Você está na página 1de 5

A TRANSFORMAÇÃO SUBJETIVA ORIUNDA DO PROCEDIMENTO DE

MEDIAÇÃO

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo o estudo teórico e prático das formas
consensuais de solução de conflito, máxime nas consequentes transformações subjetivas
observadas no procedimento de mediação, abarcando o mediador, os mediandos e os terceiros
envolvidos na lide objeto do procedimento, destacando-se a necessidade de enxergar benesses
que vão além do desafogamento do Poder Judiciário e da celeridade processual.

Palavras-chave: Mediação; Transformação; Benefícios

1 INTRODUÇÃO

Os meios consensuais de solução de conflitos foram, felizmente, fomentados no


ordenamento jurídico brasileiro com a edição da Resolução nº 125 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), ganhando merecido destaque com o advento do Novo Código de Processo
Civil – Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Esse novo viés ganhou relevância diante dos
problemas enfrentados pelo Poder Judiciário, haja vista não conseguir responder à grande e
crescente demanda judicial.
Estudos realizados pelo CNJ, feitos no ano de 2013, apontam que o número de processos
que tramitam na justiça chega a 95,1 milhões, sendo que, de acordo com a projeção feita pelo
mesmo órgão, até o ano de 2020, esse número pode chegar a 114,5 milhões. Diante de tamanho
abarrotamento, não se consegue observar e atender as peculiaridades de cada caso, o que gera
no cidadão uma grande insatisfação.
Dentro dos meios consensuais, existem os métodos autocompositivos, como a
conciliação, a negociação e a mediação, sendo que o fomento aos aludidos procedimentos pode
proporcionar grandes benesses ao sistema como um todo. Porém, em um primeiro momento,
percebe-se que a adoção desses métodos causa estranheza e rejeição, pois a cultura brasileira
revela-se litigante, além do hábito de transmitir ao outro a responsabilidade de solucionar o que
nos é devido.
Assim, elenca-se a necessidade de alteração desse paradigma da cultura litigante ou
cultura da sentença, uma vez que os meios autocompositivos mostram-se extremamente
eficazes e possuem o condão de proporcionar um resultado em que todos saem ganhando,
diferentemente dos meios heterocompositivos.
Nessa linha de intelecção, um estudo acerca das consequências oriundas dos
procedimentos autocompositivos revela-se salutar, máxime observando as transformações
causadas no terceiro imparcial que dirige o procedimento, bem como nas partes que se
submetem ao mesmo, além daqueles terceiros que sofrerão às consequências postas na lide
objeto do procedimento.

2 METODOLOGIA

A metódica metodológica do presente estudo pautou-se em pesquisas bibliográficas das


principais obras relacionadas às formas consensuais de solução de conflitos e dos meios
autocompositivos como um todo, de modo a se obter uma base teórica para desenvolvimento
do objeto de análise. De modo mais aprofundado, o estudo teórico elencou a espécie
autocompositiva denominada mediação.
No que tange ao campo prático, o desenvolvimento do estudo e da pesquisa do presente
trabalho concentrou-se na experiência pessoal dos autores, que são mediadores credenciados
pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e lidam com o procedimento diariamente,
bem como em entrevistas – realizadas por colaboradores – com os mediandos –, que
respondiam às perguntas depois de submeterem-se ao procedimento.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 A mediação

A mediação é procedimento não adversarial, um meio consensual de solução de


controvérsias, litígios e impasses, no qual um terceiro neutro e imparcial trabalha como um
“facilitador”, auxiliando a comunicação entre duas ou mais pessoas que estão envolvidas em
um conflito.
O mediador é um catalisador que usa de técnicas para ajudar às partes a encontrarem
uma solução para suas pendências. Vale lembrar que o mediador não toma as decisões, mas,
sim, as partes envolvidas (autocomposição). A mediação almeja alcançar um resultado ganha-
ganha, ou seja, é um procedimento que visa estimular as partes a devolver um discurso
colaborativo onde todos precisam contribuir para se alcançar resultados positivos.
Existem algumas técnicas que podem ser empregadas para se alcançar o sucesso em
uma mediação, dentre elas existe a escuta ativa, o parafraseamento ou recontextualização, a
formulação de perguntas abertas, o resumo seguido de confirmações positivas, o cáucus que
consiste em sessões individuais, brainstorming que estimula a chuva de ideias, o teste de
realidade, que proporciona a oportunidade ao mediado de situar-se e aplicar o que foi decidido
à sua realidade, BATNA (Best Alternative to a Negotiated Agreement), em português conhecido
com MAAN, a melhor alternativa e consequência negocial, WATNA (Worst alternative to a
negotiated agrément) pior alternativa e consequência negocial, “dentro do contesto da
mediação” e o ZOPA (Zone of Possibles Agreements) ou zona de possível acordo.
Cada tipo de demanda carece do meio autocompositivo mais adequado, sendo que para
conflitos que permeiam uma relação continuada, a mediação e o método mais propício. A
mediação segue princípios como a voluntariedade, a confidencialidade, a pessoalidade,
objetivando e viabilizando a pacificação social. Por essa questão, o procedimento é capaz
enxergar o conflito de uma forma mais humana, respeitando, assim, as peculiaridades de cada
caso.

