, incluindo a atividade ar- das políticas (LUCAS et al., 2016), de modo o caso dos mares e do oceano.
gla em inglês), parcerias e dados (OCDE, tesanal) e 14.7 (que tratam dos benefícios que “as responsabilidades devem ser defini-
2015). Paralelamente, alguns ODS tam- econômicos para os SIDS e PMDs). das, os sistemas de responsabilização colo- Oceans cover more than 70% of the
bém têm seu próprio MoI. Logo, consciente dos riscos associados cados em prática e as capacidades humanas planet’s surface and play a crucial role in
Em resumo, o ODS 14 (vida na água) à interpretação limitada a caixas fechadas construídas em conformidade” (WAAGE et planetary resilience and the provision of
aborda: em seus respectivos temas, não apenas o al., 2015, p. 87). Como exemplo, van Soest vital ecosystem services. [Given this key

104 ECONOMIA AZUL Economia Azul e a Agenda 2030 105


role,] the 2030 Agenda for Sustainable a Agenda 2030 exclusivamente focalizada da oceanografia (inclusive, tradicionalmen- e lazer; meio ambiente e clima (SANTOS,
Development puts use and conservation nos mares e no oceano, seja porque é um te, da hidrografia e da engenharia naval), 2019); e blue finance. OCDE (2016) divi-
of the ocean and its resources, including ambiente relevante para a manutenção de porém é possível afirmar que o século XXI de as ocean-based industries em setores
coastal areas, into the wider sustainable algumas atividades econômicas no futuro, testemunha um aumento no número de estabelecidos e emergentes. No primeiro
development context for the first time seja porque envolve e considera uma diver- publicações sobre o assunto e a contribui- grupo, encontram-se: pesca de captura,
(SCHMIDT et al., 2017, p. 177). sidade de setores e atores. ção de outras ciências e conhecimentos processamento de frutos do mar, transpor-
Em nível nacional ou internacional, di- (KACZYNSKI, 2011). te (shipping), portos, construção e reparo
Nesse sentido, esta seção procurou con- ferentes atores/Estados precisam interagir Neste contexto, a ciência econômica, de navios, petróleo e gás (P&G) offshore
tribuir para a literatura especializada, apre- para atingir as metas e os objetivos propos- que tradicionalmente considera o ocea- (águas rasas), construção naval, turismo
sentando brevemente o contexto de criação tos pela Agenda 2030 de forma integrada e no, ainda que quase exclusivamente se marítimo e costeiro, serviços comerciais ma-
da Agenda 2030, bem como a discussão coerente. Esta discussão em escala global é referindo ao transporte marítimo, passa rítimos, pesquisa e desenvolvimento maríti-
teórica sobre a limitação da forma estru- essencial porque, embora “a proteção das mais recentemente a estudá-lo de maneira mo e educação e dragagem; no segundo
tural de pensar sobre tal agenda, particu- áreas oceânicas sob jurisdição nacional este- mais ampla. O mesmo ocorre com outras grupo, encontram-se: aquicultura marinha,
larmente a partir da visão limitada aos 17 ja aumentando, [...] mais de 60% dos ocea- áreas, como o Direito, as Relações Interna- P&G em águas profundas e ultraprofundas,
ODS isoladamente. Na próxima seção, será nos ainda estão fora da jurisdição nacional, cionais, os Estudos Culturais e de Gênero, energia eólica offshore, energia renovável
feita uma breve revisão da literatura sobre e apenas cerca de 1% da área é coberta” por exemplo. Contudo, cabe destacar que oceânica, mineração marinha e do fundo
Economia Azul e, em seguida, analisaremos (UN, 2019, p. 28). mares e oceano nunca foram objeto de in- do mar, segurança e vigilância marítimas,
tensa pesquisa na ciência econômica. Por- biotecnologia marinha, produtos e serviços
3. Economia Azul tanto, faltam métodos e análises particula- marinhos de alta tecnologia, entre outros.
res deste setor, que têm sido realizados a Mais recentemente, OCDE (2021) publicou
Foi nos anos 1980 que começou a surgir vamente – os recursos marinhos de forma partir de outros já existentes. Avaliando os pesquisa com proposta para medição apri-
um debate mais amplo sobre a necessidade limitada e tendenciosa. códigos do Journal of Economic Literature morada da economia oceânica internacio-
de estruturar uma governança global sobre A crescente relevância dos mares e do (JEL), Santos (2019) conclui que há pouca nal por meio da contabilidade por satélite
os mares e oceano, especialmente dian- oceano em termos econômicos, geopolíti- ou nenhuma relevância para as questões para a atividade econômica oceânica.
te dos desafios que surgem nesse período cos e de governança se reflete no aumento marítimas e oceânicas na literatura econô- Portanto, é necessário “colocar os pin-
(RYAN, 2015; ROTHWELL; VANDERZWAAG, e na diversificação das publicações científi- mica, que certamente acabam aparecendo gos nos is” (SANTOS, 2021a) e estar ciente
2006). Considerando o contexto dos ODS, cas sobre o assunto, bem como na agen- de forma transversal, marginal e periférica da existência de nuance nos seguintes ter-
enfatiza-se que a análise desta seção se con- da global. Na ONU, a Agenda 2030 (2016- em outras análises. mos, frequentemente usados como sinôni-
centrará no período pós-implementação da 2030), com seus 17 ODS, e a recente Déca- Dentre os setores abrangidos pela co- mos: Economia Azul, economia do mar, eco-
Agenda 2030 (a partir de 2016). da do Oceano (2021-2030), são mais uma nhecida “economia do mar”, destacam-se, nomia marinha, economia marítima, econo-
Como apresentado na seção anterior, a evidência do esforço internacional em favor por exemplo: defesa e segurança (inter)na- mia oceânica, crescimento azul e economia
Agenda 2030 pode ser interpretada como do conhecimento, da preservação e da ex- cional; pesca e aquicultura; energias offsho- costeira, por exemplo. A Figura 1 sintetiza as
uma espécie de extensão e atualização dos ploração sustentável desses recursos. No en- re; mineração do fundo do mar; transporte, principais temáticas relacionadas a cada um
ODM – que já consideravam os recursos ma- tanto, existe uma vasta e recente literatura infraestrutura e logística marítimas; cons- desses conceitos, que não devem ser enten-
rinhos, embora de forma marginal. De fato, econômica sobre o assunto, que é confusa e trução e reparação naval; turismo, esporte didos como sinônimos.
o ODM 7 tratava de garantir a sustentabili- muitas vezes contraditória.
dade ambiental, concentrando-se principal- Quando se trata da agenda dos mares
mente na vida em terra. Entretanto, a meta e oceano, há uma ampla e diversa gama
7.b visava proteger ecossistemas terrestres de publicações de artigos científicos e re-
e marinhos, abordando áreas costeiras pro- latórios técnicos que tratam de diferentes
tegidas e a sobrepesca (SANTOS, 2019; UN, questões e abordagens (LEE; NOH; KHIM,
2015). Consequentemente, como ficará cla- 2020). Existem contribuições consolidadas
ro, a Agenda 2030 acabará tratando – no- principalmente das ciências biológicas e

106 ECONOMIA AZUL Economia Azul e a Agenda 2030 107


Figura 1. Conceitos relacionados à Economia Azul Para tanto, Santos (2021c, 2022) faz como atores e instituições. Recentemente,
uma abordagem bibliométrica com base destaca-se o estreito diálogo da Economia
em publicações científicas das bases de da- Azul com o desenvolvimento sustentável e
dos Scopus e WoS, abrangendo o período as mudanças climáticas, reforçando a forte
1959-2020 – seguindo Martínez-Vázquez, relação da agenda com a exploração susten-
Milán-García e Valenciano (2021), Madeira tável dos recursos marinhos. Alguns setores
(2020) e Costa e Caldeira (2018). Dada a da economia também se destacam, como
diversidade de abordagens ao tema, argu- a pesca, a aquicultura e o turismo. Por fim,
menta-se que existem “cinquenta tons de existe crescente enfoque na gestão desses
(economia) azul”, conforme defendido por recursos marinhos por meio, por exemplo,
Vieira, Leal e Calado (2020). do planejamento espacial marinho (PEM)
Ainda não há consenso na literatura, (SANTOS, 2021b, 2021c).
nem mesmo sobre o significado de cada Uma vez que a Economia Azul pode ser
um desses conceitos (SANTOS, 2019; KEEN; entendida como um spin-off do conceito
SCHWARZ; WINI-SIMEON, 2019). Ainda se- de “economia verde”, Santos e Carvalho
gundo Santos (2021c, 2022), de maneira (2020), Ido e Shimrit (2015), Arieff (2008) e
geral, as publicações se concentram princi- Seele (2007) argumentam que “blue is the
palmente na Europa, na América do Norte e new green” (“azul é o novo verde”). Ape-
na Ásia, com destaque para Estados Unidos, sar do termo “economia” azul, fica evi-
China, Austrália e Reino Unido. De 2010 em dente que, diferentemente de outros simi-
diante, houve crescimento exponencial das lares, ele tem uma interface próxima com
publicações sobre o assunto, principalmente as questões sociais e ambientais/climáticas
após a Conferência das Nações Unidas sobre e não se limita apenas às questões econô-
Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) (PATIL micas propriamente ditas. Dessa forma,
et al., 2016; UN, 2012), portanto, o número é possível compreender a estreita relação
de pesquisas com essa palavra-chave aumen- com o conceito de desenvolvimento sus-
tou significativamente desde então. tentável (e da governança), foco da Agen-
Em paralelo, já na segunda década dos da 2030 e da Década do Oceano.
anos 2000, a agenda parece se expandir Logo, o conceito de Economia Azul é mais
ao considerar a cooperação internacional, amplo que os demais. Ao contemplar ques-
a política oceânica, as sociedades e as ins- tões sociais, as pautas da educação, ciência
tituições. Mais recentemente, a década de e inovação acabam desempenhando um pa-
Fonte: Santos (2021b)
2010 testemunhou um aumento de temas pel fundamental nessa questão; ao abordar
e atores. Ao contrário das análises tempo- questões ambientais, as mudanças climáticas
rais das décadas anteriores, focadas em e a exploração sustentável de recursos ma-
abordagens biológicas/oceanográficas ou rinhos também são essenciais; por fim, ao
de transporte marítimo, é difícil identificar abordar questões econômicas, temas como
a discussão (e sua natureza) que conduz emprego, salários, produto interno bruto
o período, uma vez que diferentes termos (PIB) e valor adicionado bruto (VAB) também
indicam questões e agendas distintas. A são fundamentais. Consequentemente, a se-
discussão, agora, cobre crescimento econô- ção seguinte analisará justamente a interface
mico, políticas públicas, escassez de recur- entre essa Economia Azul e a agenda de de-
sos, mudanças climáticas e poluição, bem senvolvimento sustentável em curso.

108
108ECONOMIA
ECONOMIAAZUL
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4. Mar e oceano na Agenda 2030 Tabela 1. Economia Azul na Agenda 2030 além do ODS 14, por ODS e metas

Conforme destacado na seção 2, fre- pesca IUU (em nível nacional), nutrição, ODS/
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 a b c d
Metas
quentemente se menciona apenas o ODS cooperação científica, contribuição eco-
1 X X X X X
14 quando se fala de mar e oceano no nômica e saúde dos oceanos. ICSU (2017)
2 X X
contexto da Agenda 2030 – ainda que se destaca que o ODS 14 está entre as que
3 X X
conheça os diferentes setores da economia mais interagem com as demais, tendo for-
4 X X X X X
do mar e, por extensão, suas interfaces tes relações com o ODS 1, 2, 8, 11, 12 e 13,
5 X X
com demais ODS. Portanto, com impactos totalizando 61 (interações positivas), 1 (inte-
6 X X X X X X X
nacionais e geopolíticos, esses setores con- ração neutra) e 35 (interações negativas). A
7 X X
templam muito mais do que apenas “vida publicação indica uma análise além de tra-
8 X X X X X
marinha” (foco do ODS 14). Não se defende de-offs e sinergias através da escala de sete 9 X X X X
aqui que a abordagem dos ODS seja inade- pontos, sugerindo algumas relações extras 10 X X
quada ou inapropriada, ou que se faça algo entre o ODS 14 e os outros não menciona- 11 X X X X X
diferente do que o mundo tem feito e vem dos acima – em linha com Santos (2019). 12 X X X X
fazendo. No entanto, há uma simplificação Singh et al. (2019, p. 317) argumentam 13 X X X X
relevante e um viés biológico significativo que “espera-se que a mudança influencie 14 X X X X X X X X X X
ao se analisar mares e o oceano na Agenda negativamente os serviços dos ecossiste- 15 X X X
2030 e, com frequência, na Década do Oce- mas marinhos através de estresses glo- 16 X X X X
ano, apenas por meio do ODS 14. bais – como o aquecimento dos oceanos 17 X X X X X X X
Em vista da proposta de agrupamen- e a acidificação – mas também através da Tabela 1. Economia Azul na Agenda 2030 além do ODS 14, por ODS e metas.
Fonte: Elaboração própria com base em UN (2016, 2017b)
to de ODS já apresentada, van Soest et al. amplificação de estresses locais e regionais, Fonte: Elaboração própria com base em UN (2016, 2017b).

(2019) mostram pouca interação entre ODS como o escoamento de água doce e a car-
14 e outros, sendo a interação mais próxima ga poluente”. Quando se trata da frequ-
com ODS 13 (mudança climática). Le Blanc ência com que cada ODS aparece nas seis
(2015) enfatiza a estreita relação entre ODS primeiras prioridades, o ODS 14 tem uma However, as the political framework no contexto da Agenda 2030 exige uma
14 e ODS 8 (crescimento e emprego) e ODS participação global menor (apenas 5,4%), that the SDGs provide does not reflect mudança de perspectiva, principalmente
12 (consumo e produção sustentáveis), con- atingindo uma participação máxima na Ásia the full picture and as some areas and porque se trata de um tema transversal. Este
cluindo que os ODS são mais completos e Oriental e no Pacífico (13,6%) e uma par- goals are rather weakly connected (in é o assunto principal da subseção seguinte.
mais interligadas do que os ODM. OCDE ticipação mínima na Europa e Ásia Central particular the SDGs 14 Oceans [...]), A Tabela 1 apresenta todos os ODS di-
(2015) destaca a estreita relação entre o ODS (1,6%), de acordo com McDonnell (2018). attempts towards policy integration reta e/ou indiretamente relacionados com
14 e a dimensão ambiental da Agenda 2030, Logo, o ODS 14 teria uma relação mais will require the inclusion of studies on o mar/oceano – além do próprio ODS 14
embora algumas de suas metas afetem as di- estreita através de cobenefícios com os biophysical, social and economic sys- – com base nos setores relacionados à
mensões econômica (14.1, 14.3, 14.4, 14.5, ODS 1, 2, 11, 13 e 15. Na prática, há uma tems (NIESTROY, 2016, p. 12). Economia Azul. O número de metas para
14.6 e 14.7) e social (14.3, 14.6 e 14.7). forte relação de compromisso com o ODS 2 cada ODS varia muito, porém todos eles
Diante do ODS 14, a SDSN (2015) pro- (OCDE, 2015) e o ODS 11, que pode even- Embora não seja a melhor perspectiva estão relacionados com as atividades ma-
põe três níveis de monitoramento, a saber, tualmente tornar-se sinergias (KROLL et al., para enfrentar a relevância dos mares e do rítimas e oceânicas. Mais uma vez, isso
nacional, global e temático. Entre os temas, 2019) a partir dos estímulos apropriados se oceano, mesmo a análise limitada existente destaca a relevância da Década do Oce-
destacam sua estreita relação com as ODS políticas e estratégias mútuas ocorrerem. ao ODS 14 mostra que há diversos cobene- ano da ONU, principalmente porque se
2, 6, 12, 13 e 15 especialmente quando Essas interligações e trade-offs do ODS 14 fícios em alcançar suas metas. Assim como propõe a expandir o conhecimento e os
se trata de poluição, proteção, resiliência, são de fato limitadas, porque o objetivo o ODS 11, 13, 16 e 17, o ODS 14 tem trade- dados sobre estas atividades.
acidificação oceânica, pesca excessiva, ma- trata, de fato, principalmente da vida mari- -offs e não associações com outros ODS no Da proposta metodológica deste capítu-
nejo sustentável, perda de biodiversidade, nha (SANTOS, 2019). futuro. Portanto, lidar com mares e oceano lo, os mares e o oceano têm um espectro

110 ECONOMIA AZUL EconomiaAzul


Economia AzuleeaaAgenda
Agenda2030 111
2030 111
muito mais amplo e transversal na Agen- a demanda de apoio da Iniciativa de Ajuda de decisões responsiva, inclusiva, partici- ainda é marginalizada no que diz respeito
da 2030. Ao contrário de apenas discutir ao Comércio (meta 8.a). O ODS 9 focali- pativa e representativa em todos os níveis, à transição energética atual. Mesmo que
as interligações e os trade-offs entre ODS, za a necessidade de desenvolver infraes- incluindo instituições de governança global procure “fortalecer os meios de imple-
limitava-se a identificar a relevância das trutura e condições financeiras para isso (metas 16.7, 16.8, 16.a e 16.b). Isso é par- mentação”, o ODS 17 é paradoxalmente
metas do ODS 14, a Tabela 1 apresentou (metas 9.1, 9.3, 9.4 e 9.a), abordando as ticularmente importante nas diferentes or- ignorado na maioria das análises quando
como diferentes metas dos demais ODS se discussões sobre economia marítima, que ganizações nacionais e internacionais, que se trata do papel dos mares e do oceano
relacionam com a Economia Azul. prioriza portos, logística e infraestrutura lidam com os diversos setores relacionados na Agenda 2030.
De fato, a Economia Azul tem uma es- costeira. Por sua vez, o ODS 10 reforça o com a Economia Azul. Finalmente, o ODS Particularmente no que diz respeito ao
treita relação com diferentes objetivos da empoderamento e a promoção da inclu- 17 tem muitas relações com o tema (me- Sul Global, esse debate tem um ímpeto
Agenda 2030, o que é evidenciado na pró- são social (metas 10.2 e 10.6), o que é tas 17.3, 17.6, 17.7, 17.9, 17.16, 17.17 e adicional, inclusive pela lacuna de dados
pria Década do Oceano da ONU. Há uma especialmente importante, por exemplo, 17.18), pois reforça a necessidade de par- (IOC-Unesco, 2019). Sem dúvidas, é pos-
relação com o ODS 1 e o ODS 2, especial- para as populações locais, tradicionais, ri- cerias e meios de implementação das me- sível afirmar que o Brasil é um país com
mente quando é de conhecimento comum beirinhas e de pescadores. tas. Ao destacar finanças, tecnologias, trei- vocação marítima. Cabe lembrar que sua
que a pesca e as atividades relacionadas Com foco em cidades e comunidades namento, comércio e questões sistêmicas colonização se deu inicialmente pela zona
com os mares e oceanos têm grande po- sustentáveis, o ODS 11 procura fortalecer (política e coerência institucional; parcerias costeira e que, ainda hoje, parcela signifi-
tencial para reduzir e erradicar a pobreza os esforços para proteger e salvaguardar multisetoriais; e dados, monitoramento e cativa da população vive nesta região. Ape-
(metas 1.1, 1.2, 1.5, 1.a e 1.b) e a fome o patrimônio cultural e natural do mundo prestação de contas), tal relação estreita sar disso, a sociedade brasileira não possui
(metas 2.1 e 2.2). A relação com o ODS 3 é (meta 11.4), diminuir substancialmente as é clara não apenas com a Economia Azul, ampla educação, mentalidade e/ou cultura
clara no combate às doenças transmitidas perdas econômicas diretas causadas por mas também com a Década do Oceano, de marítimas (SANTOS, 2021b).
pela água (meta 3.3) e na redução do nú- desastres relacionados à água (meta 11.5) maneira mais geral e ampla. No caso brasileiro, ainda não existe
mero de mortes e doenças decorrentes da e reduzir o impacto ambiental negativo Diante do paradigma metodológico uma definição oficial de Economia Azul,
poluição da água do solo (meta 3.9). Sem associado à gestão de resíduos municipais proposto, há um impacto de todos os ODS economia do mar, economia costeira e/ou
dúvida, educação (metas 4.3, 4.4, 4.5, 4.7 (meta 11.6). O ODS 12 considera o uso efi- sobre as atividades marítimas e oceânicas economia oceânica. Em julho de 2020, foi
e 4.b) e gênero (metas 5.5 e 5.a) são ques- ciente dos recursos naturais e reduz pela – destacando-se que alguns deles suge- criado o Grupo Técnico (GT) PIB do Mar,
tões crescentes neste debate, precisamente metade os resíduos alimentares per capita rem seus próprios meios de implementa- sob coordenação do Ministério da Econo-
através da discussão da alfabetização oceâ- (metas 12.2 e 12.3), considerando a gestão ção (MoI). Entre as principais atividades e mia. O GT tem como finalidade: “Definir o
nica e do nexo oceânico-gênero. ambientalmente correta de produtos quí- setores, destacam-se: desenvolvimento so- conceito de Economia Azul/do mar para o
O ODS 6 tem estreita relação com as micos e de todos os resíduos (meta 12.4) cioeconômico; pesca; pesquisa, desenvol- Brasil; identificar seus setores e atividades;
questões marítimas e oceânicas (metas – novamente, mencionando o turismo sus- vimento e inovação (PD&I); infraestrutura elaborar proposta de metodologia para
6.1, 6.3, 6.4, 6.5, 6.6, 6.a e 6.b), enquan- tentável (meta 12.b). Ao abordar a mudan- marítima; biodiversidade e sustentabilida- mensurar o PIB do Mar do Brasil; e apre-
to o ODS 7 destaca a relevância de au- ça climática, o ODS 13 está intimamente de; e políticas públicas através de parcerias sentar sugestão para consequente institu-
mentar a participação das energias reno- relacionado à agenda marítima e oceâni- com setores privados, assim como através cionalização”. Sendo assim, o país adotará
váveis na matriz energética global (meta ca (metas 13.1, 13.2, 13.3 e 13.b), assim de cooperação regional e internacional. o conceito de “economia do mar” e, no
7.2) e a cooperação internacional para fa- como o ODS 14 (todas as metas). Concen- Logo, é possível destacar a conexão âmbito deste GT, está discutindo formas
cilitar o acesso à pesquisa e às tecnologias trando-se na vida em terra, o ODS 15 con- de todos os ODS da Agenda 2030 com as de mensuração e definindo quais setores
de energia limpa (meta 7.a) – embora não sidera a água doce interior (meta 15.1) e atividades da Economia Azul. Em alguns estarão contemplados no “PIB do Mar”,
mencione diretamente o potencial decor- reduz significativamente o impacto de es- casos, essas relações não são sequer men- integral ou parcialmente (SANTOS, 2021b).
rente das energias offshore. O ODS 8 en- pécies exóticas invasoras nos ecossistemas cionadas ou sugeridas na Agenda 2030. Sobre o país, existe uma tese de douto-
fatiza a necessidade de sustentar o cres- aquáticos (meta 15.8), propondo apoio fi- Esse é o caso de sua relação com os ODS rado que propõe o conceito de economia
cimento econômico per capita de acordo nanceiro para isto (meta 15.a). 7 e 17. Apesar de ter um enorme poten- do mar do Brasil, considerando atividades
com as circunstâncias nacionais (metas O ODS 16 também tem diferentes re- cial já comprovado para energias offshore direta e indiretamente relacionadas ao mar,
8.1, 8.3, 8.4), mencionando o turismo lações com a Economia Azul, destacando em certas regiões (ondas, correntes oce- abrangendo 12 setores econômicos de 17
sustentável (meta 8.9). Além disso, reforça a necessidade de assegurar uma tomada ânicas, marés e OTEC, por exemplo), ela estados e 280 municípios voltados para o

112 ECONOMIA AZUL Economia Azul e a Agenda 2030 113


mar. Com base nos dados de 2010, a re- 2004 o Almirante de Esquadra Roberto Referências
gião Nordeste do Brasil se destaca em ter- de Guimarães Carvalho, então coman-
mos de população litorânea (47,9%), com dante da Marinha do Brasil (MB), criou o ALLEN, C. et al. View project Initial pro- KACZYNSKI, W. The future of the blue
destaque para os estados da Bahia e Ceará, conceito de “Amazônia Azul” (SANTOS, gress in implementing the Sustainable economy: lessons for the European Union.
enquanto o Sudeste concentra a maior 2019; VIDIGAL et al., 2006). Com cerca Development Goals (SDGs): a review of Found Manag, v. 3, n. 1, p. 21–32, 2011.
participação no PIB do litoral (56,3%) e de 5,7 milhões de km2, que compõem evidence from countries. Sustainability KEEN, M.R.; SCHWARZ. A.-M.; WINI-SI-
total de empregos formais (47,4%), com as águas jurisdicionais brasileiras e cor- Science, [United Kingdom] v. 13, p. 1453– MEON, L. Towards defining the Blue Eco-
destaque para o estado do Rio de Janeiro. respondem a quase 70% da área conti- 1467, 2018. nomy: Practical lessons from Pacific Ocean
No total, os municípios costeiros brasileiros nental brasileira, trata-se de um conceito ARIEFF, A. Blue is the New Green. The governance. Marine Policy, v. 88, p. 333-
representam cerca de 17% da população político-estratégico amplamente utiliza- New York Times, New York, 20 Nov. 341, 2019.
nacional, 19% dos empregos nacionais e do pelo setor de defesa nacional. Porém, 2008 online KROLL, C. et al. Sustainable Development
21% do PIB nacional, com destaque para ainda é pouco conhecido pela sociedade BREUER, A. et al. Translating sustainable Goals (SDGs): are we successful in tur-
os setores de serviços, energia offshore e brasileira em geral, sem que haja uma development goal (SDG) interdepen- ning trade-offs into synergies? Palgrave
defesa nacional (CARVALHO, 2018). definição objetiva sobre as atividades dencies into policy advice Sustainability. Commun, v. 5, n. 140, p. 1–15, 2019.
Embora ainda não haja dados oficiais econômicas consideradas, nem quais re- Sustainability, [S. l.], v. 11, n. 7, p. 2092- LE BLANC, D. Towards integration at last?
sobre a economia do mar brasileira, em giões são consideradas. 3012, 2019. The sustainable development goals as a
CARVALHO, A. B. Economia do Mar: network of targets. Sustainable Develop-
conceito, valor e importância para o Bra- ment, v. 23, p. 176–187, 2015.
5. Conclusão sil. 2018. Tese (Doutorado em economia LEE, K.; NOH, J.; KHIM, J. S. The blue eco-
do desenvolvimento) - PUC-RS, Porto Ale- nomy and the United Nations’ sustainable
Diante do exposto, fica evidente que e, por sua vez, mobiliza a comunidade gre, 2018. development goals: challenges and oppor-
a agenda global já incorporou o debate internacional em prol de temas como COSTA, Sónia; CALDEIRA, Rui. Bibliome- tunities. Environment International, [Ams-
sobre o desenvolvimento sustentável, que, cooperação técnica, instrumentos de fi- tric analysis of ocean literacy: an underra- terdam], v. 137, 2020, 105528.
por sua vez, não pode ignorar o papel nanciamento, intercâmbios acadêmicos ted term in the scientific literature. Mari- LU Y. et al. Policy: five priorities for the UN
fundamental desempenhado pelos mares e, sem dúvidas, negócios comuns. ne Policy, v. 87, p. 149-157, 2018. sustainable development goals - comment.
e oceano. Nesse sentido, iniciativas locais, Portanto, considerando o contexto GALVÃO, Thiago Gehre. The 2030 inter- Nature, United Kingdom, v. 520, n. 7548,
regionais, multilaterais e globais já têm econômico desde 2020, é possível afir- national order and the future of global de- p. 432–433, 2015.
endereçado a questão, como é o caso, mar que “a Economia Azul pode impul- velopment. Meridiano 47, v. 21, 2020. TRANSLATING the SDGs to high-income
por exemplo, da Agenda 2030 (não ape- sionar a recuperação econômica global e, GRIGGS, D. J; NILSSON, M.; STEVANCE, Countries: integration at last? IISD Sustai-
nas por meio do ODS 14, inclusive) e da particularmente, a brasileira, na conjun- A.; MCCOLLUM, D. (ed.). A Guide to nable Development Policy and Practice,
Década do Oceano. tura pós-pandemia do novo coronavírus SDG Interactions: from Science to Imple- 49. New York, 17 Marc. 2016.
Nesse contexto, a Economia Azul re- (covid-19), podendo ser entendida como mentation Paris: International Council for LUSSEAU, D.; MANCINI, F. Income-based
presenta uma estratégia essencial para o novo El Dorado do século XXI” (SAN- Science, 2017. variation in Sustainable Development Goals
fazer frente aos desafios do século XXI, TOS, 2021a, p. 147). Seja pela agregação IDO, S.; SHIMRIT, P.-F. Blue is the new green: interaction networks. Nature Sustainabi-
particularmente por conta das oportuni- de valor, seja pela geração de emprego, Ecological enhancement of concrete based lity, v. 2, p. 242–247, 2019.
dades de negócios relacionados – muitos renda e tributos, os diversos setores da coastal and marine infrastructure. Ecologi- MADEIRA, C. R. O. The Blue Economy: a
dos quais nem sequer conhecemos no economia do mar, juntamente com o de- cal Engineering, v. 84, p. 260-272, 2015. bibliometric assessment. Dissertation in
presente –, pela geração de emprego e bate normativo/regulatório associado à UNITED NATIONS; INTERGOVERNMEN- Economics, Porto: FEP, 2020.
renda, bem como pela oferta de insu- governança do oceano, compõem a Eco- TAL OCEANOGRAPHIC COMMISSION. MARTÍNEZ-VÁSQUEZ, R.M.; MILÁN-GAR-
mos e matérias-primas essenciais à vida nomia Azul, que, infelizmente, ainda tem Summary Report of the First Global Plan- CÍA, J.; DE PABLO VALENCIANO, J. Chal-
e à dinâmica econômica e industrial. Essa sido pouco estimulada em determinados ning Meeting: UN Decade of Ocean Scien- lenges of the Blue Economy: evidence and
estratégia se aplica a diferentes países, países – fato agravado com a crise global ce for Sustainable Development. 13-15 May research trends. Environmental Sciences
com distintos graus de desenvolvimento decorrente da pandemia. 2019. Copenhagen: IOC-Unesco, 2019. Europe, [London], v. 33, 2021.

114 ECONOMIA AZUL Economia Azul e a Agenda 2030 115


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116 ECONOMIA AZUL Economia Azul e a Agenda 2030 117


6

GOVERNANÇA DO MAR
NA DÉCADA DA CIÊNCIA OCEÂNICA

Karen de Oliveira Silverwood-Cope


Thauan Santos

1. Introdução

Diante do movimento global rumo à de atores e processos para gestão da Eco-


ampliação da exploração dos recursos vivos nomia Azul: governança horizontal inter-
e não vivos presentes nos mares e oceano, setorial; governança multinível e gover-
cada vez mais percebe-se um movimento, nança antecipatória.
também em escala global, de ao maior É importante compreender a gover-
conhecimento, cooperação e uso dos po- nança, pois ela corresponde aos processos
tenciais e das oportunidades relacionadas de tomadas de decisões e ao papel que
a esse ambiente. Nesse contexto, surge a diferentes atores exercem nesse processo
Década da Ciência Oceânica para o Desen- interativo e iterativo. A governança repre
volvimento Sustentável das Nações Unidas senta uma forma de governar, represen-
(2021-2030), também conhecida como -tando a interdependência entre uma mul-
Década do Oceano. Com o slogan “A ci- tiplicidade de atores heterogêneos, em prol
ência que precisamos para o oceano que de objetivos coletivos, limitadas por regras
queremos”, tal iniciativa coletiva global visa e instituições (PETERS et al., 2016).
revolucionar a relação entre o ser humano Com isso, buscamos destacar a nature-
e o oceano, dando voz a diferentes atores, za intersetorial, transdisciplinar e multiato-
em distintos níveis e regiões, para lidar com res dessa iniciativa, cuja amplitude de obje-
os desafios globais do século XXI. tivos coloca o oceano em um lugar central
Dessa maneira, o objetivo deste capítu- na agenda internacional. Dessa maneira,
lo é analisar a Governança do Mar no Brasil entender o papel da governança no con-
considerando o contexto e as oportunida- texto mais ampla da Economia Azul per-
des da Década do Oceano e refletir sobre as mitirá que profissionais da Academia, da
oportunidades de construção de novos ca- iniciativa privada, das organizações não
minhos para melhoria contínua da gover- governamentais (ONGs), incluindo juven-
nança. Assim, inicialmente será apresenta- tude, mulheres e demais segmentos repre-
da a década, com particular destaque para sentados na tomada de decisão, não ape-
seus objetivos e sua relação com a Econo- nas tenham vozes no debate, mas que elas
mia Azul. Em seguida, estão elencados sejam, efetivamente, ouvidas e levadas em
questões a serem identificadas como “ti- consideração no plano em curso em prol da
pos ideais” de governança na perspectiva sustentabilidade do oceano.

118 ECONOMIA AZUL Governança


Governança do
do Mar
Mar na
na Década
Década da
da Ciência
Ciência Oceânica
Oceânica 119
2. Novos caminhos com a Década da Ciência Oceânica? e as inovações tecnológicas voltadas para . Um oceano acessível, com acesso livre e
a limpeza, segurança e sustentabilidade do equitativo aos dados, à informação, à tec-
A Década do Oceano e a Agenda 2030
(ver capítulo anterior), especialmente o Ob-
Geral das Nações Unidas aprovou a Agenda
2030 para o desenvolvimento sustentável.
oceano. No Brasil, como será visto mais à
frente, o Ministério da Ciência, Tecnologia .nologia e à inovação; e
Um oceano inspirador e envolvente, para
jetivo do Desenvolvimento Sustentável 14 Nela, foram estabelecidos 17 ODS, que de- e Inovações (MCTI), representante científi- que a sociedade possa compreender e valo-
(ODS 14), representam a estrutura central vem ser alcançados por todos os países até co na COI, é responsável pela implementa- rizar a sua relação com o bem-estar huma-
para identificar e abordar as questões mais 2030. O ODS 14 (Vida na Água), em parti- ção da Década da Ciência Oceânica nacio- no e o desenvolvimento sustentável.
urgentes relacionadas com o oceano em ní- cular, é o que mais diretamente visa conser- nalmente, que foi oficialmente lançada em
vel internacional e nacional. Este framework var e a promover o uso sustentável dos oce- março de 2021. Dentre os 10 desafios, estão:
resulta da constatação de que o oceano está
ameaçado por múltiplos impactos oriundos
anos, dos mares e dos recursos marinhos.
Após esse grande movimento de colo-
É importante considerar que a Déca-
da do Oceano surge em um período de . Compreender e fazer um levantamento
de atividades terrestres e marítimas, que car o oceano como chave na agenda global grandes desafios globais, dentre os quais das fontes terrestres e marinhas de poluen-
afetam mais de 40% de sua superfície. de desenvolvimento sustentável, a primeira podemos destacar: mudança climática, es- tes e contaminantes e os seus potenciais
Tratando-se, ainda, de um ambiente Avaliação Mundial dos Oceanos, concluída cassez de alimentos, epidemias e desastres impactos na saúde humana e nos ecossis-
desconhecido, dado que apenas 19% do pelas Nações Unidas em 2016, reforçou a naturais, crises econômicas e desemprego. temas marinhos, além de desenvolver solu-
fundo do oceano é mapeado e existem
vastas faixas de mar profundo e as regiões
urgência para o controle das atividades no
oceano com sustentabilidade. Por isso, em
Logo, é importante considerar que ela se
insere em um framework mais complexo e .
ções para os remover ou atenuar;
Compreender os efeitos de múltiplos
polares com pouco ou nenhum conheci- 2017, foi proclamada a Década da Ciência novos temas e discussões emergentes na fatores de estresse nos ecossistemas ma-
mento sobre a distribuição de espécies, Oceânica para o Desenvolvimento Susten- agenda global, propondo “ocean-solutions rinhos e desenvolver soluções para moni-
ecossistemas, processos oceânicos e estres- tável, a ser implementada de 2021 a 2030, to achieve global goals”. Assim, são 7 re- torar, proteger, manejar, gerir e recuperar
sores. Ao mesmo tempo, o oceano contri- buscando cumprir os compromissos da sultados em 10 anos, com 10 desafios e os ecossistemas e a sua biodiversidade em
bui com a saúde e com o bem-estar de to- Agenda 2030 com foco no ODS 14 e de- 1 oceano para, junto às demais iniciativas condições ambientais, sociais e climáticas
dos os seres humanos e demais seres vivos,
além de ser um aliado fundamental na luta
mais correlatos.
A Comissão Oceanográfica Intergover-
globais, endereçar temas chaves para um
planeta justo e sustentável. De acordo com .
em constante alteração;
Gerar conhecimento, apoiar a inova-
contra a mudança climática e fonte de uma namental (COI), da Organização das Na- o Plano de Implementação na Década do ção e desenvolver soluções para otimizar
cultura significativa, de valores estéticos e ções Unidas para a Educação, a Ciência e Brasil1 (MCTI, 2021), são sete resultados es- o papel do oceano na alimentação sus-
recreativos. Sua importância econômica é
inquestionável, ao se constituir na princi-
a Cultura (UNESCO), é a responsável pelo
design e pela preparação do Plano de Im- .
perados:
Um oceano limpo, onde as fontes de po-
tentável da população mundial em con-
dições ambientais, sociais e climáticas em
pal via de transporte do comércio exterior e plementação da Década, que define um luição estejam identificadas e sejam reduzi-
.
constante alteração;
gerar milhões empregos diretos e indiretos.
Dessa maneira, a relação entre mar, ocea-
conjunto de avanços científicos e tecno-
lógicos de alto nível necessários para o .
das ou removidas;
Um oceano saudável e resiliente, onde
Gerar conhecimento, apoiar a inovação
e desenvolver soluções para o desenvolvi-
no e economia é clara, cabendo à presente alcance de sete resultados desejados: um os ecossistemas marinhos sejam compre- mento equitativo e sustentável da econo-
década, inclusive, contribuir para que essa oceano limpo; saudável e resiliente; pre- endidos, protegidos, recuperados e devida- mia oceânica em condições ambientais,
relação seja próspera e sustentável.
Em face de um oceano ameaçado, pou-
visível; seguro; sustentável e produtivo;
transparente e acessível; e conhecido e .
mente geridos;
Um oceano produtivo, que suporte uma .
sociais e climáticas em constante alteração;
Aumentar a compreensão do nexo entre
co conhecido e mercê de sua importância valorizado por todos. Desse modo, será cadeia alimentar sustentável e uma econo- o oceano e o clima e gerar conhecimento
ecológica e econômica, precisamos mo-
bilizar recursos, pessoas, oportunidades e
buscada “A Ciência que necessitamos
para o Oceano que Queremos” de forma .
mia oceânica sustentável;
Um oceano previsível, o qual a sociedade
e soluções para mitigar, adaptar e reforçar
a resiliência aos efeitos das alterações cli-
inovações tecnológicas baseadas na ciência cooperativa, sistêmica e integrada. compreenda para que possa responder às máticas em todas as regiões e a todas as
oceânica que contribuam para o desenvol-
vimento sustentável e para a saúde do pla-
A Década surge da necessidade de se
atuar em prol da saúde oceânica. Tal atu- .
alterações das suas condições;
Um oceano seguro, em que a vida e os
escalas e melhorar os serviços, incluindo as
previsões relativas ao oceano, ao clima e às
neta como um todo. É justamente e, inclu-
sive, por isso, que, em 2015, a Assembleia
ação, por meio de cooperação internacio-
nal, busca incentivar a pesquisa científica
meios de subsistência sejam protegidos con-
tra os riscos relacionados com o oceano; .
condições meteorológicas;
Melhorar os serviços de alerta antecipado

120 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 121


de multirriscos para ameaças de impactos ge- em publicações da UNESCO disponíveis no implementação da Estrutura Global de Bio- destaque para o papel de iniciativas filan-
ofísicos, ecológicos, biológicos, meteorológi- site oficial da década (www.oceandecade. diversidade pós-2020), SENDAI Framwork trópicas. Ainda que não haja uma aborda-
cos, climáticos e antropogênicos que possam org), destaca-se que relativamente à orien- (conhecimento e soluções para a resiliência gem de “one-size-fits-all” de como uma
afetar as zonas marinhas, bem como a pre- tação e às recomendações para abordagens da comunidade), SAMOA Pathway (desen- fundação filantrópica pode apoiar a Déca-

.
paração e resiliência das comunidades;
Garantir um sistema sustentável de ob-
colaborativas, necessárias tanto à concep-
ção quanto à implementação de ações da
volvimento de capacidade e transferência
de tecnologia marinha para SIDS) e BBNJ
da o Oceano em si, as sugestões a seguir
podem orientar as Fundações no desen-
servação do oceano com ampla abrangên- Década, afirma-se que será necessária uma (conhecimento e soluções para a conserva- volvimento de uma mistura personalizada
cia espacial e temporal em todas as bacias “ciência transformadora” e uma “revolu- ção e o uso sustentável da biodiversidade de formas de engajamento: co-branding
oceânicas, que forneça dados e informa- ção em como essa ciência é produzida, uti- marinha fora da jurisdição nacional), por e patrocínio de chamadas para ações da
ções acessíveis a todos os interessados no lizada e divulgada” (UNESCO, 2021a). exemplo (IOC-UNESCO, 2021b). década; desenvolvimento de ações da dé-
tempo adequado para implementar ações Em linha com o defendido no capítulo Sendo assim, de maneira resumida, cada através de co-design; apoiar com re-
e gerar conhecimento, assim como poten- anterior, embora a Década esteja muito destaca-se que a Década do Oceano apre- cursos ações da Década; apoio aos custos
cializar a gestão dos sistemas socioecoló- relacionada com o ODS 14, ela não se li- senta 3 principais objetivos (identificar os de coordenação; apoiar as comunicações

.
gicos marinhos;
Através da colaboração de vários inter-
mita a ele – quando pensada da maneira
mais ampla, inserida no contexto da Agen-
conhecimentos necessários para o desen-
volvimento sustentável; gerar abrangente
e as atividades de divulgação; incentivar
a participação de bolsistas na Década do
venientes, desenvolver uma representação da 2030. Dessa forma, o “o oceano que conhecimento e compreensão do ocea- Oceano; liderar ou participar em comitês
digital abrangente do oceano, incluindo um queremos” (7 resultados esperados) possui no; e aumentar o uso do conhecimento e grupos de trabalho nacionais e regionais
mapa dinâmico de acesso livre e gratuito relação com o ODS 1 (conhecimento e so- dos oceanos), 10 desafios (entender e ou grupos de especialistas; e envolver no-
que permita explorar, descobrir e visualizar luções para uma economia oceânica sus- vencer a poluição marinha; proteger e vos parceiros filantrópicos na Década do
as condições do oceano no passado, presen- tentável), ODS 2 (conhecimento e soluções restaurar ecossistemas e biodiversidade; Oceano (IOC-UNESCO, 2020).
te e futuro, utilizando sistemas de observa- para a pesca sustentável e a aquicultura), alimentar de forma sustentável a popula- Com destaque para o papel de cien-
ção do oceano, de uma forma que possa ser ODS 3 (conhecimento e inovação para sis- ção mundial; desenvolver uma economia tistas, practioners/stakeholders e apoia-

.
relevante para todas as partes interessadas;
Assegurar o desenvolvimento de recur-
temas de alerta precoce multiperigosos),
ODS 4 (educação formal e informal sobre
oceânica sustentável e equitativa; desblo-
quear soluções baseadas no oceano para
dores (funders), ressalta-se o papel-chave
da governança para o sucesso da inicia-
sos humanos e competências relacionadas a importância do oceano para o desenvol- a mudança climática; aumentar a resiliên- tiva, razão pela qual ela será detalhada-
às atividades socioeconômicas voltadas vimento sustentável), ODS 5 (aumento da cia da comunidade aos riscos oceânicos; mente analisada na próxima seção. Dentre
para o mar, assim como garantir o aces- equidade de gênero na ciência dos oce- expandir o sistema global de observação as diferentes questões que precisam ser
so equitativo aos dados, à informação, ao anos), ODS 7 (conhecimento e soluções do oceano; criar uma representação digi- endereçadas, estão temas relacionados
conhecimento e à tecnologia referente a para energia oceânica de baixo impacto), tal do oceano; habilidades, conhecimen- ao financiamento adequado e sustenta-
todos os aspectos da ciência do oceano e ODS 8 (conhecimento e soluções para tos e tecnologia para todos; e mudar a do; às instituições baseadas no local ou

.
para todas as partes interessadas; e
Assegurar que os vários valores e ser-
uma economia oceânica sustentável), ODS
10 (envolvimento dos SIDS, PMDs e LDCs,
relação da humanidade com o oceano) e
7 resultados esperados (um oceano lim-
no regional, que sejam capazes de esta-
bilizar as interações transdisciplinares que
viços que o oceano aporta ao bem-estar incluindo maior acesso a dados, informa- po; um saudável e resiliente oceano; um visam abordar desafios oceânicos comple-
humano, à cultura e ao desenvolvimento ções, capacidades e tecnologias), ODS oceano produtivo; um oceano previsto; xos; padrões profissionais e institucionais,
sustentável sejam compreendidos, além de 11 (conhecimento e soluções para a resi- um oceano seguro; um oceano acessível; normas e incentivos, que rompam com os
identificar e ultrapassar quaisquer barreiras liência da comunidade) e ODS 13 (maior e um inspirador e envolvente oceano) (IO- tradicionais modelos disciplinares e de go-
às mudanças de comportamento necessá- compreensão do nexo oceano-climático) C-UNESCO, 2020). vernança; e gerenciamento adequado de
rias para uma alteração gradual da relação (IOC-UNESCO, 2021b). Há diferentes foundations para promo- projetos, engajamento e habilidades inter-
da sociedade com o oceano. Dentre os exemplos de interações possí- ção da Década do Oceano, com especial pessoais (UNESCO, 2021a).
veis com o arranjo de governança oceânica
Fica evidente a estreita relação da déca- global já existente, destaca-se com: UN-
da com a Economia Azul, especialmente se FCCC (maior compreensão do nexo ocea-
considerado o terceiro desafio. Com base no-climático), CDB (conhecimento para a

122 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 123


3. E o Brasil na Década? Dessa forma, seja na sua totalidade, é imprescindível compreender a comple-
seja no caso brasileira, fica clara a relação xidade de ambas as agendas para, efeti-
A área oceânica nacional representada produtivo e sustentável; previsível; seguro; entre a Década do Oceano e a Economia vamente, endereçar os desafios presen-
pelo Mar Territorial (MT) e pela Zona Eco- acessível; inspirador e envolvente. Azul, particularmente pelas interfaces em tes até 2030, contemplando toda con-
nômica Exclusiva (ZEE) corresponde a cerca O país iniciou as ações para a Década matéria de desenvolvimento sustentável e tribuição potencial do oceano (SANTOS,
de 3,6 milhões de km2. Se a ela for adicio- do Oceano em 2019 e instituiu um Comitê governança (SANTOS, 2021a). Portanto, 2021b).
nada à parte oceânica de Plataforma Con- de Governança Nacional para a Década da
tinental Estendida (PCE) (2,1 milhões de Ciência Oceânica. Em 2020, houve a for- 4. As teorias sobre governança
km2), que está sendo pleiteada pelo Brasil mação de Grupos de Apoio à Mobilização
à Comissão de Limites da Plataforma Con- Regional para a Década (GAM), que são Após conhecer a Década do Oceano e, ambiental. Essa evolução se deu em razão
tinental da Convenção das Nações Unidas uma formação voluntária de indivíduos e sobretudo, compreender sua complexida- da influência das agendas internacionais
sobre o Direito no Mar (CLPC/CNUDM), a representantes de diversas organizações de, é necessário entender como 3 princi- da Nações Unidas e dos Organismos Inter-
área oceânica total sob jurisdição brasilei- e indivíduos com o objetivo comum de pais objetivos, 10 desafios e 7 resultados nacionais de Financiamento do Desenvolvi-
ra poderá vir a ser de aproximadamente promover a comunicação sobre os temas serão alcançados. Isso é especialmente mento (MOURA, 2016).
5,7 milhões de km2, equivalente a cerca tratados pela Década, além de também necessário, dada a quantidade de atores Cabe ressaltar que a lógica de Políticas
de 67% da área continental do território ampliar o engajamento de todos, de forma locais, nacionais, regionais e globais, públi- Nacionais, Sistemas (Nacionais ou Únicos),
nacional de 8.511.996 km2. Em alusão à participativa, regional e inclusiva. cos e privados, da academia ou da socieda- Comitês Gestores e Conselhos tem se con-
área de floresta verde da Amazônia Legal O Plano Nacional de Implementação da de civil organizada envolvida no processo, solidado como praxe exitosa em diversas
Brasileira (Amazônia Verde ou Amazônia Década da Ciência Oceânica para o Desen- o que torna a discussão sobre governança políticas setoriais e transversais no país,
Legal), passamos a denominá-la de Ama- volvimento Sustentável apresenta os meca- central no alcance dessa iniciativa global. gerando capilaridade de integração (em
zônia Azul. A região concentra as reservas nismos de gestão e governança da Década No campo das políticas de gestão dos maior ou menor medida) entre os diversos
oceânicas do pré-sal, de onde se retira cer- no Brasil e demonstra ampla capilaridade recursos do mar, há uma necessidade sin- atores e recursos presentes nos subsiste-
ca de 85% do petróleo, 75% do gás natu- de engajamento de redes e representação gular de estudos sobre a governança em mas de políticas públicas específicos, ainda
ral e 45% do pescado produzidos no país. social. Dessa forma, a organização e coor- razão de apresentarem problemas comple- que não sem desafios e limitações. A Polí-
Por ela escoam mais de 95% do comércio denação da Década está fundada no enga- xos, de interdependência global, urgentes tica setorial relacionada ao mar está funda-
exterior brasileiro. jamento e na parceria. Esta Década será para do ponto de vista da sobrevivência da hu- da na Política Nacional de Meio Ambiente
Toda essa extensa região precisa ser todos: cientistas, organizações intergoverna- manidade, e de alto impacto orçamentá- (PNMA, Lei 6938/1981), marco institucio-
mais bem estudada e seu potencial de uso mentais e não governamentais, nações e in- rio para os países (DAMACENA; FARIAS, nal orientador da política ambiental que
aproveitado de maneira sustentável, com- divíduos, institutos de pesquisa, profissionais 2017). A agenda de pesquisa sobre as va- se desenvolveu posteriormente em vários
patibilizando os interesses variados da Eco- e setor privado, povos indígenas e detentores riáveis que explicam a governança da polí- setores: recursos hídricos, resíduos sólidos,
nomia Azul, gerando bens, serviços e em- de conhecimentos tradicionais, educadores e tica pública do mar em nível federal pode biodiversidade, florestas, mudança do cli-
pregos relacionados ao mar e contribuindo estudantes, para recreação e lazer, usuários oferecer respostas de investigação sobre a ma, gerenciamento costeiro, entre outros.
para o aumento do PIB Nacional. No Brasil, esportivos do oceano e muitos outros. formação de agenda, formulação de políti- Entretanto, Araújo (2013) aponta para
o MCTI busca facilitar a produção de da- Integrar processos do local ao global, cas, implementação e os processos decisó- o fato de que apesar de as normas ambien-
dos, de informações e dos conhecimentos construídos com diferentes setores da so- rios associados. tais brasileiras serem reconhecidas como
necessários sobre a Amazônia Azul e suas ciedade, é um requisito fundamental de A evolução histórica da política ambien- extremamente avançadas pelos principais
interconexões com o Atlântico de polo a implementação nacional da Década, que tal no Brasil se iniciou na década de 1930 autores da área do direito ambiental, iden-
polo para promovermos o desenvolvimen- visa representar a diversidade sociocultural e sob a perspectiva de gestão de recursos tifica-se na sua implementação diversas
to sustentável. Neste contexto, o objetivo ambiental brasileira em um contexto global. naturais, conseguiu avançar a partir da dé- lacunas. Para além das deficiências relacio-
do planejamento nacional da ciência oce- Assim, a Década da Ciência Oceânica é uma cada de 1970 e 1980 em uma perspectiva nadas a recursos financeiros e humanos,
ânica é orientar, coordenar e facilitar as oportunidade para reflexão de parte das ciên- integral com objetivo de prover a manuten- há centralização excessiva de atribuições
ações nacionais que permitirão o alcance cias sociais em diversas frentes da economia ção do equilíbrio ecológico, a preservação, nos órgãos federais; escassa atenção para
de um oceano limpo; saudável e resiliente; e da governança de recursos do mar. a melhoria e recuperação da qualidade os instrumentos econômicos de política

124 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 125


ambiental; carência de diálogo entre o Sis- atores de diferentes setores e desenhos limita a capacidade de abordar questões rial e da transversalidade da agenda azul e
tema Nacional do Meio Ambiente (SISNA- organizacionais apropriados. Em outras maiores e mais abrangentes de maneira abre uma janela de oportunidade para re-
MA) e os sistemas voltados a áreas especí- palavras, a governança intersetorial de- intersetorial. A compreensão dos órgãos, visão dessas lacunas institucionais horizon-
ficas da gestão ambiental, como o Sistema manda uma gestão e processos adminis- no nível federal, envolvidos nas diversas po- tais. No que se refere especificamente à go-
Nacional de Gerenciamento dos Recursos trativos adaptados a este fim. líticas ambientais e seu nível de comprome- vernança da Década no Brasil, aplicam-se
Hídricos (SINGREH), que reúne os comitês Como objeto de estudo, a governança timento, notadamente os Ministérios, será as boas práticas da coordenação interseto-
de bacia e as agências de água; prevalên- compreende as seguintes funções: tomada um sinalizador importante das limitações e rial. Há uma coordenação interministerial
cia da visão utilitarista quanto aos recursos de decisões; seleção de objetivos; mobili- do possível efeito oposto relacionado às in- diretamente realizada via o Comitê Execu-
naturais sobre a ambientalista nas decisões zação de recursos; implementação; e fee- terações dadas por normas e regras formais, tivo para o Desenvolvimento Sustentável2
governamentais de maior impacto; elevado dback, avaliação, aprendizagem (PETERS bem como permitirá identificar sobreposi- da Comissão Interministerial dos Recursos
grau de descumprimento das determina- et al., 2016). Destaca-se a centralidade da ções de agendas/atores e/ou lacunas. do Mar (CIRM), que contém 17 membros
ções insertas em sua base normativa. Ain- tomada de decisões, que perpassa trans- No caso aplicado à governança do mar, de órgãos correlatos do Governo Federal.
da, os autores Damacena e Farias (2017) versalmente as demais funções em todo o a intersetorialidade da temática está rela- As ações para Década da Ciência Oceânica
indicam que os instrumentos da política processo de produção de políticas públicas. cionada com a necessidade de articulação também estão integradas no X Plano Se-
ambiental têm implementação excessiva- Assim, ao observar o nível de articulação da gestão de recursos hídricos de forma in- torial de Recursos do Mar,3 que orienta as
mente morosa, alta demanda de controle, entre setores governamentais envolvidos tegrada com a gestão costeira. Assim, as principais ações do Governo Federal para
possuem custos administrativos elevados, na esfera federal para a implementação da instituições e os atores do Sistema Nacio- gestão dos recursos do mar.
necessidade de fiscalização e falta de estí- governança do mar, devem ser analisadas nal de Gerenciamento de Recursos Hídricos A governança intersetorial também
mulo para aprimoramento tecnológico. A as participações dos atores e sua maior ou precisam estar estreitamente conectados pressupõe a intersetorialidade entre seto-
explicação para estas lacunas pode ser rea- menor inclusão nas tomadas de decisões, com o setor da Gestão dos Sistemas Estua- res estatais, não estatais privados e não
lizada pela trajetória de governança nestas desde a definição de objetivos até o pro- rinos e Zona Costeira. estatais societais. As políticas ambientais
políticas à luz das teorias que são apresen- cesso de aprendizagem dos resultados das Em nível institucional, estes setores es- incluem, historicamente, como parte fun-
tadas a seguir. políticas implementadas. tão compreendidos pelas políticas públicas dante da agenda: a) Organizações Não
Como muitos atores são coletivos, pode associadas como a Política Nacional de Re- Governamentais (ONGs); b) Setor priva-
Governança horizontal intersetorial ser difícil estabelecer se o coletivo é o ator cursos Hídricos (Lei 9.433/1997) e a Política do; e c) Comunidades acadêmicas. Para
ou se subgrupos dentro deste coletivo atu- Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei análise da participação e inter-relação de
A governança intersetorial intragover- am por conta própria. Assim, o governo 7.661/88 e Decreto 5.300/04). Entre esses atores envolvidos, a teoria da governança
namental trata das relações intergoverna- pode ser visto como um ator, mas vários marcos setoriais, há significativos desafios em redes aborda a interdependência entre
mentais horizontais, ou seja, a interação Ministérios têm as suas próprias políticas para uma efetiva intersetorialidade. Loit- atores e padrões complexos de interação.
entre setores de governo da mesma esfera e atuam sobre elas (KLIJN; KOPPENJAN, zenbauer e Mendes (2016) analisam o caso A grande maioria das políticas públicas é
federativa. Nesse sentido, compreende as 2016). É importante destacar a necessida- concreto da influência costeira em bacias produzida com a presença de uma grande
interações entre Ministérios setoriais distin- de de compreensão da governança a partir de Santa Catarina e indicam que as lacu- diversidade de atores e, portanto, com di-
tos para a superação das lacunas e evitar do nível ministerial ou de suas subunida- nas legais, institucionais e administrativas ferentes pontos de vista sobre os proble-
sobreposições entre agendas que obrigato- des, comitês e fóruns como atores. na gestão integrada de recursos hídricos mas, as causas e soluções.
riamente devem estar alinhadas na provi- Peters et al. (2016) argumentam que a no território costeiro brasileiro têm tido um A compreensão da governança a
são de bens e/ou serviços para a sociedade. própria divisão dos governos em ministérios impacto crítico na degradação destes am- partir do nível do ator evidencia as dife-
A intersetorialidade tem a função de e agências tende a segmentar as atividades bientes. São faltantes regulação no uso e rentes percepções entre os atores, suas
garantir a integração governamental entre de elaboração de políticas, com algum es- exploração desses ambientes, intervenções divergências e consensos, bem como as
os setores ministeriais aplicada a todo o ci- treitamento do foco e o uso de aconselha- de mediação de conflitos de uso e ações de estratégias utilizadas pelos atores dian-
clo de formulação, implementação e ava- mento especializado de uma gama relativa- controle de impactos oriundos de ativida- te das incertezas do processo interativo
liação de políticas públicas (CUNILL-GRAU, mente estreita de fontes. Assim, para eles, des terrestres sobre estes ambientes. iterativo. O processo da governança para
2014). Isto implica um design de proces- se a especialização cria certamente alguns O contexto da Década da Ciência Oceâ- solução de problemas complexos deman-
sos de interação de forma iterativa entre benefícios para a governança, também nica traz a importância da integração seto- da alternativas além das competências

126 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 127


organizacionais individuais, que sejam co- Governança vertical/multinível decisórios? Há participação efetiva? Os ci- e provisão coerentes com as condições lo-
laborativas, sistêmicas e adaptativas. (metagovernança) dadãos que participam dos conselhos de cais; arranjos de escolha coletiva; monito-
A governança intersetorial da Década meio ambiente nos três níveis federativos ramento e controle; sanções; mecanismos
da Ciência Oceânica está fundada na re- A governança multinível se refere àque- têm alguma correspondência de perfil? Em para a resolução de conflitos; de direitos de
presentação equilibrada de origem diversa la que integra o Estado Central ao nível lo- que se diferenciam? E nas demais arenas organização e rede de instituições.
no Comitê de Assessoramento da Déca- cal de entrega de bens e serviços públicos, ambientais? E qual é a relação dessas are- Também é possível analisar com a abor-
da da Ciência Oceânica, formalizado por ou ainda deste com o nível internacional. nas com os Conselhos e Comitês setoriais dagem do Institutional Analysis and Deve-
meio da Portaria do MCTI nº 4.534 de 8 Nesse sentido, aqui cabem as discussões e locais? Essa questão, por si só, caracteri- lopment (IAD), baseada nas concepções de
de março de 2021. São membros e con- sobre o federalismo e a governança sob a zaria uma agenda de pesquisa específica, Ostrom (CAPELARI; CALMON; ARAÚJO,
vidados do Comitê: Ministério de Ciência, ótica de distribuições de competências re- mas entendemos que, nesse momento, a 2017), como o marco institucional se ani-
Tecnologia, Informações e Comunicações; lacionadas a tomadas de decisão regulató- priorização da elaboração do mosaico mais nha nos multiníveis municipal, estadual e
Marinha do Brasil; Conselho Nacional de rias e executoras (ARRETCHE, 2012). amplo é proeminente. federal, buscando as vantagens e desvan-
Desenvolvimento Científico e Tecnológico O tema governança refere-se mais a Uma outra agenda de pesquisa para a tagens de cada configuração. Nesse sen-
(CNPq); Instituto Brasileiro de Informação processo que a instituições, mais a práticas, governança do mar é possível com a abor- tido, são variáveis a serem observadas: a
em Ciência e Tecnologia (Ibict);, UNESCO organização e coordenação e que indepen- dagem de gestão de bens comuns, pro- natureza e qualidade das regras, sua perti-
BRASIL; 2 representantes da Sociedade Ci- de do Estado ou vai além dele. Traz, assim, posta por Ostrom (1990). A exploração e nência com a comunidade e ecossistemas,
vil; 3 representantes da Academia: Acade- as possibilidades de organizações sociais gerenciamento do meio ambiente permite o enforcement e a legitimidade do marco
mia Brasileira de Ciências e dois Pesquisa- atuarem de maneira mais independente ao uma análise agregada sobre arranjos e ins- institucional em questão.
dores; 1 representantes do Setor privado; Estado. O primeiro sinal de governança se- trumentos de gestão, que atuam de forma Aplicado ao caso da governança do
2 representantes de Jovem Embaixador e 2 ria, portanto, a superação de uma visão ex- geral no marco institucional dos instru- mar, estudos com a abordagem IAD sobre
representantes de Divulgação Científica no tremamente burocrática e hierárquica, com mentos de governança, como Comissões. as condições ecossistêmicas locais, o mar-
tema. São competências do Comitê: um Estado agindo mais com relações de O caso dos comitês de gestão de bacia, co institucional local, estadual e federal e
mercado, contratos e redes. O segundo si- por exemplo, pode oferecer um caso para os atributos da comunidade local funda-
1. Conectar a estrutura da Década à ci- nal estaria relacionado ao caráter multinível o debate sobre exemplos de regulação mentam uma análise sobre os desafios da
ência nacional e à comunidade para pro- para tentar solucionar problemas conjunta- autônoma dos ativos naturais de bens co- governança e da interação entre todos os
mover conhecimento; mente. Um terceiro sinal estaria relaciona- muns pelas comunidades locais. Em geral, partícipes em escala multinível.
2. Fornecer insumos nacionais para a do ao envolvimento de atores não estatais essas soluções para os recursos possuem Por fim, a abordagem de bens comuns
formulação de Ações da Década entre gru- nas tomadas de decisão sobre as produ- características de regulação local com múl- e do IAD é pertinente para análise multiní-
pos de partes interessadas e/ou nações; ções de políticas públicas e na entrega de tiplos atores, em complementaridade com vel da governança nacional e internacional
3. Identificar prioridades nacionais, in- serviços públicos via implementação. E, em a regulação Federal. Cesar, Luna e Perkins nas políticas públicas ambientais. Em razão
cluindo o desenvolvimento de Programas último lugar, estaria diretamente relaciona- (2020) também apresentam uma agenda da grande influência sobre Convenções e
da Década; do a redes, com o crescimento da atuação de pesquisa promissora com a abordagem Acordos Multilaterais para as agendas am-
4. Coordenar atividades nacionais de di- da sociedade civil atuando em rede. Todo de comuns analisando a eficácia da regu- bientais nacionais, há uma relação direta
vulgação e comunicação; esse arcabouço está atrelado ao conceito lação a partir das variáveis de lideranças entre a governança que se estabelece na-
5. Facilitar o fornecimento de apoio na- de “nova governança”, como característi- comunitárias e sua atuação no enforce- cionalmente, em níveis federais e locais,
cional necessário; cas que remetem a tipos ideais atrelados ment da própria regulação, bem como os com as orientações e intersetorialidade das
6. Incentivar as contribuições voluntá- a conceitos de democracia (BEVIR, 2010). conflitos locais e a relação entre a política Convenções das Nações Unidas. O aninha-
rias para as chamadas internacionais; O objetivo seria identificar, assim, quem ambiental e a fundiária. mento regulatório, assim como a gover-
7. Fornecer relatórios para a Unidade de são os cidadãos partícipes das arenas de É possível analisar no âmbito das dife- nança em redes, são teorias com heurísti-
Coordenação da Década; e discussão e deliberação no âmbito da go- rentes temáticas da governança como se cas explicativas para este arranjo nacional
8. Facilitar a realização de reuniões re- vernança do mar e por meio de quais are- aplicam os princípios da “boa” regulação, e internacional.
gionais ou internacionais relacionadas para nas e de que forma. Assim: qual é o nível observados por Ostrom (1990): limites cla- Na governança de bens comuns, en-
a Década. de envolvimento dos atores nos processos ramente definidos; regras de apropriação tende-se que modelos que excluem as

128 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 129


singularidades locais e temáticas podem com 476 participações ativas, sendo 62% O nível de metagovernança que mar- concepções do futuro: a) planejamento for-
comprometer a eficácia regulatória e incorrer destas mulheres. A participação foi maior ca o processo da Década no Brasil é tam- mal e desenvolvimento de estratégia; b) cons-
na tragédia dos comuns. A eficácia regula- de representantes da Academia, 53%, se- bém constatado na formação de cinco trução de uma ampla preparação e capacida-
tória também depende da inclusão dos re- guido de Sociedade civil, 19%; Governo, Grupos de Mobilização Regional (Norte, des da sociedade; c) mobilização diversos ato-
gulados na sua formulação, implementação 18% e Setor Privado, 5%. Em relação às Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Sudeste) res; e d) compreensão de efeitos e impactos
e monitoramento. Neste quesito, é uma contribuições técnicas recebidas, houve e um Grupo de Mobilização Jovem de de cenários no presente e no futuro.
agenda de pesquisa estudar a efetividade da participação de representantes de origem forma voluntária ao longo de 2020. Essa A governança antecipatória permite
governança do mar no equilíbrio dos meca- de todas as regiões com prevalência de governança local complementou a go- conferir atributos de resiliência para o pro-
nismos de comunicação, coordenação e co- Nordeste, Sudeste, Norte, Sul e Centro- vernança estabelecida por meio do Co- cesso de tomada de decisão especialmente
operação entre as diversas instâncias para lo- -oeste, nesta ordem (MCTI, 2021b). Este mitê de Assessoramento e conferiu gran- possibilitando: a) mitigar ou reduzir o risco
grar efetividade na construção das regras de processo amplamente participativo per- de capilaridade aos processos de debate futuro; b) navegar reflexivamente entre di-
governança e eficiência de monitoramento. mitiu esferas de debate e formulação de e tomadas de decisão, equilibrando vi- versos futuros incertos; c) imaginar e cocriar
Interessante notar que o processo de alternativas desde o nível local ao nacional sões intersetoriais tanto horizontalmente novos futuros; e d) debater sobre as impli-
preparação do Brasil para Década envolveu e ao internacional. quanto verticalmente. cações políticas no presente dos cenários
atores internacionais e locais em processos Considerando o processo de formula- futuros especulados. A governança ante-
de consultas ao longo de 2019 e 2020 em ção do Plano Nacional da Década do Ocea- 5. Governança antecipatória cipatória demanda um processo organiza-
lógica de construção da governança mul- no, Cristofoletti et al. (2021) afirmam: cional e administrativo adaptativo, flexível,
tinível. Neste processo, foram envolvidos Uma última questão central de análi- diante das incertezas e mudanças.
diversos atores para formulação do Plano Considerando todo o processo, um aprendi- se, na agenda de pesquisa proposta, é a A governança antecipatória está dire-
Nacional de Implementação da Década. zado se destaca e diz respeito ao potencial presença da governança antecipatória. A tamente ligada à capacidade estatal de
Em 2019, foi realizado no Rio de Janeiro o brasileiro no processo de tomada de decisão governança antecipatória é uma aborda- gestão e governança das políticas pú-
Regional Planning Workshop for the South cientificamente embasada. Essas oficinas gem que oferece os conceitos sobre con- blicas. No tema sobre o mar, é essencial
Atlantic, contando com a presença de 123 demonstram como o governo federal pode cepções de futuro e a sua relação com os algum nível de ação e reação sobre ce-
participantes de 22 países e 4 organismos inovar na construção de políticas públicas processos decisórios atuais. Dada a com- nários futuros considerando o nexo entre
internacionais. Esta participação incluiu de gestão da ciência com abordagens de plexidade e a existência de uma “socieda- biodiversidade-floresta-recursos hídricos-
uma representação equilibrada de gover- formulação participativas. Essa foi uma ex- de de riscos” (conforme definição teórica -oceano-clima e em suas mais complexas
nos, cientistas, empresas privadas, ONGs, periência com ampla representação local e de Ulrick Beck), vivida no momento atual, relações ecossistêmicas com a sociedade.
órgãos e governos regionais e dos meios regional se comparado ao modo usual de compreender se e como se dá essa abor- Nesse sentido, o uso da evidência cientí-
de comunicação (MCTI, 2021b). formulação de programas governamentais dagem nas análises de políticas públicas fica e a projeção da disponibilidade dos
A fim de articular e direcionar esforços e instrumentos similares anteriores. Desde o ambientais parece central. recursos naturais é condição necessária
para a participação ativa do Brasil na Déca- início o MCTI e parceiros internalizaram os O foco nesta abordagem é sobre a para eficácia, eficiência e efetividade da
da, foi estabelecido um Comitê de Gover- valores do conhecimento científico cocons- governança e gestão de riscos e cenários política pública em qualquer trajetória de
nança Nacional para a Década da Ciência truído como uma ferramenta transformativa futuros, questão fundamental sobre a go- desenvolvimento socioeconômico.
Oceânica em junho de 2020, com 16 re- ao longo de todo o seu processo e mostrou vernança que envolve recursos naturais. Atualmente, uma agenda de pesqui-
presentantes de origens diversas. Em 2020, o esforço de engajamento da sociedade no A governança antecipatória incorpora em sa incipiente analisa o uso de projeções
foi realizada uma série de oficinas partici- planejamento de futuro, desde a concepção seus processos para tomada de decisão a de variação climática para políticas do se-
pativas regionais e foi realizada ao longo de até a entrega dos resultados. Esse processo, formulação e análise de cenários prováveis, tor de agricultura ou setor energético, por
2020. Além do processo síncrono regional, com seus aprendizados e desafios, poderá a comparação entre cenários futuros plau- exemplo. No entanto, há necessidade de
foi aberta a consulta por meio eletrônico. auxiliar para que muitos processos similares síveis e examina o potencial desempenho um aprofundamento sobre o diálogo en-
Ao final, foram recebidas no total 2.597 sejam realizados nas esferas governamentais e impacto destes cenários futuros nas po- tre a governança presente e a capacidade
manifestações de interesse na participação e na produção de políticas públicas que con- líticas públicas (MUIDERMAN et al., 2020). de se preparar para os cenários futuros em
dos eventos de 2020, 900 delas para parti- siderem os conceitos de ciência transforma- São quatro tipos de reações em ter- diversos setores, notadamente para zo-
cipação nas oficinas. As oficinas contaram dora (CRISTOFOLETTI et al., 2021, p. 33). mos de processo decisório para tratar de nas costeiras e oceano. Temas complexos

130 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 131


exigem governanças que apliquem coor- No contexto da Década da Ciência Oce- 5. Conclusão
denação horizontal (intersetorial), verti- ânica, é preciso fomentar a produção e tor-
cal (multinível) e intertemporal (registros nar público o acesso ao conhecimento sobre A governança do mar eficaz precisa que uma análise diagnóstica com levanta-
passados e projeções futuras). No atual os processos naturais e sociais associados ao orientar os atores públicos e privados a mento de lacunas e resultados oriente no-
marco institucional da governança do oceano de forma que múltiplos usuários pos- analisar os trade-offs entre as alternati- vas medidas de maior integração com o se-
mar não há instrumentos ou diretrizes sam estabelecer uma governança adaptativa vas de exploração do capital natural para tor produtivo, que mudem a produção e o
que orientem a necessidade da gover- em resposta. Este ainda é um desafio global geração de renda com bem-estar não de- consumo em níveis sustentáveis. Uma con-
nança antecipatória na gestão e gover- que deve ser priorizado e coproduzido em clinante no futuro. Precisa, ainda, instruir cepção flexível de instrumentos de coman-
nança do mar. cooperação local, nacional e internacional. processos de tomada de decisão pública e do e controle integrada com instrumentos
privada com capacidade antecipatória aos de mercado, elaborados com base no prin-
cenários futuros e resolução imediata aos cípio de co-design, proposto pela Década,
problemas prementes. pode aumentar a eficácia e eficiência da
Considerando o objetivo de se alcançar governança sustentável do mar.
um oceano produtivo e sustentável, refle- Ainda permanece um desafio viabilizar
timos a governança da Década da Ciência uma governança antecipatória dos recursos
Oceânica atende os princípios da interse- do mar e carecem exemplos e conhecimento
toralidade horizontal entre setores, estatais sobre sistemas de governança que tenham
ou não, da multinível, permitindo a intera- respondido às projeções de degradação
ção entre o local, nacional e internacional e ambiental e potencial escassez de recursos
fomenta a governança em redes para solu- naturais de forma eficaz e cientificamente
ção sobre problemas complexos. Entretan- embasadas. Nesse sentido, é preciso ampliar
to, a atual institucionalidade está limitada a realização de estudos que comparem as
a instrumentos de comando e controle, medidas implementadas buscando alterna-
sendo necessária uma ampliação de instru- tivas mais custo-efetivas, mensurar impacto
mentos econômicos que tenha eficácia de macroeconômico e produção de dados e in-
intervenção na transformação da atividade dicadores consistentes e contínuos que per-
econômica sustentável. Também é necessá- mitam o monitoramento das ações.
rio ampliar os estudos sobre as falhas de go- A partir da análise da implementação da
verno que estão associadas à gestão do mar Década da Ciência Oceânica no Brasil sob
e que causam impacto estrutural limitante as óticas de governança, foi possível am-
aos instrumentos econômicos. Uma alter- pliar a reflexão sobre o quadro mais amplo
nativa, considerando a abordagem neo- de implementação da governança do mar
institucional de governança de bens co- e sugerir uma agenda de pesquisa para
muns, seria a formulação de instrumentos o campo das ciências sociais. É oportuno
de regulação (comando e controle) mais lo- aproveitar o movimento da Década da Ci-
cais e específicos, de gestão autônoma das ência Oceânica para investigar e remodelar
comunidades tradicionais, pois podem re- a governança do mar com envolvimento
presentar uma alternativa de implementar de atores horizontal e verticalmente, de
a gestão do mar com maior eficácia. Este é origem estatais e não estatais. Destaca-se a
um caminho que pode ser melhor investi- importância da participação dos cidadãos,
gado pelas ciências sociais. em processos bottom-up e top-down de
Considerando a oportunidade da Déca- concertação, considerando os diversos ar-
da da Ciência Oceânica, é imprescindível ranjos e instrumentos identificados nos

132 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 133


“tipos ideais” de governança. E, conside- Com ampliadas estruturas de governança, governance: Different conceptions of the Research, São Paulo, 2021b, no prelo.
rando a diretriz da sustentabilidade do fra- será possível transformar a Economia Azul future and implications for the present. UNESCO. The United Nations Decade
mework da Agenda 2030, há que se suge- em modos de produção sustentável e de WIREs Climate Change, v. 11, n. 6, of Ocean Science for Sustainable Deve-
rir modelos de governança que incorporem forma a alcançar um oceano produtivo, se- Nov./Dez. 2020. lopment (2021-2030) Implementation
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134 ECONOMIA AZUL Governança do Mar na Década da Ciência Oceânica 135


7

GOVERNANÇA, COOPERAÇÃO E
DIPLOMACIA NO OCEANO

Leandra Regina Gonçalves


Andrei de Abreu Sodré Polejack

1. Introdução

Multiplicam-se as evidências científicas sozinha aumentou 79% entre 2000 e 2015


da importância do oceano para a manuten- (PERSSON et al., 2022). Tudo isso exacerba
ção da vida no planeta (ROCKSTRÖM et al., as ameaças e as vulnerabilidades já existen-
2009; STEFFEN et al., 2015). O oceano pro- tes e reportadas há mais de 10 anos pela
duz e regula a maior parte do oxigênio e da ciência para as espécies marinhas e para a
água do planeta (IPCC, 2019), fornece uma saúde e bem-estar da humanidade (CUR-
grande quantidade de nutrientes, resguarda RIE; WOWK, 2009; HALPERN et al., 2019).
a maior biodiversidade do mundo e ainda Historicamente, o oceano também tem
atua como uma importante fonte de prote- sido palco de conflitos de soberania e uso
ína para a população mundial (FAO, 2020). de recursos, por desempenhar um papel
A habilidade de fornecer esses serviços global chave nas relações entre os países,
vitais está diminuindo e novas ameaças sur- principalmente do ponto de vista econômi-
gem. O oceano é impactado por pelo me- co e geopolítico, desde o período das gran-
nos seis das dez fronteiras ecológicas glo- des navegações. O Atlântico, em particular
bais: o impacto das mudanças climáticas, em sua porção Sul, abaixo do Equador, foi
a acidificação, a perda de biodiversidade, palco histórico da colonização europeia
as mudanças no uso do solo (manguezais com consequentes desastres humanitários
e estuários) e as interferências nos ciclos de (BRUNELLE, 2013).
fósforos e nitrogênio (ROCKSTRÖM et al., O oceano é considerado fundamental
2009; STEFFEN et al., 2015). Além disso, a para a economia moderna global. Enquan-
humanidade ultrapassou o limite planetá- to o transporte marítimo suporta 90% do
rio relacionado a poluentes químicos, in- volume de comércio global, há mais 6.000
cluindo plásticos. Só a produção de plástico instalações de petróleo e gás em operação

136 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação


Governança, Cooperação ee Diplomacia
Diplomacia no
no Oceano
Oceano 137
no mundo que fornecem 25 a 30 por cento vernança ambiental global, que, de forma por Estados-nação se governe sem que dis- de governos, organizações internacionais,
da energia do mundo. A indústria da pes- sintética, ocorre pelo conjunto de organiza- ponha de governo central. Atividades para empresas, e até a sociedade civil, de que a
ca global gera empregos para cerca de 180 ções, instrumentos de políticas, mecanismos as quais também contribuem muitos atores solução de muitos desses problemas não
milhões de pessoas e fornece uma fonte pri- de financiamento, regras, procedimentos e da sociedade civil, além de, é claro, gover- tem como se restringir aos mecanismos
mária de proteína para mais de 1 bilhão de normas que regulam os processos de prote- nos nacionais e organizações internacionais tradicionais da coerção e autoridade for-
pessoas (FAO 2020). Além disso, estimativas ção ambiental global (YOUNG, 2017). (ROSENAU, CZEMPIEL, 2000; GONÇALVES, mal. Mas também não se trata de rejeitar
do valor econômico dos serviços ambientais A construção dessa agenda de gover- COSTA, 2011; YOUNG, 2017). as formas tradicionais do exercício do po-
comercializados e não comercializados (for- nança ambiental global visa fundamental- Além da desconcentração de poderes, der. O desafio é incorporar dimensões que
necimento de alimentos, oxigênio, água e mente permitir que a cooperação e a di- do compartilhamento de decisões e do vêm adquirindo importância estratégica,
regulação do clima) chegam a um total de plomacia sejam alcançadas para resolver envolvimento de novos atores não esta- baseadas em instituições e organizações
21 trilhões de dólares americanos por ano grandes problemas ambientais, com partici- tais, como poderes supranacionais, setor extraestatais de cooperação para que tor-
(CONSTANZA, 1999; HALPERN et al., 2012). pação cada vez mais ampliada de múltiplos privado e organizações da sociedade civil, nem mais efetivos os processos de nego-
Essa magnitude e interdependência autores (GONÇALVES, COSTA, 2011). Com a governança global enfrenta o desafio da ciação voltados à formação de consensos
com diversos setores da sociedade faz com a crescente influência da Ciência na toma- amplificação vertiginosa dos temas que capazes de garantir aplicabilidade e conti-
que a perspectiva global de governança da de decisão diplomática, em particular na passam a ser regulados também no plano nuidade no espaço e tempo.
do oceano exija lidar com problemas que governança do oceano, é imprescindível a dos regimes e organizações multilaterais A diplomacia científica contribui nesse
transcendem os limites de soberania e ge- compreensão da dinâmica entre pesquisa e (CHASEK; WAGNER, 2012). É o caso, por sentido, já que os resultados científicos têm
opolítica, ou seja, implica mecanismos que relações internacionais, tema central da Di- exemplo, do oceano. A governança global se tornado fator determinante de consen-
não estão na esfera dos estados nacionais plomacia Científica no Oceano (POLEJACK, do oceano não é um núcleo de autoridade sos ambientais no âmbito internacional.
e compreendem um conjunto de situações BARROS-PLATIAU, 2020). E é nesse sentido com latitude para determinar o que todos As evidências científicas disponíveis hoje
nas quais os Estados e os grupos (indivíduos, que este capítulo busca discutir a relevân- os países devem fazer. O que há é uma cen- tanto apontam para os limites planetá-
ONGs, empresas) interagem. Por isso, o tra- cia da cooperação e da diplomacia científica tral de coordenação representada pela Or- rios, nos quais a humanidade pode ope-
tamento dos problemas ambientais no oce- para a governança e a economia do oceano, ganização das Nações Unidas (ONU) e suas rar com segurança, quanto também dis-
ano só pode ser analisado sob a ótica da go- com destaque para o caso brasileiro. agências, bem como as cúpulas periódicas cutem soluções inovadoras na busca de
entre seus membros. No âmbito da ONU, um planeta mais sustentável. Nesse sen-
a governança é uma forma de articulação, tido, a ciência torna-se ator crítico nos
2. Panorama: relevância do oceano na cooperação e diplomacia e não de comando. Para alguns estudiosos processos de tomada de decisão interna-
do tema, o objetivo maior da governança cional. Assim nasce a diplomacia científi-
Ao longo das últimas décadas, os pro- as regras e normas institucionais. Embora global é melhorar o estado atual do am- ca, na busca de compreender a dinâmica
blemas ambientais têm sido cada vez mais a cooperação em ambiente anárquico pos- biente rumo a um desenvolvimento sus- entre imperativos distintos com sistemas
abordados por meio de instituições inter- sa ser difícil, as melhores análises sobre as tentável (RIBEIRO, 2012; NAJAM, PAPA & de valores próprios pertencentes ao mé-
nacionais. Estima-se que existam mais de relações internacionais têm demonstrado TAIYAB, 2006; YOUNG, 2021). todo científico e aos processos políticos
700 acordos ambientais multilaterais (MIT- nos últimos 30 anos que frequentemente No entanto, o futuro da governança do em âmbito internacional.
CHELL, 2003). Além disso, há mais de 155 a cooperação pode ser alcançada confe- oceano como possibilidade de efetivo en-
acordos registrados com as Nações Unidas rindo maior eficácia à governança global frentamento dos graves desafios socioam- O que é diplomacia científica?
desde 1921, e mais de 90 Acordos Am- (KEOHANE, 1984; KRASNER, 1983; SNI- bientais do século XXI depende de fatores
bientais Internacionais (IEA, na sigla em in- DAL, 1993; YOUNG, 2017; 2021). que na realidade estão absolutamente rela- Diplomacia científica é um recente
glês) desde a Conferência das Nações Uni- A expressão “governança global” co- cionados, mas que podem ser classificados campo de pesquisa, mas uma prática an-
das sobre o Meio Ambiente, realizada em meçou a se legitimar entre pesquisadores de estruturais e conjunturais para efeito de tiga (TUREKIAN, 2018), lidando com os
Estocolmo, em 1972 (CHASEK; WAGNER, e atores chaves do cenário político desde o inevitável redução analítica. Os estruturais processos nos quais a evidência científica
2012). Esses acordos procuram proteger e final da década de 1980. Basicamente, para dizem respeito à própria noção de gover- influencia a diplomacia e vice-versa. Ainda
melhorar o meio ambiente mediante indu- designar atividades geradoras de institui- nança e sua difusão. Tem sido mais difícil do sem uma definição formal, o conceito de
ção de cooperação em conformidade com ções que garantem que um mundo formado que se poderia imaginar o convencimento diplomacia científica é muito debatido. No

138 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 139


entanto, busca estudar como a ciência in- sejamos detentores de riquezas que vão além contribuir com o avanço de um futuro mais Se cooperar é importante, e tem indica-
forma a tomada de decisão internacional, de nossa capacidade científica. Dessa forma, sustentável para o oceano. tivos de sucesso, quais seriam as estratégias
como a diplomacia pode promover e fo- o Brasil é alvo de interesse das grandes po- Haas (1992) argumenta que a difusão usadas por outros países para a coopera-
mentar projetos conjuntos de pesquisa, e tências científicas do mundo. Pelo viés da de novas ideias e informações é um dos ção e a diplomacia científica no contexto
também como tais projetos e comunidades diplomacia científica, temos a chance de or- fatores que pode levar a novos padrões de da Economia Azul que vem dando certo ou
de pesquisadores podem amenizar ten- ganizar nosso sistema de ciência e tecnolo- comportamento, sendo um determinante tem potencial para ser bem-sucedido? O
sões políticas (THE ROYAL SOCIETY, 2010). gia e buscar os elementos estrangeiros que necessário de eficácia da cooperação po- discurso em torno da Economia Azul tem
Mais recentemente, houve uma tentativa atendam a nossa demanda nacional, obtida lítica internacional. Além disso, para Haas sido promovido como algo benéfico, como
de incluir no conceito o papel que os in- por meio de amplo diálogo com os atores (2015), três principais condições podem um bem comum a todos. No entanto, di-
teresses (nacionais, regionais e globais) envolvidos. Assim, a diplomacia científica contribuir para o sucesso do manejo de versos países têm adotado diferentes con-
teriam nas distintas motivações em se en- pode se tornar uma ferramenta poderosa problemas ambientais através de institui- ceitos para a Economia Azul com base nos
gajar em práticas de diplomacia científica de negociação de acordos bi e multilaterais ções. Primeiro, a preocupação governa- interesses nacionais e na importância que os
(GLUCKMAN; TUREKIAN; GRIMES, 2018). e a busca pela implementação das provisões mental deve ser suficientemente alta para serviços ecossistêmicos marinhos têm para
Inegável, no entanto, é que cada vez mais legais contidas nos diversos instrumentos mobilizar os estados a ponto de disponibi- a economia daquele país (PEREIRA, 2020).
a ciência tem papel importante nos deba- multilaterais que regram a governança do lizarem recursos, já escassos, para resolver Ponto de inflexão em todos os conceitos
tes ambientais internacionais. oceano (POLEJACK; COELHO, 2021). o problema ambiental. Segundo, os pro- abordados é a necessidade de promover o
No oceano, esse papel da ciência tor- blemas ambientais comuns e transfrontei- desenvolvimento de forma sustentável, o
nou-se preponderante, em especial nas ne- Por que é importante a cooperação? riços não podem ser efetivamente resolvi- que em si requer níveis de cooperação no
gociações para a adoção da Convenção das dos sem um ambiente contratual em que qual a ciência e a diplomacia interagem sig-
Nações Unidas para o Direito do Mar, ou a A discussão sobre a governança glo- os estados assumam compromissos que nificativamente (POLEJACK, 2021).
constituição do oceano (ROBINSON, 2020). bal do oceano foi incluída entre os princi- sejam capazes de cumprir e honrar. E, por Assim, a cooperação e a diplomacia
Desde a adoção da Convenção e até os dias pais temas discutidos na Conferência das último, mas não menos importante, que científica apoiam e fomentam a boa go-
atuais, a ciência tem atuado como uma for- Nações Unidas sobre Desenvolvimento os estados possuem capacidade política vernança, que entre outros princípios in-
ma de poder brando nas negociações oce- Sustentável – Rio+20 e vem desde então e administrativa para fazer os ajustes do- clui a existência de um Estado de Direito,
ânicas, ou seja, uma forma de poder não ganhando espaço na arena internacional. mésticos necessários para a implementa- com previsão clara de competências e de
coercitiva pela qual países seduzem seus Por meio da Agenda 2030 e em especial ção do acordo. responsabilidades no que concerne à ges-
pares a adotarem posturas e valores basea- do Objetivo de Desenvolvimento Sustentá- Ainda para Haas e Stevens (2011), o tão do espaço e dos recursos; a garantia da
dos na ciência apresentada em negociações vel 14 (Vida Abaixo da Água), estabelece- conhecimento opera e muda o comporta- participação pública, do acesso à informa-
internacionais, muitas vezes usada para jus- ram-se indicadores relevantes para manter mento quando organizado e transmitido ção e da transparência em todo o ciclo das
tificar fins políticos (NYE, 2017; POLEJACK, a saúde do oceano e das zonas costeiras. de forma que os formuladores de políticas políticas públicas; a previsão, o monitora-
2021). Assim, torna-se preponderante o Ainda, nesse mesmo contexto, as Nações possam entender e confiar na informação. mento e a fiscalização de instrumentos re-
entendimento da dinâmica entre ciência e Unidas lançaram a Década da Ciência do Nesse contexto, regimes que são desenvol- lacionados à gestão dos recursos; a existên-
diplomacia no oceano. Oceano para o Desenvolvimento Sustentá- vidos por um processo de aprendizagem cia de equidade e inclusão; a capacidade
Países como o Brasil, com alguma ca- vel (também conhecida como Década do social e cujas regras refletem o consenso de lidar com emergências e a coerência
pacidade de pesquisa oceânica, mas ainda Oceano) (2021-2030) para apoiar os esfor- científico sobre sustentabilidade ambiental de decisões entre diferentes instituições
longe dos níveis desejados de fomento e ços científicos de reverter a tendência de tendem a ser mais efetivos. (OLIVEIRA et al., 2022) (Figura 1).
desenvolvimento de capacidades, têm cer- degradação do oceano e garantir que seja
ta dependência das capacidades analíticas produzida uma ciência oceânica que pos-
estrangeiras (POLEJACK; BARROS-PLA- sa ser interdisciplinar e útil no sentido de
TIAU, 2020). No entanto, nossa posição apoiar a tomada de decisão (RYABININ et
geográfica, nossa excelência em produção al., 2019). Com isso, esforços para a diplo-
de conhecimento e a rica diversidade social macia científica e para a cooperação mere-
e cultural ao longo do Brasil faz com que cem destaque e atenção para que possam

140 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 141


ambiente (RAJÃO et al., 2022). Recursos sociais nacionais. Aqui, mais uma vez, vê-
Figura 1. Ilustração de como os processos de cooperação e públicos e privados limitados aliados à -se o papel essencial da diplomacia.
diplomacia científica se relacionam com a governança e a
morosidade dos processos de proteção da O Itamaraty tem reconhecido e bata-
importância dessa integração para fomentar a Economia Azul
propriedade intelectual no país resultam lhado por acordos mais profícuos, nos
em baixa inovação tecnológica e alto risco quais o Brasil abre oportunidades para a
nos investimentos em pesquisa e desen- comunidade nacional no mercado global
governança volvimento. Apesar da reconhecida capa- cada vez mais competitivo. O Programa de
cidade criativa e espírito empreendedor Diplomacia da Inovação é um bom exem-
do nosso povo, os obstáculos enfrentados plo (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIO-
diplomacia pelos que se lançam à campanha da ino- RES, 2022). Com o objetivo de quebrar os
científica vação tecnológica são muitos, o que tor- estereótipos vinculados à imagem do Bra-
na o produto brasileiro mais caro e menos sil no exterior e mostrar o País que produz
competitivo no mercado internacional. No conhecimento, produtos e serviços em
oceano isso não é diferente. setores da fronteira científica, o Programa
A segunda maior empresa oceânica do busca fomentar atividades que abrangem:
cooperação mundo é brasileira (VIRDIN et al., 2021). acompanhamento de políticas públicas,
A Petrobras tem um investimento de ca- elaboração de inteligência de mercado,
libre em desenvolvimento tecnológico, o identificação de parcerias, atração de in-
que nos permitiu explorar a extração de vestimentos, apoio à internacionalização
petróleo a altas profundidades, inovan- de empresas de tecnologia, mobilização
do em tecnologia de ponta para o setor. da diáspora científica e tecnológica bra-
Políticas públicas adequadas, como a Lei sileira no exterior, bem como fomento à
do Bem (Lei 11.196/2005), incentivam em- colaboração entre parques tecnológicos
presas como a Petrobras a reduzir os riscos e ambientes de inovação brasileiros e es-
ao investir em inovação tecnológica. No trangeiros. O foco do Governo brasileiro

economia azul entanto, esse desenvolvimento tecnológi-


co ainda é altamente voltado para a ativi-
é, portanto, na diplomacia da inovação,
voltada ao aumento da competitividade
dade extrativista, posição na qual o Brasil nacional no exterior, e não somente na
Fonte: Elaboração própria
cada vez mais se consolida. As práticas diplomacia científica, mais abrangente
3. O caso brasileiro de inovação tecnológica marinha são ain- (ANUNCIATO; SANTOS, 2020).
da muito incipientes, embora o ambiente Infelizmente, o setor da economia oce-
O Brasil é um país extrativista. Nos- desenvolvimento, mas o valor mais alto de marinho seja potencial detentor de muitas ânica é pouco explorado por esse progra-
sa economia tem por base a exploração mercado está no produto final, e não nos in- riquezas ainda não exploradas de manei- ma, evidenciando o quão ineficaz têm sido
dos recursos naturais em sua forma natu- sumos de base. Assim, torna-se imperativo ra sustentável, razão pela qual o mundo as políticas nacionais de desenvolvimento
ral, com baixo valor tecnológico agrega- buscar competitividade do produto nacional se debruça hoje no conceito de Economia da Economia Azul. Contudo, abre-se uma
do. Isso é natural para um território pri- no mercado global, o que significaria altos Azul. Economia Azul é, portanto, uma ten- oportunidade de inserir no debate públi-
vilegiado em suas fisionomias vegetais e investimentos em pesquisa e inovação. dência mundial, mas que ainda carece de co a importância primordial da diplomacia
regime hídrico. No entanto, o mercado Ocorre que a estratégia brasileira nas uma definição clara, resultando em vários da inovação no setor marinho, detentor
global busca cada vez mais por soluções últimas décadas foi na contramão das ou- países definindo-a de acordo com seus de tantas possibilidades de inovação tec-
de alto conteúdo tecnológico e conse- tras nações em níveis semelhantes de de- interesses iminentes (PEREIRA, 2020). As- nológica e social (e.g. THOMPSON et al.,
quente valor agregado. É claro que as re- senvolvimento: investe-se menos em ciên- sim, não se pode falar em Economia Azul 2018). Para tal, será relevante o incremen-
servas naturais de insumos para a indús- cia e tecnologia e mais na indústria agro- no Brasil sem contextualizá-la no debate to das cooperações internacionais e de es-
tria tecnológica têm papel central nesse extrativista, com alto impacto ao meio internacional e nos interesses econômico- tratégias baseadas na diplomacia científica,

142 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 143


pela qual o Brasil expande o intercâmbio de volvimento estão depauperados e há um epistêmica: sua capacidade de persuadir os Não são numerosos os casos em que o
conhecimentos científicos e tradicionais e claro sucateamento das instituições de outros, sua capacidade para consolidar a in- poder tem ouvido a ciência para tomada
garante melhor acesso a tecnologias e in- pesquisa no país (GALVÃO-CASTRO et fluência burocrática em importantes locais de decisão no campo da cooperação in-
sumos estrangeiros, ao passo que persegue al., 2022). Aliado a esta nefasta realida- institucionais e sua capacidade de manter ternacional (GONÇALVES, 2021). Alguns
os objetivos de sua política exterior. de, há também um incremento popular a influência ao longo do tempo. Os interes- exemplos positivos são os acordos que
Apesar do movimento bem-vindo de no negacionismo à ciência, tornando-se ses e decisões dos estados para implantar versam sobre o ozônio estratosférico e a
entidades isoladas no Governo em pro- obstáculos importantes na busca pelo o poder do Estado são, portanto, sujeitos chuva ácida europeia, os quais são ampla-
mover a marca Brasil Inovador e impor- desenvolvimento de uma Economia Azul a conhecimento consensual (HAAS, 2015). mente saudados como eficazes e grandio-
tante parceiro científico no Atlântico Sul, brasileira que em si é tão deficiente em Em particular, a comunidade epistê- sos esforços de governança ambiental in-
é essencial olharmos o contexto atual no conhecimento de nossas águas e meios mica é um grupo de profissionais, muitas ternacional da era contemporânea (HAAS,
qual investimentos em pesquisa e desen- sustentáveis de sua explotação. vezes de várias disciplinas diferentes, que 2001; MILES et al., 2002). Outros exemplos
compartilham as seguintes características incluem o plano do Mediterrâneo para li-
essenciais (HAAS, 2015): dar com a poluição (HAAS, 1990) e até o
4. Oportunidades: caminhos para a diplomacia científica e a Economia Azul

. Crenças em princípios compartilhados


caso do atum azul do Atlântico, que após
A ciência tem uma longa história de dos estados. Assim, da perspectiva da co- anos de negligência da ciência e do acon-
catalisar a cooperação em espaços interna- munidade epistêmica, os regimes ambien- (shared principled beliefs): essas crenças selhamento científico enfim teve uma me-
cionais e fornecer conhecimento para a po- tais podem ser impulsionados não só pelos fornecem uma base de dados baseada lhora significativa na saúde de sua popula-
lítica externa aliviar as tensões geopolíticas. poderes do Estado, mas também pelas re- em valores para a ação social dos mem- ção (GONÇALVES, 2021). Por outro lado,

.
No entanto, apesar da grande aceitação so- des epistêmicas sob certas condições. bros da comunidade; há casos anômalos em que o argumento
bre a importância da ciência para a formu- O argumento central é que, norma- Crenças causais compartilhadas ou falhou, como desertificação e caça à baleia
lação de políticas públicas, ainda existem tivamente, as comunidades epistêmicas julgamento profissional (shared causal (HAAS, 2015).
percepções divergentes de como, quando fornecem melhores recomendações cien- beliefs or professional judgment): tais A ciência influenciará os tomadores de
e em que condições a ciência influencia as tíficas do que outros modos de orientação crenças fornecem razões analíticas e decisão quando o projeto institucional do
políticas e, consequentemente, sobre a for- política, porque é provável que o parecer explicações de comportamento, ofere- acordo permitir uma visão científica orga-
ma como a interação entre ciência e polí- especializado seja garantido. Ao contrário cendo explicações causais para as múl- nizada e incluir um grupo forte e isolado
tica deve ser melhor organizada (LIDSKOG; de outros grupos de interesse organizados tiplas ligações entre as possíveis ações de especialistas que possuem um “conhe-

.
SUNDQVIST, 2015). Estudos comparativos e ativos na política e na formulação de po- políticas e os resultados desejados; cimento útil”. Embora o conhecimento
de regimes ambientais confirmaram que a líticas públicas, as comunidades epistêmi- Noções comuns de validação (com- utilizável tenha sido usado em diferentes
experiência científica organizada teve uma cas têm crenças internas que as tornam mon notions of validity): critérios in- contextos e situações, o termo engloba um
influência notável sobre a eficácia desses re- mais propensas a fornecer informações tersubjetivos, definidos internamente núcleo substantivo que o torna útil para os
gimes (HAAS, STEVENS 2011; HAAS, 2015). que são politicamente inalteradas e, por- para validar o conhecimento. Isso per- formuladores de políticas e uma dimen-
Peter Haas argumenta que, através tanto, mais propensas a “trabalhar” no mite que os membros da comunidade são processual que fornece um mecanis-
do desenvolvimento de uma comunidade sentido político de que essa informação se diferenciem com confiança entre mo para a sua transmissão da comunida-
epistêmica, a ciência pode desempenhar será enquadrada e seguida por autorida- reivindicações garantidas e injustifica- de científica para o mundo das políticas
um papel importante na definição de de- des políticas no que concerne à necessi- das sobre estados do mundo e políti- (HAAS; STEVENS, 2011).

.
cisões políticas e aprimorar processos de dade de serem imparciais (HAAS, 2015). cas para mudar esses estados; Há cada vez mais a necessidade de que
cooperação e diplomacia. Ele enfatiza a Enquanto as comunidades epistêmicas Um grupo com política comum (a seja construída uma agenda de priorização
importância da ciência e, em particular, do podem estar entre os principais agentes common policy enterprise): um con- para a ciência no Brasil. E no caso em tela,
conhecimento consensual na formulação responsáveis pela articulação de tais prin- junto de práticas associadas a um con- para a ciência oceânica, que inclui não ape-
de políticas. Para o autor, a ciência baseada cípios, normas e regras, a extensão em que junto central de problemas que devem nas as ciências naturais, mas também as ci-
no consenso pode desempenhar um papel eles se difundem e são embutidos inter- ser abordados, por convicção de que ências sociais, humanas e aplicadas.
independente e importante influenciando nacionalmente tem a ver com a influên- o bem-estar humano será melhorado Isso se torna ainda mais relevante no
e até mesmo reformulando os interesses cia política dos membros da comunidade como consequência. contexto da Década do Oceano, em que o

144 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 145


termo “ciência oceânica” abrange discipli- Este conceito já avança no que antes Referências
nas das ciências naturais e sociais, incluin- era considerado as ciências do mar e que
do temas como a interdisciplinaridade, seu incluía Oceanografia, Biologia, Química, ANUNCIATO, R. O.; SANTOS, B. V. M. S. London: Taylor & Francis, 2012.
emprego para o benefício da sociedade e Geologia, Física e Engenharia de Pesca. DOS. Diplomacia científica e diplomacia COSTANZA, R. The ecological, economic,
reconhecimento do conhecimento tradicio- Mas, ainda é necessário consolidar esse da inovação: uma revisão sistemática de and social importance of the oceans. Eco-
nal e local (OLIVEIRA et al., 2021). Contu- entendimento e compreender que as Hu- literatura sobre a perspectiva brasileira. logical Economics, Amsterdam, v. 31, n.
do, ainda é preciso avançar nesse sentido manidades são meios importantes para Conjuntura Austral, Porto Alegre, v. 11, 2, p. 199–213, nov. 1999.
no Brasil. Segundo o X Plano Setorial de Re- avaliar as dimensões sociais e humanas n. 54, p. 35–53, 24 jun. 2020. CURRIE, D.E.J; WOWK, K. Climate chan-
cursos do Mar (BRASIL, 2020), ciência oce- das ciências naturais. E, nesse sentido, BRASIL. Decreto nº 10.544, de 16 de ge and CO2 in the oceans and global
ânica é a “[...] área de conhecimento de- considerando as ciências oceânicas uma novembro de 2020. Aprova o X Plano oceans governance: improving gover-
dicada à produção e divulgação de conhe- abordagem mais ampla, a cooperação, a Setorial para os Recursos do Mar. Diário nance of the world´s oceans. Carbon&
cimento sobre os componentes, processos diplomacia e a governança são mais bem Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano Climate Law Review n.4, 2009.
e recursos relacionados ao meio marinho e compreendidas e incorporadas, inclusive 132, 2020. Disponível em: https://www.in. FAO - FOOD AND AGRICULTURA ORGANI-
suas zonas de transição (incluindo elemen- para alcançar os objetivos da Década do gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10.544-de- ZATION. The State of World Fisheries and
tos socioculturais)”. Oceano. -16-de-novembrode-2020-288552390. Aquaculture. Rome: FAO: 2020. Disponível
Acesso em: 8 mar. 2022. em: https://www.fao.org/documents/card/
5. Conclusão BRASIL. Lei nº 11.196, de 21 de novembro en/c/ca9229en. Acesso em: 9 mar de 2022.
de 2005. Institui o Regime Especial de Tri- GALVÃO-CASTRO, B.; CORDEIRO, R. S. B.;
Ainda há muitos desafios para moderni- aprimoramentos para garantir sua eficácia butação para a Plataforma de Exportação GOLDENBERG, S. Brazilian science under
zar as instituições e convenções existentes visando favorecer a cooperação para lidar de Serviços de Tecnologia da Informação continuous attack. The Lancet, United
para responder eficazmente às ameaças com as questões de bens comuns. – REPES, o Regime Especial de Aquisição Kigdom, v. 399, n. 10319, p. 23–24, Jan.
emergentes ao oceano, bem como para O Brasil, mais especificamente, ainda de Bens de Capital para Empresas Expor- 2022.
coordenar as ações nacionais dentro e en- carece de estruturas e estabilidade polí- tadoras – RECAP e o Programa de Inclusão GLUCKMAN, P. D., TUREKIAN, V. C., GRI-
tre as regiões, construindo um ambiente tica para avançar na governança global Digital; dispõe sobre incentivos fiscais para MES, R. W.; KISHI, T. Science diplomacy:
estável para a cooperação e a diplomacia. do oceano, assim como na cooperação e a inovação tecnológica; Diário Oficial da a pragmatic perspective from the inside.
Tal ambiente só poderá vir a ser construído diplomacia. Faz-se necessário que o país União: Brasília, DF, ano 117, 2005. Dis- AAAS Center for Science Diplomacy:
no momento em que os Estados encontra- avance em uma agenda estratégica de ponível em: http://www.planalto.gov.br/ United Kingdom, v. 6, n. 4. 2017. Disponí-
rem interesses convergentes e conseguirem pesquisa e cooperação, de forma colabo- ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11196. vel em: http://www.sciencediplomacy.org/
construir uma agenda conjunta, respeitan- rativa nacional e internacionalmente. htm. Acesso em: 8 mar. 2022. article/2018/pragmatic-perspective. Acesso
do as condições estruturais de cada país. A governança, a cooperação e a diplo- BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. em: 7 mar 2022.”
Nesse contexto, a governança global macia científica caminham de mãos da- Programa de Diplomacia da Inovação. GONCALVES, A.; COSTA, J. A. F. Gover-
do oceano, ou seja, a administração cole- das buscando formas de compatibilizar Brasília, DF: Ministério das Relações Exte- nança global e regimes internacionais.
tiva dos problemas comuns que envolvem interesses e agendas próximas. Se o Bra- riores, 2022. Disponível em: https://www. São Paulo: Almedina, 2011.
o mar, está passando por um momento sil quer liderar esforços de cooperação e gov.br/mre/pt-br/assuntos/ciencia-tecnolo- GONÇALVES, L. R. Regional Fisheries
crítico. Embora reconhecendo seu avanço, diplomacia científica e apoiar ações de gia-e-inovacao/programa-de-diplomacia- Management Organizations. Cham:
o crescente número de temas na agen- construir uma Economia Azul sustentá- -da-inovacao. Acesso em: 14 fev. 2022. Springer International Publishing, 2021.
da, bem como sua complexidade e a não vel, será necessário demonstrar compro- BRUNELLE, D. Comunidades atlánticas: HAAS, P. Epistemic Communities, Cons-
convergência de interesses, está superan- misso com a produção de conhecimento, asimetrías y convergencias. Revista CI- tructivism, and International Envi-
do a habilidade de enfrentá-los de forma incluindo um planejamento detalhado e DOB d’ Afers Internacionals, Barcelona, ronmental Politics. London: Routledge,
coordenada e cooperativa. Além disso, as consistente de ações e investimentos a v. 0, n. 102-103, 25 set. 2013. 2015. 398 p.
mudanças no balanço do poder interna- curto, médio e longo prazo, e estabilida- CHASEK, P.; WAGNER, L. M. The Roads HAAS, P. M. Epistemic Communities and Po-
cional também contribuem para complicar de política e institucional para fomentar from Rio: lessons learned from twenty years licy Knowledge. In: SMELSER, N. J.; WRIGHT,
o sistema de governança, que carece de o diálogo e aprimorar a governança. of multilateral environmental negotiations. James; BALTES, P. B. (ed.) International

146 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 147


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148 ECONOMIA AZUL Governança, Cooperação e Diplomacia no Oceano 149


8

CULTURA OCEÂNICA PARA A ECONOMIA


AZUL

Ronaldo Adriano Christofoletti


Caroline Schio
Raquel Costa

1. Introdução

O desenvolvimento sustentável é um cultural, as quais devem ser trabalhadas de


conceito essencial para um mundo melhor, forma integrada, sinérgica e indissociável
pacífico e com prosperidade para as pesso- ao longo do tempo e do espaço.
as e para o meio ambiente. No entanto, do O oceano (ODS 14) foi escolhido para
conceito à prática, ainda estamos falhando. fomentar as ações para a Agenda 2030, e
A Organização das Nações Unidas (ONU) a ONU declarou a Década da Ciência Oce-
definiu a Agenda 2030 como um convite ânica para o Desenvolvimento Sustentável
para o mundo todo trabalhar junto a fim (2021-2030) (UNESCO-IOC, 2020). Esta
de atingir 17 Objetivos de Desenvolvimento Década, popularmente conhecida como
Sustentável (ODS). Década do Oceano, destaca a necessi-
Os ODS exigem que todos os setores dade de geração e uso de conhecimento
da sociedade trabalhem juntos com abor- para a tomada de decisão pela sustenta-
dagens transdisciplinares para reconhecer, bilidade, ao mesmo tempo que destaca a
por exemplo, que acabar com a pobreza importância do oceano e da zona costei-
deve ser abordada em conjunto com estra- ra para este processo que integra os 17
tégias para melhorar a saúde, a educação, ODS. A zona costeira concentra a maior
reduzir a desigualdade, ao mesmo tempo parte da população mundial e, por con-
que mitigamos as mudanças climáticas e sequência, tem um importante papel na
preservamos nosso oceano e florestas. O economia mundial, a chamada Economia
desenvolvimento sustentável também re- Azul. Neste capítulo, abordaremos como
conhece que para a melhoria da qualidade o conceito de cultura oceânica contribui
de vida, o desenvolvimento de uma nação para o fortalecimento da Economia Azul
deve ocorrer a partir da integração das di- a partir da tomada de decisão cientifica-
mensões econômica, ambiental, social e mente embasada.

150 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 151


2. Economia Azul como eixo de transformação Com o avanço da tecnologia e das pes- valorizando a sociobiodiversidade e, desta
quisas no setor marinho, a cada ano se forma, garantir um futuro sustentável e de
descobrem novos princípios ativos e se de- negócios promissores. Nesta discussão, se
A economia é uma dimensão central da ampliar o conhecimento sobre esses bens senvolvem novos produtos com potencial o desenvolvimento sustentável demanda a
sociedade atual, em que o uso de recur- e serviços para embasar a tomada de deci- de revolucionar o mercado. Por exemplo, tomada de decisão eficiente e inovadora e
sos e a cadeia produtiva sustentam o eixo são para o seu uso sustentável. Torna-se de diversas iniciativas empreendedoras já de- o setor empresarial está voltado a essa dis-
econômico dos países. No cenário dos cres- suma importância preservar e aumentar o monstraram a viabilidade de se utilizar al- cussão, existe ainda o desafio de ampliar a
centes impactos das mudanças climáticas, capital natural acumulado nos mares e no gas marinhas para produzir embalagens de discussão “azul” para a economia circular
dos impactos antrópicos e da desigualdade oceano por meio de práticas de exploração produtos biodegradáveis (OOHO WATER, e, por sua vez, favorecer a Economia Azul.
social que demandam mudanças de com- sustentáveis que permitam a regeneração 2019; DEZEEN, 2016; LOLIWARE, s.d.), A economia circular envolve uma mu-
portamento para reverter esses impactos, dos recursos a longo prazo, uma vez que a roupas e acessórios (AN OCEAN FULL OF dança dos processos produtivos e da men-
as discussões sobre economia sustentável economia associada aos recursos marinhos OPPORTUNITIES, s.d.), calçados (VIVOBA- talidade, valores e cultura empresarial, que
têm crescido ao longo das últimas décadas. sustenta grande parte das populações cos- REFOOT, 2018) e diversos tipos de artefatos, passam também por uma mudança da rela-
Conforme visto no capítulo 1, o concei- teiras e representam um significativo per- utilizando a tecnologia de impressão 3-D ção com os clientes e das políticas públicas.
to da Economia Azul (Blue Economy) come- centual do PIB mundial, contribuindo com (DEZEEN, 2017). Outros materiais, como Enquanto para empresas do setor marinho
çou a se fortalecer a partir do processo pre- um valor entre US$ 3 e US$ 6 trilhões por os exoesqueletos ou partes de animais que a economia circular pode estar associa-
paratório do evento da Rio+20, em 2012, ano, valor este que segue gradualmente são resíduos da indústria alimentícia (MARI- da aos processos de origem do pescado,
como um conceito adicional à Economia em expansão (CLAUDET et al., 2020). NATEX, s.d.; THE SHELL WORKS, s.d.), areia considerando a aquicultura sustentável, o
Verde (Green Economy) e que se tornava Liderada por uma iniciativa da Comissão (TINKAH, 2015) e sal (SALTYGLOO, 2013), bem-estar animal e a pesca artesanal, todas
essencial aos países costeiros, sugerindo o Europeia no ano de 2012, uma Estratégia também constituem a matéria-prima de as empresas podem atuar na diminuição
desenvolvimento de uma abordagem eco- de Crescimento Azul (Blue Growth Strate- produtos de ecodesign inovadores recen- da poluição e dos resíduos urbanos e dos
nômica mais associada ao oceano, uma vez gy) foi desenvolvida na última década para temente lançados no mercado. Esses pro- plásticos nos corpos-d’água, um exemplo
que suas economias estão fortemente cor- apoiar o crescimento sustentável do setor dutos constituem uma alternativa em po- clássico da relação entre economia circular
relacionadas aos recursos marinhos (UNEP, marinho nos países europeus (EUROPEAN tencial para a substituição da matéria-pri- e oceano. As ações podem ocorrer desde
2014). A Economia Azul tem como premis- COMMISSION, 2017). Atualmente, o ter- ma oriunda dos compostos petroquímicos, mudanças através de reciclagem até o de-
sa o uso sustentável dos recursos marinhos, mo Economia Azul é aceito e referenciado que estão presentes atualmente em quase senvolvimento de matérias-primas ecoló-
visando ao crescimento econômico asso- internacionalmente, sendo seus objetivos e todos os produtos que consumimos. Tais gicas e substituição de componentes por
ciado a melhores condições de empregos critérios adotados pelos países interessados compostos acabam por deixar um grande resíduos coprocessados.
e de meios de subsistência, bem como à em desenvolver uma Economia Azul pauta- passivo ambiental, afora os efeitos nocivos Porém, desenvolver a economia circular
saúde dos ecossistemas marinhos (WORLD da nos princípios da sustentabilidade (BLUE na saúde humana, ainda pouco conhecidos azul vai além das questões de poluição e
BANK GROUP, 2017). GROWTH, 2021). De acordo com o World a curto, médio e longo prazo. representa uma oportunidade visionária e
Os recursos marinhos sustentam uma Bank Group (2017), mais de 80% dos bens Compreender a Economia Azul vai para ambiciosa na tomada de decisão de negó-
economia emergente da indústria em di- comercializados internacionalmente são além da valoração dos recursos e serviços cios. Enquanto a economia circular deman-
versos setores: alimentício, farmacêutico, transportados pelo mar, e estima-se que o ecossistêmicos marinhos e inclui avaliar os da soluções baseadas na natureza, o design
cosmético, esportivo, náutico, portuário, volume do comércio marítimo irá duplicar aspectos sociais, culturais, de biodiversida- necessário para a economia circular de-
turístico e das energias renováveis. Dessa até 2030 e quadruplicar até 2040. Também de e de cadeia produtiva para a sustenta- manda investimento em ciência, tecnologia
forma, a Economia Azul vai para além do destacam que a atividade pesqueira contri- bilidade. Um processo-chave para promo- e inovação para o desenvolvimento de no-
valor dos recursos marinhos extraídos, mas bui anualmente com US$ 270 bilhões para ver a Economia Azul e a sustentabilidade vos sistemas e materiais. O oceano ocupa
contempla toda a cadeia produtiva, empre- o PIB mundial, e que países costeiros e in- passa pela economia circular. Atualmente, 70% da superfície do planeta e possui uma
gos e serviços associados ao uso daqueles sulares menos desenvolvidos recebem em a economia circular é uma das grandes ampla diversidade de recursos renováveis e
recursos. O oceano fornece diversos servi- torno de 41 milhões de turistas por ano, prioridades para o setor empresarial: de- não renováveis. Portanto, o oceano é uma
ços ecossistêmicos que são complexos de contribuindo para o aumento de empregos senvolver processos produtivos que minimi- fonte de recursos inexplorados que podem
valorar economicamente, sendo essencial e da economia local. zem resíduos e restaurem sistemas naturais, servir de base para design inovadores e

152 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 153


sustentáveis. Direcionar o planejamento com o litoral, promover uma Economia americanos. À medida que a cultura oceâ- de conhecimento e se ampliando para di-
estratégico empresarial em ciência, tecno- Azul beneficia não apenas o ambiente, nica se disseminava em contextos culturais mensões que demonstram a complexidade
logia e inovação para a ciência oceânica mas aproxima empresa e sociedade. e sociais diferentes e passou a ter pesquisas das relações entre a sociedade e o oceano,
trará novas oportunidades para uma trans- Desta forma, compreender e fortalecer sobre sua importância, o conceito foi ga- incluindo conhecimento, consciência, ati-
formação a longo prazo que beneficia não a Economia Azul demanda que todos os nhando expressão nos vários continentes e tudes, comunicação, ativismo, comporta-
apenas a sustentabilidade do oceano, mas setores envolvidos no processo produti- a introdução de novas perspectivas. Inicial- mento, emoções, acesso, experiência, con-
permite a restauração de recursos terrestres vo da Economia Azul, no setor público e mente desenvolvida em torno do conhe- fiança, transparência e capacidade adap-
e dulcícolas comumente explorados. privado, como gestores, administradores, cimento e da educação formal, a cultura tativa (BRENNAN et al., 2019; MCKINLEY;
A mudança de comportamento neces- técnicos, extratores, beneficiadores, equi- oceânica evoluiu, afastando-se de um foco BURDON, 2020).
sária para alavancar a economia circular, pes de marketing e vendas, distribuido-
Economia Azul e a sustentabilidade pas- res, revendedores e consumidores com-
sa pela compreensão da estrutura de ne- preendam o conceito da Economia Azul
gócios, atores envolvidos e processos de e o seu papel para a sustentabilidade, o Figura 1. Os 7 princípios da cultura oceânica
comunicação e engajamento. O processo desenvolvimento nacional sustentável e a
produtivo é feito por pessoas e para pes- melhoria da qualidade de vida. Cidadãos
soas. Quanto maior o reconhecimento da e profissionais conscientes serão capazes
relação positiva entre produção e a vida de de ter a tomada de decisão que valorize 1. A Terra tem um oceano global e muito diverso
cada indivíduo, maior o senso de pertenci- e contribua para o desenvolvimento da
mento e o reconhecimento dos benefícios Economia Azul. Neste cenário, a mudança
do produto. Quando pensamos em uma necessária requer a promoção da cultura 2. O Oceano e a vida marinha têm uma forte ação na dinâmica da Terra
sociedade em que a maior parte da po- oceânica como ferramenta para aumentar
pulação vive na zona costeira e a cultura o conhecimento e engajamento de todos
de lazer, férias e bem-estar se relacionam os setores da sociedade.
3. O Oceano exerce uma influência importante no clima
3. A cultura oceânica como eixo de transformação

A cultura oceânica (ocean literacy) pode A cultura oceânica é a tradução do in- 4. O Oceano permite que a Terra seja habitável
ser definida como a compreensão da influ- glês ocean literacy, também utilizada como
ência do oceano em nossas vidas e de nossas literacia do oceano em outros países lusó-
ações sobre o oceano. Desta forma, a cul- fonos ou mesmo como alfabetização oce-
5. O Oceano suporta uma imensa diversidade de vida e de ecossistemas
tura oceânica é um conceito essencial para ânica. Ela possui uma estrutura definida
que todos os indivíduos e as instituições, com 7 princípios (Figura 1), que tratam das
próximos ou longe do mar, possam com- diferentes dimensões do oceano e sua rela-
preender sua relação com o oceano e tomar ção com o planeta e a sociedade. Ela tam- 6. O Oceano e a humanidade estão fortemente interligados
decisões em prol da sustentabilidade. Se o bém possui conceitos relacionados, muitas
fortalecimento e a promoção da Economia vezes considerados como sinônimos, como
Azul demandam que todos os setores envol- a mentalidade marítima, a educação am-
vidos na cadeia produtiva azul, incluindo os biental marinha e costeira e a educomuni- 7. Há muito por descobrir e explorar no Oceano
consumidores, tenham conhecimento para cação marinha.
uma tomada de decisão sustentável, logo, A cultura oceânica surgiu nos EUA no
a promoção da cultura oceânica para esses início deste século como resposta à fal-
setores é um eixo essencial de desenvolvi- ta de conteúdos científicos relacionados Fonte: Elaboração própria
mento da Economia Azul. com o oceano nos programas escolares

154 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 155


Ao longo da evolução do conceito de xos aplicando conhecimentos que são ex-
cultura oceânica, diferentes avanços ocorre- tensíveis a diferentes situações e contextos Figura 2. Visão holística da cultura oceânica baseada na proposta
ram entre 2005 e 2018, com a cultura oce- geográficos. Interpretar e testar diferentes da COI-UNESCO, inspirada no modelo da educação para a
ânica sendo reconhecida como prioridade hipóteses pode melhorar a compreensão
sustentabilidade e refletindo os princípios da cultura oceânica
pela UNESCO e como medida de suporte ao dos fenômenos naturais, bem como a rela-
desenvolvimento do ODS14 pelas Nações ção com a humanidade.
Unidas. Em 2017, uma produção com uma
História - É sabido que a relação entre os
visão inclusiva e holística, mais permeável e
seres humanos e o oceano mudou ao longo
adaptável a diferentes realidades geográfi-
dos tempos. Com uma perspectiva histórica,
cas, culturais ou históricas sobre cultura oce-
explora-se como as questões do oceano fo-
ânica foi lançada pela COI-UNESCO Ocean
ram tratadas historicamente, como as comu-
Literacy for All Toolkit (SANTORO et al.,
nidades locais e globais tomaram decisões
2017). Esta publicação resulta da evolução
sobre a gestão do oceano e quais foram as
do conceito inicial, e a UNESCO identifica
implicações dessas decisões.
que os desafios que o oceano enfrenta po-
dem ser entendidos sob várias perspectivas e Geografia - Desafios ou processos as-
que não existe apenas a visão científica. As 7 sumem diferentes complexidades quando
perspectivas desta nova abordagem (Figura analisados à escala local, nacional ou glo-
2) podem ser vistas separadamente ou em bal. Considerando a perspectiva geográfica
conjunto, e servem de moldura para todos de um problema, obtém-se conhecimen-
os atores que promovem a cultura oceânica, tos mais profundos sobre a sua origem e
dentro ou fora de contextos educativos for- consequentemente possíveis soluções. Por
mais, sendo elas: exemplo, investigar como as alterações cli-
máticas têm impacto nas áreas marinhas
Valor - A compreensão dos valores, ne- em diferentes regiões do mundo e quais
cessidades e perspectivas de diferentes pes- são as diferentes consequências.
soas sobre questões do oceano são blocos de
Igualdade de gênero - Os aspetos so-
construção para desenvolver ações comuns
ciais e culturais moldam o acesso e uso de
e de cidadania. Encontrar possíveis soluções
recursos marinhos afetando os homens e as
que reconheçam e respeitem os valores de
mulheres de maneira diferente. Passa por
cada um, na tentativa de levar a comunida-
explorar os papéis dos homens e das mu-
de a ações comuns ligada ao oceano. Fonte: Elaboração própria
lheres na tomada de decisões para o uso e a
Sustentabilidade - Respeita às nossas proteção do oceano em diferentes comuni-
escolhas, comportamentos, sobre os nossos dades e em diferentes níveis sociais.
Durante as etapas de planejamento um novo protagonismo e inúmeros estu-
valores e sobre decisões políticas. Compreen-
Cultura - Uma perspectiva cultural é (2018-2020) e agora no início da Década dos, projetos, programas e ações ao redor
der que as interações entre o meio ambiente,
muitas vezes uma percepção única associa- do Oceano, a cultura oceânica tem se des- do mundo, sendo este um momento único
a economia e a sociedade definem a susten-
da a uma comunidade em particular, que tacado em todos os documentos de plane- para se afirmar como uma das áreas de in-
tabilidade do oceano para os ecossistemas e
pode servir para a distinguir de outras co- jamento e execução (UNESCO-IOC, 2020) tervenção prioritárias para cumprir objeti-
para as pessoas, tanto hoje como no futuro.
munidades culturais. É pesquisar como a como um conceito essencial para atingir vos da Década do Oceano, que demandam
Ciência - Compreender o oceano a diversidade cultural considera o papel que o os 7 resultados esperados pela Década do que toda a sociedade contribua com mu-
partir de uma perspectiva científica signifi- oceano tem na construção da visão de uma Oceano, incluindo as ações relacionadas à danças de comportamentos, desde o nível
ca ser capaz de resolver problemas comple- comunidade sobre o que a rodeia. Economia Azul. A cultura oceânica adquire local ao global.

156 ECONOMIA AZUL Cultura


Cultura Oceânica
Oceânica para
para aa Economia
Economia Azul 157
Azul 157
Em 2021, a Comissão Oceanográfica In- estratégias igualmente essenciais para que quando investe na educação, na mobilida- na biodiversidade e, por consequência, no
tergovernamental da Organização das Na- a transformação ocorra em todos os se- de social, na cooperação, no saneamento funcionamento dos ecossistemas é uma
ções Unidas para a Educação, a Ciência e a tores e nos tempos necessários para cada e na mitigação dos impactos da mudança etapa essencial para atingir a meta da Dé-
Cultura (COI-UNESCO) lançou a estratégia grupo, garantindo um processo contínuo e climática. Empresas que investem na ciên- cada do Oceano de termos “um oceano
global de cultura oceânica (UNESCO-IOC, sustentável ao longo do tempo. cia oceânica transformadora dentro de suas limpo” em 2030. Enquanto a poluição por
2021) como guia para ações de cultura realidades podem promover mudanças que plásticos é a mais abordada na discussão
oceânica para serem planejadas conside- A cultura oceânica e a Economia Azul impactam do local ao global e aumentam o atual, muitos outros poluentes (fertilizan-
rando todos os setores da sociedade. Este para o setor privado retorno dos investimentos, tornando-se re- tes, resíduos químicos, efluentes indus-
documento é o pilar estrutural do Progra- ferências neste processo de visão de futuro triais) impactam a zona costeira. Um desa-
ma Cultura Oceânica com Todos (Ocean A cultura oceânica para o setor priva- e na promoção da Economia Azul. fio dado pela ONU é apresentar soluções
Literacy with All) que conta com membros do demanda uma abordagem empresarial É no oceano que está a maior inovadoras que integrem as ações empre-
de todo o mundo, incluindo o Brasil, para e relacionada ao conceito de Ambiental, biodiversidade e os serviços ecossistêmicos sariais em prol da biodiversidade às agen-
a formação de redes e ações nas diferentes Social e Governança (do inglês ESG – En- no planeta e, por consequência, o maior das globais e demandas sociais.
vertentes da cultura oceânica e que podem vironmental, Social and Governance). O potencial de novos negócios sustentáveis. A relação entre rios, mares e o setor
atuar em sinergia com temas relevantes setor empresarial precisa compreender Além da manutenção do funcionamento empresarial vai além dos processos produ-
como a Economia Azul. que a Economia Azul, potencializada pela dos ecossistemas, fluxo de energia, regula- tivos e está relacionada também ao sanea-
O potencial da cultura oceânica como Década do Oceano, é uma oportunidade ção climática, alimentos (de 17 a 50% do mento básico e aos aspectos sociais e de
promotora da Economia Azul passa por de organizar os processos existentes, ino- consumo de proteína animal mundial vem saúde humana. O saneamento é essencial
metas e ações com impactos de curto a vando em ações que se relacionam com do oceano), bem-estar humano e aspectos para a transformação social, econômica e
longo prazo. Promover uma sociedade todos os ODS em um cenário costeiro, culturais, existe um enorme potencial de ambiental e é uma responsabilidade com-
consciente e que valorize a Economia Azul onde se concentram as maiores cidades, uso sustentável da biodiversidade marinha, partilhada entre os poderes público e pri-
demanda reconhecer todos os setores en- os fluxos turísticos e as oportunidades de em especial de aspectos biotecnológicos vado, assim como a água. No Brasil, mais
volvidos e trabalhar abordagens específicas negócios. Esta abordagem incluiu traba- que trazem oportunidade de inovação e de 50% da população não tem saneamen-
para cada grupo da sociedade. A primeira lhar a relação entre o setor empresarial e ampliação de negócios sustentáveis. to básico, ao mesmo tempo que a maior
etapa é o reconhecimento desses atores, o oceano como um convite para o enga- O Brasil possui a Amazônia Azul, com parte das grandes cidades brasileiras está
seu papel e o seu tempo de retorno. jamento do setor empresarial, mesmo que uma estimativa de que cerca de 20% do na zona costeira, o que intensifica o impac-
Enquanto empresas relacionadas à Eco- a princípio não tenham clara a sua relação PIB nacional venha do oceano e da zona to da poluição de esgoto no oceano e o
nomia Azul podem ter um processo mais com o oceano. costeira. Porém, existe muito sobre a bio- perigo de saúde pública na zona costeira
imediato de mudança de comportamen- A integração da ciência oceânica no se- diversidade marinha a ser descoberto, e (MARTINEZ et al., 2022). Ao final da dé-
to, a sustentabilidade da Economia Azul tor empresarial demonstra como o oceano as empresas podem investir neste conhe- cada de 2000, estimou-se que em apenas
dependerá de consumidores que tenham se relaciona com as visões para um futuro cimento, que será a base para o desenvol- um ano as empresas despenderam R$ 547
uma opção de compra que considere a sustentável de forma direta e diferencial vimento sustentável. Conhecer mais sobre milhões de remuneração referentes a horas
importância da Economia Azul e seus be- para o setor produtivo. Ao considerar o ci- a biodiversidade e seus serviços ecossistê- não trabalhadas por funcionários devido a
nefícios para o desenvolvimento nacional. dadão como parte intrínseca dos processos micos amplia também as fontes de obten- infecções gastrointestinais (FGV, 2010).
A mudança comportamental dos consu- científicos e empresariais, estamos cons- ção de recursos e as oportunidades de ino- A Década do Oceano traz uma oportu-
midores pode, por sua vez, ser mais longa, truindo juntos uma visão de futuro que vação de produtos ao mesmo tempo que nidade de inovação no modelo de negó-
dado que nem todos têm conhecimentos serve às pessoas, respeitando os direitos minimiza os impactos de sobre-exploração cios a partir de uma agenda multisetorial
mínimos sobre o processo e a importân- humanos e atendendo às necessidades de das mesmas espécies. (ODS 17), com decisões cientificamente
cia deste movimento azul. Neste caso, cada indivíduo sem esgotar os recursos na- A biodiversidade marinha é uma das embasadas para o desenvolvimento sus-
abordagens imediatas de sensibilização e turais. Além de promover a economia local, mais afetadas pelo acúmulo de impactos tentável e que beneficia a saúde e o bem-
comunicação, bem como investimento na o setor empresarial pode influenciar positi- ambientais costeiros, como a sobrepesca, -estar humano. Em linha com o defendido
formação de crianças e jovens, os consu- vamente o desenvolvimento sustentável, as poluição e perda de habitats. A avaliação no capítulo 5, esta oportunidade propõe o
midores e os profissionais do amanhã são pessoas e os objetivos da Década do Oceano de como os processos produtivos impactam consumo e a produção sustentáveis (ODS

158 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 159


12), ao mesmo tempo que apoia o traba- A Roadmap for Using the UN Decade of Ferreira et al. (2021) demonstraram As políticas públicas para a cultura
lho decente e o crescimento econômico Ocean Science for Sustainable Development a importância da cultura oceânica para oceânica e a Economia Azul para o
(ODS 8) a partir de processos sustentáveis in Support of Science, Policy, and Action se alcançar os ODS da Agenda 2030 setor privado
(ODS 6, ODS 7) que promovem cidades (CLAUDET et al., 2020), dos 17 ODS defini- das Nações Unidas. Os autores utiliza-
resilientes (ODS 11) e atuam no comba- dos pelas Nações Unidas na Agenda 2030, ram como estudo de caso o projeto Em- A Década do Oceano tem como um
te às mudanças climáticas (ODS 13), com muitos deles não terão como ser alcançados baixadores pela Biodiversidade (EmBio), de seus três objetivos centrais ampliar o
restauração dos ambientes aquáticos (ODS se não conseguirmos atingir as metas do realizado em duas regiões da costa por- uso do conhecimento para o desenvolvi-
14) e terrestres (ODS 15). Enquanto os pla- ODS 14 e garantir a sustentabilidade das ati- tuguesa, e correlacionaram as ações rea- mento sustentável. A tomada de decisão
nos de restauração econômica pós-pan- vidades relacionadas ao ambiente marinho, lizadas no âmbito deste projeto com os científica embasada por toda a sociedade
demia indicam a economia circular como uma vez que os demais ODS estão relacio- 17 ODS e suas 169 metas. Foi possível fornece uma base única para fortalecer a
prioridade, investir na economia circular nados direta ou indiretamente à preserva- identificar conexões em 11 dos 17 ODS, gestão do oceano para o benefício de to-
azul atende a um plano de desenvolvi- ção do oceano, como demonstra a Figura 3. com ênfase especial no ODS 14 – Vida dos nós. O objetivo passa por unir todos
mento sustentável global, maximizando Os blocos de cor azul indicam os cobe- na Água. Embora o EmBio tenha sido ca- os setores da sociedade de todo o mundo
os investimentos e as oportunidades no nefícios potenciais do cumprimento das paz de atender mais de 60% dos ODS, sob uma mesma causa que garanta que
processo de restauração econômica com metas do ODS 14, para se atingir as metas de acordo com os autores, as conexões o desenvolvimento da ciência suporta a
impactos a longo prazo. dos demais ODS (CLAUDET et al., 2020). do projeto com as 168 metas foram de criação de condições para um oceano
A utilização da plataforma ESG de dis- Considerando que o oceano desempenha apenas 19% (FERREIRA et al., 2021). que seja sustentável. Enquanto a união
cussões empresariais e suas metas para a funções tão primordiais no planeta, manter Mesmo havendo uma correlação inferior de esforços de vários setores, em uma
Agenda 2030 associada ao oceano é uma a saúde do oceano é fundamental se dese- em nível de metas, o principal objetivo da estratégia integrada e única, parece ser
forma de promover esta cultura oceânica. jamos alcançar o desenvolvimento susten- pesquisa foi mostrar o quanto a cultura a resposta correta a adotar, encontramos
De acordo com o documento intitulado tável da sociedade humana como um todo. oceânica pode contribuir para se alcançar ainda o desafio de tornar as ações sus-
os 17 Objetivos do Desenvolvimento tentáveis e garantidas ao longo do tempo
Sustentável até 2030. e para as gerações futuras. Neste caso,
Portanto, para o setor empresarial, a as políticas públicas tornam-se essenciais
Figura 3. Contribuição das metas oceânicas para as outras metas Década do Oceano é uma oportunidade para a garantia de que os esforços e in-
de desenvolvimento sustentável de protagonizar como a mudança com- vestimentos atuais não sejam efêmeros,
portamental e o investimento em de- mas possam ser institucionalizados e ga-
senvolvimento científico e tecnológico rantidos ao longo do tempo para toda a
para negócios sustentáveis por meio do sociedade, independentemente do seu
SDG 14.1 - Marine uso responsável dos recursos naturais, conhecimento ou interação com a Eco-
pollution incluindo o oceano, podem beneficiar a nomia Azul.
SDG 14.2 -
Environmental
saúde ambiental, humana e dos negó- A Década do Oceano representa uma
restoration cios. Para isso, ações de cultura oceânica oportunidade para a comunidade interna-
SDG 14.3 - Ocean que promovam a conscientização e o em- cional das ciências oceânicas se organizar
acidification
basamento científico para a mudança do e criar sinergias, parcerias e ações neces-
SDG 14.4 - End
overfishing processo produtivo em prol da Economia sárias para o desenvolvimento de políticas
Azul tornam-se ações essenciais para a marinhas regionais e globais pautadas
SDG 14.5 - Marine
protection transformação necessária. na ciência e no conhecimento (COSTA e
SDG 14.6 - End CALDEIRA, 2018; CLAUDET et al., 2020).
harmful subsidies Assim como a mudança da cadeia produ-
SDG 14.7 - Small
Island
tiva em prol da Economia Azul passa pela
Developing States cultura oceânica para o setor empresarial
Fonte: CLAUDET et al., 2020 e econômico, a sustentabilidade das ações

160 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 161


pela promoção de políticas públicas passa amplia e garante o impacto para toda a consideramos a complexidade das ques- necessário (FISCHHOFF, 2013).
pela cultura oceânica para os tomadores sociedade. A partir de políticas públicas, tões que afetam atualmente o oceano e É necessário utilizar o máximo de fer-
de decisões, legisladores e juristas. todos os setores envolvidos deverão pro- a vasta imensidão que este ecossistema ramentas, instrumentos e apoio possível
Enquanto os impactos e conflitos locais mover seus processos de mudanças, inde- ocupa na superfície da Terra, é preciso para podermos atravessar o mar de de-
e globais aumentam, torna-se necessário pendentemente do engajamento anterior. ser idealista e pensar em termos de uma safios que a implementação de progra-
embasar aqueles que possuem o dever de Promover a Economia Azul, portanto, revolução cultural, que fosse capaz de mas eficientes de cultura oceânica requer
promover políticas públicas para a socie- demandará que possamos desenvolver a gerar um senso de responsabilidade in- para o desenvolvimento da cidadania
dade que possam compreender todas as cultura oceânica para os setores legisla- dividual e coletiva com esta imensidão oceânica que se almeja na sociedade.
vertentes associadas à sustentabilidade e dores e que os países se comprometam azul. A escassez de estudos e iniciativas Além dos entraves financeiros, burocrá-
como a Economia Azul pode beneficiar a desenhar estratégias nacionais para im- na área da cidadania oceânica denota ticos e políticos que muitas vezes dificul-
o desenvolvimento nacional. Enquanto a plementar a cultura oceânica e se envolver a complexidade do seu processo, bem tam a implementação de bons projetos,
cultura oceânica para a cadeia produtiva com os setores responsáveis pelas políticas como a iminência de se fomentar mais é essencial apostar em estratégias peda-
fortalece a Economia Azul, a produção públicas. Além disso, será necessário criar pesquisas que possam contribuir para o gógicas inovadoras, que sejam capazes
de políticas públicas que apoiem e criam organizações autônomas que apoiem, desenvolvimento de novas ferramentas de envolver, motivar e congregar dife-
mecanismos que assegurem benefícios monitorizem e estimulem os vários atores e estratégias que promovam a cidadania rentes atores da nossa sociedade para
aos setores envolvidos na Economia Azul a alcançar os objetivos estabelecidos. oceânica e o consumo responsável. agirem não apenas em prol do oceano
As estratégias de envolvimento na so- que queremos, mas do planeta que de-
ciedade em geral em torno da Economia sejamos viver. Uma sociedade conscien-
4. A cidadania azul Azul e demais áreas da sustentabilidade te e informada compreenderá melhor a
oceânica passam por compreender e va- importância da Economia Azul e poderá
A cidadania oceânica envolve a cons- barreiras potenciais à cidadania oceânica, lorizar o processo de comunicação efeti- promover mudanças de comportamento
ciência e a compreensão dos impactos uma vez que podem influenciar e dificul- va para diferentes grupos, através de di- que suportem, valorizem e estimulem a
que nossas escolhas cotidianas podem tar a capacidade pessoal de agir. Para os ferentes meios e métodos (DAVIES, 2008; sustentabilidade.
ter sobre o oceano a ponto de promover autores, os valores pessoais correspon- POLIAKOFF e WEBB, 2007; BUBELA et Uma visão mais sistêmica e integrada
mudanças de comportamentos em prol dem a outro fator crítico para a promo- al., 2009; SCHAFER, 2009; FISCHHOFF, da comunicação e educação, somada ao
da sua preservação, bem como nossos ção da cidadania oceânica e enfatizam 2013). Pesquisadores precisam adotar uso de diferentes abordagens para o com-
direitos e responsabilidades em relação que: “a atitude pessoal em relação à vida, novos modelos de comunicação e enga- partilhamento de informações, como as
a este bem comum (MCKINLEY, 2010). ao comportamento e à responsabilidade jamento com seus públicos, informar seus redes sociais, bancos de dados públicos,
Pressupõe que os cidadãos assumam definirá como o conhecimento é usado resultados de maneiras que sejam mais aplicações, storytelling, arte, literatura e
maior responsabilidade pelo oceano, tor- dentro das limitações da capacidade pes- significativas para esses públicos e usar abordagens participativas em pesquisas
nando-se um agente político que contri- soal de agir”. E reforçam dizendo que: ferramentas de comunicação capazes de e projetos de ciência cidadã, desempe-
bua para uma melhor governança e saú- “a conscientização e a compreensão das atingir públicos-alvo amplos e diversos nharão um papel-chave para atingir este
de do ambiente marinho (MCKINLEY e questões marinhas devem ser apoiadas (GROFFMAN et al., 2010). Comunicações objetivo (FAUVILLE, 2017; CLAUDET et al.,
FLETCHER, 2012). Cidadãos conscientes pelo incentivo a uma mudança de valor, científicas eficazes devem executar qua- 2020; KELLY et al., 2020; DEVENPORT et
da importância e dos benefícios da Eco- no sentido de assumir responsabilidade tro etapas inter-relacionadas: (i) identifi- al., 2021). A colaboração entre educado-
nomia Azul podem promover mudanças pessoal pelo ambiente marinho”. car o resultado científico mais relevante res, investigadores, comunicadores, pro-
de comportamento de consumo que im- Promover a cidadania oceânica requer para as decisões a serem tomadas; (ii) fissionais do setor tradicional do mar, em-
pactam positivamente o oceano. um olhar sistêmico e holístico, que con- identificar o que as pessoas já sabem so- preendedores, juristas, políticos, artistas,
Mesmo havendo uma melhor oferta sidere a multiplicidade de fatores que a bre o assunto; (iii) produzir comunicações jovens e outros que se queiram juntar é,
de conhecimento e conscientização na envolve, que reconheça a diversidade de para preencher as lacunas críticas (entre na nossa opinião, uma resposta potencial-
área marinha, de acordo com Mckinley características na sociedade, bem como o que as pessoas sabem e precisam sa- mente inovadora e mutuamente benéfica,
e Fletcher (2012), variáveis socioeconô- a complexidade de suas interconexões. ber); e (iv) avaliar a adequação dessas reforçando uma cultura oceânica com to-
micas e demográficas podem se tornar Para Squarcina e Picorelli (2017), quando comunicações; repetindo o ciclo quando dos, e não apenas para todos.

162 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 163


5. A educação e a cultura oceânica COI-UNESCO a ser trabalhado na Década do SQUARCINA e PICORELLI, 2017; COSTA
Oceano. Mais do que promover o conheci- et al., 2020; MOKOS et al., 2020; DE-
Historicamente, as iniciativas de cultura a preservação do oceano e motivá-los a se mento sobre o oceano, é necessário desen- VENPORT et al., 2021). Após analisar a
oceânica têm privilegiado o setor da educa- unir e a agir para transformar os proble- volver estratégias, ferramentas, recursos e presença de tópicos relacionados ao am-
ção. É globalmente reconhecida a urgência mas inerentes a ele, é imprescindível que práticas educativas mais holísticas e transdis- biente marinho no currículo escolar de al-
de criar uma geração capaz de assumir mu- estas estratégias provoquem as crianças e ciplinares, focadas na ação e nos resultados guns países, Gough (2017) constatou que
danças de atitude necessárias para conti- os jovens a encontrarem sentido, significa- de transformação que se almejam (SANTO- estes tópicos não aparecem ou são escas-
nuarmos a ter o oceano que necessitamos. do e significância no que estão fazendo. É RO et al., 2017; UNESCO-IOC, 2022). sos nos planos curriculares, evidenciando
É também unânime que este é um dos fundamental que eles encontrem a causa, Um estudo recente realizado na Escócia o quanto a educação marinha é margina-
setores prioritários. Assim, é normal que, o motivo, o porquê de se envolver. Assim com jovens entre 11 e 26 anos demons- lizada na educação formal.
quando analisamos as iniciativas que se como é fundamental que desenvolvam trou que a grande maioria possui interesse A autora ainda destaca a importância do
desenvolvem no mundo, a grande maioria sentimentos, paixão e amor por esta causa. em se envolver em processos de tomadas papel dos especialistas da área marinha em
seja dedicada a crianças e jovens, em con- Somente dessa forma poderão se apropriar de decisão nos planos de gestão do am- incorporarem ações de educação marinha
textos educativos formais e não formais. como legítimos agentes de transformação, biente marinho do seu país (DEVENPORT em seus planos de ação junto às escolas, a
Em termos da Economia Azul, crianças e como cidadãos oceânicos, ou verdadeiros et al., 2021). Os resultados da pesquisa fim de fomentar a cultura oceânica nos pla-
jovens são consumidores, influenciam os guardiões deste Planeta Azul. demonstraram que os jovens valorizam e nos curriculares de ensino. Segundo a auto-
familiares e, mais importante, serão os pro- No livro Inteligência socioemocional: reconhecem o ambiente costeiro como um ra, a cultura oceânica se enquadraria muito
fissionais do amanhã que estarão atuando ferramentas para pais inspiradores e pro- importante espaço de lazer, recreação e de bem nos planos curriculares de Ciências e de
nas diferentes áreas da cadeia produtiva. fessores encantadores, do psiquiatra Au- interações sociais, fatores estes que des- Geografia. Contudo, a autora enfatiza que
Portanto, esta é uma oportunidade única gusto Cury (2019), o autor enfatiza que: pertam o seu interesse pelo mar. Baseado é fundamental que se vá além do modelo
de formar cidadãos que chegarão ao mer- “A emoção determina a qualidade do re- em suas próprias experiências, eles suge- tradicional de ensino baseado no conheci-
cado de trabalho compreendendo a impor- gistro. Quanto maior o volume emocional rem que realizar visitas à costa é um im- mento, promovendo uma aprendizagem
tância da Economia Azul e poderão desen- envolvido em uma experiência, mais o re- portante fator precursor para promover o mais ampla, que envolva os estudantes e os
volver ações em suas atividades ações que gistro será privilegiado e mais chances terá interesse e o envolvimento dos jovens com ensinem a saber lidar com as questões socio-
beneficiem a Economia Azul. de ser lido”, ou seja, mais enraizado na o mar, assim como sugerem outras diversas ambientais através de uma reflexão crítica,
É importante que este envolvimento da memória e na estrutura do indivíduo es- estratégias para se alcançar este objetivo, da negociação social e da organização para a
sociedade comece a ser fomentado desde tará. Neste sentido, Santos e Costa-Pinto tais como: ações práticas, saídas a campo, ação, visando ao alcance dos objetivos do de-
a infância, e que esteja integrado de forma (2005) trazem o conceito de potência de visitas técnicas, adotar uma praia, confe- senvolvimento sustentável (GOUGH, 2017).
transversal no currículo escolar. Entretanto, ação, que está relacionado à nossa capa- rências de jovens, estágios com profissio- Estudos realizados com alunos do En-
como promover a cidadania oceânica se cidade de agir no mundo e de transformar nais da área marinha, programas de tele- sino Fundamental e Médio revelaram que,
crianças e jovens não têm a oportunidade a realidade em que vivemos na direção do visão e melhor exploração das plataformas embora os estudantes demonstrassem in-
de se conectar com o oceano e ter expe- que desejamos, do que nos dá prazer e digitais, principalmente das redes sociais. teresse, preocupação e atitudes positivas
riências de aprendizagem que os toquem, do que nos faz sentido. De acordo com os Os jovens ainda colocam que seria im- em relação ao mar, possuíam um nível
os motivem e os mobilizem a agir em prol autores, conhecer algo de forma efetiva é portante integrar mais conteúdos relacio- de conhecimento geralmente de baixo a
da sua conservação? É preciso desenvolver “conhecer pela causa”, portanto, é fun- nados ao oceano ao seu currículo escolar, moderado sobre o oceano, inclusive, em
estratégias educativas que promovam opor- damental que tenhamos consciência da fator este que é fortemente apontado na alguns casos, com a presença de equívo-
tunidades de os aprendizes vivenciarem um causa primeira de nossos desejos, pois são literatura como uma das principais defici- cos relacionados ao tema (MOKOS et al.,
contato profundo e transformador, que lhes estes que impulsionam e aumentam nossa ências que dificultam a promoção tanto 2020). Os autores ressaltam que há uma
impacte de diversas formas, que deixem força ou potência de existir e agir. da cultura quanto, consequentemente, da necessidade de uma abordagem integrada
uma “marca”, um registro emocional, um Mas como promover esta potência de cidadania oceânica (FLETCHER e POTTS, para se promover a cultura oceânica desde
vínculo que perdure ao longo de suas vidas. ação direcionada para o desenvolvimento 2007; MCKINLEY, 2010; MCKINLEY E os primeiros anos escolares, combinando o
Se quisermos de fato conectar e enga- da cultura oceânica no âmbito escolar? FLETCHER, 2010; 2012; FAUVILLE, 2017; trabalho de desenvolvimento profissional
jar os estudantes com a Economia Azul e Este é um dos desafios apontados pela GOUGH, 2017; SANTORO, et al., 2017; do professor no tema, o fortalecimento de

164 ECONOMIA AZUL Cultura Oceânica para a Economia Azul 165


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168 ECONOMIA AZUL Cultura


Cultura Oceânica
Oceânica para
para aa Economia
Economia Azul
Azul 169
169
SEÇÃO
GOVERNANÇA E
2 REGULAÇÃO DO OCEANO
170 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 171
9

GOVERNANÇA DO OCEANO: coexistir com mais paz e segurança. A es-


tabilidade e a previsibilidade necessárias
TRÖM et al., 2009; STEFFEN et al., 2015),
“aceleração azul” (JOUFFRAY et al., 2021;
AS BALIZAS DA HISTÓRIA E A ESTRUTURA para uma ordem mais justa e inclusiva WOR 7, 2022) e Antropoceno (CRUTZEN;
seriam aprimoradas com a institucionali- STOERMER, 2000; GOUDIE, 2017). O pri-
DO SISTEMA INTERNACIONAL zação das relações internacionais. A Or- meiro foi baseado em diferentes variáveis
ganização das Nações Unidas (ONU) seria, relacionadas à manutenção de um “espaço
finalmente, o lócus privilegiado das nego- de operação seguro” para a humanidade,
ciações multilaterais (BARROS; PLATIAU enquanto o Antropoceno remete ao acú-
Ana Flávia Barros-Platiau
e SOENDERGAARD, 2021). Criou-se a mulo de desafios antigos e novos para o
Guilherme Lopes da Cunha expectativa de que o paradigma da “se- nosso futuro (FRÉMAUX, 2019; DAUVERG-
gurança coletiva” deixaria de ser apenas NE, 2021; CADMAN, HURLBERT, SIMO-
Carlos Henrique Tomé
para os membros da mesma aliança es- NELLI, 2021; ROSE; DADE, 2022) e para
tratégica, notadamente OTAN e Pacto de a gestão do oceano (LEVIN e POE, 2017;
Varsóvia, e seria “globalizada” em conso- BARROS-PLATIAU; OLIVEIRA, 2020).
nância com a “segurança indivisível” e o No contexto da aceleração azul, o pro-
“o interesse geral da humanidade”. jeto “Governança do Sistema Terra” (ESG
Entretanto, tal hipótese tornou-se cada Project, em inglês) e seu quadro de pes-
vez mais contestada pelo fato da “nova quisa tornaram-se uma importante pista
ordem” do final do século XX não levar de reflexão para gestão da qualidade do
aos resultados esperados. Ainda hoje per- ambiente e da vida no planeta. Esta abor-
Introdução sistem os grandes desafios de combate à dagem sugere não apenas uma perspecti-
fome, à pobreza, à corrupção, à violência va científica interdisciplinar, mas também
O oceano é um sistema único, com- algum interesse nas agendas em negocia- e à degradação ambiental (JOUFFRAY et uma visão de conjunto, com a sua comple-
plexo e essencial para o suporte à vida no ção) públicos e privados, com algum tipo al., 2021; YOUNG, 2021). De acordo com xidade inerente. Assim, o quadro analítico
planeta Terra (WOR 7, 2022), sobreposto de mandato formal ou informal. Ela exige os Relatórios Anuais da ONU, compatível proposto no Plano Científico do ESG Pro-
às divisões jurídicas, políticas e geográfi- uma análise de como eles interagem, par- com diversos outros relatórios mundiais re- ject de 2018 será utilizado como ponto de
cas de mares e oceanos e conectado com tindo da premissa de que a história recen- centes, a qualidade da vida na Terra piorou partida, conforme a Figura 1.
a ciência climática (BORG, 2021; EZER e te e a estrutura do sistema internacional significativamente, com concentração de A principal pergunta deste capítulo é:
DANGENDORF, 2022; NICHOLSON et al., conduziram a um arcabouço diplomáti- renda e injustiças sociais sem precedentes como a governança do oceano se insere
2022). Em que pese a sua importância co e legal fragmentado e pouco efetivo, na história recente (UN, 2019, 2021; UN- na e dialoga com a governança global?
crescentemente reconhecida, há desafios que moldou diretamente a governança DESA, 2020). As crises acumuladas com a Mais especificamente, em que medida a
e perguntas que continuam a demandar do oceano. Isto implica que as oportuni- pandemia de covid-19 agravaram ainda história recente e o sistema internacional
respostas efetivas da comunidade inter- dades e os obstáculos para a promoção mais a situação em escala global (SACHS contribuem para moldar a governança do
nacional. Entre outras questões relevan- da sustentabilidade planetária e da “eco- et al., 2021; WEF, 2022). oceano? Neste contexto, analisaremos em
tes, poderíamos questionar: quem gover- nomia verde” (UNEP, 2011; KASZTELAN, Da perspectiva da sustentabilidade primeiro lugar o conceito de governança
na - ou deveria governar - o oceano e suas 2017) se reproduzem, em larga medida, global, apesar de grandes avanços em de forma geral, com as condições contex-
riquezas ainda tão pouco exploradas? As para a Economia Azul. algumas agendas multilaterais, o sécu- tuais da Figura 1 acima, notadamente do
águas, os fundos e os recursos marinhos O conceito de governança foi muito lo XX foi marcado pelo aumento do uso Antropoceno, e com a lente de pesquisa
além da jurisdição nacional seriam espaço utilizado para marcar o final da Guerra de fontes fósseis de energia (JANCOVICI; “justiça e alocação” (parte 1), para de-
e coisa sem dono (res nullius) ou de to- Fria e da ordem bipolar, deixando augu- BLAIN, 2021). Prevalecem paradigmas pois focar mais especificamente no caso
dos (res communis), sob livre exploração? rar uma nova ordem baseada no Direito que alertam para maiores danos e riscos do oceano (parte 2), finalizando com uma
A resposta não se limita a uma lista de Internacional Público e em regras do jogo ocorrendo com mais frequência e intensi- breve reflexão sobre o Brasil (BARROS-PLA-
stakeholders (atores visíveis ou não com internacional que permitiriam aos Estados dade, como “limites planetários” (ROCKS- TIAU; BARROS, 2017).

172
172 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 173
Figura 1 - Quadro de pesquisa do Projeto Governança do Sistema Terra da ONU e com mandatos específicos, mui- O segundo grupo de organizações cor-
tas vezes pautadas pelos debates no âm- responde às instituições de Bretton Woods,
bito da Assembleia Geral e/ou do Con- criadas logo após a Segunda Guerra Mun-
selho de Segurança. Temas como fome e dial, às margens do sistema da ONU: o
pobreza, desenvolvimento, comércio justo, Fundo Monetário Internacional (FMI), o
segurança alimentar, segurança humana, Sistema Banco Mundial e o Acordo Geral
mudança global do clima, migrações, entre de Tarifas e Comércio (GATT). Em 1995 a
tantos outros, tornaram-se recorrentes nas OMC atualizou a arquitetura comercial.
agendas da Organização das Nações Uni- Houve outras iniciativas ao longo das dé-
das para Agricultura e Alimentação (FAO, cadas subsequentes, criadas com gover-
em inglês), da Organização das Nações Uni- nança e princípios próprios, além de ban-
das para o Desenvolvimento Industrial (UNI- cos de financiamento do desenvolvimento
DO, em inglês), do Programa das Nações internacional, como o Banco Nacional de
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), do Desenvolvimento Econômico e Social (BN-
Programa das Nações Unidas para o Meio DES) brasileiro, entre outros arranjos. Por
Ambiente (PNUMA) e da Organização In- funcionarem pela lógica de financiamento
ternacional do Trabalho (OIT), entre outras. e economia, o conceito de governança que
O sistema ONU adotou o conceito de go- eles contribuíram para consolidar remete
vernança a partir do Relatório da Comissão à capacidade do governo de cada país de
sobre Governança Global (UNCGG, 1996). honrar seus compromissos econômicos e
Tal como adotado, o conceito de governan- financeiros, conjugados com o seu alinha-
ça trazia uma forte carga normativa, em mento político. Assim, interessava menos
Fonte: Earth System Governance nome do interesse geral da humanidade. a legitimidade e a qualidade do regime no
Science and Implementation Plan (p. 19). Serviu, em ampla medida, como um chama- poder, e mais a sua capacidade de pagar
Disponível em: https://bit.ly/3B0LrU5.
Acesso em: 7 fev. 2022 do geral à solidariedade dos povos e à cons- suas dívidas com boas condições de previsi-
trução de sinergias entre os diferentes ato- bilidade e evitar o risco de mudança radical
Parte 1 – A governança global nas relações internacionais res, dos setores público e privado (mercado de governo. Para o sistema econômico e
e sociedade organizada). A mensagem era financeiro internacional, os fluxos de em-
A governança global é um conceito in- Norte, no Cone Sul, e na Europa, na África e que o sistema internacional unipolar, com a préstimos e investimentos são conectados e
terdisciplinar muito empregado a partir da na Ásia e à emergência de acordos megarre- ordem assegurada pelos Estados Unidos, su- correspondem ao ponto de partida da go-
década de 1990 em razão do contexto inter- gionais, implicando incertezas para uma go- perpotência vencedora da Guerra Fria, seria vernança. Longe do conceito normativo e
nacional à época, da arquitetura institucional vernança global do comércio (WOODS et al., mais estável, segura e justa. Ou seja, antes da igualdade soberana do sistema ONU, a
em vias de consolidação e das agendas da 2013; BOHNENBERGER, 2016). de completar 50 anos, a ONU finalmente ideia de “boa governança” se aproximava
ONU. Os anos 1990 foram marcados pela A arquitetura institucional correspondia poderia exercer efetivamente as funções de muito de conceitos de governança empre-
competição econômica e tecnológica, crises ao cenário de fortalecimento do eixo político- regulação das relações internacionais para sarial, com receitas impostas para o sucesso
energéticas, o processo de descolonização -econômico euro-atlântico, de derrocada so- as quais fora criada. Essa percepção poderia econômico, como no caso do Consenso de
afro-asiático, e a doutrina Gorbachev, para viética e de início da ascensão chinesa nos ta- ser sintetizada como a prevalência do Direi- Washington, de novembro de 1989.
citar apenas alguns. Esta última conduziu ao buleiros multilaterais. Desta forma, merecem to Internacional Público e a limitação do uso O terceiro grupo de grandes atores que
fim da Guerra Fria e à chamada ordem bi- destaque três grandes grupos de organiza- da força. Em termos simples, seria a opor- contribuíram para a evolução do concei-
polar. Como resultado, o ambiente tornou- ções que ajudam a explicar a origem do ter- tunidade ímpar de funcionamento da ONU, to de governança global é composto pela
-se favorável à criação Organização Mundial mo governança nas relações internacionais. dado o fim da clivagem Leste-Oeste, ou a União Europeia (UE) e os emergentes, prin-
do Comércio (OMC), ao fortalecimento de O primeiro grupo é composto por orga- “vitória do Ocidente”, com seu modelo de cipalmente China, Índia e Brasil. A cons-
blocos econômicos regionais na América do nizações intergovernamentais sob a égide democracia e livre comércio. trução da UE foi fortemente marcada pela

174 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 175
estratégico sino-russo e com o projeto chinês defendemos algo mais próximo às teorias
necessidade de criação de instituições para para tratar das agendas econômica, comer-
de implementação da Nova Rota da Seda, de estabilidade hegemônica, quando os
fortalecer o Bloco, e pelo enorme desafio cial, social e ambiental, com vistas à constru-
evidenciado pela preocupação do Ocidente estados mais poderosos patrocinam suas
de promoção da participação dos cidadãos ção de uma nova ordem internacional. Ape-
na cúpula do G7 de dezembro de 2021 em preferências dentro e fora do sistema ONU
europeus nos processos decisórios para su- sar da persistência e até aprofundamento da
Liverpool, denominando Rússia e China como ao mesmo tempo. Concomitantemente, as
perar o “déficit democrático” identificado clivagem Norte-Sul, diante da crescente con-
global agressors no caso da crise na Ucrânia. mudanças por que passou o conceito de
na literatura da época. Neste sentido, a go- centração de renda no Norte, houve resul-
Em segundo lugar, um deslocamento do se- segurança durante a segunda metade do
vernança significou também criar mecanis- tados positivos no sentido da construção de
tor público para o privado, em que as empre- século XX indicam um aggiornamento, alte-
mos de diálogo, com prestação de contas agendas multilaterais mais robustas, porém
sas se tornam atores poderosos da necessária rando a percepção de que o Estado seria o
(accountability) e construção de confiança com resultados mitigados. Nesse contexto,
transição energética, das inovações tecnoló- único elemento relevante. A proposta de Bu-
para legitimar novos processos de integra- cabe destacar a Agenda 21, adotada na Con-
gicas e da exploração do espaço sideral, do zan (1983) para que o componente humano
ção política e delegação de competências. ferência das Nações Unidas sobre Meio Am-
alto-mar e dos fundos marinhos. ganhasse importância nos estudos de segu-
Com os sucessivos alargamentos da UE e o biente e Desenvolvimento (Rio-92), a Agen-
No que concerne à lente de pesquisa rança contribuiu para que o meio ambien-
desenvolvimento do seu arcabouço políti- da do Milênio, que estabeleceu os Objetivos
“justiça e alocação”, usaremos três pontos te passasse a ser um dos setores decisivos
co-normativo, o desafio da governança tor- de Desenvolvimento do Milênio – ODM (de
de entrada para a reflexão sobre a gover- nessa perspectiva. Em suma, para garantir a
nou-se ainda maior. Outros blocos, como o 2000 a 2015), e a Agenda 2030, que instituiu
nança global: a perspectiva geopolítica (re- sua segurança e a segurança internacional,
Tratado Norte-Americano de Livre Comércio os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
cursos de poder); a econômica, financeira os Estados precisam fazer mais com menos
– NAFTA (Estados Unidos, Canadá e México) – ODS, iniciada em 2015. Entre as diversas
e comercial (recursos financeiros) e a de recursos de poder. Nesse cenário, os Estados
e o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e agendas multilaterais e regionais que inte-
ciência, tecnologia e inovação (recursos de encontram-se obrigados a navegar em con-
Uruguai) nos anos 1980-90, contribuíram ressam ao processo, três fatores se mostram
conhecimento e capacidades). textos de crescente complexidade e incerte-
para o debate sobre a governança regional. mais relevantes para a origem e evolução do
Sob a perspectiva geopolítica, “justiça za (PRANTL; GOH, 2022).
Nessa linha, a promoção do multilatera- emprego do conceito de governança: a he-
e alocação” raramente entram no cálculo Partindo da perspectiva econômica, finan-
lismo como princípio organizador das rela- gemonia norte-americana com a revitalização
estratégico. Quando entram, servem para ceira e comercial, o fim da Segunda Guerra
ções internacionais serviu para engajar po- da ONU como garantidora da governança
garantir os direitos soberanos dos Estados Mundial levou à vitória da chamada “ordem
los emergentes de poder na construção da global e com o aval da UE; a crescente rele-
mais poderosos, mas não de todos de for- liberal ocidental” (PRANTL, 2014), ancorada
“nova ordem”, durante o governo George vância da OMC e dos bancos de desenvolvi-
ma coletiva. Prevalecem os interesses das no eixo euro-atlântico. Sua característica mais
H. W. Bush. À crescente e assimétrica inter- mento internacional (Orliange, 2020), incluin-
grandes potências, que moldam a lógica da relevante atualmente é o empoderamento de
dependência econômica e comercial entre do o Banco dos BRICS (Rael, 2022) e o Banco
ação coletiva para o bem comum, institu- empresas gigantes, cujo impacto direto sobre
Estados (Prantl, 2021), somavam-se fatores Asiático de Investimento em Infraestrutura –
cionalizada principalmente na ONU e gra- a governança global é significativo. Além de
como a multipolaridade crescente, a necessi- AIIB (Cunha et al., 2019); e a emergência de
dativamente menos efetiva. Um dos casos não serem consideradas de forma adequada
dade de reformas no sistema onusiano para a potências econômicas, notadamente China,
mais emblemáticos atualmente é o do lixo no Direito Internacional Público (VARELLA,
acomodação de potências tecnológicas como Índia e Brasil. Dos três, o Brasil foi o que mais
espacial, que além de ser mal regulado pelo 2012), competem ou colaboram com os ato-
Japão e Alemanha, bem como de stakehol- perdeu relevância e capacidade de interlocu-
direito internacional, geralmente termina res estatais na regulação das relações interna-
ders diversos, o atendimento das agendas ção multilateral na última década.
no fundo do mar. O tema envolve Estados cionais em todos os setores.
de desenvolvimento do então denominado Com o novo milênio, o conceito de
Unidos, China e Rússia, notadamente de- Tomando as quatro agendas prioritá-
“Terceiro Mundo” na década de 1960, tra- governança global evoluiu para defini-
pois que um teste russo causou inseguran- rias de Young (2021) – clima, pandemia,
tado mais recentemente como “Sul Global” ções muito mais sofisticadas, com quadros
ça para as operações da Estação Espacial ciberespaço e biotecnologia –, fica clara a
(BARROS-PLATIAU; SOENDERGAARD, 2021). analíticos e teóricos que remetem à nossa
Internacional, em janeiro de 2022. Com o participação contínua e relevante de atores
A década de 1990 foi então considerada capacidade de moldar o futuro (Woods et
Programa Orbital Prime, autoridades norte- do setor privado nos processos decisórios
pela literatura ocidental como a Década da al., 2013), em função de megatendências
-americanas pretendem regular a questão internacionais. Por entenderem que os Es-
ONU, em resposta ao Consenso de Washin- que conduzem a um duplo deslocamento
com apoio do setor privado. tados não entregam sozinhos os resultados
gton. Nesta década, a ONU realizou diversas de poder. Em primeiro lugar, um desloca-
Embora alguns autores descrevam o fe- esperados, esses atores investem em prá-
conferências mundiais com um nível sem pre- mento do Ocidente para a Ásia do Sudeste,
nômeno como “crise do multilateralismo”, ticas ambientais, sociais e de governança
cedentes de participação de seus membros, com a consolidação do eixo energético-

176 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 177


(environmental, social and governance, recursos além da jurisdição nacional. Há Parte 2 – A Governança do Oceano
ESG, em inglês). Contudo, não se pode afir- outros atores e arranjos importantes, como
mar que as empresas contribuem para a jus- acordos comerciais entre grandes jogado- A história moldou a governança global e comercial – são muitas vezes mal conecta-
tiça e alocação de recursos em escala global. res, incluindo empresas gigantes, denomi- também a governança do oceano. Os para- das (CUNHA et al., 2021), o que permite a
Ao contrário, por visarem ao lucro e à con- nadas big techs na literatura atual e em- digmas de competição geopolítica e recorte criação de prioridades incoerentes ou, no
quista de novos consumidores e mercados, presários exploradores do espaço sideral, institucional de espaços além da jurisdição mínimo, inconsistentes, como será discuti-
as empresas não foram criadas para reforçar como Richard Branson, Elon Musk e Jeffrey nacional são centrais para a apreensão da do ao longo do texto. O conceito de “go-
aspectos de justiça e alocação da governan- Bezos, e dos fundos marinhos, como Vic- governança do oceano. As grandes nave- vernança conflitiva” remete a esta tensão
ça (DAUVERGNE, 2021). A geopolítica da tor Vescovo. O resultado da interação de- gações desde o século XV correspondem à entre as prioridades da sustentabilidade e
vacina (RIBEIRO, 2020), e os desdobramen- les tem impacto direto na corrida espacial corrida das potências europeias da época as comerciais em diferentes arenas multila-
tos estratégicos que ela ocasiona (QUEIROZ; e oceânica, bem como sobre o progresso para a apropriação de recursos naturais e o terais (ANSELMI, 2018).
CUNHA, 2021), na qual empresas gigantes da ciência. Portanto, a governança global comércio, sintetizado como guerras de co- Sob as lentes de “justiça e alocação”, o
estão diretamente envolvidas, são apenas a é um conceito teórico que se transforma lonização e descolonização, deixando como grande desafio para a governança global do
ilustração mais recente deste ponto. O resul- com mudanças estruturais e conjunturais. herança a dependência estrutural com rela- oceano é a “aceleração azul” (JOUFFRAY et
tado atual é claro: o sistema ONU e a OMC Consolidada com a suposta “nova ordem”, ção às metrópoles. Igualmente, a história do al., 2021), ou seja, o crescimento vertiginoso
fragilizados, radicalismos políticos crescen- ela não se limita ao Direito Internacional Ártico e da Antártica foi marcada pela com- da extensão, da diversidade e da intensida-
tes dentro de Estados com democracia con- Público e não é uma agenda de ação para petição geopolítica, tecnológica e econô- de na qual os recursos do mar são explora-
solidada, concentração de renda em escala o desenvolvimento sustentável. A ordem mica/comercial das grandes potências. Do dos, dentro e fora da lei. Um dos principais
global sem precedentes e exclusão dos Esta- internacional contemporânea pode ser de- início do século XX até nossos dias, a princi- desafios são os pleitos de extensão da so-
dos e povos mais vulneráveis. finida como um complex adaptive system, pal mudança foi o surgimento de outras po- berania sobre as plataformas continentais,
Do ponto de vista da ciência, tecnologia marcado pela não linearidade, intercone- tências, como os Estados Unidos e a China, de acordo com o artigo 76 da Convenção
e inovação (CTI), há razões para o “tecno- xões e emergência (PRANTL, 2020, p. 9). com a aceleração da economia global. das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,
-otimismo” (MILLS, 2021), porém sem olvi- Contestada pelos fracassos e crises do Obviamente, o tema da Economia Azul conhecida como seabed grabbing ou ocean
dar das duas estruturas que conformam a Milênio, a governança global corresponde não se limita à governança ambiental. Con- grabbing. Desde o pleito russo de 2001 re-
arquitetura global. Uma é a superioridade às relações de poder (rapports de force) tudo, nossa experiência acadêmica nos con- lativo ao Ártico, outros 83 Estados submete-
de alguns poucos países do Norte, que pro- dentro de estruturas multilaterais e regio- duz a duas conclusões. Por um lado, embo- ram pleitos, transformando definitivamente
movem e sustentam os direitos de proprie- nais, bem como nos eixos de poder que se ra o direito do mar e o direito marítimo não a paisagem geopolítica. Se todos os pleitos
dade intelectual, em linha com os interesses formam a partir de Washington e Moscou se enquadrem totalmente nesta conclusão, registrados até 2019 fossem deferidos, res-
de atores do setor privado. A forte interco- ou Pequim. Além disso, a governança não a dimensão ambiental e de sustentabilidade tariam apenas 48% dos fundos marinhos
nexão entre diplomacia, forças armadas e tem uma definição simples ou mesmo con- prevalece nos debates internacionais sobre atualmente considerados patrimônio co-
ciência nos países poderosos lhes permite sensual na teoria das relações internacio- a gestão dos recursos marinhos vivos e não mum da humanidade (PCH), de acordo com
competir para a exploração do espaço, do nais. Alguns modelos para a governança vivos, bem como do oceano como espaço Jouffray et al. (2020).
alto-mar, dos fundos marinhos, do Ártico conduzem a diferentes agendas de pesqui- além da jurisdição nacional, incluindo as A aquicultura marinha passou de me-
e da Antártica, enquanto o restante do sa: policêntrica (CARLISLE; GRUBY, 2019); regiões polares antártica e ártica. Por outro nos de 5 toneladas na década de 1970 a
mundo permanece parcialmente excluído. multistakeholders (GLECKMAN, 2018); lado, os recursos biológicos e minerais mari- quase 60 toneladas em 2020. Cerca de 13
Agências de pesquisa das potências tecno- multi-níveis (HOOGHE; MARKS, 2001); nhos são também tratados nas agendas eco- mil sequências genéticas marinhas foram
lógicas estão unindo tecnologia espacial e fragmentada (BIERMANN et al., 2009), nômicas e comerciais, devido ao seu enorme patenteadas desde a virada do milênio. O
hadal. A NASA, por exemplo, está usando fractal (RAYE, 2014), conflitiva (ANSELMI, potencial econômico para o futuro próximo, transporte marítimo de cargas quadruplicou
as lições da sonda Perseverance em Marte 2018) e transformadora (ERINOSHO, 2021). haja vista que o progresso tecnológico ten- desde 2000 e hoje responde por cerca de
para colocar a Orpheus no fundo do mar. Mas a lista não é exaustiva. Em síntese, tal- de a viabilizar cada vez mais a sua explora- 2,5% das emissões de dióxido de carbono
A outra estrutura concerne à partici- vez a melhor pergunta que a governança ção. Essas duas dimensões de um mesmo (Virdin; Österblom; Jouffray, 2021). Esses e
pação de empresários no financiamento tenha a responder seja: qual jogo as gran- problema complexo – as dimensões am- outros são exemplos emblemáticos da ace-
da pesquisa científica e na exploração de des potências estão jogando? biental/científica/tecnológica e econômica/ leração azul, conforme a Figura 2.

178 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 179


Além de indicadores da crescente de- dois tratados importantes para o tema: o
Figura 2 - Aceleração Azul em Gráficos
sigualdade em escala mundial (UNDESA, Tratado da Antártica, de 1959, e a Conven-
2020), os riscos azuis (Bennett et al., 2021; ção das Nações Unidas sobre o Direito do
Jouffray et al., 2021) constituem um desa- Mar, de 1982 (UNCLOS em inglês).
fio importante para a governança global. Em 1959, sob liderança de Washin-
Marine aquaculture Deep hydrocarbons Deep-sea minerals Desalinated seawater
60 1,6 1,6
Em primeiro lugar, os efeitos da ação an- gton, adotou-se o Tratado da Antártica,
60
trópica tendem a afetar mais as populações pelo qual o continente gelado ficaria livre
Thousand megawatts

Thousand megawatts
12 1,2
40

vulneráveis que dependem diretamente de armas, e seria usado apenas para fins

Million km2

Million km2
40
8 0,8

20
20
dos recursos marinhos, em função de fato- de pesquisa científica, no interesse geral
res que vão da contaminação da zona cos- da humanidade. Os pleitos territoriais de
4 0,4

0
1970 1980 1990 2000 2010 2020
0
1970 1980 1990 2000 2010 2020
0
1970 1980 1990 2000 2010 2020
0
1970 1980 1990 2000 2010 2020
teira por elementos químicos à acidificação Argentina, Austrália, Chile, França, No-
Marine genetic resources World Ocean Database 8 Shipping Submarine cables
do oceano decorrente do aquecimento ruega, Nova Zelândia e Reino Unido não
12 12 1,2 global. A poluição por plásticos, a perda foram contestados e nem aceitos, apenas
da riqueza biológica, as intensificações da suspensos pelo Tratado. Foi estabelecido
Thousand megawatts

Thousand megawatts

Million km2
Million km2
pesca, da navegação e do turismo em áreas um regime único, segundo o qual outros
8 8 0,8
4

4 4
2
0,4 específicas, entre outras atividades, contri- Estados poderiam tornar-se Partes, sob a
buem para ameaçar a saúde do oceano, condição de comprovarem pesquisa cientí-
bem como a saúde e o sustento de popu- fica substancial aos demais membros con-
0 0 0 0
1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020

30 Cruise tourism Offshore windfarms Marine protected areas 40 Extended continental shelf lações que dela mais dependem, como as sultivos. Atualmente existem 29 membros
20
30
comunidades de pescadores (VIRDIN; ÖS- consultivos (com direito a voto), inclusive o
Thousand megawatts

Thousand megawatts

30
20
TERBLOM; JOUFFRAY, 2021). Brasil, e 25 membros não consultivos. Im-
Million km2

Million km2
20

Da perspectiva da geopolítica e da porta destacar que o regime internacional


20
10
10
10
10 construção das regras do jogo internacio- criado é parcialmente descolado das regras
0 0 0 0
nal, a conferência da Haia, realizada em da ONU, por se tratar de espaço sem so-
1930 sob os auspícios da Liga das Nações, berania. Consequentemente, as provisões
1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020 1970 1980 1990 2000 2010 2020

logo após o grande crack da Bolsa de Nova da Convenção sobre Diversidade Biológica
Fonte: Jouffray et al. (2020, p. 47) York, não resultou em compromissos in- e do Protocolo de Nagoya, por exemplo,
ternacionais concernentes à questão da não se aplicam diretamente à região e,
expansão dos direitos soberanos sobre o na ausência de acordo específico sobre o
mar. Em 1945, baseado no direito consue- tema, a regulação sobre acesso a recursos
tudinário, o então Presidente Truman de- genéticos é ainda incipiente na região (LIU;
The Blue Acceleration
clarou o direito de os Estados Unidos con- BROOKS; QIN, 2019).
Global trends in (A) marine aquaculture protection; (F) accumulated number of trolarem os recursos naturais na sua Plata- A primeira Conferência da ONU sobre
production; (B) deep offshore hydrocar- casts added to the World Ocean Data- forma Continental. Isso levou a reações de Direito do Mar (UNCLOS I) foi realizada em
bon production, including gas, crude oil, base; (G) container port traffic measured outros países e ao consenso sobre a necessi- 1958 e produziu quatro convenções: uma
and natural gas liquids below 125m; (C) in Twenty-Foot Equivalent Units (TEU); dade de desenvolvimento do direito do mar. sobre o alto-mar, uma sobre a zona terri-
total area seabed under mining contract (H) total length of submarine fiber optic Além das lições tiradas da Segunda Guerra torial e a zona contígua; uma sobre o mar
in areas beyond national jurisdiction; (D) cables; (I) number of cruise passengers; Mundial, com o emprego de submarinos, territorial; e outra sobre a pesca e recursos
cumulative contracted seawater desali- (J) cumulative offshore wind energy ca- a expansão da pesca e da mineração cada vivos no alto-mar. A segunda (UNCLOS II),
nation capacity: (E) accumulated num- pacity installed; (K) total marine area vez mais distantes da costa, bem como as de 1960, não resultou em novos tratados.
ber of marine genetic sequences asso- protected; (L) total area of claimed ex- guerras coloniais içaram o oceano ao topo Nos anos 1970, firmou-se a Convenção
ciated with a patent with international tended continental shelf. de agendas multilaterais, em plena Guerra Internacional para a Prevenção da Polui-
Fria. Neste contexto, foram estabelecidos ção Causada por Navios (MARPOL 73/78).

180 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 181


Outros tratados foram assinados, focando um arcabouço político-legal robusto, ain- Da perspectiva da CTI, a Década da segundo e a Argentina em quinquagési-
principalmente na segurança durante a na- da que de efetividade limitada. Ciência Oceânica para o Desenvolvimen- mo primeiro.
vegação, poluição marítima e condições de A década de 2020 representa um novo to Sustentável 2021-2030, ou Década do A perspectiva econômica e comercial
trabalho. Nestas últimas, a OIT teve papel ponto de inflexão histórico, haja vista que Oceano, foi lançada sob a égide da ONU pode ser sintetizada pelo que Bennett et
central, levando à Convenção sobre Traba- dois novos acordos multilaterais são resul- para responder aos desafios da ciência que al. (2018) denominaram o “paradigma
lho Marítimo em 2006. tado de longas e árduas negociações (Bar- precisamos para o oceano que queremos. do crescimento azul”. Ele traz desafios
A terceira conferência (UNCLOS III), ini- ros-Platiau e Oliveira, 2020). O primeiro Entre esses desafios, a falta de dados e a antigos de exclusão, concentração de ri-
ciada em 1973 e concluída em 1982, con- busca regular a conservação e o uso sus- assimetria de conhecimento e capacidade quezas e violências, porém mais comple-
duziu à Convenção sobre Direito do Mar tentável da biodiversidade marinha além entre atores. Existe uma carência crônica xos para a Agenda 2030, notadamente
(UNCLOS), considerada até hoje como a das jurisdições nacionais (BBNJ em inglês), de dados sobre os ecossistemas marinhos para o ODS 14 - Vida na água. Estima-se
“Constituição dos Mares”. Apesar de sua segundo quatro pilares: recursos genéticos e sobre as atividades industriais e outras que haja cerca de 150 milhões de tone-
importância pela codificação de parte do marinhos, áreas marinhas protegidas, estu- no oceano, como pesca e turismo. A Ini- ladas de plástico no oceano (MIT, 2022).
direito costumeiro e de diversas inovações dos de impacto ambiental, e construção de ciativa Ciência e Empresas (ÖSTERBLOM No que concerne à biotecnologia, a em-
institucionais, como a criação do Tribu- capacidades e transferência de tecnologia. et al., 2017) constitui um exemplo de co- presa alemã BASF detém quase metade
nal Internacional para o Direito do Mar O texto atual, que circulou em 2019, re- nexão de atores globais com a pesquisa das patentes de sequenciamento genéti-
(TIDM), da Autoridade Internacional dos flete as imensas divergências entre os dife- científica, com o objetivo quebrar silos e co de organismos marinhos vivos (BLA-
Fundos Marinhos (ISBA) e da Comissão so- rentes stakeholders (CREMERS et al., 2020; tornar o diálogo mais amplo. Neste mo- SIAK et al., 2018), um indicativo inequí-
bre os Limites da Plataforma Continental BARROS-PLATIAU; OLIVEIRA, 2020). mento, há mais pesquisas sobre o espaço voco da importância do setor privado na
(CLPC), a Convenção só entrou em vigor O outro tratado, negociado no âmbi- sideral do que sobre os fundos marinhos, governança dos oceanos. A pesca mun-
em 1994. Do ponto de vista da política to da ISBA, busca instituir um código de porém descobertas recentes, como a co- dial é uma atividade de difícil controle,
internacional, um fator relevante é a au- mineração para áreas além da jurisdição lônia de peixes-gelo no oceano polar an- com dados incompletos publicados pela
sência dos Estados Unidos, que, embora nacional (SINGH, 2021). Ele refere-se a um tártico (ANDERSON, 2022) e as esponjas FAO no Relatório SOFIA. A pesca levou
tenham ratificado em 2013 convenções conjunto de regras e procedimentos para gigantes no Ártico central (MORGANTI et à sobrepesca – e ao consequente risco
adotadas em 1956 pela UNCLOS II, ain- a regulação de prospecção, exploração e al, 2022) reforçam a expectativa de ace- de extinção – de algumas espécies (CAR-
da não ratificou a Convenção de 1982, explotação de minerais marinhos na Área, leração na pesquisa oceânica, levando à MINE et al., 2020; GONÇALVES, 2021),
atitude em linha com uma postura his- que, conforme a UNCLOS, corresponde “inovação azul” (MIT, 2022). bem como ao aumento desgovernado da
tórica daquele país de não ratificaram aos fundos marinhos e ao subsolo além da O Relatório Blue Technology Barome- aquicultura (MAZZEGA et al., 2019; ÖS-
diversos tratados multilaterais. jurisdição nacional. Até fevereiro de 2022, ter (MIT, 2022) classificou os dez Estados TERBLOM et al., 2017).
Nos anos 1990, a década da “nova or- a ISBA havia autorizado 22 contratos de líderes (blue technology leaders) de acor- Apesar de não haver mecanismo ade-
dem internacional”, dois acordos impor- exploração, mas inexistem atividades de do com as suas respectivas capacidades quado de informação, dos 1.120 atores
tantes merecem destaque. O Acordo de explotação. Coreia do Sul, China, França, de emprego de tecnologias azuis para do setor da pesca oceânica, as cem maio-
Pesca de 1995 (UNCLOS Implementing Reino Unido, Alemanha e Rússia são ato- a gestão de recursos marinhos para a res empresas respondem por cerca de
Agreement relating to the Conservation res relevantes na mineração, junto com sustentabilidade. São eles: Reino Unido, 36% da pesca em alto-mar (CARMINE et
and Management of Straddling Fish Sto- um número expressivo de empresas. Alemanha, Dinamarca, Estados Unidos, al., 2020). Ou seja, menos de 10% dos
cks and Highly Migratory Fish Stocks – UN- Em que pesem os esforços para preen- Finlândia, Noruega, França, Suécia, Co- atores produzem mais de um terço do
FSA) e o acordo de 1994 sobre mineração cher lacunas regulatórias no regime inter- reia do Sul e Canadá. Seguindo o mesmo pescado. Enquanto isso, as estimativas de
(Agreement Relating to the Implementa- nacional do oceano, as estratégias para padrão da governança global, todos são pesca ilegal, não declarada e não regula-
tion of Part XI of UNCLOS). Cabe destaque mitigar a evidente fragmentação da gover- economias ocidentais, com exceção da mentada (INN) aumentam a cada ano, em
também o papel da FAO no setor da pes- nança (BARROS-PLATIAU; MALJEAN-DU- Coreia do Sul. O Japão ficou em décimo função do elevado retorno financeiro. A
ca, com a negociação do Acordo de Com- BOIS, 2017) são claramente insuficientes e primeiro, a China em décimo-sétimo e o FAO estima que 26 milhões de toneladas
pliance de 1993, que entrou em vigor dez falta uma ação coordenada para melhorar Brasil em décimo nono. Entre os demais de pescados resultem da pesca INN a cada
anos mais tarde. Atualmente a FAO tem a qualidade do oceano (HUMPHRIES; HAR- sul-americanos, o Chile ficou em vigési- ano. Entre as razões para a pesca INN es-
papel central na agenda da pesca, com DEN-DAVIES, 2020; MIT, 2022). mo segundo, a Colômbia em trigésimo tão as brechas jurídicas e institucionais,

182 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 183


como a liberdade do alto-mar, os efeitos para o oceano e atividades afins (OLIVEIRA, atualmente em descompasso com a su- A agenda de ciência, tecnologia e ino-
de tratados para terceiros e as punições 2018). Atualmente, existem diversas agen- premacia chinesa e o empoderamento de vação, na mesma linha, oferece um quadro
inexistentes ou leves (BAPTISTA, 2017). das importantes, como a revitalização da atores privados. A governança do oceano claro de divisão entre potências que têm
A governança do oceano não se limita Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul enfrenta riscos socioecológicos graves, capacidade de reformar a arquitetura ins-
à Economia Azul. Ao contrário, o cresci- (ZOPACAS), a proliferação das organiza- começando pela mudança do clima, de titucional e aproveitar ao máximo o aces-
mento e o desenvolvimento sustentável ções regionais de ordenamento pesqueiro forma comparável à economia de forma so aos recursos marinhos e aos demais. A
exigem agendas de pesquisa mais sofistica- (OROP) (TOMÉ, 2020), a confirmação dos geral, com a sua aceleração promovida produção científica é a base do desenvolvi-
das e mudança de paradigma da corrida da limites da nossa plataforma continental justamente pelas grandes potências e em- mento nas três agendas, e, portanto, a es-
apropriação (first arrived, first served) para após a denúncia do contrato brasileiro presas. Não se trata mais de great power trutura conservadora de poder não incenti-
a justiça global. Na imensa e ainda inade- com a ISBA, a finalização do tratado BBNJ competition limitada apenas aos Estados va a justiça e a alocação.
quada governança do oceano, o Brasil foi e do Código de Mineração. Todos estes soberanos. Enquanto o primeiro grupo se As três agendas acima demonstram que
tradicionalmente uma voz pelo multilatera- são temas tão complexos quanto relevan- destaca dos demais em termos de ativi- a governança global pode ser analisada
lismo e pelo direito internacional. Assinou tes para a Economia Azul brasileira e serão dades extrativistas (produção alimentar e com diferentes lentes de pesquisa e que a
e ratificou dezenas de tratados relevantes tratados nesta obra. mineração), serviços (comércio, navega- governança do oceano, no caso, reproduz
ção e turismo) e pesquisa (biotecnologia, padrões históricos consolidados pelas gran-
Conclusão nanotecnologia, inteligência artificial, ro- des potências. Poder, comércio e ciência são
bótica, entre outras áreas), os custos das indissociáveis quando se trata de oceano.
A governança do oceano reproduz, em ser apropriadas de forma egoísta por atores atividades são socializados para todos. Neste contexto, o Brasil não está no grupo
larga medida, as estruturas e relações de individuais, do que um sistema de suporte Como na agenda de poder, justiça e alo- das grandes potências. O País tem potencial
poder herdadas da Guerra Fria. Em outros à vida no planeta que precisa ser tratado de cação não são prioridades para atores na para competir em diversos setores, e por isso
termos, a governança global ainda não forma sustentável, inclusiva e justa. esfera econômica, financeira e comercial. mesmo a Economia Azul precisa ser estuda-
cumpriu a sua promessa de prevalência A agenda geopolítica permite argumen- Ao contrário, a Agenda 2030 da ONU foi da com profundidade, principalmente na
da força do direito sobre a ameaça do uso tar que as lacunas regulatórias no âmbito do desenhada para reduzir os danos e riscos geopolítica concernente ao desenvolvimen-
da força militar, e muito menos de am- direito internacional, tanto do mar quanto causados pela aceleração econômica, in- to da governança do oceano, mais especi-
pliação da segurança coletiva e da justiça marítimo, comercial, climático, ambiental e cluindo a aceleração azul. ficamente do Atlântico Sul e da Antártica.
social para a escala planetária. Em outras trabalhista, entre outros, são resultado da
palavras, o interesse dos P5 (cinco potên- interação das grandes potências e novos Referências
cias nucleares membros permanentes do stakeholders, como no caso das negocia-
Conselho de Segurança da ONU) preva- ções em curso do Código de Mineração e ANDERSON, Natali. Marine Biologists BAPTISTA, Cláudia. A pesca ilegal, não
lece sobre os interesses 5P promovidos sobre a BBNJ, bem como da dificuldade de Discover Enormous Breeding Colony of declarada e não regulamentada (INN).
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188 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano: as Balizas da História 189


10

A GOVERNANÇA DO OCEANO COMO VETOR


DE COMUNICAÇÃO: TRANSPORTE E DADOS

Marcelo José das Neves


Rogério de Oliveira Gonçalves

1. Introdução

O tema da governança do oceano vem Marítimos da Escola de Guerra Naval (PP-


desafiando pesquisadores ao longo do GEM/EGN) e que desde 2019 vem siste-
tempo, mas os estudos econômicos vol- maticamente realizando pesquisas nessa
tados ao Mar e à Economia Azul são uma importante temática. Em sua fala, Charles
demonstração inequívoca do peso que as Colgan, ao ser indagado sobre a relevância
atividades humanas desenvolvidas no meio da mensuração dos elementos componen-
marinho têm na vida econômica, com im- tes da Economia Azul respondeu que:
pactos sociais e ambientais cada vez mais
necessários a serem planejados, quantifica- O governo dos EUA começou a pesqui-
dos e avaliados. sar o papel do oceano na economia na-
Charles S. Colgan, Diretor de Pesquisa cional em 1974. Os trabalhos periódicos
do Centro de Economia Azul do Middlebury de pesquisa cobriram a temática até o
Institute of International Studies, Monterey, início do Programa Nacional de Econo-
é uma referência no assunto nos Estados mia do Oceano (National Ocean Econo-
Unidos da América (EUA). Com mais de 14 mics Program – NOEP), em 2001, com o
anos de experiência no tema, foi recente- objetivo de criar uma medição temporal
mente entrevistado pelo Grupo Economia e espacialmente consistente da econo-
do Mar (GEM), uma iniciativa acadêmica do mia do oceano para os EUA. Estes da-
Prof. Dr. Thauan Santos, Professor Adjunto dos ficaram disponíveis no formato de
do Programa de Pós-Graduação em Estudos protótipos em 2001 e se tornaram uma

190 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 191


190 A ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 191
publicação oficial do Governo Federal estrutura governamental. Assistimos, so- das comunicações, tendo em vista sua po- seguiram, explicitando a importância que o
em 2007, como a série de dados Eco- bretudo na última década, a uma profunda sição estratégica no contexto do Atlântico agente regulador e a autoridade marítima
nomics National Ocean Watch (ENOW). mudança conceitual na governança dos es- Sul e seu o papel para o desenvolvimento na governança da atividade, sem descartar
Desde então, tem sido atualizado regu- paços marítimos. A implementação de no- econômico do país, em um contexto globa- a necessária atuação estatal no Controle
larmente. Os dados desta série incluem vos marcos políticos, legais, institucionais e lizado de grande dependência internacional da Concorrência e da Jurisdição, quando
estabelecimentos, emprego, salários pa- governamentais nos levam a observar a in- das exportações brasileiras, especialmente necessário. A segunda seção apresenta o
gos e valor agregado bruto (VAB). A par- trodução um novo modelo de governança das commodities agrícolas e minerais. impacto do Custo Brasil nas atividades do
tir de 2018, o governo dos Estados Uni- marítima em escala global. O método utilizado a ser utilizado é o da setor de transporte marítimo, as medidas
dos começou a criar uma conta satélite Justifica-se a pesquisa pela necessidade argumentação jurídica desenvolvido pelo de governança adotadas na Política Nacio-
oceânica dentro das contas nacionais de compreender melhor a implicação da Prof. Dr. Nitish Monebhurrun, onde em sua nal de Transportes e as linhas de ação para
de renda. Esta conta satélite nacional atividade do tráfego marítimo na economia obra Metodologia Jurídica: Técnicas para tornar o transporte marítimo mais acessí-
de economia marítima foi lançada em e como a governança brasileira vem cui- argumentar em textos jurídicos (2015), vel e interessante aos usuários. A tercei-
2020 e refinada em 2021. Ela fornece dando do assunto, em um contexto jurídico onde cada seção deste texto procurará tra- ra seção apresenta as perspectivas com o
detalhes industriais consideravelmente e regulatório, em um recorte temporal que zer argumentos e convencimento ao leitor Programa de Estímulo ao Transporte por
maiores sobre a economia oceânica dos contempla os marcos legais atualmente vi- sobre a hipótese central do papel vital que Cabotagem (BR do Mar), principalmente
EUA do que a série de dados ENOW, mas gentes até a mais recente mudança trazida o tráfego marítimo como vetor de comuni- após a derrubada parcial do veto presiden-
somente em nível nacional. A ENOW pela Lei no 14.301, de 7 de janeiro de 2022, cação tem no desenvolvimento econômico cial, abordando pontos que significaram
continua como a referência em dados que instituiu o Programa de Estímulo ao procurando trazer luzes sobre o que poderá uma grande queda de braço entre os se-
de economia oceânica a nível estadual e Transporte por Cabotagem (BR do Mar). representar o mais recente marco legal do tores interessados e a recente sessão con-
local (condado). A MESA contém dados Nesse desiderato avaliar o papel que o Es- BR do Mar no contexto econômico nacio- junta do Poder Legislativo. A quarta seção
sobre produção bruta (PIB), valor agre- tado regulador, por meio de agentes como nal, com implicações sociais e ambientais apresenta as perspectivas de governança
gado bruto (VAB), salários e emprego. a Agência Nacional de Transportes Aquavi- que não podem ser desconsideradas. do sistema regulador de tráfego de dados
ários (ANTAQ), o Conselho Administrativo Após esta introdução, a primeira se- por cabos submarinos.
O presente trabalho se propõe a inves- de Defesa Econômica (CADE) e a Autori- ção do artigo apresenta a Governança do Por fim, nas considerações finais serão
tigar o quadro de governança no uso dos dade Marítima, exercida no país pela Ma- Tráfego Marítimo em caráter amplo, ilu- lançadas as conclusões alcançadas por
oceanos, especificamente no que tange a rinha do Brasil mostram-se fundamentais minando o papel que a Constituição Fe- meio da argumentação apresentada ao
regulamentação do tráfego marítimo como nesse assunto. deral de 1988 e os marcos legais que se longo das seções da presente pesquisa.
indutor econômico e de comunicação no Neste contexto, as questões apresen-
contexto da Economia Azul. A importância tadas no artigo vinculam-se a como vem 2. Governança do tráfego marítimo
do trabalho está associada à relevância eco- sendo medida a contribuição da atividade
nômica do Atlântico Sul, região que atual- do tráfego, do comércio e comunicação Podemos definir a governança dos oce- da Política de Governança Pública, 2018).
mente desperta enorme interesse interna- pelo uso do vetor marítimo nas contas do anos como a condução de políticas e pro- Os recursos naturais do mar e todo o
cional, onde centenas de navios cruzam Produto Interno Bruto (PIB) e se sua par- cessos desenvolvidos por meio de ações meio ambiente marinho sempre foram consi-
diariamente suas águas e cada vez mais ticipação demonstra relevância na base diretas ou parcerias com entidades priva- derados de muita importância, face ao papel
cruzeiros de pesquisa vem sendo organiza- nacional. Paralelamente se a atuação do das/não governamentais para regular o uso que desempenham na composição dos ele-
dos para compreender melhor o valor de Estado Regulador vem ocorrendo a con- adequado destes e de seus recursos. mentos que integram a produção de alimen-
seus recursos, vivos e não vivos. tento, ouvindo os atores relevantes e con- A Casa Civil da Presidência da Repúbli- tos, bem como nas muitas atividades econô-
Os governos rapidamente perceberam siderando sempre a participação social na ca define governança como o “conjunto de micas desenvolvidas nos mares do planeta,
que essa evolução, com intenso poten- medida do peso constitucional da atuação mecanismos de liderança, estratégia e con- além, pela relevância da sua biodiversidade
cial em impactos econômicos e sociais de estatal na economia. trole postos em prática para avaliar, direcio- (MARTINS & GIRÃO, 2013). Acrescentamos
grande alcance, exigia um novo arcabouço Assim, o objetivo principal do artigo é nar e monitorar a gestão, com vistas à con- aqui a importância dos oceanos como vetor
institucional adaptado a essa nova realida- avaliar a governança brasileira nas ativida- dução de políticas públicas e à prestação de de comunicação e transporte, onde grande
de, o que acabaria por impactar a própria des econômicas do tráfego, do comércio e serviços de interesse da sociedade.” (Guia parte do comércio mundial ocorre por este

192 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 193


modal, o que o coloca em posição de des- Receita Federal exerce no comércio ex- Internacionais de Direito Público, que tem a em águas sob jurisdição nacional (LESTA) de-
taque em uma economia internacionalmente terior; Direito Portuário, vez que o porto Convenção das Nações Unidas sobre o Di- ram forte ordenamento à governança estatal
globalizada, e que exige cada vez mais a ado- é o local onde as mercadorias são em- reito do Mar (CNUDM) como base de sus- na atividade de transporte marítimo no Brasil.
ção de políticas públicas de proteção e incre- barcadas; com o Direito Administrativo, tentação, um sem-número de normas da Com a criação da Agência Nacional de Trans-
mentação dos meios utilizados no transporte em decorrência da legislação editada Organização Marítima Internacional (IMO) portes Aquaviários (ANTAQ), por meio da Lei
marítimo de mercadorias. pelos diversos órgãos do Poder Execu- regulam a atividade, nos aspectos do traba- nº 10.233, de 5 de junho de 2001, um com-
Tratar de governança de tráfego marítimo tivo, especialmente Comando da Mari- lho marítimo e na governança ambiental. plexo sistema normativo e regulatório federal
significa envolver o Direito Marítimo e suas nha; com o Direito Internacional Públi- Em adição, leis federais e normas da Au- começou a ser estabelecido trazendo a pre-
fontes para cuidar da regulação administra- co, pela grande quantidade de tratados toridade Marítima e do Agente Regulador sença do Estado Regulador para a governan-
tiva e da jurisdição nacional e internacional e convenções, principalmente aqueles procuram emoldurar a atividade no contro- ça do oceano como vetor de comunicação,
em uma das mais antigas e importantes ati- editados pela International Maritime Or- le estatal, oportunizando que a governança seja no comércio realizado pela navegação
vidades humanas, que até hoje une os mais ganization; com o Direito Internacional do oceano nas atividades de transporte e de cabotagem, que é a que ocorre dentro da
diferentes povos por meio da comunicação, Privado, pela complexidade dos confli- comércio funcionem dentro de uma nor- jurisdição nacional marítima e nas águas in-
do comércio e transporte marítimos. O Di- tos envolvendo contratos de transportes malidade institucional, seja no cenário na- teriores, seja na navegação de longo curso,
reito Marítimo tem um forte relacionamento e nacionalidades diversas das partes en- cional na navegação de cabotagem costeira quando os movimentos de exportação e im-
com diversas outros ramos jurídicos, tendo volvidas; com o Direito Ambiental, pelo ou nas águas interiores ou no internacional, portação se mostram presentes.
em vista sua dimensão e complexidade de transporte ocorrer em meio aquaviário; na atividade de navegação de longo curso. Tendo em vista a importância de certas
normas locais e internacionais, ratificadas dentre outros ramos do direito. O atual cenário legal e regulatório tem atividades produtivas brasileiras no cenário
pela comunidade internacional, com o fito por base a Constituição Federal de 1988, internacional, em particular, as commodi-
de trazer organização e segurança jurídica a Compreender toda essa dinâmica e com- ao estabelecer no artigo 170 os princípios ties minerais e agrícolas, a governança da
uma atividade em que o risco e a aventura plexidade nos leva a argumentar que em da Ordem Econômica e a atuação estatal atividade de transporte marítimo de longo
sempre estiveram presentes. função direta da importância das atividades no domínio econômico. De acordo com a curso é vital à balança comercial brasileira
Conforme nos ensina Castro Júnior de transporte marítimo e do comércio in- lição de Castro Júnior (2005): e ao seu PIB. De acordo com a Fundação
(2004): ternacional, a governança dos oceanos no Getúlio Vargas, o ano de 2021 represen-
O Direito Marítimo tem sua base na desenvolvimento e o bom desempenho de O art. 170 traça a estrutura geral do or- tou o maior superávit da balança comercial
Constituição Federal de 1988, conforme toda essa cadeia é estratégica ao Estado no denamento jurídico econômico, e tem em toda a série histórica, com o valor de
artigos acima mencionados, bem como seu crescimento econômico e social susten- como fundamento a valorização do tra- US$ 61,2 bilhões e um acréscimo de US$
sua autonomia, tal como dispõe o art. tável. A capacidade de preservação do meio balho humano e a livre iniciativa, ressal- 10,8 bilhões em relação ao saldo de 2020.
22, I. Por sua vez, relaciona-se principal- ambiente marinho e seus recursos, vivos e vando-se que aceitos tais fundamentos, A corrente de comércio (exportações mais
mente com o Direito Comercial, em face não vivos, é condição direta para uma ação a Constituição estabelece a finalidade importações) atingiu valor recorde de US$
de sua regulamentação no Código Co- coordenada de planejamento que traga pos- de toda atuação através de políticas 500 bilhões, resultado de um aumento de
mercial de 1850, Parte Segunda; com o sibilidades de crescimento contínuo e sus- econômicas, qual seja, a de assegurar 34,2% nas exportações e de 38,2% nas
Direito Civil, pelo Código Civil, na parte tentável. Nessa perspectiva, faz-se necessá- a todos a existência digna, conforme os importações, entre 2020/20211.
que trata dos contratos de transportes; rio todo um sistema que envolve o controle ditames da justiça social, e para que tais Dados agregados do PIB divulgados em
com o Direito de Defesa do Consumidor, e a regulação dos contratos de transporte, objetivos sejam alcançados, é necessário 2019 pela Agência Brasil dão conta de que
especialmente pela relação de consumo as tarifas portuárias, os mecanismos de se- adotar alguns princípios norteadores da a Economia Marítima rende R$ 2 trilhões
entre prestadores de serviços e fornece- guro e de frete para que a atividade tenha ação do Estado. por ano, o que representou naquele ano
dores de produtos que se relacionam na previsibilidade e planejamento para os inves- 19% do PIB2. Nesse cenário, a participa-
indústria da navegação, bem como ações timentos, sempre vultosos. Por seu turno, a Lei nº 9.432, de 8 de ção e atuação estratégica do Estado como
coletivas especialmente por dano am- Ao lado de todo esse intrincado sistema, janeiro de 1997, ao dispor sobre a orde- agente regulador e proponente de políticas
biental causado por poluição marítima. uma extensa legislação necessita dar su- nação do transporte aquaviário e a Lei nº públicas que considerem a importância dos
Além disso, relaciona-se com o Di- porte a toda a atividade a fim de construir 9.537, de 11 de dezembro do mesmo ano, oceanos como vetor de desenvolvimento
reito Aduaneiro, pela fiscalização que a uma boa governança. Ao lado das Normas ao tratar da segurança do tráfego aquaviário econômico são mais do que necessárias.

