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Modulo 3
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Medieval
Material Teórico
O Pensamento Medieval Oriental
Revisão Textual:
Profa. Ms. Luciene Oliveira da Costa Santos
O Pensamento Medieval Oriental
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Unidade: O Pensamento Medieval Oriental
Contextualização
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O pensamento medieval oriental
Atenção
Quando olhamos um pouco mais de perto para o pensamento medieval, nos deparamos com a
questão que envolve os textos apócrifos, levadas em consideração as condições da época, em que
livros e pergaminhos eram manuscritos e produzidos artesanalmente e, além de raros, eram de
difícil reprodução. Muitas vezes, não se dispunha do documento com plena integridade, podendo
ele estar parcialmente danificado, ou mesmo em fragmentos. Além desses fatores, é importante
ressaltar que as traduções e retraduções eram feitas em diferentes épocas e lugares, com lenta
difusão da própria informação.
Storck relata o caso curioso de Algazel (1058 -1111), teólogo do mundo árabe que entrou em
controvérsia com o pensamento de Avicena, nascido na Pérsia (980-1037), sendo este último,
entre outras atividades, também filósofo.
Algazel, adversário de Avicena, escreveu uma obra em duas partes para marcar sua
posição contrária à metafísica dos filósofos. O problema é que na primeira parte ele dedica
a uma exposição das teses de Avicena, enquanto deixava para a segunda parte fazer a
crítica a cada um dos pontos de vista de seu rival. Por motivo desconhecido, no Ocidente
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Unidade: O Pensamento Medieval Oriental
durante muito tempo só surgiu a tradução da primeira parte dessa obra, por conta disso,
o antifilósofo, Algazel e feroz crítico do pensamento de Avicena, foi conhecido como “um
aviceniano”, um discípulo do filósofo.
Confusões deste porte envolveram a obra de Aristóteles. Algumas vezes, textos de
comentários, de interpretações, ou trabalhos inspirados na filosofia aristotélica foram
erroneamente considerados de autoria do próprio Aristóteles.
Muitas confusões só foram desfeitas depois de séculos, algumas chegadas ao século XIII,
após a confrontação de diferentes traduções e um laborioso estudo da linguagem do autor em
questão. Nada disso obscurece, no entanto, a relevância desse intercâmbio das ideias, tanto pela
importância que a preservação de determinados textos no Oriente – que trouxe como um novo
ímpeto ao pensamento ocidental – como a especulação do pensamento grego que germinou
junto a árabes e judeus.
Avicena
O nome completo seria: Abu’Ali al-Husayn bn’Add Allah bn Fonte: Thinkstock/Getty Images
al-Hasan bn’ Ali bn Sina), mas por praticidade, usaremos apena
Avicena. Nascido no que seria atualmente a região do Uzbequistão
em 980, Avicena foi e é uma poderosa fecundidade intelectual;
como médico, deixou trabalhos que seriam referência durante
séculos sendo utilizado tanto no Ocidente como no Oriente. Chegou
mesmo a ocupar função política (cargo equivalente a de ministro) a
serviço de príncipes. Naquilo que tange à sua contribuição para a
filosofia, Avicena, foi um devotado leitor de Aristóteles, e escolheu a
Metafísica como disciplina mestra.
Lançando uso do método da paráfrase, que no entendimento aviceniano (STORCK, 2003)
seria retomar a sua própria maneira o pensamento do autor que ele estudava, no caso Aristóteles.
Para Avicena seria importante “acrescentar” sua própria contribuição ao pensamento estudado,
de fato, fazê-lo avançar.
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Segundo Storck:
Uma das principais obras de Avicena, A cura, abordava e resumia as principais ciências,
inclusive as naturais, as disciplinas matemáticas, a lógica e a metafísica.
Aliás, para o sábio médico, o maior desafio estava na sistematização da metafísica. Nesse
tópico, Avicena e outros pensadores medievais buscaram integrar sua reflexão ao fenômeno
da fé, mais precisamente, para o pensamento aviceniano, seria possível um esclarecimento do
conteúdo da fé, embora houvesse verdades além do alcance da razão e que só atingiríamos por
inspiração divina (SCIACCA, 1962).
Do ponto de vista mais específico da metafísica, Avicena contribui para o debate em torno
da questão do ser. Na verdade, em um movimento duplo, ele se interroga sobre a possibilidade
de existência do ser e sobre sua essência. Esse debate viria a influenciar diversos pensadores
posteriores, entre eles, Tomás de Aquino no século XIII.
Como bem nos lembra Reale & Antiseri, na discussão aviceniana é preciso considerar a
diferença entre essência e ente. A essência é abstrata, por outro lado, o ente é concreto. Neste
contexto aquilo que é abstrato (essência) possui um ser, mas não uma existência concreta, na
realidade, a essência é na verdade uma possibilidade (REALE & ANTISERI, 2002). Quanto se fala
de uma essência abstrata, podemos mencionar como exemplo o atributo “humano”. Podemos,
por exemplo, mencionar “o monge João” como um ente concreto, mas, a sua “humanidade” faz
parte da essência de “João”, assim como também faz parte da essência de outrem.
