Você está na página 1de 480

1

walter kohan
sammy lopes
fabiana martins (orgs.)

o ato de educar em uma língua ainda por ser escrita

Rio de Janeiro
Nefi, 2016
22

Universidade
Universidade dodo Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro (UERJ)
(UERJ)
Reitor:
Reitor: Ruy
Ruy Garcia
Garcia Marques
Marques
Vice-Reitora:
Vice-Reitora: Maria
Maria Georgina
Georgina Muniz
Muniz Washington
Washington
Sub-Reitor
Sub-Reitor de
de Pesquisa
Pesquisa ee Pós-Graduação:
Pós-Graduação: Egberto
Egberto Gaspar
Gaspar de
de Moura
Moura
Programa
Programa de
de Pós-Graduação
Pós-Graduação em em Educação
Educação (PROPEd)
(PROPEd)
Coordenador:
Coordenador: José
José Gondra
Gondra
Vice-Coordenadora:
Vice-Coordenadora: Lígia
Lígia Aquino
Aquino

Núcleo
Núcleo de
de Estudos
Estudos de
de Filosofias
Filosofias ee Infâncias
Infâncias (NEFI)
(NEFI)
Coordenador:
Coordenador: Walter
Walter Omar
Omar Kohan
Kohan

Conselho
Conselho Editorial
Editorial

Alejandro
Alejandro Ariel
Ariel Cerletti,
Cerletti, Universidad
Universidad dede Buenos
Buenos Aires
Aires
Carlos
Carlos Bernardo
Bernardo Skliar,
Skliar, FLACSO,
FLACSO, Argentina
Argentina
César
César Donizetti
Donizetti Leite,
Leite, UNESP
UNESP -- RioRio Claro
Claro
Gregorio
Gregorio Valera-Villegas,
Valera-Villegas, Universidad
Universidad Experimental
Experimental Simón
Simón Rodríguez,
Rodríguez, Venezuela
Venezuela
Gustavo
Gustavo Fischman,
Fischman, Arizona
Arizona State
State University
University
Juliana
Juliana Merçon,
Merçon, Universidad
Universidad Veracruzana,
Veracruzana, México
México
Junot
Junot Cornelio
Cornelio Matos,
Matos, UFPE
UFPE
Karin
Karin Murris,
Murris, Cape
Cape Town
Town University
University
Marina
Marina Santi,
Santi, Università
Università degli
degli Studi
Studi di
di Padova,
Padova, Italia
Italia
Maximiliano
Maximiliano Durán,
Durán, UERJ
UERJ
Olga
Olga Grau,
Grau, Universidad
Universidad dede Chile
Chile
Paula
Paula Ramos
Ramos de
de Oliveira,
Oliveira, UNESP,
UNESP, Araraquara
Araraquara
Pedro
Pedro Pagni,
Pagni, UNESP,
UNESP, Marília
Marília
Rosana
Rosana Fernandes,
Fernandes, UFRGS
UFRGS
Sílvio
Sílvio Donizetti
Donizetti de
de Oliveira
Oliveira Gallo,
Gallo, UNICAMP
UNICAMP
Wanderson
Wanderson Flor
Flor do
do Nascimento,
Nascimento, UnBUnB

Equipe
Equipe de
de redação
redação (NEFI/UERJ)
(NEFI/UERJ)

Alessandra
Alessandra Lopes
Lopes
Allan
Allan Rodrigues
Rodrigues
Fabiana
Fabiana Martins
Martins
Marcelly
Marcelly Custodio
Custodio
Simone
Simone Berle
Berle

Capa:
Capa: Marcelly
Marcelly Custodio
Custodio de
de Souza
Souza
Diagramação:
Diagramação: Simone
Simone Berle
Berle ee Marcelly
Marcelly Custodio
Custodio de
de Souza
Souza
Revisão
Revisão Técnica:
Técnica: Fabiana
Fabiana Fernandes
Fernandes Ribeiro
Ribeiro Martins
Martins

Dados
Dados Internacionais
Internacionais dede Catalogação
Catalogação na
na Publicação
Publicação (CIP)
(CIP)
(Câmara
(Câmara Brasileira
Brasileira do
do Livro,
Livro, SP,
SP, Brasil)
Brasil)

Walter
Walter Omar
Omar Kohan;
Kohan; Sammy
Sammy William
William Lopes;
Lopes; Fabiana
Fabiana Fernandes
Fernandes Ribeiro
Ribeiro
Martins
Martins (orgs.)
(orgs.)
O ato
O ato de
de educar
educar em
em uma
uma língua
língua ainda
ainda por
por ser
ser escrita
escrita –– 11 ed
ed –– Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
NEFI, 2016
NEFI, 2016 ––

ISBN: 978-85-93057-03-8
ISBN: 978-85-93057-03-8

1.1. Educação
Educação –– Filosofia.
Filosofia. 2.
2. Ensino
Ensino de
de Filosofia
Filosofia I.I. Título.
Título. II
II Série.
Série.

CDD 370.1
CDD 370.1
Índice para
Índice para catálogo
catálogo sistemático:
sistemático:
1.1. Educação
Educação :: Filosofia
Filosofia 370.1
370.1

© 2016
© 2016 Núcleo
Núcleo de
de Estudos
Estudos de
de Filosofias
Filosofias ee Infâncias
Infâncias (NEFI/UERJ)
(NEFI/UERJ)
Site: www.filoeduc.org
Site: www.filoeduc.org
Email: publicacoesnefi@gmail.com
Email: publicacoesnefi@gmail.com
33

sumário

apresentação:
apresentação: línguas
línguas do
do mundo
mundo em
em um
um mundo
mundo de
de línguas
línguas 99

i.i. política,
política, sujeito,
sujeito, educação
educação 19
19

un
un “nosotrxs”
“nosotrxs” como
como sujeto
sujeto colectivo
colectivo de
de la
la educación
educación 21
21
alejandro
alejandro cerletti
cerletti
“o
“o desejo
desejo deseja
deseja sua
sua própria
própria repressão”:
repressão”: traços
traços de
de uma
uma educação
educação fascista
fascista 29
29
sílvio
sílvio gallo
gallo
[…]
[…] segurança
segurança pública,
pública, formação
formação policial
policial ee empresariamento
empresariamento da
da sociedade
sociedade […]
[…] 37
37
anderson
anderson duarte
duarte
sylvio
sylvio gadelha
gadelha
ciudadanía,
ciudadanía, argumentación
argumentación yy función
función filosófica.
filosófica. desafíos
desafíos político-pedagógicos
político-pedagógicos […]
[…] 45
45
marisa
marisa berttolini
berttolini
aa dimensão
dimensão política
política do
do ensino
ensino de
de filosofia
filosofia ee da
da formação
formação docente
docente 51
51
junot
junot cornélio
cornélio matos
matos

ii.
ii. nós,
nós, os
os frágeis
frágeis ee pequenos
pequenos especiais
especiais 61
61
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito 63
63
giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro
el
el lenguaje
lenguaje de
de la
la norma
norma yy los
los individuos
individuos frágiles
frágiles 79
79
carlos
carlos skliar
skliar
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos 89
89
patricia
patricia r.
r. redondo
redondo
infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: emem modo
modo dede ensaio
ensaio 103
103
césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite
aa pesquisa
pesquisa como
como gesto
gesto infantil
infantil de
de (auto)
(auto) educação:
educação: notas
notas para
para pensar
pensar um
um ser
ser professor
professor 115
115
simone
simone berle
berle
ana
ana paula
paula saraiva
saraiva morais
morais
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!
si’! 123
123
lígia
lígia prando
prando

iii.
iii. filosofia
filosofia com
com crianças
crianças 135
135

“tia,
“tia, vai
vai ter
ter fisolofia
fisolofia hoje?”
hoje?” 137
137
edna
edna olímpia
olímpia dada cunha
cunha
[…] el
[…] el propósito
propósito de
de que
que cada
cada vez
vez sean
sean más
más los
los que
que se
se representen
representen el
el mundo
mundo como
como propio
propio 143
143
laura v.
laura v. agratti
agratti
pensar, experienciar
pensar, experienciar yy jugar:
jugar: otros
otros lenguajes,
lenguajes, otras
otras prácticas...
prácticas... 149
149
maría teresa
maría teresa suárez
suárez vaca
vaca
lola maría
lola maría morales
morales mora
mora
filosofia na
filosofia na escola:
escola: pensando
pensando as
as dimensões
dimensões do
do papel
papel público
público da
da educação...
educação... 159
159
vanise de
vanise de cássia
cássia dutra
dutra gomes
gomes
edna olímpia
edna olímpia da
da cunha
cunha
[…] the
[…] the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry
inquiry and
and aa participatory
participatory action
action research
research 169
169
cristina rossi
cristina rossi
44

aa cadeira
cadeira unesco:
unesco: prática
prática da
da filosofia
filosofia com
com crianças
crianças […]
[…] 181
181
edwige
edwige chirouter
chirouter
marie-paule
marie-paule vannier
vannier

iv.
iv. áfrica
áfrica ee nós
nós 191
191

filosofia
filosofia africana
africana na
na antiguidade:
antiguidade: tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre ancestralidade
ancestralidade ee futuridade
futuridade 193
193
renato
renato noguera
noguera
tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre uma
uma educação
educação antirracista
antirracista ee filosofias
filosofias afro-diaspóricas
afro-diaspóricas da
da educação
educação 203
203
wanderson
wanderson flor
flor do
do nascimento
nascimento
imagem,
imagem, visão
visão ee conhecimento:
conhecimento: modos
modos de
de ver,
ver, modos
modos de
de dar
dar aa ver
ver 211
211
valter
valter filé
filé

v.
v. educar
educar em
em nossa
nossa américa
américa 221
221

la
la experiencia
experiencia filosófica
filosófica como
como crítica
crítica yy expectativa
expectativa en
en arturo
arturo andrés
andrés roig
roig 223
223
adriana
adriana maría
maría arpini
arpini
educar
educar en
en la
la interculturalidad:
interculturalidad: diá-logos
diá-logos con
con los
los kevin
kevin 227
227
mauricio
mauricio langon
langon
escuela
escuela popular
popular yy emancipación:
emancipación: una
una apuesta
apuesta para
para el
el continente
continente americano
americano 237
237
maximiliano
maximiliano duran
duran

vi.
vi. aa escola
escola ee oo educacional
educacional no
no escolar
escolar 247
247

school
school experiences:
experiences: an
an attempt
attempt toto find
find aa pedagogical
pedagogical voice
voice 249
249
maarten
maarten simons
simons
jan
jan masschelein
masschelein
collective
collective demands
demands for
for schole
schole (free-time)
(free-time) in in the
the neoliberal
neoliberal debt
debt economy
economy 259
259
jason
jason thomas
thomas wozniak
wozniak
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público
público 269
269
jorge
jorge larrosa
larrosa
the
the language
language of of the
the school.
school. alienating
alienating or
or emancipating?
emancipating? 291
291
jan
jan masschelein
masschelein
maarten
maarten simons
simons
la
la escuela
escuela como
como phármakon
phármakon en
en la
la toxicidad
toxicidad tecnológica
tecnológica contemporánea
contemporánea […]
[…] 301
301
inés
inés dussel
dussel

vii.
vii. narrativa,
narrativa, escrileitura,
escrileitura, ficção
ficção 311
311

para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna 313
313
jorge
jorge ramos
ramos do
do óó
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental dada diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados 327
327
sandra
sandra mara
mara corazza
corazza
perspectivas
perspectivas sobre
sobre uma
uma escola
escola sem
sem órgãos
órgãos 341
341
marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social
social 351
351
gladys
gladys madriz
madriz
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora 365
365
gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas
55

viii.
viii. musicalidade,
musicalidade, teatralidade
teatralidade ee arte
arte na
na educação
educação 381
381

educare
educare inin jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia 3823
3823
383
marina
marina santi
santi
música,
música, pensamento
pensamento ee educação
educação musical
musical menor
menor 395
395
pablo
pablo de
de vargas
vargas guimarães
guimarães
[…]
[…] la
la paradoja
paradoja contextual
contextual enen la
la configuración
configuración del
del hecho
hecho teatral
teatral como
como presencia
presencia […]
[…] 405
405
ricardo
ricardo sassone
sassone
humanidad
humanidad yy cuerpos
cuerpos tecnológicos.
tecnológicos. el
el bioarte
bioarte en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de la
la filosofía
filosofía 419
419
gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

ix.
ix. tempo,
tempo, finitude,
finitude, inquietude
inquietude ee formação
formação de
de si
si 429
429

la
la duración
duración en
en el
el espacio
espacio educativo
educativo 431
431
olga
olga grau
grau
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot
hadot 439
439
óscar
óscar espinel-bernal
espinel-bernal
óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés
reflexiones
reflexiones sobre
sobre lala finitud
finitud yy su
su aproximación
aproximación aa los
los jóvenes
jóvenes 451
451
angel
angel alonso
alonso salas
salas
colóquios
colóquios sobre
sobre educação:
educação: dada vida,
vida, oo que
que se
se sabe;
sabe; do
do estudo,
estudo, oo que
que se
se pode
pode […]
[…] 457
457
daison
daison nelson
nelson ferreira
ferreira dias
dias
josé
josé menna
menna oliveira
oliveira
rosana
rosana aparecida
aparecida fernandes
fernandes
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -- 467
467
rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias
dias
heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues
66
77

aos 54.501.118 de votos golpeados:


temer jamais
88
99

línguas do mundo em um mundo de línguas

S
e as diferentes línguas expressam estéticas e políticas distintas de desejo,
pensamento e ação, a partir das quais lidamos sensivelmente com as
intensidades dessemelhantes das coisas e dos seres existentes neste mundo,
tais linguas determinam, pelo menos em parte, nosso modo de nos afetar com este mesmo
mundo, de experimentá-lo e de fabular para ele certas imagens, e outras não.
Assim, não é o mesmo engendrar uma visão de mundo, por exemplo, a partir da
perspectiva identitária de um "Eu" - conforme o estilo usual das línguas dominantes - do
que assumir posições incomuns, como a afirmação de um "nosotros", construída por certas
línguas minoritárias e ancestrais, originárias de nossa América. Ou, ainda, a emergência de
línguas inventadas no encontro que temos entre nosotros.
De tal ponto de inflexão, as linhas de sentido que se desenrolam para compor o
presente livro se propõem a explorar o enlace amplo do encontro entre Filosofia e Educação,
a partir de uma busca comunitária pela constituição de um "nós". Busca essa desencadeada
em meio à tentativa de enunciar os mundos informes que se tecem entre nós-outros no
chão da escola, no fazer escola dentro da própria escola, forçando-nos a exprimir o ato de
educar em uma língua impronunciável, ainda por ser escrita.
Nestes termos, as seções desenhadas em função de se poder articular um corpo
intenso para o presente volume, de modo a expressar a natureza singular da referida busca
- apesar de ganharem uma organização formal (materialmente, linear e sucessiva) -,
revelam e ordenam subtemas e textos necessariamente interconexos, os quais não deixam
de manifestar os encontros coletivos de enunciação que os engendraram e desenvolveram
no fluxo produtor do VIII Colóquio Internacional de Filosofia e Educação, estendido entre os
dias 3 a 7 de outubro de 2016 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Deste modo, os trabalhos que configuram as nove seções desse livro tornam-se
passíveis de serem intensivamente experienciados por práticas diferenciais de leitura-
escrita, numa lógica de encadeamento outra, capaz de entretecer possibilidades inabituais
para o percurso: movimentos, repousos, conexões, quebras/rupturas, pontos múltiplos de
entrada e saída.
Conforma-se, assim, a possibilidade do leitor configurar seus próprios planos ou
platôs de composição para o devir do pensamento, tecendo roteiros e estilos singulares de
leitura para esse corpo-livro. Nestes termos, a seguinte proposta de ordenação das suas
seções deve ser tomada apenas como um referencial de partida: a) política, sujeito, cidade;
b) nós, os frágeis e pequenos especiais; c) filosofia com crianças; d) áfrica e nós; e) educar
em nossa américa; f) a escola e o educacional no escolar; g) narrativa, escrileitura, ficção;
h) musicalidade, teatralidade e arte na educação; i) tempo, finitude, inquietude e formação
de si.
Tal processo coletivo de produção - que inclui, portanto, aquilo que cada leitor-
coautor poderá fazer passar entre os diversos planos que constituirão suas práticas de
leitura-escrita-, expressa uma tentativa grupal de criar uma língua na qual confluem estilos
diferenciais de pensar-enunciar os problemas educativos do nosso tempo.
Procura-se, nesse sentido, induzir uma experimentação comunitária de concepção
de um "nós-outro" que possa pronunciar-se afirmativamente; isto é, conforme o
acolhimento da necessidade de se engendrar uma noção comum problemática-conceitual
singular, apta a exprimir o que nos coage na atualidade a conceber modos inusitados de
pensar e fazer educação.
Esse “nosso-livro-outro” não se direciona, por conseguinte, a cultivar a
possibilidade de se estabelecer, ao final, certa harmonia entre vozes que diferem;
10
10 |apresentação
|apresentação

procurando alcançar um concenso ou equilibrio que faria o real repousar novamente sobre
a ordem do atual e/ou do possível. Ao contrário, procura expressar, sim, as seguintes
questões: Em meio às crises e sob os efeitos diversos das modalidades de exercer os poderes
em nosso tempo: como temos problematizado o sentido da educação e, consequentemente,
o sentido da própria atividade escolar na contemporaneidade? Como tem sido possível
delinear relações mais alegres e potentes entre nós e os outros na ação de aprender e na de
ensinar? Por quais descaminhos novas estéticas ensinantes e aprendentes têm conseguido
se esboçar? Que contrapontos temos traçado entre nossas errâncias educativas e o eterno
retorno da força do que difere?
Enfim, trata-se de um convite para tentar costurar juntos, e estender em um varal
no pensamento, uma colcha de retalhos espaço-temporal que manifeste a seguinte questão:
em meio aos sufocos que enfrentamos no presente, o que temos feito de nós-outros
enquanto sujeitos do discurso menor da educação?
A título de esclarecimento, informamos a opção de publicar os textos em suas
línguas originais. Sabemos dos riscos dessa decisão, assim como daqueles associados à
ousadia de traduzi-los. Dessa forma, estendemos também um convite para desabitar os
lugares cômodos e fáceis demais no terreno do pensamento: um desafio, uma força e um
alento que vêm da necessidade de se criar modos outros de vivenciar o mundo da produção
acadêmica. Ler numa língua ainda não conhecida e fazer reverberar afetos de uma leitura
inventiva; ler em uma língua conhecida e fazer do significado, sentido e, do sentido,
inventar um ato educativo ainda não escrito.

um corpo-livro
Nas texturas de mundos que se tecem entre nosotros, em uma língua que talvez
nunca chegue a ganhar a forma de uma escrita, múltiplos sentidos atravessam e concebem
o encontro educativo, fazendo-nos questionar: haveria algo que possa constituir um
comum a partir do heterogêneo das individualidades que convergem em uma situação de
aprender e ensinar?... Na primeira seção “Política, sujeito, educação”, Alejandro Cerletti
abre o livro com o texto “Un ‘nosotrxs’ como sujeto colectivo de la educación”, analisando
o título do VIII Colóquio Internacional de Filosofia e Educação e, com ressonâncias
badiounianas, nos convida de maneira singular a pensar o ato de educar como um
entrelaçamento de mundos a partir do qual surge um sujeito coletivo - um nosotrxs sem
gênero, sem identidade fixa, sem condição de possibilidade prévia.
Na sequência, Silvio Gallo desenvolve o instigante texto “O desejo deseja sua
própria repressão: traços de uma educação fascista”, inquerindo pelos traços de uma
educação fascista e se seria possível conjurar o fascismo ou como resistir a ele nos
processos educativos. O trabalho realça que o fascismo se manifesta quando “o desejo
deseja sua própria repressão, explorando a ideia de que os processos educativos, como
micropolíticas do desejo, estão abertos sim a constituições ultra autoritárias; de modo que é
possível educar o desejo para autoreprimir-se. Sublinha também que mesmo uma educação
fascista pode ser palco de resistência, de produção de linhas de fuga e de construção de
horizontes libertários.
Nessa mesma linha, discutir as transformações verificadas no campo da segurança
pública, no contexto que se estende das sociedades modernas às sociedades de controle,
tanto no âmbito das políticas públicas de segurança quanto no dos processos de
subjetivação que incidem junto à formação policial e à conduta da população é o objetivo
de Anderson Duarte e Sylvio Gadelha no potente “Considerações sumárias sobre a relação
entre segurança pública, formação policial e empresariamento da sociedade, na
governamentalidade neoliberal”. O texto busca denunciar o papel desempenhado pelos
walter
walter kohan,
kohan, sammy
sammy lopes
lopes ee fabiana
fabiana martins
martins || 1111

discursos e práticas de segurança, tendo em vista a vigilância, o monitoramento e controle


das condutas dos indivíduos, para efeito do governo das populações.
No intuito de pensar atos educativos de resistência a essa circunstância atual,
Marisa Berttolini pensa conceito de cidadania na prática de ensino de filosofia no ensino
médio, a partir do projeto “Argumentação: um aporte filosófico à educação”. A autora
salienta que cidadania e educação são duas categorias que - devido ao excesso ou ao uso
indevido - se tornaram triviais no imaginário social. Contudo, afirma Berttolini, essas
categorias precisam ser recolocadas a fim de se recuperar a “razão pedagógica” em certas
práticas de ensino de filosofia, sob a perspectiva de uma educação emancipadora. O
desenvolvimento do projeto levou a autora a colocar algumas questões acerca da forma
como os jovens defendiam seus pontos de vista com força de verdade, em discursos
eminentemente liberais como a defesa da liberdade, igualdade e direitos individuais. O
artigo “Ciudadanía, argumentación y función filosófica. Desafíos político-pedagógicos a
partir de una investigación”, defende a experiência de filosofia com jovens como uma
oportunidade de fazer da escola um espaço público potencialmente democratizador, onde
se possa fazer, à maneira de Foucault, uma ontologia crítica do presente, tornando possível
a emergência de distintos modos de ver o mundo.
Junot Matos procura formular algumas questões que permitam discutir a formação
docente nos cursos de licenciatura em filosofia. Nesta perspectiva, nos agracia com o
incisivo “A dimensão política do ensino de filosofia e da formação docente”, evidenciando
a necessidade de superação da fragmentação na organização desses cursos, seu
descolamento em relação à escola básica e às dicotomias que marcam a própria formatação
dos seus projetos pedagógicos. Propõe discutir as demandas atuais para a universalização
da obrigatoriedade do ensino de filosofia como componente curricular do ensino médio,
considerando que o modelo de formação dos estudantes das licenciaturas em Filosofia não
revela clareza da natureza de um curso de formação de professores por parte dos docentes
responsáveis pelas componentes curriculares específicas, nem por aqueles que trabalham
com as componentes pedagógicas. Advoga então que a Filosofia na escola é uma tarefa
transdisciplinar uma vez que esta visa não somente ao exercício de uma experiência do
pensar, mas ao próprio repensamento da escola numa perspectiva de construção de um
outro projeto político.
Na segunda seção, “Nós, os frágeis e pequenos especiais”, Giuseppe Ferraro oferece
um passeio pela filosofia e pela infância em “A criança de Heráclito”, um texto que é, na
verdade, uma forma de estar em infância e também de estar em filosofia, de estar no
mundo e na escola. A filosofia para Giuseppe não é um saber, mas uma forma de dispor-se.
No texto, ele narra, por meio de conceitos e depoimentos associados a uma experiência
escolar, a maneira em que uma criança está na filosofia e as formas em que a filosofia está
na infância.
Dando seguimento à seção, no texto “A linguagem da norma e os indivíduos
frágeis”, Carlos Skliar aborda a questão do corpo como campo de batalha entre a
normalidade e a singularidade, entre a beleza instituída e a fragilidade, entre corpos e
linguagens inscritos dentro de um padrão e corpos e linguagens que se furtam a padrões.
Afirma o autor que haveria de se pensar, portanto, nossas relações com aquilo que
acreditamos diferir de nós mesmos. Com o uso de algumas narrativas literárias, Skliar
procura tecer uma ética e uma política da fragilidade.
Patrícia Redondo, em um artigo intitulado “Mestrxs e Professorxs de uma "Escuela
Especial": Narrativas e pensamentos”, se propõe a relatar, a partir de uma pesquisa
realizada num bairro periférico de Buenos Aires, os acontecimentos que emergem de um
coletivo de professores que trabalha em uma escola “especial”. Com ressonâncias
rancièrianas, a autora visa a verificar a possibilidade da igualdade entre aqueles que
12
12 |apresentação
|apresentação

frequentam esse espaço e a analisar a relação que os professores estabelecem com os


saberes inerentes à formação pedagógica. O texto vai construindo uma tessitura na qual se
entrelaçam diversos modos da experiência educativa nessa “escola-porto”, onde
professores chegam de diversas rotas e partem para distintos lugares com ideias e
propostas.
César Leite, no texto que dá continuidade a essa seção, grafa com sensibilidade
apurada “Infância e imagem e corpo e linguagem: em modo de ensaio”, nos convidando a
pensar uma educação do olhar que nos tire de onde estamos, que nos presentifique nas
dobras e nas retas do percurso, que se manifeste como um ato de atenção. Para tanto, parte
de trabalhos desenvolvidos com a produção de imagens de crianças da Educação Infantil,
propondo pensar o corpo, com o corpo, um corpo infantil, um corpo criança que se
apresenta em um povoado universo de sons e ruídos, silêncios e focos. Nestes termos,
invoca o devir de uma linguagem sugestiva, indiciária, uma linguagem infantil que gagueje
por frases, palavras, sílabas, letras; uma linguagem, enfim, povoada por uma imagem do
próprio corpo infantil.
A escrita afetuosa de Simone Berle e Ana Paula Saraiva Morais, em “A pesquisa
como gesto infantil de (auto) educação: notas para pensar um ser professor”, problematiza
os discursos pedagógicos que consideram desvendar e nomear as ações da criança a partir
do estereótipo que denomina o que ela não sabe. Destaca que, para pensar o acontecimento
da educação, precisamos refletir sobre nós mesmxs na relação com a infância. Nesta
direção, chama a atenção para a necessidade e possibilidade de pensar o termo infância fora
da categoria biológica e de assumir que a tarefa educativa não é de apresentar um mundo
para preservá-lo, mas sim de gerar possibilidade de fazer nascer, de ajudar o outro a ser,
num processo em que “...buscamos encontrar em nós, pedagogas, uma resistência infantil”.
Propõem, então, pensar a educação de professores, na inseparabilidade das experiências
educativas.
No artigo que fecha a seção, “Filosofia libertária e educação infantil: corpos-
pensamentos aos ‘cuidados de si’”, Lígia Prando defende, de maneira poética, que as
crianças pensam criadoramente, resistindo às lógicas autoritárias, politicamente repetidas
há séculos, por certa parte dos adultos. Para a autora, o pensamento das crianças é corporal
e se constitui numa interlocução entre o verdadeiro e o falso, junto à potência desse último
para suscitar novidades e devires. Nesse sentido, a autora tece uma trama, com Nietzsche e
Foucault, a fim de afirmar a Educação Infantil como um espaço potencialmente criador,
onde a prática do cuidado de si pode se revelar nas transformações do modo como crianças
e adultos se relacionam entre si e, em última instância, como vivem a vida. Cuidar de si,
afirma a autora, é cuidar dos pensamentos-criança, ir ao encontro de desejos não fabricados
por outros, cultivar o corpo-pensamento, independentemente da idade cronológica ou do
lugar ocupado dentro da instituição.
Abrindo a seção “Filosofia com crianças”, o texto de Edna Olimpia da Cunha, “Tia,
vai ter fisolofia hoje?”, nasce de um convite que, segundo a autora, permanentemente se
renova: o convite para pensar os movimentos de formação a partir do desdobrar complexo
e desafiador do projeto de pesquisa e extensão Em Caxias, a filosofia en-caixa? A escola pública
aposta no pensamento (NEFI/UERJ). Com auxílio de Foucault, Deleuze e Derrida, e de
maneira delicada, Olímpia procura puxar os fios tecidos por suas práticas no referido
projeto – fios feitos de palavras, gestos, silêncios, perguntas -, abrindo questões que nos
fazem pensar sobre a língua, a escrita, o ato de educar que se traça entre nosotros.
O texto subsequente, da platense Laura Viviana Agratti, “A prática da filosofia na
educação e o propósito de que cada vez sejam mais os que se representem o mundo como
próprio”, traz interessantes relatos de experiências da prática de filosofia com crianças em
uma escola da Universidade Nacional de La Plata. Como uma prática que sustenta a
walter
walter kohan,
kohan, sammy
sammy lopes
lopes ee fabiana
fabiana martins
martins || 13
13

importância do pensar em comunidade, numa perspectiva emancipatória, o projeto de


filosofia com crianças na escola se afirma como um espaço que incita à reconfiguração das
relações pedagógicas e democratiza a produção do conhecimento, impactando diretamente
nos processos de produção de subjetividades. Laura Agratti tece um artigo que tem como
hipótese central que o filosofar na educação, além de estimular a elaboração de perguntas,
proporciona uma relação com o saber, o que se desdobra em efeitos políticos. Nesse
sentido, a autora afirma o projeto como possibilidade de ampliar a potência do
pensamento, na medida em que permite a abertura de espaços para que cada um possa
representar o (seu) mundo singularmente.
“Pensar, experienciar e brincar: outras linguagens, outras práticas...” é um artigo
oriundo do projeto de pesquisa “Filosofia com crianças: um detonante para a construção de
sujeitos críticos e criadores na escola”, desenvolvido em uma escola rural multietária na
Colômbia. Partindo de uma prática de observação participante, entrevistas e revisão de
documentos institucionais, María Teresa Suárez Vaca e Lola María Morales Mora se
propõem a pensar a escola como um lugar capaz de promover transformações a partir da
relação das crianças com a filosofia. Para tanto, as autoras apontam para a necessidade de
se conceber o professor como um adulto sensível e atento aos modos como as crianças
habitam o mundo, destacando a ludicidade como característica inerente à experiência
filosófica.
O lhano trabalho “Filosofia na escola: pensando as dimensões do papel público da
educação...” elaborado por Vanise Cassia e Edna Olímpia Cunha, volta-se à necessidade de
pensar as dimensões políticas implicadas na ideia de espaço público, associada ao contexto
da educação formal. Isso, a partir do projeto de pesquisa e extensão do qual as autoras
participam: Em Caxias, a filosofia en-caixa? A escola pública aposta no pensamento
(NEFI/UERJ), o qual propicia que professores e estudantes vivenciem experiências
coletivas de pensamento. O texto nos instiga ao colocar questões como: o que torna uma
escola um lugar público? Seria o público um modo de habitar? De que modo a participação
no projeto de filosofia tem contribuído para pensar as dimensões do papel público da
escola?
Já os dois últimos textos dessa seção apresentam experiências internacionais de
filosofia com crianças. Cristina Rossi, em “Explorando a Educação através da comunidade
de investigação filosófica. Primeiras notas para uma pesquisa-ação participativa com uma
comunidade de investigação filosófica”, apresenta uma experiência de formação de
docentes realizada em Monte Orfano, Brescia, Itália. O objetivo é entrever, nessa
experiência formativa, ferramentas efetivas de uma pesquisa-ação que utilize como
método a comunidade de investigação. O artigo trabalha o lugar da educação dentro e fora
da escola e coloca em questão a separação entre conhecimento teórico e prático. Para Rossi,
esse tipo de prática se apresenta como uma ferramenta possível para a implementação de
pesquisas participativas entre educadores.
Finalizando a seção, Edwige Chirouter e Marie-Paule Vannier escrevem o artigo
“Apresentação da cadeira UNESCO: prática da filosofia com crianças - uma base
educativa para o diálogo intercultural e a transformação social”, com base no projeto
“Prática de filosofia com crianças: uma base educativa para o diálogo intercultural e
transformação social”, criado pela UNESCO em 2012. Trazendo como argumento para a
escritura do trabalho a experiência desenvolvida pelo grupo PHILEAS (Philosopie,
Littérature, École et Adaptation Scolaire), as autoras buscam articular infância, literatura e
filosofia no sentido de defender que a formação de cidadãos com senso crítico e com senso
de empatia, implica a necessidade de democratização de seu ensino desde a tenra idade.
A quarta seção, “África e nós”, é composta de três textos. No primeiro, Renato
Noguera, em “Filosofia africana na antiguidade: tecendo mundos entre ancestralidade e
14
14 |apresentação
|apresentação

futuridade”, apresenta um estudo sobre filosofia africana, defendendo a tese de que os


textos africanos são mais antigos do que os ocidentais. Trabalha textos de filósofos como
Ptahhotep, Amenemope e Merikare e, a partir do estudo do conceito de “filosofia”
presente nesses autores, Noguera oferece a ideia do coração como o habitat do pensamento.
Ressalta-se, aqui, que pensar uma filosofia para além do ocidente não só é um ato de
resistência face à supremacia de um tipo de discurso filosófico hegemônico, como é um
exercício de repensar nossa relação com o conhecimento e com a história da filosofia.
Pensar espaços para trabalhar filosoficamente os conteúdos de história e cultura
africana e afro-brasileira de uma perspectiva anti-racista é o desafio colocado pelo engajado
trabalho “Tecendo mundos entre uma educação antirracista e filosofias afro-diaspóricas da
educação filosofias africanas”, elaborado por Wanderson Flor do Nascimento. O autor
busca caminhos para que a execução das determinações legais acerca da presença dos
elementos ligados às filosofias africanas e afro-diaspóricas nos currículos da educação
básica não nos conduzam a armadilhas – como os usos exotizadores – que impossibilitem
um encontro mais adequado e potente com os pensares africanos.
A seção é encerrada com o ousado texto “Imagem, visão e conhecimento: modos de
ver, modos de dar a ver”. Valter Filé enfrenta os desafios que têm impedido os envolvidos
no projeto de pesquisa “Educação das relações étnico-raciais na cultura digital” (2015) de
compreenderem melhor como as desigualdades produzidas nas relações étnico-raciais
podem ser pensadas/problematizadas a partir do consumo/produção de imagens, da
produção de maneiras de ver e de dar a ver, no contexto da chamada cultura digital.
Investindo fundamentalmente na formação de professores e nas implicações das
experiências dos sujeitos da educação nas suas relações com o mundo, explora o citado
projeto traçando alguns paralelos entre os movimentos que orientam a prática da fotografia
e as exigências dos procedimentos investigativos ou dos fazeres didático-pedagógicos.
A seção seguinte, “Educar em nossa América”, se compõe também com três textos.
“A experiência filosófica como crítica e expectativa em Arturo Andrés Roig” traz uma
interessante abordagem do pensamento de um filósofo de Nossa América, o professor
Roig, cuja obra - centrada no estudo da própria atividade do filosofar - se desenvolve no
final do século passado e início do atual. Compreendendo a filosofia como atividade crítica
e autocrítica, a autora, Adriana Arpini, analisa alguns diálogos platônicos, se propondo a
pensar os alcances da crítica e sua relação com as expectativas com o porvir. A pergunta
que perpassa o presente artigo, e que se torna um convite à leitura, é: frente à injustiça,
denunciada nos escritos de Roig, o que se pode fazer a partir da e com a filosofia?
Mauricio Langón escreve, no artigo subsequente, “Educar na interculturalidade:
diá-logos com os Kevin”. Impactado ao ler o relato das experiências educativas do jovem
Kevin, morador de região equivalente a uma favela em Montevidéu, Uruguai, Langon tece
seu texto no intuito de propor um outro modo de pensar, discutir e fazer pesquisa e
educação públicas com uma perspectiva intercultural. Entendendo a escola como um
espaço de encontro entre “unidades geoculturais”, onde o que se coloca em jogo é a
condição humana, para além de conhecimentos e habilidades, o autor analisa o discurso de
Kevin a fim de extrair critérios básicos para uma educação que não negue as diferenças
culturais e a diversidade dos grupos humanos.
Finalizando a seção, o texto de Maximiliano Durán, “Escola popular e
emancipação: uma aposta para o continente americano”, traz a análise da vida e da obra do
Sócrates de Caracas, Simón Rodríguez; responsável pela criação da primeira escola
igualitária da América, onde frequentavam meninos e meninas de diversas classes sociais e
distintos grupos étnicos e culturais. O princípio de igualdade sustentado pela perspectiva
educativa de Rodríguez é, para época, uma novidade sem precedentes. Articulando o
walter
walter kohan,
kohan, sammy
sammy lopes
lopes ee fabiana
fabiana martins
martins || 15
15

conceito de alienação em Marx à instituição criada por Rodríguez, Durán sustenta a tese de
que, ainda hoje, é possível realizar o projeto de escola igualitária e emancipadora.
Na seção “A escola e o educacional no escolar”, a escola como skholé é o conceito
fundamental abordado pelos dois textos escritos (ambos a quatro mãos) por Jan
Masschelein e Maarten Simons. Em “Experiências escolares: uma tentativa de encontrar a
voz pedagógica”, eles oferecem uma perspectiva que poderíamos chamar de pedagogia da
educação, criticando a forma externa, instrumentalizadora e funcional por meio da qual a
filosofia costuma se relacionar com a educação. A partir da provocadora tese de que os
filósofos costumam esquecer que foram à escola, os autores buscam oferecer oferecer uma voz
estritamente pedagógica para compreender o específico da escola e da experiência escolar.
Essa mesma linha é desdobrada no segundo texto da dupla, “A linguagem da escola.
Alienação ou emancipação?”, onde eles fazem um esforço para explorar o que faz da escola
uma escola a partir do ponto de vista educacional, em termos do que eles chamam de uma
“linguagem escolar”: as efetivas e reais operações realizadas nesse particular arranjo de
pessoas, tempo, espaço e matéria.
O artigo “Demandas coletivas de skholé (tempo livre) na economia neoliberal da
dívida” de Jason Wozniak, procura alargar a análise
análise da
da criação
criação do
do “homem
“homem endividado”,
conceito desenvolvido por Maurizio Lazzarato, colocando em questão como as instituições
educacionais nos Estados Unidos - funcionando sobre o paradigma do credor-devedor -,
endividam profundamente as pessoas, desempenhando um papel na produção e reprodução
de subjetividades endividadas. Para entender a dívida, a vida endividada e a produção da
subjetividade endividada, Jason Wozniak estuda a dívida sob a perspectiva temporal e
como ela coloniza o futuro, “rouba” tempo, impondo um ritmo particular às vidas
cotidianas individuais e coletivas. Na contracorrente, Wozniak pensa a escola como tempo
livre e, portanto, espaço de refúgio e resistência ao endividamento como forma de vida.
“Dar a cara. Notas sobre a escola como espaço público” é, segundo Jorge Larrosa,
um simples trabalho de professor que analisa parte de um filme e as discussões realizadas a
partir do filme. Permeado de fragmentos do escritor Rafael Ferlosio, estuda a escola como
espaço público - onde professores e alunos tornam as coisas públicas, e onde o mundo,
tornado matéria de estudo, é posto (conforme afirma Arendt) no interior de uma esfera
pública. Ali traz as perplexidades de um autor-professor face ao valor e sentido dado nos
dias atuais ao espaço escolar, propondo “desnudar um puro espaço de rostos e de relações
entre rostos no qual se define, simultaneamente, sua separação e sua comunidade, sua
exposição e seu segredo, sua firmeza e sua vulnerabilidade”. Assim, a leitor fica cara a cara
com a escola como abertura, vazio, espaço interfacial, drama.
Encerrando a seção, "A escola como phármakon na toxidade tecnológica
contemporânea. Reflexões sobre a crítica à escola na cultura digital" é um artigo de Inés
Dussel que analisa as relações entre as ditas “novas formas de conhecimento”, trazidas
pelos novos meios digitais (marcados pelo ideal de flexibilidade, onipresença e adequação
individual ao usuário), e os modos “escolares” de saber, que se sustentam, segundo a
autora, no ideal da crítica, da reflexão e da construção argumentativa. Face às novas
configurações tecnológicas e culturais, Inés Dussel problematiza, pois, os modos de ser e
fazer escola hoje.
Chegamos, assim, à sétima seção, “Narrativa, escrileitura, ficção” iniciada pelo
texto de Jorge Ramos do Ó, “Para uma escrita académica inventiva: o legado da teoria
social pós-moderna”. O problema que envolve o ato de escrever na academia é o de saber
como produzir enunciados que abandonem os princípios constantemente expressos pela lei
e as instituições que a introduzem no corpo social. A partir dessa pujante problemática,
Jorge do Ó destaca que a grande dificuldade face à investigação - e que tentamos transpor
para a realidade do texto - é e será sempre a de forçar o presente a sair dos processos de
16
16 |apresentação
|apresentação

significação existentes e a disponibilizar-se a todo o tipo de encontro com o desconhecido,


forçando-nos ao desencantamento em relação à previsibilidade e homogeneidade
disciplinar com que se apresentam as identidades e os modos de vida contemporâneos. A
atividade de escrever se configuraria, assim, como se nos pressionasse ao estabelecimento
de novos pactos entre o sujeito da enunciação e o sujeito da conduta, donde derivaria a
hipótese de uma escrita inventiva.
Sandra Mara Corazza engendra o possante “Pesquisa empírica-transcendental da
diferença: arquivo, escrileitura e tradução de dados”, onde afirma que, como intérpretes e
críticos da herança humana, somos atravessados pelo paradoxo de sermos pesquisadores e
também tradutores, continuando a ser professores. O segundo texto da seção destaca que
esses dilemas povoam os atos de criação daqueles que educam, questionando então: como
realizar uma pesquisa, a partir da filosofia da diferença, com uma embocadura de ordem
empírica, sem tratá-la de maneira formal? Circunscreve o trabalho traçando uma linha de
fuga segundo a qual no empirismo renovado, não gnosiológico, mas transcendental (no
sentido deleuziano), pesquisar-educar é a experimentação de um trabalho intelectual,
traçado pelo diagrama de forças das escrileituras tradutórias e formalizado em arquivos
transdisciplinares, transculturais, translinguísticos, transemióticos, transpensamentais.
Em seguida, Marcelly Custodio de Souza apresenta “Perspectivas sobre uma escola
sem órgãos” procurando esboçar uma tentativa de pensar a escola como lugar de potência.
Faz um deslocamento conceitual do conceito de Corpo sem órgãos de Deleuze e Guattari
para o de escola sem órgãos. A partir de um recuo na história do Brasil, desenvolve a noção
de ‘corpo escolar’, o qual funciona segundo uma lógica de utilidade e produção que
sequestra o desejo dentro do nexo de uma finalidade a ser atingida. Nesse contexto, a
autora pergunta e nos pergunta se seria possível e, caso afirmativo, ‘como criar para si uma
escola sem órgãos?’
Tendo como mote a pergunta “como chegou a ser o que foi?”, Gladys Madriz se
dedica a pensar a formação cristã e a relação ético-político com o outro através do estudo
da vida do religioso espanhol Juan Vives Suriá, pedagogo engajado, ao longo de sua vida,
numa práxis da pedagogia social. “Vida, misericórdia e militância. A identidade narrativa
de um pedagogo social” se constrói, assim, como uma narrativa biográfica, recompondo a
formação de Vives enquanto sujeito de sua própria história; sobressaltando as marcas de
sua prática educativa, cristã e libertadora.
Gregorio Valera-Villegas encerra a seção com um artigo intitulado “A escola como
vontade de ficção: da verdade moral à metáfora”, escrevendo um texto como um
“exercício de antropologia filosófica do acontecimento escolar”. Entende a escola como
lugar de encontro entre meninos, meninas, professorxs e alunxs; a “escola vivida e que se
vive”, imaginada como impostura pedagógica. Em oposição à universal, o autor busca o
sentido dessa escola extramoral na vida dos sujeitos que nela vivem. Seu texto é um
convite para pensar nossas narrativas escolares e repensar o modo de habitar a escola e a
docência.
Na seção oitava, “Musicalidade, teatralidade e arte na educação”, “Educar no Jazz:
Oito traços para uma nova pedagogia”, de Marina Santi, se apresenta como uma metáfora
que concebe uma provocação e também um desafio, que questiona os limites da pedagogia
tradicional e estende os horizontes da prática educativa. O texto explora a potência do jazz
como conceito não apenas musical, mas ético-político para pensar o papel de uma
educadora e oferece oito características que constituem o específico e singular do jazzear
em campo educacional.
O que se pretende quando se reivindica a escolarização da música? Será possível
pensar música na escola? É isso que indaga Pablo Vargas no seu texto “Música,
pensamento e educação musical menor”. Compreendendo a música como uma forma de
walter
walter kohan,
kohan, sammy
sammy lopes
lopes ee fabiana
fabiana martins
martins || 17
17

pensamento, o autor enfatiza (na esteira de Deleuze e Guattari) não a presença de práticas
musicalizadas - muitas vezes usadas para disciplinarizar as crianças, principalmente na
Educação Infantil; mas, ao contrário, a função estética, ética e política da criação musical, a
exploração de materiais sonoros e a escuta atenta a obras e ruídos. Nesse sentido, Vargas
pensa uma educação musical menor, que resiste àquela de maioria, segundo a qual
existiriam verdades musicais instituídas para a educação musical. O texto defende,
portanto, a experimentação sonora não-estereotipada e não-referencial.
O terceiro trabalho da seção, “Estratégias “teatro-performativas” para o traçado de
cartografias de “inclusão” e “exclusão”. Aportes para o estudo das “condições de
possibilidade da cena” – análise da teatralidade como “cena potencial”- e desenvolvimento
de dispositivos de captura “estético-po(i)éticos”, procura colocar em jogo diversas
experiências “expressivo-comunicativas”, sob a perspectiva da complexidade do
“mundo/continuum” da ação. Para tanto, Ricardo Sassone desenvolve seu texto em quatro
eixos: o da filosofia prática e aplicada, o do desenvolvimento da ação inerente ao mundo da
performance, o da determinação “cronotópica” e, por fim, o desenvolvimento de
dispositivos de captura “estético-po(i)éticos”. Sob o ponto de vista da educação, Sassone
propõe que se pense um deslocamento do “philodrama” ao “sociodrama”.
Gabriela D’Odorico, em “Humanidade e corpos tecnológicos. A bioarte no ensino
da filosofia”, trabalha sobre as transformações que a ciência e a tecnologia vêm produzindo
na vida humana. A autora defende que a intervenção biotecnológica e bioartística traz a
necessidade de se colocar em questão o estatuto da vida, do corpo e do humano,
atualizando problemáticas que perpassam a história da filosofia. No seu texto, há um
íntimo intrínseco entre arte, filosofia e tecnologia, propondo a hipótese da bioarte como
uma produção cultural, no bojo de uma antropologia filosófica contemporânea.
Finalmente, na seção “Tempo, finitude e inquietude de si”, Olga Grau escreve “A
duração no espaço educativo” em um diálogo com H. Bergson que, embora não tenha
escrito nada especifico sobre as interfaces da filosofia e da educação, permite estabelecer
inúmeras relações entre seus conceitos e o campo da filosofia da educação. O texto de Olga
se constitui como uma tessitura entre o mundo bergsoniano e o mundo da filosofia da
educação; articulando, especificamente, o conceito de duração aos espaços educativos. De
maneira singular, com referências às ficções de Borges, Olga Grau trabalha a expressão
“educação da atenção” para propor uma educação que potencialize a percepção, conforme a
plasticidade e vitalidade intuitivas próprias da arte.
A fim de pensar o significado e a possibilidade de uma educação filosófica, Óscar
Espinel-Bernal e Óscar Pulido-Cortés trabalham sobre três perguntas centrais,
íntimamente relacionadas: “o que é a educação?”, “o que é a filosofia?”, e, finalmente, “o
que é a educação filosófica”? Nestes termos, o trabalho que dá seguimento à seção,
“Educação filosófica e inquietude de si. Diálogos entre Estanislao Zuleta e Pierre Hadot”;.
concebe, com Nietzsche, o exercício filosófico como ato intempestivo. Em outras palavras,
como pensamento investigativo e criativo. No diálogo entre Zuleta e Hadot, é construída
uma concepção ético-política de filosofia e educação como cuidado de si e cuidado do
outro, entendendo o outro como prática coletiva. Defende-se, na contramão da tendência
técnica e cientificista, uma educação emancipatória, direcionada à criatividade e ao
exercício da problematização.
Angel Alonso aborda, em “Reflexões sobre a finitude e sua aproximação aos
jovens”, a maneira com que problemáticas de difícil tratamento, como dor, sofrimento e
morte; foram abordadas nas aulas do Colégio de Ciências e Humanidades da Universidade
Nacional Autônoma do México (CCH-UNAM). Pertencente à condição humana, a
finitude perpassa a história da filosofia; ademais, no bojo de uma sociedade marcada pela
“cultura da morte”, se apresenta como potente conceito a ser trabalhado nas aulas de
18
18 |apresentação
|apresentação

filosofia. No presente texto, o autor narra sua experiência e traz seu aporte teórico e
metodológico acerca dessa complexa problemática.
Ao tecerem as linhas de escrita de “Colóquios sobre educação: da vida, o que se
sabe; do estudo o que se pode; e da filosofia, a eterna busca da verdade”; Rosana Fernandes,
Daison Nelson Ferreira Dias e José Menna Oliveira discorrem de forma contundente
sobre os equívocos que incidem nas instituições de ensino em torno do estudar e do pensar,
desenvolvendo a ideia da amizade como condição para pensar e para aprender, bem como
abordando as distinções deleuzeanas entre o conceito de “pensar” e a “Imagem Dogmática
do Pensamento”. Neste percurso, utilizam-se dos fragmentos de relatos de casos clínicos,
descrições de situações de ensino e aprendizagem praticadas em hospitais psiquiátricos,
congressos médicos e salas de aula.
Encerrando a seção, e dando fechamento ao livro, Rosimeri Dias e Heliana Conde
abordam, em “Desaprender, viajar, resistir - por modos outros de formar professores”, as
novas práticas de formação situadas entre a Universidade e a escola básica, desenvolvidas
através de projetos de pesquisa-intervenção por uma das autoras. Nesse trabalho,
elementos relacionados às práticas de cuidado de si na filosofia antiga, retomados por
autores contemporâneos, funcionam como intercessores para a discussão/problematização
da formação de professores na atualidade: Que relações podem ser, por meio da formação,
estabelecidas, inventadas, multiplicadas, moduladas? Em que sentido abrimos espaço e
tempo para modos outros de formar? Em uma escrita tecida por trechos das cartas de
Sêneca a Lucílio, e para além da normatividade, as autoras pensam a formação (de si)
como uma técnica de vida, formação inventiva que, enquanto produção de subjetividade,
afirma a potência do problema, da pergunta, da hesitação como ato educativo.
Prezado leitor-autor, está aberto o convite para ler o livro de diversos modos, em
diferentes lugares e contextos; para estabelecer uma leitura afetiva, intensa, que prescinda
de prescrições. A partir do hífen que articula as relações entre educação-filosofia, esboçam-
se aqui mil platôs, mil línguas, mil escrito-leituras, que abrem entre-espaço-tempos para o
devir de uma resistência ativa: um murmúrio ou um rumor, um som indistinto e contínuo
de muitas vozes, que procura romper com o sufoco e fazer passar à vida um pouco de
possível.

walter kohan, sammy lopes e fabiana martins


rio de janeiro, setembro de 2016.
19
19

i. política, sujeito,
educação
20
20
21
21

un “nosotrxs” como sujeto colectivo de la educación

alejandro cerletti11

D
esde el título (“Mundos que se tecem entre ‘nosotros’: o ato de educar em
uma língua ainda por ser escrita”), la convocatoria de esta VIII edición del
Colóquio Internacional de Filosofia e Educação nos plantea múltiples desafíos y
nos invita a recorrerlos. Y nos invita también a que cada uno lo haga a su
manera. Lo pueda hablar a su manera. Este Co-loquio nos ofrece entonces la posibilidad del
común de un hablar juntos, tal vez de un conversar o de un dialogar.
Y ya desde el título, la invitación a pensar-nos dice que hay mundos (en plural) y
hay una textura, un entrelazado, habido o por haber. Nos sugiere que hay hilos y un tejido:
el “nosotros”, se sospecha, tendría algo que ver con un entramado (un “entre”). Habría ya
“mundos” preexistentes que se involucran o tendrían que ver con un “nosotros”, y el
educar, entendido como “acto”, se hace en una lengua que será, en algún momento, escrita.
El título, en síntesis, ofrece al pensamiento al menos seis nudos conceptuales (o tal
vez metafóricos): mundos, tejidos, nosotros, educar (como acto), lengua (una lengua),
escritura.
Pues bien, comencemos a preguntarnos sobre todo esto, porque al fin y al cabo esta
es la tarea de la filosofía.
¿Quién sería el “nosotros”? ¿Cuándo se hace referencia a “nosotros” estamos a la
vez hablando de “todos”? ¿Ese “nosotros” qué dimensión adquiriría y qué abarcaría?
¿Puede haber un “nosotrxs” de la educación (o, al menos, de cualquier acto que aspire a
adjetivarse como “educativo”)? ¿Habría algo que haga un común de lo heterogéneo de las
individualidades que convergen en una situación de aprender y enseñar? La educación
obligatoria, por ejemplo, crea un espacio común de institucionalización donde
convergemos todos. Ese forzamiento a compartir, ¿puede implicar algún tipo de nosotrxs?
La infinita multiplicidad que cada unx es, ¿se puede entrelazar en un acto, en un lugar, en
un momento, y gestar algo diferente de lo que éramos antes? ¿Cada unx es diferente en un
nosotrxs? ¿Cuándo hacemos algo juntos, somos otrxs? ¿La diferencia está entre cada uno de
nosotros o entre el cada uno y el nosotros? En otros términos: ¿cuál es la diferencia más
significativa: la de “los unos” entre sí, o la de lo uno y lo múltiple? Y en especial: ¿la
primera persona del singular (yo) es el condición de la primera del plural (nosotros)?
¿Podría ser al revés? ¿Toda subjetivación es siempre individual y lo colectivo es una
agregación posterior?
Desplacémonos por un instante a la segunda parte del título. ¿Lo que nos uniría
sería una lengua (una lengua común)? ¿Y una lengua común por ser escrita? Pero, ¿por qué
debería ser escrita? ¿Qué sería lo diferente que aporta la escritura al diálogo, a la
conversación, al entramado vivo de las palabras, a la oralidad? Recordemos la larga
tradición oral de nuestros pueblos originarios y el impacto cultural que ha significado
someterla a la escritura, algo que les resultaba completamente ajeno. Y no sólo por la
lengua extraña que los alfabetizaba y les imponía una nueva tradición sino por duplicar la
dimensión de su existencia. Los caracteres latinos ya eran portadores de otro mundo.
Podríamos seguir problematizando largamente el título de la convocatoria y
pensando o pensándonos a partir de él. No son pocas cosas las que induce, de manera
comprimida.
La filosofía siempre tuvo que ver con preguntarse, pero no con un preguntarse
infinito en el que nunca se alcanzan respuestas. Por más que su pulsión etimológica y la
11 Universidad
Universidad de
de Buenos
Buenos Aires.
Aires. Universidad
Universidad Nacional
Nacional de
de General
General Sarmiento.
Sarmiento. Email:
Email: acerlett@filo.uba.ar
acerlett@filo.uba.ar
22
22 || alejandro
alejandro cerletti
cerletti

tradición digan que lo más importante no es el saber sino el deseo de saber y que lo
esencial es el preguntar, toda pregunta genuina tiene aspiraciones de respuesta. Aunque
luego esa respuesta pueda volver a ser cuestionada. Hay momentos en que la voluntad
filosófica de interrogación se detiene para poder decir algo. Quien dice algo, quien afirma
algo, detuvo el preguntar en un lugar. Lo que ocurre es que no todos nos detenemos en los
mismos lugares. Cada filosofía, o cada pensamiento en acto, es una exhibición implícita o
explícita de los lugares donde el preguntar se detuvo para poder expresar algunas ideas.
Voy a detener el preguntar en algunos puntos, en algunos lugares que permitan tal
vez empezar a construir un mundo posible, de entre todos los posibles y los imposibles.
Me interesa un aspecto del espíritu de la convocatoria: el “aún”, la expresión que
visibiliza un por llegar. Lo que todavía no está pero en algún momento puede estar o puede
tener lugar. Desde el título se infiere que ese lugar es la escritura. Se vislumbra que un
entramado es posible, y que es posible en una lengua escrita.
Voy a proponer un paso más atrás: que pensemos antes que nada el pasaje del
todavía no al ahora sí; esa suerte de tránsito de un no-ser al ser. Que intentemos darle fuerza
conceptual a esa transición, o mejor aún, al momento y las circunstancias de esa transición,
y qué efectos podría llegar a tener en el caso de la educación o en el “acto” de educar. En
especial, cómo aparece un “nosotros”, qué y quién sería el nosotrxs de la educación y qué
podría significar esa subjetivación en plural.
De entre las afirmaciones que detienen el preguntar, adoptaré algunas. Me
referenciaré en una concepción del ser y del acontecer que, espero, me posibilite abrir
algunos caminos conceptuales fértiles. Se hallarán en esta perspectiva, algunos ecos
badiouanos (BADIOU, 1999; 2008).
Lo que es, es una multiplicidad; y no una multiplicidad de “unos” sino una
multiplicidad de multiplicidades. O, en otros términos, todo lo que es, es una diseminación
infinita de multiplicidades.22 Somos multiplicidades infinitas. Cada unidad, cada individuo,
cada grupo determinado es una particular segmentación de las multiplicidades que somos.
Un recorte o una delimitación configura un “uno” o una identidad. Dicho de otra manera,
somos un mar de diferencias. Diferimos con otros y hasta con nosotros mismos (nadie es
otro y ni siquiera somos lo que fuimos). La diferencia es la trivialidad del ser. No hay más
que diferencias, y diferencias de diferencias. Cada unidad es un recorte de esas diferencias
infinitas, de esas multiplicidades de multiplicidades. Por lo tanto, cada individuo es una
arbitrariedad, porque exhibe una detención posible de ese mar de diferenciaciones.
Ahora bien, teniendo esto en cuenta, ¿cómo pensar entonces un nosotrxs educativo?
Habría que pensar en algo que detenga la diseminación de diseminaciones, que
circunscriba las multiplicidades de multiplicidades y haga que sea posible alguna identidad,
un eventual nosotrxs y, a la vez, que no coarte a aquellx/s que lo compone/n. Es decir, el
nosotrxs sólo es eventual, acontece en algún momento. No se lo puede deducir de lo anterior
y su continuidad depende del actuar y el pensar de ese nosotrxs.
Pero, a su vez, nosotros no vivimos nunca en una permanente diseminación.
Vivimos ya en un mundo. El mundo en que vivimos es una brutal segmentación de todos
los mundos posibles en el que nos sorprendemos existiendo. En él nos individualizamos,
nos subjetivamos, y nos constituimos en un horizonte de lo posible. Lo que hay es esto. Y
la vida es una continuidad aparentemente inexorable de esto que vivimos a diario.
En lo personal, mucho más que las continuidades, me han interesado las
discontinuidades, lo que permite pensar lo otro de lo mismo. Frente a las monotonías o los
tonos dominantes, me atraen las disonancias; lo que altera la armonía. Cuando se está

22 Un
Un ser
ser del
del todo
todo oo un
un todo
todo del
del ser
ser son,
son, por
por lo
lo tanto,
tanto, imposibles.
imposibles. No
No hay
hay delimitación
delimitación del
del ser
ser como
como todo
todo que
que
no
no termine
termine en
en alguna
alguna onto-teología.
onto-teología.
un
un “nosotrxs”
“nosotrxs” como
como sujeto
sujeto colectivo
colectivo de
de la
la educación
educación || 23
23

acostumbrado a escuchar de una manera, lo diferente no suena bien o no se escucha. Lo


nuevo siempre es, en todos los ámbitos, percibido como un ruido o como un acto o un
gesto incomprensible. Porque el mundo existente es el que define el orden de lo posible, de
lo inteligible o de lo audible. Más que la repetición de lo mismo, me interesa lo que hace
excepción en lo mismo. Lo que no es pero en algún momento puede llegar a ser. Lo que no
se entiende porque hace excepción en el mundo dominante de lo inteligible; es decir, lo que
acontece. Y para pensar lo que acontece hay que pensar lo nuevo de cada situación.
Pero hagamos una aclaración más.
Vivimos un mundo que se presenta como el único posible y en el que se ha
usufructuado hasta el hartazgo la novedad. Los emprendedores “creativos” son el modelo
del triunfador, en los negocios, en la vida y en las discusiones. Ser “creativo” o novedoso
es tener la capacidad de diseñar una publicidad de mayonesa que tenga éxito comercial.
Existimos en un mundo que ha banalizado lo nuevo hasta el punto de transformarlo en la
clave de la nueva continuidad de las cosas. Novedad, creatividad, cambio,
emprendimiento, etc., transformados en nuevas mercancías conceptuales, han logrado
esterilizar el pensamiento de lo diferente que puede haber. Este nuevo estado de las cosas,
esta nueva continuidad aparece como definitiva, porque ahora incluye y ensalza la
novedad. Ya no puede pensarse lo nuevo porque lo nuevo ya forma parte del estado de las
cosas. Sólo hay la continuidad de lo mismo, pero ahora lo mismo incorporó la novedad de
lo otro. Todo cambio, toda novedad, forma parte constitutiva de lo mismo.
En este cuadro, el común extendido es el de la comunicación. La novedad
permanente de la comunicación mercantilizada y mercantilizante, en clave de
entretenimiento. Con sus tiempos vertiginosos, que le imprimen velocidad a lo nuevo y a
lo nuevo de lo nuevo. Y no hay nada que lo detenga. Cualquier cosa impacta y luego entra
rápidamente en obsolescencia, para dar lugar a una nueva novedad. Paradójicamente, lo
nuevo entrama la continuidad conservadora de lo mismo; y lo hace a un ritmo vertiginoso
y constante. Por lo tanto, no queda más que dotar de otro sentido a la interrupción
novedosa de la continuidad de las novedades mercantilizadas y espectaculares.
La diferencia sobre la que me interesa reflexionar no es tanto la de los unos o de las
individualidades entre sí, sino la diferencia de lo uno y lo múltiple. En nuestro mundo
actual lo uno absorbe lo múltiple. Es su condición de ser. El problema es que este mundo
agota la diferencia en lo uno, en la disputa identitaria o individualista.
Ahora bien, retomando las preguntas iniciales, ¿quién sería ese yo colectivo, “el
nosotrxs” que estamos buscando en el acto de educar? ¿Qué es, en definitiva, una
subjetivación colectiva? El título de mi exposición, “Un ‘nosotrxs’ como sujeto colectivo
de la educación”, agrega un elemento más al horizonte de la propuesta del Coloquio: el
término “sujeto”, y en particular “sujeto colectivo”.
Después de que el giro lingüístico y la posmodernidad se transformaron en el
mainstream de la filosofía - o, mejor dicho, del pensamiento -, hablar de sujeto significa
asumir algunos riesgos. Obviamente, no tendría ningún sentido intentar reponer el viejo
sujeto cartesiano, o el sujeto trascendental kantiano o retomar la tradicional contraposición
sujeto-objeto como una clave virtuosa para conocer el mundo. Me importa más bien
vincular el concepto de “sujeto” con el de acontecer, y ofrecer una idea de la subjetivación
diferente de la tradicional, que esté íntimamente relacionada con la novedad que aportan
los que intervienen en cada encuentro “educativo”, y lo que sucede en cada uno de esos
encuentros; es decir, focalizar aquello que, de alguna manera, interpela la normalidad de
las cosas.
Antes que nada, tengamos presente que la palabra “sujeto” puede hacer referencia a
muchas cosas. Es un término frecuente en diferentes campos; por ejemplo, la gramática (a
partir de distinción sintáctica sujeto-predicado en la construcción de nuestro lenguaje),
24
24 || alejandro
alejandro cerletti
cerletti

también en la psicología, el psicoanálisis, el derecho y, por cierto, en la filosofía. En el


ámbito de la educación suelen operar, de una u otra manera, todos estos campos, y en
ocasiones incluso se entrecruzan, muchas veces sin quedar muy definida la mayor o menor
incidencia de uno u otro. Aparecen entonces el sujeto del aprendizaje, el sujeto educativo,
el sujeto pedagógico, el sujeto escolarizado, el sujeto de conocimiento, el sujeto de la
conciencia o del inconsciente, el sujeto moral, el sujeto de derecho (y el sujeto de derecho a
la educación, en particular), etc. El término sujeto tiene entonces una omnipresencia y una
polisemia sobre la que es necesario estar advertidos.
¿Quién es entonces el sujeto de la educación?, ¿qué es el sujeto de la educación?
¿Quién o qué es el sujeto de la educación cuando nos interesa abordarla desde una
perspectiva filosófica? Y a su vez, ese “sujeto”, ¿puede asumir una condición plural?,
¿puede ser la expresión de un nosotrxs del acto de educar?
Si nos detenemos en la expresión “sujeto de la educación”, podemos apreciar en ella
un doble significado: “sujeto de la educación” puede referir a alguien o algo que interviene
o participa o construye la educación o su educación, o, por otro lado, como alguien o algo
que es efecto de la educación, o está sometido a ella. Podríamos graficar esas dos
vertientes, de manera simplificada, como lo que hacemos con la educación, por un lado, y
por otro, lo que la educación hace con nosotros. Es decir todo proceso de construcción
subjetiva, en general, pero en especial en la educación, supone que toda subjetivación
implica alguna forma de acción y alguna forma de sujeción, de sujetación.
Tengamos presente que el sujeto de la Modernidad (o sea, el ciudadano razonable y
universalmente escolarizable) se asume como sujeto libre (activo y creador) y, a la vez,
como gobernable (sometido a la ley y respetuoso del orden). Vemos entonces que la
contraposición entre libertad y sujetación constituye una tensión fundante de la política y
la ciudadanía moderna, y por extensión, de la educación moderna.
El desafío de la filosofía de la educación es cómo lograr pensar de una manera
fructífera este aparente contrapunto entre libertad y necesidad (o libertad y obligación) en
el contexto de la educación institucionalizada; cómo exhibir la posibilidad de un nosotrxs
educativo que muestre una textura de mundos y no que imponga un mundo (el
hegemónico).
Si nos atenemos a las condiciones formales, vemos que las instituciones de
enseñanza oficial constituyen espacios de encierro obligatorio en los cuales los individuos
son reunidos por lapsos de tiempo variables para ser educados, o para que al menos algo del
orden de la educación tenga lugar ahí. Esta estructuración de los espacios destinados al
enseñar y al aprender, y transmitir los valores de la cultura dominante, es una de las piezas
políticas centrales de la educación moderna como pilar de la construcción de los estados
nacionales.
Sostendré que para que ocurra algo que merezca llamarse “educativo” es necesario
un encuentro, es decir una circunstancia en la que confluyan de una manera especial
personas, mundos, saberes, pasiones. La sola reunión de individuos en un espacio
preestablecido para la educación no garantiza que se produzca un encuentro. Un encuentro
es la posibilidad de imaginar una textura de trayectos en la que quienes intervienen se
transforman en función de los demás y dan lugar a algo diferente de lo que había antes. La
educación tendrá que ver entonces con un cruce de caminos y con un común que le es
propio.
Ahora bien, toda reunión - como por ejemplo, la educativa - tiene una dimensión
que es imprevisible. Cuando se cruzan caminos siempre existe la oportunidad de que
suceda algo diferente de lo esperado; existe la oportunidad de que algo acontezca. Esta
dimensión no previsible o aleatoria del encuentro educativo, o de las situaciones de
enseñanza y aprendizaje, suele ser vista por las instituciones como un problema. Y
un
un “nosotrxs”
“nosotrxs” como
como sujeto
sujeto colectivo
colectivo de
de la
la educación
educación || 25
25

efectivamente lo es. La cuestión es cómo pensamos esos problemas y qué sentido le


atribuimos, dentro de una lógica, como la escolar, que intenta mantener todo bajo control;
que intenta regularizar las condiciones de esos encuentros y por lo tanto normalizar los
vínculos que se den a partir de ellos.
Toda institución educativa conlleva una voluntad de promover aprendizajes (es
parte fundamental de su sentido pedagógico y político). Pero, en sentido estricto, ¿quién
aprendería? ¿Cómo se constituiría ese “sujeto” del aprendizaje? (CERLETTI, 2015).
Adoptando y adaptando algunos aportes de Alain Badiou (1999; 2008), asociaré el
concepto de sujeto con la alteración de una secuencia de normalidad. Es decir, desde esta
perspectiva, no habría “sujeto” de una continuidad o de una repetición o reproducción (de
conocimientos, de prácticas, etc.). Cuando se da una repetición o reproducción,
correspondería hablar, no de “sujetos” sino, más bien, de “objetos” de la reproducción o la
continuidad, ya que habría “alguien” (un individuo o un conjunto de individuos) que es
instalado en el ordenamiento de una maquinaria que intenta funcionar de manera
eficiente. El proceso de inclusión de los individuos en esa maquinaria de repetición es, más
que una subjetivación, una objetivación, porque pasan a formar parte de un estado de cosas.
Y si en este caso habláramos de subjetivación deberíamos hacerlo en el sentido de una
mera sujetación al estado dominante de las cosas. Es decir, sólo se recae en el aspecto
pasivo del concepto de sujeto.
En un sentido tradicional, la noción de “sujeto pedagógico” o “sujeto del
aprendizaje” hace referencia a un lugar preestablecido por la teoría pedagógica o didáctica,
que es llenado por quienes lo ocupan circunstancialmente. De este modo se constituye, por
ejemplo, y paradigmáticamente, la relación docente-alumno y su relación con el saber. Este
“sujeto” está prefigurado por la teoría educativa y por las tradiciones de la enseñanza
institucionalizada, y su lugar en la relación está definido de antemano. Lo mismo ocurre
con quien ocupa el espacio del docente. Quien ingresa en ese esquema formal como
alumno lo hace sin participar en la asignación de ese lugar; lo hace “objetivamente”, ya que
se instala en una secuencia de normalidad (y, como sucede en la mayoría de los sistemas
educativos, en el nivel primario y secundario, es obligado a hacerlo). Su dimensión
“subjetiva” no sería entonces más que la de “sujeto” sujetado al sistema de reproducción de
los saberes y las prácticas dominantes. Si, por el contrario, se adopta la perspectiva de que
el sujeto tiene que ver con algún tipo de novedad o de alteración en lo prefigurado
institucionalmente, y no una objetivación transfigurada, el panorama es bastante diferente.
El aspecto más significativo de una irrupción en lo establecido en un contexto de
enseñanza es la emergencia de la palabra del otro, y más específicamente, del pensar del
otro (del otro del docente, pero sobre todo, de lo otro de la institución, de los saberes y las
prácticas tradicionales, etc.). El pensamiento del otro es algo que no puede ser programado,
ya que pensar significa poder intervenir e interpelar los saberes que se ofrecen o circulan.
Quien piensa sobre los conocimientos establecidos no los repite mecánicamente sino que
los recrea y apropia, a su manera. Valorar esta circunstancia implica concebir a la
educación desde la perspectiva de lo que acontece (fundamentalmente, el pensamiento),
más que desde el cumplimiento administrativo de lo planeado (por caso, la reproducción
de contenidos establecidos). Pero este enfoque supone visualizar una aparente paradoja:
para que se produzca una alteración debe haber algo elaborado y ofrecido de manera
propositiva. Lo nuevo irrumpe en lo que se había propuesto, porque altera lo que había sido
establecido como hipótesis de aprendizaje de los alumnos. Si esto no ocurriera, no habría
novedad. Lo planeado se transforma entonces en condición de posibilidad de su propia
disrupción. Toda creación necesita un encuadre, para ser desbordado.
Focalizar la alteración de lo previsible implica abonar una idea de “aprender” que
atribuye un lugar central a quien aprende en la construcción de su propio aprendizaje. Por
26
26 || alejandro
alejandro cerletti
cerletti

lo tanto, el concepto de educación subyacente en esta perspectiva está relacionado, de


alguna forma, con el de autoeducación y el de enseñanza con el de autoaprendizaje. Voy a
adoptar, en consecuencia, una caracterización genérica de educar, y por extensión de
enseñar, como aquella actividad que permite disponer ciertos saberes y prácticas de modo
que sean interpelados y apropiados; es decir, que sean, en sentido estricto, pensados y
actuados. Esto supone, a su vez, tener que elucidar las relaciones que se pueden establecer
entre los saberes que se reproducen (los contenidos programados) y lo que irrumpe como
novedad en el aprendizaje (la intervención creadora del pensar).
Bajo los efectos de la singularidad del otro, alumnos y profesores son algo más que
individuos librados al juego institucional de un establecimiento de enseñanza. Se sitúan de
otra forma frente a lo que es esperable. Esto supone decisiones docentes constantes y el
trayecto programado de la enseñanza traza un recorrido diferente, por las consecuencias de
esas decisiones. El “sujeto” de los encuentros que posibilitan las situaciones de enseñanza
no es, en sentido estricto, un sujeto individual (tal o cual alumno, ese profesor, etc.), porque
en el devenir del enseñar y aprender está involucrado un conjunto de multiplicidades:
alumnos, maestros o profesores, saberes, lugares, tiempos. Se trata de un sujeto colectivo,
que involucra a todxs, porque hay un vínculo actualizado constantemente. La disrupción de
la unidireccionalidad del discurso dominante hace que puedan emerger otras palabras. La
convergencia de las novedades que portan quienes participan de esos encuentros establece
un lugar de subjetivación que es común a esos participantes.
Porque de hecho, ¿quién es el sujeto del pensamiento que circula en un aula en la
que intervienen múltiples voces? ¿Quién es el “autor” de una idea que fue inicialmente
lanzada por alguien pero retomada luego por otros para pensarla, transformarla o recrearla
de acuerdo a las circunstancias peculiares del diálogo? ¿Cómo individualizar una autoría si
la voluntad de reflexión es colectiva y desinteresada (o el único “interés” es el de pensar
juntos)?
Que el sujeto de una situación de enseñanza y aprendizaje sea, básicamente, un
sujeto colectivo significa que lo que se constituye en sujeto es verdaderamente la relación
(docentes-alumnos-saberes) en su conjunto, ya que se produce una recomposición del
vínculo a partir de la novedad de cada uno. Sólo por extensión, quienes participan de ese
sujeto (colectivo) podrían ser a su vez llamados sujetos (individuales). Asimismo, el sujeto
es colectivo porque hubiera sido otra la recomposición (o no hubiera ocurrido nada) si
hubiesen sido otros los participantes y otro el contexto del encuentro. Es decir, la
posibilidad de que exista un sujeto depende de una particular combinación de
circunstancias y decisiones en una situación y no de una práctica pedagógica instituida,
una programación o una política educativa.
Se desprende de lo anterior que no hay un sujeto general que trascienda las
situaciones, sino que hay sujeto de la situación o en situación. Tampoco el sujeto preexiste
a la situación, ya que se constituye a partir de y en una modificación de lo esperable. Es
decir, solamente en ciertas circunstancias, de acuerdo a aquello que devenga en un
momento determinado de un estado de cosas, puede haber subjetivación, o también, puede
haber un aprendizaje, colectivo e individual.
Remarquemos que, desde este punto de vista, no habrá encuentro entre sujetos
preconstituidos, ya que la subjetivación va a ser el posible resultado del encuentro. No
habría sujetos preexistentes que se encuentran. Los partícipes de un encuentro son seres
humanos, ideas, saberes, pasiones, normas que, en su especial entrelazamiento, pueden
llegar a dar lugar a un proceso de subjetivación. Pero no hay garantías para ello, ya que
depende del devenir de la relación.
El deseo de construir un “nosotros” que atraviese la escritura, es decir un nosotrxs,
sin distinción de géneros, ni colores, ni inteligencias ni de cualquier otra discriminación,
un
un “nosotrxs”
“nosotrxs” como
como sujeto
sujeto colectivo
colectivo de
de la
la educación
educación || 27
27

convocado y transido por un encuentro, da sentido a cualquier acto educativo. Cada


mundo que se incorpora a la construcción colectiva es un hilo de una textura que forja una
subjetivación inédita, porque incluye a todos en sus individualidades, pero las indiscrimina
en su ser conjunto. Pensar juntos, actuar juntos, subjetiva colectivamente porque algo
nuevo acontece, que es fruto de la colaboración recíproca. Es un nosotrxs del encuentro; un
sujeto colectivo, cuya identidad es la indiferenciación de lo uno en favor de lo múltiple. Se
da en situación y sólo existe a partir del acontecer del encuentro. No preexiste, se
constituye y desaparece. Sus efectos pueden ser momentáneos o infinitos. Si la educación
es posible como entramado de mundos, el “sujeto de la educación” deberá ser un sujeto
colectivo, un nosotrxs siempre en acto que se autoconstituye en el acto educativo.

referencias
BADIOU,
BADIOU, Alain.
Alain. ElEl ser
ser yy el
el acontecimiento.
acontecimiento. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Manantial,
Manantial, 1999.
1999.
______.
______. Lógicas
Lógicas de
de los
los mundos.
mundos. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Manantial,
Manantial, 2008.
2008.
CERLETTI,
CERLETTI, Alejandro.
Alejandro. Didáctica
Didáctica aleatoria
aleatoria de
de la
la filosofía,
filosofía, dialéctica
dialéctica del
del aprendizaje
aprendizaje filosófico.
filosófico. In:
In:
CERLETTI,
CERLETTI, Alejandro;
Alejandro; COULÓ,
COULÓ, Ana Ana (orgs.).
(orgs.). Didácticas
Didácticas dede la
la filosofía.
filosofía. Entre
Entre enseñar
enseñar yy
aprender
aprender aa filosofar.
filosofar. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Noveduc,
Noveduc, 2015,
2015, p.
p. 15-32.
15-32.
28
28
29
29

“o desejo deseja sua própria repressão”:


traços de uma educação fascista

sílvio gallo11

U ltimamente temos vivido no Brasil um esgarçamento das relações


interpessoais, atravessadas pelas divergências políticas. Se as políticas
públicas nas últimas décadas investiram fortemente em práticas
afirmativas, visando diminuir paulatinamente as desigualdades sociais construídas e
consolidadas por séculos das mais diversas lógicas colonizadoras, paralelamente a elas
constituiu-se um neoconservadorismo que muitos de nós julgávamos superados. A
afirmação dos direitos LGBT é confrontada por um “ódio gay” que nunca foi tão evidente;
a afirmação dos direitos dos afrodescendentes é confrontada por um ódio racista que
pensávamos já não existir entre nós.
Evidentemente, isso tudo nos impacta a nós que agimos e pensamos no campo
educativo. Somos vetores de relações libertárias? Somos vetores de relações fascistas?
Como se forma um sentimento e uma ação fascistas? Está sob o controle dos educadores
evitar, recusar, conjurar o fascismo? Ou ele está para além de nós ou, mesmo, em nós?
O que pretendo aqui é colocar alguns questionamentos e algumas ideias que nos
ajudem a pensar e a seguir pensando. Sem respostas prontas, portanto.

em torno de uma micropolítica do fascismo


Será possível falarmos em uma educação fascista, em um fascismo escolar?
Retomemos um antigo texto de Félix Guattari, Micropolítica do Fascismo, escrito em 1974:
Ao
Ao lado
lado do
do fascismo
fascismo dosdos campos
campos de de concentração
concentração –– queque continuam
continuam aa existir
existir em
em
inúmeros
inúmeros países
países –, –, desenvolvem-se
desenvolvem-se novas novas formas
formas de de fascismo
fascismo molecular:
molecular: um um
banho-maria
banho-maria no no familialismo,
familialismo, na na escola,
escola, no
no racismo,
racismo, nos
nos guetos
guetos de
de toda
toda natureza,
natureza,
supre
supre com
com vantagens
vantagens os os fornos
fornos crematórios.
crematórios. Por Por toda
toda aa parte,
parte, aa máquina
máquina
totalitária
totalitária experimenta
experimenta estruturas
estruturas que que melhor
melhor sese adaptem
adaptem àà situação:
situação: isto
isto é,
é, mais
mais
adequadas
adequadas para
para captar
captar oo desejo
desejo ee colocá-lo
colocá-lo aa serviço
serviço da
da economia
economia de de lucro.
lucro. Dever-
Dever-
se-ia,
se-ia, portanto,
portanto, renunciar
renunciar aa fórmulas
fórmulas demasiado
demasiado simplistas
simplistas dodo gênero:
gênero: “o“o fascismo
fascismo
não
não passará”.
passará”. Ele
Ele não
não sósó já
já passou,
passou, como
como passa
passa sem
sem parar.
parar. Passa
Passa através
através dada mais
mais
fina
fina malha;
malha; ele
ele está
está em
em constante
constante evolução;
evolução; parece
parece vir
vir de
de fora,
fora, mas
mas encontra
encontra suasua
energia
energia no
no coração
coração dodo desejo
desejo de de cada
cada umum de
de nós.
nós. Em
Em situações
situações aparentemente
aparentemente sem sem
problemas,
problemas, catástrofes
catástrofes podem
podem aparecer
aparecer de de um
um dia
dia para
para oo outro.
outro. OO fascismo,
fascismo, assim
assim
como
como oo desejo,
desejo, está
está espalhado
espalhado por por toda
toda parte,
parte, em
em peças
peças descartáveis,
descartáveis, no no conjunto
conjunto
do
do campo
campo social;
social; ele
ele toma
toma forma,
forma, numnum lugar
lugar ou
ou noutro,
noutro, emem função
função das
das relações
relações dede
força.
força. Pode-se
Pode-se dizer
dizer dele,
dele, ao
ao mesmo
mesmo tempo,
tempo, que
que éé superpotente
superpotente ee dede uma
uma fraqueza
fraqueza
irrisória.
irrisória. (GUATTARI,
(GUATTARI, 1985, 1985, p.
p. 188-189).
188-189).
Ora, se o fascismo está espalhado em toda parte, estará também na escola. Antes de
tentar compreender o fenômeno em sua micropolítica, comentarei brevemente o fenômeno
do fascismo de Estado, isto é, seu aspecto macropolítico. Ainda no início dos anos 1930, em
plena ascensão do nazismo na Alemanha, Wilhelm Reich escreveu a Psicologia de Massas do
Fascismo, obra que seria proibida no país em 1935. No prefácio à terceira edição em língua
inglesa, publicada em 1942, podemos ler:
[...]
[...] oo “fascismo”
“fascismo” nãonão éé mais
mais do do que
que aa expressão
expressão politicamente
politicamente organizada
organizada dada
estrutura
estrutura dodo caráter
caráter do
do homem
homem médio,
médio, uma
uma estrutura
estrutura que
que não
não éé oo apanágio
apanágio dede
determinadas
determinadas raçasraças ou
ou nações,
nações, ou ou de
de determinados
determinados partidos,
partidos, mas
mas que
que éé geral
geral ee
internacional.
internacional. Neste
Neste sentido
sentido característico,
característico, oo “fascismo”
“fascismo” éé aa atitude
atitude emocional
emocional básica
básica
do
do homem
homem oprimido
oprimido da
da civilização
civilização autoritária
autoritária da
da máquina,
máquina, com
com sua
sua maneira
maneira mística
mística ee
mecanicista
mecanicista dede encarar
encarar aa via.
via. ÉÉ oo caráter
caráter mecanicista
mecanicista ee místico
místico do
do homem
homem moderno
moderno que
que

11 Universidade
Universidade Estadual
Estadual de
de Campinas
Campinas –– UNICAMP.
UNICAMP. Email:
Email: silvio.gallo@gmail.com
silvio.gallo@gmail.com
30|
30| sílvio
sílvio gallo
gallo

cria
cria os
os partidos
partidos fascistas,
fascistas, ee não
não vice-versa.
vice-versa. [...]
[...] Como
Como oo fascismo
fascismo éé sempre
sempre ee emem toda
toda
parte
parte um um movimento
movimento apoiadoapoiado nasnas massas,
massas, revela
revela todas
todas as as características
características ee
contradições
contradições da da estrutura
estrutura do do caráter
caráter das
das massas
massas humanas:
humanas: não não é,
é, como
como geralmente
geralmente
se
se crê,
crê, um
um movimento
movimento exclusivamente
exclusivamente reacionário,
reacionário, mas
mas simsim umum amálgama
amálgama de de
sentimentos
sentimentos de de revolta
revolta ee ideias
ideias sociais
sociais reacionárias.
reacionárias. [...]
[...] AA revolta
revolta fascista
fascista tem
tem
sempre
sempre origem
origem nana transformação
transformação de de uma
uma emoção
emoção revolucionária
revolucionária em em ilusão,
ilusão, pelo
pelo
medo
medo da da verdade.
verdade. [...]
[...] oo fascismo
fascismo éé aa expressão
expressão máxima
máxima do do misticismo
misticismo religioso.
religioso.
[...]
[...] AA mentalidade
mentalidade fascista
fascista éé aa mentalidade
mentalidade do do “Zé
“Zé Ninguém”,
Ninguém”, que que éé subjugado,
subjugado,
sedento
sedento de de autoridade
autoridade e, e, ao
ao mesmo
mesmo tempo,
tempo, revoltado.
revoltado. [...]
[...] OO fascismo
fascismo nãonão éé um
um
partido
partido político,
político, mas
mas umauma certa
certa concepção
concepção de de vida
vida ee uma
uma atitude
atitude perante
perante oo
homem,
homem, oo amoramor ee oo trabalho.
trabalho. (REICH,
(REICH, 1972,
1972, passim).
passim).
Reich ressalta, assim, que o fascismo é mais do que uma ação no nível da política;
ele é, sobretudo, uma forma de vida, uma maneira de lidar com nossos desejos e nossas
frustrações. Se pode emergir como uma “grande política”, como um fascismo de Estado,
foi por conta desta força subterrânea.
Foucault, no curso do Collège de France Em Defesa da Sociedade, introduziu o
conceito de biopoder, um novo tipo de poder que já não mais se exerce sobre o corpo do
indivíduo, mas sim sobre toda uma população. Se durante a hegemonia do poder de
soberania, em que o soberano tinha o direito de matar seu súdito ou então deixá-lo viver,
os Estados modernos que operam no registro do biopoder inverteram a equação: trata-se de
fazer com que os indivíduos pertencentes a um Estado – agora denominados como
cidadãos – vivam; ao Estado cabe, ainda, deixá-los morrer.
Mas, no contexto desta nova forma-Estado, um problema emerge: como poderia o
Estado exercer um legítimo poder de morte sobre os indivíduos, fundamental para garantir
sua coesão e sua permanência? Foucault mostra que isso se dá através daquilo que ele
chama de “racismo de Estado”, isto é, o poder do Estado de segregar o estranho, o
estrangeiro, o indesejável. Numa dada sociedade, é exatamente aquele de uma outra “raça”
que é tomado como estranho e como indesejável, na medida em que significa uma
possibilidade de mistura, de miscigenação, que contribuiria para uma “despurificação da
raça”. Ora, é em nome da pureza da raça, da manutenção de uma certa coletividade,
portanto, que o Estado arvora-se no direito de segregar e mesmo de matar este outro que é
estranho a nós, embora familiar.
Por outro lado, podemos também afirmar que o mecanismo do racismo de Estado é
o que fundamenta o uso legal da pena de morte: o Estado arvora-se o direito de punir com
a privação da vida aqueles seres estranhos, quase alienígenas, capazes de cometer
atrocidades contra outras pessoas. É em nome do bem-estar da coletividade, da segurança
da maioria, que o Estado mata legalmente os delinqüentes.
Foucault prossegue sua análise, mostrando que no século XX os principais
exemplos deste racismo de Estado estiveram presentes nos Estados totalitários, animados
pelo fascismo: em especial os alemães do Terceiro Reich e o Estado Soviético sob o
stalinismo. Ali o direito de segregação e de morte foi largamente exercido, em nome da
manutenção das condições de vida dos “melhores”, fossem eles os arianos ou os
trabalhadores socialistas. Era perfeitamente “natural” que seu vizinho, vivendo há anos no
mesmo bairro, fosse preso e desaparecesse; afinal ele sempre tinha sido um tanto ou quanto
estranho: era judeu, no caso alemão; ou um burguês não revolucionário, no caso soviético.
A análise de Foucault é muito interessante, na medida em que explica uma política
de Estado pela política cotidiana: a força do fascismo reside em lidar com os desejos mais
inconfessáveis de cada indivíduo, como já o tinha mostrado Wilhelm Reich em Psicologia
de Massas do Fascismo. É esta mesma linha que seguem Deleuze e Guattari em Mil Platôs,
no ensaio Micropolítica e Segmentaridade.
“o
“o desejo
desejo deseja
deseja sua
sua própria
própria repressão”:
repressão”: traços
traços de
de uma
uma educação
educação fascista
fascista || 31
31

Para os autores franceses, “o homem é um animal segmentário” e “o vivido é


segmentarizado espacial e socialmente” (DELEUZE; GUATTARI, 1996, p. 83). Por
segmentação eles entendem as divisões e subdivisões que os seres humanos vão
construindo em todos os espaços sociais, para tornar a vida possível. Assim, nossas
relações humanas e sociais são traçadas e travadas nestes múltiplos estratos e segmentos
dos quais participamos em nossa vida cotidiana. Falam em três dimensões da
segmentarização: uma binária (a das grandes oposições, como entre os sexos, entre os
adultos e as crianças, entre as classes sociais); uma circular (na medida em que
participamos, ao mesmo tempo, de círculos sociais cada vez mais amplos, como minha
casa, meu bairro, minha cidade, meu país); uma linear (quando passamos por uma sucessão
de processos, quando passamos da família para a escola, da escola para o exército, da escola
para uma atividade profissional, por exemplo).
É tal processo de segmentarização que possibilita que haja uma micropolítica, ou
em outras palavras, uma política das relações cotidianas. Deleuze e Guattari justificam isto
através dos trabalhos da etnologia: os estudiosos das sociedades antigas, ditas “sociedades
primitivas”, aquelas que não possuíam Estado, mostraram que, mesmo na ausência desta
estrutura macropolítica, havia nelas uma série de segmentos, que tornavam possíveis as
relações. A criação do Estado, porém, não extinguiu os segmentos, mas utiliza-se deles na
sua própria estrutura: “não só o Estado se exerce sobre segmentos que ele mantém ou deixa
subsistir, mas possui sua própria segmentaridade e a impõe.” (idem, p. 85). Isso fica visível
inclusive nas atuais sociedade globalizadas que, no entanto, não perdem seus segmentos
menores e mais básicos:
O
O sistema
sistema político
político moderno
moderno éé um
um todo
todo global,
global, unificado
unificado ee unificante,
unificante, mas
mas porque
porque
implica
implica um
um conjunto
conjunto de de subsistemas
subsistemas justapostos,
justapostos, imbricados,
imbricados, ordenados,
ordenados, de de modo
modo
que
que aa análise
análise das
das decisões
decisões revela
revela toda
toda espécie
espécie dede compartimentações
compartimentações ee de de processos
processos
parciais
parciais que
que não
não se
se prolongam
prolongam uns
uns nos
nos outros
outros sem
sem defasagens
defasagens ou ou deslocamentos.
deslocamentos. A A
tecnocracia
tecnocracia procede
procede porpor divisão
divisão do
do trabalho
trabalho segmentário
segmentário (inclusive
(inclusive nana divisão
divisão
internacional
internacional dodo trabalho).
trabalho). AA burocracia
burocracia só só existe
existe através
através de
de suas
suas repartições
repartições ee só

funciona
funciona através
através de de seus
seus “deslocamentos
“deslocamentos de de meta”
meta” ee osos “desfuncionamentos”
“desfuncionamentos”
correspondentes.
correspondentes. A A hierarquia
hierarquia não
não éé somente
somente piramidal:
piramidal: oo escritório
escritório do
do chefe
chefe está
está
tanto
tanto no
no fundo
fundo dodo corredor
corredor quanto
quanto nono alto
alto da
da torre.
torre. Em
Em suma,
suma, tem-se
tem-se aa impressão
impressão
de
de que
que aa vida
vida moderna
moderna não não desistiu
desistiu da
da segmentaridade,
segmentaridade, mas mas que
que aoao contrário
contrário aa
endureceu
endureceu singularmente.
singularmente. (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1996, 1996, p.
p. 85-86)
85-86)
A distinção que precisa ser feita, continuam eles, não é entre o segmentário e o
centralizado, posto que todas as instâncias são segmentarizadas, mas entre uma
segmentarização que podemos chamar de “flexível”, que é como aquela das sociedades
primitivas; e uma segmentaridade moderna, aquela das sociedades com Estado, que
podemos chamar de “dura”. Em outros termos, a primeira pode ser vista como uma
segmentaridade rizomática, enquanto que a segunda seria um segmentaridade arborificada.
É importante ter em mente que se trata de dois processos diferentes, de naturezas distintas.
Mesmo as segmentaridades rizomáticas podem ser arborificadas, assim como as
arborificadas podem tornar-se rizomáticas. Elas são inseparáveis, embora de naturezas
distintas, e uma depende da outra.
Isso nos leva à noção de que, se tudo é política, há dois níveis irredutíveis, mas
complementares, da política. Dois níveis da política que convivem ao mesmo tempo: “toda
sociedade, mas também todo indivíduo, são pois atravessados pelas duas segmentaridades
ao mesmo tempo: uma molar e outra molecular /.../ Em suma, tudo é político, mas toda
política é ao mesmo tempo macropolítica e micropolítica.” (idem, p. 90). Aí reside, segundo os
autores, o problema no qual os sociólogos esbarram ao distinguir massa e classe; enquanto
a classe é molar (isto é, do nível da macropolítica, da segmentaridade dura), a massa é
molecular, e portanto micropolítica, flexível.
32|
32| sílvio
sílvio gallo
gallo

E assim chegamos, uma vez mais, ao fascismo. A sua força, segundo Deleuze e
Guattari, reside no fato de que ele seja um fenômeno de massa. Vale a pena seguir sua
caracterização:
Diremos,
Diremos, da da mesma
mesma forma,
forma, queque oo fascismo
fascismo implica
implica um
um regime
regime molecular
molecular que que não
não se
se
confunde
confunde nem nem com
com osos segmentos
segmentos moleculares
moleculares nem nem com
com sua
sua centralização.
centralização. Sem
Sem
dúvida,
dúvida, oo fascismo
fascismo inventou
inventou um um conceito
conceito dede Estado
Estado totalitário,
totalitário, mas
mas não
não há
há porque
porque
definir
definir oo fascismo
fascismo por
por uma
uma noção
noção que
que ele
ele próprio
próprio inventa:
inventa: háhá Estados
Estados totalitários
totalitários
sem
sem fascismo,
fascismo, dodo tipo
tipo estalinista
estalinista ouou do
do tipo
tipo ditadura
ditadura militar.
militar. O
O conceito
conceito de
de Estado
Estado
totalitário
totalitário só
só vale
vale para
para uma
uma escala
escala macropolítica,
macropolítica, para
para uma
uma segmentaridade
segmentaridade dura dura ee
para
para um
um modo
modo especial
especial de
de totalização
totalização ee centralização.
centralização. Mas
Mas oo fascismo
fascismo éé inseparável
inseparável
de
de focos
focos moleculares,
moleculares, queque pululam
pululam ee saltam
saltam dede um
um ponto
ponto aa outro,
outro, emem interação,
interação,
antes
antes dede ressoarem
ressoarem todos
todos juntos
juntos nono Estado
Estado nacional-socialista.
nacional-socialista. Fascismo
Fascismo rural
rural ee
fascismo
fascismo de de cidade
cidade ouou dede bairro,
bairro, fascismo
fascismo jovem
jovem ee fascismo
fascismo ex-combatente,
ex-combatente,
fascismo
fascismo dede esquerda
esquerda ee de
de direita,
direita, de
de casal,
casal, de
de família,
família, de
de escola
escola ee de
de repartição:
repartição: cada
cada
fascismo
fascismo sese define
define por
por um
um microburaco
microburaco negro,
negro, que
que vale
vale por
por si
si mesmo
mesmo ee comunica
comunica
com
com osos outros,
outros, antes
antes de
de ressoar
ressoar num
num grande
grande buraco
buraco negro
negro central
central generalizado.
generalizado. HáHá
fascismo
fascismo quando
quando umauma máquina
máquina de de guerra
guerra encontra-se
encontra-se instalada
instalada emem cada
cada buraco,
buraco, emem
cada
cada nicho.
nicho. (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1996, 1996, p.
p. 91-92)
91-92)
Fenômeno de massa, molecular, o fascismo estende rizomaticamente seus
tentáculos pela teia social. São os microfascismos, os fascismos do cotidiano, aqueles
cristalizados nas relações de casal, nas relações entre irmãos, entre pais e filhos, nos locais
de trabalho, nas relações pedagógicas, que tornam o fascismo um fenômeno socialmente
forte. São os fascismos moleculares que puderam, em alguns momentos históricos, fazer
emergir um fascismo molar, um Estado fascista. Uma vez mais nossos autores explicam:
ÉÉ uma
uma potência
potência micropolítica
micropolítica ou
ou molecular
molecular que
que torna
torna oo fascismo
fascismo perigoso,
perigoso, porque
porque éé
um
um movimento
movimento de de massa:
massa: umum corpo
corpo canceroso
canceroso maismais dodo que
que umum organismo
organismo
totalitário.
totalitário. O
O cinema
cinema americano
americano mostrou
mostrou com
com freqüência
freqüência esses
esses focos
focos moleculares,
moleculares,
fascismo
fascismo dede bando,
bando, de
de gangue,
gangue, dede seita,
seita, de
de família,
família, dede aldeia,
aldeia, de
de bairro,
bairro, de
de carro
carro ee
que
que não
não poupa
poupa ninguém.
ninguém. Não
Não há
há senão
senão oo microfascismo
microfascismo parapara dar
dar uma
uma resposta
resposta àà
questão
questão global:
global: por
por que
que oo desejo
desejo deseja
deseja sua
sua própria
própria repressão,
repressão, como
como pode
pode ele
ele desejar
desejar
sua
sua repressão?
repressão? (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1996, 1996, p.
p. 92-93)
92-93)
É por isso que “é muito fácil ser antifascista no nível molar, sem ver o fascista que
nós mesmos somos, que entretemos e nutrimos, que estimamos com moléculas pessoais e
coletivas” (idem, p. 93). Estamos acostumados, nós, professores, a este jogo de um
“fascismo de escola”? Em que medida nossos discursos democratas escondem relações
fascistas no cotidiano escolar, com nossos colegas, com os funcionários da escola e,
sobretudo, com os estudantes? Em que medida estamos sendo fascistas em nossas relações
pedagógicas? Em que medida não desejamos a repressão, não reprimimos o desejo do novo,
a curiosidade pelo diferente, em nome de amor e proteção?
Na filosofia política que desenvolvem em Mil Platôs (e que já havia sido iniciada
antes em O Anti-Édipo) Deleuze e Guattari contrapõem as figuras do Estado e da máquina
de guerra. O Estado é uma invenção dos sedentários, dos povos que vivem em cidades. O
Estado age sobretudo pelo estriamento do espaço e das relações, isto é, criando normas,
regras, técnicas, burocracias, modelos, contenção e direcionamento de fluxos. O Estado age
pela territorialização. Mas ele encontra-se permanentemente ameaçado por outra invenção
política, completamente alheia a ele: a máquina de guerra, que por sua vez é uma invenção
dos nômades. A máquina de guerra procede por desterritorizalizações, pelo alisamento do
espaço, isto é, pela liberação dos fluxos, pelo desvio, pelo escapar às normas e burocracias.
A máquina de guerra consiste em uma outra maneira de viver o espaço e as relações. 22
A máquina de guerra pode ser capturada pelo Estado; a máquina de guerra pode
devir em Estado, deixando de ser máquina de guerra. Mas ela também pode alojar-se no

22 Para
Para uma
uma visão
visão mais
mais detalhada
detalhada ee aprofundada
aprofundada destes
destes temas,
temas, ver
ver os
os textos
textos Tratado
Tratado de
de Nomadologia:
Nomadologia: aa máquina
máquina
de
de guerra
guerra ee O
O Liso
Liso ee oo Estriado,
Estriado, em
em Mil
Mil Platôs.
Platôs. Na
Na edição
edição brasileira,
brasileira, estes
estes textos
textos encontram-se
encontram-se no
no volume
volume 5. 5.
“o
“o desejo
desejo deseja
deseja sua
sua própria
própria repressão”:
repressão”: traços
traços de
de uma
uma educação
educação fascista
fascista || 33
33

interior do Estado, escavando trincheiras e vivendo nele e dele, como verdadeiro parasita,
sem no entanto territorializar-se no Estado. Aí está o fenômeno do fascismo: alojar-se no
interior do Estado, utilizar-se dele, sem no entanto tornar-se estritamente estatal; nisso
reside seu poder e sua força.

fascismo e escola: em torno de uma “má educação”


Para pensar o tema do fascismo na escola como motor da violência, vou recorrer a
um produto do cinema. Trata-se de La Mala Educación, filme de 2004 de Pedro Almodóvar.
É um autêntico film noir, como o próprio diretor o classificou:
La
La mala
mala educación”
educación” no no es
es un
un ajuste
ajuste dede cuentas
cuentas con
con los
los curas
curas que
que me
me maleducaron,
maleducaron,
ni
ni con
con elel clero
clero en en general.
general. SiSi hubiera
hubiera necesitado
necesitado vengarme
vengarme no no habría
habría esperado
esperado
cuarenta
cuarenta años
años para
para hacerlo.
hacerlo. La
La iglesia
iglesia no
no me
me interesa,
interesa, ni
ni como
como adversario.
adversario.
La
La película
película tampoco
tampoco supone
supone una
una reflexión
reflexión sobre
sobre la
la movida
movida madrileña
madrileña de de principios
principios
de
de los
los ochenta,
ochenta, aunque
aunque gran
gran parte
parte transcurra
transcurra en en el
el Madrid
Madrid de de esa
esa época.
época. Lo
Lo que
que me
me
interesa
interesa dede ese
ese momento
momento histórico
histórico es es la
la borrachera
borrachera de de libertad
libertad que
que vivía
vivía España,
España, en en
oposición
oposición al al oscurantismo
oscurantismo yy la la represión
represión de de los
los años
años 60.
60. Los
Los primeros
primeros ochenta
ochenta son,
son,
por
por ello,
ello, el
el marco
marco ideal
ideal para
para que
que los
los protagonistas,
protagonistas, ya ya adultos,
adultos, sean
sean dueños
dueños de de sus
sus
destinos,
destinos, dede sus
sus cuerpos
cuerpos yy dede sus
sus deseos.
deseos.
La
La película
película no no eses una
una comedia,
comedia, aunque
aunque hayahaya humor
humor (todo
(todo elel personaje
personaje de de Javier
Javier
Cámara),
Cámara), ni ni un un musical
musical infantil,
infantil, aunque
aunque haya haya niñosniños que que canten.
canten.
Es
Es un
un film
film noir,
noir, oo al
al menos
menos asíasí me
me gusta
gusta considerarlo.
considerarlo.
Negras
Negras sonson las
las sotanas
sotanas de de los
los curas,
curas, negras
negras las
las noches
noches deldel dormitorio
dormitorio común
común de de los
los
alumnos,
alumnos, negros
negros los los destinos
destinos dede los
los personajes
personajes yy “noir”
“noir” elel género
género alal que
que pertenece
pertenece la la
historia
historia que
que sese cuenta
cuenta enen LME.
LME. Negro,
Negro, en en francés,
francés, para
para hacer
hacer justicia
justicia al
al país
país que
que
rescató
rescató elel género,
género, definió
definió sus
sus señas
señas dede identidad,
identidad, yy estimuló
estimuló su su desarrollo
desarrollo como
como
género
género mayor.
mayor. El El noir
noir (como
(como casi
casi todos
todos los
los géneros
géneros nobles)
nobles) admite
admite bien
bien el
el mestizaje
mestizaje
con
con otros
otros géneros,
géneros, siempre
siempre queque lala narración
narración respire
respire ese
ese aliento
aliento fatal
fatal sin
sin el
el que
que elel
negro
negro sería
sería gris.
gris.33
Haveria muitas entradas e muitas cores (ou paletas) possíveis para tratar desse
filme magnífico; como não sou nem crítico nem especialista, usarei a “receita” de Deleuze,
de tomar um filme naquilo que ele nos dá a pensar. E La Mala Educación nos dá muito que
pensar. Restringirei meus interesses ao problema da educação, de como ela se faz máquina
de subjetivação, de como trata as subjetividades e o desejo de formas múltiplas,
rizomaticamente conectadas, maquinicamente produzidas.
Começo com uma afirmação de Félix Guattari:
O
O sujeito,
sujeito, segundo
segundo todatoda uma
uma tradição
tradição da
da filosofia
filosofia ee das
das ciências
ciências humanas,
humanas, éé algo
algo que
que
encontramos
encontramos comocomo um um ‘être-là’,
‘être-là’, algo
algo do
do domínio
domínio de de uma
uma suposta
suposta natureza
natureza humana.
humana.
Proponho,
Proponho, ao ao contrário,
contrário, aa idéia
idéia de
de uma
uma subjetividade
subjetividade de de natureza
natureza industrial,
industrial,
maquínica,
maquínica, ou ou seja,
seja, essencialmente
essencialmente fabricada,
fabricada, modelada,
modelada, recebida,
recebida, consumida.
consumida.
“As
“As máquinas
máquinas de de produção
produção da da subjetividade
subjetividade variam.
variam. EmEm sistemas
sistemas tradicionais,
tradicionais, por
por
exemplo,
exemplo, aa subjetividade
subjetividade éé produzida
produzida por
por máquinas
máquinas maismais territorializadas,
territorializadas, na
na escala
escala
de
de uma
uma etnia,
etnia, dede uma
uma corporação
corporação profissional,
profissional, de de uma
uma casta.
casta. Já
Já no
no sistema
sistema
capitalístico,
capitalístico, aa produção
produção éé industrial
industrial ee se
se dá
dá em
em escala
escala internacional.
internacional. (GUATTARI;
(GUATTARI;
ROLNIK,
ROLNIK, 1986,1986, p.
p. 25).
25).
Partindo dessa afirmação de Guattari, minha proposta é a de lermos A Má-Educação
como um relato de constituição de subjetividades. Como a escola, no caso, como a escola
católica numa sociedade espanhola conservadora tanto política quanto moralmente pode
engendrar subjetividades; sobretudo subjetividades fascistas como aquelas mostradas
através dos personagens de Almodóvar.

33 Comentários
Comentários de
de Almodóvar
Almodóvar no
no site
site oficial
oficial de
de La
La Mala
Mala Educación:
Educación:
(http://clubcultura.com/clubcine/clubcineastas/almodovar/malaeducacion/comentarios.htm),
(http://clubcultura.com/clubcine/clubcineastas/almodovar/malaeducacion/comentarios.htm), acessado acessado em
em
18/05/06.
18/05/06. Tomo
Tomo aa liberdade
liberdade dede citar
citar no
no original
original espanhol
espanhol para
para manter
manter osos jogos
jogos de
de palavras
palavras feitos
feitos pelo
pelo diretor,
diretor,
que
que éé também
também um
um artista
artista da
da palavra.
palavra.
34|
34| sílvio
sílvio gallo
gallo

O diretor parece mostrar-nos duas máquinas de produção de subjetividades: a escola


católica dos anos 60, sob as botinas do franquismo, e o cinema “independente” dos anos 80,
vivendo um banho de liberdade, como toda a produção cultural da “movida madrileña”.
Mas as duas máquinas, por mais opostas que possam parecer, apresentam laços, conexões
insuspeitadas, vividas nas tramas do desejo. Se é o desejo que move a vida, também é ali
que nos fazemos fascistas. É por amor que se mata, não importa se a mão que segura a
arma é a de um padre querendo proteger o segredo de um amor proibido, ou a de um jovem
que faz qualquer coisa em busca de sua identidade e da construção de sua vida.
Na modernidade, construíram-se os mitos da individualidade e da identidade. E a
escola foi pensada e instituída como máquina de produção de identidade. Identidades
únicas, forjadas numa interioridade do sujeito, num être-là, num ser-aí, como falava
Guattari. Mas pelo menos desde o final do século XIX que a certeza dessas identidades
começou a ser interrogada, problematizada.
Um importante filósofo do século XX, Jean-Paul Sartre tratou da questão da
identidade através daquilo que chamou de fenômeno da “má-fé”. Baseado na
fenomenologia de Husserl, Sartre afirmará a intencionalidade da consciência. Isto é, que a
consciência é sempre consciência de..., o que significa que não há um conteúdo da
consciência. Não há interioridade da consciência, ela é sempre ato, abertura. A náusea
advém quando a consciência percebe-se a si mesma e a seu “vazio de ser”. Para superar a
náusea, buscamos nos agarrar a “conteúdos de ser”, isto é, a identidades. Como não as
temos na interioridade, as descobrimos na exterioridade: somos “reconhecidos” pelo outro
como sendo isso ou aquilo. O fenômeno da má-fé dá-se quando o indivíduo percebe-se
reconhecido e entra no jogo do reconhecimento, jogando, fingindo ser aquilo mesmo que o
outro vê nele, embora saiba, no fundo, não o ser.
Voltemos uma vez mais ao famosíssimo exemplo do garçom, que Sartre apresenta
em O Ser e o Nada:
“Nesse
“Nesse sentido,
sentido, éé preciso
preciso que
que nos
nos façamos
façamos serser oo que
que somos.
somos. Mas Mas que
que somos,
somos, afinal,
afinal,
se
se temos
temos obrigação
obrigação constante
constante de de nos
nos fazermos
fazermos serser oo que
que somos,
somos, sese nosso
nosso modo
modo dede
ser
ser éé dever
dever ser
ser oo que
que somos?
somos? Vejamos
Vejamos esse esse garçom.
garçom. TemTem gestos
gestos vivos
vivos ee marcados,
marcados,
um
um tanto
tanto precisos
precisos demais,
demais, umum pouco
pouco rápidos
rápidos demais,
demais, ee se
se inclina
inclina com
com presteza
presteza algo
algo
excessiva.
excessiva. Sua
Sua voz
voz ee seus
seus olhos
olhos exprimem
exprimem interesse
interesse talvez
talvez demasiado
demasiado solícito
solícito pelo
pelo
pedido
pedido dodo freguês.
freguês. Afinal
Afinal volta-se,
volta-se, tentando
tentando imitar
imitar oo rigor
rigor inflexível
inflexível que
que sabe-se
sabe-se lá

que
que autômato,
autômato, segurando
segurando aa bandeja
bandeja com
com umauma espécie
espécie de
de temeridade
temeridade de de funâmbulo,
funâmbulo,
mantendo-a
mantendo-a em em equilíbrio
equilíbrio perpetuamente
perpetuamente instável,
instável, perpetuamente
perpetuamente interrompido,
interrompido,
perpetuamente
perpetuamente restabelecido
restabelecido porpor ligeiro
ligeiro movimento
movimento do do braço
braço ee da
da mão.
mão. Toda
Toda sua
sua
conduta
conduta parece
parece uma
uma brincadeira.
brincadeira. Empenha-se
Empenha-se em em encadear
encadear seusseus movimentos
movimentos como como
mecanismos
mecanismos regidos
regidos uns
uns pelos
pelos outros.
outros. SuaSua mímica
mímica ee vozvoz parecem
parecem mecanismos,
mecanismos, ee ele ele
assume
assume aa presteza
presteza ee rapidez
rapidez inexorável
inexorável da da coisas.
coisas. Brinca
Brinca ee sese diverte.
diverte. Mas
Mas brinca
brinca de
de
quê?
quê? NãoNão éé preciso
preciso muito
muito para
para descobrir:
descobrir: brinca
brinca de de ser
ser garçom.
garçom. NadaNada de de
surpreendente:
surpreendente: aa brincadeira
brincadeira éé uma
uma espécie
espécie dede demarcação
demarcação ee investigação.
investigação. A A criança
criança
brinca
brinca com
com seu
seu corpo
corpo para
para explorá-lo
explorá-lo ee inventariá-lo,
inventariá-lo, oo garçom
garçom brinca
brinca comcom sua
sua
condição
condição para
para realizá-la.
realizá-la. (SARTRE,
(SARTRE, 1999, 1999, p.
p. 106-106).
106-106).
Brincar com a própria condição para realizá-la. Será isso que fazemos? Agarrarmo-
nos a identidades externas e jogarmos com elas, para aplacar a náusea do vazio de
identidade? O film noir de Almodóvar está cheio disso: quem é Juan/Ignacio? Quem é o
ator, senão aquele que vive muitos papéis, constrói inúmeras identidades, inscritas num
mesmo corpo, numa mesma mente? Em que medida a travesti, Zahara, por exemplo,
também não demonstra esse apegar-se a uma identidade externa, “vestindo-a” como a
própria pele? Quem é Enrique? Quem é o diretor de cinema, que cria realidades, histórias,
histórias dentro da história? Para ilustrar o problema da subjetivação como produção de
identidades externas e fixas, as metáforas de Almodóvar são simplesmente sublimes.
Destaco apenas duas passagens, que me parecem emblemáticas:
“o
“o desejo
desejo deseja
deseja sua
sua própria
própria repressão”:
repressão”: traços
traços de
de uma
uma educação
educação fascista
fascista || 35
35

Primeira. A cena em que Juan e Sr. Berenguer saem de um cinema, que tem em
cartaz dois clássicos do cinema noir, e o Sr. Berenguer diz: “Parece que todos os filmes
falam de nós”; isso acontece depois que Ignacio foi morto, e os dois entram num galpão
cheio de bonecos e máscaras gigantes, como se fosse possível escolher, a cada momento,
que identidade vestir. E a despeito da identidade que se vista – lembremos que o Sr.
Berenguer, funcionário de uma editora já havia sido o padre Manolo, professor no colégio
de Ignácio – essas vestes parecem transparentes para as câmeras, desvelando nossos corpos
e nossas “identidades”: parece que todos os filmes falam de nós...
Segunda. A cena em que Zahara aparece “cantando” (na verdade, dublando, o que
já é outra máscara) e em que veste um traje especialmente desenhado por Jean-Paul
Gaultier, que é um corpo de mulher, como uma segunda pele. No corpo da travesti, onde
está a mulher? Na roupa que é uma segunda pele, um segundo corpo?
Estas duas cenas são particularmente emblemáticas porque os personagens de
Almodóvar aparecem como “consumidores de subjetividades à venda”, aderindo a uma
subjetivação como se se trocasse a roupa, como se se trocasse a máscara. Subjetividades
fluidas, líquidas, abertas... Subjetividades construídas socialmente, resultantes de processos
educativos em que a escola e o cinema, por exemplo, são máquinas de subjetivação.
A escola católica é mostrada no filme como máquina de produção de subjetividades
identitárias: constrói-se todo um panorama, em especial em torno da ritualística, das
roupas, da música, das festas, nas quais se oferece a cada criança uma identidade. E tudo
acontece para que sua subjetividade seja forjada, construída, como uma espécie de
“deformação”, um movimento violento em direção àquela máscara. É como se cada um
vestisse sua própria batina e dela não saísse jamais. Mas Almodóvar mostra que mesmo
essa máquina, poderosíssima naquela sociedade autoritária, perde parte de seu poder com a
redemocratização da Espanha e a onda de liberdade que se abate sobre ela: padre Manolo
deixa a batina e passa a ser o sr. Berenguer. Enrique e Ignacio, cada um destroçado a seu
modo pela máquina de subjetivação da escola católica, reconstroem a si mesmos e a suas
vidas, com mais tragédia ou menos tragédia.
Num outro contexto social e político, as máquinas de produção de subjetividades
são outras, mas continuam presentes. E aí Almodóvar lança luz sobre o cinema: não é por
acaso que o jovem cineasta Enrique tem sua própria produtora, a “El Azar” (quando a
produtora do próprio Almodóvar, também criada na década de 1980, chama-se “El Deseo”).
O cinema é, a um só tempo, uma arte e uma indústria, condensadas na figura da pequena
produtora. E se a máquina escolar católica produzia subjetividades identitárias, a máquina
do cinema parece abrir mais horizontes, produzindo múltiplas identidades, identidades não
fixas, mas cambiantes, camaleônicas...
Na escola autoritária Enrique e Ignacio crianças tinham no cinema uma linha de
fuga; qual a linha de fuga na produção de subjetividades da máquina cinematográfica?
Talvez a própria vida. Portas que se abrem, como no início do filme, e um portão que se
fecha, como em seu final; mas sempre novos roteiros e novas possibilidades. Se a máquina
escolar católica era a “má-educação”, será o cinema uma espécie de “boa-educação”?
Talvez, mas apenas talvez.
Penso que La Mala Educación chama nossa atenção e nos faz pensar sobre esse
problema da produção de subjetividades. Ao mesmo tempo em que fala de uma “má”
educação, a crueldade e a falta de liberdade no colégio de padres, o abuso sexual como
traçando as trilhas futuras do desejo daquelas crianças, Almodóvar fala de uma “boa”
educação, na medida em que são justamente essas experiências que os fazem viver, que os
fazem produzir suas histórias. Se somos vazios de identidade, esse “abismo de ser” de que
nos fala Sartre, a educação que nos oferece uma identidade, uma possibilidade de ser, um
figurino para constituir um personagem, é a um só tempo má e boa, pois se nos forja, se
36|
36| sílvio
sílvio gallo
gallo

nos coloca num palco delimitado, é ela que nos dá a condição de atuar, de agir, de aceitar
esse palco e esse cenário ou mesmo de transformá-los. No final das contas, é a má
educação que nos faz ser; no final das contas, essa educação que parece má encontra seu
duplo, o da boa educação. Se La Mala Educación tem toques autobiográficos, como
Almodóvar não se cansou de afirmar, falando inclusive de um ajuste de contas consigo
mesmo e com seu passado, embora sem nenhum intuito de vingança, podemos inclusive
afirmar que foi esse tipo de má educação de que ele próprio foi vítima que nos presenteou
com sua filmografia. Má educação e boa educação, talvez nem tão diferentes assim.

finalizando
Para fechar essa exploração bastante introdutória do tema, diria que o belo filme de
Almodóvar nos faz pensar na educação para além de bem e mal, parafraseando Nietzsche.
Educação, apenas, da qual não podemos escapar. Educação que sofremos e gozamos,
educação que nos faz ser. No final das contas, parece mesmo que “todos os filmes falam de
nós”, na mesma medida em que todas as escolas falam de nós.
Se a escola é lugar de vida e de desejo, a escola está aberta a maquinações fascistas,
que fazem com o que o desejo deseje sua própria repressão. E impõe um violento jogo de
poder e de subjetivação. Violência às vezes física, às vezes simbólica, não raro as duas
juntas. Mas, da mesma forma que a escola é abertura para o fascismo, pelo mesmo jogo do
desejo como produção ela é possibilidade de linhas de fuga, de criação e de singularidade.
Se a escola pode ser o palco de um microfascismo, pode ser também lugar de resistência, de
aprender a não ser fascista, cuidando de si e dos outros, inventando uma outra ética.
Pode ser que não tenhamos antídoto para um “fascismo de escola”. O remédio pode
ser o próprio veneno, as tentativas de conjurar o fascismo podem ser os vetores de sua
instituição. De algum modo, parece ser isto o que vivemos hoje no Brasil: as tentativas de
consolidação de uma educação democrática, aberta às diferenças, que opera pela inclusão
num sistema que é para ser de todos e para todos, acabaram consolidando certos avanços,
mas também abrindo caminhos para a constituição de subjetividades fascistas. Bastou
acender o estopim para que tais subjetividades, então caladas, encontrassem a luz do dia e
passassem a se manifestar e a se afirmar, sem qualquer pudor.
Mas, ainda que não haja antídotos, é preciso conviver com o veneno para saber
domá-lo e encontrar novos caminhos. Saídas libertárias são sempre possíveis; dependem
dos agenciamentos de desejos que seremos capazes de colocar em operação.

referências
GUATTARI,
GUATTARI, Félix.
Félix. Revolução
Revolução Molecular:
Molecular: pulsações
pulsações políticas
políticas do
do desejo.
desejo. 2ª
2ª ed.
ed. São
São Paulo:
Paulo: Brasiliense,
Brasiliense,
1985.
1985.
GUATTARI,
GUATTARI, Félix;
Félix; ROLNIK,
ROLNIK, Suely. Suely. Micropolítica:
Micropolítica: cartografias
cartografias do
do desejo.
desejo. Petrópolis:
Petrópolis: Vozes,
Vozes, 1986.
1986.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Félix. Félix. Mil
Mil Platôs
Platôs –– vol.
vol. 3.
3. São
São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. 34,
34, 1996.
1996.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Félix. Félix. Mil
Mil Platôs
Platôs –– vol.
vol. 5.
5. São
São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. 34,
34, 1997.
1997.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel.
Michel. EmEm defesa
defesa da
da sociedade.
sociedade. São
São Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 1999.
1999.
REICH,
REICH, Wilhelm.
Wilhelm. Psicologia
Psicologia de
de Massas
Massas do
do Fascismo.
Fascismo. São
São Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 1972.
1972.
SARTRE,
SARTRE, Jean-Paul.
Jean-Paul. O O Ser
Ser ee oo Nada.
Nada. 7ª
7ª ed.
ed. Petrópolis:
Petrópolis: Vozes,
Vozes, 1999.
1999.
37
37

considerações sumárias sobre a relação entre segurança pública, formação policial


e empresariamento da sociedade, na governamentalidade neoliberal
anderson duarte11
sylvio gadelha22
introdução

N este artigo, pretende-se indicar e discutir algumas transformações


verificadas, a partir do início da década de 1980, no conjunto formado por
saberes e práticas de governo da população, conjunto este aqui referido
como constituindo o âmbito ou campo da segurança pública. Tais processos ocorreram e
ainda ocorrem nas políticas públicas de segurança, das quais a polícia é a principal
executora. Em sequência, as indicações feitas servirão para apontar conexões entre tais
transformações e a série de novos valores e programações introduzidos pelo neoliberalismo
de origem estadunidense, o qual foi analisado pelo filósofo francês Michel Foucault, em
seu curso Nascimento da Biopolítica (2008a), quando este pensador se ocupava em
problematizar o que chamava de governamentalidade neoliberal. Na análise aqui
empreendida, o conjunto dos efeitos dessa governamentalidade no campo da segurança
pública será abordado desde a perspectiva de um empresariamento da segurança pública, o
qual, por seu turno, segue em sintonia com um movimento mais amplo que se pauta por
um empresariamento generalizado da sociedade. O uso do termo empresariamento segue
de perto o que sugerem algumas formulações de Gadelha (2009), acercados processos
contemporâneos de subjetivação e de governo das condutas operados por esta
governamentalidade neoliberal, os quais ensejam, de fato, que as maneiras com que os
indivíduos e as organizações passem cada vez mais a pautar suas condutas, representações
e formas de sociabilidade se referenciem em princípios, valores, referências, modelos e/ou
padrões que são característicos do mundo corporativo, oriundos, portanto, de um ethos
eminentemente empresarial. Assim, o que ocorre no campo da segurança pública é apenas
parte de uma série mais ampla de mudanças que estão em curso.
1. uma aproximação à segurança pública:
Para esta análise, antes de tudo, faz-se necessário definir minimamente o que se
entende por segurança pública, para, então, em seguida, problematizá-la. Como se tentará
mostrar, a segurança pública reflete diferentes racionalidades de governo, podendo a
própria atividade de vigilância policial, por exemplo, ser utilizada como importante
instrumento de governo das populações.
Sob uma perspectiva jurídico-filosófica ou jurídico-política, dominante ainda no
presente, a segurança é uma atividade típica dos Estados modernos. Na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, promulgada pela Assembleia Geral das Nações Unidas
em 1948, ela aparece como direito fundamental, na forma do artigo 3º: “Todo ser humano
tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. No entanto, é importante ressaltar,
desde já, que o significado de segurança na Declaração Universal não diz respeito apenas à
segurança pública. A palavra está relacionada também a outras funções estatais, como as
previdenciárias, as assistenciais e as de saúde pública. No caso brasileiro, a segurança é
chamada de seguridade social- termo incorporado em nosso vocabulário apenas em 1988,
com a nova Constituição – enquanto que outros países de língua portuguesa, tais como

11 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Ceará
Ceará –– UFC.
UFC. Email:
Email: anderson.selva@hotmail.com
anderson.selva@hotmail.com
22 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Ceará
Ceará –– UFC.
UFC. Email:
Email: sylviogadelha@uol.com.br
sylviogadelha@uol.com.br
38|
38| anderson
anderson duarte;
duarte; sylvio
sylvio gadelha
gadelha

Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe,


utilizam a expressão segurança social. (BOSCHETTI, 2003).
A questão da segurança pública se faz presente na atual Constituição Federal em
seu artigo 144, que preconiza que ela constitui “um dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos”, devendo-se acrescentar que, além de haver uma obrigação
estatal, a participação de toda a população é uma condição para que seja alcançado o
objetivo maior, que é o da “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
do patrimônio” (BRASIL, 1988). A concepção que tem o Estado brasileiro sobre o conceito
jurídico de segurança pública pode ser vista no portal do Ministério da Justiça na internet:
éé uma
uma atividade
atividade pertinente
pertinente aos
aos órgãos
órgãos estatais
estatais ee àà comunidade
comunidade como
como umum todo,
todo,
realizada
realizada com
com oo fito
fito de
de proteger
proteger aa cidadania,
cidadania, prevenindo
prevenindo ee controlando
controlando manifestações
manifestações
da
da criminalidade
criminalidade ee da
da violência,
violência, efetivas
efetivas ou
ou potenciais,
potenciais, garantindo
garantindo oo exercício
exercício pleno
pleno
da
da cidadania
cidadania nos
nos limites
limites da
da lei.
lei. (BRASIL,
(BRASIL, 2015,
2015, p.,
p., s/p.)
s/p.)

Deixando de lado a visão meramente jurídica, e avançando na problematização da


segurança pública e de sua relação com o governo, lança-se mão de duas importantes
teorizações sobre a questão da segurança, presentes, respectivamente, nos pensamento de
Michel Foucault e de Giorgio Agamben.
Para Michel Foucault (2008c), a partir da necessidade de gestão das sociedades
capitalistas contemporâneas, que leva em consideração os custos econômicos da
convivência social e seus riscos, emerge um novo modo de governar. Foucault (2008a;
2008c), em obrasnas quais realiza uma incursão problematizadora tanto da modernidade
quanto, avançando na direção de nossa história mais recente, da pós-modernidade,
vislumbra a existência e o funcionamento, respectivamente, de uma arte de governar
liberal e de uma neoliberal 33, como que compondo uma nova “economia geral de poder” nas
sociedades ocidentalizadas, não mais baseadas tão somente nas lógicas características das
sociedades de soberania e das sociedades disciplinares, mas, em uma lógica que é a um só
tempo de segurança, de governo, de prestação de serviços, de concorrência e de investimentos, a
qual passa a se desenvolver, sobretudo,do início dos anos 1970 até os nossos dias.
Como se vê nesse trecho citado de Foucault, o instrumento técnico essencial da
governamentalidade liberal são os mecanismos de segurança. Logo, é necessário
compreender a racionalidade que envolve tais mecanismos ou dispositivos de segurança, a
fim de caracterizá-los para, depois, localizar a sua atuação e presença no cotidiano das
grandes cidades em nosso presente. Foucault (2008c) detalha a forma através da qual opera
o dispositivo de segurança:
Dispositivo
Dispositivo de de segurança
segurança queque vai,
vai, para
para dizer
dizer asas coisas
coisas de
de maneira
maneira absolutamente
absolutamente
global,
global, inserir
inserir oo fenômeno
fenômeno em em questão,
questão, aa saber,
saber, oo roubo,
roubo, numa
numa série
série de
de
acontecimentos
acontecimentos prováveis.
prováveis. Em Em segundo
segundo lugar,
lugar, as
as reações
reações dede poder
poder ante
ante esse
esse
fenômeno
fenômeno vão vão ser
ser inseridas
inseridas num
num cálculo
cálculo de
de custo.
custo. Enfim,
Enfim, em
em terceiro
terceiro lugar,
lugar, em
em
vez
vez de
de instaurar
instaurar uma
uma divisão
divisão binária
binária entre
entre oo permitido
permitido ee oo proibido,
proibido, vai-se
vai-se fixar
fixar
de
de um
um lado
lado uma
uma média
média considerada
considerada ótima
ótima e,e, depois,
depois, estabelecer
estabelecer osos limites
limites do
do
aceitável,
aceitável, além
além dos
dos quais
quais aa coisa
coisa não
não deve
deve ir.
ir. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2008c, 2008c, p.
p. 09)
09)

33Para
Para Foucault,
Foucault, arte
arte de
de governar
governar ee governamentalidade
governamentalidade sãosão termos
termos que
que se
se equivalem,
equivalem, remetendo
remetendo ambos
ambos aa um um
“conjunto
“conjunto constituído
constituído pelas
pelas instituições,
instituições, osos procedimentos,
procedimentos, análises
análises ee reflexões,
reflexões, os os cálculos
cálculos ee as
as táticas
táticas que
que
permitem
permitem exercer
exercer essa
essa forma
forma bem
bem específica,
específica, embora
embora muito
muito complexa,
complexa, de de poder
poder queque tem
tem por
por alvo
alvo principal
principal aa
população,
população, por
por principal
principal forma
forma de
de saber
saber aa economia
economia política
política ee por
por instrumento
instrumento técnico
técnico essencial
essencial os
os dispositivos
dispositivos de de
segurança.
segurança. Em Em segundo
segundo lugar,
lugar, por
por ‘governamentalidade’
‘governamentalidade’ entendo
entendo aa tendência,
tendência, aa linha
linha dede força
força que,
que, emem todo
todo oo
ocidente,
ocidente, não
não parou
parou dede conduzir,
conduzir, ee desde
desde háhá muito,
muito, para
para aa preeminência
preeminência desse
desse tipo
tipo de
de poder
poder queque podemos
podemos chamar
chamar
de
de ‘governo’
‘governo’ sobre
sobre todos
todos os
os outros
outros –– soberania,
soberania, disciplina
disciplina –– ee que
que trouxe,
trouxe, por
por umum lado,
lado, oo desenvolvimento
desenvolvimento de de toda
toda
uma
uma série
série de
de aparelhos
aparelhos específicos
específicos de
de governo
governo [e[e por
por outro
outro lado],
lado], oo desenvolvimento
desenvolvimento de de toda
toda uma
uma série
série de
de saberes.
saberes.
Enfim,
Enfim, por
por ‘governamentalidade’
‘governamentalidade’ creiocreio que
que se
se deveria
deveria entender
entender oo processo,
processo, ou
ou antes,
antes, oo resultado
resultado do
do processo
processo pelo
pelo
qual
qual oo Estado
Estado de de justiça
justiça dada Idade
Idade Média,
Média, queque nos
nos séculos
séculos XV XV ee XVI
XVI sese tornou
tornou oo Estado
Estado administrativo,
administrativo, viu-se
viu-se
pouco
pouco aa pouco
pouco governamentalizado.
governamentalizado. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2008c, 2008c, p.
p. 143-144,
143-144, grifos
grifos dos
dos autores).
autores).
considerações
considerações sumárias
sumárias sobre
sobre aa relação
relação entre
entre segurança
segurança pública,
pública, formação
formação policial
policial ee empresariamento
empresariamento || 39
39
da
da sociedade,
sociedade, nana governamentalidade
governamentalidade neoliberal
neoliberal

Percebe-se que a racionalidade da segurança é diferente daquela referente às


sociedades de soberania, estendendo-se, igualmente, para além do mero recurso a leis
proibitivas e a mecanismos disciplinares de vigilância, encerramento e correção. Para a
segurança, importa manter o fluxo, o trânsito, a circulação, desde que estejam dentro da
margem estatística aceitável, do ponto de vista dos custos econômicos e de governo. As
inferências sobre o futuro serão feitas através do cálculo das probabilidades, que passarão a
ser componente fundamental para a gestão da segurança pública.
Os mecanismos de segurança têm algumas características gerais que permitem a
sua identificação. Foucault (2008c) identifica e analisa quatro delas. A primeira
característica alude à forma de tratamento do espaço pela segurança; em seguida, o autor
assinala a questão da análise do aleatório; em terceiro lugar, afirma que a segurança possui
uma forma de normalização específica e, em quarto, lugar, nos chama a atenção para a
emergência da população como objeto de intervenção privilegiado dos biopoderes, das
tecnologias de governo e dos mecanismos de segurança nas sociedades modernas.
De outra parte, o pensamento do filósofo italiano Giorgio Agamben (2014) também
é de suma importância para essa discussão, e traz elementos essenciais para entender como
a segurança e o governo se mostram indissociáveis entre si, formando um verdadeiro
amálgama; mais ainda, Agamben mostra “como a obsessão por segurança muda a
democracia”, título de um artigo em que o autor fornece uma importante explicação sobre
essa relação de imanência entre governo e segurança:
A
A segurança
segurança está
está entre
entre aquelas
aquelas palavras
palavras com
com sentidos
sentidos tão
tão abrangentes
abrangentes que
que nós
nós
nem
nem prestamos
prestamos mais
mais muita
muita atenção
atenção aoao que
que ela
ela significa.
significa. Erigido
Erigido como
como prioridade
prioridade
política,
política, esse
esse apelo
apelo àà manutenção
manutenção da da ordem
ordem muda
muda constantemente
constantemente seuseu pretexto
pretexto (a
(a
subversão
subversão política,
política, oo terrorismo...),
terrorismo...), masmas nunca
nunca seu
seu propósito: governar as
propósito: governar as
populações. (AGAMBEN,
populações. (AGAMBEN, 2014, 2014, p.
p. 01,
01, grifos
grifos dos
dos autores).
autores).

Além disso, Agamben revela a ideia central de sua argumentação no texto,


mostrando como a obsessão por segurança tem transformado negativamente a democracia
e, consequentemente, colocado em risco o exercício desta. Segundo o autor, a expressão
“por razões de segurança” tem sido utilizada como chave para quebra de direitos
individuais e coletivos, bem como para instauração de medidas de controle e vigilância
típicas de estado de exceção, ao longo da história contemporânea. Passar-se-á, em seguida,
a discutir sobre como algumas transformações verificadas no âmbito da segurança pública,
no contexto do capitalismo contemporâneo, demonstram a adequação da primeira a uma
governamentalidade neoliberal.

2. segurança pública e capitalismo contemporâneo: o empresariamento da segurança


pública
Que adaptações permitiram que a segurança pública se ajustasse, adequando-se à
governamentalidade neoliberal característica das sociedades capitalistas contemporâneas?
Que tipos de valores foram introduzidos nos modos de conduzir os agentes e as políticas
de segurança pública, especialmente com o advento de uma governamentalidade neoliberal
de estilo estadunidense? Utilizar-se-ão alguns exemplos que podem ser esclarecedores para
a compreensão das transformações ocorridas neste campo e que talvez ajudem a responder
a essas questões.
Prolifera atualmente, tanto no exterior quanto no Brasil, um modelo empresarial de
gestão da segurança pública, simbolizado pelos diversos “programas” e “pactos” “pela
vida”, que operam sob rigoroso controle de dados estatísticos relacionados especialmente
ao número de homicídios, com premiações pecuniárias a policiais que alcançam metas de
redução de índices e que façam parte das áreas policiais ditas mais “produtivas”. Tais
programas estão em consonância com uma biopolítica, que se dá através do controle da
40|
40| anderson
anderson duarte;
duarte; sylvio
sylvio gadelha
gadelha

população, aqui tomada como corpo-espécie no qual incidem processos biossociais em larga
escala, de nível macro, demandando que os mesmos sejam apontados, descritos,
conhecidos e administrados ou geridos pelo Estado. Tais são os casos de fenômenos como
natalidade, morbidade, mortalidade, endemias, pandemias etc. Nessa forma moderna de
governo da população, a taxa de homicídios será um dos dados em constante avaliação,
especialmente por envolver prioritariamente homens em idade considerada “produtiva”,
ou seja, indivíduos em condições de trabalhar. Durante coletiva de imprensa por ocasião do
lançamento do “Atlas da Violência” de 201644, pelo Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas do Governo Federal (IPEA), o técnico de Planejamento e Pesquisa, Daniel
Cerqueira, ao comentar o fato de que 46,4% dos homens que são mortos por homicídios
estão na faixa etária de 15 a 29 anos, afirmou que “As mortes apresentam consequências na
produtividade futura do país em geração de renda55”, chamando a atenção para a implicação
econômica dos homicídios.
Um dos vários planos de segurança orquestrado de certo tempo para cá está em
plena execução no estado de São Paulo. Lá, com efeito, desde 2014 adotou-se um programa
de “bônus por redução nos índices de criminalidade”, com a implantação do sistema de
metas. Apenas no ano de 2014 foram “investidos” mais de 173 milhões de reais no
pagamento de 222.720 bônus, que variaram entre 350 e 4.500 reais a mais no salário dos
policiais que ajudaram a atingir as metas estabelecidas pelo governo. A própria Secretaria
de Segurança Pública explica o programa:
Criado
Criado emem 2014
2014 aa partir
partir de
de sugestões
sugestões da
da sociedade
sociedade civil,
civil, oo Programa
Programa dede Metas
Metas ee de
de
Bonificação
Bonificação Policial
Policial éé uma
uma das
das ações
ações do
do projeto
projeto São
São Paulo
Paulo contra
contra oo Crime.
Crime. O O
objetivo
objetivo principal
principal éé premiar
premiar oo esforço
esforço dos
dos policiais
policiais na
na redução
redução dada criminalidade.
criminalidade.
ÉÉ baseado
baseado em em umum modelo
modelo dede gestão
gestão desenvolvido
desenvolvido em em conjunto
conjunto pela
pela Secretaria
Secretaria da
da
Segurança
Segurança Pública,
Pública, comando
comando dasdas polícias
polícias ee Instituto
Instituto Sou
Sou da
da Paz.
Paz.
Um
Um dosdos pilares
pilares dodo programa
programa éé aa adoção
adoção da da meritocracia
meritocracia na na gestão
gestão das
das polícias,
polícias,
uma
uma prática
prática comum
comum na na iniciativa
iniciativa privada.
privada. (SÃO
(SÃO PAULO,
PAULO, Governo
Governo do do Estado,
Estado,
2015,
2015, s.p.).
s.p.).

Percebe-se aqui a utilização de um léxico empresarial, caracterizado pelo uso de


termos como “meritocracia” e “gestão”, aos quais se poderia acrescentar os de “eficácia”,
“eficiência”,“investimento”, “inovação, dentre inúmeros outros, todos oriundos, todavia,
do mundo corporativo, das grandes corporações comerciais e financeiras, bem como da
área do management, os quais, mediante deslocamentos estratégicos e procedimentos de
ajustes, migram para o campo da administração pública, sendo aplicados em seus mais
diversos setores, implicando-se em maior ou menor medida tanto às operações
propriamente policiais, no âmbito microfísico) quanto à gestão que vem se dando às
políticas de segurança, no âmbito macrofísico do governo. O paradigma da “iniciativa
privada” é tomado, pois, sem qualquer pudor. Em busca da chamada “eficiência policial”, o
paradigma empresarial tem sido cada vez mais associado ao aumento do controle sobre a
população. Embora não seja possível a total privatização da polícia, posto que a existência
de uma polícia pública é inerente ao Estado moderno (BAYLEY, 2006, p. 229), os valores
da concorrência, do empreendedorismo, da recompensa por alcance de metas e do
tratamento da comunidade como “cliente”, tem cada vez mais percolado o solo de várias

44 O
O “Atlas
“Atlas da
da Violência”
Violência” do
do ano
ano de
de 2016
2016 constatou
constatou aa ocorrência
ocorrência de
de 59.627
59.627 mortes
mortes por
por homicídios
homicídios no
no país.
país. Um
Um
recorde
recorde que
que coloca
coloca oo país
país no
no topo
topo dodo ranking
ranking desse
desse tipo
tipo de
de morte
morte em
em todo
todo oo mundo.
mundo. Disponível
Disponível em:
em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160322_nt_17_atlas_da_violencia_2016_fi
<http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160322_nt_17_atlas_da_violencia_2016_fi
nalizado.pdf>.
nalizado.pdf>. Acesso
Acesso em:
em: 15
15 mai.
mai. 2016.
2016.
55 TAXA
TAXA de de homicídios
homicídios nono Brasil
Brasil atingiu
atingiu recorde
recorde em
em 2014.
2014. IPEA,
IPEA, 23
23 mar
mar 2016.
2016. Disponível
Disponível em:
em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=27412>.
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=27412>. AcessoAcesso em:
em: 15
15
mai.
mai. 2016.
2016.
considerações
considerações sumárias
sumárias sobre
sobre aa relação
relação entre
entre segurança
segurança pública,
pública, formação
formação policial
policial ee empresariamento
empresariamento || 41
41
da
da sociedade,
sociedade, nana governamentalidade
governamentalidade neoliberal
neoliberal

instituições públicas, dentre as quais a polícia se destaca. Como observa Alfredo Veiga
Neto (2000) a respeito dessas mudanças, “ou se privatizam as atividades estatais
(lucrativas), ou se submetem as atividades (não-lucrativas) à lógica empresarial” (VEIGA
NETO, 2000, p. 190). É possível observar essas mudanças na administração dos serviços
essenciais do Estado, tais como a educação, a saúde e a segurança pública.
Quanto à questão do controle dos índices de cometimento do crime, já é farta a
literatura disponível que mostra o tipo de monitoramento estatístico e probabilístico por
parte das polícias e órgãos de segurança, que é realizado para orientar suas ações de
policiamento. Um marco no modo de atuação policial sob essa nova racionalidade é
apresentado no artigo lançado em 1982, nos Estados Unidos, pelos criminólogos James Q.
Wilson e George L. Kelling, chamado The Police and neighborhoodsafety: brokenwindows
(1982), no qual apresentam sua Broken Windows Theory (teoria das janelas quebradas),
teoria que, conforme aponta o sociólogo francês Loïc Wacquant (2001, p. 26), “jamais foi
comprovada empiricamente”.
Logo no início do referido artigo, os autores indagam: “Como pode um bairro bairro se
se
tornar mais seguro quando a taxa de criminalidade não tem diminuído diminuído – na verdade,
podendo até ter aumentado?”. Nota-se aí uma mudança de perspectiva. A livre circulação,
inclusive do crime e do criminoso, é uma premissa. Não se se trata efetivamente de baixar os
índices de criminalidade,
criminalidade, mas,
mas, sim,
sim, de
de controlá-los
controlá-los e mantê-los dentro de padrões
economicamente aceitáveis, produzindo algo que seria semelhante a um equilíbrio de
mercado. Daí a emergência dos conceitos de ordem e desordem, que passam a tomar corpo
e importância nas estratégias de segurança subsequentes, gerando táticas de policiamento
como as de Tolerância Zero e Policiamento Comunitário, ambas com inspiração na Teoria das
Janelas Quebradas66.
Outro exemplo é a adoção, por grande parte das instituições de segurança pública
no Brasil, da doutrina de policiamento comunitário. Essa doutrina foi implantada no Brasil,
segundo a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP, 2007), “quando as polícias
militares estaduais buscavam a reestruturação de seus processos com base na Constituição
Federal de 88” (SENASP, 2007, p. 278). Em uma das disciplinas contidas em manuais de
policiamento comunitário produzidos e distribuídos pelo Governo Federal, disciplina cujo
nome sugestivo é gestão pela qualidade na segurança pública77, encontra-se a seguinte
afirmação: “há razões convincentes para a polícia acreditar que chegou a hora de alterar
suas políticas e práticas, principalmente para adequá-las às práticas já utilizadas na
administração de empresas privadas.” (SENASP, 2007, p.183). Neste contexto, o policial
comunitário se configura em imagem que deve encarnar idealmente o novo sujeito policial
da contemporaneidade, imagem esta articulada pelas políticas de subjetivação neoliberais.
Assim, nesta reprogramação, adjetivos como “proatividade”, “autonomia”, “liderança”,
“flexibilidade”, “capacidade de relacionamento interpessoal”, dentre outros, passam a
constituir o perfil valorizado e desejado pela polícia comunitária. Tais características são
alcançadas através de investimentos de cada policial em seu próprio capital humano (ou
capital intelectual).

66 Para
Para aprofundamento
aprofundamento do
do tema,
tema, ver
ver GADELHA;
GADELHA; DUARTE,
DUARTE, 2014.
2014.
77 Pablo
Pablo Gentili
Gentili (2000,
(2000, p.
p. 116),
116), ao
ao se
se referir
referir aa uma
uma série
série de
de processos
processos ocorridos
ocorridos nos
nos anos
anos 1980
1980 nos
nos domínios
domínios da
da
educação
educação ee em
em outros
outros domínios
domínios sociais,
sociais, afirma
afirma que
que “a“a retórica
retórica da
da qualidade”
qualidade” se
se impôs
impôs rapidamente
rapidamente como
como
senso
senso comum
comum nas nas burocracias,
burocracias, entre
entre os
os intelectuais
intelectuais ee –– mais
mais dramaticamente
dramaticamente –– em em um um número
número nada
nada
desprezível
desprezível dede indivíduos
indivíduos queque sofreram
sofreram ee sofrem
sofrem as as consequências
consequências dessas
dessas políticas
políticas conservadoras:
conservadoras: os
os
professores,
professores, os
os pais
pais ee os
os alunos.
alunos. Tal
Tal retórica
retórica aplica-se
aplica-se tanto
tanto àsàs políticas
políticas de
de segurança
segurança pública
pública que
que vêm
vêm sendo
sendo
adotadas
adotadas nos
nos últimos
últimos anos
anos (em
(em parte,
parte, responsáveis
responsáveis pela
pela formação
formação ee subjetivação
subjetivação dos
dos novos
novos policiais)quanto
policiais)quanto àà
percepção
percepção que
que as
as populações
populações pobres
pobres ee operárias
operárias passam
passam aa ter
ter das
das intervenções
intervenções dada polícia
polícia e,
e, mais
mais amplamente,
amplamente,
do
do modo
modo como
como oo Estado
Estado vem
vem se
se encarregando
encarregando da da segurança
segurança pública.
pública.
42|
42| anderson
anderson duarte;
duarte; sylvio
sylvio gadelha
gadelha

Ao falar da grade de análise utilizada pelos neoliberais estadunidenses, Foucault


(2008a, p. 339) explica que se trata de um tipo de crítica e avaliação das políticas
governamentais que toma como referência o mercado, de modo a que este constitua tanto o
lugar de produção da verdade (veridicção) sobre o governo quanto principal referência a
ser levada em conta no que se refere à produção dos valores, princípios e parâmetros de
planejamento, execução e avaliação das políticas públicas. Como consequência, tem-se
uma reorientação das políticas públicas e uma reprogramação dos indivíduos, sejam eles ou
não policiais, transformados, doravante, conforme assinala Gadelha (2009), em indivíduos
microempresas, isto é, em empresários de si mesmos.
É preciso ainda levar em consideração que a polícia, com suas medidas de segurança
pública, desde a emergência de uma sociedade disciplinar, no século XVIII, também atua
no condicionamento dos sujeitos de uma população. Ela tem um papel importante na
disseminação das disciplinas no século XVIII:
une
une oo poder
poder absoluto
absoluto do
do monarca
monarca àsàs mínimas
mínimas instâncias
instâncias de
de poder
poder disseminadas
disseminadas nana
sociedade;
sociedade; pois,
pois, entre
entre essas
essas diversas
diversas instituições
instituições fechadas
fechadas de
de disciplina
disciplina (oficinas,
(oficinas,
exércitos,
exércitos, escolas),
escolas), estende
estende uma
uma rede
rede intermediária,
intermediária, agindo
agindo onde
onde aquelas
aquelas não
não
podem
podem intervir,
intervir, disciplinando
disciplinando espaços
espaços não
não disciplinados.
disciplinados. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2008b,2008b, p.
p.
177)
177)

Assim, da mesma forma que os mecanismos da polícia atuaram naquele período nos
interstícios existentes entre as instituições de sequestro, permitindo a generalização das
disciplinas em todos os espaços sociais, também em nosso presente ela tem atuado na
educação e, mais amplamente, na formação, mesmo que de forma indireta, dos indivíduos.
É nesse sentido que o ex-secretário nacional de segurança pública, Ricardo Balestreri (2003,
p. 24) vai afirmar o policial, especialmente o “policial comunitário”, como um “pedagogo
da cidadania”. Essa dimensão pedagógica que permearia, na qualidade de inerente, não só a
ação policial, mas o funcionamento do dispositivo de segurança como um todo, e que teria
influência na modulação das condutas das populações, sobretudo dos estratos mais pobres,
é definida por ele como “inabdicável”.
A partir deste contexto, em que atuam vários microdispositivos pedagógicos, dentre
os quais se inclui o microdispositivo propriamente policial, que concorre, juntamente com
outros, para a educação, formação e subjetivação dos indivíduos, é possível falar em um
empresariamento da segurança pública. Este processo atuaria, de forma dupla, agindo tanto na
transformação das políticas de segurança pública, que então adotam paradigmas e modelos
que obedecem a uma “operacionalidade empresarial”, na forma de gestão (GAULEJAC,
2007), quanto na produção de subjetividades policialescas, securitárias ou atuariais, isto é,
sujeitos adequados a uma sociedade de (in)segurança. O “indivíduo-microempresa” de que
fala Gadelha (2009, p.149) teria a característica de policiar-se a si mesmo e aos seus
semelhantes cotidianamente, além de realizar cálculos atuariais e securitários ao realizar
seus investimentos em segurança e ao se relacionar socialmente. Nesta perspectiva,
poderiam também ser analisadas as delações estimuladas pelos órgãos de segurança
pública88, as avaliações por pares e as relações de concorrência em diversos ambientes de

88 Chama
Chama aa atenção
atenção oo programa
programa “Disque
“Disque Denúncia”,
Denúncia”, do
do estado
estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro.
Janeiro. Criado
Criado em
em 1995,
1995, oo programa,
programa,
apesar
apesar de
de ser
ser amplamente
amplamente utilizado
utilizado ee divulgado
divulgado pela
pela Secretaria
Secretaria de
de Segurança
Segurança Pública
Pública do
do estado,
estado, não
não éé um
um
serviço
serviço público.
público. Trata-se
Trata-se de de uma
uma parceria
parceria estabelecida
estabelecida entre
entre oo poder
poder público
público ee aa Organização
Organização Não Não
Governamental
Governamental Movrio.
Movrio. Totalmente
Totalmente financiado
financiado por
por empresas
empresas privadas,
privadas, oo programa,
programa, além
além de
de estimular
estimular aa
denúncia
denúncia por
por parte
parte dos
dos cidadãos
cidadãos comuns,
comuns, oferecendo
oferecendo recompensas
recompensas emem dinheiro,
dinheiro, também
também oferece
oferece premiações
premiações aa
policiais.
policiais. Segundo
Segundo oo site
site do
do programa:
programa: “Essa
“Essa premiação
premiação recebe
recebe oo nome
nome de
de Prêmio
Prêmio Gol
Gol ee tem
tem por
por objetivo
objetivo
divulgar
divulgar oo bom
bom desempenho
desempenho das das polícias
polícias ee reconhecer,
reconhecer, publicamente,
publicamente, seus
seus profissionais.
profissionais. São
São premiados
premiados
aqueles
aqueles que
que cumprem
cumprem sua sua tarefa
tarefa de
de maneira
maneira legítima,
legítima, sem
sem violar
violar direitos
direitos ee gerar
gerar vítimas”.
vítimas”. Ver
Ver site
site do
do
programa.
programa. Disponível
Disponível em:em: <http://disquedenuncia.org.br/>.
<http://disquedenuncia.org.br/>.
considerações
considerações sumárias
sumárias sobre
sobre aa relação
relação entre
entre segurança
segurança pública,
pública, formação
formação policial
policial ee empresariamento
empresariamento || 43
43
da
da sociedade,
sociedade, nana governamentalidade
governamentalidade neoliberal
neoliberal

trabalho; da mesma forma, as práticas de vigilantismos, justiçamentos, linchamentos e


extermínios daqueles indivíduos considerados indesejáveis, que ocorrem principalmente
nas periferias dos grandes centros urbanos.

considerações finais
O conceito de segurança, abrangente e complexo que é, está em permanente
construção e precisa não só ser disputado, mas, sobretudo, problematizado. Para alguns,
cujo entendimento da agonística social é perspectivado por um viés jurídico-político, ou
jurídico-filosófico, ele tanto pode ser entendido como um direito humano fundamental, ao
lado dos direito à vida e do direito à liberdade, quanto dá margem a que seja utilizado como
argumento e instrumento de governo para retirada desses mesmos direitosfundamentais.
A segurança pública tem, sobretudo, as funções de vigilância, monitoramento, controle e
governo das populações pobres e, nesse contexto a expressão, “por razões de segurança”
pode ser uma chave para a execução de medidas autoritárias e típicas de um estado de
exceção.
Na realidade das atuais sociedades de (in)segurança, policiadas sob uma
governamentalidade neoliberal, os mecanismos de gestão e de produção de subjetividades
serializadas têm proliferado, dando ensejo a um empresariamento da segurança pública,
característico do que Gilles Deleuze (1992) chamou de sociedades de controle, e colocando em
risco o que se entende por democracia, como diz Agamben (2014).
Cabe aos que pensam e aos que lutam nesse complexo campo estratégico, munirem-
se de ferramentas e instrumentos para a crítica a esse modelo de segurança e de sociedade.
Para Foucault (2005, p.242), é necessário que o intelectual seja um “destruidor das
evidências e das universalidades, que indica nas inércias e coações do presente os pontos
fracos, as brechas, as linhas de força”.

referências
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Como
Como aa obsessão
obsessão por
por segurança
segurança muda muda aa democracia.
democracia. 06.06. Jan
Jan 2014.
2014. Le
Le Monde
Monde
Diplomatique
Diplomatique Brasil.
Brasil. Disponível
Disponível em:em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1568>.
<http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=1568>.
Acessado
Acessado em:em: 09/03/2014.
09/03/2014.
BALESTRERI,
BALESTRERI, RicardoRicardo B.B. Direitos
Direitos Humanos:
Humanos: coisa
coisa de
de polícia.
polícia. Passo
Passo Fundo:
Fundo: Gráfica
Gráfica Editora
Editora Berthier,
Berthier,
2003.
2003.
BAYLEY,
BAYLEY, D. D. H.H. Padrões
Padrões de de policiamento.
policiamento. Tradução
Tradução de de Renê
Renê Alexandre
Alexandre Belmonte.
Belmonte. São São Paulo:
Paulo:
Editora
Editora dada Universidade
Universidade de de São
São Paulo,
Paulo, 2006.
2006.
BOSCHETTI,
BOSCHETTI, Ivanete. Ivanete. Implicações
Implicações da da reforma
reforma da da previdência
previdência na na seguridade
seguridade social
social brasileira.
brasileira.
Psicologia
Psicologia & & Sociedade,
Sociedade, v.15,v.15, n.
n. 1,1, p. p. 57-96,
57-96, jan./jun.
jan./jun. 2003.
2003. Disponível
Disponível em: em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822003000100005>.
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822003000100005>.
Acessado
Acessado em:em: 11/05/2016.
11/05/2016.
BRASIL.
BRASIL. Constituição.
Constituição. Constituição
Constituição da da República
República Federativa
Federativa do do Brasil.
Brasil. Brasília,
Brasília, DF:
DF: Senado
Senado Federal,
Federal,
1988.
1988.
CERQUEIRA,
CERQUEIRA, Daniel Daniel etet al.
al. (Orgs.).
(Orgs.). Atlas
Atlas da
da Violência
Violência 2016.
2016. Brasília:
Brasília: IPEA,
IPEA, 2016.
2016. Disponível
Disponível em:
em:
http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160322_nt_17_atlas_da_
http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160322_nt_17_atlas_da_
violencia_2016_finalizado.pdf.
violencia_2016_finalizado.pdf. Acessado
Acessado em:
em: 15/05/2016.
15/05/2016.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. Conversações.
Conversações. São
São Paulo:
Paulo: Editora
Editora 34.34. 1992.
1992.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Microfísica
Microfísica dodo poder.
poder. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Graal,
Graal, 2005.
2005.
______.
______. Nascimento
Nascimento da da biopolítica.
biopolítica. São
São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2008a.
2008a.
______.
______. Vigiar
Vigiar ee punir.
punir. 6.
6. ed.
ed. Petrópolis:
Petrópolis: Vozes,
Vozes, 2008b.
2008b.
______.
______. Segurança,
Segurança, território,
território, população.
população. São
São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2008c.
2008c.
GADELHA,
GADELHA, Sylvio. Sylvio. Biopolítica,
Biopolítica, governamentalidade
governamentalidade ee educação:
educação: Introdução
Introdução ee Conexões
Conexões aa partir
partir de
de
Michel
Michel Foucault.
Foucault. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2009.
2009.
44|
44| anderson
anderson duarte;
duarte; sylvio
sylvio gadelha
gadelha

GADELHA,
GADELHA, Sylvio;
Sylvio; DUARTE,
DUARTE, Anderson.
Anderson. O O policiamento
policiamento comunitário
comunitário como como dispositivo
dispositivo
neoliberal
neoliberal dede governo
governo nono campo
campo dada segurança.
segurança. In:In: AVELINO,
AVELINO, Nildo; Nildo; VACCARO,
VACCARO, Salvo. Salvo.
Governamentalidade
Governamentalidade || segurança.
segurança. São
São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. Intermeios,
Intermeios, 2014,
2014, p.
p. 129-169.
129-169.
GAULEJAC,
GAULEJAC, Vincent
Vincent de.de. Gestão
Gestão como
como doença
doença social:
social: ideologia,
ideologia, poder
poder gerencialista
gerencialista ee fragmentação
fragmentação social.
social.
Aparecida:
Aparecida: Ideias
Ideias && Letras,
Letras, 2007.
2007.
GENTILI,
GENTILI, P.P. A.A. A.
A. OO discurso
discurso da da “qualidade”
“qualidade” como como novanova retórica
retórica conservadora
conservadora no no campo
campo
educacional.
educacional. In:In: GENTILI,
GENTILI, P.A.A.;
P.A.A.; SILVA,
SILVA, T. T. T.da.
T.da. (Orgs.).
(Orgs.). Neoliberalismo,
Neoliberalismo, qualidade
qualidade total
total
ee educação:
educação: visões
visões críticas.
críticas. 10
10 ed.
ed. Petrópolis:
Petrópolis: Ed.
Ed. Vozes,
Vozes, 2001.
2001.
SÃO
SÃO PAULO.
PAULO. Governo
Governo do do Estado.
Estado. Secretaria
Secretaria dede Segurança
Segurança Pública.
Pública. Secretário
Secretário anuncia
anuncia pagamento
pagamento dede
bônus
bônus aa policiais
policiais dos
dos dois
dois primeiros
primeiros trimestres
trimestres dodo ano.
ano. 2323 set.
set. dede 2015.
2015. Disponível
Disponível em:em:
<http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=36223>.
<http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=36223>. Acessado Acessado em: em: 12/04/2016.
12/04/2016.
SENASP.
SENASP. Curso
Curso nacional
nacional de
de multiplicador
multiplicador de
de polícia
polícia comunitária.
comunitária. 2. 2. ed.
ed. Brasília:
Brasília: Secretaria
Secretaria Nacional
Nacional dede
Segurança
Segurança Pública,
Pública, 2007.
2007.
BRASIL.
BRASIL. Governo
Governo Federal.
Federal. Taxa
Taxa dede homicídios
homicídios nono Brasil
Brasil atingiu
atingiu recorde
recorde em
em 2014.
2014. IPEA,
IPEA, 2323 mar
mar 2016.
2016.
Disponível
Disponível em:
em:
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=27412>.
<http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=27412>.
Acessado em:
Acessado em: 15/05/2016.
15/05/2016.
VEIGA-NETO, Alfredo.
VEIGA-NETO, Alfredo. Educação
Educação ee governamentalidade
governamentalidade neoliberal:
neoliberal: novos
novos dispositivos,
dispositivos, novas
novas
subjetividades. In:
subjetividades. In: PORTOCARRERO,
PORTOCARRERO, Vera; Vera; CASTELO
CASTELO BRANCO, BRANCO, Guilherme
Guilherme (org.).
(org.).
Retratos de
Retratos de Foucault.
Foucault. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: NAU,
NAU, 2000.
2000. p.
p. 179-217.
179-217.
WACQUANT, Loïc.
WACQUANT, Loïc. As
As prisões
prisões da
da miséria.
miséria. Tradução
Tradução de de André
André Telles.
Telles. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Jorge
Jorge Zahar
Zahar
Editor, 2001.
Editor, 2001.
WILSON, J.
WILSON, J. Q.;
Q.; KELLING,
KELLING, G. G. L.L. The
The Police
Police and
and neighborhood
neighborhood safety:safety: broken
broken Windows.
Windows. The The
atlantic
atlantic Monthly,
Monthly, mar.
mar. 1982.
1982. Disponível
Disponível em:
em:
<http://www.theatlantic.com/magazine/archive/1982/03/broken-windows/304465/>.
<http://www.theatlantic.com/magazine/archive/1982/03/broken-windows/304465/>.
Acessado em:
Acessado em: 19/04/2016.
19/04/2016.
45
45

ciudadanía, argumentación y función filosófica.


desafíos político-pedagógicos a partir de una investigación.

marisa berttolini11

L a cuestión de la ciudadanía en vínculo con la educación y más


específicamente con la educación filosófica institucionalizada en el nivel de
enseñanza media, resulta siempre problemática. Ciudadanía y educación, dos
categorías que han devenido triviales en el imaginario social, por desprecio o
sobrevaluación vacía.
La reflexión la hago desde la experiencia de mi práctica como docente, y a partir de
investigaciones sobre la Enseñanza de la Filosofía en que participé.
La intención es religar la razón pedagógica con la lógica de la emancipación.
Propongo recuperar la potencia de la “razón pedagógica” vinculada a ciertas prácticas de
enseñanza de la filosofía con la convicción de que pueden constituirse en prácticas de
libertad.
Como lo destacábamos en reflexiones anteriores, la convicción es que el espacio de
iniciación de los jóvenes en la experiencia filosófica puede constituirse, en ciertas
condiciones, en un espacio “público” fermental en contraposición a las zonas de encierro
que se expanden y multiplican en la sociedad. Zonas de encierro, algunas extremas, donde
se castiga violentamente a los violentos en cárceles que implosionan, y verdaderos
claustros donde se atrincheran los poderosos para reducir su temor a la violencia posible de
los desposeídos.
En un escenario multicultural fragmentado y donde el deseo de comunidad está
fuertemente debilitado, el aula de filosofía puede ser un microespacio público
potencialmente democratizador.
En el imaginario social actual, el posicionamiento frente al sistema educativo oscila
entre una profunda desvalorización y una sobredemanda que pone en la escuela fantasías
omnipotentes. El fracaso se lo vivencia como traición. La educación, se dice, no cumple
con sus promesas, no aporta a la justicia social, no es garantía de movilidad social, no
iguala a los educandos en sus posibilidades, no asegura inserción laboral ni integración
social. Ni funciona con equidad ni construye igualdad. Pero simultáneamente se refuerzan
las expectativas, Se coloca en la escuela la responsabilidad de exorcizar la exclusión, de
evitar el conflicto social e incluso de amoriguar las manifestaciones de resistencia.
Este contexto tiene la virtud de poner en cuestión supuestos fuertes. Podemos
seguir pensando desde de la "razón pedagógica", pero ya no de la misma manera.. Invita a
cada educador a desplazarse de la repetición de lo mismo, de las rutinas sin convicción y
sin esperanza.
La crisis habilita propuestas extremas: o la escuela pensada como otro lugar de
encierro o proyectos radicales de desescolarización.
Una posibilidad es pensar que la escuela debe “contener” a los niños y jóvenes a
cualquier precio. Entonces, frente a ambivalencia, las instituciones educativas se
desestabilizan y responden con formaciones reactivas rigidizando su formato tradicional
para asegurarse de que “la vida” no entre a la escuela y no la jaquee. Pero este mecanismo
agudiza su fracaso y profundiza el vacío de sentido y el malestar.

11 Instituto
Instituto de
de Perfeccionamiento
Perfeccionamiento yy Estudios
Estudios Superiores
Superiores –– IPES/Uruguay.
IPES/Uruguay.
Email:
Email: marisaberttolini@gmail.com
marisaberttolini@gmail.com
46|
46| marisa
marisa berttolini
berttolini

Por su parte, aparecen propuestas de desescolarización que habitualmente, aún


desde posturas ideológicas antagónicas, se hacen en nombre del derecho de los padres a
optar por la educación que crean más adecuada para sus hijos
Algunas líneas de la ideología liberal, sospechosas del Estado, ubican en el ámbito
privado de la familia, el lugar de la libertad, en tanto supuestamente queda eximido de los
condicionamientos, las normas y el control social propio de lo público.
Pero las constelaciones privadas, aisladas de la articulación con el espacio público,
corren el riesgo de ser sólo espacio de confinamiento, de construcción de subjetividades
cerradas, pobres, xenofóbicas.
En cambio, apostamos a la educación y específicamente a la educación filosófica
como estrategia eficaz (aunque relativa y no autosuficiente) para generar deseo de
comunidad. Y esto en tanto se habilite en las aulas el interjuego de las diversas versiones del
mundo para su traducción, su confrontación, o su hibridación. Un espacio que merece ser
preservado, cuidado y potenciado como ámbito en que circulen críticamente los diversos
“logos” y se estimule la imaginación para concebir y construir proyectos alternativos de
vida en común.

reflexiones a partir de una investigación sobre argumentación


Para ejemplificar y encarnar la compleja articulación educación-ciudadanía voy a
hacer referencia a algunos aspectos de una investigación colectiva en la que participé:
Argumentación: un aporte filosófico a la educacción22.. La indagación nos revela a la vez logros y
desafíos político-pedagógicos pendientes.
En esta investigación abordamos la enseñanza y el aprendizaje de la argumentación
desde una perspectiva filosófica y pedagógica
El énfasis en la argumentación (y no exclusivamente en el razonamiento) aporta
nuevas perspectivas en el análisis del desarrollo del “buen pensar” con pertinencia material
y razonabilidad. Es una categoría lábil e inclusiva, pues no se limita a los discursos
informativos sino también emotivos y directivos. Incorpora el contexto de enunciación, la
intencionalidad, la potencia persuasiva, la especificidad de los interlocutores. Desplaza el
problema de la corrección del pensamiento según reglas formales a la cuestión de la
fortaleza o debilidad de los argumentos en función de la situación en la que se despliegan
los discursos. Así entendida, la argumentación habilita especialmente el tratamiento de
cuestiones no sólo teóricas sino también prácticas, del orden de lo político, lo ético, lo
jurídico. Aumenta, por lo tanto, la posibilidad de que las capacidades ejercitadas en el
ámbito educativo puedan ser transferidas por los estudiantes a otros espacios de la vida
social.
En los últimos tiempos se multiplican las demandas, aumenta su inserción
curricular, pero simultáneamente se detectan dificultades, que ameritan una investigación
específica.
Las principales preguntas de que partimos son: ¿Se enseña a argumentar? ¿Se
aprende a argumentar? ¿Qué relación hay entre los aspectos técnicos y la dimensión crítico-
radical del pensamiento? ¿Se puede “enseñar a pensar”?
La unidad de análisis es el discurso argumentativo que producen estudiantes en el
contexto de un curso curricular en la asignatura Filosofía.
Para visualizar la capacidad argumentativa de los estudiantes nos propusimos el
seguimiento de grupos-clase durante el desarrollo de un año lectivo realizando
observaciones de aula, entrevistas a estudiantes y docentes, provocando debates, y

22 BERTTOLINI,
BERTTOLINI, Marisa;
Marisa; GONZÁLEZ,
GONZÁLEZ, Isabel;
Isabel; LANGON,
LANGON, Mauricio.
Mauricio. Argumentación:
Argumentación: un
un aporte
aporte filosófico
filosófico aa la
la
educación,
educación, Informe
Informe de
de Investigación.
Investigación. Montevideo:
Montevideo: CFE-IPES,
CFE-IPES, 2014
2014 (sin
(sin publicar).
publicar).
ciudadanía,
ciudadanía, argumentación
argumentación yy función
función filosófica.desafíos
filosófica.desafíos político-pedagógicos
político-pedagógicos aa partir
partir de
de una investigación|| 47
una investigación 47

recogiendo producciones escritas. Se trabajó en 6 Liceos de Montevideo, 2 instituciones


privadas (una laica y otra confesional) y 4 liceos públicos, de zonas y población diversas.
Las intervenciones se hicieron a nivel de 2º año de Bachillerato. O sea, trabajamos con
estudiantes de 16-17 años aproximadamente con al menos 10 años de escolarización.
Partimos de algunos supuestos:
i.i. el valor de la enseñanza de la argumentación en los estudiantes consiste en
desarrollar habilidades para leer críticamente la sociedad, para interpretar los diversos
discursos sociales y para insertarse en los espacios de debate y discusión públicos con
capacidad de fundamentar o refutar opiniones, construir y defender las propias posturas.
ii. La necesidad de evitar el abordaje instrumental de la enseñanza de la
ii.
argumentación y la reducción del buen pensar a reglas formales.
iii. la preocupación por evaluar la fortaleza o debilidad de los argumentos en
iii.
función del contexto en que se despliegan los discursos.
iv. la exigencia de combinar el abordaje sintáctico de la argumentación con la
iv.
exploración semántica, con los contenidos, tomando en cuenta el atravesamiento filosófico
e ideológico de los discursos.
v. el valor de la enseñanza y el aprendizaje de la argumentación en el ámbito
v.
educativo formal y la posibilidad de que las capacidades ejercitadas en ese ámbito puedan
ser transferidas por los estudiantes a otros espacios de la vida social.
La interpretación de los datos obtenidos permite algunas conclusiones generales:
i.i. En la producción escrita individual, la gran mayoría de los estudiantes fue
capaz de tomar posición y de enunciar buenas razones para sustentar la opción.
ii. En los debates la mayoría de los estudiantes participó con muy buena
ii.
disposición. Discutieron con entusiasmo y creatividad.
iii. El compromiso aumenta con el interés social de las cuestiones polémicas
iii.
tratadas y con su mayor presencia en el debate público.
iv. Se observan dificultades en los estudiantes para sistematizar los argumentos.
iv.
v.v. La toma de posición en muchos casos aparece fuertemente impregnada de la
dimensión afectiva. Este aspecto resulta ambivalente. Por un lado garantiza el compromiso
con la cuestión en debate, pero también implica el riesgo de bloquear la posibilidad de
flexibilizar el pensamiento y tener en cuenta la complejidad plural de los problemas.
vi. En los debates, el docente sigue siendo el referente principal de las
vi.
intervenciones de los alumnos y continúa liderando las relaciones de poder en el aula.
vii. Es evidente la relevancia del ejercicio del rol docente para favorecer en los
vii.
alumnos las capacidades de problematizar la cuestión planteada, de definir los conceptos y
de progresar en el debate.
viii. Hay dificultades para dialogar entre pares y construir y revisar el discurso a
viii.
partir de los aportes de los compañeros.
ix. En algunos casos la discusión queda atrapada en la referencia a ejemplos de la
ix.
experiencia personal, y se obstaculiza el desarrollo de un pensamiento abstracto.
x.x. No es frecuente que las posiciones se flexibilicen o cambien en función del
despliegue del debate. Incluso, el análisis comparativo de la producción escrita individual
previa al debate con las intervenciones orales muestra que la mayoría de los estudiantes
mantienen hasta el final su perspectiva inicial.
xi. Hay dificultad para tolerar los disensos y sensibilidad a la presión colectiva, de
xi.
manera que en algunos casos se inhibe la presentación de posturas en minoría. En algunos
casos incluso se explicita el malestar y se dice que no se va a opinar porque se corre el
riesgo de ser agredido por los representantes de la posición mayoritaria.
xii. En el análisis comparativo con discursos y discusiones en otros ámbitos
xii.
sociales sobre las mismas cuestiones (por ej. Parlamento, medios masivos de
48|
48| marisa
marisa berttolini
berttolini

comunicación) se observan analogías relevantes tanto en la forma como en el contenidos


de los abordajes.
xiii. la argumentación a menudo es presentada como contenido curricular en el
xiii.
sentido más tradicional, excluyéndose la posibilidad de trabajar las capacidades
argumentativas a través de todo el curso de filosofía.
xiv. Se visualiza la tensión entre el mandato institucional de enseñar contenidos
xiv.
por un lado, y por otro la discusión en clase vista como una modalidad de aprendizaje que
puede ser amable pero entraña el riesgo de hacernos caer en la vaguedad o de olvidar los
contenidos. Se ponen en juego la concepción de la filosofía y de su enseñanza que tiene el
docente como obstáculos para promover la discusión en la clase, o por el contrario para
propiciar el pensar y el cuestionamiento.
xv. En algunos casos se manifiesta en ciertos alumnos resistencia a involucrarse en
xv.
la discusión y falta de hábito de socializar el pensamiento. La presencia de esa resistencia
en el aula tal vez pueda pensarse como efecto de cierto tipo de escolarización dominante, a
la que no escapan algunas clases de Filosofía. Las posibilidades de generar un espacio
dialógico suponen un trabajo persistente y continuado, que aunque con logros a veces muy
modestos, abre posibilidades fermentales para preguntar y para pensar cosas nuevas.
En fin, muchos obstáculos que se visualizan en las aulas están en la vida social. Las
dificultades para lidiar con el desacuerdo, la posibilidad de que todos tengan voz, los
atravesamientos afectivos e ideológicos, los dogmatismos y la violencia, el achicamiento o
ensanchamiento del espacio para discutir y argumentar.

una interpretación posible: el riesgo de que el león transmute en camello.


La primera intervención del equipo consistió en un taller exploratorio para el cual
se seleccionó una cuestión polémica, que está siendo efectivamente discutida en nuestro
país a nivel político y social: “el reconocimiento legal del matrimonio igualitario” (pocos meses
después de esta actividad, la ley fue promulgada y ya está vigente en Uruguay. Agosto de
2013)
El ejercicio incluye 3 actividades: la toma de posición fundamentada en una
producción escrita individual, un análisis también escrito de 2 entrevistas a políticos con
posturas diferentes, y luego, como actividad colectica, un debate oral.
En la producción escrita individual, la gran mayoría de los estudiantes fue capaz de
tomar posición y de enunciar razones para sustentar la opción.
En el transcurso de la investigación, en la fase de análisis de los datos empíricos,
nos fuimos desplazando del abordaje sintáctico de la argumentación a la exploración
semántica. Nos interesamos especialmente por los contenidos en que los estudiantes
sustentaban sus posiciones, es decir, por las implicancias filosóficas e ideológicas en los
discursos.
Este enfoque es coherente con nuestra preocupación por evitar la reducción del
dispositivo argumentativo a su carácter meramente instrumental, y con la convicción del
interés político-pedagógico de la educación filosófica.
De los 100 estudiantes que participaron, 74 se pronunciaron a favor del matrimonio
igualitario, 15 en contra, 9 matizaron sus posturas, y sólo dos se resistieron a realizar la
tarea. Los estudiantes fueron capaces de elaborar 161 argumentos para defender el
matrimonio igualitario y 39 para fundamentar en contra.
Las posturas favorables se sostienen mayoritariamente en principios ético-políticos
fuertes: derechos individuales (39 argumentos), libertad (26), igualdad (25).
Los resultados parecen muy promisorios.
Los jóvenes piensan, argumentan, se comprometen con posiciones fundadas, se
muestran tolerantes, comparten valores relevantes. O de otra manera, se han apropiado
ciudadanía,
ciudadanía, argumentación
argumentación yy función
función filosófica.desafíos
filosófica.desafíos político-pedagógicos
político-pedagógicos aa partir
partir de
de una investigación|| 49
una investigación 49

normativamente de las promesas del proyecto moderno, que sigue siendo, al menos en el
discurso, la ideología hegemónica.
Los argumentos reproducen un pensamiento que implícitamente se considera
“políticamente correcto” y aún las posturas más radicales en contra aclaran que “no se
trata de discriminación”. Las instituciones parecen haber sido efectivas en la construcción
de las subjetividades de los estudiantes. Podríamos afirmar que ha funcionado con eficacia
el dispositivo normalizador.
Pero algo hacía ruido. Sentíamos la necesidad de una interpretación más sutil del
discurso de los alumnos. Y así creemos haber visualizado la cuestión inquietante.
Descubrimos que la ideología liberal clásica se ha internalizado en los jóvenes con
fuerza de “verdad”. Los valores se postulan como evidentes y se construyen argumentos
sobre un modelo axiomático-deductivo.
La normativa jurídica vigente aparece como atemporal y casi “natural” (“el
matrimonio es…”) y en relación a la familia hay dificultades para concebir alternativas a la
organización teóricamente hegemónica. Tanto en las posturas a favor como en contra se
observa una sobrevaloración de la relevancia de la familia en la conformación de la
afectividad de los niños.
Para posicionarse en contra del matrimonio igualitario se acude al carácter
imprescindible de la familia nuclear, y se le atribuye importancia esencial a los roles
masculino y femenino en la educación de los hijos.
Resulta paradójico que en algunos casos se acepta y justifica la posibilidad
fuertemente transgresora y disruptiva de los vínculos homosexuales respecto a los criterios
hegemónicos de normalización, apelando a principios clásicos y al valor de la familia
nuclear moderna, que por otra parte, en su modalidad heterosexual está en crisis profunda.
Otra muestra de la capacidad del sistema de fagocitar las experiencias alternativas.
Las categorías de libertad, igualdad, derechos individuales, aparecen
sustancializadas. Se han naturalizado. Se han vuelto tradición, devienen en dogma, ocupan
el lugar de la religión. De esta manera pierden su fuerza vital, la capacidad transformadora,
se debilita su función utópica y emancipatoria.
Falta conciencia de su historicidad. El presente no se reconoce como construcción
social y resultado de contingencias históricas y luchas sociales
Si la premisa es “todos somos iguales” o “todos somos libres”, se disuelve el desafío
político. No hay conflicto, no hay proyecto, no es necesario el esfuerzo.
Ya en 1981, en una conferencia en Madrid sobre Las palabras, Julio Cortázar desde
su condición de escritor comprometido, expresa esta preocupación.
Si
Si algo
algo sabemos
sabemos loslos escritores
escritores eses que
que las
las palabras
palabras pueden
pueden llegar
llegar aa cansarse
cansarse yy aa
enfermarse, como
enfermarse, como sese cansan
cansan yy se se enferman
enferman loslos hombres
hombres oo loslos caballos.
caballos. Hay
Hay
palabras que
palabras que aa fuerza
fuerza de
de ser
ser repetidas,
repetidas, yy muchas
muchas veces
veces mal
mal empleadas,
empleadas, terminan
terminan
por agotarse,
por agotarse, por
por perder
perder poco
poco aa pocopoco susu vitalidad…Digo:
vitalidad…Digo: “libertad”,
“libertad”, digo:
digo:
“democracia”, yy de
“democracia”, de pronto
pronto siento
siento queque he
he dicho
dicho esas
esas palabras
palabras sinsin haberme
haberme
planteado una
planteado una vez
vez más
más susu sentido
sentido másmás hondo,
hondo, susu mensaje
mensaje más
más agudo,
agudo, yy siento
siento
también que
también que muchos
muchos de de los
los que
que las
las escuchan
escuchan las
las están
están recibiendo
recibiendo aa su su vez
vez como
como
algo que
algo que amenaza
amenaza convertirse
convertirse en en un
un estereotipo,
estereotipo, en
en un
un clisé
clisé sobre
sobre el
el cual
cual todo
todo el
el
mundo está
mundo está de
de acuerdo
acuerdo porque
porque esa esa es
es la
la naturaleza
naturaleza misma
misma deldel clisé
clisé yy del
del
estereotipo: anteponer
estereotipo: anteponer un un lugar
lugar común
común aa una
una vivencia,
vivencia, una
una convención
convención aa unauna
reflexión, una
reflexión, una piedra
piedra opaca
opaca aa un
un pájaro
pájaro vivo
vivo (CORTÁZAR,
(CORTÁZAR, 1981) 1981)
Esto es lo que nos remite a Nietzsche y “las tres transformaciones del espíritu” y
nos sugiere la imagen inquietante del león transmutando en camello.
La rebelión original del león rompe con la carga pesada de la tradición y representa
el movimiento de liberación que se nutre de la confrontación. Pero domesticado el león,
50|
50| marisa
marisa berttolini
berttolini

lejos de habilitar el florecimiento del niño creador, puede transmutar en un nuevo camello,
con ropaje de la modernidad, pero con el mismo peso que esclaviza.
Y es aquí donde la educación filosófica debe asumir el desafío y desarrollar una
ontología crítica del presente a la que nos invita Foucault.
La filosofía puede hacer la mediación crítica sobre lo que se ha naturalizado,
instalar la pregunta sobre las condiciones de producción de las instituciones que
habitamos, de los valores que reconocemos como deseables, de los saberes que aceptamos
como válidos
La educación filosófica debe orientarse a que los sujetos reconozcan cómo han
entrado a formar parte de una determinada representación de la verdad (FOUCAULT, 1994,
p.122), y cuáles son las reglas de juego de los dispositivos que han construido su
subjetividad.
Este reconocimiento no es garantía, pero es condición de posibilidad de la ruptura
que habilite a imaginar y construir proyectos múltiples y alternativos de vida en común
que no anulen sino que se nutran de la diversidad.

referencias
CORTÁZAR,
CORTÁZAR, Julio.
Julio. Las
Las palabras.
palabras. [Conferencia].
[Conferencia]. Madrid,
Madrid, 1981,
1981, s/f.
s/f. Consultado
Consultado en:en: 18/06/2016.
18/06/2016.
Disponible
Disponible en:
en: http://bohemiaylibre.blogspot.com.br/2012/08/conferencia-de-julio-
http://bohemiaylibre.blogspot.com.br/2012/08/conferencia-de-julio-
cortazar-madrid.html
cortazar-madrid.html
FOUCAULT, Michel.
FOUCAULT, Michel. Hermenéutica
Hermenéutica del
del sujeto.
sujeto. Madrid:
Madrid: Ediciones
Ediciones de
de la
la Piqueta,
Piqueta, 1994.
1994.
NIETZSCHE, Friedrich.
NIETZSCHE, Friedrich. De
De las
las tres
tres transformaciones.
transformaciones. In:
In: NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Así
Así habló
habló
Zaratustra. Madrid:
Zaratustra. Madrid: Alianza,
Alianza, 1972.
1972.
51
51

a dimensão política do ensino de filosofia


e da formação docente

junot cornélio matos11

A
discussão que temos empreendido nos últimos anos acerca do Ensino de
Filosofia e as implicações de sua presença obrigatória na escola pública
conduziu-nos de volta a uma preocupação constante em nossas primeiras
incursões pela temática do ensino: a formação dos professores para o trabalho pedagógico
com a filosofia enquanto componente curricular do ensino médio. Nosso ponto de partida
ancorou-se no pressuposto antropológico que coloca a inerente necessidade da educação
como via de permanente concretização do projeto de humanização desses animais que
chamamos de homens e mulheres para seguir na sequela daqueles que preconizam a
formação profissional como organização da efetiva possibilidade de intervenção no mundo
da vida. Finalmente, esbarramo-nos na esfera da vida política como esteio da vida ética e
da militante compromisso com a justiça e equidade social e os requesitos para a formação
considerando essa importante dimensão da vida do ser humano.
Em nosso olhar a dimensão humana e a profissionalização reportam-se à formação
política. Essa se refere ao desenvolvimento de atitudes que exigem o compromisso político
do professor, como intelectual transformador na aula, na escola, no contexto social,
comprometido com a prática social (PÉREZ GOMEZ, 2000). Entretanto, revela sua
própria dimensão humana que o coloca no convívio e confronto cotidiano com os outros.
Se volvermos os olhos para a LDB, no que tange à formação dos profissionais da
Educação, encontraremos assentado que esses devem ser formados de “modo a atender aos
objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características do
desenvolvimento do educando” (art. 61). Os artigos 32 e 35, referindo-se, respectivamente,
ao Ensino Fundamental e Médio, focalizam o ensino, como mediação que possibilita, ao
indivíduo, a prática da cidadania. Teriam, então, os professores, entre seus atributos, a
incumbência de atuarem, na formação de cidadãos. A preconizada cidadania tão
fortemente requisitada pelas normativas e textos acadêmicos deixa implícita a “adesão” a
um determinado projeto político assinalados em bandeiras de lutas no chão do concreto da
vida.
Preside nossa concepção a ideia de que A Educação não é um empreendimento
neutro, e o educador está envolvido em um ato político de forma consciente ou não. À
medida que tem consciência do seu papel político-pedagógico, pode optar por orientar suas
ações por uma concepção democrática, crítica e formar alunos que pensem e atuem
criticamente.
O artigo 62 reza que o professor será formado, em Cursos de Licenciatura, de
graduação plena. Tais cursos, a nosso ver, em coerência com o que prescreve a legislação,
deverá colocar, como preocupação inicial, o perfil desse docente a ser formado. Pensamos:
dado que este tem, como tarefa, a formação de cidadãos, deve, também ele, em princípio,
ser formado, em atendimento às prerrogativas de sua cidadania. Ele é, portanto, um
cidadão.
Wanderley (1987, p.187-199) aponta alguns traços identificadores do professor como
cidadão. Citamos alguns: domínio das áreas de conhecimento em que atua e da área
educacional, competência técnica e política, ser redimensionalizador do conteúdo da

11 Universidade
Universidade Federal
Federal de
de Pernambuco
Pernambuco –– UFPE.
UFPE. Email:
Email: junotcmatos@gmail.com
junotcmatos@gmail.com
52|
52| junot
junot cornélio
cornélio matos
matos

educação, estar comprometido profissionalmente com o desenvolvimento do aluno e com


seu próprio desenvolvimento profissional etc.,
As Universidades estão envolvidas com a formação inicial e continuada de
docentes. Pensamos que é esse o "lócus" por excelência para que tal formação ocorra.
Entretanto, nem sempre estão efetivamente comprometidas com tal formação.
Organizam-se ainda dentro de um padrão dicotômico entre os que “produzem o
conhecimento” (seus doutores e pesquisadores) e aqueles que ensinam (seus alunos das
licenciaturas diversas) e a formatação dos cursos de licenciatura revelam uma viciada
fragmentação que há muito vem sendo denunciada sem lograr sua superação. Para nós,
formar professores/professoras é vital, faz parte, mesmo, da missão das Comunidades
Universitárias. Esta é uma maneira, dentre outras, que têm nossas Instituições para
cumprirem seu papel social, oferecendo, à juventude do povo, e, à sociedade em geral,
agentes de transformação, críticos e criativos que lhes possibilitem o acesso aos bens da
cultura e à participação cidadã na construção do mundo melhor. Entretanto, parece
fundamental a superação das dicotomias internas, do arranjo organizacional que privilegia
áreas de conhecimento, modalidades de cursos, pesquisadores e discente, em detrimento de
outros. Parece urgente superar a distância entre os sistemas de ensino. Mas, sobretudo, o
profundo fosso aberto entre a Escola de educação básica e a Universidade.
A escola continua sendo um mal necessário: ela é campo de estágio, ela é o destino
final dos egressos das licenciaturas, ela é um argumento importante para a formulação de
projetos e a captação de recursos. Mas, o que eu é mesmo que nós sabemos da escola?
Dizemos muito dela e sobre ela, mas... sem ela? Quantos dos profissionais das áreas
específicas estão efetivamente engajados com o conhecimento da escola, sua geografia
política e pedagógica, seu desenho social? Além disso, ainda permanece disfarçadamente
aquela ideia já enxovalhada de que “a prática é aquilo que vem depois da teoria”.
Para nós, o trabalho desenvolvido, visando à formação pedagógica de professores de
Filosofia, deve ter, em conta, os problemas concretos que se colocam aos homens de nosso
tempo. No momento em que somos dominados pelo economicismo e que uma onda
neotecnicista invade nossos Cursos, não deveríamos sacudir, nossa prática pedagógica, de
seu sono dogmático? Não seria necessário e urgente concebermos práticas que visem à
superação do conformismo, do individualismo e do pessimismo? Como seduzirmo-las à
construção de bandeiras de lutas que acenem com utopias que vislumbrem um outro
amanhã? Um homem e sociedade novos, decerto, surgirão do homem e sociedade velhas,
pois a utopia se constrói, desde possibilidades cujas raízes se encontram fincadas no chão
da História. Para isso, é preciso revermos e reinventarmos a visão. Tal perspectiva implica
em perseguir aquilo que a nosso modo de entender a Universidade parece que abriu mão: a
formação política de seus estudantes. Isso requer abrir-se para os problemas e movimento
sociais, enseja atuar na formação de lideranças estudantis, implica em implantar efetivos
espaços de participação e decisão política nas políticas universitárias.
O reconhecimento da dimensão política da ação educativa repousa no
reconhecimento da dimensão humana relacional e, portanto, do que Demo (1996)
denomina de homem político, enquanto ser que se insurge contra o ser apenas objeto. O
homem político é aquele que tem consciência histórica, sabe dos problemas e busca
soluções. Não aceita ser objeto.
O
O homem
homem político
político éé aquele
aquele que
que tem
tem consciência
consciência histórica,
histórica, sabe
sabe dos
dos problemas
problemas ee
busca
busca soluções.
soluções. Não
Não aceita
aceita ser
ser objeto.
objeto. Quer
Quer comandar
comandar seu seu próprio
próprio destino.
destino. EE
amanhece
amanhece oo horizonte
horizonte dosdos direitos,
direitos, contra
contra os os dados
dados ee contra
contra aa imposição.
imposição. Ator,
Ator,
não
não expectador.
expectador. Criativo,
Criativo, não
não produto.
produto. Distinguimos
Distinguimos nas nas civilizações
civilizações ee nas
nas
culturas
culturas aa marca
marca do
do que
que oo homem
homem foifoi ee éé capaz
capaz de
de fazer.
fazer. (DEMO,
(DEMO, 1996,
1996, p.17).
p.17).
aa dimensão
dimensão política
política do
do ensino
ensino de
de filosofía
filosofía ee da
da formação
formação docente|
docente| 53
53

Tal abordagem observa a convicção socializada por Freire (2004) quando alude que
toda ação educativa é uma forma de intervenção no mundo, enquanto experiência humana,
portanto, ideológica.
Para Masetto (1998) o professor em sala de aula não deixa de ser um cidadão,
devendo organizar uma prática pedagógica que reconheça o contexto social e cultural como
processo histórico, portanto, propenso a incorporar a construção da vida e da história de
seu povo. Giareta, Vizivale e Meneghel (2008, p.133) defendem que
Os
Os educadores
educadores de de professores,
professores, ou
ou seja,
seja, as
as modalidades
modalidades educativas
educativas de
de formação
formação dede
professores,
professores, emem sua
sua dimensão
dimensão política,
política, são
são convidadas
convidadas aa estender
estender oo olhar
olhar ee dar
dar
consciência
consciência aosaos exercícios
exercícios dede poder
poder que
que sese efetivam
efetivam nana educação
educação ee delinear
delinear os
os
limites
limites ee alcances
alcances das
das intervenções
intervenções legislativas
legislativas na
na vida
vida acadêmica
acadêmica emem nome
nome deste
deste
poder.
poder. Tal
Tal caracteriza
caracteriza oo conhecimento
conhecimento não não mais
mais como
como um um conjunto
conjunto de de saberes
saberes
pré-
pré- ordenados
ordenados porpor um
um grupo
grupo de
de especialistas,
especialistas, mas
mas como
como produto
produto dede cooperação
cooperação
democrática,
democrática, ondeonde alunos
alunos dos
dos programas
programas de de formação
formação de de professores,
professores,
aproximados
aproximados de de políticas
políticas culturais
culturais de
de transformação
transformação emancipatória,
emancipatória, entendem-no
entendem-no
como
como manifestação
manifestação do do que
que acontece
acontece quando
quando aa experiência
experiência éé interrogada
interrogada àà luz
luz da
da
consciência
consciência histórica
histórica interceptando
interceptando aa experiência
experiência pessoal.
pessoal.

Nessa reflexão tomamos como pretexto o movimento nacional na direção da


obrigatoriedade da Filosofia como componente curricular no Ensino Médio, depois da
promulgação da Lei nº 11.684/08, que recolocou em pauta questões de grande importância
para os Cursos de Filosofia, seus docentes e seu corpo discente. Como assinalamos acima,
o tema do Ensino de Filosofia tem sido objeto de nosso frequente interesse, sobretudo por
entendê-lo como um problema não exclusivamente pedagógico; senão, antes, como uma
questão filosófica. Embora, tenhamos consciência que esse tema recebe um tratamento
inadequado em Cursos de Licenciatura em Filosofia22 é nossa convicção de que este é um
tema prioritário para a reflexão sobre a formação de professores e para a prática de ensino
da Filosofia enquanto componente curricular obrigatório no Ensino Médio. Abrange,
assim, uma extensão que vai do Ensino Superior à Escola Básica.
Refletir
Refletir sobre
sobre oo ensino
ensino de
de Filosofia
Filosofia éé tarefa
tarefa extensa
extensa ee transdisciplinar.
transdisciplinar. Quando
Quando
pensada
pensada enquanto
enquanto componente
componente curricular,
curricular, talvez,
talvez, tenha
tenha sido
sido aa “que
“que mais
mais
intensamente
intensamente sofreu
sofreu asas consequências
consequências das das mudanças
mudanças históricas
históricas dodo ideário
ideário
pedagógico,
pedagógico, ee também
também aquela
aquela cujo
cujo ensino
ensino esteve
esteve mais
mais sujeito
sujeito às
às vicissitudes
vicissitudes
decorrentes
decorrentes das
das transformações
transformações históricas
históricas na
na relação
relação entre
entre política
política ee educação”
educação”
(SILVA, 1993,
(SILVA, 1993, p.797)
p.797) ..
3
3

Não podemos ignorar que a Filosofia que volta à escola em pleno século XXI, no
bojo de um movimento que parece consolidar as reformatações produtivas do capital
principiadas no século passado, não é qualquer filosofia. À questão de sua concepção — e
falamos em concepção atentando para os demandantes de uma tal filosofia que, em
princípio, deve contribuir com a “formação do cidadão crítico”, ou seja, que encerra um
saber a priori — e sua ensinabilidade é necessário adicionar aquela que indaga o “para quê”,
ou seja, a que projeto histórico ela é chamada a servir. Assim, é possível atentar para a
complexidade do fenômeno, pois não é tão simples quanto parece: não se trata de discutir
exclusivamente se ela, a filosofia, presta-se ou não à disciplinarização e ao ensino. é
importante termos em conta que a relação das novas gerações com as filosofias estará, em

22 A
A esse
esse respeito
respeito consultar
consultar Pelloso
Pelloso (2010,
(2010, p.
p. 334)
334)
33 Conferir
Conferir aa respeito
respeito Carrilho
Carrilho (1987,
(1987, p.25-26):
p.25-26): “É
“É que,
que, se
se há
há disciplina
disciplina cujo
cujo conteúdo
conteúdo tenha
tenha variado
variado nono
conjunto
conjunto dos
dos currícula
currícula escolares,
escolares, surgindo
surgindo ora
ora pletórico
pletórico ee dominante
dominante em em relação
relação às
às outras
outras disciplinas,
disciplinas, ora
ora
encurralado
encurralado ee emem quase
quase desaparecimento,
desaparecimento, essa
essa disciplina
disciplina éé aa filosofia.
filosofia. EE poucas
poucas disciplinas
disciplinas terão
terão também
também
suscitado
suscitado tantas
tantas discussões
discussões ee debates
debates sobre
sobre oo seu
seu nível
nível de
de inserção,
inserção, oo seu
seu tem
tem de
de leccinação
leccinação escolar,
escolar, e,
e,
sobretudo,
sobretudo, os
os seus
seus conteúdos
conteúdos ee objetivos”.
objetivos”.
54|
54| junot
junot cornélio
cornélio matos
matos

grande parte, influenciada pelo trabalho que os professores de filosofia realizarão nas
escolas.
A questão do retorno obrigatório da Filosofia como componente obrigatório do
Ensino Médio levanta inúmeras polêmicas embora exista consenso quanto à sua
importância na formação cultural de adolescentes e jovens no momento em que buscam
respostas fundamentais para as escolhas que deverão fazer na construção de seu projeto de
vida. Tal importância encontra amparo em Navia (2005, p. 277-278) quando ressalta:
[...]
[...] não
não há
há nenhuma
nenhuma outra
outra instância
instância onde
onde se
se reflete
reflete sobre
sobre oo fundamento
fundamento ee os os
limites
limites dodo conhecimento,
conhecimento, tratando
tratando de de gerar
gerar critérios
critérios sobre
sobre aa distinção
distinção entre
entre
conhecimento
conhecimento fundamentado
fundamentado ee não não fundamentado
fundamentado ee de de tirar
tirar fora
fora oo obscurantismo
obscurantismo
ee aa mistificação
mistificação dada ciência;
ciência; não
não háhá outro
outro âmbito
âmbito onde
onde sese reflete
reflete sobre
sobre problemas
problemas
éticos,
éticos, estéticos,
estéticos, antropológicos,
antropológicos, sócio-históricos
sócio-históricos ee culturais,
culturais, procurando
procurando um um
antídoto
antídoto contra
contra oo dogmatismo,
dogmatismo, oo fanatismo
fanatismo ee aa intolerância.
intolerância. Uma
Uma instância,
instância, além
além
disso,
disso, onde
onde sese desenvolve
desenvolve as as capacidades
capacidades dede argumentação
argumentação ee discussão
discussão dede ideias
ideias
explicitamente
explicitamente fundamentadas
fundamentadas ee com com elucidação
elucidação dos dos princípios
princípios supostos
supostos
implicados
implicados como
como modelo
modelo privilegiado
privilegiado de de qualquer
qualquer análise,
análise, elucidação,
elucidação, ee avaliação
avaliação
que
que inclua
inclua princípios
princípios gerais.
gerais.

Uma pergunta que tem ocupado boa parte daqueles que estão empenhados na
pesquisa acerca do ensino de Filosofia diz respeito à especificidade da Filosofia, sua
disciplinarização e ensinabilidade, enquanto componente curricular no ensino médio.
Indaga-se qual o diferencial da filosofia no currículo, “pois a Filosofia enquanto
pensamento crítico e reflexivo tem como característica colocar a si mesma em questão”
(MARCONDES; FRANCO, 2011, p. 7). O que ela - e somente ela - é convocada a fazer no
processo de aprendizagem dos adolescentes e jovens. Possivelmente tal reposta não é de
fácil construção por que, na verdade, parece que não há um papel para a Filosofia, mas
algumas tarefas no conjunto de componentes que constituem a arquitetura curricular do
Ensino Médio. Com isso, está indicado que há problemas especificamente filosóficos a
serem enfrentados e, outros de natureza pedagógica. Nossa meta será a de propor uma
discussão que encare a problemática como filosófica deixando em suspenso questões de
natureza pedagógica. Assim, deveremos considerar que o modelo de formação dos
estudantes das licenciaturas em Filosofia não revela clareza da natureza de um curso de
formação de professores por parte dos docentes responsáveis pelas componentes
curriculares específicas, nem por aqueles que trabalham com as componentes pedagógicas
(sintomas: desarticulação, fragmentação, falta de diálogo) e que, ademais, são
pouquíssimos os filósofos que pesquisam e discutem o Ensino de Filosofia como problema
filosófico. Basta considerar que os temas relativos à Filosofia da Educação e ao Ensino de
Filosofia são cadastrados como subáreas da Educação.
Segundo Mac Dowell (2010, p. 10) o cenário acadêmico atual nos apresenta “as
atividade filosófica reduzida praticamente à interpretação de textos, à discussão do que
disseram ou não disseram diferentes autores.”. Os professores de Filosofia foram formados
em regime disciplinar e estão em sua maioria convencidos que o ensino de filosofia se
justifica pela sua própria historicidade. Regozijam-se na pose de um suposto saber
absoluto, fechado, em seu absoluto solipsismo 44. O autor citado informa que

44 A
A tal
tal respeito
respeito cabe
cabe aa posição
posição de
de Karl
Karl Jaspers
Jaspers que
que transcrevemos
transcrevemos aqui:
aqui: “O
“O que
que éé filosofar?
filosofar? Para
Para aqueles
aqueles que
que
acreditam
acreditam nana ciência,
ciência, um
um saber
saber possível
possível dede se
se possuir,
possuir, oo pior
pior da
da filosofia
filosofia éé que
que ela
ela jamais
jamais fornece
fornece resultados
resultados
apodíticos.
apodíticos. As
As ciências
ciências conquistaram
conquistaram conhecimentos
conhecimentos certos,
certos, que
que se
se impõe
impõe aa todos;
todos; aa filosofia,
filosofia, aa pesar
pesar de
de seus
seus
esforços
esforços milenares,
milenares, jamais
jamais obteve
obteve um
um tal
tal sucesso.
sucesso. ÉÉ incontestável
incontestável que
que em
em Filosofia
Filosofia não
não há
há unanimidade,
unanimidade, no no
estabelecimento
estabelecimento de de um
um saber
saber definitivo.
definitivo. Sempre
Sempre queque um
um conhecimento
conhecimento se se impõe
impõe por
por razões
razões apodíticas,
apodíticas, ele
ele se
se
torna
torna científico
científico ee cessa
cessa de
de ser
ser filosófico,
filosófico, passando
passando aa pertencer
pertencer aa um
um domínio
domínio particular
particular dodo conhecível...
conhecível... A A
palavra
palavra grega
grega philosophos,
philosophos, filósofo,
filósofo, éé formada
formada porpor oposição
oposição aa sophos,
sophos, sábio.
sábio. Ela
Ela designa
designa aquele
aquele queque ama
ama aa
sabedoria
sabedoria ee não
não aquele
aquele que,
que, possuindo
possuindo aa sabedoria,
sabedoria, intitula-se
intitula-se sábio.
sábio. Esse
Esse sentido
sentido persiste
persiste ainda
ainda hoje:
hoje: aa
aa dimensão
dimensão política
política do
do ensino
ensino de
de filosofía
filosofía ee da
da formação
formação docente|
docente| 55
55

O
O professor
professor universitário
universitário está
está continuamente
continuamente ocupado
ocupado comcom mil mil atividades
atividades
prescritas:
prescritas: aulas
aulas aa preparar
preparar ee ministrar,
ministrar, trabalhos
trabalhos aa corrigir,
corrigir, alunos
alunos aa orientar,
orientar,
formulários
formulários aa preencher,
preencher, relatórios
relatórios aa redigir
redigir reuniões
reuniões aa assistir.
assistir. Mais
Mais ainda.
ainda. Ele
Ele
precisa
precisa fazer
fazer conferências,
conferências, participar
participar dede congressos,
congressos, publicar
publicar anualmente
anualmente pelo
pelo
menos
menos umum artigo
artigo significativo,
significativo, para
para obter
obter pontos
pontos em
em vista
vista das
das avaliações
avaliações da
da
CAPES
CAPES ee de de sua
sua própria
própria instituição.
instituição. Sem
Sem produção,
produção, não
não há
há reconhecimento,
reconhecimento, nemnem
promoção.
promoção. (Idem,
(Idem, p.13-14)
p.13-14)

Para concluir que “evidentemente, uma vida filosófica será tanto mais autêntica
quanto mais fecunda. Mas a fecundidade do pensar nada tem a ver com a produtividade
quase mecânica de textos mais ou menos repetitivos e anódinos”. (Ibid, p. 15).Tal
fecundidade, opina, “não se mede pela quantidade das páginas escritas, mas pela qualidade
do pensamento” (Idem).
Para Mac Dowell (2010, p.16) “a pergunta filosófica se situa na tensão entre a
experiência subjacente e o saber explícito; ela é provocada pela distância entre o que já sei
implicitamente e aquilo do qual ainda não tomei posse em um discurso refletido.” Assim,
“todo o processo de compreensão do mundo está fundado nesta experiência radical de seu
ser”. (MAC DOWELL, 2010, p. 16). Como diz Heidegger:
Começamos
Começamos aa filosofar
filosofar quando
quando entramos
entramos emem diálogo
diálogo com
com os
os filósofos.
filósofos. Isto
Isto
implica
implica que
que discutamos
discutamos comcom eles
eles sobre
sobre aquilo
aquilo do
do qual
qual eles
eles falam.
falam. (...)
(...) Uma
Uma coisa
coisa éé
averiguar
averiguar asas opiniões
opiniões dos
dos filósofos.
filósofos. Outra,
Outra, inteiramente
inteiramente diferente,
diferente, éé discutir
discutir com
com
eles
eles oo que
que dizem,
dizem, i.e.
i.e. aquilo
aquilo sobre
sobre que
que eles
eles dizem.
dizem. (HEIDEGGER,
(HEIDEGGER, 1956, 1956, p.31).
p.31).

“A filosofia consiste, pois, na interpretação das estruturas constitutivas da


realidade, tal qual se manifestam nas experiências humanas fundamentais”. (MAC
DOWELL, 2010, p. 16). Ensinar Filosofia tem, portanto, como objetivo, liderar uma
experiência na qual a atitude fundamental desejada seja a de contribuir para que o jovem
considerando às interpretações do pensamento de cada filósofo construa sua própria
posição em relação à verdade das coisas. Na frase lapidar de Tomás de Aquino: “O estudo
de filosofia não consiste em conhecer as opiniões dos filósofos, mas qual seja o verdadeiro
sentido das coisas.”55 Decerto, o esforço para tecer um pensamento próprio tem como
indispensável o diálogo com o legado da tradição. “O discurso racional não pode ser
construído por uma razão desconectada de sua história, que pretenda descobrir por si só o
sentido das coisas...” (Idem, p. 17) pois... “a reflexão sobre a própria experiência já está
condicionada previamente por categorias interpretativas inseridas de longa data na trama
da cultura atual” (Ibidem). O olhar curioso, sacolejado pelas intempéries do tempo convida
a um questionar que não é necessariamente outro, senão que uma forma de ser e sentir em
tempos que se renovam. São por isso, lanças a perscrutarem o além dos fenômenos, vozes
que ecoa para um já que ainda não se deu em sua totalidade. É o que declara Nietzsche no
Prefácio de “Ecce Homo” (n.4): “As palavras mais silenciosas são as que desatam a
tempestade. Pensamentos que chegam com pés de pomba, são os que governam o mundo.”
(NIETZSCHE, 1955, p.1067)66 E Heidegger explica e completa:
A
A Filosofia
Filosofia se
se acha
acha necessariamente
necessariamente fora
fora de
de seu
seu tempo
tempo por
por pertencer
pertencer àquelas
àquelas
poucas
poucas coisas,
coisas, cujo
cujo destino
destino consiste
consiste em
em nunca
nunca poder
poder nem
nem dever
dever encontrar
encontrar
ressonância
ressonância imediata
imediata na
na atualidade.
atualidade. Onde
Onde tal
tal parece
parece ocorrer,
ocorrer, onde
onde uma
uma filosofia
filosofia

essência
essência da
da filosofia
filosofia éé aa busca
busca da da verdade,
verdade, nãonão sua
sua posse,
posse, mesmo
mesmo se se ela
ela trai
trai aa si
si mesma,
mesma, como
como acontece
acontece
frequentemente,
frequentemente, atéaté degenerar-se
degenerar-se em em dogmática,
dogmática, em em um
um saber
saber colocado
colocado emem fórmulas,
fórmulas, definitivo,
definitivo, completo,
completo,
transmissível
transmissível pelo
pelo ensinamento...
ensinamento... FazerFazer filosofia
filosofia éé estar
estar aa caminho.
caminho. Em Em filosofia,
filosofia, as
as questões
questões são
são mais
mais
essenciais
essenciais do
do que
que as
as respostas,
respostas, ee cada
cada resposta
resposta torna-se
torna-se uma
uma nova
nova questão
questão (1965,p.
(1965,p. 138-147)
138-147)
55 Studium
Studium philosophiae
philosophiae nonnon estest ad
ad hoc
hoc quod
quod sciatur
sciatur quid
quid homines
homines senserint,
senserint, sedsed qualiter
qualiter se
se habeat
habeat veritas
veritas
rerum.
rerum. (In
(In De
De Caelo,
Caelo, lib.1
lib.1 l.22
l.22 n.8).
n.8).
66 NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. EcceEcce Homo.
Homo. WieWie manman wird
wird was
was man
man ist.
ist. In:
In: Werke
Werke (ed.
(ed. Karl
Karl Schlechta),
Schlechta),
München:
München: Carl
Carl Hanser
Hanser Verlag,
Verlag, Vol.
Vol. II,
II, 1955.
1955.
56|
56| junot
junot cornélio
cornélio matos
matos

se
se transforma
transforma em em moda,
moda, éé porque
porque ouou nãonão há
há verdadeira
verdadeira filosofia
filosofia ou ou uma
uma
verdadeira
verdadeira filosofia
filosofia foi
foi desvirtuada
desvirtuada ee abusada
abusada segundo
segundo propósitos
propósitos alheios,
alheios, para
para
satisfazer
satisfazer àsàs necessidades
necessidades do do tempo.
tempo. (...)
(...) Todavia,
Todavia, oo que
que éé inútil
inútil pode,
pode, ee com
com
maior
maior razão,
razão, ser
ser uma
uma força.
força. O O que
que desconhece
desconhece todatoda ressonância
ressonância imediata
imediata na na
prática
prática dede todos
todos osos dias,
dias, pode
pode estar
estar em
em profunda
profunda consonância
consonância com com oo queque
propriamente
propriamente acontece
acontece na na história
história de
de um
um povo.
povo. Pode
Pode até
até mesmo
mesmo ser ser aa sua
sua pre-
pre-
sonância
sonância ee prenúncio.
prenúncio. O O queque se
se acha
acha fora
fora do
do tempo,
tempo, terá
terá seu
seu próprio
próprio tempo.
tempo. ÉÉ oo
que
que vale
vale da
da filosofia.
filosofia. EE éé essa
essa aa razão
razão de
de não
não se
se poder
poder estatuir
estatuir dede per
per si
si ee em
em geral
geral
aa tarefa
tarefa da
da filosofia
filosofia e,
e, por
por conseguinte,
conseguinte, também
também oo queque dela
dela se
se deve
deve esperar.
esperar. Cada
Cada
estádio
estádio ee cada
cada princípio
princípio dede seu
seu desenvolvimento
desenvolvimento traz traz consigo
consigo aa sua
sua lei.
lei. Somente
Somente
se
se pode
pode dizer
dizer oo que
que aa filosofia
filosofia não
não pode
pode ser
ser nem
nem prestar.”
prestar.” (HEIDEGGER,
(HEIDEGGER, 1953, 1953,
p.6-7;
p.6-7; 1966,
1966, p.
p. 45-46)
45-46)77

Assinalamos que entendemos, com Mac Dowell (Idem), que


A
A filosofia
filosofia como
como instituição
instituição social
social tem
tem uma
uma missão,
missão, ouou seja,
seja, uma
uma função
função ee
objetivo
objetivo emem nossa
nossa sociedade:
sociedade: exercer
exercer institucionalmente
institucionalmente aa crítica
crítica das
das instituições.
instituições.
Desta
Desta primeira
primeira conclusão
conclusão decorre
decorre uma
uma segunda.
segunda. A A filosofia
filosofia como
como instituição
instituição só

exercerá
exercerá adequadamente
adequadamente aa sua sua função
função social
social àà medida
medida queque oo filosofar,
filosofar, como
como
atividade
atividade pessoal,
pessoal, forfor um
um autêntico
autêntico pensar,
pensar, sem
sem qualquer
qualquer objetivo
objetivo exterior
exterior aa ele
ele
mesmo.
mesmo. A A validade
validade da da filosofia
filosofia como
como instituição
instituição social
social depende
depende paradoxalmente
paradoxalmente
do
do caráter
caráter gratuito
gratuito e, e, neste
neste sentido,
sentido, inútil
inútil do
do pensar,
pensar, que
que não
não tem
tem como
como fim
fim aa
transformação
transformação da da sociedade,
sociedade, nem
nem pretende
pretende justificar
justificar ideias
ideias pré-concebidas,
pré-concebidas, mas mas se
se
entende
entende como
como busca
busca incondicional
incondicional dada verdade
verdade por
por si
si mesma.
mesma. Destarte,
Destarte, sese não
não éé
legítimo
legítimo atribuir
atribuir ao ao pensar
pensar qualquer
qualquer objetivo,
objetivo, nós,
nós, enquanto
enquanto nos nos sentimos
sentimos
chamados
chamados aa ser ser filósofos,
filósofos, recebemos
recebemos certamente
certamente uma uma missão.
missão. QueQue missão?
missão?
Justamente
Justamente aa de de filosofar
filosofar autenticamente.
autenticamente. Para
Para tanto,
tanto, éé mister
mister que
que oo filósofo
filósofo saiba
saiba
resistir
resistir às
às pressões
pressões da da sociedade
sociedade moderna,
moderna, ao ao império
império dada técnica,
técnica, àà injunção
injunção dada
eficácia,
eficácia, abrindo,
abrindo, no no meio
meio de
de suas
suas ocupações,
ocupações, umum espaço
espaço para
para aa meditação,
meditação, para
para oo
pensar
pensar livre
livre ee gratuito.
gratuito.

A própria atitude filosófica é transdisciplinar, vai além dos fenômenos. Reconhece


a incapacidade de um dizer sozinho e um dizer para si. É pela e na atitude filosófica que se
aprende a filosofar. Com isso, é possível dirigir-se à concepção de uma Filosofia como um
conhecimento aberto. Quer dizer, vários filósofos, várias teorias, várias possibilidades
metodológicas de abordagem do mesmo problema. Ou seja, não há uma filosofia; e, parece
não existir, um progresso que aponte para um campo linear do saber. Da mesma forma que
não há uma só pergunta; e, parece não existir, uma verdade única, perene e inquestionável.
Quando nos perguntamos Para quê a Filosofia no Ensino Médio? Nossa opinião é
de que os próprios filósofos dão pouca importância a essa temática e os pedagogos tentam
transformá-la em questão de método e técnica. Entretanto, não há como responder tal
indagação sem compreender que o ensinar é processo, o aprender é processo e, o próprio
filosofar é processo. Em nosso entendimento a mais importante tarefa do filósofo na escola
é colaborar no entendimento da própria escola, temos sistematicamente falado na
construção de uma Filosofia da Escola. Que escola é essa que nós possuímos hoje? Seu
desenho, sua arquitetura física, pedagógica e curricular atende a quem? A que interesses?
Essa escola renascentista ainda joga um papel importante na formação cultural e na
socialização do conhecimento de nossa juventude? Essa discussão parece fundamental e
somente ganhará consistência se realizada num esforço diálogo consistente. Nesse sentido,
parece mais importante a presença do filósofo no esforço de repensamento da escola do quê
propriamente no ensino de uma disciplina. Temos procurado nos desvencilharmos da
armadilha de discutir a pertinência da disciplinarização da Filosofia porque essa parece
uma questão contingente.

77 HEIDEGGER,
HEIDEGGER, Martin.
Martin. Einführung
Einführung in
in die
die Metaphysik.
Metaphysik. Tübingen:
Tübingen: Max
Max Niemeyer,
Niemeyer, 1953
1953 [GA
[GA v.40].
v.40]. [Introdução
[Introdução
àà Metafísica
Metafísica (trad.
(trad. Emmanuel
Emmanuel Carneiro
Carneiro de
de Leão).
Leão). Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Tempo
Tempo Brasileiro,
Brasileiro, 1966.
1966.
aa dimensão
dimensão política
política do
do ensino
ensino de
de filosofía
filosofía ee da
da formação
formação docente|
docente| 57
57

Em nossa franca opinião parece que a educação tornou-se um tema estranho a


filósofos contemporâneos e a academia exercita uma prática de formação docente
descolada dos sistemas de ensino básico. A escola básica está muito distante de nossos bem
formados doutores. A Universidade é uma ilha, a escola uma estranha, quase um mal
necessário. Muitas vezes contentamo-nos em declarar sua falência e sua incapacidade de
responder a desafios hodiernos preservando uma formatação do passado. Entretanto, sem
recolocar a questão da educação, que implica necessariamente formação de gerações de
jovens, parece que fazemos uma filosofia que não indaga uma questão fundamental para a
sociedade. Além disso, é necessário ter em conta que a escola reproduz o projeto histórico e
político da sociedade presente.
Poderíamos perguntar que estudantes de filosofia estão sendo formados para a
docência e com que tipo de filosofias almejamos que as gerações futuras se deparem. Uma
filosofia que forma o discipulado, que empreende um esforço profundo e sofisticado na
formação dos hermeneutas, que se esmera na guarda do importante legado da tradição?
Uma filosofia que consolida escolas de pensamento, adoradores de oráculos. Em que
medida está o nosso compromisso em formar adequadamente os estudantes das
licenciaturas?
Facilmente apresentam-se queixas de docentes e discentes contra aquilo que
consideram um exagero de componentes pedagógicos. Critica-se, também, o pedagogês dos
colegas vinculados aos Centros e/ou Faculdades de Educação. Ocorre que nós nos
desresponsabilizamos de uma tarefa que é, primeiramente, nossa, e delegamos a outrem
aquilo que seria nossa responsabilidade ou que, ao menos, não poderia acontecer sem a
nossa consciente parceria e permanente diálogo. Por seu turno colegas de educação parece
que não dão a mínima para o específico da formação docente do professor de filosofia 88, ou,
então, quando dão, preocupam-se muito intensamente nas suas questões de natureza
pedagógica. É lamentável constatar que há estudantes, ainda no início do curso, fortemente
identificados com rótulos próprios do jargão acadêmico (Kantianos, Heideggerianos,
Nietzscheanos, etc) e aparentemente revoltados com a necessidade de pensar o exercício da
docência em Filosofia desde uma perspectiva pedagógica.
Não poderemos pensar o Ensino da Filosofia no contexto deste século se não
perguntamos que tipo de docente está sendo formado em nossos cursos. Não há
possibilidade de uma contribuição efetiva numa formação transdisciplinar se
continuarmos a não enxergar que o ensino é uma prática social que mobiliza
conhecimentos específicos e pedagógicos. Uma sólida formação filosófica é fundamental
para a atividade docente, mas sozinha não é suficiente. Daí a necessidade de pensá-la
dentro dos propósitos sócio-políticos da educação escolar. Não é esse um convite à
rendição, é um apelo a uma atitude filosófica assumida desde um olhar de educador que
vislumbra uma tarefa na formação de adolescentes e jovens. Assim, somos instados a
superar currículos lineares e monólogos acadêmicos por uma prática transdisciplinar e
dialógica.
Em sua Introdução à metafísica Heidegger (1987, p. 12) escreve:
ÉÉ inteiramente
inteiramente correto
correto ee absolutamente
absolutamente justo
justo dizer
dizer que
que não
não sese pode
pode fazer
fazer coisa
coisa
alguma
alguma com
com filosofia.
filosofia. O
O único
único erro
erro éé acreditar
acreditar que
que com
com essa
essa frase
frase oo julgamento
julgamento dada
filosofia
filosofia tenha
tenha chegado
chegado aoao fim.
fim. Pois
Pois umum pequeno
pequeno epílogo
epílogo emerge,
emerge, sobsob aa forma
forma de
de

88 A
A esse
esse respeito
respeito vale
vale aa nota
nota de
de Gallo
Gallo (2002,
(2002, p.
p. 203):
203): OO ensino
ensino dede filosofia
filosofia não
não pode
pode ser
ser abarcado
abarcado por
por uma
uma
didática
didática geral,
geral, nãonão pode
pode serser equacionado
equacionado unicamente
unicamente como
como uma uma questão
questão pedagógica
pedagógica porque
porque háhá algo
algo dede
específico
específico nana filosofia.
filosofia. Há
Há algo
algo que
que faz
faz com
com que
que aa filosofia
filosofia seja
seja filosofia
filosofia ee não
não ciência,
ciência, ee não
não religião,
religião, ee não
não
opinião,
opinião, ee éé esse
esse algo
algo que
que faz
faz com
com que
que oo ensino
ensino de
de filosofia
filosofia careça
careça também
também de de um
um tratamento
tratamento filosófico,
filosófico, de
de
uma
uma didática
didática específica,
específica, para
para além
além de
de toda
toda ee qualquer
qualquer questão
questão estritamente
estritamente pedagógica.
pedagógica.
58|
58| junot
junot cornélio
cornélio matos
matos

uma
uma outra
outra questão:
questão: se
se não
não se
se pode
pode fazer
fazer coisa
coisa alguma
alguma com
com filosofia,
filosofia, será
será que
que aa
filosofia
filosofia não
não pode
pode fazer
fazer algo
algo naqueles
naqueles que
que com
com ela
ela se
se envolvem?
envolvem?

Refletindo sobre o escrito, Marcondes e Franco (2011, p. 31) reflete sobre a filosofia
expressando que
OO objetivo
objetivo dela
dela não
não éé criar
criar visões
visões de
de mundo
mundo ou ou sistemas
sistemas coerentes
coerentes dentro
dentro dos
dos
quais
quais poderíamos
poderíamos ordenar
ordenar todas
todas as
as coisas,
coisas, mas
mas interrogar
interrogar os
os entes,
entes, deixando-o
deixando-o
falar
falar de
de si
si mesmos.
mesmos. Essa
Essa interrogação,
interrogação, que
que ao
ao invés
invés de
de formular
formular soluções
soluções se
se dispõe
dispõe
aa ouvir
ouvir oo “outro”,
“outro”, altera
altera toda
toda ee qualquer
qualquer relação
relação do
do homem
homem comcom oo mundo.
mundo. ÉÉ nesse
nesse
sentido
sentido que
que se
se pode
pode dizer
dizer que
que aa filosofia
filosofia transforma
transforma aqueles
aqueles que
que com
com elaela se
se
envolvem.
envolvem.

Parece, então, que um desafio que nos é colocado neste século de intensa produção
conhecimento e de elevado enaltecimento das tecnologias será priorizar a pessoa para que
possam viver uma experiência que ultrapasse o íntimo de si: seu intelecto, seus afetos, seus
sentidos, seu ser. Ajudá-lo a pensar com Platão e apesar de Platão. Contribuir para que
entendam que a extemporaneidade de Nietzsche não é a única palavra possível no
contexto em que ele viveu e nem se presta à transposição pura e simples para o
entendimento deste tempo que chamamos hoje. Assumir uma perspectiva de mediador que
busca aprender quando ensina e ensinar quando aprende. Socializar que a pergunta não
esgota o problema e nem o problema se encerra com uma possível resposta. Uma outra
questão pode ser nosso próprio despreparo para sermos professores, uma vez que para atuar
como docente no Ensino Superior a exigência mínima, no caso das universidades, é que
tenhamos mestrado. Entretanto, um curso de Pós-graduação, em tese, nos qualifica para a
pesquisa mas, não necessariamente, para a docência. Porém, quanto a isso recorro a
Cerletti (2003, p.23) quando afirma que
aa incerteza,
incerteza, oo incômodo,
incômodo, aa insatisfação
insatisfação ouou aa impossibilidade
impossibilidade dede dar
dar conta
conta
cabalmente
cabalmente dodo mais
mais básico
básico de
de nossa
nossa atividade,
atividade, longe
longe dede ser
ser um
um obstáculo
obstáculo –– ou,
ou,
talvez,
talvez, precisamente
precisamente por
por sê-lo
sê-lo –– constitui
constitui oo motor
motor dodo filosofar.
filosofar.

O Ensino de Filosofia em sua compulsória presença na escola não pode e não deve
passar sem que nós, educadores e educando no campo da filosofia, nos apercebamos de sua
complexidade, da armadilha que ele pode representar para nós, mas, também, das
possibilidades que ele oportuniza. Entretanto, o trabalho não é somente lá, no terreno
arenoso da escola de ensino fundamental e médio. Ele começa entre nós e nossa
responsabilidade não pode ser delegada para pessoas que contam com boa vontade,
conhecimento e experiência de docência, mas não conta com uma formação específica. Por
isso digo que o desafio é transdisciplinar, requer paciência e esforço de diálogo, requer
disposição para inventar e formatar outro modelo de formação de professores no qual
sejamos parceiros, exige de nós a convicção de que pensar em educação “significa pensar,
necessariamente, no homem e na sociedade, tanto do ponto de vista filosófico como
político” Cerisara (2001, p. 170). Bauman (1999, p. 11) escreveu que “Questionar as
premissas supostamente inquestionáveis do nosso modo de vida é provavelmente o serviço
mais urgente que devemos prestar a nossos companheiros humanos e a nós mesmos”.

referências
BAUMAN,
BAUMAN, Zygmunt.
Zygmunt. Globalização
Globalização –– As
As consequências
consequências humanas.
humanas. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Zahar,
Zahar, 1999
1999
CERLETTI,
CERLETTI, Alejandro
Alejandro A.,
A., Ensino
Ensino dada filosofia
filosofia ee filosofia
filosofia do
do ensino
ensino filosófico.
filosófico. In:
In: GALLO,
GALLO, Silvio
Silvio
et
et al
al (org.)
(org.) Filosofia
Filosofia do
do ensino
ensino de
de Filosofia,
Filosofia, Petrópolis,
Petrópolis, RJ:
RJ: Vozes,
Vozes, 2003.
2003.
CESIARA,
CESIARA, Ana
Ana Beatriz.
Beatriz. Rousseau:
Rousseau: aa educação
educação nana infância.
infância. São
São Paulo:
Paulo: Scipione,
Scipione, 2001.
2001.
DEMO,
DEMO, Pedro.
Pedro. Pobreza
Pobreza Política.
Política. Campinas:
Campinas: Autores
Autores Associados,
Associados, 1996.
1996.
aa dimensão
dimensão política
política do
do ensino
ensino de
de filosofía
filosofía ee da
da formação
formação docente|
docente| 59
59

FREIRE,
FREIRE, Paulo.
Paulo. Pedagogia
Pedagogia da da Autonomia:
Autonomia: saberes
saberes necessários
necessários àà prática
prática educativa.
educativa. 2929 ed.
ed. São
São Paulo:
Paulo: Paz
Paz
ee Terra.
Terra. 2004.
2004.
______.
______. Pedagogia
Pedagogia do do Oprimido.
Oprimido. 35. 35. ed.
ed. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Paz
Paz ee Terra,
Terra, 2005.
2005.
GALLO,
GALLO, Sílvio.
Sílvio. Filosofia
Filosofia no no Ensino
Ensino Médio:
Médio: em em busca
busca de de umum mapamapa conceitual.
conceitual. In:In: FÁVERO,
FÁVERO,
Altair
Altair A.A. et
et al.
al. (org).
(org). UmUm olhar
olhar sobre
sobre oo ensino
ensino de
de filosofia.
filosofia. Ijuí:
Ijuí: Editora
Editora Unijuí,
Unijuí, 2002.
2002.
GIARETA,
GIARETA, Fioravante;
Fioravante; VIZIVALI,
VIZIVALI, Paulo; Paulo; MENEGHEL,
MENEGHEL, Stela Stela M. M. A A dimensão
dimensão política
política na
na prática
prática
pedagógica
pedagógica da da formação
formação de de professores
professores no no ensino
ensino superior.
superior. Disponível
Disponível em: em:
http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2008/anais/pdf/763_653.pdf
http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2008/anais/pdf/763_653.pdf Consultado
Consultado
em:
em: 17/04/2016.
17/04/2016.
HEIDEGGER,
HEIDEGGER, Martin. Martin. Was Was ist ist das
das –– die
die Philosophie?.
Philosophie?. Pfullingen:
Pfullingen: Neske,
Neske, 1956
1956 [GA
[GA v.11].Que
v.11].Que éé isto
isto ––
[A
[A Filosofia?
Filosofia? Identidade
Identidade ee Diferença].
Diferença]. Tradução
Tradução ee notas:
notas: Ernildo
Ernildo Stein.
Stein. Petrópolis/RJ:
Petrópolis/RJ:
Vozes,
Vozes, 2009.
2009.
______.
______. Introdução
Introdução àà Metafísica.
Metafísica. Tradução
Tradução de de Emmanuel
Emmanuel Carneiro
Carneiro de de Leão.
Leão. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Tempo
Tempo
Brasileiro,
Brasileiro, 1987.
1987.
_____.
_____. Einführung
Einführung in in die
die Metaphysik.
Metaphysik. Tübingen:
Tübingen: Max Max Niemeyer,
Niemeyer, 1953 1953 [GA
[GA v.40].
v.40]. [Introdução
[Introdução àà
Metafísica
Metafísica (trad.
(trad. Emmanuel
Emmanuel Carneiro
Carneiro de de Leão)].
Leão)]. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Tempo
Tempo Brasileiro,
Brasileiro, 1966.
1966.
JASPERS,
JASPERS, Karl. Karl. Introdução
Introdução ao ao Pensamento
Pensamento Filosófico.
Filosófico. Tradução
Tradução de de Leônidas
Leônidas Hegenberg
Hegenberg ee Octanny
Octanny
Silveira
Silveira dada Mota.
Mota. São
São Paulo:
Paulo: Cultrix,
Cultrix, 1965.
1965.
MAC
MAC DOWELL,
DOWELL, João João Augusto
Augusto A. A. A. A. A A Missão
Missão da da Filosofia
Filosofia hoje.hoje. Sapere
Sapere Aude.
Aude. Belo
Belo
Horizonte/MG,
Horizonte/MG, v.1, v.1, n.1,
n.1, p.10-29,
p.10-29, 1º1º sem.
sem. 2010.
2010.
MARCONDES,
MARCONDES, Danilo; Danilo; FRANCO,
FRANCO, Irley. Irley. A A Filosofia:
Filosofia: oo que
que é?é? Para
Para que
que serve?.
serve?. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Zahar,
Zahar, PUC/Rio,
PUC/Rio, 2011. 2011.
MORAES,
MORAES, Maria Maria Cândida.
Cândida. O O Paradigma
Paradigma Educacional
Educacional Emergente.
Emergente. 11. 11. ed.
ed. Campinas:
Campinas: Papirus,
Papirus, 2005.
2005.
NAVIA,
NAVIA, Ricardo.
Ricardo. O O ensino
ensino médio
médio de de filosofia
filosofia nasnas presentes
presentes condições
condições culturais
culturais ee sociais
sociais de
de nossos
nossos
países.
países. In:
In: RIBAS,
RIBAS, Maria
Maria AliceAlice (org).
(org). Filosofia
Filosofia ee ensino:
ensino: aa filosofia
filosofia nana escola.
escola. Ijuí:
Ijuí: Unijuí,
Unijuí, 2005,
2005,
p.
p. 278-290.
278-290.
MAC
MAC DOWELL,
DOWELL, João João Augusto
Augusto A. A. A. A. A A Missão
Missão da da Filosofia
Filosofia hoje.hoje. Sapere
Sapere Aude.
Aude. Belo
Belo
Horizonte/MG.
Horizonte/MG. v.1 v.1 -- n.1
n.1 1º
1º sem.
sem. 2010
2010 p.10-
p.10- 29.
29.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.Friedrich. Ecce
Ecce Homo.
Homo. Wie
Wie man man wird
wird was
was man
man ist.
ist. Vol.
Vol. IIII [Ecce
[Ecce Homo.
Homo. Como
Como cheguei
cheguei
aa ser
ser oo que
que sou]
sou] Tradução
Tradução de de Lourival
Lourival de de Queiroz
Queiroz Henkel.
Henkel. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Edições
Edições dede Ouro,
Ouro,
1955.
1955.
PELLOSO,
PELLOSO, Gelamo,Gelamo, Rodrigo.
Rodrigo. O O Ensino
Ensino de de Filosofia
Filosofia nono Brasil:
Brasil: umum breve
breve olhar
olhar sobre
sobre algumas
algumas dasdas
principais
principais tendências
tendências no no debate
debate entre
entre os os anos
anos de de 1934
1934 aa 2008.
2008. Educação
Educação ee Filosofia.
Filosofia.
Uberlândia/MG,
Uberlândia/MG, v. v. 24,
24, nº
nº 48.
48. p.
p. 331-350,
331-350, Julho/Dezembro
Julho/Dezembro 2010. 2010.
SILVA, Franklin
SILVA, Franklin L. L. Currículo
Currículo ee formação:
formação: oo ensino
ensino da da filosofia.
filosofia. Revista
Revista Síntese.
Síntese. Belo
Belo Horizonte,
Horizonte, v.v.
20, n.63,
20, n.63, p.
p. 797-806,
797-806, out/dez,
out/dez, 1993.1993.
60
60
61
61

ii. nós, os frágeis e


pequenos especiais
62
62
63
63

il bambino di eraclito

giuseppe ferraro11

all’inizio e in principio. infanzia e filosofía

I bambini sono i più vicini all’inizio della vita. Vengono al mondo. Sono dove il
mondo comincia. La storia della filosofia si dice abbia inizio con la ricerca
dell’arché. Il rimando è immediato. L’arché è il principio che sostiene la vita. I
quattro elementi della natura attribuiti ai presocratici lasciano pensare a una funzione
simbolica d’iniziazione: il fuoco purifica, l’acqua lava, l’aria dà respi- ro, la terra nutre. C’è
dunque come un passaggio dalla vita al mondo o, piuttosto, dal mondo alla vita. Una
soglia. Un inizio. Un principio, dove la parola rincorre i suoni della natura per imitarli,
seguendo tracce indecifrabili che portano al mondo in cui la vita ha casa ed esistenza.
Arché è anche “ingresso”. Si dice così “architrave” quella che regge la casa e fa da porta,
con fregi che narrano il racconto del luogo in cui si sta entrando. Parmenide, il
“venerando” del dialogo di Platone, parla della Porta attraversando la quale essere e
pensare devono potersi dire insieme per- ché la Verità si congiunga alla Giustizia che di
quell’ingresso ha la chiave (DK 28 B 1). Nietzsche parlò della “porta carraia” (1976).
Platone dell’uscita dalla caverna. C’è dunque sempre una soglia, un inizio, un principio
dove si parla di filosofia. E i bambini sono all’inizio della vita.
“Là dove comincio arriverò alla fine”, si legge ugualmente in Parmenide (DK 28 B
5) e in Eraclito (DK 22 B 103). Tenere tutt’insieme. Hegel avrebbe detto lo stesso, così
Husserl nelle sue Idee (2002). L’ “eterno ritorno” ne è la cifra ricorrente, si ritrova a ogni
passo del cammino della filosofia. Sarà come non perdere l’inizio, il principio, l’origine. E
alla fine ricominciare. Non sarà semplicemente una dottrina del tempo, ma un compito,
un esercizio, su come pensare il tempo proprio e della vita intera che ritorna ogni volta. Il
ritorno è l’inizio, a ogni nuovo incontro si ritorna all’inizio della vita. Improvviso come il
volto dell’altro che non conosci e quello del bambino che viene al mondo. L’improvviso fu
l’istante del tempo di Platone, exaifnes, il bordo del tempo che appare e scompare, come il
lampo, velocità della luce che supera la barriera del tempo e lo mette in movimento
sfuggendo al suo dispiegamento (Platone, Parm. 156d). L’improvviso, exaifnes, si muove in
entrambe le direzioni della quiete e del movimento, quel che resta e quel che viene, quel
che è stato e quel che, venendo, ritorna. La filosofia insegna un tale intreccio del tempo:
due direzioni opposte che s’incontrano nell’improvviso dell’essere e non più. Anche
quando distinguiamo “passato” e “futuro”, dobbiamo intendere un tale doppio movimento
dell’ “uno”. Il futuro è questa strana espressione che indica un passato remoto (fu) in
participio d’avvenire, indicando quel che racconteremo come passato remoto (fu) del
presente che viviamo adesso. È quando il presente non è raccontabile che manca il suo
futuro. L’incontro vissuto si dà come racconto. Come il bambino che quando ritorna a casa
a chi gli chiede “Cosa hai fatto scuola?” risponde “Niente”, lasciando intendere ciò che
non si dà al racconto e che perciò non resta. Ciò che nasce e ci è caro, l’amore
all’improvviso, è quel che raccontiamo ed è vero nella voce che lo narra nel suo venire al
mondo. Non c’è futuro senza racconto del presente. Quel che ci manca è il racconto. Ci
manca l’incontro con l’altro, con quel che viene, non c’è dell’altro, quando quel che viene
non ci tiene nella cura del momento che che si
si dispiega
dispiega all’improvviso
all’improvviso come una nascita.
Com’è la vita che viene ritornando al mondo. Come il bambino di Eraclito.