194 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 195


3. O transporte marítimo e o Custo Brasil acordo com os sistemas viários4. O Caderno . Atuar como vetor do desenvolvimento

Custo Brasil foi uma expressão criada para


descrever o complexo conjunto de entraves
à logística de transporte necessária para a
produção. Considerando que os meios de
de Estratégias Governamentais aborda os
modais aeroviário, rodoviário, ferroviário, .
socioeconômico e sustentável do país; e
Garantir a infraestrutura viária adequa-
aquaviário, além do setor portuário e temas da para as operações de segurança e de-
burocráticos, legais, econômicos e estrutu- transporte ocupam um papel importantís- transversais, incluindo temáticas que vão fesa nacional.
rais que dificultam as atividades empresariais simo na economia, propiciando o desloca- desde financiamento, contratação e gestão
no país, impondo barreiras para novos inves- mento de cargas e pessoas, fundamental até ponderações acerca dos recursos huma- Percebe-se, portanto, que a PNT, com es-
timentos e comprometendo o ambiente de para o desenvolvimento econômico da na- nos, questões ambientais e de segurança ses objetivos, busca propiciar um ambiente
negócios, onerando produtos e serviços de ção, é extremamente relevante entender os viária (MTPA, 2018). seguro e confiável para novos investimentos
forma a torná-los menos competitivos em efeitos do Custo Brasil no setor de Transpor- Destaca-se ainda o caráter de nacionali- no setor de transportes, de modo a mitigar
relação aos produzidos no exterior. te Aquaviário e buscar a sua mitigação. dade da PNT, transcendendo o plano fede- os efeitos nefastos do Custo Brasil. Como o
Um estudo elaborado pela Secretaria ral. Suas medidas devem nortear as ações foco deste artigo, e, especificamente, desta
Especial de Produtividade, Emprego e Com- 3.1 Política Nacional de Transportes adotadas por Estados e Municípios na ela- seção, é avaliar o quadro de governança e os
petitividade do Ministério da Economia (SE- boração de suas diretrizes políticas para o impactos do Custo Brasil no modal de trans-
PEC), em parceria como o Boston Consulting A Política Nacional de Transportes é setor de transportes. porte marítimo, passamos agora a abordar
Group, estimou que o Custo Brasil consome um documento de alto nível onde são es- A PNT tem como objetivos (MTPA, as políticas públicas atuais deste setor.
das empresas R$ 1,5 trilhão por ano, repre- tabelecidas políticas públicas que visam o 2018):
sentando 22% do PIB. O Boletim de Logísti-
ca da Empresa de Planejamento e Logística
desenvolvimento econômico do setor. De
acordo com o Ministério dos Transportes, . Prover um sistema acessível, eficiente e con-
3.2 Transporte marítimo

S.A. aponta que as empresas brasileiras têm


um custo acima da média dos países da Or-
Portos e Aviação Civil (2018):
.
fiável para a mobilidade de pessoas e bens;
Garantir a segurança operacional em to-
Como já tratado, o transporte marítimo
se configura como elemento fundamental
ganização para a Cooperação e Desenvolvi-
mento Econômico - OCDE (EPL, 2020).
Diante deste cenário desfavorável, o
o estabelecimento de uma política ins-
titucionalizada visa induzir o desenvol- ..
dos os modos de transportes;
Prover uma matriz viária racional e eficiente;
no desenvolvimento econômico, ao permi-
tir o deslocamento de cargas, insumos, pes-
vimento socioeconômico sustentável e Promover a participação intra e interins- soas, propiciando o abastecimento interno,
Governo Federal lançou um projeto deno- promover a integração nacional e in- titucional, considerando sociedade, gover- além de participar ativamente das importa-
minado Redução do Custo Brasil, visando ternacional a partir da oferta de infra- no e mercado, no desenvolvimento de uma ções e exportações do país.
melhorar a competitividade do setor em-
presarial e reduzir entraves e demais obs-
táculos econômicos por meio da criação
estrutura e serviços de transportes, pro-
piciando o aumento da competitividade .
política integrada;
Planejar os sistemas de logística e trans-
Todavia, identifica-se um desequilíbrio na
matriz de transportes, com a preponderância
e a redução das desigualdades do país. portes a partir de uma visão territorial, inte- do modal rodoviário sobre os demais estabe-
de políticas públicas e medidas regulatórias
mais favoráveis a este setor. As novas bases da PNT foram estabele- .
grada e dinâmica;
Disciplinar os papéis dos atores do Setor
lecida no século passado. Assim, buscou a
nova PNT corrigir erros, deficiências e carên-
Um dos gargalos identificados foi malha
de transportes nacional, com impactos na
cadeia produtiva, cuja melhoria vem sen-
cidas em dois documentos fundamentais:
o Livro de Estado da Política Nacional de .
de Transportes do Governo Federal;
Dar transparência à sociedade, ao merca-
cias do setor, de modo a oferecer à sociedade
serviços mais eficientes e adequados5.
Transportes e o Cadernos das Estratégias do e aos agentes públicos quanto às ações Tornar a logística de transportes em um
do alvo da Política Nacional de Transportes Governamentais. No primeiro estão descri- governamentais do Setor de Transportes; ativo equilibrado na multimodalidade e
(PNT), atualizada em 2018 pelo Ministé- tos os objetivos, princípios e diretrizes fun- Incorporar a inovação e o desenvolvimento que proporcione ao ambiente de negócios
rio dos Transportes, Portos e Aviação Civil damentais, caracterizando-se como a prin- tecnológico para o aperfeiçoamento contí- a segurança que a produção necessita, seja
(MTPA). Dentre outras finalidades, a PNT
busca a melhoria na infraestrutura nacional
cipal referência da política pública setorial,
e no segundo encontram-se as ações estra- .
nuo das práticas setoriais;
Promover a cooperação e a integração
do campo ou da cidade em um país conti-
nental como o Brasil mais que um desafio,
de transportes e promoção da integração na-
cional e internacional de todos os modais3.
tégicas para implementação da política em
consonância com as orientações governa- .
física e operacional internacional;
Considerar as particularidades e poten-
merece o tratamento de política pública
(GONÇALVES & NEVES, 2020).
Esse setor sofre demasiadamente os efei- mentais e a política externa do país, com cialidades regionais nos planejamentos se- A PNT identificou que o equilíbrio das
tos do Custo Brasil, ainda mais no que tange contribuições estratégicas setorizadas, de toriais de transportes; ações regulatórias constitui uma estratégia

196 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 197


importante para o desenvolvimento de po- com o Anuário Estatístico da Agência Na- (MInfra, 2019), fortalecendo a articulação jeto BR do Mar, que tem por objetivo in-
líticas públicas voltadas à melhoria da infra- cional de Transportes Aquaviários (ANTAQ). institucional com usuários do setor. centivar a cabotagem no país, por meio
estrutura e da manutenção das condições Em relação à movimentação de contêineres, Dentre as medidas do MInfra para sim- do aumento de oferta, incentivo à con-
das vias navegáveis. Um dos pontos levan- a ANTAQ registrou um aumento de 11%. plificar os processos e desburocratizar o corrência, redução de custos envolvidos e
tados, visando a redução dos custos logís- Esse incremento pode ser atribuído a setor de transportes, cabe ressaltar o pro- expansão de rotas.
ticos no país, foi a questão da cabotagem. medidas adotadas de promoção ao incenti-
De acordo com a PNT (MTPA, 2018), vo à utilização da cabotagem no transporte 4. Perspectivas do cenário atual – BR do Mar
de cargas de longa distância, desde a greve
as exigências legais para a cabotagem dos caminhoneiros em 2018. O Programa BR do Mar nasceu por ini- da oferta de navios, haveria um aumento
devem ser avaliadas em relação às exi- No entanto, ainda são identificadas de- ciativa do Ministério da Infraestrutura, com substancial na competitividade entre em-
gências para a navegação de longo ficiências na matriz de transportes, com o objetivo de trazer um maior equilíbrio na presas de navegação, com reflexo na redu-
curso – inclusive no que tange à sim- a alta concentração no modal rodoviário, matriz nacional de transportes, predominan- ção do custo do frete, tornando assim o
plificação dos aspectos documentais e o que tem encarecido muito o custo dos temente rodoviária, incentivando a navega- modal ainda mais atrativo.
à incidência de impostos na determina- fretes no país. Uma maior eficiência nes- ção de cabotagem por meio de uma matriz Após um longo período de tramita-
ção do preço dos combustíveis. Neste sa matriz, com a distribuição nos demais de transportes mais eficiente, sustentável, ção no Congresso Nacional, o Projeto de
sentido, há de se registrar a possibilida- modais considerados de alta capacidade, com redução de custos, otimizando recursos Lei foi aprovado, dando origem à Lei nº
de de serem realizadas tratativas junto como o aquaviário e o ferroviário, permi- públicos e incrementando o investimento pri- 14.301/2022, sancionada, com vetos im-
aos estados federativos a fim de unificar tiria reduções significativas no Custo Brasil. vado nos projetos de infraestrutura logística. portantes, pelo Presidente da República em
e simplificar as exigências documentais Isso é identificado como uma das políticas A integração modal é fundamental para 7 de janeiro de 2022.
no que tange à cabotagem, de modo a públicas prioritárias do Governo Federal, o aumento de eficiência do setor de trans- Sustenta o MInfra que
desburocratizar e alavancar esse tipo de como se verá adiante. portes. A cabotagem é um modal de baixo
um dos grandes avanços da lei será a
transporte no âmbito interestadual. Estimativas da EPL apontam um custo custo, que é incentivado pela estrutura ge-
possibilidade de incrementar a oferta e
60% menor na navegação de cabotagem ográfica do país, composta por uma exten-
a qualidade do transporte por cabota-
Neste contexto, foram estabelecidas al- em comparação ao rodoviário (EPL, 2020). sa costa marítima, além de vias navegáveis
gem, estimular a concorrência, incenti-
gumas linhas de ação, das quais podemos É necessário repensar a forma como se pro- interiores que propiciam uma melhor utili-
var a competitividade e aumentar a dis-
destacar o incentivo ao desenvolvimento cedem os negócios nos setores logístico e zação deste tipo de transporte.
ponibilidade da frota dedicada à cabo-
da frota mercante brasileira de longo cur- de transporte de cargas e de pessoas. Mu- O programa nasceu com metas ousa-
tagem no território nacional. Com mais
so, cabotagem, de navegação interior e de danças normativas e regulatórias são capa- das. De acordo com a EPL, pensava-se na
concorrência na prestação do serviço,
apoio portuário e marítimo, bem como a zes de propiciar um ambiente jurídico mais ampliação de 40% da capacidade da frota
os custos de transportes de cargas entre
indústria naval nacional a partir de instru- seguro e atrativo para os investidores. marítima dedicada à cabotagem e um au-
os portos do país tendem a cair. Ações
mentos de financiamento; promover es- Em consonância com as orientações mento, em média, de 60% do volume de
voltadas à formação, à capacitação e à
tudos técnicos e econômicos voltados ao do Governo Federal para redução do Cus- contêineres transportados (EPL, 2020).
qualificação dos trabalhadores do setor
fomento da Marinha Mercante e da indús- to Brasil e com o objetivo de aumentar a O Projeto de Lei de iniciativa da Presi-
também estão previstas (MInfra, 2022).
tria naval nacional; e reduzir os custos ope- competitividade do setor de transportes do dência da República, que tramitou sobre o
racionais do transporte por cabotagem a país, o Ministério da Infraestrutura (MInfra) nº 4.199/2020, trouxe a proposta de alte- De acordo com a nova lei, o afreta-
fim de incentivar maior participação deste vem trabalhando no Programa de Desbu- rações na legislação atual, de modo a per- mento dos navios estrangeiros a casco
modo de transporte na movimentação de rocratização Infra +, que consiste em ouvir mitir, dentre outras medidas, a participação nu, com suspensão de bandeira, pode-
bens e insumos6. as entidades representativas do setor de de embarcações estrangeiras na navegação rá ser formalizado por meio de contrato
O mercado vem demonstrando reações. transportes e trânsito, e de seus usuários, de cabotagem nacional, realizada exclusi- entre a Empresa Brasileira de Navegação
A movimentação portuária brasileira regis- coletando propostas de desburocratização vamente por navios de bandeira brasileira (EBN) e sua subsidiária integral estrangei-
trou a marca de 1,2 bilhão de toneladas que proporcionem a simplificação de nor- à luz da Lei nº 9.432/1997. ra ou subsidiária integral de uma outra
de carga no ano de 2021, um aumento de mas e processos, com consequente redu- A promessa de perenidade da frota tra- EBN. Um ponto positivo é que tais navios
4,8% em relação ao ano anterior, de acordo ção de custos e aumento de produtividade zia o discurso de que, com a ampliação serão submetidos ao regime de admissão

198 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 199


temporária, e estarão isentos de diversos BR do Mar. O gráfico abaixo demonstra a Gráfico 1. Total de cargas transportadas na cabotagem (em toneladas)
tributos federais. quantidade de cargas movimentadas nos
Em termos concorrenciais, isso é bem- últimos dez anos. 900.000
visto, já que estimular a entrada de novos Nota-se uma queda entre 2014 e 2016, 782787
navios em um mercado concentrado au- com recuperação a partir de 2017. A par- 800.000
menta a competição logística com grande tir da greve dos caminhoneiros em 2018,
700.000
impacto na redução do frete. A dificulda- a cabotagem passa a receber uma maior
de desse cenário se realizar na prática é a atenção do setor empresarial, que viu no 600.000 567431
534928 538858
concentração internacional desse merca- modal uma boa alternativa de transporte, 496212 486841 502733
do, cada vez mais ocupado por empresas principalmente quando se trata de longas 500.000
424470 424375
de grande verticalização e que ocupam no distâncias. Ressaltamos que sempre haverá
400.000 375829
Brasil e no exterior o mercado marítimo e dependência do modal rodoviário, já que o
de terminais portuários. transporte por navios não atende a neces-
300.000
No cenário atual, os armadores nacio- sidade porta a porta. No gráfico, salta aos
nais encontram grandes dificuldades em olhos o aumento de 37,95% em 2021. O 200.000
relação a custos operacionais de suas em- crescimento da participação da carga con-
barcações, como aquisição de combustí- teinerizada no total explica-se pela excep- 100.000
vel a preços mais elevados do que o ofe- cional expansão do transporte desse perfil
0
recido a navios estrangeiros, e custos tra- de carga na última década. Faz-se importan-
2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
balhistas excessivos, levando em conta o te registrar que o mercado vive no momen-
protecionismo e as benesses concedidas to uma crise de caráter global de indisponi- Fonte: ANTAQ (2022)
pela legislação brasileira (GONÇALVES & bilidade de contêineres, o que tem feito que
NEVES, 2020). Isso faz com que o custo algumas commodities de forte dependência Gráfico 2. Número de navios na cabotagem brasileira
operacional de um navio de bandeira bra- na exportação como o café necessitem re-
sileira seja excessivamente alto, se com- correr novamente ao mecanismo das sacas.7 25
parado aos custos de navios estrangeiros, Conjuntamente com o aumento da de- 22
e, consequentemente, contribui para o manda de cargas, identifica-se um aumento 21
20 20 20
aumento do Custo Brasil. Acrescenta-se da frota de navios porta-contêineres. As três 20
ainda, para justificar o aumento, de acor- principais empresas brasileiras que atuam
do com Amorim et. al. (2021), que: no segmento de cabotagem são Mercosul 16 16 16
15
Line Navegação e Logística Ltda, do grupo 15
o país apresenta entraves, os quais impe- 13
CMA-CGM, Aliança Navegação e Logística
dem maior utilização do transporte marí-
Ltda., pertencente ao grupo Hamburg Süd
timo via cabotagem. Dentre esses entra-
e LOG-IN – Logística Intermodal S/A. 10
ves encontrados, pode-se destacar: tarifas
Ao mesmo tempo em que se registou um
altas no setor para carregar, descarregar
aumento no transporte de carga conteineri-
e armazenar mercadorias; burocracia nos
zada, identifica-se também uma redução no 5
portos; além de alta carga tributária, so-
preço do frete. O transporte de cabotagem
mada à baixa infraestrutura portuária e
representa uma grande vantagem em termos
um número limitado de embarcações.
de custo para os usuários, podendo chegar a
0
Todavia, o transporte de mercadorias 75% menor que o modal rodoviário. 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
na cabotagem vem mostrando sinais po- Não se sabe se o BR do Mar ocasiona-
sitivos, mesmo sem a implementação do rá uma mudança neste cenário. Apesar de Fonte: ANTAQ (2022)

200 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 201


201
apresentar pontos positivos para a redução como as questões de maior controvérsia, de cerca de R$ 2 bilhões em investimen- neste momento de preocupação quanto
do custo de operação das empresas de na- vetadas pelo despacho. tos portuários. A Associação Brasileira ao tema. Mais uma vez, restou mantido
vegação, uma forma de mitigar os impac- Na Sessão de análise, caíram os vetos de Terminais teve sucesso na articulação um incentivo do Estado regulador intervin-
tos com o Custo Brasil, a lei ainda é alvo de ao AFRMM e ao REPORTO, restando man- tendo em vista o forte placar na derruba- do na Economia para manter aquecido seu
diversas críticas, como o veto ao dispositivo tido o veto à questão da proporção de 2/3 da deste veto. Sem dúvida que o momen- funcionamento trazendo desenvolvimento
que previa a obrigatoriedade de 2/3 de tripu- nas tripulações de marítimos brasileiros. to impõe um maior investimento no setor econômico ao país.
lantes brasileiros. A indústria naval também Houve forte articulação da Confederação marítimo e portuário para que ocorra um Fica bastante claro que a governança
se posiciona contrariamente ao BR do Mar, Nacional dos Trabalhadores em Transporte reequilíbrio com o modal rodoviário no do Estado brasileiro no setor de transporte
alegando que o incentivo de afretamento Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos transporte de cargas no país. e comércio aquaviário vem crescendo ano
de embarcações estrangeiras impedirá que (CONTTMAF) e a Federação Nacional dos Por fim, em relação ao AFRMM acabou a ano, ao passo que se toma consciência
as empresas brasileiras de navegação façam Trabalhadores em Transportes Aquaviários não vingando a tese de inconstitucionali- do peso da Economia Azul no PIB nacional.
investimentos em aquisição de frota própria. e Afins (FNTTAA) que buscaram apoio par- dade e de contrariar o interesse público Claro que os setores diretamente interes-
O fato é que a navegação de cabota- lamentar para derrubar o veto ao artigo 9º, alegada pelo governo no texto que esta- sados sempre irão buscar seus interesses
gem vem apresentando números cada vez II, justificando a defesa do emprego dos beleceu alíquota de 8% para o AFRMM e antagonizar longas batalhas como foi a
mais expressivos a partir de 2018, mesmo marítimos brasileiros. Venceu a tese econô- para navegação de longo curso, linear da Lei nº 14.301/22, mas isso também sig-
sem os benefícios conferidos pelo Progra- mica da redução de custos onde a derru- para todo o Brasil, evitando uma majo- nifica que o setor ocupa uma posição de
ma de Estímulo à Navegação de Cabota- bada do veto diminuiria a atratividade para ração de preços de derivados justamente destaque no debate público e isso o fará
gem do Projeto de Lei no 4.199/2020. o ingresso de embarcações estrangeiras no crescer.
programa de estímulo à cabotagem. 5. O tráfego de dados – o mercado regulador de cabos submarinos,
4.1 Os vetos e as Controvérsias ao Cabe aqui indicar a tendência da cabo- situação atual e perspectivas
BR do Mar tagem nacional, a partir da manutenção do
veto, ficar cada vez mais assemelhada à na- Um dos elementos fundamentais no A principal característica dos sistemas
Após a sanção presidencial à Lei nº vegação de longo curso, atualmente com tráfego de dados de um país com as di- de comunicações de cabos óticos sub-
14.301, de 7 de janeiro de 2022, com ve- tripulações muito internacionalizadas onde mensões continentais do Brasil é o Cabo marinos, além da sua alta capacidade
tos à pontos que significaram uma grande nem sempre direitos trabalhistas mínimos Submarino. Consoante Oliveira (2021): de transmissão é a distância que se
queda de braço entre os setores interessa- são garantidos. Será necessária uma forte pode atingir, chegando a até 9.000 km
dos e a recente sessão conjunta do Poder atuação do Estado regulador para que não O Cabo submarino é um cabo te- sem necessidade de regeneração do
Legislativo, realizada em 17 de março de ocorra uma grande degradação da qualida- lefônico especial, que recebe uma sinal. Nos sistemas que utilizam fibras
2022 onde Câmara dos Deputados e Se- de dos serviços prestados em face de uma proteção mecânica adicional, própria óticas de terceira geração consegue-
nado Federal analisaram e deliberaram os desvalorização do mercado e a consequen- para instalação sob a água, por exem- -se atingir espaçamentos de até 60km
vetos do Poder Executivo, cabe uma breve te degradação de procura de trabalhadores plo, em rios, baías e oceanos. Normal- entre repetidores. Já nos sistemas que
análise dos pontos mais polêmicos e uma nacionais a esse setor econômico. mente dispõe de malha de aço e de utilizam cabos com fibras óticas de
indicação de tendência do que os vetos e Em relação ao REPORTO, após alegar um isolamento e proteção mecânica quarta geração, estes espaçamentos
sua derrubada podem significar para o fu- respeito à lei de responsabilidade fiscal especial. Este tipo de cabo telefônico podem atingir até 100Km. Além disso,
turo do Tráfego e Comércio marítimo no como maior razão ao veto, o governo é utilizado principalmente em redes o cabo ótico, amplificadores e regene-
setor de cabotagem nacional. passou a defender abertamente a der- internacionais de telecomunicações, radores utilizados em sistemas subma-
O documento que trata dos vetos e de rubada do veto, ouvido o MInfra9. Ao que interligam países e continentes. rinos são projetados para resistirem à
suas motivações é o despacho presidencial suspender quatro impostos referentes à No Brasil, pelo seu tamanho conti- pressão de água de até 8.000m de pro-
de nº 19, do dia da sanção da lei8. Podem importação aos terminais portuários, Im- nental, o cabo submarino é utilizado fundidade (pressão igual a 800 atmos-
ser elencados a questão da proporção posto de Importação, IPI, PIS e Cofins, para interconectar toda a sua costa. feras). A estrutura dos componentes,
de marítimos brasileiros nas tripulações, o REPORTO significava uma redução de Seu tipo pode ser metálico, coaxial ou incluindo os componentes óticos, é de
o Adicional ao Frete para Renovação da custos em cerca de 40% no preço de im- ótico, sendo este último o mais utili- altíssima confiabilidade, normalmente
Marinha Mercante (AFRMM) e o REPORTO portação, representando uma diferença zado atualmente. assegurando 25 anos de vida útil.

202 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 203


Figura 1. Mapa cabos submarinos O primeiro cabo submarino foi inau- (MB) como órgãos regulatórios, cada um
gurado no Brasil em 1857. Fez parte da com uma atribuição específica, cabendo à
Caribe
EUA primeira linha telegráfica brasileira conec- MB a atribuição de autorizar a instalação dos
tando a Praia da Saúde, no Rio de Janei- cabos submarinos, de acordo com as Normas
ro, à cidade de Petrópolis com 15 km de da Autoridade Marítima e a Lei de Segurança
Puerto Viejo
cabo submarino em uma linha cuja exten- do Tráfego Aquaviário (LESTA), que definem
Panamá são era de 50 km. os registros operacionais necessários quando
VENEZUELA Em 1874, foi concluído o primeiro pro- em Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB).
Guatemala
EUA Buenaventura África e jeto de cabeamento totalmente submari- As Capitanias dos Portos, enquanto
Portugal
no inaugurado por D. Pedro II. Conectava agentes da Autoridade Marítima, são res-
COLOMBIA
as cidades do Rio de Janeiro, Salvador, Re- ponsáveis por acompanhar os processos de
cife e Belém. No ano seguinte, uma nova autorização de instalação de cabos subma-
linha ligou as cidades de Recife, João Pes- rinos em suas áreas de responsabilidade e
Fortaleza
soa e Natal. Ainda em 1875, Irineu Evan- encaminhar os documentos referentes aos
PERU gelista de Souza, o Barão de Mauá, parti- projetos à Diretoria de Hidrografia e Nave-
cipou da organização e do financiamento gação (DHN), bem como a planta final da
BRASIL da instalação do primeiro cabo submarino situação – documento georreferenciado en-
Lurin internacional no país; instalado pela British caminhado, ao final da instalação do cabo
Eastern Telegraph Company, conectando o submarino ao Centro de Hidrografia da Ma-
Brasil a Portugal. rinha (CHM) para que seja então cartografa-
Arica Atualmente os cabos submarinos no Bra- do nos documentos náuticos oficiais e não
Rio de Janeiro sil e no mundo são de fibra óptica e permi- represente nenhum risco à navegação.
São Paulo
CHILE tem o transporte de todo tipo de informa- Em termos internacionais, a Convenção
ção digital — ou seja, telefone, internet e das Nações Unidas sobre o Direito do Mar
Florianópolis
demais dados. A rede de cabos submarinos (CNUDM), em seu artigo 79 atribui o direi-
existente no Brasil é complexa e dos 278 to aos Estados de colocar cabos submarinos
cabos submarinos atualmente em uso no na plataforma continental e no alto mar,
mundo10, seis deles passam pelo Brasil. consoante o artigo 87.
URUGUAY
No Brasil, existem quatro principais pon- Considerando o interesse que algumas
ARGENTINA tos de conexão, sendo o mais importante o big techs como a Google, Facebook, Micro-
Valparaiso Las Torinas
de Fortaleza (CE), que é considerado pela soft e Amazon tem como investidores em
comunidade internacional como um gran- novos cabos submarinos, devido à sua alta
de hub intercontinental, funcionando como capacidade e estabilidade no tráfego de da-
um polo conector entre diversos sistemas de dos, esse mercado torna-se a cada dia mais
telecomunicações via cabos submarinos. Os importante e vital no tráfego diário de co-
outros três polos relevantes estão situados municações e dados. Nesse sentido, torna-
em Santos (SP), Salvador (BA) e Rio de Janei- -se vital aos interesses do Estado realizar a
ro (RJ), conforme a figura1. melhor governança desse complexo sistema,
Na governança desse complexo sistema acomodando os interesses dos stakeholders.
destacam-se a Agência Nacional de Teleco- A rede atualmente existente de cabos
municações (ANATEL), o Instituto Brasileiro submarinos no Brasil tem um potencial de
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais tráfego aproximado de 610 Tbps11. Esta é
Fonte: Oliveira (2021) Renováveis (IBAMA) e a Marinha do Brasil uma métrica estipulada partindo da premissa

ECONOMIA AZUL
204 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 205
se todos os proprietários dos sistemas de . Projeto para Porto Alegre do Cabo redução dos custos operacionais do transpor- vegação de cabotagem vem, a cada ano,
cabos vigentes no Brasil instalassem todos Submarino Malbec. te por cabotagem a fim de incentivar maior obtendo números expressivos no transpor-
os equipamentos disponíveis nas extremi- Fica evidente que, a exemplo do participação deste modo de transporte na te de mercadorias. Somente em relação de
dades dos seus respectivos cabos. Comércio e do Transporte marítimo, a movimentação de bens e insumos no país. 2021 a 2020, o aumento foi de quase 40%
Alguns novos projetos de cabos submari- comunicação estabelecida pela rede de Diante dessa última medida citada, sur- em quantidade de carga transportada.
nos e fluviais estão em andamento, confor- cabos submarinos que cruza os oceanos e giu o Programa de Estímulo ao Transpor- Perguntas para as quais ainda não há
me o relato do 10ª Semana de Infraestrutura rios tem importância estratégica e é vital ao te por Cabotagem, conhecido como BR respostas: após a regulamentação do BR
da Internet no Brasil, mas ainda é cedo para crescimento econômico do Estado brasileiro, do Mar. Com suas discussões iniciadas no do Mar, teremos aumento na frota de na-
que se tenha plena certeza se realmente sendo um componente fundamental da ano de 2019, o programa envidou esforços vios na cabotagem? Teremos empresas ha-

.
serão implantados:
Projeto de cabo fluvial da Amazônia
Economia Azul fortalecendo o Produto
Interno Bruto.
para garantir a perenidade da frota, através
da flexibilização de normas de afretamen-
bilitadas no programa? O que temos certe-
za até o momento é que a governança do

.
Integrada e Sustentável – PAIS.
Projeto de cabo fluvial entre Macapá e
Nessa medida, importa muito ao Estado,
exercendo seu papel de Agente Regulador,
to, permitindo o ingresso de navios estran-
geiros para realizar a navegação de cabota-
Estado brasileiro no setor de transporte e
comércio aquaviário vem crescendo ano a

.
Belém.
Projeto de Cabo Fluvial Santarém x
de cuidar muito bem desse mercado com
todos os seus agentes e nas questões em
gem na costa brasileira. O argumento para
a viabilidade do projeto foi a redução do
ano, ao passo que se toma consciência do
peso da Economia Azul no PIB nacional.

.
Alenquer.
Projeto do Cabo Submarino Atlantix
que a Concorrência se torne desleal que
órgãos como o Conselho Administrativo de
custo do frete em decorrência do aumento
de concorrência entre empresas de nave-
Por fim, abordou-se na presente pesqui-
sa a governança no quadro regulador de

.
Litoral.
Projeto para Recife do Cabo Submarino
Defesa Econômica (CADE) e o Poder Judici-
ário entrem em ação para dirimir quaisquer
problemas desse importante mercado.
gação. Uma medida viável em termos con-
correnciais, mas de difícil aplicação em um
cabos submarinos no país, chegando-se à
conclusão da importância vital e estraté-
Seabras-1. mercado tão verticalizado. gica ao crescimento econômico do Estado
Todavia, como demostrando nesta pes- brasileiro, sendo um componente funda-
6. Considerações finais quisa, antes mesmo do BR do Mar, a na- mental da Economia Azul.

Por meio de uma abordagem metodoló- uma excelente estratégia do Estado para o
gica de argumentação jurídica, o presente seu pleno desenvolvimento. Dados econômi- Referências
artigo procurou abordar a governança na- cos demonstraram que, por conta de certos
cional nas questões ligadas ao transporte produtos econômicos, em particular, as com- AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES BRASIL. Constituição Federal (1988).
marítimo de bens e pessoas quanto ao qua- modities minerais e agrícolas, a governança AQUAVIÁRIOS (Brasil). Painel Estatístico Constituição da República Federativa
dro regulatório especificamente no que tan- da atividade de transporte marítimo é vital à Aquaviário. Brasília, DF: ANTAQ, 2022. do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal:
ge a regulamentação do tráfego marítimo balança comercial brasileira e ao seu PIB. Disponível em: https://www.gov.br/antaq/ Centro Gráfico, 1988.
como indutor econômico e de comunicação Todavia, identificou-se que o setor de pt-br/noticias/2022/setor-portuario-movi- BRASIL. Lei no 9.432 de 08 de janeiro
no contexto da Economia Azul, em um re- transporte marítimo sofre demasiadamente menta-1-2-bilhao-de-toneladas-de-cargas- de 1997. Dispõe sobre a ordenação do
corte temporal que contempla os marcos le- com o Custo Brasil, e, diante disso, a Política -em-2021. Acesso em: 18 mar. 2022 tráfego aquaviário e dá outras providên-
gais atualmente vigentes até a mais recente Nacional de Transportes foi atualizada para AMORIM, Daniel Correa; TRAVIZANE, cias. Brasília, DF: Presidência da República,
mudança trazida pela lei no 14.301, de 7 de propiciar um ambiente seguro e confiável Erika dos Santos da Silva; GOMES, Fabri- 1997. Disponível em: http://www.planalto.
janeiro de 2022, que instituiu o Programa para novos investimentos no setor de trans- cio de Brito; NOGUEIRA, Rosana Maria gov.br/ccivil_03/leis/l9432.htm. Acesso
de Estímulo ao Transporte por Cabotagem portes, com o estabelecimento de políticas César Dell Picchia. Projeto BR do mar e em: 18 mar. 2022.
(BR do Mar), de modo a identificar a contri- públicas voltadas à melhoria da infraestrutu- o comércio nacional e internacional: BRASIL. Lei no 9.537 de 11 de dezem-
buição da atividade do tráfego, do comércio ra e da manutenção das condições das vias reflexões e perspectivas sobre a política bro de 1997. Dispõe sobre a ordenação
e comunicação pelo uso do vetor marítimo navegáveis, e ao incentivo ao desenvolvimen- de estímulo à cabotagem. Mogi das Cru- do tráfego aquaviário e dá outras pro-
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Restou constatado que a boa governan- so, de cabotagem, de navegação interior e fateclog.com.br/anais/2021/parte3/1130- planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9537.htm
ça dos oceanos no transporte marítimo é de apoio portuário e marítimo, e ainda, para 1607-1-RV.pdf. Acesso em: 18 mar. 2022. Acesso em: 18 mar. 2022.

206 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 207


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Notas
bro de 1997. Dispõe sobre a ordenação OAB/SC Editora, 2004. v. I
do tráfego aquaviário e dá outras pro- CASTRO JÚNIOR, Osvaldo Agripino de.
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-registrou-em-2021-o-maior-superavit-da- ações necessárias específicas para o desen-
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019- tora, 2005. v. 2
-sua-serie-historica. volvimento do transporte por cabotagem,
2022/2022/Lei/L14301.htm Acesso: em 18 EMPRESA de Planejamento e Logística
2 Para saber mais, acessar: https://agencia- considerando os seguintes aspectos prioritá-
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(org). Temas Atuais de Direito do liveira.pdf Acesso em: 18 mar 2022.

208 ECONOMIA AZUL Governança do Oceano como Vetor de Comunicação 209


11

A REGULAÇÃO DO MAR:
CONSOLIDAÇÃO E PERSPECTIVAS
André Panno Beirão
Tiago Vinícius Zanella

1. Introdução

Em que pese cerca de 70% da Crosta O presente trabalho vem, portanto, mais
Terrestre esteja coberta de águas – princi- que apresentar conclusões a partir de fatos
palmente não de águas consideradas inte- pregressos, apresentar algumas perspecti-
riores ou arquipelágicas, essas submetidas a vas que demonstrem essa contínua busca
regime jurídico igual ao território seco dos pela codificação e pelo consensual uso do
Estados que as inserem – essa maior parte mar. Diante de uma abordagem analítica
do Planeta foi uma das últimas grandes ques- sucinta, pretende abordar como foi esse
tões enfrentadas para regulação. Seja para lento processo de regulação da maior parte
resolver sua relação com os Estados costeiros da superfície terrestre, diante de breve re-
(e mesmo sem litoral, que também foram trospectiva histórica que demonstre como
incorporados aos direitos e deveres), seja esse debate é crescente. A seguir, procu-
para tentar buscar o uso sustentável a todo ra demonstrar que, para sua consolidação
o Planeta para sua conservação, exploração, houve necessidade de criação de novas ins-
explotação ou mesmo o uso, essas metas so- tituições e mesmo de corte internacional
mente conseguiram chegar a termo no final que buscasse consolidar as inúmeras quere-
do século XX. Logo, seria prematuro conside- las de disputa existentes no mar.
rar que esse exercício regulatório internacio- O terceiro aspecto a ser abordado pro-
nal teria se esgotado e consolidado todas as cura demonstrar como esse processo não é
demandas e potencialidades em relação ao estático e que se encontra com reais pers-
mar, principalmente considerando a imensa pectivas de novas regulamentações, algu-
nova revolução tecnológica em curso. mas mesmo que podem influir na mudança
Assim sendo, parece prematuro consi- de paradigmas de utilização do mar, cada
derar o chamado Direito do Mar, ou como vez mais como fonte de recursos, além de
outros doutrinadores optam, o Direito In- meio de comunicação. Por fim, procura ilus-
ternacional do Mar – já aceito como ramo trar algumas novas perspectivas de uso do
especial do Direito – como algo estático e mar e carências regulatórias que justificam
pragmático, apenas servindo à reflexão, e a crescente adesão da temática marítima na
considerado como premissa seu estágio agenda global, especialmente na década de
atual (TANAKA, 2015). 2021-2030.

210 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 211


2. O mar, maior porção da Terra e tardiamente regulado: a evolução Por seu turno, a idade moderna foi liberum X mare clausum que se iniciou a
da regulação dos mares marcada no campo teórico, doutrinário, ju- discussão sobre o princípio da liberdade
rídico, político e diplomático pela querela dos mares que acabou sendo convencio-
A regulação dos mares e utilização seja, não era passível de apropriação. Con- entre os defensores do mare clausum (mar nada posteriormente. Esta querela, no-
dos espaços marítimos estão ligados dire- sagrava-se assim a liberdade de navegação e fechado) e os do mare liberum (mar aber- meadamente acadêmica, propiciou a base
tamente à própria história da civilização, de exploração, nomeadamente a pesca, nos to). Descoberto o caminho para a Índia e jurídica para a liberdade dos mares atual-
uma vez que o mar sempre foi um dos am- mares, sendo que não existia a noção de a chegada à América, os portugueses co- mente consagrada.
bientes mais utilizados por todos os povos, mar territorial e de apropriação de nenhuma meçaram a reivindicar a soberania sobre os Entretanto, foi tão somente no século
seja para exploração de seus recursos ou parcela marítima, pois “o mar é livre como mares descobertos. Portugal tornou-se um XX que a regulamentação dos mares e da
para navegação como meio de transporte o ar e a água da chuva” (MELLO, 2001). império de rotas e entrepostos, fundamen- utilização de seus recursos passaram a ser
e comunicação. Assim, a regulamentação Posteriormente, com o advindo do Im- tado em alguns homens e mercadorias de normatizados em regras internacionais de
da exploração dos recursos marinhos e da pério em Roma, é abandonada a teoria do ponta, tornando-se necessário o domínio forma universal (ou quase).
navegação marítima é tão histórica quanto res communis e os romanos passam a rei- dos mares para assegurar sua condição de Neste intento, foi realizada em 1930 na
atual. De um lado, existem regras relacio- vindicar o dominium maris, isto é, o Mar potência mercantil (FERREIRA, 1988, p. 11). cidade de Haia uma Conferência de cará-
nadas à navegação e apropriação de es- Mediterrâneo passou a ser considerado Uma das primeiras contestações des- ter universal sob a égide da Sociedade das
paços marítimos desde os primórdios das domínio romano (GUEDES, 1998). Deve-se ta soberania – da tese do mare clausum Nações a fim de, entre outras questões, fi-
aventuras marítimas. Por outro lado, em entender que, como os romanos eram os – ocorreu com a criação da Companhia xar uma largura internacional para o mar
especial quando se trata da regulação da senhores dos mares, sendo o Mediterrâneo Inglesa das Índias Orientais. Nos fins do territorial. Contudo, esta conferência termi-
exploração e explotação (ou aproveitamen- o seu mare nostrum, não havia nenhuma século XVI, invocando o estado de Guerra nou sem que fosse possível delimitar uma
to)1 dos recursos marinhos – e da repartição outra potência que os afrontasse neste contra a Espanha e agora, em função da medida exata e universal. Também não foi
de benefícios – as regras continuam em espaço. Desde modo, o dominium maris união pessoal, também contra Portugal os possível determinar os poderes dos Estados
constante processo de normatização. servia muito mais para assegurar o poder Holandeses ingressaram agressivamente na costeiros para além do mar territorial, mas
Desde a antiguidade, com as primeiras so- romano de policiamento, no que hoje de- navegação marítima para a África, Brasil e consolidou-se a ideia de que uma Zona
ciedades navegadoras (como os fenícios, gre- nominamos de Alto Mar, e o direito exclu- oriente (GUEDES, Op. Cit., p. 23). A Com- Contígua era necessária (GIDEL, 1934). O
gos, persas, macedônios2) surgem algumas sivo de pesca junto à costa (SILVA, 2003). panhia solicitou então um estudo jurídico texto final da Conferência acabou por nem
regras embrionárias sobre a utilização e apro- Após a queda do Império (em 476 d. C.), ao jovem Hugo Grócio, que, em 1609, aos ser votado, não constituindo um tratado
priação dos espaços e recursos marinhos. Po- as diversas unidades políticas que surgiram 26 anos, publicou a obra Mare Liberum internacional. Apesar disto, a Conferência
de-se citar aqui o Código de Hamurabi3, da em seu lugar rapidamente imputaram-se di- (BUTLER, 1826). Em sua tese, Grócio defen- representou o primeiro grande esforço de
Babilônia (Séc. XXIII a.C.) e o de Manu, dos reitos próprios relativos às águas mediterrâ- dia que o mar é coisa comum, insuscetível sistematização de normas consuetudinárias
Hindus4 (Séc. XIII a.C.). Todavia, a antiguidade nicas (GUEDES, 1998). Isto fica evidenciado de apropriação, e que a sua utilização deve internacionais, bem como colaborou de
é marcada pela possibilidade da apropriação posteriormente quando, no século XIII, Ve- ser livre, principalmente para a navegação. forma expressiva para o desenvolvimento
dos mares. Na Grécia e em outros Estados neza5 (BAPTISTA, 1997, p. 71) passa a deno- Para o autor, o direito natural da comuni- de regulação posterior.
marítimos era admitida a apropriação dos re- minar como mar fechado sob seu exclusivo cação é uma exigência da sociabilidade hu- Nos anos seguintes à conferência de
cursos e a propriedade não apenas sobre as poder o mar Adriático, bem como Gênova, mana; já o domínio estatal sobre uma faixa 1930, não houve grandes alterações na
águas próximas à costa, mas até bem longe que arrogou sua hegemonia sobre o mar da do mar é possível, desde que no mar ad- regulamentação da utilização dos espaços
delas, sendo o único limite para tal a possibi- Ligúria (GIDEL, 1934, p.129). Este domínio jacente (designadamente o alcance de um marítimos e de seus recursos. No entan-
lidade de se manter o controle militar do mar sobre as águas adjacentes às costas e seus tiro de canhão6), mas não é admissível que to, após o término da II Guerra Mundial,
(MELLO, 2001). Esta apropriação incluía, logi- recursos surge inicialmente com as cidades o mar alto fique sob jurisdição de algum a proclamação unilateral do presidente
camente, os recursos naturais destes espaços. italianas para justificar, no direito, as fun- país (GROTIUS, 1999). americano Harry Truman (em 28 de setem-
Já a regulação dos espaços marítimos e ções que na prática já tinham o hábito Não obstante as contestações estatais e bro de 1945) vem iniciar uma transforma-
dos recursos marinhos no período romano de exercer, em especial no que concerne doutrinárias, a tese do Mare Liberum saiu- ção na relação dos Estados com os espaços
foi inicialmente marcada pela ideia de que à exploração dos recursos nestas zonas -se vencedora7. Todavia, em suma, pode-se marítimos e a exploração dos recursos na-
o mar era uma res communis omnium, ou (ZANELLA, 2017, p.47). afirmar que foi a partir da querela mare turais, vivos e não vivos (SLOUKA, 1968).

212 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 213


A proclamação aponta e origina duas sobre o Direito do Mar agendada para 1958 Perante os malogrados resultados da sessão da Assembleia Geral, a necessida-
áreas até então inexistentes: a Platafor- (O’CORNNELL, 1982, p. 22). I Conferência, ficou estabelecido que um de de regulação da exploração e explo-
ma Continental e a Zona de Pesca (atual- A I Conferência sobre o Direito do Mar novo encontro deveria ocorrer para solucio- ração dos fundos marinhos e oceânicos
mente denominada Zona Econômica Ex- ocorreu em Genebra em 1958 e teve como nar estes problemas, o que veio a acontecer além dos limites da jurisdição nacional
clusiva). O argumento para a criação da resultado quatro convenções que versaram em 1960, com a II Conferência das Nações (PARDO, 1968). Como consequência, a
plataforma continental teve por base o sobre o Mar Territorial e a Zona Contígua; Unidas sobre Direito do Mar (DEAN, 1960). Assembleia Geral, através da Resolução
reconhecimento científico do fato da ter- o Alto Mar; a Plataforma Continental; e a Iniciados os trabalhos, percebeu-se que a po- 2.340, criou a Comissão dos Fundos Ma-
ra firme norte-americana não terminar na Convenção sobre a Pesca e a Conservação sição dos Estados continuava muito variada, rinhos, que, em 1973, apresentou um
fronteira marítima, mas se estender mar dos recursos biológicos do Alto Mar. pois o curto espaço de tempo entre as duas projeto de tratado internacional para a
adentro num prolongar natural da costa. Em relação a Convenção sobre a Pesca conferências não foi suficiente para que se al- regulação do uso dos mares.
Assim, os EUA afirmavam que o solo e e a Conservação dos recursos biológicos do terasse expressivamente o quadro da primei- Após 11 sessões e inúmeros debates
subsolo da costa americana faziam parte Alto Mar10, o texto representou um marco ra conferência (GUEDES, Op. Cit., p. 48-49). e emendas, em 10 de dezembro de 1982
do prolongamento terrestre do país e, por pela tentativa de universalizar as normas Por este motivo, a II Conferência das Nações na cidade de Montego Bay na Jamaica,
conseguinte, tinham direitos de jurisdição internacionais referentes à gestão racional Unidas sobre Direito do Mar não conseguiu foi finalmente assinada a Convenção das
sobre estes8. Quanto às zonas de pesca, dos recursos naturais marinhos (BASTOS, produzir nenhum documento vinculativo de Nações Unidas sobre o Direito do Mar
Truman alegava que Estado costeiro deve- 2005, p. 173)11. Esta Convenção estabe- regulação dos mares. (CNUDM), com 130 votos a favor, 4 votos
ria possuir alguma jurisdição relativa aos lece princípios gerais de regulação e pre- Apesar das Convenções de Genebra contrários e 17 abstenções13. Apesar de
recursos naturais do Alto Mar adjacente servação da pesca e demais recursos na- terem sido de fundamental importância à quase uma década de discussões, algumas
para fins de exploração e controle destes, turais, além de tornar possível ao Estado época, nos anos seguintes começou a ser discórdias na regulação da exploração dos
em especial da pesca9. costeiros adotar medidas unilaterais a fim objeto de inúmeras críticas, principalmen- fundos marinhos, dos recursos não vivos
A importância desta declaração am- de conservar os recursos biológicos e pes- te em razão das suas falhas em delimitar do solo e subsolo para além dos espaços
para-se na não contestação pela socieda- cados no alto mar adjacente ao seu mar a largura do mar territorial e fixar regras sob jurisdição nacional, a chamada Área,
de internacional. Isto talvez em razão da territorial (Art. 7º). mais precisas à Plataforma Continental. O fez com que mesmo os países que assi-
hegemonia estadunidense à época e/ou Resumidamente, pode-se afirmar que a uso dos mares estava avançando de forma naram a Convenção demorassem em ra-
em função destas reivindicações não res- Conferência de Genebra sobre o Direito do acelerada e as convenções não conseguiam tificá-la ou não o fizessem. A sua entrada
tringirem nem prejudicarem as atividades Mar de 1958 teve o grande mérito de regu- disciplinar as novas realidades que surgiam em vigor só ocorreria após um ano da 60°
dos demais países (BUSTAMANTE, 1949). lar de modo universal as questões jurídicas (BASTOS, Op. Cit., p. 189)12 ratificação, o que ocorreu com o depósito
Os anos seguintes à proclamação Truman relacionadas ao mar. Os quatro textos ado- A questão da Plataforma Continental e da adesão Guiana em novembro de 1993,
foram de acentuada evolução da regula- tados podem ser considerados marcos do dos fundos marinhos tornou-se o mais novo junto a Assembleia Geral da ONU, ou seja,
mentação dos mares, sendo que diversos direito internacional, pois obtiveram êxito tema de debate no cenário internacional. A quase 11 anos depois da assinatura em
outros Estados começaram, a exemplo da expressivo e conseguiram unificar e escla- origem da III Conferência das Nações Unidas Montego Bay14.
referida proclamação, a declarar a existên- recer temas históricos. Não obstante todo sobre o Direito do Mar está relacionada, so- A importância da CNUDM para a re-
cia das suas plataformas continentais e das este progresso, não foi possível delimitar bretudo, à exploração dos fundos marinhos. gulamentação dos mares – e para todo o
zonas de pesca (GUEDES, Op. Cit., p.38). a extensão do mar territorial. Ademais, o Uma grande preocupação internacional sur- direito internacional – se revela não só no
Neste sentido, a Organização das Na- problema da pesca continuou por resolver, giu na década de 1960 a respeito deste espa- tamanho do texto produzido15, mas por ter
ções Unidas fez um grande esforço para uma vez que a convenção não foi capaz de ço, de sua delimitação e natureza jurídica. Em conseguido alcançar seus principais e am-
unificar e universalizar os diversos atos definir com precisão os limites e poderes 1966, o Presidente norte americano Lyndon biciosos objetivos: transformar uma vasta
unilaterais estatais e, a partir de 1949, a estatais sobre o tema. Não foi normatizada Johnson chegou a afirmar que “as águas pro- gama de tópicos a serem deliberados – por
Assembleia Geral passou a incluir em suas uma zona de pesca (ou como se denomina fundas e os fundos oceânicos são, e continu- não menos extensa quantidade de Esta-
pautas questões sobre a regulação dos ma- atualmente, uma Zona Econômica Exclusi- arão a ser, o legado de todos os seres huma- dos participantes – em um único texto de
res. Aprovou-se então, em 1956, um texto va). Ainda, a imprecisão na delimitação da nos” (BERNAERTS, 2006). vinculação internacional, além de fazê-lo
da Comissão de Direito Internacional CDI Plataforma Continental constitui mais uma Em 1967, o embaixador de Malta nas de forma consensual, através de acordos
da ONU convocando uma Conferência falha da Conferência. Nações Unidas, Arvid Pardo, durante a XXII negociados e igualitários, abrangendo os

214 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 215


diversos interesses em jogo16. Por estes mo- de dos Estados. Em segundo pela complexi- desenvolvido de modo eficaz e atualmente para além das 200 milhas e o Estado costei-
tivos a CNUDM acabou por ser apelidada dade e abrangência do seu texto normativo, a organização está concentrando seus es- ro passa a ter direitos de exploração e ex-
de “Constituição dos Oceanos”17. No nos- que conseguiu solucionar problemas históri- forços em manter a legislação atualizada e plotação dos recursos naturais vivos e não
so entender uma justa comparação e ana- cos e delimitar de forma precisa os espaços garantir que ratificações pelo maior número vivos desta zona marítima.
logia, com todas as suas limitações que o marinhos e os direitos e deveres dos países possível de Estados. Isso tem também sido Para além da Plataforma Continental
próprio direito internacional possui (SCO- na sua utilização. Ainda, e não menos im- alcançado de modo bastante satisfatório, situam-se os fundos marinhos além da
VAZZI, 2000)18. portante pelo seu caráter superior às demais tendo diversos textos que se aplicam a jurisdição nacional, a denominada Área.
Assim, a CNUDM representou assim uma normas esparsas, a convenção se sobrepõe mais de 98% da tonelagem mundial de Esta zona é conceituada na CNUDM sim-
extraordinária evolução no direito interna- às demais regras de Direito do Mar existen- navios mercantes. Atualmente, a ênfase plesmente como: “Área significa o leito do
cional do mar e da navegação. Em primeiro tes e cria um ambiente de segurança jurídica da IMO está em tentar garantir que essas mar, os fundos marinhos, e o seu subso-
lugar por seu caráter universal, abrangendo internacional, pois todos conhecem o direito convenções e outros tratados sejam im- lo além dos limites da jurisdição nacional”
todos os mares e oceanos, além da totalida- a ser aplicado (BASTOS, Op. Cit.). plementados adequadamente pelos Esta- (CNUDM, Art. 1º, 1).
dos membros. A CNUDM não traz de forma expressa
3. A aplicação das regras no mar e as querelas nas suas interpretações: Por outro lado, quando se trata de fun- quais seriam as finalidades da Autoridade
as instituições e o sistema de solução de controvérsias no mar dos marinhos, existem duas instituições que internacional dos Fundos Marinhos,
regulamentam sua utilização e exploração: contudo, é possível auferi-las do texto. Na
Não obstante a positivação das normas VIII, que trata da criação e manutenção de a Comissão de Limites da Plataforma Con- realidade, há duas finalidades e propósitos
relativas ao uso dos espaços marítimos e listas de especialistas para a arbitragem in- tinental (CLPC) e a Autoridade Internacional da Autoridade: representar a Humanidade
dos recursos marinhos, por diversas ocasi- ternacional, cabendo à IMO fazê-lo no to- dos Fundos Marinhos (ISA). – a qual pertence todos os recursos da Área
ões existem divergências de interpretação e cante à “navegação, incluindo a poluição A Comissão de Limites da Plataforma – e organizar, administrar e controlar as ati-
aplicação dessas regras pelos Estados, que, proveniente de embarcações e por alija- Continental tem como função analisar os vidades nesta zona marítima.
em muitas ocasiões, acabam por utilizarem mento” (CNUDM, Anexo VIII, Art. 1º). Po- pleitos dos Estados costeiros sobre a exis- A Autoridade desempenha, em pri-
o sistema de solução de controvérsias no rém, existe no texto da CNUDM uma série tência ou não de uma plataforma conti- meiro lugar, uma dupla função repre-
mar criados pela CNUDM. Além disso, ou- importante de normas em que há referên- nental estendida. Os Estados que acreditam sentativa, nunca antes configurada por
tras instituições especializadas possuem a cia indireta, mas inequívoca, à IMO. Isto se que as suas plataformas continentais se es- qualquer outra organização no seio das
incumbência de atuar na utilização dos ma- dá, primordialmente, por meio da expres- tendem para além das 200 milhas maríti- Nações Unidas. Por um lado, é o fim
res e na exploração de seus recursos. são “organização internacional competen- mas, devem realizar um estudo topográfico onde os Estados partes da CNUDM ex-
Quando se trata de navegação maríti- te” (CNUDM, Anexo VIII, Art. 1º)20. Como e submeter um pedido de extensão do regi- pressam as suas opiniões, negociam e
ma, a principal instituição é a Organização a instituição em análise é uma Organiza- me jurídico da plataforma continental para tomam decisões, com vista a organi-
Marítima Internacional (IMO), que tem ção Internacional e têm mandato universal além destas 200 milhas. zarem e controlarem as atividades na
como responsabilidade cuidar das medi- para tratar dos temas da segurança e po- Esta delimitação para além das 200 mi- Área. Por outro lado, é mais do que um
das de segurança na navegação interna- luição marítima, é evidente que se trata da lhas funciona, na prática, da seguinte for- simples meio de expressão coletiva dos
cional e das questões ambientais no meio Organização Marítima Internacional (VEN- ma: o Estado costeiro faz um estudo para seus membros. É também a organização
marinho, tendo como slogan: “Safe, secu- TURA, 2005). Ainda, a CNUDM fala em re- delimitar o que entende ser a sua Platafor- que representa toda a Humanidade22.
re and efficient shipping on clean oceans” gras, padrões, regulamentos, procedimen- ma Continental, utilizando as regras esta- A administração da Área e de seus recur-
(Navegação segura, a salvo e eficiente em tos e práticas “geralmente aceitas”, o que, belecidas pelas CNUDM e acima analisadas. sos é a segunda finalidade da Autoridade.
oceanos limpos)19. entende a doutrina se referir a normas e Feito isto, é apresentado à Comissão de Isto não significa que seja titular de um di-
A IMO desempenha um papel importan- parâmetros estabelecidos pela IMO21. limites da Plataforma Continental, com- reito de propriedade, mas apenas pode gerir
te na efetivação da Convenção das Nações Quando a IMO iniciou suas operações, posta por 21 membros, que analisará os a exploração nesta zona. Para tanto, deve
Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) sua principal preocupação era desenvolver dados científicos e votará o pedido do Es- a Autoridade controlar todas as atividades
de 1982 (BLANCO-BAZÁN, 2000). Existe tratados internacionais e outras legislações tado. Se a maioria qualificada de dois ter- realizadas na Área de acordo com a regu-
assim apenas uma única menção textual sobre segurança e prevenção da poluição ços entenderem pela procedência do pedi- lamentação imposta pela Convenção de
à IMO na CNUDM: no Artigo 2° do Anexo marinha. Em geral, esse trabalho tem sido do, fica aprovada a Plataforma Continenta 1982, bem como o Acordo de 199423.

216 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 217


Por fim, outras instituições fundamen- mesmo entendendo que a multiplicidade 4. Perspectivas de uma mudança de paradigma: o mar cada vez mais
tais na regulação dos mares são os órgãos de mecanismos não é o modelo mais ideal como fonte de recursos, além de meio de comunicação
de solução de controvérsias no mar, como e perfeito de solução de controvérsias so-
o Tribunal Internacional do Direito do Mar bre o direito do mar, foi o modo com que Na realidade, como dito na evolução Ela não regulamentou e nem criou Orga-
(ITLOS). Não se trata propriamente de or- os Estados, durante a III Conferência, con- do uso e regulação do mar, quando se re- nismo Internacional que passasse a ser pe-
ganismos regulatórios, mas de cortes in- seguiram a adesão e aceitação dos países toma aos seus primórdios; antes mesmo rene regulador do mar e nem organizou
ternacionais com poderes para resolução sobre a questão. Em outras palavras, foi de ser importante meio de comunicação espacialmente a imensa massa líquida do
de controvérsias em relação às regras de melhor a criação de um sistema que, mes- entre povos, sua primeira utilização era Alto Mar – ou seja, além das águas que
direito do mar. Na verdade, o ITLOS não é mo não sendo o ideal, avançou sobrema- como fonte de recursos de subsistência a própria CNUDM atribuiu algum direito
o único meio de solução de litígios no mar. neira para a solução pacífica das contendas com a pesca. Portanto, todo o esforço (ou, secundariamente, poder) aos Estados
A Convenção de 1982 traz então um rol sobre o direito do mar, do que a falta de regulatório, tão demorado e tardio da costeiros. Por isso, pode-se afirmar que
de opções de procedimentos às partes que, um sistema próprio. Até porque, o objetivo relação entre o ser humano e o mar foi, esse processo ainda possui perspectivas
em conformidade com sua liberdade de genérico da Parte XV – a solução pacífica aos poucos, consolidando-se na tentativa de novas regulamentações. E há iniciativas
escolha, podem utilizar: a) a Conciliação, das controvérsias – tem sido razoavelmen- de regular o uso pacífico do mar. Muito já nesse sentido, por exemplo com o novo
normatizada no Anexo V, artigo 284 e 298, te bem atingido (BASTOS, Op. Cit., p.217; se alcançou, mas duas premissas parecem chamamento internacional da ONU à uma
nº 1, alínea a) da CNUDM (que compõem KARAMAN, 2012, p. 319). terem sido superadas. nova Conferência (em andamento desde
o núcleo de soluções de caráter não vincu- De qualquer modo, pode-se afirmar que o A primeira, em relação ao ‘uso pací- 2017) para regulamentar a Biodiversida-
lativas); b) o Tribunal Internacional do Direito sistema de solução de controvérsias no direito fico do mar’. A CNUDM, construída sob de Marinha além das águas jurisdicionais
do Mar (TIDM), regulamentado pelo Anexo do mar opera da seguinte maneira: um ambiente geopolítico bipolar (a Guer- (BBNJ Convention, em construção).
VI; c) um Tribunal Arbitral ad hoc a ser cons- a) cabe às partes resolverem suas próprias ra Fria EUA -URSS) evitou imiscuir-se em Em verdade, é impreciso afirmar que
tituído nos moldes do Anexo VII (MAROTTA controvérsias pacificamente; temáticas pouco consensuais como o uso o mar como meio de comunicação entre
RANGEL, 2002, p. 647)24; d) um Tribunal Ar- b) podem as partes solicitarem a inter- não-pacífico dos mares (ou seja, os casos povos tenha perdido importância. Ainda
bitral especial às matérias de pesca, proteção venção de um terceiro para efetuarem de conflitos armados clássicos) por ser é por ele que cerca de 90% do fluxo de
e prevenção do meio marinho, investigação uma conciliação e chegarem a um acor- tema diretamente afeto às soberanias es- mercadorias mundial é feito (ICS, 2022).
científica e navegação, constituído à luz do do comum; tatais e que gerariam impasses na bipola- A globalização apenas aumentou esse
Anexo VIII; e) e, ainda, existe sempre a pos- c) se a solução não for encontrada, aplica-se, ridade político-ideológica. A nova ordem fluxo. Tanto que importantes obras de
sibilidade de acesso à Corte Internacional de supletivamente, a seção 2, na qual os Estados mundial é evolutiva e pouco houve avanço ampliação foram feitas nas passagens de
Justiça, conforme artigo 287, nº1, alínea b). escolhem qual mecanismo utilizarão; em relação às regulações do uso do mar Suez e do Panamá para permitirem flu-
Cria-se assim múltiplos mecanismos d) se não for possível um consenso sobre em situações conflituosas, restando, ainda xo de navios ainda maiores. Isso poderia
para a escolha das partes envolvidas nas qual procedimento adotar, cria-se um tribu- que muito defasadas no tempo, as maio- ratificar a máxima da estratégia de Cor-
controvérsias. Esta multiplicidade de câma- nal arbitral para dirimir o litígio, com decisão res contribuições advindas das chamadas bett de que quem controla as ‘linhas de
ras e procedimentos gerou – e ainda gera vinculativa; e) apenas utiliza-se os demais Convenções de Paz da Haia, da virada do comunicação” detém o controle do mar
– bastante discussão na doutrina interna- procedimentos – como o ITLOS – por vonta- século XIX e início do século XX. A segun- (CORBETT, 1918). Entretanto, a tecnologia
cionalista. Por um lado, há aqueles que as de e escolha deliberada dos Estados envol- da questão, é que não se vislumbrou, à agregou novo sentido a esse conceito do
defendem (CHARNEY, 1996, p. 74), por vidos, porém, uma vez escolhido, as partes época da 3ª Conferência das Nações Uni- início do século XX de ‘linha de comuni-
outro os que criticam a grande quantidade devem sujeitar-se a sua decisão (COSTA E das sobre o Direito do Mar (1973 – 1982) cação”, primeiramente com cabos subma-
de opções (BROWN, 1997, p 41). Todavia, SILVA, 2004 e MENSAH, 1998). a alteração de perspectiva do interesse do rinos para rede telefônica e hoje, com a
mar alternada de apenas meio de comuni- imensa rede de cabos submarinos que é
cação, para relevante fonte intrínseca de responsável por mais de 99% das comuni-
recursos. E isso tem gerado uma corrida cações transoceânicas (AUGUSTO, 2019).
aos recursos, sejam eles energéticos, e Só esse grau de dependência do fluxo de
principalmente relacionados ao patrimô- informações em um mundo globalizado
nio genético e da biodiversidade marinha. já justificaria a afirmação. Muito embora

218 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 219


alguma regulação do uso de cabos sub- dos ‘direitos de soberania’ estatais, fica ple- e criadas. A primeira – Autoridade Inter- enquanto, gestora de recursos advindos
marinos tenha sido prevista na CNUDM, namente sob as decisões desses Estados nacional dos Fundos Marinhos (doravante dessa explotação, ainda não se firmou como
ela não tinha a relevância que adquiriu Costeiros. Como garantir que tais ativida- – Autoridade) (em inglês – International consolidada. Essa é uma nova empreitada
com o mundo completamente interco- des não poderão comprometer o direito Seabed Authority – ISA), foi, juridicamente que ainda viabilizará muitas etapas.
nectado de hoje e, por exemplo, mecanis- dos outros Estados ou mesmo da huma- algo realmente invoador, pois trata-se de A segunda questão é em relação à
mos de sua segurança (pelo viés de secu- nidade em caso de atividades pouco sus- uma Organização Internacional (portanto, imensa riqueza na massa líquida sobre-
rity) foram muito pouco regulamentados. tentáveis? Poucos são os instrumentos in- formada por Estados-membros – de forma jacente à Área. A CNUDM não agregou
A vulnerabilidade é grande e carente de ternacionais que subsidiem qualquer ação clássica) que adquiriu legalidade e legiti- nenhuma responsabilidade formal a ne-
maiores instrumentos de proteção, tanto exógena nessa perspectiva. midade de resolver sobre território (solo e nhuma Instituição criada, pouco regu-
em águas sob jurisdição estatal, quanto O mesmo pode ocorrer em relação aos subsolo marinho da Área) fora das jurisdi- lamentou em relação aos recursos vivos
mesmo em águas internacionais. recursos vivos. Algumas espécies podem ções de seus Estados componentes. Essa (especialmente peixes), tanto que abriu
Entretanto, a perspectiva de entendi- se tornar erradicadas ou, pior, no caso de construção normativa aproveitou conceito espaço para novas convenções específi-
mento do mar como fonte intrínseca de espécies migratórias, a ação unilateral do inovador (já previamente abordado nesse cas e acordos regionais (como já citado)
recursos também mudou radicalmente Estado, ainda que em áreas sob seu di- capítulo) do ‘patrimônio comum da huma- e menos ainda em relação à proprieda-
nas últimas décadas (BEIRÃO, 2018, p. 59- reito de exploração, pode implicar sérios nidade’. A ela cabe a análise e autorização de intelectual de patentes, ferramentas
63). O que outrora era quase que exclusi- riscos ao desequilíbrio ecossistêmico e de para exploração e explotação de recursos aplicáveis e biogenética. Essa lacuna re-
vamente fonte de proteína de pescados, desenvolvimento econômico sustentável (ver notai). Foram lentos os avanços tecno- gulatória em relação a essa massa, após
hoje é o novo eldorado de recursos reno- de outros Estados. Nesse sentido, houve lógicos para viabilizarem essas atividades, intensa relutância da Sociedade Interna-
váveis e não renováveis do Planeta. grande avanço na construção de novos ar- tornando-as economicamente viáveis, mas cional em viabilizar nova conferência in-
Essa perspectiva exploratória – e, por- ranjos regionais de controle sobre a pesca dois fatores fizeram com que se aceleras- ternacional, acabou por ser conseguida
tanto, que guarda plena relação com a e mesmo de convenções internacionais re- sem: a tecnologia e, subsidiariamente, o com o formal chamamento à Conferência
economia do mar – não era o foco quan- lacionadas às espécies migratórias (como Acordo relativo à implementação da Parte das Nações Unidas sobre a Biodiversidade
do da elaboração da CNUDM, ainda que o caso dos atunídeos). Foram criadas Or- XI da CNUDM, que tentou solucionar di- além das águas jurisdicionais (a chama-
um de seus princípios tenha sido o do ganizações Regionais de Pesca (OREP) em versos questionamentos quanto à criação da BBJN) que, desde 2017 vigora e ainda
“uso pacífico dos mares e oceanos, a uti- várias regiões oceânicas. Entretanto, por da segunda instituição: a ‘Empresa’. não chegou a termo final.
lização equitativa e eficiente dos recursos enquanto, essa não é uma realidade no Portanto, essa regulação ainda é um Isto posto, ainda há paradigmas explo-
(...)” (CNUDM, Preâmbulo). À época, não Atlântico Sul Ocidental, logo, também não processo em construção uma vez que, para ratórios que precisam ser construídos para
se vislumbrava a dimensão que recursos há essa articulação, amparada em acor- ser efetivada a explotação, há necessidade a consequente alavancagem da viabilida-
não vivos adquiriria (Óleo & Gás – Offsho- do internacional, que auxilie esse tipo de de convencionamento de regulamentos de econômica de utilização, cada dia mais
re, outros recursos gasosos, minerais es- ação coordenada entre os Estados sulame- específicos para cada tipo de substância cobrada em termos de sustentabilidade,
cassos em terras emersas, calcário, etc.) ricanos costeiros do Atlântico Sul. (nódulos polimetálicos, crostas cobaltífe- desses imensos recursos. E nesse diapa-
e mesmo os recursos vivos (que além do Por fim, trata-se agora da imensa par- ras, gases sulfeto-polimetálicos, dentre são, não apenas os Estados estão sendo
natural pescado, ganhou imensa riqueza cela oceânica além das jurisdições esta- outros possíveis e viáveis). Até o presen- atores relevantes, mas todos os demais
na biogenética marinha e muitas pesqui- tais. Tanto em relação à massa d’água, te, nenhum dos “exploitation mining co- atores internacionais que desejam influir
sas, especialmente na indústria de fárma- quanto em relação ao solo e subsolo. des” definitivos foi efetivado e a Empresa, nessa governança.
cos). E é exatamente nessa dimensão que Incialmente, aborda-se a regulação da
a CNUDM não se materializa como ins- eventual exploração do solo e subsolo des-
trumento suficiente. Ela apontou alguns sa região, chamada de “Área”. Essa imen-
mecanismos de solução, mas há imensas sa riqueza ecossistêmica e, até a CNUDM,
lacunas que, hoje, tenta-se construir no- pouco conhecida reserva de recursos
vos mecanismos de controle. foi um importante e inovador marco de
A explotação de recursos não vivos, em governança introduzido pela Conven-
áreas geográficas marítimas sob amparo ção. Duas instituições foram idealizadas

220 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 221


5. Novas perspectivas de uso do mar e carências regulatórias Zona Econômica Exclusiva (ZEE) pareceu Polo Norte (remetendo aos históricos mar-
ter findado a questão. Entretanto, várias cos territoriais). Ou seja, o “mar de todos”
Outros paradigmas fundantes dessa Ainda sob esse mesmo manto do respei- iniciativas unilaterais vêm demonstrando segue em movimento apontado pelo Pre-
evolução regulatória também têm sido, to incondicional às soberanias dos Estados, que esse apetite de ‘territorialização dos sidente Truman, dos EUA, em 1945, que
aos poucos, repensados. Ainda que haja houve patente expressão na Convenção das mares’ persiste (OXMAN, 2006). profetizava que, primeiro houve a colo-
a percepção do mar como livre e comum reservas e imunidades mantidas aos navios Esse movimento contínuo e ainda inin- nização do Novo Mundo, em seguida, os
a todos que dele queriam fazer uso, essa de Estado (entendidos majoritariamente terrupto não se manifesta apenas pelo povos desenvolvidos colonizaram a África,
não é a efetiva realidade. Em essência, as como Navios de Guerra, mas também ou- pedido de expansão de Plataformas Con- entretanto, o próximo movimento seria de
grandes potências navais advogam por tros navios que formalmente estejam sob tinentais que, mediante levantamento de “colonização” dos mares (ver nota ix). E
essa “liberdade de navegação”, enten- a tutela oficial do Estado – como alguns 2010, já somava mais 177 milhões de Km2 assim segue, em perspectiva.
dida na concepção mais ampla possível, exemplos, pode-se citar navios de Chefes (área aproximada de toda a América do O terceiro paradigma que se vê sob
dentre outros motivos, pelo fato disporem de Estado e de Governo) (ZANELLA, 2017). Norte (EUA, Canadá e México) somada) perspectiva de alteração, decorre dos
de meios marítimos (Forças Navais – mili- Essa precaução com Navios de Estado e (SCHOOLMEESTER, BAKER - UNEP/GRID- naturais avanços tecnológicos, alguns já
tares e Frota Mercante) capazes de ocupar respeito incondicional à Soberania dos Es- ARENDAL, 2011) que, somadas aos já presentes e outros em vias de serem mas-
os oceanos. Por outro lado, Estados com tados (apenas com raras exceções previs- consolidados MT e ZEE dos Estados, sificados, como a questão da segurança
meios em menor número e poder, têm a tas na Convenção, como os casos de trá- representavam cerca de 47% de toda cibernética de meios marítimos que pode
tendência de advogarem pela tentativa de fico de substâncias entorpecentes ou de a superfície marítima mundial. E esse impactar diversos aspectos securitários
delimitarem espaços – especialmente jun- escravos, por exemplo) acabou por pouco movimento continua. Em 2020, somava- no mar ou, principalmente, a perspectiva
to às suas costas – para terem direitos mi- contribuir na regulação do enfrentamento se à essa área mais 17 milhões de Km2 cresce de introdução de meios marítimos
nimamente exclusivistas. Esse dilema per- de ameaças à Segurança Marítima, espe- (correspondente ao território da Rússia) e (tanto mercantes quanto de guerra) autô-
siste. Em que pese a aludida regulamen- cialmente quanto às chamadas ameaças o percentual de áreas sob alguma forma nomos. Essa possibilidade, quando efeti-
tação por meio das Convenções da ONU clássicas (guerras navais entre Estados), de controle estatal já superava 53% da vada, irá confrontar-se com fundamentos
tenha, aparentemente, consolidado esses mas também em relação às chamadas área marítima (BEIRÃO, 2022). do direito do mar. O primeiro deles, em
poderes e direitos. “novas ameaças” como os casos de Pira- Entretanto, esse movimento expansio- relação aos meios mercantes, uma vez que
A rivalidade político-ideológica do perí- taria e Terrorismo Marítimos. Em relação nista não apenas se materializa com pedi- diversas atribuições e responsabilidades
odo, conferiu à Convenção (CNUDM) um às ameaças clássicas, as mais específicas dos de extensão de Plataformas Continen- – decorrentes do princípio do Estado de
sprit de la loi, manifesto desde seu pre- Convenções (e protocolos) vigentes reme- tais. Estados têm manifestado essa vonta- Bandeira – residem sob a tutela formal do
âmbulo, que é o respeito incondicional ao tem às iniciativas das chamadas Conferên- de de poder também fazendo uso de con- Comandante. Como resolver as diversas
princípio da “Soberania dos Povos” que se cias da Haia, da virada do século XIX ao ceitos não previstos na CNUDM e de regu- questões em que a CNUDM transfere essa
desdobrou em dois princípios fundantes século XX, que muito avançaram tanto no lamentações unilaterais como os conceitos decisão ao Comandante no caso de sua
da Convenção que é o respeito aos direitos jus ad bellum quanto no jus in bello. de “Mar Dominial” do Peru (que conside- ausência física no navio?
inerentes aos Estados – materializados em A segunda provável questão que ain- ra pleno domínio – que seria somente em A segunda perspectiva do avanço à au-
conceitos como os de soberania no Mar da está em construção é a sub-reptícia seu MT – até 200MN), o “Mar Presencial” tonomia no mar é mais afeto aos meios de
Territorial, os “direitos de soberania” em expansão de poder estatal sobre áreas do Chile (que considera seu pleno contro- guerra, também se confronta com a pró-
suas Zonas Contíguas, Zonas Econômicas marítimas. A longa discussão que le sobre recursos vivos em uma área que pria definição (CNUDM, Art. 29) de navio
Exclusivas e Plataformas Continentais –, e redundou na CNUDM, durante algum chega a se afastar 700MN da costa), ou de guerra. Há pressuposto de sinais visíveis
no princípio da “Soberania dos Estados de tempo, pareceu ter consolidado, em mesmo da China com sua estratégia dos de ser um “meio de guerra”, mas pres-
Bandeira” – que se desdobra na extensão definitivo, até onde os Estados costeiros “Nove Traços” que engloba como suas supõem comandante das Forças Armadas
de jurisdição dos Estados que atribuem poderiam arguir noções de poder (ainda águas de todo o Mar do Sul da China. Até nacionais e tripulação militar (SCHIMITT,
suas bandeiras aos meios marítimos, este- que não plenamente exercidos na sua mesmo ações simbólicas históricas têm GODDARD, 2016). Como considerar um
jam onde estiverem, quando, apenas por clássica formulação soberana). O amplo sido usadas, como o caso da Rússia ao fi- meio, visivelmente de guerra, autônomo e
excepcionalidades muito claras, seguem entendimento da soberania no Mar xar, usando submarino, sua Bandeira exa- que não se enquadra na conceituação do
sob a tutela de seus Estados de Bandeira. Territorial e dos ‘direitos de soberania’ na tamente no solo marinho submerso sob o direito do mar?

222 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 223


6. Considerações finais Referências

O presente trabalho, mais que uma podem ser extraídos desse ecossistema. AUGUSTO, Thaís. Cabos submarinos: como ces with the Law of the Sea Conven-
apresentação histórica da evolução da re- Concomitante a essa maciça visão do mar funciona a tecnologia que conecta pessoas tion. In the 23rd Annual Seminar of the
gulação do mar ao longo do tempo pro- como fonte de recursos vivos e não vivos, e continentes. In: CANALTECH. Disponí- Center for Ocean Law and Policy. Charlot-
curou refletir sobre a efetiva utilização do também cresceu a atenção global em re- vel em: https://canaltech.com.br7telecom/ tesville: University of Virginia, 2000.
mar e como o homem vem atuando para lação às questões ambientais e de susten- cabos-submarinos-como-funciona-a-tec- BUSTAMANTE, José Luis de Azcárraga.
tentar convencionar o uso do mar. Iniciou tabilidade que são temáticas crescentes e nolgia-que-conecta-pessoas-e-continen- Los Derechos sobre la Plataforma Subma-
mostrando quão demorado foi o início que se tornaram centrais na atual década tes-133033/ Acesso em: 26 fev. 2019. rina. In: Revista Española de Derecho
da formulação de Atos Internacionais que (2021-2030). BAPTISTA, Eduardo Correria. Ius cogens Internacional, vol. II, Madrid, 1949.
se tornassem o costume codificado. Para Entretanto, tentou apresentar como em Direito Internacional. Lisboa: Ed. BUTLER, Charles. The Life of Hugo Gro-
tanto, fez uma breve retrospectiva históri- essa apropriação do uso do mar ainda tem Lex, Lisboa; 1997. tius. Londres: Lincoln’s-Inn,1826.
ca que remonta mesmo ao período pré-e- desafios regulatórios no porvir. Dentre di- BASTOS, Fernando Loureiro. A interna- CHARNEY, Jonathan I. The implications
ra cristâ, mas que, efetivamente, tem sua versas outras possibilidades, optou-se por cionalização dos Recursos Naturais of expanding international dispute settle-
maior consolidação somente no século XX abordar algumas das temáticas que ainda Marinhos: contributo para a compreen- ment systems: the 1982 convention on
após o surgimento da ONU. demandam maior consolidação. A busca são do regime jurídico-internacional do the law of the sea. American Journal of
Ainda assim, mostrou que foram ne- crescente pela codificação de atividades aproveitamento conjunto de petróleo International Law, vol. 90, n. 1, p. 69-
cessárias três conferências para, em 1982 (desde a explotação de recursos não vivos e de gás natural nas plataformas conti- 75, jan. 1996.
ter a assinatura da Convenção das Nações da Área, por exemplo), a crescente atua- nentais, do potencial aproveitamento de CORBETT, Julian S. Some Principles of
Unidas sobre o Direito do Mar, que ain- ção estatal em delimitação cada vez maior recursos minerais na Área, da pesca no Maritime Strategy. Londres: Longmans,
da assim, somente tornou-se vigente em de espaços marítimos sob alguma forma Alto Mar e os efeitos da regulamentação 1918.
1994 quando alcançou o mínimo de esta- de subordinação ao poder estatal costei- convencional respectiva em relação a ter- COSTA E SILVA, Paula. A resolução de
dos parte exigido. Mostrou também que ro e, também, decorrente de evolução ceiros Estados. Lisboa: AAFDL, 2005. controvérsias na Convenção das Nações
em algumas temáticas específicas ou em tecnológica natural que introduzirá maior BEIRÃO, André Panno; PEREIRA, Antônio Unidas sobre o direito do mar. In. Estu-
regiões específicas já havia iniciativas re- capacidade de apropriação econômica da Celso Alves (orgs.) Reflexões sobre a dos em homenagem ao Prof. Doutor
gulatórias prévias. biotecnologia marinha e de sua decor- Convenção do Direito do Mar. Brasília: Armando Marques Guedes. Pp. 541-
Assim, mostra o quão recente esse pro- rente propriedade intelectual ou mesmo FUNAG, 2014. p. 21-66. 602, FDL, 2004.
cesso de formalização da regulação do uso da crescente possibilidade de navegação BEIRÃO, André P.; MARQUES, Miguel; DEAN, Arthur H. The second Conferen-
do mar é e, consequentemente, ainda é bas- autônoma. Essa navegação autônoma al- RUSCHEL, Rogério (org.). O Valor do ce on the Law of the Sea: the fight for
tante evolutivo e mesmo controverso. Pelo terará paradigmas trabalhistas, de capa- Mar: uma visão integrada dos recursos freedom of the seas. American Society
viés da solução de controvérsias mostrou citação, de segurança e, principalmente do oceano do Brasil. São Paulo: Essential of International Law, vol. 54, n°. 4,
que seu uso ainda demanda muita conso- poderá alterar a tradicional premissa cen- Idea, 2018. Washington, 1960.
lidação pacificada o que justificou a criação trada no Estado de Bandeira e da presença BEIRÃO, André Panno. The new territoria- FERREIRA, Ana Maria Pereira. O essencial
do Tribunal Internacional do Direito do Mar decisória de seu comandante. lization of the Seas. In: Power and the sobre Portugal e a origem da liberda-
(ITLOS) e como é crescente o número de ca- Assim, procurou-se demonstrar que Maritime Domain: A Global Dialogue. de dos mares. Lisboa, 1988
sos e temáticas apreciadas. não se pode considerar que o direito do Londres: Routledge, 2022 (no prelo). GIDEL, Gilbert. Le Droit International
Por fim, mostrou que o uso do mar mar e mesmo o direito marítimo são te- BERNAERTS, Arnd. Bernaerts’ Guide to Public de la Mer. Tomo I. Paris: Recueil
tem vivido uma forte mudança paradig- máticas quase estáticas e já plenamente the 1982 United Nations Convention Sirey, 1934.
mática recente que é de deixar de ser consolidadas. São recentes e ainda com on the Law of the Sea: Including the GUEDES, Armando M. Marques. Direito
primordialmente apreciado como meio grandes perspectivas de readequação às text of the 1982 UN Convention & Agree- do Mar. 2. ed. Coimbra: Coimbra Edioto-
de comunicação, para também ganhar necessidades decorrentes da crescente ment Concerning Part XI of 1994. Bloo- ra, 1998.
especial relevância sua apreciação en- visão do mar como ecossistema central à mington: Trafford Publishing, 2006. GROTIUS, Hugo. Le droit de la guerre
quanto fonte de recursos intrínsecos que existência humana. BLANCO-BAZÁN, Agustín. IMO interfa- et de la pax pradier. Trad. francesa de P.

224 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 225


Pradier-Podère. Paris: PUF,1999. RESOURCES OF SEABED AND FISHERIES Notas
INTERNATIONAL CHAMBER OF SHIPPING ON HIGH SEAS. 1945.
(ICS). Explaning Shipping. Disponível ROCHA, Rosa Maria Souza Martins. O reconheceram implicitamente o domínio de
1 Do inglês exploration (inclui atividades
em: https://www.ics-shipping.org/expla- mar territorial: largura e natureza jurí- Veneza ao convencionarem o direito de na-
como pesquisa e descoberta de recursos) e
ning/. Acesso em: 20 mar. 2022. dica. Porto: Universidade Portucalense, vegação para os seus navios. [...] As cidades
exploitation (que incluí efetivamente a reti-
MAROTTA RANGEL, Vicente. Jurisdição 1996. que protestaram são ignoradas e algumas das
rada de recursos do mar, o refinamento, a
internacional: considerações preambula- SCHIMITT, Michael N.; GODDARD, David S. que, como Bolonha e Ancona, decidem re-
produção). Em língua portuguesa não há
res. In: Estudos em Homenagem à pro- International Law and the military use correr às armas, são vencidas, impodo-se-lhes
uma diferenciação tão precisa dos termos. como condição de paz o reconhecimento
fessora doutora Isabel de Magalhães of unmanned maritime systems. In:
Contudo, se faz necessário diferenciá-los deste domínio e o dever de pagar o tributo.
Collaço. Vol. 2. Lisboa: Almedina, 2002. International Review of the Red Cross, v.
quando se estuda a regulação do uso dos 6 Até o século XVIII a ideia do tiro de canhão
p. 643-652 98, n.2, 2016, p. 567-592.
mares, por serem normatizadas de modo di- é largamente aceita na comunidade interna-
MATTOS, Adherbal Meira. Os novos limites SCHOOLMEESTER, T.; BAKER, E. Con-
ferente. Por exemplo, o artigo 153 da Con- cional, sendo utilizada como padrão para o
dos espaços marítimos nos trinta anos da tinental Shelf: the last Maritime Zone.
venção das Nações Unidas sobre o Direito domínio terrestre do mar adjacente à costa,
Convenção das Nações Unidas sobre o Di- Stocholm: UNEP/GRID-Arendal, 2011. Dis-
do Mar (CNUDM) de 1982, em sua versão como veremos mais adiante.
reito do Mar. p. 21-66. In: BEIRÃO, André ponível em: https://gridarendal-website-live.
original em inglês regula o “System of ex- 7 Pode-se citar aqui os textos de Serafim de
Panno; PEREIRA, Antônio Celso Alves (orgs.) s3.amazonaws.com/production/documen-
ploration and exploitation”. Já na tradução Freitas intitulada Do Justo Império Asiático
Reflexões sobre a Convenção do Direito ts/:s_document/102/original/Shelf_LastZo-
para português foi denominado “Sistema dos Portugueses tem como principal obje-
do Mar. Brasília: FUNAG, 2014. p. 21-66. ne_sept2010_march2011.pdf?1483646561. tivo rebater as ideias de Grócio. Ou então
de exploração e aproveitamento”. Da mes-
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto Acesso em: 10 mar. 2022. de John Selden que publicaria sua obra em
ma forma o Anexo III da Convenção. Assim,
Mar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. SCOVAZZI, Tullio. The evolution of in- 1635 sob título Mare Clausum, tornando-se
percebe-se que a opção na tradução nacio-
MENSAH, Thomas A. The Dispute Settle- ternational law of the sea: new issues, o porta voz inglês contra a tese da liberdade
nal para o termo “exploitation” na CNUDM
ment Regime of the 1982 United Nations new challenges. Collected Courses of the de navegação.
foi de “aproveitamento”. A doutrina parece
Convention on the Law of the Sea. In: Hague Academy of International Law, n° 8 PRESIDENT TRUMAN’S PROCLAMATIONS
utilizar mais o termo “explotação”. Pode-se
Max Planck Yearbook of United Na- 286, Martinus Nijhoff Publishers; 2000. ON U. S. POLICY CONCERNING NATURAL
citar aqui, por todos, o texto de MATTOS,
tions Law, Vol. 2, p. 307-323, 1998. SILVA, José Luís Moreira da. Direito do RESOURCES OF SEABED AND FISHERIES ON
Adherbal Meira. Os novos limites dos es- HIGH SEAS. 1945: “[...]the Government of
KARAMAN, Igor V. Dispute Resolution Mar. Lisboa: AAFDL, 2003.
paços marítimos nos trinta anos da Con- the United States regards the natural resour-
in the Law of the Sea., Netherlands: SLOUKA, Zdenek. International Custom
venção das Nações Unidas sobre o Direi- ces of the subsoil and seabed of the conti-
Martinus Nijhoff Publishers, 2012. p. 319. and the Continental Shelf: A Study
to do Mar. Brasília: FUNAG, 2014. p. 21-66; nental shelf beneath the high seas but con-
KOH, Tommy T.B. A Constitution for the in the Dynamics of Customary Rules in
50. De todo modo, há uma expressa dife- tiguous to the coasts of the United States as
Oceans. Remarks by Tommy T. B. Koh, of International Law, The Hague: Martinus
renciação no texto convencional e nas obras appertaining to the United States, subject to
Singapore. President of the Third United Nijhoff, 1968.
doutrinárias do que seria a exploração dos its jurisdiction and control.”
Conference on the Law of the Sea. 1982. TANAKA, Yoshifumi. The International
recursos (pesquisa) e o aproveitamento (ou 9 PRESIDENT TRUMAN’S PROCLAMATIONS
O’CORNNELL, Daniel Patrick. The Inter- Law of the Sea. 2. ed. Londres: Cambri-
explotação) destes recursos. ON U. S. POLICY CONCERNING NATURAL
national Law of the Sea. Vol I e II. Ox- dge, 2015.
2 Sobre o tema ver ROCHA, Rosa Maria Sou- RESOURCES OF SEABED AND FISHERIES ON
ford: Clarendon Press, 1982. VENTURA, Fabiana Abreu do Valle. A in- HIGH SEAS. 1945: “NOW, THEREFORE, I,
za Martins. O mar territorial: largura e natu-
OXMAN, Bernard H. The Territorial Temp- ter-relação entre a organização marí- reza jurídica. Universidade Portucalense, Por- HARRY S. TRUMAN, President of the United
tation: a Siren Song at Sea. In: Journal tima internacional (IMO) e a Conven- to:1996. P. 10. States of America, do hereby proclaim the
of International Law 830:2006, p. 716- ção das Nações Unidas sobre direito 3 Hammurabi’s Code of Laws (cerca 1780 B.C.) following policy of the United States of Ame-
742.PARDO, Arvid. Who will control the do mar de 10 de dezembro de 1982 4 The Laws of Manu (Manusmriti) (1500 B.C. rica with respect to coastal fisheries in certain
seabed? Council on Foreign Relations, (CNUDM). AAFDL, Lisboa, 2005. to 200 A.D.). areas of the high seas: In view of the pres-
Vol. 47, No. 1, Nova Yorque, 1968. ZANELLA, Tiago. Manual de Direito do 5 No entanto, quer o Imperador Otão IV, no sing need for conservation and protection
PRESIDENT TRUMAN’S PROCLAMATIONS Mar. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, tratado de agosto de 1209, quer Frederico of fishery resources, the Government of the
ON U. S. POLICY CONCERNING NATURAL 2017. II, no tratado de 20 de setembro de 1220, United States regards it as proper to establish

226 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 227


conservation zones in those areas of the high internacional já produzido, composto, além agreements/texts/koh_english.pdf. Acesso em frequently raised. This question will be analy-
seas contiguous to the coasts of the United do preâmbulo, por 320 artigos e 9 anexos. 10 de junho de 2022. zed here by way of the example provided by
States wherein fishing activities have been or Além disso, não se pode deixar de fazer re- 18 “The fact that the UNCLOS constitutes a the discussions on the meaning of general
in the future may be developed and maintai- ferência ao Acordo de 1994 (Acordo relativo major political and legal achievement can har- acceptance of IMO rules and standards held
ned on a substantial scale”. à implementação da Parte XI da Convenção dly be denied and is generally acknowledged.” at the working session of the Committee on
10 Convenção sobre a Pesca e a Conserva- das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 19 O Brasil tornou-se membro da IMO em coastal State jurisdiction relating to marine
ção dos Recursos Biológicos do Alto Mar. In 10 de dezembro de 1982) e ao Acordo de 1963 e, desde 1967, vem sendo reeleito para pollution at the sixty-seventh Conference of
Convenção de Genebra sobre Direito do Mar 1995 (Acordo Relativo à Aplicação das dis- o Conselho da Organização. Em dezembro de the International Law Association (1996)”.
de 1958. posições da Convenção das Nações Unidas 1998 a coordenação nacional dos assuntos 22 Neste sentido, ZANELLA, Tiago. Manu-
11 As Convenções de 1958, aprovadas no sobre Direito do Mar de 1982, respeitantes relativos à IMO, que estava al… Op. Cit. P. 379: “Desta maneira, pode-se
âmbito da I Conferência, constituem um mar- à Conservação e Gestão das Populações de sob responsabilidade do Ministério das Rela- concluir que o conceito trazido pela CNUDM
co fundamental na regulação dos recursos Peixes Transzonais e das Populações de Peixes ções Exteriores, foi transferida para a Marinha de Humanidade trata-se de uma ficção jurídi-
naturais marinhos. Por um lado, ao serem Altamente Migratórias). do Brasil. ca. Isto em razão da associação do conceito
os primeiros documentos de Direito Interna- 16 Como afirmou Ramiro Elísio Saraiva 20 Pode-se encontrar tais referências na de Humanidade a um caráter político e não
cional de natureza vinculativa, com âmbito Guerreiro, Ministro das Relações Exteriores CNUDM, nos seguintes artigos: Art. 22, n° 3, jurídico. Além do mais, a Humanidade não
de aplicação potencialmente universal, que do Brasil de 1979 a 1985, em texto apre- a; Art. 41, n° 4 e 5; Art. 53, n° 9; Art. 60, n° 3 possui personalidade jurídica e não é sujeito
abordam a questão de forma expressa. Por sentado ao Congresso Nacional em 1980 e 5; Art. 211, n° 1, 2, 3, 5 e 6; Art. 217, n° 1, de direito internacional. A solução encontra-
outro lado, ao terem na sua base a distinção, [Diário do Congresso Nacional. Ano XXXV, 4 e 7; Art. 218, n° 1; Art. 220, n° 7; Art. 222; da foi transferir à Autoridade os direitos para
a partir de então preponderante, entre recur- n°106, seção I, Brasília; 23 de setembro de Art. 223; Art. 246, n° 5; Art 253, n° 1, b e n° atuar em seu nome perante o sistema inter-
sos da coluna de água e recursos do leio e do 1980]: “O objetivo final da negociação é o 5; Art. 265; Art. 297, n° 1, c. nacional, ou seja, este organismo é o legítimo
subsolo dos oceanos. de se obter um regime para os mares que 21 BLANCO-BAZÁN, Agustín. IMO interface representante da Humanidade para as ques-
12 “O Direito do Mar é provavelmente, com seja equilibrado e possa ser universal ou, … Op. Cit.: “The need to consider IMO ru- tões dos fundos marinos”.
os Direitos Humanos, o domínio onde se têm pelo menos, geralmente aceito por todos, les and standards as intrinsically associated to 23 Acordo relativo à implementação da Parte
feito sentir algumas das mais importantes isto é, pelas principais potências marítimas the treaty in which they are contained is also XI da Convenção das Nações Unidas sobre o
modificações que caracterizaram o Direito e pela grande maioria dos demais Estados. relevant to provide a consistent legal inter- Direito do Mar de 10 de dezembro de 1982
Internacional contemporâneo. Desde 1945, Se não houver essa aceitação generalizada e pretation to the requirement of their “gene- 24 “Os tribunais arbitrais têm jurisdição tran-
o mar é palco de uma alteração radical das pacífica da eventual convenção, ela não terá ral acceptance”. It is precisely in connection sitória; tem caráter ad hoc; proferindo o julga-
concepções clássicas e do surgimento de no- real utilidade. A vantagem de tal convenção with this requirement that the question of the mento, cessam de existir; quando muito sub-
vos conceitos”. seria de se obter direitos aceitos geralmente, ambiguity of UNCLOS expressions has been siste órgão administrativo e lista de árbitros”.
13 Votos Contra: Estados Unidos da América, não mais discutidos, não mais controverti-
Israel, Turquia e Venezuela. dos, não mais resultantes de atos unilaterais
Abstenções: URSS, Bulgária, Bielo-Rússia, contestados pelas potências marítimas, mas
Tchecoslováquia, República Democrática Ale- direitos cujo exercício seria realizado de for-
mã, República Federal da Alemanha, Hun- ma pacífica e sem dificuldades externas. Esta
gria, Mongólia, Ucrânia, Polônia, Tailândia, é o objetivo final da negociação.”
Espanha, Bélgica, Itália, Luxemburgo, Países 17 Analogia utilizada por Tommy Koh, pre-
Baixos e Reino Unido. sidente da Terceira Conferência das Nações
14 Atualmente o texto tem 168 ratificações. A Unidas para o Direito do Mar (que deu ori-
grande maioria dos Estados da sociedade in- gem à CNUDM) no seu discurso ao final das
ternacional já ratificou o tema, com a ausência assinaturas da Convenção. KOH, Tommy
de alguns Estados interiores, da Turquia, da Ve- T.B. A Constitution for the Oceans. Remarks
nezuela e, sobretudo, dos Estados Unidos que by Tommy T. B. Koh, of Singapore. Presi-
apesar de não terem ratificado o texto, em geral dent of the Third United Conference on the
cumprem as regras estabelecidas na CNUDM. Law of the Sea. 1982. P. 1. Disponível em
15 Trata-se do maior tratado de direito http://www.un.org/depts/los/convention_

228 ECONOMIA AZUL A Regulação do Mar 229


12

A RELEVÂNCIA ESTRATÉGICA DO
PLANEJAMENTO ESPACIAL MARINHO PARA A
ECONOMIA AZUL

Alexandre Rocha Violante


Frederico Medeiros Vasconcelos de Albuquerque
Rodrigo de Campos Carvalho

Vou resgatar aqui a famosa conferência de Thomas Huxley, em 1883,


frente a real sociedade britânica, quando ele foi incumbido de entender
o porquê do declínio das pescarias nas águas britânicas. Naqueles anos a
tecnologia pesqueira era muito menos avançada do que a presente.
No entanto, ele estava convencido de que não havia por que ter
preocupação sobre a sustentabilidade dessa exploração. E disse assim –
‘não importa o que o homem faça ao mar, suas riquezas são inesgotáveis’.
Isso foi em 1883, uma expressão de uma autoridade como Huxley que,
diga-se de passagem, foi o grande mentor de Darwin. No entanto, este
equívoco de Huxley permaneceu presente durante várias décadas.
Ainda hoje existe certa convicção de que os recursos do mar são
inesgotáveis, que eles são tão numerosos e tão abrangentes que não
importa o que façamos com eles, eles estarão sempre presentes.

(Jorge Pablo Castelo, Professor Doutor da Universidade Federal do


Rio Grande, FURG – Mesa Redonda 3- VIII EBERI, outubro de 2021)

1. Introdução

Utilizar o mar para abertura de oportu- O mar pode trazer enormes oportunida-
nidades no futuro do país, bem como ame- des de desenvolvimento político, econômi-
nizar a escassez de recursos naturais, am- co e social que não podem ser negligencia-
pliar o bem-estar da população, melhorar das pelo governo. Segundo o estrategista
a qualidade de vida dos trabalhadores liga- naval e geopolítico Mahan, em seu clássico
dos diretamente ao mar, gerar empregos livro de 1890, “The Influence of Sea Power
são questões de tomada de decisão dos upon History (1660-1783)”, ao abordar os
decisores políticos que afetam o presente aspectos geopolíticos de sua teoria para o
e os anos vindouros. desenvolvimento de potências marítimas,

230 ECONOMIA AZUL AA Relevância


Relevância Estratégica
Estratégica do
do Planejamento
Planejamento Espacial 231
Espacial 231
afirmava que os governos deveriam canali- jurisdição marítima, chamadas de águas juris- 2. O que é Planejamento Espacial Marinho
zar seus esforços, em tempos de paz, para
o desenvolvimento econômico (principal-
dicionais brasileiras (AJB), que se bem utiliza-
das pelo homem, poderiam otimizar o uso O Planejamento Espacial Marinho (PEM) . Estratégico e antecipatório, com foco
mente da indústria naval), a aquisição de da nossa Economia Azul, já que os recursos é definido pela Comissão Oceanográfica
. Participativo, com partes interessadas
no longo prazo; e
“portos seguros”, como bases, entrepostos vivos e não vivos não são inesgotáveis. Intergovernamental (COI), estabelecida no
comerciais, e a construção de uma marinha Assim, este capítulo apresenta a relevân- âmbito da Organização das Nações Uni-
ativamente envolvidas no processo.
capaz para fazer frente a qualquer inimigo. cia da elaboração de um Planejamento Espa- das para a Educação, a Ciência e a Cultura
Ademais, também cita a importância de cial Marinho (PEM) nacional e as oportuni- (UNESCO), como: Para a condução, desenvolvimento, im-
possuir uma população ligada ao comér- dades para discussões em todas as áreas de plantação, monitoramento e avaliação do
cio no mar, pois buscaria ganhos materiais atuação do mar na áreas político-estratégica, [...] um processo público de análise e de PEM nos diversos países, a UNESCO elabo-
além do território nacional, impulsionando, social, econômica e ambiental. De forma alocação da distribuição espacial e tem- rou um manual (EHLER; DOUVERE, 2009),
por conseguinte, o poder marítimo e naval mais específica, esta pesquisa focou mais nos poral de atividades humanas em áreas sistematizando o processo em 10 passos:
de seu país. Esses dois dos mais importan- aspectos econômicos ligados à economia do marinhas, para alcançar objetivos ecoló-
1) Identificar os fins e estabelecer as auto-
tes elementos da oceanopolítica de Mahan mar, também chamada de Economia Azul. gicos, econômicos e sociais, que geral-
ridades responsáveis;
permanecem atuais. O caráter do governo Foram discutidos os tópicos: o que é mente foram especificados através de
e o caráter da população são fundamentais Planejamento Espacial Marinho; o PEM no um processo político (EHLER; DOUVERE, 2) Obter suporte financeiro;
para a implementação de políticas públicas, mundo; quais os custos e onde se preten- 2009, p. 18, tradução nossa).
3) Organizar o processo por meio do pré-
programas, projetos, planos e atividades que de alcançar com um PEM nacional; Projeto
-planejamento;
fomentem o mar como fonte de sustento, Piloto do PEM nacional; quais os benefícios É importante destacar que só podem
desenvolvimento e riqueza e poder das Na- do PEM, a busca por um Brasil desenvol- ser planejadas e gerenciadas atividades 4) Proporcionar a participação das partes
ções costeiras e de projeção oceânica, como vido com um PEM atualizado; quais Áreas humanas em áreas marinhas, não ecos- interessadas;
é o caso do Brasil (VIOLANTE, 2016). de conhecimento o PEM poderá motivar; e sistemas marinhos ou componentes de
5) Definir e analisar as condições existen-
Os oceanos ocupam aproximadamente perspectivas Econômicas Futuras. ecossistemas. Dada essa premissa, as ati-
tes (Plano de Situação);
71% da superfície da Terra e estão, intrinse- Por fim, constatou-se que a elaboração vidades humanas podem ser alocadas nas
camente, ligados à sustentabilidade da vida e implementação do PEM no Brasil poderá áreas marinhas por objetivo, por exemplo, 6) Definir e analisar as condições futuras;
no Planeta, oferecendo alternativas para contribuir para as gerações atuais e futuras áreas de preservação, ou por usos específi-
7) Preparar e aprovar o Plano de Gestão
grandes desafios globais, tais como: erradi- no almejado desenvolvimento sustentável e cos, por exemplo, parques eólicos, aquicul-
Espacial Marinho;
cação da fome; adaptação às alterações cli- racional baseado na proteção, conservação tura offshore ou extração de areia (EHLER;
máticas; diversificação das matrizes energé- e uso dos recursos naturais dos espaços ma- DOUVERE, 2009). 8) Implementar e fazer cumprir o Plano de
ticas; e aplicação de inovações tecnológicas rinhos, sendo o PEM importante ferramenta Dentre as características que devem ser Gestão Espacial Marinho;
provenientes da bioprospecção, com amplo política e de instrumentação metodológica observadas em um PEM considerado efi-
9) Monitorar e avaliar o desempenho; e
espectro de aplicação, desde energia limpa para o fomento da nossa Economia Azul.
. Baseado em ecossistemas, buscando-
caz, destacam-se:
ao desenvolvimento de fármacos, etc. Ademais, pode-se estabelecer um mo- 10) Adaptar o processo de gestão espacial
A maioria das cidades mais populosas delo cooperativo e integrativo de ações marinho.
-se o equilíbrio entre as metas e os objeti-
do mundo são costeiras. O Brasil possui com países transfronteiros, principalmente
vos ecológico, econômico e social em prol
mais de sete mil quilômetros de costa, com com Uruguai e França, na parte oceânica, Cabe ressaltar que esses 10 passos não

. Integrado, entre setores e agências, e


do desenvolvimento sustentável;
cerca de 80% da população brasileira mo- e na parte fluvial com Paraguai e Argenti- são simplesmente um processo linear que
rando até 200 quilômetros do litoral; 85% na, resguardas as particularidades de cada se move sequencialmente de uma etapa
do consumo de energia e 93% da produ- Estado nas questões afetas ao mar que lhes
. Espacialmente explícito;
entre os diferentes níveis de governo; para outra. Muitos ciclos de retroalimen-
ção industrial localizam-se, também, a 200 pertencem. O Brasil pode ser um líder po- tação (feedback) devem ser integrados ao
km do litoral; e 95% das exportações são
transportadas pelo modal marítimo. Além
lítico e econômico aos países lindeiros do
Atlântico Sul nesse processo, dada a di- . Adaptativo, capaz de aprender com a processo do PEM. Por exemplo, metas e
objetivos identificados no início do Plane-
disso, o Brasil detém 5,7 milhões de km2 de mensão transfronteiriça do PEM. experiência; jamento provavelmente serão modificados

232 ECONOMIA AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 233


conforme custos e benefícios de diferen- espaços, assumem papel fundamental no caso, sem a devida consideração dos seus Além disso, em circunstâncias como
tes medidas de gestão forem verificados nosso mundo contemporâneo. impactos para as demais atividades huma- esta, os governantes e tomadores de de-
posteriormente. As análises das condições E nos espaços marinhos não poderia nas ou para o meio ambiente marinho. cisão são capazes, muitas vezes, apenas
existentes e futuras mudarão à medida ser diferente. Novos processos vitais são Consequentemente, esta situação tem de reagir aos eventos quando já é tarde
que novas informações forem identifica- buscados, mas esbarram no uso de técni- levado a dois tipos principais de conflitos: demais, ao invés de terem a opção de
das e incorporadas ao PEM. A participação
das partes interessadas mudará à medida
cas, estas mais sensíveis e disponíveis às
potências centrais e a algumas empresas . Conflitos entre usos humanos (conflitos planejar e de moldar ações que poderiam
levar a um futuro mais desejável para o
que o processo se desenvolver ao longo
do tempo. Diante disso, o PEM é um pro-
transnacionais. Um desenvolvimento sus-
tentável passa pelo investimento e apri- . Conflitos entre usos humanos e o meio
usuário-usuário); e ambiente marinho.
Nesse contexto, o PEM surge como
cesso dinâmico e os planejadores devem moramento tecnológico, de modo a inte- ambiente marinho (conflitos usuário-am- um processo público de gestão orienta-
estar abertos e atentos para acomodar as grar essas relações “Terra-Mar-Ar” tanto biente). do para o futuro, proativo, que permite
mudanças que surgirão. em processos naturais, quanto em ativi- Esses conflitos enfraquecem a capaci- mitigar os dois tipos de conflitos elen-
Convém lembrar, no entanto, que o dades socioeconômicas, racionalizando dade dos oceanos de fornecer os serviços cados anteriormente, além de permitir a
PEM vai além de um processo político, suas ocupações e usos, reduzindo, assim, ecossistêmicos necessários aos seres hu- seleção prévia de estratégias de gestão
uma ferramenta, ou metodologia. Ele é impactos e ameaças a esse ecossistema. manos e aos demais seres vivos que habi- adequadas para manter e salvaguardar
tudo isso, a depender da utilização que Nas últimas décadas, têm-se observa- tam o planeta. os necessários serviços ecossistêmicos.
se lhe pretende dar, de seu emprego e de do uma migração cada vez mais inten-
sua motivação política-estratégica, econô- sa de relevantes atividades econômicas
mica, social e ambiental. (VIVERO, 2021). majoritariamente desenvolvidas em terra
A imensidão desses espaços transpare- para as três dimensões do mar Tal afir-
ce pelas diversas características naturais, mativa pode ser corroborada pelo avan-
econômicas, estratégicas e geopolíticas ço da exploração offshore de petróleo e
que envolvem a extensa costa brasileira. gás, pela geração de energias renováveis
Esses espaços envolvem um ecossistema (substituição de hidrelétricas por disposi-
múltiplo e complexo: o oceano, o Atlân- tivos de geração de energia a partir de
tico Sul (VIVERO et al., 2020). correntes marinhas e de ondas; ou de
“Estudar e conhecer o mar ainda campos de eólicas onshore por campos
é como abrir uma caixa de Pandora” de eólicas offshore), pela aquicultura
(MAURY 2007 apud CASTELO, 2022). (cultivos onshore para cultivos offshore)
Há que se atentar para as interfaces que e pela própria agricultura passando-se à
envolvem a superfície do mar - que se es- algacultura, com o rápido avanço do cul-
tende de maneira quase uniforme ao lon- tivo de algas marinhas de alto valor eco-
go de cerca de 7.367 km de costa - com nômico e nutricional.
a coluna atmosférica e com a coluna de Em face do exposto, a maioria dos paí-
água, com o fundo, esta mais complexa, ses já designou ou zoneou seus respectivos
mas não menos importante. espaços marinhos para uma série de ativi-
A capacidade de desenvolvimento des- dades humanas, tais como: transporte ma-
sas três dimensões do mar: a superfície, a rítimo, exploração de óleo e gás, energia
submersa e a que envolve o espaço acima renovável offshore, aquicultura offshore,
do mar, é movida pela tecnologia. Como mineração e depósito de lixo. Entretanto,
percebe Milton Santos (1994), a ciência, na maior parte dos casos, esse zonea-
tecnologia e a informação, presentes na mento dos espaços marinhos foi feito de
base de utilização e funcionamento dos forma isolada, de setor por setor, caso a

234 ECONOMIA AZUL A


A Relevância
Relevância Estratégica
Estratégica do
do Planejamento
Planejamento Espacial 235
Espacial 235
3. O PEM no mundo valor de implantação do PEM localmente, Cada PEM é um “mundo distinto”
como se percebe na tabela 1. Dessa forma, que responde a algumas necessidades e
Internacionalmente, o PEM é conside- PEM em suas águas (cobrindo 47% das ZEE aumentam-se as chances de captação de exigências determinadas, o que pode se
rado o grande “motor propulsor” da Eco- mundiais), onde os respectivos planejamen- recursos de financiamento (governamen- refletir nos planos pilotos dessas regiões
nomia Azul de um país, na medida em que tos estão em um estágio inicial. Em muitos tais e não governamentais) de menor vulto marinhas do Brasil. Além disso, essa ini-
provê, simultaneamente, a redução de in- casos, esses processos são iniciados como quando comparados ao montante total de ciativa mostra-se adequada para que se
certezas jurídicas, indispensável aos investi- a evolução natural de seus Planos de Ges- recursos necessários para a elaboração de inicie o PEM, o que demonstra maior com-
dores; a geração de empregos e de divisas tão Costeira ou apoiados no âmbito de suas um PEM completo, além de permitir a exe- prometimento político perante compro-
para o Estado costeiro, mediante o estímulo Políticas Marítimas Nacionais ou de outras cução de um Projeto Piloto em uma das missos assumidos externamente em fó-
de atividades sustentáveis no mar; contribui políticas nacionais ou regionais baseadas referidas regiões marinhas. runs internacionais, como os da UNESCO,
para o alcance dos ODS 14 (Vida marinha) em estratégias sustentáveis de Economia
da Agenda 2030 da ONU; salvaguarda os Azul. Na maioria dos casos, o envolvimento Figura 1. A Amazônia Azul e as 4 regiões marinhas do projeto PEM no Brasil:
necessários serviços ecossistêmicos, além governamental é iniciado por meio de pro- Norte, Nordeste, Sudeste e Sul
de contribuir para a mitigação de conflitos jetos-piloto a nível local ou através de pro-
entre os diversos setores ligados ao mar no jetos intergovernamentais transfronteiriços
ambiente marinho (BRASIL, 2019). com países vizinhos a nível regional.
Originalmente, o PEM começou como No entanto, VIVERO (2021) alerta que
uma abordagem de gestão para a conser- há uma percepção um tanto desviada em

0O
vação da natureza em um Parque Marinho relação à natureza real em termos práticos
da Grande Barreira de Corais, localizado do desenvolvimento do PEM. Os planeja-

10OS
no nordeste da Austrália, há mais de 40 mentos ligados ao mar estão servindo como
anos. No início da década de 2020, 20 instrumentos de reafirmação do papel do
países possuem seus Planos de Gestão estado no controle dos seus direitos e inte-
Espacial Marinho aprovados e em imple- resses no espaço marinho, porém de forma
mentação para suas águas jurisdicionais individualizada em setores, sem a coope-
(cobrindo 22% das ZEE mundiais). Outros ração e integração necessárias. Isso estaria
26 países estão em processo de aprovação permitindo maior fragmentação nacional e

20OS
dos seus Planos para as águas sob suas declínio de ações supranacionais
jurisdições (cobrindo 25% das ZEE mun-
diais). Este segundo grupo inclui países da 3.1 Quais os custos e onde se preten-
União Europeia que se comprometeram a de alcançar com um PEM nacional?
elaborar seus Planos de Gestão Espacial
Marinho até 2021; da África, tais como Detentor de um litoral com cerca de

30OS
Quênia, I. Maurício, Moçambique e Namí- 7.367 km de extensão e de uma área ma-
bia; da América, com excelente progresso rítima com cerca de 5,7 milhões de km2, o
no México, Peru e Uruguai; o mesmo na Brasil possui dimensões continentais. Isso
Coréia do Sul, Irã e Japão na região asiá- eleva os custos envolvidos em um Proje-
tica e na Oceania, com muitos exemplos to de implantação único e simultâneo do 60OW 50OW 40OW 30OW
em pequenos Estados insulares em de- PEM para toda a Amazônia Azul . Diante Regiões do Projeto PEM Zona Econômica Exclusiva (ZEE)
senvolvimento, como Kiribati, Palau e nas disso, a Amazônia Azul foi dividida em Nordeste Divisão Política
Ilhas Salomão (UNESCO-IOC, 2021b). Norte
quatro áreas geográficas, como ilustrado
Sudeste
Cabe ressaltar que mais 82 países tam- na figura 1: Norte, Nordeste, Sudeste e Sul Fonte: SECIRM – Elaboração dos autores
bém se comprometeram a desenvolver o Sul. O intuito dessa divisão foi discretizar o

236 ECONOMIA AZUL A


A Relevância
Relevância Estratégica
Estratégica do
do Planejamento
Planejamento Espacial 237
Espacial 237
Tabela 1. Custo estimado de implantação do PEM por regiões e Fase 1 - onde será realizado o “Mape- Fase 2 – onde será desenvolvido um
nacionalmente. Valores referentes ao ano de 2021. amento de Usos e Atividades Humanas” Geoportal de Apoio à Decisão, elabora-
em curso e as previstas para os próximos das matrizes de conflitos e de sinergias
ÁREA MARINHA CUSTO ESTIMADO (R$) 10 anos na região marinha Sul, com a pu- de usos, mapas de pressões e de serviços
blicação de 10 Cadernos Setoriais, a saber: ecossistêmicos; e
Região Norte 7 milhões Pesca Artesanal, Pesca Industrial, Aquicul- Fase 3 – onde será elaborado o Plano
Região Nordeste 10 milhões tura, Petróleo e Gás Natural, Energias Re- de Gestão Espacial Marinho e mapas de
nováveis, Mineração, Navegação e Portos, cenários futuros, a partir de oficinas de ne-
Região Sudeste 8 milhões
Defesa, Turismo e Meio Ambiente; gociação intersetoriais.
Região Sul 5 milhões
Toda Amazônia Azul 30 milhões Figura 2. Fases do projeto piloto do PEM
Fonte: SECIRM. Elaborado pelos autores. na região marinha do Sul do Brasil
mas, também, internamente, pelos benefí- bito da Comissão Interministerial para os Fase 1: Mapeamento de usos e Fase 2: Fase 3:
cios políticos, sociais, ambientais e econômi- Recursos do Mar (CIRM), por intermédio atividades humanas Geoportal de apoio à decisão Workshops intersetoriais
cos a serem angariados (VIOLANTE, 2021a) da sua própria Secretaria Executiva (SE-
Cabe destacar que o PEM constitui uma CIRM). Adicionalmente, de acordo com a 1. Mapa de restrições legais 1. Validação do mapa de habitats 1. Workshops de negociação
das 11 Ações do X Plano Setorial para os Ata da Reunião do Grupo de Trabalho do 2. Mapa de usos atuais e (Workshop pesquisadores) intersetorial
Recursos do Mar (X PSRM), aprovado pelo PEM, realizada em 29 de abril de 2020, potenciais 2. Matriz de conflitos e sinergias 2. Mapas de cenários futuros
3. Workshops setoriais de valida- de usos 3. Plano de Gestão Espacial
Decreto nº 10.544, de 16 de novembro na SECIRM, o Comitê Executivo estabe-
ção dos mapas de usos 3. Mapa de pressões (densidade Marinho
de 2020, com vigência entre 2020 e 2023 leceu os requisitos e os passos para sua
4. Mapa de habitats pelágicos e de usos)
(BRASIL, 2020a). Além disso, a Ação PEM implantação no País, que deverá iniciar
bentônicos (draft) 4. Mapa de Serviços
é conduzida por um Comitê Executivo sob com um Projeto Piloto na região marinha 5. Disponibilização de camadas Ecossistêmicos
coordenação da Marinha do Brasil, no âm- do Sul do Brasil. na INDE 5. Formação de atores (Oficinas e
6. Documentação detalhada e Guias)
4. Projeto Piloto do PEM Nacional
scripts (atualização e replicação) 6. Geoportal de apoio à decisão e
projeção de cenários
A escolha da região marinha Sul foi mo- para a região Norte do Brasil, devido à

.
tivada, basicamente, pelos seguintes fatores:
Representatividade, sua área marinha
fronteira com a Guiana Francesa (Estado
departamental francês). Nessa ocasião, se-
Fonte: SECIRM. Elaboração dos autores

correspondente a 13% de toda a área da rão necessárias tratativas do Estado brasi- Uma vez implantado o Projeto Piloto, Desenvolvimento Sustentável 14 (Report

.
Amazônia Azul;
Relevância, concentra variados ecossis- .
leiro com a França; e
Concentração de diversas instituições
a estratégia do Comitê Executivo PEM é
replicar o modelo adotado no Sul para as
of the United Nations Conference to Su-
pport the Implemantation of Sustainable
temas marinhos, unidades de conservação, de pesquisa com tradição em estudos cos- demais regiões marinhas do País (Norte, Developmente Goal 14: Conserve and
além de atividades econômicas diversifica- teiros e marinhos nos três estados da re- Nordeste e Sudeste), de forma a honrar sustainably use the oceans, seas and mari-

.
das e expressivas;
Disponibilidade de dados e de meta-
gião Sul (PR – UFPR; SC–UFSC e a UNIVALI;
RS –UFPel, com o Centro de Estudos Estra-
o compromisso voluntário assumido pelo
Brasil na ONU, em 2017, de implantar o
ne resources for sustainable development)
(UN, 2017). Importante salientar que essa
dados marinhos mínimos para implantação tégicos e Planejamento Espacial Marinho PEM no País até 2030. Tal compromis- “replicação” considerará as peculiaridades

.
do PEM;
Fronteira marítima com outro país, a
(CEDEPEM), em parceria com o NEA-UFF;
a FURG, UFRGS e IFRS).
so encontra-se registrado como a Ação
Oceânica 19704 (#OceanAction19704)
das outras regiões nacionais. Ademais, os
fatores que foram preponderantes para a
experiência a ser adquirida com a implan- O Projeto Piloto prevê três Fases, con- no item 334 do Anexo II do Relatório escolha da Região Sul, como projeto pilo-
tação do PEM na região fronteiriça com o forme a Figura 2, cada qual com 12 meses da Conferência das Nações Unidas para to, serão buscados paralelamente à con-
Uruguai será relevante, posteriormente, de duração: Apoio à Implementação do Objetivo de secução do projeto piloto.

238 ECONOMIA AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 239


4.1 Quais são os benefícios do PEM pode resultar em ganhos e oportunida- Dentre todos os benefícios do PEM, des- 4.2 Principais dificuldades
des de desenvolvimento, mas pressupõem taca-se, no segmento econômico, a contri-
O Brasil é um dos Estados que possuem exigências internacionais para a proteção, buição para maior clareza das leis, políticas A despeito do PEM constituir um instru-
maior responsabilidade em relação aos conservação, uso e defesa dessas áreas, públicas e demais instrumentos normativos mento sendo cada vez mais buscado como
seus espaços marinhos sob jurisdição. Isso no Atlântico Sul. que incutem menor incerteza em investi- marco regulatório em dezenas de países,
mentos privados e públicos, e ao próprio isso pode incorrer em controvérsias. Vivero
Tabela 2. Exemplos de benefícios do PEM Estado costeiro nos processos de cessão de (2021) relembra que há a tendência para
áreas marinhas. De forma geral, os grandes que o PEM abarque todo o marco jurídico
BENEFÍCIOS Identificação de áreas biológicas e ecológicas importantes. empreendimentos marinhos caracterizam- ordenador das atividades costeiras e mari-
ECOLÓGICOS/ Incorporação de objetivos relacionados à biodiversidade nas tomadas -se pelos elevados custos, sejam nas fases nhas, porém isso pode ser de difícil execu-
AMBIENTAIS de decisão. de implantação, manutenção ou desmo- ção. Por outro lado, a convergência de todos
bilização, além da necessidade de uma in- os instrumentos de governança marinha e a
Identificação e redução de conflitos entre os usos humanos e a
fraestrutura adequada em terra (portos, intenção de vinculá-los ao PEM deve-se ao
natureza.
estradas, ferrovias, galpões logísticos etc.) fato de que alguns desses instrumentos es-
Alocação de espaço para biodiversidade e conservação da natureza. para atender adequadamente às demandas tão desatualizados ou ultrapassados, sendo
Subsídios para o planejamento de áreas marinhas protegidas. das atividades offshore. Estes costumam ser inadequados diante dos desafios atuais.
Identificação e redução dos efeitos cumulativos das atividades humanas empreendimentos de médio/longo prazo, As principais dificuldades encontradas
frequentemente amortizados em 20 a 30
. Inexistência de um fundo específico
nos ecossistemas marinhos. na elaboração do PEM no Brasil são:
anos. Nesse contexto, para que tais ativida-
BENEFÍCIOS Maior certeza de acesso a áreas desejáveis para novos investimentos
des econômicas sejam estimuladas e desen-
ECONÔMICOS do setor privado, frequentemente amortizados em 20 a 30 anos. de financiamento ou de recursos orçamen-
volvidas em sua plenitude, o Estado costeiro
Identificação de usos compatíveis dentro da mesma área de tários provisionados exclusivamente para
precisa afiançar certa segurança jurídica aos
desenvolvimento.
Redução de conflitos entre usos incompatíveis.
investidores, o que pode ser alcançado por
meio do PEM e de seu Plano de Gestão Es-
.
sua implementação;
Carência de dados e de metadados
marinhos disponibilizados pelas instituições
Aprimoramento da capacidade para planejar atividades humanas pacial Marinho.
governamentais e não governamentais na
novas e mutáveis, incluindo tecnologias emergentes e seus efeitos Essas negociações entre os setores eco-
Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais
associados. nômicos e, principalmente aqueles ligados à
(INDE). Tais informações são imprescindíveis
Maior segurança durante a operação de atividades humanas. conservação marinha, podem originar a ne-
para a elaboração de um Plano de Gestão
cessidade da criação de hot spots. Isso faz
Promoção do uso eficiente dos recursos e do espaço marinho. Espacial Marinho consoante com as diver-
parte da elaboração de um PEM discutido
Racionalização e transparência nos procedimentos de permissão e de sas atividades em curso na Amazônia Azul e
pelos representantes indicados pelos setores

BENEFÍCIOS
licenciamento das áreas para atividades econômicas.
Melhores oportunidades para a participação da comunidade e do
das atividades do mar, que representam a
sociedade. Isso faz parte do “jogo” demo-
.
com as planejadas para os próximos anos; e
Necessidade de fortalecimento da
mentalidade marítima e da cultura oceâ-
SOCIAIS cidadão. crático e deve sempre ser buscado para que
nica no País. A fragilidade desses dois pi-
Identificação dos impactos das decisões sobre a alocação do espaço se convertam conflitos em oportunidades.
lares no seio da sociedade brasileira pode
oceânico (ex: fechamento de áreas para certos usos, áreas protegidas Há que perceber, ainda, alguns setores que
comprometer os efeitos desejados das po-
etc.) para comunidades e economias em terra (ex: emprego, distribuição podem e devem ser privilegiados em relação
líticas e dos demais instrumentos públicos
de renda). a outros, em situações muito específicas, em
de gestão voltados para o mar.
caso de impasses econômicos e ambientais
Identificação e melhor proteção do patrimônio cultural.
(VIVERO et al., 2020). Tais dificuldades mostram o quanto a
Identificação e preservação de valores sociais e espirituais relacionados maritimidade da população e o caráter de
ao uso do oceano. governos voltados às lides do mar são ex-
Fonte: Ehler e Douvere (2009, p. 21, tradução dos autores) tremamente importantes para que o Brasil

240
240 AECONOMIA
ECONOMIAAZUL
AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 241
configure, de fato, seu poder potencial em permitir a integração de dados, subsidiando a Figura 3. Limites dos espaços marinhos e marítimos sob jurisdição nacional
poder real como um país de verdadeira elaboração do Plano de Gestão Espacial Ma- representados no Geoportal da INDE: Linha de Base, Mar Territorial,
vocação a ser uma Potência Marítima no rinho e dos Mapas de Situação, que apresen- Zona Contígua, ZEE e limite exterior da Plataforma Continental
Atlântico Sul. tarão a distribuição espacial e temporal dos
Como consequência da migração das ati- usos e das atividades em curso e potenciais.
vidades econômicas para o mar e suas dimen- Adicionalmente, a disponibilização de
sões o Planejamento Espacial Marinho tem se todos esses valiosos dados marinhos na
tornado um instrumento público cada vez INDE começa a permitir o acesso das ins-
mais relevante para o efetivo ordenamento tituições governamentais e não governa-
dessas atividades. Há um longo caminho a mentais a dados marinhos de alto custo,
ser percorrido para o Planejamento Espacial tais como, batimetria, geologia, geofísica,
Marinho nacional. O Estado pode intensificar oceanografia, entre outros, coletados em
as tratativas para a elaboração do PEM, em toda a Amazônia Azul e que são capazes
parcerias com a iniciativa privada. de revelar áreas de elevado potencial de
No entanto, não se pode esquecer que exploração/explotação, até então desco-
atores transnacionais, em um mundo cada nhecidas por determinados setores estra-
vez mais globalizado, possuem grande in- tégicos (petróleo e gás, mineração, dentre
teresse em recursos dos países periféricos outros). Com isso, mitigam-se, significati-
(MILTON SANTOS, 2001). Os conflitos de vamente, os custos operacionais (finan-
interesse, principalmente com investimentos ceiros e temporais), referentes às extensas
unicamente privados, podem ocasionar em pesquisas marítimas em uma área de 5,7
priorizações não tão racionais em um ecos- milhões de km².
sistema marinho com diversas interações po- Ademais, o acesso público ao Geoportal Fonte: SECIRM. Elaborado pelos autores
lítico-econômicas (VIOLANTE, 2021b). da INDE evitará a redundância na coleta de
dados marinhos pelas diversas instituições, A Infraestrutura Nacional de Dados Espa- A catalogação dos dados geoespaciais é fei-
4.3 Quais áreas de conhecimento o otimizando o emprego do capital público e ciais – INDE foi instituída pelo Decreto Nº 6.666 ta mediante seus respectivos metadados pelos
de 27/11/2008, com o propósito de catalogar, próprios produtores e/ou gestores dos dados.
PEM poderá motivar? privado investido, aumentando a eficiência
integrar e harmonizar dados geoespaciais pro- Pelo Decreto o compartilhamento e dissemina-
e a competitividade das empresas que ope- ção dos dados geoespaciais e seus metadados
duzidos ou mantidos e geridos nas instituições
A elaboração e implementação exitosa ram na “Amazônia Azul”. de governo brasileiras, de modo que possam ser é obrigatório para todos os órgãos e entidades
do PEM no país pressupõe a existência e a Destaca-se, ainda, o comprometimento facilmente localizados, explorados em suas ca- do Poder Executivo federal e voluntário para os
manutenção contínua de uma infraestrutu- da INDE em salvaguardar os dados sigilosos racterísticas e acessados para os mais variados órgãos e entidades dos Poderes Executivos es-
ra nacional de dados, capaz de garantir o das instituições, bem como os de relevância fins por qualquer usuário com acesso à Internet. tadual, distrital e municipal.
acesso, de modo fácil, rápido e seguro, a para a Segurança Nacional. A facilidade de
todo o acervo de dados marinhos coletados acesso aos dados marinhos na INDE deverá
na Amazônia Azul. estimular o desenvolvimento de uma série 4.4 Perspectivas Econômicas Futuras culinária. Dessas atividades, apenas para
A contribuição do Instituto Brasileiro de de pesquisas e de inovações em diferentes exemplificar a enorme importância do
Geografia e Estatística (IBGE) tem sido funda- áreas do conhecimento, destacadamente Dentre as principais atividades eco- mar para a economia nacional, destaca-se
mental, ao disponibilizar a Infraestrutura Na- no campo das ciências oceânicas . nômicas diretamente influenciadas pelo que os campos marítimos, em fevereiro
cional de Dados Espaciais (INDE), estabeleci- No âmbito do PEM, alguns dados ma- mar no Brasil destacam-se: petróleo e de 2021, foram responsáveis por 96,7%
da por meio do Decreto nº 6.666, de 27 de rinhos já foram inseridos no Geoportal gás, defesa, portos e transporte maríti- do petróleo e 83,4% do gás natural pro-
novembro de 2008. Tal fato tem representa- da INDE, tal como os limites dos espaços mo, indústria naval, extração mineral, tu- duzidos no País e que cerca de 95% do
do redução significativa de tempo e de cus- marítimos sob jurisdição nacional (BRASIL, rismo e esportes náuticos, pesca e aqui- comércio exterior brasileiro é escoado por
tos para a implantação do PEM no Brasil ao 2022a) (Figura 3). cultura, biotecnologia, cultura popular e via marítima (ANP, 2021).

242 ECONOMIA AZUL AA Relevância


Relevância Estratégica
Estratégica do
do Planejamento
Planejamento Espacial 243
Espacial 243
Considerando-se que todos esses ín- sistema internacional. Investimentos em 5. Considerações finais
dices foram alcançados sem que o PEM defesa militar-naval, mais especificamen-
nacional estivesse sido efetivamente ela- te nos programas e projetos estratégicos Ao encerrar esse capítulo, atingimos todos os setores ligados ao mar, seja no uso
borado e implementado, espera-se um in- ligados ao mar, como por exemplo no Sis- seu propósito que foi discutir a relevância dos recursos vivos e não vivos, na proteção
cremento significativo desses e de outros GAAz e no PROSUB – incluso também o do PEM passando por diversos tópicos de e conservação e mesmo na Defesa de seus
parâmetros advindos da Economia Azul, SN-BR, podem garantir os objetivos políti- interesse, como: o que é o PEM, sua situ- interesses estratégicos no mar. Na Economia
após o efetivo estabelecimento do PEM, cos, econômicos, sociais e ambientais dos ação no mundo, os custos de produzir um Azul, destaca-se a busca por ampliação da
a exemplo do observado em outros pa- mais variados atores de seus setores apli- PEM no Brasil, o que esperar do PEM, como segurança jurídica aos investidores nacionais,
íses que possuem essa ferramenta e me- cados ao mar (VIOLANTE, 2019). fazê-lo, quais seus benefícios para a Econo- internacionais e ao próprio Estado costeiro
todologia, em estágio mais avançado, em Para se alcançar a regulamentação do mia Azul, quais áreas de conhecimento po- nos processos de cessão e utilização desses
algumas de suas áreas marinhas. PEM e de seus instrumentos decorrentes, dem ser motivadas por esse planejamento espaços marinhos, de forma regulamentada.
Acreditando que o PEM venha a ser o como Planos, que derivarão em um ciclo e algumas perspectivas futuras. Como dificuldades, lamenta-se: a falta
grande “motor propulsor ” da Economia virtuoso e recíproco de aprimoramento de Percebeu-se que o PEM é uma ferra- de uma maior interação entre os setores
Azul, levando-se em conta as extensas políticas, programas, projetos e atividades menta, uma metodologia e um processo ligados ao mar, para que sejam resolvidas
dimensões da faixa litorânea e dos espa- ligadas ao mar no Brasil, serão capazes de político em construção - na verdade são as controvérsias nos espaços conflitantes; a
ços oceânicos sob jurisdição, as atividades prover a desejada e necessária segurança três coisas juntas a depender de como ele falta de dados e de metadados marinhos
econômicas marinhas se constituem em jurídica aos investidores e ao próprio Es- é utilizado e empregado. Assim, tem-se a disponibilizados pelas instituições gover-
oportunidade de maior desenvolvimento tado. Planeja-se a publicação de uma Lei compreensão de que, sem a colaboração namentais e não governamentais na INDE
socioeconômico de forma sustentável ao ou Decreto-lei que estabeleça as “Bases entre os diversos saberes, pessoas, comu- e, talvez, a maior deficiência, a falta de
país, especificamente nos seguintes seto- da Política de Planejamento Espacial Ma- nidades, universidades ou instituições, não mentalidade marítima na sociedade brasi-
res: gestão costeira e oceânica; pesca (ar- rinho Nacional”, a exemplo do realizado existem perspectivas de um planejamento leira e de um projeto estratégico marítimo
tesanal, industrial e aquicultura); energias em Portugal, por meio da Lei nº 17, de 10 espacial marinho que seja viável a todas as mais forte dos governos para que invis-
renováveis e não renováveis; mineração; de abril de 2014 (PORTUGAL, 2014). pessoas que vivem, trabalham e utilizam tam recursos necessários, de forma mais
navegação e portos; turismo; meio am- Nesse contexto, vislumbra-se no hori- esse espaço marinho de diversas formas. imediata, para sua prontificação.
biente e na área da defesa. zonte um possível início, de fato, do PEM Muitos países estão desenvolvendo seus Um PEM pronto significa maiores inves-
A economia está ligada diretamente à brasileiro. A celebração do Acordo de Coo- PEM. Destacam-se como mais avançados timentos estatais, e privados, maior desen-
Defesa e à Ciência, Tecnologia e Inovação. peração entre o BNDES e a CIRM/SECIRM, alguns países da União Europeia, principal- volvimento econômico e social e o reforço
A Defesa Nacional, caracterizada no PEM para viabilizar, apoiar e acompanhar estu- mente devido às questões de territorialida- do Poder Marítimo do país, inclusive em
como defesa militar-naval, talvez seja uma dos técnicos para a implantação de Projeto de. A América Latina e o Brasil estão atra- seu Poder Naval, responsável, entre outras
das áreas mais negligenciadas por pesqui- Piloto do PEM na Região Marinha do Sul sados, como quase todo o resto do mundo coisas, por fiscalizar extensa área marítima
sadores do mar. No entanto, ante as amea- do Brasil, foi publicado no Diário Oficial está. Como fator positivo, o Brasil possui sob jurisdição, ante a cobiça provocada
ças tradicionais e as ditas “novas ameaças da União (DOU), em 10 de março de 2022 políticas públicas, planos setoriais e outros pela escassez de recursos em um mundo
”, espaços do Atlântico Sul, como a nossa (BRASIL, 2022b) Esse é um importante pas- instrumentos consolidados há muitas déca- cada vez mais globalizado.
Amazônia Azul e outras áreas de interesse so para o compromisso internacional as- das. Resta reformulá-los, baseados em um Além disso, também significa uma
econômico e estratégico podem ser secu- sumido pelo país na Conferência dos Oce- novo papel que os oceanos angariaram ge- posição de liderança cooperativa junto a
ritizadas por organismos multilaterais e/ anos da ONU em 2017, que dentre outros opoliticamente. Os PEM que mais avançam nossos vizinhos amigos no Atlântico Sul,
ou atores com maior poder hierárquico no assuntos, prevê um PEM até 2030. no mundo os associam a investimentos na possibilitando maior atividade econômi-
energia, principalmente na energia limpa e ca não apenas com países transfronteiros
na conservação marinha. Há que se ter um oceânicos e com os de fronteira fluvial,
objetivo claro e começá-lo, saindo da inércia mas com os demais países lindeiros desse
inicial dos diversos setores envolvidos. espaço marinho chamado Atlântico Sul.
Há muitos benefícios com um PEM bem Por fim, compreende-se que a integra-
estruturado e implementado, beneficiando a ção das mais variadas políticas públicas

244 ECONOMIA AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 245


nacionais voltadas para o mar e, principal- beres e culturas diferenciadas das mais di- College Journal, v. 24, n. 1, 2020. IOC Policy Series 2017-1. Paris, 2017.
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246 ECONOMIA AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 247


Notas “acesso ao conhecimento sobre o oceano”. que se insere em um espectro desde o que é
(UNESCO, 2021). não politizado, passando pelo que já é politi-
9 A ciência oceânica inclui todas as disciplinas zado até atingir o “securitizado”(MARRONI,
1 O poder naval é mais restrito e se manifesta dimensões do desenvolvimento sustentável: relacionadas ao estudo do oceano: ciências DE CASTRO & VIOLANTE, 2018). Ver mais
como poder especificamente militar, ao pas- econômica, social e ambiental. Também são físicas, biológicas, químicas, geológicas, hi- em: BUZAN, Barry; WAEVER, Ole e WILDE,
so que o poder marítimo é mais abrangente universais, o que significa que se aplicam a drográficas, da saúde e sociais, assim como Jaap de. Security: a New Fra¬mework for
e se concretiza na capacidade política, eco- todos os países do mundo e devem ser al- a engenharia, as humanidades e as pesquisas Analysis. Londres: Lynne Rienner Publishers,
nômica e militar de uma potência em usar o cançados em âmbito global, nacional e sub- multidisciplinares sobre a relação entre os se- 1998.
mar. (MELLO, 1997). nacional (BRASIL, 2019). res humanos e o oceano. A ciência oceânica 14 Sistema de Gerenciamento da Amazônia
2 Os serviços ecossistêmicos incluem: “servi- 4 Os serviços ecossistêmicos incluem: “ser- busca entender os complexos sistemas e ser- Azul, cujo objetivo é “monitorar e proteger,
ços de aprovisionamento”, como alimenta- viços de aprovisionamento”, como alimen- viços sociais e ecológicos multiescala, o que continuamente, as áreas marítimas de inte-
ção, água doce, fibra, produtos bioquímicos, tação, água doce, fibra, produtos bioquími- requer observações e pesquisa multidiscipli- resse e as águas interiores, seus recursos vi-
recursos genéticos; “serviços de regulação”, cos, recursos genéticos; “serviços de regula- nar e colaborativa (UNESCO, 2017, p. 3). vos e não vivos, seus portos, embarcações
como regulação do clima, regulação de do- ção”, como regulação do clima, regulação 10 Segundo a Organização para Coopera- e infraestruturas, em face de ameaças,
enças, regulação da água, purificação da de doenças, regulação da água, purificação ção e Desenvolvimento Econômico (OEDC, emergências, desastres ambientais, hostili-
água, polinização; “serviços culturais’, como da água, polinização; “serviços culturais”, 2016), a Economia Azul abrange as dis- dades ou ilegalidades, a fim de contribuir
recreação e turismo, bem como espiritual, re- como recreação e turismo, bem como es- tintas indústrias que têm suas atividades para a segurança e a defesa da Amazônia
ligioso e benefícios educacionais; e “serviços piritual, religioso e benefícios educacionais; baseadas no oceano, como o transporte Azul e para o desenvolvimento nacional”.
de apoio”, como formação do solo, ciclagem e “serviços de apoio”, como formação do marítimo, pesca, energia eólica offshore e Ver mais em: < https://www.marinha.mil.br/
de nutrientes e produção primária” (EHLER; solo, ciclagem de nutrientes e produção pri- biotecnologia marinha, assim como os ati- sisgaaz-protecao-e-monitoramento-das-a-
DOUVERE, 2009, p. 19). mária (EHLER; DOUVERE, 2009, p. 19). vos naturais e serviços ecossistêmicos pro- guas-jurisdicionais-brasileiras>. Acesso em:
3 Em setembro de 2015, durante a Cúpula 5 Região que compreende a superfície do vidos pelo oceano, como as próprias linhas 09 mar.2022.
das Nações Unidas sobre o Desenvolvimen- mar, águas sobrejacentes ao leito do mar, de navegação e a capacidade de absorção 15 Programa de Desenvolvimento de Sub-
to Sustentável, os líderes de governos e de solo e subsolo marinhos contidos na exten- de carbono, por exemplo. marinos. Prevê a construção de 4 submarinos
Estados de 193 países adotaram a Agenda são atlântica que se projeta a partir do litoral 11 São aquelas oriundas de outros Estados. convencionais com transferência de tecnolo-
2030 para o Desenvolvimento Sustentável, até o limite exterior da plataforma continen- 12 Comumente chamadas de pirataria, pesca gia, cujo projeto é baseado no submarino da
a qual contém um rol de 17 Objetivos de tal brasileira (BRASIL, 2017). ilegal, tráfico de drogas, de armas e humano, Marinha Nacional Francesa “Scorpéne”, e 1
Desenvolvimento Sustentável – ODS. Esses 6 São áreas com maior potencialidade a “con- contrabando, descaminho, terrorismo e ou- submarino convencional com propulsão nu-
ODS foram concebidos a partir dos resulta- flitos” na interação terra-mar para uso, prote- tros ilícitos transnacionais. clear, também baseado no projeto do “Scor-
dos da Conferência Rio+20 e levaram em ção e conservação, merecendo maior atenção 13 A securitização pode ser compreendida como péne, porém sem transferência de tecnologia
conta o legado dos Objetivos de Desenvol- e intervenções por parte dos gestores e atores um extremo da politização de um assunto, na área nuclear.
vimento do Milênio (ODM), em Metas de envolvidos, de modo que se tente promover
combate à pobreza que o mundo se com- consensos quanto à melhor forma de desen-
prometeu a atingir até 2015. Na busca de volvimento sustentável da região.
obter avanços nas Metas dos ODM que 7 Segundo o Plano Estratégico da Marinha
não foram alcançadas, os ODS presentes na - 2040: “A mentalidade marítima consiste
Agenda 2030 são mais ambiciosos e abran- no grau de conscientização da sociedade e
gentes. Eles buscam assegurar os direitos dos decisores governamentais sobre a im-
humanos, acabar com a pobreza, lutar con- portância do Poder Marítimo e de seus ele-
tra a desigualdade e a injustiça, alcançar a mentos constituintes para a vida da Nação,
igualdade de gênero e o empoderamento bem como o sentimento de pertencimento
de mulheres e meninas, bem como enfren- dos homens e mulheres do mar à comu-
tar outros desafios que se apresentam nos nidade marítima brasileira, cuja interação
tempos atuais. Adicionalmente, os ODS, sinérgica favorece a ampliação desse Poder
que contam também com 169 Metas e em prol dos interesses nacionais.” (BRASIL,
Indicadores, são integrados e indivisíveis, 2020b, p. 15).
e refletem, de forma equilibrada, as três 8 Cultura oceânica é conceituada como o

248 ECONOMIA AZUL A Relevância Estratégica do Planejamento Espacial 249


13

A GESTÃO DA ZONA COSTEIRA DO BRASIL


E A ECONOMIA AZUL
João Luiz Nicolodi
Marinez Eymael Garcia Scherer
José Mauricio de Camargo
Natália Ramos Corraini
Jade Moreira

1. Introdução

Conforme Gunter Pauli, um dos for- Azul tem destaque. Mas, é impossível pen-
muladores do conceito de Economia Azul, sar em uma economia com base ecossistê-
uma economia vibrante é essencial para a mica sem considerar todo o contínuo do
sustentabilidade, mas o oposto também gradiente fluviomarinho, ou seja, o com-
está correto: sem uma autêntica sustenta- plexo conjunto de bacias hidrográficas, ZC
bilidade, a economia não pode continuar e oceanos (Nicolodi et al, 2009). Estes três
funcionando por longo período. Para o sistemas estão profundamente interligados
autor, os males de nossa economia resi- e a compreensão deste fator dentro de um
dem em não compreender e aplicar a lógica contexto do planejamento estratégico do
ecossistêmica. A transformação, ainda que território torna-se vital para a consecução de
parcial, do atual e descendente ciclo econô- metas e objetivos de uma Economia Azul.
mico para outro com base na lógica ecossis- Nesse sentido, o presente capítulo irá
têmica permitiria satisfazer as necessidades abordar a gestão da ZC no Brasil (Sistema
básicas da sociedade e criar uma autêntica GERCO), sob a ótica do Planejamento Ter-
economia sustentável, ou seja, uma Econo- ritorial Estratégico, e destacará alguns de
mia Azul (Pauli, 2011). seus principais aspectos de integração com a
Evidentemente tal mudança de paradig- gestão de bacias hidrográficas e com a Zona
ma não é trivial. Os complexos ciclos eco- Econômica Exclusiva (ZEE), principalmente
nômicos vinculados às estruturas financei- através do Planejamento Espacial Marinho
ras, às matrizes energéticas, aos modais de (PEM). O PEM se configura em uma das prin-
transporte e logística estão arraigados na cipais ferramentas para operacionalizar um
sociedade humana e geram uma depen- sistema econômico com base ecossistêmica,
dência quase inquebrantável destes ciclos. tendo como objetivo final a geração de rique-
Por suposto, este argumento não invali- zas, a sustentabilidade e a equidade social.
da (pelo contrário deve incentivar) a propo- Com objetivo de identificar como os
sição e aplicação de novos conceitos, méto- sistemas de gestão destes três espaços in-
dos e paradigmas, principalmente quando terligados (Bacias Hidrográficas, Zonas Cos-
o tema são os oceanos, onde a Economia teiras e Zona Econômica Exclusiva - ZEE)

250 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 251


podem contribuir para o desenvolvimento lo para a discussão sobre a integração da lixo no mar. Este tipo de pressão sobre os geográfico de interação do ar, do mar e
de uma Economia Azul, este capítulo se Zona Costeira com as Bacias Hidrográficas ecossistemas marinhos pode minar o po- da terra, incluindo seus recursos renová-
encontra estruturado da seguinte forma: e com a Zona Econômica Exclusiva (ZEE), tencial dos benefícios obtidos dos mesmos veis ou não, abrangendo uma faixa marí-
primeiro é apresentada uma rápida descri- sempre tendo em conta o desenvolvimento e de quaisquer atividades da Economia tima e outra terrestre”, as quais viriam a
ção da ZC do Brasil considerando os as- de uma Economia Azul. Por fim, são apre- Azul, tendo em vista a relação de depen- ser definidas posteriormente.
pectos de sua delimitação e introduzindo sentados, de forma sucinta, alguns aspec- dência entre atividade econômica e ecos- O detalhamento do que seriam essas
alguns tópicos de gestão. Em seguida, é tos da Gestão Costeira Integrada (GCI) no sistemas (European Commission, 2020). duas faixas foi oficializado por meio do
exposto um breve painel sobre os usos e Brasil, buscando aprofundar a importância Considerando estas premissas, cabe Decreto 5.300/2004, que regulamentou o
atividades costeiras e marinhas e sua de- de uma base sólida de planejamento com destacar que uma das questões mais re- PNGC, da seguinte forma: I - faixa maríti-
pendência dos Serviços Ecossistêmicos. Es- foco no território para o desenvolvimento levantes para a aplicação de instrumentos ma: espaço que se estende por doze mi-
tes dois tópicos configuram um preâmbu- de uma economia rica e sustentável. de gestão em uma porção qualquer do lhas náuticas, medido a partir das linhas
território é a sua delimitação. E, para a de base, compreendendo, dessa forma, a
2. A Zona Costeira do Brasil ZC, essa tarefa não é trivial. Diversas abor- totalidade do mar territorial; II - faixa ter-
dagens são utilizadas, sendo que a mais restre: espaço compreendido pelos limites
As zonas costeiras (ZC) constituem-se e Gusmão, 2004; Nicolodi e Pettermann, básica de todas é aquela do ponto de vista dos municípios que sofrem influência dire-
em áreas com grande interesse econô- 2010; Polette e Lins-de-Barros, 2012; As- da definição do espaço geográfico a ser ta dos fenômenos ocorrentes na ZC. Per-
mico, ambiental, social e populacional, mus et al, 2019; Braga et al, 2020). Um utilizado como referência. Uma sistemati- cebe-se que a definição da faixa marítima
sendo que tal atratividade é, ao mesmo detalhado diagnóstico da questão das zação destas definições pode ser encon- apresenta claro limite físico: entre a linha
tempo, um fator de geração de oportu- mudanças climáticas e sua influência nas trada em Gruber et al. (2003), na qual os de base e as 12 milhas náuticas, que de
nidades e de conflitos pela utilização de ZC foi apresentado no Primeiro Relatório autores contextualizaram estas definições acordo com a Convenção das Nações Uni-
espaço e de recursos. Este cenário deriva de Avaliação Nacional do Painel Brasileiro sob o ponto de vista de aplicação em po- das sobre o Direito do Mar, compõem o
da intensa exploração de recursos natu- de Mudanças Climáticas, especificamente líticas públicas e diretrizes internacionais. Mar Territorial. Interessante notar que tal
rais, uso desordenado do solo e pouca no capítulo “Impactos, Vulnerabilidades e Rodriguez & Windevoxhel (1998) de- conceito exclui a porção da ZEE do escopo
priorização e efetividade de políticas inci- Adaptação” (PBMC, 2013). finiram a ZC como o espaço delimitado geográfico da GCI.
dentes nessa porção do território (MMA, Câmbios climáticos afetam todas as re- pela interface entre o oceano e a terra, Já para a faixa terrestre a definição é
1996 e 2008). giões do mundo. As placas de gelo e as ou seja, a faixa terrestre que recebe in- mais complexa. O emprego dos limites
Agregada a esta complexidade, a rele- geleiras vêm perdendo massa, o que con- fluência marítima e a faixa marítima que municipais foi estabelecido no Decreto
vância da ZC em cenários de mudanças tribui para a aceleração na elevação do recebe influência terrestre. Este conceito 5.300/2004, sendo que segundo o Art.4°,
climáticas é notoriamente reconhecida nível global do mar. Eventos climáticos ex- é relativamente simples, mas, para fins de os Municípios abrangidos pela faixa terres-
(Asmus et al., 2019) e estes devem, ne- tremos, como chuvas intensas, enchentes, aplicação direta na gestão ele torna-se tre da ZC são: I. defrontantes com o mar, as-
cessariamente, ser ponderados, principal- ondas de calor e secas estão ocorrendo complexo, uma vez que a definição mais sim definidos em listagem estabelecida pela
mente quando considerados os vetores com mais frequência e intensidade. Isto precisa possível das unidades territoriais Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
de mudança (Bustamante et al., 2019). levará a diminuição da disponibilidade de é crucial ao planejamento. Para Clark Estatística - IBGE; II. não defrontantes com o
De acordo com o MMA (2008), tais ve- recursos essenciais, como a redução da (1996) e Gesamp (1997) o polígono da mar, localizados nas regiões metropolitanas
tores podem ser agrupados em ‘naturais’ disponibilidade e da qualidade da água ZC se estende do limite da zona econô- litorâneas; III. não defrontantes com o mar,
(aspectos físicos, químicos e biológicos) em algumas regiões. mica exclusiva (ZEE) até o limite terrestre contíguos às capitais e às grandes cidades
e ‘antropogênicos’ (aspectos sociais, cul- As atividades econômicas também po- afetado pelo clima marítimo. A legislação litorâneas, que apresentem conurbação; IV.
turais e tecnológicos). Embora os vetores dem afetar os ecossistemas marinhos de brasileira tem a conceituação de ZC de- não defrontantes com o mar, distantes até
de origem natural estejam além da capa- diversas maneiras: desde a pesca e seus finida, para fins de aplicação de políti- cinquenta quilômetros da linha da costa,
cidade de controle por parte da sociedade impactos sobre o ambiente bentônico e cas públicas, no próprio Plano Nacional que contemplem, em seu território, ativida-
(secas, ondas de frio, ciclones, inundações populações marinhas, até derrames de de Gerenciamento Costeiro - PNGC (Lei des ou infraestruturas de grande impacto
etc.), é impossível dissociar os impactos petróleo, eutrofização, poluição de nitra- 7661/1988). Em parágrafo único do Art. ambiental na ZC ou ecossistemas costeiros
de seus efeitos nas ZC e marinhas (Egler tos pela agricultura, poluição marinha e 2º, considera-se “zona costeira o espaço de alta relevância; V. estuarino-lagunares,

252 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 253


mesmo que não diretamente defrontantes ecossistemas e seus serviços, atividades exis- Na União Europeia (UE), dentre os ins- Commission, 2020). O esgotamento ou a
com o mar; VI. não defrontantes com o mar, tentes e potenciais, atores envolvidos, análi- trumentos políticos utilizados com uma geração de impactos negativos sobre esses
mas que tenham todos os seus limites com se de conflitos de uso. A proposição de ce- perspectiva voltada para os ecossistemas recursos podem ser a causa de problemas
Municípios referidos nos incisos I a V; VII. nários alternativos com base em trade-offs destaca-se o quadro diretivo de estratégia aos diversos setores socioeconômicos que
desmembrados daqueles já inseridos na ZC. que venha a fundamentar a tomada de de- marinha (MSFD) como uma estratégia de são intimamente ligados aos oceanos e ZC.
A partir da supracitada delimitação do cisão complementa esse processo (Böhnke- gestão integrada da terra, água e recur- Como exemplos da ligação indiscutí-
espaço geográfico a ser planejado, todo -Henrichs et al, 2013; Blythe et al, 2020). sos vivos que viabiliza a conservação e uso vel entre ambientes naturais e benefícios
o arcabouço de gerenciamento costeiro De Groot (2002) afirma que os ecossis- sustentável dos recursos. Nessa estratégia ao ser humano, Böhnke-Henrichs et al.
no país foi desenvolvido. O tópico 3 deste temas produzem bens e serviços básicos, a GBE leva em consideração os impactos (2013) relacionaram funções e SEs ao de-
capítulo irá aprofundar os aspectos con- categorizados e classificados: (1) serviços de e pressões cumulativas de diferentes ati- senvolvimento de atividades econômicas
ceituais e metodológicos deste sistema, provisão (ex.: alimentos, água, fibras, bio- vidades e setores a fim de assegurar que (Figura 1). Por exemplo, a pesca, abarcada
buscando identificar os pontos de conver- químicos, recursos genéticos), (2) serviços de estes permaneçam em conformidade com pelo setor dos recursos marinhos vivos, é
gência entre o GERCO e o desenvolvimen- suporte (ex.: ciclagem de nutrientes, produ- as condições de um ecossistema saudável, dependente da biodiversidade presente
to de uma Economia Azul no Brasil. ção primária), (3) serviços de regulação (ex.: produtivo e resiliente, capaz de prover os no ambiente marinho e na ZC incluindo os
regulação do clima, purificação da água), (4) bens e serviços necessários e desejados pe- bancos de algas e de fanerógamas, man-
2.1 Serviços Ecossistêmicos, usos e ati- serviços culturais (ex.: recreação e turismo, los humanos (European Commission, 2020). guezais e recifes de coral.
vidades nas zonas costeiras e marinhas benefícios espirituais e religiosos, estéticos, Dessa forma, compreender os serviços A pesca também depende da capa-
inspiradores e educacionais) - Cabe salien- SEs fornecidos por diferentes componentes cidade dos ambientes marinhos de dis-
A real possibilidade de que a gestão in- tar que existem outras classificações para os ecossistêmicos e sua relação com os setores persar gametas, manter populações e
tegrada de zonas costeiras e marinhas ve- serviços ecossistêmicos, como as de Haines- econômicos e o bem-estar humano é cru- habitats berçários e realizar a regulação
nha a compor a base de uma Agenda da -Young e Potschin (2010) e Böhnke-Henri- cial para o planejamento e ordenamento da condição química das águas salgadas.
Economia Azul, perpassa pelo desenvol- chs et al (2013), dentre outras. Os serviços das atividades econômicas e, consequen- Isso significa que se os bancos de algas,
vimento de instrumentos que fomentem ecossistêmicos são vitais não apenas para a temente, para o desenvolvimento de uma manguezais, recifes de corais e outros
uma gestão sustentável ambientalmente e manutenção e a saúde dos próprios ecossis- Agenda para a Economia Azul. Dentre os ambientes marinhos forem significativa-
que seja socialmente inclusiva, o que pode temas e seus componentes, como também setores estabelecidos que contribuem para mente impactados, a pesca perderá a ca-
ser operacionalizado através de um arran- para as populações que vivem nas áreas cos- a Economia Azul da UE, por exemplo, es- pacidade de captura (Scherer e Asmus,
jo legal para a Gestão Costeira Integra- teiras (Odum e Odum, 2001). Além disso, tão incluídos os recursos marinhos vivos, os 2016). Na UE, entre 2009 e 2018, esta
da e do desenvolvimento da governança os SE podem se configurar como indicado- recursos marinhos não vivos, a energia re- atividade registrou, para determinadas es-
(Gerhardinger et al., 2020). res da qualidade ambiental e do bem estar novável marinha, as atividades portuárias, pécies, aumento na produção pesqueira
A GCI no Brasil conta com instrumentos humano, servindo para orientar a disposição construção e a reparação naval, o transporte de captura, demonstrando margem para
legais, melhor discutidos adiante. A existên- das atividades humanas, caracterizando-os marítimo e o turismo costeiro (European ampliar a produção na medida em que o
cia destes instrumentos concebe a prerroga- como fundamentais para o desenvolvimen-
Figura 1. Fluxo dos Serviços Ecossistêmicos e seus benefícios
tiva para uma gestão sustentável ambiental- to da Economia Azul.
mente, no entanto, sua implementação é Uma Gestão Baseada em Ecossistemas
processual e envolve ações a curto, médio (GBE) pode ser definida como uma aborda-
e longo prazo, que venham a direcionar os gem que tenta compatibilizar os usos hu-
cenários para a gestão efetiva das áreas cos- manos dos ecossistemas, incluindo as ativi-
teiras, permitindo a consonância entre as dades econômicas e subsistência, com sua Estrutura do Benefícios a Valor
atividades econômicas e a manutenção dos manutenção, buscando o equilíbrio entre Serviço
Ecossistema e diferentes Econômico
ecossistemas e seus serviços. os benefícios de seu uso, a geração de ri- Ecossistêmico
função atores e Social
Para tanto, é importante contar com quezas e a sustentabilidade dos processos e
um diagnóstico territorial que considere estruturas dos ecossistemas provedores des-
os seguintes aspectos: levantamento dos ses mesmos benefícios (Pirot et al., 2000). Fonte: adaptado de Böhnke-Henrichs et al., 2013

254 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 255


ambiente marinho e os recursos biológicos das hipóteses) a redução de conflitos en- ambientes naturais que são cruciais para ecossistêmica é intimamente dependente
renováveis apresentam condições saudáveis. tre usos e recursos. Mas, um dos principais um setor econômico diferente. Um exem- do tempo, da escala e da localização. Além
Outras atividades onde essa ligação se ativos da atividade turística são os próprios plo são os aero geradores offshore e o disso, existem fatores externos como mu-
mostra relevante são a aquicultura, o setor ecossistemas, tornando-a dependente da turismo, uma vez que estes aerogerado- danças climáticas, pressões econômicas e
portuário e a navegação. A aquicultura, rela- saúde dos ambientes marinhos e costeiros. res podem alterar drasticamente as paisa- comportamento cultural que podem afetar
cionada ao setor dos recursos marinhos vivos, Isso significa que os impactos negativos gens, impactando um dos principais ativos as atividades socioeconômicas e sua rela-
depende diretamente da biodiversidade, es- nesses ecossistemas tendem a afetar direta do turismo costeiro. Outro exemplo é o ção com os SEs (Garcia-Onetti et al., 2018).
pecialmente de animais e plantas aquáticas, e indiretamente o setor econômico do tu- impacto da extração mineral de areia que Os setores da Economia Azul colaboram
e da qualidade da água. Os serviços dos ecos- rismo. O turismo costeiro, na UE, se confi- pode reduzir a capacidade de controle da direta e indiretamente para a economia, na
sistemas marinhos de diluição e filtragem de gura como o setor que contribui em maior erosão das dunas, refletindo no turismo medida em que promovem contribuições
poluentes são de extrema importância para a valor para a Economia Azul, principalmen- (redução da área de praia) e na infraes- ao setor específico e, ao mesmo passo,
aquicultura. A transformação de manguezais te em valor acrescentado bruto (VAB), lu- trutura urbana, tornando-a suscetível aos promovem uma cadeia de valor acrescen-
e marismas em ambientes antrópicos afeta cro e empregos, uma vez que se destaca eventos de erosão e inundação. tado sobre setores da economia adjacente,
a qualidade da água e a disponibilidade de pela acentuada utilização de mão de obra, Por outro lado, Böhnke-Henrichs et al. gerando renda e emprego.
matérias-primas para a aquicultura. frequentemente oriundos de pequenas e (2013) apontam que algumas atividades se Dessa forma, entender como se dá a ges-
Já o setor de transporte marítimo e o médias empresas locais ou familiares (Euro- beneficiam de outra atividade e, em última tão territorial destes sistemas é crucial para
das atividades portuárias, têm sua logís- pean Commission, 2020). análise, dos SEs que beneficiam essa outra um planejamento integrado e eficiente. Em-
tica intimamente ligada aos ambientes Pensar em uma Economia Azul pressu- atividade. Por exemplo, o turismo se benefi- bora os planejamentos setoriais continuem
costeiros e marinhos, sendo que um ciclo põe a compatibilização de diversas ativida- cia da pesca e da aquicultura, o que significa sendo fundamentais para o desenvolvimento
econômico completo apenas terá longe- des em um espaço pré-definido (Zona Cos- que o turismo também se beneficia dos SEs econômico, integrá-los e compatibilizá-los
vidade se for considerada a manutenção teira, Zona Econômica Exclusiva, etc), tendo que apoiam a pesca (habitats, biodiversida- em uma visão de ordenamento territorial é
de SEs básicos quando da construção de como base a gestão ecossistêmica. Algumas de, berçário, dentre outros). um passo indissociável da Economia Azul.
infraestruturas como, por exemplo, a destas atividades podem ter uma dupla rela- Outro exemplo são as indústrias de mi- É fato que o conhecimento científico
filtragem de poluentes, a proteção costeira ção com determinados SEs, beneficiando-os neração, petróleo e gás que se beneficiam é importante para embasar a GCI e dar
e o controle de erosão. Ambas as atividades e impactando-os negativamente. Barragán de portos e rotas marítimas, e, portanto, suporte a uma Agenda da Economia Azul
desempenham papel fundamental na (2014) descreve esse comportamento como também dependem, por exemplo, do con- no país, especialmente no contexto da
economia e no comércio da UE, na geração um processo autofágico. Como exemplos o trole da erosão. No entanto estas ativida- GBE. No entanto, para uma gestão efetiva
de empregos diretos e indiretos (European autor cita o turismo e a pesca. des são frequentemente alicerçadas por e tomadas de decisão mais assertivas,
Commission, 2020). Como exemplo de O turismo se beneficia em grande parte empresas de grande porte e fortemente é necessário incorporar as perspectivas
medida para a mitigação de impactos, a de um sistema natural que possibilita diver- capitalizadas, se utilizam de um número de todos os atores envolvidos em uma
adoção do transporte multi-atividades com sas experiências aos usuários, mas, por ou- reduzido no quadro de trabalhadores e em escala apropriada, através de espaços
logística otimizada, tende a reduzir os im- tro lado, pode ser responsável por deterio- muitos casos tendem a desenvolver me- participativos que permitam que os grupos
pactos ambientais, viabilizando a utilização rar a mesma paisagem em que se baseia, nos relações diretas com as comunidades conversem e exponham seus interesses e
de frotas ecológicas, reduzindo potenciais principalmente quando a atividade não vem locais, ao contrário do turismo costeiro. opiniões, diminuindo assim as chances de
danos aos ecossistemas e seus serviços. acompanhada de minucioso planejamento Assim, de acordo com a European Com- que o resultado final desagrade as partes
Entre os setores da Economia Azul, o tu- de desenvolvimento (Butler, 2004). Já a ati- mission (2020), reflete em uma fração interessadas (Granek et al., 2009), ou ain-
rismo é uma das principais atividades gera- vidade econômica da pesca se configura em considerável dos lucros gerais e ao mesmo da não dialogue com a realidade local.
doras de renda e é associada a um grande um clássico exemplo de esgotamento do tempo uma fração mínima do percentual Para a instrumentalização do ordena-
número de SEs, indicando sua relevância mesmo SE do qual o setor é dependente. de empregos relacionados à Economia mento do território marítimo, a Comissão
no contexto costeiro e oceânico. A ativi- Outro tipo de relação discutida por Barra- Aul, tendo seu rendimento atenuado em Oceanográfica Intergovernamental (COI)
dade turística tem como principal caracte- gán (2014) diz respeito à incompatibilidade 11% no período entre 2009 e 2018. tem divulgado e apoiado o desenvolvimen-
rística a capacidade de ser compatível com entre atividades, que ocorre quando uma Todo esse complexo arcabouço que en- to do PEM (Planejamento Espacial Marinho)
outras atividades, propiciando (na melhor atividade tem o potencial de danificar volve uma economia baseada na gestão junto a seus estados membros, o que pode ser

256 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 257


entendido como uma experiência incipiente veis (local, regional e nacional) passa a ser simultaneamente aos mares oriundos do hídricos para o gerenciamento integrado de
de transição de sustentabilidade. Para a UE um objetivo a ser atingido. interior, através de bacias hidrográficas e bacias hidrográficas, o que extrapolou os
o PEM é um instrumento técnico e político, Para se pensar na Economia Azul, a es- tendem a infringir alterações significativas aspectos econômicos, hidrológicos, sociais,
considerado como uma importante ferra- cala regional é prioritária. Ainda que seja no ambiente marinho (Coccossis et al., e demográficos, passando a contemplar
menta para desenvolvimento sustentável clara a importância de projetos e ações 1999; Nicolodi et al., 2009; Mulazzani & também as dimensões sobre a conservação
da Economia Azul das zonas marinhas e re- locais, bem como a definição de uma es- Malorgio, 2017; Scherer e Nicolodi, 2021), de habitats e espécies fluviais e ecossiste-
giões costeiras. O objetivo geral do PEM é tratégia nacional, a região deveria emergir como poluição e perda de habitats. Em mas adjacentes (Massoud et al., 2004). Este
gerenciar as atividades humanas no espaço como escala institucional de organização um sentido inverso, marés, ondas e ventos paradigma tem como abordagem o geren-
marítimo de forma que estas sejam desen- política e fiscal, sendo para isso, crucial a provenientes do oceano podem impactar ciamento integrado de múltiplos recursos e
volvidas cumprindo seus propósitos sociais existência de um projeto nacional que in- áreas costeiras e, em caso de incidentes setores visando o desenvolvimento susten-
e econômicos, mas ainda considerando a clua a instância regional com algum grau com hidrocarbonetos, por exemplo, po- tado regional, uma vez que busca minimi-
eficiência, a segurança e a sustentabilidade de autonomia e dotado de capacidade po- dem contaminar vários quilômetros em zar os potenciais efeitos adversos sobre as
necessárias para a manutenção do equilíbrio lítica e não apenas como uma mera ferra- direção a terra (Coccossis, 2004; Disner & dimensões econômica, social e ecológica
e da saúde do ambiente marinho. Dado que menta acessória (Bercovici, 2003; Barbosa Torres, 2020; Magris e Giarrizzo, 2020). (Nakamura, 2003). Uma vez que a ZC cons-
60% dos oceanos estão sob responsabili- e Randolph, 2019). É inegável que usos e atividades titui parte relevante de bacias exorréicas,
dade compartilhada, faz-se imprescindível Segundo Barbosa e Randolph (2019), humanas no mar, os quais são partes (bacia com águas levadas diretamente para
a cooperação internacional e os princípios para pensar o Brasil do século XXI o plane- relevantes da Economia Azul, estão o mar aberto) tem sua sustentabilidade de-
comuns sobre o uso do meio marinho, for- jamento regional é imprescindível para que conectados e são altamente dependentes pendente, em parte, de abordagens de ges-
talecendo a governança global dos oceanos se tenha um projeto de nação. Deve-se res- dos ecossistemas e infraestruturas terres- tão adotadas no âmbito das bacias.
com intuito de reduzir as pressões e aumen- gatar a concepção de planejamento regio- tres, não podendo existir sem essa interação No Brasil, a Política Nacional de Recur-
tar os usos sustentáveis. Na Agenda 2030 nal como instrumento para o desenvolvi- (European Commission, 2020; Garcia et sos Hídricos – PNRH, estabelecida em 1997
da ONU para o desenvolvimento susten- mento e para a redução das desigualdades al., 2020; Morillo & Spalding, 2017). pela Lei nº. 9.433, tem como um de seus
tável, o PEM visa contribuir ao Objetivo de sociais e territoriais. Tanto as Zonas Costeiras, as Bacias Hi- pressupostos a bacia hidrográfica como
Desenvolvimento Sustentável 14 (ODS 14), E, para pensar esse planejamento em drográficas e a Zona Econômica Exclusiva unidade territorial para o desenvolvimen-
relacionado à vida subaquática (European escala regional que sirva como suporte ao (ZEE) possuem suas políticas e instrumentos to do planejamento de recursos hídricos.
Commission, 2020). desenvolvimento de uma Economia Azul, de gestão específicos, os quais acabam por O Conselho Nacional de Recursos Hídricos
Neste cenário, a questão da escala o Brasil já possui sistemas estabelecidos de ter rebatimentos nos aspectos econômicos – CNRH é a instância superior para articu-
geográfica tem especial relevância para o gestão para três espaços em especial: as Ba- dos oceanos. Uma premissa indiscutível é: lar a integração das políticas públicas em
desenvolvimento de uma Economia Azul, cias Hidrográficas, a Zona Costeira e a Zona quanto melhor e mais integrados forem os relação aos recursos hídricos, tendo como
especialmente em um país de dimensões Econômica Exclusiva. Integrá-las, na medida planejamentos estratégicos para estas por- principal instrumento facilitador do pro-
continentais como o Brasil. Partindo do do possível, é uma tarefa árdua, mas que ções do território melhores serão os resul- cesso de gestão o Comitê de Bacias Hidro-
pressuposto de que o ordenamento territo- trará benefícios concretos no escopo de tados em termos de geração de riquezas, gráficas. Uma das principais diretrizes da
rial da ZC é crucial para a Economia Azul, uma Economia Azul que seja, efetivamente, sustentabilidade de utilização de recursos PNRH é “a integração da gestão das bacias
a integração de planejamentos nos três ní- pensada em bases ecossistêmicas. naturais, qualidade dos ambientes e manu- hidrográficas com a dos sistemas estuarinos
tenção dos serviços ecossistêmicos básicos. e zonas costeiras”. Para tanto, em 2005,
3. A integração da Zona Costeira com as bacias hidrográficas e com a Os limites terrestres da ZC, claramen- foi criada (por meio da Resolução nº. 51 do
Zona Econômica Exclusiva (ZEE) te definidos na legislação com base nos CNRH) a Câmara Técnica de Integração da
limites municipais, são sobrepostos pelas Gestão das Bacias Hidrográficas e dos Siste-
Uma das premissas mais básicas da re- de uma questão complexa em termos de bacias hidrográficas, as quais têm sua defi- mas Estuarinos e Zona Costeira – CTCOST
lação das ZC com suas regiões limítrofes iniciativas de gestão territorial (Van Assche nição nos aspectos físicos das redes de dre- (Nicolodi et al, 2009). Esta câmara técnica
é a de que “O que acontece na terra in- et al., 2020) e que acabará por impactar nagem. Em termos de gestão destes espa- discutiu esta integração entre estes dois sis-
fluencia o oceano e vice-versa”. Uma afir- as relações econômicas deste espaço. Água ços, percebe-se que houve uma evolução temas (Zona Costeira e Recursos Hídricos)
mação simples como essa pode ser o início doce, sedimentos e contaminantes chegam dos sistemas de gerenciamento de recursos até o ano de 2019, quando foi desativada

258 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 259


por meio do Decreto 10.000/2019, passan- atividades marítimas é necessário a adoção Em 2019 o GT UCAM foi extinto, sendo essenciais para estabelecer uma Agenda
do a ter seus objetivos restritos à Câmara de estratégias de gestão baseada em ecos-
. Entrar na economia estatal em longo
substituído pelo GT PEM. Recentemente foi para a Economia Azul:
Técnica de Integração com a Gestão Am- sistemas, com destaque para o Planeja- criado o Comitê Executivo para a o Planeja-
biental e Territorial. mento Espacial Marinho (PEM). mento Espacial Marinho (CE-PEM) (Portaria

. Desenvolvimento da governança e pla-


prazo;
Quando se analisa a outra “fronteira” Para tanto, a sua implementação é MB 235/2020), no contexto da CIRM. O CE-
da gestão costeira, ou seja, a Zona Econô- apoiada por etapas de monitoramento e -PEM conta com 21 membros e tem como
mica Exclusiva (ZEE), todo o processo é re- avaliação da gestão (e aqui entram os es-
. Priorização de inovações (bioeconomia,
finalidade executar as tarefas necessárias ao nejamento estratégico;
lativamente mais recente, sendo centrada paços costeiros e oceânicos) através do cumprimento das metas e ao alcance do ob-
na figura do Planejamento Espacial Ma- desenvolvimento de indicadores para ob- jetivo estabelecido para a Ação Planejamen-
combate à poluição, diversificação da ma-
rinho (PEM). O PEM é definido em Ehler jetivos ecológicos, econômicos e sociais to Espacial Marinho - PEM do PSRM.
triz energética, avanços nos recursos de ex-
(2021) como a gestão do oceano baseada (COI, 2021). Em termos globais, em 2019 Ainda em fase quiescente, o PEM no
ploração, turismo, cultivo de algas, dentre
em ecossistemas, ou ainda em Ehler e Dou- setenta países possuíam alguma iniciativa Brasil não possui arcabouço legal. Consi-

. Desenvolver a cultura oceânica;


outros);
vere (2009) como um processo público de relacionada ao PEM, sendo que apenas 25 derando que a operacionalização da Eco-
análise e alocação da distribuição espacial e deles tinham Planos de Gestão Espacial
. Alinhamento com estratégias internacio-
nomia Azul atravessa o desenvolvimento
temporal das atividades humanas em áreas Marinha implementados ou aprovados por do PEM no Brasil, este é um entrave na
marinhas. Recentemente a Comissão Ocea- seus governos (Frazão Santos et al., 2018). Agenda da Economia Azul. A ausência de
nais.
nográfica Intergovernamental da Organiza- No Brasil, apesar de não institucionali- um PEM que desconsidere a governança
ção das Nações Unidas para a Educação, a zado por instrumento legal, o PEM foi uma e a GBE corre o risco de reduzir a Econo- O ordenamento marinho traz perspecti-
Ciência e a Cultura (COI-UNESCO) salientou das ações definidas no Plano Setorial Para mia Azul ao aumento da exploração oce- vas de uma Economia Azul em consonância
que o PEM é um processo abrangente e es- os Recursos do Mar (PSRM, 2010-2023) ânica, e nesse sentido, Gerhardinger et com os princípios da GBE, sendo preponde-
tratégico para analisar e alocar os usos de e permeou diversas ações do Plano de al. (2019) estabeleceram alguns pontos rante para o seu desenvolvimento.
áreas marinhas a fim de minimizar conflitos Ação Federal (PAF 2017-2019). Conforme
entre atividades humanas e maximizar be- Gandra et al. (2018), o Brasil iniciou o pro- 4. A gestão Costeira no Brasil
nefícios, enquanto assegura a resiliência dos cesso de elaboração do PEM em 2011,
ecossistemas marinhos (UNESCO-IOC and tendo como marco zero uma sessão do A gestão de um território pressupõe um e as ciências, tecnologias e culturas em
European Commission, 2021, pg. 23) Grupo de Integração do Gerenciamento planejamento prévio, visando identificar uma política pública dedicada ao tema.
Segundo COI da UNESCO, o conceito de Costeiro (GI-GERCO - Extinto pelo Decreto vocações e fragilidades tanto do ponto de Ao se analisar a política de Gestão Cos-
Economia Azul é uma lente para ver e de- nº 9759/2019), que se desdobrou, em vista ambiental, quanto socioeconômico e teira Integrada (GCI) no país, pode-se dizer
senvolver agendas de políticas que melho- 2013, em um grupo específico destinado a tecnológico. Toda a premissa deste plane- que o início de sua implementação se deu,
rem simultaneamente a saúde dos oceanos esta temática no âmbito da Comissão Inter- jamento parte de três conceitos básicos: efetivamente, em 1988 pela Lei 7661/88 e
e o crescimento econômico, de maneira ministerial para os Recursos do Mar (CIRM), território, espaço e região (Nicolodi, 2021). regulamentada 16 anos depois pelo Decre-
compatível com os princípios de equidade o GT UCAM (Grupo de Trabalho Uso Com- Limonad (2004) ressalta que o planeja- to Federal 5300/2004. Todo esse arcabou-
e inclusão social. Tanto a UE como a COI partilhado do Ambiente Marinho). Um im- mento de uma região pode ser interpretado ço é resultado de um processo que vinha
incentivam a utilização de um roteiro con- portante marco desta discussão ocorreu em como uma construção social que tende a amadurecendo desde o começo da década
junto, que conta com cinco etapas princi- 2014 com o seminário intitulado “Planeja- atender interesses políticos, sendo um pro- de 1970, época na qual a Gestão Costeira
pais: (1) Incentivar o PEM transfronteiriço; mento Integrado do Espaço Marinho”, com duto de práticas hegemônicas e contra he- Integrada teve seu marco inicial, se confi-
(2) Promover a Economia Azul em sintonia a troca de experiências nacionais e interna- gemônicas, constituindo-se em uma parte gurando como um processo de gestão com
com a Agenda 2030; (3) Estimular o PEM cionais. Desde então, o PEM obteve avan- da construção social do espaço de uma so- foco eminentemente territorial.
baseado em ecossistemas; (4) Capacitação ços pontuais em algumas áreas do extenso ciedade. Assim, o planejamento e a gestão Mais recentemente, um ponto de vis-
em todas as dimensões; (5) Compreensão e litoral brasileiro, principalmente em inicia- integrada deveriam agregar de forma lógi- ta complementar vem sendo incorporado
comunicação mútuas. Nesse sentido, para tivas de caráter acadêmico, estando ainda ca os diferentes setores de interesse (eco- na concepção do próprio conceito: a GCI
promover a Economia Azul, e por conse- em uma fase inicial de pré-planejamento nômicos e sociais), as diferentes escalas es- também se configura como uma discipli-
quência o desenvolvimento sustentável das (Gerhardinger et al., 2019). paciais, os diferentes níveis governamentais na técnico-científica que é preocupada,

260 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 261


primordialmente, com a relação entre a so- O PNUMA alavancou a disseminação de No Brasil, os reflexos destes movimentos 4.1 Políticas e instrumentos de
ciedade e a ZC. Além disso, outros elementos outras iniciativas de mesmo caráter, mas impulsionaram a criação, em 1974, da Co- gestão na zona costeira do Brasil
são foco de sua análise enquanto disciplina, com especificidades territoriais e de propó- missão Interministerial para os Recursos do
como a aplicação de modelos participativos sitos próprios. Um exemplo é a adoção da Mar (CIRM), que tem como objetivo reger O Art. 7º do Decreto Federal 5300/2004
de administração, a busca de um conheci- Convenção Internacional para a Prevenção as discussões acerca da temática. Consequ- traz em seu escopo a necessidade de apli-
mento integrado, a cooperação e coorde- da Poluição por Navios (MARPOL), ocorrida ência direta da criação dessa Comissão foi a cação, de forma articulada e integrada, de
nação institucional e difusão dos resultados logo após o encontro de Estocolmo (Nico- promulgação, em 1980, da Política Nacional um conjunto de nove instrumentos. Eviden-
nos processos de gestão (Barragán, 2016; lodi & Gruber, 2020). Um ponto referencial para os Recursos do Mar (PNRM) (Marroni & temente o significado desta aplicação arti-
Barragán & de Andrés, 2020). Tais concep- para a Gestão Costeira Integrada enquanto Silva, 2015). Em 1983 foi criada, no âmbito culada e integrada é uma questão ampla-
ções, quando somadas, contribuem à noção política pública foi o US Coastal Zone Ma- dessa mesma Comissão, uma subcomissão mente debatida e apresenta diversos vieses
de “governança costeira”, a qual é definida nagement Act, promulgado também em específica para tratar do gerenciamento conforme os interesses daqueles que parti-
por Polette (2020) como um sistema mais 1972, nos Estados Unidos. costeiro e que pode ser considerada como cipam de tal debate. Ainda assim, é inegá-
abrangente do que um sistema de gestão, Esta iniciativa pode ser considerada um o embrião do que viria a ser o Grupo de vel a importância de que tais instrumentos
não se resumindo à esfera governamental. instrumento de gestão que estabeleceu o Integração do Gerenciamento Costeiro (GI- sejam definidos de forma clara e concisa na
Estas visões complementares formam manejo colaborativo e voluntário da ZC no -GERCO), instituído em 1996 e com atua- legislação relacionada à temática.
um conjunto do que pode ser considerada âmbito das esferas federal e estadual, reco- ção expressiva até 2019, quando teve sua O Quadro 1 é uma síntese dos instrumen-
a Gestão Costeira Integrada: um processo brindo quase a totalidade da costa daquele importância e representatividade significati- tos de gestão mais relevantes no processo
de gestão diretamente vinculada ao Esta- país (Humphrey et al., 2000). Para muitas vamente reduzida (Santos et al., 2019). de GCI no Brasil. Uma leitura superficial fo-
do, que necessita de participação social nações ocidentais este foi um marco na dis- Desde 1988, ano da implementação da cada apenas no escopo destes instrumentos
efetiva e de aporte técnico e científico, cussão, então incipiente, do ordenamento política de GCI no Brasil até os dias atu- remete à percepção de um encadeamento
sendo que este último pode ser encon- dos espaços costeiros e de sua agenda de ais, o contexto econômico, socioambiental, lógico, com a definição de planos nas três
trado nas diversas linhas de pesquisa em gestão pública e privada. tecnológico e de gestão da ZC brasileira foi esferas de governo (federal, estadual e mu-
Universidades e Centros de Investigação Diversos foram os momentos históricos se alterando paulatinamente e nem sem- nicipal) e com sua execução coordenada por
ao redor do planeta (Nicolodi, 2021). onde foi observada a necessidade da imple- pre a resposta dada pelas políticas e seus um Plano de Ação Federal (PAF) mais amplo,
No caso do Brasil, Polette (2020) conside- mentação de uma gestão de espaços litorâ- instrumentos foram compatíveis com seus complementado, ainda, por sistemas de mo-
ra que o Plano Nacional de Gerenciamento neos que respeitasse suas especificidades. objetivos. Uma atualização importante em nitoramento e de análise de dados (Nicolodi
Costeiro – PNGC habilita a plena governança Um destaque pode ser dado à Eco-92, ocor- todo esse contexto foi a migração de inte- e Gruber, 2020; Nicolodi, 2021).
da ZC, por meio de uma ampla articulação rida no Rio de Janeiro, onde a menção a esta resses, definições, políticas e instrumentos Além disso, dois instrumentos comple-
de políticas públicas (setoriais, ambientais e necessidade foi destacada no Capítulo 17 da cada vez mais no sentido offshore. mentam este arcabouço: o Projeto ORLA,
urbanas) destinadas a otimizar o potencial de Agenda 21. Outros momentos importantes A indiscutível interação entre a ZC e o oce- que atua em escala local, com foco na par-
desenvolvimento que tais espaços represen- foram materializados na criação do Comitê ano torna-se uma questão central, seja do ticipação social (Oliveira e Nicolodi, 2012;
tam, e validam os instrumentos das políticas Intergovernamental para a Estrutura da Con- ponto de vista dos ambientes (seus ecossiste- Scherer et al., 2020) e o PROCOSTA (que
públicas, como elementos chave da gestão venção sobre Mudanças Climáticas, do Co- mas e serviços ambientais associados) quanto atua em escala regional, com uma aborda-
territorial permitindo assim sua implementa- mitê Intergovernamental sobre a Diversidade do setor produtivo, o qual cada vez mais se gem focada na concepção física da linha
ção no âmbito da governabilidade. Biológica, do Painel Intergovernamental so- debruça sobre a questão da interconectivi- de costa). Mas, ao se analisar trabalhos
Para compreender como foi pensado o bre Mudanças Climáticas (IPCC), na RIO+10, dade de atividades exclusivamente marinhas que focaram (sob diversas óticas e escalas)
PNGC deve-se analisar alguns fatos crono- na RIO+20, dentre tantos outros. Outro mar- (petróleo e gás, aquicultura, navegação, con- a existência, aplicação e efetividade deste
lógicos, como por exemplo, o ano de 1972, co importante foi estabelecido pela criação servação marinha etc.) com suas bases em ter- conjunto apresentado no Quadro 01, po-
onde a Conferência das Nações Unidas so- da Comissão Oceanográfica Intergoverna- ra (portos, refinarias, serviços ecossistêmicos de-se inferir uma intensa heterogeneidade
bre Dimensão Humana do Meio Ambiente mental (COI – UNESCO), ainda em 1960, etc.). Toda esta interdependência entre setores em termos de métodos, ações e resultados
realizada em Estocolmo foi um catalisador sendo até hoje a única organização com produtivos, logística, infraestruturas e serviços da GCI no Brasil (Gruber et al., 2003; Asmus
para a criação do Programa de Meio Am- competência para tratar de assuntos relacio- ecossistêmicos se configura como um ponto et al., 2006; Dias et al., 2007; Jablonski &
biente das Nações Unidas (PNUMA). nados às ciências do mar no sistema da ONU. central na discussão de uma Economia Azul. Filet, 2008; Nicolodi & Zamboni, 2008;

262 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 263


Oliveira & Nicolodi, 2012; Novak & Polette, ou ainda, com a organização e sistemati- Instrumentos de Descrição Legislação
2015; Cristiano et al., 2018; García-Onet- zação de informações que são cruciais ao Gestão Costeira
ti, 2018; Nicolodi et al., 2018; Scherer et desenvolvimento de uma Economia Azul.
al., 2018; Baratella et al., 2020; Nicolodi & São eles: Macrodiagnóstico da ZC (MDZC), Sistema de Informação de Componente do Sistema Nacional de Decreto 5300/04
Gruber, 2020; Scherer et al., 2020; Nico- PROCOSTA e Projeto ORLA. Interessante Gerenciamento Costeiro - Informação Ambiental - SINIMA, que
lodi, 2021; Nicolodi et al, 2021; Scherer & notar que cada um deles apresenta uma SIGERCO inclui informações georreferenciadas
Nicolodi, 2021). escala geográfica de atuação distinta, res- sobre a zona costeira.
Uma breve análise dos instrumentos de pectivamente, nacional, regional e local. Estrutura operacional para coleta Decreto 5300/04
gestão existentes para a ZC do Brasil permite A seguir será oferecido um breve detalha- contínua de dados e informações,
inferir que três deles possuem destacada in- mento de cada um deles, conectando-os aos monitoramento da dinâmica de uso e
terface com a gestão de base ecossistêmica, preceitos e desafios da Economia Azul. ocupação da zona costeira e avaliação de
metas de qualidade socioambiental
Quadro 1. Instrumentos de gestão do Gerenciamento Costeiro Integrado do
Sistema de Qualidade Consolida periodicamente os resultados Decreto 5300/04
Brasil definidos no Decreto 5.300, acrescentadoso Projeto ORLA e o PROCOSTA produzidos pelo monitoramento
Ambiental da zona
costeira RQA ambiental e avalia a eficiência e eficácia
Instrumentos de Descrição Legislação
das ações de gestão
Gestão Costeira
Zoneamento Ecológico- Orienta o processo de planejamento O art 3º da Lei
Plano Nacional de Conjunto de diretrizes gerais aplicáveis Lei 7661/88 Econômico Costeiro espacial necessário à obtenção das 7661/88 faz menção
Gerenciamento Costeiro - em diferentes níveis de governo - ZEEC condições para o desenvolvimento à necessidade de
PNGC e escalas de ação, orientando a sustentável da zona costeira, em zoneamento de usos
implementação de políticas, planos consonância com as diretrizes do e atividades na Zona
e programas voltados para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Costeira, mas sua
desenvolvimento sustentável da zona território nacional, como mecanismo definição ocorre no
costeira. de apoio às ações de monitoramento, Decreto 5300/04
licenciamento, inspeção e gestão.
Plano de Ação Federal - Planejamento de ações estratégicas Decreto 5300/04
PAF para a integração de políticas Macro-diagnóstico da Reúne informações, em escala nacional, Decreto 5300/04
públicas na zona costeira, buscando zona costeira - MDZC sobre as características físico-naturais e
responsabilidades compartilhadas pela socioeconômicas da zona costeira, com o
ação. objetivo de orientar ações de preservação,
conservação, regulação e fiscalização do
Plano Estadual de Implementa a Política Regional de Mencionado na Lei patrimônio natural e cultural.
Gerenciamento Costeiro - Gerenciamento Costeiro, define 7661/88 e detalhado
PEGC responsabilidades e procedimentos no Decreto 5300/04 Projeto de Gestão Tem como objetivo planejar e implementar Decreto 5300/04
institucionais para sua execução, com Integrada da Orla ações nas áreas com maior demanda de
base no PNGC. Marítima - Projeto Orla intervenções na costa, a fim de disciplinar o
uso e ocupação do território.
Plano Municipal de Implementa a Política Municipal de Mencionado na Lei
Gerenciamento Costeiro - Gerenciamento Costeiro, define 7661/88 e detalhado Programa Nacional de Tem como objetivo promover a gestão Programa mais recente,
PMGC responsabilidades e procedimentos no Decreto 5300/04 Conservação da Linha integrada da costa, seu conhecimento não consta na Lei
institucionais para sua execução, com Costa - PROCOSTA técnico e científico, suas variações nº 7.661/88 e no
base no PNGC e no PEGC, e também de acordo com eventos extremos e Decreto nº 5.300/04.
deve observar os demais planos de mudanças climáticas, usos múltiplos e Foi normatizado pela
uso e ocupação territorial ou outros proteção dos ecossistemas marinhos e Portaria MMA nº
instrumentos de planejamento costeiros. 76/2018
municipal. Fonte: adaptado de Nicolodi e Gruber, 2020, Nicolodi (2021) e Scherer e Nicolodi, 2021

264 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 265


4.1.1 Macrodiagnóstico da Zona especificamente entre os instrumentos de realizados (Souza, 2019). Tais testes têm po- do aproximadamente 5 milhões na capital.
Costeira do Brasil (MDZC) gestão e suas respectivas ferramentas. Nes- tencial para avançar com a introdução de va- Além desses autores, muitos outros já discu-
se contexto, o MDZC teve especial desta- riáveis econômicas que poderiam fornecer a tiram a vulnerabilidade da ZC tendo como
A primeira versão do MDZC na Escala que em função do mesmo ser um fornece- base técnica e conceitual para a construção principais ameaças os efeitos das mudanças
da União foi publicada em 1996, resultan- dor de subsídios para a tomada de decisão, do PEM, já com a noção de integração en- climáticas. Um bom panorama deste cená-
te de um esforço de avaliação do processo ainda que não seja, em sua essência, um tre estes instrumentos embutida desde sua rio pode ser encontrado, tanto do ponto de
de Gerenciamento Costeiro no país. Como instrumento de planejamento territorial ou concepção, evitando assim esforços poste- vista acadêmico quanto governamental nos
produto de atualização deste diagnóstico, de definição direta de ações e políticas. riores para compatibilização entre ambos. trabalhos de CGEE (2007); IOC (2009); Ne-
em 2008, foi publicada a segunda versão do O MDZC oferece subsídios para articu- ves e Muehe (2010), Tagliani et al. (2010);
MDZC, com a inserção de novas combina- lação interinstitucional dentro das agências 4.1.2 Programa Nacional para CEPAL (2011); PBMC (2013); Zanetti et al.,
ções de análises de impactos diretos e indi- federais em relação a planos e projetos que Conservação da Linha de Costa – (2016); Lima e Bonetti (2018); Lins-de-Bar-
retos na costa brasileira, principalmente em podem afetar áreas e recursos costeiros e PROCOSTA ros et al., (2020), entre outros.
função da migração cada vez maior em di- marinhos. Além disso, há uma visão geral da Para a European Commission (2020), cer-
reção à offshore de atividades econômicas, costa brasileira relacionada aos cenários de Segundo a European Commission (2020), ca de 95% de impactos oriundos de mudan-
bem como da preocupação com a conserva- risco (MMA, 1996; MMA, 2008). Do ponto aproximadamente 1/3 da população da ças climáticas poderiam ser evitados através
ção de áreas marinhas (MMA, 1996; 2008). de vista teórico, o MDZC é um dos instru- União Europeia (UE) vive a menos de 1km da de planejamento e mitigação, por exemplo,
A principal característica desse instru- mentos que possui uma das maiores inter- costa e cerca de 72.000 pessoas são expos- com a elevação de diques pré-existentes em
mento é seu atributo de agregar e inter-re- faces com o PEM. O MDZC tem potencial tas às inundações costeiras todos os anos. Os assentamentos humanos e em áreas econo-
lacionar informações de base referentes às para integrar, sob a ótica de diagnóstico, a danos causados pelas inundações costeiras micamente importantes ao longo da linha
características socioeconômicas e físico-na- porção terrestre da ZC com o Zoneamento na UE totalizam atualmente 1bilhão de euros costeira. Na ausência de novos investimentos
turais, propiciando uma visão de conjunto Ecológico-Econômico e a porção marinha anuais (equivalente a 0,01% do PIB atual da em adaptação costeira, projeta-se que as per-
do litoral brasileiro no que se refere aos ce- com as iniciativas de PEM (Scherer e Nicolo- UE), sendo a França que atualmente sofre o das anuais decorrentes de inundações costei-
nários existentes e potenciais de riscos. di, 2021). Esta integração pode ser um fator maior dano (0,2 bilhões de euros/anuais). As ras na UE cresçam para 18,9 bilhões de euros
Deve-se ressaltar que o MDZC tem, na chave dentro de um escopo de planejamen- estimativas de elevação do nível do mar, se e 32,3 bilhões até meados do século.
escala da União, uma percepção mais ade- to estratégico com rebatimento direto no desacompanhadas de medidas de mitigação Este cenário é objeto do Programa Na-
quada sobre fenômenos com potencial de desenvolvimento de uma Economia Azul. e adaptação poderiam causar danos de 814 cional para Conservação da Linha de Cos-
evitar possíveis polarizações entre estados e Como exemplo, podemos citar alguns bilhões de euros até 2100, afetando pelo ta (PROCOSTA), que foi criado tendo como
regiões e a multiplicação de projetos parcial- métodos de utilização de sistemas hierár- menos 3 milhões de cidadãos da UE. base o conjunto de mudanças climáticas as-
mente duplicados com desperdício de espa- quicos de classificação de habitats (Con- No Brasil, que possui uma das mais ex- sociado à dinâmica natural e dos processos
ço e recursos. Esta escala (União) permite a galton 1991; Booth et al. 1996; Connor tensas ZC do mundo com mais de 8.500 econômicos e sociais identificados nos últi-
regulação de formas de gestão, o estabele- et al. 2004), como o Coastal and Marine km, 26,6% da população vive na ZC, que mos anos no país. Este Programa foi institu-
cimento de regras de parcerias, bem como Ecological Classification Standard (CME- compreende 17 estados da federação e ído por meio da Portaria MMA nº 76/2018
permite aportar situações que podem ser CS), e o European Union Nature Informa- abriga 13, das 27, capitais brasileiras. Nico- e visa promover a gestão integrada da linha
induzidas, incentivadas, fiscalizadas ou res- tion System (EUNIS). Estes sistemas aplicam lodi e Pettermann (2010) estimaram, com de costa, seu conhecimento técnico-cien-
tringidas, tanto do ponto de vista econômi- chaves de classificação específicas para ha- base em dados de risco natural, social e tífico, suas variações conforme os eventos
co quanto ambiental (MMA, 1996; Nicolodi bitats estruturadas em níveis hierárquicos tecnológico oriundos do MDZC e Marinha extremos e mudanças do clima, usos múlti-
& Gruber, 2020, Nicolodi 2021). que permitem a aplicação destas chaves em do Brasil (MMA, 2008), os potenciais de vul- plos e proteção dos ecossistemas marinhos
Considerando a importância do PEM para escalas de milhares de km² até menos de nerabilidade da ZC, dando ênfase à relação e costeiros (PROCOSTA, 2018). Tal Progra-
o estabelecimento de uma Economia Azul, 1 m², abrangendo o litoral, zonas pelági- de população exposta e população total. ma trouxe um caráter inédito ao conjunto
Scherer e Nicolodi (2021) analisaram e iden- cas e bentônicas de estuários, zona costei- Apenas como exemplo, o Rio de Janeiro de instrumentos e ferramentas da GCI, uma
tificaram as oportunidades de integração ra e oceano aberto (Madden e Grossman, apresentou a mais alta relação, com uma vez tratar, de forma integrada e sob a ótica
da base já consolidada do GERCO ao PEM, 2004). Testes metodológicos iniciais para taxa de 78%, o que equivalia à época a um da Gestão com base Ecossistêmica, de qua-
ressaltando o potencial desta integração adaptação ao Brasil destes sistemas foram contingente de 11.194.150 habitantes, sen- tro eixos centrais para a gestão da costa:

266 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 267


a) Compatibilização da altimetria com a O projeto ORLA carrega em seu esco- a Economia Azul pressupõe uma integração, em 2015, por meio da Lei 13.240, a qual
batimetria5; po algumas especificidades em relação na medida do possível, com o projeto Orla. trata do Termo de Adesão à Gestão das
b) Projeção de Linhas de Costa Futuras e ao formato da participação social na de- Cabe ressaltar que desde 2018 a estru- Praias Marítimas (TAGP),. Este termo prevê
Identificação de Perigos; finição das ações e diretrizes que serão tura do ORLA está em processo de revisão, a transferência da gestão das praias da Se-
c) Risco Costeiros e Estratégias de Adapta- aplicadas na orla de um município. Ou- tanto do ponto de vista técnico e concei- cretaria de Patrimônio da União (SPU) para
ção; tra particularidade do ORLA diz respeito tual quanto do ponto de vista institucional os Municípios, conforme procedimento es-
d) Monitoramento e Gestão para a Conser- à escala desse planejamento nos espaços e político. Esta revisão se dá em função de pecífico a ser adotado pelas municipalida-
vação da Linha de Costa - Embora a portaria, litorâneos. O conceito de orla adotado um novo elemento que foi estabelecido des (SCHERER et al. 2020).
em seu Art. 3º, preveja que o PROCOSTA seja refere-se a um espaço pouco extenso, o
implantado pelo Ministério do Meio Ambien- qual necessita de detalhamento do pon- 5. Considerações finais
te, em 2019 o Programa teve seu desenvol- to de vista do ordenamento territorial,
vimento descontinuado, assim como pratica- ainda que boa parte dos processos que a Não há dúvidas de que o desenvolvimen- pré-existentes ou naqueles a serem ela-
mente toda a agenda de GCI no país. impactam ocorra para além de seus limi- to de uma Economia Azul tende a trazer borados. Ter a definição dos ecossistemas
Enquanto o MDZC atua na escala federal tes. Moraes (2004) define a orla como a ganhos significativos para a sociedade brasi- e serviços ecossistêmicos como parte da
e o Projeto ORLA tem como foco a escala borda marítima imediata de uma unida- leira. Estes ganhos perpassam o valor men- base territorial de um instrumento de pla-
local, o PROCOSTA visa uma atuação em es- de espacial maior, que, no planejamento surado em Reais e englobam fatores sociais nejamento é determinante para consecu-
cala regional, sendo o primeiro instrumen- brasileiro, é definida como a ZC, formada e ambientais. Mas, não se quebram paradig- ção de objetivos de um modelo de eco-
to de gerenciamento costeiro desenvolvido pelos territórios municipais do litoral. mas e conjunturas arraigadas em um sistema nomia sustentável, geradora de riquezas
desde a sua gênese sob a égide da gestão A partir do momento em que o Proje- de um dia para o outro. A adoção efetiva da e socialmente justa.
com base ecossistêmica. Tal configuração é to Orla é a política pública com incidência Economia Azul será gradual e deverá con- Pensar todo esse modelo pressupõe a
convergente com os preceitos da Economia mais direta na orla, sua representatividade siderar alguns fatores básicos, sem os quais definição de uma escala geográfica com-
Azul e, também, com a metodologia utiliza- em termos do desenvolvimento de uma ela não será representativa: Integração entre patível. Sem desmerecer e nem desconsi-
da para desenvolvimento do PEM. Economia Azul ganha relevância. A conexão setores econômicos, Gestão com base ecos- derar a importância das escalas locais e da
entre uma gestão com base ecossistêmica, sistêmica e Planejamento Regional. escala nacional, nos parece que pensar o
4.1.3 Projeto ORLA geração de riquezas, aprimoramento de ar- A integração entre setores econômicos desenvolvimento de um Planejamento Es-
ranjos produtivos locais e conservação da é um processo “chave” para o sucesso des- pacial Marinho (integrado ao sistema GER-
O Projeto ORLA foi inserido formal- qualidade ambiental necessita de espaços ta tarefa e o Brasil já conta com dois siste- CO) como base estratégica de uma Econo-
mente no contexto das políticas públicas para ocorrer. Estes espaços são mais com- mas de gestão que já foram gestados sob mia Azul remete à compreensão e adoção
da ZC pelo Decreto 5.300/04 a partir da plexos do que apenas uma porção do terri- a perspectiva da integração e outro que se da escala regional.
definição de um novo espaço geográfi- tório. Santos (1996) considera esse espaço encontra em fase de gestação: O Sistema Barbosa e Randolph (2019) relem-
co de gestão do território: a Orla Maríti- como um conjunto indissociável de sistemas de Gestão Costeira Integrada (GERCO), o bram que nos anos 1980 o modelo ne-
ma. Elaborado ainda no final da década de objetos e sistemas de ações, os quais Sistema de Gestão de Recursos Hídricos e oliberal adotado por governos e a crise
de 1990 com um escopo metodológico apresentam categorias analíticas internas, o Planejamento Espacial Marinho (PEM). fiscal e financeira foram determinantes
e um fluxo de ações específicas (em es- como por exemplo, a paisagem, a configu- Cabe ao país dar alto grau de prioridade para o apequenamento das experiências
cala local), o Projeto ORLA tem como ração territorial, a divisão territorial do tra- a estes sistemas e mantê-los/desenvolvê-los de planejamento regional. Crises como
objetivo otimizar o ordenamento dos es- balho, o espaço produzido ou produtivo, as da forma mais integrada possível, reduzin- essas reduzem o horizonte temporal das
paços litorâneos sob domínio da União, rugosidades, entre outras. do conflitos de interesse dos setores por ações governamentais em favor da pers-
aproximando as políticas ambiental, ur- Nesse sentido, a orla é a ligação mais dire- uso de recursos ou de espaço. pectiva de curto prazo, fazendo com que
bana e patrimonial (Oliveira & Nicolodi, ta entre uma Economia Azul focada nos oce- A gestão com base ecossistêmica está a perspectiva regional caia em desuso.
2012) com os demais setores, propician- anos e suas dependências e reflexos na ZC no cerne do conceito de Economia Azul. Para estes autores (e concordamos com
do oportunidades de desenvolvimento da (logística, serviços ecossistêmicos, etc). Pensar Mas ela precisa ser efetiva e atuante. A isso) é necessário resgatar a concepção
economia local, conservação ambiental e no desenvolvimento de um PEM que venha a melhor forma de atingir essa meta é inse- de planejamento regional com instrumen-
participação pública. ser a base de planejamento estratégico para ri-la/adaptá-la aos instrumentos de gestão to para o desenvolvimento econômico

268 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 269


(Economia Azul) e para a redução de desi- Ecossistêmica como base para o modelo de Max Limonad, 2003. CENTRO DE GESTÃO E ESTUDOS ESTRA-
gualdades sociais e territoriais. Economia Azul é um destes grandes temas. BLYTHE, J.; ARMITAGE, D.; ALONSO, G.; TÉGICOS. Mar e Ambientes Costeiros.
O desenvolvimento de um Economia Azul Por fim, alerta-se para o cenário de não CAMPBELL, D., DIAS, A. C. E.; EPSTEIN, Brasília, DF: CGEE, 2007.
é uma oportunidade ímpar para o Brasil vol- estabelecimento das conexões discutidas G.;.. & NAYAK, P. Frontiers in coastal well- CLARK, J. R. Coastal zone management
tar a pensar o planejamento na escala da neste capítulo, ou seja, a integração do -being and ecosystem services research: A for the new century. Ocean & Coastal
região. Para Barbosa e Randolph (2019) é o planejamento estratégico em todos seus systematic review. Ocean & Coastal Ma- Management, v. 37, n. 2, p. 191-216,
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os possíveis cenários de fragmentação do respectivos instrumentos. Este cenário BÖHNKE-HENRICHS, A.; BAULCOMB, C.; 5691(97)00052-5.
Brasil. Ainda em meados da década de 1990, aumenta a probabilidade do desenvolvi- KOSS, R., HUSSAIN, S. S.; & DE GROOT, COCCOSSIS, H. Integrated Coastal Ma-
Araújo (1995) alertava para a necessidade de mento de produtos (os quais acabam por R. S. Typology and indicators of ecosystem nagement and River Basin Management.
se ampliar os horizontes de investigação para subsidiar a tomada de decisão) focados services for marine spatial planning and Water, Air, & Soil Pollution: Focus, v.
além das relações de causa e consequência exclusivamente nas áreas marinhas (em management. Journal of Environmental 4, n. 4/5, p. 411-419, 2004. https://doi.
de fatores como a industrialização e inserir detrimento às zonas costeiras), o que re- Management, n. 130, p. 135-145, 2013. org./10.2166/wp.2004.0034.
novos e grandes temas no âmbito nacional presentará um desperdício de esforços e BOOTH, J.; HAY, D. E.; TRUSCOTT, J.Stan- COCCOSSIS, H.; BURT, T.; & WEIDE, V. D.
e internacional. Sem dúvidas, a gestão dos de recursos, uma vez que não será levada dard Methods for Sampling Resour- J. Conceptual framework and planning
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274 ECONOMIA AZUL A Gestão da Zona Costeira do Brasil 275


14

A POLUIÇÃO MARINHA COMO


RESPONSABILIDADE DE TODOS

Adriana Isabelle Barbosa Lima de Sá Leitão


Solange Teles da Silva
Tarin Cristino Frota Mont’Alverne

1. Introdução

A poluição marinha se apresenta como resíduos que contribuirão para o aumento


um fenômeno transfronteiriço1 de grande dos níveis de poluição do oceano. Até mes-
escala, presente em todo o oceano, inde- mo atividades que, de início, visavam a miti-
pendentemente do tipo de poluente ou gar a poluição, a exemplo da introdução, em
da localidade em que se originou. determinadas regiões do oceano, de espécies
Há cada vez mais evidências científicas invasoras como o Sargassum sp (RODRÍGUEZ-
demonstrando sérios impactos da poluição -MARTÍNEZ, 2019, p.202).
no ambiente marinho. A química oceânica Isso se reflete não somente na qualidade
vem sendo alterada devido às atividades de vida dos animais marinhos, mas interfere
humanas tanto em águas costeiras quanto diretamente na vida humana, seja porque o
em mar aberto. Esse fenômeno se prolon- lixo no mar alcança as cadeias alimentares,
ga já há décadas, ocasionando a destruição sendo posteriormente ingerido por organis-
de habitats costeiros e concomitantemente mos humanos, seja porque afeta paisagens
à pesca excessiva, causando impactos de- costeiras influenciando diretamente em um
vastadores na biodiversidade e nos habitats decréscimo do turismo em determinada área
marinhos (WEIS, 2015, p.4). e, de conseguinte, afeta a economia, tam-
O aumento progressivo da poluição mari- bém pela redução na provisão de serviços
nha, juntamente com as suas consequências, ecossistêmicos. A questão imperativa obser-
cada vez mais percebidas pela sociedade, im- vada, portanto, é que a poluição marinha é
pulsionaram o Direito Internacional a desen- capaz de afetar a sociedade em praticamen-
volver normas e regulamentos com o intuito te todos os seus âmbitos, desde o social, até
de mitigá-la.2 As ações empenhadas nesse o econômico, perpassando pelo ambiental.
sentido se mostram cada vez mais urgentes Vê-se, assim, que a poluição marinha se
e imprescindíveis, especialmente porque pra- constitui como um fenômeno a ser trata-
ticamente toda atividade desempenhada no do não somente pelo Direito Internacional
ambiente terrestre gera, em alguma medida, e pelos atores internacionais em abstrato,

276 ECONOMIA AZUL AAPoluição


PoluiçãoMarinha
Marinhacomo
comoResponsabilidade
Responsabilidadede Todos 277
deTodos 277
mas adentra à esfera das responsabilida- registrado na história do Brasil, na bacia do 2. A poluição marinha como fenômeno transfronteiriço:
des de maneira ampla, sendo, em verda- Atlântico Sul e em regiões costeiras tropicais conceito e abordagens
de, uma responsabilidade de todos: do em todo o mundo (SOARES et Al, 2020).
individual ao coletivo. O fato de a poluição marinha ser um Os esforços para fornecer a base cien- cujos resultados podem resultar em efeitos
Nesse sentido, são diversas as normas tema abordado em tantas esferas do di- tífica para o controle da poluição têm sido deletérios, como perigo para os seres vivos
jurídicas internacionais que preveem a res- reito demonstra a magnitude do fenôme- crescentes, e o direito, embora permeado e para a vida marinha, para a saúde huma-
ponsabilização dos Estados quando ocasio- no, assim como justifica a preocupação e a de inadequações na compreensão cientí- na e o comprometimento da qualidade do
nam poluição no oceano: entende-se que o urgência do problema, que pode se mani- fica acerca da poluição marinha, progride uso da água do mar.4
dever de cada país é pela abstenção da ocor- festar de diversas formas. A comunidade in- em níveis nacional e internacional já há Reforçando o caráter transfronteiriço
rência desse tipo de dano, especialmente de ternacional segue empenhada em suprimir algumas décadas (TOMCZAK, 1984, p. da poluição marinha, de maneira mais am-
modo a garantir que as atividades sob sua importantes lacunas jurídicas, como a ques- 311-322). Isso se deve, em grande parte, pla, o fenômeno “poluição transfronteiri-
jurisdição e controle sejam realizadas com tão da poluição marinha por plásticos e a ao fato de que um dos ecossistemas onde ça” foi objeto de arbitragem internacional
a devida diligência de não causar poluição abordagem específica dos microplásticos, a o impacto da humanidade se fez sentir no emblemático caso “Trail Smelter”,5 de
em outros Estados e seu meio ambiente. No exemplo das recentes negociações que cul- mais severamente, é o marinho. Durante 1941, considerado como a disputa que es-
direito interno brasileiro, por sua vez, foi de- minaram na Resolução da ONU “End Plastic longos períodos, a humanidade agiu como tabeleceu as bases do Direito Internacional
senvolvido o Plano Nacional de Combate ao Pollution” (UNITED NATIONS, 2021/2022). se o oceano, tão vasto e tão cheio de vida, do Meio Ambiente no que diz respeito à
Lixo no Mar, que é especificamente voltado Este trabalho, portanto, apresenta re- pudesse tolerar qualquer nível de poluição poluição transfronteiriça (HALL, 2007, p.
a mitigar a poluição marinha, considerando, flexões que perpassam desde o conceito lançada nele (POTTERS, 2013), não sendo 696). No laudo arbitral, o tribunal, ao de-
para as suas ações, as especificidades de de poluição marinha e de suas principais esta, contudo, a realidade. cidir sobre um episódio de poluição do ar,
cada região e localidade (BRASIL, 2019). origens, até a compreensão da responsa- Em 1972 foi realizada a Convenção para fez menção a um caso relacionado à po-
É de se ressaltar, que no caso brasileiro, bilidade coletiva que é característica do fe- a Prevenção da Poluição Marinha por Ope- luição da água, em que a cidade de Nova
normas dessa natureza se fazem cada vez nômeno, a qual se traduz nos dispositivos rações de Imersão de Detritos e Outros, co- Iorque foi intimada, a pedido do Estado de
mais importantes, principalmente devido à de diversos mecanismos jurídicos, sejam nhecida como Convenção de Londres, em Nova Jersey, a desistir da prática de despe-
ocorrência reiterada de vazamentos de óleo internacionais ou nacionais. A subsistência vigor desde 1975. Tal convenção objetiva jo de esgoto no mar, o que era prejudicial
nas costas do país. As substâncias derrama- de lacunas jurídicas, contudo, se demons- promover o controle efetivo de todas as às águas costeiras do requerente, nas pro-
das no litoral brasileiro são variadas, sendo tra como um importante obstáculo à efe- fontes de poluição marinha e adotar me- ximidades de seus balneários(UNITED NA-
as principais identificadas: diesel, combus- tiva abordagem e mitigação do problema, didas possíveis para evitar a poluição do TIONS; Trais smelter case. Op. Cit. p.1964).
tível marítimo, resíduo oleoso; lubrificante; o que, por outro lado, já foi devidamente mar oriunda do lançamento de resíduos e Tendo-se em consideração as nuances
e/ou petróleo. Tais derramamentos podem reconhecido e vem sendo enfaticamente de outros materiais (TURRA, 2020, p. 41). do caso e os precedentes abordados pelo
ter origem conhecida, como aqueles oriun- debatido. Embora existam diversos tipos A Convenção opera em listas de “resíduos tribunal, foi decidido que nenhum Estado
dos de embarcações, ou podem ser man- de poluição marinha, o foco principal da ou outras matérias” classificadas por sua ostenta o direito de usar ou de permitir o
chas órfãs de origem desconhecida, o que pesquisa se centra na poluição marinha dos natureza perigosa e faz as regulamentações uso de seu território de maneira a causar
dificulta a identificação do volume de óleo plásticos ao Sargassum sp., demonstran- apropriadas por referência às listas. Os ter- danos decorrentes de gases tóxicos no ter-
derramado. Estas, mesmo que em peque- do como diferentes atividades humanas mos poluição, matéria nociva e perigosa, no ritório de outro Estado ou nas propriedades
nos volumes, ocorrem com uma frequência podem impactar severamente o oceano. entanto, também são invocados, mas não das pessoas nele contidas. O Tribunal Arbi-
expressiva. É este o perfil da maioria dos Trata-se de pesquisa teórica, bibliográfi- definidos (TOMCZAK, 1984, p. 315). tral chegou a esta conclusão a respeito da
derramamentos que têm acontecido nos ca, descritiva, exploratória e qualitativa de A Convenção de Montego Bay (CNU- poluição do ar, mas ela se faz igualmente
últimos dez anos no país: pequenos, mas bibliografia nacional e internacional, com DM), dez anos mais tarde, apresentou uma aplicável à poluição das águas e dos mares
frequentes (SILVA, 2029). Ainda, no início prioridade para artigos científicos recente- definição de poluição3 do meio ambiente e é, desde então, amplamente considerada
de setembro de 2019, petróleo bruto denso mente publicados, além de legislação e de marinho, conceituando-a como o tipo de como parte do Direito Internacional geral
começou a lavar as praias da costa tropical documentos internacionais pertinentes ao poluição decorrente da introdução, pelos (MENDIS, 2006, p. 11).
do Brasil. Esse derramamento de óleo foi o objeto em análise, sobretudo relatórios, re- indivíduos, direta ou indiretamente, de A arbitragem do caso “Trail Smelter”
mais extenso e grave desastre ambiental já soluções e convenções internacionais. substâncias ou energia no meio marinho, além de ser pioneira, tendo originado uma

278 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 279


decisão judicial internacional que tratou devido a características intrínsecas do oce- 3. Principais causas da poluição marinha: do plástico ao Sargassum sp.
especificamente de uma modalidade de po- ano, como a fluidez das águas e a ocorrên-
luição transfronteiriça, teve seu precedente cia de correntes marítimas que contribuem
reafirmado em diversas declarações interna- para o deslocamento de substâncias e ma- Uma ampla gama de ameaças, como no norte e sul do Atlântico e no Oceano
cionais, sendo a sua decisão de arbitragem teriais pelos espaços marinhos (ZANELLA, o aumento da acidificação, o branquea- Índico. O giro no Pacífico Norte, conhecido
incorporada à Declaração das Nações Uni- 2013) é, em grande parte, um fenômeno mento de corais, toxinas e poluição quí- popularmente como Grande Depósito de
das sobre o Meio Ambiente Humano de Es- transfronteiriço. Isso significa que poluição mica, sobrecarga de nutrientes e esgota- Lixo do Pacífico, é o mais conhecido (FUN-
tocolmo, de 1972 (HALL, Op. Cit., p. 699). que se origina em uma localidade do oce- mento da pesca, incluindo muitas outras, DAÇÃO HENRICH BÖLL, 2020, p. 32).
A sua vez, enquanto o termo “contami- ano pode ao cruzar a fronteira por vias de estão minando a capacidade do oceano Os detritos ou resíduos que adentram
nação” é empregado para descrever o fato água ou de ar, causando danos ao meio am- de sustentar suas funções ecológicas. Os nos mares podem ser qualquer material
de um determinado composto químico es- biente de outro Estado,6 sendo um dos pro- detritos ou resíduos inseridos no oceano sólido persistente, manufaturado ou pro-
tar presente em um determinado habitat blemas mais antigos e persistentes na esfera fazem parte desse fenômeno (JAYASIRI, cessado descartado, lançado ou abando-
e/ou nos organismos que nele vivem, em do Direito Ambiental, (HALL, 2007, p. 681) 2018, p. 136). nado no ambiente marinho e costeiro.
uma concentração superior ao normal ou independentemente de ser poluição de fon- Desde mensagens em garrafas a se- Esses materiais são compostos principal-
ao valor de fundo (e isso devido a causas te pontual ou poluição de fonte difusa.7 mentes tropicais exóticas que chegam às mente de plásticos e podem incluir pon-
não naturais), a definição de “poluição” Diante da complexidade e magnitu- costas, a dispersão de detritos flutuan- tas ou filtros de cigarros, fraldas descartá-
pode ser compreendida como qualquer de desse fenômeno, a CNUDM estabele- tes no mar, há muito, fascina as pesso- veis para bebês, garrafas e latas de bebi-
forma de contaminação, em um ecossiste- ce princípios e regras específicos sobre a as (RYAN, 2015, p.2). A origem da po- das, pneus, seringas descartáveis, sacolas
ma, com impacto prejudicial sobre os orga- poluição marinha, de modo que os Esta- luição marinha, de onde vêm os resíduos plásticas, tampinhas de garrafas e linhas
nismos que nele habitam, alterando a taxa dos têm uma obrigação geral de devida sólidos que adentram os oceanos, é um e apetrechos de pesca JAYASIRI, Op. Cit,
de crescimento e a reprodução de espécies diligência, nos termos do artigo 194 da tema abordado desde os primeiros regis- p.137-138).
vegetais ou animais, ou interferindo em Convenção,8 para garantir que as ativi- tros desse tipo de poluição. A maioria das É de se ressaltar, ainda, que após a
comodidades humanas, conforto, saúde dades sob sua jurisdição e controle sejam atividades humanas, sejam em terra ou eclosão da pandemia da Covid-19, o dis-
ou valores de propriedade. Em um sentido conduzidas de forma a não causar danos nos mares, produz algum tipo de resíduo tanciamento social e o uso de máscaras fa-
mais amplo, os termos contaminação e po- por poluição a outros Estados e ao seu e, em alguma medida, parte deles aca- ciais passaram a ser cuidados socialmente
luição também incluem qualquer modifica- meio ambiente. A CNUDM contém ainda ba alcançando esse ecossistema. As ati- incentivados, que se mostraram imprescin-
ção física que altere o fluxo de energia ou disposições que estabelecem obrigações vidades terrestres são indicadas como as díveis na tentativa de superar tal cenário
radiação em um ambiente (como uma fon- diretas aos Estados para prevenir, reduzir principais responsáveis pela introdução adverso, porém, é inegável o efeito ad-
te ou sumidouro de calor, ou um elemento e controlar a poluição do meio ambien- de resíduos sólidos no oceano, pois se es- verso que tais medidas vêm causando ao
radioativo), ou mesmo a presença de uma te marinho por atividades específicas su- pecula que 80% dos resíduos detectados meio ambiente desde então. A poluição
espécie invasora (POTTERS, Op. Cit., p.16). jeitas à sua jurisdição e ao seu controle no meio marinho sejam provenientes de plástica, principalmente nos ecossistemas
Vale ressaltar que a poluição marinha, (BECKMAN, 2014, p. 24-25). fontes terrestres (TURRA, Op. Cit, p.9). marinhos, tem sido agravada pelas medi-
As fontes terrestres de poluição dos das sanitárias adotadas e pela ausência de
mares se relacionam a toda a gama de ati- destinação adequada dos resíduos plásti-
vidades cotidianas perpetradas em terra, o cos. É inegável que os plásticos revoluciona-
que engloba os resíduos gerados em casas ram a sociedade e têm sido essenciais como
residenciais, comércios, construções, hos- material utilizado de diversas formas e com
pitais e indústrias. Cerca de 10 milhões de preço acessível, com a crise sanitária desen-
toneladas de resíduos plásticos entram no cadeada pela Covid-19 aumentando seu
oceano anualmente a partir de fontes ter- consumo em todo o mundo, principalmen-
restres e os plásticos que se inserem no te os descartáveis após uso único. Ocorre
mar se concentram em cinco grandes gi- que os resíduos plásticos não são inertes no
ros oceânicos: no norte e sul do Pacífico, meio ambiente, pelo contrário, embora a

280 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 281


princípio sejam utilizados para a proteção forma de embalagens descartáveis. Sabe- essas tecnologias apresentam limitações Além dos problemas de saúde as-
dos indivíduos e tenham relevância para -se que tão somente algumas dezenas de como o alto custo e a baixa eficiência na sociados ao uso de Sargassum sp.,10 o
isso, são extremamente nocivos quan- empresas de alimentos e de bens de con- remoção total de contaminantes. Por estes turismo, que é a principal atividade eco-
do descartados de forma inadequada. A sumo são as fontes de quase todo o lixo motivos, a biossorção é vista como uma al- nômica de muitas localidades costeiras,
pandemia, portanto, representa um fator plástico despejado no oceano. O lobby da ternativa de baixo custo, simples e segu- a exemplo do Caribe,11 também é im-
de enorme aumento para a já existente indústria promove políticas públicas que, ra para a recuperação de poluentes. Essa pactado negativamente porque a quan-
sobrecarga de resíduos plásticos no meio por um lado, são focadas na reciclagem técnica se refere à capacidade da biomassa tidade alarmante de Sargassum sp. nas
ambiente (LEITÃO; MONT’ALVERNE, 2021). e no comportamento do consumidor, mas não viva de alguns organismos, de ligar e praias não permite o acesso ao mar, co-
As propriedades que tornaram os que, por outro, ignoram a necessidade de capturar substâncias de natureza diferente lore a água límpida em marrom escuro,
plásticos tão úteis para a sociedade são se reduzir a produção de plásticos.9 de soluções aquosas, permitindo sua remo- gera uma vista desagradável e exala um
as mesmas que fazem os resíduos plásti- As atividades industriais, portanto, são ção passiva do meio ambiente. A alga Sar- odor desagradável (SALDARRIAGA-HER-
cos manuseados inadequadamente uma grandes potenciais geradoras de resíduos gassum sp., portanto, tem sido empregue NANDEZ; et. al. Op. Cit., p. 3-4).
ameaça ambiental significativa. Sua du- plásticos, a exemplo da produção de saco- para esta finalidade, devido à sua eficiência Não se pode deixar de mencionar, ain-
rabilidade significa que eles persistem las de plástico, itens plásticos descartáveis para capturar poluentes direcionados ao da, que especificamente no Brasil, tem-
no meio ambiente por muitos anos, e de uso único e microesferas, as quais se ecossistema costeiro (SALDARRIAGA-HER- -se verificado a recorrência de um outro
sua baixa densidade demonstra que eles constituem de partículas de plástico sinté- NANDEZ;et.al.,2020, p. 1-3). tipo de poluição marinha, causada pelo
são facilmente dispersos pela água e tico que são adicionadas intencionalmen- A utilização de Sargassum sp., contu- vazamento de óleo nas costas do país.
pelo vento, às vezes viajando milhares de te a produtos de consumo e industriais. As do, apresenta-se como um problema pre- Mais especificamente, em 2019, foi de-
quilômetros de áreas de origem. Como sacolas plásticas são o elemento de con- mente em todo o mundo, pois apesar de tectado um grande desastre de derrama-
resultado, os resíduos plásticos se consti- sumo número um do planeta. A maioria sua utilidade, a sua proliferação incomum mento de óleo no litoral brasileiro, que
tuem como poluentes onipresentes mes- das embalagens de plástico é descartável, perto das costas tropicais e a subsequente se mostrou severamente danoso, tendo
mo nas áreas mais remotas do planeta especialmente em aplicações de comér- formação de mares de Sargassum sp. está afetado um número significativo de áre-
(RYAN, Op. Cit, p.2). cio efetuado diretamente entre a empre- associada à mortalidade em massa da fau- as protegidas costeiras e marinhas, além
Desses resíduos, o uso generalizado de sa produtora, vendedora ou prestadora na costeira (RODRÍGUEZ-MARTÍNEZ; et. de ecossistemas tropicais brasileiros. Tal
garrafas plásticas de uso único, utensílios, de serviços e o consumidor final, sendo a al., 2019, p. 202). desastre evidenciou os desafios sociais,
sacolas de compras e recipientes ou emba- maioria delas descartada no mesmo ano Em geral, os efeitos dos poluentes nos ambientais e econômicos oriundos da
lagens para comidas para viagem tem se em que produzida. Em 2015, os resíduos ecossistemas marinhos e nos recursos vi- poluição marinha (SOARES, Op. Cit, p.2)
traduzido em um grave problema de polui- de embalagens plásticas representaram vos são negativos. As principais consequ- o que se faz ainda mais perceptível quan-
ção marinha em todo o planeta. O amplo 47% dos resíduos plásticos gerados glo- ências são a redução da biodiversidade de do foi constatada uma nova aparição de
uso de plásticos, as práticas impróprias de balmente, com metade tendo origem no peixes; a perda de habitats de nidificação; manchas de óleo no litoral já no ano de
gerenciamento de resíduos, o escoamento continente asiático (UNITED NATIONS EN- a degradação dos habitats costeiros e da 2022, principalmente nas praias do litoral
de águas pluviais, o tratamento inadequa- VIRONMENT PROGRAMME, 2018, p. 6.). biodiversidade; a interrupção dos ciclos de leste do Ceará (UNIVERSIDADE FEDERAL
do de águas residuais e do lixo propiciam A integridade ecológica e a biodiversida- vida dos peixes na aquicultura; a morte em DO CEARÁ, 2022).
e agravam a poluição marinha por plásti- de dos ecossistemas marinhos têm sido al- massa de peixes por água contaminada As causas da poluição marinha, portan-
cos, causando a degradação do habitat tamente ameaçadas devido à liberação con- e as mudanças na química da água, que to, se originam de diversas fontes, todas
marinho, ameaçando a vida selvagem, di- trolada ou não controlada de altas concen- são apenas alguns exemplos da pressão em alguma medida prejudiciais, seja para
ficultando as atividades econômicas costei- trações de poluentes gerados por atividades ambiental exercida pelos poluentes nos o meio ambiente marinho, para os seres
ras e ameaçando a saúde humana (NY/NJ antrópicas. Na tentativa de solucionar ou de ecossistemas marinhos. A introdução de vivos – humanos e outros–, ou até mesmo
BAYKEEPER. NY-NJ, 2016, p. 4.). remediar o problema, diferentes tecnologias espécies invasoras para esta finalidade, no para a economia de níveis local, regional e
Os plásticos são a última etapa da vas- têm sido desenvolvidas para a recuperação entanto, embora considerada economica- mundial. É inequívoco, dessa forma, que a
ta indústria petroquímica, sendo que mais e a degradação de poluentes do ambiente mente viável e sustentável, a exemplo do responsabilidade pela poluição marinha se
da metade desses resíduos terminam em marinho, como o processamento de filtros e uso de Sargassum sp., tem demonstrado irradia entre os mais diversos atores da so-
produtos de consumo, principalmente na outros métodos eletroquímicos. No entanto, um efeito reverso. ciedade: é responsabilidade de todos.

