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Notas Sobre A Pobreza - OLdF
Notas Sobre A Pobreza - OLdF
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Texto editado a partir da publicação original da edição de Domingo, 16 de maio de 1948, do Diário de
Pernambuco. Disponível em: http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/.
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E acabou-se os pissuído
Que em setenta e sete eu tinha...
O Seridó teve na chamada seca dos “dois sete” (1877) o maior marco de sua evolução
econômica. Não sentiu de modo tão acentuado a crise provocada pela abolição por se tratar de
uma região pastoril, onde o senhor e o escravo, envergando o mesmo gibão e a mesma vesta,
excluíam a distância que, no ciclo da cana, existia entre o branco e o negro.
Até 1877 os nossos antepassados dependiam, para a sua manutenção dos gêneros de
primeira necessidade (excetuando a carne fornecida pelo rebanho) vindos das praças do
litoral. A mercadoria era trazida de Recife em lombos de “biquaras” (éguas) e nas cabeças dos
escravos. Como agricultura, apenas alguns pés de algodão herbáceo e “quebradinho” para
manufatura dos tecidos da senzala. O rebanho era criado semi-selvagem, quase sem
interferência do homem. As vacas “arreadas” (desleitadas) até meados de Sant’Ana (julho)
eram soltas para se refazerem. Nenhuma ração de concentrados. Nenhuma indústria láctea.
Apenas um pequeno cercado nos baxios – o peador, onde prendiam seus cavalos de sela.
O milho, como os demais cereais, vinha de Recife. A vaidade em ostentar cavalo de sela tão
gordos – de “rêgo-aberto”, na força da expressão popular –, gerou a quadra:
O burro (mulo) era considerado animal inútil e desprezível. Daí o provérbio da época:
burro é quem burro tem.
Nenhuma cerca divisória. Excetuando-se o “peador” de cerca, apenas as socretas
(pequenos cercados de pau-a-pique de entrada sinuosa, usados para aparelho sanitário das
mulheres).
A pequena densidade da população pecuária proporcionava meios de subsistência aos
rebanhos. O couro era desprezado como também toda a carne supérflua, aproveitada apenas
pela senzala.
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No século XIX, a grande seca geral de 1844-45 veio acompanhada de uma grande
mortandade de equinos que desfalcou o rebanho em cerca de 80 por cento de seu total. Os
anos que se seguiram foram todavia invernosos, fazendo o sertanejo descuidar das precauções
de armazenagens.
Surge 1877 e as “experiências de inverno” negativas. O vento sul, precursor da
desgraça, soprava impiedosamente. Estabelece-se o pânico. O povo “perde a cabeça” e emigra
em grandes levas. Criadores retiram o gado para o agreste deixando as estradas marginadas de
esqueletos. O rebanho equino já desfalcado pela mortandade de 1844-45 e desnutrido pela
seca não pode fazer o comercio com as praças do litoral. Os pobres apelam para a “comida
braba” (xique-xique ou sodoro; mucunã; pau-pedra; gugoia – fruto da palmatoria; raiz e
semente da faveleira; macambira; etc).
Os escravos eram levados para os mercados do Recife e permutados por rapadura,
farinha, feijão, milho, etc.
Os fazendeiros iam para a feira a pé com vergonha de selar seus cavalos transformados
em Rocinantes esqueléticos. “O Capitão-mor Francisco Gomes da Silva, um dos mais
abastados fazendeiros da zona do Seridó, viu-se obrigado emigrar para a ribeira do Cunhaú,
fazendo o trajeto a pé, transportando à cabeça dos escravos sacos de moedas de ouro e prata
que, serviam apenas para dificultar a marcha”.
Surgem os primeiros socorros públicos e o cambio negro combatido à boca do clavinote
pelo cangaceiro gentil-homem Jesuíno Brilhante, assaltando os comboios de mantimentos e
distribuindo-os com os famintos. O hino-de-guerra de Jesuíno era escutado pelos flagelados
como última esperança de salvação:
citações bíblicas, foi descoberta pelo deputado José Gonçalves de Medeiros e remetida ao
escritor Gilberto Freire que fará um estudo detalhado sobre a mesma.
Natal, maio de 1948.
BIBLIOGRAFIA