11 Università
Università deglli
deglli studi
studi “Federico
“Federico II”
II” di
di Napoli.
Napoli. Email:
Email: ferraro.filosofia@gmail.com
ferraro.filosofia@gmail.com
64|
64| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

L’improvviso sta tra la quiete e il cambiamento, due direzioni, le stesse che rendono
possibile il dialogo e la parola che divide la voce interiore separando lo Stesso e il Sé, quasi
a dire che lo “Stesso” è l’ “Altro” dal quale si ritorna in Sé per essere se stesso. Il
cambiamento è tra il movimento e la quiete, tra la vita e la morte, improvviso è il
cambiamento e la nascita che dice dell’altro che vie- ne e inizia un tempo, una vita che
incontra altre vite, che s’intrecciano in quel legame che è la filia esprime come sapere
(sofia) dell’aver caro, ed è questa la filosofia. Le cose avvengono, nascono, ritornano,
restano, vanno via, si perdono, si raccolgono, ci sono care come un figlio e amore, così
viviamo l’eternità che è come il tempo tutt’insieme, Aion. Eterno è il sentimento del tempo
che sappiamo aver caro. Sub specie aeternitatis, avrebbe detto Spinoza intendendo
l’esistenza stessa, ipsam exisistentia, nel suo valore di verità (Explicatio Definitiones, Pars
Prima), senza “quando, ante et post” (SPINOZA, 2007, Pr. XXXIII, sc. 2, Pars I). Vedere
le cose sub specie aeternitatis. Con i bambini tutto ciò che è saputo è di nuovo conosciuto
come prima non si sapeva di sapere. La verità è così, si viene sempre a sapere e quando è
saputa sfugge al sapere che cerca di trattenerla, viene di nuovo, invocando altro sapere,
non più postumo, e inquisitorio di cause e di tracce, di colpe e accusativo, ma un sapere che
viene, generativo, genitivo di chi viene di nuovo a sapere venendo di nuovo al mondo.
Vedere il mondo con gli occhi di un bambino è vederlo sub specie aeternitatis. Del
mondo possiamo riferire come lo trovammo, bisogna mettersi all’opera per lasciarlo e dire
di come ci cambiò e lo cambiammo. “L’opera d’arte è l’oggetto visto sub specie aeternitatis; e
la vita buona è il mondo visto sub specie aeternitatis. Questa è la connessione tra arte ed
etica”, si legge nei Quaderni di Wittgenstein (1968, dal 7.10.16). Il mondo si cambia
cambiando la propria vita, e quel mondo che non permette di fare della vita propria
un’opera di cambiamento è un mondo ottuso, va cambiato.
La filosofia può spiegare, definendosi come Logica, può interpretare il mondo,
facendosi Ontologia, può cambiarlo e farsi Arte. “I filosofi hanno fin qui solo
diversamente interpretato il mondo”, ora però bisogna cambiare la filosofia perché il
mondo si possa cambiare sotto la specie dell’eternità, sotto la specie della vita che viene al
mondo dandole uno stile d’esistenza proprio di ognuno perché il comune è insieme il
proprio e l’improprio, ciò che è proprio di sé e propriamente d’altri, di ogni altro sé, di chi
venendo al mondo trova un proprio mondo in cui ritornare e farsi opera, come ritorna il
bambino che viene al mondo e ne è l’opera. Come opera è il bambino. Improvvisa. Com’è
l’opera d’arte che viene improvvisa al suo autore che, se vero artista, non potrà mai
riprodurla, copiandola, ma solo generarne un’altra diversa, non uguale, ma nel suo stile.
L’eternità è un bambino che muove il tempo tutt’insieme. Come il bambino di Eraclito.
Vedere le cose sotto la specie dell’eternità è come mirarle nell’ingenuità
dell’infanzia e degli amanti. Bisogna apprenderla l’infanzia o, che è lo stesso, bisogna
imparare ad amare perché il sapere non “avvizzisca nell’aria chiusa della scuola”, perché il
sapere non sia più solo inquisitorio del già saputo, giustificatorio, perdendo così la verità
che cerca invano di mostrare. La filosofia è l’unica espressione di sapere che porta un
sentimento nella sua denominazione, si dice filia, che è insieme amicizia e amore, quel che
si ha caro, filos, il legame più importante, quello che rende tale ogni altro come significante
del legame di vita e mondo. L’opera della filosofia è l’arte di questo legame, il suo stile è
nel taglio della sua tessitura.
La soglia è come un taglio, separa per accostare. La cultura di un paese si può
leggere nel taglio della pietra da costruzione. Si taglia per separare e per ammassare, per
unire in ordine d’architettura. Si taglia per legare. Ogni legame viene da una separazione,
la marca, la mantiene. La filosofia è fatta di passaggi che si rincorrono, uguali, di voce in
voce. Somiglianti, corpo in corpo, perché la somiglianza è questa, l’intrecciarsi della vita
nei corpi che si assomigliano. Sema e soma: il segno e il corpo, si può dire. La parola e la
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 65
65

voce. Sapere a questo modo è incorporare, dire e dare voce. Così come nella voce si dà la
somiglianza familiare del padre e del figlio, della madre e della figlia. Sentire nella voce
dell’altro la propria ci accomuna. La vocazione di una terra è nelle voci di quelli che la
abitano e la vivono.
La voce fu per Aristotele il principio dell’interpretazione, peri ermeneias, di ciò che si
sostiene, perché la voce è espressione dei sentimenti, che tutti e ovunque possono
intendere, esprimendo nella coralità delle diverse note di parole delle lingue la vocazione
della terra intera, di ciò che si sente da dentro la vita e che ognuno può intendere, perché è
il suono il senso di là del segno che nella parola è significato. Quasi che significare, ficcare
dentro il segno scritto che diventa segno, scrigno delle voci che sono passate arando il
linguaggio delle parole che ci avvicinano gli uni agli altri in una sola comunità di vita. Il
senso è il suono della voce che risuona nelle parole che lo significano.
Il sapere della filosofia non è perciò accusativo, è genitivo. Non è il sapere che cosa,
ma il sapere di cosa. Non sapere la cosa che si dice, ma è sapere della cosa che si sente dire.
Il filosofo è come l’artigiano del pensare. C’è come una tradizione orale sotto la sto- ria
scritta della filosofia. Bisogna intendere ancora la portata di quella “filologia della voce”
che Platone chiarisce nel suo Protagora. Quando si dice non di una filologia del testo, che
attribuisce a chi è assente l’autorità dello scritto, la sua attribuzione. Bisogna piuttosto
attribuire a chi legge quel che ritrova nel testo. Bisogna intendersi su questa riflessività:
chi non si legge nel testo che legge, non sta leggendo. Chi non si iscrive in quel che scrive,
non sta scrivendo, non inscrive nella legge del testo. Non testimonia. Chi non si studia in
quel che studia, non sta studiando. Scrivere non “fare”, perché è “stare”. Sulla pagina
bianca lo scritto è come il velo disteso della voce interiore, lasciata, offerta, dimenticata.
Questo “stare” di chi scrive è un legame tra il mondo e la vita.

venire alla filosofia. senza o quasi


Chi insegna raccoglie il silenzio del testo, presta la sua voce confondendo il suo
racconto con quello che l’altro ha lasciato scritto. E dentro una pagina scritta è nascosta
una voce che solo la propria può modulare. Far rivivere. Sentire come mai fu espressa. Ed è
in questo “dentro” dove entrare, stando al suo ingresso, iniziando, comincia il Sé che viene
dall’Altro, comincia il mondo dalla vita. Inizia il proprio mondo dentro quello che ci si fa
intorno. Dentro, vicino, standosi accanto. Fu la lezione di Nietzsche “il nostro starci
accanto”, l’inizio della filosofia come die fröhlische Wissenschaft, “scienza felice”
(NIETZSCHE, 1979). Alla fine è questo legame che occorre imparare. Non si può
insegnare, si può però apprendere. Ogni volta, in filosofia si tratta del dialogo
dell’imparare cose che non si possono insegnare. È questo l’inciampo della sua didattica. Si
può insegnare solo apprendendo, imparando ancora, diversamente quel che si sapeva come
mai si era saputo di sapere. In questo circolo ci si trova “in” filosofia. La verità è “viziata”
dal ripensamento che la rincorre in circolo. La trattiene chi “le tiene dietro”, non chi
afferma di “detenerla”. La verità ci tiene a giro, di voce in voce, in un circolo dialogico. Il
suo “vizio” è l’altro, il dare ascolto, stare insieme, come leggere è scrivere ad alta voce e
scrivere è leggere senza voce. Il vizio di ogni circolo è l’altro che si tiene dentro. È poi
questa la figura del circolo di voci quando si sta insieme in filosofia. Non è facile. Non si
sta uno di fronte all'altro, ma assieme.
Come spiegare tutto questo ai bambini? O come apprenderlo, giusto senza
insegnare? Sarà forse così, bisogna insegnare senza insegnare per apprendere veramente.
Senza o quasi, saranno queste forse le due soglie dello stare all’inizio, della vicinanza,
dell’essere quasi come l’altro senza essere l’altro, come avviene con l’amico. Deleuze
diceva che è l’amico il personaggio della filosofia (DELEUZE; GUATTARI, 2002).
66|
66| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

Bisognerà invertire la prospettiva. Non fare o spiegare o insegnare la filosofia ai


bambini, ma domandarsi che ne è della filosofia quando ne parliamo ai bambini. Non sarà
allora fare filosofia con o tra i bambini. Sarà dello stare in filosofia insieme ai bambini. La
filosofia non si fa. Si è in filosofia. È una condizione. Uno stare. Come scrivere non è un
fare, ma uno stare come in un tempo fuori del tempo, senza tempo, quasi.
Se assistiamo al diffondersi della richiesta della filosofia con i bambini, nelle forme
più diverse di metodi e relazioni, bisogna ammettere che in questione è la filosofia stessa.
La domanda viene-dalla-filosofia, ritorna alla filosofia. Non sarà perciò da trovare modi e
curriculum per adattare alla dimensione dei bambini o perché i bambini imparino prima e
meglio a pensare in forma di competenza. La domanda è che ne è del sapere che
trasmettiamo nella formazione. La domanda verte sull’inclusione, perciò sui legami dello
stare insieme, sul nostro starci accanto. La domanda verte sui sentimenti. Sul cerchio,
sull’insieme, sul come si perimetra la città, sui suoi confini, sull’esclusione e la reclusione.
Sull’appartenere ed essere libero. La domanda è sulla libertà. Che lo si esprima come
cittadinanza, si tratta della relazione. Dello stare insieme. Bisogna perciò rispondere
ancora su quello Xunon, lo stare assieme, che si legge nelle parole incise da Eraclito. Il
pensiero è sull’accogliere, è una domanda di ricevimento della vita. Quando si va ai bambini
ci si pone su questa soglia, ci pone all’ingresso, all’inizio del mondo, prima di essere nel
mondo. Fu durante il colloquio finale che volli tenere per ogni bambina e bambino che
seguivano quel corso alla scuola primaria “Esperimento 20” a Napoli nel 2013. Quando
arrivo il suo turno, le chiesi “allora, Martina, che cosa è stata per te la filosofia?” e lui disse
quelle parole con la voce della tenerezza.
II filosofi,
filosofi, disse
disse Martina,
Martina, sono
sono persone
persone che
che credono.
credono. Confesso
Confesso che che m’irritai
m’irritai aa
sentirlo,
sentirlo, per
per un
un momento,
momento, pensando
pensando cheche sempre
sempre sisi finisce
finisce col
col confondere
confondere lala soglia
soglia
ee ci
ci si
si ritrova
ritrova castigati
castigati inin una
una religione.
religione. Le
Le chiesi
chiesi allora
allora didi spiegarmi.
spiegarmi. EE lei
lei
continuò
continuò dicendo
dicendo che
che “quando
“quando tutu hai
hai un
un pensiero
pensiero oo parli
parli didi qualcosa,
qualcosa, loro,
loro, ii
filosofi,
filosofi, ti
ti credono,
credono, ee titi di-
di- cono
cono “racconta””.
“racconta””. MiMi ritrovai
ritrovai insieme
insieme “credere”
“credere” ee
“raccontare”,
“raccontare”, nonnon credere
credere didi sapere,
sapere, ma
ma saper
saper credere,
credere, stabilendo
stabilendo unun rapporto
rapporto del
del
tutto
tutto inatteso
inatteso tra
tra essere
essere ee pensare.
pensare.

Ogni filosofia è un racconto. Husserl diceva in Erste Philosphie (2007), che ogni
filosofia è un poema, una Dichtung, lasciando pensare anche a una legatura, una cornice, un
raccordo, un tenere insieme. Ogni filosofia è racconto. Le cose vere si possono solo
raccontare. Non hanno definizione. Anche l’amore vero si può solo raccontare, si può dare
una definizione solo quando non si ha o si è perduto e mai avuto. Vale per ogni cosa vera,
anche per la libertà, si sa darne una definizione quando non si ha o si è perduta, quando si
è liberi, si può solo raccontarla. Anche un’esperienza didattica si può dire riuscita solo
quando si può raccontare, diversamente non resta, non ritorna. Il bambino che rientra a
casa da scuola e gli si chiede cosa ha fatto in classe, risponde “niente”, se quello che ha
“imparato” non è raccontabile.
Ai bambini poi si fanno i racconti. I bambini fanno inventare i racconti. I bambini
sono un racconto. È come per il dono. I bambini non hanno nulla da donare. I bambini
sono un dono. Sono loro stessi la condizione del racconto. Si può essere certi che quando
perdiamo l’infanzia, non sappiamo più raccontare. Non sappiamo che cos’è amare.
Ogni volta mi piace usare il filo del racconto. Lo faccio con i più piccoli, perché a
quell’età ognuno ripete quello che ha sentito dire dall’altro con le stesse parole. Allora ecco
il filo. Un gomitolo di spago. Si passa il capo di mano in mano e ogni volta uno continua il
racconto che inizia da un’idea. I bambini riescono a raccontare liberando immagini e trame
sorprendenti, quando il filo passa nella mano di un adulto, il racconto si perde nella
definizione di un inciampo, resta incastrato nelle maglie del quotidiano, precipita.
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 67
67

I bambini sono i più vicini all’inizio della vita, i filosofi si chiedono del principio
del mondo. La domanda è sul venire-al-mondo e sull’essere-nel-mondo. Il cruccio della
filosofia è coniugare insieme l’essere e il divenire.

venire-al-mondo, essere-nel-mondo
L’essere-nel-mondo, in der-Welt-sein, è l’immagine di pensiero che ha dominato
lungo il secolo scorso come espressione dell’ontologia fondamentale di Heidegger. Se solo
si ripensa alla condizione dell’infanzia, posta prima del linguaggio, l’esserci, il Dasein, vale a
dire l’esistenza, cambia prospettiva. Essere qui di un bambino non è l’essere “gettato” nel
mondo, che Heidegger (1991) indica come condizione d’esistenza quotidiana. Un bambino
non è “gettato”, “viene” al mondo, è come “donato”. Viene. Un bambino è nel mondo
come venuto. È perciò ancora più sconcertante pensa- re all’infanzia negata, quando un
bambino è abbandonato, usato, scambiato, denutrito, rinchiuso in un campo di profughi o
d’immigranti. È la vita che è negata, cacciata via dal mondo. Il pensiero del rapporto tra
mondo e infanzia impone la domanda sul mondo e sulla vita, di come si legano, di come si
mantiene la vita nel mondo.
Se ogni legame dice di una separazione, bisogna intendere come si tiene. Se ogni
legame mantiene una separazione, bisogna intendere come “manutere” la relazione, come
tenere per mano un bambino, come tenersi nella sua mano. Un bambino non un “ente”,
sfugge alla terminologia filosofica della scolastica moderna. Un bambino è “prima
dell’essere”. Ai margini del mondo, pone la domanda sul governo del mondo, su come si
costruisce e come va l’essere nel mondo. Sarà forse da ripensare quell’immagine di
pensiero di Eraclito che riflette il bambino che governa giocando il tempo che ritorna?
Heidegger (1997) ci ha lasciato un’altra immagine di pensiero, l’Ereignis, l’evento.
Fu una “svolta”, Kehre, dall’ontologia fondamentale all’essere in cammino nel linguaggio,
in ascolto. L’Ereignis è come opposto alla condizione del Da-sein. Non è l’essere qui,
nemmeno è però “l’andare via di qui” richiamato nel Teeteto di Platone. Piuttosto è il
“viandare” come nell’immagine poetica di Hölderlin o di Nietzsche. Un cammino d’attesa.
Essere in ascolto è porsi nella dimensione di ciò che viene. L’essere nel mondo si scambia
con l’essere nel linguaggio. Una rete entro la quale si va e si viene, in un rimando di
enunciazioni, d’immagini di pensiero.
Ereignis è una parola che sorprende. Indica una singolarità che ritorna. Viene
immediata la suggestione del rimando al “rinvenire”. È come ritrovare propriamente quel
che si pensava perduto e che non c’è mai stato prima. Un desiderio. Si desidera un
bambino. Si dice così. E forse il bambino è il desiderio che il mondo ha della vita. Il
bambino è desiderato e desidera. È esigente. Pone l’esigenza di aver cura della vita nella
sua fragilità, nella sua innocenza. Nel bene. È l’esigenza della vita.

concatenazioni
È stato Deleuze a parlare del piccolo Hans liberandolo dal teatro dell’inconscio
familiare. Nelle registrazioni dell’Abecedario, Deleuze riprendeva cosi le pagine
dell’Antiedipo:
Finora
Finora si
si èè parlato
parlato di
di desiderio
desiderio in
in modo
modo astratto
astratto perché
perché èè stato
stato isolato
isolato un
un oggetto
oggetto
che
che si
si suppone
suppone essere
essere l’oggetto
l’oggetto del
del desiderio,
desiderio, ee allora
allora si
si può
può dire
dire “desidero
“desidero una
una
donna,
donna, desidero
desidero partire
partire in
in viaggio,
viaggio, desidero
desidero questo
questo oo quello...”.
quello...”. EE noi
noi dicevamo
dicevamo
una
una cosa
cosa davvero
davvero semplice:
semplice: voi
voi non
non desiderate
desiderate mai
mai davvero
davvero qualcuno
qualcuno oo qualcosa.
qualcosa.
Voi
Voi desiderate
desiderate sempre
sempre unun insieme.
insieme. Non
Non èè complicato.
complicato. Desiderare
Desiderare èè costruire
costruire un
un
concatenamento,
concatenamento, costruire
costruire un
un insieme
insieme (DELEUZE,
(DELEUZE, 1997, 1997, “D
“D comme
comme désir”).
désir”).

Dunque insieme. Il desiderio è la costruzione di un insieme. Deleuze sottraeva così


Hans all’isolamento della casa e dell’inconscio familiare. Sottraeva anche il desiderio alla
68|
68| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

richiesta di un oggetto separato, astratto. Deleuze parla del desiderio e del delirio cercando
un rimando che si congiunge nella richiesta di un mondo, della costruzione di un mondo
come il mondo non è. L’esigenza del bambino è l’espressione del desiderio quanto del
“segreto del delirio, che concerne il mondo intero” (DELEUZE, ibid.)
Qualcosa allora “sovviene”, riviene da dentro noi stessi, com’è il ritorno del
desiderio. Non si può separare il desiderio dall’anamnesi, l’epithumia che indica il
“desiderio” letteralmente ciò che viene dall’animo. Platone quando nel suo Filebo parla del
desiderio, lascia pensare al corpo nell’insieme della vita della natura. L’anamnesi diventa
l’espressione di sapere di ciò che non si sapeva di sapere, e che quando si desidera viene
come al ricordo di quel che non si è vissuto, ma che è propriamente ciò che la vita sa di
noi, ciò che la vita saggia di noi stessi, ciò che ci rende, come diceva Nietzsche (1979), un
exsperimentum vitae. Ed è la vita che nel mondo si smarrisce e ogni volta, quasi, sovviene,
rinviene, viene di nuovo al mondo. Il desiderio è come l’altra faccia del ricordo. Il
desiderio è come il ricordo di quel che non è avvenuto in quel che è accaduto. È come
l’evento che non c’è stato. Ed è come l’amore che quando ritorna in un nuovo amore è
come non è stato mai prima ed era già quel che amiamo. Il tempo è proprio, quando passa e
rimane, giace al fondo, non va via, rimane nel ricordo mescolato al desiderio che lo inventa
e rivolta il mondo. Non sarà il tempo dei giorni al calendario, ma quello interiore, dove
avviene quel che non accade. Bisogna pensare al bambino che ciascuno di noi ha dentro
l’animo e rimescola il tempo giocando col mestolo del desiderio per far emergere di nuovo
la vita nel mondo.
L’infante, si dice, è il “non parlante”, chi non ha la parola, così come l’innocente è
chi non ha colpa, chi non fa male, anche se batte i piedi e strilla e stringe i pugni. Non fa
male. Non gli si può fare male. Eppure non è così semplice educare un bambino. Sono
tante le strisce di dolore, lo stridore che si avverte dentro. Un bambino alla sua nascita
porta un sentimento del tutto nuovo, ed è il languore. Qualcosa che non si può definire un
sentimento perché quasi è la sostanza di cui sono fatti i sentimenti. È il tempo, ma co-me
si può dire “tutt’insieme”. Si dice che sia il tempo di un’età, ma è interiore. L’infanzia è
un’età che rimane, com’è una dimensione del tempo, inteso, intenso, confuso, perduto,
perché non si riesce a trattenere se non nel suo racconto, che ogni volta è diverso. Gli
amanti sanno dell’infanzia. Sono infantili. L’infanzia è il desiderio come legame che tiene
insieme i separati. Sarà come diceva Deleuze, che il desiderio è una costruzione di
concatenazioni. Bisogna capire come si costruisce e come si tiene tutto insieme. En panta
dice la più antica espressione della filosofia, tutt’insieme. Può dispiegarsi tutto questo in
relazione? Può l’en panta essere una pratica del desiderio? L’infanzia e la filosofia
s’incontrano su questo tutt’insieme del desiderio della vita nel mondo. Sarà una
disposizione, non un insegnamento, qualcosa che si apprende ma che non si può insegnare
come una materia. È una disposizione. Allora, ecco, il nostro disporci in cerchio nelle ore
di filosofia, in aula. In tanti, senza selezione di gruppo, l’intera classe. Eccoci tutt’insieme,
in cerchio. La filosofia non è una materia, non è un insegnamento che comporti un
curriculum. È una disposizione. Un disporsi insieme. Un’educazione della voce che
risuona nell’imparare a parlare ascoltando. Mi sono chiesto tante volte quale fosse
l’obbligo della filosofia nella scuola dell’obbligo, dagli anni della primaria a seguire lungo
tutto il cammino della vita. L’obbligo è la disposizione, sono i legami, l’educazione ai
sentimenti. Imparare a parlare educando la voce all’ascolto. Non un curriculum, ma una
concatenazione di voci che si rincorrono, un partage de voix, diceva Nancy, una comunità
inconfessabile, che si racconta (2002).
Passarsi la parola allora, passare le voci, sentirle, e dare a ognuna la rilevanza della
concatenazione. Non sarà una più importante dell’altra, ma tutte insieme si rincorrono a
fare racconto del discorso che si sviluppa correndo di qua e di là, come Roland Barthes
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 69
69

diceva del “dis-correre” (BARTHES, 1979). Non solo una suggestione della parola, ma un
passare dalle parti di ognuno, un passarsi le parti, dando ascolto, e non semplicemente
ascoltare, ma dando ascolto, donarlo, perché ognuno possa ascoltare se stesso nell’ascolto
dell’altro. Scopriamo così ogni volta che l’altro è la propria risonanza, che si risuona
dell’ascolto dell’altro. Si deve apprendere, non si può insegnare. Si ritorna sempre
dall’altro quando si dice del ritorno in se stesso. L’altro è lo stesso che si è in sé. L’altro è
anche il nostro inconscio, quel che non sappiamo di sapere e che ci viene incontro quando
ci scopriamo nell’altro. Insieme. Non si può insegnare, si deve però imparare.
Quel giorno, in quella stanza, i bambini erano tanti, più di sessanta, con i loro
grembiuli delle elementari. Cercavamo una parola che dicesse “la verità”. Una parola,
un’immagine, qualcosa. Le voci cominciarono a rincorrersi, alternandosi al silenzio che
frenava le ripetizioni. Là in fondo, come se fosse detto che doveva essere là in fondo,
arrivò quella voce “acqua”. Ne risero tutti. Girammo lo sguardo nella sua direzione e
venne al suo sguardo, i suoi occhi, il suo colore di bambino della Somalia. Disse “acqua”
per dire la verità. Ed è la verità, quella di Talete, quel tutto in uno, en panta, che sta a
principio della vita e del bisogno che la vita ha del desiderio di restare. Con i bambini
arriva sempre lo stupore di sentire nelle loro voci il sapere che ci attraversa la storia della
memoria, quasi che ci sia una tradizione orale della vita che viene al mondo in ogni vita
che prende la parola e fa mondo. Lo perdiamo quel sapere nella sua infanzia, poi capiamo
che tutto quello che apprendiamo lo sapevamo già, ma non sapevamo di saperlo. Mi dicono
così i detenuti nelle carceri quando riscopriamo insieme nell’infanzia l’innocenza della
verità.
Quello stesso giorno, in quell’aula dove c’erano più di sessanta bambini, scopriamo
un sentimento che prima non avevamo. Cercavo il sentire dell’universo intero, in un solo
respiro, ci fu il bambino che disse in un solo respiro “spandimento”. Una parola che non
esisteva per un sentimento che era là che aspettava di essere raccolto in una voce e che non
ho più smesso di sentire.
Non sono i discorsi che devono imparare i bambini, siamo noi che dobbiamo
apprendere dalle loro voci a scomporci per una disciplina dei legami di libertà, dando
ascolto a ciò che sapevamo e che non sapevamo di sapere. Forse è questo l’esercizio del
sapere di non sapere. Forse è questo l’esercizio del “fare sapere”. Non informare, ma fare
sapere insieme, ritrovando quello che non si sa nel sapere che viene dall’altro. Far Far sapere
sapere
insieme, per un sapere saggiante, i legami più importanti.

il mondo trovato e l’io che non si è


“Il mondo è come io lo trovai”, diceva Wittgenstein nel suo Trattato (1968, 5.631),
chiedendosi così dell’ “io” in rapporto al corpo proprio in una posizione privilegiata nel
mondo e “considerare uomini e anima- li, del tutto ingenuamente, come simili e
compagne”. Allora l’ “io” diventa come un confine che separa il mondo e la vita.
Io
Io voglio
voglio riferire
riferire come
come io io trovai
trovai ilil mondo.
mondo. CiòCiò che
che altri
altri al
al mondo
mondo m’abbia
m’abbia detto
detto
sul
sul mondo
mondo èè parte
parte minima
minima ee infima
infima della
della mia
mia esperienza
esperienza deldel mondo.
mondo. Io Io ho ho da
da
giudicare
giudicare ilil mondo,
mondo, da da misurare
misurare le le cose.
cose. L’Io
L’Io filosofico
filosofico èè non
non l’uomo,
l’uomo, non
non ilil corpo
corpo
umano
umano oo l’anima
l’anima umana
umana con con le
le proprietà
proprietà psicologiche,
psicologiche, ma ma ilil soggetto
soggetto metafisico,
metafisico,
ilil limite
limite (non
(non unauna parte)
parte) del
del mondo.
mondo. Il Il corpo
corpo umano
umano però,
però, ilil mio
mio corpo
corpo in in
particolare,
particolare, èè unauna parte
parte del
del mondo
mondo tra tra le
le altre
altre parti
parti del
del mondo,
mondo, tratra animali,
animali,
vegetali,
vegetali, minerali,
minerali, ecc.
ecc. Chi
Chi s’avvede
s’avvede di di ciò
ciò non
non vorrà
vorrà concedere
concedere al al suo
suo corpo,
corpo, oo alal
corpo
corpo umano,
umano, una una posizione
posizione privilegiata
privilegiata nelnel mondo...
mondo... considerare
considerare uomini
uomini ee
animali,
animali, deldel tutto
tutto ingenuamente,
ingenuamente, come come simili
simili ee compagne.
compagne. (WITTGENSTEIN,
(WITTGENSTEIN,
Quaderni
Quaderni 1914-1916
1914-1916 [5.64])
[5.64])
70|
70| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

Il mondo è come io lo trovai. Chi è però quell’io? Non uno o un altro, ma chiunque,
uno e un altro, che dice “io” ed è perciò nel trovarsi. L’io si trova al mondo diviso, l’io
divide il mondo e la vita. Divide il mondo dal mondo. L’io è un divisore. Si trova al
mondo. L’io è nella condizione del trovarsi nel mondo. È qui. “I am here”, “io sono qui”.
“Voi siete qui”, “You are here”, ripetono le mappe stradali, giusto a ricordare che il tu è il
suggerimento dell’io dall’altra parte, da un io che indica come da uno specchio riflesso
dell’io. Tu è quasi l’indice puntato sull’io.
Il bambino passa un tempo abbastanza lungo per arrivare a dir- si io. La mia
nipotina, a furia di sentirselo ripetere, diceva “tu” per indicare se stessa. Diceva “Tu vuole
bere”, e ripeteva “È tuo” per dire di ciò che era suo, in uno scambio di sé, che faceva
confondere chi si vedeva assegnato una proprietà che lei non era disposta a cedere ad
alcuno.
C’è un’intimità della vita che l’Io non conosce. L’intimità è insieme. Non è nella
solitudine. Il “solo” dell’intimità è come lo scrigno del segreto della vita. L’intimità è
comune, tocca il corpo proprio. L’intimità della vita è aperta, è all’aperto, natura. Nel
mondo diventa clandestina, nascosta. La natura non ama nascondersi, siamo noi che la
cancelliamo. Fa scandalo. È ingenua, anche violenta, cambia, ritorna. L’intimità di un
bambino che parla con le cose, con gli animali, stabilisce un passaggio tra intimità e
infanzia. L’invenzione congiunge l’una e l’altra. L’infanzia è l’intimità della vita che non
dice cose che si possono udire senza suscitare il sorriso. Nell’infanzia è forse l’intima
utopia di un mondo così come non è.
“Il mio mondo è il primo e unico”, si legge a principio della pagina riportata dai
Quaderni di Wittgenstein (1968 dal 2.9.1916). Il proprio mondo è quello ingenuo
dell’intimità come dell’utopia. Un mondo senza la storia. Un mondo fuori del mondo.
Ogni volta l’utopia racconta della fine della storia e del mondo così come non è. Bisogna
imparare stando ai confini per capire come venire al mondo e ritrovare la vita.
Bisogna imparare dai confini della città per capire l’intimità. La filosofia è da quelle
parti che prende la parola e ritorna. Sui luoghi d’eccezione, sui confini della città, dove la
voce non ha parola e resta attonita o si spegne in un grido. Là ci sono le scuole d’eccezione,
dove non è possibile svolgere la regolare attività scolastica né si può tenere il locomotore
della didattica sul binario del curriculum. C’è più filosofia nella scuola di Don Milani
(1967; 2014) che in tutte le aule dove “si fa filosofia”. Nei luoghi d’eccezione non si può
tenere il corso normale, non si danno scuole d’eccellenza, si possono però fare scuole
eccezionali, si può fare l’impossibile e scoprire nell’eccezione ciò che permette alla regola
di ritrovare la relazione che la rende virtuosa di cambiamenti, per una formazione
generativa di mondo.
Nelle scuole d’eccezione l’affettività reclama, esige. L’evasione scolastica si misura
dalla censura del desiderio e dell’affettività che la relazione insegnante reclama. La prima
“causa” dell’abbandono scolastico è la valutazione. Arriva come un giudizio. Segue
l’interrogatorio dell’esame o l’andamento del “poteva fare di più”. Arriva all’ultimo banco,
si stabilisce tra le file dei banchi. La filosofia reclama altre condizioni, scompone stanze e
ambienti, rompe le righe dei banchi, reclama legami, voci che s’inseguono e preservano.
Reclama disposizioni. Non un setting formalizzato. Stare in filosofia è esercitarsi al
dialogo, e non come chi parla all’altro che aspetta il proprio turno per prendere la parola,
ma per seguire insieme, cercare scoprendo di sapere già quel che non si sapeva di sapere,
scoprendo che quel sapere era già prima stato come saputo.

ritornare, incontrare
La domanda s’impone da sola: cosa insegniamo ai bambini? che cosa apprendono i
bambini? Cosa e come è scuola? Quale rapporto dobbiamo intendere tra passato presente e
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 71
71

futuro? Non sarà da ripensare il rapporto inverso e dire del futuro-presente-passato? E


cogliere il nesso tra “venire”, “stare”, “passare”? Ancora una volta: qual è l’obbligo della
filosofia nella scuola dell’obbligo?
“Ritornare” e “incontrare”, forse il tempo bisogna pensarlo in questi due momenti,
ma è un altro tempo, non più questo tempo. È quando un attimo rompe le fila della
sequenza lineare, quando un momento sfugge alla fila dei rimandi e prende un’altra via,
verticalizzando in uno slancio d’incontro la sua direzione. Va altrove, oltre. Inizia un altro
tempo, una nuova sequenza che si pone accanto e sopra e al di sotto di quella che continua
lasciando che si perda in fondo alla sua via. È quando incontri qualcuno, un altro, un’altra,
un bambino o chi ti fa sentire di nuovo il sapore dell’infanzia e ricomincia il tempo. Il
ritorno è l’altro. Il ritorno è l’incontro. Non è perciò un tornare indietro, ma un ritornare
dove non si è mai stati e dove la vita ricomincia da capo perché non ha mai smesso di
nascere e divenire.
Nelle metafore che aprono i discorsi di Zarathustra, Nietzsche racconta del
Cammello e del Leone, dopo arriva il Bambino che annuncia l’oltreuomo (NIETZSCHE,
1976). Ed è strano questo inizio dell’oltreuomo che non è “dopo” l’uomo, ma dove la vita
comincia a venire al mondo. Il Bambino non è più animale e non è ancora uomo. Sta sulla
soglia del mondo, porta la vita.
Così non sorprende più ripensare la legge del tempo di Zarathustra: l’Eterno Ritorno
dell’Eguale è la legge non scritta del mondo della vita. A indicare l’Eterno Ritorno
dell’Uguale c’è quel- la parola, che risuona davvero strana a tradurla alla lettera, Wie-
derkunft. Si legge così in quel progetto (Entwurf) riportato nei Nachlassene Fragmente
Frühjahr-Herbst 1881 (11 [41]): “Wiederkunft des Gleichen”. L’espressione è strana, indica il
futuro all’indietro, il futuro di nuovo. Quasi il ritorno del futuro, l’uguale che è già stato,
l’inizio. L’uguale è il prima. Come il primo amore è uguale a ogni nuovo amore che è come
non è mai stato, perché è il primo amore di nuovo. Uguale. Come l’attimo che del tempo è
sempre l’inizio, in ogni tempo. L’infanzia e l’amore si rimandano l’uno all’altro. Chi ama è
infantile, non parla più come chi tiene discorsi, parla con la voce, spoglia l’intimità di ogni
maschera e persona, mantiene l’innocenza e non è più clandestina, sofferta, taciuta.
Quando un bambino parla, dice cose non dette prima, crea espressioni, opera per rimandi
inauditi, scompone l’ordine, come il bambino di Eraclito, che fa scoprire un ordine sotto
l’ordine, come ciò che non si può sapere per causa, perché la verità si viene sempre a
sapere, si racconta sempre dall’inizio e senza causa. E se il sapere della filosofia riguarda la
verità, si viene sempre a sapere con la vita, al suo inizio, ed è il sapere non di ciò che è
avvenuto, ma il sapere che viene.
Nietzsche (1979) quando “spiega” il suo “si deve imparare ad amare”, Man muss
lieben lernen, lo fa in quel modo che appare del tutto strano. Fa riferimento alla melodia. A
una musica mai sentita prima e alla quale ci si deve abituare ospitandola fino al punto di
non poterne fare a meno e riservarle tutta la gratitudine per un dono inatteso. Così
abbiamo imparato ad amare quel che amiamo, conclude. Così abbiamo imparato anche
l’amore. Questo amore che ci donano i bambini quando ci chiedono di ripetere loro sempre
la stessa favola, per sentire la melodia della voce di chi la racconta. E capire dal tono com’è
il sentimento che vi si raccoglie e che aspettano che sia sempre d’amore e gratitudine per la
vita che è nel mondo.
In fondo il dialogo è questo. Non dobbiamo insegnare ai bambini se non quello che
l’infanzia insegna ad ognuno. Quando s’incontra un bambino è come l’eterno ritorno
dell’uguale, l’eterno ritorno della vita al mondo. Ed è questo da imparare. La filosofia non
s’insegna, come ogni cosa che diciamo vera non si può insegnare, ma si deve imparare. In
quel “non potere” dell’insegnare c’è un “dovere” dell’imparare che non è “morale”, perché
72|
72| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

viene dal- l’imperativo che la vita stessa reclama al mondo di essere un mondo pieno di
vita, così come non è.
Quel Wiederkunft des Gleiches di Nietzsche è più vicino di quanto possiamo
immaginare a quel che Eraclito dice del bambino che governa l’aion (DK 22 B 52), il tempo
che, compiuto, ritorna tutt’insieme. Ed è un comando interiore, che viene dalla vita al
mondo, che viene dal bambino all’uomo.
Sovrano, basileus, è il bambino di Eraclito, che nel gesto gioca intimando. Non un
gesto d’intimidazione, ma d’intimazione, proprio dell’intimità della vita che rivolta
sempre di nuovo il mondo.
La filosofia non è una materia che si può insegnare a scuola come le altre. È una
disposizione che rende possibile l’apprendere proprio di ogni altra materia. Saper per tale
amore di sapere, bisognerà però intendere l’amore come il sapere saggiante il legame più
importante. Bisogna saggiare la vita perché sia saputa al mondo e capire quanto il mondo
ne sia sapio. La filosofia non si fa, si sta in filosofia. La domanda riguardare lo stare al
mondo verte sul come, sul sapere come si sta al mondo. Ed è una domanda che riguarda
perciò la stessa filosofia che reclama una tale forma di sapere come modo e stile dello stare
insieme al mondo. La domanda allora è sulla finalità della stessa filosofia, sulla sua
condizione. Bisogna quindi rispondere su che ne è della filosofia quando la si parla ai
bambini, su come cambia e resta, su come ritorna uguale e cambiando nel tempo del
mondo che viviamo. Bisogna rispondere sul tempo della vita. Ogni volta la filosofia
attende di ritornare in figure di relazioni, in gesti di dialogo corale, in partecipazioni di
voci, in concatenazioni di desideri, in costruzione di mondo, in innovazione di vita.
“Ingegnarsi” si dice del trovare ingegno, dell’esprimere una soluzione nuova. Il significato
della parola rimanda anche al vestito nuovo, ingegnarsi è vestirsi di nuovo. La filosofia è
questo vestirsi di nuovo di legami che accolgono la vita al mondo. Questo lasciano
apprendere i bambini dal corso alla scuola primaria “Esperimento 20” a Napoli nel 2013:
Quel
Quel giorno
giorno chiesi
chiesi che
che cosa
cosa ii bambini
bambini devono
devono imparare
imparare dai
dai grandi.
grandi. In
In coro
coro mi
mi
risposero:
risposero: leggere
leggere ee scrivere,
scrivere, attraversare
attraversare la
la strada
strada ee andare
andare in
in biciletta.
biciletta. EE chiesi,
chiesi,
ancora,
ancora, che
che cosa
cosa ii grandi
grandi devono
devono imparare
imparare daidai bambini.
bambini. EE ancora,
ancora, in in quel
quel
rincorrersi
rincorrersi di
di voci,
voci, dissero,
dissero, che
che ii grandi
grandi dai
dai bambini
bambini devono
devono imparare
imparare aa correre
correre ee
giocare.
giocare.
la voce e la parola
Essere nel mondo, In der Welt sein, è essere gettato, diceva Heidegger (1997),
geworfen. Essere nel mondo è uscire dall’infanzia. Conviene capire allora l’essere dell’ “in
fanzia”, quel fan, quel pan, for- se. La derivazione latina porta a for da cui fatus. Indica la
parola senza il dire. Infanzia si dice dell’età in cui non si parla, l’infante è il non parlante,
dando a quell’in il valore avversativo dell’andare incontro ovvero negativo, nel senso di
restare ai margini, al limine del fan. Forfari indica in latino il manifestare senza parola, il
profferire. Il fato è il proferito. La voce del bambino è fuori del fari. Una voce che non
stabilita. Fuori dell’ordine del detto già. La parola profetica fa essere il detto. La voce del
bambino è prima di un tale rapporto tra essere e dire. Il bambino grida e sorride, batte i
piedi, si fa sentire, deve essere capito. Il bambino è fuori del fari, è senza il “fato”.
L’infanzia è senza destino o è al limite del destino, fuori e contro il destino.
Il fan dell'infanzia lascia intendere anche l’ “aperto”, diverso dal “fuori”. “Noli
foras ire”, si legge in Agostino (2010), “in interiore homine habitat veritas”, stabilendo un
diretto rapporto tra la verità e l’abitare. La verità abita dentro l’uomo, nella sua interiorità.
Un bambino non ha la verità del Sé, non si abita. È fuori, non però di quel foras del foro,
della piazza, del si dice. Il bambino è fuori del “si dice”. È questo che sorprende ad ascoltare
la sua voce all’arrivo sulle parole consuete, perché le cambia, le rinnova, stabilisce
concatenazioni di desideri non registrati nel “si dice”. Il bambino è fuori del mondo. Sulla
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 73
73

soglia del mondo. Viene al linguaggio, viene al dire, viene a dirci del linguaggio che
usiamo, dell’essere dell’abitare. Il bambino è senza Sé. È in quell’aperto del “fan”, del
tutto, dell'insieme. Il bambino è “attaccato” al tutto. Non è certo “fanatico”, ma il suo
essere nel “fan” dell'infanzia lo mantiene nell’adesione all'aperto, che solo il sacro può
accogliere e preservare. Sarà come un luogo senza luogo, un abitare senza abitazione,
essere fuori dell'ordinario. Come un corpo nell’anima. Non viceversa. L’interiorità
agostiniana è nel bambino l’intimità della vita. Abitare la vita, sostenere questa verità
dell’abitare, sarà ancora lo stesso di quel Sé di Agostino, quasi. Un Sé senza sé, più vicino
all’insieme.
“In adorabile azzurro” recita il verso di Hölderlin (1986), lasciando intendere un
aperto mondo dove ogni cosa, porta, finestra, campanile, casa si rapporta al tutto della vita.
“Così voglio essere anch’io?”, si legge in quei versi di Hölderlin. È una domanda. La
risposta è immediata: “Sì”. Ed è un abitare diverso, poeticamente abita l’uomo. Misura
senza misura, non c’è misura sulla terra che non sia incommensurabile. Tra il “fan” e lo
“ius” del diritto indicano forse questo rapporto di misura e dismisura, per stare ad una
soglia, non esitante, ma esigente della vita al mondo.
“A pieno merito, quanto poeticamente, abita l'uomo su questa terra”, si legge nei
versi di Hölderlin. Bisogna intenderlo un tale rapporto tra merito e poesia come tra mondo
e vita, sulla soglia dell’ordine e del disordine meritevole, com’è la poesia, com’è il bambino
di Eraclito.
Chi coglie il nesso tra infanzia e filosofia assume anche un tale impegno, quello di
sottrarsi al destino dell’opinione e del fato. Così voglio essere anch’io, dirà quel Sé che non
vuole essere Io. Il bambino non ha un Sé dentro l’Io, ci mette tempo ad arrivare a dirsi
“io”, e quando ci arriva, è nel mondo. Prima il bambino non ha un Sé che sia dentro l’io.
Bisogna allora capire questo Sé. Fin qui si parlato dell’infanzia come età che precede
l’adolescenza e ogni altra fase della crescita definita, destinata all’essere uomo così come è
l’adulto. Tutte le analisi sul bambino sono state condotte come su un oggetto, come un
fenomeno che aveva la sua destinazione. Si tratta ogni volta di capire come si viene al
mondo così com’è e come possa essere diverso e divenire perché non sia non così.
È un’altra la prospettiva d’infanzia e filosofia. Se vogliamo, con la filosofia,
insegnare ai bambini come si diventa adulti, se vogliamo che “imparino a pensare” così
come pensiamo che si debba pensare, al meglio delle potenzialità come sono virtualmente
programmate e fissate, non sapremo mai che cosa può un bambino, che cosa possiamo
apprendere dai bambini, dall’infanzia, dall’averne cura. Fin qui non sappiamo che cosa può
l’infanzia, a questo non sapere è rivolta la filosofia come un rivolgersi su se stessa. La
domanda è che ne è della filosofia quando i bambini sono in filosofia. Com’è allora il
mondo che non c’è. È questo che si perde quando si dice che l’infanzia si perde. Questa
innocenza è un mondo diverso da qui. Si dice che si perde l’infanzia, si ripete che
l’innocenza si perde e colpevoli si diventa. Si può pensare all’inverso, che la colpa si può
perdere e innocenti si può diventare, anzi si deve, ritrovando.
l’infanzia. Bisogna essere tanto più adulti per osare di ritornarci. La maturità si
raggiunge ritrovando l’infanzia. Quello che non si è appreso dall’infanzia non si può
sperare di apprenderlo fino alla fine della vita. Allora ecco, filosofia e infanzia, significa
non spiegare la filosofia ai bambini, ma dispiegare la filosofia nell’infanzia. Pensare alla
filosofia come all’infanzia del sapere.

il tempo e la vita
Arrivo al punto dove comincia la filosofia. Eraclito. Leggo quel frammento: “Aion
pais esti paizon, pisseuon: paidos e basileie” (DK 22B 52) Olof Gigon (1935), nelle sue celebri
Interpretazioni di Eraclito, scrisse che è un frammento “di fronte al quale dobbiamo
74|
74| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

capitolare”. Incomprensibile. Il punto è quell’aion associato al bambino. Giorgio Colli


traduce: “La vita è un fanciullo che gioca, che sposta i pezzi sulla scacchiera: reggimento di
un fanciullo” (2010, p. 188). Il suo commento in appendice è: “Al di là cadono le distinzioni
e le forme, anche quella dell’intimità e dell’unità, tutto si fa lieve e senza scopo, regna
l’eterna gioventù dell’insondabile”. Intimità, unità, eterna gioventù, insondabile. A reggere
la concatenazione di questi passi è la vita, come Colli traduce aion. Intimità e unità sono
dunque forme e distinzioni che cadono di fronte all’eterna gioventù dell’insondabile. Così
è il bambino, di un’eterna gioventù insondabile. Eterna, perché ritorna e per tale permane,
come un tempo fuori del tempo, al suo inizio. E insondabile. Non si capisce, non si può
capire. La vita è così.
L’aion è il tempo compiuto, il ciclo di vita. La traduzione di Colli risale all’uso che
della parola aion si può ricavare da Omero. Aion è il tempo della vita, l’intero tempo della
vita, il tempo tutt’in- sieme. Non scandito, non periodico, ma compiuto. Solido, direbbe
Leopardi. C’è quando c’è la vita, si perde quando la vita è perduta. L’aion è il tempo che si
misura con la fine. Giunto alla fine per ricominciare in un’altra vita, per un nuovo ciclo.
C’è forse da riflettere che l’immagine dell’anima che arriva fino alla metempsicosi di
Platone riflette l’immagine che si ha del tempo. L’eterna ciclicità porta alla trasmigrazione
delle anime. Il tempo lineare porta invece all’immortalità dell’anima individuale.
Nell’immagine della metempsicosi non è però immortale la mia anima, ma l’anima che è
in me, comune, ritorna in altri come la vita ritorna. C’è da pensare che il fascino che il
mondo greco della filosofia suscita in noi è quello di un’infanzia. I Greci furono filosofi
artisti, fecero del sapere un’arte, dichiarava Nietzsche in Verità e menzogna fuori del senso
morale (1998), lasciando intendere una creatività ingenua come quella dell’infanzia, come
loro che credevano agli dei inventandosi favole, racconti e non comandamenti, tranne che
per quel punto, non essere superbi, non dirsi déi di fronte ad altri.
A chiedersi dell’infanzia e della filosofia si finisce sempre nelle pagine degli
aforismi della filosofia all’epoca della tragedia e ai racconti dei dialoghi di Socrate di
Platone.
Aion, dunque, è il fine del tempo di una vita. È il tempo della vita. Non solo quello
di una vita. Eppure la vita si dà in ogni vita. Saranno tanti gli aion e uno solo, perché ogni
vita è la vita nel suo sperimentarsi al mondo esistendo. La finalità. Non si può distinguere
il fine dalla fine. Il fine della vita è anche la sua fine.
Aion è difficile da tradurre, difficile è risalire all’origine della sua enunciazione.
Aristotele lascia intendere che è il ciclo di vita di cui ognuno è stato cinto (De Caelo
279a25). Aion è il tempo tutt’insieme di una vita, come di un ciclo di vita, che richiama
quello celeste, il ciclo degli astri. Aion è un tempo fuori del tempo del mondo. Omero lo
richiama per chi muore in battaglia, come Serpedonte, che perde la vita, la zoe, insieme a
tutto quanto ha vissuto (Il. 16.453). Il fine e la fine si corrispondono, così come nessuno
poteva dirsi felice se non alla fine della propria vita. Bisogna aspettare l’Etica, come sapere
della relazione a sé e agli altri, perché la felicità sia data dalla propria condotta di vita.
Allora il tempo non sarà più solo del ciclo, ma misura del movimento, cronologia e scelta,
sarà kronos e a ogni taglio, a ogni confine, a ogni decisione, a ogni passaggio di mare e di
terra, sarà kairos. Tutto però avviene nell’aion, che è il tempo tutt’insieme, che è la vita.
Aion viene indicato come dio, richiama i riti misterici dell’orfismo, l’iniziazione, lo si fa
incontrare con Dioniso, lo si riferisce anche al Medioriente di Zoroastro, l’inaderente, come
si legge nell’Opus postumum di Kant (1963).
Il frammento di Eraclito ha una propria musicalità, un ritmo. L’aion si accosta al
pais così come il paizon rimanda al pesseuon al gioco della scacchiera. Il pais che gioca,
paizon, al pesseuon, al gioco delle caselle, della scacchiera, spostando un pezzo e un altro su
quel piano di stanze, tra il ciclo del cielo e la scacchiera, pesseuterion, che è propriamente la
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 75
75

scacchiera celeste. Il ciclo di vita si regge nel movimento degli astri che passano e
ritornano, seguendo regole che diventano casuali a ogni nuova nascita, quasi che ogni vita
sia goccia della vita, che cade sulla terra che l’accoglie e se ne confonde.
Deve ancora sorprenderci che i Greci abbiano inteso la paideia in rapporto al pais, al
gioco. Ed è certo ancora sorprendente che il gioco degli scacchi sia attribuito alla cultura
mesopotamica come a quella degli Egizi così come a quella dei Maya e degli Aztechi. Da
un capo all’altro del mondo. Il gioco è insondabile, per quante siano le regole che ne
definiscono il campo, il risultato è sempre alterno, si vince, si perde, si partecipa, si resta
escluso e ci s’inserisce, si resta inclusi, ci si qualifica e squalifica, si ritorna a giocare.
Come può intendere allora l’aion un bambino che gioca? Come può dirsi che il
governo regio è del bambino. Ho chiesto a dei bambini per capire.
Lorenza
Lorenza (12
(12 anni):
anni): “Tutto
“Tutto èè creato
creato nella
nella casualità
casualità com’è
com’è casuale
casuale ilil risultato
risultato di
di un
un
dado
dado gettato,
gettato, ma
ma determiniamo
determiniamo la la nostra
nostra realtà
realtà attraverso
attraverso le le nostre
nostre scelte”.
scelte”.
Annagiulia
Annagiulia (8 (8 anni):
anni): “Il
“Il tempo
tempo del
del bambino
bambino èè ilil tempo
tempo di di tutti,
tutti, perché
perché ognuno
ognuno èè
stato
stato bambino”.
bambino”.
Lucianina
Lucianina (7(7 anni):
anni): “Il
“Il bambino
bambino ha ha tutta
tutta la
la fantasia
fantasia ee la
la creatività,
creatività, possiede”.
possiede”.
Antonio
Antonio (6(6 anni):
anni): “Non
“Non lo lo so”.
so”.

correre e giocare
Platone porta ancora più avanti il richiamo tale da farci intravvedere una
prospettiva importante della paideia, ben lontana dall’idea moderna di “educazione” e di
“pedagogia”.
“Svolgiamo in proposito qualche riflessione. Proviamo a raffigurarci ciascuno di
noi quanti siamo esseri viventi come una marionetta (paignion) costruita dagli déi o per
gioco o per cose serie: questo non lo sappiamo...” (PLATONE, Leggi, I, 644d8-9).
Siamo come tenuti da fili, marionette. Si può essere portati dalla parte della virtù
come dalla parte dei vizi. Appena prima, Platone lascia intendere che l’oscillazione è tra il
bene e il piacere. Di seguito chiede che cosa ne sarebbe se a quelle marionette si desse del
vino fino a farle ubriacare. Sarebbero barcollanti, più inclini all’intensificarsi delle passioni
piuttosto che ai ricordi e alla ponderazione. Aggiunge poi che quelle marionette ubriache
sarebbero come paides, ritornerebbero nella condizione infantile. Ciò che succede anche in
tarda età. Come allora intendere la paideia se non come un continuare a giocare secondo le
regole? Il logismos invocato a misura delle due inclinazioni d’oscillazione fa riflettere che
paideia sia dare regole al gioco.
Platone distingueva così paideia da trofe, e già a quel tempo veniva dato più risalto
d’efficacia di formazione alla seconda. Trofein è istruire, cresce, allevare. Si potrebbe
finanche intendere più vicina a quella che indichiamo con “educazione”. Paideia era
considerata una sorta di educazione culturale. Non è che avesse come fine l’acquisizione di
una competenza. La paideia si riferiva piuttosto al raggiungimento della virtù di essere
cittadino esemplare. In fondo è questo che è implicato nell’esercizio di portare la filosofia
nelle scuole fin dal primo grado. Ricavare, cioè, proprio dall’infanzia il valore della
cittadinanza. Non suoni come un paradosso, ma solo non perdendo l’infanzia si può essere
cittadini esemplari, perché si mantiene quel che l’infanzia ha di più prezioso: il desiderio
della vita ad essere nel mondo. Così, l’essere che perde la sua infanzia finisce con ritrovarsi
come un semplice ente, presente alla disponibilità del mercato. Il fine della paideia si
precisa allora non come istruzione, perché il fine è piuttosto suscitare il desiderio,
epitumeten, insieme all’innamoramento, erasten, di diventare cittadino, politen, completo,
teleon, a condurre, archein, e a condursi, archestai, acquisendo un sapere, epitamenon, con
giustizia, meta dikes. (PLATONE. Leggi, 643d).
76|
76| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

la democrazia che insegna


Proviamo a intendere meglio: incontrare i bambini in filosofia significa condurre
una paideia, che non ha significato di una materia o di un insegnamento accanto ad altri,
perché è piuttosto portare ogni altro sapere, come ogni altro insegnamento, nell’orizzonte
dell’essere politen teleion, cittadini diciamo ora, persone che vivono insieme, nella polis,
nella comunità sociale. Il punto è che la comunità sociale dei cittadini, diciamo pure la
democrazia, diventa il “metodo” ovvero la condizione, l’orizzonte, entro il quale è
possibile apprendere ogni altro insegnamento che, se posto fuori da un tale orizzonte,
diventa semplice competenza, istruzione di merito che non conduce se non al contrasto,
alla selezione, alla meritocrazia, senza comunità sociale, senza partecipazione corale. Il
fatto è che la democrazia non s’insegna, ma rende possibile ogni insegnamento al fine di
una comunità sociale e perciò di una società comune. Questo principio resta al fondo della
stessa idea di Comunità Europea, è nella sua tradizione, e non può essere tradito. La
filosofia non s’insegna se non come disposizione che rende insegnabile ogni altro
insegnamento. Sta dunque al fondo dell’insegnare.
Ogni insegnante pratica la filosofia quando suscita il desiderio di apprendere quel
che sa come ciò che è dentro chi le rivolge lo sguardo d’ammirazione e viene a sapere quel
che apprendendo riconoscerà come già saputo, da un altro, da un’altra, dall’insegnante
stessa che sta insegnando con ammirazione e che restituisce il proprio sapere come
propriamente dell’altro che l’apprende.
È questo il gioco del paidein, così vicino al paizein. Sono queste le regole che rendono
possibile non perdere l’infanzia, continuare a correre, a discorrere e giocare, perché stare
insieme, xunon, e ritornare a incontrarsi è il gioco più bello dell’apprendere e del sapere per
essere politen teleion, persone che vivono in completa partecipazione della comunità sociale
che il mondo è chiamato a rappresentare per la vita, perché nel mondo non ci si trovi
semplicemente gettati.
La democrazia non s’insegna, ma insegna a come apprendere il sapere perché riporti
in ogni formazione di professione la virtù della partecipazione di voci di una comunità
sociale e di una società comune. Il fine è politico, riguarda le cose che si riferiscono ai
molti tutt’insieme, uguali nella singolarità della loro differenza com’è uguale quel che
ritorna eternamente in ogni nuovo incontro e in ogni voce di bambino.
Dire “filosofia con i bambini” o come si voglia tenere insieme bambini e filosofia,
significa tradurre in altra lingua quel che resta nella parola greca paideia, che è piuttosto
dare regole al gioco senza perdere l’infanzia. Sarà come la via dell’infanzia alla vita.
Intimità e insieme vi corrispondono. Penso ancora a quelle voci di quando domandai che
cosa i grandi devono imparare dai bambini, dicevano: a correre e giocare.
Bisogna dare regole al gioco, senza smettere di giocare e rincorrersi di voce in voce,
per un dialogo corale. Questo abbiamo imparato della filosofia, ed è questo che si dà nella
sua pratica quando si sta in filosofia con i bambini. La filosofia non sarà una materia
accanto a un’altra, non sarà un insegnamento insieme ad altri, sarà piuttosto ciò che è da
imparare come condizione stessa dell’insegnare. Non ci sarà perciò un curriculum da
stabilire, percorsi e canoni uguali per tutti. Già chi insegna non opera allo stesso modo di
un altro. La relazione dell’insegnante è un corpo a corpo, qualcuno, un adulto, una maestra,
un maestro insieme a tanti che diventeranno adulti, bambine e bambini. Ciascuno dà
all’altro ciò che è diventato ed è e che diventa nuovamente a ogni nuovo incontro in un
rincorrersi di voci. Nessuno dirà cosa più importante di un altro, ciascuno è dentro il gioco
dell’aion con la sua voce, perché il ciclo scolastico è un ciclo di vita nella vita. Una paideia,
un dare regole al gioco che non smarrisca la sorpresa della vita che continua a
meravigliarci come un bambino. L’aion indica il tempo tutt’insieme. Il prefisso ai si ritrova
nell’exaifnes, l’improvviso, come si presenta il tempo tutt’insieme in un lampo, nella luce,
ilil bambino
bambino di
di eraclito
eraclito || 77
77

nel viso di un bambino che viene al mondo e di chi s’incontra nella vita. Levinas ripeteva
che l’altro è più vicino di ogni io a dio (1971, p. 168 sg.). Il bambino è l’altro in un lampo di
vita, com’è un’apparizione chi si ama. Non un’apparenza, un’apparizione.

la verità della vita


Ricordo la frase di quell’uomo detenuto, adulto, ergastolano, recluso in regole senza
gioco. Disse di qualcuno che era una “bella persona” e non perché era lui a dirlo, ma perché
è la verità della vita a dirlo. Rimasi sorpreso, e resto ancora in quella sorpresa a ricordarlo.
C’è dunque una verità della vita ed è quella che fa dire delle cose belle di una bella persona,
ma come di un bambino, di un giorno felice, della gioia d’esistere. La verità della vita fa
dire cose belle. Il bambino di Eraclito è la verità della vita. 22

riferimenti
AGOSTINO.
AGOSTINO. Le Le confessioni.
confessioni. Roma:
Roma: Newton
Newton Compton,
Compton, 2010. 2010.
BARTHES,
BARTHES, Roland.
Roland. Frammenti
Frammenti di di un
un discorso
discorso amoroso.
amoroso. Torino:
Torino: Enaudi,
Enaudi, 1979.
1979.
COLLI,
COLLI, Giorgo.
Giorgo. LaLa sapienza
sapienza greca.
greca. III
III Eraclito.
Eraclito. Milano:
Milano: Adelphi,
Adelphi, 2010.
2010.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. L´Abécédaire
L´Abécédaire de de Gilles
Gilles Deleuze.Paris:
Deleuze.Paris: Montparnasse,
Montparnasse, 1997.
1997. Vídeo.
Vídeo.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Felix. Felix. Che
Che cos’è
cos’è la
la filosofia.
filosofia. Torino:
Torino: Einaudi,
Einaudi, 2002.
2002.
DON
DON MILANI,
MILANI, Lorenzo.
Lorenzo. Lettera
Lettera aa una
una professoressa,
professoressa, Firenze:
Firenze: Libreria
Libreria Fiorentina
Fiorentina Editrice,
Editrice, 1967.
1967.
________.
________. La
La scuola
scuola della
della disobbedienza,
disobbedienza, Roma:
Roma: Chiare
Chiare Lettere,
Lettere, 2014.
2014.
GIGON,
GIGON, Olof.
Olof. Untersuchungen
Untersuchungen zu zu Heraklit.
Heraklit. Leipzig:
Leipzig: Dieterich,
Dieterich, 1935.
1935.
HEIDEGGER,
HEIDEGGER, Martin.Martin. DerDer Satzt
Satzt vom
vom Grund.
Grund. Frankfurt
Frankfurt a. a. M.:
M.: Vittorio
Vittorio Klostermann,
Klostermann, 1997.
1997.
________.
________. Beiträge
Beiträge zur
zur Philosophie
Philosophie (vom
(vom Ereignis),
Ereignis), Frankfurt
Frankfurt a. a. M:
M: Vittorio
Vittorio Klostermann,
Klostermann, 1994.
1994.
HÖLDERLIN.
HÖLDERLIN. Friedrich.
Friedrich. Poesie.
Poesie. Milano:
Milano: Arnoldo
Arnoldo Mondadori,
Mondadori, 1986.1986.
HUSSERL,
HUSSERL, Edmund.
Edmund. Erste
Erste Philosophie
Philosophie (1923/1924),
(1923/1924), Haag:Haag: Martinus
Martinus Nijhoff,
Nijhoff, 1956.
1956.
________.
________. Filosofia
Filosofia prima.
prima. Teoria
Teoria della
della riduzione
riduzione fenomenologica.
fenomenologica. Saveria
Saveria Mannelli:
Mannelli: Rubbettino,
Rubbettino, 2007.
2007.
KANT,
KANT, Immanuel.
Immanuel. OpusOpus Postumum,
Postumum, trad.trad. it.,
it., aa cura
cura didi V.
V. Mathieu.
Mathieu. Zanichelli:
Zanichelli: Bologna,
Bologna, 1963.
1963.
LEVINAS,
LEVINAS, Emmanuel.
Emmanuel. Totalité
Totalité et
et infini.
infini. Essai
Essai sursur lʼextériorité.
lʼextériorité. Paris:
Paris: Kluwer
Kluwer academic,
academic, 1971.
1971.
NANCY,
NANCY, Jean-Luc.
Jean-Luc. Le Le partage
partage des
des voix.
voix. Paris:
Paris: Galilée,
Galilée, 2002.
2002.

22 Creature
Creature in in filosofia
filosofia Bambino
Bambino èè unauna parola
parola cheche nonnon significa
significa niente.
niente. ÈÈ solo solo un
un suono,
suono, senza
senza senso.
senso. NonNon un un
significazione,
significazione, ma ma una
una lallazione,
lallazione, èè ilil suono
suono deldel lallare,
lallare, del
del la
la la
la la,
la, la
la cantilena
cantilena che che sisi usava
usava per
per addormentare,
addormentare,
ma
ma anche
anche la la vocalizzazione
vocalizzazione del del primo
primo apprendimento
apprendimento del del linguaggio.
linguaggio. L’infanzia.
L’infanzia. Si Si dice
dice allora
allora bambino
bambino
anche
anche per
per chi
chi èè inin quell’età
quell’età dei
dei primi
primi passi
passi deldel linguaggio,
linguaggio, dopo dopo si si dirà
dirà “ragazzo”
“ragazzo” che che indica
indica nell’origine
nell’origine araba
araba
della
della parola
parola ilil corriere.
corriere. Ragazzo
Ragazzo èè ilil bambino
bambino che che corre.
corre. PoiPoi sisi arriva
arriva aa “giovane”
“giovane” che che èè la
la prima
prima categoria
categoria deldel
tempo
tempo socialmente
socialmente riconosciuto,
riconosciuto, giuridico.
giuridico. Bambino
Bambino èè puro puro suono
suono di di voce,
voce, come
come ilil fanciullo
fanciullo di di un
un tempo,
tempo, ilil
pais
pais greco,
greco, ilil puer
puer latino.
latino. Bambino
Bambino èè in in altre
altre lingue
lingue si si dice
dice anche
anche “la “la creatura”.
creatura”. In In portoghe-
portoghe- se, se, l’infanzia
l’infanzia èè
criança.
criança. Nella
Nella lingua
lingua dominante
dominante nell’Italia
nell’Italia del del meridione,
meridione, ii bambinibambini sono sono criature.
criature. La La voce
voce richiama
richiama la la
“creazione”,
“creazione”, le le creature
creature sono
sono lala creazione
creazione che che viene
viene al al mondo.
mondo. EssereEssere in in uno
uno stato
stato di di creaturalità
creaturalità èè più più vicino
vicino
aa quel
quel che
che sisi può
può intendere
intendere con con stare
stare in in filosofia.
filosofia. LaLa filosofia
filosofia non non si si fa,
fa, si
si sta
sta in
in filosofia,
filosofia, ed ed èè l’essere
l’essere in
in uno
uno
stato
stato creaturale.
creaturale. Criança
Criança richiama
richiama ancora
ancora la la traslitterazione
traslitterazione “crianza”
“crianza” che che lascia
lascia intendere
intendere l’educazione
l’educazione nel nel
senso
senso del
del rispetto,
rispetto, “tenere
“tenere crianza”
crianza” èè avere avere rispetto
rispetto della
della vita,
vita, verso
verso le le persone
persone che che s’incontrano
s’incontrano ee cha cha lala
rappresentano
rappresentano nell’ospitalità
nell’ospitalità che
che la la vita
vita reclama
reclama al al mondo.
mondo. Al Al mondo,
mondo, alla alla gente.
gente. “Crianza”
“Crianza” èè un’educazione
un’educazione
che
che non
non si si dà
dà per
per istruzione
istruzione oo formazione,
formazione, ma ma viene
viene dalla
dalla vita
vita stessa
stessa come
come esigenza
esigenza che che s’impone
s’impone senzasenza
permesso.
permesso. Si Si dà.
dà. Criança,
Criança, credenza,
credenza, richiama
richiama ancora
ancora la la memoria,
memoria, la la tradizione,
tradizione, quelquel cheche si
si conserva
conserva del del tempo
tempo
passato
passato nei
nei suoi
suoi racconti,
racconti, nei
nei suoi
suoi miti,
miti, in in quel
quel che
che si
si riferisce
riferisce aa un un luogo
luogo dove
dove si si narra
narra di di particolari
particolari even-
even- ti.
ti.
La
La credenza
credenza èè anche
anche ilil mobile
mobile cheche contiene
contiene le le cose
cose dada conservare
conservare per per quelli
quelli che
che verranno.
verranno. ÈÈ lo lo “stipo”
“stipo” inin cui
cui
“stipare”,
“stipare”, conservare.
conservare. AncoraAncora nella
nella lingua
lingua dominante
dominante l’Italia
l’Italia del
del meridione
meridione si si diceva
diceva “morso
“morso della
della crianza”,
crianza”,
ed
ed era
era quel
quel cheche sisi lascia
lascia del
del cibo
cibo sulla
sulla tavola
tavola per per chi
chi poteva
poteva venire
venire in in seguito.
seguito. “Crianza”
“Crianza” come come infanzia
infanzia ee
“creature”
“creature” come come bambini
bambini intendono
intendono tutto tutto questo
questo insieme.
insieme. Creature
Creature in in filosofia
filosofia non non sarà sarà allora
allora
semplicemente
semplicemente la la lallazione
lallazione deldel “bambino”,
“bambino”, che che varrà
varrà certamente
certamente conservare
conservare nel nel canto,
canto, nella
nella cantilena,
cantilena, nelnel
ritmo
ritmo che
che la
la filosofia
filosofia reclama
reclama alla
alla ricerca
ricerca di di un
un tempo
tempo proprio,
proprio, interiore,
interiore, che che non
non puòpuò essere
essere che
che di di melodia
melodia ee
perciò
perciò rivolto
rivolto all’epimeletica
all’epimeletica comecome ciò ciò che
che concerne
concerne la la cura
cura didi sé,
sé, che
che èè cura
cura del
del proprio
proprio ritmo
ritmo di di respiro
respiro del
del
tempo
tempo cheche si si vive.
vive. “Creature
“Creature in in filosofia”
filosofia” sarà sarà da da intendere
intendere che che la la filosofia
filosofia è, è, nel
nel suo
suo stato,
stato, lala disciplina
disciplina ee
l’esercizio
l’esercizio dell’opera
dell’opera della
della vita,
vita, perché
perché la la vita
vita abbia
abbia uno
uno stile
stile che
che siasia creaturale.
creaturale.
78|
78| giuseppe
giuseppe ferraro
ferraro

NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Così
Così parlò
parlò Zarathustra.
Zarathustra. Milano:
Milano: Adelphi,
Adelphi, 1976.
1976.
________.
________. La
La gaia
gaia scienza.
scienza. Milano:
Milano: Adelphi,
Adelphi, 1979.
1979.
________.
________. Verità
Verità ee menzogna
menzogna fuori
fuori del
del senso
senso morale.
morale. Napoli:
Napoli: Filema,
Filema, 1998.
1998.
PLATONE.
PLATONE. Parmenide,
Parmenide, aa cura
cura di
di F.
F. Ferrari.
Ferrari. Milano:
Milano: Rizzoli,
Rizzoli, 2004.
2004.
SPINOZA,
SPINOZA, Baruch
Baruch de.de. Ética.
Ética. Milano:
Milano: Bompiani,
Bompiani, 2007.
2007.
WITTGENSTEIN,
WITTGENSTEIN, Ludwig. Ludwig. Tractatus
Tractatus logico-philosophicus
logico-philosophicus ee Quaderni
Quaderni 1914-1916.
1914-1916. Torino:
Torino: Einaudi,
Einaudi,
1968.
1968.
79
79

el lenguaje de la norma y los individuos frágiles

carlos skliar11

introducción: cuerpo, perfección y normalidad.

S ólo el cuerpo sabe o puede o intenta eludir el engorro y la prisión de la


normalidad, ese recipiente insulso que propaga su ley hacia las extremidades
de la apariencia, al insistir con su única potencia, su singularidad ejemplar:
ese emblema –austero, reservado, propio- de una belleza imperfecta frente a la obsesiva
pretensión de la perfección impostada.
¿Qué hacer con el cuerpo?: dejarlo allí, donde está, o ir en otra dirección, o darse
cuenta que no hay otra cosa que el cuerpo: mirar, soñar, olfatear, acariciar, pensar, amar,
escribir, doler, tocar, huir, estar, soñar, leer, jugar, hablar, gesticular, imaginar, narrar: ¿hay
algo, por acaso, que se haga fuera del cuerpo, sin el cuerpo, dejando a un lado el cuerpo,
prescindiendo del cuerpo, ignorando el cuerpo?
La política, la rabia, la desazón, la tristeza, el olvido, la memoria, el amor, la poesía,
el prejuicio, la desnudez, el llanto, nuestra soledad: nada hay, nada es, que no sea una
percepción del cuerpo, quitar el cuerpo, poner el cuerpo, entremezclar los cuerpos, mostrar
el cuerpo, sentir el cuerpo, jugarse el pellejo, meter la pata, andar con el pie torcido,
levantarse con la pierna izquierda, no dar el brazo a torcer, el corazón que se sale por la
boca, el alma hecha pedazos, el pecho inflamado, la cabeza erguida, los escalofríos, la
cabeza en otra cosa, perder la cabeza, nunca dar la espalda, dar siempre la espalda.
El cuerpo perfecto no sólo es inexistente, sino que además resulta ofensivo,
inmoral, impúdico, un híbrido entre las máquinas rectas y la sangre deshilvanada. Como
lo ha escrito Jean-Luc Nancy: “Diferentes, los cuerpos son todos algo deformes. Un cuerpo
perfectamente formado es un cuerpo molesto, indiscreto en el mundo de los cuerpos,
inaceptable. Es un diseño, no un cuerpo” (NANCY, 2007, p.16).
El cuerpo perfecto se mira a sí mismo y no tiene nada para decir a no ser: mírenme.
Pero es mejor mirar hacia los cuerpos desencajados, a los que no se sostienen en pie, los
que parecen incómodos, desatinados, desaliñados. Mirarlos con buenos ojos, con mirada
limpia -como lo expresaba Ángel González en su poema Muerte en el olvido (2008) - o,
como decía Nietzsche (1976), con una mirada sin manchas, ni virtuosa ni perezosa, que no
juzga sino que acompaña, habilita, da paso, sin conmiseración ni simulada agonía.
Habría que apreciar una belleza distinta, diferente de los atributos simétricos,
geométricos, y no eludir la conversación con aquellos que más tarde se conocerán con esos
nombres que solo los adultos son capaces de inventar para, enseguida, olvidar: los
jorobados, los paralíticos, los quemados, los mutilados, los leprosos, los ciegos, los tullidos,
los cojos, los tuberculosos, los dementes, los autistas, los deficientes, los incapaces, en fin,
los débiles, los frágiles de cuerpo.
Duele la suposición de que un cuerpo pudiese ser abandonado o apartado o
removido de su espacio y su tiempo por causa de un equívoco absurdo y anti-ético de la
mirada; habría que escuchar las historias de hombres y mujeres y niños y niñas cuya vida
hubo de ser interrumpida por la torpeza infinita del recelo ignorante de otros ojos que se
pretendían astutos y a salvo.

11 CONICET/FLACSO,
CONICET/FLACSO, Argentina.
Argentina. Email:
Email: skliar@flacso.org.ar
skliar@flacso.org.ar
80|
80| carlos
carlos skliar
skliar

Sin embargo, no se trata de la historia de los desparejos famosos, de la vida


entendida como la superación de una dificultad abismal, de la proeza por vencer con
enjundia todo límite, incluso más allá de las fuerzas de este mundo.
La belleza despareja habita en todos los cuerpos, sin privilegios. Es la belleza de este
mundo, una excepción sin excepciones, historias comunes donde lo que ofende es, en
verdad, el privilegio de lo normal, la extrañeza impúdica y el aparente heroísmo, la
sensación de que nadie los dejaría nunca en paz, la incógnita irresoluble por vacía: ¿es
posible una existencia sordo-ciega; es posible vivir entre lobos y apartado de los hombres;
es posible pasarse 18 años dentro de un pozo en cautiverio; es posible andar en cuatro patas,
sin lenguaje; es posible la joroba y las matemáticas; es posible la sordera y la música; la
sordera y la pintura; es posible la filosofía, la poesía y la demencia; es posible la escritura y
el no-ver; es posible la escultura y la anomalía de las manos? ¿Es acaso posible la existencia
de otras vidas, de otros cuerpos, de otras soledades?

1. locura, soledad y encierro.


Juana Castro escribió en el año 2005 un libro de poemas inquietante, titulado Los
cuerpos oscuros; por medio de una escritura que intenta nombrar quizá la más
impronunciable de todas las cosas: la demencia y sus encierros, el encierro y sus
demencias.
Uno de los poemas que componen el libro conmueve especialmente, pues deja al
lector allí donde nunca quisiera estar: al borde mismo del abismo de lo trágico. El poema se
llama Los encerrados22 y es en esa brevedad aguda, en esa descripción acuciante y sin respiro,
donde se puede leer lo que de otro modo sería imposible siquiera imaginar: la voz del
lenguaje de los encerrados, los enclaustrados, los atrancados, los oscurecidos en medio de la
luz del día; esos seres a quienes nadie les habla, esos seres que parecen no hablar con nadie.
Las metáforas sobre las demencias y su encierro –lo sombrío, lo infausto, las
tinieblas, el silencio, el peligro, el ahogo, el abandono, etcétera– nunca alcanzan y
languidecen delante de tanto horror y tanta incapacidad para comprender la radicalidad de
lo singular. Y la duda sobreviene: ¿hay allí una voz? ¿Qué dice? ¿A quién se lo dice? ¿Con
cuáles palabras? ¿Para decirnos algo? ¿Nos lo dice a nosotros?
Se trata de un lenguaje cuya realidad no puede pensarse apenas como deterioro,
pérdida, desvío, patología o desatino. Si así se hiciera, quedaría una sensación apenas de lo
literal, discreta y mezquina. Debería decirse: es un lenguaje incomparable, como todo
lenguaje.
La cuestión reside en comprender cuál es la diferencia entre aquellos cuerpos - y
lenguajes - que son hablados en relación a aquellos cuerpos - y lenguajes - que hablan.
En efecto, hay cuerpos y lenguajes de los cuales se habla y cuerpos y lenguajes que
hablan, que toman la palabra, que se arrogan la virtud del decir. Como si el mundo
estuviese, en efecto, partido en dos: de un lado, los acallados, los que no tienen nada para
decir, ni a quién decirlo; los que no se dirigen a nadie; anónimos que sólo podrían llegar a
tomar la palabra y usar su voz sólo para justificar su presencia y para disculpar su
existencia. Y luego están los que dicen por sí y por otros, los que cubren el mundo de

22“Los
“Los atrancados.
atrancados. Los
Los encerrados
encerrados vivos.
vivos. /Oscurecidos,
/Oscurecidos, aherrojados
aherrojados en en elel último
último cuerpo
cuerpo dede la
la casa,
casa, se
se
consumen
consumen yy hablan
hablan // Corre
Corre la
la muerte
muerte afuera
afuera // Hablan
Hablan concon el
el televisor
televisor yy concon sus
sus muertos
muertos // Olvidan
Olvidan los
los
plazos
plazos del
del futuro
futuro igual
igual que
que olvidan
olvidan hoy
hoy // qué
qué cosas
cosas les
les dolieron
dolieron ayer
ayer tarde
tarde // No
No abren
abren las
las ventanas
ventanas porque
porque nono
entren
entren el
el sol
sol ni
ni los
los ladrones
ladrones // yy el
el cielo
cielo está
está techado
techado dede uralita,
uralita, yy no
no quieren
quieren saber
saber aa cuántos
cuántos años
años // se
se
murieron
murieron su su madre
madre nini su
su padre
padre // Por
Por olvidar,
olvidar, olvidan
olvidan enfadarse,
enfadarse, sese tragan
tragan laslas horas,
horas, el
el caldo,
caldo, las
las pastillas,
pastillas, yy
arrastran
arrastran // su
su nombre
nombre yy sus
sus dos
dos pies
pies como
como un un misterio
misterio // Y
Y leen
leen yy releen,
releen, una
una vez
vez yy otra
otra vez,
vez, tercos
tercos como
como
funambulistas
funambulistas // la la cuenta
cuenta dede la
la luz,
luz, el
el testamento
testamento // lala invitación
invitación de de boda
boda de de una
una sobrina
sobrina nieta”
nieta” (Juana
(Juana
Castro,
Castro, Los
Los cuerpos
cuerpos oscuros.
oscuros. Poesía
Poesía Hiperión,
Hiperión, 2005:
2005: 47).
47).
el
el lenguaje
lenguaje de
de la
la norma
norma yy los
los individuos
individuos frágiles|
frágiles| 81
81

palabras, explicadores de ocasión que justifican vidas propias y ajenas, que todo lo saben y
ocultan con refinada técnica y su lenguaje infecto sus proverbiales ignorancias.
Pero el mundo, a poco que lo escuchemos con atención, no es así.
De hecho acerca del lenguaje de las demencias se ha escrito mucho, pero a partir de
un lenguaje especializado con pretensiones de claridad, el lenguaje arrogante que lo explica
todo, ese lenguaje compuesto a propósito de la distinción entre lo que debería ser lenguaje
y lo que dejaría de serlo. ¿No sería acaso posible que el lenguaje de las demencias pudiese
hablar por sí mismo, en sí mismo, desde sí mismo?
También sobre las experiencias de encierro se ha dicho demasiado. Sin embargo, la
distinción vuelve a ser necesaria: hay cuerpos encerrados de los que se habla desde una
posición de libertad y hay cuerpos encerrados de los que se supone nada podrán pensar al
respecto. ¿Acaso no se toma la palabra al interior del propio encierro? ¿La única posibilidad
de narrar el encierro es esperando la luz de lo exterior? ¿Siempre la civilización procede de
la oscuridad de la caverna y se dirige hacia la claridad del llano?
Esbozo de una idea: se trata, quizá, de un lenguaje y de un cuerpo que no se dirigen
a nosotros sino a un vínculo esencial existente en el espacio tenue y lúcido que permanece
móvil y frágil entre la memoria y el olvido. Un fragmento del poema Los encerrados dice:
“Hablan con el televisor y con sus muertos”.
Hablan, tal vez, a partir del movimiento subrepticio de una luz que se escapa, con el
fragmento de un recuerdo a medias perdido o partido, con el desplazamiento azaroso de las
cosas, con el enigma del misterio, con personas presentes a las que se les otorga otra edad,
otros rostros y otros nombres, en territorios de la infancia donde ya nada ni nadie
permanece, con detalles bordados en el ángulo más pequeño de la mirada.
Hablan, quién lo sabe, con una voz cuya moral se ha abandonado o fatigado o ya
harta de sí misma, con palabras cuya resonancia no está en el lenguaje sino en el oído, a
través de un dolor antiguo que quedó pendiente, con los pies arrastrándose por pasillos sin
desembocadura.
Y cuando por acaso hablan con alguien, se dirigen a alguien en particular, solo
encuentran a cambio desconcierto, indiferencia, quizá la voluntad efímera de la traducción
imposible, el rápido resguardo en la lengua sana, el retiro hacia la normalidad más banal de
la que se dispone.
Una de las voces más limpias y testimoniales en este sentido es la de Alda Merini,
poeta italiana nacida en 1931, quien atravesó varios períodos de internación, silencio y
aislamiento. Uno de sus libros, Clínica del abandono (2008) está compuesto, entre otros
poemas, por aquellos que dictó telefónicamente a sus amigos durante los tiempos de
encierro en una suerte de manicomio carcelario. De ese libro, este poema, La otra verdad:
En
En los
los tiempos
tiempos de
de la
la prisión
prisión inútil
inútil // yo
yo amé
amé aa un
un compañero
compañero míomío // unun pobrecito
pobrecito
sin
sin santidad.
santidad. // Y Y así
así de
de este
este amor
amor infeliz
infeliz // has
has nacido
nacido tú,tú, // flor
flor de
de mi
mi
pensamiento.
pensamiento. // Nadie
Nadie en en el
el manicomio
manicomio ha ha dado
dado jamás
jamás un
un beso
beso // si
si no
no es
es al
al muro
muro
que
que lolo oprimía
oprimía // yy esto
esto quiere
quiere decir
decir que
que la
la santidad
santidad // es
es de
de todos,
todos, // como
como dede todos
todos
es
es el
el amor
amor (MERINI,
(MERINI, 2008,2008, p.
p. 143).
143).

El lenguaje de la demencia dice: tiempos de la prisión inútil; dice: amar en una


prisión inútil; dice: amor infeliz que se ama en medio de una prisión inútil; dice: de todos
es el amor, es decir, de cualquiera y de cada uno.
¿Desear estar solos es ya un primer esbozo de la locura? Pirandello
Pirandello (2010,
(2010, p.
p. 76)
76) lo
lo
ha escrito de este modo:
Yo
Yo quería
quería estar
estar solo
solo de
de una
una manera
manera completamente
completamente insólita,
insólita, nueva.
nueva. Todo
Todo lo
lo
contrario
contrario de
de lo
lo que
que pensáis:
pensáis: es
es decir,
decir, sin
sin mí,
mí, yy al
al mismo
mismo tiempo
tiempo enen un
un entorno
entorno
extraño.
extraño. ¿Os
¿Os parece
parece ya
ya esto
esto un
un primer
primer signo
signo de
de locura?
locura? La
La locura
locura podía
podía ya
ya hablar
hablar
82|
82| carlos
carlos skliar
skliar

en
en mí,
mí, no
no lo
lo niego,
niego, pero
pero osos ruego
ruego que
que creáis
creáis que
que la
la única
única manera
manera de
de estar
estar
verdaderamente
verdaderamente solo
solo es
es esto
esto que
que os
os digo.
digo.

El cuerpo de la poetisa Alda Merini - según una fotografía de la época- está mitad
desnudo, mitad abierto; faldas sucias, zapatos raídos y calcinados por andar a través de
pasillos de descascaradas pinturas, el torso libre, blanco, como si sus pechos enunciaran las
cosas más graves y elementales de la vida: la leche, la nieve, el papel aún sin encender del
tabaco, las páginas donde se inscribirán poemas, los ojos sin furia, el vestido de novia
guardado en un almacén perdido de una remota aldea.
Todo es blanco en Alda, salvo los hombres que se esconden de su mirada y que
temen ser despedazados. Sí, en su italiano: “Appena mi guardi e temi di essere sepezzato”
(“Apenas me miras y temes ser despezado”). .
Alda no siente el frío, es decir, no puede ser sino ardorosa la tertulia de sus palabras
y la vigilia de la partida. Sin embargo, su cuerpo está caduco de antemano, como si la
locura no tuviera contemplación con las mujeres, y azotara con particular ensañamiento la
desnudez de las poetisas.
Hacia donde Alda mira no hay otra cosa que el interior de un edificio arrogante
que, en su soberbia y sus canceles, pretende separar la verdad de la vanidad, la sensatez de
la abundancia, cada hoja sedienta de escritura de todas las convenciones miserables.
La apartaron una y otra vez.
Apartar: ¿de quién es la parte, de quién es la partida? ¿Quién puede excusarse de
tanta veleidad absurda, de tanta normalidad que aprieta los dientes hasta morder la lengua
y decir lo incomprensible?
Alda se queja que nadie en el manicomio quiera besarla y aspira con avidez la
ausencia de vidas ajenas, como si se tragase la hoja del tabaco, lejos de Dios, fuera de toda
fácil cordura. El dolor la embiste y la retiene entre su furia. Agotada, siente que se
derrumba toda y que llora porque es de arcilla, porque es débil. Alda habla con la
desfiguración del tiempo y con el soplo de una vela apagada.
A través de una hendija prepara una fogata alta cada noche de luna para recibir al
mundo y transformarlo en lucidez, desnudez y poesía. La fogata, pues, está encendida,
aunque nadie viene a su encuentro, aunque nadie llega, aunque nadie sabe de la encarnada
y desencarnada sensatez de su espera, en una carretera alejada, muda.
Nadie viene porque ninguno desea la cegadora claridad de una fogata. Quizá porque
el fuego en ascenso, durante las noches de luna clara, es el recuerdo más sombrío de todas
las cenizas reencendidas: ese recuerdo de locura que, en cada uno, en cada una, no quisiera
ser recordado por nadie.

2. el cuerpo solitario, sin héroes ni víctimas.


No es por casualidad sino por padecimiento que Mary Shelley repite con tanta
insistencia la palabra “soledad” en su libro Frankestein, el moderno Prometeo. Y tampoco es
por acaso que Georg Lichtenberg atravesaba los metros que separaban su casa de la
Universidad de Gotinga, sintiendo sobre sus espaldas –allí donde su joroba parecía crecer
día a día- la mirada sucia, impiadosa, de los habitantes de Ober-Ramstadt y apuraba el
paso, un paso corto, diminuto, hasta sentirse a salvo en sus aulas de física y matemáticas,
entre sus estudiantes, que le admiraban incondicionalmente.
En no más de trescientos metros a través de un poblado lleno de supersticiones,
palacios de cristales rotos y el deambular de las ratas, Lichtenberg recorría sin desearlo la
esfera completa de la mirada humana: la burla, el desprecio, el empequeñecimiento, la
sorna, la humillación y la admiración, la pleitesía, la honra, la ingratitud.
el
el lenguaje
lenguaje de
de la
la norma
norma yy los
los individuos
individuos frágiles|
frágiles| 83
83

Era objeto de comentarios jocosos entre los vecinos debido a su apariencia


particular, y padecía el tormento de ser mal mirado, de ser mirado borrosamente, por ojos
que por mal ver, eran ojos asesinos. El matemático escribió en uno de sus tantos
cuadernos: “Allí donde el ojo ve borrosamente, ya hay una especie de muerte”
(LICHTENBERG, 1989, p. 58).
¿Cuál era su pecado fisonómico, la culpa corporal con la que debía cargar y soportar el
escarnio de la gente? El de ser un hombre bajo, sin llegar al enanismo, debido a una rara
enfermedad durante su infancia que atrofió su desarrollo e hizo que su cuerpo quedara
reducido a un metro y medio de altura, dejando como secuela una joroba prominente atrás
de sí, como una sombra persecutoria, una alteridad indiscreta, que siempre acechaba por
encima de los hombros.
Lichtenberg era, al mismo tiempo, de forma indisociable, un hombre enfermo, un
brillante matemático y físico, y un escritor deslumbrante. Todo en él podría reducirse a lo
mínimo y sustancial: las fórmulas acotadas, sintéticas, de la ciencia, su cuerpo abigarrado y
estrecho, y sus aforismos, esa escritura reducida y decisiva como un látigo, como un
relámpago.
Pero la metáfora de lo pequeño resulta tan obvia como indignante. Tampoco habrá
de cometerse el equívoco de la grandeza, esa imagen igualmente torpe del gran hombre
aprisionado en un cuerpo pequeño, su enorme sapiencia dentro de un envase reducido, su
inmensa escritura de manos pequeñas:“Habría que decir ‘soy esto’ –escribió-. No se dice ‘la
redondez está en la esfera’. Es la similitud lo que nos seduce” (ibidem, p. 112).
En su rostro, de frente alta, nariz en punta y labios apretados, la expresión
satisfecha de una soledad voluntariamente elegida, el punto de la esfera donde reside la
patria de los gestos, la patria humana. Porque no es el tamaño de un hombre el que explica
su vida, ni es la joroba lo que la justifica, sino ese rostro que guarda en su semblante todas
las consecuencias de la existencia: sus enfermedades, su amor por la filosofía y los
números, su escritura breve e intensa: “Un rostro no se deja analizar en un instante:
necesita una consecuencia” (ibídem: 93).

3. la insana obsesión por los diferentes.


Nunca es suficiente el ensañamiento con los débiles, los tontos, los imbéciles, los
retrasados: arrojados desde los montes, desheredados, desarropados, abandonados a su
propia suerte y muerte, condenados a un ostracismo, prohibidos del libre albedrío,
excluidos e incluidos como si se tratase de entidades autómatas, jamás absueltos de
sospecha o mala intriga, despojados de sí, angelizados y demonizados.
Nunca es demasiada la sospecha, la injuria, la tontería que impide ver lo humano
más allá de un espejo liso, sin marcas, sin dobleces.
A la desdicha generalizada de normalidad se les añade otra desdicha aún mayor: no
se les deja elegir su propia nostalgia, su propia melancolía, ni su propia carcajada. Se los ve
inútiles, incluso, para la recta esclavitud, la servidumbre dócil, abandonándolos a la pala y
el pico, a la fabricación de objetos repetidos, a la alfabetización siempre inicial, a la insana
postergación de la igualdad.
Los débiles, los tontos, los imbéciles, los retrasados - si algo así existiera, si algo así
pudiera portar esos nombres - son metáforas de un mundo estrecho, absurdo y apurado.
Muestran las brechas, los orificios, por donde el mundo de la soberbia y la jactancia se
derraman y se perforan de hipocresía y espanto.
Metáforas erráticas de la vida falsa, imágenes despintadas de una vida falseada:
nuestra ignorancia es de tal magnitud que de verdad creemos verlos en su oscura
existencia; nuestra torpeza es de tal autoritarismo que de verdad creemos vernos en
nuestra limpia existencia.
84|
84| carlos
carlos skliar
skliar

“Ya no se nombra de este modo a esas personas”, se dice por ahí.


Y el lenguaje, exhausto, responde que es así como todavía se los siente y piensa.
Aún en aquellas historias donde la inteligencia no juega papel alguno, la culpa de los
débiles, los tontos, los imbéciles, los retrasados, es evidente o se hace evidencia.
La culpa, sí, de la fragilidad, de los seres frágiles.
Por ejemplo la que es posible leer en la novela de Philip Roth Némesis (2010) cuya
historia transcurre en el verano de 1944, en la ciudad americana de Newark, cuando una
espantosa epidemia de poliomielitis va dejando su funesta huella entre niños y jóvenes.
Lo que parece ser una enfermedad lejana y ajena, comienza a sentirse próxima y
propia. Nadie, ni siquiera los afamados médicos saben de dónde viene o cómo se esparce:
¿será la comida, los escupitajos de los italianos, la inmundicia de los basurales, el ardor
inclemente del verano? ¿Vendrá de la ciudad más cercana, o serán los judíos, o estará en
medio del sudor de los juegos en los patios de las escuelas?
Némesis es una novela de lenguaje seco y abatido, cuyo protagonista es un maestro
obligado a deambular entre las despedidas a los alumnos muertos, la compasión compasión infinita
infinita
hacia sus padres, el cuidado de aquellos que aún no enfermaron y la necesidad de sostener
con su palabra ese tenue equilibrio entre las sospechas generalizadas, la culpabilización a
granel, y el derroche del egoísmo.
Durante ese verano asfixiante y sepulcral se tuerce el rumbo de la pregunta que
todos allí pronuncian sin tregua. Ya no se trata de: ¿qué causa la polio?, sino más bien:
¿cómo es que se propaga?
En el pueblo vive Horace, un retrasado mental que suele vagar sin sentido por las
calles y que, en ocasiones, pasa por la escuela a ver a los niños jugar,
jugar, sin
sin otra
otra intención
intención que
que
la de quedarse quieto en un cantocanto y,
y, de
de ser
ser posible,
posible, estrecharles
estrecharles las manos. En apariencia
Horace no comprende nada: no comprende qué es el mediodía, qué es el calor, qué la
sombra, qué la enfermedad. Así lo describe Roth:
Pasaba
Pasaba Horace
Horace dede nuevo,
nuevo, sin
sin duda
duda en
en dirección
dirección al
al centro,
centro, sin
sin comprender
comprender queque era
era
sábado
sábado yy que,
que, en
en verano,
verano, las
las instalaciones
instalaciones cerraban
cerraban elel sábado
sábado aa mediodía.
mediodía. No No es-
es-
taba
taba claro
claro que
que comprendiera
comprendiera también
también lolo que
que significaban
significaban “verano”,
“verano”, “centro”,
“centro”,
“cerrado”,
“cerrado”, oo “mediodía”,
“mediodía”, dede lala misma
misma manera
manera que
que elel hecho
hecho de
de que
que no
no caminara
caminara
por
por el
el lado
lado en
en sombra
sombra dede la
la calle
calle probablemente
probablemente significaba
significaba que
que era
era incapaz
incapaz dede
elaborar
elaborar unun pensamiento
pensamiento rudimentario
rudimentario parapara conceptualizar
conceptualizar “sombra”
“sombra” oo siquiera
siquiera
buscarla
buscarla por
por instinto,
instinto, como
como haría
haría un
un perro
perro en
en semejante
semejante díadía (ROTH,
(ROTH, 2010,
2010, p.
p. 50).
50).

Todo el mundo allí está extenuado e histérico, agotado y en tensa vigilia por la
fiereza de la calamidad. El encierro se hace cada día más agobiante y sólo algunos, los más
pequeños, salen a las calles para asistir a la colonia de verano. Todos están a flor de piel y
con la sospecha en la punta de la lengua, como si se tratara de un arma de fuego dispuesta
al gatillo en el centro de la palabra.
En poco tiempo la pregunta vuelve a mutar. Ya no se trata de saber ni qué causa la
polio, ni cómo se propaga, sino quién tiene la culpa de la epidemia.
¿Cómo no acusar, entonces, a Horace, alguien que no conoce el sentido de las
palabras, que expone su cuerpo sin conciencia al calor demencial del mediodía y que ni
siquiera tiene los instintos de un perro? ¿Qué réprobo mejor que un débil para atribuirle la
culpa de haber transmitido la polio por el pueblo? ¿Quién sino Horace, incapaz de defensa,
incapaz de lenguaje, incapaz de todo, puede ser el más perfecto de los culpables? Dice un
joven estudiante:
Él
Él la
la está
está extendiendo
extendiendo (…)
(…) Estoy
Estoy seguro.
seguro. NoNo debería
debería haber
haber perdido
perdido los
los estribos,
estribos, sé
sé que
que ese
ese
hombre
hombre es es un
un retrasado,
retrasado, pero
pero no
no está
está limpio
limpio yy propaga
propaga lala enfermedad.
enfermedad. Va Va de
de un
un lado
lado aa
otro,
otro, la
la baba
baba le
le cae
cae aquí
aquí yy allá,
allá, estrecha
estrecha lala mano
mano de
de todo
todo el
el mundo,
mundo, yy así
así es
es como
como dispersa
dispersa
los
los gérmenes
gérmenes por
por todas
todas partes
partes (ibidem,
(ibidem, p. p. 95).
95).
el
el lenguaje
lenguaje de
de la
la norma
norma yy los
los individuos
individuos frágiles|
frágiles| 85
85

Es Horace quien propaga la epidemia, dice un joven. Y está convencido de ello: su


debilidad y su suciedad son, a su entender, características comunes presentes en los débiles;
es el débil quien va de aquí para allá estrechando las manos de la gente y dispersando los
gérmenes por todas partes. El maestro intenta desestimar esa acusación y convencer al
joven de que nadie sabe cómo se propaga la poliomielitis. Pero las cartas están echadas:
nadie logrará quitar las sombras que se yerguen sobre Horace, nadie quiere pensar mejor o
de otro modo, todos desean que haya un culpable, todos buscan en el indefenso la razón del
mal.
Éste es el culpable: el que no sabe, el que no se da cuenta, el que es inconsciente de
esos actos que provocan más y más tragedia, el sucio, el retrasado, el imbécil, el incapaz. Y
cuando la sospecha recae sobre el frágil, la culpa es aún más perfecta, más incontrastable,
más rotunda aún. Una culpa anudada a un lenguaje falaz - acusador, instigador, nervioso,
deshonesto- que nadie contestará y que, enseguida, se propagará junto a la epidemia de
polio. Y más allá todavía. Más lejos. Durante más tiempo. Sin cura. Sin remedio.

4. la aniquilación del nombre propio.


Los nombres que atribuimos a otros nunca se dirigen a los otros. Los damos, pero
no se los damos. No los ofrecemos: los instalamos como signos debidos en una realidad
indebida. Son nombres que nombran a los demás pero que no los llaman. No los convocan
a venir, sino a quedarse quietos, a permanecer inertes. Ningún nombre ha cambiado
radicalmente una relación. Son términos para usar entre pares y para volver a separar, una
y otra vez, a los supuestos impares.
Esos nombres se usan con vehemencia pero nadie se ensucia las manos ni se
entierra los pies. Describen lo que sería el otro, si acaso el otro estuviese quieto, aquietado,
ajustado a unos ojos que se pertrechan detrás de la apariencia civilizatoria de una idea:
¿Cómo nombrarlos sin sus nombres? ¿Qué nombres darles si sus nombres ya le fueron
dados y son ésos, ésos mismos, los suyos? ¿Cómo llamarlos si es que no están próximos y
sin aproximarnos?
Vuelve a nosotros, a este tiempo, como una serpiente enroscada aquella última
imagen de esos cinco prisioneros de Auschwitz, en un blanco y negro terroríficos, con
unos atuendos harapientos que desbordan sus cuerpos extenuados, casi exánimes.
Podría tratarse de cinco personas cualesquiera, pero no lo son. Hay instantes de la
vida humana, de la historia de la vida humana, en que ninguno, nadie, merece ser
cualquiera. Esas cinco personas, son cinco prisioneros con alguna discapacidad, que están
con el cuerpo inclinado hacia la última fragilidad, desvencijados como trastos viejos,
aturdidos por las medicinas y los experimentos, que ven y no ven la cámara disparadora de
imágenes.
La soledad como una cámara de gas.
Con sus pijamas rayados, mezcla de campo de concentración y de hospicio, toman
una pose desconcertante, inquieta, desesperada, apoyándose unos en otros, como si ya
nadie pudiese sostenerse en pie por sí mismo y dependiesen de un único y último apoyo,
de un sostén de jirones y fragmentos rotos.
Sus rostros están casi fuera del cuerpo, desorbitados, desencajados, y sus ojos
parecen descompuestos de tanto padecer.
La soledad como sucio experimento.
¿Por cuáles sucios laboratorios habrán pasado? ¿Qué nombres tenían, de dónde
eran, qué vida llevaban hasta el momento en que les fue tomada esta imagen? ¿De qué se
les acusaba? ¿Y cuánto tiempo, cuántos segundos faltarán para que sean asesinados,
enterrados, agolpados sobre otros deshechos?
86|
86| carlos
carlos skliar
skliar

Sabemos que antes de los campos de concentración miles de cuerpos defectuosos


fueron asesinados sin contemplación al interior de la soledad atroz de los asilos. Hacia el
año 1945, 750 mil individuos con algún defecto, visible o invisible, ostensible o austero, en
los pies o en el rostro, en los ojos o en los oídos, fueron eliminaos por el régimen nazi.
La soledad que no deja en paz. La soledad como indefensión.
Y es que nunca se los ha dejado en paz, y habrá que sublevarse contra aquellos que
esgrimen la sencilla e imbécil razón según la cual hay quienes están vivos pero no deberían
haber nacido nunca, y hay quienes han nacido pero deberían estar muertos.
¿Qué viene después de la aniquilación, qué hay después de identificar un cierto tipo
de cuerpos que enseguida, más tarde o más temprano, serán condenados a distintas
muertes - la muerte común, la muerte del experimento, la muerte del exterminio, la
muerte de la disgregación, la muerte del exilio, la muerte de su soledad - ? ¿Cómo sería
posible plantearse siquiera una conversación cuando la soledad, así, es como un disparo en
la nuca?
Aquello que nos era dado a saber hace un tiempo era que la normalidad se revestía
con la imagen de un dios absoluto, incontestable, tiránico. Todas nuestras miradas se
concentraban en sospechar de los demás. Y nosotros, bien a salvo: profesionales cuya tarea
era la de corregir, identificar las ausencias, ser impiadosos con los desvíos, perseguidores
de deformidades, hablantes en oídos sordos, inteligentes frente a los débiles, evaluadores
eficaces. La deficiencia - así nombrada - no era más que un dato periférico que confirmaba
la norma. Y la norma se erigía como centro de gravedad, como un imán hacia el cual
tendían todas nuestras buenas y nobles acciones.
Pero antes de ser profesionales algo nos tuvo que haber pasado. Fuimos alumnos, en
cierto sentido también nos miraron con sospecha y, a veces, con desprecio, humillación.
Hay otra historia aun: la del miedo o el recelo o la ignorancia o el desprecio por aquellos
seres extravagantes y ajenos que formaban parte de nuestras aulas o de nuestras calles o de
nuestras familias. Lo humano como la supresión de lo humano, lo humano como una idea
mezquina de lo humano, lo humano como aquello que no admite excepcionalidad,
singularidad, irreverencia, desatino.
Hace falta volver a pensar nuestra relación con aquello que difiere de lo que
creemos ser nosotros mismos. Hace falta no solo el sinceramiento, la transparencia o la
constricción. Hace falta algo más. Un gesto tal vez desmesurado. No sólo un cambio de
narrativas o de biografías o una reescritura prolija que corrija el sinsentido anterior. Una
ética y una política de la debilidad. La vulnerabilidad propia como el escenario de nuestra
sensibilidad y nuestro pensamiento. La autonomía que, también, quiere decir dejar en paz.
No abandonar: dejar en paz.
Es una experiencia de la fragilidad porque se trata de un saber en el cuerpo. La
insurrección de los conceptos frente a la complacencia indiferente. No ser impunes cuando
hablamos del otro, no ser inmunes cuando el otro nos habla.
La ingenuidad es tan peligrosa como la obsesión. El territorio de la diferencia se
encuentra devastado por las sucesivas cruzadas que intentaron acabar con la alteridad. Aún
hoy la cultura, lo social y sus instituciones, atraviesan por campos minados: recambios de
nombres, cantos de sirena integracionistas, la supremacía en extremo de un lenguaje
jurídico, el reposicionamiento de la idea de lo normal, la belleza anoréxica y digitalizada de
los cuerpos contemporáneos, no hacen más que ofrecernos un espejo deformado, un espejo
que no devuelve la imagen despareja de lo humano sino que produce otra imagen a
semejanza de la normalidad. ¿Es cuestión de un miedo milenario, de un misterioso y
siempre astuto concepto de belleza, de la incapacidad suprema por hacer más extenso,
siempre, el alcance de lo humano?
el
el lenguaje
lenguaje de
de la
la norma
norma yy los
los individuos
individuos frágiles|
frágiles| 87
87

Lo que emerge hoy es, por lo menos, ambiguo. La travesía que consiste en desandar
las propias huellas, el arraigo de lo normal como lo natural, la confusión entre exclusión e
inclusión y la presión nefasta que ejercen los cuerpos publicitarios, no nos dejan en paz.
No los dejan en paz. Parece ser que la civilización se tranquiliza al reconocer, a suficiente
distancia, la existencia de la diferencia. Pero lo hace de un modo agazapado, reticente, de
forma jurídica aunque no éticamente. El lenguaje de los derechos ha alcanzado su máxima
aspiración y expresión. Sin embargo, sabemos que un cierto tipo de subversión y
radicalidad se vuelven necesarios. Ya no se trata de un nuevo modelo de discapacidad, ni
de una nueva organización escolar, ni de novedosas arquitecturas, ni de las conocidas
políticas de identidad: la cuestión a indagar es el sí mismo, el problema es el nosotros
mismos, cada vez que lo igual, lo común, lo normal son pronunciados como origen y
centro del universo.
La razón que nos asiste para definir al otro sujeto se ha desvanecido casi por
completo, pulverizada en sus argumentos y hecha jirones en su naturalización. Ya no hay
sujeto-uno o, para mejor decir, nunca hubo un sujeto auto-centrado, omnisciente, capaz de
rellenarse y hacerse absoluto, completo. Es esta la razón a desmitificar. Ser capaces de una
teoría de la debilidad, de lo fragmentario, de la vulnerabilidad, de lo incompleto y no ya
como condición precaria, de agonía, sino como aquello que nos hace humanos. No caer en
la trampa que nos tienden las angostas éticas hechas a medida del uno y que sólo nos
proponen resguardarnos de los demás apenas aceptándolos, respetándolos, tolerándolos.
En esos espacios, en esos territorios y relaciones está el cuerpo, la centralidad del
cuerpo, el ser un cuerpo y no sólo tenerlo. La historia de la discapacidad es, también, una
historia de mutilaciones, cercenamientos, distancias extremas y desapariciones de cuerpos:
cuerpos cojos, cuerpos sordos, cuerpos ciegos, cuerpos frágiles, cuerpos monstruosos,
cuerpos femeninos, cuerpos pobres, cuerpos niños, cuerpos dementes, etcétera.
En diferentes tiempos y espacios ciertos cuerpos - y no otros - fueron sospechados
de anomalía y juzgados y condenados sin más. Nadie los esperaba y al tenerlos de frente
no hubo más que la acostumbrada tensión de lo normal:
Tensión
Tensión entre
entre dos
dos aguas,
aguas, entre
entre lo
lo que
que está
está vivo
vivo yy no
no debería
debería haber
haber nacido,
nacido, entre
entre lo
lo
que
que ha
ha nacido
nacido yy debería
debería haber
haber muerto.
muerto. EnEn estas
estas circunstancias
circunstancias es
es fácil,
fácil, pues,
pues,
entender
entender que
que no
no hay
hay un
un lugar
lugar social
social esperándolos.
esperándolos. Terminan
Terminan ocupando
ocupando un un no-
no-
lugar,
lugar, exiliados
exiliados enen dicho
dicho umbral.
umbral. AA menudo
menudo la la muerte
muerte yy la
la eliminación
eliminación se se
personifican
personifican en
en la
la misma
misma gestación.
gestación. Son
Son objetos,
objetos, que
que no
no sujetos,
sujetos, marcados
marcados porpor la
la
muerte
muerte (BALAGUER,
(BALAGUER, 2004). 2004).

5. los bárbaros y una débil teoría de la fragilidad de los cuerpos.


Quizá no sea ésta una única respuesta ante la complejidad de todas las cuestiones
aquí parcialmente formuladas, pero se vuelve imprescindible una noción de cuerpo
completamente distinta. Una noción de cuerpos en relación, donde no exista ningún
vestigio acerca de lo que falta o de lo que hace falta. El fin de la idea del cuerpo normal.
Huir de la obligación de juzgar. El encuentro con el otro, sin condiciones. La
transformación del uno mismo en alteridad.
Por ejemplo en la novela Esperando a los bárbaros, Coetzee (2007) retrata un período
de la vida de un juez anciano que reside en el juzgado de una pequeña ciudad amurallada.
Más allá de los muros del poblado, hay un largo desierto donde se dice que habitan los
bárbaros. Todo en el pueblo está organizado y previsto en relación con esa amenaza: las
casas protegidas con rejas, la cárcel del juzgado preparada para futuras y masivas
reclusiones, los policías entrenados para resistir la invasión, las salas de tortura limpias,
todo en medio de una tensión extrema y una constante militarización de la vida cotidiana.
Los bárbaros no han sido vistos jamás, pero se cuenta de ellos desde hace siglos: se
habla de su peligro, de su amenaza, de las barbaridades que cometen a diario. El mito de la
88|
88| carlos
carlos skliar
skliar

existencia de los bárbaros ha pasado de generación en generación y el miedo es aquello que


hace respirar a una ciudad que cierra su alma cuando cae el sol. La idea de la presencia de
los bárbaros impide, por un lado, una vida normal pero, por otro lado, la habilita en la
materialidad y existencia del conjunto de instituciones de estado.
Por culpa de los bárbaros el día es sólo la planificación de la defensa de lo propio, la
tarde se asfixia demasiado temprano y la noche se vuelve un reino de tinieblas, miedo y
tensa espera, la inminencia de una invasión, la pesadilla constante de los niños:
Los
Los bárbaros
bárbaros salen
salen de de noche.
noche. Antes
Antes de de que
que oscurezca
oscurezca hay
hay que
que recoger
recoger lala última
última
cabra,
cabra, atrancar
atrancar las
las puertas
puertas yy apostar
apostar unun centinela
centinela en
en cada
cada atalaya
atalaya para
para dar
dar las
las
horas.
horas. Dicen
Dicen que
que loslos bárbaros
bárbaros merodean
merodean por
por los
los alrededores
alrededores durante
durante toda
toda lala
noche,
noche, resueltos
resueltos aa asesinar
asesinar yy saquear.
saquear. Los
Los niños
niños ven
ven en
en sueños
sueños cómo
cómo sese abren
abren las
las
contraventanas
contraventanas yy cómocómo los
los rostros
rostros feroces
feroces de
de los
los bárbaros
bárbaros les
les dirigen
dirigen miradas
miradas
aviesas.
aviesas. “¡Han
“¡Han llegado
llegado los
los bárbaros!”,
bárbaros!”, gritan
gritan los
los niños,
niños, yy no
no hay
hay quien
quien los
los
tranquilice
tranquilice (COETZEE,
(COETZEE, 2007, 2007, p.
p. 178).
178).

Pero: ¿existirán los bárbaros, de verdad? Nadie osa preguntárselo en el pueblo,


nadie se atreve a semejante duda. Quizá de tanto repetir su existencia, parece que sí, que
están y que son. Que no solamente se trata de una apariencia fantasmagórica, sino de una
existencia cargada de relatos detallados y certeros: los bárbaros son merodeadores,
asesinos, violadores, saqueadores, feroces, inhumanos de mirada aviesa y desencajada.
La novela de John Maxwell Coetzee deja abierta la sospecha, el misterio, la tensión.
Quizá los bárbaros no existan y no hayan existido nunca. Tal vez se trate solo de un relato
de exterioridad para justificar la propia interioridad. Pero el mito, la ficción y, sobre todo,
la ley, ya se han convertido en pura cotidianeidad. Y habrá que sostener ese relato y esa
vida desde las instituciones hasta las últimas consecuencias.
Lo cierto es que la novela no trata sobre los bárbaros, sino sobre aquellos que
esperan a los bárbaros, lo que es muy diferente. Lo que se dice no es sobre los bárbaros,
sino sobre el creciente dolor de la existencia durante la interminable y agónica espera del
supuesto enemigo, como lo expresa el personaje del juez: “El dolor es la verdad, todo lo
demás está sujeto a duda” (COETZEE, ibídem, p. 15).
Por ahora pareciera ser que la única solución que se plantea frente al dolor es la
exacerbación del lenguaje jurídico: la ley que nunca logra ordenar lo confuso, lo ambiguo,
la amenaza. Esa insistente jerga que deja aún más débiles a los cuerpos frágiles, más
frágiles a los cuerpos débiles.

referencias
BALAGUER,
BALAGUER, Asun.
Asun. Herencias
Herencias yy actualidad
actualidad de de la
la discapacidad.
discapacidad. Una
Una apertura
apertura pedagógica
pedagógica aa lo
lo sensible.
sensible.
Barcelona:
Barcelona: Editorial
Editorial UOC,
UOC, 2014.
2014.
CASTRO,
CASTRO, Juana.
Juana. Los
Los cuerpos
cuerpos oscuros.
oscuros. Madrid:
Madrid: Hiperión,
Hiperión, 2005.
2005.
COETZEE,
COETZEE, Johan.
Johan. M.
M. Esperando
Esperando aa los
los bárbaros.
bárbaros. México:
México: Random
Random House
House Mondadori,
Mondadori, 2007.
2007.
GONZÁLEZ,
GONZÁLEZ, Angél.
Angél. Nada
Nada grave.
grave. Madrid:
Madrid: Visor,
Visor, 2008.
2008.
LICHTENBERG,
LICHTENBERG, George.
George. Aforismos.
Aforismos. México:
México: Fondo
Fondo dede Cultura
Cultura Económica,
Económica, 1989.
1989.
MERINI,
MERINI, Alda.
Alda. Clínica
Clínica del
del abandono.
abandono. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Bajo
Bajo la
la Luna,
Luna, 2008.
2008.
NANCY,
NANCY, Jean-Luc.
Jean-Luc. 58
58 indicios
indicios sobre
sobre el
el cuerpo.
cuerpo. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Ediciones
Ediciones La
La Cebra,
Cebra, 2007.
2007.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Más
Más allá
allá del
del bien
bien yy del
del mal.
mal. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 1976.
1976.
PIRANDELLO,
PIRANDELLO, Luigi.
Luigi. Uno,
Uno, ninguno
ninguno yy cien
cien mil.
mil. Barcelona:
Barcelona: Acantilado,
Acantilado, 2010.
2010.
ROTH,
ROTH, Philip.
Philip. Némesis.
Némesis. Barcelona:
Barcelona: Literatura
Literatura Mondadori,
Mondadori, 2010.
2010.
SHELLEY,
SHELLEY, Mary.
Mary. Frankestein
Frankestein oo elel moderno
moderno Prometeo.
Prometeo. Barcelona:
Barcelona: Mondadori, 2006.
Mondadori, 2006
89
89

maestrxs y profesorxs de una “escuela especial”:


narrativas y pensamientos

patricia r. redondo11

Pero
Pero enseñar
enseñar es
es eso:
eso: volver
volver aa empezar
empezar hasta
hasta nuestra
nuestra
necesaria
necesaria desaparición
desaparición como
como profesor.
profesor.
(Daniel
(Daniel Pennac,
Pennac, Mal
Mal de
de escuela)
escuela)

E l propósito de este trabajo es presentar algunas aproximaciones a la


experiencia de los maestrxs y porfesorxs de una escuela especial en el
conurbano bonaerense. Este texto se elabora en el marco de una
investigación educativa22 que intenta comprender los modos en que esta escuela y su
colectivo de educadorxs hacen escuela a partir de la construcción de una propuesta
pedagógica e institucional distante de la escuela tradicional. Se presentan fragmentos de
entrevistas y parte de su análisis para el inicio de una conversación:
Yo
Yo empecé
empecé trabajando
trabajando enen una
una escuela
escuela especial
especial hace
hace muchos
muchos años,
años, digamos
digamos aa los
los
21,
21, 22
22 años.
años. Hice
Hice una
una suplencia
suplencia en
en una
una escuela
escuela que
que está
está sobre
sobre elel Camino
Camino de de
Cintura,
Cintura, donde
donde estaba
estaba mimi primo
primo dede alumno.
alumno. DioDio la
la casualidad,
casualidad, ¿no?
¿no? Hice
Hice lala
suplencia
suplencia un
un mes,
mes, unun mes
mes yy medio,
medio, yy me
me gustó
gustó mucho
mucho trabajar
trabajar en
en la
la escuela…
escuela… YoYo
soy
soy maestro
maestro mayor
mayor de de obras.
obras. Trabajé
Trabajé en
en especial
especial solamente…
solamente… Fue Fue esa
esa la
la única
única
experiencia
experiencia que
que tuve
tuve trabajando
trabajando enen especial.
especial. Después
Después meme dediqué
dediqué solo
solo aa lo
lo que
que es
es
construcciones.
construcciones. Pero
Pero siempre
siempre meme había
había quedado
quedado la
la idea
idea de
de volver
volver aa trabajar
trabajar en
en la
la
escuela. (EPTEE ,, octubre
escuela. (EPTEE 3
3 octubre del
del 2016)
2016)

La elección de ser docente o profesional44, integrante de un equipo técnico de


educación especial, surge -entre quienes fueron entrevistados- por diferentes motivos. Por
un lado, se encuentran motivaciones de carácter más contingente, por el otro, aquellos que
vinculan la decisión a las propias experiencias de vida, en particular, las infantiles y
quienes manifiestan la voluntad de prestar un servicio para aquellos otros que lo precisen.
Por último, existen los que, más avanzados en la formación, se inclinan con claridad por
una educación diferente a la tradicional. Entre los motivos de carácter más contingente se
destacan: el acceso más rápido a una posibilidad laboral, el contacto que realiza algún
pariente o vecino para ingresar a una escuela especial, la proximidad a un colegio de
educación especial en el barrio, el desempeño de un familiar en este nivel educativo que
orienta la elección hacia el trabajo en educación. Varios testimonios dan cuenta de este
acercamiento a la educación especial, en tanto opción laboral, por influencia de personas
próximas:
Yo,
Yo, claro,
claro, no
no conocía.
conocía. En
En realidad,
realidad, yo
yo no
no conocía
conocía mucho,
mucho, casi
casi nada,
nada, de
de educación
educación
especial
especial cuando
cuando empecé.
empecé. Empecé
Empecé más
más por
por una
una de
de mis
mis hermanas
hermanas porque
porque siempre
siempre

11 Facultad
Facultad de
de Humanidades
Humanidades yy Ciencias
Ciencias de de la
la Educación,
Educación, Universidad
Universidad Nacional
Nacional de
de La
La Plata
Plata -- Fahce/UNLP.
Fahce/UNLP.
Email: redpatricia@gmail.com
Email: redpatricia@gmail.com
22 Este
Este trabajo
trabajo se
se enmarca
enmarca enen lala tesis
tesis doctoral
doctoral “La “La escuela
escuela con
con los
los pies
pies en
en el
el aire:
aire: Hacer
Hacer escuela
escuela entre
entre la
la
desigualdad
desigualdad yy la la emancipación”
emancipación” de de lala Facultad
Facultad de de Humanidades
Humanidades yy Ciencias
Ciencias dede la
la Educación
Educación de de la
la
Universidad
Universidad de de la
la Plata,
Plata, 2016.
2016. LaLa investigación
investigación se se orienta
orienta aa comprender
comprender de de qué
qué modos
modos unauna escuela
escuela de
de
educación
educación especial
especial en
en un
un territorio
territorio signado
signado por por la
la desigualdad
desigualdad produce
produce operaciones
operaciones dede verificación
verificación dede la
la
igualdad.
igualdad.
33 Las
Las siglas
siglas utitlizadas
utitlizadas en
en el
el texto
texto son
son las
las siguientes:
siguientes: EPTEE,
EPTEE, entrevista
entrevista profesor
profesor de
de taller
taller de
de la
la escuela
escuela
especial,
especial, EPREE,
EPREE, entrevista
entrevista preceptora
preceptora de de lala escuela
escuela especial,
especial, EMEE,
EMEE, entrevista
entrevista maestra
maestra de de educación
educación
especial,
especial, EDEE,
EDEE, entrevista
entrevista director
director de de la
la escuela
escuela especial,
especial, EVDEE,
EVDEE, entrevista
entrevista vicedirectora
vicedirectora escuela
escuela especial,
especial,
EPTCEE,
EPTCEE, entrevista
entrevista profesora
profesora dede taller
taller de
de cocina,
cocina, EOEEE,
EOEEE, entrevista
entrevista orientadora
orientadora escolar.
escolar.
44 Los
Los perfiles
perfiles profesionales
profesionales que
que integran
integran loslos equipos
equipos técnicos
técnicos enen la
la educación
educación especial
especial de
de la
la Provincia
Provincia dede
Buenos
Buenos Aires
Aires son
son psicólogos,
psicólogos, licenciados
licenciados en en Ciencias
Ciencias de de la
la Educación,
Educación, fonoaudiólogos
fonoaudiólogos yy trabajadores
trabajadores sociales.
sociales.
90|
90| patricia
patricia r.
r. redondo
redondo

me
me habló
habló de
de educación,
educación, dede ser
ser maestra,
maestra, desde
desde chica.
chica. MiMi hermana
hermana me me dice:
dice:
“Vamos
“Vamos aa estudiar
estudiar juntas,
juntas, vamos
vamos aa educación
educación especial”.
especial”. Dijo:
Dijo: “Yo
“Yo voyvoy aa hacer
hacer elel
profesorado
profesorado yy vos
vos venís
venís conmigo”.
conmigo”. UnUn día
día me
me hace
hace llevarle
llevarle unos
unos papeles
papeles aa la 50155,,
la 501
todo
todo para
para que
que vaya
vaya aa conocer
conocer la
la escuela.
escuela. Me
Me hizo
hizo pasar
pasar aa ver
ver la
la escuela.
escuela. Empezó:
Empezó:
“Vení,
“Vení, vení
vení aa conocer
conocer mis
mis alumnos”.
alumnos”. Y Y yoyo creo
creo que
que ahí
ahí es
es como
como que que empezaste
empezaste aa
ver…
ver… Al
Al año
año siguiente
siguiente me
me anoté.
anoté. (EPREE,
(EPREE, septiembre
septiembre del 2016)66..
del 2016)

En otras ocasiones la opción por la educación especial se liga a un arco de


experiencias infantiles:
Yo
Yo no
no asocio
asocio bien
bien por
por qué.
qué. Solo
Solo unun día
día le
le dije
dije aa mi
mi mamá
mamá que
que yo
yo iba
iba aa ser
ser maestra
maestra
diferencial,
diferencial, era
era en
en aquel
aquel tiempo,
tiempo, yy mi
mi mamá
mamá yy mi mi papá
papá me
me dijeron
dijeron “No,
“No, vos
vos no
no
podés
podés porque
porque eses muy
muy duro
duro ese
ese trabajo”,
trabajo”, yo
yo decía:
decía: “A
“A mí
mí no
no me
me parece”.
parece”. Conozco
Conozco
ahí
ahí una
una nena
nena con
con síndrome
síndrome de de Down
Down en en el
el barrio,
barrio, que
que yo
yo iba
iba yy jugaba
jugaba pero
pero no
no sé

cuál
cuál es
es el
el punto…
punto… (EVDEE,
(EVDEE, septiembre
septiembre del
del 2015)
2015)

Los recuerdos infantiles son matizados e incluyen marcas traumáticas. Una docente
así lo expresa:
En
En realidad,
realidad, educación
educación especial
especial me me gusta
gusta dede chica,
chica, no
no sé…
sé… Yo Yo meme acuerdo
acuerdo queque
viajaba
viajaba enen colectivo
colectivo yy había
había un un nene
nene que que subía
subía como
como podía,
podía, ¿no?
¿no? Tenía
Tenía unauna
dificultad
dificultad motriz
motriz yy el
el pibe
pibe con
con todas
todas sus
sus fuerzas
fuerzas subía
subía alal colectivo,
colectivo, decía
decía “Buen
“Buen
día”
día” yy sacaba
sacaba el
el boleto.
boleto. NoNo sé,sé, desde
desde chica…
chica… me me acuerdo.
acuerdo. Y, Y, también,
también, tuve
tuve unun
poco
poco dede historia,
historia, mis
mis viejos
viejos meme mandaron
mandaron aa una una escuela
escuela privada
privada con
con todos
todos sus
sus
esfuerzos
esfuerzos pensando
pensando queque lolo privado
privado era
era lolo mejor,
mejor, yy no
no era
era lo
lo mejor.
mejor. EnEn primer
primer
grado,
grado, la
la maestra
maestra lele dice
dice que
que me
me tienen
tienen queque mandar
mandar aa unauna escuela
escuela especial
especial ¿por
¿por
qué?
qué? MiMi viejo
viejo hace
hace toda
toda una
una movida,
movida, le le dicen
dicen que
que yo
yo tenía
tenía un
un tema
tema de
de madurez,
madurez,
digamos…
digamos… Yo Yo me
me sentí
sentí como
como muymuy discriminada
discriminada en en mi
mi escuela,
escuela, meme acuerdo
acuerdo queque la
la
maestra
maestra de de primer
primer grado
grado te te ataba
ataba aa la
la silla.
silla. Yo
Yo era
era gordita
gordita yy nos
nos puso,
puso, ponéle,
ponéle, aa
una
una compañera
compañera yy aa mí,
mí, aa bailar
bailar de
de chanchos.
chanchos. Y Y vos
vos decías…
decías… Claro,
Claro, que
que eso
eso me
me lolo
acuerdo
acuerdo patente.
patente. Yo
Yo decía
decía pero
pero aa ver…
ver… Y Y éramos
éramos como
como el el grupo
grupo de de las
las burras.
burras.
Dentro
Dentro de de esa
esa escuela,
escuela, viste
viste que
que la
la escuela
escuela privada
privada tiene
tiene esto
esto dede ¿no?
¿no? El
El burro
burro
siempre
siempre fue
fue marcado.
marcado. O O sea,
sea, como
como que
que pasé
pasé por
por un
un lugar
lugar desde
desde lala escuela,
escuela, desde
desde lala
infancia,
infancia, pasé
pasé por
por ese
ese lugar
lugar dede rótulo,
rótulo, dede marca,
marca, de
de quedar
quedar de de lado…
lado… Nosotras
Nosotras
éramos
éramos cinco…
cinco… EsEs que
que sisi te
te ponés
ponés aa analizar,
analizar, claro,
claro, yoyo usaba
usaba lentes,
lentes, zapatos
zapatos
ortopédicos,
ortopédicos, como
como que
que era
era una
una cuestión
cuestión queque vos
vos decías…
decías… Y, Y, bueno,
bueno, asíasí hice
hice mimi
primaria.
primaria. Y,Y, por
por eso
eso elegí
elegí creo
creo yo,
yo, en
en algún
algún punto
punto elegí…
elegí… (EPREE,
(EPREE, octubre
octubre deldel
2015)
2015)

Al escuchar este relato resuenan las palabras de Carlos Skliar:


Lo
Lo que
que no
no puede
puede hacerse
hacerse aa este
este respecto
respecto es es decir
decir ingenuamente
ingenuamente oo no,
no, aquí
aquí no
no ha
ha
pasado
pasado nada.
nada. Sí
Sí ha
ha pasado,
pasado, lolo hemos
hemos indagado.
indagado. Pero
Pero sobre
sobre todo
todo nos
nos lo
lo han
han dicho,
dicho,
de
de formas
formas diferentes,
diferentes, las
las personas
personas apresadas
apresadas -literal
-literal yy metafóricamente-
metafóricamente- en en la
la
fuerza
fuerza gravitacional
gravitacional de
de la
la normalidad.
normalidad. Sí Sí que
que haha pasado.
pasado. SeSe ha
ha vuelto
vuelto experiencia
experiencia
en
en el
el relato
relato que,
que, aún
aún tímido,
tímido, viene
viene aa recordarnos
recordarnos las las formas
formas violentas,
violentas, desmedidas
desmedidas
yy desmesuradas,
desmesuradas, porpor encausar
encausar inútilmente
inútilmente cuerpos,
cuerpos, mentes,
mentes, lenguas
lenguas que
que se
se habían
habían
desviado
desviado dede ningún
ningún camino
camino (SKLIAR,
(SKLIAR, 2012,2012, p.183).
p.183).

Dicha experiencia, nos relata la docente, le permite cotidianamente comprender a


los niños y adolescentes con quienes trabaja, saber lo que sienten: Yo los miro, los veo y
pienso: ‘Vos podés’. O, sea lo miro creyendo en él, creyendo que puede, creer en el otro ¿entendés?, en
no desmerecer al otro, creer que puede. (EPREE, octubre del 2015). Acompañar a partir de las
propias marcas.

55 Escuela
Escuela de
de educación
educación especial
especial que
que atiende
atiende niños
niños yy niñas
niñas ciegos
ciegos en
en el
el distrito
distrito de
de La
La Matanza,
Matanza, provincia
provincia de
de
Buenos
Buenos Aires,
Aires, Argentina.
Argentina.
66 La
La docente
docente entrevistada
entrevistada cumple
cumple una
una doble
doble función:
función: preceptora
preceptora en
en el
el turno
turno de
de la
la mañana
mañana yy maestra
maestra aa cargo
cargo
de
de grupo
grupo en
en el
el turno
turno de
de la
la tarde
tarde ee integra
integra el
el equipo
equipo docente
docente de
de la
la escuela
escuela desde
desde los
los primeros
primeros años
años dede su
su
creación.
creación.
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 91
91

Los
Los lazos
lazos del
del acompañamiento
acompañamiento requieren
requieren un un encuadre
encuadre protector,
protector, el
el que
que instala,
instala, aa
la
la vez,
vez, la
la extranjeridad
extranjeridad yy ley;
ley; se
se mantienen
mantienen en en una
una ambigüedad,
ambigüedad, la la que
que nunca
nunca
termina
termina dede esclarecerse
esclarecerse totalmente
totalmente si si se
se sostienen
sostienen en
en la
la lógica
lógica contractual
contractual oo en
en la
la
lógica
lógica del
del don.
don. Los
Los lazos
lazos del
del acompañamiento
acompañamiento remiten
remiten aa figuras
figuras del
del amor,
amor, pero
pero
que
que admiten
admiten que que el
el amor
amor nono resulta
resulta de
de lala voluntad
voluntad ni
ni de
de una
una imposición,
imposición, que
que no
no
es
es posible
posible ingresarlo
ingresarlo en
en la
la cláusula
cláusula contractual
contractual dede ningún
ningún oficio
oficio (FRIGERIO,
(FRIGERIO,
2006,
2006, p.38).
p.38).

En sentido opuesto, la experiencia de subjetivación nombrada por la docente


durante su infancia, que desde su punto de vista le otorga sentido a su elección profesional,
tiene la marca como efecto de la trayectoria escolar. En este relato la estigmatización y la
discriminación se convierten en práctica educativa cotidiana donde:
La
La cuestión
cuestión del
del otro
otro extranjero
extranjero se
se reserva
reserva como
como trato
trato en
en la
la anatomía
anatomía de de nómades,
nómades,
migrantes
migrantes yy exiliados,
exiliados, cuya
cuya ’diferencia’
’diferencia’ se
se vuelve
vuelve marca
marca y, y, en
en nono pocos
pocos casos,
casos,
estigma.
estigma. Puede
Puede ocurrir
ocurrir que
que los
los no
no desventajados,
desventajados, confrontados
confrontados aa la la angustia
angustia dede la
la
castración,
castración, de
de lo
lo intolerable,
intolerable, busquen
busquen modos
modos dede expulsar
expulsar del
del lazo
lazo social
social aa los
los que
que
sufren
sufren de
de las
las huellas
huellas dede una
una biología
biología oo una
una estructura
estructura psíquica
psíquica queque los
los hace
hace
aparecer
aparecer como
como otros
otros no
no como
como los
los otros
otros (FRIGERIO,
(FRIGERIO, 2006,
2006, p.37).
p.37).

Docentes presentes en las biografías escolares de los propios maestros encarnan el


ingreso de una relación, la de los afectos, en la educación que siempre es presentada de
modo edulcorado y despojada de conflictos pero que, por el contrario:
Invita
Invita aa elevar
elevar los
los sentimientos
sentimientos individuales
individuales aa valorvalor supremo,
supremo, permitiendo
permitiendo
justificar
justificar acciones
acciones uu omisiones
omisiones realizadas
realizadas en
en nombre
nombre del del gusto,
gusto, del
del amor,
amor, del
del odio
odio
¿Cuáles
¿Cuáles sonson las
las consecuencias
consecuencias de de una
una práctica
práctica docente
docente asentada
asentada en
en estos
estos
justificativos?
justificativos? ¿Qué
¿Qué implicancias
implicancias tiene
tiene que
que elel “yo
“yo docente”
docente” actúe
actúe en
en nombre
nombre del
del
amor,
amor, del
del odio,
odio, del
del gusto
gusto que
que pueda
pueda sentir
sentir por
por tal
tal oo cual
cual alumno?
alumno? ¿Acaso
¿Acaso esto
esto no
no
conduce
conduce casi
casi inevitablemente
inevitablemente aa cierta
cierta impunidad
impunidad ee inimputabilidad
inimputabilidad emotiva?
emotiva?
(ABRAMOWSKI,
(ABRAMOWSKI, 2010, 2010, p.150)
p.150)

Cabe preguntarse sobre las huellas subjetivas de las experiencias escolares en las
elecciones de los propios docentes y en los modos de habitar la propia vulnerabilidad.
Otra variante que se presenta al momento de volcar la elección a la educación
especial es asociada a experiencias infantiles más próximas al servicio hacia los demás
como lo manifiesta el director de la escuela:
Recuerdo
Recuerdo unauna motivación
motivación de de tipo…
tipo… nono sé,
sé, de
de servicio
servicio ¿no?
¿no? Una Una cosa
cosa así
así me
me
parece
parece que
que había,
había, porque
porque yoyo iba
iba aa iglesia,
iglesia, aa grupos
grupos juveniles
juveniles de
de iglesia…
iglesia… bien
bien de
de
congregación,
congregación, deldel Sagrado
Sagrado Corazón.
Corazón. Y Y estaban
estaban los
los grupos
grupos juveniles
juveniles ahí
ahí yy uno
uno era
era
dirigente
dirigente de…
de… NoNo eraera la
la Acción
Acción Católica
Católica ¿no?,
¿no?, era
era algo
algo muy
muy chiquito,
chiquito, de de barrio,
barrio,
más
más parecido
parecido aa los
los scouts
scouts que
que aa otra
otra cosa.
cosa. No
No con
con gran
gran organización,
organización, eraera el
el grupo
grupo
juvenil
juvenil de
de la
la parroquia,
parroquia, esoeso digamos.
digamos. Y Y ahí
ahí siempre
siempre estaba
estaba como
como orientado
orientado para
para
ese
ese lado,
lado, qué
qué sésé yo…
yo… para
para ir
ir aa misionar,
misionar, para
para ir
ir aa la
la escuelita,
escuelita, esta
esta mirada.
mirada. Y Y
calculo
calculo que
que fue
fue la
la intención
intención de de seguir
seguir algo
algo dede tipo
tipo así,
así, social,
social, de
de servicio,
servicio, que
que
después…
después… queque por
por ahí
ahí no
no tiene,
tiene, me
me parecía
parecía que
que no
no tenía,
tenía, mucho
mucho queque ver
ver con
con unun
trabajo
trabajo sino
sino con
con eso
eso dede seguir
seguir haciendo
haciendo algoalgo por
por otros,
otros, una
una cosa
cosa así.
así. (EDEE,
(EDEE,
septiembre
septiembre del
del 2015)
2015)

Los afectos magisteriales, la cuestión de las emociones, no es ajena a las


definiciones sobre la carrera docente. La relación entre el amor y la pedagogía resulta una
relación compleja de ser abordada porque significa, como nos lo sugiere Inés Dussel, entrar
en ‘aguas pantanosas’.
La
La discusión
discusión pedagógica,
pedagógica, sin sin embargo,
embargo, todavía
todavía se se hace
hace poco
poco eco
eco de
de estas
estas
discusiones.
discusiones. El
El ‘amor’
‘amor’ es
es objeto
objeto dede sospecha,
sospecha, dede alabanza
alabanza acrítica
acrítica oo bien
bien de
de
domesticación
domesticación tecnocrática
tecnocrática -vía
-vía el
el concepto
concepto de
de la
la inteligencia
inteligencia emocional-
emocional- pero
pero hay
hay
pocas
pocas reflexiones
reflexiones enen estas
estas líneas
líneas que
que vienen
vienen surgiendo
surgiendo enen la
la teoría
teoría social
social
(DUSSEL,
(DUSSEL, 2006,
2006, p.145-146).
p.145-146).
92|
92| patricia
patricia r.r. redondo
redondo

Por otra parte, la elección se liga a la propia experiencia escolar y a las ofertas
formativas que el sistema educativo ofrece, como lo relata la docente más joven de la
escuela:
Yo
Yo en
en realidad
realidad había
había pensado
pensado en
en lala docencia.
docencia. Cuando
Cuando estaba
estaba enen la
la secundaria,
secundaria,
tenía
tenía un
un profe
profe de
de psicología
psicología copado
copado yy yo
yo quería
quería estudiar
estudiar psicología
psicología porque
porque elel profe
profe
era
era muy
muy copado.
copado. LaLa escuela
escuela me
me gustaba.
gustaba. Pensando
Pensando en en los
los profesorados,
profesorados, decidí
decidí
anotarme
anotarme enen primaria,
primaria, mi
mi prima
prima yaya estaba
estaba recibida
recibida dede maestra,
maestra, entonces
entonces fuifui al
al
Etchegaray
Etchegaray aa anotarme
anotarme yy estaban
estaban promocionando
promocionando la la carrera
carrera de
de educación
educación especial,
especial,
yy había
había muchos
muchos profes
profes de
de especial
especial que
que contaban
contaban cómo
cómo era.
era. Entonces,
Entonces, dije
dije bueno,
bueno,
para
para probar
probar me anoto. (EMEE,
me anoto. (EMEE, octubre
octubre del
del 2015)
2015)

Para quienes avanzan en los tramos de formación superior universitaria y no


universitaria la educación especial ofrece una diferencia:
Me
Me pareció
pareció que
que tenía
tenía la
la posibilidad
posibilidad de
de poder…
poder… de de ser
ser como
como unun espacio
espacio sumamente
sumamente
libre
libre para
para el
el trabajo,
trabajo, que
que no
no lo
lo veía
veía tanto
tanto en
en elel tema
tema de de primaria,
primaria, elel tema
tema del
del
boletín
boletín oo cosas
cosas así
así tan
tan pautadas.
pautadas. La
La libertad
libertad desde
desde lala elección
elección dede contenidos,
contenidos, de
de
actividades,
actividades, de de espacios,
espacios, dede tiempos,
tiempos, de de vinculación
vinculación con con otros.
otros. Porque
Porque alal ser
ser
menos
menos cantidad
cantidad de de chicos
chicos qué
qué se
se yo,
yo, yo
yo estaba…
estaba… Lo Lo que
que nos
nos pasa
pasa ahora…
ahora… esto
esto de
de
charlar
charlar con
con elel profe
profe dede educación
educación física
física yy decir
decir “¿Te
“¿Te parece
parece esto?”…
esto?”… O O había
había
situaciones
situaciones que
que uno
uno las
las ve
ve en
en teoría,
teoría, de
de situación
situación oo dede diagnóstico
diagnóstico dede chicos
chicos yy ahí
ahí
lo
lo tenías
tenías que
que verver en
en carne
carne propia,
propia, entonces
entonces decís
decís “Bueno
“Bueno ¿y ¿y cómo
cómo intervenís
intervenís
acá?”.
acá?”. Y,
Y, ahí
ahí tenés
tenés que
que resignificar
resignificar la
la teoría
teoría yy decís
decís “¿Y?
“¿Y? ¿Qué
¿Qué actividad?
actividad? ¿Y?
¿Y?
Tenés
Tenés que
que pensar”
pensar” (EOEEE,
(EOEEE, agosto
agosto del
del 2015).
2015).

La libertad que otorga la educación especial, asociada al pensamiento, se opone al


estereotipo de la piedad y al discurso de las emociones que categoriza a lxs niñxs como
‘pobrecitxs’. La diferencia abre oportunidades y define un territorio de infancia inscripto
en un (otro) lenguaje, el del reconocimiento y la igualdad.
El propósito de reconocer o bucear en la memoria de los actores de la escuela para
encontrar las motivaciones de una elección y/o una decisión no aspira a establecer
generalizaciones ni a construir hipótesis que expliquen, en términos afirmativos, el por
qué los que se desempeñan actualmente en la educación especial la seleccionan como
opción laboral, profesional, personal, pero sí, en todo caso, intenta comprender de qué
modos se conjugan los puntos de partida y cómo su heterogeneidad dista de configurar un
mandato homogeneizador o un discurso único, monolítico y compacto.
Por el contrario, experiencias subjetivas de infancias marcadas o manchadas por la
mirada de un adulto (SKLIAR, 2015), recuerdos infantiles de espacios o juegos compartidos
junto a otros niños discapacitados, opciones laborales más azarosas, cartografían un
territorio sobre el cual luego se inscribe y construye la propia carrera docente. El trayecto
de formación se articula con oportunidades laborales que se combinan en cada caso de
manera singular y que tienen un punto de llegada común: la Escuela Especial 516.
Los maestros, integrantes del equipo técnico, profesores encuentran en el
pensamiento los sentidos educativos de la tarea que despliega la escuela y que condensa
dos cuestiones principales: la de pertenecer a la educación especial y, al mismo tiempo,
trabajar en un barrio popular. Ambas se entrelazan entre sí generando un amplio abanico
de experiencias y situaciones. Al mismo tiempo, la posición de la escuela en considerar a
cada alumno en su singularidad, en el marco de su historia y sus posibilidades
desplazándose de las perspectivas que lo etiquetan y clasifican le permite enriquecer
también la experiencia social.
Desde el punto de vista que sostenemos en este trabajo el trabajo de los docentes y
conjunto del equipo institucional de la escuela especial 516 asume un ritmo, un movimiento
que lo podemos pensar en clave de una pieza musical, en el tiempo vivace de una sinfonía.
El trabajo educativo en términos colectivos significa exponer la dificultad, pero ello no
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 93
93

significa imposibilidad, por el contrario, requiere “conciencia77 del trabajo, a la vez sobre el
mundo interno y trabajo público y político” (FRIGERIO, 2006, p.38).
Sin embargo, para amalgamar una posición común, encontrar respuestas a lo
inesperado, pensar aquello del orden de lo impensable, estos maestros se han transformado
en maestros viajeros, maestros pensamiento, maestros ensayistas. El punto de partida, la
escuela. Punto de llegada, la infancia, la educación y la igualdad como nuevo punto de
partida. O podría pensarse también al contrario: la infancia y la igualdad como puntos de
partida y la escuela como punto de llegada y otra vez de partida. La cuestión parece no
estar ni en una punta ni en la otra, sino más bien en vivir la educación como un viaje: la
formación y la vida como ensayo (KOHAN, 2016).
1. escuela puerto: maestros que llegan y parten
Los itinerarios confluyen. Contingencias, historias infantiles, decisiones adoptadas
por influencia familiar, elecciones profesionales más especializadas confluyen al momento
de concluir la formación y enfrentar la necesidad de obtener un puesto de trabajo, ello
implica atravesar la opacidad de la burocracia del sistema educativo bonaerense que
implica: la obtención del primer cargo, pasar de escuela en escuela realizando suplencias,
alcanzar un puesto de trabajo como titular y la elección de la escuela –en lo posible-donde
ocupar un cargo durante un tiempo más largo. Las lógicas administrativas y burocráticas
con sus múltiples variables, de acuerdo a cada momento político, obligan a aprender un
lenguaje ajeno a la pedagogía para sobrevivir laboralmente 88.En ocasiones, lo aprendido
pedagógicamente se restringe sólo a las aulas y coexiste con una jerga propia de puntajes,
medidas, artículos y licencias que organiza el funcionamiento del sistema y los puestos de
trabajo docente. Este proceso singular y colectivo representa un campo de tensiones en el
cual intervienen diferentes actores políticos y sociales, entre los que se destacan las
organizaciones gremiales pero que, al mismo tiempo, genera marcas subjetivas e
identidades poco exploradas todavía.
Asumir un cargo docente, en un primer momento significa el acceso a un puesto de
trabajo, luego conocer o no las referencias de la escuela que le permitan contar con señales
para la llegada o, por el contrario, iniciar la búsqueda en un mapa para localizar el barrio
donde se localiza la escuela. Unxs y otrxs, maestrxs, profesorxs atraviesan ese acto de
manera burocrática despojado de todo sentido pedagógico pero, del otro lado, los espera
una institución con niñxs, adolescentes y/o jóvenes con los cuales trabajar, cualquiera sea
su ubicación. Eso no significa a priori que ese destino, esa vacante le garantice a priori al
docente asignado un lugar de enseñanza, como lo relata el director de la escuela:
Yo
Yo empecé
empecé como
como maestro
maestro de de un
un grupo
grupo aa los
los 19
19 años,
años, en
en una
una escuela
escuela sí,
sí, que
que nini
conocía,
conocía, una
una escuela
escuela así…bastante
así…bastante también
también precario
precario eraera todo,
todo, era
era una
una casa
casa
alquilada
alquilada yy tenía…me
tenía…me tiraron
tiraron adentro
adentro de de un
un grupo
grupo concon quince
quince pibitos
pibitos concon
síndrome
síndrome dede Down,
Down, creo
creo que
que todos
todos tenían
tenían lo
lo mismo.
mismo. Yo Yo nono sabía
sabía qué
qué hacer,
hacer, sí,
sí, no
no
sabía
sabía qué
qué hacer,
hacer, la
la verdad
verdad tete digo,
digo, la
la tipa
tipa empezó
empezó “Sí,“Sí, acá
acá está
está el
el maestro”
maestro” yy meme
dejó.
dejó. Porque
Porque aparte
aparte era
era una
una casa,
casa, me
me acuerdo,
acuerdo, lolo tengo
tengo tan
tan presente,
presente, que
que era
era una
una
casa
casa alquilada
alquilada que
que las
las habitaciones
habitaciones eran
eran aulas,
aulas, estaba
estaba alfombrada.
alfombrada. Yo Yo lo
lo contaba
contaba el el

77 Esto
Esto significa
significa también
también comprensión.
comprensión. Véase:
Véase: FRIGERIO
FRIGERIO (2006).
(2006).
88El
El acceso
acceso aa los
los cargos
cargos docentes
docentes está
está pautado
pautado dede acuerdo
acuerdo al al Estatuto
Estatuto deldel Docente
Docente sancionado
sancionado en en 1958
1958 yy
sucesivas
sucesivas reglamentaciones,
reglamentaciones, existeexiste unun calendario
calendario escolar
escolar para
para lala inscripción
inscripción yy elel ingreso
ingreso aa lala docencia
docencia dede
acuerdo
acuerdo aa las
las acreditaciones
acreditaciones con con las
las que
que cuenta
cuenta cada
cada aspirante.
aspirante. En En momentos
momentos en en que
que el
el salario
salario docente
docente eses
muy
muy bajo
bajo se
se habilitan
habilitan listados
listados dede emergencia
emergencia ee ingresan
ingresan sinsin título
título aa trabajar
trabajar estudiantes
estudiantes enen formación.
formación. PorPor el
el
contrario,
contrario, como
como sucedió
sucedió en en la
la última
última década
década hasta
hasta el
el 2015
2015 cuando
cuando el el salario
salario mejora
mejora sustantivamente
sustantivamente faltan
faltan
vacantes
vacantes para
para cubrir
cubrir la
la cantidad
cantidad dede aspirantes
aspirantes aa la
la docencia
docencia en en algunos
algunos distritos
distritos de
de la
la provincia
provincia dede Buenos
Buenos
Aires,
Aires, ello
ello varía
varía de
de acuerdo
acuerdo aa cada
cada nivel
nivel educativo
educativo ee incluso
incluso lala asignatura.
asignatura. Los
Los cargos
cargos se
se eligen
eligen en
en actos
actos
públicos
públicos donde
donde se se ofrecen
ofrecen laslas vacantes,
vacantes, los
los directores
directores aa veces
veces asisten
asisten para
para ver
ver quiénes
quiénes son
son los
los que
que eligen
eligen sus
sus
escuelas
escuelas ee intentar
intentar incidir
incidir en
en la
la decisión
decisión dede quienes
quienes aspiran
aspiran al al cargo.
cargo.
94|
94| patricia
patricia r.
r. redondo
redondo

otro
otro día,
día, decían
decían “Ay,
“Ay, alfombrada”,
alfombrada”, alfombrada
alfombrada porque
porque había
había sido
sido la
la pieza
pieza dede
alguien.
alguien. YY puertas
puertas corredizas,
corredizas, no,
no, era
era una
una casa.
casa. YY me
me acuerdo
acuerdo queque me
me tiraron
tiraron
adentro
adentro yy yo
yo quedé
quedé enen el
el medio
medio de
de tantos
tantos pibitos,
pibitos, no,
no, no
no sabía
sabía qué
qué hacer.
hacer. AA ver,
ver,
hice
hice de
de todo
todo yy mal
mal al
al principio
principio yy al
al toque
toque me
me fui,
fui, porque
porque yoyo los
los conocía
conocía aa N.
N. yy aa
G.,
G., éramos
éramos conocidos
conocidos del del barrio
barrio yy demás,
demás, yy al al toque
toque fui
fui aa la
la casa
casa de
de ellos
ellos
desesperado
desesperado aa ponerme
ponerme un un poco
poco en en tema,
tema, ellos
ellos ya
ya eran
eran directores
directores (EDEE,
(EDEE,
septiembre
septiembre del
del 2015).
2015).

Las primeras escenas de los docentes entrevistados son recordadas como el punto de
partida de búsquedas y de la presencia de otros que acompañan ese proceso, el comenzar a
hacer y a ensayar sumando un ingrediente que se mantiene a lo largo del tiempo en el caso
del director: el disfrutar estar con pibes en la escuela. “Me empecé como a hacer, a ir
probando y a ir disfrutando también de estar con pibes en la escuela y bueno, ahí me fui
como armando. Y bueno, después fui cambiando de escuela, siempre como maestro”
(EDEE, septiembre del 2015) Las dificultades del inicio marcan un punto en el cual lxs
profesorxs se hallan despojados de las herramientas pedagógicas para enfrentar el trabajo
con lxs niñxs, como si la formación realizada transitase por un andarivel distante de
aquello necesario para el aula.
Los docentes del conurbano se van armando, “entre” escuelas, “entre” políticas
educativas, “entre” experiencias educativas y comunitarias, “entre” otros y junto a otros.
En zonas distantes y con una mayor complejidad por efectos de la desigualdad social el
trabajo docente configurado en parte por el discurso estatal se inscribe en el paisaje social,
cultural, económico, político y educativo del territorio bonaerense en sus expresiones más
locales. El Estado provincial asume una presencia distante en la vida cotidiana de los
docentes que quedan más ligados a la vida social, cultural y política de los barrios donde
trabajan99. Para las autoridades educativas y políticas de los niveles centrales llegar hasta las
escuelas de los cordones del conurbano significa “bajar a los territorios” como una
metáfora espacial que remite a lugares inhóspitos y salvajes. Y también como una marca
de jerarquía o superioridad en tanto el desplazamiento se configura desde lo superior a lo
inferior, de lo alto a lo bajo.
Identidades que se componen entre la elección de la carrera, la decisión de enseñar,
la formación inicial y el acceso al puesto de trabajo en centros urbanos, suburbanos,
rurales, de islas en los diferentes niveles y modalidades en cada lugar, cada localidad, cada
escuela donde se tensiona lo particular y lo general. Identidades marcadas por experiencias
que se hilvanan. Marcas, huellas de un pasar entre escuelas, donde ser maestro se afianza o
desdibuja, potencia o empequeñece, vitaliza o mortifica, se abre a la sensibilidad social,
cultural y política o se clausura en un discurso único monolítico, moralizante y
endogámico1010.

99 En
En el
el momento
momento de
de la
la crisis
crisis del
del 2001,
2001, los
los docentes
docentes participan
participan activamente
activamente de
de la
la organización
organización de
de las
las redes
redes del
del
trueque,
trueque, como
como también,
también, las las escuelas
escuelas viven
viven escenas
escenas traumáticas
traumáticas loslos días
días 1919 yy 20
20 de
de diciembre,
diciembre, enen especial
especial enen
horas
horas dede la
la noche,
noche, que
que sese la
la conoce
conoce como
como “La
“La Noche
Noche de de los
los Fueguitos”,
Fueguitos”, en en la
la cual,
cual, los
los barrios
barrios del
del Conurbano,
Conurbano,
por
por ejemplo,
ejemplo, en en el
el partido
partido de de La
La Matanza
Matanza esperan
esperan enfrentamientos
enfrentamientos entreentre sí.
sí. Las
Las escuelas
escuelas con
con frecuencia
frecuencia sonson
una
una caja
caja de
de resonancia
resonancia de de acontecimientos
acontecimientos barriales
barriales que
que no
no tienen
tienen registros
registros mediáticos
mediáticos pero
pero que
que son
son parte
parte de
de
su
su historia.
historia.
10 A
10 A partir
partir dede los
los años
años de de trabajo
trabajo enen el
el conurbano
conurbano yy de de participación
participación en en proyectos
proyectos de de extensión
extensión dede la
la Facultad
Facultad
de
de Humanidades
Humanidades de de Ciencias
Ciencias de de la
la Educación
Educación de de la
la Universidad
Universidad de de la
la Plata
Plata es
es posible
posible constatar
constatar que,
que, si
si bien
bien
ha
ha mejorado
mejorado hasta
hasta lala fecha
fecha (fines
(fines del
del 2015)
2015) la
la condición
condición salarial
salarial del
del trabajo
trabajo docente,
docente, se se acentúa
acentúa una
una mirada
mirada
cristalizada
cristalizada hacia
hacia las
las familias
familias de de sectores
sectores populares
populares de de representaciones
representaciones estereotipadas.
estereotipadas. En En referencia
referencia aa los
los
niños
niños yy adolescentes
adolescentes incluso
incluso se se registra
registra cierto
cierto desprecio
desprecio o, o, por
por el
el contrario,
contrario, una una sobreprotección
sobreprotección anclada
anclada enen
el
el amor
amor como
como carencia.
carencia. En En el el primer
primer caso,
caso, “los
“los alumnxs
alumnxs sonson como
como animales
animales yy no no aprenden”,
aprenden”, enen elel segundo,
segundo,
“son
“son como
como muñecos
muñecos de de peluche”
peluche” yy por por la
la necesidad
necesidad de de cariño
cariño que
que tienen
tienen tampoco
tampoco aprenden,
aprenden, testimonios
testimonios
recogidos durante
recogidos durante el el Proyecto
Proyecto de de Extensión:
Extensión: "Ampliar
"Ampliar oportunidades
oportunidades en en jardines
jardines yy escuelas
escuelas primarias",
primarias",
FaHCE,
FaHCE, UNLP,
UNLP, 2013-2014.
2013-2014.
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 95
95

“Cambiar de escuela siempre como maestro” abre la pregunta sobre cuánto cambia
a cada docente en su biografía laboral los cambios de escuela que todos registran en las
entrevistas y en qué momento el camino elegido consolida una decisión: la de trabajar en
educación.
Todas
Todas las
las mañanas
mañanas hay hay que
que retomar
retomar el
el camino
camino aa clases,
clases, aunque
aunque prefiramos
prefiramos hacer
hacer
otras
otras cosas,
cosas, nono hayamos
hayamos tenido
tenido tiempo
tiempo dede preparar
preparar laslas clases,
clases, tengamos
tengamos el el miedo
miedo
metido
metido enen el
el cuerpo
cuerpo oo el
el cansancio
cansancio oo el
el desánimo
desánimo se se apoderen
apoderen de de nosotros…Pero
nosotros…Pero
aceptar
aceptar lala inevitable
inevitable mediocridad
mediocridad de de lo
lo cotidiano
cotidiano no no significa
significa condenarse
condenarse sinsin
remedio
remedio aa lala rutina
rutina yy aa la
la insignificancia.
insignificancia. Ni
Ni sobre
sobre todo,
todo, abandonar
abandonar lala esperanza
esperanza
de
de que
que pueda
pueda ocurrir
ocurrir “algo”
“algo” importante,
importante, unun día,
día, en
en la
la clase.
clase. Porque
Porque allí
allí está-estoy
está-estoy
convencido
convencido de de ello-os
ello-os ha
ha hecho
hecho escoger
escoger este
este trabajo
trabajo (MERIEU,
(MERIEU, 2006, 2006, p.13).
p.13).

El jugar con un niño Down en su historia infantil, el ser parte de un pequeño grupo
estigmatizado y violentado por su maestra en el aula de la escuela primaria o de participar
de otro grupo religioso para ayudar en el barrio, el empezar a trabajar en la escuela especial
más próxima, formarse en el profesorado de sordos o ayudar a la maestra de su hijo en la
escuela y descubrir allí su deseo de integrar a otros, buscar y pelear por algo diferente
siempre, pensar de otra manera y rebelarse contra lo instituido y naturalizado configura
una cartografía de historias y biografías ¿mínimas? que se mixturan y dibujan recorridos
heterogéneos. Delinean líneas frágiles en territorio duros - el conurbano bonaerense - pero
que confluyen en este caso, en un punto de encuentro: la escuela 516. Para algunos, un
destino buscado, deseado y alcanzado, para otros, un destino posible, contingente e incluso
desconocido. Un lugar ignoto que es necesario mapear virtualmente antes de viajar por
primera vez ¿Qué escuela espera al recién llegado?
1.1 escenas inesperadas
Yo
Yo venía
venía dede una
una formación
formación en en la
la otra
otra escuela,
escuela, donde
donde trabajé
trabajé toda
toda lala vida,
vida, que
que como
como más
más
estructurada.
estructurada. Y Y enen el
el primer
primer díadía que
que vengo
vengo acáacá no
no me
me voy
voy aa olvidar
olvidar nunca,
nunca, estaban
estaban
todos…Hermosísimo.
todos…Hermosísimo. EstabanEstaban en en el
el comedor,
comedor, un un día
día de
de mucha
mucha lluvia,
lluvia, todos
todos en
en el
el comedor,
comedor,
sentados
sentados arriba
arriba de
de la
la mesa,
mesa, viste
viste todo
todo el
el lío
lío que
que se
se arma
arma acá
acá yy en
en una
una de
de las
las paredes
paredes habían
habían
puesto
puesto afiches
afiches blancos
blancos con
con los
los grupos
grupos yy entre
entre todos
todos los
los maestros
maestros estaban
estaban decidiendo
decidiendo quéqué les
les
parecía
parecía tales
tales chicos
chicos para
para tales
tales grupos,
grupos, para
para los
los otros
otros yy salían
salían las
las opiniones
opiniones dede los
los maestros
maestros
que
que los
los conocían,
conocían, los
los que
que no,
no, la
la gente
gente del
del equipo.
equipo. Y Y eso
eso me
me pareció
pareció maravilloso
maravilloso porque
porque yoyo
venía
venía de
de un
un lugar
lugar donde
donde tenías
tenías asignado
asignado oo seasea una
una lista,
lista, muchas
muchas veces
veces tete enterabas
enterabas en en el
el
momento,
momento, ¿no?
¿no? YY sentías
sentías eso
eso tan
tan distendido
distendido queque me
me resultó
resultó maravilloso EPTCEE,, octubre
maravilloso ((EPTCEE octubre
del
del 2015).
2015).

La génesis en otra formación: toda una vida “más estructurada”. La escuela 516
quiebra esa estructura, propone un nuevo inicio, otra formación, otra escuela. Se puede
sentar arriba de la mesa, abajo, al costado, en el aire, la cuestión es la apuesta a un hacer
entre todos, a pensar lo que se está haciendo… y a llenar entre todos los grupos marcados
en los afiches blancos… pasar de la lista asignada al signo producido entre otros… el
quiebre, estas palabras lo muestran, señala otra forma de ejercer el poder en la institución
escolar.
Por eso, las instancias de trabajo colectivo son la brújula del equipo institucional
direccionada por el equipo directivo y algunos integrantes del equipo técnico con más
historia en la escuela. Desde el comienzo en este escena se producen dos desplazamientos
simultáneos: el de los alumnos y alumnas que son pensados, nombrados y reconocidos
desde su particularidad para conformar cada grupo pedagógico y no pasan a conformar
listados organizados administrativamente por edad o por alguna patología o dificultad por
la secretaria de la escuela.
La escuela asume la definición de la organización de los grupos de alumnxs y
conformación de parejas pedagógicas y desplaza la concepción individual del cargo docente
96|
96| patricia
patricia r.r. redondo
redondo

para ser pensado desde una función pedagógica compartida. A modo de ejemplo, quien es
preceptor o preceptora puede ocupar la posición de maestro/a junto con otro colega o un
profesor de taller. El cargo está asignado por un acto público pero es en la escuela donde se
define la función pedagógica que va a ocupar cada docente y la articulación con otro
integrante del equipo que habilita a quien está a cargo del taller de construcciones para que
quede a cargo del grupo de adolescentes del Altillo por la tarde en el espacio de la escuela
secundaria siempre “acompañado” por otros integrantes del equipo institucional.
Al mismo tiempo, los docentes que llegan con cargos asignados mediante listas de
méritos organizadas de acuerdo a puntajes y números de legajos son incluidos en
conversaciones que atienden también su disposición, historia, formación y deseo en
términos de una responsabilidad común, la de asumir la tarea educativa que le corresponda
cada año en diálogo con las biografías educativas y personales de lxs chicxs. La
construcción de esta mirada común no elimina las diferencias, por el contrario,
recuperando la metáfora del mosaico de Gaudi, amalgama experiencias (materiales) de
diferentes procedencias, formaciones disciplinares y biografías laborales. Esta composición
que incluye prácticas de articulación influye de manera decisiva en la tarea de la escuela,
en los modos de vincularse con las escuelas con las que integran alumnxs, en las
concepciones pedagógicas que vertebran el trabajo cotidiano. Los avances y los retrocesos
son registrados por el conjunto, hilos invisibles anudan vínculos, propuestas y
concepciones pedagógicas lo que permite establecer líneas de continuidad y alojar la
discontinuidad como también enfrentar las situaciones más inéditas que siempre se
presentan durante el año.
Una analogía con otros sujetos sociales puede ayudar a percibir lo que está
sucediendo en la Escuela 516. La urdimbre que tejen “las teleras”1111 en sus telares en
diferentes zonas de América Latina es también urdida y tramada por educadorxs en esta
escuela, por todos y todas, incluso aquellos que no cuentan con las credenciales del sistema
pero que cumplen la función educativa desde su posición en la trama escolar, estas figuras
son muy significativas en la vida cotidiana.
La organización de los seis grupos pedagógicos y las respectivas parejas de docentes
que los coordinan son una pieza clave para la escuela, el análisis de su conformación
incluye a todo el equipo institucional y, luego, también a los grupos familiares y a lxs
propixs chicxs pero alrededor de los grupos se definen también las integraciones, las
coordinaciones de los espacios de taller, los viajes del año y las novedades. Novedades que
crecen, asumen una dimensión que se distancia de una escuela de sectores populares que
trabaja en un barrio humilde como lo describen sus protagonistas. Esos sueños casi siempre
se cumplen durante el ciclo lectivo pero hay un dato que colabora para entender cómo se
logra lo que se logra, lo expresa enfáticamente la profesora de educación física en el patio
antes de iniciar la enseñanza del hockey en la escuela: “acá lo que hay es laburo, eso,
mucho laburo” (EPEFEE, septiembre del 2015). Marca la diferencia con otras escuelas y
señala que todas las escuelas pueden llevar a natación a los alumnxs pero hay que asumir el
compromiso y sostenerlo.
Una marca específica de la Escuela 516 es que ese trabajo se realiza en forma
colectiva y horizontal. La docente que vive por primera vez la experiencia de ser parte de
los espacios de decisión institucional lo relata aun sorprendida después de cinco años de
trabajo en la escuela:
No
No venía
venía una
una lista
lista que
que decía
decía te
te tocan
tocan tales,
tales, tales
tales yy tales
tales chicxs.
chicxs. No,
No, al
al contrario,
contrario,
se
se puso
puso una
una lista
lista dónde
dónde sese les
les preguntaba
preguntaba aa todos:
todos: Mirá
Mirá pensábamos…Aparte
pensábamos…Aparte
desde
desde un
un lugar
lugar muy
muy dede pares
pares ¿no?
¿no? Pensábamos
Pensábamos más más que
que estos
estos chicxs
chicxs pueden
pueden estar
estar

1111 Modo
Modo en
en que
que se
se nombra
nombra aa las
las tejedoras
tejedoras de
de telares
telares en
en la
la Quebrada
Quebrada de
de Humahuaca
Humahuaca en
en el
el Norte
Norte argentino.
argentino.
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 97
97

acá
acá qué
qué piensan?”
piensan?” No,
No, aa mí
mí me
me parece
parece que
que esto
esto puede
puede ser,
ser, porque
porque ya
ya lo
lo conocía,
conocía,
otro
otro no
no yy me
me pareció
pareció muy rico (ETCEE,
muy rico (ETCEE, octubre
octubre del
del 2015).
2015).

Los testimonios recogidos dan cuentas de construcción de espacios comunes,


integrados por un par de docentes o por todo el plantel, la cosa es siempre estar más de
unx, con frecuencia también son convocados los grupos familiares pero sobre todo lxs
chicxs. Esta es una marca insoslayable del trabajo en la Escuela 516: siempre hay más de
unx trabajando, y siempre personas de más de un segmento (docentes y chicxs; docentes y
responsables; docentes, chicxs y responsables. Nunca un docente solo; nunca sólo
docentes.
La gestualidad de la escuela es desmesurada y sostenida en el reparto de los bienes
simbólicos: quienes la integran desde el inicio están advertidos por la propia experiencia
laboral sobre el conjunto de representaciones que operan sobre sus alumnos y alumnas por
su discapacidad y por su condición social que naturalizan la oferta de lo mínimo. Para
unos, el primer impacto es llegar y encontrarse con escenas novedosas, inesperadas de las
que luego gradualmente serán parte. Desde diferentes experiencias, recorridos,
formaciones, tradiciones e incluso marcas generacionales aquellos que llegan en su
mayoría- de ser posible- eligen quedarse, ya que comprueban que “llegaron a puerto”.
Las imágenes de los que llegan teniendo que buscar primero donde queda Villa
Scasso son recurrentes:
Entrabas
Entrabas acá
acá yy no
no existía
existía dirección,
dirección, no
no existía
existía una
una computadora.
computadora. OtraOtra dede las
las
imágenes
imágenes que
que tengo
tengo dede esos
esos primeros
primeros días
días que
que me
me encantó,
encantó, fue
fue un
un día
día de
de lluvia,
lluvia,
muy
muy poca
poca gente,
gente, yy empezamos
empezamos aa hacer
hacer unun trabajo
trabajo con
con papel
papel maché
maché yy vino
vino
Alejandro,
Alejandro, se
se sentó
sentó arriba
arriba de
de la
la mesa
mesa yy nos
nos empezó
empezó aa leer
leer un
un libro
libro yy era
era el
el director
director
¿me
¿me entendés?,
entendés?, el
el director
director (EPTCEE,
(EPTCEE, octubre
octubre del
del 2015).
2015).

El sentarse y leer un libro se presenta como un gesto inesperado para la figura de un


director y sorprende a una de las docentes con más de veinte años de experiencia en el
sistema educativo. Lo inesperado puede ser pensado desde dos lugares: por ser el director
que no tiene un espacio fijo, una dirección y que circula, interviene y participa en la tarea
de enseñanza pero por el otro, en la situación de lectura con niñxs sobre los que se cargan
estereotipos y se supone que no leen ni escriben. Es posible enumerar infinidad de acciones
que por parte del equipo directivo, y también de algunos de los integrantes de los equipos
técnicos que se incluyen y son parte activa del trabajo educativo con lxs alumnxs. La
enseñanza se anuda en el terreno pedagógico y cada integrante de la escuela desde el
panadero hasta la fonaudióloga actúa en ese territorio común.
Acompañar
Acompañar aa los los proyectos
proyectos de de sede,
sede, áulicos
áulicos según…Bueno
según…Bueno escuchar
escuchar la
la propuesta
propuesta
del
del maestro
maestro yy estar
estar allí,
allí, no
no sólo
sólo acompañar
acompañar desde
desde un
un lugar
lugar pasivo
pasivo sino
sino activo.
activo. Y
Y
en
en todos
todos los
los proyectos,
proyectos, ya ya no
no importaba
importaba si
si en
en un
un proyecto
proyecto oo no
no de
de comunicación
comunicación
sino
sino que
que lo
lo importante
importante eraera lo
lo pedagógico
pedagógico (EFEE,
(EFEE, octubre
octubre del
del 2015).
2015).

Demarcar como un territorio donde lo común es la tarea educativa requiere tiempos


para transitar cambios de posición asignadas por el peso de las tradiciones en cada campo
profesional, una de las integrantes del equipo técnico así lo valora:
Los
Los compañeros
compañeros de de los
los equipos
equipos aa veces
veces vienen
vienen concon historias
historias muy
muy clásicas
clásicas de
de
equipo
equipo yy más
más de
de educación
educación especial
especial donde
donde sí
sí “Este
“Este día,
día, yy este
este día
día es
es para
para misión
misión yy
este
este día
día es
es para
para estos”
estos” yy vos
vos no
no podés
podés correr
correr las
las cosas.
cosas. Por
Por ahí
ahí yo
yo no
no era
era así,
así,
entonces
entonces esta
esta escuela
escuela fue
fue más
más oportuna
oportuna para
para todo
todo esto.
esto. Entonces
Entonces decís,
decís, vos
vos tenés
tenés
que
que pensar
pensar el
el equipo
equipo enen relación
relación aa esta
esta escuela,
escuela, si
si esta
esta escuela
escuela eses de
de esta
esta manera
manera el
el
equipo
equipo no
no puede
puede ser
ser de
de otra
otra (EOEEE,
(EOEEE, agosto
agosto del
del 2015).
2015).

Pasada la primera vez que significa aprender cómo llegar al barrio y recorrer los
cuatro kilómetros que separan a la escuela de la ruta, emprenden un camino nuevo,
98|
98| patricia
patricia r.
r. redondo
redondo

algunos rasgan el papel con la escritura para narrar su experiencia nueva. En casos muy
excepcionales después de algunos años eligen partir.
El
El primer
primer impacto
impacto fue
fue llegar
llegar aa la
la escuela,
escuela, oo sea
sea yo
yo venía
venía dede un
un ámbito
ámbito totalmente
totalmente
distinto
distinto porque
porque venía
venía haciendo
haciendo otrootro trabajo.
trabajo. Llegué
Llegué aa la
la escuela
escuela ee hice
hice un
un escrito
escrito
porque
porque aa mí
mí meme gusta
gusta escribir.
escribir. Entonces,
Entonces, cuando
cuando llegué
llegué aa la
la escuela
escuela justo
justo fue
fue un
un
día
día que
que se
se dedicaban
dedicaban aa hacer
hacer estas
estas jornadas
jornadas dede teatro
teatro yy actuaban
actuaban los
los maestros
maestros con
con
los
los chicos
chicos yy estaba
estaba el
el director
director disfrazado
disfrazado deldel Zorro.
Zorro. MeMe impactó
impactó lala predisposición
predisposición
que
que había,
había, estaban
estaban todos
todos preparándose
preparándose para para actuar,
actuar, mucha
mucha alegría,
alegría, mucho
mucho
entusiasmo.
entusiasmo. Y, Y, ese
ese entusiasmo
entusiasmo es es el
el que
que se
se contagia,
contagia, digamos.
digamos. Me
Me parece
parece que
que aa
esta
esta altura
altura que
que yaya es
es recíproco
recíproco unouno viene
viene concon una
una idea
idea yy bueno
bueno nosnos vamos
vamos
contagiando.
contagiando. Todas
Todas las
las ideas
ideas son
son buenas
buenas yy sese van
van puliendo
puliendo ¿no?
¿no? Hacia
Hacia unun fin
fin ¿no?
¿no?
Que
Que son
son lxs
lxs chicxs
chicxs (EPTEE,
(EPTEE, octubre
octubre del
del 2015)
2015)

La conformación del equipo institucional puede ser leída de manera lineal en


términos cronológicos o, por los modos en que el colectivo de la escuela siempre sostiene
una posición abierta que le permite incluir lo nuevo para capitalizar las diferentes
procedencias de quienes integran la escuela, como por ejemplo, los músicos, profesores de
la Orquesta. Desde el inicio, a pesar de las dificultades, comienza un proceso institucional
y pedagógico que, con avances y retrocesos, interrumpe la lógica tradicional y desplaza de
la forma escolar que tensiona y altera el tiempo escolar, interviene, transforma los espacios
y cambia la fisonomía de la escuela, emerge otra estética, otra paleta de colores. Pero, en
esa dirección, tres años atrás, la creación de la Orquesta y la inclusión de músicos que
nunca habían trabajado en la educación especial renueva la apuesta de la escuela y se
produce un nuevo encuentro que abre preguntas sobre los límites y posibilidades del
dispositivo escolar pero, sobre todo los logros de los alumnxs en la ejecución de los
instrumentos traspasa los límites y supera nuevamente las expectativas.
Se suman la creación de la ludoteca, la cascada, la estrella de hamacas para leer y
disfrutar en el parque, los bancos para sentarse con los pies en el aire, el taller de
construcciones y cocina con la decoración y pintura realizada con lxs chicxs, la
intervención de las paredes y los techos de las aulas, del mobiliario, entre otros pero sobre
todo la invención de propuestas pedagógicas. El juego pedagógico es abierto y eso dinamiza
al conjunto.
La escuela se irradia y proyecta su trabajo en el barrio con énfasis en el vínculo con
las familias como también en el trabajo con los jardines comunitarios y las escuelas
comunes. Las familias no son citadas para recibir novedades sobre el fracaso de su hijo, por
el contrario, es la escuela que sale de visita, conoce, recorre, conversa, dialoga e invita. Los
cuerpos de los docentes que no usan guardapolvos se hacen presentes en viviendas muy
humildes y hacen escuela entretejiendo con la intencionalidad de perforar los muros que con
suma frecuencia se instalan entre la escuela y los grupos populares. No es una tarea
sencilla pero el colectivo la realiza desde hace diez años de manera constante y compartida.
A ello se le suma que los docentes a cargo de los grupos mantienen contacto permanente
con las familias mediante comunicaciones telefónicas; en momentos en que las dificultades
aumentan, se obstinan en sostener el contacto si lxs chicxs no asisten a clase: esa
modalidad es asumida también por los asistentes de la Orquesta. En la escuela hay un solo
teléfono, al costado de un sillón muy gastado, es utilizado por todxs: la cocinera que hace
los pedidos a lxs proveedores, maestrxs que llaman a las casas de lxs alumnxs, la
trabajadora social que se comunica con juzgados u otras instituciones para ir a visitarlas,
los asistentes de la Orquesta que llaman a alguno de sus integrantes, entre otros. Un
teléfono viejo en un rincón deslucido comunica a la escuela, ´no hay internet, a no ser la
que llevan en sus celulares los docentes que la tienen móbil. Con todo, ese teléfono
anticuado es la forma de comunicación principal de la escuela y el mundo exterior. Nadie
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 99
99

está pendiente de controlar su uso; como en muchas otras circunstancias, la confianza es el


sutrato del vínculo institucional hacia adentro y hacia fuera de sus muros.
La comunicación con el exterior es vital y se usan todos los recursos disponibles. La
escuela atraviesa constantemente sus propios muros escolares, interrumpe la lógica escolar
más endogámica y los efectos que impone la distancia geográfica y social. Un ejemplo, ya
citado, pero que nos interesa revisitar se refiere al día en que la docente a cargo del grupo
de los más pequeños sale a buscar con la combi a lxs niñxs que no se pueden acercar hasta
la escuela -por las condiciones climáticas- para ir de paseo del Día del Niño. Las escenas de
encuentro con las familias en esquinas apenas urbanizadas enmarcan amorosamente una
escena educativa. La docente desciende de la combi para colaborar con los padres que se
trasladan cinco cuadras con su niña y su hermanito por las calles anegadas de agua y barro
para que puedan acceder al paseo. Al costado de la combi sucede una pequeña ceremonia, la
del cambio del calzado y el reparo que se ofrece a la pequeña de la intemperie.
La posición docente en el conurbano bonaerense y, en otras tantas barriadas
populares que rodean las grandes metrópolis latinoamericanas, invita a preguntarse: ¿Qué
motiva a esta docente a sostener esta escena? Ello incluye: impulsar y persuadir al chofer
para alcanzar los puntos pactados con las familias en cada esquina, comunicarse con la
familia tantas veces sea necesario hasta que lleguen y con su propio cuerpo colaborar para
cubrir y cambiar el calzado embarrado por otro que la madre trae prolijamente envuelto
para el paseo. Ni antes ni después de esta escena la docente realiza comentario alguno que
se asocie a una mirada piadosa o peyorativa sobre las familias; por el contrario, sólo la
situación de recolección de lxs niñxs se tensiona por el estado de las calles y el clima hasta
que todos son recogidos y manifestando muy buen humor nadie cede ante la dificultad.
La posición filiatoria de la docente torna la intemperie en amparo, un mojón más en
el puerto, un amarre, una gestualidad que aloja la infancia de Villa Scasso. Los niños y
niñas de su grupo de Villa Scasso festejan el Día del Niño en un Museo de los Niños en la
Ciudad de Buenos Aires. Frente a tanta distancia social y geográfica, la escuela opera
ofreciendo experiencias que igualan en el sentido de permitir vivenciar la igualdad con sus
pares. Los chicxs entran al Museo de los Niños como todos los demás, sin distinciones. El
cambio de calzado que prepara a la niña para el paseo, el chofer, las docentes hacen posible
que ello ocurra. Los niños y niñas celebran. Es una escena que abre líneas de pensamiento.
La posición de la maestra, la familia que se acerca y mantiene el vínculo con la escuela y
prepara a su hija para que viaje. La escuela que se responsabiliza, la disponibilidad a
experimentar una salida a un lugar nuevo en el centro de la Ciudad de Buenos Aires y la
ausencia de todo discurso caritativo, asistencialista, o piadoso.
Bueno
Bueno porpor eso,
eso, una
una cosacosa eses irte
irte aa buscar
buscar yy otra
otra cosa
cosa es
es invitarte.
invitarte. Parece
Parece una
una
taradez…pero
taradez…pero esa esa es
es la
la diferencia.
diferencia. Entonces
Entonces porque
porque unouno es
es trama
trama de de la
la escuela
escuela uno
uno
sabe
sabe que
que decís,
decís, si
si vas
vas aa algún
algún grado
grado que
que estén
estén faltando
faltando decís
decís “Mirá,
“Mirá, sabés
sabés queque
mañana
mañana pasapasa esto.
esto. En
En otras
otras escuelas
escuelas porpor ahí
ahí los
los del equipo1212 no
del equipo no saben
saben qué
qué tema
tema
están
están dando
dando enen un
un grado.
grado. Entonces
Entonces acáacá decís,
decís, sabemos
sabemos queque el
el viernes
viernes vava aa pasar
pasar
algo,
algo, bueno
bueno sabemos
sabemos que que los
los martes
martes pasa
pasa esto
esto enen educación
educación física,
física, los
los miércoles
miércoles
está
está la
la orquesta.
orquesta. Entonces
Entonces eso…uno
eso…uno lo lo invita
invita aa esos
esos momentos,
momentos, no no es
es que
que lo
lo obliga
obliga
aa venir
venir aa la
la escuela,
escuela, lo lo invita
invita aa estas
estas situaciones.
situaciones. Entonces
Entonces eso
eso gana
gana un
un montón
montón
(EOEEE,
(EOEEE, agosto
agosto del
del 2015).
2015).

Durante la investigación, las entrevistas, las observaciones en todas las instancias


se releva un discurso por parte de los docentes que escapa a toda grandilocuencia sobre la

12 En
12 En los
los testimonios
testimonios las las referencias
referencias al
al equipo
equipo aluden
aluden al
al “equipo
“equipo técnico”,
técnico”, así
así se
se lo
lo nombra
nombra enen la
la educación
educación
especial
especial en en la
la Provincia
Provincia de de Buenos
Buenos Aires,
Aires, también
también sese lo
lo conoce
conoce como
como gabinete
gabinete oo equipo
equipo de
de orientación
orientación
escolar
escolar yy sese integra
integra por:
por: una
una fonaudióloga,
fonaudióloga, una
una orientadora
orientadora educacional,
educacional, yy una
una trabajadora
trabajadora social.
social. En
En el
el caso
caso
de
de la
la escuela
escuela 516
516 se
se le
le suma
suma también
también una
una psicóloga.
psicóloga.
100|
100| patricia
patricia r.r. redondo
redondo

tarea que realizan; por el contrario, no la magnifican ni empequeñecen, la valoran como


parte de su trabajo: consideran que simplemente están haciendo lo que hay que hacer, lo
que cualquier docente podría hacer.
Es interesante destacar que existe cierta austeridad en el lenguaje: no se incluye la
palabra discapacidad, tampoco se describe a la población que atienden como pobre o
marginal y siempre que refieren al lugar donde se encuentra la escuela, nombran al barrio,
no al contexto. El carácter especial de la escuela se lo separa de la educación especial, los
docentes se “desespecializan” en un punto, reconocen que no saben, se nombran
ignorantes.
No
No sé,
sé, intencionalmente
intencionalmente trato trato de
de no
no usarla
usarla ¿no?
¿no? O
O como
como queque para
para hablar
hablar de de
discapacidad
discapacidad no no hay
hay que
que hablar
hablar de
de discapacidad,
discapacidad, algo
algo así
así ¿no?
¿no? Yo
Yo lo
lo pienso
pienso así,
así, lo
lo
decimos
decimos yy justo
justo el
el viernes
viernes también
también cuando
cuando presentábamos
presentábamos la la escuela
escuela decía
decía eso,
eso,
bueno
bueno nono somos
somos unauna escuela
escuela especial,
especial, somos
somos parte
parte del
del sistema,
sistema, pero
pero nono sabemos
sabemos
de
de discapacidad
discapacidad digamos,
digamos, yo yo nono sésé de
de discapacidad
discapacidad ¿no?¿no? Eso
Eso eraera como
como la la
presentación
presentación de de la
la escuela
escuela digamos,
digamos, no no tenemos
tenemos un un saber…Que
saber…Que aa la la vez
vez aparece
aparece
como
como una
una tensión
tensión también
también porque
porque tete dicen
dicen “¿Y
“¿Y bueno
bueno entonces?
entonces? SiSi no
no sabés
sabés dede
discapacidad
discapacidad ¿para
¿para qué
qué está
está la
la escuela
escuela especial?
especial? ¿Para
¿Para qué
qué está…?”,
está…?”, entonces
entonces ahí
ahí
viste,
viste, decíamos
decíamos bueno,
bueno, queque tal
tal vez
vez lala educación
educación especial
especial es
es una
una posibilidad
posibilidad de de
volver
volver aa mirar,
mirar, de
de aportar
aportar otra
otra mirada,
mirada, dede revisitar
revisitar la
la trayectoria
trayectoria dede los
los chicos
chicos
digamos,
digamos, pero
pero nono desde
desde unun lugar
lugar de
de déficit
déficit oo de
de pensar
pensar en
en la
la discapacidad
discapacidad como
como
algo
algo que
que limita
limita (EDEE,
(EDEE, septiembre
septiembre deldel 2015).
2015).

Ante las salidas, viajes y experiencias que significan una apuesta y un esfuerzo
significativo por parte de lxs maestrxs, se valora lo obtenido pero atendiendo los efectos
educativos en lxs chicxs que no siempre son visibles. O, si lo son, aparecen con el tiempo.
Pero sobre todo prevalece el entusiasmo y la alegría por concretar los viajes y las
experiencias: acercar la novedad al mundo de la escuela de Villa Scasso. La escuela sale al
mundo y los mundos entran a la escuela. Nuevamente, se trata de viajar, de movimiento,
de servir de pasaje, de puente, de tránsito.
Hilos y experiencias pedagógicas hilvanan el movimiento del pensamiento. La
escuela las narra y se narra cada día en la Ronda, en los momentos de comedor, en las
aulas, en el patio. Al narrarse entreteje su propia historia y la de quienes la protagonizan.
La narración toma cuerpo y una voz colectiva se enuncia como narradora. Benjamin sale
una vez más a nuestro encuentro, nos habla cuando escribe “el narrador toma lo que narra
de la experiencia; la suya propia o la transmitida, la toma a su vez en experiencias de
aquellos que escuchan su historia” (BENJAMIN, 1991). No existen narraciones épicas a ser
narradas, sí recuerdos que se enlazan, pequeñas historias cotidianas que se entrecruzan,
cronopios que visitan la escuela, gárgolas que la protegen, enigmas, relatos, viajes para
contar incluso sin salir de Villa Scasso. El marino y el campesino, nos describe el autor…
Y, las historias en el patio, o debajo de los árboles ¿cómo siguen? ¿Es posible
suponer una escuela que asume el lugar de un narrador, aquél que para Walter Benjamin
por el impacto de la modernidad se encuentra en extinción por el propio empobrecimiento
de la experiencia? (BENJAMIN, ibid). Sin embargo, en tierras desheredadas, donde los
movimientos sociales conquistan los derechos a pie, maestrxs, educadorxs, niñxs se
constituyen en narradorxs de infancias, de (otra) infancia, de (otras) experiencias
infantiles, aquellas jamás nombradas, sujetas al silencio o las marcas del desamparo.
Narradores que narran historias que escriben…

referencias
ABRAMOWSKI,
ABRAMOWSKI, Ana.Ana. Maneras
Maneras de
de querer.
querer. Los
Los afectos
afectos docentes
docentes en
en las
las relaciones
relaciones pedagógicas.
pedagógicas. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Paidós,
Paidós, 2010.
2010.
BENJAMIN,
BENJAMIN, Walter.
Walter. El
El Narrador.
Narrador. Madrid:
Madrid: Taurus,
Taurus, 1991.
1991.
maestrxs
maestrxs yy profesorxs
profesorxs de
de una
una “escuela
“escuela especial”:
especial”: narrativas
narrativas yy pensamientos
pensamientos || 101
101

DUSSEL,
DUSSEL, Inés.
Inés. Del
Del amor
amor yy lala pedagogía.
pedagogía. Notas
Notas sobre
sobre las
las dificultades
dificultades dede un
un vínculo.
vínculo. In:In:
FRIGERIO,
FRIGERIO, Graciela;
Graciela; DIKER,
DIKER, Gabriela
Gabriela (comps.).
(comps.). Educar:
Educar: figuras
figuras yy efectos
efectos del
del amor.
amor. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Del
Del Estante,
Estante, 2006.
2006.
FRIGERIO,
FRIGERIO, Graciela.
Graciela. Lo Lo que
que nono sese deja
deja escribir
escribir totalmente.
totalmente. In: In: FRIGERIO,
FRIGERIO, Graciela;
Graciela; DIKER,
DIKER,
Gabriela
Gabriela (comps.).
(comps.). Educar:
Educar: figuras
figuras yy efectos
efectos del
del amor.
amor. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Del
Del Estante,
Estante, 2006.
2006.
KOHAN,
KOHAN, Walter.
Walter. Viajar
Viajar para
para vivir:
vivir: Ensayar.
Ensayar. LaLa vida
vida como
como escuela
escuela de
de viaje.
viaje. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Miño
Miño yy
Dávila,
Dávila, 2016.
2016.
MEIRIEU,
MEIRIEU, Philipe.
Philipe. Carta
Carta aa unun joven
joven profesor.
profesor. Por
Por qué
qué enseñar
enseñar hoy.
hoy. Barcelona:
Barcelona: Grao,
Grao, 2006.
2006.
PENNAC,
PENNAC, Daniel.
Daniel. MalMal de
de escuela.
escuela. Barcelona:
Barcelona: Debolsillo,
Debolsillo, 2008.
2008.
SKLIAR, Carlos.
SKLIAR, Carlos. Charla
Charla en en Seminario
Seminario Interno
Interno dede Formación
Formación de de Productoras
Productoras yy Productores
Productores dede
Televisión
Televisión de
de PKPK
PKPK (20 (20 de
de mayo
mayo de de 2015).
2015).
______.
______. Acerca
Acerca dede la
la alteridad,
alteridad, la la normalidad,
normalidad, la la anormalidad,
anormalidad, la la diferencia,
diferencia, la la discapacidad
discapacidad yy la la
pronunciación
pronunciación de de lo
lo educativo.
educativo. Gestos
Gestos mínimos
mínimos para para una
una pedagogía
pedagogía de de las
las diferencias.
diferencias. In:
In:
ALMEIDA,
ALMEIDA, Ma. Ma. Eugenia
Eugenia et et al
al (comp.).
(comp.). Debates
Debates yy Perspectivas
Perspectivas en en torno
torno aa la
la discapacidad
discapacidad en
en
América
América Latina.
Latina. Paraná:
Paraná: Universidad
Universidad Nacional
Nacional de de Entre
Entre Ríos,
Ríos, UNER,
UNER, Facultad
Facultad de de Trabajo
Trabajo
Social,
Social, 2012,
2012, E-Book.
E-Book.
102
102
103
103

infância e imagem e corpo e linguagem: em modo de ensaio

césar donizetti pereira leite11

1.primeiras palavras:

O
propósito aqui é tecer um breve ensaio sobre alguns temas: infância e
imagem e corpo e linguagem. Sendo um ensaio o que aqui propomos não é
um texto que apresente uma linguagem dotada e domada por sentidos, que
fixa corpos inteiros, dados, previstos, acabados, mas uma linguagem que seja sugestiva,
indiciária, uma linguagem infantil que gagueje por frases, palavras, sílabas, letras, uma
linguagem povoada por uma imagem do próprio corpo infantil, um corpo ‘sem pé nem
cabeça’, uma imagem só cabeça, só pé, uma imagem sem foco, uma imagem cor, uma
imagem que ensaie outros percursos, outros temas, outros corpos, outra linguagem, outra
infância.
Para tal optamos por, entrecortar enredos, histórias, textos, narrativas, situações.
Produzir cenas, inventar proposições, criar mundos. Produzir sentidos, inventar modos de
ser, subjetividades, conceitos. Entre os ditos e não ditos possíveis de um texto, em um
texto, deslizar com palavras e imagens, falando sobre o que vimos e o que não vimos.
Assim o texto ensaia, não fecha, não finaliza, apenas inicia, apresenta começos, inaugura, o
texto infantiliza e tropeça, gagueja.
Tomamos então algumas questões sobre ensaiar um texto, em um texto, com um
texto, em Oculto nas palavras: dicionário etimológico do ensinar e aprender Castello e Mársico
indicam que ‘experimentar’ deriva do latim experior e significa “provar, fazer uma
experiência” (2007, p.46). assim também e na mesma perspectiva os autores apontam para
a ideia de experiência como uma forma de “operar sobre o real com o objetivo de conseguir
um conhecimento” (ibidem, p.46). Nestas orientações, temos que ‘experimentar’ se
relaciona a outros termos, entre eles destaco ‘prova’ ou ‘provar’ e ‘ensaio’ ou ‘ensaiar’.
Para ‘prova’ os autores (ibidem) fazem reflexões que acenam para ideias de exame,
julgamento, mas também para a ideia de provar como experimentar, e é esta última que
nos interessa, sobretudo se podemos pensá-la nas suas variáveis como algo relativo, como
sugere Castello e Mársico, a provar, experimentar como um processo prévio de
experimentação, uma atitude de ‘experimentar’ algo, assim como muitas vezes fazemos
com um alimento, uma bebida. A degustação como prova é na maior parte das vezes
experimentar aquilo que ainda não está pronto, para poder, entre outras coisas, dizer o que
falta, como se apresenta o tempero. Nas degustações, sentimos cheiro, textura, paladar,
temperatura, então colocamos à prova aquilo que ainda não se concluiu, ainda não é. Aquilo
que está se fazendo, aquilo que poderá ou não vir a ser.
Se o ensaio é uma forma de degustar, assim como frequentemente falamos (como
ensaio de uma peça, ensaio de um espetáculo), no ensaio experimentamos aquilo que, não
estando pronto passará por uma prova, para dele se dizer o que ainda falta. Assim, ensaiar
não é outra coisa senão se colocar na infância, na infância dos estados da vida, das coisas.
Apresentar um ensaio então seria como apresentar um texto infantil, infante, um texto-
infância, um texto menor, um texto ainda por vir, um texto porvir, um texto ainda não
pronto, um texto que ensaia, para que ele e deles se experimente.
Decidido a ensaiar priorizamos então experimentar um texto e experimentar em
um texto, pois a um texto que pretende falar de infância, corpo, linguagem, imagens
convém ser um texto que seja experiência, que seja prova, que seja ensaio. Neste texto,

11 Universidade
Universidade Estadual
Estadual Paulista,
Paulista, UNESP,
UNESP, Rio
Rio Claro,
Claro, SP.
SP. Email:
Email: mvhleite@uol.com.br
mvhleite@uol.com.br
104|
104| césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite

decidimos experimentar sobre acerca de nossa experiência de trabalhos que realizamos


com crianças e produção de imagens, com as infâncias que ali se manifestam, com corpo,
com a linguagem. Sendo assim, os movimentos se organizam a partir de olhares, imagens,
cenas montadas e recortadas, cenas que formam, informam, conformam, transformam,
deformam. O texto então, nos convida a pensar em uma educação de um olhar, educação
do olhar, não no sentido de um aprender a ver de outra forma, melhor, mais apurada, mais
dotada de saberes, mas uma educação do olhar que nos convide a caminhar, que nos tire de
onde estamos, que nos presentifique nas dobras e nas retas do percurso, que seja um ato de
atenção, na perspectiva do que nos apresenta Masschelein (2006).
Esse autor nos apresenta uma perspectiva potente para pensar em torno de uma
possível educação do olhar, para Masschelein (2006) educar se relaciona a sair, estar fora e
educar o olhar se refere em certo sentido a um ‘ato de atenção’. Poderíamos dizer então
que, esta perspectiva não nos aponta lugares onde devemos chegar, nossos objetivos, metas
e destinos, mas, pelo contrário nos empurra de onde estamos, daquilo que somos, nos
convoca a caminhar, não cria uma perspectiva dos lugares certos, finais, identitários, mas
nos implica a pensar nas travessias, nos percursos: “ser conducidos por algo que aún no nos
ha sido dado, sino que nos está siendo dado, algo que puntalmente se nos hace presente a
medida que avanzamos” (MASSCHELEIN, 2006, p. 300). Essa atitude educativa, não nos
reserva mais conhecimentos, certezas, garantias, pois elas nos colocam para fora de uma
perspectiva temporal, controlada, definida, demarcada, cronológica, essa atitude educativa
pelo contrário, ela nos expõem, nos coloca em uma experiência com as coisas, nos coloca
em uma relação com certa exterioridade, um estar fora.
Esse ‘ex’ que está no ‘prefixo’ da própria palavra experiência, o mesmo que está em
ex-terior, ex-terno, de ex-ilio. Não há experiência, sem que haja a presença de alguém, de
um outro. A pergunta que me soa razoável agora é se não seria então a própria infância
esse outro, não seria a própria infância ‘um estrangeiro’ como já apresentado por Kohan
(2007), que cria em mim a necessidade de uma ex-terioridade, de uma ex-periência, cria em
mim a necessidade de um deslocamento de territórios seguros, que me coloca diante, por
vezes de corpos, seres que através das imagens nos espelham nosso próprio inacabamento
em corpos que se apresentam recortados, fragmentados, são corpos disformes por efeitos
tecnológicos ou pelos modos de operar equipamentos. Assim, a educação do olhar se
apresenta como essa possibilidade, de uma educação que se apresenta como essa
perspectiva de um educere, de sair, de estar fora, de uma travessia. Sobre isso, o convite a
educação do olhar nos levaria a dizer que a atenção, pode então ser pensada como essa
possibilidade que me expõe ao presente, me presentifica, cria em mim uma condição única
de me abrir para as coisas e para o mundo, de contaminarme, que mi mirada puede ser
liberada (con la dirección de ‘ese’ presente). (MASSCHELEIN, 2006, p. 304).

2. corpo, meio corpo, sem corpo, .....


infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: em
em modo
modo de
de ensaio|
ensaio| 105
105

Tomemos as imagens, tomemos como ponto de partida imagens de corpos virados,


de corpos fragmentários e fragmentados, de corpos de passagens, de corposdedos e de
dedoscorpos, de corpos infantis, de corpos que subtraem outros corpos de uma pretensa
totalidade, de corpos inspirando e pirando corpos e outros corpos.
Dê-me
Dê-me portanto
portanto um
um corpo:
corpo: esta
esta éé aa fórmula
fórmula dada reversão
reversão filosófica.
filosófica. O
O corpo
corpo não
não éé
mais
mais oo obstáculo
obstáculo que
que separa
separa oo pensamento
pensamento de de si
si mesmo,
mesmo, aquilo
aquilo que
que se
se deve
deve
superar
superar para
para conseguir
conseguir pensar.
pensar. ÉÉ aoao contrário,
contrário, aquilo
aquilo em
em que
que ele
ele mergulha
mergulha ee ou
ou
deve
deve mergulhar
mergulhar oo impensado,
impensado, isto
isto é,
é, aa vida.
vida. Não
Não que
que oo corpo
corpo pense,
pense, porém,
porém,
obstinado,
obstinado, teimoso,
teimoso, ele
ele força
força aa pensar,
pensar, ee força
força aa pensar
pensar oo que
que escapa
escapa ao
ao
pensamento,
pensamento, aa vida
vida (DELEUZE,
(DELEUZE, 2007,2007, p.225).
p.225).

Um pensar o corpo, com o corpo, um corpo infantil, um corpo criança que se


apresenta em um povoado universo de sons e ruídos, silêncios e focos – nítidos ou não –
rostos, pés, cabeças, chãos e corpos se apresenta, perambulando, dançando, se misturando
com outros corpos, se batendo, se tocando, irritando, confundindo. Corposcâmeras,
câmerascorpos22.
Como se o corpo pensasse, como se pensasse pelo corpo. Pensamentos sem
sentidos, rotineiros e ameaçados, há sempre a ameaça de um corpo invadindo outro, outros
lugares, sempre a câmera pode ser parte do corpo e, se retirada, passa a ser amputada, passa
a ser mutilada, passa a ser corpo mutilado, amputado. Nestas mutilações e incorporações
de e em outros corpos, vemos baba, gosma, bafo, movimentos disformes, corridas, círculos.
Temos vertigens nos corpos-movimentos que se apresentam.
Deleuze é preciso ao dizer que:
as
as categorias
categorias da
da vida
vida são
são precisamente
precisamente asas atitudes
atitudes dodo corpo,
corpo, suas
suas posturas.
posturas. ‘Não
‘Não
sabemos
sabemos sequer
sequer oo que
que um
um corpo
corpo pode’.
pode’. [...].
[...]. Pensar
Pensar éé aprender
aprender oo que
que pode
pode umum
corpo
corpo não-pensante,
não-pensante, sua
sua capacidade,
capacidade, suas
suas atitudes
atitudes ouou posturas.
posturas. ÉÉ pelo
pelo corpo
corpo (e
(e não
não
mais
mais pelo
pelo intermédio
intermédio dodo corpo)
corpo) que
que oo cinema
cinema se se une
une com
com oo espírito,
espírito, com
com oo
pensamento.
pensamento. ‘Dê-me
‘Dê-me portanto
portanto um
um corpo’
corpo’ éé antes
antes de
de mais
mais nada
nada montar
montar aa câmera
câmera
sobre
sobre um
um corpo
corpo cotidiano
cotidiano (DELEUZE,
(DELEUZE, 2007,2007, p.
p. 227).
227).

Com as imagens que as crianças oferecem temos corpos produzindo pensamentos


vertigens. Ao olhar para as imagens destas câmerascorpos de corpos pulando, correndo, se
misturando, gritando, é isto que Deleuze chama de corpo cotidiano, “como isso que põe o
antes e o depois no corpo, o tempo no corpo, o corpo como revelador no termo”.
(DELEUZE, 2007, p. 228).
Os movimentos destes corpos sendo espaço, uma espécie de espaço fronteira e ao
mesmo tempo espaço sem fronteira, são atitudes que nos colocam em contato com uma
relação do corpo com o tempo, como esse corpo fora, esse corpo que estando fora se estende
no tempo que pode ser rápido ou lento, e as câmeras acabam sendo rápidas ou lentas, acabam
mostrando os tempos rápidos e lentos, é como se de alguma forma mostrassem o antes e o
depois.
E ainda, como se os corpos ameaçassem nosso corpo normal, nosso corpo uniforme,
nosso corpo carregado em uma organicidade, como se o corpo fosse ditado por uma

O
22O conceito
conceito de
de “Corposcâmera
“Corposcâmera ee camerascorpos”
camerascorpos” comocomo apresentados
apresentados aqui
aqui neste
neste texto
texto foi
foi desenvolvido
desenvolvido por
por
nós
nós no
no trabalho
trabalho em
em Infância,
Infância, Experiência
Experiência ee Tempo,
Tempo, Editora
Editora Cultura
Cultura Acadêmica,
Acadêmica, 2012.
2012. O
O mesmo
mesmo se se apresenta
apresenta
como
como sendo
sendo um
um intermezzo
intermezzo entre
entre aa criança
criança ee oo equipamento,
equipamento, oo espaço
espaço onde
onde efetivamente
efetivamente verificamos
verificamos que
que se
se
produzem
produzem asas imagens.
imagens.
106|
106| césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite

normalidade, por uma organicidade, mas também como se esse suposto corpo ditasse uma
normalidade, uma organicidade.
En
En laslas novelas
novelas de de Kafka
Kafka vienem
vienem aa nuestro
nuestro encuentro
encuentro criaturas
criaturas queque sese definen
definen
como
como ‘ayudantes’
‘ayudantes’ (Gehilfen).
(Gehilfen). Pero
Pero enen verdad
verdad ellas
ellas no
no parecen
parecen estar
estar enen condiciones
condiciones
de
de dar
dar ninguna
ninguna ayuda.
ayuda. No No entienden
entienden nada,
nada, no no tienen
tienen ‘instrumentos’,
‘instrumentos’, no no hacen
hacen
mas
mas que
que combinar
combinar tonterías
tonterías comcom chiquilinadas,
chiquilinadas, son son ‘molestos’
‘molestos’ yy encima
encima aa veces
veces
‘descarados’
‘descarados’ yy ‘lacivos’.
‘lacivos’. [...]
[...] Y
Y aun
aun así
así se
se asemejan
asemejan aa ángeles,
ángeles, aa mensajeros
mensajeros que que
ignoram
ignoram el el contenido
contenido de de las
las cartas
cartas que
que deben
deben entregar,
entregar, peropero cuya
cuya sonrisa,
sonrisa, cuya
cuya
mirada,
mirada, cuyo
cuyo propio
propio andar
andar ‘parece
‘parece unun mensaje’.
mensaje’.
Cada
Cada unouno de de nosotros
nosotros ha ha conocido
conocido aa estas
estas criaturas
criaturas queque Benjamin
Benjamin definedefine como
como
‘crepusculares’
‘crepusculares’ yy incompletas,
incompletas, similares
similares ee los
los gandharva
gandharva de de las
las sagas
sagas dede la
la India,
India,
mitad
mitad gênios
gênios celestes,
celestes, mitad
mitad demonios.
demonios.
Acaso
Acaso porque
porque el el niño
niño eses un
un ser
ser incompleto,
incompleto, la la literatura,
literatura, la la literatura
literatura para
para la
la
infancia
infancia estaesta llena
llena de de ayudantes,
ayudantes, seresseres paralelos
paralelos yy aproximativos,
aproximativos, demasiado
demasiado
pequeños
pequeños oo demasiado
demasiado grandes,
grandes, gnomos,
gnomos, larvas,
larvas, gigantes
gigantes buenos,
buenos, hadas
hadas yy genios
genios
caprichosos,
caprichosos, grillos
grillos yy caracoles
caracoles que que hablan,
hablan, borricos
borricos que que cagan
cagan dinero
dinero yy otras
otras
criaturas
criaturas encantadas
encantadas que que enen momento
momento del del peligro
peligro logran
logran porpor milagro
milagro sacar
sacar del
del
problema
problema aa la la buena
buena princesita
princesita oo aa Juan
Juan sin
sin miedo.
miedo.
Un
Un tipo
tipo perfecto
perfecto de de ayudante
ayudante es es Pinocho,
Pinocho, la la maravillosa
maravillosa marioneta
marioneta que que Geppetto
Geppetto
quiso
quiso fabricarse
fabricarse parapara dar
dar la
la vuelta
vuelta alal mundo
mundo con con ella
ella yy ganar
ganar así
así ‘um
‘um mendrugo
mendrugo de de
pan
pan yy un
un vaso
vaso de de vino’.
vino’. Ni
Ni vivo
vivo nini muerto,
muerto, medio
medio golem
golem yy medio
medio robot,
robot, siempre
siempre
listo
listo para
para ceder
ceder aa todas
todas las
las tendenciones
tendenciones yy aa prometer,
prometer, un un instante
instante después,
después, que
que
‘de
‘de hoy
hoy en en adelante
adelante seráserá bueno’,
bueno’, este
este arquetipo
arquetipo eterno
eterno de de la
la seriedad
seriedad yy de de gracia
gracia dede
lo
lo inhumano,
inhumano, en en lala primera
primera versión
versión de de la
la novela...
novela... (AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2005b, 2005b, p.
p. 37-39).
37-39).

As crianças, pelas imagens, nos mostram que as câmeras não usadas para filmar,
para fotografar, mas como que para brincar as câmeras desaparecem como equipamentos e
se re-aparecem como corpos, são assim usadas para explorar. As câmeras não são mais
meio, mas sim extensão do corpo, as câmeras e as imagens são formas, modos de explorar
o meio, o espaço, o tempo. São corpos explorando, montando e sendo montados.
A câmera, como forma de aprisionar corpos em memórias chip também liberta os
corpos, extraindo corpos graciosos.
Mas,
Mas, há
há outro
outro polo
polo do
do corpo,
corpo, outro
outro vínculo
vínculo cinema-corpo-pensamento.
cinema-corpo-pensamento. “Dar” “Dar” umum
corpo,
corpo, montar
montar uma uma câmera
câmera nono corpo,
corpo, adquire
adquire outro
outro sentido:
sentido: não
não éé mais
mais seguir
seguir ee
acuar
acuar oo corpo
corpo cotidiano,
cotidiano, mas
mas fazê-lo
fazê-lo passar
passar por
por uma
uma cerimônia.
cerimônia. Introduzi-lo
Introduzi-lo em em
uma
uma gaiola
gaiola dede vidro
vidro ou
ou um
um cristal,
cristal, impor-lhe
impor-lhe umum carnaval,
carnaval, um
um disfarce
disfarce que que dele
dele
faça
faça um
um corpo
corpo grotesco,
grotesco, mas
mas também
também extraia
extraia dele
dele um
um corpo
corpo gracioso
gracioso ou ou glorioso,
glorioso,
aa fim
fim de
de atingir,
atingir, finalmente,
finalmente, oo desaparecimento
desaparecimento do do corpo
corpo visível
visível [...]
[...] éé aa imagem
imagem
inteira
inteira que
que se
se mexe
mexe ouou palpita,
palpita, os
os reflexos
reflexos se
se colorem
colorem violentamente
violentamente (DELEUZE,
(DELEUZE,
2007,
2007, p.
p. 228).
228).

Nestes movimentos de crianças apresentam imagens que criam em nós sensações


vertigens.
infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: em
em modo
modo de
de ensaio|
ensaio| 107
107

Uma
Uma espectadora
espectadora escreve
escreve ao
ao cineasta
cineasta russo
russo Andrei
Andrei Tarkovski,
Tarkovski, surpresa
surpresa de de
encontrar
encontrar sua
sua própria
própria infância
infância em
em O O Espelho,
Espelho, testemunho
testemunho ee testamento
testamento do do artista
artista
como
como pôde
pôde oo autor
autor saber
saber de
de uma
uma experiência
experiência tão
tão pessoal,
pessoal, passada
passada em em uma
uma cidade
cidade
longínqua
longínqua ee dele
dele desconhecida
desconhecida [...]
[...] O
O ritmo
ritmo do
do tempo
tempo de
de uma
uma criança,
criança, oo som
som dede
uma
uma fala,
fala, uma
uma imagem
imagem malmal iluminada:
iluminada: aa imagem
imagem verdadeira
verdadeira revela
revela aa realidade,
realidade, oo
cinema
cinema produz
produz ou
ou inventa
inventa uma
uma comunidade
comunidade (LUZ,
(LUZ, 2002,
2002, p.
p. 116-117).
116-117).
As mutações corporais, sensoriais, vão nos levando a experimentações que escapam
às modulações do choro previsto, do riso calculado, a tensão premeditada das programações
do cinema comercial. A infância, pela criança, com as câmerascorpos, no seu mais comum,
nos ensina a criar, re-criar, singularizar, pois exprimem “espera, cansaço, vertigem”
(DELEUZE, 2007, p. 231), tornando-se um fato, um acontecimento, que só é, enquanto
sujeito (a criança), na medida em que se faz com o objeto (câmera).
Ainda sobre no campo desses encontros, observamos que estas crianças não nos dão
exatamente a presença de um corpo, mas que pelo corpo ela talvez se proponha a um outro
objetivo, a um outro propósito:
estende
estende sobre
sobre nós
nós uma
uma ‘noite
‘noite experimental’
experimental’ ou
ou um
um espaço
espaço branco,
branco, opera
opera com
com
‘grãos
‘grãos dançantes’
dançantes’ ee ‘poeira
‘poeira luminosa’,
luminosa’, afeta
afeta oo visível
visível com
com uma
uma perturbação
perturbação
fundamental,
fundamental, ee oo mundo
mundo comcom umum suspense,
suspense, que
que contradizem
contradizem toda
toda percepção
percepção
natural.
natural. Produz
Produz assim
assim aa gênese
gênese de
de um
um ‘corpo
‘corpo desconhecido
desconhecido (DELEUZE,
(DELEUZE, 2007,
2007, p.
p.
241).
241).

Nos movimentos de câmerascorpos e corposcâmeras, aprendemos que, por mais


que procuremos individualidades, pessoalidades, os desaparecimentos produzidos pelas
imagens nos fazem encontrar as singularidades estampadas, tecidas, constituídas, criadas,
montadas e, parafraseando Deleuze (em A imanência: uma vida), nos sorrisos, nos gestos,
nas caretas, pois as crianças em meio a sofrimentos e fraquezas, fragilidades e
incompletudes, são atravessadas por uma vida imanente que é pura potência.

AA idéia
idéia de
de uma
uma infância
infância como
como uma
uma ‘substância
‘substância psíquica’
psíquica’ sese revela
revela então
então umum mito,
mito,
como
como aquela
aquela de
de um
um sujeito
sujeito pré-linguistico,
pré-linguistico, infância
infância ee linguagem
linguagem parecem
parecem assim
assim
remeter
remeter uma
uma aa outra
outra em
em umum círculo
círculo no
no qual
qual aa infância
infância éé aa origem
origem dada linguagem
linguagem ee
aa linguagem
linguagem aa origem
origem da da infância.
infância. Mas
Mas talvez
talvez seja
seja justamente
justamente neste
neste círculo
círculo que
que
devemos
devemos procurar
procurar oo lugar
lugar da
da experiência
experiência enquanto
enquanto infância
infância dodo homem
homem
(AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2005a, 2005a, p.
p. 59).
59).

Como
Como infância
infância do
do homem,
homem, aa experiência
experiência éé aa simples
simples diferença
diferença entre
entre oo humano
humano ee oo
linguistico.
linguistico. Que
Que oo homem
homem não não seja
seja sempre
sempre já já falante,
falante, que
que ele
ele tenha
tenha sido
sido ee seja
seja
ainda
ainda infante,
infante, isto
isto éé aa experiência.
experiência. [...]
[...] Pois
Pois oo próprio
próprio fato
fato de
de que
que exista
exista uma
uma tal
tal
infância,
infância, dede que
que exista,
exista, portanto,
portanto, aa experiência
experiência enquanto
enquanto limite
limite transcendental
transcendental da da
linguagem,
linguagem, exclui
exclui queque possa
possa aa linguagem
linguagem ela ela mesma
mesma apresentar-se
apresentar-se comocomo
totalidade
totalidade ee verdade.
verdade. [...]
[...] Experiência
Experiência éé mystérionque
mystérionque todo
todo homem
homem institui
institui pelo
pelo
fato
fato dede ter
ter uma
uma infância.
infância. Este
Este mistério
mistério não
não éé umum juramento
juramento de de silêncio
silêncio ee de
de
inefabilidade
inefabilidade mística;
mística; é,é, ao
ao contrário
contrário oo voto
voto que
que empenha
empenha oo homem
homem com com aa palavra
palavra
ee aa verdade.
verdade. [...]
[...] A
A verdade
verdade nãonão é,
é, por
por isso,
isso, algo
algo que
que possa
possa ser
ser definido
definido nono interior
interior
da
da linguagem,
linguagem, masmas nem
nem mesmo
mesmo fora
fora dela
dela [...].
[...]. (AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2005a, 2005a, p.
p. 62-63).
62-63).
108|
108| césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite

3. infância, imagem, linguagem e diferença.


As imagens e os corpos das crianças parecem nos perguntar sobre uma perspectiva
predominante dentro da educação que é a ideia de certa homogeneidade, a ideia de uma
perspectiva uniforme, definida e definidora daquilo que é certo e dado no campo
educacional, as imagens e os corpos não parecem que excluem essas questões mas, parece
que nos perguntam sobre elas. Pois, pelas imagens e corpos, a marca daquilo que parece
único e identitário é a passagem e o povoamento de alteridades, de “outridades”, de
diferenças, de sobreposições, de sensações, de sentidos, de corpos e de tempos, migrando,
migrados, corpos que por se ocuparem vários espaços ao mesmo tempo são como corpos
heterotópicos, corpos convergindo em uma ou outra imagem eu um único corpo – mas
também escapando - em subjetividades e em modos de ser.
No percurso daquilo que as imagens nos oferecem e nos possibilitam pensar, pode-
se dizer que para além do discurso e das práticas institucionais, a política nos campos
imagéticos e de modulação de sentidos na linguagem e pela linguagem, pode ser pensada
como aquela que produz mundos, através de agenciamentos localizados, uma espécie de
“corpo sem órgãos da política, carne viva, que não se deixa totalizar em uma identidade
estável, seja ela a massa, a classe, ou o povo” (BRASIL, 2008, p. 6).
Dessa forma, a política cria um campo de ações que não se centra em uma noção de
sujeito, mas de subjetividade. A subjetividade seria, assim, criada, inventada, em
agenciamentos parciais, diagramáticos, que articulam elementos semióticos, políticos,
tecnológicos, “artísticos. A multitude é o conjunto não totalizável destas subjetividades
singulares” (BRASIL, 2008, p. 6).
Como escreve Deleuze, sim, “existem sujeitos: eles são grãos dançantes na poeira
do visível, lugares móveis em um murmúrio anônimo. O sujeito é sempre uma derivada.
Ele nasce e se esvai na espessura do que se diz, do que se vê” (BRASIL, 2008, p. 6). Os
deslocamentos, produtos das próprias experiências com as imagens, com os corpos, com a
linguagem e com a infância, indicam também a necessidade de poder pensar a educação e a
criança não como únicos e plenos, identitários e determinados, descritos por teorias
educativas e psicológicas, mas como singulares e múltiplos.

4. Algumas notas sobre infância:


Acima apresentamos alguns breves apontamentos sobre uma possível relação entre
infância e estrangeiridade. Fazer uma alusão a esta ideia de imediato sugere outras
questões, tanto em relação a ideia de infância, a de estrangeiridade, como também das
relações possíveis entre as duas.
O fato é que muitos tem sido os modos de falar sobre a infância, muitas tem sido as
alusões a um termo que atravessa a toda história da humanidade ocidental e neste sentido
acompanhando o historiador francês Philipe Ariès (1981) que nos apresenta que o conceito
de infância é uma invenção moderna, certamente não poderíamos escapar as diferentes
alusões ao infantil em outro momentos da história do ocidente, ou dito de outro modo,
dessa noção que na antiguidade grega e nos indicativos platônico nos permitem pensar no
in-fans como aquele ser privado de razão, de verdade, que carrega uma monstruosidade
que precisa ser domada, controlada pelo adulto, ou ainda as diferentes passagens bíblicas se
referindo à criança e ao infantil em diferentes contextos, ou ainda, a perspectiva presente
na época do império romano que a infância termina quando começa a vergonha, ou mesmo
como apontado por Ariès (1981) que na Idade Média a criança era vista como um adulto em
miniatura. Tudo isso nos leva a pensar, acompanhando a tese de Ariès (1981), da infância
como uma invenção moderna, que esta era inventa, cria, modula “uma” ideia de infância
que vai constituindo, produzindo, modulando nosso olhar para o infantil e para a criança e
nesse sentido para a nossa ideia de ‘desenvolvimento infantil’.
infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: em
em modo
modo de
de ensaio|
ensaio| 109
109

Devo ressaltar aqui a diferença quando falamos sobre a criança e quando falamos
sobre a infância. Falar de criança é falar desses seres pequenos e ainda com pouca idade,
por outro lado, falar da infância é falar de um conceito mais amplo, que de alguma forma
se situa em uma faixa fronteiriça entre várias áreas do conhecimento, a Filosofia, a
Política, a Linguagem, a Psicologia, a Sociologia, entre outros. O que nos parece possível
de pensar, sem necessariamente afirmar, é que os modos que lidamos com as crianças se
relacionam de modo muito íntimo aos modos pelos quais pensamos a infância e também
que nossas concepções de infância indiciam nossas práticas, nossos modos de viver e lidar
com a criança. Por isso, me parece que se podemos de alguma forma pensar questões em
torno dos olhares infantis não significa propriamente pensar em torno daquilo que as
crianças veem, olham, mas, pensar a respeito dos olhares infantis parece indiciar
possibilidades de abertura. Por isso que, mesmo que tenhamos muitas maneiras de pensar
o infantil e pensar a criança, me parece que se faz necessário aqui definir algumas questões
em torno do infantil, para que com ele possamos refletir acerca de algumas práticas com a
criança.
Tomaremos como um ponto de partida uma perspectiva de Giorgio Agamben
(2012) apresentada em seu livro A ideia da Prosa, esse autor nos oferece um instigante texto
chamado de “ideia de infância”, neste texto o referido autor nos relata a história de uma
determinada salamandra que vive nas águas doces do México, essa espécie chamada de
‘axolotl’. O que chamou a atenção dos zoólogos a respeito desse anfíbio, é que ele possuía
“uma cabeça relativamente grande e enterrada no corpo, a pele opalescente, com uma uma leve
mancha de cinzento no focinho e azulada e rosada nas excrecências febris à volta das
guelras, as delicadas patas com dedos em forma de flor-de-lis” (Agamben, 2012, p. 89).

Este ‘ser’ foi a princípio classificado como uma espécie própria que acabava
mantendo por todo o seu ciclo características larvares de um anfíbio, pois a grande questão
que se apresentava é que os axolotl apesar de seu aspecto tipicamente infantil possuía a
capacidade de reproduzir. Os estudos gerados por este curioso ser levou a criar uma
situação laboratorial em que, ao receber hormônios específicos gerou uma metamorfose
que os levava a perder as brânquias e a desenvolver respiração pulmonar, levando a
abandonar a vida aquática e ter características próximas a vida de uma salamandra
mosqueada. O fato é que, nos afirma Agamben, isso levou o axolotl a ser classificado como
um caso típico de regressão evolutiva, isso significa que, uma forma de derrota na luta pela
vida terrestre o obrigou a renunciar a vida terrestre e a prolongar a sua vida larvar, ou seja,
uma espécie de pedomorfose, de neotênia, que Agamben afirma, vem sendo uma nova
forma de entender a evolução humana.
110|
110| césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite

A
A evolução
evolução do do homem
homem nãonão se
se teria
teria dado
dado aa partir
partir dede indivíduos
indivíduos adultos,
adultos, mas
mas sim
sim
das
das crias
crias de
de uma
uma primata
primata que,
que, como
como oo axolotl,
axolotl, teria
teria adquirido
adquirido prematuramente
prematuramente aa
capacidade
capacidade dede se
se reproduzir.
reproduzir. Isso
Isso explicaria
explicaria aquelas
aquelas particularidades
particularidades morfológicas
morfológicas
do
do homem
homem que,que, da
da posição
posição do
do furo
furo occipital
occipital àà forma
forma de de concha
concha dada orelha,
orelha, da
da pele
pele
glabra
glabra àà estrutura
estrutura das
das mãos
mãos ee dos
dos pés,
pés, não
não corresponde
corresponde aa dosdos antropoides
antropoides adultos,
adultos,
mas
mas àsàs dos
dos seus
seus fetos.
fetos. Particularidades
Particularidades que
que nos
nos primatas
primatas são
são transitórias,
transitórias, mas
mas que
que
se
se tornaram
tornaram definitivas
definitivas no
no homem,
homem, realizando,
realizando, de de certo
certo modo
modo emem carne
carne ee osso,
osso, oo
tipo
tipo de
de eterno
eterno rapazinho
rapazinho (AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2012 2012 p.
p. 90).
90).

Em termos gerais, podemos pensar em duas direções, a primeira aquela que, nos
diria sobre a possibilidade supostamente necessária a vida humana de rejeição a este estado
larval e a necessária obstinação de responder à nossa carga genética e as suas leis. Por outro
lado, pensar quem sabe no que poderíamos chamar acompanhando Agamben de uma
criança neotênica, ela estaria em condições de
Poder
Poder dar
dar atenção
atenção precisamente
precisamente àquilo
àquilo queque não
não está
está escrito,
escrito, as
as possibilidades
possibilidades
somáticas
somáticas arbitrárias
arbitrárias ee não
não codificadas:
codificadas: na na sua
sua infantil
infantil onipotência,
onipotência, elaela seria
seria
tomada
tomada dede estupefação
estupefação ee ficaria
ficaria fora
fora de
de si,
si, não
não como
como os os outros
outros seres
seres vivos,
vivos, numa
numa
aventura
aventura ee num
num ambiente
ambiente específicos,
específicos, mas
mas pela
pela primeira
primeira vez,
vez, num
num mundo:
mundo: ela
ela
estaria,
estaria, verdadeiramente,
verdadeiramente, àà escuta
escuta do
do ser.
ser. EE como
como sua
sua voz
voz está
está ainda
ainda livre
livre de
de toda
toda
aa prescrição
prescrição genética,
genética, não
não tendo
tendo nada
nada para
para dizer
dizer ou
ou exprimir,
exprimir, ela
ela seria
seria oo único
único
animal
animal dede sua
sua espécie
espécie que,
que, como
como Adão,
Adão, seria
seria capaz
capaz dede nomear
nomear asas coisas
coisas nana sua
sua
língua.
língua. No
No nome,
nome, oo homem
homem liga-se
liga-se àà infância,
infância, para
para sempre
sempre amarrado
amarrado em em uma
uma
abertura
abertura que
que transcende
transcende todotodo destino
destino específico
específico ee toda
toda aa vocação
vocação genética.
genética.
(AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2012, 2012, p.
p. 91).
91).

Podemos aqui estabelecer de imediato uma conexão entre estas ideias e as


apresentadas acima a respeito da educação do olhar, que remetia a duas questões pontuais,
uma a da experiência, e esta ligada a uma exterioridade e outra da atenção, esta ligada à
presença, ao estar no mundo, de tal modo que ele se presentifique. Sendo assim, a abertura
proposta nas reflexões de Agamben, não estariam no fato de que esta condição produziria
um evento capaz de produzir uma condição interna capaz de se reproduzir geneticamente
ou por memória, mas antes e de qualquer maneira algo que se faz permanente em uma
exterioridade e que se for possível pensar em uma memória ela seria exossomática. Ou
seja, e ainda com Agamben,
Para
Para essa
essa criança,
criança, trata-se
trata-se de de não
não sese recordar
recordar verdadeiramente
verdadeiramente de de nada,
nada, dede nada
nada
que
que lhe
lhe teria
teria acontecido
acontecido ouou se se tenha
tenha manifestado,
manifestado, masmas que,
que, no
no entanto,
entanto, enquanto
enquanto
nada,
nada, antecipa
antecipa toda
toda aa presença
presença ee toda toda memória.
memória. Por Por isso,
isso, antes
antes dede transmitir
transmitir
qualquer
qualquer saber
saber ouou qualquer
qualquer tradição,
tradição, oo homem
homem tem tem dede necessariamente
necessariamente de de
transmitir
transmitir aa sua
sua própria
própria distração,
distração, aa suasua não
não latência
latência indeterminada,
indeterminada, (...)
(...) O
O
mesmo
mesmo se se poderia
poderia dizer
dizer através
através da da constatação,
constatação, aparentemente
aparentemente trivial,
trivial, de
de que
que oo
homem,
homem, antes
antes de
de transmitir
transmitir sejaseja oo que
que for,
for, tem
tem que
que transmitir
transmitir aa linguagem
linguagem (é (é por
por
isso
isso que
que umum adulto
adulto não
não pode
pode aprender
aprender aa falar:
falar: foram
foram asas crianças
crianças ee não
não os
os adultos,
adultos,
as
as primeiras
primeiras aa aceder
aceder àà linguagem;
linguagem; e, e, malgrado
malgrado os os quarenta
quarenta milênios
milênios da
da espécie
espécie dodo
Homo
Homo sapiens,
sapiens, aquilo
aquilo queque constitui
constitui precisamente
precisamente aa maismais humana
humana das das suas
suas
características
características –– aa aprendizagem
aprendizagem da da linguagem
linguagem –– permaneceu
permaneceu estritamente
estritamente ligado
ligado
aa uma
uma condição
condição infantil
infantil ee aa uma
uma exterioridade)
exterioridade) (AGAMBEN,
(AGAMBEN, 2012, 2012, p.92).
p.92).

O que vimos circulando, e fazendo operar em modos frequentes em nossa prática


com a criança e com a infância é que essa perspectiva neotênica de abertura, de novidade,
em que a infância se apresenta como espaço do novo, daquilo que inaugura mundos, não se
coloca, não está presente como uma possibilidade de nossas práticas cotidianas, mas sim, o
que se caracteriza em nossos modos de pensar a própria e o próprio da educação das
crianças são modos naturalizados de transmissão de valores que se colocam como imortais,
dados, codificados, onde uma perspectiva de cultura se fecha a abertura e aos começos que
a infância instala. Sendo assim, nossos modos dados e prontos de ver e sentir o mundo
infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: em
em modo
modo de
de ensaio|
ensaio| 111
111

através da cultura se instalam naquilo que rompe a latência da vida infantil que ainda
permanece no soma do homem e se traduz em nosso logos e em nossa razão, por que como
aa infância
infância não
não éé humanidade
humanidade completa
completa ee acabada,
acabada, éé por
por que
que aa infância
infância é,
é, como
como diz
diz
Lyotard,
Lyotard, in-humana
in-humana que,
que, talvez,
talvez, ela
ela nos
nos indique
indique oo que
que há
há de
de mais
mais verdadeiro
verdadeiro no
no
pensamento
pensamento humano:
humano: aa saber,
saber, sua
sua incompletude.
incompletude. Assim,
Assim, aa criança
criança revela
revela aa nós
nós oo
que
que somos
somos ee oo que
que tentamos
tentamos aa todo todo custo
custo esconder:
esconder: seres
seres incompletos
incompletos ee
inacabados
inacabados (LEITE,
(LEITE, 2007,
2007, p.
p. 169-170).
169-170).