282 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 283


4. O viés econômico da poluição marinha: a quaisquer mudanças na quantidade, na nutrientes e formação do solo); e provisão
uma responsabilidade compartilhada por todos qualidade e na segurança desta fonte ali- (fornecimento de alimentos, água fresca,
mentar (BEAUMONT, Op. Cit). fibras e combustíveis) (NUSDEO, 2016).
O oceano é regido por estruturas legais no funcionamento dos ecossistemas ma- As indústrias marítimas tradicionais Mais da metade do PIB global − isto
nos níveis internacional, nacional, estadual rinhos, minando assim a viabilidade eco- serão cada vez mais influenciadas pelas é, 55%, o que equivale a 41,7 trilhões
e local e, de igual modo, estão positivadas nômica da economia do mar. Para além mudanças climáticas, à medida que as de dólares americanos− depende de uma
normas acerca da poluição marinha. Diver- dos prejuízos ao meio ambiente e à saúde alterações na temperatura, na acidez do biodiversidade de alto funcionamento e
sos tratados multilaterais e bilaterais estão humana, os impactos negativos decorren- oceano e no aumento do nível do mar de serviços ecossistêmicos. Dos países do
em vigor, além de outros acordos para ges- tes do lançamento de resíduos plásticos afetam os movimentos dos estoques de mundo, no entanto, 20% correm o risco
tão da pesca, do transporte marítimo, da no oceano, por exemplo, se refletem na peixes, abrindo novas rotas comerciais e de que seus ecossistemas entrem em co-
proteção da biodiversidade e da poluição economia mundial. Estima-se que cerca afetando as estruturas portuárias, criando lapso devido ao declínio da biodiversidade
(WEIS, Op. Cit., p.16). de 4,8 a 12,7 milhões de toneladas métri- assim novos destinos e atrações turísticas, e dos serviços benéficos a ela relacionados.
As interações da sociedade, da econo- cas de plástico foram lançadas no oceano enquanto outros são destruídos. É de se Essa forte dependência econômica quanto
mia e do meio ambiente exercem uma in- a partir de fontes terrestres apenas no ano destacar que a destruição do Mar de Aral, aos recursos naturais destaca o caráter fun-
fluência importante sobre os ecossistemas de 2010, sendo que as previsões quanto exemplificativamente, ocasionou o colap- damental do desenvolvimento sustentável
marinhos por meio de sua dinâmica e de ao fluxo de plásticos no meio marinho so econômico e a migração em massa da e da conservação para uma sustentabilida-
seu ciclo biogeoquímico mais amplo. Isso apontam para o seu aumento no decorrer área costeira circundante, o que fornece de de longo prazo das economias mundiais
ocorre porque os serviços ecossistêmicos dos anos (BEAUMONT, 2019). uma visão extrema de como o colapso de (SWISS RE INSTITUTE, Op. Cit.).
são dependentes uns dos outros e exibem Os resíduos plásticos, especificamente, um ecossistema pode afetar a economia Em termos de valoração da perda, é
interações complexas que geram compen- têm o potencial de atuar em conjunto com local (SWISS RE INSTITUTE, 2022). possível estimar que um declínio de ape-
sações na entrega de um serviço ecossistê- outros estressores, como as mudanças cli- As conjecturas acerca da redução de nas 1% a 5% na prestação de serviços do
mico em relação à entrega de outros. Para a máticas e a superexploração dos recursos serviços ecossistêmicos terrestres em ra- ecossistema marinho equivale a uma perda
economia oceânica, isso é relevante porque marinhos, de forma a causar danos muito zão de distúrbios antropogênicos apon- anual de 500 a 2.500 bilhões de dólares
essas interações determinam indiretamente a maiores do que se ocorressem isoladamen- tam um declínio de 11% a 28% dos no valor dos benefícios derivados desses
viabilidade das indústrias baseadas no ocea- te. As alterações de habitat nos principais serviços do ecossistema terrestre global serviços. Dado que este valor inclui apenas
no (OCDE, 2016). ecossistemas costeiros causadas pelos im- (BEAUMONT, Op. Cit). A compreensão os impactos do capital natural marinho,
De acordo com a Organização para a pactos diretos do lixo no mar e dos plásti- acerca da concepção de serviços ecossis- o custo econômico total provavelmente é
Cooperação e Desenvolvimento Econômico cos afetam a produção local de alimentos e têmicos faz-se, então, fundamental para muito maior (BEAUMONT, Op. Cit.). Em
(OCDE), o oceano pode ser considerado danificam as estruturas costeiras, levando a que seja possível assimilar a magnitude comparação, o mercado global de plástico,
como a nova fronteira econômica. Esses consequências abrangentes e imprevisíveis, da problemática econômica que envolve em 2020, foi estimado em cerca de 580
espaços marítimos apresentam um gran- incluindo a perda de resiliência a eventos a poluição marinha por plásticos, afetan- bilhões de dólares, isto é, inferior ao valor
de potencial de crescimento, emprego e extremos e mudanças climáticas nas comu- do consequentemente todos os setores monetário das perdas de capital natural
inovação. De conseguinte, é já conside- nidades costeiras (UNEP, 2021). da sociedade. Os serviços ecossistêmicos, marinho por ano (UNEP, Op. Cit.).
rado como um ambiente de importância A produtividade, a viabilidade, a lucrati- ou serviços ambientais, podem ser defini- Esse cálculo dos custos econômicos por
crucial para enfrentar muitos dos desafios vidade e a segurança da indústria de pesca dos como fluxos oriundos dos estoques tonelada de plástico no oceano12 é funda-
que o mundo tem enfrentado e enfrentará e aquicultura são altamente vulneráveis ao de capital natural e que se combinam ao mental para futuras negociações globais
nas próximas décadas, sobretudo pós-Co- impacto do plástico depositado no oceano, capital de serviços humanos para forne- de maneira a transformar o modo como
vid-19, tais como: segurança alimentar, especialmente quando se associa a fatores cer bem-estar às populações. Tais serviços os plásticos são projetados, produzidos,
mudanças climáticas, produção de energia, mais amplos, incluindo as mudanças climá- podem ser classificados em quatro cate- usados, reutilizados e reprocessados, ten-
fornecimento de recursos naturais, além ticas e a sobrepesca. A alta dependência de gorias: serviços culturais (elementos esté- do-se em conta que a economia do mar
do progresso da medicina (OCDE, 2017). frutos do mar para a nutrição deixa o bem- ticos e recreacionais); regulação (seja do é
essencial para o futuro da prosperidade
As atividades humanas, no entanto, -estar de uma significativa proporção da po- clima, das inundações, das pragas e a pu- humana e que é uma fonte essencial de ali-
têm o potencial de intervir indiretamente pulação mundial extremamente suscetível rificação das águas); suporte (ciclagem de mento, de energia, de minerais, de saúde

284 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 285


e de lazer da qual centenas de milhões de seja assegurada a perenidade da existência 5. Respostas jurídicas para enfrentar a poluição marinha:
pessoas dependem (OCDE, 2017). humana no mundo (JONAS, 2017). da esfera internacional à nacional
A poluição marinha, assim, por ser um Nesse contexto, a proteção dos ecossis-
evento cujas consequências são percebi- temas marinhos e, em especial, o combate Diante da magnitude do fenômeno ora vigilância em sua aplicação e no exercício
das de maneira conjunta e não segmen- à poluição marinha, deve ser impulsiona- analisado, bem como de suas graves con- do controle administrativo (Idem, 2017).
tada, sobretudo devido à sua natureza da por toda a sociedade, em todos os seus sequências, a comunidade internacional Tal entendimento foi adotado pelo Tribu-
transfronteiriça, adentra à esfera da res- níveis, sendo crucial para o alcance dos empenha esforços a fim de fornecer respos- nal Arbitral na Arbitragem do Mar do Sul da
ponsabilidade como uma prática da qual Objetivos de Desenvolvimento Sustentável tas jurídicas ao enfrentamento da poluição China, cuja sentença data de 12 de julho de
todos devem se abster de realizar, sejam (ODS) e, especificamente, para que se pro- marinha. Em nível internacional, existem 2016. A decisão reitera uma obrigação de
indivíduos, empresas ou Estados. Nesse mova a saúde do oceano e a resiliência do diferentes categorias de instrumentos vin- devida diligência de que os Estados devem
sentido, a Declaração das Nações Unidas planeta. Conservar o oceano deve refletir a culantes relevantes para a abordagem da assegurar que as atividades dentro de sua
sobre o Meio Ambiente Humano de Esto- possibilidade da garantia da solidariedade poluição marinha. Os princípios e as regras jurisdição e controle respeitem o meio am-
colmo e a Declaração do Rio sobre Meio intergeracional, isto é, os agentes devem que regem os Estados quanto à poluição biente de outros Estados ou de áreas fora
Ambiente e Desenvolvimento positivaram possuir um olhar transformador sobre os transfronteiriça dos mares, como visto, es- do controle nacional e que os Estados têm o
em seus princípios a responsabilidade dos recursos naturais, não apenas vislumbran- tão estabelecidos na CNUDM, mais especifi- dever positivo de prevenir ou mitigar danos
Estados13 de assegurar que as atividades do-os como uma oportunidade de inves- camente em seu artigo 194.15 significativos ao meio ambiente ao se envol-
realizadas sob a sua jurisdição não causem timentos, mas como recursos valiosos a Uma característica notável desse dispo- verem em atividades de construção em gran-
danos ao meio ambiente de outras locali- serem perpetuados e transmitidos para os sitivo é a sua abdicação de qualquer dano de escala, em oposição a um dever negativo
dades ou de áreas além dos limites de sua descendentes no futuro (WEISS, 1992). como elemento desencadeador das obri- de se abster de degradar o meio ambiente.
jurisdição nacional.14 O uso não sustentável dos mares e de gações estabelecidas. O foco principal de A sentença, ainda, foi progressiva no senti-
A responsabilidade como princípio seus recursos ameaça a própria base da seu regime jurídico não está na responsabi- do de confirmar que a Parte XII da CNUDM
emerge da percepção de que existe uma qual muito dependem o bem-estar e a lidade ou na obrigação por danos ao meio pode evoluir através da interpretação e do
grande vulnerabilidade da natureza sub- prosperidade do planeta. Corporificar todo ambiente, mas na regulamentação abran- dever de cooperação (KOJIMA, Op. Cit.).
metida à intervenção técnica da humanida- o potencial da economia do mar portanto, gente para prevenir, reduzir e controlar a Outras normas interagem com a CNUDM
de, vulnerabilidade que não se suspeitava exige abordagens responsáveis e sustentá- poluição marinha (PRÖLSS, 2017). quando se trata da poluição do meio am-
antes de se tornar reconhecível nos danos veis para o seu desenvolvimento econômi- O princípio geral desta disposição, no biente marinho, apresentando disposições
causados pela conduta humana. A natu- co. Em se agindo para reduzir a poluição que diz respeito à responsabilidade do específicas relativas à poluição por diferen-
reza como responsabilidade humana, por- marinha, a sociedade como um todo inves- Estado por danos causados pela poluição tes fontes, existindo instrumentos orienta-
tanto, é sem dúvida um tema sobre o qual te tanto no fornecimento atual e futuro de fora de seu território, deve ser considera- dos ou relacionados com a poluição, como
a teoria ética se dedica a refletir (JONAS, serviços do ecossistema marinho, quanto do como direito consuetudinário desde os a Convenção de Londres;17 mecanismos
1995). A obrigação de responsabilidade – nos benefícios humanos que eles forne- Casos de Testes Nucleares.16 O objetivo voltados para a biodiversidade ou espécies,
seja dos Estados ou dos indivíduos, isto é, cem. O princípio da responsabilidade, des- principal, contido no artigo 194, é que os como a CDB;18 e os acordos voltados para
da sociedade como um todo– também se se modo, em consonância com o desenvol- Estados não causem danos por poluição, produtos químicos e resíduos, a exemplo
estende à responsabilidade pelo futuro, e vimento sustentável, se faz essencial para mas se a poluição ocorrer, o intuito é que das Convenções da Basiléia, de Roterdã e
isso só é possível existir a responsabilidade a manutenção de condições adequadas da ela não se espalhe além das áreas de ju- de Estocolmo (UNEP, 2017). Acrescente-se
se os seres que podem de fato se respon- biosfera e a sobrevivência futura da huma- risdição de um determinado Estado. Essa ainda, especificamente quanto à poluição
sabilizar seguirem existindo. Isso exige que nidade (JONAS, 1976). obrigação de conduta, segundo o Parecer marinha oriunda de derramamento de óleo,
Consultivo da Comissão Sub-Regional de a Convenção Internacional relativa à Inter-
Pescas do Tribunal Internacional de Direi- venção em Alto-Mar em Casos de Acidentes
to do Mar (ITLOS), de 2015, requer “due com Poluição por Óleo.19
diligence” no sentido de um Estado não De maneira mais enfática, a Convenção
apenas adotar regras e medidas apropria- da Basiléia sobre o Controle de Movimen-
das, mas, de igual modo, algum nível de tos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos

286 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 287


e seu Depósito, especificamente, consciente o ciclo de vida dos plásticos, incluindo sua a partir da 5ª Conferência Internacional global, mas de caráter vinculante que,
do risco de danos à saúde humana e ao produção, desenvolvimento e descarte. de Detritos Marinhos em 2011, emergiu em seu Anexo V,23 na regra 3, proíbe a
meio ambiente causados por resíduos pe- A Resolução UNEP/EA.5/L.23/Rev.1, a Estratégia de Honolulu como uma es- eliminação do lixo fora das áreas espe-
rigosos e outros resíduos e seu movimento intitulada como “Acabar com a poluição trutura global de esforços abrangentes ciais, incluindo o despejo de todo o tipo
transfronteiriço (BASEL CONVENTION, 2020), plástica: Rumo a um instrumento interna- voltados para a redução dos impactos de plásticos no mar; e na regra 5, que dis-
pode ser compreendida como um importan- cional juridicamente vinculativo”,22 abor- dos detritos marinhos em todo o mundo, põe sobre a eliminação de lixo nas áreas
te mecanismo vinculante aliado à mitigação da diversos aspectos da poluição marinha sejam eles ecológicos, na saúde humana especiais, proíbe o lançamento de todos
dos efeitos da poluição transfronteiriça. Espe- por plásticos e, entre eles, reconhece que: ou na economia (NATIONAL OCEANIC os objetos plásticos, como cabos e redes
cificamente quanto aos resíduos de plástico, a) os microplásticos são parte do proble- AND ATMOSPHERIC ADMINISTRATION). de pesca de material sintético e sacos de
que têm sido reconhecidos como um sério ma; b) a poluição plástica, em ambientes A Estratégia decorre do Compromisso de plástico para lixo.
problema ambiental global, a Conferên- marinhos e outros, pode ser de natureza Honolulu, com uma nova abordagem co- A Organização Marítima Internacional,
cia das Partes da Convenção da Basiléia, transfronteiriça e precisa ser combatida, laborativa para diminuir a incidência de por sua vez, adotou em 2018 um plano de
em 2019, adotou decisões importantes juntamente com seus impactos por meio resíduos sólidos no oceano, bem como os ação para tratar do lixo plástico despejado
para abordar o tema. Essas medidas for- de uma abordagem completa do ciclo de danos que causam no habitat marinho, por navios, visando melhorar os regula-
taleceram a Convenção da Basiléia como vida desses materiais; c) há uma necessi- na biodiversidade e na economia local e mentos existentes e introduzir novas me-
o único instrumento global juridicamente dade urgente de fortalecer a coordenação, global (TURRA et al, Op. Cit.). didas de apoio para reduzir o lixo plástico
vinculativo para tratar especificamente de a cooperação e a governança globais para A Estratégia de Honolulu é considerada marinho oriundo de navios. O plano en-
resíduos de plástico (Idem, 2020). tomar ações imediatas para a eliminação a como um grande avanço de soft law na fatiza o compromisso da IMO de cumprir
No Relatório da Conferência das Partes longo prazo da poluição por plásticos, em matéria (STOETT, 2019). O Compromisso as metas da Agenda 2030, em especial o
da Convenção sobre os trabalhos de sua dé- ambientes marinhos e outros; e d) é ne- pactua a intenção de diversos grupos de ODS 14, observando que o lixo plástico
cima quarta reunião, muitos representantes, cessário um maior empenho internacional combater o problema do lixo no mar, en- entra no meio marinho como resultado de
incluindo vários que se manifestavam em por meio do desenvolvimento de um ins- quanto a Estratégia tem o escopo de servir uma ampla gama de atividades terrestres
nome de grupos de países, usaram da pa- trumento internacional juridicamente vin- como instrumento de gestão para minimi- e marítimas. Ambos os macroplásticos e
lavra para destacar a extensão do problema culante sobre a poluição por plásticos, in- zar os impactos causados por esses detri- os microplásticos persistem no oceano e
dos resíduos de plástico e a importância de se clusive no ambiente marinho (UNEP, 2022). tos, a partir de ações que controlem suas resultam em efeitos nocivos sobre a vida
tomar medidas para gerenciá-los. A décima O problema do lixo no oceano tem fontes marinhas e terrestres e que redu- marinha e a biodiversidade, bem como
quarta reunião da Conferência das Partes da escala global e impacto intergeracional, zam os níveis de resíduos já presentes no impactos negativos na saúde humana e
Convenção da Basiléia (COP-14, 29 de abril a além de ser uma questão cultural e mul- meio ambiente. A Estratégia de Honolulu em atividades como o turismo, a pesca e
10 de maio de 2019) adotou, em sua decisão tissetorial complexa que reclama enormes tem um papel essencial para a fundamen- a navegação. Apesar do quadro regula-
BC-14/12,20 emendas aos Anexos II, VIII e IX custos ecológicos, econômicos e sociais tação de soluções sustentáveis e estrutu- mentar internacional existente para evitar
da Convenção com o objetivo de aumentar o em todo o mundo (TURRA et al, Op. Cit.). rantes quanto à existência de resíduos no o lixo marinho de plástico dos navios, no
controle dos movimentos transfronteiriços de A nova Resolução expressa em seu texto oceano. A acumulação de detritos – es- entanto, continuam a ocorrer descargas
resíduos plásticos, esclarecendo o âmbito da a necessidade de se promover medidas pecificamente de plásticos– nos mares é no mar (IMO, MEPC 73/19/Add.1 Annex
Convenção no que se refere a esses detritos. cooperativas de âmbito nacional e inter- um problema global, que transcende fron- 10), o que demonstra que tais normas não
Mais recentemente, em março de nacional com o objetivo de reduzir a po- teiras e tem origem em fontes variadas, alcançam o efeito esperado.
2022, Chefes de Estado, Ministros do Meio luição por plásticos no oceano, incluindo oriundas da atividade antropogênica. O Em âmbito nacional, por sua vez, tam-
Ambiente e outros representantes de 175 a poluição plástica já existente, além de problema, conforme já assinalado, é de bém existem políticas públicas voltadas à
Estados endossaram uma resolução histó- enfatizar a importância de serem forneci- responsabilidade compartilhada entre os gestão de resíduos e à mitigação da po-
rica na Assembleia das Nações Unidas para das avaliações científicas e socioeconômi- Estados e entre os diversos setores da so- luição marinha, cujo marco regulatório
o Meio Ambiente (UNEA-5) para “Acabar cas relacionadas a esse tipo de poluição ciedade (TURRA et al, Op. Cit.). é a Lei n° 12.305/2010, conhecida como
com a Poluição Plástica”21 e adotar um (UNEP/EA.5/L.23/Rev.1). A Convenção Internacional para a Pre- Política Nacional de Resíduos Sólidos do
acordo internacional juridicamente vincu- Ainda sobre as medidas internacionais venção da Poluição Causada por Navios Brasil (PNRS), a qual define as substâncias
lante até 2024. A resolução aborda todo voltadas à mitigação da poluição marinha, (MARPOL, 1973) é outro instrumento poluentes, ou os detritos inseridos nos

288 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 289


mares, como materiais, substâncias, ob- nóstico do problema do lixo no mar no país, 6. As lacunas ainda existentes: os microplásticos como parte do problema
jetos ou bens descartados, oriundos de trazendo um modelo de governança, eixos
atividades humanas em sociedade, e cuja de implementação, diretrizes e indicadores Apesar da grande variedade de normas Apesar de existirem todos esses meca-
destinação final se procede, se propõe no intuito de combater o lixo no mar. A PN- jurídicas de nível internacional voltadas à nismos jurídicos internacionais, sejam eles
proceder ou se está obrigado a proceder, CLM prevê, dentre outras iniciativas, o de- abordagem da poluição marinha, é de se ob- hard ou soft law, as lacunas subsistem. Não
nos estados sólido ou semissólido, bem senvolvimento de planos regionalizados, servar que ainda subsistem importantes lacu- existe um acordo que previna e minimize
como gases contidos em reservatórios e aplicados aos problemas de cada localida- nas. Mais especificamente, quando se trata efetivamente a poluição marinha por plás-
líquidos cujas particularidades tornem in- de do país (TURRA et al, 2021). A ausência da poluição marinha por plásticos, traça-se tico, particularmente de fontes terrestres;
viável o seu lançamento na rede de esgotos de informações suficientes sobre o proble- um caminho vagaroso e progressivo rumo a faltam recursos e cooperação técnica, es-
ou em corpos de água (BRASIL, 2010). ma do lixo no mar no Brasil e a necessi- uma governança global especializada24 volta- pecialmente nos esforços para melhorar
Especificamente quanto ao plástico, di- dade de ampliação do diagnóstico para a da para a mitigação dos efeitos dessa mo- os sistemas de coleta de resíduos; há uma
versos projetos de lei tramitam no Congres- implementação efetiva de ações executi- dalidade de poluição. Os microplásticos e o ausência de coordenação entre as várias
so Nacional Brasileiro – pelo menos 135, vas e estruturantes, contudo, reforçam a lixo plástico marinho são um problema evi- estruturas, instrumentos e plataformas
propostos entre 1995 e 2019–, não haven- urgência da parceria com a Academia, vi- tável, pois grande parte dos resíduos plásti- que lidam com a poluição por plásticos
do, no entanto, uma diretriz ou legislação sando a garantir a construção de conheci- cos que vão para o oceano é resultado de (é necessária uma coordenação interse-
específica para tratar do tema. Mesmo com mento adequado, bem como o empenho má gestão. Esses resíduos, contudo, não são torial significativamente melhorada, com
a ausência de uma diretriz nacional especí- de diversos setores da sociedade, a fim de adequadamente tratados em nível interna- esforços colaborativos de múltiplas partes
fica para plásticos, muitos estados e muni- possibilitar uma verdadeira concretização cional, tanto em instrumentos obrigatórios, interessadas e uma cooperação intergover-
cípios brasileiros desenvolvem suas próprias do Plano (BRASIL, 2019). quanto voluntários (UNEP, Op. Cit.). namental muito mais estreita); e ainda não
normas e regras para abordar o problema, No contexto do engajamento multisse- A CNUDM não se ocupa especificamen- existe um esforço institucionalizado para
principalmente com foco em banir determi- torial, quando se trata do meio ambiente te da poluição do meio ambiente marinho avaliar o estado de poluição por plástico,
nados produtos (PERTUSSATTI, 2020). e, especificamente, do lixo no oceano, as por resíduos plásticos, de forma que medi- além de faltarem normas voltadas ao mo-
O Brasil é um dos países que mais pro- organizações da sociedade civil se apre- das de eficácia não são fornecidas para al- nitoramento do lançamento de resíduos
duz resíduos de plástico no planeta, o que sentam como figuras importantes para a cançar a proteção necessária e a preserva- plásticos no meio ambiente, incluindo o
contabilizaria aproximadamente 1 kg de sensibilização da população a respeito do ção do oceano. As Convenções da Basiléia oceano. Como consequência, existem in-
lixo plástico por habitante semanalmen- problema, elucidando as suas origens, os e de Estocolmo, que podem ser aplicadas à certezas consideráveis sobre as quantida-
te (WWF, 2019). O referido dado reflete a seus impactos e estimulando o desenvol- redução das fontes terrestres de lixo plásti- des, fontes e vias de transmissão da polui-
premente necessidade de o país lidar dire- vimento de estratégias de mitigação. O co marinho e microplásticos, têm aplicação ção marinha por plásticos (SIMON, 2018).
tamente com a gestão de resíduos plásticos reconhecimento de que os riscos múlti- restringida. No âmbito da Convenção de Os instrumentos jurídicos internacionais
em âmbito interno. plos e em cascata representados pelo lixo Estocolmo, por exemplo, a aplicação de têm considerado que os resíduos plásticos
Nesse sentido, em 2019, foi lançado o marinho e pelos plásticos os tornam multi- embalagens constitui o principal setor do são um dos problemas ambientais mais ur-
Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar plicadores de ameaças é o primeiro passo mercado de plásticos. Globalmente, estima- gentes e estão se movimentando para atu-
(PNCLM), o qual é composto de um diag- (UNEP, Op. Cit.). -se que 32% das embalagens escapem dos ar contra ele, todavia, esse movimento ain-
sistemas de coleta,25 podendo chegar até da é bastante limitado, não existindo um
os ambientes marinhos. Os produtos quími- arranjo de governança global que aborde
cos migram dessas embalagens para os ali- todo o ciclo de vida dos plásticos As ques-
mentos, mas essas substâncias podem não tões pertinentes aos plásticos no ambiente
recair sob a regulamentação da Convenção. são múltiplas e abrangentes, não tendo o
Assim, em nível global, a produção, o uso e Direito Internacional evoluído com a mes-
o descarte de grandes volumes de substân- ma agilidade com que o problema trans-
cias químicas empregadas na fabricação cende as fronteiras nacionais. Um novo
dos plásticos não são regulamentados por acordo internacional juridicamente vincu-
esse instrumento (UNEP, Op. Cit.). lativo se mostra essencial para preencher

290 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 291


lacunas e abordar com eficácia a poluição incluindo extração e transporte de matérias- todo o litoral do Nordeste brasileiro, ou Sar- biosfera e a sobrevivência presente e futura
marinha por plásticos (Idem, 2018). -primas, fabricação, tratamento de resíduos gassum sp. que causa a morte de outras das populações humanas em condições de
A Resolução UNEP/EA.5/L.23/Rev.1, neste e entrada no meio ambiente. Os plásticos li- espécies— adentra à esfera das responsabili- qualidade e dignidade.
ponto, se mostra promissora quanto ao pre- berados no meio ambiente também liberam dades afigurando-se como uma questão per- O presente capítulo se dedicou a demons-
enchimento dessas lacunas, especialmente lentamente gases de efeito estufa, e a pre- tinente a todos, individual e coletivamente: é trar que a poluição marinha vem sendo abor-
por mencionar e reconhecer expressamente sença de (micro)plásticos no oceano interfere uma responsabilidade compartilhada. dada tanto pelo Direito Internacional, quanto
que os microplásticos são parte do problema seriamente na capacidade de fixação de car- Em maior ou menor medida e, em con- pelo direito interno brasileiro há várias déca-
da poluição marinha. Antes disso, contudo, bono do mar (SHEN, 2020). O aumento do sonância com as sanções estabelecidas nas das, tendo as abordagens jurídicas evoluído
apesar do foco que a comunidade internacio- CO² dissolvido causa uma mudança no equi- normas pertinentes, a poluição marinha se à medida em que o conhecimento científico
nal já destinava ao problema dos plásticos no líbrio das espécies de carbono inorgânico no caracteriza por ser um fenômeno transfron- tem avançado sobre o tema. Neste ponto, é
oceano a 26ª Conferência das Nações Unidas oceano e move o pH do oceano para o lado teiriço que deve ser tratado como de res- de se ressaltar que a subsistência de importan-
sobre Mudanças Climáticas (COP 26), reali- ácido. Como resultado, a quantidade relativa ponsabilidade comum. Cada agente poten- tes lacunas jurídicas, como a questão da ges-
zada entre 1 e 12 de novembro de 2021, im- de carbonato disponível diminui, causando cialmente poluidor pode (e deve) tornar-se tão de resíduos plásticos no oceano, começou
portante fórum de discussões globais sobre a a acidificação do oceano. Em conjunto com um agente responsável, de acordo com os a ser recentemente tratada pela comunidade
emergência climática e questões ambientais a poluição por plásticos, outros fenômenos preceitos relacionados ao desenvolvimen- internacional de maneira mais enfática, o que
afins, não abordou diretamente a temática. como a acidificação e o aquecimento dos to sustentável: isso se faz essencial para a certamente demonstra a urgência e a atuali-
O relatório do Fundo Global para o Meio mares, a eutrofização e a poluição quími- manutenção de condições adequadas da dade do tema em questão.
Ambiente para a 26ª COP, embora tenha re- ca são grandes estressores que operam de
conhecido que a vida na Terra depende fun- modo a afetar negativamente a saúde e a Referências
damentalmente de ar e de água limpos, bio- resiliência do oceano (NETHERLANDS, 2020)
diversidade, oceano e terras saudáveis, além que, por sua vez, é essencial para a adapta- BEAUMONT, Nicola J. et al. Global ecologi- Poluição por Substâncias Outras que não
de um clima estável e, ao identificar que a ção à emergência climática. cal, social and economic impacts of marine Óleo, feito em Londres, em 2 de novem-
emergência climática influencia no aumento A nova Resolução sobre a poluição ma- plastic. Marine Pollution Bulletin, volume bro de 1973. Brasília, Diário Oficaial da
do nível do mar, nas inundações, na erosão rinha por plásticos, a sua vez, traz em seu 142, 2019. DOI: https://doi.org/10.1016/j. União, 10.6.2008. Disponível em: http://
costeira, no aumento de eventos climáticos texto a observação de que a poluição por marpolbul.2019.03.022. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
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coral e na acidificação do oceano (UN, 2020), tros, pode ser de natureza transfronteiriça e article/pii/S0025326X19302061#bbb0025. em: 14 mar. 2022.
não fez qualquer menção aos plásticos nos deve ser combatida, juntamente com seus Acesso em: 29 maio 2021. BRASIL. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de
mares e seus efeitos. impactos por meio de uma abordagem do BECKMAN, Robert. State Responsibility 2010. Institui a Política Nacional de Resídu-
Essa ausência de pronunciamento sobre ciclo de vida completo dos plásticos (UNEP/ and Transboundary Marine Pollution. os Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de
a poluição por plásticos vai de encontro a EA.5/L.23/Rev.1). Isso representa uma abor- Centre for International Law, National Uni- fevereiro de 1998; e dá outras providên-
uma abordagem holística do problema, pois dagem promissora, que pode culminar na versity of Singapore. Disponível em: https:// cias. Brasília, DF, 2010. Diário Oficial da
a emissão de gases de efeito estufa ocorrem supressão de importantes lacunas jurídicas cil.nus.edu.sg/wp-content/uploads/2014/02/ União, 03 de agosto de 2010. Disponível
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Considerações finais
BRASIL. DECRETO Nº 6.478, DE 9 DE JU- BRASIL. Plano Nacional de Combate ao
As consequências do lançamento de severamente a economia global, ao interferir NHO DE 2008. Promulga a Convenção Lixo no Mar - AGENDA NACIONAL DE
lixo no mar têm se mostrado prejudiciais, na provisão de serviços ecossistêmicos. Internacional relativa à Intervenção em Al- QUALIDADE AMBIENTAL URBANA Fase 1.
desencadeando problemas não somente A poluição marinha, que decorre de diversas to-Mar em Casos de Acidentes com Polui- Ministério do Meio Ambiente - Secretaria
no oceano, mas de igual modo na superfí- atividades — e pode ser apresentar na forma ção por Óleo, feita em Bruxelas, em 29 de de Qualidade Ambiental - Departamento
cie terrestre, seja porque afeta a saúde de de resíduos plásticos despejados nas costas novembro de 1969, e o Protocolo relativo de Gestão Ambiental Territorial, 2019.
seres humanos, ou mesmo porque impacta litorâneas, manchas de óleo que percorrem à Intervenção em Alto-Mar em Casos de Disponível em:https://www.gov.br/ mma/

292 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 293


pt-br/centrais-de-conteudo/plano nacio- Annex VI); Entry into force: 2 October 1983 Andrés Hugo; MARCOVECCHIO, Jorge and the Sethusamuduram Ship Channel
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Notas por qualquer tribunal internacional, sendo 9789004344556/B9789004344556_010.xml.
aventada a possibilidade de se fazer analogia 8 Muitas empresas e setores da indústria
com casos de poluição transfronteiriça das produtora de plásticos adotam uma estraté-
1 Os danos transfronteiriços podem ser consi- collection and their disposal in environmental águas, contudo, também não havia prece- gia dupla de lobby e de pu-blicidade de alto
derados como os danos que desrespeitam as sound manner are prioritised as short-term stra- dentes de decisões nesse sentido no âmbito perfil, afirmando que o “lixo” é um problema
fronteiras jurídico-políticas entre os Estados. tegies). In: UNEP, 2011; GAMARALALAGE, P. J. internacional. Ver: UNITED NATIONS. Trail de comportamento do consumidor que pode
A poluição transfronteiriça é definida como a D.; ONOGAWA, 2019. smelter case (United States, Canada). Reports ser resolvido apenas com a reciclagem, im-
poluição que se origina em uma locali-dade, 3 Sobre a definição de poluição disposta na of International Arbitral Awards. 16 April pedindo que uma conscientização acerca dos
mas, ao cruzar a fronteira por vias de água ou CNUDM, o Tribunal Internacional do Direito 1938 and 11 March 1941. p.1963. riscos da contínua produção desses materiais
de ar, pode causar danos ao meio ambiente do Mar, na Opinião Separada do Juiz Wolf- 6 ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPE- seja implementada e disseminada. In: FUN-
em outro país. Ver (SOARES, 2001, p. 211), rum quanto ao caso Mox Plant, enfatiza que RATION AND DEVELOPMENT. Glossary of DAÇÃO HEINRICH BÖLL. Ob. cit., p. 34-35.
ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERA- a noção de poluição é definida no artigo’, pa- Statistical Terms – Transboundary Pollution, 9 Após 48h em terra firme, as algas co-
TION AND DEVELOP-MENT., 2001) e (Studies rágrafo 1(4), da Convenção. Tal definição con- 2001. Studies in Methods, Series F, No. 67, meçam a se decompor e liberam gases tóxi-
in Methods, 1997). tém dois elementos, a saber, a introdução de United Nations, New York, 1997. Disponí- cos como sulfeto de hidrogê-nio e amônia,
2 A opção por “mitigação” ou “mitigar” de- substâncias ou energia - e radioatividade na vel em: https://stats.oecd.org/glossary/detail. que afetam o sistema respiratório, cardio-
corre da observação, após a análise dos da- forma de poeira ou de outra forma qualifica- asp?ID=2754. vascular e neurológico.
dos coletados nesta e em outras pesquisas, da como tal - e que tal introdução prova-vel- 7 A poluição de fonte pontual pode ser 10 Em 2018, a costa do Caribe mexicano
de que quando se trata da poluição marin- mente resultaria em efeitos deletérios como rastreada até um único ponto identificável recebeu um influxo maciço de pelágicos Sar-
ha em documentos internacionais, como re- danos aos recursos vivos e à vida marinha, onde o poluente se originou – por exemplo, gassum sp. que se acumu-lavam e se decom-
latórios e estratégias, frequentemente ao se entre outros (tradução autoral). Ver: INTERNA- um cano de esgoto de uma empresa ou o punham nas praias produzindo produtos de
falar de políticas públicas e outras medidas TIONAL TRIBUNAL FOR THE LAW OF THE SEA. vazamento da plataforma de perfuração de decomposição orgânica que tornavam a água
para abordar o problema, faz-se uso da ação The MOX Plant Case (Ireland v. United King- petróleo Deep Horizon. A poluição de fonte turva e marrom. In: RODRÍGUEZ-MARTÍNEZ,
de “mitigar” como aquela mais adequada, dom), Provisional Measures. Separate opinion difusa não pode ser atribuída a um local ou R. E; et. al. Ob. cit., p. 201.
especialmente em estratégias de curto pra- of Judge Wolfrum. tempo específico e tem uma fonte bastan- 11 O custo imposto aos serviços ecossistê-
zo. Nesse sentido, a Estratégia de Honolulu 4 No original: “‘Article 1. Use of terms and te difusa. Exemplos incluem o escoamento micos durante a vida útil dos plásticos pro-
prevê que “os detritos marinhos têm inúme- scope. 1. For the purposes of this Convention: agrícola ou o escoamento de águas pluviais duzidos somente em 2019 foi estimado em
ras implicações econômicas, que devem ser (…) (4) pollution of the marine environment’ urbanas. In: POTTERS, Geert. Ob. cit., p. 17. aproximadamente 3,1 trilhões de dólares. In:
consideradas ao desenvolver estratégias e means the introduction by man, directly or in- Importa mencionar que a CNUDM interage WORLDWIDE FUND FOR NATURE. Plastics: the
políticas para mitigar o problema” (no origi- directly, of substances or energy into the ma- com diversos outros tratados, o que indica cost to society, the environment and the eco-
nal: marine debris has numerous economic rine environment, including estuaries, which o seu caráter único como um instrumento nomy. Published in Sept.2021 by WWF, p.39.
implications, which should be considered results or is likely to result in such deleterious “vivo”. Embora seja considerada a “Con- Ver: https://www.wwf.no/assets/attachments/
when developing strategies and policies to effects as harm to living resources and marine stituição dos Oceanos”, sua interpretação Plastics-the-cost-to-society-the-environment-
miti-gate the issue) e o relatório de 2019 da life, hazards to human health, hindrance to e aplica-ção são consideradas flexíveis e re- -and-the-economy-WWF-report.pdf.
UNEP, intitulado Strategies to Reduce Mari- marine activities, including fishing and other sponsivas a problemas emergentes. Nesse 12 Esses princípios gerais que regem a po-
ne Plastic Pollution from Land-based Sources legitimate uses of the sea, impairment of qua- sentido, especificamente quanto ao art. 194, luição transfronteiriça, especificamente no
in Low and Middle - Income Countries, que lity for use of sea water and reduction of ame- as discussões que envolvem a sua aplicação meio ambiente marinho, são os mesmos que
revela que as “medidas imediatas tomadas nities; (…).” In: UNITED NATIONS. United Nati- serão apresentadas em momento oportuno regem a poluição atmosférica transfrontei-
para mitigar o vazamento de resíduos de ons Convention on the Law of the Sea., 1982. neste trabalho. In: KOJIMA, Chie. South Chi- riça, a poluição transfronteiriça de recursos
plástico nos oceanos, parando com o lixo, 5 O conflito envolvia os governos dos Estados na Sea Arbitration and the Protection of the de água doce compartilhados e outras for-
melhorando a coleta de resíduos de plástico e Unidos da América e do Canadá e se originou Marine Environment: Evolution of UNCLOS mas de poluição transfronteiriça.
sua eliminação de maneira ambientalmente co- em virtude de danos causados ao estado de Part XII Through Interpretation and the Duty 13 Na Declaração de Estocolmo, de 1972,
rreta são priorizados como estratégias de curto Washington, oriundos da emissão de dióxido to Cooperate. Asian Yearbook of Internatio- Princípio 21: “(...) os Estados têm o direito so-
prazo” (no original: taking immediate actions de enxofre por uma empresa canaden-se. nal Law, Volume 21, 2015, DOI: https://doi. berano de explorar seus próprios recursos em
to mitigate plastic waste leakages into oceans Até aquele momento, nenhum caso de polui- org/10.1163/9789004344556_010. Dispo- aplicação de sua própria política ambiental e a
by stopping littering, improving plastic waste ção transfronteiriça do ar havia sido tratado nível em: https://brill.com/view/book/edcoll/ obrigação de assegurar-se de que as atividades

300 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 301


que se levem a cabo, dentro de sua jurisdição, do mar por despejo de resíduos e outros ma- treaties.un.org/doc/Publication/UNTS/Volu- previsto nos regu-lamentos. Em 2018, o
ou sob seu controle, não prejudiquem o meio teriais. Atualmente, 87 Estados são Partes me%20970/v970.pdf. Anexo V foi fortalecido ainda mais, alte-
ambiente de outros Estados ou de zonas si- desta Convenção. In: INTERNATIO-NAL MA- 19 Por meio da decisão BC-14/12, a COP rando os critérios para determinar se os
tuadas fora de toda jurisdição nacional”. Na RITIME ORGANIZATION. CONVENTION ON aprovou alterações em três anexos da Con- resíduos da carga são prejudiciais ao meio
Declaração do Rio, de 1992, Princípio 2: “Os THE PREVENTION OF MARINE POLLUTION BY venção: Anexo II (categori-as de resíduos ambiente marinho e revisando o Livro de
Estados, (...) têm o direito soberano de explorar DUMPING OF WASTES AND OTHER MATTER. que requerem consideração especial – su- Registro de Lixo para incluir uma nova ca-
seus próprios recursos segundo suas próprias Disponível em: https://wwwcdn.imo.org/local- jeito ao Procedimento de consentimento tegoria de lixo eletrônico.
políticas ambientais e de desenvolvimento, e resources/en/OurWork/Environment/Docu- prévio informa-do): adição da nova entrada 22 Nesse sentido, no dia 02 de março de
a responsabilidade de velar para que as ativi- ments/LC1972.pdf. Y48 cobrindo todos os resíduos de plástico, 2022, durante a UNEA-5, os representantes
dades realizadas sob sua jurisdi-ção ou sob seu 17 A Convenção sobre Diversidade Biológica incluindo misturas de resíduos de plás-tico, de 175 Estados se reuniram e elaboraram a
controle não causem danos ao meio ambiente entrou em vigor em 29 de dezembro de 1993 exceto para os resíduos de plástico abrangi- Resolução UNEP/EA.5/L.23/Rev.1, baseada em
de outros Estados ou de zonas que estejam fora e tem 3 objetivos principais: a conservação dos pelas entradas A3210 (no Anexo VIII) e três projetos iniciais de resolução de várias na-
dos limites da jurisdição nacional”. da diversidade biológica; o uso sustentável B3011 (no Anexo IX); Anexo VIII (resíduos pre- -ções, estabelecendo um Comitê Intergover-
14 O artigo 194 da Convenção, inserido na dos componentes da diversidade biológica; e sumivelmente perigosos – sujeitos ao Procedi- namental de Negociação, que começará seus
Parte XII do documento, descreve uma regra a repartição justa e equitativa dos benefícios mento de consentimento prévio in-formado): trabalhos em 2022, com a ambição de concluir
geral de Direito Interna-cional, dispondo sob- decorrentes da utilização dos recursos gené- adição da nova entrada A3210 que abrange um projeto de acordo global legalmente vin-
re a obrigação de prevenir, reduzir e contro- ticos. In: UNITED NATIONS. CONVENTION ON os resíduos plásticos perigosos; Anexo IX (resí- culante até o final de 2024. Considera-se que
lar a poluição do meio marinho. In: UNITED BIOLOGICAL DIVERSITY. 1992. Disponível em: duos pre-sumidos como não perigosos – não este será o acordo multilateral ambiental mais
NATIONS. United Nations Convention on the https://www.cbd.int/doc/legal/cbd-en.pdf. sujeitos ao Procedimento de consentimento significativo desde o acordo de Paris. In: UNI-
Law of the Sea. Montego Bay, December 10, 18 Originalmente intitulada „International prévio informado): adição de nova entrada TED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME.
1982. Disponível em: https://www.un.org/ Convention relating to intervention on the B3011, substituindo a entrada atual B3010 Historic day in the campaign to beat plastic
depts/los/convention_agreements/texts/unc- high seas in cases of oil pollution casualties”, após uma data específica, cobrindo resíduos pollution: Nations commit to develop a lega-
los/unclos_e.pdf. a Convenção data de 29 de novembro de de plástico consistindo exclusivamente de um lly binding agreement. Press release – Envi-
15 O Juiz de Castro citou esta formulação 1969, tendo sidor registrada na Organização polímero não halogenado ou resina, polímeros ronmental rights and governance. Disponível
como uma regra de direito consuetudinário Marí-tima Internacional em 25 de maio de fluorados selecionados ou misturas de polieti- em: https://www.unep.org/news-and-stories/
em sua dissidência na Corte Internacional de 1975, e promulgada no Brasil em 2008. In: leno, polipropileno e/ou tereftalato de polieti- press-release/historic-day-campaign-beat-
Justiça, no caso Testes Nucleares (Austrália BRASIL. DECRETO Nº 6.478, DE 9 DE JUN- leno, desde que os resíduos sejam destinados -plastic-pollution-nations-commit-develop.
v. França), sentença de 20 de dezembro de HO DE 2008. Promulga a Convenção Inter- à reciclagem de forma ambientalmente corre- 23 A partir desse percentual, estima-se que há
1974, Relatórios da CIJ (1974), 388-389. In: nacional relativa à Intervenção em Alto-Mar ta e quase isentos de contaminação e outros custos econômicos significativos decorrentes
INTERNATIONAL COURT OF JUSTICE. Nuc- em Casos de Acidentes com Poluição por tipos de resíduos. do lançamento de resíduos plásticos no ambi-
lear Tests (Australia v. France). Judgment of Óleo, feita em Bruxelas, em 29 de novem- 16 No original, em inglês “End Plastic Po- ente, especialmente por seu envolvimento na
20 December 1974 – Dissenting Opinion bro de 1969, e o Protocolo relativo à Inter- llution”. redução da produtividade de sistemas naturais
of Judge de Castro. Disponível em: https:// venção em Alto-Mar em Casos de Poluição 20 No original, em inglês “End plastic pollu- vitais, como o oceano, bem como na obstrução
www.icj-cij.org/public/files/case-related/58/ por Substâncias Outras que não Óleo, feito tion: Towards an international legally binding da infraestrutura urbana. O custo de tais exter-
058-19741220-JUD-01-08-EN.pdf. em Lon-dres, em 2 de novembro de 1973. instrument”. nalidades pós-uso para embalagens plásticas,
16 A “Convenção sobre a Prevenção da Po- Brasília, Diário Oficaial da União, 10.6.2008. 21 O Anexo V da MARPOL contém regula- mais o custo associado às emissões de gases
luição Marinha por Despejo de Resíduos e Disponível em: http://www.planalto.gov. mentos que tratam da gestão de lixo e pro- de efeito estufa de sua produ-ção, foi estima-
Outros Materiais de 1972”, abreviadamente br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/decreto/ íbe estritamente o descarte de plásticos. Em do conservadoramente, até 2016, em US$ 40
a “Convenção de Londres”, é uma das pri- D6478.htm. ; UNITED NATIONS. Interna- 2013, entraram em vigor novos regulamen- bilhões anuais – excedendo o lucro da indústria
meiras convenções globais para proteger o -tional Convention relating to intervention tos que impõem procedimentos de gestão de embalagens plásticas. In: WORLD ECONO-
meio ambi-ente marinho das atividades hu- on the high seas in cases of oil pollution de lixo e requisitos de documentação mais MIC FORUM, ELLEN MACARTHUR FOUNDA-
manas e está em vigor desde 1975. Seu ob- casualties. Treaties and international agree- rígidos para todas as embarcações, bem TION AND MCKINSEY & COMPANY. The New
jetivo é promover o controle efetivo de todas ments registered or filed and recorded with como plataformas fixas e flutuantes e uma Plastics Economy — Rethinking the future of
as fontes de poluição marinha e tomar todas the Secretariat of the United Nations, Nova proibição geral de descarte de todo o lixo, a plastics, 2016. Disponível em: https://ellenma-
as medidas possíveis para prevenir a poluição Iorque, vol. 970, 1982. Disponível em: https:// menos que o descarte esteja expressamente carthurfoundation.org/the-new-pla

302 ECONOMIA AZUL A Poluição Marinha como Responsabilidade de Todos 303


15

MENTALIDADE MARÍTIMA
E DESENVOLVIMENTO NACIONAL
Ilques Barbosa Júnior

... O oceano é um meio diferente da terra, tão diferente de


fato que nos força a pensar diferentemente.
O oceano, onde tudo flui e tudo é interconectado,
nos força a desfocar, a repelir nossos velhos conceitos e
paradigmas – a refocar sobre novo paradigma.
Conceitos fundamentais, desenvolvidos por milênios na terra,
como os de soberania, fronteiras geográficas e
propriedade, simplesmente não funcionarão no
meio oceânico, onde novos conceitos políticos,
jurídicos e econômicos estão emergindo.
Elisabeth Mann Borgese

1. Introdução

Após alguma dificuldade inicial, devido de uma navegação estimada, uma propos-
a amplitude e a complexidade do tema, ta de definição de “Mentalidade”.
adotou-se como ponto de partida a ela- Mentalidade, pode ser conceituada como:
boração de estudos visando identificar as “estado, qualidade daquilo que é mental, do
influências da mentalidade marítima no que caracteriza os processos e atividades da
desenvolvimento nacional. Como renoma- mente” (PINHEIRO, 2016). Adicionalmente,
dos cientistas, professores e marinheiros “um conjunto de manifestações de ordem
analisaram esse relevante assunto, efetu- mental (crenças, maneira de pensar, dispo-
aremos uma navegação, certamente, esti- sições psíquicas e morais), que caracterizam
mada; considerando, as mencionadas am- uma coletividade, uma classe de pessoas ou
plitude e complexidade e, por isso, empre- um indivíduo; mente, personalidade”.
gando uma linguagem marinheira, sem a Entretanto, os conceitos acima não de-
pretensão de encerrar a faina (...trabalho vem ser entendidos dentro da especifici-
que participa a tripulação de um navio...). dade que se espera no presente trabalho,
Como primeiro ponto na carta e visan- há de se caracterizar então a “mentalida-
do, desde logo, neutralizar as incertezas de marítima”.

304 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima


Mentalidade Desenvolvimento 305
Marítima ee Desenvolvimento 305
Mentalidade Marítima, em primeira análises, os conhecimentos da Oceanopoliti- Nos primórdios da nossa independên- O ponto comum, reitera-se, decorre da
aproximação, seria um conjunto de pro- ca e da Geopolítica caracterizam importantes cia, desafiado pela extensão continental, decisiva importância dos espaços oceâni-
cessos e atividades, com manifestações de “auxílios à navegação”. José Bonifácio de Andrada e Silva teve cos; assim como, constata-se que as causas
crenças, maneira de pensar, disposições Também se constata a necessidade de decisiva atuação na manutenção da in- e respectivas influências interagem, de for-
psíquicas e morais de uma coletividade uma prévia existência da mentalidade ma- tegridade territorial do nascente país, ao ma simultânea ou não, nas iniciativas políti-
(povo) que, ao longo de sua história, tem rítima para a aplicação adequada das ma- coordenar iniciativas político-estratégicas, co-estratégicas e nos desdobramentos dos
nos espaços oceânicos e hidroviários a sua trizes político-estratégicas decorrentes da como a adoção de operações navais em acontecimentos.
Sobrevivência e Prosperidade. Oceanopolítica, com resultados exitosos no distantes regiões de nossa Pátria. O Patriar- Nesse contexto, com a finalidade de
Portanto, consecutivamente, há de con- desenvolvimento nacional. Esse é um dos ca da Independência contribuiu, também, ampliar o entendimento das influências da
textualizar conceitos que lhe subsidiam: ensinamentos mais relevantes da Escola para a formação da nossa Esquadra, início Mentalidade Marítima; aponta-se, a seguir,
. Sobrevivência, os insumos, serviços e
de Sagres e sua revolução estratégica: As
Grandes Navegações.
da Marinha do Brasil. As brilhantes vitórias
navais, na Guerra da Independência, são
uma síntese, onde procura-se agregar cau-
sas motivadoras, sem descurar da impor-
equipamentos, os conhecimentos, a crença
Como dizem os hidrógrafos: “Sempre as coordenadas da vitoriosa navegação da tância das interações. A saber:
em determinados valores e o culto de tra-
restará muito o que fazer”. Logo, para se Marinha Invicta de Tamandaré.
dições, que são necessários para manter a
alcançar o porto de destino, em prepara- Nas duas situações, Portugal e Brasil em- a) Causas econômicas:
integridade territorial e o desenvolvimento
ção para as próximas navegações, devemos pregaram os espaços oceânicos, como arena Fenícia, Cartago, Grécia, Portugal, Espa-
nacional em nível, que preserve a continui-
ampliar as vinculações da “mentalidade para decisivos confrontos de interesses, que nha, Inglaterra e China.
dade da liberdade e da vida.
marítima” e da Oceanopolítica com o con- caracterizam um dos pontos mais relevantes
. Prosperidade, a exportação de produtos, ceito político-estratégico de “Amazônia da Mentalidade Marítima, qual seja a intera-
b) Causas relacionadas à expansão e/ou à
defesa de espaços oceânicos e territoriais
serviços e equipamentos, que ampliam as Azul”, singular construção conceitual do ção entre diversas variáveis de matrizes rela-
(aquelas, por exemplo, decorrentes de con-
possibilidades de desenvolvimento nacional. Brasil e que confere grande aporte ao pro- cionadas aos espaços oceânicos e rios.
siderações econômicas):
Na história da civilização humana temos a pósito primeiro deste texto: a consolidação Ao longo de suas histórias, portugueses
Escandinávia (Vikings), Roma, Cartago,
oportunidade de analisar, a partir da mentali- e crescimento de uma mentalidade marí- e brasileiros aprofundaram suas relações
Grécia, Portugal, Espanha e Inglaterra, Esta-
dade marítima, os feitos das potências maríti- tima brasileira, como pilar ao desenvolvi- com os oceanos. Os dois países alcançaram
dos Unidos da América, Rússia e China.
mas frente às potências terrestres. Para essas mento nacional. feitos, ao desenvolverem o comércio maríti-
mo, ampliaram e defenderam seus espaços c) Causas militares:
2. Mentalidade Marítima e o Desenvolvimento Nacional territoriais, por meio dos espaços oceânicos Alemanha, China, França e Rússia.
e, no Brasil, ainda houve uma expansão ter- Nesse agrupamento, são listados os pa-
Na história, temos diversos exemplos holandeses e ingleses, iniciando suas dispu- ritorial para o oeste, noroeste e norte, por íses onde, historicamente, a prioridade
onde a Mentalidade Marítima contribuiu tas no comércio e atividades corsárias. meio de extensos rios e pelos movimentos vem sendo atribuída às causas militares;
para ocorrerem feitos relevantes. No século As necessidades de fortalecimento de de Entradas e Bandeiras. embora, reconhecendo a influência de
XIII, Portugal iniciou um conjunto de pro- Portugal, frente às ameaças em mar e ter- Nos estudos da história das navegações outras causas, quando ocorre o emprego
cessos e atividades marítimas; onde, o Bra- ra, caracterizaram os fatores determinantes deve ser evitado que o afastamento tempo- de força militar.
sil – país continente –, seria descoberto, no para o enfrentamento do “Mar Tenebro- ral e/ou espacial, entre os acontecimentos,
apagar do século XV, após a superação de so”, o Oceano Atlântico, mesmo com suas acarrete erros na identificação e interpreta- De início, observamos que as diferenças,
múltiplos desafios. lendas sobre monstros marinhos e fortes ção dos respectivos desdobramentos, bem quanto a dimensão territorial e da costa
Portugal teve, nos espaços oceânicos ao tempestades. O Atlântico e outros Oceanos como na análise dos feitos alcançados. marítima e características geográficas, en-
sul e sudoeste, os rumos seguros para a So- foram o ambiente de aplicação de inúme- Dessa maneira, com medidas adequadas, tre outras, não tem capacidade de serem
brevivência e Prosperidade; pois, ao nor- ras variáveis em matrizes político-estraté- podemos contribuir no entendimento das determinantes no desenvolvimento da
te, enfrentava a bravura dos vikings; a leste, gicas destinadas ao equacionamento dos causas motivadoras da Mentalidade Maríti- Mentalidade Marítima.
a ameaça da Espanha e, mais além, da Fran- principais desafios, que permitiram um dos ma e nas influências na elaboração de ini- Observando as causas econômicas, con-
ça; ao sul, a hostilidade dos povos do norte maiores momentos de grandeza da civiliza- ciativas político-estratégicas, destinadas ao tatamos que Fenícia, Cartago, Portugal e Es-
da África; a oeste e noroeste, os marinheiros ção humana: as Grandes Navegações. desenvolvimento nacional. panha, com dimensões territoriais reduzidas

306 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima e Desenvolvimento 307


frente ao Império Romano, alcançaram di- terrestres e outros, nos espaços oceânicos. a) quem comanda a Europa Centro- Por outro lado, coube ao Almirante Alfred
mensões continentais, quando considera- Para respaldar esses argumentos, cons- Oriental comanda o Coração do Mundo; Thayer Mahan apontar que o controle dos
dos seus territórios ultramarinos. tatamos que, nos conceitos político-estra- mares, ao longo da história, caracterizou um
tégicos da Geopolítica, é analisada a for-
b) quem comanda o Coração do Mundo
O Império Romano, por outro lado, fator de força decisivo em todas as guerras.
comanda a Ilha Mundial; e
manteve suas conquistas territoriais, com ma geométrica do território, a disponibili- Tal argumento decorre do entendimento de
vitórias terrestres, enquanto manteve seus dade ou não de terras férteis, de hidrovias c) quem comanda a Ilha Mundial comanda “quem controla o intercâmbio controla as ri-
inimigos afastados do Mar Mediterrâneo – e de recursos naturais e as características o Mundo (Idem, p. 51). quezas e quem controla as riquezas controla
o Mare Nostrum. do relevo. As definições de Geopolítica, a o Mundo” (1987).
O Império Britânico, liderado pela insu- seguir apresentadas, ilustram esse enten- Para ampliar o entendimento dos estudos Com o mesmo entendimento e muito
lar Inglaterra, empregou os espaços oceâ- dimento, quais sejam: de Mackinder, é importante relembrar que antes de Mahan, o Almirante Temístocles,
nicos para alcançar a dimensão, onde, Rudolf Kjellen: “o estudo da influência seus apontamentos foram realizados no fi- vencedor da Batalha Naval de Salamina,
segundo autores, “o Sol nunca se põe”. dos fatores geográficos na criação e exis- nal do século XIX. Dessa maneira, conside- considerava o “comando do mar como pri-
Nesse caso, e também, do Império Portu- tência do estado” (BUSH, 1993, p.6). ravam os seguintes aspectos: mordial para o comando de todas as coi-
guês, ficam evidentes as simultaneidades Friedrich Ratzel: “estudo da influência sas”, e Ratzel, ao destacar a importância do
das causas econômico-expansionistas e de do território sobre a população e a disper- a) a fase de descobertas de territórios esta- tráfico marítimo, a navegação dos navios
defesa de territórios são do homem” (idem). va encerrada; mercantes, e o valor estratégico das ilhas
Após séculos de isolamento, o Império Meira Mattos: “Uma indicação de so- b) as ameaças ao Império Britânico, decor- oceânicas, em sua obra “O mar, origem da
do Meio – a China – continental em suas luções políticas condicionadas pelas rea- rentes do rearmamento e das pretensões grandeza dos povos”. Uma espécie de an-
dimensões territoriais, está retornando ao lidades e necessidades geográficas .... O coloniais do Império Austro-Húngaro e da tecipação dos fundamentos das atividades
mar, fortalecendo sua atuação global, em território condiciona a vida de um estado Alemanha; humanas no mar, ou de apoio em terra. Em
conjunto com a “Rota da Seda”, onde as- e limita suas aspirações (...)” (2007a, 24). outras palavras, da Economia Azul.
socia iniciativas político-estratégicas com Halford J. Mackinder argumenta que a c) o comércio internacional estava distante Para Mahan, os mares facilitam a mobi-
questões militares, logísticas e econômicas. “geografia deve ser uma ponte entre as da magnitude da atualidade; lidade, pois não existem obstáculos natu-
Na comunidade internacional, também ciências físicas e as sociais, assim como rais, exceto em situações de mar adverso, o
d) a navegação a vapor era incipiente e as
constatamos inúmeros exemplos onde é fundamental o estudo da influência da ordenamento jurídico relativo aos espaços
atividades marítimas careciam de infraes-
as iniciativas adotadas no passado conti- geografia na sociedade e o da influência oceânicos pouco restringia a movimenta-
truturas adequadas; e
nuam válidas e permanecem emolduradas da sociedade no ambiente”. Nos seus ção dos navios e a disponibilidade de por-
pela Mentalidade Marítima. A respaldar estudos geopolíticos, Mackinder desen- e) as iniciativas para descobrimento dos tos era fundamental para o apoio logístico
essas considerações, temos a permanente volveu o conceito de “área pivô”, que recursos naturais nos oceanos eram quase dos navios (1987).
relevância do comércio marítimo e da bus- alcançava maior relevância político-estra- inexistentes. Na atualidade, a tecnologia permite que
ca da expansão territorial, no passado, por tégica, frente a outras áreas terrestres do situações de mar adverso sejam evitadas e
meio de colônias além-mar e, atualmen- planeta, em decorrência de um conjunto Esse conjunto de considerações, indica observamos uma crescente complexidade no
te, com o fenômeno da “territorialização” de fatores geográficos, recursos naturais Mackinder como o principal pensador, do ordenamento jurídico, constante na III Con-
dos oceanos, quando países alteram o or- e da proteção de potências marítimas. que passou a ser denominado de Teoria do venção das Nações Unidas sobre o Direito do
denamento jurídico de espaços oceânicos Como “área pivô”, Mackinder identificou Poder Terrestre (1996, p. 22). Mar. A denominada “Constituição do Mar”
(adiante, abordaremos esse tópico). a Europa Centro-Oriental, passando a de- Nas histórias dos povos, onde tem passou a impor orientações à navegação,
Entretanto, ainda se pode analisar con- nominá-la de “Coração do Mundo” e a maior relevância o Poder Terrestre, pode- tanto a mercante, como a realizada por na-
ceitos de Geopolítica e de Oceanopolítica, Europa, Ásia e África como a “Ilha Mun- mos associar a existência de uma Menta- vios de guerra. Espaços oceânicos receberam
para aprimorar a identificação das causas dial” (1996). lidade Terrestre, que adota um conjunto denominações, Mar Territorial (MT), Zona
determinantes da influência da Mentalida- A preponderância do determinismo de processos e atividades, crenças, ma- Contígua (ZC), Zona Econômica Exclusiva
de Marítima na história de alguns povos, geográfico de Mackinder, com ênfase em neiras de pensar e outros segmentos da (ZEE), Plataforma Continental (PC), Platafor-
tendo alguns o predomínio de conceitos territórios continentais, decorre das se- definição de Mentalidade, vinculadas à ma Continental Estendida (PCE) e a Área,
político-estratégicos com base em espaços guintes assertivas: ênfase no determinismo geográfico. onde estão previstos direitos e deveres.

308 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima e Desenvolvimento 309


A superioridade dos conceitos postula- Nos conceitos da Oceanopolítica, cons- emprego de forças militares. Outros paí- navegações costeiras até aqueles dias.
dos por Mahan, frente aos de Mackinder, é tatamos a existência de Mentalidade Ma- ses, com as mesmas aspirações de ampliar Hoje, passados cerca de 40 anos de sua
respaldada pelos seguintes fatos: rítima nas potências relacionadas com o seu potencial marítimo, implantam alte- conclusão, contatamos pujantes altera-
Poder Marítimo que, ao longo da história, rações em apoio às suas Marinhas Mer- ções do contexto, onde a tecnologia ini-
a) ao longo da história, as vitórias das po-
venceram guerras e, em grande medida, cantes, com diretrizes tributárias especiais cia o emprego de robots na condução de
tências marítimas nos confrontos com as
deram partida em valores relacionados aplicadas, em bandeiras de conveniência navios, plataformas de fontes de energia
potencias terrestres;
com a democracia, as liberdades funda- e/ou de segundo registro. e de exploração de petróleo e, na mesma
b) o comércio mundial, prioritariamente mentais do ser humano, com a irradiação Assim, consideramos que os bravos par- dinâmica e a substituição de cartas náuti-
realizado por meio de navios mercantes; do conhecimento e desenvolvimento e com ticipantes das Grandes Navegações, os Al- cas (os portulanos, de outrora), bem como
a contribuição do intercambio de culturas mirantes Temístocles e Mahan, o geógrafo dos analógicos auxílios à navegação.
c) a magnitude dos recursos naturais exis-
acarretado pelo comércio marítimo. Assim, Ratzel, os cientistas de temas marinhos e A existência de Mentalidade Marítima,
tentes no mar;
podemos dizer que temos conjuntos de pro- os marinheiros de guerra e mercantes, de além de induzir, fortalece os estudos da
d) o constante desenvolvimento de tecnolo- cedimentos, atividades e ações da Oceano- ontem e de hoje, foram e são motivados Oceanopolítica, ao ampliar os horizontes
gias para a exploração desses recursos; política, que foram formulados e consolida- pelos elementos que integram a Mentali- para além dos limites das fronteiras ter-
dos, a partir de pensamentos, crenças e tra- dade Marítima. São alguns dos percursores restres. Nessa virtuosa navegação, como
e) a importância dos oceanos para o meio
dições, no decorrer dos tempos, observados da Oceanopolítica e contribuintes do de- demonstrado, a Mentalidade Marítima
ambiente; e
nos povos com Mentalidade Marítima. senvolvimento de seus povos e países, em aproxima culturas, estabelece regras nas
f) o fenômeno da “territorialização” dos Como exemplos da supremacia das po- assuntos relacionados às atividades realiza- relações internacionais, sejam aquelas pau-
oceanos. A aplicação, nos oceanos, do con- tências marítimas: a Grécia, na vitória da Ba- das, direta ou indiretamente, nos oceanos. tadas na formalidade de um ordenamento
ceito geopolítico Uti Possidetis (em sínte- talha Naval de Salamina. Atenas, devido a Esse entendimento, destaca, uma vez jurídico ou em crenças e costumes.
se, a posse decorre da presença), por meio vitória sobre os persas, teve a possibilidade mais, que a existência de Mentalidade Marí- Na formulação dos conceitos de Oceano-
da ocupação humana de áreas marítimas, de irradiar a base da filosofia da civilização tima precede os estudos de Oceanopolítica política, abaixo transcritos, pode-se verificar
por meio do emprego de interpretações ocidental. Portugal, com as Grandes Navega- e indica uma sinergia entre as consequên- a influência da Mentalidade Marítima:
discutíveis de conceitos da III Convenção ções é o pioneiro da globalização, da Inglater- cias das iniciativas adotadas, na medida em
“A Oceanopolítica envolve o Estado
das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, ra, com a vitórias sobre a Invencível Armada e que, ocorrem êxitos no desenvolvimento
como elemento central para a ado-
apoiadas por forças militares. em Trafalgar, quando impõe a Pax Britanica, dos povos envolvidos.
ção de decisões soberanas, conside-
onde a Monarquia, com limitações políticas Em outra perspectiva, observamos que
rando os espaços ocenicos, sobre
As considerações relativas à influência do parlamento, vence o absolutismo da Fran- desde, pelo menos 1609, quando da pu-
o destino de sua população, as-
dos espaços oceânicos, nos destinos dos ça e Espanha. Na atualidade, os Estados Uni- blicação do Mare Liberum, por Hugo
sim como nas relações de poder
estados, foram consolidadas pelo que pas- dos da América, com a globalização e a Pax Grotius, a comunidade internacional vem
com outros Estados e, consideran-
sou a ser denominado de Teoria do Poder Americana, possui uma Marinha de Guerra ampliando e atualizando a Mentalidade
do a conjuntura político-estratégica
Marítimo, tendo no Almirante Mahan seu que lhe permite atuar globalmente, em apoio Marítima, tendo como um de seus pontos
internacional, com os demais atores
principal formulador (NOGUEIRA, 1991). En- aos interesses norte-americanos. de análise, o ordenamento jurídico relacio-
das relações internacionais”
tretanto, a Teoria do Poder Marítimo deixou No horizonte, com ambições de potên- nado aos Oceanos.
de alcançar o mesmo prestígio acadêmico cia marítima, vemos a bandeira da China Em 1982, após 9 anos e com a partici- (BARBOSA JUNIOR, 2009).
da apresentada pelos estudiosos do Poder na maior frota mercante do mundo, con- pação de cerca de 150 países, os esforços
Terrestre, em grande medida, pela exigência tando com a maioria dos mais importan- da comunidade internacional contribuí- Como outra tentativa, a tese oriunda da
de maiores conhecimentos sobre as ativida- tes portos e sendo associada com um ram para a elaboração da Convenção das Naval Postgraduate School:
des marítimas. Dessa maneira, é convenien- robusto fortalecimento da sua Marinha Nações Unidas sobre o Direito do Mar. A “... a Oceanopolítica estabelece as
te empregar os conceitos apresentados por de Guerra. Cabe menção também a Rús- chamada “Constituição do Mar”, que es- orientações para que o Estado em-
Mahan para iniciar a análise da influência sia que, mesmo após o declínio da URSS, tabelece direitos e deveres desde o MT até pregue os oceanos como um espaço
dos fatores observados nos oceanos na po- como sempre, vem adotando o modelo a PCE e à Área, foi pautada por conhe- onde deve expandir e projetar sua influên-
lítica dos estados, ou seja, a Oceanopolítica. de causas militares, com predomínio do cimentos acumulados desde as primeiras cia...” (tradução do autor)

310 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima e Desenvolvimento 311


Os países que, ao longo de suas histórias, proveniente da evaporação dos oceanos. A amplitude de tópicos abordados as diretrizes da Oceanopolítica, há de se
souberam orientar as influências da mentali- Essas águas, levadas pelos ventos, irrigam corresponde à imensidão dos espaços fortalecer a Mentalidade Marítima, para,
dade marítima ao desenvolvimento nacional os continentes. Assim, temos rios como oceânicos e à magnitude dos interesses segundo Fernando Pessoa, “navegarmos
alcançaram elevados níveis de Prosperida- Amazonas, Nilo, Tâmisa, Mississipi e ou- de toda natureza que estão envolvidos além da dor” e poder se alcançar o al-
de, com consequente robusta capacidade tros, “correndo” na atmosfera e sendo de- com as atividades marítimas. Assim, de mejado desenvolvimento nacional das

.
de Sobrevivência. Para relembrar: cisivos na contribuição para a continuidade modo a estarmos preparados para adotar potências marítimas.
da vida no planeta Terra.

.
Portugal – As Grandes Navegações;
A preservação ambiental, na Mentali- 3. Conclusão
Inglaterra – Pax Britanica. O Império dade Marítima, traz para o debate a liga-

.
onde o Sol nunca se põe!; ção da vida com os desdobramentos rela- No Brasil, devemos, o quanto antes, ele-
Estados Unidos da América – Pax Ame- cionados com os estados físicos da água: var a dinâmica de estudos sobre os espaços influência dos espaços oceânicos, apesar de

.
ricana; e sólido, líquido e gasoso. Na verdade, caso oceânicos. Para tal, iniciativas relacionadas analisada em diversos estudos geopolíticos,
os oceanos inexistissem, a Terra seria inviá- com a Mentalidade Marítima são prioritá- deixou de alcançar à mesma relevância que a
China – A Rota da Seda. Em disputa de
vel devido ao calor irradiado pelo Sol. Os rias e com a convicção de que, muitas mi- das áreas terrestres.
espaços oceânicos.
estados físicos da água contribuem, de for- lhas ainda precisam ser navegadas, para al- Essa realidade decorreu, basicamente,
O acesso a conhecimentos e a tecnolo- ma significativa, com a proteção do planeta cançarmos uma adequada amplitude e pro- da necessidade de um elenco de conheci-
gias que permitem ampliar a permanência ao existir, na atmosfera e na terra, a água fundidade de conhecimentos sobre assuntos mentos sobre as atividades marítimas que,
do ser humano em um ambiente hostil, nos estados sólido, gasoso e líquido. Essa diversos e de grande complexidade. A Ocea- no Século XIX e início do Século XX, ainda
como o marítimo, permite um contínuo constatação, justifica a preferência, para nopolítica, que emprega os conhecimentos, eram incipientes. Nesse contexto, coube
equacionamento de dificuldades e a neu- muitos, pela substituição da denominação as tradições e as crenças da Mentalidade ao Almirante Mahan formular os conceitos
tralização de ameaças existentes em terra, de nosso habitat: planeta Água. Marítima, por consequência, depende des- que atribuíram aos espaços oceânicos uma
para o acesso a recursos minerais, alimen- Em retrospectiva histórica, lembramos sa base de sustentação para influenciar, de maior capacidade de influenciar os destinos
tos e energia. que, a princípio, os oceanos eram barrei- forma efetiva, o desenvolvimento nacional. dos Estados; sendo que o conjunto desses
A Economia Azul ou, ainda, a Nova ras, que impediam o deslocamento huma- Também, podemos entender que a conceitos passou a ser denominado de Teo-
Economia, segundo a Organização para no. A seguir, os deslocamentos passaram Mentalidade Marítima e a Oceanopolítica ria do Poder Marítimo.
a Cooperação e Desenvolvimento Econô- a ocorrer, tanto para o comércio, guerra e orientam a elaboração de pensamentos e A evolução dessa Teoria vem permitin-
mico, OECD (sigla em inglês), no livro The incipiente exploração e explotação de seus ações, que formulam diretrizes e procedi- do que um conjunto de conceitos, parcial-
Ocean Economy in 2030, em tradução livre: recursos naturais. Atualmente, temos seres mentos, induzem atividades em terra, em mente decorrentes de estudos da Geopo-
“... é essencial para o desenvolvimento e humanos trabalhando, em diversos tipos de benefício daquelas realizadas no mar e lítica, passasse a integrar e a aperfeiçoar
a prosperidade da humanidade. Fonte de atividades, em áreas oceânicas afastadas de as atividades no mar, ao envolver as refe- a Oceanopolítica; a ciência que formula
alimentos, energia, minerais, saúde, lazer terra e mesmo, o que era impossível há pou- rências para a superação dos desafios dos orientações para o desenvolvimento na-
e transporte de mercadorias e pessoas....”. co tempo, submersos por longos períodos. oceanos, rios e lagos. cional, considerando, prioritariamente, as
E continua: “... As novas tecnologias es- De Grotius até a III Convenção das Nações As análises dos conceitos apresen- atividades marítimas.
tão viabilizando a energia proveniente de Unidas sobre o Direito do Mar observamos tados pela Geopolítica permitem que, a Ainda favorecendo o desenvolvimento
correntes marítimas, de marés e do vento, um contínuo crescimento da Mentalidade partir de fatores observados – principal- da Mentalidade Marítima e da Oceanopolí-
novas fontes de proteínas e indicam, com Marítima, tanto em amplitude dos assuntos, mente – em espaços terrestres, sejam es- tica temos a possibilidade de escassez dos
absoluta clareza, a fundamental ligação da quanto na profundidade e complexidade tabelecidos os fundamentos necessários recursos naturais existentes nos territórios
preservação ambiental dos oceanos com as dos conhecimentos alcançados. Nos fení- para as atividades no mar. continentais, as dificuldades relacionadas
alterações climáticas...”. cios, encontramos os mesmos fundamentos A predominância da influência dos ter- à preservação do ambiente no ambiente
“O Mar que nos Cerca”, de autoria da Mentalidade Marítima que permanecem ritórios continentais, na Geopolítica, pode ter terrestre, o ordenamento jurídico e as con-
da distinta bióloga marinha Rachel Car- impulsionando os estudos de Oceanopolíti- alcançado o seu apogeu com Mackinder, que sequências político-estratégicas decorren-
son (2010), aponta a importância dos ca e viabilizando as atividades da Economia passou a ser considerado como o formulador tes da promulgação da III Convenção das
rios formados de água em estado gasoso, Azul e o desenvolvimento nacional. da Teoria do Poder Terrestre. Entretanto, a Nações Unidas sobre o Direito do Mar e a

312 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima e Desenvolvimento 313


magnitude do comércio marítimo provo- Em breves palavras, a Mentalidade Marí- Referências
cado pela Globalização e da dependência tima sempre foi e permanecerá sendo uma
da continuidade da vida devido a preser- indutora do desenvolvimento nacional. ABREU, Guilherme Mattos de. A Amazô- Marinha. Amazônia Azul: Patrimônio
vação ambiental dos oceanos, rios e lagos. No princípio desse trabalho, comentei nia Azul: O mar que nos pertence. Rio de Brasileiro no Mar. Periódico Notícias da
Aprimorando, então, a definição de que inexistia a pretensão de encerrar, ou Janeiro:[s.n.] ESG, 2007. Palestra profe- Marinha, Brasília, 2006.
Mentalidade Marítima: mesmo se aproximar, acrescento, de con- rida para o Programa de Atualização da BUSCH, Jorge Martinez. El Mar como Sis-
clusões definitivas sobre as influências da Mulher, 2006. tema. “Los Vetores para la Oceanopolíti-
Mentalidade Marítima, um conjunto
mentalidade marítima no desenvolvimento AGUIRRE, Horácio Justiniano. Temas de ca”. Revista de Marina, Valparaiso, Chile,
de conhecimentos, pensamentos e maneiras
nacional. Estratégia Naval. Valparaiso, Chile: Aca- n. 833. p. 329/339, 1996.
de pensar, pesquisas, processos e atividades,
A título de proposição de um ponto de demia de Guerra Naval, 1993. BUSCH, Jorge Martinez. La Oceanopo-
com manifestações de crenças, tradições,
partida, para os próximos estudos e con- BARBOSA JÚNIOR, Ilques. O dimensio- lítica en el Desarrollo de Chile. Aula
disposições psíquicas e morais de uma cole-
siderando as reflexões envolvendo Men- namento da Força Naval. Monografia Magna na Academia de Guerra Naval do
tividade (povo) que, ao longo de sua histó-
talidade Marítima e Oceanopolítica, apre- apresentada no Curso de Política e Es- Chile, 1993a.
ria, tem nos espaços oceânicos e hidroviários
senta-se a carência e decorrente proposta tratégia Marítimas da Escola de Guerra BUSCH, Jorge Martinez. Oceanopolítica:
a sua Sobrevivência e Prosperidade.
de análise das relações desses campos do Naval, 2001. Una alternativa para el desarrollo. Santia-
Quanto a Sobrevivência e Prosperi- conhecimento, com o conceito político-es- BARBOSA JÚNIOR, Ilques. Oceanopolítica: go, Chile: Andres Bello, 1993b.
dade:
.
tratégico “Amazônia Azul” e suas verten- uma pesquisa preliminar. Revista Maríti- CABRAL FILHO, Severino Bezerra. Pales-
tes Econômica, Ambiental, Científica e de ma Brasileira, Rio de Janeiro: 2º trimestre tras e Conferências sobre Geopolítica.
Sobrevivência, os insumos, serviços e
Soberania Nacional. de 2009, p. 55-68. Rio de Janeiro: [s.n.] ESG, 2007. Proferi-
bens de capital, os conhecimentos, a cren-
As vertentes da “Amazônia Azul” seriam BARBOSA JÚNIOR, Ilques. Oceanopolítica: das, em 2007, para o Curso de Altos Estu-
ça em determinados valores e o culto de
as balizas (referências) para o agrupamento conceitos fundamentais, a Amazônia Azul. dos de Política e Estratégia Disponível em:
tradições, que são necessários para manter
de iniciativas e atividades relacionadas com In MORE, Rodrigo F.; BARBOSA JÚNIOR, www.esg.br, (Escola Superior de Guerra).
a integridade territorial e o desenvolvimen-
os espaços oceânicos e hidroviários, com e Ilques (orgs.). Amazônia Azul: política, CAMINHA, João Carlos Gonçalves. Deli-
to nacional em nível, que preserve a conti-
objetivos interdependentes e envolvidos estratégia e direito para o Oceano do Bra- neamentos da Estratégia. Rio de Janeiro:
nuidade da liberdade e da vida.
. Prosperidade, a exportação e importa- em matrizes político-estratégicas.
Seriam, portanto, semelhantes àquelas
sil. Rio de Janeiro: Femar/SaGServ, 2012,
p. 205-231.
Serviço de Documentação Geral da Mari-
nha, 1980.
ção de conhecimentos, pesquisas, produtos, que levaram aos êxitos da lendária Escola BEAUFRE, André. Introdução à Es- CAMINHA, João Carlos Gonçalves. Histó-
serviços e bens de capital, que ampliam as de Sagres? Desde agora, iça-se a Bandei- tratégia. Tradução de Luiz de Alencar ria Marítima. Rio de Janeiro: Biblioteca do
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314 ECONOMIA AZUL Mentalidade Marítima e Desenvolvimento 315


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316 ECONOMIA AZUL Mentalidade


Mentalidade Marítima Desenvolvimento 317
Marítima ee Desenvolvimento 317
16

POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS AO MAR:


UM LONGO CAMINHO JÁ INICIADO
André Panno Beirão

1. Introdução

O tema Políticas Públicas tem, cada vez conceito de outra ciência, que lhe é bastan-
mais, feito parte da agenda nacional. Seja te correlata, que é o Direito. Basicamente,
em esferas mais técnicas, seja mesmo na o Direito é uma ciência post-factu, ou seja,
opinião pública, muitas vezes manifesta diante do fato social que se impõe, a so-
pela imprensa. Entretanto, apesar de mui- ciedade recorre ao seu pacto social para
to citado, poucas vezes há a clara defini- regulamentar o que pode (direito positivo)
ção do que se trata por Políticas Públicas. ou que não pode (direito negativo) (CANO-
Algumas vezes, são entendidas como “lei TILHO, 2007). Por exemplo, não se vislum-
que versa sobre o assunto”, outras vezes, brava regular a separação conjugal antes da
“como o poder público age em determi- efetiva união conjugal. Primeiro a realidade
nado setor”. Ou seja, acaba entrando para se impôs e o direito teve que se mover para
a lista dos conceitos difusos e abstratos do regulamentar. Portanto, associar o concei-
imaginário nacional. Não deveria ser assim. to de Políticas Públicas, de forma restritiva,
Quando se pretende estudar Políticas Públi- ao do direito, dizendo que é o conjunto de
cas e seus efetivos instrumentos, há de se leis de regulam determinado assunto é im-
compreender sua delimitação e seu caráter próprio. Em verdade, pode-se entender que
científico. Mesmo no meio acadêmico, é te- Políticas Públicas voltam-se para o presente/
mática recente que a pós-graduação stricto futuro, ou seja, estão mais associadas ao
sensu brasileira – tão respeitada por sua cre- “dever ser”. Elas são a vontade manifes-
dibilidade e critérios científicos – vem se de- ta de como se pretende que determinado
bruçando há pouco mais de uma década1. assunto ou atividade se estabeleça em prol
Em verdade, para se entender o que da sociedade. Logo, se apenas se relacio-
se insere no conceito de Políticas Públicas, nassem com leis, estariam sempre fadadas
dentre outras formas, pode-se recorrer ao à olharem mais para o passado que para o

318 ECONOMIA AZUL PolíticasPúblicas


Políticas Públicasvoltadas
voltadasao
aoMar 319
Mar 319
futuro. Há inúmeras e evolutivas concei- porque, exatamente em decorrência dessa 1988). Por sua vez, a gestão costeira englo- das matricial bastante complexo, que pode
tuações, a maioria convergente, das quais necessidade (e ausência), em 2018, foi pro- ba competências municipais. Esse arcabou- ser sintetizado basicamente, a nível nacio-
escolhe-se aqui uma clássica de Peters posta e aprovada (em decorrência do Edital ço complexo de competências, atribuições e nal, como multiplamente influenciado, sob
(1986, p. 37-40) que diz que “política pú- nº 27/2018 da CAPES/MD – Edital Pró-De- responsabilidades, ora exclusivas, ora com- quatro perspectivas: pela temática abor-
blica é a soma das atividades dos governos, fesa IV) a criação do Observatório de Polí- plementares ou concorrentes não é simples dada (transversal), pelo ambiente físico a
que agem diretamente ou através de dele- ticas Marítimas (OPM), sediado e coorde- de elucidar. Daí a opção em focar nos princi- que se destina (ambiente geográfico), pela
gação, e que influenciam a vida dos cida- nado na Escola de Guerra Naval (RJ) e que pais instrumentos de iniciativa federal3. competência atribuída para decidir sob de-
dãos”. Elas devem refletir tanto os interes- nasceu da cooperação com renomadas ins- Portanto, quando se pensa em “políti- terminada política pública, ou ainda, pelos
ses do Estado quanto o “valor” (que é mais tituições dispersas por grande parte do terri- cas públicas voltadas ao mar”, no Brasil, há níveis e tipos de instrumentos utilizados
que apenas seu viés econômico, pois inclui tório nacional (UNB – Distrito Federal – polo de entender que é um conjunto de medi- para implementação dessas políticas.
aspectos intrínsecos e extrínsecos) que decisor de muitas PP; UFC e FURG) e em
o povo dá à determinada temática, aqui, pouco mais de 3 anos já agregou outras 20 Figura 1. Matriz de intercorrências de Políticas Públicas voltadas ao mar
no caso, ao mar que ajudou a consolidar instituições nacionais e internacionais. Seus
a imensa nação brasileira (BEIRÃO, 2020)2. objetivos, também ousados (acompanhar,
Assim sendo, ela é a manifestação do monitorar – inclusive com estudos compara- Por temática transversal: Por ambiente geográfico:
Poder Público decisor de rumos (no caso dos –, avaliar e propor políticas públicas em Pesca Na Zona Costeira
brasileiro, em geral, advindos dos Poderes seis áreas temáticas) permitem uma visão transporte marítimo No Mar Territorial
Executivos e/ou Legislativos, em todos os ní- mais sistêmica e metodológica. explotação de recursos minerais Nos Terminais Portuários
veis) com uma série de instrumentos para Assim, pretende-se estruturar a presen- explotação de Óleo & Gás Na Zona Contígua
confluir a sociedade em torno de determi- te análise, especialmente focada em sua Exploração de energias renováveis Na Zona Econômica Exclusiva
nado caminho. Pode advir de atos tipica- contribuição à economia do mar brasileira, Instalação de Infraestrururas (Cabos Na Plataforma Continental
mente normativos (leis, decretos, portarias, fundamentada nos principais instrumentos Submarinos, Plataformas) Nas Bacias Hidrogáficas e sua ligação ao mar
instruções normativas, planos, projetos, já em vigor (ou em processo evolutivo), sob Sinalização Náutica Nas águas interiores costeiras (baías, lagoas,
etc.), de rearranjo da máquina estatal (cria- a mais ampla perspectiva nacional, que é a Segurança Marítima estuários)
ção de agências, novos órgãos controlado- federal. Certamente um assunto tão mul-
res, fiscalizadores, fomentadores, atribui- tisistêmico merece uma abordagem con-
ção de responsabilidades, etc.) ou mesmo junta. Já observava Mello et al. (2019), que Políticas Públicas
de ações de conscientização e formação as atividades no mar exigem ações coorde- voltadas ao mar
(campanhas de propaganda, cartilhas, in- nadas para atuarem em vários âmbitos e
clusão em formação educacional, etc.). Eis a que, cabe à política (latu sensu) essa coor-
Por competência decisória: Por níveis de instrumentos de
complexidade de se estudar políticas públi- denação de diferentes esferas de ações e
Complementar (por exemplo: os Implementação:
cas: não se pode ater somente a um de seus intenções para o aproveitamento de opor-
resultados auferidos da exploração de Por Lei Complementar
instrumentos possíveis. tunidades econômicas que alavanquem o
óleo & gás é compartilhado em forma Por Lei Ordinária decorrente de
Isto posto, quando se pretende abordar, interesse estratégico e o desenvolvimento
de royalties entre os três níveis de internalização de Atos Internacionais
mais especificamente as Políticas Públicas nacional. A Constituição Brasileira já enseja
organização da União; idem para geração aderidos e Leis Ordinárias, por vontade
voltadas ao mar, essas teriam uma enor- essa distribuição e/ou acumulação de ta-
energética a partir de recursoa híbridos) política interna
midade de instrumentos a serem cotejados refas. Por exemplo, em seu art. 24 (Inciso
Concorrente:: Atividade pesqueira, Por Decreto
para se absorver qual o caminho pretendi- VI) diz que a gestão de recursos de pesca
reglação ambiental, ciência e tecnologia Por Planos e Programas
do na vocação marítima nacional e, ainda, e proteção do meio ambiente (dentre ou-
Por Atos Regulamentares Normativos
o quanto isso é fator indutor da economia tras) é concorrente da União, Estados e
do mar e do desenvolvimento social e eco- Distrito Federal; já a de recursos minerais,
nômico nacional. Tal pretensão não pode navegação e regime de portos é exclusiva
Fonte: elaborado pelo autor
se ater apenas nesse capítulo. Até mesmo da União (art. 23, Incisos X e XII) (BRASIL,

320 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 321


Como dito anteriormente, a vonta- tratégico já prevê que o instrumento de A última década (2010-2020) mostrou Internacional, como ocorreu com a Inte-
de estatal, desdobrada em ações subse- mais alto nível deve ser a “política”, que o início de uma guinada para o mar. Se grated Maritime Policy of the European
quentes para determinado setor, não se deve dizer – “o que se quer” –; dela des- até 2010 pouco mais de uma dezena de Union, de 2021. Ou seja, vê-se clara reor-
expressa somente por uma Lei ou um ato dobra-se a “estratégia” (“como fazer”) países haviam consolidado instrumentos denação da agenda internacional voltada
normativo. Constitui-se de um conjunto ou “planos”, e assim por diante. Portan- a nível nacional, houve um autêntico mo- ao mar, especialmente após a instituição
de instrumentos. Entretanto, idealmente, to, merecem destaque alguns desses me- vimento de instituição de novas políticas da UN – Agenda 2030 e da escolha do
deve partir de níveis mais elevados para canismos já em vigor, em aprimoramento por outros Estados e, também, de revisão período 2021-2030 como, popularmente
ações decorrentes. A clássica construção cíclico, ou identificados como prementes pelos que já as possuíam. Dentre os que conhecida a “década dos oceanos”4 .
teórica do sistema de planejamento es- de serem instituídos. revisaram, pode-se citar: Portugal, EUA e Assim, há uma sintonia global de institui-
Reino Unido. Novos se juntaram ao seleto ção ou revisão de posicionamentos estatais
grupo: Espanha (Política marítima Integra- em relação ao mar. Alguns mais alinhados à
2. O Brasil e o mundo que o margeia
da de Espanha (2008), Chile: Política Ma- perspectiva ambiental, outros, mais holísti-
A escolha do arranjo de instrumentos mostravam um viés eminentemente am- rítima del Chile (2017), Peru: Política Ma- cos, mostrando além dessa perspectiva, seus
para publicização, a nível nacional, de uma biental em relação ao ecossistema mari- rítima del Peru (2019), Filipinas: Philippine objetivos estratégicos em relação ao liame
vontade estatal de como lidar com o mar é nho: China – The Development of Mari- Maritime Strategy (2020) e Índia: Indian marítimo geopolítico e econômico. E, se de
uma manifestação, majoritariamente e evi- ne Affairs of China; Russia – Marine Po- Maritime Security Strategy (2015 e revista alguma forma o Brasil foi um dos pioneiros
dentemente, de cunho interno. No entanto, licy Document of the Russian Federation; em 2020). Acresce-se a isso um inovador nessa formalização (com suas Políticas Ma-
também é uma sinalização externa de como Reino Unido – A Sea Change: a Marine movimento de consolidação de política rítimas Nacionais de 1984 e 1994), esse é o
esse Estado pretende gerenciar essa relação Bill White Paper; ou mesmo os EUA – US pública formal a nível regional, conquis- momento de sua readequação à nova siste-
com o mar que, como afirmava Hugo Grot- Commission on Ocean Policy. An Ocean tando status de política instituída por Ato mática mundial.
tius, é algo que une a todos no planeta. Blueprint for the 21st Century” Executive
Há um clamor internacional que essas Summary of the Final Report. Portanto, al- 3. Instrumentos de Políticas Públicas voltadas ao mar a nível nacional
“políticas” nacionais sejam estruturadas. guns já demonstravam essa vocação por
Por exemplo, a UNESCO, parte integran- instrumento distinto de uma “política” e Um país com dimensões continentais aparentemente transversal, mas que tam-
te do sistema ONU e distinta da DOALOS sim fazendo uso de “Livros Brancos” ou como o Brasil, com extensão de costa su- bém guardam macro-orientações para ati-
(Division for Ocean Affairs and the Law of “Livros Azuis”. Outros consolidavam em perior à 7.500km merece especial atenção vidades marítimas como a Política Nacional
the Sea), mantinha acompanhamento de documentos nomeadamente distintos, a essa imensa porta aberta ao mundo e de Defesa – instituída pelo Decreto Nº 5.484,
quais países possuíam, pelo menos a nível mas com a mesma finalidade: Canadá às riquezas advindas do mar. Essa vonta- de 30 de junho de 2005 (BRASIL, 2005), a
estatal, alguma forma de formalização de – Canada’s Oceans Strategy; Noruega – de nacional com teor marítimo encontra Política Nacional de Resíduos Sólidos – insti-
sua “política para o mar”. Um levantamen- Report No. 12 to the Storting; Portugal: eco em alguns instrumentos mais diretos tuída pela Lei Nº 12.305, de 2 de agosto de
to feito pela International Oceanographic National Ocean Strategy. Ou ainda, alguns e outros, indiretos. Por exemplo, resta in- 2010 (BRASIL, 2010) e, mesmo, as Política
Comission (atualizado até 2010, somente) possuíam, segundo esse levantamento, conteste que o primeiro e principal desses Nacional sobre Mudanças Climáticas – insti-
mostrava que até o final da primeira déca- mais de um instrumento que consolidas- instrumentos é a Política Marítima Nacio- tuída pela Lei Nº 12.187, de 29 de dezembro
da deste século, poucos países a possuíam: se essa visão: Portugal – National Ocean nal (PMN), já existente e em vigor, mas que de 2009 (BRASIL, 2009) e o Plano Nacional
Austrália, Brasil, Canadá, China, Colômbia, Strategy: Resolution 163/2006 and Reso- será particularizada em análise específica a de Gerenciamento Costeiro – instituído pela
Japão, Noruega, Portugal, Reino Unido, lution 40/2007 e o Brasil: Decree 1265 on seguir. Dentre outros instrumentos, mere- Lei Nº 7.661, de 16 de maio de 1988 (BRA-
Rússia e EUA (IOC, 2010). Ainda assim, National Maritime Policy and Decree 5377 cem destaque a Política Nacional de Recur- SIL, 1988) e regulamentado pelo Decreto Nº
o sprit de la loi comparativo entre elas on National Policy on Marine Resources. sos do Mar (PNRM) – instituída pela Decre- 5.300, de 07 de dezembro de 2004.
era bastante distinto. Enquanto algumas Ou seja, o Brasil fazia parte do seleto gru- to Nº 5.377, de 23 de fevereiro de 2005, a Entretanto, diversamente do que se
mostravam a macrovisão do mar: Austrá- po de pouco mais de 10 Estados que já Política Nacional do Meio Ambiente – insti- pode pensar, essa vontade estatal tam-
lia – Australia’s Ocean Policy; Japão – Basic haviam consolidado “políticas públicas tuída pela Lei Nº 6.938 de 1981, atualizada bém se desdobra da formal opção nacional
Act on Ocean Policy; Colômbia – National nacionais voltadas ao mar”, citando nossa por diversas novas leis e decretos posterio- de internalizar determinado ordenamen-
Oceans and Coastal Regions Policy; outros PMN (de 1994) e nossa PNRM (de 2005). res (BRASIL, 1981) e outras com interesse to internacional e, na temática marítima,

322 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 323


diversas foram essas manifestações que 9 Leis Ordinárias, 3 Decretos-Lei e 10 De- mirando um aproveitamento sustentá- Entretanto, vai além ao estabelecer forte
guardam plena aderência à vontade brasi- cretos. Ou seja, mesmo sem descer aos ci- vel e observando os três vieses citados compromisso de fomentar a capacitação e
leira. Desde a própria Convenção das Na- tados e fundamentais demais instrumentos (econômico, social e ecológico). Tem os meios para que os profissionais da educação
ções Unidas sobre o Direito do Mar – inter- (planos, diretrizes, atos normativos, etc.) objetivos de promoção da formação de do ensino fundamental e médio, líderes co-
nalizada pelo Decreto Nº 15.30, de 22 de pode-se contatar a existência de mais de recursos humanos aptos à estimulação munitários e outros formadores de opinião
junho de 1995 (BRASIL, 1995), o Tratado uma centena de atos federais. do desenvolvimento da pesquisa, ciên- desenvolvam programas de educação sobre
da Antártica – internalizado pelo Decreto Isto posto, optou-se por breve análise cia e tecnologia marinha, bem como, o o papel dos oceanos para a economia, qua-
Nº 75.963, de 11 de julho de 1975, ou mes- em um dos dois documentos de mais alto de incentivar a exploração e o aproveita- lidade de vida e saúde de todos, de forma
mo a Convenção das Nações Unidas sobre a nível, no Brasil – como citados na referida mento sustentável dos recursos do mar a aprimorar a mentalidade marítima das
Diversidade Biológica (que também inclui o publicação de 2010 da UNESCO – a Política em todos os ambientes citados, incluindo futuras gerações e ampliar sua capacidade
ambiente marinho), decorrente da ECO-92, Nacional de Recursos do Mar, uma vez que as áreas costeiras adjacentes. de contribuir para o desenvolvimento da
internalizada por meio do Decreto Nº 2.519, ela é assunto específico tratado sob ótica Essa articulação interministerial, rea- Economia Azul (CIRM, 2021).
de 16 de março de 1998. Essa consulta é mais ambiental e científica. Posteriormente, lizada pela CIRM, proporcionou diversos Ou seja, é um modelo de gestão funda-
extensa e merece cotejamento em função pretende-se relatar mais detalhadamente resultados concretos ao longo de sua vi- mentado na cooperação e interação entre
da temática pretendida de ser abordada. a macro-política de onde todas as demais gência. Todo o levantamento de dados diversos dos segmentos da sociedade ligados
Por exemplo, em 2015, foi realizado intensa devem (ou deveriam) advir: a Política que subsidiaram as propostas brasileiras ao mar. A Comissão consolidou um ambien-
pesquisa cotejando disposições, somente a Marítima Nacional. de extensão de sua Plataforma Conti- te harmônico de instituições da Administra-
nível federal, de legislações (portanto, asso- nental, por meio do Programa LEPLAC, a ção Pública Direta (os membros efetivos da
ciada a leis e decretos, sem descer a níveis 3.1 A Política Nacional de Recursos do construção, apoio contínuo e consolida- CIRM), de parceria com diversas agencias
mais intermediários como planos, diretrizes, Mar e seus desdobramentos ção das pesquisas no Continente Antár- oficiais de fomento, especialmente o Conse-
atos normativos, portarias), por Grupo de tico, por meio do Programa PROANTAR, lho Nacional de Pesquisa (CNPq) e a Coor-
Trabalho centrado na Comissão Interminis- A Política Nacional de Recursos do outro para as Ilhas Oceânicas brasileiras. denação para o Aperfeiçoamento do Pessoal
terial de Recursos do Mar, que consolidou, à mar (PNRM), formalmente instituída pelo Ou seja, efetivou aquilo que foi apresen- de Nível Superior (CAPES), mas também de
época (e, portanto, carente de atualização), Decreto Nº 5.377, de 23 de fevereiro de tado anteriormente, conjugando diversos diversas instituições acadêmicas e de pes-
tais instrumentos (SOUZA, 2015). Já focado 2005 (BRASIL, 2005), em verdade, não instrumentos, alinhados em um documen- quisa. Naturalmente, dado seu caráter mais
no ambiente marinho (portanto, não incluin- foi o documento que fez nascer essa vo- to macro fundador. E sua efetivação não de fomento estatal, não tem forte apelo
do outras temáticas que também são atinen- cação. Veio consolidar todo um arranjo se tornou estática no tempo. Decorrente mercadológico e de maior aproximação ao
tes à economia do mar), somente em termos e trabalho que já perduram desde a dé- da PNRM, instituiu-se “Planos Setoriais setor produtivo, mas enquanto regulador e
numéricos e de legislação geral, observa-se cada de 1970, conduzido pela Comissão para os Recursos do Mar (PSRM)”. fomentador, cumpre bem seu papel.
37 tratados e atos internacionais já formal- Interministerial para os Recursos do Mar Em 2021 foi oficializado o X PSRM, ou Entretanto, cabe ressaltar, tem apenas o
mente internalizados, 2 leis complementares, (CIRM) – que mereceria especial holofote seja, mostra relativa longevidade em temá- viés dos recursos do mar (vivos e não-vivos)
57 leis ordinárias e uma Medida Provisória, pelo papel agregador de pensamento es- ticas que, como mostrado, alguns Estados como seu objeto de trabalho o que, per se,
65 Decretos (e Decretos-Lei). Entretanto, a re- tratégico nacional / viés científico / indutor vêm se aproximando mais recentemente, acaba por não se imiscuir em uma série de
ferida publicação focaliza em diversos setores de desenvolvimento socioeconômico-am- no final da década de 2010-2020. Essa dé- outras questões ligadas ao mar e que são
(sete setores: Defesa, Respostas às Emergên- biental – mas que foge ao propósito do cima edição do Plano assume um compro- fundamentais do ponto de vista de política
cias e Segurança da Navegação; Biodiversi- presente trabalho. misso com o desenvolvimento da ciência, nacional de mais alto nível, como as ativida-
dade Costeira e Marinha; Biotecnologia Ma- A PNRM tem a finalidade de orienta- da tecnologia e da inovação; ou seja, mais des de transporte marítimo, indústria ligada
rinha; Propriedade Intelectual; Pesca e Aqui- ção para a utilização sustentável dos re- que um viés econômico, tem forte apelo ao mar, de defesa ou mesmo de seguran-
cultura; Petróleo, gás e energias renováveis; cursos do mar, definindo-os como sendo científico e ambiental (tanto que destaca ça. Daí que, enquanto política pública de
prospecção e exploração mineral costeira e todos os recursos vivos e não-vivos exis- aspectos como o monitoramento ambien- alto nível da vontade nacional, carece estar
marinha) e, também como exemplo, apenas tentes nas águas sobrejacentes ao lei- tal, sedimentológico, meteoceanográfico, aderente a um documento que lhe sobre-
para a temática exploratória e propspectiva, to do mar, no próprio leito, no subsolo pesqueiro e da biodiversidade associada) e o ponha e ampare – esse seria o papel da Po-
acresce-se 3 tratados e atos internacionais, marinho, nas áreas costeiras adjacentes, monitoramento efetivo da Amazônia Azul. lítica Marítima Nacional.

324 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 325


3.2 A nossa Política Marítima segundo informa seus “objetivos”, totali- objetivos são ousados pois além de buscar a uma avaliação ex-post da política em vigor,
Nacional zando 14, em geral bastante abrangentes integração das políticas relacionadas ao uso e que redundaria em subsídios de reformu-
e em alguns casos já obsoletos (como o do mar – que, como já foi abordado, é um lação. Tal processo tornou-se inviável. A vi-
A Política Marítima Nacional não é ato desejo de privatização de atividades marí- conjunto bastante complexo de instrumen- gente PMN não possui nenhum indicador
normativo recente. Sua primeira versão foi timas); e, um capítulo terceiro constituído tos de diversos níveis e propósitos –, visa que permitisse sua mensuração e avaliação
instituída por Decreto-Lei, em 1984, apenas de uma tabela de “Ações a realizar” des- definir os objetivos e prioridades de cada ao longo do tempo; os órgãos responsáveis
dois anos após a assinatura da Convenção crevendo-as e atribuindo responsabilida- segmento, elaborar ou propor atos e ins- foram, em sua maioria, descontinuados ou
das Nações Unidas sobre o Direito do Mar des de coordenação e de participação nas trumentos normativos decorrentes e avaliar modificados; seu recorte de vigência (supe-
(de 1982) e antes mesmo de sua vigência mesmas. Essa tabela, reflete a estrutura go- formas de financiamento e de implementa- rior a 25 anos inviabilizava a busca de dados
internacional. Foi um marco relevante na- vernamental de 1994, portanto, congrega ção da nova PMN. Ou seja, almeja ser o do- no tempo passado), ou seja, realizar a ava-
cional e internacional, posto que, à época, órgãos, ministérios e entidades que foram cumento aglutinador da vontade nacional liação ex-post e executiva seria um esforço
muito poucos Estados já haviam formaliza- extintas, modificadas ou que tiveram suas em relação ao mar, atribuindo prioridades e pouco frutífero. Assim, a primeira decisão
do suas vontades em termos oficiais de uma atribuições completamente alteradas, ou mecanismos decorrentes de implementação do GTI-PMN foi quase que a de “recriação
Política, em que pese essa seja uma das de- seja, não pode ser considerada minimamen- eventualmente necessários. de uma PMN”. Obviamente a experiência
mandas da ONU, assumidas pelos Estados. te perene. Isto posto, considerá-la como a Para tanto, nasce da participação de 15 passada serve como bom balizador para
Em 1994, nova versão da nossa PMN foi ins- expressão máxima da vontade nacional em órgãos da Administração Pública vigente2, o futuro, mas, diante da PMN vigente, ela
tituída por meio do Decreto Nº 1.265, de 11 assuntos atinentes ao mar pode ser bastan- o que reforça a mesma postura já aprendi- apenas foi utilizada como subsídio de início
de outubro de 1994 – ou seja, mesmo antes te anacrônico e obsoleto. O desejo de sua da com a citada CIRM de construção cole- à uma reformulação para uma nova PMN.
da vigência internacional da CNUDM, que modernização/atualização já não é recente, giada. Diante de metas tão ousadas e da Na qualidade de relato empírico desse
se deu em 10 de dezembro do mesmo ano mas até mesmo a designação de qual órgão pluralidade de visões de setores do Poder processo, ainda em construção, conside-
– e que é a vigente até o momento. capitanearia tal empreitada não era clara, Executivo, sob a coordenação do Comando ra-se que a experiência do presente autor
A PMN vigente (1994) bem atendeu aos uma vez que até mesmo a Marinha do Bra- da Marinha, seus trabalhos somente foram – integra o referido GTI-PMN – serve como
seus propósitos vislumbrados, à época, de sil sofreu alterações em seu posicionamento iniciados em abril de 2021, após a expedi- relato dos caminhos e opções trilhados.
nortear a vontade nacional e fez o Brasil estrutural governamental (deixando o nível ção, por Portaria de designação, pelo Mi- As primeiras questões que se colocaram
figurar, até o início da década de 2020, ministerial para o de Comando de Força). nistro da Defesa de seus integrantes. no GTI-PMN foram:
como um dos 12 países que possuíam do-
cumentos similares1. Hoje esse contingen-
Assim, cabe mesmo a pergunta: a
quem cabe essa iniciativa? Duas respostas
Como descrito anteriormente, uma Po-
lítica Pública, de mais alto nível na estrutu- . qual o contexto internacional
te é bem mais extenso por diversos fatores, se apresentam: pode ser de iniciativa le- ra nacional, vocacionada a um ambiente (o que se insere essa iniciativa nacio-
dentre eles, o tempo de maturação e mes- gislativa; uma vez que, sendo o Congres- mar, latu sensu) que, por sua vez congrega nal? A resposta para tal questão
mo de adesão à CNUDM e, principalmente, so Nacional a casa da expressão plural da diversos setores interconectados (ambiental, pressupôs um estudo comparado
à crescente atenção e foco dado aos ocea- sociedade, dele poderia advir uma vontade de trabalho, exploratório, de pesquisa, de internacional.
nos, especialmente após a Agenda 2030,
com metas específicas referentes ao mar e
estatal manifesta em uma nova Política Pú-
blica voltada ao mar. Outra opção – sendo
transporte e integração nacional e interna-
cional, e fonte de sustento econômico-so- . No contexto nacional, como o
à instituição da Década da Ciência Oceâni- a reorganização dos esforços nacionais, cial de tantos brasileiros, por exemplo) não Brasil tem estruturado políticas
ca (2021-2030). Efetivamente, o mar en- portanto mais executivos, cabe enquanto é uma tarefa simples. Fazê-lo sem a devida desse nível. Isso, então, pressupôs
trou na agenda internacional. inciativa, à formulação de política pública resposta da sociedade pode enfraquecer estudo comparado nacional.
A vigente PMN é bastante reduzida em
seu conteúdo, dispõe de uma introdução
advinda do Poder Executivo nacional. Uma
vez que a primeira opção não se manifes-
suas opções. Ao mesmo tempo, esse pro-
cesso laborativo, do ponto de vista da ciên- . Qual a melhor forma de debate
que a contextualiza e valoriza, um capítulo tou pela inciativa, desde 1994, por inciativa cia, foi bastante enriquecido na última dé- com a sociedade para que o ins-
primeiro que informa alguns documentos do Poder Executivo (Decreto Nº 10.607, de cada com métodos e sistemáticas próprias. trumento fosse mais bem elabora-
condicionantes à sua elaboração (vários 22 de janeiro de 2021) (BRASIL, 2021), foi Se considerada como já vigente uma do, refletindo os múltiplos interes-
deles de forma genérica e que já não mais instituído Grupo de Trabalho Interministe- PMN (o que é fato), sua reformulação, do ses sociais cotejados aos interesses
existem ou foram substituídos); o capítulo rial para reformular a PMN (GTI-PMN). Seus ponto de vista metodológico, passaria por estratégicos nacionais.

326 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 327


3.2.1 O Estudo Comparado clusões é um dos principais pontos agosto de 1981) trata da temática setorial . A enumeração de objetivos é pre-
Internacional: que deixa transparecer à Sociedade (ambiental) seja no ambiente florestal, seja sente em todas elas, sem a explicita-
Internacional quais são as principais no urbano, ou mesmo no marítimo. Outros ção de prioridades que restam a do-
Foram analisadas 17 Políticas Maríti- escolhas do Estado; exemplos são similares. cumentos decorrentes;
mas internacionais3, das quais, foram se-
lecionadas 11 que mais se assemelhavam . a maioria optou por explicitar Assim, foram analisadas 7 Políticas Na-
cionais, escolhidas sob três critérios, sua . Não há uniformidade na escolha
aos propósitos de uma PMN (outras eram os principais interesses nacionais abrangência ser nacional, a temática ser pelo de instrumento normativo, sendo
mais atinentes apenas a questões ambien- (apontando prioridades); menos transversalmente relacionada com o quatro delas instituídas por Leis e três

. na enumeração de seus objetivos,


tais): Austrália, Canadá, China, Colômbia, mar e sua elaboração ter partido de siste- por Decretos.
Japão, Noruega, Portugal, Rússia, EUA, mática similar colegiada: Política Nacional
Chile e Peru. Esse relatório de estudo a maior parte oscilou entre 5 e 10 para Assuntos Antárticos, Política Nacional 3.2.3 O processo de amplo debate
comparado procurou destacar similitudes objetivos voltados ao mar; de Defesa, Política Nacional de Mobilidade nacional
e diferenças em alguns indicadores, quais
sejam: estrutura, forma de redação, ins- . havia equilíbrio quantitativo na Urbana, Política Nacional do Meio Ambien-
te, Política Nacional de Resíduos Sólidos, Po- A participação social é algo que não
trumento de institucionalização, orien- explicitação de ações decorrentes/ lítica Nacional de Recursos Hídricos e Política apenas endossa o nascimento de uma po-
tações introdutórias, ambiente marítimo propositivas como “estruturas de Nacional para os Recursos do Mar (já par- lítica pública, reforça sua consistência e
internacional – enfoque geral, ambiente controle” (ou seja, órgãos respon- ticularmente analisada anteriormente). Esse debate e sempre é um processo engran-
marítimo nacional – enfoque de gover- sáveis pela Política), recortes tem- relatório de estudo comparado procurou decedor de perspectivas. Há inclusive nor-
nança, existência de princípios norteado- porais de validade, previsibilidade destacar similitudes e diferenças em alguns matizações para essa participação social,
res, enumeração de interesses nacionais, de revisão e somente 30% delas indicadores, quais sejam: estrutura, forma garantida pela Constituição Nacional e
objetivos e ações decorrentes/propositivas. apontavam alocações financeiras de redação, instrumento de institucionali- que, ainda que não seja explicita para o
Diante dos 10 indicadores, seguindo e indicadores de desempenho que zação, orientações introdutórias, existência processo em questão, serve como bom
metodologia proposta pelo Observatório permitissem melhor acompanha- de princípios norteadores, enumeração de instrumento norteador. O próprio Decreto
de Políticas Marítimas, o GTI-PMN pode mento e avaliação. Cabe ressaltar objetivos e ações decorrentes/propositivas. de instituição do GTI-PMN aponta nessa
concluir que: que na sistemática de planejamen- Diante dos 7 indicadores, seguindo meto- direção ao dizer em seu art. 3º, § 3º, que o

. Havia equilíbrio quantitativo das to de alto nível adotada no Brasil, dologia proposta pelo Observatório de Políti- Coordenador do GTI “poderá convidar re-
a alocação financeira não estaria cas Marítimas, o GTI-PMN pode concluir que: presentantes de outros órgãos e entidades

.
Políticas similares internacionais na no nível “o que se quer” – políti- públicos e de instituições privadas e espe-
adoção de estrutura discursiva, vá- ca, e sim em seus desdobramentos As políticas mais recentemente cialistas, para participar de suas reuniões,
rias delas assemelhando-se a estudos decorrentes “como se alcançar” instituídas (posteriores ao ano de sem direito a voto”.
acadêmicos exemplificativos e com – estratégia, programas ou planos 2000) procuram ter estruturas simi- Basicamente, esse processo de partici-
dados sobre a importância do mar; decorrentes. lares, construída de forma articulada pação social pode se dar por três alternati-

. a questão da cooperação interna- e não holística; vas: tomada pública de subsídios, consulta

. A estrutura articulada facilita a


3.2.2 O Estudo Comparado Nacional popular ou audiências públicas. A princi-
cional, da governança dos oceanos pal distinção entre eles é do momento de
e da retomada do mar na “agenda Contrassenso ao que se espera, não identificação de seus pontos centrais ser efetivada. A primeira (tomada pública
internacional” eram três temáticas há, no Brasil, muitas atividades tão multi- e objetividade; de subsídios) permite uma participação

. A estrutura articulada, em termos


quase onipresentes; sistêmicas que possuam um instrumento mais ampla, porém pode redundar em tan-

. nacional norteador. A maior parte das po- tos vieses distintos que dificulte o processo,
a maioria (8 de 11) faziam questão líticas possuem temática específica, ainda propositivos, facilita a eventual “es- quando em fase embrionária. Portanto, op-
de explicitar seus “princípios nortea- que atuem em diversos ambientes, não o colha política” de alteração do instru- tou-se por não a adotar. Ainda assim, sem-
dores” que, apesar de serem docu- inverso. Por exemplo, a Política Nacional mento normativo a ser usado (decre- pre houve a preocupação de proporcionar
mentos de cunho nacional, suas in- do Meio Ambiente (Lei Nº 6.938, de 31 de to, lei, etc.); esse amplo debate nacional. Se o mar é

328 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 329


um autêntico ambiente mulissistêmico, da para sua instituição por Decreto – princi- 4. Instrumentos de Políticas Públicas voltadas ao mar com
isso é fundamental para que uma Política palmente por dois motivos: tendo sido de ini- ingerência complementar
Nacional seja efetiva e agregadora. ciativa do Poder Executivo, nada oporia que
Assim, a opção foi que os trabalhos de- se transformasse em Projeto de Lei, se seu Como mostrado na Figura 1, a matriz de 4.1.1 A complexa gestão da zona
veriam avançar em algumas escolhas antes conteúdo assim o requeresse; e ainda, se ela intercorrências de implementação de políti- costeira no Brasil
da abertura às contribuições sociais. se configurasse como opção política de rear- cas públicas voltadas ao mar não pode ser
Optou-se que após alguns delinea- ranjo de prioridades e de estruturas somente vista somente por um dos quatro prismas A escolha dessa determinada “área
mentos preliminares e objetivos, seria subordinadas à Administração Pública do Po- mostrados. Mesmo em casos mais claros de geográfica” é proposital. Costuma-se atri-
um momento propício do chamamento der Executivo, essa forma lhe seria adequada. exemplificação, como nas políticas de “segu- buir à Convenção das Nações Unidas so-
à sociedade para apor contribuições, re- A segunda opção foi de uma redação clara e rança marítima” não se pode entender que, bre o Direito do Mar, de 1982 (CNUDM) a
flexões que, eventualmente, pudessem objetiva, pautada nas orientações para reda- nessa temática, exclusivamente é um ente só, alcunha comparativa de “constituição dos
apontar na revisão de decisões prévias e ção de atos normativos prevista pelo Decreto nacional, que tem a atribuição. Em sua am- mares”. Algo, do ponto de vista meramen-
apontamentos de diretrizes que, efetiva- Nº 9.191, de 2017. Entretanto, se ao final de pla visão, parece evidente ser de atribuição te jurídico, inovador e não consensual, mas
mente, pudessem apontar ao que se de- sua elaboração se verificasse eventual con- do Poder Executivo Federal por meio do Mi- que deixa permear seu grau político-legal
seja para um país mais voltado ao mar. flito normativo com leis vigentes (recorda-se nistério da Defesa e, mais particularmente8, de relevância. Assim, ainda que interna-
Os principais atores dessa participação, que algumas das políticas transversais citadas do Comando da Marinha. Entretanto, ainda mente possua status de lei ordinária, sua
ainda que ampla e irrestrita, seriam tanto e escolhidas no estudo comparado interno, assim, a própria Constituição Federal atribui relevância do ponto de vista das obriga-
o setor produtivo quanto o aporte aca- são instituídas por leis), seria mais fácil sua competência à Polícia Federal para determi- ções internacionais que o país assume é
dêmico que reflete os múltiplos anseios eventual adaptação. nadas ações com certas restrições territoriais, bastante relevante. Entretanto, a CNUDM,
sociais, científicos e econômicos. Outra escolha realizada foi em pautar Polícias Militares Estaduais em determinadas procura estabelecer alguns recortes físicos
Por fim, como todo processo cíclico e sua redação nas técnicas e processos mais águas interiores também podem fazê-lo. Em e geográficos com características especiais
regenerativo, ao findar uma proposta con- modernos que vêm sendo refletidos em algumas temáticas, não compete ao Coman- de responsabilidades e permissões. Nela é
solidada, espera-se nova oportunidade de Políticas de mesmo nível (ou semelhantes) dante da Marinha definir, mas sim à Auto- fixada a largura máxima de Mar Territo-
participação social, com nova consulta à po- mais recentes, como por exemplo: a Polí- ridade Marítima Nacional, que, no Brasil, é rial, Zona Contígua, Zona Econômica Ex-
pulação diante da proposta elaborada. tica Nacional de Resíduos Sólidos ou mes- definida por lei como sendo também atribui- clusiva (respectivamente, 12 MN (milhas
mo a Política Nacional de Transportes. ção do Comandante da Marinha, mas com náuticas), 24 MN e 200MN todas tendo
3.2.4 Escolhas de um processo em Portanto, esse é um processo laborati- responsabilidades que lhe são distintas. Ou como princípio a linha de base – sintetica-
construção vo ainda em construção, com previsão de seja, o exemplo temático usado (segurança mente – a costa).
conclusão dentro do prazo estabelecido marítima), não pode ser somente analisado Ou seja, a própria aludida “constitui-
Decorrente dos três estudos prelimina- pelo Decreto que o instituiu, mas que, cer- sob um dos quatro prismas da matriz (nível ção” não define e delimita a “zona cos-
res concluídos, as primeiras opções do GTI- tamente, ainda receberá bastante colabo- decisor), nem isoladamente por qualquer dos teira”. Eis o motivo da escolha: essa foi
-PMN foram: que a nova PMN teria uma ração da sociedade civil e mesmo do poder demais, pois há intercorrências entre eles. uma opção nacional que, portanto, deve
formulação articulada, inicialmente pensa- decisor que o instituir. Assim, tentar discorrer, neste trabalho, ser considerada sob todo o espectro de
sob todos os quatro prismas e sobre seus instrumentos normativos, que toma como
desdobramentos secundários seria bastan- referência as delimitações geográficas
te presunçoso. Entretanto, além da breve coincidentes com a CNUDM.
exemplificação acima feita, sob a perspec- Não resta dúvida que, latu sensu, parece
tiva temática (“segurança marítima”), pre- evidente a relevância de políticas públicas
tende-se mostrar que essa intercorrência para essa área de extrema importância am-
também ocorre, por exemplo, em função biental e econômica, que é a interface da
de localização geográfica. Optou-se, en- terra seca e emersa com o mar. Entretanto,
tão, por exemplificar tal interconexão na ela não tem regime especial reconhecido
área geográfica da “zona costeira”. internacionalmente, como dito, uma vez

330 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 331


que não foi instituída por Ato Internacio- E assim começaram a ser feitos, nos Ambiente e ao IBAMA, além das esferas inserir as 12MN do MT, toda a política de
nal, como a CNUDM. Logo, foi opção na- anos subsequentes. Uma série de leis es- estaduais e municipais. Além de uma sé- patrimônio histórico subaquático, regida
cional. E, essa opção foi feita praticamente taduais e municipais começaram a esta- rie de definições, traz, pioneiramente a por normas bastante específicas, também

.
junto ao nascimento da Constituição Brasi- belecer seus “planos de gerenciamento delimitação geográfica do que se consi- se sobrepõe;
leira, ainda anterior a ela, em 16 de maio costeiro”. Em 07 de dezembro de 2004, dera como “zona costeira” em seu Art.
3 a incorporação da dimensão ambien-
de 1988, pela Lei Federal Nº 7.661. Antes portanto, mais de 15 anos após a primeira 3º, limitando externamente com a exten-
tal nas políticas setoriais voltadas à gestão
mesmo da internalização da CNUDM, de lei federal sobre o gerenciamento costei- são de doze milhas náuticas (correspon-
integrada dos ambientes costeiros e mari-
1993. Ou seja, por esse dispositivo legal ro, e diversas normatizações estaduais e dente ao Mar Territorial, no caso brasi-
nhos – o que reforça a intercorrência com
nasce o “Plano Nacional de Gerenciamento municipais, por meio do Decreto Fede- leiro, em que todo ele tem sua largura
uma série de outras políticas públicas no
Costeiro” (PNGC). ral Nº 5.300, foi regulamentada a lei nº máxima e, internamente, na sua faixa

.
mesmo ambiente;
Esse dispositivo define a “Zona Costei- 7.661/1988 que instituiu o Plano Nacio- terrestre, compreendido pelos limites dos
ra” como “o espaço geográfico de inte- nal de Gerenciamento Costeiro. Essa re- Municípios que sofrem influência direta 4 a produção e difusão do conhecimento
ração do ar, do mar e da terra, incluindo gulamentação veio para estabelecimento dos fenômenos ocorrentes na zona cos- para o desenvolvimento e aprimoramento
seus recursos renováveis ou não, abran- de bases para a formulação de políticas, teira (o que seria um conceito tautológi- das ações de gestão da zona costeira – o
gendo uma faixa marítima e outra terres- planos e programas federais, estaduais co, uma vez que usa em sua delimitação que confere um objetivo mais difuso liga-
tre, que serão definidas nos respectivos e municipais; estabelecendo os limites, o próprio conceito que tenta instituir). do às políticas de educação, ciência e tec-
Planos”. Note-se que a definição busca princípios, objetivos, instrumentos e Ainda agrega novas delimitações que vi- nologia e gestão.
regulamentar de forma particular uma competências da gestão da Zona Cos- sam, então, definir quais seriam os muni-
Decorrente dessa regulamentação, di-
área física (não definida) mas que, certa- teira e da orla marítima. O decreto traz cípios abrangidos por essa faixa terrestre
versos estados e municípios criaram ór-
mente concorre com todas as atividades os limites da faixa terrestre e da faixa da zona costeira (não apenas os defron-
gãos, planos decorrentes e novas regula-
exploratórias de recursos vivos, não-vivos marítima da zona costeira. Traz a defi- tantes, mas também não-defrontantes,
mentações. Inclusive em termos infracio-
e mesmo econômicas. Passando, assim a nição, pela primeira vez, de um espaço estuarino-lagunares, etc.).
nais e de penas atribuídas.
ser um novo e decisivo instrumento de geográfico de gestão do território, a Orla Cabe menção aos objetivos dessa re-
Estabelece ainda novas subáreas com
política pública com recorte geográfico e Marítima: faixa contida na zona costeira, gulamentação. São quatro:

.
características ainda mais especiais, como a
não temático. de largura variável, compreendendo uma
orla marítima (que define como tendo limite
Mais que isso, o PNGC complemen- porção marítima e outra terrestre, caracte- 1 a promoção do ordenamento do uso
marítimo da isóbata de 10 metros e terrestre
ta agregando novos atores decisores na rizada pela interface entre a terra e o mar. dos recursos naturais e da ocupação dos
de cinquenta metros em áreas urbanas e de
questão: define que os Estados e Muni- Além disso, estabelece os Instrumentos de espaços costeiros – o que, certamente con-
duzentos metros em áreas não urbanas).
cípios podem instituir os seus respectivos Gestão para a Zona Costeira e para a Orla correrá com outras políticas como de pesca,
Assim, mais que aprofundar aqui quais

.
Planos de Gerenciamento Costeiro e que Marítima, bem como as competências de ocupação fundiária e habitacional, etc.;
foram os reais e efetivos desmembramentos
os três níveis (federal, estadual e muni- de cada ente federativo na estruturação,
2 o estabelecimento do processo de ges- ocorridos a partir dessa criação nacional, o
cipal) poderão normatizar o uso e ocu- implementação, execução e acompanha-
tão para elevar a qualidade de vida de sua que se procurou mostrar é a complexidade
pação do solo, do subsolo e das águas. mento da Gestão Costeira.
população e a proteção de seu patrimônio em correlacionar tantos ambientes, níveis
Note-se apenas como exemplo, a com- Ao analisar mais detalhadamente esse
natural, histórico, étnico e cultural – no- de decisão, temáticas e setores envolvidos –
plexidade dessa rede. Como já dito, a re- decreto de regulamentação do Plano Na-
te-se, ao incluir seu patrimônio histórico e todos intrinsicamente ligados ao mar.
gulamentação da exploração do subsolo cional de Gerenciamento Costeiro, da lei
marinho no Mar Territorial é de compe- federal anterior à Constituição, vê-se que
tência exclusiva da União. Entretanto, por há subjacente, uma escolha temática.
esse dispositivo, legal, porém, infracons- Essa escolha é bem mais focada no aspec-
titucional, o subsolo dessa área marítima to ambiental e sustentável que em outros
adjacente à costa (sem definir limite de aspectos como econômico e de transpor-
extensão) poderia ser gerenciado por pla- te. Tanto o é que estabelece uma série
nos estaduais e municipais. de competências ao Ministério do Meio

332 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 333


5. Influências internacionais nas políticas públicas nacionais voltadas 6. Considerações finais
ao mar
O presente trabalho além de buscar con- do nível federal. Recorde-se que, somente
O pensamento evidente de que a es- descontrolada, fluxo de refugiados, ou ceituar e usar metodologia tipológica para pelo tipo de instrumento de implementa-
sência das políticas públicas é a manifes- outras – estejam pautando debates em entendimento das políticas públicas nacio- ção superior a decretos, há levantamen-
tação formal da vontade do Estado para diversas organizações internacionais nais voltadas ao mar procurou apresentar a to de mais de duas centenas de tratados
determinado setor ou atividade, portanto, (ONU, EU, IMO, OTAN). Pelo viés ambien- complexidade da rede de instrumentos que internalizados, leis federais, leis comple-
de caráter eminentemente interno é ade- tal e científico, vê-se a Agenda 2030, com acabam por sinalizar a vontade do país para mentares, leis ordinárias e decretos ati-
quado. Entretanto, não é incomum a visão Objetivos de Desenvolvimento Sustentá- o grandioso, estratégico e fundamental mar nentes às diversas temáticas do mar.
de international public policy, inclusive com vel (ODS) claramente relacionados com que margeia o Brasil. Essa complexidade Isto posto, optou-se por breve análise
Associação formalmente estabelecida (In- o mar e outros transversalmente relacio- torna-se ainda maior, na medida que não é das duas Políticas consideradas mais holís-
ternational Public Policy Association - IPPA9) nados (quando observadas suas metas), oriunda de um único órgão central de de- ticas em relação ao mar: a Política Nacio-
ou mesmo construção teórica nacional e ou mesmo a instituição da chamada Dé- cisão4, ainda que, seja bastante facilitada nal de Recursos do Mar, uma vez que ela é
internacional sobre tal, como assegura An- cada da Ciência Oceânica (2021-2030). essa articulação em função da acumulação assunto específico tratado na versão mais
tonio Lassance (2020) ou mesmo acadê- Ainda, vê-se movimento de tentativa de de funções de Comandante da Marinha e ambiental e a Política Marítima Nacional,
micos mais clássicos como Jacob Dolinger consolidação de relevante nova Conven- de Autoridade Marítima Nacional. Essa du- de onde, teoricamente, todas deveriam
em seu artigo “World Public Policy: Real ção sobre a temática para as chamadas pla missão, facilita sobremaneira a comple- afluir, mas que se encontra em processo
International Public Policy in the Conflict of “águas além das jurisdições nacionais” xa relação do tráfego marítimo e toda sua de reformulação que foi abordado. Essa re-
Laws” (1982). Em verdade, sendo a vonta- com o chamamento à Conferência (ainda rede com os aspectos da segurança no mar. formulação, certamente, passa por amplo
de estatal, não parece haver espaço para se em finalização) para a elaboração de uma Entretanto, não se pode entender que debate nacional.
falar de “política pública internacional” ou Biodiversity Beyond National Jurisdiction todas as políticas públicas voltadas ao mar Posteriormente, mostrando que se a
mesmo “política pública global”. Convention (BBNJ-Convention). sejam decorrentes apenas dessas vertentes, primeira política abordada (Recursos do
Até mesmo para alguns mais legalistas, Todo esse movimento da vontade dos muito menos exclusiva do Poder Executivo Mar) privilegiava a perspectiva “por te-
essa vontade internacional somente passa Estados, acaba por influenciar também a federal, nem somente feita a partir de leis e mática transversal”, de forma exemplifi-
a vigorar como autêntica política pública, gestão nacional dos assuntos marítimos, decretos. Essa matriz de complexidade pro- cativa, optou-se por abordar outra políti-
no país, quando formalmente internaliza- logo, se anteriormente, já se mostrou o curou demonstrar que, pelo menos quatro ca, por outra perspectiva, no caso “pelo
da (ou seja, após todo o trâmite de assina- complexo sistema de cotejamento de qua- grandes prismas têm simultaneidade na ambiente geográfico”, ou seja, a Zona
tura, aprovação congressual, ratificação e tro perspectivas nacionais: por temática gestão de políticas públicas voltadas ao Costeira, e que nasce sob o nome de
promulgação interna). transversal; por competência decisória; mar. São as quatro perspectivas abordadas “Plano Nacional de Gerenciamento Cos-
Entretanto, a argumentação contras- por ambiente geográfico e por níveis e (por temática transversal; por competência teiro”, ainda antes da entrada em vigor
senso é que não se pode entender, ainda tipo de instrumentos de implementação decisória; por ambiente geográfico e por da atual Constituição Brasileira, de 1988.
mais em temáticas tão globais como “es- (ver Fig.1), agora ainda haveria um amplo níveis e tipo de instrumentos de implemen- Esse exemplo, serviu como estudo de
paço”, “meio ambiente” e “mar” que o contexto internacional que acaba se so- tação) e que acabaram justificando a cria- caso para demonstrar a complexa relação
movimento internacional não acabe bali- brepondo a todo esse arcabouço. Assim, ção do citado Observatório de Políticas Ma- com os diversos “níveis de instituciona-
zando, também, a vontade estatal. E, esse não parece concebível dissociar a vonta- rítimas que tentasse fornecer instrumentos lização” (federal, estadual e municipal”.
é um momento particularmente especial, de nacional da influência internacional de acompanhamento, avaliação e proposi- Feitas essas três análises de macro políti-
sob a perspectiva internacional, do mar que acaba por, também, ajudar a pautar tura de melhoramento ou de implantação cas, procurou-se pautar ainda a relação de
e sua gestão. Diversas temáticas maríti- as políticas públicas brasileiras voltadas de políticas públicas voltadas ao mar. superveniência de uma agenda internacional
mas têm dominado a agenda internacio- ao mar. Em questões marítimas, não bas- O presente trabalho não pretendeu ser sobre o mar, que muito acaba influenciado a
nal de debates. Por exemplo, pelo viés ta “apenas” a vontade nacional, ela deve conclusivo em tentar analisar as quatro agenda nacional e os rumos decididos pelo
securitário, observa-se que determinadas considerar como variável relevante (ainda perspectivas, então optou por analisar o Estado (mais que por governos).
áreas sensíveis e sob ações ilegais – sejam que não impositivo) todo o ambiente in- estado atual e as perspectivas das princi- Dessa maneira, espera-se ter contribuí-
de pirataria, roubo armado, migração ternacional e sua relação com o mar. pais políticas nacionais, portanto, partindo do em demonstrar o quanto sua contínua
.

334 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 335


avaliação pode ser salutar à complexa rela- de uma economia com características bas- Portugal, Russian Federation, United Sta- sentacao_rev.pdf. Acesso em: 10 dez. 2021.
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preservação do bioma marinho às futuras merece uma especial atenção de um país LASSANCE, Antônio. What is a Policy Chatham: Chatham House, 1986.
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BRASIL. Decreto Nº 10.607, de 22 de posteriores. Disponível em: https://www. 1 As seis áreas temáticas de estudo do OPM academia, constituindo uma Câmara Setorial
janeiro de 2021, que institui o Gru- planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm. são: a) exploração de recursos vivos e não- da Economia do Mar –; o Rio de Janeiro, que
-vivos; b) regulamentações internacionais iniciou por inciativa principal do setor da In-
po de Trabalho Interministerial para Acesso em: 10 dez. 2021.
e questão estratégica brasileira; c) susten- dustria de Defesa Naval no estado, constituiu
reformular a Política Marítima Nacio- BRASIL. Política Nacional sobre Mu-
tabilidade e a questão ambiental marinha; um “Cluster Tecnológico Naval” que também
nal. Brasília: 2021. Disponível em: http:// danças Climáticas. Lei nº 12.187 de 29 d) novas ameaças à segurança marítima; e) foi semente para agregar academia e princi-
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019- de dezembro de 2009, atualizada pelo questão econômica e social, tráfego maríti- palmente o setor público que, promulgou
2022/2021/decreto/D10607.htm. Decreto Nº 10.142, de 28 de novembro de mo e portuário; f) bioprospecção e novas tec- leis estaduais, decretos e programas voltados
BRASIL. Plano Nacional de Gerencia- 2019. Disponível em: https://www.planal- nologias. Para maior conhecimento em seus especificamente para a temática –; e Santa
mento Costeiro. Lei Nº 7.661, de 16 de to.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/ produtos e constituição ver: www.observato- Catarina – que também alavancada por in-
maio de 1988, que institui o Plano Nacional lei/l12187.htm. Acesso em: 10 dez. 2021. riopoliticasmar.com.br. teresse da Industria Naval (de Defesa) viu seu
de Gerenciamento Costeiro e dá outras CANOTILHO, José Joaquim. Direito Cons- 2 A opção pela análise de políticas sob ampa- enorme potencial para a Indústria Náutica (de
providências. Disponível em: http://www. titucional e Teoria da Constituição. 7. ro federal deve-se ao seu caráter mais holís- esporte e lazer) e agregou o poder público
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7661.htm. ed. Coimbra: Editora Almedina, 2007. tico, entretanto, quando observando o foco em iniciativas para alavancagem da econo-
BRASIL. Política de Defesa Nacional. De- DOLINGER, Jacob. World Public Policy: do presente trabalho em políticas públicas mia do mar estadual. Outros também pode-
voltadas ao mar, especialmente como indu- riam ser citados como a Bahia, São Paulo e
creto Nº 5.484, de 30 de junho de 2005, real International Public Policy in the Con-
toras da economia do mar, há inciativas de Rio Grande do Sul, mas tornaria o foco do
que aprova a Política de Defesa Nacional flict of Laws. In: HeinOnLine, NL. 17 Tex.
estados federados que merecem destaque. presente trabalho mais difuso.
e dá outras providências. Disponível em: Int’l L: J. p. 167-189. Apenas como exemplo, cita-se 3 estados que 3 A popularmente conhecida “década dos
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ IOC – Intergovernamental Oceanographic possuem formulações claras voltadas ao de- oceanos”, em verdade tem um contorno
ato2004-2006/2005/decreto/d5484.htm. Comission, Law of the Sea Dossier 1, IOC senvolvimento da economia do mar: Ceará – eminentemente mais ligado à ciência e ao
BRASIL. Política Nacional de Recursos Technical Series 75: National Ocean Policy. pioneiro, que iniciou essa trajetória por inicia- ecossistema marinho e seu nome oficial é “dé-
do Mar. Decreto Nº 5.377, de 23 de fe- The Basic Texts from: Australia, Brazil, tiva do setor privado ligado à FIEC, mas que, cada para a ciência oceânica e desenvolvimen-
vereiro de 2005. Disponível em: http:// Canada, China, Colombia, Japan, Norway, ao expandir-se, agregou o setor público e a to sustentável” (United Nations Decade of

336 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 337


Ocean Science for Sustainable Development). implicou a necessidade de readequação do
4 A UNESCO mantinha acompanhamento de Decreto com a inclusão de um décimo sexto
todos os Estados que publicavam suas von- órgão integrante – o MTP.
tades nacionais voltadas ao mar, por meio 6 Ver nota “v”.
da “Intergovernamental Oceanographic 7 A Autoridade Marítima Nacional foi esta-
Commission – Resources, meetings, Docu- belecida pela Lei Nº 9.537, de 11 de dezem-
ments” (última versão disponibilizada em bro de 1997, que dispõe sobre a segurança
2007). Nem sempre essas possuíam o nome do tráfego aquaviário em águas sob jurisdi-
de “Política”, alguns Estados, denomina- ção nacional e dá outras providências e pela
vam-nas de formas distintas, como Canadá Lei Complementar Nº 97, de 9 de junho de
(Canada’s Oceans Strategy”), China (“The 1997, em seu art. 17, P. Único, designa o
Development of Maine Affairs of China – Comandante da Marinha como “Autorida-
The Ocean White Paper), Portugal (“Estraté- de Marítima”.
gia para o Mar”), dentre outros. Disponível 8 Para maiores detalhes e acompanhamento
em: https://www.jodc.go.jp/jodcweb/info/ das discussões, ver: https://www.ippapubli-
ioc_doc/Technical/158387e.pdf. cpolicy.org
5 A explicitação da expressão “Administra- 9 Não é singular a opção de alguns Estados de,
ção Pública vigente” não é acidental. Uma diante da complexa e relevante relação com o
das principais características da PMN/94 é a mar, instituem órgãos centrais de decisão. Há
atribuição de tarefas/responsabilidades a ór- vários Estados, principalmente na Comuni-
gãos da Administração Pública da época o dade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)
que se mostrou bastante ineficaz. A vontade que dispõem de “Ministérios do Mar”, como
política ao longo dos anos extingue, cria e Portugal (1983-1985; 1991-1995, 2015 em
funde órgãos e nem sempre as decorrentes diante), Cabo Verde – Ministério da Economia
migrações de responsabilidades ficam explíci- Marítima; São Tomé e Príncipe – Ministro do
tas. Um exemplo evidente dessa necessidade Planejamento, Finanças e Economia Azul; Mo-
constante de readequação é que, durante a çambique – Ministério do Mar, Águas Interiores
vigência do GTI-PMN houve o desmembra- e Pescas; ou mesmo outros Estados: Croácia -
mento de responsabilidades antes na esfe- Ministério do Mar, Transporte e Infraestrutura;
ra do Ministério da Economia para o criado França – Ministério do Mar ou Coreia do Sul
Ministério do Trabalho e Previdência, o que – Ministério dos Oceanos e Pesca.

338 ECONOMIA AZUL Políticas Públicas voltadas ao Mar 339


Políticas Públicas voltadas ao Mar
17

OS ARRANJOS INOVADORES DA ECONOMIA


DO MAR NO BRASIL E NO MUNDO

Miguel Marques
Taíssi Pepe de Medeiros Farias

1. Introdução

O mar pode integrar povos, culturas, De acordo com o relatório de STUCH-


mercados, histórias. Ao olharmos para a TEY et al. (2020, p. 77), encomendado
vasta Amazônia Azul1, são perceptíveis as pelo Painel de Alto Nível para uma Econo-
inúmeras oportunidades relacionadas às mia do Oceano Sustentável, um grupo de
fronteiras marítimas brasileiras. Precisa-se dezesseis líderes mundiais, que trabalham
compreender que a Economia Azul, ou a em prol de políticas sustentáveis e de pro-
economia do mar, conceito mais específi- teção ao oceano vinculadas aos benefícios
co no que se refere aos setores e atividades econômicos, foram apontadas seis bar-
econômicas relacionadas ao mar, é multis- reiras principais que explicam por que a
setorial e envolve múltiplos atores dotados Economia do Oceano Sustentável não está
de interesses distintos, que necessitarão or- no centro dos pacotes governamentais de
ganizar-se, em alguma medida, em torno recuperação econômica pós-covid, entre
das oportunidades e relacionar-se entre si elas, destaquem-se a falta de planejamen-
para a consecução de seus objetivos. to e integração entre os atores e, as inefi-
Concomitantemente, as pressões de ciências institucionais.
uso sobre o oceano e os desafios impostos A barreira apontada pelo relatório, que
à sua saúde são inúmeros: as mudanças cli- nos chama a atenção para a análise deste
máticas, a pesca predatória, a poluição e a capítulo, é a falta de planejamento e inte-
perda da biodiversidade e dos ecossistemas gração entre os setores (p.78). O estudo de-
costeiros estão corroendo a capacidade do fende que a comunicação entre os setores
oceano de sustentar a subsistência e a pros- de alimentos, energia e transporte maríti-
peridade (KONAR & DING, p. 3). mo, por exemplo, é mais frequentemente

340 ECONOMIA AZUL Os Arranjos


Os Arranjos Inovadores
Inovadores da
da Economia
Economia do
do Mar 341
Mar 341
navais do PEM 2040, a fim de atender ao No arcabouço político nacional, o con-
sobre resolução de conflitos do que moti- Brasil, incluindo alguns exemplos de outros
objetivo naval “cooperar com o desenvol- ceito de APL tem predominado, o que não
vada pela simbiose e colaboração. A coor- estados, que se destacam por seu caráter
vimento nacional”, encontra-se: impede que associações intituladas como
denação formal permanece rara, uma vez inovador, para a abordagem da economia
clusters sejam estabelecidas no Brasil e cre-
que os setores oceânicos são geralmente do mar, ou da Economia Azul, numa pers- Contribuir com os órgãos governamen-
denciadas como APLs, para fomentar se-
governados por diferentes entidades re- pectiva mais abrangente. Em paralelo, existe tais e com a comunidade marítima na
tores marítimos, neste caso. APLs podem
guladoras, dificultando a comunicação e o um arranjo que pode ser considerado o mais criação de Clusters Marítimos, estimu-
aglutinar mais de uma associação/ cluster.
planejamento intersetoriais (p.79). apropriado para a alavancagem da Econo- lando a materialização da Política Ma-
A Agência Brasileira de Desenvolvimento
Países em fase de implementação do mia Azul? E qual seria o papel de um arranjo rítima Nacional, por meio da interação
Industrial (ABDI) já lançou no passado edi-
plano de gestão espacial marinha estão no processo de alavancagem da Economia com Ministérios, autarquias, entidades
tais para apoio a projetos coordenados por
em um processo de planejamento que per- Azul em um determinado território? de classe, centros de estudo, universi-
APLs. Mas será que esses arranjos de in-
meia o exercício de integração dos usos dos Temos observado algumas iniciativas de dades e escolas municipais, estaduais e
tegração entre os atores do mar são uma
oceanos, prevenção de conflitos de uso do associativismo no Brasil que se constituem federais (p. 65).
realidade no Brasil?
espaço, padrões de operação, processo re- como arranjos de integração em prol da
O PEM 2040 também destaca o poten- A tabela 1 é a coletânea de arranjos ob-
gulatório otimizado e eficiente e a proteção economia do mar ou de alguma atividade
cial do Programa de Construção do Núcleo tida com base nos dados do sítio eletrônico
e sustentabilidade dos principais sistemas econômica relacionada ao mar, ao passo
do Poder Naval, incluindo o Programa de do OBAPL, isto é, que constam no Progra-
oceânicos (p.79). Esse é um elemento que que há estados brasileiros que têm formu-
Submarinos (PROSUB), o Programa Classe ma APL. Observou-se que, de um universo
tende a reforçar os mecanismos de diálogo lado estudos, estratégias ou políticas volta-
Tamandaré (PCT), entre outros, para “ala- de 401 APLs registrados no Brasil, poucos
e integração entre os múltiplos setores da dos para a Economia Azul, assim como há
vancar o desenvolvimento da indústria na- são relacionados a alguma atividade eco-
economia do mar de um país. políticas estatais e práticas de apoio e forta-
cional e segmentos correlatos, favorecendo nômica afeta ao mar, havendo o de cons-
O presente capítulo visa a levantar quais lecimento de redes, do associativismo e/ou
o estabelecimento de “clusters marítimos”, trução naval em Manaus (Amazonas); o
as propostas de arranjos de integração no de arranjos produtivos.
com geração de empregos qualificados, di- de pesca artesanal extrativista em Paulista
retos e indiretos” (p. 83). (Pernambuco); o de Pescados da Baía de
2. Cenário brasileiro
Vê-se, na literatura, que há similarida- Todos os Santos, em Vera Cruz (Bahia); o
des entre os conceitos de Arranjos Produ- de Piscicultura - Território do Entre Rios, no
Algumas iniciativas de fomento a arran- coordenar as ações relativas à Política Na-
tivos Locais (APL) e de cluster. No que se Piauí; o de Piscicultura da Região Norte de
jos de integração, coordenação e desenvol- cional para os Recursos do Mar (PNRM),
refere à prática, ambos se constituem me- Tocantins e o de Piscicultura na Região de
vimento de atividades relacionadas com o implementar o Programa Antártico Brasilei-
diante uma liderança que estimule o pro- Desenvolvimento (RD) do Sertão de Itapa-
mar já possuem algum tempo de existên- ro (PROANTAR) e exercer as competências
cesso de desenvolvimento local integrado e rica, tendo abrangência em Pernambuco,
cia, outras são mais recentes e inovadoras. previstas na Lei nº 7.661, de 16 de maio
crescem por meio de uma governança bem Bahia e Alagoas.
Por exemplo, com o objetivo de articulação de 1988, que instituiu o Plano Nacional de
estruturada, mas também passível de alte- Embora não façam parte da tabela, ob-
entre diversas instituições organizacionais Gerenciamento Costeiro (PNGC) como par-
rações. O conceito de APL se baseia em um serve-se que existem alguns APL afetos ao
e de pesquisa, pode-se citar a Comissão te integrante da PNRM e da Política Nacio-
número significativo de empreendimentos setor metalmecânico no país, que se trata
Interministerial para os Recursos do Mar nal do Meio Ambiente (PNMA), conferindo
e de indivíduos que atuam em torno de de uma indústria de base, propulsora do
(CIRM), que tem sido um fórum central à CIRM a responsabilidade pela elaboração
uma atividade produtiva predominante. desenvolvimento de outras indústrias, inclu-
para a discussão dos assuntos mais ligados do PNGC e de suas atualizações.
Enquanto o conceito de cluster abarca não sive daquelas relativas à economia do mar,
à ciência do mar, mas que tem contribuin- Do ponto de vista do desenvolvimento
necessariamente uma atividade produtiva como, por exemplo, a construção naval, o
do para a integração entre diversos ato- de atividades mais relacionadas ao poder
predominante, mas uma cadeia de serviços transporte marítimo e as energias renováveis
res. Hoje abrange dezesseis membros, in- econômico e ao desenvolvimento social
com cocriação de valor. A teoria de cluster offshore. O APL Marítimo do Rio Grande do
cluindo a Casa Civil. A CIRM é um órgão decorrente, pode-se citar como uma das
também traz um olhar mais voltado para o Sul, apesar de intitular-se APL, não foi locali-
deliberativo e de assessoramento, criado referências pioneiras a criação de Clusters
compartilhamento de conhecimento estra- zado nas bases do OBAPL, talvez por alguma
em 12 de setembro de 1974 e reinsti- Marítimos, propriamente ditos, como se
tégico, a depender, na prática, do nível de questão administrativa, mas foi incluso na
tuído em 2019 pelo Decreto nº 9.858, de constata no Plano Estratégico da Marinha
maturidade do cluster. tabela por sua representatividade.
25 de junho de 2019, com a finalidade de: (PEM 2040). Entre as ações estratégicas

342 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 343


Como estamos discutindo sobre arranjos como entidade gestora do APL. A proposta
Tabela 1. Casos de Arranjos de Integração entre os Stakeholders
de integração em prol da economia do mar, foi vencedora e foi firmado convênio entre
(Atores) do Mar no Brasil
Nº NºNome
Nº Nº
Nome
Nome
Arranjo
Arranjo
Arranjo não se pode deixar de aprofundar alguns a FURG e AGDI, em 15 de agosto de 2013,
Nome Arranjo Setor Setor
Setor Produtivo
Produtivo
Produtivo
Setor Produtivo Território dede
Território
Território Principal
Território Principal
de Principal
de Principal
Produtivo casos (da tabela acima) e estados brasilei- visando à estruturação da governança do
NProdutivo
0 Produtivo
Local
Local
(APL)
Local
Produtivo
Nome Arranjo (APL)
(APL)
Local (APL)
Setor Produtivo Influência
Influência
Influência
Território Influência
de Principal
Produtivo Local (APL) Influência ros que têm formulado estudos, estratégias Arranjo, incluindo a secretaria executiva do
ou políticas voltados para a Economia Azul, APL e as atividades de mobilização do Ar-
Construção
Construção
Construção naval,
naval, offshore
naval, offshore
offshore numa abordagem mais abrangente. ranjo como um todo.
Construção naval, offshore
1 1 APL
1 1APL
Marítimo
Marítimo
APL RS RSRS RS
Marítimo e deeenergia
de energia
e de e respectiva
energia e respectiva
eenergia
respectiva Rio Grande
RioRio eGrande
Grandeentorno
Grandee entorno
e entorno De acordo com dados de 2019, o APL
APL Marítimo e de e respectiva Rio e entorno
APL Marítimo Rio Grande do Sul (RS) contava com mais de cem associados. O
cadeia
cadeia produtiva
cadeia produtiva
produtiva
cadeia produtiva
APL foi inicialmente constituído como o
O APL Marítimo RS (Maritime Cluster APL Polo Naval e Offshore de Rio Grande
2 2 Cluster
2 2Cluster
Cluster
Tecnológico
Tecnológico
Tecnológico
Cluster Construção
TecnológicoConstrução
ConstruçãoNaval
Naval Naval
Construção Naval DuqueDuque deDuque
Duque Caxias;
dede Caxias;Guapimirim;
Caxias;
de Guapimirim;
Caxias;Guapimirim;
Guapimirim; of Rio Grande do Sul, em inglês) surgiu e Entorno, tendo lançado um plano de de-
Naval
Naval
do Naval
Rio
dodo
Naval de
Rio
Riodede
do Rio de Itaboraí; Itaguaí;
Itaboraí;
Itaboraí; Itaguaí;
Itaboraí; Magé;
Itaguaí; Magé;
Itaguaí; Magé;
Magé; em 2013 através do projeto Programa de senvolvimento em 2014, como mecanismo
Janeiro
Janeiro
(CTN-RJ)
(CTN-RJ)
Janeiro (CTN-RJ)
Janeiro (CTN-RJ) Mangaratiba;
Mangaratiba;
Mangaratiba; Niterói;
Mangaratiba; Rio
Niterói;
Niterói; de
RioRio
Niterói; deRio
de de Mobilização da Indústria Nacional de Petró- de identificação e priorização de frentes
Janeiro; São
Janeiro;
Janeiro; Gonçalo.
São
Janeiro; São Gonçalo.
Gonçalo.
São Gonçalo. leo e Gás Natural (PROMINP) Ind P&G 75 de trabalho. Em 19 de novembro de 2018,
3 3 Construção
3 3Construção
Construção
NavalNaval
Construção Naval
Naval Secundário
Secundário
Secundário e e e Coari;
– Produtos
Secundário – Produtos
– Produtos – Produtos e Coari;Iranduba;
Coari; Iranduba;
Coari; Itacoatiara;
Iranduba;
Iranduba;Itacoatiara;
Itacoatiara;
Itacoatiara; “Propostas de Política para Mobilização e houve uma alteração estatutária com a nova
serviços:
serviços:
serviços: Fabricação Manacapuru;
Fabricação
Fabricação
Fabricação
serviços: Manacapuru;
Manacapuru; Manaus;
Manacapuru; Manaus; Novo
Manaus; Novo
Manaus; NovoNovo Desenvolvimento de APLs para o Setor de denominação APL Marítimo RS. A nova de-
doméstica;
doméstica;
doméstica; Estaleiros
doméstica; de dede de
Estaleiros
Estaleiros Estaleiros Airão; Parintins;
Airão;
Airão; Parintins;Tabatinga;
Parintins; Tabatinga;
Tabatinga;
Airão; Parintins; Tabatinga; Petróleo, Gás e Naval”, coordenado pelo nominação aponta para um escopo mais
reparos
reparos deeconstrução
reparos de
e de
ereparos construção
e de Tefé
de dede
construção
construção (Manaus).
deTefé
Tefé (Manaus).
Tefé(Manaus).
(Manaus). então Ministério do Desenvolvimento, In- amplo do APL, não mais tão restrito aos seg-
pequenas
pequenaspequenas embarcações;
embarcações;
embarcações;
pequenas embarcações; dústria e Comércio Exterior (MDIC) e em mentos da construção naval e offshore.
Estaleiros
Estaleiros
Estaleiros dede
Estaleirosconstrução
de construção
de de dede de
construção
construção consonância com o Plano Brasil Maior. Dentre as realizações do APL, com apoio
pequenas,
pequenas,
pequenas, médias
médias
pequenas, médiasee e
e médias Sob a coordenação da Universidade da AGDI e parceria da Prefeitura Munici-
grandes
grandes grandes embarcações.
embarcações.
grandesembarcações.
embarcações. Federal do Rio Grande (FURG), o APL for- pal de Rio Grande, teve início em 2017 a
4 4 Pesca
4 4Pesca
Pesca
Artesanal
Artesanal
Artesanal
Pesca Agropecuária
Agropecuária
ArtesanalAgropecuária Agropecuária Igarassu;
Igarassu;Itapissuma;
Igarassu; Itapissuma;
Igarassu; Itapissuma;Ilha Ilha
Itapissuma; IlhaIlha mou-se a partir de uma ampla composição: instalação de um centro de simulação de
Extrativista
Extrativista
Extrativista
Extrativista de Itamaracá;
de deItamaracá; Paulista.
Itamaracá; Paulista.
Paulista.
de Itamaracá; Paulista. os principais estaleiros da região e seus manobras navais de alta precisão, na sede
5 5 Pescados
5 5Pescados
Pescados
da Baía
dada
Pescados Baía
de
Baía
da dede
Baía dePesca
Pesca PescaArtesanal
Artesanal
Pesca e ee e
Artesanal
Artesanal Candeias;
Candeias; Itaparica;
Candeias;
Candeias;Itaparica; Madre
Itaparica; Madre
Itaparica; deMadre
Madre dede de fornecedores, Petrobras, Universidades, do APL. Em 2019, como importante passo
Todos
Todos
os Todos
Santos
Todos osos
Santos
Santos Aquicultura
Aquicultura
os SantosAquicultura Comunitária
AquiculturaComunitária
Comunitária Deus;
Comunitária Maragogipe;
Deus;
Deus; Maragogipe;
Deus; Maragogipe; Salinas
Maragogipe; daSalinas
Salinas
Salinas dada da Institutos Federais de Educação, Ciência e estratégico, o APL celebrou Acordo de Co-
Margarida;
Margarida;
Margarida;Salvador;
Salvador; São São
Salvador; SãoSão Tecnologia, Sindicatos patronais e de traba- operação com o Banco Regional de Desen-
Margarida; Salvador;
Francisco
Francisco do Conde;
Francisco dodo Conde; Saubara;
Conde; Saubara;
Saubara; lhadores, associações empresariais e os Mu- volvimento do Extremo Sul (BRDE), cujo ob-
Francisco do Conde; Saubara;
nicípios de Rio Grande, Pelotas e São José jetivo era a elaboração do projeto do Plano
VeraVera
Cruz.
Vera Cruz.
Cruz.
Vera Cruz.
do Norte, tendo como premissa promover a de Desenvolvimento da Economia do Mar
6 6 Piscicultura
6 6Piscicultura
- - - - Pesca
Piscicultura
Piscicultura Pesca
Pesca e Aquicultura Demerval
e Aquicultura
e Aquicultura
e Aquicultura
Pesca Demerval Lobão;
Demerval
DemervalLobão; José
Lobão;
Lobão;de
José
José de
Joséde de
do Rio Grande do Sul.
competitividade do território, aumentan-
Território
Território
do Entre
dodo
Território
TerritórioEntre
Entre
do Entre Freitas; Miguel
Freitas;
Freitas; Miguel
Freitas; Alves;
Miguel Alves;
Miguel Alves;
Alves; do a eficiência industrial, a cooperação
RiosRios
RiosRios Monsenhor
Monsenhor
Monsenhor Gil; Gil;
Monsenhor Nazária;
Gil;Nazária;
Nazária;
Gil; Nazária; entre diferentes setores da sociedade e Cluster Tecnológico Naval do Rio de
Palmeirais;
Palmeirais; União.
Palmeirais;
Palmeirais;União.
União.
União. mitigando as externalidades negativas do Janeiro (CTN-RJ)
7 7 Piscicultura
7 7Piscicultura
Piscicultura
da Região
dada
PisciculturaRegião
Região
da Pescado
Pescado
Região Pescado
Pescado Almas - TO.
Almas
Almas - TO.
Almas - TO. - TO. desenvolvimento econômico.
Norte
Norte
de Norte
Tocantins
NortededeTocantins
Tocantins
de Tocantins Em paralelo, a Agência Gaúcha de De- Conjugando esforços de quatro empre-
8 8 Piscicultura
8 8Piscicultura
Piscicultura
na RDnana
Pisciculturado
RDna
RDdoRD
do Tilapicultura
do Tilapicultura
Tilapicultura
Tilapicultura Belém doBelém
Belém
Belém São
dodo Francisco
São São
do Francisco
São - PE;- PE;
Francisco
Francisco - PE;
- PE; senvolvimento e Promoção do Investimen- sas, Empresa Gerencial de Projetos Navais
Sertão
Sertão
deSertão
Itaparica
SertãodedeItaparica
Itaparica
de Itaparica Jatobá - PE;
Jatobá
Jatobá - Latacuruba
JatobáPE;
- PE; Latacuruba
- PE; - PE;- PE;
Latacuruba
Latacuruba - PE;- PE; to (AGDI) lançou edital 01/2013 de apoio e (EMGEPRON), Nuclebras Equipamentos
Petrolândia
Petrolândia - PE;- Rodelas
Petrolândia
Petrolândia PE;
- PE;Rodelas-Rodelas
Rodelas
- PE; BA;- BA;
- BA;
- BA; reconhecimento de APLs no RS. Uma vez Pesados S.A. (NUCLEP), Amazônia Azul
Glória - BA;
Glória
Glória
GlóriaPaulo
- BA;
- BA; Afonso
-Paulo
Paulo
BA; Afonso- Afonso
Afonso
Paulo - - - que os atores já estavam mobilizados pelo Tecnologias de Defesa S.A. (AMAZUL) e
BA; BA;
Delmiro
BA; DelmiroGouveia
Delmiro
BA; DelmiroGouveia -Gouveia
Gouveia AL.- AL.
- AL.- AL. Projeto PROMINP Ind P&G 75, uma propos- Condor Tecnologias Não Letais, o CTN-RJ
ta foi apresentada à AGDI tendo a FURG foi fundado em 2019, tendo como missão
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do OBAPL (2021)

344 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 345
Fortaleza 2040 e Ceará 2050, os quais aju- compõem a governança criada conjunta-
consolidar a cooperação entre os setores Em complemento, fruto de debates
daram a evidenciar a importância do “Ceará mente com a Agência de Desenvolvimento
governamentais, acadêmicos e empresa- impulsionados pelo CTN-RJ, o governo
Azul”. Esse “Ceará Azul” vai além dos 149 do Ceará (ADECE).
riais e contribuir para o desenvolvimento do estado do RJ publicou o Decreto nº
mil km² do “Ceará terrestre”, ou seja, mais Entre os diversos projetos já implemen-
das atividades econômicas relacionadas 47.813/2021, que criou a Comissão Estadu-
249 mil km² de um vasto território submer- tados com impacto nas atividades que
ao mar no estado do Rio de Janeiro (RJ). O al de Desenvolvimento da Economia do Mar
so, o qual integra o espaço marítimo brasilei- compõem a Economia Azul, destaca-se o
CTN-RJ se alinha ao Mapa do Desenvolvi- (CEDEMAR), responsável pela elaboração
ro conhecido por Amazônia Azul. Atlas de Energias Renováveis do Ceará,
mento do estado do Rio de Janeiro 2016- de políticas públicas para o setor. Vinculada
O Sistema Federação das Indústrias do ferramenta online que mapeou o poten-
2025, formulado pelo Sistema Federação à Secretaria de Estado de Desenvolvimento
Estado do Ceará (Sistema FIEC) elaborou e cial eólico offshore do Ceará, contribuindo
das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro Econômico, Energia e Relações Internacio-
executa um portfólio de projetos interins- para o posicionamento entre os três esta-
(FIRJAN), que tem entre seus objetivos, am- nais (SEDEERI), a comissão terá represen-
titucionais para desenvolvimento dos se- dos do Brasil com maior número de proje-
pliar a participação da iniciativa privada nos tantes da Assembleia Legislativa, FIRJAN,
tores portadores de futuro para o Ceará, tos de geração nessa modalidade.
diversos setores da economia e fortalecer a SEBRAE, Fecomércio, CTN-RJ, universidades
com destaque para a economia do mar. O Sistema FIEC formalizou seu portfó-
gestão, a governança e a produtividade nas e dos setores de infraestrutura e logística, de
Iniciado em 2014, a partir do projeto pros- lio para a Economia Azul no Programa
empresas do Rio de Janeiro (RJ). óleo e gás, do turismo e da pesca. No mes-
pectivo que reuniu mais de duzentos to- Ceará Mar de Oportunidades, implemen-
Nasce a partir da percepção de que o mo ano, a Assembleia Legislativa do Estado
madores de decisão em cada uma das sete tado em parceria com o Serviço Brasileira
Rio de Janeiro concentra cadeias produti- do Rio de Janeiro (ALERJ) aprovou o Projeto
mesorregiões cearenses em painéis de es- de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
vas relacionadas à projeto e integração de de Lei nº 4.698/21, criando a Política Esta-
pecialistas, o trabalho de apoio do Sistema (SEBRAE), com objetivo de fomentar e
sistemas de meios navais, planejamento e dual da Economia do Mar cujo texto mapeia
FIEC ao desenvolvimento da economia do apoiar a automação de processos na in-
execução do apoio logístico, construção, trinta grupos de atividades econômicas re-
mar introduziu-se a partir de um levanta- dústria de beneficiamento de pescado e
reparação e manutenção de navios e em- lacionadas ao litoral fluminense. A medida
mento de tendências tecnológicas, sociais na aquicultura, a elaboração do Atlas Ma-
barcações de apoio, infraestrutura de Esta- incentiva o Governo do Estado a articular a
e mercadológicas que culminou na priori- rinho do estado do Ceará e a certificação
leiros, Bases Navais e Arsenal de Marinha, aprovação, no Conselho Nacional de Política
zação desse setor em todas as quatro me- de barcos de pesca do estado.
indústrias fornecedoras de insumos básicos Fazendária (Confaz), de um convênio para
sorregiões cearenses que possuem litoral. Sob articulação do setor público, em
(siderurgia, metalurgia, plásticos, borrachas incentivos tributários às atividades ligadas à
Em continuidade, implementa o proje- março de 2022, foi divulgada a iniciativa do
e mobiliário de madeira), peças, equipamen- economia do mar e ainda prevê o apoio a
to Rotas Estratégicas Setoriais 2025 (Siste- Observatório Costeiro e Marinho do Ceará
tos e equipagens de emprego naval, além instituições científicas que desenvolvam ini-
ma FIEC, 2017). Para otimizar o processo (OCMCeará)2, capitaneada pela Secretaria
de sediar em seu território algumas das mais ciativas relacionadas à temática.
de operação, neste projeto os 17 setores do Meio Ambiente (SEMA), por meio do
conceituadas universidades do Brasil, escolas Dados do governo do estado indicam que
identificados como promissores para o de- Cientista Chefe do Meio Ambiente, pro-
militares e mão de obra qualificada. De acor- a economia do mar representa 44% do PIB
senvolvimento do Estado foram reagrupa- grama desenvolvido em parceria com a
do com seu Plano de Desenvolvimento de fluminense, da pesca artesanal às indústrias
dos em 13 rotas estratégicas, entre elas, Fundação Cearense de Apoio ao Desenvol-
Negócios, para o biênio 2021/2022, foram naval e de petróleo, incluindo as atividades
a Rota Estratégica da Economia do Mar, vimento Científico e Tecnológico (FUNCAP)
estabelecidos os segmentos-foco: constru- econômicas que não têm o mar como ma-
com roadmap construído coletivamente e Superintendência Estadual do Meio Am-
ção e reparação naval, descomissionamento téria-prima, mas que são realizadas nas suas
contendo as ações de curto, médio e lon- biente (SEMACE). O projeto também conta
e desmantelamento de plataformas e navios, proximidades. O estado tem 27% de seus
go prazo para garantir sinergia de esfor- com o apoio da Universidade Estadual do
serviços marítimos, exploração e explotação municípios voltados para o mar, com popu-
ços das instituições na implementação da Ceará (UECE), Universidade Federal do Ce-
de recursos renováveis e não-renováveis do lação estimada em 11 milhões de pessoas, o
visão do futuro, bem como a identificação ará (UFC), Instituto Federal de Educação,
mar, defesa e segurança. que representa 67% do Rio de Janeiro.
de tecnologias prioritárias essenciais para Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Ma-
Desde 2021, o cluster está aberto para
a competitividade. Dessa forma, foram co- rinha do Brasil, Secretaria do Patrimônio da
a adesão de outras empresas. Em seu Plano Estado do Ceará (CE)
criados coletivamente a agenda prioritária União (SPU) e Sistema FIEC.
Estratégico, espera-se que seja uma referên-
e o portfólio de projetos de alto impacto O Observatório insere-se no projeto do
cia a ser replicada por toda a extensão da O potencial do mar do Ceará foi abor-
para economia do mar, relevantes direcio- Planejamento Costeiro e Marinho do Ceará
vasta costa brasileira, visando a consolidação dado previamente como eixo temático no
nadores do trabalho das instituições que (PCM) e tem por missão ser um instrumento
de um grande Cluster Marítimo Brasileiro. desenvolvimento dos planos estratégicos

346 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 347


O Rotas Estratégicas Setoriais para a Sul (antigo estaleiro Oceana), tem o obje-
multidisciplinar e participativo de articu- Paraná e o Observatório do Litoral Para-
Indústria Catarinense 2022 (FIESC, 2014) tivo de atingir o máximo possível de con-
lação entre as universidades, o poder pú- naense), um em Santa Catarina (Obser-
teve como metodologia um painel de teúdo nacional, sendo um dos pilares do
blico, as entidades privadas e a sociedade vatório do Litoral Catarinense) e um no
especialistas, ocorrido em outubro de 2013, projeto e indutor do desenvolvimento da
civil, tendo como base as definições da Lei Pará (Observatório da Costa Amazônica).
que foram instigados a refletir acerca da si- economia do mar no estado. A expectativa
nº 13.796, de 30 de junho de 2006 (Polí- O OCMCeará se trata de uma institui-
tuação do momento e sobre o futuro dese- é que a construção dos navios gere dois mil
tica Estadual de Gerenciamento Costeiro) ção pioneira do tipo na Região Nordeste
jado para o setor num horizonte de 10 anos. empregos diretos no auge da construção, e
(CEARÁ, 2006). e dentre os 17 estados costeiros, que de
Nessa etapa, ocorreu a elaboração de quatro até seis mil empregos indiretos.
O OCMCeará surge a partir da ideia de modo geral e integrado, unirá a academia,
visões, uma para cada um dos segmentos
que as atividades, em curso e aquelas que a gestão pública, a sociedade civil e a so-
trabalhados dentro da economia do mar: Cluster Brasileiro de Inteligência
poderão surgir em um futuro próximo, re- ciedade privada para a tomada de decisão
alimentos do mar, indústria naval, portos e Artificial para Navios e Navios
presentam clusters de inovação e Hubs de na Zona Costeira e Marinha de um estado.
transporte marítimo e recursos oceânicos. Há Autônomos (CIANNA)
grande importância social e econômica. A princípio, foram definidos quatro ei-
que se analisar em que medida essas visões e
Nesse sentido, o aproveitamento do po- xos temáticos de atuação do Observatório:
ações propostas foram implementadas. Em dezembro de 2020, foi lançado o
tencial de múltiplos usos da Zona Costeira mudanças climáticas e impactos costeiros;
Com 531 quilômetros de costa, Santa Cluster Brasileiro de Inteligência Artificial
e Ambiente Marinho do Ceará exige pla- economia do mar; protagonismo social das
Catarina conta com estaleiros de grande para Navios e Navios Autônomos (CIAN-
nejamento. Caso contrário, as atividades comunidades costeiras e riscos à biodiver-
reputação para a construção de barcos de NA), por meio de um evento virtual que
podem nem ser implementadas ou imple- sidade marinha e costeira. No que diz res-
lazer e é o maior produtor nacional de os- reuniu o ministério da Ciência, Tecnolo-
mentadas de modo inadequado, o que po- peito à economia do mar, os principais pro-
tras, mexilhões e peixes, contando com o gia e Inovações (MCTI), outros represen-
derá acarretar prejuízos à própria sustenta- dutos pretendidos pelo Observatório são
segundo maior porto de movimentações tantes do Governo Federal, academia,
bilidade da atividade econômica e conflitos servir de apoio ao Plano Estadual de Ge-
de contêineres de carga no Brasil (o por- empresas marítimas e lideranças indus-
com outros setores do desenvolvimento, renciamento dos Recursos Bióticos e Abi-
to de Navegantes); além de muitos outros triais. A ideia é que uma plataforma sem
além de significativa degradação ambiental óticos da Zona Costeira e Marinha (PCM)
fatores que, agregados, tornam o estado fins lucrativos promova o intercâmbio de
e aumento da desigualdade social. em desenvolvimento, ao Planejamento Es-
um hub marítimo com enorme potencial. A empresas e instituições para o desenvol-
Projeta-se o OCMCeará como referên- pacial Marinho do Ceará (PCM) e, ao le-
Associação Náutica Brasileira (ACATMAR) vimento da Inteligência Artificial (IA) no
cia nacional e internacional na difusão, dis- vantamento de atividades potenciais para
possui sua sede no estado de Santa Catari- setor marítimo nacional.
cussão e reflexão de informações técnicas, o desenvolvimento de atividades relaciona-
na e representa a cadeia produtiva do setor Outros objetivos da iniciativa são alavan-
científicas e educacionais, com foco no su- das à economia do mar.
náutico em todo o país. car projetos e soluções tecnológicas, atrair
porte à tomada de decisões voltadas para
Em julho de 2021, houve uma reunião investimentos, reunir núcleos de pesquisa
a gestão da Zona Costeira e do Ambiente Estado de Santa Catarina (SC)
para discutir a implantação de um cluster que já atuam na área e sinalizar ao mer-
Marinho do Ceará, reunindo profissionais e
tecnológico naval em Santa Catarina, entre cado nacional e internacional que o país
lideranças atuantes na temática. A Federação das Indústrias do Estado de
a FIESC, EMGEPRON, o SEBRAE, SENAI e aposta na IA. O cluster também atuará jun-
Os observatórios não são uma novida- Santa Catarina (FIESC) idealizou em 2012 o
Secretaria de Assuntos Internacionais. As to ao Poder Legislativo para aprovar mu-
de no mundo.Conforme levantamento da Programa de Desenvolvimento Industrial Ca-
entidades se propuserem a buscar as ar- danças legais que impulsionem o setor.
equipe de coordenação do OCMCeará, tarinense (PDIC), com o objetivo de ampliar
ticulações necessárias para o desenvolvi- Entre os desafios legais apresentados
até então, no Brasil, existem apenas sete a competitividade dos diversos setores indus-
mento de um Cluster Marítimo no estado no evento de lançamento estão uma regu-
instituições com o caráter de Observató- triais do estado. O programa foi dividido em
de Santa Catarina. Ainda não se dispõe de lamentação que permita as mudanças dis-
rio, concentradas na Região Sudeste, Sul três grandes projetos: Setores Portadores de
informações sobre o escopo e governança ruptivas, garanta a empregabilidade para
e Norte do País, sendo três no estado de Futuro para a Indústria Catarinense; Rotas
do cluster proposto. aquaviários e o setor portuário. Entre as
São Paulo (Observatório Costeiro para o Estratégicas Setoriais para a Indústria Ca-
Cabe ressaltar o Programa Fragatas tecnologias possibilitadas pela IA no setor
Monitoramento Ambiental de Santos; tarinense e Masterplan. Os setores e áreas
Classe Tamandaré, iniciativa da Marinha naval estão navios e submarinos autôno-
Observatório Litoral Norte; Observatório mapeados como de grande potencial foram
do Brasil, que visa construir quatro fragatas mos, que utilizam simuladores de navegação
da Dinâmica Costeira), dois no Paraná trabalhados em dezesseis Rotas Estratégicas
em Itajaí, no Thyssenkrupp Estaleiro Brasil e modelos matemáticos para funcionar.
(Observatório de Conservação Costeira do Setoriais, entre eles, a economia do mar.

348 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 349


(i) assumir a liderança das novas áreas de portes marítimos, bem como com todas as
3. Cenário Internacional
excelência que surgirão na indústria; (ii) indústrias e setores correlacionados. Um
melhoria contínua do ambiente regulatório forte alinhamento entre os setores público
Além das citadas iniciativas destacadas internacionais relacionados com transporte
favorável à inovação e à qualidade; e privado, bem como entre a academia e a
no cenário nacional, há de se observar marítimo, fazem parte deste sistema marí-
indústria, estão na base deste sucesso, que
também se esse é um movimento singular timo de Cingapura, o que representa um
Cingapura continua na sua agenda de já ultrapassou os 37 milhões de TEUs, movi-
brasileiro. Em verdade, essa já é uma rea- enorme crescimento face às cerca de 20
inovação internacional na economia marí- mentados em porto (UNCTAD, [2022])(PSA
lidade há muito vivenciada em vários ou- entidades que existiam há 20 anos atrás. De
tima, particularmente nos portos e trans- Singapore, [2022]).
tros países. Assim, pretende-se agregar, a acordo com o mesmo relatório, que prevê
seguir, exemplos internacionais de arranjos redução do comércio internacional e acele-
múltiplos que nasceram e florescem com o ração da inovação e de novas tecnologias
propósito de alavancar a economia e o de- disruptivas, uma nova visão da estratégia Gráfico 1. Carga em contentores (containers) movimentada
senvolvimento relacionado com o mar. marítima de Cingapura estará assente em: no porto de Cingapura (milhões de TEUs)

Cingapura . Desenvolver o cluster marítimo através Carga em contentores (containers) movimentada no porto de Cingapura
de: (i) aumentar o número de entidades de (milhões de TEUs)
Desde sempre Cingapura teve uma transporte marítimo; (ii) captar maior quo- 40
forte relação com o mar e com o comér- ta de mercado no transporte marítimo; (iii)
cio marítimo. Sendo um secular ponto de reforçar a indústria de seguros marítimos 35

encontro entre mercadores e marinheiros, e a arbitragem; (iv) expandir as fontes de


30
logo após a sua formação como país in- financiamento; (v) continuar a desenvolver
dependente, na década de 60 do século
XX, Cingapura considerou como prioritário .
o porto marítimo.
Fortalecer o efeito conexões e network
25

desenvolver uma forte estratégia de cres- através de: (i) promover as atividades do clus- 20

cimento e de desenvolvimento através da ter dentro de Cingapura; (ii) criar conexões


15
economia marítima. entre a indústria marítima e outras indústrias
O seu porto marítimo, um dos maiores da economia de Cingapura; (iv) fortalecer as 10
portos do mundo, tem sido o epicentro de conexões do cluster marítimo de Cingapura
toda a estratégia marítima do presente e do
futuro de Cingapura. Atualmente, Cinga- .
com outros clusters a nível internacional.
Desenvolver um ecossistema de inova-
5

0
pura é um dos maiores centros marítimos ção marítima vibrante e promover a digita- 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
do mundo, devido à sua excelente localiza- lização através de: (i) reforçar o investimen-
ção geográfica, nas principais rotas de co- to articulado entre o setor público e o setor
mércio intercontinental. As suas sofistica- privado; (ii) alavancar big data, internet of
das infraestruturas, as suas leis adaptadas
à realidade do mundo dos negócios e a sua .
things e intelligence systems.
Desenvolver uma força de trabalho com
capacidade de estar permanentemente a competências múltiplas e que pensa a nível
aprimorar a sua estratégia, adaptando-a à global, através de: (i) fortalecer a qualidade (milhões de TEUs)
evolução dos tempos, reforça essa sua po- da formação e treino marítimo; (ii) continu-
sição de liderança a nível global. ar a sofisticar os standards de profissiona- 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
De acordo com o relatório de Cinga- lismo na indústria; (iii) promover o perfil da 29,1 30,6 32,3 33,3 34,6 31,7 31,6 33,6 37,3 37,1 36,8 37,1
pura International Maritime Centre 2030
(International Maritime Center, [2017]), .
indústria marítima para atrair talento.
Estabelecer Cingapura como o standard Fonte:UNCTAD; PSA Singapore (2022)
hoje em dia, mais de 140 grandes grupos global da indústria marítima, através de:

350 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 351


Tabela 2. Valor acrescentado das indústrias oceânicas, na Noruega
Noruega pertencentes ao Fundo Soberano e que
são entregues para o orçamento anual de Bilhões de Coroas Norueguesas (preços Noruega
Com um dos maiores Produtos Inter- Estado da Noruega, este país conseguiu correntes)
nos Brutos/per capita do mundo e com construir um dos maiores fundos financei-
um desenvolvimento econômico social Setor 2010 2016
ros com os recursos obtidos da exploração
singular, a Noruega soube aproveitar petrolífera offshore, proporcionando aos Alimento marinho 33.1 57.9
muito bem e de forma inovadora os prin- seus cidadãos, um dos melhores índices
Petróleo offshore 596.6 478.5
cipais recursos que o oceano lhe oferece. de bem-estar a nível global (“Government
Com o apertado controle das verbas Pension Fund ”, [2021]). Transporte marítimo e portos 32.2 40.7
Turismo 32.2 45.4
Gráfico 2 – Valor do Fundo Soberano da Noruega
Total 694.1 622.5
Fonte: Meld. St. 20, Report to the Storting (white paper),
12000 Norway’s integrated ocean management plans (2020)

Para além da competência e do rigor na em engenharia oceânica, terem conseguido


10000 gestão dos recursos nacionais, a Noruega ultrapassar grandes obstáculos no mar pro-
conseguiu agregar uma grande capacida- fundo, e que isso só foi possível através de
de de antecipação das tendências futuras e “aprender fazendo” e adaptando-se cons-
8000
investe, há alguns anos, na inovação asso- tantemente às novas realidades que tinham
ciada à valorização dos recursos marítimos. pela frente. Neste contexto, consideram
Se na década de 60, de forma pioneira, que, é necessário mudar para encontrar um
a Noruega antecipou o valor econômico e balanço entre a produção de energia que o
5000
gás offshore, neste momento, já se prepara mundo precisa e o combate às alterações cli-
para o futuro de forma a reduzir a depen- máticas. Assim, estão evoluindo de uma em-
dência do petróleo offshore na produção presa de petróleo e gás para uma empresa
4000 de riqueza do país. de energia, onde as energias renováveis têm
Um exemplo da grande antecipação de também a sua importância e onde a captura
tendências e da capacidade inovadora é a de carbono é também relevante.
2000 recente mudança de nome e de estratégia Para continuar o seu caminho de sucesso
de uma das maiores empresas do mundo na rota de desenvolvimento sustentável das
na exploração de petróleo offshore, a Sta- suas principais indústrias do mar, a Noruega
0 toil (atual Equinor). A Equinor, após 45 anos montou um modelo de governança e criou
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 chamando-se Statoil e apostando na exce- planos estratégicos para pensar seu futuro.
lência da exploração de petróleo no oceano De acordo com o relatório “Meld. St. 20,
Bilhões de Coroas Norueguesas 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 em grandes profundidades, considera agora (2019–2020) Norway’s integrated ocean
ser fundamental, no presente e no futuro, management plans”, a orgânica do mode-
Valores do Fundo Soberano da Noruega 3077 3312 3816 5038 6431 7475 7510 8488 8256 10088 10914
apostar no equilíbrio entre energia e ecos- lo de governança, inclui um Steering Com-
Fonte: Fundo Estatal de Pensões, Governo da Noruega (2021) sistemas, garantindo igualdade de oportu- mittee, com funções executivas, que reúne
nidades às pessoas (Equinor, 2022)”men- os principais ministérios do governo norue-
Cabe salientar que, apenas uma pe- Noruega, o que denota uma preocupação
deley”:{“formattedCitation”:”(Equinor, guês, que é assessorado por um fórum para
quena parte do referido Fundo Soberano, com as atuais e as futuras gerações, de for-
[s.d.]. No seu website institucional, esta or- a gestão integrada do oceano e um grupo
nunca superior aos ganhos anuais, é afe- ma que o Fundo ganhe valor e se mante-
ganização afirma terem atingido a mestria de aconselhamento e monitorização.
ta ao orçamento de estado do Governo da nha sustentável ao longo de muitos anos.

ECONOMIA AZUL
352 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 353
.
Austrália
Quadro 1 -Modelo de govemança da Noruega de atividades no oceano
A Austrália considera que os oceanos desenvolver competências trans-disci-

.
Steering Committee são o futuro econômico do país. Espera em plinares
2025, que as indústrias marinhas contribu-

.
Ministry of Climate and Environment Ministry of Transport construir navios de pesquisa
am em aproximadamente 100 bilhões de
Ministry of Petroleum and Energy Ministry of Labour and Social Affairs

.
dólares por ano para a economia, esperan- investigar, mapear e monitorizar
Ministry of Trade, Industry and Fisheries Ministry of Finance do-se que a contribuição da economia do
Ministry of Local Government and Modernisation Ministry of Justice and Public Security definir a base de partida das ciências
mar, para a economia da Austrália, cresça

.
Ministry of Foreign Affairs Ministry of Defence marinhas
a um ritmo três vezes superior ao ritmo do
crescimento da economia geral. cooperar



Estrategicamente, a Austrália considera
que o conhecimento dos oceanos é instru- Estados Unidos da América
mento fundamental para extrair o máximo
Forum for Integrated Ocean Management Advisory Group on Monitoring Os Estados Unidos da América têm
proveito, de forma sustentável, dos recur-
• Norwegian • Norwegian • Institute of Marine • Norwegian Institute uma Agência Federal, que pertence ao De-
sos marinhos.
Environment Agency Meteorological Research for Nature Research partamento de Comércio (“Ministério da
• Norwegian Institute • Norwegian • Norwegian Institute Neste contexto, construiu um plano na-
Radiation and Economia”) que é uma referência mundial
• Norwegian Water Radiation and for Water Research cional de ciência marinha (National Marine
Nuclear Safety Resources and Energy  Nuclear Safety • Geological Survey em relação às matérias dos oceanos, espe-
Authority Directorate Authority of Norway Science Committee (Australia) e Gunn, 2015)
cialmente nas matérias relacionadas com

.
• Directorate of • Norwegian Polar • Directorate of • Norwegian Polar que visa responder aos seguintes objetivos:
Fisheries Institute Fisheries Institute o conhecimento das dinâmicas naturais

.
• Institute of Marine • Norwegian • Norwegian • Norwegian manter a soberania e segurança marítimas dos oceanos e do seu impacto sócio eco-
Research Petroleum Directorate Meteorological Maritime
nômico, que se chama NOAA – National

.
• Norwegian • Petroleum Safety Institute Authority atingir a segurança energética
Mapping Authority Authority • Norwegian Oceanic and Atmospheric Administration.
• Norwegian Coastal • Norwegian Environment Agency

.
assegurar a segurança alimentar Na estratégia 2021-2025 da NOAA para a
Administration Maritime Authority
Economia Azul (Leboeuf et al., 2021) cons-
conservar a boa saúde dos ecossistemas
tam os seguintes objetivos estratégicos:

. .
Fonte: Meld. St. 20, Report to the Storting (white paper), marinhos e da sua biodiversidade
Norway’s integrated ocean management plans (2020)
criar um desenvolvimento urbano costei- Contribuir para o desenvolvimento do

. .
ro, sustentável transporte marítimo
Sendo que, os objetivos do plano no- em conjunto, sem ultrapassar os limites de compreender e adaptar-se às alterações Mapear, pesquisar e caracterizar a ZEE

. .
rueguês para o mar são: sustentabilidade ambiental dos ecossiste- climáticas dos EUA

. promover o uso sustentável dos ecossis-


.
mas marinhos;
alocar o desenvolvimento dos recursos Promover o crescimento e competitivida-

.
gerir os recursos pesqueiros de forma marinhos de forma equitativa e balanceada de da indústria alimentar do mar
temas marinhos de forma a ser criado valor

.
sustentável;
e emprego, de forma sustentável, ao longo Os passos que serão dados na implementa- Expandir o turismo costeiro, oceânico e

. .
do tempo;
.
efetuar a exploração de petróleo offsho- ção do plano, serão os seguintes: nos grandes lagos
re de forma segura e em total respeito pe-
as indústrias do mar terão que promo- construção de ferramentas de suporte à Aumentar a resiliência dos oceanos, cos-

.
los mais exigentes standards ambientais;

. .
ver a criação de valor e de bem-estar para decisão tas e grandes lagos

.
todo o país; desenvolver as energias renováveis

. .
criação de modelos de previsão Desenvolver o crescimento azul sustentável

.
offshore;
a existência de coordenação entre to-
estabelecimento de parcerias entre a in- Alavancar as oportunidades externas de
das as atividades de natureza comercial criar as condições para um transporte ma-
dústria e o Estado desenvolvimento da Economia Azul
que possibilite a coexistência das mesmas rítimo seguro e ambientalmente sustentável;

354 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 355
De acordo com a conta satélite da eco- os principais setores da economia marinha que teve como principais prioridades: Atualmente, o plano de ação para o
nomia marinha dos EUA (NOAA, 2021), dos EUA são os seguintes: (i) promover o empreendedorismo e a inova- Atlântico, gerido pelo comité executivo
ção; (ii) proteger e desenvolver os ecossiste- constituído pela Comissão Europeia, por
Tabela 3 . Principais setores da economia marinha dos EUA mas marinhos; (iii) melhorar a acessibilidade e Portugal, pela Espanha, pela França e pela

.
a conectividade e (iv) criar um modelo de de- Irlanda, tem os seguintes quatro pilares:
Valor Agregado Bruto (milhões de dólares) 2019 senvolvimento social, inclusivo e sustentável. os portos do Atlântico e o seu papel na
Turismo Oceânico e Costeiro 132.984 Adicionalmente, a União Europeia ce-

.
Economia Azul
lebrou acordos estratégicos de coopera-
Defesa Marítima e Administração Pública 104.233
.
ção internacional, para melhor conhecer as competências azuis e a literacia oceânica
Minerais Offshore 78.028

.
os oceanos, destacando-se o Acordo do as energias marinhas renováveis
Transporte e Logística Marítima 21.268 Galway, que lançou a cooperação entre
um oceano saudável e zonas costeiras
Construção e Reparação Naval 3.694 a União Europeia o Canadá e os Estados
resilientes
Unidos, estabelecendo a “Atlantic Oce-
Ciência e Educação 6.613
an Reserach Alliance (AORA)”. Logo após Na totalidade da União Europeia, o Va-
Recursos Marinhos Vivos 12.028 o Acordo Galway, celebrou o Acordo de lor Agregado Bruto da Economia Azul (Eu-
Outros 26.203 Belém, estabelecendo cooperação entre a ropean Comission, 2021), no ano de 2018,
Valor Agregado Bruto da Economia Marinha dos Estados Unidos 385.051 União Europeia, a África do Sul e o Brasil. ultrapassou os 176 bilhões de euros.
da América Tabela 4. Valor Agregado Bruto da Economia Azul União Europeia
Fonte: NOAA (2021)
União Europeia Valor Agregado Bruto (milhões de dólares) 2018
Apesar de, até esse ponto, as inicia- biotecnologia marinha, das energias oceâ- Recursos Vivos 19.100

.
tivas de arranjos tenham tido como ator nicas, entre outros; Recursos não Vivos 4.243
central o Estado (tanto no caso brasilei- Energia Offshore 1.495
dados e conhecimentos marinhos – per-
ro, quanto nos exemplos internacionais),
mitir o acesso à informação sobre o mar, Atividade Portuária 26.481
há ainda de sublinhar iniciativas decor-
capaz de ser utilizada por todas as entida- Construção e Reparação Naval 14,654
rentes de rearranjos interestatais como
des, gerando conhecimento e valor através
o caso europeu. Transporte Marítimo 30.047

.
da análise desses dados;
A União Europeia tem sido pioneira na Turismo Costeiro 80.049
construção de uma visão integrada de to- planejamento do espaço marinho – re-
Valor Agregado Bruto da Economia Azul União Europeia 176.069
das as atividades que acontecem no mar. duzir os conflitos entre setores, encorajar
Fonte: Comissão Europeia (2021)
Em 2007, após um período de produção o investimento, aumentar a cooperação
de documentos estratégicos sobre o mar, entre Estados e proteger o meio ambiente; Transformação da Economia a nível global
a União Europeia iniciou a sua Política vigilância marítima integrada – permitir às A pandemia Covid-19 causou uma ruptura pré-pandemia, que já apresentava baixas
Marítima Integrada, também chamada de autoridades marítimas dos diversos Esta- a nível global, com o Produto Interno Bruto taxas de crescimento do PIB (1% a 2%)
“Livro-Azul”. Esta política foi concebida dos, terem um ambiente comum de parti- mundial tendo caído cerca 3,3%, no ano e sinais alarmantes de poluição, fenóme-

.
para reforçar o desenvolvimento sustentá- lha de informação; de 2020 (Fundo Munetário Internacional, nos climáticos extremos. A Economia Azul
vel da União Europeia através do mar. 2022.) — uma queda sem precedentes nas tem, portanto, a oportunidade de contri-
estratégias marítimas por bacia – permi-
Os eixos estruturais e suas pretensões, últimas quatro décadas, de acordo com o buir para uma recuperação sustentável
tir, de forma diferenciada, resolver as fra-

.
desta visão integrada, são: relatório internacional Burgee (Marques que transforme positivamente o modelo
quezas e realçar as forças de cada região
M., 2021), é importante que a recupera- de desenvolvimento econômico global.
o crescimento azul – desenvolver seto- marítima da União Europeia. Em 2011, o
ção signifique também a transformação Uma abordagem baseada em dois pilares:
res com grande potencial de crescimen- primeiro plano de ação por bacia, foi o plano
do modelo de crescimento econômico na ciência, que irá alimentar este processo
to, como é o caso da aquacultura, da de ação da União Europeia para o Atlântico,

356 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 357


de transformação, que se pretende balan- possibilitará cada vez mais iniciativas de mar. Tendo em vista o foco deste capítulo, arranjos catalizadores de projetos de Ciên-
ceada e integrada e; na cooperação, que arranjos colaborativos. a empreitada de mapeamento e estímulo cia, Tecnologia & Inovação e; do Ministério
aos clusters marítimos exigiria uma articu- do Desenvolvimento Regional (MDR).
4. Considerações finais lação interministerial, principalmente, tendo Não se trata apenas de “quanto mais,
a participação do Ministério da Economia, melhor”, trata-se de “mais e melhor”; por-
Pode-se observar experiências de pla- econômicos e estatísticos relativa ao papel que já atua na temática dos APL; do Mi- tanto, de articulação política, social, am-
nejamento estatal, estadual e local para o das organizações de clusters de atividades nistério da Ciência, Tecnologia e Inovações biental, econômica que alavanquem o de-
desenvolvimento da economia do mar, ou marítimas seria bem-vinda. A literatura nos (MCTI), visto que existe a possibilidade de senvolvimento nacional de forma crescente.
da Economia Azul, numa abordagem mais aponta que os clusters são mecanismos de
abrangente. Está-se diante da reativação do manifestação de interesses múltiplos em Referências
associativismo, isto é, da oportunidade de prol do desenvolvimento e uma política as-
novos arranjos de integração e, também, da sociada ao cluster pode alcançar diretrizes ACATMAR. A Associação ACATMAR. Dis- BRASIL. Ministério de desenvolvimento,
verificação, sobre os já existentes arranjos, que uma política setorial não alcança. ponível em: https://www.acatmar.com.br. indústria e comercio. Termo de Referência
quanto às suas efetividade e objetividade. Além disso, com base nas experiên- Acesso em: dez. 2021. para Política Nacional de Apoio ao Desenvol-
Isso pressupõe vontade dos tomadores de cias vivenciadas, tanto por outros Estados APL Marítimo RS. Plano de Desenvolvimen- vimento de Arranjos Produtivos Locais Versão
decisão (públicos e privados) e contínua ca- quanto pela União Europeia, que incluíram to. Disponível em: http://aplmaritimo.org/ para Discussão do GT Interministerial Versão
pacitação dos gestores (públicos e privados) abordagens de cluster, dentre outras, como wp-content/uploads/2017/07/Plano-de-De- Final (16/4/2004). Disponível em: wttp://
que compõem os Núcleos Estaduais de APL. peças fundamentais para a elaboração de senvolvimento.pdf. Acesso em: dez. 2021. www.mdic.gov.br/sitio/interna/interna.php?a-
As diversas iniciativas de integração entre uma política marítima integrada, entende- APL Marítimo RS. Documento Base Arranjo rea=2&menu=2985. Acesso em: dez. 2021.
os stakeholders do mar, em curso nos princi- se que o Brasil deve construir uma política Produtivo Local “Polo Naval e Offshore CEARÁ AZUL: o maior território do Estado.
pais estados costeiros do país são plausíveis. marítima integrada, considerando a abor- De Rio Grande E Entorno”. Disponível em: Diário do Nordeste, Artur Bruno, 11 de
Contudo, neste estudo, reitera-se que, ob- dagem de que os stakeholders do mar não <http://aplmaritimo.org/wp-content/uplo- out. 2021. Disponível em: https://diario-
servadas as especificidades de cada região, devem atuar isoladamente. Sendo assim, ads/2017/07/ANEXO1_DOCUMENTO_BASE_ donordeste.verdesmares.com.br/opiniao/
as propostas devem estar alinhadas, primei- as iniciativas de arranjos colaborativos e in- APL_NAVAL_RIO_GRANDE_ENTORNO.pdf> colaboradores/ceara-azul-o-maior-territo-
ramente com a Política Marítima Nacional, tegrados contribuem para o fortalecimento Acesso em: dez. 2021. riodo-estado-1.3146246. Acesso em: 24
documento de mais alto nível a expressar a de uma política marítima integrada e dis- APL do Polo Naval e Offshore do Rio Gran- fev. de 2022.
vontade do país em relação a esse importan- seminam boas práticas ligando os setores de é reconhecido pelo governo do Estado. CEARÁ. Lei nº 13.796, de 30 de junho de
te benefício natural que nos margeia, bem marítimos entre si. Em suma, os arranjos SEBRAE, Rio Grande do Sul, 21 de jun. 2006. Institui a Política Estadual de Geren-
como com outras, mais setoriais, como a Polí- de integração dos stakeholders do mar não 2013. Disponível em: https://sebraers.com. ciamento Costeiro e o Plano Estadual de
tica Nacional para os Recursos do Mar (PNRM) somente podem contribuir para alavancar br/apl-do-polo-naval-e-offshore-do-rio- Gerenciamento Costeiro e dá outras provi-
(e seus Planos Setoriais decorrentes (PSRM), a Economia Azul em um determinado ter- -grande-e-reconhecido-pelo-governo-do- dências. Diário Oficial do Estado, Ceará,
que se trata de um documento orientador e ritório, assim como pode constituir-se em -estado/. Acesso em: 24 fev. 2022. 30 jun. 2006. Seção 1, p. 4.
inovador ao incorporar conceitos importantes uma forma avançada de gestão no contex- BAPTISTA, Arthur Rocha. APL marítimo CIANNA. Cluster Brasileiro de Inteligên-
como a Economia Azul, o planejamento es- to da governança dos oceanos. RS. Maritime Cluster of Rio Grande do Sul. cia Artificial para Navios e Navios Autô-
pacial marinho e a cultura oceânica. Mais do que uma revisão conceitual e Rio de Janeiro. 21 nov. 2019. Apresentação nomos. Objetivos. Disponível em: Erro! A
Não existe um tipo de arranjo que possa levantamento de casos, este estudo apon- em Slide. 18 slides, color, I Seminário Inter- referência de hiperlink não é válida.https://
ser considerado como sendo o mais apropria- ta para que o Brasil avance na política de nacional “A Economia do Mar como Políti- ciannacluster.wixsite.com/cianna. Acesso
do para a alavancagem da Economia Azul ou estímulo às inovadoras e múltiplas iniciati- ca de Desenvolvimento/Rio’s Maritime Clus- em: dez. 2021.
da economia do mar, no sentido mais espe- vas de arranjo colaborativo e, em especial ter Day”. Disponível em: https://www.ma- CLUSTER Tecnológico Naval RJ. Plano Es-
cífico. O desempenho dos atores envolvidos aos APL/clusters, incluindo a atração de se- rinha.mil.br/cepe/sites/www.marinha.mil. tratégico 2021-2025. Sumário Executivo.
nos arranjos ainda é difícil de ser avaliado. As tores produtivos, sempre com a perspectiva br.cepe/files/04__arthur_rocha_20191119_ Disponível em: https://www.clusternaval.
iniciativas são muito recentes no Brasil e uma da boa gestão racional e sustentável dos apresentacao_apl_maritimo_rs.pdf. Acesso org.br/wp-content/uploads/2020/10/Plano-
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358 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 359


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Resources Institute. https://www.oceanpanel. Acesso em: 24 fev. 2022. economia azul e economia do mar, são abordados lho sobre o OCMCeará foram obtidas por meio de
org/Economicanalysis. Lançado Cluster Brasi- PORTER, M. Competição: estratégias na primeira seção desta obra, caso o leitor necessite documento piloto do projeto, que consta anexo a um
leiro para Inteligência Artificial para Navios. competitivas essenciais (On Competition). ampliar a compreensão. convite à Marinha do Brasil para fazer parte do con-
Governo do Brasil, Brasília, 7 de dez. 2020. Rio de Janeiro: Campus, 1999. 2 Em 16 de março de 2022, ocorreu o lançamento selho consultivo do Observatório, encaminhado em 5
virtual do Observatório Marinho e Costeiro do Ceará de novembro de 2021.
Disponível em: https://www.gov.br/pt-br/ PWC LEME Circum-navegação: Uma visão

360 ECONOMIA AZUL Os Arranjos Inovadores da Economia do Mar 361


18

O BRASIL NO ARRANJO DE PODER DA IMO E


O ENCORAJAMENTO PARA UMA ATUAÇÃO
MAIS EXPRESSIVA POR MEIO DO SOFT POWER
PELA TECNOLOGIA

Carlos Henrique de Lima Zampieri


Fabiana Abreu do Valle Ventura Piassi

1. Introdução

Dentre as diversas agências especializa- Assim como para o Brasil, o mar se des-
das integrantes do Sistema da Organização taca no concerto de outros Estados como
das Nações Unidas (ONU), a Organização elemento primordial para o progresso eco-
Marítima Internacional (International Mariti- nômico. Nesse contexto, um grande núme-
me Organization – IMO)1 denota expressiva ro de iniciativas são apresentadas e defendi-
relevância, mundialmente, por representar das no âmbito da Organização. Estas iniciati-
a autoridade instituída e especialmente de- vas encontram-se, muitas vezes, envoltas sob
dicada, por meio de seus Estados membros, um manto de cooperação de ordem tecno-
Organizações Intergovernamentais e Orga- lógica. Se, por uma vertente, impulsionam o
nizações Não Governamentais, à formula- futuro do setor marítimo internacional, por
ção de regramentos, sempre por meio do outra contribuem para polarizar discussões e
princípio da cooperação, destinados à se- deliberações em prol de soluções que aten-
gurança e à preservação do meio ambiente dam a interesses econômicos, tecnológicos e
no contexto do transporte marítimo inter- políticos específicos.
nacional, por meio da prevenção à poluição Consegue-se inferir tal posicionamento
marinha e atmosférica causada por navios. à medida que se observam, por exemplo,
Desde o ano de 1963 o Brasil é membro iniciativas no campo da segurança maríti-
da IMO. Tal fato assevera a significância que ma (safety), marcadas pela busca expedita
o País empresta à Organização e às decisões da regulamentação do emprego de navios
colegiadas dela originadas, primordiais para autônomos marítimos de superfície (MASS –
um ator global de destacada expressão, que Maritime Autonomous Surface Ships) e no
utiliza o transporte marítimo para o escoa- campo ambiental, por questões relacionadas
mento de seu comércio exterior, na ordem ao desenvolvimento de novos combustíveis
de mais de 95% (BRASIL, 2017, p. 1.2). menos agressivos à atmosfera, ocasionando

362 ECONOMIA AZUL O Brasil


O Brasil no
no Arranjo
Arranjo de
de Poder
Poder da
da IMO 363
IMO 363
redução de gases do efeito estufa gerados O Brasil, sendo uma das maiores econo- Releva acrescentar que os demais ór- Por motivos evidentes, muitos desses
por embarcações e outras questões ligadas mias do planeta em termos de Produto In- gãos, quais sejam, o Comitê de Coopera- acordos deparam-se com as mesmas difi-
à eficiência energética. Tais iniciativas, ao terno Bruto (PIB) (The World Bank – World ção Técnica (Technical Cooperation) e o culdades, como a morosidade nos proce-
possibilitarem o progresso do transporte Development Indicators), reúne todas as Comitê de Facilitação (Facilitation Com- dimentos de internalização e as necessida-
marítimo mundial e promoverem susten- condições para a obtenção de destacada mittee), respectivamente, auxiliam os Es- des de constantes atualizações. Para ate-
tação financeira para projetos em curso na projeção em uma ampla gama de temáticas tados membros na tarefa de prover conhe- nuar esse problema, vale propor o exem-
IMO, trazem, em seu bojo, amostras de soft em discussão na IMO, sob a ótica do desen- cimento técnico, capacitar os recursos hu- plo ocorrido na Convenção SOLAS/1974,
power2 exercidas por meio da tecnologia. volvimento científico-tecnológico. Para tal, manos e institucionais, no intuito de obter que incluiu um procedimento de aceitação
Por esta razão, as discussões, na IMO, deve valer-se do trinômio Governo, indús- um cumprimento uniforme e eficaz das tácita nos mais variados acordos, ameni-
principalmente aquelas relacionadas a tec- tria e Academia. normas citadas anteriormente, bem como zando, assim, parte dessas dificuldades ao
nologias inovadoras e disruptivas, neces- Especificamente, no que se refere ao simplificar os trâmites para um transpor- dinamizar e agilizar a implementação das
sitam de permanentemente acompanha- segmento Governo, a Autoridade Marítima te marítimo eficiente e livre de obstáculos normas da organização.
mento, pelo potencial de repercussão que Brasileira (AMB) 4, exercida pela Marinha do para navios, cargas e pessoas. Outra importante tarefa desenvolvida
detêm sobre o crescimento e o desenvolvi- Brasil (MB), a quem cabe representar o Esta- A IMO ainda desenvolve um programa pela IMO consiste na efetivação de acordos
mento nacionais e, consequentemente, so- do na IMO (BRASIL, 1999), detém elevado de assistência técnica aos Estados, princi- oficiais de cooperação com outras organiza-
bre a própria economia. A atuação do Brasil, potencial para coordenar e canalizar contri- palmente aos países em desenvolvimento, ções, sendo que 66 acordos já foram reali-
em se tratando de contribuir com sua ca- buição científico-tecnológica expressiva ao para colaborar na ratificação das conven- zados com outras organizações intergover-
pacidade tecnológica e inovadora, na IMO, setor marítimo internacional, promovendo ções e na formulação de políticas nacionais namentais com status de observadoras e 85
representa ponto indiscutível para ocasionar a redução do gap que concorre para afastar de transporte marítimo, sempre objetivan- com organizações não governamentais com
impacto positivo ao Poder Marítimo3. o País das maiores potências do setor. do alcançar um nivelado grau normativo in- status consultivo (IMO, 2022).
ternacional. Nesse sentido, destaca-se, no- O desafio atual da Organização consiste
2. A relevância da atividade normativa da IMO e o desafio da vamente, a atuação do Comitê de Coope- em atuar proativamente na identificação de
Organização em atuar proativamente na identificação de tendências ração Técnica, como um órgão de extrema tendências e desafios nas matérias circuns-
relevância para a garantia de uma eficaz critas ao seu âmbito de atuação, em adotar
A IMO é uma organização internacio- recomendações, entre outros importantes implementação dos instrumentos jurídicos uma aproximação aos referidos problemas
nal de essência técnica, que visa promover instrumentos jurídicos. A tarefa de desen- adotados pela organização. e promover uma efetiva e eficiente respos-
a cooperação entre os Estados, no campo volver acordos internacionais, regulamen- No que tange às recomendações, elas ta, por intermédio do desenvolvimento de
da regulamentação e dos procedimentos tos e medidas relacionadas às referidas servem para orientar os Estados, bem normas e em trabalhar para a implemen-
relativos à segurança da navegação e à matérias é compartilhada pelos órgãos como para auxiliá-los na elaboração de re- tação de seus instrumentos jurídicos nos
proteção e ao controle da poluição pro- que compõem a organização por comitês, gulamentos e de legislações internas. Em Estados- membros (MITROPOULOS, 2005).
vocadas por navios ao meio ambiente com especial relevo para o Comitê de Se- determinados casos, são acompanhadas Além das preocupações com os progres-
marinho. Como um sujeito ativo interna- gurança Marítima (Maritime Safety Com- de disposições que visam esclarecer dúvi- sos científicos e tecnológicos, a IMO vem
cional, é dotado de capacidade jurídica mittee), o Comitê de Proteção ao Meio das de interpretação e garantir uma apli- exercendo importante papel no desenvolvi-
internacional para o desenvolvimento e a Ambiente Marinho (Marine Environment cação uniforme de suas medidas em todos mento sustentável dos oceanos. Para tanto,
produção de normas de interesse coletivo Protection Committee) e o Comitê Jurídico os países que as acolherem. estabeleceu objetivos que pretende perse-
internacional nas referidas áreas, em sin- (Legal) (BIRNIE, 2002, p.59). Essas normas Porém, dependendo da matéria e da im- guir para atingir os seus fins, como tomar
tonia com os preceitos contidos em seu são submetidas à aprovação pela Assem- portância quanto à regulamentação, alguns medidas para implementar uma vigilância
acordo originário. Nesse sentido, deve-se bleia da Organização, que as delibera, instrumentos jurídicos deveriam assumir proativa, para que as tendências que pos-
reconhecer a importância de sua ativida- conferindo a elas a forma de recomenda- uma natureza obrigatória a seus membros. sam afetar a segurança dos navios e as ques-
de normativa. ção, sem natureza vinculativa, ou de na- Porém, como é sabido, o consentimento tões ambientais possam ser identificadas no
A IMO já impulsionou a adoção de tureza vinculativa, como no procedimento em obrigar-se por um tratado é aspecto seu estágio inicial. Ainda quanto a essas
mais de 60 convenções e protocolos, bem de aceitação tácita, contido na Convenção inerente à soberania dos Estados, não po- questões, para prevenir qualquer dano,
como um grande número de códigos e de SOLAS/1974 e suas modificações. dendo, portanto, ocorrer a sua imposição. as medidas e as ações devem reduzir tais

364 ECONOMIA AZUL O Brasil no Arranjo de Poder da IMO 365


efeitos, promover a conscientização das segundo entendimento doutrinário (TRIN- dos Estados com interesses no comércio apontadas pela DOALOS, também é impor-
pessoas, assegurar uma implementação DADE, 2012, p.49), por sua abordagem marítimo e demais usuários do transpor- tante considerar uma crescente apropriação
efetiva das regras e de seus regulamentos, funcional, ao se ocuparem da formação, te e da navegação marítima em geral. Já por parte da IMO das demandas relaciona-
em sintonia com as normas de Direito do da limitação do Direito Internacional e do no que tange ao Comitê de Segurança das à segurança marítima (security).
Mar, desenvolver uma cultura de seguran- preenchimento de lacunas no direito cons- Marítima (Maritime Safety Committee) a Essa crescente atuação vêm sendo
ça e de conscientização ambiental, evitar titucional interno decorrentes do processo sua composição foi alterada para incluir justificada pela ausência de uma organi-
uma regulação excessiva, reforçar os pro- de globalização, nas temáticas relaciona- a participação de todos os membros da zação internacional designada para tal,
gramas de cooperação técnica com outras das à segurança da navegação e da pre- Organização, e não apenas de um seleto pelo próprio reconhecimento da ONU de
Organizações Internacionais, promover venção e do controle da poluição ao meio grupo de Estados que detinham o registro que essas questões deveriam ser objeto
orientações aos Governos e às indústrias marinho provocada por navios. Assinale-se da propriedade das embarcações públicas de estudos por parte da IMO e, por fim,
nos esforços para prevenir e suprimir atos ainda que essa modalidade de constitucio- ou privadas, em atenção ao Parecer Con- devido às próprias demandas e ameaças
contrários às leis de segurança dos navios, nalização, também abrange as formas de sultivo da Corte Internacional de Justiça, que a navegação marítima passou a so-
das pessoas a bordo e do ambiente, para sua operação, tanto pela criação de institui- de 8 de junho de 1960 e, posteriormente, frer. Assim sendo, observa-se que a IMO
além de outros objetivos. ções horizontais ou de coordenação no pla- na emenda ao Acordo Constitutivo da Or- vêm tomando para si, a legitimidade para
Nota-se a importância da IMO na coope- no internacional, como da interação entre ganização de 1974. Esse remodelamento a regulação dessas matérias, demons-
ração internacional e na produção de normas os planos internacional e interno. É o que teve por objetivo a progressiva legitima- trando um alargamento institucional, ao
jurídicas, consolidando o importante fenôme- se verifica na institucionalização da IMO, ção da Organização e de seus órgãos nas empreender ações em temáticas não ori-
no da influência das organizações internacio- na cooperação com outras organizações questões afetas à sua área de atuação e ginárias ao seu âmbito de atuação, e ao
nais na formação do Direito Internacional ou internacionais e no fortalecimento de seu contidas originalmente no tratado de cria- mesmo tempo promovendo a ampliação
no processo da chamada constitucionaliza- relacionamento com os próprios Estados- ção da entidade. de sua legitimidade internacional.
ção do Direito Internacional. -membros, afiançados, dentre outros argu- Com a adequação gradativa do quadro Porém, é preciso considerar que na con-
Pode-se perspectivar que os trabalhos mentos, pelo foco em soluções inovadoras institucional, a IMO visou tornar-se uma dição de sujeito de direitos, há também a
desenvolvidos pela IMO caracterizam-se, e dotadas de elevado padrão técnico. “organização internacional competente”, condição de sujeito de deveres internacio-
nos moldes pretendidos pela CNUDM. Efe- nais, o que significa que, não basta à IMO
tivamente, essa pretensão se fortaleceu a ampliação de sua legitimação internacio-
3. A ampliação da legitimação internacional e a crescente atuação com a publicação da Divisão de Assuntos nal para atuação ativa, mas também é ne-
da IMO em temáticas não originárias Oceânicos e de Direito do Mar (DOALOS) cessário que a Organização assuma a sua
das Nações Unidas (ONU, DOALOS, 1996), legitimação passiva, para suportar o cum-
Para que a IMO desempenhe o seu pa- internos para um alinhamento participa- que considerou a IMO como organização primento das obrigações específicas a ela
pel normativo, tanto em questões inicial- tivo, a Organização buscou, gradativa- internacional designada para diversas te- conferidas pela CNUDM ou por qualquer
mente delineadas em seu acordo constitu- mente, o incremento da participação dos máticas relacionadas aos assuntos marí- outra violação à Convenção, no âmbito de
tivo, como em temáticas contemporâneas, Estados membros no processo decisório e timos contidos na CNUDM. Após o reco- suas competências, bem como nas demais
não originárias e circunstanciais que por- regulatório da instituição, como na altera- nhecimento da legitimidade ativa da Or- matérias por ela incorporadas, como a ver-
ventura venham a ser demandadas, torna- ção do quadro numérico de membros, do ganização para a regulação das temáticas tente security da segurança.
-se imperioso que a Organização detenha Conselho e do Comitê de Segurança Ma-
um arranjo legal, que legitime internacio- rítima (Maritime Safety Committee), a títu-
nalmente as suas ações. lo exemplificativo. Relativamente ao Con-
Por esse motivo, a construção organiza- selho, embora possua um restrito número
cional da IMO sofreu modificações desde de membros, totalizando 40 membros,
a sua criação, quando a Organização ain- a sua conformação lhe conferiu um grau
da denominava-se Organização Consul- de legitimidade em seu processo decisó-
tiva Marítima Internacional – OMCI, até a rio, ao propiciar a moderação de interes-
sua atual composição. Por meio de ajustes ses dos prestadores de serviços marítimos,

366 ECONOMIA AZUL O Brasil no Arranjo de Poder da IMO 367


4. O Brasil no arranjo de poder e de decisão do Conselho da IMO projetos da Organização e o apoio presta- plo papel na temática de Segurança Ma-
do em programas de cooperação técnica. rítima, no caso brasileiro, em decorrência
A estrutura organizacional da IMO cons- o combate, em conjunto com a FAO, da Outra questão que merece menção da citada atribuição dada à Autoridade
titui-se de uma Assembleia, um Conselho, pesca ilegal, não declarada e não regula- versa sobre a assunção de tarefas não tão Marítima acaba por facilitar a articulação
um “Maritime Safety Committee”, um mentada (Illegal, Unreported and Unregu- evidentes pela IMO e sua relação com a e representatividade brasileira por serem
“Marine Environment Protection Commit- lated – IUU – fishing)6. representatividade brasileira. Como co- tarefas acumuladas (safety e security) por
tee”, um Comitê de Cooperação Técnica, mentado, inicialmente, a IMO tinha sua um mesmo titular – o Comandante da
Ao que parece, a IMO não vem pade-
um Comitê de Facilitação, um Comitê Ju- atribuição, em relação à Segurança Marí- Marinha (BEIRÃO, 2012, P. 73-76).
cendo dos males descritos por HERZ
rídico, apoiados pelo Secretariado e por tima, os cuidados apenas com a seguran- Portanto, pode-se afirmar que o ativis-
(HERZ, 2015, p. 08) relativos à falta
subcomitês temáticos de trabalho. Consi- ça da navegação (safety), entretanto, aos mo da representação brasileira tem sido
de legitimidade racional-legal e à fal-
derando não ser a pretensão a análise de poucos vem desempenhando também crescente, junto à IMO, e condizente com
ta de controle sobre o conhecimento
toda a estrutura, enfatizar-se-á a relevância papel de orientadora e regulamentadora os desejos de um Estado com comprovada
técnico e informativo relacionados ao
do Conselho, como o principal arranjo de de questões relativas à security. Esse du- relação intrínseca com o mar.
setor marítimo, o que assevera a con-
poder e de decisão no âmbito da IMO.
tinuidade do crédito conferido, em ní-
O Conselho, em sua originária compo-
vel global, à Organização (ZAMPIERI,
5. Outra forma de poder de atuação na IMO: o soft power pela tecnologia
sição em 1948, contava com 16 Estados
2020, p.33).
membros. No entanto, a segunda metade Para além dos 175 Estados membros e mente, na adoção de novas tecnologias
do século XX assistiu ao surgimento de No contexto brasileiro, o País é mem- dos 3 membros associados que compõem que venham a facilitar e tornar mais viáveis
novos Estados e muitos deles passaram a bro da IMO desde 1963. Em 1967, foi a IMO, a entidade ainda engloba uma sis- e fluidos os processos, o que, por vezes,
ter interesses nos assuntos marítimos, provo- eleito para o Conselho, na ocasião, em temática de diálogo com outras 66 orga- causa disruptura (BRASIL, 2017a, p. 1-1).
cando o incremento no número de membros categoria dos Estados com especial inte- nizações intergovernamentais e outras 85 Nesse sentido, potências tecnológicas ma-
da Organização. Esse fator e a necessidade resse no transporte e na navegação e cuja organizações não governamentais7. Nesse rítimas como China, EUA, Finlândia, Ja-
de assegurar a participação e a representa- participação no Conselho assegurasse re- ambiente, no qual predominam a busca pão e Noruega, dentre outras, já há muito
ção dos países em via de desenvolvimento presentatividade geográfica balanceada – contínua por entendimentos e a adoção compreenderam a importância de se ino-
respaldaram as emendas que elevaram o conhecido como categoria c. No ano de dos melhores padrões técnicos para o se- var no shipping.
número de participantes do Conselho a 18, 1975, foi eleito para a categoria dos Es- tor marítimo, é notório que os Estados É preciso reconhecer que o poder in-
24, 32, 40 e, previsivelmente, ainda nesta tados com o maior interesse no comércio membros busquem influenciar agendas. Tal trínseco associado à tecnologia e inova-
década, a 52 membros, a depender da rati- marítimo internacional, ou categoria b, comportamento se baseia na atração e na ção representa alavanca impulsionadora
ficação de resolução de Assembleia ocorrida sendo reeleito, ininterruptamente, desde persuasão, característicos do soft power. de avanços no setor marítimo, tais como
em 2021, por determinado quantitativo de então, o que denota reconhecimento mas, Na IMO, o soft power pela tecnologia é a construção de embarcações ambiental-
Estados membros. por outro lado, incute uma crescente res- verificado desde a sua gênese, quando da mente mais eficientes e não tripuladas.
Independentemente da reforma no nú- ponsabilidade e necessidade de maior pro- adoção da Convenção IMO, em 6 de março Nesse contexto, destacam-se, como altera-
mero de membros do Conselho, integrá-lo tagonismo no concerto de atores da IMO. de 1948, em Genebra. Segundo estatuído no ções significativas em curso na IMO, com
representa um objetivo traçado por países O pertencimento ao Conselho da IMO artigo 1(a) de sua Convenção, a Organização forte apelo ao soft power na área da tec-
no setor marítimo, tais como o Brasil. representa poder na definição dos rumos deve trabalhar como facilitadora no trato en- nologia, desde 2015, os esforços realiza-
Interessa mencionar que cada vez mais do shipping. Pelo fato de as reuniões da tre governos, para incentivar e para facilitar a dos no combate às mudanças climáticas; o
Estados se apercebem da influência que a Assembleia somente ocorrerem, regu- adoção dos mais elevados padrões técnicos apelo pela regulamentação de navios au-
Organização continua a despertar no sé- larmente, a cada dois anos, os Estados (grifo dos autores) no setor marítimo. tônomos (MASS); e a incorporação de no-
culo XXI, em gama cada vez mais abran- pertencentes ao Conselho têm o destino Nessa concepção, a busca por elevados vos provedores de serviços voltados para a
gente de áreas como o combate ao lixo manifesto de atuar com seu soft power e inovadores padrões repousa, invariavel- segurança dos navios e de seus tripulantes.
plástico marinho5; em questões que se no setor marítimo, influenciando seu fu-
mesclam à vertente security da seguran- turo. Para tal, concorrem ainda, outras ini-
ça, como a questão da pirataria; e como ciativas, tais como o suporte financeiro a

368 ECONOMIA AZUL O Brasil no Arranjo de Poder da IMO 369


6. Um encorajamento ao Brasil para uma atuação mais expressiva no se constitui na formulação de estratégias mais eficientes na matriz de transportes,
âmbito da IMO como contribuinte de CT&I no shipping (BRASIL, 2016 p. 110-288) e de planos de dentre outros, o hidroviário (marítimo e flu-
ação setoriais decorrentes, em suas diver- vial), bem como o incentivo à intermodali-
O protagonismo na IMO não deve ficar da vida humana nas águas, orientação e sas vertentes, pelos entes da administra- dade e à concorrência intramodal e inter-
restrito a Estados com forte predominân- controle da Marinha Mercante brasileira, ção pública federal com atuação na esfera modal (IPEA, 2018), o que vai ao encontro
cia no setor da ciência, tecnologia e ino- preparo e emprego do Poder Naval, e de- marítima. No que se refere ao campo da do propósito de desenvolver tecnologica-
vação (CT&I). Estados como o Brasil, com fesa dos interesses nacionais junto à IMO, estratégia, vale ressaltar que o Ministério mente o setor marítmo nacional.
profunda dependência do mar para trocas considera de alta prioridade a questão da da Economia publicou, no ano de 2018, Mesmo não representando uma estraté-
comerciais, necessitam estar cada vez mais revisão da Política Marítima Nacional e se a Estratégia Nacional do Desenvolvimento gia setorial específica para o setor maríti-
inseridos neste contexto. encontra debruçada no trabalho de coor- Econômico e Social (ENDES)10, com vigên- mo, percebeu-se o destaque dado para a
O Brasil, pela relevância do transporte denação, junto a quatorze ministérios e à cia para o período de 2020 a 2031. A EN- competitividade internacional, por exem-
marítimo para o desenvolvimento nacional Advocacia-Geral da União, para obter, no DES, caracterizada por temáticas diversifi- plo, pelo emprego de modais hidroviários;
e pela capacidade tecnológica que dispõe, menor tempo e com a maior qualidade e cadas voltadas para a elevação da renda e pela proteção das linhas de comunicação
tem condições de promover o fortalecimen- riqueza de detalhes possível, uma solução da qualidade de vida da sociedade e para marítimas, vitais para o progresso; e pela
to e a adoção de iniciativas para as temáticas que congregue esforços multisetoriais por a redução de desigualdades regionais e so- necessidade de adequação às melhores
em curso na IMO, que já vêm afetando, de meio de objetivos marítimos nacionais e ciais pontua alguns desafios que sugerem práticas ambientais, calcadas em emissões
modo irreversível, o shipping. respectivas diretrizes para sua consecução. um setor marítimo nacional mais fortaleci- com baixo teor de carbono.
Existem medidas que vão ao encontro Em que pese outros aspectos nota-se do. É o caso, dentre outros, do aumento A ENDES previu, ainda, como mega-
desse propósito, destacando-se, nesse que o desenvolvimento tecnológico no se- da produtividade da economia nacional; da tendência até 2030, que o ritmo do de-
diapasão: uma atualização de políticas de tor marítimo deve representar um dos pila- consolidação do papel do Brasil no âmbito senvolvimento tecnológico será cada vez
Estado relacionadas ao setor marítimo; o res fundamentais para que ocorra uma Po- internacional; e dos esforços para o País se mais acelerado, com aplicações integradas
fomento da Tripla Hélice nacional (univer- lítica Marítima efetiva, posto que acarreta tornar uma economia resiliente e de baixo e interconectadas, constatação que ratifica,
sidade, indústria e Governo); e o aporte ganhos de produtividade, eficiência e, con- carbono. O eixo estruturante “infraestrutu- uma vez mais, o entendimento de que a in-
de colaborações substantivas na área de sequentemente, o fortalecimento do soft ra”, por sua vez, destaca, na logística, a ne- fluência pelo soft power tecnológico é um
CT&I, prestadas pelas Instituições Científi- power nacional. cessidade de ampliação do uso de modais excelente rumo a seguir.
cas, Tecnológicas e de Inovação brasileiras. Pelo fato de o Brasil ser um País predo-
No que concerne à atualização de po- minantemente exportador de commodi- 7. Considerações finais
líticas de Estado nacionais relacionadas ties, cujos mercados consumidores se en-
ao setor marítimo, frise-se a necessidade contram distantes, a tecnologia representa O artigo apresentou como proposta crescente atuação em temáticas não origi-
de uma política de Estado norteadora de um diferencial. Investimentos maciços no central reflexões sobre o Brasil no arranjo nárias. Nesse contexto observou-se o Brasil
esforços nacionais que concorram positi- setor marítimo devem se valer, por exem- de poder da Organização Marítima Interna- no arranjo de poder e de decisão do Con-
vamente para o setor marítimo. O desa- plo, da otimização de terminais portuários, cional (IMO) e propostas de encorajamento selho da IMO, para além de outras formas
fio em se obter uma política abrangente e com recursos tecnológicos como a internet para uma atuação cada vez mais expressiva de poder de atuação, a exemplo do soft
multissistêmica, vem sendo debatido pelo das coisas (IoT) e a Inteligência Artificial9 e do País na Organização. power pela tecnologia.
Governo, indústria e sociedade8. Essa in- do desenvolvimento do conceito do e-Navi- Para tanto, inicialmente foi apresenta- Foi ressaltado que o Brasil precisa re-
tegração e ação coordenada de diversas gation, destinado a aprimorar a navegação, da uma breve contextualização da IMO e servar adequada atenção e promover o
políticas não é tarefa simples, ainda mais de cais a cais, com serviços relacionados da atuação do Brasil nessa entidade, para fortalecimento e a adoção de iniciativas
quando recebe condicionantes internacio- voltados à proteção e à segurança no mar posteriormente se ponderar a relevância para as temáticas em curso na IMO. Con-
nais, como as da IMO, que acabam por se- e preservação do ambiente marinho, pos- da atividade normativa da IMO e o de- clui-se que para atingir esse propósito,
rem importante variável a ser considerada. sibilitando que a navegação se torne mais safio da Organização em atuar proativa- diversas medidas podem e devem ser ado-
Neste contexto, a Marinha do Brasil, por confiável, mais sustentável e mais simples. mente na identificação de tendências. tadas para que relevante contribuição seja
força das atividades previstas em lei, com foco Uma vez atualizada a política de Estado Seguidamente foi analisada a ampliação apresentada naquela Organização.
na segurança da navegação, salvaguarda para o setor marítimo, o passo subsequente da legitimação internacional da IMO e a Portanto, deve-se manter presente a

370 ECONOMIA AZUL O Brasil no Arranjo de Poder da IMO 371


certeza da imprescindibilidade do mar Afinal, no caso do Brasil, a constatação Notas
para as trocas marítimas e, neste contexto, inexorável é que tudo passou no porão de
para a sobrevivência nacional. um navio mercante. 1 Para maiores considerações sobre a IMO armadores de embarcações de pesca e os
vide os seguintes trabalhos dos autores: próprios tripulantes.
Referências ZAMPIERI, Carlos Henrique de Lima. A im- 7 Dados atualizados em 09 de março de
portância da Marinha do Brasil para o forta- 2022.
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que segurança?. In: BEIRÃO, André Pan- do Instituto Brasileiro de Direito do junto à Organização Marítima Internacional. do Mar (IBDMAR) reconhecendo a relevância
no e PEREIRA, Antonio Celso Alves. Re- Mar (IBDMAR): Contribuições à refor- Tese Curso de Política e Estratégia Marítimas, do debate e desejando contribuir para a ela-
flexões sobre a Convenção das Nações mulação da Política Marítima brasileira, EGN, Rio de Janeiro, 2020. PIASSI, Fabiana boração de propostas e/ou revisão de atos e
Unidas sobre o Direito do Mar. Brasília: relatório técnico, Salvador, 2021. Abreu do Valle Ventura. As prerrogativas da de instrumentos normativos relacionados ao
FUNAG, 2012. IMO. Status of Treaties. Disponível em: Organização Marítima Internacional (IMO) mar e necessários à implementação da nova
BIRNIE, Patricia; BOYLE, Alan. Internatio- <https://gisis.imo.org/Public/ST/Treaties. como sujeito de direito internacional. Disser- PMN, promoveu como temática central de
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ford: Orford University Press, 2002. IMO. Member States. Disponível em:
autores. resultado das discussões pode ser visualiza-
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3 O Poder Marítimo é a projeção do Poder do em: IBDMAR. Conclusões do V Congres-
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rio das Forças Armadas. (MD35-G-01) ONU. Divisão de Assuntos Oceânicos e de de 9 de junho de 1999, a Autoridade Maríti- to, ou então o redirecionamento de navios
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BRASIL. Estado-Maior da Armada. 5 A IMO, desde 2018, engajou-se no com- Estas iniciativas utilizam ferramentas atu-
PIASSI, Fabiana Abreu do Valle Ventu-
bate à poluição causada pelo lançamento de ais da tecnologia, como Machine Learning,
Estratégia de Ciência, Tecnologia e Ino- ra. As prerrogativas da Organização
lixo plástico no mar, por embarcações e insta- segundo comentado na revista Logística &
vação da Marinha. EMA-415. Brasília, Marítima Internacional (IMO) como
lações de apoio, tendo em vista o impacto na Supply Chain.
2017a. sujeito de direito internacional. 2017. economia e na saúde. As ações realizadas pela 10 A ENDES tem o propósito de orientar,
BRASIL. ENDES. Estratégia Nacional de Dissertação (Mestrado) – EGN, Rio de Ja- IMO, neste sentido, guardam relação com o de articular e de influenciar todas as dis-
Desenvolvimento Econômico e Social. neiro, 2017. Objetivo no 14 da Agenda 2030 para o Desen- cussões relativas aos demais instrumentos
Ministério do Planejamento Desenvolvimen- ZAMPIERI, Carlos Henrique de Lima. A volvimento Sustentável, da ONU. existentes no planejamento brasileiro, tais
to e Gestão. IPEA: 2018. Disponível em: importância da Marinha do Brasil para 6 O combate à atividade pesqueira ilegal, como os planos nacionais, setoriais e regio-
http:// antigo.sudam.gov.br/menus/docs o fortalecimento do soft power do não declarada e não regulamentada com- nais e o Plano Plurianual – PPA da União. A
HERZ, Mônica, HOFFMANN, Andrea R., Estado brasileiro junto à Organização preende esforços mútuos de Estados de ENDES foi influenciada pela Agenda 2030
TABAK, Jana. Organizações Interna- Marítima Internacional. Tese Curso de bandeira, Estados portuários, Estados cos- da ONU e orientada sobre três vertentes do
cionais: História e Práticas. São Paulo: Política e Estratégia Marítimas, EGN, Rio teiros, mercados consumidores, organiza- desenvolvimento sustentável: econômica,
Elsevier Editora, 2015. de Janeiro, 2020. ções atuantes na gestão eficiente da pesca, social e ambiental.