Outra distinção feita pelo sábio médico, no que se refere às coisas reais: o ser necessário e o ser
possível (idem, 2002). A reflexão aviceniana, também aponta para condição de desnecessário
para o ente concreto. O pensador argumenta que não há razão inerente ao próprio ente para
que esse exista, ele poderia tanto existir como não existir. Então como o ente atinge a condição
de ser-concreto (de existente)? Como o ente ultrapassa a condição de mera possibilidade? É
preciso que haja um Ser cuja existência faça parte de sua essência, ou melhor, um Ser cuja
existência não é mera possibilidade, ele tem que existir, portanto existe necessariamente. Para
Avicena esse Ser é Deus, causa primeira (SCIACCA, 1962), é pela existência de Deus que o
mundo torna-se possível.
Em Síntese
Recapitulando: Deus é Ser que guarda em si mesmo a chave para sua existência – causa primeira
em termos aristotélicos –, é através dele que a existência de toda a matéria orgânica – Vida – passa
a existir concretamente (essa matéria não poderia existir por si só). Dentre tudo o que é vivo, havia
a possibilidade da humanidade (que também não poderia existir por si mesma), essa “humanidade”
enquanto possibilidade abstrata, torna-se ente concreto – como o monge João, do exemplo anterior.
Porém, o ente “João” também poderia existir ou não – poderia ser o ente “José” em seu lugar.
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O que Avicena faz é aplicar a metafísica aristotélica de relação entre matéria e forma. A matéria traz
a forma como possibilidade e a forma só se torna um ente quando passa da possibilidade para o ato
(realização). Exemplo: uma imensa pilha de madeira que carrega em sua essência a possibilidade
(abstrata) dos mais diferentes tipos de objetos – mesa, cadeira, porta etc. Mas, ao tornar ato a
cadeira, uma das possibilidades se realizou, tornou-se concreta, tornou-se ente, mesmo assim ainda
mantém a sua essência – ser de madeira – e compartilha esse “ser de madeira” com uma infinidade
de outros objetos também de madeira.
O que está por trás de tudo isso? A causa primeira que doa existência a própria matéria, pois,
sem essa causa nenhuma matéria seria possível e, consequentemente, nada poderia ser feito
de matéria. Então, a causa primeira não possui matéria (ela a torna possível) nem depende de
possibilidade, pois existe necessariamente, a causa primeira é Deus.
Apesar de falar tanto da diferença entre o que é necessário e o que é contingente (possível),
Avicena se enreda a componentes neoplatônicos (SCIACCA, 1962), muito mais do que um
ato de criação, um ato da vontade de Deus, trata-se de um “transbordar”. Esse componente
emanacionista permite pensar em termos do destino: por que Deus, então o mundo, por que o
mundo então, os acontecimentos do mundo. “O emanacionismo neoplatônico é posto a serviço
do fatalismo mulçumano: ‘está escrito’.” (SCIACCA, 1962, p.231).
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Parte da empreitada intelectual de Averróis foi buscar estabelecer de forma clara as relações
entre religião e filosofia. A confusão nas discussões das duas áreas seria uma ameaça tanto para
filósofos como para teólogos (GILSON, 1995). Por isso garantir o direito à especulação filosófica
era fundamental, contudo, ainda assim, o pensador de Córdoba, estava ciente da queixa dos
teólogos com a discussão descuidada dos textos do Alcorão.
Alcorão do séx. XI, em exposição no Museu Britânico.
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Ideias-chave
Nesta preocupação com a difusão do conhecimento, Averróis também divide o ensino e o âmbito
das áreas do conhecimento em três:
1. Filosofia: buscar as verdades absolutas
2. Teologia: interpretação e dialética
3. Religião: a fé
Apesar dessa divisão, Averróis defende que fé e filosofia coincidem. A Verdade é uma só.
Mas, no espírito do pensamento do sábio de Córdoba, a filosofia teria condições privilegiadas
para o entendimento dessa verdade. Esse tipo de postura e os elogios à filosofia aristotélica
(Averróis chegaria ao ponto de defender que “A doutrina de Aristóteles coincide com a suprema
verdade”) levaria o filósofo árabe a ser acusado de incrédulo.
No seu empreendimento filosófico, Averróis, coloca-se em contraposição a Avicena. Averróis
procura depurar a leitura de Aristóteles das influências constantes do neoplatonismo que persiste
em diferentes pensadores, mesmo quando estes se proclamam influenciados pelo estagirita.
A exemplo disso, temos a controvérsia abordada por Avicena entre a essência e a existência.