Ou seja, parece que de alguma forma, habita em nós certo caráter neotênico, que
mantém aberta essa possibilidade de criação, essa possibilidade onde essa latência da
infância fosse verdadeiramente assumida e presentificada em Aión, criando assim uma
nova possibilidade de uma relação política com a infância e outros apelos à educação. O
fragmento 52 de Heráclito também cria essa possibilidade, diz o fragmento, o tempo é uma
criança que brinca, movendo as pedras do jogo pra lá e pra cá; o governo de criança.
Neste momento e mais especificamente acompanhando essa perspectiva
acompanhamos aqui uma instigante reflexão apresentada por Kohan (2003). Este autor
sugere uma incursão acerca da Filosofia de Heráclito na possibilidade de uma
problematização em torno da infância. Kohan (2003) apresentando Heráclito como o
filósofo dos fragmentos, de fragmentos que povoam o universo da Filosofia e que até por
isso, alguns enxergam neles uma característica bastante potente e outros são levados a
pensar que tudo o que poderia ser dito sobre ele já está falado. Não me interessa essa
polêmica, mas sim fazer alguns apontamentos acerca de seu pensamento, para com ele
problematizar em torno da questão da infância.
Acompanhando Kohan (2003, p. 120) faremos uma breve alusão apresentada por
Aristóteles que nos diz, entre outras coisas, que Heráclito nos apresenta duas teses, a
primeira que “o fogo é o princípio de todas as coisas” e a segunda “que tudo flui”. Nesse
mesmo sentido Kohan ainda se atenta a discutir sobre alguns fragmentos de Heráclito,
para esse autor (KOHAN, 2003 p.129), o que Heráclito enfatiza não é o movimento da
água, mas uma dupla oposição: (1) em primeiro lugar o fragmento revela uma distinção
entre “identidade e mesmidade” frente à “diferença e alteridade”. Essa oposição se
manifesta em dois sentidos: entre os rios idênticos a si mesmo e as águas que o constituem,
e entre as próprias águas que são diferentes entre si. E também de uma outra oposição
entre aqueles que o observam, que por um lado se apresenta totalizante, ou seja é o rio que
passa por ali, e por outro lado relativa.
Em suma, um dos problemas mais relevante que esse fragmento nos apresenta,
não
não éé oo de
de um
um suposto
suposto movimento
movimento ou ou fluir
fluir universal,
universal, senão
senão oo problema
problema do
do modo
modo
de
de ser
ser de
de identidades
identidades (neste
(neste caso
caso os
os rios,
rios, mas
mas acrescentaríamos
acrescentaríamos osos conceitos,
conceitos, as
as
infâncias,
infâncias, asas educações,
educações, ...)
...) que
que se
se apresenta
apresenta dentro
dentro de
de uma
uma perspectiva
perspectiva humana
humana
como
como algo
algo uno
uno ee aa uma
uma só só vez
vez também
também múltiplo,
múltiplo, idêntico
idêntico ee também
também diferente
diferente
(KOHAN,
(KOHAN, 2003, 2003, p.
p. 130)
130) (grifo
(grifo nosso).
nosso).

Uma das coisas que Heráclito parece nos ensinar com esse fragmento, e com outros
também, é a possibilidade de ver na suposta unidade uma perspectiva de multiplicidade.
Na perspectiva dessa ideia de unidade/identidade – multiplicidade, vamos a outros dois
fragmentos de Heráclito, também apresentados por Kohan (2003), que diretamente tocam
na criança. O primeiro é o fragmento 79 (HERÁCLITO, 1996, p. 96), onde ele diz, “o
homem como uma criança ouve o divino, tal como a criança o homem.” e o fragmento 52
(HERÁCLITO, 1996 p. 93), “tempo é a criança brincando, jogando; de criança o reinado”.
Bem, no primeiro fragmento aqui apresentado poderíamos dizer que Heráclito faz um
paralelo com a potencialidade da palavra, ou seja, a força da palavra de uma criança em
relação ao adulto trás a mesma com a força de uma palavra no adulto em relação à
112|
112| césar
césar donizetti
donizetti pereira
pereira leite
leite

divindade. Aqui vemos uma relação de forças entre os opostos e questões de poderes
sempre apresentadas na perspectiva de uma ideia corrente da infância como um “ser sem
palavras”. No segundo fragmento ao estabelecer uma relação tão próxima entre “tempo” e
criança ao dizer “tempo da vida” Kohan nos alerta que Heráclito diferente do que poderia
ser pensado não fala aqui de um tempo cronos, cronológico, mas sim de um tempo aiônico
(Aiôn filho de cronos e Filira, um tempo sem idade, eternidade), pois “tempo da vida” em
grego deveria ser traduzido “aiôn” que seria então, o tempo da própria intensidade, ou nas
palavras de Kohan (2003, p.147), ““tempo da vida” traduz aiôn, que, diferentemente de
chrónos, alude não ao tempo ‘objetivo’, mas ao mesmo tempo enquanto destino, o período
limitado da vida humana”. Aqui verificamos aiôn como uma criança que joga esse jogo de
oposições e ainda podemos afirmar que a criança é a rainha do tempo humano. É neste
ponto que passo agora a apresentar algumas questões relativas ao trabalho que
desenvolvemos com crianças e produção de imagens na Educação Infantil.
Sendo assim, parece que fica aqui algumas indagações que possam ser pensadas em
termos de uma educação das crianças, pois se a perspectiva até aqui apresentada em torno
da infância cria uma condição de latência e por isso uma nova condição para os olhares
infantis das crianças e dos adultos (e ainda mais precisamente dos adultos), rompe-se com
uma perspectiva de memória (genética ou dos sentidos) que instaura modelos e modos a
seguir, a serem reproduzidos, a serem lembrados e se constitui aqui uma nova política para
a educação das crianças e do olhar. Uma perspectiva que se constitui em torno da
invenção, de modos e formas de experimentar com as imagens, com os espaços, uma
perspectiva que cria uma potencia de um tempo brincante, de uma educação criançando
pelos espaços da escola ou fora dela. Uma perspectiva onde o exercício do olhar seja
povoado pelas aberturas dos não sentidos da infância, por aquilo que pode ser outra coisa
quando a imagem não é clara, não é dada, quando o detalhe toma conta, quando as cores se
confundem, quando o rosto perde as marcas, quando o corpo se mistura com outros corpos
deixando de ser corpos definidos e se confundindo em pernas, pés, mãos, rostos, ou quando
a memória não é dada e a educação não precisa reproduzir, mas inventar, criar outros
tempos, outras imagens, outros olhares.
Eu
Eu não
não amava
amava queque botassem
botassem data
data na
na minha
minha existência.
existência. AA gente
gente usava
usava mais
mais era
era
encher
encher oo tempo.
tempo. Nossa
Nossa data
data maior
maior era
era oo quando.
quando. O O quando
quando mandava
mandava em em nós.
nós. AA
gente
gente era
era oo que
que quisesse
quisesse ser
ser só
só usando
usando esse
esse advérbio.
advérbio. Assim,
Assim, por
por exemplo:
exemplo: temtem
hora
hora que
que eu
eu sou
sou quando
quando uma
uma árvore
árvore ee podia
podia apreciar
apreciar melhor
melhor osos passarinhos.
passarinhos. Ou:
Ou:
tem
tem hora
hora que
que eu
eu sou
sou quando
quando umauma pedra.
pedra. EE sendo
sendo uma
uma pedra
pedra eu
eu posso
posso conviver
conviver
com
com osos lagartos
lagartos ee musgos.
musgos. Assim:
Assim: Tem
Tem hora
hora que
que eu
eu sou
sou quando
quando um um rio.
rio. EE as
as
garças
garças me
me beijam
beijam ee me
me abençoam.
abençoam. EE essa
essa éé uma
uma teoria
teoria que
que aa gente
gente inventava
inventava nasnas
tardes.
tardes. Hoje
Hoje eueu sou
sou quando
quando infante.
infante. EuEu resolvi
resolvi voltar
voltar quando
quando infante
infante por
por um
um
gosto
gosto de
de voltar.
voltar. Como
Como quem
quem aprecia
aprecia ir
ir às
às origens
origens de
de uma
uma coisa
coisa ou
ou de
de umum ser.
ser.
Então,
Então, agora
agora eu
eu estou
estou quando
quando infante.
infante. (MANOEL
(MANOEL DE DE BARROS,
BARROS, 2010,
2010, p.133).
p.133).

Sendo assim, nos parece ser importante, nos perguntar. O que pode a imagem? O
que podem crianças com câmeras nas mãos nos oferecer a pensar, nos oferecer enquanto
modos de olhar para a escola? O que pode a imagem produzidas por crianças e professoras
no universo escolar e da própria educação?
Diante do exposto, poderíamos ensaiar alguns apontamentos no que diz respeito a
uma perspectiva em que a infância se apresenta como esse espaço onde o corpo
experimenta, onde o corpo se apresenta em uma multiplicidade de possibilidades, de
aberturas, onde o corpo se fragmenta em corpos outros, em blocos de sensações onde
devires se capilarizam na própria relação com as imagens, com as crianças, onde esses
‘blocos de infância’ nos convidam a pensar a educação para além da própria educação e
apresenta-la como uma educação ‘infantil’.
infância
infância ee imagem
imagem ee corpo
corpo ee linguagem:
linguagem: em
em modo
modo de
de ensaio|
ensaio| 113
113

referências
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio. Giorgio. Infância
Infância ee História:
História: destruição
destruição da da experiência
experiência ee origem
origem da da história.
história. Belo
Belo
Horizonte,
Horizonte, MG:MG: Editora
Editora UFMG,
UFMG, 2005a.2005a.
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Profanaciones.
Profanaciones. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Adriana
Adriana Hidalgo,
Hidalgo, 2005b.
2005b.
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Ninfas.
Ninfas. Valencia:
Valencia: Pre-Texto,
Pre-Texto, 2010.
2010.
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Ideia
Ideia de
de Prosa.
Prosa. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2012.
2012.
BARROS,
BARROS, ManoelManoel de.de. Poesia
Poesia Completa.
Completa. São São Paulo,
Paulo, SP:
SP: Leya
Leya Editora,
Editora, 2010.
2010.
BRASIL,
BRASIL, André.
André. M MODULAÇÃO
ODULAÇÃO/M /MONTAGEM
ONTAGEM:: Ensaio
Ensaio sobre
sobre biopolítica
biopolítica experiência
experiência estética.
estética. Tese
Tese de
de
Doutorado.
Doutorado. Programa
Programa de de Pós
Pós Graduação
Graduação em em Comunicação
Comunicação –– Faculdade
Faculdade dede Comunicação.
Comunicação.
Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Rio
Rio de
de Janeiro,
Janeiro, 2008.
2008.
CASTELLO,
CASTELLO, Luís, Luís, MÁRSICO,
MÁRSICO, Cláudia.
Cláudia. O O oculto
oculto nas
nas palavras:
palavras: dicionário
dicionário etimológico
etimológico para
para ensinar
ensinar ee
aprender.
aprender. Belo
Belo Horizonte,
Horizonte, MG:MG: Autêntica,
Autêntica, 2007.
2007.
COLLODI,
COLLODI, Carlo. Carlo. Pinóquio.
Pinóquio. Porto
Porto Alegre:
Alegre: L&PM,
L&PM, 2005.
2005.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.Gilles. A
A Imagem
Imagem Tempo
Tempo –– Cinema
Cinema 2. 2. São
São Paulo:
Paulo: Brasiliense,
Brasiliense, 2007.
2007.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Microfísica
Microfísica dodo Poder.
Poder. São
São Paulo:
Paulo: Graal,
Graal, 2009.
2009.
GALLO,
GALLO, Silvio.
Silvio. AA Vila:
Vila: Microfascismos,
Microfascismos, fundamentalismo
fundamentalismo ee educação.
educação. In: In: Fundamentalismo
Fundamentalismo & &
Educação.
Educação. Belo
Belo Horizonte,
Horizonte, MG:MG: Autêntica,
Autêntica, 2009,
2009, p.
p. 17-35.
17-35.
GALLO,
GALLO, Silvio.
Silvio. Infância
Infância ee Poder:
Poder: algumas
algumas interrogações
interrogações àà escola.
escola. In:
In: KOHAN,
KOHAN, Walter.
Walter. (org.)
(org.)
Devir-criança
Devir-criança dada Filosofia.
Filosofia. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2009,
2009, p.
p. 109-122.
109-122.
HERÁCLITO.
HERÁCLITO. Fragmentos.
Fragmentos. Coleção
Coleção os os Pensadores,
Pensadores, São São Paulo
Paulo SP:
SP: Editora
Editora Nova
Nova Cultural,
Cultural, 1996.
1996.
KOHAN,
KOHAN, Walter.Walter. Infância,
Infância, Entre
Entre aa Educação
Educação ee aa Filosofia.
Filosofia. Belo
Belo Horizonte.
Horizonte. MG:MG: Autêntica,
Autêntica, 2003.
2003.
______.
______. Infância,
Infância, estrangeiridade
estrangeiridade ee ignorância.
ignorância. Belo
Belo Horizonte.
Horizonte. MG: MG: Autêntica,
Autêntica, 2007.
2007.
LEITE,
LEITE, César
César Donizetti
Donizetti Pereira.
Pereira. Labirinto:
Labirinto: infância,
infância, linguagem
linguagem ee escola.
escola. Taubaté:
Taubaté: Cabral
Cabral Editora
Editora
Universitária,
Universitária, 2007.
2007.
LUZ,
LUZ, Rogério.
Rogério. Filme
Filme ee Subjetividade.
Subjetividade. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Contra
Contra Capa
Capa Livraria,
Livraria, 2002.
2002.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan. Jan. E-ducar
E-ducar la la mirada.
mirada. LaLa necesidad
necesidad de de una
una pedagogía
pedagogía pobre.
pobre. In:
In: DUSSEL,
DUSSEL,
Inés.;
Inés.; GUTIÉRREZ,
GUTIÉRREZ, Daniela Daniela (Org.)
(Org.) Educar
Educar LaLa Mirada:
Mirada: Políticas
Políticas yy Pedagogía
Pedagogía de
de la
la Imagen.
Imagen.
Buenos
Buenos Aires:
Aires: Manantial,
Manantial, 2006,
2006, p.
p. 295-310.
295-310.
RANCIÈRE,
RANCIÈRE, Jacques.
Jacques. O O Mestre
Mestre Ignorante.
Ignorante. Belo
Belo Horizonte,
Horizonte, MG: MG: Autêntica,
Autêntica, 2004.
2004.
SKLIAR,
SKLIAR, Carlos.
Carlos. Fragmentos
Fragmentos de de experiencia
experiencia yy alteridad.
alteridad. In:
In: Experiencia
Experiencia yy Alteridad
Alteridad enen Educación.
Educación.
Rosario:
Rosario: Homo
Homo Sapiens,
Sapiens, 2009.
2009.
114
114
115
115

a pesquisa como gesto infantil de (auto) educação:


notas para pensar um ser professor

simone berle11
ana paula saraiva morais22

E sse texto nasce de uma confusão de ideias e de um encontro ou de um


encontro que causou uma confusão de ideias… não se sabe. Ali, no encontro
e na confusão de ideias, está um desejo por dizer outras infâncias e a
incapacidade de concordar com uma forma. Chegamos até ali (ou aquí), protagonizando
encontros confusos ou encontros de ideias. Ana é uma das mais novas integrantes do
Núcleo de Estudos de Filosofias e Infâncias – NEFI. Simone já não é novata, mas também
não é “veterana”. Estamos em caminho. Ana chegou aqui como que trazida por uma onda
grande e forte: sua vida de professora na educação infantil. Simone já estava aqui quando
essa onda chegou e carregava um grande desejo que perguntava pela força e pela suposta
“opacidade” da infância. Da chegada ao encontro, o que nos reúne em torno dessa escrita é
a infância. A partir dela trataremos de pensar nossa educação de professoras pesquisadoras.
Falar de infância, como temos aprendido com o Núcleo de Estudos de Filosofias e
Infâncias é falar de começos, de potências. E por isso, é falar de algo que nunca está bem
resolvido que, por sua natureza mesma – a de começar, e por isso ser imprevisível – nunca
se mostra em sua totalidade... ou talvez em nossa altura de vida, nós, os grandes, é que não
possamos ver. Como escreveu Larrosa (2013, p. 183), “as crianças, esses seres estranhos dos
quais nada se sabe, esses seres selvagens que não entendem nossa língua”, não nos
interessa desvelar a infância, “[...] para reduzir o que ainda há de desconhecido nas
crianças e para submeter o que nelas ainda há de selvagem”, nos interessa manter a
inquietude, o questionamento, o vazio, o inexplicado, o não submetido, para manter uma
distância entre nossa vontade de saber e de poder com as crianças. Nos interessa, a partir
dos encontros com as infâncias, encontrar com nossos vestígios infantis para pensar a
educação dos educadores.
Em nossas conversas, encontramos com muitos fios soltos que trazemos da nossa
educação… muitas inquietudes, desejos de escapar, de encontrar formas de escapar de uma
lógica educativa que pensa já ter desvelado a criança, que concebe a educação um dever de
institucionalizar a infância. Por acreditar que a educação é a ação política de tornar o
conhecimento público tentaremos tecer algo juntas, entre nossos mundos, nossas infâncias,
entre nosotras. Não nos interessa amarrar os fios, somente fazer uma tentativa de reunir
experiências infantis para pensar um educar-se, com nossos fios soltos… ou nossos
pensamentos infantis… que começam.
Nossa principal experiência, aqui, diz respeito ao desejo que nos moveu até o Rio de
Janeiro. Paula do Ceará, Simone do Rio Gande do Sul. Não importava o quê, não sabíamos
bem como, só sentíamos que sair do lugar, movimentar-se, caminhar, pensar era
necessário. Fazer um caminho que nos permitisse encontrar com outras possibilidades de
educar. Nossa formação de pedagogas envolvidas com a infância nos colocou em distintas
situações em que tivemos o privilégio de acompanhar começos com as crianças em suas
vidas infantis, assim como fomos confrontadas com posturas adultas que, - na nossa
incapacidade de nomeação, dizemos -, percebem na infância uma fase da vida “selvagem”

11 Doutoranda
Doutoranda no
no Programa
Programa dede Pós-graduação
Pós-graduação em
em Educação
Educação da
da Universidade
Universidade do
do Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro ––
ProPEd
ProPEd UERJ.
UERJ. Bolsista
Bolsista FAPERJ
FAPERJ Nota
Nota 10.
10. Email:
Email: simone_berle@yahoo.com.br
simone_berle@yahoo.com.br
22 Mestranda
Mestranda no
no Programa
Programa dede Pós-graduação
Pós-graduação em
em Educação
Educação da
da Universidade
Universidade do
do Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro ––
ProPEd
ProPEd UERJ.
UERJ. Email:
Email: paulastordo@gmail.com
paulastordo@gmail.com
116|
116| simone
simone berle;
berle; ana
ana paula
paula saraiva
saraiva morais
morais

que precisa ser ordenada. O que sentimos é que juntas avivamos lembranças e sentimentos
uma na outra, sentimentos que chamamos infantis. Infantis porque sentimos que são
nascentes, primeiros, de começos. É assim que encontramos com a infância, como uma
potência de ser... não como uma condição social da criança, mas como uma possibilidade
filosófica de conceber o humano.
Nosso encontro deu-se com o NEFI, nosso desejo em comum de pensar a infância,
de desejar encontrar outros mundos possíveis de serem habitados pela infância nos fez
andar para a pós-graduação, nos fez querer ler, escrever, debater, pensar. Fomos tocadas
pela força da infância. A força que resiste, a força que subverte a ordem, a força que coloca
em xeque nossas certezas adultas.
Sobre os pesquisar e deslocamentos, temos aprendido com Masschelein e Simons
(2014) que “experiências de caminhada”, diz respeito “a arte de tornar algo capaz de
aparecer e se transformar em alguma ‘coisa’ (algo que nos preocupa, e que começa a
significar ou exprimir) que não apareceria sem esse trabalho”. (MASSCHELEIN;
SIMONS, 2014, p. 23). Ousamos tomar a caminhada também como figura de deslocamento
do pensamento é assim, pois, no gesto da escrita, que pensamos ser também um modo de
caminhar. O protocolo desse caminhar, dizem os filósofos belgas
[...]
[...] éé uma
uma orientação
orientação clara,
clara, que
que não
não leva
leva aa nada,
nada, éé como
como umum corte
corte que
que se
se abre
abre para
para
oo mundo.
mundo. Seguir
Seguir esse
esse caminho
caminho nãonão significa
significa realizar
realizar as
as intenções
intenções de de alguém
alguém ouou
responder
responder às às expectativas
expectativas de de alguém,
alguém, masmas éé um
um caminho
caminho queque implica
implica aa repetição
repetição ee
aa regularidade
regularidade mecânicas,
mecânicas, sem sem ‘sentido’,
‘sentido’, justamente
justamente parapara descentralizar
descentralizar nossas
nossas
intenções,
intenções, para
para tirar
tirar oo sujeito
sujeito do
do caminho,
caminho, por por assim
assim dizer,
dizer, ou,
ou, pelo
pelo menos,
menos, para
para
expô-lo.
expô-lo. O O protocolo
protocolo ajuda
ajuda aa suspender
suspender histórias
histórias por
por demais
demais familiares;
familiares; ajuda
ajuda aa
instalar
instalar uma
uma determinada
determinada disciplina
disciplina dodo corpo
corpo ee dada mente,
mente, tentando
tentando abrir
abrir um
um
espaço
espaço queque permite
permite experiências,
experiências, um um espaço
espaço para
para estudar
estudar ee para
para oo indivíduo
indivíduo se
se
expor,
expor, aa fim
fim de,
de, como
como dizia
dizia Bergson,
Bergson, não
não ver
ver oo que
que pensamos,
pensamos, mas mas para
para pensar
pensar no
no
que
que vemos,
vemos, para
para expor
expor nosso
nosso pensamento
pensamento para para oo que
que está
está acontecendo
acontecendo (ao(ao
presente)
presente) ee para para superar
superar nossas
nossas próprias
próprias reflexões,
reflexões, parapara quebrá-las.
quebrá-las.
(MASSCHELEIN;
(MASSCHELEIN; SIMONS, SIMONS, 2014, 2014, p.
p. 23).
23).

Com esse protocolo encontramos com a figura do professor pesquisador, que é


afirmado por Masschelein e Simons (2014) quando apresentam, a partir do pensamento de
Foucault, a pesquisa como uma pesquisa de si. Pesquisar, sugerem, diz respeito a
pesquisar-se. Isso exige, para os filósofos belgas, que nos coloquemos a caminho.
Poderíamos dizer que caminhar, nesse sentido, é a figura da dúvida ou da não certeza.
Como o caminho que se caminha todos os dias, mas que nunca é o mesmo ou que está
sujeito a não ser o mesmo. Porque a vida que vivemos passa, vive, existe e insiste ali, no
caminho. Por isso, evocam que caminhar com alguns parâmetros é diferente de buscar,
comprovar uma hipótese, pois trata-se de colocá-la também a prova. Isso significa expor-se
ao que surge no caminho, estar aberto e disposto a encontrar com o inesperado e acolhê-lo
como parte da ação de pesquisar. Diante disso, o percurso de tornar-se pesquisador, não
está mais vinculado à academia do que à escola e à vida, pois diz respeito a educar-se,
tornar-se, aprender a ser, a viver de outra maneira.
A infância que aqui buscamos escrever diz respeito a nossa preocupação com a
nossa educação ou com a educação de educadores. Por isso a infância que afirmamos está
no horizonte filosófico que a considera uma “forma de estar no mundo associada não aos
anos que se tem, mas à experiência de vida que se afirma” (KOHAN, 2012, p. 43), assim
desconfiamos da temporalidade cronológica para apostar na duração, desconfiamos das
etapas que concebem a vida uma sucessão linear de acontecimentos.
Não nos sentimos suficientemente formadas, educadas. E acreditamos que nunca
nos sentiremos. Talvez o sentimento que nos une é a angústia que nos confronta entre o
que aprendemos a ser e o que sentimos que somos. Aprendemos a andar com certezas e,
aa pesquisa
pesquisa como
como gesto
gesto infantil
infantil de
de (auto)
(auto) educação:
educação: notas
notas para
para pensar
pensar um
um ser
ser professor
professor || 117
117

talvez, a maior delas é a de que algum dia estaríamos formadas. Nos formamos professores
para formarmos outras pessoas. Estamos prontas para formar quando cumprimos um “x”
de qualificação. Estamos prontas para lidar com a incompletude do outro, que precisa ser
formado. Ainda que essa seja uma afirmação contundente, ela procura tensionar o gesto de
educar, afinal o ato educativo tem sido afirmado historicamente nas condições em que o
mais experiente ensina o menos experiente. A formação, a educação toma um caráter de
modelo, de forma. E apesar da força que o formato pode sugerir, nos parece bem pensar
outra forma de tensionar a palavra formação: como ação que dá forma ao ser professor.
Encontramos na ação, descrita por Hannah Arendt (2010), a relação com o começo ou a
natalidade. Para ela, “[...] a ação tem a relação mais estreita com a condição humana da
natalidade; um novo começo inerente ao nascimento pode fazer-se sentir no mundo
somente porque o recém chegado possui a capacidade de iniciar algo novo, isto é, de agir”.
(ARENDT, 2010, p. 10).
Para Arendt, a essência da educação é a natalidade, “o fato de que no mundo
tenham nascido seres humanos” (ARENDT, 2010). O recém-chegado rompe com a
continuidade do tempo e instaura um começo na continuidade. Aqui nos deparamos com a
ideia de começo. E outra possibilidade de pensar o termo infância fora da categoria
biológica. Sobretudo verticalizamos como nos interessa pensar a ação que forma ou a
formação do educador: como nascente. Por isso a figura infantil nos interessa, pois ela
ajuda a confrontar o que parece já ter uma forma certa.
Quantas vezes nos sentimos nascendo, recém-chegadas em um mundo? Quantas
vezes a vida de professor traz essa sensação?
A temática da infância tem mobilizado muitos estudos, debates e escritas, gerando
importantes reflexões que nos permitem abrir espaços para pensar outra vez sobre
cristalizados modos de viver e compartilhar o mundo, sobretudo com os novos. Quando
nos perguntamos pela infância ou reivindicamos a ela um status de pluralidade, estamos
querendo perguntar sobre a educação e reivindicar outros modos de ocupar os espaços de
vida coletiva.
Tomar a pergunta como gesto de filosofar ou como a infância do pensamento, tem
se tornado uma constante nos encontros com o NEFI. Perguntar exige escuta e diálogo,
sobretudo colocar algo sobre a mesa. Expor e expor-se, pois expor o que pensamos, como
pensamos, com quem pensamos, quando pensamos é uma exposição de quem somos.
Nesse sentido, expor nossos começos – duvidosos, instáveis, inseguros e medrosos – não é
mais do que uma tentativa de constituir-se educador a partir da prática de filosofar.

uma escrita no plural


A escrita tem se mostrado para nós como um nó. Um nó difícil de desfazer. “Nós”
que se encontram quando falamos de infância e dos modos como temos acompanhado
esses processos de viver as primeiras experiências no mundo e com o mundo. Nos
deparamos com relatos, vivência e experiências em que a ação adulta de educar tem se
preocupado mais em ensinar como o mundo é do que como ele pode ser, se preocupado
mais em dar respostas certas do que formular hipóteses. Diante dessas ações, nos
perguntamos não mais pela educação das crianças, mas como nós adultos podemos ajudar
as crianças se não nos colocamos em questão? E como podemos nos colocar em questão?
Como podemos nos perguntar pela infância do nosso ser educador?
Por isso tratamos da escrita como uma questão de estudo e de educação, pois, como
disse Larrosa (2002), pensamos com palavras e com os sentidos que a elas atribuímos.
Nossas infâncias e as infâncias que encontramos nos permitiram tecer essa escrita no
plural. As perguntas que temos perguntado também nos perguntam. Como se
precisássemos elaborá-las para nos elaborar, pensá-las para nos pensar. Talvez seja esse o
118|
118| simone
simone berle;
berle; ana
ana paula
paula saraiva
saraiva morais
morais

verdadeiro propósito de escrever: para pensar nossas palavras, para pensar nossas ações.
Pensar no plural, não é simples. Juntar vozes, cuidando para que todos sejam escutados,
representados, exige acolhimento, exige outras palavras, exige desaprender a dizer eu para
dizer nós. Exige encontrar um tempo e um espaço que seja igualmente nosso. Como
inspira a língua maya falada pela etnia tojolabal, exige criar uma língua que represente um
mundo para nós33. Essa tentativa será de abrir um pequeno espaço entre nós para, quem
sabem, fazer emergir o que temos pensado com nossa educação de educadoras.
Para von Foerster (1996, p. 65) “a linguagem e a realidade estão intimamente
conectadas” e nessa conexão “costuma-se afirmar que linguagem é a representação do
mundo”. Diante disso o autor propõe: “gostaria de sugerir o contrário: que o mundo é uma
imagem da linguagem. A linguagem vem primeiro; o mundo é uma consequência dela”
(VON FOERSTER, 1996, p. 65). Como são os mundos que aprendemos a dizer ou
sustentar na educação? Quais são as infâncias que temos afirmado com nossas palavras,
nossos gestos, nosso corpo, nossa vida?
A partir da vida em espaços coletivos de educação registramos memórias que
marcam infâncias que encontramos e que vemos desencontrada. São memórias, dentre
muitas, que nos possibilitaram considerar que para pensar sobre o acontecimento da
educação, precisamos pensar sobre nós mesmas.

encontros infantis i
Gabriel
Gabriel éé umum menino
menino contador
contador dede histórias.
histórias. Ele
Ele tem
tem quatro
quatro anos.
anos. Estamos
Estamos no no
ateliê
ateliê da
da universidade,
universidade, participando
participando de de oficinas
oficinas com
com luzluz ee sombra,
sombra, tintatinta ee
literatura.
literatura. Eu
Eu não
não sou
sou professora
professora dada escola
escola dodo Gabriel,
Gabriel, sou
sou parte
parte dodo projeto
projeto que
que
convidou
convidou aa turma
turma do do Gabriel
Gabriel para
para brincar
brincar nono ateliê
ateliê da
da universidade.
universidade. Os Os espaços
espaços
do
do ateliê
ateliê são
são amplos
amplos ee comcom algumas
algumas “fronteiras”,
“fronteiras”, Gabriel
Gabriel transita
transita porpor elas
elas com
com
uma
uma desenvoltura
desenvoltura impressionante.
impressionante. Os Os elementos,
elementos, as as pessoas,
pessoas, tudo
tudo vaivai fazendo
fazendo
parte
parte da
da narrativa
narrativa que
que eleele conta,
conta, como
como umum vento
vento que
que passa
passa ee vai
vai levando
levando consigo
consigo
oo que
que está
está pelo
pelo caminho.
caminho. Às Às vezes
vezes Gabriel
Gabriel éé barrado:
barrado: “Essa
“Essa brincadeira
brincadeira éé de de
menina!”.
menina!”. Às Às vezes
vezes Gabriel
Gabriel éé denunciado:
denunciado: “Profe,
“Profe, ele
ele está
está brincando
brincando de de boneca!”.
boneca!”.
Gabriel
Gabriel transita
transita pelas
pelas fronteiras
fronteiras como
como se se estivesse
estivesse emem solo
solo neutro.
neutro. No No ateliê
ateliê as
as
cores
cores ee os
os brinquedos,
brinquedos, são são cores
cores ee brinquedos.
brinquedos. EE ele ele sabe
sabe disso.
disso. A A narrativa
narrativa
sempre
sempre éé complexa
complexa ee envolve
envolve quem
quem sese dispuser
dispuser aa viajar:
viajar: sem
sem barreiras
barreiras impossíveis
impossíveis
de
de serem
serem transpostas.
transpostas. No No nosso
nosso último
último encontro,
encontro, Gabriel
Gabriel fezfez uma
uma festa
festa de
de
casamento.
casamento. Nós,Nós, professoras
professoras do do ateliê,
ateliê, fomos
fomos as as costureiras
costureiras dos dos seus
seus croquis.
croquis.
Quem
Quem quis
quis brincar,
brincar, teve
teve uma
uma roupa
roupa para
para festa
festa devidamente
devidamente ‘costurada’.
‘costurada’. Gabriel
Gabriel
certificou-se
certificou-se dede nos
nos apresentar
apresentar os os desenhos
desenhos no no papel.
papel. Quando
Quando entregou
entregou oo modelo
modelo
que
que desejava
desejava para
para seu
seu vestido,
vestido, Ana
Ana Luísa
Luísa –– uma
uma professora
professora do do ateliê
ateliê –– perguntou
perguntou
para
para ele:
ele: “Esse
“Esse éé oo teu
teu vestido?”.
vestido?”. Gabriel,
Gabriel, com
com aa mão
mão na na cintura,
cintura, lhe
lhe responde:
responde:
“Claro
“Claro que
que não!
não! Esse
Esse éé oo desenho!”.
desenho!”.
(memórias
(memórias da da Simone)
Simone)

Depois
Depois dada semana
semana dede carnaval,
carnaval, as
as fantasias
fantasias continuavam
continuavam disponíveis
disponíveis nana sala
sala da
da
Escola
Escola de
de Educação
Educação Infantil.
Infantil. As
As crianças
crianças vestiam
vestiam ee desvestiam
desvestiam as as roupas.
roupas. Elas
Elas
tinham
tinham quatro
quatro anos
anos ee brincavam
brincavam de de ser
ser um,
um, brincavam
brincavam de de ser
ser outro.
outro. Coloridos
Coloridos ee
mascarados.
mascarados. Mateus
Mateus sese encantou
encantou pela
pela saia
saia de
de tule
tule roxa
roxa ee preta.
preta. Mateus
Mateus rodopiava
rodopiava
com
com seus
seus colegas.
colegas. Passaram-se
Passaram-se dias
dias ee as
as fantasias
fantasias seguiram
seguiram circulando
circulando entre
entre as
as
crianças.
crianças. Mateus
Mateus circulava
circulava era
era com
com aa saia.
saia. Fazia
Fazia aa saia
saia rodopiar.
rodopiar. Assim
Assim como
como umum
boné,
boné, um
um óculos,
óculos, um
um carrinho,
carrinho, Mateus
Mateus andava
andava prapra cima
cima ee pra
pra baixo
baixo com
com oo
brinquedo.
brinquedo. Numa
Numa tarde
tarde dessas,
dessas, Mateus
Mateus nãonão estava
estava mais
mais com
com aa saia.
saia. O
O brinquedo
brinquedo
não
não era
era mais
mais das
das crianças.
crianças. OO brinquedo
brinquedo era,
era, pra
pra gente
gente grande,
grande, dede menina.
menina.
(memórias
(memórias dada Ana
Ana Paula)
Paula)

33 Para
Para saber
saber mais,
mais, consultar
consultar LENKERSDORF,
LENKERSDORF, Carlos.
Carlos. Filosofar
Filosofar en
en clave
clave tojolabal.
tojolabal. Disponível
Disponível em:
em:
<http://www.olimon.org/uan/lenkensdorf.pdf>.
<http://www.olimon.org/uan/lenkensdorf.pdf>.
aa pesquisa
pesquisa como
como gesto
gesto infantil
infantil de
de (auto)
(auto) educação:
educação: notas
notas para
para pensar
pensar um
um ser
ser professor
professor || 119
119

O que une essas memórias? Percebemos uma infância ou um gesto infantil que
resiste a uma denominação, conformação ao único modo de entender, viver e habitar o
mundo. O registro de acontecimento parece que, para nós adultas, provavelmente não foi o
mesmo das crianças. O que nós fizemos a partir desse acontecimento foi buscar um lugar
para resistir como as crianças. Parecem ter resistido, diante de uma nominalização bruta de
significados, elas inventaram o real que desejavam habitar e habitaram. Suspenderam
tempos e espaços e profanaram conceitos sem que nenhum adulto tivesse previsto.
Suspenderam e profanaram, sobretudo, nossa “adultez” que, em geral, está no comando. O
que havia ali para que essas crianças pudessem viver essas situações? Os espaços e tempos
foram organizados e pensados por adultos, mas as crianças tomaram iniciativas que
geraram outras narrativas, que engendraram outros sentidos naqueles tempos e espaços. A
possibilidade de começar algo novo, ficou evidente no rastro das ações das crianças.
Percebemos que para nos ocupar de ser educadoras, precisávamos nos aproximar
das crianças e de seus entendimentos infantis para nos aproximarmos de uma educação
que acolha verdadeiramente a imprevisibilidade infantil do humano, de inventar e romper
com o já pensado. Ou seja, precisávamos nos aproximar de nossas infâncias, de nós
mesmas.
O encontro com as crianças nos colocou diante da infância, da nossa infância.
Nossa infância de educadoras é a pergunta que pergunta por nós mesmas: como temos nos
educado? Como temos nos encontrado com os começos, com as dúvidas, com as incertezas,
com a imprevisibilidade que o encontro com o outro faz emergir? As propostas educativas
em espaços de vida coletiva geram condições para pensarmos a escola como intensidade da
convivência humana como espaço de vida e convivência. Nos distanciamos assim da ideia
que toma o pensar como sinônimo de raciocinar ou calcular (LARROSA, 2002). Sentimos
que fomos movidas a caminhar com o desejo de pensar essa pergunta pela infância.

encontros infantis ii
Durante
Durante umauma aula
aula na
na disciplina
disciplina dede “Estudos
“Estudos da da Infância
Infância ee da
da Juventude
Juventude II”
II”
ministrada
ministrada pelas
pelas professoras
professoras Miriam
Miriam Leite
Leite ee Vera
Vera Vasconcelos,
Vasconcelos, no no primeiro
primeiro
semestre
semestre dede 2014,
2014, no
no ProPEd/UERJ,
ProPEd/UERJ, conversamos
conversamos sobre
sobre fazer
fazer pesquisa.
pesquisa. Walter
Walter
afirmava
afirmava que
que não
não fazia
fazia pesquisa,
pesquisa, que
que aa prática
prática educativa
educativa que
que se
se afirmava
afirmava nono nosso
nosso
grupo
grupo dede pesquisa
pesquisa NEFI
NEFI (ao(ao qual
qual eueu acabara
acabara de
de me
me torna
torna integrante)
integrante) era
era outra.
outra.
Sem
Sem estar
estar convencida
convencida do do que
que ele
ele falava,
falava, perguntei:
perguntei:
-- Se
Se não
não fazemos
fazemos pesquisa,
pesquisa, então
então porque
porque estou
estou aqui?
aqui?
Ele
Ele respondeu:
respondeu: -- Você
Você quer
quer mesmo
mesmo saber?
saber?
Sem
Sem alternativa
alternativa para
para sua
sua pergunta,
pergunta, tentando
tentando encontrar
encontrar aa resposta
resposta certa,
certa, eu
eu disse:
disse: --
Sim!
Sim!
-- Você
Você está
está aqui
aqui para
para mudar
mudar aa sua
sua vida!
vida!
(memórias
(memórias da da Simone)
Simone)

Mudar a vida quer dizer que pensar não é um exercício que se faça isoladamente:
afirmamos com a vida o que pensamos, somos o que pensamos ao menos o que podemos
pensar. Esse desejo, não poderia ser de pensar mais uma vez como organizar tempos e
espaços educativos, elaborar o melhor currículo, pensar o cotidiano... Se educar é
acompanhar processos, então como temos acompanhado processos? Como temos gerado
espaços educativos? Qual língua temos usado? Instrutiva? Inventiva? Polarizada?
Escolhemos, aqui, pensar em uma possibilidade, a investigativa em que o “exercício do
pensamento é trabalho sobre si mesmo”. (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p. 14).
Tomamos, então, a tarefa de pesquisar como aprendizado e como educação. Aprender,
“é uma tarefa infinita. Não há nada prefigurado, predeterminado, previsto a aprender,
120|
120| simone
simone berle;
berle; ana
ana paula
paula saraiva
saraiva morais
morais

nada a aprender. Aprender é abrir os sentidos ao que carece de ser pensado”. (KOHAN,
2003, p. 223).
Educação como invenção de um caminho que necessita da experiência para
constituir-se, pois
oo que
que nos
nos acontece
acontece nosnos afeta
afeta particularmente,
particularmente, afeta
afeta aa relação
relação que
que temos
temos conosco
conosco ee
com
com oo mundo.
mundo. Essa
Essa relação
relação não
não pode
pode ser
ser reproduzida,
reproduzida, não
não pode
pode ser
ser passada
passada para
para oo
outro
outro (o
(o outro
outro não
não pode
pode atravessar
atravessar minha
minha experiência).
experiência). (KOHAN;
(KOHAN; OLARIETA;
OLARIETA;
WOZNIAK,
WOZNIAK, 2012, 2012, p.
p. 173).
173).

Diante da ideia de pesquisa como percurso de vida e da perspectiva da experiência


filosofar
filosofar éé inconciliável
inconciliável com
com aa ideia
ideia de
de um
um modelo,
modelo, de
de uma
uma forma
forma previamente
previamente
determina
determina àà qual
qual haveria
haveria de
de se
se ajustar.
ajustar. Se
Se aa experiência
experiência de
de pensar
pensar não
não éé nem
nem umum
conteúdo
conteúdo nemnem um
um mecanismo,
mecanismo, aa ideia
ideia tradicional
tradicional de
de “formar”
“formar” como
como um
um “moldar”
“moldar”
aa outro
outro para
para garantir
garantir essa
essa experiência
experiência deve
deve ser
ser descartada
descartada ou,
ou, no
no mínimo,
mínimo, seuseu
sentido
sentido deve
deve ser
ser reformulado.
reformulado. (KOHAN;
(KOHAN; OLARIETA;
OLARIETA; WOZNIAK,
WOZNIAK, 2012, 2012, p.
p.
174).
174).

Propomos pensar a educação de professores, na inseparabilidade das experiências


educativas, porém não tratamos de falar somente da educação institucionalizada, mas
também, e sobretudo, daquilo que parece ser algo formador, no sentido que lhe dão
Masschelein e Simons (2014), como o sentido, a forma que aprendemos a atribuir ao
mundo. Ação educativa enquanto educação de si ou, dito de outro modo, como invenção de
si.

a filosofia como (auto)educação


Masschelein e Simons (2014) concebem a filosofia da educação, assumidamente,
como uma tentativa de dar forma a uma postura que é abordada a partir do trabalho
educativo ou a filosofia como educação. Uma filosofia que é ascética e pública.
Ascética, pois não está vinculada ao entendimento da filosofia no viés da tradição
crítica, que diz respeito ao entendimento do trabalho filosófico como “um trabalho de
julgamento, ordenação, justificação, seleção, esclarecimento de conceito, interpretação ou
explicação” (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p. 10) ou seja, aquela que tem a pretensão
de validar algo, seja de forma ética, normativa ou epistemológica, pois revelam a verdade,
de modo que o filosofo ocupa um papel crítico-julgador que se distancia da realidade para
tomá-la como objeto de conhecimento. Por isso, os discursos e escritos ancorados na
tradição crítica da filosofia tomam a revelação da verdade, disciplinada e dirigida, como
uma demonstração, julgamento ou desmistificação, revelando um conhecimento adequado
para pessoas que precisam de esclarecimento. Para ilustrar tal posição os filósofos belgas
usam a imagem da alegoria da caverna: os que estão na caverna precisam do filósofo,
iluminado pelo conhecimento, para guiá-los em direção à luz (MASSCHELEIN;
SIMONS, 2014, p. 10-11).
Inspirados em outra tradição de filosofia, Masschelein e Simons (2014, p. 11),
[...]
[...] reconhecidamente
reconhecidamente mais mais marginal,
marginal, queque podemos
podemos chamar
chamar dede tradição
tradição ascética
ascética
(ou
(ou existencialmente
existencialmente orientada),
orientada), que
que compreende
compreende aa crítica
crítica não
não em em termos
termos de de
julgamento,
julgamento, mas mas em
em termos
termos dede uma
uma experiência
experiência ee de
de uma
uma exposição.
exposição. Nessa
Nessa
tradição,
tradição, oo trabalho
trabalho da
da filosofia
filosofia é,
é, em
em primeiro
primeiro lugar,
lugar, sobre
sobre si,
si, isto
isto é,
é, submeter
submeter
alguém
alguém àà ‘prova
‘prova da
da realidade
realidade contemporânea’
contemporânea’ (Foucault),
(Foucault), oo queque implica
implica um um
entendimento
entendimento não não dos
dos outros,
outros, mas
mas dede si
si mesmo
mesmo –– porém
porém dede si
si mesmo
mesmo não não como
como
sujeito
sujeito do
do conhecimento,
conhecimento, mas mas como
como sujeito
sujeito da
da ação.
ação. Essa
Essa submissão
submissão de de alguém
alguém àà
prova
prova é,é, portanto,
portanto, um
um exercício
exercício no
no contexto
contexto da da autoformação
autoformação ee autoeducação:
autoeducação: ela ela
procura
procura transformar
transformar ouou modificar
modificar oo modo
modo de de ser
ser de
de alguém
alguém ee como
como esseesse alguém
alguém
vive
vive oo presente.
presente.
aa pesquisa
pesquisa como
como gesto
gesto infantil
infantil de
de (auto)
(auto) educação:
educação: notas
notas para
para pensar
pensar um
um ser
ser professor
professor || 121
121

Complementam com Foucault (2007/1984, p.114 apud MASSCHELEIN; SIMONS,


2014, p. 17) que essa transformação é que a possibilita a percepção e o conhecimento.
A
A filosofia
filosofia (da
(da educação),
educação), entendida
entendida assim
assim como
como exercício,
exercício, pode
pode ser
ser educativa
educativa em em
três
três sentidos.
sentidos. EmEm primeiro
primeiro lugar,
lugar, como
como uma uma espécie
espécie dede investigação
investigação ou ou dede
pesquisa
pesquisa queque insinua
insinua colocar
colocar emem jogo
jogo (por
(por àà prova)
prova) aa própria
própria pesquisadora,
pesquisadora, ou ou
seja,
seja, sugerir
sugerir um
um autodidatismo
autodidatismo como como ‘trabalho
‘trabalho sobre
sobre si’.
si’. Esse
Esse trabalho
trabalho éé aa
condição
condição necessária
necessária para
para obter
obter insights
insights dentro
dentro dodo ‘campo
‘campo dede batalha
batalha das
das forças’.
forças’.
Em
Em segundo
segundo lugar,
lugar, essa
essa filosofia
filosofia pode
pode serser educacional,
educacional, no no sentido
sentido dede que
que oo
presente
presente que
que está
está emem jogo
jogo (e
(e éé investigado)
investigado) éé oo presente
presente educacional,
educacional, oo presente
presente
dos
dos discursos
discursos educacionais,
educacionais, instituições
instituições ee práticas.
práticas. E,
E, em
em terceiro
terceiro lugar
lugar –– ee mais
mais
importante
importante -,-, aa filosofia
filosofia como
como um um ensaio
ensaio também
também éé um um gesto
gesto público.
público. Portanto,
Portanto,
também
também éé educacional
educacional no no sentido
sentido de de que
que ela
ela pode
pode ter
ter um
um significado
significado para
para os
os
outros
outros que
que são
são convidados
convidados aa compartilhar
compartilhar aa experiência
experiência ee construir
construir um um público
público
pensante
pensante (isto
(isto é,
é, eles
eles são
são convidados
convidados aa se se colocarem
colocarem àà prova,
prova, ee não
não aa serem
serem
ensinados).
ensinados). A A filosofia
filosofia como
como ‘exercício
‘exercício de de pensamento’
pensamento’ nãonão éé ‘disciplina’,
‘disciplina’, logo
logo ela
ela
exige
exige ee implica
implica oo uso
uso público
público da razão44..
da razão

A partir de Arendt, consideram que descrever o seu próprio trabalho filosófico é um


exercício de pensamento que exige estar no presente, afirmam o presente como a lacuna
entre o passado e o futuro. Essa seria, para Arendt (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p.
12), a região adequada do pensamento que, ao contrário do que desejou a metafísica
ocidental, está inscrita em um tempo e um espaço. Tempo e espaço que dizem respeito ao
que experimentamos quando estamos atentos, ou, nas palavras dos filósofos belgas,
“quando estamos presentes no presente” e “nos inserimos e, assim, também nos expomos
ao que está acontecendo” (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p.13). E esclarecem que “o
presente, como a lacuna onde esses exercícios acontecem, só existem na medida em que o
homem reconhece ou experimenta a si mesmo como iniciante, como um sujeito da ação, e
se insere no tempo” (idem). A possibilidade de iniciar, significa a possibilidade da novidade
que irrompe na continuidade, ou da ruptura que um início pode conter.
Afirmam, então, que “o presente é a lacuna, e a maneira de viver nessa lacuna é
pensar” (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p. 14). A partir de Arendt, elaboram que “[...]
o pensamento é uma atividade imediatamente relacionada com uma questão existencial de
como viver no presente” (idem). E pensar, “[...] significa: não se esquecer de si mesmo [...]
como sujeito da ação, como sendo uma inserção no tempo, um início através do qual as
forças (histórica, psicológica, social...) atuam” (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p.14).
Assumimos, a partir da obra de Arendt e de Foucault (1992) que tal tarefa é da
ordem da relação do humano com o mundo. Portanto exige a exposição. Aqui, essa
exposição está marcada pela ideia da filosofia como educação, entendida por um exercício
do pensamento como trabalho sobre si mesmo em três sentidos: a) colocar em jogo a
própria pesquisadora, sugere um trabalho sobre si; b) colocar o presente educacional em
jogo, ou seja, “o presente dos discursos educacionais, instituições e práticas” ; c) como um
gesto público, e portanto, também é educacional na medida em que pode ter significado
para outros “que são convidados a compartilhar a experiência e constituir um público
pensante (isto é, eles são convidados a se colocarem à prova, e a serem ensinados)”.
(MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p. 17).
Ser professor torna-se o modo como aprendemos a habitar o mundo. Almeida (2011)
explica que, para Arendt, “mostrar o mundo para os novos é a tarefa dos mais velhos, que
fazem parte deste mundo e são corresponsáveis por ele”. (SIEVERS, 2011, p. 28). Nas
palavras de Arendt (1990a, p. 239 apud SIEVERS, 2011, p. 28), “face à criança é como se ele
[o professor] fosse um representante de todos os habitantes adultos, apontando os detalhes

44 Sobre
Sobre oo uso
uso público
público da
da razão,
razão, os
os filósofos
filósofos belgas
belgas retomam
retomam Kant.
Kant.
122|
122| simone
simone berle;
berle; ana
ana paula
paula saraiva
saraiva morais
morais

e dizendo à criança: Isto é o nosso mundo”. Como temos nos colocado, diante da
responsabilidade de acolher os novos e apresentar o mundo? Como temos apresentado o
mundo, um mundo, mundos...?
Na perspectiva arendtiana de que não nascemos o que somos, mas nos tornamos
quem somos, ser professor, talvez, seja o privilégio e a responsabilidade de compartilhar
nossa autoria. Esse privilégio e essa responsabilidade estão inscritas no compromisso com
os novos, de possibilitar que eles inventem sua autoria, sabendo que esse mundo tem uma
história, e que se esse mundo depende do interesse comum que conseguimos criar com
nossa autoria.
Trata-se também de uma dimensão política da vida porque exige, para a vida
comum, conviver. Toda ação carrega traços de natalidade, de nascimento, de novidade,
porque a humanidade carrega consigo - a imprevisibilidade - do poder inventivo de tornar-
se.
Se
Se aa criança
criança não
não fosse
fosse um
um recém-chegado
recém-chegado nesse
nesse mundo
mundo humano,
humano, porém
porém
simplesmente
simplesmente uma
uma criatura
criatura viva
viva ainda
ainda não
não concluída,
concluída, aa educação
educação seria
seria apenas
apenas
uma
uma função
função da
da vida
vida ee não
não teria
teria que
que consistir
consistir em
em nada
nada além
além dada preocupação
preocupação para
para
com
com aa preservação
preservação da
da vida
vida ee do
do treinamento
treinamento ee na
na prática
prática dodo viver
viver que
que todos
todos os
os
animais
animais assumem
assumem emem relação
relação aos
aos seus
seus filhos
filhos (ARENDT,
(ARENDT, 2011,2011, p.
p. 235).
235).

Se trata de assumir que a tarefa educativa não é de apresentar um mundo para


preservá-lo, mas de fazer nascer, de ajudar ao outro a ser.
Terminamos com os fios soltos, pois sentimos que são eles que permitem fazer
outros arranjos, eles são de começos, geradores de gestos. Assim pensamos a figura do
educador, aquele que consegue acompanhar e acolher novos gestos, que ajuda o outro a
encontrar e valorar com sentidos no e com o viver.

referências
ALMEIDA,
ALMEIDA, Vanessa
Vanessa Sievers
Sievers de.
de. Educação
Educação em em Hannah
Hannah Arendt:
Arendt: entre
entre oo mundo
mundo deserto
deserto ee oo amor
amor aoao
mundo.
mundo. São
São Paulo:
Paulo: Cortez,
Cortez, 2011.
2011.
ARENDT,
ARENDT, Hannah.
Hannah. A A condição
condição humana.
humana. 9. 9. ed.
ed. Rio
Rio de
de janeiro:
janeiro: Forense
Forense Universitária,
Universitária, 2010.
2010.
______.
______. A
A crise
crise na
na educação.
educação. In:In: ______.
______. Entre
Entre oo passado
passado ee oo futuro.
futuro. São
São Paulo:
Paulo: Perspectiva,
Perspectiva, 2011,
2011, p.221-
p.221-
247.
247.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. A A escrita
escrita de
de si.
si. In:
In: ______.
______. O
O que
que éé um
um autor?
autor? Lisboa:
Lisboa: Passagens,
Passagens, 1992,
1992, p.
p. 126-
126-
160.
160.
KOHAN,
KOHAN, WalterWalter O.;
O.; OLARIETA,
OLARIETA, Beatriz Beatriz Fabiana;
Fabiana; WOZNIAK,
WOZNIAK, Jason. Jason. Repensando,
Repensando, com com outras
outras
vozes,
vozes, os
os sentidos
sentidos dede filosofar.
filosofar. In:
In: ______(orgs.).
______(orgs.). A A escola
escola pública
pública aposta
aposta no
no pensamento.
pensamento. BeloBelo
Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2012,
2012, p.167-239.
p.167-239.
LARROSA,
LARROSA, Jorge.Jorge. OO enigma
enigma da da infância
infância ou ou oo que
que vai
vai do do impossível
impossível ao ao verdadeiro.
verdadeiro. In:In: ________.
________.
Pedagogia
Pedagogia profana:
profana: danças,
danças, piruetas
piruetas ee mascadas.
mascadas. BeloBelo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2013,
2013, p.
p. 183-198.
183-198.
______.
______. Notas
Notas sobre
sobre aa experiência
experiência ee oo saber
saber de de experiência.
experiência. Revista
Revista Brasileira
Brasileira da
da Educação,
Educação, RioRio dede
Janeiro,
Janeiro, ANPED
ANPED n.19,n.19, Jan/Fev/Mar/Abr,
Jan/Fev/Mar/Abr, p.20-28,p.20-28, 2002.
2002.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten.
Maarten. Filosofia
Filosofia como
como (auto)educação:
(auto)educação: para
para fazer
fazer aa voz
voz do
do
pedagogo
pedagogo ser
ser ouvida.
ouvida. In:
In: ______.
______. AA pedagogia,
pedagogia, aa democracia,
democracia, aa escola.
escola. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte:
Autêntica
Autêntica Editora,
Editora, 2014,
2014, p.
p. 9-26.
9-26.
123
123

filosofia libertária e educação infantil:


corpos-pensamentos aos ‘cuidados de si’!
lígia prando11

A
A Estrela
Estrela -- Venham,
Venham, venham...
venham...
Começamos
Começamos aa chamar
chamar
Na tarde
Na tarde fria
fria ee cheia
cheia de
de sol
sol aa turma
turma toda,
toda, espalhada
espalhada
A menina
A menina entrou
entrou correndo
correndo no
no parque
parque ee AA menina
menina guardou
guardou aa estrela
estrela
Alçou
Alçou voo
voo no
no balanço...
balanço... no
no bolso
bolso do
do paletó
paletó
Num repente
Num repente olhou
olhou oo chão
chão ee (melhor assim:
(melhor assim: fazia
fazia frio!)
frio!)
Aflita,
Aflita, tentou
tentou parar
parar Mas
Mas quando
quando chegamos
chegamos lá lá em
em cima
cima
Freou!
Freou! que dó:
que dó: oo sangue
sangue prata
prata escorria...
escorria...

Com os
Com os pés
pés fincados
fincados na
na terra
terra As outras
As outras crianças,
crianças, como
como eu,
eu, não
não acreditavam:
acreditavam:
Num movimento
Num movimento afoito
afoito Uma estrela
Uma estrela de
de verdade
verdade
Cavocava sem
Cavocava sem parar
parar deitada ali,
deitada ali, na
na bancada!!!
bancada!!!
(O que
(O que estaria
estaria acontecendo?)
acontecendo?)
Arrumamos uma
Arrumamos uma caixa
caixa
Numa pressa
Numa pressa de
de não
não cronos
cronos Um banho
Um banho quente
quente
Numa pressa-encantamento
Numa pressa-encantamento Um band-aid
Um band-aid
Eis que
Eis que surge
surge oo inesperado:
inesperado: AA temperatura
temperatura caía:
caía:
Uma estrela
Uma estrela arqueada
arqueada Emprestamos um
Emprestamos um cobertor
cobertor dada boneca
boneca Maria,
Maria, que
que
De ponta
De ponta aguda
aguda ee quebrada
quebrada disse não
disse não se
se importar:
importar:
Meio ensanguentada
Meio ensanguentada -- peguem,
peguem, peguem...
peguem... não
não éé toda
toda noite
noite que
que uma
uma estrela
estrela cai!
cai!
Gemia de
Gemia de dor...
dor...
O que
O que será
será que
que ela
ela come?
come?
Nas pequenas
Nas pequenas mãos-criança
mãos-criança Começaram aa perguntar
Começaram perguntar
Entre lágrimas
Entre lágrimas ee brilho
brilho Será que
Será que ela
ela gosta
gosta de
de sopa?
sopa?
Pequena, aa estrela
Pequena, estrela chorava
chorava De pipoca,
De pipoca, chocolate
chocolate
Sem, no
Sem, no entanto,
entanto, perder
perder viço:
viço: Leite quente,
Leite quente, requeijão?
requeijão?
Muito triste...
Muito triste... ela
ela brilhava!
brilhava!
Demos aa sopa
Demos sopa ee um
um pedaço
pedaço dede pão
pão
Olhei novamente
Olhei novamente ee Como ela
Como ela não
não quis
quis comer
comer
Simplesmente, não
Simplesmente, não acreditava...
acreditava... guardamos tudo
guardamos tudo no
no armário
armário
AA menina,
menina, gentilmente
gentilmente Já era
Já era bem
bem àà tardinha:
tardinha:
Acariciava aa estrela
Acariciava estrela ee dizia
dizia Pensamos: não
Pensamos: não precisa
precisa saber
saber ainda
ainda
-- ÉÉ de
de verdade!
verdade! ÉÉ de
de verdade!...
verdade!... que passará
que passará aa noite
noite ali,
ali, deitada
deitada
Vamos, professora...vamos
Vamos, professora...vamos leva-la
leva-la pra
pra sala
sala fora do
fora do céu
céu ee sozinha...
sozinha...
Coitada! Está
Coitada! Está com
com aa ponta
ponta quebrada...
quebrada...
Marli pensou
Marli pensou levá-la
levá-la pra
pra casa
casa
Olhei novamente
Olhei novamente e,e, de
de fato,
fato, não
não acreditava
acreditava no
no visto
visto Mas, preocupou-se
Mas, preocupou-se com
com aa mãe
mãe que
que
enquanto aa menina
enquanto menina dizia:
dizia: por certo
por certo teria
teria medo...
medo... decerto
decerto não
não deixaria
deixaria
-- Deve
Deve ter
ter caído
caído àà noite
noite aa nova
nova amiga
amiga ficar
ficar
naquela hora
naquela hora de
de orvalho:
orvalho: (Difícil aa quem
(Difícil quem não
não pensa
pensa como
como criança
criança
veja como
veja como está
está molhada!
molhada! lidar com
lidar com certas
certas estrelas
estrelas vivas!)
vivas!)
Deve morar
Deve morar em
em alguma
alguma casa
casa aluada...
aluada...
Não, definitivamente,
Não, definitivamente, aa mãe
mãe nãonão aguentaria:
aguentaria:
Levamos aa estrela
Levamos estrela embora
embora Do coração
Do coração morreria...
morreria...
sem contar
sem contar ainda
ainda aa todos
todos Melhor aa estrela
Melhor estrela dormir
dormir no
no armário
armário
Outras crianças
Outras crianças não
não aa viram
viram com as
com as bonecas,
bonecas, os
os carros
carros ee os
os
antes de
antes de irmos
irmos do
do parque:
parque: bichos de
bichos de estimação
estimação
Ah! Se
Ah! Se aa diretora
diretora aa enxergasse
enxergasse
com certeza
com certeza aa expulsaria
expulsaria
argumentou Mariana!
argumentou Mariana!

11 RMEC
RMEC –– Rede
Rede Municipal
Municipal de
de Educação
Educação de
de Campinas,
Campinas, São
São Paulo.
Paulo. Email:
Email: liluar11@hotmail.com
liluar11@hotmail.com
124|
124| lígia
lígia prando
prando

Tiramos
Tiramos aa estrela
estrela do
do armário
armário Um
Um menino
menino interveio:
interveio:
ee olhamos
olhamos seu
seu machucado
machucado -- Não,
Não, não...
não... isso
isso éé perigoso!
perigoso! AA escada
escada pode
pode virar
virar
Que
Que pena,
pena, aquela
aquela ponta
ponta quebrada...
quebrada... Ela
Ela éé pesada
pesada demais
demais para
para aa gente
gente segurar...
segurar...
Brilhavam
Brilhavam tanto
tanto suas
suas asas
asas Aqui...só
Aqui...só tem
tem aa Lígia
Lígia de
de grande
grande
Epa...quer
Epa...quer dizer...suas
dizer...suas pontas!
pontas!
-- Então,
Então, tá...-
tá...- disse
disse aa menina
menina sentada
sentada perto
perto de
de mim
mim
Os
Os dias
dias foram
foram passando
passando -- Vamos
Vamos fazer
fazer assim:
assim:
EE aa estrela,
estrela, que
que pouco
pouco falava
falava Um
Um de de nós
nós senta
senta nesta
nesta cadeira
cadeira
Foi
Foi sarando
sarando EE aa gente
gente vai
vai amarrando
amarrando
Até
Até que...
que... -- olhem
olhem todos
todos com
com cuidado:
cuidado: Cadeira
Cadeira sobre
sobre cadeira,
cadeira,
Ela sarou
Ela sarou dede vez!
vez! num elevador
num elevador semsem fim...
fim...
até
até chegar
chegar lálá em
em cima
cima
-- Agora...
Agora... ee pôr
pôr aa estrela
estrela nono céu
céu
-- Disseram
Disseram as as crianças
crianças --

já pode
pode brincar
brincar nana areia
areia -- É...pode
É...pode ser...
ser...
Vamos
Vamos leva-la
leva-la nono parque
parque Disseram
Disseram duas
duas meninas.
meninas.
depois
depois do
do lanche
lanche tomado?
tomado? Mas,
Mas, quem
quem vai
vai sentar
sentar na
na cadeira?
cadeira?
Gostará
Gostará dede ir
ir bem
bem alto,
alto, no
no balanço
balanço da
da mangueira!
mangueira! Vamos
Vamos terter que
que sortear?
sortear?

Levamos
Levamos aa estrela
estrela ao
ao parque
parque Nisso
Nisso soou
soou aa hora
hora para
para aa aventura
aventura do
do lanche
lanche
(escondida,
(escondida, claro!)
claro!) ee ficou
ficou para
para depois,
depois, pensarmos
pensarmos emem soluções
soluções
Mas,
Mas, eis
eis que
que pelo
pelo caminho
caminho para
para aa estrela
estrela viajar...
viajar...
aa menina
menina reluzente
reluzente
começou
começou aa soluçar
soluçar Escada,
Escada, cadeira,
cadeira, mesas
mesas
-- Para,
Para, estrela!
estrela! Por
Por favor,
favor, pare
pare de
de chorar...
chorar... Como
Como colocar
colocar lá,
lá, de
de volta,
volta, aa estrela
estrela vinda
vinda do
do céu?
céu?
vão
vão ver
ver que
que está
está com
com aa gente...podem
gente...podem até
até lhe
lhe amarrar!
amarrar! Fechei
Fechei aa porta,
porta, fui
fui com
com asas crianças,
crianças, pensando
pensando em
em nosso
nosso problema:
problema:
O
O que
que fazer?!...
fazer?!... Que
Que dilema!!!
dilema!!!
Mas,
Mas, aa estrela
estrela não
não parou...
parou...
Soluçou
Soluçou aa tarde
tarde toda
toda Mas,
Mas, quando
quando voltamos
voltamos todos...
todos...
até
até que
que oo dia
dia passou:
passou: Quanta
Quanta decepção!
decepção!
-- Amanhã
Amanhã na na roda,
roda, em
em conversa,
conversa, sem
sem pressa
pressa AA estrela
estrela era
era lixo
lixo na
na lata,
lata, sem
sem explicação
explicação nenhuma
nenhuma
decidimos
decidimos oo que
que fazer
fazer –– acabei
acabei eu
eu por
por dizer.
dizer. Alguém
Alguém esmigalhou
esmigalhou as as ideias
ideias
Tenras
Tenras dede mundos
mundos novos
novos
No
No dia
dia seguinte
seguinte na
na sala
sala EE colocou
colocou nossa
nossa vida,
vida, num
num saco
saco sem
sem liberdade
liberdade
enquanto
enquanto aa estrela
estrela dormia
dormia com
com aa estrela
estrela descartada.
descartada.
um
um pouquinho
pouquinho lálá no
no armário
armário
(chorar
(chorar pode
pode cansar,
cansar, meme explicaram
explicaram as
as crianças!)
crianças!) Dias
Dias depois,
depois, me
me contaram
contaram
Nós
Nós emem roda
roda pensávamos
pensávamos Fiquei
Fiquei sabendo,
sabendo, infeliz
infeliz
se
se ela
ela estaria
estaria infeliz:
infeliz: que
que aa professora
professora dodo lado
lado
entrou
entrou nono nosso
nosso recinto
recinto pra
pra pegar
pegar giz
giz emprestado
emprestado ee
Não
Não ria,
ria, quase
quase não
não falava
falava ao
ao ver
ver uma
uma estrela
estrela velha
velha
Não
Não brincava,
brincava, não
não comia
comia com
com aa ponta
ponta danificada
danificada
Poderia
Poderia ser
ser saudade?!..
saudade?!.. quebrou-a
quebrou-a de de vez
vez num
num assalto!
assalto!

-Precisamos
-Precisamos manda-la
manda-la de de volta
volta para
para oo céu...
céu... Depois
Depois despejou
despejou nono lixo
lixo
ee éé urgente!
urgente! -- sugeriu
sugeriu Ana
Ana Beatriz
Beatriz Os
Os seus
seus destroços
destroços sem
sem viço
viço
Mas,
Mas, como?
como? -- perguntou
perguntou Ariela.
Ariela. pra
pra ninguém
ninguém se se machucar:
machucar:
Como
Como coloca-la
coloca-la tão
tão alto?
alto? parece
parece que,
que, àquela
àquela tarde
tarde
Como
Como chegará
chegará àà sua
sua casa?
casa? Ela
Ela arranhou
arranhou suasua pele,
pele, na
na pequena
pequena
De
De quem
quem será
será que
que ela
ela tem
tem estrela
estrela verde
verde
Saudade
Saudade (?) (?) de
de plástico
plástico ee ponta
ponta lascada
lascada
Puseram-se
Puseram-se aa perguntar...
perguntar... Largada
Largada emem qualquer
qualquer lugar
lugar
sem
sem nenhuma
nenhuma proteção:
proteção:
-Tenho
-Tenho uma
uma ideia
ideia com
com certeza
certeza havia
havia sido
sido
Gritou
Gritou oo Gabriel:
Gabriel: irresponsavelmente
irresponsavelmente deixada
deixada
vamos
vamos fazer
fazer uma
uma escada
escada gigante!
gigante! por
por alguém
alguém sobre
sobre aa bancada
bancada
Um
Um de
de nós
nós sobe
sobe devagar...
devagar... da
da pia
pia de
de lavar
lavar mão.
mão.
EE põe
põe aa estrela
estrela lá
lá em
em cima,
cima,
Sem
Sem esquecer
esquecer dede dar
dar tchau...
tchau...
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!|
si’!| 125
125

... A
s crianças pensam (re)criadoramente. Comumente, as crianças pensam
novidades como as que compõem o poema-experiência que acabo de
escrever acima. Como estão há menos tempo em contato com as
reproduções que impregnam os espaços em que vivemos, muitas lógicas presentes no
pensamento das crianças não vão, costumeiramente, ao encontro das lógicas politicamente
autoritárias, disseminadas em certas parcelas das ‘gentes grandes’ com as quais
convivemos e que parecem acreditar muito saber sobre o que é preciso conhecer para
vivermos nesse mundo, constituído, para muitos, com formas e condições de vida
insubstituíveis... não cambiáveis. Formas essas, muitas vezes prescritas por poucos para
‘todos’...é certo...e, na maioria das vezes, desapropriadas de estrelas verdadeiras caídas em
parques brincantes, em noites orvalhadas. Creio que essas pessoas dificilmente socorrerão,
vida afora, essas estrelas cadentes, tão machucadas e carentes de pensamentos
transformadores de vidas, pelos cotidianos mecanicistas que invadem e assolam os nossos
corpos potencialmente criadores de novas histórias e mundos.
Alguns pensamentos de Deleuze provocam-me a pensar sobre o pensamento das
crianças:
[...]
[...] oo real
real ee oo irreal
irreal são
são sempre
sempre distintos,
distintos, mas
mas aa distinção
distinção entre
entre osos dois
dois nem
nem
sempre
sempre éé discernível;
discernível; existe
existe oo falso
falso quando
quando aa distinção
distinção entre
entre oo real
real ee oo irreal
irreal não
não éé
mais
mais discernível.
discernível. Porém,
Porém, precisamente,
precisamente, quando
quando há
há falso,
falso, oo verdadeiro
verdadeiro por por sua
sua vez
vez
não
não éé mais
mais decidível.
decidível. O O falso
falso não
não éé oo erro
erro ou
ou uma
uma confusão,
confusão, masmas uma
uma potência
potência
que
que torna
torna oo verdadeiro
verdadeiro indecidível.
indecidível. (DELEUZE,
(DELEUZE, 1992,1992, p.88-89)
p.88-89)

A potência do falso torna indecidível o tido como verdadeiro... afasta-nos, assim, tal
qual ocorre com o pensamento das crianças, dos sistemas e das relações de força pré-
configuradores do pensar... o falso, em sua potência, abre possibilidades de devires... de
desconfigurações das predominâncias sócio-culturais autoritárias, comumente valorizadas
e repetidas nos espaços em que vivemos. Eis o que nos interessa aqui, para pensarmos uma
educação em que pensamentos como os infantis atravessem as relações entre crianças e
educadores e componham novas falas a embrenharem-se no real, transformando-o: seja no
pensamento das crianças, seja no pensamento das ‘gentes grandes’ capazes de pensar como
criança, o indecidível e indefinível no pensamento exalam uma potência criadora de novas
vidas... uma potência des-significadora das verdades pré-estabelecidas... tão presentes nos
pensamentos que, embora nascidos longe de nós, tantas vezes fabricam-nos identidades
fixas: pensamentos supressores da nossa corporeidade e condutores de nós ao que esperam
que sejamos. Na contramão dos pensamentos (re)criadores da realidade ao estilo dos
pensamentos sempre novos, como os das crianças, temos as buscas de manutenção ou de
nova organização do mundo, com formas de nos privar, cada vez mais, de desejar desejos
de nossa autoria e gozo... de realizar a vida que desejamos por nós mesmos...em nossas
singularidades. O pensamento das crianças dificilmente é movido pelo que dizem ser a
vida a ser vivida: uma vida pré-significada, anunciada antes de nossas relações com a(s)
realidade(s) e, portanto, destituída de nossos corpos-pensamentos novidadeiramente
desejantes de encontros conosco mesmos e com os outros.
As crianças pensam criadoramente... entre o real e o falso des-significam, muitas
vezes, o reconhecidamente plausível nesse mundo em que vivemos, nesse momento da
história. A experiência das crianças com a estrela incorpora densa interlocução entre o
verdadeiro e o falso, numa potência intensamente desvencilhadora das verdades
incontestáveis. Eu a vivi com elas, como professora de Educação Infantil, com essa turma
cujas idades variavam entre 4 e 7 anos de idade, no meio da década de 90.
Para quem convive ou já conviveu com muitas crianças, não creio ser difícil de
perceber o pulular de pensamentos que entrelaça essas criações com vidas outras, dentro e
126|
126| lígia
lígia prando
prando

fora da escola. Eu me transformei nessa e em outras experiências com os pensamentos


infantis: soa-me próprio a esse tipo de pensamento conduzir-nos a lugares e tempos
diferentes, ainda que permaneçamos nos mesmos espaços físicos e retornemos quase
sempre ao tempo do relógio cronológico que, corriqueiramente, guia nosso cotidiano
sempre que as experiências pausam. O espaço da sala que ocupávamos cotidianamente, a
essa época, essa turma de crianças e eu, existiam na relação com o que criávamos numa
interlocução pulsante entre cronos e aíon... entre o verdadeiro e o falso... numa tensão que
tornava e manterá irreproduzível cada pensamento-momento experienciado a,
corporalmente, nos habitar.
Nessa perspectiva dessa educação libertária... intensa das novidades que as crianças
disseminam... o professor Walter Kohan propõe colocá-las em seu lugar genuíno... o lugar
dos inícios... que “abrem, assim, uma nova terra para pensar uma outra educação da
infância (KOHAN, 2007, p.120-121)”... uma terra, que não aquela preparatória para
reproduzir vidas e linguagens que já existem...para ensinar a ‘falsamente pensar’ e a dizer o
que já foi dito... para nos preparar para fazer e agir no mundo algum dia, no âmbito da
organização burocrática da vida. O lugar dos inícios é o lugar da criação...das experiências
de infância que nunca se esgotarão cronologicamente... do ser humano cuidador de
encontros consigo e com o outro, desde sempre. O lugar dos inícios é o lugar de quem
pensa e se permite caminhar, indecidivelmente, com os devires.
O mundo politicamente estabelecido, da forma que o conhecemos, dispensa
pensamentos como esses galgados em devires... joga no lixo estrelas de verdade caídas de
suas casas e encontradas por nossos corpos-pensantes-fazedores-de-novos-mundos com a
ponta machucada... o mundo político hoje existente descarta os novos inícios para manter-
se como tem sido... exclui possibilidades de encontros inusitados com a vida. Libertários,
os pensamentos que engendram o nunca antes realizado... o estrangeiro... são acolhidos
nesse nosso mundo velho conhecido, quando uma estrela sangra por uma ponta quebrada
nas mãos-criança de alguém. Parece não haver política, na atualidade, que dê conta de
referendar escolas que defendam pensamentos como esse... por isso esse pensamento
estelar das crianças, respirante entre o verdadeiro e o falso, é pura resistência às forças
controladoras de nossos autênticos desejos “[...] o assassinato do estrangeiro infantil pela
política instituída coloca a estrangeiridade e a infância num lugar não só muito arriscado e
exposto, mas também potente e afirmativo; afinal mostra-as como ameaça, fuga, a
afirmação de outros mundos, outras políticas” (KOHAN, 2007, p. 123).
A lei rejeita o corpo. A lei rejeita especialmente o corpo-pensante-criador de novos
mundos, que as crianças tantas vezes mostram e nos levam a tocar. A funcionalidade da lei
não considera que somos todos, humanamente, potencialmente criadores. Comumente, a
lei sanciona, inclusive nas instituições formais de Educação Infantil, a ausência de
pensamento criador e renovador de ideias e fazeres...e não é só isso...desde a Educação
Infantil, se não cuidarmos para educar as crianças entre pensamentos-estrelas-sedentas-de-
viagens, o cotidiano, a burocracia e a padronização das formas de ser no mundo engolirão
nossos corpos-sentintes-pensantes e nossas singularidades. A potência criadora dos
pensamentos humanos, tão vívida nas crianças, precisa ser resguardada dentro e fora das
instituições educacionais, desde a educação infantil, como uma preciosa entrada filosófica
em que cada criança...e cada uma delas nos grupos... possa, ao invés de somente ser
educada nessa potência, também nos educar com sua força desalojadora das verdades
historicamente construídas e em nós inculcadas. Humanamente, quando não nos
afastamos de nós mesmos, consumidos na massificação dos quereres, nossos corpos-
pensamentos-subjetividades constituem-se repletos de encantamentos, nos prazeres e nas
dores relacionados com a vida:
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!|
si’!| 127
127

Não
Não somos
somos batráquios
batráquios pensantes,
pensantes, não
não somos
somos aparelhos
aparelhos dede objetivar
objetivar ee registrar,
registrar, de
de
entranhas
entranhas congeladas
congeladas –– temos
temos continuamente
continuamente que que parir
parir nossos
nossos pensamentos
pensamentos em em
meio
meio aa nossa
nossa dor,
dor, dando-lhes
dando-lhes maternalmente
maternalmente todo todo oo sangue,
sangue, coração,
coração, fogo,
fogo, prazer,
prazer,
paixão,
paixão, tormento,
tormento, consciência,
consciência, destino,
destino, ee fatalidade
fatalidade que
que háhá em
em nós.
nós. Viver
Viver –– isto
isto
significa,
significa, para
para nós,
nós, transformar
transformar continuamente
continuamente em em luz
luz ee flama
flama tudo
tudo oo que
que somos,
somos,
ee também
também tudo
tudo oo que
que nos
nos atinge
atinge [...]
[...] (NIETZSCHE,
(NIETZSCHE, 2001, 2001, p.
p. 13)
13)

Na experiência com a estrela, acima contada e movimentada pela educação infantil


afora... na tragédia e nos encantamentos com a estrela perdida... quanta dor e quanta paz...
quanto tormento e quanto prazer... quanta fatalidade e quanto brilho... quanta flama...
quantas labaredas a queimar as verdades forjadas e a inflamar devires! Devires-criança-
pensamentos-labaredas-aquecendo-outros-corpos-linguagens-e-educação, “aos que
desprezam o corpo quero dar o meu parecer. O que devem fazer não é mudar de preceito,
mas simplesmente despedir-se do seu próprio corpo e, por conseguinte, ficar mudos”
(NIETZSCHE, 2009, p. 43).
Mudos... educacionalmente sem corpos... ficamos mudos. Sem corpo-criação-
novidades-zombeteiras-a-constestar-a-vida-padronizada-mundo-afora...emudecemos: sem
zombarmos da realidade, da forma como ela se nos apresenta comumente por aí,
produzindo gentes muito parecidas... ficamos mudos. Independente da potência de nossa
força (re)criadora...de nosso pensamento potência para fazedor coisas novas... sem corpos...
sem fala... sem expressão... distantes de nós mesmos e das nossas linguagens próprias...
permanecemos mudos: incapazes de nos transformarmos e de suscitarmos transformações.
Calada a força da nossa estranheza e estrangeiridade, a força do nosso pensamento
permanece latente... nosso corpo-pensante dorme... permitindo que o curso da vida
prossiga autoritário e reprodutor de sistemas, de modelos e de verdades. Sem corpo...ao
negarmos o corpo...ao “abrirmos mão” de cada um de nós, seguimos também “abrindo
mão” dos cuidados conosco mesmos e com a educação das crianças, renunciamos ao colo
necessário para os nossos pensamentos, “por trás dos seus pensamentos e sentimentos [...]
há um senhor mais poderoso, um guia desconhecido. Chama-se Si-mesmo. Habita no teu
corpo; é o teu corpo. Há mais razão no teu corpo do que na tua melhor sabedoria”
(NIETZSCHE, 2009, p.44).
Há mais razão nos nossos corpos... há mais razão nos corpos pensadores das
crianças... do que em toda a sabedoria pré-disposta no mundo sem que nosso pensamento-
coração a toque. Ensinam-nos desde criança a sermos algo que não somos. Delineiam o
que devemos ser quando formos “gentes grandes”. Negam nossa estada e nosso ser no
mundo quando crianças e vislumbram nossos futuros a partir de uma escola que aniquila o
corpo-pensamento e comumente enclausura cada filosofia numa só possibilidade de voz:
aquela que alguém academicamente resoluto, em algum momento, a ela atribuiu. Desde a
educação infantil nos têm submetido ao luto corpóreo de não pensar vasculhando estrelas e
perguntando sobre a vida... afastam-nos da poesia impedindo-nos de revigorar
pensamentos, inclusive os filosóficos...submetem nossos corpos ao luto de não criar
cientificamente na relação com a realidade: ensinam-nos a repetir conhecimentos
“comprovados” ... com esses desencantos de escola e na escola, os conhecimentos
abandonam o gozo e as dores de um parto necessário para que nossos corpos renasçam,
para que outros corpos renasçam e outras novas linguagens falem com eles e sobre
eles....para que, humanamente, nos pronunciemos outros... muitos... em pensamentos e
línguas mais do que novos... nunca antes galgados com certas dores e contentamentos
humanos:
128|
128| lígia
lígia prando
prando

O
O Si-mesmo
Si-mesmo diz diz aoao Eu:
Eu: “Experimenta
“Experimenta dores!”
dores!” EE oo eu
eu padece
padece ee medita
medita como
como nãonão
padecer
padecer mais;
mais; ee para
para isso
isso deve
deve pensar.
pensar.
O
O Si-mesmo
Si-mesmo diz diz ao ao Eu:
Eu: “Experimenta
“Experimenta alegrias!”
alegrias!” Regozija-se
Regozija-se então
então oo eu
eu ee pensa
pensa
em
em como
como continuar
continuar aa regozijar-se
regozijar-se frequentemente;
frequentemente; ee para
para isso
isso deve
deve pensar.
pensar.
[...]
[...]
O
O Si-mesmo
Si-mesmo criador
criador criou
criou aa sua
sua estima
estima ee oo seu
seu menosprezo,
menosprezo, criou
criou aa sua
sua alegria
alegria ee aa
sua
sua dor.
dor. O
O Corpo
Corpo criador
criador criou
criou para
para si
si oo espírito
espírito como
como umum instrumento
instrumento de de sua
sua
vontade.
vontade.
[...]
[...]

Já não
não pode
pode fazer
fazer oo que
que mais
mais deseja:
deseja: criar
criar superando-se
superando-se aa sisi próprio.
próprio. ÉÉ isso
isso oo que
que
ele
ele mais
mais deseja;
deseja; éé essa
essa aa sua
sua paixão
paixão toda.
toda. (NIETZSCHE,
(NIETZSCHE, 2009, 2009, p.p. 44)
44)

Nada deseja mais o nosso corpo do que os encontros conosco mesmos... do que os
encontros com nossos desejos...do que os cuidados conosco embalando nossos
pensamentos-nunca-dantes-assim-existentes levando-nos além do que éramos: “é essa a
nossa paixão toda”!
O pensamento... quando é pensamento, de fato... viceja corporalmente. Sua força
esbanja relações corporais com a vida. Atrelado ao mundo... a diversos mundos... constitui
potência de transformação ao habitá-lo(s). Os pensamentos viajam de nós para o mundo...
e do mundo para nós... são ideias que poderão, se transformadas e revivificadas, morar em
diversos corpos. Esse pensamento que resiste ao existente... ao que nos mandaram pensar...
esse pensamento comum nas crianças... permite, ao infiltrar-se na(s) realidade(s), que a(s)
vislumbremos de outras formas... de mil formas... deformadas...
inconformadas...desenformadas...

O
O corpo-sentinte-pensante...
corpo-sentinte-pensante...
Cuida
Cuida de
de si!
si!
O
O corpo
corpo
Esse
Esse corpo
corpo que
que pensa-sente
pensa-sente
Busca
Busca aa si
si mesmo
mesmo ee mergulha
mergulha
em
em autoria
autoria ee aa criação;
criação;
Como
Como educarmo-nos
educarmo-nos ee às às crianças
crianças
Resistentemente
Resistentemente
Nesse
Nesse “cuidado
“cuidado de de si”?!...
si”?!...

O “cuidado de si” respira...toma fôlego... fortalece-se... no “encontro consigo


mesmo”! Para Foucault, a expressão “conhece-te a ti mesmo”, advinda de Sócrates, estaria
desde sempre embrenhada na ideia do “cuidado de si”:
O
O gnôthi
gnôthi seauton
seauton (“conhece-te
(“conhece-te aa ti
ti mesmo”)
mesmo”) aparece,
aparece, de
de maneira
maneira bastante
bastante clara
clara e,
e,
mais
mais uma
uma vez,
vez, em
em alguns
alguns textos
textos significativos,
significativos, no
no quadro
quadro mais
mais geral
geral da
da epiméleia
epiméleia
heautoû
heautoû (cuidado
(cuidado dede si
si mesmo),
mesmo), como
como uma
uma das
das formas,
formas, uma
uma das
das consequências,
consequências,
uma
uma espécie
espécie de
de aplicação
aplicação concreta,
concreta, precisa
precisa ee particular,
particular, da
da regra
regra geral:
geral: éé preciso
preciso
que
que te
te ocupes
ocupes contigo
contigo mesmo,
mesmo, que
que não
não tete esqueças
esqueças de
de titi mesmo,
mesmo, queque tenhas
tenhas
cuidado
cuidado contigo
contigo mesmo.
mesmo. ÉÉ nesse
nesse âmbito,
âmbito, como
como queque no
no limite
limite desse
desse cuidado,
cuidado, que
que
aparece
aparece ee se
se formula
formula aa regra
regra “conhece-te
“conhece-te aa ti
ti mesmo”
mesmo” (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010, p.
p. 6).
6).

“Cuidar de si”... é preciso lembrar de si mesmo... conhecer a si mesmo... ir ao


encontro de desejos próprios, não criados por outros... cuidando de si é possível emaranhar
seus pensamentos com os pensamentos de outros ... cultivar seu pensamento-corpo-
movimento a erguer novidades na vida como um cuidado consigo... pensar cuidando de si,
como as crianças pensam cuidando de estrelas e levando-as para brincar...’cuidar de si’
requer dispensar modelos para ser e estar na crosta da Terra. Crianças e adultos podem
pensar corporalmente, mas há menos tempo imersas numa cultura de reprodução de
pensamento e de receitas de identidade, as crianças, se não tolhidas, expressam
recorrentemente ideias novas, enquanto às “pessoas grandes” tem sido comum
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!|
si’!| 129
129

submeterem-se às ideias e desejos pré-concebidos. Privilegiar experiências criadoras com o


pensamento, desde crianças... eis o sentido de buscar o novo com as crianças...de
educarmo-nos todos para o “cuidado de si” e do(s) outro(s)...com o(s) outro(s).
Ora... como temos percebido com Nietzsche e agora vemos com Foucault, esse
cuidado de si não implica somente em prazeres... o cuidado de si... os encontros consigo
mesmo... com os desejos-pensamentos-canções que acariciam... também
demolem...desestruturam o dado como certo. As experiências corpo-criadoras do encontro
consigo mesmo... do olhar e encantar-se consigo próprio... do cultivar-se... traz também a
ferradura, a picada de um mundo... e, portanto, a relação com ideias, pensamentos e
conhecimentos que se desestabilizam constantemente... que se movem e podem colocar-
nos a movermo-nos no sempre. O “cuidado de si” pode suscitar uma inquietude sem fim...
(in)tensa de sempre novos pensares... de problemas novos e soluções inusitadas... o
“cuidado de si” compõe danças e, enquanto gira, cria movimentos e experiências múltiplas
que nos incita a sermos e a dançarmos pelo mundo, debochando das identidades fixadas.
Corpos-dançantes-criadores-de-si-de-novas-vidas-e-mundos perfazem o “cuidado de si”!
Pelas
Pelas experiências
experiências despertantes
despertantes de de Sócrates
Sócrates junto
junto aos
aos seus
seus concidadãos,
concidadãos, “o
“o
cuidado
cuidado de
de si”
si” éé uma
uma espécie
espécie de
de aguilhão
aguilhão que
que deve
deve ser
ser implantado
implantado na
na carne
carne dos
dos
homens,
homens, cravado
cravado nana sua
sua existência,
existência, ee constitui
constitui um
um princípio
princípio de
de agitação,
agitação, um
um
princípio
princípio de
de movimento,
movimento, um um princípio
princípio dede permanente
permanente inquietude
inquietude no
no curso
curso da
da
existência
existência (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010, p.
p. 9).
9).

Essa inquietude sem fim... tão presente nas relações com as crianças... essa educação
de prazeres e de beliscões, potencializadora de experiências corpo-criadoras-saltitantes,
para além de pensamentos fixados... essa ida libertária ao encontro de nossos desejos
próprios... esse cuidar de si mesmo e das inquietações que pulsam em cada um de nós, com
todos os prazeres e ferroadas que isso incorpora... é o que uma outra educação... diferente
da marcada pelos saberes já conhecidos e repetidos, historicamente disseminados como
verdades absolutas e universais... possibilita, a nós, educadores, compartilhar com as
crianças e com os jovens... cuidando para que cuidem de si... e dos outros...e de uma
existência não construída antes de nossas relações com os pensamentos e com a vida,
“Sócrates é sempre [...] aquele que interpelava os jovens na rua e lhes dizia: ‘É preciso que
cuideis de vós mesmos’” (FOUCAULT, 2010, p.9).
Esse cuidado de si, que pressupõe transformações enquanto me relaciono com a
vida e com as outras pessoas, constitui-se como “[...] o tema de uma atitude geral, um
certo modo de encarar as coisas, de estar no mundo, de praticar ações, de ter relações com o
outro. A epiméleia heautoû é uma atitude - para consigo, para com os outros, para com o
mundo” (FOUCAULT, 2010, p.11).
Se há no “cuidado de si” uma atitude, um jeito de encarar a vida que pressupõe
junto com o respeito por si próprio o respeito pelo outro que está está no mundo comigo, se há
no ‘cuidado de si’ uma atitude de respeito pelos meus pensamentos e pelos pensamentos
das crianças... livres, saltitantes, pululantes... ei, então, de mover-me com as crianças, entre
as crianças e entre os seus pensamentos deslizantes... libertários como os meus solicitam
existir se vestidos de desejos e movidos entre relações pensantes que a filosofia permite
experimentar, com intensa potência, desde a educação infantil. “[...] é preciso converter o
olhar, do exterior, dos outros, do mundo,
mundo, etc. para ‘si mesmo’. O cuidado de si implica uma
certa maneira de estar atento ao que se pensa e ao ao que se passa
passa no
no pensamento”
pensamento”
(FOUCAULT, 2010, p. 12).
O que se passa com o pensamento de cada um de nós e no pensamento de cada
criança que educamos e que nos educa?!... Educacionalmente, desejamos mais pensamentos
viajanteiros... estrangeiros... implicados nas relações com uma existência que se configura e
desconfigura, sem medo de errar... porque se se despe
despe dada necessidade
necessidade de
de acertos
acertos para
para
130|
130| lígia
lígia prando
prando

experimentar pensares e realizações a eles conectadas, sem nunca abdicar do inusitado... do


eterno redesenhar(-se). Pensamento viajante adentrando nossas ações... “ações que são
exercidas de si para consigo, ações pelas quais nos assumimos, nos modificamos, nos
purificamos, nos transformamos e nos transfiguramos” (FOUCAULT, 2010, p. 12)...
pensamentos e ações como “cuidados de si”... constituições sempre momentâneas de si,
numa realidade-criação-história-sempre-transitória-dos-homens.. pensamentos
revigoradores de relações com estrelas, filósofos e poetas...pensamento acolhedor de pontas
estelares feridas, machucadas, a serem gentil e espontaneamente tratadas... pensamentos
distanciados não da ciência... mas afastados do fator causa e efeito e das verdades
universais e absolutas... Defendo o privilégio, em toda a escola, desde a Educação Infantil,
de relações com pensamentos potencialmente suscitadores de novas vidas que despontam
nas pontas lúdicas das explorações humanas, singulares e em grupos, presentes na paixão
de (des)conhecer... Com a noção de cuidado de si, “temos todo um corpus definindo uma
maneira de ser, uma atitude, formas de reflexão, práticas que constituem uma espécie de
fenômeno [...] na própria história da subjetividade ou, se quisermos, na história das
práticas da subjetividade” (FOUCAULT, 2010, p. 12).
Subjetividades diferenciadas... diversas... amor próprio brincando em nossos olhos e
nos olhos das crianças enquanto aprendemos a nos fazer mais felizes, longe do que o
capitalismo nos diz ser a felicidade. Perturba-nos olharmos para nós mesmos e para as
crianças e ensinarmos a cada uma a olhar para si... a ir ao encontro de si?!... Perturba-nos
um encantamento pleno... ainda que fugaz... em nossas mais do que próprias relações com
a existência? Perturba-nos os pensamentos deslizantes que nos acometem de utopias e
possibilidades de novas realizações? Perturba-nos bem cuidarmos de cada um de nós, sem
que percamos o outro de vista? Perturba-nos tanto ‘cuidado de si’?!... Por que nos perturba
uma ética molhada numa estética em que nos fazemos belos não só aos olhos dos outros,
mas também ao olhar de cada um de nós sobre nós mesmos?!... Perturba, junto à realidade
atual, por outros a nós designada, que possamos viver escolhendo e relacionando,
carpinteira e indefinidamente, pensamentos e outros elementos presentes na vida,
tornando-nos infinitamente do jeito que vamos desejando ser?... Perturba a possibilidade
de educar ao outro e a nós mesmos respeitando o ser e o eterno vir a ser de cada um ... e
que possamos, na relação com esses outros, desde crianças, pensar e realizar novas
possibilidades de vida e de compartilhamentos entre os seres humano e de tudo o que há no
mundo? “[...] parece claro haver, para nós, alguma coisa um tanto perturbadora no
princípio do cuidado de si” (FOUCAULT, 2010, p. 13).
Como
Como soam
soam aos
aos nossos
nossos ouvidos
ouvidos essas
essas injunções
injunções aa exaltar-se,
exaltar-se, aa prestar
prestar culto
culto aa sisi
mesmo,
mesmo, aa voltar-se
voltar-se sobre
sobre si,
si, aa prestar
prestar serviço
serviço aa sisi mesmo?
mesmo? SoamSoam como
como uma uma
espécie
espécie de
de desafio
desafio ee de
de bravata,
bravata, uma
uma vontade
vontade de de ruptura
ruptura ética,
ética, uma
uma espécie
espécie de de
dandismo
dandismo moral,
moral, afirmação-desafio
afirmação-desafio de de um um estádio
estádio estético
estético ee individual
individual
instransponível.
instransponível. Ou
Ou então,
então, soam
soam aosaos nossos
nossos ouvidos
ouvidos como
como aa expressão
expressão umum pouco
pouco
melancólica
melancólica ee triste
triste de
de uma
uma volta
volta dodo indivíduo
indivíduo sobre
sobre si,
si, incapaz
incapaz dede sustentar,
sustentar,
perante
perante seus
seus olhos,
olhos, entre
entre suas
suas mãos,
mãos, por
por ele
ele próprio,
próprio, uma
uma moral
moral coletiva
coletiva [...],
[...], ee
que,
que, em
em face
face do
do deslocamento
deslocamento da da moral
moral coletiva,
coletiva, nada
nada mais
mais então
então teria
teria senão
senão
ocupar-se
ocupar-se consigo.
consigo. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010, p.
p. 13)
13)

Transposição de verdades inquestionáveis historicamente plantadas na vida! Eis o


que causa ojeriza aos donos do mundo! Quando as verdades absolutas de alguns
desvanecem... o que sobra do mundo para esses poucos que as editaram, antes que
pudéssemos ter escolhas? O que sobra do mundo para os que o criaram estático, quando as
verdades que sustentam a sua rigidez já não dominam os valores e o saberes que o
constroem. O que sobra do mundo e do poder que o construía, quando se criam outras
vidas com outras éticas entrelaçadas a outros problemas... quando passamos a
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!|
si’!| 131
131

experimentar soluções sempre inconstantes porque referidas a questões sempre novas,


renovadas ou renováveis... inesgotáveis? O que sobra do mundo para os que o
consolidaram com determinadas formas e fazeres, quando não somos mais o que
parecíamos ser, já que passamos a corporalmente pensar o que ainda não havíamos
pensado e, com isso, passamos a fazer o que nunca foi feito de jeitos antes não
vislumbrados? O que sobra do mundo para os seus poderosos conformadores, quando as
certezas sobre o que é a vida nesse mundo desabam e a educação, desde a infância, propõe-
se a se desvencilhar das amarras das verdades e dos métodos... e ela passa a olhar para si
mesma... a cuidar de si mesma, com os educadores-educandos que a integram... como quem
experimenta e relaciona ideias e fazeres a partir do que a liberdade de desejar, pensar, criar
e fazer solicita. Ora, se nada ou quase nada resta da vida como era... se o mundo é outro...
e sempre pode ser outro(s)...se os pensamentos novidadeiros...estrangeiros...ganham asas e
brilhos estelares como o da história experienciada com as crianças... se há vidas outras!...
tristezas outras!... felicidades outras!... eternos pensamentos outros com fazeres outros!... o
que resta daquele controle atrelado e atrelador de nós a pré-determinados pensamentos?
Assim, para os que detêm justificativas para determinadas configurações do mundo
e da nossa existência em determinados períodos históricos...como parece ocorrer agora,
nesse momento que vivemos...o melhor é esquecermos dos nossos corpos e emudecermos o
“cuidado de si”... e nos eximirmos de ensinar ao outro, desde crianças, sobre o
encantamento por si mesmo e a liberdade para si e para os outros... melhor que todos
prossigam despejando-se de si próprios... negando o corpo... ausentando-se de si mesmo e
do fato de que é possível contribuir para ensinar
ensinar os
os outros
outros aa olharem
olharem para
para si.
si. Contentemo-
Contentemo-
nos com as verdades universalizadas, testadas, cientificamente comprovadas... decidíveis:
saberes indiscutíveis geram coletividades de seres humanos subjetivados, sem viço, sem
rizomas de ideias pululantes... sem desejos próprios a serem assumidos e sem tensões na
relação com eles criadas. Vivamos, então, sem pensamentos que mostrem, a todos, a
existência das diferenças e a possibilidade de respeito às diversidades humanas: esquecendo
do ‘cuidado de si’, exoneramo-nos de um tipo de cuidado com o outro que contribua para
os encontros dele consigo mesmo... melhor compor com os jogos de poder poder que
que garantam
garantam oo
bem estar de poucos: melhor deixar para lá a potência corpo-(re)criadora do ser humano.
Estranho à filosofia moderna, o “cuidado de si” não encontra espaço num mundo
concebido pelos que o antecipam à nossa relação com a vida. Quando a filosofia é
percebida como um mero depositário de verdades com pensamentos sempre prontos... já
pensados... postos para serem acessados... o que pode ela, então, contribuir para
transformar??? Os pensamentos originais das crianças e das ‘gentes grandes criançadas’
não cabem na engrenagem das leis e do capital: a professora que jogou a estrela no lixo
aderiu a ela, ainda que nunca tenha sabido disso. Cabe à vida e à educação de educadores e
de crianças... educadores-educandos... outras filosofias...outros pensares... capazes de
dúvidas... de dessentidos junto com os sentidos historicamente construídos... cabe a nós,
educadores, contatos com pensamentos que, como nos mostra Deleuze, podem encarnar
em diferentes contextos... em diversos tempos e espaços... propagando novas relações com
sempre novos problemas... filosofias-pensamentos... suscitadores de sempre novas relações
com as ideias existentes e com outras.... novas... que vão sendo (re)criadas ao longo das
histórias dos povos. Ideias relacionadas com outras ideias e realidades podem sempre
suscitar novas ideias e novas realidades. Entre novos entendimentos... relações... soluções...
as ideias filosóficas vivificam-se conectadas a diferentes lugares e momentos históricos e
contribuem para educar crianças e educadores que não se curvam aos conhecimentos pré-
existentes... antes, os interrogam, seja questionando, seja lançando novas ideias e
elaborações no mundo para entrarem em relação com as antigas:
132|
132| lígia
lígia prando
prando

Chamemos
Chamemos de de “filosofia”,
“filosofia”, se
se quisermos,
quisermos, essa
essa forma
forma de de pensamento
pensamento que que se
se
interroga,
interroga, não
não certamente
certamente sobre
sobre oo que
que éé verdadeiro
verdadeiro ee sobre
sobre oo que
que éé falso,
falso, mas
mas
sobre
sobre oo que
que faz
faz com
com que
que haja
haja ee possa
possa haver
haver de
de verdadeiro
verdadeiro ee falso,
falso, sobre
sobre oo que
que nos
nos
torna
torna possível
possível ouou não
não separar
separar oo verdadeiro
verdadeiro dodo falso.
falso. Chamemos
Chamemos “filosofia”
“filosofia” aa
forma
forma dede pensamento
pensamento que que se
se interroga
interroga sobre
sobre oo que
que permite
permite ao
ao sujeito
sujeito ter
ter acesso
acesso àà
verdade,
verdade, forma
forma dede pensamento
pensamento queque tenta
tenta determinar
determinar as as condições
condições ee os
os limites
limites do
do
acesso
acesso do
do sujeito
sujeito àà verdade
verdade (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010, p.
p. 15).
15).

Como estamos nós, agora, junto às relações com esses conhecimentos-verdades que
comumente nos são apresentados? Quem são os que tornaram tão verdadeiros os saberes...
como tais anunciados!... que imprimiram à vida o desígnio de, mais do que tudo, fazer
preponderar as verdades pré-existentes, ao invés de aprendermos a lidar com pensamentos
sempre jovens...sempre novos... instigadores de novas relações porque, mesmo quando
antigos, incorporam possibilidades de retomada e de reconfiguração de sentidos, no âmago
de diferentes contextos em diversas realidades. Que poderes têm constituído e
disseminado essas formas de relação, divorciadas de nossa humana possibilidade de criação
e autoria na vida, tão presente nos pensamentos e ações das crianças na trama da vida. Que
poderes inventaram e consolidaram certos saberes e agora os sobrepõem às nossas
possibilidades recriadoras das relações com os outros... como se esses conhecimentos
fossem insuperáveis, instransponíveis e hierarquicamente superiores aos pensamentos
manifestados pelas crianças e pelas pessoas grandes capazes de criar e de se relacionar com
o novo?...
Pois
Pois bem,
bem, se se fizermos
fizermos agora
agora umum salto
salto de
de muitos
muitos séculos,
séculos, poderemos
poderemos dizer dizer que
que
entramos
entramos na na Idade
Idade Moderna
Moderna (quero
(quero dizer,
dizer, aa história
história dada verdade
verdade entrou
entrou no no seu
seu
período
período moderno)
moderno) no no dia
dia em
em que
que admitimos
admitimos que que oo que
que dádá acesso
acesso àà verdade,
verdade, àsàs
condições
condições segundo
segundo as as quais
quais oo sujeito
sujeito pode
pode ter
ter acesso
acesso àà verdade,
verdade, éé oo conhecimento
conhecimento
ee tão
tão somente
somente oo conhecimento.
conhecimento. ÉÉ aí aí que,
que, parece-me,
parece-me, oo que
que chamei
chamei de de “momento
“momento
cartesiano”
cartesiano” encontra
encontra seuseu lugar
lugar ee sentido,
sentido, sem
sem que
que isso
isso signifique
signifique queque éé dede
Descartes
Descartes queque sese trata,
trata, que
que foi
foi ele
ele oo inventor,
inventor, oo primeiro
primeiro aa realizar
realizar tudo
tudo isso.
isso.
Creio
Creio que
que aa idade
idade moderna
moderna da da história
história da
da verdade
verdade começa
começa no no momento
momento em em que
que oo
que
que permite
permite aceder
aceder ao ao verdadeiro
verdadeiro éé oo próprio
próprio conhecimento
conhecimento ee somente
somente ele.
ele.
(FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010, p.17-18)
p.17-18)

Se a verdade pode ser reconhecida pelo sujeito porque a ele foi assim anunciada,
como verdade absoluta... e ele, no contexto em que temos vivido, só pode a ela ter acesso
sem o “cuidado de si”... sem respeito por si, por seus desejos próprios e pelas suas
peculiaridades na relação com a realidade que integra... sem o tipo de experiência corpo-
criadora de que é humanamente capaz... então, nesse momento da história, esse sujeito,
despido que está de si próprio e de cuidados consigo, não pode encontrar-se com ele mesmo
e nem com as crianças que busca educar... não pode criar e ser autor de sua própria vida, na
relação com os outros... e nem mostrar às crianças que elas podem ser criadoras e autoras
de suas próprias vidas. O cuidado consigo mesmo... a busca e o encontro com cada um de
nós, torna-nos únicos... contribui para reconhecermo-nos únicos, singulares, ainda que no
meio de uma multidão. Na negação de si próprio...e dos cuidados consigo mesmo... tem
sido preciso sucumbir ao que os desejos de poucos antecipam para muitos... é preciso
matar-se... aniquilar-se... negar-se e ao próprio corpo... para sobreviver sem seus amores.
Nesse contexto negador de si mesmo e das diferenças... é proibido enlouquecer de amor
por qualquer coisa que não nos tenha sido, anteriormente à nossa relação com a realidade,
dada por outros, como nossa.
De
De todo
todo modo,
modo, porém,
porém, éé do
do interior
interior do
do conhecimento
conhecimento queque são
são definidas
definidas asas
condições
condições de
de acesso
acesso do
do sujeito
sujeito àà verdade.
verdade. As
As outras
outras condições
condições são
são extrínsecas.
extrínsecas.
Condições
Condições tais
tais como:
como: “não
“não se
se pode
pode conhecer
conhecer aa verdade
verdade quando
quando sese éé louco”.
louco”. [...]
[...]
Condições
Condições culturais
culturais também:
também: para
para ter
ter acesso
acesso àà verdade
verdade éé preciso
preciso ter
ter realizado
realizado
estudos,
estudos, ter
ter uma
uma formação,
formação, inscrever-se
inscrever-se em
em algum
algum consenso
consenso científico.
científico. EE
filosofia
filosofia libertária
libertária ee educação
educação infantil:
infantil: corpos-pensamentos
corpos-pensamentos aos
aos ‘cuidados
‘cuidados de
de si’!|
si’!| 133
133

condições
condições morais:
morais: para
para conhecer
conhecer aa verdade,
verdade, éé bem
bem preciso
preciso esforçar-se,
esforçar-se, [...]
[...] éé
preciso
preciso que
que os
os interesses
interesses financeiros,
financeiros, de
de carreira
carreira ou
ou de
de status
status ajustem-se
ajustem-se de
de modo
modo
inteiramente
inteiramente aceitável
aceitável com
com as
as normas
normas dada pesquisa
pesquisa [...]
[...] etc.
etc. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010,
p.18)
p.18)

Nesse contexto, as crianças nada sabem... nada criam... nenhum conhecimento


produzem...nesse contexto, o pensamento corpo-criador relacionado com os fazeres da
infância, sequer pode ser percebido como pensamento, pois pensar e conhecer verdades
liga-se a determinados consensos científicos, em que as subjetividades submetem-se às
verdades comprovadas e reconhecidas como tais no âmago dos pré-conhecimentos... ou
seja, apenas os pré-saberes sobre nós mesmos... aqueles, expropriadores de nossas
experiências de pensamento e ação criadora na vida... potencializam formas, politicamente
preconizadas, de ser e de atribuir sentidos para a existência humana. Esse sujeito... ausente
de si mesmo... é uma mera criação de outros... um reflexo do poder e do pensamento de
outros, mais poderosos do que ele, sobre ele. O que buscamos aqui é, simplesmente, um
sujeito (re)criador... que “cuida de si”.
[...]
[...] desde
desde que,
que, em
em função
função dada necessidade
necessidade de
de ter
ter acesso
acesso àà verdade,
verdade, oo ser
ser do
do sujeito
sujeito
não
não esteja
esteja posto
posto em
em questão,
questão, creio
creio que
que entramos
entramos numa
numa era
era da
da história
história das
das relações
relações
entre
entre subjetividade
subjetividade ee verdade.
verdade. AA consequência
consequência disso
disso ou,
ou, se
se quisermos,
quisermos, oo outro
outro
aspecto,
aspecto, éé que
que oo acesso
acesso àà verdade,
verdade, cuja
cuja condição
condição doravante
doravante éé tão
tão somente
somente oo
conhecimento,
conhecimento, nada nada mais
mais encontrará
encontrará no no conhecimento,
conhecimento, comocomo recompensa
recompensa ee
completude,
completude, do do que
que oo caminho
caminho indefinido
indefinido do
do conhecimento.
conhecimento. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2010, 2010,
p.18-19)
p.18-19)

No entanto, mesmo nesse nosso momento enclausurador de ideias e de novos


fazeres... na contramão dessa dificuldade para criar novidades nessa vida, com tantas
rígidas relações a ela inerentes... ainda que por ora diante dessa dificuldade para recriarmo-
nos olhando de novas maneiras para nós mesmos, para cada um de nós e para o mundo e a
vida... acredito na possibilidade de uma educação, desde a infância, propagadora do
cuidado consigo, com sempre novas relações entre o pensamento e a vida ... acredito na
possibilidade de filosofias libertárias, cuidadosamente entrelaçadas entre os pensares e as
ações... acredito, na relação com esses pensamentos, na possibilidade de suscitarmos outras
formas de vida, entre ideias e realidades sempre novas... pintadas entre as asas dos
pensamentos e das pontas de estrelas molhadas de inusitado, para além dos jogos de
produção de verdades que têm roubado das relações com a educação a preciosidade de
pensar e fazer o novo de novo...

Cuidar
Cuidar dede si
si
Ocupar-se
Ocupar-se consigo
consigo
EE com
com os
os outros
outros
Pelos
Pelos corpos-criança
corpos-criança transladam
transladam os os mais
mais temidos
temidos ee os
os mais
mais corajosos
corajosos pensamentos
pensamentos
Desconhecidos
Desconhecidos
Escorregam
Escorregam
Para
Para oo mundo
mundo ee
Exalam
Exalam novos
novos perfumes:
perfumes:
Pensamentos
Pensamentos que que não
não havia
havia
Abraçam
Abraçam aa realidade:
realidade:
Criançando...
Criançando... falamos
falamos oo nunca
nunca falado...
falado...
Exalamos
Exalamos
Inéditos
Inéditos encontros
encontros comcom oo mundo
mundo
Esculpimos
Esculpimos outras
outras vidas
vidas
Fecundadas
Fecundadas num num tempo
tempo que
que oo cotidiano
cotidiano dificilmente
dificilmente (re)conhece
(re)conhece
Crianças
Crianças pensantes
pensantes
Pequenas
Pequenas ee grandes
grandes
Podem
Podem dar
dar àà luz
luz
134|
134| lígia
lígia prando
prando

Um
Um infinito
infinito
De
De mundos...
mundos...
De
De estrelas
estrelas ee
De
De educação
educação libertária:
libertária:

A
A educação
educação libertária
libertária trabalha
trabalha para
para destruir
destruir aa padronização
padronização dos
dos indivíduos,
indivíduos,
proliferando
proliferando aa singularidade,
singularidade, aa criatividade
criatividade ee as
as diferenças,
diferenças, que
que acabam
acabam porpor se
se
harmonizar
harmonizar através
através dada cooperação
cooperação ee da da solidariedade
solidariedade compondo
compondo umauma totalidade
totalidade
social.
social. A
A ideia
ideia de
de uma
uma sociedade
sociedade anarquista,
anarquista, formada
formada por
por uma
uma multiplicidade
multiplicidade de de
indivíduos
indivíduos singulares,
singulares, afasta-se
afasta-se radicalmente
radicalmente da da sociedade
sociedade capitalista,
capitalista, fundada
fundada nana
padronização
padronização dos dos indivíduos,
indivíduos, produzidos
produzidos em em massa
massa pela
pela escola
escola baseada
baseada nana
submissão
submissão ee na
na transmissão
transmissão da
da ideologia
ideologia dominante.
dominante. (GALLO,
(GALLO, 1995,
1995, p.165)
p.165)

referências
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. Conversações
Conversações 1972-1990.
1972-1990. São
São Paulo:
Paulo: Editora
Editora 34,
34, 1992.
1992.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel.
Michel. AA Hermenêutica
Hermenêutica dodo Sujeito.
Sujeito. Curso
Curso dado
dado nono Collège
Collège de
de France
France (1981-1982).
(1981-1982). São
São
Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2010.
2010.
GALLO,
GALLO, Sílvio.
Sílvio. Pedagogia
Pedagogia do
do Risco.
Risco. Campinas:
Campinas: Papirus,
Papirus, 1995.
1995.
KOHAN,
KOHAN, Walter
Walter O.O. Infância,
Infância, Estrangeiridade
Estrangeiridade ee Ignorância
Ignorância –– ensaios
ensaios dede filosofia
filosofia ee educação.
educação. Belo
Belo
Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2007.
2007.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. A
A Gaia
Gaia Ciência.
Ciência. São
São Paulo:
Paulo: Companhia
Companhia das das Letras,
Letras, 2001.
2001.
______.
______. Assim
Assim Falou
Falou Zaratustra.
Zaratustra. São
São Paulo:
Paulo: Martin
Martin Claret,
Claret, 2009.
2009.
135
135

iii. filosofia com


crianças
136
136
137
137

“tia, vai ter fisolofia hoje?”

edna olímpia da cunha11


Mas
Mas onde
onde esteja:
esteja: aa gaiola
gaiola
será
será de
de pássaro
pássaro ouou de
de pássara:
pássara:
éé alada
alada aa palpitação,
palpitação,
aa saltação
saltação que
que ela
ela guarda.
guarda.
(João
(João C. C. de
de Mello
Mello Neto)
Neto)

Tia,
Tia, vai
vai ter
ter fisolofia
fisolofia hoje?
hoje?
Acho
Acho queque isso
isso num
num éé pra
pra mim
mim não...
não... eueu sou
sou bem
bem pé pé no
no chão.
chão.
Esse
Esse espaço
espaço aquiaqui éé umum espaço
espaço de de resistência...
resistência...
Ih,
Ih, eu
eu já
já falei...
falei... aa gente
gente perdeu
perdeu foi foi tempo
tempo com com isso...
isso...
Caramba!
Caramba! O O menino
menino fezfez aa mesma
mesma pergunta
pergunta de de Kant
Kant sobre
sobre oo tempo!
tempo!
Eu
Eu quero
quero ficar,
ficar, tia,
tia, eueu aprendo
aprendo melhormelhor conversando...
conversando... Tia, Tia, só só éé vc
vc que
que pode
pode falar
falar aqui?
aqui?
Filosofia
Filosofia comcom crianças,
crianças, ah...ficção
ah...ficção científica,
científica, eu eu adoooooro
adoooooro ficçãoficção científica!!!!
científica!!!!
Ilha
Ilha da
da fantasia...
fantasia... AA taça
taça vazia/
vazia/ doce
doce assentia/
assentia/ em em assertiva
assertiva fantasia...
fantasia...
Estão
Estão dizendo
dizendo por por aíaí que
que éé coisa
coisa para
para inglês
inglês ver.
ver.
Veio
Veio um
um amigo
amigo italiano,
italiano, você
você nãonão tem
tem um um amigo
amigo chinês?
chinês? UmUm amigo
amigo chinês
chinês parapara aprender
aprender kung-fu
kung-fu com com ele?
ele?

Lá nono Japão
Japão eu eu não
não eraera uma
uma criança
criança feliz
feliz nana escola...
escola...
Transbordamento...
Transbordamento... éé isso, isso, umum transbordamento!
transbordamento!
Eh,
Eh, olha
olha essa
essa dodo cara...
cara... Ele
Ele pediu
pediu para
para responder
responder aa prova
prova em em versos...Fiquei
versos...Fiquei bolado bolado com com isso...
isso...
Que
Que bom
bom queque não
não vou
vou terter que
que copiar
copiar dever
dever do do quadro...
quadro...
Pergunta
Pergunta se se ele
ele éé homem
homem ou ou mulher...
mulher... cabelo
cabelo grande,
grande, unhaunha pintada...
pintada...
Eu
Eu quero
quero saber
saber oo que
que não
não sei...
sei... Hoje
Hoje foifoi muito
muito massa!
massa!
Existe
Existe tempo
tempo do do amor,
amor, amizade,
amizade, falsidade?
falsidade?
Estou
Estou sentindo
sentindo um um vazio...
vazio... seisei lá...uma
lá...uma melancolia...
melancolia...
As
As pessoas
pessoas falam
falam que que suas
suas vidas
vidas sese transformaram...
transformaram... eu eu quero
quero saber
saber como
como éé isso...
isso...
Aqui
Aqui você
você fala
fala isso,
isso, mas
mas lá
lá na
na sala
sala você
você faz
faz outra
outra coisa,
coisa, né!
né! Ah,
Ah, nãonão quero
quero ir ir para
para escola...
escola...
Não
Não conseguimos
conseguimos ficar ficar sozinhos
sozinhos com com nós
nós mesmos.
mesmos. Criança
Criança não não precisa
precisa de de filosofia.
filosofia.
Mas
Mas você
você precisa
precisa ser
ser verdadeiro...
verdadeiro... Vou Vou escrever
escrever um um livro
livro com
com Platão
Platão ee comcom oo Walter...
Walter...
Isso
Isso não
não éé um
um texto
texto filosófico!
filosófico! Quando Quando uma uma criança
criança faz faz uma
uma pergunta,
pergunta, eu eu tremo...
tremo...
Eu
Eu fiquei,
fiquei, assim,
assim, com
com osos poros
poros todos
todos abertos...
abertos... O
O que
que éé uma
uma palavra?
palavra? Será
Será queque eueu consigo
consigo me me perguntar?
perguntar?
A
A minha
minha vindavinda aqui
aqui me me fez
fez lembrar
lembrar os os meus
meus sonhos...
sonhos... Eu Eu sonhava...
sonhava...
ÉÉ aa primeira
primeira vez vez entro
entro numa
numa faculdade...
faculdade... Meu Meu coração
coração está está aberto!
aberto!
Fui
Fui aprendendo
aprendendo aa ver ver oo outro
outro comocomo potência
potência ee não não como
como falta...
falta...
Cara,
Cara, issoisso éé uma
uma vertigem!
vertigem! Aqui Aqui éé diferente
diferente da da aula
aula lálá nana faculdade!
faculdade!
Quanta
Quanta criança
criança aqui!!!!
aqui!!!! A A Uerj,
Uerj, este
este prédio,
prédio, ah,ah, não...não
não...não foi foi feito
feito para
para receber
receber criança...
criança...
Tia,
Tia, eu
eu acho
acho que
que aa natureza
natureza da da criança
criança éé sentir
sentir aa vida!
vida! Preciso
Preciso voltar
voltar para
para aa escola...
escola...
Até
Até agora
agora nada
nada me me aconteceu
aconteceu na na escola...
escola... asas cozinheiras
cozinheiras são são minhas
minhas amigas...
amigas...
Queria
Queria tantotanto terter mais
mais tempo
tempo parapara isso...
isso...
Essa
Essa professora
professora falafala muito,
muito, elaela não
não para
para dede falar...
falar... Com
Com ela ela isso
isso não
não vai
vai dar
dar certo...
certo...
Você
Você foi foi aa pedra
pedra no no meu
meu caminho...
caminho... TrouxeTrouxe essa essa pedra
pedra parapara você...
você...
Eu
Eu quero
quero saber
saber da
da avaliação,
avaliação, dos dos resultados...
resultados... A
A filosofia
filosofia te te ensinou
ensinou aa ficarficar muda?
muda?
De
De tanto
tanto falarem
falarem em em amor,
amor, eueu não
não acredito
acredito mais…
mais… Mudar
Mudar éé muito muito difícil...
difícil...
Professora,
Professora, porpor que
que não
não está
está tendo
tendo mais
mais filosofia?
filosofia? Por
Por queque aa morte
morte foi foi existir?
existir?
Eu
Eu quero
quero saber
saber dada avaliação,
avaliação, dosdos resultados...
resultados... Que
Que bombom queque você
você veio!!!!Bem-vinda
veio!!!!Bem-vinda ao ao hospício!!!!
hospício!!!!
Tia,
Tia, qual
qual éé aa resposta?
resposta? Você
Você sabe sabe resposta
resposta ee não não quer
quer falar...
falar...
Uma
Uma palavra
palavra também
também não não éé uma
uma charada?
charada? Huumm...
Huumm... acho acho que
que aa filosofia
filosofia me me fez
fez escutar
escutar mais...
mais...
Agora
Agora vou vou tirar
tirar você
você do
do seu
seu silêncio...
silêncio... A
A turma
turma nãonão escreve,
escreve, aa professora
professora não não escreve...
escreve...
O
O que
que você
você deseja
deseja éé desejável?
desejável? Afinal,
Afinal, oo queque estamos
estamos fazendo?
fazendo? O O que
que éé infinito?
infinito?
Relaxa...Relaxa...
Relaxa...Relaxa... Professora,
Professora, vamos vamos escrever
escrever sobresobre oo nada?
nada?
Será
Será queque oo enigma
enigma podepode sese disfarçar
disfarçar de de óbvio?
óbvio? Estou
Estou sem sem palavras...
palavras...
A
A gente
gente precisa
precisa escrever
escrever sobresobre isso...
isso...

11NEFI/UERJ;
NEFI/UERJ; Escola
Escola Municipal
Municipal Joaquim
Joaquim da
da Silva
Silva Peçanha;
Peçanha; Escola
Escola Municipal
Municipal Professora
Professora Zilla
Zilla Junger
Junger
Email:
Email: olimpiaportprof@gmail.com
olimpiaportprof@gmail.com
138|
138| edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

É instigante mais uma vez aceitar o convite da pequena Kethellen e de outras


infâncias...
No caminhar de quase uma década, temos conversado, narrado nossas
vivências, viajado compartilhando ditos e escritos... Todas as frases acima são recortes,
fragmentos, um tanto quanto desconexos, que remetem a diversos contextos das
experiências de pensamento, compartilhadas nestes tempos e espaços.
São diferentes vozes fazendo ressoar o impacto que estes exercícios têm provocado
nos sujeitos direta ou indiretamente envolvidos, desde o interior do projeto de pesquisa e
extensão Em Caxias, a filosofia en-caixa? A escola pública aposta no pensamento22, num caminhar
de quase dez anos...
Juntar pedaços, deslocar peças dos lugares, riscar, rabiscar, buscar outros
desenhos....
Nos movimentos de aproximação entre uma universidade e escolas33 de periferia,
não cessam de surgir inquietações, perguntas, provocações, embates, desafios... Essa escrita
é, pois, uma tentativa de recuperar palavras, frases, afirmações, perguntas, hesitações,
lacunas, gestos, silêncios embaralhados no tempo que ajudem a pensar esses encontros e o
que eles podem contribuir para pensar a nossa relação com a educação, com a escola, com
os outros, com nós mesmos... Estaríamos criando uma outra língua com/ nesses encontros
com gente de tantos lugares do mundo. Se sim, o que temos afirmado com ela?
Uma das singularidades do projeto tem sido permanentemente apostar nos
encontros das gentes e de muita gente. Gente que chega falando línguas diferentes. Inglês,
francês, espanhol, japonês, italiano, flamengo, português do sul, português de angola,
português do nordeste, português paulistano, português “panela de pressão”, do povo
carioca...
Que língua surge quando tanta gente de tantos lugares se reúne no exercício das
experiências de pensamento, que não buscam formar ninguém, mas gerar espaços de
problematização do que somos?
Com tantas línguas de um mundaréu de gente é possível inventar uma língua
comum? Qual seria a característica singular dessa língua? O que ela permite dizer, narrar?
Que língua atravessaria todas as línguas, as línguas das gentes que se deslocam para
encontrar com outras gentes? Que língua nasce quando desafiamos os confinamentos, as
cercas que isolam as gentes que se dedicam a viver, a pensar a educação, e mais,
especificamente a escola pública?

mundo, mundo, vasto mundo...44


A filosofia que experimentamos, ou a “fisolofia”, nos coloca diante desse enigma:
que língua temos inventado com todo esse movimento de abertura ao mundo, de acolhida
àqueles/àquelas que chegam para compartilhar seus pensamentos, suas inquietudes? Seria
a infância (KOHAN, 2002, p.239)? A infância que habita desde este intervalo em que
somos desafiados, com nossas diferenças, a encontrar uma língua comum?
A infância tem sido uma boa anfitriã...

22 Projeto
Projeto desenvolvido
desenvolvido pelo
pelo Núcleo
Núcleo dede Estudos
Estudos de de Filosofia
Filosofia ee Infâncias(NEFI),
Infâncias(NEFI), do
do programa
programa dede Pós-
Pós-
Graduação
Graduação emem Educação
Educação dada Universidade
Universidade dodo Estado
Estado dodo Rio
Rio de
de Janeiro(UERJ/Maracanã)
Janeiro(UERJ/Maracanã) em em escolas
escolas públicas
públicas
do
do município
município de
de Duque
Duque de
de Caxias,
Caxias, no
no Rio
Rio de
de Janeiro.
Janeiro.
33 Escolas
Escolas Municipais
Municipais Joaquim
Joaquim dada Silva
Silva Peçanha,
Peçanha, Pedro
Pedro Rodrigues
Rodrigues dodo Carmo
Carmo e,
e, mais
mais recentemente,
recentemente, aa escola
escola
Professora
Professora Zilla
Zilla Junger,
Junger, todas
todas localizadas
localizadas na
na região
região da
da Baixada
Baixada Fluminense.
Fluminense.
44 ANDRADE,
ANDRADE, Carlos
Carlos Drummond.
Drummond. Alguma
Alguma poesia,
poesia, 2011.
2011.
“tia,
“tia, vai
vai ter
ter fisolofia
fisolofia hoje?”
hoje?” || 139
139

A infância das crianças, dos jovens, dos adultos... Ela é esse tempo misterioso,
intempestivo... Roda que gira no seu próprio tempo... Se aproxima, olha, toca, pergunta,
traz vida... Inaugura um intervalo, uma suspensão, faz a dobra55, pondo em xeque a ilusão
de que só nos restaria caminhar em linha reta... Deleuze (abecedário, K de Kant),
relembrando Borges, nos diz que “o labirinto mais terrível do que um labirinto circular é
um labirinto em linha reta”. A infância parece brincar nas curvas, no acidental da estrada...
Por isso, talvez ela tenha algo que ver com o barroco 66. É bela, mas não recatada.
Desassossegada. Ingovernável. Um escândalo. Seu lar é um mundo... Mundo que convida
outros mundos e dá o que pensar...
Nas curvas a infância grita, como Seu Luiz, estudante da EJA77, certa vez disse, após
uma experiência de pensamento na UERJ: “Eu tenho vontade de gritar!” Seu Luiz, que
pela primeira vez frequenta uma escola, grita em silêncio, um grito para dentro, um grito
que talvez acorde seus pensamentos...Gritar para dentro seria também um modo de criar
outra língua? Renan parece ouvir o grito silencioso de seu Luiz e pergunta: “Quando eu
pergunto para mim mesmo é uma pessoa ou são duas pessoas se perguntando?” Escutar as
próprias perguntas com as perguntas do outro... Estranhar, estranhar-se é criar outra
língua? Que língua? Se ela nasce potente e, ao mesmo tempo, frágil, conseguiremos
acolhê-la? Defendê-la? E por que seria necessário defendê-la? Defender a criação desse
lugar, desse intervalo, em que uma nova língua nasce e inverte os lugares, as posições
demarcadas... Como falar, escrever uma língua dentro da própria língua? Filosofia,
“fisolofia”... Mudar a posição das sílabas... criar outra palavra dentro da própria palavra...
inventar composições inusitadas... reverter a colação e a ordem... revolver a sintaxe no jogo
do acaso...
Mundaréu, outras línguas, uma nova língua, curva, dobra, desvio,
intervalo...Acaso!

intervalo no intervalo...
E mais uma vez sopra o vento do acaso, bagunçando a ordem das coisas,
embaralhando os velhos signos...
Estamos reunidos numa tarde de dezembro para uma experiência de pensamento,
dessa vez com a visita de estudantes de uma escola estadual de ensino médio. As palavras
de Sara lançam um golpe repentino no grupo ao sugerir a suspensão imediata das
apresentações no momento inicial da experiência: “Acho que não precisa de apresentação, né?
Porque o que importa mesmo é que eles são pessoas como a gente e são estudantes e isso, para mim,
basta!”
Em silêncio, perplexos, um intervalo se abre no intervalo da própria experiência
lançada na curva já nos primeiros passos. Naquele momento, o silêncio grita mais uma
vez tentando talvez acolher o nascimento de algo que não sabemos...

55 “A
“A matéria-dobra
matéria-dobra éé uma
uma matéria-tempo,
matéria-tempo, cujos
cujos fenômenos
fenômenos são são como
como aa descarga
descarga contínua
contínua de
de uma
uma infinidade
infinidade
de
de arcabuzes
arcabuzes aoao vento”.
vento”. (DELEUZE,
(DELEUZE, 2012,2012, p.19)
p.19)
66 “O
“O que
que éé propriamente
propriamente barroco
barroco éé essa
essa distinção
distinção ee repartição
repartição de
de dois
dois andares.
andares. Conhecia-se
Conhecia-se aa distinção
distinção de
de dois
dois
mundos
mundos em em uma
uma tradição
tradição platônica.
platônica. Conhecia-se
Conhecia-se oo mundo
mundo de de inúmeros
inúmeros andares,
andares, composto
composto segundo
segundo uma
uma
descida
descida ee uma
uma subida
subida que
que se
se enfrentam
enfrentam em em cada
cada andar
andar de
de uma
uma escada
escada que
que se
se perde
perde na
na eminência
eminência do do Uno
Uno ee se
se
desagrega
desagrega nono oceano
oceano do
do múltiplo:
múltiplo: oo universo
universo emem escada
escada da
da tradição
tradição neoplatônica.
neoplatônica. Mas
Mas oo mundo
mundo comcom apenas
apenas
dois
dois andares,
andares, andares
andares separados
separados pela
pela dobra
dobra que
que repercute
repercute dos
dos dois
dois lados
lados segundo
segundo umum regime
regime diferente,
diferente, éé aa
contribuição
contribuição barroca
barroca por
por excelência.
excelência. Ela
Ela expressa,
expressa, como
como veremos,
veremos, aa transformação
transformação dodo cosmo
cosmo emem mundus”
mundus”
(DELEUZE,
(DELEUZE, 2012,2012, p.57)
p.57)
77 Educação
Educação dede Jovens
Jovens ee Adultos,
Adultos, modalidade
modalidade do do Ensino
Ensino Fundamental
Fundamental ainda ainda não
não regulamentada
regulamentada no no município
município
de
de Duque
Duque de de Caxias.
Caxias.
140|
140| edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

Estar diante de pessoas que nunca tínhamos visto, suspendendo as apresentações...


Sara cria um desvio inusitado, inquietante. Na lógica hegemônica, muitas vezes é preciso
exibir as marcas identitárias, as credenciais para conseguir atenção e credibilidade das
pessoas.
Sara renuncia aos protocolos costumeiros, rompe com o que está posto, desequilibra
uma ordem, interrompe... Parece reivindicar nossa atenção para o que está além do
quadrado traçado das concepções de nós mesmos... Que língua estaria nascendo com o
convite inusitado da infância dessa menina?
Somos prisioneiros de algumas concepções de nós mesmos e nossas condutas.
Devemos libertar nossa subjetividade, nossa relação e nós mesmos (FOUCAULT, 2012,
p.63). Sara nunca ouviu as palavras de Foucault. Curiosamente, a menina estudante e o
professor de filosofia, distanciados pelo tempo histórico, parecem íntimos pela
aproximação de seus pensamentos, quem sabe de suas infâncias, na busca de criar uma
outra língua... Somos prisioneiros... De que é preciso nos libertarmos? Do que desejamos
nos libertar? De que signos, representações, identidades, estamos dispostos a renunciar
para deixar nascer uma outra língua?

das vísceras, das chegadas e das partidas...


Todo esse movimento de aproximação entre uma universidade pública e escolas
públicas de periferia, por meio de encontros com as gentes do mundo, reunidas para
pensar, tem provocado as mais diversas reações, algumas radicalmente opostas.
Curiosidade, desconfiança, interesse, medo, entrega, recusa, acolhida, rejeição, paixão...
Os afetos se embaraçam, vêm à tona. Geram turbulência. O mais interessante é
que nesses encontros podemos colocar em questão as nossas verdades, o que não sabíamos
de nós mesmos.
Nos currículos oficiais, o foco principal está nos conteúdos das ciências, da
gramática, da matemática, da história, da geografia... E esse jogo já sabemos jogar, essa
língua de perguntas e respostas desde cedo começamos a aprender. Talvez um dos grandes
desafios, nesses muitos encontros para o exercício de pensamento, com o projeto de
filosofia, seja a defesa desse lugar, desse intervalo que nos permita acolher uma outra
maneira de pensar, uma outra maneira de viver...uma infantil “fisolofia”. Esta é uma
preocupação do professor Eduardo Jorge 88 desde que acolheu, com os estudantes, um
intervalo em suas aulas de Ciências, para os exercícios de pensamento:
Ali,
Ali, naquele
naquele momento,
momento, naquele
naquele espaço
espaço tudo
tudo sese transforma,
transforma, nem
nem sempre
sempre nono ritmo
ritmo
programado
programado ee invariavelmente
invariavelmente seguindo
seguindo rotas
rotas desconhecidas,
desconhecidas, estranhas,
estranhas, difíceis,
difíceis,
alegres,
alegres, sensuais.
sensuais. Direções
Direções dede enfrentamento,
enfrentamento, de de reflexões,
reflexões, de
de chegadas...
chegadas... ee de
de
partidas
partidas das
das certezas
certezas antes
antes petrificadas.
petrificadas. ÉÉ aa hora
hora de
de olhar
olhar nos
nos olhos
olhos daquele
daquele aluno
aluno
que,
que, por
por ventura,
ventura, tenha
tenha nos
nos estressado,
estressado, ou ou daquele
daquele que
que não
não foi
foi devidamente
devidamente
atendido
atendido por
por nós
nós em
em algum
algum momento.
momento. ÉÉ aa hora
hora dede ouvir
ouvir oo que
que nunca
nunca se
se ouve,
ouve, de
de
falar
falar com
com oo coração...
coração...

Sim, talvez seja mesmo muito perturbador, desconcertante, olhar nos olhos, lançar-
se numa ex-posição... Língua estranha na qual os signos não são mais os conteúdos oficiais
de uma disciplina, mas nossos próprios pensamentos... Intervalo incômodo em que algo
nasce, outras coisas morrem... Chegadas, partidas...
Um professor de Ciências que se ocupa da biologia, dos seres vivos, do ambiente,
dos elementos químicos, parece experimentar, sentir na própria pele sua estrangeiridade
dentro da própria língua... Para ele, a educação é um ofício “visceral”... Eduardo sente na

88 Eduardo
Eduardo Jorge
Jorge Nunes
Nunes Abreu
Abreu éé professor
professor do
do Ensino
Ensino Fundamental
Fundamental ee
médico
médico do
do hospital
hospital municipal
municipal Francisco
Francisco
da
da Silva
Silva Teles,
Teles, na
na cidade
cidade do
do Rio
Rio de
de Janeiro.
Janeiro. Atualmente
Atualmente éé pós-graduando
pós-graduando em
em Medicina
Medicina Interna
Interna pela
pela
UNIRIO/SUS.
UNIRIO/SUS.
“tia,
“tia, vai
vai ter
ter fisolofia
fisolofia hoje?”
hoje?” || 141
141

própria pele essa hora, esse intervalo de “olhar nos olhos”, de “ouvir o que nunca se ouve”.
O que é olhar nas experiências de pensamento? O que se vê? O que nunca se ouve? O que
é que nunca se ouve? O que tudo isso pode contribuir para pensar a educação como esse
exercício “visceral”, apontado pelo professor de Ciências?
Educação como língua que deixa também falar as vísceras, lo que es más carnal de
nuestro ser99... Quiçá a infância desse professor trace o desenho de uma verificação
(MASSCHELEIN; SIMONS, 2014, p.117), que se faz não apenas pelo esquadrinhar das
páginas dos livros, com o controle dos resultados, na garantia dos títulos acumulados. Mas
de outra maneira de verificar: no movimento dos encontros, quando uma presença, uma
pele, uma língua se lança na exposição com outras presenças, com outras peles, com
outras línguas...

línguas e pele...
Língua, pele, palavras que se imbricam e desafiam a pensar a língua que temos
afirmado com nossos movimentos na educação e na vida. Imbricação que evoca os sentidos
de uma vida que se vive na educação e de uma educação que afirmamos ao viver uma vida.
A língua portuguesa talvez nos forneça alguma pista quando traz as curiosas expressões
em torno da palavra pele: “cair na pele”, “estar na pele de”, “salvar a pele”, “cortar na
pele”, “tirar a pele de”, “arriscar a pele”, “sentir na própria pele”. (AURÉLIO, 1986, p.1297-
1298) Todas essas expressões carregam sentidos curiosos para pensar a relação entre língua
e pele.
É Derrida quem pergunta se a língua maternal não seria ela mesma uma espécie de
segunda pele que carregamos, um chez-soi móvel, um lar inamovível, já que ele se desloca
conosco (DERRIDA; DEFOURMANTELLE, 2003, p.81). Juntamos a nossa inquietação
com a do filósofo e nos perguntamos se esse movimento de reunir as gentes para o
exercício do pensar não seria uma maneira de inventar uma língua, “arriscando a própria
pele”... Arriscar a pele não seria, por assim dizer, correr o risco, colocar em questão uma
certa maneira habitual de nos relacionarmos com a própria língua, com seus os códigos
fossilizados, buscar outros sentidos?
Para Deleuze (2009, p.106-107), a pele, a superfície é o lugar dos sentidos, dispõe de
uma energia potencial vital. Arriscar a pele, habitar a língua de outros modos não seria um
exercício de pôr a vida à prova?
No entanto, os discursos hegemônicos no campo pedagógico parecem tomar o
sentido oposto, pois a apologia aos métodos, que buscam controlar os resultados, não têm
deixado muitas brechas para o risco... Essa lógica talvez se ajuste, sem muita dificuldade,
ao “salvar a própria pele”, conservar-se longe das zonas de perigo...
Pode ser que aqui esteja uma chave para pensar porque a aproximação das gentes de
uma universidade com as gentes de escolas de periferia, com outras gentes de muitas
línguas de muitos lugares do mundo, provoque reações tão diferentes, afete de maneiras
tão diversas... Talvez porque sejamos lançados - nesse movimento “nosotrico”, fabricado
com o outro - a um certo impasse que se verifica nesse lugar pulsante entre “salvar a pele”
e “arriscar a pele”... Esse lugar, esse intervalo em que é necessário habitar com outras
línguas para habitar minha/nossa língua de outras maneiras, pois “a língua só é a partir de
mim. Ela é também isso de onde parto, me para e me separa. É o que se separa de mim,
partindo de mim (DERRIDA; DEFOURMANTELLE, 2003, p.81-83). Quem sabe os
encontros que temos vivido com as diferentes infâncias no mundaréu das línguas das
gentes estejam nos reivindicando uma abertura aos intervalos quando, entre chegadas e

99 http://forum.wordreference.com/threads/sinonimo-de-visceral.1517073/
http://forum.wordreference.com/threads/sinonimo-de-visceral.1517073/
142|
142| edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

partidas, possamos pensar uma educação mais pele a pele, mais na língua com outras
línguas. Línguas e peles...
Uma educação, quem sabe, atravessada por uma “fisolofia” frágil, infantil... No
intervalo...
OO intervalo
intervalo dede olhar
olhar nos
nos olhos,
olhos, escutar
escutar ee ser
ser escutado,
escutado,
viver
viver uma
uma alegria
alegria difícil,
difícil,
“um
“um contentamento
contentamento descontente”
descontente” (CAMÕES,
(CAMÕES, 1994) 1994)
experimentar
experimentar um um sabor
sabor agridoce,
agridoce,
lamber
lamber asas feridas,
feridas,
exercitar,
exercitar, um um certo
certo devir-animal,
devir-animal,
um
um devir-criança,
devir-criança,
um
um devir-vanise
devir-vanise
ou
ou umum outro
outro devir
devir qualquer,
qualquer,
minoritário,
minoritário,
espreitar,
espreitar,
ir
ir farejando,
farejando,
soltar
soltar oo grito,
grito,
ouvir
ouvir oo silêncio,
silêncio,
abrigar
abrigar nossa
nossa fragilidade
fragilidade quando
quando as as palavras
palavras nos
nos escapam
escapam
ee somos
somos lançados
lançados no no vazio,
vazio,
suspender
suspender um um pouco,
pouco, como
como propôs
propôs Sara,
Sara, as
as marcas
marcas identitárias,
identitárias,
dar
dar de
de cara
cara comcom nossa
nossa arrogância,
arrogância,
ignorância,
ignorância,
com
com as
as mentiras
mentiras que que nos
nos contam,
contam,
com
com as
as que
que contamos
contamos parapara nós
nós mesmos...
mesmos...
ouvir
ouvir oo som
som dede outras
outras línguas,
línguas,
roçar
roçar língua
língua com
com língua,
língua,
como
como nana intensidade
intensidade de de um
um beijo,
beijo,
arriscar
arriscar aa pele,
pele,
sentir
sentir nana pele,
pele,
inventar
inventar outra
outra língua
língua com
com oo que
que ainda
ainda não
não sabemos,
sabemos,
inventar
inventar uma uma outra
outra língua
língua
ainda
ainda porpor ser
ser falada,
falada,
por
por ser
ser escrita,
escrita,
por
por ser
ser vivida...
vivida...

referências
AURÉLIO.
AURÉLIO. Novo Novo Dicionário
Dicionário Aurélio
Aurélio da
da Língua
Língua Portuguesa.
Portuguesa. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Nova
Nova Fronteira,
Fronteira, 1986.
1986.
CAMÕES,
CAMÕES, Luis Luis Vaz
Vaz de.
de. In:
In: MASSAUD,
MASSAUD, Moisés. Moisés. A A literatura
literatura portuguesa
portuguesa através
através de
de textos.
textos. São
São
Paulo:
Paulo: Cultrix,
Cultrix, 1994.
1994.
DERRIDA,
DERRIDA, Jacques;
Jacques; DUFOURMANTELLE,
DUFOURMANTELLE, Anne. Anne. Dufourmantelle
Dufourmantelle convida
convida Jacques
Jacques Derrida
Derrida aa falar
falar
da
da hospitalidade.
hospitalidade. São
São Paulo:
Paulo: Escuta,
Escuta, 2003.
2003.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Ditos
Ditos ee Escritos
Escritos IV:
IV: Estratégia,
Estratégia, Poder
Poder –– Saber.
Saber. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Ed.
Ed. Forense
Forense
Universitária,
Universitária, 3ª3ª edição,
edição, 2012.
2012.
GILLES,
GILLES, Deleuze.
Deleuze. AA Dobra
Dobra –– Leibniz
Leibniz ee oo Barroco.
Barroco. Campinas:
Campinas: Papirus,
Papirus, 2012.
2012.
_______.
_______. Lógica
Lógica do
do sentido.
sentido. São
São Paulo:
Paulo: Perspectiva,
Perspectiva, 2009.
2009.
______.
______. Abecedário.
Abecedário. Disponível
Disponível em:
em:
http//stoa.usp.br/prodsubjeduc/files/262/1015/Abecedario+G+Deleuze.pdf. Consultado
http//stoa.usp.br/prodsubjeduc/files/262/1015/Abecedario+G+Deleuze.pdf. Consultado
em: 09/07/2015.
em: 09/07/2015.
KOHAN, Walter
KOHAN, Walter Omar.
Omar. UmaUma Educação
Educação Filosófica
Filosófica através
através dada Infância.
Infância. In:
In: KOHAN,
KOHAN, WalterWalter
Omar.(org.). Ensino
Omar.(org.). Ensino dede Filosofia
Filosofia –– Perspectivas.
Perspectivas. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2002.
2002.
_______. El
_______. El Maestro
Maestro Inventor.
Inventor. Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez. Caracas:
Caracas: Ediciones
Ediciones DelDel Solar,
Solar, 2016.
2016.
MASSCHELEIN, Jan;
MASSCHELEIN, Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten.
Maarten. A A pedagogia,
pedagogia, aa democracia,
democracia, aa escola.
escola. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte:
Autêntica, 2014.
Autêntica, 2014.
MELO NETO,
MELO NETO, JoãoJoão Cabral
Cabral de.
de. Obra
Obra completa.
completa. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Nova
Nova Aguilar,
Aguilar, 1995.
1995.
143
143

la práctica de la filosofía en la educación y el propósito de que cada vez sean


más los que se representen el mundo como propio

laura v. agratti11

supuestos que subyacen a una práctica filosófica en la educación

D esde el año 2008 desarrollo un proyecto que procura desenvolver la práctica


de la filosofía con niñas y niños en la Escuela Graduada “Joaquín V.
González” de la Universidad Nacional de La Plata con la hipótesis de que
el filosofar en la educación, en tanto expresión de un logos inquisidor, a la vez que propicia
una determinada relación con el saber tiene efectos políticos/emancipatorios que se
develan frente a la pregunta por el tipo de subjetividad que se construye en esta práctica.
Con esta conjetura semana a semana repetimos en el aula de filosofía la experiencia
de descubrir que hay otra forma de saber que se puede construir en la escuela y que, a
diferencia del conocimiento que habitualmente se produce en la relación pedagógica
institucionalizada, lejos de volvernos capaces de dominar la naturaleza con una
explicación única de los hechos nos abren a pensar creativa y personalmente las múltiples
maneras de habitar el mundo. La experiencia del filosofar en la polifonía del aula nos
acerca a las cosas ya conocidas con una actitud de apertura, con la pregunta que interpela y
que hace emerger la multiplicidad de sentidos que ellas guardan. Un pensamiento que es
uno y es muchos a la vez y que, por lo mismo, resulta enriquecido y único dejando en cada
uno de los participantes del encuentro caminos para seguir problematizando y pensando
personalmente aquello que los ha conmovido. Así nos enfrenta a la novedad de un saber
que no busca apropiarse del mundo sino que quiere constituirse conforme a su particular
manera de atravesar el terreno de la incertidumbre. Habrá tantas maneras de transitar la
búsqueda como subjetividades participantes en el colectivo de la clase.
En este sentido, el propósito que conlleva este proyecto no es otro que coadyuvar a
crear las condiciones para que en la educación cada vez sean más los que se representen el
mundo como suyo.
Se trata de un proyecto inicialmente surgido como proyecto de extensión que
paulatinamente fue incorporado por la escuela a los distintos niveles de la educación
primaria y se constituye en un espacio privilegiado de investigación a partir de la propia
práctica del equipo docente: maestras y profesoras de filosofía.
En relación con el marco teórico, el proyecto, en un primer momento, tuvo su
inspiración en la propuesta filosófico pedagógica de Matthew Lipman, conocida como
Philosophy for children (LIPMAN, 1988; 1991; LIPMAN; SHARP; OSCANYAN, 1980;
SHARP; SPLITTER, 1995) y, luego, hace un desplazamiento a partir de la reformulación
teórica conceptualizada como filosofía con niños (EVANS, 1976; KOHAN; WAKSMAN,
2000).
Los ejes problemáticos principales que se afirman son:
a) la idea de un maestro-filósofo como una figura que irrumpe para superar una
dicotomía tradicional en el campo de la didáctica de la filosofía (CERLETTI, 2008a;
CARRIZALES RETAMOZA, 1991); b) una imagen del pensamiento que fundamenta la
introducción de la filosofía en la escuela en el marco de los dispositivos de “aprender a
pensar”/ “enseñar a pensar” (DELEUZE, 1988; RANCIÈRE, 2003); c) una indagación

11 Facultad
Facultad de
de Humanidades
Humanidades yy Ciencias
Ciencias de
de la
la Educación,
Educación, Universidad
Universidad Nacional
Nacional de
de La
La Plata
Plata -- Fahce/UNLP
Fahce/UNLP
Email: lagratti@isis.unlp.edu.ar
Email: lagratti@isis.unlp.edu.ar
144|
144| laura
laura v.
v. agratti
agratti

respecto de los fines y sentidos políticos otorgados a la presencia de la filosofía en la


escuela (LIPMAN, 1985; 1991; CERLETTI, 2008b).
Estos ejes problemáticos se expresan en preguntas que atraviesan toda nuestra
investigación sobre nuestro quehacer filosófico en la escuela, a saber:
a) ¿qué relación existe entre producir filosofía / filosofar y enseñar o transmitir
filosofía? ¿Qué lugar ocupan las figuras de profesor y filósofo en la experiencia de la
filosofía?; b) ¿Qué imagen del pensamiento sustenta las propuestas de llevar la filosofía a
la escuela?; c) ¿Cuáles son los sentidos de infancia presentes en la tradición filosófica que
permiten problematizar la práctica filosófica en la educación?; d) ¿Cuáles son los sentidos
políticos atribuidos a la filosofía en la escuela? ¿Cómo se piensa la relación entre filosofía,
educación y democracia? ¿Puede afirmarse el valor político de una práctica a partir del
propio ejercicio cuestionador de la filosofía sin suponer valores políticos que la
trasciendan? ¿Puede la experiencia del preguntar fundamentar una apuesta política por
“otra educación”?; e) ¿Qué implicaciones tiene un proyecto de extensión en prácticas
filosóficas para pensar la producción del conocimiento en el marco de las relaciones entre
Universidad, escuela y sociedad?; f) ¿Cómo pensar la formación de estudiantes
universitarios de filosofía y de maestros actuantes en la enseñanza fundamental a partir de
un proyecto de extensión en prácticas filosóficas?; g) ¿Cómo practicar la filosofía con
chicos de entre 6 y 11 años? ¿Para qué hacerlo? ¿Cómo planear, registrar, interpretar y
evaluar esa práctica?
Supuestos, propósitos, ejes problemáticos, preguntas que se amalgaman en un
proyecto que invita a la práctica de la filosofía en la educación que venimos ejerciendo e
investigando hace años aun sabiendo que las preguntas que nos orientan son inmensas y
que nuestra práctica no podrá atenderlas en su complejidad a todas. Sin embargo, creo,
ofrece elementos para pensarlas en un contexto específico: el de una práctica filosófica
desarrollada en un aula con niños y niñas de una escuela pública en Argentina.

registros de clase. escenas con niños y niñas de una escuela pública en argentina
De este contexto he tomado tres escenas para reflexionar sobre algunos de los
efectos que a mi entender se siguen de la práctica de la filosofía: específicamente en torno a
cómo modifica la relación pedagógica y “democratiza” la producción de conocimiento y
cómo esto impacta sobre la subjetividad y nos coloca en la perspectiva de pensar una
práctica educacional emancipadora a partir de la cual cada subjetividad sea capaz de
representarse intelectualmente el mundo como suyo. De alguna manera estas situaciones
son la prueba de la vigencia y presencia en la práctica de los tres ejes problemáticos
principales de nuestro proyecto que enunciamos al comienzo de este trabajo.
Escena 1. La maestra llega al aula, los/as niños/as se acomodan en círculo en el piso,
la maestra advierte que le será imposible coordinar la clase y tomar registro. Le pregunta a
Maurina si puede tomar nota de todo lo que se conversa en la clase. Maurina acepta y se
sienta en el piso junto a la maestra. Transcurridos los cuarenta minutos suena el timbre:
Maurina, de 6 años, recién alfabetizada, había tomado dos páginas de registro sin
preguntar absolutamente nada.”
Escena 2. La maestra en un intento de trabajar la cuestión de la identidad personal,
pasa un espejo con un marco de madera de otra época para que los niños y niñas de primer
grado se miren y contesten a la consigna: ¿Cuándo te ves frente al espejo qué es lo que más te
gusta de vos? Los chicos dicen en algún caso ‘mis ojos’ ‘mi sonrisa’ ‘a mí me gusta todo’,
pero el espejo cae en manos de Estéfano y cuando se mira dice ‘cuando me miro en el
espejo me siento libre’. Bernardo, ya sin el espejo en la mano le responde ‘cuando me miro
en el espejo siento que me multiplico’ y ¿qué dice Gerónimo? ‘es como si detrás hay otro y
la
la práctica
práctica de
de la
la filosofía
filosofía en
en la
la educación
educación yy el
el propósito
propósito de
de que
que cada
cada vez
vez sean
sean más
más los
los que
que se
se representen
representen || 145
145
el mundo
el mundo como
como propio
propio

detrás otro y detrás otro’. Interviene María, que sostiene que cuando ella se mira en el
espejo su otro yo sale y entra su yo al espejo.”
Escena 3. La maestra de primer grado termina de leer en la ronda el cuento Un día de
campo de Don Chancho: Don Chancho va contento a la casa de la señorita Cerda para
invitarla a pasar un día de campo. En el camino se encuentra con sus amigos el Zorro, el
León y la Cebra; cada uno de los cuales le entrega, en ese orden, la cola, la melena y las
rayas y le dicen que ahora sí se ve más audaz, más valiente, más elegante. Cuando la cerda
abre la puerta siente espanto con el monstruo que tiene frente a sí, el chancho sale
corriendo entonces a devolverle las partes a sus amigos. La maestra les pregunta con un
propósito de poner en revisión la cuestión de la amistad: cómo dando lo mejor se le puede
hacer mal a un amigo, ¿realmente esos amigos lo querían o lo aceptaban tal cual era?
¿habían actuado bien sus amigos? Malena, de seis años, vincha de peluche fucsia y colitas
celestes, sorprende con su intervención: ‘no, el que estuvo mal fue el chancho porque él no
debió aceptar lo que le daban los otros animales; él tenía que ser como era.
Las tres escenas están situadas en la escuela, son imágenes de clases de filosofía con
niños/as en las que se reconoce la presencia de un mensaje que la docente ha preparado
para sus alumnos/as.
Si nos detenemos a examinar lo que tienen en común estas postales de escuela se
puede fácilmente observar que en ellas el ámbito escolar es el escenario en el que se
construye una relación históricamente determinada por una idea de infancia que se
remonta a la modernidad y es a partir de esa caracterización de la infancia entendida como
edad diferenciada de la adultez por su incompletitud y por su dependencia al adulto que
surge la pedagogía. En este sentido, esta idea de Infancia como etapa cronológica que
construye la modernidad es la que propicia el surgimiento del espacio de formación que la
preparará para la vida: la escuela (NARODOWSKI, 1994). Se le impone entonces una
organización de tiempos, espacios y rituales en la que el saber se distribuye conforme a la
idea asimétrica con la que fue pensada la escuela con la finalidad de hacer que los seres
completos modelen a los que vienen llegando. De modo que es en ellos, en los niños y
jóvenes, en donde se verá realizado el ideal que los adultos han imaginado para la
educación. Resulta insoslayable, entonces la tensión fundacional sobre la que se apoya la
institución escolar: la relación pedagógica que ella alberga y es su razón de ser, solo es
posible en el encuentro de dos subjetividades que se saben desiguales y en el que lo único
que está en juego es la reproducción de la idea y del predominio del más fuerte y completo.
Casi idéntica a la estructura argumental que presenta Rancière al advertir que es el
maestro explicador el que necesita del ignorante y no a la inversa. Tensiones y paradojas
que dan sentido al acto de educar (RANCIÈRE, 2003). Paradojas y tensiones que hay que
comprometerse a examinar filosóficamente si es que del intento de pensarlas emerge el
sentido de nuestra tarea, de nuestro hacer en la educación.
Sin embargo, y más allá de estas similitudes y cuestionamientos, hay otro elemento
común en estas escenas: en todas ellas la infancia, las/os niñas/os, produjeron un
desplazamiento respecto de aquello buscado, promovido, de lo esperado y previsible y con
esta actitud han adoptado una nueva configuración que muestra el agotamiento de esa idea
de infancia de la modernidad. La infancia toma decisiones, pronuncia las palabras que le
resultan significativas, ocupa su lugar en el mundo sin necesidad de tutela alguna. Se
independizan de lo que el exterior les demanda y ejercen con naturalidad y entusiasmo su
labor intelectual de manera personal y creativa.
De modo que, estas postales de infancia nos enfrentan al problema de la enseñanza
como conformadora de la subjetividad. En efecto, si lo imprevisible irrumpe en un aula
entonces la novedad interpela en primera instancia, a la figura del docente y a su
posicionamiento en la relación pedagógica. La pregunta revierte sobre nosotros, los
146|
146| laura
laura v.
v. agratti
agratti

docentes: ¿qué hacemos cuando los/as niños/as se independizan de nuestra tutela al punto
de desconocer nuestras consignas y adoptar un pensamiento interesante y significativo que
como adultos no pudimos advertir? ¿nos hacemos los distraídos y actuamos como si nada
hubiese pasado? ¿nos volvemos sordos, como si no hubiésemos escuchado? ¿nos revestimos
de autoridad y evaluamos que lo que ha pasado no corresponde al tema o a la consigna? ¿o
más bien nos detenemos a pensar en aquello que hizo que se moviera el tablero y se
dislocara el juego?
Estas opciones son las que habilitan al logos inquisidor del/a docente,
volviéndolo/a otro/a, poseedor/a de preguntas, despojado/a de respuestas, y harán que se
conmueva su lugar toda vez que las/os niñas/os intervengan en el espacio de la clase con
su necesidad de recrear las historias, con su potencial para formular hipótesis que
modifican nuestras propuestas entre otras tantas posibilidades. El trabajo que sigue surgió
precisamente en esta grieta que abrió la infancia en tanto universo móvil, polícromo e
incodificable y del que, en cierto sentido, formamos parte.

la filosofía y la infancia en la escuela


En medio de las sucesivas crisis, marchas y contra marchas que atraviesan a la
educación se comenzó a expandir entre nosotros la concepción que sostiene que la
filosofía, entendida como una búsqueda de sentido, puede ser parte de la propuesta
educativa que se ofrece a la infancia. Filosofía para niños es una idea que da lugar a un
dispositivo en el que la infancia como cronología hace filosofía en las aulas, una edad
cronológica que produce en la educación una idea de filosofía en la que ella está
férreamente determinada por procedimientos que connotan al pensamiento como un
pensar crítico, creativo y cuidante. Así lo pensó Lipman, desde que concibió esta idea que
devino en una propuesta para la enseñanza. Con esta novedad a filosofía institucionalizada
ya no remite a una asignatura de la escuela secundaria sino que se la asocia a la escuela
primaria y al jardín de infantes. Así filosofía para niños es una idea que tiene más de
cuarenta años, desde que Lipman la acercaba en formato novela a los/as niños/as y
recomendaba la conformación de comunidades de indagación como dispositivo para el
aula. La infancia quedó así habilitada para encontrarse con la filosofía y a ser considerada
como parte de los saberes con los que se educa. La historia es conocida, esta novedad fue
recibida con entusiasmo como una forma de renovar el soporte disciplinar con el que se
forma a los/as niños/as. La filosofía pasa a ser un dispositivo en el contexto de la escuela
que reglamenta la práctica filosófica en las aulas bajo las pautas con las que funciona la
comunidad de indagación. La novedad se cristaliza en un espacio colectivo de construcción
de sentido a partir del cuestionamiento y el fortalecimiento del diálogo. Ahora bien,
filosofía para niños ¿podría ser pensada entonces como una alternativa a la educación
tradicional de la infancia? Estudios posteriores a la implementación de la idea comenzaron
a mostrar, caída la máscara, el rostro de la misma. Su postura contiene la imagen de la
infancia de la modernidad y por tanto, lejos de escapar a su desiderátum, lo sofistica. En
filosofía para niños la filosofía cumple una función disciplinar que está al servicio de los
valores del orden: democracia, tolerancia, razonabilidad. Su presencia consuma y
perfecciona el ejemplo de este poder disciplinar ya que modeliza a los que la ejerciten con
el modo correcto de desarrollar el pensar y con el modo correcto de juzgar de los nuevos
ciudadanos. Expuestas nuestras diferencias con la idea que supone Lipman y con la
intención de avanzar en ‘nuestro’ pensar la infancia visitaremos un fragmento de Walter
Benjamin en el que configura la condición del niño de una manera que puede resultar fértil
a nuestro propósito de resignificarla.
la
la práctica
práctica de
de la
la filosofía
filosofía en
en la
la educación
educación yy el
el propósito
propósito de
de que
que cada
cada vez
vez sean
sean más
más los
los que
que se
se representen
representen || 147
147
el mundo
el mundo como
como propio
propio

En Dirección Única (BENJAMIN, 1988) ofrece sus imágenes de infancia, no solo


para poner el acento en la importancia del juego, sino para explicitar la necesidad de iniciar
un estudio profundo de la gran ley que rige en el mundo de los juegos: la de la repetición.
Sostiene que la esencia de jugar es hacerlo una y otra vez transformando lo emocionante
en hábito. El juego busca retornar siempre, no solo para reelaborar experiencias terroríficas
sino también para buscar una y otra vez los triunfos. Juegos sin necesidad de producción
de juguetes para el berlinés no hace falta crear objetos para niños, sino que ellos hacen
ciertas cosas con los residuos de las cosas, con los pequeños restos del mundo y crean
nuevas y caprichosas relaciones. Ellos producen un mundo de objetos, sus juguetes. Esta
idea de Benjamin guarda muchísima vitalidad para pensar en la grieta que nos propuso la
infancia.
Creo que podemos establecer un interesante paralelismo entre esta idea que
tomamos del filósofo Benjamin y las imágenes de infancia que depliegan los/as niños/as
de nuestras escenas: la importancia del juego, la posibilidad de ser autores/creadores del
mundo de la objetividad para darle contenido a este juego, la necesidad de la repetición.
Entonces subrayo de Benjamin estos rasgos que nosotros podemos encontrar en cualquier
relación con los/as niños/as en nuestros encuentros de filosofía en la escuela y que,
sabemos, son rasgos que en general se pierden en las instituciones escolares por la potencia
que tiene la normatividad.
.
en síntesis
Propongo retomar una categoría que ha entrado en desuso, y actuar como
intelectuales críticos en nuestra práctica de hacer filosofía con los recién llegados. Esto es
instalarnos en la grieta con la pregunta infantil como instrumento, una pregunta que
exprese su perplejidad frente a lo que es obvio y conocido para casi todos. Como sabemos
la pregunta por la subjetividad tiene mucha relevancia en educación, pero la tiene con más
fuerza cuando somos filósofos en la educación y buscamos sentido a partir de de las
las tensiones
tensiones
que aparecen en nuestra práctica, sin dar por supuesto nada. Un pensar errante que no
tiene un mensaje para imputarle a nadie, mucho menos a niños y niñas y que ante este ser
móvil, incodificable, polícromo habitará el rol docente como un suscitador del yo justo en
el momento, diría Lacan en el Seminario XI, de la separación de la alienación que el niño
tuvo con el mundo adulto. En este proceso de separación el niño hace preguntas hasta que
el adulto le dice ‘no sé’; instante en que esta expresión se vuelve liberadora. Esa es la
respuesta que el niño necesita para comenzar a construir su subjetividad emancipada de
toda alienación. Y es entonces el momento en que hay que alimentar la pregunta,
reavivarla más que anularla con mensajes moralizantes y con respuestas que sólo miren al
futuro. Así, ser filósofos en la educación se vuelve un imperativo indispensable para
pensarlos y pensarnos en una nueva relación como las que nos nos proponen
proponen Maurina,
Maurina,
Estéfano, Bernardo, María y Malena. Cuando una relación que se construye en un diálogo
que se hace en voz alta, con otros y en condición de iguales sucede que nuestro
pensamiento crece y se amplía para poder ser otra cosa. En este sentido, el espacio del
Proyecto en la escuela es una apuesta al valor de pensar en comunidad para ampliar la
potencia de lo que pensamos y exponernos a lo que los otros piensan y son para poder
pensar y ser de otra manera.

referencias
ARENDT, Hannah. La crisis en la educación. In: Entre el pasado y el futuro. Ocho ejercicios
sobre la reflexión política. Barcelona: Península, 1996, p.185-208.
BENJAMIN, Walter. Dirección Única. Buenos Aires: Alfaguara, 1988.
148|
148| laura
laura v.
v. agratti
agratti

CARRIZALES RETAMOZA, Cesar. El filosofar de los profesores. Cuernavaca:


Universidad Autónoma de Sinaloa, 1991.
CERLETTI, Alejandro. La enseñanza de la filosofía como problema filosófico. Buenos Aires:
Libros del Zorzal, 2008a.
______. Repetición, novedad y sujeto en la educación. Un enfoque filosófico y político. Buenos
Aires: Del Estante, 2008b.
DELEUZE, Gilles. Diferencia y repetición. Gijón: Júcar, 1988.
EVANS, Clyde. Philosophy with Children: Some Experiences and Some Reflections.
Metaphilosophy, vol. 7, nº. 1, p. 53-69, 1976.
KOHAN, Walter. O.; WAKSMAN, Vera. Filosofía con niños. Aportes para trabajar en el
aula. Buenos Aires: Novedades Educativas, 2000.
KOHAN, Walter. Infancia. Entre educación y filosofía. Buenos Aires: Laertes, 2003.
LACAN, Jacques. Seminario XI. Buenos Aires: Paidós, 2000.
LIPMAN, Matthew. Moral education, higher-order thinking and philosophy for children.
International Journal of Early Child Development and Care, vol. 107, p. 61-70, 1995.
______. Philosophy Goes to School. Philadelphia: Temple University Press, 1988.
______. Thinking in Education. Cambridge: University Press, 1991.
LIPMAN, Matthew; SHARP, Ann; OSCANYAN, Frederick. Philosophy in the Classroom.
Philadelphia: Temple University Press, 1980.
NARODOWSKI, Mariano. Infancia y poder. La conformación de la pedagogía moderna.
Buenos Aires: Aique, 1994.
RANCIÈRE, Jacques. El maestro ignorante. Cinco lecciones sobre la emancipación intelectual.
Buenos Aires: Libros del Zorzal, 2003.
SHARP, Ann; SPLITTER, Laurance. The Classroom Community of Inquiry: Teaching for
Better Thinking. Melbourne: ACER, 1995.
149
149

pensar, experienciar y jugar: otros lenguajes, otras prácticas...11

maría teresa suárez vaca22


lola maría morales mora33

introducción:

T eniendo en cuenta las características particulares del contexto educativo y


social de la población con la cual se desarrolló el proyecto, se hizo notoria la
importancia de que los niños lleguen a la comprensión y a la configuración
de saberes a través de experiencias de indagación. La sede San Rafael de la Institución
Educativa Técnica Rafael Uribe está ubicada en la zona rural del Municipio de Toca
(Colombia), cuenta con los grados de transición a once, siendo un escenario educativo de
carácter público donde se trabaja con el modelo de Escuela Nueva. Por consiguiente los
maestros de educación básica primaria están a cargo de tres niveles educativos. En este
caso particular: transición, primero y segundo, los cuales comparten un solo salón. Esta
situación es compleja al reconocer que los maestros deben asumir el reto de liderar los
procesos de aprendizaje de tres grados al tiempo, desarrollar los contenidos temáticos
pertinentes para cada uno y, a la vez, responder a los objetivos académicos propuestos por
la Institución Educativa y el Ministerio de Educación Nacional.
A partir del proceso de contextualización realizado a través de prácticas de
observación participante, entrevistas y revisión de documentos institucionales se evidencia
la poca vinculación que tienen los padres de familia en los procesos de aprendizaje de los
niños, teniendo en cuenta que las familias en su gran mayoría se dedican a actividades
agrícolas y ganaderas que demandan gran parte de su atención y tiempo generando incluso
que los niños al regresar a sus casas después de la jornada académica deban encargarse de
realizar actividades domésticas. Esta situación implica que sea la escuela quien en varios
casos asume la educación de los niños. Por tal situación, se implementa el proyecto
“Filosofía con niños: un detonante para la constitución de sujetos críticos y creadores en la
escuela”; a través del cual se buscó proporcionar una mayor atención y seguimiento a los
procesos de configuración de saberes en los estudiantes de transición y primero
considerando que cada niño posee unos ritmos de comprensión y aprendizaje diferentes y
que las experiencias pedagógicas que vivencien en estos grados se verán reflejadas no sólo
en grados posteriores sino a lo largo de toda su vida.
Para el proyecto fue indispensable propiciar que los niños tuviesen la oportunidad
de expresarse en libertad, manifestando pensamientos o realizando juicios; exponiéndose
ante sus compañeros para provocar diversas apreciaciones; esto, partiendo de la idea, para
que los niños se constituyan como sujetos críticos que participan y se involucran en las
situaciones propias de sus contextos es necesario construir un ambiente educativo donde
sus aportes y sus saberes previos sean tenidos en cuenta y se convierten en la base de
nuevos saberes.
En la Institución Educativa Técnica Rafael Uribe fue necesario aumentar la
participación de los estudiantes para la construcción de sus propios saberes, proponiendo

11 La
La ponencia
ponencia surge
surge por
por indagaciones
indagaciones construidas
construidas aa partir
partir de
de diversas
diversas líneas
líneas de
de fuga
fuga producidas
producidas en
en medio
medio del
del
proyecto
proyecto “Filosofía
“Filosofía con
con niños:
niños: un
un detonante
detonante para
para la
la constitución
constitución de
de sujetos
sujetos críticos
críticos yy creadores
creadores en
en la
la escuela”,
escuela”,
realizado
realizado en
en la
la Institución
Institución Educativa
Educativa Técnica
Técnica Rafael
Rafael Uribe
Uribe del
del municipio
municipio dede Toca
Toca (Boyacá-Colombia)
(Boyacá-Colombia) sedesede
“San
“San Rafael”
Rafael” con
con los
los estudiantes
estudiantes de
de grado
grado transición
transición yy primero.
primero.
22 Universidad
Universidad Pedagógica
Pedagógica yy Tecnológica
Tecnológica de
de Colombia
Colombia –– UPTC.
UPTC. Email:
Email: maria.suarez@uptc.edu.co
maria.suarez@uptc.edu.co
33 Universidad
Universidad Pedagógica
Pedagógica yy Tecnológica
Tecnológica de
de Colombia
Colombia –– UPTC.
UPTC. Email:
Email: lm_morales@hotmail.com
lm_morales@hotmail.com
150|
150| maría
maría teresa
teresa suárez
suárez vaca;
vaca; lola
lola maría
maría morales
morales mora
mora

experiencias que parten de un reconocimiento de la infancia y que provocaran la


indagación, la exploración y el descubrimiento, teniendo en cuenta, que las prácticas
educativas que se fomentaban eran principalmente tradicionales traducidas estas en
incentivar en los niños un aprendizaje memorístico y repetitivo, donde la preocupación es
cumplir con las exigencias mínimas del Misterio de Educación Nacional; es decir son
motivaciones externas a los intereses de los niños; dejando de lado también el trabajo sobre
algunas habilidades de pensamiento, o actitudes de autonomía, que permiten dar sentido a
la educación como una forma de vida.
De tal manera, queda al descubierto, que los niños no ocupan un lugar protagónico
en su proceso educativo y que las actividades académicas son dirigidas de forma vertical
por parte del maestro, quien no tiene presente las inquietudes, aportes o expresiones de los
niños. De acuerdo con este panorama, se considera indispensable explorar y conservar la
espontaneidad con la que los niños se cuestionan por las cosas que los rodean, ya que si
esta capacidad no se potencia, se pierde. Como lo manifiesta Santiago (2011), “la genialidad
que tienen los niños para formular preguntas de manera espontánea se va perdiendo con el
paso del tiempo a causa de las dinámicas de los sistemas educativos, culturales y sociales
que van mutilando esta habilidad”. Sumado a esto es evidente que los niños van perdiendo
su capacidad de asombro y el interés innato que tienen en los primeros años por descubrir,
observar y explorar el mundo. Esta situación hace que los niños no construyan
conocimientos ni elaboren conceptos por ellos mismos, quedándose solamente con los
contenidos que les presentan en la escuela. Lo anterior confirma la pertinencia y necesidad
de construir espacios de discusión donde los niños y niñas pudiesen cuestionarse sobre el
mundo que los rodea, problematizar su entorno y defender sus ideas con argumentos para
así impulsar acciones de creación.
El proyecto retoma la filosofía con niños como eje central de la propuesta
principalmente por sus fundamentos y su intención de convertirse en una experiencia de y
para la vida, a través del desarrollo de habilidades básicas de pensamiento como:
percepción, investigación, conceptualización, razonamiento, traducción (SÁTIRO, 2010,
p.7). Habilidades que en sí mismas se constituyen como la base para desarrollar un
pensamiento crítico y así llegar a actos creativos.
Por otra parte, el reconocimiento de sus propuestas prácticas, en las cuales se
destaca la comunidad de indagación, comprendida y vivenciada como un espacio de
encuentro, discusión y búsqueda, donde los niños se cuestionan e indagan en torno a
diferentes temas, por medio de diálogos entre compañeros y maestros, propiciando una
participación voluntaria y espontánea. Este encuentro permite reconocer puntos comunes
y en muchos casos divergencias, lo que ocasiona valorar diversas perspectivas y la
oportunidad de construir conceptos a partir de la re-organización de miradas, ideas y
pensamientos otros.
La propuesta planteada, también reconoce la importancia del contexto y de las
experiencias extracurriculares, consideradas de valor por el impacto que ejercen sobre los
niños; se pretendió articular estos elementos con la propuesta de trabajo, con el fin de que
los contenidos académicos no fuesen abordados ni percibidos como temas exteriores o
aislados, sino que estuviesen conectados con la vida cotidiana de los niños. Para lograr este
vínculo, se hizo necesario crear en la escuela relaciones pedagógicas abiertas a la escucha de
experiencias de vida; otro aspecto vital para estas relaciones es el diálogo como mediación,
como señalaría Freire el diálogo permite una construcción conjunta de los saberes, donde la
voz y la palabra tiene un sentir y una intencionalidad que cobra fuerza en el colectivo. Por
lo tanto la interacción con las personas y con el contexto en el que se encuentran inmersos
los niños, se convierte en un escenario propicio para movilizar aprendizajes, pero esto sólo
pensar,
pensar, experienciar
experienciar yy jugar:
jugar: otros
otros lenguajes,
lenguajes, otras
otras prácticas...|
prácticas...| 151
151

cobra sentido cuando se logran manifestaciones por parte de los niños, es decir se
involucran de manera activa expresando sus pensamientos o ideas.
Como maestras investigadoras durante el desarrollo del proyecto se perciben
puntos de fuga que no fueron pensados desde su inicio y que corroboran lo valioso de una
experiencia pedagógica no cerrada, ni controlada. Es decir, que los primeros
cuestionamientos que motivaron la investigación, producen nuevos y mejores
cuestionamientos cuando se finaliza la experiencia, lo que indica que los procesos de
indagación siempre tendrán nuevas líneas que atraviesan y propician nuevas formas de
pensarse y constituirse como maestro.

constitución sujeto maestro en una experiencia de filosofía con niños


Es evidente que el maestro es un sujeto que se constituye diariamente a través de
discursos, prácticas, relaciones pedagógicas y reflexiones constantes sobre su ejercicio. Por
tal razón, como maestras a través de esta relación con la filosofía y con la infancia como
expresiones genuinas de la vida, se configuran como sujetos de saber que buscan,
construyen y de-construyen permanentemente estrategias, ambientes, espacios y
materiales llamativos o motivantes, con el fin de ofrecer condiciones que detonen y
potencien la construcción de conocimientos de manera conjunta. Esto a través de la
interacción y las relaciones que se entablan a partir de la confianza y el reconocimiento del
otro. Aquí queda de manifiesto la importancia de provocar en los niños gusto y goce en lo
que hacen, por medio de ambientes construidos con sentido, pensados con intencionalidad
creadora, pero tambien pensando en el disfrute de las actividades; ya que esto permite, que
las experiencias que se desarrollan en la escuela no sean efímeras o instantáneas sino que
logren trascender e impactar la vida cotidiana y futura de los niños.
En relación a lo anterior, el maestro necesita descubrir una sensibilidad especial
para resignificar sus prácticas y así potenciar sus discursos, buscando espacios para llevar a
cabo ejercicios de reflexión sobre el quehacer pedagógico, permitiéndose realizar cambios,
estructurar y desestructurar lo planeado, tomar decisiones y zarpar hacia el mundo
inesperado e impredecible de la escuela.
El maestro al hacer una relectura constante de sí mismo, de la escuela, de los
procesos y de las relaciones que allí se tejen, se ve en la necesidad de asumir y apropiar una
postura crítica que le posibilita comprender la complejidad de la educación como potencial
que dinamiza la creación de nuevas formas de constituir subjetividades a partir de las
experiencias y el acto creativo. En este sentido es importante reconocer cómo las
experiencias que atraviesan tanto a maestros como estudiantes tienen su propio valor; en
palabras de Larrosa (2006, p.90) seria:
Principio
Principio dede subjetividad
subjetividad porque
porque elel lugar
lugar de
de la
la experiencia
experiencia es es el
el sujeto
sujeto o,o, dicho
dicho de
de
otro
otro modo,
modo, queque la
la experiencia
experiencia es es siempre
siempre subjetiva.
subjetiva. Pero
Pero sese trata
trata de
de un
un sujeto
sujeto que
que
es
es capaz
capaz dede dejar
dejar que
que algo
algo le
le pase,
pase, es
es decir,
decir, que
que algo
algo le
le pase
pase aa sus
sus palabras,
palabras, aa sus
sus
ideas,
ideas, aa sus
sus sentimientos,
sentimientos, aa sussus representaciones,
representaciones, etc. etc. Se
Se trata,
trata, por
por tanto,
tanto, dede un
un
sujeto
sujeto abierto,
abierto, sensible,
sensible, vulnerable,
vulnerable, […][…] la
la experiencia
experiencia es es siempre
siempre experiencia
experiencia de de
alguien
alguien o,o, dicho
dicho dede otro
otro modo,
modo, que
que lala experiencia
experiencia es,es, para
para cada
cada cual,
cual, la
la suya,
suya, que
que
cada
cada uno
uno hace
hace oo padece
padece susu propia
propia experiencia,
experiencia, yy eso
eso de
de un
un modo
modo único,
único, particular,
particular,
propio.
propio.

Comprender la incidencia que tienen las prácticas y el ejercicio pedagógico en la


formación y transformación de los sujetos que hacen parte del acto educativo, se requiere
inicialmente analizar la forma en que el maestro observa, entiende y se relaciona con el
mundo, y en qué medida está dispuesto a dejarse afectar por los otros y por lo otro; por lo
tanto, si pensamos en un maestro de la experiencia estaríamos hablando de un maestro en
movimiento, en un ir y venir, en un viaje, en un interminable proceso de metamorfosis y
152|
152| maría
maría teresa
teresa suárez
suárez vaca;
vaca; lola
lola maría
maría morales
morales mora
mora

en una profunda conexión con su infancia convirtiéndose esta en un continuo devenir, un


retorno que posibilita mirarse y repensarse como sujeto en busca de significados que
potencien sus formas de ser y de pensar, es un punto de partida para entretejer nuevas
relaciones con el mundo, es un constante estado de principio y renovación.
Cuando el maestro teje una relación cotidiana con el acto de filosofar entiende “las
situaciones escolares” como principal fuente de posibilidad. Problematizar realidades
cotidianas es una práctica que le permite desarrollar un proceso de extrañamiento
permanente sobre las cosas que han sido naturalizadas y que necesitan su atención.
También es descubrir nuevas formas de comprender la educación, y a quienes hacen parte
de ella, en particular la infancia, como parte esencial de la relación pedagógica, donde se
comprenda que:
Los
Los niños
niños son
son sujetos
sujetos concretos,
concretos, la
la infancia
infancia bien
bien podría
podría ser
ser un
un estado,
estado, una
una
condición,
condición, una
una duplicación
duplicación que
que realizan
realizan los
los adultos
adultos sobre
sobre los
los niños.
niños. Porque
Porque los
los
niños
niños tienen
tienen rostros,
rostros, edades,
edades, semblantes,
semblantes, gestos,
gestos, acciones,
acciones, días,
días, noches,
noches, sueños,
sueños,
pesadillas,
pesadillas, piernas,
piernas, nombres.
nombres. Cuando
Cuando intentamos
intentamos encajar
encajar aa los
los niños
niños aa la
la infancia,
infancia,
algo,
algo, mucho,
mucho, se se pierde,
pierde, se
se evapora.
evapora. Pero
Pero cuando
cuando sustraemos
sustraemos aa loslos niños
niños dede la
la
infancia,
infancia, también
también algo
algo se
se pierde,
pierde, algo
algo se
se esfuma.
esfuma. Y Y en
en ambos
ambos casos
casos permanece
permanece un un
cierto
cierto gesto
gesto de
de disgusto,
disgusto, de
de incomodidad,
incomodidad, de de dolor,
dolor, de
de indiferencia.
indiferencia. (SKLIAR,
(SKLIAR,
2012,
2012, p.70)
p.70)

Pensar precisamente a la escuela como una plataforma capaz de movilizar


transformaciones a partir la relación que los niños tienen naturalmente con la filosofía
precisa que el maestro problematice y se piense las dinámicas, los intereses y las formas en
que los niños habitan el mundo. Observarlos en todos sus espacios y tiempos, permitirá
reconocerlos como sujetos vivos: sus gustos, actitudes, aptitudes, molestias y necesidades,
son aspectos que se develan sólo en espacios libres y de juego, especialmente donde el
adulto no tiene participación. En este sentido, se revela la importancia de que el maestro se
mantenga constantemente en una actitud vigilante, de escucha y de búsqueda de aquello
que sucede no sólo en el aula de clases sino en el contexto global del niño,
De otra parte, es oportuno reconocer cuándo se presentan problemas cotidianos, los
cuales no se constituirían como barreras sino, por el contrario, como situaciones con
elementos propicios para movilizar ideas, pensamientos y acciones renovadoras;
convirtiendo la escuela en un lugar de convivencia y de diálogos donde el niño descubre y
comprende el mundo a través de sus experiencias, del uso del lenguaje y de su interacción
con todo a aquello que lo rodea.
De esta manera, el desarrollo del proyecto se convirtió en una experiencia de
transformación y constitución de un sujeto maestro que considera la necesidad de
desarrollar habilidades de pensamiento junto con los niños, además de una actitud y
disposición de escucha ante los aportes y las intervenciones de cada uno, otorgando valor a
la voz y a las expresiones propias de su lenguaje.

comunidad de indagación: encuentro con otros lenguajes


Durante el desarrollo del proyecto la experiencia “comunidad de indagación” se
convirtió en un encuentro de sujetos: consigo mismo, con el otro y con lo otro; un tiempo
y espacio motivado por la pregunta, mediado por el diálogo, expresiones de asombro,
curiosidad, escucha, reflexión y actos de creación, donde surge “un espíritu de cooperación,
cuidado, confianza, seguridad, y un sentido de propósito común y de indagación que evoca
una forma de práctica auto-correctiva dictada por la necesidad de transformar lo que es
intrigante, problemático, confuso, ambiguo o fragmentario…” (SPLITTER; SHARP, 1996,
p. 36)
pensar,
pensar, experienciar
experienciar yy jugar:
jugar: otros
otros lenguajes,
lenguajes, otras
otras prácticas...|
prácticas...| 153
153

Teniendo en cuenta la necesidad de abordar los contenidos temáticos propios de


cada grado y promover el desarrollo de los procesos de lectura y escritura en los niños,
sumado a la apropiación del pensamiento matemático, se buscó a través de las actividades
pedagógicas abordar la comunidad de indagación como experiencia filosófica, esta como
eje transversal que potencia en los niños la configuración de saberes en cualquier ámbito,
es decir, propiciar en ellos una actitud de búsqueda e incertidumbre donde estructuran sus
propios conceptos y crean relaciones con el contexto.
En el desarrollo de las actividades con los niños de la sede San Rafael, se utilizaron
textos literarios como detonantes de indagación. Se reconoció la necesidad de generar
condiciones para que la lectura no sea una traducción de códigos, sino una experiencia de
resignificación, ya que cada niño asigna un significado propio a lo que lee y escucha,
partiendo de que “la lectura como formación supone cancelar esa frontera entre lo que
sabemos y lo que somos, entre lo que pasa (y que podemos conocer) y lo que nos pasa
(como algo a lo que debemos atribuir un sentido en relación a nosotros mismos)” Larrosa
(2003, p.29), permitiendo que el niño construya sus propio saberes y que su configuración
como sujeto esté en constante transformación; por por lo
lo tanto,
tanto, el
el encuentro
encuentro con la literatura
(lectura, escucha y escritura) en el desarrollo del proyecto se vuelve indispensable en en la
la
medida en que se convierte en experiencia logrando activar el pensamiento de los niños.
En la intención de relacionar la filosofía con los procesos de lectura y escritura se
apropia la metáfora del viaje planteada por Jorge Larrosa quien postula que “leer es como
viajar, donde lo importante es que el viaje exterior (el recorrido por el texto) está doblado
por un viaje interior, por un viaje que convierte al viajero en algo distinto del que había
partido” (2003, p 46), esto posibilita transformar la lectura tradicional que se practica en el
aula en una aventura, donde el niño se sorprende, se inquieta, inquieta, busca,
busca, descubre
descubre yy creacrea
relaciones que cobran sentido en su forma particular de comprender el mundo, la lectura
de un texto dentro de la comunidad de indagación se convierte en inspiración para
irrumpir en la monotonía y posibilitar volver la mirada sobre ciertas situaciones,
reconociendo a su vez que el texto no cobra valor por sí mismo, sino éste es otorgado por
sus lectores quienes construyen sus propios sentidos cuando cuando sese ven afectados.
afectados. De De otra
otra
parte se comprende que texto no sólo es es la
la expresión
expresión escrita,
escrita, sino
sino puede
puede ser
ser todo
todo lolo que
que nos
nos
rodea; se podría hablar de la lectura del mundo, donde cualquier manifestación de la vida
pude ser leída con sentido
sentido yy significación
significación provocando
provocando cuestionamientos
cuestionamientos ee inquietudes
inquietudes queque
merecen ser atendidas.
La comunidad de indagación es un encuentro de expresiones de lenguaje y por lo
tanto el proyecto posibilitó la exploración de diversas actividades concebidas aquí como
lenguajes artísticos: danzas, canto, expresión corporal, pintura, teatro, títeres, uso de
materiales reciclables, etc., todo esto con la intención de reconocer que “el lenguaje no está
necesariamente unido a las palabras
palabras sino que comprende toda articulación perceptiva que
se pueda entender como un principio
principio incipiente
incipiente de
de expresión.
expresión. NoNo existe
existe nada
nada queque no
no
participe del lenguaje ya que aquello que no se puede expresar ni transmitir es
inconcebible” (BENJAMIN 1998, p 74), de de esta
esta manera
manera sese demuestra
demuestra que
que elel lenguaje
lenguaje sese
moviliza sin ningún tipo de frontera,
frontera, que no se limita sólo al acto del habla sino que el
cuerpo también está en constante comunicación y que encuentra un sinnúmero de
expresiones que pueden ser exploradas, experimentadas y que provocan cuestionamientos.
El lenguaje es un viaje de fantasía donde se descubre que sus expresiones ocupan un
amplio espectro, que van más allá de lo externo y que tiene sus raíces en lo más profundo
de la espiritualidad humana, donde se sumergen los pensamientos más íntimos y se anidan
lenguajes que trascienden por encima de las palabras conocidas; donde la música, la
pintura, y los sentimientos son en sí mismos un lenguaje no necesariamente ligado a la
palabra, pero sí unidos a las percepciones, las expresiones y los sentidos.
154|
154| maría
maría teresa
teresa suárez
suárez vaca;
vaca; lola
lola maría
maría morales
morales mora
mora

Las formas de expresión de los niños, se convirtieron en viajes mágicos enunciados,


en medio de espacios y lenguajes artísticos, donde los niños y niñas participaron
activamente compartiendo sus ideas y pensamientos de manera espontánea El lenguaje
dentro de una comunidad de indagación, cobra un significado de principio, principio que
permite la comunicación de eso espiritual o filosófico con relación a los objetos, por lo que
este transitar en el lenguaje admite que la forma en que hablemos, es lo que le da
significado a la palabra que sale de nuestra boca, es decir, la palabra que nace y se
transporta desde nuestro espíritu al espíritu del otro y de lo otro. Por lo tanto, el
significado que le damos al lenguaje hace parte del sujeto, porque la forma de hablar genera
y trasmite significados e intenciones que son evidentes; por esto, Benjamin (1998) expresa
que la manera de decir, es lo que convierte un poema en poesía; eso que es capaz de
expresar el poema más allá de las palabras escritas, eso que puede ser descifrado por
encima del contenido, eso que es comunicado implícitamente pero que logra traspasar y
mover las fibras de la espiritualidad para dar sentido y fuerza a la poesía; es dejar que el
lenguaje precisamente se convierta en magia, y esta magia sea médium que transmite. La
magia, eso que no comprendemos, que está frente a nuestros ojos pero que nuestra retina
no es capaz de descifrar, esa magia que no necesita recurrir al truco ni al engaño, está
oculta pero a la vez expuesta a los más intensos rayos de luz, existente pero desconocida a
la vez, una fuerza que trasciende, magia espontánea, diáfana e intangible que se transporta
y habita en el lenguaje.
Esta experiencia logra reafirmar la importancia de asumir la filosofía como un
estilo de vida puesto que abre nuevas posibilidades de ser y de estar en la escuela,
resaltando la trascendencia de compartir con el otro, de reconocer su voz como parte
esencial de la comunidad y de construir y reconstruir los saberes de manera conjunta a
través del diálogo, la exploración, y las experiencias que tienen lugar a partir de la
interacción y el acercamiento con el mundo.

manifestaciones fugaces frente al juego libre como estado natural de la infancia para
filosofar
En este apartado se abordará la categoría de la dimensión lúdica como experiencia
filosófica, la cual emerge durante el desarrollo del proyecto, principalmente a partir de
observar a los niños cuando se encuentran inmersos en sus juegos, para lo que es
importante retomar el concepto de juego, comprendido como:
una
una acción
acción uu ocupación
ocupación libre,
libre, que
que se
se desarrolla
desarrolla dentro
dentro de de uno
uno de
de los
los límites
límites
temporales
temporales yy esenciales
esenciales determinados,
determinados, según
según reglas
reglas absolutamente
absolutamente obligatorias,
obligatorias,
aunque
aunque libremente
libremente aceptadas,
aceptadas, acción
acción que
que tiene
tiene su
su finfin enen sí
sí misma
misma yy va va
acompañada
acompañada de de un
un sentimiento
sentimiento dede tensión
tensión yy alegría
alegría yy de
de lala conciencia
conciencia de
de “ser
“ser de
de
otro
otro modo”
modo” que
que en
en la
la vida
vida corriente
corriente (HUIZINGA,
(HUIZINGA, 2015, 2015, pp 55).
55).

Este concepto proporciona un amplio espectro de las conexiones y la relación que se


puede establecer entre las prácticas cotidianas de juego que realizan los niños y sus formas
particulares de hacer filosofía, evidenciándose unos lazos de tensión al pensar el acto de
filosofar conectado al juego. La primera característica que nos brinda Huizinga sobre este,
es la cualidad de “acción libre”, así mismo, la filosofía busca constituir personas que
piensen en libertad y actúen en coherencia con su pensar. No se puede obligar a filosofar,
como tampoco se puede obligar a jugar. De otra parte el juego como la filosofía son
experiencias que tienen su fin en sí mismo, es decir el acto de jugar por jugar y el acto de
filosofar por filosofar, o sea, no se realizan con fines externos sino, por el gusto de
participar libremente en ello. Pero es importante reconocer que el ejercicio continuo tanto
en la filosofía como del juego, provoca desarrollos y estimula diversas habilidades
necesarias para la vida. El juego generalmente se acompaña de tensiones y alegrías, el reto,
pensar,
pensar, experienciar
experienciar yy jugar:
jugar: otros
otros lenguajes,
lenguajes, otras
otras prácticas...|
prácticas...| 155
155

el triunfo, la perdida, pero sobre todo el disfrute de las acciones; la filosofía por su parte, se
sostiene gracias a las tensiones provocadas por las inquietudes y los dilemas y en la
satisfacción de movilizar pensamientos y de construir conceptos. Finalmente el juego es
una oportunidad consiente de ser de otro modo y este como tal es un ejercicio filosófico, es
decir, la posibilidad de pensar desde diferentes perspectivas y poder optar por ser de una u
otra forma,
En el diseño de los planes de trabajo, donde surgen ensoñaciones literarias y
posibles lenguajes artísticos para provocar experiencias, encuentros, construcción de
conocimientos, indagaciones, se desvía la mirada al discurrir cotidiano de la infancia, es
decir, se atienden aquellos espacios y tiempos fuera del aula, espacios añorados por los
niños; son los tiempos del recreo. Este apartado surge de la inquietud provocada por sus
expresiones porque siempre esperan con emoción salir al encuentro con sus amigos de
manera libre y desprovista de adultos, por lo tanto, surge un cuestionamiento y
extrañamiento ante el “habitar infantil sin condicionamientos externos”. El juego libre en
el recreo.
Un grito de libertad! Todos sonríen, se emocionan. Ha sonado la campana para
salir al recreo, así surge la inquietud, ¿Qué es lo que sucede en el recreo que atrapa a los
niños y los hace tan felices? Son diversas las manifestaciones lúdicas que se perciben,
juegos de competencia, de expresión dramática, juegos tradicionales, (trompo, golosa),
corren, saltan, ruedan, discuten, pelean se reconcilian. Todos participan voluntariamente,
viven, se desenvuelven con naturalidad, dejan aflorar su ser más íntimo, se expresan sin
limitaciones, aprenden unos de otros, esos juegos que en ocasiones son ficticios se
convierten en una representación de su realidad. Cuántos maestros desearían que en sus
aulas los niños llegaran con la misma emoción y afán por participar como cuando están
jugando en el receso.
Este estado lúdico es un vivir filosófico de la infancia, un estado de alegría y
ensoñación creadora, se observan juegos de competencia que según Roger Caillois (1986,
p.43) son denominados Agón es decir, “una lucha en que la igualdad de oportunidades se
crea artificialmente para que los antagonistas se enfrenten en condiciones ideales con
posibilidad de dar un valor preciso e indiscutible al triunfo del vencedor”. En estas
manifestaciones lúdicas los niños se organizan libremente, asumen modifican o crean
reglamentos, los cuales son apropiados de común acuerdo sin imposiciones sino por el
gusto de participar, se construye por lo tanto una ética del juego que también se asume
espontáneamente, no exige jueces externos ni castigos, funciona de manera simple y
natural en medio de voluntades, por lo tanto estos juegos implican un ejercicio filosófico
que se traduce en la constitución ética del niño en relación a su ser y su actuar con el otro.
Este tipo de juegos generalmente se producen en medio de organizaciones
colectivas, es decir de participación comunitaria, por lo tanto se construye un trabajo
fusionado que implica mantener diálogos entre sí, reconociendo cualidades, debilidades y
asumiéndolas en el desarrollo del juego, en algunos casos como prácticas deportivas se
requieren habilidades corporales, pero esto solo no es suficiente pues se exige la
construcción de estrategias para trabajar en equipo, provocando pensamientos, análisis y
reflexiones sobre sí mismos y sobre el otro equipo, en palabras de Sátiro (2012, p.21)
habilidades cinestésicas “la cinestesia es la percepción consiente de los movimientos de las
diferentes partes del cuerpo y de su posición en el espacio” esta habilidad es importante
porque provoca autoconocimiento y conciencia del propio cuerpo y de su desempeño en el
mundo. Los juegos de competencia provocan una exigencia personal que recogidas entre sí
hacen un colectivo fuerte, para derrotar a sus adversarios; pero conscientemente esta
rivalidad se queda en el juego, y al volver a la realidad prima nuevamente la fraternidad,
pues cabe la posibilidad de construir nuevos equipos. También existe un factor
156|
156| maría
maría teresa
teresa suárez
suárez vaca;
vaca; lola
lola maría
maría morales
morales mora
mora

potenciador de facultades pues la práctica constante estimula habilidades y las destrezas


necesarias para participar, aunque esto no es la finalidad del juego, pues la esencia está en
el triunfo. En conclusión; se estimulan diversas habilidades por gusto y exigencia personal,
se construyen diálogos, se acepta el pensamiento del otro, se reconocen facultades, se crean
estrategias y se respetan posturas éticas, en medio del juego se aprende a ganar y a perder.
Otro tipo de Juegos observados son los denominados Mimicry. Para Roger Caillois
(1986, p.56) “el sujeto olvida, disfraza, despoja pasajeramente su personalidad para fingir
otra”. En psicología se le ha denominado como juego simbólico, es un estado aiónico que se
distancia de la realidad, pero que muestra generalmente sus propias realidades,
imaginación, ensoñaciones, fantasías, los ambientes se transforman, se utilizan objetos con
atribuciones diferentes a las de uso natural. Se juega a la familia, al colegio, a las reinas etc.
Es un juego sin discriminaciones, participan los que se atreven a soñar, donde existe
complicidad ficticia, por lo tanto es un vuelo colectivo de la imaginación, los diálogos son
naturales, auténticos e inspirados por sus propios pensamientos, pero generalmente tienen
sustento en sus propias realidades, algunas veces representan ironías o formas de protesta
ante la realidad que les embarga, en otros casos reflejan deseos anhelados, además crean
conflictos como nudos dramáticos donde ellos mismos proponen y construyen sus
soluciones.
Estos juegos de expresión dramática, no tiene edad limitante, pero tienen la
exigencia de asumir con seriedad y coherencia roles determinados; allí se refleja la lectura
que ellos hacen del mundo, no hay competencia, no hay premios, es un estado de creación,
se puede acabar cuando los mismos jugadores lo decidan. La mímica y el disfraz se
constituyen en accesorios posibles para mejorar y disfrutar el juego pero no indica que sean
indispensables para su realización. Las máscaras facilitan la posibilidad de actuar de
manera encubierta sacando a la luz expresiones que en otras condiciones no se atreverían a
manifestar. En conclusión se participa en libertad, se exige una suspensión de la realidad,
tiene un espacio y tiempo delimitado, es un estado de creación que hace experiencia para
cada uno de los participantes, estimula capacidades creadoras fundadas en habilidades
como el de hacer analogías razonamientos, interpretaciones y traducciones de lenguajes.
Finalmente se observó un disfrute especial en un tipo Juegos denominados Ilinx
que para Roger Caillois (1986, p.58)
se
se basan
basan en
en buscar
buscar el
el vértigo,
vértigo, yy consisten
consisten en
en un
un intento
intento dede destruir
destruir por
por un
un
instante
instante la
la estabilidad
estabilidad de
de la
la percepción
percepción yy de
de infringir
infringir aa la
la conciencia
conciencia lucida
lucida una
una
especie
especie de
de pánico
pánico voluptuoso.
voluptuoso. EnEn cualquier
cualquier caso,
caso, se
se trata
trata de
de alcanzar
alcanzar un
un especie
especie de
de
espasmo,
espasmo, dede trance
trance oo de
de aturdimiento
aturdimiento que
que provoca
provoca lala aniquilación
aniquilación dede la
la realidad
realidad
con
con una
una brusquedad soberana.
brusquedad soberana

Vértigo, emoción, adrenalina, euforia, valentía y alegría, pueden ser juegos


individuales o colectivos pero la sensación es personal, es un reto individual, un estado de
subjetividad incierta donde sólo lo siente la persona que lo experimenta, generalmente es
voluntario, es decir se tiene libertad para aceptar o rechazar la prueba y se realiza por
disfrute, una de sus características es que al ser acciones repetitivas pierden su encanto
muy pronto y exigen que la persona cree modificaciones, que hacen la experiencia más
valiosa para sí. Este tipo de juegos producen desarrollo de habilidades personales y control
sobre los movimientos corporales. Generalmente, están relacionados con la velocidad, las
caídas libres, el impulso, etc. con límites estrictos e invariables, en muchos casos la prueba
se convierte en materia de espectáculo y admiración, por lo tanto hay cierto reto por
convertirse en actores héroes para sus espectadores.
Una conclusión de este apartado es que la dimensión filosófica y lúdica del ser
humano, se constituyen en estados vitales por sí mismas, en actos diferenciados con
pensar,
pensar, experienciar
experienciar yy jugar:
jugar: otros
otros lenguajes,
lenguajes, otras
otras prácticas...|
prácticas...| 157
157

valores propios; existe una desconexión del tiempo cronos y se vive literalmente un
tiempo aiónico donde segundos se pueden convertir en horas de exploración, es una magia
que les transporta a un mundo distante e inadmisible para muchos, un espacio sin
fronteras, propio, donde se expresan a través de diversos lenguajes y viven en libertad.

referencias
BENJAMIN,
BENJAMIN, Walter. Walter. Sobre
Sobre el el lenguaje
lenguaje en en general
general yy sobre
sobre el
el lenguaje
lenguaje dede los
los humanos.
humanos. In: In: ______.
______.
Para
Para una
una crítica
crítica de
de la
la violencia
violencia yy otros
otros ensayos.
ensayos. Madrid:
Madrid: Taurus,
Taurus, 1998.
1998.
CAILLOIS,
CAILLOIS, Roger.
Roger. El El hombre
hombre yy loslos juegos.
juegos. México:
México: Gallimard,
Gallimard, 1986.
1986.
HUIZINGA,
HUIZINGA, Johan. Johan. Homo
Homo Luden.
Luden. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 2015.
2015.
LARROSA,
LARROSA, Jorge.Jorge. LaLa experiencia
experiencia de de la
la lectura.
lectura. Estudios
Estudios sobre
sobre literatura
literatura yy formación.
formación. México:
México: Fondo
Fondo
de
de cultura
cultura económica,
económica, 2003.2003.
_______.
_______. Sobre
Sobre lala Experiencia
Experiencia I. I. Educación
Educación yy pedagogía,
pedagogía, n.18,
n.18, p.43-51,
p.43-51, 2006.
2006.
SANTIAGO, Didier.
SANTIAGO, Didier. El El papel
papel de de lala pregunta
pregunta en en la
la construcción
construcción de de personas
personas críticas.
críticas. Revista
Revista
Internacional Magisterio
Internacional Magisterio Educación
Educación Y Y Pedagogía,
Pedagogía, n.48,
n.48, p.28-31,
p.28-31, 2011.
2011.
SPLITTER, Laurance;
SPLITTER, Laurance; SHARP,
SHARP, Ann. Ann. La La otra
otra educación:
educación: filosofía
filosofía para
para niños
niños yy la
la comunidad
comunidad de de
indagación. Buenos
indagación. Buenos Aires:
Aires: Manantial,
Manantial, 1996.1996.
SÁTIRO, Angélica.
SÁTIRO, Angélica. Proyecto
Proyecto noria
noria infantil
infantil yy primaria.
primaria. Barcelona:
Barcelona: Octaedro,
Octaedro, 2010.
2010.
_____. Jugar
_____. Jugar aa pensar.
pensar. “Guía
“Guía para
para educadores”.
educadores”. Barcelona:
Barcelona: Octaedro,
Octaedro, 2012.
2012.
SKLIAR, Carlos.
SKLIAR, Carlos. LaLa infancia,
infancia, la la niñez,
niñez, las
las interrupciones.
interrupciones. childhood
childhood && philosophy,
philosophy, Rio
Rio dede Janeiro,
Janeiro,
v.8, n.15,
v.8, n.15, p.
p. 67-81,
67-81, 2012.
2012.
158
158
159
159

filosofia na escola:
pensando as dimensões do papel público da educação...

vanise de cássia dutra gomes11


edna olímpia da cunha22

Será
Será que
que alguma
alguma vez
vez escutei
escutei outra
outra pessoa?
pessoa? Será
Será que
que alguma
alguma vez
vez
permiti
permiti que
que outra
outra pessoa
pessoa entrasse
entrasse em
em mim
mim com
com suas
suas palavras,
palavras,
desviando
desviando meu
meu fluxo
fluxo interior?
interior?
(MERCIER,
(MERCIER, 2010,2010, p.148)
p.148)

A
s inquietações que movem esta escrita são desdobramentos de uma
experiência ocorrida em novembro de 2012, no curso “Sobre a escola (pública)
e o ato educativo ou sobre a experiência da pesquisa como verificação da igualdade.
Encontrar uma escola pública em/para o Rio: andar e falar como práticas de
pesquisa educativa”33. O nome do curso parece extenso demais, e as questões que suscitaram
nos seus participantes parecem infinitas, tornaram-se potentes, mobilizam o pensamento,
provocam escritas. E quando um acontecimento nos afeta, com tamanha força, cria um
tempo de idas e vindas, atualizando um passado que não cessa de nos interrogar. O que é
público? Quais seriam os limites que demarcam a diferença entre público e privado? O que
é um lugar público, uma escola pública? O que faz de uma escola um lugar público? Estas
perguntam reverberam com força no interior de nossa participação no projeto Em Caxias, a
filosofia en-caixa: a escola pública aposta no pensamento44. Uma das características marcantes do
trabalho neste projeto é uma espécie desfamiliarização com as palavras, um convite ao
estranhamento, a vislumbrá-las por diversos ângulos, arrancando-lhes a casca já
ressequida. Ao entrar nesta luta com elas, são as nossas relações com outros e com nós
mesmos, com a própria vida que entram em jogo. Sim, porque estas palavras não são
meros signos, mas verbos encarnados na experiência de habitar uma escola, uma
universidade, um mundo, sendo atravessados pelo que não sabemos, na lacuna do que
ainda não temos como nomear. Quando estamos diante da folha em branco, tentando
escrever sobre o que temos pensado, experimentado, vivido com o projeto de filosofia na
escola, sempre nos vem à memória as palavras de Kethelen, uma aluna participante do
projeto: “Estou sem palavras(...) A gente precisa escrever sobre isso”.

11 Professora
Professora da da Escola
Escola Municipal
Municipal Joaquim
Joaquim dada Silva
Silva Peçanha,
Peçanha, Secretaria
Secretaria Municipal
Municipal dede Educação,
Educação, Duque
Duque dede
Caxias,
Caxias, RJ. RJ. Doutoranda
Doutoranda da da Universidade
Universidade do do Estado
Estado do do Rio
Rio de de Janeiro
Janeiro –– UERJ. UERJ.
Email:vanisedutragomes@gmail.com
Email:vanisedutragomes@gmail.com
22 Professora
Professora da da Escola
Escola Municipal
Municipal Joaquim
Joaquim dada Silva
Silva Peçanha,
Peçanha, Secretaria
Secretaria Municipal
Municipal dede Educação,
Educação, Duque
Duque dede
Caxias,
Caxias, RJ.
RJ. Email:
Email: olimpiaportprof@gmail.com
olimpiaportprof@gmail.com
33Este
Este curso
curso foi
foi parte
parte de
de um
um projeto
projeto interinstitucional
interinstitucional de
de pesquisa
pesquisa envolvendo
envolvendo universidades
universidades de de vários
vários países
países
da
da América
América do do Sul
Sul ee da
da Europa.
Europa. Dois
Dois professores
professores belgas
belgas ee um
um espanhol
espanhol vieram
vieram com
com cerca
cerca de
de trinta
trinta estudantes
estudantes
belgas
belgas sese juntar
juntar aa outros
outros dois
dois professores
professores ee mais
mais trinta
trinta estudantes
estudantes brasileiros
brasileiros para
para compartilhar
compartilhar umauma
experiência
experiência de de formação
formação organizada
organizada em em conjunto
conjunto pela
pela Universidade
Universidade do do Estado
Estado dodo Rio
Rio de
de Janeiro(UERJ)
Janeiro(UERJ) ee
pela
pela Universidade
Universidade Federal
Federal Fluminense(UFF).
Fluminense(UFF). Os Os professores
professores envolvidos
envolvidos foram
foram JanJan Masschelein,
Masschelein, WimWim
Cuyvers,
Cuyvers, Jorge
Jorge Larrosa,
Larrosa, Walter
Walter Omar
Omar Kohan
Kohan ee Maximiliano
Maximiliano López.
López. Durante
Durante duas
duas semanas,
semanas, os os estudantes
estudantes
percorreram
percorreram aa cidade
cidade dodo Rio
Rio de
de Janeiro,
Janeiro, buscando
buscando indicações
indicações que
que lhes
lhes permitissem
permitissem reconhecer
reconhecer os os seus
seus espaços
espaços
públicos,
públicos, através
através de
de seus
seus usos
usos pelos
pelos habitantes
habitantes do
do município.
município. (MARTINS;
(MARTINS; VARGASVARGAS NETTO; NETTO; KOHAN,
KOHAN,
2014,
2014, p.
p. 7)
7)
44Projeto
Projeto dede pesquisa
pesquisa ee extensão
extensão desenvolvido
desenvolvido pelo
pelo Núcleo
Núcleo dede Estudos
Estudos dede Filosofia
Filosofia ee Infâncias
Infâncias (NEFI),
(NEFI), dodo
Programa
Programa de de Pós-Graduação
Pós-Graduação em em Educação
Educação dada Universidade
Universidade dodo Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro (UERJ/Maracanã)
(UERJ/Maracanã)
em
em conjunto
conjunto comcom três
três escolas
escolas do
do município
município de
de Duque
Duque de
de Caxias:
Caxias: Joaquim
Joaquim dada Silva
Silva Peçanha,
Peçanha, Pedro
Pedro Rodrigues
Rodrigues
do
do Carmo
Carmo ee Zilla
Zilla Junger.
Junger.
160|
160| vanise
vanise de
de cássia
cássia dutra
dutra gomes;
gomes; edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

Então, nos indagamos: Por que ficamos sem palavras quando estamos vivendo uma
experiência de pensamento? Seria um momento de esvaziamento de nossas certezas e
convicções sobre as coisas/palavras do mundo? Por que o desejo de escrever no momento
que as palavras desaparecem? Será que desaparecem? Ou estas palavras ecoam de outras
maneiras que até então não percebíamos que poderiam vibrar? Seria o desejo de tentar
fazer ressoar um vazio repleto de dúvidas e perguntas que nos invadem sobre elas? Seria
como tentar narrar, escrever sobre esse algo que nos interpela, nos atravessa e nos provoca?
Seria uma tentativa de repensar e narrar um movimento interno chamando à vida o que
antes estava desvitalizado?
Num certo sentido esta escrita é um convite ao exercício de estranhar algumas
palavras, que tantas vezes se convertem em conceitos assimilados, repetidos à exaustão, mas
não pensados. “Escola”, “escola pública”, “público”, “privado” são palavras que têm forçado
o pensamento na intersecção das experiências do curso de 2012 e das experiências no projeto
de Duque de Caxias. No entrelaçar das experiências que nos têm afetado, perguntamo-nos:
seria o público uma maneira de habitar uma escola? De que modo nossos movimentos no
interior do projeto de filosofia têm contribuído ou não para pensar a escola enquanto uma
questão pública? Inspiradas por tais inquietações, tentamos, no presente texto, rememorar as
sensações provocadas durante a caminhada no exercício do curso de 2012 e os movimentos
traçados na maneira de habitar a escola a partir de nossa inserção no projeto de filosofia em
Duque de Caxias. Talvez seja importante narrar um pouco o per-curso que fizemos (Edna e
Naomi/Vanise e Anne) sempre em companhia de uma colega, naquele finalzinho de
primavera há quase quatro anos...

per-curso 1 (vanise e anne): atenção sobre o (des)conhecido


Já havia estudado anteriormente em um artigo algumas ideias de Masschelein e
Simons sobre a skholé55 que causaram um movimento de curiosidade e inquietação muito
interessantes. Essa curiosidade pulsava na direção de saber quem eram esses professores
que pensavam a escola de outra maneira que até então não havíamos pensado. Eles traziam
uma relação interessante, propondo a escola no sentido original da palavra e que
precisávamos pensá-la e/ou defendê-la como uma questão pública. Para nossa surpresa
esse estudo se aproximava muito com o que estávamos vivendo na escola com o projeto de
filosofia. Esta ideia de escola como skholé - tempo livre para estudar - mesmo soando ainda
como desconhecida, potencializa o pensar sobre o projeto e tudo o que estamos fazendo.
Em novembro de 2012 tivemos a oportunidade de conhecer o professor Masschelein
pessoalmente através de um curso que tinha como um dos objetivos pensar uma ideia de
educação para todos a partir da caminhada pelas ruas da cidade, tendo como orientação
observar a existência de dezesseis parâmetros66 ao longo do percurso estabelecido.
Um estudante belga e um estudante brasileiro, para realizar o curso, teriam que
caminhar juntos pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro com o objetivo de pesquisar e
propor uma escola com educação para todos. Durante o exercício que causou nos
estudantes brasileiros muita inquietude, fiquei pensando: o que haveria de skholé nesta

55Palavra
Palavra que
que deriva
deriva do
do grego
grego ee significa,
significa, antes
antes de
de tudo,
tudo, “tempo
“tempo livre”,
livre”, mas
mas também:
também: resto,
resto, atraso,
atraso, estudo,
estudo,
discussão,
discussão, palestra,
palestra, prédio
prédio da da escola,
escola, descanso,
descanso, estudo,
estudo, discussão,
discussão, palestra,
palestra, escola,
escola, prédio
prédio escolar
escolar
(MASSCHELEIN;
(MASSCHELEIN; SIMONS, SIMONS, 2014,2014, p.160)
p.160)
66 Grafites;
Grafites; prostituição
prostituição nas
nas ruas,
ruas, emem bordéis
bordéis ouou cabarés;
cabarés; pessoas
pessoas consumindo
consumindo ou ou lidando
lidando com
com drogas;
drogas;
moradores
moradores de de rua;
rua; depósitos
depósitos de
de lixo;
lixo; lugares
lugares de
de encontros
encontros sexuais
sexuais ocasionais;
ocasionais; lugar
lugar onde
onde sese praticam
praticam jogos
jogos ee
esportes
esportes coletivos;
coletivos; caixas
caixas eletrônicos
eletrônicos em em locais
locais públicos;
públicos; comércio
comércio informal
informal nas
nas ruas;
ruas; patrulha
patrulha ee delegacia
delegacia de
de
polícia;
polícia; ruínas
ruínas ou
ou prédios
prédios abandonados;
abandonados; bancos
bancos dede sentar;
sentar; amor
amor público;
público; telas
telas de
de informação
informação ee telas
telas em
em duas
duas
dimensões;
dimensões; fazer
fazer oo mapa
mapa do
do trajeto
trajeto de
de cada
cada dia.
dia.
filosofia
filosofia na
na escola:
escola: pensando
pensando as
as dimensões
dimensões do
do papel
papel público
público da
da educação...|
educação...| 161
161

tarefa? Esta atividade me fez andar em lugares pelos quais já havia passado, provocando
um exercício de atenção sobre o já conhecido.
O per-curso que eu e minha colega belga Anne deveríamos fazer correspondia a
alguns lugares/bairros por mim já conhecidos e muito visitados: de Madureira a Inhaúma;
de Madureira a Jacarepaguá e toda a extensão da Avenida Salvador Allende no Recreio dos
Bandeirantes. Sempre transitei por esses lugares de carro ou de ônibus, passando de um
bairro a outro, distraída em alguma tarefa do dia a dia. Mas desta vez nossa tarefa seria
manter atenção a cada passo, observando determinados
determinados pontos
pontos do
do per-curso, seguindo um
roteiro determinado pelos professores. Que tarefa/sensação desafiadora! Caminhar por
ruas tão conhecidas que agora se tornavam tão desconhecidas, estranhas! Esta mesma
sensação tenho sentido na escola com o projeto. A cada experiência de pensamento que
vivemos com os alunos e professores sou convidada a fazer vibrar, a habitar as palavras, as
coisas da escola e do mundo, a pensá-las de outra maneira.
Lembro também que Anne e eu estávamos numa relação de suspensão do nativo e
do estrangeiro. Precisávamos nos comunicar e realizar o exercício juntas. Não sabíamos
falar o mesmo idioma e precisávamos inventar uma outra língua para conversar sobre
nossa atividade e, assim, duas estudantes vivendo um exercício de igualdade, pensando,
pesquisando e estudando algo comum que engendraria na propostaproposta de
de criar uma escola
para todos, tendo como ponto de partida o Rio de Janeiro. Há, neste aspecto, algo também
que talvez se aproxime com o que fazemos no projeto de filosofia na escola: viver um
exercício de igualdade como princípio, abrindo uma mirada e uma escuta sensíveis à
diferença, ao que nos parece estrangeiro, ao outro singularmente diferente de nós, ao outro
de nós mesmos... Professores e alunos, crianças e a adultos, escola básica e universidade,
nativo e estrangeiro pensando algo de interesse comum. Estaria nisso uma das dimensões
do papel público da escola? Masschelein e Simons (2013, p.33), ao escreverem sobre a
possibilidade de reinventar o escolar através da criação de um tempo livre, dizem que
“criamos a possibilidade de suspensão”, ou seja, de instalar a igualdade desde o início,
início,
quiçá tornando possível o compartilhar com outros numa condição de igualdade,
potencializando assim o encontro entre as diferentes singularidades
singularidades dos
dos sujeitos no
exercício de pensar, dando vida ao que estava antes desvitalizado.
Outra sensação que me lembro com o caminhar foi a de que precisei profanar
algumas coisas que havia aprendido. Neste caso, havia aprendido nas aulas da graduação
sobre a importância do distanciamento do pesquisador para investigar o pesquisado, o que
foi colocado em questão em nosso per-curso. Estava pesquisando a cidade e para isso
precisava viver a cidade, caminhando pelas ruas, atenta ao que via e registrava de cada
lugar, num intenso exercício de skholè. Masschelein e Simons também afirmam que a
skholè um lugar, um tempo para possibilidade e liberdade e por isso para profanação do
ordinário e do usual na escola e justificam que
Um
Um tempo
tempo ee lugar
lugar profano,
profano, mas
mas também
também asas coisas
coisas profanas,
profanas, referem-se
referem-se aa algo
algo que
que
éé desligado
desligado do do uso
uso habitual,
habitual, não
não mais
mais sagrado
sagrado ou ou ocupado
ocupado por
por um
um significado
significado
especial,
especial, e,
e, portanto,
portanto, algo
algo no
no mundo
mundo queque é,
é, ao
ao mesmo
mesmo tempo,
tempo, acessível
acessível aa todo
todo ee
sujeito
sujeito àà (re)apropriação
(re)apropriação de de significados.
significados. ÉÉ algo
algo nesse
nesse sentido
sentido geral
geral (não
(não
religioso),
religioso), que
que foi
foi corrompido
corrompido ou ou expropriado;
expropriado; emem outras
outras palavras,
palavras, algo
algo que
que se
se
tornou
tornou público.
público. (...)
(...) AA típica
típica experiência
experiência escolar
escolar –– aa experiência
experiência queque éé
possibilitada
possibilitada pela
pela escola
escola –– éé exatamente
exatamente aquele
aquele confronto
confronto com
com coisas
coisas públicas
públicas
disponibilizada
disponibilizada para
para uso
uso livre
livre ee novo
novo (MASSCHELEIN;
(MASSCHELEIN; SIMONS, SIMONS, 2013,
2013, p.39-40)
p.39-40)
No projeto de filosofia na escola, quando dialogamos sobre algo numa experiência
de pensamento, também buscamos tornar esse algo um objeto de estudo, criando condições
para que ele seja explorado, problematizado de outras maneiras possíveis de seu uso
ordinário, o que tem feito de nossos encontros um filosofar compartilhado e dialógico,
162|
162| vanise
vanise de
de cássia
cássia dutra
dutra gomes;
gomes; edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

permitindo colocar em jogo algo que se transformou em matéria de estudo, nos


convidando a ver o que estava ali e não víamos, a escutar o que não se escuta...
Logo em seguida ao exercício da caminhada, que deixou marcas vibrantes no
pensamento, fui contemplada com o belo e instigante exercício de pensar, ler e escrever
sobre livro Em defesa da escola – uma questão pública, o qual me ajudou a reviver na memória
o exercício da caminhada e pensar as experiências de pensamento e os
diálogos/conversação que vivemos com as crianças, os adolescentes, os adultos e os
professores na escola.
Retomar as marcas da caminhada no corpo e ler o livro Em defesa da escola – uma
questão pública me causaram uma sensação de alegria e de espanto ao mesmo tempo, e
pensei curiosa: Existe alguém que defende a escola?! Que corajosos! Por que a escola
precisava ser defendida? Quais as acusações que estavam sendo-lhe imputadas? Por que a
defesa da escola se tornava uma questão pública? O que os autores estavam afirmando com
a palavra pública? Seria como o que se havia proposto no exercício da caminhada pelo Rio
de Janeiro, pensar uma escola para todos? Por que uma escola para todos? Que sentido os
autores queriam afirmar com escola e seu papel público? Haveria uma relação de
aproximação entre a palavra “todos”, proposta no curso e a palavra “público” no título do
livro? Precisamos continuar pensando...

per-curso ii (edna e naomi): bairros dentro de bairros, descontinuidades e interrupções


O exercício de caminhar proposto no referido curso deveria ser feito em dupla.
Coube a mim e à colega belga Naomi percorrer o perímetro de duas lagoas: a da Barra da
Tijuca e a de Jacarepaguá. Assim o fizemos, em dias de sol e de chuva, por duas semanas,
inclusive no feriado nublado do Dia dos Mortos.
Naomi não sabia sequer uma palavra do português e o desafio inicial seria ajustar
meu tímido inglês à comunicação necessária entre nós, encontrar uma língua comum. Na
caminhada, teríamos que pôr atenção aos dezesseis parâmetros elencados no início do
curso. Naomi parecia não se deter a nenhum detalhe fora da lista dos parâmetros, sempre
precisa em apontar aqui e ali a ocorrência de um ou outro. O sentido daquele exercício
talvez fosse muito diferente para as duas... Mais do que traçar um percurso, deixei que o
caminhar me atravessasse, traçasse em mim um mapa de sensações. Lancei meu corpo no
espaço...
Assim, o que pretendemos nessa breve narrativa do exercício do curso de 2012 é, de
algum modo, recuperar esse mapa de sensações, inquietações que nos afetaram e afetam até
hoje, acolhendo as perguntas que vão surgindo, na esperança de que nos ajudem a pensar a
escola como uma questão pública.
Transcorrer o perímetro das duas lagoas trouxe um sentido muito forte de
separação, de isolamento, sobretudo no momento em que caminhar já se tornara uma
tarefa quase impossível. Alguns passos e tínhamos de parar, mais alguns e mais uma
barreira... Eram condomínios luxuosos, bairros dentro de um bairro. Portões enormes
demarcavam as fronteiras, impondo limites aos “habilitados” ou não a circular naquele
espaço. Desconforto, tédio; as ruas tinham donos e seguranças muito atentos, encarregados
de dizer quem entra, quem não pode entrar, passar, transitar:
Do
Do outro
outro lado
lado das
das águas,
águas, oo condomínio
condomínio Península,
Península, insular.
insular. Imponente.
Imponente. Uma
Uma balsa
balsa
transporta
transporta apenas
apenas osos moradores
moradores ee seus
seus convidados
convidados seletíssimos,
seletíssimos, superparticulares.
superparticulares.
Aquele
Aquele lugar
lugar de
de superlativos...
superlativos... Não
Não se
se pode
pode seguir.
seguir. Não
Não háhá pontes.
pontes. Pedaços
Pedaços dede
cidade
cidade isolados
isolados por
por toda
toda parte.
parte. Disparate?
Disparate? Quantas
Quantas ilhas
ilhas fabricadas
fabricadas no
no interior
interior de
de
nós...
nós... O
O que
que nos
nos isola
isola de
de nós
nós mesmos
mesmos ee dos
dos outros?
outros? Solidão,
Solidão, cimento,
cimento, areia,
areia, pedra,
pedra,
concreto.
concreto. Solidão
Solidão incomunicável?
incomunicável? (CUNHA,
(CUNHA, 2014,
2014, p.119)
p.119)
Aquela velha frase que diz “A rua é pública” foi se diluindo pouco a pouco na
caminhada pela Barra. A rua não era pública, as ruas não eram públicas... E as escolas, as
filosofia
filosofia na
na escola:
escola: pensando
pensando as
as dimensões
dimensões do
do papel
papel público
público da
da educação...|
educação...| 163
163

universidades? Talvez nem todas as escolas públicas sejam públicas... E naquele momento
somente as sensações já descritas me dominavam, ainda não tinham surgido as perguntas
que foram citadas no início deste texto: O que é público? O que faz de uma escola uma
escola pública?
Nos encontros realizados no NEFI, durante os meses que se sucederam ao exercício
com os belgas, o conceito de skholè, enquanto tempo livre, foi tema recorrente e de
destaque em nossas conversas. As experiências provocadas com a participação no curso e a
leitura do livro Em defesa da escola, de Masschelein e Simons (2013) fizeram vibrar com
muita intensidade a problematização acerca do conceito de escola: “O que é uma escola?” “O
que faz de uma escola uma escola?”. Assim, o que se propõe aqui é justamente forçar um
pouco mais nosso pensamento, de modo a fazer vibrar também as questões em torno do
que entendemos ou costumamos nominar por público. O que é público? Foi com essa
pergunta que um estudante nos surpreendeu numa das experiências de pensamento na
escola, momento em que foi apresentado às crianças de uma turma do quinto ano o livro
acima referido.
De fato, por muitas vezes nos designamos como estudantes e professores de escola
pública e, na referida experiência, conversávamos sobre o título do livro que traz a ideia de
defesa, da necessidade de defender a escola. Por que defender a escola? Por que a escola
pública precisa ser defendida? Quando defendemos
defendemos aa escola,
escola, oo que
que estamos
estamos defendendo? E,
no nosso caso, por que defender uma escola pública? O que faz de uma escola um lugar
público, uma escola pública? Parece-nos, assim, que o sintagma presente no final da
pergunta ganhou uma complexidade que merece ser pensada, o que significa dizer que não
podemos fazê-lo de outra maneira que não seja escutando os ruídos de nosso per-curso no
interior da escola, na vida, na nossa vida no mundo.Estas inquietações abriram feridas, é
preciso exercitar um certo devir animal, nas palavras de Deleuze, e criar coragem para
lambê-las..

ver e ser visto, escutar e ser escutado nas experiências de pensamento


A vida é um caminhar. A vida de professores numa escola traça linhas que podem
dar muitoque pensar sobre o que tornaria uma escola uma escola pública. No
nossopercurso de professora, sempre nos vimos como professoras de escola pública sem
jamais termos pensado com profundidade sobre as questões em torno do conceito de
público que buscamos pensar nesta escrita. Até mesmo durante o curso com os belgas não
tínhamos pensado na questão da educação pública com as inquietações que estamos
tentando compartilhar agora. Qual seria a relação de uma educação pública como um certo
modo de habitar um lugar, o mundo? Todas essas questões surgiram no desdobramento
das experiências no projeto de filosofia em Duque de Caxias, no entrelaçamento das
caminhadas, dos mapas de sensações, afetos que suscitam perguntas, provocando
deslocamentos.
Percursos, deslocamentos, desvios que traçamos talvez possam dar pistas valiosas
deuma maneira de habitar o mundo. Dar atenção, visibilidade e escuta a elas poderá
tornar-se, quem sabe, um interessante exercício de autoeducação... Seria o público uma
maneira de habitar? Como temos habitado as instituições, os espaços, por lei, considerados
públicos?
Hannah Arendt defende que o termo “público” evoca dois fenômenos que mantêm
alguma relação entre si, mas não completamente idênticos (2011, p.61):
Significa,
Significa, em
em primeiro
primeiro lugar,
lugar, que
que tudo
tudo que
que aparece
aparece em
em público
público pode
pode ser
ser visto
visto ee
ouvido
ouvido por
por todos
todos ee tem
tem aa maior
maior divulgação
divulgação possível.(....)Em
possível.(....)Em segundo
segundo lugar,
lugar, oo
termo
termo público
público significa
significa oo próprio
próprio mundo,
mundo, na
na medida
medida em
em que
que éé comum
comum aa todos
todos nós
nós
ee diferente
diferente do
do lugar
lugar que
que privadamente
privadamente possuímos
possuímos nele.
nele.
164|
164| vanise
vanise de
de cássia
cássia dutra
dutra gomes;
gomes; edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

Nas experiências de pensamentos na escola temos sido permanentemente


convidados a pensar, a confrontar as diferentes maneiras de habitar a escola; poderíamos
mesmo considerar que,possivelmente, as experiências filosóficas com os estudantes
abriguem essas duas dimensões do termo “público”, ou seja, o que pode ser visto e ouvido
por todos e o que é comum a todos nós.Acreditamos que uma das marcas da singularidade
que constitui o projeto de filosofia na escola tem sido justamente potencializar as
dimensões de uma certa maneira de ver, escutar e chamar atenção para o que é de interesse
comum.
Em nossas experiências, encontramos abrigo na defesa de Rancière (2007), ao
pensar na igualdade enquanto um princípio e não uma meta a ser alcançada. Se
considerarmos a igualdade como um princípio, qualquer pessoa é capaz de pensar
exercitando dimensões do sensível. Nas experiências de pensamento temos insistido e
apostado nestas dimensões, que tratam de tornar visível o que não era visto, do escutar o
que não se escutava, de pensar o que ainda não foi pensado, buscar um lugar outro do que
temos habitado privadamente. Todos os movimentos do projeto de filosofia na escola, as
experiências de pensamentos com estudantes e professores, nossas leituras e escritas
durante esses anos no NEFI têm nos interrogado fortemente sobre o modo como temos
habitado não só a escola e a universidade, mas o mundo. Nessas instituições, é possível
falar em igualdade apenas sob a perspectiva do acesso, conforme defendem os discursos das
políticas oficiais? Não é de hoje que estes discursos têm se sustentado no tripé do acesso,
permanência e qualidade, tentando promover a “domesticação da democracia”
(MASSCHELEIN; SIMONS; LARROSA, 2011). Ter acesso a uma instituição estatal e
permanecer nela não garantem uma educação pública, seja na escola básica, seja na
universidade. As dimensões que são trazidas no projeto de filosofia na escola desafiam esta
perspectiva, colocando radicalmente em questão uma educação pensada sob as bases da
lógica oficial e hegemônica. Se uma educação pública pudesse ser pensada nas dimensões
apontadas por autores como Arendt (2011), Rancière (2007) e Masschelein (2012), não
poderíamos deixar de estar em permanente atenção aos movimentos que potencializam a
relação de cada um de nós com os outros. O que vemos? O que temos tornado visível?
Temos escutado e somos escutados? O que tem se tornado, nas nossas relações cotidianas,
matéria comum, pública? O que pode ser considerado de interesse comum? Seria possível
igualdade sem o exercício dessas dimensões nas escolas e universidades?
São as crianças, jovens e adultos participantes do projeto de filosofia que têm feito
pulsar tantas perguntas, mantendo-nos numa espécie de vigília às dimensões sensíveis que
entram em jogo na maneira como temos habitado a escola e a universidade na nossa
caminhada pelo mundo... Se partíssemos do princípio de que a igualdade não poderia
prescindir dessas dimensões do sensível que atravessam as relações, então a defesa da
escola enquanto uma questão pública põe em evidência o singular, a maneira como cada
um de nós tem se relacionado uns com os outros, um cuidar de si77 que se tornaria, por
conseguinte, condição sine qua non para cuidar de nosotros. Seria possível pensar a questão
pública sem acolhida ao que é singular, ao que torna a existência de cada um de nós única,
irredutível? A igualdade das inteligências como princípio (RANCIÈRE, 2007) traz para o
foco de nossa discussão aquilo que é singular e que, por essa razão, nos colocaria em
condição em igualdade.
Quando uma criança nos pergunta sobre o que é público, fazemos da sua pergunta
a nossa pergunta, que se desdobra em outras perguntas. Ver, dar a ver, escutar e ser

77 O
O cuidado
cuidado de de si
si éé uma
uma espécie
espécie de
de aguilhão
aguilhão que
que deve
deve ser
ser implantado
implantado na
na carne
carne dos
dos homens,
homens, cravado
cravado na
na sua
sua
existência,
existência, ee constitui
constitui umum princípio
princípio de
de agitação,
agitação, um
um príncípio
príncípio de
de movimento,
movimento, umum princípio
princípio de
de permanente
permanente
inquietude
inquietude nono curso
curso dada existência.
existência. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2011, 2011, p.9)
p.9)
filosofia
filosofia na
na escola:
escola: pensando
pensando as
as dimensões
dimensões do
do papel
papel público
público da
da educação...|
educação...| 165
165

escutado, pensar com outro, trazer a público, compartilhar pensamentos, vivências,


angústias, inquietações, abrir mundos, abrir-se a outros mundos, permitir-se ser
atravessado por eles... Esse modo de habitar - que tem sido uma das singularidades do
projeto de filosofia em nossa escola - nos faz pensar que, talvez, não mais seja possível
defender a escola, enquanto questão pública, fora dessas dimensões sensíveis que tão
fortemente têm nos afetado e dado a pensar nessa caminhada...Sem considerar as
singularidades estaríamos renunciando ao que pode ser irrenunciável. A questão pública da
escola convoca-nos também a pensar nos termos daquilo que estamos ou não dispostos a
renunciar, soltar a carga, desistir da posse...

um velho, uma criança: não se isolem, isso basta...