372 ECONOMIA AZUL O Brasil no Arranjo de Poder da IMO 373


SEÇÃO O CONHECIMENTO QUE
PRECISAMOS PARA A
3
374 A ECONOMIA AZUL
ECONOMIA AZUL QUE QUEREMOS
Uma Ciência Azul 375
19

OBSERVAÇÃO DOS OCEANOS:


POR QUE MONITORAR PERMANENTEMENTE
OS OCEANOS ATLÂNTICO SUL E TROPICAL?

Janice Romaguera Trotte-Duhá


Carlos Alberto Eiras Garcia

1. Introdução

A palavra “oceanografia”, que signifi- Há uma demanda crescente e urgente


ca “descrição dos oceanos”, aparece no de explorar sustentavelmente novas fontes
idioma português, pela primeira vez, no “verdes” e de energia renovável dos ocea-
final do século XIX. Passaram-se muitos nos, bem como a necessidade de monitorar
anos até que a inteligência acadêmica todas as infraestruturas críticas relaciona-
descobrisse que a oceanografia, junta- das à Economia Azul.
mente com a meteorologia e o sensoria- A disponibilidade pública de informa-
mento remoto, fornecem informações ções sistemáticas e a longo prazo sobre o
indispensáveis sobre o funcionamento da oceano Atlântico serve como elemento ba-
dinâmica climática do planeta, e sobre a silar, ou mesmo o principal eixo condutor,
qual se identifica o papel regulador dos para a transição da Economia do Mar para a
oceanos (TROTTE, J., 2008). Economia Azul, bem como para o fomento
Sistemas de observação e modelagem de seus aspectos vocacionados à inovação e
dos oceanos, em escalas espaciais que va- ao crescimento econômico, conceitos ainda
riam do costeiro ao regional e ao global, pouco explorados para o Atlântico sul.
sempre que disponíveis de forma sistemáti- Alguns questionamentos ainda se fazem
ca e contínua ao segmento econômico das presentes e seguem movendo a comuni-
sociedades locais, provêm as informações dade científica engajada nas atividades de
que permitem o manejo efetivo de ativida- monitoramento oceânico, como:
des marítimas, tornando-as seguras e sus- 1) que tipo de arquitetura científica é ne-
tentáveis. Servem também para um melhor cessária, para que se obtenha o efeito
entendimento sobre como todas as formas desejado, em apoio aos processos de go-
de vida marinha são afetadas pelas mu- vernança do mar e o fomento de políticas
danças ambientais e climáticas. públicas decorrentes? e

376 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 377


2) o que a ciência oceânica pode oferecer, sociedade de distintas formas, dentre es- 2. O Sistema Global de Observação dos Oceanos
hoje, em apoio às transformações susten- tas destacam-se melhor compreensão dos
táveis que, invariavelmente, pautarão uma processos físicos costeiros, maior eficiência O Sistema Global de Observação dos tratégia do GOOS é fornecer até 2030 um
Economia Azul? nas atividades marítimas, apoio sustentado Oceanos (GOOS – Global Ocean Observing sistema observacional integrado que possa
à formação de políticas públicas ambien- System) é liderado pela Comissão Oceano- fornecer informações de alta qualidade e
Exemplos internacionais denotam o dis- tais assim como o monitoramento de seu gráfica Intergovernamental (IOC – Intergo- fundamentais para o setor público e priva-
tanciamento atual em que ainda nos en- cumprimento, proteção ambiental, ativida- vernmental Oceanographic Commission) do na adaptação e mitigação dos impac-
contramos para a obtenção de respostas às des de lazer, dentre outras. Por exemplo, da UNESCO, e apoiado pela Organização tos das mudanças do clima. Esse sistema
questões acima postuladas. Caso contrário, a observação de propriedades meteocea- Meteorológica (WMO – World Meteo- integrado deve absorver inovações tec-
talvez não fosse necessário que a Organi- nográficas é fundamental para empresas rological Organization), pelo Programa nológicas, de forma a responder às neces-
zação das Nações Unidas (ONU) declarasse de petróleo e gás, no apoio de instalações Ambiental das Nações Unidades (UNEP – sidades dos usuários em geral. As ações do
o período de 2021-2030 como a Década de plataformas ou de perfurações seguras United Nations Environment Programme) GOOS devem levar ao maior conhecimento
da Ciência Oceânica para o Desenvolvi- de poços em alto-mar. Empresas do setor e pelo Conselho Internacional de Ciência sobre o estado do mar, proteger a saúde
mento Sustentável (IOC-UNESCO, 2020), portuário também dependem de informa- (ISC – International Science Council). dos oceanos e promover o crescimento
se já dispuséssemos de um caminho bem ções ambientais em regiões costeiras para O GOOS é um programa de observação econômico sustentável. O GOOS, portan-
definido para tal, em prol da sustentabili- entrada e saída de navios de grande porte dos oceanos, por meio de colaboração da to, é um sistema global de observações in-
dade e saúde dos oceanos. A Década do em suas operações portuárias. comunidade internacional, envolvendo ci- tegradas capaz de avaliar a evolução tem-
Oceano surge, pois, da necessidade de se Um panorama de algumas iniciativas entistas, instituições regionais e nacionais poral das propriedades físicas, biológicas
incentivar a pesquisa científica e as inova- brasileiras em curso é apresentado neste (I-GOOS, 1997). Como a observação dos e ecológicas dos oceanos e o seu funcio-
ções tecnológicas voltadas para a limpeza, capítulo, envolvendo órgãos federais, uni- oceanos é fundamental para atingir os namento, ao longo do tempo, fornecerá
segurança e sustentabilidade dos oceanos. versidades, algumas empresas privadas, objetivos fixados na Década dos Oceanos valiosas informações sobre a variabilidade
É também uma oportunidade para que o com foco nas iniciativas associadas ao mo- para Desenvolvimento Sustentável, a es- climática dos oceanos.
país considere possibilidades de se criar um nitoramento oceânico. Destaque é dado ao
novo arranjo institucional, em apoio a uma Programa GOOS-Brasil, coordenado pela
3. A componente brasileira do GOOS
rede integrada de observatórios marinhos Marinha do Brasil (MB), correspondendo A Comissão Interministerial para os Re- de boias fixas para pesquisa e previsão no
no Brasil, onde se incluam, também, as- ao sistema mais longevo existente em âm- cursos do Mar (CIRM) criou, em 1997, o Atlântico Tropical (PIRATA), Rede Perma-
pectos da biodiversidade e da biogeoquí- bito nacional, subsidiando ações que visem Programa GOOS-Brasil, como o objetivo de nente de Monitoramento do Nível Médio
mica dos oceanos, há muito necessários. à maximização dos benefícios socioeconô- ampliar e consolidar um sistema de observa- do Mar (GLOSS-Brasil), Rede de Monito-
A observação de qualidade e contínua dos micos e ao retorno seguro do investimento ção permanente dos oceanos, zona costeira ramento de Ondas em Águas Rasas (Rede
oceanos traz enormes benefícios para a público na área da Economia Azul. e atmosfera, nas regiões do Atlântico Sul e ONDAS), Projeto MOVAR, Rede de Modela-
Tropical. Seria, portanto, a contribuição bra- gem e Observação Oceanográfica (REMO),
sileira ao programa internacional GOOS. Monitoramento Meteorológico Costeiro
A Marinha do Brasil, por intermédio do e Oceânico, Rede Dados, Monitoramento
Centro de Hidrografia da Marinha (CHM), da Célula de Revolvimento Meridional do
coordena a execução do Programa GOO- Atlântico Sul (SAMOC/SAMBAR), Siste-
-Brasil, com a participação de Ministérios ma de Monitoramento da Costa Brasileira
e Secretarias de Governo, universidades, (SiMCosta) e Programa Melhores Práticas
institutos de pesquisas e representantes da na Observação do Oceano (MePrO).
comunidade científica, designados por por- A seguir, uma breve descrição de cada
taria pela CIRM. rede, programa ou projeto que compõem
Atualmente, os seguintes programas de o GOOS-Brasil, os quais, de início, se fazem
observação integram o GOOS-Brasil: Pro- relevantes em temáticas, como é o caso da
grama Nacional de Boias (PNBOIA), Rede Economia Azul.

378 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 379


Programa Nacional de Boias (PNBOIA) Rede de boias fixas para pesquisa Rede Permanente de Monitoramento RS (1962-1963, 2006-2007 e 2013-2016),
e previsão no Atlântico Tropical do Nível Médio do Mar (GLOSS-Brasil) Florianópolis, SC (março de 2002 a maio
O Programa Nacional de Boias (PNBOIA) (PIRATA) de 2005), Pontal do Paraná, PR (Dados
foi criado durante a 2ª Sessão Extraordi- O programa internacional Global Sea do SiMCosta de 2013 a 2015), Santos, SP
nária da Comissão Executiva para o GOOS A rede internacional Prediction and Level Observing System (GLOSS) foi criado (2016 e 2017), Rio de Janeiro, RJ (Dados
Brasil, em setembro de 1997, com o obje- Research Moored Array in the Tropical em 1985 pela Comissão Oceanográfica In- do SiMCosta de 2015 e 2017), Salvador,
tivo de obter e disponibilizar, aos usuários Atlantic (PIRATA), conhecida no Brasil tergovernamental da UNESCO (IOC-UNES- BA (entre 2014 e 2019), Recife, PE (entre
em geral, dados meteoceanográficos de como “Projeto PIRATA”, objetiva aumen- CO) para estabelecer uma rede de obser- 2014 e 2015). A Rede Ondas encontra-se
regiões da plataforma continental brasi- tar o conhecimento e a compreensão das vação de alta qualidade do nível médio do temporariamente desativada. Os dados
leira. Os dados são coletados por plata- interações oceano-atmosfera no oceano mar em escala global. O programa GLOSS pretéritos podem ser obtidos em: https://
formas flutuantes fixas (boias fundeadas) Atlântico Tropical. A cooperação interna- contribui ao GOOS, particularmente, nos redeondas.furg.br/pt/dados.
e móveis (boias de deriva). O PNBOIA é cional envolve instituições do Brasil (INPE módulos sobre clima, processos costeiros
coordenado pelo CHM, com participação e DHN), dos Estados Unidos (NOAA) e e serviços operacionais, buscando o contí- Projeto MOVAR
de várias instituições de pesquisa e uni- da França (IRD, Meteo-France, CNRS e nuo aperfeiçoamento da rede, da disponi-
versidades do país. As boias fixas estão IFREMER). No Brasil, o PIRATA é condu- bilidade dos dados de nível médio do mar, O Monitoramento da Caracterização da
fundeadas ao longo da plataforma con- zido por um Comitê Nacional, presidido além de sempre procurar expandir a rede Estrutura Térmica a partir de Linhas de Alta
tinental brasileira, a profundidades que pelo INPE e com participação das seguin- maregráfica com dados de alta qualidade. Densidade de XBT, entre o Rio de Janeiro
variam entre 50 e 200 m, nas regiões tes instituições: DHN, INMET, FUNCEME, Em 2007, o Plano de Implementação do e a Ilha da Trindade (Projeto MOVAR) visa
Norte/Nordeste e Sul/Sudeste do país. Os IOUSP, UERJ, UFC, UFSC e UFPE. A rede subprograma GLOSS-Brasil foi aprovado no ao estudo e monitoramento da variabili-
instrumentos e sensores acoplados nas PIRATA é formada por uma constelação âmbito Programa GOOS-Brasil. A rede ma- dade oceânica em escalas mais longas de
boias fixas medem as seguintes varáveis de boias fundeadas no Atlântico Tropical regráfica do GLOSS-Brasil conta com esta- tempo (anos e décadas), através de lança-
oceânicas e atmosféricas: temperatura (18 boias fundeadas, sendo 8 de respon- ções distribuídas espacialmente nas regiões mentos de XBT entre o Rio de Janeiro e
da superfície do mar, corrente superficial, sabilidade do Brasil, 6 de responsabilida- norte, nordeste, sudeste e sul, além de Ilha de Trindade (linha de repetição NOAA/
pressão atmosférica, direção e intensida- de da França e 4 de responsabilidade dos incluir estações localizadas nas ilhas oceâ- AOML AX97), com espaçamento varian-
de do vento de superfície, temperatura EUA) cujos instrumentos e sensores cole- nicas mais distantes da costa brasileira. Os do entre 15 mn para regiões oceânicas e
do ar, umidade relativa do ar, radiação tam dados meteoceanográficos para uso dados do GLOSS podem ser obtidos pelo 10 mn para regiões próximas às margens
solar, perfil vertical de temperatura do da comunidade em geral. A manutenção site: https://www.psmsl.org/gloss/. No caso continentais. As séries temporais de XBT
mar, condutividade (salinidade) e direção, da rede PIRATA conta com o apoio logís- do GLOSS-Brasil, os dados estão disponíveis são complementadas com lançamentos
altura e período das ondas. Estima-se que tico da Marinha do Brasil para o fundeio em: http://www.goosbrasil.org/gloss/. de boias de deriva ao longo do trajeto.
uma parceria com outros setores, como a desses instrumentos, mediante o em- As informações da variabilidade temporal
Petrobras, que tem grande interesse nes- prego dos navios hidroceanograficos da Rede de Monitoramento de Ondas de larga escala são comparadas com in-
ses dados, bem como a iniciativa privada, DHN. A rede PIRATA iniciou seus traba- em Águas Rasas (Rede ONDAS) formações de dados oriundos de satélites
possam contribuir para uma melhora nas lhos em 1997 e já distribuiu mais de 120 (temperatura superficial do mar, altimetria
falhas de instrumentos que vêm sendo milhões de arquivos de dados, que foram A Rede de Monitoramento de Ondas em etc.). O projeto completou 86 cruzeiros de
identificadas, e que implicam reduzido utilizados para a geração de mais de 350 Águas Rasas (Rede ONDAS) objetiva coletar repetição, de agosto de 2004 a agosto de
retorno de dados. As boias de deriva são artigos científicos publicados em revistas e distribuir em tempo dados sobre as on- 2021, contando com a participação de 93
lançadas no oceano Atlântico Sul e Tropi- internacionais com corpo editorial (BOU- das de superfície em vários locais da costa pesquisadores embarcados e o lançamen-
cal, com coleta de dados de temperatura RLÈS et al., 2008; 2019). Os instrumen- brasileira. Os dados permitem caracterizar to de 4020 sensores de XBT, representan-
da superfície do mar, corrente superficial, tos e sensores fixados nas boias medem o clima de ondas ao longo do litoral brasi- do uma taxa de sucesso na obtenção de
pressão atmosférica e vento na superfície várias propriedades meteoceanográficas leiro. Ondógrafos foram instalados nos se- dados de 91%. O projeto é coordenado
do mar. Os dados coletados pelo PNBOIA que podem ser acessadas livremente pelo guintes locais ao longo da costa brasileira: por pesquisadores da FURG, UFRJ e NOAA/
são acessíveis pelo site: http://www.goos- site: http://pirata.ccst.inpe.br/pt/acesso-a- Rio Grande, RS (2015 e 2016); São Louren- AOML e apoiado pela SeCIRM/GOOS/
brasil.org/pnboia/. os-dados/. ço do Sul, RS: (2015 e 2019); Tramandaí, Brasil, Marinha do Brasil, CNPq, MCTIC e

380 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 381


NOAA/CPO. Os dados do projeto MOVAR Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Monitoramento da Célula de Sistema de Monitoramento da Costa
podem ser acessados livremente através do Biocombustíveis (ANP). A Universidade Fede- Revolvimento Meridional do Brasileira (SiMCosta)
site: www.goosbrasil.org/movar/dados/ ou ral do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Atlântico Sul (SAMOC/SAMBAR)
https://www.aoml.noaa.gov/ Federal da Bahia (UFBA), o Centro de Hidro- O Sistema de Monitoramento da Cos-
grafia da Marinha (CHM) e o Centro de Pes- O programa South Atlantic Meridio- ta Brasileira (SiMCosta) é um produto da
Rede de Modelagem e Observação quisas e Desenvolvimento Leopoldo Miguez nal Overturning Circulation (SAMOC) foi Sub-rede Zonas Costeiras da Rede CLIMA
Oceanográfica (REMO) de Mello da Petrobras (CENPES) participam criado em 2007 como resultado de uma (http://redeclima.ccst.inpe.br/ ) e INCT
ativamente da REMO. Maiores informações cooperação internacional entre institui- para Mudanças Climáticas. O SiMCosta,
A Rede de Modelagem e Observação podem sem encontradas em: http://www.re- ções de Brasil, Argentina, África do Sul, desde sua criação, em dezembro de 2011,
Oceanográfica (REMO), criada em 2007, é deremo.org.Monitoramento Meteorológico EUA, França, Reino Unido, Alemanha e vem sendo apoiado fortemente pelo Fundo
um esforço multi-institucional na área de Costeiro e Oceânico outros países europeus. O projeto obje- Clima/MMA e o MCTI. O SiMCosta visa à
oceanografia física, de elevado conteúdo A rede de monitoramento meteorológico tiva investigar a componente do Atlânti- implantação e manutenção de um sistema
tecnológico, que incorpora a modelagem costeiro e oceânico coleta dados meteoroló- co da célula de revolvimento meridional observacional, constituído de plataformas
oceânica, o monitoramento e a coleta de gicos que contribuem para as atividades de (MOC), considerado como o mecanismo (fixas, flutuantes ou orbitais) com sensores
dados oceanográficos e a assimilação de previsão de tempo e clima do país, especial- primário de transporte e armazenamen- acoplados para monitorar variáveis climá-
dados em modelos oceânicos, que servem mente para as atividades associadas ao mar. to de calor, água doce, oxigênio e car- ticas essenciais (meteorológicas e oceano-
ao propósito de se obter previsões nu- A rede é composta por estações convencio- bono pelo oceano. A compreensão des- gráficas) em zonas costeiras, como forma
méricas, bem como realizar modelagens nais e automáticas, que pertencem ao INMET sa componente no Atlântico (AMOC) é de fornecer subsídios sobre os impactos das
reversas, para áreas do Atlântico Sul e a e ao CHM e cumprem os procedimentos pre- fundamental, considerando-se que águas mudanças climáticas ao longo da costa do
margem continental brasileira. A disponi- conizados pela Organização Meteorológica quentes e salgadas do Oceano Índico são Brasil. As seguintes variáveis meteorológicas
bilidade desses modelos melhora a segu- Mundial (OMM). Os dados coletados são importadas para o Atlântico, conhecido são medidas: radiação solar, velocidade e
rança das operações de navegação, busca utilizados de diversas formas pelos usuários como o Vazamento das Agulhas. O SAM- direção do vento, temperatura do ar, umi-
e salvamento, exploração do fundo do mar, público e privado, especialmente aqueles que BA é uma nova contribuição ao SAMOC, dade relativa, pressão atmosférica e con-
pesca, atividades esportivas e náuticas, en- visam à caracterização dos eventos atmosfé- visando ao melhor entendimento da va- centração de CO2. No caso da água do mar,
tre outros. Um sistema de previsão oceâ- ricos e seus efeitos ambientais. riabilidade interanual do conteúdo de ca- os sensores são de pressão, condutividade,
nica apoiado pelo REMO foi implantado lor e dos transportes meridionais através temperatura, fluorescência estimulada,
operacionalmente no CHM, produzindo Rede Dados do SAMOC Basin-wide Array (SAMBA) e pH, turbidez, matéria orgânica dissolvida
previsões diárias de 5 dias para uma extensa os impactos na Circulação do Atlântico colorida, velocidade e direção de correntes,
área, incluída entre as latitudes de 36oS a 7oN A Rede Dados atende aos objetivos bási- Sul, no Clima Regional e na estabilidade ondas e altura do nível do mar. Como a
e longitudes 20oW e a costa brasileira (ME- cos do GOOS-Brasil, atuando como sistema da MOC. O projeto é uma iniciativa in- Sub-rede Zonas Costeiras é formada por
TAREA V). Simulações reversas de mais lon- integrador dos dados coletados pelas pla- ternacional cujo objetivo geral é enten- várias instituições de ensino e de pesquisa
go prazo, conhecidas pelo termo hindcasts taformas fixas e móveis com o objetivo de der e observar as trocas interoceânicas e distribuídas ao longo da costa brasileira, o
oceânicos, por outro lado, fornecem uma in- proporcionar acesso em tempo quase real e o transporte meridional de massa e ca- SiMCosta utiliza a infraestrutura de pessoal
terpolação dinâmica consistente de todos os gratuito aos dados georefenciados e quali- lor através de uma seção transversal no e logística dessas instituições, em atendi-
dados disponíveis, tornando-se uma impor- ficados aos usuários em geral, com base na Atlântico Sul. O principal foco do projeto mento aos seus objetivos. O projeto SiM-
tante ferramenta de auxílio para a indústria adoção da filosofia de software livre. A rede é adjacente à costa brasileira, onde está Costa possui sistema modular e integrado
petrolífera offshore, bem como para a Mari- atua na obtenção, no processamento, ar- inserida a rede de observação, consti- de monitoramento de variáveis climáticas
nha do Brasil, que necessita de apoio da mo- mazenamento e na distribuição em tempo tuída de ecossondas invertidas, ADCP e essenciais em zonas costeiras, fundamentais
delagem oceânica, quando em emergências, quase real de todos os dados obtidos pelas marégrafos de fundo. No Atlântico orien- para as atividades econômicas que venham
relacionadas a derramamentos de óleo, bus- diversas redes que compõem o GOOS-Bra- tal, os parceiros da África do Sul também a se desenvolver nessas áreas. Atualmente,
ca e salvamento, dentre outros, que ocorram sil. Ela atua também na atualização e apri- possuem uma rede de observações aná- os módulos de Boias Fixas e Estações Mare-
na METAREA V, sob sua responsabilidade. moramento do conteúdo das páginas do loga, de forma que as observações sejam gráficas, apoiados por Fundo Clima e MCTI,
A REMO é financiada pela Petrobras e pela GOOS-Brasil (http://www.goosbrasil.org) . simultâneas e intercomparáveis. estão em andamento, com 12 (doze) boias

382 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 383


e 12 (doze) estações maregráficas instaladas neste documento, em que a implemen- o nível de implementação do sistema, sua responsabilidade de grupos de pesquisa-
em distintos locais da costa brasileira. O Por- tação de um sistema integrado e susten- performance, fornecimento de dados e im- dores de várias instituições. Outros gru-
tal SiMCosta (www.simcosta.furg.br) dispo- tável de observação dos oceanos passa a pactos para a sociedade. pos serão criados, de forma transversal,
nibiliza os dados meteoceanográficos livre- obedecer aos seguintes princípios: (a) O A linguagem e a arquitetura do siste- que atuarão em conjunto com os grupos
mente em tempo real aos usuários em geral. monitoramento de parâmetros ambientais ma de monitoramento dos oceanos intro- responsáveis pela coleta de dados. São
e estudo de processos oceânicos devem duzidos pelo Framework for Ocean Ob- eles: Melhores Práticas (compartilha-
Programa Melhores Práticas na ser prioritariamente feitos através de me- serving - FOO podem ser resumidas em: mento de dados, desenvolvimento de
Observação do Oceano (MePrO) didas das variáveis essenciais dos oceanos variáveis oceânicas essenciais, requisitos, equipamentos e sensores), Modelagem
(EOVs), conforme definidas pelo programa observação de elementos do sistema, ge- Oceânica (hidrodinâmica, ondas, disper-
O Programa Melhores Práticas na Ob- Global Climate Observing System (GCOS), renciamento de dados e produtos de in- são de poluentes) e Rede Dados. A Rede
servação do Oceano (MePrO), coordenado e composto de variáveis físicas, químicas e formação, níveis de prontidão, incorpora- Dados é responsável pelo gerenciamento
pela COPPE/UFRJ, consiste num programa biológicas (ou grupo de variáveis) que con- ção de observações costeiras e oceânicas, e distribuição dos dados coletados pelos
de alcance nacional, multidisciplinar, trans- tribuem para caracterizar o clima terrestre; bem como loops de feedback, abordando instrumentos e sensores das plataformas,
versal às demais ações de monitoramento (b) A implementação das redes de obser- desafios e necessidades sociais (Figura 1). e o programa Melhores Práticas tem por
de regiões costeiras e oceânicas, que busca vação deve levar em consideração o nível Considerando-se as reflexões realiza- objetivo a definição de estratégias e pro-
as melhores práticas em medições meteo- de relevância social e científica, bem como das pela comunidade científica interna- cedimentos de melhores práticas de ob-
ceanográficas. O projeto envolve uma série a sua viabilidade observacional; (c) A im- cional, bem como de usuários de ob- servação dos oceanos e zonas costeiras.
de atividades, associadas ao desenvolvimen- plementação de boas práticas de obtenção servações oceânicas e costeiras no país, A Figura 2 ilustra a nova proposta organi-
to e documentação de métodos, protocolos, dos dados é altamente recomendada, sem- o Programa GOOS-Brasil também vem zacional do Comitê Executivo do GOOS-
procedimentos e padrões comuns na reali- pre em busca do melhor e mais eficiente realizando discussões sobre sua reestru- -Brasil, em fase de aprovação pela CIRM.
zação de amostragens e medições, a criação planejamento, de forma a garantir a pre- turação, tendo em conta os princípios O GOOS-Brasil terá três painéis de es-
de laboratórios de calibração de instrumen- cisão almejada para cada EOV medida; (d) básicos do Framework of Ocean Obser- pecialistas para assessoramento científico
tos, aprimoramento de sistemas de arma- Participação de especialistas que poderão ving (LINDSTROM et al., 2012), a expe- em Oceanografia e Clima, Biogeoquímica
zenamento e disponibilização de dados e auxiliar na elaboração dos programas de riência positiva de outros programas de e Biologia e Ecossistemas. Os especialistas
metadados, desenvolvimento de sistemas de observação específicos, envolvendo desde observação dos oceanos, como o Inte- identificarão as variáveis essenciais dos
controle de dados e fomento geral à coope- os padrões de amostragem, melhores prá- grated Marine Observing System (IMOS) oceanos (EOVs, Essential Ocean Variables)
ração nacional e internacional em pesquisa e ticas, sempre visando ao alinhamento de da Austrália e o European Global Ocean a serem medidas ao longo da costa bra-
desenvolvimento na área de metrologia para suas operações com o plano estratégico do Observing System (EuroGOOS) da União sileira, desenvolverão estratégias de im-
instrumentação oceanográfica. O programa GOOS; (e) Os sistemas de observação de- Europeia. A reformulação do GOOS-Bra- plementação das observações das EOVs e
MePrO se propõe a ser o núcleo de coorde- vem melhorar os níveis de disponibilidade sil está sendo proposta de forma a mo- promoverão padrões e interoperabilidade
nação/orientação do grupo de “melhores dos dados, dos elementos do sistema de dernizar sua estrutura, organizando-o de dados e informações. A interação dos
práticas” no GOOS/Brasil, em atendimento observação e do sistema de coleta e o con- de acordo com a especialidade de seus especialistas com as diversas redes de ob-
ao documento Global Ocean Observing Sys- trole de qualidade e distribuição de dados, integrantes e do sistema e/ou metodo- servação já existentes no país é prevista e
tem 2030 Strategy (de maio de 2019). permitindo assim o seu funcionamento au- logia de coleta de dados empregados. considerada fundamental para o sucesso
tomatizado, sistemático e ininterrupto; (f) A Na nova reformulação do GOOS-Brasil, do Programa GOOS-Brasil. Com essas mu-
Reformulação do GOOS-Brasil inovação e a pesquisa de novos instrumen- estão previstas as seguintes plataformas danças, espera-se que toda a comunidade
tos e métodos devem ser sempre incenti- de coletas de dados: Autônomas (glider/ oceânica e costeira brasileira una esfor-
O Framework for Ocean Observing (FOO), vadas; (g) O sistema de sistema de obser- AUV, derivadores/ARGO etc.), Remotas ços, mobilize recursos, estabeleça parce-
publicado em 2012, serviu de base para o vação deve ser constantemente avaliado, (sensoriamento remoto, radar HF, drones rias com o setor privado e o público em
aprimoramento que vem sendo buscado, no buscando identificar mudanças nos níveis etc.), Fixas (estações terrestres, maré- geral, em seus distintos níveis, bem como
âmbito do Programa GOOS-Brasil, em estri- de prontidão e riscos para a sua sustenta- grafos, plataformas flutuantes, fundeios os organismos e institutos internacionais,
ta aderência às tendências que vêm se ob- bilidade; (h) A avaliação deve ser baseada etc), e Móveis (hidrografia, navios de igualmente usuários das informações ge-
servando, em nível internacional, pautadas em métricas que permitam determinar oportunidade, animais marinhos), sob a radas para o Atlântico Sul e Tropical.

384 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 385


Figura 2. Proposta de nova estrutura organizacional do GOOS-Brasil
Figura 1. Diagrama representativo dos elementos Framework
for Ocean Observing (FOO), utilizado pelo GOOS GOOS-BRASIL
COI COORDENAÇÃO SECIRM
GERAL
Framework for Ocean Observing Process Diagram

MMA MEC MME MD MCTI

Issues PLATAFORMAS PLATAFORMAS PLATAFORMAS PLATAFORMAS


AUTÔNOMAS REMOTAS FIXAS MÓVEIS MELHORES
Measurement Needs PRÁTICAS

GLIDERS/ MARÉGRAFOS
MODELAGEM
Essential Ocean Variables AUV/ ASV
SENSORIA- HIDROGRAFIA HIDRODINÂMICA
MENTO FUNDEIOS
REMOTO ÁGUAS RASAS MODELAGEM
DERIVADORES/ ONDAS
ARGO FUNDEIOS NAVIOS DE
Buoys, Satellites ÁGUAS OPORTUNIDADES
Aircraft PROFUNDAS REDE
Moorings DADOS
Data Assembly
Data Products

RASTREAMENTO
Issues Impact

(ROVs) (AUVs) ESTAÇÕES


DE ANIMAIS
Ships of Remotely Autonomus TERRESTRES
Creation

MARINHOS
Opportunitiy Operated
Underwater
(HF) High, Vehicles Fonte: GOOS-Brasil, 2022
Vehicles
Frequency
Radar
Floats, Sub-surface Drifters 4. Outros sistemas de observação e modelagem oceânica
disponíveis no Brasil
Observations Deployment
Observatório Costeiro da de auxiliar diversos setores socioeconômi-
and Maintenance Amazônia (OCA) cos da região, a partir de modelos hidro-
dinâmicos em escala regional (toda a zona
Fonte: Lindstrom et al., 2012 Devido à dimensão territorial, alta com- costeira da Amazônia) e em escala local
plexidade e importância da zona costeira (pequenos estuários e planícies alagadas).
amazônica no contexto global, o Observa- Além disso, o OCA desenvolve projetos de
tório Costeiro da Amazônia (OCA) foi cria- ciência cidadã, para integrar conhecimen-
do para sistematizar e padronizar os dados tos científicos e tradicionais, nas questões
meteoceanográficos que vêm sendo cole- do monitoramento ambiental marinho.
tados, disponibilizando-os e promovendo o Em particular, o Observatório vem apoian-
desenvolvimento científico multidisciplinar do o desenvolvimento científico e publi-
na região. Modelos operacionais meteocea- cações em temas primordiais e peculiares
nográficos estão sendo desenvolvidos pela para aquela região, como a propagação da
plataforma OCA-Predict, com o propósito maré (ROLLNIC e ROSÁRIO, 2013; PRESTES

ECONOMIAAZUL
386 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 387
et al., 2017), modelo de descarga (BORBA estações fixas conforme aquelas existentes de instituições formadas por este Edital, o no-atmosfera; 6. Serviço de supercompu-
e ROLLNIC, 2016; PRESTES et al., 2020), na rede SiMCosta, bem como a manuten- MCTI realizou encomenda visando ao de- tação e armazenagem de dados; 7. Estudo
Amazon Plume (MASCARENHAS et al., ção de iniciativas de pesquisa ecológica a senvolvimento do Sistema Multiusuário de sistemas marítimos não tripulados; e 8.
2016), intrusão de sal em estuários (VALEN- longo prazo (LTER/PELD) são estratégicas de Detecção, Previsão e Monitoramento Estudo de constelação de satélites. Algorit-
TIM et al., 2018), microplástico (NOVAES et para a avaliação permanente do estado de de Manchas de Óleo no Mar – SisMOM, mos de inteligência artificial serão aplica-
al., 2020) e meiofauna (BAIA et al., 2021). acidificação dos oceanos e seu impacto na apoiado com recursos emanados do Fundo dos transversalmente às oito metas do pro-
biodiversidade no país. Nacional de Desenvolvimento Científico e jeto, sendo que o produto final esperado é
Rede Brasileira de Pesquisa em Tecnológico (FNDCT), por meio da Finan- um conjunto de informações em suporte à
Acidificação dos Oceanos (BrOA) Sistema Multiusuário de Detecção, ciadora de Estudos e Projetos (FINEP). O vigilância das AJB pelas autoridades mari-
Previsão e Monitoramento de SisMOM envolve 21 instituições e mais de nhas e ambientais brasileiras.
A acidificação dos oceanos refere-se ao Manchas de Óleo no Mar – SisMOM 100 (cem) cientistas, representando inicia- O SisMOM será implementado com
declínio do pH da água do mar, concentra- tiva de cooperação técnico-científica inte- o acompanhamento do pessoal da Ma-
ção de íons de carbonato e a consequen- A poluição marinha decorrente de ativi- rinstitucional, voltada ao monitoramento e rinha do Brasil engajado na implantação
te diminuição do estado de saturação de dades antrópicas, como derramamentos de modelagem oceânica para a detecção de do Sistema de Monitoramento da Ama-
carbonato de cálcio na água do mar. Essas óleo, lançamento de lixo, sobretudo plásti- derrame de óleo no mar. O projeto é cons- zônia Azul (SisGAAz), que visa monitorar,
mudanças na química da água do mar são cos (do macro ao microplástico) e de produ- tituído por oito metas interconectadas, de forma integrada, as AJB e as áreas in-
causadas pelo aumento da concentração tos químicos no mar representam uma cres- a saber: 1. Detecção de embarcações no ternacionais sob responsabilidade do país,
atmosférica de CO2 das emissões humanas cente ameaça aos ecossistemas marinhos. mar; 2. Detecção de manchas de óleo no para apoio em operações de busca e resga-
e pela subsequente absorção pelos ocea- O projeto de desenvolvimento de Sis- mar; 3. Modelagem da dispersão de óleo te e resposta rápida em casos de ameaça,
nos de cerca de um terço do excesso de tema Multiusuário de Detecção, Previsão no mar; 4. Sala de situação integradora das emergência, desastre ambiental, conflito
carbono na atmosfera (DONEY et al., 2009; e Monitoramento de Manchas de Óleo no metas 1 a 3; 5. Modelagem acoplada ocea- ou atividade criminosa.
JIANG et al., 2019). Mar – SisMOM nasce da constatação de
A Rede Brasileira de Acidificação Oce- uma necessidade inadiável de vigilância 5. Redes de Observação a partir de plataformas orbitais
ânica (BrOA) foi criada em 2012 por um sobre incidentes por derrame de óleo em
grupo de cientistas interessados no ciclo águas jurisdicionais brasileiras (AJB), a par- O uso de ferramentas de sensoriamen- a investigação da bomba biológica do car-
do carbono marinho e nos efeitos antro- tir do colossal derramamento de óleo que to remoto para monitorar os oceanos é bono; a conversão de medidas in situ do
pogênicos de CO2 na água do mar. A rede atingiu o litoral do Brasil durante os meses um elemento facilitador para uma melhor comportamento das partículas para es-
hoje conta com pesquisadores de 14 uni- de agosto e dezembro de 2019 (SOARES et compreensão cientifica do oceano, gan- timar a exportação global, conversão de
versidades e instituições de pesquisa no al., 2022; NOBRE et al., 2022). hos de eficiência econômica e operacional, observações com sensores óticos em ta-
Brasil, cujo principal tema de pesquisa é Várias iniciativas foram empreendidas apoiando uma ampla gama de benefícios manho, tipo, concentração e fluxos de
a observação de áreas costeiras marinhas pelo poder público federal e estadual, que sociais e econômicos relacionados à se- partículas nos oceanos; a reconstrução de
e oceânicas abertas (KERR et al., 2016), culminaram na abertura de frentes de fi- gurança e soberania nacional, eficiência perfis verticais de propriedades mapeadas
compreendendo a avaliação dos efeitos da nanciamento para projetos de pesquisa. operacional e regulação de atividades cos- superficialmente pelos sensores remotos;
acidificação dos oceanos em organismos Dentre esses, destacou-se a Chamada Pú- teiras e oceânicas (LENTINI & MENDONÇA, as análises e detecção de padrões de estru-
marinhos por meio de bioensaios ou em blica MCTI/CNPq n. 06/2020, na qual 15 2022), consequentemente, de elevada im- turas de mesoescala nos oceanos e zonas
estudos in situ. A rede BrOA identificou projetos de pesquisa foram contemplados portância para a Economia Azul. costeiras (frentes oceânicas, vórtices, etc.).
os ecossistemas mais sensíveis à acidifica- e, mediante a adição de recursos financei- Quando se reúnem resultados de ex- O uso de sensores passivos e ativos a
ção dos oceanos como os recifes de coral ros de parte da Marinha do Brasil, foram perimentos em laboratórios, modelagem bordo de satélites que detectam radiação
e leitos de rodolitos ao longo da platafor- contemplados quatro projetos voltados e análises dos dados obtidos in situ e por eletromagnética de diferentes partes do es-
ma leste e nordeste do Brasil. A extensão exclusivamente para o monitoramento e satélites, grandes avanços ocorrem no pectro é hoje uma realidade e significantes
e heterogeneidade do litoral brasileiro e a a previsão de manchas de óleo nas AJB. campo da pesquisa oceânica, plenamente avanços ocorreram nas últimas décadas.
Zona Econômica Exclusiva constituem um Com base no ganho de qualidade previs- aproveitáveis pelo setor produtivo nacional Diferentes agências espaciais, em especial a
desafio a ser superado. Séries de tempo de to pelo trabalho cooperativo entre as redes e internacional. Citam-se, como exemplos: Agência Espacial Europeia (ESA – European

388 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 389


Space Agency) e a Agência Atmosférica sensores capazes de obter imagens mul- Sentinel (Sentinel-1, Sentinel-2, Sentinel-3 O Ministério da Ciência, Tecnologia e
Espacial Americana (NASA – National Ae- tiespectrais de regiões oceânicas e costeiras e Sentinel-5P) pelo site: Open Access Hub Inovações (MCTI) e a Comissão Europeia
ronautics and Space Administration ) lan- (resolução espacial de 10m), permitindo, (https://scihub.copernicus.eu/ ). firmaram, em 2018, um Arranjo de Co-
çaram missões e programas de observação por meio de algoritmos específicos, obter Muitos são os exemplos de monitora- operação no contexto do Programa Co-
dos oceanos nas últimas quatro décadas, e informações espaciais sobre a concentra- mento que podem ser realizados com o pernicus (https://www.rnp.br/noticias/co-
os dados coletados por esses sensores for- ção de material em suspensão, concentra- uso de imagens de satélites geradas pelo pernicus-tecnologia-aliada-observacao-
necem séries suficientemente longas e que ção de clorofila-a e concentração de mate- Programa Copernicus, como a qualidade -da-terra). Dentro desse acordo, a Agên-
permitem realizar estudos sobre a variabi- rial orgânico dissolvido no oceano; o Senti- da água, as florações de algas nocivas, o cia Espacial Brasileira (AEB), o Instituto
lidade de variáveis essenciais climáticas e nel-3, lançado em 2016, leva o sensor OLCI mapeamento de zonas propícias à pesca, Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e
assim melhor compreender os fenômenos (Ocean and Land Colour Instrument) para a erosão costeira, o derramamento de óleo a ESA firmaram um Arranjo de Coopera-
físicos, biológicos e bioquímicos que ocor- observar as propriedades que conferem a no mar e como contribuição e proteção da ção Técnica, com vigência até 2024, para
rem nos oceanos e zonas costeiras. cor da água do mar (fitoplâncton marinho, biodiversidade marinha. tratar de acesso aos dados Sentinel, ativi-
A ESA lançou uma série de missões nas material particulado em suspensão e maté- A disponibilização de serviços pelo Pro- dades de calibração de dados e desenvol-
duas últimas décadas, voltadas para as ria orgânica dissolvida colorida), juntamen- grama Copernicus que permitem o acesso vimento de aplicações.
observações oceânicas, de forma a moni- te com sensores que medem a temperatura tempestivo a dados e informações confiá- Finalmente, de acordo com Rayner et al.
torar variáveis importantes, como o nível da superfície do mar (SLSTR – Sea and Land veis sobre meio ambiente, proteção civil e (2019), há quatro tipos de “usuários finais”
do mar, estado do mar, temperatura da Surface Temperature Instrument) e o nível segurança do cidadão fazem parte da Es- e beneficiários das observações derivadas
superfície do mar, espessura do gelo mari- do mar (SRAL – SAR Radar Altimeter); o tratégia Europa 2020 para um crescimento de satélites e plataformas de coleta de da-
nho, cor dos oceanos, salinidade do mar, Sentinel-4, orientado para monitoramen- inteligente, sustentável e inclusivo daquela dos (PCDs): os “cientistas”, que realizam
dentre outras variáveis. to da qualidade do ar e aerossóis sobre a região. O Programa vem beneficiando po- atividades de pesquisa baseando-se total
Em 2014, a Comissão Europeia, em con- Europa; e, por fim, os satélites Sentinel 5 líticas públicas estabelecidas pela UE, em ou parcialmente em medições e observa-
junto com a ESA e os Estados Membros da e Sentinel 5P, que auxiliam no serviço de especial mediante o desenvolvimento de ções marinhas; os “operadores”, que fa-
União Europeia (UE), estabeleceram o Pro- monitoramento da atmosfera terrestre. uma política espacial eficaz, que dispo- zem uso de dados oceânicos e informações
grama Copernicus, que vem a ser o Progra- Com a criação do Programa Copernicus, nibilize os instrumentos necessários para para apoiar as suas necessidades operacio-
ma Europeu de Observação da Terra, criado a ESA tem procurado fornecer, de forma di- enfrentar alguns dos principais desafios nais relacionadas à segurança, eficiência
pelo Regulamento 377/2014 do Parlamento reta e gratuita, observações por satélites e globais, bem como para cumprir os objeti- econômica e proteção do meio ambiente
Europeu, e possuindo características de con- aquelas obtidas em campo aos usuários em vos relacionados em matéria de alterações marinho; os “agentes políticos”, no apoio
tinuidade ao programa GMES (Global Moni- geral, com o propósito de ajudar a compre- climáticas e sustentabilidade energética e formulação de políticas públicas, bem
toring for Environment and Security). ender melhor o planeta Terra e encontrar [em: REGULAMENTO (UE) N. 377/2014 DO como o monitoramento do seu cumpri-
O objetivo maior do Programa Coperni- formas de sua gestão sustentável. Os ser- PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, mento e eficácia; e os “agentes públicos”,
cus é fornecer serviços baseados em dados viços oferecidos aos usuários do Programa de 3 de abril de 2014, que cria o progra- que têm como interesse geral o uso de da-
de satélite e in situ (ou seja, coletado em Copernicus se baseiam em dados obtidos ma Copernicus]. (https://www.dgterritorio. dos e informações das regiões costeiras e
campo), que permitem observar o estado no mar por boias instrumentalizadas, esta- gov.pt/sites/default/files/ficheiros-cartogra- oceânicas para apoiar atividades de lazer
do nosso planeta. Para isso, o Programa ções meteorológicas e redes de monitora- fia/Regulamento_377_2014.pdf ). ou atividades recreativas.
planejou um conjunto de missões “sateli- mento da qualidade do ar, que integradas
tárias”, chamadas Sentinel (sentinela, em são utilizadas para calibrar e validar os da-
português), coordenado pela ESA, em que dos obtidos pelos sensores dos satélites. No
cada missão Sentinel foca em um aspecto caso dos serviços marinhos, que contem-
da observação da Terra, da atmosfera, dos plam a observação dos oceanos e de zonas
oceanos e da cobertura terrestre, confor- costeiras, esses dados podem ser acessados
me a seguir: o Sentinel-1 leva consigo um pelo site: https://insitu.copernicus.eu/ . O
Radar de Abertura Sintética (SAR – Synthe- Programa Copernicus oferece também os
tic Aperture Radar); o Sentinel-2 carrega produtos derivados da família de satélites

390 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 391


6. Perspectivas futuras internacionais, sempre que possível, e bus- Apesar das restrições orçamentárias
cando, via empreendedorismo, recursos da enfrentadas pelo setor de Ciência, Tec-
Os sistemas de observação e modela- mais disseminadas e “emprestadas” a ou- iniciativa privada, para a completa utiliza- nologia e Inovação nos últimos anos (AN-
gem dos oceanos instalados no país preci- tras regiões no Brasil, preferencialmente ção das informações que são prestadas. GELO, 2019), estima-se que, com a im-
sam estar conectados a sistemas regionais mediante um programa de incentivo que Somente assim será possível antever que plementação da nova Organização Social
e globais análogos, permitindo o correto envolva setores que se beneficiem com observatórios oceânicos e costeiros pode- para o Mar (OS para o Mar), será dado um
monitoramento da dinâmica dos oceanos, o engajamento em redes observacionais rão evoluir de forma sustentada e propor- importante passo na integração de obser-
quase sempre impulsionada por processos costeiras. São vários os exemplos de su- cionando maior retorno às sociedades lo- vações, infraestrutura de pesquisa e siste-
físicos, mas também químicos e biológicos, cesso do uso de sistemas observacionais cais e aos interesses comerciais, a partir dos mas de modelagem operacional em todo
em diferentes escalas temporais e espaciais, pelo setor portuário e de exploração de recursos investidos. o país (FRANZ et al., 2021).
processos esses que não obedecem a fron- gás e petróleo.
teiras jurídicas. Embora este capítulo descreva algumas Conclusões
Por meio dos modelos numéricos ope- interações e iniciativas em curso no país, a
racionais que se apoiam nos dados obtidos infraestrutura de apoio à pesquisa oceânica Fica entendido, de forma inequívoca, observações e informações oceânicas jul-
a partir dessas redes de observação insta- representa o principal fator de restrição à ser imprescindível a obtenção de dados gadas estratégicas para a provisão de in-
ladas in situ e aquelas a partir de platafor- integração e a continuidade sustentável de oceânicos e a partir de plataformas orbi- sumos e o fortalecimento de decisões mais
mas orbitais, passa a ser possível antecipar tais observações oceânicas, revelando cená- tais remotas, para uma previsão climática assertivas, contribuindo assim para que se
eventos extremos (por exemplo, inunda- rio de instabilidade para o reconhecimento e oceânica capaz de assessorar aos setores possam vencer os crescentes desafios de
ções costeiras, poluição marinha, floração dos sistemas de observação como o “mo- produtivos do país, seja em terra, seja no mercado futuro e a Economia do Mar. Para
de algas nocivas etc.), prever a trajetória tor” para a Economia Azul, cenário esse que mar, dentro do conceito da Economia Azul. tal, o estabelecimento de mecanismo de
de poluentes liberados em regiões distan- merece reflexões e correções de rumo. É imprescindível que se desenvolva, via governança que promova, de fato, a ma-
tes nos oceanos, ou mesmo costeiras (por Ademais da necessidade de se dispor uma rede de pesquisa, estruturada para nutenção de cadeia produtiva dos diversos
exemplo, derramamentos de óleo no mar de um quadro institucional capaz de criar atuar em nível tático-operacional, um sis- polos de produção e aglomerados permitirá
a partir de embarcações ou operações de e manter uma rede de observatórios inte- tema integrado de dados e informações o aquecimento da economia local e a gera-
rotina), bem como em auxílio a tendências grada, sem sobreposições e vocacionada que nos permita não somente obter bons ção de volume de negócios, os quais, por
futuras de eventos sobre as regiões cos- aos aspectos de apoio e assessoramento resultados, mas, e o que é mais impor- sua vez, justificarão eventuais investimen-
teiras. Para que haja melhor acurácia nos a uma Economia Azul no Atlântico tro- tante, os efeitos desejados, em apoio à tos da área das observações oceânicas.
modelos de previsão, estes devem ser vali- pical e sul, é necessário reconhecer que Economia do Mar. Finalmente, como proposição futu-
dados por observações in situ, observações a formação de recursos humanos e o O desenvolvimento de novas tecnolo- ra, fica o reconhecimento inconteste
satelitárias e técnicas aprimoradas de assi- emprego otimizado de recursos financeiros gias, como veículos autônomos e drones das prementes necessidades observa-
milação de dados (DAVIDSON et al., 2019). são elementos “pétreos”, para a garantia subaquáticos, capazes de promover maior cionais de dados oceânicos e o estímulo
A disponibilidade pública de informações e a manutenção das iniciativas ora exis- agilidade de operações, sobretudo no setor para que se ampliem as discussões so-
sistemáticas em tempo real sobre os oceanos, tentes e a sua correta apropriação, pelos de óleo e gás, bem como reduzir operações bre como agregar futuros usuários, mo-
em distintas escalas (global, mares regionais setores produtivos do país. complexas de mergulho no mar, são fatores tivando um maior nível de participação
e regiões costeiras) é elemento fundamental Cabe ressaltar que a maioria das redes de que conferem redução de custos na gestão empresarial, em benefício de um sistema
para um crescimento econômico sustentável, observação aqui listadas dependem de pro- de ativos de grandes embarcações. capaz de apoiar, de forma sustentável, as
pautado na Economia Azul. jetos de pesquisa financiados pelo Governo Espera-se que os modelos de negócios atividades futuras a serem realizadas, em
Estudos de caso já disponíveis no país Federal, que são de natureza curta, em geral, a serem implementados na região brasilei- benefício do desenvolvimento de uma
demonstram aspectos práticos de econo- de 5 anos, não dispondo de mecanismos de ra do Atlântico sul possam se valer dessas Economia Azul no Brasil.
micidade, com a entrada dos dados oceâ- financiamento mais longevos, diversificados,
nicos nos modelos de negócios, por exem- capazes de promover o alinhamento entre
plo, em áreas portuárias. Torna-se, portan- as iniciativas nacionais e regionais, o setor
to, imprescindível que essas práticas sejam produtivo, integrando-se com programas

392 ECONOMIA AZUL Observaçãodos


Observação dosOceanos:
Oceanos 393
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394 ECONOMIA AZUL Observação dos Oceanos 395


20

OCEANO E CLIMA: NOVOS DESAFIOS


ADVINDOS COM AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Moacyr Cunha de Araújo Filho


Letícia Cotrim da Cunha
Gbekpo Aubains Hounsou-Gbo
Regina Rodrigues
Carlos Alessandre Domingos Lentini

1. Introdução

As regiões que possuem parte significa- 2019, para o caso do semiárido brasileiro).
tiva de suas economias baseadas na produ- Carro-chefe das exportações brasileiras, por
ção agrícola e/ou pecuária dependente da exemplo, as análises alertam para os riscos
chuva são muito vulneráveis à variabilidade do agronegócio, uma vez que a redução
climática interanual, com impactos socioe- da produtividade da agricultura e pecuá-
conômicos notáveis sobre a população lo- ria trará consequências importantes para a
cal. As constatações do último relatório do economia nacional e para a subsistência e
grupo de trabalho acerca das bases científi- para a segurança alimentar e nutricional de
cas das alterações do clima, elaborado pelo milhares de pessoas.
Painel Intergovernamental sobre Mudan- Mas os impactos não se limitam à pro-
ças Climáticas (IPCC, 2021), indicam que dução de alimentos em terra. As mudanças
as mudanças climáticas terão um profundo climáticas irão provocar alterações impor-
impacto em todo o sistema de produção tantes também na pesca comercial e de
alimentar no mundo, com consequências subsistência em água doce e marinha e na
negativas para a produção agrícola, com aquicultura. O aumento da temperatura dos
risco inclusive do incremento da fome e oceanos, em particular nas regiões tropicais,
consequente intensificação de processos tem provocado ameaças já visíveis sobre di-
migratórios em vários locais do planeta. ferentes ecossistemas marinhos, como os
Um exemplo-chave é a relação direta recifes de corais, que possuem papel-chave
entre o desmatamento da Floresta Ama- na manutenção da biodiversidade e do ci-
zônica e a dinâmica econômica nacional, clo de vida de milhares de espécies. Para
envolvendo riscos à manutenção das segu- além do feito de estresse térmico, essas al-
ranças alimentar, energética, hídrica e so- terações têm modificado a troca oceano-
cioambiental do país (e.g., ARAUJO et al., atmosfera de CO2, resultando na acidificação

396 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 397


das águas, com impactos importantes so- na sua estrutura ecológica, funções e provi- incêndios na Amazônia em compara- este modo equatorial interage com o
bre várias espécies, muitas delas de alto são de bens e serviços. Ademais, são espe- ção com os 12 anos anteriores (JIMÉNEZ- ENOS através de teleconexões atmosfé-
valor econômico. Essas mesmas alterações rados: perda de terras, perda/realocação de -MUÑOZ et al., 2016). O mesmo evento de ricas (RODRIGUEZ-FONSECA et al., 2009;
de temperatura têm também causado mo- sítios culturais e históricos, perdas agríco- El Niño de 2015-16 agravou o longo pe- KEENLYSIDE et al., 2013). É indicado que o
dificações significativas na variabilidade na- las, salinização da vegetação e de recursos ríodo de secas de 2012-2016 no Nordeste Atlantic Niño (índice ATL3: calculado a par-
tural do clima das regiões continentais ad- aquáticos, erosão/progradação de praias, do Brasil (MARENGO et al., 2018). Cerca tir de anomalias de TSM na região 3°N-3°S,
jacentes, com o aumento do nível do mar alteração dos estoques pesqueiros, danos à de 33 milhões de pessoas foram afetadas 20°W-0°) está negativamente correlaciona-
e da intensidade e frequência de ocorrência infraestrutura portuária, urbana e turística pelas secas no Nordeste do Brasil, ocasio- do com o ENOS no Pacífico (índice Niño3:
de ondas de calor e de eventos extremos e exposição/danificação de dutos expostos nando uma perda econômica estimada em calculado a partir de anomalias de TSM
de precipitação e tempestades, com danos ou enterrados. Com a predição do aumento US$ 26 bilhões (CAI et al., 2020). No esta- na região 5°N-5°S, 150°W-90°W), com o
à vida e à saúde das populações, além de do nível do mar, espera-se um aumento na do brasileiro de Santa Catarina, os danos Atlântico liderando o Pacífico por mais de 3
elevadas perdas econômicas decorrentes da demanda por estruturas de proteção costei- relacionados às inundações provocadas meses. Anomalias positivas de TSM (águas
destruição da infraestrutura. ra, o que implica gastos adicionais e, muitas pelo El Niño de 1982-83 foram de mais mais quentes do que o normal) no Atlân-
Com relação ao aumento do nível do vezes, a supressão do ambiente praial. de 200.000 desabrigados, 65 mortes e/ou tico equatorial no verão estão associadas
mar, as regiões urbanas costeiras são as Neste capítulo nós abordaremos, a par- desaparecidos e um prejuízo econômico de a anomalias negativas de TSM (águas mais
mais vulneráveis, com possibilidades reais tir de exemplos concretos, o estado da mais de US$ 1,1 bilhão (TACHINI, 2010). frias do que o normal) no Pacífico equato-
de inundação a médio e longo prazos, se arte da compreensão de alguns dos prin- No oceano Atlântico, o modo inter-he- rial oriental vários meses depois (LOSADA
mantidas as atuais taxas de elevação do ní- cipais fenômenos geofísicos associados às misférico é o principal modo de variabili- e RODRÍGUEZ-FONSECA, 2016; CAI et al.,
vel do mar. Os recursos costeiros têm sido mudanças climáticas que possuem conse- dade que influencia o clima do Nordeste 2019). Estudos mostraram que essa cone-
sistematicamente afetados, com alterações quências importantes sobre o oceano e o brasileiro. O modo inter-hemisférico é ca- xão foi forte durante as primeiras e as úl-
das características físicas, biológicas e mor- clima, e consequentemente sobre os dife- racterizado por um gradiente meridional timas décadas do século XX e fraca entre
fológicas dos oceanos e costas, mudanças rentes setores da economia do país. da temperatura da superfície do mar (TSM) esses períodos (MARTÍN-REY et al., 2015;
entre os hemisférios norte e sul (Servain, LÜBBECKE et al., 2018).
2. Eventos extremos de precipitação e ciclones subtropicais 1991). Um gradiente norte-sul positivo, ca- Além do Atlantic Niño de verão, o
racterizado por temperatura da superfície Atlântico equatorial é caracterizado por
2.1. Teleconexões oceano-atmosfera do ENOS), caracterizados por temperatu- do mar mais quente no hemisfério norte um segundo modo equatorial no inverno
e variabilidade climática ra da superfície do mar mais quente do do que no hemisfério sul, está associado a boreal (denominado Atlantic Niño de in-
que o normal na parte leste do Pacífico, um ano seco no norte do Nordeste do Bra- verno), que é mais fraco do que o Atlantic
O clima continental é fortemente liga- o norte da América do Sul experimenta sil, principalmente em fevereiro-maio (NO- Niño do verão. Hounsou-Gbo et al. (2020)
do à variabilidade oceânica, principalmente eventos secos, enquanto o sudeste da re- BRE e SHUKLA, 1996). Por outro lado, uma investigaram a influência do Atlantic Niño
nas regiões tropicais. Na América do Sul, gião experimenta eventos úmidos (RAO e fase negativa do gradiente inter-hemisféri- de inverno sobre o ENOS e suas implica-
o clima é significativamente influenciado HADA, 1990; GRIMM et al., 2000). O in- co está associada a mais precipitações no ções para a variabilidade climática da Amé-
pela variabilidade dos oceanos Atlântico verso ocorre durante os anos de La Niña norte do Nordeste na primavera boreal. O rica do Sul para o período 1905-2014. Os
e Pacífico tropicais. O fenômeno El Niño (fase fria do ENOS). Os impactos socioeco- modo equatorial ou Atlantic Niño, que é resultados indicam que o Atlantic Niño do
Oscilação Sul (ENOS) é um mecanismo de nômicos e ambientais do El Niño/La Niña um modo de variabilidade parecido com o inverno também está negativamente rela-
interação entre o oceano e a atmosfera sobre a América do Sul incluem as ativi- El Niño do Pacífico, mas com extensão e cionado com o ENOS, com o Atlântico lide-
que ocorre no Oceano Pacífico tropical. As dades de pesca, a agricultura, as secas, impactos menores, é o segundo modo de rando o Pacífico por 2-3 estações do ano.
ocorrências de El Niño/La Niña, que são as- as inundações e a ocorrência de algumas variabilidade do Atlântico tropical. A fase Este Atlantic Niño de inverno está associa-
sociadas a mudanças da temperatura e da doenças. Estimou-se que as secas severas, positiva (negativa) do Atlantic Niño é ca- do a um desenvolvimento precoce do ENOS
circulação atmosférica no Pacífico, influen- provocadas pelo evento forte de El Niño de racterizada por águas mais quentes (frias) a partir do verão boreal, com uma notável
ciam as precipitações em escalas globais 2015-16, combinadas com o aumento das do que o normal na parte leste do Atlân- modulação multidecadal do tempo de atra-
através de mecanismos de teleconexões. temperaturas devido ao aquecimento glo- tico equatorial, principalmente no verão so do Pacífico sobre o Atlântico. Nos mea-
Durante os anos de El Niño (fase quente bal, aumentaram em 36% a incidência de boreal. Estudos anteriores mostraram que dos do século XX, quando a teleconexão

398 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 399


do Atlantic Niño do verão com o ENOS do ramo descendente/ascendente no Pacífi-
inverno subsequente era fraca, o Atlantic co equatorial central. Essas perturbações
Niño do inverno influenciava o ENOS com na circulação atmosférica zonal induzem Figure 1b
quase um ano de antecedência. Os resul- anomalias de ventos de leste/oeste na su-
tados de Hounsou-Gbo et al. (2020) su- perfície, esses últimos sendo favoráveis
gerem também que os eventos de Atlan- ao desenvolvimento do ENOS (KEENLYSI-
b 25-year running correlation
tic Niño tanto do verão como do inverno DE et al., 2013; LOSADA e RODRÍGUEZ-
interagem com o ENOS através do mesmo -FONSECA, 2016). No entanto, observa-
mecanismo da teleconexão interbacia. -se que o atraso do ENOS sobre o Atlantic 0.8
Anomalias positivas/negativas de TSM no Niño de inverno é claramente maior do
0.6
Atlântico equatorial afetam a circulação que o atraso do ENOS sobre o Atlantic
de Walker gerando um ramo ascendente/ Niño de verão que tinha sido identificado 0.4
descendente anômalo sobre o Atlântico e anteriormente (Figura 1).
0.2

Figure 1a 0.0

-0.2
ATL3 (JAS(0) x OND(0)
a Lead-lag correlation [OND(0) ATL3] & NINO3 -0.4 NINO3 (OND(0) x FMA(1)
OND(+1) ATL3 (JAS(0) x NINO3 OND(0)
-0.6 ATL3 (OND(0) x NINO3 OND(1)
II Nino3 lagging

ASO(+1)
ATL3 (JAS(0) x OND(0)
JJA(+1) -0.8 NINO3 (OND(0) x FMA(1)
ATL3 (JAS(0) x NINO3 OND(0)
AMJ(+1) ATL3 (OND(0) x NINO3 OND(1)
FMA(+1) -1.0
Fonte: Hounsou-Gbo et al. (2020)

06 5
0

16 5
21 0
5

31 0
5

41 0
46 5
0

56 5
61 0
66 5
0

76 5
81 0
5

91 0
5
DJF (0)

-2
-3
-3
-4
-4
-5
-5
-6
-6
-7
-7
-8
-8
-9
-9
-0
-0
-1
-1
01

11

26

36

51

71

86
OND(0)
ASO(0)
Nino3 leading

JJA(0) Fonte: Hounsou-Gbo et al. (2020)


AMJ(0)
FMA(0) Figura 1. a) Correlação lead-lag, com ja- em relação ao ATL3 de OND(0). O ní-
DJF(-1)
nela deslizante de 25 anos, entre os índi- vel de confiança das correlações é de
ces oceânicos de ATL3 (3°N-3°S, 20°W-0°) 95%. Figura 1. b) Evoluções da corre-
4
9
4
9
4
9
4
9
4
9
4
9
4
9
4
9
4

90 9
4

de outubro-dezembro (OND(0)) e Niño3 lação de janela deslizante de 25 anos


-2
-2
-3
-3
-4
-4
-5
-5
-6
-6
-7
-7
-8
-8
-9
-9
-0
-0
-1
00
05
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
85

(5 °N-5°S, 150°-90°W). Os valores no ei- entre: ATL3 de JAS(0) e ATL3 de OND(0)


xo-y são a média de 3 meses de Niño3. (linha preta), Niño3 de OND(0) e Niño3
A linha preta horizontal em OND(0) in- de FMA(1) (linha azul), ATL3 de JAS(0)
-0.7 -0.6 -0.5 -0.4 -0.3 -0.2 -0.1 0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 dica a correlação de lag zero entre ATL3 e Niño3 de OND(0) (linha vermelha),
de OND(0) e Niño3 de OND(0). Valores e ATL3 de OND(0) e Niño3 de OND(1)
abaixo de OND(0) indicam Niño3 lide- (linha laranja). Cada valor no eixo x (Fi-
rando o ATL3 de OND(0). Valores acima guras 1a e 1b) representa a correlação
de OND(0) indicam Niño3 em atrasado de 25 anos consecutivos.

400 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 401


Ambos os eventos de Atlantic Niño do precipitações da América do Sul durante o 2.2. Eventos extremos de precipitação lias de TSM no Atlântico Tropical Sudeste
verão e do inverno podem ser relevantes inverno e a primavera boreal subsequen- na borda leste do Nordeste do Brasil (SETA), quando o SETA lidera a precipita-
para a previsibilidade do ENOS no Pacífi- tes por meio de sua teleconexão com o ção por 4-6 meses (Figura 2a). Essa relação
co (Hounsou-Gbo et al., 2020). Contudo, ENOS no Pacífico (HOUNSOU-GBO et al., Em junho de 2010, uma sucessão de positiva se desloca para a porção oceânica
o Atlantic Niño de inverno tem a vanta- 2019, 2020). Os resultados indicam que eventos pluviométricos intensos deu origem próxima à costa leste do Brasil durante a es-
gem de poder superar a barreira de pre- os eventos do Atlantic Niño de inverno in- a inundações nos rios orientais dos estados tação chuvosa, ou seja, na piscina quente
visibilidade do ENOS antes da primavera, fluenciam a variabilidade sazonal da preci- de Pernambuco e Alagoas. O relatório do do Atlântico sudoeste (Figura 2b) (CINTRA
a denominada “spring barrier for ENSO pitação da América do Sul de duas manei- Banco Mundial e do governo de Pernambu- et al., 2015; SILVA et al., 2018), onde o sinal
predictability”. No entanto, os mecanis- ras. Em primeiro lugar, esses eventos afe- co (2010) registrou um total de 67 cidades da Zona de Convergência Intertropical do
mos que explicam esta resposta oceânica tam as chuvas da primavera no norte do danificadas, 20 mortes, aproximadamente Sul do Atlântico equatorial (SITCZ) é forte
atrasada no Pacífico equatorial ainda não Nordeste do Brasil (NNEB) através da evo- 30.000 desabrigados e um prejuízo econô- (HOUNSOU-GBO et al., 2019). Esses resul-
são bem conhecidos. A teleconexão entre lução para o modo meridional do Atlânti- mico de mais de US$ 1 bilhão. Nesse ano, tados suportam que anomalias de TSM são
o Atlântico e o Pacífico está associada à co tropical (OKUMURA e XIE, 2006; HOU- foram registradas anomalias positivas de transportadas da região SETA no inverno
variabilidade de baixa frequência dentro NSOU-GBO et al., 2020). Os eventos de TSM no Atlântico tropical sudoeste que ul- boreal (novembro-janeiro; NDJ) para oeste
das duas bacias que é potencialmente Atlantic Niño do inverno também influen- trapassaram 1 °C em relação à climatologia até a costa do NEB (Figuras 2c, d, e) (HOU-
modulada pela Oscilação Multidecadal ciam a precipitação sul-americana através entre fevereiro e junho, na boia do programa NSOU-GBO et al., 2015, 2019). Portanto, a
do Atlântico (AMO). Estudos recentes in- da conexão com o ENOS do ano seguinte Prediction and Research Moored Array in the variabilidade interanual da SITCZ deve estar
dicam que a AMO pode modular a varia- (HOUNSOU-GBO et al. 2020). Esses resul- Tropical Atlantic – PIRATA (BOURLÈS et al., relacionada com o deslocamento das ano-
bilidade multidecadal do modo equatorial tados sugerem a relevância de diferentes 2019) localizada a 30°W e 8°S , bem como malias de TSM de leste a oeste no Atlântico
atlântico (MARTÍN-REY et al. 2018), no tipos de Atlântico Niño para a previsibili- nos dados de SST do Advanced Very High- tropical Sul. Quando localizadas perto da
entanto, ainda existem várias incertezas dade de 6 meses a 1 ano do ENOS e seus -Resolution Radiometer (AVHRR, disponível costa leste do NEB, as anomalias positivas
sobre os mecanismos que controlam a impactos climáticos, incluindo o clima da em: http://oceanwatch.pifsc.noaa.gov). de TSM estão associadas a uma pressão su-
variabilidade do Atlântico equatorial em América do Sul. Hounsou-Gbo et al. (2015, 2019) investi- perficial anormalmente baixa, uma circula-
escalas de tempo sazonais a decenais. A influência da fase positiva/negativa garam como as condições oceânico-atmos- ção atmosférica ciclônica anômala na super-
Segundo diferentes autores, vários me- do modo inter-hemisférico do Atlântico e féricas anteriores (quase 6 meses antes) no fície e uma velocidade vertical ascendente
canismos contribuem para a variabilidade El Niño/La Niña são principalmente fortes Atlântico Sul tropical influenciam o clima do em 500 hPa (Figura 2c). Essas últimas condi-
do Atlântico equatorial. Alguns estudos sobre a parte norte do NEB no final do in- leste do NEB. Eles identificaram uma relação ções são favoráveis a mais chuva na região.
indicam que a variância do Atlantic Niño verno boreal e início da primavera. Na par- positiva significativa entre as anomalias de O contrário ocorre durante anos mais frios
depende principalmente do feedback ter- te leste do NEB (5°-11° S; 34.5°-37° W), a precipitação do leste do NEB e as anoma- no Atlântico tropical sul.
modinâmico, enquanto outros defendem estação chuvosa, que atinge seu pico no
que os processos dinâmicos contribuem inverno austral (maio-julho), está ligada
fortemente para a variabilidade do Atlân- principalmente a eventos como atividades
tico equatorial (NNAMCHI et al., 2015; de distúrbios ondulatórios de leste que
JOUANNO et al., 2017). A advecção me- ocorrem no Atlântico tropical Sul (KOUA-
ridional de anomalias de TSM do Norte ao DIO et al., 2012; SILVA et al., 2018). O esta-
equador, a reflexão de ondas de Rossby belecimento sazonal da segunda ZCIT loca-
no limite oeste da bacia equatorial, entre lizada na região equatorial sul (GRODSKY
outros mecanismos, são indicados como e CARTON, 2003) também coincide com o
responsáveis pela variabilidade do Atlânti- pico da estação chuvosa no leste do NEB.
co Niño (LÜBBECKE e MCPHADEN, 2012; A convergência na ZCIT sul está associada
LÜBBECKE et al., 2018). à convecção atmosférica e chuvas sobre as
Os eventos Atlantic Niño do verão im- águas quentes da piscina quente do Atlân-
pactam indiretamente a variabilidade das tico Sudoeste em junho-julho.

402 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 403


Figure 2

Figura 2
a ENEB MJJ(0) & (SST & WIND) ND (-1)J(0) b ENEB MJJ(0) & (SST & WIND) MJJ (0)

Figura 2. Mapas da correlação de- anomalias de TSM dentro do Atlânti-


fasada entre as anomalias de chuva co tropical sudeste (SETA; 10° S–25° S,
de maio-julho(0) [MJJ(0)] no leste 10° W–10° E; caixa preta oceânica) em
do NEB (caixa preta em a e b, dados ND(-1)J (0) e o TSM (cores), vento de
GPCC) e as anomalias de TSM espa- superfície (vetores), velocidade verti-
ciais (cores, dados HadISST) em: cal de 500 hPa (marcador verde para
(a) novembro-dezembro(-1)-janeiro cima indica movimento ascendente
(0) [ND(−1)J(0)] e (b) maio-julho(0) e marcador marrom para baixo in-
[MJJ(0)]. Os vetores representam a dicam movimento descendente) e as
correlação (significativa ao nível de anomalias de pressão do nível do mar
confiança de 95%) entre as anoma- (contornos) dentro todo o Atlântico
lias de chuva no leste do NEB e as tropical em MJJ(0). Apenas as correla-
anomalias de vento de superfície ções que são significativas a um nível
-0.6 -0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4 0.6 -0.6 -0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4 0.6 (u e v; dados NCEP). (c) - Mapa da de confiança de 95%, são plotadas
correlação linear defasada entre as para todas as variáveis em (c).

c SETA ND(-1)J(0) X (SST, SLP, WIND & Omega) MJJ(0) 2.3. Eventos extremos meteorológicos US$ 350 milhões de dólares1. Desta for-
na região Sul-Sudeste do Brasil: o ma, torna-se evidente que a necessidade
caso do ciclone Catarina de compreender as variações de intensida-
de e frequência de eventos extremos em
No que se refere a eventos extremos na uma determinada região depende de quão
América do Sul, apesar das teleconexões abrangente é o conhecimento científico so-
oceano-atmosfera e suas consequências bre os fatores ambientais que os controlam.
descritas anteriormente com enfoque no Nesse contexto, o potencial modulador do
Atlântico Tropical, a importância dos ciclo- oceano vem sendo cada vez mais explo-
nes extratropicais na região sul/sudeste do rado. No caso do Catarina, o fenômeno
Brasil também merece ser enfatizada. Por que atingiu o litoral de Santa Catarina em
exemplo, a passagem de um ciclone extra- 28 de março de 2004 foi caracterizado
tropical, que posteriormente deu origem a como um ciclone2, e não um furacão, de
um ciclone subtropical nessa mesma área, acordo com Cunha et al. (2004) em cita-
-1.0 -0.8 -0.6 -0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0
esteve relacionada ao desenvolvimento do ção a Nota Técnica conjunta emitida pelo
primeiro furacão já documentado no Atlânti- CPTEC/INPE e INMET. Independentemente
co Sul: o Catarina. Ele atingiu o sul do Brasil da terminologia, a análise do conteúdo de
Fonte: Hounsou-Gbo et al. (2019) no final de março de 2004, deixando mais calor do oceano (Ocean Heat Content –
de 27,5 mil desalojados, quase 36 mil ca- OHC), é uma medida do calor potencial
sas danificadas, 518 feridos e 11 mortos. que o oceano tem para manter e intensifi-
Os prejuízos totalizaram aproximadamente car os ciclones tropicais (e.g., HALLIWELL

404 ECONOMIA AZUL


404 Oceano e Clima: Novos Desafios 405
et al., 2008, SHAY et al., 2000; LEIPPER GPI jamais havia sido usado para avaliar o estudos publicados acerca do Catarina. passado sobre a região de maior OHC ao
e VOLGENAU, 1972). Por exemplo, Mai- furacão Catarina. Na maior parte do tempo da trilha do longo de sua via (Figura 4a). Esse ambien-
nelli et al. (2008) demonstraram que a Os ciclones tropicais (CTs) são frequen- Catarina, o GPI permaneceu alto e acima te de forte vorticidade e alta umidade pro-
inclusão de OHC em modelos numéricos tes em todas as bacias oceânicas, exceto da climatologia de 1990-2019 (Figura 3a). duziu um pico de GPI que provavelmente
melhoraram a previsão da intensidade de no Atlântico Sul. Esse déficit na ocorrên- A comparação de suas quatro variáveis influenciou a transição do Catarina, uma
furacões em até 20%. Além de melho- cia de CTs é geralmente atribuído a um com suas respectivas climatologias (Figura vez que os mesmos processos que mo-
rar a previsão numérica, estudos recentes ambiente adverso de temperaturas frias 3, primeira coluna) mostra que a vorticida- dulam o desenvolvimento de CT também
apontam uma forte relação entre o au- da superfície do mar e forte cisalhamen- de, a umidade e o cisalhamento do vento podem impactar ciclones extratropicais
mento do OHC devido ao aquecimento to vertical do vento (PEZZA e SIMMONDS, foram mais eficazes na modulação do ciclo (Hart, 2003).
global com as chuvas extremas de fura- 2005). Ciclones subtropicais (CSTs), no en- de vida do sistema do que a intensidade A partir de 23 de março, tanto a umi-
cões recentes (e.g., TRENBERTH et al., tanto, ocorrem rotineiramente no Atlânti- potencial, que na maioria das vezes ficou dade quanto a vorticidade (i.e., valor ab-
2018). Ainda de acordo com Trenberth et co Sul (e.g., EVANS e BRAUN, 2012; GOZ- abaixo do nível climatológico para mar- soluto) permaneceram bem acima da cli-
al. (2018), os valores de OHC acima da ZO et al., 2014). Em outras regiões como ço. Apesar de contraintuitivo, não é raro matologia, enquanto o cisalhamento do
média climatológica não apenas aumen- o Atlântico Norte, os CSTs sofrem Transi- que a intensidade potencial desempenhe vento cresceu em importância à medida
taram o “combustível” disponível para ção Tropical (TT) para CTs frequentemente um papel secundário na determinação do que o sistema se dirigia para uma região
sustentar e intensificar o furacão Harvey, (EVANS e GUISHARD, 2009). A ciclogê- GPI (por exemplo, WANG e MOON, 2017; de cisalhamento abaixo do limite teórico
mas também aumentaram as inundações nese subtropical e a TT sobre o Atlântico GAO et al., 2020). da ciclogênese tropical de 10 m/s propos-
decorrentes das chuvas associadas a ele Sul só ganharam atenção após o furacão Durante a maior parte da fase extra- to por Zehr (1992), permanecendo neste
quando atingiram o continente. Catarina. Começou como um ciclone ex- tropical entre 19 e 22 de março, o sistema ambiente ao longo das fases subsequen-
Outra quantidade física importante na tratropical e se tornou um CST antes da ficou sob a influência de ambientes pró- tes do seu ciclo de vida (Figura 3m). McTa-
avaliação da ciclogênese tropical é a in- transição para um CT propriamente dito, ximos ao cisalhamento climatológico do ggart-Cowan et al. (2006) mostraram que
tensidade potencial (EMANUEL e NOLAN, que atingiu o sul do Brasil em 28 de mar- vento (Figura 3m). Nessa fase da tempes- um padrão atípico de bloqueio do dipolo
2004), que determina a máxima velocida- ço de 2004 como um furacão nominal de tade, o GPI foi dominado pela umidade Rex, mais intenso e de maior duração, foi
de que ventos associados a ciclones tro- categoria 2 (MCTAGGART-COWAN et al., e vorticidade. As altas vorticidades nega- responsável por esse fraco cisalhamen-
picais poderiam atingir para determinadas 2006, REBOITA et al., 2019). tivas anômalas (Figura 3d) são ciclônicas to do vento. Na noite de 23 de março, a
condições ambientais. A temperatura da Em realidade, à medida que o clima (Hemisfério Sul) e indicam um fator dinâ- tempestade sofreu insumos ambientais
superfície do oceano entra como uma muda, a capacidade de prever variações mico favorável à ciclogênese (HALL et al., que produziram o terceiro maior pico de
fonte quente no termo termodinâmico da na frequência de TT no Atlântico Sul de- 2001). A vorticidade atingiu seu máximo GPI (Figura 3a) e a fase subtropical de Ca-
equação dessa variável, sendo a tempe- pende de uma visão abrangente dos fa- negativo na tarde de 21 de março, apro- tarina foi alcançada algumas horas depois
ratura da tropopausa atmosférica a fon- tores que modularam Catarina. Lauton ximadamente 12 horas após o sistema ter (MCTAGGART-COWAN et al., 2006).
te fria. Emanuel (2007) demonstrou que et al. (2021) aplicaram o GPI (EMANUEL
muito da variabilidade da energia cinética e NOLAN, 2004) existente que quantifica
atribuída a ciclones tropicais no Atlântico a contribuição dos fatores ambientais de
Norte e no oeste do Pacífico Norte foram grande escala associados à ciclogênese
explicados pela intensidade potencial, em tropical para entender o ciclo de vida do
análise conjunta com a vorticidade relativa Catarina. Isso difere de estudos anteriores
atmosférica em baixos níveis, umidade e que avaliaram cada fator interdependente
o cisalhamento vertical do vento. A teo- individualmente. Além disso, os autores
ria existente que quantifica a contribuição incorporaram a análise do conteúdo do
conjunta entre as variáveis descritas por OHC (LEIPPER e VOLGENAU, 1972), uma
Emanuel (2007) é o Índice de Potencial medida do potencial do oceano para sus-
de Gênesis (Genesis Potential Index – GPI; tentar a intensificação da CT (HALLIWELL
EMANUEL & NOLAN, 2004). Até 2020, o et al., 2008), ignorada por quase todos os

406 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 407


Figure 3 Figura 3. GPI [painéis a), b) e c)]; entre 19-29 de março de 2004 (painéis
vorticidade absoluta a 850 hPa [painéis da direita – c), f), i), l) e o)] relativos à
H2 Ts
Ex Hy Hy H1 d), e) e f)]; umidade relativa a 600 hPa climatologia de março de 1990-2019. As
a) b) c) 30 [painéis g), h) e i)]; intensidade poten- cores de fundo nos painéis esquerdos
clim
20 2004 25 S
0 20 cial [painéis j), k) e l)]; e velocidade de mostram o estágio do sistema confor-
10 cisalhamento do vento entre 850-200 me relatado por McTaggart-Cowan et
0 hPa [painéis m), n) e o)] ao longo da al. (2006): extratropical (Ex), tempesta-
GPI

10 30 S
0

-10 pista/trajetória do Catarina em compa- de subtropical híbrida (Hy), tempestade


0 20
35 S
0
ração com a climatologia de 1990-2019 tropical (TS), furacão de categoria 1 (H1)
-30
(o sombreamento azul indica um desvio e furacão de categoria 2 (H2). A pista
e) f) 3 da Catarina é mostrada nos painéis de
padrão). Mapas de anomalias corres-
vorticity ( x10-5 s-1)

0 2
25 S
0
pondentes de março de 2004 [painéis anomalias onde os pontos coloridos in-
1
do meio – b), e), h), k) e n)] e do período dicam o início de cada etapa.
300S 0
-5 10
Pezza e Simmonds (2005) argumentam março. Esse ambiente deu origem ao maior
20
350S que a TT Catarina começou com a forma- pico de GPI (Figura 3a), que correspondeu
-10 30
ção do CST, quando o núcleo da tempes- ao segundo maior pico de vorticidade (Fi-
f) 30
tade começou a mudar de frio para quen- gura 3d). Além disso, a umidade relativa
rel. humidity (%)

60 20
25 S
0
te. A conclusão da TT ocorreu em 25 de foi alta durante a maior parte de 24 de
10
40 0
março, após o sistema ter experimentado março (Figura 3g). Ao mesmo tempo, o
30 S
0

-10
condições particularmente propensas à ci- OHC estava principalmente abaixo da cli-
20 20 clogênese tropical durante a tarde de 24 de matologia (Figura 4a).
35 S
0

-30
Figure 4
k) l) 8
H2 Ts
pot. int. (m s-1)

60 250S
4
3 clim 0.8
0 250S
40 300S 2004
0. 4
-4 2
30 S
0 0. 0
20 350S -8
-0. 4
1
35 S -0. 8
o)
0

40 h) 12
wind shear (m s-1)

20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 500W 450W 400W 350W 500W 450W 400W 350W


250S
6 Days of March
30
0
300S
20 -6 Figura 4. a) OHC ao longo da trajetó- por McTaggart-Cowan et al. (2006): ex-
10 350S -12 ria do Catarina comparada com a clima- tratropical (Ex), tempestade subtropical
50 W0
45 W
0
40 W
0
35 W
0
50 W
0
45 W
0
40 W
0
35 W
0
tologia de 1993-2018 (o sombreado em híbrida (Hy), tempestade tropical (Ts –
20 21 22 23 24 25 26 27 28 29
Days of March azul indica um desvio padrão); e mapas que aqui foi definido como TT), furacão
de anomalias durante b) março de 2004 de categoria 1 (H1) e furacão de cate-
e c) entre 19-29 de março de 2004 rela- goria 2 (H2). A trajetória do Catarina
Fonte Figuras 3 e 4: Lauton, G et al. (2021)., Marta-Almeida, M., Dorfschäfer, G. S., & Lentini, C. A. tivos à climatologia de março de 1993- é mostrada nos painéis de anomalias
D. (2021). Metocean modulators of the first recorded South Atlantic Hurricane: Catarina. Geophysical 2018. As cores de fundo em a) mostram onde os pontos coloridos indicam o iní-
Research Letters, 48, e2020GL091416. https://doi.org/10.1029/2020GL091416
o estado do sistema conforme relatado cio de cada etapa.

ECONOMIA AZUL
408 ECONOMIA
408 AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 409
O Catarina tornou-se um furacão de ca- convectiva durante o período do Catarina ocorreram no Pacífico Norte, Atlântico Nor- atmosféricos sobre o sudeste do Brasil são
tegoria 1 na manhã de 26 de março (MC- e foram encontradas como as principais te, Austrália Ocidental e Mar Mediterrâneo responsáveis por até 60% dos eventos de
TAGGART-COWAN et al., 2006). Nesse dia, componentes das anomalias positivas do (SCANNELL et al., 2016; HOBDAY et al., OCM no Atlântico Sul sudoeste durante o
a tempestade interagiu com fatores am- GPI. No entanto, os três maiores picos de 2016; OLIVER et al., 2017). As OCMs po- verão. A falta de nuvens permite que mais
bientais que produziram o segundo maior GPI só apareceram depois que o sistema dem ser causadas por processos atmosfé- radiação solar chegue tanto ao continente
pico de GPI (Figura 3a). Notavelmente, esse se dirigiu para a região de baixa tensão ricos ou oceânicos, dependendo do evento quanto ao oceano causando o aquecimen-
pico foi formado durante o forte aumento de cisalhamento do vento (entre os níveis e da localidade (HOLBROOK et al., 2019). to da superfície da terra e do mar que leva
de umidade observado entre 25 e 26 de de 850 e 200 hPa). Portanto, confirman- As OCMs têm um impacto devastador às ondas de calor sobre o continente e no
março (Figura 3g). Enquanto isso, o OHC do que a transição de Catarina foi iniciada para ecossistemas marinhos (SMALE et al., oceano, respectivamente. A causa desses
estava próximo de sua climatologia (Figura pelo padrão atípico de bloqueio de dipolo 2019). Por exemplo, o evento que ocorreu bloqueios também foi identificada e está
4a). Foi apenas em 27 de março que o fura- (MCTAGGART-COWAN et al., 2006). no Mediterrâneo em 2003 causou uma associada a Oscilação de Madden Julian,
cão encontrou o OHC anormalmente alto e As áreas de anomalias positivas do mortalidade em massa de pelo menos 25 principalmente quando esta se encontra
o campo de vento se intensificou para um OHC sugerem que as condições oceâni- espécies de invertebrados de costões ro- mais ativa no Oceano Índico (RODRIGUES
máximo de 34,7 m/s (VIANNA et al., 2010). cas podem ter sido favoráveis à ciclogê- chosos (BLACK et al., 2004; OLITA et al., & WOOLLINGS, 2017). Além disso, Costa
Os resultados sugerem uma estreita nese. No entanto, não houve correspon- 2007; GARRABOU et al., 2009). Os da- e Rodrigues (2021), usando saídas dos mo-
correspondência entre grandes anoma- dência significativa entre tais anomalias e nos causados pelas OCMs não se limitam delos climáticos do Coupled Model Inter-
lias positivas do GPI e os principais está- os principais estágios do desenvolvimen- a organismos demersais ou ecossistemas comparison Project Phase 6 (CMIP6), iden-
gios do ciclo de vida de Catarina, princi- to do Catarina. Ao contrário do OHC em costeiros. A OCM que ocorreu no Noroes- tificaram uma tendência de aumento na
palmente quando o sistema desenvolveu março de 2004, o GPI foi o mais alto en- te do Oceano Atlântico em 2012 teve um ocorrência, intensidade, duração e extensão
estrutura de ciclone subtropical, passou tre março de todos os anos (1990-2019). impacto nos pescados de grande importân- espacial dessas OCMs no Atlântico Sul su-
por transição tropical e se intensificou em Portanto, os resultados de Lauton et al. cia comercial (MILLS et al., 2013). Quando doeste, tanto para o período de 2021-2050
um furacão de categoria 1. Lauton et al. (2021) indicam que o GPI é potencial- as temperaturas são tão extremas quan- como para o período de 2071-2100, anali-
(2021) especulam que até mesmo o pre- mente um bom índice para a obtenção to o evento que persistiu no noroeste do sando um cenário moderado e outro mais
cursor extratropical do Catarina recebeu de um limiar para a ciclogênese na re- Oceano Pacífico de 2014 a 2016, a OCM extremo de mudanças climáticas. Além dis-
importantes contribuições da interação gião. Provavelmente, isso afetará futu- pode ter efeitos negativos até em aves e so, os resultados mostram que o Atlântico
com altos valores do GPI. As anomalias ras investigações sobre os impactos das outros animais marinhos (CAVOLE et al., Sul sudoeste pode atingir um estado quase
de vorticidade a 850 hPa e umidade re- mudanças climáticas na probabilidade de 2016). Recentemente, Smith et al. (2021) permanente de OCMs até o fim do século
lativa a 600 hPa favoreceram a atividade outros eventos extremos desse tipo. forneceram uma perspectiva global sobre XXI, com OCMs durando todo o verão.
os impactos das OCMs nas sociedades hu- Ainda são inexistentes estudos sobre
3. Ondas de Calor Marinhas manas. Impactos ecológicos variaram des- OCMs em outras partes do Atlântico Sul e
de proliferação de algas nocivas e eventos Tropical, mas a Figura 5 mostra um aumen-
As mudanças climáticas afetam subs- eventos de temperatura extrema nos oce- de mortalidade em massa até reconfigura- to da ocorrência desses eventos extremos
tancialmente o planeta e a sociedade, es- anos, chamados de Ondas de Calor Mari- ções de ecossistemas inteiros, afetando o em praticamente todo Atlântico Sul e Tro-
pecialmente por aumentar a intensidade nhas (OCMs). Uma OCM é definida como habitat, regulação e serviços ecossistêmi- pical durante o verão, com valores de in-
e frequência de eventos extremos, como um evento prolongado (de no mínimo de cos globalmente. Os custos econômicos tensidade acumulada positivos ao longo de
inundações, secas e ondas de calor, sendo 5 dias) de temperaturas da superfície do de eventos individuais de OCM excederam quase toda a costa do Brasil. Infelizmente,
países subdesenvolvidos e em desenvol- mar (TSM) acima do limite do 90° per- US$ 800 milhões em perdas diretas e US$ os impactos das OCMs nos ecossistemas
vimento os mais afetados (TRENBERTH centil em relação a uma climatologia de 3,1 bilhões em perdas indiretas de serviços marinhos do Atlântico Sul e Tropical e seus
et al., 2007). Apesar da maior parte dos pelo menos 30 anos de dados (HOBDAY ecossistêmicos por vários anos. desdobramentos econômicos não foram es-
estudos focarem em extremos sobre os et al., 2016, 2108). Além dos estudos em Embora comprovada sua importância, tudados a fundo. Brauko et al. (2020) iden-
continentes, Oliver et al. (2018) constata- escala global sobre a duração, frequência são escassos estudos de OCMs e suas pro- tificaram uma diminuição da diversidade
ram que houve um aumento significativo e intensidade de OCMs, pesquisas foram priedades para o Atlântico Sul. Rodrigues de espécies nas comunidades planctônicas
na frequência, duração e intensidade dos conduzidos para eventos específicos que et al. (2019) mostraram que os bloqueios e bênticas na região costeira de Santa

410 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 411


4. Acidificação e perda de biodiversidade
Figura 5
A acidificação é provocada pelo au- os bancos de rodolitos (algas calcáreas ver-
mento da absorção do CO2 atmosférico melhas) (Citação da Figura 6).
pelo oceano, acarretando mudanças na De forma geral, quase todos os principais
química da água do mar, a saber: i) dimi- sistemas de recifes de coral (rasos e profun-
nuição do pH da água, provocado pela dos) são vulneráveis às mudanças climáticas
reação do CO2 dissolvido com a água, com diferenças regionais em suas sensibili-
00 ii) diminuição da disponibilidade de íons dades e perdas globais projetadas atingindo
carbonato [CO32-] e do índice de satura- mais de 70% mesmo sob o cenário de aque-
ção do carbonato de cálcio (Ω). Os íons cimento global mínimo (Representative Con-
carbonato são essenciais para organismos centration Pathway 2,6 W/m2, ou RCP2.6,
150 S
marinhos produtores de estruturas de car- BINDOFF et al. 2019). O aquecimento dos
bonato de cálcio na forma de aragonita e oceanos, a acidificação, o aumento do nível
300 S calcita (CaCO3), como corais, moluscos bi- do mar e a intensificação das tempestades
valves e gastrópodos, macroalgas calcáreas, impedem uma maior resiliência dos recifes
além de certos produtores primários planc- em nível global e aumentam a sua destrui-
450 S tônicos, como os cocolitoforídeos (DONEY ção. Recifes de coral rasos que são não de-
300 W et al., 2009). Segundo o último balanço gradadas por outros impactos, como arrasto
00 W global do carbono (FRIEDLINGSTEIN et al., extensivo de fundo e enriquecimento de nu-
60 W0
2021), o sumidouro oceânico de CO2 captu- trientes, podem constituir um importante re-
Tendência de Intensidade Acumulada (0C por decáda) rou em média 26% das emissões globais de fúgio para recifes degradados pelas mudan-
CO2 para a atmosfera na década de 2011- ças climáticas. A perda de habitat de recifes
2020, e no ano de 2021, estima-se que te- de corais em águas profundas é virtualmente
-20 -10 0 10 20 nha assimilado cerca de 2.9 GtC/ano. certa, considerando a projeção de crescente
Segundo o Sexto Relatório de Avaliação acidificação oceânica (BINDOFF et al., 2019).
Fonte: Reynolds et al., 2007 do Clima do IPCC (AR6 – WGI e WGII), é vir- Além da acidificação e do aquecimento do
Figura 5. Tendência de intensidade acu-
tualmente certo que a acidificação do oce- oceano, a fragmentação de ecossistemas e a
dias de OCMs multiplicados pela inten-
mulada de eventos de OCMs para o pe-
ano continuará a ocorrer em todos os cená- poluição em regiões costeiras são outras for-
sidade do aumento de temperatura no
ríodo de 1982-2020 durante os meses de
rios de emissões de CO2 (IPCC, 2021; 2022) tes ameaças aos ecossistemas marinhos em
dia (valor da anomalia de temperatura
verão (dezembro a fevereiro). Unidades
ao longo do século XXI. No entanto, a taxa todo o planeta (IPCC, 2022).
da superfície do mar). Os dados para o
estão em ˚C por década. Intensidade
de acidificação será decorrente da quantida- Em relação aos efeitos da acidificação,
cálculo foram obtidos do Optimum In-
acumulada é o somatório do número de
de de CO2 emitida nos anos futuros. Pode-se as regiões costeiras podem responder ao
terpolation Sea Surface Temperature
afirmar com alta confiabilidade que as mu- excesso de CO2 dissolvido na água mar de
danças climáticas, incluindo a acidificação, forma heterogênea, já que outros proces-
já provocaram mudanças nos ecossistemas sos, como a eutrofização, podem amplifi-
Catarina como um resultado de OCMs se que o aumento da frequência e in- costeiros e oceânicos (IPCC, 2022). Dentre car ou mitigar parcialmente o efeito da aci-
combinado com a diminuição de oxigênio tensidade das OCMs seja um dos fatores os ecossistemas brasileiros mais vulneráveis, dificação, notadamente através do aumen-
durante o verão de 2020. Carneiro et al. para o declínio desse bivalve nas últimas segundo a avaliação de 2016 realizada pela to da produção primária local (CAI et al.,
(2020) mostraram que o bivalve Anomalo- décadas. OCMs também afetam o cultivo Rede Brasileira de Pesquisa em Acidificação 2011; COTOVICZ et al., 2022). No entanto,
cardia flexuosa, de importância econômica de ostras na região responsáveis por uma dos Oceanos – BrOA (KERR et al., 2016), en- o aspecto potencial de mitigação através
e cultural para a região, é bastante sensí- movimentação de R$ 29.709.300,00 para contram-se os recifes de corais e a região da da eutrofização deve ser cuidadosamente
vel a aumentos de temperatura. Acredita- o estado (SEBRAE, 2018). plataforma este-sudeste onde encontram-se examinado, pois a variabilidade natural dos

412 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 413


ecossistemas costeiros leva a respostas re- tendência entre 1991 e 2011 de acidificação dados dos ecossistemas marinhos brasi- iniciado como uma estratégia de estado,
gionais diferentes (COTOVICZ et al., 2022). e aumento da fugacidade do CO² (fCO2, um leiros continua aquém do desejado quan- alinhada ao Objetivo do Desenvolvimento
Ainda não temos observações suficientes proxy para a quantidade de CO2 no oceano) do levamos em consideração a extensão Sustentável 14 – Vida na Água da Agenda
para inferir sobre as tendências de acidifica- na superfície do mar foram de -0.0016 ± e heterogeneidade da Amazônia Azul. É 2030 e à Década das Nações Unidas da
ção do oceano nas regiões costeiras e oceâ- 0.0003 unidades pH a-1 e 1.81 ± 0.32 µatm fundamental que um programa nacional, Ciência Oceânica. Somente desta forma
nicas do Brasil (KERR et al., 2016; COTOVICZ CO 2 /ano, segundo Lauvset et al. (2015). alinhado às melhores práticas de análise será possível traçar políticas públicas para
et al., 2022). No oceano Atlântico tropical, Apesar dos esforços da rede BrOA, a e transparência de dados empregadas a adaptação e mitigação dos efeitos da
resultados de modelagem estimam que a capacidade de observação e análise de pela comunidade internacional (DICKSON acidificação do oceano nos diversos ecos-
et al., 2007; TANHUA et al., 2021), seja sistemas marinhos do país.
Figura 6
5. Elevação do nível do mar: o caso da região metropolitana de Recife
10 N
0

Os últimos relatórios da Comissão Inter- também pode resultar em supressão comple-


governamental Painel sobre Mudanças Cli- ta de praias arenosas e zonas húmidas. Tal im-
EQ máticas concluem que o planeta está ine- pacto, embora sentido globalmente, depen-
quivocamente experimentando um aqueci- de das peculiaridades locais; portanto, acon-
mento rápido, e isso se deve em parte às tece de forma desigual entre países, regiões,
100S atividades humanas (IPCC, 2021). Como comunidades e indivíduos como resultado de
consequência, o nível médio global do mar diferentes níveis de exposição e vulnerabilida-
continuará a subir ao longo de séculos a de. Além disso, a adaptação das regiões cos-
milênios em todos os cenários de emissões. teiras representa naturalmente um desafio
200S
O aumento do nível do mar acelerará ain- maior para os países em desenvolvimento do
da mais sob altas emissões (por exemplo, que para os países mais desenvolvidos, por
RCP8.5). Essas mudanças são projetadas razões sobretudo econômicas.
300S para resultar em impactos diretos e indiretos No Brasil, as tendências do nível do mar
disruptivos nos ecossistemas costeiros e nos para diferentes os lugares são diferenciados.
meios de subsistência e infraestrutura utili- Para Recife, especificamente, Harari et al.
zadas por dezenas de milhões de pessoas na (2008) apontaram um aumento do nível do
400S
500W 400W 300W 200W 100W 500W 400W 300W zona costeira de baixa altitude (considerada mar de cerca de 5,6 mm/ano. Apesar dessa
Fonte: Kerr et al. (2016) elevação <10 m em relação ao nível médio lacuna, alguns estudos têm se dedicado às
do mar). De acordo com este e outros es- previsões costeiras diante dos futuros cená-
Figura 6. Principais instituições en- costeiras e de plataforma sombreadas tudos (NEVES e MUEHE, 1995; THIELER e rios do nível do mar, como Alfredini et al.
volvidas na Rede BrOA e os ecossiste- em cinza foram destacadas regional- HAMMAR-Klose, 1999; ALFREDINI et al., (2008), que descreve ilhas e áreas urbanas
mas-chave para monitoramento no mente: cinza-claro para a porção nor- 2008; SNOUSSI et al., 2008; VARGAS et como as mais vulneráveis a inundações a
Brasil. Painel A (esquerda): Os números te, cinza-médio para a região leste e al., 2008), os cenários de elevação do nível médio e longo prazos. Outro estudo, elabo-
representam os grupos regionais, se- cinza-escuro para a porção sul-sudeste. do mar para futuro próximo são de grande rado por Marengo et al. (2007) em escala
gundo as instituições, e as respectivas Painel B (direita): ecossistemas-chave, preocupação. Resultados recentes indicam nacional, apontou Pernambuco como um
áreas de estudo. Os triângulos indicam com maior vulnerabilidade para aci- uma aceleração da taxa de aumento do ní- dos mais afetados estados pelo aumento
as posições em 2016 da rede de boias dificação, identificados por Kerr et al. vel do mar. Esta aceleração da taxa na qual do nível do mar. A mesma conclusão é de-
SiMCosta, os círculos indicam a posição (2016): recifes de corais, manguezais, o nível do mar sobe não só aumenta a pos- monstrada por outros dois estudos: Neves
das boias meteoceanográficas PIRATA lagunas costeiras, rodolitos, pradarias sibilidade de impactos intensificados – como et al. (2007) e Nacarati (2008). De acordo
(Prediction and Research Moored Ar- de fanerógamas e áreas sob influência erosão costeira, perdas de habitat e intrusão com esses autores, causas tanto naturais
ray in the Tropical Atlantic), e as áreas de plumas fluviais. salina em aquíferos costeiros e rios –, mas como de características de ocupação do

ECONOMIA AZUL
414 ECONOMIA
414 AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 415
espaço urbano contribuem para a elevada cenários distintos em 2100: (i) elevação de A preocupação em proteger o patrimônio Na tentativa de valorar os imóveis lo-
vulnerabilidade da área. De fato, o Centro 0,5 m; e (ii) elevação de 1,0 m com relação público (calçadões, ruas) e privado (edifícios, calizados nas zonas potencialmente inun-
Metropolitano do Recife combina topogra- ao nível médio do mar. Os resultados, mos- casas, hotéis) é notória. Entretanto, ques- dadas, foram obtidos junto à prefeitura
fia baixa, urbanização intensa, densidade trados na Figura 7, indicam que o município tões simples, como o valor médio do metro de Recife valores médios do m² em algu-
demográfica e elevada ecologia, valores tu- terá cerca de 11,7% (25,4 km2) de sua área quadrado dos imóveis em áreas protegidas, mas ruas e bairros (Tabela 1). Os valores
rísticos e econômicos (ARAUJO et al., 2009; total inundada periodicamente num cenário a arrecadação de impostos nestas áreas, a foram estimados com base na experiên-
COSTA et al., 2010). Além disso, o município de 0,5 m de aumento, e que estes números contribuição dessas áreas para a economia cia dos técnicos do setor de ITBI (Imposto
de Recife apresenta vários conflitos no lito- sobem para 15,5% (33,7 km2) de sua área municipal ou a perda do município em ar- sobre a Transmissão de Bens e Imóveis),
ral sobre o uso da terra e do litoral, que é para o cenário de 1,0 m de aumento do ní- recadação, não são conhecidas. Tampouco uma vez que para a determinação do va-
uma das razões pelas quais tornou-se uma vel do mar em 2100. são conhecidas informações acerca das con- lor do imposto a ser cobrado (entre 1%
das primeiras regiões do Brasil a ser objeto Uma vez delimitadas as zonas poten- sequências econômicas e sociais da perda e 2%) é realizada uma avaliação do valor
de estudos integrados sobre a problemas da cialmente inundadas, é de grande impor- de áreas por erosão/ inundação. dos imóveis.
erosão costeira, com a colaboração diversas tância conhecer os recursos em risco, i.e.,
esferas do poder público (FINEP/UFPE, 2009). quantificar áreas afetadas; identificar ti- Figura 7. Áreas inundadas do município do Recife para os cenários
Um outro ponto de vulnerabilidade local tra- pos de uso e ocupação; estimar população de aumento do nível do mar de 0,5 m e 1,0 m em 2100
ta da pressão antrópica. Pernambuco é o es- afetada; mensurar valor de imóveis; iden-
tado que possui maior taxa de ocupação da tificar atividades econômicas desenvolvi-
Inundation Areas
faixa litorânea brasileira. Mais de 1000 hab./ das, perdas econômicas e consequências Recife - PE
km2, maior do o Rio de Janeiro, São Paulo para a economia do município. O conhe-
e outros estados. E o município de Recife cimento dessas informações é de suma
tem um peso importante nesta ocupação importância para que os gestores possam
costeira do estado, com um total de quase avaliar as possibilidades de ação em cada
1,7 milhões de habitantes no município; essa área. A presente análise limitou-se aos
taxa de ocupação sobe para cerca de 7.000 dois primeiros parâmetros – mensuração
pessoas/km2, grande parte localizada ao lon- de áreas afetadas e identificação dos tipos
go da faixa litorânea e nos estuários e canais de uso e ocupação –, embora uma peque-
que cortam a cidade. Estamos falando facil- na explanação acerca dos aspectos econô-
mente em cerca de 600 mil pessoas que se- micos seja a seguir apresentada. 1:70.000
rão afetadas direta e indiretamente pelo au- Nos municípios estudados, as informa- Meters
0 501.000 2.000
mento do nível do mar na cidade do Recife. ções referentes aos assuntos supracitados,
Dados de observação e resultados de embora pudessem servir como subsídio Projection:UTM
Datum: SAD1969
modelagem confirmam uma elevação de para a gestão dos problemas de erosão
3,6 mm/ano no período 2006-2015, ou seja, enfrentados, são escassas. Em visitas às
cerca de 2,5 vezes mais rápida do que o va- prefeituras, observa-se que este tipo de
lor médio 1,4 mm/ano, observado no último informação, quando existente, não se en-
século (1901-1990) (IPCC, 2019). Mantidas contra sistematizada e acessível. Sua con-
estas taxas, o que seria por si só uma posi- tribuição poderia nortear a tomada decisão
Legend
ção conservadora, teríamos no final do sé- por parte do poder público quanto à opção 0.5m SLR

culo um incremento médio do nível do mar política a ser adotada em cada caso (não 1m SLR

City Boundary
que variaria entre 0,43 m (RCP2.6) e 0,84 fazer nada, o que corresponde ao cenário Atlantic Ocean

m (RCP8.5). Araujo et al. (2009) realizaram usualmente referenciado como Business As


um estudo de projeção das áreas inundadas Usual (BAU) x realocar imóveis e estruturas
do município de Recife considerando dois x proteger imóveis e estruturas). Fonte: Costa et al. (2010)

416 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 417


Tabela 1. Valor médio do m2 no município de Recife
Local/ Bairro Valor do m² (R$) Região Figura 8. Recursos costeiros em risco para no município do Recife
para: cenário de aumento do nível do mar em 0,5 m (esquerda);
Av. Boa Viagem/Boa Viagem 12.000,00 Costeira e cenário de aumento do nível do mar em 1,0 m (direita).
Av. Conselheiro Aguiar/Boa Viagem 6.000,00 Costeira
Av. Domingos Ferreira/Boa Viagem 4.000,00 Costeira
Coastal Area Coastal Area
Pina 600,00 Costeira Vuinerable to Flooding
Recife - PE
Vuinerable to Flooding
Recife - PE
(Scenery: 0.5m SLR) (Scenery: 1m SLR)
Brasília Teimosa 400,00 Costeira
Ilha do Leite 1.400,00 Ribeirinha
Ilha do Retiro 2.600,00 Ribeirinha
Av. Beira Rio/Madalena 5.000,00 Ribeirinha
1:40.000 1:40.000
Av. Beira Rio (favela)/Madalena 100,00 Ribeirinha Meters Meters
0 500 1.000 0 500 1.000

Rua do Bom Jesus/Recife Antigo 2.000,00 Ribeirinha Projection:UTM


Datum: SAD1969
Projection:UTM
Datum: SAD1969

Santa Rita/São José 2.000,00 Ribeirinha


Av. Sul/ São José (edifícios) 8.000,00 Ribeirinha
Rua das Calçadas/São José 400,00 Ribeirinha
Rua da Concórdia/São José 2.000,00 Ribeirinha
Rua da Palma/São José 1.600,00 Ribeirinha Legend Legend
Unoccupied land Unoccupied land

Rua do Rangel/Santo Antônio 1.000,00 Ribeirinha Buildings (<3 levels)


Buildings (>3 levels)
Buildings (<3 levels)
Buildings (>3 levels)
Historical/cultural patrimony
Rua da Aurora/Boa Vista 1.200,00 Ribeirinha
Historical/cultural patrimony
Drainage Drainage
Atlantic Ocean Atlantic Ocean

Av. Conde da Boa Vista/Boa Vista 3.000,00 Ribeirinha


Boa Vista 800,00 Ribeirinha Fonte: Araujo et al. (2009)

Av. Agamenon Magalhães/Ilha do Leite 6.000,00 Ribeirinha


Av. Agamenon Magalhães/Santo Amaro 2.000,00 Ribeirinha
Fonte: Adaptado de Araujo et al (2009) Tabela 2. Áreas dos recursos costeiros vulneráveis à elevação do nível do
Em decorrência do processo histórico Embora as orlas das Praias da Boa Viagem mar (em m2) para os cenários de aumento de 0,5 m e 1,0 m em 2100
de ocupação dos municípios estudados, e Pina – que compreendem a maior ex-
os terrenos mais valorizados estão loca- tensão do litoral do Recife – se mostrem Característica de uso 0,5 m 1,0 m
lizados nas áreas mais elevadas, planas e altamente verticalizadas, tais áreas apre- Área desocupada 2.612 19.174
aterradas, cujo acesso limita-se à popula- sentam cotas, em geral mais elevadas. Em Praia 177.636 177.636
ção mais favorecida. Assim, a população contraposição, os terrenos baixos e com Mangues e restingas 0 0
menos favorecida se submete à ocupação edificações de pequeno porte (casas tér-
Edificações com menos de 3 andares 282.302 542.332
das terras alagadas ou sujeitas à inunda- reas) concentram-se, em especial, junto
ção. No município do Recife atenta-se para ao bairro de Brasília Teimosa, localizado Edificações com mais de 3 andares 4.540 69.174
a grande área de edificações com número às margens da Bacia do Pina. Tal área, de Áreas de patrimônio histórico e cultural 3.200 13.201
de andares inferior a três que se mostra acordo com a análise, seria a mais impacta- Fonte: Araujo et al. (2009)
vulnerável ao aumento do nível do mar. da, conforme indicado na Figura 8.

418 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 419


As áreas quantificadas de cada recurso ção aos níveis de 2014 para R$ 9,32 bilhões de precipitação, temperatura e vento sobre turas projetadas até soluções baseadas na na-
costeiro, para ambos os cenários, estão re- (US$ 3.97 bilhões) em 2030. Prognosticamos o mar e sobre a terra, intensificando tem- tureza. Em particular, os modelos climáticos
presentadas na Tabela 2. Os resultados in- também que, no cenário de BAU, as emis- pestades, condições de ondas, inundações, da próxima geração fornecerão detalhes sem
dicam que, num cenário crítico de aumen- sões totais de carbono de Recife estão previs- secas, tempestades tropicais e ciclones ex- precedentes sobre os impactos climáticos lo-
to do nível do mar (1,0 m) em 2100, espe- tas para crescer 79,1% em relação aos níveis tratropicais, ondas de calor e de frio. cais. Estes ajudarão a melhorar os sistemas
ram-se incrementos significativos nas áreas de 2014 até o ano de 2030. Os extremos oceânicos são críticos, pois de alerta precoce e podem ser integrados na
a serem impactadas, quando comparadas Depois de examinar os potenciais custos e as regiões costeiras abrigam aproximada- preparação para desastres e na adaptação
ao cenário de elevação de 0,5 m acima do benefícios da ampla gama de eficiência ener- mente 40% da população mundial e 75% a longo prazo. O investimento em platafor-
nível médio do mar atual. gética, energias renováveis e outras medidas das maiores áreas metropolitanas estão em mas de observação in situ é necessário para
Por fim, no que se refere à adaptação às de baixo carbono que poderiam ser implanta- áreas costeiras. Consequentemente, uma melhorar as condições iniciais de previsão e
mudanças climáticas para a cidade de Recife, das nos diferentes setores da cidade, encon- proporção significativa da atividade econô- fornecer “verdade do terreno” para previ-
Gouldson et al. (2020) realizaram um estudo tramos que – comparado com as tendências mica global depende das zonas costeiras e sões e projeções de modelos. As soluções
para identificar os melhores caminhos para do BAU, Recife poderia reduzir suas emissões oceânicas, desde a pesca e agricultura até a que se adaptam às mudanças climáticas po-
o estabelecimento de uma cidade de baixo de gás carbônico até 2030 em: (i) 24,3% exploração de recursos naturais. Além disso, dem gerar vários cobenefícios, incluindo o
carbono em 2030. Os autores estimaram que através de investimentos rentáveis na cida- as regiões costeiras e oceânicas são respon- progresso em direção aos Objetivos de De-
o PIB de Recife foi de R$ 35,6 bilhões (US$ de que poderiam mais que se autofinanciar/ sáveis pela geração de energia renovável e senvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
16.55 bilhões) em 2014, e caso as tendências sustentar em termos comerciais ao longo de não renovável e pelo transporte de 80% das A pesquisa interdisciplinar é essencial para
recentes continuem, estimamos que o PIB suas vidas. Para tal fim, seriam exigidos um mercadorias comercializadas globalmen- identificar os cobenefícios e as compensa-
crescerá para R$ 70,54 bilhões (USD 32.82 investimento de R$ 7,79 bilhões (US$ 3.32 te. Elas também oferecem proteção con- ções das estratégias de adaptação para oti-
bilhões) até 2030. Encontramos também que bilhões), ocasionando uma economia anual tra extremos relacionados ao clima, como mizar seu planejamento e implementação.
o gasto total energético de Recife em 2014 de R$ 1,37 bilhões (US$ 585,25 milhões), tempestades. As mudanças climáticas irão Em outras palavras, “os oceanos que
foi de R$ 3,40 bilhões (US$ 1.45 bilhões), o retornando o investimento em 5,7 anos e exacerbar a vulnerabilidade e os impactos precisamos para o futuro que deseja-
que significa 8,7% de todos os rendimen- gerando uma economia anual por todo o pe- existentes, principalmente através da eleva- mos” preconiza um nível crescente de
tos arrecadados em Recife está atualmente ríodo de duração das medidas; e (ii) 31,0% ção do nível do mar e extremos oceânicos, conhecimento científico que seja capaz de
comprometido com Energia. Os aumentos com medidas sem custo que poderiam ser como tempestades costeiras, tempestades identificar ações que garantam os serviços
nos gastos de energia estão estimados em pagas ao reinvestir os lucros gerados pelas extremas (ventos fortes acompanhados por ecossistêmicos e a transição de uma Eco-
12,1% do PBI da cidade até 2030. medidas custo-efetivas. Tais medidas exigi- ondas de altura extrema), ciclones tropicais nomia do Mar para uma Economia Azul.
Os resultados das análises indicaram que riam um investimento de R$ 14,91 bilhões e extratropicais extremos, ondas de calor Neste capítulo abordamos, a partir de
a continuação da tendência do BAU no perí- (US$ 6,35 bilhões), gerando uma economia marinhas, eventos extremos de desoxige- exemplos concretos, o estado da arte da
odo até 2030 aumentaria o uso de energia de custos anuais de R$ 1,35 bilhões (US$ nação e acidificação. Esses extremos oceâ- compreensão de alguns dos principais fe-
em Recife em 94,1% comparado com os ní- 575,01 milhões), retornando o investimento nicos afetam os ecossistemas marinhos, a nômenos geofísicos associados às mudan-
veis de 2014 e que o gasto energético total em 11 anos e gerando uma economia anual disponibilidade de alimentos e, portanto, as ças climáticas que possuem consequências
para a cidade crescerá em 174,2% em rela- por todo período de duração das medidas. economias locais e globais. À medida que importantes sobre o oceano e o clima e,
os extremos oceânicos representam desafios consequentemente, sobre os diferentes se-
6. Conclusões e perspectivas crescentes para as áreas costeiras, a adapta- tores da economia do país.
ção climática e a resiliência costeira devem A evidência do papel que desempenham
O oceano desempenha um papel funda- oceanos e desoxigenação estão se tornan- ser objetivos-chave no planejamento e im- os oceanos Atlântico e Pacífico sobre a
mental nos ciclos da água, energia e carbo- do mais frequentes e intensos, tendo um plementação de políticas de zonas costeiras. ocorrência de eventos climáticos extremos e
no. Absorve 93% do excesso de calor das efeito devastador nos ecossistemas mari- A adaptação bem-sucedida baseia-se seus impactos tanto socioeconômico como
mudanças climáticas provocadas pelo ho- nhos e nas comunidades costeiras locais. em uma ampla gama de recursos, des- ambientais na região exige que esses últi-
mem e um terço das emissões de CO2. Con- Ao mesmo tempo, o oceano fornece calor e de a modelagem baseada na ciência até o mos beneficiam de uma atenção especial.
sequentemente, ondas de calor marinhas, umidade à atmosfera e, como tal, também conhecimento da comunidade local e abran- Entretanto, os mecanismos de interação en-
eventos extremos de acidificação dos é responsável pelo aumento dos extremos ge muitos tipos de intervenções, desde estru- tre as bacias tropicais e suas implicações para

420 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 421


o clima regional ainda não são bem compre- população. A ausência de observações con- estratégias de planejamento e a habilidade alcalinidade total, carbono inorgânico total,
endidas. Portanto, estudos mais aprofunda- tínuas de longa duração, assim como a falta local para usar as informações das mudan- ou pressão parcial de CO2), além das variá-
dos são necessários para um melhor enten- de mapeamentos altimétricos de detalhe, ças climáticas geradas através das pesquisas veis oceanográficas essenciais, como tempe-
dimento desses mecanismos assim como representa a maior dificuldade na constru- científicas no gerenciamento da região; (3) ratura, salinidade, oxigênio dissolvido e nu-
a maior previsibilidade, com antecedência ção de cenários de risco em nível local e Valorar os recursos naturais e culturais em trientes em sítios considerados estratégicos
de alguns meses, de seus impactos. Essas consequentemente para o desenvolvimento risco nas Zonas Potencialmente Inundáveis e e/ou vulneráveis, como áreas de proteção
análises são necessárias pois se apresentam e aplicação de medidas de minimização dos Costeiras; (6) Verificar os efeitos do aumen- marinha, e plataformas alternativas de ob-
como um subsídio fundamental na elabora- impactos sobre a população. to do nível do mar na indústria do turismo. servação, como navios de oportunidade; 2)
ção das políticas públicas que visam mitigar Uma série de recomendações é sugerida Embora tenha havido um aumento da fomentar os programas ecológicos de longa
os impactos causados por esses últimos so- para adaptação e mitigação diante dos im- literatura científica sobre a acidificação do duração marinhos e costeiros – PELD – para
bre sociedade para os próximos anos. pactos previstos pelo aumento do nível do oceano e seus impactos na biodiversidade que, além dos parâmetros físico-químicos
Com relação ao Ciclone Catarina, fatores mar no Brasil. Estas se dividem em dois eixos: marinha da Amazônia Azul desde a última sejam observadas também as respostas dos
ambientais oceânicos e atmosféricos foram um relativo aos tipos de conhecimentos que década, pouco se sabe sobre as tendências organismos aos impactos da acidificação e
avaliados conjuntamente através de uma te- devem ser adquiridos prioritariamente sobre regionais de acidificação. De forma similar poluição do mar, e 3) aumentar a coopera-
oria que quantifica a contribuição integrada o fenômeno para possibilitar previsões e ce- às ações voltadas para a problemática do ção científica com a finalidade de acelerar
desses fatores: o Índice de Gênesis Potencial nários futuros mais precisos sobre os impac- aumento do nível do mar, é necessário: 1) as soluções de mitigação e adaptação, no
(GPI). Os altos valores de GPI alcançados em tos e o outro em relação a ações de geren- instalar o monitoramento a longo prazo propósito do Objetivo de Desenvolvimento
março de 2004, mês em que o Catarina se ciamento e planejamento urbano que devem de pelo menos dois dos parâmetros rela- Sustentável 14 – Vida na água – e a Década
desenvolveu, não tiveram precedentes na incentivados para melhorar a capacidade de cionados à acidificação do oceano (pH, das Nações Unidas para o Oceano.
série histórica de 30 anos. Os resultados in- adaptação dos municípios em questão. No
dicam uma importante correspondência en- escopo desses dois eixos são abordados os Referências
tre as fortes anomalias positivas de GPI e as seguintes temas emergenciais: Eixo 1- (1)
principais etapas do ciclo de vida do Catari- Monitoramento do nível médio relativo do ALFREDINI, P.; ARASAKI, E.; AMARAL, R. F. G.; ARÍSTEGUI, J.; GUINDER, V. A.; HALL-
na, principalmente: (1) onde o sistema pas- mar; (2) Compreensão dos fenômenos hi- do. Mean sea-level rise impacts on Santos BERG, R. et al. Changing Ocean, Marine
sou a caracterizar um ciclone subtropical e drodinâmicos indutores de inundação em Bay, Southeastern Brazil – physical model- Ecosystems, and Dependent Communities.
posteriormente sofreu transição tropical (TT) zonas estuarinas; (3) Análise da maneira di- ling study. Environmental Monitoring and In: PÖRTNER, N. M. W. H.-O.; ROBERTS,
para um ciclone tropical propriamente dito, ferencial de como os recifes e manguezais Assessment, 144: 1-3, 2008. D. C.; MASSON-DELMOTTE, V.; ZHAI, P.;
e (2) onde ele adquiriu o status de “furacão” atuam na dispersão das ondas na atualida- ARAÚJO, M.; MALLMANN, D. L. B.; LEI- TIGNOR, M.; POLOCZANSKA, E.; MINTEN-
na escala Saffir-Simpson. Desta forma, o GPI de e como eles atuarão com o aumento do TE, F. S.; ROLLNIC, M.; MESQUITA, P. P.; BECK, K.; ALEGRÍA, A.; NICOLAI, M.; OKEM,
se mostra, potencialmente, como um bom nível relativo do mar. Criação de Unidade BORBA, M.; FAÇANHA, P. Vulnerabilidade A.; PETZOLD, J.; RAMA, B. (eds.). IPCC Spe-
índice para a obtenção de um limiar para a de Conservação como estratégia de prote- e impactos à elevação do nível do mar do cial Report on the Ocean and Cryosphere
Centro Metropolitano do Recife, PE. Rela- in a Changing Climate, 2019.
ciclogêneses tropical no Sul/Sudeste do Bra- ção e manutenção destas defesas naturais;
tório Técnico, Recife, 168 p. 2009. BLACK, E.; BLACKBURN, M.; HARRISON,
sil. Esse resultado poderá servir como base (4) Elaboração de cartas de vulnerabilidade
ARAÚJO, M.; OMETTO, J.; RO- R. G.; HOSKINS, B. J.; METHVEN, J. Factors
conceitual para futuras investigações sobre fundamentadas nos processos hidrodinâmi-
DRIGUES-FILHO, S.; BURSZTYN, M.; Contributing to the Summer 2003 European
a probabilidade de outros eventos do tipo cos; (5) Realizar estudos de probabilidade LINDOSO, D. P.; LITRE, G.; GAIVIZZO, L.; Heatwave. Weather, 59 (8), 217-223, 2004.
Catarina na região, especialmente conside- de ocorrência de fenômenos hidrodinâmi- FERREIRA, J. L.; REIS, R. M.; ASSAD, E. BRAUKO, K. M.; CABRAL, A.; COSTA,
rando os efeitos das mudanças climáticas. cos extremos; (6) Avaliar a capacidade de The socio-ecological Nexus + approach N. V.; HAYDEN, J.; DIAS, C. E.; LEITE, E.
No que se refere ao aumento do nível drenagem de cada município; (7) Melhorar used by the Brazilian Research Network on S.; WESTPHAL, R. D.; MUELLER, C. M.;
do mar, os resultados indicam que a baixa as informações altimétricas dos municípios; Global Climate Change. Current Opinion HALL-SPENCER, J. M.; RODRIGUES, R. R.;
ocupação de grande parte da linha de cos- Eixo 2- (1) Reavaliar e adequar os planos de in Environmental Sustainability, 39:62- RÖRIG, L. R. Marine heatwaves, sewage
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tram nas cidades costeiras, sendo os riscos ração as implicações do aumento relativo do cosust.2019.08.005. deoxygenation and biodiversity loss: A SW
de inundação os de maior impacto sobre a nível do mar; (2) Verificar o atual status das BINDOFF, N.; CHEUNG, W. W. L.; KAIRO, J. Atlantic case study. Frontiers in Marine

422 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 423


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428 ECONOMIA AZUL Oceano e Clima: Novos Desafios 429


21

DA OBSERVAÇÃO À UTILIZAÇÃO DE DADOS

Clemente Augusto Souza Tanajura


Fabrice Paul Antonie Hernandez
Paulo Nobre
Márcio Borges Ferreira

1. Introdução

Como mencionado nos Capítulos 19 e oceano, o conhecimento sobre o estado


20, o oceano é parte interativa de todo o do oceano e seu comportamento é cada
sistema terrestre. O oceano é caracterizado vez mais necessário para a sociedade; a
por seus processos dinâmicos físicos e bio- Economia Azul está permanentemente
geoquímicos com variabilidade em todas impondo o crescimento de suas atividades
as escalas de espaço e tempo. A circulação sobre o oceano, da superfície até o fundo.
oceânica transporta e mistura, em esca- Observar o oceano se torna crucial, mas
la global, calor e massas de água com se defronta com os desafios pelo tamanho
vários conteúdos químicos e material do oceano e a miríade de processos que lá
natural ou artificial que pode poluir re- ocorrem em todas as escalas. Desde dos
giões oceânicas e degradar ecossistemas, anos 1970, a tecnologia e a capacidade
reduzindo os benefícios para a socieda- de observação do oceano têm progredido
de. Assim, recursos oceânicos reunidos fortemente, em particular através de par-
através das atividades humanas são im- cerias internacionais que almejam a inten-
pactados pela variabilidade da circulação sificação do esforço onde o oceano é inter-
oceânica e de seu estado. Atividades no nacional. Contudo, o Sistema de Observa-
mar, como transporte, pesca, turismo e ção Global do Oceano (Global Ocean Ob-
outras, são também afetadas por todos serving System – GOOS) (MOLTMAN et al.,
os processos oceânicos, os quais podem 2019), sustentado por esse esforço inter-
evoluir para eventos sob condições extre- nacional, ainda precisa de melhorias. Este
mas e perigosas. Considerando desde a capítulo enfoca os processos oceânicos e
praia, áreas costeiras e regiões estuarinas, as escalas que são observados e, sobretu-
até o oceano profundo e o assoalho do do, como essas observações são usadas

430 ECONOMIA AZUL Da Observação


Da Observação à
à Utilização
Utilização de
de Dados
Dados 431
431
ou poderiam ser usadas para prover apoio do conhecimento” do oceano. Por exem- pode ser facilitado pela adoção de acor- o monitoramento da maioria das Variáveis
à Economia Azul no Brasil. plo, o mapeamento da batimetria do oce- dos para aplicar padrões comuns e as me- Oceânicas Essenciais (EOVs).
É importante primeiro mencionar que as ano global em escala média (8-10 km, lhores práticas (PEARLMAN et al., 2021) No Brasil, o destaque é o Banco Nacio-
características da amostragem observacio- TOZER et al., 2019) só foi completado na medição, calibração e transferência de nal de Dados Oceanográficos (BNDO) man-
nal dependem do fenômeno a ser estudado quando missões de satélites altimétricos informação do dado bruto até a informa- tido pelo Centro de Hidrografia da Mari-
e de outros fatores, como exequibilidade e e gravimétricos foram lançadas desde os ção processada nos servidores de dados. nha (CHM). Ele foi criado em 1994 e tem
recursos disponíveis. De forma geral, para anos 1990. Novas estruturas topográfi- Nas duas últimas décadas, a comunidade cadastrado em sua base as informações e
qualquer estudo científico, quanto mais cas e espécies da fauna são descobertas oceanográfica como um todo tem tenta- os dados oceanográficos, batimétricos me-
longa for a série temporal de dados, melhor a cada expedição científica em áreas do do compartilhar práticas e adotar proce- teorológicos, incluindo algumas regiões es-
será a obtenção de informações sobre a va- oceano profundo e polar; dimentos nos quais atores sucessivos au- tuarinas, fornecidos por organizações na-
riabilidade de baixa frequência em escalas (ii) estudar processos físico-biogeoquími- mentam o valor agregado da cadeia desde cionais e estrangeiras, oriundas de comis-
interanual, decenal e além. Quanto menor cos específicos e prover base para a cons- o dado bruto até o estágio final das bem sões realizadas por navios da Marinha do
for intervalo entre as medições, melhor será trução de relações estatísticas e matemáti- organizadas bases de dados acessíveis ao Brasil e navios mercantes, pela comunidade
a obtenção de informações sobre a variabi- cas, as chamadas parametrizações, a serem usuário final. científica nacional e por navios de pesquisa
lidade de alta frequência em escalas intra- empregadas em modelos numéricos de si- Atualmente, portais de dados oceâni- estrangeiros em águas sob jurisdição bra-
sazonal, diurna e turbulenta. mulação e previsão da circulação oceânica cos, como o National Oceanic Data Center sileira. O BNDO representa a contribuição
Segundo, o oceano é apenas um com- ou do sistema terrestre; (NODC) dos EUA e o Copernicus Marine brasileira para o programa Internacional de
ponente do sistema climático e terrestre, (iii) validar e investigar a qualidade dos Environment Monitoring Service (CMEMS) Intercâmbio de Informações e Dados Oce-
formado pela atmosfera, a criosfera, a su- modelos numéricos em modo de simula- da Europa dão acesso a vários níveis de da- anográficos da Comissão Oceanográfica
perfície dos continentes e a biosfera. A va- ção e previsão; dos observados e processados do oceano, Intergovernamental (COI). O banco abriga
riabilidade do oceano em todas as escalas (iv) juntamente com os métodos de assi- contemplando diferentes tipos de usuários dados de diferentes sensores, incluindo os
está intimamente ligada à dos outros com- milação de dados e modelos numéricos, e usos, por exemplo: dados meteoceanográficos do Programa
ponentes, de modo que diversos processos construir a condição inicial de sistemas Nacional de Boias (PNBOIA) e dados de
oceânicos não podem ser estudados de previsores de curto-prazo e em escalas (i) dados brutos para puro uso científico e marégrafos. Alguns dados estão disponí-
forma independente. Assim sendo, é man- mais longas; calibração de modelos e processos; veis para download, como os do PNBOIA, e
datório que os dados observados do oce- (v) construir as chamadas reanálises, i.e., (ii) dados “limpos” tratados depois de outros necessitam de requisição por e-mail.
ano sejam disponibilizados em bancos de longas séries temporais produzidas por sis- calibração, validação e com redução de O BNDO carece, entretanto, de aprimora-
dados que também ofereçam informações temas de assimilação de dados, observa- incertezas de certo tipo de instrumento e mentos para facilitar a disponibilização dos
dos outros componentes do sistema terres- ções e modelos, que permitem uma repre- plataforma, para serem usados em estudos dados por ele abrigados e, com isso, am-
tre ou que, pelo menos, indiquem o acesso sentação mais acurada do clima pretérito e, científicos por especialistas; pliar os benefícios que o uso dos dados traz
a eles. O amplo benefício dos sistemas ob- com isso, possibilitam um melhor entendi- (iii) dados de alto nível provenientes de para os avanços científicos e para toda a
servacionais depende da forma na qual os mento do clima e de suas mudanças. pós-processamento, normalmente combi- cadeia de serviços produzida pelos diversos
dados são armazenados e disponibilizados nando diferentes tipos de medidas e pla- setores de nossa sociedade que direta ou
juntamente com outros tipos de dados. Outro aspecto é a diversidade de ato- taformas de determinada grandeza (e.g., indiretamente estão associados ao mar.
Os processos oceânicos e o ecossistema res, tecnologias e programas que hoje co- temperatura da superfície do mar estima- Os sistemas de observação do oceano
marinho estão longe de serem completa- letam observações do oceano. O amplo da por satélites), que são regradeadas es- global sofreram uma verdadeira revolu-
mente entendidos. As observações do oce- benefício dessas observações depende pacialmente e mapeadas em uma frequ- ção nas últimas décadas. Dentre os mais
ano são fundamentais e usadas inicialmente também de informações associadas ou ência regular, com acurácia bem definida, relevantes marcos conquistados para sua
para reduzir lacunas do conhecimento para: “metadados” que informam as formas a fim de facilitar a investigação, a visuali- melhoria, pode-se mencionar: (i) o satélite
de medição das grandezas, a precisão dos zação e, então, a transferência e uso por altimétrico TOPEX/POSEIDON, lançado em
(i) descoberta, observação e identificação instrumentos e as especificidades das pla- usuários finais que não são especialistas 1992, que produziu informações sem pre-
de processos oceânicos e biodiversidade taformas de coleta de dados (e.g., avião no processamento dos dados brutos. Es- cedentes sobre a topografia dinâmica mé-
desconhecidos, e, ainda, extensão do“mapa versus navio versus boias ancoradas). Isso ses produtos oceânicos dão acesso para dia e absoluta do oceano global, circulação

432 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 433


oceânica e marés (MUNK, 2002); (ii) a orga- de mudanças climáticas. Deve-se mencio- in situ existente, esses dados permitiram 2.1 O que é a oceanografia
nização de dados de alta resolução de tem- nar também que essas conquistas foram monitorar o estado do oceano superior na operacional? O tripé observação-
peratura da superfície do mar (TSM) pelo apoiadas de forma crucial pelo substancial larga escala, criando uma massa crítica de modelo-assimilação
Group of High Resolution Sea Surface Tem- aumento da capacidade de processamen- informações que viabilizasse seu uso em
perature (GHRSST) (DONLON et al., 2007), to computacional empregada, tanto para um sistema operacional. Da comunidade A oceanografia operacional é a área da
fundamentais para servir como condição de processar e disponibilizar os dados coleta- de meteorologia, técnicas de assimilação oceanografia dedicada à coleta de dados
contorno para modelos de previsão de tem- dos como para integrar operacionalmente de dados foram adotadas e adaptadas para observados em tempo quase real, assimi-
po a curto prazo e para o entendimento modelos de física complexa com resoluções empregar as observações oceânicas dispo- lação de dados, produção de previsão nu-
do clima oceânico; e (iii) a implantação do cada vez mais altas (e.g., LE SOMMER et níveis na correção dos campos dos modelos mérica do ambiente oceânico com diver-
sistema Argo a partir dos anos 2000 para al., 2018; CHASSIGNET e XU, 2017). Ape- numéricos e, com isso, produzir acurada sos horizontes de tempo para o futuro e
medição de perfis verticais de temperatura sar da importância dos dados observados, condição inicial para os sistemas previsores. disponibilização dessas informações para
(T) e salinidade (S) até 2000 m de profundi- sua cobertura é ainda limitada, conside- A assimilação produz uma condição inicial os interessados por essas observações e
dade, hoje com mais de 3,900 perfiladores, rando que a maioria dos dados hoje co- mais realista e, portanto, impactos positivos previsões. O sistema previsor é basica-
sendo agora expandido para coletar dados letados de EOVs são obtidos por satélites na previsibilidade dos modelos nas escalas mente composto por um modelo numéri-
de T/S em toda a coluna-d’água, da super- que amostram apenas a superfície dos de tempo curta, estendida, sazonal e ainda co da circulação oceânica, seus forçantes
fície até o assoalho, e abrigar sensores de oceanos. Isso limita a um entendimento mais longas (EDWARDS et al., 2015; MAR- atmosféricos, normalmente provenientes
CO2, O2, clorofila-a, entre outros (ROEMMI- parcial de fenômenos de subsuperfície, TIN et al., 2015; MOORE et al., 2019). de previsões oferecidas por modelos at-
CH et al.2019; LETRAON et al., 2020). que só podem ser observados por senso- Na prática, a rotina da previsão oceânica mosféricos ou acoplados oceano-atmosfe-
Essa revolução dos sistemas observacio- res in situ, como os do Argo e Gliders, ou também necessitou do desenvolvimento de ra-terra-gelo, e um sistema de assimilação
nais levou a um grande avanço no enten- coletados por equipamentos lançados di- sistemas de processamento de dados para de dados, responsável pela construção da
dimento de processos físicos nos oceanos retamente por navios. Portanto, o uso de coletar diariamente observações in situ e condição inicial do modelo previsor. No
e de interação oceano-gelo-atmosfera, modelos numéricos com assimilação de por sensoriamento remoto e para realizar caso de o sistema previsor considerar as
demonstrados com a implantação de sis- dados, empregados amplamente na oce- uma verificação e controle de qualidade dos grandezas do ciclo biogeoquímico e ecos-
temas previsores de tempo e clima de alta anografia operacional, é crucial para com- dados que pudessem prover regularmente sistêmicas, a complexidade aumenta, pois,
qualidade e de investigações de cenários plementar a informação observacional. informações para a assimilação e inicializa- além das grandezas físicas como velocida-
ção dos sistemas de previsão oceânica. Sem de, temperatura e salinidade, é necessário
um bom sistema de controle de qualidade observar, modelar e assimilar nutrientes,
2. A oceanografia operacional de dados, dados com erros grosseiros pode- oxigênio, detritos, sedimentos e muitas
riam ser assimilados e comprometer subs- outras grandezas. Assim, a oceanografia
Apoiada pelo sucesso e desenvolvi- sua evolução no tempo ao longo da janela tancialmente a previsibilidade dos sistemas. operacional é calcada, portanto, no tripé
mento dos sistemas de previsão numérica de previsão, juntamente com forçantes at- Esforços foram conduzidos pela comunida- observação-modelo-assimilação, visto que
de tempo e clima realizado pelas agências mosféricos e condições iniciais acuradas do de internacional para aprimorar essa cadeia sem um desses componentes não é possí-
de meteorologia, a comunidade da ocea- estado “real” do oceano. No final dos anos de processamento de observações para fins vel realizar previsão numérica acurada que
nografia iniciou o desenvolvimento de sis- 1990, os modelos oceânicos foram capazes operacionais com base no conhecimento seja útil para os diversos setores de nossa
temas de previsão numérica dos oceanos de representar a circulação oceânica de me- científico em calibração e validação das ob- sociedade que demandam previsões.
no fim dos anos 1990 para implantar as soescala forçados por campos atmosféricos servações brutas. Por exemplo, dados de
primeiras atividades rotineiras e opera- com o ciclo diurno. Em paralelo, a radio- altura da superfície do mar (ASM) coleta- Observações
cionais de previsão da circulação oceâni- metria e a altimetria por satélites oferece- dos por satélites são recalibrados ao longo
ca. Baseado no paradigma atmosférico, ram uma cobertura global da TSM e da to- do tempo considerando novas observações Deve ser mencionado que os dados ob-
a oceanografia operacional e a previsão pografia dinâmica que permitiram mapear com sensores cada vez mais precisos. Esse servados possuem erros de diversas nature-
oceânica necessitaram de modelos numé- com frequência semanal a circulação oce- esforço é realizado continuamente com a zas, de modo que não representam exata-
ricos do oceano suficientemente confiáveis ânica global em larga e mesoescala. Com- extensão regular dos sistemas de observa- mente a realidade, que é intangível. Há o
para representar os processos oceânicos e binados com a rede de dados oceânicos ção oceânica (PENNY et al., 2019). erro de instrumentação associado ao sensor,

434 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 435


que muitas vezes é pequeno logo depois de são produzidos em todo o domínio tridi- isto é, muitas vezes não funcionam da Apesar das diversas e relevantes apli-
calibrado em laboratório, mas que pode au- mensional de interesse, que pode ser global mesma forma em diferentes regiões e são cações, o uso das análises como condição
mentar substancialmente depois de algum ou regional. Esses campos incluem fluxos construídas para oferecerem relações entre inicial do sistema previsor foi e ainda é a
tempo de uso. Por exemplo, recentemente de calor, sal e momentum, além das gran- grandezas em faixas específicas de valores. principal motivação para o desenvolvimen-
foi identificado pelos responsáveis do sis- dezas primitivas de altura da superfície do Finalmente, há fontes de erros dos modelos to dos métodos de assimilação de dados
tema Argo que, devido à um problema na mar, velocidade, temperatura, salinidade e associadas às condições de contorno, seja em meteorologia e oceanografia. Assim
construção de sensores de salinidade da Se- densidade ou pressão, no caso de um mo- na batimetria, nas condições cinemáticas como a atmosfera, os oceanos e os siste-
aBird Scientific a partir de 2016, o erro de delo puramente de circulação oceânica. Se das fronteiras, seja nos forçantes atmos- mas climático e terrestre são caóticos, e
instrumentação após 2 anos de uso sofreu modelo incluir gelo marinho e grandezas féricos. Considerando as limitações dos parte da previsibilidade dos sistemas pre-
um aumento que ultrapassou o valor-alvo de do ciclo biogeoquímico, outras grandezas modelos e das observações, os métodos de visores depende da qualidade da condição
0,01 psu, podendo atingir mais de 0,05 psu estarão também disponíveis, como espes- assimilação de dados extraem as melhores inicial. Quanto menor for o erro da condi-
(K. Sato, 8th OceanPredict OS-Eval-TT Mee- sura e concentração de gelo, concentração informações dessas fontes e as combinam ção inicial, maior é a probabilidade de se
ting, April 28, 2021). Esse fato movimentou de dióxido de carbono e pH. Em modelos para produzir as valiosas análises objetivas, produzir previsões acuradas (e.g., DERBER
a comunidade científica para remover o viés do ecossistema, além de todas essas gran- que são empregadas tanto para estudos e ROSATI, 1989; KALNAY, 2003; EVENSEN,
dos dados e identificar os impactos desses dezas, nutrientes, clorofila, uma miríade de científicos como para a prática da previsão 2006; DAVIDSON et al.2019).
dados nos resultados científicos derivados parâmetros da cadeia trófica deve ser con- oceânica operacional.
destes. Além do erro de instrumentação, siderada. Os modelos oferecem, portanto, Observando as escalas certas para a
há também o erro de amostragem, associa- uma representação espaço-temporal dos Assimilação de dados assimilação
do ao fato de muitas vezes não ser possível processos oceânicos, do ciclo biogeoquími-
coletar dados com a frequência necessária co e de ecossistemas que atendem ou po- Visando extrair o máximo de informação A capacidade da assimilação de restringir
para caracterizar a variabilidade do fenôme- dem atender aplicações diversas, incluindo dos dados observados e reduzir os erros dos ou corrigir a solução do modelo numérico
no natural. Algumas frequências de varia- a conservação do ambiente marinho, e vas- modelos numéricos, métodos de assimilação na direção das observações é limitada pela
bilidade obtidas dos dados observados são ta gama de usuários da informação ocea- de dados são empregados. Eles aprimoram a qualidade e quantidade de observações.
projeções errôneas da frequência natural. nográfica, especialistas ou não. Entretanto, representação da circulação e do estado físi- Em modelos globais de relativamente bai-
Portanto, sempre deve ser tomado muito os modelos também têm limitações. co do sistema de interesse produzida por mo- xa resolução, com espaçamento de grade
cuidado com o uso de dados observados Para viabilizar a obtenção de uma so- delos numéricos corrigindo os campos dos de 20 km ou maior, os campos de TSM e
para estudar processos, pois tanto os erros lução, os modelos numéricos não lineares modelos na direção das observações e extra- ASM globais hoje disponíveis com resolu-
de instrumentação quanto os de represen- sofrem uma série de aproximações e pos- polando a informação observacional no es- ção, respectivamente, de aproximadamente
tatividade têm que ser considerados. suem erros sistemáticos ou aleatórios em paço do modelo (DALEY, 1991; Kalnay et al., 5 km e 25 km, juntamente com os perfis T/S
todas as suas grandezas. As equações do 1996; EVENSEN, 2003). Os métodos de assi- oferecidos pelos perfiladores Argo e outros
Modelos modelo, depois de aproximadas com mé- milação combinam, de forma ótima ou subó- equipamentos, oferecerem boa qualidade
todos numéricos e aproximações matemá- tima em um sentido matemático, campos de e quantidade para corrigir com eficácia os
Os modelos numéricos dos oceanos, as- ticas, enfrentam ainda dificuldades com as modelos com dados observados e produzem modelos. Contudo, quando se consideram
sim como os da atmosfera e do sistema ter- resoluções espacial e temporal empregadas novos campos, as análises objetivas, com er- os modelos regionais ou mesmo globais
restre, são ferramentas fundamentais para para discretizar o espaço-tempo, tendo em ros menores que os dos modelos. Eles con- com alta resolução (2 km ou menores), os
a sociedade nos dias de hoje. Eles refletem vista que o aumento da resolução impõe sideram os erros dos dados observados e os sistemas observacionais hoje disponíveis
grande parte do conhecimento científico mais custos computacionais, não só no pro- erros do modelo, os dados observados e os não são mais eficazes. Esse desafio requer a
conquistado até hoje em oceanografia e cessamento como no armazenamento das campos do modelo que sofrerão correções. concepção e implantação de novos sistemas
meteorologia considerando equações não saídas. Isso impede os modelos de resolve- Quando os erros do modelo são grandes em observacionais de alta resolução para aten-
lineares e contínuas que traduzem os ba- rem processos com pequena escala espa- relação aos erros das observações, a análise der a uma nova etapa da evolução dos siste-
lanços de momentum, massa e energia cial e/ou de alta frequência. Outra fonte de se apoia mais nas observações. Quando o mas previsores de feições com variabilidade
(FOX-KEMPER et al., 2019). Diferentemen- erros dos modelos são as chamadas para- contrário acontece, a análise se apoia mais de alta frequência em escalas espaciais infe-
te das observações, os campos dos modelos metrizações físicas, que não são universais, nos campos do modelo. riores a 2 km, na chamada submesoescala.

436 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 437


A comunidade científica de seu potencial para melhor entendimen- Como fruto da REMO, o primeiro sistema PIRATA (MIGNAC et al., 2015; SANTANA et
internacional envolvida na tos de processos como a interação da plu- de previsão numérica oceânica operacional al., 2020; TANAJURA et al., 2020).
oceanografia operacional ma do Rio Amazonas com a circulação do a curto prazo (até 5 dias) com assimilação O impacto positivo que a assimilação de
Atlântico tropical oeste (VARONA et al., de dados oceanográficos da América Latina dados pode oferecer na previsão da estru-
Considerando a necessidade de desen- 2019). Em 2019, o GODAE OceanView foi foi implantado no CHM em agosto de 2009 tura termohalina e de anomalias de TSM e
volvimento da oceanografia operacional, encerrado e o OceanPredict foi iniciado. e seus resultados oferecidos a partir do iní- de ASM do sistema HYCOM+RODAS no
em 1998 foi iniciado um grande esforço in- Hoje, 12 países participam do OceanPre- cio de 2010. Essa conquista levou a REMO à horizonte de 30 dias na Metarea V foi de-
ternacional através do projeto Global Oce- dict: Austrália, Brasil, Canadá, Coreia do admissão no GODAE OceanView no final de monstrado em Carvalho et al. (2019). Ao
an Data Assimilation Experiment (GODAE) Sul, China, EUA, França, Itália, Índia, Japão 2010. O sistema previsor com assimilação final de 30 dias, os erros das previsões de
(CHASSIGNET e VERRON, 2006; BELL et al., e Noruega, além da Comunidade Europeia. foi aprimorado ao longo do tempo, sempre TSM em relação às análises atingiram em
2009). Esse projeto envolveu os maiores No OceanPredict, novos desafios estão sen- empregando o modelo Hybrid Coordina- média 0,5 oC e, sem assimilação, cerca de
centros operacionais de oceanografia do do agora discutidos, em particular como a te Ocean Model (HYCOM) (MELLO et al., 1 oC. As correlações da AASM das previsões
mundo e apoiou o planejamento e a reali- oceanografia operacional apoiará os de- 2013; TANAJURA, et al., 2013). Hoje é usa- inicializadas com assimilação foram cerca
zação de estudos científicos envolvendo o senvolvimentos do Programa das Nações da uma grade com 1/12o de resolução ho- de 0,8, e, sem assimilação, menores de 0,6.
aprimoramento de sistemas de observação Unidas da Década da Ciência dos Oceanos rizontal e 32 camadas verticais que cobre o Outros resultados sobre a previsibilidade do
in situ e por sensoriamento, de métodos para Desenvolvimento Sustentável e todos Oceano Atlântico e parte do Índico (60oW – HYCOM+RODAS na janela de até 3 dias
de assimilação de dados oceanográficos e os serviços para a sociedade e a Economia 40oE, 78oS – 50oN) e uma grade com 1/24o e foram acessados em Tanajura et al. (2020)
de modelos oceânicos (CUMMINGS et al., Azul que são esperados. 32 camadas para a Metarea V que considera e Santana et al. (2020). Reduções nos er-
2009; DAVIDSON et al., 2009). Em 2009, os efeitos da maré. O sistema é inicializado ros da previsão de TSM foram maiores que
o GODAE foi encerrado e seu legado foi REMO: primeiro sistema de pelo REMO Ocean Data Assimilation System 50% e aumento na correlação de ASM
passado para o GODAE Oceanview (BELL previsão numérica operacional com (RODAS) (TANAJURA et al., 2014; MIGNAC maiores que 40%. Esses exemplos demons-
et al., 2015). Nessa nova etapa, os mes- assimilação na América Latina et al., 2015; TANAJURA et al., 2020, SAN- tram a grande importância das observações
mos objetivos gerais do GODAE foram TANA et al., 2020; DORFSCHÄFER et al., e da assimilação no sistema previsor.
mantidos, mas houve uma adaptação do No Brasil, um grande avanço em oce- 2020), baseado no método de assimilação Além do uso nas previsões, as análises
trabalho para atender a novas demandas anografia operacional foi dado em 2007 de interpolação ótima por conjuntos (EnOI), objetivas podem contribuir positivamente
de desenvolvimento da oceanografia ope- com a criação da Rede de Modelagem e muito adequado para uso operacional ten- para o melhor entendimento de processos
racional costeira, de sistemas regionais de Observação Oceanográfica (REMO), com do em vista seu relativamente baixo custo físicos e/ou biogeoquímicos dos oceanos,
previsão com alta resolução espacial e me- recursos da Petrobras e da Agência Na- computacional (EVENSEN, 2003; OKE e visto que, como são mais acuradas que os
lhor disseminação dos produtos observa- cional do Petróleo, Gás Natural e Biocom- SCHILLER, 2007; COUNILLON e BERTINO, campos puramente do modelo, podem
cionais e de previsão ou simulação. Ainda, bustíveis (ANP) (LIMA et al., 2013; TANA- 2009). O HYCOM+RODAS em operação no também oferecer diagnósticos mais preci-
desafios científicos são permanentemente JURA et al., 2013; MELLO et al., 2013). CHM produz diariamente previsões na jane- sos sobre a circulação e a variabilidade dos
enfrentados com a implantação de novos Um consórcio composto pela UFBA, la de 5 dias para todo o Oceano Atlântico oceanos. Uma vez comprovada a qualida-
sistemas de monitoramento oferecendo UFRJ, FURG, USP, IEAPM, o Centro de Hi- forçado por campos atmosféricos previstos de das análises, essas podem também ser-
novos dados, como a salinidade da super- drografia da Marinha (CHM) e o CENPES/ pelo modelo Global Forecasting System vir como complemento ao monitoramento
fície do mar obtida pelo satélite Soil Mois- Petrobras apoiou o desenvolvimento em (GFS) do National Centers for Environmen- observacional e referência para avaliação
ture and Ocean Salinity (SMOS) a partir de modelagem oceânica e assimilação de tal Prediction (NCEP) da NOAA na grade de da qualidade de simulações e de previsões.
2009 (REUL et al., 2014), que podem e dados, tendo o CHM como centro opera- 1/12o e pelo modelo KOSMO integrado no Além disso, podem apoiar diversos outros
devem ser assimilados visando à melhoria cional. Hoje, as instituições que formam CHM na grade de 1/24o. O HYCOM+RO- usuários associados ao ambiente marinho.
da condição inicial dos sistemas previso- a REMO são a UFBA, a UFRJ, o CENPES DAS é hoje capaz de assimilar: (i) campos Por exemplo, o Projeto TAMAR, dedicado à
res (MARTIN et al., 2016; TRANCHANT et e o CHM, mas novas colaborações estão de TSM; (ii) dados de ASM ou de anomalia preservação de tartarugas marinhas, empre-
al., 2019). Os dados do SMOS, entretan- sendo estabelecidas, visando ao fortale- de ASM (AASM) gradeados ou ao longo da gou produtos da REMO para investigar a mi-
to, estão sujeitos a erros grandes e ainda cimento da oceanografia operacional no trilha dos satélites; e (iii) dados de perfis ver- gração e dispersão de tartarugas marinhas
não são usados operacionalmente, apesar Brasil e no exterior. ticais T/S de perfiladores Argo, CTDs, XBTs, no Atlântico Sul (MANSFIELD et al., 2017).

438 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 439


As análises complementam esforços
na implantação e aprimoramento de sis-
Os OSSEs são empregados para apoiar a
implantação de novos sistemas observacio-
0 . .. ... .. . .. . .. . ............

Depth (m)
100 0,2

(m.s-1)
temas observacionais através dos chama- nais, nos quais dados sintéticos são usados 200 0
300 -0,2
dos experimentos com sistemas observa- para capacitar o sistema a assimilar novos 400
XBT

cionais (OSEs – Observing System Experi- dados e investigar o possível impacto que 0

Depth (m) Depth (m) Depth (m) Depth (m)


100 0,2
ments) e experimentos de simulação de esses dados trarão à análise e ao sistema

(m.s-1)
200 0
sistemas observacionais (OSSEs – Obser- previsor. Por exemplo, a partir de 2023, os 300
FREE
-0,2
ving System Simulation Experiments). Os dados altimétricos do satélite Surface Wa- 400
0
OSEs são experimentos de sensibilidade ter and Ocean Topography (SWOT) aporta- 100 0,2

(m.s-1)
200 0
das análises às observações que buscam rão novas informações sobre a circulação
300 -0,2
identificar a importância relativa dos sis- submeso e mesoescala no oceano global e 400
RODAS

0
temas observacionais, ou de grandezas há hoje um grande esforço em andamen- 0,2
100
observadas, na análise e na previsibilidade to nos principais centros de oceanografia

(m.s-1)
200 0
(OKE et al., 2015; FUJI et al., 2019; TANA- operacional para realizar OSSEs e preparar 300
RODAS XBT - BKG
-0,2
400
JURA et al., 2020). os sistemas de assimilação e previsão para 0
0,2
Por exemplo, em Dorfschäfer et al. receberem esses dados (BONADUCE et al., 100

(m.s-1)
200 0
(2020), um OSE foi realizado para identifi- 2018; FUJII et al., 2019). Os desafios são 300 -0,2
RODAS XBT - ANL
car a importância de dados de temperatura grandes, pois o número de dados altimé- 400
-40 -39 -38 -37 -36 -35 -34 -33 -32 -31
de XBTs no sistema HYCOM+RODAS. Em tricos a serem assimilados aumentará em Longitude
uma integração, foram assimilados de TSM, duas ordens de grandeza e os erros asso- Fonte: Adaptado de Dorfschäfer et al. (2020)
AASM e de perfis T/S do Argo e, em ou- ciados estarão correlacionados no tempo
Figura 1. Seção vertical da velocidade assimilação. Terceira linha: HYCOM+RO-
tra integração, foram incluídos os dados de e no espaço. Entretanto, os benefícios que
meridional (m/s) ao longo da linha de DAS com assimilação de TSM, ASM e
XBTs, como os da linha AX-97 da NOAA en- eles trarão têm enorme valor, tanto para a
XBTs AX-97 (posição dos sensores repre- perfis T/S do Argo. Quarta linha: HY-
tre Vitória e a Ilha da Trindade, mantida em ciência como para uma cadeia de serviços
sentada por pontos pretos) em 27 de fe- COM+RODAS imediatamente antes da
parceria da NOAA com o MCTI no contexto na Economia Azul que prosperam a partir
vereiro de 2012. Primeira linha: velocida- assimilação dos dados de XBTs; Quinta
do projeto MOVAR. Só quando os dados de dos avanços científicos.
des estimadas geostroficamente a partir linha: HYCOM+RODAS imediatamente
XBTs foram assimilados houve uma repre-
dos dados. Segunda linha: HYCOM sem após a assimilação dos dados de XBTs.
sentação acurada dos meandramentos da A cadeia de valor da oceanografia
Corrente do Brasil na região de Vitória-Trin- operacional
dade. Como mostrado na Figura 1, apesar oceanografia e meteorologia e os centros de que puderam melhor definir uma ampla
da diferença em magnitudes, a complexa Nos anos 1990, os centros de previsão previsão de tempo e clima interessados em gama de aplicações e de usuários finais e
estrutura de velocidades meridionais só é oceânica emergentes, organizados através verificar como uma representação mais rea- se uma determinada aplicação era econo-
bem reproduzida com a assimilação dos da comunidade do GODAE, adotaram uma lista da dinâmica da superfície oceânica po- micamente confiável. Desta forma, os usu-
dados de XBTs. Esse resultado indica que se estratégia passo a passo para servir a usuá- dia em tempo real melhorar a representação ários finais pavimentaram o caminho para
houvesse um permanente monitoramento rios específicos (BELL et al., 2009). Os centros dos campos atmosféricos. O “núcleo” desses que os “usuários intermediários” transfor-
de perfis T/S, com gliders, por exemplo, operacionais criaram e apoiaram esforços produtos oceânicos foi baseado em saídas de massem os produtos básicos em produtos e
na região, a Corrente do Brasil poderia ser governamentais, concentrando-se inicial- modelos, i.e., variáveis oceânicas básicas nas serviços úteis para o mercado da Economia
melhor reproduzida e prevista a curto pra- mente em prover rotineiramente produtos grades nativas dos modelos, as quais eram Azul. Esse mecanismo de desenvolvimento
zo pelo HYCOM+RODAS. Assim, os OSEs de larga escala do oceano com os mais con- fáceis de manipular por usuários não espe- tem sido apoiado com sucesso na Europa
podem efetivamente contribuir para a sus- fiáveis modelos, sistemas de observação e cialistas em modelagem (BAHUREL et al., através do programa GMES com os projetos
tentabilidade dos sistemas observacionais técnicas de assimilação disponíveis na épo- 2009). Isso levou, posteriormente, a mode- MERSEA e MyOcean (e.g., JOHANNESSEN
e para um melhor planejamento das suas ca. Usuários óbvios desses primeiros produ- los e produtos mais consolidados dedicados et al., 2006; BAHUREL et al., 2009). Essa
futuras configurações. tos foram a comunidade de pesquisa em a um grupo de “usuários intermediários” estratégia ainda prevalece hoje ao redor do

440 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 441


Da Observação à Utilização de Dados 441
mundo: somente iniciativas governamentais Nessas atividades há suporte governamen- adaptação, primeiro, devido ao aumento do perenes que permitem uma fiel caracteriza-
com recursos públicos ao longo de décadas tal para parcerias internacionais visando ao custo do combustível fóssil e, segundo, devi- ção da variabilidade do clima passado em
podem sustentar os necessários desenvolvi- fortalecimento científico e tecnológico em do a preocupações ambientais associadas à relação ao clima presente. O oceano global
mentos de satélites e sistemas observacio- ações alinhadas com atividades internacio- poluição do ar e do mar, mudanças climáti- e todo o clima da Terra passaram e estão
nais in situ capazes de prover observações nais. cas e riscos na infraestrutura de transporte. passando por intensas modificações devido,
descrevendo a variabilidade física, biogeo- Ao longo das últimas duas décadas, o Serviços oceânicos operacionais foram de- principalmente, ao aumento da concentra-
química e de ecossistemas do ambiente ma- aprimoramento contínuo dos produtos senvolvidos para atender o setor com previ- ção de gases de efeito estufa na atmosfera,
rinho; e ainda apoiar o desenvolvimento do “básicos” da oceanografia operacional sões da intensidade e direção de correntes, à poluição e à transformação de vegetação
estado da arte da comunidade científica em na direção de maiores resoluções, maior por exemplo, e auxiliar no planejamento de natural em todo o mundo em áreas para
modelagem e assimilação em oceanogra- acurácia e representação mais completa ajuste de rotas, reduzindo o tempo de nave- agricultura, pecuária e expansão das cida-
fia e meteorologia, além do pesado custo das variáveis-chave da dinâmica física, bio- gação e a emissão de carbono. Ainda, perdas des. Esses fenômenos ocorreram e ocor-
computacional capaz de lidar com a massa geoquímica e ecossistêmica aumentou o podem ser evitadas considerando antecipar rem em escala global ao longo de décadas
de informações necessária para realizar as interesse de novos potenciais usuários. O ou adiar a atracação de um navio para carga/ ou séculos, e o oceano global, como parte
estimativas do estado atual e previsto dos maior interesse dos usuários intermediá- descarga em função de uma previsão de mar do sistema terrestre, foi também alterado.
oceanos. Esse é o caso do Brasil, onde a ci- rios capazes de planejar novas aplicações grosso na região portuária de interesse. Car- Têm-se verificado objetivamente no oceano
ência em oceanografia nas universidades e causaram uma retroalimentação positiva gueiros gastam em média 23,5 h nos portos global um aumento da temperatura do oce-
centros de pesquisa é apoiada para avançar nesse desenvolvimento convencendo no- (SIRIMANNE, 2019), mas no Brasil gastaram ano não só na superfície como no oceano
o conhecimento sobre o ambiente marinho vos usuários quanto à confiabilidade dos 1,66 dias em 2020 (fonte: http://unctadstat. profundo, aumento do nível médio do mar,
ao redor do país, com envolvimento direto novos serviços no contexto da Economia unctad.org/). Atrasos e custos podem en- reduções drásticas da cobertura de gelo ma-
da Marinha do Brasil, do MCTI, Petrobras Azul (SCHILLER et al., 2016). Na Europa, tão ser reduzidos nas operações portuárias rinho, alterações da salinidade, entre outros
e de outras instituições, contribuindo para o CMEMS é pioneiro em projetar novos brasileiras com previsões e monitoramento (IPCC, 2021). A associação de anomalias de
programas observacionais como o PNBOIA, desenvolvimentos na oceanografia opera- ambiental, como as oferecidas pelo serviço precipitação e da intensidade de furacões,
PIRATA, CLIVAR-Atlantic e grupos dedicados cional voltados para as necessidades dos SAMOA na Espanha (FANJUL et al., 2018). por exemplo, com o aumento da TSM nas
à oceanografia operacional, como a REMO. usuários (DRÉVILLON et al., 2018). Outro setor que demanda previsões bacias oceânicas é clara. Particularmente,
oceânicas é o de busca e salvamento, tanto anomalias negativas de precipitação e for-
3. Das observações até as aplicações e os serviços operacionais em regiões costeiras como em mar aberto. mação de nuvens foram registradas no su-
As correntes previstas com horizontes de deste do Brasil e oceano adjacente no verão
horas a dias ou semanas servem para que de 2013/2014 (RODRIGUES et al., 2019). Es-
Usuários da previsão e aplicações da a segurança da navegação, envolvendo especialistas definam as áreas de busca e sas anomalias, causadas por complexas te-
oceanografia operacional tanto a cabotagem como o transporte de possam reduzir o tempo de regaste em be- leconexões na atmosfera entre a circulação
carga internacional. O transporte maríti- nefício de salvar vidas e patrimônio, além no sudeste da América do Sul e a distribui-
Diversos setores no mercado da oceano- mo é hoje o mais importante dos tipos de de reduzir o custo das operações de resga- ção da convecção profunda no Pacífico Sul,
grafia operacional foram identificados nas transporte em relação ao volume de bens, te e o desgaste do pessoal e material en- provocaram sérios impactos negativos no
últimas duas décadas pelo GODAE e GO- chegando a aproximadamente 80% do vo- volvido. Isso permite que os serviços se or- abastecimento de água, na produção agrí-
DAE OceanView. Dentre eles estão trans- lume transportado em todo o mundo em ganizem para atender outras situações de cola e no aumento da TSM do Atlântico Su-
porte marítimo e segurança da navegação, 2018. Isso representa 11 bilhões de tonela- emergência em menor intervalo de tempo. doeste. Esse evento foi mais um forte indício
busca e salvamento, indústria de óleo e gás, das de bens transportados, os quais perce- As observações oceânicas são funda- da intensificação de ocorrência de ondas de
operações militares e em defesa naval, pre- bem um crescimento de cerca de 3% por mentais, não só para o conhecimento sobre calor marítimas na região de 1982 a 2016.
visão de tempo de curto prazo a sazonal, ano (SIRIMANNE, 2019). No Brasil, mais de o estado físico e biogeoquímico do oceano Outro exemplo da importância do moni-
pesca, piscicultura, recreação, turismo e 10 milhões de contêineres transitaram em atual e a oceanografia operacional como toramento do oceano está na relação entre
proteção ambiental (SCHILLER et al., 2018). portos em 2020, o 16º no ranking mundial também para estudos climáticos. Esses re- a distribuição de precipitação no Nordeste
Dentre os setores que mais se benefi- (fonte: http://unctadstat.unctad.org). Este querem longas séries temporais de dados do Brasil e a TSM do Atlântico tropical. A
ciam com previsões oceânicas pode-se citar setor econômico está antevendo uma forte coletados por sistemas de monitoramento intensidade da estação chuvosa no norte

442 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 443


do Nordeste do Brasil está ligada à Zona de a importância do conhecimento e previ- decorrente localização a curto espaço de que, dentre outras ações, permitiu a aqui-
Convergência Intertropical, a qual varia de são da dinâmica dos oceanos em áreas tempo dos destroços da aeronave. sição de computadores de alto desempe-
acordo com os diferentes modos e padrões remotas distantes do litoral. O acidente Esse trabalho foi também apoiado por nho que contribuirão para a integração de
do clima do Atlântico tropical (HOUNSOU- ocorrido na região equatorial do Atlântico outras iniciativas internacionais – particu- modelos de previsão da deriva de objetos
-GBO et al., 2015; CABOS et al., 2019). com intensa variabilidade da direção das larmente pela França, devido à sua respon- no mar e planejamento das operações.
Eventos extremos de chuva que afetam correntes oceânicas em superfície e sub- sabilidade junto a Air France – nas quais
áreas costeiras do Nordeste, causando en- superfície, além da forte interação ocea- muitos centros operacionais conduziram Combate à poluição marinha:
chentes catastróficas, deslizamentos de en- no-atmosfera, representou um grande de- estudos complementares (SCOTT et al., derramamento de óleo na costa
costas e grande destruição de infraestrutura safio para as operações de busca e salva- 2012; DRÉVILLON et al., 2013). Eles trou- brasileira
são causados por condições anomalamente mento para definição da área inicial e da xeram à tona um novo aspecto da previsão
quentes da camada superficial do Atlântico provável direção de deriva dos destroços oceânica operacional já estabelecido nas Em ações de mitigação de impactos am-
tropical, excesso de umidade e aceleração da aeronave e de possíveis sobreviventes. ciências atmosféricas: o uso de multimo- bientais causados por derramamento de
dos ventos alísios que se intensificam pró- A ocorrência do acidente em uma área delos e multissistemas de assimilação ca- óleo no mar por navios ou plataformas de
ximo à costa do Brasil e excitam células distante do litoral, a cerca de 770 km do pazes de reduzir os erros da previsão de exploração de óleo, o uso da previsão de
convectivas de mesoescala na atmosfera Arquipélago de Fernando de Noronha e trajetórias e torná-las mais confiáveis. De- temperatura, densidade e correntes é tam-
associadas com ondas atmosféricas de les- 1.100 km de Natal, além do limite da área vido ao componente caótico da dinâmica bém fundamental para que os modelos de
te vindas da África (KOUADIO et al., 2012). de busca e salvamento aéreo e marítimo dos oceanos, o uso de conjuntos de pre- transporte de óleo possam ser aplicados.
A modelagem acoplada oceano-atmosfera do Brasil, demandou um grande esfor- visões conduzidas por diferentes centros Esses devem ainda prever transformações
mostrou como anomalias positivas de TSM ço logístico conduzido pela Força Aérea oferece uma previsão probabilística mais físicas no óleo, como evaporação de gases
de mais de 1o C na piscina quente do Atlân- Brasileira e pela Marinha do Brasil. As robusta que uma única previsão. Aborda- voláteis, para que acoplados aos modelos
tico tropical levaram à intensificação das dificuldades de uma operação em região gem similar foi também empregada com o de circulação possam prever a posição do
células convectivas que causaram chuvas tão inóspita associadas aos desafios tec- acidente do voo MH370 da Malaysia Air- óleo na coluna-d’água. A previsão de cor-
extremas e inundações em Recife de 10 a nológicos da época deram provas da re- lines (DURGADOO et al., 2021). rentes tridimensionais, junto com o modelo
25 de junho de 2010 (SILVA et al., 2018). levância do conhecimento científico para Na atualidade, não é possível vislum- de óleo, contribuirão para definir as áreas a
Hounsou-Gbo et al. (2019) mostraram que uma nação que possui destacado papel brar a condução de operações de busca serem atingidas pelo óleo e para que toma-
toda a região tropical do Atlântico estava no Atlântico Sul, e como tal, constitui-se e salvamento no mar sem que haja prévio dores de decisão atuem na mitigação do
afetando a variabilidade climática do Nor- numa referência para atividades e desafios conhecimento e constante monitoramen- seu impacto ambiental.
deste. Tal problema pode ser investigado de grande porte relacionados com o mar, to das variáveis meteoceanográficas, re- O grave derramamento de óleo que
usando produtos operacionais disponíveis mesmo em áreas localizadas além de seus presentando assim dados de inicialização atingiu praias do litoral do Brasil de 30 de
do CMEMS e outros, como dados de satéli- limites jurisdicionais sob a égide da salva- para o estado da arte de modelos mate- agosto de 2019 a 20 de março de 2020
tes e in situ no Atlântico tropical, que conta guarda da vida humana no mar, funda- máticos de planejamento, gerenciamento (SOARES et al., 2022; FERREIRA, 2022;
com o papel-chave das plataformas PIRATA mental para o desenvolvimento e fomento e controle empregados nas operações de NOBRE et al., 2022) denotou a evidente
e Argo, as quais provêm hoje a amostragem da Economia Azul. busca e salvamento. Desta forma, a Mari- necessidade de monitoramento contínuo
mínima requerida para monitoramento da Somente por meio da modelagem me- nha do Brasil, por intermédio do Coman- do tráfego marítimo e da manutenção e
relevante variabilidade oceano-atmosfera teoceanográfica e de boias de deriva as- do de Operações Navais (ComOpNav) e aperfeiçoamento de sistemas de previsão
na região (FOLTZ et al., 2019). sociadas com técnicas de assimilação e re- do CHM, em parceria com as Empresas meteoceanográfica, muito além das áre-
análise, conduzidas desde 2007 no CHM Shell Brasil e Prooceano, tendo como in- as contidas em nossa Amazônia Azul pela
Operações de busca e salvamento no por meio da iniciativa de pesquisadores terveniente a Fundação de Desenvolvi- ausência de barreiras físicas nos oceanos.
mar: o caso do voo AF447 brasileiros em oceanografia operacional mento da Pesquisa (FUNDEP), estabeleceu Fenômenos ou atividades inadequadas que
da REMO, foi possível realizar um estudo em 2019 um projeto de pesquisa para o ocorrem em alto-mar, fora dos limites de
Já em 2009, a queda do avião da com- detalhado da região que permitiu a orien- desenvolvimento do Sistema de Planeja- jurisdição do Brasil, podem ser potencial-
panhia Air France, que realizava o voo tação adequada dos navios e aeronaves mento e Apoio à Decisão em Operações mente danosos ao meio ambiente e com-
AF447 do Rio de Janeiro até Paris, indicava envolvidos nas operações de busca com a de Busca e Salvamento no mar (SPAD-SAR) prometer a Economia Azul brasileira.

444 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 445


período supracitado, os quais potencial- sistema Automatic Identification System
mente poderiam ter causado o vazamento – AIS de embarcações. O sistema de de-
de óleo (FERREIRA, 2022). Mais uma vez, tecção e previsão de deriva de manchas de
a oceanografia operacional demonstrou óleo no mar é integrado através do uso de
sua relevante contribuição, agora em ações ferramentas de inteligência artificial, para
para mitigar os danos ambientais que tan- a detecção de comportamentos anômalos
to comprometeram ecossistemas costeiros de deslocamento de navios e identificação
e a economia das regiões afetadas. de manchas de óleo no mar.
A capacidade de monitoramento e pre- Conquanto o evento de derrame de
visão do deslocamento de embarcações e óleo no mar de 2019 seja único em mag-
manchas de óleo no mar tem reflexo direto nitude e extensão, com mais de 3.000 to-
na capacidade de dissuasão de derrames neladas de resíduos oleaginosos coletados
de óleo no mar por navios e plataformas ao longo de aproximadamente 2.900 km
de exploração de petróleo na Amazônia de litoral (SOARES et al., 2022), derrames
Azul. Para fortalecer essa capacidade, o de óleo de menor magnitude ocorrem com
Fundo Nacional de Desenvolvimento Cien- grande frequência. Durante o período de
tífico e Tecnológico (FNDCT) aprovou em 31 de dezembro de 2021 a 10 de fevereiro
Figura 2. À esquerda, mapa de corren- nordeste brasileiro atingidas pelo derra- 2022 financiamento para a constituição de de 2022, o IBAMA identificou a ocorrência
tes (em nós) do modelo HYCOM provido mamento de óleo marcadas em vermelho um Sistema de Detecção, Previsão e Mo- de três aportes de resíduos oleaginosos em
pelo Centro de Hidrografia da Marinha e a distribuição de correntes oceânicas nitoramento de Derrame de Óleo no Mar praias da Paraíba e do Ceará e uma man-
(CHM). O quadrado em vermelho indica nesta região: ramo Central da Corrente (SisMOM). O sistema contará com a partici- cha de óleo órfã no mar, a qual não chegou
a área de possível ocorrência do vaza- Sul Equatorial (CCSE), Corrente Norte do pação do INPE, IBAMA, UFBA, UFPR, UFSB, a atingir o litoral. De forma a exemplificar
mento de óleo. À direita, área do litoral Brasil (CNB) e Corrente do Brasil (CB). UFES, UFMA, UFRJ, IOUSP, IEAv, VISIONA, o futuro funcionamento do SisMOM, o
UFPA, SIMEPAR, EPAGRI, UnB, UFRGS, caso do aparecimento de manchas de óleo
Fonte: Cortesia do Centro de Hidrografia da
Marinha (CHM), 2019
UFPE, UFPI, UFAL, PUC-Rio; em adição à no litoral da Paraíba entre 31/12/2021 e
DGDNTM, CPTMRJ, CASNAV, CHM, COM- 1/1/2022 foi analisado. Para este exercício,
PAAz, DGePM, IEAPM e IPqM da Marinha. foi montada sala experimental de situação
Graças à modelagem numérica regres- ramo Central da Corrente Sul Equatorial Ao SisMOM compete realizar estudo da SisMOM, com a participação de cientistas
siva realizada pelo grupo de trabalho, co- (CCSE) e, posteriormente, distribuídas no viabilidade de desenvolvimento de conste- e técnicos do INPE, IBAMA, UFBA, UFPR,
ordenado pela Marinha do Brasil, ANP e ponto de bifurcação da corrente perto da lação de microssatélites, controlados pelo UFSB, COMPAAz, CHM e IEAPM.
IBAMA, com participação de dezenas de plataforma continental brasileira na dire- Brasil, com capacidade de aquisição de A Figura 3 mostra as datas e os locais
pesquisadores e instituições, foram feitas ção noroeste através da Corrente do Norte imagens óticas e radar de abertura sinté- de observações de resíduos de óleo, a der-
investigações para determinar a região de do Brasil (CNB) e, finalmente, na direção tica em tempo real de áreas específicas do rota reversa de traçadores lagrangeanos
origem e o causador deste grave aciden- sudoeste através da Corrente do Brasil oceano, ao longo das principais derrotas de lançados nos locais e datas de toque e as
te ambiental. Foi possível identificar que o (CB) e correntes de plataforma interna, navios ou posição de plataformas de explo- posições de navios petroleiros ou reboca-
derramamento ocorreu entre 24 e 29 de atingindo a costa brasileira em diferentes ração de petróleo. dores cujas derrotas cruzaram a derrota
julho de 2019, em uma área a cerca de 750 áreas ao longo de toda a orla marítima, Para a identificação de falsos positivos dos traçadores lagrangeanos, indicados
km da costa da Paraíba (PB) e a 390 km dos conforme ilustrado na Figura 2. de manchas de óleo em imagens de saté- pelas cores de ambos. De modo demons-
limites externos da Zona Econômica Exclu- O cruzamento de dados de tráfego ma- lites, concorrem os campos meteoceano- trativo, foram realizadas integrações do
siva brasileira, ou seja, em alto-mar (FER- rítimo e inteligência permitiu identificar 3 gráficos observados e previstos, obtidos a modelo OSCAR para um derrame hipo-
REIRA, 2022). Aproximadamente 3.000 navios-tanque que trafegaram na região partir da composição de dados satelitários tético na posição do navio mais afastado
toneladas de petróleo foram liberadas em determinada pela modelagem meteocea- e de previsões de modelos acoplados oce- da costa (mostrado pelo ponto verde-claro
alto-mar, transportadas para oeste pelo nográfica conduzida no CHM, durante o ano-atmosfera e o acesso aos dados do mais a oeste no painel central da Figura 3),

446
446 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 447
4. Setor privado se beneficiando dos dados observados e dos avanços
da oceanografia operacional

Apesar do conceito da Economia Azul, cais do nível do mar por efeitos de maré
combinando oportunidades de desenvol- e ventos. Amostragens diárias de aporte
vimento da oceanografia com a defesa e de água doce e sedimentos de rios são
proteção do meio-ambiente, estar ainda necessárias para investigação biogeoquí-
sujeito a debates, em particular em rela- mica, bloom de algas nocivas e impacto
ção à governança e potenciais conflitos de poluentes em áreas costeiras. A previ-
entre partes interessadas (VOYER et al., são de espalhamento de lixo, difusão de
Figura 3. Resultados da Sala de Situação respondentes ao número de dias anterior à 2018; CISNERO-MONTEMAYOR, 2021), poluentes e deslocamento de manchas de
Experimental do SisMOM: (esquerda) lo- data de toque no litoral) e pontos coloridos, uma série de mercados ou setores já estão óleo nas regiões costeiras requer mode-
calização dos pontos de toque de resíduos indicando a proximidade temporal/espacial claramente definidos. A Tabela 1 mostra lagem na escala de pelo menos 1 km e
oleaginosos no litoral da Paraíba entre os de navios petroleiros (cortesia Emanuel Gia- os setores usados pelo CMEMS e alguns em alta frequência que considere os efei-
dias 31/12/2021 e 1/1/2022 (Fonte: IBAMA); rolla Xavier (INPE); (c) probabilidades da pre- estão associados à relevantes aplicações tos das marés e do acoplamento com a
(centro) derrota do óleo como computado sença de petróleo a coluna d’água segundo no Brasil e às EOVs. Estão também iden- camada limite da atmosfera. A correção
por trajetórias lagrangeanas reversas (faixa modelagem com o modelo OSCAR (cortesia tificados na tabela as observações que desses modelos com as observações atra-
em cinza com traço central em cores; cor- Angelo Lemos, UFSB). apoiam os setores, potenciais desenvol- vés da assimilação e do aperfeiçoamento
vimentos e os usuários alvo. O sistema dos modelos requer esforços específicos,
observacional do Atlântico Sul (FOLTZ et por exemplo, com a criação de uma rede
cujos resultados são mostrados à direita na mais clorofila, visto que nessas condições al.2019) já oferece dados do PIRATA, Argo de radares de alta frequência que com-
Figura 3. As correntes oceânicas utilizadas há maior probabilidade da presença de e satélites que permitem adequadas corre- plementaria os radares meteorológicos.
tanto para o cálculo das trajetórias reversas cardumes. ções dos modelos de circulação oceânica Próximo a portos, marégrafos e outros
com o modelo de parcelas quanto para a Um exemplo recente de usuário inter- em mesoescala. Esforços recentes em mo- sensores poderiam oferecer a requerida
dispersão do óleo foram obtidas do siste- mediário de previsões oceânicas é o Obser- delagem biogeoquímica junto com assimi- referência da “verdade” do estado físico
ma operacional Europeu CMEMS/Merca- vatório do Mar Brasileiro sediado no Centro lação de dados de clorofila e cor de saté- para os sistemas previsores.
tor. Os campos de ventos utilizados foram de Estudos do Mar da Universidade Federal lites, por exemplo, dão acesso à descrição A Tabela 2 apresenta uma lista não
do ERA5. Em tempo, o experimento foi do Paraná (UFPR), em Pontal do Paraná, de alguns parâmetros chave do ciclo bio- exaustiva de aplicações onde os dados
posteriormente refeito utilizando campos com apoio de empresas privadas e agên- lógico e de carbono em mesoescala, como observados são empregados, ferramentas
de correntes do HYCOM do CHM/REMO e cias do governo brasileiro (veja em: https:// apresentado no catálogo do CMEMS. Isso e abordagens, sistemas observacionais e
ventos do modelo Kosmos do CHM. portal.brazilianseaobservatory.org). Ele em- permite o desenvolvimento de aplicações usuários ou potenciais usuários das infor-
prega produtos do CMEMS e roda modelo e serviços associados à variabilidade do mações. Pode-se observar que apenas par-
Outros serviços operacionais no Brasil oceânico regional com resolução 3-5 vezes clima em larga escala. Entretanto, próxi- te dos interessados no Brasil hoje podem se
maior que o modelo global. Recentemen- mo à costa e em escalas menores, muitas beneficiar com a oceanografia operacional
Previsões oceânicas são também empre- te, passou também a usar os produtos do aplicações relevantes para algumas inicia- e os serviços oceânicos. Na prática, produ-
gadas pela indústria do petróleo offshore CHM desenvolvidos no contexto da REMO. tivas e usuários ao redor do mundo ainda tos chave para a maioria das Variáveis Cli-
para orientar a execução de perfuração e o O principal objetivo é prover estimativas da não estão prontas para serem operacio- máticas Essenciais (VCEs) e das EOVs em es-
uso de equipamentos, pela indústria do tu- dinâmica oceânica em alta resolução em nalizadas por interessados no Brasil. Um cala média no tempo e no espaço são ago-
rismo e dos esportes náuticos no auxílio da regiões costeiras ao largo do Sul e Sudeste programa de observação costeiro com alta ra oferecidos por centros internacionais,
definição de rotas mais seguras e rápidas, do Brasil. Outros casos de usuários estão densidade observacional é ainda necessá- como CMEMS e a NOAA, ou por iniciativas
para recreação e pela indústria da pesca. apresentados pelo CMEMS (https://marine. rio juntamente com modelos, batimetria brasileiras como a REMO. Tais produtos são
Essa última, particularmente, se beneficia copernicus.eu/services/use-cases) e a maio- e assimilação em alta resolução, para ofe- plenamente usados pela comunidade de
com a previsão de águas mais frias e com ria deles poderiam ser aplicados ao Brasil. recer melhor estimativa de elevações lo- pesquisa e acadêmica no Brasil, a qual se

448
448 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 449
mostra como o primeiro beneficiário dos medições, mas também pela melhoria do
Setores Aplicações e Serviços Variáveis-chave
avanços existentes. Esses produtos também gerenciamento e processamento dos da-
permitem que usuários intermediários e es- dos dos sistemas brasileiros, que podem ser Alimentos do mar Tomada de decisão sobre pesca, EOVs costeiras e estuarina
piscicultura, carcinicultura e alertas
pecialistas elaborem serviços demandados centralizados ou distribuídos. O CMEMS
biológicos e de bloom de algas nocivas
pela Economia Azul quando possível. Este conta com um sistema de organização dos Serviços costeiros Adaptação à erosão costeira Nível do mar, estado do mar,
é o caso das aplicações do SisMOM e do dados observacionais distribuídos em toda Gerenciamento de portos correntes, batimetria
Observatório do Mar da UFPR. Entretanto, a Europa que é eficiente. Esse modelo po- Sargaço e bloom de algas perigosas Parâmetros biogeoquímicos
dentre os setores identificados da Econo- deria ser empregado para integrar iniciati- Qualidade da água
mia Azul, muitos serviços ainda necessitam vas regionais e federais no Brasil, visando Detecção de lixo marinho com
de aprimoramentos no sistema observa- coletar e dar acesso ao conteúdo completo participação de cidadãos
cional das águas costeiras, não somente das observações disponíveis para uma vas- Marinha mercante e Planejamento de rotas de navios Parâmetros de superfície: pressão,
navegação Busca e salvamento precipitação, vento, estado do
pelo aumento do número de plataformas e ta comunidade de usuários.
Gerenciamento de portos oceano, correntes
Recursos naturais e Exploração de petróleo, gás e recursos Ventos, estado do mar e
Tabela 1. Lista de setores da Economia Azul, aplicações e serviços e energia minerais correntes de superfície
variáveis chave em termos de Variáveis Oceânicas Essenciais (EOVs) e Fazendas eólicas
Variáveis Climáticas Essenciais (ECVs) Fonte: Elaboração própria

Setores Aplicações e Serviços Variáveis-chave


Tabela 2. Lista de aplicações onde os dados são empregados, ferramentas e abordagens,
Clima e adaptação Previsão sazonal Conteúdo de calor do oceano sistemas observacionais requeridos e usuários ou potenciais usuários das informações
Projeções climáticas superior e fluxos/transporte
Monitoramento do branqueamento Fluxos ar-mar Aplicações Ferramentas Sistemas observacionais Usuários
de corais Nível do mar, mapeamento e abordagens requeridos
Aumento do nível do mar batimétrico
Saúde do oceano Qualidade da água, eutrofização Correntes Clima dos oceanos Esforço internacional Produtos de larga escala do Pesquisa
Bloom e deriva de sargaço Nutrientes, distribuição de O2, e mudanças baseado em análises CMEMS como transportes (volume, Tomadores
Poluição e espalhamento de lixo CO2, pH climáticas, mensais da circulação calor, sal), pH, e fluxos de carbono de decisão e
Acidificação no oceano avaliação da e do transporte são adequados. Entretanto, autoridades
Conservação Programas de proteção (e.g., TAMAR) Todas as EOVs AMOC e da de calor, fluxo de medidas rotineiras de pCO2 e do governamentais
marinha e Mapeamento de espécies acidificação dos carbono ramo superior da AMOC não são
biodiversidade Proteção de áreas marinhas (e.g., oceanos adequadamente amostrados,
Fernando de Noronha) principalmente no Atlântico Sul
Ciência e inovação Projetos de Pesquisa: Rede Clima, Todas as EOVs e ECVs Previsão sazonal Informação de Sistema observacional do Atlântico Agricultura,
REMO, PIRATA, PNBOIA modelos acoplados tropical (satélites, PIRATA, Argo, energia, transporte,
Políticas e Defesa, policiamento e atividades Todas as EOVs e ECVs, globais ou regionais; derivadores) provê informações comércio, turismo
governança oceânica militares mapeamentos específicos de Monitoramento das necessárias para amostrar escalas Público em geral
e mitigação Áreas marinhas de preservação no Brasil ecossistemas e biodiversividade condições oceânicas de 50-200 km
Políticas públicas de adaptação à erosão marinha em regiões de interesse Monitoramento Monitoramento Dados de satélites da altura da Autoridades
costeira e de gestão do lixo e previsão do regional do nível do superfície do mar em larga escala públicas ao longo
Educação, saúde Qualidade e estado da água Parâmetros biogeoquímicos e aumento do mar e dados atmosféricos (ventos e da costa
pública e recreação Condições do tempo, do surf e do biológicos nível do mar e de Modelagem da pressão) são adequados; Construção civil e
banho; Parâmetros de superfície: pressão, erosão costeira erosão costeira Batimetria, modelagem local de infraestrutura
precipitação, vento, estado do Monitoramento marés, transporte de sedimentos, Turismo
oceano, correntes costeiro nível do mar não são adequados
Extremos, perigos e Eventos de chuvas extremas e secas Parâmetros de superfície: pressão, nas escalas de 1 a 10 km ao longo
segurança Ondas de calor no Brasil continental precipitação, vento, temperatura de toda a costa;
do ar, estado do oceano, corrente Carência de observações de

450 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 451


Aplicações Ferramentas Sistemas observacionais Usuários Aplicações Ferramentas Sistemas observacionais Usuários
e abordagens requeridos e abordagens requeridos
correntes costeiras por radares de Aquacultura Detecção de Observações de grandezas físicas Autoridades
alta frequência no Brasil riscos, poluentes e biogeoquímicas em escalas finas governamentais e
Qualidade da Monitoramento Somente adequado onde Autoridades locais e degradação de não realizadas ao longo de águas agências ambientais
água costeiro autoridades públicas têm Serviços de saúde ecossistemas por costeiras Indústria da
Modelagem n programas de monitoramento Turismo fazendas de peixes, Dados de fluxos de água de rios aquacultura
umérica Necessidade de modelagem Interessados em mariscos e crustáceos; e descarga de sedimentos não
e observações específicas em aquacultura Monitoramento adequados.
estuários e rios em escala fina de
Alerta de eventos Ferramentas e Adequado em alguns centros Todas as estuários e águas
extremos conhecimento de regionais no Brasil. O sistema autoridades, serviços costeiras e modelagem
previsão acoplada de observação oceânico provê de emergência acoplada do sistema
oceano-atmosfera e condições para inicializar os Público em geral físico-biogeoquímico-
especialistas modelos, mas há necessidade de biológico
melhorar as previsões atmosféricas. Fonte: Elaboração própria
Monitoramento Monitoramento, Amostragem de satélites Autoridades e
de áreas marinha modelagem e parcialmente adequada para serviços ambientais
de proteção (e.g., assimilação locais escalas costeiras de 1 a 10 km Como discutido acima, as observações para apoiar aplicações em média escala.
Fernando de em alta resolução da Rede de observações in situ não- de grandezas físicas, do ciclo biogeoquí- Entretanto, próximo à costa, melhorias na
Noronha) atmosfera-oceano e adequada mico e de ecossistemas são aplicadas dire- capacidade observacional são necessárias
do ecossistema com tamente para o melhor entendimento dos para monitorar os fenômenos locais de in-
ciclo biogeoquímico diversos processos do ambiente oceânico e teresse em escalas menores, como descrito
Previsão de Modelagem Ferramentas testadas no Brasil Autoridades têm impacto direto na construção de uma acima. Ainda, o desenvolvimento da cadeia
deslocamento de lagrangeana (e.g., MedSlick, OSCAR, MOHID) governamentais, sociedade global mais produtiva e susten- de valores operacional depende também
óleo e previsão empregando estimativas de autoridades
tável. Entretanto, a relevância das observa- de infraestrutura adequada que permita
por conjuntos circulação do CMEMS, REMO, marinhas e
empregando CHM ou outro sistema com ambientais ções é potencializada quando elas são assi- aos usuários brasileiros intermediários e
estimativas assimilação responsáveis pelo miladas em modelos numéricos, visto que finais acessar rotineiramente as informa-
de circulação Há necessidade do aprimoramento combate ao impacto esses são corrigidos com as informações ções produzidas pelos centros operacio-
inicializadas com das técnicas de detecção com do derramamento observacionais. No contexto da oceanogra- nais. Em outras palavras, o que a Europa
assimilação de dados imagens de satélite SAR de óleo fia operacional, formada pelo tripé observa- está desenvolvendo com o CMEMS deve
in situ e de satélites Durante os eventos, há necessidade Público em geral ção-modelo-assimilação, são ainda produzi- também ser realizado no Brasil: centros, se
de verificação da qualidade da das previsões que oferecem a possibilidade beneficiando perenemente da informação
previsão do deslocamento do óleo
Espalhamento de Modelagem Avaliação costeira requer modelos Autoridades
de antever as condições do ambiente ma- por eles produzida, e, em contrapartida, as
lixo lagrangeana de circulação com marés e governamentais, rinho ou de cenários futuros e, com isso, comunidades nacional e internacional ali-
e previsão forçantes em alta frequência autoridades apoiar o planejamento de atividades em mentando-se dos esforços dos programas
por conjuntos com 1-10 km de resolução e marinhas e diversos setores da Economia Azul, a sus- de observação brasileiros. Além disso, há
empregando observações com alta densidade ambientais tentabilidade das atividades econômicas e necessidade de fortalecer a formação de
estimativas (e.g., radares de alta frequência) responsáveis pelo da vida no mar ao longo do tempo. especialistas de usuários intermediários no
de circulação não ainda disponíveis no Brasil. combate ao impacto Assim, a observação do Atlântico sul e Brasil com educação técnica e científica,
inicializadas com Dados de fontes de lixo continental da poluição marinha
tropical em regiões abertas e costeiras é para produzir mais serviços marinhos para
assimilação de dados transportado por rio ainda não
in situ, de satélites e adequados no Brasil. fundamental para a maioria das aplicações a sociedade brasileira no contexto de uma
de fontes de Avaliação regional com e serviços costeiros. Esforços internacionais, estruturada Economia Azul brasileira. A rede
lixo transportadas representação da mesoescala e da nos quais há contribuição brasileira, já pro- de universidades e institutos de pesquisa do
por rios submesoescala é necessária vêm nessas bacias informação suficiente Brasil que provê educação em alto nível em

452 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 453


ciências marinhas é uma marca de sucesso feiçoar ainda mais as iniciativas brasileiras DRÉVILLON, M. et. al. Learning about S.; CAUD, N.; CHEN, Y.; GOLDFARB, L.;
para o surgimento de tais especialistas na que já estão em andamento, cujos exemplos Copernicus Marine Environment Mo- GOMIS, M. I.; HUANG, M.; LEITZELL, K.;
comunidade. Esta rede de pesquisadores, descritos neste capítulo provam que a Oce- nitoring Service « CMEMS »: A Practical LONNOY, E.; MATTHEWS, J. B. R.; MAY-
com o apoio de instituições públicas como anografia Operacional, que é fundamental Introduction to the Use of the European COCK, T. K.; WATERFIELD, T.; YELEKÇI, O.;
a Marinha do Brasil e de empresas privadas para o desenvolvimento da Economia Azul Operational Oceanography Service. GO- YU, R.; ZHOU, B. (eds.). Climate Change
como a Petrobras e a Vale S.A., pode aper- no Brasil, está ativa e é promissora. DAE Oceanview International School in 2021: The Physical Science Basis. Contri-
“New Frontiers in Operational Oceanogra- bution of Working Group I to the Sixth As-
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456 ECONOMIA AZUL Da Observação à Utilização de Dados 457


22

TECNOLOGIAS INOVADORAS

Fábio Nascimento de Carvalho


Claudio Coreixas de Moraes
Vinícius França Machado

1. Introdução

O Homem ainda não pisou o fundo do o foco nas tecnologias mais avançadas e
oceano, apesar de tê-lo feito na Lua há inovadoras, mas quais são as tecnologias
mais de 50 anos. Conseguiu se deslocar necessárias para o desenvolvimento da Eco-
a velocidades superiores à do som, tanto nomia Azul? A resposta totalmente correta
no ar quanto em terra, mas está longe de não existe, pois depende dos objetivos al-
fazê-lo na água. O ambiente marinho é mejados. Pode-se resolver uma necessidade
um desafio para as tecnologias existentes, de monitoramento de temperatura da água
seja pela ação das ondas, dos ventos, das em um tanque de aquacultura com um sen-
correntes, da salinidade, das grandes pres- sor de poucas dezenas de dólares, mas para
sões, seja por outros fatores que o tornam estudos de mudanças climáticas ou de ge-
extremamente hostil. ofísica do solo marinho, esse instrumento
Lord Kelvin (1824-1907) fez uma im- deve custar poucos milhares de dólares.
portante colaboração para o avanço do Estratégias que possibilitem e fortale-
conhecimento quando proclamou a im- çam a existência de uma estrutura criativa e
portância da medição e da expressão nu- competente em tecnologia oceânica devem
mérica de resultados. Já o Método Cien- fazer parte dos preceitos de Estado de uma
tífico destaca a relevância da associação nação. Esta necessidade foi demonstrada
do conhecimento teórico com as técnicas recentemente durante a pandemia de co-
experimentais para a construção e teste de vid-19 que deixou explícita a importância
hipóteses, e a busca de respostas para os da detenção do conhecimento e da fabri-
questionamentos científicos ou para os de- cação local de componentes eletrônicos e
safios tecnológicos. Tudo isso pode jogar de insumos farmacêuticos.