Como bem resume Gilson:
Para o pensamento averroísta, tudo que é é um ser mesmo em se tratando de uma característica
acidental da substância, o fato de se referir seja a qualidade, seja a quantidade, não nega a
relação que elas têm com o ser, ou seja, designam algo. Nesse contexto, a metafísica tem como
seu objeto de estudo a natureza do ser e suas propriedades (GILSON, 1995). Ou ainda, a
metafísica fica encarregada de estudar tudo o que é, enquanto é.
Continuando a partir da linha de pensamento de Averróis, os universais não existiriam em si
separados dos indivíduos. Os universais são simplesmente obra do entendimento. Vale dizer que
a possibilidade (abstrata) torna-se ato quando a matéria assume determinada forma, (a madeira
que se tornou banqueta, por exemplo) e é justamente essa “forma” aquilo que é alcançado pelo
pensamento; é o pensamento que “recorta” as diferentes possibilidades da madeira e orienta
o artesão a atualizar (realizar) uma delas. É o pensamento que concebe o universal. Dito de
outra forma: é o pensamento que identifica a realidade sensível, e é também o pensamento
que identifica (ou constrói) padrões, semelhanças e as designa, as nomeia como uma categoria
universal. Em outro exemplo, são as características que determinam que “uma certa forma”
possa ser designada como “banqueta”.
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Averróis postula, ainda, teses bastante controversas em relação aos seus contemporâneos
(pode-se dizer que são controversas até hoje). Ao levar a ideia de matéria e forma presente em
Aristóteles ao último nível, Averróis acaba por defender que o mundo sempre existiu e que não
fora criado – como defende o pensamento islâmico – de maneira sintética: se a forma atualiza a
possibilidade de uma dada matéria, teríamos que recuar até a matéria primeira que tudo coloca
em movimento – primeiro motor –, mas isso parece ser difícil de conciliar com um momento
em que a matéria seja criada a partir do nada. Aristóteles não deu claramente a entender essa
possibilidade, portanto, Averróis também não o fará.
Maimônides
Moisés ben Maimón, também fora versado em medicina, teologia e filosofia e também
nascera em Córdoba, só que no ano de 1135 e de família judia. Assim como suas contrapartes
cristãs e mulçumanas, Maimônides volta suas preocupações para a relação entre fé e filosofia.
Sua principal obra foi O Guia dos perplexos, uma “suma teológica judaica” (GILSON, 1995),
direcionada principalmente aos “perplexos”, e quem eram exatamente esses “perplexos”?
Segundo, Dobbs-Weinstein:
Maimônides
Outra vez, como suas contrapartes, a perplexidade, ou o mal-estar espiritual, tem origem
num erro de entendimento, num apressamento do aprendizado o que leva a tratar teses mais
sofisticadas da filosofia e da teologia de forma equivocada. Sua obra guarda o espírito que
atravessa os séculos da Idade Média, a saber, conciliar filosofia e religião, no caso de Maimônides,
a conciliação entre a razão e os ensinamentos revelados pela Torá.
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Enfim, Maimônides, integra a linha de força filosófica medieval oriental, cujo acesso aos textos
aristotélico-platônicos e a reedição, nos demais terrenos do monoteísmo (judaico e islâmico),
da disputa entre razão e fé, servirá como elemento importante nas discussões análogas dos
pensadores cristãos, discussões tais que abrem caminho para a escolástica.
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Material Complementar
Explore
História das grandes civilizações (Islamismo)
• Parte 1: https://www.youtube.com/watch?v=X0EYm-9BeIU
• Parte 2: https://www.youtube.com/watch?v=4l8bUtquFjc
História das grandes civilizações (Hebreus)
• Parte 1: https://www.youtube.com/watch?v=r5P5ZkdRSIo
• Parte 2: https://www.youtube.com/watch?v=gor-E3M3auA
Bibliografia
GILSON, Etienne. A filosofia na Idade Média. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins
Fontes, 1995.
McGRADE, A.S. (org.). Filosofia Medieval. Trad. André Oídes. Aparecida: Ideias &
Letras, 2008.
NASCIMENTO, Carlos Arthur. O que é Filosofia Medieval. São Paulo: Brasiliense, 2004.
SCIACCA, Michele Federico. História da Filosofia. Trad. Luís Washington Vita. São Paulo:
Mestre Jou, 1962.
STORCK, Alfredo Carlos. Filosofia Medieval. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2003.
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Referências
GILSON, Etienne. A filosofia na Idade Média. Trad. Eduardo Brandão. – São Paulo: Martins
Fontes, 1995.
NASCIMENTO, Carlos Arthur. O que é Filosofia Medieval. – São Paulo: Brasiliense, 2004.
SCIACCA, Michele Federico. História da Filosofia. Trad. Luís Washington Vita. São Paulo:
Mestre Jou, 1962.
STORCK, Alfredo Carlos. Filosofia Medieval. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
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Anotações
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