“Não se isolem! Não se isolem! Foi a frase muitas vezes repetidas por Paulo Freire,
em tom de apelo, numa mesa redonda organizada pela faculdade de educação da UERJ, nos
anos 90. Passado tanto tempo, suas palavras naquela ocasião ressoam como um convite a
pensar a questão pública da escola, da educação, como resistência aos isolamentos dentro
das instituições escolares, ou seja, as separações entre os segmentos de professores e
estudantes, entre os diretores e os professores e demais funcionários, entre os estudantes
das diversas etapas e turmas, entre a própria universidade e a escola básica. Este é mais um
dos aspectos que o projeto de filosofia da escola tem posto em questão, na medida em que
temos vivenciado experiências de pensamentos nas quais todos esses papéis e a delimitação
dos espaços por eles marcados são problematizados. Nestas experiências, diferentemente
do que costuma acontecer no contexto de uma sala de aula - onde a professora prepara
perguntas a serem respondidas pelos estudantes – não há uma demarcação dessas funções
sob este ponto específico. Nos nossos encontros defendemos que qualquer pessoa é capaz
de pensar, não importa se se trata de uma criança ou um adulto, de um estudante ou
professor, que esteja neste ou naquele ano de escolaridade, se é aluno ou ex-aluno da escola,
de outra escola, se é brasileiro ou estrangeiro, se é ou não da universidade, se fala português
ou outro idioma...
Num belíssimo encontro, ano passado, por ocasião da visita de um grupo de
estudantes do Ensino Médio, de uma escola pública estadual, 88 para uma experiência de
pensamento com os alunos da nossa escola, a menina Sara se fez escutar:
Daniel:
Daniel: Acho
Acho que
que aa gente
gente podia
podia começar
começar se se apresentando...Vocês
apresentando...Vocês querem
querem que
que eles
eles
se
se apresentem?
apresentem?
Sara:
Sara: Acho
Acho que
que não,
não, não
não precisa,
precisa, né?
né? Porque
Porque oo que
que importa
importa mesmo
mesmo éé que
que eles
eles são
são
pessoas
pessoas como
como aa gente
gente ee são
são estudantes
estudantes ee isso,
isso, para
para mim,
mim, basta!
basta!
As palavras de Sara causam impacto no grupo ali reunido que decide acolher, de
imediato, a sugestão da colega quanto a não necessidade de um momento inicial de
apresentações.. Sara parece, assim, desafiar uma certa lógica identitária que permeia todo o
projeto pedagógico hegemônico, fixando papéis no cenário na instituição escolar. Ao
apontar para a dispensabilidade das apresentações na experiência, mesmo estando diante
de pessoas que jamais tinha visto, ela traz uma ruptura interessante para ser pensada que
vai ao encontro de Hannah Arendt (2011, p.64) quando destaca que “o importante é que
estejamos reunidos na companhia uns dos outros, evitando que caiamos uns sobre os
outros”. Não há necessidade de credenciais, sequer da menção de um nome próprio ou
sobrenome, ou currículos, para sentar e pensar com outros, para arriscar-se nessa
caminhada... O que importa para ela é a presença de cada pessoa, de cada estudante. Em
outras palavras, um estudante não poderia ser todo aquele que se abre e entrega ao pensar
com outro? A invenção do público na escola, por assim dizer, não passaria, em alguns

88Os
Os estudantes
estudantes do
do Colégio
Colégio Estadual
Estadual José
José Leite
Leite Lopes,
Lopes, no
no bairro
bairro da
da Tijuca,
Tijuca, RJ,
RJ, são
são alunos
alunos do
do curso
curso de
de
filosofia, ministrado
filosofia, ministrado pelo
pelo prof.
prof. Daniel
Daniel Barenco
Barenco Contage,
Contage, mestrando
mestrando no
no NEFI/
NEFI/ ProPEd.
ProPEd.
166|
166| vanise
vanise de
de cássia
cássia dutra
dutra gomes;
gomes; edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

momentos, pela suspensão de certos protocolos? “Isso basta!”, diz Sara, no entanto
talvez seja uma pedagogia pobre (MASSCHELEIN, SIMONS, 2014, p. 49-53), simples
demais para exigências de um mercado competitivo a que as instituições estão cada ve z
mais submetidas em suas ações.
Estamos ali reunidos, nas experiências de pensamento, para pensar juntos,
exercitar as dimensões sensíveis do ver e ser visto, escutar e ser escutado, criar uma
matéria comum... Sara cria um desvio, como se tentasse nos dizer que é preciso buscar
outros caminhos, outra linguagem diferente daquela que nos tem sido ensinada através
da imposição de marcas identitárias, que tantas vezes contribuem muito mais para
erguer muros do que para transpô-los, que mais isolam e excluem do que convidam e
acolhem.
O apelo do velho mestre Paulo Freire, citado anteriormente, atravessa as barreiras
de tempo e de espaço para fazer vibrar o pensamento da menina Sara, uma vez que ambos
parecem apontar para a questão do público, não como algo dado, no interior de uma
democracia não somente enquanto regime político , mas como uma experiência singular
que se traduz numa maneira de habitar os espaços como tentativa de resistência ao que
asfixia, embrutece, exclui e isola.

com-paixão: uma dimensão do papel público da escola?


Sabemos que não é uma tarefa fácil, em meio aos discursos sedutores que prometem
a vitória e sucesso, defender o papel público da escola que se faz na atenção às dimensões
do sensível.Sabemos que tentar criar uma outra língua nos estrangeiriza e que os ataques99
virão daqueles que defendem certos interesses privados, daqueles que tomam decisões
pelos outros, sem uma aproximação verdadeira, sem escuta, sem se importar com que
poderia ser de interesse comum.
Nossa condição no interior do projeto de filosofia é frágil, vulnerável, não está
amparada pelas garantias de um currículo oficial. Isso tem provocado embates com o que já
está posto como certeza inquebrantável. De fato, o projeto de filosofia tem, em certo
sentido, forçado a vir a público, a se tornar visível e audível o que interessa a alguns
manter escondido, oculto. Para alguns pode ser insuportável ver exposto o que pode lhes
cutucar as feridas... Pode até mesmo provocar ódio (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014,
p.81) explícito ou disfarçado... Saber da vinda de pessoas dos quatro cantos do mundo para
sentar um pouco e pensar com nossos meninos e meninas... Saber da aproximação entre
uma universidade e uma escola da periferia na Baixada Fluminense... Saber que ex-alunos
voltam porque não conseguem mais imaginar suas vidas sem o exercício de filosofar...
Saber que professores e alunos desafiam a assimetria das relações e lançam-se desnudos na
aventura de uma escrita...Esses movimentos têm, sem dúvida, provocado as mais diversas
reações, arrancando dos mundos privados, como diria Spinoza, as paixões tristes e as
paixões alegres.
Não desejamos esconder nossas feridas porque entendemos serem elas inevitáveis
quando nos entregamos aos riscos e perigos na exposição de pensar com o outro. Tudo isso
temos aprendido com as dores e as delícias de nossa vivência com o projeto de filosofia em
nossa escola. Nossos estudantes têm sido nossos grandes com-panheiros, com eles temos
vivido no chão da escola esta paixão nosótrica, ou quem sabe, uma com-paixão, uma

99 Em
Em dezembro
dezembro de de 2015,
2015, os
os participantes
participantes de
de projeto
projeto de
de pesquisa
pesquisa ee extensão
extensão Em
Em Caxias,
Caxias, aa filosofia
filosofia en-caixa?
en-caixa? A
A
escola
escola pública
pública aposta
aposta no
no pensamento
pensamento foram
foram convocados
convocados para
para oo que
que aa SME,
SME, Secretaria
Secretaria de
de Educação
Educação do do Município,
Município,
designou
designou como
como “defesa”
“defesa” dodo projeto.
projeto. Após
Após aa defesa,
defesa, ocorreram
ocorreram vários
vários episódios
episódios que
que temos
temos avaliado
avaliado como
como
tentativas
tentativas dede intervenções
intervenções nosnos movimentos
movimentos singulares
singulares que
que oo projeto
projeto tem
tem provocado
provocado nas
nas instituições
instituições ee sujeitos
sujeitos
envolvidos.
envolvidos.
filosofia
filosofia na
na escola:
escola: pensando
pensando as
as dimensões
dimensões do
do papel
papel público
público da
da educação...|
educação...| 167
167

intensidade afetiva com o outro, com nosotros. Haveria um lugar nas discussões sobre o
papel público da escola para essa com-paixão? Não no sentido corriqueiro com que esta
palavra é usada no âmbito religioso, muitas vezes entendida como um sentimento de pena,
comiseração, mas no sentido de viver uma potência afirmativa com o outro, que nos dá
força para recusar tudo que possa embrutecer nossas relações: as injustiças, os
silenciamentos, as exclusões. Talvez o contrário de isolamento seja esta com-paixão, esta
intensidade afetiva que nos aproxima de algo de interesse comum, que se faz público no
espaço que temos habitado.
Essa paixão1010, convertida em com-paixão, vivenciada no encontro para pensar com o
outro pode criar relações interessantes com o já visto e o já pensado. Lucas sinaliza um
deslocamento: “Eu não gostava de ir para escola, faltava muito... Mas depois de participar da
filosofia meu jeito de ver a escola mudou”. O modo de ver a escola se modificou porque
talvez Lucas tenha encontrado um lugar onde agora possa pensar na transformação de si
mesmo, transpondo as barreiras que lhe fizeram perder o interesse e a alegria de estar na
escola por tanto tempo. E o estar na escola para ele não é mais um mero frequentar de uma
vez ou outra, mas um estar intensivo, que dá força e este jovem estudante para tornar a sua
paixão, a sua ferida, algo de matéria pública, de interesse comum. Ele se expõe no desejo de
estar com o outro, o outro também de si mesmo...
Guilherme, outro estudante no quinto ano, também compartilha seu pensamento.
Tenta alongar os cinquenta minutos destinados à experiência de pensamento em sua
turma. Ao ser chamado pela professora, permanece sentado no pufe colorido e diz: “Eu
quero ficar! Eu aprendo mais conversando!”
Até mesmo ante a recusa e os obstáculos impostos por alguns, são eles, nossos
estudantes apaixonados, que pedem, desejam a continuidade desses encontros que abrem o
mundo, que tanto têm nos convidado a pensar o público como invenção/criação de uma
outra linguagem, de um outro modo de habitar a escola, o mundo da escola...De que
maneira lidar com esse afirmativo poder de captura que as experiências de pensamento
têm exercido sobre nosotros? Que fôlego ainda teremos na defesa desse modo singular de
habitar um lugar como uma das (im)possíveis dimensões do papel público da escola? São
perguntas saindo fresquinhas no forno das nossas inquietações, das nossas paixões...

referências
ARENDT,
ARENDT, Hannah.
Hannah. A A condição
condição humana.
humana. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Forense
Forense Universitária,
Universitária, 2011.
2011.
CUNHA,
CUNHA, Edna.
Edna. De De quando
quando pedras
pedras no no caminho
caminho fazem
fazem pensar.
pensar. In:
In: MARTINS;
MARTINS; VARGASVARGAS
NETTO;
NETTO; KOHAN. KOHAN. Encontrar
Encontrar escola:
escola: oo ato
ato educativo
educativo ee aa experiencia
experiencia dada pesquisa
pesquisa em
em
educação.
educação. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina, 2014,
2014, p.175-184.
p.175-184.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michael.
Michael. A A Hermenêutica
Hermenêutica do do Sujeito.
Sujeito. Trad.
Trad. Márcio
Márcio Alves
Alves da
da Fonseca,
Fonseca, Salma
Salma Tannus
Tannus
Muchail.
Muchail. SãoSão Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2011.
2011.
LARROSA,
LARROSA, Jorge.
Jorge. Tremores:
Tremores: escritos
escritos sobre
sobre experiência.
experiência. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2014.
2014.
MARTINS,
MARTINS, Fabiana
Fabiana F. F. R;
R; VARGAS
VARGAS NETTO, NETTO, Maria Maria J.;
J.; KOHAN,
KOHAN, Walter
Walter O.O. (Orgs).
(Orgs). Encontrar
Encontrar
escola:
escola: oo ato
ato educativo
educativo ee aa experiência
experiência dada pesquisa
pesquisa emem educação.
educação. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina,
FAPERJ,
FAPERJ, 2014.2014.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten;
Maarten; LARROSA,
LARROSA, Jorge. Jorge. Jacques
Jacques Rancière:
Rancière: La
La educación
educación
pública
pública yy la
la domesticación
domesticación dede la
la democracia.
democracia. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Miño
Miño && Dávila,
Dávila, 2011.
2011.

10“Paixão”
10 “Paixão” pode
pode referir-se
referir-se também
também aa certa
certa heteronímia,
heteronímia, ou
ou aa certa
certa responsabilidade
responsabilidade em
em relação
relação ao
ao outro
outro que,
que,
no
no entanto,
entanto, não
não éé incompatível
incompatível com
com liberdade
liberdade ee autonomia(...)
autonomia(...) AA paixão
paixão funda
funda sobretudo
sobretudo uma
uma liberdade
liberdade
dependente,
dependente, determinada,
determinada, vinculada,
vinculada, inclusa,
inclusa, fundada
fundada não
não nela
nela mesma,
mesma, mas
mas na
na aceitação
aceitação primeira
primeira de
de algo
algo
que
que está
está fora
fora de
de mim,
mim, de
de algo
algo que
que não
não sou
sou eu
eu ee que
que porpor isso,
isso, justamente,
justamente, éé capaz
capaz de
de meme
apaixonar.(LARROSA,
apaixonar.(LARROSA, 2014,
2014, p.29)
p.29)
168|
168| vanise
vanise de
de cássia
cássia dutra
dutra gomes;
gomes; edna
edna olímpia
olímpia da
da cunha
cunha

MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten.
Maarten. Em Em defesa
defesa da
da escola:
escola: uma
uma questão
questão pública.
pública. Belo
Belo
Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2013.
2013.
_____.
_____. A
A pedagogia,
pedagogia, aa democracia,
democracia, aa escola.
escola. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2014.
2014.
RANCIÉRE.
RANCIÉRE. Jacques.
Jacques. O O mestre
mestre ignorante:
ignorante: cinco
cinco lições
lições sobre
sobre emancipação
emancipação intelectual.
intelectual. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte:
Autêntica,
Autêntica, 2007.
2007.
MERCIER,
MERCIER, Pascal.
Pascal. Trem
Trem noturno
noturno para
para Lisboa.
Lisboa. Trad.
Trad. Kristina
Kristina Michahelles.
Michahelles. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Record,
Record,
2010.
2010.
169
169

exploring education through the community of philosophical inquiry.


first remarks for a participatory action research using cpi

cristina rossi11

introduction

I n this paper, after an overview on the origin and meaning of the Community
of Inquiry (CoI) practice, we will deal with the first broad results of the
observation of four sessions of a Community of Philosophical Inquiry of
teachers and educators, based in Monte Orfano, Brescia, Italy. These four sessions had
followed a training on CPI addressed to this group and we decided to analyze analyze the the
experience
experience to to see
see if
if this
this kind
kind ofof practice
practice could
could be
be an
an effective
effective tool
tool for
for implementing
implementing
participatory
participatory action
action research
research between
between teachers
teachers and
and for
for investigation
investigation in in education.
education.
In
In the
the first
first part
part of
of the
the article
article we
we will
will present
present the
the concepts
concepts of of CoI
CoI and
and CPI
CPI and
and the
the
meaning
meaning of of this
this experience
experience as as it
it has
has been
been proposed
proposed toto the
the group
group andand acted
acted out
out by
by it.
it. In
In the
the
second
second part,
part, we
we will
will briefly
briefly describe
describe the
the nature,
nature, origin
origin and
and activities
activities of
of this
this particular
particular CPI
CPI
of
of teachers
teachers and
and educators
educators (that
(that wewe will
will call
call Monte
Monte Orfano
Orfano CPI)CPI) that,
that, after
after having
having
participated
participated inin aa training
training course
course inin this
this practice,
practice, have
have started
started implementing
implementing it it in
in their
their
work
work inin schools
schools and
and between
between them.
them. After
After that,
that, we
we will
will give
give aa first
first synthetical
synthetical report
report ofof the
the
main
main ideas
ideas and
and arguments
arguments emerged
emerged during
during this activity and we will suggest some way to
this activity
use this method of inquiry in a participatory action research, summing up its weaknesses
and effectiveness, that could be worth of a future and more structured research.

1. the community of inquiry and the community of philosophical inquiry


First of all lets deal briefly with some aspects of the theory and practice of what is
known as “community of inquiry” and “community of philosophical inquiry”.
The concept of “community of inquiry” has ancient and uncertain origins. Usually,
it is said, it was first introduced by early pragmatist philosophers Charles S. Peirce and
John Dewey, but we may find various roots of its different aspects and characters
throughout history and in different education cultures. But clearly in the 1970s, with
Matthew Lipman and Anne Sharp, the CoI paradigm and framework was seized upon as a
form of pedagogy by the originators of the “Philosophy for Children” program. The
“school” of Lipman and Sharp (and the curriculum that they had build) spread over in
north America and in many other countries around the world, and has generated a wide
movement that it is impossible here to describe in brief (but see VANSIELEGHEM;
KENNEDY, 2011). In the field of philosophy with children and in that of the practice of
CoI a number of different proposals, curricula and activities has grown since the 1970s,
which deserve to be known and understood but of course we cannot here follow this line.
We will simply explore its meaning in general, specially for the reader that does not know
about this movement.
The CoI, as a community of practice, concerns the nature of knowledge formation
and the process of scientific and philosophical inquiry, but also the processes of building
communities and social coexistence (and so it affects the problem of democracy as a
means towards a widespread participatory leadership).

11 University
University of
of Bergamo,
Bergamo, Italy.
Italy. Email:
Email: rossic1409@gmail.com.
rossic1409@gmail.com. This
This paper
paper was
was coauthored
coauthored by
by my
my dear
dear
teacher,
teacher, colleague
colleague and
and friend
friend Fulvio
Fulvio Manara
Manara whowho died
died too
too early,
early, in
in March
March 2015.
2015.
170|
170| cristina
cristina rossi
rossi

While Peirce originally understood the concept of the community of inquiry as a


way to describe and model natural sciences, the concept has been borrowed, adapted, and
applied in various different fields.
In the field of education and school we can look at this practice from different
points of view. If we look at it from a point of view based on a simple modeling theory,
we can surely say that the “CoI” - “CPI” finds its location at the intersection of a number
of “discourses” or theories, such as the discourses on philosophy as a practice, and of
argumentation theory, communications theory, semiotics, systems theory, dialogue
theory, learning theory and group psychodynamics, and maybe some other theory. But
this kind of description is clearly inadequate. The CoI, in general, is a kind of practical,
pragmatical and open situation that cannot at all be understood simply on the basis of
discourses or modeling theories, however correct and precise they are. We will be able to
understand it correctly only on the basis of a direct and personal experience. Its
comprehension involves a kind of cognition linked to feelings and to experiential exercise
that cannot be communicated only in a conceptualized definition.
The “community of inquiry” is a complex reality, that strictly keeps a connected
and vast variety of elements, in an open and flexible system that is not univocally
structured. For these reasons it is quite impossible to present a complete conceptual
definition, that could permit us to explain it definitely (SHARP, 1992, passim and
CEVALLOS-ESTARELLAS; SIGURĐARDOTTIR, 2000). Along this line, the CoI and
CPI experience can be defined as an “a-methodical method” (MORTARI, 2006).
We can try anyway to give an idea in a few words, and than to indicate a minimal
definition (as it has been suggested by Cevallos-Estarellas and Sigurđardottir, 2000), that
can allow us not to remain in a general and ideal perspective. This minimal definition will
help us in the objective of giving some valid indicators, operationally too, as criteria or as
marks for orientation.
CoI represents a model of circular communication, and circular transformative
interaction, and has been thought by Lipman exactly for the transformation of a class-
group into a community. But this practice can also be useful in any other group context.
A “working” and much broader definition proposed by SAPERE (Society for the
Advancement of Philosophical Enquiry and Reflection in Education) is the following: a
CoI is a group of people used to thinking together with a view to increasing their
understanding and appreciation of the world around them and of each other.
We can add that the CoI is a space and a time in which communities, as living
social organisms, do act towards co-operative activity and for creating knowledge. And this
acting is founded on thinking together and on people’s values, history, and lived
experiences. Inquiry, in this way, is simply an open-ended, democratic, participatory
engagement. Community of inquiry is thus a living learning process that keeps connected
between them the dimensions of theoretical inquiry and of action, and social action in
specific.
It is an effective practice both for intellectual education and for moral forming.
Precisely a CoI works both at the level of inquiry and research, discovery and
intersubjective co-construction of knowledge (following the most recent addresses of the
cognitive sciences, for example constructivism), and on the level of education aims to
develop human relations based on co-participation, co-operation and co-responsibility.
What characterizes the CoI is dialogue, in its various forms and typologies. The principle
of the community is not dependence nor autonomy, but inter-in-dependence
(PANIKKAR, 2008).
The activity realized in a CoI is an infinite process of discovering, de-construction,
revision, re-examination and reconstruction (of knowledges and meanings but also of
exploring
exploring education
education through
through the
the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry.
inquiry. first
first remarks
remarks for
for aa participatory
participatory || 171
171
action
action research
research using
using cpi
cpi

relations, sensibilities, praxis and actions, of cooperation and co-participation etc.). The
function of the educator / instructor /teacher is radically transformed, because it is
resolutely re-oriented towards thethe function
function of
of “facilitation”
“facilitation” of
of processes
processes (both
(both cognitive
cognitive
and
and relational).
relational). And,
And, at
at the end, every single CoI participant can act as a facilitator for the
community (towards a participatory leadership).
This proposal of a minimum definition can be then drawn up alongside the
following table (on the basis of the definitions given by SHARP, 1991; CEVALLOS-
ESTARELLAS; SIGURĐARDOTTIR,
SIGURĐARDOTTIR, 2000, 2000, and
and others).
others).

EETHOS
THOS OF THE C
OF THE COOII

Minimal
Minimal and
and essential
essential principles
principles and
and criteria
criteria of
of aa CoI/CPI
CoI/CPI and
and corresponding
corresponding behaviors
behaviors

C
COMMUNITY
OMMUNITY IINQUIRY
NQUIRY

Basic
Basic Principles
Principles *:
*: Basic
Basic Principles:
Principles:
Respect
Respect // Nonviolence
Nonviolence Curiosity
Curiosity
Empathy
Empathy Creativity
Creativity
Participation
Participation and
and co-participation
co-participation Reasoning
Reasoning
Equality
Equality Freedom
Freedom
Differences
Differences (and
(and harmony
harmony ofof differences)
differences) Pluralism
Pluralism
Fallibilism
Fallibilism

Corresponding
Corresponding behaviours:
behaviours:

Active
Active (and
(and mutual)
mutual) listening
listening Asking,
Asking, wondering
wondering // radical
radical questioning
questioning
Being
Being trustful
trustful // accept
accept one's
one's own
own interdependence
interdependence Following
Following thethe inquiry
inquiry freely,
freely, going
going where
where the
the
Caring
Caring with
with each
each other
other inquiry
inquiry itself
itself leads
leads
Accepting
Accepting thethe responsibility
responsibility to to give
give one's
one's own
own Relativizing
Relativizing irrational
irrational actions
actions
contribution
contribution intointo aa relational
relational context
context of of full
full Expressing
Expressing one's
one's own
own beliefs
beliefs and
and opinions
opinions
reciprocity
reciprocity Being
Being mentally
mentally open
open
Compel
Compel one's
one's own
own limits
limits Letting
Letting oneself
oneself bebe involved
involved in in self-correction
self-correction
Being
Being able
able to
to give
give reasons
reasons to to support
support the
the point
point of
of in
in aa cooperative
cooperative wayway
view
view of
of another
another person,
person, even
even if
if you
you don't
don't agree
agree with
with Looking
Looking forfor clarity,
clarity, even
even inin complexity
complexity
itit Looking
Looking forfor good
good arguments
arguments and and reasons
reasons
Being
Being willing
willing to
to be
be transformed
transformed by by the
the relation
relation
Sharing
Sharing thoughts
thoughts and
and experiences
experiences
TTABLE
ABLE 11
** [These
[These principles
principles have
have to
to be
be intended
intended asas “basilar
“basilar aptitudes
aptitudes and
and behavioral
behavioral criteria”,
criteria”, rather
rather than
than as
as
abstract
abstract or
or intrinsic
intrinsic “values”,
“values”, and
and are
are connected
connected pragmatically
pragmatically with
with operational
operational behaviors.
behaviors. Secondarily,
Secondarily, the
the
level
level of
of “behaviors”
“behaviors” isis clearly
clearly opened,
opened, because
because there
there appears
appears to
to be
be an
an intertwining
intertwining of
of effectiveness
effectiveness and
and
interaction
interaction between
between the
the two
two dimensions
dimensions ofof the
the CoI
CoI at
at the
the level
level of
of actions
actions and
and behaviors.]
behaviors.]

We have no space and time here to analytically comment this proposal, that is
obviously not aiming to be in itself definitive.
But it is necessary to state that among the movement for the CoI, in specific as a
setting and paradigm for conducting experiences of philosophy with children, it has been
specified and defined the “community of philosophical inquiry” (MCCALL, 2009). This
proposal has been progressively freed from its link to the field of children, to become a
proposal that can be explored with all ages.
We prefer to insist on the CPI instead that simply on the CoI because we
recognize that at the beginning of whatever inquiry process there is or can be a
philosophical questioning, as a human radical questioning.
172|
172| cristina
cristina rossi
rossi

It has also been argued, in our opinion correctly, that, when formulated as
community of philosophical inquiry in particular, CoI offers the possibility of
“philosophizing” the school curriculum in general, by extending the concept-work that
doing philosophy entails to all of the disciplines (VANSIELEGHEM; KENNEDY, 2011).
And it entails also the school as a social system and a field for possible democratic
experiences too.
If doing philosophy is basically questioning, radical questioning, as a process of
finding together legitimate questions (VON FOERSTER, 1987), we believe that it can be
connected with whatever community of practice, to transform it radically. Following this
suggestion, we can say that a philosophical practice is possible in every moment and
situation in human life. Matthew Lipman identified the community of philosophical
inquiry as a “social matrix” that generates a variety of “social relationships” and builds the
framework of the “cognitive matrices” which in turn generate fresh “cognitive
relationships” (LIPMAN, 2003; STRIANO, 2011).
LIPMAN, 2003;
In fact, a community of inquiry, and a community of philosophical inquiry, cannot
be reduced to a simple abstract means or technique to be “applied” or “used” in different
contexts to obtain desired results. It “does not come into being immediately and by itself,
but is created through sustained practice over time” (MCCALL, 2009, p.80). As a way and
practice to create communities between human beings, CPI has also a unique and specific
profile each time it is acted out and it is realized. That means that, dealing with this
practice, each group of human beings can develop itself as a unique and particular one.
Each CPI is unique, even if all of them “share what can only be described as a flavor”
(MCCALL, 2009, p.85)22. CPI is a creative and open way to launch, put into operation and
activate a transformation in learning, thinking and acting (interacting and cooperating)
that cannot be foreseen, foretell or predicted in its integrity.

2. the experience of monte orfano cpi


2.1 brief history of the monte orfano cpi
The “Monte Orfano Community of Philosophical Inquiry” is a community of
primary school teachers and some other educators of about 15 people. This CPI was born
in Monte Orfano (Rovato, Brescia, Italy) at the end of the experience of a training course
given by prof. Fulvio Manara between November 2010 and May 2011. The training course
had been devoted to initiation to the practices of philosophy with children and to
community of philosophical inquiry itself.
As everywhere in the world, a person can understand and be introduced to the
community of philosophical inquiry doing it, participating, being involved in practice and
not just reading or studying on books, or listening to discourses on it, however decent they
may be. So a program of about 40 hours of CPI sessions had been realized, during which
the group understood and learned the various aspects and moments of the practice. Beside
this number of hours (any session had an average length of about an hour and a half or
little more) we had set up a program of in-depth analysis of the practice's aspects,
conditions and dynamics, for another number of hours of about 40.
This was not of course the first experience we conducted in that field, but it is the
one which has created the conditions for exploring a possible participatory action research
and has become the context of the experience we are dealing with in this paper.
In fact, at the end of the "training", teachers and educators involved in the Monte
Orfano CPI decided to go on with the practice, between them, to develop their skills and

22 As
As already
already said
said before,
before, with
with McCall
McCall has
has developed
developed aa specific
specific method
method of
of group
group philosophical
philosophical discussion
discussion
(CoPI),
(CoPI), while
while with
with CPI
CPI we
we refer
refer in
in general
general to
to philosophical
philosophical inquiry.
inquiry.
exploring
exploring education
education through
through the
the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry.
inquiry. first
first remarks
remarks for
for aa participatory
participatory || 173
173
action
action research
research using
using cpi
cpi

to enjoy it. And, of course, they afforded the problem of applying the philosophy with
children approach to their teaching as well, asking to prof. Manara to keep working with
them as a facilitator and a supervisor in new school experiences with the CPI itself.
As a following of this educational activity, other groups of teachers asked to be
involved with new training courses, and they have also started with the Monte Orfano
CPI an experiential exploration of different, even new aspects of the practice in schools.
So we have a variety and broad number of activities that are flourishing inside the
context in which the Monte Orfano CPI has grown33. The main central moment are the
Sunday morning meetings, that occur monthly, to deepen and continue the community
practice in itself and also to reflect upon the organizational needs arousing in the
community.

2.2. methodology
Starting from the need of teachers to continue the practice out of a formal training
course, we have decided to treat some of these Sunday morning sessions (four in
particular, from September to December 2011) as material for an analysis of the potential
of CPI as a research tool. In order to analyze them, the CPI sessions have been taped and
transcribed, as regards to both the contents emerging from the discussion and the quality
of the emotions and interactions established during the activity. The four sessions started
with the reading of a text drawn from a work of the Italian pedagogue Luigina Mortari on
María Zambrano’s method of research (MORTARI, 2006). We have collected the pre-
texts from Zambrano and Mortari that we offered to the Community at the beginning of
each session, along with the materials expressed during the CPI practice: questions of the
agenda, discussion plans, community dialogue and evaluation. Even if some reference has
been made to Mortari and Zambrano’s though, or maybe other scholars, the authors’ aim
hasn’t been that to interpret the material starting from a particular pedagogical theory; the
sessions have been analyzed following the Grounded Theory approach, and the the authors
authors
have tried to label and categorize the content being as closer as possible to the meanings
emerging from the community discussions. In fact, the structure of a CPI itself can help
the researcher to follow the construction of meanings through dialogue and
argumentation. Even if we have not reached the saturation of categories, being this just a
first sketch of a possible research to continue, we have tried to answer two questions:
i.i. which are the topics that teachers, and in particular this community of teachers,
think to be worth of an inquiry and to be explored in participatory action research?
iiii. could CPI be an effective research tool for a participatory action research? For
which reasons?

2.3 first hermeneutic of monte orfano community’s inquiry


We are giving here simply a first glance on the different arguments and issues
explored by the community, providing a first simple hermeneutic. Surely these materials
are worthy of a deeper and much structured analysis that we are not able to fully develop
here.

2.3.1 polarity and opposition


At the very beginning, in the first of the four sessions, education has been
described as a means for human completeness or fullness of life. Following María

33 These
These activities
activities and
and network
network of
of people
people started
started up
up in
in an
an association
association of
of social
social promotion,
promotion, in
in the
the Italian
Italian
territory,
territory, of
of CPI
CPI and
and P4C
P4C practices,
practices, which
which had
had been
been co-founded
co-founded by
by Fulvio
Fulvio Manara
Manara before
before his
his death
death
(www.cdrf.it)
(www.cdrf.it)
174|
174| cristina
cristina rossi
rossi

Zambrano’s thought, life is considered as an opposition between Being and not-Being, to


be born and not-to be born, something and nothing. This opposition, emerging from
Zambrano’s writings, cannot be disregarded and it is the preliminary step for answering
the question on education, so that the polarity eventually emerging in this field is founded
in and is dependent upon the polarity emerging in life. For this reason, questioning on the
sense of being a human being is previous to the questioning about who is a good or a bad
teacher.
But which polarities and oppositions do emerge in the school context today? We
can see this searching for a more comprehensive sense of education as the ethic demand
that is becoming more and more urgent nowadays. Educational institutions such as
schools are not only crossed by several tensions, but in particular school seems to have lost
the sense of its mission. The need to be considered first as human beings and then as
teachers emerges several times in the discussion and witnesses a certain dissociation
between actor and subject that seems to be present in the school environment:
“Individuals (teachers and pupils) consider themselves in the learning processes as actors
playing the role of teachers and the role of pupils and not as persons” (PORCHER;
ABDALLAH-PRETCEILLE, 1998, p.43).
This tension between communication and expression, where only the second one
implies a full consideration of identity and life experience of everyone as a unique human
being, needs to be undertaken. Neglecting it could lead not only to suffering for people
involved, but also to ineffectiveness of the learning process. Nevertheless, the discussions
about it is linked to the reflection upon the necessity to satisfy the demand of the labour
market in terms of knowledge and skills which are part of the teaching. Teachers show
their difficulty in conciliating the awareness about the importance to consider the ethos at
the core of their profession with the economic aspects involved in education. Maybe we
can glimpse here another polarity, another opposition that rises at several points of the
discussion and that deals with the meanings of the word “education”, as we will see.
At the same time, according to María Zambrano philosophical reflection must
“find a correspondence also in the domain of the social figures of cohabitation”
(PREZZO, 1996, p.xvi) and for that reason trying to answer this ethical question doesn’t
mean to leave behind the concrete implications for human communities, such as the
education community.

2.3.2. reason and birth


A topic that has been deeply explored by the CPI is the one which concerns reason
and the rationality model underlying the research of sense and knowledge. Still following
a text of the Spanish philosopher, the Western model of rationality has been seen as the
main instrument of building the process of learning, but its power in realizing the re-birth
(desnacer) as described by María Zambrano has been questioned: “An animal was born
once and for all, while human being was never completely born, has to face the effort to
generate himself again and again or to hope to be generated …” (ZAMBRANO, 1996,
p.90). If reason can show us the incompleteness that characterizes human beings, it is not
sure that reason itself could help in the process of self-education that, following
Zambrano, consists in trying to be faithful to themselves and that she refers to with the
word “re-birth”.
In this sense, a truly education could be seen as a form of mis-education from the
structures imposed by society and by reason itself. If reason indicates a straightforward
process, in which one step follow the other, it could also be seen as opposed to life, which
is characterized, in the description the Monte Orfano CPI gives, as a movement in
unpredictable directions. So, this mis-education has been seen by the group as a work of
exploring
exploring education
education through
through the
the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry.
inquiry. first
first remarks
remarks for
for aa participatory
participatory || 175
175
action
action research
research using
using cpi
cpi

undoing, that seems to have a priority, while the work of doing, building up new shapes of
knowledge, which are closer to ourselves, comes after. We can remember here Descartes’
description, in the Discourse de la methode, of the act of getting rid of our previous and
uncertain knowledge with the analogy of destroying a city from the foundation, while a
participant in the CPI has described this work with the more familiar and comforting
image of the knitting job. Anyway, also the purpose can be questioned; for María
Zambrano “philosophy is not a requirement to enter the ‘world of culture’, but to enter
ourselves, without being imprisoned” (PREZZO, 1998, p.viii).
In fact, the work of the CPI, the philosophical questioning that characterizes this
kind of activity, has been seen by the participants as a way to awaken from a raving
reason. In ancient times, at the beginning of the philosophical thought, philosophy was
seen as “going into reason”, but now philosophy must “go into reality” (ZAMBRANO,
1998, p.99). The renewal of the link between knowledge and reality happens through
action. This action presupposes the responsibility to choose, act and think properly,
starting from ourselves. In fact, the activity of the CPI has also led the group, most of all
in the third session, to go deeply along the route traced by Western philosophy, trying to
find a definition of the word “reality”. Finally, the opposition that seems to characterize
education is that between undoing and doing, for which the learning process has to be
restarted all over again, while a lack of reflection leads to the unaware repetition of the
same process.

2.3.3 nostalgia of childhood


Education is seen by Zambrano as a creative action which “produces in the other
person the passion for self-education” (MORTARI, 2006, p.117). So education is an
education to possibility, to an opening in which we can feel the nostalgia, the longing to a
lost and better world, a feeling that could also be projected in the future. At several points
of the discussion the Monte Orfano CPI is faced with the fear and the suffering caused by
the choice of not following the mainstream but searching for our own way. As we have
already stressed, it sometimes seems difficult for teachers to come out of a way of seeing
education as a process built upon the managerial capacity of planning definite and linear
steps. Going out of that forma mentis means not only a possible conflict with the
institution or the society, but also to struggle with our fears, leaving the known for the
unknown. These worries are expressed in several ways: fear of meeting the other; fear of
being fully involved; fear of diversity; fear of getting rid of our knowledge competencies
and experiences, without knowing exactly which alternative propose to pupils; fear of not
being able to go so deeper; fear to open a gap for “bad education”.
Teachers still deal with the idea that education should consist in filling up a
vacuum, writing on a white sheet. But are those contradictions true or only apparent?
Education and life, knowledge and reality, doing and undoing … The group suggests that
turning into the way of self-education means to start a re-definition of it, re-interpreting
oppositions as a means to reach the completeness we’re looking for.
Who’s closer to the passage between not-to be born and to be born, to the feeling of
a loss? It is the child to which education is addressed and which is our opportunity to
come closer to the birth as the moment in which can emerge the sense we, as human
beings, are looking for. While adults think to be complete, children seem to feel more
strongly the incompleteness of birth, showing a natural shape which needs to be uphold
and supported instead of being imprisoned by a structure which is not connected with
their uniqueness. This unwitting knowledge is not only linked to the feeling of needs, but
to Being, to the place from which we come from and that we are not sure we can consider
fully real. Education deals with the capacity of seeing connections, while our rational
176|
176| cristina
cristina rossi
rossi

knowledge is incline to divide and separate reality; education deals with the willing to
listen, which is expressed also with the picture of bending down at child’s height, which is
also a metaphor for a humbly approach to the relation between teacher and pupil.

2.3.4. what is education?


As we said, the work of the CPI has allowed the participant to meet in a fresh way
with the big educational questions aroused by philosophical dialogue and reflection. The
community constantly expressed the will to deepen its motivation, to reach fundamental
questions both on the empirical and on the existential plan. Besides observations linked to
the everyday effort of doing “the most difficult job in the world”, the participants finally
tried to answer to the question “What is education and what is mis-education?”, “In
which circumstances do I educate and in which ones do I mis-educate?”. As regards to this
question the need for a certain and clear criteria that should allow to judge what is good
and what is wrong in education remind us of the ancient diatribe between Socrates and
the Sophists. Anyway, one of the goal of the activity of CPI has been of gaining plurality
of points of view and visions, instead of the unambiguousness of one single truth.
Several definitions of education have been proposed, and first of all the distinction
between a structured education process, as we have seen it, and the etymological meaning
of the term, deriving from the Latin “e-ducere”, which refers to the necessity of let things
happen. In this approach mis-educating means obliging to follow one way only and not to
act but all the possible ways of welcoming the specific and particular experiences of other
fellow human beings, establishing a respectful and trusting relation. Someone observed
that talking about education finally means to talk about human relations. There is no
education without self-education and all these different ways of educate themselves need
to be included into a broader meaning of education, which is not a simple collection of
procedures, valid for any context, but an attempt at connecting everyone to the whole of
reality.

2.3.5. emotions and learning


Considering the emotional atmosphere that emerges from the materials collected,
at several points during the discussion and the evaluation of the sessions, the participants
underline the sense of uneasiness they are feeling. During the discussion, this feeling has
been expressed in several ways, through words or body language, responding to other
participants’ contributions we don’t agree with, at least apparently. If it’s true that
“emotions carry information about models of behavior interiorized more or less deeper
and unconscious that we are putting into action” (SCLAVI, 2003, p.125), in the specific
context of a CPI this sense of unease could refer to the fact that the point of view of the
participants on the theme discussed, and indirectly their weltanschauung, are perceived as
threatening. Every participant has developed different manners to deal with this feeling,
and if some of them seem to be more familiar with the capacity of listening to others'
positions in an open minded attitude, others have behaved more spontaneously or
aggressively or in a nonconformist way, for example being provocative44. The difficulties
of taking into account emotions has to do also with the rhetoric of emotional control in
Western civilization, which assign a specific but non cognitive role to emotions and
feelings (SCLAVI, 2003, p.121ss).

44 On
On the
the difference
difference between
between being
being spontaneous
spontaneous or
or nonconformist
nonconformist and
and seriously
seriously taking
taking into
into account
account emotions
emotions
as
as signals
signals of
of possible
possible breaking
breaking of of our
our cognitive
cognitive frames
frames (see
(see SCLAVI,
SCLAVI, 2003,2003, p.129ss).
p.129ss). The
The Italian
Italian
anthropologist
anthropologist propose,
propose, following
following Gregory
Gregory Bateson’s
Bateson’s thought
thought between
between others,
others, an
an humor-based
humor-based methodology
methodology
in
in order
order to
to train
train the
the capacity
capacity of
of listen
listen and
and dialogue
dialogue in
in aa complex
complex context
context and
and multicultural
multicultural societies.
societies.
exploring
exploring education
education through
through the
the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry.
inquiry. first
first remarks
remarks for
for aa participatory
participatory || 177
177
action
action research
research using
using cpi
cpi

On the contrary, the feeling of uneasiness could be seen as a signal of the necessity
or the effectiveness of going out its own cognitive and cultural frames. The CPI has
recognized, during the discussion, that this feeling has to do with our personal
convictions, which are more or less rooted in the Western vision of education, educating,
knowledge, learning and so on. As we have already seen, the idea of education that is most
of all unconsciously assumed in a formal school environment is that of a linear process, a
progressive addiction of knowledge and competences that doesn’t envisage the possibility
of going back to its own acquisitions from a different point of view. On the contrary the
sense of unease suggests that a learning process is on its way, and a specific one. This kind
of learning is based not only on the change of the point of view about the problem
considered, but on the most radical change of the cultural frames in which we usually, but
unconsciously, organize our answers to problems. The feeling of being anxious or simply
uncomfortable, or the worry to seem ridiculous have been reported several times during
the discussion, as we said, and it deals not only with knowledge, but also with the sense of
identity.

3. conclusions
In this paper we have given a simple and partial account of an inquiry that is still
indeed going on, but the broader results of CPI that we summed up in the second part of
this article testify, in our opinion, that inside a school context the CoI and CPI could
represent not only a good practice for teachers and pupils, but a means of inquiry, and of
philosophical inquiry and maybe also scientific inquiry, from different points of view.
The first point we would like to stress is participation in the building of theoretical
and practical knowledge. In fact what we have tried to do here is to look at the CPI
activity as a tool for qualitative research and in particular participatory action research.
We would like to remind here that an action research is a disciplined process of inquiry
conducted by and for those taking the action. It aims at finding answers to a problem as
perceived from the practitioners in a specific field. In particular, participatory action
research questions the idea of a separation between academic scholars, producing theories,
and operators applying them in a specific context. CPI practice follows this line and in
this experience we have tried not to draw a rigid separation between the idea of a superior
“scientific research” dimension and the practice of CoI between “common” people that are
not scientists. After all, schools of every level are exactly the field in which “common”
people meet and live with “scientists” or intellectuals. If the primary reason for engaging
in action research is to assist the “actor” in improving and/or refining his or her actions,
we think that the members involved in a CPI could do it this job in community, of course
helped by the facilitator, but with the aim of self-facilitation and self-education. We are
not considering here if CPI could be used in academic research, but of course also this
questions deserves, in our opinion, to be answered, along with the exploration of the
possible ways of collaboration between the different fields of research, academic and non
academic.
The second point we would like to argument is the methodological one. At a first
glance the practice of the Community of Philosophical Inquiry seems to represent a strong
tool for investigating education in general for different reasons. First of all, CPI seems an
excellent tool in generating questions and could be use to identify research questions. The
second methodological aspect that we want to stress is that this method can help in
identifying the values, beliefs, and theoretical perspectives the researchers hold relating to
their focus. Here the researchers are the members of a CPI, but also the facilitator is
involved in the process. In this perspective the text-pretext, also if carefully chosen,
should be only a stimulus for the group to start exploring the topic they’ve chosen as the
178|
178| cristina
cristina rossi
rossi

object to inquire. As we have seen, the Monte Orfano CPI was still choosing among the
several topics that had emerged which one to put at the centre of a broader inquiry. To our
eyes it is not so much important not to have already found it or even not to have already
given an exhaustive answer to the many great questions we have met during this
experience. It is much more important that we have made a first step towards a new way
of inquiring about those questions, leaving behind a method based on the individual quest
of philosophers or pedagogues.
In fact, the interdisciplinary and intersubjectivity could be other benefits of this
method, along with an intercultural aspect, as we usually define the exchange and passing
from a cultural frame to another one. The method of the CPI could be, in our opinion, a
good way of training this competence which is essential for research and for teaching and
living in complex contexts and which is also based on the capacity of using emotions in an
explorative way rather than in a defensive one.
In fact, another important aspect of this method is the possibility of evaluating the
cognitive and emotional process that have been observed during the experience at the end
of the sessions. From a phenomenological point of view, an adequate knowledge is not
only consciousness of the different points of view on the object reached during the
inquiry, but has to make intelligible also the transformative dynamics necessary for this
knowledge to be acquired: “We ‘call adequate’ a description which make clear the
correlation between what is experienced (noema) and his way of being experienced (noesis)
and make transparent the transformative dynamics which allows to enlighten this
correlation” (SCLAVI, 2003, p.68).
Beside this positive characters of CPI as research tool, we can foresee some
weakness that we would like here to suggest. The first one is the passage from the
theoretical investigation to the operationalization of concepts. How should, for example,
one of the issues emerged during this experience be related to and find its way in the
school practice everyday? How can we, for example, translate practically the idea of a
more deeper involvement of teachers in the educational process and decision-making?
And how can we further collect data about, for example, the feeling of teachers to be
protagonist of the educational process and not only executors? So the question is about
how the awareness and deeper knowledge reached thanks to CPI experience could be
translated into the learning process out of CPI practice and thus observed.
Another point that in our opinion needs to be discussed is the way to share the
results of the inquiry process with others stakeholders - teachers, scholars, practitioners,
parents, pupils etc - out of CPI practice, maybe influencing school priorities. We think
this point to be of particular importance. In our society the mission of education, and in
particular school education, has become a complex task that can be fulfilled only
questioning the identity of this institution. Nevertheless this must be an ethic
questioning, that cannot be satisfied by an uncritical reflection on methodology or
curricula, which are necessary but not sufficient to welcome instances and needs from
society. On the other hand, these needs cannot be reduced to the mere economic purposes
and the demand of a skilled workforce. As in the past it was the construction of an
identity shaped according to the values of a majority to determine the role and the aims of
formal education, nowadays the risk is that of the passive conformity to the economic
rules that show us “a picture of a world deserted by thought” where school is “reduced to
the transmission of technical knowledge and competences” (PORCHER; ABDALLAH-
PRETCEILLE, 1998, p.37, but also NUSSBAUM, 2010). As we have seen this ethical
questioning is central to CPI practice, at least for the Monte Orfano CPI, and the risk is to
lose this ethical dimension during the way or to look at it as a sterile theoretical exercise
without effective consequences in praxis.
exploring
exploring education
education through
through the
the community
community of
of philosophical
philosophical inquiry.
inquiry. first
first remarks
remarks for
for aa participatory
participatory || 179
179
action
action research
research using
using cpi
cpi

In conclusion from our point of view the CPI method seems to run far beyond the
simple undergoing of participatory or collaborative action research. Nevertheless,
different characters of CPI that have emerged suggest that this method could be used as an
effective tool for research in educational field, although its real efficacy have still to be
tested, planning a possible larger and deeper research using the setting and instrument of
the CPI.

references
CEVALLOS-ESTARELLAS,
CEVALLOS-ESTARELLAS, Pablo; Pablo; SIGURÐARDÓTTIR,
SIGURÐARDÓTTIR, Brynhildur. Brynhildur. The The Community
Community of of
Inquiry
Inquiry as as aa Means
Means for for Cultivating
Cultivating Democracy.
Democracy. Inquiry.
Inquiry. Critical
Critical Thinking
Thinking Across
Across the
the
Disciplines,
Disciplines, v.19,
v.19, n.2,
n.2, p.
p. 45-57,
45-57, 2000.
2000.
LIPMAN,
LIPMAN, Matthew.
Matthew. Philosophy
Philosophy Goes
Goes toto School.
School. Philadelphia:
Philadelphia: Temple
Temple University
University Press,
Press, 1988.
1988.
_______.
_______. Thinking
Thinking inin Education,
Education, 22ndnd
Ed.
Ed. Cambridge:
Cambridge: Cambridge
Cambridge University
University Press,
Press, 2003.
2003.
MCCALL,
MCCALL, Catherine.
Catherine. Transforming
Transforming Thinking.
Thinking. Philosophical
Philosophical Inquiry
Inquiry inin the
the Primary
Primary and and Secondary
Secondary
Classrooms.
Classrooms. NewNew York:
York: Routledge,
Routledge, 2009.
2009.
MORTARI,
MORTARI, Luigina.
Luigina. Un Un metodo
metodo a-metodico.
a-metodico. La La pratica
pratica della
della ricerca
ricerca in
in María
María Zambrano.
Zambrano. Napoli:
Napoli:
Liguori,
Liguori, 2006.
2006.
NUSSBAUM,
NUSSBAUM, Martha Martha C. C. Not
Not for
for profit.
profit. Why
Why democracy
democracy needs
needs the
the Humanities.
Humanities. Princeton:
Princeton: Princeton
Princeton
University
University Press,
Press, 2010.
2010.
PANIKKAR,
PANIKKAR, Raimon.Raimon. Mito,Mito, Simbolo,
Simbolo, Culto.
Culto. Mistero
Mistero ed ed Ermeneutica,
Ermeneutica, v.ix,
v.ix, Opera
Opera Omnia,
Omnia, tomo
tomo I.I.
Milano:
Milano: Jaca
Jaca Book,
Book, 2008.
2008.
PORCHER,
PORCHER, Louis; Louis; ABADALLAH-PRETCEILLE,
ABADALLAH-PRETCEILLE, Martine. Martine. Ethique
Ethique dede lala diversité
diversité et
et éducation.
éducation.
Paris:
Paris: PUF,
PUF, 1998.
1998.
PREZZO,
PREZZO, Rosella.
Rosella. Il Il cominciamento,
cominciamento, introduction
introduction to to Zambrano
Zambrano María,
María, Verso
Verso un un sapere
sapere dell’anima.
dell’anima.
Milano:
Milano: Raffaello
Raffaello Cortina,
Cortina, 1996.
1996.
SCLAVI,
SCLAVI, Marianella.
Marianella. Arte Arte di
di ascoltare
ascoltare ee mondi
mondi possibili.
possibili. Milano:
Milano: Bruno
Bruno Mondadori,
Mondadori, 2003.2003.
SHARP,
SHARP, AnneAnne M. M. The
The Community
Community of of Inquiry:
Inquiry: Education
Education for for Democracy.
Democracy. Thinking.
Thinking. The
The Journal
Journal of
of
Philosophy
Philosophy for
for Children,
Children, v.9,
v.9, n.2,
n.2, p.31-37,
p.31-37, 1991.
1991.
______________.
______________. What
What is is aa community
community of of inquiry?.
inquiry?. In:In: OXMAN,
OXMAN, Wendy;Wendy; MICHELLI,
MICHELLI, Nicholas;
Nicholas;
COIA,
COIA, Lesley
Lesley (eds.).
(eds.). Critical
Critical Thinking
Thinking and and Learning.
Learning. Upper
Upper Montclair,
Montclair, NJ, NJ, Project
Project
THISTLE:
THISTLE: Teaching
Teaching Skills
Skills in
in Teaching
Teaching and and Learning,
Learning, Montclair
Montclair State
State University,
University, p.p. 209-
209-
219,
219, 1992.
1992.
SHIELDS,
SHIELDS, Patricia
Patricia M. M. TheThe Community
Community of of Inquiry:
Inquiry: Classical
Classical Pragmatism
Pragmatism and and Public
Public
Administration.
Administration. Administration
Administration & & Society,
Society, v.35,
v.35, n.5,
n.5, p.510-538,
p.510-538, 2003.
2003.
STRIANO,
STRIANO, Maura. Maura. TheThe Community
Community of of Philosophical
Philosophical Inquiry
Inquiry asas aa Social
Social and
and Cognitive
Cognitive Matrix.
Matrix.
Childhood
Childhood & & Philosophy,
Philosophy, RioRio de
de Janeiro,
Janeiro, v.7,
v.7, n.
n. 13,
13, p.91-102,
p.91-102, jan./jun.
jan./jun. 2011.
2011.
UNESCO.
UNESCO. Philosophy.
Philosophy. A A School
School ofof Freedom.
Freedom. Teaching
Teaching Philosophy
Philosophy and
and Learning
Learning to to Philosophize:
Philosophize: Status
Status
and
and Prospects.
Prospects. Paris:
Paris: Unesco,
Unesco, 2007.
2007.
VANSIELEGHEM,
VANSIELEGHEM, Nancy; Nancy; KENNEDY,
KENNEDY, David David (eds).
(eds). Philosophy
Philosophy for for Children
Children in in Transition:
Transition:
Problems
Problems and and Prospects.
Prospects. Journal
Journal ofof Philosophy
Philosophy of of Education,
Education, Special
Special Issue,
Issue, v.45,
v.45, n.2,
n.2, May
May 2011.
2011.
VON
VON FOERSTER,
FOERSTER, Heinz. Heinz. Sistemi
Sistemi che
che osservano.
osservano. Roma:
Roma: Astrolabio,
Astrolabio, 1987.
1987.
ZAMBRANO,
ZAMBRANO, María. María. Verso
Verso unun sapere
sapere dell’anima.
dell’anima. Milano:
Milano: Raffaello
Raffaello Cortina,
Cortina, 1996.
1996.
180
180
181
181

apresentação da cadeira unesco:


prática da filosofia com crianças: uma base educativa para o diálogo
intercultural e a transformação social.

edwige chirouter11
marie-paule vannier22
introdução33

A
UNESCO criou em 2016 uma Cátedra sobre a Prática de filosofia com
crianças: uma base educativa para o diálogo intercultural e a transformação social.
Ela é promovida pela Universidade de Nantes (França) sob a coordenação
de Edwige Chirouter. Essa é a primeira e única Cátedra UNESCO
dedicada especificamente a esse assunto. É, portanto, um grande reconhecimento para a
prática de filosofia com crianças e um avanço para a democratização da filosofia. Nessa
comunicação, nós apresentaremos os desafios e o funcionamento da Cátedra e, em seguida,
mostraremos um exemplo de pesquisa embasada nesse contexto: o do nosso grupo de
pesquisa PHILEAS (Filosofia, literatura, escola, adaptação escolar). Nós desenvolveremos
mais precisamente nossos trabalhos sobre as relações que unem a infância, a literatura e a
filosofia, nas quais as narrações literárias são uma mediação fecunda na aprendizagem do
filosofar. Essa pesquisa específica é um trabalho significativo da Cátedra UNESCO que
defende a ideia de que as humanidades (filosofia, literatura e artes) são indispensáveis para
formar os cidadãos de amanhã, para aguçar o espírito crítico, lutar contra os dogmatismos,
desenvolver a tolerância e a empatia.

1) apresentação da cátedra unesco práticas de filosofia com crianças: uma base educativa para o
diálogo intercultural e transformação social.
Essa Cátedra UNESCO, a primeira e única no mundo sobre filosofia com crianças,
é promovida pela Universidade de Nantes com o apoio do programa de pesquisa EnJeu[x],
Universidade de Angers, França, com outras universidades e associações parceiras no
mundo francófono. Uma cátedra UNESCO é essencialmente uma rede internacional de
universidades e de associações abertas ao desenvolvimento de uma prática ou de um
patrimônio defendido pela UNESCO.

quais os desafios de uma cátedra na unesco?


A trágica atualidade presente em todo o mundo (nós pensamos particularmente nos
atentados que atingiram a França em 2015) alerta todas as autoridades públicas
democráticas sobre a necessidade de educar desde a mais tenra idade os futuros cidadãos e
cidadãs para o espírito crítico, para os valores humanistas, para igualdade entre homens e
mulheres, para a necessidade de um diálogo pacífico e respeitoso entre todas as culturas e
para a luta contra todos os dogmatismos.
A cátedra sobre a prática de filosofia com crianças (de 4 a 18 anos) tem por objetivo
ajudar o desenvolvimento dessas práticas cidadãs através da pesquisa, ensino, formação e
difusão de materiais pedagógicos nas escolas, e na cidade, e em cooperação internacional

11 Maitre
Maitre de
de conférences.Université
conférences.Université de de Nantes.
Nantes. CREN.
CREN. Coordinatrice
Coordinatrice dede la
la Chaire
Chaire UNESCO/U.
UNESCO/U. de de Nantes
Nantes ::
Pratique
Pratique de
de la
la philosophie
philosophie avec
avec les
les enfants
enfants :: une
une base
base éducative
éducative pour
pour le
le dialogue
dialogue interculturel
interculturel et
et la
la transformation
transformation
sociale.Email:
sociale.Email: edwige.chirouter@wanadoo.fr
edwige.chirouter@wanadoo.fr
22 Maitre
Maitre de
de conférences
conférences .Université
.Université de
de Nantes.
Nantes. CREN.
CREN. Membre
Membre du du groupe
groupe dede recherche
recherche PHILEAS
PHILEAS
Email:
Email: marie-paule.vannier@univ-nantes.fr
marie-paule.vannier@univ-nantes.fr
33 Tradução
Tradução de
de Alice
Alice Pessanha
Pessanha
182|
182| edwige
edwige chirouter;
chirouter; marie-paule
marie-paule vannier
vannier

com os atuantes. A cátedra visa a coordenar e colocar em relação às diferentes equipes e


estruturas que já trabalham no assunto e consolidar cooperações entre pesquisadores e
praticantes no contexto das relações Norte-Sul. Além da formação de monitores e do
desenvolvimento de pesquisa, a cátedra tem também por objetivo fazer dialogar as crianças
no contexto de intercâmbios Norte e Sul (através da plataforma colaborativa e das redes
sociais).
Os desafios da prática de filosofia com crianças aderem estritamente aos objetivos e
valores da UNESCO: tão frequentemente reservada ao ensino secundário ou universitário,
a prática de filosofia é, portanto, um dos motores essenciais para o desenvolvimento do
espírito crítico, das competências democráticas, da empatia, da abertura e do diálogo
intercultural. Em 2007, o relatório, Filosofia: uma escola da liberdade, já sublinhava essa
preocupação da UNESCO pelo desenvolvimento da filosofia com os mais novos:
AA missão
missão mesma
mesma dada UNESCO,
UNESCO, colocada
colocada aa serviço
serviço da
da solidariedade
solidariedade intelectual,
intelectual, éé
aa de
de abraçar
abraçar ee promover
promover oo conjunto
conjunto dosdos saberes.
saberes. Em
Em uma
uma sociedade
sociedade do
do saber,
saber,
aberta,
aberta, inclusiva
inclusiva ee pluralista
pluralista aa filosofia
filosofia tem
tem oo seu
seu lugar.
lugar. Seu
Seu ensino
ensino ao
ao lado
lado de
de
outras
outras ciências
ciências humanas
humanas se se encontra
encontra nono coração
coração das
das nossas
nossas preocupações
preocupações
(UNESCO,
(UNESCO, 2007,2007, p.9)
p.9)

Nessa mesma linha de pensamento, a filósofa Martha Nussbaum, que se refere à


herança de seu colega John Dewey, denuncia em As emoções democráticas, uma “crise
silenciosa da educação” que se traduz por uma transformação de fundo das políticas (e,
assim, das filosofias) da escola do ocidente que abandonam as humanidades e a
necessidade de formar os cidadãos críticos, lúcidos e desenvolver, inversamente, uma visão
tecnicista dos saberes e das competências apenas ao serviço da adaptação do indivíduo para
a vida social e sobretudo para a economia liberal:
Profundas
Profundas mudanças
mudanças afetam
afetam aquilo
aquilo que
que asas sociedades
sociedades democráticas
democráticas ensinam
ensinam aos
aos
jovens
jovens ee essas
essas mudanças
mudanças nãonão foram
foram suficientemente
suficientemente examinadas.
examinadas. Ávidos
Ávidos dede
melhoria
melhoria nacional,
nacional, os
os estados
estados ee os
os sistemas
sistemas educativos
educativos agitam
agitam com
com imprudência
imprudência
os
os pontos
pontos fortes
fortes indispensáveis
indispensáveis àà sobrevivência
sobrevivência dasdas democracias.
democracias. Se
Se aa tendência
tendência
se
se prolonga,
prolonga, osos estados
estados dodo mundo
mundo inteiro
inteiro logo
logo produzirão
produzirão gerações
gerações de
de máquinas
máquinas
eficazes,
eficazes, mas
mas não
não cidadãos
cidadãos completos
completos capazes
capazes dede pensar
pensar por
por eles
eles mesmos,
mesmos, dede
criticar
criticar aa tradição
tradição ee de
de compreender
compreender oo queque significa
significa os
os sofrimentos
sofrimentos ee os
os sucessos
sucessos
do
do outro.
outro. O O futuro
futuro das
das democracias
democracias mundiais
mundiais está
está em
em jogo
jogo (NUSSBAUM,
(NUSSBAUM, 2011, 2011,
p.10).
p.10).

Martha Nussbaum (2011, p.96) faz referência a Matthew Lipman e às experiências


de filosofia com crianças como um apoio ao desenvolvimento do espírito crítico e das
democracias:
Os
Os professores
professores que
que querem
querem adotar
adotar umum modo
modo dede ensino
ensino socrático
socrático têm
têm uma
uma fonte
fonte
contemporânea
contemporânea aa partir
partir da
da qual
qual podem
podem se se guiar.
guiar. Eles
Eles podem
podem encontrar
encontrar conselhos
conselhos
bastante
bastante úteis,
úteis, mas
mas não
não autoritários
autoritários sobre
sobre aa pedagogia
pedagogia socrática
socrática em
em uma
uma coleção
coleção
de
de livros
livros dirigidos
dirigidos por
por Matthew
Matthew Lipman,
Lipman, onde
onde oo programa
programa de de filosofia
filosofia para
para
crianças,
crianças, destinado
destinado aa crianças
crianças que
que têm
têm entre
entre 10
10 ee 14
14 anos,
anos, foi
foi desenvolvido
desenvolvido pelo
pelo
Instituto
Instituto de
de Desenvolvimento
Desenvolvimento de de Filosofia
Filosofia para
para Crianças,
Crianças, em
em Montclair
Montclair State
State
Collège
Collège emem Nova
Nova Jersey.
Jersey. Lipman
Lipman parte
parte dada convicção
convicção de de que
que as
as crianças
crianças mais
mais
novas
novas são
são bastante
bastante ativas
ativas ee curiosas,
curiosas, que
que aa capacidade
capacidade de de avaliação
avaliação ee dede
questionamento
questionamento devemdevem serser respeitadas
respeitadas ee desenvolvidas,
desenvolvidas, convicção
convicção queque ele
ele
compartilha
compartilha com
com membros
membros da da tradição
tradição progressista
progressista européia.
européia.

Nós estamos, então, muito orgulhosos que a UNESCO tenha aceitado essa
proposta de Cátedra que permitirá, assim esperamos, trabalhar para a legitimação e para o
desenvolvimento dessas práticas.
apresentação
apresentação da
da cadeira
cadeira unesco:
unesco: prática
prática da
da filosofia
filosofia com
com crianças:
crianças: uma
uma base
base educativa
educativa para
para oo diálogo
diálogo || 183
183
intercultural
intercultural ee aa transformação
transformação social.
social.

quais são os objetivos da cátedra unesco?


Nos primeiros anos, a Cátedra da UNESCO terá como missão:
i.i. A valorização, a legitimação e o desenvolvimento de experiências, de formações
e pesquisas sobre as práticas filosóficas com crianças para a coordenação de uma
rede internacional, a organização de colóquios internacionais e de seminários de
pesquisa.
ii. A cooperação Norte (Europa-América)/ Sul(África/Maghreb) para a criação e
ii.
a difusão livre de material pedagógico (manual, mala-direta, bibliotecas).
iii. A criação de uma formação universitária francófona para a realização de
iii.
práticas filosóficas com crianças, abertas aos professores, monitores,
bibliotecários.
iv. A disposição livre e aberta recursos online para a pesquisa e as práticas no site
iv.
de documentos do projeto.

quais são as universidades parceiras da cátedra unesco?


Por enquanto, os parceiros oficiais são os seguintes (mas essa lista não é minuciosa
e a Cátedra está aberta a todos os atuantes desejosos de integrar seus trabalhos).
i.i. Na França: as universidades de Créteil, de Clermont, de Maine e de
Montpellier
ii. No mundo: em Bénin, Universidade d’Abomey-Calavi; em Camarões,
ii.
Universidade de Yaoundé; no Canadá, as universidades de Québec em
Montréal, Sherbrooke e Laval; na Grécia, Universidade de Égée; em
Luxemburgo, Instituto de Formação Nacional – IFN; na Suiça, Alta Escola
Pedagógica – HEP e Universidade de Fribourg; na Bélgica, as Universidades de
Bruxelas e de Liège.

Por enquanto, a rede é essencialmente francófona, mas visa à abertura ao mundo


anglo-saxão, pioneiro histórico nessas questões graças aos trabalhos de M. Lipman.
Indicamos nossas coordenadas com o objetivo de nos comunicarmos se vocês pensam que
sua instituição, pesquisa, estabelecimento, associação, pode se associar a essa rede.
Daremos a seguir justamente um exemplo de pesquisa realizada no contexto da
Cátedra UNESCO, a do nosso grupo de pesquisa PHILEAS.

2) apresentação do grupo de pesquisa phileas e uma pesquisa sobre a conexão entre a


infância, a literatura e a filosofia.
PHILEAS (Philosophie. Littérature. Ecole. Adaptation Scolaire)44 é um grupo de
pesquisa colaborativa, coordenado por Edwige Chirouter e vinculado ao laboratório CREN
da Universidade de Nantes, França.

phileas: um grupo de pesquisa colaborativa sobre a prática de filosofia com crianças.


PHILEAS é uma equipe composta por três professores pesquisadores da
Universidade de Nantes (Edwige Chirouter, Marie-Paule Vannier e Christine
Pierrisnard) e cinco professores de escolas (Guillaume Agnoli, Caroline Faivre, Isabelle
Nagy, Caroline Poirier e Fabienne Schmitt), professores de estruturas especializadas que
acolhem alunos em situação de deficiência física e/ou mental ou em grande dificuldade
escolar.
Nossas experiências se conduzem voluntariamente na margem da inovação
pedagógica: em relação às crianças em grande dificuldade escolar ou em situação de

44 Filosofia.
Filosofia. Literatura.
Literatura. Escola.
Escola. Adaptação
Adaptação escolar.
escolar.
184|
184| edwige
edwige chirouter;
chirouter; marie-paule
marie-paule vannier
vannier

deficiência física e/ou mental (ensino especializado, mundo do cuidado e voluntariado),


em relação àqueles que a priori são os mais distantes do exercício filosófico. Essa ética da
aposta na educabilidade, essa revendicação pela necessidade de democratizar o ensino de
filosofia para todas as crianças é o centro das preocupações da Cátedra UNESCO.
Um dos objetivos científicos de PHILEAS é o de elucidar com precisão em que e
em quais condições a prática de momentos de reflexão filosófica desde a escola primária e
no ensino especializado, permitindo que os alunos se engajem numa metareflexão sobre o
sentido das disiplinas ensinadas (ciências, matemática, artes, história), pode responder à
injunção de restituir o sabor ao saber (ASTOLFI, 2008). Como a filosofia pode ajudar a
devolver o sentido da aprendizagem e fazer uma conexão entre as disciplinas?
A fim de responder essa questão, PHILEAS coloca em prática projetos
interdisciplinares ligados aos ateliês de filosofia e às outras disciplinas escolares. Durante
um ano escolar, as cinco classes do grupo de pesquisa trabalham respectivamente sobre os
projetos Filosofia/Ciências (2012-2014), Filosofia/Artes (2014-2015) e Filosofia/História
(2015-2016). Todas as sequências são preparadas, realizadas e analisadas pelo grupo de
pesquisa.
Temos a hipótese, em nossas experiências interdisciplinares, de que uma
aproximação filosófica das narrações pode permitir dar mais sentido às atividades
escolares, interrogando, por exemplo, através de um álbum literário, um conto, uma
fábula, o sentido das disciplinas. Por que aprender história? O que é uma verdade científica? O
que é a criação artística? Para que serve a escola? Os alunos podem reencontrar esse sabor dos
saberes, ou seja, fazer emergir novamente as inquietudes, as interrogações de onde provém
o conhecimento humano. Em uma época conturbada e atravessada por “crises”, nos parece
necessário mais do que nunca aprender desde a mais tenra idade a aguçar o espírito crítico,
a desenvolver a reflexão coletiva e a escuta pelos debates democráticos, a desenvolver a
empatia, a fazer os futuros cidadãos refletirem sobre os valores (igualdade, fraternidade,
liberdade). As questões não são apenas pedagógicas e didáticas, mas políticas no sentido
mais nobre do termo. É nesse sentido que as práticas filosóficas com crianças são
sustentadas pela UNESCO.
PHILEAS se funda sobre os princípios da pesquisa-ação colaborativa entre
profissionais e pesquisadores. Nossas pesquisas se constroem com os praticantes (vs uma
pesquisa sobre ou acima das práticas). A ideia do coletivo constitui não apenas um critério
de rigor metodológico, mas também uma ética da pesquisa.
Segundo os princípios da pesquisa colaborativa, nossa organização de trabalho é a
seguinte:

i.i. A preparação comum das sequências. Cada trimestre possui seminários de


trabalho que reagrupam todos os membros e PHILEAS. Trata-se de determinar
os objetivos conceituais, as progressões, o número e a duração das sessões, os
dispositivos escolhidos, a organização material, a escolha de suportes (como a
disponibilidade em rede de livros infanto-juvenis). Trata-se também de fazer o
balanço sobre as sessões realizadas. Cada turma adapta, em seguida, esse
dispositivo co-construido às suas particularidades próprias (idade dos alunos,
dificuldades encontradas). Todas essas sessões de trabalho em co-elaboração de
sequências são filmadas e transcristas. Elas constituem, assim, um material
importante para analisar esse trabalho de pesquisa colaborativa.
ii. A co-realização das sessões. Nesses seminários de trabalho, os professores
ii.
colocam em prática o dispositivo e realizam os ateliês de filosofia sozinhos ou
em co-realização com um pesquisador (sendo a co-realização sistemática
impossível em todas as sessões do projeto). As sessões em sala são filmadas e
apresentação
apresentação da
da cadeira
cadeira unesco:
unesco: prática
prática da
da filosofia
filosofia com
com crianças:
crianças: uma
uma base
base educativa
educativa para
para oo diálogo
diálogo || 185
185
intercultural
intercultural ee aa transformação
transformação social.
social.

algumas são transcritas. Todas as marcas escritas dos alunos são conservadas.
Esse material é analisado durante as reuniões de co-explicação.
iii. As reuniões de co-explicitação (VINATIER, 2015) reúnem o conjunto do
iii.
coletivo pesquisadores-praticantes, tendo a finalidade de decodificar os efeitos
das práticas filosóficas colocadas em prática nas classes em relação ao saber dos
alunos. Essas reuniões se fundem sobre as análises do material de dados
recolhido, que se trata de submeter ao coletivo para validação (VANNIER,
2012). Essas reuniões são registradas. As reuniões com os alunos são igualmente
registradas e transcritas.

Esses quatro primeiros anos de pesquisa do PHILEAS deram lugar a uma dezena de
comunicações em colóquios científicos internacionais e igualmente a uma dezena de
publicações.
Apresentamos, a seguir, uma das pesquisas do PHILEAS que obteve maior sucesso,
sobre a função da literatura infanto-juvenil na aprendisagem do filosofar. Essa pesquisa
apresenta significativamente os objetivos da Cátedra UNESCO: mostrar como as
humanidades (artes, literatura, filosofia) são indispensáveis para formar os cidadãos de
amanhã.

a criança, a literatura e a filosofia. o papel das humanidades para formar cidadãos


esclarecidos.
Minha hipótese de pesquisa sobre as codições de possibilidade de uma
aprendizagem precoce da filosofia era a seguinte: não podemos aprender a filosofar sem
textos, sem mediações culturais que permitam a problematização e a distância da noção
trabalhada. Sendo muito difícies para as crianças do primeiro segmento os textos clássicos
de filosofia, é graças à literatura que talvez possamos lhes permitir de avançar nessa
rigorosa aprendizagem.

desafios da questão: filosofia (com crianças) e literatura (infanto-juvenil).


A prática de filosofia com crianças se desenvolve em todo o mundo há cerca de
quarenta anos. Essa aproximação com a literatura juvenil é tão mais possível hoje em dia
que paralelamente a esse desenvolvimento da filosofia com crianças, a literatura dita
juvenil parece também levar cada vez mais em conta as interrogações metafísicas das
crianças.

a literatura infanto-juvenil e as representações da infância


Desde os anos de 1960, a sociedade ocidental contemporânea, graças às
contribuições da psicologia e da psicanálise, reconheceu as crianças como sujeitos de pleno
direito, que precisam ser guiados nos seus caminhos existencial e intelectual. A literatura
dita “juvenil” é sempre reveladora do modo como uma época representa o mundo da
infância. Quando uma sociedade considera a criança como um pequeno ser ignorante,
desprovido de razão ou como uma pequena coisa inocente que devemos proteger do mundo
e das preocupações dos adultos (e é essa visão de infância que prevaleceu no ocidente até
bem recentemente), nós podemos oferecer apenas narrativas bastante enfraquecidas,
desinteresantes ou moralistas, sem nenhuma profundidade e sutiliza literária ou filosófica.
Ora, o desenvolvimento e a vulgarização da psicologia e da psicanálise desde os
anos 60 - definindo a infância como um sujeito pensante portador de agonias e de
interrogações existenciais - permitiu no fim do século XX o desenvolvimento de uma nova
literatura ambiciosa que aborda assuntos sérios e profundos.
186|
186| edwige
edwige chirouter;
chirouter; marie-paule
marie-paule vannier
vannier

Em 1976, com o sucesso da psicanálise dos contos de fada, Bruno Bettelheim


convenceu muitos educadores que as crianças têm preocupações existenciais intensas e
sobretudo que, mesmo bem jovens, elas são capazes de interpretar inconscientemente a
messagem latente dos contos para ultrapassar suas angústias inconscientes e responder
seus questionamentos metafísicos profundos. As crianças precisam de grandes narrativas
para se construirem e são capazes de interpretações complexas. É essa lição que foi retida
do sucesso de Bettelheim e que vai permitir o desenvolvimento de uma verdadeira
literatura de qualidade para os mais jovens.

uma literatura filosófica juvenil:


Tudo, desde então, contribuiu para permitir que esse gênero, durante muito tempo
menosprezado e considerado como paraliteratura, ganhasse suas cartas de nobreza
editoriais, universitárias e institucionais: novo status da infância, desenvolvimento da
pesquisa, abertura de bibliotecas e de livrarias especializadas, sucesso de grandes salões
(como o de Montreuil na França), sucesso de vendas, interesse da crítica, inclusão formal
nos programas escolares.
Hoje em dia, autores como Tomi Ungerer, A. Browne, M. Sendak ou Grégoire
Solotaref oferecem aos seus jovens leitores narrativas ambiciosas e sutis que abordam, sem
nenhuma moralização e de forma interessante, questões metafísicas universais. E, além da
publicação desses livros (frequentemente magníficos também no plano gráfico), nós
vemos aparecer desde alguns anos no mercado infanto-juvenil manuais de filosofia para
crianças, dos quais os mais conhecidos na França são certamente os Goûters philo editados
pela Milan. A filósofa M. Revault d’Allones dirige também a coleção Chouette penser! da
editora Gallimard-Jeunesse. Uma jovem editora Petits Platons propõe iniciar, pelo viés de
uma ficção, à vida e ao pensamento de grandes filósofos (Kant, Rousseau, Sócrates,
Descartes, Ricoeur, etc).
A literatura juvenil abrange um verdadeiro continente literário habitado por obras
que abordam com sutiliza e inteligência grandes questões metafísicas. Assim, todos os
educadores que queiram guiar as crianças no difícil caminho do pensamento e do
conhecimento de si têm hoje a sua disposição numerosas riquezas e belas histórias.
Além disso, acompanham e favoressem essa abundância de obras literárias que
abordam com inteligência grandes questões filosóficas os programas de literatura na escola
primária na França, que desde 2002 insistem nessa dimensão antropológica e metafísica das
obras e incitam a debates ditos reflexivos.
Desde
Desde aa escola
escola maternal,
maternal, aa criança
criança pode
pode refletir
refletir sobre
sobre as
as questões
questões daquilo
daquilo que
que nós
nós
lemos
lemos para
para ela,
ela, uma
uma vez
vez que
que oo texto
texto resiste
resiste aa uma
uma interpretação
interpretação imediata
imediata aa ser
ser
fortalecida
fortalecida no
no terceiro
terceiro ciclo.
ciclo. A
A interpretação
interpretação tem,
tem, na
na maioria
maioria das
das vezes,
vezes, aa forma
forma
de
de um
um debate
debate livre
livre no
no qual
qual nós
nós refletimos
refletimos coletivamente
coletivamente sobre
sobre asas questões
questões
estéticas,
estéticas, psicológicas,
psicológicas, morais,
morais, filosóficas
filosóficas que
que estão
estão no
no centro
centro de
de uma
uma ou
ou várias
várias
obras
obras (MEN,
(MEN, 2008,
2008, p.2).
p.2).

Na minha tese, portanto, eu quis analisar a conjunção possível desses dois


fenômenos: desenvolvimento de práticas filosóficas com crianças e de uma literatura
filosófica juvenil.

literatura para pensar o mundo e crescer:


Porque a infância funciona intimamente segundo as modalidades do pensamento
mágico, ela é a idade de ouro dessa capacidade propriamente humana de se imergir corpo e
alma no universo ficcional. “Esse consentimento eufórico para a ficção” (JOUVE, 1993,
p.86), porque ele é constitutivo da nossa condição humana, nunca desaparece
completamente. O encontramos quase intacto toda vez que nós (re)fazemos a experiência
apresentação
apresentação da
da cadeira
cadeira unesco:
unesco: prática
prática da
da filosofia
filosofia com
com crianças:
crianças: uma
uma base
base educativa
educativa para
para oo diálogo
diálogo || 187
187
intercultural
intercultural ee aa transformação
transformação social.
social.

inicial do encontro literário, a cada vez que nós somos pegos por e em uma narrativa. Em
cada leitura intensa é a infância em nós que desperta. Como escreve Vincent Jouve, “a
leitura é uma revanche da infância" (JOUVE, 1993, p.86). Mas a ficção literária não é
apenas da ordem do imaginário (uma evasão), ela dispoõe de uma função referêncial que
nos relança a nossa experiência do real e que pode mesmo revelar dimensões imprevisíveis
da realidade. Como sublinha P. Ricoeur, semelhante ao discurso filosófico, mais
conceitual, argumentativo e racional, a narrativa nos permite interrogar o real e pensá-lo.
A literatura constitui, dessa forma, uma experiência autêntica, singular e universal,
simultaneamente, através da qual os leitores vão poder apreender o real. Ela é assim como
um imenso labaratório onde os homens podem modelar, desenhar, redesenhar ao infinito as
situações, os dilemas, os problemas lhes atravessam. Dissociado do contraste do real
empírico, das leis físicas, e mesmo das leis morais, a ficção me permite viver por
procuração aquilo que apenas o real não me permitirá jamais viver: Eu posso comenter um
crime e experimentar por procuração os tormentos do remorso, posso ficar invisível (tal
como Gygés no mito de Platão) e experimentar os limites do bem e do mal (se eu estivesse
no lugar de Gygès). Tal como diz Ricoeur (1990, p.96): “As experiências de pensamento
que nós conduzimos no grande laboratório do imaginário são também explorações levadas
no reino do bem e do mal”.
E para as crianças, que a capacidade de abstração está em curso de elaboração, as
histórias têm um papel de mediação necessária que dão forma às problemáticas éticas ou
existenciais. Elas permitem que através delas experimentemos mundos possíveis. A
narrativa instaura também as problemáticas em uma “boa distância” (CHIROUTER,
2015) em comparação com a experiência cotidiana e facilita por isso o desenvolvimento de
um pensamento mais conceitual.
Não existe verdadeira obra literária que não seja também uma reflexão sobre o
mundo e a existência. Assim, desde a escola primária o trabalho sobre essa dimensão
fundamental das obras pode iniciar, ao mesmo tempo, uma aprendizagem do pensamento
filosófico. Existe uma conjunção necessária entre as duas disciplinas. Assim, para evitar a
aproximação tecnisista, o ensino de literatura deve encontrar a razão mesma de ser das
narrativas: por que existe a literatura? Porque os homens precisam falar e pensar sobre o
mundo. Por que nós precisamos contar histórias? (BRUNER, 2002): para dar forma e
sentido aos mistérios do mundo, à sua inquietante estranheza. A literatura tem a mesma
razão de ser que a filosofia: dizer, configurar, compreender, esclarecer.
Contudo, mesmo que as fronteiras entre a filosofia e a literatura sejam difíceis de
delimitar (um aforisma de R. Char – A lucidez é a ferida mais próxima do sol (2007), revela
mais de poesia ou de filosofia? Onde situar Zaratustra de Nietzsche?) é, no entanto,
necessário distinguir a aproximação literária e a aproximação filosófica: a primeira se
funda, por sua vez, sobre um trabalho da língua, do estilo e sobre a pluralidade de
interpretações possíveis. Ela se interessa, primeiramente, com o texto, a sua estrutura, a
sua inscrição em uma história, em um gênero, aos seus significados e seus efeitos estéticos.
O pensamento do texto é indissociável da experiência de escrita e da forma através da qual
o escritor escolheu entregá-la. É a construção dessa aproximação específica do texto, e a
colocada em perspectiva com outras obras, que visa prioritariamente o ensino de literatura
na escola. A segunda, a aproximação filosófica, é ultramente específica, e oferece uma
clareza ao texto que é necessária para permitir ao leitor não apenas se apropriar da obra em
toda sua riqueza, mas sobre tudo para alcançar sua finalidade última. Uma obra não existe
essencialmente para se inscrever na história do gênero, nem mesmo para modificar a
relação com a língua (uma experiência puramente formal ou técnica seria, em última
análise, vaga), mas ela existe porque o autor, através da metáfora ficcional, nos diz algo. A
aproximação filosófica do texto não é apenas complementar da aproximação estritamente
188|
188| edwige
edwige chirouter;
chirouter; marie-paule
marie-paule vannier
vannier

literária, mas ela é absolutamente necessária para esclarecer a razão de ser profunda da
narrativa. É isso que enuncia claramente T. Todorov em seu apelo por um ensino de
literatura que realce os sentidos e finalidades heurísticas das obras:
O
O conhecimento
conhecimento da da literatura
literatura não
não éé um
um fim
fim em
em si
si mesmo,
mesmo, mas
mas uma
uma dasdas vias
vias reais
reais
que
que conduzem
conduzem àà realização
realização de
de cada
cada um.
um. O O caminho
caminho no no qual
qual hoje
hoje está
está engajado
engajado oo
ensino
ensino dede literatura,
literatura, que
que vira
vira as
as costas
costas para
para esse
esse horizonte
horizonte (essa
(essa semana
semana nósnós
estudamos
estudamos aa metonímea,
metonímea, na na próxima
próxima semana
semana passamos
passamos para
para aa personificação),
personificação),
sofre
sofre oo risco
risco dede nos
nos conduzir
conduzir para
para um
um impasse,
impasse, sem
sem falar
falar daquilo
daquilo queque poderá
poderá
dificilmente
dificilmente levar
levar aa um
um amor
amor da
da literatura
literatura (TODOROV,
(TODOROV, 2007, 2007, p.25).
p.25).

A complementação dessas duas aproximações é recíproca. Não deve haver


hierarquia ou relação de subordinação entre essas duas disciplinas. Se o ensino de literatura
necessita dessa aproximação filosófica, o ensino de filosofia necessita também desse
recurso à sensibilidade e à boa distância do texto literário para dar novamente alma e
vivacidade a seu discurso. A filosofia tem também como finalidade última desorganizar o
sujeito e ajudá-lo a viver. Dessa forma, a aproximação filosófica se nutre do texto literário,
respeita-o profundamente preservando sua irredutibilidade e a pluralidade de seus
significados, mas em seguida se distância e se situa finalmente sobre o terreno abstrato dos
conceitos. Ela visa ultrapassar as particularidades das experiências singulares e as
ambiguidades da linguagem para se dirigir para uma certa relação com a verdade, com a
objetividade e com a universalidade.
Todas minhas pesquisas se baseiam na demonstração de que o conteúdo da
literatura dita infanto-juvenil contemporânea não escapa (mais) a essa definição da
literatura como experiência de pensamento e de que as crianças são definitivamente capazes
de alcançar a relação filosófica das obras.
três anos de ateliês de filosofia a partir da leitura de narrativas
O coração da minha análise na minha tese foi mostrar como no ciclo 3 da escola
elementar, com crianças de 8 à 11 anos, o apelo feito à literalidade de uma obra de literatura
infanto-juvenil permite aos alunos começarem a pensar filosoficamente uma noção, como
o debate sobre o implícito do texto permite iniciar e construir uma reflexão do tipo
filosófica. Quanto à metodologia, tratava-se essencialmente de uma pesquisa-ação, já que
estive intervindo 3 anos seguidos com os mesmos alunos ao longo do ciclo 3, sendo 10
sessões por ano. Todas as sessões foram filmadas, transcritas e é essencialmente a partir
desse material de três anos consecutivos com os mesmos alunos que tirei as principais
conclusões e os resultados dessa pesquisa.
As sessões de pesquisa-ação estão todas no dispositivo de colocar em rede as
narrativas infanto-juveil sobre uma questão filosófica (dispositivo que descrevi nas
diferentes edições do meu manual, Atelier de philosophie en classe à partir d’albums de jeunesse
editado pela Hachette-éducation).
Pude, a partir desse material, analisar em que medida e em quais condições esses
alunos podiam, pouco a pouco, e com o auxílio do professor, adiquirir uma leitura
especificamente filosófica das obras e como eles iniciam uma aprendizagem do filosofar.
as principais conclusões são as seguintes:
i. as referências literárias ajudam a manter as exigências do pensamento:
M. Tozzi caracteriza a reflexão filosófica em três grandes competências
intelectuais: problematizar, argumentar, conceitualizar. A literatura facilita esse rigor
filosófico das trocas. Na medida em que ela tem um valor de exemplariedade, a literatura
ajuda à argumentação, à problematização e à conceitualização. Por exemplo, em uma classe
de CM1, Florian (9 anos), vai utilizar a figura de Peter Pan para refutar a ideia de que é
sempre bom crescer.
apresentação
apresentação da
da cadeira
cadeira unesco:
unesco: prática
prática da
da filosofia
filosofia com
com crianças:
crianças: uma
uma base
base educativa
educativa para
para oo diálogo
diálogo || 189
189
intercultural
intercultural ee aa transformação
transformação social.
social.

Tem
Tem também
também quem
quem não
não quer
quer crescer.
crescer. Porque...
Porque... como
como Peter
Peter Pan,
Pan, ele
ele não
não quer
quer crescer.
crescer. Tem
Tem
quem
quem não
não quer
quer crecer,
crecer, porque
porque eles
eles dizem
dizem que
que tem
tem responsabilidades
responsabilidades demais
demais quando
quando éé
grande.
grande.

Essa representação universal do medo de crescer permite que ele contra-argumente


na discussão. Florian problematiza pegando uma objeção (o que não é tão simples),
argumenta graças à figura de Peter Pan e conceitualiza dando um atributo ao conceito de
pessoa grande (ser grande é ter responsabilidades). As três grandes competências
intelectuais próprias do filosofar são apresentadas nessa intervenção de Florian e são
seguramente possibilitadas graças à mediação do personagem. O caráter imaginário do
exemplo não dá menos valor à ideia enunciada, mas o contrário. A referência a essa figura
emblemática, que encarna um desejo constitutivo da condição humana universal, tem
valor de verdade. Jean Cocteau dizia que “a literatura é uma mentira que diz a verdade”.
As crianças não têm nenhuma dificuldade com esse valor de exemplificação da literatura.
E se elas alcançam plenamente a força dessa função referencial é porque existe uma
correlação íntima e profunda entre o mundo da infância e os mundos da ficção e do
imaginário. As reflexiões de P. Ricoeur ou de J. Bruner sobre a literatura como experiência
de verdade encontram uma marca remarcável na maneira como os alunos se apoiam sobre
as referências literárias para auxiliar sua reflexão com justeza e coerência.

ii. a “boa distância” da literatura:


Enfim, a boa distância que instaura a literatura, entre a experiência pessoal e o
conceito, permite fazer a pote entre o mais geral e o íntimo. Ela permite essa ida e vinda
fecunda entre a ficção, o geral e a realidade. Ela dá assim um sentido profundo à reflexão
filosófica. A literatura permite dar corpo a um exercício intelectual ainda geralmente
entendido como impessoal e desconectado das verdadeiras preocupações humanas.
Nas aulas de todas as turmas, mas particurlamente das turmas de ensino
especializado, onde o efeito de lupa é ainda mais surpreendente, percebemos que os alunos
se servem daquilo que chamo tela do personagem (CHIROUTER, 2015, s.p.) para se engajar
automaticamente na reflexão filosófica:
não
não falo
falo de
de mim
mim na na primeira
primeira pessoa,
pessoa, pois
pois jamais
jamais ousaria
ousaria me me entregar
entregar tão
tão
intimamente
intimamente nana frente
frente dos
dos meus
meus colegas
colegas de
de turma
turma ee dos
dos professores!
professores! Sobre
Sobre temas
temas
tão
tão íntimos
íntimos ee profundos,
profundos, mas mas me
me sirvo
sirvo do
do personagem
personagem dada história
história -- Robinson,
Robinson,
Cyrano,
Cyrano, Peter
Peter Pan,
Pan, etc.
etc. para
para pensar
pensar ee meme apropriar
apropriar autenticamente
autenticamente ee
publicamente
publicamente dessas
dessas grandes
grandes questões
questões metafísicas
metafísicas universais,
universais, aa solidão,
solidão, oo amor,
amor, oo
medo
medo de
de crescer,
crescer, aa tragédia
tragédia da
da condição
condição humana.
humana.

Em uma aula sobre o amor em uma turma do 4° ano SEGPA (Section


d’Enseignement Général et Professionnel Adapté) do colégio Kennedy d’Allones (Sarthe,
França) a partir de uma adaptação de Cyrano de Bergerac, um dos alunos passa de maneira
indiferente (e sem se dar conta, a maneira de um lapso) do personagem (aqui Cyrano) à
primeira pessoa do singular.
Cyrano
Cyrano não
não tem
tem motivo
motivo para
para escrever
escrever no
no lugar
lugar de
de Christian…
Christian… EleEle está
está doido!
doido! Ele
Ele
ama
ama Roxanne
Roxanne ee ele
ele ajuda
ajuda Christian.
Christian. Bobagem.
Bobagem. EuEu não
não aa deixaria
deixaria para
para outro.
outro. Ele
Ele éé
louco
louco de
de fazer
fazer isso.
isso.

A mediação cultural ajuda-o assim nessa intervenção pública sobre assuntos


profundos. E esse espaço de fala permite ganhar em auto-estima, pois o aluno é
reconhecido em e pela instituição escolar como um sujeito digno de pensamento,
incorporado à condição humana, capaz de intervir, de pegar a palavra e de pensar essas
grandes questões universais.
190|
190| edwige
edwige chirouter;
chirouter; marie-paule
marie-paule vannier
vannier

Não afirmo que a prática de filosofia com crianças seja possível e legítima apenas
tendo como apoio os suportes literários, existem outros dispositivos que partem
essencialmente da experiência pessoal dos alunos, da atualidade e de outros suportes
culturais, mas a literatura, por sua natureza reflexiva e seu carater universal, facilita com
sensibilidade e beleza a aprendizagem do pensamento crítico. Ela dá sentido às
problemáticas permitindo o rigor de pensar. A literatura pode efetivamente permitir às
crianças melhor compreender o mundo, torná-lo mais inteligível. Oferecendo narrativas
portadoras de sentido, elas poderão fazer a inesquecível experiência inicial de entrar no
mundo do pensamento, da inteligência, da beleza.

conclusão
Postulamos assim que a democratização do ensino de filosofia é uma necessidade
no mundo de hoje, caracterizado pela complexidade e pelas crises múltiplas (crises de
valores, crises democráticas, crises econômicas). Aderimos às preocupações da filósofa M.
Nussbaum em seu ensaio Les émotions démocratiques (2011). Para Nussbaum, o sistema
educativo mundial tende a colocar de lado as humanidades em benefício de um
conhecimento puramente tecnológico, propiciando assim uma grave crise da democracia.
Portanto, apenas a literatura, a filosofia, a história e as artes permitem aos futuros cidadãos
desenolverem suas faculdades críticas e sua empatia. É essa convicção que anima a Cátedra
UNESCO e o grupo de pesquisa PHILEAS.

referências
ASTOLFI,
ASTOLFI, Jean-Pierre.
Jean-Pierre. La La saveur
saveur desdes savoirs.
savoirs. Disciplines
Disciplines et
et plaisir
plaisir d'apprendre.
d'apprendre. Paris:
Paris: ESF,
ESF, 2008.
2008.
BRUNER,
BRUNER, Jérôme.
Jérôme. Pourquoi
Pourquoi nousnous racontons-nous
racontons-nous des des histoires?
histoires? LeLe récit
récit au
au fondement
fondement de de la
la culture
culture etet de
de
l’identité
l’identité individuelle.
individuelle. Paris:
Paris: Retz,
Retz, 2002.
2002.
CHAR,
CHAR, René.
René. Feuillets
Feuillets d'Hypnos.
d'Hypnos. Paris:
Paris: Gallimard,
Gallimard, 2007.
2007.
CHARLOT,
CHARLOT, Bernard.
Bernard. Du Du rapport
rapport au au savoir.
savoir. Éléments
Éléments pour
pour une
une théorie.
théorie. Paris:
Paris: Anthopos,
Anthopos, 1997.
1997.
CHIROUTER,
CHIROUTER, Edwige. Edwige. Philosopher
Philosopher avec avec les
les enfants
enfants dès
dès l’école
l’école élémentaire
élémentaire grâce
grâce àà lala littérature.
littérature.
Analyse
Analyse d’und’un corpus
corpus de de trois
trois années
années d’ateliers
d’ateliers dede philosophie
philosophie en en cycle
cycle 3.3. Recherches
Recherches en en
Education,
Education, n.13, n.13, p.31-42,
p.31-42, 2012. 2012. Consultée:
Consultée: 08/05/2016.
08/05/2016. Disponible
Disponible en en ligne:
ligne:
http://www.recherches-en-education.net/IMG/pdf/REE-no13.pdf
http://www.recherches-en-education.net/IMG/pdf/REE-no13.pdf
________.
________. L’enfant,
L’enfant, la
la littérature
littérature etet la
la philosophie.
philosophie. Paris:
Paris: L’Harmattan,
L’Harmattan, 2015. 2015.
________.
________. Ateliers
Ateliers de
de philosophie
philosophie àà partir
partir d’albums
d’albums de de jeunesse.
jeunesse. Paris:
Paris: Hachette,
Hachette, 2016.2016.
DEVELAY,
DEVELAY, Michel;
Michel; LÉVINE,
LÉVINE, Jacques.
Jacques. Pour Pour une
une anthropologie
anthropologie desdes savoirs
savoirs scolaires.
scolaires. Paris:
Paris: ESF,
ESF, 2003.
2003.
JOUVE,
JOUVE, Vicent.
Vicent. LaLa lecture.
lecture. Paris:
Paris: PUF,
PUF, 1993.
1993.
MEN,
MEN, Eduscol.
Eduscol. Une
Une culture
culture littéraire
littéraire àà l’école.
l’école. mars
mars 2008.
2008. Consultée:
Consultée: 03/02/2016.
03/02/2016. Disponible
Disponible en en ligne:
ligne:
http://media.eduscol.education.fr/file/ecole/46/9/culture-litteraire-ecole_121469.pdf
http://media.eduscol.education.fr/file/ecole/46/9/culture-litteraire-ecole_121469.pdf
NUSSBAUM,
NUSSBAUM, Martha. Martha. Les Les émotions
émotions démocratiques.
démocratiques. Comment
Comment former
former lele citoyen
citoyen du
du XXIe
XXIe siècle.
siècle. Paris:
Paris:
Climats,
Climats, 2011.
2011.
RICOEUR,
RICOEUR, Paul.Paul. Soi-même
Soi-même comme
comme un un autre.
autre. Paris:
Paris: Seuil,
Seuil, 1990.
1990.
TODOROV,
TODOROV, Tzvetan.Tzvetan. La La littérature
littérature en en péril.
péril. Paris:
Paris: Flammarion,
Flammarion, 2007. 2007.
TOZZI,
TOZZI, Michel.
Michel. Nouvelles
Nouvelles pratiques
pratiques philosophiques.
philosophiques. LyonLyon :: Chroniques
Chroniques sociales,
sociales, 2012.
2012.
UNESCO.
UNESCO. La La philosophie,
philosophie, une
une école
école dede la
la liberté.
liberté. Paris:
Paris: UNESCO,
UNESCO, 2007. 2007.
VANNIER,
VANNIER, Marie-Paule.
Marie-Paule. PlacePlace et et rôle
rôle dudu chercheur
chercheur dans
dans le le dispositif
dispositif de de co-explicitation.
co-explicitation. In: In:
VINATIER,
VINATIER, Isabelle Isabelle (Eds.).
(Eds.). Réflexivité
Réflexivité etet développement
développement professionnel.
professionnel. UneUne orientation
orientation pour
pour lala
formation.
formation. Toulouse
Toulouse :: Octarès,
Octarès, 2012,2012, p.117-150.
p.117-150.
VANNIER,
VANNIER, Marie-Paule;
Marie-Paule; CHIROUTER,
CHIROUTER, Edwige. Edwige. Pratiques
Pratiques philosophiques
philosophiques en en ASH
ASH :: quelles
quelles
médiations
médiations pourpour quels
quels apprentissages?.
apprentissages?. In: In: ASSUDE,
ASSUDE, Teresa;Teresa; PEREZ,
PEREZ, Jean Jean Michel
Michel (Eds.).
(Eds.).
Pratiques
Pratiques inclusives
inclusives et
et savoirs
savoirs scolaires.
scolaires. Nancy:
Nancy: PUN,
PUN, 2013,
2013, p.89-104.
p.89-104.
VINATIER,
VINATIER, Isabelle;
Isabelle; RINAUDO,
RINAUDO, Jean Jean Luc.
Luc. Rencontres
Rencontres entreentre chercheurs
chercheurs et et praticiens
praticiens :: quels
quels
enjeux
enjeux ?.?. Carrefours
Carrefours de de l'éducation,
l'éducation, n.39,
n.39, p.9-18,
p.9-18, 2015.
2015.
191
191

iv. áfrica e nós


192
192
193
193

filosofia africana na antiguidade:


tecendo mundos entre ancestralidade e futuridade
renato noguera11
Dedicado
Dedicado aa (e
(e inspirado
inspirado em)
em) Wilson
Wilson N.
N.
preâmbulo: áfrica

A
História da Filosofia tem se confundido com a historiografia filosófica do
Ocidente. No Brasil, é raro encontramos textos de introdução que não
iniciem os primeiros registros filosóficos na Grécia, embora existam
discordâncias que pairam entre a paternidade; o berço não é questionado. Apenas
encontramos com muita frequência Tales de Mileto consagrado como o primeiro filósofo.
Outras tradições insistem em deslocar essa paternidade para Sócrates ou Platão. De
qualquer modo, não vamos tratar disso. Essa brevíssima menção se deve à necessidade de
pluralizar a História da Filosofia, trazendo à luz as bases da Filosofia Africana.
Sem dúvida, precisamos caminhar para um entendimento prévio de África. O
termo é polissêmico e pode gerar confusões. De início, tudo indica que o nome “África”
provêm de um batismo colonial, não teriam sido “africanas/os” que teriam se
autodenominado. Mas, alguns registros informam que foram os romanos durante a
expansão do seu domínio sobre outros povos na antiguidade (KI-ZERBO, 2010, p. XXXI).
O historiador burkinense Joseph Ki-Zerbo foi um dos responsáveis por um trabalho
magnífico, contar a história da África a partir de africanas/os, o que fez com que
organizasse o primeiro volume da coleção História Geral da África e nos brindasse com o
primeiro levantamento mais preciso a respeito do nome do continente mais antigo do
mundo.
Conforme Ki-Zerbo, uma genealogia da “África” passa pelas seguintes
possibilidades (Ibidem): (1) afrig – nome de povo berbere que vivia ao sul de Cartago; (2)
nas línguas sânscrita e hindi africa significa algo como “o que vem depois”, isto é, ocidente;
(3) oriunda de um termo fenício com o sentido de fertilidade; (4) viria da palavra faraga
(diáspora) que tem mesma grafia e sentido no fenício antigo e no atual idioma bambara;
(5) viria do latim apricao (ensolarado); (6) origem na palavra grega apriké (sem frio); (7)
nome da cidade Afrikyah fundada pelo líder iemenita Africus dois séculos antes da Era
Comum.
Para o nosso trabalho vamos assumir a quarta possibilidade como chave para
definição do termo: África. Nessa hipótese, o povo bambara, assim como os fenícios 22 na
antiguidade, já apontavam para uma característica importante dos povos do continente
estava em ser faraga. Ou seja, diáspora, dispersão, um tipo de viagem para fora do lugar
habitual seja de modo cíclico ou “definitivo”, por interesses próprios ou alheios. Uma
dúvida que surge é a respeito dessa “unificação” da África, na ideia de submeter o
continente africano a uma certa uniformização. Tal como nos diz o pensador camaronês
Celéstin Monga em seu livro Niilismo e negritude: “O mito da homogeneização racial do
mundo negro e das visões de mundo dela decorrentes não resiste à análise” (MONGA,
2010, p.29).
Na esteira de Cheik Anta Diop – um dos maiores pensadores do século XX. –
podemos entender que “África” extrapola os limites geográficos continentais. Vale
comparar com o conceito de “Ocidente”. Sem dúvida, ainda que as bases da cultura
ocidental estejam assentadas na Europa, não podemos confundir os dois conceitos. Europa

11 Universidade
Universidade Federal
Federal Rural
Rural do
do Rio
Rio de
de Janeiro.
Janeiro. Email:
Email: renatonoguera@ymail.com
renatonoguera@ymail.com
22 Vale
Vale registrar
registrar que
que os
os fenícios
fenícios eram
eram negros,
negros, oo que
que aparece
aparece mencionado
mencionado por
por Heródoto.
Heródoto.
194|
194| renato
renato noguera
noguera

difere de Ocidente, ainda que estejam imbricados e articulados. Aqui vamos definir
Ocidente como um paradigma cultural, cujas bases estão, dentre diversas outras, na
filosofia grega. A Europa é um continente diversificado, com povos e nações diferentes;
mas, politicamente existe um projeto de unidade que encontra lastro e fiança para avançar
num paradigma comum que aqui chamamos de Ocidente. Do mesmo modo se dá com o
continente africano, sendo que usamos o mesmo termo para designar o continente e o
paradigma cultural. Em linhas muito gerais, quando tratamos de Ocidente emergem
diversas fontes, dentre as quais vale apenas citar as seguintes: a filosofia grega, a tradição
religiosa de matriz judaico-cristã (uma estrutura em que a busca pela salvação informa que
apenas um “povo eleito” terá direito ao paraíso), o modelo político de um Estado tripartido
assentado nos princípios da Revolução Francesa, a ciência como modelo de
desenvolvimento da racionalidade humana.
Pois bem, ancorados nas leituras de Diop (1954; 1967; 1977) e do pan-africanismo,
quando tratamos de África estamos a falar da filosofia egípcia, da diáspora, da xenofilia, da
matrifocalidade, da religiosidade de matriz kemetico-banto-ioruba (uma estrutura plural
que não opera através da lógica da salvação; mas, do estabelecimento do bem-estar
individual e coletivo), o modelo político de gestão através de linhagens familiares, a
ciência como um modo de raciocínio entre outros.
Não cabe aqui nos demorarmos nesse ponto. Mas, somente sublinhar o que nos diz
o filósofo Nkolo Foé.
O
O Egito
Egito antigo
antigo faz
faz parte
parte integrante
integrante da
da história
história da
da cultura
cultura africana.
africana. Para
Para nós,
nós, ele
ele
desempenha
desempenha mais
mais ou
ou menos
menos oo mesmo
mesmo papel
papel que
que aa Grécia
Grécia ee Roma
Roma desempenham
desempenham
para
para oo Ocidente.
Ocidente. Isso
Isso éé uma
uma evidência
evidência conhecida
conhecida desde
desde os
os trabalhos
trabalhos dede Victor
Victor
Schoelcher,
Schoelcher, Cheikh
Cheikh Anta
Anta Diop
Diop ee Théophile
Théophile Obenga
Obenga (FOÉ,
(FOÉ, 2013,
2013, p.197).
p.197).
Neste sentido que tomamos África como um termo complexo que diz respeito a
encruzilhadas de tradições combinadas e assentadas na noção de diáspora, um tipo de
nomadismo. Nós voltaremos adiante nesse aspecto. Mas, de qualquer forma o que importa é
fazer uma apresentação da filosofia africana, por isso: vamos adentrar o Egito, território
que segundo diversos autores foi indevidamente embranquecido. James, Diop, Bernal e
Asante convergem com a ideia de que o racismo antinegro embranqueceu o Egito. Na
antiguidade, os egípcios eram negros. As pesquisas de Diop (1954; 1967; 1977) confirmam
isso, seja com os testes de melanina em múmias ou através dos estudos da arte egípcia.
Aqui não vamos nos deter nesse aspecto; mas, vale registrar que o racismo antinegro tem
sido o único argumento mais contundente contra a negritude do Egito antigo,
autodenominado na própria língua de Kemet – terra negra. De qualquer maneira, as noções
de África e Ocidente são relativizáveis, à medida que aqui coletamos somente imagens,
referências e possibilidades. Nós concordamos com Bernal que descontrói o purismo da
Grécia antiga.
No
No trabalho,
trabalho, “A
“A imagem
imagem da da Grécia
Grécia Antiga
Antiga como
como uma
uma ferramenta
ferramenta para
para oo
colonialismo
colonialismo ee para
para aa hegemonia
hegemonia europeia”,
europeia”, Bernal
Bernal propõe
propõe umauma reavaliação
reavaliação
histórica
histórica da
da imagem
imagem da da Grécia
Grécia Antiga
Antiga como
como “berço
“berço da
da civilização
civilização europeia”
europeia” ee
questiona
questiona aa ideia
ideia de
de neutralidade
neutralidade ee de
de homogeneidade
homogeneidade do do Mundo
Mundo Clássico.
Clássico. Na
Na
obra,
obra, oo autor
autor analisa
analisa dois
dois modelos
modelos explicativos
explicativos modernos
modernos aa respeito
respeito das
das origens
origens
da
da Grécia
Grécia Antiga:
Antiga: O O Modelo
Modelo Ariano
Ariano ee oo Modelo
Modelo Antigo
Antigo (...)
(...) Neste
Neste modelo,
modelo,
acreditava-se
acreditava-se que
que osos conquistadores
conquistadores faziam
faziam parte
parte de
de um
um ramo
ramo superior
superior da
da raça
raça
branca,
branca, ee mesmo
mesmo os os nativos
nativos que
que sofreram
sofreram as as invasões,
invasões, eram
eram considerados
considerados
“racialmente
“racialmente puros”,
puros”, ideia
ideia que
que sustenta
sustenta asas bases
bases racistas
racistas dos
dos séculos
séculos XIX
XIX ee XX,
XX,
época
época emem que
que foi
foi elaborado
elaborado (EGGERS,
(EGGERS, 2013,
2013, p.
p. 20).
20).
A crítica à pretensão de homogeneidade da cultura grega na antiguidade não
significa o abandono de relações específicas de saber e poder que, de um modo ou de outro,
fazem que a filosofia ocidental se reporte invariavelmente aos gregos. Num sentido similar
ao tratarmos de filosofia africana precisamos articular com o Egito, a cultura kemética é de
filosofia
filosofia africana
africana na
na antiguidade:
antiguidade: tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre ancestralidade
ancestralidade ee futuridade
futuridade || 195
195

suma importância para o nosso percurso de demonstração de uma das tradições filosóficas
mais antigas da história da humanidade.
“origens” da filosofia (africana)
Théophile Obenga é um dos maiores expoentes nos estudos de filosofia antiga
africana – aqui também denominada de filosofia africana na antiguidade. Sem dúvida,
Obenga ainda não é muito conhecido entre scholars da filosofia antiga (ocidental). O
filósofo, egiptólogo e linguista Obenga nos diz em Egito: História Antiga da Filosofia
Africana:
Filosofia
Filosofia nosnos tempos
tempos do do antigo
antigo Egito
Egito faraônico
faraônico eraera uma
uma espécie
espécie dede atividade
atividade
pedagogia
pedagogia de de ensinamento
ensinamento da da sabedoria
sabedoria (sebayt)
(sebayt) dosdos antigos
antigos sábios,
sábios, que
que eram
eram
estudiosos,
estudiosos, sacerdotes,
sacerdotes, oficiais
oficiais ee altos
altos funcionários
funcionários ao ao mesmo
mesmo tempo.
tempo. DeDe fato,
fato, oo
verbo
verbo rekh
rekh (escrito
(escrito com
com os os signos
signos hieroglíficos
hieroglíficos de de “boca”,
“boca”, “placenta”
“placenta” ee “papiro
“papiro
enrolado,
enrolado, amarrado
amarrado ee selado”)
selado”) significa
significa “saber”
“saber” ouou “estar
“estar ciente
ciente dede algo”,
algo”, mas
mas
também
também “aprender”.
“aprender”. Os Os seres
seres humanos
humanos conhecem
conhecem através
através do
do aprender,
aprender, isto
isto é,
é, por
por
meio
meio da da experiência
experiência ou ou condicionamento,
condicionamento, da da educação
educação ou ou dos
dos estudos.
estudos. AA palavra
palavra
rekh
rekh (quando
(quando escrita
escrita comcom oo hieróglifo
hieróglifo de de umum homem
homem sentado)
sentado) significa
significa
“prudente”,
“prudente”, istoisto é,
é, uma
uma pessoa
pessoa culta,
culta, um
um erudito,
erudito, um
um filósofo.
filósofo. Portanto
Portanto oo conceito
conceito
de
de rekhet
rekhet (escrito
(escrito com
com hieróglifos
hieróglifos que
que remontam
remontam aa noções
noções abstratas)
abstratas) significa
significa
uma
uma espécie
espécie dede “conhecimento”,
“conhecimento”, um um tipo
tipo de
de “ciência”
“ciência” no no sentido
sentido de de “filosofia”,
“filosofia”,
isto
isto é,é, perguntar
perguntar pelapela natureza
natureza dasdas coisas
coisas (khet)
(khet) baseado
baseado no no conhecimento
conhecimento
acurado
acurado (rekhet)
(rekhet) ee bombom (nefer)
(nefer) discernimento
discernimento (upi).
(upi). A A palavra
palavra upiupi significa
significa
“julgar”,
“julgar”, “discernir”,
“discernir”, oo que que éé “dissecar”.
“dissecar”. A A palavra
palavra cognata
cognata upet upet significa
significa
“especificação”,
“especificação”, “julgamento”
“julgamento” ee upset upset quer
quer dizer
dizer “específico”,
“específico”, istoisto é,
é, dar
dar os
os
detalhes
detalhes de de algo.
algo.
Na
Na língua
língua egípcia
egípcia “sabedoria”
“sabedoria” ee “prudência”
“prudência” são são expressas
expressas pela
pela mesma
mesma palavra:
palavra:
sat
sat (o
(o hieróglifo
hieróglifo determinativo
determinativo éé muito
muito característico;
característico; trata-se
trata-se dede um
um homem
homem com com
aa mão
mão na na boca).
boca). Com
Com efeito,
efeito, ser
ser sábio
sábio (sai)
(sai) éé ser
ser prudente
prudente (sai);
(sai); também
também significa
significa
“silencioso”,
“silencioso”, istoisto é,
é, sagaz
sagaz em em lidar
lidar com
com variados
variados assuntos
assuntos ee exercitar
exercitar bombom
julgamento
julgamento (OBENGA,
(OBENGA, 2004, 2004, p.33-34).
p.33-34).
A extensa passagem acima ajuda-nos a situar a filosofia africana como uma
atividade que teve início por volta de 2780 a. E.C. com Imhotep. Conforme estudos de
Asante, Imhotep foi um alto funcionário, médico e arquiteto que atuou intensamente
durante a 3ª Dinastia do Reino Antigo durante os reinos dos faraós Nebka e Djeser.
Imhotep aparece venerado e divinizado como patrono da medicina. De qualquer modo os
indícios históricos apontam para um expoente filosófico que deixou um legado, segundo
Asante, um legado a respeito da emergência da razão expresso nos registros do Rei Antef
de Tebas.
OO mesmo
mesmo parapara nascidos
nascidos ricos
ricos ou
ou pobres.
pobres.
As
As palavras
palavras dede Imhotep,
Imhotep, ouvi.
ouvi. (...).
(...).
OO que
que éé prosperidade?
prosperidade? Ensine!
Ensine!
Suas cercas
Suas cercas ee muros
muros são são destruídas,
destruídas,
suas casas
suas casas não
não existem
existem mais
mais
EE ninguém
ninguém vem vem novamente
novamente da da tumba
tumba
Para dizer
Para dizer oo que
que passa
passa abaixo.
abaixo.
Você vai
Você vai para
para oo lugar
lugar das
das carpideiras.
carpideiras.
Devem fortalecer
Devem fortalecer seus
seus corações
corações para
para esquecer
esquecer suas
suas alegrias,
alegrias,
No entanto,
No entanto, devem
devem cumprir
cumprir osos seus
seus desejos
desejos enquanto
enquanto viver
viver
Cabe ungir
Cabe ungir -se,
-se, vestir
vestir -se
-se bem,
bem,
Use as
Use as dádivas
dádivas queque os
os deuses
deuses concedem
concedem
Cumprir os
Cumprir os nossos
nossos desejos
desejos sobre
sobre aa terra
terra
para oo dia
para dia que
que virá
virá para
para todos
todos
quando você
quando você não
não ouve
ouve as
as vozes
vozes dede amigos
amigos
quando oo choro
quando choro nãonão puder
puder nada
nada mais
mais fazer
fazer
sendo assim,
sendo assim, festeje
festeje (o)
(o) agora
agora com
com tranquilidade
tranquilidade
(ANTEF apud
(ANTEF apud ASANTE,
ASANTE, 2000, 2000, p.28-29).
p.28-29).
196|
196| renato
renato noguera
noguera

É interessante notar que Imhotep proponha uma determinada desconfiança acerca


da continuidade da existência, ainda que mencione os deuses, o filósofo sugere que a vida
seja festejada agora. Imhotep insere um elemento filosófico importante: a dúvida. Sem
saber o que nos espera no futuro, devemos nos concentrar no presente. Uma postura
filosófica que nos convida para atenção ao presente. Por outro lado, os comentários sobre o
pensamento de Imhotep (OBENGA, 1990; ASANTE, 2000) trazem uma relevante
perspectiva filosófica: perguntar. Não aceitar uma ideia sem que ela possa ser medida,
pesada na balança do conhecimento.
Considerando os relatos e o material que temos, o primeiro filósofo (africano) é
bem anterior ao primeiro filósofo grego. Com efeito, aqui não nos interessa examinar uma
querela que pouco acrescentaria ao nosso objetivo: quem “inventou” a filosofia? Sem
sombras de dúvidas, o que temos diante dos papiros, registros e documentos atesta
simplesmente que os escritos egípcios são mais antigos do que os gregos. A suspeita dos
críticos da tese de que a filosofia em solo africano é mais antiga do que a que foi erigida na
Europa pode estar justamente num elemento: o baixo conhecimento do material africano.
Per Ankh (Escola de Vida) era o nome dos espaços em que escribas, sacerdotes, altos
funcionários eram formados. A formação básica era a respeito da sebayt (sabedoria), da
investigação de todas as coisas – khet, para que a pessoa pudesse enveredar para se tornar
rekh – filósofo(a). A atividade filosófica diz respeito a um certo esforço que aparece bem
descrito na Sátira das profissões (2000) de Khéti que se encontra integralmente nos Papiro
Sallier II (Museu Britânico 10182) e parcialmente no Papiro Anastasi VII (Museu
Britânico 10222), ambos da 19ª Dinastia que durou de 1295 a 1213 a. E.C. Na Sátira, o filósofo
Khéti procura convencer seu filho Pépy a escolher os estudos, porque durante a formação
de escriba, o conhecimento de rekhet (filosofia) é aprendido como um dos pilares básicos
dessa formação (ARAÚJO, 2000; ASANTE, 2000, OBENGA, 1990).
Não podemos deixar de registrar um dado muito relevante acerca da origem da
filosofia africana que se mistura com o noticiário acadêmico da filosofia ocidental. Se
defendemos uma perspectiva que não quer “descobrir” quem “inventou” a filosofia, deve-
se primeiro à compreensão de que filosofar não é exclusividade de nenhum povo. Mas,
algo que atravessa e constitui a condição humana. Por outro lado, vale insistir que estamos
embrenhados numa arqueologia dos primeiros escritos. Nessa arqueologia que
encontramos indícios que parecem confirmar a hipótese de que egípcios e gregos
dialogavam bastante. Kemetismo e helenismo teceram encontros de diversos modos e
clivagens. Numa dessas tessituras encontramos um elemento que merece destaque. Uma
significativa parte dos comentadores atribui à Pitágoras de Samos (570-496 A.E.C) o termo
“filosofia” pela primeira vez. Dentre as fontes de que foi no século V A.E.C. com
confirmam essa versão Diógenes de Laércio (~ 225 A.E.C- 3000 A.E.C.) com Vida dos
filósofos e Cícero (106- 44 A.E.C) com Discussões de Túsculo. Ambos assentados numa
leitura amplamente popular que remonta aos escritos de Heráclides Pôntico (~ 387 A.E.C.-
312 A.E.C), discípulo de Platão (428 A.E.C – 348 A.E.C). Um dado importante que nem
sempre é mencionado diz respeito aos vinte e cinco anos que Pitágoras estudou no Egito
(CARREIRA, 1994; ASANTE, 2000; OBENGA, 1990). o filósofo grego frequentou Per
Ankh, sua formulação de que sua atividade não era coisa de sábio; mas, de amante da
sabedoria (filósofo) se dá em seu retorno à Grécia. Sem dúvida, Pitágoras poderia ter feito
essa formulação para se diferenciar dos egípcios. Mas, também poderia ter feito justamente
para revitalizar o seu aprendizado kemético no contexto grego. O que aqui nos interessa
são os sinais de contato entre essas duas culturas na antiguidade. Porém, ainda que
distantes da tese de George James exposta no livro Legado roubado: que os gregos teriam
sido meros repetidores do pensamento filosófico egípcio (JAMES, 2013), não podemos
deixar de sublinhar de modo enfático que os africanos começaram a escrever milênios
filosofia
filosofia africana
africana na
na antiguidade:
antiguidade: tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre ancestralidade
ancestralidade ee futuridade
futuridade || 197
197

antes e que a ausência dessas menções causa estranheza. Ainda mais quando se trata de
uma área sem respostas consensuais e que o mais importante é recolocar as questões sem
temer os caminhos que elas possam nos impor. Por isso, cabe sempre refazer aquela
pergunta simples e inescapável: o que é filosofia?

o que é filosofia (africana)?


Na antiguidade egípcia encontramos um texto que pode lançar bastante luz sobre as
dúvidas a respeito do que viria a ser a atividade filosófica propriamente dita na antiguidade
(e, em certa medida na atualidade e na futuridade). Ora, Os ensinamentos de Ptahhotep são
exemplo magistral para que possamos discorrer acerca da natureza da filosofia. Logo no
início dos seus ensinamentos encontramos uma formulação que merece exame detido.
Não
Não tete envaideças
envaideças dede teu
teu conhecimento,
conhecimento, toma
toma oo conselho
conselho tanto
tanto do
do ignorante
ignorante
quanto
quanto dodo instruído,
instruído, pois
pois os
os limites
limites da
da arte
arte de
de filosofar
filosofar (rekhet)
(rekhet) não
não podem
podem ser
ser
alcançados
alcançados ee aa destreza
destreza de
de nenhum
nenhum artista
artista éé perfeita.
perfeita. OO bem
bem falar
falar (a
(a palavra
palavra
perfeita)
perfeita) éé mais
mais raro
raro do
do que
que esmeralda,
esmeralda, mas
mas pode
pode encontrar-se
encontrar-se entre
entre criados
criados ee
britadores
britadores de
de pedra
pedra (PTAHOTEP,
(PTAHOTEP, 2000, 2000, p.247).
p.247).
A passagem acima desperta atenção porque o filósofo, um vizir responsável pela
gestão, armazenamento e distribuição de cereais na 5ª Dinastia do Reino Antigo, nos
informa que filosofia é uma atividade em que a conclusão nunca está pronta. Ou seja, o
exercício de filosofar é alguma coisa que está sempre por fazer, um processo ininterrupto
que requer esforço e caracteriza-se mais pela compreensão de que precisamos aprimorá-lo
continuamente do que pela convicção de que chegamos a alguma conclusão definitiva.
Essa característica revelaria que filosofar é um ato de humildade. A filosofia inspira o
reconhecimento da ignorância e exige a eliminação da arrogância. Sem essas características
a arte de filosofar é impossível.
Podemos notar que outra característica indispensável está em considerar todos os
pontos de vistas como relevantes para o aprendizado. Ptahhotep é categórico ao afirmar
que tanto faz aprender com pessoas desprovidas de qualquer formação, ignorantes em
qualquer arte, quanto com as que são versadas em alguma. Porque Ptahhotep pressupõe
que possamos nos enganar em qualquer circunstância e somente a persistência em revisitar
as ideias nos trará mais “precisão”. No texto original podemos ler: “a palavra perfeita
(medet nefer) é mais raro do que esmeralda” (Idem). A raridade da palavra perfeita, aqui
entendida como aquela que tem o peso da verdade, significa que poucas pessoas conseguem
medir e conhecer as medidas exatas da verdade. Porque esse “bem falar” é fruto de uma
labuta pesada e estafante que requer humildade e persistência das pessoas que estão a
buscar destreza na arte de conhecer as coisas e aproximar-se da sabedoria (sebayt): o
conhecimento de si somado ao conhecimento do mundo. Aqui vale dizer que a dificuldade
em conjugar esse duplo conhecimento, de si e do mundo, faz da sabedoria uma busca
contínua. Inclusive, os estudos de egiptólogos como Obenga (2004) e Karenga (1990)
revelam um fato importante e que parece desconhecido de muitos estudiosos da área de
filosofia. Conforme Obenga, a inscrição Rix ki ink (conheça-te a ti mesmo) era comum nas
tumbas egípcias, pelo menos, desde o Reino Médio. Ou seja, o gnothi seuaton (conheça-te a
ti mesmo em grego) foi escrito no templo do Oráculo de Delfos cerca de um milênio
depois da inscrição egípcia. Com isso, não queremos nos restringir apenas à leitura de que
os gregos teriam copiados os egípcios. O assunto não está no escopo dessa pesquisa.
Poderíamos considerar outras perspectivas, tais como: nenhum povo é dono do
pensamento filosófico. O que enfraqueceria a atividade filosófica seria supor sua origem
única, visto que filosofar parte da ignorância, do abandono da rotina. Contudo, a ideia de
fixar-se numa única “língua” tem sido retomada como dogma quando enxerga a Grécia
como berço da filosofia. O reconhecimento de que o “conheça-te a ti mesmo” já circulava
198|
198| renato
renato noguera
noguera

entre egípcios é um deslocamento muito importante. Isso faz parte do ímpeto filosófico de
repensarmos o que considerávamos pronto e acabado. Ora, Ptahhotep é um dos pilares do
pensamento filosófico. A formulação ptahhotepiana traz um encaminhamento
radicalmente filosófico que até então não existia: assumir a ignorância como ponto de
partida, reconhecer que a verdade não é prerrogativa de ninguém. Conforme Emanuel
Araújo (2000), os estudos que se embrenham pelos papiros egípcios parecem convergir, o
principal manuscrito é o Papiro Prisse (Biblioteca Nacional, Paris, 183-194). A obra remete
ao vizir da 5ª Dinastia do Reino Antigo, Ptahhotep, cujo nome está no túmulo de Saqqarah
e tem registrado títulos ostentados pelas figuras mais prestigiadas do país depois do Faraó.
No túmulo de Ptahhotep aparecem as menções, “juiz supremo, superintendente de todas as
obras do rei, superintendente dos documentos, secretário de todas as ordens régias,
portador do rolo de papiro, escriba do livro divino” (ARAÚJO, 2000, p.244). Num
belíssimo trabalho intitulado The mastaba of Ptahhotep and Akhethetep, vol. I. de Normam
Davies e Francis Grifftih (1975), encontramos diversos detalhes sobre o personagem
histórico. O material com os escritos de Ptahhotep que foi preservado está datado no Reino
Médio, no período da 12ª Dinastia, o que informa que desde a 5ª Dinastia foi reescrito pelos
escribas como uma fonte importante a respeito da arte em que a destreza (perfeita) está
sempre por ser conquistada – a filosofia. Ptahhotep trabalhou e escreveu sobre rekhet
durante o reinado do Faraó Isési entre 2414 a 2375 A.E.C. Dentre nossas pesquisas,
Ensinamentos de Ptahhotep é um dos textos mais antigos que trata de filosofia. Sem dúvida,
essas informações podem criar um fértil debate, ajudando a tecer outras compreensões
sobre a filosofia em sua longa história. O que nos interessa é justamente acrescentar mais
elementos ao diálogo filosófico, enriquecendo o debate e reconhecendo que, quiçá, possam
existir mais semelhanças entre os primeiros textos africanos e os ocidentais – escritos
milênios depois. Com efeito, se o nosso alvo era uma definição, pelo menos preliminar e
sumária, de filosofia a partir da tradição kemética – o que aqui fazemos assentados no
pensamento de Ptahhotep –, podemos ficar com a seguinte: “filosofia é saber que a arte de
buscar a palavra perfeita, reflexo do conhecimento de si e do mundo, está sempre por
fazer”.

a balança (e o debate acerca) da verdade


Como mensurar essa expressão “palavra perfeita”? Esse conceito deve ser
entendido como resultado de uma laboriosa investigação sobre si e o mundo, nós temos
aqui outra questão: a medida da verdade. O que torna uma palavra perfeita? Como “pesar”
a verdade? Nesse quesito O livro do vir à luz do dia erradamente traduzido como O livro dos
mortos nos ajuda bastante a compreender o assunto. O filósofo Maulana Karenga fez uma
bela tradução bilíngue em 1990, em seu trabalho originalmente intitulado The Book coming
forth by day (1990) encontramos a cosmovisão de Maat, a deusa que controla e gere a
balança da verdade. Maat é um termo que circunscreve as noções de: verdade, harmonia,
justiça, equilíbrio. A narrativa do mito é bem interessante. Na cosmovisão egípcia, ela é
casada com Thot, deus do conhecimento, o inventor da escrita. Maat é responsável pela
balança que decide o caminho de uma pessoa depois da morte. A balança de Maat mensura
o coração – sede do pensamento, caráter e emoções – com a pena do pássaro íbis. O
coração deve ser leve, o destino dos corações pesados é ruim e desastroso. Num outro
registro, Maat traz a verdade como fiel de sua balança. O filósofo deve pesar suas palavras
nessa balança, se a “palavra perfeita” é algo que a filosofia não cansa de buscar, a balança
de Maat deve ser sempre requisitada. Ora, a balança de Maat é uma menção explícita à
ideia de critério de julgamento, o juízo que separa as palavras leves e verdadeiras das falsas.
Uma recomendação para o exercício da filosofia, um plano que busca o conhecimento de si
e do mundo, aparece no Capítulo 10 dos escritos de Amenemope, “Não separes teu coração
filosofia
filosofia africana
africana na
na antiguidade:
antiguidade: tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre ancestralidade
ancestralidade ee futuridade
futuridade || 199
199

de tua língua, para que teus planos sejam bem-sucedidos” (AMENEMOPE, 2000, p. 270).
Na cultura egípcia, o pensamento é um atributo do coração, por isso a língua, isto é, as
palavras lhe devem fidelidade. Ora, pensamos com o coração e as palavras que dele saem
são como pinturas. Aqui temos diversos elementos que merecem vagar. Primeiro, dizer
que pensar é uma atividade do coração traz uma compreensão de que pensar reúne lógica,
emoções e o caráter da pessoa.
Na cultura egípcia, o pensamento (sixer) é um plano, por assim dizer, uma
estratégia para encontrar consigo e com o mundo. As palavras que brotam do coração são
como “pinturas”, isto é, devem obedecer à lei da frontalidade. Aqui vale introduzir um
debate acerca da produção artística; ainda que o escopo desse trabalho não seja um estudo
sobre artes egípcias, contudo não podemos deixar de fazer uma ligeiríssima digressão a
respeito da pintura num único aspecto. Conforme, as pinturas no Egito antigo obedeciam
um conjuntos de regras denominadas de frontalismo ou lei da frontalidade. Ora, tudo que
sai do coração depois do plano de encontrar a si e o mundo deve estar dentro do
frontalismo, o crivo da verdade que está presente na balança de Maat, para que possamos
avalizar a verdade. Por frontalismo se deve entender um conjunto de regras que essa “lei
determinava que o tronco da pessoa fosse representado sempre de frente, enquanto sua
cabeça, suas pernas e seus pés eram sempre vistos de perfil” (PROENÇA, 2012, p. 19). Aqui
não cabem considerações nas áreas da estética e filosofia da arte, basta dizer que artistas do
Egito antigo queriam colocar diversos pontos de vista num só plano. Numa analogia com a
expressão conceitual de “medida da verdade” que está sob nosso exame, pode-se dizer o
seguinte. A partir da necessidade de conjugação de pontos de vista distintos num só plano
que se instala a verdade como princípio e critério. A palavra “verdade” (Maat) se aproxima
de “ver” (maa). Pois bem, verdade é o nome da deusa e nos revela justamente a perspectiva
de reunião de pontos de vistas distintos num só plano. Em outros termos, a verdade é um
tipo de juízo que coloca pelo menos duas perspectivas na balança. Assim sendo, vamos
retomar o trecho de Amenemope que diz: “Não separes teu coração de tua língua, para que
teus planos sejam bem-sucedidos” (AMENEMOPE, 2000, p. 270). Como as palavras (aqui
entendidas como “língua”) podem ser fiéis ao pensamento proveniente do coração? Ora,
apoiados nos textos egípcios, o exercício filosófico consiste numa “pintura” de vários
pontos de vista, reunindo-os em seus aspectos mais relevantes. Por exemplo, conforme o
frontalismo (ou lei da frontalidade), a pintura egípcia coloca o tronco e o olho na posição
frontal que ajuda a ver (maa) com mais extensão o corpo. A visão de perfil aumenta a
compreensão do rosto. Dito de outro modo, a pintura precisa trazer dois pontos de vistas
simultaneamente que ampliem a maior quantidade de informações possíveis a respeito da
figura. O que significa que a lei da frontalidade aplicada à filosofia indica um tipo de
combinação em favor de tornar a visão geral mais ampla, conciliando perspectivas
diversas.
Pois bem, considerando a tradição filosófica kemética, podenos denominamos de
verdade: a reunião harmoniosa de pontos de vistas diferentes, o equilíbrio entre “pesos”
diferentes. Neste ponto, voltemos aos escritos de Ptahhotep que reconhece o diálogo como
uma ferramenta importante na busca da verdade. O filósofo percebe a existência de
contendas e traz um modelo para as pessoas entrarem em discussão acerca das palavras
perfeitas. Além de Ptahhotep, outro filósofo egípcio exalta o debate. Merikare (2000) diz:
“Sê um artesão da palavra e vencerá, (pois) a língua é a espada (de um nobre): as palavras
têm mais força que qualquer combate, o de coração destro não é vencido” (MERIKARE,
2000, p.283-284). Nossa interpretação sobre os ensinamentos de Ptahhotep identifica três
classes de recomendações para o debate, sugerindo uma conduta adequada para cada tipo
de contenda. Ptahhotep diz que em relação ao contendor podem existir três tipos de
pessoas. 1ª) As que têm uma balança mais precisa, “superiores”; 2ª) As que têm balança tão
200|
200| renato
renato noguera
noguera

precisa quanto a nossa, “iguais”; 3ª) As que têm balança menos precisa, “inferiores”. Pois
bem, Ptahhotep está a nos dizer com estes tipos algo muito interessante. De acordo com a
destreza de pensamento de cada pessoa, podemos diferenciar e classificar as pessoas entre
às que têm: juízo preciso, juízo razoável e juízo impreciso. Por juízo preciso e bem ajustado
se deve tomar a balança que tem o peso-padrão e o seu fiel bem ajustados, em harmonia e
justo funcionamento. A partir das leituras dos filósofos Ptahhotep (2000), Amenemope
(2000), Merikare (2000), Amenenhat I (2000) e de comentadores como Asante (2000),
Obenga (1992; 2004) e Carreira (1994) , definimos que o exercício do debate filosófico em
busca da verdade envolve a balança e seus elementos, o peso-padrão e o fiel da balança. O
peso-padrão do filósofo está em seu coração, o fiel da balança é a capacidade de navegar
pelas águas da ignorância, mantendo o prumo, sem deixar-se afogar em suas profundezas.
Neste sentido, filosofar é uma atividade que exige a escuta do coração, o reconhecimento
da ignorância e de alguma maneira o ato de educar.

a barca e o ato de educar


Nos escritos de Amenemope (2000) podemos localizar várias menções ao barco
numa travessia. Ao longo dos seus trinta capítulos, o filósofo traz uma perspectiva que
merece atenção, o conceito de barca tem lugar especial.

A
A transliteração
transliteração do
do hieróglifo
hieróglifo [barca]
[barca] éé dpt,
dpt, éé importante
importante observar
observar

que
que [experimentar]
[experimentar] transliterado
transliterado como
como dp dp significa
significa degustar
degustar ee
experimentar.
experimentar. Neste
Neste sentido,
sentido, oo termotermo barca
barca circunscreve
circunscreve ideias
ideias como
como
experimentar,
experimentar, degustar,
degustar, testar
testar oo gosto
gosto ee participar
participar de de uma
uma experiência
experiência queque não
não
seja
seja ordinária.
ordinária. AA barca
barca carrega
carrega aa ideia
ideia de
de que
que aa travessia
travessia éé uma
uma experimentação.
experimentação.
Ou
Ou ainda,
ainda, aa possibilidade
possibilidade fazer
fazer um
um novo
novo caminho,
caminho, ou ou ainda,
ainda, percorrer
percorrer oo mesmo
mesmo
destino
destino para
para compreender,
compreender, aprender
aprender ee ensinar.
ensinar. No
No capítulo
capítulo 29,
29, podemos
podemos ler ler “Não
“Não
impeças
impeças asas pessoas
pessoas de
de atravessarem
atravessarem oo rio rio se
se tens
tens cabine
cabine emem tua
tua barca.
barca. Quando
Quando te te
derem
derem umum remo
remo emem meio
meio às às águas
águas profundas,
profundas, estende
estende teus
teus braços
braços ee pega-o”
pega-o”
(AMENEMOPE,
(AMENEMOPE, 2000, 2000, p.279-280).
p.279-280). Amenemope
Amenemope está está dizendo
dizendo bem
bem algoalgo bem
bem
simples:
simples: asas pessoas
pessoas habilitadas
habilitadas na na arte
arte da
da palavra
palavra nãonão podem
podem se se esquivar
esquivar de de
ensinar
ensinar aa usar
usar aa barca
barca queque atravessa
atravessa as as tormentas
tormentas de de dúvidas
dúvidas ee falta
falta de
de
discernimento.
discernimento. A A barca
barca éé aa experimentação
experimentação do do discernimento.
discernimento. A A pessoa
pessoa queque tem
tem
lugar
lugar na
na cabine
cabine de
de sua
sua barca
barca tem
tem aa tarefa
tarefa de
de educar
educar osos que
que não
não têmtêm barca
barca
(NOGUERA,
(NOGUERA, 2013, 2013, p.
p. 149).
149).
A travessia pelo rio da ignorância deve ser enfrentada pelo filósofo sem recuo, de
modo persistente, assumindo o remo da barca. Os que sabem que não sabem, reconhecem
os limites do seu conhecimento, têm um dever: oferecer um espaço na sua barca. O que
pode ser entendido como apoiar com alguma estratégia, plano ou método. Neste ponto,
encontramos a barca, muito ligada à filosofia. Educar em egípcio antigo tem a
transliteração Sdi, o hieróglifo tem um homem com um bastão na mão. No entanto, trata-
se menos de um recurso de força do que uma orientação para que as pessoas que estão
aprendendo não se assustem com a travessia.
“Não movas as escalas nem falsifiques os pesos ou diminua as frações da medida”
(AMENEMOPE, 2000, p. 273). O filósofo nos convida para examinar o coração e toma-lo
como peso-padrão da verdade. Nossa leitura é de que esta é a condição prévia para ceder
cabine na barca. O filósofo está junto do seu coração. Por isso, o filósofo pode atravessar
rios perigosos e remar sem recuar diante do temor que as águas profundas inspiram. Ora,
educar é justamente convidar para atravessar o rio; mas, enganam-se os que acreditam que
o aprendizado é sobre o rio e a qualidade da barca. Ainda que seja necessário conhecer a
barca, saber remar e ter uma noção sobre o rio. A primeira medida está na escuta do
próprio coração – habitat do pensamento, das emoções e do caráter.
filosofia
filosofia africana
africana na
na antiguidade:
antiguidade: tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre ancestralidade
ancestralidade ee futuridade
futuridade || 201
201

conclusões parciais: tecendo ancestralidade e futuridade


De qualquer modo, este texto (inconcluso) é um convite para a leitura e releitura
dos textos africanos originais. Um encaminhamento para pensarmos dois conceitos,
ancestralidade e futuridade na encruzilhada da filosofia e da educação. O que a filosofia
africana na antiguidade pode nos dizer a respeito de educar e das relações entre
ancestralidade e futuridade? Primeiro, cabe registrar que uma característica muito
importante na cultura africana – aqui entendida como paradigma que ultrapassa o ocidente
– está na perspectiva de que “vivo” não é antônimo de “morto”. Os estudos pan-
africanistas nos ensinam algo muito importante, as pessoas “mortas” adentram a categoria
da ancestralidade – parte integrante da comunidade. As que estão para nascer, as não
nascidas e que virão ao mundo em algum momento também fazem parte da comunidade.
Nós concordamos com a ideia de que a “cultura negra é uma cultura das encruzilhadas”
(MARTINS, 1997, p. 26). A cultura africana, aqui entendida como sinônimo de cultura
negra, está sempre em cruzamentos e entrecruzamentos, articulando-se, reinventando-se,
combinando-se com outros elementos por seu seu caráter xenófilo. Em certa medida, a
encruzilhada é um exercício de tessitura, “pontos “pontos de de encontro”,
encontro”, isto
isto é,
é, “intersecções,
“intersecções,
inscrições e disjunções, fusões e transformações,
transformações, confluências
confluências e desvios, rupturas e
relações, divergências, multiplicidade, origens e disseminações”
disseminações” (Idem,
(Idem, p. 25).
Pois bem, entendendo ancestralidade
ancestralidade como as gerações passadas que vivem através
de seus relatos, experiências e pensamentos. Por futuridade, as gerações que virão. Ora, o
encontro entre ancestralidade e futuridade se dá na revitalização do presente como
território guardião do que foi e do que virá. A partir dessas considerações, a filosofia
africana na antiguidade não é somente um legado do passado; mas, uma atualidade
necessária à futuridade. Pelas seguintes razões, existiria um ato africano de educar inscrito
na ideia de faraga. Ora, faraga no idioma bambara pode ser traduzido como (viver a)
diáspora. O que interpretamos como uma condição da experiência humana fundamental
para filosofar. A filosofia é justamente um deslocamento, um exercício de sair do lugar
seguro, um abandono do território doméstico, lançando-se no mundo estrangeiro. Como
anunciado no início, este escrito inspirado (e dedicado) a Wilson, griot de ascendência
bambara que ocupa a terra da ancestralidade desde 1993 é um preâmbulo em busca de
reafricanizar a filosofia e o ato de educar num mundo ainda tão encarcerado na
monorracionalidade da modernidade ocidental. Wilson nada escreveu, frequentou a escola
por quatro anos. No entanto, sua formação djeli/griot só poderia ser comparada ao título
de doutor seguido de um pós-doutorado. Uma formação de 21 anos aprendendo histórias.
Por isso, encerramos com uma delas.
Certa vez que um rei, inspirado divinamente, precisou decidir quem era a pessoa mais sábia
de seu reino. Ele passou a mesma tarefa para 13 mulheres e 13 homens. No fim um um homem
homem conseguiu
conseguiu
realizar a tarefa até o fim. A tarefa dividida em duas partes consistia em cozinhar cozinhar aa melhor
melhor comida
comida
do mundo e, em seguida, a pior comida do mundo. O homem que foi sagrado o mais sábio preparou
língua de touro com inhame no quesito, melhor comida do mundo. O rei banqueteou-se e sorriu com
gosto. Na hora seguinte, o homem trouxe outro prato. Mas, era língua de touro com inhame. O rei
comeu a contragosto, porque o odor, assim como o sabor, estava terrível. Chamado às explicações, o
homem disse: “´Com a língua, agradecemos a chuva que refresca. Com a língua, maldizemos a
chuva que não para e inunda nossas casas. Com a língua, elogiamos; com a língua, xingamos. Com a
língua, reclamamos; mas, com ela: agradecemos”. Encantado, o rei disse: você é o homem mais sábio
do reino. O homem respondeu:
-- Eu
Eu não
não sou
sou oo mais
mais sábio;
sábio; mas,
mas, posso
posso ser
ser oo que
que mais
mais gosta
gosta de
de saber.
saber. Por
Por isso,
isso, sei
sei que
que oo sabor,
sabor,
seja
seja bom
bom ouou ruim,
ruim, se
se experimenta
experimenta ee antes
antes de
de provar,
provar, nada
nada éé sabido.
sabido. Ainda
Ainda assim,
assim, mesmo
mesmo depois
depois da da
prova,
prova, oo gosto
gosto das
das coisas
coisas podem
podem mudar.
mudar. Basta
Basta lembrar
lembrar da da língua
língua dede touro
touro com
com inhame.
inhame. Por
Por isso,
isso, aa
sabedoria
sabedoria éé uma
uma arte
arte de
de cozinhar
cozinhar ee provar
provar tanto
tanto oo cru
cru quanto
quanto oo cozido.
cozido. Uma
Uma arte
arte de
de provar
provar todo
todo dia
dia
202|
202| renato
renato noguera
noguera

o mesmo prato ou pratos diferentes. Eu só serei sábio quando provar todos os pratos, conhecer todos
os sabores. Eu vou permanecer cozinhando e provando, testando temperos e iguarias. Porque a
sabedoria é como o sabor da comida: depende da língua, do tempero, da fome e do cozinheiro. Ela
nunca é perfeita em tudo, sempre pode melhorar.

referências
AMENEMOPE.
AMENEMOPE. EnsinamentosEnsinamentos de de Amenemope.
Amenemope. ARAÚJO, ARAÚJO, Emanuel. Emanuel. Escrito
Escrito para
para aa eternidade:
eternidade: aa
literatura
literatura no
no Egito
Egito faraônico.
faraônico. Brasília:
Brasília: Editora
Editora da da Universidade
Universidade de de Brasília:
Brasília: São
São Paulo:
Paulo: Imprensa
Imprensa
Oficial
Oficial dodo Estado,
Estado, 2000,
2000, p.260-280.
p.260-280.
ASANTE,
ASANTE, Molefi.
Molefi. TheThe Egyptian
Egyptian philosophers:
philosophers: ancient
ancient African
African voices
voices from
from Imhotep
Imhotep to to Akhenaten.
Akhenaten. Illinois:
Illinois:
African
African American
American images,
images, 2000.2000.
BBC, Documentary.
BBC, Documentary. Chapter
Chapter 66 –– The The Secrets
Secrets ofof the
the Hieroglyphs
Hieroglyphs (no (no Brasil:
Brasil: Capítulo
Capítulo 66 –– O O Segredo
Segredo dos dos
Hieróglifos).
Hieróglifos).
CARREIRA,
CARREIRA, José. José. Filosofia
Filosofia Antes
Antes dos dos Gregos.
Gregos. Mem
Mem Martins:
Martins: Publicações
Publicações Europa-América,
Europa-América, 1994. 1994.
DAVIES,
DAVIES, Normam;
Normam; GRIFFITH,
GRIFFITH, Francis. Francis. TheThe mastaba
mastaba of of Ptahhotep
Ptahhotep andand Akhethetep,
Akhethetep, vol.
vol. I:I: the
the chapel
chapel of
of
Ptahhotep
Ptahhotep andand the
the hieroglyphics.
hieroglyphics. Londres:
Londres: Egypt
Egypt Exploration
Exploration Fund.,
Fund., 1975.
1975.
DIOP,
DIOP, Cheikh
Cheikh Anta.
Anta. Antériorité
Antériorité des des civilisations
civilisations nègres
nègres :: mythe
mythe ou ou vérité
vérité historique?.
historique?. Paris:
Paris: Présence
Présence
Africaine,
Africaine, 1967.
1967.
______.
______. Nations
Nations nègres
nègres et
et culture,
culture, t.t. i,i, Paris:
Paris: Présence
Présence africaine,
africaine, 1954.
1954.
______.
______. Parenté
Parenté génétique
génétique dede l’égyptien
l’égyptien pharaonique
pharaonique et et des
des langues
langues négro-africaines.
négro-africaines. Paris:
Paris: IFAN/NEA,
IFAN/NEA, 1977. 1977.
JAMES.
JAMES. George.
George. Stolen
Stolen legacy.
legacy. Trenton:
Trenton: AfricaAfrica World
World Press,
Press, 2013.
2013.
EGGERS,
EGGERS, Natasha
Natasha de de Andrade.
Andrade. O O antigo
antigo Egito
Egito ee oo imperialismo
imperialismo britânico
britânico no
no século
século XIX:
XIX: as as descobertas
descobertas dodo
antiquarista Giovanni
antiquarista Giovanni Belzoni.
Belzoni. Curitiba:
Curitiba: Universidade
Universidade Federal Federal do do Paraná.
Paraná. Monografia.
Monografia.
Bacharelado
Bacharelado em em História,
História, 2013. 2013.
FOÉ,
FOÉ, Nkolo.
Nkolo. África
África em em diálogo,
diálogo, África
África em em autoquestionamento:
autoquestionamento: universalismo
universalismo ou ou provincialismo?
provincialismo?
‘Acomodação
‘Acomodação de de Atlanta’
Atlanta’ ou ou iniciativa
iniciativa histórica?.
histórica?. Educar
Educar em em Revista,
Revista, Curitiba,
Curitiba, Brasil,
Brasil, Editora
Editora
UFPR, n.
UFPR, n. 47,
47, p.
p. 175-228,
175-228, jan./mar.
jan./mar. 2013.2013.
KARENGA, Maulana.
KARENGA, Maulana. Maat,Maat, thethe Moral
Moral Ideal
Ideal inin Ancient
Ancient Egypt:
Egypt: anan study
study inin classical
classical african
african ethics.
ethics. New
New
York:
York: Routledge
Routledge Press,
Press, 2004.
2004.
KI-ZERBO,
KI-ZERBO, Joseph.
Joseph. História
História geral
geral da da África,
África, I:I: Metodologia
Metodologia ee pré-história
pré-história da da África.
África. 2.ed.
2.ed. rev.
rev. Brasília
Brasília ::
UNESCO,
UNESCO, 2010. 2010.
MARTINS,
MARTINS, Leda Leda Maria.
Maria. Afrografias
Afrografias da da memória:
memória: oo reinado
reinado dodo rosário
rosário nono Jatobá.
Jatobá. São
São Paulo:
Paulo: Perspectiva;
Perspectiva;
Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Mazza
Mazza Edições,
Edições, 1997.
1997.
MERIKARE.
MERIKARE. Ensinamentos
Ensinamentos de de Merikare.
Merikare. In: In: ARAÚDO,
ARAÚDO, Emanuel Emanuel (trad.).
(trad.). Escrito
Escrito para
para aa eternidade:
eternidade: aa
literatura
literatura no
no Egito
Egito faraônico.
faraônico. Brasília:
Brasília: Editora
Editora da da Universidade
Universidade de de Brasília,
Brasília, 2000.
2000.
MONGA,
MONGA, Célestin.
Célestin. Niilismo
Niilismo ee negritude.
negritude. Tradução
Tradução Estela Estela dosdos Santos
Santos Abreu.
Abreu. São São Paulo:
Paulo: Martins
Martins
Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2010.
2010.
NOGUERA,
NOGUERA, Renato. Renato. Amenemope,
Amenemope, oo coração coração ee aa filosofia,
filosofia, ou,ou, aa cardiografia
cardiografia (do (do pensamento).
pensamento). In In
BRANCAGLION
BRANCAGLION JR., JR., Antônio;
Antônio; SANTOS,
SANTOS, RAIZZA RAIZZA (org). (org). Semna
Semna –– Estudos
Estudos dede Egiptologia.
Egiptologia. Rio Rio
de
de Janeiro:
Janeiro: Seshat
Seshat –– Laboratório
Laboratório de de Egiptologia
Egiptologia do do Museu
Museu Nacional,
Nacional, 2015.
2015.
NOGUERA,
NOGUERA, Renato. Renato. Ensino
Ensino de de Filosofia
Filosofia ee aa Lei
Lei 10639.
10639. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Pallas,
Pallas, 2014.
2014.
NOGUERA,
NOGUERA, Renato. Renato. A A ética
ética dada serenidade:
serenidade: oo caminho
caminho da da barca
barca ee aa medida
medida da da balança
balança nana filosofia
filosofia de
de
Amenemope.
Amenemope. Ensaios Ensaios Filosóficos
Filosóficos Volume
Volume VIII,
VIII, p. p. 139-155,
139-155, 2013
2013
OBENGA,
OBENGA, Théophile.Egypt:
Théophile.Egypt: Ancient Ancient HistoryHistory of of African
African Philosophy.
Philosophy. In In WIREDU,
WIREDU, Kwasi. Kwasi. A A
companion
companion to to African
African Philosophy.
Philosophy. Oxford:
Oxford: Blackwell
Blackwell Publishing,
Publishing, p. p. 31-49,
31-49, 2004.
2004.
OBENGA,
OBENGA, Théophile.
Théophile. Ancient
Ancient Egypt
Egypt and and Black
Black Africa.
Africa. Chicago,
Chicago, IL: IL: Karnak
Karnak House,
House, 1992.
1992.
OBENGA,
OBENGA, Théophile.
Théophile. La La philosophie
philosophie africaine
africaine de de la la période
période pharaonique
pharaonique (2780-330
(2780-330 a. a. C.).C.). Paris:
Paris:
L’Harmattan,
L’Harmattan, 1990. 1990.
OBENGA,
OBENGA, Théophile.
Théophile. L’Égypte,
L’Égypte, la la Grèce
Grèce et
et l’École
l’École d’Alexandrie.
d’Alexandrie. Paris:
Paris: L’Harmattan,
L’Harmattan, 2005. 2005.
PROENÇA,
PROENÇA, Graça. Graça. Historia
Historia da da Arte.
Arte. 17.ed.
17.ed. São
São Paulo:
Paulo: Ática,
Ática, 2012.
2012.
PTAHHOTEP.
PTAHHOTEP. “Ensinamentos
“Ensinamentos de de Ptahhotep”.
Ptahhotep”. In: In: ARAÚJO,
ARAÚJO, Emanuel.Emanuel. Escrito
Escrito para
para aa eternidade:
eternidade: aa
literatura
literatura no
no Egito
Egito faraônico.
faraônico. Brasília:
Brasília: Editora
Editora da da Universidade
Universidade de de Brasília:
Brasília: São
São Paulo:
Paulo: Imprensa
Imprensa
Oficial
Oficial dodo Estado,
Estado, 2000,
2000, p.p. 244-259.
244-259.
203
203

tecendo mundos entre uma educação antirracista e


filosofias afro-diaspóricas da educação

wanderson flor do nascimento11

situando a tessitura...

P or que se demanda institucionalmente a presença da prática da filosofia nas


escolas? Por que aprender filosofia quando estudamos na educação básica? Se
recorrermos aos documentos oficiais – como os Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio e as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio – essas questões são respondidas em torno de expressões como "formação para o
exercício da cidadania", "interdisciplinaridade", "reflexão", "crítica", "sensibilidade",
"identidade autônoma", "participação democrática", "problematização", "tradição
filosófica", "visão de conjunto", "debate público sobre a vida comum" (BRASIL, 2002),
"desenvolvimento do educando", "centralidade da história da filosofia", "sopesar os
conceitos", "discurso consciente" (BRASIL, 2006) entre outras ideias que dão um certo
contorno institucional e que evocam certas imagens acerca do que seria um horizonte
possível de definir o que seja a filosofia.
Em um cenário no qual parece importante situar a prática da filosofia nas escolas
frente às expectativas políticas da em torno da presença dos conhecimentos e das
atividades filosóficas nos currículos, enfrentar a necessidade de observar o contexto
brasileiro e os elementos culturais que compõem a identidade nacional é fundamental,
embora não possamos afirmar que as demandas institucionais definam todo o sentido da
presença da filosofia nas escolas.
Quando, em 2003, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) é
modificada pela lei federal 10.639, que nela introduz o artigo 26-A, demandando que nos
currículos dos ensinos fundamental e médio estejam presentes, em todos os seus
componentes, elementos da história e cultura africana e afro-brasileira, está se
respondendo a uma reivindicação dos movimentos sociais em criar condições de
visibilidade e valorização desse que é um dos elementos fundadores da identidade
brasileira, a saber as heranças que temos do continente africano.
Tendo em vista que a participação da filosofia no cumprimento dessa dimensão
legal implica em um resgate das filosofias africanas, poderíamos recolocar as questões
iniciais em outros termos: para que estudamos (ou deveríamos estudar) a filosofia africana
no Brasil? Quais alcances poderiam haver no contato com esse modo de pensar pouco
conhecido no ocidente e, em especial, entre nós? O horizonte dessas questões não pode
contornar que o sentido da alteração da LDB em 2003 se devia à busca de um certo tipo de
educação que enfrentasse o racismo que impactou e impacta a história de nosso país,
sobretudo em uma das suas facetas mais nefastas que apaga os modos de pensar e produzir
conhecimentos advindos do continente africano e de suas/seus descendentes na diáspora.
E nesse cenário, precisamos pensar que para além de procurar responder de modo
decisivo a essas perguntas, importa notar que a dimensão metafilosófica que aparece nesse
contexto aparece buscada, demandada por essa problemática identitária que está em jogo
na procura de uma educação antirracista; assim, não é tanto o que seja a filosofia africana
em si que importa, mas de que modo ela nos aparece para nós, brasileiras/os que pouco
sabemos de nossas heranças africanas. Desta maneira, as questões "O que é a filosofia?" e,

11 Universidade
Universidade de
de Brasília
Brasília –– UNB.
UNB. Email:
Email: wandersonn@gmail.com
wandersonn@gmail.com
204|
204| wanderson
wanderson flor
flor do
do nascimento
nascimento

mais especificamente, "O que é a filosofia africana?" ganham contornos em um determinado


contexto, associadas com a proposta de uma desconstrução de uma certa faceta do racismo e,
consequentemente, com a estruturação de outra política do conhecimento e do pensamento
assim como, também, relacionadas com um o debate sobre os processos de subjetivação,
em torno da trajetória histórica que fez e faz com que chegássemos a ser o que hoje somos.
Ou seja, para o que me interessa discutir aqui, é a nossa relação com nossas heranças
africanas ou, ainda, nosso desejo de herdar, que orienta uma busca de compreensão sobre o
estudo de uma filosofia africana e seus lugares na educação brasileira. Há, nesse cenário,
uma velha discussão metafilosófica que se pergunta se a filosofia conhece a geografia, ou,
dizendo de outro modo, se faz sentido pensar em uma filosofia agregada a ou emanada de
um lugar. Muito do que se diz é que o caráter “universal” da filosofia recusaria fronteiras
geográficas, mas, curiosamente, esse argumento só serve para desqualificar a filosofia
africana como filosofia e não uma “filosofia francesa”, uma “filosofia alemã”, uma
“filosofia inglesa”.
Em que pese saber que a África não é um país, penso que, muitas vezes, o nome
filosofia aparece como um significante "supostamente" sem importância frente à ideia de
pensamento, mas que quando há a disputa pelo pensamento 'sofisticado' ela se sobressai
como o grande produto intelectual do humanismo ocidental e, por isso, o que está em jogo
não é apenas a classificação de uma experiência de pensamento, mas o prestígio de quem
tem a capacidade de pensar de modo rigoroso e acurado, típico dos humanos ilustrados. Por
isso concordo com as abordagens de Severino Ngoenha (2011) e Mogobe Ramose (2011),
para quem a disputa pela filosofia africana é, de modo geral, a disputa final pela
humanidade das pessoas africanas.
Como a perspectiva do humanismo ocidental resolveu que apenas as civilizações
superiores seriam capazes de exercer um pensamento sofisticado chamado de filosofia,
podemos, ao menos em um nível estratégico, buscar a afirmação da existência da filosofia
africana, seja em África, seja na diáspora. Ampliar os contextos históricos que significam a
própria palavra filosofia implica em revisar o etnocentrismo e o racismo que construíram a
história moderna das práticas filosóficas e nos colocarmos na busca de novos sentidos para
as atividades superiores do pensamento, encontradas em qualquer povo humano que
pondere sobre sua própria situação no mundo. Esta discussão – vinculada aos históricos de
humanização e desumanização de populações nas tramas coloniais –, portanto, coloca em
jogo a legitimidade de um pensamento e não a identidade de uma prática do pensar.
Ao lembrarmos que é nesse contexto desumanizado que as culturas africanas
entram em contato com o nosso país, torna-se necessário retomar, sob outras perspectivas,
a importância do pensar e do filosofar africano que herdamos (ou esquecemos que
herdamos). Isso implica em propor uma reconstrução identitária, que passe pelo
reconhecimento dos mecanismos históricos e políticos que apagaram as presenças
africanas na construção de nosso país, para além da força de trabalho e das contribuições
“folclóricas”. Esta foi e tem sido uma das principais reivindicações dos movimentos negros
em nosso país: se temos um real interesse em saber quem somos, é imprescindível assumir
que parte fundamental de nossas heranças – embora apagadas, obliteradas – é advinda de
ancestrais negras/os africanas/os. É nesse contexto que buscamos a afirmação de
Souleymane Bachir Diagne (2006, p. 5) quando nos recorda que um aspecto fundamental
da filosofia em África é "sua preocupação com a identidade", algo que herdamos também
aqui na busca pela compreensão pela presença de tal filosofia em nosso fazer educativo e
currículos. Porém, não é o caso de que esta abordagem da identidade a evoque como
substância ou essência, mas como movimentos múltiplos e complexos da constituição das
nossas imagens de si, relacionados com processos de agenciamentos históricos e políticos
que findam por visibilizar ou ocultar os elementos destas imagens.
tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre uma
uma educação
educação antirracista
antirracista ee filosofias
filosofias afro-diaspóricas
afro-diaspóricas da
da educação
educação || 205
205

dos legados africanos às presenças afro-brasileiras em busca da filosofia


O contexto desta busca pela filosofia africana é, então, o das demandas trazidas
pelos movimentos antirracistas na educação, ou ainda, aquele que conforma propostas de
uma educação antirracista, que se projeta, no que aqui nos interessa, na determinação do
trabalho com a história e cultura africana e afro-brasileira nos currículos, como estratégia
que promova outras visibilidades - para além da que fora subalternizada - da presença dos
povos africanos em nosso país e, com isso, colaborar com o busca de liberação da cultura
escolar das ainda renitentes amarras coloniais. Parto da pressuposição de que não basta só
inserir sobre a história e a cultura africana como meios de ampliação da erudição
curricular: é preciso que adotemos outras posturas, outras relações com os conhecimentos
que perpassam os currículos, no momento em que inserimos estes outros elementos. É
preciso narrar outras essas histórias, de outras maneiras, com o objetivo de descolonizar
nosso modo de ver nossa própria identidade, para descolonizar nossas subjetividades,
nossas relações conosco mesmas/os, com o mundo e com as outras pessoas (FLOR DO
NASCIMENTO, 2014/2015).
No que tange à nossa discussão aqui, cabe assinalar que o determinado pelo artigo
26-A da LDB afirma, além da necessidade da presença dos conteúdos antes mencionados,
um sentido político que se expresse nas posturas pedagógicas e na concepção de educação
que orientaria a proposta da modificação da LDB. Esse horizonte político é explicitado
pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para
o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana: o enfrentamento ao racismo,
insistindo na necessidade de que se assuma outra maneira de encarar a educação,
acolhendo e promovendo outros olhares sobre os processos de formativos, sobre os modos
de ensinar e aprender, sobre nossas identidades e sobre como nos relacionamos com nossa
história (BRASIL, 2004).
Essa aposta na construção de uma educação antirracista nos coloca sempre diante da
necessidade de um cuidado com as armadilhas racistas que foram construídas ao longo da
história brasileira do ensino das imagens de pessoas africanas e suas descendentes. Uma
das bases do nosso racismo consiste em construir imagens diminuidoras e estereotipadas
das pessoas africanas que foram escravizadas, reduzindo-as à função de escravo/coisa,
refletindo o que Achile Mbembe (2014, p. 12) destaca sobre em relação ao tráfico atlântico
em que "homens e mulheres originários de África foram transformados em
homens[/mulheres]-objeto, homens[/mulheres]-mercadoria e homens[/mulheres]
moeda".
Tais representações criaram um lastro nos modos como entendemos a identidade
nacional, que fez com que procurássemos nos livrar de tudo o que fizesse referência à
presença das heranças africanas como elemento constitutivo de nossas imagens de nós
mesmas/os, deixando, por vezes, resvalar somente o primitivo, o exótico e o excêntrico.
Na busca de ressignificar essas representações que o contexto político da educação
antirracista afirma outras imagens a serem supostas e construídas por meio de
reconsiderações sobre a história do continente africano e das pessoas africanas, sobretudo
em sua capacidade de pensar, produzir conhecimentos, valores, cultura e filosofia.
Em função da dificuldade em nos livrarmos dessas imagens, torna-se fundamental
que nossas posturas no que diz respeito aos conteúdos curriculares sejam modificadas, pois
apenas a ampliação da erudição curricular não implica, necessariamente, em que nos
livremos dos modos redutores de lidar com as pessoas sobre as quais esses conhecimentos
se referem em termos de referência ou autoria. É fácil nos apegarmos a imagens vinculadas
a uma negação de heranças que consideramos negativas ou inferiores. E se nos
mantivermos vinculados a uma abordagem estereotipadora, inferiorizadora, pouco
adiantará que estudemos uma "história" ou uma "cultura" que não seja a europeia, pois
206|
206| wanderson
wanderson flor
flor do
do nascimento
nascimento

tenderemos a recapturá-las nas armadilhas etnocêntricas que podem resultar tão danosas
quanto a ignorância sobre outras possibilidades históricas acerca do velho continente
negro.
E é neste cenário de valorização das presenças africanas em nosso processo de
construção identitária que a proposta de uma perspectiva da ancestralidade se transforma
em uma interessante e potencializadora abordagem das filosofias africanas no contexto da
educação antirracista, que busque estabelecer outros lugares para as presenças africanas em
nossa história e nossos processos de construção identitária. Se acompanharmos Eduardo
Oliveira (2012), entenderemos que a ancestralidade não deveria ser entendida apenas como
um parentesco consanguíneo ou simbólico, mas como categoria que busca produzir
sentidos para a experiência ética e política, em torno da vida e do pensamento,
estabelecendo, descobrindo, construindo heranças outras, heranças valorizadas
positivamente.
Porém, a ancestralidade não aparece, para Oliveira, como uma ideia que tenha
apenas uma acuidade analítica: atua articulando inexoravelmente a vida e o pensamento,
operando também como vetor que sensibilize o pensamento e os corpos, para que se abram
a esse novo encontro com o "outro", que fora negado por nossa história construída em
ditames coloniais; estruturando para ele espaços, sentidos outros, vivências diversas e,
assim, nos refazendo como sujeitos históricos diferentes. A ancestralidade seria um
"conceito-experiência", que atue como categoria de relação, ligação e inclusão
(OLIVEIRA, 2012, p. 40), em busca de uma nova sociabilidade, aberta e atenta ao que fora
historicamente negado pelas tramas do racismo colonial. Por meio desta abertura, constrói
uma interconexão produtiva entre a ética, a ontologia e a epistemologia, que, partindo de
um horizonte político de reinvenção, seja atenta aos processos de exclusão promovidos
pela colonialidade que forja subjetividades violadoras e violadas em nossa percepção
histórica de quem somos nós.
Desde essa perspectiva, a ancestralidade oferece outras orientações para a educação
brasileira, exigindo uma radical crítica e autocrítica, nos permitindo olhar para a filosofia
africana – e nos olharmos – de outros modos: modos menos racistas, menos sexistas,
menos classistas, menos excludentes, menos reificadores, menos invisibilizadores. Nos
incita a criarmos espaços filosóficos, pedagógicos, éticos, políticos e estéticos outros, que
potencializem a vida e o pensamento, procurando um mundo mais plural, menos violento,
mais acolhedor e que esteja mais disposto a promover encontros. A perspectiva da
ancestralidade favorece (e exige) uma relação encantada com este mundo que, por meio da
modernidade, esvaziou em muito o sentido de nossas existências, reificando-o,
mercantilizando-o (MACHADO, 2014). Este encantamento se mostra como uma abertura
estética para a pluralidade, estabelecendo com elas relações propositivas, construtivas,
criadoras, valorizadoras. Desde essa percepção, podemos ter na filosofia africana abordada
pela perspectiva da ancestralidade, um potencializador ou mediador das proposições
antirracistas em educação que, assim como também podemos propor ou nos engajar na
busca de uma educação que se teça tendo, como parte de seus fios, os valores, saberes e
modos de pensar africanos que nos foram herdados e que insistimos, ainda, em obliterar.

tecendo uma filosofia da educação afro-diaspórica


Pensar em termos de uma proposta de educação antirracista já nos coloca em uma
relação diferente com os conteúdos do que seriam os elementos de uma história, cultura ou
filosofia africanas ou afro-diaspóricas. Sem adentrar nos efeitos de uma identidade
homogeneizada que poderiam ocorrer em função da aplicação geral de um adjetivo
“africanas” a um vasto conjunto de valores, práticas e pensares distintos, podemos
observar que considerar a existência da filosofia africana, e de uma filosofia afro-
tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre uma
uma educação
educação antirracista
antirracista ee filosofias
filosofias afro-diaspóricas
afro-diaspóricas da
da educação
educação || 207
207

diaspórica, já nos coloca frente a uma nova postura em relação aos conteúdos demandados
pela reformulação da LDB em 2003, com o objetivo de enfrentar o racismo nas escolas.
Este primeiro passo nos leva a considerar que mais que os conteúdos em questão, a
relação que com eles estabelecemos define o impacto de nossos contatos com qualquer tipo
de informação disponível em um currículo. E se estamos interessados em uma relação que
valorize positivamente as heranças negras na cultura brasileira, considerar elementos como
a oralidade, a ancestralidade, a gestão coletivista da autoridade e da própria identidade
pessoal, e a relação integrativa com a natureza e o trato xenofílico diante de outras
práticas, culturas e saberes pode ser um bom começo para pensar em uma filosofia afro-
diaspórica da educação que nos auxilie a lidar com esses conteúdos determinados pela lei e
exigidos pelos movimentos antirracistas.
Diante deste cenário, insisto que, no que diz respeito ao Brasil, mais que uma
definição identitária de “filosofia africana”, nos interessa uma noção política de filosofia
afro-diaspórica da educação, uma vez que o que nos interessa, nessa valorização do legado
negro, é menos aquilo que uma filosofia africana seria em si que aquilo que uma filosofia
africana da educação significa para nós, herdeiros de uma diáspora que historicamente nos
vilipendia e apaga as memórias do velho continente negro que nos constituem.
Este movimento não significa que me interessa uma instrumentalização de
qualquer coisa que se possa chamar de filosofia africana para fins de uma execução de um
imperativo legal, mas antes uma criação de sentidos que levem em consideração aspectos
que a história racista/colonial da modernidade nos apresentou como inferiorizados e
indignos de serem considerados em um projeto de desenvolvimento intelectual e
existencial tocado em moldes ocidentais.
Desde essa percepção, encontramos uma imagem de filosofia como um discurso
nômade, em movimento, sem começos ou finais, que não se move desde pensamentos
estáticos ou estáveis e, por isso, tal prática de pensamento romperia com qualquer forma de
prescrição terminológica, mas se apresentaria como um processo livre e criativo
(MONTOYA, 2010, p. 41). Neste sentido, nos interessa um processo de criação que nos
auxilie a atravessar o legado nefasto de nossa história colonial, que não se reconhece em
sua dimensão danosa.

tecendo uma travessia entre filosofias e a educação


Dado que esta criação se dará em solos já contaminados pelo trajeto colonial, a partir do
que criar? Como criar sem reproduzir, mesmo não intencionalmente, o que desejamos nos livrar?
Michel Serres (2015) nos provoca ao dizer que pensar é inventar. Séverine Kodjo-
Grandvaux (2013), por sua vez, ao pensar nas filosofias africanas, nos aguça a seguir nessa
direção, nos incita a nos projetarmos em um porvir, buscando soluções para reparar
situações presentes, herdeiras do passado e refazer o futuro. Para essa tarefa, de pensar
criativamente, é preciso abandonar os fardos que nos levam a vernos a nós mesmos,
enquanto herdeiras/os do continente negro, como impotentes, desconstruindo, à nossa
maneira, as histórias que nos foram contadas sobre nós mesmos e nossas limitações ou
ausências de potências intelectuais. É preciso desacreditar nas determinações ontológicas
(históricas ou naturalizadas) acerca das impossibilidades de nosso pensar.
Um dos caminhos sugeridos por Jean-Godefroy Bidima (2014) para esta tarefa é
retomar a "Palabre", contra a repetição falatória que a modernidade colonial nos legou. La
Palabre, ao contrário dos modos colonizados e repetitivos de expressão, não apenas
representa ideias, mas é parte constitutiva das pessoas. As pessoas são feitas de palavras e,
exatamente por isso, são criadoras, já nos ensinava Hampaté Bâ (2010). Parte do trabalho
de assumir-se como criador pelo pensamento e pela Palabre consiste em agir criticamente
para identificar os momentos nos quais a repetição nos impede de criar e, assim, libertar o
208|
208| wanderson
wanderson flor
flor do
do nascimento
nascimento

pensamento dos lugares comuns, abrindo espaços libertadores. Kodjo-Grandvaux (2013)


recorda que, para várias tradições africanas, esta dimensão da Palabre é profundamente
ética, pois nos obriga a estabelecer uma relação jamais destrutiva ou violenta com o outro,
sob o risco de extinguir o interlocutor, condição necessária para a atuação desse caráter
criador da Palabre. A palavra, para essa perspectiva, pode discordar, tencionar, criticar;
porém, jamais violar. Ela precisa ser respeitosa para que não se extinga ao outro como
interlocutor e, em consequência, a si mesma.
Para atuar de tal modo, a palavra deveria ser utilizada no contexto daquilo que
Bidima (2002, p. 8) chama de Paradigma da Travessia. Bidima (2002, p. 7) nos conta que não
é possível começar o filosofar, assim como estar na vida, sem estarmos inseridos e
enredados pelas histórias que nos cercam, sobre e em torno de quem somos. As mesmas
histórias que nos constituem, nos situam, nos transportam, nos capturam, podem nos
libertar. E, assim, nos diz Bidima em um diálogo com Ernst Bloch:
AA ideia
ideia de
de travessia
travessia conjuga,
conjuga, dede uma
uma só só vez,
vez, as
as possibilidades
possibilidades históricas
históricas existentes
existentes
no
no tecido
tecido social
social ee as as tendências
tendências ee motivações
motivações subjetivas
subjetivas que que empurram
empurram os os atores
atores
históricos
históricos para
para um um outrooutro lugar.
lugar. ÉÉ no no cruzamento
cruzamento da da objetividade
objetividade ee da da
subjetividade
subjetividade que que alguma
alguma coisa
coisa de
de diferente
diferente pode
pode advir.
advir. A A travessia
travessia se se ocupa
ocupa dosdos
devires,
devires, das
das excrescências
excrescências ee das das exuberâncias,
exuberâncias, ela ela diz
diz dede quais
quais plurais
plurais umauma
determinada
determinada história
história éé feita.
feita. Ela
Ela não
não procura
procura nenhuma
nenhuma essência
essência africana,
africana, mas,
mas,
não
não negligenciando
negligenciando as as vicissitudes
vicissitudes da da história,
história, aa travessia
travessia reafirma
reafirma queque “este
“este
mundo
mundo estáestá longe
longe de de ser
ser um
um ordo
ordo sempiternus
sempiternus rerum,
rerum, não
não há há nenhum
nenhum processo
processo semsem
imperfeições,
imperfeições, [este [este mundo]
mundo] não não possui
possui nenhuma
nenhuma aptidão
aptidão em em constituir
constituir umauma
decoração
decoração fechada;
fechada; sem sem cessar
cessar se
se liberam
liberam do do que
que ele
ele se
se tornou
tornou irrupções
irrupções para
para uma
uma
outra
outra possibilidade”.
possibilidade”. Sua Sua relação
relação com com aa memória
memória africana
africana nãonão éé dada ordem
ordem da da
simples
simples evocação,
evocação, ela ela remete
remete ao ao registro
registro dada elaboração,
elaboração, ou ou seja,
seja, essa
essa memória
memória não não
éé feita
feita de
de “lugares”
“lugares” inamovíveis,
inamovíveis, ela ela se
se constitui
constitui por por “lugares
“lugares indicativos”
indicativos” que que
são,
são, de
de fato,
fato, indicadores.
indicadores. Esses
Esses “lugares
“lugares de de memória”
memória” indicam
indicam queque todo
todo “lugar
“lugar dede
memória”
memória” éé um um chamado
chamado ee um um trânsito
trânsito para
para os os “não-lugares
“não-lugares da da memória”.
memória”.
Chamado,
Chamado, primeiro,
primeiro, parapara liberar
liberar nono seio
seio de
de uma
uma memória
memória os os elementos
elementos ainda
ainda nãonão
efetivados
efetivados ee que que estão
estão emem sofrimento,
sofrimento, trânsito,
trânsito, emem segundo
segundo lugar,
lugar, pois
pois todo
todo oo
conteúdo
conteúdo da da memória
memória está está exposto
exposto àà corrosão
corrosão dodo devir.
devir. Contrariamente
Contrariamente às às lógicas
lógicas
da
da identidade
identidade que que articulam
articulam aa memória
memória africana
africana encontrando
encontrando nela nela personagens
personagens
prestigiosos,
prestigiosos, lugares
lugares ee momentos
momentos gloriosos,
gloriosos, aa noção
noção de de travessia
travessia fazfaz da
da memória
memória
“um
“um quadro
quadro mais
mais queque umum conteúdo,
conteúdo, uma uma questão
questão sempre
sempre disponível,
disponível, um um conjunto
conjunto
de
de estratégias,
estratégias, um um ser-aí
ser-aí que
que vale
vale menos
menos porque
porque eleele é,
é, somente
somente porque
porque oo fazemos”
fazemos”
(BIDIMA,
(BIDIMA, 2002, 2002, p.p. 12).
12).
O paradigma da travessia, então, nos convoca a atravessar a história do que apagou e
violou as memórias e presenças das pessoas negras na constituição de nossa história
‘oficial’, sem esquecê-la, para construir algo novo, em movimento, dinâmico, inventivo.
Sem buscar por grandes monumentos do pensar, nos conclama a articular novos devires,
novos vir a ser distintos do que os que já conhecemos nos apagamentos repetitivos e
sucessivos. Estrategicamente aliado a uma construção coletiva de um pensar que nos
reinvente, nos abra outras imagens de nós mesmos, considerando nossas heranças em
memória africanas.
No sentido da travessia, talvez possamos experimentar uma busca entre as várias
facetas das reflexões produzidas no continente africano, que busque fortalecer laços, na
procura de encontros criativos e agregadores. Refiro-me aqui, ao modo de convite, à
perspectiva que uma parte do pensamento bantu tem chamado de ubuntu. O filósofo
africano Mogobe Ramose (1999, p. 49) afirma que ubuntu é a raiz da filosofia africana.
Ramose conta que essa palavra, originária de uma das muitas línguas bantas, é composta
por duas outras: ntu e ubu (1999, p. 50). A primeira, ntu, se referiria ao princípio
fundamental da existência de tudo o que há, ao passo que ubu seria a manifestação
articulada, constante e dinâmica deste mesmo princípio. Ubuntu, portanto, seria a
tecendo
tecendo mundos
mundos entre
entre uma
uma educação
educação antirracista
antirracista ee filosofias
filosofias afro-diaspóricas
afro-diaspóricas da
da educação
educação || 209
209

expressão do princípio fundamental de toda a existência de modo inexoravelmente


interconectado e interdependente, para o qual nada teria sentido ontológico,
epistemológico, ético ou estético se existisse isoladamente.
Desde a perspectiva ubuntu, a existência de tudo o que há se dá de maneira
dinâmica, articulada, coletiva, vinculando todos os existentes. Assim, se existimos
enquanto humanos é porque estamos conectadas/os a todas as outras coisas existentes e,
exatamente por isto, a todo o restante da humanidade, de maneira que o que temos de
humano é sempre interdependente e plural, como plurais são as coisas que compõem o
mundo. Retomando o caráter apontado pela dimensão da Palabre, Ramose aponta para o
fato de que a fala é uma das características fundamentais que expressam a humanidade, o
que ele explicita ao retomar a descrição dos seres humanos como homo loquens, que nesta
perspectiva banta seria nomeada de umuntu: um ser que fala, que coletivamente se
expressa, na relação com outros falantes (lembrando que a fala é sempre uma dimensão
intersubjetiva que se dá no encontro entre falantes e ouvintes), na pluralidade entre
existentes.
Trazendo outros aspectos acerca de ubuntu, as palavras de outro sul-africano,
Desmond Tutu (1999, p. 38), são elucidadoras:
A
A palavra
palavra ubuntu
ubuntu éé muito
muito difícil
difícil de
de traduzir
traduzir para
para uma
uma língua
língua ocidental.
ocidental. Ela
Ela
expressa
expressa oo fato
fato de
de se
se mostrar
mostrar humano.
humano. Quando
Quando queremos
queremos fazer fazer saber
saber tudo
tudo de
de bom
bom
que
que pensamos
pensamos de de alguém,
alguém, dizemos
dizemos "Yu,
"Yu, uu nobuntu",
nobuntu", "Existe:
"Existe: assim
assim ee por
por isso
isso tem
tem
ubuntu"
ubuntu" [...].
[...]. ÉÉ também
também um um modo
modo de de dizer:
dizer: "Minha
"Minha humanidade
humanidade está está
intimamente
intimamente ligada
ligada àà sua"
sua" ou
ou "Nós
"Nós pertencemos
pertencemos ao ao mesmo
mesmo feixe feixe dede vidas."
vidas." Nós
Nós
temos
temos umum princípio:
princípio: "Um"Um serser humano
humano existe
existe apenas
apenas em em relação
relação aa outros
outros seres
seres
humanos.
humanos. Isso
Isso éé bastante
bastante diferente
diferente dodo "penso,
"penso, logo
logo existo".
existo". PeloPelo contrário,
contrário, isso
isso
significa:
significa: "Sou
"Sou humano,
humano, porque
porque sou
sou parte,
parte, participo,
participo, partilho".
partilho". Uma Uma pessoa
pessoa com
com
ubuntu
ubuntu está
está aberta
aberta ee disponível,
disponível, afirma
afirma as
as outras
outras pessoas
pessoas ee nãonão sese sente
sente ameaçada
ameaçada
se
se elas
elas são
são competentes
competentes ee eficientes,
eficientes, uma
uma vez
vez que
que ela
ela tem
tem uma
uma confiança
confiança queque se
se
alimenta
alimenta dodo sentimento
sentimento de de pertença
pertença aa um
um grupo
grupo ee ela
ela se
se sente
sente depreciada
depreciada quando
quando
as
as outras
outras pessoas
pessoas sãosão menosprezadas,
menosprezadas, humilhadas,
humilhadas, torturadas,
torturadas, oprimidas
oprimidas ou ou
tratadas
tratadas como
como menos
menos do do que
que elas
elas são.
são. Harmonia,
Harmonia, afabilidade,
afabilidade, sentido
sentido de de
comunidade
comunidade são são bens
bens preciosos.
preciosos. Para
Para nós,
nós, aa harmonia
harmonia social
social éé oo summum
summum bonum,
bonum, oo
bem
bem supremo.
supremo. TudoTudo oo que
que éé susceptível
susceptível dede pôr
pôr em
em perigo
perigo aa harmonia
harmonia deve
deve ser
ser
evitado
evitado como
como aa peste.
peste. Raiva,
Raiva, ressentimento,
ressentimento, desejo
desejo de
de vingança,
vingança, ee atéaté mesmo
mesmo oo
sucesso
sucesso alcançado
alcançado pelopelo preço
preço de
de um
um confronto
confronto agressivo,
agressivo, tem tem oo poder
poder de
de corroer
corroer
harmonia
harmonia [...].
[...]. O
O que
que tete desumaniza,
desumaniza, me me desumaniza
desumaniza fatalmente.
fatalmente.
Assim, ubuntu afirma uma dinâmica de expressão da humanidade por meio de sua
inquebrantável interligação com todos os outros existentes e, em especial, os outros
humanos, a quem nos vinculamos em nosso caráter de umuntu. Dessa forma, nossa
dimensão humana apenas aparece em uma comunidade que, de modo necessário, é anterior,
lógica e ontologicamente, a nosso status individual, o que finda por determinar uma
característica fundamentalmente ética e política para a existência humana, em decorrência
desta sua necessária expressão intersubjetiva.
Se transferirmos esta discussão para uma filosofia da educação, ubuntizando-a,
teremos de atravessar os processos educativos de elementos comunitários, fazendo com
esse aspecto da Palabre perpasse os valores, saberes e práticas educacionais. Poderíamos ver
as pessoas inseridas em processos pedagógicos movidos por essa fala que é sempre uma
troca intersubjetiva; aliando-as a processos solidários e colaborativos e que busque tratar de
modo acolhedor todos os saberes que nos circundam, uma vez que de algum modo
estaríamos conectadas/os com todos eles.
Esta dimensão solidária se faria presente nos movimentos de ensinar e aprender de
modo a impedir que formemos hierarquias opressivas entre saberes, crenças, visões de
mundo, podendo esse movimento acolher sem exotizações ou reducionismos os saberes e
filosofares africanos e afro-diaspóricos. A perspectiva ubuntu nos levaria a contornar o
210|
210| wanderson
wanderson flor
flor do
do nascimento
nascimento

contexto da competitividade que, além de outros campos da vida social, se instaurou


também em contextos educacionais (GENTILLI, 1999) que finda por também fazer com
que as pessoas estabeleçam competições pelo pensamento e pela filosofia. Desde ubuntu,
não se priorizaria nenhum tipo de competição, mas de colaboração solidária.
Penso que a abordagem da educação a partir de uma abordagem de ubuntu possa ser
interessante para uma filosofia afro-diaspórica da educação que sirva aos propósitos da
injunção de trabalharmos com a história e cultura africanas e afro-brasileiras nos
currículos da educação básica. Educarmo-nos para não sermos mais as/os mesmas/os, para
pensarmos de outros modos. Pensarmos diferentemente do que já viemos pensando e
sendo em contextos coloniais. Inscrever a educação antirracista em um cenário no qual
tecer mundos menos opressivos e excludentes, mundos que se teçam entre nós, em nossas
diversas heranças, que possamos encarar cada uma delas, sem ocultações; educar em
línguas diversas, todas elas por serem acolhidas, avaliadas, e consideradas em importâncias
ponderadas, passando pelos processos de travessia que recusem exclusões e construa
mundos mais plurais, mais nossos.

referências
HAMPATÉ
HAMPATÉ BÂ, BÂ, Amadou.
Amadou. A A tradição
tradição viva.
viva. In:
In: KI-ZERBO,
KI-ZERBO, Joseph Joseph (ed.).
(ed.). História
História Geral
Geral dada África
África I.I.
Metodologia
Metodologia ee Pré-história
Pré-história da da África.
África. Brasília:
Brasília: Unesco,
Unesco, 2010,
2010, p.
p. 167-212.
167-212.
BIDIMA,
BIDIMA, Jean-Godefroy.
Jean-Godefroy. De De la la traversée:
traversée: raconter
raconter des des expériences,
expériences, partager
partager le le sens.
sens. Rue
Rue Descartes,
Descartes,
n.36,
n.36, p.
p. 7-17,
7-17, 2002/2
2002/2
BIDIMA,
BIDIMA, Jean-Godefroy.
Jean-Godefroy. Law Law and and the
the Public
Public Sphere
Sphere in in Africa.
Africa. La La Palabre
Palabre and and other
other writings.
writings.
Bloomington:
Bloomington: IndianaIndiana University
University Press,
Press, 2014.
2014.
BRASIL:
BRASIL: MEC/SECAD;
MEC/SECAD; SEPPIR; SEPPIR; INEP. INEP. Diretrizes
Diretrizes Curriculares
Curriculares Nacionais
Nacionais para
para aa Educação
Educação dasdas Relações
Relações
Étnico-Raciais
Étnico-Raciais ee para
para oo Ensino
Ensino de de História
História ee Cultura
Cultura Afro-Brasileira
Afro-Brasileira ee Africana.
Africana. Brasília:
Brasília: MEC,
MEC, 2004.
2004.
BRASIL:
BRASIL: MEC/SEMTEC.
MEC/SEMTEC. Parâmetros Parâmetros Curriculares
Curriculares Nacionais
Nacionais para
para oo Ensino
Ensino Médio.
Médio. Brasília:
Brasília: MEC,
MEC, 2002.
2002.
DIAGNE,
DIAGNE, Souleymane
Souleymane B. B. Comment
Comment philosopher
philosopher en en Afrique?
Afrique? In: In: GOUCHA,
GOUCHA, Moufida Moufida (Org.).
(Org.).
Comment
Comment philosopher
philosopher en en Afrique
Afrique aujourd'hui?
aujourd'hui? Paris:
Paris: Unesco,
Unesco, 2006,
2006, p.
p. 5-11.
5-11.
FLOR
FLOR DO
DO NASCIMENTO,
NASCIMENTO, Wanderson. Wanderson. Orí: Orí: A A saga
saga atlântica
atlântica pela
pela recuperação
recuperação das das identidades
identidades
usurpadas.
usurpadas. In: In: SOUZA,
SOUZA, EdileuzaEdileuza P. P. de.
de. (Org.).
(Org.). Negritude,
Negritude, Cinema
Cinema ee Educação,
Educação, v. v. 3.
3. Belo
Belo
Horizonte:
Horizonte: Mazza,
Mazza, 2014,
2014, p.p. 134-146.
134-146.
FLOR
FLOR DO
DO NASCIMENTO,
NASCIMENTO, Wanderson. Wanderson. Entre Entre aa educação
educação ee aa política:
política: aa colonialidade.
colonialidade. Revista
Revista Sul-
Sul-
Americana
Americana de de Filosofia
Filosofia ee Educação,
Educação, n. n. 23,
23, p.444-458,
p.444-458, nov/2014-abr/2015.
nov/2014-abr/2015.
GENTILI,
GENTILI, Pablo.
Pablo. Escola
Escola ee exclusão
exclusão social.
social. As
As perspectivas
perspectivas para para aa educação
educação na na era
era do
do neoliberalismo.
neoliberalismo.
Caderno
Caderno Pedagógico
Pedagógico da da Ofinarte,
Ofinarte, Fortaleza,
Fortaleza, v.2,v.2, p.
p. 9-43,
9-43, 1999.
1999.
KODJO-GRANDVAUX,
KODJO-GRANDVAUX, Séverine. Séverine. Philosophies
Philosophies Africaines.
Africaines. Paris:
Paris: Présence
Présence Africaine,
Africaine, 2013.
2013.
MACHADO,
MACHADO, Adilbênia
Adilbênia F. F. Ancestralidade
Ancestralidade ee encantamento
encantamento como como inspirações
inspirações formativas:
formativas: filosofia
filosofia africana
africana
mediando
mediando aa história
história ee cultura
cultura africana
africana ee afro-brasileira.
afro-brasileira. Dissertação
Dissertação (Mestrado
(Mestrado em em Educação).
Educação).
Salvador:
Salvador: Universidade
Universidade FederalFederal da da Bahia,
Bahia, 2014.
2014.
MBEMBE,
MBEMBE, Achille.
Achille. Crítica
Crítica dada razão
razão negra.
negra. Lisboa:
Lisboa: Antígona,
Antígona, 2014.2014.
MONTOYA,
MONTOYA, Fernando
Fernando S. S. Introduccíon
Introduccíon aa la la filosofía
filosofía africana.
africana. UnUn pensamiento
pensamiento desde
desde elel cogito
cogito dede la
la
supervivencia.
supervivencia. Santa
Santa Cruz
Cruz de de Tenerife:
Tenerife: Ediciones
Ediciones Idea,
Idea, 2010.
2010.
NGOENHA,
NGOENHA, Severino
Severino E. E. Ubuntu:
Ubuntu: Novo Novo modelo
modelo de de justiça
justiça Glocal?
Glocal? In: In: NGOENHA,
NGOENHA, Severino Severino E.;E.;
CASTIANO,
CASTIANO, José José P.
P. Pensamento
Pensamento Engajado:
Engajado: Ensaios
Ensaios sobre
sobre Filosofia
Filosofia Africana,
Africana, Educação
Educação ee Cultura
Cultura
Política.
Política. Maputo:
Maputo: Educar,
Educar, 2011,
2011, p.
p. 63-74.
63-74.
OLIVEIRA,
OLIVEIRA, Eduardo
Eduardo D. D. de.
de. Filosofia
Filosofia da da ancestralidade
ancestralidade como como filosofia
filosofia africana:
africana: Educação
Educação ee cultura
cultura
afro-brasileira.
afro-brasileira. Revista
Revista Sul-Americana
Sul-Americana de de Filosofia
Filosofia ee Educação,
Educação, n. n. 18,
18, p.28-47,
p.28-47, maio-out/2012.
maio-out/2012.
RAMOSE,
RAMOSE, Mogobe
Mogobe B. B. African
African Philosophy
Philosophy through
through Ubuntu.
Ubuntu. Harare:
Harare: Mond
Mond Books,
Books, 1999.
1999.
RAMOSE,
RAMOSE, Mogobe
Mogobe B. B. Sobre
Sobre aa legitimidade
legitimidade ee oo estudo
estudo da da filosofia
filosofia africana.
africana. Ensaios
Ensaios filosóficos,
filosóficos, v.IV,
v.IV, p.6-
p.6-
35,
35, out/2011.
out/2011.
SERRES,
SERRES, Michel.
Michel. LeLe gaucher
gaucher boiteux:
boiteux: figures
figures de
de la
la pensée.
pensée. Paris:
Paris: Le
Le Pommier,
Pommier, 2015. 2015.
TUTU,
TUTU, Desmond.
Desmond. Il Il n'y
n'y aa pas
pas d'avenir
d'avenir sans
sans pardon.
pardon. Paris:
Paris: Albin
Albin Michel,
Michel, 1999.
1999.
211
211

imagem, visão e conhecimento:


modos de ver, modos de dar a ver
valter filé11

...quando
...quando eu
eu te
te encarei
encarei frente
frente aa frente
frente não
não vi
vi oo meu
meu rosto
rosto
chamei
chamei dede mau
mau gosto
gosto oo que
que vi
vi
de
de mau
mau gosto,
gosto, mau
mau gosto...
gosto...
(Caetano
(Caetano Veloso
Veloso -- Sampa)
Sampa)

O uvi e contei essa história várias vezes. O personagem principal é o diretor


de uma escola publica de uma cidade do Vale do Paraíba, região que fica
no caminho entre São Paulo e Rio de Janeiro. Negro, viveu várias vezes a
mesma situação: alguém chega na escola para falar com o diretor e, sem conhecê-lo, dirige-
se até o local onde informam que ele estaria. Sempre acontece de ele estar com o secretário
da escola, que é branco. Invariavelmente as pessoas se dirigem, sem titubear, ao secretário
certas de estarem falando com o diretor da escola. Muitos, nem ao menos percebem a sua
presença. Depois, tentam esconder o desapontamento quando o secretário desfaz o
“equivoco”. Como se adquire tamanha certeza? Como se aprende isso? Como se elege
determinados personagens como possíveis para determinados espaços tempos e como se
cria a impossibilidade e a invisibilidade de outros? De que maneiras se fabricam essas
imagens que passam a nos orientar? Falar de imagem, visão e conhecimento implica
falarmos de uma espécie de antevisão, ou seja, uma visão que vai em busca de confirmação
daquilo que já sabemos/queremos ver para repetirmos o já sabido?

a que se propõe esse esforço de pensar sobre a nossa relação com as imagens?
Este texto nasce como um dos esforços para enfrentar os desafios do projeto de
pesquisa Educação das relações étnico-raciais na cultura digital (2015). Desafios que ainda nos
impedem de compreendermos melhor como as desigualdades produzidas nas relações
étnico-raciais podem ser pensadas/problematizadas na chamada cultura digital. Será que
tais desigualdades, muitas delas históricas, aprofundam-se, renovam-se ou são
reinventadas? As tecnologias da informação e da comunicação poderiam contribuir para
uma educação mais democrática? Como pensar as TICs para além das suas dimensões
instrumentais?
Obviamente que as questões abordadas aqui investem nas nossas condições para
pensarmos na imagem, na visão como elementos tidos como fundamentais para a produção
de conhecimentos. O projeto de pesquisa citado e as ações que decorrem dele investem
fundamentalmente na formação de professores e as implicações das experiências dos
sujeitos da educação e as suas relações com o mundo.
A tentativa é que as metáforas usadas no campo da fotografia nos ajudem a pensar
em alguns embates, em algumasdemandas, em algumas questões que permeiam a vida
acadêmica. As formas de compormos determinadas imagens e, consequentemente a
produção/reprodução de determinadas pedagogias do olhar. Questões que tem sido
pensadas a partir de alguns paralelos entre as metáforas e os movimentos que orientam
qualquer fotógrafo (mesmo que alguns não se deem conta) e as exigências dos
procedimentos investigativos ou didático-pedagógicos: o que colocar no quadro (no
enquadramento) e o que deixar de fora? O que mostrar e o que esconder? O que ajudar a

11 Universidade
Universidade Federal
Federal Rural
Rural do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro -- UFRRJ/Instituto
UFRRJ/Instituto Multidisciplinar.
Multidisciplinar.
Email:
Email: valterfile@gmail.com
valterfile@gmail.com
212|
212| valter
valter filé
filé

naturalizar, reforçando determinadas maneiras de ver, e o que oferecer como


deslocamento?Que ética do olhar orienta nossos planos, nossos ângulos, nossas sequências,
nossas produções? Como mesclar luz e sombras para produzir imagens/conhecimentos?
Como considerar os deslocamentos como ampliação das nossas possibilidades de ver e de
dar a ver?
Hoje, nas atividades propostas no projeto de pesquisa citado acima, ou seja, nas
oficinas de imagens orientadas para trabalharmos sobre “modos de ver e modos de dar a
ver”, as demandas nos levam a constantemente estar de olho nas questões que nos
desafiam e que estão além daquelas que levamos conosco. Principalmente quando a
imagem impregna os espaços virtuais - redes sociais, blogs, sítios, etc. - em tal profusão
que alguns de nós temos dúvidas se ela se vale pelo que mostra, pelo que pretende
materializar, ou pelas velocidades vertiginosas das suas passagens, mixagens e remixagens,
como rastros.
De todas as maneiras, considero que esse texto ainda é um apanhado de algumas
ideias, de alguns apontamentos que estão agora juntos em busca de leitores, de fazeres, de
interlocução para que continuem seus fluxos. Não está acabado (como, aliás, nada na vida
está). Para usar um conceito da área computacional, este texto pode ser considerado como
(definitivamente) uma versão “beta”22, em teste. Talvez ele possa servir de “aplicativo”
para muitas situações, para alguns experimentos, para alguns estudos, ajudando a rodar
outras ideias, mas, fundamentalmente, gerando nas experiências de uso, possibilidades de
irmos aprendendo e irmos propondo outras versões provisórias como testemunho daquilo
que está sempre em movimento e que nunca poderemos assegurar numa versão definitiva.
Assim, nesse texto, as escaramuças tentam levar em consideração algumas
dimensões da imagem, prestando atenção (sempre) nas produções culturais possíveis. Ou
seja: sua produção, sua materialidade e seu entorno sociotécnico; a imagem como produção
de imaginários, como produção da nossa subjetividade, como produção dos nossos
conceitos e pré-conceitos; os usos da fotografia e seus efeitos que podem ajudar na
reprodução do mesmo, como produção de determinadas maneiras de ver e,
consequentemente, com a produção de invisibilidades. Esta última dimensão pode nos
ajudar a pensar sobre os modelos considerados válidos e aqueles que devem ser eliminados
ou reforçados como falta, impossibilidade. Portanto, pode nos ajudar a pensar nas relações
étnico-raciais e o reforço de determinadas "visões" racistas com a repetição e a
naturalização de determinadas imagens em determinados espaços-tempos. Espaços-tempos
que estão organizados para determinadas cenas, para determinados personagens. Uma
organização do mundo segundo alguns critérios que se naturalizam. Se não vejamos: Será
que é indiferente a cor da pele para imagens produzidas em diferentes situações na vida
cotidiana? A proliferação de imagens de um determinado padrão de beleza, de um
determinado fenótipo em determinados cenários não atuariam como uma "didática" que
nos ajuda a aprender as “formas de ver corretas" para reconhecer e até rejeitar (ou, no
mínimo, estranhar) outros tipos de imagem em determinados contextos?

22Versão
Versão beta
beta éé aa versão
versão dede um
um produto
produto (geralmente
(geralmente software)
software) que
que ainda
ainda se
se encontra
encontra emem fase
fase dede
desenvolvimento
desenvolvimento ee testes.
testes. No
No entanto,
entanto, esses
esses produtos
produtos muitas
muitas vezes
vezes são
são popularizados
popularizados bem
bem antes
antes de
de sair
sair aa
versão
versão final.
final. Na
Na prática,
prática, sempre
sempre que
que um
um programa
programa éé lançado
lançado em
em versão
versão Beta,
Beta, significa
significa que
que oo próprio
próprio
desenvolvedor
desenvolvedor (quem
(quem fez
fez oo programa)
programa) admite
admite que
que oo programa
programa ainda
ainda não
não está
está pronto
pronto ee pode
pode ter
ter problemas,
problemas,
porém
porém jájá está
está em
em um
um nível
nível decente
decente para
para aa utilização,
utilização, mesmo
mesmo que
que sem
sem nenhuma
nenhuma garantia.
garantia. Extraído
Extraído dede
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Vers%C3%A3o_beta>
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Vers%C3%A3o_beta> em em 16/10/2011.
16/10/2011.
imagem,
imagem, visão
visão ee conhecimento:
conhecimento: modos
modos de
de ver,
ver, modos
modos de
de dar
dar aa ver
ver || 213
213

a importância da imagem
Deus
Deus disse:
disse: "Faça-se
"Faça-se aa luz!"
luz!" EE aa luz
luz foi
foi feita.
feita.
(Genesis,
(Genesis, 1) 1)
(E
(E essa,
essa, talvez,
talvez, tenha
tenha sido
sido aa primeira
primeira providência
providência
para
para termos
termos acesso
acesso àà imagem,
imagem, pelo
pelo menos
menos para
para as
as religiões
religiões de
de origem
origem judaico-cristã)
judaico-cristã)

Costuma-se dizer que a matéria-prima da fotografia é a luz. Seria ela a escrita que
se baseia na luz. Na verdade, a imagem, como sugerem os livros judaico-cristãos, tem
como condição fundamental a luz. Sem ela não haveria a chamada criação do mundo,
segundo a crença destes grupos, e dos fotógrafos: havendo luz há possibilidade de produção
de conhecimento, de produção de imagem.
A imagem está na origem de humanidade. Ela tem servido como elemento
constitutivo de muitas didáticas e sido motivo de intensas disputas e principalmente de
muitas interdições. Não por acaso as religiões do livro - as de origem judaico-cristã, pelo
menos - começam os seus ensinamentos radicalizando: "Não farás para ti imagem
esculpida, nem figura alguma do que em cima no céu, nem embaixo na terra, nem nas
águas debaixo da terra. Não te curvarás diante delas, nem as servirás" (do Velho
Testamento: Êxodo 20, 4-5). Este é um dos mandatos hegemônicos que está na origem (no
Ocidente) da nossa relação com a imagem. E esta relação vai ser conflituosa o tempo todo
no desenrolar da cultura judaico-cristã, como cultura vencedora, colonizadora.
E não é apenas no campo religioso que a imagem foi/é motivo de intensas
demandas. O mundo acadêmico, até hoje considerado como o reino da palavra escrita,
abriga vastos territórios de desconfiança das condições de possibilidades da imagem.
Muitos dos habitantes destes territórios encontram na tradição filosófica Grega, e mais
especificamente em Platão, as origem de suas desconfianças, já que o filósofo foi
implacável com as imagens. Segundo Arlindo Machado (2001, p.9), citando Platão,
oo artista
artista plástico
plástico éé uma
uma espécie
espécie de
de impostor:
impostor: ele
ele imita
imita aa aparência
aparência das
das coisas,
coisas, sem
sem
conhecer
conhecer aa verdade
verdade delas
delas ee sem
sem ter
ter aa ciência
ciência que
que as
as explica
explica (...).
(...). A
A imagem,
imagem,
conclui
conclui Platão,
Platão, pode
pode sese parecer
parecer com
com aa coisa
coisa representada,
representada, mas
mas não
não tem
tem sua
sua
realidade.
realidade. ÉÉ uma
uma imitação
imitação dede superfície,
superfície, uma
uma mera
mera ilusão
ilusão de
de ótica,
ótica, que
que fascina
fascina
apenas
apenas as
as crianças
crianças ee os
os tolos.
tolos.
Para muitos, a ideia da representatividade do mundo pela imagem ainda não
bastaria. Afinal, o que seria então a imagem? Estaria a serviço de quem e para quê?
Voltando... Como parte destas escaramuças, tempos depois, a igreja católica vai
empreender sua grande missão evangelizadora utilizando-se da arte barroca,
fundamentalmente das imagens, exatamente por compreender que esta era a melhor forma
para lidar com as gentes incultas, iletradas do "novo mundo". Certamente nas mesmas
condições de crianças e de tolos, como supunha Platão.
Infelizmente não pretendo, neste texto, continuar percorrendo as diferentes
condições sócio-históricas de usos e interdições da imagem. Interessa-me, desde aqui, lidar
com a imagem tal como ela tem sido assumida hoje como um componente fundamental da
nossa cultura contemporânea.

ver e dar a ver - o fotógrafo e o pesquisador


Por
Por trás
trás da
da fotografia,
fotografia, mesmo
mesmo aquela
aquela com
com intenção
intenção documental,
documental,

há uma
uma perspectiva
perspectiva do
do fotógrafo,
fotógrafo, umum modo
modo de
de ver
ver33
que
que está
está referido
referido aa situações
situações ee significados
significados que
que não
não são
são diretamente
diretamente próprios
próprios
daquilo
daquilo que
que está
está sendo
sendo fotografado
fotografado ee daqueles
daqueles que
que estão
estão sendo
sendo fotografados,
fotografados,
mas
mas referido
referido àà própria
própria ee peculiar
peculiar inserção
inserção do
do fotógrafo
fotógrafo no
no mundo
mundo social.
social.
(José
(José de
de Souza,
Souza, A A sociologia
sociologia da
da fotografia
fotografia ee da
da imagem)
imagem)

33 Destaque
Destaque meu.
meu.
214|
214| valter
valter filé
filé

Podemos considerar que uma fotografia dá a ver ao mesmo tempo que oferece uma
didática da visão. Podemos começar colocando essa tal didática da visão como ponto de
força para pensar o fotógrafo, o ato fotográfico como o intermediário: aquele que está entre
os mandatos que lhe ofereceu o mundo e aquilo que ele oferece na fotografia, na imagem
produzida para lidar com tais mandatos - os modos de ver, os modos de dar a ver dentro de
uma determinada didática da visão (ou do esforço para a rasura de determinadas
didáticas).
Talvez caiba nos perguntarmos: Como fugir do lugar já reservado desde antes de
nos colocarmos na cena, para o ato fotográfico (para a pesquisa, para a prática pedagógica)?
Como poderíamos nós, ao nos colocarmos entre o que nos formou/forma e o modelo - a cena a
ser fotografada (abordada) - darmos outras possibilidades de se ver o mundo supostamente já
sabido? Seria essa a nossa luta, buscar outros pontos de fuga como outras possibilidades de ver
e de dar a ver?
Aviso: caso não consigamos ter sucesso nos desafios que nos toca, ou seja,
encontrarmos novas formas de vermos, de darmos a ver, ao menos poderíamos descartar as
nossas certezas de que estamos representado o mundo, de que estamos oferendo o real com
as imagens que produzimos, que propomos. Talvez possamos enfatizar nas nossas
empreitadas que o que estamos oferecendo são apenas as nossas possibilidades de ver e que
estas não eliminam outras. Mais que a representação do real, o que talvez possamos
oferecer, nas imagens produzidas, sejam dispositivos que forcem o pensamento a pensar,
como nos sugere Deleuze. Pensar naquilo que se está dando a ver e as possibilidades de
aguçarmos a nossa curiosidade e nos darmos como tarefa pensar no que ficou fora do
quadro. Uma espécie de exercício prático daquilo que Boaventura de Souza Santos chama
de Sociologia das Ausências (2002). Pensar sobre o que está sendo mostrado e o como o
mostrado pode nos forçar a irmos para fora o quadro, em algumas circunstâncias. Vermos
como um contínuo, tomando a imagem materializada como parte. Mais do que foi
mostrado, às vezes é o que ficou de fora que parece gritar, que pretende nos convocar a
pensar.

didáticas do olhar: o que ver e como ver


Muitas das vezes a composição escolhida (ou naturalizada), para a produção de uma
imagem, coloca no centro aquilo que supostamente é o mais importante. Uma didática que
nos ensina a ver, que nos ensina o que supostamente há para ver. Um exemplo possível
está na pintura de Pedro Américo, “O grito do Ipiranga” 44. A imagem que representaria a
inauguração do Brasil como um império “independente” de Portugal. O quadro que está no
Museu Paulista e mede 4,15 x 7,60. Ele, o quadro, tenta dar ar imponente ao fato e ao
personagem central em destaque que é D. Pedro I. O quadro de Pedro Américo, terminado
em 1888, sofreu muitas críticas, inclusive de ser plágio de um outro quadro pintado por
Ernest Meissonier, Batalha de Friedland, uma das batalhas enfrentadas por Napoleão
Bonaparte e seu exército.
Mas o que me interessa no quadro não são as polêmicas que este gerouou seus
dados históricos. O que me interessa é a sua função como peça didática, como dispositivo
para a educação do olhar, como educação daquilo que devemos ver, daquilo que devemos
considerar no visto. Quem de nós escolarizados não fomos expostos a esta imagem nos
livros didáticos (e em certa época em capas de cadernos), nos murais das escolas quando da
comemoração da independência? Essa imagem nos educou de alguma forma sobre aquilo
que é importante neste fato histórico. Costumo perguntar a estudantes do curso de
Pedagogia onde trabalho se alguém lembra da tal imagem. Um número esmagador de

44https://pt.wikipedia.org/wiki/Independ%C3%AAncia_ou_Morte_(pintura)
https://pt.wikipedia.org/wiki/Independ%C3%AAncia_ou_Morte_(pintura) Acesso
Acesso em
em 12/02/2014.
12/02/2014.
imagem,
imagem, visão
visão ee conhecimento:
conhecimento: modos
modos de
de ver,
ver, modos
modos de
de dar
dar aa ver
ver || 215
215

estudantes ainda lembra. Minha segunda pergunta (sem mostrar a imagem, apenas
recorrendo à memória da turma), é sobre o que da imagem ficou retido e que ainda é
possível ser descrito. Pergunto, então: O que tinha na imagem? De que era composta a
imagem? A maioria esmagadora das respostas dão conta de que ela retrata o ato da
independência do Brasil. Mostrava D. Pedro com a espada em punho dando o grito do
Ipiranga, com soldados à sua volta. Depois desta conversa mostro a imagem e pergunto: O
que mais, além de D. Pedro e dos supostos soldados, tem na imagem?
Aos poucos a turma vai se dando conta de que havia na imagem, desde sempre,
umas pessoas comuns, provavelmente trabalhadores, agricultores, gente do povo,
assistindo a tudo aquilo no canto da cena. Aos poucos vão percebendo que aqueles
personagens “representam” o povo brasileiro. Trabalhamos então o fato de que as
“representações” da história, dos personagens importantes tratados pela educação, ainda
hoje desconsideram o povo, esse mesmo povo que hoje entra nas universidades e não são
reconhecidos/reconhecíveis como alunos esperadose, em muitos casos, são convidados a se
esquecerem de quem são para se fingirem outros, para ocuparem-se daquilo que interessa
aos grupos que sempre ficam no centro das imagens históricas. Quem foi capaz de ver os
personagens que estão na margem da cena? Quem porventura foi capaz de estabelecer
relações entre a cena da independência e a vida do povo brasileiro, ou seja, a relação entre o
centro da cena e a periferia? O que podemos pensar sobre o que não está no quadro? O que
ainda não sabemos ver?

a fotografia
Poderíamos abordar a fotografia a partir de diferentes possibilidades, mas, opto por
começar recorrendo a Boris Kossoy (2005, p.40) e as sugestões que ele nos faz de
pensarmos na ideia de que "fotografia é memória e com ela se confunde". Esta ideia,
aparentemente óbvia e simples, nos leva a pensar naquilo que o autor vai trabalhar a partir daí,
ou seja, as "realidades das fotografias". Para Kossoy (2005, p.9) existiriam múltiplas faces e elas
estariam implicadas. Nas palavras do autor,
A
A imagem
imagem fotográfica
fotográfica tem
tem múltiplas
múltiplas faces
faces ee realidades.
realidades. A
A primeira
primeira éé aa mais
mais
evidente,
evidente, visível.
visível. ÉÉ exatamente
exatamente oo que
que está
está ali,
ali, imóvel
imóvel àà nossa
nossa vista,
vista, na
na aparência
aparência
do
do referente,
referente, isto
isto é,
é, sua
sua realidade
realidade exterior,
exterior, oo testemunho,
testemunho, oo conteúdo
conteúdo da da imagem
imagem
fotografada
fotografada (passível
(passível dede identificação),
identificação), aa segunda
segunda realidade.
realidade. As
As demais
demais faces
faces são
são
as
as que
que não
não podemos
podemos ver,ver, permanecem
permanecem ocultas,
ocultas, invisíveis,
invisíveis, não
não se
se explicitam,
explicitam, mas
mas
que
que podemos
podemos intuir;
intuir; éé oo outro
outro lado
lado do
do espelho
espelho ee do do documento;
documento; não não mais
mais aa
aparência
aparência imóvel
imóvel ouou aa existência
existência constatada,
constatada, mas
mas também,
também, ee sobretudo,
sobretudo, aa vida
vida das
das
situações
situações ee dos
dos homens
homens retratados,
retratados, desaparecidos,
desaparecidos, aa história
história do
do tema
tema ee da
da gênese
gênese
da
da imagem
imagem nono espaço
espaço ee no no tempo,
tempo, aa realidade
realidade interior
interior da
da imagem:
imagem: aa primeira
primeira
realidade.
realidade.
Kossoy nos convida a pensar sobre uma dimensão da fotografia que é a memória.
Mas, quais seriam os movimentos da memória que nos interessam aqui? Vamos chamar o
autor mais uma vez:
Quando
Quando apreciamos
apreciamos determinadas
determinadas fotografias
fotografias nos
nos vemos,
vemos, quase
quase semsem perceber,
perceber,
mergulhando
mergulhando no no seu
seu conteúdo
conteúdo ee imaginando
imaginando aa trama
trama dos
dos fatos
fatos ee as
as circunstancias
circunstancias
que
que envolveram
envolveram oo assunto
assunto ou
ou aa própria
própria representação
representação (o(o documento
documento fotográfico)
fotográfico) no
no
contexto
contexto em
em que
que foi
foi produzido:
produzido: trata-se
trata-se de
de um
um exercício
exercício mental
mental de de reconstituição
reconstituição
quase
quase que
que intuitivo.
intuitivo. Veremos
Veremos que que aa reconstituição
reconstituição -- quer
quer seja
seja elaela dirigida
dirigida àà
investigação
investigação histórica
histórica quer
quer àà mera
mera recordação
recordação pessoal
pessoal -- sempre
sempre implicará
implicará um
um
processo
processo de
de criação
criação de
de realidades,
realidades, posto
posto que
que elaborada
elaborada por
por meio
meio dasdas imagens
imagens
mentais
mentais dos
dos próprios
próprios receptores
receptores envolvidos
envolvidos (ibidem).
(ibidem).
E essa criação de realidades não se limita ao momento de estudo, de exame, de
fruição da fotografia. Parece ser que a fotografia é uma das maneiras de reforçar
determinadas “visões” que temos do mundo, de estranharmos determinadas coisas que
vemos, de deixarmos de enxergar outras.
216|
216| valter
valter filé
filé

A imagem fotográficavale pelo que exibe no seu quadro, como escolha, e da relação
que ela (a imagem) estabelece com os que a veem. Uma escolha que elege
mostrar/produzir uma imagem entre tantas outras possíveis. Escolha por uma
determinada forma, não de mostrar o mundo, mas de dizer como se vê o mundo, que é
uma forma de recria-lo.
As imagens disponibilizam possibilidades de pensarmos sobre a percepção que
temos delas e das nossas ações. Nessa direção vai o trabalho de Henri Bergson, sobretudo
em seu livro Matéria e Memória (1990). Bergson nos propõe que o ato de ver é uma
solicitação à ação. Uma ação que instaura-se a partir da percepção da imagem. Perceber é
agir virtualmente sobre algo. O olhar manipula nosso esquema sensório-motor de ação e
reação a partir dos estímulos que recebemos. Opera uma decomposição do percebido em
função da sua utilidade para nós. Numa imagem, o que assegura o nosso deslocamento em
seu interior é o deslocamento do nosso próprio campo visual (BENTES, 2006). As imagens
certamente contribuem para as nossas mobilizações, para as nossas movimentações em
torno daquilo que ela nos oferece como referente no encontro com as nossas subjetividades
e como movimento de subjetivação. Mas, será que a repetição de determinadas formas de
ver e de dar a ver não podem contribuir com a certa“atrofia” das nossas capacidades de
locomoção, de mobilização, uma espécie de consolidação de uma certa ética do olhar, como
nos sugere Susan Sontag (1983)?
Kossoy nos sugere que o mundo tornou-se de certa forma "familiar" após o advento
da fotografia (KOSSOY, 2001, p. 26). Podemos usar a afirmação do autor para nos
perguntarmos: o que entendemos por "familiaridade"? Seria algo ligado ao sentimento de
próprio, de próximo, de pertencimento, de costume, de hábito? Alguma coisa que nos leva
a pensar naquilo que sempre vemos porque está sempre perto, que temos alguma relação de
re-conhecimento. Mas, justamente por isso, temos mais dificuldades de enxergar certas
coisas que não são tão familiares. Se for assim, o familiar também poderia ser aquilo que
não nos causa mais estranheza, que já naturalizamos? Familiar seria a forma naturalizada
de organizar as nossas possibilidades de ver que repercutiram sobre as nossas aceitações
sobre as formas de organizar o mundo? Seria a familiaridade um acordo intersubjetivo para
a aceitação do mesmo?
Talvez devêssemos nos perguntar o que já naturalizamos e quais imagens e pontos
de vista são reforçamos nestas naturalizações? Podemos pensar na propaganda, em muitos
livros didáticos, nas imagens das mídias hegemônicas, nas imagens que enfeitam nossas
casas o que essas imagens nos ajudam a naturalizar? Quais "modelos” estão sendo
reforçados? O que ajudam a mostrar e o que ajudam a esconder com o que mostram? O que
nos ensinam sobre a ocupação dos espaços? Quem pode estar em que lugar? O que não nos
chama mais a atenção e o que nos causa ainda desconforto?
As imagens nos ajudam a educar a nossa visão, as nossas possibilidades de ver e as
nossas cegueiras. Naturalizamos certas imagens apenas pela presença de determinados
personagens, de determinada raça, de determinada classe social com determinado tipo
físico em contextos, paisagens e cenas. Contextos, paisagens e cenas que já aprendemos
serem “adequados ou inadequados, dependendo da imagem que fazemos dos seus
integrantes. E assim vamos nos familiarizando, naturalizando, eliminando outras
possibilidades de ver o mundo. Assim, também, talvez nos afastemos daquilo que
(supostamente) não nos diria respeito por ser algo longínquo (e talvez produzido como
inexistente), por estar fora do nosso “quadro”.
Talvez fosse importante, então, fazermos um exercício de desnaturalização das
imagens que nos produzem como uma das possibilidades de agirmos sobre o que
produzimos. Podemos começar fazendo uma espécie de inventário imagético daquilo que
consumimos, aquilo que nos atinge e o que produzimos: Que tipos de imagens vemos? Em
imagem,
imagem, visão
visão ee conhecimento:
conhecimento: modos
modos de
de ver,
ver, modos
modos de
de dar
dar aa ver
ver || 217
217

que tipos de imagens acreditamos? Que situações cotidianas as imagens que nos
alimentam reproduzem? Que tipo de fotos fazemos e que tipo de fotos nos param (nos
param para olharmos com calma, para pensarmos sobre elas)? Se é verdade que o nosso
olhar é o resultado de construções da/na cultura a partir das imagens que nos são
"familiares", o nosso olhar está familiarizado com o quê? Será que esta familiarização não é
o resultado de uma "didática" da produção de uma determinada maneira de ver? Será que
vemos o que podemos ver ou será que só vemos o que já sabemos ver? Será que não
estamos presos a determinados pontos-de-vista (que são lugares criados pela perspectiva
clássica para nos colocar num determinado lugar e prevenir da possível curiosidade da
nossa visão)? De prevenir ou de nos desestimular certos “movimentos”, certos
deslocamentos, certas posições que nos possibilitariam ver as coisas também de outras
maneiras?

produzir imagens, produzir-nos pelas imagens


AA fotografia,
fotografia, antes
antes de
de tudo
tudo éé um
um testemunho.
testemunho.
Quando
Quando se
se aponta
aponta aa câmara
câmara para
para algum
algum objeto
objeto ou
ou sujeito,
sujeito, constroi-se
constroi-se umum significado,
significado,
faz-se
faz-se uma
uma escolha,
escolha, seleciona-se
seleciona-se um
um tema
tema ee conta-se
conta-se uma
uma história,
história,
cabe
cabe aa nós,
nós, espectadores,
espectadores, oo imenso
imenso desafio
desafio dede lê-Ias.
lê-Ias.
(Ivan
(Ivan Lima,
Lima, AA fotografia
fotografia éé aa sua
sua linguagem)
linguagem)
Infelizmente ainda não vai ser aqui que vou dedicar-me ao aprofundamento de
algumas questões sobre o ato fotográfico. Questões do tipo: de que ele é feito? O que se
passa na solidão do fotógrafo no momento da suspensão da sua respiração, quando este se
prepara para flagrar o instante que poderá perdurar? Como as tecnologias atravessam e
alteram esse instante? O que selecionar, quando o mundo se apresenta tão vasto, mesmo
quando nosso objetivo é perpetuar o olhar perdido e distante de uma criança? Como
podemos trabalhar pela “des-familiarização” das possibilidades de ver o mundo, das
formas hegemônicas de sua organização? Tais movimentos podem ajudar também com a
desnaturalização dos movimentos das cidades, para a des-invisibilização de certos
personagens, e para inserir outras imagens na equilibrada e bem composta cena burguesa,
branca, cristã.
A fotografia mais do que mobilizar modelos geométricos e óticos, põe em marcha
os meios visuais que passam a vigorar, também, como modelos cognitivos e perceptivos de
uma época. Depende, não apenas de um aparato mecânico - câmera - e um modelo
(referente), mas daquilo que preexiste ao ato de fotografar, ou seja, aquilo da cultura, da
subjetividade do fotógrafo que vai incidir sobre as suas decisões sobre o que mostrar e o
que esconder. Nenhum ato de fotografar pode ser considerado como um ato banal, sem
referentes, isolado em si mesmo. Este ato revela a reação do fotógrafo (e podemos pensar
no pesquisador, também) ao que se apresenta a ele, um tempo-espaço a ser traduzido, a ser
registrado. Como reagimos a estes momentos? De que são feitas as nossas escolhas? Que
cenas construímos e a que modelos de sociedade ela se presta a reforçar? Será que as nossas
propostas de produção de imagens não fazem parte da proliferação de imagens que
trabalham pela reprodução sempre de um mesmo modelo?
Muitas são as possibilidades de pensarmos sobre as nossas escolhas - e sobre
a nossa relação com a fotografia, pois para um profissional, suas escolhas serão mais
apuradas pelos ditames de uma técnica, de uma arte, embora ele também não consiga
escapar da atuação da sua subjetividade. E, ainda, as intervenções da/na cultura. Aquilo
que incide sobre um tempo, sobre estes tempos. E alguns autores tem designado estes
tempos atravessados pela chamada cultura digital. Uma cultura produzida em torno das
TICs.
218|
218| valter
valter filé
filé

Pensar a fotografia na cultura digital nos convida a nos envolvermos na sua


proliferação. Pensar sobre o retorno desta profusão de imagens como proliferação, muitas
vezes, do mesmo. Ou seja, tentar levantar alguns aspectos da influencia da banalização da
fotografia, já que muitos aparatos hoje produzem imagens e tais imagens são oferecidas ao
público quase que instantaneamente nos blogs, flogs, redes sociais, mensagens de celulares,
etc. Tal profusão, velocidade e fluxos estão reconfigurando os modos de ver, de produzir,
de produzir-se.
No lugar das imagens que pretendiam fazer um testemunho, dar conta de uma
realidade, hoje as imagens produzidas, principalmente pelos mais jovens, parece que se
contentam em ser imagens-rastros, imagens-ruídos, ou seja, imagens que parecem duvidar
da sua capacidade de representação, da sua possibilidade de verdade, de relação com um
referente. São, muitas delas, testemunhos de perenidade já que parecem ser atravessadas
pelo anúncio de sua superação, já que elas são apenas parte do fluxo continuo de
mensagens, muitas das vezes, de exacerbação narcísica.
Parece que esta é uma época em que a fotografia (como metáfora de modelos
cognitivos), usada pelos mais jovens nas mídias digitais, experimenta o elogio do efêmero,
da velocidade, da urgência, da superação de uma imagem por outra. Parece ser que o que
está em jogo não é mais ver uma imagem ou uma coleção delas. O que parece estar em jogo
é uma movimentação constante onde a imagem é apenas um detalhe daquilo que se coloca
como elemento de mediação das relações, das autoproduções. O ato fotográfico parece um
ato de consumo, de consumição (ou de comichão) das imagens, mixadas e remixadas
incessantemente. De toda forma, creio que podemos ainda falar de produção de imagens,
de fotografias como desafio para pensarmos as nossas condições de possibilidades para as
nossas tarefas acadêmico-pedagógicas. Portanto, vamos tentar usar a fotografia - as
metáforas do seu ato de composição - como analogia dos atos de produção de
conhecimento. Sugiro, como exercício, que possamos pensar os movimentos do
pesquisador, do estudante, do professor a partir das metáforas usadas no ato fotográfico.
Ou, pelo menos, aquilo que serve de referência para pensarmos a produção da foto como
referência para a produção de conhecimentos. O encontro do fotógrafo com a sua cena,
com o seu campo de trabalho, talvez possa ser pensando como o encontro do pesquisador,
do aprendente, do ensinante com o seu campo de estudo, com o seu campo de pesquisa.

exercícios do olhar
A
A imaginação
imaginação fotográfica
fotográfica envolve
envolve umum modo
modo de de produção
produção dede imagens
imagens fotográficas,
fotográficas,
aa composição
composição ee aa perspectiva,
perspectiva, oo apelo
apelo aa recursos
recursos técnicos
técnicos para
para escolher
escolher ee definir
definir
aa profundidade
profundidade de de campo,
campo, enfim
enfim umum modo
modo dede construir
construir aa fotografia,
fotografia,
de
de juntar
juntar no
no espaço
espaço fotográfico
fotográfico oo que
que da
da fotografia
fotografia deve
deve fazer
fazer parte
parte
ee oo modo
modo como
como deve
deve fazer
fazer parte.
parte. OO chamado
chamado "congelamento"
"congelamento" do do instante
instante fotográfico
fotográfico é,
é,
na
na verdade,
verdade, aa redução
redução das
das desencontradas
desencontradas temporalidades
temporalidades contidas
contidas nos
nos diferentes
diferentes
componentes
componentes da da composição
composição fotográfica
fotográfica aa um
um único
único ee peculiar
peculiar tempo,
tempo,
oo tempo
tempo da
da fotografia.
fotografia.
(José
(José de
de Souza,
Souza, A A sociologia
sociologia da
da fotografia
fotografia ee da
da imagem)
imagem)

Os cursos de fotografia (ou da lida com imagens visuais na educação), que tem
acontecido a partir do projeto de pesquisa citado (FILÉ, 2015) baseiam suas propostas (com
algumas variações), fundamentalmente, na ideia de trabalharmos a articulação de duas
dimensões que acredito serem importantes para a produção de imagens: a primeira,
considerando que existem algumas informações importantes para se fazer uma fotografia,
que existe um trabalho mais técnico - o trabalho que envolve o ato fotográfico, a relação
com a câmera, com os enquadramento, a composição da imagem etc.; e, a segunda
dimensão, um trabalho de consideração mais epistemológica sobre as questões que
imagem,
imagem, visão
visão ee conhecimento:
conhecimento: modos
modos de
de ver,
ver, modos
modos de
de dar
dar aa ver
ver || 219
219

envolvem a fotografia, a visão e a produção de conhecimentos e os modelos cognitivos


disponíveis e disponibilizados. Questões que podem nos ajudar a estabelecer conexões
entre o ato fotográfico e a pesquisa acadêmica, a produção de conhecimentos, as maneiras
de ver (e dar a ver o mundo) reconstruindo-o, reinventando-o. Então, pretendem (os
cursos) articularem-se traçando um paralelo entre as duas dimensões: o ato fotográfico e a
produção de conhecimentos, a partir de algumas metáforas que governam a ambos. Por
exemplo: podemos trabalhar sobre a importância da visão para o ato de fotografar e para as
condições de ver o que precisamos ver na pesquisa. Nesse sentido, visão e fotografia são
inseparáveis, assim como visão e conhecimento. Isto porque a relação visão e
conhecimento está na trajetória do pensamento ocidental, desde muito tempo.
Na
Na altura
altura dos
dos séculos
séculos VI
VI ee V V a.C.,
a.C., aa faculdade
faculdade da da visão
visão ee oo atributo
atributo dodo
conhecimento
conhecimento tinham-se
tinham-se juntado
juntado na na palavra
palavra grega
grega ‘theorein’,
‘theorein’, significando
significando tanto
tanto
“ver”
“ver” quanto
quanto “saber”.
“saber”. A
A partir
partir daí,
daí, oo conhecimento
conhecimento era era um
um registro
registro da
da visão.
visão. A
A
ignorância,
ignorância, consequentemente,
consequentemente, torna-se
torna-se uma
uma falta
falta de
de conhecimento
conhecimento decorrente
decorrente de
de
os
os objetos
objetos não
não serem
serem visíveis
visíveis (...)
(...) (HAMILTON-PATERSON,
(HAMILTON-PATERSON, apud apud ALVARES,
ALVARES,
1996,
1996, p.
p. 20).
20).

Porém, muitos de nós temos compreendido a visão como algo relacionado a um


órgão e todos que não tenham deficiência visual estariam aptos a ver, bastaria abrirem os
olhos. Assim pensamos que temos acesso à realidade e fazemos fotos da "realidade".
Também nas nossas pesquisas supomos ver tudo o que há para ver, supomos ver a
realidade que se nos apresenta.
Porém, ver, um atributo da visão, compreende outros sentidos. Como nos adverte
von Foerster (1996), em um artigo sobre visão e conhecimento. Não vemos com os olhos, mas
através deles, diz o autor. Ver/perceber, então, não se restringe ao olho e a sua relação com
os objetos, pois não vemos com os olhos, mas através deles. Vemos o que podemos ver, o
que já sabemos ver. Vemos com aquilo que a nossa subjetividade - nossos valores, nossas
crenças, nossos gostos, nossas preferencias, etc. - nos permite ver. O que vemos não
alimenta os olhos, alimenta o nosso imaginário, confirmando, ampliando ou modificando
os nossos sentimentos, movimentando, acionando valores e contaminando aquilo que
supomos incontaminável que é a nossa razão.

finalizando (por ora...)