458ECONOMIA
458 AZUL
A ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras
Tecnologias Inovadoras 459
459
A exemplo de outras áreas que atuam Todos esses fatores se conectam atra- 2. Tecnologias modernas na observação e exploração do oceano
em uma economia globalizada e com forte vés da criação de uma mentalidade marí-
dependência de tecnologias estrangeiras, tima sólida no seio da sociedade, poten- Pesquisadores que faziam medições no de velocidade e direção dos ventos, em per-
como o agronegócio, a indústria farma- cializando o sentimento de importância mar, no início da década de 1970, costu- filadores de correntes por efeito doppler,
cêutica, a aeroespacial, a de telecomuni- da Economia Azul e seu impacto na vida mam dizer que naquela época havia uma os Acoustic Doppler Current Profilers, em
cações entre outras, o avanço tecnológico de cada um dos indivíduos nela inserido. crença que instrumento oceanográfico sistema sonares ativos e passivos e siste-
nacional para a economia ligada ao mar Segundo o Vice-Almirante Paulo Moreira, bom é aquele com menos de um transis- mas de comunicação e de posicionamento
exige altos investimentos para obtenção Patrono da Oceanografia na Marinha do tor. Tal rejeição certamente era função da submarino. Estas aplicações se ramificam
do conhecimento, sejam eles financeiros, Brasil, não basta proclamarmos que as ri- péssima imagem de confiabilidade que os em diversas outras, quando se adiciona
em infraestrutura de pesquisa ou industrial, quezas do mar são nossas, elas precisam equipamentos eletrônicos tinham. Hoje, complexidade ao hardware e a capacidade
em formação de recursos humanos, sejam ser conhecidas por nós e transformadas não se consegue imaginar um instrumen- de processamento dos sistemas de recep-
em ações operacionais. Investimentos estes em riquezas humanas. As tecnologias oce- to que seja desprovido de controle progra- ção. Hoje em dia, pode-se ter uma imagem
que devem obedecer a um plano de desen- ânicas inovadoras são fundamentais para mável de leitura, digitalização, armazena- 3-D de um pequeno objeto, localizado em
volvimento estratégico que busque realiza- que o País conheça seus recursos no mar e mento interno e transmissão digital dos águas profundas, se um sonar multifeixe for
ções a curto prazo para atender demandas seja capaz de explorá-lo de forma susten- dados. O aprimoramento dos materiais, acoplado a um veículo submarino autôno-
reprimidas e a médio e longo prazos para a tável e inteligente. dos processos de usinagem e fabricação, mo, tripulado ou controlado remotamente.
busca da autonomia tecnológica e do em- Nas últimas três décadas, o avanço das dos sistemas eletrônicos e computacionais, Os modernos submarinos de defesa e na-
preendimento de soluções, com embasa- tecnologias, em especial a da eletrônica, da telemetria por rádio, telefonia móvel ou vios de sísmica utilizam arranjos complexos
mento e visão estruturante, que envolvam da computação, da acústica submarina, satélites, dos algoritmos de análise, proces- de receptores para “ouvirem” o ambiente
todos os níveis de governos, a academia, da nanotecnologia, dos satélites, dentre samento e controle e o uso de ferramentas marinho ao seu redor ou o eco de ondas so-
centros de ciência e tecnologia, empresas e outras, permitiu ao homem evoluir mui- recentes como a Inteligência Artificial (IA), noras no fundo oceânico, respectivamente.
demais atores da sociedade civil. to no seu conhecimento sobre o Oceano, Realidades Virtual (RV) e Aumentada (RA) e Os exemplos acima, somados a apli-
Além destes desafios estratégicos, a mas ainda resta muito o que fazer, como nanotecnologia têm possibilitado o aperfei- cações como a de redes de comunicação
observação in situ e a realização de ativi- apresentado por Claudet e colaboradores çoamento e a aparição de dispositivos para acústica para controle e posicionamento
dades operacionais num ambiente desfa- (2020) nas demandas para a Década da uso nas diversas áreas ligadas ao oceano, de veículos e equipamentos (procurando
vorável como o marinho são desafios para Ciência Oceânica. Este conhecimento, desde sensores para estudos do Fitoplânc- suprir a inoperância dos sistemas de comu-
as tecnologias existentes. As adversidades transformado em agente provedor e fo- ton, até grandes geradores de energia eóli- nicação eletromagnética e de navegação
a serem vencidas passam pela sua ampli- mentador de ações transversais que bus- ca offshore ou máquinas autônomas para por satélite dentro d’água), demonstram a
dão e condições severas, pela pluralidade quem soluções para o monitoramento monitoramento ou mineração. diversidade de áreas do conhecimento en-
de atores e necessidades, pelos custos, e integral do Oceano e Zonas Costeiras, e Dissertar sobre as diversas tecnologias volvidas nestas tecnologias. O desenvolvi-
até pela inexistência de soluções. A miti- a Pesquisa, o Desenvolvimento e a Inova- ligadas ao oceano seria uma missão qua- mento destes equipamentos exige de suas
gação destas contrariedades depende não ção (P,D&I) para o progresso nacional, co- se impossível e não atenderia aos objeti- equipes conhecimentos de química dos
só de uma indústria forte, mas também da laborará para a criação, dentro dos pre- vos desta publicação. Como exemplo des- materiais, eletrônica, mecânica/robótica,
necessidade do desenvolvimento científico ceitos da Economia Azul, de novos polos ta grandiosidade, pode-se citar o guia de computação, processamento de sinais, físi-
e técnico para a geração de inovações que indústrias fortes e consolidados, como os compras 2022 da revista Sea Technology ca da propagação do som na água, poden-
tragam o progresso, a melhoria do acesso já existentes nas áreas de exploração de (Sea Technology Buyers Guide Directory do passar por técnicas de compactação de
e gestão de dados e a formação de recur- óleo e gás em águas profundas e da in- 2022), que classifica mais de 240 produtos dados, aprendizado de máquina (Machine
sos humanos. dústria aeroespacial. com fornecedores no mercado mundial. Learning) entre outras, dependendo da apli-
Nas últimas três décadas, os sistemas cação: geologia, oceanografia, biologia etc.
acústicos vêm ganhando destaque em ati- O universo de robôs é outro aglutina-
vidades como o monitoramento ambiental, dor de diferentes e modernas tecnologias.
a comunicação e a Defesa. Suas tecnolo- Leva-se anos entre a concepção inicial de
gias são utilizadas em simples medidores um modelo e os testes bem sucedidos de

460 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 461


validação de campo. Esta cronologia de- atuadores, sensores físico-químicos, geo- e gerenciamento de tráfego de entrada e trazendo maior segurança à navegação, re-
monstra a necessidade de um planejamen- físicos, biológicos etc., executando tarefas saída, atualmente já podem ser feitas por dução do custo de frete no transporte de
to estratégico sério nesta área, pois ou se simples de filmagem até a manipulação de sistemas autônomos com técnicas de inteli- cargas e a otimização de operações com na-
tem um polo de tecnologia instalado para objetos a grandes profundidades, como se gência artificial. Empresas de tecnologia ma- vios com pouca margem abaixo da quilha
responder rapidamente as demandas fu- fossem a extensão do corpo de seu ope- rítima que eram voltadas para soluções de (Under Keel Clearence-UKC), o que é cha-
turas ou estas terão um caminho crítico e rador. Com isso, demandam equipes in- sistemas de navegação de navios, hoje, vol- mado de operação com Calado Dinâmico.
arriscado ao longo dos desenvolvimentos. terdisciplinares que compreendam não só tam-se para o desenvolvimento do conceito
No monitoramento ambiental, os ro- todas as etapas do desenvolvimento como de portos inteligentes e integrados, onde Imageamento sísmico
bôs são potentes plataformas de medição, também o seu ambiente operativo e os re- rebocadores não precisam mais de operado-
concentrando diferentes sensores ambien- quisitos das tarefas a serem realizadas. res e são capazes de reconhecer comandos Da mesma forma que a Hidrografia e a
tais e podendo realizar, por meses, medi- Os veículos não tripulados estão no de voz para empurrar ou puxar um navio Oceanografia se beneficiam do uso dos sis-
ções de forma persistente e ininterrupta na topo da lista das tecnologias marítimas com durante uma manobra de atracação ou de- temas marítimos autônomos para a realiza-
região de interesse, sem a necessidade da maior foco nesta década. Tanto a Indústria satracação. Portos como o de Singapura já ção de atividades repetitivas e monótonas,
logística complexa e onerosa que envolve quanto a Academia vêm aumentando o nú- realizaram com sucesso provas deste concei- que exigem persistência de seus sensores na
um navio de apoio. Nesta área, pode-se mero de projetos de pesquisas e inovação to inovador que promete reduzir custos de região de operação, levantamentos sísmicos
contar com os simples derivadores ARGO, na busca por soluções de problemas diver- operação e emissão de CO2, e aumentar a vêm optando pelo emprego de pontos recep-
até os ocean gliders, os wave gliders, os sos relacionados à atividade marítima. Além segurança da atividade portuária. tores (nodes) submersos inteligentes. Estes
saildrones, os ROV (Remotely Operated das atividades acima, pode-se destacar: equipamentos são capazes de ficar pousados
vehicle), os AUV (Autonomous Underwa- Hidrografia no assoalho marinho realizando a “escuta”
ter Vehicle) e as embarcações de superfície Transporte Marítimo das reflexões de sinais acústicos gerados em
(ASV), que são cada vez mais comuns na Levantamentos hidrográficos são impor- subsuperfície, e de forma muito mais acu-
execução de serviços de batimetria. As grandes companhias de navegação tantes para uma economia voltada para o rada que um sensor rebocado. Adicional-
A versatilidade e potencial destes veícu- investem atualmente grandes quantias em mar, pois viabilizam a navegação segura dos mente, estes receptores podem ser dotados
los não tripulados, remotamente operados pesquisa e desenvolvimento de Maritime navios mercantes e embarcações de espor- de baterias de longa duração e sistema de
ou autônomos, juntamente com o avanço Autonomous Surface Ships (MASS). Navios te e recreio. Atualmente, sistemas de carta comunicação, que permitam que os dados
no domínio de suas tecnologias, têm cria- capazes de realizar, não apenas pequenas náutica, no formato digital, já podem ser gerados sejam coletados por veículos autô-
do fronteiras há pouco inconcebíveis para o rotas de linhas de ferry, mas grandes nave- alimentados com sondagens atualizadas de nomos submarinos (AUV) ou ROV, conforme
seu uso. Há no mercado internacional ou em gações transportando as mesmas cargas que uma dada região passível de assoreamento a demanda. Além disso, estas plataformas
desenvolvimento veículos para atender de- um porta container tradicional. Além do frete frequente, e praticamente em tempo real. podem receber o acoplamento de diversos
mandas como mapeamento em alta resolu- marítimo, a indústria offshore de óleo e gás Os veículos autônomos de superfície (USV) sensores não sísmicos, como magnéticos,
ção do fundo marinho, inspeção submarina, inicia um movimento chamado boatless que vêm cada vez mais prestando um impor- eletromagnéticos, gravimétricos, acelerôme-
embarcações de superfície para uso civil ou estuda a redução do número de embarca- tante papel na atualização da geração de tros etc., que podem potencializar o processo
militar, grandes máquinas para mineração, ções de apoio a plataformas com o emprego dados batimétricos de canais de acesso de de imageamento. Este tipo de arranjo reduz
entre outras aplicações comercialmente es- otimizado de veículos autônomos para trans- portos em regiões de estuários, como é o significativamente a necessidade de empre-
tratégicas que vão ser conhecidas pelo mer- porte regular entre unidades e terra. caso de Paranaguá-PR, Itaqui-MA e Bacia go de navios de superfície, implicando menor
cado somente daqui a quatro ou cinco anos. do Amazonas. Com o emprego de moder- emissão de CO2, menor custo de operação e
Os desenvolvimentos nesta área exigem Atividades Portuárias nos e compactos sonares do tipo multifeixe, maior segurança à navegação.
conhecimentos especializados em diversos com sensores de referência de movimento
domínios das ciências exatas como em sis- Tarefas complexas desempenhadas na integrados, estas plataformas são capazes Operações submarinas para a
temas inerciais de navegação, controle de operação de entrada e saída de porto de de realizar um levantamento de forma mui- Industria de Óleo e Gás
processos e robótica, mas não se restringin- grandes navios mercantes que até então to mais rápida e simples do que um navio
do a estes. Por se tornarem cada vez mais eram apenas realizadas por humanos, como hidrográfico era capaz de fazê-lo há 15 A Economia Azul também possui ra-
sofisticados, estes robôs podem agregar a operação de rebocadores para atracação anos. Este tipo de tecnologia inovadora vem mificações importantes nas tecnologias

462 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 463


submarinas, principalmente aquelas que valor histórico ou material, ou simplesmente na fase de pesquisa, o que se chama de Tri- coordenação central do CTMRJ, tem-se
vêm viabilizando a atividade de exploração na definição exata da posição de determina- plice Hélice de desenvolvimento (governo, hoje disponibilizada uma plataforma de
e produção de Óleo e Gás a grandes profun- do evento/material. As expedições montadas academia e indústria). Hoje, soluções como pesquisas, nos moldes de um laboratório
didades. O emprego de ROV nas atividades para a localização dos destroços do submari- o AUV Flatfish, desenvolvido pelo SENAI- flutuante, que integra os resultados de to-
offshore para a realização de inspeção sub- no argentino ARA San Juan (2017) e do nau- -CIMATEC em um projeto de pesquisa com das estas frentes de trabalho de maneira
marina é bastante antigo e já não é mais con- frágio de um dos mais emblemáticos navios uma empresa da indústria de Óleo e Gás, coordenada. O VSNT-E vem se destacan-
siderado algo inovador do ponto de vista tec- de exploração de todos os tempos, o HMS estão sendo empregadas para a monta- do como importante recurso de pesquisa,
nológico, cedendo este protagonismo para Endurance (1915), são exemplos de um gem de complexos sistemas de Defesa que aberto às Universidades e empresas da
os AUV. Atualmente, uma importante massa segmento pouco conhecido da Economia despertam interesse de diversos países. O Base Industrial de Defesa (BID) para realiza-
de pesquisadores em centros de pesquisa, Azul que emprega os mais modernos re- veículo não tripulado de superfície USV Tu- rem testes e experimentos, utilizando uma
como o CENPES (Petrobras) e Universidades, cursos de veículos autônomos submarinos pan, projetado e fabricado pela empresa moderna plataforma de superfície. O VSNT-
vêm estudando o emprego de AUV para ins- disponíveis no mercado. Graças aos avan- carioca Tidewise, também para operações -E vem atraindo, principalmente, a atenção
pecionar de forma mais rápida e inteligente ços tecnológicos dos sensores de busca e offshore, tem se mostrado uma ferramenta de jovens pesquisadores das Universidades
instalações no leito marinho empregadas na localização, aliados à autonomia elevada e muito versátil para a realização de tarefas parceiras UFRJ, UFF e USP, que já desenvol-
exploração e produção offshore. Estes veícu- à capacidade de operação em “enxame” de superfície para a Marinha. vem pesquisas aplicadas com este veículo.
los, por não terem conexão física (umbilical) (múltiplos veículos simultâneos e de forma A demanda por pesquisas e soluções Além dos veículos, deve ser destacado
ao navio-mãe e por possuírem grande auto- coordenada), naufrágios e destroços de aci- inovadoras na área dos veículos não tripu- também, a necessidade do monitoramento
nomia e capacidade de configuração de seu dentes importantes ocorridos no mar vêm lados é vasta e requer soluções multidisci- das diversas Variáveis Essenciais do Oceano
payload (compartimento de instrumentos), sendo localizados com mais frequência. plinares, que transcenda a área de atuação (EOV – Essential Ocean Variables), defini-
representam uma flexibilização e otimização principal de um laboratório de pesquisa. das pelo Global Ocean Observing System
de recursos sem precedentes na atividade de Defesa Torna-se importante o desenvolvimento da (GOOS), um sistema que o país é membro
inspeção submarina. As intervenções em dis- cultura de Centro Coordenador de Pesqui- através do GOOS-Brasil. Deve-se incluir
positivos de fundo, situações em que algum Costuma-se associar o emprego de pla- sas, na qual pode-se alcançar transversali- também as demandas de monitoramento
tipo de atuação deve ser realizada, conti- taformas não tripuladas com a execução dade dos esforços e investimentos, conec- para o auxílio à navegação, às atividades
nuam a ser operadas por ROV. A pesqui- de tarefas que envolvam os três “Ds”: Dirty tando diferentes atores em busca de uma offshore, portuárias e de engenharia costei-
sa neste campo se destaca pela fabricação (sujo), Dull (monótonas) ou Dangerous (ar- solução comum. A Marinha, por exemplo, ra, à previsão de tempo e clima, à pesquisa
de ferramentas cada vez mais sofisticadas riscadas). Veículos operados remotamen- vem utilizando seu Centro Tecnológico no científico-tecnológica e ao desenvolvimen-
e inovadoras, que permitem a execução te ou autônomos são ótimas plataformas Rio de Janeiro para concentrar as iniciativas to econômico de indústrias como a da pes-
de tarefas acima da capacidade humana e para realizar missões em que o risco de vida em sistemas marítimos não-tripulados e co- ca e da aquacultura. A criação e fortaleci-
sem oferecer risco à vida do operador. do operador é alto, o ambiente de empre- ordenar as pesquisas realizadas no Centro mento de grupos de instrumentação que
go é inóspito e/ou as tarefas executadas de Análises de Sistemas Navais (CASNAV) e atuem no desenvolvimento de plataformas
Busca e Arqueologia Submarina requerem longas permanências com pouca Instituto de Pesquisas da Marinha (IPqM), de medição que auxiliem ao atendimento
complexidade. As operações militares ma- aplicando os resultados ao Veículo de Su- destas demandas é importantíssimo. Essas
A localização, identificação e recuperação rítimas conseguem muitas vezes incorporar perfície Não Tripulado – Experimental (VS- equipes devem atuar tanto no desenvolvi-
de objetos de valor depositados no leito mari- estas três características, como por exem- NT-E). As equipes do CASNAV desenvolvem mento de plataformas e sensores de baixo
nho é uma tarefa complexa e demorada, até plo a busca antissubmarino em uma vasta trabalhos na área de visão computacional, custo, como na criação/utilização de siste-
mesmo em águas rasas e calmas. Aeronaves área geográfica. O setor de Defesa repre- pesquisa operacional, inteligência artificial, ma mais complexos ou delicados, como a
sinistradas e embarcações naufragadas são senta uma importante fatia do mercado de simulação, realidade aumentada e sistemas utilização de animais marinhos para medi-
alguns exemplos práticos de objetos impor- veículos não tripulados e por muitas vezes de comando e controle, enquanto o IPqM ções oceanográficas.
tantes a serem detectados. Os veículos autô- a dualidade da solução tecnológica encon- foca nas soluções de sistemas inerciais, As plataformas de medição, autôno-
nomos se mostram cada vez mais adequados trada para um problema militar é levada sistemas de armas, sistemas de combate, mas, fixas, derivantes etc., com sensores
para auxiliar no esclarecimento de causas de para a indústria civil, trazendo benefícios materiais e acústica. Graças ao entrela- nacionais ou importados, necessitam de
um acidente, na recuperação de objetos de para a sociedade e envolvendo a Academia çamento dos resultados das pesquisas e certas especificidades para cada aplicação.

464 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 465


Como exemplo, a medição da temperatura mapeamento de bolsões de lixo com a Shadman e colaboradores (2019) apre- testes de conceitos e protótipos em escala
da superfície do mar (SST), longe da costa e modelagem do seu percurso desde a fonte sentaram um panorama global das tecno- real no ambiente marinho, aos moldes do
para fins de previsões climáticas, necessita de despejo (utilizando imagens de satélite, logias existentes que buscam a utilização de European Marine Energy Centre – EMC.
de sensores que custam de um a três mil drones e medição in situ), a coleta do lixo energias renováveis, focando predominan- Este laboratório em céu aberto, financiado
dólares e que são instalados em boias oce- já lançado e a aquisição de dados tanto na temente nas ondas, marés, correntes mari- pela União Europeia, foi instalado em 2003
anográficas que transmitem os dados via coluna-d’água quanto no leito marinho nhas e gradientes de salinidade ou tempe- nas Ilhas Orkney ao norte do Reino Unido.
satélite e custam mais de cem mil dólares para o auxílio à compreensão da dinâmica ratura, para a geração de energia elétrica e Ele funciona como um provedor de infra-
cada. Além destes custos, as operações de destes problemas (P&D). em alguns casos de água doce. Ao men- estrutura para a demonstração, testes e
lançamento, manutenção e recolhimento Como a preocupação com os níveis de cionarem que 80% da população brasileira validação de resultados de conversores de
destas plataformas de medição precisam lixo, em especial os plásticos, nos oceanos vive próximo à costa, afirmaram não haver energia das ondas e das marés diretamente
de grandes e custosos navios. Esta mesma é recente, ainda há grandes desafios tec- no país estudos aprofundados sobre a utili- em escala real no mar. Além de funcionar
necessidade de medição da SST, no caso nológicos a serem vencidos. Por exemplo, zação da energia do oceano e sua conversão como um suporte de infraestrutura para os
de uma fazenda de produção de pescado, a identificação automática, por imagem, em eletricidade. Ao longo do trabalho, apre- desenvolvedores, ele age como um fomen-
pode ser feita com um sistema de valor na de pequenas ilhas de lixo ainda não tri- sentam o potencial energético destas fontes tador de melhores práticas para a sua área,
faixa de cem dólares, que com transmissão vial, e a detecção e qualificação dos nano no Brasil e salientam que ainda há muito o como pode ser visto através da publicação
de dados por telefonia ou rádio, e cuja ma- plásticos in situ é uma dificuldade ainda que fazer para o custo destas energias ser Guidelines for project development in the
nutenção de sua operação é praticamen- maior. Atualmente, é necessária à coleta competitivo em relação as fontes de energia marine energy industry (2009).
te nula, por já haver outras demandas de de amostras para a definição do tipo de tradicionais e a solar e dos ventos geradas Indo além das atividades oceânicas já
equipe junto aos viveiros de produção. plástico (poliéster, polipropileno, etc.) e em terra. A alternativa, hoje, além do de- citadas, existe um grande potencial ainda
A articulação no entendimento das sua quantidade no ambiente. A qualifica- senvolvimento de projetos mais otimizados, pouco explorado relacionado à atividade
carências nacionais em medições me- ção do tipo de plástico ainda exige análises é buscar novos mercados onde as opções de de mineração submarina que consiste na
teo-oceanográficas, na compreensão de em caríssimos equipamentos de labora- geração de energia elétrica sejam escassas coleta de nódulos poliminerais metálicos
suas peculiaridades e no fomento ao de- tório. Quantificar e qualificar in situ nano ou caras, como para a indústria de óleo e abundantes no assoalho marinho, em de-
senvolvimento tecnológico e à inovação plásticos ainda é uma promessa, pois não gás, a aquacultura, defesa e demandas de terminadas localidades. Trata-se de um as-
possibilitará a consolidação de uma ca- há instrumento que consiga identificar uma eletricidade e água doce por comunidades sunto controverso sobretudo em relação ao
deia produtiva que atue com serviços e partícula como plástico e que execute essa isoladas, como em ilhas oceânicas. impacto ambiental marinho, alguns cien-
produtos de qualidade e preços competi- missão sem alterar significativamente o Esses autores, ao apresentarem os con- tistas advogam que o impacto nos oceano
tivos para o mercado. escoamento (fluxo de água) ao seu redor, o ceitos adotados para a conversão da ener- seria muito forte a ponto de desestabilizar
O desenvolvimento tecnológico nacio- que compromete a qualidade da medição. gia do mar, descrevem que, mundialmente, ecossistemas inteiros, enquanto outros ad-
nal para a Economia Azul deve prover so- Outros grupos de tecnologias merecem quase todas as tecnologias ainda estão na vogam que os impactos da mineração em
luções para a urgência de se minimizar a destaque, como a geração de energia reno- fase de desenvolvimento e testes de pro- águas profundas seriam muito menores do
existência de lixo no mar, principalmente vável no mar, tão importante para a diversifi- tótipos, necessitando de uma cadeia de que a atividade de mineração nos conti-
plásticos que nas formas de micro e nano cação da matriz energética brasileira. Como fornecedores local, forte e conectada ao nentes, do jeito que conhecemos hoje. Pa-
plásticos já atingem a cadeia alimentar exemplo, a necessária consolidação da gera- mercado internacional. ralelamente as necessárias discussões acer-
humana (Toussaint et al., 2019). Estes tra- ção eólica offshore que tem tecnologias já Como em outras áreas da Tecnologia ca do impacto ambiental da atividade mi-
balhos devem estar sincronizados com as dominadas pelo mundo, o país já possui ex- Oceânica os renováveis para o mar ne- neradora, em terra ou no mar, existe uma
ferramentas da Economia Circular ligada pertise na instalação e operação de empreen- cessitam da adoção de políticas de subsí- crescente demanda da sociedade sobre
ao mar. Este lixo impacta as atividades de dimentos offshore (Hernandez et al., 2021) dio tarifário e financeiro para incentivar a metais específicos relacionados à transição
diversos setores econômicos, notadamente e o potencial energético brasileiro, que é de pesquisa e o desenvolvimento científico e das fontes de energia de origem fósseis
pesca e aquacultura, turismo e recreação e 176 GW para empreendimentos até a bati- tecnológico. Há também a necessidade de para energias limpas, os chamados me-
navegação (ten Brink et al., 2016). métrica de 20 m, chegando a 606 GW até a ações estratégicas na formação de grupos tais verdes, que são os metais necessários
Deve-se buscar soluções para a dis- de 100 m, que é bem superior ao continental multidisciplinares para os desenvolvimen- para a inevitável eletrificação dos sistemas
seminação de barreiras ecológicas, o de 146 GW (Ortiz e Kampel, 2011). tos com o apoio de uma infraestrutura para de energia. Lítio, cobalto, cobre e níquel,

466 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 467


entre outros metais de Terras Raras, estão Tão importante quanto conhecer as tec- Figura 1. Simulador Virtual de Treinamento
presentes em chips, componentes ele- nologias existentes ou as que estão em es-
troeletrônicos e em baterias, com um pa- tudos é a conscientização da importância
pel relevante não apenas na eletrificação estratégica de se investir massivamente
do transporte, mas em todas as áreas de em Tecnologia Oceânica. A multidiscipli-
transformação digital. A partir de 2001 a nariedade, a necessidade de informações
International Seabed Authority, autorida- exatas (em oceanografia usa-se a termo
de internacional que cuida da exploração em inglês Quality Assurance) e de produ-
econômica além das Zonas Econômicas tos de alto valor agregado gera a impres-
Exclusivas, aprovou inúmeras concessões cindibilidade da existência de uma cadeia
para exploração mineral submarina, com tecnológica forte e ágil, que possa respon-
os primeiros projetos de produção previs- der prontamente às necessidades do mer-
tos para os próximos 5 anos. cado e da sociedade.
Fonte: Claudio Coreixas, CASNAV (2020)
3. Tornando a navegação mais segura e eficiente através da tecnologia um passadiço avançado, com os recursos brasileira. O emprego de simuladores, seja
tecnológicos aderentes aos Serviços Marí- para treinamento ou realização de estu-
A exploração do espaço marítimo é riquezas minerais da Zona Econômica Ex- timos (SM) previstos dentro do conceito de dos de engenharia, até a década de 2000,
historicamente conectada com a navega- clusiva nacional. e-Navigation da IMO. eram viáveis apenas no CIAGA (com um
ção e capacidade do homem de se fazer As necessidades de se fazer ao mar O desenvolvimento de simuladores de simulador importado) ou no exterior. Os
ao mar. Inicialmente, a sociedade se voltou são inúmeras e fazem com que a ativida- manobra e navegação de embarcações, simuladores nacionais representam o surgi-
para atividades tradicionais como a pesca de marítima cresça e se desenvolva a cada como o da figura abaixo, é uma atividade mento de um novo segmento da atividade
e o transporte, servindo-se dos oceanos ano, demandando por uma formação mais revestida de grande complexidade tecno- econômica relacionada com a tecnologia
como caminho para alcançar territórios completa e moderna de pessoal para a lógica e relativamente recente no Brasil. A marítima, que oferece redução de custos
mais prósperos e zonas pesqueiras mais operação de embarcações. No Brasil, a for- simulação é uma importante ferramenta operacionais, maior segurança e autono-
abundantes. A evolução das técnicas de mação do pessoal aquaviário e portuário para treinamento dos profissionais envol- mia tecnológica na qualificação e treina-
navegação sempre foi uma grande aliada é uma atribuição da Autoridade Marítima vidos na atividade marítima, como Práti- mento do pessoal marítimo civil e militar e
para tornar estas atividades mais seguras (AM) através de cursos oferecidos no âmbi- cos, Comandantes e Oficiais de navios estudos de viabilidade portuários.
e eficientes, como estudos e aperfeiçoa- to do Ensino Profissional Marítimo (EPM). O mercantes, mestres de rebocadores ou O CIAGA está implementando nova
mentos das formas de cascos, aparelhos Centro de Instrução Almirante Graça Ara- alunos em formação. Hoje, há no país a capacidade de treinamento aos portuários
de vela, propulsão a vapor, sextantes, cro- nha (CIAGA) é o principal órgão do EPM capacidade de se produzir simuladores de para a formação de profissionais de geren-
nômetro, mapas, a exploração do uso de responsável pela formação de grande parte qualidade internacional seguindo as mais ciamento de Vessel Traffic Service e Local
energias limpas, inteligência artificial e dos oficiais mercantes brasileira. rígidas normas de certificação. Isto é dig- Port Service através do seu Simulador In-
navegação por satélite. Hoje, demanda-se O CIAGA está constantemente revendo no de ser enaltecida graças a pesquisa in- tegrado Marítimo (SIM) que reúne em um
soluções tecnológicas que vão muito além seus currículos e adequando o conteúdo tensa e investimentos feitos pela Marinha ambiente virtual a simulação dos navios e
da simples navegação. As atividades oceâ- de seus cursos à realidade tecnológica en- do Brasil, Petrobrás e Universidades como do controle portuário desenvolvido pelo
nicas do século XXI envolvem, por exem- contrada nos passadiços dos navios mais a USP, UFRJ e UFF. A popularização e dis- CASNAV. Destacam-se ainda as ativida-
plo, operações complexas de colocação modernos em operação (Figura 1). Prova ponibilização de sistemas de simulação des de simulação realizadas na Academia
de cabos submarinos no leito oceânico, a disso é a atual preocupação de moderniza- permite que haja ensaios de manobras Transpetro, onde é operado um simulador
manutenção de um posicionamento dinâ- ção de seu parque de simuladores virtuais complexas ou treinamento intensivo de do tipo Full Mission Ship Simulator de-
mico altamente confiável para o transbor- de treinamento que permitirão a partir de pessoal nas dependências de praticagens senvolvido pela empresa paulista Techno-
do de petróleo entre navios em alto mar 2022 oferecer treinamento aos alunos com locais, em centros de formação, como a mar Engenharia, no simulador LabOSim
ou a utilização de sofisticados sistemas recursos de realidade virtual, que facilitarão Escola Naval, nas Capitanias dos Portos e desenvolvido pelo LabOceano da COPPE/
de sensoriamento para a exploração das a compreensão do complexo ambiente de Centros de Adestramentos da Esquadra UFRJ e no Centro de Simulação de Manobras

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de Navios do TPN-USP com seu pioneiro disponibilizadas no ambiente de um mo- cartas náuticas eletrônicas, recebimento de ço para os riscos decorrentes de ameaças ci-
sistema de simulação virtual. derno passadiço compatibilizada com a sinais de AIS ou mesmo a navegação por bernéticas, com impactos que transcendem
O emprego de soluções inovadoras na na- capacidade cognitiva do operador. A difi- satélite, leva à necessidade de se adotar o mundo digital. Isso porque, ao se realizar
vegação vem sendo impulsionado, em gran- culdade encontrada em balancear a apre- medidas de proteção cibernética rígidas, o controle de sistemas críticos por meio de
de parte, pela necessidade de otimização de sentação de informações sem torná-las iguais ou superiores às adotadas em um computadores, possibilita-se que uma ação
rotas e de economia de combustíveis fósseis, confusas e sobrecarregando o usuário está computador conectado à internet. Ao mes- iniciada no mundo digital tenha efeitos
que adicionalmente leva a uma redução na gerando pesquisas importantes na busca mo tempo que permite grandes ganhos na concretos no mundo real, com impacto na
emissão de CO2 da frota mercante. Soluções por soluções de apoio à decisão com o em- operação dos navios, aumentando a efici- operação do navio e na segurança da tripu-
de inteligência artificial, embarcadas nos sof- prego de inteligência artificial e recursos de ência e reduzindo a necessidade de mão de lação, dos passageiros e do meio ambiente
twares de apoio à decisão e planejamento de realidade aumentada, que visam melhorar obra, a digitalização dos sistemas abre espa- (Armor Shield, 2021).
rota, utilizam previsões meteo-oceanográfi- a consciência situacional marítima.
cas a longo prazo para sugerir alterações de A Marinha do Brasil está trabalhando Figura 2. Console de visualização do CITRA e do AVP
rotas importantes aos navios. Estas alterações intensamente na especificação e implemen-
visam evitar situações adversas de vento, cor- tação do Sistema de Gerenciamento da
rente ou seakeeping (resposta às ondas) e Amazônia Azul (SisGAAz) que será capaz de
propiciam a otimização do consumo de com- monitorar, com múltiplas fontes de dados,
bustível em uma travessia oceânica. o espaço marítimo adjacente a costa brasi-
O monitoramento do tráfego marítimo leira, denominado Amazônia Azul. Um dos
e portuário vem sofrendo uma importante primeiros produtos desenvolvidos para esta
quebra de paradigma desde o estabeleci- finalidade é o Console de Imagens Táticas
mento de sistemas de posicionamento por com Realidade Aumentada (CITRA) desen-
satélite que passaram a disponibilizar para o volvido pelo CASNAV. Ele integra câmeras de
navegante a sua posição precisa em tempo vigilância, sensores como AIS e Radar ARPA,
real, e esta passou a ser compartilhada por localizados em terra ou embarcados, com
rádio com estações de controle em terra. O recursos de inteligência artificial e realidade
compartilhamento de informações de posi- aumentada (Léo, 2022). O resultado desta
ção entre navegantes ajuda a melhorar a se- integração é a apresentação em tempo real
gurança da navegação em regiões de tráfe- de imagens de alta definição da fusão de
go intenso e baixa condição de visibilidade. informações de sensores com uma camada
Hoje, mais de 30 anos depois da populari- inteligente sintética que oferece ao operador
zação do GPS no ambiente marítimo, tem- portuário dados importantes dos alvos mo-
-se recursos a bordo que automaticamente nitorados, como pode ser visto nas imagens
compartilham a posição, rumo, velocidade, abaixo. O CITRA, em sua versão Assistente
status e características das embarcações, Virtual de Passadiço (AVP), também pode ser
como é o caso do Automatic Identification empregado a bordo de um navio e oferecer
System (AIS). Os avanços no setor de tele- ao navegante um cenário tático mais preciso
metria de dados permitem que uma gama e harmônico, integrando dados de múltiplas
elevada de informações seja enviada e rece- fontes em uma única plataforma, aprimoran-
bida pelas embarcações e trocadas com es- do assim a segurança à navegação (Figura 2).
tações de controle em terra ou até mesmo Apesar de animador, o emprego dos re-
com o usuário comum pela internet. cursos computacionais na atividade maríti-
Um desafio tecnológico recente é ma que fazem uso de dados externos para
harmonizar a quantidade de informações seu processamento, como a utilização de Fonte: Luiz Felipe de Souza Léo, CASNAV (2022)

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Ataques cibernéticos no ambiente ma- de navegação e garantir a operação se-
rítimo vêm mostrando a vulnerabilidade gura dos sistemas de navegação e contro-
dos sistemas de navegação integrados e le das plataformas a bordo. Esta solução Figura 3. Relações da Tecnologia Oceânica com a Sociedade
controles integrados de gerenciamento de vem demandando importantes pesquisas
plataforma, não sendo raros os casos de em subsistemas ou operações específicas
ciberataques a navios e armadores (Leite como embarcações autônomas, sistemas
et al., 2021). Atividades intencionais de portuários e sistemas de IT/OT instalados
sabotagem no sinal de posicionamento sa- a bordo de navios (Meland, 2021). Diver-
telital ou de identificação AIS são possíveis sos estudos que estão sendo conduzi-
de ocorrerem e causarem danos materiais e dos em importantes centros de pesquisa
pessoais de grandes proporções. como as Universidades de Plymouth e de
Este risco operacional aumentou de Ciência e Tecnologia da Noruega (NTNU)
intensidade a partir da década de 2000 têm mostrado a baixa conscientização da
com o boom da digitalização dos navios, comunidade marítima em relação a este
causando o surgimento de uma impor- problema, apresentando que ainda existe
tante indústria tecnológica que visa mi- um vasto campo de pesquisa e desenvol-
tigar tais problemas: a cibersegurança vimento a ser trilhado para se mitigar os
marítima. Este ramo é especializado em riscos na digitalização e conectividade dos
proteger dados de navios e companhias sistemas marítimos de navegação.

4. Desafios em Tecnologia Oceânica

Há uma diversidade de atores ligados da pesquisa pura virem protótipos que


aos estudos e ao uso do oceano, envolven- provem estes conceitos e depois produtos
do diversas áreas da ciência (oceanografia, na mão da indústria para uso do merca-
meteorologia, engenharias, ciências so- do. A compreensão desta cadeia foi muito
ciais, biologia etc.), as indústrias de pesca, bem adotada pela NASA que desenvolveu
aquacultura, de óleo & gás, de mineração, a métrica dos níveis de prontidão tecno-
energias renováveis, de turismo, o lazer en- lógica, do inglês Technology Readiness
tre outros tantos, como está exemplificado Levels-TRL (Gil, Andrade e Costa, 2014).
no diagrama circular da Figura 3. Soma-se a Nesta métrica, a pesquisa básica e o de-
isto, a diversidade cultural, social, econômi- senvolvimento de protótipos vão do TRL-1
ca, ambiental e geológica nas diversas regi- ao TRL-5, ou seja, processos de pesquisa e
ões da costa brasileira. Toda essa pluralida- invenção. O aprimoramentos piloto para
de vai se refletir nas tecnologias existentes ambientes reais, processos de inovação,
que devem suprir desde as necessidades do do TRL-5 ao TRL-7, etapa esta que já deve
pescador artesanal de áreas costeiras até as incluir empresas e startups, e as evoluções
demandas das grandes empresas de óleo & para os produtos ou serviços se tornarem
gás e mineração em águas profundas. maduros e comerciais, processos de inves-
Fonte: Fábio Nascimento
Para o desenvolvimento tecnológi- timento comercial e de mercado que vão
co perene, é necessário que haja supor- do TRL-8 ao TRL-9. Esta lógica evolutiva e
te à pesquisa, ao desenvolvimento e à a sinergia entre os atores está ilustrada na
inovação, possibilitando que os conceitos figura na página ao lado.

472 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras


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As atividades de exploração de recursos vigorosamente em Tecnologia Oceânica. O existentes no país, e o desenvolvimento e captação, como por exemplo, com fun-
do oceano de forma sustentável, visando amparo às pesquisas pura e aplicada e à produção comercial de equipamentos, ins- dos de investimentos em inovação do
à produção de benefícios para a sociedade inovação de forma estruturante e coorde- trumentos, sistemas computacionais etc. tipo venture capital.
e o meio ambiente, devem abordar uma nada possibilitará ao país atingir seus obje- Um forma de ação construtiva seria a uti- Uma questão crítica é a formação de re-
ampla cadeia de engenhos e sistemas, tivos de entendimento, soberania e explo- lização e proposição de projetos conjuntos cursos humanos. Infelizmente, nem todas
cobrindo desde o desenvolvimento e dis- ração sustentável do Oceano. aos diversos laboratórios e grupos de pes- as áreas de formação profissional, neces-
ponibilização de instrumentos e sistemas A atual economia globalizada e a forte quisa dos centros de C&T nacionais junta- sárias aos desenvolvimentos em Tecnologia
de baixo custo, livres de propriedade inte- dependência que o país possui em relação mente com empresas de base tecnológica Oceânica, estão totalmente relacionadas
lectual, i.e., open-source, até os mais ino- às tecnologias estrangeiras devem ser ava- que atuam em robótica para o mar, como com as grades curriculares das universi-
vadores e custosos, todos suportados por liadas com muita habilidade e sabedoria. As o SENAI/Cimatec, GSCAR da COPPE/UFRJ, dades e centros de formação técnica tra-
uma estrutura de serviços que envolvam a prioridades têm que focar o atendimento a LVNT da USP, empresas como a Tidewise, dicionais brasileiros. Há a necessidade de
aplicação de padrões, normas e melhores curto prazo das, ainda reprimidas, neces- USSV, Xmobots, Hydratec, entre outros, conhecimentos em outros setores e de prá-
práticas (Figura 4). sidades de serviços para os equipamentos que articulados poderão realizar os de- ticas peculiares que fazem com que o pro-
Infelizmente, no Brasil toda essa cadeia mais utilizados pelo mercado, de forma a senvolvimentos que o Brasil necessita nes- cesso de instrução específico necessite ser
sofre de falta de estrutura. Não há políticas levar a um rápido início de estruturação ta área. Principalmente se contarem com complementado de alguma forma, como
que gerem ações coordenadas, financia- de uma cadeia produtiva. A médio e longo grandes infraestruturas laboratoriais, como já é feito por algumas empresas que atuam
mentos públicos ou privados a longo prazo prazos, precisa-se entender as demandas o LabOcano da COPPE/UFRJ, o Tanque de nos setores diretamente envolvidos. Ações
e com visão estruturante, não há uma ca- da sociedade por tecnológicas, para assim, Provas Numérico-TPN da USP e o Laborató- continuadas de identificação e procura de
deia de fornecedores que torne o mercado empreender com embasamento e visão es- rio de Engenharia Naval e Oceânica do IPT. atendimento a essas necessidades de for-
viável e nem a formação de mão de obra truturante na busca de soluções, em con- A compreensão, a estruturação do tra- mação específica, estimulando os jovens
especializada suficiente. junto com governos, academia, centros de balho dos diversos atores e o auxílio na estudantes a buscarem carreiras associadas
Existe a necessidade de se promover e ciência e tecnologia, empresas e demais busca de financiamentos têm que ser uma à Tecnologia Oceânica, e fomentando a
realizar estudos, pesquisas e outras ativi- atores da sociedade civil. missão continuada, para que haja o desen- formação técnico-científica continuada dos
dades de interesse público e privado em A atuação em Tecnologia Oceânica deve volvimento de produtos e serviços de qua- profissionais que atuam na área, são bási-
diversas áreas ligadas à compreensão e ser embasada numa abordagem sistêmi- lidade, valor justo e grande confiabilidade. cas para a existência de um corpo técnico
uso dos recursos do mar, devendo-se atuar ca, objetivando a aglutinação dos atores já Para isso, deve-se provocar as ICTs e buscar que supra as exigências do mercado.
financiamentos para que elas realizem a A consolidação um de complexo in-
pesquisa básica, se conectando a empre- dustrial e de serviços forte é premissa para
Figura 4. Cadeia de inovação; níveis de prontidão tecnológica sas e incentivando a criação de startups e uma produção tecnológica de qualidade e
spin-offs. Todos trabalhando no desenvol- que atenda às expectativas do mercado e
vimento de sistemas piloto que evoluam da sociedade. O crescimento industrial e
Colaboração para produtos e serviços maduros, comer- a existência de uma cadeia de fornecedo-
Academia e ICTs Indústria
ciais e competitivos globalmente. res/prestadores de serviços sólida e neces-
Esta dinâmica do processo de desen- sária ao atendimento das demandas liga-
Desenvolvimento do Conhecimento Desenvolvimento Tecnológico Desenvolvimento Industrial volvimento também deve caracterizar das ao mar não será possível sem coexistir
a de financiamento. Gestores deverão um mercado consumidor também forte.
TRL 1 TRL 2 TRL 3 TRL 4 TRL 5 TRL 6 TRL 7 TRL 8 TRL 9 atuar junto aos órgãos e fundações de Para isso, as empresas devem ser tecnoló-
fomento governamentais, a entidades gica e comercialmente competitivas para
Pesquisa Básica e Aplicada Validação em Laboratório Desenvolvimento de protótipos Validação do produto privadas, e as Agências Reguladoras para atender o mercado nacional e atuar inter-
obter recursos para os desenvolvimentos nacionalmente.
Prova de viabilidade Aprimoramento da tecnologia Lançamento no mercado dos processos até a obtenção da inova- Os investimentos a curto e médio pra-
ção. Não havendo recursos próprios nas zos devem ser estruturantes e devem focar
Fonte: Fábio Nascimento empresas envolvidas, deve-se apoiar a inciativas como:

474 ECONOMIA
474 ECONOMIA AZUL
AZUL Tecnologias Inovadoras 475
i. Apoio ao monitoramento ambiental iii. Formação de infraestrutura e recur- estímulo fiscal e a diminuição de entraves degários na exportação ou reimportação de
– Este pode ser feito através da Montagem sos humanos, e fomento industrial – Para o alfandegários. Não há motivos para não ha- mercadorias agrava a deficiência de serviços
de um Centro de Calibração para sensores estímulo a formação de recursos humanos ver a simplificação e redução da carga tri- de manutenção e calibração de instrumen-
de salinidade, temperatura e pressão (os e atração de profissionais para as áreas de butária, nos moldes da Lei do ICMS para as tação no país. Há a necessidade da criação
CTDs) e medidores de Ondas com rastrea- Tecnologia Oceânica, deve-se visar: ao in- indústrias aeronáutica e naval. O Convênio de mecanismos que agilizem os trâmites al-
bilidade internacional. Estes sensores são centivo à formação e à especialização, esti- ICMS 75/91 que dispõe sobre a concessão fandegários no envio e retorno de equipa-
importantes na oceanografia física e para mulando as instituições de ensino médio e de redução de base de cálculo do ICMS para mentos ou partes.
a economia nacional, pois seus dados são superior, direcionadas às áreas tecnológicas itens aeronáuticos, constitui-se em um im- O fortalecimento da cadeia produtiva é es-
utilizados para calibração e assimilação a abrirem suas grades de ensino à área de portante mecanismo de fomento à indústria tratégico, seja por questões econômicas, so-
em modelos de previsão meteorológica e instrumentação; à realização de oficinas so- aeronáutica nacional e a toda a sua cadeia cioambientais, seja de soberania. Tem-se que
oceanográficas e importantes para a so- bre Instrumentação Oceanográfica e Tecno- produtiva. Deve-se também buscar mecanis- buscar soluções locais para limitações como
ciedade civil e indústrias como da pesca, logias Oceânicas, onde profissionais e estu- mos que facilitem a atuação das empresas, as restrições impostas pelo Departamento de
turismo e Óleo & Gás. Deve-se também dantes destas áreas poderão apresentar seus com a emissão de certidões de existência Comércio dos EUA, que através do Bureau
atuar no mapeamento, articulação e coo- trabalhos e interagir com geradores de de- ou não de produto similar de fabricação na- of Industry and Security, controla e muitas
peração em P,D&I, buscando formas de mandas. Essas oficinas devem abranger tam- cional para fins de atendimento a regras de vezes restringe a exportações de itens como
aglutinar os grupos de pesquisa, as em- bém outras áreas como: energias renováveis, licitações e compras governamentais, como conversores de sinais, sensores inerciais e
presas geradoras de demandas e as pres- segurança à navegação e logística portuária, é feito pela ABINEE- Associação Brasileira sistemas acústicos (Commerce Control List)
tadoras de serviços, as organizações do pesca, aquacultura, turismo, inclusão social, da Indústria Elétrica e Eletrônica para seus ou a crise de respiradores mecânicos ocorrida
terceiro setor, os possíveis patrocinadores defesa, obras costeiras, exploração do solo associados. As dificuldades e custos alfan- durante pandemia de covid-19.
e os demais atores que podem atender ou marinho, mineração, entre outras.
serem usuários das entregas a serem fei- Considerações finais
tas. A preocupação com a existência de Para o apoio ao crescimento industrial e
uma infraestrutura para Dados Oceâni- a existência de uma cadeia de fornecedores/ O universo entorno das tecnologias oce- desenvolvimentos necessários nesta área.
cos e Costeiros possibilitará a gestão efi- prestadores de serviços forte, comprometi- ânicas é vasto e deve atender ao mercado A conexão das tecnologias recentes,
caz do processo da obtenção dos dados, da e entregando qualidade, deve haver um de energias renováveis, à segurança à na- como a Inteligência Artificial, a Robótica,
auxiliando a documentação de procedi- órgão de fomento industrial. Este tem que vegação e da logística portuária, à pesca e a Tecnologia Submarina, a Modelagem
mentos, da preparação, de detalhes na contribuir para a normalização, certificação, aquacultura, ao turismo, à defesa, à realiza- Computacional, a Bio e a Nanotecnologias,
observação, do controle de qualidade (em rastreabilidade, respeito à Propriedade Inte- ção de obras costeiras, à mineração, entre entre outras, com os conhecimentos mais
inglês Quality Control – QC) e da geração lectual, o incentivo transferência de tecno- outras áreas. Suas soluções são de grande tradicionais é necessária para o desenvolvi-
de metadados que descrevam a estrutura logia e cooperação industrial. Deve assim importância para o crescimento da Econo- mento de equipamento básicos e baratos,
do conjunto de dados principal de forma fomentar a existência de um complexo cien- mia Azul, seja para o melhor conhecimento e até os mais sofisticados e custosos. Estes
a torná-lo confiável. tífico-tecnológico-industrial em torno das do ambiente marinho, a sua preservação, a devem atender às demandas da sociedade,
pesquisas oceânicas e hidroviárias no Brasil, salvaguarda da vida humana, seja ou o uso com seus desenvolvimentos buscando a
ii. Investimento em Inovação Tecnológi- aos moldes do IFI – Instituto de Fomento e do oceano de forma sustentável. formação de uma cadeia robusta de forne-
ca – Investir em P&D&I em todos os níveis Coordenação Industrial que prestar servi- Áreas da economia nacional como a de cedores de serviços e produtos.
TRL das diversas áreas com demandas por ços nas áreas de normalização, metrologia, óleo e gás, de software, o agronegócio e a O mapeamento das demandas a curto,
tecnologias, unindo os diferentes atores certificação e coordenação industrial, para indústria aeroespacial demonstram que com médio e longo prazos, incluindo as reprimi-
do país será primordial. Um Plano de Ação produtos e sistemas aeronáuticos militares planejamento e investimentos estratégicos das, é estratégico para a atuação nas diversas
para isto deve incluir as articulações para e espaciais, a fim de fomentar o desenvol- é possível ter no país um polo tecnológico áreas ligadas à Economia Azul. A busca de
cooperações nacionais e internacionais em vimento de soluções científico-tecnológicas forte e inovador para as tecnologias oceâni- recursos e a articulação para fomentar a
C,T&I fortalecendo a colaboração na Trípli- no campo do poder aeroespacial brasileiro. cas. Estes casos de sucesso confirmam que pesquisa científica e tecnológica, e a ino-
ce Hélice da Inovação (Empresas, Universi- Uma importante ação é na articulação há localmente conhecimento e mão de obra vação industrial para o atendimento destas
dades e Governo). para a redução das burocracias, isenção/ especializada para enfrentar os desafios dos demandas é um desafio a ser vencido.

476 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 477


Referências

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478 ECONOMIA AZUL Tecnologias Inovadoras 479


479
23

DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA
MARINHA, BIOPROSPECÇÃO, FÁRMACOS E
DERIVADOS
Ricardo Coutinho
Lohengrin Dias de Almeida Fernandes
Giselle Pinto de Faria Lopes

1. Introdução

O termo Biotecnologia é derivado de 3 Um dos marcos divisórios entre a Biotec-


palavras gregas: bios (βίος), que significa nologia Clássica e a Biotecnologia Moderna
vida; technos (τεχνηος), que representa tec- é a série de experiências realizadas por H.
nologia; e logos (λόγος), que denota pen- Boyer e S. Cohen que culminou em 1973
samento. Deve-se a um engenheiro agríco- com a transferência de um gene de sapo
la húngaro Ereky em 1919, a primeira de- a uma bactéria. A partir desse momento,
finição de Biotecnologia como “a ciência e tornou-se possível mudar o programa ge-
os métodos que permitem a obtenção de nético de um organismo, transferindo-lhe
produtos a partir de matéria-prima, me- genes de outra espécie.
diante a intervenção de organismos vivos”. Na atualidade, a Biotecnologia abran-
Desde então, o século XX assistiu a um ge uma ampla área do conhecimento que
desenvolvimento extraordinário da ciência combina ciências básicas (como por exem-
(genética, microbiologia) e da tecnologia plo, biologia molecular, biofísica, fisiologia,
(eletrônica, informática). Da convergência bioquímica, genética e ecologia) com ciên-
entre ambas, resultaram em grandes avan- cias aplicadas (e.g. farmacodinâmica, nano-
ços em vários setores produtivos, onde os tecnologia de materiais, bioengenharia e
seres vivos constituem a base de itens tão imunohistoquímica) por meio do emprego
diversos como a produção de variedades de técnicas decorrentes da física (micro-
vegetais mais produtivas, a fabricação de eletrônica), da química (fermentações, se-
novos alimentos, o tratamento do lixo, a parações, purificações) e de outras tecno-
produção de enzimas e os antibióticos. logias (informática, robótica e controle de

480 ECONOMIA
480 AZUL
A ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 481
processos). Trata-se, portanto, de uma rede potencial de crescimento sustentável. Os de políticas, é essencial primeiro chegar a cultiváveis resistentes a doenças, plásticos
complexa de conhecimentos onde ciência biorrecursos marinhos têm potencial inex- uma definição clara da biotecnologia mari- biodegradáveis, detergentes mais eficien-
e tecnologia se entrelaçam e complemen- plorado como fonte de novos produtos nha, para em seguida formular indicadores tes, biocombustíveis, e também processos
tam (Figura 1). A Biotecnologia Marinha, e processos, e podem ajudar o Brasil a apropriados dos efeitos das ações políticas industriais menos poluentes, biorreme-
ou Biotecnologia Azul, é definida no pre- enfrentar os desafios globais na promo- e por fim proceder à avaliação. diação de poluentes, testes de diagnós-
sente capítulo como a aplicação da ciência ção da saúde e na geração de alimentos Para o Brasil, a biotecnologia marinha, tico e medicamentos mais eficazes. Em
e tecnologia a organismos marinhos vivos, e energia. Assim, espera-se que além de que utiliza os biorrecursos marinhos como geral, eles incluem o conhecimento de
bem como suas partes, produtos e modelos contribuir para o desenvolvimento socioe- fonte para o desenvolvimento biotecno- produtos (know-how técnico) gerados
dos mesmos, para otimizar a produção de conômico sustentável e fortalecimento lógico, representa o vetor de desenvolvi- a partir de pesquisa e desenvolvimento
conhecimento, bens e serviços. das indústrias nacionais, a biotecnologia mento científico, tecnológico e socioeco- em biotecnologia. Na área emergente da
Como resultado de expressivos avanços marinha seja um dos mecanismos funda- nômico para as áreas de Saúde (Produtos saúde, a bioprospecção marinha tem de-
científicos ao longo dos últimos anos, a mentais para a concretização desse poten- Naturais e Fármacos), Energia (Reatores e monstrado ser essencial, principalmen-
biotecnologia marinha vem sendo consi- cial de desenvolvimento. Biocombustíveis), Materiais (Biopolímeros te no estudo dos produtos naturais, que
derada uma área estratégica e, portanto, Atentos a esse potencial, vários países e Biocorrosão) e Defesa (NBQR e Bioin- constituem a base principalmente para a
tem despertado o interesse em distintos têm elaborado estratégias para promover vasão), além de representar a soberania produção de alimentos a base de proteí-
setores da indústria. Nosso crescente co- o crescimento da Biotecnologia Marinha. brasileira no Atlântico Sul e Tropical, e na nas alternativas e para o desenvolvimen-
nhecimento sobre a biodiversidade mari- A implementação dessas estratégias tem Antártica (Figura 1). to de novos fármacos, buscando em um
nha e o subsequente desenvolvimento de sido usualmente acompanhada por planos De fato, não será possível desenvol- futuro próximo atender as necessidades
tecnologias para acessar e estudar orga- de financiamento e investimento, aliados ver plenamente a Bioeconomia e por crescentes da população mundial. Por
nismos e ecossistemas marinhos apresen- a uma avaliação das ações de apoio. Nes- consequência a Economia Azul sem a outro lado, aplicações inovadoras através
tam oportunidades promissoras e grande se tipo de processo de desenvolvimento contribuição do potencial dos oceanos da aquicultura também têm demonstrado
para a produção de biomassa e alimen- estratégias impactantes na produção de
Figura 1. Setores da Indústria com potencial associação tos. A produção de algas de produtos alimentos, o que converge no importan-
à Biotecnologia Marinha químicos de base biológica, plásticos e te papel da biotecnologia marinha para a
biocombustível tem se mostrado promis- saúde e o bem-estar ao longo da vida.
sora. Sua aplicação no desenvolvimento O Brasil possui uma costa de 8.500km,
de biorrefinarias marinhas integradas para uma Zona Econômica Exclusiva (ZEE) de
a produção de produtos biológicos de alto 3.540.000km2 que, somados aos 960.000
valor será crucial para impactar na dimi- km2 da proposta de extensão da Platafor-
nuição dos custos dessa produção e capi- ma Continental, totalizam uma área marí-
talizar as oportunidades disponíveis. tima de 4,5 milhões de km2 – a Amazônia
Os produtos e processos biotecnológi- Azul (Figura 2). Nessa região se encontram
cos fazem parte de nosso dia a dia, tra- reservas de petróleo e gás, de minérios e
zendo oportunidades de emprego e in- por ser a principal via de transporte do co-
vestimentos. Produtos biotecnológicos são mércio exterior do País tem destaque na
definidos como produtos ou serviços, cujo economia nacional. Aliado a isso, a mul-
desenvolvimento é obtido a partir do uso tiplicidade de recursos naturais, como a
de uma ou mais técnicas biotecnológicas pesca, a influência sobre o clima brasilei-
(DNA/RNA, proteínas e outras moléculas, ro (em particular sobre a pluviosidade e a
cultura e engenharia de células e tecidos, temperatura) e a reconhecida biodiversi-
técnicas de processamento biotecnológico, dade de espécies elevam a biotecnologia
Fonte: Elaboração própria (2022) vetores de genes e RNA, bioinformática e marinha ao patamar de área estratégica
nanotecnologia). Tratam-se de organismos no Plano Nacional de Ciência e Tecnologia

ECONOMIA AZUL
482 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 483
2. Impactos da bioprospecção marinha na sociedade brasileira e mundial
Figura 2. A relevância da Amazônia Azul
no contexto da Biotecnologia Marinha O impacto da bioprospecção marinha na apenas 2 medicamentos baseados em pro-
sociedade é evidenciado pela quantidade dutos naturais marinhos aprovados para uso
crescente de estudos envolvendo a biotec- clínico contra o câncer. Entretanto, na última
nologia marinha e as grandes áreas da Saú- década esse número subiu para 12, o que
de, Energia, Materiais e Defesa, consolidan- supera muito as previsões feitas originalmen-
do seu grande potencial atual e futuro para te. No Brasil, há duas inovações brasileiras
a sociedade brasileira e mundial (Figura 3). baseadas em produtos naturais aprovados
00S Em 2010, Erwin e colaboradores demons- para uso clínico, o Acheflan® como anti-in-
traram uma estimativa monetária para o va- flamatório, obtido de Cordia verbenacea,
lor farmacêutico da biodiversidade marinha a conhecida como erva baleeira ou maria-
partir do potencial de descoberta de medica- -milagrosa, pelos Laboratórios Aché, e do
mentos para tratamento do câncer. Estiman- Helleva® para disfunção erétil, constituído
do até 600 mil novas substâncias químicas, de carbonato de lodenafila, substância sin-
sendo que 90% estariam aguardando sua tética desenvolvida pela indústria Cristália
descoberta, sugeriram que esse estudo po- Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda.
200S deria resultar no desenvolvimento de mais de Especificamente na área da saúde, no-
200 novos medicamentos anticâncer, o que vas drogas eficazes de origem marinha es-
equivalia a um valor entre US$ 563 bilhões e tão sendo descobertas e testadas a todo
US$ 5,69 trilhões. Ressalta-se que na época momento através dos ensaios pré-clínicos.
em que esse trabalho foi publicado existiam A maioria das vezes, essas novas moléculas

Desenvolvimento da
Desenvolvimento da Biotecnologia
BiotecnologiaMarinha
Marinha
40 S
0

0700W 0700W 0300W


90000
90000
80000
80000

Publicações (2010-2022)
Fonte: Elaboração própria (2022)

Publicações (2010-2022)
70000
70000
60000
60000
50000
50000
40000
40000
e no Livro Branco da Defesa (MD, 2012; advogados, empresários, economistas, etc.
30000
30000
PNCT, 2000) Figura 2. A proposta do capítulo é avaliar os fun-
20000
20000
No presente capítulo, a biotecnologia damentos da biotecnologia, com ênfase
10000
10000
é definida como a atividade baseada em na bioprospecção marinha e na produção
0o
conhecimentos multidisciplinares, que uti- de fármacos derivados, revisando os im- Defesa
Defesa Materiais
Materiais Energia
Energia Saúde
Saúde
liza agentes biológicos para fazer produtos pactos para a sociedade, os setores eco-
úteis ou resolver problemas. Esta definição nômicos envolvidos no Brasil, as diretrizes Figura 3. Publicações registradas no revisões, com todas as palavras chaves em
é suficientemente abrangente para en- para o pleno desenvolvimento da Econo- Google Acadêmico entre 2010 e 2022. qualquer lugar do artigo “biotechnolo-
globar atividades tão variadas como as de mia Azul no país e, por fim, como a bio- Os critérios da busca foram: artigos de gy”, “marine” e alterando entre “defen-
engenheiros, químicos, agrônomos, veteri- tecnologia se aplica em diversos setores qualquer natureza e idioma, exceto as se”, “material”, “energy” e “health”.
nários, microbiologistas, biólogos, médicos, produtivos da sociedade. Fonte: Elaboração própria (2022)

484 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 485


têm estruturas muito complexas, de modo no cumprimento do compromisso com os de trabectedina é um alcaloide e foi a marinho do Mar Mediterrâneo (Apli-
que é difícil imaginar um design racional pacientes oncológicos, a partir de investi- primeira molécula anticancerígena de dium albicans) e atualmente obtido por
para desenvolver um fármaco que con- mento multinacional entre Espanha, Itália, origem marinha aprovada na União síntese química para atender a escala de
tenha o princípio bioativo escalonável e, Alemanha, França, Suíça, Bélgica, Áustria Europeia (UE) para uso no tratamento produção industrial. De modo análogo, a
assim, comercializável. Com isso, o investi- e Estados Unidos. Abaixo, encontram-se de sarcoma de tecidos moles e em al- tetrodotoxina, conhecida como o veneno
mento no conhecimento dos princípios es- outros exemplos de sucesso no desenvol- guns casos de câncer de ovário sen- do peixe baiacu, também se encontra na
senciais das vias biossintéticas (ex. genoma, vimento de bioprodutos de origem diversa sível à quimioterapia padrão. Além última fase dos testes clínicos, uma vez

.
transcriptoma e metaboloma) e do próprio entre organismos marinhos. disso, recentemente, o FDA aprovou que vem demonstrando propriedades de
animal marinho permitiria um maior de- O peptídeo Conotoxina MVIIA (Zi- um alcaloide análogo à trabectedi- analgesia, particularmente promissoras no
senvolvimento através da biologia sintética conotide®), originalmente extraído na, também encontrado no mesmo combate à dor neuropática periférica in-
e da bioinformática. Esse conhecimento, e purificado do veneno do caracol organismo marinho, chamado lurbi- duzida pela quimioterapia.
tem se tornado a base para possibilitar o marinho Conus magus, originou a nectedina (Zepzelca®), usado no tra- Indo ao encontro da inovação dos bio-
desenvolvimento de métodos terapêuticos molécula sintética ziconotida, a qual tamento de pacientes com câncer de produtos marinhos, há 5 anos, a tendência

.
através da elaboração de um produto ou foi o primeiro fármaco de origem ma- pulmão metastático; multidisciplinar vem sendo a associação da
processo biotecnológico sustentável. As- rinha liberado pela Food and Drug Ad- O mesilato de Eribulina (Halaven®) bioinformática e das áreas de “ômicas”
sim, espera-se assegurar o processo de pes- ministration (FDA), em 2004, para o é uma cetona sintética derivada da para o refinamento e aceleração da ino-

.
quisa e desenvolvimento de bioprodutos tratamento da dor crônica severa; halicondrina B, produto natural da es- vação tecnológica nessa área de biotec-
marinhos candidatos a se tornarem novos A Citarabina (CytosarU®, Ara-C) é ponja marinha Halichondria okadai e nologia marinha no desenvolvimento de
fármacos, com atividade potencial contra um nucleosídeo de pirimidina sintético é utilizada no tratamento de câncer fármacos e derivados. Considerando es-
diversas doenças. Atualmente, a maioria isolado principalmente de uma espécie de mama inicial e metastático, pro- tratégias terapêuticas alvo-específicas, de
dos fármacos aprovada pelas agências re- de esponja caribenha Tethya crypta. longando positivamente a sobrevida acordo com um estudo de 2019, os tuba-
gulatórias são utilizados no tratamento de Esse medicamento também é aprova- dos pacientes. rões-brancos têm uma vida útil média de
diferentes tipos de câncer, a 2ª doença de do pela FDA e usado principalmente Os exemplos acima listam casos de 70 anos, e o primeiro mapa do DNA des-
maior incidência e letalidade do mundo. em diferentes tipos de leucemia, in- sucesso no desenvolvimento e emprego ses tubarões revelou mutações que pro-
Essas estratégias impactam diretamente a cluindo leucemia mielocítica aguda, de fármacos no bem estar humano. A tegem esses animais do câncer e outras
sociedade, uma vez que os estudos têm leucemia linfocítica, leucemia menín- estratégia terapêutica mais inovadora foi enfermidades. A pesquisa também mostra
o intuito de descobrir alternativas tera- gea e fase de crise blástica da leucemia a associação de produtos naturais mari- que os grandes brancos, que existem há

.
pêuticas que proporcionam uma melhor mieloide crônica; nhos com a imunoterapia, o brentuximab quase 16 milhões de anos, são capazes
qualidade de vida, a extensão da sobre- A Vidarabina (adenina arabinosídeo, vedotin (Adcetris®). O fármaco consiste de reparar seu DNA, mantendo a estabi-
vida, a diminuição dos efeitos colaterais, ara-A ou arabinofuranosiladenina) é da conjugação de monometil auristatina lidade do genoma, o que preserva a sua
inovação na especificidade/eficácia do um nucleosídeo purínico sintético iso- E, uma endolastatina derivada inicial- integridade, algo que os humanos não
tratamento. Apesar de haver uma varie- lado da mesma esponja caribenha T. mente de um molusco da lebre do mar conseguem. Em contraste, a instabilidade
dade de estudos pré-clínicos nessa área, o crypta e desenvolvido a partir de es- Dolabella auricularia, e posteriormente nos genomas, que é causada por danos​​
avanço dos estudos clínicos somente será ponguridina é atualmente obtido de de cianobactérias marinhas. É utilizado ao DNA, é conhecida por provocar câncer
possível através do envolvimento das em- Streptomyces antibiótico. É aprovado como primeira linha na terapêutica do e outras doenças relacionadas à idade. Em
presas farmacêuticas. Há uma empresa pelo FDA para uso como antiviral em linfoma de Hodgkin em combinação com outras palavras, a habilidade do tubarão-
global de biotecnologia marinha que se ceratite epitelial, ceratoconjuntivite a quimioterapia convencional. -branco de reconstruir seu próprio DNA

.
sobressai e contribui para o desenvolvi- aguda e para ceratite superficial; Em 2021, com a pandemia do SARS- evoluiu, enquanto a nossa, não. Logo,
mento desses medicamentos desde 1986, A Trabectedina (Yondelis®) é um -COV2, foram aprovados ensaios clínicos esse exemplo evidencia a necessidade do
chamada PharmaMar. Com sede em Ma- produto natural marinho extraído de de fase III (última fase para aprovação e conhecimento de como isso acontece,
drid, Espanha, foca especialmente na área uma espécie de tunicado (Ecteinasci- comercialização) do uso de Plitidepsina para que possa ser aplicado aos humanos.
de oncologia, na busca por moléculas com dia turbinata) habitante do Mar Me- (Aplidin ®), que é um peptídeo isolado Além das doenças, através de uma
atividade anticâncer proveniente do mar e diterrâneo e do Caribe. A molécula originalmente a partir de um tunicado pesquisa pública feita recentemente por

486 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 487


pesquisadores da Marinha do Brasil (IEAPM) envelhecimento, bronzeamento e redução a Chlorella, um gênero de algas verdes uni- de capital de risco até maio de 2018, de
em 2021, constatou-se que a área da saúde da celulite, por exemplo. celulares que através da fotossíntese se mul- acordo com informações do PitchBook,
que emprega a biotecnologia marinha e vive Um exemplo de nutracêutico marinho tiplicam rapidamente, podendo servir como e deve chegar a 980 bilhões de reais até
em crescente expansão é a de nutrição e que merece ser destacado são as gordu- uma fonte potencial de alimento e de ener- 2022, segundo a instituição britânica The
cosméticos. Os produtos naturais marinhos ras poli-insaturadas conhecidas como gia na forma de biomassa. Assim como a Food Tech Matters. Nessa revolução alimen-
estão sendo classificados e constantemen- “gorduras boas”, essenciais para a saú- Spirulina, também o faz atrativa fonte ali- tar provocada pelas foodtechs se destacam
te comercializados como superalimentos, de: ômega 3 e ômega 6. A fonte mais mentar por sua alta proporção de proteína e especialmente: a agricultura biotecnológica,
assim como já se sabe de longa data que conhecida são os peixes, como o salmão outros nutrientes essenciais ao corpo huma- as plataformas de compra e venda de pro-
principalmente as algas são matéria-prima e a sardinha, mas atualmente, também no. Segundo uma revisão abrangente sobre dutos agrários, a bioenergia e os biomate-
para shampoo, sabão e cremes, por exem- se encontra fontes de ômega 3 vegano, a desintoxicação de metais pesados, a Chlo- riais, a robótica agrícola, os alimentos ecoló-
plo. Essas últimas áreas têm se desenvolvido extraído e concentrado de algas, abrin- rella contribui com a eliminação de substân- gicos e os novos sistemas de cultivo.
enormemente com maiores oportunidades do um novo mercado de oportunidades. cias a que estamos expostos diariamente e Diante dessas diversas abordagens, é se-
de inovação, virando uma nova tendência O organismo humano não produz essas que são nocivas à saúde. guro afirmar que a bioprospecção marinha
dos consumidores em busca de produtos gorduras sozinho. Quando ingeridas, vão O ramo das foodtechs ainda é incipiente está apenas no início de uma fase ascen-
naturais para a saúde e o bem-estar. ajudar na manutenção da estrutura das no Brasil em comparação com outros seto- dente de desenvolvimento e que contribui-
Segundo dados da Empresa Brasileira células e do sistema nervoso. Outros dois res da biotecnologia marinha. Entretanto, rá potencialmente para o desenvolvimento
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no nutracêuticos são estudados há muitos é importante ressaltar sua importância em da área da biotecnologia marinha aplicada
Brasil, dos 140 milhões de toneladas de ali- anos são o ágar-ágar e a astaxantina, um nível mundial. Este mercado recebeu cerca à saúde, principalmente nas áreas de nutri-
mentos produzidos por ano, 26 milhões são carotenoide vermelho obtido através de de 1,3 bilhão de dólares em investimentos ção e fármacos.
desperdiçados. Proporcionalmente a essa uma espécie de microalga. Segundo es-
situação, 19 milhões de brasileiros estão tudos, é conhecido como um poderoso 3. Os modelos de desenvolvimento da biotecnologia marinha no Brasil
passando fome. Com o propósito de rever- antioxidante natural e apresenta eficiên-
ter essa situação, diversas foodtechs estão cia antioxidante superior à vitamina C no A Biotecnologia Marinha possui uma desenvolvimento tecnológico e industrial
propondo novos modelos de consumo combate aos radicais livres que causam o ampla gama de aplicações tecnológicas do Brasil. Por que então os investimentos
consciente, pensados em sustentabilidade envelhecimento das células. que têm proporcionado benefícios rele- na educação e no desenvolvimento cientí-
e impacto socioambiental voltados para Ainda há os alimentos ricos em prebió- vantes para sociedade. Atualmente, vários fico no Brasil não têm implicado em cres-
alimentos plant-based e cell-based, chama- ticos, que são fibras e outros componentes bioprodutos marinhos possuem diversas cimento da taxa de inovação tecnológica?
dos alimentos do futuro. não digeríveis derivados dos carboidratos aplicações comerciais, principalmente nas Uma explicação possível pode ser en-
Os nutracêuticos são um tipo de suple- que contribuem para o desenvolvimento das áreas da Indústria Farmacêutica, Alimen- contrada no modelo da “Tripla Hélice” (TH)
mento alimentar que contêm em sua com- bactérias benéficas que habitam o intestino, tícia, Cosmética e Naval, entre outras. O do desenvolvimento tecnológico. Esse mo-
posição compostos bioativos que foram como as algas marinhas. Uma vez que a Orga- Brasil, ainda que possua uma grande di- delo desenvolvido por Henry Etzkovitz na
extraídos dos alimentos e que possuem nização Mundial da Saúde elegeu a Spirulina versidade biológica marinha e um rol de década de 1990, é hoje uma das metáforas
benefícios para o organismo, podendo, como o “alimento do milênio”, os extratos pesquisadores altamente qualificados, mais populares e aceitas para explicar a ca-
inclusive, ser utilizado como forma de de cianobactérias estão em evidência, sendo está aquém de seus parceiros internacio- pacidade de transformar o conhecimento
complementar o tratamento para alguma facilmente comercializados. Popularmente nais na exploração do potencial biotecno- científico em inovação tecnológica. Basica-
doença, sendo os nutracêuticos funcio- conhecida como “Alga Azul”, a Spirulina é, lógico dos organismos marinhos. mente o modelo, que foi desenvolvido ob-
nais. Já os nutricosméticos são um termo na realidade, uma cianobactéria, que contém Entre os aspectos relacionados ao uso servando os mais importantes polos e par-
utilizado pela indústria cosmética para de- mais de 50 nutrientes fundamentais ao or- da Biotecnologia Marinha na sociedade, a ques tecnológicos do mundo, sugere que
signar produtos para administração oral, ganismo. Seus inúmeros benefícios são rela- inovação tecnológica é o pilar do desen- uma maior taxa de desenvolvimento tec-
que são formulados e comercializados tados nos estudos científicos, contemplando volvimento científico e socioeconômico. nológico só é possível a partir da parceria
especificamente para contribuir para a desde auxílio no tratamento da osteoporose Na última década, houve uma expansão entre academia (Universidades e Institutos
hidratação, o desempenho em atividades até à prevenção do envelhecimento preco- considerável da produção científica brasi- de Pesquisa como geradores de conheci-
específicas, o emagrecimento, atraso do ce. Na mesma linha de ação, encontramos leira, mas que não se refletiu no ritmo do mento), empresas (como aplicadores do

488 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 489


conhecimento) e governo (como promo- país na última década, o maior padrão de
tores do conhecimento). Nesse modelo, a colaboração tem sido observado entre a Figura 4: Modelo expandido da Tríplice Hélice aplicado
biotecnologia se insere como uma ativi- academia e o governo, reflexo do depósito à Biotecnologia Marinha
dade econômica essencialmente baseada das patentes em regime de cotitularidade
na interdependência de atores das esferas entre agências de fomento e universidades.
ciência, mercado e Estado, respectivamen- Já a colaboração entre a academia e a in-
te. A empresa privada depende do conhe- dústria permanece incipiente, fazendo com

o
cimento da academia e de financiamento que o padrão de colaboração não seja o

Of
çã
para inovação para produzir bens e serviços. esperado no modelo da Tríplice Hélice.
Universidades e institutos fazem pesquisa Um dos instrumentos normalmente

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utilizando recursos públicos e privados. Por utilizados para aproximar as partes dentro
sua vez, governos, agências e comitês for- do modelo academia-indústria-governo é

Ino

a
mulam políticas de C,T&I e respondem pela o estabelecimento de Polos Tecnológicos,
estrutura de regulação, atividades que pre- que são ambientes propícios à interação
cisam estar afinadas com empresas e acade- entre instituições públicas, empresas pri-
mia para que sejam efetivas. vadas e a comunidade científica. Tais Polos
Compreender a biotecnologia perpas- servem como ambientes de cooperação
sa pelo entendimento desse complexo de entre a iniciativa empreendedora e a co-
interdependências, por isso as três esferas munidade acadêmica, visando ao fortale-
podem ser utilizadas como recurso analíti- cimento da capacidade de inovação, ge-
co. A ideia-base sugere que inovação bio- ração de riqueza e bem-estar da socieda-
tecnológica só é possível no momento em de. Ainda, esses ambientes possuem alto
que conhecimento novo é direcionado para potencial para transpor o abismo que há
atender demandas de desenvolvimento so- entre a geração do conhecimento cientí-
cioeconômico, que em seguida são analisa-
das, gerenciadas e comercializadas por enti-
fico e o desenvolvimento socioeconômico
(o paradigma da Inovação).
Demanda
dades privadas e empresas. Nesse caminho, Ainda que esse modelo pareça bem Fonte: Elaboração própria (2022)
há o estímulo de políticas públicas que visem resolvido, existem outros mais recentes
a coordenar o desenvolvimento do potencial que reconhecem o protagonismo de in-
de cada setor e a gerir os modelos contra- vestidores e usuários dentro do fluxo de 4. A Biotecnologia nas empresas
tuais das parcerias entre os diferentes atores desenvolvimento; a chamada hélice tripla
(incluindo as patentes). Nessa perspectiva, de inovação expandida. Nesta visão, o O termo “Biotecnologia” abrange di- pós-graduação em biologia molecular e
os atores (governos, indústria e academia) modelo da TH está ultrapassado e falha ao versas tecnologias empregadas na pesqui- com a associação da Embrapa (Empresa
precisam aumentar sua interação para criar desconsiderar dois grupos centrais no mo- sa e na indústria, que variam desde a pro- Brasileira de Pesquisa Agropecuária) a algu-
inovações que contribuam para o desenvol- delo, que são empreendedores e clientes. dução de enzimas por bactérias genetica- mas universidades do Estado de São Paulo
vimento econômico, a competitividade e o Segundo um estudo do Instituto de Tec- mente modificadas até terapias utilizando para o desenvolvimento de programas de
bem-estar social. E é justamente nesse ponto nologia de Massachusetts (MIT), 93% da ino- células-tronco. A biotecnologia em si, no engenharia genética em animais, a biotec-
que falha o modelo de inovação. vação têm origem fora de empresas estabele- Brasil, iniciou-se por volta de 1930, quan- nologia foi pouco a pouco se consolidando
A academia está distante das empresas. cidas. A principal razão está no paradigma da do o Instituto Agronômico de Campinas no cenário nacional.
Os empresários normalmente são avessos a Inovação supramencionado: organizações e (IAC) começava a desenvolver pesquisas Apesar de o país ser essencialmente agrí-
inovação. E falta ao governo políticas ativas industrias estabelecidas reconhecem o abis- para melhoramento genético de café, cola, somente 10% das empresas de bio-
e integradoras para inovação. E embora o mo entre inovação e mercado, e optam por milho e outras espécies. Gradualmen- tecnologia estão voltadas para a agricultura.
esforço inovativo apresente crescimento no evitar os riscos inerentes à inovação. te, com o surgimento de programas de Cerca de 40% atuam em saúde humana e

490 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 491


5% em bioenergia, com 63% das empresas destaque no contexto de patentes estão Com base no papel estratégico da Bio- . As parcerias público-privadas podem se
fundadas após o ano de 2000, sendo que os anticorpos monoclonais, que funcionam tecnologia Marinha no cenário socioeco- envolver no financiamento conjunto de
a grande maioria delas são micro ou pe- principalmente como moléculas capazes nômico brasileiro, os seguintes corolários equipamentos e funções de coleta e geren-
quenas empresas, que tem seus centros de de localizar com precisão uma substân- merecem ser destacados: ciamento de dados, levando em conta os
pesquisa e desenvolvimento associados a cia-alvo e se ligar a ela. Esses bioprodutos diferentes interesses de indústrias marinhas
Incubadoras de Empresas dentro de univer- têm alta complexidade e frequentemente O potencial da biotecnologia marinha bem estabelecidas e emergentes.
sidades. Isso demonstra que o mercado da envolvem o depósito de múltiplos pedidos para muitas aplicações e em distintos seto-
biotecnologia é extremamente novo e está de patentes, ainda que relacionados a um res industriais é um ponto relevante quan- Por outro lado, o desafio que a indústria

.
em expansão, que acompanha os desen- mesmo medicamento biológico devido às do se quantifica a bioeconomia; de biotecnologia marinha enfrenta no pró-
volvimentos e avanços nas pesquisas den- várias tecnologias passíveis de proteção. A participação da biotecnologia marinha ximo milênio é:

. identificar novas fontes de bioprodutos


tro das universidades. Outro dado impor- No Brasil, para obtenção de uma paten- na economia de mercado deve crescer con-
tante é que 77% dos reagentes utilizados te, é necessário que tais tecnologias sejam comitante à geração de aplicações inova-

. . desenvolver novas tecnologias de tria-


por essas empresas são importados, enca- modificadas geneticamente e diferentes de doras baseadas em recursos marinhos; marinhos;
recendo o processo de inovação. correspondentes naturais. A biotecnologia marinha como um seg-

. fornecer uma fonte sustentável de abas-


O mercado de trabalho de biotecnolo- Processos biotecnológicos, por sua vez, mento que contribui para a bioeconomia e gem;

.
gia, embora vasto e atraente, ainda está são definidos como os processos de pro- a economia oceânica;

. otimizar a produção e recuperação dos


em desenvolvimento, conforme demons- dução ou outros tipos – como processo Existe uma lacuna na infraestrutura de tecimento; e
trado pelo aumento no número de mestre ambiental, por exemplo – que utilizem pesquisa acessível para a biotecnologia
e doutores formados em áreas como ciên- uma ou mais técnicas e/ou produtos bio- marinha. Embora as necessidades de bioprodutos.
cias da saúde, ciências biológicas e ciências tecnológicos. Nesse contexto, empresas infraestrutura de pesquisa geralmente
agrárias. A título de exemplo, o mercado biotecnológicas ativas são definidas como tenham um caráter mais genérico, a es- Em relação às Patentes em 2015, o INPI
biotecnológico ainda é dominado por me- aquelas empresas cujas atividades-chave cala prevista de oportunidades ofereci- publicou a Resolução 144, que institui as Di-
dicamentos químicos, puramente sintéti- são relacionadas à biotecnologia, a partir das pela biotecnologia marinha, ligada à retrizes de Exame de Pedidos de Patente na
cos, e que consistem de pequenas molécu- da aplicação de pelo menos uma técnica imensidão do ambiente oceânico, exige Área de Biotecnologia. Essas diretrizes são

.
las dotadas de uma estrutura simples. Com biotecnológica para produzir produtos, requisitos especiais; importantes para definir conceitos de bio-
a ascensão e o entendimento dos mecanis- serviços e/ou pesquisa. Apesar de não A natureza compartilhada e dinâmica dos tecnologia de acordo com o entendimento
mos complexos atrelados à modificação de estar destacada na Política de Desenvol- recursos biológicos oceânicos, juntamente do INPI e para auxílio na análise de paten-
genes e ao uso de células e microrganis- vimento da Biotecnologia Brasileira, a com o enorme volume de oportunidades teabilidade em pedidos de proteção. Con-
mos, propiciados pelos novos profissionais Biotecnologia Marinha está se tornando de desenvolvimento (e desafios), significa tudo, sabe-se que o maior problema atual-
melhor qualificados, tornou-se possível a rapidamente uma importante área do que a cooperação nacional e internacional mente enfrentado pelo INPI é o backlog (ou
fabricação de medicamentos biológicos, setor biotecnológico global, por seu po- é um requisito básico para o desenvolvi- atraso no exame de pedidos de patentes),
que consistem de moléculas maiores e de tencial para contribuir com os desafios mento de infraestrutura para apoiar a bio- onde a espera pela emissão de um parecer

.
estrutura complexa. Dessa forma, inven- futuros da humanidade, gerar riquezas tecnologia marinha; técnico é longa, afetando o tempo para
ções direcionadas a produtos e processos e contribuir para o desenvolvimento de Uma das necessidades mais urgentes que uma decisão final seja emitida.
biológicos têm se tornado promissoras economias mais verdes e inteligentes. Por relacionadas à infraestrutura de pesquisa Sob a ótica das empresas nacionais e
no tratamento e prevenção de uma gama outro lado, a biotecnologia marinha não é é a padronização de protocolos e procedi- estrangeiras, a Biotecnologia é atualmente
maior de doenças, como câncer, esclerose um campo autônomo, mas espera-se que mentos – de coleta dados ou de amostras, a fonte de maior inovação. Todavia, existe
múltipla, artrite reumatoide e asma. contribua no futuro para o desenvolvimen- de armazenamento e gerenciamento, de uma necessidade de grande investimento
Na última década, o número de pro- to de uma bioeconomia madura, baseada curadoria, de capacidade de análise, arma- em pesquisa e desenvolvimento (P&D) por
cessos e produtos oriundos da Biotecno- na biomassa de origem marinha para bio- zenamento e cálculo, além de estruturas trás dos medicamentos biológicos, que é
logia refletidos em depósitos de pedidos combustível por exemplo, e em produtos legais para usar dados (brutos). A ligação influenciado basicamente pela necessida-
de patente tem crescido de forma ex- de base biológica de ponta provenientes de e a comunicação entre bancos de dados é de de estudos laboratoriais longos e mais
pressiva. Dentre os bioprodutos de maior recursos marinhos. um desafio particular; complexos, e de materiais e reagentes que

492 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 493


assegurem a manutenção de um meio pro- científicas e patentes nas Ciência da Saúde 5. As Startups e o empreendedorismo
pício para obtenção do produto biológico esteja se reduzindo nos últimos 10 anos,
final. Assim, considerando o tempo de pes- em algumas áreas como a de Antibióticos/ O Brasil é um país altamente empreen- 41,9% entre 2011 a 2014, mostrando que
quisa necessário para que se obtenha um Biofilme e Anticâncer ainda há uma grande dedor. Segundo o Global Entrepreneurship ainda há espaço para o crescimento da bio-
medicamento biológico comprovadamente proporção de publicações científica quan- Monitor Brasil, em 2016 para cada 100 tecnologia no país. Ademais, na edição de
seguro e eficaz, espera-se que o sistema do comparada com as patentes (Figura habitantes 36 eram empreendedores, uma 2018 da revista BioBr, empresas e organi-
brasileiro de patentes seja dinâmico e cé- 5). Dessa forma, esse talvez seja um dos taxa superior a muitos outros países da zações proeminentes compartilharam sua
lere com relação à área de Biotecnologia. grandes desafios nacional para o maior de- América Latina e até alguns países “desen- visão sobre o cenário da biotecnologia no
Ainda, embora a proporção entre as senvolvimento, e uso do conhecimento em volvidos”. Isso se reflete no setor de bio- Brasil e exemplos de suas atividades de ino-
pesquisas que resultam em publicações benefício da sociedade no Brasil. tecnologia, pois há muitas startups sendo vação. O empreendedorismo dos dias de
criadas com foco em projetos nessa área. hoje está cada vez mais relacionado com
De acordo com um mapeamento da As- inovação tecnológica, e a biotecnologia
sociação Brasileira de Startup (ABStartups), nada mais é do que inovação.
80000 existem mais de 4,2 milhões de startups no Segundo estudos do CEBRAP, desenvol-
Brasil, mas ainda é difícil estimar quantas vidos em parceria com a BrBiotec e a APEX
70000
estão trabalhando com biotecnologia. Para do Brasil, em 2011 o Brasil contava com
60000 atenuar essa carência de dados, a Biomi- 237 empresas de biotecnologia, sendo que
Publicações (2010-2022)

nas Brasil, a Abiquifi e a Apex-Brasil estão 63% delas foram criadas ainda na última
50000
trabalhando no mapeamento de startups década. Entretanto, 78% dessas empresas
40000 no Brasil que trabalham com ingredien- dependem do financiamento público para
tes farmacêuticos, compostos químicos e executar suas funções. A área de atuação de
30000
biológicos, equipamentos médicos, saúde maior destaque é a de pesquisa em saúde
20000 digital, produtos farmacêuticos humanos humana (cerca de 40%), seguida pela área
e animais, nutrição animal e biotecnologia de saúde animal (14%). As áreas de agri-
10000 em geral. Também mapeará os principais cultura, ambiente e bioenergia reunidas
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clusters de inovação do país nestas áreas; abrangem 25% das empresas de biotec-
o tipo de soluções sendo pesquisadas; e os nologia brasileiras. De todas essas entida-
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produtos já em fase de protótipo. des, 80% são micro e pequenas empresas


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Uma pesquisa realizada pela Biominas que sofrem com a falta de investimentos,
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(2017) revelou o perfil geral das empre- indisponibilidade de insumos, excesso de


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sas brasileiras de biotecnologia. A maioria burocracia e inexperiência para concluir o


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(cerca de 60%) é de pequeno porte, com desenvolvimento de seus produtos.


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Pesquisa Patentes
até 10 funcionários, e jovem, com menos Normalmente na criação das empresas
de 10 anos de idade. Quase 70% das em- (Startups por exemplo), ainda que haja re-
Fonte: Elaboração própria (2022) presas já fizeram algum tipo de coopera- cursos disponíveis para a fase inicial de pes-
ção internacional e todos os entrevistados quisa, usualmente há falta para a fase de
Figura 5. Publicações e patentes regis- lavras chaves em qualquer lugar do texto demonstraram interesse em realizar futu- testes de produtos e para a desvinculação
tradas no Google Academic e no Google “biotechnology”, “marine” e alterando ras atividades de cooperação. As grandes das incubadoras. As incubadoras normal-
Patents, respectivamente, entre 2010 e entre “anti-parasitic”, “antifungal”, “an- empresas também estão buscando inova- mente são mantidas com aporte de recur-
2022. Os critérios da busca foram: artigos tihypertensive”, “anti-inflammatory” , ção por meio de projetos de biotecnologia. sos federais provenientes da Financiadora
ou patentes de qualquer natureza e idio- “antiviral”, “neuroprotective”, “analge- De acordo com a Pesquisa de Inovação do de Estudos e Projetos (Finep), e as empresas
ma, exceto as revisões, com todas as pa- sic” , “antibiotic” e “anticancer”. Brasil (PINTEC), o número de empresas ino- incubadas dependem desses recursos tan-
vadoras que usam biotecnologia cresceu to para desenvolver seus produtos quanto

ECONOMIA AZUL
494 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 495
para investir em gestão e marketing. Pou- ro de empreendimentos envolvidos em as tendências para o futuro. São reunidas é analisada a partir da avaliação da tecno-
co é investido pelo empresário, mesmo na biotecnologia, ainda que haja empresas informações sobre outros produtos dispo- logia utilizada e suas formas de produção;

.
fase inicial da criação da empresa. atuantes em outras subáreas: níveis (concorrentes e substitutos), assim além da avaliação da tecnologia e produção
Apesar dos fatos desfavoráveis, as com- Bioenergia: desenvolvimento de novas como seus posicionamentos (preço, quali- dos possíveis fornecedores.

.
panhias de biotecnologia brasileiras con- tecnologias para biocombustíveis; dade ou nicho de mercado), seus desempe- Contudo, um outro aspecto importante
tam com profissionais de alta competência Meio ambiente: biorremediação, geren- nhos e as tecnologias utilizadas. é que os pesquisadores da área de biotec-
técnica. Em empresas com 1 a 10 funcioná- ciamento de resíduos e recuperação de Já o Planejamento do Negócio corres- nologia marinha brasileira ainda encontram

.
rios, aproximadamente 40% são doutores áreas devastadas; ponde ao planejamento do produto susten- muitas dificuldades para transformar suas
e 20% têm mestrado. Com bons profissio- Agricultura: controle biológico de pra- tável e seu modelo de comercialização. En- invenções em inovações, fazendo com que
nais sendo formados e atraídos, espera-se gas, biofertilizantes, sementes transgênicas globa a definição da estratégia, através das muitas invenções acabem sendo publica-

.
que o resultado seja o aporte de mais inves- e melhoramento vegetal; atividades de identificação dos stakeholders das e depois não avancem para produtos.
timentos, a adoção de políticas de estímulo Saúde animal: melhoramento animal, (partes interessadas) envolvidos e parceiros A razão disso é o fato de que os pes-
e, finalmente, a consolidação da biotecno- drogas e vacinas, desenvolvimento de tec- potenciais; mapeamento do ciclo de vida do quisadores de biotecnologia marinha, bem

.
logia no desenvolvimento socioeconômico nologias em reprodução animal; produto; definição dos requisitos técnicos como as instituições que apoiam a geração
brasileiro. Convém ressaltar que embora os Reagentes: enzimas, kits diagnósticos, necessários para a produção e comerciali- de inovação nas Instituições de Ciência e

.
pesquisadores conheçam muito bem a parte moléculas bioativas e anticorpos; zação do produto; mapeamento da cadeia Tecnologia (ICTs) do País não conseguem
do desenvolvimento técnico dos produtos, Bioinformática: análise de testes diag- de valor (macroprocessos e processos de atender, ainda, às premissas essenciais para
sabem pouco sobre o mercado em que se nósticos, sequenciamento e consultoria. produção e comercialização); e identificação o desenvolvimento de produtos sustentá-
encontram inseridos. Isso resulta em dificul- As empresas dessas áreas encontram- dos diferenciais e fatores críticos de sucesso. veis na área. Assim, poucos são os produ-
dades adicionais na escolha de estratégias -se concentradas principalmente na região Engloba também a realização dos estudos tos efetivamente disponibilizados para a
para alavancar seus produtos e/ou sua mar- sudeste, mantendo São Paulo em primeiro de viabilidade técnica, econômica, ambien- sociedade, o que reforça o abismo entre
ca, e, por fim, escalonar seus empreendi- lugar com 18% do número total de com- tal e social. A viabilidade técnica do produto inovação e desenvolvimento.
mentos à economia de mercado. panhias, seguido por Minas Gerais (13%),
Como foi citado anteriormente, a área Rio de Janeiro (12%) e Rio Grande do Sul 7. Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha no Brasil
da saúde humana se destaca pelo núme- (5%), no sul do país.
A Biotecnologia Marinha tem tido um Marinha no Brasil carecem de uma maior es-
6. Biotecnologia marinha e o desenvolvimento de novos produtos enorme crescimento nos últimos anos no pecificidade, pois foram estabelecidas para
Brasil e no mundo. Esse fato está relaciona- o mar de uma forma geral. O setor da Bio-
Para se chegar a um produto em biotec- instituições de apoio, pesquisa e financia- do principalmente a prioridades que o go- tecnologia Marinha, por sua complexidade e
nologia marinha é necessário que além do mento, além de todo um arcabouço jurídi- verno tem estabelecido para aplicação de importância, deveria ter uma política pública
conhecimento oriundo da pesquisa básica co devem estar alinhadas. recursos. Contudo, ainda existe um grande própria que pudesse juntar questões do uso
exista um processo de ideia, descoberta, in- A avaliação estratégica do mercado é o espaço a ser ocupado pelas empresas para dos recursos marinhos às questões ambien-
venção e produção do produto para a sua co- processo que engloba o estudo da viabili- que esse crescimento possa atingir um pa- tais e legais. Da forma como existe hoje, a
mercialização e disponibilização para a socie- dade mercadológica do produto. Em outras tamar de forma a que os benefícios para a Biotecnologia Marinha reúne decretos de
dade, remetendo-se a uma escala de maturi- palavras, é a verificação da viabilidade de sociedade sejam mais visíveis. lei que estão pulverizadas nas regulamen-
dade tecnológica que leva em média 10 anos. comercialização do bioproduto, na qual são As políticas públicas estabelecidas pelos tações das atividades pelas agências regula-
Essa escala de maturidade, corroborada detalhadas as necessidades do mercado, governos precisam ser reformuladas de for- doras. Essas agências têm contribuído para
pela legislação brasileira, demonstra que identificando clientes potenciais, concor- ma a atender as novas demandas nacionais e o fortalecimento das atividades no mar, mas
para serem consideradas produtos, as des- rentes e toda cadeia de suprimentos. Além internacionais. Hoje as políticas públicas para elas ainda não estão consolidadas.
cobertas em biotecnologia marinha preci- disso, são avaliadas as demandas do mer- o setor estão formuladas dentro de um ema- Existem obrigações legais que essas
sam ser disponibilizadas para a sociedade. cado, ou seja, as quantidades demandadas ranhado de leis e decretos que dificultam sua agências têm na atuação em atividades de
E para que isto possa ocorrer, toda uma do produto, o crescimento do mercado nos compreensão e implementação. Hoje as po- C,T&I de setores regulados, contando para
estrutura de transferência de tecnologia, últimos anos, o crescimento estimado e líticas públicas para a área da Biotecnologia tanto com recursos das chamadas cláusulas

496 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 497


de P, D&I. Essas cláusulas são obrigações le- constituída pelo leito do mar, fundos mari- de medidas mais concretas para a redução (CGEE), observou-se que apesar de um ele-
gais de investimento privado em P,D&I de- nhos e seu subsolo para além dos limites dos conflitos. O modelo adotado pelos EUA vado interesse declarado por C&T e de uma
finidas por normas emanadas por Agência da jurisdição nacional. A ausência jurídica é por exemplo, onde o Coastal Zone Manage- visão positiva sobre o tema, os brasileiros exi-
Reguladora competente para exercer o po- preocupante porque os avanços científicos ment possui leis aprovadas pelo Congresso, bem uma escassa apropriação de informação
der de fiscalização e controle dos recursos e aperfeiçoamento das tecnologias oceano- encorajam os Estados costeiros a implemen- científica e tecnológica e conhecem muito
aportados. Contudo, nem todas as agências gráficas ampliam cada vez mais a possibili- tar planos de gerenciamento costeiro, o que pouco sobre a história da ciência e tecno-
contam com esses recursos humanos e finan- dade de novas descobertas, monopolizadas difere do que é feito no Brasil pela ausência logia no País. Os brasileiros esperam que o
ceiros, o que dificulta a sua regulamentação por poucos países desenvolvidos, podendo de leis de regulamentação, fiscalização e mi- conhecimento científico e tecnológico traga
e o seu incentivo. Além disso, grande parte dificultar a instituição de um regime jurídico tigação de procedimentos potencialmente a solução de problemas e tenha a maior par-
dos recursos usados em C,T&I pelas empre- que restrinja a mercado que vem se consoli- prejudiciais ao meio ambiente. te de suas ações realizada onde a população
sas são maquiados como P,D&I, mas são na dando nas profundezas do mar. Foi definido No entanto, nenhuma política pública, consegue ver concretamente o impacto e
verdade recursos para atender às obrigações também que os recursos minerais nela en- programa ou plano na área da Biotecnolo- sua aplicação. De forma compatível com o
ambientais que os órgãos estabelecem para contrados são patrimônio da humanidade. gia Marinha terá sucesso se não tiver o en- maior interesse apresentado pelos temas de
as empresas. Assim, há uma tênue linha en- Foi definido também que os recursos mine- gajamento e apoio da sociedade e esse tal- medicina, saúde e meio ambiente, as áreas
tre o investimento que a empresa é obrigada rais nela encontrados são patrimônio da hu- vez seja o aspecto mais importante. O Brasil apontadas para maior desenvolvimento de
a fazer para atender aos órgãos ambientais e manidade. Não há, contudo, previsão quan- vem ampliando, nas últimas décadas, seus iniciativas de C&T são medicamentos, ener-
o 1% que a empresa pode usar como P,D&I, to ao destino e titularidade dos recursos da esforços pelo avanço do desenvolvimento gias renováveis, agricultura, mudanças climá-
fazendo com que o investimento real das biodiversidade. Por outro lado, a Convenção científico e tecnológico, e em especial da ticas, exploração dos recursos da Amazônia.
empresas seja reduzido. A área da Biotecno- sobre Diversidade Biológica, submete a bio- Biotecnologia Marinha. Mas os benefícios e Ainda segundo a pesquisa do CGEE, os
logia Marinha ainda não se beneficiou total- diversidade, e consequentemente seus re- os impactos da ciência e tecnologia na vida brasileiros consideram a ciência atrasada.
mente dessa alocação do recurso, embora o cursos genéticos, ao princípio da soberania, do cidadão de uma forma geral são pou- Entretanto, não conhecem as instituições
país tenha dobrado o investimento em C,T&I consagrando direitos dos Estados sobre os co reconhecidos. Esse aspecto é de grande de pesquisa, não conhecem os cientistas e
como um todo entre 2004 e 2014. recursos naturais que estejam sob sua jurisdi- relevância, não somente para auxiliar as to- não sabem que o principal financiador da
A criação das Agências Reguladoras que ção. Há, pois, uma lacuna na regulação dos madas de decisão em relação à área como C&T no País é o Estado. Portanto, cabe ao
foi vista como uma forma de disciplinar o recursos genéticos marinhos se estes estive- também ampliar a participação da socieda- governo, à comunidade científica, às insti-
setor, carece de uma maior integração com rem situados nesta Área. de nessas escolhas. É importante saber, por tuições de pesquisa e ensino e à mídia, em
as políticas públicas, planos e programas, O Brasil com sua Amazônia Azul é cer- exemplo, o quanto a população brasileira um esforço conjunto, preencher essa lacuna
de forma a estabelecer um fluxo de recur- tamente um dos países mais prejudicados conhece a respeito de temas relacionados à de forma que a sociedade verdadeiramente
sos adequados para a área de C,T&I e em para o uso da Biodiversidade pela Biotec- área de ciência e tecnologia, notadamente reconheça e se aproprie da Ciência e Tecno-
especial para a Biotecnologia Marinha. Da nologia Marinha, que carece de um papel sobre a Biotecnologia Marinha. logia brasileiras como recursos estratégicos
forma que se encontra, as agências atuais mais atuante do governo nos processos de Em muitos países, as enquetes sobre para o desenvolvimento sustentável do País.
são órgãos em descompasso com os outros direito e nas organizações internacionais, percepção pública da ciência têm sido No caso específico da Biotecnologia Ma-
atores governamentais e privados na área de com um suporte nas políticas nacionais usadas como instrumento de apoio para a rinha, o reconhecimento da sua importância
Biotecnologia Marinha. Por outro lado, há que permitam um papel mais relevante no formulação de políticas públicas, o acom- é relativamente mais fácil do que em ou-
também uma grande discrepância entre os uso dos recursos marinhos. panhamento social das aplicações da C&T tras áreas do conhecimento. Algumas áreas
países desenvolvidos e em desenvolvimento, Um outro importante aspecto que ne- e a avaliação de decisões relativas à política como as da saúde e da aquacultura são dois
como o Brasil, no que diz respeito às mol- cessita ser mencionado é a redução dos científica e tecnológica. No Brasil, isso não exemplos claros. As ações sob a responsabi-
duras jurídicas na área da Biotecnologia Ma- impactos ambientais e os conflitos nas áreas tem sido feito sistematicamente. As políti- lidade do Ministério da Saúde, por exemplo,
rinha, principalmente relativas à definição costeiras. Atualmente, o Plano Nacional cas públicas são estabelecidas muitas vezes visam ao atendimento da demanda social
da Convenção das Nações Unidas sobre o de Gerenciamento Costeiro é o principal com atores governamentais e privados que por novos produtos, insumos e serviços es-
Direito do Mar (MONTEGO BAY, 1982) que instrumento com esse objetivo. Mas o Plano não incorporam a percepção da sociedade. pecializados na área da saúde. A introdução
definiu e aperfeiçoou zonas marinhas de in- não é aparato em Leis e precisa ser renovado Numa recente pesquisa realizada pelo de novas tecnologias resulta em um acele-
fluência dos Estados e estabeleceu a “Área”, periodicamente, o que enfraquece a adoção Centro de Gestão e Estudos Estratégicos rado avanço nos recursos de diagnósticos,

498 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 499


terapêuticos e de prevenção à saúde. As po- Uma outra área que pode ser usada Os resultados obtidos propiciam informa- uma ponte com o mercado e a univer-
líticas públicas na área da saúde são princi- como exemplo para valorizar e mudar a per- ções que contribuem para o aprimoramen- sidade, que não possuem foco em desen-
palmente voltadas ao estímulo da produção cepção da Biotecnologia Marinha é a car- to e a difusão do uso aplicado de métodos volvimento de produtos. Existe também falta
nacional de vacinas, kits diagnósticos, he- cinicultura, segmento da aquicultura que biotecnológicos voltados ao incremento da de conhecimento dos pesquisadores e
moderivados e outros produtos da bioindús- mais cresce no mundo. No Brasil, o Ceará produtividade na carcinicultura nacional. O empresários sobre a legislação e as possi-
tria, como medicamentos e insumos para o é o maior produtor e responde por 50% impacto desses desenvolvimentos é perce- bilidades de interação entre a universidade
tratamento de doenças incidentes no país. de toda a produção nacional. Sabe-se que bido pela população, tanto pelo aumento e empresas privadas.
O aprimoramento da saúde pública está aproximadamente 40% do peso do ca- na disponibilidade de camarão na mesa do Um outro problema está relacionado
diretamente ligado ao desenvolvimento da marão é considerado resíduo de descarte, brasileiro a preços mais acessível do que com as startups, que têm dificuldades para
biotecnologia. Exemplos disso são as pes- como a cabeça, a cauda e a casca, gerando os camarões pescados no mar, quanto na fazer negócio com as grandes empresas,
quisas científicas em andamento no Brasil grandes quantidades de matéria orgânica grande quantidade de empregos diretos e mesmo as instaladas nos Parques Tecnológi-
e o Programa Nacional de Competitividade que devem ser descartadas adequadamen- indiretos gerado por essa atividade. cos, porque são muito pequenas e não con-
em Vacinas (Inovacina), desenvolvido pela te. Assim, o reaproveitamento de resíduos Dessa forma, destacar esses aspectos seguem atender à demanda e às vezes, nem
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e outras da carcinicultura através de recursos bio- positivos das atividades de pesquisa e de- conseguem se cadastrar como fornecedo-
instituições ligadas ao Ministério da Saúde. tecnológicos é uma alternativa inovadora senvolvimento em Biotecnologia Marinha ras. Não existe por sua vez uma ponte entre
Por meio deles, o governo vem aumentan- para reduzir a poluição ambiental causada pode mudar a percepção da sociedade da as pequenas empresas incubadas e residen-
do a produção de vacinas, medicamentos por essa atividade. Temos como exemplo importância da área e assim possibilitar um tes nos Polos e os laboratórios de pesquisa.
e insumos para o tratamento de diversas recente o desenvolvimento 100% nacional maior aporte de investimentos. É necessário ressaltar que a biotecno-
doenças, especialmente das chamadas de uma máscara facial que inativa o coro- Por outro lado, os problemas associados logia é uma área de inovação tecnológica
doenças negligenciadas como a malária, navírus por ser revestida com um nanofilme ao desenvolvimento da Biotecnologia Ma- que está revolucionando setores distintos
doença de Chagas, hanseníase e outras de quitosana, substância isolada da casca rinha no Brasil estão localizados em vários da economia, já que fornece novos proces-
que acometem populações de países em do camarão, evidenciando a capacidade de setores, entre eles dos pesquisadores, das sos, produtos e serviços mais eficientes e,
desenvolvimento, mas que, por estarem inovação dos pesquisadores brasileiros. empresas e do governo. Há um desconheci- muitas vezes, menos impactantes ao meio
erradicadas em nações desenvolvidas, não Um outro exemplo é a melhoria gené- mento por parte dos pesquisadores sobre a ambiente. No entanto, para que ocorra ino-
recebem a atenção adequada da indústria tica de plantéis reprodutores, baseada no Lei de inovação e sobre os direitos e prazos vação, consubstanciada em novos produ-
farmacêutica. As iniciativas do Governo Fe- melhoramento clássico. Protocolos bio- para a obtenção de patentes, que resultam tos e processos, são necessárias ações que
deral ganharam impulso a partir de 2004, tecnológicos utilizados em organismos em muitas vezes na publicação de suas in- transcendam o nível de pesquisa nas univer-
quando, em consonância com a tendência aquáticos cultivados, que visam a aumen- venções antes do depósito de patentes. Além sidades. Em virtude do caráter revolucioná-
mundial, aproximou-se a atividade de pes- tar as taxas de crescimento e resistência disso, as empresas internacionais residentes rio dessa área e, portanto, prioritário para
quisa da política nacional de saúde. A mu- a doenças, vêm sendo estudados e aper- nos Parques Tecnológicos desenvolvem tec- o desenvolvimento de qualquer nação, o
dança de enfoque foi estabelecida a partir feiçoados. Entre as técnicas disponíveis, a nologias a partir de contratos de prestação Estado brasileiro deve agir por meio de po-
da construção da Agenda Nacional de Prio- manipulação cromossômica, embora ainda de serviços com laboratórios das ICTs, mas as líticas públicas na promoção da inovação e
ridades de Pesquisa em Saúde, permitin- incipiente, se apresenta como ferramenta patentes, por serem propriedade das empre- do desenvolvimento na área, através de ins-
do que os estudos em saúde atendessem, adequada a mitigar questões ecológicas e sas, na maioria dos casos não ficam no Brasil. trumentos como compras exclusivas, linhas
prioritariamente, aos princípios e às neces- econômicas na carcinicultura. A poliploidi- Já os Núcleos de Inovação Tecnológica especiais de financiamento, transferência de
sidades do Sistema Único de Saúde (SUS). zação artificial, método já empregado em (NITs) não possuem um setor/equipe que tecnologia, entre outros, que visem a uma
Assim, muitas pesquisas em Biotecnolo- peixes e moluscos, vem sendo largamente identifique possíveis interessados no mer- interação mais profícua entre universida-
gia Marinha podem contribuir sobremanei- pesquisada para o uso em camarões cul- cado e ofereça os licenciamentos. Não há des, instituições de pesquisa e empresas.
ra para o desenvolvimento da saúde pública tivados. Algumas limitações da expansão
no Brasil, e informar a população sobre esse deste método em camarões se referem a 8. Formação de recursos humanos em Biotecnologia Marinha, no Brasil
papel possibilitará uma maior valorização e um melhor conhecimento de aspectos ci-
consequentemente um reconhecimento da togenéticos, do nível de dimorfismo sexual As pesquisas relacionadas com a Bio- graduação no Brasil são realizadas em
importância dessa ciência para a sociedade. e performance em condições de cultivo. tecnologia Marinha em nível de pós- cursos de Ciências do Mar e áreas afins

500 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 501


tais como Química de Produtos Naturais, com os setores produtivos público e priva- as empresas de biotecnologia, recomenda- cados nacionais de produtos biotecnológicos,
Genética e Biologia Molecular, Aquicultura, do, com destaques à prospecção de com- se ampliar a participação dessas agências; particularmente o de insumos empregados
Alimentos, Ciência da Saúde. postos de origem marinha com ações anti- • Criar programas para capacitação de em P&D e o de compras governamentais;
Contudo, entre os 67 programas de Bio- -incrustrante, e a incorporação destes em profissionais em biotecnologia, nos mol- • Investimento público em pesquisa, visan-
tecnologia em funcionamento no Brasil ape- tintas e estudos de substâncias antiviral e des dos programas especiais da Capes; e do a atingir o nível de empresas do mesmo
nas 1, o de forma associada entre o Instituto antitumoral na área da saúde. Ainda, as 3 ampliar os programas de fomento para segmento no exterior; e
de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira linhas de pesquisa originais (Biorrecursos, promover a fixação de mestres e doutores • Desenvolver programas de informação e
(IEAPM) e a Universidade Federal Fluminen- Sistema de Produção e Produtos Naturais nas empresas de modo a atender à de- conscientização da biotecnologia marinha
se criado em 2016 em Arraial do Cabo, RJ, é Marinhos e seus usos) foram ampliadas manda das empresas de biotecnologia; que possam aumentar a percepção na po-
específico em Biotecnologia Marinha. em 2020 as linhas de pesquisas relacio- • Incentivos fiscais para as empresas, permi- pulação da importância da biotecnologia
Esse programa, foi também o primeiro nadas a Biotecnologia Ambiental, incor- tindo assegurar pelo menos parte dos mer- marinha para a sociedade brasileira.
programa da Marinha do Brasil credenciado porando as áreas de Poluição por Petróleo
pela CAPES, o que constitui uma importante e Microplásticos, Bioincrustação, Bioinva- Referências
vantagem estratégica porque as estruturas são, Biorremediação e Bioacústica. Todas
de laboratórios, de navios, e o suporte logís- essas áreas possuem conteúdo associa- AGÊNCIA BRASIL SAÚDE. Disponível em: MARRA, NICHOLAS J. ; STANHOP, MICHA-
tico da Marinha são disponibilizados para o dos à propriedade intelectual, inovação https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/ EL E; JUE, NATHANIEL; WANG, MINGHUI;
programa o que é um aspecto de extrema tecnológica, empreendedorismo e demais noticia/2021-03/pesquisadores-da-unb-de- SUN, QI; PAULINA PAVINSKI BITAR; VIN-
relevância dadas às peculiaridades e as de- tópicos, afins à formação de egressos me- senvolvem-mascara-que-inativa-coronavi- CENT P. RICHARDS; ALEKSEY KOMISSA-
mandas requeridas à investigação de ecos- lhor qualificados ao exercício de atividades rus. Acesso em: 15 abr. 2022. ROV; MAHMOOD S. SHIVJI. White shark
sistemas marinhos, sob a ótica biotecnológi- junto ao setor produtivo e ao empreende- CIVI-CO COWORKING. Disponível em: ht- genome reveals ancient elasmobranch
ca. A interação com a Marinha do Brasil per- dorismo. Os resultados desses esforços já tps://civi-co.com/english-foodtechs-pancs- adaptations associated with wound healing
mite também ao Programa de Pós-Gradua- podem ser mensurados com a presença -superalimentos-o-sabor-da-sustentabilida- and the maintenance of genome stability.
ção em Biotecnologia do IEAPM/UFF (nível hoje no programa de 27 pesquisadores de de/. Acesso em: 16 abr. 2022. PNAS. 116 (10) 4446-4455. 2019. DOI: ht-
de mestrado e doutorado) avançar de forma diferentes áreas do IEAPM, UFF, UFRJ, USP, BOLZANI, Eliezer J. Barreiro Vanderlan da tps://doi.org/10.1073/pnas.1819778116.
consistente no desenvolvimento de produ- UFBA, FURG, INPI e a defesa de 46 disser- Silva. Biodiversidade: fonte potencial para OCEAN DROP. Disponível em: https://oce-
tos e processos biotecnológicos relevantes tações de mestrado, 10 de doutorado e a descoberta de fármacos. Química Nova. androp.com.br. Acesso em: 16 abr. 2022.
no contexto regional e nacional. Interações 616 produções bibliográficas em 4 anos. 32 (3). 2009. DOI: https://doi.org/10.1590/ PANOWSKI S, BHAKTA S, RAAB H, PO-
S0100-40422009000300012. LAKIS P, JUNUTULA JR. Site-specific anti-
KIM, S.H.; KIM, H. Inhibitory Effect of Asta- body drug conjugates for cancer therapy.
9. Considerações finais xanthin on Oxidative Stress-Induced Mito- MAbs. Jan-Feb; 6(1):34-45. 2014. DOI:
chondrial Dysfunction-A Mini-Review. Nu- 10.4161/mabs.27022.
No Brasil as empresas de biotecnologia empresas incubadas e/ou recém-saídas do trients. 10(9):1137. 2018. DOI: 10.3390/ ERWIN, PATRICK M.; LÓPEZ-LEGENTIL,
marinha encontram vários obstáculos nas processo de incubação. Considerando a nu10091137. SUSANNA; SCHUHMANN, PETER W. The
suas atividades de P&D, desenvolvimento, menor participação das empresas de bio- MALVE, H. Exploring the ocean for new pharmaceutical value of marine biodi-
regulamentação e comercialização. Algu- tecnologia nos programas do Banco Nacio- drug developments: Marine pharmaco- versity for anti-cancer drug Discovery.
mas sugestões para melhorar esses garga- nal de Desenvolvimento Econômico e Social logy. J Pharm Bioallied Sci. 8(2):83-91. Ecological Economics, Volume 70, Issue
los são apresentadas abaixo: (BNDES), recomenda-se rever as exigências 2016. DOI: 10.4103/0975-7406.171700. 2, Pages 445-451, 2010. DOI: https://doi.
• Reformulação dos órgãos regulatórios, desse banco, ampliando seu atendimento MAYER, A.M.; GLASER, K.B.; CUEVAS, C.; org/10.1016/j.ecolecon.2010.09.030.
equipando-os com pessoal qualificado em a essas micro e pequenas empresas; JACOBS, R.S.; KEM, W.; LITTLE, R.D. et al. PHARMAMAR. Disponível em: https://mail-
biotecnologia e melhorando a eficiência ad- • Maior continuidade, frequência e agilidade The odyssey of marine pharmaceuticals: chi.mp/fd4a40254e82/la-revista-science-
ministrativa na tramitação dos processos, es- dos programas de fomento. Observando que A current pipeline perspective. Trends -confirma-la-potente-actividad-de-plitidepsi-
pecialmente das micro e pequenas empresas; a Finep e as Fundações de Amparo à Pesquisa Pharmacol Sci. 2010; 31:255-65. DOI: na-de-pharmamar-frente-al-sars-cov-2?e=-
• Programas de investimento público para (FAPs) são as agências que melhor atendem 10.1016/j.tips.2010.02.005. 2d496a8fd4. Acesso em: 16 abr. 2022.

502 ECONOMIA AZUL Desenvolvimento da Biotecnologia Marinha 503


24

SISGAAZ, UMA VISÃO ESTRATÉGICA


DE MONITORAMENTO E PROTEÇÃO DE
NOSSA ECONOMIA AZUL

João Batista Barbosa


Mauricio Pires Malburg da Silveira

1. A Estratégia Nacional de Defesa, o Monitoramento e Proteção


da Amazônia Azul
Os mares e oceanos têm desempenha- que traz consigo enormes desafios a serem
do um papel de grande importância ao superados em nível global e regional nos
longo da história, proporcionando não só próximos anos, desde mudanças climáti-
o sustento, mas também desenvolvimento cas, segurança alimentar, fornecimento de
e expansão territorial para a humanidade. energia, controle da poluição, incluindo a
Vivemos cercados de água e, de fato, os exploração não regulamentada de recursos
oceanos ocupam 71% da superfície terres- naturais e ferozes disputas internacionais
tre, onde cerca de 70% do oxigênio libera- em regiões anecumênicas repletas de bio-
do na atmosfera é produzido pelo processo diversidade e recursos naturais, incluindo-se
fotossintético subaquático. Hoje, como no áreas em disputas por soberania. Inúmeros
passado, os oceanos são fundamentais na esforços são feitos para defender o cresci-
estrutura estabelecida pela sociedade mo- mento sustentável nos setores marítimos,
derna, pois são fonte de alimentação sau- reconhecendo o valor dos oceanos em to-
dável, contribuindo com cerca de 16% do dos os seus aspectos, sejam eles culturais,
consumo de proteína animal. sociais ou econômicos. Nesse sentido, a
Sendo a base de inúmeras atividades Economia Azul consolida-se como fator de
econômicas geradoras de crescimento e em- resiliência e de esperança como base sólida
prego, agregam a promessa de riqueza po- para um futuro mundial mais promissor.
tencial de recursos sustentáveis capazes
​​ de O termo “Economia Azul”, apesar de al-
promover o desenvolvimento à medida que guns usos divergentes, refere-se ao alcan-
cruzamos uma nova fronteira econômica, ce econômico de vários setores e políticas

504 ECONOMIA
504 AZUL
A ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 505
públicas e privadas relacionadas que en- uso inteligente dos recursos naturais e das Neste contexto, a Estratégia Nacional risdição brasileira, conforme diretrizes da
volvem o uso sustentável dos recursos do matérias-primas. de Defesa (END), que consiste de um pla- END, requerem a capacidade de “perceber
oceano (World Bank and United Nations Tal patrimônio deve ser monitorado e no de ações estratégicas estruturantes, os elementos no ambiente, compreendê-
Department of Economic and Social Af- protegido, mantendo esta área sob vigilân- com o objetivo de modernizar, a médio e -los dentro da moldura temporal e espa-
fairs, 2017), abrangendo todo o cresci- cia constante, que o Brasil passou a chamar longo prazos, a estrutura nacional de de- cial, e projetar seus estados no futuro”,
mento econômico gerado pelos oceanos e de “Amazônia Azul”, buscando alertar a fesa, visa preparar o Brasil para o exercí- conhecida como o estabelecimento da
também em terra, o que não deve ser uma sociedade sobre a importância estratégica cio pleno da soberania e da governança Consciência Situacional2 (SIMON, 2006.
oportunidade para exploração sem fim deste imenso espaço marítimo, pois além de seu patrimônio. Este exercício requer p. 225, tradução nossa).
(Our Ocean, 2017). Partindo dessa premis- da ampla gama de naturais, sua importân- a preparação para a proteção de nossa Desta forma, evidencia-se que ser capaz
sa, o conceito de Economia Azul foi desve- cia estratégica é evidente por sua grande soberania, organizando as Forças Públi- de comandar e controlar ações que ocor-
lado pela primeira vez na Conferência Rio extensão e posicionamento no Atlântico cas para a estruturarem-se sob o trinômio ram em função da detecção e identificação
+ 20 em 2012, enfatizando justamente a Sul (CHAVES JUNIOR, 2013), servidoura de Monitoramento/Controle, Mobilidade e de uma ameaça, antes ou logo após que
conservação e o manejo sustentável (World força motriz de uma economia vigorosa em Presença, a concebendo as diretrizes para ela concretize seu intento, em função de
Bank and United Nations Department of desenvolvimento. a sua atuação em rede, de forma proativa, sua intempestividade e dinâmica, menos
Economic and Social Affairs, 2017). fazendo-se presentes em todas as áreas afetas a planejamentos, tem implicações
Olhando para 2030, de acordo com a En este marco, es preciso destacar la de jurisdição brasileira, sendo capazes de na estrutura de monitoramento e Coman-
Organização para Cooperação e Desen- capacidad de la industria de defensa y atuar de forma tempestiva e flexível. do e Controle, mais amplas dos que as
volvimento Econômico (OECD1), muitas seguridad a la hora de generar riqueza Entretanto, as atividades proativas – previstas em situações de crises – que, em
indústrias oceânicas têm potencial para en términos económicos y de seguridad entendendo-se pró-atividade como a ati- algum grau, implicam ações deliberadas de
superar o crescimento da economia glo- nacional, así como en materia de inno- tude diligente de agir antes que fatos des- Estados – sendo, razão das estruturas tradi-
bal como um todo, tanto em termos de vación y desarrollo de alta tecnología, favoráveis ocorram – nas plataformas e cionais de Comando e Controle, puramen-
valor agregado como de emprego, entre lo que la convierte en una pieza clave demais áreas e recursos marítimos sob ju- te voltadas para a defesa da pátria.
as quais destacamos, no nosso interesse, en el entramado industrial de cual-
a “Vigilância e Segurança Marítima” que quier país. [Neste quadro, é necessário 2. O SISGAAz e as vertentes da Amazônia Azul
relaciona produtos e serviços em diferen- destacar a capacidade da indústria de
tes campos marítimos, desde o controle da defesa e segurança em gerar riqueza Os estudos empíricos mostram pouco positivos sobre el conjunto de la econo-
pesca e da poluição marinha até a busca e em termos econômicos e de seguran- consenso sobre os impactos e efeitos dos mía”. [a importância do gasto público vol-
salvamento (OECD, 2016), o que tem im- ça nacional, bem como em termos de gastos com defesa no crescimento econô- tado para estimular o investimento privado
pacto direto no setor de Defesa Nacional, inovação e desenvolvimento de alta mico, em que as implicações parecem advir como possível gerador de efeitos positivos
principalmente no caso do Brasil. tecnologia, o que a torna um elemen- de diferentes modelos e estimadores. Kha- na economia como um todo.] (JIMÉNEZ &
Com efeito, o imenso território brasilei- to-chave da rede industrial de qualquer lid e Noor (2015) integram os estimadores FONFRÍA, 2017, p. 100).
ro está envolto pelo Oceano Atlântico, um país] (MUÑOZ, 2015, p. 219). do Método Generalizado dos Momentos Porém, Aizenman e Glick (2006) aler-
patrimônio natural ainda pouco explorado (GMM3) na análise entre 2002 e 2010 para tam que o setor de defesa pode expulsar
e que tem muitas riquezas a descobrir, bem Assim, grandes investimentos públicos 67 países em desenvolvimento, onde os re- recursos para consumo e investimento pelo
como recursos naturais e uma rica biodiver- são necessários para alavancar o progres- sultados indicam um efeito positivo e signi- lado da demanda, eliminando mão de obra
sidade ainda pouco conhecida. São mais so tecnológico, material e humano, capaz ficativo sobre o crescimento econômico dos qualificada e insumos de capital da produ-
de 8.500 km de litoral e mais de 95% do de desenvolver ativos adequados à pro- países da amostra. A dinâmica dos estudos ção civil pelo lado da oferta, com a corrup-
fluxo de comércio exterior brasileiro por via teção da Amazônia Azul e, consequente- foi considerada relevante resultando que ção gerando externalidades negativas, ou
marítima; das reservas marinhas são extra- mente, tornar-se um fator de geração de despensas militares têm, de fato, um im- em decorrência dos efeitos sobre os salá-
ídos cerca de 95% do petróleo brasileiro, valor agregado para Ciência, Tecnologia pacto significativo no PIB dos Estados, onde rios em setores de bens não comercializá-
80% do gás natural e 45% da produção do e Inovação (C,T&I) como um contribuidor se verifica “la importancia del gasto públi- veis, mas também considerando o impacto
pescado (Marinha do Brasil, 2020a), onde a positivo para o desenvolvimento e cresci- co que se destina a estimular la inversión sobre a eficiência do ambiente burocrático,
natureza exige cada vez mais que façamos mento nacionais. privada como posible generador de efectos onde os países que vinculam altos gastos

506 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 507


militares ideais e alta corrupção provavel- from the enhanced capital stock. Alter- sobre a economia oceânica, estima que, Os conceitos de Mar Territorial (MT5),
mente precisam de mais do que mudan- natively, the military may raise the de- somente em 2010, as atividades econômi- Zona Econômica Exclusiva (ZEE6), Platafor-
ças incrementais de política para alcançar mand for its suppliers’ output, spurring cas associadas ao oceano totalizaram cerca ma Continental (PC7) foram consagrados
o desenvolvimento (D’AGOSTINO, DUNNE, their growth as well as their technical de US $ 1,5 trilhão, gerando diretamente ainda em 1982, durante a Convenção das
LORUSSO, & PIERONI, 2020). Em contra- sophistication due to the often-cutting cerca de 31 milhões de empregos formais. Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UN-
partida, Katz (1995, p. 99) defende que o edge nature of military technology. Num sistema internacional globalizado, CLOS8) e em 4 de janeiro de 1993, o Go-
mercado está subordinado à demanda cati- [Esses efeitos indiretos podem ser obti- onde a população continuará a crescer cons- verno brasileiro sancionou a lei N ° 8.617,
va e planejada pelo Estado, mas que a dinâ- dos de várias maneiras. A tecnologia de- tantemente, verifica-se uma tendência as- tornando os limites marítimos brasileiros
mica da inovação militar rejeita a concep- senvolvida para militares ou usada por cendente de migração para as zonas costei- consistentes com os estabelecidos pela
ção neoclássica, identificando o progresso empresas para atender às especificações ras, pressionando os respectivos ecossistemas UNCLOS. Buscando estabelecer o seu devi-
tecnológico com a liberdade de mercados de projetos militares pode ter aplicações com a exploração dos seus recursos naturais do espaço no Atlântico Sul, última frontei-
e sujeita à orientação dos governos para para clientes não militares. Da mesma e o consequente aumento da poluição, onde ra marítima do Brasil, o Almirante Roberto
o empreendedorismo militar, afirmando forma, embora os fornecedores possam o fator demográfico constitui-se o centro do de Guimarães Carvalho começou a difun-
ainda que “la ‘mano invisible’ no actúa en aumentar o nível e a qualidade de seu crescimento da economia oceânica, como dir em 2004 o termo “Amazônia Azul”,
ninguna etapa de la investigación o fabri- capital para cumprir contratos milita- importante motor das atividades marítimas. conceito de cunho político-estratégico que
cación militar. Ni en la concepción, ni en el res, a produção não militar poderia se inclui o MT, a ZEE, PC, hidrovias e demais
patentamiento de los artefactos. La idea de beneficiar de um capital social melhor. Expanding populations will need to be águas interiores brasileiras, numa extensa
un ‘consumidor soberano de armamentos’ Alternativamente, os militares podem fed, raising demand for fish, molluscs área oceânica, com cerca de 5,7 milhões
es obviamente ridícula”. [a ‘mão invisível’ aumentar a demanda pela produção and other marine foods; as consumers de km², aproximadamente metade da
não atua em nenhum estágio de pesquisa de seus fornecedores, estimulando seu they will stimulate sea-borne freight massa continental brasileira (Marinha do
ou fabricação militar. Nem na concepção, crescimento, bem como sua sofisticação and passenger traffic, shipbuilding and Brasil, 2020a), com objetivo de destacar a
nem no patenteamento de artefatos. A técnica devido à natureza frequente- marine equipment manufacturing, as importância dessa faixa do oceano e seu
ideia de um “consumidor soberano de ar- mente de ponta da tecnologia militar.] well as exploration for offshore oil and peso geopolítico e econômico, em relação
mamentos” é obviamente ridícula.] (SABA & NGEPAH, 2019, p. 6) gas reserves. Ageing populations will à Amazônia Verde, já tão conhecida da po-
Assim, vemos que embora não haja con- continue to motivate the medical and pulação.
senso, no entanto, Rashid e Arif (2012) con- No que diz respeito à Economia Azul não pharmaceutical communities of the Neste cenário, devemos enfrentar a
cordam que existe uma relação positiva entre é diferente, induzindo também ao desen- world to accelerate marine biotechno- ameaça da poluição hídrica, como efeito
gastos militares e crescimento econômico, volvimento e ao crescimento econômico, já logical research into new drugs and secundário humano, que impacta a saúde
sugerindo que a presença do efeito spin-off4 que os oceanos que nos cercam sustentan- treatments. [As populações em expan- do meio marinho e a utilização dos mares
fornece capacitação técnica por meio de trei- do nossas próprias vidas com seus delica- são precisarão ser alimentadas, aumen- para atividades comerciais e recreativas,
namento e auxilia no processo de moderni- dos e imensos ecossistemas envolvidos em tando a demanda por peixes, crustáceos constituindo um dos principais fatores
zação, criando a infraestrutura necessária ao uma cadeia ecológica de regulação do clima e outros frutos do mar; como consumi- de perda da biodiversidade marinha. Sob
desenvolvimento econômico nacional. do nosso Planeta, nos proporcionam fonte dores, estimularão o tráfego marítimo esta orientação e compromisso, a Econo-
de alimentação, transporte, recreação e ren- de cargas e passageiros, a construção mia Azul, gerida de forma sustentável,
Such spin-off effects may be achieved in da da exploração de seus recursos, vivos ou naval e a fabricação de equipamentos torna-se um instrumento que permite a
several ways. Technology developed for não. Segundo o Banco Mundial (2020, p. marítimos, bem como a exploração de valorização dos oceanos, potenciando
the military or used by firms to fulfil the 2), durante a Conferência das Nações Uni- reservas offshore de petróleo e gás. O as atividades costeiras, respeitando a sua
specifications of military projects might das sobre os Oceanos de 2017, estimou-se envelhecimento da população continu- capacidade regenerativa de longo prazo,
have applications for non-military cus- que 37% da população mundial vive nas ará a motivar as comunidades médicas garantindo a proteção da produtividade
tomers. Similarly, while suppliers may regiões costeiras e depende dos oceanos e farmacêuticas do mundo a acelerar econômica marítima, para que todo o po-
raise the level and quality of their cap- para sua subsistência, além de ser o prin- a pesquisa de biotecnologia marinha tencial possa ser utilizado e mantido (EU-
ital in order to fulfil military contracts, cipal elo para o comércio internacional. para novos medicamentos e tratamen- ROPEAN COMMISSION, 2020, p. 2). Com
non-military production might benefit Por sua vez, a OECD (2016), em seu relatório tos.] (OECD, 2016, p. 60) o objetivo de sensibilizar a opinião pública,

508 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 509


além de destacar o debate sobre o assunto fenômeno que ganha um significado Em 2017, num contexto internacional que o rege. Uma estratégia orientada
em todo o mundo e garantir que a ciên- cada dia mais importante nas trans- onde 67 países já haviam lançado suas ini- para a proteção dos interesses marí-
cia dos oceanos possa ajudar os países a formações vigentes do sistema inter- ciativas de MSP, a visão estratégica brasileira timos não é concebível sem a partici-
estabelecerem condições favoráveis ​​ para nacional. [...] a disputa pelo acesso a sempre buscou conscientizar a população pação efetiva de atores não militares
o desenvolvimento marinho sustentável, fontes de recursos energéticos e mine- sobre a importância da atividade marítima que compõem o potencial nacional.]
as Nações Unidas declararam 2021-2030 rais e a concorrência pelo controle das para uma nação de dimensões continentais (STORNI, 2009, p. 11)
como a “Década da Ciência Oceânica para principais rotas internacionais de na- como o Brasil, sobre potencial da riqueza
o Desenvolvimento Sustentável”, que bus- vegação continuam compondo o nú- marítima, seus recursos e o desenvolvimen- De fato, a ausência de uma forte men-
ca apoiar esforços para reverter o ciclo de cleo da competição global de poder e, to tecnológico, econômico e social. E para talidade marítima pode resultar numa ex-
declínio da saúde dos oceanos, destacando hoje, abrangem de forma mais incisiva tal, defesa e segurança devem estar inter- ploração insustentável dos recursos da ZEE,
a crescente importância da Economia Azul o espaço marítimo. relacionadas e vinculadas à multidimensio- uma vez que a população ainda vê o mar
(UNESCO, 2019). nalidade das ameaças que pairam sobre numa perspectiva terrestre, tendo apenas
Nas últimas décadas, a maior ênfase Atualmente, a indústria de energia reno- as latitudes azuis e à interdependência de a zona costeira como referência constante
dada ao conhecimento dos oceanos, suas vável offshore ainda é incipiente, mas com seu enfrentamento com políticas públicas (CASTRO, BRANDINI, DOTTORI, & FORTES,
dinâmicas e realidades, impôs uma percep- enorme potencial para tornar-se um contri- multissetoriais, envolvendo principalmente 2017). Nesse sentido, a Marinha do Brasil
ção econômica, social e política do mar, buinte significativo para a matriz energética educação e desenvolvimento tecnológico (MB) notou que era preciso mudar essa
centrada na sua dimensão de possível es- global, uma vez que os oceanos hospedam rumo ao necessário direcionamento militar realidade, e o conceito político-estratégi-
gotamento futuro dos recursos terrestres, ofertas de energia latente que podem ser naval. Nesse sentido, é interessante trazer co da Amazônia Azul instituído, agregou
ao passo que o processo de competitivida- convertidas em calor, como ondas, corren- o pensamento de uma nação irmã mais a capacidade do brasileiro na percepção
de globalizada contribuiu ainda mais na ex- tes e marés. Portanto, na dinâmica do meio austral na figura do almirante Storni e no- do mar e seus recursos, buscando nortear
pansão do poder marítimo mundial (GAR- marinho, as atividades humanas, a explora- tar como ela ainda se faz atual: o desenvolvimento nacional, colocando o
CIA & RIBEIRO, 2018). ção dos seus recursos e as pressões, opor- Brasil na vanguarda da preservação e do
No entanto, os oceanos hoje se apre- tunidades e prioridades políticas associadas La actividad naval militar se debe de- uso sustentável dos oceanos, mares e rios
sentam como cenários de disputas territo- devem ser tidas em conta na governança sarrollar exclusivamente al servicio de (Marinha do Brasil, 2020a), contribuindo
riais, uma vez que essas áreas anecumêni- dos oceanos, estabelecendo uma neces- la política nacional atendiendo a las para a consolidação de uma nova dimen-
cas estão ganhando cada vez mais acessi- sária Gestão do Espaço Marítimo (MSP9) particularidades que plantea el medio são para a sobrevivência e prosperidade do
bilidade, graças aos avanços tecnológicos, baseada em ecossistemas (PINARBAŞI, acuático: su vastedad, los paisajes y cli- Brasil, determinando a presença do Estado
transformando as latitudes azuis em locais GALPARSORO, ALLONCLE, QUEMMERAIS, mas extremos que gobiernan su exten- brasileiro no espaço oceanopolítico10 de
potenciais para a exploração mineral, estu- & BORJA, 2020), evitando-se assim uma sión, la compleja red de intereses de interesse (Barbosa Júnior, 2012, p. 230).
dos medicinais, bem como no futuro virem, série de barreiras interrelacionadas, como terceros estados y el sistema jurídico Comprovando as dimensões da Amazônia
possivelmente, a tornarem-se fontes abun- conflitos de recursos e usuários, reduzindo internacional que lo rige. No es conce- Azul, Issmael Junior (2016, p. 146) defende
dantes de energia limpa. a complexidade regulatória e a compreen- bible una estrategia orientada hacia la que a imensa quantidade de riqueza dispo-
Nesse sentido, os recursos oceânicos são limitada dos impactos ambientais as- protección de los intereses marítimos nível nas latitudes azuis pode ser facilmente
e sua Economia Azul ganham ainda mais sociados às tecnologias de energia renová- sin la participación efectiva de los ac- deduzida, sendo possível inferir também as
destaque no cenário internacional de cres- vel offshore (YOUNG, 2015). Tais desafios tores no militares que hacen al poten- dificuldades de seu monitoramento e pro-
cimento populacional e consequente au- relacionados à governança dos oceanos, cial nacional. [A atividade naval mili- teção contra a exploração ilegal ou ilícita, o
mento da demanda por alimentos e ener- continua Young, dificultam o desenvolvi- tar deve ser realizada exclusivamente que, a meu ver, nem sempre se traduz de
gia. Neste aspecto, Brozoski (2019, p. 82) mento industrial e, nesse sentido, o MSP ao serviço da política nacional, tendo forma trivial para um cidadão comum, mes-
comenta que o mundo está passando por surge como uma ferramenta prática para em conta as particularidades do meio mo que tenha formação acadêmica, mas
transformações na matriz energética, onde promover uma aplicação sustentável e ra- aquático: a sua vastidão, as paisagens carece de sentido e senso de maritimidade.
cional da Economia Azul, desempenhando e climas extremos que regem a sua ex- Nesta perspectiva, More (2012, p. 233)
a recente intensificação da expan- um papel regulador e fomentador em sua tensão, a complexa rede de interesses sugere que a formação de um pensamen-
são dos Estados sobre os mares é um rápida implementação. de terceiros Estados e o sistema legal to político-oceânico brasileiro deve ter dois

510 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 511


elementos essenciais a saber: a formação Estado (BARBOSA JÚNIOR, 2012). Entende- o processo de desenvolvimento e implan- Ao contrário das abordagens setoriais
de recursos humanos e os investimentos -se que, além das Águas Jurisdicionais Bra- tação do SISGAAz favorecerá as empresas que podem levar ao uso ineficiente de re-
em C,T&I voltados para as ciências político- sileiras (AJB), as vias de acesso ao Atlântico nacionais, que poderão participar isolada- cursos e oportunidades perdidas por meio
-estratégicas marítimas, abrangendo o di- Sul, bem como a fronteira marítima Brasil- mente ou em consórcio com empresas es- de decisões desconexas, o gerenciamento
reito do espaço oceânico brasileiro. Assim, -África, são áreas de importância estraté- trangeiras, favorecendo a transferência de baseado em ecossistemas, em que a econo-
vivendo na era da sociedade da informa- gica fundamental para o tráfego marítimo tecnologia (BISPO, 2015), onde o setor pú- mia e os ecossistemas prosperam, deve usar
ção e do conhecimento, as universidades internacional (MARTINS, 2010), visto que blico desempenhará um papel importante ferramentas, como o MSP, como parte da
têm um papel estratégico relevante como esta região se apresenta como um espaço no desenvolvimento de pesquisa e tecno- transição para uma economia azul (World
motor integrador na articulação entre di- de importantes interesses e aspectos polí- logia para quase toda a indústria (Ruttan, Bank and United Nations Department of
ferentes setores da sociedade, como os tico-estratégicos, econômicos, científicos e 2006), se os investimentos em pesquisa, Economic and Social Affairs, 2017). Para
movimentos ambientais, sociais, militares, ambientais de alta relevância internacional inovação tecnológica e desenvolvimento fins de ilustração, a OECD (2016) salienta
industriais, entre outros, onde a Economia (ISSMAEL JUNIOR, 2016). produtivo forem aumentados de forma que, na Europa, o MSP é visto como um
Azul exigirá adequada formação de força Assim, é necessário desenvolver e es- adequada (Sala, 2018, p. 4). E então, meio de apoio à Economia Azul, propor-
de trabalho devidamente treinada, bem tabelecer ferramentas relevantes no setor cionando uma oportunidade de criar um
como promoção de C,T&I e pesquisa mul- marítimo, como a Consciência Situacional en el caso concreto de las firmas que clima de investimento ideal para os setores
tidisciplinares (World Bank and United Na- Marítima (CSM11), identificando antecipa- producen bienes para el ámbito de la marítimos, além de prover aos operadores
tions Department of Economic and Social damente as ameaças existentes, na medida defensa, debido a su intenso esfuerzo mais segurança sobre possíveis oportunida-
Affairs, 2017). Para tal, More (2012, pp. do possível, interagindo em um quadro ope- en actividades innovadoras, el efecto des de desenvolvimento econômico.
247-248) argumenta que racional único e complexo capaz de integrar del gasto público sería especialmente Projetos marítimos são projetos de alto
sistemas de inteligência, vigilância, observa- elevado. Así, las políticas orientadas valor agregado na sua concepção, geral-
o caminho para se construir um esta- ção e navegação (CHAVES JUNIOR, 2013). a la adquisición de sistemas de armas mente de grande porte, envolvendo signifi-
do oceânico brasileiro, soberano sobre Para isso a Marinha do Brasil implemen- cuya complejidad tecnológica es muy cativos recursos materiais, humanos e finan-
seus recursos, científica e tecnicamen- tou em 2009 o programa estratégico do elevada y requieren de importantes ceiros, com mão de obra especializada, altos
te preparado para pesquisá-los e ex- Sistema de Gerenciamento da Amazônia esfuerzos en I+D, puede generar in- custos, longos prazos de execução, além de
plorá-los, passa pela educação e pela Azul (SISGAAz), justificado por sua missão crementos de renta elevados y sosteni- envolver um robusto binômio mar-terra, de-
difusão das ciências do mar, em todos constitucional de defesa das AJB, com o bles temporalmente. Huelga decir que vido à necessidade de apoiar infraestrutu-
os níveis [...], além de uma moldura ju- objetivo fundamental de ampliar o moni- estos incrementos son generadores ras de manutenção para trabalhos no mar,
rídica mais adequada para a gestão do toramento da Amazônia Azul, bem como de empleo y valor añadido. [no caso gerando inúmeros empregos diretos e indi-
espaço oceânico do Brasil. das regiões sob sua responsabilidade SAR12 específico das empresas produtoras retos. Neste ponto, encontramos a contri-
(ISSMAEL JUNIOR, 2016). Por sua natureza de bens para a área de defesa, devido buição do aspecto econômico da Amazônia
Portanto, é decisiva a disseminação dual intrínseca, o SISGAAz está intimamen- ao intenso esforço em atividades ino- Azul para o desenvolvimento nacional, onde
contínua dos aspectos que sustentam o te ligado aos interesses relacionados à Eco- vativas, o efeito dos gastos públicos através do MSP conhecemos a importância
conceito político-estratégico da Amazônia nomia Azul, tendo sido concebido como seria especialmente elevado. Assim, dos dados marinhos para companhias ma-
Azul, dando especial prioridade à vigilância um sistema de monitoramento e controle políticas voltadas para a aquisição de rítimas, como o batimetria14, geologia15,
marítima e à presença do Estado brasileiro relacionado ao conceito internacional de sistemas de armas cuja complexidade correntes oceânicas16 e regimes de ventos17,
no espaço oceânico-político, que envol- segurança marítima e para a proteção do tecnológica é muito elevada e reque- entre outros. Assim, podemos correlacionar
ve também o tráfego marítimo para além litoral brasileiro e de toda a sua área de ju- rem esforços significativos de P&D13, o valor do mar, da Amazônia Azul ao Bra-
das “fronteiras marítimas”, promovendo a risdição e responsabilidade. podem gerar aumentos de receita sil, com seu envolvimento e influência eco-
segurança da navegação nas linhas de co- Contribuindo para o aumento da CSM elevados e temporariamente sustentá- nômica direta com os setores de petróleo
municação marítima, a salvaguarda da vida do Estado brasileiro, bem como melhorando veis. Nem é preciso dizer que esses au- e gás, portos e transporte marítimo, cons-
humana no mar e a preservação do meio sua capacidade de fiscalização e defesa des- mentos são geradores de empregos e trução naval, mineração, turismo náutico e
ambiente, estabelecendo medidas desti- tes espaços (ANDRADE, ROCHA, & FRANCO, valor agregado] (JIMÉNEZ & FONFRÍA, biotecnologia, entre outros, formando uma
nadas a manter ou atingir os objetivos do 2019). Vocacionado sobre um pilar dual, 2017, p. 101). demanda final do setor marítimo em 2015

512 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 513


de R$ 1,31 trilhão, o que constitui 22,19% e garantir condições de navegação seguras. interconexão de sensores localizados em operações SAR, prevenção e repressão ao
do PIB brasileiro e 19,41% da demanda fi- Assim, aqueles Estados que estiverem áreas distintas e em plataformas distintas, tráfico de drogas, prevenção da poluição nas
nal do país (CARVALHO, 2018, p. 99). melhor preparados estruturalmente terão porque, “frente às tecnologias atuais, os águas, pesquisa científica marítima, meteo-
Nesse cenário, o setor de Defesa se apre- melhores possibilidades de viabilizar a ex- sensores podem estar desacoplados das rologia, entre outras. Segundo Muñoz (2015,
senta como integrador de outros na im- ploração sustentável dos oceanos, fortale- plataformas, podendo, até mesmo, estar p. 223), a segurança marítima é fundamen-
plantação do MSP, com plena capacidade cendo sua Economia Azul em uma parce- em plataformas não tripuladas, expondo tal e requer cooperação e intercooperação,
de contribuir para a redução dos conflitos la ainda mais significativa do PIB do país, ao risco os sensores, não as pessoas” (AL- incluindo aviso prévio e intervenção rápida.
marítimos existentes, gerando empregos sendo mais capazes de melhor enfrentar os BERTS, 2004, p. 161, tradução nossa). Assim, a segurança marítima deve ser for-
diretos e indiretos, potencializando o PIB, desafios relacionados às necessidades pre- Ao examinar os fundamentos do conceito mulada como uma tarefa a ser realizada em
bem como garantindo segurança jurídica mentes de sua população. do compartilhamento da Consciência Situa- um ambiente multidimensional e multitare-
ao Estado e aos investidores (nacionais e No Brasil, o processo de implantação do cional, Alberts (2004, p. 71, tradução nossa) fa, exigindo um aumento do nível das ca-
internacionais) na medida em que permite MSP encontra-se em fase inicial, em que um menciona “esse novo modelo mental é fo- pacidades marítimas do Estado, bem como
a redução de custos com a disponibilização sistema de segurança e vigilância marítima, cado em compartilhamento e colaboração, instrumentos adicionais de cooperação e
dos referidos dados marinhos. como o SISGAAz, é descrito pela OECD para gerar consciência ampliada, comparti- coordenação (ALMEIDA SILVEIRA, 2020).
Além disso, ainda podemos citar as se- (2016, p. 47) como produto de uma das lhada, colaborativa e, consequentemente, Promover a utilização de sistemas cola-
guintes contribuições do MSP (PINARBAS, indústrias emergentes da Economia Azul, com melhor sincronismo. Esse novo modelo borativos, satélites, radares e equipamen-
GALPARSORO, ALLONCLE, QUEMMERAIS de uma atividade econômica relacionada a modifica o modelo linear-sequencial existen- tos de detecção subaquática, integrando
Y BORJA, 2020): produtos e serviços em diferentes domínios te, no qual a informação é coletada, proces- redes de análise e classificação de informa-
. Acompanhar a ascensão do setor de marítimos, que vão desde o controle da po- sada e fornecida para um decisor para deci- ções, bem como estimulando o desenvol-
Energias Renováveis por
​​ meio de um planeja- luição e da pesca até a busca e salvamento, são para, só então, a ação ocorrer”. vimento de tecnologias (ANDRADE, FRAN-
mento adaptado e apoiar a P&D da indústria alfândega e defesa costeira pelo governo Para isso, é imprescindível a geração CO, & HILLEBRAND, 2019), pressupõe in-
para implantação dessas tecnologias em ati- e organizações públicas ou privadas, dedi- de uma CSM consistente, para o qual o teroperabilidade entre plataformas navais
vidades relacionadas às energias renováveis; cando-se à compilação, armazenamento e SISGAAz se baseia em um conjunto de e aeronavais versáteis, bóias de sensores e
. Garantir a competitividade e comple- distribuição da informação obtida por toda sistemas integrados, ampliando a capa- capacidade de interceptação. Voltado para
mentaridade dos portos, melhorar o seu a cadeia envolvida nos projetos e empreen- cidade de monitoramento e controle da a égide do trinômio monitoramento, mo-
serviço e promover a mudança modal na dimentos relacionados com as atividades AJB, garantindo assim o uso soberano de bilidade e presença, o SISGAAz proporcio-
atividade do tráfego marítimo; marítimas e costeiras, especialmente no que seu patrimônio e o controle das linhas vi- nará um data link confiável desenvolvido
. Na atividade de desportos náuticos e diz respeito aos atores relacionados com os tais de comunicação marítima no Atlântico no Brasil, entre outras exigências previstas
turismo, otimizar a ocupação do espaço em contextos ambientais, técnicos, econômicos Sul (GERALDO & COSSUL, 2017, p. 11). A que dependem de investimentos em C,T&I,
marinas e zonas de atracação, respeitando e ambientais. (SANTOS & TEIXEIRA, 2017). Marinha do Brasil buscará ampliar a sua envolvendo recursos materiais e humanos,
os ecossistemas marinhos e promovendo o O monitoramento de grandes áreas capacidade de monitorar a superfície ma- governamentais e privados (JUDICE, 2015,
turismo costeiro; geralmente transcende a capacidade dos rítima, abrangendo a área de responsabili- p. 745), na utilização de veículos aéreos
. Realizar avaliação de risco, conside- sensores de um ou mais meios (platafor- dade AJB e de Busca e Salvamento18 (SAR não tripulados20 (VANTs), bem como infra-
rando os riscos naturais e as mudanças mas) presentes em uma área de opera- – Search and Rescue) internacional, em estrutura de tráfego de voz, dados e vídeo,
climáticas no planejamento de territórios ção. Consequentemente, para se formar aproximadamente 14.411.000 km² (Bis- rádios definidos por software, comunica-
costeiros mais resilientes; a Consciência Situacional de grandes áre- po, 2015, p. 142), tendo como principais ções por satélite, radares de longo alcance,
. Reforçar a imagem da indústria ma- as e utilizar as informações obtidas para características do SISGAAz o uso de tec- sensores acústicos subaquáticos, entre ou-
rítima e tornar mais atrativas as profissões orientar o emprego das Forças nas áreas nologias C4ISR19 envolvidas no seu desen- tros (GERALDO & COSSUL, 2017).
marítimas, bem como sensibilizar o público de operação, é fundamental que essas volvimento, gerando impactos na evolução O imperativo da mobilidade, menciona-
para o potencial e a fragilidade do mar; informações possam fluir, de forma livre, tecnológica nacional, bem como na Base do na diretriz nº 13 da Estratégia Nacional
. Por último, em matéria de segurança entre as plataformas da cena de ação e Industrial de Defesa Brasileira (BID) (Issmael de Defesa, é “a aptidão para se chegar ra-
marítima e proteção do tráfego marítimo, os demais centros produtores de infor- Junior, 2016, p. 146), atuação não só em pidamente ao teatro de operações – refor-
reduzir e conter os riscos de contaminação mações. Isto significa: que seja possível a Operações Navais típicas, mas também em çada pela mobilidade tática – entendida

514 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 515


como a aptidão para se mover dentro da- para obtenção de dados deve priorizar a políticas de defesa nacional, priorizando HILLEBRAND, 2019, p. 27), além de con-
quele teatro” (BRASIL, 2008a). Com a contratação de empresas e recursos na- a autonomia no desenvolvimento de tec- tribuir para o fortalecimento da dissuasão,
Consciência Situacional obtida do monito- cionais, evitando qualquer vulnerabilidade, nologias, sistemas e produtos de defesa, traduzido pelo desenvolvimento de capaci-
ramento e integração das plataformas e a dada a perda de autonomia decorrente da mas com múltiplas aplicações, de forma dades de monitoramento e controle do es-
decorrente Superioridade de Informação, falta de controle sobre a obra (ANDRADE endógena e, portanto, com expectativa de paço marítimo, terrestre, aéreo, cibernético,
conhecimentos atualizados a respeito do et al., 2019), que pode ser uma força signi- arrasto tecnológico, além do consequente e outras áreas de interesse, uma vez que
cenário são disponibilizados (elementos ficativa no incentivo ao BID. Para dar maior surgimento de novas demandas pelos ser-
hostis, terreno e meteorologia), permitindo confiabilidade ao sigilo das comunicações viços decorrentes, principalmente nas áreas a dissuasão deve ser a primeira postura
dessa forma explorar mais eficazmente a estratégicas e militares do Estado brasilei- de engenharia civil, transporte, segurança e estratégica a ser considerada para a de-
mobilidade e flexibilidade das próprias for- ro, a implementação do Satélite Geoesta- energia limpa. Nesse contexto, a pesquisa e fesa dos interesses nacionais. A explo-
ças. Alberts (2004, p. 71, tradução nossa), cionário de Comunicação (SGDC-121) em o desenvolvimento, bem como as aquisições ração e explotação da Amazônia Azul e
ao avaliar o impacto da Era da Informação 2017 elevou o nível de segurança, além militares relacionadas à defesa, têm sido a utilização das linhas de comunicação
nas organizações e no exercício da autori- de permitir o fornecimento de Internet uma importante fonte de desenvolvimento marítimas do Atlântico Sul continua-
dade, mostra que o uso intensivo de suas de alta velocidade para regiões remotas, tecnológico em um amplo espectro de seto- rão a ser vitais para o desenvolvimento
tecnologias “incrementa a habilidade de atendendo tanto a aplicações civis (banda res, representando uma parte importante da do Brasil, exigindo a intensificação das
adaptação a ambientes dinâmicos”, im- Ka22) quanto militares (banda X23) (Geraldo produção industrial (RUTTAN, 2006, p. 5), capacidades de prover Segurança Marí-
plicando organizações virtuais, capazes de & Cossul, 2017) e (Demenicis, 2019) em contribuindo, nesse sentido, como indutor tima (BRASIL, 2020, p. 33).
serem “montadas rapidamente, reduzindo áreas de interesse do Atlântico Sul, como catalizador da Economia Azul.
o deslocamento (mover informações – não Ilha da Trindade, Arquipélago de São Pedro Segundo Herrera (2015, p. 49), a cria- Finalmente, uma vez que a economia
pessoas) e comprimir o tempo por serem e São Paulo e Estação Antártica Almirante ção de uma capacidade científica e tecno- comece a operar com excesso de capaci-
capazes de manter efetivamente operações Ferraz. Devido ao seu duplo uso militar e lógica de alto nível é uma das condições dade substancial, a demanda e a produção
24 horas por dia, 7 dias por semana”. civil, aumentará sua relevância na imple- essenciais para a superação da estrutura adicionais tenderiam a aumentar a taxa de
Como elemento fundamental, para mentação de políticas públicas, promoven- do atraso e da relação de dependência utilização dessa capacidade, elevando os lu-
exemplificar, tivemos recentemente, no final do a integração social e o desenvolvimento que é, ao mesmo tempo, a sua causa e cros e possivelmente acelerando os investi-
de agosto de 2020, o voo inaugural do pri- econômico do Brasil. efeito. Nesse ponto, pode-se dizer que os mentos, sejam de curto ou de longo prazo,
meiro grande VANT produzido inteiramente Tais interfaces de satélite permitirão a militares, como força organizada, auxiliam onde o primeiro ou o último efeito predo-
no Brasil, o Atobá, que poderá atender às integração do SISGAAz com outros siste- no processo de modernização, propor- minante determinará o resultado final dos
demandas de vigilância marítima. Ao custo mas e plataformas, internamente na MB, cionando capacitação técnica e formação gastos militares com o crescimento. Isso se
de R$ 11,5 milhões, foi desenvolvido em com destaque para o SISNC224, que inclui educacional, além de estabelecer uma in- daria, conforme relatado por Deger y Smith
cinco anos pela Stella Tecnologia, que in- o SISTRAM25, entre outros sistemas, e fora fraestrutura necessária ao desenvolvimen- (1985), o que poderia justificar economica-
cluiu alunos da Universidade Federal do Rio da MB, o Sistema de Comando e Contro- to econômico, na qual esse efeito indireto mente os gastos militares segundo a teo-
de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Estácio le Militar do Ministério da Defesa (SISMC²/ pode ocorrer desde a concepção do proje- ria keynesiana, uma vez que a presença de
de Sá, além de técnicos do Ministério da MD26), que, por sua vez, abarca o Sistema to ao momento de gerar demanda efetiva, uma demanda efetiva inadequada faria o
Defesa. O diretor-geral da empresa, Gilberto Integrado de Vigilância de Fronteiras (SIS- aumentando a produtividade por meio do multiplicador funcionar, implicando em um
Buffara Jr., revelou recentemente a possibili- FRON27) do Exército Brasileiro (EB), e Siste- avanço tecnológico (RASHID & ARIF, 2012). aumento do produto nacional decorrente
dade de aplicação do Atobá em áreas além ma Brasileiro de Defesa Aeroespacial (SIS- E nessa lógica, extrapolando sua finalida- de gastos adicionais com defesa.
de 200 milhas náuticas, sendo visto como DABRA28) da Força Aérea Brasileira (FAB). de principal, o desenvolvimento do SISGA- No meio da revolução informacional
estratégico para a Defesa do Brasil, já que o Considerado um dos programas estra- Az também contribui para a prosperidade de uma sociedade em rede29 “[…] el pro-
processo nacional de seu desenvolvimento tégicos mais ousados ​​ da MB, Andrade, da C,T&I no Brasil, considerando os pro- ceso de liberación, para poder realizarse
tem um custo menor, gerando empregos e Rocha e Franco (2019) relatam que o SIS- cessos de nacionalização de componentes plenamente, necesita utilizar esas pode-
desenvolvimento do país. GAAz se destaca pela intensidade cien- e transferência de tecnologia, previstos no rosas herramientas de transformación que
Além disso, a utilização de satélites e o tífico-tecnológica, em um contexto mais programa, onde se estima um grande ar- son la ciencia y la tecnología modernas [o
consequente desenvolvimento de software amplo de aproximação entre C,T&I e as rasto tecnológico (ANDRADE, FRANCO, & processo de liberação, para ser totalmente

516 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 517


realizado, precisa usar aquelas poderosas duz em investimentos em programas como com a participação da Fundação EZUTE32 e . Desenvolver, por meio das Unidades
ferramentas de transformação que são a o SISGAAz, participando do cumprimento do Setor Operativo, foi finalizado em abril de de Vigilância, produtos padronizados vi-
ciência e a tecnologia modernas]” (HERRE- dos objetivos estratégicos nacionais e, so- 2018 e produziu um relatório técnico com sando à escalabilidade do sistema para ou-
RA, 2015, p. 49) E para isso, o povo brasi- bretudo, por um Brasil mais soberano (IS- priorizações geográficas e funcionais a se- tras regiões da costa brasileira;
leiro deve tomar consciência da importân- SMAEL JUNIOR, 2016, p. 154), contribuir rem alcançadas por um “SISGAAz Viável”. . Estabelecer um sistema de monitora-
cia do mar e de sua defesa por meio de como vetor integrador e catalisador do Em termos técnicos, o principal objeti- mento marítimo ativo, preferencialmente
um Poder Naval30 treinado e capacitado, desenvolvimento tecnológico brasileiro e, vo do projeto envolve o desenvolvimento contínuo, para as AJB até o limite de 200
eficiente e eficaz, o que, em parte, se tra- sobretudo, de sua Economia Azul. de soluções de monitoramento, com ma- MN das linhas de base, através de um ar-
turidade tecnológica, que permitam que o ranjo de sensores que maximize o desem-
3. O programa SISGAAz e sua implementação SISGAAz seja implantado em nível nacional penho do sistema e minimize os custos de
de forma escalável, faseada e com custos implantação e manutenção;
O SISGAAz está previsto no Plano Es- te uma ameaça ou emergência; de implantação e manutenção conhecidos, . Desenvolver serviços integrados de in-
tratégico da Marinha (PEM 204031) para ser . Aumento da capacidade de preven- conforme as prioridades a serem estabele- formação, relacionados à navegação, utili-
um sistema que tenha capacidade integrada ção contra ameaças e emergências, sejam cidas pela sociedade. Para tal, os seguintes zando o conceito do e-Navigation, com ên-
para monitorar e controlar as AJB e as áreas elas de caráter interno (relacionadas com a objetivos específicos devem ser atingidos: fase nas capacidades do serviço marítimo
de responsabilidade SAR, a fim de contribuir segurança) ou externo (relacionadas com a . Desenvolver e implantar uma arquitetu- relacionado com a navegação entre portos
para agilizar a tomada de decisões por par- defesa); ra modular para o processamento de dados, e terminais (Maritime Service 3); e
te das autoridades, assegurando sobretudo . Aumento da segurança da navega- capaz de realizar o fusionamento dos dados . Expandir a utilização do framework
a capacidade de pronta resposta a qualquer ção e a proteção do meio ambiente mari- de contatos detectados pelos sensores e sis- arquitetural HIDRA, desenvolvido pela Ma-
ameaça, emergência, agressão ou ilegalida- nho por intermédio da coleta, integração e temas colaborativos e efetuar análises acerca rinha, aprimorando-o, quando necessário,
de (MARINHA DO BRASIL, 2020c). apresentação de informações, incorporan- do tráfego marítimo, incluindo emprego de e consolidando-o como um padrão da Ma-
Em 2019, o incidente do derramamento do as funcionalidades do e-Navigation; algoritmos de Inteligência Artificial; rinha do Brasil.
de óleo que se estendeu por uma área de . Aumento da acurácia do acompa-
cerca de 3.600 km nas costas norte e nor- nhamento das atividades críticas realiza- 4. O SISGAAz e o e-Navigation
deste do Brasil atingindo centenas de loca- das nas AJB;
lidades apontou para as eventuais fragilida- . Ampliação e facilitação do acesso a Com a evolução das ferramentas da Era como, cartas eletrônicas, modelos de eleva-
des no controle do tráfego marítimo, que análises e dados de inteligência pelos pla- da Informação, particularmente no con- ção de terreno e plantas de engenharia. Esse
afetam diretamente as dimensões da segu- nejadores; e texto da elevada capacidade de coleta, conjunto de informações, vistas, coletadas e
rança marítima, a segurança nacional, a se- . Integrar sistemas e dados do MD, outras transmissão e processamento de informa- fundidas em ambiente imersivo proporciona
gurança humana, o meio ambiente e o uso Forças Armadas e agências governamentais. ções dos sistemas computacionais atuais, maior precisão, melhor avaliação e redução
econômico do mar. Ficou evidenciado, tam- O SISGAAz foi concebido dentro do desenvolveu-se, sistemicamente, a capa- do tempo de análise de uma realidade. Suas
bém, a necessidade da Autoridade Marítima conceito de Sistema de Sistemas e devido cidade de ampliar a percepção do mundo aplicações no mundo real vão desde a esca-
contar com sistema de detecção do tráfego à complexidade de sua implementação em real por meio da adição de elementos visu- la micro, em ambientes fechados e de alto
marítimo não colaborativo (monitoramento toda a área de abrangência das AJB, o Es- ais, sons, telemetria de fatores ambientais risco, até as escalas macro, aplicadas a per-
ativo), e com a capacidade de realizar análi- tado-Maior da Armada (EMA) determinou a coletados e processados por computado- cepção da realidade de grandes distâncias.
ses preditivas e regressivas acerca do tráfego reavaliação do escopo geográfico e funcio- res, constituindo-se o domínio da realidade Nesta categoria da aplicação da re-
marítimo, incluindo estudos de dispersão de nal do projeto, buscando viabilizar a opera- virtual ou realidade aumentada. alidade aumentada em ambientes ma-
poluentes no mar. Nesse contexto, o SISGA- ção de partes do sistema (módulos) que pu- O emprego da realidade aumentada cro, destacam-se as aplicações e os no-
Az se apresenta como solução para: dessem oferecer incremento significativo na possibilita, então, que os estímulos senso- vos conceitos de navegação, tanto aérea
. Ampliação da capacidade de monito- CSM em médio prazo, além de estabelecer riais do mundo físico sejam incrementados quanto marítima. A Organização Maríti-
ramento e controle, atendendo ao conceito metas parciais adequadas, exequíveis e acei- (aumentados) por elementos tanto cole- ma Internacional (IMO) não se furou a ob-
de Consciência Situacional Marítima; táveis. O estudo coordenado pela DGePM tados por sensores em tempo real quanto servar os impactos dessa verdadeira revo-
. Redução do tempo de reação peran- para reavaliação do escopo, e que contou por dados oriundos de modelos digitais, tais lução tecnológica que ainda encontra-se

518 ECONOMIA AZUL


A ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 519
em curso, na atividade marítima. Assim a o e-Navigation permitirá, também, a oti- de 2021, realizou importante mudança em mais padronizada em toda a gama de ope-
IMO entende que o e-Navigation (ou En- mização dos meios e recursos marítimos, sua estrutura organizacional, particular- rações militares, onde o monitoramento,
chanced Navigation – Navegação Aumen- por permitir integrar ao processo decisório mente no setor operativo, ativando o Co- via SISGAAz, é condição necessária para o
tada) como um conceito em termos do da navegação marítima, informações dos mando de Operações Marítimas e Proteção controle da Amazônia Azul, devendo ser
conjunto de tecnologias, doutrinas, regu- portos, terminais, canais, vias de acesso e da Amazônia Azul (COMPAAz). Essa nova exercido por uma autoridade operacional
lamentos, sistemas e pessoas que buscam serviços como praticagem e rebocadores e Organização Militar nasceu fruto do na- (COMPAAz), de modo proativo para deci-
a “Coleta, integração, intercâmbio, apre- será, futuramente, requisito essencial para tural processo evolucionário do CISMAR33 dir mais rápido, agilizando o clássico ciclo
sentação e análise harmonizados de in- a navegação autônima. e seu fusionamento com a Subchefia de OODA35 para a tomada de decisões (Mari-
formações marítimas, a bordo e em terra, Com o e-Navigation a disponibilidade de Operações do Comando de Operações nha do Brasil, 2020c).
por meios eletrônicos, com o propósito de informações do ambiente marinho é essen- Navais (COMOPNAV), tendo como propó- Para tal, o Centro de Operações Maríti-
aprimorar a navegação de berço a berço cial, contínua e, principalmente, não centra- sito acelerar o processo decisório a fim de mas (COpMar), sob o Comando de um Capi-
e serviços relacionados, para a proteção e da na plataforma – a embarcação. Assim, prover rápida resposta às ameaças que ve- tão de Mar e Guerra, foi criado juntamente,
a segurança no mar, bem como a preser- não é suficiente para o e-Navigation a capa- nham a se apresentar ao nosso país e nesse e de forma subordinada ao COMPAAz, com
vação do ambiente marinho” (MARINHA cidade de uma embarcação monitorar com sentido a nossa economia azul. a implementação da concepção de um cen-
DO BRASIL, 2022d). os seus sensores o ambiente, pois, a essas Vemos, portanto, que sua natureza co- tro unificado de Comando e Controle, re-
Desta forma, o e-Navigation não se informações coletadas pela embarcação, aduna-se com a do programa SISGAAz e, sultante da sinergia do Centro de Comando
resume a equipamentos ou a uma tec- outras camadas, oriundas de sensores no de fato, teve sua gênese em 2008 junta- do Teatro de Operações Marítimo (CCTOM),
nologia específica, mas a uma visão con- ambiente e devem estar disponibilizadas e mente com esse importante programa es- do Centro de Controle do Tráfego Marítimo
ceitual e ampla de serviços digitais que, interligadas. O desafio infraestrutural que o tratégico, para que o setor operativo possa (CCTRAM) e do Console SAR (ConSAR),
integrados, proveem informações rela- e-Navigation propõe envolve a construção receber assessoramento de alto nível quan- guarnecidos 24 horas por dia, todos os dias
cionadas à navegação e serviços de terra. de uma rede de dados abrangente e ágil do ao preparo e emprego do Poder Naval, da semana, otimizando processos e recur-
O intuito desse conceito está relacionado capaz de apoiar a troca de informações e o que hoje apresenta-se integrado a outros sos humanos. Centralizando-se o controle
com a redução dos riscos à navegação, processamento computacional que, ao final agências governamentais nacionais e inter- do tráfego mercante, as operações navais e
tanto por erros quanto por ausência de do processo, será capaz de desenvolver a re- nacionais. Com a ativação do COMPAAz, a a atividade SAR, busca-se uma adequada e
informações necessárias para a segurança alidade aumentada sob a qual, os serviços Marinha do Brasil contará como organiza- contínua resposta às crises ou situações de
das atividades marítimas. Marginalmente do e-Navigation se apoia. ção militar, comandada por um Contra-Al- emergência por meio do preparo e emprego
mirante, estruturada em seções de Estado- integrado dos meios navais, aeronavais e de
5. Em proteção da Economia Azul -Maior com capacidades administrativa e fuzileiros navais, assegurado pelo substan-
operacional aprimoradas e, principalmen- cial incremento da CSM.
Novos tempos, novas tendências, novas espectro de conflitos com tipificações te, capaz de uma rápida efetivação do Es- Assim, o COpMar integrando as ativi-
realidades impõem-se mais à razão quando que entram nos dois campos, como a tado-Maior para o Comandante do Teatro dades de monitoramento desempenhadas
são experimentadas pela sociedade. Hoje “Guerra Híbrida”, os poderes navais de Operações34 Marítimo (COMTOM). pelo CCTRAM e pelo CCTOM, deve pro-
vivemos dias em que a Marinha do Brasil também ampliaram sua faixa de em- Todos os sistemas empregados na Sub- ver um serviço de “compilação do quadro
apresenta-se operando de forma contínua prego para as áreas não puramente chefia de Operações e no CISMAR, migran- tático na Amazônia Azul” permanente-
em situações de paz, de crise ou de conflito, militares, mais próximos às demandas do para o COMPAAz, capacitam o setor mente guarnecido, empregando todas as
onde o emprego do Poder Naval integrado presentes da sociedade, o que tende operativo a implementar, pela primeira vez fontes de dados disponíveis. Identificando
se consolida em seus três eixos: operações a se acentuar no caso do Brasil devido o conceito de Maritime Operation Center, de comportamentos anômalos e possíveis
e ações clássicas de guerra naval; emprego à falta de recursos e de tensões regio- utilizado por diversas Marinhas, buscando ameaças, deve ser capaz de prover moni-
limitado da força; e em atividades benignas. nais (MOURA, 2019, p. 259). contraposição a um ambiente operacional toramento contínuo e alerta antecipado no
acelerado e multifacetado, fruto de um enfrentamento aos desafios que podem vir
Na atualidade, em que os limites en- Nesse contexto e dentro de uma ne- mundo globalizado e ativamente regido por a impactar a segurança marítima e a defesa
tre guerra e paz se tornaram menos cessária evolução estratégica, sistêmica e uma sociedade em rede. Assim, o setor ope- nacional, preparando a Força Naval a tem-
definidos, com o espalhamento do operacional, a Marinha do Brasil, ao final rativo passa a atuar sob uma abordagem po oportuno de reação adequada.

520 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 521


6. Conclusão um círculo virtuoso sinérgico e simbiótico temas das Forças Armadas irmãs. Poderá,
de desenvolvimento tecnológico que ar- assim, contribuir para a necessária integra-
No mundo globalizado em que vive- necessita se reorganizar de forma sustentá- rasta o econômico e o social, traduzindo- ção marítima servindo de instrumento no
mos, onde a realização de todo o potencial vel para que, com isso, o país possa crescer -se em multiplicadores de benefícios para correto estabelecimento de um MSP, cons-
do oceano exigirá abordagens responsáveis​​ social e economicamente. todos. Os valores da Economia Azul e da tituindo-se num poderoso instrumento
e sustentáveis ​​para o seu desenvolvimen- O Programa Estratégico SISGAAz foi oceanopolítica devem ser trazidos para o dual capaz de integrar a capacidade cientí-
to econômico, é essencial que um Estado concebido e proposto pela Marinha do debate no meio acadêmico, incutindo nos fica nacional, vetorando-a para o estabele-
de dimensões continentais como o Brasil Brasil tendo como missão monitorar e jovens uma mentalidade marítima que per- cimento de uma elevada capacidade estra-
tenha domínio tecnológico e concreto de proteger, continuamente, as áreas marí- meie sua consciência do mundo que existe tégica e operacional para desenvolvimento
monitoramento, vigilância e, sobretudo, timas de interesse e as águas interiores, além das praias, criando uma futura massa econômico e dissuasivamente sustentável,
apoio à tomada de decisão na proteção de seus recursos vivos e não vivos, seus por- crítica de tomadores de decisão no sentido baseado na Economia Azul, como forma
uma área de tal valor, não só material, mas tos, embarcações e infraestruturas, em de uma nação próspera, que pode pensar de gerar crescimento, inovação e emprego.
também patrimonial que denota sobera- face de ameaças, emergências, desastres o mar estrategicamente como fonte de ri- Por fim, o recém-criado COMPAAz deve
nia, como a Amazônia Azul. ambientais, hostilidades ou ilegalidades, quezas e futuro, avançando cada vez mais encarregar-se, valendo-se dos recursos dis-
Nesse sentido, o SISGAAz representa, a fim de contribuir para a segurança e a no estabelecimento de um marco legal que poníveis desde já do programa SISGAAz,
no campo externo, a relevante contribui- defesa da Amazônia Azul e para o desen- posicione o Brasil como ator relevante no de integrar as informações sobre ameaças e
ção do Brasil para a paz e a segurança inter- volvimento nacional. sistema internacional por sua magnitude, desafios que influenciam a evolução do ce-
nacional, não apenas nas latitudes azuis do Porém, ainda há grandes passos a se- potencial e real valor. nário, provendo adequado assessoramento
Atlântico Sul, mas também em seus reflexos rem dados, principalmente no que se re- E neste sentido, o SISGAAz não se des- ao Comandante de Operações Navais, bem
nos continentes. Internamente, representa fere à conscientização nacional sobre o taca apenas pela complexidade tecnológi- como aos Distritos Navais no desempenho
a contribuição significativa da Marinha do imenso patrimônio existente nas águas da ca, que envolve diversos setores industriais, de suas tarefas quanto ao emprego do Po-
Brasil para os objetivos estratégicos nacio- Amazônia Azul e a necessidade urgente acadêmicos, científicos, sociais e até milita- der Naval em prol da defesa dos interesses
nais, pois proporcionará uma CSM robusta, de protegê-los e preservá-los, a fim de ga- res, quando permite a interconexão e troca nacionais e, em nosso caso particular de
baseado em dados disponibilizados em rantir a posse desse tesouro, que, embora de informações e dados com os demais sis- interesse, da Economia Azul.
tempo real, desde os recantos mais longín- incalculável, pertence ao Brasil, a todos os
quos da Amazônia Azul, ou da nossa gigan- brasileiros e às suas futuras gerações, que Referências
tesca área de responsabilidade SAR, para o também poderão continuar aproveitando
tomador de decisão em campo, o que per- e explorando de forma sustentável. Nesse AIZENMAN, J.; GLICK, R. (2006). Military Springer Singapore. DOI:10.1007/978-
mitirá reduzir o tempo de reação às ameaças sentido, o desenvolvimento da Economia expenditure, threats, and growth. The 981-13-9155-2_22.
que podem permear o ambiente estratégico Azul deve ser o fio condutor da soberania e Journal of International Trade & Eco- ANDRADE, I. D.; FRANCO, L. A.; HILLE-
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mostrar seus mastros no horizonte. legado de crescimento e desenvolvimento ALBERTS, David S.; GARSTKA, John J.; Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
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RASHID, A. S.; ARIF, Z. U. (2012). Does WENHAI, L.; CUSACK, C.; BAKER, M.; pensamento à frente do objetivo. É a perfeita ploração e aproveitamento dos seus recur-
military expenditure influence economic TAO, W.; BAO, C. M.; PAIGE, K.; YUFENG, sintonia entre a situação percebida e a situa- sos naturais, que são os recursos minerais e
growth in developing countries? A cointe- Y. (2019). Successful Blue Economy Exam- ção real. (BRASIL, 2015). outros recursos vivos do fundo do mar, do
gration analysis. Journal of Arts, Science ples With an Emphasis on International 3 Sigla em inglês para Generalized Method mar e do subsolo, bem como os organismos
of Moments, é um método de estimativa se- vivos pertencentes a espécies sedentárias. Os
& Commerce, III [3(1)], 92-99. Perspectives. Frontiers in Marine Sci-
miparametricamente eficiente que começa direitos do Estado costeiro na PC são exclusi-
RUTTAN, V. (2006). Is War Necessary for ence, 6. DOI: 10.3389/fmars.2019.00261.
com um conjunto de populações de condi- vos no sentido de que, se o Estado costeiro
Economic Growth? Military Procure- WORLD BANK. (2020). PROBLUE 2019 ções de momento superidentificadas e busca não explorar a plataforma continental ou não
ment and Technology Development. Annual Report. Washington: World Bank. encontrar um estimador que minimize uma tirar partido dos seus recursos naturais, nin-
Oxford: Oxford University Press. WORLD BANK AND UNITED NATIONS DE- norma quadrática do vetor de momento da guém poderá realizar essas atividades sem o
SABA, C. S.; NGEPAH, N. (2019). Empirical PARTMENT OF ECONOMIC AND SOCIAL amostra (KHALID & NOOR, 2015). consentimento expresso desse Estado (MA-
Analysis of Military Expenditure and Indus- AFFAIRS. (2017). The Potential of the 4 O termo comumente usado para denotar a RINHA DO BRASIL, 2020a) e (ONU, 1982).
trialisation Nexus: A Regional Approach for Blue Economy: Increasing Long-term Ben- transferência de inovação tecnológica da indús- 8 Sigla em inglês para United Nations Con-
Africa. International Economic Journal. efits of the Sustainable Use of Marine Re- tria militar para a civil (TREBILCOCK, 1969, p. vention on the Law of the Sea. É um tratado
DOI: 10.1080/10168737.2019.1641541. sources for Small Island Developing States 475), ou ainda pelos impactos na esfera civil de que estabelece um regime abrangente de lei
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Política, Año 1 (nr. 1), 31-38. https://sustainabledevelopment.un.org/ 5 Faixa oceânica que se estende desde as li- dos oceanos e seus recursos, incorporando
content/documents/15434Blue_Economy- nhas de base adotadas pelo Estado costeiro em um único instrumento as regras tradicio-
SANTOS, R. F.; TEIXEIRA, P. L. (2017). O
até 12 milhas náuticas (22km), onde o Estado nais para o uso dos oceanos e, ao mesmo
Sistema de Gerenciamento da Amazônia Jun1.pdf. Acesso em: 11 set. 2020.
costeiro exerce plena soberania sobre a massa tempo, introduz novos conceitos e regimes
Azul como um Instrumento de Contri- YOUNG, M. (2015). Building the Blue
líquida e o espaço aéreo coberto pelo MT, bem jurídicos e aborda novas preocupações. A
buição para a Avaliação Ambiental Estra- Economy: The Role of Marine Spatial Plan- como seu leito e subsolo (ONU, 1982). Convenção também fornece a estrutura
tégica de Planos, Programas e Projetos ning in Facilitating Offshore Renewable 6 Faixa oceânica que se estende até uma dis- para o desenvolvimento de áreas específicas
em Setores Governamentais no Brasil. Energy Development. The International tância máxima de 200 milhas náuticas (370 do direito do mar (IMO, 2020).
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SIMON, Paul et al. (2006). Situation Awa- 12341339. costeiro tem direitos soberanos para efeitos de de apoio ao desenvolvimento sustentável de

526 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 527


atividades históricas e novas, ao mesmo 18 Consiste no emprego de todos os meios Marítimo monitora a movimentação de navios na da identificação de ameaças, que estabelece
tempo que aumenta os esforços de preser- possíveis a fim de localizar e socorrer aero- área de responsabilidade de Busca e Salvamento do os programas estratégicos com o propósi-
vação do meio marinho, sendo considerado naves abatidas ou acidentadas, navios, ma- Brasil, por meio de informações de navegação to de prover o Brasil com uma Força Naval
no sentido mais amplo, como um processo teriais e instalações diversas, avariadas ou padronizadas, baseada em outros sistemas fon- moderna e de dimensão compatível com a
público através do qual as autoridades ana- sinistradas, no mar ou em terra e, também, tes (MARINHA DO BRASIL, 2020b) y (SILVA, 2019). estatura político-estratégica do País, capaz
lisam e organizam atividades de recursos socorrer suas tripulações ou pessoas em peri- 26 Por meio de recursos humanos, centrali- de contribuir para a defesa da Pátria e sal-
humanos em áreas marinhas para alcançar go (BRASIL, 2015, p. 257). za a atuação da Estrutura de Defesa Militar, vaguarda dos interesses nacionais, no mar e
objetivos ecológicos, econômicos e sociais 19 Acrônimo em inglês para Command, Con- articulando seus diferentes níveis de decisão águas interiores, em sintonia com os anseios
(DUPONT et al., 2020). trol, Communications, Computers, Intelligen- (MINISTÉRIO DA DEFESA, 2016). da sociedade” (Marinha do Brasil, 2020c).
10 Considerando os espaços oceânicos e a ce, Surveillance and Reconnaissance, (Coman- 27 Sistema correspondente ao SISGAAz na 32 Organização privada sem fins lucrativos
conjuntura político-estratégica internacional, do, Controle, Comunicações, Computadores, fronteira terrestre. que oferece soluções inovadoras em tecno-
a Oceanopolítica envolve o Estado como ele- Inteligência, Vigilância e Reconhecimento) 28 Sistema correspondente ao SISGAAz no logia e gestão, para os desafios e problemas
mento central nas decisões soberanas sobre o como um marco de uma estrutura arquite- espaço aéreo. enfrentados pelas instituições brasileiras, es-
destino de sua população, as relações de poder tônica para operações militares, fornecendo 29 Conforme definido por Castells (1997), a pecialmente as públicas. Possui como missão
com outros Estados e demais atores do Sistema capacidades interoperáveis e​​ atendendo às sociedade em rede é uma estrutura social em Contribuir para transformação das organiza-
Internacional (BARBOSA JÚNIOR, 2012). necessidades do combatente no campo. expansão ilimitada, gerada principalmente pelo ções brasileiras, especialmente as públicas,
11 Em um ambiente marítimo, que envolve 20 Veículo aéreo, sem operador a bordo, desenvolvimento tecnológico das comunica- melhorando sua efetividade (EZUTE, 2022).
oceanos, mares, baías, estuários, rios, regiões com asas fixas ou rotativas, que dispõe de ções e das tecnologias da informação, onde a 33 Organização Militar originária do Comando
costeiras e portos, a Consciência Situacional Ma- propulsão própria, podendo ser pilotado re- internet desempenha um papel fundamental do Controle Naval do Tráfego Marítimo (COM-
rítima é definida como a compreensão dimen- motamente ou dotado de um sistema autô- devido às suas infinitas oportunidades e possi- CONTRAM), tem a missão de “contribuir para
sional de eventos, atividades e circunstâncias nomo de navegação. É empregado em ações bilidades. A integração social é baseada em nós a segurança do tráfego marítimo de interesse
militares ou não, associados ao ambiente ma- de ataque ou reconhecimento, sendo recu- de informação em um sistema organizado em do Brasil, atender a compromissos relativos ao
rítimo, que são relevantes para as ações atuais perável ou não (BRASIL, 2015, p. 278). redes globais de capital, gestão e informação, Controle Naval do Tráfego Marítimo (CNTM) e à
e futuras de um Estado (FARIA, 2012, p. 219). 21 Os satélites geoestacionários estão sempre com preeminência da morfologia social sobre a Doutrina Naval Cooperation and Guidance for
12 Acrônimo em inglês para Search and Res- no mesmo ponto fixo, rodando à mesma veloci- ação social. O acesso ao desenvolvimento tec- Shipping (NCAGS) assumidos pelo País, além
cue, que envolvem operações de busca e sal- dade da Terra acompanhando o seu movimen- nológico é a base da produtividade e da com- de incrementar a Consciência Situacional Ma-
vamento no mar. to, o que permite a sua utilização para estabele- petitividade, materializando o poder, separan- rítima (CSM)” (MARINHA DO BRASIL, 2020b).
13 Pesquisa e desenvolvimento. cer uma rede de comunicações ou monitoriza- do-se do processo produtivo das empresas pela 34 Parte do teatro de guerra necessária à
14 Ciência que mede a profundidade de cor- ção e vigilância (GERALDO & COSSUL, 2017). transnacionalização da produção. condução de operações militares de grande
pos-d’água (oceanos, mares, lagos etc.) para 22 Sua cobertura se dá em todo o território 30 Parte do Poder Marítimo capacitada a atu- vulto, para o cumprimento de determinada
determinar a topografia de seu leito. nacional com sinal de banda larga, incluindo ar militarmente no mar, em águas interiores e missão e para o consequente apoio logístico
15 Oceanografia geológica também conhe- a região amazônica, com controle de trans- em certas áreas terrestres limitadas de interes- (BRASIL, 2015, p. 265).
cida como oceanografia abiótica é o estudo ponder realizado exclusivamente por pessoal se para as operações navais, incluindo o espa- 35 Conhecido também como Ciclo de Boyd ou
da formação e estrutura do fundo do mar, da TELEBRAS (DEMENICIS, 2019). ço aéreo sobrejacente. Compreende as Forças Ciclo de Comando e Controle – “Sequência na
estudando sedimentologia, geomorfologia, 23 Proporciona maior flexibilidade no uso Navais, incluídos os meios navais, aeronavais qual as ações em combate são desenvolvidas, de
geofísica, geoquímica e processos morfodi- das comunicações, podendo prestar serviço, próprios e de fuzileiros navais, suas bases e forma cíclica: observação – orientação – decisão
nâmicos marinhos e costeiros. abrangendo a América do Sul, Caribe e par- posições de apoio e suas estruturas de co- – ação (OODA). Na primeira etapa, é percebida
16 Escoamento das águas oceânicas, orde- te do Oceano Atlântico, sendo o controle de mando e controle, logísticas e administrativas, uma mudança no curso dos acontecimentos;
nado ou não, resultante da inércia da rotação transponders realizado exclusivamente por bem como os meios adjudicados pelos pode- na segunda, é produzida uma imagem mental
do planeta Terra, dos ventos e da diferença militares (DEMENICIS, 2019). res militares terrestre e aeroespacial, e outros da nova situação; na terceira etapa, chega-se
de densidade. 24 Sistema de Comando e Controle Naval, uti- meios, quando vinculados ao cumprimento da à decisão da conduta a ser desenvolvida; e, na
17 São o resultado da superposição de me- lizado para monitoramento da Amazônia Azul, missão da Marinha e submetidos a algum tipo última, são implementadas as ações decorren-
canismos atmosféricos sinópticos (globais) e baseado no Centro Integrado de Segurança de orientação, comando ou controle de auto- tes da decisão tomada, voltando-se à da ob-
de mesoescala (regionais), para onde conver- Marítima (CISMAR), alimentado com dados do ridade naval (BRASIL, 2015, p. 212). servação para um novo ciclo. Deve-se buscar
gem as direções desses mecanismos, resul- SISTRAM, entre outros (Silva, 2019). 31 “Documento de alto nível, estruturado a realizar o ciclo completo mais rapidamente
tando em ventos predominantes na região. 25 O Sistema de Informação de Tráfego partir da análise do ambiente operacional e que o oponente (BRASIL, 2015, p. 62).

528 ECONOMIA AZUL SISGAAZ, uma Visão Estratégica 529


25

TECNOLOGIAS NUCLEARES PARA O MAR

Carlos Alberto Aragão de Carvalho Filho


Renato Machado Cotta
Guilherme da Silva Sineiro

1. Introdução

As tecnologias nucleares têm sua ori- outro núcleo pesado fissionável. No ano
gem em avanços científicos e tecnológicos seguinte, Fermi e Szilárd construíram a
das décadas de 1930 e 1940. Com efeito, “Pilha de Fermi”, considerada o protóti-
a primeira reação nuclear foi investigada, po do primeiro reator nuclear.
em1932, por Sir John Douglas Cockcroft O primeiro reator nuclear para produ-
e Ernest Thomas Sinton Walton (agracia- ção controlada de energia, o de Obninsk,
dos com o Nobel de Física – 1951). Em na União Soviética, capaz de gerar 5 MWe
1933, Léo Szilárd propôs a ideia de uma (megawatts de potência elétrica), surgiu
reação em cadeia para produção copio- em 1954. Um ano depois, entrou em ope-
sa de nêutrons e liberação de energia ração o primeiro submarino com propulsão
nuclear. No ano seguinte, Enrico Fermi nuclear, o Nautilus, resultado do progra-
(Nobel de Física – 1938) sugeriu mecanis- ma nuclear da Marinha dos EUA, liderado
mos para a moderação da energia desses pelo Almirante Hyman George Rickover. É
nêutrons. Quatro anos mais tarde, Otto bastante razoável considerar esse evento
Hahn (Nobel de Química – 1944) e Fritz como o marco inicial da aplicação de tec-
Strassmann chegaram à fissão do núcleo nologias nucleares no mar. Desde então,
de urânio e à reação em cadeia sugerida diversas tecnologias que envolvem reações
por Szilárd. A explicação teórica da fissão e processos nucleares foram criadas e apri-
nuclear foi proposta, em 1939, por Lise moradas tiveram seu espectro de aplicação
Meitner e seu sobrinho, Otto Robert Fris- ampliado e tornaram-se de uso corrente
ch. Já na década de 1940, Glenn Theo- pela sociedade. Nas demais seções deste
dore Seaborg e Edwin Mattison McMillan capítulo, iremos descrevê-las, reservando
(contemplados com o Nobel de Química – para o final a discussão de seu uso no am-
1951) descobriram, em 1941, o plutônio, biente marítimo.

530 ECONOMIA
530 AZUL
A ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 531
2. Tecnologias nucleares para geração de energia neutralidade de emissões de carbono até avançados, com destaque para os cerca
lá. Até aqui, cerca de metade dos países de 50 projetos de reatores modulares de
Inicialmente, as tecnologias nucleares fo- altas temperaturas, com alta eficiência e da UE concordou com a expansão do uso pequeno porte (Small Modular Reactors
ram direcionadas para a produção de ener- com preços competitivos. da energia nuclear na transição energética. – SMR). Estes últimos são construídos de
gia, seja em aplicações civis, em usinas nu- Ao final de 2019, de acordo com o Nu- A utilização da energia nuclear para pro- maneira modular, em sítios industriais, e
cleares, seja em aplicações militares, seja em clear Technology Review 2020 da Agência pulsão de meios navais iniciou-se em 1955, transportados para o local de utilização.
propulsão nuclear naval. Em ambos os casos, Internacional de Energia Atômica – AIEA, com o já mencionado submarino Nautilus, Produzem potência térmica na faixa entre
houve avanços tecnológicos notáveis. Tenta- havia 443 reatores nucleares em operação, da Marinha dos EUA. Submarinos com 20 e 300 MWt (megawatts térmicos), têm
remos traçar um panorama dessa evolução. com capacidade de gerar 392,1 GWe. As propulsão nuclear vêm sendo igualmente projetos mais simples e mais robustos, são
As usinas nucleares em terra empre- projeções da AIEA, no cenário mais pessi- construídos e operados pelas Marinhas bri- menos sujeitos a problemas operacionais e
gam reatores nucleares para produção de mista, preveem redução dessa capacidade tânica, russa, francesa, chinesa e indiana, acidentes severos, mais independentes da
energia térmica por meio de reações em até 2030, seguida de aumento, de modo a algumas das quais também constroem e ação do operador e incorporam as lições
cadeia nas quais átomos pesados, como os atingir 371 GWe em 2050. No cenário mais operam navios de guerra e porta-aviões de do acidente de Fukushima (geração III+),
de urânio, são fissionados em átomos mais otimista, a capacidade deve aumentar 25% propulsão nuclear. Pode-se distinguir ao me- bem como a experiência prévia em pro-
leves, com grande liberação controlada de até 2030, chegando a 496 GWe, e 80% até nos quatro gerações desses meios navais. jeto e operação. Seu licenciamento deve
energia e de nêutrons. A energia térmica 2050, chegando a 715 GWe. A participa- Cada nova geração incorporou elementos ser mais ágil e eles terão maior disponi-
é convertida em energia elétrica por meio ção da energia nuclear na geração global de segurança nuclear naval e trouxe me- bilidade e vida operacional de 60 anos.
de turbinas a vapor acopladas a geradores de energia elétrica seria de 6% ou 12% em lhorias quanto à versatilidade e capacidade Há também projetos de micro-reatores
elétricos. Ao longo dos anos, foram desen- 2050, conforme o cenário adotado, número operacional. Em relação à segurança, algu- (potência < 20 MWt), em geral para apli-
volvidas quatro gerações de reatores, que a ser comparado com 10% em 2019. Vale mas Marinhas optam por usar combustível cações offgrid, como em regiões inóspitas
serão descritas brevemente. notar que havia 54 reatores em construção nuclear de baixo teor de enriquecimento ou zonas de conflito ou de desastres natu-
A geração I, predominante nos anos ao fim de 2019, 35 deles na Ásia, e que 74 (< 20%, low enrichment uranium – LEU), rais, que se juntam aos SMR para oferecer
1950-1960, usava, como combustíveis, reatores foram conectados à rede elétrica em vez do alto teor (> 90%, high enrich- uma gama de possibilidades de aplicação
urânio (U) metálico ou dióxido de urânio desde 2005, dos quais 61 na Ásia. ment uranium) utilizado, por exemplo, por de sua energia elétrica e do seu calor re-
(UO2); como moderadores, grafite, água Trinta países usam energia nuclear e há estadunidenses e russos. Revisitaremos os jeitado, que inclui dessalinização e produ-
pesada, água leve ou berílio (Be); como cerca de 28 candidatos a ingressar nesse meios navais na seção dedicada à utilização ção de hidrogênio. Esses reatores, além de
refrigerantes, líquidos ou gases; e atingia grupo. O interesse na área nuclear advém de tecnologias nucleares no mar. contribuírem para uma economia de baixo
potências entre 5 e 180 MWe. A geração II, de considerações sobre sua relevância para Atualmente, com o progresso tecnoló- carbono, devem ampliar a participação do
dos anos 1970-1990, corresponde à maio- a mitigação de mudanças climáticas, ga- gico, busca-se construir reatores nucleares setor nuclear na economia.
ria dos reatores em operação atualmente, rantia de segurança energética e imple-
Usina Nuclear de Angra dos Reis - RJ
de tipo PWR (pressurized water reactor) ou mentação de políticas ambientais e socioe-
BWR (boiling water reactor). A geração III, conômicas. A International Conference on
pós-1990, incorporou sistemas passivos de Climate Change and the Role of Nuclear
segurança e tem projeto, operação e ma- Power, organizada pela AIEA e pela Orga-
nutenção simplificados e padronizados. En- nização para a Cooperação e Desenvolvi-
globa reatores recentes, de grande porte, mento Econômico – OCDE, em outubro
como o AP1000 – PWR da Westinghouse, de 2019, discutiu amplamente o papel do
de 1.100 MWe, o EPR – PWR da Areva, setor nuclear na transição para uma eco-
de 1.650MWe e o ABWR – BWR da GE- nomia de baixo carbono. A União Europeia
-Hitachi, de 1.350 MWe. A geração IV, em recentemente reconheceu que precisará
franco desenvolvimento, incluirá sistemas investir mais de 500 bilhões de euros em
passivos de segurança adicionais, repro- energia nuclear até 2050 (50 bilhões de
cessamento de combustível e operação em euros até 2030), para honrar suas metas de

532 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 533


3. Tecnologias nucleares para pesquisa, saúde, agricultura e indústria podem ter suas estruturas modificadas, o cimento e fabricação de combustível nu-
que auxilia seu processo de reciclagem, clear. Há iniciativas de utilização de tório
Em seu Nuclear Technology Review de boro, nos cálculos e no controle das do- evitando o descarte, de alto potencial como combustível nuclear, um tema de
2020, a AIEA contabilizou 250 reatores sagens, bem como o uso de aceleradores poluidor, especialmente para os oceanos. pesquisa e desenvolvimento recentemente
de pesquisa operando em 54 países, em compactos para produção de nêutrons em Essa técnica se encaixa na chamada quí- revitalizado. Apesar de ainda incipientes,
apoio à pesquisa e ao desenvolvimento em hospitais e centros de tratamento, tornam mica verde, cada vez mais demandada por alguns projetos parecem promissores, em
medicina, agricultura, indústria e energia, essa terapia especialmente promissora. requisitos de sustentabilidade. especial na China. Igualmente promisso-
bem como em atividades educacionais de Ainda no tocante à saúde, métodos A energia nuclear também tem encon- ras são as iniciativas de projeto de reatores
formação. Há planos para adicionar mais de biodosimetria permitem identificar e trado aplicações não-elétricas que utilizam para reutilização de combustível nuclear
vinte desses reatores nos próximos anos, quantificar o nível de exposição de seres calor residual em processos denominados usado em misturas e distribuições adequa-
distribuídos por 11 países. Eles constituem humanos à radiação, inclusive de maneira de cogeração. Dessalinização de água, das com combustível novo.
importantes instrumentos para o avanço retrospectiva. Tais métodos têm sido utili- produção de hidrogênio e utilização des- Nos próximos anos, diversos reatores
da ciência e das tecnologias nucleares. O zados em medicina nuclear, seja para uso sa energia para aquecimento distrital e de potência e de pesquisa, instalações de
Brasil conta com quatro reatores de pesqui- de radiação em oncologia, seja em radiolo- refrigeração são exemplos disso. Reatores produção de combustíveis, aceleradores e
sa em operação: o IEA-R1 (IPEN/CNEN); o gia diagnóstica e de tratamento. modulares de pequeno porte serão ideais irradiadores deixarão de operar, o que vai
MB-01 (projetado e construído em coope- Na interface entre saúde e agricultura, para tais aplicações. Além disso, processos requerer procedimentos cuidadosos de
ração entre o CTMSP-MB e o IPEN/CNEN); tecnologias nucleares minimamente invasi- industriais intensivos em energia podem descomissionamento e remediação de ins-
o reator Argonauta (IEN/CNEN); e o reator vas, que usam os isótopos deutério e car- ser viabilizados por cogeração, com a re- talações com materiais radioativos. A ques-
TRIGA (CDTN/CNEN). bono-13 (13C), permitem aferir a digestibi- dução de seus custos. tão dos rejeitos de alto nível de radiação é
Há também reatores dedicados a pro- lidade de amino ácidos, de forma a avaliar Sobre o combustível nuclear, essencial cada vez mais premente, o que tem levado
duzir radioisótopos para a obtenção de a qualidade das proteínas em alimentos, para as tecnologias nucleares, a AIEA cons- alguns países a construírem e prepararem
radiofármacos empregados em medici- especialmente os de origem vegetal. tatou que a produção mundial de urânio locais subterrâneos em sítios geológicos
na nuclear, tanto para diagnóstico como Outras aplicações relevantes de tecno- (acima de 50 mil toneladas) tem-se mos- profundos para armazená-los de maneira
para tratamento de enfermidades, como logias nucleares na agricultura incluem a trado adequada, tanto para necessidades segura, garantindo-lhes a segurança nu-
diferentes tipos de câncer. Recentemen- técnica do inseto estéril para controle de atuais quanto futuras, graças à capacidade clear e física necessárias pare evitar danos
te, o Brasil concluiu o projeto executivo pragas. Irradiação por cobalto-60 (60Co) global existente para conversão, enrique- à população e ao meio ambiente.
do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), deixa os insetos estéreis e contribui para
em colaboração da CNEN com a AMAZUL o controle de sua população, preservan- 4. Tecnologias nucleares para uso no mar
Tecnologias de Defesa, com consultoria da do as culturas.
INVAP da Argentina. Além de levar à au- Técnicas nucleares baseadas no rastrea- 4.1 A indústria naval militar aviões, graças à sua capacidade de man-
tonomia e independência na produção de mento de isótopos também permitem veri- ter meios navais por longos períodos no
radiofármacos e radioisótopos para aplica- ficar a procedência de produtos agrícolas, Como já foi assinalado, o uso da energia mar, sem necessidade de reabastecimen-
ções na indústria e agricultura, o RMB será evitando fraudes e dando maior segurança nuclear para propulsão naval pode ser con- to, e de prover maior potência para sub-
um laboratório avançado de pesquisas em aos consumidores. siderado o primeiro exemplo de aplicação marinos, que lhes permite atingir de 20 a
energia nuclear e ciências dos materiais por Por fim, a irradiação de alimentos para de tecnologias nucleares no mar. Reatores 25 nós quando submersos.
irradiação com feixes de nêutrons. sua adequada preservação tem sido cada nucleares como fonte de propulsão naval De acordo com o Lloyd’s Register, atual-
Novas opções de tratamento vêm sur- vez mais utilizada e já impacta a capacida- vêm sendo utilizados em embarcações mi- mente pelo menos 160 navios são impul-
gindo, como a Boron Neutron Capture de de exportar, pois passou a ser exigida litares desde 1955, quando foi comissiona- sionados por cerca de 200 reatores nucle-
Therapy (BNCT), que permite a irradiação por controles sanitários em diversos países. do o submarino Nautilus. ares. Apenas na Marinha dos EUA, há 108
seletiva das células de tumores canceríge- Na indústria, irradiação com feixes de A propulsão nuclear naval passou a ser reatores operando em seus navios. Desde
nos por meio de uma reação entre nêu- nêutrons permite estudar e mesmo mo- amplamente empregada por diversas Ma- a década de 1950, cerca de 700 reatores
tron e boro, destruindo apenas as células dificar a estrutura de materiais. Em par- rinhas, inicialmente em submarinos, mas foram usados no mar, perfazendo mais de
comprometidas. Melhorias nos compostos ticular, polímeros submetidos a irradiação também em navios de guerra e porta- 13.000 reatores.ano de operação marítima

534 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 535


(um reator.ano = um reator operando por O caso brasileiro é singular, pois a demonstrar viabilidade econômica do até o momento não foram exitosas. Porém,
um ano), cerca de 7.000 da Rússia e mais Marinha do Brasil vai construir um sub- transporte marítimo com propulsão nu- a necessidade de restringir o uso de combus-
de 6.200 dos EUA. marino cuja propulsão nuclear está sendo clear, algo que, como veremos, ainda não tíveis fósseis, por contribuírem para o aqueci-
Em um período de 50 anos, a Marinha desenvolvida de maneira totalmente au- ocorreu, exceto para navios quebra-gelo. mento global, pode levar a novas tentativas
estadunidense operou, sem acidentes, 526 tóctone, enquanto a parte naval, que in- No caso dos quebra-gelos usados no de construção e utilização desses navios que
reatores nucleares, ao longo de 240 mi- clui o casco e todos os equipamentos não Ártico, os russos demonstraram que a incorporem avanços tecnológicos recentes.
lhões de quilômetros. Toda a sua frota de diretamente ligados à propulsão, utilizará propulsão nuclear era técnica e economi- O primeiro navio mercante nuclear
submarinos utiliza propulsão nuclear. Em tecnologia francesa já repassada a técni- camente viável para operar em condições foi o NS Savannah, de 22.000 toneladas,
2017, possuía 11 porta-aviões e 70 subma- cos brasileiros responsáveis pelo projeto e adversas, enfrentando camadas de gelo construído nos Estados Unidos, comis-
rinos, que usavam 92 reatores. Em geral, construção. Esse submarino, que levará o espessas sem as dificuldades de reabaste- sionado em 1962 e desativado oito anos
suas embarcações são projetadas para ope- nome do Almirante Álvaro Alberto, deve cimento das embarcações convencionais. mais tarde, pois, apesar do bom desem-
rarem por mais de 40 anos, com combustí- ser comissionado a partir de 2030. Desde a introdução dos quebra-gelos nu- penho técnico, não era economicamen-
vel de alto enriquecimento (> 90%) e uma Todos os países mencionados têm indús- cleares, a navegação no Ártico aumentou te viável. O mesmo ocorreu com o navio
única parada prevista para reabastecimen- trias de construção naval capazes de pro- de dois para dez meses por ano. cargueiro e de pesquisa alemão Otto
to e manutenção geral. jetar e construir meios navais com reatores O primeiro desses quebra-gelos foi o Hahn, de 15.000 toneladas, que navegou
A Marinha russa registrou 6.500 reato- embarcados. Dado o quantitativo de navios Lenin, o primeiro navio civil de superfície durante dez anos com propulsão nucle-
res-ano em uso marítimo até 2015. Possui e a constante necessidade de manutenção e com propulsão nuclear, comissionado em ar, mas foi convertido para propulsão a
cerca de 21 submarinos nucleares, um cru- atualização, esse segmento militar da indús- 1959 e desativado trinta anos depois. Se- diesel em 1982. Já o japonês Mutsu, de
zador com propulsão nuclear em operação e tria naval é de grande relevância econômica, guiram-se seis da classe Arktika, nome do 8.000 toneladas, comissionado em 1970,
três outros em manutenção. Existem planos pois cada embarcação custa bilhões de dó- primeiro navio de superfície a atingir o Polo teve problemas técnicos e econômicos.
de construir mais oito submarinos nucleares lares. Essa indústria, por envolver projeto e Norte, em 1977. Desses, dois permanecem Os três usavam urânio de baixo enrique-
e um submersível com propulsão nuclear construção, gera muitos empregos, alguns em operação, sendo que o último foi comis- cimento, entre 3.7 e 4.4% de 235U.
para grandes profundidades, além de au- deles de alta qualificação, já que a cons- sionado em 2007. Para se ter uma ideia do Uma experiência de sucesso com um
mentar de 25 para 35 anos o tempo de vida trução de embarcações nucleares tem alto porte desses navios, este último tem 25.800 navio mercante nuclear ocorreu na Rússia,
de seus submarinos de terceira geração. grau de complexidade tecnológica. toneladas de peso morto, 160 m de compri- onde as condições de navegação do Mar
A China possui cerca de doze submari- mento, 20 m de largura e pode romper 2,8 do Norte demandam esse tipo de propul-
4.2 A indústria naval civil
nos nucleares e cogita construir navios pola- m de espessura de gelo com uma potência são para lidar com o gelo e as dificuldades
res, porta-aviões e navios quebra-gelo com O emprego da propulsão nuclear em de propulsão de cerca de 54 MWe. de reabastecimento. O NS Sevmorput, des-
propulsão nuclear. A França opera um porta- embarcações civis, especialmente quebra- Há dois outros quebra-gelos em ope- tinado a servir portos do norte da Sibéria,
-aviões de propulsão nuclear e dez submari- -gelos e navios mercantes de grande porte, ração na Rússia, projetados para as águas foi comissionado em 1988, programado
nos nucleares, com seis novos, classe Barra- como graneleiros e navios de transporte de rasas de rios e estuários. Além disso, a in- para desativação em 2014, mas teve sua
cuda, planejados, dos quais o Suffren será o minérios, é algo que tem sido considerado, dústria naval russa, prevendo maior tráfe- vida útil estendida. Em 2019, transportava
primeiro a ser comissionado. A Grã-Bretanha pois pode levar a uma redução de custos go pelo Ártico no futuro, está empenha- alimentos frescos do Pacífico, pela rota do
possui doze submarinos, todos nucleares. de transporte e à substituição de combus- da na construção de cinco quebra-gelos Mar do Norte, para Murmansk.
Mais recentemente, a Marinha indiana tíveis fósseis por fontes de energia que não da classe LK-60, o primeiro dos quais Há também exemplos de quebra-gelos
construiu, com tecnologia russa, um sub- produzem gases de efeito estufa. deve ser comissionado este ano, outro com propulsão nuclear sendo utilizados
marino nuclear balístico, o INS Arihant, co- Para tanto, será necessário lidar com da classe LK-120, de maior porte, e um naquela rota para guiar, e eventualmente
missionado em 2016, e está construindo questionamentos quanto à segurança nu- menor, da classe LK-40, para águas rasas. socorrer, navios-tanque para transporte de
um segundo, o INS Aridaman, a ser comis- clear naval que têm levado a restrições de Esses projetos têm orçamentos entre 0,5 gás, resultando em uma economia de tem-
sionado em 2022. Ela também faz o leasing acesso a portos, convencendo os diversos e 2 bilhões de dólares. po de até 20 dias e de milhares de quilô-
de um submarino russo seminovo, da clas- atores da sociedade de que a tecnologia mo- Navios mercantes com propulsão nuclear metros em relação a outras rotas. Existem
se Akula II, o INS Chakra, e tem planos de derna é plenamente capaz de garantir essa precisam ainda demonstrar sua viabilidade planos para ampliar a utilização dessa rota
construir nove outros submarinos nucleares. segurança. Adicionalmente, será preciso econômica, pois as experiências realizadas para incluir o transporte de minérios.