3.2 A mediação para os mediadores

Aos olhos dos mediadores, a descrição mais pertinente para o procedimento de


mediação é transformação, pois o cidadão que está acostumado a delegar a solução dos seus
problemas para terceiros é chamado a construir a resolução de maneira colaborativa,
participativa e pacífica. Durante o procedimento, as partes empoderam-se de uma autonomia
que nunca deveria ter sido perdida, mas que é deixada de lado ao longo da vida quanto se é
condicionado a achar que sempre um terceiro é quem será capaz de decidir.
Diversas situações despertam a paixão pela mediação, como a reaproximação de pai e
filha que não se falavam, como a união entre irmãos que não se conheciam e não se sentiam
amados, como a felicidade de uma criança que percebe que os pais pararam de brigar. A maior
gratificação que um mediador recebe é sua transformação como ser humano, que passa a
conseguir não apenas ouvir o outro, mas também a escutar seus anseios, medos e sonhos,
percebendo que rever as suas atitudes é fundamental para alcançar resultados positivos.
Um bom mediador internaliza que pessoas devem ser separadas dos problemas, que
muitas vezes a verdade não existe, mas que o que se tem são pontos de vista distintos. A
importância dos sentimentos, que precisam ser trabalhados para que se veja a implementação
prática do que foi acordado. Enfim, mediadores, simplesmente aprendem a amar o que fazem,
pois se trata de uma transformação constante para o mediador que tem a oportunidade de se
reconstruir e se transformar todos os dias, participando ativamente e assistindo a transformação
dos mediados.

3.3 A mediação para os mediandos

No que tange à visão dos mediandos, percebeu-se que a grande maioria conseguiu atinar
para o fato que as pessoas não precisam recorrer a um terceiro, pois devem assumir o poder de
decisão sobre seus conflitos e que são capazes de serem os atores principais, o que é um bom
início para se romper com o paradigma da cultura litigante que permeia o direito pátrio.
É estatisticamente comprovado que a participação do mediando na solução do seu
conflito, do que se tornaria uma demanda processual, é efetivamente eficaz, pois o mediando
se torna parte da decisão e, portanto, responsável pelos seus atos, rompendo assim com uma
cultura patriarcal, proporcionado ao mediado a oportunidade retomar as “rédeas” da sua vida.
Constatou-se que as sessões de mediação, por vezes, eram enxergadas pelos mediandos
como sessão de terapia, principalmente, em demandas familiares. A vasta maioria tomou
ciência de suas opiniões e sentimentos eram tão importantes quanto os da outra parte,
aprendendo que a discursividade ativa tem o mesmo valor de uma escuta ativa.

3.4 A mediação para os terceiros envolvidos

Dificilmente pensa-se na influência que os terceiros a nossa volta têm sobre as nossas
decisões, no entanto isso fica muito nítido no processo da mediação, quando efetivamente
percebe-se o peso da opinião dos terceiros que acabam contribuindo para a maximização ou
minimização da lide, e como é importante para o mediador, desenvolver a sensibilidade para
detectar e posteriormente trabalhar esse lado do conflito.

CONCLUSÃO

Ao se falar em mediação de conflitos, o objetivo precípuo traduzia-se em “desafogar” o


Judiciário, tendo em vista a possibilidade de diminuição do número de demandas, e a uma
resolução célere da lide, que não mais se submeteria aos entraves processuais. Nas discussões
realizadas entre os operadores do direito, sempre se apontam soluções para que uma lide seja
solucionada de forma rápida e para que se tenha um Judiciário mais eficaz.
Realmente, elencam-se como resultados de uma mediação de qualidade os anseios
supracitados, todavia, a mediação não pode se minimizar às aludidas vantagens processuais,
haja vista representar um instrumento de política pública e até mesmo uma forma de garantir
ao cidadão o pilar constitucional da dignidade da pessoa humana.
Para além, a mediação, conforme pontuado no presente trabalho, deve ser enxergada
pela óptica transformativa para todos os sujeitos envolvidos no procedimento – mediador,
mediando e terceiros.
Destarte, a transformação pauta-se em facilitar que o mediado se encontre como ser
humano independente, capaz de trilhar seu caminho, realizar seus desejos e construir sua
independência emocional, desmistificando seus anseios.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, André Gomma de. Manual de Mediação Judicial. Brasília: Conselho Nacional
de Justiça, 2015.

BRANDÃO, Adaldberto. DUZERT, Yann. ESPINOLA, Ana Tereza. Negociação. Rio de


Janeiro: FGV, 2010.

BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Justiça em Números permite gestão estratégica da


Justiça há 10 anos. 2015. Disponível em <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/79579-justica-
em-numeros-permite-gestao-estrategica-da-justica-ha-10-anos> Acesso em 15/10/2015.

GRINOVER, Ada Pellegrini. Neto, Caetano Lagrasta. WATANABE, Kazuo. Mediação e


gerenciamento do processo: revolução na prestação jurisdicional. São Paulo: Atlas, 2013.

JUNIOR, José Carlos Rocha. Melhor alternativa no processo de negociação (batna) e zona
de possível acordo (zopa) – modelagem Harvard III. 2012. Disponível em <
http://www.josecarlosjunior.com.br/josecarlosjunior/?p=166> Acesso em 15/10/2015

NASCIMENTO, Dulce. Clube Mediação. Chiado Editora, 2013.

Você também pode gostar