Assim, as propostas dos cursos de fotografia - das ações a serem
desenvolvidasna/pela pesquisa - desenvolvem-se a partir das considerações das condições
para o trabalho do fotógrafo e do professor-pesquisador-estudante diante do seu "assunto",
diante dos seus desafios: Os lugares que escolhemos para nos colocar na nossa relação com
as coisas, na nossa relação com o mundo e a consideração das suas precariedades em dar
conta da representação. Nossos planos (tipos de enquadramentos), nossas movimentações
(a busca por diferentes ângulos, por diferentes posições). A busca de outras éticas, de
outras estéticas para tentarmos outras possibilidades de ver e de dar a ver. Tentar des-
invisibilizar aquilo que ainda não se pode e não se sabe ver. Tentar inter-romper os
processos de reafirmação do mesmo, da imagem como rebatimento da realidade. Tentar
possibilidades de complexificação de tal “realidade”. Isso requer não apenas um bom
equipamento ou um bom referencial teórico-metodológico, como pensamos muitos de nós.
Depende, também, das nossas disponibilidades, dacapacidade de reconhecermos os nossos
limites e da nossa capacidade de nos deslocarmos, de nos mo-vermos, de nos com-
movermos com os outros e com o mundo.

referências
ALVARES,
ALVARES, A.
A. Noite:
Noite: aa vida
vida noturna,
noturna, aa linguagem
linguagem da
da noite,
noite, oo sono
sono ee os
os sonhos.
sonhos. Trad.
Trad. Luiz
Luiz Bernardo
Bernardo
220|
220| valter
valter filé
filé

Pericás,
Pericás, Bernardo
Bernardo Pericás
Pericás Neto.
Neto. São
São Paulo:
Paulo: Companhia
Companhia das das Letras,
Letras, 1996.
1996.
BENTES,
BENTES, Ivana.
Ivana. Midia-arte
Midia-arte ou ou as
as estéticas
estéticas dada comunicação
comunicação ee seus seus modelos
modelos teóricos.
teóricos. Limiares
Limiares da
da
imagem
imagem -- tecnologia
tecnologia ee estética
estética na
na cultura
cultura contemporânea.
contemporânea. Rio Rio dede Janeiro:
Janeiro: Mauad
Mauad X,X, 2006.
2006.
BERGSON,
BERGSON, Henri.Henri. Matéria
Matéria ee memória.
memória. São
São Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 1990.
1990.
FILÉ,
FILÉ, Valter.
Valter. Educação
Educação das das relações
relações étnico-raciais
étnico-raciais nana cultura
cultura digital.
digital. Projeto
Projeto de de pesquisa.
pesquisa.
UFRRJ/IM/PPGEDUC,
UFRRJ/IM/PPGEDUC, 2015. 2015. Meio
Meio digital.
digital.
FOERSTER,
FOERSTER, Heinz Heinz von.von. Visão
Visão ee conhecimento:
conhecimento: disfunções
disfunções de de segunda
segunda ordem.
ordem. In:In:
SCHNITMAN,
SCHNITMAN, Dora Dora Fried
Fried (Org).
(Org). Novos
Novos paradigmas,
paradigmas, cultura
cultura ee subjetividade.
subjetividade. Porto
Porto Alegre:
Alegre:
Artes
Artes Médicas,
Médicas, 1996,
1996, p.59-74.
p.59-74.
KOSSOY,
KOSSOY, Boris.Boris. Fotografia
Fotografia ee memória:
memória: reconstituição
reconstituição por por meio
meio dada fotografia.
fotografia. In:
In: SAMAIN,
SAMAIN,
Etiene.
Etiene. OO fotográfico.
fotográfico. São
São Paulo:
Paulo: Editora
Editora Hucitec/Editora
Hucitec/Editora Senac, Senac, 2005.
2005.
______.
______. Fotografia
Fotografia ee história.
história. São
São Paulo:
Paulo: Ateliê
Ateliê Editorial,
Editorial, 2001.
2001.
LIMA, Ivan.
LIMA, Ivan. A
A fotografia
fotografia éé aa sua
sua linguagem.
linguagem. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Espaço
Espaço ee Tempo,
Tempo, 1988.
1988.
MACHADO, Arlindo.
MACHADO, Arlindo. O O quarto
quarto iconoclasmo
iconoclasmo ee outros
outros ensaios
ensaios hereges.
hereges. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Rios
Rios
Ambiciosos, 2001.
Ambiciosos, 2001.
MARTINS, José
MARTINS, José S.
S. A
A sociologia
sociologia da da fotografia
fotografia ee da
da imagem.
imagem. 2a. 2a. Ed.
Ed. São
São Paulo:
Paulo: Contexto,
Contexto, 2011
2011
SANTOS, Boaventura
SANTOS, Boaventura de de Souza.
Souza. Para
Para uma
uma sociologia
sociologia das
das ausências
ausências ee umauma sociologia
sociologia das
das
emergências. Revista
emergências. Revista Crítica
Crítica de
de Ciências
Ciências Sociais,
Sociais, n.
n. 63,
63, p.
p. 237-280,
237-280, 2002.
2002. Disponível
Disponível em:
em:
http://www.boaventuradesousasantos.pt/media/pdfs/Sociologia_das_ausencias_RCCS63.
http://www.boaventuradesousasantos.pt/media/pdfs/Sociologia_das_ausencias_RCCS63.
PDF. Acesso
PDF. Acesso em:
em: 15/08/2012.
15/08/2012.
SONTAG, Susan.
SONTAG, Susan. Sobre
Sobre Fotografia.
Fotografia. São
São Paulo:
Paulo: Cia.
Cia. das
das Letras,
Letras, 1983.
1983.
221
221

v. educar em
nossa américa
222
222
223
223

la experiencia filosófica como crítica y expectativa


en arturo andrés roig

adriana maría arpini11

Filosofar
Filosofar es
es para
para Platón
Platón ejercer
ejercer un
un acto
acto de
de libertad.
libertad. (…)
(…) el
el filósofo
filósofo (…)
(…)
se
se ha
ha de
de plantear
plantear el
el problema
problema dede la
la naturaleza
naturaleza deldel lenguaje
lenguaje yy de
de su
su uso
uso ––
hablado
hablado oo escrito
escrito –– si
si quiere
quiere que
que lala búsqueda
búsqueda de de la
la verdad
verdad nono vea
vea
comprometida
comprometida su su libertad
libertad consustancial.
consustancial. Otro
Otro aparece
aparece con
con clara
clara luz
luz al
al
plantearse
plantearse qué
qué cosa
cosa sea
sea el
el amor,
amor, relación
relación que
que supone
supone en
en susu íntima
íntima
esencia
esencia aquella
aquella misma
misma libertad,
libertad, jugada
jugada enen la
la actividad
actividad pedagógica
pedagógica
(Roig,
(Roig, 1972)
1972)

H emos elegido un filósofo de nuestra América, Arturo Andrés Roig 22, cuya
obra más importante se desarrolla durante el siglo pasado y principios del
actual, quien ha reflexionado desde sus propias circunstancias valiéndose
de las producciones del pensamiento universal. Una de sus preocupaciones centrales es la
propia actividad filosófica. En sus escritos tempranos, la meditación los lleva a discurrir a
propósito de los diálogos platónicos. En este nudo filosófico queremos detenernos para
pensar acerca de la experiencia filosófica como crítica y expectativa.
Nuestra realidad está llena de injusticias - advierte Roig -. Frente a ello, ¿qué se
puede hacer desde y con la filosofía? Antes que nada es necesario comprender que su
naturaleza es esencialmente crítica y autocrítica. Esto está presente ya en Platón, en la
exétasis platónica. La lectura de algunos diálogos nos acerca a la comprensión de los
alcances de la crítica y su relación con las expectativas en el porvenir.
En las II Jornadas de Humanidades, que se realizaron en Mendoza, en setiembre de
1964, Arturo Roig presentó un trabajo titulado “Ideología y crítica en la enseñanza de las
humanidades. Una meditación a propósito del Alcibíades de Platón”, cuyo objetivo es
confirmar la naturaleza esencialmente crítica de la filosofía y plantear la posibilidad y
conveniencia de su enseñanza. La crítica es entendida aquí como examen, en el sentido de
la “exétasis” platónica, enunciada en la Apología por Sócrates: “La vida no examinada no es
vivible para el hombre” (Apología, 38 a-5).
La crítica fue la tarea de la filosofía desde que comenzó a practicarse en la antigua
Grecia. La exigencia de autoexamen contenida en la sentencia “conócete a ti mismo” - que
según Diógenes habría sido acuñada por Tales y estaba inscripta en el templo de Apolo - se
11 Universidad
Universidad Nacional
Nacional de de Cuyo
Cuyo yy Consejo
Consejo Nacional
Nacional de de Investigaciones
Investigaciones Científicas
Científicas yy Técnicas
Técnicas ––
Uncuyo/CONICET.
Uncuyo/CONICET. Email: Email: aarpini@mendoza-conicet.gob.ar
aarpini@mendoza-conicet.gob.ar
22 Arturo
Arturo Andrés
Andrés RoigRoig (Mendoza,
(Mendoza, 1922 1922 –– 2012),
2012), filósofo
filósofo ee historiador
historiador de de las
las ideas
ideas latinoamericanas.
latinoamericanas. ProfesorProfesor dede
Filosofía
Filosofía antigua
antigua yy deldel Seminario
Seminario de de filosofía
filosofía latinoamericana
latinoamericana en en lala Facultad
Facultad de de Filosofía
Filosofía yy Letras
Letras de de la
la
Universidad
Universidad Nacional
Nacional de de Cuyo
Cuyo (Mendoza,
(Mendoza, Argentina).
Argentina). Autor Autor de de LosLos krausistas
krausistas argentinos
argentinos (1969),
(1969), El El
espiritualismo
espiritualismo argentino
argentino entre
entre 1850
1850 yy 1900
1900 (1972),
(1972), Platón
Platón oo la
la filosofía
filosofía como
como libertad
libertad yy expectativa
expectativa (1972).
(1972). Exiliado
Exiliado
desde
desde 1974
1974 enen México
México yy luego
luego en en Ecuador,
Ecuador, contribuyó
contribuyó decididamente
decididamente en en lala reconstrucción
reconstrucción de de la
la Historia
Historia dede
las
las ideas
ideas en
en este
este país,
país, orientando
orientando un un equipo
equipo de de jóvenes
jóvenes investigadores
investigadores yy renovando
renovando las las bases
bases teórico-
teórico-
metodológicas
metodológicas de de la
la Historia
Historia de de las
las ideas.
ideas. Publicó
Publicó Esquemas
Esquemas parapara una
una historia
historia de de la
la filosofía
filosofía ecuatoriana
ecuatoriana (1977),
(1977),
Teoría
Teoría yy crítica
crítica del
del pensamiento
pensamiento latinoamericano
latinoamericano (1981),
(1981), El
El pensamiento
pensamiento social
social de
de Juan
Juan Montalvo
Montalvo (1984),
(1984), El El humanismo
humanismo
ecuatoriano
ecuatoriano enen la
la segunda
segunda mitad
mitad deldel siglo
siglo XVIII
XVIII (1984),
(1984), Bolivarismo
Bolivarismo yy filosofía
filosofía latinoamericana
latinoamericana (1984),
(1984), Narrativa
Narrativa yy
cotidianidad
cotidianidad (1984),
(1984), LaLa utopía
utopía enen el
el Ecuador
Ecuador (1987).
(1987). DeDe regreso
regreso en en Argentina
Argentina prosiguió
prosiguió sussus indagaciones
indagaciones yy la la
formación
formación de de investigadores
investigadores aa través
través deldel Seminario
Seminario de de Filosofía
Filosofía Latinoamericana.
Latinoamericana. Desde Desde 1986
1986 fue
fue Director
Director
del
del Centro
Centro Regional
Regional de de Investigaciones
Investigaciones Científicas
Científicas yy Técnicas
Técnicas de de Mendoza
Mendoza yy del del Instituto
Instituto de de Ciencias
Ciencias
Humanas,
Humanas, Sociales
Sociales yy Ambientales.
Ambientales. Desde Desde entonces
entonces publicó:
publicó: Rostro
Rostro yy filosofía
filosofía dede América
América Latina
Latina (1993),
(1993), ElEl
pensamiento
pensamiento latinoamericano
latinoamericano yy su su aventura
aventura (1994),
(1994), LaLa universidad
universidad hacia
hacia la la democracia
democracia (1998),
(1998), Ética
Ética del
del poder
poder yy
moralidad
moralidad dede la
la protesta
protesta (2002),
(2002), Necesidad
Necesidad de de una
una segunda
segunda independencia
independencia (2003),
(2003), Para
Para una
una lectura
lectura filosófica
filosófica del
del siglo
siglo
XIX
XIX (2008),
(2008), Mendoza
Mendoza en en sus
sus letras
letras yy sus
sus ideas.
ideas. Segunda
Segunda parte
parte (2009),
(2009), entre
entre otros
otros títulos.
títulos.
224|
224| adriana
adriana maría
maría arpini
arpini

encuentra en toda la filosofía presocrática de manera implícita o explícita, aunque con


limitaciones en su desarrollo debido a cierto dogmatismo y falta de método. Ella alcanza
en el pensamiento socrático-platónico el primer intento de sistematización de todas las
formas de crítica. Roig señala que “con Sócrates todas las facetas críticas anteriores quedan
reintegradas en su actitud de examen que tiene pretensiones de universalidad y de
proceder metódico” (ROIG, 1964, p. 1), con lo que se produce un rechazo de las formas de
saber existentes, las cuales quedan sometidas a “exétasis”.
En efecto, Sócrates no puede dudar de la sentencia del Oráculo y pone en marcha
un método para su aplicación. Su búsqueda muestra que ni los políticos, ni los poetas, ni
los artesanos pueden superar un saber de tipo empírico. Frente a lo cual surge “la necesidad
de alcanzar una interiorización, en busca de un punto de partida desde el cual pudiese
reestructurar todos los conocimientos, tanto desde un punto de vista del saber científico,
como de una posición axiológica ordenadora del conocimiento y de la vida” (Idem., p. 2).
Su examen procede en un primer movimiento, desde lo externo hacia el descubrimiento
del núcleo íntimo de nosotros mismos. Una vez hallado comienza el segundo movimiento
en sentido inverso que permite superar el rechazo de lo externo, reintegrándolo en un
orden jerárquico cognitivo y valorativo. En esto consiste el primer intento orgánico de
crítica en el pensamiento griego. Según Roig, los principios de la exétasis, enunciados por
Sócrates, alcanzan con Platón carácter sistemático. A través de sus diálogos se plantea
tanto el problema de la posibilidad de una “ciencia de la ciencia” (Cármides), como el de los
diversos contenidos de conciencia, de formas de la experiencia y las ciencias de cada una
(Alcibíades).
¿En qué consiste el “tomar cuidado de sí mismo”? Para responder es necesario
delimitar lo que “somos nosotros mismos”, “las cosas de nosotros mismos” o “lo nuestro”.
Tal distinción descubre al cuerpo como la esfera inmediata al “nosotros mismos” y en una
esfera de mayor exterioridad lo que se refiere a “las cosas de nosotros mismos”, v.gr. las
riquezas. Pero conocer nuestro cuerpo y nuestras cosas no es lo mismo que el conocimiento
de nosotros mismos. La exétasis requiere el intento de captar nuestra interioridad
absolutamente. “¿De qué manera encontraríamos el sí mismo del sí mismo?”
(ALCIBÍADES, 129 b-1), “¿De qué manera conoceríamos claramente el sí mismo?” (Idem.,
132 c-7). Vale destacar que en estas preguntas no se interroga directamente por algo, sino
por el modo de acceder a ello. Esta es una exigencia metodológica que revela el sentido
crítico de toda la tarea. La respuesta se busca por vía analógica, mediante la comparación
entre la visión y el conocimiento, así –afirma Roig– el lema délfico es entendido como
“mira a ti mismo”. De tal modo que el conocimiento es radical interioridad, “una cierta
visión que se ve a sí misma y que funda la posibilidad de las otras visiones” (ROIG, 1964,
p. 3).
Es decir que el núcleo luminoso del alma, inmediato a “nosotros mismos”, está
rodeado por una esfera envolvente constituida por los contenidos de conciencia referentes
al mundo de la experiencia. Esta segunda esfera no es reflexiva en sí misma, sino que hace
referencia a objetos diferentes de sí misma. Es un camino de ida y vuelta, se transita desde
la exterioridad hacia el núcleo reflexivo y se regresa desde este hacia el exterior. Esta
segunda marcha es expresada en la sentencia: “Conociendo a Alcibíades, conoceremos las
cosas de Alcibíades y las cosas que se refieren a las cosas de Alcibíades” (ALCIBÍADES,
133 c-d).
Hay un saber que es saber de sí mismo y de los demás saberes: la sofrosyne.
Desde
Desde el
el punto
punto de de vista
vista del
del conocimiento
conocimiento -- dice
dice Roig
Roig -- la
la sofrosine,
sofrosine, que
que eses razón
razón yy
fundamento
fundamento de de otras
otras formas
formas de de saber,
saber, que
que atiende
atiende aa lala salud
salud del
del cuerpo
cuerpo (“lo
(“lo
nuestro”)
nuestro”) yy aa la
la salud
salud de
de la
la ciudad
ciudad (“las
(“las cosas
cosas que
que tienen
tienen que
que ver
ver con
con lolo nuestro”),
nuestro”),
es
es decir
decir la
la medicina
medicina yy la la política,
política, con
con el
el amplio
amplio sentido
sentido que
que aquí
aquí tienen.
tienen. (…)
(…) La
La
la
la experiencia
experiencia filosófica
filosófica como
como crítica
crítica yy expectativa
expectativa en
en arturo
arturo andrés
andrés roig
roig || 225
225

terea
terea crítica
crítica resulta
resulta dede esta
esta manera,
manera, dentro
dentro dede lala filosofía
filosofía platónica,
platónica, integral,
integral, yaya
que
que enen ella
ella se
se pretende
pretende someter
someter aa examen,
examen, en en forma
forma orgánica
orgánica yy jerarquizada,
jerarquizada,
desde
desde lolo a-priori
a-priori yy necesario,
necesario, hasta
hasta los
los contenidos
contenidos a-posteriori
a-posteriori yy contingentes.
contingentes. En En
otras
otras palabras,
palabras, que
que enen este
este intento
intento dede crítica
crítica no
no se
se encuentran
encuentran escindidos
escindidos lo lo lógico
lógico
yy lo
lo antropológico.
antropológico.
La
La filosofía
filosofía –concluye
–concluye Roig–,
Roig–, como
como saber
saber central
central dentro
dentro dede las
las humanidades,
humanidades, debe debe
una
una vez
vez más
más afirmar
afirmar para
para sísí misma
misma el el derecho
derecho de de ser
ser una
una tarea
tarea de
de examen;
examen; pero pero
he
he aquí
aquí lolo que
que pensamos:
pensamos: esa esa exétasis
exétasis debe
debe ser
ser integral
integral yy orgánica,
orgánica, en en el
el doble
doble
sentido
sentido de de apuntar
apuntar tanto
tanto aa una una crítica
crítica de
de la la razón
razón como
como de de las
las formas
formas de de
experiencia
experiencia histórica
histórica de de nuestra
nuestra modernidad.
modernidad. TodosTodos sabemos
sabemos cómo
cómo laslas formas
formas deldel
pensamiento
pensamiento enmascarado,
enmascarado, aa las las que
que sese da
da el
el nombre
nombre de de ‘ideologías’,
‘ideologías’, pueden
pueden llegar
llegar
inclusive
inclusive aa condicionar
condicionar una una crítica
crítica dede la
la razón
razón yy hasta
hasta qué
qué punto
punto invaden
invaden yy
condicionan,
condicionan, en en general,
general, la la transmisión
transmisión de de las
las humanidades.
humanidades. (…) (…) El
El ‘conócete
‘conócete aa ti ti
mismo’,
mismo’, queque orienta
orienta lala filosofía
filosofía clásica
clásica desde
desde su su origen
origen hasta
hasta sus
sus últimos
últimos días,
días, es
es
sin
sin duda
duda enen cuanto
cuanto aa exigencia
exigencia de de examen,
examen, la la clave
clave dede toda
toda filosofía
filosofía antropológica
antropológica
(ROIG,
(ROIG, 1964,
1964, p.
p. 4).
4).
En la lectura que hace Roig del Alcibíades se plantea el problema de la conciencia
pura de modo tal que permite dar el paso de lo epistemológico a lo antropológico. Todo
comienza allí con la esperanza óntica de Alcibíades, de llegar a ser “el más poderoso de la
ciudad”. A través del diálogo socrático consigue elevarse a un plano de realización en lo
ontológico: se trata de una investigación en la naturaleza del hombre que permite
distinguir entre lo que en él manda y lo que en él hace de instrumento. La búsqueda de este
“sí mismo” y su caracterización es una terea que exige ser cumplida en común, no
aisladamente. La comunicación se da de hecho entre almas, pero el “examinar en común”
no se lleva a cabo con los elementos físicos del lenguaje (v. gr. el rostro) ni con el alma
como mera realidad psíquica, sino como aquella actividad que le es realmente propia: el
“mirar” con “vista de ideas” (sabiduría), o sea la captación de las esencias presentes en el
horizonte trascendental de la psique y el pensar acerca de estas realidades ontológicas. Esto
sobrepasa al hombre individualmente, para presentarlo en su naturaleza única, en la que es
posible la comunicación y el “examen en común”. El conocimiento de sí mismo se alcanza
mirando el sí mismo de otra alma. De donde el dictum “conócete a ti mismo” puede ser
expresado también como “mira a ti mismo”, pero tal mirar sólo es posible en otro: “si un
ojo contemplando un ojo y fijando su mirada sobre aquello que es lo mejor de él, en él
mira, de este modo a sí mismo se mira” (ALCIBÍADES, 133a, 5-6).
Otro
Otro tanto
tanto lele sucede
sucede al
al alma
alma sisi quiere
quiere alcanzar
alcanzar susu propio
propio conocimiento.
conocimiento. Al Al
encontrar
encontrar lo lo semejante
semejante enen lala otra,
otra, descubre
descubre lolo trascendental
trascendental que
que la
la define.
define. La
La
única
única manera
manera de de alcanzar
alcanzar conciencia
conciencia dede la
la universalidad
universalidad yy exactitud
exactitud dede las
las
esencias
esencias se se logra
logra cuando
cuando las
las encontramos
encontramos comocomo unauna realidad
realidad común
común queque nos
nos
trasciende
trasciende individualmente.
individualmente. (…) (…) LaLa reflexión
reflexión en
en común
común supone
supone pues
pues elel modo
modo
originario
originario deldel filosofar
filosofar del
del cual
cual depende
depende todo
todo otro
otro modo.
modo. (ROIG,
(ROIG, 1969,
1969, 24;
24; ROIG,
ROIG,
1972,
1972, §§ 33).
33).
Con lo cual se pasa del yo al nosotros gracias al “recurso inagotable del diálogo” y el
mirar-se en otro. Este mirar-se en otro permite también avanzar desde la dimensión
epistémica a la ético-antropológica, por cuanto se trata en cada caso de “mirar aquello que
es lo mejor en él”, su mejor modo de ser. Tal mirar, cuando se trata de objetos, permite dar
con la razón de ser de una cosa, y cuando se refiere a la dimensión moral señala el modo de
ser de la razón ante el cual se decide la voluntad. Uno y otro no se dan separadamente, sino
que ambos suponen la estructura moral del hombre y el ejercicio de la libertad tanto en el
conocer como en el obrar. Así se explica por qué Sócrates, siendo coherente consigo mismo
(con su propia estructura moral) en un acto de libertad suprema, elige la cicuta.
Ahora bien, ¿es suficiente para la conciencia filosófica afirmar que el orden
trascendental es correlativo con otro orden y no inquirir por la naturaleza de ese otro
orden? En los textos platónicos, la respuesta se encamina por dos vías: la del mito y la de la
226|
226| adriana
adriana maría
maría arpini
arpini

reducción del poner, llevada a cabo, esta última, sobre la base del concepto de “hipótesis” o
“sub-posición”. Asunto especialmente trabajado por Roig por cuanto ofrece acceso a la
consideración de la experiencia como expectativa.
Mientras que la acción trascendental se expresa mediante el verbo poner, el intento
de alcanzar la posibilidad absoluta de toda experiencia será expresado con el verbo sub-
poner (ὑποτίϑημι) y su correspondiente sustantivo hipótesis. El poner implica ya un sub-
poner, un tomar como base o fundamento algo respecto de algo. Es decir que toda hipótesis
es condicionante y condicionada por una hipótesis superior. Esta ambigüedad juega en el
desarrollo del método, pues en virtud de la potencia de dialectizar es posible, en la
dimensión noética, sostener la expectativa de pasar desde la hipótesis al principio no-
hipotético. (ROIG, 1972, § 48 y § 49, 45-46). Cabe preguntar cómo se comporta la
naturaleza humana en relación con tal expectativa.
La doctrina de la expectativa se funda en Platón en una teoría de la “vaciedad” y de
la “replesión” (sic).33 Tanto el cuerpo como el alma experimentan formas de vaciedad,
como el hambre y la sed para el cuerpo y la ignorancia o la insensatez para el alma. Ambas
carencias pueden trocarse en plenitud gracias al alimento y la inteligencia. La “replesión”
implica pues un modo propio de ser del alma en función del cual se constituye como
estructura abierta, como expectativa. Existe en cada uno de nosotros el ansia de llenarnos,
como existe la realidad con la cual nos hemos de llenar. “Todo hombre está lleno de
muchas esperanzas” (FILEBO, 40a, 3-4).
El
El ser
ser humano
humano –concluye
–concluye Roig–
Roig– se se mueve
mueve entre
entre el
el dolor
dolor provocado
provocado porpor el
el vacío
vacío yy
la
la alegría
alegría por
por la
la esperanza
esperanza dede llenarlo
llenarlo si
si no
no por
por ese
ese doble
doble yy profundo
profundo dolor
dolor que
que es
es
el
el que
que provoca
provoca nuestra
nuestra vaciedad
vaciedad yy nuestra
nuestra desesperanza
desesperanza ante
ante la
la imposibilidad
imposibilidad de de
la
la plenitud.
plenitud. MásMás tanto
tanto aquella
aquella expectativa
expectativa esperanzada
esperanzada como
como la la desesperanza,
desesperanza,
suponen
suponen la la esperanza
esperanza como
como forma
forma misma
misma deldel alma.
alma. Las
Las esperanzas
esperanzas enen plural,
plural,
apuntan
apuntan porpor elel contrario
contrario aa la
la “materia”
“materia” dede nuestra
nuestra replesión,
replesión, aquello
aquello con
con lo
lo cual
cual
nos
nos llenamos,
llenamos, mas mas no
no constituyen
constituyen lo lo que
que funda
funda la
la posibilidad
posibilidad de
de llenarse.
llenarse. (ROIG,
(ROIG,
1969,
1969, p.
p. 41-42;
41-42; ROIG,
ROIG, 1972,
1972, §§ 59,
59, p.53-54).
p.53-54).
La esperanza como forma del alma es ontológica, las esperanzas en plural remiten a
la temporalidad como condición propia de los seres humanos. Pero ambas son modos
formales del alma.
La
La esperanza
esperanza así así entendida
entendida –podemos
–podemos esperar
esperar porque
porque estamos
estamos hechos
hechos para
para
esperar–
esperar– significa
significa pues
pues posibilidad
posibilidad de
de una
una radicación
radicación absoluta
absoluta de
de toda
toda experiencia.
experiencia.
El
El pensamiento
pensamiento platónico
platónico se se nos
nos muestra
muestra de
de este
este modo
modo construido
construido como
como una
una
filosofía
filosofía de
de la
la libertad
libertad yy de
de la
la expectativa.
expectativa. (ROIG,
(ROIG, 1969,
1969, p.
p. 42).
42).

referencias
PLATÓN.
PLATÓN. Alcibíades
Alcibíades oo dede la
la naturaleza
naturaleza deldel hombre.
hombre. Traducción
Traducción deldel griego,
griego, prólogo
prólogo yy notas
notas dede José
José
Antonio
Antonio Míguez.
Míguez. Madrid-Buenos
Madrid-Buenos Aires: Aires: Aguilar
Aguilar -- Biblioteca
Biblioteca dede iniciación
iniciación filosófica,
filosófica, 1961.
1961.
______.
______. República.
República. Traducción
Traducción de de Antonio
Antonio Camarero.
Camarero. Estudio
Estudio preliminar
preliminar yy notas
notas dede Luis
Luis Farre,
Farre, Buenos
Buenos
Aires:
Aires: EUDEBA,
EUDEBA, 1963. 1963.
______.
______. Apología
Apología dede Sócrates.
Sócrates. Traducción
Traducción directa,
directa, Introducción,
Introducción, Notas
Notas yy Apéndice
Apéndice de de Luis
Luis Noussan-Letry
Noussan-Letry
(tercera
(tercera edición
edición revisada
revisada yy ampliada).
ampliada). Buenos
Buenos Aires:
Aires: Astrea,
Astrea, 1973.
1973.
ROIG,
ROIG, Arturo
Arturo Andrés.
Andrés. Ideología
Ideología yy crítica
crítica en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de las
las humanidades.
humanidades. UnaUna meditación
meditación aa propósito
propósito del
del
Alcibíades
Alcibíades dede Platón.
Platón. 55 páginas.
páginas. Texto
Texto mecanografiado
mecanografiado conservado
conservado en en el
el Archivo
Archivo de de Pensamiento
Pensamiento
Latinoamericano
Latinoamericano del del CRICYT
CRICYT (actual
(actual Centro
Centro Científico
Científico Tecnológico,
Tecnológico, CCT–Mendoza),
CCT–Mendoza), 1964. 1964.
______.
______. La
La experiencia
experiencia de de lala filosofía
filosofía enen Platón.
Platón. Philosophia.
Philosophia. Revista
Revista del
del Instituto
Instituto de
de Filosofía,
Filosofía, Mendoza,
Mendoza,
n.35,
n.35, p.5-42,
p.5-42, 1969.
1969.
______.
______. Platón
Platón oo la
la filosofía
filosofía como
como libertad
libertad yy expectativa.
expectativa. Mendoza:
Mendoza: Instituto
Instituto dede Filosofía
Filosofía dede la
la Universidad
Universidad
Nacional
Nacional de de Cuyo,
Cuyo, 1972
1972 (Edición
(Edición facsimilar
facsimilar yy otros
otros escritos:
escritos: Mendoza,
Mendoza, EDIFYL,
EDIFYL, Colección
Colección
Cumbre
Cumbre Andina, 2014)..
Andina, 2014)

33 Cfr.
Cfr. libro
libro IX
IX de
de la
la “República”
“República” yy retomada
retomada en
en “Filebo”.
“Filebo”.
227
227

educar en la interculturalidad: diá-logos con los kevin11

mauricio langon22

1. introducción

Q uiero proponer pensar y discutir investigación y educación públicas,


interculturalmente, como lugares de encuentro entre "unidades geoculturales"
diversas en que están tanto los "educadores" como los "educandos". En esos
espacios de encuentro intercultural está en juego la existencia humana de los
interlocutores. Sus conflictos y problemas pueden ir desde los del "choque de
civilizaciones" a los del diá-logos intercultural, que es lo que aquí propongo. Dicha
educación no puede ser considerada como si fuera un proceso de homogeneización en una
única cultura y sociedad, como mera distribución de conocimientos y destrezas
pretendidamente aptos para sobrevivir en la globalización.
La "educación" sigue siendo pensada hoy, de modo muy predominante, como
instrumento de inserción de las nuevas generaciones en un sistema mundo ya dado que se
presenta como única realidad buena, indiscutible y deseable, garantizada por la calidad
tecnológica de los instrumentos que lo sostienen, que a su vez se fundan circularmente en
los aspectos positivos del desarrollo tecnocientífico. Pensada así como sustancialmente
acrítica e insolidaria, y reducida su creatividad a innovaciones en el marco de lo dado, la
educación resulta herramienta útil y sutil para una deshumanización de alcance mundial,
complementaria de más brutales dominaciones y etnocidios.
Hay que cambiar la mirada: mirar las educaciones como procesos diversos,
complejos y conflictivos de formación de seres humanos (de hominización) en contextos
grupales y modos relacionales, cuya humanización es condición de posibilidad de la
reproducción de la vida humana (y de la vida a secas). Un cambio teórico que se está
gestando en reflexión y discusión con situaciones y prácticas educativas concretas, que
van avanzando en la apertura de otros modos de pensar, discutir y actuar. Los esbozos de
criterios y preguntas para valorar procesos y experiencias educativas, que aquí sugiero quieren
ser un aporte a ese cambio.
La idea central es pensar y trabajar los espacios y tiempos educativos en tanto
lugares inter, de frontera, escenarios de encuentro entre personas y grupos de distintas
culturas, saberes y generaciones, de modo que puedan dar lugar a avanzar en un proceso de
humanización inter-cultural, a través de distintas palabras y modos de pensar (dia-logos),
distintas sensibilidades (dia-pathos) y modos de valorar (dia-ethos).
Aquí ensayaré usar esta perspectiva en el estudio de una escena concreta de encuentro
intercultural acaecida recientemente en el entorno de una investigación cuyos objetivos
eran "comprender los sentidos que le dan a la experiencia educativa" jóvenes desafiliados o

11 "Kevin"
"Kevin" es es el
el nombre
nombre impuesto
impuesto (por(por razones
razones dede confidencialidad)
confidencialidad) al al joven
joven marginal
marginal uruguayo
uruguayo cuyo
cuyo discurso
discurso
estudio
estudio enen este
este trabajo.
trabajo. EnEn el
el título
título uso
uso el
el plural,
plural, "los
"los Kevin",
Kevin", para
para referirme
referirme aa las
las nuevas
nuevas generaciones
generaciones queque en
en
barrios
barrios miserabilizados.
miserabilizados. Con Con esta
esta nominación
nominación consciente,
consciente, impropia
impropia ee impuesta
impuesta como
como las
las duras
duras circunstancias
circunstancias
en
en que
que están
están viviendo,
viviendo, quiero
quiero denunciar
denunciar la la responsabilidad
responsabilidad colectiva
colectiva de de nuestra
nuestra sociedad
sociedad enen esa
esa situación
situación
injusta,
injusta, aa la
la vez
vez que
que implicar
implicar un un reconocimiento
reconocimiento incondicional
incondicional de
de la
la cualidad
cualidad de
de humano
humano queque comparten
comparten estos
estos jóvenes
jóvenes
con
con los
los demás.
demás. CosaCosa que
que nono ocurre
ocurre con
con pretendidos
pretendidos "conceptos"
"conceptos" como:
como: "bárbaros",
"bárbaros", "planchas",
"planchas", "los
"los de
de la
la
gorrita".
gorrita". O O de
de manera
manera másmás eufemística
eufemística yy educada,
educada, pero
pero siempre
siempre cosificadora,
cosificadora, deshumanizadora
deshumanizadora yy negadora:
negadora:
"Los
"Los ni...
ni... ni...".
ni...". En
En este
este escrito
escrito tomamos
tomamos comocomo base
base otro
otro mencionado
mencionado en en las
las referencias
referencias (Langon,
(Langon, 2016a),
2016a),
reducido
reducido yy modificado
modificado considerablemente
considerablemente yy con con criterios
criterios yy preguntas
preguntas utilizados
utilizados enen otro
otro trabajo
trabajo todavía
todavía
inédito
inédito (Langon,
(Langon, 2016b).
2016b).
22 Universidad
Universidad de de la
la Republica
Republica -- UDELAR.
UDELAR. Email:
Email: mlangon@gmail.com
mlangon@gmail.com
228|
228| mauricio
mauricio langon
langon

en riesgo de desafiliación de la educación media formal, pero vinculados a otras propuestas


educativas públicas, que específicamente se propuso "reconocer si la experiencia educativa
(...) ha dejado huellas en ellos y significado su formación" y, "a partir de ello, reconstruir
los sentidos y/o ausencias de sentidos que le dan a la educación" (RUIZ BARBOT et al,
2015, s.p.). Me centro en el relato del relato de experiencias (educativas) de un joven de un
cante al que los investigadores bautizaron Kevin (cf. infra Anexo).

2. consideraciones teóricas
Explicito a continuación, sintéticamente, algunas ideas que me llevan a plantear
esta manera de dirigir la mirada a los procesos educativos.

2.1. geocultura y educación


Para Kusch (2000) la educación es un fenómeno intracultural. Al educarnos nos
hacemos humanos por endoculturación, en la cultura de determinado grupo, de cierto modo
particular de ser humano, ligado a anteriores experiencias colectivas de suelo e historia que
han generado culturas diversas que nos son previas y nos condicionan. Se trata de una
relación a priori de toda individuación, una "comunidad interna" previa a cada ser humano,
que lo es siempre de la cultura en que se educa. Ya que:
Cultura
Cultura no
no es
es sólo
sólo el
el acervo
acervo espiritual
espiritual que
que elel grupo
grupo brinda
brinda aa cada
cada uno
uno yy que
que es
es
aportado
aportado por
por la
la tradición,
tradición, sino
sino además
además eses el
el baluarte
baluarte simbólico
simbólico en en el
el cual
cual uno
uno se
se
refugia
refugia para
para defender
defender la la significación
significación de
de susu existencia.
existencia. Cultura
Cultura implica
implica una
una
defensa
defensa existencial
existencial ante
ante lo
lo nuevo,
nuevo, porque
porque si
si careciera
careciera de
de ella
ella no
no tendría
tendría elementos
elementos
para
para hacer
hacer frente
frente aa una
una novedad
novedad incomprensible
incomprensible (KUSCH,
(KUSCH, 2000,2000, p.252)
p.252)

"Un diálogo es, ante todo, un problema de interculturalidad", pues está en juego
nada menos que aquello que defiende cada cultura: "la existencia de los interlocutores".
Hay diferencia "en el modo cultural que se ha encarnado en cada uno", que es "una
diferencia de perspectiva y de código" y, en tanto tal, "cuestiona la posibilidad de una
comunicación real" (KUSCH, 2000, p.251ss.). Pero cuestiona también el "saber absoluto":
"no establecer ad hoc un pensamiento así llamado universal", puesto que todo pensamiento
"está condicionado por el lugar".
La idea que propongo es considerar los lugares y prácticas de educación pública como
escenarios y escenas de encuentros interculturales esencialmente conflictivos, entre miembros de
distintas culturas, y que implican riesgos existenciales y de incomunicación real. Para
entender la educación como procesos de dia-logos sostenidos, durante toda la vida, entre
miembros de diferentes culturas.
Los lugares educativos no se piensan como espacios de relaciones de subordinación
entre quien sabe (atada a su cultura, pensamientos, juicios, conceptos, objetivos e intereses
previos, concebidos como indiscutibles e inamovibles) y quien ignora. Esta perspectiva
antropológico-filosófica, en la medida en que no concibe sujetos colectivos constituidos sino
históricos, desconstituidos y constituyentes, siempre en relación con otros, en la medida en
que sabe que no está en el saber absoluto, que su cultura no es el conocimiento universal,
exige avanzar a través de los distintos modos de ser humanos, en diá-logos, en un proceso
siempre abierto de constitución humana (singular y colectiva), de convivencia entre
diferentes.
El actual proceso de "globalización" produce y profundiza la fragmentación
territorial, económica y social. Genera así nuevas unidades geoculturales (por ejemplo,
cantegriles y barrios privados), considerablemente aisladas que, al mismo tiempo,
cohabitan espacios puntuales, locales, ciudadanos, nacionales y globales. Pero como en
educar
educar en
en la
la interculturalidad:
interculturalidad: diá-logos
diá-logos con
con los
los kevin
kevin || 229
229

"mundos paralelos", invisibilizados entre sí, sin habla, incomunicados,33 en choque. Parece
necesario pasar al dia-logos.

2.2. experiencia y comunicación


Experiencia la entiendo como "pasar peligros juntos". Hay un peligro, hay un pasar.
No siempre juntos. Pero si la pongo fuera de mí (ex), en común con otros seres humanos, si
la expongo en lenguaje, si la traduzco para otro, mi experiencia se comunica. Nunca del
todo: en la traducción siempre, algo pasa al otro, y algo permanece ininteligible. Jamás es
transparente. Nunca dejamos de ser al menos dos en la experiencia; nunca dejamos de ser
humanos; por tanto, diferentes; por eso, iguales.
La dificultad de la traducción viene de que no hay experiencia sin advertir que hay
peligro existencial, sin peligro de muerte sentido o sospechado. Viene de que, cuando se trata
de pasarla a otros, ya ha pasado, ya se ha sobrevivido. Los otros con que se la pasó, no
necesitan traducción: o no sobrevivieron o nos entienden. Hay que traducir una experiencia
para quienes no pasaron ese peligro, y es preciso que pasen ahora por esta experiencia
educativa para que atisbar la otra experiencia y enfrentarla mejor. Quienes pasaron por la
radical experiencia de los campos de concentración o la tortura, por ejemplo, hablan de la
dificultad de transmitirla; de transformarla en experiencia educativa para otros. Pero "cuando
te encuentras, por la calle, con otro compañero que también pasó por esa misma
experiencia y se entienden con sólo mirarse directamente a los ojos o al darse un abrazo"
(VÚSCOVIC, 2001, p.28). Para el otro que, para Kevin, sería otro joven de la calle (otro
Kevin), basta una mirada, un gesto. Pero "encontrar" a otro "más otro", que no haya
pasado esa experiencia, exige traducción en lenguaje.
Por eso, en el inter de las aulas se encuentran culturas, generaciones, lenguajes,
experiencias vitales muy diversas que están pasando de vuelta por una nueva experiencia
educativa juntos: la de generar espacios y tiempos en común en que se ponen en juego
experiencias vitales muy diversas, de modo de llegar a ser capaces de irse constituyendo en
ella desde y con sus distintos modos de sentir, de valorar, de pensar, de actuar. Entraña los
peligros del dia (pathos, ethos, logos): que sea a través de esos distintos modos, y no contra
contra oo
sin
sin ellos.
ellos.
El
El diálogo,
diálogo, enen el
el fondo,
fondo, eses intercultural.
intercultural. Necesita
Necesita tiempo-espacios
tiempo-espacios nuevos,
nuevos, que
que
trasciendan
trasciendan su su entorno.
entorno. Tiempo-espacios
Tiempo-espacios de de encuentro
encuentro entre
entre "los
"los demás".
demás". Generar
Generar nuevos
nuevos
nos-otros,
nos-otros, sin
sin reducir
reducir aa uno
uno los
los anteriores.
anteriores.

2.3. lugares
2.3.
Me refiero a determinada porción del espacio, a cierto lugar preciso, considerando
toda la diversidad y complejidad de su "contenido", cualitativamente particular
(inseparable de ese lugar y tiempo. Incluidos los elementos que entran en relación y se van
constituyendo en ese lugar, así como los que están fuera de él, pero repercuten en su
interior. Recurro al término "escenario" para aludir a lugares que están aconteciendo y se están
trans-formando a través, en y con ritmos, sucesos, estructuras, seres humanos que "ahí"
piensan y actúan, preparan estrategias, repiten y alteran consciente e inconscientemente
movimientos, en las circunstancias que los rodean, que cierran y abren posibilidades y
perspectivas desde ese lugar al que construyen mientras son construidos por y en él.
Propongo pensar los lugares educativos como escenarios de encuentros interculturales.
Propongo pensar cada aula, experiencia o práctica educativa: como "escena"; en
tanto todo lo que acontece en un tiempo dado en esos escenarios, puede ser considerado

33 Por
Por ejemplo,
ejemplo, puede
puede verse
verse un
un estudio
estudio del
del "kilómetro
"kilómetro 0"
0" (Plaza
(Plaza Libertad
Libertad oo Cagancha)
Cagancha) yy de
de la
la "Ciudad
"Ciudad Vieja"
Vieja"
de
de Montevideo
Montevideo (FRAIMAN;
(FRAIMAN; ROSSAL,
ROSSAL, 2011).
2011).
230|
230| mauricio
mauricio langon
langon

como "una unidad en sí misma" en que "se encuentran" (es decir: "están" y "entran en
contacto") interlocutores forjados previamente en distintas geoculturas. Unidad
contingente, nueva, definida, cambiante, finita. Determinada, concreta, única. Con su
lugar, su mobiliario, su clima, sus actores, sus normas, su inicio, su movimiento, sus
tensiones, su despliegue, sus ritmos, sus cambios, su final. Que abre "otras" unidades en
movimiento.
Tratando de entender su movimiento propio "mientras" está siendo, en el "entre
tanto" de cada escena concreta, sin deducción desde un principio ni conducción hacia un fin.
Es decir: intentando pensar de modo finito, contingente, humano, radical.

2.4. cambiar nuestra mirada


Se trata de cambiar nuestra mirada y nuestra actitud educativa. La perspectiva
antropológico-filosófica que asumimos (que concibe múltiples sujetos, colectivos y
singulares, históricos, siempre en construcción, desconstituidos, constituidos y constituyentes,
siempre en relación con otros; que sabe que no está ni puede estar en el saber absoluto, que
ninguna cultura es el conocimiento universal) exige avanzar a través de los distintos modos de
ser humanos, en diá-logos, en un proceso siempre abierto de constitución humana (singular
y colectiva), de convivencia entre diferentes.
Mirar a los jóvenes de los cantes como sujetos de cierta específica geocultura en la que
ya se están endoculturando, advertir nuestra otredad, renunciando a imponerla borrando su
identidad (desconociendo su existencia), exige abrirnos a una educación en diálogo intercultural.
Abrirnos a escucharlos e invitarlos a que se escuchen y nos escuchen en plano de igualdad.
Pasar juntos, solidariamente, la experiencia educativa de avanzar a través del
reconocimiento, la tensión y la discusión entre distintos modos de sentir, valorar y pensar.

3. escuchando a jóvenes seres humanos


Vamos, entonces, a pensar en clave de espacio entre culturas el encuentro que se dio
entre los Kevin y los investigadores.
Ese espacio inter es, sin embargo, interno una actividad (investigación), propia
(endógena) de cierta cultura en la que ocupa un lugar específico. Escena inventada en
escenarios preparados en función de objetivos de investigación: construir un "corpus" en
base a las palabras de sus interlocutores, interpretarlas y, sobre esa base, producir
conocimientos útiles a los decisores educativos y políticos en el momento de tomar
acciones tendientes a mejorar la educación de esos jóvenes.
Así buscado y (re)querido por grupos de nuestra cultura -y por eso mismo- se genera
un encuentro intercultural: Los jóvenes invitados se expresan y hablan, los investigadores
les dan la palabra y escuchan.
En y por principio no es un espacio de dia-logos: es sin intercambio, sin discusión,
sin "devolución", sin sugerencias, sin toma de decisiones. No es pensado como educativo (se
trata de una investigación) pero pasar por esa experiencia puede serlo para ambos grupos.
Aunque no pretenda incidir en los jóvenes, seguramente impactará en ellos esa
experiencia, de modos imprevisibles que no serán "seguidos" por nosotros. Para los otros
investigadores habrá sido, seguramente, una experiencia tensa y fructífera, capaz de
profundizar sus individuaciones singulares y colectivas. En ese sentido será, para ellos una
experiencia educativa, de aprendizaje.
En estudio de esta escena -centrada por otra parte, en las experiencias educativas de
los jóvenes- nos habilita a intentar pensar la educación en clave de dia-logos inter-cultural.
Y reubicar la discusión respecto a la educación en la actualidad.
Podría parecer que en esta investigación se asumiera como principal problema
educativo las dificultades de (re)insertar a (los) Kevin en el sistema educativo formal de
educar
educar en
en la
la interculturalidad:
interculturalidad: diá-logos
diá-logos con
con los
los kevin
kevin || 231
231

nuestra cultura pretendidamente universal. Ese es el problema de políticas sociales educativas


habituales, que promueven variadas acciones, más o menos puntuales, con esa finalidad
(que no por desorientadas dejan de tener efectos positivos, aparte del buscado). Pero surge
de la misma investigación que no es ése el problema de Kevin. Tampoco el de su educación.
Más bien, buena parte del problema educativo de los Kevin radica en las aporías de
los intentos de trasladarlos a una cultura, espacios y grupos que les son ajenos. Son esos
intentos los que están fracasando hoy en el llamado "fracaso educativo" de los Kevin. Es el
fracaso de una educación que niega a esos jóvenes en su otredad, y que, por eso, ni imagina
una educación en dia-logos intercultural.
Al entrar en escena, Kevin está siendo humano desde y en la cultura del grupo en
que se ha venido individualizando (singular y colectivamente, con sus "pares") en los
cantes. Esa cultura lo va formando en sus maneras propias de estar. La cultura particular
que encarna en esos jóvenes los habilita a construir, a través de sus experiencias, sus
sentidos de la vida; no los determina (eso lo hacen, quizás, circunstancias políticas
económicas y sociales que habría que cambiar) pero sí condiciona sus maneras de
relacionarse con sus otros y posibilita su des-arrollo endógeno. Quiero decir, al menos no
alienado. Así lo debería (re)conocer una educación humanizadora.
Es desde este marco geocultural que Kevin responde a las interrogantes por los
sentidos de la educación con un rechazo global a la educación formal, respondiendo a actos
de educar que no se insertan en su proceso de desarrollo y cambio, sino que apuestan a
hacerlo otro, a borrar su importancia propia (su id-entidad), a fin de incluirlo en situación
subordinada en el sistema global.
Impacta en el discurso de Kevin el rechazo a la "educación ajena" que vive desde la
escuela primaria, donde aprende a irse acomodando a ese mundo: "a no ser desubicado, a tener
respeto a las personas mayores". Aprende a callar y a obedecer: "Me decían algo, yo me callaba y
lo hacía". Pero sumisión y silencio -aprendizajes serviles- son también estrategias de
defensa y sobrevivencia: "Sabía que me iba a servir".
Su rechazo de la educación secundaria (que lo rechaza) engloba a todos los implicados
en esa educación, sus otros, utilizando un criterio que marca una distinción valorativa
radical, entre ese grupo y el nosotros del cantegril. "No le gusta" ese tipo de gente: "los
profesores y los alumnos", "toda gente creída". Criterio que capta en marcas lingüísticas,
culturales, modos de ver y actuar opuestos al propio: "Son creídas, te das cuenta, la forma que
hablan, la forma que miran, la forma en que se paran
paran todos
todos juntos"; "son todos creídos".
No es un mero planteo pasional lo que suelta: "¡te dan ganas de ..., a todos juntos,
atarlos a todos y agarrarlos a cachetazos!". Detrás hay un criterio de distinción antropológica y
ética que orienta juicios y (¿re?) acciones (visceralmente) negadoras de esos otros. Acciones
violentas apenas reprimidas por ahora. Expresamente no argumentativas o dialogales.
Las instituciones del Estado destinadas a estos jóvenes entran crisis de estancamiento
educativo cuando la educación que ofrecen ya no puede proponer a estos adolescentes nada
que no sea repetir cursos. Trata de retenerlos, de hacerla obligatoria, atractiva. Busca formas
de reinsertarlos. Pero ellos entran y salen; se van retirando. Sólo cabe culparlos y
estigmatizarlos: son desertores, fracasados. Kevin va asumiendo como propio ese fracaso.
No encuentra lugar en el mundo.
No sólo no quiere estar en los espacios de educación formal. Tampoco en ningún
lado: "No hice fuerza para nacer, hice fuerza para no nacer". Vivirá sin sentido, morirá pronto:
"Me arrepiento de nacer, estoy podrido de estar vivo, soy un bandolero, mi vida es un basurero, a los
veinticinco años me muero".
232|
232| mauricio
mauricio langon
langon

Pronto entran a tallar otros aparatos estatales, los represivos. Cómplice (o no) de
un delito será internado en un "hogar" del INAU44. Aprende ahí cosas sin importancia:
"hacer trucos con las cartas, nomás", confirmando la irrelevancia vital de la educación que se le
ofrece.
En el INAU el rechazo se transforma en odio: "Odiaba a todos". Aprende a
"escarmentar bastante", a tener "buena conducta", a evadir castigos: "estuve todo un mes
portándome bien, sin tener problemas ni nada". En ese marco experiencial va tomando posición
autónoma (solitaria, rebelde) en el plano moral o ético: "no capto reglas de nadie, no me gustan
las órdenes, me pongo mis reglas". Pero también posición solidaria: "siempre ayudé".
El proceso de individuación de Kevin, puede seguirse en las experiencias (previas y
paralelas a la educación formal) en su lugar de aprendizaje: "la calle". Sin recuerdos positivos
de sus padres, sí de un abuelo, que lo cuidó y le enseñó a no beber vino antes de morir de
cirrosis. Vive mudándose en el mismo cantegril: con un amigo al que salva de un intento
de suicidio; otra vez con la madre; y con una pareja mayor: "Esa mujer sí que me cuidó bien;
me decía hijo. Me cuidaba más que mi madre". Ahora vive en Aldeas Infantiles con amigos; ahí
todo "está mejor; zarpado".
Kevin dice que no aprendió "en ningún lado, todo fue en la calle". Un "ningún lado"
muy preciso, entonces. Dice que aprendió "todo solo, sin nadie".
Pero a la vez, entre muchos: con "el amor de mi vida y mi pesadilla": "a escuchar", "a
aconsejar", "a no sentirme solo".
solo".
"En
"En lala calle
calle encontrás
encontrás amor,
amor, encontrás
encontrás respeto,
respeto, encontrás
encontrás odio,
odio, amigos,
amigos, encontrás
encontrás enemigos.
enemigos.
Encontrás
Encontrás muchas
muchas cosas,
cosas, pero
pero aa la
la vez
vez no
no encontrás
encontrás nada".
nada". Lugar
Lugar de de encuentros:
encuentros: con
con todos
todos yy
nadie;
nadie; de
de todo
todo yy nada.
nada. "Ésta
"Ésta es
es la
la escuela,
escuela, ésta
ésta es
es la
la verdadera
verdadera escuela,
escuela, eso
eso de
de andar
andar estudiando,
estudiando,
llenando
llenando cuadernos
cuadernos concon palabras,
palabras, eso
eso no
no es
es escuela,
escuela, esto
esto es
es escuela".
escuela".
Cuando
Cuando le le piden
piden aa Kevin
Kevin como
como imaginaría
imaginaría un un lugar
lugar educativo,
educativo, aparece
aparece susu currículo
currículo
de
de fondo,
fondo, el el aprendizaje
aprendizaje en en sentido
sentido de de encuentro
encuentro entre
entre humanos
humanos que que habilita
habilita (o(o inhibe)
inhibe)
configurar
configurar sentidos,
sentidos, vidas
vidas humanas,
humanas, aquel aquel aprendizaje
aprendizaje del del cual
cual -quizás-
-quizás- son
son medio
medio oo
pretexto
pretexto laslas maneras
maneras yy temastemas de de enseñanza,
enseñanza, debería
debería ser,
ser, para
para Kevin:
Kevin: "Un "Un lugar
lugar donde
donde sese
aprenda
aprenda la la vida.
vida. Hay
Hay queque aprender,
aprender, aprender
aprender aa caminar,
caminar, aprender
aprender aa verver aa la
la gente,
gente, aprender
aprender aa
escucharla".
escucharla". Un Un lugar
lugar donde
donde aprender
aprender aa ser ser humano
humano yy aa seguir
seguir siéndolo
siéndolo entre
entre humanos.
humanos.
Donde
Donde continuar
continuar yy profundizar
profundizar los los encuentros
encuentros vitales
vitales dede la
la calle,
calle, abriéndolos
abriéndolos más más allá
allá del
del
grupo
grupo cercano,
cercano, en en diálogo
diálogo concon otros,
otros, geográfica,
geográfica, cultural
cultural yy etariamente
etariamente diferentes.
diferentes. La La
educación
educación comocomo encuentro,
encuentro, reflexión
reflexión yy diálogo
diálogo vitales,
vitales, no
no como
como acumulación
acumulación de de saberes
saberes
que
que enen una
una de de esas
esas resultan
resultan inútiles.
inútiles. También
También un un lugar
lugar donde
donde aprender
aprender aa sobrevivir
sobrevivir enen un
un
mundo
mundo en en elel que
que laslas relaciones,
relaciones, el el valor
valor yy el el sentido
sentido de de cosas
cosas yy seres
seres humanos
humanos estánestán
subordinadas
subordinadas al al dinero:
dinero: "Aprender
"Aprender aa manejar
manejar plata,
plata, aprender
aprender aa saber
saber qué
qué es
es plata;
plata; muchas
muchas cosas".
cosas".

4. criterios para educar en dia-logos


4.
Propongo pensar la educación como espacios de encuentro intercultural; y hacer de los
espacios educativos lugares de dia-logos inter-cultural. Sugiero el camino -no carente de
tensiones y riesgos- de pensar y construir la educación pública en perspectiva de diálogo
intercultural.
Los jóvenes marginales atribuyen a la educación pública formal por los que
transitaron (sin dejar de sentirla como un "vacío", una "nada", una "ausencia de sentido", "un
espacio y un tiempo donde no les pasa nada", que "no los altera") la significación de acciones
contra ellos, "para negar y negativizar lo que son". Una educación "ajena", "extraña", "arbitraria,
absurda o injusta", que no les posibilita "formarse" ni "transformarse", que inscribe en ellos "el
fracaso como huella" (RUIZ BARBOT et al, 2015, s.p.). Una institución que los ataca, los

44 Instituto
Instituto del
del Niño,
Niño, Niña
Niña yy Adolescente
Adolescente del
del Uruguay.
Uruguay.
educar
educar en
en la
la interculturalidad:
interculturalidad: diá-logos
diá-logos con
con los
los kevin
kevin || 233
233

altera, los aliena, un peligro que amenaza su existencia; una forma de ataque específica de
la que tienen que defenderse. Las conclusiones de la investigación constatan que nuestra
educación vive a esos jóvenes como el problema, y los vive como culpables de las situaciones
de la inseguridad social. Los agrede. Los jóvenes del cante "son vividos como extranjeros
por la institución" que "los sitúa en la imposibilidad de simbolizar y aprender": "no
pueden", "no saben"; o son los "que no quieren aprender, que no 'quieren ser alguien en la
vida'"; o los que tienen "dificultades de aprendizaje", "patologías sociales". Ellos son el
problema: "peligrosos", "violentos", "agresivos", "anómicos"; son "bichos"; son "lo que no se
tiene que ser". "Tendrían que (...) corregirse, enderezarse, normalizarse, silenciarse,
negarse". "Tienen que ser borrados por el orden pedagógico". Hay que enseñarles que está
mal ser así, y que está bien "ser aquello que no son, que no están siendo y que nunca
podrán ser" (RUIZ BARBOT et al, 2015, s.p.).
Alterar ese punto de vista es lo que estoy proponiendo. Repensar la educación pública
como ágora que parte de la diversidad cultural y sus conflictos para ir generando lugares
educativos que más bien sean de encuentro y diálogo interculturales. Cada aula: una escena de
encuentro y dia-logos entre culturas y personas. Las discusiones sobre educación, lugares
de dia-logos entre culturas.

5. preguntas para valorar las prácticas educativas concretas en tanto lugares inter culturales
de dia-logos
Esbozaré tentativa y sinténticamente algunas preguntas orientadoras de la tarea de
pensar y valorar nuestras prácticas (nuestras aulas, las de otros, las experiencias
educativas, los escenarios de encuentro dentro y fuera de las instituciones, por ejemplo)
como lugares de encuentros dialógicos interculturales:

1. El escenario para en encuentro: ¿se organiza y reorganiza de modo que sea propicio
al diálogo?:
i.i. ¿es acogedor? ¿es cómodo?
ii. ¿permite ubicar y distribuir a todos de modo que no se sientan mal?
ii.
iii. ¿se recogen críticas y se discuten modos de mejorar el ambiente físico en
iii.
siguientes sesiones?

2. El desarrollo de actividades: ¿habilita relaciones de mutua aceptación de las


diferencias y su mejora?
i.i. ¿se toman en cuenta las sensibilidades y modos de valorar que entran en juego?
ii. ¿se realizan actividades tendientes al mutuo reconocimiento y conocimiento?
ii.
iii. ¿se conversa sobre las dificultades en la relación, particularmente si surgen
iii.
situaciones de violencia?
iv. ¿se recogen ideas para mejorar el ambiente relacional en siguientes sesiones?
iv.

3. ¿Se da lugar a la exposición de distintos modos de valorar, opiniones, ideas,


convicciones...?
i.i. ¿se promueve la expresión de cada uno sobre sus problemas, modos de sentir, etc.,
por diversos medios?
ii. ¿se genera un ambiente respetuoso y propicio para mostrarse, decirse, escuchar?
ii.
iii. ¿se buscan caminos de enmienda y mejora en el trato mutuo?
iii.

4. ¿Se ponen en discusión argumentativa problemas y situaciones?


i.i. ¿Se prepara adecuadamente el diálogo?
ii. ¿Se diseñan actividades que faciliten su procesamiento por distintos medios?
ii.
234|
234| mauricio
mauricio langon
langon

iii. ¿Se va mejorando la capacidad dialógica del grupo y de las personas?


iii.
iv. ¿Se reflexiona sobre lo que se viene haciendo y se acuerdan criterios
iv. de
discusión?
v. ¿Se va profundizando cada vez más el diálogo?
v.
vi. ¿Se trabajan problemas y se procura que haya acciones en común?
vi.

filmografía
PRITSCH, Federico (director). Cometas sobre los muros (Documental, 76 minutos).
Montevideo, 2014.

referencias
FRAIMAN,
FRAIMAN, Ricardo;
Ricardo; ROSSAL,
ROSSAL, Marcelo.
Marcelo. De De calles,
calles, trancas
trancas yy botones.
botones. Una
Una etnografía
etnografía sobre
sobre violencia,
violencia,
solidaridad
solidaridad yy pobreza
pobreza urbana.
urbana. Montevideo:
Montevideo: Ministerio
Ministerio deldel Interior,
Interior, 2011.
2011.
KUSCH,
KUSCH, Rodolfo.
Rodolfo. Esbozo
Esbozo de de una
una antropología
antropología filosófica
filosófica americana
americana (1a (1a ed.
ed. 1978).
1978). In:In: KUSCH,
KUSCH,
Rodolfo.
Rodolfo. Obras
Obras Completas
Completas (IV(IV vols.).
vols.). Rosario:
Rosario: Fundación
Fundación Ross,Ross, 2000.
2000.
LANGON,
LANGON, Mauricio.
Mauricio. A A puertas
puertas abiertas.
abiertas. Madrid:
Madrid: Bubok,
Bubok, 2006.
2006. Accesible
Accesible enen papel
papel yy en en versión
versión
digital
digital en:
en: www.bubok.es/libros/234/A-puertas-abiertas.
www.bubok.es/libros/234/A-puertas-abiertas.
______.
______. Pensar
Pensar yy discutir
discutir valorativamente
valorativamente experiencias
experiencias educadoras.
educadoras. In: In: II Seminario
Seminario de de lala
RedESTRADO,
RedESTRADO, ago.2016.ago.2016. Anais…
Anais… Montevideo,
Montevideo, 2016b
2016b (no
(no prelo)
prelo)
______.
______. Traducciones
Traducciones de de las
las experiencias
experiencias educativas
educativas de de los
los demás.
demás. In:In: LOBOSCO,
LOBOSCO, Marcelo Marcelo
(Comp.).
(Comp.). Espectros
Espectros de
de la
la Filosofía.
Filosofía. Los
Los estados
estados generales
generales dede la
la educación
educación filosofíca
filosofíca yy su
su intervención
intervención
en
en la
la vida
vida democrática.
democrática. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Biblos,
Biblos, 2016a.
2016a.
RUIZ
RUIZ BARBOT,
BARBOT, MabelaMabela et et al.
al. Sentidos
Sentidos yy genealogías
genealogías dede la
la experiencia
experiencia educativa
educativa enen adolescentes
adolescentes yy
jóvenes.
jóvenes. 118
118 p.,
p., archivo
archivo enen pdf,
pdf, s/f,
s/f, 2015.
2015. Gentileza
Gentileza de de la
la autora.
autora.
VÚSCOVIC, Sergio.
VÚSCOVIC, Sergio. UnUn viaje
viaje muy
muy particular;
particular; Comentario.
Comentario. s.l.
s.l. Valparaíso:
Valparaíso: Edición
Edición deldel autor,
autor, 2001,
2001,
28p.
28p. Disponibles
Disponibles también,
también, respectivamente,
respectivamente,
en http://www.blest.eu/biblio/seminario/cap15.html#Un
en http://www.blest.eu/biblio/seminario/cap15.html#Un viaggio viaggio yy en
en
http://www.blest.eu/biblio/seminario/cap58.html
http://www.blest.eu/biblio/seminario/cap58.html

anexo: "ahora
anexo: "ahora escuchemos
escuchemos el el trayecto
trayecto socio-educativo
socio-educativo de de kevin,
kevin, saberes
saberes de
de la
la calle"
calle"
(Extraído
(Extraído de de Ruiz
Ruiz Barbot,
Barbot, Mabela:
Mabela: "Ausencia
"Ausencia de de sentidos,
sentidos, una
una educación
educación ajena")
ajena")
La
La voz
voz de
de Kevin,
Kevin, unun adolescente
adolescente desafiliado
desafiliado dede la
la educación
educación formal
formal yy participante
participante de de un
un programa
programa
socio-educativo
socio-educativo del del Estado,
Estado, la la veníamos
veníamos escuchando
escuchando en en un
un entorno
entorno grupal
grupal de de investigación.
investigación. Entorno
Entorno queque
actuó
actuó como
como espacio
espacio para
para el
el despliegue
despliegue dede un
un “nosotros
“nosotros desafiante”
desafiante” yy aa lala vez,
vez, de
de su
su “yo
“yo pasional”,
pasional”, turbulento
turbulento
yy sufrido.
sufrido. Allí
Allí lo
lo oímos
oímos situarse
situarse enen un
un estar
estar con
con el
el otro,
otro, el
el otro
otro cercano
cercano deldel “cante”
“cante” yy en
en lala incertidumbre
incertidumbre yy
agonía
agonía de
de su
su vida,
vida, en
en la
la finitud.
finitud. EnEn un
un lugar
lugar paródico
paródico de
de “resto
“resto social”,
social”, de
de “bandolero”
“bandolero” al al mismo
mismo tiempo,
tiempo, que
que
en
en sujeto
sujeto de
de la
la experiencia.
experiencia. Un Un sujeto
sujeto que
que habita
habita una
una representación
representación de de sí.
sí.
Siempre
Siempre ayudé.
ayudé. Pero
Pero después
después el el resto
resto soy
soy unun bandolero.
bandolero. Muchas
Muchas cosas cosas no
no me
me
gustan.
gustan. No
No capto
capto reglas
reglas de
de nadie,
nadie, nono meme gustan
gustan laslas órdenes.
órdenes. Yo
Yo mismo
mismo me me pongo
pongo
mis
mis reglas.
reglas.
Yo
Yo hablo
hablo que
que mimi vida
vida es
es un
un basurero.
basurero.
Me
Me arrepiento
arrepiento dede nacer
nacer (…)
(…) porque
porque estoy
estoy podrido
podrido de de estar
estar vivo
vivo (…)(…) muchas
muchas cosas
cosas
malas
malas meme pasaron
pasaron (…)
(…) estuve
estuve pila
pila de
de veces
veces pa’
pa’ matarme
matarme
Supuestamente
Supuestamente aa los los 25
25 me
me muero.
muero. ¿Pensas
¿Pensas quéqué voy
voy aa llegar
llegar aa los
los 27?
27? voy
voy aa estar
estar
adentro
adentro de
de un
un cajón
cajón porque
porque aa los
los 25
25 años
años me
me muero,
muero, estoy
estoy seguro
seguro de de eso.
eso.

Narra
Narra (...)
(...) su
su trayecto
trayecto vital,
vital, su
su historia
historia educativa
educativa yy social.
social. Narra
Narra sussus recuerdos
recuerdos yy sus
sus olvidos;
olvidos; susu
existencia
existencia yy su
su finitud;
finitud; lala vida
vida en
en el
el “cante”
“cante” yy sus
sus “mudanzas”;
“mudanzas”; su su sufrimiento
sufrimiento social
social yy sus
sus amores;
amores; la la calle
calle yy
su
su relación
relación con
con el
el saber.
saber.
Kevin,
Kevin, reconstruye
reconstruye su su trayecto
trayecto yy relata
relata cómo
cómo lele gustaría
gustaría que
que fuera
fuera un
un lugar
lugar para
para aprender
aprender si si él
él
pudiera
pudiera inventarlo.
inventarlo. LoLo escuchamos
escuchamos diciendo,
diciendo,
Primero,
Primero, tiene
tiene que
que tener
tener un
un patio
patio para
para jugar
jugar al
al fútbol,
fútbol, adentro,
adentro, tiene
tiene que
que tener
tener un
un
taller
taller para
para cocina,
cocina, un
un taller
taller de
de canto,
canto, un
un taller
taller de
de Informática,
Informática, las las cosas
cosas que
que me
me
gustan,
gustan, nono tantos
tantos alumnos,
alumnos, másmás profesores
profesores (…)
(…) UnUn profesor
profesor que
que sisi vos
vos te
te portas
portas
bien,
bien, élél se
se porta
porta bien.
bien. (Un
(Un profesor
profesor eses bueno)
bueno) cuando
cuando hace
hace algo
algo que
que otros
otros
educar
educar en
en la
la interculturalidad:
interculturalidad: diá-logos
diá-logos con
con los
los kevin
kevin || 235
235

profesores,
profesores, no. no. Ponele,
Ponele, un un profesor
profesor te te dice:
dice: nono hagas
hagas esto,esto, yy viene
viene otro
otro profesor
profesor yy
te
te dice:
dice: vamos
vamos aa hacerhacer esto.esto. (Un
(Un lugar
lugar donde
donde se se aprenda)
aprenda) la la vida
vida (…)(…) Hay Hay que que
aprender,
aprender, aprender
aprender aa caminar,
caminar, aprender
aprender aa ver ver aa lala gente,
gente, aprender
aprender aa escucharla,
escucharla, yo yo
qué
qué sé,
sé, aprender
aprender aa manejar
manejar plata,
plata, aprender
aprender aa saber saber quéqué eses plata;
plata; muchas
muchas cosas.cosas.
Kevin
Kevin tienetiene 16 16 años,
años, en en pocos
pocos días días cumplirá
cumplirá 17. 17. Cuenta
Cuenta su su llegada
llegada al al mundo
mundo yy que que élél nono hubiera
hubiera
querido
querido nacer,
nacer, “no “no hicehice fuerza
fuerza para para nacer,
nacer, hice
hice fuerza
fuerza para para no no nacer”.
nacer”. NacióNació prematuramente,
prematuramente, estuvo estuvo en en
incubadora
incubadora yy luego,luego, en en dos
dos momentos
momentos estuvo estuvo por por morir,
morir, “que“que te te morís
morís yy después
después no no te te morís”.
morís”. En En un un primer
primer
momento,
momento, pone pone su su existencia
existencia yy la la muerte
muerte en en el el centro
centro de de la la conversación.
conversación. Es Es de de Cerro
Cerro Largo,Largo, pero pero
prácticamente
prácticamente desde desde bebé bebé vivió
vivió en en Montevideo.
Montevideo. Su Su abuelo
abuelo materno
materno lo lo cuidaba
cuidaba cuando
cuando lo lo internaron
internaron en en elel
hospital
hospital yy mientras
mientras vivió.vivió. Nunca
Nunca volvióvolvió al al departamento
departamento en en que
que nació.
nació. Su Su madre
madre quedóquedó un un tiempito
tiempito con con élél en
en
la
la internación
internación yy enseguida
enseguida volvió volvió aa Melo. Melo. Su Su padre
padre murió murió aa los los 2020 años
años por por sobredosis
sobredosis de de droga
droga (“se (“se
inyectaba,
inyectaba, tomaba
tomaba alcohol,
alcohol, corría
corría carreras
carreras de de moto”).
moto”).
Su
Su abuelo
abuelo lo lo “quería
“quería más más aa (él)
(él) queque aa susu hijo”,
hijo”, “le“le compraba
compraba las las cosas
cosas aa (él)
(él) yy al al tío
tío no
no lele compraba.
compraba.
Yo
Yo vendría
vendría aa ser ser elel primer
primer nieto,nieto, fue fue como
como que que agarró
agarró más más cariño
cariño conmigo”.
conmigo”. Kevin Kevin cuentacuenta que que su su abuelo
abuelo
murió
murió de de cirrosis
cirrosis yy que que aa pedido
pedido suyo suyo le le dio
dio aa probar
probar vino vino blanco
blanco cuando
cuando él él tenía
tenía seis
seis años
años diciéndole
diciéndole “nunca “nunca
tomes
tomes esto”.
esto”.
De
De chico
chico le le decían
decían Jerry Jerry por por el el dibujito
dibujito animado
animado de de lala tele:
tele: TomTom yy Jerry, Jerry, por por lo lo movedizo
movedizo yy
provocador.
provocador. Así Así lo lo nombró
nombró su su abuelo,
abuelo, “me “me pusopuso Jerry”.
Jerry”. En En la la casa
casa de de sus
sus tíos
tíos lo lo siguen
siguen apodando
apodando así. así.
Riéndose
Riéndose de de sí
sí mismo,
mismo, afirmando
afirmando yy ampliandoampliando sus sus estigmas
estigmas en en lala conversación
conversación en en torno
torno aa la la construcción
construcción de de
sí,
sí, dice
dice “soy
“soy una
una persona
persona famosafamosa en en mi mi familia,
familia, de de todos
todos soysoy el el peor”.
peor”. ConCon una una cuota
cuota de de sufrimiento
sufrimiento personalpersonal
yy social,
social, narrará
narrará su su derrotero
derrotero luego luego de de lala muerte
muerte de de susu abuelo,
abuelo, única
única figura
figura parental
parental que que quiere
quiere recordar.
recordar.
Única
Única figura
figura de de sus
sus pocos
pocos tiempos
tiempos felices.
felices.
Me
Me preguntás
preguntás si si tengo
tengo algúnalgún recuerdo
recuerdo de de mimi vieja
vieja yy digo
digo que que no.no. Ninguno.
Ninguno. No No
tengo
tengo recuerdos,
recuerdos, me me olvidé.
olvidé. Me Me preguntás
preguntás yy tengo… tengo… sí, sí, de
de mi mi abuelo,
abuelo, nomás…
nomás…
Si
Si su
su abuelo
abuelo no no estuviera
estuviera muertomuerto “no “no le le hubiera
hubiera pasado
pasado nada”,
nada”, “estaría
“estaría estudiando
estudiando 4to 4to de
de liceo
liceo oo másmás
todavía”.
todavía”. “No “No andaría
andaría en en lala calle,
calle, nono sufriría
sufriría tantos
tantos problemas”.
problemas”.
Ante
Ante la la muerte
muerte de de susu abuelo
abuelo se se vava aa vivir
vivir concon su su madre,
madre, quien quien ya ya estaba
estaba viviendo
viviendo en en Montevideo
Montevideo
junto
junto aa susu padrastro
padrastro yy dos dos hermanas
hermanas en en elel mismo
mismo “cante”.
“cante”. KevinKevin creíacreía queque susu padrastro
padrastro era era susu padre
padre pero pero aa
los
los once
once años
años sese entera
entera que que no no lolo era
era enen unauna discusión
discusión yy “pelea”
“pelea” fuerte
fuerte entre
entre su su madre
madre yy él. él. De
De allí
allí enen más,
más, no no
quiere
quiere recordar
recordar nadanada de de susu madre,
madre, no no trae
trae anécdotas
anécdotas de de su
su vida
vida con
con ella.
ella. Cuenta
Cuenta que que siempre
siempre se se llevó
llevó mal mal con
con
su
su padrastro
padrastro yy que que su su madre
madre “ni “ni (lo)
(lo) conoce.
conoce. Fueron
Fueron siempre
siempre peleas,
peleas, discusiones”.
discusiones”. Frente Frente aa esta esta situación
situación se se
va
va de
de susu casa
casa porpor varios
varios meses.
meses. Aparentemente,
Aparentemente, nadie nadie lo lo vava aa buscar.
buscar. Y Y prácticamente,
prácticamente, ya ya nono vuelve
vuelve oo va va yy
viene.
viene. VaVa habitando
habitando distintos
distintos espacios,
espacios, mudándose.
mudándose. Buscando Buscando afectos.
afectos.
Vive
Vive un un tiempo
tiempo con con un un “amigo”,
“amigo”, catorcecatorce años años mayor
mayor que que él,
él, aa quien
quien salva
salva de de la la muerte.
muerte. El El mismo
mismo
día
día que
que se se va
va dede la
la casa
casa de de su su madre
madre yy llega llega aa lala de
de susu amigo,
amigo, encuentra
encuentra aa éste éste ahorcándose.
ahorcándose. Kevin Kevin se se trepa
trepa
arriba
arriba dede una
una mesa
mesa yy lo lo desata,
desata, el el amigo
amigo cae cae alal piso
piso yy empieza
empieza aa temblar.
temblar. Él Él lolo patea,
patea, “lo “lo mata
mata aa palos”
palos” yy le le
grita
grita “¡sos
“¡sos tarado,
tarado, sos sos ¿cómo
¿cómo te te vas
vas aa andar
andar matando?!
matando?! Te Te vasvas aa andar
andar matando
matando por por unauna mujer!!"
mujer!!" Luego,Luego, se se
queda
queda con con él,él, “le
“le (hace)
(hace) compañía,
compañía, yy él él empieza
empieza aa hablar”.
hablar”. Estuvo
Estuvo allí allí cuando
cuando su su amigo
amigo lo lo necesitó,
necesitó, lo lo
acompañó,
acompañó, lo lo escuchó.
escuchó.
Vuelve
Vuelve un un tiempo
tiempo aa la la casa
casa de de lala madre
madre yy como como ésta ésta sese muda,
muda, él él queda
queda en en el el hogar
hogar de de unauna pareja
pareja
mayor,
mayor, enfrente
enfrente aa la la que
que eraera susu casa;
casa; “una
“una familia,
familia, ahí, ahí, con
con la la que
que yo yo meme crie”.
crie”. Desde
Desde los los doce
doce aa loslos 1414 años
años
vive
vive con
con ellos.
ellos. Y Y rememora,
rememora,
Me
Me re re cuidaban
cuidaban la la mujer
mujer de de López,
López, tas tas loco,
loco, eseese hombre,
hombre, esa esa mujer
mujer sí sí qué
qué siempre
siempre
me
me cuidó
cuidó bien.bien. Me Me decía
decía hijo.
hijo. Yo Yo aa veces
veces iba iba para
para la la casa
casa yy me me decía,
decía, ‘¿en‘¿en qué
qué
anda,
anda, m’ijo,
m’ijo, no no sésé qué?’
qué?’ Le Le hacía
hacía mandados,
mandados, la la ayudaba
ayudaba aa limpiar.
limpiar. Nunca
Nunca dejó dejó que
que
me
me pase
pase nada.
nada. Me Me cuidaba
cuidaba más más queque mi mi madre.
madre.
A
A los
los 1414 años
años se se muda
muda con con unosunos amigos,
amigos, con con los
los que
que finalmente
finalmente sigue sigue viviendo
viviendo hoy. hoy. Amigos
Amigos que que
eran
eran dede Aldeas
Aldeas Infantiles
Infantiles yy “los “los dede Aldeas
Aldeas le le dan
dan plata
plata para
para que
que compren
compren una una casa,
casa, yy fueron
fueron los los que
que hicieron
hicieron
una
una casa
casa grande
grande parapara ellos
ellos tres,
tres, yy ahí
ahí estamos
estamos nosotros”.
nosotros”. Allí Allí para
para Kevin
Kevin está está “todo
“todo mejor”,
mejor”, “zarpado”.
“zarpado”.
Entremedio
Entremedio de de todas
todas estas
estas mudanzas
mudanzas yy cambios cambios de de domicilios
domicilios aunque aunque dentro
dentro del del mismo
mismo territorio,
territorio, aa
los
los once
once Kevin
Kevin empieza
empieza aa trabajar.
trabajar. Trabaja
Trabaja en en el el mercado
mercado yy de de tarde
tarde asiste
asiste aa la la escuela
escuela primaria.
primaria. Trabajará
Trabajará
con
con unun “vecino
“vecino de de su su cuadra”,
cuadra”, se se “levantaban
“levantaban aa las las dos
dos de de lala mañana”,
mañana”, “lo “lo llevaba
llevaba en en unun camión”,
camión”, “le “le
compraba
compraba bizcochos
bizcochos para para el el camino”
camino” yy aa “la “la vuelta
vuelta le le compraba
compraba milanesas”,
milanesas”, “volvía“volvía comiendo”.
comiendo”. Durante Durante un un
año
año trabaja
trabaja en en el el mercado.
mercado. Volverá Volverá aa trabajartrabajar en en el el mercado
mercado cuando cuando termine
termine su su recorrido
recorrido escolar.
escolar. Lo Lo
finalizará
finalizará aa los los 1414 años.
años. En En la la escuela
escuela aprendió
aprendió aa “no “no serser desubicado”,
desubicado”, aa “tener “tener respeto
respeto por por laslas personas
personas
mayores”
mayores” ya ya que
que “le
“le contestaba
contestaba aa todo todo el el mundo
mundo (…) (…) Después
Después empecé…
empecé… me me decían
decían algo,algo, yo yo meme callaba
callaba yy lo lo
hacía,
hacía, sabía
sabía queque meme iba iba aa servir”.
servir”. Habiendo
Habiendo ido ido aa los
los dos
dos años
años aa unun CAIF,
CAIF, más más tarde
tarde aa un un jardín
jardín deldel barrio
barrio yy
por
por último
último aa la la escuela,
escuela, relatará
relatará que que el el liceo
liceo nono era
era para
para él.él.
Llega
Llega aa asistir
asistir aa secundaria,
secundaria, pero pero no no le le gusta.
gusta. “No“No (le)(le) gustan
gustan los los profesores
profesores yy los los alumnos,
alumnos, no no (le)
(le)
gusta
gusta nada”,
nada”, “va “va toda
toda la la gente
gente creída
creída (y (y aa él)
él) no
no (le)
(le) gusta
gusta la la gente
gente creída.
creída. Son Son creídas,
creídas, te te das
das cuenta,
cuenta, la la forma
forma
236|
236| mauricio
mauricio langon
langon

que
que hablan,
hablan, la la forma
forma que que miran,
miran, la la forma
forma en en que
que se
se paran
paran todos
todos juntos,
juntos, sonson todos
todos creídos.
creídos. Te Te dan
dan ganas
ganas de
de
(…)
(…) aa todos
todos juntos,
juntos, atarlos
atarlos aa todos
todos yy agarrarlos
agarrarlos aa cachetazos.
cachetazos. Entonces,
Entonces, por por eso
eso nono voy.
voy. Acá
Acá (en(en el
el programa
programa
del
del Estado),
Estado), acá acá no no hay
hay nadie
nadie creído.
creído. Porque
Porque vienen
vienen yy te te hablan
hablan como como queque tete conocen”.
conocen”. En En lala educación
educación
media
media se se siente
siente segregado,
segregado, vivevive aa sus
sus pares
pares como
como diferentes
diferentes aa élél ee iguales
iguales entre
entre sí,
sí, “creídos”.
“creídos”.
A
A loslos quince
quince añosaños recién
recién cumplidos
cumplidos es es internado
internado en en un un hogar
hogar deldel Instituto
Instituto del del Niño,
Niño, Niña
Niña yy
Adolescentes
Adolescentes del del Uruguay,
Uruguay, ya ya que
que lo lo encuentra
encuentra la la policía
policía enen el el copamiento
copamiento de de una
una vivienda
vivienda junto
junto aa un
un
compañero
compañero de de susu barrio
barrio “que
“que nono tenía
tenía donde
donde caerse
caerse muerto”.
muerto”. Cuenta
Cuenta que que fue
fue “a“a hacerle
hacerle la la cabeza
cabeza aa ese
ese
compañero
compañero para para queque no
no sese mandara
mandara ninguna
ninguna cagada
cagada yy terminó…
terminó… “crucé“crucé de de costado”,
costado”, dice.
dice. Lo
Lo quiso
quiso convencer
convencer
“que
“que no no robara
robara pero pero que
que cuando
cuando llegó,
llegó, élél ya
ya había
había robado
robado yy cuando
cuando yo yo agarré
agarré la la escopeta,
escopeta, vinovino justito
justito la
la
policía...”
policía...” Pasa
Pasa unosunos meses
meses en en elel hogar
hogar del del INAU
INAU donde,donde, irónicamente,
irónicamente, aprende aprende aa “hacer“hacer trucos
trucos con
con las
las
cartas,
cartas, nomás”
nomás” yy aa “no “no hacer
hacer más
más cagadas”,
cagadas”, aa “escarmentar
“escarmentar bastante”.
bastante”. Pasa Pasa malmal yy sostiene
sostiene que que “tá
“tá de
de menos”,
menos”,
que
que “odiaba
“odiaba aa todos”
todos” los los adultos
adultos que
que allí
allí trabajaban,
trabajaban, que que “tuvo
“tuvo unos
unos cuantos
cuantos líos”
líos” yy que
que “lo
“lo sacaron
sacaron en en mayo,
mayo,
fue
fue todo
todo por
por lala jueza
jueza yy por
por (fulano),
(fulano), me me hicieron
hicieron un un informe
informe del del centro
centro juvenil,
juvenil, deldel Aula
Aula yy un un par
par de
de lugares
lugares
que
que yo
yo estudié,
estudié, dicen
dicen que
que tenía
tenía buena
buena conducta,
conducta, estuve
estuve todo
todo un
un mes
mes portándome
portándome bien, bien, sin
sin tener
tener problema
problema ni ni
nada”.
nada”. Será
Será aa partir
partir dede este
este momento
momento que que comienza
comienza aa participar
participar en en el el programa
programa del del Estado.
Estado.
Fue
Fue aa lala escuela,
escuela, aa Aulas
Aulas Comunitarias,
Comunitarias, aa un un Centro
Centro Juvenil
Juvenil donde donde accedió
accedió aa saberes
saberes puntuales.
puntuales. Sin
Sin
embargo,
embargo, narra
narra yy afirma
afirma queque no
no “aprendió
“aprendió en en ningún
ningún lado,
lado, que
que todo
todo fuefue enen la
la calle.
calle. Todo
Todo solo,
solo, sin
sin nadie”,
nadie”,
para
para luego
luego decir
decir que que aprendió
aprendió concon un un hermano.
hermano. Con Con élél aprendió
aprendió aa andar
andar aa caballo,
caballo, aa andar
andar enen moto.
moto. Aprendió
Aprendió
sobre
sobre construcción,
construcción, mirando,
mirando, observando
observando como como otros
otros construían
construían sus sus casas
casas oo enen sus
sus casas.
casas. Aprendió
Aprendió aa “ser“ser
valiente,
valiente, aa no
no tenerle
tenerle miedo
miedo aa nadie.
nadie. Muchas
Muchas cosas”.
cosas”. Aprendió
Aprendió con con “el“el amor
amor de de su
su vida”
vida” yy “su
“su pesadilla”,
pesadilla”, “la
“la
dueña
dueña queque tiene
tiene la la marca
marca en en (su)
(su) espalda”,
espalda”, aa quien
quien conoció
conoció “en“en lala calle”,
calle”, “fue
“fue donde
donde la la vi”,
vi”, yy con
con quien
quien hoy,
hoy,
está
está “peleado”.
“peleado”. Con Con ella
ella aprendió
aprendió “a “a escuchar”,
escuchar”, “a “a aconsejar”,
aconsejar”, “a “a nono sentirse
sentirse solo”.
solo”. Ella
Ella lolo entendía,
entendía, lolo
escuchaba,
escuchaba, lo lo ayudaba,
ayudaba, yy en en tanto
tanto que
que “con
“con la la gente
gente (se)
(se) siente
siente solo,
solo, concon ella
ella no”.
no”.
En
En la
la calle
calle encontrás
encontrás amor,
amor, encontrás
encontrás respeto,
respeto, encontrás
encontrás odio,odio, amigos,
amigos, encontrás
encontrás
enemigos.
enemigos. Encontrás
Encontrás muchas
muchas cosas,
cosas, pero
pero aa la la vez,
vez, nono encontrás
encontrás nada.nada. Esta
Esta es
es la
la
escuela,
escuela, esta
esta eses la
la verdadera
verdadera escuela,
escuela, eso
eso de de andar
andar estudiando,
estudiando, llenando
llenando cuadernos
cuadernos
con
con palabras,
palabras, eso eso no
no es
es escuela,
escuela, esto
esto es
es escuela.
escuela.

Kevin,
Kevin, dando
dando cuenta
cuenta de de sus
sus condiciones
condiciones existenciales
existenciales yy de
de una
una experiencia
experiencia singular
singular abre
abre sentidos
sentidos del
del
aprender
aprender distantes
distantes aa la
la educación
educación media,
media, se
se identifica
identifica con
con saberes
saberes yy sufrimientos
sufrimientos que
que le
le dio
dio la
la calle
calle como
como
escuela.
escuela.
237
237

escuela popular y emancipación:


una apuesta para el continente americano

maximiliano duran11

introducción

H ace 190 años don Simón Rodríguez transformó la educación


latinoamericana al abrir las puertas de una escuela sin precedentes. La
escuela de Huérfanos y Muchachos Carpinteros de Chuquisaca fue una
institución a través de la cuál Rodríguez desarticuló los saberes y las prácticas pedagógicas
de su época al sostener y desarrollar un principio de igualdad entre sus alumnos. Todos los
niños y niñas de la ciudad fueron recibidos en calidad de iguales en un mismo salón de
clases. A diferencia de la mayoría de las instituciones educativas de los siglos XVIII y
XIX la escuela de Chuquisaca rompe con la exigencia identitaria que las constituía en
tanto tales.
El mundo escolar latinoamericano de aquel entonces estaba constituido por un
cuadro variopinto de instituciones escolares íntimamente relacionadas con el sistema de
castas diseñado por los borbones. A lo largo y ancho del continente americano era posible
encontrarse con escuelas para la élite blanca como los colegios de San Cristóbal de
Chuquisaca, escuelas para la nobleza de los pueblos originarios como el Colegio del Sol,
escuelas cabildales para los niños blancos y mestizos con padre y madre reconocidos,
escuelas de doctrina para el común de los pueblos originarios y escuelas en el interior de
los hospicios a las que accedían los huérfanos (ESCOBARI DE QUEREJAZU, 2009; 2012).
De acuerdo con este cuadro, al menos en teoría, los niños de todas las castas podían
ingresar a un determinado tipo de institución educativa en función de su pertinencia
identitaria. A su vez, las escuelas variaban sus contenidos y prestigio en función de su
población. Las escuelas que mayor “pureza de sangre” exigían eran consideradas las
mejores y los conocimientos que se impartían en ellas eran los necesarios para las élites
españolas y criollas en su camino de ascenso social y político. El resto de las escuelas
brindaban saberes acordes a las necesidades de cada una de las castas.
Como puede observarse, las escuelas reproducían en su interior el sistema
jerárquico, injusto y desigual de la sociedad colonial. La casta más alta accedía a las
mejores escuelas y la calidad educativa e institucional decrecía de acuerdo con el lugar
asignado a cada una de las castas en el entramado social. Este panorama de escuelas para
ricos y escuelas para pobres no mudó significativamente durante los primeros años de la
república. Los distintos programas educativos implementados muestran la intención de las
elites republicanas de conservar gran parte de los privilegios de los que gozaron durante la
colonia. Ya sea dentro del ámbito público o el privado siguieron existiendo escuelas para la
elite y escuelas para pobres.
La escuela de Rodríguez rompe radicalmente con este orden. Por primera vez en
América se abre una escuela que no exige condición identiraria alguna para el ingreso de
sus alumnos. Independientemente del origen económico, social, cultural y sexual, los niños
son recibidos en la nueva escuela de Chuquisaca. Todos y todas en una misma escuela, en
un mismo salón de clases. Los pobres, los ricos, los blancos, los mestizos, los negros, los
niños y niñas de los pueblos originarios ingresan en calidad de iguales por primera vez en
América. Esta decisión de Rodríguez de recibir a todos en un mismo salón implica el

11 Universidad
Universidad de
de Buenos
Buenos Aires
Aires –– UBA;
UBA; Universidade
Universidade do
do Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro/Fundação
Janeiro/Fundação de
de Amparo
Amparo àà
Pesquisa
Pesquisa do
do Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro -- UERJ/
UERJ/ FAPERJ.
FAPERJ. Email:
Email: maximiliano1771@gmail.com
maximiliano1771@gmail.com
238
238 || maximiliano
maximiliano duran
duran

despliegue de un principio igualitario inédito en el continente americano. La igualdad que


se pone en juego en la escuela de Huérfanos y Muchachos Carpinteros, presenta una serie
de rasgos que la diferencian significativamente del concepto de igualdad impulsado por las
élites criollas.
Autores tales como Ciriza y Fernández (2000) Daniela Rawicz (2003) y Guanchéz
de Méndez (2005) sostienen que el proyecto de escuela popular era irrealizable y estaba
condenado al fracaso desde su inicio. En este trabajo intentamos sostener una hipótesis
contraria. Para nosotros la escuela popular de Rodríguez lejos de ser un proyecto utópico y
quimérico es una apuesta fértil, potente y emancipadora cuya vigencia aún hoy puede ser
sostenida. Para lograr nuestro objetivo dividimos nuestro trabajo en dos partes. En la
primera de ellas realizamos una presentación histórica de la escuela popular de Rodríguez.
En esta sección del trabajo analizamos el carácter igualitario de dicha institución como uno
de sus rasgos más relevantes y originales. Según nuestro punto de vista el carácter
axiomático de la igualdad que se despliega en la institución de Chuquisaca es un elemento
inédito en la educación americana del período. En la segunda y última parte del trabajo
intentamos mostrar en qué medida esta escuela puede ser considerada como una propuesta
emancipadora. Para ello realizamos una relectura del concepto de alienación marxiano y lo
relacionamos con la escuela de Chuquisaca. Para terminar, dedicamos un momento
conclusivo en el que se retoman las ideas centrales del trabajo. En función de nuestra
lectura pensamos que es posible presentar la escuela que Rodríguez crea en Bolivia como
una experiencia inédita, igualitaria y emancipadora.

la escuela de muchachos huérfanos y carpinteros de chuquisaca.


En la ciudad de Chuquisaca, en el siglo XIX, un maestro abre una escuela y decide
recibir como alumnos a todos los niños y niñas de la ciudad, sin distinción alguna. Por
primera vez, en la historia de esa ciudad Rodríguez junta en un salón de clases, en calidad
de iguales, a los niños de las distintas castas. Este simple hecho genera un escándalo entre
los vecinos de esta aristocrática ciudad que ven alterada su representación del buen orden
social y moral. La sociedad de Chuquisaca, al igual que la mayoría de las ciudades
latinoamericanas de los siglos XVIII y XIX, está fuertemente segmentada. Démelas (2003,
p.54-55), sostiene que las sociedades coloniales están fundadas en una intrincada red de
vínculos sociales verticales, que obedecen a una serie de normas tácitas que hacen
referencias a los parentescos, el interconocimiento y el respeto por las jerarquías propias de
cada grupo. Más allá de la flexibilidad existente en el paso de un grupo a otro dentro de las
diversas identidades y de la ambigüedad con las que las autoridades interpretan las
definiciones étnico-sociales, la autora señala que, las jerarquías son un elemento central de
la vida andina (DÉMELAS, 2003, p.64). La fragmentación social, sobre la base de la
distinción racial es un patrón común a partir del cual se desarrolla la vida cotidiana dentro
de los territorios del imperio español.
En el caso de la educación, la desigualdad es mucho más notoria, degradante y
extrema. Las primeras letras generalmente son impartidas por tutores privados en el
interior de los hogares de la gente acomodada o en instituciones exclusivas como el colegio
de San Cristóbal de Chuquisaca. A su vez, a lo largo y a lo ancho de las colonias españolas
en América, junto a la enseñanza privada, existen diversos tipos de instituciones escolares
de primeras letras a las que asisten los chicos. Cada una de ellas acomoda sus programas y
constituciones de acuerdo a la extracción social de cada uno de los niños que recibe en su
interior. Las órdenes religiosas desarrollan una labor pedagógica monumental en el
territorio americano. Crean y dirigen diversos tipos de escuelas a las que asisten de manera
diferenciada indios, mestizos y blancos. También existen escuelas municipales, sostenidas
por los cabildos. Estas escuelas, en teoría, admiten a todos los niños católicos. Sin
escuela
escuela popular
popular yy emancipación:
emancipación: una
una apuesta
apuesta para
para el
el continente
continente americano
americano || 239
239

embargo, la mayoría de la población escolar se ajusta a una serie de condiciones, vinculadas


a la pureza de sangre y el lugar que ocupan en la sociedad.
En el interior de este tipo de sociedades fragmentadas y jerárquicamente ordenadas
en torno a un sistema de castas, Rodríguez como hemos mencionado, toma una decisión
que altera y transforma un determinado estado de cosas. En la ciudad residencial de los
propietarios de los complejos mineros del Potosí, en una urbe exclusivamente destinada al
consumo, Rodríguez, sostiene en su rol de director de la escuela modelo de Chuquisaca,
que todos los chicos y chicas sean recibidos en calidad de iguales. Dicha postura queda
acuñada en forma de proposición universal en Sociedades Americanas. Allí escribe “escuela
para todos, porque todos son ciudadanos” (RODRÍGUEZ, 1999 I, p.284). Sí, todos, sin
excepción, ni condición que limite su ingreso. Por primera vez, los niños pobres y sus
padres son alojados por cuenta del Estado en casas aseadas y espaciosas (RODRÍGUEZ,
1999 II, p.356). La escuela, el espacio diferenciado, en el que las oligarquías empiezan el
camino de reproducción de su lugar en la sociedad, abre sus puertas por primera vez en
su historia a los sin nombres, a los parias de la ciudad, ya no como
como subalternos
subalternos necesitados
necesitados
de instrucción adecuada para cumplir adecuadamente con los mandados de los
supuestamente superiores, sino como iguales.
La potencia de esta decisión muchas veces es pasada por alto o señalada
superficialmente como un gesto utópico e ingenuo, en el interior de un proyecto
pedagógico de un hombre bien intencionado. Daniela Rawicz (2003), Alejandra Ciriza y
Estela Fernández (1993, p.79-80), observan que, el proyecto de educación popular es
concebido por Rodríguez como medio ideal para alcanzar la reconciliación social y hacer
efectiva la existencia de una sociedad republicana sin contradicciones. Dicho proyecto,
según ellas, es utópico e imaginario, puesto que asume los conflictos sociales como
artificiales, desconociendo su raíz histórica.
histórica. En
En definitiva, para las autoras, se trata de un
proyecto irrealizable y condenado al fracaso, dado su carácter ideal y su desconocimiento
de las contradicciones materiales de la sociedad a la que está destinado.
Para nosotros, a diferencia de las autoras mencionadas, la afirmación de Rodríguez
lejos de ser una frase, una propuesta ingenua, utópica y artificial, constituye el reflejo de
una práctica que significa un aporte original al pensamiento educativo del siglo XIX cuyas
consecuencias aún hoy pueden sentirse. “Educación para todos porque todos son
ciudadanos” (RODRÍGUEZ, 1999 II, p.356) es una proposición a partir de la cual
Rodríguez expresa en forma escrita su decisión de de incluir en ese universal a niños y niñas
de las diferentes castas. Esto constituye un hecho sin precedentes en América latina que es
imposible de asimilar por la elite de la ciudad.
La aparición de estos chicos cuestiona y altera significativamente la forma forma
tradicional de vinculación entre personas y grupos humanos e introduce la acción de un
principio igualitario.
igualitario. La
La igualdad
igualdad implícita
implícita en
en la
la decisión
decisión contenida
contenida en
en “escuela
“escuela para
para todos
todos
porque todos son ciudadanos” (RODRÍGUEZ, 1999 II, p.356) posee una serie de rasgos que
la diferencian significativamente de “la igualdad” que sostiene la élite ilustrada de
Chuquisaca. La “igualdad” que afirma Rodríguez es un axioma a partir del cual deriva una
conducta y no un programa. Para Rodríguez, la igualdad no es algo a conseguir por los
supuestamente desiguales, sino un principio del cual parte. El mismo puede observarse en
los siguientes interrogantes:
“¿Cómo se hará creer a un hombre, distinguido por ventajas naturales, adquiridas o
casuales, que el que carece de ellas es su igual? ¿Cómo por el contrario, creerá otro que
nada le falta, cuando está viendo que carece de todos?...
Y ambos, ¿como se persuadirán que han pasado a otro estado, si se ven siempre en
el mismo” (RODRÍGUEZ, 1999 I, p.271).
240
240 || maximiliano
maximiliano duran
duran

La igualdad, para Rodríguez no es un concepto que debe ser demostrado, sino un


nombre cuyas consecuencias se verifican en cada uno de sus actos. Su trabajo en la escuela
de primeras letras de Chuquisaca, es una consecuencia práctica de la afirmación igualitaria.
En ella se incluye a los niños de todos los estamentos, en calidad de iguales. Ninguno vale
más que otro, ni tiene privilegios u obligaciones especiales derivadas del lugar que ocupan
en el entramado social. A diferencia del resto de los proyectos educativos de la época, la
escuela de Rodríguez parte de la igualdad y no de la desigualdad. Este hecho supone una
novedad que transforma radicalmente el lugar en el que irrumpe. Hasta ese momento, la
inclusión de los niños pobres en las escuelas obedece a motivos muy distintos a los que
aquí hemos señalado.
Desde los primeros tiempos de la colonia, la presunta igualdad entre los seres
humanos estuvo relacionada a la condición racional presente en el alma de los seres
humanos. Sobre la base del derecho natural, algunos religiosos y hombres de letras
españoles sostienen la necesidad de tratar con dignidad y humanidad a los indígenas. Para
el humanismo español existía un plano de igualdad entre los hombres, en la medida que
todos poseían la capacidad de actuar como era debido de acuerdo a la Ley Natural, en
virtud de su forma racional. Es decir, la igualdad se desprendía, no sólo de la universalidad
de la Ley Natural, de la posibilidad de ser conocida por todos, sino también de la
naturaleza racional de los seres humanos (VITORIA, 1975; DE LAS CASAS, 1966; 1999).
Para nosotros, lo realmente novedoso y transformador de la decisión de Rodríguez
no es la inclusión en sí misma de un número mayor de personas de distintos estamentos en
la institución escolar, sino la forma en la que se lo hace. La función política de la
institución escolar no es hacer algo por igualar a aquellos que se presentaban como
desiguales, sino a la inversa, postular su igualdad y actuar en consecuencia a ello. La
igualdad que sostiene funciona como principio indemostrable y se mantiene
exclusivamente en el peso de una decisión. Ella es quien orienta todo su accionar político y
pedagógico.
La irrupción de cholos, indios, negros y zambos en un mismo salón, junto a los
blancos y en calidad de iguales es algo inadmisible. Su presencia en el aula trastoca toda
representación del orden social que las oligarquías han naturalizado durante más de
trescientos años. La decisión de incluir a los niños de las distintas castas en un espacio
común, como iguales es un hecho que transforma no sólo la educación de aquel entonces,
sino también la sociedad en su conjunto. Lo que allí sucede no es un simple hecho
disruptivo, una singularidad, producto de la mente febril de un soñador. Lo que irrumpe en
Chuquisaca es la operación de un principio igualitario a partir del cual es posible pensar
una nueva forma de relacionarse entre las personas.
Rodríguez afirma la necesidad de conceptualización de esta novedad. Ante la falta
de saberes educativos y políticos que pudieran nombrar lo que sucede en la escuela de
Chuquisaca, sostiene la necesidad de la filosofía en la escuela primaria. Para Rodríguez la
filosofía en la escuela primaria es requerida en su carácter creativo. En la medida que ella
crea los conceptos para nombrar esta aparición novedosa que agujerea y transforma todos
los saberes educativos de la ciudad. La filosofía para Rodríguez es aquella práctica que
permite pensar las paradojas que plantean la nueva situación. De la misma forma que el
poeta para Kohan (2014), el filósofo para Rodríguez es el inventor conceptual de esa
disrupción que altera el orden establecido. La filosofía que anuncia Rodríguez como una
necesidad para la escuela primaria es aquella que inventa un nuevo significado para esa
presencia inédita en el salón de clases, que constituyeron cholos, negros y zambos junto a
los niños blancos.
Educación popular es esa conceptualización en el pensamiento de Rodríguez. Ella es
el nombre filosófico de la afirmación “los hombres son iguales”. No se trata de una
escuela
escuela popular
popular yy emancipación:
emancipación: una
una apuesta
apuesta para
para el
el continente
continente americano
americano || 241
241

reapropiación o resignificación de un saber habitual. Educación popular no es una simple


variación de un concepto existente, sino que es una invención, una creación conceptual, en
la medida que se encuentra cargada “de una propiedad que no tenía, una fuerza
desconocida para pensar” (KOHAN, 2014, p.73). Educación popular encierra la potencia
inédita para pensar la igualdad como un axioma. Esta forma de concebir la igualad es el
punto de partida para entender un nuevo tipo de escuela. Una escuela que se diferencia del
resto de las instituciones escolares, en la medida que desarticula el carácter diferenciador
del resto de las instituciones escolares de aquel entonces y abre una posibilidad de
vinculación entre las personas muy diferente a la tradicional.
En la próxima sección del trabajo intentamos mostrar en qué medida este espacio
igualitario, se constituye como una propuesta emancipadora muy diferente al resto de los
proyectos educativos de aquel período. Según nuestro punto de vista los proyectos
pedagógicos que se llevan a delante en América tras las guerras de independencia tienen
como objetivo primordial la formación de trabajadores asalariados funcionales a los
intereses de las incipientes burguesías criollas. En esta perspectiva leemos el éxito del
proyecto Lancaster en América. Las escuelas de enseñanza mutua ofrecen a las oligarquías
americanas el medio más económico y rápido de formar personas dóciles para superar las
relaciones sociales pre- capitalistas del período colonial. A continuación, desarrollamos un
análisis del proyecto de educación popular de Rodríguez y su enfrentamiento con la
propuesta hegemónica de Lancaster. En función de este análisis decimos que los objetivos
políticos y pedagógicos de ambos proyectos son completamente diferentes. Mientras que el
lancasterismo persigue la formación de un trabajador asalariado, dócil y sumiso a la
autoridad de turno, Rodríguez propone la formación de ciudadanos libres, independientes
y soberanos. En otras palabras, mientras uno de los proyectos educativos supone la
continuidad de las relaciones de dominación de unos pocos respecto de muchos, el otro
plantea romper con esas relaciones y afirma una nueva posibilidad de relación.

la escuela popular como acto de emancipación


Hasta aquí presentamos la escuela creada por Rodríguez y al rasgo igualitario de la
misma. En esta segunda parte del trabajo intentamos trabajar en torno a otro rasgo
constitutivo de la escuela: la emancipación. Aquí intentamos mostrar que la escuela
popular creada por Rodríguez no sólo es un espacio igualitario en el que todos los niños de
la ciudad valen lo mismo, sino también una institución en la que se despliega una práctica
emancipadora a partir de una determinada concepción del trabajo y la propiedad. Para ello
nos apoyamos en una lectura particular de los Manuscritos económicos filosóficos de 1844. El
sentido de esta lectura no obedece a ciertas interpretaciones que pretenden vincular a
Rodríguez con el socialismo y, en algunos casos con el marxismo. Sostener la adecuación
de esta interpretación es, al menos, un anacronismo. La utilización de los Manuscritos se
basa exclusivamente en la relación que Marx realiza entre trabajo alienado, propiedad privada
y emancipación. En otras palabras acordamos, tal como sostiene Marx, que la emancipación
se encuentra íntimamente relacionada con la supresión del trabajo alienado y la propiedad
privada. En este sentido decimos que la escuela popular es un espacio igualitario y
emancipador en tanto que asume al trabajo libre y social como una idea central del
proyecto.
El abordaje que realiza Marx conserva toda su potencia y vigencia para pensar el
problema de la emancipación independientemente de las críticas a las que fue sometida
durante las últimas décadas. La descripción que realiza Marx del trabajo alienado es
sumamente interesante en la medida que nos presenta un determinado estado de cosas que
constituyen la representación del orden de la realidad económica y social propia del
capitalismo. Dentro de este orden, la propiedad privada es concebida como un elemento
242
242 || maximiliano
maximiliano duran
duran

central. Al respecto Marx escribe: “La propiedad privada es, pues, el producto, el resultado,
la consecuencia necesaria del trabajo enajenado, de la relación externa del trabajador con la
naturaleza y consigo mismo” (MARX, 2010, p.117). De acuerdo con su lectura es el
resultado y, al mismo tiempo el medio a través del cual el trabajo se aliena. La propiedad
privada es clave en la enajenación del trabajo y del ser humano, se trata del concepto a
tener en cuenta, tanto para la dominación como para la liberación del ser humano. De la
relación entre estos dos conceptos, sostiene, se deriva que la emancipación de la sociedad
respecto de su condición servil y sumisa se expresa a través de la emancipación de los
trabajadores de la propiedad privada y de su asociación con el trabajo alienado. Esto se
debe a que la condición servil del trabajador se encuentra ligada precisamente a la relación
enajenada que este tiene con la producción y con la propiedad (MARX, 2010, p.119). De
acuerdo con esto podríamos decir que los Manuscritos nos muestran una concepción
estructurada de la realidad en la que se establece una relación engañosa entre dos grupos de
personas en relación a la actividad humana y al producto de dicha actividad. Tal como se
describe en el texto un cierto grupo de personas, se apodera de la fuerza vital y del
producto de esa fuerza perteneciente a otro grupo de personas (MARX, 2010). Esa
apropiación independientemente de su legalidad, es injusta y opresiva. En este sentido, la
emancipación tiene que ver con la ruptura de este orden constituido sobre la propiedad
privada.
De acuerdo con nuestra lectura, la escuela popular no sólo rompe con un orden
determinado propio del período colonial, sino también que se opone al sistema capitalista y
de libre comercio que se pretende establecer en las nuevas repúblicas. Se trata de una
escuela emancipadora porque, a diferencia de otros proyectos educativos, asume y
despliega un concepto de trabajo y propiedad muy distintos al de trabajo alienado y
propiedad privada. La afirmación y desarrollo en la escuela de Rodríguez de los conceptos
de propiedad colectiva y trabajo libre quiebran la base de la relación de dominación del
hombre por el hombre a la que se hace referencia en los Manuscritos económico filosóficos de
1844. De esta manera, apoyados en el análisis de Marx sobre la relación entre trabajo
alienado, propiedad privada, sumisión y emancipación, decimos que la escuela de Rodríguez
puede ser considerada como una instancia emancipadora contrapuesta a la mayoría de los
proyectos educativos del período.
Las elites gobernantes americanas tras las guerras de emancipación del poder
español tienen como objetivo central la constitución del pilar básico del sistema capitalista,
aquel que cuya única posesión es su fuerza de trabajo puesta al servicio de aquellos que
pudiesen pagarla. Oszlak (1997, p.4), sostiene al respecto que el contexto internacional
ligado a los intereses de las oligarquías nacionales posibilitó “[…]el surgimiento y
desarrollo […] de intereses diferenciados generadores de relaciones sociales capitalistas”.
Sin embargo, dada la situación interna de las nuevas repúblicas (mercados muy
localizados, baja población, caminos intransitables, inestabilidad monetaria, grandes
porciones de territorio bajo el dominio de caudillos locales y la inexistencia de un mercado
financiero) el desarrollo de estas relaciones se veía comprometido. La superación de estos
problemas se convirtió en un objetivo central de los nuevos gobiernos. Los sectores
hegemónicos vieron en el Estado Nacional la instancia capaz de disponer los recursos y
generar las condiciones necesarias para desarticular y superar los inconvenientes
señalados. Entre las diversas acciones que el Estado llevó a cabo con el objetivo de
institucionalizar el orden necesario para el desarrollo y expansión de las nuevas relaciones
sociales y económicas se encuentra la consolidación de un aparato educacional. Debido a
ello es posible observar la creación y expansión de los diversos sistemas educativos
americanos durante este período. La educación primaria y el acceso a la misma como
medio control social fue impulsado mayoritariamente por los sectores hegemónicos a lo
escuela
escuela popular
popular yy emancipación:
emancipación: una
una apuesta
apuesta para
para el
el continente
continente americano
americano || 243
243

largo de todo el siglo XIX. A través de los diversos programas educativos las elites se
propusieron la formación de un pueblo obediente y funcional al nuevo orden social y
económico.
Anclados en el hecho de la supuesta formación de ciudadanos, llevaron adelante un
proceso de constitución y formación de mano de obra asalariada dócil y disciplinada. El
método lancasteriano es un ejemplo de esto que sostenemos. Desde los primeros años de
independencia el método gozó de un apoyo formidable por parte de las autoridades.
Venezuela, Colombia, Perú, Argentina y Uruguay desarrollaron experiencias de dicho
método a lo largo de todo el siglo XIX.
El alumno lancasteriano, no guarda grandes diferencias con el obrero disciplinado
premiado en función de sus propios logros en base al esfuerzo personal. La articulación de
la escuela con el mundo del trabajo es una preocupación fundamental del método
Lancaster. Nadorowski (1994, p.146) sostiene que uno de los principales problemas a
resolver por el método es la cuestión del disciplinamiento del trabajador y la participación
futura de los niños en la actividad productiva. El sistema lancasteriano sostiene que la
escuela debe preparar a los niños en la práctica de hábitos morales que condujesen a su
bienestar futuro como hombres virtuosos y miembros útiles de la sociedad. Esta virtud y
utilidad se materializa en su práctica como obreros fabriles dóciles y disciplinados. El
sistema lancasteriano en la medida que aplica el mismo principio que la industria a la
escuela. La enseñanza mutua, prepara y disciplina al futuro obrero de la sociedad
industrializada del capitalismo de fines del siglo XVIII y XIX.
Rodríguez fue un fervoroso opositor del sistema lancasteriano. En diversos escritos
se dedica a combatir el proyecto que se pretendía instalar en América no sólo en función
de los rasgos pedagógicos, sino también en relación al tipo de personas que apuntaba a
formar. El proyecto pedagógico de Rodríguez se diferencia significativamente del de
Lancaster, en relación al método y en relación al carácter político de la educación. Mientras
Lancaster propone la formación de un pueblo dócil, Rodríguez propone la educación de un
pueblo activo, crítico, autónomo y soberano. En esta oposición podría encontrarse los
motivos del triunfo y el fracaso de cada proyecto. En otras palabras, el triunfo de
Lancaster, obedece a la funcionalidad de ese proyecto a los intereses dominantes de las
nuevas repúblicas y el fracaso de Rodríguez se debe precisamente a su antagonismo con
esos mismos intereses. Mientras un proyecto educativo apunta a la sujeción y
disciplinamiento de la clase popular, el otro afirma la emancipación y soberanía colectiva
del pueblo.
Según nuestro punto de vista, la escuela de Rodríguez es una institución
emancipadora, no sólo del orden colonial, sino también un espacio de resistencia al orden
capitalista. Dicha resistencia se estructura en torno a los conceptos de trabajo y propiedad.
En la escuela popular el trabajo se constituye a partir de una idea antagónica a la de
trabajo alienado propio del capitalismo. De acuerdo con su punto de vista el trabajo al que
hace referencia es la actividad constitutiva del ser humano. Se trata de un trabajo libre,
social y capaz de desplegar las potencialidades de los hombres. En su proyecto educativo, el
trabajo manual ocupa un rol fundamental en la formación de una sociedad republicana.
Vera Peñaranda (2009) observa que, en la propuesta del maestro caraqueño, el trabajo es
condición necesaria para la formación plena de los ciudadanos (81). La relación existente
entre la actividad humana sobre la naturaleza inorgánica y el producto de esa actividad con
la formación de un hombre pleno queda de manifiesto en la Defensa de Bolívar (1999).
Según su punto de vista el trabajo es libre por dos razones. La primera de ellas obviamente
se encuentra relacionada al trabajo esclavo o mejor dicho al trabajo no remunerado.
Sostiene explícitamente que “no hay convención que dé a un hombre a otro hombre en
Propiedad, ni conveniencia que lo haga dueño de industria ajena” (RODRÍGUEZ, 1999
244
244 || maximiliano
maximiliano duran
duran

TII p.117). Dadas las estructuras tradicionales de la sociedad colonial la gran mayoría de la
población de la ciudad de Chuquisaca subsistía a través de actividades vinculadas a la
servidumbre. El maestro se proponía romper con esta situación por medio de un proyecto
educativo en el que el trabajo es una herramienta fundamental para la liberación de las
masas populares.
La segunda razón respecto de la libertad del trabajo se relaciona con la anterior en la
medida que no está asociado exclusivamente a la subsistencia. Para Rodríguez el trabajo se
limita a la necesidad física. Para Rodríguez el trabajo propiamente dicho se constituye
precisamente cuando está libre de esa necesidad.
El trabajo del cual habla Rodríguez es un trabajo social en dos sentidos. El primero de ellos
tiene que ver con la relación entre la acción de los hombres y la sociedad de la cual forman
parte. Mientras que el segundo aspecto está vinculado el carácter de la propiedad del
producto resultante del trabajo. A partir de uno de los párrafos más citados de la obra de
Rodríguez se sostiene que su proyecto educativo se sustenta en el apoyo y defensa de la
propiedad. En Sociedades Americanas, Luces y Vitudes, Breve proyecto sobre educación popular
escribe:
“Por más que velen los Liberales sobre la conducta del Jefe Supremo, los Servicios que
puede hacer con distinciones y gracias de toda especie, las excederán en número y en
influencia, y con las armas en la mano, les impondrán silencio. No hay sino un solo
recurso, y por fortuna muy fácil… hacer que el Pueblo sea REPUBLICANO, y esto se
consigue
Con una Educación POPULAR
Destinando la gente a ejercicios UTILES, y haciendo que aspiren FUNDADAMENTE a
la propiedad” (RODRÍGUEZ, 1999, TII, p.346)
A partir de la lectura de esta afirmación es posible pensar que ella es el reflejo de
una concepción ilustrada propia de las elites criollas. De acuerdo con este pensamiento era
necesaria la superación de las estructuras sociales pre-capitalistas propias del período
colonial para la incorporación de las nuevas repúblicas en el mercado internacional como
productoras de materias primas. Para ello se tornaba imprescindible la formación de un
mercado libre de tierras basado en la eliminación de manos muertas y vinculaciones; la
defensa de la propiedad privada, y la abolición jurídica de las formas de servidumbre y
esclavitud, a partir de la cual se tendía a la formación de un mercado libre de trabajo. En
este contexto puede ser leída la frase de Rodríguez sin presentar mayores sospechas como
el producto de un pensador ilustrado que se propone la materialización del proyecto de la
incipiente burguesía criolla.
En este trabajo adoptamos una postura distinta. Para nosotros existe otra posible
interpretación relativa al concepto de propiedad al que hace referencia Rodríguez. Según
nuestro punto de vista el maestro caraqueño se inclina a favor de una propiedad de tipo
colectivo en lugar de la propiedad privada. En base a sus escritos, es posible sostener que
Rodríguez se opone explícitamente a la idea de propiedad privada tal como se la entiende
en el capitalismo tradicional y postula otro tipo de propiedad. En Sociedades Americanas en
1828 sostiene que “hacer frente a una empresa, contando con el trabajo ajeno, sin
comprometer sus intereses, es la especulación más sencilla… porque cuenta la miseria del
obrero” (RODRÍGUEZ, 1999, TI, p.469). Aquí es interesante destacar la fuerte similitud
de lo escrito por el maestro con los Manuscritos económicos filosóficos de 1844. Con una
distancia de casi veinte años en ambos textos se hace mención explícita a la relación entre
la miseria del obrero y la apropiación del producto de su trabajo por parte de otra persona
(MARX, 2010, p.107). A su vez, en Luces y Virtudes, agrega que no existe ningún tipo de
conveniencia que haga a un hombre “… dueño de la industria ajena” (RODRÍGUEZ, 1999,
TII, p.117). Para Rodríguez el trabajo y el producto del trabajo son parte constitutiva de
escuela
escuela popular
popular yy emancipación:
emancipación: una
una apuesta
apuesta para
para el
el continente
continente americano
americano || 245
245

aquel que lo realiza y no de un tercero. Es decir, el trabajador es dueño de su actividad de lo


que produce con ella. Sobre este punto es interesante ver de qué manera propone la
creación de los establecimientos laborales a lo largo de su obra. De acuerdo con lo escrito
en Consejos de amigo al Colegio de Latacunga (RODRÍGUEZ,1999, TII) y en la Defensa de
Bolívar (RODRÍGUEZ, 1999, TII) en los talleres y fábricas que allí propone no existe la
figura del capitalista dueño de los medios de producción. En el mejor de los casos hay un
socio encarnado siempre en la figura del Estado que provee el capital inicial para poner en
marcha los talleres y debido a ello recibe un interés muy bajo hasta cancelar el dinero
adelantado (RODRÍGUEZ, 1999, TII).
Respecto al carácter colectivo de la propiedad podemos decir que ella es
explícitamente defendida por Rodríguez en distintos lugares de su extensa obra. Nosotros
por cuestiones de espacio y en función de la claridad con la que Rodríguez realiza el
análisis sobre este punto nos detenemos en una sección de Luces y Virtudes en la que hace
referencia a su proyecto político y educativo. Allí el maestro explica qué entiende por
“educación popular destinada a ejercicios útiles y fundada en la propiedad”
(RODRÍGUEZ, 1999, TII, p.346).
En función de lo escrito en esta sección del trabajo decimos que la escuela de
Rodríguez se enfrenta abiertamente con los sectores hegemónicos de su época. A diferencia
de las escuelas Lancaster, pensadas para los pobres como espacios de producción de mano
de obra barata, la escuela popular se presenta como un espacio acogedor e igualitario. Ella
es emancipadora en la medida que se opone a las ideas de trabajo alienado y propiedad
privada propias del capitalismo que se pretendía implantar en América del Sur. A partir de
una idea de trabajo como actividad constitutiva del hombre propone escuelas en las que
este sea considerado como una práctica social, libre y enriquecedora de todos y para todos.
En otras palabras, propone una escuela emancipadora de los antiguos y los nuevos amos
que según el propio Rodríguez son los mismos (1999).

conclusión
A lo largo del presente texto nos propusimos pensar el concepto de emancipación
como una de las características constitutivas de la escuela popular pensada por Rodríguez
en la ciudad de Chuquisaca. Para ello partimos del concepto de emancipación presentado
por Marx en los primeros manuscritos. Allí el pensador alemán plantea la emancipación
como superación del trabajo alienado y la propiedad privada (MARX, 2010). En el
transcurso de este trabajo intentamos mostrar de qué manera la escuela popular de
Rodríguez cumple con las condiciones propuestas por Marx. Aquí es sumamente
importante aclarar que, bajo ningún punto de vista, intentamos decir que Rodríguez sea
marxista, ni que haya formado parte de su formación intelectual. De hecho, pensamos que
es muy poco probable que haya tenido conocimiento alguno de los trabajos de este. En este
sentido, constituye una decisión teórica nuestra y no una influencia del maestro Rodríguez
afirmar que el concepto de emancipación de Marx conserva toda su potencia en la
actualidad.
En función de lo escrito pensamos que la escuela popular es una escuela
emancipatoria en la medida que combate la relación injusta que surge del trabajo propio del
capitalismo y la propiedad privada. En esta misma línea nos interesaría mostrar en trabajos
futuros: a) de qué forma esta escuela emancipatoria puede ser pensada en la actualidad, b)
relación entre trabajo intelectual, trabajo, manual y emancipación y c) la relación entre
escuela popular y comunismo.
246
246 || maximiliano
maximiliano duran
duran

referencias
CASAS,
CASAS, Bartolomé
Bartolomé de de las.
las. Brevísima
Brevísima relación
relación dede la
la destruición
destruición de de las
las Indias.
Indias. Madrid:
Madrid: ed.ed. Castalia,
Castalia,
1999.
1999.
______.
______. Los
Los indios
indios de
de México
México yy la
la Nueva
Nueva España.
España. México:
México: Porrúa,
Porrúa, 1966.
1966.
CIRIZA,
CIRIZA, Alejandra;
Alejandra; FERNÁNDEZ,
FERNÁNDEZ, Estela. Estela. SimónSimón Rodríguez:
Rodríguez: Emancipación
Emancipación Mental Mental yy
Redefinición
Redefinición del del Papel
Papel deldel Estado
Estado en en el
el Espacio
Espacio Público.
Público. Revista
Revista dede Pedagogía,
Pedagogía, Caracas,
Caracas,
v.XXI,
v.XXI, n.6,
n.6, p.49-65,
p.49-65, 2000.
2000.
______.
______. El
El dispositivo
dispositivo discursivo
discursivo deldel socialismo
socialismo utópico.
utópico. Los Los escritos
escritos de de simón
simón Rodríguez.
Rodríguez. Revista
Revista de
de
Filosofía,
Filosofía, n.18.
n.18. Universidad
Universidad de de Zulia,
Zulia, Maracaibo,
Maracaibo, p.77-85,
p.77-85, 1993.
1993.
______
______ Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez. Una Una formulación
formulación original
original de de lala dicotomía
dicotomía civilización
civilización -- barbarie.
barbarie. Nuestra
Nuestra
Historia
Historia Revista
Revista Historiográfica,
Historiográfica, Caracas,
Caracas, n.2,
n.2, p.33-39,
p.33-39, enero-junio
enero-junio 1992.
1992.
ESCOBARI
ESCOBARI DE DE QUEREJAZU,
QUEREJAZU, Laura. Laura. Historia
Historia de de lala alfabetización
alfabetización en en Bolivia.
Bolivia. Época
Época colonia
colonia ss
XVI-
XVI- XVIII.
XVIII. Estudios
Estudios Bolivianos,
Bolivianos, n.15,
n.15, p.227-283,
p.227-283, 2009.2009.
______.
______. Cacique,
Cacique, yanaconas
yanaconas yy extravagantes.
extravagantes. Sociedad
Sociedad yy educación
educación colonial
colonial en
en Charcas
Charcas s.s. XVI-XVIII.
XVI-XVIII. La La
Paz:
Paz: Plural
Plural Editores,
Editores, 2012.
2012.
GUANCHEZ
GUANCHEZ DE DE MENDEZ,
MENDEZ, Zenaida.Zenaida. Simón
Simón Rodríguez,
Rodríguez, la la Constitución
Constitución de de 1826
1826 yy el
el Proyecto
Proyecto
de
de Educación
Educación Popular.
Popular. Revista
Revista de
de Pedagogía,
Pedagogía, v.26,
v.26, n.75,
n.75, enero
enero 2005.
2005.
KOHAN,
KOHAN, Walter.
Walter. ElEl maestro
maestro inventor.
inventor. Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Miño
Miño yy Dávila,
Dávila, 2014.
2014.
MARX,
MARX, Carlos.
Carlos. Manuscitos
Manuscitos económico-filosóficos
económico-filosóficos de de 1844.
1844. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Colihue,
Colihue, 2010.
2010.
NARODOWSKI,
NARODOWSKI, Mariano. Mariano. Infancia
Infancia yy Poder.
Poder. La
La conformación
conformación de de la
la pedagogía
pedagogía moderna.
moderna. Buenos
Buenos Aires:
Aires:
Aique,
Aique, 1994.
1994.
OSZLAK,
OSZLAK, Oscar.Oscar. La
La formación
formación del del Estado
Estado Argentino.
Argentino. Buenos Buenos Aires:
Aires: Planeta,
Planeta, 1997.
1997.
RAWICZ,
RAWICZ, Daniela.
Daniela. Ensayo
Ensayo ee Identidad
Identidad cultural
cultural enen elel siglo
siglo XIX
XIX latinoamericano.
latinoamericano. Simón
Simón Rodríguez
Rodríguez yy
Domingo
Domingo F. F. Sarmiento.
Sarmiento. México:
México: Universidad
Universidad de de lala Ciudad
Ciudad de de México,
México, 2003.
2003.
RODRÍGUEZ,
RODRÍGUEZ, Simón. Simón. Obras
Obras completas,
completas, v.I-II.
v.I-II. Caracas:
Caracas: Ediciones
Ediciones de de la
la Presidencia
Presidencia de de la
la República
República
Bolivariana
Bolivariana de de Venezuela,
Venezuela, 1999.
1999.
VERA,
VERA, Peñaranda;
Peñaranda; PATRICIO,
PATRICIO, Edgar. Edgar. Simón
Simón Rodríguez
Rodríguez yy sus sus ideas
ideas dede educación
educación popular
popular en
en Bolivia.
Bolivia. La
La
Paz:
Paz: Instituto
Instituto dede Estudios
Estudios Bolivianos-
Bolivianos- UMSA,
UMSA, 2009. 2009.
VITORIA
VITORIA DE, DE, Francisco.
Francisco. Relecciones
Relecciones sobre
sobre los
los indios
indios yy el el derecho
derecho de de guerra.
guerra. Madrid:
Madrid: Espasa
Espasa -- Calpe,
Calpe,
1975.
1975.
247
247

vi. a escola e o
educacional
no escolar
248
248
249
249

school experiences:
an attempt to find a pedagogical voice

maarten simons11
jan masschelein22

introduction

H ow do we speak about education today? Perhaps the question itself is not


framed adequate since we increasingly tend to speak about learning
instead of education. How then do we speak about learning? It is referred
to as a process, and hence approached in terms of having a beginning and having an end.
The end is commonly framed in terms of knowledge, skills, attitude or competences. The
process itself is regarded as a force of transformation, or increasingly also as a
construction or production process. Learning then is often regarded as a process of change,
and depending on the approach the change process is differently conceptualized. From a
psychological point of view learning processes are essential development or growth
processes. From the economic perspective of human capital theory learning is about
accumulation of capital. From a sociological point of view learning is about habituation,
reproduction, appropriation or acquisition processes which are functional for establishing
or changing (existing) orders. From a biological or neuroscience point of view learning is
about processing information and about adaptation, connecting and associating. Education
or school are than the organizational or institutional arrangements to make these learning
processes possible (to stimulate, foster, elicit or facilitate them). One could say that in
these approaches education and learning itself is always approached from an external
perspective, it is functionalized or instrumentalized implying in some way or another
learning in itself to be something ‘natural’ which can be conceived without taking
‘artificial’ schooling into account. Moreover, from these external perspectives schooling is
increasingly criticized as an inefficient and non-functional institutional arrangement.
Philosophy of education or educational theory often criticize the psychological,
economical, sociological or biological perspectives on education and learning. But it is
striking to notice that they too mostly stick to an external, functionalizing or
instrumentalizing perspective. In this contribution we want to address this omnipresent
perspective of philosophy of education showing, on the one hand, how it repeats in fact
the way in which master thinkers in philosophy and social and political theory tend to
treat and actually to tame education and learning and we attempt, on the other hand, to
offer a different internal pedagogical perspective that approaches education by relating
learning explicitly to ‘artificial’ schooling. Or stated differently, we want to attempt to
speak pedagogically about what is at stake in school learning. Instead of narrating about
the (good, bad, great, sad) experiences of learning at school, this pedagogical language
seeks to give voice to the experience while school learning.
Our contribution is structured in five parts. We will start (1) with a typical recent
case of a master thinker that is explicitly dealing with ‘change’ and refers thereby to
learning: Peter Sloterdijk. We will then (2) further distinguish between various kinds of
philosophy and (social/political) theory according to the ‘metaphor’ (or example) they
mobilize to conceive of the meaning of learning and we will indicate how this always
comes down to an instrumentalization or marginalization of education. We will then (3)

11 KU
KU Leuven.
Leuven. Email:
Email: maarten.simons@kuleuven.be
maarten.simons@kuleuven.be
22 KU
KU Leuven.
Leuven. Email:
Email: jan.masschelein@kuleuven.be
jan.masschelein@kuleuven.be
250
250 || maarten
maarten simons;
simons; jan
jan masschelein
masschelein

indicate how philosophy of education itself runs the same risk of instrumentalizing and
marginalizing education and naturalizing learning. Taking distance from this we want (4)
to point to the importance of the artificial milieu of the school in order to present a
pedagogical voice that proposes to think about learning as crucially and intrinsically a
school experience. In the conclusion (5) we suggest some reasons why philosophers
(including philosophers of education) often (like to or tend to) forget that they too went
to school.

1. a case to start: peter sloterdijk’s treatment of education


If education is about change, how can we think of this change that is involved in
education. We could take as a point of departure Peter Sloterdijk’s recent work. Sloterdijk
refers to Rilke’s commandment that emerges from out of the stone torso ’you must change
your life’ in his book with the same title (SLOTERDIJK, 2014a). In this book, which
clearly echoes the work of Nietzsche, Pierre Hadot and Michel Foucault on the art of
existence and practices or technologies of the self, Sloterdijk writes a history of the often
forgotten techniques and ideas about how and why to change one’s life. Clearly, in his
book he addresses also education, and particularly modern school education, as the time
and space where ‘life change’ is being organized, but he immediately seems to understand
and disqualify these ‘change practices’ as being institutionalized, normalized or state
governed. He fails to acknowledge the proper educational operations that are involved in
these practices. As such it reveals that his concern and interest is not in the first place
educational, but foremost related to ethics and aesthetics, and hence judging educational
change and school education with standards of ethics and aesthetics.
In his book Die schrecklichen Kinder der Neuzeit, published in 2014, the focus is not on
individual change but on intergenerational change, and how, gradually the preoccupation
with a disconnection from tradition – parents, common culture, norms and values – has
become the leitmotif of modernity (SLOTERDIJK, 2014b). He traces back the roots of
modernity to Greek Antiquity but also to early Christianity where, for instance, the focus
is not so much on the family and the figure of the obedient son or daughter, but on the
figures of those who liberate themselves from family life – and tradition as a whole – in
order to dedicate their lives to a future that is not just the continuation of a given past.
Jesus, or the figure of Jesus, is according to Sloterdijk clearly an embodiment of this anti-
genealogical movement. It is not the logic of the heir or the inheritor, but the logic of the
bastard. Although the roman catholic church later on clearly tames this logic, here lies,
according to Sloterdijk, one of the origins of the modern free individual and currently,
perhaps, the figure of the entrepreneur. For these figures genealogy, tradition, generational
transmission and passed norms and values refer to something that one has to transgress,
or appears at least not as something that could give meaning and orientation to one’s life
and the future of society. These figures are, so to speak, change agents. While before
modernity only a few had the occasion or courage to act as ‘bastard’ while disconnecting
themselves from their homes, families and communities, being a change agent has
become, according to Sloterdijk, a common mode of existence for many afterwards.
We will not go into detail regarding the pessimistic – or perhaps, realistic –
conclusions of his book, but we want to draw attention to how Sloterdijk approaches the
issue of change from a particular perspective. While one could argue that what he
describes – the interruption of history, the idea of leaving one’s home or the movement of
distancing oneself from one’s parents as offering an orientation from past to future - is
actually what education precisely is about, he rarely addresses education as such. He
focuses on culture, politics and religion instead, with one exception, however. In the
introduction of his book he shortly and rather enigmatically refers to “learning”, as the
school
school experiences:
experiences: an
an attempt
attempt to
to find
find aa pedagogical
pedagogical voice
voice || 251
251

“most neglected notion of current times.” He seems to suggest that we should consider the
notion of learning much more carefully today, even cherish and celebrate it, and – at least
that is our interpretation – to hope that it is ‘learning’ that somehow will save us from the
postmodern condition where we no longer trust the past (as in pre-modern times) but also
do no longer belief the futurist optimism of modernity. However, these are just 3 or 4
sentences in a 400 pages book. Although his main concern, thus, is not about education he
seems to expect everything from it. Suddenly, an educational vocabulary, while absent
throughout the book, turns out to be required to lead us out the dark ages of
postmodernism.

2. ‘social learning’, ‘enfance’, ‘teaching’ and ‘game’ philosophers


We take both recent books of Sloterdijk just as an example to show how often
philosophers and social, political or cultural theorists discuss the issue of change,
transformation and generations, while not really addressing in detail education, or at least,
not explicitly trying to understand what kind of change is typical to education and
learning. At the same time, educational vocabulary does play a role in their work; despite
often written as marginal comments equally all hopes are invested in it.
Habermas (1981), for instance, is another case. In his social and political theory he
seeks to understand social and political change and transformation, yet at the same time
he has to come up with notions such as cognitive capacities and societal learning processes
in order ‘to explain’ shifts from one world view to another. His point of view is
sociological and political, but he has to draw on notions from the field of education to save
or to finalize his sociological and political project. Similar to Latour (2004) who introduces
the notion ‘learning curve’ in order to explain how a gradual change from one social
constitution towards another comes about, without this change being imposed from
outside (politics or policy) or from inside (morality and ethics). For Sloterdijk, but also for
Latour and Habermas, education and learning seem to be notions that indicate a process of
change, but always in one way or another these notions are postulated as needed to safe or
close their ethical, political or social intellectual project, that is, to explain how ethical,
political or social changes come about. As such, educational change and the educational
meaning of change is either being ignored or ridiculed. And if it is conceptualized, in one
way or another, education is narrowed to a form of socialization (habituation, acquisition)
or – in progressive circles – an attempt to counter-socialization. Ultimately, the social and
cultural theories of these (social) learning-philosophers are theories about grown-ups, about
how adults need learning but without becoming a child.
Along these lines it is perhaps also possible to distinguish such learning-philosophers
from some enfance/infancy-philosophers, some ‘teaching’-philosophers and some ‘game’-
philosophers. With the enfance/infancy-philosophers we want to refer to authors such as Jean-
François Lyotard and Giorgio Agamben, and perhaps even Hannah Arendt. Lyotard
(1988) specifically draws on the notion of ‘enfance’ or ‘infantia’ in order to address issues
that are to be located beyond language or beyond the capitalist system, but that
nevertheless play a key role or ‘haunt’ the system. Using the image of childhood – at least
as in-fantia i.e. not-speaking – his ambition is to conceptualize conditions and events that
do not (yet) belong to our common discourses and languages and, hence, is a kind of
childhood that continues to play a role in adulthood. He refers to it as an initial lack, an
absence of determination that is (can) never (become) filled up, and continues to take
hostage of adulthood. For that, he draws on the one hand on Freud’s ideas about the
structure of the trauma and affect (always having difficulties to find an expression in
language) and on the other hand on Arendt’s concept of natality or the capacity to begin.
In a similar way, Agamben (1982) introduces the ‘enfance/infancy’ or ‘infantia’ concept to
252
252 || maarten
maarten simons;
simons; jan
jan masschelein
masschelein

think about a condition of potentiality that is not yet actualized, and thus about the
experience of being able to speak as such. More precisely, it is – according to Agamben -
the experience of language itself as the experience of man being an animal that has
language, being able to speak and hence also being able not to speak or to be silent.
Without going into detail, and hence doing injustice to the complexities of the work of
these authors, we do think their references to education and childhood often become
images or metaphors to think about what is at stake in adult life. For them, education and
learning is at least not the key concern. And if their thoughts are translated to (philosophy
of) education itself, it is perhaps not a surprise that education runs the risk of being
framed in therapeutic or ethical terms. The risk is a kind of personalization by putting in
one way or another a dialogical or analytical relation between persons, that is the person
of the teacher and the person of the pupil, central stage. The pedagogical key issue is not
turned into an issue of socialisation or counter-socialisation, but becomes the act of ‘doing
justice’ (to someone, or even to enfance/infancy itself) in terms of ‘opening up futures’ as
‘capacities to act and speak’.
In a different way, for sure, we can relate also some teaching-philosophers to this
ethical framing of education. Although we also cannot render it in its complexity, we
could point here for example to Levinas’ use of the teaching metaphor to describe the way
the ethical demand is inscribed before the subject comes to itself (LEVINAS, 1998). It is a
description which in the context of philosophy of education is often turned around so to
say, to understand teaching as quasi identical with an ethical relation. An ethical framing
of education which is very often related to an understanding of ethics in terms of being
summoned before the ‘face of the other’ as the ‘Law’ beyond any law, etc. Perhaps another
version of this ethical teaching philosophy is the work of Judith Butler (2005) on the
decisive role of an act of interpellation in the constitution of subjectivity. In line with this,
there is the interpretation of the act of teaching as working according to the logic of
interpellation and focusing on the relational and performative dimension of the child’s
subjectivity.
Furthermore, such enfance/infancy-philosophers and teaching-philosophers,
perhaps, should be distinguished from game-philosophers. Again without claiming to make
a final statement about the complexity of his work, we could think of Wittgenstein (1965),
with his concept of language game being the most telling one. Probably here, the focus and
concern is already much more on the practice of education, although the experience of
education itself and the specificity of educational and learning events and relations, is
much less outspoken. Education along these lines is not a matter of socialization or
capacity to act, but a matter of initiation.
While all these philosophies and theories acknowledge that childhood and change
through education is important and while they are postulating the existence of conditions
of childhood and childish conditions, education and childhood is at once
‘instrumentalized’, be it as a temporary condition, a necessary evil, a logical factor in view
of ethical, political or social change, or be it as an image or practice to conceptualize what
is difficult to conceptualize in adult life. From the perspective of such adult or grown-up
philosophies, and thinking along these instrumental lines, education and learning is often
marginalized, ridiculed or – when acknowledged – celebrated as a unique case, example or
metaphor.

3. the risk of/for philosophy of education


The risk of/for philosophy of education and educational theory is to be trapped in
the same movement of instrumentalizing or even marginalizing education and
naturalizing learning. The risk is that education and learning are considered to be
school
school experiences:
experiences: an
an attempt
attempt to
to find
find aa pedagogical
pedagogical voice
voice || 253
253

foremost a field of application for theories developed elsewhere and for other purposes, or
to be a field of practice with a function or meaning that is only to be derived from other,
non-educational practices. This risk is real not so much because educational theory and
philosophy would draw on (developmental) psychology, economy (and human capital
theory), biology or neurosciences. Explicitly taking distance from these disciplines is
(still) to a large part central to its own self-understanding and self-definition. The risk is
real precisely because philosophy of education and theory often tend to rely on master
thinkers (including philosophers) such as Habermas, Wittgenstein, Latour, Levinas,
Lyotard, Agamben, Rorty, Arendt, etc. While being often engaged in great efforts to
disentangle the complexities of the work of these thinkers, philosophy of education
equally often (implicitly or explicitly) turns education and learning into a field of
application, if education and learning as well as a genuine educational concern is not
marginalized completely by a political, social or ethical concern.
The ‘imperative to change’ - as put forward by Sloterdijk (2014a) - , but the
discourse about change more generally, to which philosophies and theories of education
are attracted time and again, is indeed often leading towards an ethically, politically,
socially, psychologically or economically ‘colonized’ understanding of education. It is
colonizing since the ‘you must change your life’ or ‘we want to change our - including your
or their - life’ is always involved, and always includes a kind of judgment as its starting
point. The change is motivated by a judgement or evaluation that something is in
whatever way wrong or insufficient or in need of light or clarity, and that change is
wanted, needed, looked for, aspired to, suggested, required or desirable. Change through
learning becomes a matter of need or a necessity. Learning is motivated by an obligation
or call (moral, ethical) or by new regulations or political responsibilities (political), it
becomes a matter of socialization (and following the need for social reproduction), a
matter of investment in human capital (and follow the need for capital accumulation and
rates on return), or a matter of cognitive and affective development and growth
(according to certain norms, stages and brain functions). This is change that is always
motivated by an aim (a projected future or outcome: we/you/they want or have to get
somewhere) or/and by a lack (we/you/they miss or need something).
In order now to develop a pedagogical (internal) voice or to give voice to
pedagogical change, we suggest to reclaim the old distinction between
initiation/socialization/development on the one hand and education on the other hand. In
order to clarify why and how to make this distinction, let us make a short detour passing
the meanwhile influential (but in fact equally old and traditional) distinction between
qualification, socialization and subjectification (e.g. Biesta, Hasslöf, Ruitenberg). For
Biesta (2009), for instance, these are three functions or roles of education, and often all three
of them are playing a role. Clearly, Biesta wants to focus on the role of subjectification –
and becoming a person, coming into presence by finding a place in the world not by
inserting into existing orders but by interrupting or disturbing them -, against the often
dominant roles of socialization and qualification. The critical question, however, is
whether these are three roles or functions to be distinguished when looking at education
indeed from a pedagogical/educational perspective. We think that this is not the case, and
that Biesta’s rephrasing of an old distinction is the result of combining three different
approaches which are all three external to education. It seems as if the qualification
function pops up when looking at education from an economic perspective, while
socialization (and the process of integration in social norms and values) is the key term
when looking through sociological lenses. Subjectification, then, is what appears when
approaching education either politically (in line with a particular reading of Rancière:
becoming someone which is at the same time challenging the existing social order in
254
254 || maarten
maarten simons;
simons; jan
jan masschelein
masschelein

terms of equality) or ethically (in line with certain interpretation of Levinas: becoming
someone which is always motivated by a call from the other in terms of doing justice).
We want to argue that qualification, socialization and subjectification represent three
versions of taming education; an ethical-personalising or political-equalizing taming of
education that imposes ethical or political standards on change (subjectification), an
economical one that imposes an exchange value or investment calculus (qualification) and
a sociological one that tames educational change by imposing the rules of social and
cultural reproduction – or in a progressive version – the rules of social renewal and change
(socialization). Or to put it differently, the distinction between qualification, socialization
and subjectification misses a pedagogical/educational perspective. Ultimately it
functionalizes or instrumentalizes education and learning, it tames learning by imposing
external aims or functions. In the next sections, we suggest a different, pedagogical
perspective and attempt to indicate that from such a perspective education is about a
learning (happening) without destination or inclination, it is about a being-in-the-middle
which is always artificial.

4. artificial pedagogic forms


Our pedagogical perspective is not focusing on learning and education by revealing
its true role or function, nor is it an attempt to reveal the true nature of learning by
liberating it from its historical organizations. Our pedagogical perspective takes a
somehow unusual point of departure; it wants to give a voice to the learning experience as
being the experience of being-in-the-middle by focusing on the always artificial
arrangements (called ‘school’ or ‘university’) that make this experience possible. In other
words, we want to address the (radical) operations of what we call pedagogic forms and
that (always artificially) allow learning and education to happen.
The pedagogical operations (to realize being-in-the middle) can be summarized as
follows (see also MASSCHELEIN; SIMONS, 2014). (1) Operations to turn someone into
a ‘student’ or ‘pupil’, i.e. suspending the ties of whatever family or state or any
‘past/existing community’ (this is to a certain extent referring to Sloterdijk’s bastard). It
implies making that one can become part of any family/community-to-come. (2)
Operations of suspension of the usual order of things, and hence putting their common
usage and functions temporarily out of effect. Certain things (e.g. books, tools, words …)
can become study object, one can start to exercise with these things, precisely because
their normal usage is put between brackets. (3) Operations of putting some-thing on the
table (profanation) and making ‘free time’, i.e. the materialization or spatialization of
scholè. In ancient Greece scholè signified the flight of undergoing from the determination
of doing. It is about un-finishing, undoing the appropriation and destination of time, and
as such a catalyst of beginnings. School in this sense puts someone in a position to begin.
(4) Operations of making attentive, that is, forming attention relying on ‘pedagogic love’
for both certain things and the students. This is not just an matter of attitude or relation,
but about using techniques and certain types of discipline to draw attention to something.
Discipline, however, not as a moral or political category but as a practice of enabling.
Pedagogic forms refer, than, to associations of people and things arranged as a way
to deal with, pay attention to, take care of some-thing – to get and be in its company - in
which this care entails structurally an exposition since it is confronted with pupils,
students. It is crucial to stress at this point that pedagogic forms are not in need of a
projected political utopia or a normative ideal of the educated person (for which they
would be functional), but are in themselves (in the actual and particular way they are
gathering people and things) materializations of a utopian belief: everybody can learn
everything. One could say that this is why the decision to bring children to ‘school’ is in
school
school experiences:
experiences: an
an attempt
attempt to
to find
find aa pedagogical
pedagogical voice
voice || 255
255

itself political, and not in need of an external/extra ideal or a projected political function.
What pedagogic forms do, is enabling the ‘everybody can’ on the one hand, and the
‘everything’ on the other hand. In other words, there is no such thing as an utopian school.
School learning itself embodies the utopian idea that everybody can learn everything. What
the school as pedagogic form does is the double movement of bringing someone into a
position of being able (and hence, turning someone into a pupil or student) which is at the
same time an exposure to something outside (and hence, an act of presenting and exposing
the world). Drawing on Michel Serres (1997), this double movement could be captured in
the notion ‘ex-position’, and the strong experience of someone who learns to swim being
in a condition where she is not yet able to swim, however, is no longer constantly looking
for a safe haven or ground under his/her feet. It is a condition or experience ‘in between’
or ‘in the middle’, that is, the condition where one has left one’s safe home, lifeworld or
house, and everything is (still) possible when confronted with the world outside. Our
thesis is that this condition and this experience are an educational condition and
experience, and are not to be confused by an ethical, psychological or political one.
Moreover, our thesis is that this condition of exposition is what is enabled or prepared
through specific, always artificial, pedagogic forms. It is what is at stake in ‘school’
learning, and what deserves to have a voice and is in need of a pedagogical language.
Indeed, instead of narrating about the (good, bad, great, sad) experiences of
learning at school, a pedagogical language seeks to give voice to the experience while
school learning. Not the experience of a condition where someone is not (yet) being able
to, for instance, write or count. But also not the experience of (already) being able to write
or count. School experience is what is experienced at the moment that writing or counting
becomes a possibility; the experience of learning before actually being able to write or
count, yet not just the experience of (simply) not being able to write or count. Think
about the little child who learns to write. Before being able to write, the child experiences
(probably) her not being able, but she doesn’t experience learning. When being able to
write, perhaps she remembers herself learning, but she doesn’t experience learning itself.
The learning experience is the experience at the moment that the ability to write (and
hence, not to write) is experienced as such. School experiences refer to the experience of
being-in-the-middle (of things), the experience of an interrupted course of life where new
courses become possible, the experience of knowledge and ability after making a mistake.
Or after being forced or invited to cross the river, “to split off from the so-called natural
direction” (SERRES, 1997, p.8).
We want to stress again that from a pedagogical perspective ‘school’, including the
university as a particular school, is not an institution or a kind of organizational shell but
the always artificial arrangement of time, space and matter you have to go to for these
experiences. As a consequence, the terms ‘school’ and ‘university’ are not used (as is very
often the case) for so-called normalizing institutions or machineries of reproduction in the
hands of the cultural or economic elites. There is reproduction and normalizing, of course,
but then the school or university does not (or does no longer) operates as a pedagogic
form.
The question, of course, is what is the role or aim of the school and university? At
this point, we want to introduce the notions preparation and practice. The school is not
about making students and pupils best performers – although that is often asked from
schools and universities. The school is about offering young people the time and space to
bring themselves ‘in shape’, to work on their (intellectual, physical…) ‘condition’, and of
course, one may hope that this preparation and this shape or condition results in top
performances or unique contributions, but making that possible is outside the school’s or
university’s field of influence. This focus on preparation and practice, perhaps helps to
256
256 || maarten
maarten simons;
simons; jan
jan masschelein
masschelein

understand that schools and universities are also always the places where the coming
generation actually appears as a new generation, and hence, where society can be renewed.
Schools and universities, nor society can have control about this renewal or about how the
coming generation actually uses its preparation and study. This seems to be typical to
pedagogic change or renewal, and this kind of change is always the risk of a society that
decides to organize or allows the pedagogic forms of schools and universities. These
societies always give their future (and also the continuation of their past) out of hands or,
formulated in another way, entrust pedagogical change to the coming generation (who
might become a new generation). Such societies do not ‘choose’ for initiation or
socialisation, but for school education. Or to be more precise: it is with school education
that a society becomes in a particular way aware of itself which means that it is turned
into a matter of concern. Probably this explains why there are so many attempts – both
within schools and universities and within society – to tame schools and universities, that
is, to give pedagogical change a specific direction, and hence, to impose psychological,
ethical, political or social norms. Deciding for school education implies accepting that
what is valued by a society (and its adults) can be fundamentally questioned and
challenged, being put on the table. The school opposes all naturalising and sacralising
claims, and all movements of conservatism and restauration associated with these claims.
It is in that sense that it is indeed affecting society and as we stated before, so to say,
intrinsically ‘political’.

5. in conclusion: a pedagogical voice as a voice from the middle


We started with the tendency among philosophers and social theorists to
instrumentalize education and learning, and hence, move education and learning to the
margins of their adult theories and grown-up philosophies. We want to give voice to what
is in the middle, and what – from the perspectives of these grown-ups – are probably only
murmurs in the margins. As conclusion, it is perhaps worth reflecting on why education
and educational theory or philosophy is often put aside, treated as marginal or ridiculed.
We think (but are not sure) that it was Bernard Stiegler who once made the remark that
philosophers often forget that they as well went to school, and they are not happy to be
reminded about it. But why not? Why this forgetting, or marginalization and ridiculing?
Before delving further into this, it is helpful to recall other manifestations of what is at
least an ambivalent relation to (one’s) education.
It is striking to notice that people – especially at moments when they celebrate
their own intellectual or other achievements – are not happy to be reminded about their
dependencies on schools or universities for what they have achieved. It seems as if one’s
educational past may cast a shadow on one’s acquired state of adulthood, and the freedom
and liberation that we associate with that state. And if we do recall the role of schools or
universities and of studying and exercising in who we have become and in what we are
able to today, we either stress that we came that far despite the school or the university
(and reaffirming our independency) or we tell the stories of those rare, enlightened
teachers or professors that, despite the normalizing school or university apparatus, were
able to show us the real world and our freedom as it truly is (and hence, these grateful
stories about inspiring teachers or professors are often also only about reaffirming one’s
present state of independency).
Another observation, related to the previous one, is that those who are working in
or on education always have a kind of marginal position (one that in a way is disturbing
the social order). Those who choose to become a teacher, for example, often in fact not
choose to put their knowledge and skills at the service of productive and economic life, but
at the service of the coming generation. It is a position in between, that is, in between the
school
school experiences:
experiences: an
an attempt
attempt to
to find
find aa pedagogical
pedagogical voice
voice || 257
257

family and society, the young generation and adult society, and hence, a position that is
difficult to define and that remains ambiguous. There are tendencies of course, over and
over again, to turn teaching into a regular job or even profession. But perhaps, because
teaching always implies being out-of-position – somehow similar to the position of artists
– these tendencies often fail, and have to fail, if education is about putting the world at the
distance in order to study it. In that regard, we should perhaps recall the figure of the
pedagogus – where our notion of pedagogue comes from. Often, this figure was a slave, but
a slave with privileges for he was allowed to bring the children to school. In that sense, he
was the liberated slave, that literally brought young people to free time, that is, to study
and exercise. From the perspective of society and adult economic life, the position of
teachers, and all those who are concerned with education (thus also educational
researchers), are living a life in the margins. As marginal figures they are nonproductive,
and hence, regarded as not really important. At the same time they are considered to be
instrumental or functional for real life and the real productive world (that wants to
reproduce itself). But we could also look at these roles and positions as exactly liberated
and liberating, and hence, they are often also envied in that regard.
The question we should further explore is, however, the reasons for the
ambivalence, if not straightforward ridiculing or marginalizing. A first reason could be: if
education in the strong sense is indeed about changing oneself, and hence, always also
becoming someone else, it is very difficult to remember who one was before (implying
also that there is no stable ‘one’ that would experience the change). Or to put this in
another way: it is always from the perspective of who one has become that one returns on
one’s past. There is a kind of irreversibility at stake, and hence, the educational experience
and process itself is difficult to remember. Probably, when doing an effort, one could
imagine who one was before one learned to write or read, and one could imagine who one
was before reading and studying a particular subject, work or author. But that is always a
projection of a state of not-knowing or not-being-able based on what is experienced today
as knowing or being able. Probably there is this tendency to forget, exactly because it is
just hard to remember one’s learning in the strict sense. One could say that learning in
this sense comes close to the structure of the trauma and the logic of the unconscious. But
there is a fundamental difference; it is not about painful remembering but about joyful
forgetting, and it probably does not need analysis and therapy, but celebration and
gratefulness.
The second, possible reason is that schools always organize a ‘fundamental
disorder’; arranging a middle without direction and accepting that ‘minors’ and ‘new ones’
can really question and challenge ‘adults’ and ‘natives’. The deep ambiguity of societies
that ‘decide’ to have schools is related, one could say, to the fact that this is a generous act
on the one hand. But that the act is accompanied by a strong fear (and non-acceptance)
that what is actually valued and taken for granted becomes, indeed, actually questioned or
objected by minors or ‘immature’, even without reasons or arguments. Something which
is maybe for philosophers (or a least many of them) even more difficult to deal with. In
sum, the ridiculing, marginalization and instrumentalisation of the school would be the
result of a deep fear for the coming generation actually becoming a new generation.
More reasons are to be formulated, and some of them to be found in the famous
text of Adorno (1971) about the ‘taboos’ of being a teacher. But in conclusion we would like
to return to the instrumentalisation and marginalization that is central to most if not all
philosophy and educational theory. If this is the case indeed, perhaps we should really take
the challenge to reconsider a narrative that often is used to articulate what education is
about: the allegory of the cave, and the story about the illuminated philosopher that wants
to bring the caged or imprisoned people to light. Isn’t this exactly a philosophical story
258
258 || maarten
maarten simons;
simons; jan
jan masschelein
masschelein

about education, about how the philosopher-teacher has to liberate the chained people, and
shows that what they hold for the truth are merely shadows and representations? The
story of the cave is a celebration of the status ethos of the philosopher – or at least, of a
particular philosopher. It is about philosophy, a particular philosophical stance, but it is
not about education. Perhaps we need an educational/pedagogical story for the experience
of learning. It is a story about how to lead people into a cave, that is, into a school or
university, and hence, about how to chain people gently in order to give them time and
space to think, to study but also to present them the world and ask for its regard.

references
ADORNO,
ADORNO, Theodor.
Theodor. Erziehung
Erziehung zur
zur Mündigkeit.
Mündigkeit. Frankfurt:
Frankfurt: Suhrkamp,
Suhrkamp, 1971.
1971.
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Enfance
Enfance etet histoire.
histoire. Paris:
Paris: Payot,
Payot, 1982.
1982.
BIESTA,
BIESTA, Gert.
Gert. Good
Good education
education in in an
an age
age of
of measurement:
measurement: on on the
the need
need to
to reconnect
reconnect with
with the
the
question
question of of purpose
purpose inin education.
education. Educational
Educational Assessment,
Assessment, Evaluation
Evaluation and
and Accountability,
Accountability, v.21,
v.21,
n.1,
n.1, p.
p. 33-46,
33-46, 2009.
2009.
BUTLER,
BUTLER, Judith.
Judith. Giving
Giving anan account
account ofof oneself.
oneself. New
New York:
York: Fordham
Fordham University
University Press,
Press, 2005.
2005.
HABERMAS,
HABERMAS, Jürgen. Jürgen. Theorie
Theorie des
des kommunikativen
kommunikativen Handelns.
Handelns. Frankfurt
Frankfurt amam Main:
Main: Suhrkamp,
Suhrkamp, 1981.
1981.
LATOUR,
LATOUR, Bruno. Bruno. Politics
Politics of
of nature:
nature: How
How to to bring
bring the
the sciences
sciences into
into democracy.
democracy. Cambridge
Cambridge
Massachusetts:
Massachusetts: Harvard
Harvard University
University Press,
Press, 2004.
2004.
LEVINAS,
LEVINAS, Emmanuel.
Emmanuel. Otherwise
Otherwise thanthan Being,
Being, oror Beyond
Beyond Essence.
Essence. Pittsburgh:
Pittsburgh: Duquesne
Duquesne University
University
Press,
Press, 1998.
1998.
LYOTARD,
LYOTARD, Jean-François.
Jean-François. L’Inhumain:
L’Inhumain: Causeries
Causeries sur
sur le
le temps.
temps. Paris:
Paris: Galilée,
Galilée, 1988.
1988.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten.Maarten. Em Em defesa
defesa dada escola.
escola. Uma
Uma questão
questão pública.
pública. Coleção
Coleção
Educação:
Educação: Experiência
Experiência ee sentido,
sentido, Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2014.
2014.
SERRES,
SERRES, Michel.
Michel. TheThe Troubadour
Troubadour of of Knowledge.
Knowledge. Ann Ann Arbor:
Arbor: University
University ofof Michigan
Michigan Press,
Press, 1997.
1997.
SLOTERDIJK,
SLOTERDIJK, Peter. Peter. You
You must
must change
change your
your life.
life. Cambridge:
Cambridge: Polity
Polity Press,
Press, 2014a.
2014a.
______.
______. Die
Die schrecklichen
schrecklichen Kinder
Kinder der
der Neuzeit.
Neuzeit. Frankfurt:
Frankfurt: Suhrkamp,
Suhrkamp, 2014b.
2014b.
WITTGENSTEIN,
WITTGENSTEIN, Ludwig. Ludwig. Philosophical
Philosophical Investigations.
Investigations. New
New York:
York: TheThe Macmillan
Macmillan Company,
Company,
1965.
1965.
259
259

collective demands for schole (free-time) in the neoliberal debt economy

jason thomas wozniak11

introduction

W e begin this short piece with a passage found in one of the greatest
novels ever written on the struggles of, and resistance to, indebted life:
John Steinbeck’s, The Grapes of Wrath (1939). The novel tells the story
of a farming family, the Joads, and thousands of others like them in the United States that
were forced from their lands during what is popularly known as “The Great Depression”
(circa 1929-late 1930s). A relentless combination of modernization, failing crop prices,
drought, market failures, and other factors, most notably financial debt, drove American
small farmers from their lands and onto American highways West in search of work,
food, and a modicum of comfort and security. Along these roads of toil and desperation
these families often found something they weren’t necessarily looking for: hope in the
form of collective solidarity.
We quote at length here from one of the novel’s interludes:
The
The Western
Western StatesStates nervous
nervous underunder the the beginning
beginning change.change. Texas Texas andand Oklahoma,
Oklahoma,
Kansas
Kansas and and Arkansas,
Arkansas, New New Mexico,
Mexico, Arizona,
Arizona, California.
California. A A single
single family
family moved
moved
from
from thethe land.
land. PaPa borrowed
borrowed money money from from the the bank,
bank, and and nownow thethe bank
bank wants
wants the the
land.
land. The
The land
land company—that's
company—that's the the bank
bank whenwhen it it has
has land—wants
land—wants tractors,
tractors, not not
families
families on on the
the land.
land. Is Is aa tractor
tractor bad?
bad? Is Is the
the power
power that that turns
turns the
the long
long furrows
furrows
wrong?
wrong? If If this
this tractor
tractor were were oursours itit would
would be be good—not
good—not mine, mine, butbut ours.
ours. If If our
our
tractor
tractor turned
turned thethe longlong furrows
furrows of of our
our land,
land, itit would
would be be good.
good. NotNot mymy land,
land, but
but
ours.
ours. WeWe could
could lovelove that
that tractor
tractor then
then as as wewe have
have lovedloved thisthis land
land when
when it it was
was
ours.
ours. But
But this
this tractor
tractor doesdoes two two things—it
things—it turnsturns the the land
land andand turns
turns usus off
off the
the land.
land.
There
There is is little
little difference
difference betweenbetween this this tractor
tractor and and aa tank.
tank. TheThe people
people areare driven,
driven,
intimidated,
intimidated, hurt hurt by by both.
both. We We mustmust think
think about
about this.
this.
One
One man,
man, one one family
family drivendriven from from thethe land;
land; this
this rusty
rusty car car creaking
creaking alongalong thethe
highway
highway to to the
the west.
west. II lost
lost mymy land,
land, aa single
single tractor
tractor took
took my my land.
land. II am
am alone
alone and
and
II am
am bewildered.
bewildered. And And in in the
the night
night oneone family
family campscamps in in aa ditch
ditch and
and another
another
family
family pulls
pulls in
in and
and the the tents
tents come
come out.out. The
The two two menmen squatsquat on on their
their hams
hams and and the
the
women
women and and children
children listen.
listen. Here
Here is is the
the node,
node, you you who who hatehate change
change and and fear
fear
revolution.
revolution. Keep Keep thesethese two two squatting
squatting men men apart;
apart; makemake them them hate,
hate, fear,
fear, suspect
suspect
each
each other.
other. Here
Here is is the
the anlage
anlage of of the
the thing
thing you you fear.
fear. This
This is is the
the zygote.
zygote. For For here
here
"I
"I lost
lost my
my land"
land" is is changed;
changed; aa cell cell is
is split
split andand from
from its its splitting
splitting grows
grows the the thing
thing
you
you hate—"We
hate—"We lost lost ourour land."
land." TheThe danger
danger is is here,
here, forfor two
two menmen areare not
not as as lonely
lonely
and
and perplexed
perplexed as as one.
one. And
And from from this
this first
first "we"
"we" there
there grows
grows aa still
still more
more dangerous
dangerous
thing:
thing: "I"I have
have aa little
little food"
food" plus plus "I"I have
have none."
none." If If from
from thisthis problem
problem the the sum
sum is is
"We
"We have
have aa little
little food,"
food," the the thing
thing is is on
on itsits way,
way, the the movement
movement has has direction.
direction.
Only
Only aa little
little multiplication
multiplication now, now, andand this
this land,
land, this
this tractor
tractor areare ours.
ours. TheThe twotwo
men
men squatting
squatting in in aa ditch,
ditch, thethe little
little fire,
fire, the
the side-meat
side-meat stewingstewing in in aa single
single pot,pot, the
the
silent,
silent, stone-eyed
stone-eyed women; women; behind,behind, the the children
children listening
listening with with their
their souls
souls toto
words
words their
their minds
minds do do not
not understand.
understand. The The nightnight draws
draws down.down. The The baby
baby has has aa
cold.
cold. Here,
Here, taketake this
this blanket.
blanket. It's It's wool.
wool. It It was
was my my mother's
mother's blanket
blanket -- take
take itit for
for
the
the baby.
baby. This
This is is the
the thing
thing to to bomb.
bomb. ThisThis is is the
the beginning
beginning -- from from "I" "I" toto "we"
"we"
(STEINBECK,
(STEINBECK, 1939, 1939, p.151-152,
p.151-152, italics
italics added).
added).

We must think about this: these lines, the sharing of story, sorrows, food, a blanket
handed down from one generation to another and then to a baby of a complete stranger;
the movement, the beginning of revolution, of the transition from the “I” to the “we,” the

11 Latin
Latin American
American Philosophy
Philosophy of
of Education
Education Society
Society (LAPES),
(LAPES), Columbia
Columbia University.
University.
Humanities
Humanities Department,
Department, San
San Jose
Jose State
State University.Email:
University.Email: jazonwoz1@gmail.com
jazonwoz1@gmail.com
260|
260| jason
jason thomas
thomas wozniak
wozniak

movement that all of those who wield gross power fear; the energy of collective hope that
they want to destroy as quickly as possible with their bombs, or slowly, by forcing us into
permanent precarity and competition for limited resources. We must think about this::
how despite all obstacles “we,” those of us who struggle against the monsters: greed,
capitalism, racism, machismo, sexism, hatred of the Other, those of us who refuse to be
intimated, defeated, alone, refuse to hate, to remain separate, to suspect, and instead
continuously decide to come together to resist, and to demand, another way. We must
think about this: how we share time and cultivate space for all of us to escape suffering,
build alliances, regenerate ourselves, and the collective spirit; imagination, hope, love, all
this takes root in the moments we sit down with the stranger, eat with another, and study,
yes study, the way out, the way forward, the way to something, to somewhere, better for
all of us. Let us think about this, and collect our thoughts, after we have thought more
about the situation we are in.

notes on the contemporary global debt economy and indebted subjectivity


This is an essay about debt, education, and time; the time that debt robs, and the
time that education might gift. Education today happens in, and is deeply influenced by,
the contemporary global debt economy. Another way to state this, keeping the etymology
and historical significance of the word “economy” (oikonomia) in mind, is to say that debt
produces, orders, gives structure to, governs, and sets the measure of what education can,
or cannot be. It is therefore important to understand some of the key characteristics of this
economy, particularly its force of subjectivation.
Both Étienne Balibar and Maurizio Lazzarato provide us with invaluable analysis
of the debt economy. We refer first, albeit briefly, to Balibar’s recent “Politics of Debt”
(2013) which is an indispensable guide to understanding the machinations of the debt
economy. His examination of contemporary finance capital here is a highly technical and
nuanced account of the relation between the state and financial institutions (creditors),
and it reveals how debt’s force reconfigures everyday life and the subjectivity of the
indebted.
The global triumph of neoliberal ideology and policy has left both states and
individuals as servants of financial institutions. Within the debt economy financial
institutions have acquired a never before seen degree of sovereignty over states (Greece
and Puerto Rico are recent examples of this fact), and the concept and praxis of democracy
has been significantly hollowed out. Today it is possible to trace a direct correlation
between the state’s loss of power to regulate finance and the increasing power of finance
to control the state and dictate its policies. Or as Balibar (2013, p.8) claims, “having seized
control at the same time of the resources of the state and of the citizens, the credit
mechanisms which concentrate debts from all social actors have become in practice the
‘regulators’ of society”.
In essence, a legalized blackmailing ring functions with impunity in the modern
day debt economy. Not mixing words, Balibar (2013, p.3) drives this point home:
The
The banks
banks that
that increasingly
increasingly hold
hold budgets
budgets and
and currencies
currencies hostage
hostage inasmuch
inasmuch as as
they
they give
give them
them (states)
(states) credits
credits are
are in
in need
need of
of an
an insurance
insurance provided
provided by
by the
the states
states
and
and thus
thus by
by the
the populations
populations represented
represented by
by their
their states.
states. In
In the
the current
current crisis,
crisis, the
the
states
states are
are permanently
permanently blackmailed
blackmailed byby the
the financial
financial markets.
markets.

States, for example, are increasingly beholden to private financiers that demand
pledges for debt payments in advance in the form of tax revenue. Such blackmailing
radically reconfigures societies; they are shaped by the debts they are forced to service.
The everyday life of individuals is also transformed. We are forced to go into debt for
collective
collective demands
demands for
for schole
schole (free-time)
(free-time) in
in the
the neoliberal
neoliberal debt
debt economy
economy || 261
261

services like education and healthcare that were once offered for free. As debt market
relations re-shape the state’s relations with citizens (and vice-versa), they “create new
modalities of domination, subjection, and subjectivation” (BALIBAR, 2013, p.13). Thus,
the debt economy possesses a totalitarian dimension, according to Balibar, because it is a
“system in which virtually all subjects or agents are indebted, there seems to be no space
or sphere of existence left outside the capitalist subsumption” (BALIBAR, 2013, p.1).
Like Foucault, Deleuze, and Guattari before him, and similar to Balibar, M.
Lazzarato (2012) develops, based on a certain reading of Nietzsche’s Genealogy of Morals
(1967), a non-economistic concept of the economy. He argues that, “economic production
involves the production and control of subjectivity and forms of life; economy
presupposes a ‘morality of custom’; desire is part of the ‘infrastructure’” (LAZZARATO,
2012, p. 42), in order to highlight debt’s ability to produce a particular subjectivity. The
contemporary debt economy is characterized by Lazzarato (2012, p.52) has having a
“twofold expansion of the exploitation of subjectivity: extensive (since not only are
industrial work and tertiary sector concerned but every activity and condition) and
intensive (since it encompasses the relationship to the self, in the guise of the
entrepreneur of the self”. Picking up where Foucault left off in his Collège de France 1978-
1979 lectures on bio-power, Lazzarato (2012, p.104) extends Foucault’s analysis of human
capital theory to describe how debt shapes who we are:
Debt
Debt directly
directly entails
entails life
life discipline
discipline and
and aa way
way ofof life
life that
that requires
requires ‘work
‘work onon the
the
self,’
self,’ aa permanent
permanent negotiation
negotiation with
with oneself,
oneself, aa specific
specific form
form of
of subjectivity:
subjectivity: that
that of
of
the
the indebted
indebted man….In
man….In this
this way,
way, by
by reconfiguring
reconfiguring sovereign,
sovereign, disciplinary,
disciplinary, and
and
biopolitical
biopolitical power,
power, the
the debt
debt economy
economy fulfills
fulfills at
at once
once political,
political, productive,
productive, and
and
distributive
distributive functions.
functions.

Debt, in other words, brings into being “a particular form of homo economicus, that
of the ‘indebted man’” (LAZZARATO, 2012, p.30). Or as Lazzarato writes, “Credit or debt
and their creditor-debtor relationship constitute specific relations of power that entail
specific forms of production and control of subjectivity” (ibid). Significantly for our
analysis below, Lazzarato (2012, p.29) demonstrates that if debt is able to function as a
mechanism that produces and governs collective and individual subjectivities, it is able to
do so because of the way that it captures, or one might say “colonizes,” our time. Debt’s
temporality receives substantial treatment from Lazzarato in both his The Making of
Indebted Man (2012), but also in his Governing by Debt (2015). We now touch on the former,
before returning to the latter at the end of this essay.

notes on debt temporality


Given what we have said about debt and subjectivity above it seems pertinent to
ask the following: To what degree do we owe ourselves to debt? Is who I am, the process of
my becoming, shaped by the conditions of the debt I owe? To address these questions we
must understand some of the temporal dimensions of indebted life.
Most financial debt involves the establishment of specific terms of agreement
through contract. This means that strict time limits for repayment are set. To break a debt
contract, or to default on debt payment timetables, is to set oneself up for for aa host
host of
punitive measures. As such, debt exerts a governing force on our daily lives, particularly
on how we use our time. Typically, the more money we owe, the more we have to
dedicate our time to work that allows us to meet repayment terms; as indebted subjects we
work as much and as quickly as possible to rid ourselves of the debts we owe. But we also
spend a great deal of time educating ourselves, or performing other activities, which will
allow us to remain, to the extent possible, debt free. In other words, no matter how you
look at it we dedicate great amounts of time to work on the self that on the one hand,
262|
262| jason
jason thomas
thomas wozniak
wozniak

allows us to service our debt, and/or on the other, allows us to remain free of it. The point
to stress here is that debt is a time disciplining apparatus. Building on Lazzarato’s (2012,
p.44-49) analysis of debt temporality we can briefly flesh out how debt shapes the time of
our lives.
Past debts accrued delimit both our present and future. A promise or requirement
to pay a certain sum owed, by a certain moment, significantly predetermines the way the
future will unfold. But the indebted future-to-come also travels back in time to haunt the
present of the indebted subject. We might say that debt creates specters of a future-to-
come that haunt the present of indebted persons. These specters of debt compel indebted
subjects to shape daily activities so that debts can be serviced. In sum, our existential time
is regulated by the temporalities of the debts we owe. Most immediately, indebted life
takes the form of constant efforts to earn an income which will allow us to satisfy debt
repayment. But often simultaneously, our time is occupied with efforts to form capacities
which will permit us to pay off our loans, maybe, someday.

debt’s pedagogical force


To claim, as Lazzarato does, that debt forms us, is to claim, if we keep in mind a
common notion of education, that debt educates us. Debt, however, not only educates
us/gives form to who we are, it also influences the shape of contemporary education
philosophy, policy, and practice. More precisely, the more debt’s force saturates education,
the more efficient and more expansive debt’s ability to shape indebted persons becomes.
Below we highlight two ways, one pertaining to debt’s impact on individuals, the other to
its impact on society, that debt educates persons, while also influencing the shape of
educative processes.
In his provocative essay on the current U.S. student debt crisis in higher education,
“The Pedagogy of Debt” (2006), critical theorist Jeffrey Williams (2006, p.162) argues that
“debt is not just a mode of financing but a mode of pedagogy”. Williams highlights six
specific lessons that debt imposes. Taken together, they advance the argument that the
contemporary debt-education matrix has the ability to fabricate indebted subjectivity.
Williams (2006, p.163) contends that first, “debt teaches that higher education is a
consumer service” (all italics in original), and that second, “debt teaches career choices”
(WILLIAMS, 2006, p.164). The three lessons, that “debt teaches a worldview,” that it
“teaches civic lessons,” and that it “teaches the worth of a person” (WILLIAMS, p.164-165), are
most directly related to the ways in which debt plays a pedagogical role in forming the
neoliberal indebted subject. Finally, we must remember that debt teaches not only
cognitive lessons, but also emotional ones. This fact is clarified in what Williams (2006,
p.165) states is the final debt lesson: “debt teaches a sensibility or feeling”.
It is also worth recalling, as Balibar (2013, p.2) has written, that in the debt
economy, “Ultimately, all public assets belong in advance (virtually) to the state’s
creditors”. This is in essence another way of stating the fact that public resources in a debt
economy are used to subsidize the financial private sector (ibid). Balibar’s analysis does
not extensively cover the ways in which debt operates as a key neocolonial apparatus. But
the current case of Puerto Rico’s struggles with financial capitalist institutions and the
countries that support them, principally the United States, reveals how debt both sustains
asymmetrical colonial hierarchies, and also how it colonizes public education.
The island’s current debt crisis also highlights some of the ways that debt
facilitates the transfer of education resources from the public to private sectors. For
example, the journal, “The Progressive” (2015), has reported that since 2014, the Puerto
Rican government, under pressure from creditors, hedge funds and the U.S. government,
has closed 135 schools— about 10% of the schools on the island. Additionally, “Project
collective
collective demands
demands for
for schole
schole (free-time)
(free-time) in
in the
the neoliberal
neoliberal debt
debt economy
economy || 263
263

1456”, a new law pushed by neoliberal “reformers” to ameliorate the debt crisis, requires
the closure of 400 more public schools—30% of the remaining public schools in Puerto
Rico. Importantly, and highlighting debt’s role in accumulation by dispossession practices,
“Project 1456” also stipulates that the Puerto Rican government turn at least 15% of the
island’s schools into Lider charter schools every three years.

education as a means to render debt inoperable


Though the financial debt economy and the creditor-debtor paradigm which
constitutes it has tremendous influence on individual and collective subjectivity, it is not
totalizing. Even Balibar (2013) contends that debt’s force is susceptible to internal and
external conflict and destabilization. Given the above comments on debt’s educative force,
and its ability to reconfigure education, it may at first seem counterintuitive to argue that
education is actually a privileged realm in which debt’s subjectivation force can be, at least
temporarily, rendered inoperable. But there are ways to suspend the debt economy’s
subjectivation force, rupture creditor-debtor paradigms, and these suspensions and
ruptures, can, and in fact do, happen in education.
If part of debt’s formative power resides in its ability to capture our time, then it
would seem prudent to suggest that any efforts meant to resist indebted subordination
must direct efforts at destabilizing the temporality of debt. But where? And how? What is
suggested below is that in the debt economy there is a need for a type of what we might
call “temporal refuge:” time-places where any individual, but also collectives, can find
respite from indebted life. Within such time-places alternatives to indebted life, and
different ways of being and becoming, are potentially cultivated. The ancient Greek
concept schole helps us imagine how education might be a site for temporal refuge from
indebted life.
The work of Jan Masschelein and Maarten Simons (2011; 2013), the most prolific
philosophers of education on schole, reveals that schole has been simultaneously and
separately defined as: free-time, rest, delay, study, discussion, lecture, school, and/or
school building. Despite the variances, all of these definitions mark either an activity
which produces, or place where a break, or suspension, with dominant time economies
occurs. Masschelein and Simons (2011, p.674) disclose that in ancient Greece schole was not
aa place
place and
and time
time organized
organized toto reproduce
reproduce social
social order,
order, or
or way
way of
of life.
life. Separated
Separated
from
from both
both oikos
oikos and
and polis,
polis, and
and hence
hence free
free from
from daily
daily occupations,
occupations, the
the school
school was
was aa
real
real space
space with
with aa real
real inner
inner place
place and
and time
time where
where people
people were
were exposed
exposed toto real
real
matter.
matter.

It was a time and place where those in it were separated from their daily lives, the
labor associated with the production of goods for everyday needs, the norms of civil
society, and their customary identities. Or in other words, while in schole, the identities of
who students were, ought to be, and become according to their place in society, were
suspended. More to the point, Masschelein and Simons argue that in schole
economic,
economic, social,
social, cultural,
cultural, political,
political, or
or private
private time
time is
is suspended,
suspended, asas are
are tasks
tasks and
and
roles
roles connected
connected to
to specific
specific places.
places. Suspension
Suspension here
here could
could be
be regarded
regarded asas an
an act
act of
of
de-privatization,
de-privatization, de-socialization,
de-socialization, de-appropriation;
de-appropriation; itit sets
sets something
something freefree
(MASSCHELEIN;
(MASSCHELEIN; SIMONS, SIMONS, 2011,2011, p.674-675)
p.674-675)

What it sets free is time. Within a suspension time becomes fecund with
possibility. As Masschelein (2011, p.531) states, “what appears, happens or is done within
schole` is not determined by a defined result, outcome or product. In this sense it is time
which is freed from a defined end and therefore from the usual economy of time”. Put
264|
264| jason
jason thomas
thomas wozniak
wozniak

slightly differently, in schole, telos is suspended. Masschelein describes the suspension of


telos in the following manner:
Free
Free time
time as
as un-destined
un-destined time
time is
is time
time where
where the
the act
act of
of appropriating
appropriating oror intending
intending
for
for aa purpose
purpose or
or end
end is
is delayed
delayed or
or suspended.
suspended. ItIt therefore
therefore is
is also
also the
the time
time of
of rest
rest
(of
(of being
being inoperative
inoperative or
or not
not taking
taking the
the regular
regular effect)
effect) but
but also
also the
the time
time which
which
rests
rests or
or remains
remains when
when purpose
purpose or
or end
end is
is delayed
delayed (ibid).
(ibid).

Influenced by Masschelein and Simons, Argentine philosopher of education


Walter Kohan (2015) calls on teachers today to hacer escuela (invent school/schole) by
evoking the figure of the “Socrates of Caracas,” Simón Rodríguez (1769-1854). Kohan’s
Rodríguez is a de-colonial educator who invented popular schooling in the Americas.
Moreover, he was able, according to Kohan, to rupture colonial models of conceiving and
making school by inventing schole.
Kohan recounts in his The Inventive Schoolmaster: Simón Rodríguez (2015), that
Rodríguez invented schools across Latin America where all Americans, and especially the
traditionally most marginalized and oppressed, had the time to dis-identify themselves
from the stations and subjectivities they were typically assigned to by oligarchic societies.
In the Rodríguean school anyone could become someone other than who they were
supposed to be. Or in other words, those pre-destined to study and work according to the
rhythm of the shoemaker, farmhand, or maid, had in the Rodríguean school the time to
shape themselves to live according to different rhythms. Inventing schools (schole) across
the Americas, Simón Rodríguez created the conditions for a multiplicity of subjectivities
to take shape.
What must be stressed about Rodríguez’s efforts to invent school is that he
invented schole in a way traditionally unheard of in ancient Greece, 19thth century liberated
Latin America, and schools of today. He was temporally irreverent towards an
exclusionary schole. His life mission consisted of popularizing free time, making the
leisure of study, and the time to study leisurely, available to everyone. It is this legacy
which Kohan (2015, p.80) urges contemporary educators to follow: “The work of every
teacher, all teachers, of everyone who is concerned with education, is to invent
school/schole, inside (and outside) of schools”.

towards collective demands for schole


Lazzarato (2015, p.255) has written that,
The
The need
need to
to discover,
discover, produce,
produce, and
and reconstitute
reconstitute temporalities,
temporalities, heterogeneous
heterogeneous
subjectivities
subjectivities and
and their
their institutions,
institutions, requires
requires that
that we
we continually
continually seek
seek to
to elude
elude the
the
techniques
techniques of
of subjection
subjection and
and enslavement
enslavement deployed
deployed by
by governmentality.
governmentality.

What we need, he argues, is “a time of rupture, a time that arrests the ‘general
mobilization’ (of capital), a time that suspends apparatuses of exploitation and
domination—an ‘idle time” (LAZZARATO, 2015, p.246). The work of Masschelein,
Simons, and Kohan on schole described above provokes us to consider education as an
event which potentially brings into being the temporalities of which Lazzarato speaks,
those that elude and/or suspend debt governmentality.
Masschelein and Simons (2013) call for a “defense of school/schole,” Kohan (2015)
asks teachers everywhere to hacer escuela (invent school/schole), Lazzarato (2015, p.250) for
his part argues on behalf of refusal: “Like the strike, refusal operates a suspension of the
generalized mobilization decreed by capital; it steers chronological time off track and
reveals other movements, speeds, and rhythms”. It can said that these authors share the
conviction that there is a contemporary need for temporal exteriority from dominant
time-disciplining regimes. Whether temporalities exterior to those produced by power,
collective
collective demands
demands for
for schole
schole (free-time)
(free-time) in
in the
the neoliberal
neoliberal debt
debt economy
economy || 265
265

especially capital, are produced through refusal or invention, and it certainly is the case
that some refusals can lead to inventions, or preserved through defense, what remains a
common theme within these authors’ work is that there need be some historical
intervention which opens up, rather than delimits time. If we are to be, as Maria Lugones
(2010) has written, someone other than what the hegemon demands of us, then there
exists, according to the above authors, a need for praxis that either invents, or allows for
the preservation of, democratically structured temporalities that are fecund with
possibility. In other words, for Masschelein, Simons, Kohan and Lazzarato, a temporal
negation, invention and/or preservation engenders the potentiality for the liberation of
subjectivity.
We cast no doubt on the claims that individual and collective defenses or
inventions of schole are necessary. Nor do we deny the need for refusal(s). But we ask if
whether or not it is sufficient that these defenses or inventions of schole are implied, rather
than explicit, demands? Should defenses or inventions of schole be explicitly articulated and
practiced as demands if they are to wield the force that will inspire collective resistance
against the force of debt in education? In a similar fashion, we ask whether or not a
general call for refusal, (where debt’s temporality can/should be negated remains
ambiguous in Lazzarato’s work) need be situated in particular contexts? Borrowing from
the Marxist feminist scholar Kathi Weeks (2011), we suggest that schole can be a
theoretical tool that facilitates contestation in and through education against the force(s) of
debt if it is articulated as, and produced through, a demand. Demands (making demands)
add important performative dimensions to the struggle for schole in/through education in
the debt economy.
Inspired by late 20thth century calls by Marxists feminists like Mariarosa Dalla
Costa, Selma James, and Silvia Federici, for women to simultaneously refuse free
domestic labor while demanding wages for housework, Weeks illustrates the
epistemological and ontological stakes in making demands. She argues that, “The
collective practice of demanding has its own epistemological and ontological productivity”
(WEEKS, 2011, p.131). On the one hand, demands, conceived as “perspectives,” make
visible and encourage critical reflection on capitalist exploitation. They can function
epistemologically, according to Weeks (2011, p.129), “as a force of demystification, an
instrument of denaturalization, and a tool of cognitive mapping”. Demands emerge from,
inform, and change perspectives (WEEKS, 2011, p.128,130). They produce knowledge and
consciousness (WEEKS, 2011, p.131).
On the other hand, when conceived as “provocations,” the ontological status of
demands becomes apparent. Demands, Weeks (2011, p.131) asserts, serve to “elicit the
subversive commitments, collective formations, and political hopes that “they” appear
only to reflect”. As provocations to collective action, demands are conceptualized by
Weeks (2011, p.133) as means rather than ends. They simultaneously constitute
movements, put/keep people in movement, and encourage a consistent flux of individual
and collective becoming. Demands give rhythm and form to movements, while also
giving shape to horizons of collective and individual becoming.
Demands we might add here, and Weeks (2011) does indeed allude to this on
occasion, can also be said to not only have performative dimensions, but also educative
ones. They are pedagogical in that they create moments for collective teaching and
learning in which critical analysis of the present is heightened, and different imaginaries
of the future are engendered (WEEKS, 2011, p.147). They are educative in that they play a
crucial role in influencing the shape(s) of individual and collective subjectivity.
266|
266| jason
jason thomas
thomas wozniak
wozniak

conclusion
What would happen then if “we” came together to share time, to share knowledge,
to share struggle, and to share in the making of a demand for schole in the debt economy
we find ourselves in? What would happen if not just “I,” or “you,” but “we” made a
demand for time in education, through education, for education? Demands for schole in the
debt economy would open up possibilities in which we could learn which obligations to
honor, which debts to refuse, and in honoring some obligations and refusing others, we
might learn how to become, as Richard Dienst (2011, p.186) puts it, the “we which we owe
it to ourselves to become”. This “we” would never be something that can be prescribed,
Weeks (2011, p.223) cautions, but rather something that would emerge in the process of
political-pedagogical struggle, hence allowing its “advocates to emerge in the collective
process of demanding”. Thus this “we” that would make the demand for schole would be
constituted in part by the demand itself, but also constantly reconfigured as others join
our struggle, and as we collectively advance towards the horizon the demand makes
visible.
This is what they fear. This is what they must constantly seek to prevent from
happening. They believe that by driving us into debt that they can rob our time, keep us
apart, drain our spirits, delimit who we may or may not become. But just as isolated and
desperate farmers, workers, the oppressed, and the marginalized have come together since
time immemorial to share meals, blankets, clothing, struggle, hopes, dreams and
resistance, we educators will also come together to demand to shape an education that
allows us to become something other than indebted subjects.
The movements have begun, they are on the way. In the Middle East, Greece, on
Wall Street, in the schools and universities across Latin America, we see the brave
students and teachers in Brasil, Chile, Mexico, El Salvador and other places, other people,
coming together to protest draconian austerity regimes, and financial neocolonialism as
they share in the making of worlds not dominated by capital. We have begun to realize
like my friends in The Debt Collective say, that it is true that if “I” own the bank $100,000
dollars, then the bank owns me. But if “we,” that is the millions of us in debt, stand
together in refusal of debt payment, then “we” own the bank. We have begun to realize
that we do not owe ourselves to debt; rather we owe it to ourselves and to each other to
not allow financial capital to delimit the shape of future individual and collective
becoming. We have begun to realize that our paths to liberation from debt
governmentality and subjection can only be reached through collective resistance. And
importantly, we have come to realize the need for time: that we need more time to
cultivate this resistance; we need more time to think, feel, love, laugh, play, learn, teach,
strategize, and care for each other.
From this realization there grows a still more dangerous thing: We are beginning
to carve out time. In plazas, parks, homes, bars, cafes, in the streets, and in the schools,
little by little, we hear the voices: “I am in debt; I can’t pay it,” is becoming, “Together we
can take the time to study and plan debt resistance.” The “I” will become the “we” in due
time; demanding time together, we become the “we” that cannot be crushed like an “I.”
And that is why WE make this demand for time, this demand for schole, this demand for
education...
“Que queremos? Schole!” “Quando queremos? Agora!”
“What do we want? Schole!” “When do we want it? Now!”
collective
collective demands
demands for
for schole
schole (free-time)
(free-time) in
in the
the neoliberal
neoliberal debt
debt economy
economy || 267
267

references
BALIBAR,
BALIBAR, Étienne.
Étienne. The
The Politics
Politics ofof Debt.
Debt. Postmodern
Postmodern Culture,
Culture, v.23,
v.23, n.3,
n.3, p.1-35,
p.1-35, 2013.
2013. Retrieved
Retrieved
9/14/15,
9/14/15, from
from https://muse.jhu.edu/article/554614
https://muse.jhu.edu/article/554614
DIENST,
DIENST, Richard.
Richard. The
The bonds
bonds of
of debt.
debt. New
New York:
York: Verso,
Verso, 2011.
2011.
HEILIG,
HEILIG, J.V. J.V. Puerto
Puerto Rico’s
Rico’s School
School Crisis.
Crisis. TheThe Progressive.
Progressive. Retrieved
Retrieved 09/1/2016
09/1/2016 fromfrom
http://www.progressive.org/news/2015/11/188428/puerto-ricos-school-crisis.
http://www.progressive.org/news/2015/11/188428/puerto-ricos-school-crisis.
KOHAN,
KOHAN, Walter.
Walter. The
The inventive
inventive schoolmaster:
schoolmaster: Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez. Translation
Translation Vicki
Vicki Jones
Jones && Jason
Jason T.T.
Wozniak.
Wozniak. Rotterdam:
Rotterdam: Sense
Sense Publishers,
Publishers, 2015.
2015.
LAZZARATO,
LAZZARATO, Maurizio.Maurizio. The The making
making ofof the
the indebted
indebted man:
man: AnAn essay
essay onon the
the neoliberal
neoliberal condition.
condition.
Translation
Translation Joshua
Joshua D. D. Jordan.
Jordan. Los
Los Angeles:
Angeles: Semiotext(e),
Semiotext(e), 2012.
2012.
___________.
___________. Governing
Governing byby debt.
debt. Translation
Translation Joshua
Joshua D.D. Jordan.
Jordan. Los
Los Angeles:
Angeles: Semiotext(e),
Semiotext(e), 2015.
2015.
LUGONES,
LUGONES, Maria.Maria. Toward
Toward aa decolonial
decolonial feminism.
feminism. Hypatia,
Hypatia, v.25,
v.25, n.4,
n.4, p.742-759,
p.742-759, 2010.
2010.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan. Jan. Experimentum
Experimentum scholae:
scholae: The
The world
world once
once more…but
more…but not not (yet)
(yet) finished.
finished.
Studies
Studies in
in Philosophy
Philosophy and
and Education,
Education, v.30,
v.30, n.5,
n.5, p.529-535,
p.529-535, 2011.
2011.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten.
Maarten. TheThe hatred
hatred ofof public
public schooling:
schooling: TheThe school
school asas the
the
mark
mark ofof democracy.
democracy. Education
Education Philosophy
Philosophy and
and Theory,
Theory, v.42,
v.42, n.5-6,
n.5-6, p.666-682,
p.666-682, 2010.
2010.
______.
______. In
In defense
defense ofof the
the school:
school: A
A public
public issue.
issue. Translation
Translation JackJack McMartin.
McMartin. Leuven:
Leuven: E-ducation,
E-ducation,
Culture
Culture & & Society
Society Publishers,
Publishers, 2013.
2013.
STEINBECK,
STEINBECK, John. John. The
The Grapes
Grapes ofof Wrath.
Wrath. New
New York:
York: Penguin,
Penguin, 1939.
1939.
WEEKS,
WEEKS, Kathi.
Kathi. The
The problem
problem with
with work:
work: Feminism,
Feminism, Marxism,
Marxism, Antiwork
Antiwork Politics,
Politics, and
and postwork
postwork
imaginaries.
imaginaries. Durham:
Durham: DukeDuke University
University Press,
Press, 2011.
2011.
WILLIAMS,
WILLIAMS, Jeffrey.
Jeffrey. The
The pedagogy
pedagogy of of debt.
debt. College
College Literature,
Literature, v.33,
v.33, n.4,
n.4, p.155-169,
p.155-169, 2006.
2006.
268
268
269
269

dar la cara.
notas sobre la escuela como espacio público.

jorge larrosa11

Sin
Sin embargo…
embargo… ¡oh,
¡oh, sin
sin embargo!,
embargo!, parecen
parecen adivinarse
adivinarse aquí
aquí yy allá
allá dispersas,
dispersas,
débiles,
débiles, inciertas
inciertas huellas
huellas de
de que
que ha
ha habido,
habido, de
de que
que ha
ha podido
podido haber,
haber,
oo por
por lo
lo menos
menos ha
ha querido
querido haber,
haber, alguna
alguna vez,
vez, un
un mundo.
mundo.
Rafael
Rafael Sánchez
Sánchez Ferlosio.
Ferlosio.

E n el Coloquio anterior hablé de la escuela como espacio público (LARROSA,


2014). No tanto de la escuela de titularidad pública, o de la escuela como un
asunto público, sino de la escuela como espacio público, es decir, como un
espacio, en primer lugar, en el que las personas (tanto los profesores como los alumnos)
hacen las cosas en público, públicamente, en presencia de otros, y un espacio, en segundo
lugar, en el que el mundo, convertido en materia de estudio, es hecho público, puesto o
dispuesto en público o, como diría Hannah Arendt, colocado en el interior de una esfera
pública. Para Arendt (1996, p.230),
el
el término
término ‘público’
‘público’ significa
significa elel propio
propio mundo,
mundo, en en cuanto
cuanto es
es común
común aa todos
todos
nosotros
nosotros yy diferenciado
diferenciado de de nuestro
nuestro lugar
lugar poseído
poseído privadamente
privadamente en en él”,
él”, yy eso
eso
porque
porque “un
“un mundo
mundo está
está entre
entre quienes
quienes lo
lo tienen
tienen en
en común,
común, al
al igual
igual que
que lala mesa
mesa
está
está localizada
localizada entre
entre los
los que
que se
se sientan
sientan alrededor;
alrededor; el
el mundo,
mundo, como
como todo
todo lo
lo que
que está
está
en
en medio,
medio, une
une yy separa
separa aa los
los hombres
hombres alal mismo
mismo tiempo.
tiempo.

La escuela, por tanto, hace el mundo interesante porque lo pone o lo dispone en


medio, porque lo sitúa en un entre, inter-esse, porque lo pone, o lo presenta, como dicen Jan
Masschelein y Maarten Simons, encima de la mesa (MASSCHELEIN; SIMONS, 2014,
p.41ss), reclamando la atención de todos y de cada uno a ese mundo que pone en común.
Y es claro que algo podría elaborarse, desde esa perspectiva, en relación a la primera
parte del título de este Coloquio, a eso de “Mundos que se tecem entre ‘nosotros’”. Aunque
es claro que para Arendt no se trata de tejer mundos entre nosotros (no se trata de la
intersubjetividad) sino de tejer relaciones entre la infancia y el mundo. Como saben, la
última frase de “La crisis de la educación”, la que cierra el párrafo famoso sobre la
educación como doble amor, como amor al mundo y como amor a los nuevos, es
“prepararlos con tiempo para la renovación del mundo común” (ARENDT, 1996b, p.208).
En ese sentido, el mundo es primero, está desde luego “entre nosotros”, pero no es, en
absoluto, el resultado de las relaciones intersubjetivas.
También google teje mundos, y facebook, y las telenovelas de la Globo, y el
shopping, y el samba, y la literatura, y la religión, y la política, y el deporte, y el “fora
Dilma”, y el “fora Temer”, y habría que especificar bien cómo y por qué la educación y la
escuela los teje, si es que los teje, con otros hilos y de otra manera. Aunque, en cualquier
caso, yo creo que el problema de hoy para la educación no es tanto su capacidad (o su
incapacidad) para tejer mundos, sino el hecho, para mí incontestable, de que el mundo
mismo está desapareciendo. Para mí lo que debería ser pensado, y seriamente, es lo que ya
decía Albert Camus en 1957, en una Europa devastada por la guerra, en el discurso de
aceptación del Nobel: “Cada generación se cree destinada a rehacer el mundo. La mía sabe
que no podrá hacerlo. Pero su tarea es tal vez mayor. Consiste en impedir que el mundo se
deshaga” (CAMUS, 2003, p.21). O, más cerca de nosotros, ya no hablando de la guerra sino
de la mercantilización total de la existencia, lo que decía Jean Luc Nancy (2002, p.16-17, 22,

11 Universidad
Universidad de
de Barcelona.
Barcelona. Email:
Email: jlarrosa@ub.edu
jlarrosa@ub.edu
270|
270| jorge
jorge larrosa
larrosa

48) cuando comenzaba uno de sus libros sobre el mundo afirmando que “el mundo ha
perdido su capacidad de hacer mundo”, que lo que nos ocurre es que “el mundo está
atravesado por una pulsión de muerte que no tiene otra cosa que destruir que el mundo
mismo”, que el hecho de que “el mundo se destruye no es una hipótesis: es en cierto
sentido la constatación de la que se alimenta hoy cualquier pensamiento del mundo”, y
que esa destrucción del mundo tiene que ver, esencialmente, con “la circulación de todo en
la forma de la mercancía”, con “la absorción de toda significación en la mercancía”. Pero
eso es otro tema.
También saben ustedes que la noción arendtiana de “esfera pública” no sólo se
refiere a que algo (el mundo) está en medio, que es hecho público, y que debe ser a la vez
conservado y renovado, sino que tiene que ver también con la visibilidad. Lo público
significa el ámbito de la aparición pública y en público, el ámbito en que los seres humanos
aparecen o comparecen los unos ante los otros, se hacen visibles los unos para los otros, se
presentan los unos ante los otros, se exponen los unos a los otros, se interpelan y se
responden los unos a los otros, públicamente y en público o, como trataré de desarrollar en
lo que sigue, cara a cara. Y es a esta cuestión, a este asunto, al que quiero referirme en este
Coloquio.

1.
El semestre pasado, en mi Universidad, dicté un curso de Maestría titulado “Pensar
la educación en tiempo de crisis”, un título de claras resonancias arendtianas. Dediqué el
curso a leer el libro de Jan y de Maarten sobre la escuela (MASSCHELEIN; SIMONS,
2014), haciéndolo resonar con otros textos y con algunos fragmentos cinematográficos. Y
cuando estábamos con la cuestión de la escuela como espacio público, un poco en la línea
de lo que fue mi intervención en el Coloquio pasado (LARROSA, 2014), se me ocurrió
proyectar un fragmento de la película El país de los sordos, de Nicholas Philibert,
concretamente una escena de apenas cinco minutos en la que se ve un ritual escolar clásico
y de cierta solemnidad: la entrega de las calificaciones del semestre en una escuela de niños
sordos hecha por el director de la escuela y en presencia de las profesoras y de las familias.
El fragmento produjo acaloradas discusiones, volvimos a él en distintos momentos del
curso y lo pusimos en relación con distintos asuntos que iban apareciendo.
Para darles una cierta idea de lo que quiero decir por “acaloradas discusiones” debo
decirles que el libro de Jan y de Maarten fue recibido con una enorme hostilidad por parte
de los estudiantes, en parte porque la mayoría de ellos estaban iniciándose en la
investigación de temas que caen en lo que Jan y Maarten llaman “la domesticación de la
escuela” y “la domesticación del profesor”, es decir, estaban trabajando contra lo que hace
que la escuela sea escuela, desde luego con la pretensión (a mi juicio muy discutible) de
que la escuela se adapte a los tiempos que corren, y en parte también porque todos ellos,
casi sin excepción, tenían completamente interiorizado ese viejo tópico de las Facultades
de Educación que podríamos llamar, por decirlo brevemente, “crítica de la escuela
tradicional”, y que tiñe negativamente (de color gris) la sonoridad de palabras como
disciplina, ejercicio, igualdad, atención, repetición, responsabilidad, etc.. Y esa escena de la
entrega solemne de calificaciones sonó irremediablemente a “escuela tradicional” y, por
tanto, provocó que se dispararan ciertos automatismos interpretativos.
Una vez, en Juiz de Fora, Maximiliano López dijo que nadie aprende a tocar
críticamente la guitarra. Y no deja de ser curioso que lo primero que aprenden los que van
a dedicarse a la escuela sea, precisamente, a criticar la escuela, a pensar la escuela no desde
lo que es sino desde lo que debería ser, a verla como algo que hay que cambiar, como una
institución anticuada, obsoleta, triste, ineficaz, anclada en las rutinas. Por eso gran parte de
mi esfuerzo, casi siempre sin resultados, estuvo dirigido a intentar una “mirada amorosa a
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 271
271

la escuela” y no sólo a nuestras ideas o nuestros ideales sobre la escuela. Y digo esto porque
quisiera que ustedes vieran este fragmento tratando de suspender el juicio, el “me gusta” o
“no me gusta” o, quizá, tratando de distanciarse de ese juicio para tomarlo como lo que es:
un síntoma de nuestros propios prejuicios, de nuestras propias supersticiones, de nuestros
propios automatismos de pensamiento (y “propios” significa también “propios de nuestros
tiempo”, de ese tiempo que nos exige que seamos modernos, actuales, que sincronicemos
con él), de nuestras dificultades para mirar lo que no se ajusta completamente a nuestros
puntos de vista y, en este caso, como un síntoma de que la escuela como espacio público,
como espacio en el que aún es posible un cierto cara a cara, un cierto dar la cara, está
comenzando a desaparecer y comienza a ser incomprensible para nosotros.
En cualquier caso, les diré, antes de comenzar, que lo que he hecho y lo que les voy
a decir no es otra cosa que un simple trabajo de profesor: tomarme en serio el fragmento y
las discusiones que produjo, movilizar mi biblioteca, y rodearlo de algunos textos que nos
puedan ayudar a pensarlo, o a leerlo, con un poco más de profundidad. En ese sentido,
inmediatamente sentí que debía aprovechar la ocasión para releer a un escritor siempre
perturbador, Rafael Sánchez Ferlosio, cuyas ideas sobre educación van claramente a
contracorriente de los tópicos de la actualidad. Y, como era de esperar, después de varios
días de trabajo, no conseguí una interpretación más o menos canónica del fragmento sino,
más bien al contrario, aumenté considerablemente mis perplejidades. Así que es ese
fragmento, y esas discusiones, y esos textos, y esas perplejidades, lo que les presento a
continuación.

2.
La película es de 1993. Si está filmada a principios de los 90, podemos suponer que la
escena tiene unos 25 años. Dada la sorprendente sincronía con que acontecen los cambios
en todo el mundo, podemos suponer también que aquellos de ustedes que tengan más de 40
años habrán vivido escenas parecidas, aunque es verdad que la escuela republicana francesa
es especialmente poderosa en sus formas de ritualizar su carácter público. De algún modo,
es de eso de lo que se trata en este fragmento: de un ritual altamente formalizado en el que
un cierto aspecto del carácter público de la escuela, de la escuela como espacio público, se
hace particularmente evidente, ese que tiene que ver con la visibilidad, con el aparecer y el
comparecer, con el hacer las cosas delante de los otros, con la exposición a la mirada de los
otros, con el hacerse responsable de lo que se hace ante los otros, con el dar la cara.
La ceremonia tiene lugar en la sala de aula. El espacio está dividido según el tipo de
personas que lo ocupan. En el fondo están los padres, que no hablan, pero cuya presencia y
cuyas miradas son muy elocuentes. En el centro, los niños y, entre ellos, los cinco que van
a recibir las calificaciones: Florent, Frédéric, Antoine, Abou y Tomo. En el frente, delante
de una pizarra en la que puede leerse “buenas vacaciones a todos” y “trabajos para hacer”,
están el director de la escuela, Denis Azra, la profesora, Odile Ghermani, y la educadora,
Babette Deboissy, todos ellos en pie. El ritual, por tanto, da un lugar para todos, pero no les
da a todos el mismo lugar. El ritual supone que cada uno ocupe su lugar, el que le
corresponde, el que le es propio. Y que cada uno se comporte como corresponde a su lugar.
Transcribiré los diálogos con una pequeña descripción de las acciones. El director
de la escuela enmarca el acto y fija su naturaleza: “Bien, estamos aquí al final del año
escolar. Hay que hablar de los resultados de los niños, de sus progresos, y del año
próximo”. Y sin más preámbulos pronuncia el nombre del primero de los niños, de
Florent:
Primero
Primero voy
voy aa hablar
hablar de
de Florent.
Florent. Me
Me dirijo
dirijo aa los
los padres.
padres. Entonces,
Entonces, matemáticas,
matemáticas,
bien.
bien. Ritmo
Ritmo de
de habla,
habla, Florent
Florent tiene
tiene más
más facilidad.
facilidad. Lectura,
Lectura, muy
muy bien.
bien. Muy
Muy bien
bien
igualmente
igualmente la
la ortografía.
ortografía. Vocabulario,
Vocabulario, bien.
bien. Ha
Ha empezado
empezado con
con las
las conjugaciones.
conjugaciones.
272|
272| jorge
jorge larrosa
larrosa

Conclusión:
Conclusión: un un trimestre
trimestre excelente,
excelente, el
el año
año que
que viene
viene no
no debería
debería tener
tener
dificultades,
dificultades, será
será un
un buen
buen cambio
cambio respecto
respecto aa esas
esas mañanas
mañanas en
en que
que sollozaba
sollozaba yy se
se
sentía
sentía muy
muy muy
muy infeliz.
infeliz.

La profesora se inclina ante él, le dice algo en lengua de signos y le entrega un libro
como regalo. El director también se inclina y le da un beso y dice que “es siempre muy
emocionante cuando le doy un beso”.
Después pronuncia el nombre de Frédéric:
Frédéric
Frédéric ja,
ja, ja.
ja. ¿Dónde
¿Dónde están
están sus
sus padres?
padres? ¿no
¿no están
están aquí?.
aquí?. Puedo
Puedo decirles
decirles aa toda
toda la
la
comunidad
comunidad reunida
reunida aquí
aquí esta
esta mañana
mañana que
que Frédéric
Frédéric ha
ha hecho
hecho muchos
muchos progresos
progresos en en
su
su comportamiento.
comportamiento. Es Es mucho
mucho másmás diligente,
diligente, todo
todo funciona
funciona mejor,
mejor, sese puede
puede
hablar
hablar con
con él,él, escucha.
escucha. En
En cuanto
cuanto al
al trabajo
trabajo escolar
escolar ha
ha hecho
hecho progresos
progresos en en
matemáticas,
matemáticas, está está muy
muy bien.
bien. En
En cuanto
cuanto aa la
la atención,
atención, está
está también
también muy
muy bienbien
Frédéric,
Frédéric, se
se aplica.
aplica. Y
Y ahora
ahora de
de verdad
verdad se
se ha
ha convertido
convertido en
en un
un alumno
alumno dede lala clase.
clase.
Ha
Ha hecho
hecho progresos
progresos asombrosos,
asombrosos, asombrosos.
asombrosos.

Luego es el turno de Antoine. “Vamos a hablar de Monsieur Antoine. De pie. Bien,


aquí tenemos a un señor que no trabaja lo suficiente (que trabajo un poco a mínimos). No
estoy muy contento, no estás trabajando lo suficiente, hace falta que te apliques”. Ahí
interviene la profesora: “Pero siempre hace las tareas. Creo que la mamá vela para que las
haga”. Y de nuevo el director: “¿Debemos darle algo a pesar de todo? Un pequeño
recuerdo. Está sonriendo, mirad cómo está sonriendo”. Y la profesora: “Pero recuerda lo
que hemos dicho”. Y le entrega el regalo. Y de nuevo el director: “Dale las gracias a la
profesora”. Y el niño le da las gracias en lengua de signos. Y el director le pide y le da un
beso y le advierte del año que viene. A lo que la profesora añade: “El año que viene estará
con los niños grandes”.
Abou ya está de pie y el director enuncia las calificaciones: “En francés, bien.
Expresión oral, algún progreso. Matemáticas todavía con algunas dificultades, todavía se
puede mejorar. Muy buen trimestre. Abou tiene que hablar más en casa”. La profesora
insiste: “En casa, tienes que hacer frases, tienes que hablar con Mamá, con Bahía”. Y otra
vez el director: “Hay que hablar”. Y la profesora: “Tú puedes, ¿de acuerdo?”. Y otra vez el
director le pide que agradezca, y el da las gracias en lengua de signos: “Gracias. Gracias
señora”. Y la profesora responde: “Muy bien Abou”. Y el director le pide y le da un beso.
Y le entrega un regalo y la hoja de las calificaciones.
Por último Tomo: “Y ahora pasamos a Tomo. Que con frecuencia ha sido llevado a
mi oficina para terminar sus tareas, que no siempre hace. Como ejemplo de su actitud
relajada, incluso un día llegó con una bolsa con unos petardos y un encendedor”. Mientras
su madre se sorprende por lo que acaba de oír Tomo responde: “Estaban en casa”. Y la
profesora: “Ahora dice eso”. Y el director concluye: “Pero en general todo está bien. Espero
que el año próximo sea aún mejor, ya que sin duda es capaz de hacerlo mejor. Este año ha
hecho progresos asombrosos”. Y continúa: “Ahora se va a llevar algo que estaba confiscado
desde hace tiempo en mi oficina, su game-boy. ¿Se lo devuelvo? ¿Te lo devuelvo? Aunque
los petardos los guardaré como un recuerdo”.
3.
En la escena se entrega una hoja de calificaciones, es cierto, pero se habla de muchas
cosas. Se habla de comportamientos, de actitudes, de esfuerzo, de aplicación, de
comunicación, de integración en la clase, de travesuras, de progresos. Se habla también de
las tareas de casa, de lo que se ha hecho y de lo que se puede hacer en casa. Pero lo que me
interesa aquí no es tanto lo que se dice como esa coreografía de posiciones corporales, de
movimientos, de acciones, de gestos, de rostros y de miradas, es decir, todo lo que
constituye un espacio público y remite a un espacio público.
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 273
273

Aunque no voy a comentar la específica naturaleza calificadora o evaluadora de la


escena, sí que quisiera decir que ese asunto ha sido capturado ya, casi definitivamente, por
ese espíritu deportivo y meritocrático de la jerarquización y la comparación, de la
valoración obsesiva de resultados, del “ganar” en cualquier cosa y respecto a cualquier
cosa, del morbo de los rankings de cualquier tipo, eso que el neoliberalismo contemporáneo
se complace en llamar “espíritu de superación” o “aspiración a la excelencia”, y que hoy se
aplica con un entusiasmo digno de mejor causa no sólo a los alumnos sino a los profesores,
a las escuelas y al sistema educativo mismo.
En ese sentido, y para comenzar a darle un cierto espíritu ferlosiano a este texto, me
limitaré a transcribir una primera cita del autor que está en el trasfondo de la escritura de
este texto:
las
las calificaciones
calificaciones son
son perjudiciales
perjudiciales para
para el
el propio
propio estudiante
estudiante por
por sí
sí solo,
solo, porque
porque
llevan
llevan en
en sí
sí la
la incitación
incitación aa desviar
desviar el
el interés
interés dirigido
dirigido aa los
los contenidos
contenidos hacia
hacia el
el
interés
interés espurio
espurio dede su
su huero
huero valor
valor como
como instrumentos
instrumentos de de la
la propia
propia vanidad,
vanidad,
especialmente
especialmente porque
porque son
son idóneas
idóneas para
para prestarse
prestarse aa una
una función
función comparativa,
comparativa,
permitiendo
permitiendo entablar,
entablar, al
al menos
menos ‘entre
‘entre los
los mejores’,
mejores’, una
una especie
especie de
de competición
competición
deportiva
deportiva dede ‘a
‘a ver
ver quién
quién vale
vale más’
más’ (FERLOSIO,
(FERLOSIO, 2002a,
2002a, p.26-27).
p.26-27).

Yo no sé qué han visto ustedes en este aspecto de la escena que les he mostrado,
pero me parece importante señalar, aunque sea de paso, que ese espíritu competitivo y
meritocrático tiene que ver, me parece, con el arrasamiento de la escuela como espacio
público y con su sumisión a las lógicas individualistas, competitivas, clientelares,
meritocráticas y mercantilistas de las que, en muchos casos, la familia es una de las
principales portavoces. En la escena que hemos visto, creo, todavía se percibe algún resto
de sociabilidad y de vida pública que muestra que la escuela, esa escuela, aún no se ha
entregado completamente a la presión de la economía privatizadora o, si lo ha hecho, hay
algo en sus rituales que todavía responde a otras lógicas. De hecho los rituales tienden a
permanecer relativamente estables y fijados aunque haya desaparecido ya su sentido. De
ahí su extrañeza y el hecho de que, a veces, nos parezcan vacíos, puramente formales.
4.
Tampoco comentaré el beso del director, aunque diré, para prevenir cualquier
banalización, que Peter Sloterdijk comienza el capítulo de Esferas dedicado a las relaciones
cara a cara, un capítulo que se titula “Entre rostros. Sobre la emergencia de la esfera íntima
interfacial”, comentando dos besos pintados por Giotto en una iglesia de Padua,
seguramente antes de 1306, concretamente el beso entre Santa Ana y San Joaquín ante las
puertas de Jerusalén y el beso de Judas al Cristo en el Huerto de los Olivos. En ambas
escenas de beso, dice Sloterdijk (2003, p.140), “Giotto ofrece el ensayo pictórico más
sublime de una metafísica del encuentro facial”. Y les diré, de paso, que Sloterdijk apunta
en ese texto a la larguísima historia de la facialización humana, a esos centenares de miles
de años de evolución que permiten que los seres humanos tengamos un rostro único y
singular y, además, enormemente expresivo. Generaciones y generaciones de intensas y
delicadas relaciones interfaciales, cara a cara, básicamente, dice Sloterdijk, entre las madres
y los recién nacidos, son las que van a ir formando la enorme complejidad y expresividad
de nuestra cara, casi 50 músculos faciales (22 a cada lado) y más de 10.000 expresiones
faciales posibles según nos dicen los estudiosos, especialmente Ekman (1982; 2004). Y no
quiero ni pensar en los estragos que un par de generaciones de la práctica obsesiva de las
selfies puede causar en esa riqueza facial tan lentamente acumulada.
Además, y también en relación al beso, les recomiendo un texto poco conocido de
Iván Illich en el que desarrolla las tres palabras que existían en latín para beso, el basium
paternal o conyugal, el suavium lascivo o sexual, y el osculum ritual, ese beso en la boca que
274|
274| jorge
jorge larrosa
larrosa

la liturgia cristiana convierte en el elemento fundamental de la conspiratio, de ese beso de


paz que significa, física y corporalmente, la comunidad atmosférica de los alientos
compartidos y que, en la misa de nuestros días, ha quedado reducido a un roce de mejillas o
a un frío apretón de manos, desde luego entre personas próximas. Para Illich (2004, p.340-
350)
la
la conspiratio,
conspiratio, el
el beso
beso en
en la
la boca,
boca, fue
fue el
el gesto
gesto litúrgico
litúrgico solemne
solemne por
por el
el que
que los
los
participantes
participantes enen el
el culto
culto compartían
compartían susu espíritu
espíritu los
los unos
unos con
con los
los otros
otros (…).
(…).
Explícitamente,
Explícitamente, corporalmente,
corporalmente, la la celebración
celebración cristiana
cristiana central
central se
se entendía,
entendía,
literalmente,
literalmente, como
como co-respiración,
co-respiración, conspiración:
conspiración: la
la producción
producción dede una
una atmósfera
atmósfera
común.
común.

Y no deja de ser curioso que, para nosotros, la palabra conspiración aluda a


comportamientos mafiosos mientras que Illich (idem) insiste en su sentido de comunidad
y, sobre todo, de igualdad: “cualesquiera que sean sus orígenes, hombres y mujeres, griegos
y judíos, esclavos y ciudadanos, engendraban entre todos, físicamente, alguna cosa que los
sobrepasaba, un espíritu de amistad”.
No comentaré tampoco los gestos simétricos de dar las gracias a la profesora y de
recibir un regalo, aunque esa simetría está dislocada por el hecho de que, en casi todos los
casos, no es la profesora sino el director el que da el regalo y no es al director sino a la
profesora a la que se da las gracias. Pero si que quisiera sugerir que el regalo que aquí se
nos muestra no tiene que ver con un pago, o con una retribución (no está sujeto a las reglas
del intercambio), tampoco tiene que ver con lo que en la jerga pedagógica se llama
“motivación” (esa figura que supone que los niños necesitan de un estímulo externo para
hacer lo que deben) y, desde luego, tampoco tiene que ver con ese infame “porque tú lo
mereces” que, de tan evidente, ya apenas somos capaces de arrancar de nuestra boca. Si mi
instinto interpretativo no me falla, creo que el niño que recibe el regalo no se parece al
niño cliente que se impone en la escuela de hoy en día, a ese niño perpetuamente comprado
que exige constantemente ser recompensado y que ya es incapaz de hacer algo a cambio de
nada.
Sobre el gesto, para mí precioso, de dar las gracias a la profesora al final del curso,
diré que cuando hablé de esta escena con una de mis sobrinas, Núria, de 12 años, ella dijo
dos cosas. La primera fue que el agradecimiento no es necesario porque la maestra ha
hecho su trabajo y ya le han pagado por ello. La segunda, en forma de pregunta, era “qué
pasa si la maestra no te cae bien”. Ante este segundo comentario mi hermana, la madre de
la niña, sufrida profesora de secundaria en un colegio público, respondió inmediatamente
lo siguiente: “seguramente a la profesora no le cae bien gran parte del grupo y, sin
embargo, os trata a todos por igual, como es su obligación”. Y, como me parece que tiene
cierto interés pensar si lo que se nos muestra en esta escena debe ser leído como un signo
de igualdad o como un signo de desigualdad y, además, ese fue uno de los motivos
principales de las acaloradas discusiones que provocó la escena que les he mostrado, me
permitiré volver a la respuesta de mi hermana en algún momento de mi intervención.
Mi impresión es que nuestra manera habitual de entender el beso, el regalo y el
agradecimiento muestra hasta qué punto hemos mercantilizado la relación educativa (al
igual que todo tipo de relaciones), hasta qué punto la hemos hecho contractual, y hasta qué
punto somos incapaces de interpretar algunos gestos pedagógicos fuera de esa extraña
dimensión de lo emocional y de lo afectivo que contamina hasta lo indecible las relaciones
educativas y, desde luego, el carácter público (y, por tanto, relativamente impersonal) de la
escuela.
Comenté también la escena con otras dos de mis sobrinas, con Júlia y con Sofía, de
10 y de 8 años, que habían pasado el curso anterior en una escuela pública de California en
la que, muy al estilo norteamericano, la lógica de los premios y las recompensas (en forma
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 275
275

de una especie de dinero con valor sólo dentro de la escuela) atravesaba todos y cada uno
de los aspectos de la vida escolar. Sobre el regalo dijeron que les parecía bien siempre que
fuera de poco valor y apenas para servir “al orgullo” y a “la motivación”. Y sobre el beso al
director su reacción inmediata fue decir: “qué asco”.
En cualquier caso, y también para indicar posibles maneras de leer estos gestos con
relativa independencia de los prejuicios que nos constituyen y que, de alguna manera, nos
impiden ya imaginar qué es, o era, eso de besar, y qué es, o era, eso de regalar, y qué es, o
era, eso de agradecer, voy a permitirme sugerirles la relectura de los ensayos de Marcel
Mauss (1988, p.234) sobre la lógica del don y, complementariamente, la bellísima
“Digresión sobre la fidelidad y el agradecimiento” incluida en el segundo volumen de la
Sociología de George Simmel en la que habla de este último como si contuviera algo así
como “la memoria moral de la humanidad”.
Como ven, el profesor que soy no puede renunciar a sugerir bibliografía, aunque
para los gestos simétricos del regalar y del agradecer tal vez fuera suficiente, ya que
estamos en Rio de Janeiro, con tomarse en serio las segunda y la quinta página del libro
urbano del Profeta Gentileza22 (numeradas como 54 y 51), esas que construyen una
dicotomía que funciona como principio hermenéutico para la interpretación del resto del
libro. La segunda página dice así: “2 palavra que condena por favor obrigado e ser escravo
do capitalismo”. Y la quinta: “2 palavra que liberrta por gentileza e por jessuss agradecido
eo espirito santo que nos condus”. El favor es el intercambio interesado, la no gratuidad en
las relaciones, el vínculo que obliga y que condena (el “obrigado” de la fórmula de
agradecimiento en portugués), la forma de relación con el mundo y con los demás que está
esclavizada a la lógica de la reciprocidad y de la mercancía, el principio maligno del
capitalismo. La gentileza, sin embargo, es el principio benigno del don, de la gratuidad, de
las relaciones humanas desinteresadas, libres y que liberan, esas que no producen una
obligación sino un agradecimiento, y que están guiadas por el espíritu santo de la
generosidad.
La cuestión, desde luego, es decidir si la escena que les he mostrado tiene que ver
con el “por favor” y el “obrigado”, o con el “por gentileza” y el “por Jesús agradecido”, o
con las dos cosas a la vez.

5.
Tampoco comentaré el ambivalente papel de los padres en la escena, el hecho de
que, por una parte, parezcan reducidos al papel de testigos (como si lo que se quisiera
ritualizar fuera su presencia y, al mismo tiempo, el hecho de que ellos no participan en la
escena) y, por otra parte, que unas veces parezca que el director se dirige a los niños y otras
veces parezca que se dirige a los padres.
En el Coloquio anterior, en el que, como decía, hablé también de la escuela como
espacio público, insistí en que eso sólo es posible si se constituye como un espacio distinto
del hogar. De hecho, estoy convencido de que, en la escuela privada, la familia manda en
tanto que es quien paga, el cliente principal, y el principal responsable, tal vez, de su
mercantilización. Y estoy convencido también de que la escuela pública no sólo adopta
cada vez más, miméticamente, esa subordinación clientelar, sino que además tiende a
tratar al niño según sus “condiciones familiares” con lo que se hace cada vez más incapaz,
en el lenguaje masscheleniano, de “suspender” o de “poner entre paréntesis” los aspectos

22 El
El “libro
“libro urbano”
urbano” de
de Gentileza
Gentileza está
está compuesto
compuesto por
por una
una serie
serie de
de 56
56 textos
textos numerados
numerados escritos
escritos en
en las
las pilastras
pilastras
que sostienen
que sostienen el
el viaducto
viaducto elevado
elevado que
que da
da entrada
entrada aa la
la ciudad
ciudad de
de Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro por
por la
la Avenida
Avenida Brasil
Brasil yy que
que
continúa por
continúa por la
la orilla
orilla carioca
carioca de
de la
la Bahía
Bahía dede Guanabara.
Guanabara. ElEl libro
libro fue
fue escrito
escrito al
al final
final de
de la
la vida
vida del
del Profeta,
Profeta,
entre finales
entre finales de
de los
los 80
80 yy principios
principios de
de los
los 90.
90.
276|
276| jorge
jorge larrosa
larrosa

culturales, sociales, psicológicos y, en general, identitarios que, según se dice,


“determinan” la trayectoria escolar de los niños.
En cualquier caso, mi tesis de hace dos años fue que la escuela no es una especie de
familia, ni una extensión o una prolongación de la familia, ni está subordinada a la familia.
Por eso los padres mandan a sus hijos a la escuela: para procurar que se emancipen al
educarse “fuera de casa”. Para que la escuela sea un espacio público es fundamental que sea
otra cosa que la familia, distinta de la familia. O, dicho de otro modo, la escuela es un
espacio público sólo si hace que la familia se distinga, es decir, que se mantenga a
distancia. Y para desarrollar eso utilicé una cita de Rafael Sánchez Ferlosio (2002a, p.25-26)
que decía así:
El
El muchacho
muchacho que que empieza
empieza aa ir ir al
al colegio
colegio tendría
tendría que
que compenetrarse
compenetrarse plenamente
plenamente
con
con la
la idea
idea dede que
que elel ir
ir desde
desde su su casa
casa alal colegio
colegio eses verdaderamente
verdaderamente una una salida
salida al
al
exterior;
exterior; unun camino
camino que que apareja
apareja cruzar
cruzar una
una frontera,
frontera, para
para pasar
pasar aa un
un territorio,
territorio, no
no
ciertamente
ciertamente enemigo,
enemigo, pero pero enen elel que
que tiene
tiene que
que saber
saber sentirse
sentirse aa solas
solas enen lo
lo que
que se
se
refiere
refiere aa la
la vida
vida familiar,
familiar, lolo que
que aa lala vez
vez implica
implica comprender
comprender cabalmente
cabalmente que que este
este
nuevo
nuevo conjunto
conjunto de de personas
personas al al que
que sese incorpora
incorpora no no es,
es, de
de ningún
ningún modo,
modo, propio
propio yy
personal,
personal, sino
sino indistintamente
indistintamente común común yy colectivo.
colectivo. Tan
Tan sólo
sólo esta
esta conciencia,
conciencia, queque
un
un muchacho
muchacho de de 88 oo de
de 1010 años
años no no sabría
sabría definir
definir nini explicitar,
explicitar, pero
pero sí,
sí, por
por lo
lo
menos,
menos, si si las
las cosas
cosas se se hicieran
hicieran de de manera
manera ritualmente
ritualmente correcta,
correcta, intuir
intuir yy
comprender,
comprender, es es lo
lo adecuado.
adecuado. Sí, Sí, ‘ritualmente’
‘ritualmente’ acaboacabo dede decir:
decir: los
los índices
índices externos,
externos,
las
las señales
señales sensibles,
sensibles, porpor sencillas
sencillas yy mínimas
mínimas que que sean,
sean, marcan
marcan loslos tránsitos
tránsitos dede la
la
vida
vida humana,
humana, la la deslindan,
deslindan, ilustran
ilustran yy organizan,
organizan, yy en en cada
cada lugar
lugar enseñan
enseñan aa unouno aa
estar
estar enen susu lugar.
lugar. En En este
este caso,
caso, una
una mirada
mirada atenta
atenta advierte
advierte fácilmente
fácilmente el el
espontáneo
espontáneo cambio
cambio de de actitud,
actitud, manifiesto
manifiesto en en algunos
algunos casos,
casos, por
por ejemplo,
ejemplo, en en el
el
asomo
asomo de de una
una especie
especie de de timidez
timidez oo de de circunspección,
circunspección, que que no
no hay
hay por
por qué
qué tomar
tomar
por
por inseguridad
inseguridad oo desconfianza,
desconfianza, sino sino por
por lala manera
manera de de pisar
pisar oo de
de avanzar
avanzar –para
–para
expresarlo
expresarlo de de unun modo
modo figurado-
figurado- más más cuidadosa
cuidadosa yy reflexiva
reflexiva deldel que
que percibe
percibe lala
extraterritorialidad
extraterritorialidad del del nuevo
nuevo medio
medio en en que
que sese mueve.
mueve. SóloSólo con
con esta
esta actitud
actitud
diferenciada,
diferenciada, que que no no eses sino
sino la la conciencia
conciencia de de lo
lo público,
público, puede
puede un un muchacho
muchacho
sentirse
sentirse yy hacerse
hacerse pleno
pleno protagonista
protagonista de de sus
sus propios
propios estudios.
estudios.
6.
Detengámonos un momento en ese “hacerse pleno protagonista de sus propios
estudios” con el que acaba la cita de Ferlosio. En el curso del que les hablé comentamos
largamente el cartel publicitario de una universidad catalana en el que sobre el rostro de un
estudiante se lee una frase que dice “tú eres el protagonista”. Naturalmente, yo afirmé con
vehemencia que esa frase es más propia de un shopping o de un reality televisivo que de
una Universidad y que, en esta última, el protagonista no es en absoluto el estudiante sino
el estudio, la materia de estudio y, por tanto, la relación que tanto los profesores como los
alumnos tienen con el estudio, con el mundo convertido en materia de estudio. Una de las
estudiantes, sin embargo, afirmó que eso de ser el protagonista podría leerse también como
ser responsable o hacerse responsable. Alguien dijo que la palabra “protagonista” pertenece
claramente a esta época del autointerés y el egocentrismo (en la que todos aspiran al
protagonismo, es decir, a convertirse en el centro de atención y en el personaje principal)
mientras que la palabra “responsable”, sobre todo en contextos escolares, ya casi nadie la
usa y, si la usa, se arriesga a ser tachado de moralista. Y no deja de ser curioso, dicho sea de
paso, que “moralista” sea hoy casi un término claramente despectivo.
Pero por lo que sé de Ferlosio y de su empeño desesperado en mantener la esfera de
lo moral separada y distinguida de la esfera de lo jurídico y de lo psicológico con las que
hoy se confunde, y por lo que sé también de su crítica feroz a toda forma de onfaloscopia
(a ese sentimiento de ser el centro del mundo y a esa práctica de mirarse constantemente el
ombligo) su uso de “protagonista” se parece, sin duda, al de “responsable” o, quizá mejor,
al de “autorresponsable”. Transcribo ahora otra cita en la que, después de quejarse de “la
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 277
277

invasión de lo público y lo social por las huestes de lo privado y lo familiar”, sobre todo en
la escuela, Ferlosio (2002a, p.28) explicita la relación entre protagonismo y responsabilidad:
Ese
Ese mismo
mismo control
control yy esa
esa tutela
tutela familiar
familiar que
que se
se mantienen
mantienen extendidos
extendidos sobre
sobre el
el hijo
hijo
en
en el
el ámbito
ámbito público
público dede la
la enseñanza
enseñanza actúan
actúan sobre
sobre él
él aa la
la manera
manera de
de una
una rémora
rémora
que
que lele impide
impide hacerse
hacerse verdadero
verdadero protagonista
protagonista autorresponsable
autorresponsable de de su
su propio
propio
interés
interés por
por los
los contenidos
contenidos de de las
las cosas
cosas que
que podría
podría aprender.
aprender.

Ferlosio no dice “responsable” sino “autorresponsable”, y eso porque le interesa


sobremanera que, precisamente porque están haciéndose adultos, es decir, mayores de
edad, es decir, emancipados, los niños comiencen a aprender que no hay que hacer las cosas
bien sólo “por darle gusto a los padres”, o “para que los profesores estén contentos”, sino,
esencialmente, porque es lo que se debe hacer. Además, esa autorresponsabilidad no está
referida a la calificación sino al estudio, a las cosas que se aprenden, al interés o a lo que
interesa, es decir, a lo que importa. Y lo que importa en la escuela es el mundo, y el
conocimiento, y el estudio, y no el “más o menos valer” de los unos respecto a los otros.
Como él mismo dice: “… humano no es medirse con los otros hombres, sino ocuparse de
las cosas” (FERLOSIO, 2002a, p.43).
En cualquier caso, sólo porque los padres no están, o están colocados a distancia,
sólo porque el espacio escolar es público y no “familiar”, sólo porque la escuela está
separada de la familia y también del shopping (espacios todos ellos donde, seguramente, el
niño sí es el protagonista, en el peor sentido de la palabra), sólo porque el niño está solo
ante los demás y en medio de los demás, sólo porque es singular, él mismo, y al mismo
tiempo uno más, uno entre otros, igual a los otros, el niño puede y debe sentirse y hacerse
responsable, personal y moralmente responsable (y no jurídicamente responsable o
psicológicamente responsable), de sus propios estudios. De hecho, en la escena que les he
mostrado, el niño es el centro, el protagonista, el único cuyo nombre es pronunciado con
cierta solemnidad, precisamente porque es el responsable, porque lo que ahí se está jugando
y juzgando es su propia responsabilidad (y no sólo su rendimiento, su merecimiento, su
mérito o su demérito) o, dicho de otro modo, su propia persona.

7.
Y en esas estábamos cuando caímos en una sección del libro de Daniel Pennac que
se tradujo en Brasil como Diário de escola33, un libro que, como ustedes saben, Jan y Maarten
citan profusamente y que nosotros, en ese curso del que les estoy hablando, leímos con
cierto detenimiento. La sección a la que voy a referirme está en el contexto de una larga
consideración sobre la escuela shopping y el niño cliente. Poco antes, Pennac se ha
declarado heredero de una escuela que duró apenas 100 años, desde 1875, en que se propuso
arrancar a los niños de la fábrica, hasta 1975, cuando ya no es capaz de arrancarlos del
shopping, cuando ni siquiera trata de hacerlo, cuando, muy frecuentemente, los entrega
atados de pies y manos al shopping, a la lógica del shopping, a lo que él llama “la sociedad
mercantil”. La escuela de que habla Pennac se parece a la escuela entendida como espacio
público de la que habla José Luis Pardo. La escuela es un espacio público, dice Pardo,
precisamente porque separa al niño de la familia y de la fábrica, porque no es ni una
continuación de la familia, o de la comunidad, ni una preparación para la fábrica, o para el
trabajo. Y es un espacio público, dice Pennac (2008, p.235), apenas durante un siglo, desde
que el niño fue “arrancado a la sociedad industrial durante el último cuarto del siglo XIX”
hasta que “fue entregado cien años más tarde a la sociedad mercantil que lo convirtió en

33 El
El título
título en
en francés
francés es
es Chagrin
Chagrin d’école,
d’école, que
que podría
podría traducirse
traducirse como
como “tristeza
“tristeza oo malestar
malestar de
de escuela”.
escuela”. La
La
edición
edición portuguesa
portuguesa lo
lo traduce
traduce como
como Mágoas
Mágoas da
da escola.
escola. En
En español
español se
se tradujo
tradujo como
como Mal
Mal de
de escuela
escuela yy en
en inglés,
inglés,
bellamente,
bellamente, como
como School
School blues.
blues.
278|
278| jorge
jorge larrosa
larrosa

niño cliente”. En ese contexto, el fragmento que me interesa comienza hablando de “la
dificultad del cara a cara con una clase de niños clientes” (y subrayo lo del cara a cara).
Continúa hablando de la especificidad del espacio escolar cuando dice que “estamos en la
escuela, en el colegio, en el instituto, no en familia, no en unos grandes almacenes: no se
satisfacen deseos superficiales por medio de regalos, se satisfacen necesidades
fundamentales por medio de obligaciones”.
Y finalmente llega a la frase que quiero destacar (PENNAC, 2008, 240-241):
la
la escuela
escuela de
de la
la República
República sigue
sigue siendo
siendo hoy
hoy el
el último
último lugar
lugar de
de la
la sociedad
sociedad de
de
mercado
mercado donde
donde el
el niño
niño cliente
cliente tiene
tiene que
que pagar
pagar con
con su
su persona
persona (en
(en francés:
francés: “payer
“payer
de
de sa
sa personne”).
personne”).