536 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 537


Como mencionado, ainda são poucos supre energia elétrica e dessalinização. uma opção a mais para o transporte marí- com razoável potencial de utilização futu-
os exemplos de uso civil de propulsão nu- Uma segunda geração dessas FNPP, cha- timo. Como a frota mercante mundial tem ra. O fornecimento de energia por reatores
clear no mar. Contudo, a expansão desse madas Optimised Floating Power Units – capacidade de consumir 410 GWt, o que re- submersos (subsea), o emprego de técni-
uso, estimulada por questões climáticas, OFPU, está sendo desenvolvida. presenta cerca de um terço da potência ge- cas nucleares para preservação de alimen-
levaria a um crescimento da indústria na- Um projeto dinamarquês propõe insta- rada por usinas nucleares, há amplo espaço tos na indústria pesqueira e o emprego de
val em vários países, sem estar necessa- lar, em barcaças flutuantes, modernos re- para crescimento do uso, direto ou indireto, SMR para geração de energia, dessaliniza-
riamente restrita àqueles que fazem uso atores compactos a sal fundido (compact da energia nuclear no mar. ção, aquecimento e refrigeração em regi-
militar, com razoável impacto econômico, molten salt reactors), cujo combustível nu- Em decorrência disso, desde 2009, vá- ões costeiras, ilhas e bases oceânicas.
dados os recursos de monta envolvidos clear vem misturado a sais de fluoretos, rios estudos vêm sendo realizados sobre Microrreatores ou SMR submersos a
na construção das embarcações. em estado líquido acima de 500 oC e a propulsão nuclear para navios mercantes diferentes profundidades vêm sendo es-
Para que essa expansão possa ocorrer, pressão próxima da atmosférica, de modo na China, no Reino Unido, nos Estados tudados como possíveis fontes de energia
será preciso construir navios de propulsão a fluir e também atuar como refrigeran- Unidos e no Canadá. Esses estudos tratam elétrica para regiões costeiras e exploração
nuclear cuja operação seja economicamen- te. Tais reatores são mais seguros porque, de viabilidade econômica, mitigação de de petróleo e gás (Cotta et al., 2020). A
te compensadora e que incorporem novas dentre outras razões, o líquido se solidifica efeitos climáticos, uso de SMR e aspectos primeira usina nuclear submarina projeta-
tecnologias, de modo a aprimorar seu de- quando exposto ao ar, não ocorrendo va- de regulação. Alguns foram apoiados pela da que se registra na literatura foi proposta
sempenho e atender a requisitos de segu- zamento de vapor superaquecido. IMO e pela AIEA. Mais recentemente, des- pela Rockwell International em 1974, com
rança nuclear naval que lhes garanta acei- Há também dois projetos na China, e de 2020, surgiram, nos Estados Unidos, o objetivo de viabilizar a produção de pe-
tação pela sociedade. projetos na Coreia do Sul e no Canadá. Es- Reino Unido e Coreia do Sul, atividades tróleo offshore no Golfo do México com
sas plantas nucleares usam urânio de bai- de pesquisa e desenvolvimento de reato- a geração de 3MWe. Atualmente, o rea-
4.3 Plantas nucleares flutuantes
xo enriquecimento e podem chegar a for- res modulares (~ 100 MWt) para propul- tor SHELF da Rússia é projetado para uso
Plantas nucleares embarcadas em estru- necer 100 MWe de potência e 1400 GJ/h são marítima, refrigerados a sais fundidos a bordo e submerso, tendo sido idealizado
turas flutuantes que podem ser deslocadas de potência térmica para dessalinização. (modular molten salt reactors – MSR), para exploração de petróleo e gás natural
para regiões remotas por mar e/ou por rios para operação a pressão ambiente e com na região do Ártico, abaixo da calota polar.
4.4 Perspectivas futuras para
navegáveis já vêm sendo empregadas. Com combustível de baixo enriquecimento. A análise da geração núcleo-elétrica para
propulsão nuclear marítima
o desenvolvimento dos SMR, isso represen- A propulsão nuclear pode ser indica- exploração de petróleo e gás voltou a des-
taria uma nova opção para fornecimento Em 2018, a International Maritime Or- da para grandes graneleiros e navios de pertar interesse mais recentemente, com a
de energia a locais de difícil acesso, que ganization – IMO propôs, para 2050, uma cruzeiro, em que reatores SMR poderiam necessidade de reduzir a queima de gases
poderia valer-se de cogeração para também meta de redução dos gases de efeito estufa inclusive suprir a energia para as ativida- com alto teor de CO2 e elevado Inventário
viabilizar dessalinização, produção de hidro- do transporte marítimo de 50% em rela- des a bordo, rebocadores para travessias de Gases de Efeito Estufa (IGEE) nas platafor-
gênio, aquecimento distrital e refrigeração. ção a 2008. O gasto anual de energia com transoceânicas e cargueiros rápidos. Além mas de petróleo. Em particular, os campos
Um reator instalado no mar forneceu o transporte marítimo global foi de 8,9 EJ disso, a Organização para Cooperação e do Pré-sal brasileiro, com alto RGO (razão
potência (1,5 MWe) para a base norte-a- (1 Exajoule = 1018 Joules) em 2017, 82% Desenvolvimento Econômico – OCDE, em gás-óleo) e elevado teor de CO2, requerem
mericana na Antártica por dez anos, até provenientes de óleos pesados e o restante seu estudo Energy Technology Perspec- muitas unidades de processamento e limitam
1972. Uma planta de energia nuclear de gás e diesel. A frota mercante mundial tives 2020 projeta um cenário de desen- a produção de óleo pelo congestionamen-
flutuante (Floating Nuclear Power Plant – tinha uma capacidade de 2 Gt e transpor- volvimento sustentável em que 12% do to das Unidades Flutuantes de Produção,
FNPP) forneceu potência (10 MWe) para a tou 8,9 Gt de frete em 2018. transporte marítimo utilizará hidrogênio Armazenamento e Transferência (Floating,
Zona do Canal do Panamá por nove anos. Diante desses números, chama a aten- em 2070, o que abre boas perspectivas Production, Storage and Offloading – FPSO)
A Rússia construiu e instalou uma ção o fato de haver um único navio mercan- para produção nuclear desse insumo. existentes. A geração de eletricidade subsea
FNPP sobre uma barcaça, em 2019, a te com propulsão nuclear, o Sevmorput rus- liberaria espaço precioso nessas plataformas
4.5 Perspectivas futuras para outras
Akademic Lomonosov, que navegou até so, de 61,9 kt (0,003% dos 2 Gt). A possibi- (fixas ou flutuantes) e facilitaria a transmis-
aplicações
sua localização permanente, na região de lidade de usar hidrogênio ou amônia como são de energia para as estruturas submari-
Chukotka, e começou a operar em de- combustíveis marítimos pode fazer da pro- Existem outras aplicações das tecnologias nas de produção. Há um estudo em curso
zembro daquele ano. Por cogeração, ela dução de hidrogênio por plantas nucleares nucleares sendo contempladas atualmente, em colaboração da UFRJ com a DGDNTM/

538 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 539


MB e seus parceiros, e projetos de pesquisa lações e atividades produtivas desses locais. 5. O Programa Nuclear da Marinha do Brasil
foram propostos para avaliar a viabilidade Com relação à indústria da pesca e aqui-
dessa alternativa (Cotta et al., ABCM Enge- cultura, a disseminação das técnicas nuclea- A Marinha do Brasil (MB), desde 1979, volver em paralelo ao projeto do submarino
nharia, 2020). Recentemente, a Petrobras e res aplicáveis a alimentos certamente atingirá persegue o objetivo de projetar e construir convencional de propulsão nuclear (SCPN).
seus parceiros desenvolveram um novo pro- os produtos do mar, contribuindo para sua um submarino com propulsão nuclear, cuja Em 1981, em parceria com o Instituto
cesso para separação e reinjeção do gás já preservação e certificação de procedência e dificuldade é bem ilustrada pela Figura 1 a de Pesquisas Energéticas e Nucleares –
na cabeça do poço, conhecido como HISEP, qualidade. É razoável imaginar um cenário seguir, que compara em termos de Homens. IPEN, a MB deu a partida em um projeto
que seria uma inovação ainda mais transfor- em que irradiadores instalados em portos hora (Hh) e número de componentes (cp), de construção de um reator de pesquisa,
madora a partir do fornecimento de energia pesqueiros poderão processar os produtos a complexidade no desenvolvimento de di- o IPEN/MB-01, de potência zero, ao mes-
in situ, como possibilitado pela geração nu- do mar de maneira segura, rápida e eficiente. ferentes projetos de grande envergadura na mo tempo que se lançava ao desafio de
clear subsea. Outra aplicação em franco de- Tecnologias nucleares e isotópicas têm sido engenharia moderna. Na Figura 1 não está dominar o ciclo do combustível com tec-
senvolvimento que poderia se beneficiar da usadas para monitorar e estudar o processo incluído o processo também muito com- nologias autóctones. O reator e o domínio
instalação de reatores nucleares subsea para de acidificação dos oceanos. Como absorvem plexo de obtenção do combustível nuclear, do enriquecimento de urânio foram ambos
geração de eletricidade é a mineração. Es- um quarto das emissões de CO2 do planeta, baseado em ultracentrífugas de enriqueci- obtidos em 1988, um marco na história da
tima-se uma movimentação de mais de 70 os oceanos passam por mudanças na sua mento isotópico e que a MB precisou desen- tecnologia nuclear do País.
bilhões de dólares até 2030 em tecnologia e química, com aumento de acidez que afeta
equipamentos para mineração subsea. organismos marinhos e ciclos biogeoquími-
Ainda na geração núcleo-elétrica subsea, cos, levando à corrosão de carbonatos de
destaca-se a plataforma submersível FlexBlue cálcio, com impactos para a pesca, entre ou-
Figura 1. Comparação da complexidade tecnológica de diferentes
desenvolvida pelo líder francês em tecnolo- tros. Com as tecnologias mencionadas, po-
projetos da engenharia moderna de grande envergadura
gia naval DCNS (atualmente Naval Group, de-se estudar processos biológicos de modo
França), que incorpora os principais méritos a quantificar e monitorar a acidificação.
dos SMR. O reator FlexBlue foi proposto para Além disso, o monitoramento de ra- SUBMARINO NUCLEAR - ALGUNS NÚMEROS
fornecimento de energia elétrica para popu- dionuclídeos no mar, em escala global, é SSBN
(submarino a propulsão e
lações costeiras e insulares. Ele seria instalado feito regularmente pela AIEA, em parce- UMA COMPLEXIDADE EM PROGRESSÃO com mísseis nucleares)
SSN
a cerca de 100 m de profundidade, a uma ria com diversas organizações de pesquisa GEOMÉTRICA 12 milhões Hh
(propulsão nuclear) 950 milhão cp
distância de uns 10 km da costa e se valeria marinha ao redor do mundo, valendo-se 18.750 t
8 milhões Hh
de linhas de transmissão também submersas. de tecnologias nucleares. Isso, entre outras 950 mil cp
Outro tipo de proposta é defendido pelo aplicações, permite detectar quaisquer al- 6.900 t
Mísseis Boeing 777
Center for Advances in Nuclear Energy, do terações advindas da utilização de energia 23 Hh
Blindados 50 mil Hh
MIT, baseado em Offshore Floating Nu- nuclear no ambiente marítimo. Na atuação 3 mil cp
103 mil cp SCPN
SCPN
SCPN
5,5 mil Hh 1,9 t
clear Plants – OFNP, que foram propostas em monitoramento, destaca-se o programa 254 t
14 mil cp
em duas versões, uma de 45 m de diâme- NUTEC Plastics. Usando técnicas nucleares 65 t


NAUTILUS
tro, gerando 300 MWe, e outra de 75 m de para quantificar a dispersão de plásticos e 1964
 SEAWOLF
Caças 1993
diâmetro, gerando 1100 MWe. contaminantes, a AIEA apoia laboratórios
57 mil Hh (Hh) Homens/ hora
A evolução dos micro e pequenos reato- em todo o mundo para gerar conhecimento Automóveis 30 mil cp (cp) Componentes
res certamente facilitará sua instalação e sua científico nos impactos da poluição por plás- 23 Hh 10 t
(t) Toneladas
3 mil cp
operação contínua em regiões remotas. Ilhas ticos em ecossistemas marinhos e costeiros.
e bases oceânicas se enquadram nessa cate- Em paralelo, empregando radiação gama
1,9 t
. . . . . . . . . Tempo de
fabricação
0 10 20 30 40 50 60 70 80 (meses)
goria. SMRs ou microrreatores, dependendo e feixes de elétrons em complemento aos
da necessidade, podem ser uma solução de métodos mecânicos e químicos tradicionais, Fonte: Adaptado do National Shipbuilding Research Program
custo-benefício compensador para garantir certos tipos de resíduos plásticos podem ser (NSRP) – Advanced Shipbuilding Enterprise (ASP)
autonomia e segurança energética às popu- modificados para reúso ou reciclagem.

540 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 541


Na busca pelo domínio do ciclo do com- levou finalmente à produção de pastilhas Figura 3. Atividades do PNM e sua inserção no programa
bustível nuclear, foi necessário desenvolver de combustível nuclear. A Figura 2 abaixo de obtenção do SCPN, o PROSUB
uma tecnologia para obtenção e enriqueci- ilustra as etapas do ciclo, sendo que a parte
mento isotópico de hexafluoreto de urânio de prospecção, mineração e beneficiamen-
com centrífugas totalmente construídas no to está integralmente a cargo da empresa
Domínio do Ciclo do Desenvolvimento e Construção
Brasil. O enriquecimento deu-se por ultra- Indústrias Nucleares do Brasil – INB, parcei- Combustível Nuclear de Propulsão Nuclear
centrifugação obtida pela exitosa tecnolo- ra da MB no domínio do ciclo do combus-
gia brasileira de levitação magnética, que tível nuclear. Obtenção dos Elementos Construção do LABGENE
Combustíveis e (Protótipo em Terra da Planta
Infraestrutura de Apoio Nuclear Embarcada - PNE
Figura 2. Esquema do ciclo completo do combustível nuclear
desenvolvido pelo PNM e INB

PROGRAMA NUCLEAR DA MARINHA


PROGRAMA
CICLO NUCLEAR
COMPLETO DA MARINHA
DO COMBUSTÍVEL
CICLO COMPLETO
TECNOLODO
G ICOMBUSTÍVEL
A NACIONAL
PROSPECÇÃO, MINERAÇÃO
PROSPECÇÃO, MINERAÇÃO E E TECNOLOGIA NACIONAL Fonte: Indústrias Nucleares do Brasil (INB), Marinha do Brasil (2022)
BENEFICIAMENTO
BENEFICIAMENTO
CONVERSÃO
CONVERSÃO
>> >> O LABGENE será o primeiro reator de Figura 4. Detalhe da unidade
potência projetado e construído no País, demonstrativa de dessalinização via
ENRIQUECIMENTO
ENRIQUECIMENTO um pequeno reator a água pressurizada destilação por membranas do
>>

DEPÓSITO
DEPÓSITO
(PWR), que futuramente poderá ser adap- Laboratório de Tecnologias em
>> SUBMARINO NUCLEAR
tado para utilização dual, de forma modu- Energias Sustentáveis, LATES-IPqM
SUBMARINO NUCLEAR lar, provendo energia e água, via dessalini-
zação, para regiões com baixa quantidade
>>

>>

>>

e/ou baixa qualidade de recursos hídricos.


GERAÇÃO
GERAÇÃO Esse conceito motivou a proposição em
DE ENERGIA
DE ENERGIA
ELÉTRICA
ELÉTRICA >> >> 2016 do projeto DESSAL, envolvendo a
RECONVERSÃO E FABRICAÇÃO
RECONVERSÃO E FABRICAÇÃO CNEN e seus Institutos, a Marinha do Bra-
DO ELEMENTO COMBUSTÍVEL
DO ELEMENTO COMBUSTÍVEL sil, e a UFRJ (Cotta et al., Conexão Nuclear,
2019). As análises realizadas permitiram
Fonte: Marinha do Brasil (2019) estimar, a partir de um reator semelhante
ao LABGENE, gerando 75 MWt, a produ-
A tecnologia de enriquecimento por truindo o protótipo em terra de um reator e ção de mais de 130.000 m3/dia de água
ultracentrifugação empregando levitação de uma planta de propulsão naval, no Labo- dessalinizada, que para um consumo típico
magnética permitiu a construção de nove ratório de Geração de Energia Nucleoelétrica de cerca 110 litros/pessoa.dia, permitiria
cascatas de ultracentrífugas que hoje – LABGENE, desenvolvimento crucial para se atender a mais de 1,2 milhão de pessoas e/
equipam a INB. Há previsão de entrega de chegar à planta nuclear embarcada (PNE), a ou alternativamente outros usos industriais
mais 30 cascatas até 2030, o que possi- ser incorporada ao submarino convencional e agroindustriais. Além das técnicas mais
bilitará fornecer o combustível para todas com propulsão nuclear – SCPN, conforme convencionais de dessalinização, a UFRJ em
nossas usinas nucleares, hoje abastecidas previsto no programa de desenvolvimento colaboração com o Instituto de Pesquisas
apenas parcialmente por combustível pro- do meio (Programa de Construção de Sub- de Marinha e seus parceiros, desenvolvem
duzido no Brasil, e ainda exportá-lo. marinos – PROSUB). A Figura 3 a seguir ilus- processos de destilação por membranas
Em sua outra vertente, o PNM está cons- tra a correlação entre o PNM e o PROSUB. que fazem uso do calor rejeitado, mesmo a Fonte: Marinha do Brasil (2021)

542 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 543


baixas exergias, que podem ser aplicados certificado pela assistência francesa. No mo- Como já mencionado, a MB também cleares no mar, pois estão envolvidas com
tanto à recuperação de calor da propul- mento, o projeto encontra-se em fase de de- colabora com a Comissão Nacional de a produção de combustível nuclear, com a
são nuclear quanto a combustíveis fósseis talhamento, já tendo sido concedidas, pelo Energia Nuclear – CNEN, por intermédio construção de plantas nucleares para pro-
(Lisboa et al., 2021). A Figura 4 ilustra um órgão licenciador naval, uma autorização e do IPEN, no projeto do Reator Multipropó- pulsão naval e com a construção de rea-
protótipo de dessalinizador de destilação uma licença parcial para construção do meio. sito Brasileiro – RMB, destinado a produzir tores de pesquisa e produção de radioisó-
com membranas construído e instalado O Acordo com a França previu também radioisótopos e radiofármacos. topos que contribuirão para desenvolver
no Laboratório de Tecnologias em Ener- a construção de quatro submarinos com Todas as iniciativas do PNM acabam materiais de utilização direta ou indireta
gias Sustentáveis, LATES, do IPqM, com propulsão diesel elétrica, dois dos quais já por incrementar o uso de tecnologias nu- em aplicações marítimas.
apoio financeiro do Programa PROCAD- estão no mar, enquanto os dois restantes
-Defesa da CAPES. estão em fase adiantada de construção. 6. Considerações finais
Para enfrentar o desafio de construir um Para tanto, foram criadas a Unidade de Fa-
casco de submarino capaz de receber um bricação de Estruturas Metálicas – UFEM e Em 2017, a ONU proclamou a Década sobre Mudanças Climáticas (COP26) termi-
reator nuclear, a MB optou por absorver Estaleiros de Construção – ESC e de Manu- da Ciência Oceânica para o Desenvolvi- nou em 12/11/21, mas desde então desta-
tecnologia estrangeira para a parte não nu- tenção – ESM, em Itaguaí, cuja evolução mento Sustentável, com diversos eventos ca-se a energia nuclear como central para
clear do SCPN (a transferência de tecnologia no tempo aparece na Figura 5 a seguir. Na e iniciativas a se realizarem entre 2021 e combater a crise climática. As fontes mais
de construção do casco não incluiu a planta área do Complexo Naval de Itaguaí, que 2030. Um dos focos dessa iniciativa é au- seguras para nós hoje são as mesmas que
de propulsão nuclear), por meio de Acordo abriga uma base naval, além dos estalei- mentar o conhecimento sobre o oceano e têm o menor impacto no clima, ou seja,
e Parceria Estratégica com a França, iniciado ros, haverá um Complexo de Manutenção suas oportunidades, já que apenas 5% do nuclear, eólica e solar.
em 2008, o qual deu origem ao já mencio- Especializada – CME, destinado especifica- solo dos oceanos foi mapeado em alta re- A energia nuclear ainda representa uma
nado PROSUB. O projeto básico do SCPN mente à manutenção e eventuais trocas de solução até hoje e estima-se que mais de 1 parcela relativamente pequena do con-
foi finalizado em janeiro de 2017 e depois combustível nuclear do SCPN. milhão de espécies marinhas permanecem sumo global de energia – cerca de 10%
desconhecidas. Busca-se um oceano pro- da energia primária mundial – mas tem o
Figura 5. Evolução da implantação da Unidade de Fabricação de dutivo e sustentável, com informação con- maior fator de capacidade em compara-
Estruturas Metálicas (UFEM) em Itaguaí, RJ fiável para a sociedade sobre as condições ção a todas as demais fontes de energia.
atuais e futuras de sua exploração como A energia nuclear para propulsão marítima
fonte de alimentos e riquezas. surge como possibilidade atraente, passível
Tecnologias nucleares oferecem boas de viabilizar-se economicamente, tanto pe-
perspectivas de aplicação no mar, inclu- los avanços tecnológicos quanto pelos cus-
sive para seu monitoramento e proteção. tos cada vez mais altos que serão impostos
Na realidade, o conhecimento sobre essas às energias poluentes.
tecnologias, tão necessárias para a Econo- O estabelecimento e a consolidação
mia Azul, está em franco desenvolvimento da opção nuclear no transporte mercante
e próximo de ser mais efetivamente utiliza- marítimo dinamizará a indústria de cons-
do. Pequenos reatores modulares e micror- trução naval e poderá eventualmente re-
reatores oferecerão, muito em breve, novas duzir custos no comércio marítimo. Para
opções de uso no ambiente marítimo. tanto, deve-se dedicar especial atenção
Na medida em que questões ambien- à segurança nuclear naval e à sua ampla
tais tornam-se a cada dia mais relevantes, divulgação na sociedade, convencendo-a
a necessidade de mitigar as emissões de de que é possível compatibilizá-la com a
gases de efeito estufa advindas da queima proteção efetiva de tripulações, meio am-
de combustíveis fósseis aponta, forçosa- biente e público em geral.
mente, para a busca por outras opções de A opinião pública sobre a energia nu-
Fonte: Marinha do Brasil (2018)
energia. A Conferência das Nações Unidas clear tende a ser negativa, mas os números

544 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 545


apontam ser uma das fontes de geração no convencional com propulsão nuclear, em Dessalinização Nuclear. Conexão Nu- (DCMD) Module for Waste Heat Recov-
de energia mais seguras. A energia nucle- a possibilidade de utilização de propulsão clear, ABDAN, Vol. 1, n.1, p.19, 2019. ery. Appl. Thermal Eng., V. 182, p.
ar salvou e salva vidas diariamente deslo- nuclear em graneleiros e outros navios Disponível em: www.abdan.org.br. 1-14, 2021. DOI: 10.1016/j.applther-
cando os combustíveis fósseis e gerando mercantes de grande porte, a instalação IAEA. Nuclear Technology Review 2020. maleng.2020.116063.
radioisótopos para diagnóstico e tratamen- de reatores modulares em áreas costeiras IAEA. NUTEC Plastics. Disponível em: NATIONAL SHIPBUILDING RESEARCH
tos médicos para várias enfermidades. e ilhas oceânicas, a cogeração de eletrici- https://www.iaea.org/services/key-pro- PROGRAM – NSRP. History of NSRP,
A nova geração de reatores, mais versá- dade, hidrogênio e dessalinização com pe- grammes/nutec-plastics. MARITECH and ASE. Disponível em:
til e segura, poderá ser usada no ambiente quenos reatores, o emprego de microrrea- IAEA; OCDE. International Conference https://www.nsrp.org/wp-content/up-
marítimo para dessalinização e produção tores na produção de petróleo e gás, o uso on Climate Change and the Role of loads/2015/06/NSRP-History.pdf
de hidrogênio, por meio de ciclos termo- de técnicas nucleares na indústria da pesca Nuclear Power, 2019. OCDE. Energy Technology Perspectives
dinâmicos de cogeração que otimizem o e aquicultura são exemplos de aplicação LISBOA, K. M.; MORAES, D. B.; COTTA, C. 2020, 2019.
aproveitamento de energia. Isso tanto po- dessas tecnologias que poderão contribuir P. N.; COTTA, R. M. Analysis of the Mem- WORLD NUCLEAR ASSOCIATION – WNA.
derá ser feito em embarcações como em para a mitigação de mudanças climáticas e brane Effects on the Energy Efficiency of a Nuclear-Powered Ships. Disponível em:
áreas costeiras ou insulares, remotas ou para o bem-estar geral da população. Direct Contact Membrane Distillation https://world-nuclear.org.
de difícil acesso. Certamente, com avan- Considerando que a Amazônia
ços tecnológicos que já apontam no ho- Azul é uma extensão de 5,7 milhões de qui-
rizonte, novas aplicações de tecnologias lômetros quadrados, por onde passam 95
nucleares no mar surgirão e serão sub- % do comércio marítimo do País, 10% do
metidas a análises quanto à sua eficiência comércio marítimo global e 99% das co-
e efetividade. Para isso, é preciso manter municações por cabos submarinos, região
uma atitude aberta e receptiva às novida- que detém 90% das reservas de petróleo
des que permita avaliações científico-tec- e 70% das de gás e grande riqueza em
nológicas e econômicas isentas e atentas recursos minerais e biodiversidade, é fun-
ao bem-estar da sociedade. damental preservá-la, protegê-la e explorar
No Brasil, com suas grandes reservas de suas riquezas de maneira sustentável. Por
urânio, domínio do ciclo do combustível tudo o que já foi discutido neste capítulo,
nuclear e eventuais progressos no desafio as tecnologias nucleares têm muito a con-
de construir modernos reatores modula- tribuir para que essa imensa região conti-
res, a opção nuclear para o mar parece ser nue a ser patrimônio valioso e portador de
particularmente interessante. O submari- futuro para os brasileiros.

Referências

CAMARGO, G. O Fogo dos Deuses – Nuclear Submarina. ABCM Engenharia,


Uma História da Energia Nuclear. Rio de Vol. 23, n.1, p. 29-37, 2020. Disponível
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Perspectivas na Geração Elétrica Reatores Modulares (SMRs): Perspectivas

546 ECONOMIA AZUL Tecnologias Nucleares para o Mar 547


26

NOVA ORGANIZAÇÃO SOCIAL PARA O MAR

Segen Farid Estefen


Janice Romaguera Trotte-Duhá
Jailson Bittencourt de Andrade
Moacyr Cunha de Araújo Filho

1. Introdução

O presente trabalho propõe-se a apre- entidade privada sem fins lucrativos, para
sentar informações preliminares sobre as apoio à gestão da pesquisa marinha, nos
ações empreendidas pelo Ministério da níveis tático e operacional”, cuja demanda,
Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) expressa por instituições com interesse na
e demais instituições com interesse na pesquisa oceânica, data de alguns anos.
pesquisa oceânica, em prol da qualifica- A OS é um modelo de organização pú-
ção de uma Organização Social (OS), cuja blica não estatal, destinada a absorver ati-
missão será a de promover as ciências do vidades publicizáveis mediante qualificação
mar de forma integrada e transdiscipli- específica. Trata-se de uma forma de pro-
nar, permitindo o enfretamento dos de- priedade pública não estatal, constituída
safios nacionais nessa área, em distintas pelas associações civis sem fins lucrativos,
escalas, bem como provendo o embasa- que não são propriedade de nenhum indi-
mento técnico para a implementação de víduo ou grupo, mas estão orientadas ao
políticas públicas que beneficiem a socie- atendimento do interesse público. O Con-
dade brasileira e a ampliação do papel do trato de Gestão (CG) é o instrumento que
Brasil no cenário internacional em prol de regula as ações de uma OS.
um oceano sustentável. Cabe ressaltar algumas características
A proposta de criação de uma OS para básicas de uma OS, que garantem a trans-
o mar encontra-se fundamentada no Pro- parência na execução dos contratos, a exce-
grama Ciência no Mar (Portaria MCTI no. lência e a economicidade na aplicação dos
4.719/2021), que preconiza a “viabilização recursos públicos, em modelo de contrata-
da qualificação de uma organização social, ção entre uma entidade sem fins lucrativos

548
548 ECONOMIA AZUL
A ECONOMIA AZUL Nova
Nova Organização
Organização Social
Social para
para o
o Mar 549
Mar 549
e o Governo, avaliado por gestores públicos car alternativas fundamentadas no setor A ausência de uma instituição nacio- Ministério da Economia (ME), foram esta-
como opção eficiente para projetos que privado e que promovam o fortalecimento nal, com fins operacionais, de execução, belecidas as bases para uma ação articula-
precisam ser executados de forma susten- do Sistema Nacional de C,T&I no Brasil. facilitação e promoção das atividades pre- da entre o Governo, a comunidade cien-
tável, em prol da melhoria dos serviços do O que se espera, como “efeito de- conizadas pelos principais programas e tífica, bem como futuras conexões com a
Estado. Importante ressaltar que é vedada sejado”, ademais do amplo apoio que planos de ação nacionais, tornam muito iniciativa privada, para o estabelecimento
a qualificação de OS para desenvolvimento a OS para o mar já angaria de parte tênues o alcance de tais políticas nacionais de uma OS para o mar, vocacionada para
de atividades exclusivas de Estado. da comunidade cientifica no País, é o e planos decorrentes. subsidiar ações de expressão das políticas
O alinhamento de instituições com alinhamento da pesquisa com a infraes- Empresas estatais poderão ter poten- públicas nacionais, nas áreas afetas aos
elevada representatividade nacional, tais trutura operacional e administrativa, cial interesse no nicho de atuação da OS, oceanos. A publicação da Portaria Inter-
como a Academia Brasileira de Ciências bem como o desenvolvimento de novas como EMBRAPA e CPRM, da mesma forma ministerial ME/MCTI no. 2.828, de 9 de
(ABC) e a Sociedade Brasileira para o Pro- tecnologias, em parceria com a iniciativa que empresas de economia mista e priva- março de 2021, autorizou o processo de
gresso da Ciência (SBPC), completam o privada, que permitam a geração de co- das, tais como Petrobras, Vale, Shell, Total publicização da OS-INMAR.
regime de colaboração entre os entes na- nhecimento sobre os oceanos, com vistas Energies, Equinor, Neoenergia e Engie, en- A criação da OS-INMAR decorreu de per-
cionais, com vistas à promoção do desen- a atender às demandas do Poder Público, tre outras, ademais de empresas de menor severantes esforços do MCTI, com apoio de
volvimento científico e tecnológico no País, da sociedade e do setor privado. porte, vocacionadas para a área de inova- diversas instituições, entre muitas: Acade-
congregando assim os setores federal, as Assim, o objetivo principal do presente ção em oceanos e energias renováveis, que mia Brasileira de Ciências, Marinha do Brasil
instituições de pesquisa, o setor empresa- artigo é o de avaliar os potenciais impactos podem gerar expressivo desenvolvimento (MB), Sociedade Brasileira para o Progresso
rial e outros setores locais envolvidos, em que a implementação da OS para o mar econômico e social em âmbito nacional. da Ciência (SBPC), Conselho Nacional das
pleno respeito aos critérios do interesse pú- (cuja sinonímia pode ser encontrada ao lon- A Academia Brasileira de Ciências Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa
blico atinentes às ciências do mar. go do texto como OS-INMAR, ou OS-INPO) (ABC), ao endossar a Década da Ciência (CONFAP) e Conselho Nacional de Desen-
A pesquisa oceânica é atrativa para di- poderá exercer, para a governança brasileira Oceânica, reconhece as dificuldades que volvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
ferentes setores econômicos, possibilitan- nas atividades de pesquisa oceânica, tendo afetam a capacidade do Brasil em contri- Por iniciativa do MCTI, a MB participou, por
do a venda de serviços, de informações e em vista o contexto geopolítico do Oceano buir com a ciência oceânica, em nível glo- meio da então Secretaria de Ciência e Tec-
de dados. Entretanto, não gera um modelo Atlântico e o seu entorno estratégico, bem bal. Entretanto, ressalta que o país tem o nologia da Marinha (hoje, Diretoria-Geral
de negócio ancorado em lucro, mas sim na como a sua relevância, para o desenvolvi- potencial de promover mudanças para al- de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico
produção de conhecimento. É preciso bus- mento econômico e social do País. cançar os resultados esperados frente aos da Marinha, DGDNTM), de reunião realiza-
desafios propostos pela Década, mediante da em 16 de novembro de 2016, cuja Ata
2. Considerações iniciais ações relevantes a serem apoiadas, como é indica a intenção do órgão em apoiar a cria-
o caso da OS para o mar (ABC, 2021). ção da OS para o Mar.
O Brasil possui instituições e especia- MCTI, na promulgação de políticas públi- O Decreto n. 9.190, de 1º de novembro Desde a estrutura administrativa ini-
listas em ciências do mar reconhecidos in- cas marinhas, nas quais a ciência oceâni- de 2017, impôs a necessidade de chama- cial até a contratação de equipe responsá-
ternacionalmente. Entretanto, a influência ca exerça papel central, como é o caso da mento público para se dar início à implan- vel pelos projetos, a OS está alicerçada na
das ciências oceânicas e a grande impor- Política Nacional para os Recursos do Mar tação de uma OS para o mar. Cumprido o meritocracia. No seu CG, cada etapa do
tância dos espaços marinhos brasileiros nos (PNRM) e os seus Planos e Programas Seto- disposto no Artigo 6º do referido Decreto, projeto é acompanhada pelo Conselho de
aspectos socioeconômicos nacionais, bem riais (PSRM); o Programa Ciência no Mar; o processo de qualificação de entidade pri- Administração, formado por profissionais
como na geopolítica internacional, ainda o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e vada sem fins lucrativos compreendeu uma voluntários designados por órgãos de Go-
se fazem restritos, revelando grande con- Inovação para Oceanos; bem como o Plano fase de publicização e seleção de entidade, verno e da sociedade civil. A equipe de pro-
traste com a imensa área geográfica que Nacional da Década da Ciência Oceânica que precede a fase de publicação do ato de fissionais da OS é contratada pelo regime
a zona econômica exclusiva, a Amazônia no Brasil, no qual se projeta a promoção da qualificação e a celebração de um Contrato de CLT. Relatórios periódicos são avaliados e
Azul, encerra para o País. ciência como base para a tomada de deci- de Gestão, cuja expectativa é a de ser fir- aprovados pelo referido Conselho.
Esforços são continuamente exercidos são e desenvolvimento de ações coordena- mado ainda em 2022. O fomento à ciência, tecnologia e ino-
pela Comissão Interministerial para os das, que venham a transformar o oceano Após um amplo estudo de viabilidade vação em ciência oceânica no país ainda é
Recursos do Mar (CIRM), bem como pelo que temos no oceano que queremos. realizado pelo MCTI, com o concurso do predominantemente de natureza pública,

550 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 551


embora alguns poucos projetos de pesqui- Acordo de Belém, a Agenda 2030 das Na-
sa e desenvolvimento estejam sendo exe- ções Unidas para o Desenvolvimento Sus- Figura 1. Composição do Quadro Científico (QC) associado
cutados em parceria com a iniciativa priva- tentável, com seus Objetivos de Desenvol-
da, como é o desejo. São essas ações que vimento Sustentável (ODS) e a Década das Bolsa de Produtividade
1. Oceanografia Física e Oceanografia por Satélites Bolsa de Produtividade
em Pesquisa CNPQ
merecem ser mais bem exploradas e am- Nações Unidas da Ciência Oceânica para o em Pesquisa CNPQ
2. Oceanografia Química, Interação
plificadas, garantindo impacto positivo no Desenvolvimento Sustentável (2021-2030).
provisionamento de respostas oferecidas Cabe ressaltar o papel que vem sendo Oceano-Continente e Poluição Marinha
pela ciência ao conjunto sociedade-eco- exercido pela Comissão Técnico-Cientifica 3. Oceanografia Biológica
nomia nacional, e em cenário de reduzidas para o Assessoramento e Apoio das Ativi-
disparidades regionais. dades de Monitoramento e a Neutraliza- 4. Oceanografia Geológica 20%
Severas limitações na disponibilidade ção dos Impactos Decorrentes da Poluição 5. Interação Oceano-Atmosfera, Mudanças
65%
de infraestrutura de pesquisa oceânica im- Marinha por Óleo e outros Poluentes – a Climáticas e Modelagem do Sistema Terrestre 5% PQ 1A
pactam diretamente os esforços nacionais ComTecPolÓleo, instituída pela Portaria
24%
em ampliar o papel do país como uma lide- no. 313/MB, de 26 de outubro de 2020, 6. Pesca e Agricultura
rança científica no Atlântico Sul e Tropical. cujo Artigo 3º, inciso V, preconiza a parti- 7. Engenharia Costeira, Naval e Submarina 10%
Parte desse cenário se dá pela ausência de cipação da MB, por meio dos trabalhos a
estratégias que garantam investimentos serem exercidos pela ComTecPolÓleo, nas 8. Robótica, IA e Instrumentação Oceanográfica
sólidos e contínuos para o desenvolvimen- etapas estruturantes para a implantação 9. Energia Renovável dos Oceanos
to científico e tecnológico do Brasil na área da OS-INMAR, especificamente, na ques-
10. Biotecnologia PQ 1
de ciências do mar (PINHO et al., 2021). tão da poluição marinha por derramamen-
PQ 2
Em especial, limitações na capacidade e in- to de óleo e outros poluentes (plásticos, 11. Biodiversidade Marinha e Costeira
SR
fraestrutura de pesquisa oceânica impõem p.ex.) na Amazônia Azul. Dessa forma, o
12. Ciências Humanas e Sociais SB
restrições a essas ações e impactam direta- Brasil, por meio da OS-INMAR, também Fonte: elaborado pelos autores
mente os esforços nacionais em ampliar o passa a dispor de capacidade específica
papel do país como liderança científica no para o apoio e assessoramento no cum- 1ª Fase do Edital de Chamamento Público mandas do poder público, da sociedade e
Atlântico Sul, bem como no atendimento primento das atividades previstas para a n. 31/2021, para a seleção da entidade a do setor privado. Essa ação sinérgica e de
a compromissos multilaterais firmados Autoridade Marítima (MB), com destaque ser qualificada como Organização Social articulação dos diversos atores permitirá
(TURRA et al., 2021), onde se destacam o à preservação ambiental. responsável por apoiar, difundir e integrar também o fomento à indústria nacional,
a pesquisa oceânica brasileira. Todos os estimulará a inovação e ampliará o prota-
3. O processo de qualificação da OS para o mar – situação atual trâmites vêm sendo conduzidos pelo MCTI, gonismo brasileiro nessa área científica, em
estritamente dentro do preconizado por níveis nacional e internacional, gerando
O processo de implementação da OS- ações de longa duração, como o provi- lei, e sem quaisquer interveniências admi- forte impacto positivo sobre a economia e
-INMAR segue o seu curso, após a defi- sionamento da infraestrutura de pesquisa nistrativas de outros setores, em processo o bem-estar social.
nição da proposta vencedora do certame oceânica, o monitoramento e a vigilância transparente e acessível por todos. A proposta vencedora está apoiada na
público realizado, e que descreve arranjos permanente sobre a Amazônia Azul, bem A proposta da Associação Instituto capacidade técnica de um quadro cientí-
inovadores para a área de execução e de como uma eficiente curadoria de dados Nacional de Pesquisas Oceânicas (INPO), fico formado por 85 pesquisadores em 12
financiamento de suas principais ações a que nela são coletados. doravante denominada OS-INPO, é de diferentes áreas (Figura 1) e uma Rede de
serem implementadas. Detalhes serão des- Em publicação feita no Diário Oficial da ser uma organização que abranja apoio Pesquisa, Inovação e Infraestrutura (RPII),
critos abaixo, a título de subsídio sobre as União datado de 20 de abril de 2022, o Mi- à pesquisa e ao desenvolvimento de tec- que reúne 24 universidades, 9 Institutos
iniciativas que se pretende implementar, de nistro de Estado da Ciência, Tecnologia e nologia, por meio de infraestrutura ade- Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs),
expressiva importância para o desenvolvi- Inovações, Marcos Cesar Pontes, anunciou quada operacional e administrativamente, vários programas de pesquisa, sociedades
mento nacional, focando sempre no com- a Associação Instituto Nacional de Pesqui- que permita a expansão do conhecimento técnico-científicas e empresas privadas
bate à volatilidade e à descontinuidade de sas Oceânicas (INPO) como a vencedora da sobre os oceanos com vistas a atender de- (Figura 2).

552 ECONOMIA AZUL Nova


Nova Organização
Organização Social
Social para
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Mar 553
sobretudo para programas globais, para devendo pautar-se por uma análise crítica
Figura 2. Rede de Pesquisa Inovação e Infraestrutura (RPII) que se cumpram as metas de destaque. da literatura, cujas discussões estarão nor-
A OS vencedora da 1ª Fase do certame teadas por vários documentos, citando-se
apresentou um Plano de Trabalho robusto, apenas alguns, como exemplos: relatórios
abordando os elementos relacionados aos dos Workshops da Década do Oceano no
impactos esperados junto à sociedade ci- Brasil (MCTI, 2021), as Avaliações Globais do
vil em escalas a curto, médio e longo pra- Oceano (ONU, 2017; 2021), os relatórios do
zos, ademais da identificação de potenciais Global Environmental Outlook do Programa
clientes, estrutura de governança adminis- das Nações Unidas para o Meio Ambiente
trativa e estrutura técnico-científica. (UNEP/GEO, 2021), os documentos do High
O Plano de Trabalho se alicerça nos 9 Level Panel for a Sustainable Ocean Economy
(nove) objetivos estratégicos, abaixo ex- (Ocean Panel, 2021), os relatórios da Inter-
plicitados, que foram estruturados de for- governmental Science-Policy Platform on
ma totalmente aderente ao Edital MCTI n. Biodiversity and Ecosystem Services (IPBES,
31/2021, onde se destacam as estratégias de 2021) e do Intergovernmental Panel on Cli-
atuação, os indicadores e as metas propostas mate Change (IPCC, 2019; 2021), os rela-
para cumprir com os desafios apresentados: tórios Globais sobre Ciência Oceânica (IOC/
UNESCO 2017; 2020a), o Macrodiagnóstico
4.1. Objetivo 1
da Zona Costeira Brasileira (MMA, 2008),
Expandir a base do conhecimento os Relatórios de Qualidade Ambiental ela-
sobre os oceanos, com ênfase para o borados periodicamente pelo MMA (MMA,
Atlântico Sul e Tropical, a fim de redu- 2020) e as metas do Plano Setorial para os
Fonte: elaborado pelos autores
zir a vulnerabilidade econômica e social Recursos do Mar (Brasil, 2020). Somam-se
no Brasil, decorrentes de eventos extre- a esse arcabouço de informações as análi-
4. Objetivos estratégicos e produtos esperados da OS para o mar a ser mos e dos impactos da variabilidade do ses estratégicas sobre os rumos da ciência
qualificada clima e da ação antrópica no mar. oceânica no Brasil e no mundo, como con-
Para que a OS-INPO possa cumprir com tribuições do Instituto Nacional de Ciência e
O planejamento estratégico para a pactuados, alicerçados por um cronograma a sua missão e contribuir com a elabora- Tecnologia para Mudanças Climáticas para
OS-INPO deverá focar em ações que con- de desembolso financeiro das contra-obri- ção de conhecimento sobre problemas zonas costeira e oceano (Nobre & Marengo,
ciliem metas de desenvolvimento econô- gações da União, em rigoroso mecanismo nacionais prementes, é essencial que se 2017), os Community White Papers deriva-
mico e de minimização às desigualdades de avaliação dos resultados atingidos e os realize um diagnóstico das necessidades e dos da OceanObs19 (OceanObs19, 2020), o
sociais, nos espaços naturais a serem con- efeitos desejados alcançados. lacunas identificadas, bem como a criação Projeto de Ciência para o Brasil, elaborado
templados, sistematizando e compatibi- As OS trabalham com Ação Orçamentá- e priorização de uma “agenda científica” a pela Academia Brasileira de Ciências, com
lizando projetos com objetivos e metas ria (AO) específica, denominada Manuten- direcionar os esforços e as atividades-meio destaque para os temas de Oceano, Biodi-
bem delineados, otimizando aqueles me- ção de Contratos de Gestão das Organiza- a serem empreendidas. Essa agenda cien- versidade e Mudanças Climáticas (Silva &
diante os quais serão gerados os produtos ções Sociais (212H), por força legislativa. tífica, denominada Diagnóstico Nacional Tundisi, 2018), o volume especial da revis-
esperados pelo planejamento. Haverá necessidade de que as instituições sobre o Oceano, requererá a integração e ta Ciência e Cultura sobre Oceano (SBPC,
Todas as atividades da OS serão regi- participantes do CG operacionalizem conta a discussão com órgãos governamentais fe- 2021), a Declaração da Academia Brasilei-
das por um Contrato de Gestão, firmado orçamentária específica. derais (ex. MCTI, MMA, Marinha do Brasil, ra de Ciências sobre a Década da Ciência
pelo MCTI junto à entidade vencedora do Adicionalmente ao orçamento da União CIRM), estaduais (ex. Secretarias de Desen- Oceânica para o Desenvolvimento Susten-
certame, no qual estarão discriminadas as que se faz previsto, serão imprescindíveis a volvimento Econômico, Secretarias de Meio tável (ABC, 2021) e o Diagnóstico Mari-
atividades, os serviços, as metas e os obje- promoção e a ativa captação de recursos de Ambiente) e municipais, com a iniciativa nho-Costeiro da Plataforma Brasileira sobre
tivos a serem alcançados, em prazos bem fontes privadas, bem como internacionais, privada, com o terceiro setor e a academia, Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos

554 ECONOMIA
554 ECONOMIA AZUL
AZUL Nova Organização Social para o Mar 555
(BPBES, 2021), que está em construção, aspectos referentes aos setores da pesca e um importante desafio para o sucesso da serviços básicos de calibração, manuten-
bem como inúmeros textos científicos que da aquicultura marinha, objetivando maior futura OS. Esse gerenciamento será feito em ção e certificação de equipamentos. Alia-
ponderam sobre a temática (ex. CEMBRA, segurança nos investimentos dos respecti- conjunto com as instituições proprietárias/ do a isso, há necessidade de que o desen-
2012; Turra & Denadai, 2016; Turra et al., vos setores e a geração de emprego e ren- gestoras das infraestruturas, inclusive embar- volvimento científico e tecnológico, om-
2013; Claudet et al., 2020; Lana & Castel- da no médio e longo prazo. cações, respeitando suas políticas internas e breado com as inovações, impliquem na
lo, 2020; Franz et al., 2021). Grande parte prioridades de uso, mas será um importan- melhoria do acesso e à gestão de dados
4.3. Objetivo 3
desses documentos contou com a lideran- te facilitador de atividades de manutenção e usando os princípios FAIR, sigla em inglês
ça e/ou participação dos pesquisadores que Apoiar a manutenção, ampliação e uso de embarcações, incluindo o Programa que indica que os dados devem ser facil-
construíram e apoiaram a proposta apre- modernização da infraestrutura nacio- de Experiência Embarcada do Programa de mente descobertos, acessíveis, interope-
sentada para a OS-INPO. nal, laboratorial e embarcada, em apoio Formação em Recursos Humanos em Ciên- ráveis e reutilizáveis (MONS, 2018). Tanto
Estabelecido o Diagnóstico Nacional às suas atividades, mediante a moderni- cias do Mar (PPGMAR/SECIRM), gerando o desenvolvimento quanto a manutenção
sobre o Oceano, serão especificadas as en- zação e/ou a implantação de laborató- oportunidades de embarque para alunos e a calibração de equipamentos são es-
tregas prioritárias previstas para o primeiro rios, centros de pesquisa, bancos de da- dos cursos nacionais de oceanografia. senciais para a criação de um parque de
ano de atividades da OS-INPO, e de anos dos, preferencialmente em cooperação A OS-INPO propõe-se a implementar instrumentos para uso compartilhado pela
subsequentes, que, funcionando como com instituições públicas ou privadas. uma articulação muito próxima com os co- comunidade científica, conforme preten-
um “hub” e centro de síntese do conhe- Para que a OS-INPO possa cumprir sua mitês gestores das diferentes embarcações dido pelo Objetivo 3 acima descrito.
cimento, em diálogo permanente com os missão, é essencial que uma visão tática e de pesquisa oceanográfica existentes do A OS-INMAR deverá, também, realizar
diferentes setores da sociedade, contribuirá operacional de manutenção, ampliação, País, bem como o acompanhamento das ações coordenadas que visem ao planeja-
para a construção da identidade e reputa- modernização e uso compartilhado e arti- atividades e participação nas reuniões do mento e implementação de um Programa
ção da OS-INPO, em estado de permanente culado da infraestrutura de pesquisa nacio- Comitê Executivo para o Programa GOOS- de Inovação Tecnológica. Esta atuação em
aferição, por meio de Seminários Nacionais nal, a ser construída e bem implementada. -Brasil, sempre que julgado necessário, P,D&I deve abranger o desenvolvimento de
de Integração entre Oceano e Sociedade, Para isso, destaque deve ser dado ao apoio ademais de reuniões com instituições par- sensores, plataformas como ROVs, AUVs,
a alimentar o Planejamento Estratégico da a iniciativas já estruturadas no âmbito da ceiras que integram os principais projetos gliders e drones, métodos e procedimentos
OS-INPO e Plano de Trabalho Plurianual, a oceanografia operacional, tais como aque- e programas de observação oceânica (ex. de coleta de dados, além de metrologia,
serem também definidos no primeiro ano las vinculadas ao Programa GOOS-Brasil, Rede Clima, PELDs e INCTs). materiais e modernas técnicas de medições
de atividade da OS. em que projetos e redes vêm sendo imple- e avaliação de dados, como big data, in-
4.4. Objetivo 4
mentadas, tais como o PIRATA (Prediction teligência artificial (IA) e realidade aumen-
4.2. Objetivo 2
and Research Moored Array in the Atlan- Apoiar a inovação por meio da ar- tada (RA). O apoio ao desenvolvimento de
Apoiar a promoção de estudos, pes- tic), SAMOC (South Atlantic Meridional ticulação da comunidade científica e produtos e processos biotecnológicos e de
quisa e desenvolvimento, inovação e Overturning Circulation) e SIMCOSTA (Sis- tecnológica com o setor privado, bem serviços também será parte desse Progra-
outras atividades de interesse público, tema de Monitoramento da Costa Brasilei- como pelo apoio a novas empresas de ma. Os parques tecnológicos das universi-
nas áreas de sua atuação. ra), dentre outros, e que envolvem a coo- base tecnológica nas áreas de sua atua- dades brasileiras poderão ter uma grande
Com a implementação da agenda cien- peração e a articulação em níveis nacional ção, buscando soluções nacionais aos sinergia para as atividades propostas de
tifica prevista no Objetivo 1 acima, e uma e internacional (como é o caso do PIRATA desafios relacionados aos oceanos. inovação, e serão mapeados e envolvidos
vez identificados os problemas nacionais e do SAMOC). Igualmente, novas redes de A OS-INPO buscará criar um Programa nas discussões. Exemplos de outros seto-
mais prementes, serão aprofundados os es- observação dos oceanos, que servem como de Instrumentação Oceanográfica, como res nacionais de sucesso, como óleo e gás,
tudos e buscadas as atividades de inovação “motores” da Economia Azul (vide Capítulo agente fomentador de ações transversais aeroespacial, fármacos e cosméticos, de-
tecnológica capazes de auxiliar no solucio- 19), deverão ser identificadas e fomentadas. com a iniciativa privada. Essa demanda há vem ser analisados na busca de eficiência e
namento do desafio que é imposto à so- O estabelecimento de um processo eficaz muito domina o cenário das observações aproveitamento de fornecedores nacionais
ciedade brasileira. Como exemplo, citam-se para o compartilhamento de infraestruturas oceânicas no País, em que sensores básicos e internacionais para os sensores e compo-
os aspectos referentes às fontes de energia de pesquisa, assim como do compartilha- para a obtenção de dados oceanográficos nentes a serem utilizados, bem como sobre
renováveis do oceano, o transporte maríti- mento de custos para o uso adequado e a importantes requerem que remessas se- processos que potencializem a produção
mo e as operações portuárias, bem como manutenção dessas instalações, conferem jam feitas ao exterior, para a realização de de moléculas bioativas.

556 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 557


Propostas de Convênios deverão ser técnicas digitais e estatísticas, em particu- parcerias para superar os desafios para o Muitas indagações ainda movem a co-
consolidadas com universidades, institu- lar o conjunto de ferramentas matemáticas avanço da ciência oceanográfica e da en- munidade cientifica engajada nas ativida-
tos de pesquisa, Marinha do Brasil, bem denominado Inteligência Artificial (IA), são genharia oceânica. des de ciências do mar, no que tange ao seu
como instituições voltadas para a inova- empregados. Será necessário o fortaleci- Conforme mencionado anteriormente, a papel transformador e de apoio aos pro-
ção e o empreendedorismo, tais como o mento do BNDO e a consolidação de uma OS-INPO funcionará como um “hub” articu- cessos de governança do mar e o fomento
Instituto Nacional de Propriedade Intelec- política de manutenção, armazenamento, lador e catalisador de iniciativas, mediante a de políticas públicas decorrentes, proces-
tual (INPI), e o Serviço Brasileiro de Apoio controle de qualidade e distribuição de da- construção e o funcionamento de uma rede sos esses que, invariavelmente, se fazem
às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), dos para a sociedade. integrada de instituições colaboradoras, re- imprescindíveis para o desenvolvimento e
respectivamente. Como estratégia para a implantação do presentada nesta proposta como a Rede de a implementação de uma Economia Azul.
A cooperação internacional poderá ser SID-Oceano faz-se importante distinguir a Pesquisa, Inovação e Infraestrutura (RPII), Exemplos internacionais denotam o distan-
relevante para os esforços de capacitação “base de dados”, com sua infraestrutura parte essencial e estruturante de todos os ciamento em que a humanidade ainda se
de profissionais nesse setor. e serviços associados, das “informações e demais objetivos dessa OS (Figura 2). encontra, caso contrário, não seria neces-
previsões”, a serem realizadas a partir da Caberá ao presente objetivo fazer a sário que a Organização das Nações Unidas
4.5. Objetivo 5
mineração de dados e das técnicas de IA gestão das parcerias interinstitucionais, (ONU) declarasse o período de 2021-2030
Instituir mecanismos de informação que propiciam o Data Analytics (IANSITI & considerando-se as diferentes abordagens como a Década da Ciência Oceânica para
e de difusão do conhecimento, bem LAKHANI, 2020). O projeto Blue Cloud, da em tela. Para tanto, a OS-INPO promoverá o Desenvolvimento Sustentável, em prol da
como colaborar para a capacitação União Europeia, é uma iniciativa que me- ações sistemáticas de mapeamento, arti- sustentabilidade e saúde dos oceanos. A
avançada de recursos humanos. lhor exemplifica essa abordagem, confor- culação, formalização, monitoramento e Década do Oceano surge, pois, da neces-
A importância de se gerar e utilizar da- me expressa em seu slogan: Piloting Inno- avaliação das parcerias, processo esse que sidade de se incentivar a pesquisa científica
dos oceanográficos e costeiros nacionais se vative Services for Marine Research & the será fundamental para evidenciar o papel e as inovações tecnológicas voltadas para
respalda na existência, há três décadas, do Blue Economy. transformador da OS-INPO sobre a forma a limpeza, segurança e sustentabilidade
Banco Nacional de Dados Oceanográficos Será preciso também integrar as dis- como se produz ciência oceânica no Brasil, dos oceanos. É também uma oportunidade
(BNDO), operado pela Marinha do Brasil, tintas bases de dados e sistemas de ob- e pautada no diálogo horizontal e transpa- para que o País considere as possibilidades
que visa à sistematização dos dados nacio- servação existentes no País, tais como o rente entre os parceiros. de se criar um novo arranjo institucional,
nais e aqueles coletados por navios estran- Banco Nacional de Dados Oceanográficos em apoio a uma rede integrada de observa-
4.7. Objetivo 7
geiros em Águas Jurisdicionais Brasileiras (BNDO), o Biota Brasil, o Sistema de In- tórios costeiros no Brasil, onde se incluam,
(AJB), em atendimento às recomendações formação sobre a Biodiversidade Brasilei- Apoiar a expansão e consolidação do também, aspectos da biodiversidade mari-
do International Oceanographic Data and ra (SIBBr), bem como aqueles alinhados conhecimento científico e tecnológico nha e da biogeoquímica dos oceanos.
Information Exchange (IODE), no que tan- com bases de dados internacionais, como nacional em oceanos, orientado a so-
4.8. Objetivo 8
ge à participação do Brasil nos programas é o caso do Ocean Biogeographic Infor- luções, com ênfase no Atlântico, e sua
da COI-UNESCO. mation System (OBIS) e os dados gerados consequente contribuição ao desenvol- Promover a ativa captação de recur-
No âmbito da OS-INPO, está prevista a pelas redes de observação vinculadas ao vimento sustentável do País e à concreti- sos de fontes privadas e internacionais.
concepção, implantação e operação de um Programa GOOS. zação do Objetivo de Desenvolvimento Para que a OS-INPO cumpra sua missão,
Sistema de Infraestrutura de Dados Oceâ- Sustentável 14, da ONU e de objetivos é fundamental que a instituição tenha uma
4.6. Objetivo 6
nicos e Costeiros (SID-Oceano), como con- correlatos, e ao alcance dos resultados forte atuação na prospecção e captação de
sequência do avanço tecnológico da última Promover propostas de eficiência na sociais preconizados para a Década da recursos adicionais àqueles disponibiliza-
década, associado às tecnologias digitais integração de ações de diversas institui- Ciência Oceânica para o Desenvolvimen- dos pelo Governo Federal. Esses recursos
para gerenciamento das informações. ções, a fim de potencializar os resulta- to Sustentável (2021-2030). se fazem essenciais para as atividades es-
Serviços ofertados a partir da base de da- dos das iniciativas e dos conhecimentos A OS-INPO terá um papel central e es- truturantes, como: o Diagnóstico Nacional
dos e que possibilitem a tomada de decisão nas áreas das ciências do mar. tratégico para o desenvolvimento de ativi- sobre o Oceano (Objetivo 1); o Sistema de
equivalem a outra vertente de um sistema A atuação da OS-INPO pressupõe a dades associadas à Década do Oceano e da Infraestrutura de Dados Oceânicos e Cos-
de infraestrutura de dados, denominada construção de um processo de articula- Agenda 2030 das Nações Unidas, incluído teiros (Objetivo 3), bem como para as ativi-
Data Analytics, na qual o extensivo uso de ção interinstitucional e de formalização de o cenário pós-2030. dades aplicadas, todas elas a serem regidas

558 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 559


pelo Contrato de Gestão. Esses recursos de forma a identificar e agregar projetos O papel da OS-INPO estará ancorado das, incluindo os estudos de modelagem
adicionais podem ser provenientes de di- de pesquisa, em regime de parcerias, ser- em sólido apoio aos órgãos governamen- numérica com assimilação de observações
ferentes arranjos de fomento (FOA, 2020) vindo como ferramenta para a ampliação tais que atuam em ações de resposta para como circulação de correntes oceânicas em
que serão amparados por parcerias formal- da capacidade de detecção, prevenção de a mitigação de desastres ambientais e, pequena e grande escala, por exemplo, se-
mente realizadas (Objetivo 6). Esforços se- impactos, formulação de “ações de respos- também, em ações preventivas, de cará- rão bem exploradas.
rão direcionados para o planejamento da ta” tempestivas, bem como a mitigação ter inovador, que minimizem os impactos Parcerias com os órgãos responsáveis
captação de recursos financeiros adicionais de danos, na eventualidade de situações previstos. Tais estudos envolvem técnicas na MB pela prevenção de acidentes por
junto a patrocinadores, permanentes e de ameaça ou de desastres ambientais por de modelagem computacional oceanográ- poluição no mar, ademais de Autoridades
pontuais, e agências de fomento nacionais poluição no mar, onde os plásticos também fica e meteorológica, análise integrada de Portuárias, ANTAQ e IBAMA, são previstas
e internacionais. A acreditação em fundos vêm ocupando nicho de atenção e de preo- dados ambientais (ex. oceanográficos, me- de acontecer, em nível tático-operacional.
internacionais, como o Fundo Verde para cupações adicionais no País. Sobre essa últi- teorológicos, biológicos, geológicos, sociais Cabe ressaltar, uma vez mais, que a OS-IN-
o Clima e o Fundo Ambiental Global, será ma forma de poluição hídrica, ressalta-se a e econômicos) e esforços observacionais PO não se encarregará de funções exclusivas
uma estratégia considerada relevante para necessidade de se cumprir a Meta 14.1 dos (aquisição de dados) em ambientes costei- de Estado, mas a essas aportarão conheci-
o financiamento de projetos realizados ou Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ros, estratégias associadas a outros objeti- mento técnico-científico, para a melhoria de
apoiados pela OS-INPO. (ODS-14) de “até 2025, prevenir e reduzir vos da OS. Ações locais e globais conjuga- atividades sob suas responsabilidades.
Adicionalmente, as entidades partici- significativamente a poluição marinha de
pantes da implementação da OS-INPO po- todos os tipos, especialmente a advinda de 5. Governança e estrutura administrativa
derão oferecer contrapartida de pessoal e atividades terrestres”.
de infraestrutura existente. Também deve ser tratada de forma inte- A Governança proposta no Estatuto da assinado pela OS é o MCTI, um dos mem-

.
grada e urgente a questão do lixo no mar Associação Instituto Nacional de Pesquisas bros do CF será indicado pelo MCTI; e
4.9. Objetivo 9
e dos poluentes emergentes, muitos deles Oceânicas (OS-INPO), entidade privada sem Conselho Científico (CC), que será
Apoiar sistemas públicos de gestão de origem terrestre, e com severo impacto fins lucrativos, atendeu aos requisitos neces- constituído de 17 membros, sendo nove
de riscos e prevenção de desastres na- sobre o ambiente marinho, ressaltando-se, sários para que a referida associação fosse indicados pelo Poder Público e ratificados
turais e antrópicos no mar. mais uma vez, a gravidade da presença de qualificada como OS, estando estruturada pelo CA e oito representantes da sociedade
Dentre os objetivos estratégicos estabe- nano, micro e macroplásticos que são se- pelos seguintes Conselhos superiores: civil designados pelo CA, dentre personali-

. Conselho de Administração (CA), ór-


lecidos para a OS-INPO e sua inter-relação guidamente descartados no mar. dades e representantes de instituições dedi-
com o conceito de Economia Azul, este é, Diferentes atividades econômicas pode- cadas às áreas de atuação da OS.
certamente, aquele de maior relevo, para o rão ser impactadas em decorrência de even- gão máximo de orientação e deliberação O quadro de recursos humanos previsto
relacionamento da OS com os sistemas pú- tos extremos, como operações offshore dos da OS, constituído conforme a Lei 9.637 para a OS, conforme o Estudo de Publici-
blicos voltados para a gestão de riscos e a setores de óleo e gás e, em um futuro breve, de 15 de maio de 1998, que estabelece sua zação mencionado no Edital, é no total de
prevenção de desastres naturais ou aqueles da geração eólica. Eventos extremos tam- composição em termos de representativi- 17 profissionais, sendo dois diretores exe-
provocados por atividade humana. bém impactam diretamente a zona costeira, dade de órgãos governamentais, institui- cutivos, cinco de nível superior sênior, cinco
A OS-INPO propiciará o estabelecimento afetando o turismo, a segurança alimentar ções privadas e indivíduos representativos de nível superior intermediário e cinco de

.
de modelos e aprimoramento de protocolos e as atividades econômicas nos centros ur- da comunidade a ser atendida pela OS; nível médio. Considerando a necessidade
voltados para os aspectos mais prementes banos costeiros. O transporte marítimo e as Conselho Fiscal (CF), que será consti- de uma estrutura mínima e eficiente, as ati-
referentes à poluição marinha (detecção, operações portuárias também podem ser tuído de três membros, tendo o objetivo, vidades administrativa-financeiras contarão
monitoramento, mitigação e remediação), impactados e estudos em curso sobre distin- dentre outros previstos no Estatuto, de com a participação de cinco fundações de
sempre de forma coordenada com a Com- tos aspectos marítimos associados a portos opinar sobre os balanços e relatórios de apoio que formalizaram o Acordo de Par-
TecPolÓleo, conforme expresso pela Portaria nacionais podem ser apoiados pela OS-IN- desempenho financeiro e contábil e sobre ceria com a associação INPO, sob a respon-
313/MB, em seu Artigo 3º, Inciso V. PO. No que concerne à segurança alimentar, as operações patrimoniais realizadas, emi- sabilidade direta da Coordenação Adminis-
Sendo assim, a OS-INPO continuará florações de algas nocivas podem impactar tindo pareceres para o Conselho de Admi- trativa-Financeira e Captação da OS.
preconizando e aprimorando mecanismo áreas de maricultura e trazer riscos severos à nistração. Tendo em vista que a autoridade A minuta de Organograma da OS-INPO
de coordenação e articulação inclusivo, biodiversidade e à população humana. supervisora do Contrato de Gestão a ser encontra-se expressa na Figura 3.

560 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 561


inovador que converte resíduos plásticos biente profícuo de interlocução permanen-
Figura 3. Organograma proposto para a Governança da OS-INPO
em hidrogênio, em fase de teste em alguns te entre a ciência e a sociedade.
Conselho países na Europa, deve ser perseguido. Em todos os caminhos de atuação da OS-
Fiscal Vários são os resultados qualitativos es- -INPO, considera-se que a base do conheci-

.
Conselho de
perados, onde se destacam: mento científico nacional estará diretamen-
Administração o aporte de conhecimento científico e te vinculada aos grupos de pesquisa e in-
Conselho Científico tecnológico em áreas prioritárias para a fraestrutura laboratorial das universidades
Diretor-Geral sociedade, tais como prevenção de de- e centros de pesquisa, públicos e privados.
sastres, a partir de monitoramento oce- Em função disso, a considera na sua estra-
Assessoria ânico contínuo de variáveis relevantes, tégia de governança a Rede de Pesquisa,
Comunicação Coordenação de Diretor de Operações
Infraestrurura (Logística,
desenvolvimento sustentável e seguran- Inovação e Infraestrutura (RPII), que inclui
Navios e Lab Embarcados ça alimentar, contribuindo assim para o lideranças científicas, laboratórios especia-
Assessoria Monitoramento Oceânico
Jurídica
avanço da nova fronteira socioeconômi- lizados, INCTs, sociedades técnico-científi-
e Gestão de Riscos
ca: a ECONOMIA AZUL; cas e empresas parceiras que comporão a
.
Coordenação
Administrativa-Financeira a redução de custos operacionais, com massa crítica que atuará em conjunto com
Assessoria de Relações Empreendedorismo e
e Captação
Institucionais e Inovação o aumento da capacidade de atuação co- a OS-INPO em suas ações.
Internacionais ordenada de projetos a serem executados Ressalta-se a necessidade de aprofundar
Capacitação e Cultura simultaneamente, sobretudo em campa- o conhecimento sobre todo o processo que
Rede de Fundações Parceiras Oceânica
nhas oceanográficas, bem como o apoio pautará as ações a serem desenvolvidas
à infraestrutura laboratorial, por meio de pela OS-INPO, quais foram as suas princi-
Comitê gestor do RPII
Quadro Científico uma gestão integrada entre estes projetos pais motivações, quais são os impactos
Rede de Pesquisa, Inovação e Infraestrutura - RPII
e suas demandas de coleta e aquisição de previstos e decorrentes de sua criação para
dados e amostras de múltiplos usos. Den- todos os setores envolvidos com as ciências
Fonte: elaborado pelos autores
tre esses projetos, destaque para aqueles do mar no Brasil, bem como a identificação
6. Perspectivas futuras com a implementação da OS-INPO voltados à proposição de soluções para mi- sobre como será o delineamento de con-
tigação e adaptação das mudanças climáti- tribuições futuras a setores estratégicos no

.
Vislumbra-se, com clareza, o interesse sores. Isso se soma às novas iniciativas de cas, bem como à poluição marinha; País. De antemão, estima-se que a OS-IN-
da OS-INPO no apoio ao setor de Inovação órgãos internacionais, visando a limitação em todo tempo, a indução à INOVAÇÃO, PO terá potencial para a indução de novas
para a pesquisa oceânica, cuja contribuição do aquecimento global a níveis próximos em face às oportunidades identificadas e empresas de base tecnológica (start-ups) e

.
é ainda bastante modesta, na busca por de 1,5 oC. A inserção nacional no esforço oriundas dos recursos oceânicos; e que poderá conduzir ações em cooperação
soluções nacionais aos desafios relaciona- global de descarbonização da economia primordialmente, a criação de um am- com os setores empresariais e a academia.
dos ao Atlântico sul. poderá gerar oportunidades nas ativida-
A importância da interlocução entre ór- des de base tecnológica desenvolvidas no 7. Conclusão
gãos governamentais que regulam as ativi- mar. Nesse contexto, as energias renová-
dades econômicas na zona econômica ex- veis no oceano, incluindo a eólica offshore, Para além da pluralidade de interpreta- Tropical, a fim de reduzir a vulnerabilidade
clusiva e a área científica e tecnológica, de apontam para novas possibilidades na ge- ções e inspirações sobre as incertezas do econômica e social no Brasil, decorrente
forma a subsidiar as decisões e políticas pú- ração elétrica, na produção de hidrogênio futuro e o futuro das incertezas no univer- de eventos extremos e dos impactos da
blicas desses órgãos, é uma das mais impor- verde e na dessalinização da água do mar. so científico das ciências do mar, o que se variabilidade do clima e da ação antró-
tantes externalidades positivas da OS-INPO. Projetos inovadores e de elevado conte- espera das ações que estarão a cargo da pica no mar. Esta nova base de conhe-
A eficiência desse relacionamento poderá údo tecnológico serão fomentados, em OS-INPO, em parceria com os setores de cimento deverá ser capaz de subsidiar e
representar ganhos econômicos e sociais particular, aqueles que se caracterizam inovação existentes no País, é a expansão otimizar a transição de uma Economia
relevantes para o país, com a agregação de como exemplos de economia circular. A da base do conhecimento sobre os oce- do Mar para uma Economia Azul na-
empregos de qualidade em setores promis- possibilidade de se implementar projeto anos, com ênfase para o Atlântico Sul e cional. Para tal, será necessário apoiar

562 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 563


estudos e atividades de pesquisa e desen- mentar que se fazem, há muito, necessárias. Oceanographic Observations: Standards and Acesso em: 5 abr. 2022.
volvimento de interesse público, servindo Uma estratégia de atuação bem conso- Guidance Adopted by an International Part- INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMA-
como mecanismo agregador de projetos em lidada requererá apoio incondicional para a nership. Front. Mar. Sci., v. 6, n. 706, 2019. TE CHANGE. [S. l.]: IPCC, 2021. Disponível
regime de parcerias, capazes de reduzir in- manutenção, a ampliação e a moderniza- CARVALHO, A.B., Economia do mar: con- em: https://www.ipcc.ch/. Acesso em: 5
certezas, prevenir impactos, formular “ações ção da infraestrutura de pesquisa existente ceito, valor e importância para o Brasil. abr. 2022.
de resposta” tempestivas, ademais de im- no País, seja laboratorial, seja embarcada, 2018. Tese (Doutorado em Economia do MONS, B. Data Stewardship for Open
pulsionar a natureza econômica estratégica mediante a modernização e a implantação Desenvolvimento), Pontifícia Universidade Science. Implementing FAIR Principles.
da pesquisa oceânica, com previsão de alto de laboratórios, centros de pesquisa, gerên- Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Chapman and Hall/CRC, 244 p.
impacto no PIB nacional, mediante a geração cia de bases e bancos de dados, preferen- 2018. 185 p. NOBRE, C. A. MARENGO, J. A. Mudanças
CENTRO DE EXCELÊNCIA PARA O MAR climáticas em rede: um olhar interdiscipli-
de conhecimento sobre o oceano Atlântico. cialmente em cooperação com instituições
BRASILEIRO. O Brasil e o Mar no Século nar. São José dos Campos: INCT, 2017. 608p.
É possível antever um robusto engaja- públicas e privadas.
XXI: relatório aos tomadores de decisão do OCEANOBS Community White Papers. [Ho-
mento das instituições vinculadas às pes- Conclui-se, por fim, que a viabilização
país. In: COSTA-FERNANDES, L. F. (Coord.). nolulu]: OCEANOBS, [2020]. Disponível em:
quisas oceânicas, em várias esferas da OS- de tal Instituto, nos níveis estratégico e táti- 2. ed. Niterói: BHMN. https://www.oceanobs19.net/community-
-INPO, com desdobramentos positivos para co-operacional, buscará garantir, em caráter CLAUDET, J. et al. A Roadmap for Using -white-papers/. Acesso em: 5 abr. 2022.
o desenvolvimento nacional e, por conse- mais permanente, o aporte dos recursos fi- the UN Decade of Ocean Science for Sus- PEARLMAN, J. et al. Evolving and Sus-
quência, no fortalecimento do bem comum nanceiros e de pessoal adequados ao pleno tainable Development in Support of Scien- taining Ocean Best Practices and Standards
para os brasileiros e da soberania nacional. apoio às pesquisas oceânicas, para além do ce, Policy, and Action. One Earth, v. 2, n. for the Next Decade. Front. Mar. Sci., v. 6,
A OS-INPO, em vias de qualificação prazo de existência do Programa Ciência no 1, p. 34-42, 2020. n. 277, 2019.
pelo MCTI, alicerçada em princípios de Mar do MCTI, bem como aqueles relacio- EUROPEAN COMISSION. Cost of not PINHO, R. et al. A ciência oceânica no Brasil
eficiência e economia de recursos públi- nados com as atribuições de outras insti- having FAIR research data / Cost-Bene- e desafios transversais para a produção do
cos, conforme preconizado pelo Governo tuições, como os de interesse de setores da fit analysis for FAIR research data, 2018. conhecimento. Ciência e Cultura, v. 73, n.
Federal, é oportuna e conveniente, vindo a comunidade científica e da Autoridade Ma- Disponível em: https://www.ouvrirlas- 2, p. 7-11, 2021.
preencher lacunas existentes, mediante a rítima; sobretudo, os considerados como fa- cience.fr/wp-content/uploads/2019/03/ PORTNER, H. O. et al. (ed.). IPCC Special
conjugação de esforços conduzidos por pro- tores críticos para o processo de superação Cost-Benefit-analysis-for-FAIR-research-da- Report on the Ocean and Cryosphere in
jetos de pesquisa e infraestrutura comple- dos grandes desafios nacionais, nessa área. ta_KI0219023ENN_en.pdf. Acesso em: 5 a Changing Climate. [S. l.]: IPCC, 2019.
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Oceânica para o Desenvolvimento de Pesquisas Oceânicas e Hidroviárias a healthy ocean. [S. l.]: FOA, 2020. 111 p. UNESCO, Global Ocean Science Report
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288552390. Acesso em: 5 abr. 2022. BUSHNELL, M. et al. Quality Assurance of 2021. Diponível em: https://ipbes.net/. -outlook. Acesso em: 5 abr. 2022.

564 ECONOMIA AZUL Nova Organização Social para o Mar 565


SEÇÃO A CONTABILIDADE NACIONAL
AZUL E AS ATIVIDADES DO
4
566 ECONOMIA AZUL
CAPITAL OCEÂNICOO Brasil do Mar e da Costa 567
27

O BRASIL DO MAR E DA COSTA: 2. O litoral do Oceano Atlântico

UMA ABORDAGEM ECONÔMICA O Brasil possui área total de


8.515.767,049 km2, dividido entre 26 esta-
da zona costeira brasileira. São mais de
400 municípios banhados pelas águas
dos mais o Distrito Federal. Destes, com- interiores e Oceano Atlântico; destes,
põem a costa Brasileira 17 estados (63% 280 (5% nacional) são exclusivamente
do Brasil) – na porção leste e pequena par- defrontantes ao mar e alvos do estudo
Andréa Bento Carvalho
cela da região Norte. no presente capítulo. A Tabela 1 apre-
No ano de 2021 o Ministério do Meio senta as regiões, as unidades da federa-
Ambiente (MMA) publicou a listagem atu- ção e a população estimada 1 dos muni-
alizada dos municípios da faixa terrestre cípios defrontantes ao mar.

1. Introdução

Os diferentes usos dos recursos do mar Brasil? Quais são as atividades predomi-
e suas atividades correlatas são importantes nantes? O Modelo Insumo-Produto (MIP)
estratégias para o crescimento e desenvolvi- foi escolhido para atender aos objetivos
mento econômico sustentável das nações. almejados pelo trabalho resultando na Ma-
Para tanto, é necessário a devida identifica- triz Insumo-Produto Brasileira do Mar 2018,
ção da contribuição econômica, por meio doravante denominada MIP Br Mar 2018.
de quantificação de seus usos, e os estudos A crescente demanda pelos recursos
nesta área são uma tendência mundial por costeiros-marinhos impõe a relevância de
diversos motivos, entre eles: (i) aumento identificar o PIB do mar e costeiro como
da procura de recursos ambientais cos- um indicador de contribuição dos usos
teiros para a sobrevivência humana, pro- ofertado pelo recurso natural para a eco-
teção costeira, recreação e climatização; nomia, além de ser um indicador relevan-
(ii) crescimento populacional global e eco- te de crescimento econômico que pode
nômico (pressão sobre todo o ambiente apoiar e direcionar a formulação de políti-
costeiro); (iii) conservação do ecossiste- cas públicas e investimentos.
ma marinho (HEINRICH BÖLL, 2017); (iv) Para isso, o capítulo está dividido em
governança de recursos e usos nas Zonas mais quatro seções, além da introdutória.
Econômicas Exclusivas. A próxima seção apresenta algumas carac-
Assim, no tocante à realidade Brasileira terísticas geográficas e econômicas dos Es-
o presente capítulo intenciona apresentar tados costeiros e municípios defrontantes
um panorama e discutir a contribuição eco- ao mar. A terceira seção apresenta os resul-
nômica do mar e da costa nacional. Logo, tados mensurados e os discute no contexto
as principais perguntas que se pretendem da economia costeira e marinha Brasileira.
responder são: Qual é a contribuição da A quinta e última seção apresenta as consi-
economia relacionada ao mar para o derações finais do trabalho.

568 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL O Brasil do Mar e da Costa 569
Tabela 1 – Região do país, Estado costeiro, quantitativo de municípios defrontantes Gráfico 1 – População estimada total dos municípios de-
ao mar e população total estimada nos anos de 2015, 2018 e 2020 frontantes ao mar, por Estado, nos anos de 2015, 2018 e 2020

Região UF Quantidade População estimada dos municípios


Rio Grande do Sul
de Municípios (2015) (2018) (2020)
Santa Catarina
N Pará 4 500.267 512.780 521.026 Paraná
São Paulo
N Amapá 14 507.506 540.216 561.301
Rio de Janeiro
NE Maranhão 25 1.876.753 1.917.551 1.944.780
Espírito Santo
NE Piauí 4 197.957 199.832 201.051 Bahia

NE Ceará 21 3.854.657 3.943.068 4.002.101 Sergipe


Alagoas
NE Rio Grande do Norte 22 1.235.742 1.266.460 1.285.870
Pernambuco
NE Paraíba 10 1.074.564 1.108.789 1.131.632 Paraíba
NE Pernambuco 14 3.336.631 3.395.402 3.434.967 Rio Grande do Norte
Ceará
NE Alagoas 15 1.245.709 1.269.897 1.286.031
Piauí
NE Sergipe 8 867.480 899.991 920.518 Maranhão
NE Bahia 36 4.536.629 4.624.359 4.680.659 Amapá
Pará
SE Espirito Santo 14 1.960.099 2.058.903 2.123.802
2020 0.000 2.000 4.000 6.000 8.000 10.000 12.000 14.000
SE Rio de Janeiro 25 11.622.644 11.872.146 12.038.696 2018
2015
(milhões)
SE São Paulo 16 2.038.731 2.104.420 2.146.104
Fonte: Elaborado pela autora
S Paraná 6 269.155 277.794 283.378
Todos os municípios apresentaram Outro ponto interessante a ser elenca-
S Santa Catarina 30 1.949.578 2.069.799 2.147.705 aumento populacional, mesmo que dis- do é que 13 estados costeiros apresentam
S Rio Grande do Sul 16 563.245 581.615 592.852 creto, com destaque para os estados do municípios defrontantes ao mar inseridos
Amapá (11%), Santa Catarina (10%) e em regiões metropolitanas (RM) ou aglo-
Total 280 37.639.362 38.645.040 39.304.493 Espírito Santo (8%). Embora não figure merações urbanas (AGL). O IBGE (2020)
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do DataSus (2021) entre os três estados com maior dinâmica preconiza que a finalidade principal de
populacional, o Rio Grande do Sul, em tais recortes espaciais é a identificação
Podemos observar que a maioria dos população Brasileira habite em municípios pesquisa divulgada pelo Instituto Brasilei- das unidades político-administrativas do
municípios defrontantes ao mar estão defrontantes ao mar, além disso verifica-se ro de Geografia e Estatística, apurou que Brasil, as quais se habilitam a tratamento
localizados na região Nordeste (155) se- que entre os anos de 2015 a 2020 o refe- entre os dez municípios que tiveram au- específico em função de suas particulari-
guida da região Sudeste (55). A Tabela 1 rido contingente aumentou 4%. Os esta- mento populacional no período de 2017 dades de planejamento e gestão. Assim,
apresenta também o contingente po- dos do Rio de Janeiro (32%), Bahia (13%) e 2018, sete estão localizados no litoral a Tabela 2 explicita as RM e AGL em que
pulacional estimado, dado que o últi- e Ceará (11%) são os mais populosos, em norte do Estado, destoando de mais de os municípios da economia relacionada
mo Censo Brasileiro ocorreu no ano de contraponto aos estados do Piauí, Paraná dois terços dos municípios que registra- ao mar se encontram em comparação ao
2010. Estima-se que em torno de 17% da e Pará (1%). ram redução populacional. respectivo Estado.

570 ECONOMIA AZUL O Brasil do Mar e da Costa 571


Tabela 3 – Produto Interno Bruto (mil) dos Estados costeiros e de seus respectivos
Tabela 2 – Regiões metropolitanas e aglomerações urbanas municípios defrontantes ao mar e a participação (%) no ano de 2015 e 2018
nos Estados costeiros no ano de 2020
UF Municípios UF Municípios
(%) (%)
Estado
Tipo/Número total Tipo/ Número Participação (2015) (2018)
de municípios de municípios (%)
defrontantes ao mar Pará 130.899.505,12 3.562.161,31 2,7 161.349.602,00 4.227.933,64 2,6
São Paulo 6 RM (168) RM Baixada Santista (9) Amapá 13.861.293,27 9.700.304,05 70,0 16.795.206,67 11.677.241,87 69,5
6,0
Norte 144.760.798,39 13.262.465,36 9,2 178.144.808,67 15.905.175,50 8,9
3 AGL (49) RM Vale do Paraíba e
Maranhão 78.475.993,84 32.123.024,23 40,9 98.179.495,65 40.244.250,12 41,0
Litoral Norte (4)
Piauí 39.149.685,74 2.157.073,49 5,5 50.378.417,56 2.783.483,16 5,5
Rio Grande do Sul 2 RM (48) AGL Litoral Norte (10) 16,4 Ceará 130.629.848,53 77.166.345,85 59,1 155.903.824,75 90.175.759,20 57,8
2 AGL (25) AGL Sul (2) Rio Grande 57.250.866,83 27.185.169,14 47,5 66.969.562,00 31.931.349,55 47,7
Alagoas RM (83) RM Caetés (1) 9,6 do Norte
RM Maceió (5) Paraíba 56.141.890,25 24.391.269,68 43,4 64.373.595,37 26.958.048,08 41,9
RM São Francisco (2) Pernambuco 156.963.667,54 91.240.053,25 58,1 186.351.975,25 106.362.971,00 57,1
Amapá 1 RM (3) RM Macapá (1) 33,0 Alagoas 46.367.210,61 25.240.373,21 54,4 54.413.046,66 28.283.740,21 52,0
Bahia 1 RM (29) RM Salvador (9) 31,0 Sergipe 38.556.530,46 19.964.431,03 51,8 42.017.981,28 21.905.012,56 52,1
Ceará RM (46) RM Fortaleza (9) 19,6 Bahia 245.043.689,66 115.068.100,98 47,0 286.239.541,12 128.807.692,44 45,0
Espirito Santo RM (7) RM Grande Vitória (4) 57,1 Nordeste 848.579.383,46 414.535.840,87 48,9 1.004.827.439,63 477.452.306,31 47,5
Maranhão RM (35) RM Grande São Luiz (6) 17,1 Espirito Santo 120.365.979,91 83.916.524,99 69,7 137.020.054,88 95.197.553,17 69,5
Paraíba RM (159) RM João Pessoa (7) Rio de Janeiro 659.138.951,83 530.563.328,37 80,5 758.859.046,87 614.306.598,24 81,0
6,3
São Paulo 1.939.901.907,12 63.006.198,10 3,2 2.210.561.949,48 76.159.877,14 3,4
RM Vale do Mamanguape (3)
Sudeste 2.719.406.838,87 677.486.051,46 24,9 3.106.441.051,22 785.664.028,55 25,3
Pernambuco RM (14) RM Recife (8) 57,1
Paraná 376.962.821,63 9.523.337,73 2,5 440.029.402,86 14.408.915,00 3,3
Rio de Janeiro 1 RM (22) RM Rio de Janeiro (9) 40,9 Santa Catarina 249.079.642,28 80.950.176,79 32,5 298.227.090,04 100.519.499,29 33,7
Rio Grande do Norte RM (15) RM Natal (6) 40,0 Rio Grande
Santa Catarina RM (295) RM Carbonífera (5) 5,8 do Sul 381.992.601,12 15.196.744,87 4,0 457.293.957,59 21.017.754,19 4,6
RM Foz do Rio Itajaí (8) Sul 1.008.035.065,03 105.670.259,39 10,5 1.195.550.450,48 135.946.168,47 11,4
RM Florianópolis (6) Total 4.720.782.085,75 1.210.954.617,07 25,7 5.484.963.750,00 1.414.967.678,82 25,8
RM Tubarão (3) Fonte: Elaboração própria com base nos dados do IBGE (2020)
RM Norte/Nordeste Catarinense (3)
Total 998 120 12,0 A Tabela 3 mostra o PIB dos Estados RM acima de 30%. As menores participa-
costeiros, dos respectivos municípios de- ções concentram-se no Pará, Paraná e Rio
Fonte: Elaborado pela autora, com base em IBGE (2020) frontantes ao mar e a participação para os Grande do Sul em ambos os anos, embora
anos de 2015 e 2018. No ano de 2018, as caiba destaque para os dois últimos com
maiores participações se concentravam no consideráveis aumentos no PIB agregado
Rio de Janeiro (81%), seguido do Amapá dos municípios defrontantes ao mar.
e Espírito Santo (69,5%) e Ceará (57,8%). Ao observarmos as variações do PIB do
Dos 280 municípios defrontantes ao territórios com múltiplos usos e conflitos em Comparando com o ano de 2015: Rio de ano de 2015 para 2018 dos municípios, nota-
mar, 120 (43%) estão inseridos em RM ou que estão presentes ecossistemas extrema- Janeiro (81%); Amapá (70%) e Espírito -se um leve aumento na região Sul (28,7%)
AGL. Fazer parte de uma RM preconiza a mente frágeis, organizar políticas públicas Santo (69,7%). Registra-se que três (RJ, ES – destaque para os municípios de Santa Ca-
integração de políticas públicas entre os eficazes e que atendam ao maior número e CE) dos quatro estados apontados pos- tarina, seguido da região Norte (19,9%) –,
municípios que as compõem. Considerando de interesses faz-se um desafio a mais. suem a capital litorânea e participações em ênfase para os municípios do Amapá.

572 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL O Brasil do Mar e da Costa 573
3. O Brasil do Mar e da Costa Marinha apresentou maior crescimento jacentes ao Mar (20%). A participação do
percentual no PIB (35%). Uma variação PIB do Mar e da Costa na economia Brasi-
A metodologia utilizada na obtenção a economia do mar (3,0% do PIB nacional menos pronunciada ocorre em relação à leira nos anos de 2015 e 2018 é apresenta-
dos dados da economia do mar e costeira em 2018 ante a 2,6% em 2015); (ii) Adjacen- economia costeira, ou seja, no escopo Ad- do no Gráfico 2.
para o ano de 2018 foi o Modelo Insumo- te ao Mar, relacionado indiretamente com a Gráfico 2 – Participação do PIB do Mar e da Costa na economia nacional – 2015 e 2018
-Produto. No presente caso, apresenta-se a economia do mar, ou seja, pertinente a eco-
segunda MIP Br Mar, uma vez que a pri- nomia costeira2 (em torno de 16,5% do PIB
meira contabilizou os dados referentes ao nacional nos anos pesquisados). Cabe ressal- 2015 2018
ano de 2015. tar que no anexo A encontram-se as ativida-
des do escopo Dimensão Marinha (Tabela
3.1 Produto Interno Bruto do Mar e A.1), que se constituem as mais importantes
da Costa Brasileira desta porção da economia por apresentarem
alta dependência do recurso natural.
Identificou-se um crescimento no in- Para melhor visualização da evolução do
dicador para os anos apontados, embora indicador, a Tabela 4 desagrega em setores.
modesto: Assim, observa-se que: (i) Dimen- Na comparação dos valores entre os Mar Mar
são Marinha, relacionada diretamente com anos de 2015 e 2018, o escopo Dimensão Outros Setores Outros Setores
Fonte: Elaborado pela autora
Tabela 4 - Produto Interno Bruto do Mar
No ano de 2018, a fatia representativa períodos instáveis, conforme ilustra o Grá-
e da Costa Brasileira
das atividades relacionadas direta e indire- fico 3. O PIB nacional apresentou queda
Setor PIB (bilhões) 2015- tamente ao mar registrou 19,5% de par- expressiva em meados do ano de 2014,

2015 % Mar 2018 % Mar 2018 ticipação na economia nacional (0,6 p.p apontando os decréscimos na atividade eco-
acima do ano de 2015). Antes de entrar nômica e mercado de trabalho, elevação da
Recursos Vivos do Mar 10,768 1,0 18,501 1,4 0,72
nas análises propriamente ditas do PIB do inflação e juros nos anos seguintes.
Energia do Mar 16,790 1,5 49,437 3,6 1,94 Mar e a desagregação setorial, é preciso O ano de 2015 foi marcado por uma
Manufaturas do Mar 38,083 3,4 27,298 2,0 -0,28 ressaltar que a economia brasileira atravessa profunda recessão no país; o PIB recuou

Transporte do Mar 9,192 0,8 7,3550 0,5 -0,20


Gráfico 3 – Evolução % do PIB Brasileiro entre os anos de 2010 a 2020
Serviços do Mar 60,305 5,4 82,840 6,1 0,37
10
10
Defesa do Mar 22,342 2,0 26,950 1,9 0,21
8 7,5
7,5
Dimensão Marinha 157,480 14,1 212,381 15,6 0,35
6
Primários Adjacentes ao Mar 23,891 2,1 23,950 1,8 0,00
4
4 4,0

(%)
Variação(%)
Secundários Adjacentes ao Mar 173,472 15,5 191,213 14,0 0,10 3,0
3,0
2 1,8
1,8

Variação
2 1,9
1,9 1,3
1,3
1,4
1,4
Terciários Adjacentes ao Mar 762,717 68,2 937,505 68,7 0,23 0,5
0
0
Adjacentes ao Mar 960,080 85,9 1152,67 84,4 0,20 2010
2010 2011
2011 2012
2012 2013
2013 2014
2014 2015
2015 2016
2016 2017
2017 2018
2018 2019
2019 2020
2020
-2
-2
Total 1117,56 100 1365,05 100 0,22 -3,3
-3,3
-4
-4 -3,5
-3,5 -4,1
-4,1
Participação na economia nacional 18,9 19,4
-6
-6
Fonte: Elaboração com metodologia proposta por Carvalho (2018)
Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados do IBGE (2021)

574 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL O Brasil do Mar e da Costa 575
3,5% em relação ao ano anterior. O com- do Mar 2018 sugere a captação da variação Podemos notar que o padrão setorial setor de turismo e lazer com belas praias
portamento do PIB nos anos de 2017 e negativa citada, pois tem ênfase nas cons- do ano de 2015 se repete parcialmente banhadas pelo Oceano Atlântico.
2018 esboçou discreta evolução positiva, truções relacionadas ao mar, entre outros em 2018. O setor Serviços do Mar conti- Ainda no que diz respeito aos seto-
sugerindo uma recuperação gradual da segmentos econômicos. Em contraste ao nua com pronunciada participação (6,1%) res que tiveram a participação na eco-
economia, que não se sustentou nos anos setor industrial, encontra-se o setor de servi- e crescimento vigoroso no período (37% nomia do mar e costeira intensificada,
seguintes, sendo agravada pela pandemia ços, apontando sucessivos crescimentos nos no período 2015-2018), assim como a vale destacar o setor Energia do Mar
de covid-19 em 2020. segmentos de transportes e atividades imo- concentração (68,7%) nas atividades (de 1,5% para 3,6%) atualmente, rela-
De acordo com os dados oficiais brasilei- biliárias – da mesma forma, acredita-se que terciárias desenvolvidas nas adjacências cionado principalmente aos recursos da
ros, no ano de 2015 o segmento econômi- os resultados exibidos na MIP Br Mar, Ta- do mar (crescimento de 23% no mesmo exploração de petróleo e gás offshore.
co nacional que apresentou crescimento foi bela 4 ano de 2018, estejam captando tais período). Ou seja, a economia relaciona- Na comparação da produção nacional de
o setor agropecuário. De fato, a MIP Br Mar achados, já que os setores Serviços de Mar e da – direta e indiretamente – ao mar está petróleo entre os anos de 2010 e 2020
no ano de 2015 mostrou que a economia do Terciários Adjacentes ao Mar apresentam ro- imbuída por atividades de turismo, outras os valores apresentaram crescimento de
mar e costeira era comparável ao setor agro- bustas participações, assim como variações categorias de transporte, alojamentos e 43,5% – 1.076,0 ante a 749,9 mil barris
pecuário brasileiro (responsável por quase positivas no período analisado. alimentação, entre outras. (Gráfico 5). Ao observarmos a produção
20% do PIB nacional) com atores incorpora- Embora não muito expressivo, o au- Carvalho (2018) aponta que o setor de nacional entre os anos de 2015 e 2018,
dos a jusante e a montante de suas cadeias mento na participação das atividades rela- turismo é muito desenvolvido no Brasil, a nota-se crescimento de 6,1% – 944,1
produtivas (CARVALHO; MORAES, 2021). cionadas ao mar no PIB nacional é impor- maior parte de seu território mantém tem- ante a 889,6 milhões de barris. É interes-
Ao longo do ano de 2018, entre os se- tante, pois remonta a um período de maior peraturas em torno de 30 ºC durante todo sante desagregar segundo a localização
tores produtivos nacionais, cabe destaque deterioração na atividade econômica e no o ano. Quase 20% da população nacio- da produção do petróleo no período. A
o setor industrial registrando queda no mercado de trabalho. nal está localizada na orla marítima, e 120 produção em mar registrou um aumento
desempenho3. Nele, o segmento da cons- Na decomposição do PIB do Mar e da (43%) municípios defrontantes ao mar es- de 8,7% – 903,3 ante a 831,2 milhões de
trução registrou a maior variação negativa Costa, pode-se dizer que dos 9 setores, tão localizados em regiões metropolitanas barris. De forma distinta, a produção em
– o resultado referido levanta a hipótese apenas 2 registraram variação negativa – ou aglomerações urbanas. Assim, o turista terra registrou queda de 30,4% – 40,6
de que o mesmo esteja ocorrendo no setor Manufaturas do Mar e Transporte do Mar encontra uma infraestrutura urbana de- ante a 58,3 milhões de barris no mesmo
Manufatura do Mar (MMar) em compara- – ao comparar o desempenho do referido senvolvida, especialmente um poderoso período (ANP 2019; 2021).
ção ao ano de 2015 (Tabela 4). Ou seja, a indicador entre os anos de 2015 e 2018
queda do setor MMar na participação do PIB (Gráfico 4).
Gráfico 5 – Evolução da produção do petróleo entre os anos
Gráfico 4 – Variação do PIB do Mar e da Costa entre os anos de 2015 e 2018 de 2010 a 2020 em mar e terra
1.200.000
1.200.000

Aumento Dimnuição Total


1.000.000
1.000.000

0,23
0,00 0,10 800.000
800.000
1,94 0,21
0,37

(barris)
mil(barris)
-0,28 600.000
600.000
-0,20

mil
400.000
400.000

0,72
200.000
200.000
Terra
Terra
Mar 00
Mar
BR 2010
2010 2011
2011 2012
2012 2013
2013 2014
2014 2015
2015 2016
2016 2017
2017 2018
2018 2019
2019 2020
2020
RMar EMar MMar TMar SMar DMar PAM SAM TAM BR

Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados da ANP (2019; 2021)
Fonte: Elaborado pela autora

576 ECONOMIA AZUL O Brasil


O Brasil do
do Mar
Mar e
e da
da Costa
Costa 577
577
No Gráfico 5 é possível registrar que nacional são pronunciadas. No caso, te- Gráfico 7 – Evolução da produção de gás natural entre os anos de
no ano de 2018 a produção nacional de mos o pré-sal apresentando taxa de parti- 2010 e 2020 em mar e terra
petróleo apresentou queda (1,3%) em cipação de 55,2% em 2018 ante a 31,5%
comparação ao ano anterior, contudo, em 2015 e no pós-sal a taxa de participa-
vale destacar o considerável aumento da ção foi de 40,5% em 2018 ante a 60% 50.000,0
50.000,0

produção de petróleo na camada pré-sal em 2015 (ANP, 2019). 45.000,0


40.000,0
entre os anos apontados (Gráfico 6). As- Diante desse panorama, destaca-se a 40.000,0
30.000,0

de3 m3
magnitude do aumento no pré-sal passan- 35.000,0
sim, é deveras importante apontar o re-
25.000,0

de m
30.000,0
corte por produção proveniente exclusiva- do de 280,0 milhões de barris para 521,5

milhões
25.000,0
mente do mar – foco da MIP Br Mar – em milhões de barris (crescimento de 86,2%) 20.000,0

milhões
20.000,0
que as diferenças na taxa de participação entre 2015 e 2018. (ANP, 2021). 15.000,0
15.000,0
10.000,0
10.000,0
5.000,0
5.000,0
-
2010
2010 2011
2011 2012
2012 2013
2013 2014
2014 2015
2015 2016
2016 2017
2017 2018
2018 2019
2019 2020
2020
Gráfico 6 – Evolução da produção de petróleo nas camadas
Brasil
Brasil Terra
Terra Mar
Mar
pré e pós-sal entre os anos de 2015 e 2018
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da ANP (2019; 2021)

600.000
600.000
Direcionando a análise para os anos de Embora o Brasil esteja entre os maiores
500.000
500.000
2015 e 2018, a produção nacional de gás produtores de P&G do mundo, o Instituto
natural apresentou crescimento de 16%. Brasileiro do Petróleo (IBP, 2020) cita que
400.000
400.000 Desagregando por localização, observa-se o país deve aproveitar todas as suas fon-
que a produção advinda do mar apresenta tes de energia, explorando estratégias de
mil(barris)
barris

300.000
300.000
valores significantemente acima dos campos descarbonização e transição energética.
mil

200.000
200.000
localizados em terra. Ou seja, no mar em Esses são desafios existentes, pois o mun-
2018 a participação nacional foi de 80,4% do continuará consumindo petróleo e gás,
100.000
100.000 ante a 76,1% em 2015; já em terra no ano mas com maior preocupação em reduzir e
de 2018, obteve-se participação de 19,6% compensar as emissões de carbono (CAR-
-
2015
2015 2016
2016 2017
2017 2018
2018 ante a 23,9% em 2015 (ANP 2019; 2021). VALHO; MORAES, 2021).
Pré-sal
Pré-sal Pós-sal
Pós-sal
Na comparação entre os resultados dos Além do setor supracitado, a extração de
campos marítimos localizados no mar, o recursos vivos registrou aumento de parti-
Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados da ANP (2021) padrão encontrado na produção de petró- cipação na economia relacionada direta e
leo se repete. Ou seja, no pré-sal (30,2% indiretamente ao mar (de 1,0% para 1,4%)
em 2015 e 51,4% em 2018) e no pós-sal no mesmo período. De acordo com a esta-
(45,9% em 2015 e 29,0% em 2018) per- tística pesqueira mundial publicada pela FAO
mitindo dizer que o pré-sal assume a li- (2020), a importância dos países em desen-
O Brasil obteve a 10ª posição no Algo semelhante ocorreu na produ- derança na produção em comparação ao volvimento como consumidores de pescado
ranking dos países maiores produto- ção nacional de gás natural entre o perí- pós-sal a partir do ano de 2016 (Gráfico 8). tem aumentado constantemente refletindo
res de petróleo; em 2018 e em 2020 odo analisado. Na comparação entre os Registra-se que em 2018 o Brasil passou a urbanização e a expansão da classe média
subiu para a 9ª colocação no referido anos de 2010 e 2020, os valores apre- para 31ª posição e em 2020 para 30ª posi- consumidora de pescado. Contudo, avaliar
ranking mundial (CBIE, 2020; ANP, sentaram crescimento de 103% – 46,6 ção no ranking mundial de produtores de a participação brasileira dentro deste merca-
2019; 2021). ante a 22,9 milhões de m3 (Gráfico 7). gás natural (ANP, 2019; 2021). do é complexo, em especial pela lacuna de

578 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL O Brasil do Mar e da Costa 579
dados oficiais de produção (captura e aqui- pescado e alavancar o mercado domésti-
Gráfico 8 – Comparação da evolução da produção de gás natural cultura) à FAO desde o ano de 2014. co. Ou seja, “possui alta disponibilidade
nas camadas pré e pós-sal entre os anos de 2015 e 2018 A Figura 2 mostra que a produção de mão de obra, características ambien-
brasileira por captura e aquicultura cres- tais propícias à produção em mar aberto
25.000
25.000,0
ceram no comparativo 2015/2018. Xime- e localização estratégica para escoamento
nes (2021) aponta que o Brasil reúne as da produção para o Cone Sul, Europa e
20.000
20.000,0 condições de se tornar grande produtor de EUA” (XIMENES, 2021, p. 2).
de m33

4.2 Ocupações do Mar e da Costa no Brasil


de m3m

15.000
milhõesde

15.000,0
milhões

Observa-se para o indicador compa- ou seja, pertinente à economia costei-


milhões

10.000
10.000,0
rando os anos apontados: (i) Dimensão ra4 (em torno de 17,6% das ocupações
Marinha, relacionada diretamente com nacionais nos anos pesquisados). Des-
5.000
5.000,0
a economia do mar (2,2% da ocupa- tacando que os valores compreendem
ção nacional em 2018 ante a 2,1% em trabalhadores formais e informais, a Ta-
00
2015
2015 2016
2016 2017
2017 2018
2018 2015); (ii) Adjacente ao Mar, relacionado bela 5 desagrega os referidos escopos
Pré-sal
Pré-sal Pós-sal
Pós-sal indiretamente com a economia do mar, em setores.

Tabela 5 - Ocupações formais e informais relacionadas


Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados da ANP (2021)
ao Mar e a Costa Brasileira
Setor Ocupações (milhões) 2015-
Figura 2 – Produção pesqueira por captura e aquicultura no Brasil
2015 % Mar 2018 % Mar 2018
850 Recursos Vivos do Mar 130.408 0,7 114.270 0,6 -0,12
800
750 Energia do Mar 48.275 0,2 39.204 0,2 -0,19
700
650 Manufaturas do Mar 314.593 1,6 239.134 1,2 -0,24
600 Transporte do Mar 91.066 0,5 93.881 0,5 0,03
550
500 Serviços do Mar 1.320.004 6,7 1.731.793 8,4 0,31
450
Milhares

400 Defesa do Mar 179.814 0,9 163.695 0,8 -0,09


350 Dimensão Marinha 2.084.160 10,5 2.381.977 11,5 0,14
300
250 Primários Adjacentes ao Mar 742.059 3,7 626.750 3,0 -0,16
200
150 Secundários Adjacentes ao Mar 1.175.127 5,9 1.064.488 5,1 -0,09
100 Terciários Adjacentes ao Mar 15.828.093 79,8 16.645.875 80,0 0,05
50
0 Adjacentes ao Mar 17.745.279 89,5 18.337.113 88,0 0,03
1990

2000

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

2019

2020

2021

Total 19.829.438 100,0 20.719.090 100,0 0,04


Aquicultura Captura
Participação na economia nacional 20,05 19,86
Fonte: Ximenes (2021) apud FAO (2020) Fonte: Elaborado pela autora, com metodologia proposta por Carvalho (2018)

580 ECONOMIA AZUL O Brasil do Mar e da Costa 581


A participação das ocupações relacio- na economia Brasileira nos anos de 2015 e
Gráfico 10 – Produtividade do escopo Dimensão do Mar, por setor,
nadas diretamente e indiretamente ao mar 2018 são apresentadas no Gráfico 9. nos anos de 2015 e 2018
Gráfico 9 – Participação das ocupações relacionadas ao mar e a costa
1400,000
nas ocupações Brasileiras – 2015 e 2018

1200,000

2015 2018
20,05% 19,86% 1000,000

800,000

600,000

79,95% 80,14%
400,000

Mar Mar
Outros Setores Outros Setores 200,000

Fonte: Elaborado pela autora 0,000


RMar EMar MMar TMar SMar DMar

2015 2018
No ano de 2018, registrou-se 19,8% apresentaram recuo nas ocupações na
de participação na ocupação nacional comparação 2015-2018.
Fonte: Elaboração própria
(0,19 p.p do ano de 2015). O Instituto O Gráfico 10 ilustra a comparação do
de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) ano de 2015 e 2018 da produtividade
aponta que o mercado de trabalho apre- por setor do escopo Dimensão Marinha
sentou até o período da análise (referente – ressaltando que os setores que formam 5. Conclusões
ao período de 2015 a 2018) uma trajetó- o referido escopo constituem-se os mais
ria de lenta recuperação, refletindo o bai- importantes da economia relacionada ao Iniciativas que visam ao reconhecimento classificados empregaram, entre formais
xo dinamismo da economia brasileira. mar por apresentarem alta dependência da contribuição, dimensionando a partici- e informais, perto de 21 milhões de pes-
Vale destacar duas situações dentre do recurso natural. pação do mar para a economia nacional, soas, gerando mais de R$ 530 bilhões em
outras que o Cadastro Geral de Emprega- A produtividade mede o grau de eficiên- ainda são recentes no Brasil, apesar de salários. A demanda final dos setores foi
dos e Desempregados (CAGED) apud IPEA cia com que determinada economia utiliza apresentar umas das maiores extensões estimada em R$ 1,5 trilhão.
(2019) retrataram no ano de 2018, sejam seus recursos para produzir bens e serviços costeiras do mundo. Focando no escopo Dimensão Ma-
eles: i) o setor de serviços foi grande ge- de consumo (MESSA, 2013). No presente Desta forma, o presente capítulo joga rinha, o mais importante da economia
rador de emprego na economia brasileira; caso, o Gráfico 10 ilustra a produtividade luz à temática respondendo às perguntas relacionada ao mar, outros dois setores
ii) a indústria de transformação registrou do trabalho entre os diferentes setores rela- norteadoras relativas à contribuição da se destacaram no ano de 2018 com au-
fraca geração de emprego. É interessan- cionados diretamente ao mar nos anos de economia relacionada ao mar para o Brasil mentos substanciais na participação to-
te notar que entre os setores apontados 2015 e 2018. Assim, os setores de energia e suas atividades predominantes. A eco- tal: Energia do Mar e Recursos Vivos do
na Tabela 5 os relacionados ao Serviços do mar, extração de recursos vivos e defe- nomia do mar e costeira nacional atinge, Mar. O Brasil é um expoente mundial na
do Mar e Terciários foram os maiores sa do mar são aqueles que combinam po- no ano de 2018, 19,5% de participação produção de petróleo e gás, com ênfase
empregadores e apresentaram variações tencial de renda e níveis de produtividade no PIB nacional (0,6 p.p acima do ano de ao oriundo da camada pré-sal. Quan-
positivas mais acentuadas, na compa- importantes para alavancar a geração de 2015), e tem como atividade predomi- to aos Recursos Vivos, o Brasil no ano
ração 2015-2018. Por outro lado, os se- empregos qualificados, com vocações dis- nante o setor Serviços do Mar, com desta- de 2018 ainda experimentava a maior
tores Manufatura do Mar e Secundários tribuídas para todas as regiões Brasileiras. que para o turismo. Para mais, os setores produção pesqueira advinda da captura.

582 ECONOMIA AZUL O Brasil do Mar e da Costa 583


Contudo, a partir do ano de 2020 a civil, com redução do nível de atividade e 2018. 184 f. Tese. (Doutorado em Econo- Aglomerações Urbanas e Regiões
produção nacional por captura e aqui- de emprego. mia do Desenvolvimento) – Pontifícia Uni- Integradas de Desenvolvimento. Rio
cultura praticamente se igualaram e, no Sendo assim, mais uma vez, ressalta- versidade Católica do Rio Grande do Sul, de Janeiro: IBGE, 2020. Disponível em:
ano de 2021, observa-se uma orientação -se a relevância deste estudo, ampliando Porto Alegre, 2018. https://www.ibge.gov.br/geociencias/
a aquicultura. Ximenes e Vidal (2018) a identificação do perfil da economia re- CARVALHO, A. B.; MORAES, G. I. The organizacao-do-territorio/divisao-regional/
pontuam que, assim como outros países lacionada ao mar e a costa que o Brasil já Brazilian Coastal and Marine Economies: 18354-regioes-metropolitanas-aglomera-
emergentes, o Brasil terá maior disposição possui. O método utilizado, insumo-pro- quantifying and measuring marine eco- coes-urbanas-e-regioes-integradas-de-de-
produtiva via aquicultura por tratar-se de duto, permite evidenciar uma porção da nomic flow by input-output matrix analy- senvolvimento.html?=&t=o-que-e. Acesso
um sistema de produção de retorno mais economia que as contas nacionais não sis. Ocean & Coastal Management, v. em: 6 set. 2021.
rápido e econômico, cujos desafios estão exibem distintamente de outros setores. 213, 2021. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA
bem aquém daqueles da pesca. Enfatizando que é impossível definir e CENTRO BRASILEIRO DE INFRA ESTRUTU- E ESTATÍSTICA. Produto Interno Bruto
Os setores relacionados direta e indi- gerir políticas eficientes e eficazes quan- RA. Quais são os maiores produtores dos Municípios. Rio de Janeiro: IBGE,
retamente ao mar que possuem vocação do ainda não se conhece a real dimen- mundiais de petróleo? São Paulo: CBIE, 2018. Disponível em: https://www.ibge.
industrial – Manufaturas do Mar e Secun- são e as contribuições do recurso natural. 2020. Disponível em: https://cbie.com.br/ gov.br/estatisticas/economicas/contas-na-
dários Adjacentes – registraram redução Isso se aplica também a políticas de in- artigos/quais-sao-os-maiores-produtores- cionais/9088-produto-interno-bruto-dos-
no cômputo da participação no total da cremento de produtividade do trabalho e -mundiais-de-petroleo/#:~:text=Os%20 -municipios.html?edicao=29720&t=resul-
economia do mar e costeira Brasileira capital do setor estudado. EUA%20ultrapassaram%20a%20 tados. Acesso em: 6 dez. 2020.
comparando 2018 a 2015. Tais resulta- Para estudos futuros, pretende-se aliar a R%C3%BAssia,da%20produtora%20 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
dos levantam a hipótese dos efeitos con- mensuração da economia do mar e costeira de%20petr%C3%B3leo%2C%20BP. ESTATÍSTICA. Sistema de Contas Nacio-
junturais da economia nacional, caracte- às atividades que, apesar de embrionárias Acesso em: 4 dez. 2020. nais (SCN). Rio de Janeiro: IBGE, 2021.
rística do período iniciado em meados de no Brasil, estejam relacionadas a avançadas HEINRICH BÖLL FOUNDATION SCHLESWI- Disponível em: https://www.ibge.gov.br/
2014, que afetaram a construção naval e tecnologias azuis. G-HOLSTEIN, HEINRICH BÖLL FOUN- estatisticas/economicas/contas-nacionais/
DATION; UNIVERSITY OF KIEL’S FUTURE 9052-sistema-de-contas-nacionais-brasil.
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2017. Ocean Atlas. Facts and Figures em: 4 dez. 2021.
AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS on the Threats to our Marine Ecosystems INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA
NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS. Boletim NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS. Anuário Disponível em: <https://eu.boell.org/ APLICADA. Análise do Mercado de
da Produção de Petróleo e Gás Natu- estatístico brasileiro do petróleo, gás en/2017/06/02/ocean-atlas-understandin- Trabalho. Rio de Janeiro: Ipea, 2019. Dis-
ral, Rio de Janeiro, n. 76, 2016. Disponível natural e biocombustíveis. Rio de Ja- g-threats-our-marine-ecosystems>. Aces- ponível em: https://www.ipea.gov.br/carta-
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blicacoes/anuario-estatistico/arquivos-anu- popbr.def. Acesso em: 5 set. 2021. 3 maio 2019. produzir bem e vender melhor. Caderno
ario-estatistico-2019/2019-anuario-versao- CARVALHO, A. B. Economia do mar: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E Setorial ETENE, Fortaleza, Ano 3, n. 49,
-impressao.pdf. Acesso em: 8 out. 2021. conceito, valor e importância para o Brasil. ESTATÍSTICA. Regiões Metropolitanas, nov. 2018.

584 ECONOMIA AZUL O Brasil do Mar e da Costa 585


Anexo A Setor Atividade CNAE
Tabela A.1 – Atividades CNAE classificadas no escopo Dimensão Marinha Serviços do Mar - SMar Trens turísticos, teleféricos e similares
Hotéis e similares
Setor Atividade CNAE
Outros tipos de alojamento não especificados anteriormente
Recursos Vivos do Mar - RMar Pesca em água salgada
Restaurantes e outros estabelecimentos de serviços de
Aquicultura em água salgada e salobra
alimentação e bebidas
Extração e refino de sal marinho e sal-gema
Serviços ambulantes de alimentação
Preservação do pescado e fabricação de produtos do pescado
Atividades imobiliárias de imóveis próprios
Energia do Mar- EMar Extração de petróleo e gás natural
Intermediação na compra, venda e aluguel de imóveis
Atividades de apoio à extração de petróleo e gás natural
Aluguel de equipamentos recreativos e esportivos
Atividades de apoio à extração de minerais, exceto petróleo
Agências de viagens
e gás natural
Operadores turísticos
Manufaturas do Mar - MMar Extração de gemas (pedras preciosas e semipreciosas)
Serviços de reservas e outros serviços de turismo não
Fabricação de máquinas e equipamentos para a prospecção
especificados anteriormente
e extração de petróleo
Atividades de recreação e lazer não especificadas anteriormente
Construção de embarcações e estruturas flutuantes
Gestão de instalações de esportes
Construção de embarcações para esporte e lazer
Clubes sociais, esportivos e similares
Fabricação de artefatos para pesca e esporte
Defesa do Mar - DMar Defesa
Manutenção e reparação de embarcações Fonte: Adaptado de Carvalho (2018)
Incorporação de empreendimentos imobiliários
Obras portuárias, marinhas e fluviais Notas
Comércio atacadista de carnes, produtos da carne e pescado
1 Os dados oficiais da população têm como indicadores expressos ao longo do capítulo.
Comércio varejista de carnes e pescados - açougues e peixarias
base o CENSO realizado no ano de 2010. Os 3 Contudo, comparativamente aos anos an-
Transporte do Mar - TMar Transporte marinho de cabotagem demais anos são estimações da população. teriores, em especial no período 2015-2017,
2 Ressalta-se que as atividades englobadas houve crescimento.
Transporte marinho de longo curso
pelo escopo Adjacentes ao Mar não são as 4 Ressalta-se que as atividades englobadas
Navegação de apoio mesmas classificadas no escopo Dimensão pelo escopo Adjacentes ao Mar não são as
Transporte por navegação de travessia Marinha. Portanto, não há dupla contagem mesmas classificadas no escopo Dimensão
no consumo intermediário, nos componen- Marinha. Portanto, não há dupla contagem
Transportes aquaviários não especificados anteriormente tes da demanda final, assim como nos demais no indicador expresso.
Gestão de portos e terminais
Atividades de agenciamento marinho
Atividades auxiliares dos transportes aquaviários não
especificadas anteriormente

586 ECONOMIA AZUL O Brasil do Mar e da Costa 587


28

ALTERNATIVA DE FINANCIAMENTO PARA A


ECONOMIA AZUL BRASILEIRA
Gustavo Inácio de Moraes
Andréa Bento Carvalho

1. Introdução

O problema da oferta de recursos para para que se garanta um retorno apropriado


o estabelecimento e a consolidação de um ao projeto em execução.
projeto ou de um conjunto de ações é pou- Este capítulo, sendo assim, almeja discu-
co notado na literatura de desenvolvimento tir potenciais fontes e instrumentos para o fi-
social e econômico brasileira. Normalmen- nanciamento de projetos da Economia Azul
te, como somos uma sociedade com mui- brasileira. Nosso objetivo é apontar possibili-
tos desafios, os diagnósticos concentram-se dades à luz da particularidade brasileira, mas
nas estratégias de ações sem, na maioria considerando a experiência internacional e a
das vezes, considerar a disponibilidade de teoria de valoração de recursos naturais.
insumos, especialmente financeiros, nem o Nosso problema principal concentra-se
esforço decorrente do aproveitamento das em responder quais são as alternativas de
disponibilidades. Em outras palavras, há financiamento no contexto contemporâ-
uma preocupação com a eficácia, ou o atin- neo, para ações na Economia Azul.
gimento de objetivos, sem uma considera- Para cumprir este objetivo geral, há ne-
ção da eficiência, ou a avaliação do melhor cessidade de considerarmos três objetivos
emprego dos recursos disponibilizados. específicos: (1) a evolução e dificulda-
Ademais, em muitos casos nem sequer des de financiamento enfrentadas pela
os recursos, quaisquer dimensões que se- economia brasileira; (2) os métodos dis-
jam, estão viabilizados. Desse modo, como poníveis para uma oferta permanente e
a economia azul detém um potencial sig- adequada de recursos; e, finalmente, (3)
nificativo de recursos e exploração, muitos quais são os instrumentos possíveis e a
projetos e aproveitamentos econômicos experiência internacional à luz do con-
nas áreas de energia, pesca, extrativismo texto econômico deste início de século 21
mineral, turismo e defesa entre outras áre- e as experiências e teorias disponibilizadas.
as, são viáveis e relevantes para a explora- Como consequência, este capítulo é di-
ção em benefício da sociedade brasileira. vidido em 5 partes: além desta introdução,
Contudo, pouco se discute a oferta firme de divide-se em 3 tópicos, cada um deles cons-
recursos financeiros: suas origens, seus ins- truindo os objetivos específicos e, ainda,
trumentos e as possibilidades estratégicas considerações finais.

588 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 589


2. O financiamento da Economia Brasileira Há um sexto exemplo, recente: a evo- representar uma chance significativa de
lução chinesa. Desde a implementação da acúmulo de capital. Porém, uma vez con-
A economia brasileira vivenciou diferen- produtiva o suficiente para financiar seus estratégia política e econômica de Deng siderada a estrutura colonial estabelecida,
tes fases ao longo de sua história econô- próprios projetos e, espalhando suas téc- Xiaoping, após a passagem de Mao Tse a economia brasileira não teve acesso ao
mica, algumas favoráveis e outras desfavo- nicas, seu poder econômico e sua influên- Tung, no final dos anos 1970, a China próprio capital e à decisão estratégica de
ráveis de uma perspectiva do crescimento cia, financiar projetos em economias ex- passou essas etapas. De sociedade empo- como utilizá-lo. Isso se dá em um longo
econômico e geração de riqueza. Se os teriores, exportando não necessariamente brecida e tradicional, acumulou capitais período da história brasileira, envolvendo
diferentes ciclos econômicos foram mar- produtos, mas, sobretudo capital. com uma balança comercial superavitá- os ciclos econômicos do pau-brasil, da ca-
cantes e frequentes na história da econo- Essa esquematização foi refletida em al- ria, consequência de uma taxa cambial na-de-açúcar e da mineração. Esse é o pri-
mia brasileira, pode-se, contudo, demarcar guns teóricos como ROSTOW (1959), em desvalorizada, e tornou-se nesta segunda meiro momento de financiamento, ou de
poucas transições no modelo de financia- um sentido mais amplo, de desenvolvimen- década do século 21, após quarenta anos não efetividade, da estrutura econômica
mento dos projetos na economia brasileira. to econômico como um todo. Ademais, foi de evolução contínua uma exportadora de brasileira e durou cerca de 300 anos, até a
A sequência deste capítulo pretende situar percebido na evolução econômica de inú- capital relevante. abertura dos portos em 1808.
o leitor nessas fases históricas, para que se meras nações: (1) A Inglaterra, que antes Com efeito, ao listarmos os exemplos O segundo momento do financiamen-
possa colocar em perspectiva a dificuldade da Revolução Industrial acumulou parcelas bem-sucedidos de transições produtivas e to, portanto, inicia-se com a abertura dos
e os desafios atuais que inclusive compro- consideráveis de capital pelo comércio e os acúmulo de capital, citamos todos os prin- portos e sua perspectiva. Por algum tem-
metem o desempenho da economia brasi- reinvestiu nas tecnologias industriais, no cipais atores mundiais com disponibilida- po regiões isoladas como o Maranhão e
leira nas últimas décadas. século 18, transformando-se até meados de de capital no contexto presente: à ex- seu ciclo do algodão foram capazes de
Como é natural, o financiamento de do início do século 20 na maior exporta- ceção da Inglaterra e dos Estados Unidos, levantar capital, porém de forma ainda
uma nação passa por fases, que a literatu- dora de capital do mundo, sendo então todos os demais mantêm posição prepon- tímida. Mas com a viabilidade da cultura
ra econômica mapeia dentro da evolução ultrapassada pelos EUA; (2) Os Estados derante na exportação de capitais para do café em território do Centro Sul brasi-
e indicadores do balanço de pagamentos. Unidos, de país importador de capital no o mundo desenvolvido e em desenvolvi- leiro, a perspectiva se concretizou: o café
É bastante lógico e refletido na técnica de século 18 para o maior exportador de ca- mento; ocorre através de financiamento iniciou uma aceleração das exportações,
contabilização das contas nacionais. pital no século 20, ancorado inicialmente em títulos públicos ou de empresas, finan- dentro de uma estrutura comercial acessí-
Inicialmente, uma economia nacional em economia industrial, pouco depois em ciamento de projetos ou aquisição direta vel a todo o mundo e com independência
provavelmente terá necessidade de desen- economia de serviços e alta tecnologia; de empresas e capital produtivo. Alguns de utilização dos capitais, paralelo a um
volver uma infraestrutura e serviços pú- (3) os países denominados Tigres Asiáticos: estão com prioridades voltadas para a vi- fortalecimento do sistema de crédito e
blicos, porém, como não obtém receitas, Japão, Coreia do Sul, Singapura e Taiwan, zinhança – caso da Alemanha –, outros bancário, em geral. É também nessa fase
dependerá de fluxos iniciais para viabilizar que através de uma política de exportações ainda não criaram uma estratégia ao exte- que a Inglaterra se torna a principal finan-
a produção e os serviços, endividando-se. agressiva acumularam significativo capital rior – caso dos árabes, da Noruega e dos ciadora dos projetos brasileiros, investidos
Em uma segunda fase, amadurecendo e posteriormente o reinvestiram em outros Tigres Asiáticos –, e outros ainda o fazem na consolidação do estado nacional e em
seus processos produtivos, a economia é países, durante o século 20; (4) os países de maneira política – caso da China. alguma infraestrutura.
capaz de obter receitas, incrementar pro- árabes e a Noruega, a partir do choque de Essa ilustração permite que se possa Esta segunda fase alcança sua maturi-
dutividade e contar com produção dispo- petróleo, que investiram na mudança do agora passar ao caso em foco: o Brasil. dade nos primeiros vinte anos do século
nível a pagar os primeiros empréstimos re- perfil produtivo de suas economias e torna- Como território colonizado em seus prin- 20, quando a estrutura bancária, aliada a
alizados na fase anterior. Em uma terceira ram-se em paralelo exportadores de capital; cípios e dotado de uma significativa quan- um crescimento da vida urbana, dotada
fase, quando o endividamento inicial se (5) a Alemanha, pela força de seus produ- tidade de recursos naturais, a economia dos capitais acumulados pelos agricultores
extinguiu ou diminuiu consideravelmente, tos industriais nos séculos 19 e 20. São to- brasileira por aproximadamente 450 anos estabelece um programa de empréstimos
a economia torna-se madura e sua estru- dos exemplos de países que, de uma con- especializou-se na exportação de produtos destinado a uma infraestrutura industrial
tura de produção tem capacidade para dição inicial de desvantagem acumularam commodities. Em última análise, não é um (BAER; KERSTENETZKY; VILLELA, 1973). A
acumular capitais próprios, destinados a capitais suficientes aos seus projetos, bem impeditivo para o acúmulo de capitais, an- industrialização acelera-se em setores bá-
projetos internos e avanço da estrutura. como permitindo uma condição de expor- tes, pelo contrário, devido a uma estrutura sicos e complexos nos principais centros
Finalmente, a economia pode se tornar tação desse capital para outras nações. de custos e tecnologia mais simples pode urbanos, sobretudo em São Paulo, polo

590 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 591


exportador de café, e tendo a Inglaterra econômicos, com características regionais, empobrecimento das camadas mais caren- setor externo dessas economias, compro-
como principal cliente nos mercados mun- o Brasil teve apenas 3 modelos de financia- tes da população (DINIZ, 1978). Entendia-se mete as moedas, compromete a estabilida-
diais (DRAIBE, 1985). mento, sendo apenas 2 na sua fase inde- que a dinâmica do setor público poderia de monetária e desacelera o crescimento
Uma terceira fase inicia-se nos anos pendente. Modelos esses que refletiram o criar compensações às camadas econômicas econômico, gerando desemprego e estag-
1930, em consequência de mudanças sig- privilégio de relações com Portugal, Ingla- prejudicadas no decorrer do processo de de- nação. A rápida mudança das condições,
nificativas no contexto mundial, na vida terra e Estados Unidos, respectivamente, senvolvimento (DRAIBE, 1985). ademais, cria traumas e pressões em um
social brasileira e aos quais a economia não em que cada nação a seu tempo espelhou A cooperação e chegada de recursos contexto de sociedade de massas, politica-
ficou alheia, em especial. Além de uma troca a sua posição mundial na afinidade com a internacionais também se deu por meio mente volúvel (CARVALHO; LIMA, 2009).
do principal parceiro, com os EUA assumindo economia brasileira. A terceira fase ganha de instituições multilaterais, como o FMI, São esses fatos que, em nossa interpre-
protagonismo a partir dos conflitos mun- destaque por equivaler a economia brasi- e curiosamente acelera-se na crise do pe- tação, ainda que distantes, condicionam o
diais, opta-se por um financiamento e estra- leira às principais economias do mundo, tróleo: com a liquidez gerada pelos inves- presente em termos de desempenho eco-
tégia consolidados no setor público (BAER, seja em perfil, seja em importância (BAER; timentos árabes em bancos europeus e nômico. Esgota-se, em paralelo, a capaci-
KERSTENETZKY; VILLELA, 1973). Não pode KERSTENETZKY; VILLELA, 1973). americanos, estes recursos necessitavam dade do setor público manter os projetos
passar despercebida a tendência mundial Esta última fase é importante para en- de investimentos lucrativos, e os países da operacionais e ampliá-los, ao que tam-
nesse sentido, reflexo das necessidades de tendermos o processo atual. Os fundos in- América Latina contraíram os empréstimos bém, por ocasião da dívida externa cres-
ações militares e organização do estado para ternacionais em contínuo fluxo, contudo, para seus projetos de desenvolvimento. cente e em alguns casos não paga confor-
enfrentar as crises econômicas. A criação de não tinham o Brasil como uma prioridade: Não à toa, tornaram-se à época os países me o previsto, novos aportes externos se
estatais e órgãos de regulação passa a ser como área refratária da Guerra Fria, o Brasil mais endividados do mundo, tanto em ter- tornam inviáveis. Com o esgotamento da
uma crescente, além de proporcionar uma tinha menor importância do que o leste da mos absolutos como em termos per capita. fonte de financiamento, esgota-se a capa-
estrutura de planejamento para identifica- Ásia, a Europa Ocidental e o Oriente Mé- A estratégia dos países em desenvolvimen- cidade de viabilização de projetos. O que
ção de gargalos e direcionamentos possíveis dio. A chegada de multinacionais, transfe- to, todavia, parecia adequada, pois despro- era um crescimento econômico ao redor
(MALAN; BONELLI; ABREU; PEREIRA, 1977). rindo sua tecnologia, foi marcante no perí- vidos de capital e diante de juros baixos, o de 3-4% ao ano, em uma década, tor-
Por 50 anos, ou até 1980, essa terceira odo e, por fim, o auxílio no planejamento potencial de um projeto qualquer era en- na-se um crescimento de 1-2,5% ao ano
fase foi capaz de gerar crescimento eco- da economia não pode ser desprezado, ao corajador e o retorno social politicamente (CARVALHO; LIMA, 2009).
nômico significativo, no chamado “na- colaborar no diagnóstico dos setores cha- compensador (DINIZ, 1978). É bem verdade que em alguns perío-
cional-desenvolvimentismo”, uma com- ves da economia. Mas a mesma crise do petróleo que dis- dos o crescimento econômico acelerou-se
binação de capitais providos pelo setor Uma alternativa a este financiamento ponibilizou capitais e reduziu os juros tam- para logo ceder: esses períodos correspon-
público, via tributação crescente, e capital foi a estrutura pública. O aumento de im- bém foi responsável por alterar a tendência dem a algum dinamismo no setor externo.
internacional, notadamente americano e postos pode ser viabilizado pela comple- dos juros mais à frente: com o processo in- Nos anos 1980, consequência da desvalo-
europeu em articulação. Ao setor público xidade crescente da estrutura econômica, flacionário acelerado nas principais econo- rização do cruzeiro e do aumento de ex-
cabia o papel de planejador, incentivador sendo lançados impostos sobre a renda mias, os bancos centrais optam por conter portações. Nos anos 1990, resultado da
e a construção de políticas de viabilização (na década de 1940) e sobre o consumo a inflação através da política monetária, via flexibilização no mercado mundial e da es-
da efetividade do capital, como a política (ICMS, no final da década de 1960). Além aumento dos juros. Com efeito, o que era tabilização e atração de capitais para inves-
de substituição de importações (PSI) (MA- do canal tributário, o governo deu-se conta um financiamento acessível, com taxas de timento especulativo e direto. Finalmente,
LAN; BONELLI; ABREU; PEREIRA, 1977). O da capacidade de financiamento embutida viabilização de produtos, logo torna-se um na primeira década do século 21, consequ-
crescimento econômico desta terceira fase na moeda fiduciária e monopólio estatal: a fardo para os países que aceleraram a con- ência da emergência da China e Índia e na
de financiamento caracterizou-se por uma impressão monetária permitia um crescente tratação desses recursos. A chamada crise valorização associada das commodities nos
rápida urbanização, consolidação do ter- poder de compra ao governo e ainda que da dívida externa, no início dos anos 1980, mercados globais.
ritório brasileiro em direção à Amazônia tenha gerado pressões inflacionárias, com tornou politicamente instável as conforma- Parece-nos nítido, portanto, julgar que é
e aumento significativo da infraestrutura trocas de padrão monetário já a partir da se- ções políticas locais, bem como impediu o crucial retomar uma fonte de financiamen-
energética e de transportes. gunda metade da década de 1960, permitiu equilíbrio financeiro das nações (DRAIBE, to contínua para que se possa obter cresci-
Logo, em benefício de uma pausa para a criação de uma infraestrutura de habita- 1985). A necessidade de pagamentos de mento econômico a médio e longo prazos.
resumo, apesar de viver inúmeros ciclos ção, energia e transportes, ao custo do juros crescentes e proibitivos inviabiliza o E é relevante discutir as alternativas.

592 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 593


jurídica e econômica para o desenvolvi- onde há um deslocamento da economia
mento de atividades em padrões de risco mundial para a bacia do Pacífico, além de
Figura 1 – Crescimento do PIB brasileiro
comerciais, ou capitalistas. A dificuldade é ter uma um papel voltado para as commo-
que o Brasil, a despeito de todo seu poten- dities, reforçando sua vocação.
15,0 cial e outros países latinos nunca se mos- O problema do financiamento, portan-
trou o centro dos interesses geopolíticos to, é delicado e estratégico para a econo-
12,5
globais, especialmente no contexto atual mia brasileira como um todo.
10,0
7,5 3. Financiamento de projetos e de ações sustentáveis
(%)

5,0
O escritor Júlio Verne, ainda no sécu- possibilidades de melhoria substancial no
2,5 lo 19, imaginou viagens interplanetárias e desempenho dos produtos e na integração
0,0 também viagens ao fundo do mar. Aquilo da indústria. Aventuras, portanto, sempre
que não era o meio natural da humani- geram conhecimentos significativos e solu-
-2,5 dade sempre desafiou a imaginação, bem ções novas: o meio natural nos proporcio-
-5,0 como encorajou os mais ousados a pensa- na desafios para serem vencidos através de
1932

1937

1942

1947

1952

1957

1962

1967

1972

1977

1982

1987

1992

1997

2002
rem soluções para tornarem viáveis aquilo soluções engenhosas.
que era tão somente ficção. A raça huma- De outra parte, os atores envolvidos na
na, dentro de seu grau de inteligência e missão eram nações que do ponto de vista
PIB 10 por. Méd. Móv. (PIB)
persistência, sempre encontrou soluções econômico e tecnológico, na melhor das hi-
para seus desafios. póteses, estavam no mesmo nível do Brasil
Ainda em 2021, três missões espaciais há 40 anos, muito provavelmente atrás. A
Fonte: Publicado em Carvalho e Lima (2009) a partir de dados do IPEADATA
chegam a Marte, usufruindo, entre ou- realidade geopolítica muda em quatro dé-
tros aspectos, da proximidade recente do cadas e somos apanhados em inferioridade
A primeira alternativa é o capital priva- de receitas, reconhecidamente regressivas, planeta vermelho à Terra. O congestiona- frente a nações que direcionaram recursos
do. Este segmento nunca foi relevante no e no perfil de despesas, e quem os gastos mento de naves espaciais em Marte chama aos objetivos que as obrigam a revolucio-
Brasil, parte pela ausência de educação fi- com o resgate do passado, previdência, as- atenção pelos países envolvidos: Estados nar tecnologias. Para o Brasil, alcançá-las
nanceira, sobretudo relacionada a seguros sistência social e trabalho, ocupam parcela Unidos, China e Emirados Árabes, uma lista nesse momento é muito difícil pela defa-
e previdência, fundos emprestáveis a longo desproporcional, ainda que sejam necessá- que há 2 décadas seria difícil de imaginar e sagem e pela ausência de recursos frente
prazo, mas também pela renda per capita rios, em relação a gastos produtivos, volta- há 4 décadas seria simplesmente impensá- a setores público e privado que pouco in-
baixa, consequência da pequena produti- dos ao futuro, como educação e saúde. vel. O fato nos convida a pensar sobre o vestem em tecnologia. Nessas condições,
vidade e qualificação da mão de obra. É A terceira e última alternativa em objetivo e sobre os atores envolvidos. recomenda-se que o Brasil persiga objetivo
urgente que essa agenda apareça no pla- consonância com a história brasileira é o A conquista espacial, por muitos con- distinto, evitando a competição aberta e
nejamento da economia brasileira, via qua- financiamento externo: a atração de ca- siderada inútil, em realidade é um desafio focando seus recursos em áreas onde ain-
lificação do mercado de trabalho, mas para pitais, especulativos ou produtivos, neces- gigantesco e que exige soluções tecnoló- da há espaço para o desenvolvimento de
as próximas décadas é improvável qualquer sita uma correspondência com produtos e gicas em várias dimensões para ser viabili- ganhos significativos.
choque representativo nessa dimensão. instrumentos que qualifiquem, remunerem zada: softwares, materiais, comunicações, Além da conquista espacial, o outro
A segunda alternativa é o financiamen- e gerem uma expectativa de retorno con- produção de imagens, eletrônica etc., um meio não natural ao homem e que nos
to pelo setor público. Desde o problema dizente com a estrutura capitalista inter- sem-número de campos tecnológicos e de desafia são os oceanos. Para obter-se co-
do endividamento externo, o setor público nacional. Significa dizer que a economia soluções integradas para colocar um sa- nhecimento do oceano e realizar a sua ade-
brasileiro tem dificuldade de equilibrar-se brasileira seria atrativa não apenas por sua télite em outro planeta. Essas tecnologias quada exploração é necessária uma carga
na atual estrutura de receitas e despesas. estrutura e potencial de produção e con- são testadas nas viagens interplanetárias e de tecnologia que rivaliza com a tecnolo-
Parece-nos que há um problema de captura sumo, mas também por ofertar segurança aplicadas no cotidiano e na vida civil com gia espacial. Há desafios como a pressão

594 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 595


da água, as condições climáticas voláteis, E esta matéria é relevante para garantir variação de disponibilidade está sendo ana- potenciais beneficiados; preços hedônicos,
as profundidades abissais e a complexa in- um estudo de viabilidade econômica cor- lisada. O benefício (ou custo) da variação quando um mercado é simulado procuran-
teração das condições químicas da água, respondente à exploração dos oceanos. da disponibilidade do recurso ambiental é do obter o valor de cada uma das proprieda-
que geram correntes, ecossistemas e re- Sem a perspectiva de valor, torna-se difí- dado pelo produto da quantidade variada des identificadas no recurso natural; custos
cursos particulares. No limite, as mesmas cil desenhar qualquer projeto. Entretanto, do recurso vezes o seu valor econômico es- de viagem, em que o valor está associado a
tecnologias de softwares, materiais, co- nesse ponto a teoria de valoração dos re- timado. Por exemplo, a perda de nutrientes deslocamentos a partir do interesse pelo re-
municações, produção de imagens, ele- cursos naturais pode colaborar em socor- do solo causada por desmatamento pode curso natural; outros ainda podem ser cita-
trônica etc., que são produzidas na cor- rer os projetos determinando o valor de afetar a produtividade agrícola. Ou a redu- dos: o método da produtividade marginal, o
rida espacial, são também produzidas na parcelas e potenciais remunerações decor- ção do nível de sedimentação numa bacia, método do mercado de bens substitutos, o
exploração dos oceanos. O Brasil já pode rentes (LIMA, 2018). por conta de um projeto de revegetação, método dos custos evitados, o método dos
experimentar e notar um resultado signi- Primeiro devemos perceber que o valor pode aumentar a vida útil de uma hidroelé- custos de controle, o método dos custos de
ficativo desse potencial quando da desco- econômico dos recursos ambientais é deri- trica e sua produtividade (MOTTA, 1998). reposição e o método dos custos de oportu-
berta e viabilização da exploração do pe- vado de todos os seus atributos e, segun- Embora capaz de medir valor de exis- nidade (LIMA, 2018; MOTTA, 1998).
tróleo encontrado na camada de pré-sal, a do, que estes atributos podem estar ou não tência, a aplicação do MVC não é trivial e Na valoração econômica de bens e ser-
5 mil metros de profundidade. associados a um uso. Desse modo, quere- pode gerar resultados bastante enviesados viços ambientais, a escolha do método a
A exploração oceânica tem resultados mos enfatizar que as técnicas de valoração caso certos procedimentos não sejam cor- ser utilizado em cada estudo dependerá de
potenciais econômicos mais encorajadores são predominantemente voltadas ao valor retamente obedecidos. A valoração pode uma análise minuciosa do que se pretende
que os da exploração planetária, traz desa- dos estoques, ao invés do valor dos fluxos. ser usada tanto para avaliar a contribuição avaliar, pois todos os métodos existentes
fios tecnológicos que se igualam e não tem De posse do valor dos estoques, só então que os ecossistemas fazem para o bem- na literatura apresentam vantagens e defi-
tantos atores envolvidos nesse momento da é possível construir os fluxos que o projeto -estar quanto para mensurar os incentivos ciências (LIMA, 2018).
história. Para um século que vislumbra a ên- apresentará na exploração de um recurso considerados por tomadores de decisão Em termos de contribuição para o de-
fase na sustentabilidade ambiental e na tec- natural (LIMA, 2018; SANT’ANNA, 2010). para a gestão de ecossistemas e as conse- senvolvimento oceânico sustentável, o mé-
nologia, o oceano parece ser um campo ób- É comum na literatura desagregar o va- quências de medidas alternativas às exis- todo de Valoração Contingente pode ser
vio de desenvolvimento econômico e social. lor econômico do recurso ambiental (VERA) tentes (MOTTA, 1998). o mais utilizado devido a sua flexibilidade,
As experiências internacionais e finan- em valor de uso (VU) e valor de não uso As modificações na quantidade e quali- eficiência e capacidade de estimar valor
ciamento de projetos ao redor do mundo (VNU). O valor de uso, por sua vez, subdivi- dade de serviços ambientais, por exemplo, como um todo. As organizações regionais
são crescentes, em relação a instrumentos de-se em outros três valores. Valor de Uso podem ser valoradas à medida que venham caracterizadas por uma gestão ambien-
e modalidades de fundos. Especialmente Direto (VUD), Valor de Uso Indireto (VUI) e gerar custos ou benefícios para as atividades tal sustentável devem se preocupar com
naquilo que é uma tendência relacionada Valor de Opção (VO) (MOTTA, 1998). humanas (LIMA, 2018; SANT’ANNA, 2010). a questão ambiental como fator primor-
ao ESG (Environmental, Social and Go- Se o recurso ambiental é um insumo ou São vários os métodos de valoração eco- dial e estratégico e, consequentemente,
vernance) e há uma percepção de que os um substituto de um bem ou serviço pri- nômica ambiental existentes, como valora- atenderem aos requisitos das dimensões
fundos serão crescentes também em valor, vado, esses métodos utilizam-se de preços ção contingente, em que o valor é captu- de conservação, preservação e de controle
quando as atividades forem direcionadas de mercado deste bem ou serviço privado rado a partir da percepção dos usuários e ambiental (LIMA, 2018).
para essa dimensão. para estimar o valor econômico do recurso
Essa é a primeira vantagem em relação ambiental (MOTTA, 1998). Assim, os bene- 4. Financiamento para a Economia Azul
ao futuro da exploração oceânica como um fícios ou custos ambientais das variações
todo: haverá, na medida em que houver co- de disponibilidade destes recursos ambien- 4.1 Experiência e sugestões nacionais e instrumentos específicos para o setor.
nexão com os valores ESG, fundos disponí- tais para a sociedade podem ser estimados. Nessa seção apresentaremos essas alterna-
veis em grandes e crescentes quantidades. Com base nos preços destes recursos priva- As modalidades práticas para aplica- tivas, divididas por esta característica, (1)
Contudo, permaneceria um problema dos, geralmente admitindo que não se al- ção ao financiamento da Economia Azul gerais e (2) específicos para o setor.
essencial que paulatinamente encontra so- teram frente a estas variações, estimam-se podem ser descritas em instrumentos que A primeira possibilidade de financia-
luções cada vez mais comuns: como saber indiretamente os valores econômicos (pre- são aplicados em todas as linhas, inclusive mento é a constituição de um fundo,
o valor potencial da exploração do mar? ços-sombra) dos recursos ambientais cuja no financiamento de atividades oceânicas ou uma carteira de ativos, conectada às

596 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 597


atividades oceânicas. Pode funcionar com capital inicial que permitirá o sucesso ou não mundo, ameaçando o modelo tradicional energética dos oceanos tem um forte con-
2 abordagens: a primeira, mais descentra- de pagamentos futuros. Regra geral procura de negócios dos bancos constituídos. As teúdo de pesquisa e desenvolvimento, o
lizada, a criação de um índice setorial que diversificar seus investimentos, haja vista que fintechs voltadas para projetos sustentáveis qual pode beneficiar seus investidores em
referencie os investimentos em empresas muitos projetos podem não alcançar sucesso, já são portas de entrada factíveis voltadas outras aplicações ou no escalonamento
ou projetos do setor indicando por conse- mas não é uma pré-condição, a depender do para o financiamento de projetos oceânicos. do uso das tecnologias em outras áreas ou
quência a valorização potencial do setor apetite de risco do investidor cotista. Nesse particular, fundos setoriais volta- empreendimentos.
e, se favorável, levantando mais recursos Insistindo na exemplificação, fundos dos para finanças sociais, projetos de apelo É importante enfatizar que essas mo-
para o setor. Essa abordagem permite que imobiliários têm a mesma abordagem. social e sustentáveis, podem representar dalidades muitas vezes recompensam seus
haja possibilidade de criação de inúmeros Nesse caso, porém, como se trata de um um encorajamento para a pesca, tradicio- cotistas pelos impactos ambientais e so-
produtos financeiros pelas casas de inves- ativo concreto que passa a gerar renda nal ou não, visando à aquisição e renova- ciais, incorporados aos relatórios sociais
timento, desde que atrelados ao índice. através de aluguel a partir da sua disponi- ção de barcos, equipamentos e armazéns, de muitas pessoas jurídicas, indo além dos
Assim como já existem índices em bolsa bilidade, o cotista recebe dividendos com calcados na geração de emprego e renda, impactos econômicos e remunerações mais
voltados para a sustentabilidade, para a maior frequência. Permite-se com que mas sobretudo do emprego do conheci- imediatas. Essa ênfase é importante em um
governança corporativa e para setores es- grandes empreendimentos imobiliários, mento dos pescadores e de pesquisadores contexto de valorização da ESG e outras
pecíficos, pode-se pensar a criação do índi- como shoppings, prédios comerciais, gal- na manutenção dos ecossistemas litorâne- governanças associadas.
ce para o setor oceânico. Entretanto, uma pões logísticos etc. sejam financiados por os e oceânicos. É uma modalidade de fun- Em um contexto de sustentabilidade,
suposta desvantagem é que tal abordagem vários cotistas. Como exemplo adicional, do que permitiria, ademais, a possibilidade duas iniciativas permitiriam que o po-
limita os financiamentos a empresas de ca- no Brasil recentemente possibilitou-se a de criação e/ou incremento do turismo em tencial oceânico, relacionado à captura
pital aberto, ou que sigam as normas de constituição de fundos de terras agrícolas, áreas potencialmente lucrativas no territó- de carbono e outras dimensões, possa
transparência e funcionamento do merca- extraindo-se como receita e dividendos rio. Atualmente fundos sociais estão estru- ser financiado: 1. O Programa Nacional
do acionário, normalmente empresas de decorrentes de arrendamento: o produtor turados para a agricultura familiar e peque- de Crescimento Verde, do Ministério do
porte médio ou grande e que contem com agrícola capitaliza-se através de hipoteca nos empreendimentos. Meio Ambiente e também do Ministério
uma estrutura de assessoria jurídica com- e os cotistas tem retorno de uma proprie- É útil também notar que dentro da da Economia, cujo objetivo central é zerar
patível, o que dificulta a prosperidade de dade com atividade lucrativa. agenda sustentabilidade o setor energético as emissões de carbono até 2050. Nesse
pequenas empresas ou projetos. Outra estratégia é a criação de fintechs oceânico brasileiro pode se beneficiar dos contexto, o financiamento voltado para
A segunda abordagem é a criação de com finalidades voltadas à exploração do desafios geopolíticos do presente: a curto atividades oceânicas é crucial, com des-
fundos setoriais voltados para aquisição oceano. Nesse aspecto, a fintech com fi- e médio prazos, colaborando para diversi- taque para áreas de conservação e eco-
de participação societária nas empresas nalidade específica captura recursos dos ficar as fontes de oferta de petróleo e cola- turismo, nessa extensão. Cabe enfatizar
e projetos voltados à economia oceânica. clientes prometendo o engajamento na borando, em consequência, para a estabi- que os bancos públicos comerciais e de
Na medida em que os projetos obtenham atividade oceânica, selecionando por seu lidade dos preços energéticos ao redor do investimento já possuem linhas com essa
retorno, o investidor é recompensado com turno os projetos e empresas mais atra- mundo. Mas, a longo prazo, pode também abordagem e com juros competitivos; 2.
pagamentos periódicos ou definidos em entes. Algumas fintechs, como exemplo, proporcionar uma transição energética se- Já a segunda, é o Bureau do Crédito Ver-
contrato. Essa modalidade pode mesmo dedicam-se a financiar pequenos negócios gura e sustentável, tanto ambientalmente de, no qual produtores rurais ingressam
ser enquadrada, em algum grau, como e microempresas ou ainda projetos sociais, quanto em termos de perenidade, explo- em uma plataforma de open finance, em
um venture capital, com os cotistas do sempre em compromisso com seus de- rando energia das ondas, mas também a já que são definidos critérios de sustentabili-
fundo exercendo um investimento de ris- positantes. Desse modo, o investidor tem factível energia eólica. dade social e ambientais, proporcionando
co ou renda variável. a garantia de que os recursos são repas- A urgência da dimensão energética nes- melhores taxas aos produtores engajados
Alguns fundos de venture capital, para sados a empresas compromissadas com te início de século 21 é que pode garantir nos critérios definidos. A extensão dessas
efeitos de exemplificação, investem em valores pré-estabelecidos, ao invés de um a prioridade de direcionamento de recursos modalidades de rurais para oceânicos ou
jogadores de futebol, outros em startups, banco tradicional onde qualquer empreen- para os empreendimentos energéticos oce- ambientais em uma faixa mais larga de
outros ainda em setores emergentes, dimento pode ser selecionado para os em- ânicos, especialmente na Economia Azul. competição pelos recursos é justificável à
mas em comum todos capturam um valor, préstimos. O segmento tem sido fonte de Como complemento, destacamos que a luz dos objetivos de sustentabilidade pro-
captado junto a cotistas, para constituir o crescimento exponencial no Brasil e no tecnologia desenvolvida na exploração porcionados pela ferramenta.

598 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 599


4.1 Experiência internacional defesa, pesca e localização de população
Figura 2 – Possibilidades de Financiamento para a Economia Azul
selecionada e como eixo de crescimento da economia Figura 2 – Possibilidades de Financiamento para a Economia Azul
.
mundial, a preocupação principal do pro-
Embora possuidores de uma diversida- grama é a garantia de exploração susten-



de de instrumentos nacionais já existen- tável e coordenação entre as diferentes

  
tes, ainda assim cabe identificar as iniciati- nações, haja vista que os efeitos na região Fundos Setoriais Fintechs
vas internacionais de sucesso que podem de uma ação podem ser sentidas em vá-
ser reproduzidas no contexto nacional. Em rias comunidades e nações (MATHEW;
particular, destacaremos 4 experiências in- ROBERTSON, 2021). É relevante notar a
ternacionais ligadas exclusivamente ao fi- participação do financiamento de portos
nanciamento das atividades oceânicas. com design sustentável, em que cargas
A primeira é o programa Pro Blue do de alta periculosidade e terminais petro-



World Bank, iniciado em 2018, que visa, líferos recebem uma gestão de risco com Venture Capital, com Venture Capital, com
no seu objetivo principal, ao desenvolvi- investimento superior à própria despesa risco diversificado risco acentuado
mento sustentável da economia do mar, com equipamentos, implantando uma
sobretudo em economias emergentes. A política de responsabilização e gestão
seleção acontece através de projetos e os paralela à introdução de equipamentos
fundos do World Bank são acompanha- (TIRUMALA; TIWARI, 2020).
dos de consultoria técnica especializada Uma terceira iniciativa é localizada em
para garantir o sucesso do empreendi- Seychelles, no Oceano Índico, ao largo da Carteiras de bancos



mento (SATIZÁBAL; DRESSLER; FABINYI costa da África, onde o governo local, em de investimentos Índices Setoriais
et al., 2020; McFARLAND, 2021). Em vá- parceria com o World Bank, lançou os cha- privados referenciados
rios sentidos, encontra paralelo em ou- mados Blue Bonds, ou “Títulos Azuis”, ga-
tras linhas da instituição, como os fundos rantidos pelo órgão multilateral, mas ge-
voltados para o saneamento básico ou ridos pelo governo local (KEMPER, 2019;
para a educação. MATHEW; ROBERTSON, 2021). A aquisi-
O programa do World Bank, em bases ção desses títulos é a garantia de que são
permanentes, é também o primeiro a ser investidos no setor oceânico, central para
desenhado por uma instituição multilate- o desenvolvimento da nação. Mas como se
Emissão de títulos



ral (NAGIBA; HSING; HUANG; TANAKA, trata de uma pequena nação, que arrecada Carteiras de bancos de


públicos com
2021; McFARLAND, 2021) e sua recente poucos tributos e cujos títulos são pouco investimento públicos
garantias próprias ou
aplicação demonstra que a iniciativa pode recomendados no mercado internacional,
de terceiros
ser reproduzida por outros bancos de in- o World Bank garante a emissão dessa dí-
vestimento localizados no Brasil, como o vida, com resgate a longo prazo (KEMPER,
BNDES, o BRDE, o BNB e o BASA. 2019; McFARLAND, 2021).
Seguindo a mesma tradição de insti- Essa fórmula em que a garantia dos
tuições multilaterais colaborando para o títulos, prazo de resgate e administração
financiamento das atividades oceânicas, dos fundos é compartilhada indica uma Fonte: Elaborado pelos autores
o Asian Development Bank em 2019 lan- possibilidade para governos subnacionais
çou linhas de crédito voltadas para a Ásia ao redor do mundo, mas especialmente
e o Oceano Pacífico (NAGIBA; HSING; aos estados e municípios brasileiros. Na
HUANG; TANAKA, 2021). Como região de medida em que muitos deles são econo
forte impacto oceânico, em transportes, mias significativas, mas com credibilidade

600 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 601


reduzida pela característica subnacional, o nível de conscientização e a disponibili- Referências
ou sem poder de emissão de moeda, a dade e diversificação de instrumentos de
fórmula é passível de aplicação em proje- investimento e apoio poderiam se desen- BAER, W.; KERSTENETZKY, I.; VILLELA, A. McFARLAND, B.J. Blue Bonds and Seas-
tos locais. É preciso considerar a perspec- volver concomitantemente. Em verdade, V. As Modificações do Papel do Estado na cape Bonds. In: Conservation of Tro-
tiva de que muitos municípios litorâneos está relacionado ao baixo conhecimento Economia Brasileira. IPEA, Pesquisa e Pla- pical Coral Reefs. Palgrave Macmillan,
brasileiros e estados tem economias supe- do potencial que os oceanos possuem, nejamento Econômico, v. 3 n. 4, 1973. 2021. Cham. Disponível em: https://doi.
riores à de Seychelles, determinando uma fruto do desconhecimento relativamente CARVALHO, Veridiana R.S.; LIMA, Gil- org/10.1007/978-3-030-57012-5_15.
oportunidade, dentro dos limites de endi- as formas de vida e suas interações com a berto T. Estrutura Produtiva, restrição MOTTA, R. S. Manual para valoração
vidamento institucionais. alimentação, produção industrial e impac- externa e crescimento econômico: a ex- econômica de recursos ambientais.
Finalmente, vale destacar que em 2021 to nas cadeias alimentares. periência brasileira. Economia & Socie- Brasília: Ministério do Meio Ambiente,
o Credit Suisse, forte instituição financei- Ao se permitir uma variedade de ins- dade, v. 18, n.1, 2009. dos Recursos Hídricos e da Amazônica
ra, em pesquisa realizada em 34 países trumentos rentáveis, permite-se de outro CREDIT SUISSE (2021). Super tendên- Legal, 1998. 218 p.
constatou que dos 17 objetivos de susten- modo a própria sustentabilidade e reco- cias, como investir com propósito. NAGIBA, Shiiba; HSING, Hao Wu;
tabilidade estabelecidos pela ONU, o rela- nhecimento da importância que os oce- Disponível em: https://www.credit-suis- HUANG, Michael C.; TANAKA, Hajime.
cionado à vida na água foi o que recebeu a anos possuem em uma visão estratégi- se.com›supertrends-2021-pt. How blue financing can sustain ocean
menor atenção. É necessário apontar que, ca social e econômica (NAGIBA; HSING; DINIZ, E. Empresário, estado e capi- conservation and development: A pro-
como consequência dessa baixa atenção, HUANG; TANAKA, 2021). talismo no Brasil: 1930-1945. Rio de posed conceptual framework for blue
Janeiro: Paz e Terra, 1978. financing mechanism. Marine Policy,
5. Conclusão DRAIBE, S. Rumos e Metamorfoses: Esta- 104575, 2021. Disponível em: https://
do e industrialização no Brasil (1930/1960). doi.org/10.1016/j.marpol.2021.104575.
O financiamento de atividades oceâni- justificariam o estabelecimento de um se- Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. TIRUMALA, Raghu Dharmapuri; TIWARI,
cas na Economia Azul dependerá de um guro, ações de defesa, compatíveis com a KEMPER, Karin. The Seychelles Blue Piyush. Innovative financing mechanism
trabalho paciente que envolve a busca de exploração econômica. Bond: Good for Business and the Pla- for blue economy projects. Marine Po-
recursos junto ao setor público, privado e Em perspectiva, há instrumentos fi- net. (January 2, 2019). Revue Analyse licy, 2020. Disponível em: https://doi.
externo. Na atual estrutura da economia nanceiros e modalidades de financiamen- Financière, 2019, Available at SSRN: org/10.1016/j.marpol.2020.104194.
brasileira, neste início de século 21, há to, inspirados em outros setores e capazes https://ssrn.com/abstract=3805926. ROSTOW, W.W. The stages of economic
uma dificuldade latente para que projetos de sustentar um fluxo de recursos, com LIMA. Joyce Lázaro A valoração econô- growth. Economic History Review,
rentáveis encontrem financiamento está- transparência e dentro de uma faixa de mica ambiental no Brasil. Diálogos: Eco- agosto 1959.
vel e permanente. risco capitalista. O desenho e a disponi- nomia e Sociedade. Porto Velho, v. 2, n. SANT’ANNA, A. C. Valoração Econômi-
Com efeito, a dificuldade de se avaliar bilidade desses produtos são relativamen- 1, p. 147-163, 2018. ca dos Serviços Ambientais de Florestas
o estoque de riqueza contido na Econo- te simples, contudo, dependentes de um MALAN, P. S.; BONELLI, R.; ABREU, M. Nacionais. Revista de Administração e
mia Azul é um obstáculo que do ponto convencimento do público investidor que P.; PEREIRA, J. E. C. Política Econômica Negócios da Amazônia, v. 2, n. 2, p.
de vista teórico está encaminhado, mas desconhece as potencialidades e impor- Externa e Industrialização no Brasil 83-108, 2010.
ainda não implementado. A avaliação tância da Economia Azul. (1939-52). Rio de Janeiro: IPEA, 1977. SATIZÁBAL, P.; DRESSLER, W.H.; FABINYI,
de potenciais estoques de riquezas e de O sucesso no financiamento da Econo- MATHEW, J.; ROBERTSON, C. Shades of M. et al. (2020). Blue economy discou-
possibilidades de extrativismo e gera- mia Azul, de outro modo, integra-se a um blue in financing: transforming the ocean rses and practices: reconfiguring ocean
ção de energia, bem como de atividades reposicionamento da economia brasileira economy with blue bonds. Journal of spaces in the Philippines. Maritime
sustentáveis, é um encorajamento para em socorro a seus objetivos de crescimen- Investment Compliance, Vol. 22 N. 3, Studies 19, 207-221. Disponível em:
atração de linhas, públicas ou privadas. to econômico, desenvolvimento tecnoló- 2021 ,pp. 243-247. Disponível em: https:// https://doi.org/10.1007/s40152-020-
Em especial, a constatação da riqueza e gico e progresso em áreas nas quais é vo- doi.org/10.1108/JOIC-04-2021-0020. 00168-0.
o estabelecimento de um fluxo produtivo cacionado, como a exploração oceânica.

602 ECONOMIA AZUL Financiamento para a Economia Azul 603


29

DESIGN DE NEGÓCIOS AZUIS (DNA):


UMA METODOLOGIA DE IDENTIFICAÇÃO DE SETORES DE
NEGÓCIOS PARA OS MUNICÍPIOS COSTEIROS BRASILEIROS

Sergio Ricardo da Silveira Barros


Paschoal Prearo Junior
Jorge Eduardo Lins Oliveira
Aldo Aloísio Dantas da Silva

1. Definindo os territórios costeiros e marítimo adjacentes no Brasil e


sua importância socioeconômica

A definição de zona costeira é demasia- Por ser um espaço geográfico de extre-


damente discutida na atualidade, poden- ma importância para o Estado, foi inserida
do ser considerada a interface entre terra, na Constituição Federal Brasileira (1988)
atmosfera e o oceano, ou o espaço onde como área de patrimônio nacional. De acor-
acaba a influência do mar e começa a influ- do com o Plano Nacional de Gerenciamen-
ência da terra, ou vice-versa. Sendo um es- to Costeiro I e II (Lei 7.661 de 1988; CIRM/
paço intermédio entre litosfera, atmosfera PNGC II, 1997), a zona costeira é conside-
e hidrosfera, seus limites são muito difíceis rada como um espaço geográfico de intera-
de estabelecer. Não existindo um sistema ção do ar, do mar e da terra, incluindo seus
rígido de definição de zona costeira que recursos renováveis ou não, abrangendo
deva ser seguido internacionalmente, cada uma faixa marítima e outra terrestre.
país adapta o seu sistema e a sua definição, As relações atuais da sociedade na zona
dependendo das condições, das suas capa- costeira estabeleceram um conceito de
cidades e dos seus objetivos na abordagem valor crematístico, ou seja, o valor desses
do tema. A zona costeira pode ser consi- espaços é formado por um mercado imo-
derada um macro sistema geoambiental biliário, em face da escassez e da disponi-
formado na área de interação direta entre bilidade para usos futuros. Segundo Mo-
o domínio oceânico e o domínio terrestre. raes (1999), seus espaços são qualificados
Composta por diferentes paisagens, abriga como raros, de localização privilegiada,
uma diversidade de ecossistemas de alta finitos e relativamente escassos, dotados
fragilidade (BARROS, 2007). de especificidades e vantagens locacionais.

604 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 605


Dessa forma, são marcados atualmente priação e os seus usos (MORAES, 1999). É seu potencial de expansão ainda não foi Outro vetor de ocupação da zona cos-
por uma apropriação sociocultural que os interessante notar que esta lógica da valo- explorado devidamente, principalmente no teira que atualmente encontra-se em evi-
identifica como local de veraneio e lazer rização e apropriação está relacionada aos contexto da cabotagem e no transporte de dência é o turismo, considerado a vocação
por excelência, quando bem preservados. espaços horizontais assim como aos verti- águas interiores, contudo, a recente publi- de muitos municípios costeiros. Segundo
As dimensões das áreas utilizadas pelos cais, ou seja, quanto mais ampla é a mi- cação da legislação – Lei nº 14.301, de 7 de Moraes (2004), são as funções turísticas
empreendimentos na zona costeira estão rada para o litoral, maior será o seu valor. janeiro de 2022 – institui o Programa de Es- as principais responsáveis pela dinâmica
diretamente relacionadas ao seu retorno, Sendo assim, é importante destacar que tímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do hoje vivenciada em tais espaços. Esta ativi-
vide exemplo, os complexos portuários e o objetivo do capítulo é propor um modelo Mar) como nova forma de estímulo ao setor. dade vem explorando os ambientes litorâ-
turísticos. Submetidos a uma lógica mer- para identificar setores e atividades econô- O principal problema relacionado à in- neos num processo bastante desordenado.
cantil, o valor dos espaços costeiros é bem micas mais compatíveis aos territórios dos dustrialização na zona costeira é a degrada- Multiplicam-se os complexos hoteleiros,
mais elevado do que os da hinterlândia, municípios costeiros, denominado Design ção ambiental provocada pelos lançamen- os balneários e as marinas, criando um
o que acaba por condicionar a sua apro- de Negócios Azuis. tos de rejeitos e efluentes carreados pelos mercado imobiliário com insuficiente visão
rios e pela atmosfera. Entretanto, algumas de ordenamento espacial, estabelecendo
outras formas de poluição são lançadas empreendimento sem infraestrutura de sa-
2. Da Economia do Mar à Economia Azul diretamente nos oceanos, como podemos neamento e apropriando-se ilegalmente de
citar: as tubulações de efluentes industriais áreas públicas (QUADROS; FILHO, 1998).
A formação da Economia do Mar flo- A atividade industrial tem-se intensi- e urbanos, emissários submarinos, rejeitos A falta de ação política na zona costeira
resce em pequenos agrupamentos huma- ficado na zona costeira com a criação de das operações da indústria petroquímica e permitiu que municípios sem infraestrutura
nos através do uso do mar nas atividades diversos polos e distritos industriais, sobre- das plataformas de petróleo e, finalmente, turística deixassem construir enclaves, re-
de transporte e comércio marítimo, junta- tudo os relacionados à produção de ener- das atividades marítimo-portuária, através dutos isolados, em seus territórios. Os ho-
mente com a atividade pesqueira devido gia através da produção de petróleo e gás, de lavagens de porões e resíduos de bar- téis tipo resorts contribuem, sem dúvida,
à abundância de alimentos e à rica biodi- e atualmente, das renováveis conforme caças. No que se refere ao gerenciamen- com arrecadação de impostos municipais e
versidade disponível nas águas costeiras. o Decreto nº 10.946 de 25 de janeiro de to costeiro, é importante uma política que estaduais, contudo, para a economia local
Muitos dos aglomerados urbanos e cidades 2022, que trata da cessão de uso de espa- integre as metas dos setores industriais a pouco contribuem, geram grandes exter-
costeiras do mundo possuem uma cultura ços físicos e o aproveitamento dos recursos maior eficiência ambiental das atividades, nalidades socioambientais, alterando ecos-
e um modo de vida associado ao mar, com naturais em águas interiores de domínio da principalmente as do setor do petróleo e as sistemas, bem como a cultura local, geran-
áreas de elevado potencial econômico para União, no mar territorial, na zona econô- do setor marítimo-portuário. do, consequentemente, uma desagregação
a nossa sociedade moderna. A produtivi- mica exclusiva e na plataforma continental A urbanização é o principal vetor de ocu- social das comunidades tradicionais onde
dade das lagoas costeiras, manguezais e para a geração de energia elétrica a partir pação da zona costeira, que, desde o pe- se instalaram. Atualmente novas formas
estuários têm um importante papel a de- de empreendimento offshore, o que pode- ríodo colonial, o país apresenta um modelo de turismo se apresentam, como aponta
sempenhar na produção alimentar, através rá gerar sérios impactos socioambientais econômico voltado para a exportação. Um Weeden (2001), seguindo os princípios da
da manutenção da pesca e da aquicultura, se não forem gerenciados com a partici- fenômeno que caracteriza a urbanização na sustentabilidade, e que estão relacionados
bem como na preservação da cultura e da pação da sociedade nos lugares onde se zona costeira é o descontrole do ordena- com a equidade social, econômica e am-
biodiversidade (BARROS, 2003). encontram instalados esses empreendi- mento espacial, que tem sua matriz história biental. Acrescenta ainda que existem dife-
Segundo Carvalho e Rizzo (1994) e mentos. A industrialização foi responsável vinculada às dinâmicas dos ciclos econômi- rentes formas de turismo sustentável, como
Quadros e Filho (1998), os vetores de ocu- pelo processo de urbanização, induzindo cos ali implantados. Este processo tem ge- o turismo comunitário, turismo responsável
pação da costa brasileira, bem como o de- a população brasileira para uma nova or- rado um inchaço das grandes cidades cos- e ecoturismo, contudo, cada tipologia tem
senvolvimento de uma economia do mar denação espacial. O crescimento industrial teiras, cabendo destacar, segundo Moraes seu próprio ponto de vista ético.
foram: (1) a industrialização, que está li- brasileiro centralizou-se principalmente no (1999), que cinco das nove regiões metro- Gostaríamos de salientar que quando
gada diretamente ao segundo vetor, (2) a eixo Rio-São Paulo, onde estão localizados politanas do país se localizam nessa faixa, tratamos de economia do mar remete-se
urbanização. Por sua vez, esta última está os maiores portos e terminais do país, o agregando 15% da população. No estado à ideia de uma economia tradicional, já
ligada ao terceiro vetor, (3) o de transportes de Santos, o do Rio de Janeiro e o de Ita- do Rio de Janeiro, este número aumenta consolidada em designs economicamente
e, finalmente o quarto, (4) o turismo. guaí. O setor de transporte marítimo com para 65% da população (BARROS, 2007). lucrativos, mas que trazem externalidades

606 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 607


negativas marcantes no território, como . Pesquisas do meio marinho, a produção mobilizados pesquisadores com diferentes metodologia replicável que sirva de base
mencionado nos parágrafos anteriores. Já e integração de informação e de geração formações para sistematizar uma escolha para avaliar e propor atividades econômi-
a Economia Azul se diz sustentável, com de novos conhecimentos; de modelo de negócios que contemple for- cas para a Zona Costeira que tenha interface
aportes de novos negócios e inovação, mais
alinhada às necessidades do século XXI. Po-
. Aumento do investimento empresarial mas de arranjos produtivos locais específi-
cos para cada uma das Zonas Costeiras e
com a Política Nacional de Ordenamento Ter-
ritorial (PNOT), o Plano Nacional de Geren-
em atividades da economia do mar.
de-se definir esta Economia Azul como uma suas regiões oceânicas adjacentes. ciamento Costeiro (PNGC), o Planejamento
A Economia Azul, na qual setores eco-
“economia do mar sustentável, resultante O conceito de design deixa de conce- Espacial Marinho (PEM) e ao Plano Setorial
nômicos já consolidados estão sendo trans-
do equilíbrio entre a atividade econômica e ber somente produtos e passa a incluir para os Recursos do Mar (PSRM – CIRM).
formados em um crescente alinhamento
a capacidade a longo prazo dos ecossistemas processos, sistemas e organizações, assu- O Design de Negócios Azuis (DNA) de-
potencial futuro, desenvolve-se na União
oceânicos para suportar atividades que não mindo uma posição estratégica que auxi- verá ser atrelado ao conceito da Especializa-
Europeia através das atividades de aquicul-
afetem os serviços prestados por esses ecos- lia na tomada de decisão de empreende- ção Inteligente, cuja estrutura se dá numa
tura, do turismo costeiro, da biotecnologia
sistemas, permanecendo, assim, resilientes dores (NICOLETTI; SCALETSK; FRANZATO, seleção de atividades consideradas estraté-
marinha, da energia renovável oceânica.
e saudáveis” (ECONOMIA AZUL, s/d). Cabe 2018). O design estratégico de negócios gicas para o desenvolvimento e a mudança
Esta é uma importante visão da Comuni-
destacar que a Economia Azul necessita en- é uma metodologia de administração, ges- da estrutura social de uma região (PINTO
dade Europeia, que traz novos designs de
frentar um conjunto de desafios e oportuni- tão e governança, que mantém seu foco na et al., 2019). Refere-se à estruturação so-
negócios para os ambientes costeiros e ma-
dades relevantes, conforme destaca o Fórum sustentabilidade, promovendo o bem-estar cioeconômica de uma região buscando
rítimos, um conceito ainda emergente para
Desafios do Mar 2030, Fórum Oceano/PWC entre os atores, stakeholders e investidores alcançar uma rede de domínio científico,
muitos países, mas tem grande potencial
.
(FÓRUM OCEANO, s/d), são eles: diretos ou indiretos na interface das ativida- tecnológicos e de inovação, destacando-se
para valor econômico e criação de empre-
Descarbonização e transição energética, des e tarefas do negócio como um todo. O das demais para o desenvolvimento. Essa
gos, bem como para valoração dos serviços
que afeta evidentemente todos os setores design estratégico é capaz de considerar to- rede tem o papel de catalisar esses domí-
ecossistêmicos. A economia do mar mun-
da economia do Mar e especialmente os dos os aspectos no desenvolvimento de um nios para uma mudança estrutural de uma
dial foi avaliada de forma conservadora em
setores das indústrias navais, dos trans- modelo de negócio, contemplando as rela- região. O modelo pressupõe a participação
cerca de US$ 1,5 trilhão por ano em 2010
portes marítimos e das energias renová- ções entre organização, mercado e usuários, de instituições de ensino e pesquisa, em-
(equivalente a 2,5% do PIB) pela OCDE
veis marinhas; bem como desenvolvimento de produto, presas, governo e sociedade, cuja partici-

.
(2016). Segundo a Comissão Europeia
geração de valor, devendo estar conectado pação na gestão é fundamental. Para que
Circularidade da economia, no sentido (2021), se a economia azul global fosse um
ao território onde é desenvolvido (NICOLET- o modelo seja bem-sucedido, é necessário
da transformação de modelos lineares de país, seria a sétima maior do mundo, e o
TI; SCALETSKY; FRANZATO, 2018). que a região consiga definir três fatores:
produção para modelos circulares, desafio oceano, como entidade econômica, seria
O Design de Negócios Azuis (DNA) tem visão sobre o futuro desejável; estabelecer
que é transversal a todos os setores e espe- membro do G7, assegurando 4,5 milhões
sua matriz no design estratégico, contudo, um elenco de prioridades e implementar as
cialmente ao setor pesqueiro (conservação de postos de trabalho diretos com o cresci-
está atrelado aos ODS1 (Objetivos do De- ações mais adequadas.
e transformação) e das indústrias navais; mento de setores inovadores, como: ener-
senvolvimento Sustentável), principalmente
. Transição digital, desafio transversal a to- gia marítima renovável; bioeconomia azul;
biotecnologia e dessalinização (COMISSÃO
aos que têm grande aderência aos temas li-
gados às zonas costeiras e regiões oceânicas
3.1. Metodologia para aplicação do
design
dos os setores, estabelecidos e emergentes; EUROPEIA, 2021).
adjacentes, eliminação da pobreza e gera-
ção de renda. Sua definição é a proposição O Design de Negócios Azuis possui sua
3. Design de Negócios Azuis (DNA) de um conjunto de atividades econômicas origem em Barros (2007) e contém 4 (qua-
viáveis e emancipadoras, para os diversos tro) fases na sua execução, possuindo um
A dificuldade da gestão integrada dos fragilidades econômicas das relações entre espaços marinhos e costeiros, através caráter interdisciplinar através de um diálo-
espaços costeiros tem como base a dificul- os sistemas continental e oceânico adjacen- de um design de negócios inovador e go de saberes entre os diversos atores: aca-
dade dos órgãos governamentais, em suas tes, o que causam múltiplos conflitos sobre instigante, observando características dêmicos, governamentais e da sociedade
diferentes escalas, de articular, sistema- as dimensões econômicas, sociais, ambien- locais, o papel da política, inovação e o civil em um contexto de grupo focal. A me-
tizar e gerenciar informações que permi- tais e políticas nas estratégias nacionais meio ambiente, voltado, principalmente, todologia parte da análise histórico-espacial,
tam o conhecimento das potencialidades e de desenvolvimento. Sendo assim, foram para geração de emprego e renda. Uma considerando seus usos e conflitos de modo

608 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 609


a compatibilizá-los ao desenvolvimento de micas nos espaços costeiros. É importante 3.1.1. Fase I – Definição da área de recursos costeiros e oceânicos adjacentes?
atividades sustentáveis. Esta metodolo-
gia se amplia com a visão da Especializa-
salientar que a interdisciplinaridade e a par-
ticipação social promovem um alargamen-
estudo e elaboração do diagnóstico
. De que maneira se verifica o cumpri-
ção Inteligente (RIS3) (PINTO et al., 2019), to do campo de visão da ciência clássica, A primeira fase do DNA sugere: (1) a de- mento desses requisitos legais pelos atores
envolvidos?
. Quem são os atores sociais envolvidos e
cuja estrutura está calcada numa estrutura em decorrência da complexidade. Segundo finição da área de estudo da zona costeira
econômica baseada na seleção de conheci- Morin (2004, p. 13), a abordagem interdis- e oceânica adjacente; (2) a elaboração de
mentos estratégicos para o desenvolvimen- ciplinar se faz cada vez mais necessária. um diagnóstico físico, biológico, socioes- os responsáveis pelos problemas da área de
to de determinada região, que, no nosso pacial, socioeconômico; (3) levantamento estudos? Quais são seus interesses, limita-
Torna-se cada vez mais evidente a ina-
caso, é a costeira. dos aspectos legais; (4) Plano Estratégico a ções e potencialidades?
dequação entre os saberes formais (dis-
O Design de Negócios Azuis, doravante partir do DNA.
ciplinares), face às suas fragmentações
nominado DNA, é uma proposta de ativi- Uma questão muito relevante será a de- 3.1.2. Fase II – Definição dos conflitos
e compartimentações, principalmente,
dades compatíveis aos princípios da susten- finição prévia da área de estudo, ou seja, de usos
quando se defrontam com problemas
tabilidade forte que, segundo Leff (2003), um espaço geográfico onde serão realiza-
cada vez mais poli disciplinares, multidi-
promove a construção de uma nova racio- dos os estudos de base, área que será obje- Os conflitos de usos são, na verdade,
mensionais e em escala planetária.
nalidade produtiva, fundada nos limites to de coleta de dados primários ou secun- “conflitos gerados” pela incompatibili-
das leis da natureza, assim como nas po- Em resumo, o DNA procura estabelecer dários. Os estudos de base são os pilares dade entre valores culturais de diferentes
tencialidades ecológicas e na criatividade um terreno comum para uma política de no processo de elaboração de um DNA, grupos humanos, que, ao estabelecerem
humana. É aliado também a um arcabouço consenso, capaz de integrar os diferentes e em torno deles gira a organização dos contato, exercem diferentes relações de
interdisciplinar, que procura apontar ca- interesses locais que moldam o campo con- trabalhos de campo e de levantamento de uso do território, podendo exercer efeitos
minhos para problemas complexos, como flitivo através da apropriação dos espaços informações, assim como a estruturação desintegrantes sobre suas culturas (AZE-
é a gestão de múltiplas atividades econô- costeiros (Figura 1). do próprio diagnóstico. Os resultados dos VEDO, 1977). Os conflitos relacionados às
estudos de base mostram uma análise da populações tradicionais na zona costeira
situação atual da área de estudo feita por ocasionam, em última análise, a absorção
Figura 1. Metodologia para a construção do
meio de levantamentos dos componentes de novos valores trazidos por uma nova
Design de Negócios Azuis do meio físico, biológico, socioespacial, cultura, uma nova relação com o meio am-
socioeconômico, seus riscos ambientais e biente e o abandono do seu grupo de ori-
FASE I - DEFINIÇÀO DOS LIMITES DA ÁREA DE
do levantamento dos requisitos legais, con- gem. Este fenômeno muito observado com
ESTUDO E ELABORAÇÀO DE UM DIAGNÓSTICO templando as suas interações. os pescadores e os pequenos agricultores,
O diagnóstico da área de estudo deverá que abandonam sua atividade tradicional
responder a questões-chave abaixo elenca- por trabalhos de apoio ao veraneio como:
FASE II - DEFINIÇÃO DOS CONFLITOS DE USOS das, e são elas: caseiros, pedreiros, serventes de obras etc.,

. Quais são as características do território,


passando a pesca e a agricultura a ser sua
segunda ocupação (CALSJ, 2000).
da paisagem, das atividades econômicas, Entende-se por conflitos ambientais
FASE III - ZONEAMENTO ECOLÓGICO - ECONÔMICO do perfil da população, dos aspectos legais
(PRESENTE) aqueles envolvendo grupos sociais com
e dos ecossistemas locais?
. Qual é a importância da área de estu-
modos diferenciados de apropriação, uso e
significação do território, tendo sua origem
do para as partes interessadas? E quais são quando pelo menos um dos grupos tem
PLANO ESTRATÉGICO PARA ATIVIDADES sua forma vida ameaçada. A apropriação
ECONÔMICAS COMPATÍVEIS COM A ZONA os bens, serviços e usos associados a esses
ecossistemas/espaços urbanos? se dará pelos impactos indesejáveis – trans-

. Existem dispositivos legais adequados/


COSTEIRA E ÁREAS OCEÂNICAS ADJACENTES mitidos pelo solo, ar, água, ou sistemas
vivos decorrentes do exercício das práticas
Fonte: Elaborado pelos autores dos outros grupos (ACSELRAD, 2004).
eficazes para a proteção e conservação dos

610 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 611


Os conflitos, segundo Bourdieu (2004), beneficiar diretamente mais do que outras. dos espaços são as fontes dessas crises, os A metodologia empregada por Barros
se impõem no campo de produção simbóli- O marco característico desse novo direito problemas gerados nessas apropriações são (2007) foi composta por Diegues (2001),
ca como um microcosmo de luta simbólica é, segundo Marques (2005), a indetermi- de natureza socioambiental, econômica, Quadros e Filho (1998) e pela Legislação
entre as classes, que Viégas (2009) apre- nação dos titulares. cultural e política. Os conflitos se instalam Estadual do Rio Grande do Norte, referente
senta como um processo que se reproduz O modelo utilizado para identificação gerando problemas de toda ordem, diante ao Zoneamento Ecológico-Econômico Cos-
nas sociedades através do confronto dos dos conflitos, segundo Theodoro (2005), das diferentes e conflitantes racionalidades teiro (ZEEC). A seguir é apresentada a me-
diferentes projetos de uso e significação valida as relações desiguais de poderes defendidas, pelos dois lados do conflito, para todologia empregada criando as seguintes
dos seus recursos ambientais e territoriais, (companhias petrolíferas x comunidades o uso dos bens coletivos ou de uso comum. áreas de zoneamento (Quadro 2).
o que significa admitir que a “questão am- tradicionais; latifundiários x agricultores O modelo de identificação do conflito a O ZEE deve atentar para os Planos Dire-
biental é intrinsecamente conflitiva, embo- sem-terra; índios x garimpeiros; comunida- seguir sugere que, a partir do conhecimen- tores, vulnerabilidades socioambientais e eco-
ra isso não seja reconhecido”. des de remanescentes de quilombos x em- to dos campos de poder, o gestor possa, lógicas e a participação dos atores sociais e
Não se pode furtar da discussão dos presas) que são as geradoras dos conflitos de alguma forma, mediar as ações no terri- partes interessadas, visando aos princípios do
conflitos de usos os direitos difusos. Nos- de base territorial. Dentro dessa lógica os tório de modo a torná-los compatíveis en- desenvolvimento local e da sustentabilidade.
sa Constituição Federal (1988) estabelece, conflitos poderão ser analisados segundo tre os grupos mais poderosos, no sentido Desta forma, conforme cita Buarque (2002),
por exemplo, que o meio ambiente é um os Elementos de Análise: Os Atores; A na- econômico, e os grupos mais fragilizados, para serem empregadas as propostas de zo-

.
bem de uso comum do povo, fundando tureza; A Escala; os Objetos e as Dinâmicas ou seja, aqueles que sentem os efeitos da neamento dos espaços costeiros deverão:
uma nova titularidade, fora da esfera do (Quadro 1). nova forma de usos de espaços. Para isso, é
Ter delimitação da área de atuação do

.
direito público e privado, que é o direito da Na prática dos conflitos, as classes do- importante um ordenamento do território
planejamento;
coletividade. Existe uma grande dificulda- minantes estabelecem suas estratégias de que avaliem esses usos, e um exemplo é o
Possuir o conhecimento da realidade so-
de em entender que a titularidade de uma ação, que, segundo Bourdieu (2004), ten- zoneamento ecológico-econômico.
cioeconômica e cultural da área de planeja-

.
das partes do conflito é a coletividade. O dem a reforçar a crença na legitimidade de
mento;
titular sempre é o grupo, e não as pessoas sua dominação, tanto dentro de sua classe 3.1.3. Fase III – Zoneamento ecológico-
Criar um diagnóstico dos fatores que po-
individualmente, embora umas possam se como fora dela. Os processos de apropriação econômico (ZEE)
dem facilitar e dificultar o desenvolvimento
Quadro 1: Modelo de identificação dos conflitos de usos
Elementos de Descrição do conceito
Segundo Salim e Melo (2004), o ZEE
é um instrumento político e técnico de
.
local;
Estabelecer um prognóstico que busca
antecipar os possíveis desdobramentos fu-
planejamento cujo objetivo é otimizar o
análise turos da realidade atual, que terá por obje-
uso do espaço e as políticas públicas. É,
Os atores
tivo identificar as oportunidades que a re-
Indivíduos, grupos, organizações ou o Poder Público  sem dúvida, uma ferramenta de gestão
envolvidos no são movidos por interesses, valores e percepções próprias gião poderá oferecer no futuro e os fatores

.
para organizar as informações sobre o
conflito a cada um. exógenos que poderão constituir ameaças;
território, necessárias ao planejamento da
Selecionar as ações convergentes e articula-
Os que têm naturezas diferentes (campos do poder) ocupação racional e ao uso sustentável dos
A natureza das capazes de transformar a realidade atual.
econômica; política; socioambiental. recursos naturais. É um instrumento políti-
co para aumentar a eficácia das decisões O que Buarque (2002) propõe está bem
A escala Lugar, regional e global. políticas e da intervenção pública na gestão alinhado aos caminhos que a DNA percor-
do território e para criar canais de nego- re para propostas estratégicas de atividades
Os objetos Podem ser bens ou símbolos (material ou simbólica); ciação entre as várias esferas de governo e compatíveis com a Zona Costeira. Dessa
público ou privado; profana ou sagrado. a sociedade civil. O fator limitante desses forma, a próxima fase contempla as etapas
zoneamento ecológico-econômico são os finais, em que deverão ser apresentados
As dinâmicas As dinâmicas trazem em si as componentes históricas do
aspectos legais, os seja, deve-se compati- planos e projetos estratégicos de atividades
processo de apropriação e usos dos espaços; dos danos e
impactos ambientais.
bilizar as legislações gerais e específicas de econômicas alinhadas a um zoneamento
ordenamento territorial de modo a se evi- ecológico-econômico costeiro, bem como
Fonte: baseado nos modelos de Theodoro (2005) tar conflitos jurisdicionais. a mitigação dos conflitos de usos.

612 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 613


Quadro 2: Modelo de Zoneamento Ecológico-Econômico Quadro 3: Roteiro do Plano Estratégico do Design de Negócios Azuis

a. Pesca tradicional e PLANO ESTRATÉGICO PARA AS ATIVIDADES ECONÔMICAS DA ZONA


a. Manguezal em toda a sua Áreas de uso
econômico artesanal COSTEIRA
extensão; b. Ecoturismo e turismo
Áreas de b. Mata Atlântica; intensivo (AUEI) responsável Vulnerabilidades
Proteção e Mata Ciliar. Faixa mínima de c. Esporte de contato primário Levantamento das atividades econômicas presentes, ou seja,
conservação preservação de 50 (cinquenta) socioambientais
respeitando os respectivos zoneamentos existentes e outros
(APC); metros, a partir do leito mais São áreas associadas a e ecológicas
sazonal, medida horizontalmente. aspectos legais nas três esferas de poder
ecossistemas que vem sofrendo
d. Restingas, Dunas e Praias forte degradação na zona
e. Costões Rochosos costeira.
Áreas de
a. Ecossistemas costeiros
Potencial Risco adjacentes à área urbana
a. Áreas de lazer náutico e reparos; Ambiental b. Ecoturismo e turismo Plano Estratégico para Atividades Econômicas Interação com
Áreas de uso (APRA)
b. Porto e Estaleiros responsável Projeção 5 anos e 10 anos partes interessadas
econômico
exclusivo c. Petrolíífera c. Ecossistemas pressionados
d. Turismo por atividades econômicas
(AUEE)
e. Pesca Industrial não compatíveis
Os Planos Estratégicos irão sugerir atividades
Áreas Urbanizadas São os núcleos urbanos econômicas através de um mapeamento estratégico de
e de Expansão localizados na Zona Costeira áreas conforme o método escolhido para Zoneamento
Urbana (ZC) e demais sedes municipais.
(AUEU) Ecológico para a Zona Costeira

Áreas de Proteção e conservação (APC); Obs.: estas áreas deverão estar relacionadas à classificação Fonte: Elaborado pelos autores
pela CONAMA nº 357, que estabelece para essas atividades a classe 1 para águas salinas e salobras.
P – Fatores Políticos locais que po- regulamentação ambiental; gestão de re-
Áreas de uso econômico exclusivo (AUEE) Obs.: estas áreas deverão estar relacionadas à classificação
dem influenciar os negócios, são eles: síduos e efluentes; sustentabilidade; ade-
pela CONAMA nº 357, que estabelece para essas atividades a classe 2 para águas salinas e salobras.
mudança de governo; políticas gover- rência aos protocolos ou acordos para
Áreas de uso econômico intensivo (AUEI) Obs.: estas áreas deverão estar relacionadas à classificação
namentais; conflitos internos; relação redução de emissão de carbono; certi-
pela CONAMA nº 357, que estabelece para essas atividades a classe 1 para águas salinas e salobras.
público e privado etc. ficações visando à gestão sustentável.
Fonte: Barros (2007)
E – Fatores Econômicos que influen- L – Fatores Legais (regulatórios): Planos
ciam os negócios: geração de renda; Diretores, Zoneamentos Territoriais, Lei
4 - Plano estratégico para atividades econômicas compatíveis com a taxa de juros; câmbio; índices de preço; Trabalhista; Proteção do Consumidor;
zona costeira e oceânicas adjacentes sazonalidade de produção; economia Regulamentação e Normas do segmen-
local; índices de confiança; relações co- to específico; Órgãos regulatórios; Legis-
Um plano estratégico deverá alinhar e compatibilizar programas com objetivos merciais; nível de mão de obra; taxa de lação atual e tendências de mudança.
seu foco em ações futuras que gerem va- e metas, procurando otimizar projetos desemprego etc.
lor para o território, permitindo conciliar onde serão gerados os produtos de todo S – Fatores Sociais que influenciam os Importante esclarecer que os fatores aci-
metas de desenvolvimento econômico o planejamento. Os Projetos estratégicos negócios: expectativa de vida; cresci- ma são exemplificações, podendo entrar na
e de minimização às desigualdades so- (Design de Negócios Azul) deverão seguir mento populacional; taxa de natalida- análise de cada fator outros argumentos re-
ciais, aliado à conservação dos espaços o roteiro abaixo (Quadro 3): de; padrões de consumo; papéis sociais lacionados ao tema. As propostas das ativi-
naturais. Para se estabelecer um plano Os projetos estratégicos, alinhados por idade e gênero; cultura local. dades econômicas mais viáveis deverão ser
estratégico, os municípios costeiros de- em atividades econômicas, serão pro- T – Fatores Tecnológicos que influenciam transformadas em projetos estratégicos para
verão instituir o seu Plano Municipal de postos a partir dos impactos provocados os negócios: legislação em relação à tec- sua viabilidade ou aumento de sua poten-
Gerenciamento Costeiro, observadas as pelos fatores do acrônimo PESTAL, são nologia; maturidade tecnológica; tecno- cialidade naquele referido território costeiro
normas e diretrizes do Plano Nacional de eles: POLÍTICO, ECONÔMICO, SOCIAL, logias emergentes; pesquisa e inovação. conforme sua análise a partir da PESTAL.
Gerenciamento Costeiro, bem como seu TECNOLÓGICO, AMBIENTAL E LEGAL, A – Fatores Ambientais que influenciam Como exemplo, podemos citar o esta-
Plano Diretor. Ao plano cabe sistematizar exemplificados abaixo: os negócios: gestão de sustentabilidade; do do Rio de Janeiro, que aprovou a Lei nº

614 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 615


9.466, de 25 de novembro de 2021, que poderão ser implementadas ou potenciali- Quadro 5: DNA – Matriz de Qualificação do Design de Negócios Azuis
cria a Política Estadual de Incentivo à Econo- zadas em seu município costeiro a partir da

TECNOLÓGICO
mia do Mar, como estratégia de desenvolvi- avaliação de um grupo focal. Esta avaliação

ECONÔMICO
ECONÔMICO

AMBIENTAL
AMBIENTAL
mento socioeconômico do estado. Esta lei parte de uma análise qualitativa, em que o

TECNOLÓGICO
SETOR
SETOR ATIVIDADE
ATIVIDADE

POLITICO
ECONÔMICO
POLITICO

AMBIENTAL
estabelece uma lista com as principais ati- 0 (zero) representa que o fator é neutro, e

SOCIAL
SOCIAL
SETOR ATIVIDADE

LEGAL

TOTAL
TOTAL
LEGAL
POLITICO
vidades relacionadas à Economia do Mar e não tem relevância com a atividade propos-

SOCIAL

TOTAL
LEGAL
que foi a base para a matriz de avaliação do ta, até o valor 5 (cinco), onde o fator tem Captura ee processamento
Captura processamentodedepescado
pescadoe frutos
e frutos
DNA. Nesse contexto, o modelo DNA avalia total relevância (benéfica), ou até -5 (menos setor
setorde
depesca
pescae do
do mar
mar
Captura e processamento de pescado e frutos 0 3 3 0 -3 0 3
e aquicultura
aquicultura Atividades deaquicultura
aquicultura
as atividades econômicas fazendo um cruza- cinco), onde o fator tem total relevância ne- setor de pesca
Atividades
do mar de 3
0 33 3
3 30 -3 3
0 0 15
3
Comercialização
Comercialização depescado
de pescadoe frutos
e frutos
dodo mar;
mar; 03 33 33 03 00 0 6
mento com a PESTAL, de modo que o ges- gativa (adversa). Abaixo encontra-se o qua- e aquicultura Atividades de aquicultura 3 15
Atividades
Atividades de
de apoio
apoio à àextração
extração dede óleo
óleo e
e gásgás
tor possa ter um elenco de atividades que dro de análise qualitativa (Quadro 4). Comercialização de pescado e frutos do mar;
offshore 0 3 3 0 0 0 6
offshore de apoio à extração de óleo e gás
Atividades 0 5 1 -3 -5 0 -2
Exploraçãoeeextração
Exploração
offshore extraçãodedeóleo
óleoe gás
e gás natural
natural
Quadro 4: Avaliação qualitativa dos impactos offshore; 0 5 1 -3 -5 0 -2
offshore; e extração de óleo e gás natural
Exploração 5 5 1 -3 -5 0 3
setor
setor de
de óleo
óleo&& gás
gás
Atividades de
Atividades
offshore; de escoamento,
escoamento, transporte,
transporte,
5 5 1 -3 -5 0 3
5 IMPACTA MUITO POSITIVAMENTE setor de óleo & gás distribuição
distribuiçãode
Atividades ee processamento
natural offshore;
processamentode degás
escoamento, transporte,
gásnatural

offshore; e processamento de gás


distribuição 5 5 -3 -3 -5 0 -1
3 IMPACTA POSITIVAMENTE Refinarias
Refinarias
natural ee petroquímicas;
petroquímicas;
offshore; -35 55 -3 -3 -5 0 -9
-3 -3 -5 0 -1
Indústria militar
Indústria militarnaval;
naval; -3 35 -3 -3 -5 00 -11
0 NEUTRO setor
setor de
deconstrução
construçãoe
Refinarias e petroquímicas; -3 -3 -3 -5 -9
e reparos
reparosnavias
navias
Indústria militar naval; -3 3 -3 -3 -5 0 -11
-3 IMPACTA NEGATIVAMENTE setor de construção Construção,reparação,
Construção, reparação,descofmissionamento
desmantelamento de
descomissionamento e e

e reparos navias desmantelamento


Construção, deembarcações
reparação,embarcações e plataformas
e plataformas
descofmissionamento e -3 3 -5 -3 -5 0 -13
-5 IMPACTA MUITO NEGATIVAMENTE Exploraçãoeeextração
Exploração
desmantelamentoextração mineraloceânica
mineral
de embarcações oceânica ee
e plataformas
-3 3 -5 -3 -5 0 -13
setor
setor de
de mineração
mineração offshore;
offshore; e extração mineral oceânica e
Exploração -3 3 -3 -3 -5 0 -11
Fonte: Elaborado pelos autores Extraçãoeerefino
Extração
offshore; refino de
desal
salmarinho
marinhoeesal-gema;
sal-gema; -3 33 -3 -3 -5 00 -11
setor de mineração -3 -3 -3 -5 -11
Turismo costeiro
costeiro ee marítimo;
-35 53 -35 -33 -3 00 15
Turismo marítimo;
Para validação da metodologia desen- ecoturismo, turismo de aventura, turismo Extração e refino de sal marinho e sal-gema; -5 -11
setor
setor de
de turismo
turismo Mergulhocosteiro
Mergulho recreativo,
recreativo, científico ee profissional;
científico profissional; 55 55 55 33 -3 00 15
Turismo e marítimo; -3 15
volvida, o modelo foi aplicado fazendo-se esportivo etc. Contudo, o Relatório de Dis- setor de turismo Marinas
Marinas ee clubes
clubes náuticos
náuticos
Mergulho recreativo, científico e profissional; 55 55 55 33 -3
-3 00 15
15
uma simulação no município costeiro de tribuição das Rendas Petrolíferas entre os Desenvolvimento
Desenvolvimento ee manutenção
manutenção de de
Marinas e clubes náuticos
equipamentos de navegação e busca 5 5 5 3 -3 0 15
equipamentos de navegação e busca 5 3 5 3 0 3 19
Saquarema, no litoral do Rio de Janeiro, na Municípios Fluminenses, do CENPE MPRJ Desenvolvimento e manutenção de
Pesquisa, Desenvolvimento
Pesquisa,
equipamentosDesenvolvimento
de navegaçãoeeInovação
eInovação (PD&I)
busca (PD&I) no
região denominada Baixada Litorânea, per- (2019), relata que o município depende de setor
setor de
de P&D
P&D ambiente marinho; 5 3 5 3 0 3 19
no ambiente
Pesquisa, marinho;
Desenvolvimento e Inovação (PD&I) no 5 3 5 3 0 3 19
tencente ao macrocompartimento do litoral aproximadamente 30% de suas receitas setor de P&D Biotecnologia
Biotecnologia
ambiente marinha;
marfinha;
marinho; 55 33 55 33 00 33 19
19
dos Cordões Litorâneos (BARROS, 2003). O proveniente dos royalties do petróleo, o que Difusão
Difusão ee popularização
popularização dasCiências
marfinha; das CiênciasdodoMar
Mar;
; 55 33 55 33 00 33 19
Biotecnologia 19
Atividade portuária;
Atividade portuária; -55 33 -55 -33 -50 -33 -18
município encontra-se em uma região pla- faz da atividade uma fonte de grande rele- Difusão e popularização das Ciências do Mar; 19
Transporteportuária;
Transporte marítimo de
marítimo de alto
alto mar;
mar; -5 33 -5 -3 -5 -3 -18
na, com pequenas elevações, apresentando vância para gestão municipal. Todas estas Atividade -5 -5 -3 -5 -3 -18
Transporte
Transporte marítimo
marítimo de
de cabotagem;
cabotagem; -5 3 -5 -3 -5 -3 -18
Transporte marítimo de alto mar; -5 3 -5 -3 -5 -3 -18
uma formação de dunas nas proximidades atividades necessitam de planos que as tor- setor
setor portos
portos ee navegação
navegação Infraestrutura
Infraestrutura
Transporte tecnológica para as
tecnológica para
marítimo as atividades
de cabotagem; atividades
-5 3 -5 -3 -5 -3 -18
portuárias e de navegação;
da faixa litorânea, onde predominam praias nem mais sustentáveis nos aspectos sociais, portuárias e detecnológica
setor portos e navegação Infraestrutura navegação;para as atividades -5 3 -5 -3 -5 -3 -18
Aluguel de
Aluguel deetransporte
portuárias transporte marítimo;
marítimo;
de navegação; -5 33 -5 -3 -5 -3 -18
oceânicas de grande extensão e um impor- ambientais e econômicos, principalmente -5 -5 -3 -5 -3 -18
Dragagem;
Dragagem; -5 33 -5 -3 -5 -3 -18
tante sistema lagunar (BARROS et al., 2006). através de mecanismos de geração de em- Aluguel de transporte marítimo; -5 -5 -3 -5 -3 -18
setor de energia
setor de renovável Dragagem;
energia renovável -5 3 -5 -3 -5 -3 -18
O Município de Saquarema faz limites com prego e renda. O crescimento econômico e Energiasrenováveis
Energias renováveisoceânicas
oceânicas e offshore;
e offshore; 5 5 5 5 0 -3 17
setor de energia renovável Implantação
Implantação ou reforço
ou de estrutura
reforço de estrutura logística,
logística,
o município de Rio Bonito ao norte, com o o aumento das receitas são fundamentais Energias renováveis oceânicas e offshore;
física e de recursos humanos em unidades de 5 5 5 5 0 -3 17
física e de recursos humanos em unidades de
município de Araruama a leste, a oeste com para melhora dos indicadores sociais, que setor
setorde
demeio ambientee Implantação
meioambiente ou reforço de estrutura logística,
conservação marinhas;
e saneamento
saneamento conservação
física e de marinhas;
recursos humanos em unidades de 3 5 5 3 5 5 26
os municípios de Maricá e Itaboraí e ao sul revertem em uma melhor qualidade de vida setor de meio ambiente Aperfeiçoamento
Aperfeiçoamento
conservação dos sistemas
dos
marinhas; sistemasdedesaneamento
saneamento
e saneamento 3 5 5 3 5 5 26
com o Oceano Atlântico (CALSJ, 2000). da população residente. A seguir encontra- relacionados aos ambientes marinhos;
relacionados aos ambientes
Aperfeiçoamento marinhos;
dos sistemas de saneamento 3 5 5 3 5 5 26
-se uma avaliação das vocações do municí- Setor de serviços
serviços Serviços de negócios marinhos; 33 35 35 33 35 35 18
Saquarema é vocacionada para as ativi- relacionados aos ambientes marinhos;
26
Segurança pública
Segurança pública Defesa, segurança e vigilância do mar; 03 03 03 03 03 03 180
dades de turismo e lazer, em suas diversas pio de Saquarema baseada no método do Setor de serviços Serviços de negócios marinhos;
Segurança pública Defesa, segurança e vigilância do mar; 0
Fonte: 0Elaborado
0 0 pelos
0 0autores
0
derivações, a saber: turismo responsável, Design de Negócios Azuis (Quadro 5).

616 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 617


A partir do exemplo acima pode-se avaliar o caso acima demonstra a vocação turística Referências
potencialidades e fragilidades no município de Saquarema, que é de fato algo muito es-
citado, sendo este o instrumento final para tratégico, mas que deverá estar alinhada a ACSELRAD, Henri (org.). Conflitos am- BRASIL. Lei nº. 7.661, de 16 de maio de
elaboração de projeto estratégicos alinhados conservação do Patrimônio Cultural e Eco- bientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume 1988. Institui o Plano Nacional de Geren-
a vocação atual e futura, lembrando sem- lógico, bem como mantendo-se, mesmo Dumará/ Fundação Heinrich Böll, 2004. ciamento Costeiro e dá outras providên-
pre que esses projetos estratégicos deverão não sendo sua vocação, a possibilidade de 294 p. cias. Brasília, DF: Presidência da República.
ser implantados com base nos ordenamen- atividades consideradas impactantes como AZEVEDO, Fernando. Dicionário de So- Disponível em: http://www.planalto.gov.
tos territoriais previstos em lei, juntamente o setor de Óleo & Gás pelo forte aporte ciologia. 7. ed. Porto Alegre: Editora Glo- br/ccivil_03/LEIS/L7661.htm. Acesso em: 6
com o ZEEC. Só a título de exemplificação, financeiro que promove em toda a região. bo, 1977. 377 p. dez. 2021.
BARROS, Sergio Ricardo da Silveira. A BRASIL. Resolução nº 005, de 3 de de-
inserção da zona costeira nas territo- zembro de 1997. Aprova o Plano Nacio-
5. Considerações finais
rialidades da bacia hidrográfica do Rio nal de Gerenciamento Costeiro II – PNGC
São João – RJ: inter-relações, trocas e II. 9p., Comissão Interministerial para os
O Design de Negócios Azuis é uma matriz os atores; a natureza; a escala; os
conflitos. 2007. Tese (Doutorado em Geo- Recursos do Mar. Brasília, DF. Brasil. Dis-
proposta que pretende ser aplicada nos objetos e as dinâmicas deles. Não há go-
grafia) – Programa de pós-graduação em ponível em: http://www.mma.gov.br/es-
municípios costeiros, ou em um conjunto vernança efetiva sem uma mediação séria
Geografia, Universidade Federal Fluminen- truturas/orla/_arquivos/pngc2.pdf. Acesso
de municípios consorciados, como uma dos conflitos. A identificação dos conflitos
se, Niterói, 2007. em: 6 dez. 2021.
ferramenta de apoio a tomada de deci- sugere que, a partir do conhecimento dos
BARROS. Sérgio Ricardo da Silveira; KER- BUARQUE, Sergio C. Construindo o
são na gestão territorial no que se refere campos de poder, o gestor possa, de algu-
SANACH, Mônica Wallner; WASSERMAN, desenvolvimento local sustentável:
a vantagens comparativas entre atividades ma forma, mediar as ações no território de
Júlio César Alvin. Proposta de um plano metodologia de planejamento. Rio de
econômicas. Este design foi desenvolvido modo a se ter o entendimento dos objeti-
de ação para o gerenciamento integrado Janeiro: Garamond, 2002. 177 p.
em quatro etapas, que contemplarão um vos dos grupos mais poderosos, no sentido
da zona costeira no município de Saqua- CALSJ – Consórcio Intermunicipal para
diagnóstico nos meios físico, biológico, econômico, e os grupos mais fragilizados,
rema-RJ. Revista de Gestão Costeira Gestão Ambiental das Bacias Hidrográ-
socioespacial, socioeconômico e dos seus ou seja, aqueles que sentem os efeitos da
Integrada. n. 5, ano 4 – 2006. Disponível ficas da Região dos Lagos, Rio São João
requisitos legais. Em um segundo momen- nova forma de usos de espaços.
em: https://www.aprh.pt/rgci/issue5.html. e Zona Costeira. Panorama geral do
to, a partir do conhecimento das caracterís- Destaca-se a importância do DNA no
Acesso em: 1 dez. 2021. município de Saquarema. In: encontro
ticas da área de estudo, deverão ser elenca- sentido de avaliar qualitativamente, a
BARROS, Sergio Ricardo da Silveira. Pro- das lagoas de Saquarema, Jaconé e bacia
dos seus conflitos de usos e de governança, partir da PESTAL, com o apoio de gru-
posta de um plano de ação para o hidrográfica contribuinte. 2000, Saquare-
de modo que se possa propor um ZEEC, no pos focais, as atividades econômicas mais
gerenciamento integrado da zona cos- ma. Anais [...] Saquarema: CALSJ, 2000.
intuito de um ordenamento territorial, para compatíveis aos territórios costeiros. Sen-
teira no município de Saquarema-RJ/. 30 p. p 3-5.
que, a partir desses levantamentos, se pos- do assim, é uma técnica rápida, de baixo
2003. Dissertação (Mestrado em Ciência CARVALHO, Vitor Celso; RIZZO, Hidely
sam propor planos estratégicos de negó- custo para avaliação e obtenção de dados,
Ambiental) – Programa de pós-graduação Grassi. A zona costeira: subsídios para
cios voltados ao desenvolvimento sustenta- fornecendo aos gestores dos projetos uma
em Ciência Ambiental, Universidade Fede- uma avaliação ambiental. MMA. Brasília:
do dos municípios costeiros. grande riqueza de informações qualitati-
ral Fluminense, Niterói, 2003. MMA, 1994.
O modelo busca elencar os conflitos de vas sobre os potenciais dos impactos das
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 7. CENPE MPRJ – Centro de Pesquisas do
usos e de governança quando aborda na atividades propostas.
ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. Ministério Público do Rio de Janeiro. Dis-
322 p. tribuição das Rendas Petrolíferas entre
Agradecimentos BRASIL. [Constituição (1988)]. Constitui- os Municípios Fluminenses: Impactos
ção da República Federativa do Brasil nos Orçamentos Municipais com a Even-
Ao Ministério do Desenvolvimento Regio- dade Federal Fluminense (UFF), por colaborar de 1988. Brasília, DF: Presidência da Repú- tual Mudança nas Regras de Distribuição.
nal (MDR) pelo financiamento da pesquisa; à com seus pesquisadores, e a todos os técni- blica. Disponível em: http://www.planalto. MPRJ. Rio de Janeiro: MPRJ, 2019, 19 p.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte cos e pesquisadores que de alguma forma gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao. COMISSÃO EUROPEIA. Relativa a uma
(UFRN) pela execução do projeto; à Universi- contribuíram para elaboração desse modelo. htm. Acesso em: 6 dez. 2021. nova abordagem para uma economia

618 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 619


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620 ECONOMIA AZUL Design de Negócios Azuis (DNA) 621


30

ESTADO DA ARTE DAS OCORRÊNCIAS


DE HIDRATOS DE GÁS AO LONGO DA
MARGEM CONTINENTAL BRASILEIRA
José Antonio Cupertino
Adolpho Herbert Augustin
Luiz Frederico Rodrigues
João Marcelo Medina Ketzer
Adriano Roessler Viana
Dennis James Miller

1. Introdução

Hidratos de gás são sólidos com estru- gás (BOHRMANN; TORRES, 2006). Assim,
tura cristalina da família dos clatratos (do sem o suporte das moléculas aprisionadas,
latim clatratus = gaiola), formados por uma quando ocorre o degelo da molécula de
estrutura externa de moléculas de água (si- água, a grade estrutural se colapsa, libe-
milar à estrutura do gelo) que aprisionam rando a água o gás. Para sua estabilidade
em seu interior uma molécula de gás (Figu- é necessário um ambiente de baixa tempe-
ra X1). Hidratos de gás não são compostos ratura e alta pressão, condições facilmente
químicos, pois não há ligação molecular encontradas nas formações mais rasas pre-
entre a molécula de água e a molécula de sentes em águas oceânicas.

Figura X1: Representação


esquemática dos hidratos
de metano. A molécula de
metano, CH4, (em tons de
cinza) está “presa” em uma
“gaiola” de água no estado
sólido, cujas moléculas
(esferas azuis) são mantidas
unidas por ligações de
hidrogênio (traços em preto).
Fonte: Chang, (2010)

622 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 623
Hidratos de gás ocorrem nas regiões de de gás substituam progressivamente o gás baseadas nestes dados sísmicos desper-
permafrost (solos permanentemente conge- Figura X2: BSR (Bottom- natural (GRAULS, 2001), podendo fomen- taram o interesse pela área (estimado em
lados das regiões polares), e como resultado Simulating Reflector) – reflexão tar uma nova revolução energética. Segun- 780 tcf) (SAD et al. 1998).
da diagênese de sedimentos de lagos e ma- aproximadamente paralela do Kvenvolden (1993), 1m3 de hidrato de A confirmação da existência de hidratos
res profundos (> 500 m de lâmina-d’água), à reflexão do fundo do mar, gás metano contém 164 m3 de metano e de gás em território brasileiro (Bacia de Pe-
quando condições apropriadas de pressão, com polaridade invertida, 0,8 m3 de água, quando levado à superfí- lotas) só ocorreu com o desenvolvimento
temperatura e saturação de gás são encon- presumivelmente causada pelo cie (STP). Este número ele chama de fator do “Projeto CONEGAS: Origem, ocorrência
tradas. O equilíbrio físico-químicos destas contraste entre sedimentos de expansão do hidrato. Por outro lado, e caracterização de depósitos de hidrato de
estruturas pode ocorrer na coluna de água, sobrepostos contendo hidrato Sloan (2003) afirma que, se cada cavidade gás no Cone de Rio Grande, Bacia de Pelo-
na interface água-sedimento e nos poros de gás e sedimentos subjacentes estiver preenchida com uma molécula de tas”, (MILLER et al., 2015). Posteriormen-
dos sedimentos, caracterizando a zona de saturados de gás, devido à gás, 1m3 de hidrato contém 180 m3 (STP) te, em 2015, uma missão oceânica à Foz
estabilidade de hidratos de gás (gas hydrate diferença nas densidades. Indica de metano. A conclusão é que reservató- do Amazonas ratificou a ocorrência deste
stability zone, ZEHG – Figura 2). A liberação o limite inferior da zona de rios portadores de hidrato contêm mais recurso na área (KETZER et al, 2018). Tais
catastrófica de metano pela desestabiliza- estabilidade dos hidratos de gás, metano por m3 quando comparado com projetos foram desenvolvidos pela equipe
ção de tais depósitos devido às mudanças a ZEHG, onde os hidrocarbonetos o volume de gás livre no mesmo espaço do Instituto do Petróleo e dos Recursos Na-
climáticas globais que vêm sendo observa- ficam aprisionados em uma (KVENVOLDEN,1993). turais da PUCRS ao longo de uma década.
das pode apresentar uma retroalimentação estrutura sólida. No Brasil, estudos de detalhe sobre hi- Estas descobertas em território brasileiro
negativa nestes processos, acelerando tais dratos de gás são ainda incipientes, ape- despertaram a necessidade da realização
mudanças, pois a liberação instantânea des- sar de seu enorme potencial dada a gran- de pesquisas adicionais que fomentem o
tes gases aumenta o chamado efeito estufa. de área das bacias oceânicas brasileiras. entendimento de suas formas de ocorrên-
Adicionalmente, a desestabilização desses A existência de depósitos de hidratos de cia e o futuro aproveitamento deste recur-
depósitos representa um risco geológico, gás no país era, até o início deste século, so em outras bacias sedimentares, além
devido ao seu potencial para causar desliza- apenas fundamentada em evidências ou das conhecidas, as bacias de Pelotas e da
mentos, terremotos e tsunamis. marcadores indiretos, como a presença do Bacia da Foz do Amazonas (Figura X3).
A origem dos hidrocarbonetos para chamado BSR (Bottom Simulating Reflec- Além da sua importância como recurso
formação dos hidratos pode ser biogênica, tor) em seções sísmicas (FONTANA, 1989; energético, os estudos de hidratos de gás
resultante da ação de micro-organismos FONTANA; MUSSUMECI, 1994; SAD et al., também fornecem importantes informa-
metanogênicos nos sedimentos, termogê- 1997 e 1998). Este marcador consiste em ções sobre o ciclo do carbono na Terra e
nica, associada à migração de gás prove- um refletor sísmico paralelo ao fundo do as mudanças climáticas. As pequenas al-
niente de campos de hidrocarbonetos em mar (Figura X2), normalmente entre 200 e terações nas condições de temperatura da
profundidade, ou mista. Os gases mais 700 m de profundidade, causado pela mu- água dos oceanos podem, por exemplo,
comuns que formam hidratos são o meta- dança abrupta de impedância acústica na causar a dissociação e liberação de gran-
no, butano, propano e dióxido de carbono base da zona de estabilidade de hidratos des quantidades de metano e dióxido de
(MILLER et al., 2015). de gás (ZEHG) no maciço sedimentar, em carbono para a atmosfera. A desestabiliza-
Mesmo sendo uma substância pou- função da existência de uma zona com hi- ção maciça do sistema de hidratos de gás
co conhecida, os hidratos de metano são dratos de gás (acima) e uma zona com gás em uma determinada região pode também
abundantes nos oceanos de todo o mun- livre (abaixo) deste refletor nos sedimentos ocasionar grandes movimentos de massa
do. Estimativas conservadoras apontam (MACKAY et al., 1994). No Cone do Rio submarinos, com potencial impacto em
que os recursos energéticos associados a Grande (CRG), em uma espessa sequência instalações submarinas, como plataformas
hidratos de gás podem ultrapassar todos sedimentar depositada durante o Neóge- de petróleo e cabos de comunicação sub-
os demais combustíveis fósseis somados no, foi identificada a presença do BSR de marinos, ou até mesmo grandes catástro-
(COLLET et al., 2009). A partir deste enor- Fonte: Elaboração própria (2022) modo contínuo nos levantamentos sísmi- fes em áreas costeiras como a geração de
me potencial, é esperado que os hidratos cos. Estimativas de volumes significativos tsunamis (MIENERT et al., 2010).