Y añade:
saber
saber aa cambio
cambio dede trabajo,
trabajo, conocimientos
conocimientos aa cambio
cambio de de esfuerzo,
esfuerzo, el
el acceso
acceso aa la
la
universalidad
universalidad aa cambio
cambio del
del ejercicio
ejercicio solitario
solitario de
de la
la reflexión,
reflexión, una
una vaga
vaga promesa
promesa dede
porvenir
porvenir aa cambio
cambio de
de una
una plena
plena presencia
presencia escolar,
escolar, eso
eso es
es lo
lo que
que la
la escuela
escuela le
le exige.
exige.

En la escuela no se satisfacen deseos que se puedan pagar con dinero sino que se
cumplen obligaciones que hay que pagar con la persona. Y pagar con la persona es pagar
con trabajo, con esfuerzo, con ejercicio, con soledad, con reflexión, pero sobre todo con
presencia. En la escuela el niño no puede ser cliente, no puede ser tratado como cliente, no
puede comportarse como cliente, porque lo que escuela le exige es que entregue su
presencia y su persona, que se dé a sí mismo en su presencia y en persona, que pague
consigo mismo. La escuela, dice Pennac, le exige “ceder al toma y daca”: le ofrece algo
(saber, conocimientos, universalidad, una vaga promesa de porvenir) pero le pide algo a
cambio (su presencia y su persona). Y algo de todo eso hay, creo, en la escena que les he
mostrado: algo del toma y daca, algo del protagonismo y de la responsabilidad, algo de la
presencia y de la persona, algo del cara a cara, algo del dar la cara.

8.
Puesto que no es el asunto que me interesa aquí directamente, no voy a demorarme
en comentar algo de lo que se habló mucho en mi clase del semestre pasado a propósito de
la escena que les he mostrado: si el gesto mayor de suspender a un niño al final del año y,
por tanto, de obligarle a repetir curso, o el gesto menor, pero equivalente, de rechazar el
ejercicio mal hecho de un niño, junto con el de obligarle a repetirlo o, en algunos casos, el
gesto de ofrecerle una ayuda complementaria para que pueda hacer mejor sus tareas, son
gestos de igualdad o de desigualdad o, como se dice ahora, de inclusión o de exclusión.
Aunque sí les diré que yo defendí vehemente, para sorpresa de mis alumnos, que son
gestos de igualdad, que lo que dicen es algo así como:
mira,
mira, nono lolo has
has hecho
hecho bien,
bien, pero
pero aquí
aquí el el tiempo
tiempo no no importa,
importa, yy la la repetición
repetición tampoco
tampoco
importa,
importa, yy podemos
podemos hacerlo,
hacerlo, de
de lala misma
misma oo de de otra
otra manera,
manera, tantas
tantas veces
veces como
como sea sea
necesario,
necesario, yy eses más,
más, yo
yo como
como profesor
profesor te te ofrezco
ofrezco también
también mi mi tiempo,
tiempo, que
que tampoco
tampoco importa,
importa,
porque
porque enen lala escuela
escuela tenemos
tenemos todo
todo elel tiempo
tiempo del del mundo,
mundo, un un tiempo
tiempo indefinido,
indefinido, un un tiempo
tiempo
que
que no
no cuenta
cuenta yy queque no
no se
se cuenta,
cuenta, yy estoy
estoy dispuesto
dispuesto aa atenderte
atenderte otra
otra vez
vez elel año
año que
que viene
viene
(aunque
(aunque no no me
me apetece,
apetece, pero
pero eso
eso tampoco
tampoco importa,
importa, porque
porque aquí
aquí enen la
la escuela
escuela nono se
se trata
trata dede
que
que las
las cosas
cosas nosnos apetezcan
apetezcan oo no,
no, nono se
se trata
trata de
de deseos
deseos sino
sino de
de obligaciones)
obligaciones) oo aa leer leer
atentamente
atentamente tus tus ejercicios
ejercicios tantas
tantas veces
veces como
como sea
sea necesario,
necesario, hasta
hasta que
que estén
estén alal menos
menos tan tan
bien
bien hechos
hechos como
como los
los de
de tus
tus compañeros
compañeros que que han
han pasado
pasado dede curso,
curso, oo los
los de
de aquellos
aquellos que
que hehe
aceptado,
aceptado, porque
porque en en la
la escuela
escuela lala igualdad
igualdad que que cuenta
cuenta eses la
la de
de la
la potencia,
potencia, yy haciéndote
haciéndote
repetir
repetir el
el curso,
curso, oo pidiéndote
pidiéndote que
que hagas
hagas otraotra vez
vez el
el trabajo,
trabajo, lolo que
que tete estoy
estoy diciendo
diciendo es es que
que

tú puedes,
puedes, queque doy
doy por
por supuesto
supuesto queque tú tú puedes,
puedes, yy que
que lo
lo único
único que
que hace
hace falta
falta eses que
que
descubramos
descubramos juntosjuntos esa
esa potencia
potencia que
que tete hace
hace igual
igual aa todos
todos yy que
que eses la
la única
única que
que puede
puede
emanciparte
emanciparte de de todo
todo eso
eso que
que ahora
ahora se
se llama
llama tustus condicionamientos,
condicionamientos, esos esos que
que tete atan
atan aa lo
lo que
que
eres
eres yy no
no aa lo
lo que
que puedes,
puedes, yy que
que la
la pongamos
pongamos aa trabajar,
trabajar, porque
porque aquí
aquí en en la
la escuela
escuela eso
eso que
que
dices
dices oo que
que crees
crees que
que eres
eres no
no importa,
importa, como
como no no importa
importa tampoco
tampoco lo lo que
que yo
yo piense
piense de
de eso,
eso, el
el
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 279
279

hecho
hecho de
de que
que me
me gustes
gustes oo no
no me
me gustes,
gustes, de
de que
que me
me resulte
resulte oo no
no agradable,
agradable, oo satisfactorio,
satisfactorio,
trabajar
trabajar contigo,
contigo, dede que
que hagas
hagas mimi vida
vida de
de profesor
profesor más
más fácil
fácil oo más
más difícil,
difícil, porque
porque mi
mi
obligación
obligación eses trataros
trataros aa todos
todos por
por igual,
igual, yy por
por eso
eso tete suspendo,
suspendo, yy por
por eso
eso no
no acepto
acepto ese
ese
ejercicio
ejercicio mal
mal hecho,
hecho, yy por
por eso
eso te
te pido
pido que
que vuelvas
vuelvas el
el curso
curso que
que viene,
viene, oo que
que vuelvas
vuelvas aa hacer
hacer
el
el trabajo
trabajo yy me
me lo
lo vuelvas
vuelvas aa entregar
entregar mañana.
mañana.

Tampoco comentaré el otro asunto que provocó acaloradas discusiones: si el gesto


mayor y altamente ritual de entregar las calificaciones en público (también las de los
suspendidos), y el gesto menor y equivalente de hacer que un niño muestre en público sus
ejercicios, sus trabajos (también los que no están bien hechos, los que no pueden usarse
como modélicos), es un gesto de humillación o de reconocimiento o, dicho de otro modo, si
los ejercicios escolares se hacen para el profesor, o para uno mismo, si son un documento
confidencial para uso evaluativo, o si forman parte del trabajo cotidiano en la sala de clase,
ese que no consiste solamente, como se dice ahora, en “procesos individuales de
aprendizaje”, sino que tiene que ver con un verdadero trabajo público y hecho en público
en el que juega, no sólo una nota, sino sobre todo una responsabilidad colectiva. Y les diré
que, también para sorpresa y tal vez escándalo de mis alumnos, yo defendí que son gestos
de reconocimiento.
Y en esas andábamos cuando intervino uno de los estudiantes, un chico que no
estaba inscrito en el curso pero que me había pedido permiso para asistir con la idea de que
las clases podrían ayudarle a elaborar algo que le había ocurrido siendo estudiante de
tercero de sociología (con un profesor amigo mío) y que le había perturbado hasta tal
punto que había decidido convertirlo en el asunto principal de su trabajo final de grado. Lo
que le había pasado a Guillermo es que asistió en un silencio incómodo y perplejo a las
múltiples maneras como un nutrido grupo de sus compañeros mostró airadamente su
disgusto con el profesor a través de constantes interrupciones de la clase, correos
electrónicos con todo tipo de reclamaciones, denuncias a las autoridades académicas,
pésimas puntuaciones en las encuestas de evaluación del profesorado, notorios abandonos
de la clase, etc. Y eso por varios motivos entre los cuales hay algunos que nos pueden
interesar aquí, en esta consideración de la escuela como espacio público, aunque sólo los
traigo a colación porque creo que la Universidad es una especie de escuela y porque estos
asuntos aparecieron, en mi curso, en una relación explícita con la escena que estamos
comentando.
Primero, que el profesor no les dejaba elegir, como hacían otros profesores, según su
propio interés, ni el material de lectura ni el tema de sus trabajos, y que nunca explicitaba
para qué servían, o podían servir, las lecturas que exigía o las tareas que encomendaba.
Segundo, que el profesor no devolvía los trabajos con calificaciones numéricas sino llenos
de comentarios sobre lo dicho y lo callado en cada uno de ellos y que, si no le habían
gustado, los hacía repetir varias veces (el mismo Guillermo contaba que él tuvo que repetir
un trabajo sobre Bourdieu hasta nueve veces). Tercero, que comentaba públicamente, a
veces con severidad, las correcciones que había hecho en los ejercicios que le habían sido
presentados, que a veces se le escapaba alguna reprimenda que tenía que ver, básicamente,
con la negligencia y la falta de atención en el trabajo, que, a veces, pedía a sus estudiantes
que justificaran ante los demás sus argumentos, que pedía a algunas personas lecturas o
ejercicios complementarios que debían ser hechos de una semana para otra, que volvía una
y otra vez a los mismos textos y a cómo habían sido leídos por la clase, y que eso hacía que
no se avanzara en la materia. Y cuarto, como no podía faltar, que no explicitaba los
criterios de evaluación y que suspendía demasiado.
Naturalmente la animadversión de los estudiantes se expresaba diciendo que el
profesor no respetaba la opinión de los estudiantes, que no les permitía elegir según sus
intereses, que les humillaba en clase, que no aclaraba cómo había que hacer las cosas, que
280|
280| jorge
jorge larrosa
larrosa

era arrogante y dogmático en sus consideraciones, que no permitía el intercambio de


saberes, y cosas de ese tenor. Y la perplejidad de Guillermo estuvo en su dificultad para
entender cómo el único profesor “de verdad” con el que se había encontrado en la
Universidad, el único que se tomaba en serio su trabajo, pudo suscitar reacciones tan
airadas. Y a nosotros nos sirvió, también, para ver cómo los gestos de igualdad pueden
leerse como gestos de desigualdad (o al revés), los gestos de generosidad como gestos de
arrogancia (o al revés), y los gestos que tratan de sostener un espacio público de trabajo y
reflexión como gestos de humillación (o al revés). Es decir, para ver de qué tipo y
complejidad son las dificultades que hoy en día se arrostran (y la palabra “arrostrar” viene
de “rostro”) cuando se da la cara y se exige a los demás que también la den.

9.
Les dije que no iba a hablar de las calificaciones (aunque algo he dicho). Les dije que
no iba a hablar ni del beso del director, ni del regalo a los niños, ni del agradecimiento a la
profesora (aunque algo he dicho). Les dije que no iba a hablar del lugar y del papel de los
padres en la escena (aunque algo he dicho). Les dije que no iba a hablar tampoco de lo que
fue mi asunto hace dos años, de eso de la escuela como espacio público en tanto que
separada de espacios privados como el de la familia, el del trabajo y el del consumo
(aunque no he podido evitar decir también algo a ese respecto). Les dije que no iba a hablar
de si la escena habla de igualdad o de desigualdad, de humillación o de reconocimiento
(aunque algo he dicho). Y vuelvo a insistir en que mi asunto de hoy tiene que ver con el
espacio público como espacio de la visibilidad, y de la exposición, y del aparecer y del
comparecer, como espacio del hacer las cosas entre los otros y con los otros y delante de los
otros, como espacio del hacerse responsable ante los otros, como espacio del cara a cara y
del dar la cara.
Así que, purificando la escena al máximo, dejándola apenas como una escena inter-
facial, como un puro espacio público del cara a cara, lo que tenemos es, en primer lugar, la
pronunciación del nombre del estudiante, en segundo lugar, el gesto de ponerse en pie (por
un lado una marca de presencia y, por otro, una marca de exposición, una especie de “aquí
estoy, todos pueden verme”) y tenemos, por último, el “dar la cara”. Para desarrollar este
último aspecto les sugiero empezar por las palabras, primero por la etimología.
El término clásico griego para cara o rostro, prosopon, significa literalmente “lo que
está ante la mirada de otros” y, al mismo tiempo, la máscara, tanto la la máscara escénica
como la marca ritual. No deja de ser interesante que los griegos carecieran de un término
que les permitiera distinguir el rostro de la máscara, la cara de la careta o, como nosotros
diríamos, contaminados como estamos por las retóricas de la individualidad y de la
autenticidad, el ser
ser de la apariencia. En cualquier caso prosopon se relaciona siempre con el
mirar, con lo que se mira y lo que puede devolver la mirada, con lo que aparece y
comparece a la mirada.
Los romanos llamaban persona a la máscara y vultus o facies al rostro, y es de ahí que
derivan, en italiano, viso o facia, en francés face y visage, en inglés face, en español faz, facha
- y fachada - y facial, en portugués face. Y, como saben, persona designa al mismo tiempo la
máscara y el rol o el papel o el personaje, algo que podría relacionarse con la evolución de
las palabras griegas typo y charakter que pasan de significar cuño, marca, o impronta a
significar la característica distintiva de alguien y, al fin,
fin, el
el carácter
carácter moral
moral oo el
el tipo
tipo humano
humano
(en el sentido en el que se dice en español que alguien “es un buen tipo” o, en portugués,
“un bom cara”). También la persona latina nos lleva a la persona moral, o a la persona
jurídica.
La palabra rostro en español - y rosto en portugués - deriva del latín rostrum (de
donde derivaría también roer y roedor) que podría traducirse por pico, hocico o incluso,
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 281
281

despectivamente aplicada a los humanos, por labio o boca, y sólo a partir del siglo XV
adquiriría su sentido actual.
Por último, sobre la etimología de cara, Corominas (1984) afirma que es una
voz
voz común
común aa todas
todas las
las lenguas
lenguas hispano
hispano yy galorrománicas,
galorrománicas, de
de origen
origen incierto,
incierto, que
que
acaso
acaso sea
sea palabra
palabra prerromana
prerromana oo acaso
acaso derive
derive del
del griego
griego arcaico
arcaico kara,
kara, cabeza,
cabeza,
etimología
etimología queque sólo
sólo se
se podría
podría aceptar
aceptar admitiendo
admitiendo que
que fue
fue empleada
empleada con
con carácter
carácter
de
de voz
voz semi-jergal
semi-jergal en en el
el habla
habla de
de los
los legionarios
legionarios romanos
romanos yy que
que desde
desde ahí
ahí se
se
propagó
propagó alal latín
latín vulgar.
vulgar.

Tenemos pues un complejo sistema verbal que relaciona aspectos como tipificación,
caracterización, individualización o personificación, y que se refiere a cuestiones
personales pero también jurídicas, sociales y morales. Y de todo eso hay algo, tal vez, en la
escena que les he mostrado puesto que alguno de ustedes podrá decir, y no sin cierta razón,
que se trata de una escena en la que la entrega de las calificaciones tiene algo de
caracterización y tipificación y catalogación de los niños (y, por tanto, de su inserción en
una clasificación o taxonomía), algo de imputación (lo que la haría compartir algo con el
ámbito de lo jurídico), y algo de culpabilización (lo que la aproximaría al ámbito de lo
moral o de lo religioso). La escena mostraría, de alguna manera, cómo los niños son
clasificados, juzgados o culpabilizados. Si a eso añadimos el sistema de premios y castigos
que parece implicar estaríamos claramente en la dimensión foucaultiana del “vigilar y
castigar”.
Pero a mí me gustaría ir un paso más atrás e insistir en esa dimensión primera del
mirar y ser mirado, del exponerse a la mirada. Y, si bien es verdad que hay miradas que
acusan, que juzgan, que tipifican, que culpabilizan, que humillan e, incluso, que matan
(piensen si no en todas las tradiciones que hablan de los peligros del “mal de ojo”) 44, todo
eso es posible precisamente porque el rostro es, o era, el lugar fundamental de la apertura y
de la exposición, eso que le hace decir a Giorgio Agamben (2001, p.79), siguiendo una larga
tradición ética y fenomenológica, que “el rostro es el estar irremediablemente expuesto del
hombre” y que “caminar en la luz del rostro significa ser esa apertura, padecerla”.
O a Peter Sloterdijk (2003, p.157), en un sentido más antropológico, que “por la
apertura del rostro -más que por la cerebralización o la formación de la mano- el hombre se
convirtió en un animal abierto al mundo o, lo que importa más aquí, abierto al prójimo”.
De hecho, una de las palabras que he usado anteriormente, la palabra “comparecer”,
tiene también una resonancia jurídica, incluso policial, pero un filósofo como Jean-Luc
Nancy la usa para pensar ese aparecer juntos, ese ser-en-común, ese vínculo que al mismo
tiempo reúne y separa a los hombres, en el que aún podríamos darle algún sentido a la
palabra “comunidad” y a la palabra “comunismo”. Para Nancy (2014, p.64) comparecer
tiene que ver con presencia y con exposición: “… se trata de presencia. O, si se prefiere, se
trata de exposición: una condición común se expone, se pone al desnudo y nos expone a
ella. Comparecemos ante ella”.
Y tiene que ver también con nacimiento. Comparecer consiste en “llevar a cabo la
separación del nacimiento (la multiplicidad arrojada en el tiempo) adaptándola al hecho de
que dicha separación se da en común para todos los hombres” (Ibídem, p.43).
O, en otro lugar:

44 Sobre
Sobre lala humillación,
humillación, remito
remito alal libro
libro coordinado
coordinado porpor Manuel
Manuel Delgado
Delgado (2009),
(2009), La
La humillación.
humillación. Técnicas
Técnicas yy
discursos
discursos de
de la
la exclusión
exclusión social.
social. Y,
Y, concretamente,
concretamente, aa mi mi texto
texto sobre
sobre uno
uno de
de los
los grandes
grandes escritores
escritores del
del cara
cara aa cara
cara
como
como mecanismo
mecanismo de de formación
formación yy dede formación.
formación. ElEl texto
texto se
se titula
titula “Pedagogía
“Pedagogía yy fariseísmo.
fariseísmo. Sobre
Sobre la
la elevación
elevación
yy el
el rebajamiento
rebajamiento en en Gombrowicz”
Gombrowicz” yy está está entre
entre las
las págs.
págs. 37-54
37-54 del
del libro
libro citado.
citado. Para
Para una
una revisión
revisión interesante
interesante
de
de todas
todas estas
estas cuestiones,
cuestiones, puede
puede leerse
leerse con
con provecho
provecho elel libro
libro de
de Belén
Belén Altuna
Altuna (2010),
(2010), Una
Una historia
historia moral
moral del
del
rostro.
rostro.
282|
282| jorge
jorge larrosa
larrosa

Comparecemos:
Comparecemos: venimos
venimos juntos
juntos al
al mundo.
mundo. No No sese trata
trata de
de que
que haya
haya una
una
producción
producción simultánea
simultánea de
de muchas
muchas entidades
entidades distintas
distintas (como
(como cuando
cuando vamos
vamos
‘juntos’
‘juntos’ al
al cine),
cine), sino
sino de
de que
que no
no hay
hay venida
venida al
al mundo
mundo queque no
no sea
sea radicalmente
radicalmente
común.
común. LoLo ‘común’
‘común’ mismo.
mismo. Venir
Venir al
al mundo
mundo == ser-en-común
ser-en-común (Ibídem,
(Ibídem, p.67).
p.67).

Si pensamos, con Hannah Arendt, que la educación tiene que ver con la natalidad.
Si pensamos que la escuela es un dispositivo insertado en el venir al mundo de los que
nacen. Si pensamos que la escuela tiene que ver con poner en relación a la infancia y al
mundo. Entonces la educación y la escuela tienen que ver, también, con un aparecer y con
un comparecer fundamentales, con un exponerse, con un hacerse presente (a la vez
múltiple y común) que se da en el mundo y también, desde luego, sobre todo en la escuela,
respecto a la relación con el mundo. Y algo de eso hay en la escena que les he mostrado: un
comparecer de cada uno ante los otros que está referido, fundamentalmente, a la manera
como cada uno de los niños se han relacionado, a lo largo del curso escolar, con el estudio.
Es decir, una exposición que revela lo que los hace diferentes pero también lo que tienen
en común, su condición común de escolares.

10.
Pero, más que la etimología, quizá sea el uso de expresiones que contienen “cara” el
que nos pueda dar una idea más precisa de lo que se está jugando en esa escena. El
castellano es pródigo en ese tipo de expresiones que, curiosamente, tienen que ver, casi
todas ellas, con la honra y el orgullo por un lado, y con la culpa y la vergüenza por el otro.
Ser un sinvergüenza, o un desvergonzado, es ser un descarado, o un caradura, o un jeta, o
alguien que tiene mucha cara, o alguien a quien no se le cae la cara (de vergüenza). La palabra
desfachatez (del latín facies) es sinónima de descaro. Sentir vergüenza, o tener vergüenza,
tiene que ver con bajar la cara, o esconder la cara, o perder la cara. Ser un aprovechado es ser
un caradura y también un jeta, alguien que lo hace todo por la cara, o por su cara bonita. La
honestidad y la franqueza, por su parte, tienen que ver con expresiones como ir de cara, o ir
a cara descubierta. La honra y el orgullo permiten ir con la cara bien alta. Reprochar algo a
alguien se dice echar en cara o pasar por la cara. Esconderse de una situación potencialmente
vergonzosa es salvar la cara. Salir en defensa de la honradez de otro es sacar la cara por él.
Enfrentar una situación o a una persona es plantarle cara, o encararla. Aceptar un desafío es
verse las caras. El miedo a sentir vergüenza nos hace decir cosas como con qué cara salgo yo a
la calle, o con qué cara se lo digo, o con qué cara me presento yo allí. Exigir una responsabilidad
nos hace decir mírame a la cara cuando te hablo, o dímelo a la cara si te atreves. Responder de
los propios actos, o de las propias palabras, y afrontar las consecuencias, es poner la cara, o
dar la cara. Etcétera, etcétera, etcétera.
Seguramente todas esas expresiones son como restos arqueológicos de dos cosas que
han desaparecido, o que están en trance de desaparición, en tanto que dependen
estrechamente la una de la otra: las relaciones cara a cara y la ética del honor. Pero lo que
también está desapareciendo de este mundo es la vergüenza. Y más si nos tomamos en
serio la tesis de Ferlosio (2000, p.29) de que
la
la vergüenza
vergüenza es
es la
la comadrona
comadrona oo la
la nodriza
nodriza de
de toda
toda educación.
educación. El
El momento
momento enen que
que
nace
nace la
la pasión
pasión anímica
anímica de
de lala vergüenza
vergüenza -- inequívocamente
inequívocamente señalado
señalado por
por lala
aparición
aparición del
del concomitante
concomitante síntoma
síntoma del
del rubor
rubor -- debe
debe ser
ser considerado
considerado como
como el
el del
del
surgimiento
surgimiento de de la la mera
mera condición
condición dede posibilidad
posibilidad dede toda
toda educación
educación
verdaderamente
verdaderamente humana.
humana.

Y “verdaderamente humana” quiere decir, para Ferlosio, que se basa en una


constricción moral, educativa, una constricción que se produce cara a cara, en el acto
mismo de ponerse el niño a merced de la mirada ajena, y no en una constricción física,
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 283
283

como es el caso de la doma animal, que se produce cuerpo a cuerpo. Por eso la cara que no
puede ocultar el rubor, es decir, la vergüenza, a menos que uno sea un caradura, es el lugar
donde se produce todo drama educativo, entendiendo “drama” en el sentido de “teatro”
pero también en el sentido de “conflicto” o de “campo de batalla”.
Con
Con lolo que
que uno
uno se
se avergüenza,
avergüenza, [dice
[dice Ferlosio],
Ferlosio], es
es con
con la
la cara.
cara. De
De modo
modo que
que ya
ya no
no
me
me conformo
conformo con
con elel dicho
dicho tradicional
tradicional de de que
que ‘la
‘la cara
cara es
es el
el espejo
espejo del
del alma’,
alma’, yy digo
digo
que
que lala cara
cara pertenece
pertenece al al alma
alma misma,
misma, forma
forma parte
parte dede ella”.
ella”. Y,Y, un
un poco
poco más
más
adelante:
adelante: “…solamente
“…solamente la la cara
cara eses la
la persona
persona (…).
(…). A A la
la cara
cara es es aa lo
lo que
que remite
remite elel
nombre
nombre personal
personal (…).
(…). LaLa cara
cara es,
es, como
como parte
parte del
del alma,
alma, susu lugar
lugar dede aparición
aparición enen
tanto
tanto que
que sujeto
sujeto específicamente
específicamente social
social (…).
(…). Todo
Todo yy casi
casi todo
todo lolo que
que se
se transmite
transmite
yy lo
lo que
que ocurre
ocurre entre
entre alma
alma yy alma,
alma, entre
entre un
un sujeto
sujeto yy otro,
otro, entre
entre esta
esta persona
persona yy esa
esa
otra
otra persona,
persona, es
es algo
algo que
que vava yy viene
viene yy viene
viene yy va
va de
de cara
cara aa cara
cara (Ibídem,
(Ibídem, p.35-37).
p.35-37).

Dar la cara, entonces, no tiene que ver con la identidad sino con la persona, con el
alma, con el completo ser social o, como dice Ferlosio, con el completo ser con-subjetivo de
cada uno. No estamos, pues, ante un drama de la identidad, ni siquiera de la
intersubjetividad, sino de la con-subjetividad, algo quizás no muy alejado de ese ser-en-
común de que hablaba Nancy. Y cuando no hay cara, cuando no somos capaces de dar la
cara, no puede haber ya constricción moral, constricción educativa humana,
verdaderamente humana, sino apenas constricción corporal, es decir, directamente,
violencia física o, cuando menos, constricción institucional, o sea, temor a la ley y, por
consiguiente, al castigo. O, por decirlo de otro modo, cuando no hay temor al reproche no
queda sino el temor a la ley, o el temor a la paliza, o el temor al castigo, el ejercicio puro y
duro del poder y, por tanto, la impotencia educativa.
Quizá la incomodidad de mis alumnos con la escena que les he mostrado, con su
carácter anticuado, tenga que ver con que ya no somos capaces de ver en ella otra cosa que
la posibilidad de un trauma psicológico, o la apariencia de un juicio penal, o la simulación
de un concurso deportivo, o la atmósfera de un empleador que estimula y premia los
resultados obtenidos por sus trabajadores, con lo que se confirmaría la tesis de Ferlosio de
que el ámbito de la moral y, por tanto, de la responsabilidad y de la autorresponsabilidad,
con sus ineludibles dimensiones de vergüenza y de remordimiento, habría sido
enteramente devorado por lo psicológico, por lo jurídico y por lo económico. Y quizá eso
tenga que ver con lo que Eva Illouz (2014) llama “la desaparición del alma” y su sustitución
por la psique, es decir, por una entidad que ya no es moral sino emocional y que, en el caso
que nos ocupa, mis alumnos nombraron como algo que tiene que ver con la autoestima. Y
tal vez por eso yo mismo me sentí como alguien que trataba inútilmente de hablar de
mundos casi desaparecidos intentando, además, interpretarlos, no ya melancólicamente
sino, al menos, con una pizca de respeto y, sobre todo, con ganas de aprender alguna cosa.
Que me sentí como un viejo, vamos.

11.
Hay dos cosas más en la escena que me gustaría destacar. La primera tiene que ver
con la relación entre el dar la cara y la honra. En el texto que estoy citando, Ferlosio (2000,
p.48) insiste en que el honor es, como decía Calderón, patrimonio del alma, de la cara
social o co-subjetiva del alma y, sobre todo, es patrimonio del nombre, es decir, “de lo que
el sujeto es ante los demás y para ellos, o sea, una categoría irreductiblemente pública y
social”.
De ahí que sea la mentalidad liberal-capitalista y lo que se ha venido en llamar
“individualismo posesivo”, con su arrasamiento de todo atisbo de socialidad y de espacio
público, de los lugares del cara a cara, los que hayan conseguido
284|
284| jorge
jorge larrosa
larrosa

desposeer
desposeer aa la
la cara
cara de
de la
la plenitud
plenitud dede su
su condición
condición anímica,
anímica, con
con la
la concomitante
concomitante
titularidad
titularidad de
de lala persona
persona yy dede su
su nombre.
nombre. [De
[De modo
modo que]
que] la
la cara
cara pasó
pasó aa ser
ser mera
mera
apariencia,
apariencia, aa veces
veces fiel,
fiel, aa veces
veces engañosa.
engañosa. La
La persona
persona quedó
quedó reducida
reducida aa término
término
susceptible
susceptible dede recibir
recibir la
la atribución
atribución judicial
judicial de
de una
una autoría.
autoría. YY el el nombre
nombre aa
credencial
credencial utilizable
utilizable aa efectos
efectos dede identificación
identificación (Ibídem,
(Ibídem, p.49).
p.49).

Pero no es sólo el arrasamiento del espacio público como espacio de la visibilidad,


del aparecer y del comparecer, de la exposición y de la presencia, del hacer las cosas ante
los otros y en la presencia de otros, del hacerse responsable ante los otros, lo que ha
acabado con cualquier atisbo del honor (y de su correlato, la vergüenza), sino también lo
que el mismo Ferlosio llama la “perversión psicológica del honor”, es decir, su reducción a
una emoción, o a un sentimiento que ya no tiene que ver con los demás sino con uno
mismo, eso que ahora se llama autoestima y que se pone en peligro, según dicen, cuando
los demás no nos miran, o no nos quieren, como a nosotros nos gustaría que nos miraran, o
que nos quisieran, y que es, además, sin duda, lo que nos merecemos, porque parece que
hoy en día hay que quererse mucho y todos los días. Hubo una época, no diré si mejor o
peor que esta pero sí, sin duda, muy distinta y muy lejana, en la que eso de “morirse de
vergüenza” no era sólo una frase hecha, en la que “sentirse orgulloso de uno mismo” no era
sólo algo de lo que hablan los deportistas y, por extensión, los ganadores, y en la que lo que
Ferlosio (1993, p.12) llama “moral de identidad” o “moral del pedo” no se había impuesto
completamente a la “moral de perfección”, que es la única que puede tener validez en los
ámbitos educativos:
Conforme
Conforme aa lala moral
moral de
de perfección,
perfección, elel movimiento
movimiento de de la
la bondad
bondad cambia
cambia al
al sujeto
sujeto
en
en cada
cada una
una de
de sus
sus obras,
obras, le
le hace
hace ser
ser otro,
otro, nuevo,
nuevo, mejor
mejor yy diferente
diferente cada
cada vez.
vez. Ser
Ser
bueno
bueno aparejará,
aparejará, entonces,
entonces, dejar
dejar de
de parecerse
parecerse aa sí
sí mismo,
mismo, alal menos
menos un
un poquito
poquito
cada
cada día.
día. En
En consecuencia,
consecuencia, la
la el
el mero
mero seguir
seguir siendo
siendo idéntico
idéntico aa sí
sí mismo
mismo es
es ser
ser peor
peor
que
que uno
uno mismo.
mismo. YY complacerse
complacerse enen ello
ello es
es abyección.
abyección.

Además, a esa perversión psicológica del honor podríamos añadirle otro fenómeno
todavía más extraño y que podríamos llamar, tal vez, la “perversión mercantilista del
honor”, su conversión en un valor, que se expresaría, por ejemplo, en la sustitución de la
honra por la imagen. Las personas, desprovistas de honor (y de vergüenza), desprovistas,
en definitiva, de alma, se dedicarían a diseñar y gestionar su imagen (y su persona, y su
nombre) y a convertirla en un valor mercantil. De hecho, sólo después de un vaciado del
alma puede aparecer algo así como la identidad, pura mímesis superficial de estereotipos y
de modelos altamente publicitados, fantasma desencarnado de personalidades banales,
intercambiables, fortuitas y accidentales, mera imitación de imágenes, gestos y actitudes
que se compran y se venden como cualquier otra cosa.
Mientras escribo esta página aparece por televisión una bloguera de moda famosa,
con más de un millón de seguidoras adolescentes, una chica que presume, claro, de ser
“natural”, de ser “ella misma”, y de la que se dice que ha convocado una fiesta para vender
su ropa usada a la que han acudido millares de jovencitas de todo el mundo hispano. Y
cuando ve a esas jovencitas que tienen, eso sí, la autoestima muy alta, uno se pregunta si
tendrán padres, si habrán tenido alguna vez profesores, y si sus caras de plástico no son
uno de los síntomas más flagrantes del fracaso de lo que la escuela, algún día, aún tuvo, o
quiso tener, de público. Tanto en el sentido de tratar de conseguir que los niños se
interesen por otra cosa que su propio ombligo, como en el sentido de intentar que vayan
aproximándose, poco a poco, a la simple posibilidad de pertenecer, algún día, a una
sociedad de adultos.
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 285
285

12.
La segunda cosa que quería decir sobre la escena tiene que ver con el carácter
colectivo del honor (y de la vergüenza) y, concretamente, con la vergüenza ajena. En el
complejo y delicado cara a cara que muestra la escena, no sólo son los niños los que pueden
sentir vergüenza u orgullo, sino que eso, la manera como los escolares dan la cara, también
afecta a los padres y a los profesores, en tanto que ellos, de alguna manera, también ponen
la cara. Y eso es así porque el honor y la vergüenza no son sólo personales sino que afectan
a toda la colectividad, se contagian por todo el grupo. El mal comportamiento de alguien
deshonra a todo el grupo, de la misma manera que el buen comportamiento lo honra. El
viejo mandamiento de “honrarás a tu padre y a tu madre” tiene que ver con eso, con que el
comportamiento de los hijos honra o deshonra a los padres. Y, en esta escena, también
puede intuirse algo de lo que significaba, o podía significar, que el comportamiento de los
estudiantes podía honrar o deshonrar a los profesores y, por extensión, a la escuela. Es toda
la comunidad la que se siente orgullosa o avergonzada, y es aquí, me parece, donde
podemos tratar de entender esa extraña pasión anímica de la vergüenza ajena que también
está en trance de desaparecer en las sociedades masificadas e individualistas.
Por eso lo que se juega en el dar la cara, en ese delicado ritual interfacial, es,
precisamente, la cuestión esencial de la pertenencia. La docilidad con la que los niños de la
escuela que les he mostrado se someten a la ceremonia es una docilidad específicamente
humana, es decir, voluntariosa, solícita y bien dispuesta, una docilidad que, otra vez en
palabras de Ferlosio (2000, p.20 e 28),
no
no debe
debe concebirse
concebirse como
como algo
algo meramente
meramente inerte
inerte oo negativo,
negativo, como
como falta
falta de
de
resistencia
resistencia ante
ante el
el adulto,
adulto, sino
sino como
como algo
algo sumamente
sumamente activo
activo yy positivo,
positivo, como
como unun
espontáneo
espontáneo impulso
impulso de
de convergencia
convergencia con
con el
el medio
medio formado
formado porpor sus
sus prójimos.
prójimos. El
El
niño
niño muestra
muestra querer
querer corresponderse
corresponderse con
con los
los que
que le
le rodean,
rodean, bailar
bailar aa su
su compás
compás o, o,
por
por decirlo
decirlo de
de un
un modo
modo más
más comprometido,
comprometido, ser
ser uno
uno de
de ellos,
ellos, pertenecer
pertenecer aa ellos.
ellos.

O, un poco más adelante, volviendo a la educación como un proceso de integración


en una pertenencia, cuando dice que el niño
lejos
lejos de
de sentirlo
sentirlo como
como unauna limitación,
limitación, lolo que
que más
más querrá
querrá yy agradecerá,
agradecerá, en
en
principio,
principio, enen este
este mundo,
mundo, será
será que
que tal
tal pertenencia
pertenencia le
le sea
sea reconocida,
reconocida, que
que se
se diga
diga
de
de él
él ‘es
‘es de
de los
los nuestros’,
nuestros’, pues
pues nono otra
otra cosa
cosa es
es lo
lo que
que le
le confiere
confiere yy reconoce
reconoce el
el
estatuto
estatuto yy le
le confirma
confirma la
la condición
condición humana
humana de de persona.
persona.
13.
Apenas dos cosas sobre esa cuestión de la pertenencia. La primera es que todo esto
puede empezar a sonar como una apología del conformismo o, aún peor, como otra versión
más de la educación entendida como socialización, es decir, como asimilación de los
nuevos a las normas y los valores de la sociedad en que nacen o, lo que aún es peor, a una
concepción de la educación como violencia constrictiva, aunque esa violencia sea aceptada
con docilidad y entusiasmo por parte de aquellos sobre los que es ejercida. En esa lógica,
parecería que estoy lamentando los viejos tiempos en que la escuela aún podía contribuir a
eso (a esa asimilación, a esa violencia) en tanto que aún podía entenderse como parte de
una “comunidad” en el sentido que algunos clásicos de la sociología, como Ferdinad
Tönnies (2013) o Max Weber (2012), dan a esa palabra, es decir, como un grupo humano
estable y reducido en el que se mantienen relaciones densas entre sus miembros y, por
tanto, moralmente totalitario. Y es verdad que, de alguna manera, estoy dando a la escena
de la entrega de calificaciones un cierto aire “comunitarista” de ese tipo, y más cuando
estoy apelando a cosas como las relaciones cara a cara o la moral del honor, ya imposibles o
muy degradadas en lo que esos mismos sociólogos llaman “sociedad”, es decir en
asociaciones masivas de individuos anónimos y desconocidos como la que conforman las
ciudades modernas, en las cuales apenas existe el temor al reproche, y en las que la
286|
286| jorge
jorge larrosa
larrosa

constricción institucional, es decir, el temor al castigo, sustituye a la constricción moral, al


temor al reproche.
No voy a defenderme de esas objeciones anticipadas, aunque sí diré que la vida de
los niños todavía se da en ámbitos que tienen algo de comunidad, desde luego la familia,
pero también, en gran parte, la escuela, y que es en esos ámbitos donde se producen las
relaciones cara a cara y donde aún, a veces, hay que dar la cara. Pero lo que sí quiero
señalar es que la escuela es también, y fundamentalmente, un espacio público en el otro
sentido, en el sentido de que tiene que ver con el conocimiento. Seguramente es a ese al
que se refiere Ferlosio cuando dice que:
Por
Por muchas
muchas yy muy muy puestas
puestas en en razón
razón queque puedan
puedan ser ser las
las circunstancias
circunstancias externas,
externas,
sean
sean dede carácter
carácter moral
moral oo sociológico,
sociológico, seansean del
del mayor
mayor ‘bien‘bien común’
común’ oo del del mejor
mejor
‘orden
‘orden político’,
político’, etcétera,
etcétera, queque puedan
puedan recomendar
recomendar la la preferencia
preferencia por por lala enseñanza
enseñanza
pública,
pública, ninguna
ninguna llegará
llegará aa serlo
serlo dede manera
manera tan tan taxativa
taxativa ee incontestable
incontestable como como una
una
única
única circunstancia
circunstancia interna,
interna, queque eses lala que
que atañe
atañe aa la la condición
condición del del contenido;
contenido;
según
según ésta,
ésta, enen efecto,
efecto, toda
toda enseñanza
enseñanza es es ‘pública’
‘pública’ por por definición
definición (…). (…). Los
Los
contenidos
contenidos de de la la enseñanza
enseñanza son son conocimientos,
conocimientos, yy el el adjetivo
adjetivo ‘público’
‘público’ eses
perfectamente
perfectamente adecuadoadecuado para para designar
designar una una nota
nota diferencial
diferencial definitoria,
definitoria, un un
atributo
atributo analítico,
analítico, deldel concepto
concepto mismomismo de de ‘conocimiento’
‘conocimiento’ (…). (…). Los
Los contenidos
contenidos de de
la
la enseñanza
enseñanza en en cuanto
cuanto tales,
tales, los
los conocimientos
conocimientos en en sísí mismos,
mismos, no no sese prestan
prestan aa
venir
venir oo aa ser
ser llevados
llevados oo tan
tan siquiera
siquiera acercados
acercados al al alumno,
alumno, sino sino que,
que, por
por su su propia
propia
condición,
condición, exigen
exigen que que sea
sea él
él el
el que
que salga
salga aa buscarlos
buscarlos fuera,
fuera, en en la
la pura
pura intemperie
intemperie
impersonal,
impersonal, mostrenca,
mostrenca, en en la
la tierra
tierra dede nadie
nadie enen lala que,
que, porpor definición,
definición, surgen
surgen yy
están.
están. ConCon esta
esta insípida
insípida obviedad
obviedad oo perogrullada
perogrullada trato trato de de disipar
disipar cualquier
cualquier
equívoco
equívoco sobre
sobre la la circunstancia
circunstancia de de que
que loslos contenidos
contenidos de de la
la enseñanza
enseñanza no no pueden
pueden
nunca
nunca adaptarse,
adaptarse, en en cuanto
cuanto tales,
tales, aa las
las idiosincrasias
idiosincrasias oo las las condiciones
condiciones personales
personales
de
de los
los estudiantes,
estudiantes, sino sino que
que necesariamente
necesariamente han han dede ser
ser éstos
éstos los
los que
que tengan
tengan queque
adaptarse
adaptarse aa las las impersonales
impersonales condiciones
condiciones de de los
los conocimientos
conocimientos (…). (…). La La noción
noción
misma
misma de de ‘conocimiento’,
‘conocimiento’, oo al al menos
menos la la pretensión
pretensión oo aspiración
aspiración humana
humana que que
desde
desde siempre
siempre ha ha estado
estado detrás
detrás dede ese
ese concepto,
concepto, como
como una una condición
condición inapelable,
inapelable,
es
es la
la de
de que
que los
los conocimientos
conocimientos no no conocen
conocen aa nadie,
nadie, ni ni llaman
llaman por por su
su nombre
nombre de de
pila
pila aa cada
cada quisque
quisque (…). (…). AA lala propia
propia naturaleza
naturaleza de de los
los conocimientos
conocimientos pertenece
pertenece esaesa
absoluta
absoluta yy radical
radical impersonalidad,
impersonalidad, que que es,es, por
por tanto,
tanto, la la que
que sese corresponde
corresponde
estrechamente
estrechamente con con los
los fines
fines dede la
la enseñanza
enseñanza mismamisma (FERLOSIO,
(FERLOSIO, 2002a, 2002a, p.28-29).
p.28-29).

Porque la escuela no es, o era, sólo uno de los lugares de la educación (esa cuya
nodriza es la vergüenza), sino que es también, o era, fundamentalmente, el lugar de la
instrucción. Y es la instrucción, el conocimiento, el único que emancipa de las
constricciones comunitarias (y también de las constricciones sociales) justamente por su
radical exterioridad. Eso es lo que hace que Ferlosio (2002b, p.114) exclame: “¡Qué limpio
me sonaba aquello de ‘instrucción pública’! ¡Qué gorrino me suena ‘educación’, ‘formación’
o, peor todavía, ‘formación integral’!”.
Y es que una de las oposiciones que atraviesa su obra es la de “instrucción” o
“conocimiento” o “ilustración” frente a “educación” y “paideia”. Y la emancipación, la
emancipación verdaderamente humana, lo único que nos arranca no sólo de la sociedad, o
de la comunidad, sino también de nosotros mismos en tanto conformados por ellas es,
precisamente, el conocimiento, siempre que sea conocimiento y no eso que hoy se llama
“aprendizaje significativo”, es decir, pura exterioridad, pura extrañeza, pura y dura
oportunidad de que el sujeto salga de sí mismo, puro disparador de un movimiento
centrífugo que contrasta con el movimiento centrípeto de la asimilación y de la
pertenencia. Y lo interesante de la escuela es, justamente, como implica, a la vez, una
relación “educativa” o “moral” con los otros, un movimiento centrípeto de integración, y
una relación “instructiva” o “cognoscitiva” con el mundo, es decir, un movimiento
centrífugo de separación y/o emancipación. Pero eso es otro tema.
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 287
287

En otra ocasión podemos trabajar con una escena de instrucción y ver si esa escena
también constituye, o no, un espacio público, y de qué otro tipo, y si en ella se da también,
o no, y de qué otra manera, una relación cara a cara, y si en ella también hay que dar la
cara, o no, o de qué otra manera. Porque en la escena que les he mostrado hay referencias
al estudio (yo mismo he insistido en que eso de lo que los niños se hacen responsables es
de su propio estudio), pero no aparece el estudio mismo o, por decirlo en términos de
Masschelein y Simons, no hay nada encima de la mesa. Porque cuando se trata de estudio,
los niños no se miran los unos a los otros, no se dan la cara entre sí, ni ante los padres, ni
antes los profesores, ni ante la sociedad o el Estado, sino que están mirando a la pizarra, o
al libro, y es ante ese espacio impersonal en el que aparece algo así como el saber ante el
que tienen que dar la cara. Y ahí otras son las leyes, otras las responsabilidades y otras las
exigencias. Y seguramente es el mismo shopping (el mundo entendido como un shopping)
el que hace imposible tanto el cara a cara de la responsabilidad (y de la socialización) como
la instrucción del conocimiento (y de la emancipación).
Y la segunda cosa que quisiera indicar, muy brevemente, es cómo se ha hecho ya de
imposible eso de que los niños quieran “ser de los nuestros” y obtener nuestro
reconocimiento. Creo que estamos viviendo una crisis, no sólo de la herencia, sino de la
transmisibilidad misma. Y eso también es otro tema y lo dejaremos, por tanto, si se tercia,
para otra ocasión.

14.
Volviendo a nuestro asunto, a la escuela como un lugar de relaciones cara a cara,
podríamos continuar diciendo que hubo un tiempo, quizá, en que la escuela existía para
hacer de los niños adultos responsables, es decir, mayores de edad. Para ello tenía que
separar a los niños de la familia y llevarlos a un espacio público, a un espacio en el que los
niños se responsabilizaran, ante sí mismos y ante los demás, ante la sociedad de adultos
representada por los profesores, de su propio estudio, y eso, no por alguna motivación
externa, no porque les hiciera felices, sino porque era su obligación, porque ahí estaba la
condición de posibilidad de su futura pertenencia a una sociedad de adultos. Esa escuela,
además, cuidaba de realizar algunos rituales que eran altamente expresivos (llenos de
significación) y claramente performativos, es decir, que tenían efectos por el mero hecho
de su correcta realización.
Y eso, convertirse en adultos, es lo que hoy parece imposible, como parecen
imposibles rituales como el que les he mostrado. Y no porque la escuela no consiga
arrancar a los niños de la familia, o de la fábrica, sino porque no puede arrancarlos del
shopping. Y eso, tal vez, también porque sus padres ya han nacido en el shopping, porque
la familia se ha convertido en una extensión del shopping, porque la escuela se está
convirtiendo ya, también ella, en una sucursal del shopping, y porque, en definitiva, para
que triunfe el shopping es necesario que nunca se crezca y que a nadie le interese ya eso de
la mayoría de edad.
Hay una cita de José Luis Pardo (un filósofo español que también ha homenajeado,
en diversas ocasiones, a Ferlosio) en la que utiliza la figura de Pinocho (mezclada con la de
Peter Pan) para mostrar lo que ocurre cuando no hay escuela, o cuando la escuela ya no es
una frontera entre la familia y el trabajo, o entre la familia y el shopping, cuando ya no
hace que los niños salgan de casa ni tampoco los mantiene por un tiempo a salvo del
mundo de la producción y del mundo del consumo, cuando la escuela ya no es un espacio
tercero, separado, heterogéneo, público, entre la familia y la economía, cuando la escuela
no puede pensarse ya, con esas categorías viejas de la ilustración, como camino a la
emancipación, a la autorresponsabilidad y a la mayoría de edad.
288|
288| jorge
jorge larrosa
larrosa

Gepetto, decía Pardo, envía a Pinocho a la escuela porque es un buen padre, porque
no sólo acepta la responsabilidad de protegerle sino que acepta también la responsabilidad
de permitir que se emancipe, que se haga mayor de edad y que, por tanto, le abandone.
Pero,
en
en su
su camino
camino deldel hogar
hogar aa la
la escuela,
escuela, Pinocho
Pinocho sese encuentra
encuentra concon Juan
Juan sin
sin nombre
nombre
(que
(que es es elel portavoz
portavoz del del mercado
mercado capitalista
capitalista mundial),
mundial), que que le le engaña
engaña
prometiéndole
prometiéndole una una vida
vida en
en Jauja.
Jauja. El
El miedo
miedo dede Gepetto
Gepetto (y (y no
no conviene
conviene olvidar
olvidar que
que
Gepetto
Gepetto es es unun artesano,
artesano, es es decir,
decir, pertenece
pertenece aúnaún al al mundo
mundo del del trabajo
trabajo pre-
pre-
industrial)
industrial) eses conocido,
conocido, es es el
el temor
temor infinito
infinito que
que todos
todos los
los padres
padres sienten
sienten aa que
que sus
sus
hijos
hijos sean
sean raptados
raptados porpor la
la seducción
seducción deldel mercado,
mercado, secuestrados
secuestrados por por Disneyland
Disneyland yy
arrastrados
arrastrados alal País
País de
de Nunca
Nunca Jamás,
Jamás, el
el país
país donde
donde la la infancia
infancia eses perpetua
perpetua yy nunca
nunca
se
se crece.
crece. Y
Y temen
temen eso eso porque
porque saben
saben que
que Disneyland
Disneyland se se convierte
convierte rápidamente
rápidamente en en
Horrorland,
Horrorland, es es decir,
decir, en
en una
una terrible
terrible fábrica
fábrica en
en donde
donde loslos niños
niños –sin
–sin llegar
llegar al
al
estado
estado dede adultos-
adultos- se se tornan
tornan animales,
animales, eses decir,
decir, bestias
bestias dede labor.
labor. Para
Para los
los hijos
hijos de
de
las
las sociedades
sociedades modernas,
modernas, el el mercado
mercado aparece
aparece enen primer
primer lugar
lugar como
como un un paraíso
paraíso
(del
(del consumo)
consumo) yy termina
termina porpor convertirse
convertirse enen unun infierno
infierno (de
(de la la producción)
producción)
(PARDO,
(PARDO, 2010,2010, p. 190-191).
p. 190-191)

15.
En realidad, en la escena que les he mostrado ocurren muy pocas cosas, y todas ellas
extremamente banales. Está claro que no es la acción lo que interesa al cineasta (porque de
acción hay bien poca), sino mostrar la sutileza y la delicadeza de esa galería de rostros en
su comparecencia mutua y en su mutua afinación. Y lo que he querido hacer aquí, con
mejor o peor fortuna, y de la única manera que sé, poniéndole palabras, tal vez demasiadas,
no es otra cosa que poner al desnudo un puro espacio de rostros y de relaciones entre
rostros en el que se define, simultáneamente, su separación y su comunidad, su exposición
y su secreto, su firmeza y su vulnerabilidad. No he querido mostrarles nada más que la
abertura, o el vacío, de ese espacio interfacial, de ese drama del cara a cara. O, por decirlo
de otro modo, no he querido mostrarles otra cosa que un puro espaciamiento, ese que
forma o conforma el lugar de la mutua visibilidad, de la mutua presencia, de la mutua co-
pertenencia, de la mutua apertura, ese en el que es posible dar la cara y, al mismo tiempo,
recibir la cara, ese en el que aprendemos a encararnos con los otros y con nosotros mismos
y, al hacerlo, nos convertimos en humanos responsables. Porque eso también es, o era, la
escuela, antes de que este nuestro mundo se convirtiera en “el país donde nunca se crece”,
y sólo ahora que ese espacio se nos está disolviendo, no sabemos si para bien o para mal,
empezamos a hacernos cargo de su importancia.

referencias
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio. Giorgio. El El rostro.
rostro. In:
In: ______.
______. Medios
Medios sinsin fin.
fin. Notas
Notas sobre
sobre lala política.
política. Valencia:
Valencia: Pre-
Pre-
textos,
textos, 2001.
2001.
ALTUNA,
ALTUNA, Belén. Belén. Una
Una historia
historia moral
moral del
del rostro.
rostro. Valencia:
Valencia: Pre-textos,
Pre-textos, 2010.
2010.
ARENDT,
ARENDT, Hannah.Hannah. La La crisis
crisis en
en lala cultura.
cultura. SuSu significado
significado político
político yy social.
social. In:
In: ______.
______. Entre
Entre el
el
pasado
pasado yy el
el futuro.
futuro. Ocho
Ocho ejercicios
ejercicios sobre
sobre la
la reflexión
reflexión política.
política. Barcelona:
Barcelona: Península
Península 1996a.
1996a.
______.
______. La
La crisis
crisis en
en la
la educación.
educación. In: In: ______.
______. Entre
Entre elel pasado
pasado yy el
el futuro.
futuro. Ocho
Ocho ejercicios
ejercicios sobre
sobre la
la reflexión
reflexión
política.
política. Barcelona:
Barcelona: Península,
Península, 1996b.
1996b.
CAMUS,
CAMUS, Albert.Albert. La La misión
misión del del escritor.
escritor. In:In: ______.
______. Visionarios
Visionarios Implacables.
Implacables. Buenos
Buenos Aires:
Aires:
Mutantia,
Mutantia, 2003.
2003.
COROMINAS,
COROMINAS, Joan. Joan. Diccionario
Diccionario crítico
crítico etimológico
etimológico castellano
castellano ee hispánico.
hispánico. Madrid:
Madrid: Gredos,
Gredos, 1984.
1984.
DELGADO,
DELGADO, Manuel. Manuel. La La humillación.
humillación. Técnicas
Técnicas yy discursos
discursos de
de la
la exclusión
exclusión social.
social. Barcelona:
Barcelona: Bellaterra,
Bellaterra,
2009.
2009.
EKMAN,
EKMAN, Paul. Paul. Emotions
Emotions in in the
the human
human face.
face. Cambridge:
Cambridge: Cambridge
Cambridge University
University Press,
Press, 1982.
1982.
______.
______. ¿Qué
¿Qué dice
dice ese
ese gesto?.
gesto?. Barcelona:
Barcelona: RBA RBA editores,
editores, 2004.
2004.
dar
dar la
la cara.
cara. notas
notas sobre
sobre la
la escuela
escuela como
como espacio
espacio público.|
público.| 289
289

FERLOSIO,
FERLOSIO, Rafael Rafael S.S. Pedagogos
Pedagogos pasan,pasan, alal infierno
infierno vamos.
vamos. In:In: ______.
______. La La hija
hija de
de la
la guerra
guerra yy la
la madre
madre
de
de la
la patria.
patria. Barcelona:
Barcelona: Destino,
Destino, 2002a.
2002a.
______.
______. ¡Fuera
¡Fuera papás!.
papás!. In:
In: ______.
______. LaLa hija
hija de
de la
la guerra
guerra yy la
la madre
madre dede la
la patria.
patria. Barcelona:
Barcelona: Destino,
Destino, 2002b.
2002b.
______.
______. El
El alma
alma yy lala vergüenza.
vergüenza. In: In: FERLOSIO,
FERLOSIO, Rafael Rafael S.S. El
El alma
alma yy la
la vergüenza.
vergüenza. Barcelona:
Barcelona: Destino,
Destino,
2000.
2000.
______.
______. Moral
Moral de de perfección
perfección yy moral
moral dede identidad.
identidad. In: In: FERLOSIO,
FERLOSIO, Rafael Rafael S. S. Vendrán
Vendrán másmás años
años malos
malos
yy nos
nos harán
harán más
más ciegos.
ciegos. Barcelona:
Barcelona: Destino,
Destino, 1993.
1993.
ILLICH,
ILLICH, Iván.Iván. La
La culture
culture dede la
la conspiration.
conspiration. In: In: La
La perte
perte des
des sens.
sens. Paris:
Paris: Fayard,
Fayard, 2004,
2004, p.340-350.
p.340-350.
ILLOUZ,
ILLOUZ, Eva. Eva. El
El futuro
futuro del
del alma.
alma. Madrid:
Madrid: Katz,
Katz, 2014.
2014.
LARROSA,
LARROSA, Jorge. Jorge. Herodes,
Herodes, el el Ogro…
Ogro… yy la la carabina
carabina de de Miss
Miss Cooper.
Cooper. La La educación
educación escolar
escolar como
como
refugio
refugio (para
(para la
la infancia
infancia yy para
para elel mundo).
mundo). In: In: VII
VII Colóquio
Colóquio Internacional
Internacional de de Filosofia
Filosofia da da
Educação:
Educação: O O que
que pode
pode aa escola
escola hoje
hoje emem nossa
nossa América?,
América?, n.7, n.7, 2014.
2014. Rio
Rio de
de Janeiro.
Janeiro. Anais...
Anais...
Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: NEFI,
NEFI, 2014,
2014, p.1-32.
p.1-32. Disponible
Disponible en:
en:
http://www.filoeduc.org/trabalhos_2014/TR1094.pdf.
http://www.filoeduc.org/trabalhos_2014/TR1094.pdf. Consultado Consultado en: en: 14/05/2015.
14/05/2015.
LARROSA,
LARROSA, Jorge. Jorge. Pedagogía
Pedagogía yy fariseísmo.
fariseísmo. SobreSobre la la elevación
elevación yy el el rebajamiento
rebajamiento en en Gombrowicz.
Gombrowicz.
In:
In: DELGADO,
DELGADO, Manuel. Manuel. La La humillación.
humillación. Técnicas
Técnicas yy discursos
discursos dede lala exclusión
exclusión social.
social. Barcelona:
Barcelona:
Bellaterra,
Bellaterra, 2009,
2009, p.37-54.
p.37-54.
MASSCHELEIN,
MASSCHELEIN, Jan; Jan; MAARTEN,
MAARTEN, Simons. Simons. Defensa
Defensa de de la
la escuela.
escuela. UnaUna cuestión
cuestión pública.
pública. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Miño
Miño yy Dávila,
Dávila, 2014.
2014.
NANCY,
NANCY, Jean Jean Luc.
Luc. La
La création
création du du monde
monde ou ou la
la mondialisation.
mondialisation. Paris:
Paris: Galilée,
Galilée, 2002.
2002.
NANCY,
NANCY, Jean-Luc;
Jean-Luc; BAILLY,
BAILLY, Jean-Chistophe.
Jean-Chistophe. La La comparecencia.
comparecencia. Madrid:
Madrid: Avarigni,
Avarigni, 2014.
2014.
PENNAC,
PENNAC, Daniel. Daniel. Mal
Mal dede escuela.
escuela. Barcelona:
Barcelona: Debolsillo,
Debolsillo, 2008.
2008.
PARDO,
PARDO, José José Luis.
Luis. Carta
Carta abierta
abierta aa Richard
Richard Sennet
Sennet aa propósito
propósito de de ‘La
‘La corrosión
corrosión deldel carácter’.
carácter’. In:
In:
______.
______. Nunca
Nunca fue
fue tan
tan hermosa
hermosa la la basura.
basura. Madrid:
Madrid: Galaxia
Galaxia Gutenberg,
Gutenberg, 2010. 2010.
SIMMEL,
SIMMEL, George.George. Sociología
Sociología II.
II. Barcelona:
Barcelona: Ed. Ed. 62,
62, 1988.
1988.
SLOTERDIJK,
SLOTERDIJK, Peter. Peter. Entre
Entre rostros.
rostros. Sobre
Sobre la la emergencia
emergencia de de lala esfera
esfera íntima
íntima inter-facial.
inter-facial. In:
In: ______.
______.
Esferas
Esferas I.I. Madrid:
Madrid: Siruela,
Siruela, 2003.
2003.
TÖNNIES,
TÖNNIES, Ferdinand.
Ferdinand. Comunidad
Comunidad yy asociación.
asociación. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Biblioteca
Biblioteca Nueva,
Nueva, 2013.
2013.
WEBER,
WEBER, Max. Max. Conceptos
Conceptos fundamentales
fundamentales de de lala sociología.
sociología. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 20122012
290
290
291
291

the language of the school. alienating or emancipating?

jan masschelein11
maarten simons22

1. in defense of our defense

I t might have sound either outdated or arrogant, conservative and to some even
aggressively neo-colonial to try to defend the school as we stated in the title of
the little book that was published in Portuguese as Em defesa da escola. Uma
questão pública in 2014. Indeed, in many different places all over the world (including the
Brazilian or more broadly the South- American context) the school has been accused of
being a normalizing, colonizing and alienating machinery that is more or less violently
imposing, establishing or reproducing a certain social order (often that of the nation state)
whereby, for sure, language plays a central role. In fact the language of the school is an
issue we didn’t really address in our defense, but we intend to make a very preliminary,
unprotected and hence undoubtedly very debatable attempt to deal with it in this
contribution. However, we want to recall explicitly that we didn’t intend to defend the
school as an institution of the state. We wanted and still want to take the school out of the
hands of those who confuse school with all kinds of manipulative and institutionalizing
mechanisms. We do not ignore or trivialize these mechanisms — not at all — but we think
it is more just to talk educationally and appreciatively about the school first. Our ambition
was to articulate school experiences, not the institutionalized experiences that are often
mobilized to attack the school (see also SIMONS; MASSCHELEIN, 2016). But to be clear
from the outset, we want to stress that the school, just like democracy, is an invention
(equally emerging in ancient Greece and maybe even more radical than the invention of
democracy itself) and as such has nothing to do with the kind of natural or informal
learning that is often (implicitly or explicitly) cherished by those who oppose
institutionalized (or ‘artificial’) forms of learning.
In fact, we assumed that our explicit review of the charges leveled at the school and
the extensive attention we gave to all kinds of taming of the school would have reassured
the reader of the book that we are very aware of most of the critiques (including the one’s
by radical de-schoolers such as Ivan Illich) that have often rightly been directed at the
school. We hoped that this would help the reader, at least for a moment, to suppress the
strong (very common, and in fact rather uncritical) inclination to immediately reenact all
those well-known and easily recognizable frustrations regarding school (that it is boring,
disciplining, formal, ‘dead’, not related to the lifeworld, excluding, etc.). We invited the
reader to accompany us in our effort to explore what makes a school into a school from an
educational point of view. This is not a sociological point of view in terms of functions, not a
philosophical one in terms of ideas or purposes, not a psychological one in terms of
development, not an ethical one in terms of values, norms, or interpersonal relations, and
not a political one in terms of struggle or interests. It is an educational one in terms of the
effective and real operations performed by a particular arrangement of people, time, space,
and matter.

11KU
KU Leuven.
Leuven. Email:
Email: jan.masschelein@kuleuven.be
jan.masschelein@kuleuven.be
22 KU
KU Leuven.
Leuven. Email:
Email: maarten.simons@kuleuven.be
maarten.simons@kuleuven.be
292|
292| jan
jan masschelein;
masschelein; maarten
maarten simons
simons

2. summarizing the school


Let us briefly summarize these operations since we will have to keep them in mind
when dealing with the issue of the school language: (1) the operation to consider everyone
as ‘student’ or ‘pupil’ i.e., suspending, not destroying, the ties of family and state or any
‘closed’ or defined community; (2) the operation of suspension i.e. putting temporarily out
of effect the habitual order and use of things; (3) the operation of making ‘free time’ i.e.
materialization or spatialization of what the Greeks called ‘scholè’: the time for study and
exercise; (4) the operation of making (knowledge, practices) public and putting (them) on
the table (what could also be called a profanation); (5) the operation of making ‘attentive’
or forming attention relying on a double ‘love’, both for the world and the new generation,
and on disciplining practices to make attention and renewal possible. The school (as
pedagogic form) refers, than, to an association of people and things arranged as a way to
deal with, pay attention to, take care of something – to get and be in its company - in
which this care entails structurally an exposition. The school in this sense, i.e. as a
pedagogic form, is neither oriented towards and tamed by a political utopia nor by a
normative ideal of a person, but is in itself the materialization of a utopian belief: everybody
can learn everything. This belief is, in our view, not a kind of goal or aim (projected in the
future), but the point of departure. There are clearly other points of departure possible
when it comes to learning (e.g. some should a priori be excluded from certain subjects,
natural ability is a decisive criterion to decide on when and what to learn). The school, for
us, is the making possible of the ‘everybody can’ on the one hand, and the ‘everything’ on
the other hand. In other words, instead of thinking about how an utopian school or an
utopian educational system would look like (as is often the case), we suggest to look at the
school itself, and by what it does through its pedagogical form, as the materialization of
the utopian idea that everybody can learn everything. What it does is the double movement
of bringing someone into a position of being able (and hence, turning someone into a pupil
or student) which is at the same time an exposure to something outside (and hence, an act
of presenting and exposing the world).
Furthermore, as we stated already above, we are aware of how, from its very origin
up to today, the ‘school’ as pedagogic form has been subject to all kinds of tactics and
strategies, more or less effective, to neutralize, to recuperate, instrumentalize or tame it,
meaning that what is called school is often not scholastic at all. And how today, partly
related to developments in ICT (e.g. e-learning), the school is even said to soon disappear.
And of course, our defense of the school didn’t ignore the devastating and profound
critiques of the school as being something like a prison, as a subjugating, oppressing,
colonizing, banking machinery or as an outdated technology of power. However, we
didn’t want to maintain that the school as we know it today as an institution or
organization is scholastic in the sense that we tried to elaborate. But we did, and we still
do believe that it is worthwhile to try to unearth the radical and revolutionary operations
of the school as very particular pedagogic arrangement and practice of making things public
and of gathering people and world which emerged in Greece.
We claim indeed, that just as the Greeks invented a particular way to deal with
living together that is called democracy (which has provoked, of course, strong questions
and debates regarding its ‘essence’, its ‘desirability’, its ‘effectiveness’ etc. ever since), they
also invented a particular way to deal with the common world in relation to the new
generations. This is not socialization or initiation, but precisely school education, that is,
taking the new generation out of (any) family and getting them to school. School as first
and foremost, a particular arrangement of time, space, and matter where young people are
brought into the company of (something of) the world in a specific way. We have tried to
explore what this educational invention is about, not to idealize the past (it is not about
the
the language
language of
of the
the school.
school. alienating
alienating or
or emancipating?|
emancipating?| 293
293

romanticizing school), or worse, to return to the past (restoring the traditional school).
The reason we took this approach is that we think that it is still worthwhile to deal with
the future of our world and of the coming generations in this pedagogical way that we can
call school. Although, just as with democracy, it remains an issue to be discussed and to be
concerned about (i.e. a public issue). Much about the history of and accusations leveled
against the school seems to be repeating what we all seem inclined to think about the
school. Perhaps this criticism is nothing more than a kind of intellectual continuation or
even cultivation of the feeling that people don’t like to go to school — as if we want to
forget about the school, and as if we are not pleased to be reminded that who and what we
have become maybe somehow depended on the school. Of course, there is this typical
appreciation of teachers, but at the same time there is the pervasive contempt toward
nearly everyone who is involved with education.
There are many versions of this looking down on education, ranging from the
often-repeated claim that teaching is not a real job, to educational research being not true
research, to educational theory and philosophy being marginal. According to us, this
contempt actually expresses how society deals with what is immature, with minors, and
that one always assumes and protects the idea that being involved in serious matters
requires a kind of maturity or being grown-up. Isn’t there always a deep fear motivating
this type of looking down? It results from recognizing that the coming generation actually
becomes a new generation, and is directly or indirectly questioning what grown-ups value
and take for granted. In In defense of the school, we took the risk of using the notion of
school for the always artificial space–time configuration that makes this radical
educational experience possible, instead of using the notion for what makes this
experience impossible. Actually, we think it is our duty as educational theorists to take the
notion of school out of the hands of those using it only to express political, economic, and
ethical frustrations or expectations (i.e. to instrumentalize it in relation to political or
ethical ideals or projects). If the school does not meet someone’s expectations, isn’t it also
because young people (sometimes) do not meet expectations, and hence they do not fit or
want to fit the image we have in mind for them. If that is the case, all this is about a fear
for school, as far as school refers to the time and space that starts from the assumption
that human beings have no (natural, or social, cultural, etc.) destiny, and therefore should
have the opportunity to find their own destiny. We want to reserve the notion of school
for that simple but far-reaching assumption. And de-schooling, for us, refers to the
opposite assumption that society has to impose a destiny on young people through
developing their so-called natural talents, through projecting a predefined image of the
educated person, of the true citizen, the life-long learner, and so on.

3. exercises in familiarizing
It has been suggested that we are looking to the past in an idealized way, with our
backs to the future, and without noticing crucial historical developments, current
challenges, and other helpful conceptualizations. We are not sure. We experience
ourselves living in the present and trying to open up another future by intervening in the
current conceptualizations of the school, including in the historical narratives (of
increased normalization, etatization , governmentalisation, educationalization, etc.) that
are part of our conceptualizations. In that sense, our book is perhaps a counter narrative.
Or to continue in a Foucauldian idiom: the book does not envision a critical but a creative
ontology of the present, and history is not used to “de-familiarize” by warning how school
education is in fact oppressive due to political, economic, or other powers, but to
“familiarize” by remembering what school makes possible and by reminding we have been
young too.
294|
294| jan
jan masschelein;
masschelein; maarten
maarten simons
simons

In order to further clarify what we were and are attempting to do and what we are
defending and find very worthy of defense – and which is indeed neither ‘teaching’ or
‘learning’ but ‘school’ – we want to take this opportunity to address in a “familiarizing”
way the really difficult and challenging issue of the language of the school. An issue
which has come up strongly in discussions we had about our book in Brazil during the last
two years, but is now also very much debated in our own country related to the issues of
migration (including the arrival of refugees) and (national) identity. It is an issue which is
emphatically and maybe also paradigmatically present in Brussels which is not only the
capital of Belgium (with its three official languages) and ‘Europe’ (‘recognizing’ all
‘national’ languages of its member states) but also otherwise an extremely
multicultural/multi-lingual urban environment (more than 110 languages are spoken). The
issue of the school language is, of course, also one which has received already plenty of
attention by theorists and critics dealing with ‘school’ in relation to societal issues such as
(neo-)colonialism, justice, equality. Some of the analyses are famous and influential. The
sociolinguistic one of Basil Bernstein (1971) making a distinction between the use of a
restricted and an elaborated code and suggesting a clear relation to social class. An analysis
which Pierre Bourdieu and Jean-Claude Passeron (1970) sustained albeit within another
theoretical framework. Ivan Illich’ sharp attack of the way in which various political
authorities imposed one ‘national’ language thereby devaluating vernacular languages
(1981/2009). And of course, Paulo Freire’s critique of the way in which the ‘words’
(language) of the dominant social group (the oppressors) not only alienate the oppressed
from their experiences but also operates as a mechanism to install and reproduce the
existing unjust social order (1968/1970).
While recognizing the importance and value of these analyses, and we will come
back to some of them, in our contribution we will try to offer some reflections from a
different perspective. We should also state from the beginning that we have no definite
and clear cut answer, we will, therefore, not make a systematic argument, but we want to
offer some reflections in the form of suggestions, hypotheses and possible consequences.
These reflections do not intend to settle the issue of the language at school, but to open up
(just start!) another approach to this issue, which we call a strictly pedagogical one lining
up with what we indicated earlier: thinking about language starting from (the requests) of
the school (and not from the individual, the family, society) as an arrangement to offer
‘minors’ (and perhaps also minorities) at once the opportunity to find or define their own
destination (i.e. to become pupils or students) and to question directly or indirectly what
‘adults’ value and present to them. This could maybe help to think about this issue in a
perspective that is not immediately occupied by political, sociological or psychological
considerations, which does not at all entail that these are not important.
To move beyond these considerations and to address the issue of school language
from a pedagogical perspective is the real challenge we have to face. It seems as if it is
impossible to discuss the language of the school without immediately finding oneself in de
middle of, for instance, a political discussion, if not to be blamed for always already taking
a political stance. We do not want to disregard the politics in language issues involved, but
by introducing a pedagogical perspective on the language of school we hope it becomes
possible to look at the politics of school language from another angle. The pedagogical
hypothesis we will elaborate can be formulated as follows: the language of the school is
always an artificial language for it has to address on the one hand the coming generation
as a new generation and on the other hand attempts to turn ‘objects’ (something of the
world) into subject matter. School education ‘requires’ so to speak a particular language
for pedagogical reasons. The result is that only at school, and while being exposed to the
artificial school language, something like a mother tongue (the language spoken at home
the
the language
language of
of the
the school.
school. alienating
alienating or
or emancipating?|
emancipating?| 295
295

or in a local community) and father tongue (the official, institutionalized and/or state
language), as well as their (potential conflictual) relation, becomes an issue. Probably
these ‘tongues’ precede the language of the school, but it is schooling that turns their
relation into an issue. For that reason, our reflections will try to take into account some
observations and remarks that have been made concerning the ‘mother’ and ‘father
tongue’33. However, we will try to indicate why and in what sense we could say that the
language of the school is actually the ‘children’s and the poets tongue’ and why this is
actually implying a radical crisis or interruption of the (oedipal) logic of any family
(including the ‘national’, the ‘native’ and the ‘scientific’ one).

4. the language of school: a love affair


Maybe first it is important to clarify in more detail what we have in mind when
we refer to the language of the school. It can mean at least two things. First, what is often
called the language of instruction or communication, and thus the common language in or
through which students learn. Second, there is the language or often, the languages, that
students learn (to speak, write, …) at school or that students learn about or study during
school time. Our focus is mostly on the first meaning, that is, the language that is part of
pedagogic practices in schools, and that is spoken by teachers and (at least assumed to be)
understood by students. As announced earlier, we will formulate the hypothesis that this
language is always artificial, it is not a ‘natural’ language (no vernacular and no native
one), nor a kind of ‘sacred’ language that is conserved or protected by a political or another
authority. With a language being artificial we mean that it is always somehow ‘made’. To
state it quite bluntly: nobody actually speaks ‘school language’ at home or at work (except
for schoolteachers). When leaving the family and entering the school, students are often
confronted with a language that differs from what they were used to speak. The language
spoken at home can be a complete other language, or a kind of dialect. At this point, we
will make a strong claim: the difference between dialects and actually different languages
is not the major issue here, what is important is that the language of school is always
different from the one spoken so to say ‘before’ school. But the language spoken at school
is also different from the language (or languages) spoken ‘after’ school. These can be
dialects, but also the institutionalized and protected or ‘officialized’ languages of a
community or country. Of course, the school language has connections with these other
languages, but it is always a transformed, modified language.
Taking into account the typical features of the school as pedagogic form, and
considering school language as being part of a pedagogical school arrangement, there are at
least two reasons for school language being artificial, or more precisely: two pedagogic
operations that make a school language.
The first one is that the school is the place where subject matter leaves a mark on
language. Take the example of the teacher of physics, history or mathematics. A specific
language – in the extreme case a highly formalized or a symbolic one - is needed in order
for the world (of physics, history and mathematics) to become an object of study. It is not
just that certain words are not (yet) part of the vocabulary used in the family or local
community. It is not only that school language is more formal. All that is probably the
case. The main issue is also not just the difference between the restricted and the

33 These
These notions
notions cancan be
be taken
taken in
in different
different ways,
ways, we we take
take them
them here
here to
to refer
refer to
to the
the language
language (possibly
(possibly
languages
languages inin the
the plural)
plural) spoken
spoken atat home,
home, the
the mother
mother tongue,
tongue, and
and the
the official
official language
language (possibly
(possibly equally
equally in
in
the
the plural),
plural), the
the father
father tongue.
tongue. This
This useuse of
of the
the terms
terms is is different
different from
from e.g.
e.g. Thoreau
Thoreau forfor whom
whom thethe father
father
tongue
tongue is
is referring
referring to
to the
the written
written (literary)
(literary) tongue
tongue (see
(see STANDISH,
STANDISH, 2006) 2006) or
or e.g.
e.g. Illich
Illich who
who isis not
not using
using the
the
notion
notion of
of father
father tongue,
tongue, but
but makes
makes aa difference
difference between
between thethe vernacular
vernacular and
and the
the mother
mother tongue
tongue (ILLICH,
(ILLICH,
1981/2009).
1981/2009). The
The mother
mother tongue
tongue being
being the
the artificial
artificial language
language imposed
imposed byby the
the state
state as
as the
the official
official one.
one.
296|
296| jan
jan masschelein;
masschelein; maarten
maarten simons
simons

elaborated code hiding class differences as mentioned by Bernstein. What we want to


stress is that the language of school is always partly marked by or even co-constructed by
subject matter. And for that reason it is always a language that is somehow ‘emptied’
‘emptied’ or
‘cleaned’ from all sorts of (cultural, social, political …) impositions or appropriations,
exactly because it is used to present the world to students, it wants to name the world
without already acting upon it. There is, of course, no such thing as a complete neutral
language, but language at school – at least at the moment when it contributes to ‘making’
school – is successful in naming the world (and bringing something to the foreground)
without all kinds of impositions and claims to have the upper hand. In that sense, one
could say that it is always a strongly ‘functionalized’ language; it has no specific or single
single
function, but can have any function (it has something of a pure function).
The second reason for the artificial character of the language of schools is that in
schools – at least in sense we use the term school – the coming generation is being spoken
to, invited to leave one’s lifeworld. It is about exposing and gathering young people
around a (subject) matter of concern. In other words, it is a language that should have the
force to gather and expose in such a way that young young people
people are
are placed
placed inin the
the ‘(ex-
‘(ex-
)position’ where they become students, and thus, are able to start giving meaning
themselves to the world and are able to ‘shape’ themselves through practice and study,
through skills and knowledge. As such, this language is inviting to speak, and hence
always also a language that can reach out, that can be stretched, that can be changed
without too much consequences. In a certain sense, it is a kind of poetic
poetic language:
language: it
it can
can
address everyone, and while inviting and showing it does not really impose expectations.
School language here is a language that allows the coming generation actually to become a
new generation, and hence, a language that is not not claimed
claimed by
by teachers
teachers (or
(or others)
others) but
but aa
language of words that can be given (away).
Combining both aspects, and drawing on Arendt’s ideas, the language of school is a
(strange) kind of love language that enacts the combined love for the world and the love
for the new generation. It is a language of naming (without closing off), of inviting
(without interpellation), of making something (subject matter) speak (without silencing
students), of giving words (without imposing closed definitions or ask for return), of
hyper-functionality (exactly because removing specific functions). Probably this also
explains that school language is sometimes close to the language of ‘poets’ on the one hand
(language to name, invite, inspire, making speak)44 and the language of science or to
academic language on the other hand (strongly functional and abstracting language), for
both being languages which are also strongly worked at or made (and nobody’s native
language). But these are at the same time very different from school language. It is not
just about reaching out to the world, but always also to the coming generation. Hence,
probably the often heard remark (as a complaint) of the teacher being too ‘artificial and

44 As
As parenthesis,
parenthesis, itit is
is interesting
interesting to
to note
note that
that the
the sophists,
sophists, to
to which
which we
we owe
owe the
the first
first articulation
articulation of
of the
the belief
belief
that
that human
human beings
beings have
have toto find
find their
their own
own destiny
destiny and
and inin that
that sense
sense are
are related
related to
to the
the emergence
emergence of of ‘school’,
‘school’,
are
are said
said to
to have
have continued
continued the the tradition
tradition ofof the
the great
great Greek
Greek poets.
poets. Who
Who werewere not
not in
in the
the service
service ofof Apollo,
Apollo, the
the
god
god of
of wisdom,
wisdom, butbut received
received their
their tongue
tongue from
from Mnenosyne,
Mnenosyne, the the goddess
goddess of of memory,
memory, and and her
her daughters,
daughters, thethe
Muses
Muses whowho inin the
the first
first place
place tell
tell and
and re-call
re-call ‘stories’,
‘stories’, communicate
communicate their their enthusiasm
enthusiasm and and inspire
inspire –– and
and not
not
impose
impose -- ‘meaning’
‘meaning’ and and inin this
this sense
sense can
can contribute
contribute to to ‘form’
‘form’ people
people or or to
to allow
allow them
them to to form
form themselves.
themselves.
This
This formation
formation implies
implies crucially
crucially memory
memory and and presentation.
presentation. It It is
is telling
telling that
that in
in order
order for
for the
the oral
oral storytellers
storytellers
to
to memorize
memorize the the content
content thethe poems
poems contained
contained muchmuch repetition
repetition andand used
used formulaic
formulaic epithets
epithets toto maintain
maintain the
the
hexameter
hexameter structure.
structure. They
They were,
were, wewe could
could say,
say, grammatized.
grammatized. And And we we can
can recall
recall that
that the
the Illiad
Illiad and
and Odyssey
Odyssey
are
are handed
handed down
down to to us
us in
in the
the Epic
Epic Greek
Greek dialect
dialect which
which is is aa purely
purely literary
literary dialect,
dialect, combining
combining vocabulary
vocabulary andand
even
even grammatical
grammatical formsforms from
from several
several Greek
Greek dialects.
dialects. NoNo oneone ever
ever spoke
spoke Epic
Epic as
as their
their native
native tongue.
tongue. From
From
which
which wewe can
can retain
retain indeed
indeed that
that school
school language
language is is in
in some
some wayway the
the language
language of of ‘poets’
‘poets’ which
which is is itself
itself never
never
‘native’
‘native’ and
and always
always crucially
crucially artificial
artificial (or
(or even
even fictional
fictional i.e.
i.e. ‘made’).
‘made’).
the
the language
language of
of the
the school.
school. alienating
alienating or
or emancipating?|
emancipating?| 297
297

affecting’ or too ‘academic’ in her speaking. But this also might explain why school
language is at once nevertheless also a rather familiar language, that is, reaching out to
family life and the life world of students. But again, it is not ‘their’ language, and when
school language would become their language it would be difficult to reach out for the
world (beyond their life world). It would be difficult to make them exposed and give the
world a chance (to object, touch, …). One could say that language within the school
arrangement – and when it actually works as a school arrangement - is a (pure) means of
communication, or perhaps more precisely, a means of commoning.
It should be clear that in our view, the question about the language of school is
actually concerning the obvious question about how generations can communicate.
However, it is important to be more precise at this point. The issue of generations, in our
pedagogical view, does not refer to a matter of age or time implying the assumption that
generations are given and evolve (as a kind of law of nature). Generations are always
made, and themselves come into being as the result of putting something on the table and
setting it free. They are not pre-existing this school act, which makes a new generation
possible, and this act implies that school language is artificial, and actually never owned
but opened for free use. If this is indeed the case, we should avoid to turn the issue of
school language too quickly into a political issue of minority and majority languages or
official languages and those that are not officially recognized or protected. The language at
school – and again, we have to emphasize: if it works as a school language – can never just
be a majority (nor a minority) language. Clearly, school language is often the language of
the majority, or most close to their language, but it is not their language (anymore).

5. exploring the consequences of a hypothesis


The previous, short sketches should be sufficient to – hopefully – formulate our
hypothesis: the language of school is always an artificial (purified, functionalized…)
language that allows the coming generation to name the world and while doing that
turning themselves into a new generation. But we also hope the hypothesis has some
credibility in the sense of being prepared to think
think further
further along
along these
these lines
lines and
and explore
explore its
consequences. But it is a real hypothesis for us meaning that we are not (yet) sure whether
these consequences can support the hypothesis or undermine it completely.
One consequence – and in a way it is quite radical one - would be that school
language is not just an artificial language but that at the same time it is quite arbitrary and
partly contingent what language is spoken at school. It is arbitrary on the condition that
the links (and the expectations related to these links) with its mother or father tongue are
suspended. To reformulate this: school language always comes from somewhere (and
indeed, probably often through imposition or other overt or less overt power plays), but its
genealogy (and family obligations – towards the mother/home or father/nation) should
be suspended in order to offer the coming generation school education. School language is
somehow an arbitrary choice, but a choice that imposes specific pedagogic responsibilities
that we explore in the next consequences. There is one additional element here: indeed
since school is about the possibility to relate to that what isis defining one’s life (i.e. about
emancipating) and not just being immerged or enclosed in it, school should always at least
include the profanation of the mother tongue (or the language of the family). Which
would mean for instance that for an Arabic family living in Brussels Arabic should be
present at school, but as a subject matter (and thus grammatized) in the way we indicated
before.
The second consequence is that since the language of schoolschool is
is a language
language that is
not (yet) really spoken by students (in varying degrees), it is the school’s responsibility –
out of love for the coming generation - to teach or learn them speak the language of
298|
298| jan
jan masschelein;
masschelein; maarten
maarten simons
simons

school. To put it bluntly: this is in fact a didactical issue, and one should be careful not to
turn it too quickly into a cultural, social and political one. By having (or ‘deciding’ on) a
particular school language, students are immediately placed in a different start or
beginning position, and the school has to compensate or remediate for that. Again, we
suggest to look at this not immediately in terms of acts of cultural imposition or a matter
of deficit reasoning and imposed ‘treatment’. This (critical) framing only makes sense if
school language is approached in terms of minority or majority, family or official
language. As clarified earlier, we frame it as an intergenerational and artificial thing, and
hence, the issue is probably foremost a ‘didactic’ one (how to compensate for the
difference in beginning situation?).
The third consequence is, probably, that in school education the father or mother
tongue is at once transformed into a subject matter. And in that sense it also becomes a
tongue that starts to stutter, to hesitate, to fall apart, becomes analyzed, is turned around,
recomposed, recreated – the tongue of a student/child. Again, we have to be more precise
at this point. The existence of the artificial school language, and while being confronted
with it, makes something appear as a mother tongue or a father tongue (similar to the idea
that the existence of school turns society into a matter of concern). Perhaps this is first
responsibility towards the coming generation: to grammatize the father or mother tongue,
and allow that language becomes an object to study, that is something to relate to (instead
of completely being absorbed or immersed in it).
This implies, first, that language should be ‘available’ or ‘given’ in some way, it has
to be (re)presented or it should be possible to have it at hand so to say (to take it up, and
take it up again and repeat it). Therefore, language has to be grammatized first in the
sense that it should be ‘written’ (taken in a broad sense). It means that we can have no
school without writing. Writing makes it possible that we can return to what is said, what
is known, can archive it, pass it on, analyze it as an ‘object’, start with it again, etc.
Second, the grammatization is referring also to the grammar not just in a strict sense, but
more broadly to the externalisation and materialisation of what usually remains enclosed
(the basic elements, principles, rules, definitions, …). ‘Naturally’ you will not encounter
language turned into the letters to be found in the alphabet and the letter box. Without
this grammatization of the ‘natural’ we deprive children to relate to the world and to that
what defines them to a large extent (i.e. precisely the language). Therefore there is indeed
a difference between ‘learning by doing’ and ‘scholastic learning’. Even if indeed
grammars are often boring and in terms of immediate use often very useless, it is the
knowledge of the grammars (in the broad sense) that allows us to not be just absorbed in
and by the language, but to be engaged and at distance, to escape from being imprisoned or
locked up in one’s lifeworld. We can also reformulate this as follows: if a school states
that Portuguese or Dutch is the school language, it should acknowledge not just that it is
‘school Portuguese’ or ‘school Dutch’ (as a mother or father tongue), but at once allow the
students to relate to their mother or father tongue.
The fourth consequence is that school has to offer always more than one language
to be learned and studied as subject matter. This is actually a strong way (the only way?)
to contribute to the profanation of communication, that is, allowing for the experience of
the ability/potentiality to communicate and the ability/potentiality to translate. More
language refrain from turning the school language in a tool for baptizing the new
generation. Here we have to keep in mind that these languages also become an object of
‘study’ (not just practice). Or put differently: at school at least two languages should be
grammatized in order to allow for the crucial experience of ‘translatability’, the experience
of being-in-the middle or, as Michel Serres states in the fold of the dictionary. In the
Troubadour of knowledge Serres (1997) expresses his deep gratitude for having been forced,
the
the language
language of
of the
the school.
school. alienating
alienating or
or emancipating?|
emancipating?| 299
299

being left-handed, to learn at school to write right-handed. He became a “thwarted left-


hander” or better a joyful “completed half” (“completed body”) who made the experience
of ‘handiness’ as such and calls it, contrary to what ‘we’ today would expect, the most
revolutionary event in his life. From which we can retain that school has to do with a
force that draws us away from our ‘natural direction’, forces us to cross the river and leave
our nest. It sets in motion a mutation (including a suffering, but also a joy) without
which, according to Serres, no real learning takes place. Recounting this mutation, this
“voyage of the children” (which is “the naked meaning of the Greek word pedagogy”), he
uses the image of the one that swims across a large river, leaving one bank on which she
stands (or belongs) e.g. one language – say Portuguese - to arrive at the other bank where
she stands again (or belongs) e.g. another language – say English. However, Serres urges
us not to forget the swim and the river in the middle or the middle as river; “(…) in the
middle of the crossing, even the ground is missing; any sense of belonging, of support is
gone.” (SERRES, 1997, p.5) Crossing the river one arrives at the other bank where the
other language is spoken, but one passes through a ‘third world’ which “has no direction
from which to find all directions” (ibid,p.7). Passing a threshold without (one) reference
(or where all references are abandoned or being equally far away), being very sensitive:
“time and site of extreme attentiveness”, “being nothing but potential” (ibid,p.25). One,
now, not simply speaks two languages, one passes “unceasingly through the fold of the
dictionary”, “inhabiting both banks and haunting the middle (…) from which diverge
twenty or one hundred thousand directions.” (ibid, p.6) Thus learning another language,
passing the fold of the dictionary, as a pedagogic voyage, allows for this experience of
translatability - which perhaps always also involves the experience of what it is to ‘have’ a
language.
The fifth and final consequence that we want to highlight very shortly is that
taming the language of school (through imposing official or other majority languages) is
probably the first and probably also a very effective way of taming and neutralizing the
school.55 Making school language an official language always implies turning school
education into a mode of socialization (and hence reproduction). And it also explains that
counter-reactions to this taming through language policies are probably not really effective
if they (only) impose a minority language as new school language. The result is often that
the school is turned into a site of counter-socialisation and the production of a new society
that the older generation has in mind for the coming generation. The risk here is that the
coming generation is deprived of schooling (is only socialized) and hence of the possibility
to become a new generation. Perhaps the school is the wrong place for the politics of
language and related identity politics and cultural wars to be played out. This is not to say
these wars are unimportant, but that we should be careful that they are fought at a time
and place that is organized out of love for both the world and the coming generation.

55 We
We think
think that
that this
this isis what
what Illich
Illich ‘forgets’
‘forgets’ in in his
his analysis
analysis (ILLICH,
(ILLICH, 1981/2001)
1981/2001) of of the
the way
way inin which
which the the
imposition of
imposition of aa ‘mother
‘mother tongue’
tongue’ (i.e.
(i.e. “the
“the language
language which
which the
the authorities
authorities ofof the
the state
state have
have decided
decided ought
ought toto
be one’s
be one’s first
first language)
language) is is actually
actually aa mining
mining or or capitalizing
capitalizing ofof commons
commons (the (the vernacular)
vernacular) andand making
making people
people
dependent upon
dependent upon an an institution
institution that
that teaches
teaches them
them this
this ‘mother
‘mother tongue’.
tongue’. For
For Illich
Illich the
the school
school isis the
the institution
institution
of the
of the state
state that
that inin the
the first
first place
place teaches
teaches people
people that
that they
they need
need this
this institution
institution (and
(and thus
thus become
become dependent)
dependent)
to become
to become free
free or
or independent
independent (to (to be
be able
able to
to participate
participate inin the
the communication).
communication). We We think
think however
however thatthat he
he is
is
totally conflating
totally conflating ‘school’
‘school’ as as aa pedagogical
pedagogical form form inin our
our sense
sense with
with the
the institution
institution ofof aa state.
state. HeHe isis in
in fact
fact
taking an
taking an external
external functionalist
functionalist perspective
perspective and and neglecting
neglecting the
the elements
elements that
that he
he himself
himself seems
seems toto recognize
recognize
(in this
(in this text
text and
and in in others,
others, e.g.
e.g. the
the ones
ones onon alphabetization
alphabetization and and visualization
visualization also
also implying
implying aa grammar,
grammar,
implying artifice,
implying artifice, implying
implying aa distance
distance to to the
the oral
oral by
by writing
writing and
and aa distance
distance toto the
the written
written byby reading
reading aloud)
aloud)
as being
as being important
important for for enabling
enabling study
study and
and that,
that, according
according to to us,
us, can
can be
be related
related to
to ‘school’
‘school’ asas we
we understand
understand
it. There
it. There seems
seems to to bebe aa constant
constant floating
floating of of the
the vernacular
vernacular to to the
the oral
oral and
and implicitly
implicitly also
also the
the ‘natural’
‘natural’ oror
‘native’.
‘native’.
300|
300| jan
jan masschelein;
masschelein; maarten
maarten simons
simons

We want to ask to not understand this as a plea for the school as a safe site of peace
and understanding. It is our expression of the strong belief that society can be changed
and renewed, that emancipation is possible through school, also that an intergenerational
‘fight’ is different (and perhaps more productive in the longer run) from a political or
cultural war. But only if we also give the school and her language a chance.

references
BERNSTEIN, Basil. Class, Codes and Control. London: Routledge, 1971.
BOURDIEU, Pierre ; PASSERON, Jean-Claude. La Reproduction. Éléments pour une théorie
du système d'enseignement. Paris: Éditions de Minuit, 1970.
FREIRE, Paulo. Pedagogy of the Oppressed. New York: Herder and Herder, 1968/1970.
ILLICH, Ivan. Shadow Work. London/New York: Marion Boyars, 1981/2009.
MASSCHELEIN, J., SIMONS, M. Em defesa da escola. Uma questão pública. Coleção
Educação: Experiência e sentido. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.
______. School experiences: An attempt to find a pedagogical voice. In: KOHAN, Walter
O.; LOPES, Sammy. MARTINS. Fabiana F. R. (orgs.). O ato de educar em uma
língua ainda por ser escrita. Rio de Janeiro: NEFI, 2016, p. 247-256.
SERRES, Michel. The Troubadour of Knowledge. Ann Arbor: University of Michigan Press,
1997.
STANDISH, Paul. Uncommon Schools: Stanley Cavell and the Teaching of Walden.
Studies in Philosophy and Education, 25, p.145-157, 2006.
301
301

la escuela como phármakon en la toxicidad tecnológica contemporánea.


reflexiones sobre la crítica a la escuela en la cultura digital

inés dussel11

E s un lugar común citicar a la escuela. En los últimos tiempos, al consabido


cuestionamiento de su carácter disciplinario y autoritario, se le suma la
acusación de que no se ajusta a los tiempos, que los docentes resisten los
cambios y que es una institución condenada a desaparecer ante el avance de los métodos
centrados en el alumno, y hechos y distribuidos según la necesidad de cada uno (“tailor-
made” o “just-in-time” content, como se los llama en inglés). Lo llamativo es que en estas
críticas confluyen las posturas críticas emanadas de movimientos democráticos de los años
’60 y ’70 así como las industrias del edu-business, interesadas en convertir a lo educativo
en otro mercado más (LINGARD y SELLAR, 2013).
Sostengo, en este texto, que es necesario interrogar nuestras posiciones críticas
sobre la escuela como aparato tecnológico-político.22 Como dice Latour, vivimos en una
época iconoclasta, más cerca de quemar monumentos que de erigirlos (LATOUR, 2010).
Quizás sea más interesante e irreverente preguntarse sobre ese gesto, y suspenderlo por un
rato, a ver qué se produce. Parece abrirse un tiempo que invita a pensar con una
perspectiva que permita desplazarnos de la crítica post-68 a la escuela como la institución
disciplinaria total y homogeneizante, y que pueda encontrar, en esa vida y experiencia
escolar, formas múltiples. En esa dirección, creo que hay que resistir la tentación de
resolver el problema de pensar a la escuela de forma plural por medio de agregar una “s” al
final y hablar de las escuelas y no de la escuela, como si la pluralidad viniera de la
multiplicación de lo Uno, y como si cada entidad no tuviera que pensarse de otra forma,
más compleja e híbrida.
En este cuestionamiento a las posturas críticas sobre la escuela que ya se volvieron
sentido común en muchas universidades y centros de investigación, voy a hacer referencia
al trabajo de investigación que desarrollo desde hace unos años en Argentina y México, y
con algunas incursiones comparadas en Brasil y Uruguay, que busca relevar cómo se están
introduciendo los nuevos medios digitales (computadoras, celulares, videojuegos, redes
sociales, entre otros) en las escuelas. Una pregunta central de mi línea de investigación es
cuáles son los procesos de traducción, adaptación, negociación o conflicto que se están
produciendo, pensando a la noción de traducción como práctica compleja e inconclusa que
requiere simultáneamente una lectura cercana y distante, una sensibilidad para lo que se
pierde y lo que resta como intraducible (BUDICK, 1996; LATOUR, 2005a; SPIVAK,
2010). Me interesa especialmente analizar cuáles son las relaciones entre las nuevas formas
de conocimiento o saberes promovidas por los nuevos medios digitales (generalmente más más
intuitivas, cinéticas y centradas en la adhesión emocional inmediata) y los modos
“escolares” de saber (que privilegian la distancia crítica, la reflexión y la construcción
argumentativa) (DUSSEL, 2012). Por “modos de operación con el saber”, entiendo las
prácticas y lógicas de trabajo que estructuran criterios de verdad y de autoridad y que
definen repertorios o archivos de la cultura, así como operaciones a realizar en y con esos

11 Departamento
Departamento de de Investigaciones
Investigaciones Educativas.
Educativas. Centro
Centro dede Investigación
Investigación yy de
de Estudios
Estudios Avanzados
Avanzados del
del
Instituto
Instituto Politécnico
Politécnico Nacional
Nacional –– DIE-CINVESTAV,
DIE-CINVESTAV, México/DF.
México/DF. Email:
Email: idussel@gmail.com
idussel@gmail.com
22 Una
Una versión
versión anterior
anterior de
de este
este trabajo
trabajo fue
fue presentado
presentado como
como ponencia
ponencia enen un
un seminario
seminario sobre
sobre “Saberes
“Saberes
Nómadas”
Nómadas” desarrollado
desarrollado en
en Bogotá,
Bogotá, Colombia,
Colombia, por
por el
el Instituto
Instituto de
de Estudios
Estudios Sociales
Sociales Contemporáneos
Contemporáneos
(IESCO)
(IESCO) de de la
la Universidad
Universidad Central
Central en
en octubre
octubre de
de 2015.
2015. Agradezco
Agradezco los
los comentarios
comentarios de
de los
los presentes
presentes en
en ese
ese
encuentro.
encuentro.
302|
302| inés
inés dussel
dussel

repertorios (CHARLOT, 2007; POPKEWITZ, 2011). También estoy indagando en cómo


negocia la escuela con las promesas farmacológicas de flexibilidad, ubicuidad y adecuación
al usuario de los medios digitales, promesas que son contrarias a la estructuración más
rígida y uniforme de la institución escolar, pensada desde Comenio en adelante como un
espacio y un tiempo “para todos”.
Mis preguntas y preocupaciones sobre los efectos de las nuevas tecnologías en las
aulas están en sintonía con lo planteado por Bernard Stiegler (2014) sobre el carácter de
phármakon de las tecnologías, a la vez remedio, veneno y magia, y sobre la intoxicación
tecnológica como marca de esta época. Me interesa poner a discusión la “retórica de la
inevitabilidad” del cambio tecnológico (NESPOR, 2006, p.1) y la perspectiva
mayoritariamente celebratoria de estas transformaciones de muchos de los textos de la
política educativa mundial (cada vez más parecida, salvo en algunos países
latinoamericanos, a la perspectiva de las corporaciones tecnológicas transnacionales), que
desconoce la diversidad y complejidad de las prácticas y relaciones con el saber en los
nuevos medios digitales y en las escuelas.
No se trata solamente de subrayar la pluralidad de prácticas en uno y otro lado.
Como dice Latour, “la multiplicidad hoy no falta en la teoría social. Limitarse a señalar la
multiplicidad también puede significar que la tarea política del ensamblaje fue
abandonada” (LATOUR, 2005a, p. 190). Creo que hay que profundizar en las tensiones
profundas entre modos de trabajo con el saber, subjetivaciones, autoridades, que aparecen
en el vínculo entre medios digitales y escuelas, como signo de época, y en sus efectos
políticos. Alessandro Baricco señala que no deja de fascinarlo que los alumnos de
secundaria por las mañanas estudien la cultura clásica y por las tardes se transformen en
“animal de la red, despegando en su personal multitasking.(…) ¿Cómo se explica la
mansedumbre con que acepta(n) la escuela?” (BARICCO, 2008, p.187). Para muchos, entre
ellos Paula Sibilia (2012), esa mansedumbre no va a durar: la escuela es una institución en
decadencia que pronto dejará de existir porque no puede sostener esta disyunción mucho
más tiempo.
Sin embargo, creo que no hay que ir tan rápido, ni en el diagnóstico masivo y
totalizador ni en la condena al anacronismo de la escuela. Retomo al respecto un alerta que
plantea recientemente Peter Sloterdijk sobre la dificultad, en “el contexto de las actuales
turbulencias”, de sostener la operación filosófica de la crítica, que implica retroceder “ante
la imagen de la realidad efectiva” y poner entre paréntesis o en suspenso “las propias
intenciones existenciales” (SLOTERDIJK, 2010, p. 141-142). En el mundo de la
telecomunicación, de los aparatos portátiles, de los medios interactivos que proponen
experiencias cada vez más envolventes, de las “vecindades remotas globales”, Sloterdijk
plantea que la posibilidad de alejarse y convertir a un evento en un objeto de
contemplación o reflexión se vuelve cada vez más problemática. A esto se refiere también
Bernard Stiegler (2014) cuando denuncia la toxicidad tecnológica de esta época, en las que
las industrias automatizadas de programación dificultan los procesos de individuación,
dependientes en gran parte de los vínculos intergeneracionales y de la posibilidad de
interrumpir y reorganizar con otros sentidos o direcciones la circulación de los saberes.
Tomar distancia, apartarse de los flujos automatizados o del ‘por defecto’ de los medios
digitales, requiere realizar varias operaciones que cada vez están menos disponibles para el
conjunto de la población, no solamente por falta de tiempo sino porque los modos en que
se construye el ‘por defecto’ son crecientemente opacas y quedan enmascaradas por la
‘supuesta’ interactividad de las tecnologías digitales.33

33 Digo
Digo ‘supuesta’
‘supuesta’ porque
porque la
la opción
opción que
que se
se ofrece
ofrece es
es muchas
muchas veces
veces ‘clickear’
‘clickear’ (o
(o abstenerse
abstenerse de
de clickear)
clickear) el
el botón
botón
de
de ‘Me
‘Me gusta’
gusta’ como
como medio
medio rápido
rápido yy eficaz
eficaz de
de participar
participar en
en conversaciones
conversaciones públicas.
públicas. Para
Para una
una crítica
crítica de
de esta
esta
la
la escuela
escuela como
como phármakon
phármakon en
en la
la toxicidad
toxicidad tecnológica
tecnológica contemporánea.
contemporánea. reflexiones
reflexiones sobre
sobre || 303
303
la
la crítica
crítica aa la
la escuela
escuela en
en la
la cultura
cultura digital
digital

Esta ruptura o reconfiguración de la distancia en la cultura digital, esta “caída en


desgracia” de la visión kantiana del conocimiento44, que en muchos sentidos ha sido
celebrado como el fin del predominio de la racionalidad moderna, no necesariamente
instala un status quo mejor. Más bien, como lo advierten Sloterdijck y Stiegler, las nuevas
condiciones plantean un problema político y pedagógico muy relevante y con muchas otras
aristas políticas, epistemológicas y subjetivas que las que plantea la visión “cruel-
optimista” de los nuevos tiempos, como la llama Lauren Berlant (2011). Pese a su
relevancia, este problema todavía no está siendo suficientemente atendido en el debate
educativo, que parece más preocupado por el ascenso de Wikipedia o la pérdida de la
escritura manuscrita que por la reconfiguración de la atención, la distancia y las formas
culturales que traen los medios digitales. Habría que analizar cómo se repiensa un
concepto de distancia crítica en estas nuevas condiciones que parecen imposibilitarla cada
vez más, con estos medios que ya ‘no hacen pantalla’ (MONDZAIN, 2002), que no
permiten dar un paso atrás, o al costado, porque van con nosotros, como una extensión de
nuestros cuerpos, manos u ojos.
Puede indagarse, por ejemplo, en los cambios en las disposiciones del cuerpo y de la
atención que vuelven difíciles muchas de las operaciones con el saber que propone, o
debería proponer, la escuela, y que van más allá de lo que plantean quienes celebran la
caída de las instituciones disciplinarias. Es muy sugerente el planteo de Michel Serres en
“Pulgarcita”55, cuando señala que es la “gestualidad del cuerpo-piloto” la que se pone en
juego frente a una computadora o un celular, no la del pasajero que anda “con la panza al
aire y la mirada perdida y pasiva”. Por eso “ya sólo hay conductores, sólo hay motricidad;
ya no hay espectadores, el espacio del teatro se llena de actores, móviles; ya no hay jueces
en el pretorio, sólo oradores, activos; ya no hay sacerdotes en el santuario, el templo se
llena de predicadores; ya no hay maestros en el anfiteatro, en todas partes hay
profesores…” (SERRES, 2013, p. 53). Para Serres la escucha se desprecia como un símbolo
de pasividad, y la desatención se convierte en una patología. Paradójicamente, esta
incitación al cuerpo-conductor, al cuerpo-piloto, se da por medio de aparatos tecnológicos
que sedentarizan cada vez más los cuerpos, que facilitan las conexiones sin requerir
mayores desplazamientos (TURKLE, 2011).
Desde la perspectiva escolar y pedagógica, es interesante notar que, en la
formulación de Serres, los maestros se oponen a la figura profesoral: la erudición, la
investigación, la originalidad, la producción de conocimiento, se colocan alto en esta
jerarquía de conocimientos y asuntos sociales; la transmisión, el cuidar a otros, el
pertenecer a una profesión de masas, es poco atractivo, aburrido, pasivo, viejo. También es
interesante notar la coincidencia de este nuevo clima de época de la cultura digital que
valora el do-it-yourself, la creación y el activismo, con la vulgata constructivista que se
expandió en las últimas décadas en los sistemas educativos, y que identificó a la
manipulación táctil de objetos, el hands-on, y al ‘busyness’ (mantenerse ocupado) con el

modalidad
modalidad de de interactividad,
interactividad, remito
remito al al trabajo
trabajo dede José
José van
van Dijck
Dijck (2013),
(2013), así
así como
como aa las
las críticas
críticas de
de Lev
Lev
Manovich
Manovich (2006)
(2006) sobre
sobre los
los medios
medios digitales
digitales yy sus
sus limitaciones
limitaciones para para abrir
abrir caminos
caminos aa lala participación
participación yy
creación
creación cultural.
cultural.
44 Para
Para ver
ver las
las conexiones
conexiones entre
entre epistemología
epistemología yy política
política en
en esta
esta formulación
formulación del del sujeto
sujeto cognoscente,
cognoscente, pueden
pueden
consultarse
consultarse loslos trabajos
trabajos de
de Boltanski
Boltanski (1999)
(1999) yy Haroche
Haroche (2009),
(2009), donde
donde sese subraya
subraya lala relación
relación intrínseca
intrínseca entre
entre la
la
posibilidad
posibilidad de de “ver
“ver aa distancia”
distancia” lala naturaleza,
naturaleza, la la sociedad,
sociedad, el el sufrimiento
sufrimiento ajenoajeno oo el
el conflicto
conflicto político,
político, yy
aprender
aprender aa moderar
moderar las
las pasiones
pasiones yy procesarlas
procesarlas aa través
través dede la
la reflexión.
reflexión.
55 El
El título
título responde
responde aa un un apodo
apodo con
con elel que
que Serres,
Serres, “con
“con lala mayor
mayor ternura
ternura queque un
un abuelo
abuelo pueda
pueda expresar”,
expresar”,
bautiza
bautiza aa los
los jóvenes
jóvenes que
que pueden
pueden “enviar,
“enviar, con
con una
una rapidez
rapidez mayor
mayor de de lolo que
que podría
podría hacerlo
hacerlo jamás
jamás con
con mis
mis
torpes
torpes dedos,
dedos, enviar,
enviar, digo,
digo, SMS
SMS con
con los
los dos
dos pulgares”,
pulgares”, yy que
que escriben
escriben de de otro
otro modo,
modo, hablan
hablan dede otro
otro modo,
modo, yy
tienen
tienen que
que reinventar
reinventar instituciones,
instituciones, “una
“una manera
manera de de ser
ser yy de
de conocer”
conocer” (SERRES,
(SERRES, 2013,
2013, p.
p. 22).
22).
304|
304| inés
inés dussel
dussel

único aprendizaje significativo (FELDMAN, 2010). Desde la perspectiva que propongo en


este texto, este nuevo discurso tecno-cultural de los medios digitales es un “cemento” que
articula cuestiones tan diversas como las críticas anti-autoritarias a la escuela, las nuevas
visiones de los sujetos de aprendizaje y los discursos de la industria tecnológica-
comunicacional –temas muy amplios que no se pueden analizar aquí.66 Pero vale la pena
mencionarlos, para poner de manifiesto que el debate es mucho más amplio que lo que
hacen las escuelas con las computadoras, e involucra a las formas de autoridad y de saber
de la sociedad, que están en el corazón de la política y la cultura.
En este contexto, considero que hay que repensar y rehistorizar las nociones que
tenemos de escuela, deshaciéndonos “de la imagen actual de lo que es una escuela”
(ROCKWELL, 2007, p. 269) y reconociendo que las experiencias escolares han variado a lo
largo de [la] historia”, y siguen variando hoy (p. 307). En esta rehistorización, me parece
necesario tomar distancia de la crítica post-68 a la escuela como institución meramente
disciplinaria, y poder plantear algunas otras perspectivas sobre qué tipo de operaciones
produce la escuela.77
Parto de una primera idea, la del anacronismo, para empezar a poner la lupa en
ciertos modos de hacer escuela que están por fuera de lo que enuncia la crítica establecida
como nueva doxa. Traigo una viñeta de mi trabajo en escuelas, que no se vinculan a la
cultura digital directamente, aunque se da en el mismo contexto de toxicidad tecnológica.
En el año 2002-2003, en el medio de una gran crisis económica, social y política, acompañé
al equipo docente de una escuela secundaria pública en la periferia urbana de Buenos Aires
(tercer cordón del Conurbano, zona de alta marginación y conflictividad) en su trabajo
cotidiano. Eran momentos muy duros, y los profesores de la escuela se sentían
desbordados. Las fronteras entre el adentro de la escuela y el afuera –descarnado, incierto-
se habían borrado por completo. En las clases, los alumnos se desmayaban de hambre,
contaban a viva voz que habían participado de secuestros express o que habían sufrido
violaciones en el camino a la escuela. Las conversaciones entre los docentes giraban en
torno a cómo actuar cuando se presentaban situaciones como éstas (muy en concreto,
estaba la angustia de: ¿qué digo? ¿qué hago?) y cómo hacer para proteger un espacio escolar
donde tuvieran vigencia los derechos, a la par que se debatía si a la escuela le tocaba entre
sus funciones juntar dinero y organizar una olla popular para dar de comer, y si en este
contexto tenía algún sentido enseñar historia, geografía o matemática. Fue una especie de
ateneo clínico mensual, donde se intentaba crear un espacio de reflexión para aliviar el
padecimiento y elaborar estrategias colectivas, entre ellas festivales, comedores, cursos de
formación docente y actividades extracurriculares. Fue en ese marco que surgió la idea de
ofrecer los sábados un taller de circo y un curso de haiku, iniciativa de un colega
entusiasta del género. Para sorpresa de todos, el taller de haiku tuvo una muy buena
recepción, y los sábados se llenaron de jóvenes escribiendo poesía en el patio de la escuela.
La anécdota recuerda otra que cuenta Jacques Rancière en La noche de los proletarios.
En su historia de cómo los obreros se constituyeron como proletarios en la primera mitad

66 Puede
Puede verse
verse el
el trabajo
trabajo de
de Serres
Serres (2013)
(2013) para
para una
una crítica
crítica más
más amplia,
amplia, yy también
también la
la discusión
discusión sobre
sobre la
la cuestión
cuestión
de
de la
la distancia
distancia como
como condición
condición deldel trabajo
trabajo pedagógico
pedagógico –otro
–otro “herido
“herido grave”
grave” enen esta
esta contienda
contienda cultural-
cultural- que
que
realizamos
realizamos en en un
un trabajo
trabajo anterior
anterior (DUSSEL,
(DUSSEL, 2014).
2014).
77 No
No voy
voy aa ocuparme
ocuparme en en este
este texto
texto de
de problematizar
problematizar enen igual
igual medida
medida lala noción
noción de
de los
los medios
medios digitales,
digitales, que
que
como
como ya ya se
se dijo
dijo son
son complejos
complejos ee híbridos,
híbridos, yy expresan
expresan másmás dede una
una lógica.
lógica. EnEn la
la perspectiva
perspectiva crítica,
crítica, está
está
siempre
siempre lala tentación
tentación dede reducirlos
reducirlos aa “veneno”,
“veneno”, cuando
cuando lala perspectiva
perspectiva farmacológica
farmacológica enseña,
enseña, precisamente,
precisamente,
que
que son
son también
también “remedio”,
“remedio”, “cura”
“cura” (STIEGLER,
(STIEGLER, 2014).
2014). Para
Para pensar
pensar enen estas
estas otras
otras posibilidades
posibilidades dede
poetización
poetización yy dede libertad
libertad que
que ofrecen
ofrecen los
los medios
medios digitales,
digitales, puede
puede seguirse
seguirse el
el trabajo
trabajo de
de Rocío
Rocío Gómez
Gómez Zúñiga
Zúñiga
(2014)
(2014) yy Rocío
Rocío Rueda
Rueda Ortiz
Ortiz (2014),
(2014), así
así como
como la
la reflexión
reflexión que
que ofrece
ofrece Ethan
Ethan Zuckerman
Zuckerman sobre
sobre el
el activismo
activismo
digital
digital (2014),
(2014), entre
entre muchos
muchos otros.
otros.
la
la escuela
escuela como
como phármakon
phármakon en
en la
la toxicidad
toxicidad tecnológica
tecnológica contemporánea.
contemporánea. reflexiones
reflexiones sobre
sobre || 305
305
la
la crítica
crítica aa la
la escuela
escuela en
en la
la cultura
cultura digital
digital

del siglo XIX, Rancière relata cómo en su tiempo libre, es decir, en sus noches, los obreros
hacían otra cosa que lo esperado: ni se acostaban a reparar su fuerza de trabajo, ni se
dedicaban a complotar contra las autoridades. Al contrario: escribían versos, leían
tragedias griegas o salían a pasear y disfrutar de la cultura para afirmarse como iguales.
Eran “terriblemente inactuales”, dice Régine Robin (2012, p. 57), pero fue ese anacronismo
lo que “[permitió] definir orientaciones temporales inéditas, garantizar el salto o la
conexión de una línea de temporalidad a otra. Y es mediante esas orientaciones, esos saltos
y esas conexiones como existe un poder de ‘hacer’ la historia” (Rancière, apud Robin,
idem).
El haiku en una escuela asediada por el hambre, el desamparo, la violencia, era
igualmente inactual y anacrónico que los versos alejandrinos de los proletarios de 1840. Y
sin embargo, unos y otros permitieron abrir un espacio y un tiempo donde se podía ser
iguales, en términos rancièrianos, y proponer otro vínculo con la cultura. La anécdota tiene
que ver con los modos de hacer escuela en contextos donde parece estar desacompasada,
desajustada, ir “contra su tiempo”, poner en evidencia que el tiempo es siempre más
heterogéneo y más multiforme que lo que las retóricas de la actualización suponen (DIDI-
HUBERMAN, 2006). Esos contextos “actuales” pueden ser los de la crisis aguda, la
narcoviolencia o la cultura de los medios digitales que plantea la velocidad, la
hiperatención y la hiperactividad como ejes de la interacción. Propongo entonces pensar
que lo que hace la escuela siempre es inactual, en este sentido rancièriano de permitir
saltos en el tiempo, conexiones otras, y que ahí está su fuerza.
El anacronismo permite presentar otra idea sobre la escuela, planteada por los
filósofos belgas Simons y Masschelein (2014), de que la escuela es ante todo una acción de
suspensión de un tiempo y creación de un espacio. Siguiendo esta idea, puede decirse que
es la creación de una cierta duración, o un tiempo “extra” de la cultura: la escuela como
suspensión. Para estos filósofos, desde los griegos88 la escuela tiene que ver con crear un
tiempo libre, un tiempo no productivo, un tiempo igualitario 99 para todos los que están en
la escuela, en el que se les propone un tipo específico de trabajo o relación con el saber, que
los autores llaman “escolástico”. Retomando la idea arendtiana de que el trabajo de enseñar
consiste en poner algo sobre la mesa y escudriñarlo o desmenuzarlo, Simons y
Masschelein sostienen que el trabajo escolar anima a una profanación del conocimiento, en
el doble sentido de des-sacralizarlo y de volverlo profano, es decir, ponerlo en relación
horizontal con las personas. Este es un acto profundamente democrático, y aunque en sus
formas concretas de realización no siempre alcance a todos, la promesa de que puede
hacerlo ya instala un horizonte cultural y político diferente al de la visión aristocrática del
saber para pocos. Puede verse entonces bajo otra lente la contraposición entre el ‘hecho a
medida’ (tailor-made) de los medios digitales y el ‘para todos’ de la escuela: hay una

88 La
La conceptualización
conceptualización que que realizan
realizan Masschelein
Masschelein yy Simons
Simons sobresobre la la escuela
escuela recoge
recoge unauna tradición
tradición de de
pensamiento
pensamiento yy de de organización
organización institucional
institucional occidental.
occidental. Habría
Habría queque indagar
indagar qué
qué validez
validez tiene
tiene esta
esta forma
forma de
de
pensar
pensar el
el trabajo
trabajo escolar
escolar enen contextos
contextos donde
donde elel saber,
saber, el
el lenguaje
lenguaje yy elel tiempo
tiempo sese organizan
organizan de de otra
otra manera,
manera,
reconociendo
reconociendo queque la
la propia
propia tradición
tradición occidental
occidental tomó
tomó préstamos
préstamos del del Oriente
Oriente yy dede otras
otras culturas.
culturas. También
También
habría
habría que
que someter
someter esta
esta visión
visión aa la la crítica
crítica poscolonial,
poscolonial, revisando
revisando sus sus vínculos
vínculos con con las
las formas
formas de de
conocimiento
conocimiento coloniales.
coloniales. Sin
Sin embargo,
embargo, observo
observo queque en
en lala perspectiva
perspectiva pedagógica
pedagógica de de Gayatri
Gayatri Spivak,
Spivak, una
una
destacada
destacada crítica
crítica poscolonial,
poscolonial, hayhay muchas
muchas similitudes
similitudes con con esta
esta visión
visión del
del trabajo
trabajo docente
docente yy escolar
escolar dede
Masschelein
Masschelein yy Simons,
Simons, yaya que
que ella
ella lo
lo concibe
concibe como
como una
una especie
especie dede “pedagogía
“pedagogía del del seminario”
seminario” quizás
quizás tedioso
tedioso
yy poco
poco glamoroso,
glamoroso, que que enseñe
enseñe aa leer
leer yy escuchar
escuchar de de otra
otra manera,
manera, queque permita
permita trabajar
trabajar con
con narrativas
narrativas
emancipatorias
emancipatorias queque ayuden
ayuden aa reordenar
reordenar loslos deseos
deseos yy nutrir
nutrir la
la intuición
intuición dede lo
lo público
público (SPIVAK,
(SPIVAK, 2010, 2010, p.
p. 230).
230).
Hay
Hay una
una preocupación
preocupación similar
similar por
por las
las reglas
reglas de
de trabajo,
trabajo, de
de lectura
lectura yy de
de cuestionamiento
cuestionamiento sistemático
sistemático yy público
público
de
de lo
lo escolar
escolar entre
entre ambas
ambas perspectivas.
perspectivas.
99 Esta
Esta idea
idea del
del tiempo
tiempo escolar
escolar presupone
presupone una una heterogeneidad
heterogeneidad de de la
la temporalidad:
temporalidad: la la escuela
escuela realiza
realiza una
una
operación
operación dede detener
detener el
el tiempo,
tiempo, oo crear
crear un
un tiempo
tiempo propio.
propio.
306|
306| inés
inés dussel
dussel

tensión que no habría que pasar por alto, ni despachar a la ligera, como solicitaba Benjamin
de las demandas de la historia.
Suspendiendo el tiempo y el espacio “actual”, creando una posibilidad “inactual” de
trabajo con un saber, la institución escolar también permite una cierta atención, un foco,
que es la base de una actitud “escolástica”. Masschelein y Simons señalan que esa forma de
trabajo con el conocimiento habilita a preguntarse, indagar, aprender, que ayuda a
recortarse de otras afiliaciones familiares, religiosas, comunitarias, lo que implica también
un principio igualitario (aunque sus realizaciones, como ya se ha dicho, no siempre lo
sean). Esta suspensión implica una salida del contexto, es decir, una descontextualización,
mediante la creación de un espacio con reglas específicas. Este distanciamiento de la
escuela, su descontextualización, fue criticado desde mediados del siglo XX por su elitismo
o carácter excluyente, en un movimiento que fue volviendo a la escuela cada vez más
parecida al afuera, y con la demanda de que, para ser más inclusiva, dejara de ser ‘escuela’
y se volviera “más convivencial, más adaptada a la sociabilidad de los niños de las clases
desfavorecidas” (RANCIÈRE, 2003, p.v). Reducir las brechas, achicar las distancias; bajar
al maestro de la tarima y convertirlo en guía, promotor o compañero, hablarle de tú, abolir
los uniformes y vestirse ‘de civil’; a nivel pedagógico, poner bajo sospecha la acción de dar
clase y sostener como única vía posible el activismo; estos y otros fueron los presupuestos
y las consecuencias de este giro político-pedagógico, de esta revuelta contra las teorías
señoriales y las posiciones epistémico-políticas fundadas en la superioridad de la autoridad
magisterial moderna (SLOTERDIJK, 2010). Sin despreciar la importancia y la
profundidad de estas críticas democráticas, hay que destacar que contribuyeron a generar
un consenso contrario a estas operaciones de saber, basadas en la distancia, la separación y
el extrañamiento de lo cotidiano, que estructuraban a la escuela.
Además de la suspensión, hay otro rasgo de la institución escolar que destacan
Masschelein y Simons que está bajo sospecha cuando se la intenta domesticar y convertir
en una institución “hecha a medida” del usuario-consumidor, y es su carácter de
institución pública, qua conecta con otros espacios y que apunta hacia lo común. Esta
afirmación de su carácter público no ignora que “lo público” se redefine continuamente.
En los siglos XVIII y XIX, lo público fue cooptado por lo estatal, y ser alumno era el
primer paso para construir un vínculo con el Estado-nación; todavía en los años ’60 se
pensaba que lo público se definía por la ciudadanía letrada o la opinión pública descripta
por Habermas, pero hoy la primera identificación es con la idea del público consumidor o
de la audiencia del espectáculo televisivo (LATOUR, 2005b). Las huellas del carácter
público-estatal y de la ciudadanía letrada todavía persisten en la escuela, y siguen
permitiendo conexiones (filiaciones) que ayudan a los alumnos distanciarse de las
filiaciones de origen y poder ser otra cosa (un alumno, en principio, una categoría más
anónima y abstracta) para un conjunto más amplio que la familia o la comunidad
circundante; al mismo tiempo, en esta época de tantas multitudes anónimas de las redes
sociales, la inscripción en la escuela permite asociarse a un conjunto definido por reglas
que vinculan a una estatalidad y a un espacio político y legal que, aunque en retirada como
forma de regulación, sigue definiendo una parte importante de nuestras vidas de forma no
despreciable, como muestra por ejemplo la complejidad del avance de los discursos de los
derechos humanos (GIBNEY, 2003). Este es un aspecto muy importante de la escuela
como institución educativa, y conecta lo individual y lo colectivo con cuestiones políticas,
pedagógicas, didácticas e institucionales.
Tomando estos aportes de Masschelein y Simons sobre la escuela como institución
pública que propone una cierta atención y un cierto trabajo con la cultura, y una cierta
calibración o conexión entre escalas y espacios como puede ser el contexto inmediato del
aula y la política educativa o la identidad nacional, puede empezar a afirmarse una
la
la escuela
escuela como
como phármakon
phármakon en
en la
la toxicidad
toxicidad tecnológica
tecnológica contemporánea.
contemporánea. reflexiones
reflexiones sobre
sobre || 307
307
la
la crítica
crítica aa la
la escuela
escuela en
en la
la cultura
cultura digital
digital

conceptualización distinta de la institución escolar, subrayando también algo no


suficientemente explorado por los filósofos belgas que es su carácter histórico,
heterogéneo, atravesado por tensiones y relaciones múltiples. En otras palabras, hay que
enriquecer la perspectiva filosófico-política sobre la escuela con abordajes antropológicas e
histórico-culturales sobre las condiciones en que “se hace escuela” hoy (ROCKWELL,
2007), sobre los modos en que tiene lugar esa complejidad de operaciones de ensamblaje
que permiten que funcione y se sostenga una institución particular de producción de la
cultura y de lo público-común.
En esta línea, me parece muy sugerente la definición que da el antropólogo Jan
Nespor de la escuela como “una intersección en un espacio social, un nodo en una red de
prácticas que se expande en sistemas complejos que empiezan y terminan afuera de la
escuela” (NESPOR, 1996, p. xiii). La escuela no es una institución homogénea y unificada,
sino un ensamblaje provisorio de prácticas, artefactos, personas, saberes, que no se define
solamente por las paredes o las formas de regulación estatales o disciplinarias sino por
complejas interacciones en varias direcciones; esto no implica negar su vínculo con la
estatalidad, pero pide cautela respecto a la centralidad que eso tiene en su configuración
concreta. El hecho de que sea un ensamblaje provisorio, que requiere de múltiples acciones
para sostenerse como tal, la define como una producción histórica, que va cambiando y
transformándose en modos que hay que analizar en sus redes de relaciones concretas.
Volviendo a la pregunta de Baricco, que se sorprende por la mansedumbre de los jóvenes
en aceptar una institución anacrónica, habría que pensar en el trabajo y ensamblado que
requiere que esa red particular siga operando de manera relativamente eficaz, y no darlo
por sentado.
¿Qué aporta este repensar la escuela para analizar los modos de hacer escuela hoy,
en este contexto de introducción masiva de artefactos tecnológicos? Contra la idea de que
las escuelas resisten o se revolucionan en masa con las computadoras, estos abordajes
antropológicos e histórico-filosóficos permiten abrir otras indagaciones sobre las
negociaciones y adaptaciones que hacen las instituciones educativas. Por ejemplo, hay que
cuestionar los límites rígidos que se plantean entre el ‘afuera’ y el ‘adentro’, que fueron y
son mucho más porosos de lo que se supone, y que no están definidos por las paredes o los
nombres de las instituciones sino por un tipo de vínculo y de trabajo con el conocimiento
particular. Mi hipótesis es que hay mucho de escuela fuera de la escuela (por ejemplo, en
ciertas formas de lectura y de trabajo con los textos, en las tareas escolares, en las
conversaciones escolásticas que hoy tienen lugar en Facebook o en blogs), y mucho de no-
escuela en la escuela (en la falta de acciones de “profanación del conocimiento”, en la
renuncia a lenguajes u operaciones más rigurosas y desafiantes, en el reinado del régimen
de la opinión y de la adhesión emocional inmediata también en el aula). Queda más claro
que antes, con la entrada de dispositivos tecnológicos portátiles y la presencia de
conectividad más o menos permanente, lo poroso de las paredes de la escuela, y la
importancia de esas redes de relaciones interpersonales y de saberes que nos atraviesan
dentro y fuera de ella.
Otra idea relevante para pensar en estas nuevas condiciones es la de suspensión y
de trabajo escolar con el saber: vale la pena preguntarse sobre la capacidad de las escuelas
de producir algunos de esos movimientos o tareas escolares en contextos mucho más
desafiantes, entre otras cosas por la presencia de los dispositivos móviles que nos conectan
todo el tiempo a otras conversaciones y espacios y que vuelven más compleja la operación
de distanciamiento y des-contextualización. Pero el desafío se ensancha también por la
fuerza de discursos pedagógicos que desautorizan esas operaciones: los docentes que hoy
trabajan con tecnologías digitales suelen invocar la necesidad de ‘capturar la atención’ en
los términos que definen las industrias del entretenimiento, o de ‘acercarse a la cultura de
308|
308| inés
inés dussel
dussel

los niños y los jóvenes’, considerados ‘nativos digitales’, sin cuestionar que estas categoría
vengan ya definidas por lo que esas industrias definen como cultura infantil o juvenil, y
sin tomar nota de los procesos y modos en que esas culturas están siendo producidos por
esta tecnocultura. También sienten que tienen que disculparse si no son lo suficientemente
creativos y participativos, si deciden algo sin consultar a sus alumnos, si eligen un texto o
material que no responde directamente a los intereses de sus alumnos. Habría que
interrogar ese tipo de discurso pedagógico que enmarca las interacciones de los docentes y
los estudiantes en una oposición taxativa entre paidocentrismo o directivismo del docente,
que considera al activismo de los estudiantes como única condición para el aprendizaje,
como única posición posible, visión que desvaloriza la importancia del recorrido y las
conexiones que propone el curriculum o la didáctica. Hay un modo de hacer escuela que
también tiene que afirmarse contra un cierto discurso pedagógico que la desprecia.
Para concluir, la pregunta que creo emerge hoy con fuerza, derivada de esta
perspectiva de la escuela como ensamblaje provisorio e inestable, es qué condiciones tiene
la escuela hoy para seguir siendo y haciéndose “escuela”. En otras palabras, sostener ese
ensamblaje que es la escuela, y producir una suspensión, demandó mucho esfuerzo
siempre: el esfuerzo de los profesores para circunscribir a los niños y niñas a ciertas formas
de trabajo, el balizamiento o vigilancia de una cierta frontera de lo que se podía hacer o no
hacer en la escuela, la organización de rutinas, rituales, modos de hablar, de vestir, la
disposición de los cuerpos en el espacio, y la arquitectura escolar para hacer lugar a estas
necesidades, la calibración de los espacios locales e inmediatos con reglas e identidades
más generales. La creación o la producción de la escuela no fue, no es, un acto hecho de una
vez y para siempre: requiere de acciones constantes que la reafirmen. Precisamente, lo que
hay que indagar son las condiciones en que hoy se realizan esos actos y se organizan esos
espacios, menos proclives, o directamente antagonistas, reacios, opuestos a esta propuesta
de suspender un tiempo y un lugar, focalizar una atención y someter a los cuerpos
infantiles a cierto tipo de ejercitación y estudio. A partir de lo planteado en este texto, se
ve que esta oposición que hoy surge a estas operaciones se debe no solamente a la
resistencia de esos cuerpos infantiles o juveniles que se rebelan contra un viejo orden, sino
también, y quizás sobre todo, a que los propios discursos que abogaban por ese ensamblaje
no tienen fuerza; más bien, el nuevo consenso pedagógico es que hay que ir en la dirección
contraria, incluida la perspectiva crítica de la izquierda que, como se señaló al inicio de
este texto, confluye, inesperadamente, con el discurso celebratorio e intoxicador de las
tecnologías digitales, y que sostiene que el phármakon-remedio pasa por ponerla a tono
con las nuevas condiciones de subjetividad y saber y no, como sostiene Stiegler (2014), en
pensar en otras curas y terapias, entre las cuales está proponer otras filiaciones y
conexiones entre las generaciones que las que promueve la industria de la programación.
Habría también que recordar que la escuela tiene que ver con una tarea de
construcción de lo público que no debe subestimarse, como sí lo hacen muchos discursos
pedagógicos, aún los críticos. No hay dudas que se aprenden muchas cosas en muchos
espacios, entre ellos los medios digitales, las comunidades circundantes, y que los saberes
son múltiples y abarcan mucho más que lo que define el curriculum; sería necio decir que
lo que no se aprende en la escuela, no se aprende en otro lado. Sin embargo, hay tareas que
hace la escolarización que no pueden hacer otras instituciones, al menos no hasta ahora, y
entre ellas está la de proponer un espacio igualitario y sistemático de indagación-
profanación del conocimiento y los lenguajes, con un horizonte público y para todos. Estos
saberes pueden incluir los saberes ancestrales, como hoy se produce en Bolivia o en
Ecuador, o la visión eurocéntrica del curriculum enciclopédico del siglo XIX; pero en los
dos casos, importa también la operación de saber que se propone con ese saber, no definida
por el saber mismo sino por el vínculo que se establece con él (al punto que, para Charlot,
la
la escuela
escuela como
como phármakon
phármakon en
en la
la toxicidad
toxicidad tecnológica
tecnológica contemporánea.
contemporánea. reflexiones
reflexiones sobre
sobre || 309
309
la
la crítica
crítica aa la
la escuela
escuela en
en la
la cultura
cultura digital
digital

el saber es antes que nada una relación, y no un objeto o sustancia externa). Queda, de
cualquier forma, la pregunta rancieriana, y que retoma Badiou: “¿Cuáles son los nuevos
protocolos de transmisión desde el momento en que se ha desmontado, desligado,
cancelado la canónica autoridad del poder y el saber conjuntos que servía
institucionalmente de espacio para esa transmisión? ¿Qué es una transmisión que no
significa una imposición?” (BADIOU, 2013, p. 236). Y me pregunto, ¿podemos pensar en
esos protocolos de transmisión sin una organización que implique cierta duración y
acumulación, sin pensar en una configuración que permita algunos montajes provisorios
pero no tan efímeros, que ayuden a logros más amplios en las relaciones con el saber y en
las posiciones epistemológico-políticas de los sujetos? Aquí me distancio un poco de
Rancière y su crítica demoledora a la institución escolar, y planteo que es necesario pensar
ese espacio de la institución, de la duración, de la suspensión, del anacronismo, de otra
manera en estas nuevas condiciones de hegemonía del nuevo capitalismo.
Son muchas las preguntas y dudas que quedan abiertas, y hay que seguir indagando
y cuestionando esos modos de producción de lo escolar y de los discursos sobre lo escolar.
Pero en ese marco de tentativas y tensiones, tengo la convicción de que la crítica
disciplinaria ya no es de la misma ayuda que en los años ’60 y ’70; y que hoy es importante
analizar mejor cuáles son las condiciones que permiten un tipo de trabajo escolar que
habilita a operaciones y posiciones posiciones de saber plurales, y que interrumpan o
resistan la intoxicación tecnológica de nuestra época insistiendo en pensar a la escuela
como phármakon. Eso permitiría defender algo de la inactualidad y anacronismo de la
escuela en relación a un contexto donde sus jerarquías, reciprocidades, autoridades, ya no
cuentan, y en su lugar se afirman otras, quizás más peligrosas, más totalizadoras o más
amenazantes. Sin caer en la melancolía ni en el conservadurismo, habría que ver cómo
defender esa vigencia de la escuela como proyecto político-pedagógico público y común, y
dotarla de cierta eficacia, tenue, débil, pero a la que no habría que cancelar sino intentar
ampliar y expandir para que tome otra fuerza y haga lugar a los trabajos afectivos,
intelectuales, éticos, políticos que demanda la época.

referencias
BADIOU,
BADIOU, Alain.
Alain. LaLa aventura
aventura de de la
la filosofía
filosofía francesa.
francesa. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Eterna
Eterna Cadencia,
Cadencia, 2013.
2013.
BARICCO,
BARICCO, Alesandro.
Alesandro. Los Los bárbaros.
bárbaros. Madrid:
Madrid: Anagrama,
Anagrama, 2009. 2009.
BERLANT,
BERLANT, Lauren.
Lauren. Cruel
Cruel Optimism.
Optimism. Durham
Durham yy Londres:
Londres: DukeDuke University
University Press,
Press, 2011.
2011.
BOLTANSKI,
BOLTANSKI, Luc. Luc. Distant
Distant Suffering.
Suffering. Morality,
Morality, Media.
Media. and and Politics.
Politics. Cambridge:
Cambridge: Cambridge
Cambridge
University
University Press,
Press, 1999.
1999.
BUDICK,
BUDICK, Sanford.
Sanford. Crisis
Crisis of
of Alterity:
Alterity: Cultural
Cultural Untranslatability
Untranslatability and and the
the Experience
Experience of of Secondary
Secondary
Otherness.
Otherness. In:In: BUDICK,
BUDICK, Sanford;
Sanford; ISER, ISER, Wolfgang
Wolfgang (eds.).(eds.). The
The Translatability
Translatability of of Cultures.
Cultures.
Figurations
Figurations of
of the
the Space
Space Between.
Between. Palo
Palo Alto,
Alto, CA:
CA: Stanford
Stanford University
University Press,
Press, 1996,
1996, p.
p. 1-22.
1-22.
CHARLOT,
CHARLOT, Bernard.
Bernard. La La relación
relación con
con el
el saber.
saber. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Libros
Libros del
del Zorzal,
Zorzal, 2007.
2007.
DIJCK,
DIJCK, José
José van.
van. The
The culture
culture of
of connectivity.
connectivity. A A critical
critical history
history of
of social
social media.
media. Oxford
Oxford and and New
New York:
York:
Oxford
Oxford University
University Press,
Press, 2013.
2013.
DIDI-HUBERMAN,
DIDI-HUBERMAN, Georges. Georges. AnteAnte elel tiempo.
tiempo. Historia
Historia del
del arte
arte yy anacronismo
anacronismo de de las
las imágenes.
imágenes. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Adriana
Adriana Hidalgo,
Hidalgo, 2006.
2006.
DUSSEL,
DUSSEL, Inés.
Inés. Más
Más allá
allá del
del mito
mito de de loslos “nativos
“nativos digitales”.
digitales”. Jóvenes,
Jóvenes, escuelas
escuelas yy saberes
saberes en
en la
la
cultura
cultura digital.
digital. In:
In: SOUTHWELL,
SOUTHWELL, Myriam Myriam (comp.).
(comp.). Entre
Entre generaciones.
generaciones. Exploraciones
Exploraciones sobre
sobre
educación,
educación, cultura
cultura ee instituciones.
instituciones. Rosario:
Rosario: FLACSO/Homo
FLACSO/Homo Sapiens, Sapiens, 2012,
2012, p.
p. 183-213.
183-213.
DUSSEL,
DUSSEL, Inés.
Inés. Distancia
Distancia yy vínculo
vínculo pedagógico
pedagógico en en la
la cultura
cultura digital.
digital. Reflexiones
Reflexiones en en torno
torno aa "El
"El
espectador
espectador emancipado"
emancipado" de de Rancière.
Rancière. In: In: CAMARGO,
CAMARGO, Maria Maria R.;R.; DONIZETTI,
DONIZETTI, C., C.,
CHALUH,
CHALUH, Laura Laura (ed.).
(ed.). Linguagens
Linguagens ee imagens:
imagens: educação
educação ee políticas
políticas de
de subjetivação.
subjetivação. Petrópolis,
Petrópolis, RJ:
RJ:
De
De Petrus
Petrus Et
Et Alii,
Alii, 2014,
2014, p.
p. 91-111.
91-111.
FELDMAN,
FELDMAN, Daniel.
Daniel. Enseñanza
Enseñanza yy escuela.
escuela. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Paidós,
Paidós, 2010.
2010.
310|
310| inés
inés dussel
dussel

FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. El El filósofo
filósofo enmascarado.
enmascarado. Entrevista Entrevista clandestina
clandestina de de Christian
Christian
Delacampagne
Delacampagne para
para Le
Le Monde,
Monde, 1980.
1980. Disponible
Disponible en:
en:
http://anarquiacoronada.blogspot.mx/2013/10/el-filosofo-enmascarado-entrevista.html.
http://anarquiacoronada.blogspot.mx/2013/10/el-filosofo-enmascarado-entrevista.html.
Consultado
Consultado en: en: 05/02/2016
05/02/2016
GIBNEY,
GIBNEY, Matthew
Matthew (comp).
(comp). La La globalización
globalización de de los
los derechos
derechos humanos.
humanos. Barcelona:
Barcelona: Crítica,
Crítica, 2003.
2003.
HAROCHE, Claudine.
HAROCHE, Claudine. El El porvenir
porvenir de de lala sensibilidad.
sensibilidad. LosLos sentidos
sentidos yy loslos sentimientos
sentimientos en en cuestión.
cuestión. Buenos
Buenos
Aires: Nueva
Aires: Nueva Visión,
Visión, 2009.
2009.
LATOUR, Bruno.
LATOUR, Bruno. Reassembling
Reassembling the the social.
social. Oxford:
Oxford: Oxford
Oxford University
University Press,Press, 2005a.
2005a.
_________. From
_________. From Realpolitik
Realpolitik to to Dingpolitik.
Dingpolitik. Or Or howhow to to make
make things
things public.
public. In:In: LATOUR,
LATOUR, Bruno; Bruno;
WEIBEL, Peter
WEIBEL, Peter (Eds.),
(Eds.), Making
Making Things
Things Public.
Public. Atmospheres
Atmospheres of of Democracy.
Democracy. Cambridge
Cambridge & & London:
London:
ZKM/Center for
ZKM/Center for Art
Art and
and Media
Media Karlsruhe
Karlsruhe and and The
The MIT MIT Press,
Press, 2005b,
2005b, p.p. 14-43.
14-43.
_________. On
_________. On the
the Modern
Modern Cult
Cult ofof the
the Factish
Factish Gods.
Gods. Durhman,
Durhman, NC NC & & London:
London: DukeDuke University
University Press,Press,
2010.
2010.
LINGARD, Robert
LINGARD, Robert & & Sam
Sam SELLAR
SELLAR (2013). (2013). Globalization,
Globalization, edu-business
edu-business and and network
network governance:
governance:
the policy
the policy sociology
sociology of of Stephen
Stephen J. J. Ball
Ball and
and rethinking
rethinking education
education policypolicy analysis.
analysis. London
London Review
Review
of Education,
of Education, 11:3,
11:3, 265-280.
265-280.
MANOVICH, Lev.
MANOVICH, Lev. ElEl lenguaje
lenguaje de de los
los nuevos
nuevos medios
medios de de comunicación.
comunicación. La La imagen
imagen en en lala era
era digital.
digital.
Barcelona: Paidós,
Barcelona: Paidós, 2006.
2006.
MASSCHELEIN, Jan;
MASSCHELEIN, Jan; SIMONS,
SIMONS, Maarten. Maarten. Defensa
Defensa de de lala escuela:
escuela: UnaUna cuestión
cuestión pública.
pública. Buenos
Buenos
Aires: Miño
Aires: Miño editorial,
editorial, 2014.
2014.
MONDZAIN, Marie-José.
MONDZAIN, Marie-José. L’image,
L’image, peut-elle
peut-elle tuer?.
tuer?. Paris:
Paris: Bayard,
Bayard, 2002.2002.
NESPOR, Jan.
NESPOR, Jan. Tangled
Tangled Up Up in in School.
School. Politics,
Politics, Space,
Space, Bodies,
Bodies, and and Signs
Signs inin the
the Educacional
Educacional Process.
Process.
Mahwah, NJ:
Mahwah, NJ: Lawrence
Lawrence Erlbaum
Erlbaum Associates,
Associates, 1996. 1996.
____________. Finding
____________. Finding Patterns
Patterns with with Field
Field Notes.
Notes. In: In: GREEN,
GREEN, Judith Judith et et al
al (comp.).
(comp.). Handbook
Handbook of of
Complementary Methods
Complementary Methods in in Education
Education Research.
Research. Mahwah,
Mahwah, NJ: NJ: Lawrence
Lawrence Erlbaum
Erlbaum Publ./AERA,
Publ./AERA,
2006, p.
2006, p. 297-308.
297-308.
POPKEWITZ, Thomas
POPKEWITZ, Thomas S. S. Curriculum
Curriculum history, history, schooling
schooling and and thethe history
history of of the
the present.
present. History
History
of Education.
of Education. Journal
Journal of of the
the History
History of of Education
Education Society,
Society, v.40,
v.40, n.1,
n.1, p.1-19,
p.1-19, 2011.
2011.
RANCIÈRE, Jacques.
RANCIÈRE, Jacques. El El maestro
maestro ignorante.
ignorante. Barcelona:
Barcelona: Laertes,
Laertes, 2003.2003.
ROCKWELL, Elsie.
ROCKWELL, Elsie. Hacer
Hacer escuela,
escuela, hacer
hacer estado.
estado. La La educación
educación posrevolucionaria
posrevolucionaria vista vista desde
desde Tlaxcala.
Tlaxcala.
Morelia: El
Morelia: El Colegio
Colegio de de Michoacán/CIESAS/CINVESTAV,
Michoacán/CIESAS/CINVESTAV, 2007. 2007.
ROBIN, Régine.
ROBIN, Régine. La La memoria
memoria saturada.
saturada. Buenos
Buenos Aires:Aires: Waldhuter,
Waldhuter, 2012. 2012.
ORTIZ, Rocio
ORTIZ, Rocio R. R. (Trans)formación
(Trans)formación sociotécnica,
sociotécnica, subjetividad
subjetividad yy política,política, Revista
Revista Pedagogía
Pedagogía yy
Saberes, nº.40,
Saberes, nº.40, 2014,
2014, p.11
p.11 -- 22.
22.
SERRES, Michel.
SERRES, Michel. Pulgarcita.
Pulgarcita. El El mundo
mundo cambió
cambió tanto
tanto que
que los
los jóvenes
jóvenes deben
deben reinventar
reinventar todo:
todo: una
una manera
manera dede
vivir juntos,
vivir juntos, instituciones,
instituciones, una una manera
manera de de ser
ser yy conocer....
conocer.... Buenos
Buenos Aires:Aires: Fondo
Fondo de de Cultura
Cultura
Económica, 2013.
Económica, 2013.
SIBILIA, Paula.
SIBILIA, Paula. ¿Redes
¿Redes oo paredes?
paredes? La La escuela
escuela en en tiempos
tiempos de de dispersión.
dispersión. Buenos
Buenos Aires:Aires: Tinta
Tinta Fresca,
Fresca,
2012.
2012.
SLOTERDIJK, Peter.
SLOTERDIJK, Peter. Actio
Actio in in Distans.
Distans. SobreSobre las las formas
formas de de producción
producción telerracional
telerracional del del mundo.
mundo.
In: ARANZUEQUE,
In: ARANZUEQUE, Gabriel Gabriel (ed.).
(ed.). Ontología
Ontología de de la
la distancia.
distancia. Filosofías
Filosofías de de la
la comunicación
comunicación en en la
la era
era
telemática. Madrid:
telemática. Madrid: AbadaAbada Ediciones,
Ediciones, 2010,2010, p.p. 141-167.
141-167.
SPIVAK, Gayatri.
SPIVAK, Gayatri. In In response.
response. Looking
Looking back,back, looking
looking forward.
forward. In: In: MORRIS,
MORRIS, RosalindRosalind (ed.).
(ed.). Can
Can
the Subaltern
the Subaltern Speak?
Speak? Reflections
Reflections on on thethe History
History of of anan Idea.
Idea. Nueva
Nueva York:York: Columbia
Columbia University
University
Press, 2010,
Press, 2010, p.
p. 227-236.
227-236.
STIEGLER, Bernard.
STIEGLER, Bernard. Phamarcologie
Phamarcologie de de l’épistème
l’épistème numérique.
numérique. In: In: STIEGLER,
STIEGLER, Bernard Bernard (ed.).
(ed.).
Digital Studies.
Digital Studies. Organologie
Organologie des des savoirs
savoirs et et technologies
technologies de de la
la connaissance.
connaissance. Paris:
Paris: FYPFYP éditions,
éditions, 2014,
2014,
p. 13-26.
p. 13-26.
TURKLE, Sherry.
TURKLE, Sherry. Alone
Alone Together.
Together. WhyWhy We We Expect
Expect More
More FromFrom Technology
Technology and and Less
Less From
From eacheach Other.
Other.
New York:
New York: Basic
Basic Books,
Books, 2011.
2011.
ZUCKERMAN, Ethan.
ZUCKERMAN, Ethan. Curating
Curating participation.
participation. Aperture
Aperture 214.214. New
New York:
York: Artbook,
Artbook, 2014,
2014, p.p. 36-42.
36-42.
ZUÑIGA, Rocío
ZUÑIGA, Rocío G. G. Del
Del usuario
usuario al al artista
artista mundano:
mundano: Facebook
Facebook como como ámbito
ámbito de de creación
creación yy
poetización de
poetización de lala vida.
vida. Revista
Revista Nexus
Nexus Comunicación,
Comunicación, vol. vol. 15,
15, 2014.
2014. Disponible
Disponible en: en:
http://nexus.univalle.edu.co/index.php/nexus/article/view/2976. Consultado
http://nexus.univalle.edu.co/index.php/nexus/article/view/2976. Consultado en: en: 08/02/2016.
08/02/2016.
311
311

vii. narrativa,
escrileitura,
ficção
312
312
313
313

para uma escrita académica inventiva:


o legado da teoria social pós-moderna

jorge ramos do ó11

Talvez
Talvez aa meditação
meditação paciente
paciente ee aa investigação
investigação rigorosa
rigorosa em
em volta
volta do
do que
que ainda
ainda se
se denomina
denomina
escritura,
escritura, emem vez
vez de
de permanecerem
permanecerem aquémaquém dede uma
uma ciência
ciência da
da escritura
escritura ou
ou de
de aa repelirem
repelirem
por
por alguma
alguma reação
reação obscurantista,
obscurantista, deixando-a
deixando-a –– aoao contrário
contrário –– desenvolver
desenvolver suasua positividade
positividade
ao
ao máximo
máximo de de suas
suas possibilidades,
possibilidades, sejam
sejam aa errância
errância dede um
um pensamento
pensamento fielfiel ee atento
atento ao
ao
mundo
mundo irredutivelmente
irredutivelmente porpor vir
vir que
que se
se anuncia
anuncia nono presente,
presente, para
para além
além dada clausura
clausura dodo
saber.
saber. O O futuro
futuro só
só se
se pode
pode antecipar
antecipar na na forma
forma do do perigo
perigo absoluto.
absoluto. Ele
Ele éé oo que
que rompe
rompe
absolutamente
absolutamente com com aa normalidade
normalidade constituída
constituída ee porpor isso
isso somente
somente se se pode
pode anunciar,
anunciar,
apresentar-se,
apresentar-se, na na espécie
espécie da
da monstruosidade.
monstruosidade. Para Para este
este mundo
mundo porpor vir
vir ee para
para oo que
que nele
nele
terá
terá feito
feito tremer
tremer osos valores
valores de
de signo,
signo, de
de fala
fala ee de
de escritura,
escritura, para
para aquilo
aquilo que
que conduz
conduz oo nosso
nosso
futuro
futuro anterior,
anterior, ainda
ainda não
não existe
existe epígrafe
epígrafe
(DERRIDA,
(DERRIDA, 2000, 2000, p.6)
p.6)

D epois do século XVII, a nossa civilização tem tratado as descrições


científicas como se fossem elas mesmas divindades e, a partir de finais da
centúria seguinte, sobrepusemos a Deus um amor ao sujeito e “a nós
próprios, na adoração da nossa própria natureza espiritual ou poética profunda” (RORTY,
1994, p. 45). Este texto propõe-se enfrentar essa tradição. Defenderei aqui a tese segundo a
qual um mar de possibilidades criativas se abrirão à nossa frente quando nos
descentrarmos do sujeito transcendental. Trata-se de substituir a essencialidade da identidade
por um trabalho permanente da redescrição do próprio sujeito e que tome sem receio a
autocriação como o fim último da investigação e da escrita decorrente dela. As práticas de
escrita deeveriam impor-se, soberanas, rasurando ou mesmo soterrando todas as
declarações que à nossa volta não cessam de teorizar e assimilar a identidade à
autoconsciência ou à posse da verdade de si. Por esta via da inquietude face à identidade e
da desconfiança relativamente ao conhecido do pensamento, a escrita académica ficaria
certamente mais aberta à reinvenção das condições propriamente éticas e estéticas dos
próprios escreventes. Numa palavra, à sua própria autotransformação.

o legado da teoria social pós-moderna


É amplamente sublinhado que o projeto de tomar o social como objeto, teorizando-
o e decompondo-o com o propósito de o sistematizar, constituiu uma preocupação da
modernidade, cujas origens remontam ao Iluminismo e às hipóteses formuladas pelos
grandes philosophes ao redor da emancipação da razão e da liberdade. Ao mesmo tempo
fácil será constatar que a reiterada obstinação, característica da ciência das Luzes, com a
racionalidade, o universalismo e a ideia de progresso tem sido abertamente questionada e
problematizada tanto nos planos epistemológico quanto ético nas últimas décadas do nosso
tempo. Isto é ponto assente e não oferece dúvidas. Mas, para sermos rigorosos, deveríamos
igualmente reconhecer que toda uma tradição de reflexão, anterior no tempo, antecipava já
o pós-modernismo, através de uma fortíssima vigilância crítica relativamente aos limites e
restrições da ordem social moderna. Com efeito, tanto as premissas desta, assim como os
seus artefactos culturais, foram abertamente abalados, avant la lettre e só para nomear os
mais conhecidos, por Nietzsche, Heidegger - vistos estes como fundadores da chamada
filosofia da diferença -, Simmel, Weber, Benjamin, Adorno, Horkheimer. A eles devemos,
de facto, as primeiras tentativas de problematizar e questionar frontalmente as proposições
11 Universidade
Universidade de
de Lisboa,
Lisboa, Instituto
Instituto de
de Educação.
Educação. Email:
Email: jorge.o@ie.ul.pt
jorge.o@ie.ul.pt
314|
314| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

analíticas do pensamento social moderno. E, por sobre todas, gostaria de destacar as


críticas tanto à reiterada presunção de que o conhecimento é progressivo, cumulativo,
total, universal e racional, noção esta que a imagem clássica da enciclopédia tão bem
corporiza, quanto ao princípio de que é o sujeito que deve estar no centro na análise e da
teoria e, ao mesmo tempo, que está origem do pensamento e da ação. Como se através dos
textos e interpretações que nos legaram aqueles colegas nascidos em pleno século XIX
pudéssemos começar a compreender, e por vezes de forma intensíssima, o quanto as bases
programáticas da modernidade estiveram historicamente tão distantes da verdade que o
mundo ia entretanto evidenciando. Refletindo sobre os postulados, as práticas e as
realizações da vida moderna, aqueles autores exploraram a “complexidade, a irregularidade
e a imprevisibilidade das consequências da modernidade”. Alertam-nos, portanto, para o
facto de que a racionalização que sobre a vida político-social se foi sucessivamente fazendo
obnubilava - senão mesmo recusava, através de enunciados, apresentados com valor de
verdade, nos quais o homem moderno surge como o herói vinculado unicamente à causa
ético-política da paz e da harmonia social -, a compreensão das contradições e dos lances
mais dramáticos e brutais que ela mesma ia engendrando (SMART, 2002, p.405-407).
A condição da análise social se aprofundar supõe, pois, o reconhecer-se que toda a
explicação que se imagine absoluta e onipotente, querendo esclarecer a ordem do mundo dos
homens e das coisas, está apenas ao serviço da legitimação, isto é, de uma série de práticas, de
uma auto-imagem cultural, de um discurso dominante e, no limite, de uma instituição.
Ora, o que nós tentamos fazer, a partir da variedade dos campos disciplinares em que nos
encontramos hoje, muitas vezes ignorando-os deliberadamente para os transpor, é
continuar esse gesto que procura produzir uma instabilidade de sentido face à episteme
moderna, posto que admitimos que não apenas o conhecimento científico quanto a ideia de
sujeito racional e autônomo têm de ser questionados das mais diversas formas.
Trabalhamos em prol de uma metafísica da presença, que rompa com os circuitos fechados
de significação e interpretação que durante séculos mediaram e empobreceram a nossa
relação com a realidade. Penso aqui no prólogo que Deleuze redigiu para Diferença e
repetição, livro aparecido em 1968. Exprimiu aí, como constituindo o “ar do tempo” que
então já se respirava, “um anti-hegelianismo generalizado”. Aquele em que o “primado da
identidade” já não bastava para definir “o mundo da representação”. A atualidade do pós-
guerra reafirmava a falência de todas as velhas forças que agiam “sob a representação do
idêntico”. Para Deleuze o espetáculo que o mundo já apresentava era o dos “simulacros”. E
explicava-se: “nele o homem não sobrevive a Deus, nem a identidade do sujeito sobrevive
à identidade da substância; todas as identidades são apenas simuladas, produzidas como
um efeito óptico por um jogo mais profundo, que é o da diferença e da repetição”
(DELEUZE, 2000b, p. 36).
Reivindicou ali, também de forma emblemática, a herança de Nietzsche, dizendo
que este inaugurara a pesquisa de “novos meios de expressão filosófica”, na demarcação
clara de todos quantos desejavam manter acantonada a filosofia ao passado. Deleuze
afirmou então que, graças ao autor de A gaia ciência, pudemos todos “descobrir o
intempestivo como sendo mais profundo que o tempo e a eternidade”, cabendo nesta
perspectiva à filosofia atual ultrapassar “a alternativa temporal-intemporal, histórico-
eterno, particular-universal”, melhor dito, tomar como ponto de partida uma crítica radical
dos pressupostos subjetivos e dos postulados que a própria disciplina foi assumindo como
naturais. De outro modo: depois de Nietzsche a filosofia não é mais a filosofia da história e
do eterno, mas “intempestiva, sempre e só intempestiva, isto é, contra este tempo, a favor,
espero, de um tempo que virá”. Daqui Deleuze partia para uma confissão metodológica na
qual assumia o trabalho inventivo como estando afastado de quaisquer predicados
antropológicos: “eu faço, refaço e desfaço os meus conceitos a partir de um horizonte
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 315
315

móvel, de um centro sempre descentrado, de uma periferia sempre deslocada que os repete
e diferencia”. A positividade do nosso tempo é a que nos faz crer num mundo em que “as
individuações são impessoais” e “as singularidades pré-individuais”. Por estas razões
Deleuze assumia que um livro de filosofia devia ser como um romance policial ou uma
ficção científica. No primeiro dos casos, tomava o princípio da especificidade, querendo
significar que os conceitos devem intervir na economia da narrativa unicamente para
resolver uma “situação local”, o que significa que se modificam com os problemas
(DELEUZE, 2000b, p. 37-38). No segundo, tinha em mente o princípio segundo o qual o
enredo do texto filosófico deveria, como na ficção científica, apontar para uma coerência
por vir, que já não seria da ordem do mundo. Daqui deriva a hipótese de uma escrita
inventiva, experimental, que se abeira e tateia o desconhecido. Deleuze exprimiu-se nestes
termos:
Ao
Ao escrevermos,
escrevermos, como
como evitar
evitar que
que escrevamos
escrevamos sobre
sobre aquilo
aquilo que
que não
não sabemos
sabemos ou ou
sabemos
sabemos mal?
mal? ÉÉ necessariamente
necessariamente nesteneste ponto
ponto que
que imaginamos
imaginamos terter algo
algo aa dizer.
dizer. Só

escrevemos
escrevemos na na extremidade
extremidade do do nosso
nosso próprio
próprio saber,
saber, nesta
nesta ponta
ponta extrema
extrema queque
separa
separa oo nosso
nosso saber
saber ee aa nossa
nossa ignorância
ignorância ee que
que faz
faz passar
passar um
um nono outro.
outro. ÉÉ apenas
apenas
deste
deste modo
modo que
que somos
somos determinados
determinados aa escrever.
escrever. Suprir
Suprir aa ignorância
ignorância éé transferir
transferir aa
escrita
escrita para
para depois
depois ou,
ou, antes,
antes, torna-la
torna-la impossível.
impossível. Talvez
Talvez tenhamos
tenhamos aí, aí, entre
entre aa
escrita
escrita ee aa ignorância,
ignorância, umauma relação
relação ainda
ainda mais
mais ameaçadora
ameaçadora que que aa relação
relação
geralmente
geralmente apontada
apontada entre
entre aa escrita
escrita ee aa morte,
morte, entre
entre aa escrita
escrita ee oo silêncio.
silêncio.
Falamos,
Falamos, pois,
pois, de
de ciência,
ciência, mas
mas dede uma
uma maneira
maneira que,
que, infelizmente,
infelizmente, sentimos
sentimos nãonão
ser
ser científica
científica (DELEUZE,
(DELEUZE, 2000b,
2000b, p.p. 38).
38).

Sistematizando, a relação crítica com a modernidade tende a consensualizar-se em


torno do repúdio dos universais, no pressuposto de que não existe qualquer denominador
comum que garanta a unidade do mundo, invoque-se para tanto a Natureza, Deus, a
Verdade ou o próprio Homem. Como também sugeriu Lyotard (2003) em A condição pós-
moderna, publicada pela primeira vez em 1979, a modernidade teria substituído as narrativas
divinas e providenciais do destino humano por outras, marcadamente seculares é certo, mas
que nem por isso seriam menos universalisantes ou metanarrativas: o predomínio da Razão
e do projeto iluminista; a dialética do espírito e a autoconsciência na sequência da filosofia
hegeliana; a emancipação dos sujeitos racionais ou trabalhadores fixada pelas correntes
marxistas. A época pós-moderna em que vivemos - “uma formação social na qual o
impacto da secularização, democratização, computorização e consumo vêm redesenhando
os mapas e reescrevendo o estatuto do conhecimento” (JENKINS, 1991, p.60) -, afirma, por
sua vez, a incredulidade face a esta visão essencialista da humanidade. As paisagens sociais
que se oferecem à nossa interpretação não comportam mais a verdade de que a ciência fala
através de um sujeito que se imagina soberano. A análise que nos é exigida terá, ao invés, de
dar conta da multiplicação e “maleabilidade das identidades”, da “complexidade e
incomensurabilidade dos mundos humanos”, do “cruzamento de fronteiras”, do
“hibridismo”, da “colagem” dos discursos contemporâneos, da “montagem e do pastiche”
nas produções artísticas e culturais; passa a ser obrigação do investigador perceber e
responder à complexidade das propostas e das soluções da vida social, processem-se estas
através da “ironia, ambiguidade e ambivalência”, através da “contingência e
provisoriedade” ou até mesmo da “indeterminação, insegurança, contradição e violência”
(BAUMAN, 1993; CONNOR, 2000; HARVEY, 1989). Os textos que seremos levados a
produzir neste contexto interpretativo assumir-se-ão exactamente como sendo isso mesmo,
como interpretações. E, em consciência, apenas se podem prestar a um só serviço – o da
perpétua expansão da explicação. Não há qualquer denominador comum que garanta que o
mundo seja uno ou que sustente a possibilidade de um pensamento natural e objetivo. A
principal, e porventura única, lei do pós-modernismo será a de que a informação não cessa
316|
316| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

de se multiplicar. O aumento de produção social registado no nosso tempo corresponderá


então, unicamente, a um acumular das perspectivas, dos modelos, dos ângulos, dos pontos
de vista contingentes dos investigadores que as subscrevem. Eis como se questiona a
universalidade das asserções de verdade e se passa a defender que o significado é uma
construção activa, dependente tanto da pragmática do contexto quanto de regras próprias
dos regimes discursivos. Neste quadro, é como se o trabalho da dialética de Hegel fosse
substituído pelos jogos da vontade de potência de que tanto falou Nietzsche.
Importa que nos detenhamos com algum vagar sobre o influente texto de Lyotard,
uma vez que nele é a “condição do saber nas sociedades mais desenvolvidas” que se toma
por objeto de estudo. O diagnóstico que A condição pós-moderna nos apresenta logo nas
primeiras páginas é o da crise ou desuso, na contemporaneidade, “do dispositivo
metanarrativo de legitimação” a que corresponde, especialmente, “a crise da filosofia
metafísica e da instituição universitária que dela dependia”. Lyotard toma pois a evidência
segundo a qual a função narrativa vem perdendo “os seus functores, o grande herói, os
grandes perigos, os grandes périplos e o grande objectivo”, para se dispersar “em nuvens de
elementos de linguagem narrativos, mas também denotativos, prescritivos, descritivos,
etc., veiculando cada um consigo valências programáticas sui generis”. À sua maneira estes
configuram a encruzilhada em que cada sujeito contemporâneo se encontra mergulhado. O
essencial do argumento fica devidamente explicitado quando Lyotard afirma que “nós não
formamos combinações de linguagem necessariamente estáveis e as propriedades das que
formamos não são necessariamente comunicáveis” (LYOTARD, 2003, p.11-12).
O problema da legitimação do saber coloca-se em termos inteiramente diferentes,
numa sociedade e numa cultura que não reconhece mais a credibilidade a qualquer discurso
unificador ou totalizante, tome ele a forma da especulação ou a da emancipação. Lyotard
defende então que, mercê do desenvolvimento das técnicas e das tecnologias a partir da
segunda guerra mundial, se registou um deslocamento do “acento para os meios de ação
em detrimento dos seus fins”. Desde então, a crise do saber científico parece resultar
invariavelmente do estiolamento, por um lado, “da trama enciclopédica na qual cada
ciência devia tomar o seu lugar” e, por outro, da chamada independência dos interlocutores
envolvidos na divulgação do conhecimento. Quanto ao primeiro destes aspectos, há a
assinalar que as configurações clássicas das diversas disciplinas científicas têm sofrido um
intenso “trabalho de problematização”, o que se vem traduzindo no “desaparecimento de
determinados saberes”, na produção de “encavalitamentos nas fronteiras das ciências” e,
por fim, no nascimento de “novos territórios”. Mas, para Lyotard, o rearranjo institucional
da “hierarquia especulativa dos conhecimentos” tem levado “as ‘antigas’ faculdades a
desagregarem-se em institutos e fundações de toda a espécie”, situação esta que conduz, na
maior parte das escolas de ensino superior, a uma lógica de transposição mecânica, e por
isso empobrecida, dos “saberes julgados estabelecidos” e ao assegurar, pela didáctica, “mais
a reprodução de professores que a de sábios”. Quanto ao segundo aspecto, enfatiza-se ainda
em A condição pós-moderna, o elemento que havia já surgido com a Aufklärung, aqui
denominado de “dispositivo da emancipação”. Trata-se da noção corrente que tende a
fundar a legitimidade da ciência e a sua verdade a partir da “autonomia dos interlocutores
empenhados na pratica ética, social e política”. Ora, nota Lyotard sobre este particular, a
ciência atual já não tem mais condições para sustentar a existência de enunciados
cognitivos e denotativos que se tomem como de valor prático, de alcance universal, que se
desejem impor como leis positivas. Por aqui se fixa uma importante tese acerca da pós-
modernidade, aquela que defende que “a ciência joga o seu próprio jogo e não pode
legitimar outros jogos de linguagem; por exemplo, o da prescrição escapa-lhe”. É assim que
também este autor aponta para o exercício auto-reflexivo, quando defende que o traço
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 317
317

marcante da ciência do nosso tempo é a “auto-imanência do discurso sobre as regras que o


validam” (LYOTARD, 2003, p.81-82; 111).
Uma vez longe de um metadiscurso de saber, há então que procurar pensar a
mudança de estatuto da ciência a partir da “pragmática da investigação” e da sua artesania.
No nosso tempo a legitimidade do saber advém para Lyotard, em primeira linha, da
performatividade. O “enriquecimento das argumentações” e a complexidade da
“administração das provas” são as características fundamentais que marcam o nosso ofício
de investigadores. A aceitação dos enunciados científicos vive hoje da “flexibilidade” dos
seus meios e da “multiplicidade” das linguagens. E o mais desafiante de tudo isto é que o
desenvolvimento do saber pode corresponder tanto a um desdobramento inesperado, a um
novo lance do argumento, como à invenção de novas regras, ou seja, a uma mudança do
próprio jogo. Lyotard descobre nesta prática da multiplicidade e da multiplicação um
deslocamento importante na própria “ideia de razão”. Em vez de uma metalinguagem
universal e de uma dialética do espírito, temos ante nós uma pluralidade de sistemas que
até se podem assumir publicamente como “formais e axiomáticos”, mas que todos sabemos
serem finitos no tempo e no espaço. E explica-se: “aquilo que passava por paradoxo ou
mesmo por paralogismo no saber da ciência clássica e moderna pode achar num destes
sistemas uma força de convicção nova e obter um assentimento na comunidade dos
peritos”. O sentido do saber na pós-modernidade é, desta sorte, deslocado dos domínios do
conhecido e da previsão para uma lógica de evolução perspectivada como “descontínua”,
“catastrófica”, “não retificável” e até “paradoxal”. A ciência que procuramos fazer “produz
não o conhecido mas o desconhecido”, reconhece. Aqui está para mim o essencial: a
investigação torna-se útil não por ter um “método científico”, mas antes porque apresenta
uma metodologia de trabalho teórico e empírico que, tornando manifestos os pressupostos
sobre que ela mesma se constrói, permite ato contínuo a aparição de novas ideias e de
novos enunciados. O modelo de legitimação é agora marcado pelo inesperado, melhor dito,
por uma atividade diferenciante ou de imaginação. E o conceito de diferença é traduzido
por Lyotard por “paralogia”, remetendo este diretamente para as noções de sistema aberto,
de co-variação, de consenso local e de informação completa no momento considerado, de
metargumentação finita e limitada. O cenário de política científica em que estamos, e ao
mesmo tempo por que nos batemos no interior da instituição universitária, mau grado os
reveses e refluxos, é, segundo as suas palavras, marcado pelo “desejo de justiça e do
desconhecido” (LYOTARD, 2003, p.87-90; 119; 133).

preparar o encontro com o desconhecido


Creio que o grande problema face à investigação, e que tentamos transpor para a
realidade do texto, é e será sempre o de forçar o presente a sair dos processos de significação
existentes e seus correlatos interditos, a disponibilizar-se a todo o tipo de encontro com o
desconhecido. Eis porque importa sublinhar que os objectos de pesquisa se delimitam,
aprofundam e concretizam numa resistência individual, propriamente da ordem ético-
política, que se determina em confrontar os enunciados que circulam e se tomam por
certezas consensuais, a fim de mudar a consciência de si. Trata-se portanto de um trabalho
sobre o sujeito e não tanto sobre os outros. Como se a escrita pudesse assumir não apenas
uma dimensão céptica mas mais rigorosamente uma força agonística – em que o que se
toma por universal, necessário e obrigatório se passe a perceber como singular, contingente
e arbitrário –, e cujo efeito último fosse o de nos desencartarmos da previsibilidade e
homogeneidade disciplinar com que se apresentam as identidades e os modos de vida
contemporâneos, mesmo se postos a circular com a rotulagem da subjectividade e da mais
ampla diversidade individual. Como se ela nos forçasse a entrar no não conhecido e, dessa
forma, nos pressionasse ao estabelecimento de novos pactos entre o sujeito da enunciação e o
318|
318| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

sujeito da conduta. Já regresso por esta via uma vez mais a Deleuze e às suas considerações
sobre a potência da escrita, quero dizer, sobre a produção mesma da vida:
Escrever
Escrever nãonão éé certamente
certamente impor
impor uma
uma forma
forma (de(de expressão)
expressão) aa uma
uma matéria
matéria vivida
vivida
[...].
[...]. Escrever
Escrever éé uma
uma tarefa
tarefa de
de devir,
devir, sempre
sempre inacabada,
inacabada, sempre
sempre aa fazer-se,
fazer-se, ee que
que
extravasa
extravasa toda
toda aa matéria
matéria que
que se
se pode
pode viver
viver ouou vivida.
vivida. ÉÉ um
um processo,
processo, quer
quer dizer,
dizer,
uma
uma passagem
passagem de de Vida
Vida que
que atravessa
atravessa oo vivível
vivível ee oo vivido.
vivido. A
A escrita
escrita éé inseparável
inseparável
do
do devir:
devir: ao
ao escrevermos,
escrevermos, devimos-mulher,
devimos-mulher, devimos-animal
devimos-animal ou ou vegetal,
vegetal, devimos
devimos
molécula
molécula até até aoao devir-imperceptível
devir-imperceptível [...].
[...]. Devir
Devir nãonão éé atingir
atingir uma
uma forma
forma
(identificação,
(identificação, imitação,
imitação, Mimesis),
Mimesis), masmas encontrar
encontrar aa zona
zona de
de vizinhança,
vizinhança, de de
indiscernibilidade
indiscernibilidade ou ou de
de identificação
identificação tal
tal que
que jájá não
não nos
nos podemos
podemos distinguir
distinguir dede
uma
uma mulher,
mulher, dede um
um animal
animal ouou de
de uma
uma molécula
molécula (DELEUZE,
(DELEUZE, 2000a,
2000a, p.11-12).
p.11-12).

Escreve-se para tentar aceder ao multiforme da existência. Nessa perspectiva torna-


se forçoso admitir que as figuras do Único e do Último – aquelas que na nossa cultura
melhor simbolizam o fechamento tanto da identidade de si do sujeito quanto do saber
científico - são exactamente as que a linguagem, como a vamos aqui entendendo, torna
impossíveis de serem pronunciadas. Também em vários livros compostos de textos-
fragmento do filósofo Giorgio Agamben se sucedem as considerações acerca da escrita
enquanto exercício prático de choque contra os enunciados que se alimentam da ilusão da
identidade e da verdade. Lembra-nos, em Profanações e cotejando a este respeito Michel
Foucault, que a escrita é um dispositivo humano e que a história dos homens outra coisa
não é “que o incessante corpo com dispositivos que eles próprios produziram - e antes de
qualquer outro, a linguagem”. Também por aqui se começará a poder discutir criticamente
as razões pelas quais a figura do autor, ainda tão mitificada entre nós, se deve secundarizar
- na terminologia de Agamben: “permanecer inexpressa” - face à obra e ao não-
conhecimento que a linguagem sempre determina e encerra. A existir alguma
subjectividade ela é produzida no momento em que o ser vivo encontra a linguagem, e
nesta se põe em jogo “sem reservas”. Somos o que conseguirmos exibir nessa
irredutibilidade. O que está em causa na escrita “não é tanto a expressão de um sujeito
quanto a abertura de um espaço em que o sujeito que escreve não pára de desaparecer”,
esclarece Agamben (2006, p.100; 83-84). “Qualquer é a figura da singularidade pura”,
adianta em A comunidade que vem, livro em que procura trabalhar o problema do
conhecimento fora da dicotomia entre o “caráter do indivíduo” e a “inteligilidade dos
universais”. O ser que falta acontecer, o ser por vir é, para Agamben, o “ser qualquer”. E
essa singularidade pura de que nos fala não remete para a identidade, mas antes para a
“indeterminação” e para a relação com a ideia, isto é, na sua definição precisa “para a
totalidade das suas possibilidades”. Então o que alguém, um qualquer acrescenta a uma
singularidade é apenas a deslocação de um “limite”, um “espaço vazio”, uma
“exterioridade pura”. Qualquer deve ser tomado pois como “o acontecimento do exterior”
(AGAMBEN, 1993, p.11-12; 53-54).
Em Profanações encontra-se uma discussão detalhada acerca da etimologia,
significação e usos de Genius, deus que a tradição latina começou por apresentar como
protetor de cada homem desde o seu nascimento. Agamben mostra aí, recolhendo
exemplos de diferente origem - registando a sua presença constante em narrativas que
reiteram uma aproximação do génio ora do ato da geração, ora das qualidades físicas e
morais inatas de cada um, ora de uma relação secreta que cada um pode ter com o seu deus
-, como também este conceito tem estado associado ao que é “mais impessoal, a
personalização daquilo que, em nós, nos ultrapassa e excede”. Sugere, com esta análise, que
a espiritualidade não remete apenas para o que se considera nobre e transcendente. A tese
de Agamben neste particular é a de que “todo o impessoal em nós é genial”, que a nossa
vida se joga naquilo que nos não pertence ou que qualquer iniciativa de se apropriar de
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 319
319

Genius, “de o obrigar a assinar em seu nome, está, necessariamente, votada ao fracasso”. É
à luz desta evidência que se podem entender tanto as operações irónicas das vanguardas -
de inoperacionalidade, descaracterização, des-criação ou, mesmo, destruição da própria
obra de arte - como a ideia frequentemente associada a Duchamp segundo a qual “o artista
verdadeiramente genial é aquele que é desprovido de obra”. Não obstante, o fundamental
passa por entender que, aceitar viver com a presença de Genius, significa que se admite
uma relação de intimidade de um ser estranho, “estar constantemente em relação com uma
zona de não conhecimento”, que se sobrepõe à noção de si mesmo e de consciência. Genial
é aqui sinónimo de impessoal, já se vê. E a criação, o consubstanciar desse caminhar para o
desconhecido, em que o Eu “assiste, alegre, ao seu próprio esfacelamento”. Traduzindo e
adaptando ao desejo de escrever: “sinto que, algures, Genius existe, que existe, em mim,
um poder impessoal que impele à escrita”. E Agamben (2006, p.9-23) conclui: “Genius é a
nossa vida naquilo que não nos pertence”.
São pois forças-outras que nos atravessam, capturam e põem em jogo quando
escrevemos. Poderemos tomar partido, separar, dividir, confrontar - enfim dizer alguma
coisa -, mas nunca exprimir o Todo sobre as coisas ou nós mesmos. Duplicidade e não
unicidade é o que resulta do abandono ao trabalho insistente sobre a palavra. Qualquer
“ato de acabamento do pensamento”, sublinha Agamben em Ideia da prosa, “deve dissolver-
se inteiramente na linguagem”, tornando-se assim possível projectar e decifrar novas
formas de vida. E a sua conclusão a este respeito só podia remeter-nos para a evidência de
que “é precisamente a ausência de um objecto do conhecimento que nos salva da tristeza
sem remédio das coisas” (AGAMBEN, 1999, p.102; 46). É a falta - a falta incessante - que a
escrita exprime.
A imperiosa necessidade de bem associar o seu exercício a uma consciência do infinito
da linguagem há-de fatalmente conduzir-nos até Maurice Blanchot. E a ter de permanecer
junto aos seus textos com a maior atenção, tal a amplitude de planos, superfícies e figuras
que faz suceder com a finalidade de dar conta desse enigma, dessa estranha paixão do
incessante a que também se dá o nome de escrita. Esta, para Blanchot, afirma um eu vasto,
esparso, descontínuo, cindido, impessoal; materializa uma narrativa que se produz e relata
a si própria, que muda incessantemente de direcção porque, na procura do acontecimento,
se descaminha dele e vê espelhar-se no seu âmago a diferença, o contraditório, quando não
mesmo o absurdo; faz sonhar a obra como navegação contra o vazio ou a mais pequena
lacuna, mas o que mais ocorre suceder-lhe é ligar-se a um tempo-outro, indeterminado, até
que, quando enfim se dá o momento da sua própria concretização, eis que se percebe
novamente exposta a um vazio, a um apagamento, ao deserto, a uma distância, a um novo
pôr-se a caminho. Blanchot tudo fez para nos convencer que a felicidade da criação supõe a
indeterminação da obra, a exclusão de qualquer alusão a um fim ou destino último -
sempre o questionamento e, como há pouco com Agamben, o mesmo movimento de
procura e afirmação da exterioridade. Ele vai decompondo, dir-se-ia com a atenção de um
joalheiro, os mil problemas que a prática da escrita desenterra. Jamais deixa de a vincular à
metamorfose e, por isso, a seu ver a lei secreta desta prática é a do livro por vir.
É justamente para essa região, de todas a menos reflectida, que me quero dirigir já a
partir dos seus textos. Blanchot toma preferencialmente a literatura como domínio
preferencial, mas o certo é que as suas análises sobre os escritos de Homero, Mallarmé,
Sade, Proust, Kafka, Mellvile, Musil, Joyce, Borges, Beckett, entre muitos outros, o
fizeram amiúde penetrar também nos territórios da filosofia, com referências frequentes a
Heráclito, Espinosa, Nietzsche, Heidegger, Wittgenstein, Levinas etc. Ademais a sua voz
brilha sem parar em muitos dos movimentos de arranque teórico-metodológico de Barthes,
Deleuze, Foucault ou Derrida, nomes que não cessam de nos visitar neste texto. O efeito
Blanchot associa-se, creio, à possibilidade de uma pesquisa à volta da linguagem poder
320|
320| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

somar argumentos em favor da palavra plural - fundada não mais numa lógica dos pares
antinómicos igualdade-desigualdade, predominância-subordinação, mas, antes, na
dissimetria e na reversibilidade - e da compreensão da “potência de infinito” que a escrita
transporta no seu interior. O primeiro dos três volumes de A conversa infinita, publicado
em França em 1969, começa então por anunciar e explicar a “exigência do escrever” como
estando ao serviço da tese do “fim do livro” ou da “ausência de livro”. Todo um programa
teórico se parece ir construindo em análises de caso destinadas a questionar e abalar o
movimento tendente à unificação e à totalidade da “civilização do Livro”. A pesquisa sobre
a literatura que Blanchot empreende procura estabelecer, nos escritores que nos precedem
no tempo, a performatividade trangressora da escrita, melhor dito, a experiência limite que
ela manifesta (BLANCHOT, 2001, p.36; 39; 8-9). Em seu entender, o trabalho escritural é
desde sempre atingido por um efeito de desmultiplicação ou pela aproximação a outros
espaços, porque é a própria verdade ou lei que por ele se vê posta em causa. Retiro da
abertura daquele primeiro volume de Maurice Blanchot um fragmento que, na economia
geral da minha narrativa, desejaria pudesse soar a manifesto, quero dizer, à questão
decisiva de explicitar um território
território em
em torno
torno do qual alguém assuma um compromisso
irrevogável, de transgressora pertença vital:
Escrever,
Escrever, aa exigência
exigência de de escrever:
escrever: não não mais
mais aa escrita
escrita queque sempre
sempre se se pôs
pôs (por
(por uma uma
necessidade
necessidade nadanada evitável)
evitável) aa serviço
serviço da da palavra
palavra ou ou dodo pensamento
pensamento dito dito idealista,
idealista,
ou
ou seja,
seja, moralizante,
moralizante, mas mas aa escrita
escrita que,
que, por
por sua
sua força
força propriamente
propriamente liberadaliberada (força
(força
aleatória
aleatória de
de ausência),
ausência), parece
parece consagrar-se
consagrar-se apenasapenas aa si si mesma,
mesma, permanecendo
permanecendo sem sem
identidade
identidade e, e, pouco
pouco aa pouco,
pouco, libera
libera possibilidades
possibilidades totalmente
totalmente diferentes,
diferentes, um um jeito
jeito
anónimo,
anónimo, distraído,
distraído, diferido
diferido ee disperso
disperso de de estar
estar em em relação,
relação, um um jeito
jeito por por
intermédio
intermédio do do qual
qual tudo
tudo éé questionado,
questionado, e, e, para
para começar,
começar, aa ideia ideia dede Deus,
Deus, do do Eu,
Eu,
do
do Sujeito,
Sujeito, depois
depois da da Verdade
Verdade ee do do Uno,
Uno, depois
depois aa ideia
ideia de de Livro
Livro ee da da Obra,
Obra, de de
maneira
maneira queque essa
essa escrita
escrita (entendida
(entendida no no seu
seu rigor
rigor enigmático),
enigmático), longe longe de de terter por
por
meta
meta oo Livro,
Livro, assinalaria
assinalaria antes
antes oo seuseu fim:
fim: escrita
escrita queque se se poderia
poderia dizer
dizer fora
fora do do
discurso,
discurso, fora
fora da da linguagem.
linguagem. [...][...]
Quando
Quando me me refiro
refiro aoao ‘fim
‘fim dodo livro’,
livro’, ou
ou melhor,
melhor, àà ‘ausência
‘ausência de de livro’,
livro’, não
não penso
penso
aludir
aludir aoao desenvolvimento
desenvolvimento dos dos meios
meios audiovisuais
audiovisuais de de comunicação
comunicação com com que que
tantos
tantos especialistas
especialistas se se preocupam.
preocupam. Que Que se se interrompa
interrompa aa publicação
publicação de de livros
livros em em
benefício
benefício dede uma
uma comunicação
comunicação pela pela voz,
voz, pela
pela imagem,
imagem, ou ou pela
pela máquina,
máquina, isso isso emem
nada
nada modificaria
modificaria aa realidade
realidade daquilo
daquilo que que denominamos
denominamos ‘livro’: ‘livro’: aoao contrário,
contrário, aa
linguagem,
linguagem, como como palavra,
palavra, nele
nele afirmaria
afirmaria aindaainda mais mais suasua predominância,
predominância, sua sua
certeza
certeza dede ser
ser uma
uma verdade
verdade possível.
possível. Em Em outras
outras palavras,
palavras, oo LivroLivro indica
indica sempre
sempre
uma
uma ordem
ordem submetida
submetida àà unidade,
unidade, um um sistema
sistema de de noções
noções em em que
que se se afirma
afirma oo
primado
primado da da palavra
palavra sobre
sobre aa escrita,
escrita, do do pensamento
pensamento sobre sobre aa linguagem,
linguagem, ee aa
promessa
promessa de de uma
uma comunicação
comunicação que que algum
algum dia dia será
será imediata
imediata ee transparente.
transparente.
Ora,
Ora, éé possível
possível queque escrever
escrever exija
exija oo abandono
abandono de de todos
todos esses
esses princípios,
princípios, ou ou seja,
seja, oo
fim
fim ee também
também aa conclusão
conclusão de de tudo
tudo oo que
que garante
garante aa nossanossa cultura,
cultura, nãonão para
para voltar
voltar
idilicamente
idilicamente atrás,
atrás, mas,
mas, antes,
antes, para
para irir além,
além, ou ou seja,
seja, até
até ao
ao limite,
limite, com
com oo objetivo
objetivo
de
de tentar
tentar romper
romper oo círculo
círculo dede todos
todos os os círculos:
círculos: aa totalidade
totalidade dos dos conceitos
conceitos que que
funda
funda aa história,
história, nela
nela sese desenvolve
desenvolve ee da da qual
qual elaela éé oo desenvolvimento.
desenvolvimento. Escrever, Escrever,
nesse
nesse sentido,
sentido, (...)
(...) supõe
supõe umauma mudança
mudança radical
radical de de época
época –– aa própria
própria morte,
morte, aa
interrupção
interrupção –– ou, ou, para
para falar
falar hiperbolicamente,
hiperbolicamente, oo ‘fim ‘fim dada história’,
história’, ee nisso
nisso passa
passa
pelo
pelo advento
advento do do comunismo,
comunismo, visto visto que
que oo comunismo
comunismo continua continua sempre
sempre aa estar estar
além
além dodo comunismo.
comunismo. Escrever,
Escrever, então,
então, passa
passa aa serser uma
uma responsabilidade
responsabilidade terrível.terrível.
Invisivelmente,
Invisivelmente, aa escritaescrita éé convocada
convocada aa desfazer
desfazer oo discurso
discurso no no qual,
qual, porpor mais
mais
infelizes
infelizes queque nos nos acreditemos,
acreditemos, mantém-nos,
mantém-nos, nós nós que que deledele dispomos,
dispomos,
confortavelmente
confortavelmente instalados.
instalados. Escrever,
Escrever, dessedesse ponto
ponto de de vista,
vista, éé aa maior
maior violência
violência
que
que existe,
existe, pois
pois transgride
transgride aa Lei,Lei, toda
toda aa lei
lei ee sua
sua própria
própria lei lei (BLANCHOT,
(BLANCHOT, 2001, 2001,
p.8-9).
p.8-9).

Quem se recolhe e se preserva na solidão da escrita está forçado a compreender que


a obra não termina. O que se expressa num livro será recomeçado ou mesmo destruído
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 321
321

noutro. Em O espaço literário, volume publicado ainda em meados dos ano 50, Blanchot
refere-se a esta evidência como sendo a do “privilégio do infinito” - a existência de um
lugar concreto, fechado, onde a solidão mais essencial dá corpo a uma prática que não cessa
nunca. Todos os desfechos ou desenlaces que o escritor ou o artista experimentam, seja por
pressão do editor, por razões financeiras ou outras circunstâncias da vida comum, não
impedem o prosseguimento e a retoma do trabalho que deixou para trás. Nesta
perspectiva, há então que compreender que “o infinito da obra é tão só o infinito do
próprio espírito”. O escritor escreve “um livro, mas o livro não é ainda a obra”; sucede-lhe
terminar e publicar o primeiro mas ele sabe que só pertence à segunda. E, por isso, volta a
pôr as mãos à obra, a redizer, regressa a um tema privilegiado, repisa, retoma a palavra num
ponto qualquer para então novamente a dispersar em nova diversidade de pensamentos ou
de assuntos. A narrativa expressa uma potência de nascente que não logra encontrar um
desfecho firme. Ora, sobre este preservar-se no recomeço há que tirar algumas conclusões.
Desde já esta: que o texto pertence “à sombra dos acontecimentos, não à realidade, à
imagem, ao objecto”. Para Blanchot, as palavras podem confundir-se com “aparências” e,
por isso, é fundamental que não nos equivoquemos mais a seu respeito, tomando-as como
representando o “poder de verdade”. A obra apenas revela que escrever “é o interminável,
o incessante”. O escritor, prossegue, “já não pertence ao domínio magistral em que
exprimir-se significa exprimir a exactidão e a certeza das coisas e dos valores segundo o
sentido de seus limites” (BLANCHOT, 2001, p.11-16).
Deste modo a autoridade de uma afirmação escrita passa a estar no que se escreve e
não mais na assinatura do autor. Por esta importante razão, também Blanchot insiste tanto
na necessidade de “quebrar o vínculo” ou em “romper o elo” que une “a palavra ao eu”. A
relação não é entre um autor que fala para um leitor com a autoridade de quem domina e
fornece o entendimento. E se se aceita que escrever mais não é que descobrir e incorporar o
interminável e o incessante, então ter-se-á de ir mais fundo e tirar outra consequência.
Blanchot regista aqui uma transformação decisiva. Passa ela por renunciar ao eu, aceitando
que “o escritor pertence à linguagem que ninguém fala, que não se dirige a ninguém, que
não tem centro, que nada revela; ele pode acreditar que se afirma nessa linguagem, mas o
que afirma está inteiramente privado de si”. No escritor encontra-se a mediação e o
murmúrio que vão permitindo à linguagem, num processo de disseminação infinita, ir-se
convertendo em imagem e argumento. Ele faz-se eco do que não pode deixar de ser dito.
As mudanças que se detectam no curso da linguagem não supõem que o escritor trabalhe
numa região que se move por princípios racionais, que levem a glorificar-se a consciência,
o progresso e a superação, num movimento ascensional em direção à verdade última e ao
universal. E já regressamos ao argumento central que aqui me traz. O escritor - o
investigador - não está no trilho de “um mundo mais seguro, mais belo, mais justificado,
onde tudo se ordenaria segundo a claridade de um dia justo”; e também “não descobre a
bela linguagem que fala honrosamente para todos”. O que se exprime nele, sustenta ainda
Blanchot, é uma decorrência do facto “de que, de uma maneira ou de outra, já não é ele
mesmo, já não é ninguém”. Temos então que a máquina sem fim da linguagem determina
o “apagamento” daquele que escreve. E que, em vez da autoridade de um sujeito soberano
ou de um herói, estamos perante enigmas e questões que se revezam (BLANCHOT, 2001,
p.17-18).
Os escritos literários de Stéphane Mallarmé e de Jorge Luís Borges podem tomar-se
como ilustrações impressivas do infinito da linguagem e consequente apagamento do
autor. Num pequeno capítulo de O livro por vir, e a propósito deste escritor argentino,
Blanchot começa por afirmar que toda a verdade da literatura
literatura se
se encontra “no erro do
finito”, logo nos esclarecendo que é o estar a caminho - essa circunstância do escritor
sonhar o fim sem contudo o poder encarar que permite transformar o que se imagina
322|
322| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

finito em infinito. Borges é aqui tomado como o “homem essencialmente literário”, ou


seja, aquele que nos surge “sempre pronto a compreender segundo o modo de compreensão
que a literatura autoriza”. As ficções e falsificações de Borges, que dão conta de um sujeito
“desértico e labiríntico” - aquele que caminha sem poder parar –, reiteram a ideia segundo
a qual o mundo e o livro se refletem e confundem eternamente, numa multiplicação
“cintilante”. Nos seus trabalhos literários, deixa portanto de haver limites de referência, o
que normalmente se toma por real e irreal, tudo acontecendo na reciprocidade de um jogo
de espelhos. Borges terá, por consequência, assimilado que a literatura “comporta algo de
perigoso”. E o risco não decorre dela “nos levar a imaginar que existe algures entre nós
“um grande autor, absorvido em mistificações imaginosas”, mas, bem diversamente, em
“nos fazer sentir a aproximação de uma estranha potência, neutra, impessoal”. Blanchot
cita Borges que terá escrito acerca de Shakespeare: “‘parecia-se com todos os homens,
exceto no facto de se parecer com todos os homens’”. Ou seja: Borges vê em todos os
autores um só autor. O único sentido que a narrativa tem é o que nos faz entender que não
estamos perante “acontecimentos que se realizam realmente, nem perante pessoas que os
realizam pessoalmente, mas perante um conjunto preciso e indeterminado de versões
possíveis” (BORGES, 1984, p. 103-106;158-159).
No ensaio dedicado a Mallarmé começa por se interrogar sobre qual o significado
da palavra Livro neste poeta e logo a ideia da impersonificação se impõe: “o livro que é o
Livro é um livro entre outros”. O devir do desaparecimento falante do autor reaparece com
outra intensidade quando Blanchot reproduz esta conhecida afirmação do poeta de L'Après-
midi d'un faune: “‘a obra implica o desaparecimento elocutório do poeta, que cede a
iniciativa às palavras, pelo choque da sua desigualdade mobilizada’”. Tudo como se o livro
só o pudesse ser quando deixasse de remeter para aquele que o teria escrito. As palavras
apenas designam a extensão das suas relações e, nessa medida, o espaço em que se
projetam vai-se disseminando. Regista-se em seu torno um movimento de máxima
dispersão e diversidade. A compreensão da espessura e das várias dimensões do espaço
produzido pela linguagem terá sido fundamental para Mallarmé, que afirmou ter
experimentado sintomas inquietantes e abismos desesperantes causados pelo ato simples
de escrever. Nele, elucida-nos Blanchot, “uma frase não se limita a desenrolar-se
linearmente: abre-se; através dessa abertura escalonam-se, desprendem-se, espaçam-se e
estreitam-se de novo, a diferentes níveis de profundidade, outros movimentos de frases,
outros ritmos de palavras que se relacionam entre si segundo firmes determinações de
estrutura”. A origem criativa da aventura do movimento poético pode, assim, ser definida
como a de um espaço que se aproxima de outro espaço, de uma prática analítica que procura
entender, através da sua mobilidade falante, não o real conhecido do tempo presente, mas
aceder a outra coisa. A partir dos problemas teóricos que Mallarmé se colocou a si próprio,
Blanchot pode, pois, aprofundar as suas teses fundamentais associando a escrita à
construção da mudança. Uma delas é que a presença da poesia e de toda a literatura “é uma
presença por vir: vem para além do futuro e não cessa de vir quando aí está”. E outra é que
“a obra é a espera da obra; só nesta espera se reúne a atenção impessoal que tem por
caminhos e por lugar o espaço próprio da linguagem” (BLANCHOT, 1984, p. 234-255).
Porque nela é a atração pelo exterior que domina, a escrita materializa a experiência mais
radical da alteridade, a da saída de si.
Ora, também o discurso filosófico é marcado por conceitos que visam, sem sucesso,
atingir o que Blanchot denomina de “reino seguro” ou “espaço de permanência” onde a
verdade possa ser ressuscitada. Com efeito, incansavelmente se procura edificar um
mundo, “a fim de que a secreta dissolução, a universal corrupção que rege o é” possa ser
suspensa ou mesmo esquecida ante a coerência do aparato conceptual, as noções, objectos e
relações estabelecidas entre eles por meio da nossa análise. Mas eis que uma outra busca se
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 323
323

transforma na abertura de uma crise, e um novo movimento para fora que faz desvanecer o
sentido, a ideia, o universal. Na palavra filosófica é igualmente o exterior que fala. Por essa
razão a possibilidade é, para Blanchot, muito mais do que a realidade. A primeira funda a
segunda e é assim que, também ele, chega à noção de potência e ao trabalho da construção
da diferença. A possibilidade, esclarece-nos, “é o ser mais o poder de ser”. E, de um modo
mais rigoroso e porventura mais instigante, afirma sobre as dimensões essenciais da nossa
existência individual: “é somente com o poder de sê-lo que se é aquilo que se é; aqui vemos
logo que o homem não tem somente possibilidades, mas ele é a sua possibilidade”. Outra
vez, estamos ante o desafio de enfrentamento a todos os poderes estabelecidos a partir de
uma dimensão auto-reflexiva. As relações “no mundo e com o mundo” passam a ser
compreendidas como relações de potência, estando esta “contida na possibilidade”.
Quando alguém toma a palavra, e mesmo ficando nos “traços mais aparentes da
linguagem”, entra sempre numa relação de potência: “eu pertenço, quer saiba quer não, a
uma rede de poderes da qual me sirvo, lutando contra a potência que se afirma contra
mim”. Também para Blanchot “toda a palavra é violência, violência tanto mais temível
quanto secreta” (BLANCHOT, 2001, p. 73; p.85-86).
Interrogamo-nos sem trégua, e não mais ontem que hoje, sobre o tempo e as formas
de vida que ele instala. Ainda de acordo com o testemunho de Maurice Blanchot, a
capacidade de nos mantermos em exercício neste jogo relacional com o curso do mundo e
connosco mesmos está dependente de perceber que a maneira de ser da escrita se define pelo
questionamento e que este, uma vez desencadeado, não termina nunca. A palavra torna-se o
lugar da dispersão e da fuga do sentido porque existe uma fantástica força que produz um
revezamento permanente entre o todo e o ser. Ora, essa força ou poder materializa-se no
próprio ato de questionar. Em A conversa infinita sucedem-se as páginas destinadas a
elucidar-nos como uma estrutura cognitiva vai sempre desviando “o questionamento de
ser questão e de obter uma resposta” definitiva que apazigúe o espírito. Há
invariavelmente nas nossas perguntas um contacto com algo de mais fundo que “se furta a
toda a questão e excede todo o poder de questionar; o questionamento é a própria atração
deste desvio” (BLANCHOT, 2001, p.41-61). É este que sobrecarrega a palavra escrita de
uma relação de infinidade e estranheza, produzindo um campo essencialmente
dissimétrico e descontínuo, que inviabiliza o discurso de se esterilizar. O trabalho da
questão impede o pensamento de tender para a unidade e de realizar o todo.
Questionar
Questionar éé buscar,
buscar, ee buscar
buscar éé buscar
buscar radicalmente,
radicalmente, ir ir ao
ao fundo,
fundo, sondar,
sondar,
trabalhar
trabalhar oo fundo
fundo e,
e, finalmente,
finalmente, arrancar.
arrancar. EsseEsse arrancar
arrancar dede raiz
raiz éé oo trabalho
trabalho dada
questão.
questão. Trabalho
Trabalho do do tempo
tempo [...].
[...]. Freud
Freud afirma
afirma mais
mais ouou menos
menos que que todas
todas as
as
questões
questões atabalhoadas
atabalhoadas das das crianças
crianças lhes
lhes servem
servem de de revezamento
revezamento para para aa questão
questão
que
que elas
elas não
não formulam,
formulam, ee que que éé aa questão
questão da da origem.
origem. Da Da mesma
mesma forma,forma,
interrogamo-nos
interrogamo-nos acerca acerca de de tudo
tudo aa fim
fim de de manter
manter em em movimento
movimento aa paixãopaixão pela
pela
questão,
questão, masmas todas
todas elas
elas se
se dirigem
dirigem para
para uma
uma única,
única, aa questão
questão central,
central, ouou aa questão
questão
de
de tudo
tudo [...].
[...]. A
A questão
questão inaugura
inaugura um um tipo
tipo de
de relação
relação caracterizada
caracterizada pelapela abertura
abertura ee
oo livre
livre movimento
movimento [...].[...]. A
A questão
questão espera
espera aa resposta,
resposta, mas
mas aa resposta
resposta nãonão apazigua
apazigua
aa questão
questão e, e, embora
embora elaela encerre,
encerre, não
não termina
termina com com aa espera
espera queque éé aa questão
questão dada
questão
questão [...].
[...]. Toda
Toda aa questão,
questão, hoje,
hoje, já já éé aa questão
questão dede tudo.
tudo. Essa
Essa questão
questão dede
conjunto,
conjunto, que que não
não deixa
deixa nada
nada dede fora
fora ee nos
nos confronta
confronta constantemente
constantemente com com tudo,
tudo,
numa
numa paixão
paixão abstracta
abstracta extenuante,
extenuante, está está presente,
presente, para
para nós,
nós, emem todas
todas as as coisas
coisas
[...].
[...]. Questionar
Questionar éé jogar-se
jogar-se na na questão.
questão. A A questão
questão éé esse
esse convite
convite ao ao salto,
salto, que
que não
não
se
se detém
detém numnum resultado.
resultado. ÉÉ necessário
necessário um um espaço
espaço livre
livre para
para saltar,
saltar, ee éé necessário
necessário
um
um solo
solo firme,
firme, éé preciso
preciso um um poder
poder que,
que, aa partir
partir da
da imobilidade
imobilidade segura,
segura, transforme
transforme
oo movimento
movimento em em salto.
salto. O O salto,
salto, aa partir
partir ee fora
fora de
de qualquer
qualquer firmeza,
firmeza, éé aa liberdade
liberdade
de
de questionar
questionar (BLANCHOT,
(BLANCHOT, 2001, 2001, p.41-53).
p.41-53).

São também vários os textos em que Deleuze, ele mesmo ou em parceria com
Guattari, reflete acerca da experiência limite proporcionada pela escrita, em explícita
324|
324| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

ligação às noções blanchotianas da relação do texto com o de fora, do inacabamento e do


anonimato da linguagem. No livro Kafka: Para uma literatura menor (DELEUZE;
GUATTARI, 2003), é o tema do espaço delimitado por uma vontade de escrita, que se
exerce para apenas exprimir infinito de si mesma, a dominar a minuciosa análise da dupla
Deleuze-Guattari. Kafka é ali tomado como o caso da mais pura paixão pela escrita,
confundindo-se esta com a própria vida do autor de Metamorfose. Descobrem nele uma
verdadeira máquina de escrita em que todas as diferentes componentes da expressão
literária comunicam entre si na tarefa de deslocamento da questão e por isso de
desterritorialização do pensamento. Os dois filósofos chegam a afirmar que nunca se terá
construído uma obra literária tão completa através de movimentos que sempre se goram,
mas nunca deixam de operar e relacionar-se estruturalmente entre si. Em Kafka a paixão
de escrever não cessa, embora mudem os respectivos limiares de intensidade: são “cartas
paradas porque uma devolução as bloqueia”; “novelas que param porque não podem
desenvolver-se em romances, divididas nos dois sentidos que tapam a saída”; “romances
que o próprio Kakfa pára porque são intermináveis e simplesmente sem limite, infinitos”.
No seu processo criativo há um arrastamento ou uma linha de fuga, na conhecida
terminologia de Deleuze, que lhe permite questionar de frente e em simultâneo a ordem
política, económica, burocrática ou jurisdicional. Essa paixão extenuante de compreender o
funcionamento das instituições terá, também, permitido a Kafka antecipar e “extrair sons
ainda incógnitos que pertencem ao futuro próximo - fascismo, estalinismo, americanismo,
as forças diabólicas que estão a bater à porta” nos anos 30. Deleuze e Guattari encontram nesta
dinâmica, em que a expressão precede o conteúdo e o arrasta, a tese fundamental deste seu
livro. Viver e escrever só se opõem no que ambos denominam “literatura maior”; em
Kafka, pelo contrário, estas duas dimensões fundem-se e constituem as condições objetivas
do exercício de uma “literatura menor”, isto é, de uma prática de escrita que oferece à
língua “condições revolucionárias”, por intermédio da “ligação do individual com o
imediato político” e do “agenciamento coletivo da enunciação”. Notam que, mesmo
moribundo, Kafka era “transido por um fluxo de vida invencível” que lhe vinha tanto das
cartas, das novelas, dos romances como “do seu inacabamento mútuo por razões
diferentes, comunicantes e permutáveis”. Tudo é questão de tudo, como se acabou de ler
há pouco em Blanchot. Por essa razão, o primado da escrita em Kafka só pode ter um
significado que não se confina de modo algum ao que vulgarmente entendemos por
literatura. E o significado é este: a enunciação constitui-se como um desejo contingente,
situado histórica, política e socialmente no seu tempo, mas que se projeta “acima das leis,
dos Estados e dos regimes”. Temos então na escrita de Kafka uma “micropolítica, uma
política do desejo que põe em causa todas as instâncias”. As razões que o terão levado a
abandonar este ou aquele texto configuram, afinal, um vasto mapa de transformações e
intensidades, dir-se-ia moleculares, que nos dão conta não de um fracasso, mas de uma
análise multivariável que se determina em antecipar-ultrapassar dos limiares estabelecidos
por uma qualquer ordem. Quer dizer, há na experiência da escrita de Kafka a possibilidade
de descortinar uma “desterritorialização absoluta” por oposição às “territorializações
relativas que o homem produz sobre si mesmo” quando viaja, por exemplo. O enunciado
mais não é que a possibilidade de organização de um combate cognitivo dominado pela
possibilidade de relançar a análise, produzindo uma “linha de fuga viva” ante a
transcendência com que a lei sempre se anuncia. Tarefa urgente e interminável a do
confronto com todas as formas de desejo e poder, já se vê. Deleuze e Guattari concluem:
“nunca houve autor tão cómico e alegre do ponto de vista do desejo; nunca houve autor
mais político e social do ponto de vista do enunciado”. Em Kafka, “tudo é riso, a começar
pelo Processo; tudo é político, a começar pelas cartas a Felice” (DELEUZE; GUATTARI
2003, p.41; p.69-79).
para
para uma
uma escrita
escrita académica
académica inventiva:
inventiva: oo legado
legado da
da teoria
teoria social
social pós-moderna
pós-moderna || 325
325

Os mesmos haviam já problematizado em O que é a filosofia, e ainda a partir de


Blanchot, a noção de acontecimento, ligando-a a conceitos centrais no seu trabalho como
sejam os de nuvem, fluxo, bifurcação ou de transposição de limiar. A uma prática do
interminável, do que não acaba nem começa. A seu ver a escrita ligar-se-ia, igualmente, a
uma experiência que se distingue da do estado corrente de coisas por que passamos, nós
próprios e o nosso corpo, porque produz um tipo de acontecimento que é simultaneamente
“incorpóreo e de pura reserva”. Nestes termos, escrever seria aquele “acontecimento no
qual nos afundamos ou nos elevamos, o que recomeça sem jamais ter começado nem
acabado, a internidade imanente” (DELEUZE; GUATTARI, 1992, p.138). A dívida em
relação a Blanchot é reforçada nos momentos em que Deleuze procurou incorporar na sua
linguagem filosófica o tema da relação com o exterior. Trata-se, para ele, de imaginar uma
linha, uma articulação que não está no pensamento ou nas coisas em si, mas se encontra
em toda a parte onde o pensamento enfrente algo que seja mais longínquo que o mundo
exterior e, ao mesmo tempo, mais próximo que o mundo interior. Um processo de
“reinversão perpétua” do adjacente e do longínquo. Para Deleuze, o pensamento estrutura-
se nessa dinâmica e é convocado a enfrentar “qualquer coisa como a loucura, e a vida,
qualquer coisa como a morte”. A linha do exterior seria então o nosso “duplo”, precisamente
o que nos atravessa “com toda a alteridade do duplo” (DELEUZE, 2003, p.151).
Num artigo amiúde referenciado, e que tem o sugestivo título Pensamento nómada,
Deleuze refere-se às características dos textos de Nietzsche – particularmente os seus
aforismos – como se da sua leitura ficasse a impressão de se estar face a um novo tipo de
objeto, para de novo insistir na relação com o fora. Quando olhamos ao acaso para um
livro qualquer do autor de Assim falou Zaratustra sucede “que não passamos mais por uma
interioridade”, seja a da alma, da consciência ou do conceito, princípios que fizeram
sempre parte da filosofia . Esta deixa aqui de ser mediatizada e dissolvida por interioridade
– Nietzsche “funda o pensamento, a escrita sobre uma relação imediata com o fora”.
Deleuze clarifica a sua ideia nos termos seguintes:
O
O que
que éé uma
uma bela
bela pintura
pintura ou ou umum desenho
desenho muitomuito belo?
belo? Há Há um um quadro.
quadro. Um Um
aforismo
aforismo também
também éé enquadrado.
enquadrado. Mas Mas aa partir
partir de
de que
que momento
momento se se torna
torna belo
belo oo que
que
está
está no
no quadro?
quadro? A A partir
partir do
do momento
momento em em que
que sese sabe
sabe ee se
se sente
sente queque oo movimento,
movimento,
que
que aa linha
linha que
que éé enquadrada
enquadrada vem vem de de outro
outro lugar,
lugar, que
que ela
ela não
não começa
começa nos nos limites
limites
do
do quadro.
quadro. Como
Como nos nos filmes
filmes dede Godard,
Godard, pinta-se
pinta-se oo quadro
quadro com com aa parede.
parede.
Dizemos
Dizemos [igualmente
[igualmente dos dos textos
textos de
de Nietzsche
Nietzsche ou ou de
de Kafka,
Kafka, porpor exemplo]
exemplo] que que são
são
atravessados
atravessados por por um
um movimento
movimento que que vem
vem de de fora,
fora, que
que não
não começa
começa na na página
página dodo
livro
livro nem
nem nas nas páginas
páginas precedentes,
precedentes, que que não
não cabe
cabe no no quadro
quadro do do livro
livro ee que
que éé
absolutamente
absolutamente diferente
diferente do do movimento
movimento imaginário
imaginário das das representações
representações ou ou dodo
movimento
movimento abstrato
abstrato dosdos conceitos
conceitos taistais como
como eles eles acontecem
acontecem habitualmente
habitualmente
através
através das
das palavras
palavras ee nana cabeça
cabeça dodo leitor.
leitor. Alguma
Alguma coisa
coisa salta
salta dodo livro,
livro, entra
entra em
em
contato
contato com
com umum puro
puro fora.
fora. ÉÉ isto,
isto, creio,
creio, oo direito
direito aoao contrassenso
contrassenso para para toda
toda aa obra
obra
de
de Nietzsche.
Nietzsche. Um Um aforismo
aforismo éé um um jogo
jogo dede forças,
forças, umum estado
estado de de forças
forças sempre
sempre
exteriores
exteriores umas
umas àsàs outras.
outras. Um Um aforismo
aforismo não não quer
quer dizer
dizer nada,
nada, não não significa
significa nada,
nada,
não
não tem
tem significante
significante como
como não não tem
tem significado.
significado. Seriam
Seriam maneiras
maneiras de de restaurar
restaurar aa
interioridade
interioridade de de um
um texto.
texto. UmUm aforismo
aforismo éé um um estado
estado dede coisas,
coisas, cuja
cuja última
última força,
força,
ou
ou seja,
seja, ao
ao mesmo
mesmo tempo
tempo aa mais
mais recente,
recente, aa mais
mais atual
atual ee aa provisória-última,
provisória-última, éé
sempre
sempre aa mais
mais exterior.
exterior. Nietzsche
Nietzsche oo diz diz muito
muito claramente:
claramente: se se você
você quiser
quiser saber
saber oo
que
que eu
eu quero
quero dizer,
dizer, encontre
encontre aa força
força queque dá
dá um
um sentido,
sentido, sese for
for preciso
preciso um um novo
novo
sentido
sentido ao ao que
que eueu digo.
digo. Conecte
Conecte oo texto
texto aa essa
essa força.
força. Desta
Desta maneira,
maneira, nãonão háhá
problema
problema de de interpretação
interpretação de de Nietzsche,
Nietzsche, há há apenas
apenas problemas
problemas de de maquinação:
maquinação:
maquinar
maquinar oo texto
texto de
de Nietzsche,
Nietzsche, procurar
procurar comcom qual
qual força
força exterior
exterior ele ele faz
faz passar
passar
alguma
alguma coisa,
coisa, uma
uma corrente
corrente de de energia
energia (DELEUZE,
(DELEUZE, 2006a, 2006a, p.p. 323-324).
323-324).

Em síntese, na perspectiva que aqui tomo, o problema que envolve o ato de escrever
é o de saber como produzir enunciados que abandonem os princípios a toda a hora
expressos pela lei - e pelas instituições que a introduzem no corpo social através das mais
326|
326| jorge
jorge ramos
ramos do
do óó

variadas rotinas de representação disciplinar e unitária da herança cultural, fazendo para


isso uso do saber como um corpo de prescrições e um círculo em que se desenrolam
verdades -, puxando a linguagem para fora dos seus sulcos habituais e fazendo-a comunicar
com o que será o seu próprio exterior. Os enunciados de alguma teoria social a que deitei
mão para melhor sugerir a força inventiva do exercício escritural não cessam de nos falar
de inacabamento, de desvio, de desaparecimento orgânico, de devir estrangeiro ou da
intensidade de uma corrente de energia que vem e puxa para fora. Convergem na metáfora
do nomadismo, no rigoroso sentido de um deslocamento perpétuo operado pela
experiência mesma da escrita - a hipótese de uma aventura, de uma partida que sobrevém à
máquina administrativa que acompanha todos os grupos sedentários e o aparelho de
Estado. A escrita consubstanciaria, nestes termos, uma potência migratória para o
pensamento e, nessa relação com o fora, a possibilidade de viajar no mesmo lugar.
Viagem-imóvel intensa, imperceptível, inesperada, subterrânea, anónima, mas capaz de
engendrar práticas extratextuais e renovadas possibilidades de existência.

referências
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Profanações.
Profanações. Lisboa:
Lisboa: Livros
Livros Cotovia,
Cotovia, 2006.
2006.
______.
______. Ideia
Ideia da
da prosa.
prosa. Lisboa:
Lisboa: Livros
Livros Cotovia,
Cotovia, 1999.
1999.
______.
______. A
A comunidade
comunidade que que vem.
vem. Lisboa:
Lisboa: Presença,
Presença, 1993.
1993.
BAUMAN,
BAUMAN, Zygmunt.
Zygmunt. Postmodern
Postmodern ethics.
ethics. Oxford:
Oxford: Blackwell,
Blackwell, 1993.
1993.
BLANCHOT,
BLANCHOT, Maurice. Maurice. A A conversa
conversa infinita:
infinita: A
A palavra
palavra plural.
plural. V.1.
V.1. São
São Paulo:
Paulo: Escuta.
Escuta. 2001.
2001.
______.
______. O
O livro
livro por
por vir.
vir. Lisboa:
Lisboa: Relógio
Relógio d’Água,
d’Água, 1984.
1984.
CONNOR,
CONNOR, Steven.Steven. Cultura
Cultura pós-moderna:
pós-moderna: Introdução
Introdução àsàs teorias
teorias do
do contemporâneo.
contemporâneo. SãoSão Paulo:
Paulo: Loyola,
Loyola,
2000.
2000.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.Gilles. Pensamento
Pensamento nômade.
nômade. In: In: AA ilha
ilha deserta
deserta ee outros
outros textos:
textos: Textos
Textos ee entrevistas
entrevistas
(1953-1974).
(1953-1974). São São Paulo:
Paulo: Iluminuras,
Iluminuras, 2006,
2006, p.
p. 319-329.
319-329.
______.
______. Conversações.
Conversações. Lisboa:
Lisboa: Fim
Fim de de Século,
Século, 2003.
2003.
______.
______. Crítica
Crítica ee clínica.
clínica. Lisboa:
Lisboa: Século
Século XXI,
XXI, 2000a.
2000a.
______.
______. Diferença
Diferença ee repetição.
repetição. Lisboa:
Lisboa: Relógio
Relógio d’Água,
d’Água, 2000b.
2000b.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Félix. Félix. Kakfa:
Kakfa: Para
Para uma
uma literatura
literatura menor.
menor. Lisboa:
Lisboa: Assírio
Assírio & & Alvim,
Alvim,
2003.
2003.
______.
______. O
O que
que éé aa filosofia?
filosofia? Lisboa:
Lisboa: Presença,
Presença, 1992.
1992.
DERRIDA,
DERRIDA, Jacques.
Jacques. Gramatologia.
Gramatologia. São São Paulo:
Paulo: Perspectiva,
Perspectiva, 2000.
2000.
HARVEY,
HARVEY, David.David. The The condition
condition ofof postmodernity:
postmodernity: An An enquiry
enquiry into
into the
the origins
origins of
of social
social change.
change. Oxford:
Oxford:
Basil
Basil Blackwell,
Blackwell, 1989.1989.
JENKINS,
JENKINS, Keith.
Keith. Re-thinking
Re-thinking history.
history. London:
London: Routledge,
Routledge, 1991.
1991.
LYOTARD,
LYOTARD, Jean-François.
Jean-François. A A condição
condição pós-moderna.
pós-moderna. Lisboa:
Lisboa: Gradiva,
Gradiva, 2003.
2003.
RORTY,
RORTY, Richard.
Richard. Contingência,
Contingência, ironia
ironia ee solidariedade.
solidariedade. Lisboa:
Lisboa: Presença,
Presença, 1994.
1994.
SMART,
SMART, Barry.
Barry. Teoria
Teoria social
social pós-moderna.
pós-moderna. In: In: TURNER,
TURNER, Brian Brian SS (Ed.).
(Ed.). Teoria
Teoria social
social .. Lisboa:
Lisboa:
Difel,
Difel, 2002,
2002, p. p. 405-436
405-436
327
327

pesquisa empírica-transcendental da diferença:


arquivo, escrileitura e tradução de dados

sandra mara corazza11

C omo intérpretes e críticos da herança humana, somos atravessados pelo


paradoxo de ser pesquisadores que são também tradutores, continuando a
ser professores; além de movimentar matérias que, ao ser atualizadas, são
renovadas; mas têm de continuar sendo matérias criadas por outros, em outros tempos,
espaços, problemáticas. Esses dilemas povoam os atos de criação daqueles que educam;
pois, se, por um lado, a tradução deve prosseguir ligada à matéria-fonte e, assim manter,
em algum grau, a sua equivalência de código; para que esta matéria seja revitalizada, a
tradução tem de transcriá-la, porque não pode não fazê-lo.
Nessa instância paradoxal, como realizar uma pesquisa, desde a filosofia da
diferença, com uma embocadura de ordem empírica, sem tratá-la de maneira formal?
Como operar com matérias – tomando-as como dados, embora amorfos –, que tenham sido
produzidas, para então serem reunidas em um arquivo? E, a partir desse arquivo –
conceitualizado como suporte gerativo de pensamento, por meio da tradução transcriadora
de escritas-leituras (escrileituras) –, produzir autoconhecimento e sabedoria de vida, sem
quantificação paradigmática ou modelo totalitário de racionalidade?
Para começar, os dados deixam de ser a laicização feita pela ciência positivista da
doutrina religiosa da Graça; enquanto o arquivo escuta mais o avesso e espera o sentido do
que induz e armazena. Nesse empirismo renovado, não gnosiológico, mas transcendental (no
sentido deleuziano), pesquisar-educar é a experimentação de um trabalho intelectual,
traçado pelo diagrama de forças das escrileituras tradutórias e formalizado em arquivos
transdisciplinares, transculturais, translinguísticos, transemióticos, transpensamentais.

ler e escrever
Não é fácil ler nem escrever. Difícil é ler e escrever traduzindo o que outros
disseram, escreveram, gestualizaram, encenaram, e considerá-los dados (a partir daqui,
deixamos de grafar esta palavra em itálico) de uma pesquisa, que acabam condensados
naquilo que chamamos resultados; os quais costumam ser fornecidos por aqueles mesmos
dados, que resultam das leituras e escritas tradutórias que deles fizemos como
pesquisadores.
Em que medida a pesquisa nas Humanidades, em especial na área da Educação,
pode se fiar em um fluxo não representativo, não figurativo e não significativo? Haverá aí
uma marcha disruptiva, diferentemente daquela progressiva verificada nas Ciências
Exatas? Temos condições de mudar a chave representacional de nossas pesquisas para
vibrações, intensidades, sensações ou suplementações, em línguas das quais nunca nos
apropriaremos, por serem línguas não repressivas como formas, configurações sociais ou
regimes institucionais? Como lemos e escrevemos, traduzindo livros, textos, depoimentos,
relatórios, projetos, e lhes atribuímos verdades e certezas, confirmando-os, como sendo os
dados de uma pesquisa?
Consideramos que a noção de dado consiste em uma duradoura (e esperta)
laicização, feita pela ciência positivista, da doutrina religiosa da Graça; laicização de um
Dado-Graça, que seria colhido pelos sentidos, pela reta razão ou pelo bom senso. Em
nossas pesquisas, tampouco consideramos dado como uma construção, ao modo kantiano;

11 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Rio
Rio Grande
Grande do
do Sul
Sul –– UFRGS.
UFRGS. Email:
Email: sandracorazza@terra.com.br
sandracorazza@terra.com.br
328|
328| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

mas, ao lado de Bachelard (2008a), o consideramos como invenção, baseada na imaginação


criadora e sempre voltada para o futuro, para uma ideia elevada, para o por vir, que está
além do pensado, sentido e percebido (CORAZZA, 2016a).
O dado, assim concebido, resulta de uma herança e de uma dívida contraídas, pois
não é possível que ele apareça a não ser daí; e é flagrado porque integra um arquivo
(AQUINO, 2016; CORAZZA, 2016b; DELEUZE, 1991; 2013; DERRIDA, 2011;
FOUCAULT, 1972); o qual é traduzido, pois não pode não sê-lo. Logo, o dado
(substantivo) não pode ser nem apreendido, nem compreendido, nem dado (verbo), se não
for recriado, desvirtuado, para ser transformado em ideias, no registro da ilusão de
estarmos sendo fiéis àquilo que foi dado pela realidade da pesquisa e por ela mesma
construída como realidade.
Poderíamos, talvez, falar em uma espécie de Dadoísmo, no sentido que pensar é
jogar, do tipo: diga-me com quais dados trabalhas que poderemos conversar. Nesse nosso jogo
dadoísta, são as bordas da individuação e os planos de vida (no sentido geométrico) que
traçam um diagrama supersensível de forças, formalizado em um arquivo transaudiovisual:
arquivo que não é gnosiológico, mas tradutório, e que decorre de uma aproximação-
afastamento dos dados, que não se fixa, tal como a “distância amativa” de Jankélévitch
(apud DOSSE, 2010, p.17).
Preferimos, como se vê, tomar os dados como fluxos, ao modo de Deleuze (2006,
p.18), em sua primeira aula (15/04/1980) do Curso sobre Leibniz:
O
O que
que está
está dado,
dado, em
em última
última instância,
instância, poderia
poderia sempre
sempre chamar-se
chamar-se umum fluxo.
fluxo. Os
Os
fluxos
fluxos estão
estão dados,
dados, enquanto
enquanto aa criação
criação consiste
consiste em
em recortar,
recortar, organizar,
organizar, conectar
conectar
fluxos;
fluxos; de
de tal
tal maneira
maneira que
que se
se desenhe
desenhe ou
ou se
se faça
faça uma
uma criação
criação em
em torno
torno de
de certas
certas
singularidades
singularidades deles
deles extraídas.
extraídas.

Dados-fluxos que uma pesquisa da diferença deixaria, primeiramente, escorrer e,


sobre eles, iria retroagindo, rebatendo-os, para que ondas não a engulam ou construam um
mar de realidade sossegada. Dados de uma pesquisa da experimentação, que resultam da
consciência dos pesquisadores sobre o seu caráter inventivo e criador, obtido por meio de
um método como trabalho tradutório de pensamento e de escritas-leituras (escrileituras)
(CORAZZA, 2016b).
Em outras palavras, ler, escrever e traduzir, em uma pesquisa do acontecimento
(TADEU; CORAZZA; ZORDAN, 2004), não seria mais perguntar quem disse ou que
quis dizer, qual a significação (oculta ou explícita) daquilo que foi dito ou daquele
conceito; mas seria um compósito de experimentações de pensar, escrever e ler. A questão
é que aquele que lê e traduz e aquilo que é lido e traduzido nada são até que, daí, uma nova
matéria seja composta, bloqueada, inflexionada, cortada, acrescentada; em suma, até que
seja posta em funcionamento uma máquina de escrileituras, dotada de funcionamento
efetivo para pensar o pensamento, que é sempre crítico e coletivo, feito em grupos e
grupúsculos, relações e existências. Máquina erosiva, portanto.
Agora, como ler esses dados? Por vezes, o pesquisador não entende nada ou então
aquilo – reunião, entrevista, diálogo, declaração, depoimento, manifesto, ensaio, prólogo,
anotações – não é para ser entendido; bem como um dado de pesquisa talvez não exista
para ser comunicado; mas, antes, para afetar subjetivamente durante o obrar transcriador
de leitura, escritura e tradução da pesquisa. O problema talvez seja este: que o sentido do
dado escape sempre, desde que não conseguimos conectar um som, uma palavra ou uma
imagem a seu significado, ficando, em seu lugar, o não-figurativo, o não-nomeado, o não-
lugar, o extra-ser (DELEUZE, 1998).
Logo, cada vez que o pesquisador publica os resultados de suas pesquisas,
comprovados, empiricamente, pelos dados obtidos e analisados ou tratados; cada vez que
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 329
329

os solidifica, em relatórios, artigos, notas de aula, isso soa à falsidade. Por esse motivo, o
pesquisador volta a fluidificar esses dados outra vez; o que, todavia, não lhe garante a
verdade absoluta da sua pesquisa. No primeiro caso, quando publica os resultados, o
pesquisador estanca o movimento; no segundo, aparenta a sua estagnação; desde que se
mover, na pesquisa, não é saltar de uma à outra; mas, em cada movimento, construir
pontos fixos, para, justamente, poder saltar. A nossa questão, como pesquisadores, é o que
produzimos na multiplicidade de dados das nossas pesquisas e como isso que produzimos
funciona.
Quando se trata da produção de dados, estamos afirmando práticas de
experimentação no terreno da produção tradutória de escrileituras. Escrileituras que são
sempre duplas, desde que traduzem uma matéria e seu funcionamento; ao mesmo tempo
em que experimentam o próprio método tradutório dessa matéria. De maneira que o
pesquisador indaga: o que acontece aqui? E esta é a única pergunta suportada por qualquer
funcionamento experimentador; pois, nela, não há lugar para alguma realização prodigiosa
ou salvamentos visionários, mas algo da ordem do acaso (o que é um paradoxo) e das
possibilidades. Funcionamento que, por ter uma natureza mais virtual do que atual, age
para além do pesquisador que experimenta, da própria matéria que é trabalhada e dos
dados que são colhidos.
Assim, perguntar o que acontece aqui? coloca para andar o vazio de uma
indeterminação, que será definida, classificada, valorada, descrita, sumariada, resenhada,
declarada, manifesta, somente após essa pergunta. A pesquisa efetiva, portanto, é posterior
à experimentação e é ela que registra, em nome dos dados do que aconteceu, o seu sentido
(DELEUZE, 1998). Em escritas e leituras tradutórias, é o sentido desses dados que se
submete à experimentação, e não o contrário. Em decorrência, é preciso cuidar para que
não digamos e escrevamos sempre o mesmo sentido, em nossas diversas pesquisas; isto é,
que lutemos para fazer valer diversos tipos de sensibilidade, de modo a captar vários dados,
enquanto sentidos-acontecimentos.

exercício de estilo
Ora, em qualquer pesquisa, a leitura é um dos pilares do denominado tratamento
empírico dos dados: ler algo, aprender a ler algo – que pode estar disposto como anotação,
registro de gestos, filme –, resultante de observações, entrevistas, estudos. Como um
pesquisador lê? Como aprende a ler o que concerne a sua pesquisa? Parado na terra, ao pé
do fogo, girando sem corpo no ar, pulando na água, fazendo piruetas com as imagens,
levantando a cabeça para as nuvens, revirando as ideias? Como o pesquisador lê aquilo que
passa a tomar como dado, em sua seriedade de dado, como recebido de alguma fonte
externa, como uma resposta da realidade; e que, por isso, lhe outorga o direito de inclui-lo
na cena dos saberes, via contagem, análise ou interpretação?
Parece-nos que aprender a ler aquilo que resulta de diversas ações de pesquisa,
pensadas como coleta de dados; e, então, dar a estes dados (coletados) o direito a
tratamento ou elaboração (de dados), por meio da escrita e da leitura, consiste em realizar
uma tradução desses mesmos dados, que nada mais é do que um exercício de estilo
(DELEUZE, 2003); o qual, de fato, funciona “para submeter a língua a um processo de
variação contínua com vistas a transformar quem escreve e quem lê” (TADEU;
CORAZZA; ZORDAN, 2004, p.170).
Exercício de estilo, que encaminha o pesquisador lidar com equívocos,
incompletudes e enigmas, oferecendo-lhe uma saída: sua transformação em dados
resultantes de pesquisa. Saída que não se dá na direção de adequação, eliminação de pontos
obscuros ou decifração; mas que, ao contrário, os aproveita e trata como acontecimentos,
que constituem, justamente, o domínio informe (CORAZZA, 2013), por onde a pesquisa
330|
330| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

passa e opera. Isto é, faz de tudo aquilo que é tomado como dado um texto ilegível,
impossível de ser lido, que não é para ser lido. Sendo assim, como é que o lemos e
aprendemos a lê-lo?
Ocorre que somente existe leitura (criadora) quando há uma destinação, um apelo a
pensar, produzido com as matérias irradiadas pela obra. Todo pensamento é, dessa
maneira, leitura, escritura e tradução; pois, se há uma obra anterior, que nos é destinada,
nem por isso a sua leitura deixa de levar à ruptura e de fazê-la entrar em uma outra
história. História que será armada por meio da escritura e que desembocará na tradução de
uma nova obra. Como afirma Juranville (1987, p.394): “Só podemos ler o destino
produzindo uma nova obra, inventando. [...] Na qual a verdade da obra original é
apreendida, mas necessariamente transformada em verdade parcial”.
Aquilo que a obra oferece às nossas leituras e escrituras, que são tradutórias e
transcriadoras, não é um significado consistente, um sentido determinado, um mundo
compreensível, mas uma abertura estilística que ultrapassa tudo isso e, inclusive, a própria
obra. Como diz Blanchot (apud JURANVILLE, 1987, p.395) sobre aquilo que aí se
estabelece:
entre
entre oo livro
livro que
que ali
ali está
está ee aa obra
obra que
que nunca
nunca está
está ali
ali de
de antemão,
antemão, entre
entre oo livro,
livro, que
que
éé aa obra
obra dissimulada,
dissimulada, ee aa obra,
obra, que
que só
só pode
pode afirmar-se
afirmar-se na na espessura
espessura presentificada
presentificada
dessa
dessa dissimulação,
dissimulação, uma
uma ruptura
ruptura violenta,
violenta, aa passagem
passagem do do mundo
mundo onde
onde tudo
tudo tem
tem
mais
mais ouou menos
menos umum sentido,
sentido, onde
onde háhá obscuridade
obscuridade ee clareza,
clareza, aa um
um espaço
espaço onde,
onde,
falando
falando comcom propriedade,
propriedade, nada
nada tem
tem sentido
sentido ainda,
ainda, mas
mas para
para oo qual
qual tudo
tudo oo que
que tem
tem
sentido
sentido remonta
remonta como
como que
que em em direção
direção aa sua
sua origem.
origem.

Quando o pesquisador escreve e lê os dados (coletados) em sua pesquisa,


transforma a relação com a obra (dos outros e a sua própria) em uma relação de não
reciprocidade, de pura diferença, constitutiva. Relação reexperimentada a cada leitura e
escritura, em direção à ex-sistência dos originais, que estão sendo lidos e reescritos. De
modo que os dados, os autores e as obras, que ainda estão por ler e escrever, tomam parte
daqueles que já foram lidos e escritos, sendo-lhes irredutíveis; condição que ampara a sua
sobrevida e mantém acesa a nossa consistência de autores que realizam experimentações.
Por isso, o trabalho tradutório de escrita-leitura dos dados de uma pesquisa abre
passagem para mais além dos seus próprios limites. As fantasias (BARTHES, 2005)
autorais de ler, escrever e traduzir são as molas propulsoras do ato de pensar do
pesquisador, que não reconstitui sentidos já atribuídos; nem se apega ao nome do autor ou
da obra (supostamente acabados); tampouco reflete a gravidade e o peso dos dados; mas
destaca as aberturas, impessoais e violentas, para as suas ex-sistências. Tanto o autor e a
obra, como os dados, são sempre parciais e provisórios, no contexto de uma nova pesquisa,
que surge, quando escrevemos, traduzindo o que lemos; e quando lemos, traduzindo outra
vez aquilo que escrevemos. É assim, diz Juranville (1987, p.399), que “a invenção se
propaga e toda teoria se reorganiza”.

fantasia de novidade
Agora, como compreender que aquilo que é dito ou escrito, pelo pesquisador, não
diz ou não escreve o que é dito e escrito; enquanto aquilo que é dito ou escrito possa dizer
ou escrever outra coisa diferente? Afinal, ambicionamos uma competência de leitura,
afirma Bachelard (2008b, p.4), desde que:
não
não passamos
passamos dede um
um leitor,
leitor, ledor.
ledor. EE passamos
passamos horas,
horas, dias,
dias, aa ler
ler em
em lenta
lenta leitura
leitura os
os
livros
livros linha
linha por
por linha,
linha, resistindo
resistindo oo mais
mais que
que podemos
podemos àà sedução
sedução dasdas histórias
histórias (isto
(isto
é,
é, àà parte
parte claramente
claramente consciente
consciente dosdos livros)
livros) para
para estarmos
estarmos bem bem certos
certos de
de habitar
habitar
as
as imagens
imagens novas,
novas, as
as imagens
imagens queque renovam
renovam osos arquétipos
arquétipos inconscientes.
inconscientes.
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 331
331

Essa posição de resistência in-consciente de ledor implica-se na necessidade que os


dados sejam tomados como uma novidade em si mesmos, mediante o signo da potência
criadora da imaginação que lê; e, logo, incompreensíveis, de modo que necessitamos de
alguma fantasia para tentar compreendê-los. Porque a “leitura é um envolvimento, um
resgaste das condições da emergência do novo” (DINARTE; CORAZZA, 2016, p.143), essa
fantasia remete ao seu diferencial de novidade; por meio do qual sejam efetivamente
considerados e acreditados como dados da pesquisa; isto é, como a nossa tentativa de dar
forma a eles, seja épica, trágica, dramática, cômica, filosófica, científica, artistadora.
Vemos, muitas vezes, como um impossível tornado possível, apresentando-se como
resultado de pesquisa, acaba por eliminar o silêncio, a intradutibilidade, o equívoco
contingencial dos dados; como se o pesquisador e a pesquisa decifrassem o enigma que já
neles estava contido. O paradoxal de uma pesquisa da diferença reside, precisamente, em
que, por ser puro trabalho do pensamento e de escrileituras sobre coisas, textos,
fenômenos, os seus resultados, após coleta, análise e tratamento ou elaboração dos dados,
nunca deixam de estar cobertos de equívocos, ambivalências e alteridade, em contraste
com a sua reprodução.
Por essa via de produção, cuja única saída é a própria entrada na pesquisa, outros
enigmas e problemas são dispostos, fisgando o pesquisador, em sua curiosidade e coragem,
sem, no entanto, dar-lhe qualquer garantia de arrimo. Ele não tem como escapar da
pesquisa, a não ser inventar, criar e experimentar alguma espécie de verdade, a partir de
traços mínimos, de fragmentos caóticos, de fiapos de realidade, que ele considera os dados
e resultados da sua pesquisa.
Se a leitura dos dados vividos ou vivenciados é impossível, no sentido de que esse
tipo de escrito não é para ser lido, o valor mesmo daquilo que o pesquisador lê e escreve é
inestimável, em termos das ressonâncias de suas traduções; cuja recorrência movimenta os
saberes, o mundo da pesquisa e a prática docente. Só que, como toda literatura, essas
traduções necessitam surpreender, ter o seu diferencial de novidade, desde que expressam
matérias que não serão imaginadas mais de uma vez. Nessa condição de singularidade dos
resultados, o pesquisador reanima uma realidade, por meio da criação de novos dados,
mediante um tipo de pesquisa, que não é mecânica, derivada ou secundária, mas que
transcria ao traduzir, como suplemento – significação substitutiva que se junta aos
originais e os transformam (DERRIDA, 2002).
Logo, tratados literária, teatral, poética ou pedagogicamente, são os tais dados que
acabam por fornecer ao pesquisador a experiência de criação de linguagem e de
pensamento, de desconstrução de várias línguas, textos, obras, lançando o seu espírito em
várias direções, agrupando elementos diversos, realizando sobreposições de sentidos. Dessa
forma, os dados – que não são dados, mas criados, inventados, produzidos – têm uma vida
autônoma, não sendo uma imaginação de segunda posição, advinda da realidade registrada
pela percepção.

ocos e quedas
É inegável que, com tudo que lemos, escrevemos e traduzimos numa pesquisa,
realizamos movimentos de nominação, divisão, organização, classificação, ordenação.
Entretanto, os efeitos desses movimentos nos escorrem, são insuficientes, possuem
dificuldades intransponíveis, levando-nos a fracassar narrativamente. Por isso, ao
tomarmos algo como dado parece ser mais produtivo, desde a partida, senti-lo como aquela
matéria que deixa correr a vibração, gotejar a sensação e chover afecções.
Em função disso é que, como pesquisadores, temos de suportar ocos e quedas, pois
são eles que nos fazem prosseguir pesquisando. Se o pesquisador atende e responde a todos
os chamados – O que faço? O que quero? Quem eu sou? O que acontece em minha profissão? –,
332|
332| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

em vez de um pesquisador, não será ele um pastor? Como diz Nietzsche (1986), é
necessário que o pesquisador tenha orelhas pequenas para não escutar aquilo que encontra
formas e sentidos cedo demais, mortos ou respondentes demais (CORAZZA, 2008).
Tem mais valor, numa pesquisa, indagar sobre a experiência de escrileituras
tradutórias dos dados e ir, assim, trabalhando para obter um método de criação da própria
pesquisa. Ao cortar as leituras e anexar delas algo ao nosso pensar, através da escritura,
seguimos até o próximo corte e anexação, feitos de variações na vontade e no ato de
pesquisar. Para traduzir os dados é preciso deles ser leitor; só que lê-los implica nos ocupar,
por muito tempo (às vezes, durante uma vida inteira), e em diferentes momentos, de uma
mesma matéria, mediante um compromisso com a sua escritura. Ler e escrever acerca de
uma matéria demanda conhecer suas várias traduções, em termos de conceitos,
tematizações, perspectivas e inflexões; mesmo que algumas dessas traduções e matérias já
tenham perdido o frescor de sua pertinência ou o seu caráter de novidade epistêmica,
atribuídos no momento em que foram criadas.

sincronia e eficácia
A pesquisa do acontecimento é uma forma eficaz de recolocar o pesquisador em um
“agenciamento maquínico” e, ao mesmo tempo, em um “agenciamento coletivo de
enunciação”, no sentido de Deleuze e Guattari (1997, p.219). Agenciamentos, que nos
colocam em um domínio de dados que são elididos, enquanto sujeitos aos efeitos de um
dito, de um feito, de um escrito. Dados que voltam a se articular no ato de produzir um
conhecimento tradutório, que rompe o campo (pretensamente estático) da linguagem e de
seu aparelho lógico ou de submissão a uma cientificidade dogmática. Dados que são
atravessados pelo sentido, criado por novas palavras e pela emergência de outros dizeres,
fazeres e escrituras, que podem, inclusive, desdizer e desfazer o já dito, o já feito, o já
escrito.
Dessa maneira, as contingências e os acidentes dos dados, produzidos pela
linguagem da pesquisa, fazem emergir outros dados, que permitem a ocorrência de um tipo
de sincronicidade, onde o pesquisador e a verdade da sua pesquisa são o produzido e o
próprio produtor. Sincronia que se transversaliza nos cruzamentos com uma diacronia,
onde o pesquisador surge como um sujeito-forma, que não suporta o impossível real; e que,
por isso, se põe, concreta e materialmente, a pesquisar.
A pesquisa, então, pode ser pensada como pré-ontológica, enquanto os batimentos
temporais e espaciais dos seus dados produzem uma ontologia. Aí, a empiria alia-se ao
transcendental, não no sentido ordinário, mas como Deleuze (1988, p.378) entende
transcendental, ou seja: capaz de “apreender a intensidade, independentemente do extenso
ou antes da qualidade”, nos quais ela se desenvolve; tal como a “obra de arte abandona o
domínio da representação para tornar-se ‘experiência’, empirismo transcendental ou
ciência do sensível” (ibidem, p.107).
Transcendentalidade em ato de uma pesquisa, que trata dos dados reais do mundo e
das existências, de maneira tradutória, para que, do deserto das existências empíricas,
brotem ex-sistências paradoxais (DELEUZE, 1998), sempre equívocas, que colocam os
pesquisadores e os seus grupos, bandos, coletivos, diante da verdade das próprias pesquisas,
pela ética transcriadora que elas veiculam.
A experimentação de escrileituras tradutórias é, assim, um apelo aos pesquisadores
para que a imposição de determinado real, na linguagem transcendental, trabalhe para que
um resultado apareça – inclusive, na sua formalização –, como efeito e produto de um
trabalho de pensamento, que opera no discurso, cortando-o para que as palavras tenham a
sua eficácia. Trata-se, aqui, de jogos de posição, disposição, composição, montagem,
interpretação, dramatização dos dados, que contam uma história de exercícios de escrita e
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 333
333

de leitura, formada sob e sobre outras histórias, feitas em bordas de conceitos, de perceptos
e de afectos (DELEUZE; GUATTARI, 1992). Jogos que produzem, como resultados de
pesquisa, algo que não possui identidade com os dados empíricos, nem com as suas
vivências, mas que carregam a possibilidade de efetividade e concreção.

empirismo transcendental
Pesquisar, de modo empírico-transcendental é, assim, uma questão de produção
maquínica, uma invasão dos signos, uma operação escandalosa de enunciados, um
conjunto absurdo de vibrações. Há, aqui, o fundamento de um empirismo superior (como
Deleuze o chama), mas também renovado, no sentido de Bachelard (2008a), para o qual, a
imaginação é o que fica subjacente à razão sonhada. Pesquisar, devaneando, não é inovar
os dados nem a sua coleta, mas exercitar variações de sentido, que podem ser moleculares,
justapostas, separadas por cadências. Variações que, muitas vezes, conduzem o
pesquisador a dizer o mesmo, mas não tanto; porque, inclusive, o próprio sentido morde a
sua língua.
Não sendo uma enteléquia transparente nem transcendente, mas a realização de um
conjunto de operações tradutórias, que precisamos conhecer e com elas trabalhar, o ponto
de partida dessa pesquisa é a experimentação não-repressiva com as matérias-dados do
arquivo. Arquivo que é conservador e revolucionário, formação histórica e devir, tradição e
tradução luciferina. E que, portanto, carrega a possibilidade de experimentar o pensamento
do impensável; isto é, o advento de uma alteridade radical daquilo que nele está presente e
que nos constitui, por ser, em alguma medida, produzido historicamente e também
recalcado.
Existe, nessa pesquisa, uma necessidade imperativa de traduzir as matérias-dados
do arquivo para evitar uma língua única, axiomas teóricos ou críticos dogmáticos e a
servidão aos textos ou ideias alheios. Traduzir implica ler, entender, discutir e reescrever
os dados como nossos, o que talvez seja a única maneira “de assumir a aventura da relação
entre línguas e situações. É só se colocando em face do intraduzível que o discurso teórico
pode encontrar-se diante daquilo que o questiona, de certa forma”; de maneira que “é só ao
traduzir que se tem alguma chance de ler” (FERREIRA; OTTONI, 2006, p.11).
Operar tradutoriamente com o par empírico-transcendental não abarca ódio à
concepção que a realidade não é analisável nem uma apologia da observação direta, no
sentido da ciência que afirma ser necessário “ver para compreender”, diz Bachelard (2008a,
p.12), como “ideal dessa estranha pedagogia” dos “decretos ministeriais: pese, meça, conte;
desconfie do abstrato, da regra; dirija a mente dos jovens para o concreto, para o fato”; e
“azar se, assim, o pensamento vai do fenômeno mal observado à experiência malfeita”. Ao
contrário, pesquisar o sentido-acontecimento, é trazer à tona a destinação das palavras e
das ideias arquivadas com o ouvido interno (DERRIDA, 2005), recheado de
entrecruzamentos, expressões contraditórias, desvios abruptos, sintaxes aproximativas,
substituições paradoxais, segredos e mistérios.
Quando o pesquisador pensa nas relações entre leitura, escritura, tradução,
desconstrução do arquivo e a vida, cai, de cheio, em um torvelinho intelectual, onde toda
estrutura é posta em variação. Ora, não há adequação entre verba e res; de modo que os
dados não se encontram a sua disposição, contidos em si mesmos, nem oferecidos a sua
grelha conceitual; assim como não toma a linguagem como um instrumento dócil e
transparente do mundo; tampouco considera-se um sujeito totalmente individuado, mas
uma entidade em constante movimento e crise.
O que ocorre se esse pesquisador empírico-transcendental substitui operações ou
conceitos do arquivo por outros? Se tabula – entabula, dispõe, prepara, entabua, estabelece,
firma, combina, principia, acerta, compõe, apalavra, avança, concorda, convenciona, terça,
334|
334| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

negocia, liga, tabela, mapeia o que tem forma de tábua – os dados que coleta do arquivo,
mais ou menos estatística ou literariamente, positiva ou negativamente, figurativa ou não-
figurativamente? Como a pesquisa desconstrói o visível e o dizível (DELEUZE, 1991) do
arquivo? Quando ocorre o punctum escrileitural que une objeto, linguagem e o sujeito que
pesquisa?
Ao ler e escrever os dados-matérias, realizando anexações não lineares, que
bloqueiam a recondução circular e paralela, embora autônoma, à origem, o pesquisador
pesquisador
traduz a sua dispersão e o seu diferimento, ferindo-os, performando-os e, neles,
inscrevendo a sua marca. Ele realiza uma encenação de arquivo, implicando a dizibilidade
na visibilidade; fazendo operações de serialização enunciativa; cortando pequenas unidades
que atuam por meios diferenciais, como parágrafos, seções, capítulos, temas, épocas,
conceitos, momentos, gêneros, tipos; alinhando séries por vizinhança heteróclita; em outra
palavra, ele dobra os dados até que toquem o seu ponto de partida e ali se rebatam para
então recomeçarem a sua potência de criação, outra e outra vez. Como se fosse uma
conversa entre loucuras.

arquivo-máquina
O arquivo desse tipo de pesquisa do acontecimento-sentido (CORAZZA, 2004)
pode ser entendido como uma máquina abstrata, no sentido de Deleuze e Guattari (1997;
2010), qual seja: nem real, nem fictício, mas problemático; que opera em agenciamentos
concretos, descodificando e desterritorializando estratos, abrindo-os para o molecular e
para o cósmico, em devires diferenciais. Quase-causal, esse arquivo-máquina ignora as
formas e as substâncias, excede toda mecânica, apreendendo os dados em sua diferença de
potencial e de intensidade, ligando-os em sua heterogeneidade e singularidade virtual, para
formar multiplicidades em um novo plano de consistência (DELEUZE; GUATTARI,
1992) que resulta da pesquisa.
Arquivo que define as multiplicidades das suas matérias-dados por linhas de fuga,
que são os limiares através dos quais o sistema material promove mudanças na própria
pesquisa, ao cortar divisas de desterritorialização; formular convites para novas conexões e
agenciamentos; ligar matérias informes (phylum) e funções não formadas (CORAZZA,
2013); determinar aquilo que pode ser feito e pensado, e também o que não pode, como
limite para a grade forma-substância, não no corrente estado de coisas, mas em estados
futuros.
Definido por suas capacidades virtuais, indicadas pelos traços dos dados, esse
arquivo é um diagrama funcional, que maquina transformações, afectos e devires de vários
agenciamentos que o habitam, para além da interação mútua entre eles. Como um plano de
expressão-conteúdo (DELEUZE, 1991), o arquivo condensa as organizações de conteúdo e
de expressão de cada matéria trabalhada, cada uma contendo formas e substâncias –
conteúdo, entendido não somente como “a mão e as ferramentas, mas uma máquina social
técnica”, que preexiste às organizações e “constitui estados de força ou formações de
potência”; expressão, entendida não apenas como “a face e a linguagem, nem as línguas,
mas uma máquina coletiva semiótica que a elas preexiste e constitui regimes de signos”
(DELEUZE; GUATTARI, 1995, p.80).
Como um operador virtual em intensidade das matérias e de suas funções, o
arquivo possui uma semiótica material, constituída por artigos indefinidos, nomes
próprios, verbos no infinitivo, datas. Por exemplo, sujeito à atualização divergente,
encarnado em registros diferentes, o arquivo do Projeto Escrileituras: um modo de ler-escrever
em meio à vida tomou como sua matéria informe a multiplicidade humana dos
participantes, ligada às suas funções não formadas, impondo-lhes o tipo de conduta
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 335
335

derivada da filosofia da diferença (CORAZZA; RODRIGUES; HEUSER; MONTEIRO,


2015).
Esse arquivo-máquina, além de abstrato, é singular e imanente, definindo, a cada
movimento de pesquisa, os padrões e limiares que ligam multiplicidades virtuais entre si,
possuindo uma capacidade emergente de variações contínuas dos dados. Assim, estes
dados podem ser descodificados e desterritorializados, codificados e territorializados,
sobrecodicados e reterritorializados, ao produzirem palavras de ordem na linguagem,
significações, subjetividades, axiomáticas e estratos. Desse modo, as três atividades
principais de um arquivo-máquina são a criação (produzindo vontade de potência de mais
vida), a estratificação e a captura (aquilo que a vida organiza contra si mesma e no limite
de si mesma): “Mecanosfera” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.232).

esfolamento em ziguezague
Em uma pesquisa empírica, tudo se passa como se o pesquisador examinasse um
arquivo, mantido em ordem perfeita, feito de fatos ordinários e contendo dados
armazenados em ordem cronológica, de acordo com dias da semana, meses do ano,
momentos de participação na escola, etc. Esses conjuntos, que se mostram, à primeira
vista, tão precisamente armados, tornam difícil o trabalho tradutório; pois, de fato, na
maioria das vezes, é o conjunto vivido na pesquisa que propicia o estabelecimento de laços
lógicos e de sentido, como efeitos de determinadas relações diferenciais e repartições dos
pontos singulares que lhes correspondem.
Agora, se, junto a Derrida (2001, p.7), distinguirmos arquivo “daquilo a que o
reduzimos frequentemente, em especial a experiência da memória e o retorno à origem,
mas também o arcaico e o arqueológico, a lembrança ou a escavação, em suma, a busca do
tempo perdido”, vias sinuosas surgem, como resultado de um caráter dinâmico, feito o
ziguezague do cavalo sobre uma mesa de xadrez. Podemos, diante desse tipo de arquivo,
pensar em um processo de perlaboração – como Freud usa Durcharbeiten –, efetivado por
estratos que envolvem o conjunto vivido e formam temas que evoluem no tempo
cronológico, mas, seguindo outros dinamismos espaço-temporais (DELEUZE, 2006),
dentro de outra lógica de produção e num tempo retroversivo, em posterioridade – aprés-
coup, na expressão lacaniana para Nachträglich (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001).
Por isso, se não for rápido demais na atribuição de significações, o pesquisador se
deixa trabalhar por esses jogos experimentais, que lhe possibilitam reconstituir e,
inclusive, escrever e ler termos e lugares, resgatar outras leituras e escritas, no limite
mesmo daquilo por ele vivenciado; limite que lhe fornece outros índices para uma teoria da
leitura-escritura-tradução dos dados, deduzida das implicações em sua história como
pesquisador.
Agora, se o pesquisador for muito rapidamente em direção ao estabelecimento de
uma estrutura, seja por recorrência, seja por raridade, a eficácia dessa palavra pode postular
a própria morte do arquivo da pesquisa. Desde que a atribuição rápida demais de sentido
ou de estrutura funciona como uma maneira de blindar ou de evitar os enigmas e de
assentar a pesquisa num arrimo; posições que diferem do funcionamento de deixar-se e de
deixar a pesquisa ser trabalhada por eles e ir, assim, produzindo novos problemas; além de,
por vezes, encontrar positividade no fato de ficar à deriva.

intolerável, quase-original, cópia e tradução


O pesquisador traduz porque a sua pesquisa (assim como a sua docência) seria
intolerável se não traduzisse. Intolerabilidade, no sentido daquilo que é prática e discurso
hegemônicos, considerados naturais, enquanto evidências, certezas, prospecções ou
obediências. Diagnosticar, em nossos discursos e práticas, aquilo que nos é intolerável,
336|
336| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

como pesquisadores, abre vias para o desprendimento das tranquilas certezas e certeiras
verdades.
Como professores, podemos dizer com Aury (1975, p.11) que enfrentamos:
esse
esse monstruoso
monstruoso obstáculo
obstáculo dede Babel,
Babel, cujas
cujas pedras
pedras esparsas
esparsas encontramos
encontramos todos
todos os
os
dias.
dias. Por
Por vezes
vezes derrubamos
derrubamos algumas.
algumas. Será
Será forçoso
forçoso continuar,
continuar, ee as
as máquinas
máquinas não
não
nos
nos serão
serão de
de nenhuma
nenhuma valia;
valia; sim,
sim, tudo
tudo que
que realmente
realmente pode
pode ser
ser traduzir
traduzir oo será
será por
por
elas.
elas. AA margem
margem porém
porém éé mínima.
mínima. A A nós
nós caberá
caberá todo
todo oo resto,
resto, as
as aproximações
aproximações
mais
mais ou ou menos
menos bem
bem sucedidas,
sucedidas, os
os furores
furores de
de fidelidade,
fidelidade, osos entusiasmos
entusiasmos malmal
recompensados;
recompensados; aa nós,
nós, oo impossível.
impossível. OO impossível
impossível éé oo desespero,
desespero, mas
mas éé também
também aa
desforra
desforra dodo tradutor.
tradutor.

Benjamin (2012, p.14) fala, em Produtos da China, que a força de uma estrada no
campo difere, caso se ande por ela ou se a sobrevoe de aeroplano: “Assim é também a força
de um texto, uma se alguém o lê, outra se o transcreve”. Ou seja, para aquele que vê a
estrada de cima, esta integra a paisagem e segue as suas leis; já aquele que por ela caminha
experimenta suas voltas, clareiras, perspectivas, distâncias. Do mesmo modo, Benjamin
distingue o mero leitor (conduzido por um aeroplano), reduzido a uma leitura consumista
de sobrevoo, daquele leitor que transcreve o mesmo texto:
Assim
Assim unicamente
unicamente oo texto
texto transcrito
transcrito comanda
comanda aa alma
alma daquele
daquele que
que está
está ocupado
ocupado
com
com ele,
ele, enquanto
enquanto oo mero
mero leitor
leitor nunca
nunca fica
fica conhecendo
conhecendo as as novas
novas perspectivas
perspectivas de
de
seu
seu interior,
interior, tais
tais como
como asas abre
abre oo texto,
texto, essa
essa estrada
estrada através
através da
da floresta
floresta virgem
virgem
interior
interior que
que sempre
sempre volta
volta aa adensar-se:
adensar-se: porque
porque oo leitor
leitor obedece
obedece ao
ao movimento
movimento de de
seu
seu eu
eu no
no livre
livre reino
reino aéreo
aéreo dodo devaneio,
devaneio, enquanto
enquanto oo queque transcreve
transcreve oo faz
faz ser
ser
comandado.
comandado.

Nessa direção é que Benjamin (ibidem, p.14) afirma que a “arte chinesa de copiar
livros foi, portanto, a incomparável garantia de cultura literária, e a transcrição, uma chave
para os enigmas da China”. Desde essa lição, existiriam, para o pesquisador, no mínimo,
duas maneiras de ler-escrever um texto, quais sejam: aquele que lê como alguém que lê por
ler; e aquele que dele se apropria, transcriando-o. Este que transcria é quem percebe as
variações da paisagem, pois se entrega, desbloqueia, desmancha a casca grossa, devaneia
(BACHELARD, 2008a), deixando que o seu desejo de escrever seja descongelado.
De modo que o pesquisador (como o copista) pode ser uma espécie de escriba dos
textos científicos, artísticos e filosóficos (bem como da tradição, das culturas e das
heranças); aquele que só os lê, acreditando que estão aí, dados, prontos e fechados em si
mesmos como caramujos; assim como aquele que é intérprete usa um método processual
de tradução, que os transcreve e atualiza, em sua potência de provocar transcriações.
Transcriação como uma espécie de hiperfidelidade, que leva à transformação
criativa dos extratextos; qual seja, a modernização do contexto histórico, por meio da
incorporação de intertextos, que aproximam a tradução feita pela pesquisa ao presente da
criação. Passado e presente, literalidade e criatividade, nacional e estrangeiro mantém,
dessa maneira, uma relação vital, por meio da transcriação, que suspende e desloca a falsa
dicotomia entre fidelidade e criatividade. É o excesso de fidelidade à potência criadora de
tal ou qual obra que leva a pesquisa à transformação dos originais, numa atitude de
desmesura mimetizante.
O jogo da tradução faz sentido, mediante a paixão que o pesquisador tem pela
matéria com a qual trabalha; paixão que, como um vulcão, consome tudo, extermina tudo,
mas é também pré-requisito, vontade de potência para toda vitalidade da pesquisa. Sem
paixão pela matéria, sem lava fervendo, a pesquisa seria pedra ou gelo puro: Eu tenho paixão
pela matéria da minha pesquisa. Se não a temos, como pesquisadores (e como docentes),
somos como um vulcão morto, um cisco de poeira humana, a ser resumido num epitáfio ou
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 337
337

em três frases de um discurso fúnebre, do tipo: Fui pesquisador-professor porque não soube
fazer outra coisa. Fui professor-pesquisador infeliz. Contei os dias para tudo acabar.

sentido-acontecimento
O arquivo-máquina de uma pesquisa empírica-transcendental produz um sentido-
acontecimento, anterior e irredutível ao estabelecimento de códigos, linguagens e meios
(DELEUZE, 1998). A esse efeito de arquivo, as escrileituras tradutórias e transcriadoras
atribuem uma lógica, distinta de proposições, significações, referências ou intenções
identificáveis.
É esse sentido-acontecimento que permite ao pesquisador construir uma
multiplicidade de problemáticas e de vibrações originais. Sentido que é, ele mesmo, o
transcendental, o extra-ser, o impossível tornado possível pela pesquisa, a casa vazia, o
lugar do mistério, o objeto de adivinhação, o grau zero que pede passagem, o não-lugar
sempre fluido, que faz escorrer nossas pesquisas, leituras e escrituras em currículos e
didáticas.
Sentido que fica entre o dizível e o visível, entre o ler e o escrever, entre o currículo
e a didática, e do qual extraímos novos dados para traduzir, que não são os originais. Desde
esse sentido do arquivo, criamos um logos curricular; e, de modo paralelo, embora
autônomo, o dramatizamos didaticamente, na cena da aula; desconstruindo tanto as
matérias do próprio arquivo quanto o seu sentido.
Enquanto formação de potência e regime de signos, o arquivo de pesquisa atua
como um agente determinante e seletivo, para a constituição das línguas e das ferramentas
e, também, para os seus usos, comunicações e difusões. Já o sentido-acontecimento faz
emergir novos arquivos-máquinas, que pertencem plenamente ao original, mas que, ao
mesmo tempo, dele se desprendem e estendem suas pinças em direção a outros arquivos.
O sentido-acontecimento, produzido pelo arquivo da pesquisa empírica-
transcendental, seria, dessa maneira, outra formação de um novo arquivo-máquina: aquele
que permanece envolvido num estrato anterior, que lhe corresponde parcialmente; e aquele
no qual desenvolve-se, por si mesmo, num plano desestratificado. Essa condição permite
que a pesquisa transcrie outros dados-matérias, a partir das traduções feitas, produzindo a
ilusão – derivada da sobrecodificação ou da tradutibilidade imanente à própria linguagem –
que transborda todos os estratos do arquivo, embora ainda siga pertencendo a um
determinado arquivo.

quem?
Diante dessas problemáticas, resta perguntar: quem o pesquisador-professor pensa que
é? Ora, embora a resposta a esta questão seja composição de desejo para agenciar outro
artigo, com outros fluxos de imagens, sons, palavras, matérias, sensações, importa aqui
indicar que a nossa pesquisa argumenta que o arquivo-máquina do professor-pesquisador é
EIS AICE – arquivo que também o transcria, ao ler, escrever e traduzir, curricular e
didaticamente (CORAZZA, 2013; 2014; 2016a; DINARTE; CORAZZA, 2016; ADÓ;
CORAZZA; CAMPOS, 2016).
Arquivo-máquina, virtual, potencial, revolucionário, experimentador e empirista,
que mexe no real dos dados, nas matérias do mundo, nas coisas da pesquisa e nos
significados das culturas, de forma transcendental, isto é, na imanência absoluta de um
Fora-de-Arquivo – superfície intensiva e aformal, posta em dobra no Aion. Fora-de-
Arquivo que está sempre em dívida com as traduções que fazemos, pois delas depende para
existir; enquanto dele dependemos para as nossas lutas por mais vida na vida.
338|
338| sandra
sandra mara
mara corazza
corazza

referências
ADÓ,
ADÓ, Máximo
Máximo Daniel Daniel Lamela;
Lamela; CORAZZA,
CORAZZA, Sandra Sandra Mara;Mara; CAMPOS,
CAMPOS, Maria Maria Idalina
Idalina Krause.
Krause.
Processos
Processos tradutórios
tradutórios na na pesquisa
pesquisa em em Educação:
Educação: oo Projeto
Projeto Escrileituras.
Escrileituras. Educação
Educação ee Pesquisa.
Pesquisa.
Universidade
Universidade de de São
São Paulo,
Paulo, 2016.
2016. (No
(No prelo.).
prelo.).
AQUINO,
AQUINO, Julio Julio Groppa.
Groppa. Não Não mais,
mais, masmas ainda:
ainda: experiência,
experiência, arquivo,
arquivo, infância.
infância. Childhood
Childhood & &
Philosophy.
Philosophy. Rio Rio dede Janeiro,
Janeiro, v.12,
v.12, n.23,
n.23, jan.-abr.2016,
jan.-abr.2016, p.179-200.
p.179-200. Disponível
Disponível em:em: http://www.e-
http://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/childhood/article/viewFile/23357/16713
publicacoes.uerj.br/index.php/childhood/article/viewFile/23357/16713 Acessado
Acessado em:
em:
05/05/2016.
05/05/2016.
AURY,
AURY, Dominique.
Dominique. Prefácio.
Prefácio. In:In: MOUNIN,
MOUNIN, Georges. Georges. Os Os problemas
problemas teóricos
teóricos da
da tradução.
tradução. Tradução
Tradução
Heloysa
Heloysa de de Lima
Lima Dantas.
Dantas. SãoSão Paulo:
Paulo: Cultrix,
Cultrix, 1975,
1975, p.7-11.
p.7-11.
BACHELARD,
BACHELARD, Gaston. Gaston. A A terra
terra ee os
os devaneios
devaneios da da vontade:
vontade: ensaio
ensaio sobre
sobre aa imaginação
imaginação das das forças.
forças.
Tradução
Tradução MariaMaria Ermantina
Ermantina de de Almeida
Almeida PradoPrado Galvão.
Galvão. São São Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2008a.
2008a.
BACHELARD,
BACHELARD, Gaston. Gaston. Estudos.
Estudos. Tradução
Tradução Estela
Estela dos dos Santos
Santos Abreu.
Abreu. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Contraponto,
Contraponto,
2008b.
2008b.
BARTHES,
BARTHES, Roland. Roland. A A preparação
preparação do do romance
romance I:I: dada vida
vida àà obra.
obra. Tradução
Tradução LeylaLeyla Perrone-Moisés.
Perrone-Moisés. São São
Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2005.
2005.
BENJAMIN,
BENJAMIN, Walter. Walter. Rua Rua de de mão
mão única.
única. (Obras
(Obras Escolhidas
Escolhidas v.2). v.2). Tradução
Tradução Rubens
Rubens Rodrigues
Rodrigues
Torres
Torres Filho
Filho ee José
José Carlos
Carlos Martins
Martins Barbosa.
Barbosa. São São Paulo:
Paulo: Brasiliense,
Brasiliense, 2012.
2012.
CORAZZA,
CORAZZA, Sandra Sandra Mara.
Mara. Currículo
Currículo ee didática
didática da da tradução:
tradução: vontade,
vontade, criação
criação ee crítica.
crítica. Educação
Educação & &
Realidade.
Realidade. Revista
Revista da da Faculdade
Faculdade de de Educação,
Educação, Universidade
Universidade FederalFederal dodo Rio
Rio Grande
Grande do do Sul,
Sul,
Porto
Porto Alegre,
Alegre, 2016a.
2016a. (No
(No prelo.)
prelo.)
______.
______. Inventário
Inventário de de procedimentos
procedimentos didáticos
didáticos de
de tradução:
tradução: teoria,
teoria, prática
prática ee método
método dede pesquisa.
pesquisa. Programa
Programa
de
de Pós-Graduação
Pós-Graduação em em Educação
Educação da da Universidade
Universidade Federal Federal do do Rio
Rio Grande
Grande do do Sul
Sul (UFRGS)
(UFRGS)
ee Conselho
Conselho Nacional
Nacional de de Desenvolvimento
Desenvolvimento CientíficoCientífico ee Tecnológico
Tecnológico (CNPq),
(CNPq), PortoPorto Alegre,
Alegre,
2016b,
2016b, 27
27 p.p. (No
(No prelo.)
prelo.)
______.
______. Ensaio
Ensaio sobre
sobre EISEIS AICE:
AICE: proposição
proposição ee estratégia
estratégia parapara pesquisar
pesquisar em em educação.
educação. Porto
Porto Alegre:
Alegre:
Programa
Programa de de Pós-Graduação
Pós-Graduação em em Educação;
Educação; CNPq, CNPq, 2014,2014, 30
30 p.
p. (Texto
(Texto digitalizado.)
digitalizado.)
______.
______. O
O queque se
se transcria
transcria emem educação?
educação? Porto
Porto Alegre:
Alegre: UFRGS,
UFRGS, 2013. 2013.
______.
______. Sem
Sem exceção.
exceção. In: In: CORAZZA,
CORAZZA, Sandra Sandra Mara.
Mara. Os Os cantos
cantos dede Fouror:
Fouror: escrileitura
escrileitura em
em filosofia-
filosofia-
educação.
educação. Porto
Porto Alegre:
Alegre: Sulina,
Sulina, Editora
Editora da da UFRGS,
UFRGS, 2008, 2008, p.99-115.
p.99-115.
CORAZZA,
CORAZZA, Sandra Sandra Mara;Mara; RODRIGUES,
RODRIGUES, Carla Carla Gonçalves;
Gonçalves; HEUSER,
HEUSER, Ester Ester Maria
Maria Dreher;
Dreher;
MONTEIRO,
MONTEIRO, Silas Silas Borges.
Borges. Didática
Didática da da tradução:
tradução: transcriações
transcriações do do currículo
currículo nono Projeto
Projeto
Escrileituras.
Escrileituras. Revista
Revista de de Educação
Educação Pública.
Pública. Cuiabá,
Cuiabá, EdUFMT,
EdUFMT, v.24. v.24. n.56,
n.56, p.317-335,
p.317-335, maio-ago
maio-ago
2015.
2015.
_______.
_______. El
El saber.
saber. Curso
Curso sobre
sobre Foucault.
Foucault. Tomo
Tomo I. I. Traducción
Traducción Pablo Pablo Ires
Ires & & Sebastián
Sebastián Puente.
Puente. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Cactus,
Cactus, 2013.
2013.
_______.
_______. El El Leibniz
Leibniz de de Deleuze:
Deleuze: exasperación
exasperación de de lala filosofía.
filosofía. Traducción
Traducción EquipoEquipo Editorial
Editorial Cactus.
Cactus.
Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus, 2006.
2006.
_______.
_______. Proust
Proust ee osos signos.
signos. Tradução
Tradução Antonio
Antonio Carlos
Carlos Piquet
Piquet ee Roberto
Roberto Machado.
Machado. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Forense
Forense Universitária,
Universitária, 2003.2003.
_______.
_______. Lógica
Lógica do do sentido.
sentido. Tradução
Tradução LuizLuiz Roberto
Roberto Salinas
Salinas Fortes.
Fortes. São
São Paulo:
Paulo: Perspectiva,
Perspectiva, 1998.
1998.
_______.
_______. Foucault.
Foucault. Tradução
Tradução Claudia
Claudia Sant’Anna
Sant’Anna Martins.
Martins. São São Paulo:
Paulo: Brasiliense,
Brasiliense, 1991.
1991.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles. Gilles. Diferença
Diferença ee repetição.
repetição. Tradução
Tradução Luiz Luiz Orlandi,
Orlandi, Roberto
Roberto Machado.
Machado. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Graal,
Graal, 1988.
1988.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles; Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Felix. Felix. OO anti-Édipo:
anti-Édipo: capitalismo
capitalismo ee esquizofrenia,
esquizofrenia, v.1.
v.1. Tradução
Tradução LuizLuiz
B.
B. L.
L. Orlandi.
Orlandi. São São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. 34,
34, 2010.
2010.
_______.
_______. Conclusão:
Conclusão: regrasregras concretas
concretas ee máquinas
máquinas abstratas.
abstratas. (Platô
(Platô 15).
15). Tradução
Tradução Peter
Peter Pál
Pál Pelbart.
Pelbart.
In:
In: ______.
______. MilMil platôs.
platôs. Capitalismo
Capitalismo ee esquizofrenia,
esquizofrenia, v.5. v.5. Tradução
Tradução Peter Peter Pál
Pál Pelbart
Pelbart ee Janice
Janice
Caiafa.
Caiafa. SãoSão Paulo:
Paulo: Ed.34,
Ed.34, 1997,
1997, p.215-232.
p.215-232.
_______.
_______. 10.000
10.000 A.C.
A.C. A A geologia
geologia da da moral
moral (Quem
(Quem aa terra terra pensa
pensa queque é?.
é?. (Platô
(Platô 3).
3). Tradução
Tradução CéliaCélia
Pinto
Pinto Costa.
Costa. In:In: ______.
______. Mil
Mil platôs.
platôs. Capitalismo
Capitalismo ee esquizofrenia,
esquizofrenia, v.1.
v.1. Tradução
Tradução Aurélio
Aurélio Guerra
Guerra ee
Célia
Célia Pinto
Pinto Costa.
Costa. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Ed.34,
Ed.34, 1995,
1995, p.53-91.
p.53-91.
______.
______. OO que
que éé aa filosofia?.
filosofia?. Tradução
Tradução de de Bento
Bento Prado
Prado Jr. Jr. ee Alberto
Alberto Alonso
Alonso Muñoz.
Muñoz. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Ed.34,
Ed.34, 1992.
1992.
pesquisa
pesquisa empírica-transcendental
empírica-transcendental da
da diferença:
diferença: arquivo,
arquivo, escrileitura
escrileitura ee tradução
tradução de
de dados
dados || 339
339

DERRIDA,
DERRIDA, Jacques.
Jacques. Otobiographies.
Otobiographies. L’enseignement
L’enseignement de de Nietzsche
Nietzsche et
et la
la politique
politique du
du nom
nom propre.
propre. Paris:
Paris:
Galilée,
Galilée, 2005.
2005.
______.
______. Torres
Torres de
de Babel.
Babel. Tradução
Tradução Junia
Junia Barreto.
Barreto. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Editora
Editora UFMG,
UFMG, 2002.
2002.
______.
______. Mal
Mal dede arquivo:
arquivo: uma
uma impressão
impressão freudiana.
freudiana. Tradução
Tradução Claudia
Claudia dede Moraes
Moraes Rego.
Rego. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Relume
Relume Dumará,
Dumará, 2001.
2001.
DINARTE,
DINARTE, Luiz Luiz Daniel
Daniel Rodrigues;
Rodrigues; CORAZZA,
CORAZZA, Sandra Sandra Mara.
Mara. Espaço
Espaço poético
poético como
como tradução
tradução
didática:
didática: Bachelard
Bachelard ee aa imagem
imagem da da casa.
casa. Educação
Educação && Formação.
Formação. Revista
Revista PPGE/UECE,
PPGE/UECE, p.136-149,
p.136-149,
2016.
2016.
DOSSE,
DOSSE, François.
François. Gilles
Gilles Deleuze
Deleuze ee Félix
Félix Guattari:
Guattari: biografia
biografia cruzada.
cruzada. Tradução
Tradução Fátima
Fátima Murad.
Murad. Porto
Porto
Alegre:
Alegre: Artmed,
Artmed, 2010.
2010.
FERREIRA,
FERREIRA, Élida;
Élida; OTTONI,
OTTONI, Paulo.Paulo. Introdução.
Introdução. In:
In: FERREIRA,
FERREIRA, Élida;
Élida; OTTONI,
OTTONI, Paulo.Paulo. (Orgs.)
(Orgs.)
Traduzir
Traduzir Derrida:
Derrida: políticas
políticas ee desconstruções.
desconstruções. Campinas:
Campinas: Mercado
Mercado de de Letras,
Letras, 2006,
2006, p.9-20.
p.9-20.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. A A arqueologia
arqueologia do do saber.
saber. Tradução
Tradução LuizLuiz Felipe
Felipe Baeta
Baeta Neves.
Neves. Petrópolis:
Petrópolis:
Vozes,
Vozes, 1972.
1972.
JURANVILLE,
JURANVILLE, Alain. Alain. Lacan
Lacan ee aa filosofia.
filosofia. Tradução
Tradução Vera
Vera Ribeiro.
Ribeiro. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Jorge
Jorge Zahar
Zahar
Editor,
Editor, 1987.
1987.
LAPLANCHE;
LAPLANCHE; PONTALIS. PONTALIS. Vocabulário
Vocabulário de de psicanálise.
psicanálise. Tradução
Tradução Pedro
Pedro Tamen.
Tamen. SãoSão Paulo:
Paulo:
Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2001.
2001.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Assim
Assim falou
falou Zaratustra.
Zaratustra. Tradução
Tradução Mário
Mário dada Silva.
Silva. São
São Paulo:
Paulo: Círculo
Círculo do
do
Livro,
Livro, 1986.
1986.
TADEU,
TADEU, Tomaz;Tomaz; CORAZZA,
CORAZZA, Sandra; Sandra; ZORDAN,
ZORDAN, Paola. Paola. Linhas
Linhas de de escrita.
escrita. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte:
Autêntica,
Autêntica, 2004.
2004.
340
340
341
341

perspectivas sobre uma escola sem órgãos

marcelly custodio de souza11

introdução

Escrever
Escrever
ÉÉ desenhar
desenhar
Sentimentos.
Sentimentos.
(HENRIQUE,
(HENRIQUE, 2015,
2015, p.
p. 26)
26)

T raçar as letras, combinar os fonemas, formar sílabas, palavras, frases para


um texto. Não se trata apenas de um formalismo, de uma regra, de uma
exigência da academia. A escrita pode até tornar-se submissa às
burocracias, mas talvez sua função seja um pouco mais estética: “desenhar sentimentos”.
Uma maneira outra de habitar a nós mesmos, de experimentar.
Isto não é somente um texto. Isto é uma garatuja. É uma experimentação de cores,
de traços, de encontros e desencontros, que extrapolam os limites do papel, muitas vezes se
inscrevendo na própria pele de quem os lança. É, além de tudo uma tentativa de
experimentar-se nesse processo de construção.
Talvez poderíamos pensar numa espécie de cartografia do rabisco, ou até mesmo
numa garatuja cartográfica para pensar as dimensões desse trabalho. Desejamos criar
possibilidades outras, rabiscar outros mundos possíveis para a educação. Não se trata de
uma tarefa de salvação, ou mesmo construção de um projeto previamente definido, mas
antes traçar um mapa aberto de possibilidades e experiências. Um abrir-se ao inacabado na
intenção de tentar fazer com que o conhecido não se torne aprisionador. Uma tentativa de
pulsar a vida na escola em suas múltiplas faces.
Fazer da escola corpo cartografado, composto por muitas e variadas mãos, tecido e
entrelaçado por diversos mundos e temporalidades. Contrapondo-se à ideia das
estratificações que a escola sugere: as séries, as disciplinas, as pessoas e até as estruturas
físicas passaram a ter a função de manter a vida escolar, ao mesmo tempo em que contem e
redireciona os fluxos de multiplicidade.
Nós
Nós não
não paramos
paramos de de ser
ser estratificados.
estratificados. Mas
Mas oo que
que éé este
este nós,
nós, que
que não
não sou
sou eu,
eu,
posto
posto que
que oo sujeito
sujeito não
não menos
menos do do que
que oo organismo
organismo pertence
pertence aa um
um estrato
estrato ee dele
dele
depende?
depende? Respondemos
Respondemos agora:agora: éé oo CsO,
CsO, éé ele
ele aa realidade
realidade glacial
glacial sobre
sobre oo qual
qual vão
vão
se
se formar
formar estes
estes aluviões,
aluviões, sedimentações,
sedimentações, coagulação,
coagulação, dobramentos
dobramentos ee
assentamentos
assentamentos queque compõe
compõe umum organismo
organismo (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1995b, 1995b, p.
p.
15)
15)

Assim nossa tentativa é pensar a escola com um deslocamento do conceito de


Corpos sem órgãos (CsO) de Deleuze e Guattari. Não se trata de sobrepor o conceito à
prática, mas de pensar/repensar os autores com a escola, nos seus entrelaçamentos. O que
pode Deleuze, Guattari e a escola?
Os autores relatam que os órgãos, que restringem e redirecionam nossos fluxos são
formados a partir de um Corpo sem órgãos (CsO). Da mesma maneira, não poderíamos
pensar a instituição escolar semelhante ao corpo? Corpo este composto por órgãos, bem
ordenados entre si, cada um desempenhando uma função de modo a garantir o
funcionamento de um sistema. Talvez a escola também seja um corpo. Um corpo
construído historicamente como tal, funcionando de maneira orgânica.

11 Universidade
Universidade dodo Estado
Estado dodo Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro –– UERJ/CNPq,
UERJ/CNPq, Conselho
Conselho Nacional
Nacional de
de Desenvolvimento
Desenvolvimento
Científico ee Tecnológico
Científico Tecnológico -- Brasil.
Brasil. Email:
Email: marcellysalvini@hotmail.com
marcellysalvini@hotmail.com
342|
342| marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza

Entretanto, mesmo esse corpo escolar, pensando com Deleuze e Guattari, também é
formada sobre um Corpo sem órgãos. Há uma escola que tende às compartimentalizações do
corpo, talvez no que tange à sua institucionalização, e outra povoada por intensidades,
semelhante ao Corpo sem órgãos.
Para repensarmos a escola enquanto uma escola sem órgãos talvez seja preciso, antes,
observar o que nela estratifica e faz dela um corpo. Convidamos neste texto a subverter
essa lógica orgânica a partir do próprio órgão.
O que faz de um corpo, um corpo? Dentre as múltiplas definições que a palavra
assume em diferentes contextos, podemos destacar pontos comuns: grande parte envolve a
formação de uma unidade organizada.
Nesse sentido, percebemos o corpo como um mecanismo que funciona para uma
espécie de produção externa, com objetivos e utilidades pré-definidas. Assim também
procuramos observar a escola e consequentemente o currículo como uma espécie de
organismo escolar, composto de instrumentos que trabalham para além dele mesmo.
Ao longo da história, no processo de construção do que entendemos hoje por escola,
foi sendo formado, produzido, essa espécie de organismo escolar. Nossa intenção é
repensar essa função colocando o corpo de ponta-cabeça. Precisamos deslocar alguns
estratos, desnaturalizar algumas certezas e então pensar essa escola sem órgãos para além da
escola.
Uma maneira de perceber a escola como algo que não está dado é pensá-la como
fruto do processo histórico. Assim, chamamos corporificação, o processo de gestação desse
corpo escolar brasileiro ao longo do tempo.

corporificação da escola: o embrião brasileiro


Nessa tentativa de captar alguns acontecimentos que poderíamos considerar como
precursores do que pretendemos chamar de ‘corpo escolar’ no Brasil, optamos por fazer um
retorno na história de nosso país, até aproximadamente 1500, quando o embrião de nossa
escola começou a se formar no ventre dessas terras do novo mundo.
Juntamente com os Portugueses, desembarcaram em nossas terras comissões de
ordens religiosas, dentre elas a de maior destaque foi a dos jesuítas, com apoio da Coroa e
das autoridades da colônia, a fim de organizar um modelo educacional. Nasce aí em nosso
país o embrião do que hoje conhecemos por ‘corpo educacional’, numa tendência de criar
uma escola que pudesse dar conta de uniformizar, de subdividir e controlar os fluxos. Não
estendo críticas ao modelo criado ou à pedagogia empregada, apenas marco em terras
nacionais o início de uma técnica de controle que visa unificar pela instrução, que
privilegia determinados conteúdos em detrimentos de outros.
Pela abrangência do território conquistado pela coroa Portuguesa, o modelo
educacional jesuítico se tornou uma espécie de sistema de ensino, alçando mais um degrau
de “evolução” até a concretização do corpo educacional. Nesse modelo três aspectos se
articulavam para atingir as finalidades propostas: a colonização, a educação e a catequese.
A educação era transmitida por formas institucionalizadas, como o sistema implantado, e
formas não institucionalizadas como o convívio nas atividades que cercavam a vida no
dia-a-dia.
Esse período pode ser subdividido em dois modelos: o período heroico e o período
de implementação do Ratio Studiorum. Este segundo, em “escala evolutiva”, representa a
formação do corpo escolar em suas principais estruturas.
perspectivas
perspectivas sobre
sobre uma
uma escola
escola sem
sem órgãos
órgãos || 343
343

gastrulação da escola: período heróico


Na perspectiva de corporificação da escola, destacamos a gastrulação 22 como a fase
do desenvolvimento embrionário em que ocorre o aumento do número e volume das
células, com uma pequena diferenciação entre elas, como metáfora do sistema educacional
que já tendia, mesmo que a pequenos passos, à organização dos tecidos que posteriormente
se reuniriam para a formação de nossos órgãos.
Esse período abrange a chegada dos jesuítas no Brasil em 1549, até a morte do padre
Manuel da Nóbrega em 1570, ou mesmo até 1597, morte do padre José de Anchieta e
promulgação do Ratio Studiorum.
Compreende o período em que os jesuítas estabeleceram o primeiro contato com os
índios, deparando-se com seu modelo de organização social, que apesar de não possuir uma
orientação pedagógica precisa, continha um modelo educacional baseado em três pilares: a
tradição, a ação e o exemplo.
Dentre
Dentre os os índios
índios oo processo
processo educacional
educacional era era algo
algo contínuo,
contínuo, porém
porém se se concentrava
concentrava
primordialmente
primordialmente até até os
os 25
25 anos.
anos. Entre
Entre os os 77 ee 88 anos
anos meninos
meninos ee meninas
meninas ficavam
ficavam na na aldeia
aldeia
sob
sob oo cuidado
cuidado da da mãe
mãe ee além
além das das brincadeiras
brincadeiras iniciavam
iniciavam aa aprendizagem
aprendizagem das das primeiras
primeiras
lições.
lições. Os
Os meninos
meninos erameram iniciados
iniciados no no manuseio
manuseio de de armas
armas como
como oo arcoarco ee aa flecha
flecha ee as
as
meninas,
meninas, na na arte
arte de
de fiar
fiar ee fabricar
fabricar cerâmica.
cerâmica. EntreEntre 77 ee 15
15 anos,
anos, aa educação
educação dos dos meninos
meninos era era
de
de responsabilidade
responsabilidade dos dos pais,
pais, que
que os os levava
levava para para caçar
caçar ee servia-lhes
servia-lhes de de modelo
modelo aa ser ser
seguido.
seguido. Da Da mesma
mesma maneira
maneira as as meninas
meninas eram eram educadas
educadas ee iniciadas
iniciadas no no trabalho
trabalho
desenvolvido
desenvolvido pelaspelas mulheres
mulheres da da aldeia,
aldeia, tomando
tomando aa mãe mãe como
como figura
figura modelo.
modelo. Entre
Entre osos 15
15 ee
25
25 anos,
anos, aa participação
participação na na chamada
chamada “vida “vida adulta”
adulta” acontecia
acontecia de de maneira
maneira maismais efetiva,
efetiva,
incluindo
incluindo cerimônias
cerimônias de de iniciação,
iniciação, onde onde era era permitido
permitido ao ao jovem
jovem ter ter suas
suas ‘aventuras
‘aventuras
amorosas’.
amorosas’. No No período
período dos
dos 25 25 aos
aos 40
40 anos,
anos, osos homens
homens erameram aceitos
aceitos nos
nos bandos
bandos guerreiros
guerreiros ee
participavam
participavam das das reuniões
reuniões com com os os velhos
velhos adquirindo
adquirindo conhecimento
conhecimento das das tradições
tradições queque
permeavam
permeavam aa culturacultura da da tribo.
tribo. Nesse
Nesse período
período as as mulheres
mulheres também
também participavam
participavam
ativamente
ativamente da da vida
vida da
da tribo,
tribo, assumindo
assumindo as as tarefas
tarefas domésticas
domésticas ee cuidando
cuidando da da educação
educação dos dos
filhos,
filhos, além
além de de participar
participar de de algumas
algumas cerimônias
cerimônias com com osos homens.
homens. ApósApós os os 40
40 anos,
anos, os
os
homens
homens tinham
tinham aa possibilidade
possibilidade de de se
se tornar
tornar chefes
chefes ee líderes
líderes guerreiros,
guerreiros, ou ou mesmo
mesmo pajés.
pajés.
Eram
Eram admirados
admirados ee exerciam
exerciam aa influência
influência de de uma
uma espécie
espécie de
de professor.
professor. Ao Ao mesmo
mesmo tempo,
tempo, as as
mulheres
mulheres se se tornavam
tornavam mestras
mestras do do trabalho
trabalho doméstico
doméstico além além de
de assumir
assumir aa função
função de de carpir
carpir
os
os mortos.
mortos.
Tal
Tal organização
organização era era presente
presente nas nas comunidades
comunidades Tupinambás,
Tupinambás, que que abrangia
abrangia diversos
diversos
grupos
grupos tupis,
tupis, ocupando
ocupando extensa
extensa parteparte do do território
território de de norte
norte aa sul.
sul. Seu
Seu modelo
modelo de de educação
educação
de
de certa
certa forma
forma representava
representava oo conjunto
conjunto das das populações
populações indígenas.
indígenas.
Assim
Assim inicia-se
inicia-se aa tendência
tendência brasileira
brasileira de de adotar
adotar modelos
modelos estrangeiros
estrangeiros ee descartar
descartar osos
seus
seus próprios.
próprios. Não
Não que
que os
os índios
índios tenham
tenham tido tido escolha
escolha aoao adotar
adotar este
este ou
ou aquele
aquele modelo,
modelo, ou ou
mesmo
mesmo que que osos portugueses
portugueses tenhamtenham sido sido osos vilões
vilões aoao trazer
trazer aa escola
escola nosnos moldes
moldes europeus.
europeus.
Não
Não pretendemos
pretendemos entrar
entrar nono mérito
mérito do do julgamento
julgamento dos dos modelos,
modelos, apenas
apenas pretendo
pretendo destacar
destacar oo
processo
processo orgânico
orgânico de de formação
formação da da escola.
escola.
Nesse
Nesse contexto
contexto osos jesuítas
jesuítas implantaram
implantaram inicialmente
inicialmente oo plano
plano dede estudos
estudos elaborado
elaborado
pelo
pelo padre
padre Manoel
Manoel da da Nóbrega
Nóbrega conhecido
conhecido como como pedagogia
pedagogia brasílica,
brasílica, uma
uma espécie
espécie de de degrau
degrau
de
de desenvolvimento
desenvolvimento até até aa elaboração
elaboração de de um
um modelo
modelo geral.
geral. Esse
Esse plano
plano dede estudos
estudos se se pautava
pautava
no
no ensino
ensino dede português
português para para os os índios,
índios, doutrina
doutrina cristã,
cristã, escola
escola de de ler
ler ee escrever
escrever ee
opcionalmente
opcionalmente oo cantocanto orfeônico
orfeônico ee aa músicamúsica instrumental.
instrumental. Havia
Havia também
também oo aprendizado
aprendizado
profissional
profissional ee agrícola,
agrícola, além
além da da preparação
preparação daqueles
daqueles que que se
se destinavam
destinavam ao ao ensino
ensino superior
superior
na
na Universidade
Universidade de de Coimbra,
Coimbra, em em Portugal.
Portugal. NesseNesse período
período aa pedido
pedido dos dos índios,
índios, houve
houve aa

22 O
O termo
termo gastrulação
gastrulação éé utilizado
utilizado aa partir
partir de
de um
um deslocamento
deslocamento conceitual
conceitual do
do campo
campo da
da biologia.
biologia.
344|
344| marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza

especulação de um projeto de educação destinado ao sexo feminino, logo vetado pela coroa,
que só iniciou esse modelo de educação em 1815.
Nota-se aqui o esboço de uma pedagogia que buscava unificar os brasileiros
segundo um padrão, um ensaio para a corporificação da escola. Não entrarei no mérito da
catequese, amplamente discutido, mas mantenho a atenção nas questões que dizem
respeito à instrução e não necessariamente tangem o aspecto espiritual. Nesse contexto há
a clara explicitação de uma identidade a ser alcançada através da instrução, o que não
significa educação, pois esta, ao invés de uniformizar o indivíduo, promove a emancipação.
Não pretendo dizer, contudo, que os índios não tinham direito de se apropriar do conjunto
de técnicas e saberes desenvolvidos na Europa, apenas ressalto a maneira impositiva que
essa apropriação foi feita, desrespeitando outra série de saberes, técnicas e identidades de
nossas terras.
Posteriormente esse modelo educacional continua a ser posto em prática pelo padre
José da Anchieta, que além do modelo do padre Manoel da Nóbrega, domina a língua dos
índios e organiza uma gramática.
Entretanto, tal modelo educacional teve uma aplicação precária e enfrentou
oposição dentro da própria ordem, sendo substituído posteriormente por um plano mais
organizado, que no Brasil, resultou na formação de uma espécie de corpo escolar, dividido
em órgãos com funcionamento específico.

organogênese da escola: ratio studiorum


Seguindo a ideia de desenvolvimento embrionário do corpo escolar, destacamos a
terceira fase desse processo, a organogênese 33. Nessa fase, há a diferenciação dos órgãos,
cada qual com sua função específica e determinada no conjunto do organismo, assim como
a escola nesse período tendia a uma organização segmentária.
Em 1564, houve por parte da Coroa o processo de redízima, que consistiu no destino
de 10% dos impostos arrecadados na colônia para a educação jesuítica. Assim fica claro de
onde provém a alimentação e a criação desse ‘corpo escolar’: da Coroa portuguesa, e de
seus interesses.
Nesse período ocorreu também a implantação da primeira versão do Ratio
Studiorum. Esse plano de estudos era orientado pelo modus parisiensis, um modelo
educacional adotado pela Universidade de paris, onde o padre Nadal, dentre outros padres
que fundaram o primeiro colégio jesuíta estudaram. Esse modelo ganhou força em
oposição ao modus italicus, que prevaleceu durante a idade média e final do século XV.
Essas duas vertentes se diferenciavam quanto ao conteúdo e método adotado. O
modus italicus não seguia um plano estruturado, não possuía vínculos disciplinares e nem
diferenciação idade-série, o papel do professor era de um mediador, o que poderia muitas
vezes ser desempenhado por estudantes mais adiantados. Contrariamente, no modus
parisiensis, havia a determinação de conteúdos pré-fixados com regência de um professor e
a presença de exercícios escolares, dentre outros mecanismos de incentivo ao trabalho
escolar, além da divisão dos alunos em classes de acordo com idade ou domínio de certos
conteúdos. Esse modelo era baseado na escolástica, pautado na lectio, uma espécie de lição,
na disputatio, um modelo de debate acerca de questões da lectio, e a repetitiones, que
compunha uma série de exercício de fixação e repetição.
Em nível de macropolítica, surge na opção pelo modus parisiensis o gene para a
criação do modelo que conhecemos por escola, segmentado e com órgãos específicos que
tentam controlar os fluxos de multiplicidade.

33 O
O termo
termo organogênese
organogênese éé utilizado
utilizado aa partir
partir de
de um
um deslocamento
deslocamento conceitual
conceitual do
do campo
campo da
da biologia.
biologia.
perspectivas
perspectivas sobre
sobre uma
uma escola
escola sem
sem órgãos
órgãos || 345
345

O Ratio Studiorum tinha suas origens fixadas nas constituições da Companhia de


Jesus elaborada por seu Fundador Santo Inácio de Loyola e possuía uma corrente de
pensamento aristotélico-tomista, uma articulação entre a filosofia de Aristóteles e a
tradição cristã, trabalho organizado pelo filósofo e Teólogo medieval São Tomás de
Aquino. Esse modelo tinha um caráter universalista, entendendo-se em 1599, quando
editada e promulgada a sua 3ª versão, para todo mundo onde se encontravam os colégios
mantidos pela Companhia de Jesus. Não me proponho a criticar tal modelo, ou apresentar
outro que possa ser considerado ‘superior’, apenas faço alguns apontamentos.
Esse modelo abarcava um curso de humanidades, chamado de estudos inferiores,
com duração de seis a sete anos, e disciplinas como retórica, humanidades, gramática
superior, gramática média e gramática inferior. A formação era seguida pelos cursos de
filosofia e teologia, considerados estudos superiores e destinados àqueles que seriam padres
catequistas.
AA dialética,
dialética, chamada
chamada na na Ratio
Ratio de
de humanidades
humanidades (uma
(uma série)
série) buscava
buscava garantir
garantir uma
uma
expressão
expressão poderosa
poderosa ee convincente.
convincente. No No conteúdo
conteúdo trabalhado
trabalhado nesses
nesses cursos
cursos oo latim
latim
ee oo grego
grego constituíam
constituíam as as disciplinas
disciplinas dominantes.
dominantes. AA elas
elas subordinavam-se
subordinavam-se aa língua
língua
vernácula,
vernácula, aa história
história ee aa geografia,
geografia, ensinadas
ensinadas na
na leitura,
leitura, versão
versão ee comentários
comentários dosdos
autores
autores clássicos
clássicos (SAVIANI,
(SAVIANI, 2011, 2011, p.57).
p.57).

Posteriormente, com os aumentos do número de estudantes e a concentração de


padres destinados ao ofício de ensinar houve um processo de divisão do trabalho didático,
criando espaços diferenciados e especializados para o ensino das disciplinas e
consequentemente os modelos de divisão por série como meio de organização e divisão
desses espaços. Nasce assim no Brasil, o modelo escolar predominante, pautado na divisão
do trabalho, na divisão de disciplinas e na divisão de pessoas: um verdadeiro corpo.
No
No palco
palco da
da episteme
episteme moderna,
moderna, da
da representação,
representação, oo saber
saber científico
científico constrói-se
constrói-se
então
então numa
numa busca
busca de
de ordenação
ordenação do
do mundo.
mundo. Ora,
Ora, as
as diversas
diversas ciências
ciências ou
ou as
as várias
várias
disciplinas
disciplinas –– constituem-se
constituem-se em
em esforços
esforços de
de construção
construção dede uma
uma ordem
ordem dodo mundo
mundo
no
no nível
nível do
do saber.
saber. Esta
Esta ordenação
ordenação está
está intimamente
intimamente relacionada
relacionada com
com osos
mecanismos
mecanismos do do poder
poder (GALLO,
(GALLO, 2008,
2008, p.257).
p.257).

Nessa perspectiva ao longo de todo processo histórico, o ‘corpo escolar’ sofreu


intensas modificações, abandonando a vertente religiosa e assumindo novas roupagens
como o liberalismo, positivismo e ecletismo entre os anos de 1759 e 1932. Posteriormente
ganhou força no cenário brasileiro os ideários da pedagogia nova e toda crítica à escola
tradicional.
Assim, durante todo processo histórico, o organismo educacional sofreu suas
mutações, curou e adquiriu novas doenças, sofreu evoluções genéticas, transplantou
órgãos, mudou diversas vezes as teorias que o alimentavam, mas sobretudo permaneceu
vivo em sua constituição curricular formada por órgãos.
[...]
[...] oo currículo,
currículo, acabou
acabou funcionando
funcionando como
como condição
condição de de possibilidade
possibilidade para
para que
que aa
lógica
lógica disciplinar
disciplinar fizesse
fizesse da
da escola
escola essa
essa ampla
ampla ee eficiente
eficiente maquinaria
maquinaria dede fabricação
fabricação
do
do sujeito
sujeito moderno
moderno ee da da própria
própria sociedade
sociedade disciplinar.
disciplinar. AA importância
importância histórica
histórica
disso
disso tudo
tudo éé mais
mais do
do que
que evidente
evidente (VEIGA-NETO,
(VEIGA-NETO, 2009, 2009, p.17).
p.17).

Pensando nessa ‘evolução’ do corpo curricular ao longo de tantos anos é


interessante pensar que talvez não haja precisamente um ‘erro genético’, algo que possa ser
consertado por uma teoria mais ou menos elaborada. Talvez haja um equívoco na
finalidade a que são submetidas as infinitas teorias que buscam agir sobre a educação.
Talvez seja necessário pensar além do que é estrato, do que é externo. Podemos pensar a
escola além desse corpo?
346|
346| marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza

[...]
[...] Não
Não éé aa construção
construção dede um
um outro
outro corpus
corpus teórico
teórico que
que pudesse
pudesse substituir
substituir oo atual
atual
estado
estado das
das coisas.
coisas. Não
Não éé nem
nem poderia
poderia ser,
ser, pois
pois isso
isso significaria
significaria caircair numa
numa
contradição
contradição performativa.
performativa. AoAo contrário,
contrário, oo que
que eles
eles buscam
buscam éé liberação
liberação das
das “velhas
“velhas
categorias
categorias do do Negativo
Negativo que que oo pensamento
pensamento ocidental,
ocidental, por
por um um longo
longo tempo,
tempo,
sacralizou
sacralizou como
como forma
forma de
de poder
poder ee modo
modo dede acesso
acesso àà realidade
realidade [...
[... entendendo]
entendendo] que que
aquilo
aquilo que
que éé produtivo
produtivo nãonão éé sedentário,
sedentário, mas
mas nômade”
nômade” NesseNesse processo
processo de de
dessacralização
dessacralização pedagógica,
pedagógica, pode-se-dizer
pode-se-dizer que,
que, em
em suas
suas tentativas
tentativas profanatórias,
profanatórias,
eles
eles combinam
combinam oo segundo
segundo comcom oo terceiro
terceiro dos
dos sete
sete princípios
princípios essenciais
essenciais arrolados
arrolados
por
por Foucault.
Foucault. Lembremos
Lembremos oo segundo
segundo princípio:
princípio: “faça
“faça crescer
crescer aa ação,
ação, oo pensamento
pensamento
ee os
os desejos
desejos por
por proliferação,
proliferação, justaposição
justaposição ee disjunção”.
disjunção”. EE assim
assim eleele resume
resume oo
terceiro
terceiro princípio:
princípio: “prefira
“prefira oo queque éé positivo
positivo ee múltiplo;
múltiplo; aa diferença
diferença àà
uniformidade;
uniformidade; oo fluxofluxo às
às unidades;
unidades; os os agenciamentos
agenciamentos móveis
móveis aos aos sistemas”
sistemas”
(VEIGA-NETO,
(VEIGA-NETO, 2009, 2009, p.22-23).
p.22-23).

Assim, partindo na contramão dessa tendência de fazer da escola um organismo,


nos dispusemos a pensar com Deleuze, uma escola sem órgãos, onde o currículo não
representasse o engessamento, o redirecionamento dos fluxos, semelhante à maneira dos
Corpos sem órgãos (CsO). Não uma nova organização, uma nova mutação do sistema em
prol de outro modelo de órgão, mas uma espécie de anarquia do modelo orgânico.
Não nos referimos à morte da escola, pois da mesma forma que o Corpo sem órgãos
não se opõe ao órgão, mas sim ao modelo estratificado do organismo, assim também a
escola sem órgãos se opõe à organização curricular que engessa, não ao órgão em si. Tal
oposição não significa necessariamente a destruição daquilo que a escola tem estratificado,
mas antes uma abertura ao que vai além dos estriamentos.
Desfazer
Desfazer oo organismo
organismo nunca
nunca foi
foi matar-se,
matar-se, mas
mas abrir
abrir oo corpo
corpo aa conexões
conexões que que
supõem
supõem todo
todo um
um agenciamento,
agenciamento, circuitos,
circuitos, conjunções,
conjunções, superposições
superposições ee limiares,
limiares,
passagens
passagens ee distribuições
distribuições de
de intensidade,
intensidade, territórios
territórios ee desterritorializações
desterritorializações
medidas
medidas àà maneira
maneira de
de um
um agrimensor.
agrimensor. (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1995b,
1995b, p.
p. 15)
15)

Trata-se então de pensar modos de habitar a escola para além do modelo orgânico,
desterritorializar o corpo escolar, pensar outras conexões. Mesmo que estejamos sob o
domínio de qualquer modelo de ‘corpo escolar’, nossa tentativa é pensar a possibilidade de
uma escola sem órgãos. Poderíamos nos perguntar com Deleuze: como criar para si uma
escola sem órgãos?
Contrapondo-se à ideia de órgão como uma espécie de mecanismo que trabalha em
função da produção, pensar uma escola sem órgãos é pensar fora da lógica de uma finalidade
externa, é desvincular a escola de uma utilidade fora de si mesma.
Situando essa discussão em relação ao cenário pertencente à educação brasileira,
podemos citar, no Título II, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que trata
dos princípios e fins da educação nacional:
Art.
Art. 2º
2º A
A educação,
educação, dever
dever da
da família
família ee do
do Estado,
Estado, inspirada
inspirada nos
nos princípios
princípios de
de
liberdade
liberdade ee nos
nos ideais
ideais de
de solidariedade
solidariedade humana,
humana, tem
tem por
por finalidade
finalidade oo pleno
pleno
desenvolvimento
desenvolvimento do do educando,
educando, seu
seu preparo
preparo para
para oo exercício
exercício da
da cidadania
cidadania ee sua
sua
qualificação
qualificação para
para oo trabalho.
trabalho.

É fácil perceber, que ao menos em termos de lei nossas escolas estão atreladas a
ideia de uma formação para o trabalho. Nesse sentido, segundo a LDB, a escola estaria
atrelada ao mundo e à sua forma de produção.
Nesse sentido, uma escola sem órgãos tende a fugir dessa obrigação de formação
externa, deixando de ser um mero instrumento da sociedade para habitar a ordem das
sensações, das potências. Talvez seja necessário fazer escola sem pensar na existência de
uma finalidade exterior, para aí descobrir o que é escola.
No conceito de CsO que Deleuze retira de Artoud, quando o órgão trabalha para a
produção, o desejo, a potência se torna apática perante à organização que a sobrepõe. Nesse
perspectivas
perspectivas sobre
sobre uma
uma escola
escola sem
sem órgãos
órgãos || 347
347

sentido Deleuze propõe criar para si um corpo sem órgãos. Uma tentativa de não
canalização do desejo, uma fuga da produção, uma busca por intensidades. Assim,
pensamos na possibilidade de criar uma escola sem órgãos para inventar tudo que a escola
pode e o modelo orgânico limita.
Pensar fora dos órgãos é pensar maneiras outras de vida. Trata-se de um conjunto
de práticas inerentes ao estilo de vida nômade, ao movimento. Há uma busca incessante
pela potência de ser em suas mais variadas formas e modos de vida. Afetar e ser afetado.
Uma espécie de contramão da produção.
Como pensar uma escola sem órgãos se tudo que permeia esse universo parece incitar
à produção? Como viver as intensidades se a escola se organiza em estruturas estanques?
Como resistir às disciplinas, aos horários e às pessoas que cada vez mais habitam a escola
para uma finalidade e em uma posição determinada?
Não pretendemos apresentar propostas de educação, abolições de horários ou outras
organizações curriculares, este texto procura ser um convite a criar uma escola sem órgãos
na escola que aparentemente está dada como orgânica. Talvez uma possibilidade, uma
tarefa revolucionária de fugir da produção. Inventar novas formas de vida possíveis dentro
da escola.
Pensar uma escola sem órgãos talvez seja habitá-la de outra maneira. Por que não
utilizar o horário que inicialmente teria a função de controlar, de produzir, ordenar o
tempo para cada atividade, para ao invés disso, produzir experimentações, intensidades?
Por que ao invés de pensarmos nas hierarquias e funções funcionando como engrenagens
de uma máquina não as reinventamos? Por que não transformar um currículo engessado
em um corpo que dança?

uma experiência sem órgãos?


Certo dia, durante as férias, os pequenos estavam em minha casa. Entre leituras e
escritas e outras tarefas que deveria cumprir, resolvemos fazer uma manhã de pintura,
talvez uma pausa das atividades ‘acadêmicas’.
Eu havia comprado uma caixa de lápis de cor nova. Era uma aquisição que sonhara
há um tempo. Finalmente estava em minhas mãos. Era um pouco difícil deixá-la nas mãos
das crianças. Confesso que já pensava nos tombos, nas pontas quebradas e nos estragos que
os meus tão sonhados lápis sofreriam.
Mesmo relutando, não havia outro jeito. Então coloquei-os sobre a mesa como
quem apresenta um filho recém-nascido. Cuidadosamente retirei-os da caixa. Estavam
acomodados em um estojo que os mantinham milimetricamente organizados por cores e
nuances, com os respectivos nomes do branco aos “neons”.
Essa organização me encantava. Cada lápis em seu lugar, cada cor combinava e
parecia conversar com a vizinha e a aparência era realmente bonita. Expliquei então, que
depois de usados, cada lápis deveria retornar ao seu devido local. Todos concordaram
prontamente com a condição, penso que talvez até mesmo sabendo que seria impossível,
mas o que importava naquele momento era colocar a mão nos lápis. Logo, a resposta
afirmativa representava um “sim” à pintura e não necessariamente às minhas condições.
Então, demos início. Éramos quatro, dois adultos e duas crianças, oito mãos, três
desejos e uma preocupação. Nos primeiros momentos, confesso que estava mais aflita em
relação à preservação dos lápis do que desejosa em experimentá-los. Não era a primeira vez
que os utilizava, mas era uma estreia do seu uso compartilhado. Os demais, não pareciam
me notar, seus olhos passeavam entre as cores e os desenhos, seus dedos deslizavam
rapidamente entre os lápis num ritmo quase musical.
348|
348| marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza

Depois de um tempo percebi que era impossível coordenar a devolução dos lápis
para os locais originais. O movimento de idas e vindas fazia com que o próprio estojo e os
lápis, que aparentemente estavam estáticos, com lugares pré-definidos, se movimentassem.
Ao me dar conta da situação olhei tristemente para a caixa em completa desordem e não
disse nada.
Fui surpreendida com uma fala de quem nem sequer me olhou pois estava mais
interessada nas cores: “ Que pena, os lápis já estão todos fora do lugar..., mas ainda dá para
colorir”. E nada mais foi dito.
Sim...ainda coloriam e talvez só por isso coloriam. Confesso que me senti um
pouco frustrada comigo mesma. Qual o sentido de manter os lápis cada um em seu lugar,
ordenados por nomes? Talvez pensasse em facilitar na combinação das cores. Uma ideia
um tanto quanto ingênua, porque se colorir é justamente combinar, por que não combinar
com o seu modo de olhar as cores, ao invés do que veio da fábrica? Por que eu havia ficado
tão apegada a essa lógica?
Uma criança na vontade de experimentar logo me mostrou que para colorir não é
necessário ordenar, não é preciso uma lógica, mas deixar-se levar pela dança dos dedos que
se entrelaçavam no papel ao som das cores. Sim, os lápis ainda cumpriam a função de
colorir fora da caixa...e talvez só poderiam colorir desse modo. Naquela minha ordem
primeira, cartesiana, os lápis não eram lápis, mas objetos de enfeite que não coloriam. Só a
partir do movimento das mãos, dos apontadores, das pontas que traçavam o papel, os lápis
estavam sendo lápis, mesmo que para isso necessitassem sair de um lugar original e
diminuir um pouco o tamanho. Ao final, cada lápis tinha um tamanho diferente, uns mais
apontados, outros menos, e um lugar totalmente novo, mas acima de tudo estavam sendo,
de fato, lápis.
Colorir com as crianças aparentemente deveria ser uma atividade comum. Uma
oportunidade de passar um pouquinho das férias com eles e até mesmo uma parada
obrigatória da tarefa de ler e escrever para compor este trabalho. Entretanto a atividade foi
além, assim como os lápis foram tirados de suas caixas pré-determinadas para colorir,
movimentando-se, percebi-me deslocada de certos lugares que habitava em relação à
pesquisa. Por que colorir não seria uma maneira de pesquisar como ler e escrever? Por que
pensava a atividade como uma pausa em relação à pesquisa? Fui movimentada por este
trabalho garatuja, esta cartografia da incerteza que se apresenta como inesperado.
Entre os rabiscos dos lápis de cor, rabisquei possibilidades de pensar a escola.
Possibilidades de pensar os movimentos da pesquisa e da educação para além do que nos
engessa.
Talvez seja necessário sair dessa caixa que nos classifica por cores e nuances. Fugir
da segmentação e do que nos vem pronto. Talvez seja interessante nos misturarmos com
outras cores, para que possamos aí, de fato, colorir.
E se pensarmos em colorir a escola? Como brincar com as cores e fazer com que a
escola experimente outras para além dos desenhos pré-definidos ou da ‘lógica das caixas’?
Talvez seja interessante pensar com o ato de colorir. Da mesma maneira que é impossível
colorir com os lápis dentro de suas caixas, numa ordem pré-determinada, talvez retirar a
escola de suas caixas também seja condição para colorir a educação. Não há como pensar
uma educação colorida com pessoas segmentadas.
Pensar em colorir uma escola sem órgãos é neste sentido colorir com diversas mãos.
Trata-se de pensar além das hierarquias pré-fixadas e funções desempenhadas dentro da
escola. É preciso que todos nós, que em alguma medida, trabalhamos com educação
experimentemos juntos a ideia de colorir. Não há papéis fixos nesse exercício, mas a
possibilidade de experimentar a escola que se dá e ao mesmo tempo pode ser inventada.
perspectivas
perspectivas sobre
sobre uma
uma escola
escola sem
sem órgãos
órgãos || 349
349

Esse
Esse caminho
caminho temtem uma
uma certeza,
certeza, precisa
precisa de
de mistura:
mistura: dede alunos,
alunos, professores,
professores,
pesquisadores,
pesquisadores, arte,
arte, pensamento.
pensamento. Inventar
Inventar mundos
mundos possíveis
possíveis é,
é, necessariamente,
necessariamente,
um
um trabalho
trabalho dede coletivização,
coletivização, pois
pois oo espanto
espanto que
que nos
nos faz
faz estranhar
estranhar oo mundo
mundo emem
que
que vivemos
vivemos ocorre
ocorre quando
quando somos
somos afetados
afetados por
por algo
algo inédito,
inédito, por
por uma
uma diferença,
diferença,
que
que está
está aí
aí no
no mundo,
mundo, nas nas relações,
relações, na
na pintura,
pintura, no
no texto,
texto, no
no pensamento
pensamento de de uma
uma
criança.
criança. (DIAS,
(DIAS, 2012,
2012, p.
p. 8)
8)

Misturemos os sujeitos da escola entre si. Misturemos as diversas cores. Talvez


uma ou outra cor nos seja mais interessante, mas o ato de colorir não envolve uma única
escolha, uma favorita, mas a experimentação. Não nos é interessante pensar em colorir a
escola de laranja, ou somente de vermelho, por mais que vejamos essas cores como
necessárias ao exercício de pensar uma escola colorida. É preciso que todos os sujeitos
tenham a possibilidade de colocar suas cores, independentemente de seu papel na escola.
Trata-se, portanto, de misturar os papéis dos sujeitos da escola como se misturam
os lápis, experimentar os conceitos que a envolvem, da mesma maneira como fazemos com
as cores. Abrir possibilidades de contemplar todas as nuances e escolher aquelas que
seriam interessantes para pintar a sua escola, da mesma maneira em que os outros sujeitos
que compõem a mesma realidade também o fazem. Este ato de colorir é sempre um
trabalho a muitas mãos.
Não se trata de uma proposta de colorir a escola segundo uma regra ou lógica, mas
antes experimentar o que cada cor pode levar a pensar, e se realmente isso é possível.
É preciso desorganizar as cores para que façam suas diversas combinações e desta
experiência amorosa de mistura, possam nascer outras possibilidades de fazer cores na
escola.
Cores-experiências, que após os encontros de se embrenhar na escola, não precisem
ser guardadas em caixas pré-fixadas, mas ao contrário, que possam estar sempre acessíveis
às diferentes mãos que ao longo do tempo desejarem contribuir nessa composição.
Guardar
Guardar umauma coisa
coisa não
não éé escondê-la
escondê-la ou ou trancá-la.
trancá-la.
Em
Em cofre
cofre não
não se
se guarda
guarda coisa
coisa alguma.
alguma.
Em
Em cofre
cofre perde-se
perde-se aa coisa
coisa àà vista.
vista.
Guardar
Guardar umauma coisa
coisa éé olha-la,
olha-la, fita-la,
fita-la, mirá-la
mirá-la por
por
Admirá-la,
Admirá-la, isto
isto é,
é, iluminá-la
iluminá-la ou ou ser
ser por
por ela
ela iluminado.
iluminado.
(Antonio
(Antonio Cícero)
Cícero)

Assim, nossa intenção é convidar à atenção. Olhar a escola atentamente. Um


exercício estético de experimentar as cores da escola sem órgãos enquanto colorimos a
própria existência. Guardemos fora das caixas, no ato livre de fazer escola e de se refazer
nessa experiência. Brinquemos na sua luz e nas cores que a compõem num ato amoroso.
Guardemos as escolas nas escolas, e não somente em nossos textos, teses ou
dissertações. Ponhamo-nos a caminho dessa escola possível de ser colorida. Criemos
nossas alternativas de habitar “Esse espaço dos ‘sujeitos possíveis’ [e que] talvez possa se
tornar o espaço do sujeito que tenta construir sua própria vida. Ele, como autor. A vida,
como obra de arte” (BURMESTER, 2009, p.32).

referências
BRASIL,
BRASIL, Ministério
Ministério da
da Educação.
Educação. LeiLei de
de Diretrizes
Diretrizes ee Bases
Bases da
da Educação
Educação Nacional.
Nacional. Lei
Lei nº
nº 9.394/96,
9.394/96, 20
20
de
de dezembro
dezembro dede 1996.
1996.
BURMESTER,
BURMESTER, Ana Ana Maria
Maria dede Oliveira.
Oliveira. A A vida
vida como
como obra
obra de
de arte:
arte: oo sujeito
sujeito como
como autor?.
autor?. In:
In:
RAGO,
RAGO, Margareth;
Margareth; VEIGA-NETO,
VEIGA-NETO, Alfredo Alfredo (org.).
(org.). Para
Para uma
uma vida
vida não-fascista.
não-fascista. Belo
Belo
Horizonte:
Horizonte: Autêntica
Autêntica Editora,
Editora, 2009,
2009, p.27-33.
p.27-33.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. Diferença
Diferença ee repetição.
repetição. 2.ed.
2.ed. São
São Paulo:
Paulo: Graal,
Graal, 2009.
2009.
350|
350| marcelly
marcelly custodio
custodio de
de souza
souza

DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Félix. Félix. Kafka:
Kafka: por
por uma
uma literatura
literatura menor.
menor. Tradução
Tradução Júlio
Júlio Castañon
Castañon
Guimarães.
Guimarães. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Imago,
Imago, 1977.
1977.
______.
______. Mil
Mil Platôs:
Platôs: Capitalismo
Capitalismo ee Esquizofrenia.
Esquizofrenia. Vol.
Vol. 1.1. São
São Paulo:
Paulo: Editora
Editora 34,
34, 1995a.
1995a.
______.
______. Mil
Mil Platôs:
Platôs: Capitalismo
Capitalismo ee Esquizofrenia.
Esquizofrenia. Vol.
Vol. 3.
3. São
São Paulo:
Paulo: Editora
Editora 34,
34, 1995b.
1995b.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; PARNET,
PARNET, Claire.
Claire. Diálogos.
Diálogos. Trad.
Trad. Eloisa
Eloisa Araújo
Araújo Ribeiro.
Ribeiro. São
São Paulo:
Paulo: Escuta,
Escuta,
1998.
1998.
DIAS,
DIAS, Rosimeri
Rosimeri de de Oliveira
Oliveira (org).
(org). Formação
Formação inventiva
inventiva de de professores.
professores. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina,
2012.
2012.
GALLO,
GALLO, Silvio.
Silvio. Transversalidade
Transversalidade ee educação:
educação: pensando
pensando uma uma educação
educação não-disciplinar.
não-disciplinar. In:In:
ALVES,
ALVES, Nilda;
Nilda; GARCIA,
GARCIA, Regina Regina Leite.
Leite. OO sentido
sentido da da escola.
escola. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: DP&A,
DP&A, 1999,1999,
p.17-41.
p.17-41.
______.
______. Deleuze
Deleuze & & aa educação.
educação. 22 ed.
ed. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2008. 2008.
HENRIQUE,
HENRIQUE, Pedro. Pedro. Um
Um cartão:
cartão: sentimentos
sentimentos cotidianos.
cotidianos. 1.1. Ed.
Ed. Rio
Rio de
de janeiro:
janeiro: Fábrica231,
Fábrica231, 2015.
2015.
SASSO,
SASSO, Robert;
Robert; VILLANI,
VILLANI, Arnaud.
Arnaud. Le Le Vocabulaire
Vocabulaire dede Gilles
Gilles Deleuze.
Deleuze. Paris:
Paris: Les
Les Cahiers
Cahiers dede Noesis,
Noesis,
2003.
2003.
SAVIANI,
SAVIANI, Demerval.
Demerval. História
História das
das idéias
idéias pedagógicas
pedagógicas no no Brasil.
Brasil. Campinas:
Campinas: Autores
Autores Associados,
Associados, 2011.
2011.
473p.
473p.
SILVA, Tomaz
SILVA, Tomaz Tadeu
Tadeu da.da. Documentos
Documentos de de Identidade:
Identidade: uma
uma introdução
introdução àsàs teorias
teorias do
do currículo.
currículo. 2ª
2ª ed.
ed. Belo
Belo
Horizonte: Autêntica,
Horizonte: Autêntica, 2002.
2002.
VEIGA-NETO, Alfredo.
VEIGA-NETO, Alfredo. O O currículo
currículo ee seus
seus três
três adversários:
adversários: os os funcionários
funcionários da da verdade,
verdade, os os
técnicos do
técnicos do desejo,
desejo, oo fascismo.
fascismo. In:In: RAGO,
RAGO, Margareth;
Margareth; VEIGA-NETO,
VEIGA-NETO, Alfredo Alfredo (orgs).
(orgs).
Para uma
Para uma vida
vida não-fascista.
não-fascista. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2009, 2009, p.
p. 13-21.
13-21.
PORTOCARRERO, Vera.
PORTOCARRERO, Vera. Práticas
Práticas sociais
sociais de
de divisão
divisão ee constituição
constituição do do sujeito.
sujeito. In:
In: RAGO,
RAGO,
Margareth; VEIGA-NETO,
Margareth; VEIGA-NETO, Alfredo. Alfredo. Figuras
Figuras de de Foucault.
Foucault. 2ª2ª ed.
ed. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica,
2008, p.253-260.
2008, p.253-260.
351
351

vida, misericordia y militancia.


la identidad narrativa de un pedagogo social.

gladys madriz11

presentación

E n este trabajo se trata de responder a la interrogante, a manera de imperativo


de formación del: ¿Cómo llegó a ser lo que fue? El cual apunta a
inquietarnos y a movilizarnos hacia la pesquisa de la conformación de una
identidad narrativa en el sentido de Ricoeur. Asimismo, la respuesta o mejor las múltiples
preguntas y respuestas, viejas y nuevas, supondrán seguramente una ¿nueva? mirada de la
formación en la acción educativa cristiana y el compromiso ético-político con el otro. Un
ejercicio de misericordia y militancia que atraviesa toda una vida dedicada a una obra
misionera, ecuménica y la teología liberadora.
De hecho, en el transcurso de la investigación hemos intentado leer una praxis de
pedagogía social a través de una vida vivida al servicio de un ideal religioso, ético y
político liberador. La vida y la obra de Juan Vives Suriá se convierten así en nuestro
sujeto-objeto-sujeto de estudio. Vives Suriá fue un sacerdote catalán-venezolano, cura
diocesano que a la edad de veinticinco años dejó su tierra natal, allá por el año de 1949 para
venir a con-formarse en un venezolano y latinoamericano. Y decimos con razón con-
formarse, porque en la medida en que desplegaba su acción, durante unos cincuenta y
cinco años, su praxis educativa formadora del otro, le formaba en colectividad.
Este trabajo puede ser visto como las notas iniciales de un proyecto mayor
orientado a la comprensión de una práctica educativa a través de una biografía. Por tanto,
la investigación puede ser caracterizada como de carácter biográfico-narrativa porque se
trata de escribir un relato de vida, es decir, la vida y obra de un religioso como pretexto
para comprender su praxis educativa. La narrativa biográfica permite recuperar la autor-
idad que tiene el individuo sobre su formación al convertirse en sujeto de su propio
desarrollo histórico, visualizado en este caso, como actor de unas acciones educativas. Así,
el sujeto, en tanto sujeto narrado se expresa y manifiesta en el relato en el cual se
constituye en sujeto22. Por lo que podría decirse que el trabajo en cuestión es parte de una
investigación que hace del relato de vida, el testimonio, el documento histórico y la
acción, sus pisos de sustentación principales. Es así como al compás de la narración
biográfica y el volver hacer hablar unos documentos como pre-textos, trataremos de
aproximarnos a la comprensión de una práctica educativa, cristiana, éticamente responsiva
y liberadora en el seno de unas comunidades de servicio socio-político.
Finalmente, hemos organizado este trabajo en tres secciones, a saber: a) una
presentación, en la que justificamos la importancia de recoger y mantener viva la memoria
ética y pedagógica de unos agentes sociales que con su acción marcaron la vida de muchas
personas, tal y como es el caso del padre Juan Vives Suriá; b) la sección De la biografía a la
praxis educativa. Una vida religiosa, política y formadora de conciencias, en la que pretendemos
esbozar algunas reflexiones acerca de un saber pedagógico, éticamente responsable, que se
fue consolidando en la praxis de este comunicador y educador religioso; c) la intitulada
Vida, misericordia y militancia, donde a partir de nuestro testimonio como testigo y con
cierta documentación recopilada (fotografías, audiovisuales, cartas, artículos de prensa y

11 Universidad
Universidad Central
Central de
de Venezuela;
Venezuela; Universidad
Universidad Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez. Email:
Email: gladyshay.58@gmail.com
gladyshay.58@gmail.com
22 Dentro
Dentro de
de esta
esta línea,
línea, hemos
hemos adelantado
adelantado alguna
alguna publicación
publicación anterior,
anterior, aa saber:
saber: Madriz
Madriz (2013).
(2013).
352|
352| gladys
gladys madriz
madriz

documentos mimeografiados) reconstruimos un relato de vida parcial del padre Juan


Vives Suriá, o el padre Vives como lo conocimos en Venezuela, quien entendió que su
sacerdocio habría de convertirse en una ruta de militancia comprometido con el más
indefenso, una ruta que siendo misericordiosa, no olvidase la lucha, a través de la
denuncia, por un mundo de justicia y paz; y la d) A manera de cierre abierto.

1. de la biografía a la praxis educativa. una vida religiosa, política y formadora de


conciencias.
Contar la historia de un actor, o que el actor viva su historia mientras la comprende,
así como contar una historia que no es, no por falsa, sino por no ocurrida, pero igualmente
probable. Esa es la utilidad de los relatos, de los relatos de vida y de los relatos de ficción.
Y comienzo por la utilidad, porque la Educación ha sido invadida por una racionalidad
técnica-instrumental que ha terminado por reducirla a un lenguaje de la eficacia, de un
culto por la competencia, por la organización, que no estaría mal si no la alejara cada vez
más de lo cotidiano, del hombre común, del mundo de la vida. Y como éste aspira a ser un
artículo serio, que se ocupe de cosas serias, entonces estamos obligados a comenzar esta
parte de la exposición refiriéndonos a la potencial utilidad de este estudio, porque si no
¿cómo garantizar la atención de ustedes?
Pero nuevos tiempos están llegando a las ciencias sociales, estamos presenciando un
renovado interés en los procesos de la memoria individual, grupal y colectiva, en un
momento en que precisamente la sociedad de los medios de masificación pretende
homogeneizar todas las formas de saber y de comunicación social. Ante un discurso
racionalizador universalista o unidireccional de la Historia, surgen las historias
particulares, la de los sujetos de a pie. Rescatar el testimonio de formas de vida que tienden
a desaparecer implica un compromiso ético y político que no podemos eludir los
formadores.
Este trabajo consiste en unas notas iniciales de una investigación mayor que hemos
de lineado y que persigue, grosso modo, comprender las praxis educativas, haciendo
lecturas hermenéuticas de las vidas de sus protagonistas. Actores comprometidos con los
otros, a través de la praxis social-popular, o a través de la acción educativa formal, pero
siempre ya sea consciente o no, ejecutores de acciones transformadoras de los demás.
En la medida de lo posible, la intención es la de dejar que estas personas se narren, y
narren sus acciones, para ello la lectura de sus vidas la haremos dentro del marco de la
hermenéutica filosófica-fenomenológica, donde cada actuación comporta un significado
particular, histórico, profundamente imbricado con la vida, que es pasión, deseo de vida
propia y de la de los demás. Cuando las voces de estos formadores se hayan apagado,
entonces nuestra intención es prestarles las nuestras, sin ánimo de apagar el recuerdo de
las suyas, sino con una profunda voluntad de comprender, y de no dejar morir la memoria.
Porque tal y como señalaba Arendt (1999, p.31) “…sólo conoceremos quién es esencialmente
alguien después de su muerte (tal es la verdad expresada en la antigua sentencia nemo ante
morten beatus esse dici potest). Para los mortales, lo eterno y definitivo comienza sólo
después de la muerte”.
Pero no nos despistemos, el hecho de mencionar en estas páginas a la muerte, no es
derivado de una visión fatalista de la realidad, sino todo lo contrario, asumimos tal y como
lo afirmara la propia Arendt (1999) que lo más propio de la condición humana es su
capacidad de comenzar algo en el mundo, precisamente a este poder de iniciativa, de
comienzo, es el que denomina la filósofa natalidad. Y que si bien es cierto tiene que ver con
el nacimiento, con la llegada al mundo, también se refiere a otro nacimiento, un segundo
nacimiento que es la inserción en el mundo humano a través de la palabra y de la acción.
Como dice Arendt (1999, p.107):
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 353
353

Sin
Sin la
la acción,
acción, sin
sin la
la capacidad
capacidad dede comenzar
comenzar algoalgo nuevo
nuevo yy de de este
este modo
modo articular
articular el
el
nuevo
nuevo comienzo
comienzo que que entra
entra en
en el
el mundo
mundo con con el
el nacimiento
nacimiento de de cada
cada ser
ser humano,
humano, la la
vida
vida deldel hombre,
hombre, que que sese extiende
extiende desde
desde elel nacimiento
nacimiento aa la la muerte,
muerte, sería
sería
condenada
condenada sin sin salvación.
salvación. El El propio
propio lapso
lapso dede vida,
vida, en
en su
su carrera
carrera hacia
hacia lala muerte,
muerte,
llevaría
llevaría inevitablemente
inevitablemente aa todo
todo lolo humano
humano aa la la ruina
ruina yy aa la
la destrucción.
destrucción. La La acción,
acción,
con
con todas
todas sus
sus incertezas,
incertezas, eses como
como un un recordatorio
recordatorio siempre
siempre presente
presente dede que
que los
los
hombres,
hombres, aunque
aunque hanhan dede morir,
morir, nono han
han nacido
nacido para
para eso,
eso, sino
sino para
para comenzar
comenzar algoalgo
nuevo.
nuevo. Initium
Initium ut
ut esser
esser homo
homo creatus
creatus est;
est; “para
“para que
que hubiera
hubiera comienzo
comienzo fue fue creado
creado el
el
hombre”,
hombre”, dijo dijo San
San Agustín.
Agustín. ConCon la la creación
creación deldel hombre,
hombre, el el principio
principio del
del
comienzo
comienzo entró
entró enen el
el mundo;
mundo; lolo cual,
cual, naturalmente,
naturalmente, no no eses más
más que
que otra
otra forma
forma de
de
decir
decir que,
que, con
con lala creación
creación del
del hombre,
hombre, el el principio
principio dede lala libertad
libertad apareció
apareció enen la
la
tierra.
tierra.
Una biografía, al igual que el relato de vida, no sería más que el relato de unas
acciones y de las consecuencias de éstas, de las acciones que en libertad de decidir asumiera
un mortal, pero consciente de su incapacidad de deshacer lo hecho, e incluso, consciente de
la total impredecibilidad de sus acciones, no por no tener un objetivo claro, sino por no
poder controlar las inmensurables influencias que sobre los otros su conducta acarreara.
Porque somos incapaces de poder predecir las consecuencias de nuestras acciones, entonces
si debemos ser capaces de responder a la responsabilidad de las mismas. Somos
responsables no sólo y no tanto de lo que hayamos hecho cuanto de lo que no hagamos
para impedir el deterioro creciente del hábitat humano. Y somos responsables de la
herencia que les dejemos a los demás. De la herencia natural, política y cultural que les
leguemos a nuestros hijos y a los hijos de los demás.
¿Y entonces quién contará nuestra historia, pudiéramos preguntarnos? Todo
dependerá de nuestra respuesta ante la historia, de cómo asumimos el compromiso ético de
responder por el otro, y de cómo siendo frágiles como somos, nos crecemos en las
dificultades. En todo caso, lo común en todos nosotros es que tenemos muchas historias
por contar. Historias de infortunios, de lamentables sucesos, de incomprendidos que luego,
inexplicablemente son reconocidos por la comunidad como héroes, como sus hijos
excepcionales. ¿No tiene esto mucho de cuento de la cenicienta, por ejemplo?
En esta suerte de contar historias invocamos el papel de la biografía, sobre todo
como en el caso que nos ocupa cuando la persona sobre la cual versa la historia no se halla
entre nosotros. Una biografía es en términos generales, la elaboración por biógrafos o
investigadores como estudio de caso, de la vida de una o más personas, que puede
presentar distintos formatos narrativos. Normalmente, además del propio relato de vida,
se emplean otros documentos para acercarse a la historia real. Y realizamos este trabajo de
recoger la vida de alguien cuando para algunos de nosotros esa vida adquiere un
significado especial o también porque se quiere hacer uso de la memoria ejemplar, aquella
que da testimonio de una vida que más que relato se convierte en ejemplo a seguir, por su
generosidad, por lo mucho que entregó y con ello cambió la vida de tantos otros.
En este caso, la biografía, el relato de vida, o también la historia de vida, como se le
conoce más en la literatura francesa, es “investigación y construcción de sentido a partir de
hechos temporales personales vividos” 33 pero, es importante señalar, que si bien los relatos
de vida siempre hacen referencia a la singularidad de una vida, no tienen por qué ser
individualistas.
De hecho, como intentaremos ir demostrando en el transcurso de la investigación,
aparece como referente todo un grupo social y profesional que, a lo largo del tiempo, ha ido
entretejiendo otras historias e incidiendo en esa vida. Exactamente por reflejar la
colectividad social de que se trate es por lo que Ferrarotti (1993) acuña su propuesta de leer

33 Con
Con este
este término
término normalmente
normalmente se se hace
hace referencia
referencia al
al curso
curso de
de experiencia
experiencia de
de una
una vida
vida individual,
individual, aa
diferencia
diferencia del
del curso
curso de
de vida,
vida, que
que indica
indica la
la trayectoria
trayectoria de
de varias
varias vidas.
vidas. (PINEAU,
(PINEAU, 1993,
1993, p.
p. 5).
5).
354|
354| gladys
gladys madriz
madriz

una sociedad a través de una biografía y que nosotros con un ligero cambio de sentido
hacemos nuestro pero entendiéndose como leer una praxis educativa a través de una biografía.

1. vida, misericordia y militancia


La primera vez que escuché la frase “el que no vive para servir, no sirve para vivir”
fue a finales de la década de los ochenta, deberíamos decir que se trató de una larga
ignorancia porque esa frase es original de San Augustín de Hipona hacia el 400 de la era
cristiana. Pero eso no es lo importante, lo importante es que se me han olvidado muchas
frases a lo largo de mi vida, pero esa, quedó marcada, y ocasionalmente me asalta a la
conciencia cuando, en ocasiones, el tedio, la falta de voluntad y otro tanto de fuerzas
oscuras amenazan mi sencillo plan de vida. Pero el asunto es que les confesaba que muchas
frases, algunas quizás hasta más importantes se me han olvidado, ¿por qué esta no corrió
con igual suerte? Porque me topé ese día con una voz y un espíritu que se hizo para
persuadir, para contagiar de vida y regalar alegría. Ese día la frase “el que no vive para
servir, no sirve para vivir”, se llenó de sentido para mí, y aunque en mi vida no he podido
honrarla, de seguro puedo decir que he conocido a algunas personas que sí lo han hecho.
Así me sentí de impactada con el primer y único encuentro personal que tuviese con el
padre Juan Vives Suriá (1924-2004).
El padre Juan Vives Suriá nació y vivió en Barcelona hasta el año de 1949.
Precisamente, estoy en estos momentos viendo una fotografía suya de esos días. En el
reverso, apunta: noviembre de 1949. Un joven veinteañero parece llenar la pantalla con
una sonrisa tan natural como el árbol deshojado pero altivo, que está a su espalda. Más
atrás, un edificio enorme se alza mostrando la arquitectura de hace más de un siglo. La
foto tuvo que ser tomada unos días antes de su venida al trópico. En su rostro se lee la
ilusión, la confianza, la viveza, me refiero a ese particular optimismo y jovialidad que le
acompañarán hasta el último de sus días.
En España, en su Barcelona natal, había probado que le gustaba estar entre la gente.
Probar en el sentido de saborear, complacerse, gustar de ser uno entre los muchos. Eso
también le acompañaría por el resto de su vida. No era un hombre solitario, le gustaba
organizar e invitar a participar a los demás. Las tareas que siempre emprendió, desde un
principio, sonaron a música compartida, a bullaranga colectiva, al humor simple de la
gente que se divierte con poco, de risa fácil y de mejor carácter, fue un líder natural de
causas colectivas.
Durante su juventud, concretamente entre los veinte y veinticuatro años, antes de
venir a acompañarnos a esta tierra de gracia, Vives desarrolló una faceta periodística de
prensa y radio. Colaboraba con El Correo Catalán y Radio Barcelona, escribiendo notas y
haciendo guiones vinculados a su formación religiosa: principalmente, sobre la vida de
santos, el pesebre o los valores humanos. Así mismo, fue un entusiasta de los castells, tal y
como quedara constancia de sus artículos en medios impresos españoles con el seudónimo
de “Juan Cirera” (Juan Cereza). Pareciera que el espíritu de los castellers, se grabara en él y
con los años se profundizara. Los castellers son personas de ambos sexos y de todas las
edades y complexiones físicas, familiares y amigos, principalmente, que acuerdan formar
una pinya para construir en medio de festividades los castells. Se tratan de unas torres
humanas, de varios “pisos”, que constituyen una tradición catalana que celebra el espíritu
cooperativo, al igual que el sano esparcimiento entre familiares, amigos y simples
espectadores que pasan a formar parte de las collas. El padre Juan Vives era un entusiasta
seguidor y organizador de estas collas y en más de una fotografía, quedó el recuerdo de su
participación en la segunda de las “columnas” de un castillo de siete pisos humanos. En la
fotografía que llegó a nuestras manos era fácil reconocerlo, un hombre de unos cuarenta
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 355
355

años, de entrada prominente, el único enfundado en su sotana de color negro, todo


esfuerzo, concentración y animosa presencia.
En su país natal también aprendió la elaboración de los “pesebres”, imaginativas
creaciones navideñas que recrean el nacimiento y la adoración del Jesús nacido, y que en
nuestra patria goza de alta estima por la gente de cualquier estrato social y gentilicio, desde
el Occidente hasta el Sur del país. Se trata también de una elaboración colectiva,
generalmente familiar, que a través de la dirección de un miembro experimentado y hábil
artesano, va dando forma a un paisaje navideño, lleno de figuras humanas y animales
dentro de un despliegue particular de efectos de luces y espejos, estratégicamente
dispuestos dentro de un arquitectural diseño. Con el tiempo, por lo menos en nuestro país,
pasa del ámbito del hogar a convertirse en una tradición en numerosos contextos, desde los
laborales, ya sean privados o públicos, hasta en los centros comerciales y plazas públicas.
En la elaboración del pesebre se convida a la donación de cualquier figurilla o motivo por
parte de quien quiera, como una forma de representar la donación, la vinculación y el
sentido de pertenencia de quienes participan o de aquellas familias donde se levanta la
obra.
Esta tradición de la elaboración de los pesebres la rescataría al llegar a Quiriquire,
un pequeño pueblo al Oriente del país, otrora campo petrolero norteamericano, que tras el
espolio cayó en abandono, tal y como las Casas Muertas del escritor Miguel Otero Silva.
Allí el padre conquistó sin colonizar el espíritu de un pueblo que se negaba a morir. Con su
ayuda y siempre bien dispuesto ánimo, resucitaron los pesebres, las parrandas navideñas y
los aguinaldos tradicionales, de tal manera que los festivales navideños llegaron a
convertirse en un referente en la zona, y de toda Venezuela llegaban personas, atraídas por
los concursos que premiaban los mejores grupos de canto navideño.
A nuestro parecer, tanto el sentido de los castells, como el de la elaboración de los
pesebres, es celebrar en colectivo la vida, el hecho de poder crear entre los muchos o pocos,
en colaboración, mientras ensayan en pequeño, el milagro de una creación. Todo un
ejercicio cooperativo, para honrar al Creador, pero también el esfuerzo humano, la
creatividad, la belleza, y el deseo escondido de trascender el breve momento en que
transcurre la vida. El mismo Juan Vives Suriá interpretará a su manera, la simbología de
los castells en un artículo que apareciese en un diario de circulación nacional de nuestro
país:
No
No sese puede
puede soñar
soñar una
una imagen
imagen más
más plástica
plástica de
de la
la escala
escala ontobiológica
ontobiológica que que lala que
que
ofrecen
ofrecen loslos Xiquets
Xiquets de de Valls,
Valls, ha
ha dicho Pujols44.. “En
dicho Pujols “En ellos
ellos están
están carnalmente
carnalmente
representadas
representadas las las relaciones
relaciones entre
entre el
el espíritu
espíritu yy la
la materia…”
materia…” Efectivamente,
Efectivamente, en en la
la
base
base –nada
–nada gregaria-
gregaria- de de cualquier
cualquier castillo,
castillo, trabado
trabado comocomo una una estructura
estructura de de
concreto
concreto armado,
armado, una
una masa
masa compacta
compacta de de pueblo
pueblo fusiona
fusiona elel espíritu
espíritu concon la
la materia.
materia.
En
En los
los pisos
pisos intermedios
intermedios están
están las
las cariátides
cariátides palpitantes
palpitantes que
que sese van
van elevando
elevando de de la
la
materialidad.
materialidad. Y Y enen la
la cima
cima hay
hay un
un ángel
ángel –– L´Enxaneta-,
L´Enxaneta-, según
según el el vocablo
vocablo técnico
técnico
de
de origen
origen árabe-,
árabe-, que
que representa,
representa, como
como el el gótico,
gótico, unun intento
intento de de espiritualizar
espiritualizar lala
materia.
materia. NoNo eses ésta
ésta la
la figura
figura vertical
vertical de Casals55 “cruzando”
de Casals “cruzando” el el violoncelo
violoncelo concon susu
arco
arco para
para repetir
repetir el
el mensaje
mensaje dede paz
paz (VIVES
(VIVES SURIÁ,
SURIÁ, 1973,
1973, p.
p. 11)
11)
Espiritualidad, goce estético, creatividad, donación, cooperación, fiesta popular,
etc., todas ellas son dimensiones que se vinculan a los castillos humanos y los pesebres, a
la vez que son dimensiones que tienen que ver con el despliegue de una vida buena, en el
sentido de Séneca66, por ejemplo. De manera que el subtitulado de este apartado del texto

44 Se
Se refería
refería elel padre
padre al al conocido
conocido filósofo
filósofo catalán
catalán Francesc
Francesc Pujols
Pujols (1882-1962)
(1882-1962) quien
quien además
además de
de ensayos
ensayos
filosóficos,
filosóficos, yy de
de crítica
crítica de
de arte
arte yy teatro,
teatro, también
también llegó
llegó aa escribir
escribir poesía
poesía yy algunas
algunas novelas.
novelas.
55 El
El padre
padre convoca
convoca al al reconocido
reconocido mundialmente
mundialmente Pau Pau Casals,
Casals, elel músico
músico catalán.
catalán.
66 Una
Una vida
vida buena
buena eses la
la que
que tiene
tiene armonía,
armonía, la
la que
que posee
posee una
una actitud
actitud positiva
positiva que
que le
le permite
permite sobrellevar
sobrellevar las
las
dificultades,
dificultades, así
así como
como agradecer
agradecer las
las bondades
bondades que
que la
la vida
vida nos
nos ofrece.
ofrece. Decía
Decía Séneca:
Séneca: “Yo,
“Yo, fortificando
fortificando el
el
356|
356| gladys
gladys madriz
madriz

no es casual, no es casual que la palabra vida le encabece. La primera característica de la


personalidad del padre que me gustaría resaltar es su condición de vital. Voy a intentar no
usar el diccionario para darme a entender. El padre Juan poseía una impresionante fuerza,
esa que sólo algunas personas poseen, que no pasan inadvertidas, y que sin embargo, no se
percibía como amenazante ni soberbia. Se trataba, diríamos, de una fuerza cálida, que en
vez de rechazo, generaba cercanía. Era un hombre de una gran energía, se notaba, porque
nunca permanecía en el mismo lugar. Su voz cambiaba de tono, al compás de sus
movimientos, y resultaba imposible no escucharle, tan convencido estaba de estar vivo. De
estatura y contextura mediana, viéndole, no podría sospechar nadie tanto arrebato, tanto
enérgica y sentida afirmación de la vida que a través de su voz nos llegaba. Es que el
compromiso le venía de muy adentro.
Así de vital era, que efectivamente tenía que convertirse en militante. ¿No son
acaso militantes aquellos que han encontrado una verdad y que se empeñan en
transmitirla, comunicarla, o simplemente en contagiarla? Por eso su causa, más que la
Iglesia, fue el amor, la misericordia, la buena nueva de que entre todos, con el trabajo de
todos, un mundo mejor era posible. Pero a diferencia de algunos curas, decía que ese
mundo había que alcanzarlo luchando, transformando la realidad injusta que vive tanta
gente, y no callando tanta sinvergüenzura, tanta indolencia, tanta rapacidad.
Dirán ustedes que cómo es eso que el amor tiene que ver con la lucha, con la batalla.
Y hasta ahora no había notado ese antagonismo. Creo que cuando el amor es muy, pero
que muy grande, la injusticia duele tanto que se asemeja a una herida sangrante en el
propio cuerpo, y ¿cómo se actuaría en ese momento?, sino atacando a la bestia que lo hace
sangrar, como mínimo para defenderse, o para expulsarla del terreno donde se vive, o para
alejarla del lugar donde vive tanta gente que se quiere.
El padre Vives aprendió a militar porque en el mundo donde habitamos hay
demasiadas bestias sueltas, y aunque en su voz sólo había cabida para la ilusión, la alegría,
la bondad, en su mano siempre blandía la escandalosa espada que reclamaba justicia.
Rectifico, también en ocasiones, su voz fue presa de la rabia, y entonces poníase muy
serio, y reclamaba al victimario, que a veces no muestra la cara, tan perverso es que se
esconde cuando abusa, se esconde cuando lastima e incluso cuando mata. En ocasiones ha
dicho su nombre para despistar, se hace llamar progreso, globalización, es tan cínico, que
ha usado el nombre de justicia, también el del bien común, como si nada.
Eso me recuerda la carta que entregara el padre personalmente al Canciller
venezolano del momento, en el año de 1987, dirigida a los presidentes de Argentina, Brasil,
Colombia, México, Panamá, Perú, Uruguay y Venezuela, con motivo de celebrarse una
próxima reunión (cumbre de Acapulco). La carta inicia así:
La
La reunión
reunión cimera
cimera de
de ustedes
ustedes en
en Acapulco
Acapulco deberá
deberá iniciarse
iniciarse con
con una
una pregunta:
pregunta:
¿qué
¿qué espera
espera de
de ella
ella el
el pueblo
pueblo empobrecido
empobrecido de
de América
América latina?
latina? Sus
Sus jóvenes
jóvenes sin
sin

cuerpo
cuerpo concon el
el ánimo,
ánimo, obedeceré
obedeceré aa los
los trabajos
trabajos por
por grandes
grandes queque sean.
sean. YoYo con
con igualdad
igualdad despreciaré
despreciaré las
las riquezas
riquezas
presentes
presentes como
como laslas ausentes:
ausentes: nono me
me entristeceré
entristeceré dede verlas
verlas enen otros,
otros, ni
ni meme envanecerá
envanecerá el el poseerlas.
poseerlas. Yo
Yo no
no haré
haré
caso
caso de
de que
que venga
venga oo se se ausente
ausente lala fortuna:
fortuna: miraré
miraré todas
todas las
las tierras
tierras como
como si si fueran
fueran mías,
mías, yy las
las mías
mías como
como si si
fuesen
fuesen de de todos.
todos. Y Y finalmente
finalmente viviré
viviré como
como quien
quien sabe
sabe que
que nació
nació para
para los
los otros:
otros: yy porpor esta
esta razón
razón daré
daré gracias
gracias aa
la
la naturaleza,
naturaleza, queque con
con ningún
ningún otro
otro medio
medio pudo
pudo hacer
hacer mejor
mejor mimi negocio;
negocio; pues
pues siendo
siendo yoyo uno
uno solo,
solo, me
me hizo
hizo de
de
todos,
todos, yy con
con eso
eso hizo
hizo que
que todos
todos fuesen
fuesen para
para mí.
mí. Todo
Todo lo lo que
que yoyo tuviere,
tuviere, nini lo lo guardaré
guardaré concon escasez,
escasez, nini lo
lo
derramaré
derramaré con con prodigalidad;
prodigalidad; yy juzgaré
juzgaré que
que ninguna
ninguna cosa
cosa poseo
poseo mejor
mejor queque lo
lo que
que doy
doy bien.
bien. No
No ponderaré
ponderaré loslos
beneficios
beneficios porpor el
el número
número oo peso,
peso, ni
ni por
por otra
otra alguna
alguna estimación
estimación más más que
que por
por la
la que
que tengo
tengo del
del que
que los
los recibe;
recibe; yy
nunca
nunca juzgaré
juzgaré hay
hay demasía
demasía en en lo
lo que
que sese da
da al
al benemérito.
benemérito. No No haré
haré cosa
cosa alguna
alguna por por la
la opinión,
opinión, harélas
harélas todas
todas
por
por la
la conciencia
conciencia (…) (…) Sabré
Sabré que
que todo
todo elel mundo
mundo es es mi
mi patria,
patria, yy que
que los
los dioses
dioses presiden
presiden sobre
sobre mí,
mí, yy que
que asisten
asisten
cerca
cerca de
de mí
mí para
para ser
ser jueces
jueces de
de mis
mis hechos
hechos yy dichos,
dichos, yy cada
cada yy cuando
cuando la la naturaleza
naturaleza volviere
volviere aa pedirme
pedirme lala vida
vida oo
la
la razón,
razón, lala soltaré:
soltaré: saldré
saldré de
de ella,
ella, protestando
protestando queque amé
amé lala buena
buena conciencia
conciencia yy las las bunas
bunas ocupaciones,
ocupaciones, yy que
que aa
nadie
nadie disminuí
disminuí su su libertad,
libertad, yy ninguno
ninguno disminuyó
disminuyó la la mía”.
mía”. (SÉNECA,
(SÉNECA, 1952, 1952, p.59).
p.59).
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 357
357

espacio,
espacio, los
los desempleados,
desempleados, desnutridos,
desnutridos, indígenas,
indígenas, niños
niños abandonados,
abandonados, ancianos
ancianos
desvalidos,
desvalidos, sus
sus millones
millones “in
“in crescendo”
crescendo” de de marginados.
marginados. (…)
(…)
Señores
Señores Presidentes:
Presidentes: ElEl mundo
mundo pobre
pobre latinoamericano
latinoamericano está
está impaciente.
impaciente. Como
Como
nunca
nunca en en esta
esta década
década se
se han
han violado
violado los
los Derechos
Derechos Humanos
Humanos yy sese ha
ha retrocedido
retrocedido
en
en las
las aspiraciones
aspiraciones dede nuestros
nuestros pueblos.
pueblos. ElEl advenimiento
advenimiento democrático
democrático está
está siendo
siendo
una
una pausa
pausa queque poco
poco haha resuelto.
resuelto. Porque
Porque la la democracia
democracia eses un
un hecho
hecho moral
moral
sustentado
sustentado en en la
la igualdad,
igualdad, yy nunca
nunca se
se ha
ha acentuado
acentuado tanto
tanto la
la desigualdad
desigualdad como
como en
en
el
el último
último decenio
decenio (VIVES
(VIVES SURIÁ
SURIÁ et et al,
al, 1987,
1987, s.p.)
s.p.)
Un poco más adelante, y en relación con la deuda –eterna- que todavía pesa sobre
los países del tercer mundo, en la carta se señala lo siguiente:
No
No sese puede
puede ser
ser latinoamericano
latinoamericano –– ni ni tercermundista-
tercermundista- ignorandoignorando la la deuda.
deuda. Así,
Así, la
la
deuda
deuda aa secas.
secas. No
No hay
hay adjetivos
adjetivos queque agregarle
agregarle porque
porque es es una,
una, sin
sin confusiones.
confusiones.
Decir
Decir lala deuda
deuda –hoy-
–hoy- es es como
como decir,
decir, enen términos
términos históricos,
históricos, la la independencia
independencia
ayer.
ayer.
Los
Los mercaderes
mercaderes ubican
ubican la la deuda
deuda como
como unauna relación
relación de de servidumbre,
servidumbre, obligada
obligada por
por
la
la restitución
restitución de de algo
algo recibido.
recibido. UnUn curioso
curioso intercambio
intercambio de de unos
unos queque reciben
reciben lolo
que
que les
les sobra
sobra yy otros
otros que
que devuelven
devuelven lo lo que
que les
les falta.
falta. ¡Sí,
¡Sí, los
los empobrecidos!
empobrecidos! Porque
Porque
pagar
pagar lala deuda
deuda eses despojarse
despojarse de de alimentos,
alimentos, de de petróleo,
petróleo, de de estaño,
estaño, dede cobre,
cobre, dede
bananas,
bananas, dede todo,
todo, para
para que
que elel Primer
Primer Mundo
Mundo lo lo despilfarre.
despilfarre. ¡Son ¡Son tan
tan hirientes
hirientes los
los
patrones
patrones dede consumo
consumo dondedonde se se bota
bota lolo que
que permitiría
permitiría sobrevivir
sobrevivir aa nuestros
nuestros niños
niños
yy sostener
sostener aa nuestros
nuestros estudiantes
estudiantes desesperados
desesperados por por salir
salir deldel pantano!
pantano! ParaPara colmo,
colmo,
crece
crece la
la amenaza
amenaza de de pagar
pagar lala deuda
deuda con
con lala entrega
entrega de de nuestros
nuestros principales
principales activos
activos
productivos
productivos enen una
una suerte
suerte de
de embargo
embargo inconcebible.
inconcebible.
Este
Este lenguaje
lenguaje nono es
es el
el de
de unos
unos extremistas.
extremistas. Es Es elel de
de los
los obispos
obispos comprometidos,
comprometidos,
como
como el el Cardenal
Cardenal Arns,
Arns, Arzobispo
Arzobispo de de Sao
Sao Paulo,
Paulo, ese
ese profeta
profeta que que se
se ha
ha dado
dado
nuestro
nuestro Continente.
Continente.
Este
Este eses el
el mundo
mundo que que ustedes
ustedes gobiernan,
gobiernan, Señores
Señores Presidentes.
Presidentes. La La deuda
deuda ha ha
configurado
configurado dosdos frentes
frentes antagónicos
antagónicos irreconciliables,
irreconciliables, una una lucha
lucha aa matar
matar oo morir.
morir.
De
De una
una parte,
parte, ese
ese sombrío
sombrío frente
frente histórico
histórico de de las
las finanzas,
finanzas, de de los
los papeles,
papeles, de
de lala
voraz
voraz acumulación
acumulación especulativa,
especulativa, de de los
los depósitos
depósitos millonarios
millonarios de de latinoamericanos
latinoamericanos
en
en el
el exterior
exterior que
que sepultan
sepultan aa sussus propios
propios hermanos.
hermanos. ¡Qué ¡Qué maldición
maldición ha ha caído
caído
sobre
sobre nosotros!
nosotros! Podríamos
Podríamos exclamar
exclamar como como el el Salmista:
Salmista: ¿qué ¿qué pecado
pecado hemos
hemos
cometido
cometido para
para tanta
tanta ignominia?
ignominia? (VIVES
(VIVES SURIÁ SURIÁ et et al,
al, 1987,
1987, s.p.)
s.p.)
Por eso el padre Juan Vives Suriá termina acercándose a la Teología de la
Liberación, esa tendencia confrontadora de la Iglesia, nacida al calor de la lucha de los
pueblos que padecen la injusticia, mantenida con la sangre de los mártires caídos y con las
voces de miles de denunciantes de un orden trastocado, negador de la vida y la esperanza.
La Teología de la Liberación nace en Latinoamérica, y Oliveros Maqueo
refiriéndose a su real compromiso señala:
¿Cuál
¿Cuál es es la
la experiencia
experiencia ee intuición
intuición originales
originales dede las
las que
que brota
brota lala Teología
Teología de de la
la
liberación?
liberación? No No fue
fue otra
otra que
que la la experiencia
experiencia cotidiana
cotidiana de de la
la injusta
injusta pobreza
pobreza enen que
que
son
son obligados
obligados aa vivirvivir millones
millones de de hermanos
hermanos latinoamericanos.
latinoamericanos. Y Y enen esta
esta
experiencia
experiencia yy desde
desde ella,
ella, la
la palabra
palabra contundente
contundente del del Dios
Dios de de Moisés
Moisés yy de de Jesús:
Jesús:
esta
esta situación
situación nono eses conforme
conforme aa su su voluntad,
voluntad, sino
sino contraria
contraria aa ella.
ella.
En
En esta
esta experiencia
experiencia fundante
fundante destacamos
destacamos tres tres elementos
elementos importantes:
importantes: los los pobres,
pobres,
las
las formas
formas dede la
la caridad
caridad cristiana
cristiana hoy hoy yy la
la conversión
conversión (…)(…)
Hoy
Hoy en en América
América Latina
Latina se se relee
relee lala Escritura,
Escritura, enen la
la teología
teología de de la
la liberación,
liberación, desde
desde
el
el pobre,
pobre, desde
desde lala clase
clase explotada
explotada con con lala que
que sese hizo
hizo solidario
solidario Cristo.
Cristo. Y Y dede ahí
ahí
surge
surge lala pregunta:
pregunta: ¿qué
¿qué exigencias
exigencias entraña
entraña hoy
hoy elel amor
amor alal prójimo?
prójimo? EstoEsto no
no es
es un
un
tema
tema másmás enen la
la teología
teología de de lala liberación.
liberación. EsEs su
su corazón.
corazón. Es Es la
la vida,
vida, es
es la
la sangre
sangre
que
que anima
anima la la experiencia
experiencia ee intuición
intuición original
original yy lala existencia
existencia de de los
los grupos
grupos
cristianos
cristianos enen la
la praxis
praxis de de la
la liberación.
liberación. Amar
Amar aa Dios
Dios yy al
al prójimo
prójimo significa
significa salir
salir de
de
mi
mi camino,
camino, entrar
entrar al al camino
camino del del oprimido,
oprimido, del del golpeado
golpeado por por lala injusticia
injusticia yy
comprometerme
comprometerme con con su
su causa.
causa. (OLIVEROS
(OLIVEROS MAQUEO, MAQUEO, 1991, 1991, s.p.)
s.p.)
Exactamente lo que hiciera el padre Vives Suriá, romper con una de las formas en
que la Iglesia tradicional se acercaba a parte de su feligresía, realizando obras de caridad de
manera paternalista y asistencial. En el fondo, esa no era sino una forma de disculpar que
358|
358| gladys
gladys madriz
madriz

en el mundo existieran desde siempre, ricos y pobres, y que no era asunto de la Iglesia el
cambiar esa realidad. En su artículo sobre la génesis y el desarrollo de la Teología de la
Liberación, Oliveros Maqueo señala que a partir del Concilio y Medellín se gesta un
“fervor profético que encontró eco en muchos cristianos latinoamericanos. Estos se
empeñaron en poner en práctica los compromisos evangélicos a que invitaban los obispos.
Se abrieron valiosas experiencias apostólicas. Se reabrieron sendas y caminos que habían
quedado cubiertos por el tiempo.” Pero no sería fácil, el movimiento que se iniciara en
Nuestra América pronto obtendría respuesta:
Ese
Ese fervor
fervor profético
profético pronto
pronto topó
topó con
con lala reacción
reacción deldel sistema
sistema dominante.
dominante.
Cristianos
Cristianos yy nono cristianos
cristianos empeñados
empeñados en en la
la liberación
liberación sufrieron
sufrieron duros
duros golpes.
golpes. El
El
golpe
golpe de
de Pinochet
Pinochet enen Chile
Chile marcó
marcó la
la pauta.
pauta. Los
Los regímenes
regímenes de de seguridad
seguridad nacional
nacional
se
se difundieron
difundieron porpor todo
todo elel subcontinente.
subcontinente. Se Se apoyó
apoyó económicamente
económicamente aa esos esos
gobiernos
gobiernos dictatoriales
dictatoriales yy corruptos
corruptos con
con petrodólares
petrodólares que que eraera necesario
necesario hacer
hacer
circular
circular para
para la
la transnacionalización
transnacionalización de de la
la economía
economía yy su su comercio
comercio yy colocar
colocar el
el
grillete
grillete de
de la
la deuda
deuda externa
externa enen nuestros
nuestros pueblos,
pueblos, nueva
nueva forma
forma de de servidumbre
servidumbre yy
explotación.
explotación. Es Es más,
más, fuertes
fuertes sectores
sectores de
de las
las jerarquías
jerarquías eclesiásticas
eclesiásticas dieron
dieron la
la
espalda
espalda alal Concilio
Concilio yy Medellín.
Medellín. Por
Por otra
otra parte,
parte, bajo
bajo capa
capa dede frenar
frenar elel avance
avance del
del
comunismo
comunismo internacional,
internacional, muchos
muchos sacerdotes,
sacerdotes, religiosos,
religiosos, yy aún
aún algunos
algunos obispos,
obispos,
no
no sólo
sólo fueron
fueron vistos
vistos como
como sospechosos
sospechosos por
por susu compromiso
compromiso con con el
el pobre,
pobre, sino
sino que
que
fueron
fueron seriamente
seriamente atacados
atacados yy marginados
marginados en en sussus iglesias
iglesias locales
locales oo
congregaciones.(OLIVEROS
congregaciones.(OLIVEROS MAQUEO, MAQUEO, 1991, 1991, s.p.)
s.p.)
Curiosamente, y en consonancia con las arremetidas del orden dominante a las que
hace referencia el párrafo anterior, nunca quedó muy claro el por qué el padre Vives Suriá
deja intempestivamente la presidencia de Cáritas de Venezuela 77. Se dice que aprovechaba
su cargo y su pequeño volkswagen escarabajo, para realizar visitas a pequeños grupos de
guerrilleros venezolanos desperdigados por el oriente del país, los cuales eran objeto de
persecuciones, torturas y hasta su muerte por las fuerzas militares y policiales de
Venezuela, entre las décadas de los años sesenta y setenta. Dicen que llegaba con bolsas de
comida y de ropa usada, pero limpia, mientras les daba su bendición.
Pero su salido de Cáritas también le dejó la independencia que necesitaba para
acometer nuevos proyectos, como la constitución de Fundalatin, una fundación ecuménica,
que desde su paso por el Callao como sacerdote, venía soñando como una realidad posible
para la celebración, compromiso y militancia de y para un mayor número de personas. Un
espacio donde pudieran vincularse las personas para vivir las ideas, sin distingo de credos,
razas, sexo, ni edad. Una organización que sorprendiese por lo avanzado de su espíritu: no
se exigía un credo, se exigía un compromiso, una acción consciente y misericordiosa, un
amor desinteresado.
Siendo un sacerdote sencillo, también fue reconocido por sus pares. Es el caso que
ilustra la fotografía de arriba, donde se halla con el padre Samuel Ruiz en una preciosa
tarde de 1994. Tenemos conocimiento de esta importante entrevista gracias al blog del
periodista Salvador Díaz, quien a propósito de la misma narra lo siguiente:
…nos
…nos dijo
dijo que
que buscaba
buscaba entrevistarse
entrevistarse con
con el
el Monseñor
Monseñor Samuel
Samuel Ruiz,
Ruiz, que
que él
él era
era
venezolano
venezolano yy que
que le
le tenía
tenía una
una gran
gran admiración
admiración alal Tatic,
Tatic, “él
“él es
es el
el actual
actual símbolo
símbolo
vivo
vivo de
de la
la Teología
Teología de
de la
la Liberación,
Liberación, vengo
vengo desde
desde Venezuela
Venezuela aa platicar
platicar con
con él,
él, yy aa
darle
darle todo
todo mimi respeto,
respeto, reconocimiento
reconocimiento yy consideración
consideración porque
porque élél es
es un
un grande
grande
entre
entre los
los grandes
grandes yy en
en la
la iglesia
iglesia es
es un
un ícono
ícono en
en la
la defensa
defensa de
de los
los pobres,
pobres, en
en toda
toda
Latinoamérica”,
Latinoamérica”, yy estoesto era
era así
así porque
porque nomás
nomás hayhay que
que recordar
recordar queque en
en eseese

77 El
El período
período que
que el
el padre
padre Juan
Juan Vives
Vives Suriá
Suriá transcurre
transcurre en
en distintas
distintas responsabilidades
responsabilidades en
en Cáritas
Cáritas de
de Venezuela
Venezuela
está
está comprendido
comprendido entre
entre el
el año
año dede 1963
1963 hasta
hasta su
su salida
salida en
en 1978.
1978. Cáritas
Cáritas Internacionalis
Internacionalis es
es una
una institución
institución dede la
la
iglesia
iglesia católica
católica dedicada
dedicada aa la
la promoción
promoción de de la
la caridad
caridad yy el
el desarrollo
desarrollo de
de las
las personas
personas más
más pobres
pobres aa través
través de
de la
la
asistencia
asistencia humanitaria.
humanitaria. Se
Se introduce
introduce enen Venezuela
Venezuela en en el
el año
año de
de 1958,
1958, desde
desde la
la Arquidiócesis
Arquidiócesis de
de Caracas
Caracas porpor el
el
Monseñor
Monseñor Rafael
Rafael Arias
Arias Blanco,
Blanco, yy siempre
siempre estuvo
estuvo dependiente
dependiente de de la
la Conferencia
Conferencia Episcopal
Episcopal Venezolana.
Venezolana. En En
1963
1963 nombra
nombra como
como su
su primer
primer director
director general
general al
al padre
padre Juan
Juan Vives
Vives Suriá.
Suriá.
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 359
359

momento
momento al al Tatic
Tatic lolo promovían
promovían multitud
multitud de de organizaciones
organizaciones internacionales
internacionales como como
candidato
candidato al al Premio
Premio NobelNobel de de la
la Paz
Paz yy que que había
había sidosido un
un artífice
artífice dede las
las
negociaciones
negociaciones por por lala paz
paz entre
entre el
el EZLN
EZLN yy el el traidor
traidor gobierno
gobierno zedillista.
zedillista. ComoComo yo yo
iba
iba también
también aa la la zona
zona zapatista
zapatista llevaba
llevaba mi mi cámara
cámara de de video,
video, entonces
entonces le le ofrecí
ofrecí
filmar
filmar lala entrevista.
entrevista. Aceptó
Aceptó de de mil
mil amores,
amores, me me lo lo agradeció
agradeció con con toda
toda elel alma.
alma. LeLe
dije
dije al
al sacerdote
sacerdote que que comprara
comprara dosdos cintas
cintas de de Hi8
Hi8 yy aa darle.
darle. Después
Después de de que
que elel
padre
padre Juan
Juan Vives
Vives hizo
hizo lolo prudente
prudente para
para llegar
llegar con
con DonDon Samuel
Samuel (seguro
(seguro éste
éste ya
ya
conocía
conocía al al sudamericano)
sudamericano) la la puerta
puerta de
de la
la sacristía
sacristía de de lala curia
curia de
de SanSan Cristóbal
Cristóbal de de
Las
Las Casas,
Casas, donde
donde ofició
ofició el
el Obispo
Obispo de de los
los Pobres
Pobres porpor 40 40 años,
años, sese abrió
abrió de
de par
par en
en
par,
par, como
como un un corazón
corazón que que derrocha
derrocha amor
amor por por todos
todos lados.
lados. AlAl aparecer
aparecer el el Obispo
Obispo
Proletario,
Proletario, los los ojos
ojos vivos
vivos dede Vives
Vives brillaron
brillaron aún aún más más de de alegría,
alegría, “Padre,
“Padre,
Monseñor
Monseñor Samuel,Samuel, es es unun honor
honor saludarle
saludarle yy expresarle
expresarle todo todo mi mi afecto
afecto yy
admiración”,
admiración”, dijo dijo elel sacerdote
sacerdote venezolano,
venezolano, fue fue mayúscula
mayúscula mi mi sorpresa
sorpresa al al ver
ver alal
presbítero
presbítero de de la
la patria
patria dede Bolívar,
Bolívar, más
más oo menos
menos de de lala misma
misma edad
edad del del Tatic
Tatic yy con
con
una
una vitalidad
vitalidad extraordinaria,
extraordinaria, deshacerse
deshacerse en en reverencias
reverencias ante ante Don
Don Samuel.
Samuel. Se Se
hincó,
hincó, lele beso
beso la la mano,
mano, unauna yy otra
otra vez,
vez, lolo abrazó,
abrazó, los los saludó
saludó estrechándole
estrechándole con con
ambas
ambas manos
manos las las manos
manos deldel Apóstol
Apóstol dede los
los Indios,
Indios, jamás
jamás había
había visto
visto tal
tal respeto
respeto
reverencial
reverencial de de una
una persona
persona aa otra,
otra, de
de una
una investidura
investidura menor menor aa otra
otra mayor.
mayor. Bueno,
Bueno,
hablamos
hablamos durante
durante una una hora,
hora, después
después dede la la cual
cual nos
nos tomamos
tomamos las las obligadísimas
obligadísimas
fotos
fotos (DIAZ,
(DIAZ, 2016,2016, s.p.).
s.p.).
El periodista que nos narra el encuentro repara en dimensiones que de alguna u otra
forma ya habíamos mencionado: la vitalidad de Vives Suriá, su alegría y personalidad
borboteante, así como su humildad y generosidad al reconocer la magnificencia del
Monseñor de los Indios, el padre Samuel Ruiz. Sólo en una cosa se equivocaba, al calificar
al padre Vives de poseer una investidura menor. Es evidente que se refería al “cargo”, más
no al oficio. Tampoco hablaba de lo que ambos llevaban en el corazón, ni en sus manos, ya
que como ellos entendían, la religión no era cosa de flojos sino de militantes.
Pero volvamos al hilo del relato. Su salida de Cáritas no pasa desapercibida, y es
objeto de un artículo de prensa en un periódico de cobertura nacional en Venezuela. Es
posible que lo que se pensara como un castigo, el padre supo transformarlo en una
declaración de guerra y de profundización del trabajo que venía acometiendo. El título del
artículo de la periodista Alba Sánchez no podía ser más sugerente al respecto: “Las
confesiones del Padre Juan Vives Suriá: Soy ateo de un Dios burgués”, tomado de una cita
textual de nuestro querido padre Vives. Revisemos parte del artículo en cuestión:
El
El padre
padre Vives
Vives deja
deja ahora
ahora Cáritas
Cáritas yy el el Servicio
Servicio de
de Migración
Migración deldel Episcopado,
Episcopado,
donde
donde ha ha tenido
tenido una
una experiencia
experiencia de de casi
casi veinte
veinte años,
años, para
para dedicarse
dedicarse aa trabajar
trabajar
desde
desde la
la Fundación
Fundación Latinoamericana
Latinoamericana por por los
los Derechos
Derechos Humanos
Humanos (Fundalatin)
(Fundalatin) yy
desde
desde el
el Programa
Programa Venezolano
Venezolano Pro Pro Refugiados
Refugiados Latinoamericano
Latinoamericano yy sussus programas
programas
audiovisuales
audiovisuales “Semáforo
“Semáforo 2000”.
2000”.
-Es
-Es un
un cambio
cambio de de autobús
autobús para
para seguir
seguir una
una misma
misma ruta.
ruta. Pero
Pero ya
ya no
no tratando
tratando dede
resolver
resolver casos
casos individuales,
individuales, sino
sino viendo
viendo elel problema
problema desde
desde un
un contexto
contexto global.
global. No
No
se
se trata
trata de
de poner
poner adhesivos
adhesivos aa una
una pata
pata de
de palo,
palo, sino
sino de
de ver
ver el
el problema
problema estructural,
estructural,
como
como unun todo
todo que
que requiere
requiere cambios
cambios rápidos
rápidos yy profundos.
profundos.
(…)
(…) No
No meme preguntes
preguntes sisi creo
creo en
en Dios,
Dios, pues
pues también
también soy
soy ateo
ateo de
de un
un Dios
Dios burgués,
burgués,
amigo
amigo dede explotadores.
explotadores. Me Me eduqué
eduqué enen lala Escolástica,
Escolástica, bajo
bajo el
el Dios
Dios de
de los
los griegos
griegos --
poderoso,
poderoso, sabio,
sabio, terrible
terrible -- yy en
en contacto
contacto con con “pecadores
“pecadores yy prostitutas”
prostitutas” -- dice
dice
mientras
mientras nos nos pide
pide queque lolo pongamos
pongamos entre entre comillas
comillas pues
pues son
son palabras
palabras deldel
Evangelio-.
Evangelio-. En En contacto
contacto concon elel pueblo,
pueblo, obreros
obreros yy campesinos,
campesinos, concon migrantes
migrantes yy
refugiados,
refugiados, con con admirables
admirables compañeros
compañeros que que hoy
hoy viven,
viven, sufren
sufren yy luchan
luchan con con la
la
gente
gente del
del pueblo
pueblo enen los
los barrios
barrios yy en
en el
el campo
campo (SÁNCHEZ,
(SÁNCHEZ, 1979, 1979, p.8).
p.8).

Sin duda, el padre se había decantado por la opción al servicio de los más humildes,
“los pecadores y prostitutas”, los desamparados de nuestros tiempos. Y algo intuyó la
periodista que a continuación le comenta:
360|
360| gladys
gladys madriz
madriz

Le
Le decimos
decimos que que enen su su hablar
hablar le le ubicamos
ubicamos entre
entre laslas corrientes
corrientes sacerdotales
sacerdotales
“rebeldes
“rebeldes yy contestatarias”
contestatarias” yy le le preguntamos
preguntamos si si sus
sus actitudes
actitudes no no son
son criticadas
criticadas por
por
la
la llamada
llamada “Iglesia
“Iglesia tradicional”
tradicional”
-La
-La Iglesia
Iglesia eses una
una –afirma-
–afirma- peropero dentro
dentro de de ella
ella hay
hay tendencias,
tendencias, pluralidad
pluralidad yy
posiciones
posiciones que que unos
unos aceptan,
aceptan, otros
otros apoyan
apoyan yy algunos
algunos oponen.
oponen. El El problema
problema es es que
que
éstos
éstos sese han
han bajado
bajado del
del tren
tren de
de lala historia
historia yy nono comprenden
comprenden la la velocidad
velocidad de de la
la
nave,
nave, actitud
actitud que
que comienza
comienza con con la la incomprensión
incomprensión y, y, en
en algunos
algunos casos,
casos, termina
termina
con
con lala pugna.
pugna.
(…)
(…) –Hoy,
–Hoy, no no por
por casualidad,
casualidad, sinosino por
por maldad,
maldad, algunos
algunos hombres
hombres se se han
han rebelado
rebelado
contra
contra el el plan
plan dede Dios
Dios yy se se hanhan hecho
hecho dioses
dioses ellos
ellos mismos:
mismos: faraones
faraones yy
emperadores
emperadores que que esclavizan
esclavizan aa los los demás.
demás. Es Es el
el caso
caso dede las
las dictaduras
dictaduras de de ayer
ayer yy
hoy.
hoy. Todos
Todos paranoicos,
paranoicos, desde
desde Hitler
Hitler aa Somoza,
Somoza, sonson lala encarnación
encarnación de de la
la soberbia,
soberbia,
la
la autosuficiencia
autosuficiencia yy la la cobardía.
cobardía. Maníacos
Maníacos de de lala persecución,
persecución, se se refugian
refugian en en el
el
poder
poder yy enen las
las armas,
armas, cuando
cuando no no enen lala misma
misma Iglesia.
Iglesia. Detrás
Detrás dede todo
todo esto
esto está
está el
el
Dios
Dios queque tiene
tiene más
más devotos:
devotos: el el dios
dios dinero,
dinero, con
con varios
varios epicentros,
epicentros, que
que cuenta
cuenta con
con
su
su propia
propia religión,
religión, su
su propia
propia liturgia
liturgia yy sussus propios
propios sacristanes.
sacristanes.
(…)
(…) –Como
–Como paradoja
paradoja –dice
–dice riendo-,
riendo-, nunca
nunca se se habló
habló tanto
tanto como
como ahora
ahora dede derechos
derechos
humanos
humanos yy nunca nunca como
como ahora
ahora habían
habían sidosido tan
tan violados.
violados. El El 40
40 por
por ciento
ciento dede la
la
población
población latinoamericana
latinoamericana vive vive enen extrema
extrema pobreza
pobreza yy más más de
de la
la mitad
mitad está
está bajo
bajo
regímenes
regímenes dictatoriales.
dictatoriales. Los Los secuestros,
secuestros, asesinatos
asesinatos yy exilios
exilios ya
ya casi
casi no no son
son
noticias.
noticias. (SÁNCHEZ,
(SÁNCHEZ, 1979, 1979, p.9)
p.9)

Sin embargo, y en función de su experiencia como comunicador social, iniciada en


su juventud en Barcelona, donde colaboraba con una radio de corte popular, y posterior a
ésta incursión, con la creación y puesta en marcha de una serie de audiovisuales, el padre
Vives Suriá se da cuenta que debe llegar a un mayor número de personas con la intención
de informar y sembrar conciencia ética. Y esto es lo que anuncia en esta entrevista, tal y
como apunta la periodista:
(…)
(…) el
el padre
padre Vives
Vives piensa
piensa proseguir
proseguir con con sus
sus programas
programas audiovisuales,
audiovisuales, aunque
aunque
ahora
ahora sus
sus producciones
producciones tendrán
tendrán dos
dos finalidades:
finalidades: la
la de
de concientizar
concientizar aa grupos
grupos en
en
materia
materia de
de derechos
derechos humanos
humanos yy la
la de
de recaudar
recaudar fondos
fondos para
para el
el financiamiento
financiamiento de
de la
la
Fundación,
Fundación, sin
sin pedir
pedir limosnas.
limosnas. El
El padre
padre Vives,
Vives, siempre
siempre emotivo,
emotivo, se
se considera
considera un
un
comunicador
comunicador (SÁNCHEZ,
(SÁNCHEZ, 1979,1979, p.9).
p.9).

Y lo fue, tuve la oportunidad de presenciar la puesta en escena de uno de sus


documentales. Se trataba de todo un despliegue de tres o cuatro máquinas de diapositivas
que iban, sin parar, presentando imágenes a todo color: textos, reflexiones, fotografías,
acompañados de las arengas y aclaratorias del mismo padre con micrófono en mano. Las
imágenes iban una tras otra, en ocasiones se superponían, en un torbellino incesante de
provocadoras y siempre reveladoras imágenes. Un verdadero y conmovedor espectáculo
audiovisual, cuando no existía el desarrollo computacional de hoy, y ni siquiera el internet.
La voz del padre, en ocasiones profundas, y en otras, confrontadora, terminaba por
generar en el auditorio una conmoción y una gran inquietud generalizada que obligaba a la
reflexión personal. Nos sentíamos hechizados por el ambiente que durante más de una
hora el padre lograba generar, mientras en nosotros se agolpaban las imágenes,
pensamientos y sentimientos que pasaban de la incredulidad, la compasión, el dolor, la
rabia, hasta el desprecio, y terminábamos preguntándonos que cómo era posible que en
este siglo tan lleno de promesas, la cosas no habían mejorado nada para la mayoría de las
personas. Luego, esas producciones se hicieron en VHS, donde se añadieron locuciones y
mejoraron técnicamente. Pero siempre el padre estuvo detrás como el guionista y el
director de las mismas.
No es entonces nada de extrañar, que el mismo padre se identificara como un
comunicador social. A lo largo de su vida fue cultivando un saber de experiencia que le
permitía acercarse y afectar a un mayor grupo de personas, mucho más de lo que podría
hacer a partir de un confesionario. Pero, aclaremos, no era cualquier comunicador, como sé
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 361
361

que hay algunos, que son capaces de falsear completamente la realidad, para favorecer a
intereses particulares y mezquinos. El padre se convirtió en un comunicador
misericordioso, por la íntima conexión de la misericordia y el amor, a saber:

… la
la misericordia
misericordia está
está de
de tal
tal manera
manera conexa
conexa con
con el
el amor
amor queque todos
todos los
los matices
matices de
de
éste
éste aparecen
aparecen también
también en en aquella.
aquella. Así
Así se
se dice
dice que
que la la misericordia
misericordia es es «el
«el amor
amor
benigno»,
benigno», «el
«el amor
amor paciente»,
paciente», «el«el amor
amor compasivo».
compasivo». Si Si es
es exacto
exacto decir
decir que
que la
la
misericordia
misericordia es
es el
el más
más grande
grande de de los
los atributos
atributos yy perfecciones
perfecciones de de Dios
Dios en
en cuanto
cuanto se
se
relaciona
relaciona con
con los
los hombres,
hombres, afirmar
afirmar susu estrecha
estrecha relación
relación concon el
el amor
amor supone
supone
entender
entender que
que ahí,
ahí, en
en lala misericordia,
misericordia, es es donde
donde el el hombre
hombre «se «se encuentra
encuentra
particularmente
particularmente cerca»
cerca» de
de Dios.
Dios. (JUAN
(JUAN PABLO
PABLO II, II, 1980,
1980, s.p.)
s.p.)

Abrir los ojos y el corazón hacia los pobres permitió descubrir su situación y vivir
la experiencia de ser evangelizados por ellos. Un padre misericordioso. El misericordioso
es quien puede leer en los ojos de los demás la esperanza que anida en cada uno y luego
vela y ayuda para que ésta no se apague. La alienta, le da fuerzas. Cuando ve la tragedia, la
miseria en su profundidad, no se queda en la apariencia, busca el reconfortar para enseñar
a buscar la potencia que anida en cada uno de nosotros, y transmite la lección de que entre
muchos, organizándose, trabajando en conjunto, apoyándose los unos a los otros, se siente
aligerar la carga. Les muestra que es posible creer en la promesa de un mundo mejor si se
lucha por él, les enseña que su miseria, nuestra miseria es circunstancia, que no destino.
Esas lecciones cambiarán la percepción del desalentado y proveerá de un nuevo sentido de
la dignidad a quien la pusiera en duda. Pero también acrecentará la dignidad del maestro,
por la experiencia común del bien, por el redescubrimiento de la dignidad que le es propia
al hombre. Lejos está la misericordia de la conmiseración y la lástima, lejos de la
apariencia, y de la falsa bondad, lejos de la tolerancia, que inclina la balanza hacia un lado
de la relación, denotando que hay un lado fuerte y otro débil, uno que es menos que el otro,
el poderoso y el abandonado, el que puede darte y el otro, sólo recibir y resignarse con su
suerte.

a manera de cierre abierto


Ya conocemos el nombre de nuestro personaje, un sacerdote catalán-venezolano,
fallecido a la edad de ochenta años, el padre Juan Vives Suriá, cura diocesano que a la edad
de veinticinco años dejó su tierra natal, allá por el año de 1949 para venir a con-formarse en
un venezolano, en un latinoamericano. Y decimos con razón con-formarse, porque en la
medida en que desplegaba su acción, su praxis educativa formadora del otro, en esa misma
medida era formado en colectividad.
Quisiéramos en este apartado introducir unos párrafos de un documento que el
padre Vives redactara a propósito de la invitación a participar en un foro denominado: Seis
visiones de esta paciente llamada Venezuela, en el Ateneo de Caracas, en Julio de 2001.
Debemos señalar que lo traemos a colación a propósito de un ejercicio autobiográfico,
donde a nuestro entender el padre expone las profundas motivaciones de su praxis
religiosa y educativa. Leamos y escuchemos la palabra del padre Vives:
Hablar
Hablar de de “esta
“esta paciente
paciente llamada
llamada Venezuela”,
Venezuela”, me me hace
hace recordar
recordar mi mi comienzo
comienzo
como
como cura
cura de
de ElEl Callao
Callao donde
donde canté
canté la
la primera
primera misa
misa (1950).
(1950). Me Me estrené
estrené con con dos
dos
enfermos:
enfermos: un un joven
joven campesino
campesino tuberculoso
tuberculoso queque me
me pidió
pidió que
que lo lo bajase
bajase dede susu catre
catre
al
al suelo,
suelo, “para
“para morir
morir como
como SanSan Francisco
Francisco dede Asís,
Asís, pegado
pegado aa la la tierra
tierra yy de
de cara
cara al
al
cielo”,
cielo”, me
me dijo.
dijo. YY la
la prostituta
prostituta dede un
un barrio
barrio minero
minero rodeada
rodeada de de gente
gente humilde
humilde
rezando
rezando concon ella.
ella. Ante
Ante una
una escena
escena tan
tan pura,
pura, me
me vino
vino aa la
la mente
mente la la sentencia
sentencia de de
Jesús
Jesús aa los
los sacerdotes
sacerdotes yy ancianos
ancianos deldel pueblo
pueblo (senadores)
(senadores) que
que lolo cuestionaban
cuestionaban en en el
el
templo
templo porpor susu dureza
dureza con
con los
los soberbios
soberbios yy susu ternura
ternura con
con los
los más
más débiles:
débiles: “Las“Las
prostitutas
prostitutas yy los
los publicanos
publicanos llegan
llegan primero
primero que
que ustedes
ustedes al
al Reino
Reino de
de Dios”
Dios” (Mt(Mt 21,21, 31).
31).
Este
Este fue
fue el
el comienzo
comienzo queque marcó
marcó mi mi vida
vida con
con aquellas
aquellas muestras
muestras de de pobreza
pobreza en en la
la
tierra
tierra del
del oro
oro yy de
de riqueza
riqueza espiritual,
espiritual, que
que tiene
tiene la
la gente
gente sencilla
sencilla en en la
la América
América
362|
362| gladys
gladys madriz
madriz

Mestiza.
Mestiza. Razón
Razón tenían
tenían los los cronistas
cronistas de de Indias
Indias cuando
cuando decían:
decían: “gente
“gente de de índole
índole
natural
natural bondadosa”.
bondadosa”.
En
En aquellas
aquellas rondas
rondas por por los
los campos
campos yy las las minas,
minas, vi vi muchos
muchos ranchos
ranchos de de bahareque
bahareque
con
con piso
piso de
de tierra
tierra yy techo
techo de de paja.
paja. En
En todos,
todos, aúnaún enen los
los lugares
lugares másmás apartados
apartados oo
difíciles
difíciles de
de alcanzar,
alcanzar, vi vi pintadas
pintadas al al frente
frente unas
unas letras
letras yy un
un número:
número: DDT DDT Nº… Nº… un un
registro
registro para
para elel seguimiento
seguimiento de de la
la campaña
campaña contracontra la la malaria,
malaria, el el paludismo
paludismo que que
diezmaba
diezmaba la la población
población venezolana
venezolana yy dejaba,
dejaba, con
con el el éxodo
éxodo rural
rural por
por elel petróleo,
petróleo, los
los
pueblos
pueblos vacíos
vacíos yy laslas “Casas
“Casas Muertas”
Muertas” de de Otero
Otero Silva…
Silva…
Hago
Hago memoria
memoria de de esto
esto para
para añadir
añadir lolo que
que predico
predico también
también en en las
las misas.
misas. Hace
Hace más
más
de
de 50
50 años,
años, unun pequeño
pequeño yy abnegado
abnegado equipo
equipo de de sanitaristas,
sanitaristas, “con“con cuatro
cuatro churupos
churupos yy
mucha
mucha mística”,
mística”, acabaron
acabaron con con elel paludismo,
paludismo, me me dijo
dijo uno
uno dede sus
sus protagonistas.
protagonistas.
Muchas
Muchas veces
veces loslos vivi llegar
llegar en en mula
mula oo en en jeep
jeep aa remotos
remotos campos,
campos, de de “monte
“monte yy
culebra”,
culebra”, con
con lala alegría
alegría de de la
la gente.
gente. Luego,
Luego, concon todos
todos loslos reales
reales del
del mundo,
mundo, como
como
ningún
ningún paíspaís dede aa tierra
tierra ha ha tenido,
tenido, yy las las grandes
grandes promociones
promociones de de médicos
médicos yy
enfermeras,
enfermeras, ha ha rebrotado
rebrotado el el paludismo,
paludismo, el el dengue,
dengue, la la tuberculosis,
tuberculosis, la la desnutrición,
desnutrición,
la
la rabia,
rabia, el
el desespero,
desespero, la la muerte…Y,
muerte…Y, lo lo peor,
peor, elel sida
sida social,
social, es
es decir,
decir, lala pérdida
pérdida en
en la
la
sociedad
sociedad de de los
los mecanismos
mecanismos de de defensa
defensa -- la la solidaridad
solidaridad -- que que eses lala dimensión
dimensión
política
política del
del amor
amor parapara hacer
hacer un un mundo
mundo más más humano
humano yy justo justo (VIVES
(VIVES SURIÁ,SURIÁ,
2001,
2001, p.4).
p.4).

Esas palabras, acompañadas de su acción permanente por construir un mundo


mejor, su capacidad de servicio, de respuesta a la demanda del rostro del otro, su
indignación ante la miseria que no puede racionalmente ser explicada, su sensibilidad ante
lo noble, ante la belleza interior de un pueblo, de una América mestiza como le llamara, no
puede menos que enternecernos e impactarnos. Queremos saber cómo se fue conformando,
cómo se fue constituyendo una personalidad así, cuáles circunstancias acompañaron la
decisión de dejar una aparente comodidad en un suelo patrio para venir a la aventura de
compartir con unos extraños. Queremos darle nueva vida a sus palabras, hacer una nueva
lectura de sus acciones para conocerle, re-conocerle como el sacerdote, el amigo, el
comunicador social, el pedagogo social, el entusiasta de la vida, que hasta el último
momento nos regalara con el don de la palabra y de la acción.
Un pedagogo social de la presencia, de la palabra, de la acción redentora, más que de
la escritura. Al respecto, en numerosas cartas a sus parientes y amigos confesaba con
preocupación el que no le alcanzaba el tiempo para escribir, tanta era su participación en
causas vivas, que demandaban su presencia, que la escritura se le hacía un ejercicio lejano,
como si dejándolo para “después”, y con la reflexión postrera, terminase por clarificar la
vorágine de acción y compromiso que asumiera en su vida. Con este proyecto nos
proponemos rescatar la pequeña historia de un gran hombre: el padre Juan Vives Suriá o
Mossen Juan, para quienes le conocieron en Cataluña.

referencias
ARENDT,
ARENDT, Hannah.
Hannah. De De lala historia
historia aa la
la acción.
acción. Barcelona:
Barcelona: Paidós,
Paidós, 1999.
1999.
DIAZ,
DIAZ, Salvador.
Salvador. Furgón
Furgón dede lunas
lunas bajo
bajo cielo
cielo mapuche.
mapuche. Disponible
Disponible en: en:
http://furgondelunas.blogspot.com/
http://furgondelunas.blogspot.com/ Consultado
Consultado en: en: 10/04/2016.
10/04/2016.
FERRAROTTI,
FERRAROTTI, Franco.Franco. Sobre
Sobre lala autonomía
autonomía del del método
método biográfico.
biográfico. In:
In: MARINAS,
MARINAS, José José Miguel;
Miguel;
SANTAMARINA,
SANTAMARINA, Cristina Cristina (eds).
(eds). La
La historia
historia oral:
oral: Métodos
Métodos yy experiencias.
experiencias. Madrid:
Madrid: Debate,
Debate,
1993.
1993.
JUAN
JUAN PABLO
PABLO II. II. Encíclica.
Encíclica. Dives
Dives in
in misericordia
misericordia (Sobre
(Sobre la
la misericordia
misericordia divina),
divina), 1980.
1980. Disponible
Disponible en:
en:
http://web.archive.org/web/20130928170523/http://www.vatican.va/edocs/esl0034/_index.htm
http://web.archive.org/web/20130928170523/http://www.vatican.va/edocs/esl0034/_index.htm
Consultado
Consultado en:en: 11/04/2016.
11/04/2016.
MADRIZ,
MADRIZ, Gladys;
Gladys; ARCILA,
ARCILA, Eudelis
Eudelis yy GÁMEZ,
GÁMEZ, Meredith.
Meredith. Un Un maestro
maestro sese narra.
narra. Vida,
Vida, historia,
historia,
praxis
praxis pedagógica.
pedagógica. Ensayo
Ensayo yy Error,
Error, a.a. XXII,
XXII, n.n. 44,
44, p.
p. 55-90,
55-90, 2013.
2013.
OLIVEROS
OLIVEROS Maqueo,
Maqueo, Roberto
Roberto O. O. SJ.
SJ. Breve
Breve historia
historia de
de la
la teología
teología de
de la
la liberación
liberación (1962-
(1962-
vida,
vida, misericordia
misericordia yy militancia.
militancia. la
la identidad
identidad narrativa
narrativa de
de un
un pedagogo
pedagogo social.
social. || 363
363

1990).
1990). Revista
Revista Electrónica
Electrónica Latinoamericana
Latinoamericana de de Teología.
Teología. n. n. 300.300. Disponible
Disponible en: en:
http://servicioskoinonia.org/relat/300.htm.
http://servicioskoinonia.org/relat/300.htm. Consultado Consultado en: en: 17/02/2016.
17/02/2016.
PINEAU,
PINEAU, Gaston;
Gaston; LELE GRAND,
GRAND, Jean-Lous.
Jean-Lous. LesLes histoires
histoires de
de vie.
vie. París:
París: PUF,
PUF, 1993.
1993.
SÁNCHEZ,
SÁNCHEZ, Alba. Alba. Las
Las confesiones
confesiones deldel Padre
Padre Juan
Juan Vives
Vives Suriá:
Suriá: Soy
Soy ateo
ateo de
de un
un Dios
Dios burgués.
burgués. In:
In:
Diario
Diario El
El Nacional,
Nacional, C.12,
C.12, Caracas,
Caracas, 2626 de
de junio
junio dede 1979.
1979.
SÉNECA,
SÉNECA, Lucio Lucio A.A. DeDe la
la vida
vida bienaventurada.
bienaventurada. In: In: Tratados
Tratados Filosóficos.
Filosóficos. Traducción
Traducción de de Pedro
Pedro
Fernández
Fernández de de Navarrete.
Navarrete. Buenos
Buenos Aires:
Aires: El
El Ateneo,
Ateneo, 1952.
1952.
VIVES
VIVES SURIÁ,
SURIÁ, Juan.
Juan. Esta
Esta paciente
paciente llamada
llamada Venezuela:
Venezuela: Visión
Visión de
de un
un cura.
cura. Caracas:
Caracas: Fundalatin,
Fundalatin, 2001.
2001.
______
______ et
et al.
al. Llegó
Llegó lala hora
hora de
de América
América Latina
Latina plantea
plantea carta
carta dede Fundalatín.
Fundalatín. Diario
Diario El
El Nacional,
Nacional,
Caracas,
Caracas, 2929 de
de noviembre
noviembre de de 1987.
1987.
______.
______. Los
Los castillos
castillos de
de Paz.
Paz. Casals
Casals para
para tocar
tocar el
el cielo.
cielo. Diario
Diario El
El Nacional,
Nacional, Caracas,
Caracas, 44 de
de noviembre
noviembre
de
de 1973,
1973, Cuerpo
Cuerpo 77 días,
días, p.
p. 11.
11.
364
364
365
365

la escuela como voluntad de ficción:


de la verdad moral a la metáfora

gregorio valera-villegas11

Con
Con timbre
timbre sonoro
sonoro yy hueco
hueco
truena
truena elel maestro,
maestro, un
un anciano
anciano
mal
mal vestido,
vestido, enjuto
enjuto yy seco,
seco,
que
que lleva
lleva un
un libro
libro en
en la
la mano.
mano.

Y
Y todo
todo un
un coro
coro infantil
infantil
va
va cantando
cantando lala lección:
lección:
mil
mil veces
veces ciento,
ciento, cien
cien mil,
mil,
mil
mil veces
veces mil,
mil, un
un millón.
millón.
Antonio
Antonio Machado
Machado (recuerdo
(recuerdo infantil)
infantil)

presentación. la escuela como vivencia del ser humano.

A
manece, las luces del día comienzan a invadir los espacios de la vivienda,
del apartamento. Hace apenas unos minutos, pocos, la madre y el padre se
han levantado. Es hora de ayudar a prepararse al hijo para ir a la escuela.
En la ciudad parece reinar la tranquilidad, una relativa paz social y política, de estabilidad
se diría. En esos momentos los hijos, niñas y niños, van a la escuela a “labrarse un
porvenir”, un lugar en la sociedad que les espera paciente. De no ser así, de resultar lo
contrario, expresado en el llamado fracaso escolar, fraude escolar, deserción o expulsión,
repitencia, entre otras “menudencias”; vendrá la consabida pregunta ¿en qué nos
equivocamos? ¿En qué hemos fallado? Por cierto que, la mayoría de las veces, las
respuestas vienen siempre cargadas, plomo en el ala, hacia los hijos, convertidos en
alumnos. Ellos, muchas veces, terminan por ser los culpables. Y se le considera rebeldes,
flojos, brutos, indisciplinados, desadaptados, groseros, maleducados. En suma no han
sabido aprovechar la oportunidad de oro que se les ha estado brindando. En muy pocas
ocasiones, en casa, se culpa a los maestros y mucho menos a la escuela, o al sistema social
y político. Se hace necesario hacer algo, se dice, casi como un imperativo moral kantiano,
meterles el saber, el conocimiento, juzgado valioso, entre pecho y espalda. Antes
aplicando la máxima: “la letra con sangre entra” para incrustarles en el cuerpo, vía
pedagogías coercitivas (VARELA, 1995), los valores del sacrificio, del esfuerzo, de la lucha
por llegar a ser mejores, en función, claro está, de la recompensa a obtener por ser los más
estudiosos, los más disciplinados, en suma, los más aplicados. Ahora, con iguales
propósitos, mediantes mecanismos más sofisticados de las pedagogías psicológicas de las
sociedades del control, en términos de Foucault. Ese primer día de marcha a la escuela es
de desconcierto y alegría a la vez. Una inquietud por lo nuevo y una alegría por lo que se
espera, por los sabidos beneficios para el hijo. Salir de casa e ir a una institución otra. A un
lugar conocido por ellos, por los padres. A un lugar en donde la historia tenía que volver a
repetirse. Aquella historia que durante años, muchísimos años, se había repetido. Esa
suerte de rito de paso (FOUCAULT, 2009; DELEUZE, 1996), el ir a la escuela, sería
cumplido con éxito, el fracaso no contaba. Todo estaba previsto para ello.
Así las cosas, en el presente estudio, se realizan unos ejercicios de antropología
filosófica orientados, por un lado, por una reflexión sobre lo vivido en la escuela, la escuela

11 Universidad
Universidad Central
Central de
de Venezuela.
Venezuela. Universidad
Universidad Simón
Simón Rodríguez.
Rodríguez.
Email:
Email: gregoriovaleravillegas@gmail.com
gregoriovaleravillegas@gmail.com
366|
366| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

vivida y, por el otro, la búsqueda de un sentido de lo vivido y experimentado. En pocas


palabras, se trata de hacer una antropología filosófica de la vida escolar. De igual modo,
puede decirse, que se trata también de presentar una perspectiva de la escuela como
voluntad de ficción, ubicada, de algún modo, en un entre la verdad moral y la metáfora,
desde interrogantes como: ¿quién soy yo o quién fui como escolar? Y ¿qué es propiamente
la vida escolar? Interrogantes que apuestan a un experimentar-se, a un imperativo:
experiméntate como te hayas conocido, como el ser que te sabes; un sé lo que eres.
Imperativo que responde a un escolar, no al escolar, a una escuela, no a la escuela. A este
escolar, a esta escuela22. Unos alguien visibles, un yo y un tú, unos vividos que pueden,
quizá, contribuir con una idea general de una escuela. De allí que la reflexión filosófica,
como antropología filosófica, se vuelca al mismo filosofar, al trayecto andado y vuelto a
andar. Lo que se experimenta en el camino escolar es el ejercicio filosófico, el cual no
necesariamente conduce a un resultado terminado y determinado, sino inconcluso, de un
permanente buscar. De allí que pudiese ser visto como una aventura, una aventura
filosófica.
Puede decirse, por consiguiente, que esta antropología filosófica está implicada con
una acción educativa, valga decir, con el acontecimiento de lo escolar. Filosofía y escuela,
filosofía y acción escolar, filosofía y vida del alumno y vida del maestro en un lugar
constituido y constituible, siempre inacabado, llamado escuela. Así las cosas, la escuela es
vida de seres humanos, una vida y un vivir. El enseñar, el encontrarse de algún modo, la
influencia que pueda darse, que pueda recibirse. Escuela, maestro, alumno, filosofía, una
unidad permeada por una narración.
En esta antropología filosófica se busca un sentido de la escuela en la vida de unos
sujetos: alumnos y maestros; así como también un sentido para la propia escuela. Es así un
reto de reflexión filosófica sobre la vida de esos sujetos y sobre esa escuela, en una relación
de lo antropológico filosófico y de lo humano-escolar. De allí que se plantee también en
este estudio el juego a una filosofía de la imaginación, en tanto perspectiva filosófica, para
abordar lo tocante a unos sujetos escolares y a una escuela, para una apuesta por una forma
de ser y existir que refleje unas convicciones acerca de lo que significa, o pueda llegar a
significar, ser sujeto escolar y ser escuela en un tiempo determinado. Aquí el papel de la
narración, dar cuenta de, y del testimonio son fundamentales, en tanto puntales de una
identidad narrativa en el sentido de Ricoeur33. Narraciones y testimonios distintos y
parecidos a la vez, aun cuando resulten parecidos en pocos aspectos, lo que les da mayor
fortaleza. Lo que orienta una filosofía, una antropología filosófica, como forma de vida en
un cuadrante histórico escolar determinado. Puede decirse, en un segundo plano
antropológico filosófico, que el presente estudio es un intento de mostrar cómo el relato
histórico y el de ficción recuperan la historicidad de la escuela y de sus personajes
(maestros y alumnos).

1. la escuela: entre la verdad moral y la metáfora


La escuela cambia, sus personajes cambian a pesar de que no lo queramos, en ese
anhelo absurdo de un siempre igual, que nada pase, que nada les pase; por lo que toda
auténtica experiencia está descartada. No obstante, el asunto escolar no marcha así, al
menos si se entiende desde un cambio continuo y para ello necesitamos la imaginación,

22 Por
Por escuela
escuela vamos
vamos aa entender
entender aquí
aquí como:
como: la
la enseñanza
enseñanza que
que se
se da,
da, aa los
los profesores
profesores yy alumnos
alumnos de
de una
una misma
misma
enseñanza,
enseñanza, yy alal lugar
lugar en
en donde
donde sese desarrolla
desarrolla la
la acción
acción educativa
educativa yy es
es constituido
constituido por
por unos
unos determinados
determinados
alumnos
alumnos yy docentes.
docentes.
33 Entre
Entre el
el describir
describir yy el
el prescribir
prescribir optamos
optamos por
por la
la acción
acción de
de narrar.
narrar. Asimismo
Asimismo por
por una
una identidad
identidad narrativa,
narrativa,
ubicada
ubicada en
en la
la ipseidad
ipseidad yy la
la alteridad.
alteridad. Véase
Véase aa Ricoeur
Ricoeur (1996).
(1996).
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 367
367

necesitamos la invención de la metáfora, y no exclusivamente de los conceptos que


tienden a congelar, rigidizar, detener. Cuantos conceptos pululan como verdades sacras
con este fin en nuestros medios académicos: curriculum, programas, planes, evaluación
escolar, pedagogía por objetivos, curriculum por competencias; y una pléyade adicional de
nuevas palabras almacenadas en viejos odres: facilitador, participante, discente, mallas
curriculares y un largo etcétera. Ese lenguaje así creado, nutrido de conceptos fijos e
inmutables, termina por hacer ver lo que se quiera que se vea.
Si el interpretar, siguiendo a Nietzsche (1996)44, depende siempre del punto de vista,
entonces necesitamos una voluntad de imaginación, voluntad que supone la creación de
metáforas que nos permitan mirar e interpretar la escuela y sus personajes de otro modo.
Ello nos distanciará del dogmatismo de una verdad única y posible, valga decir, aquella
que está legitimada por un lenguaje55. Esta voluntad de imaginación o de ficción nos
permitirá a su vez vivir y convivir en el lugar escolar, en la incertidumbre de lo inseguro,
de lo cambiante, de lo movedizo; valga decir, en su historicidad, en su contingencia, en su
libertad. Por tanto, la escuela y sus personajes pasarían de ser lugar de edificación del ser
humano racional, todo prudencia, precisión (incapaz de cometer errores porque está
prohibido hacerlo) y regularidad (predecible estadísticamente hablando), para ser
intuitivo, valga decir, ser de imaginación, de ficciones, de metáforas, que juega porque
imagina e imagina porque juega, capaz de jugar, transgresor de verdades morales. La
verdad conformadora de esta escuela66 sería extramoral, es decir, metáfora, distante del
lenguaje conceptual77. La verdad extramoral no por definición es negadora de la verdad

44 Es
Es necesario
necesario apuntar
apuntar aquí,
aquí, queque nosnos interesa
interesa másmás lo lo que
que Nietzsche
Nietzsche tienetiene que
que decirnos
decirnos yy nos nos ayuda
ayuda aa decir,
decir,
que
que lolo que
que él
él quiso
quiso decir.
decir.
55 Una
Una verdad
verdad como
como correspondencia
correspondencia yy como como coherencia;
coherencia; convención
convención acordada
acordada para para conocer
conocer la la realidad.
realidad.
Aunque
Aunque con con el
el uso
uso sese termine
termine por por olvidar
olvidar estaesta condición
condición yy terminen
terminen por por parecer
parecer inmutables,
inmutables, canónicas
canónicas yy de de
uso
uso obligado.
obligado. Véase
Véase aa Nietzsche
Nietzsche (1996).
(1996).
66 Cabe
Cabe aquíaquí señalar
señalar queque la la escuela
escuela comocomo institución
institución social
social haha hecho
hecho siempre
siempre de de la
la verdad
verdad unouno de de sus
sus pilares,
pilares,
en
en contraposición
contraposición con con la la mentira.
mentira. Así Así que
que en en ella
ella lala verdad
verdad moral,
moral, orientada
orientada aa la la supervivencia
supervivencia social, social, sese
presenta
presenta camuflada
camuflada con con lala verdad
verdad de de la
la ciencia,
ciencia, lala cual,
cual, casi
casi por
por definición,
definición, no no aceptaría
aceptaría el el carácter
carácter de de verdad
verdad
moral
moral de de sus
sus verdades,
verdades, ni ni tampoco
tampoco su su origen
origen como
como metáfora
metáfora en en tanto
tanto lenguaje
lenguaje conceptual
conceptual universal.
universal.
77 Un
Un ejercicio
ejercicio dede metáforas
metáforas científicas,
científicas, presentadas
presentadas como como verdades,
verdades, podría
podría serser elel siguiente:
siguiente: la la idea
idea deldel arribo
arribo
al
al límite
límite absoluto
absoluto de de la
la comprensión
comprensión del del mundo
mundo por por medio
medio de de la
la ciencia.
ciencia. “A “A las
las nuevas
nuevas preguntas
preguntas científicas
científicas
no
no sese podrá
podrá seguir
seguir dando
dando respuestas”.
respuestas”. Así Así lo lo afirmó
afirmó HarryHarry Cliff,
Cliff, físico
físico de de partículas
partículas de de la
la Organización
Organización
Europea
Europea para para la
la Investigación
Investigación Nuclear Nuclear (CERN).
(CERN). “La “La razón
razón por por la
la que
que este
este límite
límite se se acerca
acerca es es igual
igual de de
alarmante:
alarmante: Las Las leyes
leyes dede lala física
física lo
lo impiden”,
impiden”, afirmó
afirmó Cliff”.
Cliff”. Y Y esto
esto según
según su su prolífica
prolífica imaginación,
imaginación, mostrada
mostrada
eso
eso sísí en
en términos
términos de de conjeturas
conjeturas científicas,
científicas, sólo
sólo falsables
falsables al al interior
interior de
de susu lenguaje.
lenguaje. Y Y ésto
ésto será
será así,
así, según
según él, él,
porque
porque los los dos
dos números
números más más peligrosos
peligrosos del del universo
universo podrían
podrían acabar
acabar concon lala física
física “Estos
“Estos números
números son son loslos
responsables
responsables de de la
la existencia
existencia de de toda
toda la la materia,
materia, estructura
estructura yy vida vida que
que vemos
vemos en en el el cosmos.
cosmos. Y Y si si estos
estos dosdos
números
números fueranfueran ligeramente
ligeramente diferentes,
diferentes, el el universo
universo sería
sería unun lugar
lugar yermo
yermo yy vacío”.
vacío”. En En palabras
palabras Cliff.
Cliff. Y Y susu
imaginación
imaginación creadora
creadora de de angustiantes
angustiantes ficciones
ficciones continúa:
continúa: uno uno de de esos
esos números,
números, el el número
número 1,1, es es lala fuerza
fuerza del del
campo
campo Higgs,
Higgs, unun concepto
concepto del del lenguaje
lenguaje científico
científico al al uso,
uso, que
que se se refiere:
refiere: “a“a un
un campo
campo de de energía
energía invisible
invisible que,que,
aa diferencia
diferencia de de otros
otros campos
campos magnéticos,
magnéticos, impregna
impregna todo todo el el cosmos”.
cosmos”. Y Y sigue
sigue el el despliegue
despliegue imaginativo:
imaginativo:
“Cuando
“Cuando las las partículas
partículas pasanpasan aa través
través deldel campo
campo de de Higgs
Higgs adquieren
adquieren masa masa yy se se convierten
convierten en en loslos protones,
protones,
neutrones
neutrones yy electrones
electrones que que sese encuentran
encuentran en en los
los átomos
átomos de de los
los cuales
cuales todos
todos estamos
estamos hechos,
hechos, tú,tú, yoyo yy todo
todo lolo
que
que vemos
vemos aa nuestro
nuestro alrededor.”
alrededor.” Sin Sin ellos,
ellos, en en pocas
pocas palabras,
palabras, no no existiríamos.
existiríamos. "[El "[El campo
campo de de Higgs]
Higgs] es es 10.000
10.000
billones
billones más más débil
débil dede lo
lo que
que debería
debería ser ser yy ese
ese valor
valor es es crucial
crucial porque,
porque, sisi fuera
fuera ligeramente
ligeramente distinto,
distinto, no no habría
habría
estructuras
estructuras físicas
físicas en
en elel universo",
universo", destaca
destaca Cliff.
Cliff. El
El segundo
segundo número
número peligroso,
peligroso, es es la
la energía
energía del
del espacio
espacio vacío,
vacío,
que
que “tiene
“tiene que
que verver con
con la la fuerza
fuerza de de lala energía
energía oscura,
oscura, (…) (…) queque debería
debería ser ser 10.120
10.120 másmás fuerte
fuerte de de lo lo que
que
observamos.
observamos. Ese Ese número
número es es mayor
mayor que que cualquier
cualquier otro
otro que
que conocemos
conocemos en en la
la astronomía
astronomía yy superasupera la la cantidad
cantidad
de
de átomos
átomos que que contiene
contiene el el universo.
universo. Las Las fuerzas
fuerzas fundamentales
fundamentales que que unen
unen esos esos átomos
átomos no no podrían
podrían
contrarrestar
contrarrestar la la energía
energía oscura
oscura y, y, por
por consiguiente,
consiguiente, nunca nunca formarían
formarían las las galaxias,
galaxias, laslas estrellas
estrellas yy los
los planetas”.
planetas”.
Véase
Véase a: a: https://actualidad.rt.com/ciencias/196968-dos-numeros-peligrosos-acabar-fisica
https://actualidad.rt.com/ciencias/196968-dos-numeros-peligrosos-acabar-fisica
368|
368| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

moral, sino que su búsqueda responde a fines distintos, no precisamente morales 88. La
verdad en sentido extramoral es una verdad que inaugura una perspectiva, una
interpretación de camino al arte. De allí que, la verdad en sentido extramoral puede ser
ubicada al interior de la metáfora, de lo metafórico. Ello le da la posibilidad para narrar la
realidad mediante un lenguaje simbólico, y, por tanto, que podamos también hablar de una
metáfora viva, en términos de Ricoeur. Metáfora viva que permitirá trascender lo
meramente ornamental, el que “suene bonito”, valga decir, la idea de figura retórica o
tropo, por cuanto ofrecerá otra interpretación al poseer un carácter hermenéutico y una
ampliación de nuestro conocimiento (RICOEUR, 2001). Conviene agregar aquí que el
lugar de esta metáfora viva, en tanto artística, no científica, es el arte como terreno de la
intuición, del sueño creador y no lugar del lenguaje conceptual. En este último puede
ubicarse la metáfora científica, a todas luces inconsciente por el uso mismo y olvido de su
condición, mientras que la artística es consciente y en ese sentido se convierte en
verdadera.

1.2 la verdad moral y la verdad extramoral:


la escuela tradicional y escuela nueva
La filosofía, la vida y la poesía, diríamos con Nietzsche y María Zambrano, en su
justo encuentro, o reencuentro, no se oponen a la razón, por el contrario, su punto de
encuentro es la metáfora, por cuanto se trata de erigir una razón poética. Pensar y hablar
por el camino de la metáfora en el lenguaje poético, renovador y transformador por
antonomasia, más allá de un fin ornamental. El camino de la metáfora, el camino del arte,
nos permite revelar lo singular oculto en el polvo de lo universal. La búsqueda de una
verdad es la vía del ser humano puramente racional, una verdad, que en su nacimiento es
moral, que esté basada en un leguaje conceptual. Una verdad consensuada, regular,
explicable/predecible, universal, aceptada por todos y que ofrezca un marco de estabilidad
y seguridad, es una opción. Empero, hay otra, la opción del ser humano intuitivo, la de la
verdad extramoral, menos racional, o mejor, irracional, por cuanto pone la vida en primer
lugar, más consciente del mundo en su irregularidad, en su incertidumbre e
imprevisibilidad en buena medida. La primera es la vía científica, la segunda la del arte, la
de la metáfora, la de la razón poética.
El lenguaje de la metáfora es el medio de una persona que crea poéticamente 99, es
también una vía para acceder a lo real, un “ver como” nietzscheano, para conocerlo en
términos de lo verosímil, y que implica transferir, configurar, imaginar.
Leamos a continuación un texto en lenguaje científico sobre la escuela tradicional:
En
En el
el siglo
siglo XIX,
XIX, aa partir
partir del
del desarrollo
desarrollo alcanzado
alcanzado por por la
la práctica
práctica pedagógica
pedagógica yy elel
liberalismo,
liberalismo, esta
esta tendencia
tendencia pedagógica
pedagógica fuefue considerada
considerada un un enfoque
enfoque pedagógico
pedagógico
como
como tal.
tal. Una
Una dede sus
sus características
características oo aporte
aporte fundamental
fundamental es es el
el que
que concede
concede aa la
la
"escuela"
"escuela" unun valor
valor de
de ser
ser reconocida
reconocida como
como lala "institución",
"institución", cuyocuyo encargo
encargo social
social es
es
el
el de
de educar
educar aa todas
todas las
las capas
capas sociales,
sociales, es
es lala primera
primera institución
institución deldel estado
estado
nacionalista
nacionalista para
para poder
poder llevar
llevar aa cabo
cabo la
la política
política dede la
la orientación
orientación social.
social. La
La escuela
escuela
educa
educa alal hombre
hombre en en los
los objetivos
objetivos que
que persigue
persigue el el Estado.
Estado. (…)
(…) La La forma
forma más
más
común
común de de organización
organización de de las
las actividades
actividades de de estudios
estudios individuales
individuales yy frontal,
frontal,
donde
donde nono hay
hay colaboración
colaboración para
para el
el éxito
éxito de
de los
los demás.
demás. Sostiene
Sostiene queque la
la función
función de
de
la
la escuela
escuela es
es preparar
preparar al
al alumno
alumno parapara el
el desempeño
desempeño de de papeles
papeles sociales,
sociales, acorde
acorde con
con
aptitudes
aptitudes individuales,
individuales, adaptándose
adaptándose aa los los valores
valores yy normas
normas vigentes
vigentes de de una
una

88 Nietzsche
Nietzsche no
no precisa
precisa lo
lo que
que entiende
entiende por
por verdad
verdad extramoral,
extramoral, aquí
aquí hemos
hemos seguido
seguido la
la interpretación
interpretación que
que la
la
caracteriza
caracteriza así:
así: aquella
aquella que
que no
no se
se mueve
mueve en en un
un lenguaje
lenguaje dede conceptos,
conceptos, en
en tanto
tanto metáfora,
metáfora, yy no
no tiene
tiene fines
fines
morales.
morales. Véase
Véase aa RIVERO
RIVERO NOVOA
NOVOA (2014).
(2014).
99 Lo
Lo poético
poético se
se refiere
refiere aquí
aquí aa la
la poiesis,
poiesis, es
es decir,
decir, aa todo
todo proceso
proceso de
de creación,
creación, yy también
también aa una
una forma
forma de
de
conocimiento.
conocimiento.
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 369
369

sociedad
sociedad dividida
dividida en en clases
clases mediante
mediante el el desarrollo
desarrollo de de una
una cultura
cultura individual.
individual. (…) (…)
Se
Se ejerce
ejerce un
un control
control de de arriba
arriba hacia
hacia abajo,
abajo, dede la
la institución
institución al al profesor,
profesor, yy de de este
este al
al
alumno.
alumno. LasLas decisiones
decisiones se se toman
toman en en la
la cúspide.
cúspide. Lo Lo fundamental
fundamental es es el
el intelecto,
intelecto, nono
la
la persona.
persona. Mediante
Mediante esta esta tendencia
tendencia se se proporciona
proporciona una una cultura
cultura general,
general, en en la
la que
que
cada
cada alumno
alumno llega
llega por
por susu propio
propio esfuerzo
esfuerzo aa susu plena
plena realización
realización comocomo persona.
persona. El El
compromiso
compromiso de de la
la escuela
escuela es es con
con lala cultura,
cultura, loslos problemas
problemas sociales
sociales pertenecen
pertenecen aa la la
sociedad
sociedad (…)(…) Relación
Relación docente-alumno:
docente-alumno: predomina
predomina la la autoridad
autoridad del del docente,
docente, que que
es
es el
el centro
centro deldel proceso
proceso de de enseñanza,
enseñanza, es es el
el agente
agente principal
principal de de transmisión
transmisión de de
conocimientos
conocimientos de de forma
forma acabada
acabada hacia
hacia los
los alumnos,
alumnos, es es el
el que
que piensa.
piensa. El El profesor
profesor
tiene
tiene unun papel
papel autoritario,
autoritario, coercitivo,
coercitivo, sus sus principios
principios educativos
educativos son son bastante
bastante
inflexibles,
inflexibles, impositivos,
impositivos, que que deben
deben ser
ser respetados
respetados por por elel alumno.
alumno. El El docente
docente debe debe
dar
dar todo
todo el
el conocimiento
conocimiento en en la
la enseñanza,
enseñanza, distante
distante del del alumno,
alumno, por por lo lo que
que existe
existe
poco
poco espacio
espacio para para este,
este, el el cual
cual tiene
tiene un un papel
papel pasivo,
pasivo, receptivo
receptivo de de los
los
conocimientos,
conocimientos, con con poca
poca independencia
independencia cognoscitiva;
cognoscitiva; se se anula
anula toda
toda comunicación
comunicación
entre
entre los
los alumnos
alumnos durante
durante la la clase,
clase, siendo
siendo el el silencio
silencio el el medio
medio másmás eficaz
eficaz para
para
asegurar
asegurar lala atención
atención en en elel aula.
aula. (…)
(…) Métodos:
Métodos: se se basan
basan en en lala exposición
exposición verbalverbal de de
la
la materia
materia y/o
y/o la la demostración.
demostración. Los Los objetivos
objetivos se se elaboran
elaboran de de forma
forma descriptiva,
descriptiva,
designados
designados aa la la tarea
tarea deldel profesor,
profesor, no no aa las
las acciones
acciones oo habilidades
habilidades aa desarrollar
desarrollar por por
los
los alumnos.
alumnos. Se Se exige
exige la la memorización
memorización de de los
los conocimientos
conocimientos narradosnarrados por por el
el
profesor,
profesor, ajenos
ajenos aa laslas experiencias
experiencias vivenciales
vivenciales de de los
los estudiantes.
estudiantes. El El énfasis
énfasis es es
puesto
puesto en en los
los ejercicios,
ejercicios, en en lala repetición
repetición de de conceptos
conceptos expuestos
expuestos oo fórmulas,
fórmulas,
apunta
apunta aa disciplinar
disciplinar la la mente
mente yy formar
formar hábitos.
hábitos. El El conocimiento
conocimiento se se selecciona
selecciona de de
modo
modo empírico,
empírico, por por lo lo que
que hay
hay un un desarrollo
desarrollo del del pensamiento
pensamiento teórico teórico del del
estudiante.
estudiante. Evaluación
Evaluación de de aprendizaje:
aprendizaje: la la evaluación
evaluación tiene tiene un un carácter
carácter
reproductivo,
reproductivo, apuntaapunta aa los los resultados
resultados dadosdados por por verificaciones
verificaciones aa corto corto plazo
plazo
(evaluaciones
(evaluaciones orales),
orales), oo de de plazo
plazo másmás largo
largo (pruebas
(pruebas escritas,
escritas, oo tareas
tareas parapara elel
hogar).
hogar). ElEl refuerzo
refuerzo de de aprendizaje
aprendizaje es es en
en general
general negativo
negativo (en (en forma
forma de de castigos,
castigos,
notas
notas bajas,
bajas, llamado
llamado aa los los padres).
padres). Algunas
Algunas veces veces se se presenta
presenta positivo
positivo (por (por
ejemplo:
ejemplo: emulación
emulación en en las
las calificaciones)
calificaciones) (ACOSTA
(ACOSTA NAVARRO, NAVARRO, 2005, 2005, s.p.).
s.p.).
Leamos ahora un texto en lenguaje metafórico también sobre la denominada
escuela tradicional:
Allí
Allí estaba
estaba Gil
Gil Ruiz,
Ruiz, elel primero
primero dede la
la clase.
clase. El
El palmetazo
palmetazo debía
debía ser
ser duro
duro yy por
por una
una
falta
falta grave.
grave. Romper
Romper definitivamente
definitivamente la la cáscara,
cáscara, serser de
de los
los otros,
otros, entrar
entrar en en lala
conversación
conversación de de los
los malos,
malos, sólo
sólo así.
así. Mojé
Mojé bienbien el
el corcho
corcho enen la
la tinta
tinta negra,
negra, lolo
agarré
agarré por
por la
la punta
punta seca
seca yy me
me acerqué
acerqué distraídamente
distraídamente aa Gil Gil que
que estaba
estaba ajeno
ajeno alal
mundo,
mundo, sacando
sacando cuentas
cuentas apoyado
apoyado en en la
la mesa
mesa grande.
grande. MeMe daba
daba tumbos
tumbos el el corazón,
corazón,
pero
pero nono me
me vaciló
vaciló el
el pulso
pulso cuando
cuando pasé
pasé elel corcho
corcho lleno
lleno de
de tinta
tinta entre
entre la
la nariz
nariz yy el
el
labio
labio superior.
superior. Puse
Puse unun inmenso
inmenso bigote
bigote dede jefe
jefe civil.
civil. Reventaron
Reventaron laslas risas
risas yy esperé
esperé
temblando
temblando queque GilGil me
me acusara.
acusara. Había
Había llegado
llegado la la hora.
hora. Pero
Pero Gil
Gil no
no se
se movió
movió de de su
su
asiento,
asiento, sacó
sacó elel pañuelo
pañuelo yy trató
trató de
de limpiar
limpiar la la mancha.
mancha. Después
Después me me miró
miró lleno
lleno de
de
rabia.
rabia. Me
Me acusará.
acusará. “Tú“Tú me me las
las vas
vas aa pagar
pagar hijueputa”.
hijueputa”. Acúsame
Acúsame pues,
pues, acusón”.
acusón”.
“¿Acaso
“¿Acaso soysoy pendejo?
pendejo? De De Escorá
Escorá vengo
vengo pero
pero papera
papera nono tengo.
tengo. ¿No
¿No eses tu
tu papá
papá el
el
maestro?
maestro? PorPor eso
eso lo
lo haces,
haces, por
por atenido”.
atenido”. Se Se acercó
acercó mimi padre
padre “¿Qué
“¿Qué pasa
pasa aquí?”
aquí?”
(ARAUJO,
(ARAUJO, 2004, 2004, p.110)
p.110)
Este lenguaje metafórico, consustanciado con el arte, en términos epistémicos
devela lo que enmascara el lenguaje conceptual científico, lo resemantiza, lo renueva, lo
recrea, al transponer una esfera a otra; lo que significa “(…) que surja de las ruinas del
sentido literal (…) El intelecto libre lesiona el orden dado y establece uno nuevo. La
destrucción y la producción de sentido son dos fenómenos correlativos” (INNERARITY,
1998, p.132). En un auténtico ejercicio de poiesis. En el uso de la metáfora estética se
muestra una verdad otra, no la fría verdad objetiva, más allá de pretensiones morales. Es la
verdad del ‘como si’, lo verosímil. Una verdad ubicada en una subjetividad en la cual “(…)
los sentimientos tienen una dimensión informativa acerca del mundo y no están
clausurados en la esfera privada” (Ibidem). En los dos textos citados puede verse el tránsito
de lo conceptual a lo metafórico en relación a la denominada escuela tradicional. En el
primero está una verdad objetiva, canónica, regular, segura; en el segundo una subjetiva,
370|
370| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

ambigua1010, (in)segura y de la pasión de lo vivido imaginado. Así, el lenguaje metafórico


estético, como perspectiva para mirar la escuela, nos permite superar de algún modo la
tendencia de reificación de palabras o conceptos del lenguaje pedagógico científico: escuela,
maestro, alumno, curriculum, enseñanza, aprendizaje, entre otras. Reificación y olvido de
lo efímero del significado de las palabras. Valga decir: “Lo que dicen las palabras no dura.
Duran las palabras. Porque las palabras son siempre las mismas y lo que dicen no es nunca
lo mismo”1111. En este sentido el papel jugado por la metáfora es fundamental en la
renovación de significados, en la transgresión y el salto hacia otras formas de mirar el
mundo de la vida escolar.

2. la escuela como voluntad de poder.


Narrar la escuela, hablar de ella, imaginarla, implica partir de unas vivencias
tomadas de la propia vida escolar, de la vida de la escuela, o de la vida de otros escolares y
de otras escuelas, testigos y testimonios, o de quienes se nos ha referido su historia escolar.
De ahí, seguramente, saldrán, y alternarán con ellas, consideraciones generales sobre el
mundo de la vida escolar. De estas experiencias y reflexiones escolares se sacarán
conclusiones sobre el modo en que la vida escolar tenga que organizarse, se establecerán
criterios que luego se decantarán, de igual modo, en ejemplos vivos singulares. Vida,
escuela, narración y reflexión filosófica. De ello se trata, justamente del afán de una
antropología filosófica narrativa de la identidad escolar. Se trata de una búsqueda de un
comprenderse a sí mismo y al otro en la circunstancia escolar y de lo escolar. Al narrar, el
sujeto escolar, busca saber lo que es, lo que significa ser tal, qué cualidades lo definen, lo
identifican. Asimismo, quiere entender su vida escolar y la de sus semejantes, desde la
multiplicidad de experiencias y acontecimientos en un tiempo vivido en una experiencia
especial. De una experiencia biográfica, valga decir, según su trayecto y contenido propio.
Quien narra la escuela, su escuela, lo hace como sujeto escolar a sus semejantes, con base
en su experiencia escolar, lo vivido por él. Quienes le escuchan o leen ponen en escena su
experiencia escolar, y hablan partiendo de sí mismos; para asentir o disentir lo dicho en la
narración leída o escuchada. Se trata de un diálogo, entre el disenso y el consenso, buscado
y mantenido entre sujetos escolares en el marco de la vida escolar, la narración y una
antropología filosófica. El yo escolar pregunta, interroga la escuela, a sí mismo y a los
otros desde una perspectiva filosófica o antropología.
De esta manera, partiendo de la experiencia de la vida escolar, surge la narración.
Se narra para dar expresión a una vivencia escolar, para tratar de darle sentido, para
afirmarla o salvarla. Esta relación no perderá la relación con la situación concreta de la
vida escolar, ni de la propia ni tampoco la del otro. De esta manera, una antropología
filosófica escolar resulta traducida en vivencias, en experiencias y acontecimientos de la
vida escolar. Desde luego, que aquí no se trata de referir estas experiencias, estas vivencias,
al amarre del falso dilema de escuela tradicional o escuela nueva; porque ambas son,
mutatis mutandis, harinas del mismo saco, esto es, ambas están ubicadas y atrapadas en
ideas y fundamentos de carácter cientificista y moral, ambas se refieren a prototipos de
maestros y alumnos estandarizados, únicos, y siempre los mismos, aquí, allá y más allá.
Una, la tradicional, se supone, es superada por la otra al desplazar el protagonista, en la

10 Aquí
10 Aquí ambigüedad
ambigüedad debemos
debemos entenderla
entenderla enen términos
términos dede un
un “ver
“ver como”
como” que,
que, siguiendo
siguiendo Wittgenstein,
Wittgenstein, sería
sería la
la
posibilidad
posibilidad de de ver
ver en
en una
una cosa
cosa un
un algo
algo uu otro
otro algo.
algo. ElEl ejemplo
ejemplo muy
muy usado
usado por
por el
el autor
autor es
es lala cabeza-C-P
cabeza-C-P
(cabeza
(cabeza de de conejo
conejo oo de
de pato).
pato). Tal
Tal figura
figura se
se puede
puede “ver
“ver como”
como” una
una cabeza
cabeza de
de conejo
conejo oo “ver
“ver como”
como” una una cabeza
cabeza
de
de pato.
pato. Véase
Véase aa Wittgenstein
Wittgenstein (1988).
(1988). La
La ambigüedad
ambigüedad en en este
este sentido
sentido puede
puede ser
ser entendida
entendida como
como algo
algo que
que no
no
es
es determinado,
determinado, estructurado,
estructurado, concluido,
concluido, si si no
no que
que puede
puede ser
ser inconcluso
inconcluso yy cambiar
cambiar con
con el
el tiempo.
tiempo. O O que
que
puede
puede tener
tener más
más dede una
una interpretación.
interpretación.
1111 Dirá
Dirá el
el poeta
poeta argentino
argentino Antonio
Antonio Porchia
Porchia (1989,
(1989, p.111).
p.111).
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 371
371

primera el maestro, en la segunda el alumno, todo sobre la base de principios justificados


con argumentos cientificistas, casi indiscutibles en el talante de sus verdades y también
por un talante moral no develado. Todo por un mejor niño o niña, todo por un mejor
ciudadano, útil a la sociedad (¿a cuál? ¿La industrial/capitalista, de explotación del trabajo
asalariado?). Leamos la cita siguiente sobre la denominada escuela nueva:
El
El uso
uso dede ese
ese nombre
nombre nos nos remite
remite aa unun movimiento
movimiento desarrollado
desarrollado aa partir
partir de
de los
los
últimos
últimos años
años del
del siglo
siglo XIX,
XIX, en en relación
relación con
con determinadas
determinadas ideasideas sobre
sobre lala
educación
educación yy sussus prácticas
prácticas que que en
en Europa
Europa yy en en distintos
distintos países
países del
del mundo
mundo
emergieron
emergieron aa contrapelo
contrapelo de de la la educación
educación tradicional,
tradicional, “...fruto
“...fruto ciertamente
ciertamente dede una
una
renovación
renovación general
general que
que valoraba
valoraba la la autoformación
autoformación yy la la actividad
actividad espontánea
espontánea deldel
niño”
niño” (Gadotti,
(Gadotti, 2000,
2000, p. p. 147).
147). EnEn oposición
oposición aa una
una pedagogía
pedagogía basada
basada enen el
el
formalismo
formalismo yy la la memorización,
memorización, en en el el didactismo
didactismo yy la la competencia,
competencia, en en el
el
autoritarismo
autoritarismo yy la la disciplina,
disciplina, la la nueva
nueva educación
educación reivindica
reivindica lala significación,
significación, el
el
valor
valor yy la
la dignidad
dignidad dede lala infancia,
infancia, se se centra
centra en
en los
los intereses
intereses espontáneos
espontáneos del
del niño
niño
yy aspira
aspira aa fortalecer
fortalecer su su actividad,
actividad, libertad
libertad yy autonomía
autonomía (Palacios,
(Palacios, 1978)
1978) (…)
(…)
(NARVAÉZ,
(NARVAÉZ, 2006, 2006, p. 630)1212..
p. 630)
El marco cientificista de la escuela nueva, venido de la psicología, la neurología, la
psiquiatría, entre otras disciplinas, avala el paidocentrismo, el activismo pedagógico, y
destaca el control de la inteligencia y la conducta. Lo que a su vez significaba la
subestimación o menosprecio de la memoria y la creación libre del alumno, por ejemplo en
el ensayo1313. Ahora bien, cabe decir que a pesar de las supuestas marcadas diferencias y la
renovación y el progresismo que representaba esta última frente a la primera, la escuela
tradicional. En ambas está presente, con sus más y sus menos, un tiempo escolar
disciplinario (de vigilancia y castigo, edulcorado en la escuela nueva por premios y
reforzamientos negativos de conducta), una producción social del individuo; el
disciplinamiento de los saberes; así como también una acción pedagógica correctiva (con
afinadas estrategias en una frente a las de la otra); el uso sistemático de pedagogías
psicológicas, en la llamada nueva, para lograr un fin parecido: un sujeto adaptado a los
requerimientos de la sociedad de marras. En ambas escuelas, o pedagogías de base
cientista, encontramos a unos individuos, maestros y alumnos, sujetados a una moral
semejante, con ribetes de un cientismo, supuestamente no moral, que sirve de base
ideológica y promocional de una verdad/base científica en el caso de la escuela nueva.
Ambas pedagogías, escuelas, están imbuidas de valores semejantes y atadas a un
evolucionismo societal, representado, mutatis mutandis, a la escuela como símbolo
indiscutible de progreso humano y social. Ambas pedagogías propugnan una vida
subordinada a la razón, gran entelequia indiscutible y salvadora1414.
De la misma manera, puede decirse, que estas pedagogías sustentan con diferentes
intensidades y vías de encubrimiento una praxis educativa de la educación como
fabricación con base en moldes o patrones a alcanzar, porque se les considera conocidos,
buenos, ideales que garantizan la previsión de unas consecuencias morales esperadas. A
pesar de que se esgrima argumentos, presentados como principios, del talante siguiente:
“Respeto a la personalidad del educando o el reconocimiento de que éste debe disponer de
libertad.” (NARVAÉZ, 2006, p.635). O enunciados del tipo: “las lecciones están hechas
para los alumnos, y no los alumnos para la lecciones” (CLAPARÈDE, 1959, p.25). Unos

12 La
12 La cita
cita de
de Gadotti
Gadotti corresponde
corresponde a:a: GADOTTI,
GADOTTI, M. M. Historia
Historia de
de las
las ideas
ideas pedagógicas.
pedagógicas. México:
México: Siglo
Siglo veintiuno
veintiuno
editores,
editores, 2000.
2000. YY la
la de
de Palacios
Palacios a:
a: PALACIOS,
PALACIOS, J. J. et
et al.
al. La
La cuestión
cuestión escolar.
escolar. Barcelona:
Barcelona: Laia,
Laia, 1978.
1978.
1313 Entendemos
Entendemos aquíaquí por
por ensayo
ensayo aquel
aquel texto
texto escrito
escrito como
como expresión
expresión de de un
un ejercicio
ejercicio de
de interpretación
interpretación de de un
un
tema
tema oo asunto,
asunto, que
que apuesta
apuesta aa decirlo
decirlo igual
igual yy con
con laslas propias
propias palabras,
palabras, yy en
en elel que
que suele
suele usarse
usarse un
un aparato
aparato
crítico
crítico (citas,
(citas, notas
notas aa pie
pie página),
página), con
con las
las correspondientes
correspondientes referencias
referencias bibliográficas.
bibliográficas. SuSu estructura
estructura
tradicional
tradicional presenta:
presenta: una
una introducción
introducción oo presentación,
presentación, un un desarrollo
desarrollo yy unas
unas conclusiones.
conclusiones.
14 Lo
14 Lo que
que queremos
queremos destacar
destacar aquí,
aquí, entre
entre otras
otras cosas,
cosas, eses una
una diferencia
diferencia dede matices
matices más
más que
que de
de las
las supuestas
supuestas
diferencias
diferencias radicales
radicales entre
entre ambas
ambas pedagogías.
pedagogías.
372|
372| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

alumnos a quienes se les “respeta la personalidad” y se les “da libertad”, las dos entre
comillas porque la práctica dice lo contrario. Ella, la práctica, al final resulta marcada por:
i.i. Un alumno que al llegar por vez primera a la escuela ya tiene inscrita la impronta
de la posesión. Un sujeto escolar al cual ya se le ha “escrito” su historia sin haberla vivido.
El curriculum marcará su destino y lo que de él se espera y quiere que sea. La novedad que
pudiera representar el recién llegado, en términos de la natalidad de Arendt, es limitada
por el “molde” que ya se tiene para él.
ii. Cualquier resistencia que ofrezca el recién llegado es “controlada y orientada” por
ii.
el “buen camino preestablecido”1515.
iii. Toda idea de reconstrucción y recreación y reinvención de lo recibido en la escuela
iii.
por parte del alumno, choca contra los mecanismos de duplicación de iguales, algo así
como: lo que fue, seguirá siendo igual; a pesar de que se aleguen modernas estrategias de
aprendizaje que, supuestamente, dinamizan la transmisión mecánica y acrítica de saberes.
iv. En la formación cabe la decisión del querer o no (el aprender o no), poder o no de
iv.
quien se forma. Ello supone el llegar a ser un alguien distinto a lo que se suponía que
llegara a ser, que alcance una autonomía. La escuela, tradicional o nueva, la rechaza por
diferentes vías y distintos dispositivos de saber poder, esta posibilidad la niegan de
antemano. El perfil de lo que va a ser el alumno ya está perfilado, so pena de considerarlo
un desadaptado.1616
v. La pedagogía es asumida, especialmente en la escuela nueva, como una ciencia de la
v.
educación, rigurosa y seguidora del método científico, por lo que sus ideas y métodos están
fundados en verdades científicas con su sustrato de verdades morales. De ahí que una
perspectiva distinta de la pedagogía que afirme su carácter diferente como ciencia
humana, que no se funda, en materia de formación del ser humano, en verdades científicas
de validez universal; sino en la singularidad del acontecimiento y la experiencia educativa,
es ipso facto rechazada de plano (MEIRIEU, 2003).
MEIRIEU, 2003)
Esta pedagogía nos permite imaginar una escuela otra desde las siguientes ideas
preliminares y provisionales, a saber:
i. Una escuela puede ser imaginada desde su singularidad y ubicación espacio
temporal.
ii. Una escuela, vista de esta manera, supone una destrucción de valores y, a la
vez, su creación, re-creación y reinvención.
iii. Una escuela presa de dualismos como: mente / cuerpo, bueno / malo, verdad /
falsedad, ciencia / no ciencia, lo ideal / lo material. Y en la cual predominan como
deseables siempre los primeros de la lista, tal es el caso de la negación del error como
indeseable siempre y por eso censurado, incluso castigado. Esta escuela debe ser salvada
por una de la ambigüedad1717, v.g.: verdad/error.
iv. Una escuela que supere estos dualismos y, por tanto, asuma la ambigüedad. El
mundo de la vida escolar es un mundo de interpretaciones, de perspectivas que dependen
del cristal con que se mire1818. Por consiguiente, se trata de: no asumir verdades y valores

15 Las
15 Las denominadas
denominadas psicopedagogías
psicopedagogías está
está aa la
la mano
mano para
para cumplir
cumplir este
este papel.
papel.
16
16 Esto
Esto mismo
mismo puede
puede decirse,
decirse, mutatis
mutatis mutandis,
mutandis, del
del denominado
denominado curriculum
curriculum por
por competencias,
competencias, muy
muy enen boga
boga
hoy
hoy enen día.
día.
17 Entendida
17 Entendida como
como posibilidad
posibilidad de
de que
que algo
algo pueda
pueda entenderse
entenderse dede varios
varios modos
modos oo dede que
que puedan
puedan aceptar
aceptar
distintas
distintas interpretaciones.
interpretaciones.
18 En
18 En una
una suerte
suerte de
de paráfrasis
paráfrasis del
del poema
poema de de Ramón
Ramón Campoamor
Campoamor (1949,
(1949, p.68):
p.68): “En
“En este
este mundo
mundo traidor
traidor // nada
nada
es
es verdad
verdad ni
ni mentira
mentira // todo
todo es
es según
según elel color
color // del
del cristal
cristal con
con que
que se
se mira”
mira”
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 373
373

inmutables, de asumir lo subjetivo (ante un reino de lo puramente objetivo, y su


subsecuente objetivismo) y lo relativo en buena medida de las facetas del mundo. 1919
v. Una escuela así no puede ser pensada sólo como un “mar de la felicidad”, sino
como alegría, sí, y también dolor, tristeza, desengaño, rabia, éxitos y fracasos,
verdades/errores.
vi. Una escuela, no la escuela, que suponga sólo la concepción lineal del tiempo,
valga decir también, y del tiempo cronológico, y la dicotomía verdad / error. No es la
escuela imaginada, sino una que incorpore una relación fenomenológica del tiempo: pasado
/ presente / futuro y un tiempo diacrónico, un tiempo de línea quebrada de avances y
retrocesos históricos. Capaz de asumir el error como parte del aprendizaje, y el ensayo y el
error.
vii. Una escuela que no asuma la educación como un ciclo evolutivo, predecible,
controlable, intervenible, “de frasco a llenar y a cerrar” una vez alcanzado el nivel
preestablecido. No es esa tampoco la escuela imaginada, sino aquella abierta a una
concepción de la formación que mira al ser humano como un proyecto de formación
inconcluso, es decir, que sólo finaliza con la muerte. Y que, además, asuma la relación de
natalidad, en el sentido de Arendt, como posibilidad auténtica de inicio, reinicio, comienzo
o nuevo comienzo a lo largo de la vida del ser humano, y no anclada en una idea
cronológica evolucionista de etapas alcanzadas y cerradas, a las que corresponden unos
determinados comportamientos, niveles y logros.
viii. Una escuela que educa débiles, necesitados permanentemente de muletas para
sobrevivir. En donde la incapacidad representada en: la minusvalía, la torpeza, el
menosprecio, la subestimación, la mediocridad, está a la orden del día. Ello representado
por los débiles de espíritu, por aquellos que tienen: miedo al riesgo, a la aventura, a lo
incierto, a lo inseguro de la vida; ansiosos de encontrar un supuesto mundo de paz, de
comodidad, de seguridad. A esa escuela hay que transmutarla en otra, la que aquí
imaginamos.
ix. Una escuela que rechace la idea de que sólo racional es leitmotiv de su
existencia; sino que, por el contrario, lo irracional sirva de fundamento a lo racional, o en
la que lo primero le da cabida a lo segundo. Y que, por tanto, ponga en primer plano la
vida.2020
x. Una escuela llamada a irrumpir contra la invención de un mundo considerado
como único y verdadero; para ser capaz de contribuir con la creación de otro distinto.
Capaz también de contribuir con la formación de un ser humano que supere su sumisión,
y su conversión en un Hombre masa, dócil y alienado, que no le tema a las dificultades, ni
al cambio, ni a lo nuevo.
xi. Una escuela abierta capaz de propiciar la travesía de las transformaciones o
metamorfosis del ser humano, que nos platea Nietzsche en “Así habló Zaratustra”, para
alcanzar ser un espíritu libre, a saber: a) la del camello con su carga de sumisión que le
ancla en la resignación y renuncia, amarrado a los valores establecidos, moviéndose

19
19Porque,
Porque, sese trata
trata de
de la
la asunción
asunción dede la
la ambigüedad
ambigüedad como como atributo
atributo dede cualquier
cualquier concepto,
concepto, idea,
idea, enunciado,
enunciado,
juicio
juicio cuyo
cuyo sentido,
sentido, intención
intención oo interpretación,
interpretación, nono pueden
pueden serser resueltos
resueltos según
según unun método,
método, regla
regla oo proceso
proceso
establecido
establecido rígida
rígida yy sacralizadamente.
sacralizadamente.
20 Lo
20 Lo irracional
irracional puede
puede ser
ser entendido
entendido aquí,
aquí, en
en el
el marco
marco filosófico
filosófico del
del llamado
llamado irracionalismo,
irracionalismo, esto
esto es,
es, aquel
aquel que
que
da
da mucha
mucha importancia
importancia al al ejercicio
ejercicio de
de la
la voluntad
voluntad yy lala individualidad
individualidad más más allá
allá de
de la
la comprensión
comprensión racional
racional del
del
mundo
mundo denominado
denominado objetivo,
objetivo, del
del neopositivismo.
neopositivismo. Aquel
Aquel que
que dada primer
primer plano
plano aa la
la vida,
vida, yy aa la
la razón
razón un
un
segundo.
segundo. De De élél también
también puede
puede decirse,
decirse, con
con Kierkegaard,
Kierkegaard, queque lala verdad
verdad está
está en
en la
la subjetividad
subjetividad que que debe
debe
conducir
conducir al al ser
ser humano
humano aa la la asunción
asunción del
del compromiso
compromiso éticoético de
de sus
sus decisiones
decisiones yy actos
actos y,
y, de
de algún
algún modo,
modo, aa la
la
conquista
conquista de de la
la individualidad.
individualidad. Así
Así mismo,
mismo, elel irracionalismo
irracionalismo supone
supone aa la
la intuición
intuición como
como método
método del del pensar,
pensar,
de
de la
la práctica
práctica filosófica.
filosófica.
374|
374| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

dentro de ellos y limitándose a ellos; b) la del león, capaz de arrasar lo establecido: toda la
imposición, todo deber, todo valor decadente de un nihilismo negativo, en su preparación
para convertirse en espíritu libre; y c) la del niño, la del nacimiento, del reinicio, del nuevo
comienzo, que le dice sí a la vida y a todo aquello, desde lo irracional, que pueda contribuir
a crear nuevos valores, y como expresión de su voluntad de poder, capaz de hacerse
distinto, diferente en su pasión por la vida.

3. la escuela como voluntad de ficción.


¿Podemos imaginar una escuela otra, distinta a la que hemos conocido hasta ahora?
Una escuela del acontecimiento humano y no de los hechos, fenómenos, explicados y
predichos. Una escuela de lo incierto y de lo abierto a lo que no sabe, a lo por-venir.
La escuela, llámese tradicional o nueva2121, es una escuela de la falsedad, una escuela
que se sostiene sobre falsas necesidades, como la de asistir a ella, como la de estudiar, como
la de enseñar, si tales necesidades son impuestas externamente. El alumno, el estudiante, el
maestro es obligado, en muchas ocasiones, hacerlo inexorablemente, a hacer alguna de
ellas por mandato externo. Por consiguiente, ellas no son el producto de una necesidad
sentida, hecha propia del agente que la realiza, no ha nacido de él. Ellas no vienen de un
alguien menesteroso, es decir, que necesita algo y que viene de él, las siente y las expresa
como tales, como necesidades suyas. En el caso de la enseñanza cabe aquí citar a Ortega y
Gasset (2007, p.65) cuando sostiene a este respecto:


… en
en ningún
ningún orden
orden dede la
la vida
vida sea
sea tan
tan constante
constante yy habitual
habitual yy tolerado
tolerado lo lo falso
falso
como
como enen la
la enseñanza.
enseñanza. (…) (…) sopese
sopese concon susu experiencia
experiencia cada
cada uno
uno dede los
los que
que meme
escuchan
escuchan si si no
no nos
nos daríamos
daríamos por por muymuy contentos
contentos concon que
que no
no existiesen
existiesen en en la
la
efectividad
efectividad de de la
la enseñanza
enseñanza más más insuficiencias,
insuficiencias, falsedades
falsedades yy abusos
abusos queque los
los
padecidos
padecidos enen el
el orden
orden jurídico.
jurídico. Lo
Lo que
que allí
allí se
se considera
considera como
como abuso
abuso intolerable
intolerable ––
que
que no
no se
se haga
haga justicia
justicia –– es
es correspondientemente
correspondientemente casi casi lo
lo normal
normal en
en la
la enseñanza:
enseñanza:
que
que el
el estudiante
estudiante no no estudie,
estudie, yy que
que si si estudia,
estudia, poniendo
poniendo su su mejor
mejor voluntad,
voluntad, no no
aprende,
aprende, yy claro
claro es
es que
que si
si el
el estudiante,
estudiante, seasea por
por lo
lo que
que sea,
sea, no
no aprende,
aprende, el el profesor
profesor
no
no podrá
podrá decir
decir que
que enseña,
enseña, sino,
sino, aa lo
lo sumo,
sumo, queque intenta,
intenta, pero
pero no
no logra
logra enseñar.
enseñar.
Se trata pues, de pensar en una escuela que no contenga entre sus ingredientes
principales esta falsedad de sus prácticas, sino que contenga una orientación auténtica,
sentida, vivida como propia, por cuanto esa escuela será lo que auténticamente se haga en
ella, lo que pase en ella, lo que se muestre en ella como evidencia de su vida. De tal
manera, que sus actores sean real y auténticamente afectados, no sólo por los éxitos
logrados, sino también por los fracasos vividos, por los dolores sentidos, por los errores
cometidos, por los aciertos alcanzados. Una escuela que sea expresión de sus reales
circunstancias, históricas, políticas, sociales, culturales, etc. Una escuela que si enseña, que
lo haga desde su propia vida, tal y como es, y no desde un simulacro impuesto para fingir
que se hace algo bueno, dentro de una moral de sumisión y resignación. Una escuela que se
sienta y se padezca, forzada a decidir lo que va a ser en un toparse constante con el
porvenir, desde el reconocimiento de lo que fue y de lo que es.
La escuela, la tradicional y la nueva y la remozada de la actualidad, 2222 tiene, exhibe y
aplica en su vigilar y castigar, mediante dispositivos abiertos o taimados de psicopoder,

21 Añadiéndole
21 Añadiéndole especificidades,
especificidades, desde
desde una
una perspectiva
perspectiva genealógica,
genealógica, de:
de: las
las pedagogías
pedagogías correctivas,
correctivas, las
las
pedagogías
pedagogías psicológicas.
psicológicas. Véase
Véase aa Varela
Varela (1995).
(1995).
22 Que
22 Que se
se apoya
apoya en en el
el llamado
llamado curriculum
curriculum por
por competencias,
competencias, elel cual
cual presenta
presenta como
como núcleos
núcleos duros,
duros, en
en susu
lenguaje
lenguaje cientista,
cientista, racionalista
racionalista instrumental,
instrumental, el el “saber
“saber hacer”
hacer” yy el
el “saber
“saber estar”,
estar”, “ser
“ser competente
competente vsvs ser
ser
capaz”,
capaz”, “ser
“ser el
el individuo
individuo oo el
el profesional
profesional que
que se
se requiere”.
requiere”. Cualquier
Cualquier semejanza
semejanza con con la
la educación
educación como
como
fabricación
fabricación no
no es
es pura
pura coincidencia.
coincidencia. Leamos
Leamos susu lenguaje:
lenguaje: “El
“El núcleo
núcleo central
central de
de las
las competencias
competencias (…)
(…) eses el
el
comportamiento,
comportamiento, como como conjunto
conjunto dede acciones
acciones observables,
observables, puestas
puestas enen acto
acto por
por una
una persona
persona yy modeladas
modeladas
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 375
375

normas absolutas y verdades sacralizadas que condenan la libertad de vivir y pensar, y la


imaginación creadora y libre, la diferencia y el error.
Ahora bien, preguntemos ahora por una escuela con voluntad de ficción, una
escuela que imagina, que crea y se re-crea, no anclada en verdades morales tradicionales y
verdades seguras y aseguradas. ¿Es posible imaginar una escuela que asuma el carácter
ficcional2323 de la realidad? Esta pregunta / desafío puede ser ubicada en parte,
antropológicamente hablando, en la perspectiva del hombre como animal de ficciones, de
metáforas, propuesta por Nietzsche. Pregunta esta que implica también la idea de una
escuela histórica, montada sobre el devenir, sin que nada, o muy poco, tenga de elementos
invariables, y a tenor de las circunstancias. Una escuela siempre inconclusa, siempre
abierta a la natalidad, en el sentido de Arendt, de los que llegan, de los recién llegados. La
respuesta a la pregunta formulada, es un sí, si la fuente del lenguaje y del conocimiento
está en la imaginación creadora2424 como expresión de interpretaciones, como expresión
hermenéutica de metáforas, enigmas y modelos, siempre en perspectiva y desde
circunstancias determinadas.2525 Imaginación con sentimientos, o inteligencia sentiente de
Xubiri2626. Una imaginación creadora que para nada sea impersonal, al menos en el filósofo,
ya Nietzsche (1983, p.27) lo afirmaba: “(…) nada, absolutamente nada es impersonal”.
Esa escuela que asuma la ficción constitutivamente hablando, puede ser vista como
aquella capaz de futurizarse, es decir, no anclada en unos saberes y haceres del pasado, sino
capaz de asumir el compás del pasado – presente – futuro. Un presente, como un ahora, al
cual se busca comprender en un hacer-se y transformar-se. Un futurizar-se desde el
acontecimiento y la experiencia, desde la metáfora, en el camino de la ficción. Estamos
hablando de una escuela como metáfora viva, es decir, consciente de su condición
ficcionadora, de su voluntad de ficción.
¿Qué
¿Qué hay,hay, Pardal?
Pardal? Espero
Espero queque por
por fin
fin este
este año
año podamos
podamos ver ver lala lengua
lengua de de las
las
mariposas."
mariposas." El El maestro
maestro aguardaba
aguardaba desdedesde hacía
hacía tiempo
tiempo que que lesles enviasen
enviasen un un
microscopio
microscopio aa los los dede la
la Instrucción
Instrucción Pública.
Pública. Tanto
Tanto nos nos hablaba
hablaba de de cómo
cómo se se
agrandaban
agrandaban las las cosas
cosas menudas
menudas ee invisibles
invisibles porpor aquel
aquel aparato
aparato queque loslos niños
niños
llegábamos
llegábamos aa verlas
verlas de de verdad,
verdad, como
como si si sus
sus palabras
palabras entusiastas
entusiastas tuviesen
tuviesen el el efecto
efecto
de
de poderosas
poderosas lentes.
lentes. "La"La lengua
lengua dede la
la mariposa
mariposa es es una
una trompa
trompa enroscada
enroscada como como un un
muelle
muelle de de reloj.
reloj. Si Si hay
hay unauna flor
flor que
que lala atrae,
atrae, la
la desenrolla
desenrolla yy la la mete
mete enen el
el cáliz
cáliz
para
para chupar.
chupar. Cuando
Cuando lleváis
lleváis elel dedo
dedo humedecido
humedecido aa un un tarro
tarro de
de azúcar,
azúcar, ¿a ¿a qué
qué
sentís
sentís yaya el
el dulce
dulce en en la
la boca
boca como
como si si la
la yema
yema fuese
fuese lala punta
punta de de la
la lengua?
lengua? Pues
Pues así
así
es
es la
la lengua
lengua de de lala mariposa."
mariposa." Y Y entonces
entonces todos
todos teníamos
teníamos envidia
envidia de de las
las mariposas.
mariposas.
Qué
Qué maravilla.
maravilla. Ir Ir por
por elel mundo
mundo volando,
volando, con con esos
esos trajes
trajes dede fiesta,
fiesta, yy parar
parar en en
flores
flores como
como tabernas
tabernas con con barriles
barriles llenos
llenos dede almíbar.
almíbar. Yo Yo quería
quería mucho
mucho aa aquel
aquel
maestro.
maestro. (…)(…) ¿A ¿A queque parece
parece mentira
mentira eso eso de
de que
que las
las mariposas
mariposas tengan
tengan lengua?"
lengua?" "Si"Si
él
él lo
lo dice,
dice, es
es cierto.
cierto. HayHay muchas
muchas cosas
cosas queque parecen
parecen mentira
mentira yy son son verdad.
verdad. (…)(…)
Don
Don Gregorio
Gregorio llevóllevó puesto
puesto aquel
aquel traje
traje durante
durante unun año,
año, yy lolo llevaba
llevaba también
también aquel
aquel
día
día dede julio
julio de de 1936,
1936, cuando
cuando se se cruzó
cruzó conmigo
conmigo en en la la Alameda,
Alameda, caminocamino del del

respecto
respecto aa las
las actividades
actividades que
que deben
deben desarrollar
desarrollar (cosas
(cosas aa hacer)
hacer) en
en base
base aa reglas
reglas ee instrucciones
instrucciones dadas
dadas (cómo
(cómo
hacer)”
hacer)” (ABARCA-FERNÁNDEZ,
(ABARCA-FERNÁNDEZ, 2010, 2010, p.6).
p.6).
23 Ficción
23 Ficción entendida
entendida en en términos
términos del
del ‘como
‘como si’,
si’, siguiendo
siguiendo aa Hans
Hans Vaihinger
Vaihinger (1965),
(1965), de
de lo
lo verosímil.
verosímil.
24 Que
24 Que permita
permita inventar
inventar unas
unas ficciones,
ficciones, diríamos
diríamos con con Hans
Hans Vaihinger,
Vaihinger, para
para poder
poder aprender
aprender la la realidad.
realidad.
25 Entendida
25 Entendida lala metáfora
metáfora nono como
como una
una figura
figura literaria,
literaria, sino
sino como
como conocimiento,
conocimiento, yy aa lala verdad
verdad como
como invención
invención
ee implicación
implicación subjetiva.
subjetiva.
26 Para
26 Para captar
captar la
la realidad
realidad “de
“de suyo”,
suyo”, eses decir,
decir, enen la
la percepción.
percepción. Véase
Véase aa Xavier
Xavier Xubiri
Xubiri (1991).
(1991). “Sin
“Sin que
que para
para
nada
nada signifique
signifique olvidar
olvidar el
el papel
papel de
de las
las interpretaciones,
interpretaciones, hasta
hasta el
el punto
punto dede afirmarse
afirmarse que:
que: lolo que
que llamamos
llamamos
percepciones
percepciones está
está condicionado
condicionado por por las
las interpretaciones;
interpretaciones; nuncanunca hay
hay un
un mero
mero funcionamiento
funcionamiento del del aparato
aparato
perceptivo
perceptivo humano,
humano, sino
sino que
que éste
éste opere
opere aa lo
lo largo
largo dede un
un sistema
sistema de
de interpretaciones…”
interpretaciones…” (ROCCA,
(ROCCA, 2012,2012, p.52).
p.52).
376|
376| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

ayuntamiento.
ayuntamiento. "¿Qué
"¿Qué hay,
hay, Pardal?
Pardal? A
A ver
ver si
si este
este año
año por
por fin
fin podemos
podemos verle
verle la
la
lengua
lengua aa las
las mariposas
mariposas (RIVAS,
(RIVAS, 1996,
1996, p.27-32)
p.27-32)2727
En estos fragmentos del relato, “La lengua de las mariposas” de Manuel Rivas,
podemos leer un ejercicio de metáfora escolar, la lengua de las mariposas, y los atisbos de
una escuela de ficción, entrecruzada en la narración histórica y el relato de ficción. Una
escuela distinta, un maestro distinto, en el período de la república en España. Una escuela
que no castigaba, un maestro humilde que enseñaba sin agredir y desplegaba una
imaginación fascinante. Podemos suponer que el maestro Don Gregorio era expresión,
directa o indirecta, de la Institución Libre de Enseñanza. 2828 El nihilismo decadente que
atraviesa el maestro y la escuela hoy día, es denunciado por la escuela de Don Gregorio. Él
nos muestra una pedagogía del educar en la vida y no para la vida y desde fuera de la vida.

3.1 intempestiva pedagógica en tono de ficción.

Törles
Törles sese convirtió
convirtió en en unun muchacho
muchacho de de espíritu
espíritu refinado
refinado yy sensible.
sensible. Entonces
Entonces fue
fue uno
uno dede
esos
esos seres
seres dede naturaleza
naturaleza estético-intelectual,
estético-intelectual, aa loslos cuales,
cuales, la la observancia
observancia de de la
la ley,
ley, ee
incluso,
incluso, en
en cierta
cierta medida,
medida, de de la
la moralidad
moralidad pública,
pública, ofrece
ofrece tranquilidad
tranquilidad yy serenidad,
serenidad, pues
pues
así
así se
se ahorran
ahorran el el tener
tener que
que reflexionar
reflexionar sobre
sobre cosas
cosas groseras
groseras yy sobre
sobre todo
todo lo
lo que
que se
se halle
halle
lejos
lejos de
de los
los estados
estados espirituales
espirituales másmás exquisitos;
exquisitos; unouno de
de estos
estos seres,
seres, sin
sin embargo,
embargo, en en los
los
cuales
cuales lala magnífica
magnífica corrección
corrección exterior,
exterior, teñida
teñida dede un
un toque
toque de de ironía,
ironía, se
se relaciona
relaciona en en
seguida
seguida concon una
una sutil
sutil indiferencia
indiferencia cuando
cuando se se espera
espera de
de ellos
ellos que
que muestren
muestren porpor las
las cosas
cosas
concretas
concretas unun interés
interés personal
personal que
que trascienda
trascienda la la legalidad
legalidad yy la
la moralidad
moralidad estrictas.
estrictas. Pues
Pues ese
ese
interés
interés personal,
personal, eseese justo
justo conocimiento
conocimiento de de sí
sí mismo,
mismo, sese concentra
concentra sólo,sólo, en
en esos
esos seres,
seres, en
en elel
desarrollo
desarrollo deldel alma,
alma, del del espíritu,
espíritu, oo como
como quiera
quiera que
que sese llame
llame aquello
aquello que,
que, enen nuestro
nuestro
interior,
interior, se
se hace
hace grande
grande mediante
mediante unun pensamiento
pensamiento nacido
nacido entre
entre las
las palabras
palabras de de un
un libro
libro oo aa
través
través dede lo
lo que
que nos
nos dice
dice un
un cuadro,
cuadro, aa media
media voz,
voz, cuando
cuando nosnos hallamos
hallamos frente
frente aa él
él (…)
(…) A A
tales
tales seres,
seres, pues,
pues, les
les resultan
resultan dede una
una importancia
importancia suprema
suprema todas
todas laslas cosas
cosas que
que signifiquen
signifiquen
exigencia
exigencia para
para su
su propia
propia circunspección
circunspección moral.
moral. PorPor eso
eso Törless,
Törless, al al largo
largo de
de su
su vida,
vida, nunca
nunca
se
se arrepintió
arrepintió dede aquella
aquella experiencia
experiencia enen el
el instituto. (MUSIL,, 1986,
instituto. (MUSIL 1986, p.151-152)
p.151-152)2929

Las Tribulaciones del Estudiante Törless de Musil es una novela de formación (una
bildungroman) que trata del paso de lo inmaduro a lo maduro, en tono de lo inconcluso de la
vida humana, de la formación de un ser humano, Törless, en tono de ensimismamiento y
volcamiento, interior – exterior. Él, Törless, salvadas sus tribulaciones alcanza la
confianza en sí mismo, su voluntad de poder en términos de Nietzsche, para superar la
culpa y la vergüenza por la homosexualidad vivida y las aventuras sadomasoquistas con
Basini. Una novela que nos muestra un nihilismo decadente, tanto de la escuela como de la
sociedad en la que se ubica.
La novela nos sirve de pretexto para introducir unas brevísimas notas de una
intempestiva pedagógica en tono de ficción. La escuela es pensada/sentida aquí como un
acontecimiento que se experimenta, que se vive, que se tiene una experiencia en un tiempo
y un espacio determinados. Así que no se trata aquí de mirar la escuela desde cierta
distancia objetiva, en un objetivismo que no nos toca o trastoca, sino como quien mira
desde afuera un algo para no ser tocado por él. Por el contrario, se trata de un pensar desde

27 El
27 El relato
relato narra
narra la
la historia
historia de
de la
la amistad
amistad entre
entre elel niño
niño apodado
apodado Pardal
Pardal yy su
su maestro,
maestro, don
don Gregorio,
Gregorio, durante
durante
el
el año
año anterior
anterior alal inicio
inicio de
de la
la Guerra
Guerra Civil
Civil española,
española, ante
ante sala
sala de
de cuarenta
cuarenta años
años dede dictadura
dictadura franquista.
franquista. Don
Don
Gregorio,
Gregorio, claro
claro está,
está, era
era republicano.
republicano.
28 Un
28 Un proyecto
proyecto pedagógico
pedagógico de de renovación
renovación de de la
la escuela
escuela enen su
su momento,
momento, desarrollado
desarrollado entre
entre 1876
1876 yy 1936
1936 en
en
España.
España. La La clave
clave de
de la
la enseñanza
enseñanza eraera el
el maestro
maestro yy el el método,
método, elel alumno
alumno eraera el
el centro
centro del
del proceso
proceso pedagógico.
pedagógico.
El
El método
método socrático
socrático era
era un
un método
método fundamental
fundamental de de enseñanza.
enseñanza. Véase
Véase aa Jiménez-Landi
Jiménez-Landi (2010).
(2010).
29.. Esa
29 Esa es
es una
una novela
novela rica
rica en
en elementos
elementos para
para el
el estudio,
estudio, aa partir
partir de
de la
la escuela,
escuela, los
los maestros,
maestros, la
la sexualidad,
sexualidad, la
la
homosexualidad,
homosexualidad, el el sadomasoquismo,
sadomasoquismo, y, y, claro
claro está,
está, el
el desarrollo
desarrollo espiritual
espiritual de
de los
los jóvenes,
jóvenes, especialmente
especialmente dede
Törless,
Törless, el el protagonista.
protagonista.
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 377
377

la presencia que se tiene, que se hace, que se vive 3030. Un hacerse presente también en lo
narrado del mundo de la vida escolar para que algo nos pase, nos trastoque, nos tumbe para
volvernos a levantar desde un pensar y un sentir, desde y en un ejercicio del ‘como si’ o
ficcional, doblemente asumido: desde el relato de ficción y desde una perspectiva de la
escuela como voluntad de ficción.
Así las cosas, experimentar la escuela, vivirla, sentirla es mucho más que un asunto
meramente epistemológico, un mero conocer a secas. Lo escolar, la experiencia escolar, es
un pensar en lo que estamos haciendo, estar atentos, un darse cuenta y un dar cuenta. Es
un involucrarse en lo que pasa y nos pasa en el espacio y el tiempo escolar. Es allí en la que
se ubica una pedagogía de la presencia en el sentido de Bárcena (2012, p.34), en sus palabras:
“…la idea de la presencia - la presencia de un espectador atento en la realidad acerca de la
cual busca pensar, para pensar de otro modo - rematerializa el mundo: lo habita”.
Al relato “Las tribulaciones del estudiante Törles”, lo leemos aquí desde el presente
y desde una antropología filosófica de la presencia. De allí que lo veamos como metáfora
viva para comprender y comprender-nos en el acontecimiento escolar en ese ejercicio de
poiesis, aisthesis y catarsis, en el que más allá de una epistemología está involucrada una
estética de la recepción del acontecimiento y la experiencia lectora, para que nos toque,
trastoque, y algo nos pase en esa búsqueda de la comprensión de nuestro presente escolar.
El instituto de Törless, el liceo diríamos en Venezuela, es acontecimiento y experiencia
narrada, ficcionada, no para establecer generalizaciones estocásticas, sino como expresión
de lo singular vivido y narrado3131. Relato éste que tiene una dimensión antropológica
distinta al de la “Lengua de las mariposas”, en este último somos llevados hacer presencia
de otra manera, en otras circunstancias, en una ficción distinta, en un ‘como si’ distinto, la
escuela de don Gregorio y de Pardal es otra, ellos están inmersos en verdades morales
distintas.

epílogo: la escuela nos ha borrado la experiencia: la escuela vivida. un relato de ficción.