624 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 625
Figura 1y

Figura X3: Descobertas da ocorrência de (PROJETO TUCUXI*) e Cone do Rio Gran-


GH em território brasileiro: Leque do de, Bacia de Pelotas (Projeto CONEGAS*)
Amazonas, Bacia da Foz do Amazonas *Projetos desenvolvidos pelo IPR/PUCRS.
Fonte: Adaptado de Ketzer et al., (2021)

A Província de Hidratos de Gás do Cone da Foz do Amazonas


O Cone da Foz do Amazonas está a apro- A movimentação desta espessa sequ-
ximadamente 250 km da foz do Rio Ama- ência de sedimentos, predominantemente
zonas. Este leque sedimentar se estende por composta por depósitos de movimento
700 km em direção ao mar, a partir do limite de massa e sistemas turbidíticos (channel-
externo da plataforma continental, para pro- -levee), provocou o colapso gravitacional
fundidades de água de mais de 4.000 m no da região, resultando no estabelecimento
Planície Abissal Demerara (Fig. 1y). Ocupa de uma dinâmica distensiva na parte pro-
uma área de 330.000 km2 e 9 km de espes- ximal e compressiva na parte distal, com
sura sedimentar (SILVA et al., 1999; DAMU- a consequente formação de sistemas de
TH e KUMAR, 1975). Esta feição iniciou sua falhamentos normais e de dobramentos,
Plumas de Gás
formação no Mioceno Inferior, através da responsáveis pela formação de desníveis
acumulação de sedimentos cuja área fon- com até 500 m no fundo marinho (FLOOD Hidratos de Gás
te é atribuída aos soerguimentos da Cordi- et al., 1991; REIS et al., 2010, 2016; SILVA
lheira dos Andes e consequente inversão da et al., 2016). O desencadeamento de mo-
direção do Rio Amazonas para nordeste (FI- vimentos de massa gigantes (MTDs) tem
GUEIREDO et al., 2009). A missão #155 do sido associado a variações causadas pelo
IODP trouxe importantes contribuições sobre clima durante as mudanças do nível do
a evolução tectono-sedimentar desta área. mar (MASLIN et al., 2005). Mais recente-
Foram testemunhados e perfilados 17 poços mente, durante o Neogeno, os MTDs estão
com até 450 m de informações sobre os sedi- associados à atividade tectônica dentro da
Fonte: Modificado de Ketzner et. al (2018)
mentos ali depositados (FLOOD et al., 1995). parte superior do talude (REIS et al., 2016).

626 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 627
Fig. 1y (A) Mapa de localização mostran- tos mostram a localização de plumas, A partir do mapeamento de fundo, fo- de ocorrência dos hidratos de gás sejam nó-
do a posição do Leque da Foz do Amazo- enquanto as estrelas verdes representam ram identificados diversos mounds subma- dulos dispersos na matriz de lama, camadas
nas (linha vermelha) e a área de levan- locais onde foram recuperados hidratos rinos com relevo entre 10-20 m de altura, maciças de 10 cm de espessura também fo-
tamento com ecobatímetro de multifeixe de gás em pistão (piston cores). A linha em lâmina-d’água de 1000-1800 m de ram recuperadas (KETZER et al., 2018).
(polígono preto), os pontos vermelhos preta C–C’ indica a posição da linha sísmi- profundidade (Fig y3). Estas feições estão Figura y3: Imagens do fundo marinho ge-
indicam locais perfurados durante o ODP ca em C. (C) perfil sísmico SW-NE cortan-
localizadas próximas da borda da zona de radas a partir de levantamento com ecoba-
155 (PIPER et al., 1997). A isóbata linha do as estruturas de direção NW-SE e um
estabilidade de hidrato de gás e associadas tímetro de multifeixe, ilustrando zonas de
de -600 m (em vermelho) representa a detalhe mostrando o refletor BSR (linha
a falhas; em uma delas foram recuperadas escapes de fluidos no fundo do mar associa-
profundidade aproximada da borda da amarela) e detalhe das falhas profundas
as amostras de hidrato de gás. Os mounds das com plumas de gás na coluna-d’água:
zona de estabilidade do hidrato de me- que atingem a superfície de descolamen-
do fundo do mar estão frequentemente as- (A) Plumas alinhadas ao longo de falha
tano na área. (B) Detalhe da área do le- to (linha vermelha).
sociados as exsudações de gás (plumas) re- NW-SE ilustrando a variação na altura de
vantamento multifeixe: hexágonos pre- Fonte: Modificado de Ketzer et. al., (2018) acordo com o acréscimo de profundidade
conhecidas na coluna de água (KETZER et
da lâmina-d’água; a linha tracejada verme-
Os estudos sobre a ocorrên- al., 2018, 2019). As exsudações localizadas
lha corresponde à linha sísmica C-C’ (Figura
cia de hidratos de gás tiveram perto da borda da zona de estabilidade de y1); (B) Conjunto de plumas alinhadas, as-
maior interesse a partir de 2010, hidratos de gás podem estar ligadas à dis- sociadas ao limite superior ZEHG (linha tra-
com o lançamento do projeto sociação de hidratos relacionada ao aque- cejada amarela), isóbata ~600m, nota-se a
Tucuxi na Bacia da Foz do Ama- cimento oceânico contemporâneo (KETZER presença de mounds submarinos (setas).
zonas. Este projeto incluiu o et al., 2019). Embora a forma mais comum Fonte: Elaboração própria (2022)
mapeamento do fundo do mar
do leque superior através de
um ecobatimetro de multifeixe
(MBES) montado no casco (pri-
meira missão em 2012) e a per-
furação do substrato usando um
testemunhador de pistão (piston
cores) com 6 m de comprimento
(segunda missão em 2015). Na
primeira missão foram identi-
ficadas inúmeras estruturas de
escape de gases ativas na coluna
de água e pockmarks no fundo
marinho. A partir destas infor-
mações foi formulada a segun-
da missão para amostragem de
sedimentos de testemunho em
Figura 2y: Fotografia de
alvos específicos, anteriormente
testemunho a pistão coletado
identificados com os dados do
no Leque da Foz do Amazonas
MBES. Foram coletados 10 tes- – sedimentos finos com nódulos
temunhos que resultaram na pri- de hidrato de gás (seta preta).
meira recuperação de hidrato de
gás em águas profundas (Fig 2y) Fonte: Rodrigues et al., (2019)
na Margem Equatorial brasileira
(RODRIGUES et al., 2019).

628 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 629
O mapeamento do refletor BSR na Foz durante a campanha marítima do Projeto
Figura y4
do Amazonas indicou uma área com 28.000 Tucuxi, em 2015.
km2, presente em seções sísmicas obtidas em Os hidratos de gás recuperados através
lâminas de água de 600 a 2800 m, numa de testemunhos perfurados em lâmina-
profundidade cerca de 450 m abaixo do -d’água de 1900 m, internamente a um ca-
fundo do mar (Figura y4). O BSR ocorre de nal onde o escape de gás está ativo, apre-
modo descontínuo nas linhas sísmicas, es- sentaram composição de CH4 (85-98%),
tando comumente associado à charneira de CO2 (2-15%) e traços de C2H6. Valores iso-
dobramentos anticlinais na zona compressiva tópicos do carbono presente no metano

5o0’0’’N
do leque. Estes refletores desaparecem em indicam uma origem biogênica com valores
direção aos flancos (KETZER et al., 2022). Asde δ13C entre -81.1 e -77.3‰ (RODRIGUES
razões para esse padrão de ocorrência ainda et al., 2019). Os hidratos de gás apresentam
são pouco compreendidas, mas podem es- na sua composição CH4 (95%), CO2 (4%)
tar relacionadas ao fluxo diferencial de fluido
e C2H6 (1%); análise isotópicas do metano
nas estruturas (PRAEG et al., 2018). Sad et (δ13C entre -61.7 e -59.2‰ e δD entre -206
al., (1998), usando o volume total de sedi- e -205‰) e do etano (δ13C entre -31.5 e
mentos existente na ZEHG e assumindo uma -30.8‰) indicam uma origem fundamen-
saturação de 1,5% de hidratos de gás pre- talmente biogênica com possível conta-
sentes, estimaram um volume potencial de minação termogênica (RODRIGUES et al.,
metano na ordem de 12 trilhões m3 (ou 430 2019). Esta mistura pode ter ocorrido duran-
tcf) de CH4 na superfície. te a migração vertical de gases termogênicos
O poço 938, perfurado durante a mis- através dos sedimentos, até alcançar os de-
são IOPD 155, indicou a presença de me- pósitos de gás microbiano em profundidades

0o0’0’’
tano dissolvido nos sedimentos. A análise mais rasas. Esta influência termogênica pos-
geoquímica destas amostras indica uma ori- sivelmente está relacionada à conexão pro-
gem in situ essencialmente biogênica, suge- piciada por falhas conectando fontes de gás
rindo como fonte a formação dos hidratos profundas aos depósitos superficiais. Segun-
de metano presentes na ZEHG, identificada do Rodrigues (2019), o reconhecimento da
nos dados sísmicos (ARNING et. al., 2013). mistura deve ser baseado em análises base-
A presença de hidratos de gás juntamente adas nos valores de 13C-CH4 vs. C1/(C2+C3),
nos sedimentos do Leque do Amazonas foi como pode ser visto nas análises da área do
50o0’0’’W 45o0’0’’W
confirmada pela recuperação de amostras talude continental (Figura y5).
TWTT (s)
100.000 Figura y5. Gráfico mostrando a relação
BSR Fundo marinho –1,5
BIOGÊNICO entre as composições de C1/(C2+C3) versus
10.000 13
C de gases de hidratos, plumas e gases
BSR –2 dissolvidos em sedimentos do Leque da
1.000 Foz do Amazonas. Círculos abertos (HG)

C1 / C2+C3
e círculos sólidos (gases dissolvidos e plu-
–2,5 100
mas). Amostras de área proximal do Leque
10 TERMOGÊNICO do Amazonas. Triângulos abertos (HG);
triângulos sólidos (gases dissolvidos e plu-
Figura y4. Mapa do Leque da Foz do micas 2D, coincidente com as dobras 1 mas). Amostras da área do talude conti-
Amazonas ilustrando as áreas de ocor- anticlinais, linha sísmica abaixo (d-d’). -110 -100 -90 -80 -70 -60 -50 -40 -30 -20 nental a nordeste do leque.
rência do BSR mapeadas nas linhas sís- Fonte: Elaboração própria (2022) δ13C de CH4 (0/00 VPDB) Fonte: Modificado de Rodrigues (2019)

630 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 631
Figura Z1
A Província de Hidratos de Gás do Cone de Rio Grande

O Cone de Rio Grande (CRG) está lo- em um conjunto de horsts e grabens. No


calizado na porção sul da Bacia de Pelotas domínio compressional (retângulo vermelho
e possui uma área aproximada de 35.000 da Figura Z1) ocorrem as falhas de empurrão
km², em lâmina-d’agua entre 200 e 3.000 com cavalgamento e dobramento das cama-
m, distante 200 km da cidade de Rio Gran- das sedimentares, dobras com alto ângulo de

30o0’0’’S
de. A espessura máxima de sedimentos che- fechamento que formam desníveis da ordem
ga a cerca de 5.000 m (FONTANA, 1996), de 200 m no fundo marinho (SILVEIRA e MA-
depositados desde o Mioceno inferior, há CHADO, 2004; CASTILLO et al., 2009).
cerca de 23 M.a. O CRG é composto, prin- Diferentemente da região do Leque da
cipalmente, por sedimentos siliciclásticos Foz do Amazonas, o refletor BSR se apre- Legenda
finos, cuja construção é atribuída a fluxos senta de modo contínuo nas linhas sísmi- Bacia_de_Pelotas

provenientes de três drenagens distintas, cas, desde a batimetria de 520 m até apro- BSR

os rios de La Plata (MARTINS et al., 1972; ximadamente 3.500 m de lâmina-d’água,


CONTRERAS et al., 2010), Camaquã e Jacuí extrapolando o limite leste do Cone. Sua
(BUENO, 2021), embora hoje não exista ne- área de ocorrência alcança os 35.000 km2

35o0’0’’S
nhuma drenagem de porte ali desaguando. (Fig Z1), com espessura média em torno
Da mesma forma que o Leque da Foz do de 200-300 m (SAD et al., 1998; OLIVEIRA
Amazonas, o CRG está em processo de colap- et al., 2010). Sad et al. (1998), assumindo 50o0’0’’’W 45o0’0’W

so gravitacional, onde a porção superior es- estes parâmetros volumétricos e estiman- Domínio Distensional Domínio Compressional

correga sobre a superfície de detachment na do uma saturação 1,5% de hidratos de 1.000

base da sequência miocênica. As estruturas gás, concluem existir um volume possível 2.000

formadas na região do CRG têm sua gênese de 780 tcf (~22 trillhões de m3) de metano 3.000

TWTs
relacionada ao rápido acúmulo de sedimen- na região. Ressalte-se que estes números 4.000

tos provindos do oeste-sudoeste, a partir do foram baseados em volumes extrapolados


5.000

6.000

Mioceno, associados megamovimentos de dos dados sísmicos. 6.500

massa (MTDs) para leste-nordeste, formando


Fig. Z1: Mapa batimétrico do fundo oceâ- 3.000

uma zona de sobre pressão, substrato à mo-


nico ressaltando a área de ocorrência do
vimentação tectônica (zona de detachment).
BSR no Cone de Rio Grande, em azul. A
4.000

Esta superfície de descolamento fez com que – Linha sísmica A-A’ mostrando superfície TWTs
todas as camadas acima dela se movimen- de descolamento, em amarelo, e os domí-
5.000

tassem, formando dois domínios tectônicos nios distensional e compressional; no do- 6.000

com características estruturais distintas, o do- mínio distensional são reconhecidas falhas
mínio distensional e o domínio compressio- normais lístricas (preto) e falhas normais
nal (MILLER et al., 2015 – Figura Z1). planas, sintéticas e antitéticas (verde). O
3.500

No domínio distensional, junto ao limite domínio compressional está caracterizado


oeste do CRG, falhas normais e lístricas favo- por falhas de empurrão (vermelho). A li- TWTs
4.000

receram a migração de gás na posição do de- nha azul tracejada corresponde ao BSR. B
pocentro, e o aumento da pressão nos sedi- – Retângulo vermelho correspondente ao
mentos provocou a formação de diápiros de detalhe das dobras. C – Nota-se o cavalga- 4.500

lama, anticlinais residuais e enxames de fa- mento das camadas de NW-SE.


lhamentos que acomodam a movimentação Fonte: Miller et al., (2015)

632 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 633
Figura Z2
Fig. Z2: Pockmark PC22, Cone do Rio casco e veículo autônomo submarino (AUV),
Grande. A) Imagem de retroespalhamento propiciando a compreensão com alto deta-
do fundo (sonar de varredura lateral lhamento do assoalho oceânico, permitindo
e multifeixe – dados obtidos por AUV) a localização dos pockmarks e a expressão
associada a dados de coluna-d’água, das falhas. Também foram coletados dados
ilustrando associação entre as feições de da coluna-d’água que permitiram a identifi-
fundo e o escape de fluidos (plumas). cação de exsudações (MILLER et al., 2015)
B) Detalhe do pockmark PC22 e seu associadas aos pockmarks (Fig. Z2). Amos-
relevo onde foram recuperados diversos tras de hidratos de gás e de gás livre associa-
testemunhos a pistão (piston cores). do a zonas de escape de fluidos (chaminés)
A partir de 2010 o conhecimento do CRG foram recuperadas em mais de uma deze-
sofreu grande avanço através da execução na de locais e pontos de amostragens por
do Projeto CONEGAS (termo de cooperação testemunho a pistão e coleta de gases por
científica PUCRS/PETROBRAS). Durante uma veículo submarino – ROV, em coluna-d’água
década foram realizadas seis missões ocea- entre 500 e 1500 m de profundidade. Os
nográficas que efetuaram a coleta de infor- hidratos gasosos do CRG ocorrem como lâ-
mações geológicas e geofísicas em diversas minas, nódulos disseminados na matriz de
posições do CRG. A região central do cone lama, tubos e camadas maciças (até 25 cm
foi mapeada com batimetria multifeixe de de espessura; Fig. Z3).

Figura Z3. Exemplos das


diferentes formas de
hidratos recuperados em
testemunhos do CRG.
(a) laminado (lâminas
entre 3 e 3 cm de
espessura);
(b) Grânulos dissemi-
nados em depósitos
lamosos (setas
vermelhas);
(c) Nódulos maciços
(diâmetro de 2 a 3 cm)
(d) nódulos alongados
(1-2 cm de diâmetro);
(e) Camadas maciças de
até 25 cm de espessura;
(f) chama alaranjadas
resultado da combustão
dos hidratos de gás.
Fonte: Adaptado de Miller,
(2015)

Fonte: Elaboração própria (2022)

634 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 635
O levantamento eletro-magnético com menor resistividade. Outros locais na área Figura Z5
fonte controlada 3-D (controlled source também indicam chaminés relacionadas ao
electromagnetic – CSEM) das áreas onde fluxo de fluido ainda não conectadas à su-
se concentram os pockmarks permitiu a perfície (Figura Z4). A inversão dos dados
distinção entre uma chaminé que possivel- do CSEM revela também que o gás abaixo
mente tenha fluido preso e uma chaminé do BSR migra ao longo das falhas através
que parece ter deixado todo o gás vazar da GHSZ formando corpos ricos em hidrato
em direção ao fundo do mar (THARIME- de gás com saturação de hidrato de gás de
LA et al., 2019). O método se baseia na 40-60% (THARIMELLA et al., 2019), bem
diferença de resistividade entre o gás livre como que as amplitudes anômalas abaixo
altamente resistivo e o sedimento porta- do BSR nos dados sísmicos podem repre-
dor de água salgada e/ou de hidrato com sentar acumulações de gás livre (Figura Z5).

Fig. Z4 – (a) Imagem do fundo marinho o perfil sísmico de alta resolução, correla-
ressaltando a expressão das falhas em to. As maiores anomalias de resistividade
superfície e a área coberta pelo levan- dentro da zona de estabilidade do hidra-
tamento eletromagnético de fonte con- to de gás estão possivelmente associadas
trolada (3D CSEM polígono amarelo). A a saturações de hidrato de gás. Note-se
seta amarela ressalta a ocorrência do po- que também revelou chaminés de gás
ckmark 22 - Fig Z2). (b) Perfil ilustrando ainda não conectadas a superfície, bem
as anomalias identificadas na inversão como a expressão CSEM em subsuperfície
dos dados CSEM (cores quentes), abaixo da área do pockmark.

Figura Z4

Fonte: Elaboração própria (2022)


Fig. Z5 – (a) Imagem do fundo marinho das anomalias eletromagnéticas. (c) Perfil
ressaltando a expressão das falhas em su- ilustrando as anomalias identificadas na
perfície e a área coberta pelo levantamen- inversão dos dados CSEM (cores quen-
Fonte: Elaboração própria (2022) to eletromagnético de fonte controlada tes). (d) Perfil sísmico correlato ao perfil
(3D CSEM polígono amarelo). (b) Visão 3D de (c). A sobreposição revelou chaminés

636 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 637
A principal contribuição da matéria tos orgânicos “antigos” (> 50 ka) para a
de gás com diferentes saturações de hi- gás. Observe que as anomalias CSEM em
orgânica na formação dos HG foi do car- superfície, fator que influencia na matéria
dratos. A inversão dos dados do CSEM cor amarela abaixo do BSR sugerindo a
bono orgânico marinho com base nos orgânica original e, portanto, mascara as
revela que as maiores anomalias de resis- existência de uma zona de maior concen-
resultados do isótopo estável de carbono idades da matéria orgânica.
tividade dentro da zona de estabilidade tração de gás livre. Os dados acústicos
(δ13C-org) e análises da relação carbo- Acumulações de hidrato de gás próximo
do hidrato de gás estão possivelmente (anomalias de amplitude abaixo do BSR)
no orgânico total/nitrogênio total (RO- ao fundo do mar em pockmarks do CRG
associadas a saturações de hidrato de englobam esta zona CSEM anômala.
DRIGUES et al., 2019). Rodrigues et. al., parecem estar associadas a bolsões de gás
(2019) observam uma contribuição de de profundidades rasas (dezenas de me-
O gás no hidrato é principalmente me- ficada como biogênica. Da mesma forma, fluidos provenientes de sedimentos pro- tros abaixo do fundo do mar – Rodrigues
tano com traços de etano, e os isótopos os estudos dos gases livres em sedimentos fundos, os quais transportaram compos- et al., 2017) que, por sua vez, sustentam
de carbono estáveis do metano indicam foram produzidos pelo produto da meta-
uma origem microbiana (valores de δ13C nogênese microbial, ou seja, os hidrocar- Figura Z7
de -69,3 a -66,7; Miller et al., 2015; Ro- bonetos gasosos foram gerados, princi-
drigues et al., 2019). De acordo com os palmente, pela via de redução microbiana Imagens obtidas
diagramas, a origem dos gases foi classi- do CO2 (Figura Z6). na área do PC22
em que ocorrem
poliquetas
Figura Z6 - Relação entre os valores de δ13C2H6 e δ13CH4
tubículas
para amostras de diferentes áreas do Cone do Rio Grande
do gênero
(Projeto CONEGAS, 2021)
Escarpia, os
mais frequentes
integrantes da
comunidade
quimiossintética.
As imagens
foram feitas com
um remotely
operated vehicle
(ROV) e com um
autonomous
underwater
vehicle (AUV),
ambos usados
nas missões
do projeto
CONEGAS.

Fonte: Elaboração própria (2022) Fonte: MEDINA-


SILVA (2018)

638 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 639
Figura Z8
comunidades quimiossintéticas (GIONGO et Esta interseção do refletor BSR com o fun-
al., 2016). Nas comunidades quimiossinté- do do mar foi observada em apenas algumas
ticas foram descritos microrganismos que outras regiões do mundo (e.g. margem da
vivem aderidos externamente (epibiontes) Mauritânia, Davies et al., 2015). A raridade
a tubos do verme Escarpia (Fig Z7). Trata-se de tais características é enigmática, pois o afi-
de um grupo de bactérias metanotróficas, namento da zona de estabilidade do hidrato
o que indica que estas formas de vida se de gás relacionado à diminuição da pressão
encontram adaptadas à presença de meta- (profundidade da água) e aumento da tem-
no, localizadas junto das exsudações deste peratura da água de fundo deveria natural-
gás (MEDINA-SILVA et al., 2018 a e b). mente levar a afloramentos de BSR. A posi-
Além das exsudações de gás associa- ção da borda da ZEGH no fundo do mar do
das à presença de falhas e “pockmarks”, CRG, calculada a partir das medições atuais
ocorrem ainda nas porções onde a zona da temperatura da água de fundo, situa-se
de estabilidade afina na região proximal mais distal ao do afloramento BSR, indican-
do CRG. Ketzer et al. (2022) identificam a do um desequilíbrio termodinâmico entre
presença de um fenômeno singular, onde o sistema de hidratos e as águas de fundo
a ZEHG (base do BSR) afina em direção (KETZER et al., 2020). O aquecimento das
ao fundo marinho até desaparecer, ca- águas de fundo em profundidades >500
racterizando uma zona de afloramento m no Atlântico Sul, que pode ser rastreado
do BSR. Esse fenômeno ocorre entre as pelo menos desde a década de 1970 (SCH-
isóbatas de 515 e 520 m de água (KET- MIDTKO e JOHNSON, 2012), fornece fortes
ZER et al., 2020 – Figura Z8) onde foram evidências de que esse desequilíbrio pode
detectadas 394 plumas de gás atingindo estar ligado às mudanças climáticas con-
alturas de até 50 m na coluna-d’água. temporâneas (KETZER et al., 2019; KETZER
Margens com afloramentos de BSR bem et al., 2020). As taxas de transferência de
definidos constituem locais únicos para metano dos sedimentos para o oceano fo-
investigar as interações entre os sistemas ram estimadas por Ketzer et al. (2020) entre
de hidratos de gás marinhos e as mudan- 31,3 e 144 MgCH4/ano (megagramas de
ças climáticas, pois a borda da ZEHG é metano por ano), nesta região.
o local mais suscetível à dissociação de Modelagens numéricas efetuadas para
hidratos de gás impulsionada pelo aque- esta área envolvendo escala de centenas
cimento das águas do fundo do oceano de anos confirmaram a sensibilidade dos
(Ruppel, 2011). hidratos as variações da temperatura de
fundo, provocando a sazonalidade no li-
Fig. Z8 – (A) Perfil sísmico mostrando a mite da ZEHG, podendo recuar significa-
zona de afloramentos do BSR no Cone tivamente talude abaixo, dependendo da
do Rio Grande; (B) Detalhe de (A) mos- taxa de aumento das temperaturas. Isso
trando o afloramento do BSR no fundo resultaria na completa dissociação dos hi-
do mar a 515-520 m de lâmina-d’água, a dratos e em liberações significativas de
faixa de ocorrência das plumas de gás e metano para o oceano. Outro fenômeno
a faixa atual da zona de estabilidade de relacionado a liberações de gás para o oce-
hidratos de gás (ZEHG). ano é o colapso dos depocentros, talude
Fonte: Modificado de Ketzer et al., (2020) abaixo, induzido pela gravidade. De acordo

640 ECONOMIA AZUL


640 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 641
com Ketzer et al. (2022), esse fenômeno consegue passar por esse filtro e vazar no as taxas de geração de metano biogênico bilhões do pré-sal), o que coloca o país em
produz falhas e fraturas que permitem a fundo marinho, formando plumas de gás através da comparação de resultados das uma posição privilegiada.
migração massiva de fluidos ricos em gás gigantes que atingem alturas de 900 m perfurações, modelos experimentais e mo- Entretanto, quando se olha para espe-
através da ZEHG. Esse fluxo vertical mas- na coluna-d’água. Taxas de liberação de delos numéricos, relação entre as fontes de cificamente para a questão do gás natu-
sivo alimenta a oxidação anaeróbica do metano para o oceano foram estimadas metano biogênico rasas versus profundas ral o cenário se modifica, ficando o Brasil
metano, mas a maior parte do metano entre 46,44 e 304,1 MgCH4/ano. e as reações biogeoquímicas que afetam a numa posição de fragilidade. Isso porque
quantidade de metano acumulado nos se- as constantes crises hídricas resultantes das
Olhando para o futuro dimentos, e como estas impactam o ciclo mudanças climáticas resultaram no acrés-
global de carbono e a transferência de car- cimo significativo deste recurso para o uso
De tudo acima exposto, é marcante francês Marion Dufresne. O objetivo é es- bono para o oceano. das usinas termoelétricas, gás dependen-
o grande avanço obtido no conhecimen- tudar a história climática pretérita da mar- Tais projetos permitirão ao Brasil con- tes. Segundo a Associação Brasileira das
to das ocorrências de hidratos de gás no gem equatorial do Brasil ao longo dos últi- tinuar os estudos sobre potencialidade do Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado
Brasil, em especial no que tange às áreas mos milhões de anos, determinar o com- uso deste recurso como fonte de energia, (Abegás), em 2021 foram consumidos em
da Foz do Amazonas e do Cone do Rio portamento dos hidratos de gás em relação no futuro. Hoje a produção nacional de hi- média 76,043 milhões de m3/dia de gás
Grande. Através da coleta de amostras a deslizamentos submarinos de grande im- drocarbonetos está focada principalmente natural, e aproximadamente 34 milhões
efetivada pelos projetos TUCUXI e CONE- pacto e avaliar a extensão dos vazamentos na camada pré-sal. Segundo a Agência Na- foram destinados às termoelétricas. A reto-
GÁS, foi possível a caracterização dos ga- dos gases na área do Leque do Amazonas cional do Petróleo (ANP), em fevereiro de mada do crescimento econômico nacional
ses associados, bem como a determinação como um todo. Serão utilizados testemu- 2022 foram produzidos 3,754 milhões de também provocará uma alta no consumo
de aspectos geoquímicos e biológicos que nhadores à pistão CALYPSO com capacida- barris de óleo equivalente por dia, sendo, de insumo. Por outro lado, ainda segundo
auxiliam no entendimento da sua gêne- de de recuperar até 70 m de sedimentos, 75% deste volume proveniente dos reser- os relatórios da ANP, a produção nacional,
se e do seu comportamento ao longo do resultando em aproximadamente 300 m de vatórios pré-sal. Em 2021 as reservas brasi- embora crescente, ficou na casa dos 134
tempo geológico. Os trabalhos resultan- testemunhos, recuperados de diferentes sí- leiras alcançaram um volume de 13,24 bi- milhões de m3/dia, a maior parte prove-
tes destas análises despertam o interesse tios previamente selecionados. lhões de barris de óleo equivalente (9,621 niente do gás associado ao petróleo.
da comunidade científica mundial devido Na área do Cone do Rio Grande da Bacia
à importância dos hidratos não só como de Pelotas, pretende-se executar a missão Agradecimentos
recurso energético alternativo, mas tam- IODP#394, uma realização do International
bém por sua importância para a compre- Ocean Discovery Program (IODP) utilizando Nossos agradecimentos à PETROBRAS 2020). Nosso reconhecimento à impor-
ensão do ciclo do carbono e seus impac- o navio oceanográfico JOIDES Resolution pela parceria e suporte financeiro ao Pro- tância da parceria com a SeaSeep Dados
tos nas mudanças climáticas. Assim, es- (Joint Oceanographic Institutions for Deep jeto CONEGAS (2010-2021). Também de Petróleo Ltda. e as equipes das embar-
tão previstas duas missões científicas de Earth Sampling), um navio de perfuração agradecemos aqueles que participaram cações Inspector II (missão TU15, 2015) e
caráter internacional. Como nas missões científica para a coleta e estudos de rochas das missões oceanográficas executadas Teknik Perdana (missão TP15, 2015) sem
anteriores todas as amostras se ativeram e sedimentos marinho. Os estudos serão durante este período, em especial as os quais a execução do Projeto TUCUXI
a parte mais superficial da coluna sedi- realizados através da cooperação de diver- equipes integrantes dos navios científicos não seria possível.
mentar (no máximo 20 m de comprimen- sas instituições internacionais e brasileiras. Marechal Rondon (missão MR11, 2011), Para a Agência Nacional do Petróleo –
to), as novas missões comtemplarão teste- Entre as universidades estão as brasileiras Marion Dufresne (missões MD186, 2011 ANP nossos agradecimentos pela cessão
munhos mais profundos. PUCRS, UFRGS, FURG e USP, a Linnaeus e MD195, 2013), Rig Supporter (missão dos dados sísmicos. Por fim, agradecemos
Na Bacia da Foz do Amazonas está pre- University, (Suécia), o Lamont-Doherty Ear- NR12, 2012), EM Leader (missão EM14, aos geólogos Rosalia Barili e João P. Zie-
vista a execução de um projeto cooperação th Observatory e Rice University (USA), a 2014), e Super Pesa XIII (missão SP20, linski pela revisão do manuscrito.
entre universidade brasileiras (PUCRS, UFR- University of Bremen (Alemanha) e a Japan
GS, UNISINOS, USP, UFF, UERJ e UFESP), a Agency for Marine-Earth Science and Tech-
Linnaeus University, na Suécia, e institutos nology (Japão). Serão perfurados cinco po-
de pesquisa franceses (IFREMER, GEOAZUR ços, com profundidades entre 200 e 800 m,
e LSCE), utilizando o navio oceanográfico em cinco sítios distintos. Objetivo é estudar

642 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 643
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646 ECONOMIA AZUL Estado da Arte das Ocorrências de Hidratos de Gás 647
31

ENERGIAS RENOVÁVEIS NO OCEANO

Milad Shadman
Segen Farid Estefen

1. Introdução

As fontes de energia renovável offsho- térmico e as propriedades químicas. Inclui


re podem ser divididas em duas catego- onda de superfície, amplitude de maré,
rias, conforme mostrado na Figura 1. A corrente de maré, gradientes de salinidade
primeira é a energia renovável marinha, e térmico e corrente oceânica. A segunda
que inclui as fontes originadas da água do inclui as fontes renováveis não originadas
mar e definidas como energia captada por da água do mar, que podem ser aprovei-
tecnologias que utilizam o movimento da tadas no espaço oceânico, como a eólica
água do mar, ou aproveitam o diferencial offshore e a solar.

Figura 1- Classificação das fontes renováveis no oceano

Energia Renovável no Oceano

Energia Oceânico Fontes Oriundas da Água do Mar

Eólica Offshore Solar Flutuante Onda Amplitude de Corrente de


Maré Maré

Corrente Gradiente Gradiente de


Oceânica Térmico Salinidade
Fonte: Elaborado pelos autores

648 ECONOMIA
648 AZUL
A ECONOMIA AZUL Energias Renováveis no Oceano 649
Apesar de décadas de esforços para o de 1966, e no Lago Sihwa, na Coreia do Sul, paralela à direção de propagação da onda; (CAMPOREALE et al., 2011; CARRELHAS
aproveitamento energético, o seu poten- desde 2011. Projetos marítimos avançados absorvedores pontuais (OLAYA et al., 2014; et al., 2019), hidráulico (FALCÃO, 2008;
cial mundial ainda é muito pouco explorado para geração de energia de correntes de ma- TODALSHAUG et al., 2016), Figura 2e, que ZHANG et al., 2019), acionamento me-
(REN21, 2018). Na última década, o uso de rés, variando de 10 kW a 1 MW foram im- possuem dimensões pequenas em relação cânico direto (ALBERT et al., 2017; YIN,
fontes de energia oceânica teve um cres- plantados, principalmente, no Reino Unido, ao comprimento de onda predominante et al. 2017) e acionamento elétrico dire-
cimento significativo. Desde 2010, muitos Canadá, na Austrália e China. No entanto, e, geralmente, são axissimétricos em rela- to (MUELLER, 2002; LI et al., 2016). Uma
dispositivos foram implantados em todo o esses projetos de demonstração continuam ção ao seu eixo vertical; e corpos oscilantes descrição detalhada desses sistemas pode
mundo para capturar a energia de ondas, com custos elevados e ainda não alcançaram submersos (SERGIIENKO et al., 2016). (Figu- ser encontrada em (OZKOP et al., 2017;
correntes e amplitudes de maré e gradientes a economia de escala necessária para a redu- ra 2f), que são boias submersas de grandes WANG et al., 2018).
térmico e de salinidade. Globalmente, esse ção significativa de custos (IEA, 2021). As tec- dimensões. O overtopping utiliza o fenôme-
crescimento mais que dobrou, de 244 MW nologias de energia renovável oceânica ainda no de galgamento para suprir de água um 2.2 Conversão de energia das marés
em 2009 para 526,8 MW em 2021 (IRENA, estão nos estágios conceitual, de P&D ou de reservatório, no qual água escoa através de
2021) . No entanto, mais de 90% dessa ca- protótipo demonstrativo. No caso de ondas e turbinas de baixa queda acopladas a gerador Barragens de marés usam a variação de
pacidade operacional é representada por correntes de marés, com base nos desenvol- para produzir eletricidade (KOFOED, 2006; amplitudes das marés durante as condi-
duas barragens de marés, que operam co- vimentos atuais, a aplicação comercial global LIU, 2017), Figura 2g. Outros, descrevendo ções de baixa (vazante) e alta (cheia) para
mercialmente, em La Rance, na França, des- é esperada a médio prazo. conceitos diferentes das categorias acima, acionar turbinas similares às utilizadas em
por exemplo, o wave carpet (ALAM, 2012) e barragens hidrelétricas. A maior variação
2. Conceitos e tecnologias a rotating mass (DURAND et al., 2007; ZHAN de amplitude das marés resulta em maior
et al., 2017), que utiliza o movimento de um extração de energia pela usina. A forma da
2.1 Conversores de energia de onda casco para acelerar e manter as revoluções estrutura é semelhante às barragens hidre-
Atualmente, há um grande número oscilante e overtopping. A coluna de água de uma massa giratória em seu interior. létricas, sendo geralmente construídas no
de conceitos e patentes sobre o uso da oscilante (OWC) comprime e descompri- Existem diferentes tipos de sistemas de estuário de rios ou baías para o armaze-
energia das ondas. O processo de conver- me o ar em uma câmara, a partir da ele- PTO adotados para os conversores de ener- namento de água na maré alta. A diferen-
são da energia das ondas pode ser dividi- vação da onda, para acionar uma turbina gia das ondas, por exemplo, pneumático ça das alturas das superfícies da água nos
do em três etapas principais: a etapa de acoplada a um gerador, produzindo eletri-
conversão primária, a etapa de conversão cidade. Dependendo do local de instala- Figura 2 - Categorias dos conversores de energia de onda
secundária e a etapa de conversão terciá- ção, os dispositivos OWC podem ser ins-
ria (E. R., 2019). No estágio de conversão talados na costa (HEATH, 2012; FERNAN-
primária, o conversor de ondas captura a DES et al., 2018). Figura 2a, ou flutuantes,
energia cinética das ondas por meio de in- Figura 2b (BULL et al., 2016; FALCÃO et
terações entre o conversor e a onda, por al., 2014). Corpos oscilantes utilizam os
exemplo, oscilação de boia, fluxo de ar ou movimentos das ondas para excitar dois
fluxo de água. O estágio secundário con- corpos de um conversor, de forma que o
verte a energia do movimento do corpo movimento relativo entre os corpos, com
em eletricidade através do gerador elétri- o auxílio de um gerador, produza eletrici-
co (power take-off – PTO). No estágio ter- dade. De acordo a dimensão e orientação,
ciário, as características da energia produ- esses sistemas também podem ser classi-
zida são adaptadas aos requisitos da rede ficados como terminadores (DIAS et al.,
com interface eletrônica de potência. Com 2017), Figura 2c, posicionados com gran-
base nos princípios de funcionamento dos des extensões horizontais perpendiculares
estágios de conversão primária e secun- à direção de propagação da onda; atenua-
dária do conversor de onda, a classifica- dores (YEMM, 2012; ZHENG, 2017) (Figu-
ção inclui coluna da água oscilante, corpo ra 2d), com grande extensão horizontal Fonte: SHADMAN et al., 2019

650 ECONOMIA AZUL Energias Renováveis no Oceano 651


lados interno e externo da barragem ocorre (JING et al., 2014; FERNANDES et al., 2015; 2.3 Conversão de gradiente térmico de água doce com água salgada, por exem-
devido a mudanças no regime das marés. WANG et al., 2018; CHEN et al., 2018), hi- plo, na região de foz de um rio. Existem dois
A energia cinética das correntes de ma- drofólios oscilante (MA et al., 2017; WANG Ocean thermal energy conversion (OTEC) métodos para gerar eletricidade a partir do
rés e oceânicas pode ser extraída com tur- et al., 2017; FILIPPAS et al., 2018), e turbi- é uma tecnologia que utiliza a diferença de gradiente de salinidade: osmose retarda-
binas hidrocinéticas, que têm semelhanças nas de efeito Venturi (CHAUDHARI et al., temperatura da água entre a superfície do da por pressão (PRO) (ALTAEE et al., 2017;
com as turbinas eólicas, todavia, atuando 2013). As correntes que passam pelo hi- mar e grandes profundidades (cerca de 1000 Idem, 2019) e eletrodiálise reversa (RED)
submersas. Devido à maior densidade da drofólios geram força de sustentação, que m) para fins de aquecimento, resfriamento, (TUFA et al., 2018; AVCI et al., 2018). O
água em relação à do ar, as pás das turbi- aciona o movimento do sistema hidráulico geração de eletricidade ou dessalinização. método PRO é baseado em membranas
nas para correntes de marés ou oceânicas para gerar eletricidade. As turbinas de efei- A viabilidade da tecnologia exige diferencial semipermeáveis que permitem apenas a
têm dimensões menores e se movem mais to Venturi aproveitam a energia cinética da mínimo de temperatura em torno de 20 °C. passagem das moléculas de água. Nesta
lentamente do que as turbinas eólicas. A corrente, amplificando a velocidade da cor- No ciclo fechado, a água morna das camadas abordagem, a água flui da solução diluí-
principal diferença entre as correntes de rente devido à redução da seção transversal superiores é usada para vaporizar um fluido da (água doce) para a solução concentra-
marés e oceânicas é que as primeiras têm do fluxo (MOFOR et al., 2014). Além des- de trabalho, amônia, por exemplo, que acio- da (água do mar), elevando a pressão da
fluxos bidirecionais em contraste com as tes tipos de conversores, tem-se os ducted na um gerador elétrico. O vapor resultante água salgada, que movimenta uma tur-
correntes oceânicas que são unidirecio- channels (KHAN et al., 2009; BELLONI et é então condensado pela água fria, que é bina, produzindo eletricidade. O méto-
nais. Os quatro principais tipos de dispo- al., 2017; TAMPIER et al., 2017) e tidal kite elevada, por meio de bombas hidráulicas, a do RED é baseado no transporte de íons
sitivos de conversão de energia de corren- (TSAO et al., 2018; TAMPIER et al., 2017), partir do fundo do oceano e, posteriormente, (sal) através de membranas. Dois fluidos
tes, mostrados na Figura 3, são: turbina ambos em fase de desenvolvimento. Uma descartada. Alguns trabalhos sobre OTEC de diferentes salinidades (água doce
de eixo horizontal (SEO et al., 2019; SHI- revisão da tecnologia de correntes de ma- de ciclo ser podem ser encontrados nas re- e água salgada) passam por uma série
RASAWA, 2016), turbina de eixo vertical rés é apresentada em (QIAN et al., 2019). ferências (FAIZAL et al., 2013; AYDIN et al., de membranas específicas. A diferença
2014; YANG et al., 2014). A tecnologia de de potencial químico entre as membra-
ciclo aberto usa a água aquecida das cama- nas resulta em uma voltagem elétrica. A
Figura 3 - Principais categorias das turbinas de correntes de marés das superiores do oceano como fluido de água salobra é então descartada no mar.
trabalho. O principal benefício do processo Além disso, alguns processos híbridos,
de ciclo aberto é que ele pode produzir ele- como a produção de eletricidade a par-
tricidade e água dessalinizada. O ciclo híbri- tir de energia térmica usando um motor
do combina tecnologias dos ciclos fechado térmico RED de circuito fechado, dessali-
e aberto. Neste processo, a água aquecida nização de baixa energia integrando RED
da superfície é evaporada rapidamente com com instalações de dessalinização, e o
o objetivo de vaporizar a amônia do fluido uso de células RED microbianas com de-
de trabalho de um ciclo fechado, acionando sempenho energético aprimorado foram
uma turbina para produzir eletricidade. Em propostos para a extração de energia a
seguida, o vapor é condensado por um tro- partir do gradiente de salinidade (TUFA et
cador de calor, produzindo água dessaliniza- al., 2018; MEI et al., 2018) .
da (OCTAVIANI et al., 2016). Tal ciclo pode
realizar a geração de eletricidade e de água 2.5 Turbinas eólicas offshore
potável simultaneamente.
Existem dois tipos principais de funda-
2.4 Conversão de gradiente de ções para as turbinas eólicas offshore, fixas
salinidade com apoio no solo marinho e flutuantes. Os
conceitos de fundação fixa são adequados
O gradiente de salinidade aproveita a para profundidades até 60 m. No entan-
Fonte: SHADMAN et al., 2019 energia que pode ser gerada pela mistura to, para lâminas-d’água superiores a 40 m,

652 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Energias Renováveis no Oceano 653
essas estruturas sofrem grandes cargas hi- por cravação de pilar é a mais utilizada nas 3. Potencial dos recursos
drodinâmicas, o que leva a um aumento no instalações existentes, seguida pela jaque-
custo, devido ao aumento de suas dimen- ta. Os projetos implementados em maiores Esta seção utiliza quatro trabalhos prin- norte equatorial do Brasil, com velocidade
sões (DEWAN et al., 2015). Para superar profundidades fazem uso das fundações cipais: SHADMAN et al., 2019, HERNANDEZ de 1,52 m/s. Essa região está localizada a
esse problema, foram propostos conceitos flutuantes. Até agora, o único parque eóli- C. et al., 2021 e ASSIS TAVARES et al., 2021, uma distância entre 120 e 300 km do lito-
flutuantes. Como mostra a Figura 4a, o co flutuante comercial é o Hywind Scotland, para apresentar os recursos renováveis no ral, com valores de densidade de potência
tipo de fundação fixa pode ser categoriza- instalado no final de 2017, que inclui cinco oceano ao longo da costa brasileira. O con- superiores a 500 W/m2. Todavia, a longa
do em quatro tipos, incluindo base de gra- aerogeradores flutuantes, com fundação junto de dados de onda é obtido usando distância da costa implica custos substan-
vidade, pilar (monopile), tripé e jaqueta. A tipo spar, com turbinas de 6 MW. Alguns o sistema operacional global de análise e ciais dos cabos submarinos, o que pode
fundação flutuante pode ser categorizada exemplos do tipo semissubmersível são os previsão oceânica da Météo-France que está inviabilizar o projeto de transmissão de ele-
em três tipos: semissubmersível, spar e pla- projetos Windfloat, Sea Angle, Eolink Pro- disponível para o CMEMS (Copernicus Mari- tricidade para o continente.
taforma de pernas tracionadas (TLP), con- totype e Kincardine, que estão em fase de ne Environment Monitoring Service). O mo- De acordo com SHADMAN et al., 2019,
forme mostrado na Figura 4b. A fundação demonstração (WIND EUROPE, 2019). delo tem uma resolução horizontal de 1/12° ao longo da costa brasileira, exceto para a
(~9 km) e campos instantâneos de 3 horas região do extremo Sul, abaixo de 27°S, a
Figura 4 – Fundações de turbinas eólicas offshore de parâmetros de onda integrados. Os con- variação térmica média anual, que repre-
a – Fundações fixas juntos de dados para velocidades e tempe- senta a diferença térmica entre profundi-
Gravity Monopile Tripod Jacket Tripile ratura das correntes oceânicas foram obtidos dades de 20 m e 1000 m, é cerca de 20
Foundation Foundation Foundation Foundation Foundation (superfície até 5500 m) do produto modelo °C ou superior. Os autores consideraram
numérico disponível para o CMEMS. O con- doze usinas de OTEC de 10 MW ao lon-
junto de dados tem uma grade horizontal go da costa. Os pontos selecionados estão
regular com resolução de 1/12° (~9 km) ba- a distâncias entre 30 e 200 km da costa.
seada na grade tripolar ORCA (GM, 1996), As regiões Norte e Nordeste apresentam
50 níveis verticais com 22 camadas dentro maior potência média anual comparadas
dos 100 m superiores da superfície, batime- com as regiões Sul e Sudeste. Os resulta-
tria de ETOPO1 (AMANTE, 2018), e forçantes dos mostraram que a diferença térmica de
atmosféricas do ECMWF (Centro Europeu de 20 °C pode ser atingida em profundidades
Previsões Meteorológicas de Médio Prazo). de até 500 m na região nordeste. Em ter-
De acordo com SHADMAN et al., 2019, mos econômicos, tem-se considerável re-
a potência total da energia de onda foi es- dução de custos para a elevação da água
timada em 91,8 GW ao longo da costa, fria a 500 m ao invés de 1000 m.
b – Fundações flutuantes
considerando a extensão dada costa bra- A Empresa de Pesquisa Energética do Bra-
sileira. Na prática, apenas uma pequena sil (EPE) estimou o potencial eólico offshore
parcela desse valor pode ser extraída pe- na zona econômica exclusiva do Brasil em
los dispositivos de conversão de energia 1.78 TW (MME, 2020), com cerca de 700
das ondas, devido a diferentes questões GW em regiões de profundidades até 50 m
associadas a desafios técnicos, impactos (EPE, 2020). No estudo foi utilizada a turbina
ambientais, economia, uso diferenciado eólica DTU de 10 MW para calcular a pro-
da área marítima e impactos sociais. No dução de energia e o fator de capacidade.
entanto, apenas um quinto desse potencial Os resultados mostrados por HERNANDEZ
equivale a cerca de 35% da demanda bra- C. et al., 2021, revelam a existência de três
sileira de eletricidade em 2017 (EPE, 2018). áreas de interesse nas regiões Nordeste,
Uma média anual máxima de corrente Sudeste e Sul, com velocidade média anual
Fonte: COMH, 2021 oceânica pode ser observada na margem de vento superior a 8 m/s. Como mostrado

654 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Energias Renováveis no Oceano 655
nas referências (RODRIGUES et. al., 2015; os estados do Rio de Janeiro e Espírito San- Ele foi desativado em 2014, devi- com capacidade de 50 kW, que consiste
PIMENTA et al., 2019), os estados do Mara- to apresentam potencial eólico offshore do ao projeto de ampliação do porto em um corpo oscilante e uma estrutura de
nhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte, expressivo. Entretanto, conforme mostrado O dispositivo, denominado conversor hi- suporte fixada no leito marinho. A parte
cada um com uma ampla plataforma con- por (Idem, 2020), nessas regiões as velo- perbárico de energia de onda COPPE, oscilante é um cilindro cônico que pode se
tinental e águas relativamente rasas (pro- cidades do vento atingem uma média de com capacidade instalada de 100 kW, é move na direção vertical. A estrutura fixa
fundidades de até 50 m), são as áreas mais 9 m/s em áreas com lâmina-d’água entre composto por um corpo flutuante, com é tipo jaqueta com quatro colunas com
atrativas do nordeste para implantação de 50 m e 3000 m, onde a implantação das 10 m de diâmetro, conectado a braço me- diâmetros pequenos em relação ao com-
turbinas eólicas offshore. Na região Sul, re- plataformas fixas, como monopile ou base cânico de bombeamento, com 22 m de primento de onda predominante, para se
curso eólico offshore significativo, com ve- de gravidade, não é tecnicamente viável. comprimento, um acumulador hidropneu- evitar o efeito de difração. A estrutura é
locidades de até 9 m/s, pode ser observado Ressalta-se que 86% dos recursos eólicos mático, uma câmara hiperbárica e uma montada no fundo do mar por uma base
ao longo do litoral dos estados de Santa offshore das regiões Sudeste e Sul estão unidade geradora. O movimento do corpo de concreto. Oito rolamentos facilitam a
Catarina e Rio Grande do Sul (TAVARES et localizados em regiões com profundidades flutuante na direção vertical (heave), de- oscilação da boia na direção vertical. Eles
al., 2020; idem, 2022) . Na região Sudeste, superiores a 50 m (Idem, 2020). vido às interações entre o flutuador e as são colocados na parte superior e inferior
ondas, aciona o atuador da bomba que da seção cilíndrica. O sistema de conver-
desloca a água dentro do circuito fecha- são está localizado no convés superior e é
4 Estágio atual de desenvolvimento do para o acumulador hidropneumático. composto por uma caixa de engrenagens,
O acumulador é conectado a uma câmara que aumenta a velocidade de rotação for-
4.1 Mundo tipo spar, instalada no final de 2017. Outros hiperbárica pressurizada. Em seguida, a necida pela boia, e um gerador rotativo. O
projetos piloto, como WindFloat, Sea Angle, água pressurizada aciona uma turbina hi- movimento vertical da boia é transferido
Exceto barragens de marés e eólica of- Eolink Protoype e Kincardine estão em fase dráulica acoplada a um gerador elétrico. através de uma haste central para a caixa
fshore, as demais tecnologias de conversão pré-comercial (WIND EUROPE, 2018). A câmara hiperbárica funciona como um de engrenagens. Em seguida, o movimen-
das fontes renováveis no oceano estão na Desde 2009, muitos dispositivos foram sistema de armazenamento de energia, to vertical é convertido em rotação ade-
fase pré-comercial. Primeira barragem de implantados em todo o mundo para captu- que suaviza as flutuações causadas pela quada ao gerador elétrico.
marés com capacidade de 240 MW foi ins- rar a energia de ondas, correntes, amplitu- natureza oscilatória das ondas do mar. A Um sistema de controle denomina-
talada em La Rance, França, em 1966. Em des de maré, gradientes térmicos e de sali- pressão aplicada está na faixa de 250-400 do latching, proposto por Budal e Falnes
2011, a Coreia do Sul inaugurou a maior nidade. A Europa tem o maior número dos m de coluna de água (mwc) (COSTA et al., (1980), foi aplicado no conversor de on-
barragem no mundo, Sihwa, com capacida- projetos de fontes renováveis do oceano, 2010). Na fase de projeto, os testes expe- das para compensar a redução do diâ-
de de 254 MW (BAE et al., 2010). Existem cerca de 60,66%, seguida pela América do rimentais de modelo reduzido em escala metro da boia, adequada à amplificação
projetos em avaliação na China, Rússia e Norte, Ásia, Oceania, África, América Cen- de 1:10 foram realizados no Laboratório dinâmica, visando à redução de custos
Grã-Bretanha (HOOPER et al., 2013). Cerca tral e Caribe e América do Sul com 17,10%, de Tecnologia Oceânica (LabOceano) da (SHADMAN et al., 2018; Idem, 2021). O
de 81% das turbinas eólicas offshore insta- 13,35%, 5,62 %, 1,64%, 0,94% e 0,7%, UFRJ, onde foi observada uma razão de sistema de controle latching utiliza um
ladas no mundo é do tipo monopile. Apenas respectivamente (SHADMAN et al., 2019). largura de captura entre 19% e 36% para dispositivo de travamento, que represen-
alguns projetos usaram turbinas com base Os projetos de conversores de onda e de o conversor de energia das ondas (ESTE- ta o método de controle mecânico que
flutuante, incluindo Hywind Scotland, do corrente de maré são predominantes. FEN et al., 2012; Idem, 2008). O segun- sintoniza o período natural da boia com
do projeto, mostrado na Figura 5b, é um o período da onda atuante, segurando e
5. Brasil conversor de energia de onda nearshore, liberando a boia na extremidade superior
com instalação prevista em águas relativa- do movimento vertical. Consequentemen-
5.1 Energia de onda Renovável no Oceano do Laboratório de mente rasas (profundidades entre 18 e 30 te, maiores amplitudes e velocidades de
Tecnologia Submarina da COPPE/UFRJ. m) na costa do Rio de Janeiro. A tecnolo- movimento da boia podem ser alcança-
No Brasil, existem dois principais pro- Como ilustrado na Figura 5a, o primei- gia está em fase de pesquisa e desenvolvi- das, levando a uma maior produção de
jetos de energia de onda com diferentes ro é um dispositivo em escala real, com mento, TRL 4, e será brevemente testada energia. Na prática, um sistema hidráulico
níveis de prontidão tecnológica (TRL), dois flutuadores instalados no Porto de no LabOceano. O sistema é um conversor é utilizado para travar mecanicamente a
ambos realizados pelo Grupo de Energia Pecém, no estado do Ceará, em 2011. de energia de onda do tipo point absorber, boia oscilante.

656 ECONOMIA AZUL Energias Renováveis no Oceano 657


Figura 5 – Conversores de energia das ondas desenvolvidos pela COPPE/UFRJ 5.2 Energia das marés do uso de comportas do tipo stop-log para
controle do limite máximo do reservatório.
a) conversor hiperbárico
As áreas costeiras do Maranhão, Pará e Foi estimada uma produção anual de ener-
Amapá são as regiões com as maiores am- gia de aproximadamente 14 GWh/ano,
plitudes de marés do Brasil. O potencial de considerando a turbina Kaplan com dupla
energia das marés de 22 TWh/ano foi esti- regulagem fornecida pela Andritz Hydro
mado para o estado do Maranhão (NETO et (AGGIDIS et al., 2012). Um outro estudo foi
al., 2017). Alguns estudos abordaram a ex- realizado por Ferreira e Estefen (2009), le-
ploração dessa energia no Brasil (FERREIRA vando em consideração as restrições da Bar-
et al., 2009; NETO et al., 2015). O estuário ragem do Bacanga para propor alternativas
do rio Bacanga com 10.219 ha de exten- a serem incorporadas a um projeto de adap-
são, que inclui o corpo de água estuarino tação visando constituir uma usina maremo-
e o Lago do Bacanga, tem uma capacidade triz piloto. A possibilidade de conversão das
de cerca de 40 milhões de metros cúbicos correntes de marés, depende da identifica-
a uma altura de 4,5 m, correspondente ao ção do fluxo das marés alta e baixa, tendo
nível da maré de primavera (NETO et al., sido investigada a possibilidade de identifi-
2017). A barragem do Bacanga possui um cação desses fluxos por imagens de satélite,
talude rochoso, com extensão de 800 m, o que se mostrou potencialmente atraente
preenchido com material argiloso. Existem para contribuir na definição dos pontos de
(b) conversor com controle latching dois sistemas de comportas tipo radial e aquisição posteriores por medições in situ
stop-log que foram instalados em 1974 e (FERREIRA et al., 2016).
Heave 1980, respectivamente. As três comportas
Stem radiais têm larguras de aproximadamente 5.2.1 Eólica offshore
Generator
12,5 m. No caso de uma comporta total-
Topside mente aberta, é registrado um nível de água Atualmente, não há nenhuma turbina
System
de 4,5 m para cada comporta radial. Este eólica offshore instalada ao longo da cos-
valor é de cerca de 3 m para os compor- ta brasileira. No entanto, de acordo com o
Columns
tas de tipo stop-log, que são planas e fun- IBAMA, 23 projetos já iniciaram o proces-
cionam na vertical, com larguras de 2,85 m so de licenciamento ambiental, com capa-
Bearings (SHADMAN et al., 2019). NETO et al., 2017, cidade instalada total de cerca de 47 GW.
propuseram um novo modelo para a essa Considerando um fator de capacidade
barragem em que as três comportas radiais médio de 50%, isso significa 32% da de-
Buoy seriam substituídas por outras adequadas manda nacional de eletricidade em 2020.
à operação automatizada. Foi considerado Os projetos dos parques eólicos offshore
um limite de nível de água do reservatório de submetidos ao IBAMA estão localizados
2,5 m. O novo modelo exclui a necessidade nos estados de CE, PI, RN, BA, RJ e RS.

Base Seafloor

Fonte:
COPPE/UFRJ

658 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Energias Renováveis no Oceano 659
6. Aspectos regulatórios no Brasil proteção ambiental. O Relatório de Impac- da política nacional de meio ambiente,
to Ambiental – RIMA é outro importante preservando os recursos naturais e fiscali-
No Brasil, os processos de concessão e horizonte a médio prazo. O objetivo do documento, elaborado simultaneamente zando seu uso racional, impondo sanções
licenciamento de petróleo e gás offshore e roadmap eólico offshore brasileiro publicado ao EIA, que visa apresentar à população, administrativas e executando as normas de
eólico onshore pela ANP (Agência Nacional pela EPE é identificar as principais barreiras e de forma inteligível, as informações técni- proteção ambiental, inclusive as de nature-
do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) desafios que devem ser considerados para o cas contidas no EIA. O Instituto Brasileiro za criminosa. O sistema de licenciamento
são baseados no regime de licitação, no qual desenvolvimento desse setor no Brasil. Além do Meio Ambiente e dos Recursos Natu- ambiental é regulamentado pelo Decreto
o órgão regulador oferece locais específicos disso, indica recomendações nos aspectos rais Renováveis (IBAMA), criado em 1989, nº 99.274/1990, com emissão de licenças
onde os reservatórios poderão ser explora- de planejamento e regulamentação. é responsável pela elaboração e execução diferentes para cada fase.
dos. A fase de pré-desenvolvimento inclui a O roadmap eólico offshore da EPE (2020)
concessão/licença da área para realização concluiu que a legislação atual, que vem sen- 7. Sinergia com óleo e gás
de estudos preliminares. A ANEEL (Agência do aplicada no setor eólico onshore, poderia
Nacional de Energia Elétrica) é a agência re- ser aplicada para a eólica offshore, conside- O Brasil possui abundantes recursos pe- localizada nas profundidades superiores.
guladora responsável pelo processo de con- rando pequenas adaptações. No entanto, trolíferos, desenvolvidos nas atividades de ex- A presença de infraestrutura e instala-
cessão para a produção de energia na zona o roadmap destacou que a diferença bási- ploração, produção e refino. A infraestrutura ções de óleo e gás em locais com alto po-
econômica exclusiva. O IBAMA analisa as ca entre a eólica onshore e offshore é que do setor de óleo e gás offshore incluem pla- tencial eólico offshore pode causar conflitos
condições ambientais e possíveis impactos as áreas eólicas onshore são propriedades taformas, poços e dutos, sendo as refinarias de uso do espaço no mar para instalação
para a concessão das licenças preliminar, privadas, enquanto as áreas offshore são localizadas em terra. Segundo a ANP (https:// das turbinas eólicas offshore em larga es-
de instalação e de operação. O Decreto N. propriedade federal, onde o Estado brasilei- www.gov.br/anp), em janeiro de 2020 a pro- cala. Por outro lado, o reaproveitamento
10.946, de 25 de janeiro de 2022, dispõe ro tem jurisdição e direitos soberanos para dução total de petróleo e gás natural no Bra- da infraestrutura de óleo e gás, a partir do
sobre a cessão de uso de espaços físicos e o fins de produção de energia, nos termos do sil era de aproximadamente 4,041 milhões descomissionamento de instalações pode
aproveitamento dos recursos naturais para art. 56 da Convenção das Nações Unidas so- de barris de óleo equivalente por dia. Isso representar oportunidades para a instalação
a geração de energia elétrica a partir de bre o Direito do Mar (UNCLOS), internaliza- representa cerca de 47% da oferta interna de turbinas eólicas, conversores de energia
empreendimentos offshore. O roadmap da do pelo ordenamento jurídico brasileiro no de energia do Brasil em 2018, conforme re- de ondas e turbinas de corrente oceânica
eólica offshore elaborado pela EPE (2020), Decreto nº 99.165/1990. Além disso, é es- latado pela EPE (2019). A produção offshore (LEPORINI et al., 2019; KLABUČAR et al.,
Termo de Referência ambiental do IBAMA, sencial, no caso de implantação de parques representada 96,9% do petróleo e 80,8% 2020). Além disso, as atividades existentes
e o Decreto acima referido são iniciativas de energia renovável offshore, considerar do gás natural em relação ao volume total. associadas à indústria de petróleo e gás,
relevantes para propiciar segurança jurídica dois marcos legais brasileiros que regem as As bacias de Campos e Santos, locali- dados ambientais e experiência em licencia-
para os investimentos no espaço oceânico políticas relacionadas ao mar, a Política Ma- zadas na região sudeste ao longo do litoral mento ambiental podem representar opor-
para aproveitamento de energia renovável. rítima Nacional (PMN), aprovada pelo Decre- do RJ e SP, são as bacias sedimentares mais tunidades para desenvolver projetos eólicos
O Plano Nacional de Energia – PNE2050 to nº 1.265, de 11 de outubro de 1994, e a produtivas e com maior potencial offsho- offshore nessas áreas (COMH et al., 2021).
(MME, 2020) publicado pela EPE é o pri- Política Nacional para os Recursos do Mar re de óleo e gás do país. Elas estão numa As fontes renováveis nas regiões offshore
meiro documento que contém a temática (PNRM), aprovada pelo Decreto nº 5.377, de faixa entre 2 km a 487 km da costa, em ocupadas pela indústria de óleo e gás po-
eólica offshore, com o mapeamento dos 23 de fevereiro de 2005. profundidades entre 12 m e 2796 m. Os dem ser utilizadas no esforço de descarbo-
recursos energéticos disponíveis no país A Lei nº 6.938/1981 instituiu o Conse- reservatórios do pré-sal são a mais recente nização do setor, fornecendo energia elétri-
no horizonte a longo prazo. Este pode ser lho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e importante descoberta das últimas duas ca para as atividades de exploração e pro-
considerado o primeiro esforço institucional órgão consultivo e deliberativo do Sistema décadas, sendo atualmente responsáveis dução de petróleo (RIBOLDI et al., 2019).
para apresentar, de forma sistemática, o re- Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA). por cerca de 70% da produção brasileira. Uma aplicação das energias oceânicas que
curso eólico offshore ao longo da costa bra- Em 1986, o Conama criou o Estudo de Na região Nordeste, o litoral norte do esta- tem sido avaliada é referente à recuperação
sileira. Mais recentemente, o Plano Decenal Impacto Ambiental (EIA), considerado um do do Rio Grande do Norte possui ativida- de petróleo em poços maduros e o aumen-
de Expansão de Energia – PDE 2029 (MME, dos mais importantes instrumentos utiliza- des intensivas de produção de petróleo e to da produção em reservatórios do pré-sal
2019) considerou a energia eólica offsho- dos para buscar a compatibilização entre gás em águas rasas de até 50 m. No entan- pela injeção de água e gás por equipamen-
re uma fonte candidata para expansão no desenvolvimento econômico sustentável e to, a maioria dos blocos exploratórios está tos submarinos (SHADMAN et al., 2020).

660 ECONOMIA AZUL Energias Renováveis no Oceano 661


8. Conclusão Appl Energy 2017; 206:303-11. DOI: Sihwa tidal power plant project. Ocean
10.1016/j.apenergy.2017.08.195. Eng 2010; 37:454-63. DOI: 10.1016/j.
As energias renováveis no oceano No espaço oceânico também se vislum- ALTAEE A.; CIPPOLINA, A. Modelling and oceaneng.2010.01.015.
estão em diferentes estágios de desen- bra o aproveitamento da energia solar em optimization of modular system for power BELLONI, C. S. K.; WILLDEN, R. H. J.;
volvimento. Atualmente, existe grande sistemas flutuantes para painéis fotovoltai- generation from a salinity gradient. Renew HOULSBY, G. T. An investigation of ducted
Energy, 2019; 141:139-47. DOI: 10.1016/j. and open-centre tidal turbines employing
interesse e planejamento de empreendi- cos. Tecnologias têm sido desenvolvidas a
renene.2019.03.138. CFD-embedded BEM. Renew Energy,
mentos em parques eólicos offshore em partir de projetos pilotos para regiões pou-
AVCI, A. H.; TUFA, R. A.; FONTANANOVA, 2017; 108:622-34. DOI: 10.1016/j.rene-
diferentes países, inclusive no Brasil. A co afetadas pelas ondas, mas que progres- E.; DI PROFIO, G.; CURCIO, E. Reverse ne.2016.10.048.
conversão de fontes energéticas oriundas sivamente irão incorporar dispositivos que Electrodialysis for energy production from BUDAL, K.; FALNES, J. Interacting point
da água do mar, com exceção das bar- minimizem os movimentos hidrodinâmicos. natural river water and seawater. Energy, absorbers with controlled motion.
ragens maremotrizes, ainda demandam As energias renováveis no oceano tam- 2018; 165:512–21. DOI: 10.1016/j.ener- Power from Sea Wave. London: Academic
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tivos que possibilitem a incorporação na verde, substituindo as fontes fósseis. Aspec- relief model: procedures, data sources and PPING, A. E.; COPELAND, G. Levelized cost
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rando diferentes projetos comerciais, espe- competitividade do hidrogênio produzido. actuated seafloor-mounted carpet for CAMPOREALE, S. M.; FILIANOTI, P.; TOR-
cialmente na Europa, a serem operacionali- As fontes renováveis no oceano, consi- a high-performance waveenergy ex- RESI, M. Performance of a Wells Turbine in
zados nos próximos anos. traction. Proc R Soc A Math Phys Eng an OWC Device in Comparison to Labora-
derando o enorme potencial no litoral bra-
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Os parques eólicos offshore tendem a sileiro, podem servir como um complemen-
rspa.2012.0193. CARRELHAS, A. A. D.; GATO, L. M. C.;
incorporar conversores de outras fontes to na matriz elétrica Brasileira, diminuindo ASSIS TAVARES, L. F. de; SHADMAN, M.; HENRIQUES, J. C. C.; FALCÃO, A. F. O.;
renováveis, em sistemas híbridos que tor- cada vez mais a dependência das hidrelétri- FREITAS, A. L. P. de; SILVA, C.; LANDAU, L.; VARANDAS, J. Test results of a 30 kW
naram viáveis, por exemplo, os conversores cas. Isso, certamente, contribuirá para a se- ESTEFEN, S. F. Assessment of the offshore self-rectifying biradial air turbine-gene-
de ondas e correntes, pela utilização da in- gurança energética do país, estabilização do wind technical potential for the Brazilian rator prototype. Renew Sustain Energy
fraestrutura comum. preço de energia elétrica, e redução de risco Southeast and South regions. Energy, Rev, 2019; 109:187-98. DOI: 10.1016/j.
No caso do Brasil, além das energias eóli- de desabastecimento de energia elétrica. 2020; 196:117097. DOI: 10.1016/j.ener- rser.2019.04.008.
ca, de ondas e de correntes de marés, existe Finalmente, deve-se enfatizar a vanta- gy.2020.117097. CHEN, B.; SU, S.; VIOLA, I. M.; GREATED,
um potencial relevante para o aproveitamen- gem comparativa do Brasil em termos de ASSIS TAVARES, L. F. de.; SHADMAN, M.; C. A. Numerical investigation of vertical-
to do gradiente de temperatura, o que pos- abundância dos recursos de fontes renová- FREITAS, A., L. P. de; ESTEFEN, S. F. Influen- -axis tidal turbines with sinusoidal pitching
sibilitará uma diversidade de fontes energéti- veis no oceano e de tecnologias que po- ce of the WRF model and atmospheric blades. Ocean Eng 2018; 155:75-87. DOI:
cas renováveis pouco suscetíveis às alterações dem ser adaptadas a partir da vasta expe- reanalysis on the offshore wind resource 10.1016/j.oceaneng.2018.02.038.
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666 ECONOMIA AZUL Energias Renováveis no Oceano 667


32

TRANSPORTE MARÍTIMO E INFRAESTRUTURA


PORTUÁRIA: UMA PERSPECTIVA ECONÔMICA

Newton Narciso Pereira

1. Introdução

Em 1778, no livro a A riqueza das Na- aos mercados de transporte aquaviário.


ções, o economista Adam Smith afirma- Alguns fatores inerentes deste processo
va que as nações que tivessem interação estão caracterizados na distância, volume,
direta com o mar teriam maiores possibi- densidade, possibilidade de embalagem e
lidades de realizar as trocas de mercado- manuseio como fatores específicos para
rias com outros países, propiciando assim um determinado transporte. Neste contex-
seu desenvolvimento. Do ponto de vista to, o transporte marítimo se destaca, uma
econômico, a possibilidade de os países vez que uma das suas principais vantagens
realizarem sua troca de excedentes de pro- é vencer longas distâncias, transportar
dução utilizando-se da via marítima é uma grandes volumes de cargas, sejam elas a
atividade antiga na história da humanida- granel sólido, líquida e gasosa, embaladas
de. As águas lacustres, fluviais e oceânicas em contêineres, sacarias ou unitizadas em
há muito tempo servem de ambiente para paletes, bem como cargas especiais de pro-
o transporte de seres humanos e cargas. O jetos, carga geral e passageiros.
transporte marítimo tem um papel impor- Para isso são utilizadas embarcações
tante na economia das nações, pois opera como meio de transporte nas vias aquo-
com meio integrador das cadeias logísticas sas. O desenvolvimento da indústria naval
locais, regionais e internacionais. permitiu que os navios ficassem cada vez
Mais precisamente, Robles (2021) expli- maiores e que fossem encontradas novas
ca que a economia marítima é um ramo alternativas mais eficientes para realizar o
da economia de transportes e se refere transporte a cada período da humanidade.

668 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 669


Da vela, a máquina a vapor e aos moto- Europa 16%; Oceania 14%. Isso significa e 24 m de calado e 564.763 DWT, operan- encerrando o ciclo do maior navio petrolei-
res de combustão interna, inúmeras trans- dizer que estes são os fluxos destas regiões do inicialmente entre o Oriente Médio com ro do mundo (MARINE INSIGHT, 2021).
formações ocorrem no projeto das embar- com embarques de carga para exportação. os Estados Unidos. Durante a guerra do Ira- Ainda neste contexto, a partir dos anos
cações e nos materiais empregados na sua Na descarga (importação) temos: África que ele sofreu um ataque e ficou seriamen- 2000 o setor marítimo passou a experi-
construção. Em 2021, haviam registrados 5%; Américas 13%; Ásia 62%; Europa te avariado em 1986. Voltou a operar em mentar novamente um aumento significa-
cerca de 99.800 navios mercantes no mundo. 19%; Oceania 1%. Este balanço de oferta 1989, e em 2004 deixou de navegar, sendo tivo do tamanho dos navios de contêineres.
Estes navios estão subdivididos nas seguin- e demanda do transporte marítimo inter- convertido numa FPSO. Em 2010, foi en- A Figura 1 mostra a evolução dos portes
tes proporções: 11% oil tankers; 12% bulk nacional refere-se ao período de 2019, em viado para reciclagem em Alang, na Índia, dos navios em TEUs nos últimos vinte anos.
carriers; 19% general cargo; 5% container; que foram movimentadas na exportação
51% outros tipos diversos, segundo a classi- 11,76 bilhões de toneladas e na importa- Figura 1 - Evolução da capacidade de transporte dos navios em TEUs
ficação total com base nos dados UNCTADS- ção 11,083 bilhões de toneladas.
30.000
TAT (2021). Anualmente, são enviados para É claro que o fluxo de exportações dos
demolição cerca de 800 navios por ano, em países, por exemplo, americanos, e neste
condições pré-covid-19. Até 2020, havia cer- se enquadram o Brasil, mostram-se maio- 25.000

Capacidade em TEUS
ca de 2.779 ordens para construção de novos res que as importações, pois somos um país
navios em países que não membros da OECD exportador de commodities em grandes
20.000
(WP6), tendo a China como maior protago- quantidades. Por outro lado, observa-se
nista, com cerca de 70,7% das ordens para que na Ásia e mais especificamente a Chi-
novas construções, em que a maior parte dos na, sendo um grande importador. Por isso, 15.000
novos contratos de construção são para gra- existe uma inversão em relação ao fluxo de
neleiros (DANIEL et al., 2021). cargas, ou seja, muitas cargas importadas 10.000,
A densidade de transporte marítimo são processadas em território asiático, para
está concentrada no Hemisfério Norte em posteriormente serem consumidas interna-
5.000
função das questões econômicas destas mente e depois embarcadas para exporta-
nações, ou seja, a riqueza do mundo em ção. Esta dinâmica do transporte marítimo
termos de valor das mercadorias transporta- em termos de oferta e demanda é o que 0
das. Existe um intenso transporte marítimo rege sua atividade. 1996 1997 2012 2003 2005 2006 2012 2013 2014 2018 2019 2020
no eixo entre Ásia-Europa (Eurásia), o que Ano
mostra a importância desse fluxo para a ma- 1.2 Economia de escala
triz econômica global. Do lado do Oceano Fonte: Adaptado de Rodrigue (2020)
Pacífico também se verifica um fluxo Ásia- O setor de transporte marítimo vive um
-América do Norte (costa oeste), bem como momento crucial para redução dos custos Em 1996, a capacidade dos navios de os portos na Ásia são Shanghai, Ning-bo,
Europa-América do Norte na sua costa leste, unitários da tonelada transportada a bordo contêineres eram de 6.400 TEUs. Já em Xiamen, Yantian e Hong Kong, na Ásia; e
concentrando o fluxo de transporte de car- dos navios. Quando comparamos a evolu- 2020, essa capacidade passou para 23.964 na Europa Algeciras, Aarhus, Barcelona,
gas de alto valor agregado. ção dos tamanhos dos navios, nota-se que TEUs, um aumento de 3,74 vezes. A am- Bremerhaven, Gothenburg, Port of Poti,
Os dados de Sirimanne et al. (2021), em 1980 houve um movimento de cons- pliação da capacidade dos navios em ter- Rotterdam-Maasvlakte, Rotterdam-Maas-
publicados no Review of Maritime Trans- trução de grandes navios petroleiros, para mos de movimentação de contêineres de vlakte 2, Wilhelmshaven-JadeWeser Port,
portation (2021) da United Nations Confe- movimentação de carga. Contudo, o cres- certo modo acompanhou o processo de Valencia, Gijon, Izmir, Zeebrugge, Vado Li-
rence of Trade and Development (UNCTAD) cimento destes navios trouxe um problema globalização, bem como o aumento das gure Reefer Terminal e Vado Gateway. Ou
mostram a participação internacional das para os portos, uma vez que estes ficaram exportações de produtos acabados produ- seja, nesta rota esses portos são aqueles
regiões no mercado marítimo. No que tan- limitados nas rotas onde poderiam operar. zidos na China para os países da Europa. capazes de receber esses navios em função
ge ao embarque, a distribuição é a seguin- Um exemplo disto foi o navio Knock Nevis, Esses navios foram projetados para operar da infraestrutura disponível (profundidade,
te: África 7%; Américas 22%; Ásia 41%; com 458 m de comprimento, 67 m de boca em poucos portos do mundo, por exemplo, berço e equipamentos de movimentação).

670 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 671


671
Isso faz com eles sejam portos concentra- descarbonização da frota. Isso significa de exemplo, a Yara lançou em novembro atender a essas necessidades em âmbito
dores, uma vez que estes navios trazem um uma das maiores mudanças do século XXI, de 2021 o primeiro navio autônomo YARA nacional. Tomando como exemplo o Brasil,
elevado número de contêineres para serem uma vez que consiste em alterar o tipo de Birkeland, dotado de baterias com capa- um país com dimensões continentais, ade-
descarregados a cada escala. combustível utilizado pelas embarcações. cidade 7 MWh, intitulado como navio de quar todos os 37 portos públicos para essas
Além de reduzir o custo por slot, por Ao longo dos anos, houve um processo de emissão zero. demandas a curto e médio prazo será um
contêiner transportado, existe o aspecto transição do fornecimento de energia para Porém uma descarbonização comple- desafio para a indústria nacional, mas tam-
ambiental. O aumento do porte dos na- os navios, passando da vela para o vapor e ta da frota de aproximadamente 50.000 bém uma grande oportunidade para gera-
vios de contêineres permitiu que houvesse combustível fóssil. navios mercantes de grande porte deverá ção de emprego e renda no setor marítimo
também uma redução da tonelada de CO2 Ocorre que o processo de descarboniza- atingir níveis diferentes em cada país, pois portuário. Cabe frisar que essas mudanças
equivalente. Como o consumo de combus- ção significa utilizar combustíveis alternati- demandará ações que envolvam incentivos deverão envolver todos os setores da nave-
tível não cresce de maneira exponencial ao vos como, nuclear, gás natural liquefeito – financeiros, desenvolvimento tecnológico gação, desde longo curso, cabotagem e na-
crescimento do porte dos navios, é natural LNG, hidrogênio, amônia, metanol, fontes local, cadeia de suprimentos eficiente para vegação fluvial, pois são metas de redução
que a quantidade de emissões em função de energia renováveis, células de combustí- indústria de navipeças, estaleiros, suporte e de emissões que os países estão se compro-
do total da carga transportada diminua. vel e eletricidade, para reduzir a quantida- políticas em nível internacional e regional, metendo a atender, até as imposições da
Assim, a economia gerada em função do de de CO2 lançado na atmosfera durante a em função da contribuição de ~ 3% do se- Organização Marítima Internacional (IMO).
volume maior transportado também bene- operação dos navios. Outros combustíveis tor marítimo para as emissões de gases de Assim, tudo isso é uma mudança de pa-
ficia os indicadores ambientais dos navios. e tecnologias, como biocombustíveis, po- efeito estufa. Essas ações deverão ser com- radigma para a indústria, que ainda está
Ainda neste sentido, os navios de derão num futuro próximo ajudar a descar- binadas, pois deverão exigir de uma indús- pautada no bunker. Uma corrida tecnoló-
granéis minerais também cresceram de bonizar a indústria de transporte marítimo, tria internacional e regional para atender gica que foi motivada pela IMO para que
tamanho nos últimos anos. Até 2008 o mas cada um tem barreiras significativas a essa demanda, além de capacitação de os navios possam alcançar as metas esta-
maior navio para o transporte de minério em relação a custo, recursos, riscos ope- pessoal especializado. belecidas para 2030-2050. Basicamente, a
de ferro era o Berge Stal, que tinha capa- racionais, infraestrutura de distribuição e Algumas das alternativas para mitigar redução das emissões de CO2 do transpor-
cidade de transportar 360.000 t. A partir abastecimento, armazenamento, toxicida- emissões de CO2 já estão disponíveis em al- te marítimo deve ser de pelo menos 50%
de 2006, a VALE iniciou o projeto do na- de, transporte e aceitabilidade social (AL-E- gumas classes de navios, como o uso do sho- até 2050 em comparação com a linha de
vio VALEMAX, para transportar 400.000 t NAZI et al., 2021). re power. A ação de fornecer energia elétrica base de 2008. O fato é que a própria re-
de minério. Os primeiros navios da classe Além disso, o consumo de combustível para os navios nos portos exige a instalação novação da frota existente em 2021, que
entraram em operação a partir de 2010, o pode ser melhorado por vários aperfeiçoa- de equipamentos (transformadores e conver- necessitará terminar seu ciclo entre 2040-
que trouxe uma revolução para o mercado mentos na eficiência (como otimização das sores), plugs de tomadas, instalação elétrica 2050, deverá trazer equipamentos já ade-
de transporte de minério de ferro. Foram linhas e forma do casco, limpeza do casco para média tensão (4 a 6.6 KVA), adequação quados para atingir os índices estabeleci-
incorporados a frota cerca de 30 navios para reduzir as bioinscrustações e melhoria das subestações e berços, bem como estra- dos pela IMO em termos de redução das
desta classe. Isso permitiu uma redução no da hélice, entre outros), uso de velas rota- tégias comerciais para o fornecimento deste emissões CO2, seja operando no mar, seja
custo total do minério de ferro transporta- tivas (rotor de Flettner), velas para propul- serviço para o navio no porto. nos portos de maneira mais eficiente do
do, uma vez que a época este mercado era são como da Sky Wind e uso de baterias A mesma coisa é a infraestrutura ne- ponto de vista ambiental.
dominado pelos navios da classe Capesize para navios elétricos, além de ações ope- cessária para suprir os navios com LNG. Já
(±180.000 t). racionais como reduzir a velocidade dos existem navios atracando em portos brasi- 1.4 O mercado de transporte
navios “slow steaming”, otimizar as rotas leiros capazes de receber esse combustível, marítimo durante a covid-19
1.3 Descarbonização da frota e monitorar as filas dos portos, ajustes de porém ainda não existe infraestrutura de
janelas de atracação e fornecimento de abastecimento, principalmente para navios O mercado de transporte marítimo ti-
Muitas demandas ambientais nos energia elétrica para os navios no porto de cruzeiros e graneleiros. Com o aumen- nha um ritmo muito bem conhecido até
últimos 10 anos afetaram a indústria “shore power”. Na prática, para cada tipo to da demanda de navios que chamarão 2019, considerando suas oscilações típicas
de transporte marítimo, mas não creio de navio é provável que sejam identificadas os portos com essa tecnologia a bordo, ao longo dos anos, em função dos ciclos
que nenhuma delas tenha um impacto alternativas diferentes para que possam será necessário que as ações integradas econômicos, variações da oferta e deman-
tão significativo quanto o processo de atingir uma redução das emissões. A título em termos de país sejam adequadas para da e influências políticas e econômicas,

672 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 673


antes do advento da covid-19, em os pro- de contêineres vazios para serem reposicio- Figura 2 - Evolução do índice de frete de Shanghai
cessos até estavam mapeados, funciona- nados nas origens, principalmente na Ásia.
do dentro de certa harmonia. Uma análise Nos Estados Unidos, os navios de contê-
nos valores de afretamento de time char- ineres, principalmente na costa oeste, pas-
ter nos últimos 20 anos até 2019 mostra saram a ficar mais de uma semana aguar-
um comportamento com alguma flutua- dando para atracar. O efeito em cadeia se
ção, principalmente nos períodos entre deu basicamente nos preços dos afreta-
2004 e 2008, que acompanhou o boom mentos e, consequentemente, no valor do
de desenvolvimento da China e uma que- frete pago para transportar um contêiner
da acentuada nos períodos subsequentes, da Ásia para o Brasil. A evolução dos valo-
mantendo valores dentro de patamares res de frete pode ser observada na Figura
praticados pelo mercado internacional de 2, que mostra o Shanghai Containerized
transporte marítimo. Freight Index (SCFI).
Ocorre que, com a chegada da co- O SCFI foi lançado oficialmente em 16
vid-19, a dinâmica do mercado se alterou de outubro de 2009. Esse índice reflete o
fortemente. Primeiro foram os fechamen- frete marítimo e as sobretaxas marítimas
tos das fronteiras internacionais, inician- associadas de rotas de navegação individu-
do-se pela China no início de 2020. Isso ais no mercado à vista. Fonte (https://en.sse.net.cn/indices/scfinew.jsp)
causou um impacto no comércio interna- As rotas de envio são as principais rotas
cional, uma vez que este país é o maior de comércio de contêineres de exportação Figura 3 – Evolução dos valores de frete para contêineres de 40 pés –
World Container Index
fabricante mundial de produtos de alto de Shanghai para as seguintes regiões: Euro-
valor agregado que distribui para o resto pa, Mar Mediterrâneo, costa oeste dos EUA, $12.000
do mundo. Naturalmente, o fechamento costa leste dos EUA, Golfo Pérsico, Austrália/
das fronteiras chinesas fez com as cargas Nova Zelândia, África Ocidental, África do
ficassem retidas nos seus portos. Os na- Sul, América do Sul, Japão Ocidental, Leste $10.000

vios começaram então a aguardar para do Japão, Sudeste Asiático e Coreia do Sul. A
atracar, causando um desbalanceamento unidades utilizadas pelo indicador referem-se
na oferta e demanda de serviço de trans- a USD/TEU (USD/FEU é para serviços da costa $8.000

porte e distribuição de produtos dentro oeste dos EUA e da costa leste).


da cadeia de suprimentos global. Com o Em termos de valores em dólares, a Fi-
$6.000

$
espalhamento do vírus pelo globo, outras gura 3 apresenta o World Container Index
fronteiras também fecharam, como foi o desenvolvido pela Drewry, mostrando a
caso de muitos países da Europa e dos Es- evolução dos valores de frete marítimo e as
$4.000
tados Unidos (LAZARIN; VIEIRA, 2021). sobretaxas marítimas associadas de rotas
O efeito cascata fez os navios ficarem de navegação individuais no mercado spot.
parados nas pontas, ou seja, junto aos por- Em termos absolutos, no início de 2020 $2.000
tos aguardando a oportunidade para carre- um contêiner na rota Shangai-Santos custava
gar ou descarregar. A consequência disso em torno de US$ 2.000. No início de 2021, o
foi a ruptura na cadeia de abastecimento valor do frete passou para US$ 9.000. Já em $0
global, em que produtos começaram a fi- junho de 2021, o valor alcançou patamares 9 0 0 20 0 0 0 21 1 1 21 1 1 1
-1 v-2 -2 ai- l-2 t-2 -2 n- -2 -2 n- -2 -2 -2
dez fe abr -ju se ov ja ar abr ju go out ez
car estocados nas pontas, gerando uma de US$ 10.000 (Figura 3), e alguns embarca- 2- 06- 02- 8-
m
23 17- 2-
n
07- 4-
m
29- 24- 9-
a
14- 9-
d
1 2 1 0 1 0
redução no número de navios disponíveis dores reportaram valores na ordem de US$ Período
no sistema para realizar o transporte, falta 15.000 em dezembro de 2021. Fonte: Drewry (2021)

674 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 675


A dinâmica dos fretes praticados para o Armadores no início de novembro de 2021 ço nos pátios de contêineres. Como todo cerca de 674 navios granéis sólidos esta-
transporte marítimo passou então a ter um passaram a relatar dificuldades para com- sistema de distribuição é integrado, existe vam esperando na China por dois dias ou
novo comportamento após o surgimento por sua tripulação, em função ainda das a necessidade dos outros elos da cadeia mais para atracar. No mesmo período da
da covid-19. Naturalmente, os valores mais restrições impostas pela covid-19, bem neste período terem também capacidade pré-pandemia de 2019, apenas 287 navios
altos geram toda uma pressão sobre o sis- como houve um aumento dos salários dos de movimentação, como armazéns, trans- de granéis sólidos estavam esperando por
tema econômico, que refletem no aumen- tripulantes dos navios, devido aos riscos as- portadores terrestres, rodoviários e ferro- tanto tempo. Contudo, a partir de setem-
to dos preços das mercadorias, provocando sociados à atividade durante este período. viários, disponibilidade de mão de obra bro de 2021, verificou-se uma redução no
inflação, uma vez que toda a cadeia de dis- Soma-se a isso o problema relacionado ao para movimentação, que foram reportados valor do BDI, o motivo reportado referiu-
tribuição passa a ser pressionada. elevado tempo que as tripulações estão fi- como problemas existentes em terra que -se a uma redução de demanda da China,
Não podemos esquecer que o fato de cando a bordo dos navios, em muitos ca- afetam o transporte marítimo. principalmente na indústria de construção,
o navio Ever Given ter encalhado no Canal sos sem poder deixar o navio, em função Por outro lado, outros setores também combinadas com informações de redução
de Suez em março de 2021, também con- das restrições sanitárias em vários portos tiveram um movimento de elevação nos de produção da VALE, que impactam o
tribuiu para ampliar o congestionamento do mundo. O efeito são problemas de de- preços dos fretes, como dos granéis sóli- mercado de fretes dos navios mineraleiros
nos portos da Europa e Ásia, bem como pressão e ansiedade, que têm afetado par- dos. Um indicador que mede o mercado de (GCAPTAIN, 2021). Deste modo, neste mer-
ampliar a ruptura do sistema de transpor- te da tripulação. Uma pesquisa realizada frete deste segmento é o Baltic Dry Index cado uma oscilação é natural, mas podemos
te de contêineres. Este canal é responsável pela BIMCO/ICS prevê escassez potencial (BDI). Este é emitido diariamente pelo Bal- observar que no período da pandemia man-
por 12% da movimentação de carga glo- de quase 150.000 oficiais até 2025, segun- tic Exchange, com sede em Londres. O BDI teve a tendência de crescimento dos fretes,
bal. Em números absolutos, isso significa do a Bloomberg (2021) e a International é um composto das médias das escalas de em função da demanda elevada da China.
aproximadamente 1,32 bilhões de tonela- Union of Marine Insurance (2021). Handmax (38 kt), Capesize (180 kt), Pana- Por outro lado, mesmo neste período
das por ano. Diariamente, nós estimamos Podemos analisar esse problema como um max (82 kt) e Supramax (58kt). É reportado confuso para o mercado marítimo, os arma-
que 3,6 milhões de toneladas passam pelo grande jogo de dominó, ou efeito cascata. em todo o mundo como um substituto para dores tiveram os melhores resultados nos úl-
canal. Considerando que o mesmo ficou Com os navios parados nas filas dos portos na estoques de remessa de granéis sólidos, timos tempos. As margens operacionais das
parado 7 dias, totaliza-se pelo menos 25 Europa, Ásia e Estados Unidos, os contêineres bem como um termômetro do mercado empresas de navegação de contêineres ace-
milhões de toneladas que deixaram de cir- cheios não são descarregados e os vazios não marítimo. Neste mercado, como já falamos leraram a uma velocidade maior no terceiro
cular nestes dias, sendo que a fila de navios podem ser recolhidos para serem novamente anteriormente, notamos que não houve trimestre de 2021, com a proporção média
chegou a alcançar cerca de 400 navios pa- reinseridos na cadeia de transporte. Todos es- nada semelhante ao que ocorreu entre 2004 reservada pelas dez linhas principais chegan-
rados aguardando a liberação do canal nas ses efeitos combinados geram um impacto no e 2008. Mesmo no período da covid-19, do a 56%. Ao analisarmos a Figura 4, verifi-
suas pontas. Esses navios parados deixa- sistema de transporte marítimo internacional em que houve um aumento no índice BDI, camos que em 2019 a margem operacional
ram de cumprir sua programação de che- que influencia diretamente nos preços de frete não se presenciou os mesmos patamares de média era de apenas 3,7%. De acordo com
gada nos portos, de carga e descarga, bem dos contêineres e outros segmentos do trans- aumento. Em termos de valores de afreta- o Global Maritime Hub, após a divulgação
como abastecer a cadeia logística. Após a porte marítimo. Em novembro de 2021, os mento em time charter, em janeiro de 2019 dos resultados do terceiro trimestre, os 10
liberação do canal, estes mesmos navios se portos de Los Angeles e Long Beach informa- estava cotado em USD 10 a 15 mil/dia, e em principais armadores de contêineres que re-
deslocaram para os portos transferindo a ram que havia 87 navios em fila aguardando setembro de 2021 USD 30 a 45 mil/dia, ten- lataram publicamente que poderão alcançar
fila de lugar, uma vez que a capacidade de para operar em seus berços. O impacto desta do o Capesize alcançado os maiores valores, lucros operacionais de US$ 115-120 bilhões
movimentação nos portos é limitada em ruptura da cadeia logística reflete que os por- segundo dados da BIMCO (2021). para suas atividades de transporte em 2021,
função da sua produtividade. tos implementaram taxas para os operadores Em 2021, um dos fatores que causou mais de 6 vezes o valor em 2020.
O impacto da ruptura da cadeia logís- logísticos retirarem o mais rapidamente possí- impacto nas altas taxas de frete pode ser Deste modo, é possível perceber que du-
tica gera o efeito da escassez de navios, vel para reduzir o excesso de dwell time dos parcialmente atribuído às restrições e aos rante a pandemia os armadores de contê-
tripulação e contêineres disponíveis para contêineres no porto (S&P GLOBAL, 2021). problemas nos portos devido à pandemia, ineres, bem como de granéis, conseguiram
o transporte das mercadorias. A escassez Outros portos americanos também têm que estão prendendo os navios por mais resultados positivos, em termos de valores
de navios fez com os armadores tivessem adotado aumento das tarifas no segundo tempo do que o normal. De acordo com de fretes e afretamentos. As empresas de na-
que readequar suas rotas, bem como os semestre de 2021, para forçar os operado- os dados BIMCO, sendo o estudo realiza- vegação tiveram que fortalecer suas alianças
serviços disponibilizados para os clientes. res desta cadeia logística para liberar espa- do pela Oceanbolt, em setembro de 2021 para cumprir os compromissos assumidos

676 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 677


com os seus clientes, principalmente no Os portos e terminais portuários brasilei- Figura 4 -Evolução do EBTIDA das empresas de navegação
início de 2020, período de muita incerte- ros foram responsáveis pela movimentação no setor de contêineres em 2021
za para o mercado global. Contudo, com de 1,21 bilhões de toneladas em 2021. Ba-
50,0%
o avanço da vacinação e abertura gradual sicamente, a infraestrutura portuária brasi- 44,4%
de alguns mercados, as empresas de nave- leira está dividida entre pública (porto orga-
38,2%
gação ajustaram sua estratégia de oferta e nizado) e privada (arrendamentos e fora do 40,0%

demanda, em termos da disponibilidade de porto organizado). Os terminais portuários


navios para atender ao mercado. Ao final de privados movimentam aproximadamente 30,0%

Margem EBIT
2020, observou-se uma recuperação parcial 66,2% de todo o volume de carga, mos- 24,5%

da economia, com o aumento da demanda trando a grande participação da iniciati-


20,0%
e produção na Ásia e aumento do consu- va privada no processo portuário, seja por 14,8%
mo no Hemisfério Norte. A maior ocupação meio dos arrendamentos operando dentro
dos navios gerou aumento significativo no do porto público, seja pelos terminais priva- 10,0% 8,5%
5,3%
ganho das empresas de navegação e me- dos fora da área do porto organizado. 3,0% 1,9%
3,7% 2,6%
2,4%
1,0% 1,7%
nor ociosidade dos slots. Em contrapartida, Essa infraestrutura portuária nacional 1,1% 1,4%
500,0% -1,1%
-1,3% 3,1%
mesmo com o aumento das esperas nos está alinhada com a vocação do país, princi- -5,6% -3,8%
portos, o que ocorre é um aumento da de- palmente no que se refere às suas principais -9,3%
-10,0%
manda para o transporte, o que faz com cargas de exportação focadas em commo-

Q 016
Q 016
Q 016
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Q 017
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Q 017
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Q 019
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Q 019
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Q 020
Q 020
Q 021
21
os preços de frete subam, trazendo maior dities. A análise dos dados do anuário da

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2
retorno financeiro aos armadores, uma Agência Nacional dos Transportes Aquaviá-

Q
Período
vez que o custo operacional não cresce na rios (ANTAQ) mostra que as cinco principais Fonte: statista.com
mesma proporção. Além disso, o efeito da cargas são: (i) minério de ferro (370 Milhões
economia de escala por transportar cargas de toneladas – Mt – 31%); (ii) Petróleo e de- Figura 5 - Evolução dos principais produtos exportados pelo Brasil
em navios maiores ajuda na redução dos rivados (óleo bruto) – (195 Mt – 16%); (iii) entre 1995-2019
custos unitários, o que maximiza a receita, contêineres (133 Mt – 11%); (iv) soja (109 What did Brazil export between 1995 and 2019?
cujas margens no terceiro trimestre de 2021 Mt – 9%); (v) petróleo e derivados (sem óleo $3008

$2808
alcançaram patamares de 56%, conforme bruto) (84 Mt – 7%). Com o agrupamento $2608 Serv
ices
amplamente divulgado na imprensa. de todas as cargas movimentadas, temos: $2408

granel sólido – 58%; granel líquido – 26%; $2208

$2008
1.5 Desenvolvimento econômico e conteinerizada – 11% e carga geral – 5%.

CURRENT GROSS EXPORT


$1808

infraestrutura portuária brasileira Os 5 maiores portos em termos de mo- $1608

vimentação são: (i) Terminal Marítimo de $1408

$1208 Minerals
Os portos são a linha de frente do trân- Ponta da Madeira (182,36 Mt) – privado; (ii) $1008

sito das riquezas de uma nação, ou seja, Santos (113,28 Mt) – público; (iii) Terminal $808

são por eles que o PIB do país circula. Essas Aquaviário de Angra dos Reis (64,14 Mt) $608

Agriculture
$408
infraestruturas refletem diretamente em – privado; (iv) Terminal de Tubarão (64,09 $208

como a economia de um país está pauta- Mt) – privado e; (v) Itaguaí (54,47 Mt) – pú- $0

da. O Brasil é um país com dimensões con- blico. Considerando o fluxo por natureza

96

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tinentais, com cerca de 8.500 km de costa das cargas, 65,3% das movimentações são PRODUCT
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marítima, com 37 portos públicos e mais de embarques e 34,7% são desembarques, o 1995
VISUALIZATION
2019
200 terminais de uso privados (TUP) instala- que mostra a vocação exportadora do país.
1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018
dos ao longo da costa, bem como aqueles As movimentações de cargas nos portos
Figura 5 - Evolução dos principaisFonte: Atlas
produtos da complexidade
exportados pelo Brasileconômica de Harvard (2021)
entre 1995-2019
instalados em bacias fluviais. brasileiros estão ligadas às características Fonte: Atlas da complexidade econômica de Harvard (2021)

678 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 679


produtivas nacionais. Os dados do Atlas termos de disponibilização de infraestrutu-
Figura 6 - Mapa da distribuição do PIB x Densidade Econômica -
da Complexidade Econômica desenvolvi- ra portuária no país.
Referência: 2019
do pela Universidade de Harvard mostram A partir desta constatação é possível
claramente as características da evolução também verificar como está distribuída a PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB) PER CAPITA DOS ESTADOS
das exportações nacionais desde 1995, em densidade econômica nacional, ou seja, BRASILEIROS (2019)
Fonte de dados: IBGE (2019)
termos de participação na economia mun- quais são os municípios e estados que con- Sistema de coordenadas: Planas
Projeção: UTM/SIRGAS 2000
dial (Figura 5). O objetivo principal deste centram a geração de riqueza, que têm uma
atlas é apresentar o nível de complexidade relação direta com a concentração da ativi- R$ - Valores em mil reais
14.292 (Roraima/RR)
dos países, em termos da sua capacidade dade portuária, em termos do número de 15.630 (Acre/AC
de produção e integração com o mercado portos e terminais para atender ao fluxo de 17.497 (Amapá/AP)
39.356 (Tocantins/TO)
internacional. Isso pode ser traduzido em exportação e importação para atendimento 44.689 (Sergipe/SE)
47.091 (Rondônia/RO)
todo o volume de conhecimento incorpo- destas demandas (Figura 6). 52.781 (Piauí/PI)
rado em uma sociedade, não dependendo Ainda neste contexto, nota-se que os 58.964 (Alagoas/AL)
67.986 (Paraíba/PB)
necessariamente do acúmulo de conheci- municípios mais urbanizados localizados 71.337 (Rio Grande do Norte/RN)
97.340 (Maranhão/MA)
mento individual, mas sim da diversidade próximos na faixa litorânea são os que apre- 106.943 (Mato Grosso do Sul/MS)
de conhecimento de todos os indivíduos sentam maior representatividade na den-
R$ - Valores em mil reais 273.614 (Distrito Federal/DF)
de determinada sociedade, que, ao combi- sidade econômica nacional. A maior parte 108.181 (Amazonas/AM) 293.241 (Bahia/BA)
137.346 (Espírito Santo/ES) 323.264 (Santa Catarina/SC)
narem esses conhecimentos, culminam em das empresas no Brasil também se concen- 142.122 (Mato Grosso/MT) 466.377 (Paraná/PR)
redes complexas de interação. Deste modo, tram nestas localidades, gerando fluxos 163.575 (Ceará/CE)
178.377 (Pará/PA)
482.464 (Rio Grande do Sul/RS)
651.873 (Minas Gerais/MG)
a capacidade de produção de um país vai diretos de importação e exportação que 197.853 (Pernambuco/PE) 779.928 (Rio de Janeiro/RJ)
208.672 (Goiás/GO) 2.348.338 (São Paulo/SP)
depender diretamente da capacidade de entram e saem pelos portos localizados nes-
Fonte: IBGE (2019)
todos os membros da respectiva sociedade tas regiões. O Mapa do IBGE intitulado Lo-
de produzir produtos, bens e serviços à dis- calização das Empresas Industriais do Brasil
posição, ou seja, quanto mais diversidade mostra as relações diretas entre a quantida- Figura 7 - Participação do Brasil no market share global de
de produtos complexos um país é capaz de de de empresas distribuídas no território na- exportações de cargas que passam pelos portos
produzir, mais desenvolvida e bem-sucedida cional, que pode ser sobreposto pelo mapa What share of the global market does Brazil export?
é sua economia (PEDROSO et al., 2021). de densidade econômica (Figura 6). Por ou- Textiles X
4.5%
Ao analisarmos a Figura 5, podemos tro lado, na região Centro-Oeste do Brasil, Agriculture X

observar que ao longo dos últimos anos o onde temos a maior concentração da ativi- 4% Stone X

Brasil ampliou significativamente sua ex- dade agropecuária, é onde está ocorrendo Minerals X

3.5% Metals X
portação de produtos agrícolas, bem como a maior expansão das demandas de trans-
Chemicals X
de minerais (minério, combustíveis e deriva- porte e exportação destes produtos no país, 3%
Vehicles X

dos). Produtos como químicos, farmacêuti- pela infraestrutura das regiões Sul e Sudeste

Share of Market Sector


Machinery X
2.5%
cos, maquinaria e eletrônicos praticamente com a migração para Norte e Nordeste. Electronics X

se mantiveram estáveis nos períodos, em Isso pode ser observado pela Figura 7, 2%
Services X

termos de crescimento – produtos esses de que mostra a participação global do Brasil


1.5%
maior valor agregado. Isso mostra que para em termos de market share, em função das
a movimentação das cargas, a infraestrutu- cargas que são exportadas pelo país. É pos- 1%

ra disponível deve acompanhar a tendência sível observar que, em termos de produtos


de crescimento das exportações. Assim, é agrícolas, temos uma participação global 0.5%

possível notar que a movimentação de mi- em 4,25%, sendo os dados de até 2019. 0% 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018

nérios e produtos agrícolas foram as que Nota-se um aumento da participação dos


tiveram maior crescimento exponencial em minerais no período, mas para os outros Fonte: Atlas da complexidade econômica de Harvard (2021)

680 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 681


setores avaliados verifica-se uma estabilida- em que notamos um decaimento acentuado. Observa-se claramente que os 4 princi- conteinerizadas no transporte marítimo
de constante, ou seja, não houve crescimen- Por outro lado, verificamos o caso do Japão pais portos apresentados do mundo estão são apresentadas pelo Port Economics,

.
to nesta participação internacional quando (2.80 – 2000 – 1ª posição – 2.49 – 2019 – 1ª diretamente relacionados com seu nível de Management and Policy (2021), sendo:
comparado entre o início e final da série, posição), Coreia do Sul (1.25 – 2000 – 20ª complexidade, e os nove primeiros mun-
Fabricações diversas incluem artigos
principalmente em produtos de maior valor posição – 2.05 – 2019 – 4ª posição), bem diais estão concentrados na Ásia, e como
feitos de plástico (por exemplo, sacolas),
agregado, que demandam de uma infraes- como a China (0.44 – 2000 – 39ª posição – demonstrado na seção anterior, a região
brinquedos, artigos esportivos ou material
trutura específica de movimentação de car- 1.35 – 2019 – 16ª posição), Singapura (1.55 que ampliou seu ICE. Somente o porto de

.
de escritório;
gas, como os terminais de contêineres. – 2000 – 11ª posição – 2.00 – 2019 – 5ª po- Rotterdam é o único europeu que vigora
Deste modo, podemos identificar pelas sição) e Vietnã (0.59 – 2000 – 93ª posição entre os primeiros do mundo, na décima Máquinas elétricas incluem máquinas
cargas que exportamos e movimentamos – 0.05 – 2019 – 56ª posição), mostrando que posição. Quando analisamos o caso do movidas a eletricidade, como cabos elétri-
no país o grau de complexidade econô- alguns países aumentaram sua complexidade Brasil, verificamos que no mesmo período cos, eletrodomésticos, baterias e circuitos

.
mica. Assim, o desenvolvimento econô- de produção nos últimos anos. Isso mostra os terminais que tiveram maior crescimen- integrados;
mico requer o acúmulo de conhecimento que o desenvolvimento logístico portuário to nas exportações foram os ligados a mi-
Hortaliças e frutas compõem um im-
produtivo e seu uso em setores cada vez tem forte correlação com o grau de comple- nérios e granéis sólidos vegetais. O porto
portante segmento de transporte por con-
mais complexos. As classificações de país do xidade econômica global. de Santos, que é o maior público Brasilei-
têineres refrigerados. Este setor tem sido
Harvard Growth Lab avaliam o estado atu- ro, encontra-se na posição 45ª em termos
objeto de notável crescimento com logísti-
al do conhecimento produtivo de um país, 1.6 Complexidade econômica re- de movimentações globais totalizando

.
ca de cadeia de frio mais confiável;
por meio do Índice de Complexidade Eco- flete no transporte de contêineres (2,6 milhões de unidades – 4,23 milhões
nômica (ICE). Os países melhoram seu ICE de TEU), conforme o anuário do Porto de Têxteis e artigos confeccionados in-
aumentando o número e a complexidade A movimentação de contêineres pode ser Santos 2020. cluem fios, fibras tecidas, cobertores, len-
dos produtos que exportam com sucesso, utilizada como um termômetro para avaliar a Do ponto de vista macroeconômico, çóis, cortinas e tapetes.
ou seja, produtos de maior tecnologia repre- economia de um país, considerando a natu- essa posição mostra diretamente o efei-
sentam maior grau de ICE, que representa reza das principais cargas que em geral estão to da economia brasileira, em termos de Neste contexto, podemos comparar o
maior valor agregado. a bordo dessas caixas. O exemplo recente bens e produtos gerados para exportação, Índice GS1 Brasil de Atividade Industrial,
Em 2000, o ICE brasileiro era de 0.86 (26ª desse fenômeno ocorreu com a covid-19. Por bem como insumos e produtos de impor- que mostra o reflexo das atividades indus-
posição) e 2019 foi de 0.10 (53ª posição). Ou alguns meses a economia global entrou em tação. É sabido que as principais cargas triais no país. Neste índice são analisados
seja, esses dados, quando comparados com processo de estagnação, mas quando houve conteinerizadas são aquelas de maior va- os setores como alimentos, bebidas, têxtil
a Figura 7, mostram que devido a maior par- a sua retomada todo o reflexo se pautou na lor agregado. Isso tem uma relação dire- vestuário e produtos diversos. Uma análise
ticipação no market share global de produtos escassez de contêineres, filas de navios nos ta com a indústria. As principais cargas global é mostrada na Figura 8.
como commodities (agrícolas e minerais), o portos e congestionamentos. Isso foi um
país foi reduzindo sua complexidade em ter- sinal positivo de retomada econômica nas Figura 8 - Série histórica do Índice GS1 no Brasil
mos da produção para exportação. Isso signi- maiores economias do mundo. Para validar – 2002-2020 –
fica dizer que as cargas que são embarcadas nossa afirmação, basta realizarmos um com- Índice GS1 Brasil
em grandes volumes nos portos brasileiros parativo dos principais terminais de contêine-
180,00
apresentam menor complexidade de produ- res globais nos últimos anos, e o contêiner é 160,00
ção em relação à carga de outros países com uma carga que em geral transporta produtos 140,00
160,00
maior grau de industrialização e agregação de maior valor agregado, que consequente-

Índice
120,00
100,00
de valor tecnológico nos produtos exporta- mente tem uma correlação com ICE dos pa- 80,00
dos. Este fenômeno não é apenas brasileiro, íses. O principal porto de movimentação de 60,00
40,00
ocorre também com outros países como Ar- contêineres é Shanghai – 45 MTEU (milhões

jan/02
jul/02
nov/02
abr/03
set/03
fev/04
jul/04
dez/04
mai/05
out/05
mar/06
ago/06
jan/07
jun/07
nov/07
abr/08
set/08
fev/08
jul/09
dez/09
mai/10
out/10
mar/11
ago/11
jan/12
jun/12
nov/12
abr/13
set/13
fev/14
jul/14
dez/14
mai/15
out/15
mar/16
ago/16
jan/17
jun/17
nov/17
abr/18
set/18
fev/19
jul/19
dez/19
mai/20
out/20
gentina (0.14 – 2000 – 54ª posição – 0.24 de TEUS) em 2020; Singapura (37 MTEU);
– 2019 – 73ª), Estados Unidos (1.99 – 2000 Ningbo-Zhoushan (32 MTEU); Shezhen (26 Meses/ano

– 6ª posição – 1.57 – 2019 – 11ª posição), MTEU); Rotterdam (15 MTEU). Fonte: www.gs1br.org

682 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 683


Observa-se que no Brasil existe uma os- Isso pode ser verificado também quando Compreender a dinâmica da economia redução das emissões na cadeia de trans-
cilação entre os anos com alta e baixa no comparamos os índices trimestrais de evo- internacional e nacional é muito importan- porte, maior utilização da cabotagem por
indicador. Quando realizada uma análise lução dos três setores que compõem o PIB te para interpretar as perspectivas de cresci- parte das empresas permite ainda um po-
setorizada, verifica-se que existem setores nacional, conforme a Figura 9, que mostra mento ou de movimentação das movimen- tencial de captura de cargas para migração
com maior pujança em relação a outros. a variação no período entre 2017 a 2021. tações de contêineres. As projeções para o modal. Mas seguindo a tendência natural,
ano de 2022 pelo Banco Central Brasileiro é que deveria ser resultante de um aumento
Figura 9 - Taxa de variação do índice de volume trimestral do PIB
de que o setor industrial deverá ter uma re- de produção e demanda interna e maior
considerando os principais setores nacional no período de 2017 a 2021
tração de -1,3 % no PIB. Já para o setor da de movimentação de contêineres, isso não
agropecuária existe a expectativa de cresci- sugere ocorrer, segundo as análises dos
Agropecuária - total Indústria - total Serviços- total
mento de 5,0% e de serviço 1,3%. A pro- dados públicos econômicos disponíveis,
jeção é que o PIB brasileiro cresça somente quando se comparado com outros países.
1o trimestre 2017
3o trimestre 2021 25 2o trimestre 2017
1% neste ano, enquanto o PIB global seja Um baixo crescimento da indústria afeta
20 de 4,1% segundo os dados do World Bank o segmento de transporte de contêineres,
2o trimestre 2021 3o trimestre 2017
15 – Global Economic Prospects (2022). isso pode ser observado pela ótica da par-
1o trimestre 2021
10
4o trimestre 2017
O baixo crescimento do país, princi- ticipação global nas exportações brasileiras
5 palmente no setor industrial, pode ter um no market share, quando considerando
0 reflexo sobre este setor, mesmo com as produtos de maior valor agregado que de-
4o trimestre 2020 -5 1o trimestre 2018
perspectivas de crescimentos anunciadas mandam principalmente das cargas con-
-10
por alguns representados deste segmento teinerizadas, conforme mostrado na Figura
-15
3o trimestre 2020 2o trimestre 2018 no mercado. É natural que devido às ca- 7. Contudo, alguns fatores exógenos têm
racterísticas implícitas dos tipos de cargas propiciado que, mesmo com todos esses
capturadas, restrições logísticas, aumento problemas, aumentos contínuos na movi-
2o trimestre 2020 3o trimestre 2018
dos custos dos combustíveis para o setor mentação de contêineres, nos principais
de transporte terrestre, disponibilidade de complexos portuários entre 2018-2021,
1o trimestre 2020 4o trimestre 2018
ferrovias e terminais ferroviários para mo- conforme os dados da Associação Brasilei-
4o trimestre 2019 1o trimestre 2019 vimentação de contêineres, redução da de- ra dos Terminais de Contêineres – Abratec,
3o trimestre 2019 2o trimestre 2019 pendência do rodoviário, intermodalidade, venham ocorrendo ano após ano (Tabela 1).
Figura 9 - Taxa de variação do índice de volume trimestral do PIB considerando os
Fonte: Sidra/IBGE (2022)
Tabela 1 - Recorte da movimentação de contêineres
principais setores nacional no período de 2017 a 2021
Fonte: Sidra/IBGE (2022)
nos principais complexos portuários
Nota-se claramente que ao longo desses Não podemos esquecer que o setor de PORTO 2018 2019 2018-2019 (%) 2020 2019-2020 (%)
quatro anos existe uma variação significativa serviços é um grande consumidor de produ-
entre os setores, e o setor industrial represen- tos diversos que são embarcados e transpor- Santos 2.594.811 2.586.082 99,66% 2.656.340 103%
tou menor crescimento do PIB no período tados em contêineres, por exemplo, peças
Itajaí 643.017 688.514 107,08% 786.998 114%
analisado. O setor agropecuário apresentou para reposição e reparo de equipamentos
maior estabilidade em termos de crescimen- industriais, eletrônicos, eletrodomésticos Paranaguá 461.468 486.134 105,35% 551.670 113%
to, com apenas três períodos de baixa, sen- etc. Segundo os dados do IBGE, em 2015
Av. Paulista, 1079, 8 .andar, CEP 01311-200 – S. Paulo – SP – Brasil - WhatsApp: +55-11-994-482-884
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o
terceiro semestre
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– São Paulo milhões de empresas tinham essa
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Rio de Janeiro 453.147 417.400 92,11% 401.205 96%
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2021, com uma redução de 9%. Contudo, classificação. Este setor foi responsável pela
Rio Grande 448.975 403.783 89,93% 404.721 100%
na média o setor teve um crescimento de ocupação de 11 milhões de pessoas neste
3,8%. Embora o setor industrial seja respon- período (IBGE, 2022). Neste contexto de PIB, S. Fco. do Sul 360.087 423.106 117,50% 336.098 79%
sável pela movimentação de cargas de alto este setor apresentou maior estabilidade no
valor agregado, no período avaliado observa- tempo, em relação à indústria. No período Manaus 336.864 380.481 112,95% 324.446 85%
-se que o crescimento do PIB foi de 0,29%. avaliado, o crescimento foi 0,8%. Fonte: Abratec (2022).

684 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 685


Notadamente, observa-se que o por- além de estarem concentrados no polo de Figura 11 - Participação da indústria no PIB do estado. Referência: 2020
to de Santos é o maior complexo hub desenvolvimento econômico nacional na
de contêineres no país. Isso se justifica região sudeste.
principalmente pelo estado de São Pau- Neste sentido, é possível observar
lo ser o maior PIB nacional, sendo este o também a relação econômica da indús- 35% 35%
concentrador do maior número de em- tria do estado de São Paulo em termos 30%
29%
30%
presas, mostrando a influência da relação de arrecadação de contribuição previden- 25% 25%
industrialização x conteinerização. Aliado ciária (CSS) como elemento gerador de

PIB Industrial
PIB - Estado
20% 20%
a isso, existe o fato da infraestrutura de tributos oriundos da atividade industrial 12%
15% 15%
transporte do estado de São Paulo per- (Figura 10). Para melhor compreensão 11%
10% 10%
mitir também capturar cargas em vários destas relações econômicas versus a in- 7% 8%
5%
4% 4%
estados que estão na sua hinterlândia. Os fraestrutura disponível para movimenta- 5%
1%
3%
2% 2% 2% 2% 2% 1% 1% 1% 1% 0% 1% 1% 0% 0% 0% 0%
5%

terminais de contêineres no porto de San- ção de contêineres, relacionamos o CSS 0% 0%

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tos estão integrados diretamente ao ofe-

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com o número de terminais disponíveis

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recimento de uma infraestrutura logística,

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em cada estado da federação.

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Estados

Figura 10 - Ranking de arrecadação de contribuição previdenciária (CSS) Fonte: Adaptado de Perfil da Indústria (2022)
da Indústria dos Estados
A análise integrada desses dados per- mais de uma integração modal, em que
Ranking dos Estados Brasileiros em Arrecadação da Indústria x No Terminais de Contêineres - Dados de 2017 mite-nos identificar que embora verifica- a cabotagem tem um papel fundamental
5
R$ 35.000,00 mos um crescimento ano a ano da movi- para essa atividade, reduzindo o custo da

No de Terminais de Contêineres
R$ 30.000,00 4 mentação de contêineres em alguns dos cadeia logística.
R$ 25.000,00 portos brasileiros, este fator não é expli- De maneira geral, isso mostra a impor-
3
R$ 20.000,00 cado pelo desenvolvimento da atividade tância do planejamento, bem como da
R$ 15.000,00 2 industrial (crescimento médio 2017-2021 análise sistêmica para o desenvolvimento e
R$ 10.000,00 = 0,29%), mas pela oportunidade de mi- crescimento das operações de contêineres
1
R$ 5.000,00
gração modal, ou seja, cargas que estão no Brasil, considerando a integração entre
R$ 0,00 0 migrando do transporte rodoviário para a polos consumidores e produtores, além de
cabotagem têm aumentado a movimenta- uma infraestrutura logística que permita
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o acesso terrestre aos portos e integração


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ção de carga do nos portos. Desde 2018,


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GR
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notamos um crescimento mais acelerado multimodal. É pouco provável que sem es-
GR
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Estados da movimentação de cabotagem, tendo ses fatores integrados tenhamos espaço


como um grande fator motivador a greve para novos complexos de contêineres no
dos caminhoneiros, que causou um impac- país, uma vez que a análise da infraestru-
Fonte: Adaptado de Perfil da Indústria (2022)
to na cadeia logística nacional. Neste ano, tura disponível x atividade econômica e
houve um crescimento de 12% na movi- industrial estão interligadas. Ou seja, não
mentação em relação a 2017. Entre 2020 adianta apenas dispor de infraestrutura de
e 2021 o crescimento foi de 14%, sendo acesso, águas profundas, sem a demanda
Portanto, notamos claramente que os conteinerizadas. Adicionalmente, nós rela- os dados da ABAC (2022). Atrelado a isso, para carga para atrair os armadores. Esses
estados com maior contribuição são aque- cionamos os estados em termos de partici- verifica-se também que as empresas de aspectos foram discutidos previamente por
les que apresentam também maior número pação do PIB nacional x PIB industrial dos logística têm ampliado significativamen- Pereira (2021), mostrando os drivers para o
de terminais para movimentação de cargas respectivos estados (Figura 11). te o serviço porta a porta, utilizando-se desenvolvimento portuário.

686 ECONOMIA
ECONOMIA AZUL
AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 687
1.7 Infraestrutura para commodities do ponto de vista logístico no país, este
foi o corredor de maior crescimento neste Figura 12 - Agropecuária no Brasil. Referência: 2019
A Figura 7 mostrou que o país tem período, principalmente no transporte de
uma participação da ordem de 4,1% no cargas como soja e milho. Isso refletiu dire-
market share global das exportações liga- tamente na conjuntura de movimentação
das à agricultura, tendo como carro-chefe das commodities brasileiras, que culminou
a exportação de soja. Diferentemente das numa nova alternativa logística, bem como
atividades industriais, a atividade agrope- uma nova alavanca propulsora para o de-
cuária concentra-se no interior do país, senvolvimento regional.
principalmente na região do Centro-Oeste Assim, com a expansão da infraestrutu-
e ramificações para o Sul-Sudeste e, mais ra portuária na região houve também a ne-
recentemente, para Norte e Nordeste, re- cessidade da melhoria nos acessos, sendo
gião também conhecida como MATOPIBA um marco para o país o asfaltamento da BR
(sigla que reúne as iniciais dos estados do 163, nos estados de Mato Grosso e Pará,
Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) (Figura que permitiu aumentar a capacidade de es-
12). Neste sentido, a expansão portuária coamento e movimentação destas cargas
está se desenvolvendo principalmente nas nesta região até Miritituba.
regiões Norte e Nordeste do Brasil, sendo Por outro lado, isso também gerou um
impulsionada pelos projetos do Arco Norte. impacto em relação aos portos do Sudes-
De 2010 à 2020 foi possível observar te, uma vez que retirou a sobrecarga so-
um crescimento exponencial na infraestru- bre este sistema portuário. Neste contex-
tura de transporte alocada na região Norte to, cabe salientar que não se pode realizar
do país, no que tange à instalação de es- uma análise isolada, mas o resultado final Fonte: IBGE (2019)
tações de transbordo em Miritituba, novos deste desenvolvimento foi a geração de
terminais portuários no Pará, nas cidades uma série de novos serviços e demandas
de Santarém e Vila do Conde, além do de- para o desenvolvimento da região do Arco destas cargas, que naturalmente está liga- realizar investimentos em ferrovias, com a
senvolvimento de tecnologias específicas Norte, que reflete no processo de geração da ao seu grau de complexidade econômi- garantia da construção e operação ferro-
para movimentação de carga por meio de de emprego e renda na região para desen- ca, em função do que se é capaz de produ- vias, ramais, pátios e terminais ferroviários
barge to ship e operações offshore. volver e manter uma nova infraestrutura zir internamente no Brasil. por meio de autorização.
Adicionalmente, projetos de infraestru- de transporte. Cabe ressaltar que existem A tendência ao se observar a maior par- Os novos projetos de concessões previs-
tura para a região têm sido previstos, como ainda novas perspectivas de projetos es- te dos projetos de infraestrutura portuária tos nas zonas portuárias brasileiras, em ter-
melhoria das condições de passagem dos truturantes para ampliar a capacidade de apresentadas para os próximos anos são mos da natureza das cargas, não são muito
navios pela Barra Norte (AM), derroca- movimentação de cargas nesta região de novos terminais que envolvem principal- diferentes das que já são movimentadas
mento do canal do Lourenço, dragagem e influência do Arco Norte, com a possível mente a movimentação de commodities, por esses complexos existentes, seguindo
balizamentos nos rios Madeira e Tapajós, construção futura da ferrovia Ferrogrão por exemplo, o Terminal de Alcântara, no a tendência do índice de complexidade
asfaltamento da BR 163/PA até Miritituba (SINOP-Itaituba), expansão do trecho ferro- Maranhão, localizado numa posição pri- econômica nacional. Por fim, cabe salien-
já concluída, de acordo com a ATP (2020). via Norte-Sul de Açailândia para Barcarena vilegiada em termos de acesso marítimo, tar que para o mercado das commodities
Tudo isso reflete o aumento da movimenta- ainda sem previsão. profundidade natural de 25 metros, porém ainda existem alguns gargalos a serem
ção de cargas nesta região, com crescimen- Portanto, percebe-se que a infraestru- com restrições ainda de acesso terrestre, superados, como a ampliação das draga-
to médio anual de 19,9% de 2010-2020, tura portuária tende a se desenvolver em que poderão ser mitigadas com a constru- gens, duplicação de canal de acesso, orde-
sendo os dados apresentados no Diagnós- função das características principais das ção da ferrovia que já entrou no projeto namento do tráfego de navios e barcaças,
tico Logístico 2020 da Empresa de Plane- cargas movimentadas pelo país, em função estruturante do governo federal chamado zonas para realização de transhipment
jamento e Logística – EPL. Observando da demanda prevista para movimentação Pró Trilhos, que garante a iniciativa privada na área de Santarém, derrocamentos,

688 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 689


balizamentos, sinalizações em algumas hi- outro lado, operar navios maiores significa econômico, para os armadores de contê- que concentram maior número de termi-
drovias, reforços na amarração de berços dizer que ele irá descarregar/ou carregar ineres este período foi um dos melhores de nais portuários para movimentação de
próximos, melhorias de acessos terrestres mais cargas, por exemplo, obrigando os todos os tempos em termos de ganhos em cargas conteinerizadas. Adicionalmente,
(rodoviário e ferroviário), conforme aponta- terminais a se prepararem para essa nova EBITDA. verificamos que a expansão da fronteira
do pela ATP (2020), além de outras deman- conjuntura. O efeito no tempo será acom- No caso do Brasil, os importadores pas- agrícola nacional no sentido Norte e Nor-
das locais de cada região portuária nacional panhar um aumento das movimentações/ saram a experimentar um aumento signifi- deste tem impulsionado os investimentos
que deverão ampliar a competitividade dos escala com redução do número de atraca- cativo nos fretes de contêineres. O impacto em infraestrutura para viabilizar as opera-
portos brasileiros. ções de navios, com efeito global na taxa disso é um aumento dos custos ao longo ções nestas regiões, que, de certo modo,
Além desses pontos, temos os desafios de ocupação dos berços. da cadeia de distribuição que impacta o levará desenvolvimento de novos serviços
para operação de navios cada vez maiores, Um ponto importante a ser observado consumidor final, podendo levar a uma re- que agregam valor à cadeia logística e aos
que estão sendo deslocados de rotas do é que a substituição da frota de navios an- dução nas movimentações de algumas car- municípios na zona de influência desses
Hemisfério Norte para o Sul, que irá de- tigos por mais modernos irá exigir a curto gas de menor valor agregado que precisam empreendimentos portuários. Ou seja, um
mandar de planejamento e ações para per- e médio prazo que os portos brasileiros te- ser importadas. impacto positivo de mais serviços sendo
mitir a recepção segura para atendimento nham melhores infraestruturas para atendi- Neste sentido, a infraestrutura portuária gerado em regiões que até então não ti-
destes navios. mento destes navios. Existirá uma deman- brasileira, como demonstrado, acompanha nham uma demanda tão significativa para
da para fornecimento de energia elétrica, o grau de complexidade econômica do o transporte de cargas por via fluviomarí-
1.8 Considerações finais por meio do sistema shore power, além da país. Entre 2000 e 2019 verificou-se que tima.
disponibilidade de fornecimento de LNG, houve uma redução desta complexidade, Por fim, cabe frisar que é necessária
O desenvolvimento do transporte ma- hidrogênio verde, metanol e/ou amônia, impulsionada principalmente pelo aumen- uma visão sistêmica e integrada para en-
rítimo e do setor portuário é fortemente sendo estes os combustíveis que estão to das exportações de commodities e uma tender o comportamento do desenvolvi-
afetado pelas variáveis econômicas dos sendo cotados para substituir o bunker estagnação em termos de produtos de mento da infraestrutura, do fluxo de inves-
países, sejam eles desenvolvidos, sejam em dos navios, para atender aos critérios IMO- maior valor agregado. Deste modo, fatores timentos em função da vocação das cargas
desenvolvimento. O setor marítimo tem 2030-2050 em termos de redução de emis- que envolvem a distribuição das indústrias movimentadas no Brasil. Uma mudança
passado por transformações significativas são CO2 de 2008. Ou seja, existe uma nova ao longo do território nacional, distribuição na complexidade econômica ao longo do
nos últimos anos impulsionado por pres- cadeia de projetos, tecnologias e serviços da renda, centros de produção e consumo tempo poderá também mudar as relações
sões ambientais, que de certo têm refletido para os portos brasileiros, e a indústria têm uma influência na relação de oferta e de cargas movimentadas, necessitando de
na busca de melhor eficiência operacional marítima à disposição para ser capturada demanda e, consequentemente, na distri- implementação de outras infraestruturas
e redução dos custos. O fenômeno de eco- a curto e médio prazo, com potencial de buição dos principais complexos portuários para atendimento destas demandas de
nomia de escala tem obrigado os navios a geração de emprego, renda e melhoria da nacionais. As regiões Sudeste e Sul são as transporte.
aumentarem de tamanho, trazendo uma sustentabilidade.
pressão sobre as infraestruturas portuárias Por outro lado, é importante perceber Referências
distribuídas ao longo do globo. O Brasil já o impacto que a covid-19 causou ao mer-
tem percebido este movimento de aumen- cado de transporte marítimo, que direta- AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTE br/cabotagem/numeros-do-setor/. Acessa-
to dos navios, sendo induzido principal- mente se refletiu sobre os portos em todo AQUAVIÁRIO – ANTAQ. Estatístico Aqua- do em: 20 jan. 2022.
mente nas commodities minerais, mas já se o mundo. Novos eventos ocorreram que viário. Disponível em: http://ea.antaq.gov. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS TERMI-
nota o interesse de aumentar o tamanho desregularam a cadeia logística internacio- br/. Acesso em: 20 jan. 2022. NAIS DE CONTÊINERES. Estatísticas. Dis-
dos navios de contêineres que operam em nal, com reflexo direto nos fretes pratica- AL-ENAZI, A.; OKONKWO, E. C.; BICER, ponível em: https://abratec.terminais.org.
nossos portos, em função da infraestrutura dos, bem como em termos de congestio- Y.; AL-ANSARI, T. A review of cleaner al- br/estatisticas. Acesso em: 20 jan. 2022.
disponível. Aumentar o tamanho dos na- namentos em função dos fechamentos de ternative fuels for maritime transportation. ASSOCIAÇÃO DE TERMINAIS PORTUÁ-
vios pode ter um reflexo natural na quan- fronteiras internacionais. Tudo isso trouxe Energy Reports, 7, 2021, 1962-1985. RIOS PRIVADOS – ATP. Análise do setor,
tidade de escalas mensais, uma vez que se novos paradigmas para o setor, que preci- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ARMADO- das atividades e das finanças. Relatório
a demanda não aumentar os navios irão sou se adaptar às mudanças impostas pela RES DE CABOTAGEM. Números do setor. anual. Disponível em: https://www.portos-
escalar menos vezes os portos por mês. Por pandemia. O fato é que, do ponto de vista Disponível em: https://www.abac-br.org. privados.org.br/files/relatorio-atividades-

690 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 691


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692 ECONOMIA AZUL Transporte Marítimo e Infraestrutura Portuária 693


33

INDÚSTRIA NAVAL BRASILEIRA: PANORAMA


ATUAL E PONDERAÇÕES PARA O FUTURO

Jéssica Pires Barbosa Barreto


Israel de Oliveira Andrade
Claudio da Silva Tarrisse Fontoura

1. Introdução

Tendo a necessidade de deslocamento capacidade de produção dos estaleiros, prin-


e transporte pela via marítima, as embar- cipalmente em períodos com pouca deman-
cações têm acompanhado a história da da no mercado internacional. Nesse sentido,
humanidade, desenvolvendo-se de acordo o Canadá é um interessante exemplo de go-
com o avanço tecnológico das civilizações. verno que, para garantir benefícios econô-
Com o passar dos anos, a estrutura dedica- micos para suas províncias costeiras, investe
da à construção das embarcações também em políticas de construção naval para seus
evoluiu, contando com uma infraestrutura estaleiros. Outro exemplo é a China, onde
de grande porte e mão de obra especializa- sua empresa estatal é a responsável pela
da. Apesar disso, é possível observar que a maior parte da produção do país.
história mundial da indústria naval é base- No caso brasileiro, o marco inicial da
ada em ciclos de alto desenvolvimento tec- indústria de construção naval é a funda-
nológico com forte demanda, e períodos ção do Estabelecimento de Fundição e
de baixa demanda. Estaleiros da Ponta d’Areia em 1846 pelo
Além da sua importância para garantia Barão de Mauá. Entretanto, assim como a
de transporte e comércio internacional, e tendência mundial, esse setor econômico
também para defesa da soberania pelos teve sua história intrinsecamente atrelada
Estados, a construção naval possibilita alto aos ciclos econômicos no país. Ademais,
desenvolvimento tecnológico, benefícios é possível observar a importância dos pro-
sociais para os países e geração de empre- jetos militares, com destaque para o Pro-
gos. Por isso, muitos investem em políti- grama de Desenvolvimento de Submarinos
cas governamentais para manutenção da (PROSUB) e o Programa Classe Tamandaré,

694 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 695


e nas necessidades do setor de petróleo. Es- te introdução: panorama internacional da Navy (RCN), estabelecida em 1910, lidava poder naval e a soberania nacional (COL-
sas demandas têm garantido investimentos construção naval, para situar o leitor quanto com embarcações antigas e sucateadas, TON; HUNTZINGER, 2002).
na infraestrutura e desenvolvimento tecno- ás origens da indústria de construção naval após tentativa falha do primeiro-ministro Apesar de alguns fatores serem comuns
lógico do Brasil. e os maiores construtores internacionais; a Sir Wilfrid Laurier de equipar a marinha à construção naval ao redor do mundo, in-
Desse modo, o capítulo tem como história da construção naval no Brasil, des- com embarcações projetadas e construídas fluenciando a competitividade no mercado
principal objetivo trazer um panorama da tacando o papel das encomendas militares e no país (BARRETO, 2021a). internacional, como custo, layout das em-
indústria de construção naval brasileira, do setor de óleo e gás para o seu desenvol- Durante a Segunda Guerra Mundial barcações, desenvolvimento tecnológico e
destacando sua importância econômica e vimento; e o papel da inovação nesse cená- (1939-1945), diversos países investiram ciclos da demanda; todos esses fatores so-
social para o país. Para isso, o texto é di- rio. A conclusão traz algumas ponderações massivamente na sua indústria de constru- frem impactos de questões específicas de
vidido em quatro partes, além da presen- para o futuro da construção naval brasileira. ção naval, principalmente pelo destaque cada país. A forma como o governo inter-
que as embarcações tiveram no conflito fere e organiza esse setor pode definir sua
2. Panorama internacional da construção naval anteriormente. A necessidade em larga es- atuação e espaço no cenário internacional,
cala fez com que o setor se adaptasse para principalmente porque muitos setores se
A prática da construção naval é eviden- diferentes países que não conseguiram constituir uma produção mais rápida, inclu- tornam dependentes dos incentivos do Es-
ciada ao longo da história da humanidade, acompanhar o desenvolvimento tecnológi- sive adotando a prática de “linha de produ- tado para sobreviver (TODD, 2019).
com o desenvolvimento de embarcações co, como no caso do Canadá. A indústria ção” e a pré-fabricação de algumas partes No Canadá, o setor de construção na-
para cruzar rios e oceanos. Foi durante a de construção naval canadense tem seu e peças dos navios (TODD, 2019). val teve o Estado como o principal res-
Primeira Revolução Industrial, no final do sé- início no período em que o país ainda era No Canadá, o governo deu uma sé- ponsável pelo seu desenvolvimento e es-
culo XVIII e início do século XIX, o primeiro colônia do Reino Unido, no século XIX. O rie de incentivos para o desenvolvimento tabilização em momentos de crise, sendo
salto de desenvolvimento do setor, com o desenvolvimento dessa atividade foi im- dos estaleiros, principalmente para com- completamente voltada para as demandas
advento das máquinas a vapor e, no meio pulsionado pelo aumento da população e pensar a desmobilização da indústria de nacionais. Isso se dá, principalmente, pela
naval, a criação das primeiras docas secas na o comércio de madeira com a metrópole, construção naval após o fim da Primeira prática do país de investir nos momentos
Inglaterra. O período foi marcado por uma principalmente nos estaleiros localizados Guerra Mundial. Mesmo com uma série de crise e, após esses momentos de alto
melhoria significativa na construção das em- em Quebec (WILSON, 2009). de investimentos, a indústria do país não crescimento, quedas bruscas pela falta de
barcações, causando menos naufrágios e Ainda no início do seu desenvolvimen- tinha conhecimento tecnológico nem ha- demanda. Essa tradição de “produzir para
melhor navegabilidade (TODD, 2019). to, o setor sofreu uma queda na produção bilidades específicas para a construção de responder” afeta diretamente a estrutu-
Os projetos e materiais utilizados na por causa das novas embarcações constru- grandes embarcações. Por isso, a pedido ra do mercado e a conduta das empresas
construção naval foram gradualmente al- ídas em aço. Logo, políticas de incentivo da Marinha do país, o foco foi a constru- (BARRETO, 2020).
terados durante o século XIX. Os barcos por parte do governo eram demandadas ção de destroyers classe Tribal, baseados Reconhecendo a importância da área
feitos de madeira tiveram o acréscimo tí- pelos estaleiros, que se concentravam na nos projetos da Marinha Britânica (SHOU- para a criação de empregos nas regiões
mido de ferro para confecção de juntas região costeira do país, mas não eram de- TE, 2015). costeiras, mais afastadas dos centros indus-
mais resistentes no convés. Foi em 1843 vidamente atendidas. O setor se manteve Após a Segunda Guerra Mundial, uma triais do país, o governo geralmente se utili-
que o primeiro navio com o casco feito até meados do século XIX através de de- série de práticas adotadas durante a guerra za desses impactos positivos para defender
de ferro foi concebido, construído pelo mandas do Reino Unido (BARRETO, 2020). para uma fabricação mais rápida se estabe- os projetos diante da opinião pública. O
engenheiro Isambard Kingdom Brunel. Foi apenas com o início da Primeira leceram na indústria de construção naval, país também adota a política de compen-
O navio Great Britain foi projetado para Guerra Mundial (1914-1918) que essa in- em especial a utilização de seções pré-fa- sações industriais em todas as suas aqui-
levar 250 passageiros e teve sua primei- dústria voltou a ser altamente demandada bricadas em blocos para ganhar tempo sições, inclusive as nacionais, buscando o
ra viagem em 1845. Esse projeto repre- pelo governo para suprir o número de em- no processo com menor esforço. Alguns desenvolvimento econômico e tecnológico
sentou uma grande ruptura com a tradi- barcações necessárias para a marinha Britâ- exemplos desses componentes são tubos de outros setores (BARRETO, 2021b).
ção de construção de navios de madeira nica, ainda com dificuldades para assimilar e cabos elétricos. Ademais, com o fim do Não foi apenas o Canadá que investiu
(COLTON; HUNTZINGER, 2002). os novos conhecimentos de construção de conflito, a indústria de construção naval em políticas de subsídio para a indústria de
Essa mudança na matéria-prima dos na- embarcações de aço (YOUNG, 2012). Até ganhou destaque em diversos países como construção naval. Entretanto, por criar uma
vios prejudicou o setor de construção em esse momento, a própria Royal Canadian uma atividade estratégica para garantir o distorção na competição internacional,

696 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 697


Figura 1 - Principais programas de construção naval do governo canadense foi hegemônico até a década de 1980, sen- influenciar medidas políticas e não técnicas
do ameaçado pelo aumento da participa- ou econômicas, distorcendo a concorrência
no pós-Segunda Guerra Mundial
ção da Coreia (LEE, 2019). De acordo com internacional (OCDE, 2021a).
Todd (2019), a participação da Coreia nas Na China, as empresas estatais corres-
Royal Restigouche Annapolis Halifax vendas do setor aumentou de 9,7% em pondem a mais de 90% das entregas do
Canadian Class (1953- Class (1960 - Class (1987- 1982 para 23% em 1983. país em 2020. A maior dessas empresas
Navy 1959) 1964) 1996) Ao final da década de 1990, a China pas- é a China State Shipbuilding Corporation
sou a se destacar no mercado após grandes (CSSC), criada em 2019. Após uma série de
investimentos estatais no setor. Isso se deu, investimentos e expansão em larga escala da
em grande parte, por causa da velocidade infraestrutura do setor entre 2003 e 2008, a
1910 [...] 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010
de construção de navios e preços mais bai- China alcançou o topo da construção naval
xos. No país, além de pequenas empresas mundial em 2010 e tem se mantido nessa
nacionais privadas, sendo o Yangzijiang Shi- posição, principalmente em termos de novos
pbuilding Group fundado em 1956 a maior contratos e conclusão de embarcações. O
St. Laurent Mackenzie Iroquois National delas, e joint ventures, em torno de 40% do país representou 37,5% de toda a produção
Class (1950 - Class (1958 - Class (1969- Shipbuilding
setor pertencem a empresas estatais (PARK; mundial em 2020 (OCDE, 2021b).
1957) 1963) 1973) Strategy
HWANG, 2018). Empresas estatais são uma Com o início da pandemia em 2020,
estratégia comum para controle do setor, diversos estaleiros mundiais tiveram im-
Fonte: Barreto (2020, p. 46) entretanto, a forte influência do governo pactos negativos, como França e Espanha,
em sua estrutura e tomada de decisão pode com diminuições de demanda de mais de

diferentes Estados declararam em 1972, a Os governos assumem políticas específi-


partir da OCDE, seu objetivo de eliminar es- cas para garantir a competitividade de suas Figura 2 - Conclusões e novos contratos de navios por estaleiros chineses,
ses incentivos e garantir uma livre-concorrên- indústrias, entretanto, as alianças geopolí- 2011-2020
cia no mercado. Alguns anos depois, a pró- ticas podem definir a escolha do design das
pria OCDE pedia aos países que interferissem embarcações pensando em interoperabili-
25000
para apoiar seus estaleiros e garantir a capa- dade entre as nações no caso de operações
cidade dessas estruturas (TODD, 2019). conjuntas. Outra grande característica da
Assim, o Reino Unido foi o grande ber- indústria naval é a mudança em relação aos 20000
ço da indústria naval moderna, com uma países que lideram o mercado internacio-

Thousand cgt
Marinha de destaque e mantendo a Europa nal. Na década de 1960, a Europa perdeu
15000
Ocidental no centro do mercado mundial seu posto de maior indústria para o Japão
até meados da década de 1960. Apesar e, depois, na década de 1980, para a Co-
do destaque no cenário internacional, os reia do Sul e China (BOTELHO, 2007). 10000
países também dependiam enormemente Nas décadas de 1950 e 1960, o Japão
da ajuda estatal para manter sua produção se utilizou do setor de construção naval 5000
(idem). É importante evidenciar que, apesar para gerar emprego e renda para socieda-
das características dos estaleiros serem fun- de e reconstruir seu parque industrial após
damentais nas compras internacionais, por a Segunda Guerra Mundial. Uma das estra- 0
2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
influenciar a qualidade e desenvolvimento tégias do país foi o controle de 35% dos
tecnológico das embarcações, as especifici- estaleiros nacionais através da criação de Completions New contracts
dades dos países e suas relações bilaterais uma agência governamental. Assim, o do-
mínio do mercado internacional pelo país Fonte: OCDE (2021b, p. 14)
também interferem na escolha (LEE, 2019).

698 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 699


70%. Nesse período, o setor de construção gás natural em função dos seus objetivos Campos Neto e Paula (2014), no período de objetos de crédito são incluídos como passí-
naval russo, que também é dominado por de exploração na região do Ártico. Atual- 1880 a 1930 o desenvolvimento da infraes- veis de serem abarcados pelos financiamen-
empresas estatais, merece destaque. Con- mente uma das maiores empresas do país trutura portuária esteve intimamente rela- tos oferecidos.
trário à tendência mundial de queda, os es- é a United Shipbuilding Corporation (USC), cionado aos esforços exportadores do país. O FMM é um fundo contábil que conta
taleiros do país tiveram um aumento na sua criada em 2007 e pertencente ao governo. Porém, não havia, naquele momento, uma com os recursos das seguintes fontes: (i)
produção devido à demanda governamen- O setor é dependente das demandas mili- política dedicada à indústria naval. percentual sobre a arrecadação do Adicio-
tal para quebra-gelos e transportadores de tares do Estado (idem). Segundo D’Avila e Bridi (2017), somente nal ao Frete para a Renovação da Marinha
Figura 3 - Novos contratos nos estaleiros da Rússia por tipo de navio
a partir da década de 1950 a indústria na- Mercante (AFRMM); (ii) dotações orça-
e por local de armador, 2018-2019 val passa a ter a atenção do governo, com mentárias no Orçamento Geral da União;
sua inclusão no Plano de Metas. E, somen- (iii) valores e importâncias destinados em
(a) Ship type (b) Owner location te no final da década de 1960, passam a lei, produto do retorno das operações
existir ações específicas voltadas para essa de financiamento concedido; (iv) outras
Gas Carrier 56,4% indústria, conforme afirmam Amaral, Go- receitas resultantes de aplicações finan-
Other Dry 17,8% mide e Pires (2014); D’Avila e Bridi (2017); ceiras2. Atualmente, é gerenciado pelo
Cargo Russia 99,1%
Tanker 11,6% e Sinaval (s/d), com o Plano de Emergên- Ministério de Infraestrutura e pelo Con-
Icebreaker
cia de Construção Naval (1969/1970) e os selho Diretor do Fundo da Marinha Mer-
6,3%
Programas de Construção Naval (1970 a cante. Durante o período de existência do
Passenger 3,9%
1980). Conforme definido em Pires, Gomi- FMM, ele sofreu várias modificações, a
Offshore 2,8%
Service Unknow 0,9% de e Amaral (2014a, p. 188-189). última ocorrendo com a aprovação da Lei
Dredger 0,7% 13.401, de 7/1/2022, também conhecida
Others 0,4% [...] a indústria naval compreende a como BR do Mar.
atividade de fabricação de embarca-
ções e veículos de transporte aquático 3.3. A indústria naval nos anos 1970
Fonte: OCDE (2021b, p. 32)
em geral, envolvendo desde navios
Desse modo, é importante destacar com a abrangência de empresas estatais li- de apoio marítimo, portuário, petro- Durante a década de 1970, o Brasil obteve
como a dominância do cenário internacio- derando o ranking de produção, e nas políti- leiros, graneleiros, porta-contêineres relativo sucesso na atuação de sua indústria
nal na indústria de construção naval sofreu cas governamentais de subsídios. Apesar do e comboios fluviais à construção de naval, atendendo a 4% do mercado mundial,
uma mudança gradual da Europa para a impacto sofrido pela pandemia do covid-19, estaleiros, plataformas e sondas de segundo Amaral, Gomide e Pires (2014), além
Ásia. Essa mudança, não apenas em termos a indústria tem se reerguido de forma len- perfuração para produção de petróleo de empregar cerca de 40 mil pessoas. Essa in-
de economia, também representa uma mu- ta através de medidas governamentais para em alto-mar, além de toda a rede de dústria foi baseada em tecnologia estrangei-
dança de estrutura na competição mundial, proteção e incentivo de suas indústrias. fornecimento de navipeças. ra: japonesa, holandesa, alemã e inglesa, mas
tinha um alto percentual de nacionalização,
3. Histórico da construção naval no Brasil 3.2. O Fundo da Marinha Mercante aproximando-se a 60%. Assim, o que carac-
(FMM) teriza essa época de sucesso de produção
3.1. O início da indústria naval no Esse empreendimento, que não contou são as encomendas internacionais, quando o
Brasil com o investimento público, foi responsável Em 1958, é criado o Fundo de Marinha Brasil chegou a ocupar o segundo lugar nas
por um terço da armada na guerra contra o Mercante – FMM, por intermédio da Lei encomendas mundiais.
A primeira ação de pensamento indus- Paraguai (SINAVAL, s/d). 3.381. A iniciativa aborda o financiamento No entanto, com a crise econômica mun-
trial no setor naval foi a iniciativa do Ba- A partir de análise da literatura dedicada de diversas atividades relativas à indústria dial de 1980, o mercado perde força e nem
rão de Mauá que, em 1846, fundou, em ao tema, é possível observar que os investi- naval, como a construção e aquisição de os esforços do governo com o Segundo Pro-
Niterói, o Estabelecimento de Fundição e mentos na indústria naval brasileira se mos- embarcações e estaleiros. De acordo com grama de Construção Naval de 1981 foram
Estaleiros da Ponta d’Areia1, também co- tram intrinsecamente relacionados aos ciclos o desenvolvimento da indústria, a regula- capazes de manter a produção do país (D’AVI-
nhecido como primeiro estaleiro do país. econômicos do país. Assim, segundo Barat, mentação do fundo se modifica e novos LA; BRIDI, 2017; PIRES; GOMIDE; AMARAL,

700 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 701


Tabela 1 – Fundo da Marinha Mercante 2014). Durante os anos 1990, com a libera- petróleo nacional ou estrangeiro; c) a
lização econômica e a desregulamentação importação e exportação dos produtos
Ano Quantidade de projetos concluídos Repasses de recursos de proposta pelo governo, o setor sofre outro e derivados básicos resultantes das ati-
Embarcações Estaleiros financiamento para a indústria naval baque. O impacto de todo esse cenário foi vidades previstas nos itens anteriores; d)
(em bilhões) a desvalorização da indústria do país, com o transporte marítimo do petróleo bru-

2007 33 0 1,10 os armadores nacionais não sendo conside- to de origem nacional ou de derivados
2008 51 1 1,30 rados competitivos internacionalmente, a básicos de petróleo produzidos no País,
2009 36 0 2,30 retração nas encomendas internacionais e bem como o transporte, por meio de
2010 40 1 2,60
o crédito para a indústria naval diminuindo conduto, de petróleo bruto, seus deri-
2011 60 2 2,60
2012 30 0 4,10 (SINAVAL, s/d). Como resultado dessas con- vados e de gás natural4.
2013 76 4 4,50 dições, há encolhimento na frota brasileira.
2014 89 2 4,00 A Figura 4, à esquerda, expõe as oscila- A partir de 1997, e em decorrência da lei
2015 70 2 4,90 ções supracitadas na indústria naval nacio- supracitada, a indústria naval foi alavancada
2016 119 0 2,80 nal. É possível observar a retração do setor, pelas operadoras de petróleo, em especial a
2017 82 2 2,30
em especial na década de 1990. A posterior Petrobras, com o Programa de Renovação
2018 54 0 2,60
2019 53 0 2,00 retomada é tratada na subseção seguinte. da Frota de Apoio Marítimo I (Prorefam I)
2020 92 1 0,35 em 1999 (PIRES; GOMIDE; AMARAL, 2014).
2021 46 0 0,21 3.4. A importância do setor de Segundo D’Avila e Bridi (2017), nes-
Total 931 15 37,67 petróleo e gás sa primeira fase foram encomendadas
Fonte: Elaboração própria, baseado no Sítio eletrônico do Ministério da Integração3 22 embarcações, e 19 foram entregues.
Figura 4 – Evolução do número de empregados e do volume de produção O setor voltaria a receber atenção do Na segunda fase do programa, foram en-
na indústria naval brasileira 1960-2009 governo, no entanto, em 1997, com a Lei comendadas mais 30 embarcações e 21
9.478, específica para o setor de óleo e gás. modernizações de embarcações. Na
3,5 49,0 A partir desse marco legal se inicia uma nova terceira e última fase do programa, a partir
fase para a indústria naval alavancada pelos de 2008, foram encomendadas mais 146
3,0 42,0 investimentos e demandas da Petrobrás. embarcações novas. Segundo Barat, Cam-
A Lei 9.478/1997 apresenta-se como pos Neto e Paula (2014), o volume de em-
Produção (em milhões de TPBs)

2,5 35,0 ampla, não tratando somente do transpor- barcações encomendado nas três fases do
Empregados (em mil) te marítimo, mas da estrutura legal e orga- Programa totalizou 223.
2,0 28,0 nizacional do setor de petróleo e gás. É por Paralelamente aos programas desenvol-
esse diploma legal que se cria a Agência vidos pela Petrobras, existiam outras inicia-
1,5 21,0 Nacional do Petróleo (ANP) e se quebra o tivas do governo. Uma delas, importante
monopólio estatal do setor, permitindo, para a indústria Naval, foi o Programa Nave-
1,0 14,0 em seu art. 5º, que as atividades desta- ga Brasil, conduzido a partir dos anos 2000,
cadas abaixo passassem a ser passíveis de que abordava as ações de melhoria de crédi-
0,5 7,0 concessão, autorização ou contratação sob to para o setor naval, com aumento de valo-
o regime de partilha de produção, por em- res e de prazo de financiamento de crédito.
0,0 0,0 presas constituídas sob as leis brasileiras, Outra iniciativa conduzida pelos Ministé-
1960
1961
1965
1970
1971
1974
1975
1976
1978
1979
1980
1981
1985
1990
1996
1997
1998
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009

com sede e administração no país. rios de Minas e Energia, de Desenvolvimen-


Fase to Indústria e Comércio, pelo Banco Nacio-
TPBs contratadas TPBs entregues Empregados a) pesquisa e lavra das jazidas de pe- nal de Desenvolvimento Econômico e Social
tróleo e gás natural e outros hidro- (BNDES), pelo Instituto Brasileiro de Petróleo,
Fonte: BARAT; CAMPOS NETO; PAULA, 2014, p.64 carbonetos fluidos; b) a refinação de Gás e Biocombustíveis (IBP) e pela Petrobras

702 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 703


Figura 5 – Estimativa de Valores de Investimento do Prorefam Com o avanço das atividades do setor em ciência e tecnologia. Isso pode ser ob-
de petróleo e gás, as plataformas também servado pela adoção do conceito de Trípli-
Planos Número de embarcações Valores (R$ milhões)
passaram a ser objeto de preocupação. ce Hélice6 no desenvolvimento das ações,
Prorefam 1 (1991) 1
19 1.425
Era necessário aumentar o número de que prevê uma colaboração harmônica e
Prorefam 2 (2004) 58 4.350
plataformas para atender à exploração construtiva entre academia, governo e in-
Prorefam 3 (2008) 146 10.950
Total 223 16.725
nos campos do pré-sal. Assim, foram en- dústria, considerado fundamental para o
Embarcações entregues comendadas 22 plataformas, sendo 14 sucesso desse programa.
(até dezembro de 2912 90 6.750 construídas no Brasil e 8 construídas no
[...] em um espectro relacionado à in-
Novas necessidades (2016) 90 6.750 exterior, mas adaptadas no Brasil.
dústria, o PROSUB propicia incentivos às
Elaboração e estimativas do autor áreas de eletrônica, engenharia naval,
Nota: Não estão incluídos os valores de vinte modernizações realizadas nesta primeira etapa. 3.5. Participação da base industrial
mecânica pesada, computação (desen-
Fonte: Campos Neto, 2014, p.113
de defesa
volvimento de hardware e softwares),
mecânica de precisão, optrônica, me-
foi o Programa de Mobilização da Indústria e revitalização da indústria de navipeças, Uma lacuna importante da indústria na-
catrônica, eletromecânica, metalúrgica,
Nacional de Petróleo e Gás (Prominp), que preços internacionalmente competitivos”. val foi preenchida a partir de 2008 com a
química e nuclear (ANDRADE; ROCHA;
tinha como objetivo “maximizar a participa- Segundo Campos Neto (2014), o Promef construção de embarcações militares. Tra-
HILLEBRAN, 2019b, p. 39).
ção da indústria nacional de bens e serviços, teve duas fases, a primeira iniciada em 2005 ta-se do Programa de Desenvolvimento de
em bases competitivas e sustentáveis, na im- e a segunda, em 2008. Na primeira fase, Submarinos (PROSUB) e o Programa Classe Os 4 submarinos convencionais estão
plantação de projetos de petróleo e gás natu- seriam entregues 23 navios, enquanto na Tamandaré. Ambos movimentam a indús- sendo construídos em Itaguaí-RJ. São eles:
ral no Brasil e no exterior” (BARAT; CAMPOS segunda 265 embarcações eram esperadas. tria naval, criando empregos, desenvolven- Riachuelo (concluído, em fase de finalização
NETO; PAULA, p. 55). O programa contou Em 2008, a Petrobras iniciou o Programa do tecnologia de ponta, priorizando aquisi- dos testes para entrar para o setor operativo
com a participação de diversas organiza- Empresa Brasileira de Navegação (Programa ções de empresas brasileiras e contribuindo nos próximos meses); Humaitá (concluído,
ções, além das citadas acima. Seu funcio- EBN), que tinha como objetivo estimular o para aquecer outros setores da economia. em fase de testes); Tonelero (fase de inte-
namento se dava por comitês setoriais para surgimento de armadores privados nacio- O PROSUB contribui, desde 2008, para gração das seções finalizada); e Angostura.
que houvesse maior sinergia entre as áreas nais para reduzir a necessidade da contra- a dinamização do setor naval brasileiro Os dois últimos submarinos devem ser con-
envolvidas na indústria de petróleo e gás, tação de empresas estrangeiras, visto que (CAMPOS NETO, 2014; ANDRADE; RO- cluídos ainda em 2022. Já o submarino de
além de ter conduzido ações de qualifica- o mercado estava aquecido e o país não CHA; HILLEBRAND, 2019b). O Programa propulsão nuclear – Álvaro Alberto – está
ção profissional para o setor (idem). queria enfrentar a dificuldade de conseguir tem como objetivo aumentar o poder dissu- previsto para ser concluído em 2029.
O Programa de Modernização e Expan- contratos de afretamento. Essas entregas asório do país e a capacidade de vigilância e Outra iniciativa demandada pela base
são da Frota (Promef), que foi conduzi- deveriam ocorrer até o ano de 2017 (idem). proteção das águas jurisdicionais por meio industrial de defesa que estimula a indús-
do pela Petrobras (Transpetro) a partir de Além das contratações das embarca- da modernização da Força de submarinos, tria naval é o Programa Classe Tamandaré,
2004, também tratava da contratação de ções dentro dos programas expostos, a beneficiando o desenvolvimento tecnoló- conduzido pela Marinha do Brasil desde o
embarcações, entretanto, com uma pecu- Petrobras possuía demandas de platafor- gico, industrial e de defesa. Esse programa ano de 2017. O Programa prevê a constru-
liaridade: as contratações eram aquisições, mas e sondas motivadas pela descoberta contemplou a construção de um estaleiro e ção de quatro Fragatas a serem incorpora-
e não afretamento. Segundo Campos Neto da zona do pré-sal. Assim, foram contra- base naval, além de uma unidade de fabri- das pela Marinha brasileira. Esse Programa
(2014, p. 119), o principal objetivo do pro- tadas 29 sondas por 15 anos. Esse empre- cação de estruturas metálicas; 4 submarinos buscou superar alguns obstáculos, dentre
grama era modernizar e expandir a frota endimento não foi financiado pelo FMM, convencionais (em parceria com a França); eles a inexistência de estaleiros brasileiros
da Transpetro a partir de três premissas: “i) pela falta de uma linha específica para e um submarino de propulsão nuclear (AN- capacitados à construção desse tipo de
construir navios no Brasil; ii) alcançar o mí- essa demanda, mas a empresa contrata- DRADE; ROCHA; HILLEBRAN, 2019b). embarcação e o pequeno número de na-
nimo de nacionalização de 65% (em sua da investiu R$ 13 bilhões, o BNDES, R$ 27 Uma característica importante desse pro- vios envolvidos, tornando pouco atrativo o
primeira fase) e 70% (na segunda); e iii) bilhões, e outras instituições financeiras, grama é a preocupação existente em utilizá- investimento estrangeiro. A solução encon-
atingir, com o desenvolvimento do progra- R$ 14 bilhões, totalizando R$ 54 bilhões -lo como um mecanismo de sinergia para o trada foi a opção pelo consórcio de empre-
ma, por meio do processo de aprendizado (CAMPOS NETO, 2014). desenvolvimento nacional, principalmente sas brasileiras e estrangeiras.

704 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 705


A concretização dessa iniciativa se deu por tos Navais (EMGEPRON) em março de 2020. pretender aumentar a produção ou eficiên- financeiros diretamente para a empresa
meio de um processo licitatório iniciado em Essa parceria deve atuar propiciando a capa- cia na entrega de produtos existentes. (subvenção econômica); f) Prevê novo regi-
2017, cujo vencedor foi o Consórcio Águas citação e aprimoramento de mão de obra na As principais atividades envolvidas em me fiscal que facilite e incentive as empresas
Azuis, constituído pela brasileira Embra- área, transferência de tecnologia, domínio de uma inovação TPP são P&D (Pesquisa e em investir em P&D; g) Autoriza participa-
er Defesa e Segurança, Atech e pela alemã tecnologia sensível e geração de empregos. Desenvolvimento) e aquisição de má- ção minoritária do capital de empresa de
ThyssenKrupp Marine Systems. O contrato As entregas estão previstas para o período quinas e equipamentos que incorporem pesquisa energética cuja atividade principal
foi assinado pela Empresa Gerencial de Proje- entre 2025 e 2028 (BARRETO, 2021b). nova tecnologia. seja inovação; h) Autoriza a instituição de
fundos mútuos de investimento em empre-
4. Inovação e o setor de construção naval 4.2. Legislação sas cuja atividade principal seja inovação.

4.1. Conceitos e definições b) produtos tecnologicamente aprimora- A Lei federal n. 10.973 de dezembro de 4.3. Particularidades da indústria da
dos. Um produto tecnologicamente novo é 2004, regulamentada e posta em aplicação construção naval
De forma sucinta, pode-se definir “ino- um produto cujas características tecnológi- no dia 11 de outubro de 2005, alterada em
vação” como a exploração, com sucesso, cas ou usos pretendidos diferem daqueles 2016 e regulamentada pelo DEC 9.283/2018 A indústria naval possui um lento proces-
de novas ideias. Sucesso, para as empresas, dos produtos produzidos anteriormente. de 7/2/2018, é a chamada Lei da Inovação. so de inovação tecnológica, no que diz res-
subentende-se aumento de faturamento, Tais inovações podem envolver tecnologias Essa Lei estabelece medidas de incentivo peito ao produto final “navio”. A busca de
acesso a novos mercados, aumento das radicalmente novas, podem basear-se na à inovação e à pesquisa científica e tecno- inovações pelos estaleiros normalmente é de-
margens de lucro, sustentabilidade, entre combinação de tecnologias existentes em no- lógica no ambiente produtivo, com vistas à terminada pela necessidade de atender aos
outros benefícios. vos usos, ou podem ser derivadas do uso de capacitação tecnológica, ao alcance da au- requerimentos dos armadores (demand pull),
Como referência, será utilizado o Manual novo conhecimento. Já um produto tecnolo- tonomia tecnológica e ao desenvolvimento quase sempre como obrigação de atendi-
de Oslo – Proposta de Diretrizes para Cole- gicamente aprimorado é um produto existen- do sistema produtivo nacional e regional do mento à legislação ambiental ou normas de
ta e Interpretação de Dados sobre Inovação te cujo desempenho tenha sido significativa- país. Tem como princípio a promoção das segurança. A evolução tecnológica na cons-
Tecnológica. Esse documento foi editado mente aprimorado ou elevado. Um produto atividades científicas e tecnológicas como trução naval visa em maior grau à obtenção
em 1990 pela Organização para a Coopera- simples pode ser aprimorado (em termos de estratégias para o desenvolvimento eco- de embarcações mais seguras e eficientes, se-
ção e Desenvolvimento Econômico (OCDE) melhor desempenho ou menor custo) através nômico e social. Além disso, regulamenta guindo normas de segurança ou ambientais,
e tem o objetivo de orientar e padronizar de componentes ou materiais de desempe- parcerias no modelo “Tríplice Hélice” (ins- do que a busca de aumento de faturamento,
conceitos, metodologias e construção de es- nho melhor, ou um produto complexo que tituições de ensino – empresas – governo), margens de lucro ou outros benefícios.
tatísticas e indicadores de Pesquisa e Desen- consista em vários subsistemas técnicos inte- criando ambientes propícios a parcerias pú- Ademais, a falta de garantia de encomen-
volvimento (P&D) de países industrializados. grados pode ser aprimorado através de modi- blico-privadas no desenvolvimento de solu- das a longo prazo faz com que as empresas
A primeira tradução para o português foi ficações parciais em um dos subsistemas. ções e estimulando a aplicação do conhe- foquem apenas no dia a dia, sem um pla-
produzida e divulgada pela FINEP em 2004. Inovação tecnológica de processo é a cimento acadêmico no mundo corporativo. nejamento com foco em inovação, longo e
De acordo com o Manual, as Inovações adoção de métodos de produção novos ou Em resumo, os principais pontos da Lei duradouro. Sendo assim, a inovação verifica-
Tecnológicas em Produtos e Processos (TPP) significativamente melhorados, incluindo da Inovação, são: a) Autoriza a incubação da nos processos da construção naval, con-
compreendem as implantações de produtos métodos de entrega dos produtos. Tais mé- de empresas dentro de institutos de ciência sequência, principalmente, do crescimento
e processos tecnologicamente novos e subs- todos podem envolver mudanças no equi- e tecnologia (ICT); b) Permite a utilização de da informática, tem permitido, de fato, uma
tanciais melhorias tecnológicas em produtos pamento ou na organização da produção, laboratórios, equipamentos e instrumentos, evolução tecnológica tanto no que tange ao
e processos. Uma inovação TPP é considerada ou uma combinação dessas mudanças, e materiais e instalações dos ICTs por empre- gerenciamento da construção como no fer-
implantada se tiver sido introduzida no mer- podem derivar do uso de novo conheci- sa; c) Facilita o licenciamento de patentes e ramental utilizado para a obtenção das diver-
cado (inovação de produto) ou usada no pro- mento. Os métodos podem ter por objeti- a transferência de tecnologias desenvolvidas sas partes que compõem o navio.
cesso de produção (inovação de processo). vo produzir ou entregar produtos tecnolo- pelos ICTs; d) Promove a participação dos O “navio”, como um produto complexo
A inovação tecnológica de produto gicamente novos ou aprimorados que não pesquisadores dos ICTs nas receitas advindas com vários subsistemas técnicos integrados,
pode assumir duas formas abrangentes: possam ser produzidos ou entregues com de licenciamento de tecnologias para o pode, e tem sido aprimorado, como con-
a) produtos tecnologicamente novos; e os métodos convencionais de produção, ou mercado; e) Autoriza a concessão de recursos sequência de modificações em seus vários

706 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 707


sistemas. As inovações em navipeças de alto A Região Norte tem sua matriz de trans- à restrição das demandas ao fornecimento cações e reduzir custos para o cliente final.
conteúdo tecnológico têm sido introduzidas portes fortemente concentrada no modal de produtos de baixa complexidade. Porém, a redução futura da demanda por
no mercado brasileiro, no entanto, por meio aquaviário. Assim, possui necessidade e ap- Uma das iniciativas governamentais nesse novas embarcações, com a permissão para
de importações. Não há, ainda, grande par- tidão para o setor naval. O estado do Ama- sentido é a Lei de Estímulo à Cabotagem “BR importação de navios, pode impactar nega-
ticipação de empresas nacionais no desen- zonas conta com aproximadamente 400 do Mar” (PL 4.199/2020). Apesar de apre- tivamente a indústria naval, com estaleiros
volvimento desses produtos. estaleiros, carreiras e oficinas navais, confi- sentar avanço para o transporte logístico do operando atualmente com elevada ociosida-
Contudo, a transferência de tecnologia, gurando-se em dois setores claramente dis- país, a facilitação de afretamento de embar- de e sem condições de competir com os pa-
fruto da participação de estaleiros estrangei- tintos, sendo eles: (i) formais; (ii) informais. cações estrangeiras pode criar assimetrias re- íses orientais, por exemplo, devido ao “cus-
ros (acionistas, fornecedores e consultores), Os formais utilizam o aço, o alumínio ou gulatórias no país e diminuir a demanda dos to Brasil”. Destaca-se que as consequências
tem permitido trazer para o Brasil a engenha- a fibra como material de construção. Já os estaleiros. Ademais, o incentivo claro para o dessa política serão vitais para a identificação
ria de processos de construção necessária, informais (cerca de 300 estaleiros) constro- setor seria no ramo de reparo de embarca- do futuro da Indústria Naval Brasileira.
com equipamentos e software, para qualifi- em artesanalmente utilizando como insumo ções, com a possibilidade de utilização do Outra iniciativa que tem potencial para
car tecnologicamente os estaleiros. No entan- predominantemente a madeira, e dedican- Fundo da Marinha Mercante para financiar colaborar no desenvolvimento da área é a
to, para produzir e ser competitivo em um pa- do-se, também, à área de reparos. Nos esta- projetos, tanto brasileiros quanto estrangei- clusterização, que tradicionalmente no ex-
drão global, além de modernizar as plantas, leiros informais, os carpinteiros não utilizam ros, realizados em estaleiros brasileiros. Mais terior contribui para a dinamização e au-
é também importante a manutenção do co- projeto para a execução da embarcação, estritamente, o texto proposto prevê, entre mento da competitividade das empresas.
nhecimento obtido, o que somente se conse- sendo necessárias, no entanto, adequações outras medidas, a possibilidade de afreta- No Brasil, a Associação do Cluster Tecno-
gue com a continuidade da construção, per- para se classificarem junto à Capitania dos mento de embarcação estrangeira, com sus- lógico Naval (CTN-RJ) foi institucionaliza-
mitindo passar (e aprimorar) o conhecimento Portos. A quantidade de empregados tercei- pensão da bandeira do país de origem, des- da em novembro de 2019, com atuação
para as gerações seguintes de profissionais. rizados nesses estaleiros é muito grande e vinculado da necessidade e capacidade de baseada num modelo triplo hélice de coo-
Outro panorama importante no aspec- varia em função da demanda. tonelagem. Ou seja, a Empresa Brasileira de peração entre os stakeholders.
to brasileiro são as hidrovias, que possuem Esses estaleiros têm foco na constru- Navegação (EBN), que realiza o afretamento, Ainda que essas atuações sejam lou-
pouco mais de 40.000 km de trechos nave- ção de embarcações para uso local (balsas, não precisará ter frota própria, como é reque- váveis para assegurarem investimentos
gáveis, e mais da metade se localizam na re- empurradores, rebocadores), mas também rido atualmente. Esse é o ponto essencial da na infraestrutura, é necessário pensar em
gião Norte, mais especificamente na Região constroem lanchas em alumínio ou fibra. O política de incentivo à cabotagem, pois retira políticas a longo prazo para garantir sus-
Amazônica (Dados.gov.br – Portal Brasileiro reparo de embarcações também é realiza- a necessidade de apenas embarcações com tentabilidade no setor. Nesse sentido, não
de Dados Abertos). do nesses estaleiros. bandeira brasileira realizarem o transporte apenas políticas de incentivo à construção
aquaviário entre os portos nacionais. Com de embarcações no Brasil seriam bem-vin-
5. Conclusão isso, o Governo Federal pretende aumentar das, mas também ações focadas na área de
de forma rápida a disponibilidade de embar- reparação e desmonte de embarcações.
O setor de Construção Naval estruturado visto anteriormente, o setor apresenta instabi-
tem potencial para geração de empregos e lidades ao longo da sua história, afetando sua
renda para a sociedade, sendo um dos seto- infraestrutura e capacidade produtiva. Referências
res industriais que mais demandam mão de Atualmente, o principal investidor des-
obra e englobam grandes cadeias produtivas. se desenvolvimento tem sido a Marinha do ANDRADE, I.O.; FRANCO, L. G. A.; HIL- CAMPOS NETO, C. A. S.; POMPERMAYER, F.
Também contribui para o desenvolvimen- Brasil, através do programa para obtenção LEBRAND, G. R. L. Ciência Tecnologia e M. Ressurgimento da Indústria Naval no
to tecnológico, preparo para atuação das de quatro fragatas Classe Tamandaré (FCT) Inovação nos Programas Estratégicos da Brasil (2000/2013). Brasília: IPEA, 2014.
forças armadas e marinha mercante, e leva e do Navio de Apoio Antártico (NApAnt). Marinha do Brasil. Texto para Discussão, BARRETO, Jéssica Pires Barbosa. O Estado
investimentos para regiões afastadas do go- A política de obrigatoriedade de conte- Rio de Janeiro, n. 2471, IPEA, jan./2019a. como Agente Facilitador da Indústria
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do Estado, característica na maior parte dos prestigia a indústria nacional, tendo como PAULA, J. M. P. Visão Econômica da Im- 2020. Dissertação (Mestrado) – Programa de
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708 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 709


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710 ECONOMIA AZUL Indústria Naval Brasileira 711


34

SEGURANÇA, DEFESA E ECONOMIA DO MAR

Gustavo Calero Garriga Pires


William de Sousa Moreira
Frederico Medeiros Vasconcelos de Albuquerque
Israel de Oliveira Andrade
Giovanni Roriz Lyra Hillebrand

1. Introdução

Segurança e Economia são pilares cen- permite antever o aumento da demanda


trais das sociedades e requisitos fundamen- por recursos naturais, necessários ao cres-
tais para a qualidade da inserção dos países cimento econômico e à geração de empre-
no sistema internacional. A atividade eco- gos em grau compatível com o incremento
nômica, em especial, é função de uma série populacional esperado.
de fatores como capital, trabalho, tecnolo- Os espaços marítimos vêm despertan-
gia e recursos naturais. do crescente interesse da comunidade in-
Países litorâneos têm acesso facilitado ternacional à medida que a ciência revela
aos recursos vivos e não vivos do ambien- conexões entre clima e oceano, bem como
te marinho. Podem também construir uma as possíveis consequências negativas das
infraestrutura de exploração e explotação atividades humanas. Fenômenos climáticos
desses recursos e utilizar as linhas de comu- extremos, aquecimento global, elevação
nicação marítimas para o comércio e inter- dos níveis dos oceanos são alguns fatores
câmbio de produtos e serviços. de preocupação. A esses se somam a polui-
Assim é que, na distribuição demográ- ção marinha, que acumula rejeitos da civili-
fica de países, observa-se que as regiões zação e as más práticas ligadas à atividade
litorâneas tendem a acumular concentra- econômica, como a explotação predatória
ções populacionais. Estima-se que o pla- de recursos, a exemplo da pesca desorde-
neta alcançará a marca de nove bilhões de nada e a mineração submarina, com im-
habitantes até meados deste século, o que pactos ambientais de diversas ordens.

712 ECONOMIA
712 AZUL
A ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 713
Nesse contexto, a saúde dos oceanos se dê no âmbito da soberania, da integri- 2. Espaços marítimos, segurança e atividade econômica
passou a ser um imperativo do nosso tem- dade territorial ou de ofensa aos interesses
po e o debate conceitual associado a esses nacionais no mar, a capacidade de defesa O entendimento de que a delimitação responsabilidade, uma vez que águas segu-
fenômenos tem gerado novas expressões do país proporcionado pelas Forças Arma- dos espaços marítimos é fundamental para ras combinadas com recursos naturais atra-
ou atualizado significados já existentes. das torna-se primordial. Em qualquer dos a segurança internacional e para o uso em interesses e investimentos. São, pois,
Um exemplo é a ascensão da “economia casos, a Marinha do Brasil (MB) tem uma compartilhado dos oceanos levou a comu- fundamentais as instituições criadas para
azul”, que emergiu como forma de chamar responsabilidade central, uma vez que o nidade internacional a buscar instrumentos prover a segurança marítima ou restaurá-la
a atenção para a necessidade de um uso Comandante da Marinha é designado por de governança nessa área. Um significati- em caso de necessidade.
mais inteligente e ponderado dos abun- lei a Autoridade Marítima brasileira. vo avanço foi obtido com a assinatura da Cabe lembrar que o Poder Naval inte-
dantes recursos marinhos, em prol do de- Convém lembrar que as capacidades Convenção das Nações Unidas para o Direi- grado deve contribuir para uma defesa de
senvolvimento. A economia azul se deixa mencionadas ganham concretude nas suas to do Mar (CNUDM), em Montego Bay, Ja- amplo espectro dos interesses marítimos
pensar por uma miríade de atividades de bases materiais, humanas e organizacio- maica, em dezembro de 1982. Formalmen- nacionais. Além da defesa naval clássica
geração e troca de bens e serviços que, de nais. A existência de forças bem equipadas te em vigor após a sexagésima assinatura contra atores estatais, deve também ga-
alguma forma, estão relacionados com os e treinadas, com infraestrutura de coman- de estado-parte, em 1994, a Convenção rantir a segurança (security) desses inte-
espaços marítimos e faixas de terra litorâ- do e controle e de apoio, são um requisito conta na atualidade com a ratificação de resses contra ilícitos e ameaças dinâmicas
neas. O termo sugere um modelo de de- fundamental. A construção e manutenção 168 membros, incluindo o Brasil. e multifacetadas. Da mesma forma, em
senvolvimento que não considere somente dessas forças requerem investimentos e Entre os conceitos fundamentais esta- outra acepção de segurança (safety), deve
a perspectiva dos negócios, mas que leve mobilizam setores da economia ligados ao belecidos na Convenção para balizar os salvaguardar a vida humana no mar e o trá-
em conta o impacto da saúde dos oceanos mar, para atender demandas de constru- espaços marítimos estão: águas interio- fego seguro de embarcações e, adicional-
para o clima e para os ecossistemas costei- ção naval, de sistemas de combate, equi- res, mar territorial (MT), zona contígua, mente, contribuir para a proteção do meio
ros, alinhado à agenda de desenvolvimento pamentos de comunicações, sensoriamen- zona econômica exclusiva (ZEE), platafor- ambiente.
sustentável da ONU (WORLD BANK, 2017). to, propulsão, manutenção e logística em ma continental (PC) estendida e alto-mar2. Mostra-se importante aprofundar os
Há que se considerar que a alavancagem geral, bases navais, atividades portuárias, Esse arcabouço conceitual é a base para o dois eixos que contribuem para a seguran-
da atividade econômica não pode prescindir apenas para citar alguns exemplos. trato de temas de segurança e defesa. ça marítima mencionados acima. No caso
de um ambiente de segurança e estabilidade, Assim, os instrumentos do Estado para No caso brasileiro, a enorme extensão da segurança/security, para prover a “Pro-
em que os atores se sintam livres de ameaças. o uso legítimo da força no mar têm uma da área formada pelo somatório do MT, teção Marítima” considera-se o empre-
Nos espaços marítimos, há acentuada de- dupla contribuição para o desenvolvimen- da ZEE e da PC estendida deu origem ao go coercitivo de parcela de forças navais,
manda por instrumentos de governança e de to da atividade econômica no ambiente conceito de “Amazônia Azul”. Nela estão juntamente com outros órgãos governa-
preservação da boa ordem no mar.1 Assim, a marítimo. Por um lado, pela preservação 95% do petróleo e 80% do gás produzidos mentais, entre eles Polícia Federal, Receita
manutenção da segurança marítima requer ou resgate da segurança marítima, dando no país, além de outros recursos minerais Federal, IBAMA, em operações interagên-
um ordenamento jurídico apropriado e a respostas tempestivas a eventuais ame- que constituem reservas de importância cias, contra ilícitos como: pirataria, roubo
existência de expedientes de implementação aças que porventura sobrevenham; por estratégica. Ressalta-se a relevância das li- armado, sabotagem, contrabando, pesca
e garantia desse ordenamento. outro, como indutor do desenvolvimento nhas de comunicação marítimas, em que ilegal, tráfico de drogas e de seres huma-
Num contexto em que ameaças de di- nacional à medida que é gerador de de- o tráfego marítimo responde por 95% do nos. No que tange ao caso segurança/sa-
versas naturezas se manifestam no am- mandas por ampla gama de materiais e comércio exterior brasileiro. A atividade fety, objetiva-se que o tráfego seguro de
biente marítimo, as Forças Armadas e, em serviços de diversas naturezas, em geral, pesqueira e a indústria do turismo, rela- embarcações se realize conforme as leis e
especial, a Marinha, juntamente com as intensivos em tecnologia, estimulando va- cionado à bela região litorânea brasileira, normas vigentes, atuando-se por meio de
demais forças de segurança e agências do riados setores da economia. complementam um panorama que requer inspeções e vistorias de modo a prevenir a
Estado, têm um papel primordial na manu- Tendo como base o contexto apresenta- segurança e estabilidade para o desenvol- poluição hídrica, a ocorrência de acidentes
tenção da segurança necessária à atividade do, o presente capítulo se volta a explorar vimento econômico do país. e incidentes da navegação.
econômica. Se a ameaça se dá no âmbito as contribuições que a Segurança e a Defe- Preservar a segurança no ambiente ma- No caso brasileiro, na estrutura orga-
da segurança pública, as forças policiais e sa prestam à atividade econômica susten- rítimo é uma primordial atribuição do Es- nizacional do setor de Defesa, a Marinha
as agências se tornam fundamentais. Caso tável no ambiente marítimo. tado costeiro, sobretudo nas áreas de sua do Brasil prepara e emprega o Poder Naval

714 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 715


para o cumprimento de sua missão consti- do de Operações Marítimas e Proteção da Com guarnecimento contínuo, essa es- de monitoramento e controle, bem como da
tucional e das atribuições subsidiárias es- Amazônia Azul (COMPAAz), em dezembro trutura se inspira no conceito de Centro de mobilidade estratégica. São exemplos o Sis-
tabelecidas em lei. Para tal, no âmbito do de 2021. A alteração visou melhorar as Operações Marítimas – COpMar (Maritime tema de Gerenciamento da Amazônia Azul
Comando de Operações Navais (ComOp- capacidades administrativa e operacional Operations Center – MOC), de emprego (SisGAAz), o Programa de Aquisição de Fra-
Nav) estão as forças navais, aeronavais e de ao possibilitar uma rápida efetivação do consagrado em outras marinhas e estabele- gatas Classe Tamandaré (PCT), o Programa
fuzileiros navais, bem como infraestrutura Estado-Maior em caso de ativação de um cido, de forma pioneira na Marinha do Bra- de Obtenção de Submarinos (PROSUB) e o
de comando e controle e de apoio, subdi- Teatro de Operações Marítimo (TOM). Tal sil, na estrutura do COMPAAz. A partir de Programa Nuclear da Marinha (PNM).
vididas e posicionadas ao longo da costa e concepção servirá como projeto piloto de uma maior fluidez no processamento das in- Tais projetos são a longo prazo, inten-
das bacias hidrográficas. Dispõe também, guarnecimento para o Sistema de Geren- formações, espera-se ampliar o dinamismo, sivos em capital e envolvem tecnologias
no âmbito da Diretoria-Geral de Navega- ciamento da Amazônia Azul (SisGAAz), a consciência situacional marítima3 e a ca- avançadas. Assim, suas realizações trazem
ção, de unidades navais que se dedicam às possibilitando serviços de compilação do pacidade de pronta reação a contingências. importante e continuado impulso à ativi-
atividades de hidrografia, oceanografia e quadro tático ocorrendo em escalas, quais Essa inovação se conecta e realça a rele- dade econômica relacionada com o mar,
outras ligadas à pesquisa científica no am- sejam: estratégica (em âmbito do COMPA- vância dos principais projetos estratégicos notadamente por intermédio da base in-
biente marítimo. Az no monitoramento de águas nacionais da Marinha, voltados à renovação de meios dustrial de defesa nativa, fomentando ar-
A priorização da segurança marítima e internacionais); regionais (no âmbito dos necessários a cumprir as tarefas do Poder Na- ranjos produtivos locais e, em especial, o
no Atlântico Sul deu origem a um recen- Distritos Navais); e locais (no âmbito das val, e para a instrumentação da capacidade cluster tecnológico naval do Rio de Janeiro.
te avanço organizacional na estrutura do Capitanias dos Portos, suas Delegacias e
ComOpNav. Trata-se da criação do Coman- Agências), como mostra a Figura 1. 3. Programas e projetos da Marinha como indutores da economia
Figura 1 - Áreas juridicionais dos Distritos Navais e área de
responsabilidade SAR O Plano Estratégico da Marinha (PEM- são indutores do desenvolvimento pela de-
2040) contempla os programas considera- manda de produtos e serviços. Ademais,
dos estratégicos que visam prover o Brasil eles contribuem para transferência e absor-
com uma Força Naval moderna e eficaz.4 ção de novas tecnologias por meio de acor-
Considerando o propósito deste capítulo, dos e contratos em parcerias estratégicas
serão abordados quatro dos programas ou com outros países.
projetos que contribuem diretamente para A descrição a seguir permite ver o po-
a capacitação do Poder Naval com vistas tencial impacto indutor para setores diver-
à defesa nacional, à segurança marítima, sos, desde o científico-tecnológico e de
além de terem elevado potencial de indu- educação, pela demanda de produção de
ção da economia do mar. conhecimento e pela necessária formação
O binômio desenvolvimento-defesa, de recursos humanos com elevada qualifi-
mencionado na Estratégia Nacional de De- cação, até o setor industrial e de serviços,
LEGENDA fesa, em sua versão 2008, explicitou uma em especial aos ligados ao ambiente marí-
DISTRITOS visão em que os dois conceitos e as respec- timo, ao qual são endereçadas encomen-
1o Distrito Naval
2o Distrito Naval
tivas estratégias são interdependentes, se das tecnológicas, diretamente ou com o
3o Distrito Naval apoiam e se complementam, criando as concurso de parcerias internacionais.
4o Distrito Naval
condições para um projeto de defesa po-
5o Distrito Naval
6o Distrito Naval liticamente viável e socialmente inclusivo. 3.1 Sistema de Gerenciamento da
7o Distrito Naval Convém lembrar que, no século XXI, a Amazônia Azul
8o Distrito Naval
9o Distrito Naval defesa ganha concretude e muito depen-
Área de Jurisdição das Capitanias (12 MIN) de de sua base humana e material. No que O Sistema de Gerenciamento da Ama-
Área de Jurisdição dos COMDN
tange a essa última, os programas e pro- zônia Azul (SisGAAz) destaca-se por sua
Fonte: Marinha do Brasil jetos de relevância estratégica da Marinha intensidade científico-tecnológica e possui

716 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 717


como missão “monitorar e proteger, conti- Ademais, o SisGAAz visa incrementar a Figura 2 - Representação gráfica do SisGAAz
nuamente, as áreas marítimas de interesse e Consciência Situacional Marítima do país,
as águas interiores, seus recursos vivos e não por meio do desenvolvimento de “uma es-
vivos, seus portos, embarcações e infraes- trutura que englobe a coleta de dados, o
truturas, em face de ameaças, emergências, monitoramento, os sensores dos meios na-
desastres ambientais, hostilidades ou ilega- vais e aéreos e a análise correta dos fatos,
lidades, a fim de contribuir para a seguran- permitindo uma resposta rápida e precisa”
ça e a defesa da Amazônia Azul e para o na ocorrência de episódios nas águas na-
desenvolvimento nacional” (MARINHA DO cionais (FARIA, 2012, p. 220).
BRASIL, 2021). Como principais desafios ao Mostra-se relevante apontar, também, o
seu pleno desenvolvimento, destacam-se arrasto tecnológico produzido pelo desenvol-
aumentar a aquisição e a capacidade de vimento do SisGAAz traduzido, sobretudo,
monitoramento, análise e fusão de grandes em possibilidades de aproximação entre as
volumes de dados; implantar a estrutura de políticas de defesa e de Ciência, Tecnologia e
comunicações e TI para segurança da nave- Inovação (CT&I), proporcionando avanços na
gação; e gerenciar o ciclo de vida e os custos busca pela autonomia e pelo desenvolvimen-
operacionais de tal estrutura. to endógeno de soluções de defesa no país
Em termos de monitoramento, está pre- (ANDRADE et al., 2019).5 Destaca-se, nesse
visto o uso de satélites, radares e equipa- sentido, o desenvolvimento de tecnologias
mentos de sensoriamento, permitindo a in- como parte constituinte fundamental do po-
tegração com outros sistemas e com redes der marítimo no século XXI (TILL, 2018).
de informação e de apoio à decisão. No Instituído oficialmente em 2009, o Sis-
que tange à proteção, a já citada criação GAAz passou por diferentes etapas ao longo
do COMPAAz representa um passo impor- da última década, ressaltando-se o desen-
tante da articulação do Setor Operativo da volvimento de projeto piloto no estado do Fonte: Marinha do Brasil. LAMPERT; COSTA, 2020. Disponível em: https://www.marinha.mil.br/
sisgaaz-protecao-e-monitoramento-das-aguas-jurisdicionais-brasileiras
Marinha para implementação do SisGAAz Rio de Janeiro – em especial nas regiões da
em sua plenitude. Baía de Guanabara, Cabo Frio e Ilha Gran-
O SisGAAz foi concebido como “um de. Nessa fase, ainda em andamento, são Fundamental para o gerenciamento (IMO) compreende a “a coleta, integração,
sistema de monitoramento e controle rela- utilizados, de maneira incremental, radares e o monitoramento da Amazônia Azul, o troca, apresentação e análise harmoniza-
cionado ao conceito internacional de segu- de curto e médio alcance – até 50 milhas. SisGAAz se conecta e instrumenta vários das de informações marítimas, a bordo e
rança marítima” e projetado para tornar-se Posteriormente, será incorporado também o outros sistemas, como o e-Navigation, que em terra, por meios eletrônicos, para me-
o principal sistema de comando e controle monitoramento de longo alcance – até 200 será abordado a seguir. lhorar a navegação de berço a berço do
da Marinha do Brasil, permitindo “a gestão milhas da costa brasileira – por meio de ra- cais e serviços relacionados à segurança e
3.2 e-Navigation e sua contribuição
das atividades ligadas ao mar que envol- dares Over The Horizon (OTH) de ondas de proteção [“safety” e “security”] no mar e
para a Economia
vam vigilância, monitoramento, prevenção superfície (LAMPERT; COSTA, 2020). à proteção do ambiente marinho. O foco
da poluição, recursos naturais, entre ou- Após sua implementação completa, o Assim como as aeronaves e os aero- é “atender as necessidades presentes e fu-
tras” (BRASIL, 2016, p. 60). Observa-se, SisGAAz operará a partir da integração de portos comunicam-se com efetividade e turas dos usuários por meio da harmoniza-
portanto, a aplicabilidade desse sistema diferentes equipamentos e sistemas, com- sabem se haverá alguma alteração em pra- ção dos sistemas de navegação marítima e
em iniciativas não somente relativas à de- postos por radares localizados em terra e ticamente tempo real, assim também serão dos serviços de apoio em terra”.6
fesa da soberania na Amazônia Azul, mas em embarcações, câmeras de alta resolu- futuramente as relações entre os navios e As necessidades de harmonização e de
também ao aproveitamento sustentável de ção, satélites, aeronaves de patrulha e ve- os portos (AGUIAR, 2022). padronização dos serviços de terra resul-
suas potencialidades e à preservação am- ículos aéreos não tripulados (VANT) (LAM- O conceito de e-Navigation estabeleci- taram na elaboração do portfólio de ser-
biental dessa vasta área. PERT; COSTA, 2020; MANSO, 2013). do pela Organização Marítima Internacional viços marítimos (Maritime Service Portfolio

718 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 719


– MSP), que categorizaram esses serviços aperfeiçoar ou criar os processos necessá- no Brasil e no mundo, haverá a redução e proteção do país. As embarcações serão
por áreas geográficas, de modo a facilitar a rios, principalmente no que se refere às ati- da emissão de gases de efeito estufa, com empregadas, ainda, na patrulha da Ama-
determinação do tipo e da quantidade de vidades de segurança marítima associadas rotas otimizadas, o desenvolvimento de zônia Azul, com ênfase na fiscalização
informação a ser transmitida e consideran- ao SisGAAz, que será operado pelo COM- novos postos de trabalho nos portos do das atividades econômicas realizadas na
do o sistema de comunicação a ser usado, PAAz. Nesse sentido, o elemento humano mundo, melhoria nos serviços de acompa- região, como a petrolífera e a pesqueira
bem como a identificação das entidades ou continuará sendo essencial. nhamento de navios, redução de custos, (EMGEPRON, 2020). Em termos técnicos,
organizações responsáveis pela dissemina- O país poderá ter, em futuro próximo, incluindo seguros, e de períodos de espera os novos navios são classificados, segundo
ção da informação. As seis áreas identifi- máquinas controlando camadas de dados para acesso a portos. Tudo isso contribuirá os parâmetros internacionais, como fraga-
cadas para entregas de Serviços Marítimos que serão apresentadas em uma única tela; para um ambiente mais virtuoso e possibi- tas, e suas entregas estão previstas para
são: as áreas portuárias e de aproximação, aplicativos que poderão monitorar e acom- litará, em última instância, a redução do ocorrer entre 2025 e 2028 (MARINHA DO
áreas costeiras ou restritas; mar aberto e panhar quaisquer tipos de meios no ambien- custo Brasil, com consequentes benefícios BRASIL, 2021).
áreas abertas; áreas com empreendimento te marítimo, contribuindo assim para o aten- para a economia do país. Em dezembro de 2017, a Marinha, por
offshore e/ou de infraestrutura; áreas pola- dimento aos compromissos internacionais meio da Diretoria de Gestão de Programas
res ou outras áreas remotas. brasileiros no âmbito da Convenção Interna- 3.3 Programa de Obtenção das da Marinha (DGePM), em parceria com a
Entre os desafios está a integração de cional para a Salvaguarda da Vida Humana Fragatas Classe Tamandaré (PCT) EMGEPRON8, lançou uma Solicitação de
equipamentos e sistemas dos navios, de no Mar (SOLAS). A IMO tem uma preocupa- Proposta (Request for Proposal – RFP), bus-
terra e da infraestrutura e equipamentos ção especial com a vertente safety e estimula Estabelecido em atendimento às ne- cando selecionar parceiros adequados para
de comunicações. O aperfeiçoamento a padronização de sistemas e equipamentos cessidades apontadas pelos documentos a construção das fragatas. Após duas fases
desses últimos é essencial para a fluidez de segurança para que navios possam trocar estruturantes da Defesa Nacional, o Pro- de seleção, das quais participaram 10 con-
necessária ao funcionamento do MSP, informações com outros meios e com esta- grama de Construção do Núcleo do Poder sórcios interessados, a Marinha anunciou,
permitindo sua expansão caso necessária, ções em terra de forma clara e rápida. Espe- Naval tem como propósito a ampliação em março de 2019, o consórcio Águas
com o aparecimento de novas demandas ra-se o desenvolvimento de sistemas, produ- da capacidade operacional da Marinha do Azuis como a melhor oferta para o PCT.
futuras. À proporção que o transporte tos e serviços terra-navio-terra. Brasil, sendo essencial para modernizar a Composto pelas empresas ATECH Negó-
marítimo incorpora o mundo digital, in- Nesse sentido, um exemplo de iniciativa Força Naval e para possibilitar a atualização cios em Tecnologias S.A., EMBRAER S.A.
formações e infraestrutura digitais serão inovadora brasileira é o desenvolvimento e a substituição gradual dos meios e das e Thyssenkrupp Marine Systems (TKMS),
trocadas em benefício da segurança ma- do Portable Pilot Unit (PPU), produzido pela plataformas de combate navais, aeronavais o consórcio, formalizado como Sociedade
rítima e da proteção do meio ambiente, Empresa Navigandi, um spin-off do Labora- e de fuzileiros navais (BRASIL, 2016). de Propósito Específico (SPE) Águas Azuis,
reduzindo encargos administrativos e au- tório Tanque de Provas Numérico da Univer- Entre os subprogramas que compõem a projeta um índice de conteúdo local de
mentando a sua eficiência. sidade de São Paulo com a praticagem de Construção do Núcleo do Poder Naval, des- 31,6% para o primeiro navio e média de
Nesse processo surgem demandas de Pernambuco. Por meio de tal colaboração, tacam-se o Programa de Obtenção das Fra- 41% para os demais. Definiu-se, também,
aperfeiçoamentos para os produtos e ser- foi desenvolvido o Orbis Navigandi para ga- gatas Classe Tamandaré (PCT), objeto de a subcontratação das empresas ATLAS
viços cartográficos, ligados à sinalização rantir a segurança da navegação nos Portos exame desta seção, e o Programa de De- Elektronik, Estaleiro Aliança S.A. e L3 Ma-
náutica e desenvolvimento de sistemas Brasileiros. Tal equipamento tem o potencial senvolvimento de Submarinos (PROSUB), pps (MARINHA DO BRASIL, 2021).
relacionados às necessidades do Poder de permitir operações mais seguras com que será detalhado em seção subsequente. Os contratos para a construção das qua-
Naval e do Poder Marítimo. Importa navios mercantes e com a possibilidade de Iniciado em 2017, o Programa de Ob- tro fragatas, que ocorrerão em sua totalida-
atender as expectativas do e-Navigation manutenção de tais aparelhos no país.7 tenção das Fragatas Classe Tamandaré de no Brasil, em Itajaí (SC), foram assinados
quanto ao aprimoramento dos sistemas Outra inovação que demandará adap- (PCT) tem como principal objetivo promo- em março de 2020. Além do contrato prin-
de posição, à produção e disseminação tação e gerará oportunidades são os navios ver a renovação da esquadra de superfície cipal de aquisição, foi estabelecido também
de cartas e publicações náuticas eletrôni- não tripulados que estão por vir, com seus da Marinha do Brasil, a partir da incorpo- acordo de compensação (offset), que tem
cas, bem como no que tange às informa- sensores e sistemas específicos para nave- ração de quatro navios de alta complexida- como objeto a transferência de conheci-
ções de segurança da navegação. gação autônoma (STATECZNY, 2022). de tecnológica e com elevado poder com- mento e de tecnologia referentes aos siste-
O Centro de Operações Marítimas Entre os benefícios do estímulo ao batente, possibilitando o incremento nas mas embarcados nas fragatas e prevê cursos
(COpMar) lidará com a necessidade de desenvolvimento do conceito e-Navigation capacidades de defesa, monitoramento de operação e manutenção dos navios. O

720 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 721


programa garante à Marinha o acesso am- O PROSUB foi formalizado após parceria Figura 3 - Estaleiro de construção de Submarinos em Itaguaí-RJ
plo aos conhecimentos e às tecnologias, estratégica assinada entre Brasil e França em
bem como seu direito de uso, sob a forma 2008, por meio da qual foram estabeleci-
de licença geral de uso de know-how (SI- dos contratos e documentos estratégicos,
NAVAL, 2020; MARINHA DO BRASIL, 2021). que preveem a efetivação de três grandes
Observa-se, de modo geral, que o PCT empreendimentos: i) o projeto e a constru-
tem como foco a produção de embarca- ção de um Estaleiro e Base Naval (EBN) e de
ções com elevados índices de conteúdo na- uma Unidade de Fabricação de Estruturas
cional, além de estimular a cultura e adotar Metálicas (UFEM); ii) a construção de qua-
o modelo de gestão do ciclo de vida, bem tro submarinos convencionais (S-BR), tendo
como o caráter de autossustentabilidade. como modelo a classe francesa Scorpène, e
Além de contribuir diretamente para a vigi- o projeto de sua seção intermediária, mo-
lância e para a proteção da Amazônia Azul, dificada para atender a requisitos específi-
o PCT beneficiará a presença e a atuação cos da Marinha do Brasil; e iii) o projeto e a
brasileira no Atlântico Sul e promoverá ex- construção do casco do primeiro submarino
ternalidades positivas relativas ao fomento convencional de propulsão nuclear brasileiro
da indústria e da economia nacional em sua (SN-BR) (MARINHA DO BRASIL, 2014).
vertente marítima. Nesse sentido, o progra- O Programa abarca, em suas diversas
ma consiste em um indutor da atividade frentes, transferência de tecnologia, capa-
econômica e do desenvolvimento nacional. citação de pessoal e aprimoramento das in- Fonte: Marinha do Brasil. PROSUB. Disponível em:
Nessa perspectiva, combina-se com outros fraestruturas necessárias para a construção https://www.marinha.mil.br/programas-estrategicos/prosub
projetos de elevado potencial de fomento, e a manutenção dos submarinos. Tendo em
como o Programa de Desenvolvimento de seu escopo um acentuado componente de
Submarinos, o PROSUB, abordado a seguir. nacionalização de equipamentos e de siste- Paralelamente, prossegue o projeto e que favorece, inclusive, diferentes formas
mas de alto teor tecnológico, o programa desenvolvimento do primeiro submarino de atuação desses meios no Atlântico Sul.9
3.4 PROSUB e o Programa Nuclear da resulta na promoção do nível de ciência, convencional de propulsão nuclear brasilei- Cabe destacar que, além de gerar ao
Marinha tecnologia e inovação (CT&I) da indústria ro, previamente denominado Álvaro Alber- Brasil uma maior capacidade de vigilância e
nacional (ANDRADE et al., 2019). to (SN-10). Entre as principais vantagens de proteção da Amazônia Azul, o PROSUB
O Programa de Desenvolvimento de No contexto da proteção e da vigilância desse tipo de submarino, em comparação traz também reflexos relativos ao desenvol-
Submarinos (PROSUB) é um subprograma da Amazônia Azul, o PROSUB permitirá ao ao convencional (de propulsão diesel-elé- vimento de CT&I autóctone. Os processos
do Programa de Construção do Núcleo do Brasil maior capacidade dissuasória e maior trica), destacam-se: sua autonomia virtual- de transferência de tecnologia e de na-
Poder Naval com enfoque na construção de controle das atividades realizadas em suas mente ilimitada, não sendo necessário se cionalização de componentes, elementos
quatro submarinos convencionais e do pri- águas jurisdicionais – ampliando, sobre- expor para carregar as baterias; navegação fundamentais do programa, promovem as
meiro submarino convencional de propulsão tudo, sua capacidade de resposta a ame- em maiores distâncias e velocidade, por condições necessárias para um expressivo
nuclear brasileiro. De modo geral, o PRO- aças existentes em seu espaço marítimo. tempo praticamente irrestrito; sua estrutu- arrasto tecnológico, ou seja, para a difu-
SUB busca assegurar o objetivo apresentado Até 2022, os submarinos Riachuelo (S-40) ra extremamente robusta, garantindo uma são dos conhecimentos e dos equipamen-
desde a primeira versão da Estratégia Nacio- e Humaitá (S-41) já haviam sido lançados maior resistência a altas pressões e con- tos por diferentes cadeias produtivas civis
nal de Defesa (END) de negação do uso do ao mar. O Tonelero (S-42) e o Angostura sequentemente uma maior profundidade e militares (ANDRADE et al., 2019). Nesse
mar, garantindo ao Brasil uma “força naval (S-43), por sua vez, estão em fase avança- de imersão a ser alcançada (ANDRADE et contexto, deve-se ressaltar a parceria da
submarina de envergadura” e a capacidade da de construção (MARINHA DO BRASIL, al., 2019). Contudo, a alta complexidade e Marinha com universidades, institutos de
de “projetar e fabricar tanto submarinos de 2021). A Figura a seguir mostra parte do alto custo contrastam com tais característi- pesquisa e empresas privadas e estatais,
propulsão convencional como de propulsão estaleiro de construção de submarinos em cas, tornando ideal que a frota submarina bem como outros componentes da BID,
nuclear” (BRASIL, 2008, p. 21). Itaguaí, no estado do Rio de Janeiro. do Brasil seja composta pelos dois tipos – o nos esforços de pesquisa relacionados ao

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programa (MARINHA DO BRASIL, 2014). as etapas do ciclo do combustível nuclear10 Nesse sentido, um exemplo positivo pode grandes programas e projetos de obtenção
No que se refere aos aspectos científico- (LANA, 2014; CNEN, 2017). ser citado com a formação da economia de de produtos de defesa.
-tecnológicos do PROSUB, faz-se funda- Além de garantir a consecução do PRO- cluster focado na Industria Naval, como é a Convém ressaltar que as encomendas
mental compreender o Programa Nuclear SUB e contribuir diretamente para a vigi- iniciativa do “Cluster Tecnológico Naval do tecnológicas geradas devem ser compatíveis
da Marinha (PNM). lância e a defesa da Amazônia Azul, o PNM Rio de Janeiro” (CTN-RJ). com as possibilidades científico-tecnológi-
Apontado como prioritário pelos docu- resulta, de maneira geral, em impactos re- No momento em que novas perspecti- cas da BID nativa, para que os investimentos
mentos de Defesa Nacional e executado levantes nas áreas tecnológicas e produti- vas e campos se abrem ou se combinam governamentais resultem na alavancagem
desde 1979, o PNM surgiu com o propósi- vas do país. Nesse sentido, entre as suas ex- para criar as condições para o desenvolvi- da capacidade da indústria de defesa, em
to de alcançar o domínio do ciclo do com- ternalidades, ressalta-se o desenvolvimento mento de novas plataformas e sistemas de outras palavras, da atividade econômica.
bustível e construir uma planta nuclear de de diversos itens e sistemas de emprego na combate, surgem soluções e equipamentos As externalidades dos programas de Defesa
geração de energia elétrica – o Laboratório indústria nacional, como aços de ligas es- baseados em novas tecnologias, a exemplo trazem benefícios diretos ao país e abran-
de Geração de Energia Núcleo-Elétrica (LA- peciais, materiais poliméricos, sistemas de de inteligência artificial, nanotecnologia, gem efeitos de arrasto tecnológico e de spin
BGENE), que servirá de base para o reator controle digital, entre outros, elevando-se internet das coisas militares (IoMT), bem off, possibilitando, no limite, uma melhor
do primeiro submarino convencional de a capacitação de empresas brasileiras e da como sistemas crescentemente autôno- inserção do país no competitivo e fechado
propulsão nuclear do país. O desenvolvi- indústria nacional. mos, incluindo os letais (LAWS).11 mercado internacional de defesa.
mento do PNM, portanto, é fundamental Sendo um dos três setores estratégicos Nesse cenário, é importante dispor de Os investimentos em defesa ora em
para os resultados do PROSUB, em especial previstos na Estratégia Nacional de Defe- uma sistemática de planejamento estra- curso, alguns dos quais foram destacados
no que se refere à construção do submari- sa, ao lado do cibernético e do espacial, o tégico que seja capaz de compatibilizar neste capítulo, refletem políticas públicas
no convencional de propulsão nuclear Ál- setor nuclear tem alcançado importantes o pensamento estratégico dominante no nessa direção, que se revelam por meio
varo Alberto (SN-10) (BRASIL, 2016; MARI- avanços recentes e proporcionado relevan- país, revelado pelos documentos condicio- dos marcos normativos desenvolvidos nas
NHA DO BRASIL, 2018). te progresso em CT&I no Brasil e, conco- nantes de alto nível. É igualmente relevante últimas décadas, como a lei da inovação, a
Intrinsecamente relacionados, o PRO- mitantemente, na industrial nacional. O que, por meio de metodologia adequada, lei do fomento à defesa e o novo marco da
SUB e o PNM são programas subordinados desenvolvimento de avançadas tecnologias esse pensamento seja transformado em CT&I no Brasil.12
à Diretoria-Geral de Desenvolvimento Nu- soma-se à conquista de prestígio interna- uma configuração de forças, com meios O futuro da base industrial de defesa
clear e Tecnológico da Marinha (DGDNTM). cional, decorrente do domínio da tecnolo- que contribuam para resolver a equação brasileira será, em boa medida, função do
Coordenado pelo Centro Tecnológico da gia nuclear e de ações como a construção estratégica nacional. Tão importante, ain- reconhecimento por parte da sociedade,
Marinha em São Paulo (CTMSP), o PNM é do primeiro submarino convencional de da, é a capacidade de efetuar a alocação por meio de suas instâncias de represen-
desenvolvido, principalmente, no Centro propulsão nuclear brasileiro, que garantirá eficiente de recursos aos projetos deriva- tação, além da conscientização acerca da
Industrial Nuclear de Aramar (CINA). Res- uma presença mais robusta no Atlântico dos, o que implica não somente a disponi- contribuição estratégica que esse setor
salta-se, nesse sentido, que o Brasil integra Sul e incrementará sua capacidade de dis- bilidade, mas também a estabilidade orça- provê para a Segurança, a Defesa e, impor-
o seleto grupo de países que detêm, atu- suasão e de negação de área (ANDRADE; mentária, a longo prazo, característica dos ta destacar, para a Economia nacional.
almente, o domínio tecnológico de todas BARROS-PLATIAU; HILLEBRAND, 2020).
5. Considerações finais
4. Perspectivas
A importância dos espaços marítimos e necessário à atividade econômica no domí-
A marcha acelerada da ciência no século dependência externa. Os programas e pro- o aproveitamento sustentável de seus recur- nio marítimo, seja na vertente security, con-
XXI permite antever inovações tecnológicas jetos estratégicos do setor de Defesa pos- sos seguirão paradigmáticos no século XXI, tra ameaças aos interesses brasileiros e à boa
de aplicação militar, algumas com poten- suem o potencial de estimular as cadeias à medida que a ciência instrumenta, viabi- ordem no mar, seja na vertente safety, com
cial de ruptura em relação a modelos an- produtivas associadas à BID, promovendo liza e intensifica as interações homem-mar. foco na segurança das atividades marítimas,
teriores. Para a atenuação dos gaps tecno- incentivos aos arranjos produtivos neces- As Forças Armadas em geral, e a Ma- seja na salvaguarda da vida humana no mar.
lógicos, os países emergentes veem-se de- sários para o atendimento de demandas rinha em particular, contribuem de duas Cabe acrescentar que a manutenção da
safiados a investir em produção e absorção de materiais e de serviços associados à Se- formas para a Economia do Mar. Por um boa ordem no mar engloba a implementa-
de conhecimentos que permitam reduzir a gurança e à Defesa no domínio marítimo. lado, assegurando o ambiente de segurança ção das leis e dos regulamentos voltados

724 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 725


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rior de Guerra, Rio de Janeiro. Disponível Countries, 2017. Disponível em: http:// jetos Navais – é um ente público criado em tp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
1982, vinculado ao Ministério da Defesa por 2014/2012/lei/l12598.htm. Novo Marco da
em: https://repositorio.esg.br/bitstre- hdl.handle.net/10986/26843 . Acesso em:
intermédio do Comando da Marinha do Bra- CT&I: LEI Nº 13.243, DE 11 DE JANEIRO DE
am/123456789/1158/1/CAEPE.37%20 5 jan. 2022.
sil e que tem como finalidades principais: pro- 2016. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
mover a Indústria Naval Brasileira; gerenciar ato2015-2018/2016/lei/l13243.htm.
Notas

1 “Boa ordem no mar” é uma expressão ao ambiente marítimo (TILL, 2018; MEDEI-
encontrada na literatura relativa à estraté- ROS; MOREIRA, 2017; MOREIRA, 2018)”.
gia naval, notadamente na discussão sobre 2 Para definições adotadas no regime jurídico
as tarefas e atribuições subsidiárias das ma- brasileiro, ver: BRASIL. LEI Nº 8.617, de 4 de ja-
rinhas. Ela sugere um estado de segurança neiro de 1993. Dis-põe sobre o mar territorial,
alcançado de uma forma ampla, a partir de a zona contígua, a zona econômica exclusiva e
atividades de natureza policial voltadas à a plataforma continental brasileiros, e dá outras
prevenção de ilícitos e a implementação da providências. Disponível em: http://www.pla-
lei e dos regimes de governança pertinentes nalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8617.htm.

728 ECONOMIA AZUL Segurança, Defesa e Economia do Mar 729


35

A EXPLORAÇÃO PESQUEIRA NA ZONA


ECONÔMICA EXCLUSIVA BRASILEIRA

Marcelo Francisco Nóbrega


Matheus Assis de Oliveira
Sergio Ricardo da Silveira Barros
Jorge Eduardo Lins Oliveira

1. A produção pesqueira nacional

A pesca é uma das atividades mais municípios, incluindo ainda a faixa marítima
antigas exercidas pelo homem, data do formada pelo mar territorial, com largura de
período anterior ao neolítico, e sua impor- 12 milhas a partir da linha da costa.
tância além da econômica é também cultu- Já a Zona Econômica Exclusiva (ZEE)
ral e simbólica. Diversos grupos humanos apresenta uma área aproximada de 4,3
têm sua origem fundada na atividade, sen- milhões de quilômetros quadrados e 8,5
do responsável por sua reprodução física e mil quilômetros de costa. Ao longo des-
social de seus membros (DIEGUES, 2004). sa extensão, abriga diversos e complexos
No Brasil a pesca se notabilizou desde os ecossistemas costeiros, considerando um
períodos coloniais como uma atividade im- gradiente latitudinal no sentido Norte-Sul,
portante como fonte de alimentação para desde 4,2°N até 34°S. Estas dimensões
os engenhos de cana-de-açúcar e para as continentais e as diversidades climáticas
cidades litorâneas (DIEGUES, 2004). É exer- e morfológicas de sua região costeira e
cida em águas interiores (rios, reservató- oceânica tornaram necessárias a adoção
rios, dentre outros corpos-d’água), na Zona de medidas e coleta de dados de produção
Costeira e na Zona Econômica exclusiva. A dos recursos pesqueiros considerando-se
Zona Costeira se estende por mais de 8.500 as regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Sul,
km, abrangendo 17 estados e mais de 400 separadamente (Figura 1).

730 ECONOMIA
730 AZUL
A ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 731
Quanto à produção pesqueira nacional, t, seguida pelo grupo de outros peixes,
Figura 1. A costa e a Zona Econômica Exclusiva Brasileira (ZEE),
dividida em quatro regiões, incluindo a Ilha de Trindade segundo de Zamboni et al. (2020), estima- com 40.168. O bonito-listrado representou
e o Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP) -se que atualmente oscile ao redor de 500 30.563 t (Figura 2c). Em relação à produ-
mil toneladas anuais, colocando o Brasil ção de crustáceos, o camarão-sete-barbas
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW 20o0’0oW
na 33ª posição mundial entre os produ- (Figura 2d) e o camarão-rosa (Figura 2e)
tores de pescados de captura marinha do foram as espécies mais capturadas, com
mundo. Por outro lado, os últimos dados 15.417 t e 10.331 t, respectivamente, re-
10oo0’0’’N 10o0’0’’N estatísticos detalhados das capturas foram presentando 45% do total da produção
publicados pelo Ministério da Pesca e Aqui- de crustáceos marinhos no Brasil. A lagos-
cultura através do Boletim Estatístico de ta (Figura 2f), uma das principais espécies
5oo0’0’’N 5o0’0’’N Pesca e Aquicultura em 2011. A partir des- destinadas à exportação de pescados do
te ano, não houve continuidade na coleta e Brasil, representou 12% do total captura-
divulgação de dados de desembarques da do do grupo dos crustáceos, com 6.929 t.
0o0’0’’ 0o0’0’’ atividade pesqueira nacional. Desta forma, As capturas do camarão-branco (Figura 2g)
somente considerando-se os últimos dados contribuíram com 4.115 t. Entre os molus-
publicados (MPA, 2011) constata-se que o cos, o mexilhão (Figura 2h) foi a espécie
5o0’0’’S 5o0’0’’S Brasil produziu 1.431.974 t. Neste período, mais capturada, com 3.772 t, representan-
a pesca extrativa marinha foi a principal do 27% do total desta categoria, sendo o
fonte de produção de pescado nacional, sururu (Figura 2i) a segunda espécie mais
10o0’0’’S 10o0’0’’S com 553.670 t, seguidos pela aquicultura capturada, com 2.133,3 t, seguida do pol-
continental (544.490 t), pela pesca extra- vo (Figura2j), com 2.089 t. A captura de
tiva continental (249.600 t) e aquicultura lulas (Figura 2k) foi de 1.623 t e de ostras
15o0’0’’S 15o0’0’’S marinha (84.214 t). A região Nordeste re- (Figura 2l) 1.233 t (MPA, 2011).
gistrou a maior produção de pescado, com As espécies de atuns e afins são cap-
454.216,9 t (31,7%). As regiões Sul, Norte turadas pela frota que atua com espinhel
20oo0’0’’N 20o0’0’’N e Sudeste registraram 336.451 t (23,5%), pelágico, apresentando relevante valor
326.128 t (22,8%) e 226.233 t (15,8%), comercial e participação na pesca mari-
respectivamente. O estado de Santa Cata- nha principalmente na região oceânica.
25o0’0’’S 25o0’0’’S rina foi o maior produtor de pescado do Representaram 4,8% (26.629 t) da pesca
Brasil, com 194.866 t (13,6%), seguido pe- extrativa marinha em 2011, considerando
los estados do Pará (153.332 t – 10,7%) e o total capturado no período de 553.670 t
30oo0’0’’N 30o0’0’’N Maranhão 102.868 t (7,2%). (MPA, 2011). As principais espécies captu-
Os peixes representaram 87% da pro- radas por essa frota são: albacora-laje (Fi-
dução total, seguido pelos crustáceos, com gura 2m), albacora-bandolim (Figura 2n),
10%, e moluscos com 3%. Em 2011, a albacora-branca (Figura 2o), albacorinha
35o0’0’’S 35o0’0’’S
produção pesqueira marinha foi dividida (Figura 2p), espadarte (Figura 2q), tubarão-
da seguinte forma: peixes representaram -azul (Figura 2r), agulhão-vela (Figura 2s),
482.335 t, crustáceos, 57.344 t e molus- agulhão-verde (Figura 2t), dourado (Figura
40o0’0’’S 40o0’0’’S
cos, 13.989 t. Entre as espécies de peixes 2u) e cavala-preta (Figura 2v).
50 0’0 W
o o
45 0’0 W 40 0’0 W 35 0’0 W 30 0’0 W 25 0’0 W 20 0’0 W
o o o o o o o o o o o o
mais capturadas, a sardinha-verdadeira Apesar de a atividade pesqueira mari-
0 310 620 1.240 1.860 2.480 3.100 (Figura 2a) apresentou o maior volume nha no Brasil estar estagnada e a pesca
Kilometers
(75.122 t). O segundo recurso mais captu- costeira se caracterizar por ser artesanal
Fonte: Elaboração própria rado foi a corvina (Figura 2b), com 43.369 e de baixo rendimento (XIMENES, 2021),

732 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 733


Figura 2. Recursos pesqueiros mais captu- telasp.), J. Polvo (Octopus vulgaris),
A B C rados no Brasil: K. Lula (Loligosp.), L. Ostra (Ostrea sp.),
A. Sardinha-verdadeira (Sardinella brasi- M. Albacora-laje (Thunnusalbacares),
liensis), N. Albacora-bandolim (Thunnusobesus),
D E F B. Corvina (Micropogoniasfurnieri), O. Albacora-branca (Thunnusalalunga),
C. Bonito-listrado (Katsuwonuspelmis), P. Albacorinha (Thunnusatlanticus),
D. Camarão-sete-barbas(Xiphopennaeus- Q. Espadarte (Xiphiasgladius),
-kroyeri), R. Tubarão-azul (Prionace glauca),
E.Camarão-rosa (Penaeussubtilis), S. Agulhão-vela (Istiophorusalbicans),
G H I F. Lagosta (Panulirussp.), T. Agulhão-verde (Tetrapturuspfluegeri),
G.Camarão-branco (Penaeusschmitti), U. Dourado (Coryphaenahippurus),
H. Mexilhão (Perna perna), I. Sururu (My- V. Cavala-preta (Acanthocybiumsolandri).

pode ainda ser considerada uma das ativi- de embarcações no mapa Global Fishing
J K
dades mais tradicionais para os habitantes Watch, o Brasil aumenta a governança so-
L de todas as quatro regiões costeiras brasi- bre sua frota que operam em águas juris-
leira, contribuindo com R$ 5 bilhões para dicionais, dando um exemplo importante
o PIB e gerando 3,5 milhões de empregos e melhorando a transparência da pesca
diretos e indiretos (RUFFINO et al., 2016). em toda a região.
Desde a descontinuidade do Programa Na- A Global Fishing Watch e as autori-
cional de Estatística Pesqueira em 2009, o dades brasileiras trabalham em conjunto
M N O
Brasil vive um cenário de poucas perspec- para garantir uma boa gestão pesqueira
tivas quanto à estatística pesqueira, tor- e promover a sustentabilidade dos esto-
nando muito mais complexa a avaliação ques pesqueiros do país, que incluem es-
do grau de vulnerabilidade dos estoques pécies de alto valor, como a sardinha bra-
pesqueiros no país. sileira, atuns, lagostas e outras espécies
P Q R Por outro lado, apesar da carência de demersais. Desde 2007, o Brasil emprega
3. O processo de qualificação da os para o mar – situação atual dados estatísticos para o setor pesqueiro um sistema de rastreamento de embarca-
brasileiro nos últimos 12 anos, o Brasil as- ções para monitoramento (Programa Na-
sinou um memorando de entendimento cional de Rastreamento de Embarcações
de compartilhamento de dados em abril Pesqueiras por Satélite – PREPS), controle
S T
de 2021 entre a Global Fishing Watch, site e vigilância de sua frota pesqueira nacio-
que fornece informações globais sobre as nal. Ao longo dos anos, o programa au-
atividades de pesca comercial, e o Minis- xiliou na verificação das autorizações de
tério da Agricultura, Pecuária e Abasteci- pesca, no monitoramento e análise das
V mento, representado pela Secretaria de atividades de pesca e na avaliação de al-
U
Aquicultura e Pesca. Este acordo marcou gumas medidas de gestão pesqueira. A
o início oficial de colaboração do Brasil, parceria entre a Global Fishing Watch e
significando um marco importante na jor- a Secretaria de Aquicultura e Pesca do
nada em direção à transparência de dados Ministério da Agricultura, Pecuária e Ca-
Fontes: A. Acervo Revista Pesca e Companhia; B. Acervo agro20; C, Q. Scandinavian Fishing Year Book; e governança oceânica equitativa. Com deia de Abastecimento é uma grande
D, E, G. Acervo Clara Costa Delia; F. Acervo Convemar; H. Acervo Biotrends; I. Acervo Fineartamerica,
Ikon Images; J, K, P, S, T, U, V. Domínio público; L. Acervo Wikimedia Hectonichus; M. Diane Rome
a decisão de compartilhar publicamente oportunidade para o setor pesqueiro bra-
Peebles, 1992; N. Diane Rome Peebles, 1998; O. Acervo Chartinh Nature; R. Acervo Kano Serrano. os dados do sistema de monitoramento sileiro mostrar a intenção de promover a

734 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 735


modernização da gestão da pesca na há outros que também são de fácil acesso,
Zona Econômica Brasileira. como o Global Fishing Watch.
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW 20o0’0oW
Outras bases de dados, conhecidas como As possibilidades de utilização dessas
repositórios de dados on-line, têm por obje- bases de dados devem contribuir signifi-
tivo o Open Science, que são os dados aber- cativamente para a análise espacial das
10o0’0’’N 10o0’0’’N
tos e gratuitos aos pesquisadores (LIN et al., áreas de operação da frota pesqueira
2020). Existem muitos repositórios on-line nacional, no tempo e no espaço, dire-
disponíveis atualmente, muitos deles são cionados as capturas da pesca extrativa
5o0’0’’N 5o0’0’’N
voltados para áreas específicas, seja para marinha do Brasil, assim como atualizar
biodiversidade, ecologia, oceanografia, seja informações desses importantes recursos
0o0’0’’ 0o0’0’’
para outras áreas. Há um controle da quali- pesqueiros para a comunidade de pesca-
dade desses dados para cada repositório re- dores da frota artesanal e industrial do
gidos sob licenças e políticas de uso (LIN et Brasil, constituindo-se em um marco na
5o0’0’’S 5o0’0’’S al., 2020). Os mais famosos dentro da área análise da distribuição espacial das fro-
da biodiversidade são o Ocean Biodiversity tas e contribuindo decisivamente com os
Information System (OBIS) e o Global Bio- subsídios para o planejamento espacial e
10o0’0’’S 10o0’0’’S diversity Information Facility (GBIF), porém ordenamento dessas pescarias.

2. O rastreamento de embarcações pesqueiras nacionais


15o0’0’’S 15o0’0’’S
Os dados gerados pelo Programa Na- foram registradas 597 embarcações da
cional de Rastreamento de Embarcações frota industrial e semi-industrial brasileira.
20o0’0’’N 20o0’0’’N Pesqueiras por Satélite (PREPS), referente A frota de arrasto de portas representou
à frota brasileira industrial e semi-indus- 60,5% das embarcações, 11,9% a de espi-
trial que possuem comprimento igual ou nhel de fundo e 11,4% o espinhel pelágico
25o0’0’’S 25o0’0’’S superior a 15 metros, equipados com ras- de deriva (Tabela1).
treadores que registram localizações ge- A seguir, serão descritas informações
orreferenciadas a cada uma hora, foram e características gerais das frotas que
30o0’0’’N 30o0’0’’N
compartilhados junto à plataforma Global operam com diferentes equipamentos de
Fishing Watch. Esses dados apresentam pesca, assim como os principais recursos
registros entre 5 de setembro de 2013 e capturados e a distribuição espacial dessas
35o0’0’’S 35o0’0’’S
18 de dezembro de 2021. Foram gera- frotas, considerando os registros gerados
dos, nesse período, um total de 244.558 no período de setembro de 2013 a dezem-
40o0’0’’S 40o0’0’’S
registros (Figura 3), que correspondem a bro de 2021.
50 0’0 W
o o
45 0’0 W 40 0’0 W 35 0’0 W 30 0’0 W 25 0’0 W 20 0’0 W
o o o o o o o o o o o o 1.283.905 horas de monitoramento. As
frotas que apresentaram as maiores frequ- 2.1. O espinhel pelágico de deriva
0 312.5 625 1.250 1.875 2.500 3.125
Kilometers
ências de registros foram as de redes de ar-
rasto de portas (43,8%), espinhel de deriva O espinhel pelágico de deriva (Figura 4)
Fonte: Elaborado pelos autores, baseado na Global Fishing Watch (2022) (32,4%) e espinhel de fundo (14,2%). A é operado manualmente em barcos que
Tabela 1 apresenta um sumário das frequ- operam com essa arte de pesca (Figura 5),
Figura 3. Mapa da costa e ZEE brasileira barcações monitoradas da frota pesquei- ências de registros e do esforço de pesca variando apenas a quantidade de linha e
e do Oceano Atlântico Sudoeste, apre- ra industrial brasileira, entre setembro de aparente para todas as frotas registradas. anzóis. Este equipamento é direcionado
sentando a distribuição espacial das em- 2013 e dezembro de 2021. No período analisado de 2013 a 2021 para peixes pelágicos, utilizando-se anzóis

736 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 737


736
e isca (FAO, 2022). Neste equipamento, dade neutra, tal aparato é desprendido (ou Nessas embarcações há um pequeno mento e recolhimento do espinhel em um
uma sequência horizontal ou vertical de desenrolado) durante o processo de lan- guincho com roldana que auxilia o lança- de seus extremos.
anzóis são presos a uma linha de multifi- çamento do espinhel (UHRIN et al., 2020).
lamento (geralmente de poliamida ou po- É utilizado com mais frequência em áreas Figura 4. Pesca passiva com a utilização de Espinhel de deriva (acima) e
liéster) suspensa por boias e submersa por oceânicas, mas é também usado nas Zonas espinhel de fundo (abaixo), boias e anzóis evidenciados
pesos de chumbo, mantendo a flutuabili- Econômicas Exclusivas (FAO, 2022).

Tabela 1. Artes de pesca, frequência de registros, esforço de pesca aparente (horas)


mínimo, máximo, médio, desvio padrão (DP), soma para os registros gerados pelo
PREPS e número de embarcações para as diferentes frotas industriais brasileiras
Artes de pesca N Mínimo Máximo Média DP Soma Embarcações
Arrasto de portas 107.047 0,000001 164,6 6,62 9,12 708.355 361
Corso 153 0,000009 21,84 4,96 5,24 759 3
Espinhel de deriva 79.194 0,000001 38,8 2,85 3,53 225.444 68
Linha de mão 15.314 0,000001 42,03 5,23 5,97 80.144 43
Espinhel de fundo 34.848 0,000001 119,31 6,78 8,49 236.384 71
Rede de emalhar de fundo 406 0,000001 26,47 4,05 4,92 1.643 5
Rede de emalhar de superfície 58 0,000573 23,82 6,97 7,08 404 1
Rede de cerco 3.057 0,000001 30,36 3,44 4,21 10.514 40
Vara isca viva 4.481 0,000001 34,49 4,52 5,05 20.258 5
Total 244.558 1.283.905 597 Fonte: Cochrane, 2005
Fonte: Elaborado pelos autores, baseado na Global Fishing Watch (2022}

O espinhel pelágico de deriva é utiliza- e utilizados em diferentes profundidades Figura 5. Ilustração de uma embarcação de espinhel de deriva
do direcionado a espécies de peixes pe- (GARCÍA-BARCELONA et al., 2016; UHRIN
lágicos. As espécies mais frequentes nas et al., 2020). A interpolação dos registros
capturas no Atlântico Ocidental são os gerados para o esforço aparente de pesca
atuns albacora-laje (Thunnus albacares), do PREPS, para a frota brasileira que opera
albacora-bandolim (Thunnus obesus), al- com espinhel de deriva na ZEE brasileira
bacora-branca (Thunnus alalunga) e alba- e região adjacente oceânica internacional,
corinha (Thunnus atlanticus). O espadarte resultou os maiores esforços e frequên-
(Xiphias gladius) é uma espécie importan- cia de embarcações nas áreas da ZEE na
te nas capturas da frota de espinhel, assim região Sul do Brasil, no Rio de Janeiro e
como o tubarão-azul (Prionace glauca) e Espírito Santo, no sul da Bahia, no entro-
algumas espécies do gênero Carcharhinus. no da Ilha de Trindade, na região oceâni-
O agulhão-vela (Istiophorus albicans) e ca no extremo nordeste da ZEE brasileira
agulhão-verde (Tetrapturus pfluegeri) são e região oceânica, nas proximidades do
eventualmente capturados. O dourado Arquipélago de São Pedro e São Paulo e
(Coryphaena hippurus) e a cavala-preta em direção oeste na região oceânica in-
(Acanthocybium solandri) são espécies ternacional (Figura 6). Essa frota represen-
menos frequentes nas capturas. Os anzóis tou 32,4% dos registros das embarcações
Fonte: Cochrane & Garcia, 2009
podem variar em sua forma e tamanho rastreadas pelo PREPS entre 2013 e 2021.

738 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 739


2.2. O espinhel de fundo 2020). As principais espécies associadas a
essas pescarias no Sudeste e Sul do Brasil Figura 6. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota brasileira
(agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com espinhel de deriva
O espinhel de deriva não é utilizado nas são o peixe-batata (Lopholatilus villarii), os
em toda ZEE brasileira e região oceânica internacional
capturas de peixes demersais e bentônicos, chernes (Epinephelus niveatus e Polyprion
55o0’0oW 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW 20o0’0oW
o espinhel de fundo (Figura 4) é a técni- americanus) e o namorado (Pseudoper cis-
ca utilizada para capturar essas espécies numida). Espécies como a abrótea-de-pro-
com anzóis (FAO, 2022). Este equipamento fundidade (antes utilizada quase exclusiva-
segue a mesma estrutura do espinhel de mente como isca), o bagre (Genidens bar- 10o0’0’’N 10o0’0’’N
deriva com anzóis ligados sequencialmen- bus), a corvina, o congro-rosa (Genypterus
te a uma corda de multifilamento principal brasiliensis) e a cação-bico-doce (Heptran-
na qual se prendem os anzóis, utilizam do chias perlo) são também exploradas (Valen- 5o0’0’’N 5o0’0’’N
mesmo tipo de embarcação (Figura 5), e tin e Pezzuto, 2006).
têm também a premissa de atrair os peixes A frota industrial e semi-industrial brasi-
a partir de iscas presas nos anzóis (FADER leira que atua com espinhel de fundo ope- 0o0’0’’ 0o0’0’’
et al., 2021). A diferença é que o espinhel rou entre os anos de 2013 e 2021 predo-
de fundo possui boias grandes apenas nas minantemente na região Sul e nos estados
suas extremidades, possuindo boias pe- de São Paulo e Rio de Janeiro, no Sudeste. 5o0’0’’S 5o0’0’’S
quenas e chumbo por todo o filamento Os maiores esforços de pesca encontram-
principal, fazendo com que estes fiquem -se em áreas de até 100 km da costa, que
sempre muito próximos ou encostando ao apresentam profundidades aproximadas de 10o0’0’’S 10o0’0’’S
fundo (FAO, 2022). O espinhel de fundo é 100 m. A partir destas áreas, o esforço de
voltado para espécies da família Serranidae pesca é menor, apesar das operações ocor-
(sirigado, garoupas e chernes), dos elas- rem até os 2.000 m de profundidade, em 15o0’0’’S 15o0’0’’S
mobrânquios (tubarões e raias), da família distâncias da costa aproximadas de 200 km
Lutjanidae (vermelhos), da família Carangi- (Figura 7). Essa frota representou 32,4%
dae (xareús e arabaianas) e Sparidae (par- dos registros das embarcações rastreadas
20o0’0’’N 20o0’0’’N
gos) (ECHWIKHI et al., 2014; PINHO et al., pelo PREPS no período.

25o0’0’’S 25o0’0’’S

30o0’0’’N 30o0’0’’N

35o0’0’’S 35o0’0’’S

40o0’0’’S 40o0’0’’S
55o0’0oW 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW 20o0’0oW
0 310 620 1.240 1.860 2.480 3.100
Kilometers

Fonte: Autores baseado na Global Fishing Watch (2022)

740 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 741


741
2.3. A frota de vara isca viva, linha de arrastadas (trollers) pelas embarcações
Figura 7. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota brasileira
mão e corso (trollers) em movimento (FAO, 2022). Podem ser
(agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com espinhel de fundo
realizadas de duas formas, a partir de
nas regiões sul e sudeste da ZEE brasileira
As frotas que atuam com linha de uma embarcação (à deriva ou ancorada)
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW
mão, corso e varas com isca viva repre- (linha de mão e vara de pesca) (BJORDAL,
sentaram conjuntamente 8,15% dos re- 2005). As três artes objetivam a pesca de
gistros gerados pelo PREPS entre os anos espécies pelágicas ou demersais, como os
de 2013 e 2021 (Figura 8). São méto- atuns (Thunnus albacares, Thunnus obe-
dos de pesca amplamente difundidas no sus, Thunnus atlanticus, Thunnus alalun-
20o0’0’’S 20o0’0’’S mundo todo, justamente por serem as ga), bonito-listrado (Katswonus pelanis),
mais simples, maleáveis e de baixo cus- cavalas, xaréus e pargos (BJORDAL, 2005;
to. A linha de mão consiste apenas em SETYADJI et al., 2018).
utilizar um monofilamento de nylon com Na modalidade vara com isca viva, a isca
um anzol que imita a morfologia de uma é capturada através de uma rede de cerco.
presa ou que possui uma isca presa. A Os barcos que utilizam essa arte de pesca,
mesma metodologia é seguida pela vara possuem viveiros (tinas) com circulação con-
com isca viva, que se diferencia por usar tínua de água, para manter uma baixa taxa
25o0’0’’S 25o0’0’’S iscas vivas e pelo corso (Figura 8), que se de mortalidade das iscas, uma vez que pei-
caracterizam por linhas com anzóis e isca xes como a sardinha, cavalinha e chicharro

Figura 8. Pesca passiva por linha de mão (abaixo), vara isca viva (direita)
e trollers– corso (esquerda). Diferentes tipos e formas de anzóis
evidenciados, pesca com embarcação em movimento (a esquerda-corso) e
com embarcação parada (direita)

30o0’0’’S 30o0’0’’S

35o0’0’’S 35o0’0’’S

50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW


0 120 240 480 720 960 1.200
Kilometers

Fonte: Elaborado pelos autores utores baseado na Global Fishing Watch (2022)
Fonte: Cochrane (2005)

742 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 743


não suportam cativeiros por tempo prolon- lançam em cima do cardume e em segui-
gado (Figura 9). Após a obtenção da isca, da, puxam-nas para bordo. Esses anzóis Figura 10. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota
a embarcação para e lança ao mar a isca são cobertos por uma imitação de penas brasileira (agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com vara isca
viva na ZEE brasileira e região oceânica internacional
viva, que é composta por peixes vivos ju- de aves, fabricados de fibra sintéticas, com
venis de sardinha, manjuba, chicharro e a finalidade de simular um pequeno pei- 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW
cavalinha. A embarcação em toda a sua ex- xe quando atirados na água. Não possuem
tensão deve ter uma saída de água para es- farpas, facilitando assim o escape do peixe
timular a concentração de pequenos peixes quando cai no convés da embarcação. Esta 0o0’0’’ 0o0’0’’
na superfície. Os peixes vivos são lançados modalidade de pescaria se destina à cap-
ao mar, para manter o cardume junto ao tura de atuns e afins, cujos cardumes são
barco. À borda do barco, vários pescado- encontrados junto à superfície. A principal
res munidos de vara com linha e anzol, as espécie capturada é o bonito-listrado. 5o0’0’’S 5o0’0’’S

Figura 9. Estrutura de uma embarcação e acessórios que utiliza


a arte de pesca com vara isca viva
10o0’0’’S 10o0’0’’S

15o0’0’’S 15o0’0’’S

20o0’0’’N 20o0’0’’N

25o0’0’’S 25o0’0’’S

Fonte: https://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/artes_de_pesca/industrial/vara_isca_viva/vara_isca_viva.pdf 30o0’0’’N 30o0’0’’N

A frota que opera com vara e isca viva participam eventualmente das capturas.
apresentou maiores esforços entre os anos de Uma área isolada de atuação foi estimada na
2013 e 2021 na região Sul e nos estados de região Nordeste do Brasil, entre os estados de
35o0’0’’S 35o0’0’’S
São Paulo, Rio de Janeiro e sul do Espírito San- Pernambuco e Paraíba, entre as áreas de 300
to, de 300 m até áreas com profundidades de e 2.000 m de profundidade (Figura 10).
2.000 metros. A frota apresenta ainda áreas A distribuição espacial da frota que atuou
de atuação além da ZEE brasileira, a leste da re- com linha de mão entre 2013 e 2021 apre-
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW
gião Sul do Brasil em áreas oceânicas interna- senta os maiores esforços direcionados para
0 237.5 475 950 1.425 1.900 2.375
cionais, nas proximidades da elevação do Rio a região Sul e nos estados de São Paulo,
Kilometers
Grande, direcionados principalmente ao bo- Rio de Janeiro e Espírito Santo, da costa até
nito-listrado. Algumas espécies de Scombri- profundidades de 300 metros. Nessa região, Fonte: Elaborado pelos autores baseado na Global Fishing Watch (2022)
dae, como o bonito Euthynnus alletteratus a frota atua até profundidades superiores a

744 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 745


2.000 m, próximo do limite externo da ZEE tes, a exploração atualmente se direciona
Figura 11. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota brasileira (Figura 11). No entorno do Arqui- principalmente para cardumes de espécies
brasileira (agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com linha de pélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP) de atuns (Thunnus albacares e Thunnus
mão na ZEE brasileira e região oceânica internacional
observa-se um esforço considerável da fro- atlanticus) e para espécies demersais da
55o0’0oW 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW ta de linha, que se inicia no extremo nor- família Lutjanidae (Lutanus jocu, Lutjanus
10 0’0’’N
o
10o0’0’’N deste da costa do Rio Grande do Norte, analis, Lutjanus vivanus, Etelis oculatus), e
assim como no entorno do Atol das Rocas, garoupas e chernes da família Serranidade,
da Ilha de Fernando de Noronha e nos Ban- dos gêneros Epinephelus e Mycteroperca.
5o0’0’’N 5o0’0’’N
cos Oceânicos da Cadeia Norte Brasileira.
Uma pequena área de operação foi identi- 2.4 A rede de emalhar
ficada no extremo oeste da costa brasileira,
na costa do Amapá próximo à divisa com a As redes de emalhar (Figura 12) con-
0o0’0’’ 0o0’0’’ Guiana Francesa (Figura 11). sistem em uma arte de pesca que forma
Essas pescarias no ASPSP são direciona- paredes horizontais de rede, em que de-
das para espécies pelágicas, principalmente pendendo do tamanho da abertura de
5o0’0’’S 5o0’0’’S para albacora-laje (Thunnus albacares), ca- malha e do comprimento dos peixes estes
vala-empinge (Acanthocybium solandri) e se prendem às redes (FAO, 2022). As redes
o peixe-rei (Elagatis bipinulattus. No entor- para a flutuação são presas a boias em sua
no dos Bancos Oceânicos e áreas adjacen- parte superior e a âncoras (ou portas) em
10o0’0’’S 10o0’0’’S

Figura 12. Rede de emalhar de fundo e suas estruturas (esquerda), como


malhas,bóias e âncoras. Embarcação (direita) da frota de rede de emalhar.
Rede de emalhar de superfície (abaixo)
15o0’0’’S 15o0’0’’S

20o0’0’’N 20o0’0’’N

25o0’0’’S 25o0’0’’S

30o0’0’’N 30o0’0’’N

35o0’0’’S 35o0’0’’S

55o0’0oW 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW 25o0’0oW

0 265 530 1.000 1.590 2.120 2.860


Kilometers

Fonte: Elaboração dos autores, utilizando dados da Global Fishing Watch (https://globalfishingwatch.org/) Fonte: Modificado de Cochrane (2005) e Acervo FAO Fishing Gear Type

746 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 747


sua parte de baixo, conferindo uma flutuabi- Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, com Fig.13 Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota
lidade em formato de um contínuo de parede mais frequência em áreas de até 100 metros brasileira (agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com rede
no qual o comprimento e altura depende ex- de profundidade. Menores frequências foram de emalhar de fundo na ZEE brasileira
clusivamente das redes, confeccionadas ge- observadas na Plataforma Continental da Bacia
50o0’0oW 45o0’0oW
ralmente por multifilamento de nylon, mono- potiguar do Rio Grande do Norte e Ceará, em
filamentos ou monomultifilamentos de fibra áreas que ultrapassaram os 200 m de profundi-
e podem ser utilizadas em pequena e larga dade (Figura 14).
escala (BJORDAL, 2005; FAO, 2022). As redes
de emalhar de fundo apresentam boias na 2.5 A rede de cerco
25o0’0’’S
parte superior e chumbo na parte inferior; já
as redes de emalhar de superfície apresentam A rede de cerco (Figura 15) possui a premis-
apenas boias na parte superior, flutuando sa de cercar os recursos pesqueiros de determi-
25o0’0’’S 25o0’0’’S
com a corrente, em geral perto da superfície nada área com uma rede muito longa, englo-
ou em meia água (Figura 12). bando-a (FAO, 2022). Este aparato opera com
As embarcações são utilizadas para o duas cordas fixadas em seus extremos que ser-
transporte, soltura e recolhimento das redes vem como apoio para cercar a região desejada,
de emalhar, geralmente são soltas e recolhidas existindo dois principais tipos, as redes de cerco
à mão, porém, em embarcações maiores, são de barco e as redes de cerco de praia (ou costa)
utilizados equipamentos hidráulicos e guin- (FAO, 2022). Essa rede possui boias na sua par-
chos (soltura e recolhimento) (FAO, 2022). A te superior e pesos na sua parte inferior, o que 30o0’0’’S
pesca por rede de emalhe é muito generalis- a confere flutuabilidade neutra, sendo também
ta e captura recursos pelágicos e demersais utilizada por embarcações que possuem tam- 30o0’0’’S 30o0’0’’S
(SMITH et al., 2022). As principais espécies bores de rede (FAO, 2022). De forma geral, são
capturadas são da família Scianidae (pescadas direcionadas para capturas de espécies pelági-
e corvinas); bagres da família Ariidae; ancho- cas (FABRIZIO et al., 2017), mostrando-se mui-
va (Pomatomus saltatrix); espécies da família to eficiente na captura de cardumes pelágicos.
Scombridae, como a serra (Scomberomorus Na costa brasileira capturam principalmente a
brasisliensis) e cavala (Scombermorus cavala); sardinha-verdadeira, algumas espécies da famí-
espécies da família Lutjanidae (Vermelhos) e lia Engraulidae e Scombridae.
Serranidae (Badejos e garoupas); recursos da Os maiores esforços para a frota de rede 35o0’0’’S
família Carangidae do gênero Caranx e Ca- de cerco brasileira, no período de 2013 a
rongoides, entre outros gêneros); peixe-espa- 2021, foram estimadas da costa central de 35o0’0’’S 35o0’0’’S
da (Trichiurus lepturus) e espécies de sardinhas Santa Catarina até a região de Cabo Frio
das famílias Clupeidae e Engraulidae (BJOR- no Rio de Janeiro, principalmente direcio-
DAL, 2005; FAO, 2022; SMITH et al., 2022). nados para a captura da sardinha-verdadei-
A frota brasileira que atuou com redes de ra, de forma geral em áreas de até 100 m
emalhar de fundo entre os anos de 2013 e de profundidade (Figura 16). Entretanto, a
2021 se concentrou no sul do estado de Santa distribuição dessa frota se deu desde a di-
Catarina e norte do Rio Grande do Sul, ope- visa do Rio Grande do Sul com o Uruguai 50o0’0oW 45o0’0oW
rando principalmente em áreas de até 100 até o sul do estado do Espírito Santo, com 0 90 160 360 540 720 900
metros de profundidade (Figura 13). A frota maiores esforços em áreas com até 100 Kilometers
que operou com rede de emalhar de superfí- metros de profundidade (Figura 16). Outras
Fonte: Elaborado pelos autores baseado na Global Fishing Watch (2022}
cie se distribuiu na plataforma continental de espécies também são capturadas por essa

748 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 749


Figura 14. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota Figura 15. Rede de cerco mostrando como é rebocada durante o processo de
brasileira (agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com rede de cerco, evidenciando etapas e a forma da rede em si.
emalhar de superfície na ZEE brasileira
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW

5o0’0’’S 5o0’0’’S

10o0’0’’S 10o0’0’’S

15o0’0’’S 15o0’0’’S

Fonte: Modificado de FAO Fishing Gear Type

frota, como tainhas (Mugil spp.), enchova bolsa, há equipamentos especialmente di-
20 0’0’’N
o
20 0’0’’N
o
(Pomatomus saltatrix), cavalinha (Scomber- recionados para a regulação da abertura
japonicus), sardinha-laje (Opisthonemao- de malha para selecionar as espécies que
glinum), palombeta (Chloroscombruschry- serão capturadas, sendo estas redes man-
surus), galo (Selene setapinnis) e savelha tidas horizontalmente por boias e âncoras
(Brevoortia spp.), entre outras (VALENTIN; (ou portas) verticais (FAO, 2022; SPEDICA-
25o0’0’’S 25o0’0’’S PEZZUTO, 2006). TO et al., 2019).
Geralmente nas grandes embarcações
2.6 A rede de arrasto são utilizados equipamentos para o mane-
jo das redes de arrasto, como sensores que
As redes de arrasto (Figura 17) possuem identificam velocidade, simetria, captura,
30o0’0’’N 30o0’0’’N formato de cone que dependem da aber- profundidade, distância e altura, também
tura de malha e podem ser direcionadas ao são utilizados tambores de rede para soltar
ambiente pelágico, meia água ou de fundo e recolher as redes (FAO, 2022). Embarca-
(FAO, 2022). Possuem uma abertura hori- ções de arrasto apresentam variações, sen-
zontal que é ligada a uma ou duas (par de do denominados navios de arrastos fábri-
35o0’0’’S 35o0’0’’S arrasto) embarcações, nas quais rebocam cas e navios de arrasto freezers, que são
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW a rede, ainda duas redes de arrasto para- utilizados para garantir a integridade do
0 190 380 760 1.140 1.520 1.900
lelas (redes gêmeas) podem ser utilizadas recurso pescado em águas mais distantes
Kilometers (SARMIENTO-NATAFE et al., 2015; SPEDI- (HOFF & FROST, 2007).
CATO et al., 2019). O tamanho da malha No Brasil, a modalidade de arrasto de
Fonte: Elaborado pelos autores baseado na Global Fishing Watch (2022)
das redes pode ser regulável na região da portas possui duas frotas distintas, a dos

750 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 751


Figura 16. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota brasileira arrastos duplos e simples. O arrasto duplo Os registros analisados referentes ao
(agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com rede de cerco na ZEE brasileira é direcionado à captura de camarões (ca- rastreamento da frota brasileira de arrasto
marão-sete-barbas, camarão-rosa e cama- de fundo, entre os anos de 2013 e 2021,
50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW rão-branco). O arrasto simples é dedicado resultaram nos maiores esforços entre a di-
à captura de peixes da família Scianidae. A visa do Brasil com o Uruguai até o norte
15o0’0’’S 15o0’0’’S
partir dos anos 2000, com o avanço da pes- do Rio de Janeiro, especialmente em áreas
ca demersal por ambas as frotas para áreas com profundidades de até 100 m. Entre
da plataforma externa e talude, observa-se Ilhéus, na Bahia, até as proximidades de
na região sul e sudeste o direcionamento Salvador foi identificada outra área de atu-
para espécies como a merluza (Merluccius ação dessa frota, bem como da costa leste
hubbsi), peixe-sapo (Lophius gastrophysus), do Pará até o leste do Amapá, da costa até
abrótea-de-profundidade (Urophycis mysta- áreas com aproximadamente 50 metros de
20o0’0’’S 20o0’0’’S cea), calamar-argentino (Illex argentinus) e profundidade (Figura 18). As embarcações
galo-de-profundidade (Zenopsis conchifera) dessa frota no norte do Brasil são principal-
(VALENTIN; PEZZUTO, 2006). mente direcionadas para os camarões.

Figura 17. Rede de arrasto rebocada por apenas uma embarcação,


mostrando suas malhas, cabos, portas e saco.

25o0’0’’S 25o0’0’’S

Navio de arrasto

Abertura da
Saco Cabo mestre boca
30o0’0’’S 30o0’0’’S
Cabos varredouros

Cabo de Cabos de
fundo arrasto

35o0’0’’S 35o0’0’’S
Asa Portas de
arrasto

50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW


0 130 260 520 780 1.040 1.300 Fonte: Modificado de Sarmiento-Natafé et al. (2017)
Kilometers

Fonte: Elaboração dos autores, utilizando dados da Global Fishing Watch (https://globalfishingwatch.org/)

752 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 753


Figura 18. Interpolação do esforço de pesca (horas) para a frota brasileira 3. Considerações finais
(agrupados os anos de 2013 a 2021) que opera com rede de arrasto na ZEE brasileira
Inventários da frota pesqueira e o mo- embarcações no presente estudo, assim
55o0’0oW 50o0’0oW 45o0’0oW 40o0’0oW 35o0’0oW 30o0’0oW
nitoramento das áreas de atuação, assim como a distribuição e quantitativos de bar-
como os recursos capturados e sua pro- cos para as diferentes artes de pesca e sua
dução, são de extrema importância para distribuição espacial, representam um mar-
o ordenamento e planejamento espacial co no conhecimento da dinâmica dessas
0o0’0’’ 0o0’0’’ das atividades pesqueiras no Brasil. Essas frotas e, principalmente, referente às áreas
informações possibilitarão adotar medidas atuais de operação. Análises da distribui-
que visem à implementação de um siste- ção da frota ao longo dos anos e meses
ma de pesca sustentável e racional, nas serão realizadas no futuro próximo, contri-
5o0’0’’S 5o0’0’’S águas da Zona Econômica Brasileira. Ape- buindo ainda mais para gerar informações
sar da lacuna e carência de informações, abrangentes da exploração pesqueira nas
referentes aos recursos capturados e suas águas brasileiras.
produções, desconhecidos desde o ano de Ressalta-se ainda a necessidade para a
10o0’0’’S 10o0’0’’S 2011 com o encerramento da estatística expansão e desenvolvimento de um siste-
pesqueira nas águas marinhas brasileiras, ma de rastreamento de embarcações para
a parceria entre a Global Fishing Watch e a frota artesanal brasileira, cujas informa-
a Secretaria de Aquicultura e Pesca do Mi- ções serão cruciais, juntamente com a re-
nistério da Agricultura, Pecuária e Cadeia tomada das estatísticas pesqueiras na ZEE
15o0’0’’S 15o0’0’’S
de Abastecimento é uma grande oportu- brasileira, na construção de um inventário
nidade para o setor pesqueiro brasileiro abrangente dos recursos e biomassas explo-
promover a modernização da gestão da rados, da distribuição espacial e dinâmica
pesca na Zona Econômica Brasileira. temporal das frotas pesqueiras. Todas essas
20o0’0’’N 20o0’0’’N
Constitui-se ainda em um marco na informações tornarão a atividade pesquei-
análise da distribuição espacial das frotas e ra mais transparente e poderão garantir a
pode contribuir decisivamente com os sub- continuidade da cadeia produtiva marinha
sídios para o planejamento espacial e or- brasileira, contribuindo para manutenção
25o0’0’’S 25o0’0’’S denamento dessas pescarias. Informações e geração de proteína de alta qualidade,
como o número total de embarcações que conjugando tanto a sustentabilidade dos
atuam na frota pesqueira industrial e se- recursos pesqueiros quanto a garantia de
mi-industrial brasileira, estimadas em 597 alimento para as gerações futuras.
30o0’0’’N 30o0’0’’N
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o
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756 ECONOMIA AZUL A Exploração Pesqueira na Zona Econômica 757


36

TURISMO AZUL NO BRASIL: ASPECTOS


CONCEITUAIS E CARACTERIZAÇÃO

Eduardo Rodrigues Sanguinet


Karina Simone Sass

1. Introdução

O turismo é um importante setor preservados e revalorizados nessas regiões.


econômico, sendo considerado um rele- A análise econômica em turismo geral-
vante motor de crescimento e desenvol- mente se associa à importância das paisa-
vimento regional. Muito do setor turístico gens e das áreas costeiras como um atrativo
depende do capital natural, das belas pai- para promover a atividade turística a nível
sagens e das áreas marinhas e costeiras que local. Nesta linha, a Economia Azul, enten-
atraem viajantes de todo o mundo. Dados dida como o conjunto de atividades econô-
do Banco Mundial (2017) mostram que micas que utilizam recursos marinhos ou
o turismo desenvolvido nessas áreas gera fluviais de forma sustentável, é vista como
mais de 6,5 milhões de empregos no mun- uma possibilidade de expansão do cresci-
do todo e deve se tornar cada vez mais re- mento e desenvolvimento sustentável em
levante. Estima-se que até 2030 o turismo várias partes do mundo. No Brasil, Carvalho
costeiro e marinho constituirá o segmen- (2018) mostrou que as atividades econômi-
to de maior valor agregado da economia cas direta ou indiretamente relacionadas ao
das regiões oceânicas (EUROPEAN COMIS- mar geraram, em 2015, cerca de R$ 1,11
SION, 2021). No Brasil, por sua imensa área trilhão de produto interno bruto, ao mes-
de costa (aproximadamente 10.959 km de mo tempo que empregaram mais de 19
extensão), o padrão de desenvolvimento milhões de pessoas, com uma massa sala-
local de regiões costeiras e marítimas de- rial superior a R$ 500 bilhões. A demanda
pendem fortemente da atividade turística. final dos setores marinhos foi estimada em
Assim, promover o crescimento econômico R$ 1,3 trilhão, em que se destacam o se-
de forma sustentável é fundamental para tor de serviços, sobressaindo o conjunto de
garantir que os ecossistemas que susten- atividades econômicas ligadas ao turismo.
tam as oportunidades de turismo sejam Internacionalmente, a economia azul gera

758 ECONOMIA
758 AZUL
A ECONOMIA AZUL Turismo Azul
Turismo azul no
no Brasil
Brasil 759
759
cerca de US$ 1,5 trilhão por ano, corres- também para os esforços de conservação MCCORMICK, 2002), com o turismo rural riquezas naturais, a produção de energia
pondendo a aproximadamente 3% do valor ambiental das áreas azuis do país. (FARMAKI, 2012) e impactos sobre econo- limpa e o transporte marítimo (EUROPEAN
agregado mundial (WORLD BANK, 2021). Para contribuir com esta discussão, este mias regionais (HADDAD; PORSSE; RABAHY, COMISSION, 2021; TEGAR; SAUT GUR-
No Brasil, o Ministério do Turismo capítulo apresenta uma proposta de defini- 2013) também têm sido reportados. NING, 2018; TONAZZINI et al., 2019).
(MTUR, 2018) tem desenvolvido diferentes ção de turismo azul de acordo com as carac- Uma característica comum aos estudos Neste sentido, o turismo azul pode ser
estratégias regionais para o fortalecimento terísticas das economias das regiões brasi- em economia do turismo é o recorrente des- apontado como uma atividade econômica
e mapeamento do turismo, promovendo leiras. Este mapeamento é importante para taque ao nível de atratividade dos ambientes particularmente relevante para fomentar a
ações e políticas que busquem estimular o orientar a tomada de decisão em relação à costeiros, marinhos e marítimos (BATISTA economia azul, o que se reflete nos estu-
desenvolvimento regional baseado na ativi- valorização das riquezas naturais em torno E SILVA et al., 2021; SHARAFUDDIN; MA- dos aplicados ao campo econômico e social.
dade turística e revalorização das riquezas do turismo como uma das vertentes da eco- DHAVAN, 2020), principalmente em países Sharafuddin e Madhavan (2020) analisaram
naturais. No âmbito da economia azul, o nomia azul. A análise permitirá identificar a e regiões insulares e com fronteira marítima. a evolução dos temas de pesquisa relaciona-
papel das pequenas e médias empresas, localização das áreas potencialmente benefi- Os aspectos naturais do espaço costeiro e dos com economia e turismo azul entre 2000
da integração em cadeias de valor, a sus- ciadas pelo turismo azul, assim como revelar marítimo implicam uma maior disposição e 2019, apontando que os conceitos ecotu-
tentabilidade no contexto da mudança cli- onde os benefícios da atividade econômica a pagar por parte dos viajantes para visitar rismo, desenvolvimento do turismo, turismo
mática e gênero e da diversidade tornam-se estão ocorrendo e em que nível, contribuin- cidades costeiras, ou regiões naturalmente marinho, turismo de cruzeiros e sustentabili-
elementos de alcance da gestão do turismo do para uma melhor compreensão analítica compostas por praias, recifes de coral e dade, além de turismo costeiro e a indústria
azul. Para as regiões costeiras brasileiras, do setor de turismo, e orientar investimen- paisagens marítimas. Essas características de cruzeiros, evoluíram conjuntamente com
que são dependentes do turismo, a capita- tos de proteção aos sistemas naturais que do espaço marítimo e costeiro tornam es- os estudos aplicados de impacto econômi-
lização dos recursos marítimos e costeiros sustentam a própria atividade turística. tas regiões potencialmente atrativas para o co da atividade turística (BALLANTYNE; PA-
requer investimentos em manutenção da O capítulo está estruturado, além da fomento da economia do turismo azul. Tal CKER; SUTHERLAND, 2011; CATLIN et al.,
riqueza oceânica, com investimentos plane- seção introdutória, em mais cinco seções. atratividade regional costeira e marítima 2010; HOSANY; WITHAM, 2009; HUANG;
jados, gestão territorial marinha e políticas Na próxima, se apresenta uma revisão de tem sido ainda mais ressaltada desde a im- HSU, 2009). Essas características apontam
inclusivas que permitam comunidades lo- literatura sobre economia e turismo azul. plementação da Agenda 2030 para o De- para o potencial do turismo azul em gerar
cais serem beneficiadas do capital natural Na sequência, se apresenta uma definição senvolvimento Sustentável das Nações Uni- estruturas produtivas e desenvolvimento de
existente. No entanto, no Brasil, os estudos conceitual e uma métrica de especialização das, principalmente no contexto da econo- escala local (HUH; VOGT, 2007; LI; PETRICK,
aplicados em economia e turismo azul ainda regional em turismo azul para o Brasil. A mia azul. Em 2022, o enfoque de economia 2008; NUNKOO; RAMKISSOON, 2009), prin-
são incipientes, requerendo-se análises que seção 4 mostra os principais resultados da azul tem sido considerado uma importante cipalmente desde o ponto de vista de comu-
permitam mapear e caracterizar o potencial estimação, comparando-se regiões turísticas estratégia de desenvolvimento econômico nidades e das populações costeiras (DIEDRI-
econômico do turismo azul, de forma sus- azuis e não azuis em termos de aptidão à sustentável, em que distintas organizações CH; GARCÍA-BUADES, 2009)).
tentável. Esse conhecimento é importante atividade turística local. A última seção apre- mundiais e governos nacionais, principal- A pesquisa aplicada em turismo costei-
não apenas para a indústria do turismo, mas senta conclusões e considerações finais. mente na União Europeia, têm avançado ro e marítimo também reforça a ideia de
rapidamente na sua incorporação dentro do que o capital oceânico e cultural é capaz
2. Economia do turismo azul marco de desenho de políticas regionais de de motivar as famílias a decidir seus desti-
crescimento econômico sustentável. nos de viagens, em que a experiência com-
Esta seção apresenta o estado da arte ROGERSON, 2013), na economia costeira Em termos gerais, a economia azul pode portamental e econômica dos passageiros
da literatura enfocada em turismo, eviden- (MIKULIĆ; KREŠIĆ; KOŽIĆ, 2015), com enca- ser entendida como uma estrutura para o (tanto de cruzeiros como de outros meios
ciando como os estudos empíricos foram deamentos com o setor de transporte (EIJGE- desenvolvimento sustentável que considera de transporte) se reflete nos gastos em por-
evoluindo e incorporando elementos rela- LAAR; THAPER; PEETERS, 2010) e rodoviário os principais elementos dos ecossistemas. tos e no conjunto setorial econômico local
cionados com a economia azul. Em geral, os (ASAFU-ADJAYE; TAPSUWAN, 2008; NAVAR- Os oceanos são entendidos como espaços (LARSEN et al., 2013). A intenção compor-
estudos sobre os impactos econômicos do RO JURADO et al., 2012), assim como o papel de desenvolvimento, em que o planejamen- tamental nos locais de destino turístico con-
turismo se ampliaram a partir de 2010. Des- do turismo alternativo e ecológico (BOXILL, to espacial marítimo integra diferentes di- tribui para valorizar a gestão e o manejo das
tacam-se a contribuição da atividade turística 2003). Além disso, estudos relacionados com mensões, como a social, a conservação am- praias, assim como se relaciona com dispo-
no desenvolvimento regional e local (PILLAY; a preservação patrimonial (BESCULIDES; LEE; biental, o uso sustentável dos recursos e das sição a pagar dos atores locais e não locais

760 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 761


pela manutenção e melhoria na infraestru- aponta a potencialidade do turismo costeiro, Figura 1. Definição de turismo azul
tura dos destinos, que consequentemente marinho e marítimo no âmbito da economia
pode incrementar os efeitos intersetoriais azul. Ao conceitualizar a atividade econômi- Regiões com capital marítimo e costeiro
(BIRDIR et al., 2013). Outro aspecto relevan- ca turística azul como o uso sustentável dos
te se relaciona com a gestão do planejamen- recursos do oceano para o crescimento eco-
Atividade econômica típica Atividade econômica relacionada
to econômico e social das regiões costeiras nômico, considera-se que há capacidades
(RANGEL-BUITRAGO et al., 2013), em que locais que permitam fortalecer o emprego,
Turismo de praia e atividades recreativas, juntamente
se indica que o fomento a atividade turística ao mesmo tempo que dinamizar os sistemas Turismo costeiro  com outras atividades que ocorrem na costa e para as
é um importante motor para o desenvolvi- produtivos locais atrelando-se ao patrimô- quais a proximidade do mar é vantajosa
mento local. Neste sentido, a administração nio marítimo e cultural e à preservação dos
espacial e a gestão econômica dos destinos ecossistemas oceânicos. No entanto, apesar Turismo azul
turísticos é orientada a qualificar a estru- da evolução dos estudos em economia e tu- Turismo relacionado com atividades
tura de parques marinhos (SMALLWOOD; rismo azul, não há uma clara definição me- Turismo marítimo  predominantemente baseadas na água , como vela,
iate e cruzeiro, e outros esportes náuticos, muitas
BECKLEY; MOORE, 2012), de fomento ao todológica que permita padronizar as análi- vezes realizados em águas costeiras
fluxo turístico entre cidades, o que permi- ses comparativas associadas aos potenciais
te inclusive incrementar os encadeamentos econômicos do turismo azul. Neste sentido,
inter-regionais e o crescimento econômico a próxima seção busca apresentar uma defi-
(YANG; WONG, 2013). nição operacional de turismo azul que possa Fonte: Elaborado pelos autores
A relevância econômica e sustentável do ser aplicada para entender o seu potencial
turismo azul foi recentemente reforçada em econômico, e as diferenças regionais entre Nossa abordagem conceitual considera ao espaço elementos que, naturalmente, são
um relatório do Banco Mundial (2017), que áreas costeiras e não costeiras no Brasil. que o turismo azul cobre uma ampla gama costeiros e/ou marítimos. Outros atributos de
de atividades que revalorizam aspectos viagens turísticas, como aquelas de cruzeiros
3. Definição analítico-conceitual de turismo azul no Brasil naturais associados a elementos azuis em ou velas, ou mesmo de hospedagem, como
regiões costeiras e marítimas. Nesse senti- resorts ou ecoespaços, também são, direta
3.1 Conceito (2019), e a própria noção adotada pela do, dois conceitos se relacionam. O primei- e indiretamente, considerados no conceito
Batista e Silva et al., (2021) e EUROPEAN ro se relacionada à atividade econômica de de turismo azul. Além disso, atividades de
O turismo azul inclui conceitos associa- COMISSION (2021). Assim, o conceito turismo, que é definido desde a perspecti- lazer de base aquática e desportos náuticos
dos a economia azul e ao turismo propria- incorpora outras definições, como as de va da demanda, ou seja, como o resultado (muitas vezes realizados em águas costeiras)
mente. A operacionalização do conceito “turismo costeiro” e “turismo marítimo” econômico do consumo dos visitantes em são o mergulho, a pesca submarina, o esqui
deve incluir o turismo costeiro e marítimo (ECORYS, 2014) associados à Economia um determinado território. Incluem-se as aquático, o windsurf, os passeios a parques
– que estão intimamente relacionados aos Azul (TONAZZINI et al., 2019). Em particu- atividades econômicas associadas principal- marítimos, a observação de mamíferos selva-
elementos água e mar. Embora existam dis- lar, o turismo costeiro se refere ao turismo mente à hospedagem e ao lazer nos locais gens etc. No turismo marinho, enquanto a
tintas formas de turismo, o que se enten- de praia e atividades recreativas, incluindo de destino. O segundo conceito se associa à grande maioria das atividades ocorre no mar,
de por turismo azul constitui uma forma natação, banho de sol e surf, juntamen- atratividade natural dos territórios com ele- suas instalações de apoio e infraestrutura são
particular de turismo totalmente ligada e te com outras atividades que ocorrem na mentos azuis, como áreas costeiras e marí- geralmente encontrados em terra. Essas ins-
dependente do mar e do entorno marinho costa e para as quais a proximidade do timas. Desta forma, as unidades espaciais talações (infraestrutura) podem variar entre
e costeiro. O conceito que adotaremos de- mar é vantajosa, como passeios pela costa costeiras e marítimas possuem uma atrativi- portos e marinas (servindo cruzeiros, iates
fine, como mostra a Figura 1, o turismo ou observação da vida selvagem. Em com- dade turística natural ao território, o que ca- etc.), para operações de uma pessoa (por
azul como relacionado a todas as ativida- plemento, o turismo marítimo refere-se a racteriza o espaço turístico com os elementos exemplo, guias, instrutores etc.), empresas
des turísticas relacionadas com os oceanos, atividades predominantemente baseadas de economia azul. Além do mais, o conceito privadas de tamanho moderado ou mesmo
mares e costas, seguindo estudos recen- na água, como vela, iate e cruzeiro, e ou- permite considerar a atividade turística como grandes corporações (empresas de navios de
tes que vão na mesma linha argumenta- tros esportes náuticos, muitas vezes reali- um elemento relevante para o desenvolvi- cruzeiro etc.) (SCOTT; SIMPSON; SIM, 2012;
tiva, como Ecorys (2014), Tonazzini et al., zados em águas costeiras. mento local, principalmente se é imputada YANG; WONG, 2013).

762 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 763


3.2 Mapeamento e indicadores terísticas similares e/ou complementares e A segunda dimensão considerada se especialização em turismo das áreas cos-
aspectos em comum (identidade histórica, relaciona ao fato de uma região turística teiras em comparação às demais regiões
A ideia de avaliar a capacidade do tu- cultural, econômica e/ou geográfica), por no Brasil ser composta ou não por municí- turísticas do Brasil. Assim, chamemos de
rismo azul em potencializar as economias vezes compostos por diferentes municípios. pios costeiros. Essa definição leva em con- oit ao número de ocupados em setores
locais requer estratégias empíricas capazes Esses municípios se articulam, normalmente sideração a literatura de turismo costeiro e econômicos i ligados ao turismo na região
de dimensionar o tamanho relativo da ati- em uma instância de governança regional marítimo, em que se adota a classificação turística costeira (azul) t. O quociente lo-
vidade econômica nas regiões costeiras e para desenvolver o turismo de forma con- do IBGE de município costeiro.1 De acor- cacional do turismo na região turística t,
marinhas (NAVARRO JURADO et al., 2012). junta e regionalizada. Numa região turística do com o IBGE (2021), cerca de 26% da então, pode ser definido como:
Para o caso brasileiro, é necessário incor- podem existir municípios que não recebem população brasileira mora em municípios oit
porar a dimensão territorial dos espaços turistas, mas que se beneficiam da ativida- da zona costeira, o que equivale a aproxi-
∑oit
que são costeiros, ao mesmo tempo que de pelo fornecimento de produtos e servi- madamente 50,7 milhões de habitantes.
LQt = ∑ot (1)
devemos incorporar regiões que possuem ços. Este conceito se relaciona com a lógica Parte dessa população está ocupada em
características propícias ao turismo. Em es- do Programa de Regionalização do Turismo, atividades, direta ou indiretamente, liga- ∑o
pecífico, neste capítulo, consideram-se três que pressupõe a ideia de turismo territorial das ao turismo, à produção de petróleo e Onde:
integrado, uma vez que se assume que o tu-
.
aspectos principais: gás natural, pesca e serviços que atendem oit é o emprego no turismo na região turís-
rista é estimulado a permanecer mais tempo à dinâmica econômica gerada por esses tica costeira t
Definição de região turística, seguindo
na região, gerando mais recursos para os municípios e regiões próximas. ∑oit é o emprego no turismo em todas as
a classificação proposta pelo Ministério do
municípios envolvidos. Na prática, diferentes A terceira dimensão considerada identi- regiões turísticas (costeiras ou não);

.
Turismo (MTur).
municípios e governos locais já incorporam fica a relevância das atividades econômicas
∑ot é o emprego total na região turística t; e
Identificação de municípios costeiros essa lógica, por vezes adotando os termos ligadas ao turismo em relação ao total da
∑o é o emprego total das regiões turísticas
compondo a região turística, de acordo “circuitos”, “zonas” ou “polos” turísticos. atividade econômica nas regiões turísticas.
(costeiras e não costeiras).
com a classificação do Instituto Brasileiro A partir da identificação das Regiões Tu- Para isso, utilizaremos dados do mercado de
rísticas, o MTur adotou algumas variáveis trabalho para estimar a participação relativa Assim, valores de LQt>1 indicam espe-
.
de Geografia e Estatística (IBGE).
que traduzem a economia do turismo e as do emprego nos setores de hospedagem e cialização regional em atividades turísticas
Nível de atividade econômica dos municí-
utiliza para orientar a elaboração de políticas alojamento em cada região turística em re- em uma determinada região t e quanto
pios que compõem as regiões turísticas, re-
públicas voltadas a esse setor. Essas variáveis lação ao total setorial de cada região turís- maior o valor, maior a especialização da re-
lacionadas com setores ligados ao turismo,
são apresentadas na Tabela 1 e serão utili- tica e também em relação à participação de gião na referida atividade. Em outras pala-
especificamente hospedagem e alojamento.
zadas no âmbito desse trabalho para traçar cada região turística em relação ao total se- vras, a região t é relativamente mais impor-
Desta forma, adotaremos a definição de um panorama do turismo azul no Brasil, torial de todas as regiões turísticas do país. tante, dentre todas as regiões turísticas, em
regiões turísticas do MTur, que são enten- comparando-o com a turismo desenvolvido Desta forma, calcularemos um índice termos da participação relativa da atividade
didas como territórios que possuem carac- longe da costa (turismo não azul). similar ao quociente locacional (LQ), o turística do que em termos gerais de todos
que nos permitirá diferenciar o nível de os demais setores econômicos.
Tabela 1. Variáveis utilizadas para categorizar as regiões turísticas no Brasil

Variável . Fonte de coleta 4. Panorama do turismo azul no Brasil


Quantidade de estabelecimentos de hospedagem RAIS 2017 Para traçar um panorama do turismo Brasil, dessas, 58 são consideradas azuis,
Quantidade de empregos em Estabelecimentos de Hospedagem RAIS 2017 azul no Brasil são utilizadas as três dimen- de acordo ao descrito na Seção 3.2. Mais
sões discutidas anteriormente. Uma Região da metade das RTAs estão localizadas na
Quantidade estimada de visitantes domésticos MTur/FIPE Turística Azul (RTA) é uma Região Turística, região Nordeste (33), seguidas da região
Quantidade estimada de visitantes internacionais MTur/FIPE tal como definida pelo MTur, em que pelo Sudeste (13), da região Sul (8) e da região
menos um de seus municípios constituintes Norte (6). Dentre as RTAs se incluem áreas
Arrecadação de impostos federais a partir dos meios de Hospedagem Receita Federal-ME é costeiro, conforme informações do IBGE. de proteção ambiental, parques naturais,
Fonte: Ministério do Turismo (2021) O MTur definiu 333 regiões turísticas no áreas tombadas como patrimônio natural,

764 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 765


pequenos povoados e áreas metropolitanas parcela em relação ao total geral do Bra- preferência, tanto dos turistas internacionais país. A arrecadação de impostos com servi-
costeiras. A lista com as RTAs e suas locali- sil se encontra nas áreas de turismo não como nacionais, pelas áreas de turismo azul. ços de alojamento também é relativamente
zações foi inclusa no Apêndice A. azul. Por outro lado, as RTAs têm densidade Ambos os indicadores são bem maiores nes- maior nas RTAs, o que vai ao encontro das
Com o objetivo de identificar carac- populacional média e renda média (repre- sas áreas quando comparados com os indi- outras informações que apontam uma ativi-
terísticas únicas da atividade de turismo sentada pelo PIB per capita), superior às cadores das RTs localizadas no interior do dade de turismo maior nas RTAs.
desenvolvida ao longo da costa brasileira, áreas não azuis. A relativa maior densida-
é feita uma comparação das informações de populacional se deve a fatores físicos, Tabela 3. Dados relacionados ao turismo nas regiões turísticas azuis e não azuis
disponíveis entre as RTAs (costeiras) e as RTs pois são áreas delimitadas pelo oceano e
não azuis (não costeiras). Para começar, na por serras, e a fatores socioeconômicos, já
Variável Região Turística Azul Região Turística Não Azul
Tabela 2 são apresentadas alguns dados so- que muitas RTAs incluem regiões metropo- Participação (%) dos empregos em
cioeconômicos de ambas regiões de forma litanas onde a concentração de pessoas é alojamento no total de empregos 1,08 0,47
agregada.2 Pelos dados da referida Tabela, maior. A presença de regiões metropolita-
vê-se que em termos de concentração de nas também pode explicar porque a renda Participação (%) dos estabelecimentos
população e de riquezas (representadas média nas RTAs é relativamente maior que de alojamento no total de estabelecimentos 1,02 0,51
pelo produto interno bruto [PIB]), a maior nas RTs não azuis. Razão entre visitas internacionais e emprego
total (n° visitantes/total de empregos) 0,63 0,13
Tabela 2. Dados socioeconômicos das regiões de turismo azul e não azul, 2018
Razão entre visitas nacionais e emprego total
Variável Região Turística Azul Região Turística nãoAzul (n° visitantes/ total de empregos) 6,77 3,46

% na População Brasileira 18,11 59,36 Arrecadação pelo emprego total


(R$/ total de empregos) 148,74 61,77
% no PIB Brasileiro 19,48 66,56
Fonte: Elaborado pelos autores, com base em Ministério do
Densidade populacional (hab./km²) 180,27 28,61 Turismo (2021) e Ministério do Trabalho e Previdência (2022)

Por fim, para analisar a especialização de corais do mundo. Isso sugere que a pre-
PIB per capita médio (R$) 29.562,02 27.439,08
da atividade turística nas RTs brasileiras foi servação de ecossistemas e outros recursos
Fonte: Elaborado pelos autores, com base em IBGE (2021, 2022). calculado o para cada uma delas. Na Figu- naturais nessas regiões é de fundamental
ra 2 são apresentados os LQt das RTAs (os importância para o desenvolvimento de
A Tabela 3 faz uma comparação entre não azuis. Isso pode ser um indicativo da valores podem ser conferidos no Apêndi- atividades de turismo, pois são muito va-
regiões de turismo azul e não azul com base maior importância do turismo para a eco- ce A). As RTAs com os dois maiores LQt, lorizadas pelos visitantes. De outro lado, os
nas variáveis descritas na Tabela 1. Cada va- nomia local nas RTAs, quando comparado ou seja, regiões mais especializadas em menores valores (valores menores que 1),
riável foi ponderada individualmente para às RT não azuis. turismo, estão localizadas em estados da ou seja, regiões não especializadas em tu-
permitir uma comparação direta entre as Em relação aos visitantes internacionais região Nordeste: Costa do Descobrimento rismo, são da Região Turística das Florestas
regiões. Com base nessas informações, e nacionais, os indicadores utilizados (total (BA) e Costa dos Corais (AL). A Costa do do Marajó (PA) e do Polo Lagos e Campos
podemos visualizar um padrão distinto en- de visitas estimadas pelo emprego total da Descobrimento é uma área tombada pelo Floridos (MA), regiões que oferecem diver-
tre RTs azuis e não azuis. Primeiramente se região) apontam para dois padrões. Primei- Patrimônio Natural Mundial da Unesco e sas atividades ligadas ao ecoturismo.
nota que a participação dos empregos no ro, em ambas as regiões as visitas nacio- oferece diversos atrativos naturais como Essas evidências nos permitem supor
setor de alojamento no total de empregos nais se sobressaem às internacionais. Ou praias, baías, recifes de corais, manguezais, que destinos mais conhecidos de praia e
e a participação do número de estabeleci- seja, os turistas brasileiros são a maioria rios navegáveis, além de oferecer condi- que tradicionalmente recebem muitos tu-
mentos de alojamentos no total de esta- dos visitantes e provavelmente são os que ções para prática do turismo de aventura ristas, como os destinos da região Nordes-
belecimentos são relativamente pequenas mais contribuem para a geração de renda e ecoturismo.3 A Costa dos Corais é uma te, são os que apresentam maior grau de
em ambas regiões, porém, os valores nas e emprego vinculada ao turismo em to- área de proteção ambiental com 135 km especialização em atividades relacionadas
regiões azuis são quase o dobro das regiões das as RTs. O segundo padrão sugere uma de extensão, ela é a segunda maior barreira ao turismo. Da mesma maneira, destinos

766 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 767


menos conhecidos ou com menor nível de social (falta de acessibilidade das popula- Uma última análise baseada no LQt é que 1, enquanto entre as RTs não azuis
acesso logístico, como é o caso das RTAs ções a bens ou condições necessárias para a comparação dos valores médios das RTs o percentual está em torno de 33%. Isso
nos estados do Pará e Maranhão, não sustentar seu bem-estar). Assim, a promo- azuis e não azuis. Verificou-se que o valor vai ao encontro das demais informações
apresentam especialização na atividade ção do turismo e investimentos em infraes- na primeira (2,875) é mais que o dobro do apresentadas ao longo dessa seção. As
turística. Como mostrado por Curi e Ga- trutura turística podem auxiliar na melho- valor da segunda (1,111), sugerindo uma RTAs recebem relativamente mais turistas
salla (2021), municípios nessas áreas apre- ria desse indicador, ao proporcionar mais maior especialização em atividades de tu- e para atendê-los dispõe de mais infraes-
sentam elevado índice de vulnerabilidade oportunidade de emprego e renda. rismo nas áreas costeiras do que no inte- truturas de alojamento, o que as torna
rior do país. Além disso, dentre as RTAs, relativamente mais especializadas na ati-
Figura 2. Quociente locacional do turismo nas RTAs, 2017 mais de 60% delas tem quociente maior vidade turística.

5. Considerações finais

Dada a imensa costa brasileira e a im- calculados a partir de dados de mercado de


portância das atividades turísticas para o trabalho, número de visitantes nacionais e
desenvolvimento econômico dos muni- estrangeiros, número de estabelecimentos
cípios nela localizados, torna-se impor- de alojamento e arrecadação de impostos
tante uma caraterização do turismo azul. federais sugerem que as RTAs possuem
A contribuição deste capítulo foi propor uma especialização maior em atividades tu-
uma definição de turismo azul adaptada rísticas do que as RTs não azuis. Dentre as
ao contexto brasileiro e a partir dela e de RTAs, a especialização parece ser maior em
dados disponíveis, identificar característi- destinos de praia tradicionalmente conhe-
cas do turismo desenvolvido ao longo da cidos pelos brasileiros. Dentre as regiões
costa e diferenciá-lo daquele no interior não especializadas, encontram-se destinos
do território brasileiro. menos conhecidos nacionalmente ou onde
Definimos o turismo azul no Brasil o acesso é relativamente mais difícil. Estra-
como aquele composto pelo turismo cos- tégias de promoção do turismo no Brasil
teiro, que inclui as atividades realizadas devem então, atentar para essas questões
na praia, e pelo turismo marítimo, com- e verificar a possibilidade de implementar
posto pelas atividades desenvolvidas na políticas específicas para as áreas que de-
água (cruzeiros, vela etc.). Os indicadores senvolvem turismo azul.

Fonte: os autores

768 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 769


BOX 1. TURISMO AZUL E SUSTENTABILIDADE BOX 2. POTENCIAL DE ENCADEAMENTOS DO TURISMO AZUL

As atividades produtivas associadas ao turismo azul também incluem, direta e A atividade turística permite incrementar os encadeamentos com outros se-
indiretamente, os cruzeiros, os resorts e o ecoturismo, que podem produzir im- tores econômicos, o que contribui para o crescimento econômico local sinérgico e
pactos ambientais e sociais relacionados com a exploração dos recursos naturais e integrado. Os setores econômicos não vinculados ao turismo também se beneficiam
das próprias comunidades locais, por meio de mudanças no uso da terra, poluição indiretamente dos encadeamentos para trás e para frente, seja como fornecedor
marinha e do ar, alteração da biodiversidade e consumo de materiais ou serviços para outras indústrias e setores, seja como comprador de outros setores produtivos.
ecossistêmicos. Desse modo, em muitas regiões costeiras, o turismo é visto como Em nível de consumidores individuais, é intuitivo considerar que o agente econô-
motor de crescimento econômico e um meio para aumentar a riqueza e de promo- mico viajante demanda bens e serviços de outros setores da economia do destino
ver o desenvolvimento econômico em nível local. turístico, como hospedagem, alojamento, alimentação, consumo cultural etc. Neste
Desde uma perspectiva ampla da sustentabilidade – incluindo-se as dimen- sentido, o turismo azul permite que as áreas costeiras, marinhas e com paisagens
sões social, econômica e ambiental – o turismo baseado nas riquezas naturais naturais associadas a elementos da água sejam consideradas um potencial elemento
é um aspecto transversal. O fomento ao ecoturismo, por exemplo, seria uma de promoção de encadeamentos intersetoriais, o que também está de acordo com a
estratégia que permitiria integrar à economia azul ações concretas de revalori- definição de Região Turística adotada pelo Ministério do Turismo (2017).
zação do patrimônio cultural e natural dos oceanos, reduzindo assim as exter- Como enfoque de política pública, os vínculos intersetoriais entre o turismo e os
nalidades negativas nos territórios. Como consequência, esse fomento poderia demais setores da economia – como agricultura, manufatura e serviços – ganham
se converter em um conjunto mais amplo de efeitos positivos sobre as regiões uma outra perspectiva quando consideramos elementos azuis. Para além da visão
turísticas azuis (Scott et al., 2012). Nesta linha, Tegar e Gurning (2018) sugerem setorial, a literatura em economia dos negócios e do turismo aponta que em am-
que o enfoque em turismo azul pode garantir o desenvolvimento sustentável em bientes costeiros, marinhos e marítimos, o crescimento econômico local se associa
sentido ecológico e social, para além do puramente econômico. De acordo com ao fortalecimento de atividades operações e gestão de cruzeiros, turismo costeiro,
os autores, esse desenvolvimento poderia ser fomentado desde um modelo eco- gestão de acomodações costeiras, gestão de praias e atividades de lazer maríti-
nômico enfocado na sustentabilidade ecossistêmica que, por definição, contem- mas. Em termos de potenciais efeitos de encadeamento do turismo azul, podemos
plaria cinco princípios interdependentes: (1) eficiência dos recursos naturais; (2) considerar que dentro das dimensões sociais, econômicas, culturais, ambientais e
desperdício zero (circularidade); (3) inclusão social (autossuficiência, igualdade ecológicas há espaço para o fortalecimento e promoção dos encadeamentos liga-
social e oportunidades); (4) sistemas cíclicos de produção: geração sem fim à re- dos à segmentação de mercado, ao planejamento operacional e à eficiência, ao
generação, equilibrando produção e consumo, e (5) inovação aberta e adaptação comportamento de compra de gastos dos turistas, responsabilidade social corpora-
(princípios da lei da física e adaptação natural contínua). tiva azul4, além de ordenamento do território e do desenvolvimento comunitário.
Particularmente, o setor turístico é dependente das riquezas naturais e das No entanto, o setor turístico sofreu muito com a crise do covid-19, de forma a
paisagens marinhas para atender as preferências dos turistas e consumidores fomentar a discussão sobre abordagens inovadoras para o turismo sustentável e
finais dos setores associados à atividade turística. Ao depender da qualidade para as atividades de lazer que podem estar direta e indiretamente relacionadas.
dos ecossistemas naturais para atrair visitantes, é importante ter um olhar es- O turismo costeiro e marítimo depende fortemente das boas condições ambien-
pecífico para a dimensão da sustentabilidade nestas regiões. As empresas e os tais e, em particular, da boa qualidade da água. Qualquer atividade marítima ou
governos locais devem levar em consideração que o fortalecimento da institu- terrestre que prejudique o meio ambiente pode afetar negativamente o turismo.
cionalidade em torno da preservação do meio ambiente é algo favorável ao de- As áreas costeiras também podem ser diretas ou indiretamente afetadas por
senvolvimento econômico baseado na economia e no turismo azul. Portanto, o uma série de impactos relacionados às mudanças climáticas, como enchentes,
turismo costeiro e marítimo, como parte do turismo e economia azul, enfrenta erosão, intrusão de água salgada, aumento da temperatura do ar e da água do
desafios em nível local e global relacionados à interligação do turismo com o mar e secas. Além disso, os portos também são cruciais para o crescimento eco-
compromisso de sustentabilidade, como o Acordo de Paris ou a Agenda 2030 nômico das áreas costeiras e do interior. O transporte de passageiros e cruzeiros
e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), destacando-se o ODS é um meio importante para o desenvolvimento do turismo marítimo e costeiro,
14 de Conservação do Oceano. enquanto o transporte de mercadorias pode ser visto como uma atividade com-
petitiva em termos de espaço.

770 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 771


A forma como a atividade turística se vincula com outros setores pode ser vista Exemplo desta necessidade foi reconhecido durante a crise econômica e de saúde
como uma estratégia de desenvolvimento capaz de incrementar a sinergia interseto- associada a pandemia de covid-19. As áreas costeiras e turísticas experimentaram
rial, com boas práticas em estratégias de inovação, competitividade e sustentabilidade. um impacto econômico incrementado, principalmente em regiões fortemente de-
O turismo costeiro e as atividades de lazer estão inerentemente interligados, uma vez pendentes do turismo, implicando efeitos nos níveis de empregos formais e infor-
que a oferta recreativa presente no destino faz parte do produto turístico. Em conso- mais, principalmente decorrentes da redução dos gastos turísticos e na demanda
nância com isso, podem surgir sinergias por meio de atividades alternativas, incluindo por bens e serviços locais. Isso é ainda mais evidente em cidades costeiras de menor
ecoturismo e áreas marinhas protegidas. Pelo lado da economia azul, a coexistência tamanho, que possuem maior dependência do setor do turismo como empregador
do turismo azul com os demais setores, como a extração de recursos marinhos vivos e e impulsionador da atividade econômica. Por outro lado, uma possibilidade clara de
não vivos, pode representar um potencial de redução de conflitos espaciais diretos. Por atuação da política pública e do setor privado é capaz de impulsionar o turismo a
exemplo, energias renováveis marinhas, como parques eólicos offshore, podem ajudar curto prazo pós-pandemia de covid-19. É evidenciado na literatura que os turistas es-
a mitigar os impactos ambientais, reduzindo o carbono e outras emissões de gases de tão dispostos a pagar mais por férias mais seguras e ecológicas, o que seria uma ma-
efeito estufa, mas podem implicar uma compensação com benefícios estéticos. neira com a qual o turismo azul possa ser uma alternativa para o desenho de políticas
públicas que fomentem a geração de soluções de negócios ambientais sustentáveis,
associados à valorização social dos meios naturais e culturais costeiros e marítimos.
BOX 3. ÁREAS DE POLÍTICAS PARA FORTALECER O
POTENCIAL DO TURISMO AZUL
Referências
A economia azul oferece uma oportunidade para desenvolver investimentos
que sejam econômica e ambientalmente sustentáveis, de forma a fomentar o uso ASAFU-ADJAYE, John; TAPSUWAN, So- Tourism Management, v. 36, p. 279-283,
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economia azul foi desenvolvido para responder ao desafio de que o sistema eco- Ko Similan Marine National Park, Thailand. for Belize. International Journal of Con-
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No Brasil, algumas regiões são consideradas estratégicas para o desenvolvimento LAND, Lucy A. Visitors’ memories of wil- do Mar: Conceito, Valor e Importância
do turismo azul, em que se torna necessário avançar na revalorizacão do ecossiste- dlife tourism: Implications for the design para o Brasil. 2018. 1-183 f. 2018. Dis-
ma que forma a atividade econômica turística em territórios azuis. Neste sentido, é of powerful interpretive experiences. Tou- ponível em: http://tede2.pucrs.br/tede2/
importante promover o gerenciamento do crescimento econômico fundamentado rism Management, v. 32, n. 4, p. 770- handle/tede/7915.
na preservação dos ecossistemas que sustentam as oportunidades de fomento da 779, 1 ago. 2011. CATLIN, James et al. Discovering
atividade turística. Não obstante, o aproveitamento das riquezas marinhas e oceâ- BATISTA E SILVA, Filipe et al. A new Euro- wildlife tourism: a whale shark tou-
nicas requerem uma abordagem deliberada dos tipos de investimentos e de planifi- pean regional tourism typology based on rism case study. DOI: http://dx.doi.
cação desde a política pública em relação à dimensão espacial do mar, das zonas de hotel location patterns and geographical org/10.1080/13683500903019418, v.
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recursos torna-se mais sinérgico quanto à preservação e eficiência, o que deve ser CORMICK, Peter J. Residents’ perceptions so em: 12 jan. 2022.
considerado por parte das políticas de fomento de atividades produtivas. of the cultural benefits of tourism. Annals CURI, Rodrigo Luis Comini; GASALLA, Ma-
Embora seja bom para o desenvolvimento local, o aumento crescente de turis- of Tourism Research, v. 29, n. 2, p. 303- ria A. Social vulnerability and human deve-
tas em regiões turísticas costeiras e marítimas traz desafios em relação a encontrar 319, 1 abr. 2002. lopment of Brazilian coastal populations.
maneiras sustentáveis de aproveitar o potencial turístico dessas regiões. No en- BIRDIR, Sevda et al. Willingness to pay as Frontiers in Ecology and Evolution,
tanto, é importante fortalecer os encadeamentos de forma a diversificar a econo- an economic instrument for coastal tourism 2021, p. 473.
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772 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 773


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774 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 775


APÊNDICE A – REGIÕES TURÍSTICAS AZUIS NO BRASIL Macro região UF Região Turística Azul QL turismo
E QUOCIENTE LOCACIONAL DO TURISMO Norte PA REGIÃO TURÍSTICA AMAZÔNIA ATLÂNTICA GUAMÁ 0,439
Macro região UF Região Turística Azul QL turismo Norte AP REGIÃO TURÍSTICA CABO ORANGE 3,322
Nordeste BA BAÍA DE TODOS OS SANTOS 1,009 Norte PA REGIÃO TURÍSTICA DAS FLORESTAS DO MARAJÓ 0,044
Nordeste AL CAMINHOS DO SÃO FRANCISCO 0,970 Norte PA REGIÃO TURÍSTICA DOS CAMPOS DO MARAJÓ 2,802
Nordeste BA COSTA DAS BALEIAS 1,895 Norte AP REGIÃO TURÍSTICA MEIO DO MUNDO 0,419
Nordeste BA COSTA DO CACAU 4,728 Sudeste RJ BAIXADA VERDE 0,368
Nordeste BA COSTA DO DENDÊ 8,427 Sudeste RJ CAMINHOS DA MATA 0,282
Nordeste BA COSTA DO DESCOBRIMENTO 23,523 Sudeste SP COSTA DA MATA ATLÂNTICA 1,324
Nordeste BA COSTA DOS COQUEIROS 5,494 Sudeste RJ COSTA DO SOL 3,197
Nordeste AL COSTA DOS CORAIS 20,952 Sudeste RJ COSTA DOCE RJ 0,585
Nordeste PE COSTA NÁUTICA COROA DO AVIÃO 0,554 Sudeste ES COSTA E DA IMIGRAÇÃO 1,523
Nordeste CE FORTALEZA 0,638 Sudeste RJ COSTA VERDE 5,383
Nordeste AL GRANDE MACEIÓ 1,859 Sudeste SP LAGAMAR 2,480
Nordeste PE HISTÓRIA E MAR 1,511 Sudeste SP LITORAL NORTE DE SÃO PAULO 9,719
Nordeste PE HISTÓRICA, DOS ARRECIFES E MANGUEZAIS 1,593 Sudeste ES METROPOLITANA ES 0,418
Nordeste AL LAGOAS E MARES DO SUL 1,371 Sudeste RJ METROPOLITANA RJ 1,202
Nordeste CE LITORAL EXTREMO OESTE 11,205 Sudeste RJ SERRA VERDE IMPERIAL 2,023
Nordeste CE LITORAL LESTE 3,160 Sudeste ES VERDE E DAS ÁGUAS 0,926
Nordeste CE LITORAL OESTE 2,062 Sul SC CAMINHO DOS CANYONS 0,620
Nordeste MA POLO SÃO LUÍS 0,654 Sul SC CAMINHO DOS PRÍNCIPES 0,514
Nordeste MA POLO AMAZÔNIA MARANHENSE 0,223 Sul RS COSTA DOCE RS 0,908
Nordeste RN POLO COSTA BRANCA 1,127 Sul SC COSTA VERDE & MAR 3,535
Nordeste RN POLO COSTA DAS DUNAS 2,530 Sul SC ENCANTOS DO SUL SC 2,376
Nordeste PI POLO COSTA DO DELTA 3,138 Sul SC GRANDE FLORIANÓPOLIS 2,106
Nordeste SE POLO COSTA DOS COQUEIRAIS 1,309 Sul PR LITORAL DO PARANÁ 1,789
Nordeste MA POLO DELTA DAS AMÉRICAS 0,172 Sul RS LITORAL NORTE GAÚCHO 2,247
Fonte: os autores
Nordeste MA POLO FLORESTA DOS GUARÁS 0,123 Notas
Nordeste MA POLO LAGOS E CAMPOS FLORIDOS 0,082
Nordeste MA POLO LENÇÓIS MARANHENSES 4,919 1 Entende-se como o arranjo espacial dos mu- soma dos dados de seus respectivos municípios.
nicípios que atendem ao inciso I, do Artigo 4° 3 https://www.guiadoturismobrasil.com/rotei-
Nordeste MA POLO MUNIN 0,920 da Seção I do Capítulo II do Decreto 5300 de ro/9/costa-do-descobrimento-bahia.
Nordeste PB ROTA SANHAUÁ 0,659 7/12/2004 que determinou que municípios “... 4 Entendida como a toma de decisão por par-
Nordeste PB TRILHAS DOS POTIGUARAS 0,474 defrontantes com o mar, assim definidos em te de administradores de negócios que sejam
listagem estabelecida pela Fundação Instituto enfocadas em garantir que o desenvolvimen-
Nordeste PB TRILHAS DOS TABAJARAS 3,508
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE”. to econômico do oceano contribua para a
Norte PA REGIÃO TURÍSTICA AMAZÔNIA ATLÂNTICA CAETÉ 2,602 2 A agregação dos dados por RTs foi feita pela verdadeira prosperidade dos territórios.

776 ECONOMIA AZUL Turismo azul no Brasil 777


37

PANORAMA DAS OCUPAÇÕES DAS REGIÕES


METROPOLITANAS (RM) LITORÂNEAS
ASSOCIADAS À ECONOMIA DO MAR E
COSTEIRA

Andreia Pereira de Freitas


Taíssi Pepe de Medeiros Farias
Andréa Bento Carvalho

1. Introdução

Sem fazer muito ruído, quase não são 72 convenções/recomendações afetas ao


vistos nos veículos de imprensa, trabalham trabalho marítimo.
diuturnamente, são corajosos, enfrentam É inegável a relevância dos trabalhadores
temores, são responsáveis por sustentar do mar e costeiros para um país como o
uma cadeia logística global, ou responsá- Brasil, que possui uma extensa zona costeira
veis pela subsistência da comunidade local, composta por 17 estados litorâneos, soman-
empreendedores, movidos pelo espírito do 443 municípios (MMA, 2021) e, destes,
científico, sagazes, aventureiros, navegan- 280 são defrontantes com o mar.
tes: essa seria uma tentativa de descrever Neste sentido torna-se necessário expor
os trabalhadores do mar brasileiro. o conceito de zona costeira para o Bra-
De acordo com o Compendium of Ma- sil. De acordo com o Decreto Presidencial
ritime Labor Instruments (3. ed., 2021), a 5300/2004, a zona costeira brasileira é con-
Convenção do Trabalho Marítimo (MLC, siderada patrimônio nacional pela Consti-
em inglês), que entrou em vigor em 20 de tuição de 1988, correspondendo ao espaço
agosto de 2013, foi um marco de desen- geográfico de interação do ar, do mar e da
volvimento para o setor mais globalizado terra, incluindo seus recursos, renováveis
do mundo, o setor marítimo. O Compe- ou não. Ela abrange uma faixa marinha –
dium reconhece os desafios de viver, tra- entendida como o espaço que se estende
balhar e conduzir negócios no mar. Desde por doze milhas náuticas medidas a partir
1920, foram adotadas, pela Organização das linhas de base,1 estabelecidas de acordo
Internacional do Trabalho (ILO, em inglês), com a Convenção das Nações Unidas sobre

778 ECONOMIA
778 AZUL
A ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 779
o Direito do Mar (CNUDM) – compreenden- Em decorrência de tal proposta, o ca- Existem ocupações que podem ser mais e caça”. Optou-se por tal recorte exemplifi-
do a totalidade do mar territorial2 e uma pítulo está dividido em 7 seções, além da facilmente identificadas como atreladas ao cativo pelo nível de agregação apresentada
faixa terrestre, que corresponde ao espaço introdutória. A segunda seção dedica-se mar e à costa. O recorte estratificado do pela fonte consultada. Ou seja, as ocupa-
compreendido pelos limites dos municípios a exemplificar algumas classificações das setor aquaviário e pesca e caça é apresen- ções relacionadas ao transporte e pesca
que sofrem influência direta dos fenômenos ocupações adotadas em países de três di- tado na Tabela 1: “trabalhadores do trans- estão desagregadas, possibilitando a visu-
ocorrentes na zona costeira. ferentes continentes; a terceira refere-se a porte aquático” e “trabalhadores da pesca alização direta dos dados.
A zona costeira brasileira, conforme a apontamentos sobre as ocupações formais
Portaria MMA no 34, de 2 de fevereiro de associadas ao mar e a costa das RM lito- Tabela 1: Recorte e perspectiva estratificada do setor aquaviário
2021, possui 443 municípios. Este capítulo râneas; a quarta seção traça um perfil das e da pesca e caça nos EUA
apresenta o perfil do trabalhador associa- ocupações formais das RM Litorâneas re- Ocupações Código Empregados Projeção Variação
dos às atividades litorâneas da zona costei- lacionadas à Economia do Mar e Costeira; SOC[i] 2020 Emprego 2020/2030 (%)
ra metropolitana brasileira. Neste sentido, a quinta, fala da participação feminina nas
Trabalhadores do
serão abordados aspectos das ocupações RM litorâneas da Economia do Mar e Cos- transporte aquático (Total) 53-5000 66,7 74,5 12
classificadas como costeiras e do mar brasi- teira; e a sexta apresenta uma comparação
Marinheiros e petroleiros marinhos 53-5011 26,4 29,2 10
leiro, considerando variáveis como: escola- entre a Economia do Mar e Costeira das
ridade, gênero, idade, salário, admitidos e RM Litorâneas e a Economia Nacional, por Capitães, oficiais de convés e
desligados a luz da RAIS e CAGED. fim as conclusões a que se chegaram. pilotos de embarcações 53-5021 29,9 33,9 13
Operadores de lanchas 53-5022 2,6 3 15
2. Considerações sobre ocupações relacionadas ao mar e costa em três Engenheiros de navios 53-5031 7,8 8,4 8
continentes heterogêneos Trabalhadores da pesca e caça
(Total) 45-3031 32,3 35,8 11
A subseção pretende exemplificar que não estão definidos na CIUO-08, pois espe- Fonte: Adaptado do Escritório de Estatísticas do Trabalho dos EUA,
países diferentes podem ou não adotar ra-se que os próprios países desenvolvam programa de projeções de emprego (2022). (Tradução Livre)
classificações ocupacionais semelhantes, esse subnível de detalhe conforme as suas
conforme especificidades e necessidades, necessidades. Há diversos países que ado- Observa-se na Tabela 1 a previsão de e (iv) profissões emergentes identificadas
à luz da classificação internacional. Des- tam a referida classificação, o que facilita criação de empregos no transporte aqua- pela Comissão Nacional de Competências.
taca-se que a proposta não é esgotar in- o alinhamento das informações referentes viário em 12% no período de 2020 a 2030 A ANZSCO 2021 estruturou-se em oito
teiramente o debate, e sim exemplificar entre os Estados, e, em alguns casos, ha- (acima da média de crescimento de todas grandes grupos ocupacionais, 43 subgru-
como os referidos dados sobre ocupações bilitando a comparabilidade internacional. as ocupações da economia estadunidense, pos principais e 1070 ocupações, diferen-
são apresentados em variadas nações. Ou Adiante, observam-se alguns exemplos estimada em 8%). Espera-se que muitas temente da CIUO-08, que apresenta dez
seja, expor o quão complexo pode ser de classificações e comparações entre 5 vagas resultem da necessidade de substi- grandes grupos como já mencionado ante-
identificar as ocupações dos trabalhadores nações. tuir trabalhadores que se transferem para riormente. Além disso, a ANZSCO propõe
de um país, associadas à costa e ao mar, diferentes ocupações ou saem da força de para os cargos ocupados por membros das
dificultando a quantificação, qualificação e 2.1 Estados Unidos trabalho, devido à aposentadoria. forças armadas classificações equivalentes
comparabilidade do mercado de trabalho a civis, quando existentes, ou por outras
propriamente dito. O programa de Estatísticas de Emprego 2.2 Austrália e Nova Zelândia ocupações específicas das forças de defesa.
A Classificação Brasileira de Ocupações e Salários Ocupacionais (OEWS) do Depar- Assim, na Tabela 2 exemplifica-se duas
(CBO) segue a Classificação Internacional tamento do Trabalho dos Estados Unidos A Classificação Padrão de Ocupações ocupações australianas relacionadas a ocu-
Uniforme de Ocupações (CIUO), preconi- produz anualmente estimativas de empre- da Austrália e da Nova Zelândia3 (ANZS- pações marítimas e costeiras. Optou-se por
zada pela Organização Internacional do go e salário para mais de 800 ocupações. CO) foi atualizada em 2021 e apresenta este recorte pois tratam-se de ocupações
Trabalho (OIT), atualizada no ano de 2008 Essas estimativas estão disponíveis para a ocupações associadas a quatro áreas prio- que podem mais facilmente ser identifi-
(CIUO-08) contendo dez grandes grupos nação, estados, áreas metropolitanas e não ritárias: (i) agricultura, silvicultura e pesca; cadas como atreladas ao mar e à costa na
ocupacionais. Os subníveis de “ocupação” metropolitanas. (ii) cibersegurança; (iii) construção naval; fonte consultada.

780 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 781
Tabela 2: Exemplo de ocupações marítimas e costeiras Tabela 3: Comparativo entre a Classificação Ocupacional Internacional
na Austrália (milhar) e a Classificação do Canadá

Ano 2019 2020 2021 Variação Primei Classificação Internacional Uniforme NOC 2021 Versão 1.0 –
ro de Ocupações Versão 2008 (CIUO-08) Categorias Ocupacionais
2019/2021
Dígito – Grandes Grupos Ocupacionais Amplas
(%)
1 Gerentes Ocupações de negócios,
Grupo Ocupações nov ago mai fev nov ago mai fev nov ago mai fev finanças e administração
1211 Aquicultores 3,2 1,7 2,5 3 1,1 1,5 2,2 1,9 3,8 0,2 1,5 1 19 2 Profissionais Ciências Naturais e Aplicadas e
profissões afins
2312 Profissionais
3 Técnicos e profissionais associados Ocupações de saúde
do Transporte 4 Trabalhadores de apoio Ocupações em educação, direito
Marítimo 10 9 6,8 9 9,5 9,1 8,3 11 13 9,7 5,8 7 21 administrativo e serviços sociais,
comunitários e governamentais
Fonte: Adaptado do Escritório Australiano de Estatísticas (2022). (Tradução Livre)
5 Trabalhadores de serviço e vendas Ocupações em arte, cultura,
recreação e esporte
6 Trabalhadores qualificados da Ocupações de vendas e serviços
2.3 Portugal 2.4 Canadá agricultura, silvicultura e pesca
7 Trabalhadores artesanais es Comércios, operadores de
A Classificação Portuguesa de Profis- A Classificação Ocupacional Nacional relacionado transporte e equipamentos e
sões 2010 (CPP 2010) está integrada à do Canadá (NOC) passou por uma exten- ocupações relacionadas
CIUO-08 e organiza-se em 43 subgrupos sa revisão em 2021, nomeado NOC 2021 8 Operadores de plantas e máquinas Recursos naturais, agricultura e
principais e 708 ocupações. A atualização versão 1.0. O NOC 2021 apresenta uma e montadores ocupações de produção
realizada no ano de 2010 permitiu obter nova estrutura hierárquica de 5 dígitos, re- relacionadas
ganhos de qualidade e de relevância es- visando e introduzindo a estrutura “nível 9 Ocupações elementares Ocupações em manufatura e
tatística, segundo o Instituto Nacional de de habilidade” (skill level) que representa serviços públicos
Estatística (INE) de Portugal. o grau de Treinamento, Educação, Experi- 0 Ocupações das forças armadas Ocupações legislativas e de alta
Embora os dados para ocupações não ência e Responsabilidades (TEER) necessá- administração
sejam divulgados, a exemplo dos demais rio para uma ocupação. Assim, o primeiro Fonte: Adaptado da Agência de Estatística do Canadá e Escritório de Estatísticas do
países, é possível extrair o número de dígito identifica a ocupação e o segundo Trabalho dos EUA, programa de projeções de emprego (2022)

trabalhadores por atividade econômica, dígito identifica o TEER, ambos chama-
assim como a remuneração bruta men- dos de Grupo Principal. Organiza-se em Em relação à classificação do Cana- em uma ocupação. Desse modo, per-
sal média por trabalhador (total, regular 89 subgrupos principais e 516 ocupações. dá, as categorias foram definidas com cebe-se que no Canadá há uma agen-
e base) e uso de tecnologia e intensidade Contudo, não foi possível localizar dados a base no setor de emprego e na área da de relação intrínseca entre educa-
do conhecimento. respeito do número de trabalhadores com de estudo necessária para o ingresso ção e trabalho.
base na classificação atualizada.
Abaixo, apresenta-se uma Tabela com- 3. Apontamentos sobre as ocupações formais relacionadas ao
parativa entre grupos ocupacionais da clas- mar e costa das RM litorâneas
sificação internacional e aqueles da classifi-
cação canadense. No presente panorama constam 176 regulamentado pela Portaria MMA N. 34
municípios que compõem a RM litorânea, de 2 de fevereiro de 2021 do Ministério
de acordo com a listagem dos municípios do Meio Ambiente (MMA) – Anexo 1.
da zona costeira brasileira (municípios) Tal exercício se justifica pela marcante

782 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 783
concentração industrial que se desenvol- 2.0 – classe) selecionadas pela referida au- Setor Atividade Código
ve, em especial, nas regiões metropoli- tora, foram agregadas cinco atividades em CNAE
tanas, corroborado pelo Macro Diagnós- função da amostra de municípios reuni- Manufatura Fabricação de máquinas e equipamentos para a prospecção e 28.51-8
tico das Zonas Costeiras (2008). O fluxo rem aqueles banhados exclusivamente por extração de petróleo
derivado destas indústrias necessita de águas interiores, totalizando 45 atividades Construção de embarcações e estruturas flutuantes 30.11-3
uma logística estruturada que certamente econômicas. Além da inserção tratada an- Construção de embarcações para esporte e lazer 30.12-1
concorre com espaços já demandados por teriormente, foi incorporado o município Fabricação de artefatos para pesca e esporte 32.30-2
outras atividades, por exemplo, transpor- de Paranaguá no estado do Paraná ao re- Manutenção e reparação de embarcações 33.17-1
te, setor petrolífero, recreação e serviços corte espacial das RM. Embora não esteja Incorporação de empreendimentos imobiliários 41.10-7
(com destaque para o turismo). incluso nas RM do estado do Paraná, trata- Obras portuárias marinhas e fluviais 42.91-0
Na pesquisa são utilizadas as classes das -se de importante vetor de desenvolvimen- Transporte Transporte marítimo de cabotagem 50.11-4
atividades econômicas (CNAE 2.0 – Classe) to da Economia do Mar e Costeira nacio- e Logística Transporte marítimo de longo curso 50.12-2
diretamente relacionadas ao mar, ou seja, nal, em especial pelo setor portuário. Transporte por navegação interior de carga 50.21-1
do escopo dimensão marinha (CARVALHO, Sendo assim, as variáveis como escola- Transporte por navegação interior de passageiros em linhas 50.22-0
2018) associadas à Classificação Brasileira ridade, gênero, idade, salário, admitidos e regulares
de Ocupações (CBO – Família). Seguindo desligados podem ser individualmente apre- Navegação de apoio 50.30-1
o expediente de Carvalho (2018), para a sentadas através das bases de dados RAIS Transporte por navegação de travessia 50.91-2
presente pesquisa foi escolhido o escopo e complementados pelos fluxos expressos Transportes aquaviários não especificados anteriormente 50.99-8
dimensão marinha por compreenderem pelo CAGED/MTE. A Tabela 4 apresenta os Gestão de portos e terminais 52.31-1
as atividades que apresentam ligação di- setores e atividades da Economia do Mar e Atividades de agenciamento marítimo 52.32-0
reta com o mar, constituindo-se a catego- Costeira, bem como os códigos, conforme a Atividades auxiliares dos transportes aquaviários não 52.39-7
ria mais importante da Economia do Mar CNAE 2.0. Para tanto, as ocupações foram especificadas anteriormente
e Costeira brasileira. Para tanto, além das classificadas por intermédio da Classificação Serviços Hotéis e similares 55.10-8
40 classes de atividades econômicas (CNAE Brasileira de Ocupações (CBO) 2002 Família. Outros tipos de alojamento não especificados anteriormente 55.90-6
Restaurantes e outros estabelecimentos de serviços de 56.11-2
Tabela 4: Setores e atividades CNAE alimentação e bebidas
Serviços ambulantes de alimentação 56.12-1
Setor Atividade Código Atividades imobiliárias de imóveis próprios 68.10-2
CNAE Intermediação na compra venda e aluguel de imóveis 68.21-8
Aluguel de equipamentos recreativos e esportivos 77.21-7
Pesca e Pesca em água salgada 03.11-6 Agências de viagens 79.11-2
Aquicultura Pesca em água doce 03.12-4 Operadores turísticos 79.12-1
Aquicultura em água salgada e salobra 03.21-3 Serviços de reservas e outros serviços de turismo não 79.90-2
Aquicultura em água doce 03.22-1 especificados anteriormente 93.29-8
Preservação do pescado e fabricação de produtos do pescado 10.20-1 Atividades de recreação e lazer não especificadas
Extração e Extração de petróleo e gás natural 06.00-0 anteriormente 93.11-5
Energia Atividades de apoio à extração de petróleo e gás natural 09.10-6 Gestão de instalações de esportes
Atividades de apoio à extração de minerais exceto petróleo e 09.90-4 Clubes sociais, esportivos e similares 93.12-3
gás natural Defesa Defesa 84.22-1
Extração de pedra, areia e argila 08.10-0
Extração e refino de sal marinho e sal-gema 08.92-4 Fonte: Adaptado de Carvalho (2018). Elaboração própria com base nos dados da CNAE 2.0.

Extração de gemas (pedras preciosas e semipreciosas) 08.93-2 Observamos na Tabela 4 que, mesmo espontânea com recurso natural alvo do
as atividades que não possuem ligação estudo, mas são desenvolvidas no litoral,

784 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 785
apresentam agregação de valor, seja por cadas pelo presente capítulo (Tabela 4) –
fruto da localização, seja por ofertarem perfazendo 0,71% do total de postos de Gráfico 2: Ocupações com maiores fluxos do emprego formal por setor
produtos ou serviços que se beneficiam trabalho gerados no Brasil. do mar e costa – ano de 2019
do habitat em algum dos estágios de No Gráfico 1, verifica-se o comporta-
suas operações. Além disso, diversas ati- mento do saldo das ocupações por setor
Ocupação com Maior Saldo por Setorcom Maior Saldo por Setor
Ocupação
vidades apresentadas são recorrentes nos de atividades relacionadas ao mar e cos- 7000 7000
estudos dos principais países da presente ta nas RM litorâneas no ano de 2019. Por 6000
Ocupação Setor Saldo
6000 Pescadores de Água Costeira e
pesquisa. Por exemplo, as atividades off- meio dele podemos notar que o setor de 5000
A
Alto Mar
Pesca e Aquicultura -251
5000
shore e as ligadas ao turismo, como ho- Pesca e Aquicultura apresentou mais des- 4000 Trabalhadores da Extração de
4000 B Extração e Energia 108
Minerais Líquidos e Gasosos
téis e restaurantes. ligamentos do que admissões no período, 3000
3000
Trabalhadores da Navegação
tornando o saldo negativo, a exemplo do 2000 C
Marítima, Fluvial e Regional
Manufatura -43
2000
3.1 Fluxo dos trabalhadores: CAGED setor de Manufatura. Embora na econo- 1000 D
Trabalhadores da Navegação Transporte e
314
1000 Marítima, Fluvial e Regional Logística
mia nacional observe-se a criação de em- 0
Garçons, Barmen, Copeiros e
A B C 0 D E F E Serviços 6084
No ano de 2019 foram gerados 3.947 pregos formais na indústria, para o recorte -1000 A B C Sommeliers
D E F
-1000 F Defesa Defesa 0
postos de trabalho nas RM litorâneas em das ocupações elencadas como do mar e -2000
-2000
setores relacionados às atividades elen- costeira o destaque foi negativo.
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do CAGED/MTE (2022)

Gráfico 1: Saldos do emprego formal relacionados aos setores do mar e costa –


ano de 2019
Já no setor de serviços, as ocupa- os fluxos da categoria respondem por
5.000
5.000 ções garçom, barmen, copeiro e som- 39.026, e no ano de 2019 no fluxo de
melier registram o maior fluxo positivo trabalho intermitente contabilizou-se
4.000 no período. Ressalta-se que no Brasil 3.614 e regime parcial 891.
4.000

3.000
3.000
Gráfico 3: Fluxos de maiores destaques do emprego formal relacionados
2.000 às ocupações dos setores do mar e costa – ano de 2019
2.000

1.000 Occupation with the Largest Balance by Sector


1.000 7000
Ocupações com maiores saldos Saldos
Ocupações com maiores sald
6000

00 5000 Garçons, Barmen, Copeiros e Garçons, Barmen, Copeiros e


A A 6077
4000
Sommeliers Sommeliers
Pesca e Extração e Manufatura Transporte e Serviços Defesa
Agricultura Energia Logística 3000
Gerentes de Operações de Turismo, Gerentes de Operações de T
-1.000
-1.000 B B -1490
2000 Alojamento e Alimentação Alojamento e Alimentação
1000
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do CAGED/MTE (2022)
0 Supervisores dos Serviços de Transporte, Supervisores dos Serviços de
A B C C Turismo, Hotelaria e Administração e C Turismo,
-691 Hotelaria e Admini
Por outro lado, o setor de serviços foi Dentre os setores com saldos negativos, -1000
Edifícios Edifícios
o que mais criou empregos na esteira as ocupações pescador de água costeira -2000

do observado na economia nacional. O e alto-mar e trabalhador da navegação Source: Own elaboration based on CAGED/MTE data (2022
Gráfico 2 mostra os maiores saldos das marítima, fluvial e regional apresentam
ocupações nos seis setores considerados. as maiores quedas.

786 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 787
Observa-se que as ocupações estão rela- pode-se inferir que tal setor seja um dos Gráfico 4: Faixa Etária, Escolaridade e Faixa Salarial das ocupações formais
cionadas ao setor de serviços. Tratando-se grandes responsáveis por esta dinâmica no prevalentes do Setor de Pesca e Aquicultura nas RM litorâneas – ano 2019
das localidades com forte apelo turístico, mercado em questão.
Faixa Etária Escolaridade Faixa Salarial
4. Perfil das ocupações: CBO 600
500
800
600
1200

400 800
400
300 400
200 200
0
4.1 Pesca e Aquicultura Anexo 2 encontra-se a Tabela 6 indican- 100
0
0
M C T U N Outras
M C T U N Outras

M C T U N Outras
do as 22 ocupações que formam o setor, Analfabeto Até 5ª Incompleto
Não Ativ Dez
1,01 a 1,50 SM
Até 0,50
1,51 a 2,00 SM
0,51 a 1,00 SM
2,01 a 3,00 SM
5ª Completo Fundamental 6ª a 9ª Fundamental
No setor de Pesca e Aquicultura há que também podem ser visualizadas na
15 A 17
25 A 29
18 A 24
30 A 39 Fundamental Completo
Médio Completo
Médio Incompleto
Superior Incompleto
3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM
40 A 49 50 A 64
predominância do gênero masculino Figura abaixo à direita, apontadas pelas 65 OU MAIS
Superior Completo
Doutorado
Mestrado
7,01 a 10,00 SM
Mais de 20,00 SM
10,01 a 15,00 SM
{ñ class}
15,01 a 20,00 SM

(99%), como demonstra a Figura 1. No letras A a V.


Ocupações mais prevalecentes no Setor de Pesca e Aquicultura Homens Mulheres Total

C Criadores de animais aquáticos 413 9 422


Figura 1: Ocupações formais do setor de pesca e aquicultura 2038 9 2047
M Pescadores de Água Costeira e Alto Mar
nas RM litorâneas - ano 2019 89 3 92
N Pescadores Polivalentes

T Técnicos Marítimos, Fluviários e Regionais de Convés 410 1 411

Gênero dosGênero
Trabalhadores
dos Trabalhadores
e Ocupaçõese Ocupações
do do U Trabalhadores de Apoio ao Extrativismo da Pesca 175 2 177
A B A B
Setor de Pesca e Aquicultura
Setor de Pesca e Aquicultura C D C D
Outras Soma das demais ocupações do Setor 212 22 234
12% 5% 12%
12% 5% 12%
E F E F Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)
G H G H
Mulheres Mulheres
1% 1%
I J I J 4.2 Extração e Energia
K L K L
M N M N
61% 61%
O P O P
Direcionando a análise para as ocupações (Anexo 2, Tabela 7), somente duas (biólo-
Homens Homens contempladas pelo Setor Extração e Energia,
99% 99%
Q R Q R gos e afins; garçons, barmen, copeiros e
S T S T
observa-se maior diversidade de funções e sommeliers) apresentam destaque para o
U V U V
concentração do gênero masculino. gênero feminino, e empate em outra (en-
Dentre as 28 ocupações apontadas genheiros ambientais e afins).
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)

Figura 2: Ocupações formais do setor extração e energia nas RM litorâneas –


Através da Figura 1 registra-se que as a 64 anos) e 26% intermediária (30 a 39
ano 2019
ocupações predominantes do setor são: anos). Na sequência, a ocupação criado-
(i) pescadores de água costeira e alto-mar res de animais aquáticos apresenta quase
(61%); (ii) criadores de animais aquáticos 35% dos seus trabalhadores Gênero dos Trabalhadores
na faixa in- e Ocupações Gênero dos Trabalhadores e Ocupações
9% A B 9% A B
C D C D
e (iii) técnicos marítimos, fluviários e regio- termediária (30 a 39 anos). Com do relação
Setor de Extração e Energia do Setor de Extração e Energia 20% E F 20% E F
G H G H
nais de convés (12% ambos). à escolaridade, no Gráfico 4 é possível 25% I J 25% I J
Mulheres Mulheres
No tocante à faixa etária, há prevalên- observar que essas ocupações apresen- 12% 12%
K L K L
M N M N
5% 5%
cia de adultos de idade intermediária e tam baixa escolaridade – mais de 50% O P O P
Q R Q R
avançada (30 a 64 anos). Estratificando dos trabalhadores com o nível de instru- Homens Homens
6%
S T
6%
S T
u v u v
as cinco ocupações predominantes (Grá- ção Fundamental ou inferior (1,2 % de 88% 88%
6% 9% x w 6% 9% x w
fico 4), temos: 30% dos pescadores e analfabetos). A faixa salarial prevalecente y z y z
AA AB AA AB
técnicos marítimos, fluviários e regionais entre os pescadores é de 2,01 a 3,00 SM,
de convés na faixa intermediária (40 a 49 enquanto para os criadores de animais
anos); 28% intermediária e avançada (50 aquáticos é de 1,01 a 1,5 SM. Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)

788 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 789
De acordo com Gráfico 5, identifica-se Em relação ao nível de instrução, os ge- na faixa etária entre 30 e 49 anos de idade, Entre as ocupações destacam-se: (i) operado-
que os trabalhadores da extração de mine- ólogos e geofísicos possuem curso superior, além de uma remuneração acima de 7,01 res de processos das indústrias de transforma-
rais líquidos e gasosos (25%), seguido da contendo 25% de profissionais pós-gradua- SM, respectivamente em 73% e 48%. ção de produtos químicos, petroquímicos e
função geólogos e geofísicos (20%), são dos, o que reflete na remuneração da ocu- afins (21%); (ii) trabalhadores na navegação
preponderantes no setor. Duas ocupações pação, indicando 66% de trabalhadores ob-
4.3 Manufaturas marítima, fluvial e regional (15%); (iii) mecâ-
que apresentam alta afinidade ao setor – tendo um ganho acima de 15,01 SM e 12%, A Figura 3 apresenta um panorama da nicos de manutenção naval (em terra) (12%);
operadores de processos das indústrias de entre 7,01 e 15,00 SM. Já os operadores de composição das funções do setor de Manu- (iv) eletricistas-eletrônicos de manutenção
transformação de produtos químicos, petro- processos das indústrias de transformação fatura. As mulheres, seguindo a dinâmica dos veicular (aérea, terrestre e naval) (10%); (v)
químicos e afins, e trabalhadores na nave- de produtos químicos, petroquímicos e afins, setores apontados acima, são minoria (11%). carpinteiros navais e de aeronaves (9%).
gação marítima, fluvial e regional represen- e os trabalhadores na navegação marítima,
Figura 3: Ocupações formais do setor de Manufatura nas RM litorâneas – ano 2019
tam apenas 9% do setor, cada. fluvial e regional são duas ocupações de ní-
Desagregando as ocupações por faixas vel médio de instrução, e os operadores au- Gênero dos Trabalhadores e Ocupações
Gênero dos Trabalhadores e Ocupações AA BB A
A BB
etárias, observa-se a prevalência de traba- ferem um ganho acima de 7,01 SM (82%), do Setor de Manufatura CC DD C
C DD
lhadores da extração de minerais líquidos e enquanto os trabalhadores na navegação do Setor de Manufatura EE FF E
E F
F
9%
9% 15% 9% G H
gasosos com idade intermediária (30 a 39 marítima, fluvial e regional, uma remunera- 15%
10%
G
G H
H 15% 10%
10%
G
I J
H
II JJ I J
anos); geólogos e geofísicos aproximada- ção entre 5,01 e 10,00 SM (50%). Mulheres
Mulheres K L
KK LL K L
mente 70% encontram-se na faixa etária de Das Ocupações de maior empregabilidade 11%
11%
M
M N
N
M
M
N
O PN
30 a 49 anos de idade; operadores de pro- no setor de Extração e Energia, ainda desta- O
O PP 21%
12%
O
Q RP
12% 12%
cessos das indústrias de transformação de cam-se a de oficiais de convés e afins; e técni-
Faixa Etária Escolaridade 21%
Homens Q
Q RR 21% SQ TR
Homens
89% SS TT S
U VT
produtos químicos, petroquímicos e afins, e cos em transportes
400 intermodais, perfazendo 600
89% U
U VV X
U W
V
os trabalhadores na navegação marítima, na 6% cada. Ambas300as ocupações possuem mais 400
YX ZW
200 200
XX W
W
mesma faixa, apresentam respectivamente, de 50% trabalhadores
100
com nível superior e YY ZZ
AA
Y Z
0
78% e 71% de trabalhadores. um pouco mais 0de 70% de trabalhadores
AA H N AB M Outras
AA H N AB M Outras
AA
AA AA
Até 5ª Incompleto 5ª Completo Fundamental 6ª a 9ª Fundamental
Gráfico 5: Faixa Etária, escolaridade e faixa salarial das ocupações
30 A 39
formais
40 A 49
18 A 24 25 A 29
Fundamental Completo Médio Incompleto Médio Completo Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)
prevalentes do Setor Extração e Energia nas RM litorâneas50 A–64 ano65 OU2019
MAIS
Superior Incompleto Superior Completo Mestrado
Doutorado
O Gráfico 6 mostra com mais detalhes os A segunda ocupação que mais emprega
postos de trabalhadores do mar do setor de no setor de manufatura é a de trabalhado-
Faixa Etária Escolaridade Faixa Salarial
400 manufatura. Observamos que 94% dos ope- res na navegação marítima, fluvial e regio-
400 600
300 400
300
radores de processos das indústrias de trans- nal. Essa função é exercida praticamente
200
200 200 100 formação de produtos químicos, petroquími- por homens (99%), 64% dos trabalhadores
100 0
AA H N AB M Outras
0
AA H N AB M Outras cos e afins possuem ensino médio completo, tem ensino médio, 26% possuem o funda-
0
AA H N AB M Outras Até 0,50 0,51 a 1,00 SM 1,01 a 1,50 SM
no entanto, a faixa salarial se divide em 1,01 mental e médio incompleto, e os demais,
Até 5ª Incompleto 5ª Completo Fundamental 6ª a 9ª Fundamental 1,51 a 2,00 SM 2,01 a 3,00 SM 3,01 a 4,00 SM
18 A 24
30 A 39
25 A 29
40 A 49
Fundamental Completo Médio Incompleto Médio Completo 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM 7,01 a 10,00 SM a 1,5 SM (50 pessoas), 1,51 a 2,00 (36) e a níveis mais baixos de instrução. Do total de
50 A 64 65 OU MAIS
Superior Incompleto
Doutorado
Superior Completo Mestrado 10,01 a 15,00 SM 15,01 a 20,00 SM Mais de 20,00 SM
2,01 a 3,00 SM (41), 3,01 a 4,00 SM (27), trabalhadores 85% se dividem quase pro-
{ñ class}
4,01 a 5,00 SM (32) e 5,01 a 7,00 SM (37). porcionalmente entre as faixas etárias de 30
Ocupações mais prevalecentes no Setor de Extração e Energia
Faixa Salarial Homens Mulheres Total
A maioria são jovens (18 a 24 anos) e adultos a 39 anos, 40 a 49 anos e 50 a 64 anos. A
AA Trabalhadores da Extração de Minerais Líquidos e Gasosos 782 12 794
400
300 H Geólogos e Geofísicos 479 151 630
jovens (25 a 39 anos) e 32% estão na faixa remuneração de 2,01 a 4,0 SM representa
200
Operadores de Processos das Indústrias de Transformação de Produtos Químicos, Petroquímicos e
de 40 a 64 anos de idade, o que equivale a 58% (74 trabalhadores de um total de 127),
100 N 263 19 282
0
Afins
78 operadores. Isso nos leva a pensar que a de 4,01 a 7,00 SM, 31% (39), e apenas 5%
AB Trabalhadores
ABna Navegação Marítima, Fluvial e Regional 276 2 278
(6) recebem de 7,01 a 15,00 SM e os demais
AA H N M Outras

Até 0,50 0,51 a 1,00 SM


experiência na ocupação é responsável pelo
M Oficiais de Convés1,01 a 1,50 SM
e Afins 173 15 188
1,51 a 2,00 SM 2,01 a 3,00 SM 3,01 a 4,00 SM aumento de remuneração, uma vez que 79 recebem valores abaixo de 2,00 SM.
Outras Soma das demais ocupações do Setor 783 194 978
4,01 a 5,00 SM

10,01 a 15,00 SM
5,01 a 7,00 SM

15,01 a 20,00 SM
7,01 a 10,00 SM

Mais de 20,00 SM
pessoas de um total de 245 nessa ocupação, Os mecânicos de manutenção naval
{ñ class} Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022) recebem na faixa de 4,01 a 10,00 SM. (em terra) representam 12% do setor de

790 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 791
manufatura, assim como os trabalhadores setor de manufatura, enquanto os carpintei- Figura 4: Ocupações formais do setor de Transporte e Logística
na navegação marítima, fluvial e regional, ros navais e de aeronaves representam 9%. nas RM litorâneas – ano 2019
são ocupações exercidas pelo sexo masculi- Do total de eletricistas, 80% possuem ensi- Gênero dos dos
Trabalhadores e Ocupações do
Gênero
Gênero dos
Gênero Trabalhadores
Trabalhadores
dosdos
Trabalhadores e Ocupações
Ocupações do
no. Na sua maioria são adultos jovens (25 a no médio (79 trabalhadores com curso com- Gênero Trabalhadoresee Ocupações
Ocupações dodo
Setor de
do Transporte
Setor e Logística
de Manufatura AAA ABBBA A B
39 anos) e adultos (40 a 64), que represen- pleto e 13 incompleto), 4% ensino superior Setor
Setorde
deTransporte
Setor Transporte
de Logística
Transporteee Logística
Logística CCC
E
CD
EF
DDC C D
F
B B
DD
tam respectivamente 46% e 40%. O nível (se dividem em completo e incompleto) e os EEG GH
FFE E H F F
14% 14% GGI I JHHG G J HH
de instrução médio é o dominante (65% do 16% restantes têm até o fundamental. A 14%
14% 14%
14% IIK KLJJ I I L J J
total de trabalhadores), abaixo desse nível escolaridade reflete uma diversificada faixa Mulheres
8%
8% KKM MN LL K K N L L
8%
8%
11% 47% 47% MMO OPN NM M P NN
de escolaridade se encontram 27% dos tra- salarial da ocupação: 3% ganhando 0,51 a OOQ QRPPO O R P P
47%
47% 47%
47% S STRRQ Q T
balhadores e acima apenas 8%. A maioria 1,50 SM; 22%, de 1,51 a 3,00 SM; 57%, 11% 11% QQ R R
11%
11% SSU UVTTS S V T T
dos trabalhadores recebem de 2,01 a 4,00 3,01 a 5,00 SM; 12%, 5,01 a 7,00 e 6%, Escolaridade
Escolaridade 6% 6%13% 11%
11%
13% UUX XW
VVU U W V V
92%
Homens
Faixa
Faixa Etária
Etária 6%
6% 6%6%
Y
XXAA
YZ
W
Z
WX X AB WW
SM (48%) os demais se distribuem nas fai- acima de 7,00 SM. Cerca de 70% da ocupa- 250
250
200
92%
92%
89% 13%
13% 13%
13%
YYAC
AAAB
ZZ Y Y Z Z
200 92% ACAD AD
xas de 4,01 a 7,00 SM (25%), abaixo de ção é composta por trabalhadores entre 25 150
150 AA
AA
AE AE AB
AFABAAAAAF ABAB
100 100 AC
AC
AG AG AD
AHADACACAH ADAD
2,01 SM (15%) e acima de 7,01 SM (12%). e 49 anos de100idade. Já os carpinteiros con- 100
50
50 AE
AE AEAE
AF
AF AFAF
Os eletricistas-eletrônicos de manuten- centram aproximadamente
50
50 60% nessa faixa00 O Z M E A Outras
AG
AG AGAG
AH
AH AHAH
O Z M E A Outras
ção veicular (aérea, terrestre e naval) cor- etária, 60% deles
0
auferem uma renda 1,51 Analfabeto
Analfabeto
5ª Completo Fundamental
Até 5ª Incompleto
Até
6ª a


Incompleto
Fundamental
0 Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)
respondem a 10% dos trabalhadores do a 4,01 SM, e 63% O nível
O Z
Z
15 A 17
médio
M
M
E
E de
18 A 24
A
A instrução.
Outras
Outras
5ª Completo Fundamental
Fundamental Completo
Fundamental Completo
Médio Completo
6ª a 9ª Fundamental
Médio Incompleto
Médio Incompleto
Superior Incompleto
15 A 17 18 A 24 Médio Completo Superior Incompleto
25 A 29
25 A 29
40 A 49
30 A 39
30 A 39
50 A 64
Superior Completo
Superior Completo
Mestrado
Mestrado As ocupações dos trabalhadores na nave- Os técnicos em transportes intermodais
Gráfico 6: Faixa Etária, escolaridade e faixa salarial das ocupações formais 40 A 49
65 OU MAIS
65 OU MAIS
50 A 64 Doutorado
Doutorado
gação marítima, fluvial e regional empregam totalizam 1511 trabalhadores, conforme
prevalentes do Setor Manufatura nas RM litorâneas – ano 2019
Escolaridade quase 50% do setor de Transporte e Logís- Tabela 9 no Anexo 2. Destes, 41% estão
Faixa Etária Escolaridade Faixa
Faixa Salarial
Salarial
250 tica, 73% dos trabalhadores têm escolarida- na faixa de 30 a 39 anos de idade e a esco-
Faixa Etária 200
250
100
100
150
200 80
80
de média completa e a maior faixa etária da laridade prevalecente da ocupação é a de
100 100 60
150
50
100
60
40
ocupação está entre 30 a 49 anos de idade, nível intermediário. Cerca de 80% da re-
100 40
50 500
O Z M E A
20
Outras 20
representando 64% dos trabalhadores. Já os muneração dos técnicos se divide em: 44%
0 0
50
O
Analfabeto Z M E Até 5ªAIncompleto
Outras 0 O Z M E A Outras oficiais apresentam 56% na faixa etária de de 2,01 a 4,00 SM, 14% de 4,01 a 5,00
0 5ª Completo Fundamental 6ª a 9ª Fundamental O Z M E A Outras

0
O Z M E A Outras Analfabeto
Fundamental Completo
5ª Completo Fundamental
Até 5ª Incompleto
Médio Incompleto
6ª a 9ª Fundamental Não Ativ Dez Até 0,50 0,51 a 1,00 SM
30 a 49 anos de idade e 66% deles tem cur- SM, 19% de 5,01 a 7,00 SM.
15 A 17 18 A 24 Médio Completo Superior Incompleto
O Z M E A Outras
25 A 29
15 A 17
40 A 49
30 A 39
18 A 24
50 A 64
Fundamental Completo
Superior Completo
Médio Completo
Médio Incompleto
Mestrado
Superior Incompleto
Não Ativ Dez
1,01 a 1,50 SM
1,01 a 1,50 SM
Até 0,50
1,51 a 2,00 SM
1,51 a 2,00 SM
0,51 a 1,00 SM
2,01 a 3,00 SM
2,01 a 3,00 SM
so superior (sendo 9 pós-graduados num to- A ocupação de técnicos marítimos, flu-
Doutorado 3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM
25 A 29
65 OU MAIS
40 A 49
30 A 39
50 A 64
Superior Completo
Doutorado
Mestrado 3,01 a 4,00 SM
7,01 a 10,00 SM
7,01 a 10,00 SM
4,01 a 5,00 SM
10,01 a 15,00 SM
10,01 a 15,00 SM
5,01 a 7,00 SM
15,01 a 20,00 SM
15,01 a 20,00 SM
tal de 1258). A escolaridade explica os 83% viários e regionais de convés é representa-
65 OU MAIS Mais de 20,00 SM {ñ class}
Mais de 20,00 SM {ñ class} dos oficiais auferindo renda superior a 7,01 da pela escolaridade média em 72% (dos
Faixa Salarial
Ocupações mais prevalecentes no Setor de Manufatura
Faixa Salarial
Homens Mulheres Total SM (destes, 24% na faixa de 15,01 a 20,00 797, 35 apresentam nível de instrução
100 Operadores de Processos das Indústrias de Transformação de Produtos Químicos, Petroquímicos e
80
100
O
Afins
218 27 245 SM e 26% na faixa de mais de 20,00 SM). médio incompleto e 542 médio completo).
60
80 Z Trabalhadores na Navegação Marítima, Fluvial e Regional 168 1 169 Dos técnicos em transportes por vias na- Já a remuneração da função se encontra
40
60
20
40
M Mecânicos de Manutenção Naval (em Terra) 135 1 136 vegáveis e operações portuárias, 69% estão distribuída nas faixas: abaixo de 2,00 SM;
E Eletricistas-Eletrônicos de Manutenção Veicular (Aérea, Terrestre e Naval) 112 2 114
200
OA Z M E
na faixa etária de 30 a 49 anos de idade. A 3,1%, de 2,01 a 4,00 SM, 10%; de 4,01 a
0 Carpinteiros Navais e deAAeronaves
Outras 108 0 108
O Z M E A Outras escolaridade característica da ocupação é o 5,00 SM, 3,9%; de 5,01 a 7,00 SM, 19%;
Outras
Não Ativ Dez
Soma das demais ocupações do Setor
Até 0,50 0,51 a 1,00 SM Fonte: Elaboração própria com
287base nos102
dados RAIS389(2022)
1,01 a 1,50 SM
Não Ativ Dez
1,51 a 2,00 SM
Até 0,50
2,01 a 3,00 SM
0,51 a 1,00 SM Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022) nível intermediário (52%), mas ainda apre- 7,01 a 10,00 SM, 25%; de 10,00 a 15,01
3,01 a 4,00 SM
1,01 a 1,50 SM
7,01 a 10,00 SM
4,01 a 5,00 SM
1,51 a 2,00 SM
10,01 a 15,00 SM
5,01 a 7,00 SM
2,01 a 3,00 SM
15,01 a 20,00 SM
senta 40% de técnicos com curso superior SM, 19%; e acima de 15,00 SM, 5,5%. A
3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM
4.4 Transporte e logística
Mais de 20,00 SM
7,01 a 10,00 SM
{ñ class}
10,01 a 15,00 SM
15,01 a 20,00 SM transportes por vias navegáveis e operações (575 trabalhadores com superior completo faixa etária predominante é adulto acima
Mais de 20,00 SM {ñ class}
portuárias (13%), técnicos em transportes in- e 142 incompletos). E a remuneração mos- de 50 anos (46%, o equivalente a 369 tra-
O setor de Transporte e Logística destaca termodais (11%) e técnicos marítimos, fluvi- tra 79 técnicos na faixa de 0,50 a 1,50 SM; balhadores); a faixa de 40 a 49 anos repre-
as seguintes ocupações: trabalhadores na na- ários e regionais de convés (6%). Observa-se 347, de 1,51 a 3,00 SM; 360, de 3,01 a sentam 32%; a de 30 a 39 anos, 21%; e
vegação marítima, fluvial e regional (47%), que a participação da mulher nesse setor é de 5,00 SM; 660, de 5,01 a 10,00 SM; e 276, os mais jovens (18 a 29 anos) são apenas
oficiais de convés e afins (14%), técnicos em 8%, conforme a Figura 4. acima de 10,00 SM. 1,1% dos trabalhadores.

792 ECONOMIA
ECONOMIAAZUL
AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 793
Faixa
Faixa
Etária
Etária Escolaridade
Escolaridade
1200012000 2000020000
1000010000 1500015000
8000 8000 1000010000
6000 6000 5000 5000
4000 4000 0 0
2000 2000 AG AG R R AB AB AA AA AD AD
Outras
Outras
0 0
AG AGR RAB ABAA AAAD AD
Outras
Outras Analfabeto
Analfabeto Até 5ª Até
Incompleto
5ª Incompleto 5ª Completo
5ª Completo
Fundamental
Fundamental

6ª a 9ª6ª
Fundamental
a 9ª Fundamental Fundamental
Fundamental
Completo
Completo Médio Médio
Incompleto
Incompleto
18 A 24
18 A 24 25 A 29
25 A 29
Gráfico 7: Faixa etária, escolaridade e faixa salarial das ocupações formais 30 A 39
30 A 39 40 A 49
40 A 49 Médio Médio
Completo
Completo Superior
Superior
Incompleto
Incompleto Superior
Superior
Completo
Completo A ocupação garçons, barmen, copeiros (71%), conforme indica o Gráfico 8. A ocu-
50 A 64
50 A 64 65 OU 65
MAIS
OU MAIS
prevalentes do Setor Transporte e Logística nas RM litorâneas – ano 2019 Mestrado
Mestrado Doutorado
Doutorado
e sommeliers é a que mais emprega em to- pação aponta uma remuneração de 1,01 a
Faixa Etária
Faixa Etária das as faixas etárias: 15 a 29 anos (57%); 3,00 SM, para 65% dos gerentes e 16%,
Faixa Etária Escolaridade
Escolaridade
Escolaridade Faixa
Faixa
Salarial
Salarial
12000
12000
12000 12000 2000020000
20000 20000 5000 5000 30 a 49 anos (36%); 50 a 64 anos (7%) e na faixa salarial de 3,01 a 5,00 SM.
10000
10000
10000 10000
80008000
8000 8000
15000
10000
15000
15000 15000
10000 10000
4000 4000
3000 3000 ainda mais de 65 anos (0,5%). Caracteri- Os supervisores dos serviços de trans-
10000
60006000
6000 6000
40004000
4000 4000
50005000
5000 5000 2000 2000
1000 1000 zada pela baixa escolaridade, em que 17% porte, turismo, hotelaria e administração
0 0 0 0
20002000
2000 2000 AG AGAG RAGR
R AB R ABAB AAABAA AA ADAAAD ADOutras
AD
OutrasOutras
Outras
0 0
AG AG R R AB AB AA AA AD AD
Outras
Outras dos trabalhadores possuem nível de instru- e edifícios são ocupações caracterizadas
0 00 0
AG AG
AG R AGR
R AB RAB
AB AA AB
AA AD AA
AA AD
Outras
AD Outras
AD Outras
Outras Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto Até 5ª
Até
Incompleto
5ª Incompleto
Até 5ª Incompleto
Até 5ª Incompleto 5ª Completo
5ª Completo
Fundamental
5ª Completo
Até 0,50
Fundamental
Até 0,50
Fundamental
5ª Completo Fundamental
0,51 a 1,00
0,51 SM
a 1,00 SM 1,01 a 1,50
1,01 SM
a 1,50 SM ção fundamental (7815 pessoas com cur- pela instrução média (76%), na maioria
18 A18
24A
18 A 24
2418 A2524A25
29A
25 A 29
2925 A 29
6ª a 9ª
6ªFundamental
6ª aa 9ª
9ª Fundamental
Fundamental
6ª a 9ª FundamentalFundamental
Fundamental
Fundamental
Completo
Fundamental Completo
CompletoCompleto
MédioMédio
Incompleto
Médio Incompleto
1,51 a 2,00
Médio Incompleto
Incompleto
1,51 SM

4,01 a 5,00
a 2,00 SM 2,01 a 3,00

4,01 SM
2,01 SM

a 5,00 SM 5,01 a 7,00


a 3,00 SM 3,01 a 4,00

5,01 SM
3,01 SM

a 7,00 SM 7,01 a 10,00


a 4,00 SM

7,01 aSM
10,00 SM
so incompleto e 15553 completo) e 81% de adultos entre 30 e 49 anos (64%) e
30 A30
30
39A
A 39
3930 A4039A40
49A
40 A 49
4940 A 49
50 A50
64A 64
50 A 6450 A6564
OU65
65 OU MAIS
MAIS
OU 65 OU MAIS
MAIS
MédioMédio
Completo
Completo
Médio
Médio Completo Completo Superior
Superior
Incompleto
Superior
Incompleto
Incompleto
Superior Incompleto Superior
Superior
Completo
Superior
Completo
Superior CompletoCompleto
10,01 a10,01
15,00aSM 15,01 a15,01
15,00 SM 20,00aSM Mais deMais
20,00 SM 20,00
deSM20,00 SM ensino médio (16014 incompletos e 96613 remuneração de 1,01 a 3,00 SM (63%).
Mestrado
Mestrado
Mestrado Mestrado Doutorado
Doutorado
Doutorado
Doutorado
{ñ class}
{ñ class}
completos), o que se reflete na remunera- Enquanto os técnicos em turismo repre-
Faixa Salarial
Faixa
Faixa Salarial
Salarial
Ocupações mais prevalecentes no Setor de Transporte e Logística Homens Mulheres Total ção de 80% das pessoas recebendo até 2,0 sentam 60%, na mesma faixa etária, per-
AG Trabalhadores na Navegação Marítima, Fluvial e Regional 6581 102 6683
50005000
5000
40004000
4000
5000
4000 SM e 12% 2,01 a 4,00 SM. fazem 98% da escolaridade dividida em
R Oficiais de Convés e Afins 1715 200 1915
30003000
3000
20002000
2000
3000
2000 Dos gerentes de operações de turismo, 45% no ensino médio e 53% no ensino
AB Técnicos em Transportes por Vias Navegáveis e Operações Portuárias 1628 153 1781
10001000
1000
0 0 0
1000
0 AA Técnicos em Transportes Intermodais 1135 376 1511 alojamento e alimentação, 31% são jovens superior. Além de apresentar 78% da ocu-
Escola
Esco
AG AG
AG RAG R
R ABR AB
AB AAABAA
AA ADAAAD
ADOutras
AD
OutrasOutras
Outras
de 18 a 29 anos de idade e 56% são adul- pação dividida entre as faixas de remune-
Faixa Escola
Até 0,50
Até
Até 0,50
AD
0,50Até 0,50 0,51 a0,51
0,51
Técnicos Marítimos, Fluviários e Regionais de Convés
1,00aaSM
1,00
0,51SM
1,00 a 1,00
SM 1,01
SMa1,01
1,50aaSM
1,01 1,50
1,01SM
1,50 a 1,50 SM
SM
783 14 797
FaixaEtária
Faixa Etária
Etária 120000
1,51 a1,51
1,51
2,00aaSM Outras
2,00
1,51
2,00 SM
a 2,00
SM 2,01 3,00aaSoma
SMa2,01
2,01 SM
3,00 das
2,01SM
3,00 SM demais
a 3,00
3,01 4,00ocupações
SMa3,01
3,01 aaSM
4,00 a 4,00do
3,01SM
4,00 SM SMSetor 1243 222 1464 tos de 30 a 49 anos. A escolaridade predo- ração: 1,01 a 2,00 SM (38%); 2,01 a 3,00 120000 120000
100000
100000
100000
80000
50000 80000
4,01 a4,01
4,01
5,00aaSM
5,00
4,01SM
5,00 SM
a 5,00
5,01
SMa5,01
5,01
7,00aaSM
7,00
5,01SM
7,00 SM
a 7,00
7,01
SMa7,01
7,01
10,00
aa 10,00
10,00
SM
7,01 SM
SM
a 10,00 SM
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022) minante na ocupação é a de ensino médio SM (27%) e 3,0150000 a 4,00 SM (13%).
50000
40000
40000
40000
80000
60000
60000
60000
40000
10,0110,01
a 15,00
aa 15,00
10,01
SM SMa 15,00
15,01SM
15,01
a 20,00
aa 20,00
15,01
SM SMa 20,00
Mais SM
de
Mais
20,00
de 30000 40000
40000
10,01 15,00 SM 15,01 20,00 SM Mais de Mais
20,00
SM deSM
20,00 20,00 SM
SM 30000
30000 20000
20000 20000
20000
20000 20000
0
{ñ class}
{ñ class}
class}{ñ class} 10000

10000
10000 0 0
0 L O
4.5 Serviços de garçons, barmen, copeiros e sommeliers 0 0
L
L L
O AA AG AK Outras
O O AAAA AGAG AKAKOutras
Outras Analfabeto
L L O O
Até 5ª I

(85% de participação no setor de serviços). Gráfico 8: Faixa Etária, Escolaridade e Faixa Salarial das ocupações
10 A 14 15 A formais
17
Analfabeto
Analfabeto
6ª a 9ª Fundamental
AtéAté
5ª I
Fundam
10 A1014A 14 15 A1517A 17 6ª a6ª9ªaFundamental
9ª Fundamental Fund
Fundam
18 A 24 25 A 29

O Setor de Serviços apresenta uma dis- Os gerentes de operações de turismo, prevalentes do Setor de Serviços nas RM litorâneas 3030–AA303939ano
18 A1824A 24
A 39
2019
25 A2529A 29
40 A 49
40 A4049A 49
Médio Completo
Médio
Médio Completo
Completo
Superio
Supe
Superio
50 A 64 65 OU MAIS Mestrado Doutora
tribuição mais equilibrada nas ocupações alojamento e alimentação representam Escolaridade 50 A5064A 64 65 OU
65 OU MAIS
MAIS Mestrado
Mestrado Dou
Doutora

Faixa Etária Escolaridade


dos trabalhadores do mar, em relação ao 9% das ocupações no setor de serviços, Faixa Etária 120000 Escolaridade Faixa
FaixaSalarial
Salarial
120000
100000 80000
Faixa Salarial
100000
gênero, em que 42% são mulheres e 58%, enquanto os supervisores dos serviços de 50000
50000
40000
80000
120000
80000
60000
100000
80000
80000
60000
60000
60000
40000 60000
40000
80000
homens. Isso pode ser observado na Figura transporte, turismo, hotelaria e administra- 30000
30000
20000
40000
20000
60000
20000
40000
40000
40000
20000
20000
10000 40000 0 20000
5. Em referência às funções, há uma con- ção e edifícios; e técnicos em turismo expri- 10000
0
0
20000 0 L
L
O
O
AA
AA
AG
AG
AK
AK
Outras
Outras
20000
0
0 0
L O AA AG AK Outras 0 L O AA AG AK Outras
centração de trabalhadores na ocupação mem, respectivamente, 3% e 2 %. L O AA AG AK Outras Analfabeto
Analfabeto L O
Até 5ª Incompleto
AA
Até 5ª Incompleto AG
5ª Completo Fundamental
AKCompleto
5ª Outras
Fundamental
L L O O AAAA AGAG AKAK Outras
Outras
10 A 14 15 A 17 6ª a 9ª Fundamental Fundamental Completo Médio Incompleto Não Ativ Dez Até 0,50 0,51 a 1,00 SM
10 A 14 15 A 17 Analfabeto
6ª a 9ª Fundamental AtéFundamental
5ª Incompleto
Completo 5ª Médio
Completo Fundamental
Incompleto NãoNão
AtivAtiv
DezDez AtéAté
0,500,50 0,510,51 a 1,00
a 1,00 SM SM
18 A 24 25 A 29
Figura 5: Ocupações formais do setor de Serviços nas RM litorâneas – ano 2019 18 A 24 25 A 29 Médio Completo Superior Incompleto Superior Completo 1,01 a 1,50 SM 1,51 a 2,00 SM 2,01 a 3,00 SM
30 A 39 40 A 49 6ª aMédio
9ª Fundamental
Completo Fundamental Completo
Superior Incompleto Médio Incompleto
Superior Completo 1,011,01 a 1,50
a 1,50 SM SM 1,511,51 a 2,00
a 2,00 SM SM 2,012,01 a 3,00
a 3,00 SM SM
30 A 39 40 A 49 3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM
50 A 64 65 OU MAIS Mestrado Doutorado
50 A 64 65 OU MAIS Médio Completo
Mestrado Superior Incompleto
Doutorado Superior Completo 3,013,01 a 4,00
a 4,00 SM SM 4,014,01 a 5,00
a 5,00 SM SM 5,015,01 a 7,00
a 7,00 SM SM
7,01 a 10,00 SM 10,01 a 15,00 SM 15,01 a 20,00 SM
Mestrado Doutorado 7,017,01 a 10,00
a 10,00 SM SM 10,01
10,01 a 15,00
a 15,00 SM SM 15,01
15,01 a 20,00
a 20,00 SM SM

Gênero dos Trabalhadores e Ocupações Faixa Salarial Mais de 20,00 SM {ñ class}


2%2%
3%3%
A A B B
80000
Faixa Salarial MaisMais de 20,00
de 20,00 SM SM {ñ class}
{ñ class}
C C D D
do Setor de Serviços 9%9% E E F F
80000
60000
60000
G G H H 40000 Ocupações mais prevalecentes no Setor de Serviços Homens Mulheres Total
I I J J 40000
L Garçons, Barmen, Copeiros e Sommeliers 80831 58535 139366
20000
K K L L 20000
MM N N 0 O Gerentes de Operações de Turismo, Alojamento e Alimentação 7908 6119 14027
0
O O P P L O AA AG AK Outras
L O AA AG AK Outras
Mulheres Q Q R R AA Supervisores dos Serviços de Transporte , Turismo, Hotelaria e Administração e Edifícios 3695 1670 5365
Não Ativ Dez Até 0,50 0,51 a 1,00 SM
S S T T
42% Homens U U V V
Não Ativ Dez
1,01 a 1,50 SM
Até 0,50
1,51 a 2,00 SM
0,51 a 1,00 SM
2,01 a 3,00 SM
85%
85% 1,01 a 1,50AG
SM Técnicos
1,51 a 2,00 SMem Turismo
2,01 a 3,00 SM 1205 2726 3931
58% X X WW 3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM
Y Y Z Z 3,01 a 4,00AK
SM Trabalhadores
4,01 a 5,00 SM na Navegação
5,01 a 7,00 SM Marítima, Fluvial e Regional 405 5 410
AAAA AB AB 7,01 a 10,00 SM
7,01 a 10,00 SM
10,01 a 15,00 SM
10,01 a 15,00
15,01 a 20,00 SM
AC AC ADAD Outras Soma dasSM 15,01
demais a 20,00 SMdo Setor
ocupações 587 217 804
Mais de 20,00 SM {ñ class}
AE AE AF AF Mais de 20,00 SM {ñ class}
AGAG AHAH
AI AI AJ AJ Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)
AK AK AL AL
AMAM

Fonte: Elaboração própria com base nos dados RAIS (2022)

794 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 795
4.6 Defesa na Figura 6, que exibe um panorama das representam 10% cada. A primeira tem (67%) e acima de 65 anos (33%). Os Téc-
ocupações que compõem o setor, indican- apenas mulheres, nas faixas de 40 a 49 anos nicos em Transportes Intermodais apresen-
As ocupações dos trabalhadores do Mar do um percentual de 31% de participação (33%) e de 50 a 64 anos (67%), e 33% de- tam escolaridade média e a remuneração de
do setor da Defesa podem ser observadas feminina e 69% masculina. las possuem ensino superior e as demais 5,01 a 7,00 SM (67% ) e de 7,01 a 10,00
instrução intermediária, enquanto que a re- SM (33%). E os Técnicos Marítimos, Fluviá-
Faixa Etária Escola
Figura 6: Ocupações formais do setor de Defesa nas RM litorâneas – ano 2019 muneração se segmenta em 4,01 a 5,00 SM rios e Regionais6 de Convés, 67% possuem3,5
(33%) e 5,01 a 7,00 SM (67%). As outras ensino fundamental
5
4
e 33% ensino médio e3
2,5
duas ocupações são compostas apenas por auferem ganhos3 de 1,51 a 2,00 SM (67%) e2
Gênero dos Trabalhadores e Ocupações do 2
homens, nas faixas etárias de 50 a 64 anos de 2,01 a 3,00 1SM (33%). 1,5
Setor de Defesa 0
1

G A D B C Outras 0,5
A 0
14% 4% B
Gráfico 9: Faixa Etária, escolaridade e faixa salarial das ocupações formais 30 A 39 40 A 49 G A D
50 A 64 65 OU MAIS 6ª a 9ª Fundamental Funda

Mulheres 10% 31% C prevalentes do Setor de Defesa nas RM litorâneas – ano 2019 Superior Completo Mestr

31% D
10%
E Faixa 10,01
7,01 a 10,00 SM
Etária
a 15,00 SM {ñ class}
Escolaridade Faixa Salarial
Homens 10%
4%
6 3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM 3,5
69% 17% F 4
5 1,01 a 1,50 SM 1,51 a 2,00 SM 2,01 a 3,00 SM 3
4 3
G 2,5
3 2
H G A D B C Outras 2
2 0 1
1,5
1 0
1 1
0 G A D B C Outras
2 0,5
G A D B C Outras
3 0
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022) 4 30 A 39 40 A 49 G A D B C Outras
1,01 a 1,50 SM 1,51 a 2,00 SM 2,01 a 3,00 SM

50 A 64 65 OU MAIS 6ª a 9ª Fundamental Fundamental Completo Médio Completo 3,01 a 4,00 SM 4,01 a 5,00 SM 5,01 a 7,00 SM

Faixa Salarial Superior Completo Mestrado 7,01 a 10,00 SM 10,01 a 15,00 SM {ñ class}

A Figura 6 destaca a ocupação de balhadores com mais de 50 anos de idade, Faixa Salarial
Ocupações mais prevalecentes no Setor de Defesa
Superior Completo Mestrado Homens Mulheres Total

garçons, barmen, copeiros e sommeliers e os gerentes têm 80% na faixa de 50 a 64 4


G50 A 64
30 A 39
65 OU MAIS
Garçons, Barmen, Copeiros e Sommeliers
40 A 49 G
6ª a 9ª Fundamental
A D B
Fundamental Completo
C Outras
Médio Completo 3 6 9

com uma participação de 31% do setor anos de idade e os técnicos, 75% com mais 3
2 G
A
A
Gerentes de Operações de Serviços em 0Empresa de Transporte, de Comunicação e de Logística (Armazenagem e
Distribuição)
D B C Outras 0,5
5 0 5

de Defesa, em que 2/3 são mulheres. Da de 65 anos. Os gerentes auferem um ganho 0


1
1
D
1
Trabalhadores na Navegação Marítima, Fluvial e Regional 4 0 4
0 1,5
totalidade dos trabalhadores, 67% estão mais elevado (4,01 a 5,00 SM, 5,01 a 7,00 2
B
G A D B C Outras
Técnicos em Transportes Intermodais 2 3 0 3
3
na faixa etária de 50 a 64 anos de idade SM e 10,01 a 15,00 SM, 20% em cada faixa; 4 C
1,01 a 1,50 SMTécnicos Marítimos,
1,51 a 2,00 SM Fluviários e
2,5
Regionais de Convés
2,01 a 3,00 SM 3 3
3
e os demais com mais de 65 anos, con- e 40% na faixa de 7,01 a 10,00 SM) e a sua 5
6
Outras
3,01 a 4,00 SMSoma das demais
4,01 a 5,00 SM ocupações do Setor
5,01 a 7,00 SM 3,5
2 3 5

forme ilustra o Gráfico 9. A escolaridade escolaridade se distribui em: 20% curso su- Faixa 10,01
7,01 a 10,00 SM Etária
a 15,00 SM {ñ class} Escolaridade
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da RAIS (2022)
da ocupação continua sendo a média, no perior, 40% ensino médio e 40% fundamen-
entanto, nesse setor, a ocupação mostra tal. Já os trabalhadores, metade têm ensino De maneira geral, a escolaridade do tra- Ainda encontramos diferenças na mesma
uma parcela de trabalhadores (11%) com médio e a outra metade ensino fundamental balhador do mar preponderante é a inter- ocupação nos diferentes setores: os traba-
nível superior, o que tem impacto direto na (dividido em curso completo /curso incomple- mediária, ou seja, ensino médio; e essa tem lhadores da extração de minerais líquidos e
remuneração, apresentando uma faixa sa- to). O baixo e segmentado nível de instrução influência na remuneração da ocupação, gasosos do Setor de Extração e Energia, aci-
larial (4,01 a 10,00 SM) mais elevada que leva uma remuneração também segmentada levando em consideração as peculiaridades ma mencionados, quase 40% deles recebem
os outros setores na mesma ocupação. (1,01 a 1,50 SM, 1,51 a 2,00 SM e 2,01 a de cada ocupação e setor. Por exemplo, acima de 5,01 SM (18%, 5,01 a 10,00 SM
A ocupação de gerentes de operações de 3,00 SM) com 25% cada. Dos trabalhadores, encontramos ocupações de nível médio e 20%, mais de 10,01 SM ). Essa função no
serviços em empresa de transporte, de comu- 25% ganham de 5,01 a 7,00 SM. Isso fica de instrução auferindo renda mais elevada setor de Transporte e Logística contém 63%
nicação e de logística (armazenagem e distri- bem visível na ilustração do Gráfico 9. que outras de mesmo nível de escolarida- de trabalhadores de ensino médio, ganhan-
buição) representa 17% do setor de Defesa, As ocupações do setor de Defesa: Téc- de, como a ocupação dos trabalhadores da do 4,01 a 5,00 SM (16%) e 5,01 a 10,00 SM
enquanto os trabalhadores na navegação nicos de Apoio à Biotecnologia, Técnicos extração de minerais líquidos e gasosos do (31%), enquanto o setor de Manufatura pos-
marítima, fluvial e regional têm participação em Transportes Intermodais, Técnicos Ma- Setor de Extração e Energia, com 87% no sui 74% de empregados no ensino médio e
de 14%. Ambas as funções apresentam tra- rítimos, Fluviários e Regionais de Convés ensino médio, recebendo mais de 5,01 SM. 87% auferindo ganhos de 2,01 a 3,00 SM.

796 ECONOMIA AZUL Panoramadas


Panorama dasOcupações
ocupaçõesdas
dasRegiões
regiões Metropolitanas
metropolitanas 797
Ocupações em que a exigência da fun- de 1,01 a 3,00 SM; no de Defesa, 1,01 a afins no setor de Serviços apresenta 75% de de Diretores de Produção e Operações de
ção requer curso superior e as que os tra- 3,00 SM; no de Manufaturas, 2,01 a 4,00 mulheres (conforme Gráfico 10), e apesar Serviços de Turismo, Alojamento e Alimen-
balhadores detêm mais formação auferem SM; no de Extração e Energia, 7,01 a 10,00 de todos possuírem curso superior comple- tação, no setor de Serviços: (i) em Pernam-
rendimentos maiores, como: oficiais de con- SM (14%) e de 10,01 a 20,00 SM (59%); no to, a faixa salarial encontra-se segmentada buco, temos um total de 5 trabalhadores
vés e afins; engenheiros ambientais e afins; setor de Transporte e Logística, 5,01 a 10,00 em: 2,01 a 3,00 SM (50%); 3,01 a 4,00 SM (1 homem e 4 mulheres), todos com en-
geólogos e geofísicos; gerentes de pesquisa SM (45%) e acima de 10,00 SM (25%). Ou- (25%); e 5,01 a 7,00 SM (25%), e pode ser sino superior completo e duas faixas sala-
e desenvolvimento; gerentes de operações tro exemplo são os gerentes de operações vista no Anexo 2, Tabela 10. Comparando riais (5,01 s 7,00 SM – 4 pessoas; e 7,01
de serviços em empresa de transporte, de de serviços em empresa de transporte, de a mesma ocupação entre os setores, o de a 10,00 SM – 1 pessoa); (ii) no Rio de Ja-
comunicação e de logística (armazenagem comunicação e de logística (armazenagem Transporte e Logística (29% de participa- neiro, temos 10 homens e 11 mulheres, a
e distribuição), entre outras. e distribuição), que, na maioria, auferem ção feminina), mostra uma segmentação escolaridade se divide em Ensino Médio (4
De forma geral, os Setores de Pesca e renda na faixa salarial: 1,01 a 3,00 SM com salários mais elevados: 3,01 a 4,00 SM pessoas) e Ensino Superior (17 pessoas); e
Aquicultura e o de Serviços apresentam sa- (Pesca); 1,51 a 4,00 (Serviços), 4,01 a 10,00 (14%); e 10,01 a 15,00 SM (29%), 15,01 a remuneração se distribui em: até 0,50 SM
lários mais baixos; a Manufatura e a Defe- SM (Defesa); 7,01 a 10,00 SM (17%) e mais a 20,00 SM (14%); e acima de 20,00 SM (1), 1,01 a 1,50 SM (1), 1,51 a 2,00 SM
sa se posicionam num nível intermediário; de 15 SM (44%) (Manufatura); mais de 15 (43%). Já no setor de Extração e Energia (1), 2,01 a 3,00 SM (1), 3,01 a 4,00 SM
e os Setores de Extração e Energia e o de SM (Extração e Energia); 5,01 a 10,00 SM (67% de mulheres), a faixa salarial se divide (2), 4,01 a 5,00 SM (1), 5,01 a 7,00 SM(1),
Transporte e Logística mostram uma remu- (22%), 10,01 a 15,00 SM (14%) e mais em: 3,01 a 4,00 SM e 15,01 a 20,00 SM, 7,01 a 10,00 SM (6), 10,01 a 15,00 SM (2),
neração mais elevada. Um exemplo que de 15 SM (25%) (Transporte e Logística). um setor de maior escolaridade com 67% 15,01 a 20,00 SM (2), e mais de 20,00 SM
ilustra essa configuração é a ocupação de De todo modo, não apenas a escolaridade de graduados e 33% de pós-graduados. (2), não classificados (1); (iii) já em São Pau-
técnicos marítimos, fluviários e regionais de influencia na remuneração, outros fatores A função de Diretores de Produção e lo temos apenas mulheres (1 com ensino
convés, que no setor de pesca e aquicultura também têm efeito, como: experiência, Operações de Serviços de Turismo, Aloja- médio e 3 com nível superior) e as faixas
ganham, na maioria, rendimentos na faixa habilidades técnicas e cognitivas, postura mento e Alimentação indica (Gráfico 10), salariais: 1,01 a 1,50 SM (1), 2,01 a 3,00
de 3,01 a 4,00 SM; no de Serviços, na faixa profissional, entre outras. no setor de Transporte e Logística, 80% de SM (1), 10,01 a 15,00 SM (1), não classi-
participação feminina, enquanto no setor ficado (1); (iv) em oposição, no Estado de
5. A participação feminina de Serviços a participação das mulheres é de Sergipe, temos apenas 3 homens na fun-
55%. Em termos de remuneração, o Setor ção (1 possui ensino médio, e os outros 2
As ocupações dos trabalhadores brasi- 10 indica ocupações em que a participa- de Transporte e Logística, que de maneira ensino superior) e duas faixas salariais: de
leiros do mar são exercidas na sua maioria ção feminina superou a masculina. geral apresenta remuneração mais elevada, 3,01 a 4,00 SM (1) e 5,01 a 7,00 SM (2).
por pessoas do sexo masculino. O Gráfico Notamos que a ocupação de Biólogo e mostra 20% na faixa salarial 1,01 a 1,50 SM Outra observação é que os salários da
e também 20% na faixa de 3,01 a 4,00 SM. região Sudeste e Sul tendem a ser, de ma-
Gráfico 10: Ocupações com maior participação do gênero feminino – ano 2019 Contudo, o de Serviços tem variada faixa neira geral, mais elevados que as demais
salarial: até 0,50 SM (2%); 1,01 a 2,00 SM regiões (salvo algumas exceções, como
Ocupação
Ocupação Setor
Setor Masculino
MasculinoFeminino
Feminino (9%); 2,01 a 3,00 SM (13%); 4,01 a 5,00 a do Estado de Pernambuco na ocupa-
Ocupações de Maior Participação Feminina AA Biólogos
Biólogos
e Afins
e Afins Serviços
Serviços 11 33
Diretores
Diretores
dede
Produção
Produção e Operações
e Operações dede
Serviços
Serviçosdede DM (2%); 5,01 a 7,00 SM (21%); 7,01 a ção de Diretores de Produção e Opera-
70 B B Serviços
Serviços 2121 2626
Turismo,
Turismo,
Alojamento
Alojamento e Alimentação
e Alimentação
60 Diretores
Diretores
dede
Produção
Produção e Operações
e OperaçõesdedeServiços
Serviçosdede
10,00 SM (19%); 10,01 a 15,00 SM (6%) ções de Serviços de Turismo, Alojamen-
C C Transporte
Transporte
e Logística
e Logística 11 44
50
Turismo,
Turismo,
Diretores
Alojamento
Diretores
Alojamento
dede
Produção
Produção
e Alimentação
e Alimentação
e Operações
e Operaçõesem emEmpresa
Empresa
e mais de 15,01 SM (9%). Se verificarmos a to e Alimentação, no setor de Serviços,
DD Serviços
Serviços 22 66
40
Agropecuária,
Agropecuária,Pesqueira,
Pesqueira, Aquícola
Aquícola
e Florestal
e Florestal escolaridade deste setor, encontramos 17% acima citada). Para exemplificar, no setor
Trabalhadores
TrabalhadoresdadaExtração
ExtraçãodedeMinerais
Minerais
líquidos
líquidos
ee
Serviços
Serviços 00 33
30
E E
Gasosos
Gasosos com nível médio e 83% com nível superior, de Transporte e Logística, a mesma fun-
F F Guias
Guias
dede
Turismo
Turismo Serviços
Serviços 3131 5555
20
G G Garçons,
Garçons,Barmen,
Barmen,Copeiros
Copeirose Sommeliers
e Sommeliers Extração
Extração
e Energia
e Energia 11 1818 enquanto a qualificação de nível de instru- ção aparece: (i) em Rio Grande do Norte,
10 H H Garçons,
Garçons,Barmen,
Barmen,Copeiros
Copeirose Sommeliers
e Sommeliers Manufatura
Manufatura 2323 5858 ção no setor anterior é superior. apenas uma mulher com ensino superior
I I Garçons,
Garçons,Barmen,
Barmen,Copeiros
Copeirose Sommeliers
e Sommeliers Defesa
Defesa 33 77
0
A B C D E F G H I J K
J J Técnicos
Técnicos
ememMineração
Mineração Transporte
Transporte
e Logística
e Logística 22 44 Verifica-se também que a presença da ganhando a faixa salarial 1,01 a 1,50 SM;
Masculino Feminino K K Técnicos
Técnicos
dedeApoio
Apoio à Biotecnologia
à Biotecnologia Defesa
Defesa 00 33 mulher na ocupação faz diversificar as fai- (ii) e em Santa Catarina, também apenas
Total
Total 8585 187
187
xas salariais; além de os salários tenderem uma mulher com curso superior ganhan-
Fonte: Elaboração própria com base nos dados RAIS (2022) a ser mais baixos. Um exemplo: a função do 3,01 a 4,00 SM.

798 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 799
A ocupação de garçons, barmen, copei- homens e 21 mulheres (14 pessoas com o Em relação ao sexo dos trabalhadores e na Economia Nacional, o único setor que
ros e sommeliers é uma função que emprega nível fundamental e 10 com nível médio), nas das ocupações dos setores econômicos, aparece 50% ocupado por homens e mu-
em todas as faixas etárias, de forma geral faixas salariais 0,51 a 1,00 SM(1), 1,01 a 1,50 a Economia do Mar e Costeira das RM Lito- lheres é o de Serviços, os demais setores
apresenta baixo nível de escolaridade e de SM (4), 1,51 a 2,00 SM (11), 2,01 a 3,00 SM râneas é preponderante no sexo masculino são ocupados em maioria por homens.
salários. Quando a ocupação é repartida (6), e não classificado (2).
Tabela 5: Comparativo das ocupações por setores na economia do Mar e
com as mulheres, isso tende a ser ainda No Setor da Defesa, a ocupação garçons,
Costeira nas RM litorâneas e a Economia Nacional – dados de 2019
mais agravado. No setor de Extração e barmen, copeiros e sommeliers é realizada
Energia, a função mostra: (i) em Pernambu- pelo taifeiro, que tem uma remuneração Ocupações
co apenas 2 mulheres com ensino Médio, mais elevada em função do soldo. Assim, Setores Economia do Mar e Costeira Economia Nacional
ganhando na faixa de 0,51 a 1,00 SM (1) os salários mais altos não se verificam no das RM Litorâneas
e 1,01 a 1,50 SM (1); (ii) no Rio de Janeiro, restante dos setores analisados. Todos
M F T M F T
11 mulheres (6 com ensino fundamental e apresentam idade acima de 50 anos
5 com ensino médio) e remuneração se di- de idade: (i) no Rio Grande do Norte, Pesca e Aquicultura 3.337 46 3.383 334.762 49.866 384.628
vide em: 0,51 a 1,00 SM (1), 1,01 a 1,50 encontramos 1 pessoa do sexo masculino e Extração e Energia 2.756 393 3.150 222.260 129.784 352.044
SM (2), 1,51 a 2,00 SM (4), 2,01 a 3,00 SM 2 do Feminino, todos com ensino médio e Manufatura 1.028 133 1.161 6.554.161 2.207.043 8.761.204
(2), e 3,01 a 4,00 SM (1), não classifica- a remuneração está na faixa de 4,01 a 5,00
Transporte e Logística 13.085 1.067 14.151 1.972.766 398.342 2.371.108
do (1). Se usarmos os mesmos Estados no SM (2) e não classificado (1); no Rio de
setor de Manufatura, encontramos: (i) em Janeiro, 2 homens e 4 mulheres, 5 pessoas Serviços 94.631 69.272 163.903 12.147.338 12.355.462 24.502.800
Pernambuco 7 mulheres (1 analfabeta, 3 com nível fundamental e 1 nível superior e Defesa 20 9 29 135.504 26.028 161.532
ensino fundamental e 3 ensino médio) com as faixas de remuneração são 5,01 a 7,00 Total 114.857 70.920 185.777 21.366.791 15.166.525 36.533.316
remuneração nas faixas 1,01 a 1,50 SM (3) SM (4) e 7,01 a 10,00 SM (2). Esse também
e 3,01 a 4,00 SM (1), não classificado (3); é mais um exemplo de remuneração mais Obs: atividades que não entram na conta- síduos e descontaminação; organismos inter-
(ii) no Rio de Janeiro, temos na função 3 elevada na região Sudeste e Sul. gem: agricultura, pecuária, produção flores- nacionais e outras instituições extraterritoriais;
tal; água, esgoto, atividades de gestão de re- administração pública, seguridade social.
6. Comparação da Economia do Mar e Costeira das RM Litorâneas com Fonte: Elaboração própria com base nos dados RAIS (2022)
a Economia Nacional
7. Considerações finais
A Tabela 5 a seguir indica uma compa- percentuais que a Economia do Mar e Cos-
ração das ocupações dos trabalhadores dos teira das RM Litorâneas equivale a 0,51% Os ecossistemas marinhos e costeiros formais e informais da Economia do Mar e
setores econômicos da Economia do Mar da Economia Nacional. fornecem produtos e serviços como: petró- Costeira são responsáveis por aproximada-
das RM Litorâneas e da Economia Nacional. A composição dos setores econômicos leo, alimentos, proteção costeira, lazer, en- mente 19 milhões de postos, representan-
Cabe salientar que as atividades agricultura, da Economia do Mar das RM Litorâneas tre outros; sendo indiscutível a sua relevân- do 20% da ocupação nacional.
pecuária, produção florestal; água, esgoto, perfaz a seguinte combinação: (i) Pesca e cia para a economia de uma nação. O Brasil Dito isso, ressalta-se que o Brasil, dife-
atividades de gestão de resíduos e descon- Aquicultura (1,82%); (ii) Extração e Ener- possui muitas cidades próximas e contíguas rentemente de outros países, ainda não
taminação; organismos internacionais e ou- gia (1,7%); (iii) Manufatura (0,62%); (iv) ao mar, o que evidencia ainda mais a impor- trata o mar como um setor econômico,
tras instituições extraterritoriais; administra- Transporte e Logística (7,62%); (v) Serviços tância do Setor Marítimo. Como estimado deixando de aproveitar plenamente o re-
ção pública, seguridade social não entram (88,23%); e (vi) Defesa (0,02%). em Carvalho (2018), o PIB do mar em 2015 curso. Detentor de uma extensão conti-
na contagem da totalidade das ocupações. Os setores que mais empregam na representa 19% na participação no PIB na- nental e um dos maiores litoral costeiros
Dito isso, a Economia Nacional mostra Economia do Mar e Costeira das RM cional, sendo maior que países como Fran- do mundo, não mensura o setor, e des-
um total de 36.533.316 ocupações, en- Litorâneas são o de Serviços (83%) e ça, Austrália, China, EUA, que são nações sa forma, não explora adequadamente a
quanto a Economia do Mar e Costeira das o de Transporte e Logística (11%), já que entendem o mar como potencial eco- imensa riqueza que possui. Assim, a falta
RM Litorâneas indica um total de 185.777 na Economia Nacional são o de Servi- nômico, apresentando políticas voltadas a desse olhar também mostra poucos es-
ocupações, o que representa em termos ços (57%) e o de Manufatura (31%). ele. E em relação ao emprego, as ocupações tudos e análises na área, de modo que a

800 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 801
temática é pouco pesquisada. Nesse senti- de Extração e Energia, apontando um nível Referências
do, esse trabalho tem um caráter pioneiro intermediário de instrução, faixa etária pre-
na contribuição para a evolução do pano- valecente de 30 a 49 anos de idade, predo- BRASIL. Ministério do Trabalho. Classifi- volvimento, PUCRS, Porto Alegre, 2018.
rama das ocupações dos trabalhadores das minância do sexo masculino e rendimentos cação Brasileira de Ocupações (CBO). CLEMENTE, C. C. Faces do Pré-Sal Brasi-
RM litorâneas associadas ao mar e à costa. mais elevados; Setor de Manufatura, tam- Disponível em: http://www.mtecbo.gov. leiro: Migração, Trabalho e Sociabilidade.
Este capítulo apresentou o perfil dos bém prevalecente no sexo masculino e na br/cbosite/pages/informacoesGerais.jsf;j- Ideias, Campinas, SP, v. 5, n. 2, p. 40–64,
trabalhadores associados às atividades li- escolaridade média, exibe distribuições de sessionid=gU1YWO66OijJFMlLAENnQSsH. 2015. DOI: 10.20396/ideias.v5i2.8649429.
torâneas da Zona costeira metropolitana ocupações nas diferentes faixas etárias e sa- slave17:mte-cbo. Acesso em: dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.sbu.
brasileira. Primeiro, indicando a classifica- lariais; Setor de Transporte e Logística, ocu- BRASIL. Ministério do Trabalho. Relação unicamp.br/ojs/index.php/ideias/article/
ção ocupacional adotada pelas nações, tra- pados na maioria por homens, de faixa etá- Anual das Informações Sociais. Disponível view/8649429. Acesso em: 3 set. 2021.
zendo alguns exemplos para ilustrar o quão ria intermediária e nível médio de instrução em: https://bi.mte.gov.br/bgcaged/caged_ DECRETO Nº 5.300 DE 7 DE DEZEMBRO
complexo é quantificar e qualificar os tra- e faixas salariais mais elevadas; Setor de Ser- rais_vinculo_id/caged_rais_vinculo_basico_ DE 2004. Regulamenta a Lei no 7.661,
balhadores relacionados à costa e ao mar, viços, mais equilibrado, em relação ao sexo, tab.php. Acesso em: dez. 2021 de 16 de maio de 1988, que institui o
lembrando que diferentes dimensões das nas ocupações, apresenta baixa escolarida- BRASIL. Ministério do Trabalho. Cadastro Plano Nacional de Gerenciamento Cos-
nações e as suas peculiaridades retratam de e salários mais baixos, e é o que emprega Anual Geral de Empregados e Desem- teiro – PNGC, dispõe sobre regras de uso
realidades e condutas próprias, dificultando em todas as faixas etárias; o Setor de De- pregados. Disponível em: https://bi.mte. e ocupação da zona costeira e estabelece
a comparabilidade das ocupações. fesa, caracterizado por escolaridade média, gov.br/bgcaged/caged_acerto/caged_acer- critérios de gestão da orla marítima, e dá
Segundo, apresentando a entrada e idade acima de 50 anos, remuneração seg- to_basico_tabela.php. Acesso em: dez. 2021 outras providências. Disponível em:
saída das ocupações associadas ao mar mentada em diferentes faixas salariais. BUREAU OF LABOR STATISTICS, U.S. De- http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
e à costa, que conforme dados do IBGE As ocupações dos trabalhadores do partment of Labor, Occupational Out- ato2004-2006/2004/decreto/d5300.htm.
no ano de 2019, em comparação ao ano mar são exercidas na maioria por homens, look Handbook, Water Transportation INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION.
de 2018, as ocupações relacionadas aos e onde se verifica a presença da mulher, se Workers. Disponível em: https://www.bls. International Standard Classification
setores do mar e da costa apresentaram observam mais faixas salariais na ocupação, gov/ooh/transportation-and-material-mo- of Occupations (ISCO). Disponível em:
ving/water-transportation-occupations. https://ilostat.ilo.org/resources/concepts-
fluxos menores de contratações, contudo, assim como os níveis salariais na ocupação
htm. Acesso em: 19 abr. 2022. -and-definitions/classification-occupation/.
o saldo manteve-se positivo. A ocupação tendem a ser mais baixos. Percebe-se tam-
BUREAU OF LABOR STATISTICS, U.S. Fishing Acesso em: 5 maio 2022.
de maior fluxo do emprego formal por se- bém que ocupações apresentam diferenças
and Hunting Workers. Disponível em: ht- INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA.
tor mar e costa no ano de 2019 foi a de entre si, dependendo do setor e da região.
tps://www.bls.gov/ooh/farming-fishing-and- Classificação Portuguesa das Profissões:
garçons, barmen, copeiros e sommeliers Comparando os setores que mais empre-
-forestry/fishers-and-related-fishing-workers. 2010. Lisboa: INE, 2011. Disponível em:
(6084 postos); essa mesma ocupação foi gam da Economia do Mar e Costeira das
htm. Acesso em: 19 abr. 2022. https://www.ine.pt/xurl/pub/107961853.
também a que mais contratou, enquanto RM Litorâneas com os setores da Economia
CARVALHO, A. B. Economia do Mar: Acesso em: 5 maio 2022.
a Gerentes de operações de Turismo, Alo- Nacional, a primeira, os setores que mais
Conceito, Valor e Importância para o Bra- MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Macro-
jamento e Alimentação; e a de Superviso- empregam são os Setores de Serviços e de sil. 2018. Tese (Doutorado) – Programa de diagnóstico da Zona Costeira e Mari-
res dos Serviços de Transportes, Turismo, Transporte e Logística; enquanto o da Eco- Pós Graduação em Economia do Desen- nha do Brasil. Brasília, DF. 2008. 242 p.
Hotelaria e Administração e Edifícios fo- nomia Nacional são os de Serviços e o de
ram as que mais perderam postos (respec- Manufatura.
tivamente, -1490 e -691). De toda forma, as ocupações de manei- ANEXO 1
Seguindo, exibiu-se o perfil das ocupa- ra geral, diferem não só entre os setores e DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO
ções formais associadas ao mar e à costa as regiões, mas também sofrem influência Publicado em: 3/2/2021| Edição: 23| Seção: 1| Página: 53
das RM litorâneas. Para isso, apresentou-se de todo o contexto que as envolvem, des- Órgão: Ministério do Meio Ambiente/Gabinete do Ministro
uma análise por setores: Setor de Pesca e de disponibilidade de pessoas aptas à de- PORTARIA MMA Nº 34, DE 2 DE FEVEREIRO DE 2021
Aquicultura, indicando quase que a totali- terminada função até características como: Aprova a listagem atualizada dos municí- O MINISTRO DE ESTADO DO MEIO AM-
dade de homens, idade média e avançada, escolaridade, habilidades técnicas, expe- pios abrangidos pela faixa terrestre da zona BIENTE, no uso de suas atribuições, e tendo
de baixa escolaridade e rendimento; Setor riência e capacidade de adaptação. costeira brasileira. em vista o disposto no Decreto nº 10.455,

802 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 803
de 11 de agosto de 2020, no art. 4º do De- Municípios abrangidos pela faixa terrestre Olinda, Paulista, Recife, Rio Formoso, São tacazes, Carapebus, Casimiro de Abreu,
creto nº 5.300, de 7 de dezembro de 2004, da zona costeira, serão disponibilizados no José Coroa Grande, Sirinhaém e Tamandaré. Duque de Caxias, Guapimirim, Iguaba
e o que consta no Processo Administrativo portal do Ministério do Meio Ambiente na ALAGOAS: Atalaia, Barra de Santo Antônio, Grande, Itaboraí, Itaguaí, Macaé, Magé,
nº 02000.000303/2021-91, resolve: rede mundial de computadores. Barra de são Miguel, Coqueiro Seco, Coru- Mangaratiba, Maricá, Mesquita, Nilópolis,
Art. 1º Aprovar a listagem atualizada dos Art. 2º Fica revogada a Portaria nº 461, de ripe, Feliz Deserto, Igreja Nova, Japaratinga, Niterói, Nova Iguaçu, Paraty, Quissamã, Rio
Municípios abrangidos pela faixa terres- 13 de dezembro de 2018. Jequiá da Praia, Maceió, Maragogi, Marechal das Ostras, Rio de Janeiro, São Francisco
tre da zona costeira do País. Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data Deodoro, Messias, Murici, Paripueira, Passo do Itabapoana, São Gonçalo, São João da
Parágrafo único. Os arquivos digitais, em de sua publicação. de Camaragibe, Penedo, Piaçabuçu, Pilar, Barra, São João do Meriti, São Pedro da Al-
formato shapefile, com a delimitação dos RICARDO SALLES Porto Calvo, Porto de Pedras, Rio Largo, Ro- deia, Saquarema e Seropédica.
teiro, Santa Luzia do Norte, São Luís do Qui- SÃO PAULO: Bertioga, Cananeia, Caragua-
ANEXO I tunde, São Miguel dos Milagres e Satuba. tatuba, Cubatão, Guarujá, Iguape, Ilhabe-
LISTAGEM ATUALIZADA DOS MUNICÍPIOS ABRANGIDOS PELA FAIXA TERRESTRE DA SERGIPE: Aracaju, Barra dos Coqueiros, la, Ilha Comprida, Itanhaém, Mongaguá,
ZONA COSTEIRA BRASILEIRA Brejo Grande, Carmópolis, Divina Pastora, Peruíbe, Praia Grande, Santos, São Sebas-
Estância,General Maynard, Ilha das Flores, tião, São Vicente e Ubatuba.
AMAPÁ: Amapá, Calçoene, Cutias, Itaubal, do Maranhão, São João Batista, São José Indiaroba, Itaporanga d’Ajuda, Japaratu- PARANÁ: Antonina, Guaraqueçaba, Gua-
Macapá, Mazagão, Oiapoque, Pracuúba, de Ribamar, São Luís, Serrano do Mara- ba, Japoatã, Laranjeiras, Maruim, Neópolis, ratuba, Matinhos, Morretes, Paranaguá e
Santana, Tartarugalzinho e Vitória do Jari. nhão, Turiaçu, Tutóia e Viana. Nossa Senhora do Socorro, Pacatuba, Pi- Pontal do Paraná.
PARÁ: Abaetetuba, Afuá, Anajás, Ananin- PIAUÍ: Bom Princípio do Piauí, Cajueiro da rambu, Riachuelo, Rosário do Catete, San- SANTA CATARINA: Araquari, Araranguá,
deua, Augusto Corrêa, Bagre, Barcarena, Praia, Ilha Grande, Luís Correia e Parnaíba. ta Luzia do Itanhy, Santo Amaro das Brotas, Balneário Arroio do Silva, Balneário Barra do
Belém, Benevides, Bragança, Breves, Cacho- CEARÁ: Acaraú, Amontada, Aquiraz, Aracati, São Cristóvão e Siriri. Sul, Balneário Camboriú, Balneário Gaivota,
eira do Arari, Capanema, Castanhal, Cha- Barroquinha, Beberibe, Camocim, Cascavel, BAHIA: Alcobaça, Araçás, Aratuípe, Bel- Balneário Piçarras, Balneário Rincão, Barra
ves, Colares, Curralinho, Curuçá, Gurupá, Caucaia, Chaval, Cruz, Eusébio, Fortaleza, monte, Cachoeira, Cairu, Camaçari, Ca- Velha, Biguaçu, Bombinhas, Camboriú, Ca-
Inhangapi, Magalhães Barata, Maracanã, Fortim, Icapuí, Itapipoca, Itarema, Jijoca de mamu, Canavieiras, Candeias, Caravelas, pivari de Baixo, Florianópolis, Garopaba, Ga-
Marapanim, Marituba, Melgaço, Muaná, Jericoacoara, Paracuru, Paraipaba, Pindoreta- Cardeal da Silva, Catu, Conde, Dias d’Ávi- ruva, Governador Celso Ramos, Içara, Imaruí,
Oeiras do Pará, Ponta de Pedras, Portel, Pri- ma, São Gonçalo do Amarante e Trairi. la, Entre Rios, Esplanada, Igrapiúna, Ilhéus, Imbituba, Itajaí, Itapema, Itapoá, Jaguaruna,
mavera, Quatipuru, Salinópolis, Salvaterra, RIO GRANDE DO NORTE: Areia Branca, Arês, Itabuna, Itacaré, Itanagra, Itaparica, Itube- Joinville, Laguna, Maracajá, Navegantes, Pa-
Santa Bárbara do Pará, Santa Cruz do Arari, Baía Formosa, Caiçara do Norte, Canguareta- rá, Jaguaripe, Jandaíra, Lauro de Freitas, lhoça, Passo de Torres, Paulo Lopes, Penha,
Santa Izabel do Pará, Santarém Novo, Santo ma, Ceará Mirim, Extremoz, Galinhos, Gros- Madre de Deus, Maragogipe, Maraú, Mata Pescaria Brava, Porto Belo, Santa Rosa do Sul,
Antônio do Tauá, São Caetano de Odivelas, sos, Guamaré, Macaíba, Macau, Maxaran- de são João, Mucuri, Nazaré, Nilo Peçanha, São Francisco do Sul, São João do Sul, São
São João da Ponta, São João de Pirabas, São guape, Mossoró, Natal, Nísia Floresta, Parna- Nova Viçosa, Pojuca, Porto Seguro, Prado, José, Sombrio, Tijucas e Tubarão.
Sebastião da Boa Vista, Soure, Terra Alta, mirim, Pedra Grande, Pendências, Porto do Salinas de Margarida, Salvador, Santa Cruz RIO GRANDE DO SUL: Arambaré, Arroio do
Tracuateua, Vigia e Viseu. Mangue, Rio do Fogo, São Bento do Norte, Cabrália, Santa Luzia, Santo Amaro, São Sal, Arroio do Padre, Arroio Grande, Bal-
MARANHÃO: Água Doce do Maranhão, São Gonçalo do Amarante, São Miguel do Félix, São Francisco do Conde, São Sebas- neário Pinhal, Barra do Ribeiro, Camaquã,
Alcântara, Anajatuba, Apicum-Açu, Araio- Gostoso, Senador Georgino Avelino, Tibau, tião do Passé, Saubara, Simões Filho, Tape- Capão da Canoa, Capão do Leão, Capivari
ses, Arari, Axixá, Bacabeira, Bacuri, Bacu- Tibau do Sul, Touros e Vila Flor. roá, Una, Uruçuca, Valença e Vera Cruz. do Sul, Chuí, Cidreira, Cristal, Dom Pedro de
rituba, Barreirinhas, Bequimão, Cajapió, PARAÍBA: Alhandra, Baía da Traição, Bayeux, ESPÍRITO SANTO: Anchieta, Aracruz, Cariaci- Alcântara, Imbé, Itati, Jaguarão, Mampitu-
Cândido Mendes, Carutapera, Cedral, Caaporã, Cabedelo, Conde, João Pessoa, ca, Conceição da Barra, Fundão, Guarapari, ba, Maquiné, Morrinhos do Sul, Mostardas,
Central do Maranhão, Cururupu, Godo- Lucena, Marcação, Mataraca, Pitimbu, Rio Itapemirim, Jaguaré, Linhares, Marataízes, Pi- Osório, Palmares do Sul, Pelotas, Rio Gran-
fredo Viana, Guimarães, Humberto de Tinto e Santa Rita. úma, Presidente Kennedy, São Mateus, Serra, de, Santa Vitória do Palmar, Santo Antônio
Campos, Icatu, Luís Domingues, Mirinzal, PERNAMBUCO: Abreu e Lima, Barreiros, Sooretama, Viana, Vila Velha e Vitória. da Patrulha, São José do Norte, São Louren-
Morros, Paço do Lumiar, Paulinho Neves, Cabo de Santo Agostinho, Fernando de No- RIO DE JANEIRO: Angra dos Reis, Ararua- ço do Sul, Tapes, Tavares, Terra de Areia, Tor-
Porto Rico do Maranhão, Primeira Cruz, ronha, Goiana, Igarassu, Ilha de Itamaracá, ma, Armação dos Búzios, Arraial do Cabo, res, Tramandaí, Três Cachoeiras, Três Forqui-
Raposa, Rosário, Santa Rita, Santo Amaro Ipojuca, Itapissuma, Jaboatão Guararapes, Belford Roxo, Cabo Frio, Campos dos Goy- lhas, Turuçu, Viamão e Xangri-Lá.

804 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 805
ANEXO 2 Tabela 7: Ocupações formais do Setor de Extração e Energia das RM Litorâneas

Fundamental Completo
Completo
9ª Fundamental
Fundamental

Superior Incompleto
Incompleto

Superior Completo
Completo

20,00 SM
SM
Médio Incompleto
Incompleto

15,00 SM
SM
20,00 SM
SM
5ª Incompleto
Incompleto

Médio Completo
Completo

10,00 SM
SM
1,00 SM
SM
1,50 SM
SM
2,00 SM
SM
3,00 SM
SM
4,00 SM
SM

5,00 SM
SM
7,00 SM
SM

de 20,00
a 15,00
a 20,00
Fundamental
Fundamental

Fundamental

a 10,00
5ª Completo
Completo

a 1,00
a 1,50
a 2,00
a 3,00
a 4,00

a 5,00
a 7,00
Ou Mais
Mais
Tabela 6: Ocupações formais do Setor de Pesca e Aqüicultura das RM Litorâneas

Ocupações
Ocupações

Doutorado
Doutorado
Masculino
Masculino

Mestrado
Mestrado
Feminino
Feminino

Até 0,50
0,50
Superior

Superior
A 24
24
A 29
29

A 39
39

A 49
49

A 64
64

Mais de

{ñ class}
class}
10,01 a
15,01 a
a 9ª

0,51 a
1,01 a
1,51 a
2,01 a
3,01 a

4,01 a
5,01 a
7,01 a
Médio

Médio
65 Ou
Até 5ª

10,01
15,01
Total
Total
18 A
25 A

30 A

40 A

50 A

Mais
0,51

1,01
1,51
2,01
3,01
4,01
5,01

7,01
6ª a
Até

Até
18

25

30

40

50
65



Fundamental

Superior Incompleto
AA 11 22 33 00 00 22 11 00 00 00 00 00 00 00 00 00 22 11 00 00 00 00 00 00 11 00 00 00 00 11 00 11

a 9ª Fundamental

Superior Incompleto
9ª Fundamental

Completo
Superior Incompleto

Mais de 20,00 SM
Incompleto

10,01 a 15,00 SM
a 20,00 SM
5ª Incompleto

Completo

0,50 Completo

SM
Incompleto

Mais de 20,00 SM
Médio Incompleto

SM
a 20,00 SM
Incompleto

SM

SM
Incompleto

Completo

20,00SM
Médio Completo

Médio Completo

SM

SM
BB 23
23 99 32
32 00 00 44 10
10 17
17 11 00 00 00 00 00 00 22 18
18 99 33 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 14
14 18
18

SM

1,50 SM

SM

SM

SM
5,00 SM
SM
a 1,00 SM

1,00 SM
1,51 a 2,00 SM

SM

3,01 a 4,00 SM
4,01 a 5,00 SM
4,00 SM
0,51 a 1,00 SM
1,01 a 1,50 SM
1,51 a 2,00 SM
SM
3,01 a 4,00 SM
4,01 a 5,00 SM
5,01 a 7,00 SM

20,00

15,00
15,00
Dez
Fundamental

Fundamental

15,01a a10,00
5ª Completo

Não Ativ Dez


Fundamental

Fundamental

7,01 a 10,00
t l

Não Ativ Dez


Fundamental

7,01 aa 10,00
Completo
65Completo
CC 11 00 11 00 00 00 11 00 00 00 00 00 00 00 00 00 11 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 11

2,00

a 3,00

10,01a a7,00
65 Ou Mais

1,01 aa 1,50

2,01 aaa3,00

5,01 aa 7,00
Ou Mais
Analfabeto

a 3,00
Mais

Doutorado
Analfabeto
Analfabeto

Doutorado
Ocupações

Doutorado
Masculino

Completo
Masculino
Masculino

Completo

Mestrado
Mestrado
Feminino

Mestrado
Feminino

0,510,50
Feminino

Ativ
Até 0,50
Superior
Superior
l t
17

24

25 A 29

39

A 49

50 A 64
17

24

25 A 29

30 A 39

40 A 49

5ª64

DD 33 00 33 00 00 00 22 11 00 00 00 00 00 00 00 00 33 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 11 11 11 00

Superior

{ñ class}
{ñ class}
15 A 17
A 24

A 29

18 AA 39
40 A 49
A 64

Mais de
{ñ class}
6ª aa 9ª

Médio

Médio
Até 5ª
Médio
65 Ou

15,01
10,01
15,01
Total

50 A
Total

F d
Total

A
15 A

50 A

0,51

1,01

1,51

2,01

3,01
4,01
5,01
7,01
2,01
EE 15
15 00 15
15 11 00 66 55 33 00 00 11 00 00 11 11
11 00 22 00 00 00 00 00 00 55 33 33 11 00 00 00 22 11

Não
Até

Até
Até

Até
15

18

30

40
18
25
30



10A 0110 10811 C


AA 108 1 0 11 01 25
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00 25
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20 00 00 00 00 10 0 1 FF 31
31 31
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39 21
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34 99
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G 11 18
18 19
19 22 11 00 99 66 11 11 00 44 11 33 10
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1C 0413
CC 413
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0 0
0 0 00 020 90
0 2
203
090 0 71
2030 15
0
71 0115 10 0 1
0 0
0
0
0
0
0
0 40
0 0 0 40 HH 479
479 151
151 630
630 22 25
25 261
261 170
170 157
157 15
15 00 00 00 00 00 00 00 470
470 136
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24 00 00 00 00 11 00 00 22 21
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322 136
136
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DD 22 00 2 2 0 00 0 10 1 0 0 1
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39 88 4747 00 22 22
22 15
15 88 00 00 00 00 00 00 10
10 22 34
34 11 00 00 00 00 00 33 22 11 11 11 44 66 20
20 99
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EE 112
5F 20 1145 0 09
3 3 6
20
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0 0 2 2 2 0 0 0
130 790 2 1 2 00 04 00 0 0 1
0 1 0 0 3 0 1 0 012 070 150
0
360
1
190 12 14 0
3 0 02
2 0 0 16
0 0 00 00 01 00 00 20 0 1 JJ 33 11 44 00 00 11 22 11 00 00 00 00 00 00 22 00 22 00 00 00 00 00 00 22 00 00 00 00 11 00 00 11
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117 35
35 152
152 00 22 52
52 50
50 47
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120 21
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96 48
48
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16 00 10 2 1 6 0 4 0 3 0 0 01 00 0 00 00 0 0 11 0 1 0 3 10 00 00 00 00 40 41 30 2 0 0 02 00 00 10 00 00 0 0
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M 173
173 15
15 188
188 11 27
27 107
107 31
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107 00 00 00 00 00 00 11 00 00 00 33 16
16 17
17 101
101 50
50
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J 1 1 2 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 NN 263
263 19
19 282
282 11 37
37 145
145 74
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23 22 00 00 00 66 00 164
164 30
30 81
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25 66
66 97
97 37
37 31
31 66
J 21K 48 25 0 80 01 02 1 8 3 8 2 6 2 0 0 00 12 10 12 35 0 4 2 8 0 2 0 20 00 00 00 00 00 33 25 1 3 1 70 11 01 00 00 01 0 4
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55 11 56
56 00 00 38
38 14
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37 33 15
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21 11
11 11

Fundamental Completo
Completo
Fundamental Completo
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PP 43
43 22 45
45 00 55 22
22 12
12 66 00 00 00 00 22 00 28
28 11 14
14 00 00 00 00 00 00 00 00 00 11 44 10
10 18
18 55 77

9ª Fundamental
Fundamental
6ª a 9ª Fundamental

Superior Incompleto
Incompleto
Incompleto
LM 4
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013 0
18 0 3 0 1 0 0 0 100 0 0 1 1 1 1 03 013 0 0 0 0 1 23 1 50 11
1 1 0 0 0 0 0 0
0 456 326 2227 5 240 272 20 10 4 15 3 884 426 7 3 0 500 00 10 03 20 40 15
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Superior Completo
Completo
Superior Completo
N 1 0 0 0 4 0 0 0 0 0 4

20,00 SM
SM
SM
Médio Incompleto
Incompleto
Médio Incompleto

15,00 SM
SM
10,01 a 15,00 SM
SM
15,01 a 20,00 SM
SM
5ª Incompleto
5ª Incompleto
Incompleto
QQ 88 22 10
10 00 00 44 55 11 00 00 00 00 00 00 00 00 44 55 11 00 00 00 00 00 00 00 00 00 00 33 44 33

Completo
Médio Completo
Completo
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10,00 SM
SM
7,01 a 10,00 SM
37O 1 17 03 11
3 2 158 1 0 0 40 00 03 7 1 11 16 1 5 1 0 8 0 01 00 00 0 0 0 6 139 0 60 20 0 0 0 0 0

1,00 SM
SM
SM
1,50 SM
SM
1,01 a 1,50 SM
a 2,00 SM
SM
2,00 SM
SM
3,00 SM
SM
4,00 SM
SM
3,01 a 4,00 SM

7,00 SM
SM
5,01 a 7,00 SM
a 5,00 SM
SM
5,00 SM

20,00
de 20,00
a 15,00
20,00
20,00
NO 89P
218 27322 245
92 057
0 0 22 06 91
19 06 52127266 24
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0 0027 00 3 30 00 00 00 00 50 0 4 RR 74
74 55 79
79 11 44 20
20 31
31 22
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11 15
15 18
18 99 33 11 22 77

ttt lll

Fundamental

a 10,00
0

5ª Completo
Completo
Completo

a 1,00
1,00
a 1,50

1,51 a 2,00
a 3,00
a 3,00
a 4,00

a 7,00
4,01 a 5,00
Ou Mais
Ou Mais
Mais
Ocupações
Ocupações
Ocupações

Doutorado
Doutorado
Doutorado
OP 16
14Q 010 14171 0 100 03
1 502 50 8 3 1 0 0 04 00 0 00 000
010 1411 0 05 0 0 10 0 08 00 0 00 000 100 000 000 000 200 500 5 041 00 0013 01 1 00 00 00 00 00 00 0 0

Masculino
Masculino
Masculino
SS 33 00 33 00 00 11 11 00 11 11 00 00 00 00 11 00 11 00 00 00 00 00 11 00 00 00 11 11 00 00 00 00

Mestrado
Mestrado
Mestrado
Feminino
Feminino
Feminino

0,50
Até 0,50
0,50
Superior
Superior
Superior
A 24
18 A 24
24
A 29
25 A 29
29
A 39
39
30 A 39
A 49
40 A 49 49
A 64
50 A 64 64

de
Mais de
{ñ class}
class}
{ñ class}
10,01 a
a
a
PQ 221R 0017 1 22 00
5 0 22 00
1 011 03 6 0 7 5
0 1006 10 4 00 000
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65 30
30 95
95 00 13
13 40
40 13
13 28
28 11 00 00 00 00 00 58
58 55 29
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21 12
12 77 18
18 30
30

6ª ad9ª

0,51 a
a
1,01 a
1,51 a

2,01 a
3,01 a
4,01 a
5,01 a
7,01 a
Médio
Médio
Médio
65 Ou
Até 5ª

10,01
15,01
15,01
d
FFF6ª ad
Total
Total
Total
18 A
25 A

30 A

40 A
50 A

Mais
Mais
0,51
0,51
1,01

1,51
2,01
2,01
3,01

4,01
5,01
7,01
QR 03S 1150 4 16 0 56
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Até
Até

Até
Até
UU 44 11 66 11 11 22 11 00 11 00 11 00 00 11 33 00 11 00 00 00 00 33 00 11 11 00 00 11 00 00 00 00

18
25
30

40
50
65
65



RS 171T 05 1 22 0 00
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31U 175 2 177 12 103 1616851160 52018421 1 50 061
39
1 111 VVVV 1111 0000 1111 0000 0000 1111 0000 0000 0000 0000 0000 1111 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 1111 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000
ST 50 186 4956 0 03 9 14 15 9 2 931 4 2239341260 5409 00 0 101700 000 020 8120 6680 1228 19
11
124 0 626 61404 10
0 42 50 01 05 00 320 0 3
TU 11 01 114110 00 5
410 0 313 4 594 121
0 0180 0 330 00 27
0 031 1042 0 174 1 27 0 1070 02 0 1 0 0 2 00 00 3 1 0 4 3 102 0 0 500 252
14 1 15 13 4 0 0 0 48
XXXX 129
129
129
12948
48
48
48177
177
177
177 0000 12
12
12
12 76
76
76
76 51
51
51
51 38
38
38
38 0000 0000 0000 0000 0000 2222 54
54
54
54 2222 117
117
117
117 2222 0000 0000 0000 0000 1111 3333 2222 2222 16
16
16
1635
35
35
3519
19
19
1915
15
15
1516
16
16
16 68
68
68
68
UV 1
175 32 41771 12 10
0 016 1 510 52
0 042 0 5 0 60 390 011 431 0 230 12 0 54 0 00 0 1 0 0 0 00 00 012 0 19 0 680 0 0 60
28 46 4 2 0 0 0 0 32 W
WWW 77
7777 0000 77
77 7777 0000 0000 29
77 29
29
29 33
33
33
33 14
14
14
14 1111 0000 0000 1111 4444 3333 54
54
54
54 3333 12
12
12
12 0000 0000 0000 0000 0000 3333 8888 11
11
11
11 6666 10
10
10
1012
12
1212 8888 7777 7777 5555
VVVV32
VV32
VV32
32
V32
32
V0V
32
032
V032
V032
0
V32
032
0V32
0VV
32
32
032
32
032
032
032
32
32
032
0032
1032
010032
01032
010132
0100132
132
032
01012
001012
01012
0112
000112
12
80112
0812
1812
1018011
12
812
811
0811
0812
011
12
0811
011
12
811
0812
11
0
12
12
11
802
8011
011
28020811
280
11
82211
0220211
11
2011
20
62620260226020652625662526525665265256262
56465645664654
656446566446556451
664164616416064116046101406410046010610601
06061000101
001
0010000000000000000000000018
0018
00018
0018
0018
018
0
6018
6018
618
0060018
618
6066618
0618
060618
66118
6118
618
616160116061610660100601106060160010001010010100000000000000000000000000100010001010010100110010010101001 1 111 YYYY 49
49
4949 0000 49
49
4949 0000 1111 14
1414 15
14 1515 15
15 1515 4444 0000 0000 0000 3333 1111 39
15 3939 1111 5555 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 0000 2222 7777 21
39 21
21
21 8888 2222 9999
ZZZZ 39
39
3939 0000 39
39
3939 2222 6666 14
1414 8888 5555 4444 0000 0000 0000 2222 1111 19
14 1919 1111 16
19 16
16
16 0000 0000 0000 0000 1111 0000 5555 1111 5555 1111 9999 1111 6666 8888 2222
Fonte: Elaboração Própria com base nos dados da RAIS (2022)
AA
AAAA782
AA 782
78212
782 12
1212794
794
79415
794 15
151560
60
6060441
441
441
441199
199
199
19974
74
74
74 5555 0000 1111 7777 4444 11
11
11
11691
691
691
69110
10
10
10 69
69
69
69 1111 0000 1111 2222 5555 4444 151
151
151
151105
105
105
10553
53
53
5383
83
83
8356
56
56
5672
72
72
7224
24
242462
62
6262176
176
176
176
AB
AB
AB
AB276
276
276
276 2222 278
278
278
278 2222 9999 111
111
111
111 87
87
87
87 58
58
58
5811
11
1111 0000 0000 2222 25
25
25
25 3333 222
222
222
22214
14
14
14 12
12
12
12 0000 0000 0000 0000 2222 1111 14
14
14
14 17
17
17
17 22
22
22
2277
77
77
7761
61
61
6139
39
39
39 8888 6666 31
31
31
31

(A) Biólogos e Afins; (B) Carpinteiros Navais e Mecânicos de Manutenção Naval (em Terra; Fonte: Elaboração Própria com base nos dados da RAIS (2022)
de Aeronaves; (C) Criadores de Animais Aquá- (L) Oficiais de Convés e Afins; (M) Pescadores
ticos; (D) Diretores de Produção e Operações de Água Costeira e Alto-Mar; (N) Pescadores (A) Biólogos e Afins; (B) Diretores de Pes- ção de Produtos Químicos, Petroquímicos e
em Empresa Agropecuária, Pesqueira, Aquí- Polivalentes; (O) Pescadores Profissionais Ar- quisa e Desenvolvimento; (C) Diretores de Afins; (O) Operadores de Produção e Refino
cola e Florestal; (E) Eletricistas-Eletrônicos tesanais de Água Doce; (P) Supervisores de Produção e Operações de Serviços de Arma- de Petróleo e Gás; (P) Operadores Polivalen-
de Manutenção Veicular (Aérea, Terrestre e Produção em Indústrias Químicas, Petroquí- zenamento, Transporte e Comunicação; (D) tes de Instalações Químicas, Petroquímicas,
Naval); (F) Garçons, Barmen, Copeiros e Som- micas e Afins; (Q) Supervisores dos Serviços de Diretores de Serviços de Informática; (E) Ele- e Afins; (Q) Pesquisadores das Ciências Bioló-
meliers; (G) Geólogos e Geofísicos; (H) Geren- Transporte, Turismo, Hotelaria e Administra- tricistas-Eletrônicos de Manutenção Veicular gicas; (R) Supervisores da Extração Mineral;
tes de operações de Serviços em Empresa de ção e Edifícios; (R) Técnicos em Aquicultura; (Aérea, Terrestre e Naval); (F) Engenheiros (S) Supervisores dos Serviços de Transporte,
Transporte, de Comunicação e de Logística (S) Técnicos em Transportes Intermodais; (T) Ambientais e Afins; (G) Garçons, Barmen, Turismo, Hotelaria e Administração e Edifí-
(Armazenagem e Distribuição); (I) Gerentes Técnicos Marítimos, Fluviários e Regionais de Copeiros e Sommeliers; (H) Geólogos e Geo- cios; (T) Técnicos em Geologia, Geotecnolo-
de Pesquisa e Desenvolvimento; (J) Gerentes Convés; (U) Trabalhadores de Apoio ao Extra- físicos; (I) Gerentes de operações de Serviços gia e Geofísica; (U) Técnicos em Mineração;
de Produção e Operações em Empresa Agro- tivismo da Pesca; (V) Trabalhadores na Nave- em Empresa de Transporte, de Comunicação (V) Técnicos em Transportes (Aduaneiros);
pecuária, Pesqueira, Aquícolas e Florestal; (K) gação Marítima, Fluvial e Regional e de Logística (Armazenagem e Distribui- (X) Técnicos em Transportes Intermodais; (W)
ção; (J) Gerentes de operações de Turismo, Técnicos em Transportes por Vias Navegáveis
Alojamento e Alimentação; (K) Gerentes de e Operações Portuárias; (Y) Técnicos Marí-
Pesquisa e Desenvolvimento; (L) Gerentes de timos, Fluviários e Regionais de Convés; (Z)
Produção e Operações em Empresa Agrope- Técnicos Petroquímicos; (AA) Trabalhadores
cuária, Pesqueira, Aquícolas e Florestal; (M) da Extração de Minerais Líquidos e Gasosos;
Oficiais de Convés e Afins; (N) Operadores (AB) Trabalhadores na Navegação Marítima.
de Processos das Indústrias de Transforma- Fluvial e Regional.

806 ECONOMIA AZUL Panorama das Ocupações das Regiões Metropolitanas 807
Tabela 8: Ocupações formais do Setor de Manufatura das RM Litorâneas Tabela 9: Ocupações formais do Setor de Transporte e Logísticadas RM Litorâneas

6ª a 9ª Fundamental

Superior Incompleto

Fundamental Completo
Superior Completo

Mais de 20,00 SM
Médio Incompleto

10,01 a 15,00 SM
15,01 a 20,00 SM
Até 5ª Incompleto

6ª a 9ª Fundamental

Superior Incompleto
Médio Completo

7,01 a 10,00 SM

Superior Completo

Mais de 20,00 SM
Médio Incompleto

10,01 a 15,00 SM

15,01 a 20,00 SM
Até 5ª Incompleto
0,51 a 1,00 SM
1,01 a 1,50 SM
1,51 a 2,00 SM
2,01 a 3,00 SM
3,01 a 4,00 SM
4,01 a 5,00 SM
5,01 a 7,00 SM

Médio Completo

7,01 a 10,00 SM
0,51 a 1,00 SM

1,01 a 1,50 SM

1,51 a 2,00 SM

2,01 a 3,00 SM

3,01 a 4,00 SM

4,01 a 5,00 SM

5,01 a 7,00 SM
t l

Não Ativ Dez


Fundamental
5ª Completo
65 Ou Mais

Fundamental
5ª Completo
Analfabeto
Ocupações

Doutorado

65 Ou Mais
Masculino

Analfabeto
Ocupações

Doutorado
Mestrado

Masculino
Feminino

Até 0,50

Mestrado
l t

Feminino
15 A 17
18 A 24
25 A 29
30 A 39
40 A 49
50 A 64

Até 0,50
{ñ class}

18 A 24

25 A 29

30 A 39

40 A 49

50 A 64

{ñ class}
F d
Total

Total
C
A 5 2 7 0 0 5 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 2 1 3 0
A 108 0 108 0 4 11 25 28 37 3 1 0 7 8 22 10 58 0 2 0 0 0 0 0 5 17 23 25 12 6 2 0 0 0 18
B 11 0 11 0 0 3 4 3 1 0 1 1 1 1 1 6 0 0 0 0 0 0 1 0 2 5 1 1 0 0 0 0 1
B 1 0 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 C 1 0 1 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
C 1 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 D 2 0 2 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0
D 2 0 2 0 0 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1 0 E 36 4 40 0 1 4 15 19 1 0 0 0 0 1 0 2 2 33 2 0 0 0 0 0 1 0 2 1 1 1 3 26 5
F 1 4 5 1 0 0 0 3 1 0 0 0 0 0 0 0 0 5 0 0 0 0 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 3
E 112 2 114 0 9 20 47 15 18 5 0 1 2 6 9 13 79 2 2 0 0 0 0 1 2 7 15 36 19 12 4 0 2 0 16
G 0 1 1 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0
F 5 4 9 0 1 1 5 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 9 0 0 0 0 0 0 1 3 1 0 1 1 2 0 0 0 H 7 0 7 0 0 1 3 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 1 1 4 0
G 23 58 81 0 6 5 16 24 26 4 1 4 2 11 22 8 32 0 1 0 0 0 0 7 24 26 11 3 0 0 0 0 0 0 10 I 113 3 116 4 7 44 34 25 2 0 0 1 2 5 6 87 6 1 0 0 0 1 1 3 8 12 17 8 34 18 5 0 9
H 3 0 3 0 0 0 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 J 15 15 30 0 6 19 3 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 27 2 1 0 0 0 2 0 4 5 3 8 4 0 2 2
K 39 35 74 1 4 21 19 23 6 1 2 1 9 12 8 39 0 2 0 0 0 4 28 14 16 2 0 0 0 0 0 0 10
I 16 2 18 0 1 0 8 5 3 1 0 0 0 0 0 0 4 1 11 2 0 0 0 0 1 0 1 2 1 1 3 0 2 6 1
L 3 3 6 0 0 5 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 4 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 3 0 2 0
J 1 1 2 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 M 462 89 551 21 56 199 162 107 6 2 0 0 7 5 8 156 68 292 6 7 1 0 8 11 47 48 39 54 65 75 50 88 65
K 22 15 37 0 0 2 19 11 5 0 0 0 0 0 0 0 3 1 33 0 0 0 0 0 0 0 2 0 2 1 3 8 8 9 4 N 2 2 4 0 0 0 2 2 0 0 0 0 0 0 0 3 0 1 0 0 0 0 0 0 0 3 0 1 0 0 0 0 0
L 2 0 2 0 0 0 1 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 14 20 45 152 69 1183 101 624 13 39 75 237 276 283 419 244 198 115 133 181
O 41 17 58 0 3 22 22 11 0 0 45 21 22

Fundamental Completo

Completo
Fundamental Completo
Completo
Fundamental Completo
Completo
Completo
Completo
9 3 7 1 1 7 4 6 0 3 0 5 1 4 3 6 8 9 6 7
M 135 1 136 1 13 18 45 32 22 5 0 2 0 10 15 10 88 4 7 0 0 0 0 3 3 13 20 40 15 16 2 6 2 5 11 P 3 2 5 3 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 1 2 2 0 0 0 0 3 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

6ª a 9ª Fundamental

a 9ª Fundamental
Fundamental
9ª Fundamental
Fundamental
9ª Fundamental
Fundamental
Superior Incompleto

Superior Incompleto
Incompleto
Superior Incompleto
Incompleto
Superior Incompleto
Incompleto
Superior Completo

Superior Completo
Completo
Completo
Completo
Superior Completo
Completo
24 20,00 SM

20,00 SM
SM
SM
20,00 SM
SM
SM
Médio Incompleto

Incompleto
Incompleto
Médio Incompleto
Incompleto
Médio Incompleto
Incompleto
Médio Incompleto
a 15,00 SM

Total a 20,00 SM

15,00 SM
SM
15,00 SM
SM
15,00 SM
SM
20,00 SM
SM
SM
SM
SM
Até 5ª Incompleto

5ª Incompleto
Incompleto
Incompleto
5ª Incompleto
Incompleto
5ª Incompleto
Incompleto
N 37 0 37 0 0 3 11 7 15 1 0 0 0 3 7 1 16 1 9 0 0 1 0 0 1 2 3 2 2 3 6 9 0 6 2 Q 12 12 0 0 1 5 4 2 0 0 0 0 0 5 1 0 0 0 0 0 6 00 1 2 4 2 1 1 0 0 0 1

Médio Completo

Completo
Completo
Médio Completo
Completo
Completo
Médio Completo
Completo
a 10,00 SM

10,00 SM
SM
SM
10,00 SM
SM
SM
SM
0,51 a 1,00 SM

1,01 a 1,50 SM

1,51 a 2,00 SM

2,01 a 3,00 SM

3,01 a 4,00 SM

4,01 a 5,00 SM

5,01 a 7,00 SM

SM
SM
1,00 SM
SM
1,00 SM
SM
1,00 SM
1,50 SM
SM
1,50 SM
SM
SM
SM
1,50 SM
2,00 SM
SM
SM
2,00 SM
SM
SM
SM
3,00 SM
3,00 SM
SM
3,00 SM
2,01 a 3,00 SM SM
SM
SM
4,00 SM
SM
SM
3,01 a 4,00 SM SM
5,00 SM
SM
5,00 SM
SM
SM
5,00 SM
SM
7,00 SM
SM
7,00 SM
SM
SM
7,00 SM
SM

20,00
de 20,00
20,00
de 20,00
10,01 aa 15,0015,00
10,01 aa 15,00
10,01 aa 20,0020,00
15,01 aa 20,0020,00
20,00
a 20,00
171 191 20 124
O 218 27 245 0 57 19 91 52 26 0 0 1 0 0 2 1 231 7 3 0 0 0 0 1 50 36 41 27 32 37 10 0 0 0 3

Fundamental

Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental
Fundamental

5,01 aa 10,00
7,01 aa 10,00
10,00
7,01 aa 10,00
7,01 a a10,00
R 47 285 699 376 422 86 1 1 9 5 58 13 526
5 4 0 1 11 73 18 44 33 38 66 183 439 452 503 98

5ª Completo

AtéCompleto
Completo
5ª Completo
Completo
Completo
5ª Completo
Completo

aa 1,00
a 1,00
0,51 aaa 1,00
0,51 aa 1,001,50
1,01 aa 1,50
1,01 aa 1,50
1,01 aa 2,00
1,51 aaa 2,00
2,00
1,51 aa 2,00
1,51 aa 2,00
2,01 aa 3,003,00
2,01 aa 3,00
aa 4,00
4,00
3,01 aa 4,004,00
4,00
4,01 aa 5,00
4,01 aa 5,00
5,00
4,01 aaa 5,00
5,01 aa 7,00
5,01 aa 7,007,00
7,00
10,01 a 15,00 SM65 Ou Mais

Ou MaisMais
Ou MaisMais
Mais
Mais
Mais
5 5 0 9

15,01 a 20,00 SMAnalfabeto

Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto
Analfabeto
Ocupações

Ocupações
Ocupações
Ocupações
Ocupações
Ocupações
Ocupações
Ocupações
Doutorado

Doutorado
Doutorado
Doutorado
Doutorado
Doutorado
Doutorado
Doutorado
Masculino

Masculino
Masculino
Masculino
Masculino
Masculino
Masculino
Masculino
Mestrado

Mestrado
Mestrado
Mestrado
Mestrado
Mestrado
Mestrado
Mestrado
Feminino

Feminino
Feminino
Feminino
Feminino
Feminino
Feminino
P 14 0 14 0 0 1 5 5 3 0 0 0 0 0 0 0 14 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 5 5 1 0 0 0 1

Até 0,50

0,50
Até 0,50
0,50
Até 0,50
0,50
Até 0,50
0,50
Superior
Superior
Superior
Superior
Superior
Superior
Superior
S 47 47 0 0 4 10 9 23 1 0 0 1 3 3 1 29 0 8 2 0 0 0 0 0 0 0 9 14 17 5 2 0

18 A 24

25 A 29

30 A 39

40 A 49

7,01 a 10,00 SM50 A 64

24
A 24 24
24
A 24 24
29
29
A 29 29
29
25 A 29 29
A 39 39
A 39 39
A 39
30 A 39 39
A 49 49
A 49 49
49
40 A 49 49
A 64 64
A 64 64
A 64 64
64
A de

{ñ class}

15,01de de
Mais de
Mais de de
{ñ class}
class}
class}
{ñ class}
class}
{ñ class}
class}
a

6ª aaa 9ª
6ª a 9ª

Médio
Médio
Médio
Médio
Médio
Médio
Médio
Médio
Médio

a
a

a
a
a
65 Ou
65 Ou
Ou
Ou
Ou
Até 5ª
Até 5ª 5ª

10,01
15,01

10,01
10,01
10,01
15,01
15,01
15,01
15,01
15,01
6ª a 9ª Fundamental

Superior Incompleto

293 985 712 551 75 18 26 54 197 82 1460 120 716 16 46 97 297 359 343 475 302 237 126 150 235

Total

Total
Total
Total
Total
Total
Q 1 0 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0

18 A
18 A A
A
A
A
25 A A
A
30 A
30 A
30 A
40 A
40 A A
A
50 A
50 A
50 A A
Mais

Mais
Mais
Mais
Mais
Mais
7,01

0,51
0,51
0,51
0,51
0,51
1,01
1,01
1,01
1,51
1,51
1,51
1,51
2,01
2,01
2,01
2,01
3,01
3,01
3,01
3,01
3,01
4,01
4,01
4,01
4,01
5,01
5,01
5,01
5,01
7,01
7,01
7,01
7,01
a
T 210 9 219 2 29 69 32 25

Até
Até
Até
Até

Até
Até
Até
Até
Superior Completo
Médio Incompleto

18
18
18
18
18
25
25
25
25
25
30
30
30
40
40
40
40
50
50
50
50
65
65
65
65
65
Até 5ª Incompleto

2 4 9 7 6 5 9 7 6 8 0 1 8 4 9 6 5 4 0 2 5 5 9 5 3

Mais de 20,00 SM













Médio Completo

R 3 1 4 0 0 0 0 2 1 1 0 0 0 0 0 1 3 0 0 0 0 U 0 230 10 0
23 20 13 07 1 8 0 50 00 0
0 00 00 0 0 1 11 6 5 0 0 0 0 0 0 0 0 1 U
U
UUUUU
U
0U
U23
23
23
23
23
23
23
23
23
23
6 1111116
111123
23
23
23
23
23
423
23
23
23000
4000000032
333333333 7777777777 8888888888 5555555555 0000000000000000000000000000000000000000000000000000000000111111111111
11
11
11
11
11
11
11
11
11666666666655555555550000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000 0000000000 1111111111 0000000000 666666666666666666664444444444444444442222222222

0,51 a 1,00 SM
1,01 a 1,50 SM
1,51 a 2,00 SM
2,01 a 3,00 SM
3,01 a 4,00 SM
4,01 a 5,00 SM
5,01 a 7,00 SM
Fundamental

Fundamental

S 1 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 V 0 00 10 1 00 01 00 0 0 0 00 00 0 00 00
Não Ativ Dez
0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0 VVVVVVV0
VVV0000000000 1111110
1111 11111011111 000000000010
111111111 0000000000 0000000000 0000000000 00000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000 0000000000 000000000011111111110000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000 1111111111 0000000000 0000000000 000000000000000000000000000000000000000000000000
5ª Completo
65 Ou Mais
Analfabeto
Ocupações

Doutorado
Masculino

Completo

Mestrado

T 31 18 49 0 3 9 14 15 8 0 0 1 0 1 1 1 9 2 34 0 0 X 0 100 10 11
0 20 80 116 6 412 14 20 0
0 00 04 0 0 0 1 1 8 1 0 0 0 0 0 1 0 XXX10
0 XXXXXXX0 10
1010
1010
1010
10
10
1 1111116 111111
11
11 11
11 11
111
11
11
11000 200000000000000000 6666666666 4444444444 1111111111 00000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000 1111111111 11111111118888888888111111111
01
0000000000000000000000000000000000000000000001111111111 0000000000 0000000000 0000000000 11111111116666666666111111111
21
2222222220000000000
Feminino

Até 0,50

{ñ class}
15 A 17
18 A 24
25 A 29
30 A 39
40 A 49
50 A 64

U 11 0 11 0 0 0 3 4 4 0 0 0 0 0 0 0 10 0 1 0 0 W 0 200 4
0 24
2 00 01 3 6 0 9 3 8
2 00 0
0 0
0 0
1 0 1 3 13 0 7 0 0 0 0 1 0 3 1 4 W
WWWW W
WWW
7W 20
2020
2020
20
20
20
201 4444442
20 444424
24
2424
2424
024
2424000000000013
24 111111111 6666666666 9999999999 8888888888 0000000000000000000000000000000000000000000000001111111111333333333313
13
1313
13
13
13
1313000000000077777777770000000000000000000000000000000000111111111100000000003333333333 1111111111 4444444444 7777777777 111111111122222222220000000000000000003333333333
13
Total

Y 2 4 6 0 1 4 1 0 0 0 0 0 0 0 0 6 0 0 0 0 0 0 0 2 2 1 YYYYYYY0
YYY22222222022 4444440
4444 66666066666 00000000001111111111 4444444444 1111111111 0000000000 00000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000 6666666666 000000000000000000000000000000 000000000000000000000000000000000000002222222222 2222222222 1111111111 0000000000 000000000000000000000000000000000000001111111111
V 1 3 4 1 2 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 4 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 4
Z 122 21 143 9 16 54 43 20 11 0 2 1 1 2 4 72 14 47 0 0 0 1 8 14 21 41 ZZZ122
18 ZZZZZZ18 Z122122
122122
122
122
122 122
122721
2121
21 21
21
2121
21
121
143
143143
143
143
143
143 3143
143
1439991999999916
16
1016
1616
16
16
16
16
16
5454
54
545454
54
54
54
5443
4343
4343
43
43
43
43
4320
2020
2020
20
20
20
20
2011
11
1111
11
11
11
11
11
11 000000000
20
222222222111111111111111111112222222222444444444472
7272
7272
72
72
72
72
7214
1414
141414
14
14
14
14
47

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