La imaginación, la invención poética, la voluntad de ficción desde su autonomía
creativa en la ficción de lo real para la unión de la acción ficcional con el acontecimiento y
la experiencia, nos ha ayudado a apuntalar un ejercicio de una antropología filosófica como
el que hemos venido realizando. Esta antropología filosófica de la escuela es una invención
de voluntad de ficción, del ‘como si’, de lo verosímil, en la que lo menos importante es una
verdad, entendida como verdad moral. Para esta antropología el mundo de la vida escolar
está constituido por acontecimientos y experiencias más allá de una lógica de la causalidad
y de la racionalidad instrumental medios fines. Esta antropología escolar así pensada es
poética, valga decir, imaginativa en contraste con una facticidad y una verdad moral. Es
poética porque es más que lo histórico y lo verdadero. Es poética porque no se hace a
semejanza de la historia, la trasciende.
Una antropología filosófica escolar como la que hemos venido presentando en parte
se funda en la palabra poética, hecha también memoria y narración que sin subestimar la
palabra oral, sino suponiéndola, asume la escrita. Asimismo, asume también el carácter
temporal de la vida humana, y la mediación entre el tiempo y la narración y la ficción de
camino a una identidad narrativa, en el sentido Ricoeur, en una ipseidad y no en una
identidad ídem de carácter permanente y cerrada. Esta identidad como ipseidad va, en tono
de Ricoeur, de la vida al texto, y de éste a la lectura, al lector en el juego de mimesis I, II y

30 Esta
30 Esta idea
idea de
de la
la presencia
presencia tiene
tiene que
que ver
ver con
con la
la desarrollada
desarrollada por
por Fernando
Fernando Bárcena
Bárcena (2012,
(2012, p.33),
p.33), en
en tono
tono de
de la
la
pregunta:
pregunta: “¿Cómo
“¿Cómo me me hago
hago presente
presente en
en lo
lo que
que hago
hago yy en
en lo
lo pienso?”.
pienso?”.
3131 No
No excepto
excepto del
del elemento
elemento histórico,
histórico, lo
lo autobiográfico,
autobiográfico, vivido
vivido por
por el
el autor
autor del
del relato
relato en
en su
su adolescencia.
adolescencia.
378|
378| gregorio
gregorio valera-villegas
valera-villegas

III3232 del autor de “Sí mismo como otro”. En esta antropología filosófica escolar, la
actividad del ficcionar es entendida en sus tres acepciones: “…a) dar forma, formar,
modelar y b) simular, fingir (ficción poética). Ligadas estas dos significaciones se ligan a
una tercera: imaginar” (LAMARCHE, 1998, s.p.).
Acontecimiento, experiencia, narración, voluntad de ficción. Narrar lo vivido, dar
cuenta, darse cuenta. Narrar la vida escolar, narrar la escuela vivida no sólo como ejercicio
de un ficcionar, sino también de un memento vivere, en ese acuérdate de vivir, en términos
de lo que queda pendiente, en ese presente desde el que se futuriza, que no es destino
marcado, destino sino, sino destino como amor fati, de acuerdo con Nietzsche. En ese
futurizar desde un presente, en el que hacemos presencia, recordamos lo que fuimos,
hacemos memoria vía poesía, y desde una vía que puede ser la analepsis 3333, para trazar o
imaginarnos un camino otro. Sin olvidar el memento morti, o recordar que podemos morir,
que somos mortales y la finitud nos toca.

referencias
ACOSTA
ACOSTA NAVARRO,
NAVARRO, María María Elena.
Elena. Tendencias
Tendencias pedagógicas
pedagógicas contemporáneas.
contemporáneas. La La pedagogía
pedagogía
tradicional
tradicional yy elel enfoque
enfoque histórico-cultural.
histórico-cultural. Análisis
Análisis comparativo.
comparativo. RevistaRevista Cubana
Cubana de de
Estomatología,
Estomatología, Ciudad
Ciudad de de la la Habana,
Habana, v.42, v.42, n.1,n.1, abr.
abr. 2005.
2005. Disponible
Disponible en: en:
http://scielo.sld.cu/scielo.php?pid=S0034-75072005000100009&script=sci_arttext
http://scielo.sld.cu/scielo.php?pid=S0034-75072005000100009&script=sci_arttext ..
Consultado
Consultado en:en: 12/12/2015.
12/12/2015.
ABARCA-FERNÁNDEZ, Ramón
ABARCA-FERNÁNDEZ, Ramón R R Necesidad
Necesidad del del Currículo
Currículo por por competencias.
competencias. VI VI Congreso
Congreso
Iberoamericano de
Iberoamericano de Docencia
Docencia Universitaria.
Universitaria. Anais.
Anais. Universidad
Universidad Católica
Católica de de Santa
Santa María:
María:
Arequipa,
Arequipa, 2010.
2010. Disponible
Disponible en:
en:
https://www.researchgate.net/publication/266492626_Necesidad_del_Curriculo_por_comp
https://www.researchgate.net/publication/266492626_Necesidad_del_Curriculo_por_comp
etencias. Consultado
etencias. Consultado en: en: 02/03/2016.
02/03/2016.
ARAUJO, Orlando.
ARAUJO, Orlando. Liberación.
Liberación. In: In: ARAUJO,
ARAUJO, Orlando.Orlando. Compañero
Compañero de de viaje
viaje yy otros
otros relatos.
relatos. Caracas:
Caracas:
Monte Ávila
Monte Ávila Editores,
Editores, 2004.
2004.
BÁRCENA, Fernando:
BÁRCENA, Fernando: Una Una pedagogía
pedagogía de de la la presencia.
presencia. Crítica
Crítica filosófica
filosófica de de lala impostura
impostura
pedagógica. Teoría
pedagógica. Teoría dede la
la educación,
educación, Vol.
Vol. 24,
24, Nº
Nº 2,
2, 2012,
2012, p.
p. 25-57.
25-57.
CLAPARÈDE, Edouard.
CLAPARÈDE, Edouard. A A escola
escola sob
sob medida.
medida. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Fundo
Fundo de de Cultura,
Cultura, 1959.
1959.
DELEUZE, Gilles.
DELEUZE, Gilles. Post-scriptum
Post-scriptum sobre sobre laslas sociedades
sociedades de de control.
control. In:In: Conversaciones.
Conversaciones. Valencia:
Valencia:
Pre-textos, 1996,
Pre-textos, 1996, p.
p. 277-286.
277-286.
DUCH, Lluís.
DUCH, Lluís. Estaciones
Estaciones del
del laberinto.
laberinto. Ensayos
Ensayos de de antropología.
antropología. Barcelona:
Barcelona: Herder,
Herder, 2004.
2004.
FOUCAULT, Michel.
FOUCAULT, Michel. Nacimiento
Nacimiento de de la
la biopolítica.
biopolítica. Madrid:
Madrid: Akal,
Akal, 2009.
2009.
INNERARITY, Daniel.
INNERARITY, Daniel. La La seducción
seducción del del lenguaje:
lenguaje: Nietzsche
Nietzsche yy la la metáfora.
metáfora. Contrastes.
Contrastes. Revista
Revista
Interdisciplinar
Interdisciplinar de
de Filosofía,
Filosofía, v.
v. II,
II, 1998.
1998. Disponible
Disponible en:
en:
dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3041221.pdf .. Consultado
dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3041221.pdf Consultado en: en: 25/11/2015.
25/11/2015.
JIMÉNEZ-LANDI, Antonio.
JIMÉNEZ-LANDI, Antonio. BreveBreve historia
historia de
de la
la Institución
Institución Libre
Libre dede Enseñanza
Enseñanza (1896-1939).
(1896-1939). Madrid:
Madrid:
Editorial Tébar,
Editorial Tébar, 2010.
2010.
LAMARCHE, Juan.
LAMARCHE, Juan. La
La ficción
ficción yy lala verdad.
verdad. In:In: 20th
20th World
World Congress
Congress of of Philosophy,
Philosophy, 1998, 1998, Boston.
Boston.
Anais… Disponible
Anais… Disponible en:en: https://www.bu.edu/wcp/Papers/Aest/AestLama.htm
https://www.bu.edu/wcp/Papers/Aest/AestLama.htm
MEIRIEU, Philippe.
MEIRIEU, Philippe. Frankenstein
Frankenstein educador.
educador. Barcelona:
Barcelona: Laertes,
Laertes, 2003.
2003.

32 La
32 La mimesis
mimesis es es mediadora
mediadora entre
entre elel tiempo
tiempo yy la la narración
narración yy entre
entre esta
esta última
última yy la
la ficción.
ficción. La
La mimesis
mimesis II es es
prefiguración
prefiguración de de acciones
acciones de de la
la vida
vida cotidiana,
cotidiana, lala mimesis
mimesis IIII es
es configuración
configuración narrativa,
narrativa, momento
momento del del ‘como
‘como
si’,
si’, configuración
configuración de de la
la trama,
trama, unun hacer
hacer sobre
sobre el
el hacer,
hacer, un
un conocer
conocer enen términos
términos dede verosimilitud,
verosimilitud, del
del ‘como
‘como si’.
si’.
La
La mimesis
mimesis III,
III, la
la refiguración,
refiguración, la la lectura,
lectura, que
que incorpora
incorpora yy recrea
recrea nuevos
nuevos significados
significados ee identidades
identidades
narrativas.
narrativas. Véase
Véase aa RICOEUR
RICOEUR (1998),(1998), Paul.
Paul. La
La trama:
trama: “…“… bien
bien formada
formada produce
produce peripecia
peripecia produce
produce peripecia
peripecia --
paso
paso dede la
la dicha
dicha al al infortunio
infortunio -,-, agnición
agnición -- paso
paso de de la
la ignorancia
ignorancia al al conocimiento
conocimiento -- yy catarsis
catarsis -- emoción
emoción ee
instrucción
instrucción -”-” (LAMARCHE,
(LAMARCHE, 1998, 1998, s.p.).
s.p.).
33 Como
33 Como vuelta
vuelta rápida
rápida al al pasado
pasado para
para alterar
alterar el
el ensimismamiento
ensimismamiento que que aa veces
veces da
da el
el presente.
presente. YY desde
desde una
una
prolepsis
prolepsis imaginar
imaginar lo lo que
que vendrá
vendrá yy lo
lo que
que posiblemente
posiblemente seremos.
seremos. Sin
Sin olvidar
olvidar el
el proverbio
proverbio latino:
latino: “Respice
“Respice post
post
te!
te! Hominem
Hominem te te esse
esse memento!”
memento!” Ese
Ese mirar
mirar tras
tras de
de mí,
mí, recordando
recordando que
que soy
soy un
un hombre,
hombre, no no un
un dios.
dios.
la
la escuela
escuela como
como voluntad
voluntad de
de ficción:
ficción: de
de la
la verdad
verdad moral
moral aa la
la metáfora
metáfora || 379
379

MUSIL,
MUSIL, Robert.
Robert. Las
Las tribulaciones
tribulaciones del
del estudiante
estudiante Törless.
Törless. Bogotá:
Bogotá: LaLa Oveja
Oveja Negra,
Negra, 1984.
1984.
NARVÁEZ,
NARVÁEZ, Eleazar.
Eleazar. Una
Una mirada
mirada aa la la escuela
escuela nueva.
nueva. Educere,
Educere, v.
v. 10,
10, n.35,
n.35, octubre-diciembre,
octubre-diciembre, p. p. 629-
629-
636,
636, 2006.
2006.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. MásMás allá
allá del
del bien
bien yy del
del mal.
mal. Barcelona:
Barcelona: Ediciones
Ediciones Orbis,
Orbis, 1983.
1983.
_________.
_________. Sobre
Sobre Verdad
Verdad yy mentira
mentira enen sentido
sentido extramoral.
extramoral. Madrid:
Madrid: Tecnos,
Tecnos, 1996.
1996.
ORTEGA
ORTEGA Y Y GASSET,
GASSET, José. José. Unas
Unas lecciones
lecciones dede metafísica.
metafísica. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 2007.
2007.
POCHIA,
POCHIA, Antonio.
Antonio. Voces.
Voces. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Edicial,
Edicial, 1989.
1989.
RANCIÈRE,
RANCIÈRE, Jacques.
Jacques. ElEl maestro
maestro ignorante.
ignorante. Barcelona:
Barcelona: Laertes,
Laertes, 2002.
2002.
RIVERO
RIVERO NOVOA,
NOVOA, Ángel. Ángel. Verdad
Verdad yy metáfora
metáfora en en el
el primer
primer Nietzsche.
Nietzsche. ¿Es ¿Es lo
lo extramoral
extramoral una
una
negación
negación de de la
la moralidad?
moralidad? Saga Saga Revista
Revista dede estudiantes
estudiantes de
de filosofía.
filosofía. 2014.
2014.
Disponible
Disponible en: en: http://www.saga.unal.edu.co/etexts/PDF/saga14/Rivera.pdf
http://www.saga.unal.edu.co/etexts/PDF/saga14/Rivera.pdf Consultado Consultado
en:
en: 13/01/2016.
13/01/2016.
RICOEUR,
RICOEUR, Paul. Paul. La
La metáfora
metáfora viva.
viva. Madrid:
Madrid: Trotta,
Trotta, 2001.
2001.
_________.
_________. Sí
Sí mismo
mismo como
como otro.
otro. México:
México: SigloSiglo XXI,
XXI, 1996.
1996.
_________.
_________. Tiempo
Tiempo yy narración
narración II.
II. Configuración
Configuración del del tiempo
tiempo en en el
el relato
relato histórico.
histórico. México:
México: Siglo
Siglo
XXI,
XXI, 1998.
1998.
RIVAS,
RIVAS, Manuel.
Manuel. La La lengua
lengua de de laslas mariposas.
mariposas. In: In: RIVAS,
RIVAS, Manuel.
Manuel. ¿Qué ¿Qué me me quieres,
quieres, amor?
amor?
Barcelona:
Barcelona: Alraguara,
Alraguara, 1996.
1996.
ROCCA,
ROCCA, Adolfo
Adolfo Vásquez.
Vásquez. Nietzsche:
Nietzsche: de de la
la voluntad
voluntad de de poder
poder aa la la voluntad
voluntad de de ficción
ficción como
como
postulado
postulado epistemológico.
epistemológico. Nómadas,
Nómadas, Bogotá,
Bogotá, n.37,
n.37, p.40-53,
p.40-53, July/Dec,
July/Dec, 2012,
2012, Disponible
Disponible en:en:
http://www.scielo.org.co/pdf/noma/n37/n37a04.pdf.
http://www.scielo.org.co/pdf/noma/n37/n37a04.pdf. Consultado Consultado en: en: 08/04/2013.
08/04/2013.
VARELA,
VARELA, Julia.Julia. Categorías
Categorías espacio-temporales
espacio-temporales yy socialización
socialización escolar:
escolar: del
del individualismo
individualismo al al
narcisismo.
narcisismo. In: In: LARROSA,
LARROSA, Jorge Jorge (Ed).
(Ed). Escuela,
Escuela, poder
poder yy subjetivación.
subjetivación. Madrid:
Madrid: La La piqueta,
piqueta,
1995,
1995, p.153-189.
p.153-189.
VAIHINGER,
VAIHINGER, Hans. Hans. The The Philosophy
Philosophy of of ‘As
‘As if’.
if’. AA System
System of of the
the Theoretical,
Theoretical, Practical
Practical and
and
ReligiousFictions
ReligiousFictions of of Mankind.
Mankind. London:
London: Routledge
Routledge & & Kegan,
Kegan, 1965.
1965.
WITTGENSTEIN,
WITTGENSTEIN, Ludwig. Ludwig. Investigaciones
Investigaciones filosóficas.
filosóficas. Barcelona:
Barcelona: Crítica,
Crítica, 1988.
1988.
XUBIRI,
XUBIRI, Xavier.
Xavier. Inteligencia
Inteligencia sentiente.
sentiente. Inteligencia
Inteligencia yy realidad.
realidad. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 1991.
1991.
ZAMBRANO,
ZAMBRANO, María. María. Filosofía
Filosofía yy poesía.
poesía. México:
México: Fondo
Fondo de de Cultura
Cultura Económica,
Económica, 1996.1996.
380
380
381
381

viii.
musicalidade,
teatralidade e
arte na educação
382
382
383
383

educare in jazz: otto tratti di una nuova pedagogia

marina santi11

perché educare in jazz?

E ducare in jazz è una metafora che rappresenta insieme una provocazione e


una sfida, ma anche un auspicio, che mette alla prova i confini della
pedagogia tradizionale ed estende gli orizzonti e le aspirazioni del discorso e
della pratica educativa. Esplorare le potenzialità del jazz, concepito non solo come un
genere di musica o l'arte, ma anche come prospettiva che comprende principi, valori,
atteggiamenti e competenze, è fondamentale nel breve termine della nostra vita quotidiana
e nel lungo termine delle risorse per lo sviluppo umano.
Esplorare la metafora del jazz nel discorso educativo e sostenere il jazz come buon
auspicio nella pratica educativa significa accettare anche una sfida teorica importante, in
quanto ciò comporta un ripensamento dell'intero paradigma all'interno del quale i processi
di insegnamento e di apprendimento sono tradizionalmente compresi e proposti. Ma
questa nuova metafora ha il vantaggio di far convergere gli obiettivi dell’azione educativa
verso le “virtù” umanitarie riconosciute dall'UNESCO nel 201122 come proprie del jazz, che
ha promosso nella storia il valore della pace sociale, il potere del dialogo interculturale, la
garanzia della parità di genere e il coraggio della trasgressione creativa. In effetti,
considerare jazz come quadro di riferimento e come risorsa educativa concreta potrebbe
condurre verso una nuova pedagogia della libertà.
Fino ad oggi gli stereotipi sul jazz sono stati un ostacolo per questo impegno
culturale e educativo, in particolare quelli che riconducono a quel jazz non accessibile e
comprensibile immediatamente. Si suppone che il jazz si rivolga ad una élite di fruitori
con un’alta disposizione per la dissonanza e un’audizione diversificata, il che implica che
l'ascoltatore ha bisogno di molta attenzione alla tecnica e alla ricerca sonora, con un
approccio globale alla comprensione del suono. Questo, a sua volta, provoca e insieme fa
scattare schemi e script precedenti, aprendo l'ascoltatore ad una reazione inaspettata di
sorpresa e meraviglia. Tuttavia, questi miti, pur fondati nella cultura jazzistica, saranno
trasformati qui in idee utili e concrete, che si collegano direttamente al jazz come metafora
del dialogo educativo, mettendo in evidenza l'improvvisazione come processo centrale
nella sperimentazione e produzione jazz.

otto tratti jazz per educare in jazz.


Ma quali sono le caratteristiche e dimensioni del jazz che, trasferite e tradotte in
chiave educativa, consentono una trasformazione così radicale dei processi educativi?
Essendo il jazz tutt’altro che univoco nella sua definizione e unisono nel suo
riconoscimento, presentandosi più che come un genere, come un modo di intendere la
musica e il suonare, è piuttosto difficile individuarne dei tratti discriminanti. Eppure, resta
possibile attribuire al jazz elementi propri, irriducibili e distintivi che ne fanno
un’esperienza e tendenza unica seppur multiforme, comunque riconducibile ad una
tradizione. Ho proprio attinto a questa tradizione e alla letteratura critica attualmente
disponibile sul jazz per scegliere le otto principali caratteristiche/dimensioni interessanti e
utili per osservare, attraverso una lente jazzistica l’educazione, in quanto dotate di
particolari potenziali pedagogici e didattici.

11 Università
Università di
di Padova.
Padova. Email:
Email: marina.santi@unipd.it
marina.santi@unipd.it
22 http://www.unesco.org/new/en/jazz-day
http://www.unesco.org/new/en/jazz-day
384|
384| marina
marina santi
santi

1. Innanzitutto (e ovviamente) il jazz è jazzing. Questa prima affermazione suona


come una tautologia e in un certo senso lo è, dal momento che è impossibile definire
un'esperienza composita e complessa come il jazz con alcune qualità del jazzare, inteso
come modo/modalità di fare e generare musica. Ma l'ossimoro resta fecondo proprio per la
molteplicità di significati che vengono attribuiti al "jazzing", riferiti al suo significato
originale nell’etimologia e nello slang del linguaggio nativo. In origine il termine jazz era
un’espressione afro-americana sessualmente colorata e che rimandava metaforicamente
alla copulazione e al liquido seminale. Tuttavia, esso non era solo legato all’azione
meccanica del coito, ma al piacere e più precisamente al piacere di un orgasmo condiviso
(in latino co-ire significa letteralmente "camminare insieme") e alla promessa fruttuosa
connessa all’eiaculazione. Come ha scritto un giornalista australiano nell’anteprima di un
concerto jazz del Tord Gustavsen Trio a Melbourne: "La musica è tutta sul sesso. Riguarda
la tensione e il rilascio, l’ansia e la moderazione, la gratificazione e la generosità, il
controllo e la resa, e tutte le altre forze che si oppongono con delicatezza in un armeggiare
più o meno aggraziato verso l'estasi" (GUSTAVSEN, 2010, p.7, trad. nostra).
Ecco perché jazz e jazzing si riferiscono sia alla intimità dell'anima in una
performance solista che all’intensità delle relazioni in una jam-session. L'erotismo del jazz
è riconoscibile anche nella forma dell’esecuzione musicale che è evidente nelle
performance jazzistiche, che sono chiaramente arricchite dalle tensioni psicofisiche dei
musicisti orientate verso opposizioni dialettiche: momento vs durata; differenza vs
identità; gratificazione vs frustrazione; stabilità
stabilità vs
vs stimolazione;
stimolazione; vicinanza vs distanza
(GUSTAVSEN, 2010). Quando queste opposizioni sono "congelate", il jazzing – inteso
appunto come esperienza del jazzare – è in pericolo; quando invece il dilemma tra gli
opposti crea flussi, il pieno potenziale dinamico della jazzing emerge. Pertanto, non è un
caso che jazz inneschi sempre un processo creativo, o meglio, una dimensione generativa
di condivisione nel fare musica
musica che
che dà
dà origine
origine aa nuove
nuove melodie
melodie ee esperienze
esperienze sonore,
sonore,
plasmando ogni volta qualcosa di originale che modella al contempo chi le dà forma (che,
entrando nella dimensione educativa chiameremmo formatori) per sempre.
Così, si comprende come il significato proprio di jazz, punti più al potenziale
creativo umano che al potere demiurgico degli uomini, in un modo che rimanda ad una
femminilità che da sempre nel jazz viene celebrata e coinvolta. Con questo in mente,
jazzing appare più un modo di essere e di fare legato alla generatività, che la produzione di
un agente individuale. Jazzare significa ravvivare; un agire in cui il vigore, la resistenza e
l'accelerazione umani (tutti termini, questi, che sono evocati nel significato gergale di
jazzing) sono circondati da vitalità e animazione. Di conseguenza, nel jazz la creatività non
è mai onanismo autoreferenziale, ma sempre un divertimento entusiasmante e condiviso.
La dimensione generativa del jazz compare anche nel significato gergale di jazzing
come confusione creativa entro cui si cela un ordine caotico, o un disordine armonico 33, che
è ciò che si intende con l'espressione idiomatica "All that Jazz". Tuttavia, jazzare è
generare – ordine nel caos, disordine nell’armonia, deviazione dalla melodia– ma non è
creare dal nulla. La generatività jazzistica emerge quando le opportunità offerte dal
momento in cui vengono provocate dal ricordo di modelli, che sono intenzionalmente
sfidati dalle infinite alternative di variazione. La variazione - di ritmi, sequenze, catene,
riff o fraseologie - è la tecnica principale che genera innovazione e novità nel jazz, senza
danneggiare la spontaneità. Possiamo anche dire che nel jazz la generatività si trova
esattamente tra tecnica e spontaneità (SANTI, 2010), ed è sempre in perfetto equilibrio tra

33 Vedi
Vedi la
la traduzione
traduzione italiana
italiana del
del volume
volume di
di F.
F. Barrett
Barrett (2012).
(2012).
educare
educare in
in jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia || 385
385

arte e cuore44 (PILC, 2012). Sono proprio il sentimento e l’intuizione spontanei ad


alimentare nuove idee nel jazz, mentre i musicisti stanno dialogando con la loro memoria
di colonne sonore del passato. Ciò significa che la generatività del jazz è saldamente
radicata nella provocazione rispettosa della tradizione.
Questo è ampiamente riconoscibile nel forte impegno verso la ripetizione, la copia
e l’imitazione che si trova al centro della formazione jazz: solo attraverso la ripetizione
ogni musicista può trovare tutto ad un tratto, il proprio suono da suonare, contribuendo
all’improvvisazione del dialogo musicale, in cui composizione, interpretazione ed
esecuzione si mescolano nell'atto di suonare insieme (BENSON, 2003). Ripetere nel jazz
significa appropriarsi del repertorio di base della cultura e della comunità jazzistica, che
vengono poi trasformate, contestate e persino negate per creare neologismi nel vocabolario
jazz.
2. Il jazz è fusion. "Fusion" nella tradizione è un tipo di musica che combina e
mescola elementi dissimili provenienti da generi diversi, come è accaduto negli ultimi
decenni con il pop-rock-funk e jazz. Di fatto molti studiosi concordando nell’affermare
che "tutto il jazz è fusion" (BROWN, 1986). Si può dire, usando la già citata espressione
idiomatica, che la fusione è proprio "All that Jazz". Abbiamo ricordato prima, come il jazz
abbia sempre assorbito le influenze da ogni parte e che l'atto di "fusione" non è limitato ad
un breve periodo della sua storia. Pertanto, siamo in grado di fare riferimento al "Fusion"
come ad un invito generale a fondere stili interculturali, tecniche educative multiple e a
teorie e pratiche alternative. Fusion implica l'abbandono della "purezza", aprendo alla
contaminazione e la promiscuità. Fusion è un processo di mescolamento in cui il prodotto
finale è più della somma delle parti; fa emergere nuove identità in cui la memoria degli
elementi misti è mantenuta nel processo di miscelazione. Tutto il jazz è fusione che
coinvolge artisti nella miscellanea di tutto ciò che amano della musica con cui sono
cresciuti con l'aggiunta di tocchi contemporanei; incorporano timbri e trame di musica
dance elettronica, utilizzando sia pezzi composti che improvvisazioni, non solo per
riflettere sulla tradizione dei vari vocabolari costruiti in oltre 90 anni di storia, ma con la
volontà di incorporare i suoni di oggi in un modo che risponde ugualmente sia alle
aspirazioni artistiche, che alle preoccupazioni commerciali (SHEARN, 2013).
3. Il jazz è free. Porre la libertà tra le peculiarità del jazz può sembrare scelta banale o
comunque non dirimente, ritenendola caratteristica fondamentale di molti generi o
attività musicali. Eppure il “Free Jazz” è una forma unica di musica popolare con forti
radici libertarie e una chiara ispirazione eterodossa. D’altra parte, la funzione generativa
jazzing, di cui abbiamo già parlato, èè strettamente strettamente legata
legata allaalla libertà
libertà interiore
interiore ee
all’eterodossia
all’eterodossia costitutiva
costitutiva del del jazz.
jazz. Naturalmente,
Naturalmente, qui qui non
non intendiamo
intendiamo riferirci
riferirci solo
solo al
al
"Free
"Free Jazz",
Jazz", ovvero
ovvero allo
allo stile
stile di
di musica
musica che
che èè emerso
emerso negli
negli Stati
Stati Uniti
Uniti nelnel corso
corso degli
degli anni
anni
‘50,
‘50, ma
ma alla
alla libertà
libertà come
come condizione
condizione ee linfa
linfa che
che sta
sta alle
alle origini
origini del
del jazz,
jazz, musica
musica natanata come
come
grido
grido di
di liberazione
liberazione degli
degli schiavi
schiavi africani
africani dalle
dalle catene
catene deldel colonialismo.
colonialismo. Analogamente,
Analogamente, le le
catene
catene delle
delle note
note troppo
troppo vincolanti
vincolanti sono
sono state
state infrante.
infrante. LaLa lotta
lotta perper la
la libertà
libertà èè infatti
infatti
riconoscibile
riconoscibile nel nel “Free
“Free Jazz”
Jazz” anche
anche come
come necessità
necessità di
di rompere
rompere le le catene
catene sonore
sonore tradizionali
tradizionali
ee di
di esplorare
esplorare nuove
nuove scalescale armoniche
armoniche ee paesaggi
paesaggi melodici.
melodici. In In questo
questo senso,
senso, jazz
jazz èè
eterodossia
eterodossia –– aspetto
aspetto riconoscibile
riconoscibile nella
nella formazione
formazione jazzjazz tradizionale
tradizionale -- un un ottimo
ottimo antidoto
antidoto
contro
contro l'istruzione
l'istruzione canonica
canonica ee unun potente
potente anticorpo
anticorpo contro
contro lala pedagogia
pedagogia accademica,
accademica, in in cui
cui
l'insegnamento
l'insegnamento ee l'apprendimento
l'apprendimento sono sono ridotti
ridotti alla
alla riproduzione
riproduzione "puro""puro" di di vie
vie classiche
classiche ee la
la
ripetizione
ripetizione dello
dello standard
standard contenuto.
contenuto. Essere
Essere liberi
liberi di
di trasgredire
trasgredire le le regole
regole fissate
fissate non
non vuol
vuol
dire
dire essere
essere totalmente
totalmente liberi
liberi da
da un
un quadro
quadro di di regole
regole ee norme,
norme, ma ma fa fa liberare
liberare ilil sistema
sistema dal
dal

44 L’espressione
L’espressione originale
originale di
di Pilc
Pilc “between
“between art
art and
and heart”
heart” èè sicuramente
sicuramente più
più evocativa
evocativa ee di
di effetto
effetto nel
nel rendere
rendere
lo
lo spazio
spazio della
della generatività
generatività jazzistica.
jazzistica.
386|
386| marina
marina santi
santi

rischio di diventare un dogma, con quadri estetici fissi all'interno di vincoli rigidi e criteri
per giudicare risultati prevedibili.
Come molti musicisti jazz riconoscono della loro esperienza jazzistica, l'anima del
jazz emerge quando il solista e/o il gruppo esperimenta fuori dalla “confort zone”, di agio e
successo assicurato per esplorare altri spazi entro quello che il batterista newyorkese
Jimmy Weinstein chiama un "safe creativity environment" (WEINSTEIN, 2016). Il
paradosso necessario alla creatività jazzistica è quello di essere libera entro un contesto
"safe", cioè protetto più che "a norma di sicurezza". L’ambiente protetto contiene la ricerca,
senza limitarla; apre varchi, senza produrre voragini. La meravigliosa espressione di Steve
Lacy "saltare nel vuoto" rende bene l’idea del coraggio che serve alla creazione, ma anche
dell’ebrezza che accompagna il rischio; è questa la pretesa, per se stesso e per gli altri, che
Miles Davis rinnovava ad ogni esibizione: dover giocare sempre quello che ancora non si
sa. Libero da ciò che sai e libero di conoscere diversamente. Libero significa dunque aperto:
all'esplorazione, alla deviazione, ai rischi, a commettere errori (non ne esistono!
Affermava Davis), e all'incertezza. Libero significa anche fluente, flessibile, plastico e
modificabile: free è ciò che è libero di assumere nuove cornici e quadri di riferimento. La
libertà è anche un'opportunità e un impegno per un pensare e agire “provvisorio”, ma non
casuale, che implicano l'assunzione di responsabilità per i nostri tentativi e di essere liberi
di partecipare all’esplorazione e alla sperimentazione. In questo senso il “Free Jazz” è stato
anche aperto a una vera democrazia nel suonare, dove tutti gli strumenti - non solo quelli a
corde, come ad esempio il pianoforte e la chitarra - possono avere il tempo e lo spazio per
esprimere le loro sonorità e voci, decidendo quando ritirarsi e lasciare opportunità agli
altri. Una democrazia free, che è anche gratuita, non nel senso che non costa niente, ma
che tutti la possono acquisire.
4. Il jazz è swing. Così come per il “Fusion Jazz”, anche con “Swing” di solito ci si
riferisce ad un genere musicale inventato da afro-americani durante 1920, ma qui useremo
il termine come una parola nel vocabolario jazz che lo caratterizza in generale. L'immagine
dell’altalena cui si riferisce il termine swing è essenzialmente giocosa e piena di
divertimento. Viene associata alle dinamiche del libero andirivieni, che richiama
l’esperienza fisica del passare del tempo, il ritmo pendolare e l’alternanza, combinata con il
movimento intenzionale di un corpo e la sua forza. L'intenzione e il desiderio di
“oscillazione” sfugge all'inerzia del “penzolare”, è ciò rende oscillare un tempo e uno
spazio di eccitazione ed entusiasmo. Dondolare è anche un'immagine femminile; un’icona
del piacere istintuale come si percepisce nel vuoto (o gravido) della pancia, più che in una
mente piena. L'enfasi data alle battute in levare è anch’essa connessa al significato di base
dello swing e del suo movimento saltellante. Inoltre, l’altalena sembra coincidere con la
percezione essenziale del ritmo e della sua bontà, mentre lo ascoltiamo nel fare musica. Lo
swing è sia una sorta di intuizione "inconfondibile" in quello che sta succedendo e un
chiaro giudizio sulla qualità del flusso creato dalle voci diverse. Lo swing ci dice che "si sta
giocando" senza mentalismi, eppure include le componenti intellettuali di tale valutazione
(PILC, 2012). E 'emblematica a questo proposito l’affermazione di Duke Ellington "Non
significa niente se non c’è lo swing", titolo di un suo brano del 1931, diventato poi uno
standard. Il significato gergale di swing è ricco e molto interessante dal punto di vista
educativo: suggerisce la dinamicità interna di un processo; ricorda i turni di conversazione;
esprime la tensione dei dilemmi all'interno della dialettica educativa così come in quella
jazz, la cui percezione conferisce potenziale al flusso musicale così come a quello
educativo. Ma la cosa più importante è il bisogno fondamentale di "umanizzazione" del
tempo che lo swing esprime, che si mostra quando - come Marsalis (2008) ha suggerito - i
tempi "diversi" del suono, del soggetto e degli altri diventano "il nostro tempo". Ma questo
è il groove.
educare
educare in
in jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia || 387
387

5. Il jazz è groove. Groove è la traccia a spirale incisa su un disco in vinile che segue
la puntina. In un senso più ampio, è il corso (perché no: il curricolo?) in cui tutti i
suonatori, gli strumenti, le note, i punti e contrappunti, si susseguono e trovano un flusso.
Groove esprime metaforicamente un flusso comune, una direzione condivisa,
un’intenzione e intensione reciproche, raggiunte in quanto ricercate mentre si fa jazz. Il
groove è al centro del processo musicale ed ciò che ci permette di percepire la musica come
un processo e la sua unità globale. Groove è una sensazione positiva che accompagna il
raggiungimento della soddisfazione, senza però ammorbidire la tensione della dialettica.
Nonostante la sua ermeneutica sessuale, il solco è, in fondo, l'ascolto di ciò che viene detto
mentre viene detto. Ma è anche guardare ciò che sta accadendo e decidere all’istante per
garantire che accada, toccando e gustando l'evento con tutti i sensi all'erta. Inoltre, solco
significa condividere sensazioni e azioni che confluiscono in un corso che unisce e produce
sintonia. Il groove contiene componenti intersoggettive e interazionali, che portano ad un
senso intrapersonale di pienezza. Per questo il groove prevede la collaborazione e la
cooperazione, il sostegno reciproco e la creazione di ponti e ponteggi per garantire che ogni
singolo individuo coinvolto senta il flusso e si impegni nella sua fluidità. Il groove si sente,
si trova, si mantiene. Groove è l'espressione e la condizione di ciò che Sawyer (2007)
chiama "il genio del gruppo" e di ciò che Alterhaug mi suggerì in una conversazione,
dicendomi che bisognava "cercare di essere allo stesso tempo con me se stessi e con gli
altri", per lasciare, infine, se stessi dietro, entrando a far parte di qualcosa di più grande; di
ciò Pilc definisce "un'onda musicale" (PILC, 2012).
6. Il jazz è soul. Il “Soul” è un altro modo fare jazz di origine afro-americana,
ispirato al blues e al gospel, per piccoli gruppi di strumenti e teso a far toccare il livello più
profondo di intimità ai musicisti mentre suonano insieme. Ma questo termine evoca e
comprende anche un tratto fondamentale della musica jazz, che bilancia la componente di
disordine e di caos che gli viene associata. Soul sembra, infatti, essere un termine più
adatto al dominio individuale della vita spirituale, con le connotazioni religiose connesse,
che però sfugge ad ogni forma di dogma. Si tratta piuttosto di una forma di conoscenza
pervasa da una componete visionaria e intuitiva, eppure in grado di ispirare un
riconoscimento più autentico e più saggio di sé, della vita e dell'umanità. Soul significa
anche pace, non però come quiete, bensì come uno stato dinamico che viene
continuamente alimentato dall’agire con una disposizione armoniosa verso gli eventi e le
persone verso le quali ci si sente impegnati. La dimensione soul del jazz implica e richiede
sincerità ed è questo ciò che rende il fare jazz un gioco credibile.
7. Il jazz è cool. Raffreddare sembra essere la controparte delle calde e colorate
qualificazioni che vengono attribuite alla musica e all’esperienza jazz; cool è fresco e
rarefatto ed è ciò che ci ricorda che “jazzare” significa anche diminuire, ridurre e togliere
l’eccesso. Nel jazz cool implica alleggerire per raccogliere; placare per liberare. In realtà, il
“Cool Jazz” era nella tradizione uno sviluppo del Free Jazz e i protagonisti di questo
movimento si sono impegnati appunto nella rarefazione del paesaggio sonoro, al fine di
rivelare le linee delicate del discorso melodico.
Le catene e scale armoniche vengono dilatate, ampliate, allargate e stressate così da
creare spazio tra gli strumenti e dare loro il tempo di parlare. L'atmosfera che si crea è
quella dell’alba e del tramonto, quando le ombre sono più lunghe ed i suoni sono più
leggeri. Ciò mantiene l'esperienza fresca, non fredda e capace di aprire un orizzonte di
possibilità.
8. Il jazz è impromptu. Impromptu significa letteralmente, nella sua etimologia
latina, ciò che è imprevisto, estemporaneo, fatto o detto senza una preparazione preventiva
che ne definisca i contorni e contenuti; in una parola improvvisato. Poniamo alla fine il
tratto improvvisativo del jazz, perché, pur basilare, esso in qualche modo richiama e
388|
388| marina
marina santi
santi

riempie tutti gli altri e li orienta verso la performance unica e irripetibile che motiva lo
stesso jazzare; che è poi uguale a quella del vivere. E’ un tratto complesso, che non è
riconoscibile in modo univoco e non dona uniformità al jazz, pur essendo la condizione
che genera l’unisono. Consideriamo l'improvvisazione il tratto jazzistico più difficile da
definire, eppure il più facile da capire. Ognuno di noi è sta, in fondo, sempre
improvvisando; ciò che il jazz fa è solo mettere questa componente evolutiva dell’essere - e
della vita - al centro della propria esistenza.
Possiamo dire che l'improvvisazione è il processo, la procedura e il prodotto
connaturale al jazzing; durante l'improvvisazione, la dimensione genetica incontra e
soddisfa i vincoli ambientali e ha l'opportunità di creare nell’istante "fenomeni musicali"
imprevedibili e irripetibili.
Lungi dall'essere il frutto della spontaneità, la natura dell’improvvisazione è quella
di Giano, il dio romano bifronte: ha le sue radici in modelli e sequenze algoritmici ben
memorizzati ed è nutrita nell’istante dall'istinto, dall'intuizione e dall'ispirazione. Infatti,
"la spontanea improvvisazione musicale nel jazz dipende da una sostanziale impalcatura
cognitiva che permette la generazione in tempo reale delle strutture creative"
(HODGSON, 2006, p.1506). Questo mette in evidenza quanto sia fondamentale
l’"apprendimento" che sta dietro improvvisazione, in quanto si basa sulla dedizione e lo
studio necessario per conoscere i diversi modelli e sulle tecniche di internalizzazione.
Tuttavia, dimostra anche che il virtuosismo non è sufficiente a creare qualcosa di nuovo in
quel momento. L'improvvisazione non è solo una risposta "reattiva" ad un problema,
anche se una buona improvvisazione è sempre una risposta adattativa di successo ad un
cambiamento. In qualche modo, l'improvvisatore adotta anche un approccio “ex-attivo”
all'attività in corso, aprendo se stesso verso la nascita di un'esperienza alternativa e
ritirandosi dal depauperamento della ripetizione e della routine. Il paradosso del processo e
procedimento di improvvisazione è l'importanza che gioca la ripetizione e la routine
all’emergere della creatività. Sebbene improvvisare comporti un approccio e una
disponibilità mentale aperti alla rottura delle routine e delle regole, Johnson-Laird ha
sottolineato che "ci sono molti modi per rompere le regole di qualsiasi genere: quasi tutti
sono poco interessanti ed esteticamente poco attraenti. La genialità ha bisogno di sapere di
più e di avere questa conoscenza in una forma che consenta di controllare la generazione di
nuove idee" (JOHNSON-LAIRD, 1991, apud HODGSON, 2006, p.1506). Il livello a cui
quel "controllo diverso" deve essere vissuto e fatto proprio dall’improvvisatore è difficile da
identificare. Probabilmente durante l'improvvisazione abbiamo diversi livelli di attività e
agentività che richiedono elaborazioni algoritmiche in tempo reale. Ciò rende
l'improvvisazione un processo largamente dipende sia dalla linearità che da eventi
stocastici in cui la capacità dell’improvvisatore di improvvisare nuove melodie che si
adattino alla sequenza di accordi è fondamentale, costosa e basata su una doppia e
simultanea creatività: vale a dire, la creazione di sequenze di accordi per l'improvvisazione
e la creazione di improvvisazioni melodiche in tempo reale (JOHNSON-LAIRD, 2002).
Questa è la descrizione perfetta di come l’improvvisazione assomigli alle principali
funzioni e caratteristiche del cervello umano come multitasking, polimorfismo, plasticità e
modificabilità sistemica, che dovrebbero stare alla base di ogni processo educativo mirato a
potenziare la generatività nello sviluppo umano. Come ha osservato Pilc, quando la
musica incontra la vita reale non si può non essere affascinanti da esempi di 'multitasking
misto', in cui il cervello elabora simultaneamente arte e realtà senza alcuna traccia di
interferenza o di confusione tra i due (PILC, 2012). Quando questo accade durante
l'improvvisazione, la musica che ne esce passa attraverso i musicisti con la minor
resistenza possibile; ma al contempo i musicisti sfidano e cambiano la musica con
sicurezza e fiducia nell’alternativa e nel sostegno dell’ambiente circostante. Inoltre
educare
educare in
in jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia || 389
389

improvvisazione è un'attività multitasking che mette insieme l'attenzione alla personalità


del performer con l’attenzione alla qualità particolare della performance, con la sensibilità ad
una performatività altamente collettiva.
La complessità intellettuale dell'improvvisazione non ne pregiudica la sua
spontaneità, con tutta l’emotività e l'umorismo che essa richiede. Abbiamo già citato la
componente di fiducia necessaria per improvvisare, ma il coraggio, la meraviglia, la
simpatia e l'empatia sono altrettanto fondamentali e devono essere promosse e sostenute,
anche sul piano educativo.
Per quanto riguarda i processi di apprendimento coinvolti nell’improvvisazione,
molti studi si concentrano sul ruolo dei flussi informativi e l'interazione di azione-
apprendimento come l’esito di un’organizzazione che risponde a un ambiente mutevole,
complesso e/o ad una crisi (CHELARIU; JOHNSTON; YOUNG, 2002). Quindi,
l'apprendimento jazz può essere considerato come un processo intercambiabile di
"imparare ad improvvisare" e "improvvisare per imparare", nel quale la deviazione dalla
pratica o dalla conoscenza (ROGERS, 1983) già presente è necessaria, in circostanze
problematiche caratterizzate da incertezza e dinamismo. Si potrebbe addirittura sostenere
che “si impara improvvisando” e che “si improvvisa imparando”.
Considerata in questo modo, siamo in grado di differenziare meglio
l'improvvisazione da altre attività creative. La differenza sembra risiedere proprio nella
prossimità tra la pianificazione e l’agire in un determinato momento che, espresso in
termini musicali, significa la simultaneità tra composizione ed esecuzione. Su questo
punto diversi autori si sono espressi in modo alternativo: mentre Moorman e Miner
(1998a, 1998b) presentano l'improvvisazione come uno stato di pianificazione in cui la
composizione e l'esecuzione convergono nel tempo, Weick (1987) afferma che
nell'improvvisazione la pianificazione strategica e l'azione sono parte integrante l’una
dell’altra. Mintzberg (1994), tuttavia, va oltre, sostenendo che può essere l’azione stessa a
guidare la composizione di un piano e l’improvvisazione è parte integrante della
progettazione e dell’azione.
Inoltre, l'improvvisazione dovrebbe essere considerata sia come un processo sia
collettivo che individuale che emerge da attività multilivello - in cui variano di grado sia i
rapporti che i network (ANDERSON et al, 1994). Anche la multidimensionalità è
considerata come una caratteristica comune delle diverse forme di improvvisazione.
Moorman e Miner (1998b) hanno proposto un modello in cui la novità, la velocità e la
coerenza interna ed esterna sono dimensioni chiave che emergono e interferiscono
reciprocamente durante l'improvvisazione individuale o collettiva. Chelariou et al. (2002)
sottolineano chiaramente che
al
al centro
centro del
del processo
processo didi improvvisazione
improvvisazione c’è c’è l'apprendimento,
l'apprendimento, dal dal momento
momento che che
l'improvvisazione
l'improvvisazione richiede
richiede una
una valutazione
valutazione continua
continua delle
delle attività
attività ee dei
dei risultati
risultati ee
la
la loro
loro modifica,
modifica, se
se necessario.
necessario. L'apprendimento
L'apprendimento èè un un processo
processo cheche coinvolge
coinvolge la la
scoperta,
scoperta, la
la conservazione
conservazione ee la la valorizzazione
valorizzazione delle
delle conoscenze
conoscenze memorizzate.
memorizzate.
Nell'improvvisazione
Nell'improvvisazione l’apprendimento
l’apprendimento è, è, verosimilmente,
verosimilmente, continuo
continuo ee circolare,
circolare, ee
si
si presenta
presenta nell’istante
nell’istante stesso
stesso in
in cui
cui avviene
avviene l’improvvisazione,
l’improvvisazione, venendo
venendo
immediatamente
immediatamente utilizzato
utilizzato come
come parte
parte del
del processo
processo (Ibid.,
(Ibid., p.142).
p.142).

La circolarità emerge quindi come una caratteristica comune sia


all’improvvisazione che all’apprendimento, in quanto "l'improvvisazione è un processo
circolare di apprendimento che avviene attraverso lo spostamento e l'elaborazione delle
informazioni, agendo su quell'apprendimento col risultato di apprendere di più" (ibidem).
Il "di più" che si apprende durante l'improvvisazione corrisponde alla quantità di nuove
conoscenze a disposizione e al suo potenziale trasformativo del nostro comportamento e
agentività (SIMON, 1969). L'apprendimento può anche essere il risultato
390|
390| marina
marina santi
santi

dell’improvvisazione, che implica la scoperta e il mantenimento delle conoscenze


(MOORMAN; MINER, 1998b) o della lezione tratta dall’esperienza improvvisativa, che
entra a far parte della nostra memoria organizzativa (WEICK, 1987). In realtà,
l'improvvisazione può essere vista come una forma di deviazione dalla prassi esistente o la
conoscenza (ROGERS, 1983) che emerge da circostanze problematiche o di esplorazione
con opportunità a breve termine. Pertanto, il riconoscimento degli errori, la sensibilità alla
sfida e la curiosità verso la novità, guidano il comportamento flessibile e il processo
decisionale spontaneo nell’improvvisazione. In poche parole, l'improvvisazione è
"praticare l'ignoto" (PILC, 2012). In quanto processo che rompe volutamente la continuità
con le modalità esistenti di pianificazione esplicite, l’improvvisazione implica anche una
disposizione ad abbandonare la nostra "confort zone", così come si abbandona la
dipendenza dai piani predefiniti e le soluzioni precedentemente testate, facendo i conti con
lo sforzo che comporta pensare "fuori dagli schemi" (MOORMAN; MINER, 1998a).
Come ha osservato Senge (1990), nel contesto dell'improvvisazione,
l'apprendimento può essere adattivo e/o generativo: in entrambi i casi, assumere rischi,
violare norme e mettere in discussione le conoscenze, sembrano essere i componenti di
base, che paradossalmente emergono dalla fiducia nella routine, nella tecnica sicura e nella
memoria di informazioni solide. Così l'improvvisatore è sia un pensatore ingenuo che un
saggio, sia un professionista principiante che un esperto. Questa è l'antinomia che porta
Chelariou et al. (2002) ad affermare che esiste una interdipendenza tra "imparare
l’improvvisare" e "improvvisare l’imparare".

postludio
Gli otto tratti del jazz che abbiamo considerato mostrano in modo più o meno
evidente la loro natura cognitiva complessa, riferibile ad un’idea di cognizione “calda”,
fatta di intuizioni, concetti, decisioni, emozioni e fisicità. Tutte queste componenti
dell’esistenza umana sono oggetto e meta dell’azione educativa e non possono essere
ignorate nelle pratiche di insegnamento e apprendimento sia formali che informali.
Eppure le componenti educative dell’improvvisazione sono tanto evidenti quanto
trascurate nella pedagogia tradizionale, che necessita di essere esaminata in tal senso e
rivisitata in modo ben più dettagliato di quanto sia possibile nell'ambito di questo saggio,
ma che comunque vale la pena di mettere in luce. Se apprendere è improvvisare
imparando e imparare improvvisando, una prima forte implicazione sul jazz come nuova
metafora per l'educazione si va delineando con successo e ci induce a tentare l’analogia con
i tratti di una nuova pedagogia jazz.
Una pedagogia jazzing potrebbe significare semplicemente una pedagogia che dice
"sì", accettando di esplorare un ideale generativo di educazione in cui ciò che conta di più
nell'attività è il modo di plasmare invece della forma predefinita e preordinata da ottenere.
Ciò potrebbe implicare, ad esempio, che non possiamo sapere in anticipo ciò che gli
insegnanti devono sapere, al fine di insegnare; né quello che gli studenti hanno bisogno di
sapere per imparare; che le finalità e i contenuti dell’istruzione emergono dal contesto di
esperienze condivise di pensiero, in cui ciò che è interessante sapere viene generato dal
processo di formazione ed emerge in modo creativo come dimensione comunitaria del
vivere insieme. Le tecniche di insegnamento - con le loro priorità e vincoli - coesistono con
gli interessi pedagogici e gli scopi spontanei, per trovare un nuovo suono per ogni studente
in classe e per la polifonia della classe nel suo insieme.
Una pedagogia fusion, fonde così intenzionalmente diverse teorie, modelli, progetti,
metodologie, strumenti, approcci per l'insegnamento e l'apprendimento, proveniente da
contesti pedagogici e da culture alternativi, cercando nell'educazione interculturale e
inclusiva le opportunità e le condizioni dello sviluppo umano e della crescita personale.
educare
educare in
in jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia || 391
391

Secondo tale determinazione, una pedagogia fusion dovrebbe essere la risposta educativa
per la biopsicosocio-diversità e la complessità (BEN-JOSEF, 2005). Una pedagogia fusion
dice "sì" alle differenze; e dire "yes to the mess" (BARRETT, 2012, tr.it 2013), accogliendo il
disordine armonico, può divenire anche il motto della progettazione didattica e della
leadership educativa, considerando il disordine come un'opportunità per la nascita di
nuove armonie anche nel curricolo.
La condizione per esplorare alternative è la libertà. Una pedagogia free assomiglia
all'aspirazione emancipativa delle origini del jazz e alla disposizione all’heterodoxia e
eteroglossia che rimane alla base della progressione tipica del jazzing. La pedagogia free non è
dunque del tutto riconducibile ad una pedagogia libertaria - già incarnata nella tradizione
dell’educazione popolare da figure come Freire - e nemmeno esclusivamente una
"pedagogia per la libertà" come rintracciabile in molta pedagogia attivista da Freinet a
Manzi, fino a Lodi e Milani. Una pedagogia free incarna soprattutto la libertà di mettere in
discussione i quadri e le tradizioni pedagogiche, impregnate di monologismo
nell’insegnamento e dell’apprendimento, per cambiarli. In un periodo di crisi dei
paradigmi tradizionali com’è quello attuale, questa libertà radicale diventa la condizione
principale dello sviluppo umano. E’ la libertà che rende il maestro ignorante - perché libero
dal sapere - per poter essere ogni volta inventore della sua pratica
pratica educativa
educativa - per non
ridurla al ripetere il programma- e improvvisatore per cogliere l’ebrezza dell’educare proprio
nello spazio e tempo unico e irripetibile
irripetibile della relazione con gli allievi. Allievi che a loro
volta imiteranno in ciò i loro maestri, per superarli55.
Libero non è senza relazioni. Al contrario, la pedagogia swing ricorda ad insegnanti
e studenti, ad educatori ed educandi, che l'educazione e l'istruzione non accadono al di
fuori del dialogo e degli scambi dialogici. E’ esattamente quello Wegerif (2012) ci ha
suggerito con la sua teoria dialogica del pensiero e ciò che il suo quadro di riferimento
propone come antidoto al monologismo, sollecitando il movimento altalenante della
conversazione e del confronto tra voci.
La pedagogia groove aggiunge al dialogismo la polifonia delle voci che creano il
flusso, l'onda in cui una jam-session trova il ritmo comune, che è più della somma dei
monologhi dei singoli musicisti. In termini didattici, trovare il solco potrebbe significare
trovare il “curricolo reale”, il "taglio" più interessante e significativo da dare al flusso
dell’insegnamento tra le molteplici linee di possibili offerte dalle discipline. Le materie e
gli ambiti di conoscenza possono essere considerati come dei "repertori" di modelli
sedimentati nella cultura disponibili e pronti ad essere messi in discussione entro un
insegnamento e apprendimento jazzing. Certo, non è un'impresa facile essere impegnati
continuamente in una jam-crescita volta non a riprodurre standard, bensì a cercare
impromptu. Ha bisogno di interesse, la motivazione, la resistenza e la passione. In una
parola, ha bisogno di un’anima soul.
La pedagogia soul pone l'accento sulla dimensione spirituale della formazione,
considerandola non solo come un processo di conoscenza orientata ad un fine, ma come
un’esperienza di crescita interiore dentro un’impresa condivisa.
Una pedagogia diventa cool quando aspira all’essenziale e in questo si assimila a
molte avanguardie. In realtà "trendy" è un altro significato di "cool" nel linguaggio gergale,
che implica essere proiettati verso il futuro e le nuove tendenze. Lo stile “fresco” di una
pedagogia cool con la scioltezza dei suoi vincoli, facilita i viaggi in territori inesplorati
attrezzati con zaino leggero.
E’ questa l’attrezzatura che serve ad una pedagogia improvvisante, che fonde in
modo mirabile tutte queste caratteristiche insieme, in un tratto sostanziale e multiforme.

55 Si
Si veda,
veda, su
su questo
questo tema,
tema, ilil capitolo
capitolo in
in pubblicazione:
pubblicazione: Kohan,
Kohan, Santi,
Santi, Wozniak
Wozniak (2016).
(2016).
392|
392| marina
marina santi
santi

Tomlinson e Germundson (2007, p.27), confrontando l'insegnamento al jazz, affermano


che:
Anche
Anche l’insegnamento
l’insegnamento fa fa la
la sua
sua musica
musica con
con gli
gli elementi
elementi che
che l’insegnate
l’insegnate ha
ha aa
disposizione,
disposizione, fondendoli
fondendoli inin modo
modo da
da garantire
garantire un
un suono
suono unico,
unico, coinvolgente
coinvolgente ee
memorabile.
memorabile. PerPer far
far questo
questo occorre
occorre riconoscere
riconoscere che
che ci
ci sono
sono diversi
diversi ritmi
ritmi in
in aula.
aula.
Soprattutto,
Soprattutto, l’esigenza
l’esigenza più
più grande
grande dell’insegnamento
dell’insegnamento èè l’improvvisazione.
l’improvvisazione.

La diversità torna di nuovo come l’essenza che accomuna il jazz e l’educazione. Nei
contesti formali come la scuola, un’istruzione jazzlike si traduce in didattica differenziata
in cui ogni attività viene orientata al successo, viene mossa dalla sensibilità ai contesti e si
muove verso ciò che gli studenti trovano veramente importante. Tomlinson (2001, p. 19)
così descrive come buon insegnante dovrebbe assomigliare ad un musicista jazz:
L’improvvisazione
L’improvvisazione si si associa
associa ad
ad un
un elevato
elevato livello
livello di
di competenza
competenza musicale
musicale per
per
consentire
consentire al al musicista
musicista jazz
jazz di
di pensare
pensare siasia dentro
dentro che
che fuori
fuori dagli
dagli schemi.
schemi. IlIl
musicista
musicista jazz
jazz ha
ha ilil quadro
quadro generale,
generale, mama può
può aggiungere
aggiungere nuove
nuove note,
note, cambiare
cambiare ilil
tempo,
tempo, fare
fare un
un passo
passo indietro
indietro per
per consentire
consentire al al solista
solista di
di avere
avere ii riflettori
riflettori su
su di
di sé,
sé,
oo farsi
farsi avanti
avanti per
per diventare
diventare ilil solista
solista sotto
sotto ii riflettori.
riflettori.

Il curricolo stesso diventa un'opportunità per creare nuove melodie in aula,


armonizzando le suggestioni derivanti dai contenuti disciplinari con la smania a mettere
in discussione la conoscenza. Di conseguenza, "l'insegnamento diventa un'arte quando
l'insegnante è colpito dal potere che ha il curricolo di nobilitare una vita e dal bisogno degli
studenti di quella dignità" (ibid., p. 29). In particolare, ciò di cui il maestro ha bisogno e che
rivela all'interno di una prospettiva di apprendimento basato sulla ricerca, è la capacità di
modulare le attività in corso nell’aula con le competenze professionali e le tecniche che ha
acquisito nella sua formazione professionale, improvvisando atti didattici in cui sono
coinvolte molteplici strutture pedagogiche e disciplinari nella gestione nel momento
(TOCHON, 1993).

Che dire, dunque, se non “Largo al jazz!”

riferimenti
ANDERSON,
ANDERSON, James;James; HAKANSSON,
HAKANSSON, Håkan; Håkan; JOHANSSON,
JOHANSSON, Jan. Jan. Dyadic
Dyadic business
business
relationships
relationships within
within aa business
business network
network context.
context. Journal
Journal of
of Marketing,
Marketing, v. v. 58,
58, p.1-5,
p.1-5, Oct.
Oct. 1994.
1994.
BARRETT,
BARRETT, Frank.
Frank. Yes
Yes to to the
the Mess.
Mess. Surprising
Surprising Leadership
Leadership Lessons
Lessons from
from Jazz,
Jazz, 2012.
2012. Tr.
Tr. It.
It. Disordine
Disordine
armonico.
armonico. Milano:
Milano: Egea,
Egea, 2013.
2013.
BEN-JOSEF,
BEN-JOSEF, Elite.
Elite. A
A Pedagogy
Pedagogy of of fusion.
fusion. AnAn educational
educational response
response toto diversity
diversity andand complexity.
complexity.
International
International Journal
Journal of of Diversity
Diversity in in Organisations,
Organisations, Communities
Communities and and Nations,
Nations, v.5,
v.5, n.
n. 5,
5,
2005/2006.
2005/2006.
BENSON,
BENSON, Bruce.
Bruce. E.
E. The
The Improvisation
Improvisation of of Musical
Musical Dialogue.
Dialogue. AA Phenomenology
Phenomenology of of Music.
Music. Cambridge:
Cambridge:
Cambridge
Cambridge University
University Press,
Press, 2003.
2003.
CHELARIU,
CHELARIU, Cristian;
Cristian; JOHNSTON,
JOHNSTON, Wesley. Wesley. J;J; YOUNG,
YOUNG, Louise.Louise. Learning
Learning to to improvise,
improvise,
improvising
improvising toto learn.
learn. AA process
process ofof responding
responding to
to complex
complex environments.
environments. Journal
Journal ofof Business
Business
Research,
Research, v.55,
v.55, issue
issue 2,
2, p.141-147,
p.141-147, 2002.
2002.
GUSTAVSEN,
GUSTAVSEN, Tord. Tord. The The dialectical
dialectical eroticism
eroticism of
of improvisation.
improvisation. In:In: SANTI,
SANTI, MarinaMarina (Ed.).
(Ed.).
Improvisation.
Improvisation. Between
Between technique
technique andand spontaneity.
spontaneity. New
New Castle:
Castle: Cambridge
Cambridge ScholarsScholars
Publishing,
Publishing, 2010.
2010.
KOHAN,
KOHAN, Walter
Walter O;
O; SANTI,
SANTI, Marina;
Marina; WOSNIAK,
WOSNIAK, JasonJason T.
T. Philosophy
Philosophy for for Teachers.
Teachers. Between
Between
ignorance,
ignorance, invention
invention and and improvisation.
improvisation. In:
In: GREGORY,
GREGORY, Maughn Maughn R; R; HAYNES,
HAYNES, Joanna; Joanna;
MURRIS,
MURRIS, KarinKarin (eds).
(eds). The
The Routledge
Routledge International
International Handbook
Handbook of of Philosophy
Philosophy for for Children.
Children.
Rotterdam:
Rotterdam: Routledge,
Routledge, 2016.2016.
educare
educare in
in jazz:
jazz: otto
otto tratti
tratti di
di una
una nuova
nuova pedagogia
pedagogia || 393
393

JOHNSON-LAIRD,
JOHNSON-LAIRD, Philip Philip N. N. Jazz
Jazz improvisation:
improvisation: A A theory
theory at at the
the computational
computational level. level. In:
In:
HOWELL,
HOWELL, Peter; Peter; WEST,
WEST, Robert;
Robert; CROSS,
CROSS, Ian Ian (eds.).
(eds.). Representing
Representing musical
musical structure.
structure. San
San
Diego:
Diego: Academic,
Academic, 1991.1991.
______.
______. How
How Jazz
Jazz musicians
musicians improvise.
improvise. Music
Music Perception,
Perception, v.19,
v.19, n.
n. 3,
3, p.415-442,
p.415-442, 2002.
2002.
MARSALIS,
MARSALIS, Wyntron.Wyntron. Moving
Moving to to the
the higher
higher ground.
ground. How
How Jazz Jazz can
can change
change your
your life.
life. New
New York:
York:
Random
Random House,
House, 2008.
2008.
MINTZBERG,
MINTZBERG, Henry. Henry. TheThe rise
rise and
and fall
fall of
of strategic
strategic planning.
planning. New
New York:
York: Free
Free Press,
Press, 1994.
1994.
MOORMAN,
MOORMAN, Christine;Christine; MINER,
MINER, Anne Anne S. S. Organizational
Organizational improvisation
improvisation and and organizational
organizational
memory.
memory. Academy
Academy of of Management
Management Review,
Review, nº23,
nº23, October,
October, 1998,
1998, p.698-72.
p.698-72.
______.
______. “The
“The convergence
convergence of of planning
planning and and execution:
execution: improvisation
improvisation in in new
new product
product development”.
development”.
Journal
Journal of
of Market,
Market, v. v. 62,
62, n.
n. 3,
3, p.1-20l,
p.1-20l, July,
July, 1998.
1998.
PILC,
PILC, Jean-Michel.
Jean-Michel. It’s It’s about
about Music.
Music. ArtArt andand heart
heart ofof improvisation.
improvisation. Montrose
Montrose CA: CA: Glenn
Glenn Lyon
Lyon
Books,
Books, 2012.
2012.
ROGERS,
ROGERS, Everett.
Everett. The
The diffusion
diffusion of of innovation.
innovation. NewNew York:
York: Free
Free Press,
Press, 1983.
1983.
SANTI,
SANTI, Marina;
Marina; ILLETTERATI,
ILLETTERATI, Luca. Luca. Improvisation.
Improvisation. Between
Between performance
performance art art and
and lifeworld.
lifeworld.
In:
In: SANTI,
SANTI, Marina.
Marina. Improvisation.
Improvisation. Between
Between technique
technique and and spontaneity.
spontaneity. New New Castle:
Castle:
Cambridge
Cambridge Scholars
Scholars Publishing,
Publishing, 2010.
2010.
SANTI,
SANTI, Marina
Marina (ed.).
(ed.). Improvisation.
Improvisation. Between
Between technique
technique and
and spontaneity.
spontaneity. NewNew Castle:
Castle: Cambridge
Cambridge
Scholars
Scholars Publishing,
Publishing, 2010.2010.
TOMLINSON,
TOMLINSON, Carol. Carol. HowHow to to differentiate
differentiate instruction
instruction in in mixed
mixed ability
ability classroom.
classroom. 22ndnd
edition,
edition,
Alexandria
Alexandria VA: VA: ASCD,
ASCD, 2001. 2001.
TOMLINSON,
TOMLINSON, Carol; Carol; GERMUNDSON,
GERMUNDSON, Aamy. Aamy. Teaching
Teaching as as Jazz.
Jazz. Educational
Educational Leadership,
Leadership, v.v. 64,
64,
n.
n. 8,
8, p.27-31,
p.27-31, May,
May, 2007.
2007.
WEGERIF,
WEGERIF, Rupert.
Rupert. TwoTwo models
models of of reason
reason in in education.
education. TheThe School
School Field,
Field, v.
v. 9,
9, n.
n. 3-4,
3-4, p.77-107,
p.77-107, 1999.
1999.
______.
______. Towards
Towards aa dialogic
dialogic theory
theory of of how
how children
children learn
learn to
to think.
think. Thinking
Thinking Skills
Skills and
and Creativity,
Creativity, v.
v. 6,
6,
n.
n. 3,
3, p.179-190,
p.179-190,
WEICK,
WEICK, Karl Karl E.
E. Substitutes
Substitutes for for strategy.
strategy. In: In: TEECE,
TEECE, David
David K. K. J.
J. (ed.).
(ed.). The
The competitive
competitive challenge:
challenge:
strategies
strategies for
for industrial
industrial innovation
innovation andand renewal.
renewal. New
New York:
York: Harper
Harper & & Row,
Row, 1987,
1987, p.221-233.
p.221-233.
WEINSTEIN,
WEINSTEIN, Jimmy. Jimmy. A A safe
safe creativity
creativity environment.
environment. In: In: SANTI,
SANTI, Marina;
Marina; ZORZI,
ZORZI, Eleonora.
Eleonora.
(eds.).
(eds.). Education
Education asas Jazz.
Jazz. Interdisciplinary
Interdisciplinary sketches
sketches on
on aa new
new metaphor.
metaphor. NewNew Castle:
Castle: Cambridge
Cambridge
Scholars
Scholars Publishing,
Publishing, 2016.2016.
394
394
395
395

música, pensamento e educação musical menor

pablo de vargas guimarães11

prelúdio de um futuro quase esquecido

E m 2008, a Lei nº 11.769/08 trouxe à cena educacional brasileira a


especificação da música como ‘conteúdo obrigatório’ do ensino da arte na
educação básica. Mesmo sem deixar claro o que poderia ser o referido
conteúdo ou sem afirmar a exigência de uma formação específica para o professor de
música, a lei despertou em educadores brasileiros a esperança da garantia de um espaço-
tempo “legítimo”, de um território musical escolar bem definido como lugar de direito em
projetos político-pedagógicos.
Por certo a exigência legal da inclusão do conteúdo música, nos currículos escolares,
implica a ampliação e consolidação da formação específica (musical) para o professor de
música, e abre espaço a novas interrogações se. Quem forma e como deve ser formado o
professor de música? Como pensar a reestruturação dos cursos de licenciatura para
habilitar o profissional que assumiria as funções de professor na educação básica? Como
atender às cidades afastadas dos grandes centros urbanos, muitas vezes a centenas de
quilômetros do curso de música mais próximo credenciado pelo MEC?
Pelo menos no Estado do Rio de Janeiro, dos sete cursos de licenciatura em música,
com o citado credenciamento, cinco encontram-se na capital do estado e região
metropolitana, sendo que somente os da UFRJ e da UNIRIO são públicos. As duas
licenciaturas fora da capital, e pertencentes à rede privada, estão localizadas em Barra
Mansa, na Região do Médio Paraíba, e em Nova Friburgo, na Região Serrana. Só para dar
um exemplo de como esse quadro não dá conta de atender às demandas do interior do
Estado, para que alguém da Região do Noroeste Fluminense possa seguir um curso privado
de licenciatura em música, precisará viajar mais de 100 km. Caso não tenha condições de
pagar por um curso universitário, e opte por uma das duas instituições federais, o
deslocamento aumentará para mais de 250 km, mas o interessado precisará arcar com
despesas de passagem e hospedagem. Esse é um dos motivos pelos quais os cursos a
distância têm, infelizmente, se mostrado em alguns casos como a única solução possível.
Como afirma Gohn (2010), algumas especificidades de um curso de música, tais como a
atenção exclusiva do mestre, face a face, ou a possibilidade de contatos síncronos com
audição em tempo real, não são típicas dos cursos a distância, planejados para grandes
grupos e com materiais previamente preparados.
A fim de acabar com essas distâncias físicas e simbólicas, o governo adotou, o
caminho mais fácil e curto, vetando, junto à sanção da Lei 11.769/08, o 2º artigo que previa
“formação específica na área”. Assim como o texto legal, os argumentos usados para
justificar o veto, presentes na “Mensagem noo 622”, (razões do veto), também podem ser
encontrados em rede. Logo na primeira leitura é possível identificar uma série de
contradições. De um lado, afirma não se ter certeza sobre o que seja “formação específica
na área”, por outro, aponta com clareza qual seria ela, argumentando que diversos músicos
reconhecidos nacionalmente – enquanto artistas – que não possuam essa formação,
chamada pelo relator de “acadêmica ou oficial”, “estariam impossibilitados de ministrar tal
conteúdo”. Ora, como bem sustenta Maura Penna (2007), “[...] ‘não basta tocar’ para se
capacitar como professor, especialmente diante dos desafios da escola regular de educação
básica.”. Retoma-se o dilema qualidade/quantidade no ensino da música: como garantir a

11 Universidade
Universidade Federal
Federal Fluminense
Fluminense –– UFF.
UFF. Email:
Email: pablodvg@gmail.com
pablodvg@gmail.com
396|
396| pablo
pablo de
de vargas
vargas guimarães
guimarães

qualidade da formação numa velocidade que atenda à urgência de profissionais para


atuarem na educação básica? Como pensar o ensino da música e quais os limites e
possibilidades para se ensinar e aprender música na escola?
A falta da formação específica em música pode levar a concepções estereotipadas a
respeito do que seja música, ensino de música e de qual seria a importância da música na
educação básica. Além disso, muitas vezes, a pouca afinidade desses professores com a
experiência musical, acaba restringindo as atividades ditas ‘musicais’ à linguagem verbal,
ao conteúdo temático de letras de canções “aprendidas” em sala. Talvez fosse consequente
perguntar qual compreensão de educação musical estaria sendo suposta pela lei e quais
especificidades de formação profissional seriam requeridas a essa educação.
As reflexões acadêmicas em música e educação sobre os rumos do ensino da música
dissonam das práticas voltadas para a mera reprodução de modelos, baseadas em uma
tradição pedagógica com forte ênfase na cópia, na repetição e na memorização. Ainda hoje,
as atividades musicais, ou melhor, “musicadas” observadas na escola têm no canto
memorizado e gesticulado (FUKS, 1991a; 1991b) seu maior representante, com predomínio
na educação infantil. Como alternativa ou substituição a essas atividades são pensadas
propostas de ensino ou de musicalização mais propriamente musicais da música. Passar
pelo problema do musical seria se aproximar do pensamento. Não de um pensar sobre
música, mas da música como uma das formas do pensamento, ou seja, da própria criação
musical.

entre atividades “musicadas” e práticas musicais na escola


O que se pretende quando se pensa na escolarização da música? Quando a presença
da música na escola é desejada ou exigida, o que nos leva a reivindicar, a pedir por algo que
não tem uma definição clara e é até mesmo bastante vago e abstrato? A expressão “música
na escola” é por demais abrangente e pode ser interpretada de diversas maneiras. Ela pode
se referir à presença da música simplesmente enquanto atividades “musicadas” que
permeiam o cotidiano escolar, em especial na educação infantil. A prática do canto tanto
com a intensão de disciplinar como para auxiliar ou facilitar a apreensão do que se quer
transmitir ao aluno é uma dessas possíveis atividades. “Ensina-se”, por exemplo, os nomes
das cores, das partes do corpo ou então algo com conteúdo cívico ou ambiental. A essas
práticas eu chamo de atividades “musicadas” pelo fato de a música servir apenas de
pretexto, de fundo, de acompanhamento para um objetivo outro, extrínseco a suas
especificidades. O foco não está na música, no fazer musical, na exploração sonora, e sim
na mensagem da letra. Musica-se assim o comando a ser obedecido, o conteúdo a ser
transmitido. Desse tipo de prática também fazem parte as montagens teatrais
coreografadas de fim de ano e as contações de histórias que muitas vezes usam a música
como trilha sonora, a fim de ambientar ou ressaltar os diversos climas sugeridos pelas
tramas encenadas ou narradas.
Diferente dessas atividades “musicadas”, seriam as práticas “musicais”, dando um
outro caráter ao adjetivo musical. Da simplificação de atividades que apenas utiliza a
música com função coadjuvante, de acompanhamento, a práticas que de fato a colocam no
centro do trabalho, dando ênfase à criação musical, à exploração sonora, à escuta atenta
tanto de obras as mais variadas – tonais, modais, não-tonais – de diversas partes do
mundo, como também dos ruídos, materiais sonoros que nos envolvem diariamente.
A expressão “música na escola” poderia ainda se referir a uma disciplina música,
uma “aula de música”. Neste caso teríamos muitas outras possibilidades de interpretação.
Poderia ser entendida como aula de teoria musical, de história da música, de musicalização
(com flauta doce ou com instrumentos de percussão), canto coral etc. Isso tudo em uma
concepção bastante tradicionalista de aula de música, situando-a dentro dos estriamentos
música,
música, pensamento
pensamento ee educação
educação musical
musical menor
menor || 397
397

de uma grade curricular. Uma outra maneira de pensar a aula de música seria conceber
uma aula-música: liberação ou alisamento da segmentação imposta pela organização
temporal do quadro de horários. “Linhas de fuga” operadas de modo a evidenciar as
sonoridades e decorrentes musicalidades que se atualizam constantemente no espaço-
tempo escolar.
Talvez a pergunta "a música deve voltar à escola?" merecesse ser problematizada de
modo a não permanecer refém de uma polaridade simples entre afirmação e negação. Até
porque sobre essa 'volta' da música, cabe uma constatação importante, como observa
Penna (2002) e Santos (2005; 2010) e Santos et al. (2012): a música nunca esteve fora da
escola, principalmente enquanto prática ou técnica disciplinar. Talvez ela tenha saído da
grade curricular enquanto disciplina e deixado de ocupar um período ou espaço bem
definido no quadro de horários. Mas quanto a essa demarcação disciplinar, a lei também
não poderá garantir uma mudança significativa, uma vez que não é da criação de uma
disciplina denominada música que ela trata. Portanto, um primeiro movimento para a
reformulação do questionamento acima poderia ser a criação de um espaço entre música e
escola, um terreno propício à pergunta pelos sentidos a construir desde o interior da
relação música-escola. Perguntar “para que música na escola?” já permite tomar distância
da disjuntiva sim-não à qual a pergunta acima constrange; "que se quer com música na
escola?". Ou talvez a pergunta que Nietzsche faria e que para mim parece mais potente:
"que quer quem quer música na escola?".
Só então passaríamos a questões sobre como fazer ou em que momento fazer o que
se deseja ou pretende. Não quero com isso dizer que apenas uma resposta é desejável e
muito menos que somente a última pergunta seria capaz de conduzir a resultados que eu,
pessoalmente, consideraria desejáveis ou transformadores. Pelo contrário, entendo que há
muitas maneiras de encaminhar possíveis respostas para um tal problema e, por este
motivo, omiti intencionalmente o artigo definido antes do interrogativo “que”. Seria,
talvez, necessário um mapeamento dos objetivos inerentes aos discursos dos que
reivindicam a escolarização da música para que se possa fortalecer ou fundamentar melhor
os argumentos em sua defesa, evitando assim sua desvalorização ou banalização.

música na escola: argumentos extrínsecos e argumentos intrínsecos


É comum ler e ouvir do campo da educação musical um certo discurso da utilidade.
Isso ocorre por um certo viés cientificista, como se houvesse a necessidade de se justificar
“cientificamente” a inclusão da música no currículo escolar: são citadas pesquisas que
pretendem comprovar os benefícios da aprendizagem musical para a “formação integral”
da criança ou do auxílio no aprendizado de outras disciplinas como a matemática, por
exemplo (frações e operações básicas como multiplicação ou divisão). Ressalta-se, ainda, a
importância da música para o desenvolvimento cognitivo e psicomotor, bem como para o
aprimoramento da memória e da capacidade de concentração. Por outro, afirma-se que a
presença das artes na escola - através de uma abordagem frequentemente chamada de
contextualista - contribui, por exemplo, para o resgate e preservação do ‘patrimônio
cultural nacional’ (ou da humanidade), para o reconhecimento da diversidade cultural, ou
ainda para campanhas de combate ao preconceito e à intolerância, e para a promoção da
inclusão social.
O início do Manifesto pela implantação do ensino de música nas escolas, elaborado em
2006, a partir do Grupo de Trabalho formado por professores de grande visibilidade no
cenário musical-acadêmico brasileiro, ilustra bem esse tipo de discurso de fundo
utilitarista-cientificista:
Estudos
Estudos ee pesquisas
pesquisas mostram
mostram queque aa aprendizagem
aprendizagem musical
musical contribui
contribui para
para oo
desenvolvimento
desenvolvimento cognitivo,
cognitivo, psicomotor,
psicomotor, emocional
emocional ee afetivo
afetivo e,
e, principalmente,
principalmente,
398|
398| pablo
pablo de
de vargas
vargas guimarães
guimarães

para
para aa construção
construção de
de valores
valores pessoais
pessoais ee sociais
sociais de
de crianças
crianças ee jovens.
jovens. A
A educação
educação
musical
musical escolar
escolar não
não visa
visa aa formação
formação do do músico
músico profissional,
profissional, mas
mas oo acesso
acesso àà
compreensão
compreensão da da diversidade
diversidade de
de práticas
práticas ee de
de manifestações
manifestações musicais
musicais da
da nossa
nossa
cultura
cultura bem
bem como
como dede culturas
culturas mais
mais distantes
distantes (apud
(apud FIGUEIREDO,
FIGUEIREDO, 2007, 2007, p.
p. 36-
36-
37).
37).

Esses argumentos extrínsecos à música adquirem um caráter paradoxal. Ainda que


busquem defender a importância da música na escola, de certo modo contribuem para sua
desvalorização. Aduzem, como justificativa, objetivos que não dependem diretamente da
aprendizagem musical para serem alcançados. Além disso, deixa entender que a presença
da música no currículo só fará sentido quando respaldada por motivos extrínsecos
considerados mais importantes que ela própria. Retiram, assim, do foco central das
práticas musicais o desenvolvimento do potencial musical, colocando em segundo ou
nenhum plano o compromisso com a criação ou com o pensamento musical, com o fazer
musical decorrente de uma concepção artística não-objetivista, imaterial. Como escreve
Santos,
[...]
[...] aa música
música na na escola
escola deve
deve contribuir
contribuir para
para oo desenvolvimento
desenvolvimento do do potencial
potencial
musical
musical dede que
que todo
todo sujeito
sujeito éé capaz.
capaz. Música
Música nana escola
escola deve
deve servir
servir para
para isso.
isso. Essa
Essa
tese
tese tem
tem uma
uma dupla
dupla remissão:
remissão: trata-se
trata-se de
de compreender
compreender música
música como
como uma
uma forma
forma
de
de pensamento;
pensamento; ee de de compreender
compreender os os processos
processos pedagógicos
pedagógicos disparados
disparados por
por aquilo
aquilo
que
que "desafia
"desafia ee faz
faz pensar.
pensar. (SANTOS,
(SANTOS, 2010, 2010, p.8)
p.8)

Segundo Nita Temmerman (1991), os argumentos extrínsecos, como forma de


justificar a importância da música na educação, são bem mais antigos que os intrínsecos.
De fato, desde a antiguidade, seja na Grécia, na China ou na Índia, justificativas de caráter
extrínseco dominaram os discursos sobre o papel da música na sociedade. O etos da música
para os gregos a tornava capaz de influenciar as emoções e os comportamentos de quem a
ouvia. No livro segundo de As Leis de Platão (1951, Les Lois, p. 655-657), o estrangeiro
ateniense desenvolve toda uma argumentação para defender que a música tem o poder de
agir sobre as virtudes dos jovens. A educação musical dos poetas deveria então
acompanhar o que as leis considerariam virtuoso e não simplesmente o que agradaria aos
educadores. O caráter extrínseco desses valores está em vincular a música à
responsabilidade social para se formar bons cidadãos. Na idade média, pela forte relação
entre educação e igreja, a função extrínseca da música consistia basicamente em aproximar
o homem de Deus. Temmerman faz ainda um balanço dos principais fundamentos
extrínsecos da educação musical, passando pelo renascimento, até chegar em finais da
década de 1950 com a publicação de Basic concepts in music education (1958), considerado pela
autora um marco na mudança de concepção e na argumentação sobre a importância da
educação musical, principalmente com o capítulo de Allen Perdue Britton (1958). Com essa
obra nasce o que poderia ser chamado, segundo Temmerman, de filosofia intrínseca da
educação musical, frequentemente denominada educação estética. Vale citar um trecho do
capítulo de Britton a fim de ilustrar sua aversão às justificativas extrínsecas para a
educação musical:
Embora
Embora nãonão se
se possa
possa negar
negar os
os valores
valores extrínsecos
extrínsecos das
das atividades
atividades musicais,
musicais, ou
ou de
de
qualquer
qualquer outra
outra atividade
atividade artística,
artística, oo problema
problema da da concepção
concepção de de Platão,
Platão, ee daqueles
daqueles
que
que oo seguem,
seguem, está
está no
no fato
fato de
de ser
ser uma
uma concepção
concepção que
que nono fundo
fundo deprecia
deprecia aa música
música
ee outras
outras formas
formas de de arte.
arte. Argumentos
Argumentos como como esses
esses jamais
jamais soam
soam verdadeiros,
verdadeiros, não
não
convencem,
convencem, ee aa música
música permanece
permanece injustificada.
injustificada. Os
Os valores
valores sociais
sociais alcançados
alcançados
através
através da
da participação
participação de de uma
uma banda
banda escolar
escolar poderiam
poderiam facilmente
facilmente serser alcançados
alcançados
em
em várias
várias outras
outras atividades
atividades emem grupo
grupo (BRITTON,
(BRITTON, 1958, 1958, p.
p. 195).
195).

O que considero mais relevante nesse tipo de abordagem da educação musical, é o


esforço de resgate dos valores intrínsecos da música; da promoção da música por ela
música,
música, pensamento
pensamento ee educação
educação musical
musical menor
menor || 399
399

mesma, entendendo que não são necessários argumentos extrínsecos para justificar sua
importância. A filosofia intrínseca vai além do ensino teórico e instrumental, exigindo
uma "completa imersão na música, suas combinações sonoras, forma e desenvolvimento."
(TEMMERMAN, 1991, p. 152). O interessante da consideração de Britton é que ela não
exclui ou nega os valores extrínsecos mas busca deslocar o foco principal para os
intrínsecos. O que está em questão aqui é a prioridade dada às especificidades da música.
A perspectiva intrínseca se aproxima em parte da que o arte-educador Vincent
Lanier (2002) chamou de “essencialista” em seu texto Devolvendo a arte à arte-educação,
originalmente publicado em 1984. Ao contrário da concepção “contextualista”, que justifica
a importância da arte via argumentos chamados pelo autor de extra-artísticos, a postura
“essencialista” sugere que se redirecione o foco da arte-educação para referenciais
prioritariamente estéticos e artísticos. Mas assim como Britton, Lanier não nega ou omite
que a arte possa ajudar a “tornar alguém melhor” e, não sem ironia, escreve que não há:
[...]
[...] nenhuma
nenhuma razão razão constrangedora
constrangedora que que nos
nos faça
faça duvidar
duvidar ouou negar
negar queque asas
atividades
atividades de de arte
arte na
na sala
sala de
de aula
aula possam
possam promover
promover crescimentos
crescimentos pessoais
pessoais
independente
independente do do valor
valor ou
ou da
da resposta
resposta estética.
estética. Talvez
Talvez aa arte
arte possa
possa tornar
tornar alguém
alguém
mais
mais criativo
criativo em
em geral
geral (o
(o que
que quer
quer que
que isso
isso queira
queira dizer).
dizer). Talvez
Talvez possa
possa fazê-lo
fazê-lo
perceber
perceber seuseu contexto
contexto físico
físico ou
ou social
social mais
mais objetivamente.
objetivamente. Talvez
Talvez possa
possa ajuda-lo
ajuda-lo aa
resolver
resolver suassuas inadequações
inadequações emocionais,
emocionais, aumentar
aumentar seu seu QI,
QI, enriquecer
enriquecer sua sua
aposentadoria
aposentadoria ou ou promover
promover aa pazpaz mundial
mundial ee aa boa
boa vontade
vontade entre
entre osos homens.
homens. O O
ponto
ponto sobre
sobre oo qual
qual queremos
queremos insistir
insistir éé que
que todos
todos esses
esses outros
outros aspectos
aspectos do do
crescimento
crescimento individual
individual nãonão são
são ouou não
não deveriam
deveriam ser ser oo principal
principal foco
foco para
para oo
professor
professor de de artes
artes plásticas:
plásticas: que
que aa sua
sua principal
principal referência
referência deveria
deveria ser
ser oo progresso
progresso
no
no domínio
domínio dosdos procedimentos
procedimentos estético-visuais.
estético-visuais. Se Se outros
outros benefícios
benefícios colaterais
colaterais
resultam
resultam dasdas atividades
atividades dede arte,
arte, tanto
tanto melhor.
melhor. Se,
Se, no
no entanto,
entanto, eles
eles não
não ocorrem,
ocorrem, oo
papel
papel educacional
educacional da da arte
arte não
não terá
terá sido
sido traído
traído –– contanto
contanto que
que oo crescimento
crescimento das das
capacidades
capacidades estético-visuais
estético-visuais tenha
tenha sese efetuado
efetuado (LANIER,
(LANIER, 2002,
2002, p.
p. 45).
45).

Esse embate de “essencialistas versus contextualistas” é relembrado por Célia Maria


de Castro Almeida (2004) que procurou se situar, de alguma maneira, entre as duas
perspectivas. Almeida sustenta em parte a posição de Lanier, para quem a preocupação do
ensino de arte deveria estar no desenvolvimento de habilidades, conhecimentos e valores
artísticos, mas acrescenta a essa concepção algumas ideias contextualistas de Elliot Eisner
relacionadas ao desenvolvimento da auto-estima, da autonomia, do sentimento de empatia
etc. Nesse sentido, a arte-educação não “excluiria” os aspectos intrínsecos mas também
continuaria a manter no centro da atenção o que Lanier chama de responsabilidade social
ou de aspectos do crescimento individual. Em sua análise, levando o mesmo embate para a
área de educação musical, Penna (2006; 2012) faz menção à teoria da curvatura da vara,
considerando que a postura essencialista da arte pela arte (ou da música pela música)
poderia ser entendida como necessária para se chegar a um caminho intermediário. Busca-
se então um distanciamento da mera oposição a fim de se chegar a um diálogo que leve em
conta a diversidade de perfis, enfoques, contribuições e experiências.

música como forma do pensamento


Em O que é a filosofia, Deleuze e Guattari (1991) consideram a arte uma das três
grandes formas do pensamento. As outras duas seriam a ciência e a filosofia, cada qual
opera por meio de dois tipos de multiplicidades de naturezas distintas, respectivamente,
funções e conceitos. A arte seria uma forma de pensar por afetos e perceptos que formam o
bloco de sensações. Enquanto o filósofo é um criador de conceitos, o artista cria, inventa
um compósito de afetos e perceptos. “A arte é a linguagem das sensações” (Ibid, p.166), seja
ela feita de palavras (literatura), cores (pintura), sons (música) ou pedras (escultura). O
artista, com seus materiais, pinta, esculpe, compõe e escreve sensações com sensações
400|
400| pablo
pablo de
de vargas
vargas guimarães
guimarães

desde sensações. Mas as sensações, tal como os afetos e os perceptos, são seres que têm
vida própria, existem em si, são autossuficientes, não dependem do homem, do espectador
ou do ouvinte para se conservar. Consequentemente, são independentes das percepções e
dos sentimentos humanos que “remeteriam a um objeto (referência): se se assemelham a
alguma coisa, é uma semelhança produzida por seus próprios meios, e o sorriso na tela é
somente feito de cores, traços, sombra e luz” (DELEUZE, 1991, p.156).
Essas três formas de pensamento podem interagir, mas sem síntese. Uma não
substitui ou diminui a outra. Quem faz arte não está fazendo filosofia ou ciência. Da
mesma forma, a filosofia como criação de conceitos não é, pelo menos em um plano
prioritário, um pensar por sensações. Mesmo a arte conceitual e a arte abstrata, tentativas
de aproximar arte e filosofia, não tomam o lugar do conceito. Permanece a noção de
criação de sensações. A diferença é que não mais diria respeito diretamente à sensação de
um objeto reconhecível, representado na tela, e sim à sensação conservada do conceito
desse objeto. “Não mais uma sensação de mar ou de árvore, mas uma sensação do conceito
de mar ou do conceito de árvore” (DELEUZE, 1991, p. 187). É uma tentativa de
desmaterialização ou “desobjetificação” extrema da sensação.
Compreender a música como um modo de pensamento seria então compreender o
pensar-música musical como tecer com as vibrações, intensidades, silêncios; sensações
sonoras, não verbais e não-conceituais. O pensar-música musical se compõe e desde o
material sonoro que dá consistência ao plano da composição, alheio a conceito, palavras,
verbo. São ideias musicais, motivos se entretecendo. Pensamento musicando, e um
motivo rítmico ou melódico emaranhando-se a outro motivo rítmico ou melódico e uma
sequência harmônica irrompendo no entre outros grupos de acordes. E da linguagem
verbal, o pensamento musical se ocupa apenas de sua sonoridade/musicalidade, espaços,
pausas e silêncios.
Educar musicalmente, (com)formar uma ambiência povoada pelos signos
afirmativos das qualidades sensíveis, cujo sentido seja provocar o sentir e experimentar o
impacto das qualidades sensíveis sonoras. Explorar a potência da educação estética para
abrir o mundo da arte e fazê-lo extravasar para os demais mundos. Pensar o ensinante de
música não como quem identifica, traduz e explica discursivamente o 'significado' dos
sons e das músicas, mas como alguém que promove bons encontros entre os aprendizes, as
obras musicais e todo o repertório de ruídos, materiais sonoros do entorno, estimulando a
criação, o fazer musical de modo a que eles possam prosseguir suas
explorações/criações/escutas sonoro-musicais. Pensar-fazer música. Pensamento musical
não-verbal e não-conceitual. Implicaria também em nos libertarmos de pré-concepções e
estereótipos sonoros e musicais, em nos deixarmos transformar pela escuta/criação
musical. É aceitar o risco da criação, próprio a toda educação menor - questionadora por
natureza - em vez de se contentar com o conforto da reprodução de modelos pré-
estabelecidos.

considerações acerca de uma educação musical menor


O conceito de Littérature mineure (literatura menor), pensado por Deleuze e
Guattari (1975), é a origem do deslocamento para o campo da educação proposto por Silvio
Gallo (2008) e posteriormente por Brito para a educação musical (menor). Importante
ressaltar que a tradução para a língua portuguesa desse conceito não é muito boa uma vez
que o termo ‘menor’ não remete tão diretamente à noção de minoria como na expressão
francesa, podendo até mesmo ser confundida com o sentido pejorativo de inferioridade.
Como escrevem Deleuze e Guattari, “uma literatura menor não é a de uma língua menor,
mas antes a que uma minoria faz em uma língua maior” (DELEUZE, 1975, p. 29). Difere
portanto do maior-menor kantiano, ou, como é traduzido para o português, dos opostos
música,
música, pensamento
pensamento ee educação
educação musical
musical menor
menor || 401
401

maioridade-menoridade (mündigkeit-unmündigkeit). No caso de Kant trata-se mais de uma


oposição ou de uma negação, que aliás é mais evidente na língua alemã. O oposto de
mündigkeit é unmündigkeit, ou seja, a negação de mündigkeit garantida pelo prefixo “un” e
exemplificada, logo no início do texto, pela “preguiça e covardia” (KANT, 198522, p. 100). É
preciso um esforço para sair da “menoridade” e chegar à “maioridade”, ou seja, de um
estado inferior para um superior.
No caso de Deleuze e Guattari não se trata de uma oposição entre inferioridade e
superioridade. “Maior” e “menor” (majeur et mineur) são uma dupla conceitual em que o
“menor” age dentro do “maior”. Além disso, o “menor” não é inferior e pode ser tão ou
mais potente que o “maior”. Aqui, as imagens sensíveis que reverberam nesse par
conceitual são, respectivamente, árvore e erva. Se a primeira, de raiz pivotante e
anaxomorfa, se erige em unidade desde um centro, a erva itinerante, multiplicidade
acêntrica, brota do entre, nomadiza, rizoma. Outras imagens deixam ver o “maior” e
“menor” nas figuras políticas, respectivamente, do Estado totalizante, hierárquico e
concentrador de poder e a dispersão centrífuga em sistema tribal.
A educação “menor”, enquanto desterritorialização dos processos educativos, das
normas, dos princípios da educação “maior”, busca outras possibilidades de aprendizado,
cuidando de não as configurar numa reterritorialização permanente, cristalização perigosa
que a transforma em aparelho de Estado. A ramificação política, própria à “educação
menor”, age nas entranhas da educação “maior”, desterritorializando suas macro-fórmulas
de concentração de poder. Frente à generalização estriada das leis, as singularidades
micropolíticas das máquinas de guerra, alisando os estriamentos do espaço-tempo. E, por
fim também do valor coletivo, da coletivização de cada ato singular pela produção
rizomática de multiplicidades e da singularização coletiva. Sem ponto de origem, sem
lugar de chegada, antimétodo para experimentações no pensamento, a educação menor é
abertura a bifurcações imprevisíveis, franqueamento a encontros inesperados.
Pensar um ensino de música musical na educação básica, tramar linhas de fuga,
buscando brechas, escapes, vazamentos, extravasamentos por entre as grades e molduras.
Escapulir ficando. Pensar a música na escola antes como possibilidade de música da escola;
atualizar as virtualidades musicais desde a diversidade de materiais sonoros que compõem
o dia-a-dia escolar, o staccato do giz, o arrastar das cadeiras, os suspiros e gargalhadas,
sirenes e espirros.
Investigar em que medida esquemas musicais nos ajudam a pensar, na própria
educação, uma espécie de devir-música da educação. A transversalidade da música para
além de um espaço-tempo estriado em disciplinas; para além de uma disciplina música que
na faça da música serva de outras disciplinas. Musicalidade/sonoridade da voz de
professores e alunos, na maneira de dizer, de evocar o alfabeto, de ler, de contar histórias,
de bater palmas. Ritornelos escolares. Agenciamentos territoriais em permanente
desterritorialização/ reterritorialização. No canto para entrar ou sair da escola, para lavar
as mãos antes da merenda, para fechar os olhos no momento da sesta. Como explorar,
sensibilizar-se para essas musicalidades? Como e qual a importância de se buscar, com a
ajuda do ensinante-músico, uma educação mais musical atenta à musicalidade/sonoridade
do que/como se diz, se lê, se escreve?
Os conceitos de desterritorialização e reterritorialização são entendidos aqui na
concepção de Deleuze e Guattari (1980). A ideia de desterritorialização conecta-se a dois
outros conceitos, dois polos que, articulados, representam o problema musical em Deleuze.
O polo do ritornelo e o polo do devir. “O ritornelo é o conteúdo propriamente musical, o

22 Texto
Texto originalmente
originalmente escrito
escrito em
em 1783.
1783.
402|
402| pablo
pablo de
de vargas
vargas guimarães
guimarães

bloco de conteúdo próprio da música”33 (DELEUZE; GUATTARI, 1980, p. 368). É


territorial, agenciamento territorial: territorializante e reterritorializante. Por isso mesmo,
não é a música propriamente dita que desterritorializa, que acontece na
desterritorialização: ela parte do ritornelo, seu conteúdo territorializado, e o
desterritorializa para, de alguma forma, recriá-lo.
A música é então, por natureza, a forma de expressão desterritorializante. E neste
ponto que entra a noção de devir, o conteúdo musical (ritornelo) passando por uma
desterritorialização. O devir é o que é real na música e não os termos; ou seja, o que é real
na música não são as noções de harmonia, de acordes ou de notas musicais e sim o devir
ele próprio, a passagem de uma nota a outra, de um acorde a outro, de um som a outro,
enfim, o que torna música.
Num certo sentido, pode-se dizer que o discurso escolar “maior” se preocupa mais
com o “que” se diz do que com o “como” se diz. A supervalorização do conteúdo às
expensas da maneira como esse conteúdo se compõe. Talvez venha daí a prevalência, por
exemplo, do caráter temático das atividades artísticas escolares: no dia da árvore a criança
desenha, canta e recita poemas sobre árvores, no dia do índio, toca apito e põe cocar. Lógica
da explicação, do verbo, da palavra, do referente, do objeto, da função de estado de coisas,
do movimento “mais pobre e infantil do pensamento”. A educação menor,
desterritorializante por natureza, é o próprio devir e, por isso, de alguma forma se
aproxima do musical.
A educação “menor” passa de algum modo por um devir-música ao entrar em uma
espécie de zona de vizinhança de partículas de musicalidade, em sua preocupação com uma
escuta cuidadosa das diversas vozes e sons da escola, pela atenção ao material sonoro
escolar em permanente movimento, escapando das relações de desigualdade e hierarquia
entre ensinante e aprendiz, e passando da lógica de uma verdade intemporal a uma
experiência limite transfiguradora. Não é certamente tarefa fácil, pois buscar uma outra
lógica, descobrir linhas de fuga, exige antes de tudo repensar constantemente nossa
atuação no espaço/tempo escolar. Não há modelo dado a priori. "Ni roi, ni loi, ni foi".
Um outro deslocamento, desta vez da noção de educação menor para a de educação
musical menor foi proposto por Brito (2009). Imbricada ao próprio fazer musical, a educação
musical 'menor' rompe, questiona, resiste às verdades musicais instituídas pela educação
musical maior, aos modos predeterminados de escuta e produção sonora. Em lugar de dizer
ao aluno o que e como ele deve ouvir ou tocar determinada música, aqui a preocupação se
volta para a experimentação sonora não-estereotipada e não-referencialista. Com isso não
me refiro apenas ao trabalho de pesquisa sonora com o fim de interpretar obras musicais já
existentes, mas também ao jogo mesmo de exploração sonora que em música, segundo
Delalande (2003, p. 22), pode ser entendido como um meio e um fim. Como se o interesse
pela música estimulado através do jogo musical despertasse o interesse pelo próprio jogo.
É o próprio ato de criação musical, seja da criança ou do compositor experiente, que
se faz “menor” quando opera uma desterritorialização dos modelos hegemônicos
instituídos da música “maior”, dominante. Todavia, no caso da criança escolarizada, a
criação “menor” tem maior dificuldade para se atualizar, uma vez que as normas de
submissão e obediência ao modelo (pretensamente) “correto” imperantes no ambiente
escolar propiciam produções de subjetividades desencorajadas e inibidas. Aprender a se
desprender da lógica do certo ou errado, do superior e do inferior: desaprender; e
compreender essas produções/composições como linhas de fuga, microporos na aparente

33 Tradução
Tradução livre
livre de
de “la
“la ritournelle
ritournelle est
est le
le contenu
contenu proprement
proprement musical,
musical, le
le bloc
bloc de
de contenu
contenu propre
propre àà la
la musique”,
musique”,
da
da edição
edição francesa
francesa dede 1980
1980 (Editions
(Editions Minuit).
Minuit).
música,
música, pensamento
pensamento ee educação
educação musical
musical menor
menor || 403
403

impenetrabilidade do instituído. Educação musical “menor”: máquina de guerra,


resistência ao musical “maior”, formalmente estabelecido e sacramentado.

referências
ALMEIDA,
ALMEIDA, Célia
Célia Maria
Maria dede Castro.
Castro. Concepções
Concepções ee práticas
práticas artísticas
artísticas na
na escola.
escola. In:
In: FERREIRA,
FERREIRA,
Sueli
Sueli (Org.).
(Org.). OO ensino
ensino das
das artes:
artes: construindo
construindo caminhos.
caminhos. Campinas:
Campinas: Papirus,
Papirus, 2004.
2004.
BRASIL.
BRASIL. Lei
Lei nº
nº 11.769,
11.769, de
de 1818 de
de agosto
agosto de de 2008.
2008. Altera
Altera aa Lei Lei nº
nº 9.394,
9.394, de
de 20
20 de
de dezembro
dezembro dede 1996,
1996,
para
para dispor
dispor sobre
sobre aa obrigatoriedade
obrigatoriedade do do ensino
ensino da da música
música nana educação
educação básica.
básica. Diário
Diário Oficial
Oficial
da
da União,
União, Brasília,
Brasília, ano
ano CXLV,
CXLV, nº nº 159,
159, seção
seção 1,1, p.
p. 1,1, 19-8-2008.
19-8-2008.
BRITO,
BRITO, Teca.
Teca. Por
Por uma
uma educação
educação musical
musical do do pensamento:
pensamento: educação educação musical
musical menor.
menor. Revista
Revista da
da
ABEM,
ABEM, Porto
Porto Alegre,
Alegre, v.v. 17,
17, n.21,
n.21, p.
p. 25-34,
25-34, 2009.
2009.

BRITTON,
BRITTON, Allen Allen Perdue.
Perdue. Music
Music in in early
early american
american public
public education:
education: aa historical
historical critique.
critique. In:
In:
HENRY,
HENRY, Nelson Nelson B. B. (Ed.).
(Ed.). Basic
Basic concepts
concepts in in music
music education:
education: fifty-seventh
fifty-seventh yearbook
yearbook of of the
the
national
national society
society forfor the
the study
study of of education,
education, PartPart I.I. Chicago:
Chicago: University
University of of Chicago
Chicago Press,
Press,
1958,
1958, p.
p. 195-211.
195-211.
DELALANDE,
DELALANDE, François. François. La La musique
musique estest un
un jeu
jeu d’enfant.
d’enfant. Paris:
Paris: Buchet/Chastel,
Buchet/Chastel, 2003. 2003.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;
Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Felix. Felix. Kafka:
Kafka: pour
pour une
une littérature
littérature mineure.
mineure. Paris:
Paris: Minuit,
Minuit, 1975.
1975.
______.
______. Capitalisme
Capitalisme et et Schizophrénie:
Schizophrénie: Mille
Mille Plateaux.
Plateaux. Paris:
Paris: Minuit,
Minuit, 1980.
1980.
______.
______. Qu’est-ce
Qu’est-ce queque la
la philosophie.
philosophie. Paris:
Paris: Minuit,
Minuit, 1991.
1991.
FIGUEIREDO,
FIGUEIREDO, Sérgio. Sérgio. Olhando
Olhando oo presente
presente ee delineando
delineando oo futuro
futuro da da Abem.
Abem. Revista
Revista dada ABEM,
ABEM,
Porto
Porto Alegre,
Alegre, v. v. 16,
16, p.
p. 31-38,
31-38, mar.
mar. 2007.
2007.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Surveiller
Surveiller et et punir:
punir: naissance
naissance de de la
la prison.
prison. Paris:
Paris: Gallimard,
Gallimard, 1975.1975.
FUKS,
FUKS, Rosa.
Rosa. O O discurso
discurso dodo silêncio.
silêncio. Rio
Rio de de Janeiro:
Janeiro: Enelivros,
Enelivros, 1991a.
1991a.
______.
______. Tradição
Tradição // contradição
contradição na na prática
prática musical
musical de de uma
uma escola
escola formadora
formadora de de professores.
professores. Revista
Revista
Opus,
Opus, Porto
Porto Alegre,
Alegre, v.3,
v.3, p.
p. 25-35,
25-35, set.
set. 1991b.
1991b.
GALLO,
GALLO, Silvio.
Silvio. Deleuze
Deleuze ee aa educação.
educação. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2008.
2008.
GOHN,
GOHN, Daniel
Daniel Marcondes.
Marcondes. Educação
Educação musicalmusical aa distância:
distância: possibilidades
possibilidades de de uso
uso das
das tecnologias.
tecnologias.
Revista
Revista “musica
“musica em em contexto”,
contexto”, Brasília,
Brasília, anoano IV,
IV, v.1,
v.1, p.
p. 7-22,
7-22, 2010.
2010.
KANT,
KANT, Immanuel.
Immanuel. RespostaResposta àà pergunta:
pergunta: Que Que éé oo Esclarecimento?
Esclarecimento? In: In: Kant:
Kant: textos
textos seletos.
seletos.
Petró
Petróppolis:
olis: Vozes,
Vozes, 1985,
1985, p.
p. 100-117.
100-117.
LANIER,
LANIER, Vincent.
Vincent. Devolvendo
Devolvendo arte arte àà arte-educação.
arte-educação. In: In: BARBOSA,
BARBOSA, Ana Ana Mae Mae (Org.).
(Org.). Arte-
Arte-
educação:
educação: leitura
leitura no
no subsolo.
subsolo. São
São Paulo:
Paulo: Cortez,
Cortez, 2002.
2002.
PENNA,
PENNA, Maura.
Maura. Professores
Professores de de música
música nas nas escolas
escolas públicas
públicas de de ensino
ensino fundamental
fundamental ee médio:
médio: uma
uma
ausência
ausência significativa.
significativa. Revista
Revista da da ABEM,
ABEM, PortoPorto Alegre,
Alegre, v.v. 7,
7, p.
p. 7-19,
7-19, set.
set. 2002.
2002.
______.
______. Desafios
Desafios para para aa educação
educação musical:
musical: ultrapassar
ultrapassar oposições
oposições ee promover
promover oo diálogo.
diálogo. Revista
Revista da
da
ABEM,
ABEM, PortoPorto Alegre,
Alegre, v.v. 13,
13, p.
p. 35-43,
35-43, mar.
mar. 2006.
2006.
______.
______. Nã
Nãoo basta
basta tocar?
tocar? Discutindo
Discutindo aa formaçformaçaãõo do
do educador
educador musical.
musical. Revista
Revista da da ABEM,
ABEM, Porto
Porto
Alegre,
Alegre, v. v. 16,
16, p.
p. 49-56,
49-56, mar.
mar. 2007.
2007.
______.
______. Educação
Educação musical
musical comcom função
função social:
social: qualquer
qualquer prática
prática vale?
vale? Revista
Revista da da ABEM,
ABEM, PortoPorto Alegre,
Alegre,
v.
v. 27,
27, p.65-78,
p.65-78, 2012.
2012.
PLATÃO.
PLATÃO. ŒuvresŒuvres complètes.
complètes. Tome
Tome XI, XI, 1re1re partie:
partie: Les
Les Lois,
Lois, Livres
Livres I-II.
I-II. Tradução
Tradução de de Edouard
Edouard des des
Places,
Places, Paris:
Paris: Les
Les Belles
Belles Lettres,
Lettres, 1951.
1951.
SANTOS,
SANTOS, ReginaRegina Márcia
Márcia Simão.
Simão. Música,
Música, aa realidade
realidade nasnas escolas
escolas ee políticas
políticas de de formação.
formação. Revista
Revista
da
da ABEM,
ABEM, PortoPorto Alegre,
Alegre, v.v. 12,
12, p.
p. 49-
49- 56,
56, mar.
mar. 2005.
2005.
______.
______. Música
Música na na Escola:
Escola: prapra quê?
quê? Considerações
Considerações aa propósito
propósito da da lei
lei 11.769/08.
11.769/08. In:In: ENCONTRO
ENCONTRO
DE
DE EDUCAÇÃO
EDUCAÇÃO MUSICAL, MUSICAL, 3., 3., 2010,
2010, Campinas.
Campinas. Anais Anais do...
do... Campinas:
Campinas: UNICAMP,
UNICAMP,
2010,
2010, p.
p. 05-16.
05-16.
SANTOS,
SANTOS, ReginaRegina Márcia
Márcia Simão
Simão et et al.
al. Música,
Música, cultura
cultura ee educação:
educação: os os múltiplos
múltiplos espaços
espaços de
de educação
educação
musical.
musical. 2.2. ed.
ed. Porto
Porto Alegre:
Alegre: Sulina,
Sulina, 2012.
2012.
TEMMERMAN,
TEMMERMAN, Nita. Nita. The
The Philosophical
Philosophical Foundations
Foundations of of Music
Music Education:
Education: The The Case
Case ofof Primary
Primary
Music
Music Education
Education in in Australia.
Australia. British
British Journal
Journal of
of Music
Music Education.
Education. n. n. 8,
8, p.
p. 149-159,
149-159, 1991.
1991.
404
404
405
405

notas para la comprensión de la paradoja contextual en relación a la configuración


del hecho teatral como presencia. la dialéctica «performance» / «política» como
pro-yección de la relación escindida: «mundo de la re-presentación» - «mundo de la
presentación». el acontecimiento como concepto articulador

ricardo sassone11

El
El poeta
poeta eses un
un fingidor.
fingidor.
Finge
Finge tan
tan completamente
completamente
Que
Que llega
llega aa fingir
fingir que
que es
es dolor
dolor
El
El dolor
dolor que
que dede veras
veras siente.
siente.
(FERNANDO
(FERNANDO PESSOA,
PESSOA, Autopsicografía)
Autopsicografía)

introducción

I ntentamos, este trabajo, revisar ciertas relaciones conceptuales evidenciadas en


el cruce de distintos marcos teórico-prácticos, a saber: filosofía-práctica-aplicada;
teatro-performance y ámbito de articulación socio-política, que nos permitan poner
en perspectiva la definición concerniente a las artes del “teatro-performance” como campo
de aplicación, y del correspondiente correlato objetivo: el “hecho teatral”, definido como:
presencia (ámbito vivencial); procedimiento de configuración escénico-po(i)ético (“estethos” en
tanto: al lugar común de las acciones po(i)éticas asociado a la reflexión que permite
tematizar el “estethos” desde en clave de interpretación “filosófico-práctica” (encuadre del
pensamiento propiamente estético). A tal efecto cabe considerar cierto andamiaje, en
principio, con alguna resonancia fenomenológica a fin de comprender las consecuencias
del establecimiento del llamado “criterio de denegación” que da cuenta de la escisión entre
mundos: el de la “presentación”, configurado en el movimiento general del mundo de la vida,
y el de la “re-presentación”, configurado en la convención establecida en el plano de la
creación artística y del ludema teatral.
En clave política esta escisión se lee desde la paradoja que surge al considerar por un
lado: el espacio de re-presentación como lugar de elucidación veritativa - en el orden de los
conceptos -, y por otro: un dispositivo/forma de organización social (aparato de Estado-
espacio de poder), plasmada dentro del esquema general de la circulación de los
significantes expuestos en el respectivo espacio político y tematizado como espacio de
circulación del poder. Es por ello que en la dimensión “arte-cultura”, cuando la misma se
constituye en “dispositivo” (AGAMBEN, 2006)22 operante en tal espacio de poder, se
instancia sistémicamente un lugar de enunciación acrítica de la “verdad”, que
necesariamente debería ser revisado. De igual modo opera una destitución de la re-
presentación, al instituirse el “sentido”, y la lucha por su apropiación, bajo condición de
legitimación “pseudo-estética”, generándose un círculo de protección o consenso (del cual
forma parte la producción de la crítica especializada -un “discurso” paralelo en relación al
plano en el que opera el impulso de creación “po(i)ético”-, dentro del cual se vigila y
controla el hecho de que no sean afectados ciertos significados sacralizados y/o

11 UBA/UBACYT;
UBA/UBACYT; InstitutoInstituto dede Artes
Artes del
del Espectáculo
Espectáculo // FFyL-UBA;
FFyL-UBA; UNA/Universidad
UNA/Universidad Nacional
Nacional del
del Arte.
Arte.
ISATC/Instituto
ISATC/Instituto Superior
Superior dede Arte
Arte (Teatro
(Teatro Colón).
Colón). Email:
Email: resass88@gmail.com
resass88@gmail.com
22 Expresa
Expresa elel autor
autor que
que la
la sociedad
sociedad contemporánea,
contemporánea, que que vive
vive bajo
bajo el
el control
control dede diversos
diversos dispositivos,
dispositivos, sese
presenta
presenta bajo
bajo la
la forma
forma de de “cuerpos
“cuerpos atravesados”
atravesados” por
por un
un enorme
enorme proceso
proceso dede “des-subjeticación”.
“des-subjeticación”. Asimismo,
Asimismo,
aludiendo
aludiendo alal tratamiento
tratamiento del del concepto
concepto realizada
realizada por
por Foucault,
Foucault, llamará
llamará “literalmente
“literalmente dispositivo
dispositivo [a]
[a] cualquier
cualquier
cosa
cosa que
que tenga
tenga dede algún
algún modo
modo lala capacidad
capacidad dede capturar,
capturar, orientar,
orientar, determinar,
determinar, interceptar,
interceptar, modelar,
modelar, controlar
controlar
yy asegurar
asegurar los
los gestos,
gestos, las
las conductas,
conductas, las
las opiniones
opiniones yy los
los discursos
discursos de
de los
los seres
seres vivientes”.
vivientes”.
406|
406| ricardo
ricardo sassone
sassone

dogmáticamente cristalizados. Esto último, legitimando además las correspondientes


prácticas sociales normadas en el ethos, apelando acríticamente a un marco de referencia
conceptual “pseudo-ético”.
Consideraremos que la estética, fuera de su dimensión práctica, dimensión ésta que
remite, como hemos dicho, al campo de la filosofía (práctica y aplicada), carece de eficacia
para dar cuenta del acontecimiento artístico (en el sentido de Badiou), regulada esta
aparición por una lógica de la representación que remite a una razón específicamente
estética (CHANTAL, 1998, p.22ss; RANCIÈRE, 2005, p.35ss) y más aún: a una zona en la
cual podría interpretarse que la acción creadora remite a una suerte de “inconsciente
estético”. Asimismo, consideramos que, desde el marco de referencia conceptual
“performativo”, será factible situarnos en la comprensión de la dimensión política del arte
como práctica social, focalizando lo genérico de la práctica teatral como el ámbito de
producción discursivo/presencia-vivencial, resultante del cruce de una analítica y una
dialéctica. La primera, entendida como conjunto de elementos: texto-escritura (actor-
personaje), “textualidades no textuales”, actor-intérprete (individual-colectivo), espacio-
tiempo (cronotopismo), cuerpo/voz-acción; gestualidad (lenguaje no verbal), etc., que
partiendo de la teatralidad como “condición de posibilidad de la escena” adquiere el status
de “escena potencial” sita en el contexto de enunciación de un “mundo posible” propuesto
por la obra], hacen factible la materialización de la obra, deviniendo hecho teatral. La
segunda, leída en clave de las circunstancias en las cuales dicho acontecimiento se
instancia y las consecuencias implicadas: situación de representación / dispositivo Estado;
Ética de la interpretación33 / Ética del Actor intérprete (en particular, STANISLAVSKI,
2000); soporte de la verdad elucidada / condiciones de adecuación del público receptor, etc.
Nos planteamos estas cuestiones en el contexto de una “filosofía de la sustracción”, que al
no renunciar al imperativo de la praxis, considera el hecho de que la acción es la «morada»
del sujeto, en confrontación con la filosofía que sostiene su negación. Esto nos permite
recuperar el valor de la diversidad, desde la primacía de lo mismo - lo que mancomuna-,
sobre lo otro (BADIOU, 1993, LXXIV, p.92).
I.
Tal como hemos analizado en nuestro trabajo inherente al análisis e instanciación
del «hecho teatral” (SASSONE, 2004), enmarcado en un territorio modulado por el
encuentro de los discursos filosófico, artístico y político, podemos observar que, entre las
múltiples notas que podrían ser tomadas en cuenta para delimitar tal territorio, nos
centraremos en la consideración del teatro como “presencia en el mundo”. Si consideramos
al mundo definido como conjunto de hechos, siendo un hecho un estado de cosas
(procediendo homológicamente respecto a la tematización de Wittgenstein;
WITTGENSTEIN, 1985, p.35ss.)44, deberíamos pues indagar acerca de qué tipos de cosas

33 En
En cuanto
cuanto aa la la conceptualización
conceptualización de de una
una ética
ética de
de lala interpretación,
interpretación, consideramos
consideramos la la posición
posición de
de
VATTIMO,
VATTIMO, 1991). 1991). Se Se establece
establece aquí,
aquí, bajo
bajo susu caracterización
caracterización de de la
la “posmodernidad”,
“posmodernidad”, una una suerte
suerte de
de
correspondencia
correspondencia entreentre “discursividad
“discursividad ética”
ética” yy “hermenéutica”
“hermenéutica” (eje (eje de
de de
de lala comprensión),
comprensión), situadas
situadas en
en el
el
contexto
contexto socio-histórico-político-cultural
socio-histórico-político-cultural al al cual
cual remite;
remite; mediando
mediando la la articulación
articulación de de un
un “pensamiento
“pensamiento débil”
débil”
yy orientación
orientación ontológica
ontológica de de sesgo
sesgo “nihilista”.
“nihilista”.
44 Entre
Entre las
las proposiciones
proposiciones que que hacen
hacen aa nuestro
nuestro interés,
interés, cabe
cabe citar:
citar:
1.1. ElEl mundo
mundo [Welt]
[Welt] es es todo
todo lolo que
que acaece
acaece [Fall]
[Fall]
1.1
1.1 ElEl mundo
mundo es es la
la totalidad
totalidad de de los
los hechos
hechos [Tatsachen],
[Tatsachen], nono de
de las
las cosas
cosas [Dinge].
[Dinge].
1.2
1.2 ElEl mundo
mundo está
está determinado
determinado por por los
los hechos
hechos yy por
por ser
ser todos
todos los
los hechos.
hechos.
1.12
1.12 Porque
Porque lala totalidad
totalidad de de los
los hechos
hechos determina
determina lo lo que
que acaece
acaece yy también
también lo lo que
que nono acaece.
acaece.
1.13
1.13 Los
Los hechos
hechos enen elel espacio
espacio lógico
lógico son
son el
el mundo.
mundo.
2.
2. Lo Lo que
que acaece,
acaece, elel hecho,
hecho, eses la
la existencia
existencia dede los
los hechos
hechos atómicos.
atómicos.
2.01
2.01 El
El hecho
hecho atómico
atómico [Sachverhalt]
[Sachverhalt] es es una
una combinación
combinación de de objetos
objetos (entidades,
(entidades, cosas).
cosas).
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 407
407
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

están involucradas en nuestro “hecho teatral-performativo”. Este hecho se instancia en


cierto espacio: el espacio de re-presentación. Este espacio se configura como campo de
fuerzas; campo este, en el cual se da un posible ordenamiento material (plataforma fáctica
asociada a la escena) desplegados en cierta temporalidad, concebida como posible orden de
acontecimientos. Esta doble posibilidad es la que se encuentra abierta a la incidencia y
capitalización del azar, en cuanto a la constitución de la obra de arte como tal. En relación
a lo que queremos expresar por “azar”, cabe recordar la concepción nietzscheana, al
desarrollar la metáfora de la tirada de dados: lanzados una vez son la afirmación del azar
en tanto que la combinación que forman al caer es la afirmación de la necesidad55. Esto da
lugar a una triple replicación: la necesidad en el azar, el ser en el devenir; lo uno en lo
múltiple.
Concebiremos al actor como “ser-cuerpo-existente”, arrojado en el “espacio-
tiempo” de “re-presentación”; ahora: espacio teatral: Tal espacio fue concebido
inicialmente por Brook como “espacio vacío”66. Nos permitiremos desplazar esta
consideración en, forma contrapuesta –pasando del status del “vacuum” al del “plenuum”-,
concebido como un espacio virtualmente “lleno” de “espacio-tiempo”, un “estado base”,
primigenio, antes de ser “modulado” energéticamente por las distintas determinaciones
que permiten una apertura hacia múltiples sistemas codificación, bajo ciertos regímenes
de signos. En relación a tales regímenes podemos considerar que la producción artístico-
po(i)ética queda estabilizada en determinado período, cuando los mismos presentan cierta
permanencia (invariante), y es tal condición la que nos permite concebir el “territorio” que
se convalida estilísticamente. Por el contrario, un cambio abrupto en el régimen de signos
nos llevará a sostener una línea productiva que lleva a la “desterritorialización” del código,
evento de ruptura que identificaremos con el gesto propio de lo que denominamos
“vanguardia artística”; para luego “reterritorializarnos” en una nueva zona de
estabilización (los diversos Manifiestos dan cuenta de esta exteriorización). Tal como se ha
concebido la captura de este doble movimiento desde el planteo de Wölflin y la
reformulación de Hauser77, identificamos tres instancias en la variación de estilo: punto de
partida de la serie: momento “clásico”; momento de transición o trasvasamiento:
“manierismo”; momento de afirmación de la “novedad” -siempre un estado efímero- de lo
nuevo: “barroco”. Y así diacrónica y sucesivamente. Cabe manifestar que el
“acontecimiento” que se corresponde con este “cambio” radical, nos ubica en una
discontinuidad temporal y como sucede en toda “singularidad” nos enfrentamos ante un
vacío teórico-conceptual para poder dar cuenta y/o tematizar qué es lo que ocurre
po(i)éticamente dicha ruptura (agenciamiento maquínico - estipulación de lo “que se hace”).
Consecuentemente, el pensamiento en dimensión “filosófico-práctico-estético” deberá
crear nuevos conceptos (plano de inmanencia) para dar cuenta de lo acontecido. Y esta
operación será a posteriori de experimentar el mencionado cambio y configurándose

2.11
2.11 EsEs esencial
esencial aa la
la cosa
cosa poder
poder ser
ser parte
parte constitutiva
constitutiva dede un
un hecho
hecho atómico.
atómico.
2.14.1
2.14.1 Los
Los objetos
objetos contienen
contienen la la posibilidad
posibilidad dede todos
todos los
los estados
estados de
de cosas.
cosas.
Los
Los objetos
objetos forman
forman la la substancia
substancia del
del mundo.
mundo.
2.24
2.24 LaLa substancia
substancia es es aquello
aquello queque existe
existe independientemente
independientemente de de lo
lo que
que acaece.
acaece.
2.25
2.25 Ella
Ella es
es forma
forma yy contenido.
contenido.
2.25.1
2.25.1 Espacio,
Espacio, tiempo
tiempo yy color
color (cromaticidad)
(cromaticidad) son son formas
formas dede los
los objetos.
objetos.
55 DELEUZE
DELEUZE (1986).(1986). Para
Para lala descripción
descripción de de la
la relación
relación “azar”
“azar” yy “necesidad”,
“necesidad”, verver p.
p. 59
59 ss.
ss. Para
Para una
una interesante
interesante
confrontación
confrontación entreentre lala idea
idea dede Nietzsche
Nietzsche yy Mallarmé,
Mallarmé, en en torno
torno alal azar,
azar, v:
v: CABO
CABO VALVERDE,
VALVERDE, 1999; 1999;
MALLARME,
MALLARME, 1998. 1998.
66 Expresa
Expresa Brook
Brook (1973,
(1973, p.9),
p.9), enen relación
relación con
con susu definición
definición dede “teatro”:
“teatro”: “Puedo
“Puedo tomar
tomar cualquier
cualquier espacio
espacio vacío
vacío yy
llamarlo
llamarlo escenario
escenario desnudo.
desnudo. Un Un hombre
hombre camina
camina porpor ese
ese espacio
espacio vacío
vacío mientras
mientras otro
otro observa,
observa, yy eso
eso es
es todo
todo lo
lo
que
que se
se necesita
necesita para
para realizar
realizar teatro.”
teatro.”
77 Para
Para la
la conceptualización
conceptualización de de la
la noción
noción de
de “estilo”,
“estilo”, v:
v: Wölflin
Wölflin (2007)
(2007) yy Hauser
Hauser (1974)
(1974)
408|
408| ricardo
ricardo sassone
sassone

nuevos “agenciamientos de enunciación” - estipulación de lo “que se dice”) (DELEUZE;


GUATTARI, 1994; 2006).
Asimismo, consideraremos la imbricación “espacio-temporal” como una la
condición antropológico-filosófica propia de la condición de existencia humana asociada a la
configuración y mundo de la “acción”, en tanto empíricamente “vivida”. Desde este punto
de vista, la consideración espacial escindida de la temporal resultará una mera separación
operante en el orden de los conceptos, inherentes, con especificidad, al marco teórico de la
física, sin un anclaje en la dimensión de lo “existencial-vivencial-presencial” en la que el
“actor social” se proyecta. Y es la caracterización del “continuum” de la acción
“cronotópicamente” (PAVIS, 2000)88 concebida la que nos posibilitaría establecer la
relación mutua [formalizaremos esto como: R(C;A] entre “cuerpo” -comprendido como
“entidad psicofísicamente determinada”- [C] y “acción” -comprendida como “acción
efectiva”- [A]. Esto es: si partimos una determinación cronotópica del “cuerpo”
[formalizaremos esto como: R(tc;c; ecc); Relación (tiempo corporal: tcc; espacio corporal: ecc)] y,
asimismo, de una determinación cronotópica de la “acción” [formalizaremos como: R(ta;a; eaa);
Relación (tiempo de la acción: taa; espacio de la acción: eaa)]; y si consideramos una cierta
“correspondencia homológica” (correspondencia esta, efectivizada en un posible “campo
de la experiencia” configurado como tal) entre: el tiempo asociado por un lado al cuerpo
(C) y por otro lado a la acción (A) (formalizada como: tcc Ξ taa); y entre el espacio asociado
por un lado al cuerpo (C) y por otro a la acción (A) (formalizada como: ecc Ξ eaa), resulta
posible visualizar una correspondencia entre cuerpo y acción (formalizada como: C Ξ A).
Esto se podría expresar sumariamente como: en tanto “cuerpo”, somos “acción” y
viceversa: o, parangonando la expresión latina: soy cuerpo (entidad psicofísica) y nada de
la acción (mundo de la acción) me es ajeno, y viceversa 99. Por otro lado, también cabe
referirse categorialmente al “cuerpo” como “punto cero” de todas las referencias y
determinaciones cronotópicas (HUSSERL, 2006)1010. Así, el cuerpo se involucra en
estrategias productivas determinadas cenestésica y proxémicamente hablando (HALL,
2003, p.125, 139), es decir: desde la capacidad de tener conciencia del propio cuerpo en tanto
cuerpo presente1111, y desde la percepción de la configuración espacial en la que dicho cuerpo
88 En
En ref.
ref. aa Mijaíl
Mijaíl Bajtín,
Bajtín, aa quien
quien debemos
debemos la
la creación
creación de de la
la categoría
categoría de de análisis
análisis "Cronotopo".
"Cronotopo". BajtínBajtín rechaza
rechaza
la
la idea
idea gnoseológica
gnoseológica kantiana
kantiana en en la
la consideración
consideración “a “a priori”
priori” dede “espacio”
“espacio” yy “tiempo”
“tiempo” como como inherentes
inherentes aa la la
conciencia
conciencia del del sujeto.
sujeto. Para
Para Bajtín,
Bajtín, las
las nociones
nociones de de espacio
espacio yy tiempo
tiempo sonson generadas
generadas por por lala “materialidad
“materialidad del del
mundo”,
mundo”, con con posibilidad
posibilidad de de ser
ser “objetivables”
“objetivables” para para susu correspondiente
correspondiente análisis.
análisis. LaLa noción
noción de de "cronotopo"
"cronotopo"
extrapolada
extrapolada de de lala física,
física, expresa
expresa el el carácter
carácter indisoluble
indisoluble del del espacio
espacio yy el el tiempo,
tiempo, que,que, concebidos
concebidos en en
vinculación
vinculación con con elel movimiento
movimiento yy la la materia,
materia, se se configuran
configuran como como sussus propiedades.
propiedades. Así Así elel tiempo
tiempo puede
puede
constituirse
constituirse en en una
una “coordenada
“coordenada espacial”
espacial” yy ser ser tomada
tomada como como la la cuarta
cuarta dimensión
dimensión del del espacio.
espacio. Desde
Desde esta
esta
perspectiva,
perspectiva, Bajtín
Bajtín (1989)
(1989) define
define alal “cronotopo”
“cronotopo” como como la la conexión
conexión intrínseca
intrínseca de de las
las relaciones
relaciones temporales
temporales yy
espaciales
espaciales asimiladas
asimiladas artísticamente
artísticamente en en la
la literatura.
literatura.
99 TERENCIO,
TERENCIO, Heautontimorumenos,
Heautontimorumenos, (El (El enemigo
enemigo de de sí
sí mismo).
mismo). V. V. 77.
77. (Acto
(Acto II // Escena
Escena I).I). CHREMES:
CHREMES: homo homo
sum: humani
sum: humani nilnil aa me
me alienum
alienum puto.
puto. vel
vel memonere
memonere hoc hoc vel
vel percontari
percontari puta:
puta: rectumst
rectumst egoego utut faciam;
faciam; nonnon est
est te
te utut
deterream.
deterream. [CREMES.
[CREMES. -- Soy Soy hombre;
hombre; yy por por lolo tanto,
tanto, nada
nada queque sea
sea humano
humano me me resulta
resulta extraño.
extraño. Supón
Supón que que tete
hago
hago una una advertencia
advertencia oo bien bien que
que tete formulo
formulo una una pregunta:
pregunta: si si tienes
tienes razón,
razón, para
para imitarte;
imitarte; yy si si no,
no, para
para
disuadirte.
disuadirte. (Trad:
(Trad: José
José Juan
Juan DelDel Col)].
Col)].
10 Husserl
10 Husserl procede
procede aa invertir
invertir la la cosmovisión
cosmovisión copernicana
copernicana en en relación
relación aa como
como concebimos
concebimos la la tierra
tierra que
que no
no
podemos
podemos percibir
percibir yy dede la
la que
que nono tenemos
tenemos experiencia
experiencia en en tanto
tanto cuerpo
cuerpo enen el
el espacio
espacio exterior.
exterior. Solo
Solo gracias
gracias aa las
las
experiencias
experiencias de de la
la imaginación
imaginación podemos
podemos dar dar sentido
sentido alal espacio.
espacio.
1111 En
En torno
torno aa la
la cuestión
cuestión de de la
la PRESENCIA
PRESENCIA del del actor,
actor, vale
vale tener
tener presentes
presentes laslas reflexiones
reflexiones de de Eugenio
Eugenio Barba,
Barba,
en
en conexión
conexión concon los
los atributos
atributos asociados
asociados al al “BIOS”
“BIOS” del del actor.
actor. ElEl nivel
nivel de
de análisis
análisis “PRE-EXPRESIVO”,
“PRE-EXPRESIVO”, en en
sentido
sentido Barba,
Barba, se se corresponde
corresponde con con el
el de
de PRESENCIA.
PRESENCIA. Cabe Cabe recalcar
recalcar que
que los
los conceptos
conceptos de expresividad yy pre-
de expresividad pre-
expresividad
expresividad sólo sólo son
son separables
separables desde
desde elel punto
punto de de vista
vista analítico.
analítico. En En este
este contexto
contexto se se define
define CENESTESIA
CENESTESIA
como
como “la “la capacidad
capacidad deldel ser
ser humano
humano de de sentir,
sentir, tener
tener conciencia
conciencia de de su
su propio
propio cuerpo”.
cuerpo”. Cf.:
Cf.: Exposición
Exposición de de Eugenio
Eugenio
Barba,
Barba, correspondiente
correspondiente aa la la Segunda
Segunda Reunión
Reunión del del «Encuentro
«Encuentro de de Estudiosos
Estudiosos de de Teatro»,
Teatro», Buenos
Buenos Aires,
Aires, 1515 ––
18
18 dede abril
abril de
de 1987,
1987, en:
en: Boletín
Boletín del
del Instituto
Instituto dede Teatro,
Teatro, N°
N° VI,
VI, Facultad
Facultad de de Filosofía
Filosofía yy Letras,
Letras, UBA,
UBA, 1989,
1989, pp.15
pp.15 ss.
ss.
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 409
409
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

se inscribe, atendiendo en especial al factor distancia en relación a otros “cuerpos” y


objetos materiales y demás propiedades topológicas1212. Tomando la “escena ficcional” como
laboratorio de la acción (RICOEUR, 1996), nos situamos en la “escena teatro-
performativa” observando que en el contexto de representación el “actor/intérprete”
deviene “actor-personaje” (PAVIS, 1980)1313 (en-carnado en ese cuerpo presente), desde el
cual se expresa y desarrolla cierta textualidad1414. Esta textualidad resultante de una posible
proyección de ciertas “marcas” de “teatralidad”1515 en el contexto en el que se crea y
configura el “mundo de la obra”. Dicha “teatralidad” es tomada en sentido amplio
obedeciendo a ciertas reglas de composición en relación a distintos tipos de dramaturgias
emergentes (de autor, de actor - sean individuales o colectivas -, con estructura centrada en
el texto literario o plasmada en secuencia de imágenes - plásticas, sonoras, visuales) y/o a
distintos tipos de teatro (teatro de texto, teatro físico, “teatro-performance”, etc.). Por último,
atendiendo a la configuración de una “textualidad espectacular”, la totalidad de acciones
se despliegan en relaciones a un dispositivo escenotécnico en el cual la modulación del
espacio-tiempo escénico define diversas formas de codificación y/o “sobre-codificación”:
visuales, acústicas, corporales, objetuales, etc. Definidas en el contexto de las
correspondientes “po(i)éticas” - nos remitimos nuestro concepto de “estethos”
(SASSONE, 2008) -, y a los modos de producción de la “obra de arte bajo” según el
“sistema de restricciones” y procedimientos adoptado en torno a la plataforma fáctica que
la sustenta el proyecto de creación. Estas “marcas” de teatralidad también se podrían
concebir en expresiones “pre-teatrales” y performativas en sentido amplio
(SCHECHNER, 2000; TAYLOR, 2015). En el contexto de estas manifestaciones - ritos,
fiestas populares, ceremonias, etc (GEIST, 1996) -, no se pretende una mirada
desinteresada por parte del “participante-celebrante”, sino que se procura perfeccionar una
acción eficaz en cuanto a la incidencia en algún aspecto inherente al mundo de de la
la vida
vida yy al
al
orden de lo cotidiano (ordinario) aunque bajo pretensión de “extra-ordinario”1616.

12 Nos
12 Nos remitimos
remitimos al al desarrollo
desarrollo de de lala cuestión
cuestión PROXEMICA
PROXEMICA en en Hall
Hall (2003,
(2003, p.6),
p.6), elel autor
autor define
define el el término
término en en
cuestión
cuestión desdedesde el el análisis
análisis del del “espacio
“espacio personal
personal yy social,
social, yy la
la percepción
percepción que que el el hombre
hombre tienetiene de de él...
él... He
He
acuñado
acuñado la la palabra
palabra proxémica
proxémica para para designar
designar las las observaciones
observaciones yy teorías
teorías interrelacionadas
interrelacionadas del del empleo
empleo queque el el
hombre
hombre hace hace del
del espacio,
espacio, queque eses una
una elaboración
elaboración especializada
especializada de de la
la cultura”.
cultura”.
1313S/v:
S/v: Actancial
Actancial (modelo)
(modelo) III. III. ACTANTES
ACTANTES Y Y ACTORES.
ACTORES. A. A. Teoría
Teoría de de los
los niveles
niveles de de existencia
existencia del del
personaje.
personaje.
14Como
14 Como categoría
categoría superior
superior aa la la del
del texto,
texto, “TEXTUALIDAD”
“TEXTUALIDAD” remite remite al al modo
modo de de toda
toda comunicación
comunicación
mediante
mediante signos.
signos. Schmidt
Schmidt ve ve la
la base
base deldel fracaso
fracaso en en definir
definir elel concepto
concepto de de “texto”
“texto” con con medios
medios exclusivamente
exclusivamente
lingüísticos
lingüísticos en en que
que los
los textos
textos “no “no son
son fenómenos
fenómenos puramente
puramente lingüísticos”.
lingüísticos”. “El “El concepto
concepto de de textualidad
textualidad hace hace
referencia
referencia al al carácter
carácter del
del concepto
concepto de de texto,
texto, aa lala compleja
compleja integración
integración de de los
los constituyentes
constituyentes del del texto
texto yy los
los
textos
textos en en los
los juegos
juegos de de actividad
actividad comunicativa/actos
comunicativa/actos verbales, verbales, yy elel carácter
carácter de de los
los textos
textos como
como realizaciones
realizaciones
lingüísticas
lingüísticas oo manifestaciones
manifestaciones socio-comunicativas
socio-comunicativas de de la
la textualidad”.
textualidad”. (LEWANDOWSKI,
(LEWANDOWSKI, 1992, 1992, s.s. v.:
v.:
“Textualidad”).
“Textualidad”).
15 En
15 En relación
relación al al concepto
concepto de de “TEATRALIDAD”,
“TEATRALIDAD”, tomaremos tomaremos provisoriamente
provisoriamente la la propuesta
propuesta en en el
el Taller
Taller de de
Teatralidad
Teatralidad II, II, realizado
realizado durante
durante el el “Encuentro
“Encuentro de de Estudiosos
Estudiosos de de Teatro”,
Teatro”, Buenos
Buenos Aires,Aires, 1987,
1987, que
que expresa:
expresa:
“Resultante
“Resultante del del espesor
espesor de de signos
signos [Barthes]
[Barthes] que que sese pone
pone dede manifiesto
manifiesto en en una
una representación
representación dirigidadirigida aa un
un
espectador:
espectador: signossignos producidos
producidos en en un
un espacio
espacio de de ficción,
ficción, en
en tanto
tanto espacio
espacio parapara ser ser mirado”
mirado” Cf.: Cf.: Boletín
Boletín del
del
Instituto
Instituto de de Teatro,
Teatro, N°N° VI,
VI, Facultad
Facultad de de Filosofía
Filosofía yy Letras,
Letras, UBA,
UBA, 1989,
1989, p.
p. 36.
36.
Nos
Nos remitimos
remitimos tambiéntambién al al artículo
artículo de de Josette
Josette FÉRAL
FÉRAL (1985,
(1985, p.137).
p.137). En
En p.p. 137
137 sese ensaya
ensaya una una interesante
interesante def.
def. dede
teatralidad,
teatralidad, resultante
resultante deldel acontecer
acontecer en en el
el contexto
contexto del del performance
performance yy del del teatro:“La
teatro:“La thétrâlité
thétrâlité apparaît
apparaît ainsi
ainsi
faire
faire dede deux
deux ensembles
ensembles différents:
différents: l’un,l’un, que
que metmet enen valeur
valeur lala perfonmance,
perfonmance, c’est c’est les
les réalités
réalités dede l’imaginaire;
l’imaginaire;
l’autre,
l’autre, que
que metmet enen valeur
valeur le le théâtre,
théâtre, c’est
c’est les
les structures
structures symboliques
symboliques précises.
précises. LesLes premières
premières s’originent
s’originent dans
dans
le
le sujet
sujet etet laissent
laissent parler
parler ses
ses flux
flux dede désir,
désir, les
les secondes
secondes inscrivent
inscrivent le le sujet
sujet dans
dans la la loi
loi et
et les
les codes,
codes, c’est-
c’est- à-dire
à-dire
dans
dans le le symbolique.
symbolique. Du Du jeu
jeu dede ces
ces deux
deux réalités
réalités naït
naït la
la théâtralité,...,
théâtralité,..., liée
liée àà un
un sujet
sujet désirant”.
désirant”.
16 Esto
16 Esto eses advertido
advertido por por Rousseau
Rousseau cuandocuando en en susu carta
carta aa D’Alembert,
D’Alembert, criticacritica alal teatro
teatro por por razones
razones de de moral
moral yy
política.
política. ParaPara este
este autor
autor la la idea
idea dede arte, corrompe la
arte, corrompe la presentación
presentación de de un
un hecho
hecho oo determinada
determinada cosa cosa por
por susu
representación. El
representación. El poder
poder político
político representa
representa el el poder
poder del
del pueblo,
pueblo, mostrado
mostrado como como voluntad
voluntad general.
general. El El teatro
teatro
410|
410| ricardo
ricardo sassone
sassone

Pero, más allá de lo dicho, el espectáculo no «es» - desde el punto de vista que
sostenemos, en cuanto a una “estética de la recepción” (JAUSS, 1992; especialmente
JAUSS, 1989, p.209ss) -, sino hasta que ingresa en el horizonte de expectativas del
receptor-destinatario -“puesto” en “estado de abierto” frente a la “pro-puesta” - del
proyecto artístico, quien desde su mirada y su spectare configura la “textualidad
espectacular” como ejercicio de reescritura en su experiencia de registro y captación
performativa, “presencial-vivencial”, de la obra en cuestión. Al hablar de “teatro-
presencia”, debemos ahora dar cuenta de la forma en que esta “presencia” se instancia. Por
un lado la obra, tiene la capacidad de generar “mundo” (mundo de la obra). En este
“mundo” se inscriben las acciones (físico-dramáticas) que, generando polarizaciones,
tensionarán el “espacio-tiempo” escénico, en tanto espacio de fuerzas mencionado,
configurado en clave ficcional. Y correlacionando todas las líneas discursivas o no
discursivas: gestuales y/o, corporales en sentido amplio, que, hasta el momento, se han
puesto en juego. Necesitamos introducir aquí algunas categorías fundamentales que hacen
a la comprensión de la “escena” en tanto laboratorio de la acción, tal como se ha
mencionado. En primer término, mencionaremos lo que para nosotros se da como
condición de posibilidad para que un objeto cualquiera se configure en el campo artístico, a
saber: el criterio de denegación1717 entendido como la convención que nos permite escindir
“mundos”. Esta “denegación” se plasma en dos modalidades: en sentido estricto o rígido;
en sentido amplio o lato. En el primer sentido, existe una delineación que marca sin lugar
a duda, cuál es el espacio del “actor intérprete” y el de “espectador”. En el segundo caso la
delineación es difusa, podríamos decir “porosa”, y da lugar a una “zona” de
indeterminación” en la que el “mundo ordinario” y el “extraordinario” se conjugan e
“inter-penetran”. Llamaremos e esta zona: “espacio-performática” en sentido estricto. En
estas propuestas espectaculares no “texto-centrista” - o sea: aquellas en las cuales un “eje
textual estructurado” no ordena unívocamente el sistema de codificación de la puesta en
escena- se pueden producir devenires cruzados entre “actor-intérprete” y “actor-social”:
espectador-receptor. Si analizamos ahora lo que ocurre en “continuum” de la acción,
podemos considerar el siguiente doble movimiento: acciones propias del “mundo de la
vida”, cotidiano, proyectadas sobre el “mundo de la obra”, extracotidiano - esto
constituirá lo que llamaremos “verosímil”1818: expresión del efecto que crea la “ilusión de
realidad” - y acciones propias del “mundo de la obra”, extracotidiano, proyectadas sobre el
“mundo de la vida, cotidiano” - esto constituirá lo que llamaremos “simulacro”. Nos
referiremos a este concepto siguiendo la línea de análisis de Baudrillard (1998), quien

se
se confronta
confronta con
con la
la fiesta
fiesta pública/popular
pública/popular que que deviene
deviene presentación
presentación ingenua
ingenua del del pueblo
pueblo ante
ante sísí mismo.
mismo. EstaEsta
relación
relación de
de ingenuidad
ingenuidad contrasta
contrasta con con loslos rasgos
rasgos queque definirían
definirían la la relación
relación (mediatizada)
(mediatizada) “arte “arte /público
/público
receptor”,
receptor”, tal
tal como
como el el atinente
atinente aa poner
poner enen juego
juego lala oscuridad
oscuridad deldel deseo.
deseo.
17 Corresponde
17 Corresponde aa la la visión
visión aristotélica,
aristotélica, planteada
planteada en en esa
esa obra
obra fundante
fundante que que eses la
la Poética,
Poética, la
la focalización
focalización de de las
las
condiciones
condiciones desde
desde laslas cuales
cuales se se puede
puede pensar
pensar lala obra
obra dede arte
arte como
como autónoma,
autónoma, característica
característica éstaésta que
que para
para
nosotros
nosotros sese encuentra
encuentra aa la la base
base de de lo
lo que
que hoy
hoy introducimos
introducimos como criterio de
como criterio de denegación.
denegación. La La separación
separación
conceptual
conceptual dede praxis
praxis yy póiesis
póiesis nos
nos presenta
presenta el el arte
arte como
como realización
realización de de una
una póiesis
póiesis aa través
través dede una
una cierta
cierta téchne
téchne
(un
(un hacer
hacer con
con conocimiento
conocimiento de de causa).
causa). LaLa obra
obra (materia
(materia yy forma),
forma), resultado
resultado de de lala realización
realización (téchne/
(téchne/ póiesis),
póiesis),
se
se producirá
producirá por
por mímesis
mímesis dede una
una forma
forma (eidos).
(eidos). En
En el
el arte
arte trágico,
trágico, tal
tal forma
forma eses la
la acción
acción (praxis).
(praxis). De De lolo dicho
dicho se
se
desprende,
desprende, entonces,
entonces, la la conocida
conocida fómula
fómula constructiva
constructiva aristotélica:
aristotélica: lala tragedia
tragedia es,es, ante
ante todo,
todo, unauna mímesis
mímesis dede
una
una praxis
praxis (mimesis
(mimesis praxeos).
praxeos). La La función
función del del poeta
poeta será
será creativa,
creativa, suponiendo
suponiendo un un trabajo
trabajo personal
personal de de
reelaboración
reelaboración que que arroja
arroja comocomo resultado
resultado la la trama
trama (mythos).
(mythos). Siguiendo
Siguiendo aa Ricoeur
Ricoeur (Tiempo
(Tiempo yy Narración,
Narración,
Configuración
Configuración deldel Tiempo
Tiempo en en elel Relato
Relato Histórico),
Histórico), interpretaremos
interpretaremos la la definición
definición de de mythos,
mythos, “disposición
“disposición de de los
los
hechos
hechos enen sistema”
sistema” (he (he ton
ton pragmaton
pragmaton systasis),
systasis), entendiendo
entendiendo systasis
systasis oo su su equivalente
equivalente synthesis
synthesis como
como
disposición,
disposición, sisi se
se quiere
quiere en en sistema,
sistema, de de los
los hechos.
hechos. Se Se trata
trata entonces
entonces de de imitación
imitación oo representación
representación en en sentido
sentido
dinámico
dinámico dede puesta
puesta en en escena,
escena, de de transposición
transposición en en obras
obras de
de representación
representación (ARISTÓTELES,
(ARISTÓTELES, 1974). 1974).
18 Cabe
18 Cabe mencionar
mencionar que que concebimos
concebimos el el “verosímil”
“verosímil” libre
libre de
de todo
todo resabio
resabio deldel primitivo
primitivo estadio
estadio mimético-
mimético-
descriptivo.
descriptivo.
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 411
411
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

expresa que el “simulacro” no se trata de “...una imitación, ni de reiteración, incluso ni de


parodia, sino de una suplantación de lo real, es decir de una operación de disuasión de todo
proceso real por su doble operativo”. Nos introducimos de este modo, en un “espacio-
tiempo” cuya curvatura no es ya “la de lo real, ni la de la verdad”, la era de la simulación se
abre, pues, “con la liquidación de todos los referentes”. El simulacro se instancia desde una
estrategia de “simulación”, marca de ausencia, “fingir tener lo que no se tiene”, en
contraposición con el “disimular”, marca de presencia, que es “fingir no tener lo que se
tiene”. Focalizando la cuestión desde el punto de vista de la imagen, nos apartamos del
principio de realidad, no es apariencia (buena o mala) ni juega a serlo (sortilegio), sino que
“se da como su propio y puro simulacro”.
Recapitulando, la introducción del criterio de denegación es lo que instrumentalmente
nos permite separar “mundos”, producir un hiato entre el orden del “movimiento general
del mundo de la vida”, orden de la presentación de los sucesos y el “mundo de la obra”,
orden de la “re-presentación”. En el ámbito que nos incumbe, el espectador experimenta la
ilusión teatral, la instauración del “como si”, formando parte del hecho artístico que se
constituye desde su mirada. El saber que lo que está percibiendo no existe realmente, no le
impide verse a sí mismo (reflexión de la mirada), implicado en cierto espacio lúdico, en el
cual se dispone a participar, cubriendo el mencionado horizonte de expectativas dentro del
cual se verificará la ocurrencia de ciertos sucesos (ludemas) que lo modificarán. En la
dialéctica creativa tomada como proceso, es necesario poder ubicarnos en un polo de
negatividad en relación al mundo, para luego poder afirmar algo acerca de él (polo de
positividad, doble negación), o sea: niego al mundo para poder hablar del mundo. En este
proceso, se producirá la instanciación de cierto mundo posible -en este sentido el artista,
como hemos dicho, crea “mundo”, genera un espacio de ficcionalidad- plasmado en el
artificio que denominamos en sentido lato “obra”. Entendemos entonces que nos
encontramos en un proceso sometido a las leyes del azar, en el cual el “objeto poético
(poiético)”, en el sentido de Rosset (1974), se libera de toda referencia a una naturaleza,
apareciendo como enteramente artificial. Esto hace a la pertenencia de la obra de arte al
“reino de lo fortuito”. La instauración de la denegación es, a nuestro criterio, condición
necesaria para considerar el despliegue del hecho teatral-performativo en sus distintas
dimensiones, las que consideraremos a la luz del desarrollo de Badiou1919.
Consideraremos que el “teatro-performance” produce en y por sí, un efecto de
verdad singular, que denominaremos “verdad-teatro”. Tal verdad se genera y despliega en
el espacio de representación en relación a una “idea-teatro”. El teatro es entonces el ámbito
en el cual la virtualidad de la idea baja a la actualidad del espacio escénico. Debe su
condición de existencia a ese momento y sólo a ese momento. El teatro considerado como
“acto de la idea” remite a una “verdad-teatral” que en sí misma es un acontecimiento en
virtud de lo cual esa “verdad” llega y existe, instanciada en ese momento. Advertimos aquí
una situación paradojal, ya que la inmediatez de esta “verdad” se presenta en el contexto
en que se representa.

19 BADIOU
19 BADIOU (1999).
(1999). Y
Y también:
también: BADIOU
BADIOU (2009,
(2009, p.121ss):
p.121ss): “(…)
“(…) El
El teatro
teatro es
es una
una disposición.
disposición. La
La disposición
disposición de
de
componentes
componentes materiales
materiales ee ideales
ideales extremadamente
extremadamente dispares,
dispares, cuya
cuya única
única existencia
existencia es es la
la representación.
representación. (…)
(…)
Sostenemos
Sostenemos entonces
entonces queque este
este acontecimiento
acontecimiento -cuando
-cuando es es realmente
realmente teatro,
teatro, arte
arte del
del teatro
teatro -- es
es un
un
acontecimiento
acontecimiento de de pensamiento.
pensamiento. Lo Lo que
que quiere
quiere decir
decir que
que lala disposición
disposición de de los
los componentes
componentes produce
produce
directamente
directamente ideas
ideas (mientras
(mientras queque la
la danza
danza más
más bien
bien produce
produce lala idea
idea de
de que
que elel cuerpo
cuerpo es es portador
portador de
de ideas).
ideas).
Estas
Estas ideas
ideas -y
-y éste
éste es
es un
un punto
punto esencial-
esencial- son
son ideas-teatro.
ideas-teatro. Lo
Lo que
que significa
significa que
que ellas
ellas no
no pueden
pueden serser producidas
producidas
en
en ningún
ningún otro
otro lugar,
lugar, por
por ningún
ningún otro
otro medio.
medio. Y Y también
también queque ninguno
ninguno de de los
los componentes
componentes tomados
tomados por
por
separado
separado es
es apto
apto para
para producir
producir ideas-teatro,
ideas-teatro, nini aún
aún el
el texto.
texto. La
La idea
idea adviene
adviene en en yy por
por la
la representación.
representación. EsEs
irreductiblemente
irreductiblemente teatral
teatral yy no
no preexiste
preexiste aa su
su llegada
llegada “sobre
“sobre el
el escenario””.
escenario””.
412|
412| ricardo
ricardo sassone
sassone

Por otro lado, el espacio de representación deviene punto de encuentro entre la


eternidad de la figura/forma y el instante, en y durante el tiempo de la representación. Así
un personaje (definido como: actor-personaje, cuerpo ausente, marca del cuerpo diferido
del autor) es en-carnado en el actor-intérprete/cuerpo-presente, existiendo sólo en el
momento efímero de la actuación y va decididamente en procura del “instante en que se
produce el encuentro con la eternidad de la figura” o tipo ideal. Tal es el tiempo propio del
teatro-performance, tiempo del artificio, condición de posibilidad del mencionado
encuentro entre el “instante de la actuación y la eternidad de la figura”. Del mismo modo
el texto teatral virtual y abierto por definición a interpretación, deviene texto teatral
efectivo, a instancias de la representación o teatralización. El cuerpo del actor y su voz, que
también forma parte del cuerpo, detentan la materialidad de la composición. Este artificio,
producto del encuentro del instante y la eternidad, conforma la dimensión de la
experiencia de “verdad-teatral”.
El hecho teatral como presencia y la verdad teatral, dan cuenta de la
presentificación de la “idea”. Este “estar ahí” de la “idea”, es lo que se opone frontalmente
al “lugar” de la “idea” en el contexto filosófico teorético, en el cual la “verdad” aparece
asociada a ciertas notas de eternidad, universalidad, etc. Y en muchos casos advertimos
que al suprimir alguno de estos atributos se derrumba el concepto, cayendo en
concepciones cercanas tanto al escepticismo como al dogmatismo abstracto o al
relativismo.
El teatro-performance organiza entonces la presencia colectiva de la figura, en este
encuentro entre instante y eternidad, implicando esto una experiencia y actividad pública.
Aparece aquí plasmada la dimensión política de la “verdad-teatral”. Así como planteamos
más arriba, la condición configuradora de la mirada del receptor, en relación a su condición
de ser parte de una operación pasible de ser leída en clave de razón estética2020, el público
tiene la función de completar la “idea”. Pero no se trata aquí de un colectivo social
homogéneo, sino depositario de la diversidad. Esto nos permite introducirnos en el ámbito
de lo genérico, y de una “universalidad concreta” en concomitancia con la singularidad
propia de la dimensión de la experiencia.
Podemos también considerar la existencia de una dimensión histórica de la
“verdad-teatral”, dado que el teatro nos permite “ver” amplificadamente, en la dimensión
del tiempo histórico, aspectos inherentes a la condición humana, plasmados en “tipos
ejemplares”. Tal experiencia, recuperada en clave política, nos permite aclarar nuestra
propia situación socio-cultural en nuestro tiempo histórico.
Desde las dimensiones en que se proyecta el hecho teatral, se comprende ahora la
razón por la cual el espacio teatral-performativo se configura como espacio ficcional de
elucidación veritativa no ficcional.

II.
II.
Nos plantearemos, finalmente, ciertos aspectos relacionales en la articulación teatro
y política, tomando en consideración lo expresado en cuanto a la dimensión política de la
“verdad-teatro”. Focalizando esta cuestión aparece también, en primer plano, la relación
entre el “dispositivo Teatro” y “dispositivo Estado”, y su dependencia sistémica y por
cierto estructural en relación a este último2121. Se pregunta al respecto Badiou (1993, xxxiv,
p.52)

20 Sobre
20 Sobre el
el particular,
particular, es
es de
de sumo
sumo interés
interés confrontar:
confrontar: CHANTAL
CHANTAL (1998,
(1998, cap.
cap. 2,
2, 33 yy 5).
5).
21 Un
21 Un marco
marco de
de referencia
referencia sobre
sobre los
los problemas
problemas alrededor
alrededor de
de esta
esta relación
relación de
de dependencia
dependencia lo
lo tenemos
tenemos en
en
BADIOU
BADIOU (1993).
(1993).
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 413
413
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

...tomado
...tomado en en el
el pliegue
pliegue del
del Estado,
Estado, ¿no
¿no es
es el
el teatro
teatro el
el único
único arte
arte que
que establece
establece una
una
visibilidad
visibilidad del
del Estado?
Estado? ¿El
¿El único
único arte
arte que
que lolo muestra?
muestra? ¿De ¿De qué
qué habla
habla el
el Teatro
Teatro sino
sino
de
de “estado”
“estado” del
del Estado,
Estado, del
del estado
estado de
de la
la sociedad,
sociedad, deldel estado
estado de
de la
la revolución,
revolución, del
del
estado
estado dede las
las conciencias
conciencias respecto
respecto alal Estado,
Estado, aa lala sociedad,
sociedad, aa lala revolución,
revolución, aa la
la
política?
política?

Más adelante queda definido el Teatro categóricamente como:


...arte
...arte de
de la
la declaración
declaración del
del estado
estado (de
(de las
las cosas)...
cosas)... El
El teatro
teatro representa,
representa, en
en efecto:
efecto:
representa
representa lala representación,
representación, no no la
la presentación...
presentación... Es Es lala ceremonia
ceremonia de de todas
todas las
las
ceremonias.
ceremonias. No No comienza
comienza aa nono ser
ser que
que la
la libertad
libertad (política...)
(política...) [en
[en referencia
referencia aa la
la
“escena
“escena originaria”
originaria” enen la
la cual
cual se
se conceptualiza
conceptualiza aa la la polis
polis griega]
griega] de
de juzgar
juzgar lala
representación
representación comocomo inmanente
inmanente aa las las condiciones
condiciones del del arte.
arte. Se
Se legitima
legitima en
en
representar
representar laslas representaciones.
representaciones. AsíAsí pues
pues enen la
la Idea
Idea todo
todo teatro
teatro es
es teatro
teatro de
de
Ideas.
Ideas.

Debemos introducirnos, entonces, en la cuestión de la articulación entre saber y


poder, ya que todo espacio de elucidación de la verdad nos remite al primer término, en
tanto que la presencia de todo dispositivo inherente al Estado, al campo de poder. Dado
que parte de las investigaciones foucaultianas se desarrollan en torno al análisis de la
conexión entre política y verdad, creemos apropiado ubicarnos dentro de este marco teórico.
Tenemos aquí planteado el problema de “cómo se formaron dominios de saber a partir de
las prácticas sociales” (FOUCAULT, 1980), o más específicamente, del problema de la
formación de ciertos determinados “dominios de saber” a partir de las “relaciones de
fuerza y relaciones políticas en la sociedad” (Ibidem, p.13, 31). Y, sin lugar a duda, el teatro
es una práctica social. Es factible, entonces develar los mecanismos que hacen al gobierno
de los hombres a través de la “producción de verdad”, entendida esta última no según la
posición de un gesto de “realismo gnoseológico” en cuanto a considerar la adecuatio entre
un sujeto y un objeto previamente constituidos, sino de un ordenamiento de dominios
donde la práctica de lo verdadero y de lo falso pueda ser regulada. Como ya vimos el
teatro produce cierto tipo de “verdad”. Si se ubica el régimen de producción
verdad/falsedad en el centro del análisis histórico y la crítica política, atendiendo a los
efectos de realidad asociados, entonces no aparecerá lo “real” como substancia “pre-dada”
sino como correlato producido. Al deslizarse, en Foucault, el análisis de la relación
saber/poder hacia el campo de lo político2222, se generan categorías importantes para nuestra
indagación: la definición del discurso como acontecimiento, el pasaje de una
caracterización puramente represiva del poder hacia otra en que se lo afirma como
productividad. El teatro es una práctica social productiva que arrastra dos marcas
históricas al respecto: la de póiesis, y la de téchne (ARISTÓTELES, 1974).
Expone Deleuze (1986)2323 que uno de los nudos de la denuncia nietzscheana en
relación a la filosofía occidental, es que la misma ocultó el vínculo entre saber y poder,
planteando el conocimiento como relación pura entre un sujeto y un objeto neutros. Esto
pone en el centro del debate el hecho de que la valoración, siendo condición y fuente de la
proyección del pensamiento, se confunde con el despliegue del poder. Expresa Nietzsche
(1973, p.189): “El llamado ‘instinto de conocimiento’ debe ser reducido a un instinto de
apropiación y conquista (...) La ‘verdad’ consiste en la voluntad de hacerse dueño de la

22
22 Esta
Esta inflexión
inflexión enen Foucault,
Foucault, está
está marcada
marcada porpor una
una práctica:
práctica: su
su participación
participación enen el
el “GIP”,
“GIP”, Grupo
Grupo de de
Información
Información sobre
sobre Prisiones,
Prisiones, yy un
un artículo
artículo teórico:
teórico: “Nietzsche,
“Nietzsche, genealogía,
genealogía, la
la historia”
historia” (1971),
(1971), luego
luego incluido
incluido
en
en FOUCAULT
FOUCAULT (1978). (1978).
23 Cf.:
23 Cf.: El
El concepto
concepto dede genealogía,
genealogía, §§ 1.1. Deleuze
Deleuze expresa
expresa desde
desde un
un principio
principio que:
que: “El
“El proyecto
proyecto másmás general
general de
de
Nietzsche
Nietzsche consiste
consiste en
en esto:
esto: introducir
introducir en en la
la filosofía
filosofía los
los conceptos
conceptos de
de sentido
sentido yy valor
valor (...)
(...) La
La filosofía
filosofía del
del
sentido
sentido yy de
de los
los valores
valores tenían
tenían que
que ser
ser una
una crítica.”
crítica.” A
A su
su juicio
juicio Kant
Kant no
no habría
habría realizado
realizado lala verdadera
verdadera crítica
crítica
ya
ya que
que no
no supo
supo plantear
plantear el
el problema
problema en en términos
términos dede valores.
valores.
414|
414| ricardo
ricardo sassone
sassone

multiplicidad de las sensaciones, en ordenar los fenómenos, en categorías determinadas...”.


Es interesante recalcar el papel de la voluntad -voluntad de poderío, en clave nietzscheana-,
en la articulación de saber y poder. Y como base de nuestra concepción de la obra de arte, se
encuentra la voluntad del ejecutor, en cuanto a tomar la decisión singular, tal como lo
hemos sostenido, de negar el mundo para poder “hablar del mundo”, sea para afirmarlo,
sea para transformarlo en un vector de cambio. Precisamente, la obra teatral se afirma
como obra de arte, desde la voluntad de poder del artista que la “con-firma”.
Podemos remitirnos a la tradición platónica para fundamentar la posición según el
cual se sostiene que “donde hay poder no hay saber”. La culminación en el orden histórico de
esa tradición se evidenciaría en el propio juicio a Sócrates. En el plano de la creación
artística y teatral, la configuración trágica del mythos, en el Edipo Rey Sófocles, se centraría
prima facie en torno a la misma cuestión: desde el saber explicitado en la resolución del
enigma, se llega a detentar la máxima investidura política, esto es: el poder asociado al
tyrannos. Tal coincidencia deviene, como es sabido, en la “falla trágica” (hamartia) que
conduce fatalmente al cambio de suerte del héroe y a su inevitable destrucción. La
interpretación de Foucault (1980, p.39), según la cual la tragedia es presentada como una
mera “historia de una investigación de la verdad” - nuevamente vemos la “escena
ficcional” operando como laboratorio de una posible acción efectiva inscripta en el “mundo
de la vida” - expresando que: “...Si hay algo parecido a un complejo de Edipo, éste no se da
a nivel individual sino a nivel colectivo; no a propósito del deseo y el inconsciente sino a
propósito del poder y saber”. Es entonces necesario comprender definitivamente que,
desde la producción artística, considerada la obra en tanto forma y contenido social en el
sentido de Hauser2424, la acción po(i)ética y su conceptualización estético-filosófica, se
inscribe tanto desde el lado del “saber” como desde su posibilidad de definirse dentro de
una estrategia y campo de “poder”, y que esto no es ajeno en modo alguno al “qué-hacer”
artístico. Al igual que en encadenamiento coerción-dirección, planteada por Gramsci en
torno al concepto de hegemonía, supone Foucault que: “...si [el poder] es fuerte, es debido
a que produce efectos positivos a nivel del deseo,..., y también a nivel del saber”.

III.
III.

Para concluir, deseamos correlacionar el posible despliegue de la “idea-teatro”, con el


recorrido propuesto por Nietzsche, en la parábola De las tres transformaciones
(NIETZSCHE, 1980, p.49-55, sub. nuestro) del espíritu: “cómo el espíritu se convierte en
camello, y el camello en león y el león, por fin, en niño”. Este despliegue, también aplicaría
al propio desarrollo de la “idea-arte”, instanciada en los tres momentos evolutivos
señalados: clásico, manierista y barroco. Y a la posible correlación entre: estética y ética;
po(i)ética y moral; estethos y ethos. De ser así, la “idea-teatro” podría derivarse, como caso,
de la “idea-arte” en general.

24
24 Asumiendo
Asumiendo la la estricta
estricta condición
condición ideológica
ideológica dede lala obra
obra artística,
artística, Hauser
Hauser (1975a)
(1975a) nosnos instala
instala en
en una
una
concepción
concepción de de arte
arte como
como forma
forma yy contenido
contenido social,
social, el
el cual
cual puede
puede aparecer
aparecer en en forma
forma dede manifestaciones
manifestaciones
explícitas,
explícitas, oo bien
bien en
en formas
formas dede meras
meras implicaciones,
implicaciones, expresadas
expresadas unasunas yy otras
otras aa través
través dede las
las más
más variadas
variadas
formas
formas estilísticas.
estilísticas. En
En otro
otro lado,
lado, expresa
expresa Hauser
Hauser (1975b,
(1975b, p.14),
p.14), aa modo
modo de de declaración
declaración de de principios,
principios, que
que el
el
arte
arte “constituye
“constituye el el substrato
substrato del
del comportamiento
comportamiento estético
estético normativo
normativo sólosólo cuando
cuando está
está en
en conexión
conexión con
con la
la
totalidad
totalidad dede lala vida
vida concreta,
concreta, práctica
práctica ee indivisible,
indivisible, cuando
cuando se se convierte
convierte enen vehículo
vehículo de de expresión
expresión yy enen el
el
medio
medio de de la
la intuición
intuición del
del hombre
hombre completo,
completo, cuando
cuando consigue
consigue encerrar
encerrar dentro
dentro dede sísí la
la suma
suma de de experiencias
experiencias
derivada
derivada dede lala práctica
práctica existencial
existencial ee incorporada
incorporada aa las
las formas
formas homogéneas
homogéneas de de sus
sus representaciones”.
representaciones”. O O sea
sea
que,
que, el
el fenómeno
fenómeno estético
estético en
en correspondencia
correspondencia con con la
la vivencia
vivencia plena
plena del
del mencionado
mencionado “hombre
“hombre completo”
completo” se se
corresponde
corresponde con con el
el proceso
proceso dinámico
dinámico en en el
el que
que el
el sujeto
sujeto creador
creador oo elel receptor
receptor sese identifican
identifican con
con el
el mundo
mundo
como presencia, no
como presencia, no pudiendo
pudiendo serser considerada
considerada lala obra
obra dede arte
arte como
como objetiva,
objetiva, cosificada
cosificada ee independiente
independiente del del
sujeto,
sujeto, fenómeno
fenómeno que que adquiere
adquiere susu sentido
sentido en
en conexión
conexión con
con lala totalidad
totalidad vital.
vital.
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 415
415
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

Tal vez podríamos caracterizar este primer momento, como el de un “arte del teatro-
camello”, considerando la posición crítica de Artaud (1964)2525 en relación al hecho teatral,
aunque sin compartir su concepto de “naturaleza”, que para nosotros, remite a natura
naturata antes que a natura naturans. Decía Artaud que lo que estorbaba al drama, al igual
que al resto de las artes, era la cultura, entendida ésta como “capa de artificios que la
civilización ha impuesto sobre la naturaleza humana” (1964, p. 25). La esencia de esta
“naturaleza” humana ha sido deformada por máscaras formalistas ficticias, normas de
conducta socialmente sancionadas que imponen, arbitrariamente, las costumbres y las
transmiten por efecto de la tradición (WELLWART, 1964). Sólo poniendo entre
paréntesis la cultura, según Artaud, aparecerán ante la consideración del artista los deseos
y aspectos primigenios, desde los cuales se podrá reformular el teatro. Si el mismo tiene
como misión reflejar la condición humana y ésta se encuentra signada por “la inflexible
maldad de los incomprensibles poderes cósmicos que lo gobiernan a su antojo” (1964, p.31),
tal teatro devendrá “teatro de la crueldad”, un teatro esencialmente extático. Tal vez esta sea
la “pesada carga” que arrastra el teatro desde sus tiempos fundacionales. Prosigue el
recorrido: “… Con todo esto carga el espíritu sufrido; como el camello cargado se interna en
el desierto, se interna él en su desierto. Mas en pleno desierto tiene lugar la segunda
transformación: la del espíritu en león ansioso de conquistar libertad y mandar en su
propio desierto”. En la soledad del desierto, el espíritu sufrido desconoce a su amo, su dios:
el “¡Tú debes!”, proclamando un sonoro “¡Yo puedo!”. Este es el momento de la subversión
y trasvasamiento de todo valor incluido en la mencionada carga, y aquí aparece una
salvedad: “Establecer valores nuevos - he aquí algo que ni aún el león es capaz de hacer-;
pero conquistar libertad para nueva obra - eso sí puede hacer el león. Conquistar libertad y
un santo ¡no! incluso ante el deber”. Es este el momento del “arte del teatro-león”, el
momento de la negatividad, de la puesta en crisis del “conceptos” enfrentados al “anti-
concepto”. Así operamos desde los pares dialécticos: estética/anti-estética; arte/anti-arte;
teatro/anti-teatro; filosofía/anti-filosofía; pedagogía/anti-pedagogía; etc. Pero este
enfrentamiento, no agota la cuestión del cambio, es en el fondo una disputa en el campo de
fuerzas del “poder”, campo de circulación del significante, campo de apropiación del
sentido. Es menester advertir la capacidad sistémica para neutralizar recurrentemente el
polo de negatividad. Siguiendo el hilo conductor de Baudrillard (1998, p.45) podemos decir
que:
Todo
Todo sese metamorfosea
metamorfosea en en término
término contrario
contrario para
para sobrevivir
sobrevivir enen susu forma
forma
expurgada.
expurgada. Todos
Todos los
los poderes,
poderes, todas
todas las
las instituciones,
instituciones, hablan
hablan de
de sí
sí mismos
mismos porpor
negación,
negación, para
para intentar,
intentar, simulando
simulando la
la muerte,
muerte, escapar
escapar dede su
su agonía
agonía real.
real. El
El poder
poder
quiere
quiere escenificar
escenificar su
su propia
propia muerte
muerte para
para recuperar
recuperar (...)
(...) existencia
existencia yy legitimidad.
legitimidad.

De este modo se permite hacer pié en su propia muerte simbólica, para relanzar un
nuevo ciclo de vida, a través del espejo de la crisis, de la negatividad y del “anti-poder”. En
clave del “arte” como práctica social, esto significa que es necesario pues, generar una
estrategia creativa conducente a la recuperación del concepto negado, reabsorbido en una
nueva matriz productiva (po(i)ética).
Es el tercer momento de la transformación que celebra la aparición del “arte del
teatro-niño”. Volviendo a nuestra parábola, advertimos que surge una pregunta:
(...)
(...) ¿de
¿de qué
qué empresa
empresa superior
superior aa las
las fuerzas
fuerzas del
del león
león será
será capaz
capaz elel niño?...
niño?... El
El niño
niño
es
es inocencia
inocencia yy olvido,
olvido, un
un nuevo
nuevo comienzo,
comienzo, un un juego,
juego, una
una rueda
rueda echa
echa aa girar
girar
espontáneamente,
espontáneamente, un un movimiento
movimiento inicial,
inicial, un
un santo
santo decir
decir ¡sí!
¡sí! Para
Para el
el juego
juego de
de la
la

25 Expresa
25 Expresa Artaud
Artaud (1964,
(1964, p.45s)
p.45s) con
con claro
claro compromiso
compromiso político:
político: “Pues
“Pues bien,
bien, yo
yo digo
digo que
que el
el actual
actual estado
estado social
social
es
es inicuo
inicuo yy debe
debe ser
ser destruido.
destruido. Si
Si este
este hecho
hecho atañe
atañe al
al teatro,
teatro, también
también atañe
atañe mucho
mucho más
más aa la
la metralla”.
metralla”. Y
Y más
más
adelante:
adelante: “El
“El teatro
teatro contemporáneo
contemporáneo está está en
en decadencia
decadencia porque
porque ha
ha perdido
perdido por
por un
un lado
lado el
el sentimiento
sentimiento dede lo
lo
serio,
serio, y,
y, por
por otro,
otro, el
el de
de la
la risa”.
risa”.
416|
416| ricardo
ricardo sassone
sassone

creación,
creación, hermanos,
hermanos, se
se requiere
requiere un
un santo
santo decir
decir ¡sí!
¡sí! Quiere
Quiere hacer
hacer ahora
ahora el
el espíritu
espíritu
su
su propia
propia voluntad;
voluntad; perdido
perdido para
para el
el mundo,
mundo, se
se conquista
conquista ahora
ahora su
su propio
propio mundo.
mundo.

El arma del “arte del teatro-niño”, se devela como poderosa, ya que la transgresión y
violencia de la etapa anterior no cuestionan más que el reparto de lo real. La estrategia del
arte, operando sobre el territorio performativo de simulación/simulacro, es infinitamente
más poderosa ya que permite suponer, más allá de su objeto, que “el orden y la ley mismos
podrían no ser otra cosa más que simulación” (BAUDRILLARD, 1998, p.47). El desafío de
la simulación es inaceptable para el poder, es entonces en la ausencia de lo real, donde hay
que enfocar el orden y no en otra parte. Si el arma absoluta del poder consiste en
impregnarlo todo de referentes, en salvar lo real, en persuadirnos de la realidad de los
problemas sociales, de la gravedad de los problemas económicos, de las finalidades de la
producción, para lograrlo, propaga efectivamente la crisis por doquier, a tal punto de
sostener publicitariamente, el verdadero slogan del llamado mercado global: “tomen sus deseos
por realidad”. En un mundo sin referencias, la referencia, valga la redundancia, deviene el
propio deseo; o lo que es peor: el hecho de confundir el principio de realidad con el principio
de deseo. Celebramos entonces cada vez que se percibe un estado de crisis, estado que se
presenta discursivamente como de “muerte del arte”, ya que siempre tendremos la
posibilidad de afirmar, ritualmente, desde nuestro sagrado derecho de decir ¡sí!, esto es: “el
arte ha muerto…, viva el arte”. Y tal vez sea esta la clave de nuestro posible “eterno
retorno”.

referencias
AA.
AA. VV.,
VV., Boletín
Boletín del
del Instituto
Instituto dede Teatro,
Teatro, N°N° VI,
VI, Facultad
Facultad de de Filosofía
Filosofía yy Letras.
Letras. UBA,
UBA, 1989.
1989.
ARISTÓTELES.
ARISTÓTELES. Poética. Poética. Ed.Ed. trilingüe
trilingüe griego,
griego, latín,
latín, castellano.
castellano. Madrid:
Madrid: Gredos,
Gredos, 1974.
1974.
ARTAUD,
ARTAUD, Antonin.
Antonin. El El teatro
teatro yy su
su doble.
doble. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Sudamericana,
Sudamericana, 1964.1964.
BADIOU,
BADIOU, Alain.Alain. Conferências
Conferências de de Alain
Alain Badiou
Badiou no no Brasil,
Brasil, Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica-Prefeitura
Autêntica-Prefeitura de de
Belo
Belo Horizonte,
Horizonte, 1999.
1999.
______.
______. Pequeño
Pequeño Manual
Manual de de Inestética.
Inestética. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Prometeo,
Prometeo, 2009.
2009.
______.
______. Rapsodia
Rapsodia por
por el
el teatro.
teatro. Málaga:
Málaga: Ágora,
Ágora, 1993.
1993.
BAJTIN,
BAJTIN, Mijail.
Mijail. Las
Las formas
formas de de tiempo
tiempo yy deldel cronotopo
cronotopo en en la
la novela
novela en:
en: Ensayos
Ensayos dede poética
poética histórica.
histórica.
Teoría
Teoría yy estética
estética de
de la
la novela.
novela. Madrid:
Madrid: Taurus,
Taurus, 1989.
1989.
BARBA,
BARBA, E., E., Conferencia,
Conferencia, Boletín
Boletín del
del Instituto
Instituto de
de Teatro,
Teatro, N°
N° VI,
VI, Facultad
Facultad de de Filosofía
Filosofía yy Letras,
Letras, UBA,
UBA,
1989.
1989.
BAUDRILLARD,
BAUDRILLARD, Jean. Jean. Cultura
Cultura yy Simulacro.
Simulacro. Barcelona:
Barcelona: Kairós,
Kairós, 1998.
1998.
BROOK,
BROOK, Peter.Peter. El
El espacio
espacio vacío.
vacío. Barcelona:
Barcelona: Península,
Península, 1973.
1973.
CABO
CABO VALVERDE,
VALVERDE, María María T. T. LaLa escritura
escritura del
del otro.
otro. Murcia:
Murcia: Servicio
Servicio de de Publicaciones,
Publicaciones, Univ.
Univ. de
de
Murcia,
Murcia, 1999.
1999.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles;Gilles; GUATTARI,
GUATTARI, Félix., Félix., ¿Qué
¿Qué eses filosofía?
filosofía? Barcelona:
Barcelona: Anagrama,
Anagrama, 2006.
2006.
______.
______. Mil
Mil Mesetas.
Mesetas. Capitalismo
Capitalismo yy esquizofrenia
esquizofrenia (II).
(II). Valencia:
Valencia: Pre-Textos,
Pre-Textos, 1994.
1994.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.Gilles. Nietzsche
Nietzsche yy lala filosofía.
filosofía. Barcelona:
Barcelona: Anagrama,
Anagrama, 1986.1986.
FÉRAL,
FÉRAL, Josette;
Josette; SAVONA,
SAVONA, Laillou; Laillou; WALKER,
WALKER, Edward.Edward. Théâtralité,
Théâtralité, écriture
écriture et
et mise
mise en
en scène,
scène,
Québec:
Québec: Hurtubise
Hurtubise HMH, HMH, 1985. 1985.
FOUCAULT,
FOUCAULT, M., M., LaLa verdad
verdad yy las
las formas
formas jurídicas,
jurídicas, Barcelona:
Barcelona: Gedisa,
Gedisa, 1980.
1980.
_____.
_____. Microfísica
Microfísica del
del poder.
poder. Madrid:
Madrid: La La Piqueta,
Piqueta, 1978.
1978.
GEIST,
GEIST, Ingrid
Ingrid (Comp.).
(Comp.). Procesos
Procesos de de escenificación
escenificación yy contextos
contextos rituales.
rituales. México:
México: PP yy V V Ed.,
Ed., 1996.
1996.
HALL,
HALL, Edward.
Edward. La La dimensión
dimensión oculta.
oculta. Madrid:
Madrid: Siglo
Siglo XXI,
XXI, 2003.
2003.
HAUSER,
HAUSER, Arnold.,
Arnold., Teorías
Teorías deldel arte.
arte. Tendencias
Tendencias yy método
método dede la
la crítica
crítica moderna.
moderna. Madrid:
Madrid: Punto
Punto
Omega,
Omega, 1975a.
1975a.
______.
______. Fundamentos
Fundamentos de de la
la sociología
sociología deldel arte.
arte. Madrid:
Madrid: Guadarrama,
Guadarrama, 1975b.
1975b.
______.
______. Historia
Historia Social
Social dede la
la Literatura
Literatura yy el el Arte.
Arte. Madrid:
Madrid: Guadarrama,
Guadarrama, 1974.1974.
HUSSERL,
HUSSERL, Edmund.Edmund. La La tierra
tierra no
no se
se mueve.
mueve. Madrid:
Madrid: Complutense,
Complutense, 2006.2006.
notas
notas para
para la
la comprensión
comprensión de
de la
la paradoja
paradoja contextual
contextual en
en relación
relación aa la
la configuración
configuración hecho
hecho teatral
teatral || 417
417
como
como presencia.
presencia. […]
[…]

JAUSS,
JAUSS, Hans.Hans. Continuación
Continuación del del diálogo
diálogo entreentre lala estética
estética de de lala recepción
recepción “burguesa”
“burguesa” yy
“materialista”.
“materialista”. In: In: WARNING,
WARNING, Rauner Rauner (Ed.).
(Ed.). Estética
Estética de de la
la recepción.
recepción. Madrid:
Madrid: Visor,
Visor, 1989.
1989.
______.
______. Experiencia
Experiencia estética
estética yy hermenéutica
hermenéutica literaria.
literaria. Madrid:
Madrid: Taurus,
Taurus, 1992.
1992.
LEWANDOWSKI,
LEWANDOWSKI, Theodor. Theodor. Diccionario
Diccionario de de Lingüística.
Lingüística. Madrid:
Madrid: Cátedra,
Cátedra, 1992.
1992.
MALLARME,
MALLARME, Stéphane.Stéphane. Un Un coupcoup de de dés
dés jamais
jamais n’abolira
n’abolira le le hasard.
hasard. In:
In: Ouvres
Ouvres Complètes
Complètes de de
Mallarmé.
Mallarmé. Paris:
Paris: Bibliothèque
Bibliothèque de de la
la Pléiade,
Pléiade, Gallimard,
Gallimard, 1998. 1998. Ref:
Ref: Una
Una tirada
tirada de
de dados
dados jamás
jamás
abolirá
abolirá el
el azar.
azar. Poema
Poema tipográfico
tipográfico de de Stéphane
Stéphane Mallarmé
Mallarmé pub. pub. orig.
orig. Revista
Revista Cosmópolis,
Cosmópolis,
1897.
1897.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Así Así habló
habló Zarathustra,
Zarathustra, Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 1980.
1980.
______.
______. En
En torno
torno aa la
la voluntad
voluntad dede poder.
poder. Barcelona:
Barcelona: Ediciones
Ediciones Península,
Península, 1973.1973.
ORDINE,
ORDINE, Nuccio,
Nuccio, L’utilità
L’utilità dell’inutile.
dell’inutile. Manifesto.
Manifesto. Milano:
Milano: Bompiani,
Bompiani, 2015.2015.
PAVIS,
PAVIS, Patrice.
Patrice. Diccionario
Diccionario de de teatro.
teatro. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Paidós,
Paidós, 1980.
1980.
______.
______. El
El análisis
análisis de
de los
los Espectáculos.
Espectáculos. Teatro,
Teatro, mimo,
mimo, danza,
danza, cine.
cine. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Paidós,
Paidós, 2000.
2000.
PESSOA,
PESSOA, Fernando.
Fernando. “El “El poeta
poeta es es un
un fingidor”.
fingidor”. Autopsicografia.
Autopsicografia. In: In: Antología
Antología poética.
poética. Trad.
Trad. Ángel
Ángel
Crespo.
Crespo. Madrid:
Madrid: Espasa
Espasa Calpe,
Calpe, 1998.
1998.
RANCIÈRE,
RANCIÈRE, Jacques.
Jacques. El El inconsciente
inconsciente estético.
estético. Buenos
Buenos Aires:
Aires: del del Estante,
Estante, 2005.
2005.
RICOEUR,
RICOEUR, Paul. Paul. ElEl sí
sí mismo
mismo como
como otro.
otro. Madrid:
Madrid: Siglo
Siglo XXI,
XXI, 1996.
1996.
ROSSET,
ROSSET, Clement.
Clement. La La anti-naturaleza.
anti-naturaleza. Madrid:
Madrid: Taurus,
Taurus, 1974.
1974.
SASSONE,
SASSONE, Ricardo.
Ricardo. A A intervenção
intervenção “estético-pedagógica”
“estético-pedagógica” ee sua sua fundamentação
fundamentação no no marco
marco de de uma
uma
‘estética
‘estética aplicada’
aplicada’ no no contexto
contexto institucional-curricular.
institucional-curricular. In: In: KOHAN,
KOHAN, Walter Walter (org.),
(org.),
Políticas
Políticas do
do ensino
ensino de
de Filosofía,
Filosofía, Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: CNPq
CNPq –– DP&A DP&A editora,
editora, 2004.
2004.
SASSONE,
SASSONE, Ricardo.
Ricardo. En En elel camino
camino de de la
la ficcionalidad
ficcionalidad teatral.
teatral. Notas
Notas acerca
acerca del
del “ser”
“ser” de
de “ser
“ser otro”.
otro”.
In:
In: HORMIGÓN,
HORMIGÓN, Juan Juan A A (edit).
(edit). DelDel pensamiento
pensamiento literario-dramático
literario-dramático al al pensamiento
pensamiento escénico.
escénico.
Madrid:
Madrid: Publicaciones
Publicaciones de de ADE
ADE // Asociación
Asociación de de Directores
Directores de de España,
España, serie:
serie: teoría
teoría yy
práctica
práctica teatral,
teatral, n.29,
n.29, 2008.
2008.
SCHECHNER,
SCHECHNER, Richard. Richard. Performance,
Performance, Teoría
Teoría yy prácticas
prácticas interculturales.
interculturales. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Libros
Libros deldel
Rojas,
Rojas, UBA,
UBA, 2000.2000.
STANISLAVSKI,
STANISLAVSKI, Constantin. Constantin. Ética Ética yy disciplina;
disciplina; método
método de de acciones
acciones físicas:
físicas: propedéutica
propedéutica del
del actor.
actor.
México:
México: Escenologia,
Escenologia, 2000. 2000.
TAYLOR,
TAYLOR, Diana.Diana. Performance,
Performance, Buenos
Buenos Aires:
Aires: Asunto
Asunto Impreso
Impreso Ed., Ed., 2015.
2015.
TERENCIO,
TERENCIO, Heautontimorumenos,
Heautontimorumenos, (El (El enemigo
enemigo de de sísí mismo).
mismo). Trad: Trad: José
José Juan
Juan Del
Del Col.
Col. En:En:
http://juan23.edu.ar/delcol/pdf/terencio_heautontimorumenos.pdf.
http://juan23.edu.ar/delcol/pdf/terencio_heautontimorumenos.pdf.
CHANTAL,
CHANTAL, Maillard.
Maillard. La La razón
razón estética.
estética. Barcelona:
Barcelona: Ed.Ed. Laertes,
Laertes, 1998.
1998.
VATTIMO,
VATTIMO, Gianni.Gianni. Ética
Ética dede la
la interpretación.
interpretación. Barcelona:
Barcelona: Paidós,
Paidós, 1991.
1991.
WELLWART,
WELLWART, George. George. Teatro
Teatro de de protesta
protesta yy paradoja.
paradoja. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 1964.
1964.
WITTGENSTEIN,
WITTGENSTEIN, Ludwig. Ludwig. Tractatus
Tractatus Logico-Philosophicus.
Logico-Philosophicus. Madrid:
Madrid: Alianza
Alianza Universidad,
Universidad, 1985.
1985.
WÖLFFLIN,
WÖLFFLIN, Heinrich.
Heinrich. Conceptos
Conceptos fundamentales
fundamentales de de la
la historia
historia deldel arte.
arte. Madrid:
Madrid: Austral,
Austral, 2007.
2007.
418
418
419
419

humanidad y cuerpos tecnológicos.


el bioarte en la enseñanza de la filosofía

gabriela d’odorico11

a. materiales vivientes en la creación artística

E n el año 2009 el artista Eduardo Kac propuso, dentro de su serie artística


Historia Natural del Enigma, la producción de un “plantimal” dentro de un
laboratorio biológico. Se trataba una planta con flores, genéticamente
manipulada, un híbrido del ADN del artista y una Petunia a la que llamó Edunia para
mantener la hibridación terminológica con su nombre de pila. Edunia era una obra
bioartística que expresaba el código genético de su creador exclusivamente en sus vetas
rojas.22
Este tipo de manifestaciones artísticas que hicieron proliferar la crítica estética,
ética y política, coinciden en poner a la vista una serie de deslizamientos entre la
experimentación científica y lo lúdico. En los últimos años, nuevas formas del arte
mostraron que la experimentación científica ilimitada y el juego creativo con materiales
vivientes pueden ser “modos de hacer” que se confunden, al punto de volverse
indiscernibles. Se trata de obras que cuestionan tanto el devenir actual del arte como el
significado al que llegó la experimentación en ciencia.
¿Qué significa que un investigador de un laboratorio biotecnológico pueda crear
piezas vivientes y difundirlas como obras de arte? ¿Qué criterios convierten en artista
performático a quien produce en laboratorios biotecnológicos obras de arte que luego
difunde y que son la resultante del juego experimental con células o tejidos cultivados?
¿Cuál es la novedad que aporta a la estética un cuerpo transformado con intervenciones
biomédicas e informáticas? ¿Qué estatuto tienen la vida y la muerte en los artefactos
culturales vivos asistidos biotecnológicamente que deberán ser desconectados con la
finalización de la muestra?
Estas preguntas iniciales nos permiten asomarnos a las dificultades que el
despliegue tecnocientífico introduce cuando se vincula con el arte y la filosofía. En ese
vínculo el arte se resiste a convertirse en un campo de experimentación, una zona liberada
de restricciones éticas y jurídicas, para probar el supuesto avance científico. A la vez, las
producciones más sofisticadas de la tecnociencia, como algunos artefactos informáticos y
biotecnológicos, exceden su carácter de meras herramientas para el arte contemporáneo.
La tensión entre arte y tecnociencia está presente en lo que hoy se denomina, en
términos generales, bioarte. Si bien, en sentido estricto, se utiliza esta denominación como
sinónimo de arte genético —arte que utiliza materiales vivientes y técnicas como el cultivo
de células y tejidos— en sentido amplio se denomina bioarte a obras que incorporan
avances tecnológicos de última generación provenientes de la biología, la ingeniería
genética, la informática o la robótica. En general se trata de producciones que requieren de
un importante soporte en conocimientos e infraestructura para la investigación biológica.
De allí que estas producciones se ubican en el umbral entre arte y tecnología, a la vez,
están habitadas por una serie de tensiones provenientes de esos campos. Estas obras de
arte, aunque no se inscriben en la producción tecnológica de objetos de uso, muchas veces

11 Instituto
Instituto de
de Investigaciones
Investigaciones “Gino
“Gino Germani”.
Germani”. Universidad
Universidad de
de Buenos
Buenos Aires.
Aires. Universidad
Universidad Nacional
Nacional de
de las
las
Artes,
Artes, Argentina.
Argentina. Email:
Email: gdodorico@sociales.uba.ar
gdodorico@sociales.uba.ar
22 Expuesta
Expuesta en
en 2009
2009 en
en el
el Weisman
Weisman ArtArt Museum,
Museum, enen Minneapolis.
Minneapolis. Teleprescence
Teleprescence and
and Bio
Bio Art.
Art. Networking
Networking
Human,
Human, rabbits
rabbits &
& robots.
robots. Michigan:
Michigan: University
University of
of Michigan,
Michigan, 2005.
2005.
420|
420| gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

no se distinguen de aparatos funcionales. Otras veces, estas expresiones artísticas se


presentan como proyectos de artefactos que poblarían nuestra vida cotidiana en un mundo
futuro completamente tecnologizado.
La muestra “+ Humanos. El futuro de nuestra especie” es una exposición producida
por la Science Gallery de Dublín en Barcelona y está constituida por una serie de muestras
tecnológicas.33 Allí se exponen unas cincuenta obras que exhiben posibles experimentos
respecto de nuestra concepción del cuerpo, de la vida, de la muerte y de lo humano. Entre
ellas encontramos la “Montaña Rusa Eutanásica” de Julijonas Urbonas, una máquina
imaginaria para quitar la vida que, a la vez, permite atravesar experiencias que van desde
la euforia a la emoción, mientras se atraviesa la visión en túnel, la pérdida de conciencia y
la muerte. O bien “Transfiguraciones”, de la diseñadora alemana Agatha Haines, quien
propone mejorar médicamente las funciones corporales, representadas en cinco bebés con
alguna modificación quirúrgica que resolverá una dificultad futura. También allí, el primer
cyborg reconocido como ciudadano de la historia expone su obra 'Cabeza sonocromática”.
El activista cyborg inglés, Neil Harbisson padece una enfermedad congénita que le impide
ver colores y se implantó en su cabeza un sensor que transforma los colores en música.
Estas expresiones nos remiten, inevitablemente, a la literatura, el cine y las series
de ciencia ficción que se aventuraron, con mayor o menor éxito, en la reconstrucción
artística de lo que podía denominarse, todavía, la utopía tecnológica del siglo XX. A la vez
actualizan lecturas clásicas, como Sobre la psicología de lo siniestro (1906) de Ernst Jentsch,
para caracterizar comportamientos y las experiencias subjetivas que nos arrojan a la
incertidumbre intelectual, oscilante entre la identificación y el rechazo frente a lo inusual
o incomprensible.44 El arte nunca dejó de incorporar las novedades técnicas de cada época.
Como lo expresaba Walter Benjamin, el arte moderno se imbrica en la compleja relación
tejida entre el desarrollo tecnológico y las actualizaciones del modo de producción
capitalista (BENJAMIN, 1989). El carácter reproductivo que adoptan esos vínculos, sin
embargo, no impide que el arte sea un modo del pensamiento capaz de estar a la altura de
su época.
El arte que trabaja con el cultivo de células, la producción de organismos
genéticamente modificados, la intervención sobre le ADN o el uso de tejidos vivos —
incluido en términos generales bajo la denominación de bioarte— está dando lugar a un
tipo de pensamiento que interroga, en mayor o menor medida, el grado de concreción y las
experiencias subjetivas provocadas por la utopía tecnológica del siglo XX a la que
referimos.

33 “+HUMANOS.
“+HUMANOS. El El futuro
futuro dede nuestra
nuestra especie”
especie” Sicence
Sicence Gallery
Gallery de de Dublin,
Dublin, Centro
Centro de de Cultura
Cultura
Contemporáneo
Contemporáneo de de Barcelona,
Barcelona, 77 octubre
octubre 2015
2015 -- 10
10 abril
abril 2016.
2016. Algunos
Algunos proyectos
proyectos artísticos
artísticos incluidos
incluidos en
en la
la
exposición
exposición son:
son: Portraits
Portraits of
of Aimée
Aimée Mullins
Mullins (Howard
(Howard Schatz),
Schatz), Oblique.
Oblique. Images
Images from
from Stelarc’s
Stelarc’s Extra
Extra Ear
Ear
Surgery
Surgery (Nina
(Nina Sellars),
Sellars), Strategies
Strategies for
for Copy
Copy Prevention
Prevention (Center
(Center forfor PostNatural
PostNatural History),
History), TheThe Human
Human
Pollination
Pollination Project
Project (Laura
(Laura Allcorn),
Allcorn), Tardigotchi
Tardigotchi (S.W.A.M.P.,
(S.W.A.M.P., TiagoTiago Rorke),
Rorke), Foragers
Foragers (Anthony
(Anthony Dunne,
Dunne,
Fiona
Fiona Raby),
Raby), Area
Area V5 V5 (Louis
(Louis Philippe
Philippe Demers),
Demers), Human
Human Version
Version (Yves
(Yves Gellie),
Gellie), Euthanasia
Euthanasia Coaster
Coaster
(Julijonas
(Julijonas Urbonas);
Urbonas); Optimization
Optimization of of Parenthood
Parenthood (Addie
(Addie Wagenknecht),
Wagenknecht), Semi-Living
Semi-Living Worry
Worry Dolls
Dolls (Tissue
(Tissue
Culture
Culture and
and Art
Art Project-
Project- Oron
Oron Catts
Catts && Ionat
Ionat Zurr),
Zurr), Transfigurations
Transfigurations (Agatha
(Agatha Haines),
Haines), AfterLife
AfterLife (Auger
(Auger //
Loizeau);
Loizeau); Misbehaving
Misbehaving Machines
Machines (Heidi
(Heidi Kumao),
Kumao), The The Machine
Machine to to BeBe Another
Another (BeAnotherLab)
(BeAnotherLab) yy
Ciborguismo
Ciborguismo (Cyborg
(Cyborg Foundation).
Foundation).
44 Uncanny
Uncanny valley:
valley: término
término acuñado
acuñado enen 1970
1970 en
en la
la robótica
robótica yy hoy
hoy utilizado
utilizado como
como hipótesis
hipótesis en
en la
la animación
animación 3D.
3D.
Se
Se afirma
afirma que
que las
las réplicas
réplicas antropomórficas
antropomórficas realistas,
realistas, causan
causan rechazo
rechazo entre
entre los
los observadores
observadores humanos.
humanos. ElEl
“valle”
“valle” es
es la
la inclinación
inclinación que
que se
se obtiene
obtiene en
en unun gráfico
gráfico que
que mide
mide la
la reacción
reacción positiva
positiva de
de las
las personas
personas según
según el
el
parecido
parecido humano
humano del del robot.
robot. Mac
Mac Dorman,
Dorman, Karl Karl (2005,
(2005, 106:118)
106:118) Esta
Esta hipótesis
hipótesis sese vincula
vincula alal concepto
concepto dede
“identidad
“identidad siniestra”,
siniestra”, Ernst
Ernst Jentsch,
Jentsch, On
On the
the Psychology
Psychology ofof the
the Uncanny
Uncanny (1906)
(1906) que
que luego
luego introdujera
introdujera Freud
Freud en
en el
el
psicoanálisis
psicoanálisis aa partir
partir de
de su
su ensayo
ensayo “Das
“Das Unheimliche"
Unheimliche" (1919)
(1919) traducido
traducido como
como "Lo"Lo Siniestro".
Siniestro".
humanidad
humanidad yy cuerpos
cuerpos tecnológicos.
tecnológicos. el
el bioarte
bioarte en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de la
la filosofía
filosofía || 421
421

b. bioarte: un pensamiento sobre la tecnociencia


Si bien la denominación de bioarte circula desde no hace demasiado tiempo
asociado a los avances de la ingeniería genética, la biotecnología y la robótica, el arte
transgénico puede remontarse a las obras del pintor y fotógrafo Edward Steichen. (KAC,
2007, p. 347-348). Steichen expuso en 1930 fotografías gigantes e instalaciones cuyos
motivos eran flores de colores diversos cultivadas por el artista a partir de la selección y
alteración química sistemática de semillas durante veintiséis años. 55 George Gessert, quien
también implementó la hibridación de flores con fines estéticos, fue uno de los primeros
artitas en acuñar el término bioarte y darle difusión (GESSERT, 2010). Con sus obras,
Gessert aviva la polémica contemporánea respecto de la manipulación de elementos
vegetales y reflexiona sobre la independencia del arte frente al uso de la genética en la
hibridación de plantas con fines alimentarios. (GESSERT, 2007).
En un sentido similar utilizaron el término bioarte los artistas transgénicos Joe
Davis y Eduardo Kac en sus presentaciones en el Festival Ars Electronica en 1999. Una de
las muestras emblemáticas de Kac fue GFPBunny (2000), obra de arte transgénico que
presentaba una coneja albina, Alba. Se intervino, en el ámbito del laboratorio, en el zigoto
de un antepasado de Alba con la proteína verde fluorescente (Green Fluorescent Protein o
GFP) producida por el ADN extraído de la medusa Aequorea Victoria (KAC, 2007: 163).
Alba no tenía pigmento dérmico, por eso era blanca con ojos rosados en condiciones
ambientales ordinarias, pero iluminada con la luz correcta producía una fosforescencia
verdosa. La creación de Alba fue seguida por una campaña de difusión con la imagen de la
coneja retocada fotográficamente con el color verde que sólo puede verse en cierto espectro
luminoso. A las discusiones éticas desatadas por la obra le siguieron las disputas por la
propiedad del animal producido con materiales del laboratorio. Además, como el Institute
Français de la Recherche Agronomique, mantuvo a Alba bajo custodia alegando un litigio por
el patentamiento, Kac inició acciones legales y una campaña pública que denominó Free
Bunny para la liberación de Alba (KAC, 2007, p. 170). El proceso de integración social de la
coneja y las discusiones provocadas fueron documentados y publicitados como parte de la
obra.
Estos antecedentes inauguran una serie experimental de obras hibridadas que
desataron cuestionamientos éticos, antropológicos, jurídicos y políticos alrededor de la
manipulación genética de especies con fines estéticos (D’ODORICO, 2015). El bioarte, en
particular el arte genético, interroga la estetización de la producción científica que parece
ocultar los subsidios de grandes corporaciones para la investigación de las
transformaciones de la vida y para patentar materiales, organismos y seres vivientes.
En otro plano de discusiones el bioarte se ubica en la zona liminal entre lo vivo y lo
muerto, entre lo viviente y las cosas inertes. Con ello plantea preguntas filosóficas que,
que, aa
lo largo del último siglo, vinculan la vida con la política o ubican a la biotecnología en un
lugar preponderante respecto del gobierno de la población. Los más significativos dentro
de estos planteos filosóficos son una serie de estudios aglutinados alrededor de nociones
como biopoder y biopolítica que tuvieron una gran proliferación durante las últimas
décadas.
Si bien los términos biotecnología, biopolítica y bioarte comparten un prefijo común
están siendo sometidos a una enorme demanda hermenéutica por diferenciarlos. Este
hecho los convierte en verdaderas cajas negras para el pensamiento contemporáneo que
está abocado a desentrañar los sentidos y el estatuto del bíos (vida) al cual cada uno refiere.

55 Es
Es un
un antecedente
antecedente artístico
artístico que
que juega
juega con
con procedimientos
procedimientos para
para reinventar
reinventar científicamente
científicamente la
la vida
vida yy la
la
naturaleza.
naturaleza. Cf.
Cf. DELPHINIUM,
DELPHINIUM, New New York:
York: Museo
Museo de
de Arte
Arte Moderno
Moderno de
de Nueva
Nueva York,
York, MoMA,
MoMA, 1936.
1936.
422|
422| gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

c. lo humano como problema filosófico biopolítico


La profusión de lecturas, definiciones e interpretaciones actuales acerca de las
nociones de biopoder y biopolítica toman como referencia inicial los textos de Michel
Foucault de la década de 1970. (FOUCAULT, 1990, 1999). Con posterioridad, al compás de
la dinámica histórica y política que trajo el cambio de siglo, ambas nociones fueron
cobrando singularidad en cada contexto teórico. Como señala Roberto Esposito, hay
antecedentes de este concepto que, ya a comienzos del siglo XX, se emparentan con
necesidades de gobierno específicas para la estabilización de los estados nacionales
(ESPOSITO, 2008, p. 29-30). Así es significativo que haya sido Rudolph Kjellen quien
acuñó la noción de biopolítica junto a geopolítica hacia 1916, ligando ambos términos a una
concepción organicista del Estado.
Esta primera indicación fue compartida y radicalizada por una serie de ensayos
alemanes de la época. Por ejemplo, Jakob von Uexküll, especialista destacado en biología
comparada y uno de los fundadores del pensamiento hoy denominado “ecologista”,
fundamenta una concepción vitalista del Estado-nación, al que concibe como “forma
viviente” regido por leyes biológicas. 66 El nuevo campo de la investigación científica debe
encontrar en la formación estatal, según von Uexküll, la anatomía y la fisiología que rige a
cualquiera de los organismos corporales analizados por la biología (AGAMBEN, 2006, p.
83). De allí la importancia de una biología y una medicina que se ocupen de las patologías
de ese organismo viviente que es el Estado.
Estos ensayos alemanes de la década de 1920 están animados por la esperanza de
encontrar, en los vínculos entre biología y Estado, claves para la comprensión de los
procesos sociales y para la implementación de políticas de gobierno específicas. El mundo
biológico se equipara a un equilibrio musical que conjuga secuencias de sonidos y silencios
no predeterminados; son las mismas melodías que se infieren del funcionamiento del
organismo estatal y que deben ser descubiertas para gobernarlo (VON UEXKÜLL, 2014,
p. 94).77 En definitiva, el afianzamiento de esa “forma viviente” llamada Estado es
semejante al equilibrio artístico que presenta la vida en los estudios biológicos de la época.
Aunque probablemente Foucault conociera estos trabajos, es llamativo que no los
considere como antecedentes de importancia ni biológica ni política (ESPOSITO, 2008, p.
41-42). El vínculo entre vida y política, para Foucault, se sustenta en fuentes teóricas
alejadas del organicismo político. Así se puede encontrar que hacia 1975 el filósofo francés
sitúa el inicio de una economía política de la salud en el siglo XVIII. Eso significó para el
autor la generalización de la medicalización y la proliferación de mecanismos de
interpenetración entre historia y vida dando lugar al despliegue de una verdadera
biohistoria (FOUCAULT, 1999).
Esos lineamientos fueron completados posteriormente en trabajos que afirman que
la vida ingresa en los mecanismos y cálculos del poder dando lugar al ascenso de un
biopoder que transforma la política, a través de sus prácticas e intervenciones, en una
biopolítica (FOUCAULT, 1990, p. 168). Así el viejo derecho soberano que identificaba el
peligro y decidía a través de la pena capital sobre la muerte o concedía la vida —hacer
morir y dejar vivir— va a quedar desacoplado dentro de esta nueva racionalidad
biopolítica. Con el ascenso del biopoder se invierte el viejo derecho afirmándose ahora el
“hacer vivir y dejar morir” como nueva lógica de gobierno. Claro que la vida ahora
involucrada, no concierne a los individuos sino a la “especie” humana. Es la vida en tanto

66 Jakob
Jakob von
von UexKüll
UexKüll desarrolla
desarrolla yy grafica
grafica la
la hipótesis
hipótesis del
del paralelismo
paralelismo entre
entre elel funcionamiento
funcionamiento de
de un
un
organismo
organismo animal
animal yy el
el de
de la
la formación
formación deldel Estado.
Estado. (VON
(VON UEXKÜLL,
UEXKÜLL, 2014,
2014, p.
p. 150).
150).
77 Son
Son de
de interés
interés especial
especial algunos
algunos análisis
análisis contemporáneos
contemporáneos sobre
sobre estas
estas metáforas
metáforas musicales.
musicales. (SLOTERDIJK,
(SLOTERDIJK,
2006,
2006, p.
p. 150;
150; DELEUZE,
DELEUZE, 2014,2014, p.
p. 15-16).
15-16).
humanidad
humanidad yy cuerpos
cuerpos tecnológicos.
tecnológicos. el
el bioarte
bioarte en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de la
la filosofía
filosofía || 423
423

especie la que entra progresivamente en los cálculos y la administración del Estado que,
apoyado en la incipiente ciencia estadística, puede medir la natalidad, la mortalidad, la
morbilidad o la longevidad. La estadística es la herramienta tecnológica que transforma a
la vida de la especie en una “población” susceptible de ser tratada como una variable
cuantificable y, por ello, volverse eficiente, aumentada y reproducida de un modo casi
ilimitado (FOUCAULT, 2006, p. 217-237).
La bipolítica se perfila como una gestión eficiente a partir de los registros
probabilísticas acerca de la vida de la población. Los cuerpos de la población ya no se
encuentran encerrados sino distribuidos en espacios abiertos, registrados y controlados a
través de estadísticas. Gracias a la tecnología social se puede “volver cada vez más
probable” la gestión de la vida. Así la biopolítica, volviéndose dependiente de la tecnología
social, aumenta progresivamente su fortaleza (DELEUZE, 2014, p. 84-85). A la vez la
biopolítica se ve implicada en problemas que la obligan a discutir el estatuto de esas vidas
que se gestionan, el significado de la muerte demorada, la ontología del cuerpo asistido
tecnológicamente, la categorización de la producción de materiales vivientes o la
funcionalidad de una humanidad que se diseña. Por eso, perspectivas biopolíticas
diferentes se orientan cada vez más a estudiar la incidencia de la tecnociencia en
discusiones, eminentemente políticas, como las que conciernen al estatuto de la vida y de
lo humano en este nuevo contexto tecnologizado (AGAMBEN, 2006; ESPOSITO, 2011;
LAZZARATO, 2008; VIRNO, 2005). Estas lecturas muestran que la afirmación
biopolítica acerca del “hacer vivir y dejar morir” puede extremarse, radicalizarse gracias a
la intervención biotecnológica. Eso significa pensar la posibilidad de un biopoder que se
afirmara sólo en el “hacer vivir” posponiendo en el tiempo el “dejar morir” o bien
experimentando en laboratorios biotecnológicos sobre la postergación indefinida de la
muerte.
De esta manera se puede ver que las reflexiones biopolíticas actuales enfrentan
problemas similares a los que adelantamos en los apartados anteriores como interrogantes
para el bioarte. Campos de conocimiento y acción diferentes como el arte, la filosofía y la
tecnología se encuentran compartiendo y construyendo problemáticas que les son
comunes.

d. arte y antropocentrismo
¿Y si la actual manifestación del biopoder estuviera realizando lo que fue la utopía
tecnológica del siglo XX? ¿No incluía esa utopía la prolongación de la vida de la especie
humana, la postergación ilimitada de la muerte de los cuerpos de la población? Estos
interrogantes, como señala Boris Groys, plantean una demanda utópica cuyos
antecedentes atraviesan todo el siglo XX. Se trata de recrear la la ilusión de inmortalidad
cimentándola en una concepción del biopoder que pudiera, tecnológicamente, aplazar
indefinidamente la muerte. Un biopoder tal que, dada su radicalidad, podría ser calificado
como intensivo (GROYS, 2014).
En la medida en que esta demanda de vida ilimitada se inserta en los actuales
desarrollos biotecnocientíficos se ve intensamente reanimada. La muerte, dentro de la
utopía, es pensada como un obstáculo que podría ser superado por un Estado
biotecnológico capaz de instalar un biopoder total y, con ello, una especie de “toma
biopolítica del mundo”. Nuestra imaginación acerca del futuro tal vez ya esté asumiendo
esta forma biopolítica radicalizada e intensiva a la que se refiere Groys.
Extremar las tesis biopolíticas, hipotetizar sobre una biopolítica radical, nos llevaría
a preguntarnos cómo definir el estatuto de la vida y de lo humano en contextos
tecnológicos desarrollados. En este sentido, hasta qué punto el apartamiento teórico de la
biopolítica foucaulteana significa, en algunos autores actuales, el regreso a una concepción
424|
424| gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

biopolítica organicista como la de los biólogos alemanes de los inicios del siglo XX.
(D’ODORICO, 2011, p. 115-164)
En esta reconstrucción de nuestro problema es posible ver que el bioarte se inscribe
como un pensamiento que revisa las concepciones vigentes acerca de la vida, del cuerpo, de
la muerte, del organismo y de lo humano. Sus obras, instalaciones e intervenciones
artísticas presentan perspectivas biopolíticas propias y producen reacciones críticas en
otras disciplinas y en el público en general. ¿Es el bioarte un campo para la
experimentación más o menos desregulado respecto de la normativa vigente en la
investigación científica? ¿Son las instalaciones bioartísticas lugares de ensayo para la
implementación de una biopolítica total? ¿Pueden los bioartistas interrogar críticamente la
biotecnología que sustenta y asiste sus propias obras? ¿Hasta qué punto el bioarte puede
convertirse en una práctica de resistencia biopolítica frente a los usos de la biotecnología?
Estos interrogantes involucran, por lo menos y en una primera instancia, a la
biología, la medicina, la informática, la ética, el derecho, la sociología o la psicología. El
bioarte aporta elementos de importancia para construir problemas que convocan a
disciplinas diversas. Especialmente en relación con la tecnología el bioarte delimita
problemas y convoca a la multidisciplinariedad porque no tiene una producción masiva, ni
respaldada en grandes colectivos artísticos. Su fuerte es el uso de espacios virtuales para la
difusión de obras pero, ante todo, de documentos y manifiestos estético-políticos que
toman posición frente al avance científico, difunden sofisticadas prácticas de laboratorio o
bregan por cierta concientización de la población.
Esa modalidad de intervención artística en la que se inscribe el bioarte tiene efectos
porque muchos movimientos críticos del tecnocapitalismo, antiglobales y regionales, han
ido adoptando herramientas y conceptos ya hibridados con el propio trabajo del arte
(Lazzarato, 2008). Es por ello que bioarte no es sólo una mixtura entre la creación artística
y las herramientas de laboratorios biológicos. (KAC, 2007, p. 19; TRATNIK, 2014). Las
obras bioartísticas, al mostrar el vertiginoso avance de la tecnología, son vías de acceso
para pensar el significado de la utopía tecnológica a la que aludíamos y para identificar sus
indicios en nuestra vida cotidiana.

e. la “humanidad” del cuerpo extendido


El proyecto Tissue Culture and Art (TC&A) dirigido por los artistas australianos
Oron Catts y Ionnat Zurr produce instalaciones artísticas a partir de tejidos celulares
vivos.88 Estos artistas se proponen estimular la reflexión acerca del modo en que los
humanos nos relacionamos entre nosotros, con otros seres vivos y con el resto de la
naturaleza (ZURR Y CATTS, 2006). El proyecto TC&A aprovecha los desarrollos
tecnológicos para la fabricación de piezas corporales de repuesto. Parten de una estructura
3D con la forma de algún órgano obtenida a partir del uso de polímeros biodegradables
dentro de y sobre los cuales cultivan células. El conjunto se mantiene con intervención
artificial en un biorreactor que oficia de “cuerpo tecnocientífico” porque recrea las
condiciones alimentarias, térmicas, gaseosas y de esterilidad, necesarias para la
supervivencia y crecimiento de una entidad que denominan semi-viva. Así mediante
técnicas de ingeniería de tejidos construyen - ¿crían? - nuevos objetos - ¿seres? -, entidades
parcialmente vivas con distintas formas, tipos de células, cuerpos de donantes y especies

88 Oron
Oron Catts:
Catts: Artista/Investigador
Artista/Investigador yy conservador.
conservador. Cofundador
Cofundador yy Director
Director Artístico
Artístico de
de SymbioticA.
SymbioticA. Fundó
Fundó
el
el proyecto
proyecto Tissue
Tissue Culture
Culture && Art
Art (TC&A)
(TC&A) en en 1996.
1996. Utiliza
Utiliza tejidos
tejidos vivos
vivos de
de organismos
organismos complejos
complejos como
como
medio.
medio. Ionat
Ionat Zutrr:
Zutrr: Artista/Investigadora
Artista/Investigadora yy curadora.
curadora. Residente
Residente yy Profesora
Profesora Adjunta
Adjunta en
en SymbioticA.
SymbioticA.
Cofundadora
Cofundadora del del proyecto
proyecto TC&A.
TC&A. Investiga
Investiga las
las implicaciones
implicaciones éticas
éticas yy epistemológicas
epistemológicas de
de las
las prácticas
prácticas
artísticas
artísticas de
de biología
biología húmeda.
húmeda.
humanidad
humanidad yy cuerpos
cuerpos tecnológicos.
tecnológicos. el
el bioarte
bioarte en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de la
la filosofía
filosofía || 425
425

(ZURR Y CATTS, 2006, p. 10). Estas piezas con fines estéticos, semi-vivas, en
crecimiento dentro de una obra viviente, hacen mutar la totalidad de la instalación
artística. Son proyectos tisulares con fines artísticos, que muestran la mecánica del actual
modo de producción bioartístico y biopolítico.
Una de las instalaciones biotecnológicas con semi-vivos del proyecto TC&A es
Semi-living worry dolls,99 es una serie de esculturas tisulares con forma de muñeca en
crecimiento dentro de un biorreactor. Inscribiéndose en la tradición popular, a partir del
nombre “quitapenas”, hicieron cobrar vida a las pequeñas muñecas guatemaltecas. La
leyenda aconseja, en la noche mientras dormimos, contar una pena a cada una de las seis
muñecas, colocadas debajo de la almohada, para despertar aliviados.
El proyecto TC&A presenta esculturas tisulares de cada muñeca sin identificación
de género;1010 creciendo bajo la asistencia permanente de un biorreactor. Cada una lleva el
nombre de los principales temores sociales que el público hizo llegar, en su momento, al
proyecto: Verdad Absoluta, Biotecnología, Capitalismo, Demagogia, Eugenesia y Miedo.
TC&A agregó una séptima muñeca irónicamente denominada Esperanza y diseñada para
verla morir colgada por el cuello. Los artistas quieren mostrar el significado de la vida
pensada sólo como un juguete de material genético. Así la instalación consta de siete
piezas asistidas por un biorreactor y un micrófono desde el cual el público se va turnando
para contar sus pesares (KAC, 2007, p. 237). Una interfaz, además, permite componer
sonidos musicales en forma colectiva. 1111
La red conceptual viviente tejida con los nombres de cada pieza —Verdad Absoluta,
Biotecnología, Capitalismo, Demagogia, Eugenesia, Miedo y Esperanza— interpela el
imaginario asociado con la utopía biotecnológica, el proyecto de un biopoder radical o
intensivo. Especialmente porque el público participa en el cierre de la exposición, es decir,
debe decidir cuándo y cómo detener la vida de estas piezas semi-vivas, tratadas
artísticamente como muñecas guatemaltecas mientras duró la instalación. Así se
experimenta en forma colectiva el significado de anteponer el lema biopolítico del “hacer
vivir” en un sentido extremo, de aplazar indefinidamente el “dejar morir” o la legitimidad
de los criterios antropocéntricos sobre la vida.
La instalación introduce una reflexión acerca de la muerte como parte de la vida,
junto con el sentido político de la intervención a través de la biotecnología en esos
procesos. ¿Qué significaría, entonces, la posible implementación de un proyecto biopolítico
de “producción” a gran escala de objetos-seres de vida parcial para injertos quirúrgicos,
tratamientos médicos o fines alimentarios? ¿Qué procesos de subjetivación política se
activan a través de la implementación de estos vínculos con lo viviente?
Las obras de Catts y Zurr obligan a redefinir la noción tradicional del cuerpo como
organismo que sentó las bases de la concepción biopolítica organicista (VON UEXKÜLL,
2014, p. 124). Con ello profundizan en el significado biopolítico del carácter productivo del
cuerpo de la población a partir de desarrollos tecnocientíficos y que la convierten en capital
humano genético (FOUCAULT, 2007, p. 267). Los artistas proponen utilizar la noción de
cuerpo extendido para incluir los aumentos, ampliaciones y asistencias biotecnológicas del
cuerpo biológico (CATTS Y ZURR, 2006, p. 10).

99 Muñecas
Muñecas quitapenas
quitapenas semi-vivas
semi-vivas fueron
fueron una
una de
de las
las primeras
primeras presentaciones
presentaciones artísticas
artísticas de
de esculturas
esculturas con
con “vida
“vida
parcial”.
parcial”. TC&A
TC&A en en colaboración
colaboración concon SimbioticA,
SimbioticA, University
University of
of Western,
Western, Australia,
Australia, 2000.
2000. Presentado
Presentado en
en
“Next
“Next Sex”,
Sex”, Ars
Ars Electronica
Electronica Festival
Festival in
in Linz,
Linz, Austria,
Austria, 2000.
2000.
http://www.tca.uwa.edu.au/ars/main_frames.html
http://www.tca.uwa.edu.au/ars/main_frames.html
10 Doll,
10 Doll, en
en inglés
inglés pierde
pierde la
la marca
marca dede género.
género. LaLa denominación
denominación muñeca
muñeca en
en español
español mantiene
mantiene el
el vínculo
vínculo con
con la
la
tradición
tradición cultural
cultural en
en la
la que
que se
se inserta
inserta la
la obra.
obra.
1111 La
La interfaz
interfaz Squeezables
Squeezables fue
fue desarrollada
desarrollada por
por MIT
MIT Media
Media Lab
Lab Hyperinstrument
Hyperinstrument Group.
Group.
426|
426| gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

Así, el cuerpo extendido constituye un meta-cuerpo cuyo origen histórico se


inscribe en los inicios del siglo XX, con los primeros cultivos de tejidos con finalidades
médicas. Las células y tejidos vivos siempre han existido sobreviviendo fuera de los
laboratorios durante horas y hasta días. Los laboratorios de investigación permitieron,
además extraer fragmentos tisulares fuera del cuerpo, mantenerlos vivos, reinjertarlos en
el cuerpo de la extracción o en otros cuerpos, incluso, de especies diferentes. Pero hace
unas décadas el cultivo de tejidos dejó de ser sólo un campo de investigación para
convertirse en un nuevo medio de producción que va creciendo en escala (CATTS Y
ZURR, 2006, p. 10). Esa producción incluye el proyecto de creación de seres quiméricos, es
decir, de formaciones constituidas por, al menos, dos tipos de poblaciones celulares
genéticamente distintas.
El cuerpo extendido ofrece una perspectiva conceptual y artística de la vida
mediada y aumentada que interroga la clasificación de los seres vivos en géneros y
especies, en escalas antropomórficas, en distinciones de raza, de sangre, de etnia, o de
morfología (CATTS Y ZURR, 2008, p. 130). Con el concepto de cuerpo extendido se
discuten las tesis acerca de la excepción humana, es decir, la afirmación moderna de que
hay una distinción ontológica que hace de lo humano algo excepcional - racional, conciente
- frente al resto de la naturaleza (SCHAEFFER, 2009, p. 23-26). Con esa revisión
ontológica el cuerpo extendido, inclasificable, obliga a examinar los ordenamientos
taxonómicos de la modernidad y todas las categorías asociadas a la vida.
Si la tecnologización de la vida produce el aumento de la “población” de estas vidas
parciales, si la cantidad de células y tejidos que viven y crecen fuera de sus organismos de
origen sigue proliferando, se advierte una instrumentalización que no puede ser
desvinculada de sus dimensiones económica y política. Ello obliga a reconocer el modo en
que esas vidas parciales nos asisten, nos sostienen y nos aumentan. Y eso supone
reconocernos a nosotros mismos en la noción de cuerpo extendido a partir de esa
progresiva asistencia tecnocientífica que ya no es sólo biológica, médica o farmacológica en
función del afianzamiento de un capital humano genético (FOUCAULT, 2007, p. 269). El
cuerpo hibridado y extendido desde la informática o la robótica originó estudios
antropológicos vinculados a lo cyborg (HARAWAY, 1991, p. 149-181). Reconocernos en un
cuerpo extendido nos pone a experimentar la radicalización del proyecto biopolítico que se
obstina en un “hacer vivir”, en extender la vida tecnológicamente más allá de los límites
biológicos o de la muerte orgánica.

f. fin: lo humano – hibridado


El músico Neil Harbisson, el primer ciudadano cyborg de la historia, se colocó en
2004 un eyeborg para suplir su imposibilidad de ver colores. El eyeborg es una antena que el
artista diseñó e implantó en su cabeza enfocando en la dirección de su vista. El sensor
envía lo percibido a un chip instalado en el cráneo que convierte las frecuencias de luz en
audibles y que él puede escuchar a través de los huesos. Así Harbisson oye colores
mediante ondas sonoras.1212 El año de su implante el gobierno británico negó al artista la
renovación del pasaporte alegando que una fotografía con dispositivos electrónicos en la
cabeza inhibe cualquier documento. Harbisson sostuvo su identidad cyborg y, después de
un tiempo, obtuvo su documento.
Harbisson brinda conciertos de colores conectando su ojo a altavoces y apuntando
la antena a las caras del público y a objetos coloridos. La demanda eyeborg no demoró y

12 El
12 El invento
invento creado
creado junto
junto con
con el
el británico
británico Adam
Adam Montandon
Montandon recibió
recibió el
el premio
premio británico
británico de
de innovación
innovación de
de
Submerge
Submerge enen Bristol
Bristol (Inglaterra,
(Inglaterra, 2004)
2004) yy el
el primer
primer premio
premio europeo
europeo en
en Interface
Interface Design
Design Europrix
Europrix Multimedia
Multimedia
Top
Top Talent
Talent Award
Award (Viena,
(Viena, 2004).
2004). Vitaliev
Vitaliev (2009,
(2009, p.
p. 26–28)
26–28)
humanidad
humanidad yy cuerpos
cuerpos tecnológicos.
tecnológicos. el
el bioarte
bioarte en
en la
la enseñanza
enseñanza de
de la
la filosofía
filosofía || 427
427

Harbisson creó, junto con artistas y tecnólogos, una organización internacional para
extender los sentidos y las capacidades humanas a través de prolongaciones cibernéticas en
el cuerpo. Así promueve el cyborguismo como movimiento artístico y social, defiende
derechos cyborg y desarrolla el sentido del color en comunidades con reducción visual
facilitando el acceso a eyeborgs.
Las extensiones corporales que trascienden andamiajes biológicos y los hibridan
con nuevas producciones tecnocientíficas radicalizan nuestros interrogantes
antropológicos. Las hibridaciones escapan a toda categorización humanista de la
modernidad y cuestionan de un modo radical las intervenciones biopolíticas que
necesariamente reposan sobre supuestos acerca de lo humano. Los híbridos permiten
recrear experiencias acerca de una continuidad material entre un entorno cada vez más
tecnologizado y una percepción intervenida para su adaptación a la tecnología. De ese
modo la supuesta interioridad humana, mientras se produce a sí misma, crea un mundo
que funciona automáticamente y se reproduce cada vez con mayor autonomía.
(TRATNIK, 2014).
Sin embargo, compartir esta hipótesis acerca de la continuidad material entre lo
humano y lo tecnológico no supone extraer las mismas consecuencias acerca del devenir
tecnocientífico. Así, posiciones superadoras del humanismo a través de las hibridaciones
autodenominadas transhumanistas o poshumanistas, celebran el desarrollo y la
intervención tecnológica sobre la vida en las mismas instalaciones artísticas como lo hacen
Kac, Stelarc o Harbisson. Otros artistas como Catts y Zurr, a través de sus híbridos,
proponen experiencias de interrogación sobre los propios prejuicios, los nuevos lazos
comunitarios y la tecnologización de la vida. En ambas perspectivas bioartísticas se señala
la necesidad de volver a pensar nuestra inserción reproductiva dentro del orden
tecnológico al que fuimos arrojados y las posibilidades efectivas de transformarlo.

referencias
AGAMBEN,
AGAMBEN, Giorgio.Giorgio. Lo Lo abierto.
abierto. El
El hombre
hombre yy el el animal.
animal. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Adriana
Adriana Hidalgo,
Hidalgo, 2006.
2006.
BENJAMIN,
BENJAMIN, Walter.Walter. La La obra
obra dede arte
arte enen lala época
época de de su
su reproductibilidad
reproductibilidad técnica.
técnica. In:
In: Discursos
Discursos
Interrumpidos
Interrumpidos I.I. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Taurus,
Taurus, 1989.
1989.
CATTS,
CATTS, Oron;Oron; ZURR,
ZURR, Ionat.Ionat. Hacia
Hacia una una nueva
nueva clase
clase de
de ser
ser –– El
El cuerpo
cuerpo extendido.
extendido. «Organicidades»
«Organicidades»
[modo
[modo en en línea].
línea]. Artnodes,
Artnodes, nº6.nº6. UOC,
UOC, 2006. 2006. Fecha
Fecha de de consulta:
consulta: 30/05/2015.
30/05/2015. Disponible
Disponible en: en:
http://www.uoc.edu/artnodes/6/dt/esp/catts_zurr.pdf.
http://www.uoc.edu/artnodes/6/dt/esp/catts_zurr.pdf.
CATTS,
CATTS, Oron;
Oron; ZURR,
ZURR, Ionat.Ionat. The
The Ethics
Ethics of of Experiential
Experiential Engagement
Engagement with with the
the Manipulation
Manipulation of of Life.
Life.
In:
In: COSTA,
COSTA, BeatrizBeatriz da; da; PHILIP,
PHILIP, Kavita Kavita (Eds).
(Eds). Tactical
Tactical Biopolitics
Biopolitics -- Art,
Art, Activism,
Activism, and
and
Technoscience.
Technoscience. USA:USA: The The MIT
MIT Press,
Press, p.
p. 125-142,
125-142, 2008.
2008.
D’ODORICO,
D’ODORICO, Gabriela.Gabriela. El El hombre
hombre imposible:
imposible: la la “naturaleza
“naturaleza humana”
humana” comocomo invención
invención tecnológica.
tecnológica.
Indistinciones.
Indistinciones. Tecnología,
Tecnología, naturaleza,
naturaleza, administración.
administración. Buenos
Buenos Aires,
Aires, Mnemosyne,
Mnemosyne, p. p. 115-164,
115-164, 2011.
2011.
______
______ Problemas
Problemas éticos
éticos de de la
la investigación
investigación socialsocial en en el
el nuevo
nuevo orden
orden tecnológico.
tecnológico. Revista
Revista Saber/Es,
Saber/Es,
Universidad
Universidad Nacional
Nacional de de Rosario:
Rosario: publicación
publicación de de lala Facultad
Facultad de de Ciencias
Ciencias Económicas
Económicas yy
Estadísticas,
Estadísticas, n.6,
n.6, p.5-15,
p.5-15, 2015.
2015.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. El
El poder.
poder. Curso
Curso sobre
sobre Foucault.
Foucault. Tomo
Tomo II.
II. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus, 2014.
2014.
ESPOSITO,
ESPOSITO, Roberto.
Roberto. El El enigma
enigma de de la la biopolítica.
biopolítica. In:In: Bíos.
Bíos. Biopolítica
Biopolítica yy filosofía.
filosofía. Buenos
Buenos Aires:
Aires:
Amorrortu,
Amorrortu, 2008,2008, p.p. 23-72.
23-72.
______.
______. El
El dispositivo
dispositivo dede la
la persona,
persona, Buenos
Buenos Aires:
Aires: Amorrortu,
Amorrortu, 2011.2011.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Derecho
Derecho de de muerte
muerte yy poder
poder sobre
sobre la
la vida.
vida. In:
In: Historia
Historia de
de la
la sexualidad.
sexualidad. La
La voluntad
voluntad
de
de saber.
saber. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Siglo
Siglo XXI,
XXI, 1990,
1990, p.p. 163-194.
163-194.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. ¿Crisis
¿Crisis dede la
la medicina
medicina oo crisis
crisis de
de la
la antimedicina?
antimedicina? Nacimiento
Nacimiento de de la
la medicina
medicina
social.
social. In:
In: Estrategias
Estrategias de de poder.
poder. Obras
Obras esenciales,
esenciales, volumen
volumen II.
II. Barcelona:
Barcelona: Paidós,
Paidós, 1999,
1999, p.
p. 343-384.
343-384.
______.
______. Defender
Defender lala sociedad.
sociedad. Curso
Curso enen el
el Colège
Colège dede France
France (1975-1976).
(1975-1976). Buenos
Buenos Aires:
Aires: Paidós,
Paidós, 2006.
2006.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Nacimiento
Nacimiento de de lala bipolítica.
bipolítica. Cours
Cours enen el
el Collège
Collège de
de France
France (1978-1979).
(1978-1979). Buenos
Buenos Aires:
Aires:
F.C.E,
F.C.E, 2007.
2007.
428|
428| gabriela
gabriela d’odorico
d’odorico

GESSERT,
GESSERT, George.
George. Green
Green Light,
Light, toward
toward an an Art
Art ofof Evolution.
Evolution. Cambridge,
Cambridge, MA; MA; London:
London: MITMIT Press,
Press, 2010.
2010.
______.
______. Al
Al cielo
cielo pero
pero nono con
con ellos.
ellos. In:
In: Revista
Revista aa mínima,
mínima, Barcelona,
Barcelona, n.13,
n.13, p.
p. 6-19,
6-19, 2007.
2007. Disponible
Disponible en:en:
http://newmediafix.net/aminima/Gessert.pdf.
http://newmediafix.net/aminima/Gessert.pdf. Consultado Consultado en: en: 21/08/2015.
21/08/2015.
GROYS,
GROYS, Boris.
Boris. Cuerpos
Cuerpos inmortales.
inmortales. In: In: Volverse
Volverse público.
público. Las
Las transformaciones
transformaciones del del arte
arte en
en el
el ágora
ágora
contemporánea.
contemporánea. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Caja
Caja Negra,
Negra, 2014,
2014, p.
p. 149-162.
149-162.
HARAWAY,
HARAWAY, Donna. Donna. Simians,
Simians, Cyborgs
Cyborgs and and Women:
Women: The The Reinvention
Reinvention of of Nature.
Nature. New New York:
York: Routledge,
Routledge,
1991.
1991.
JENTSCH,
JENTSCH, Ernst.Ernst. OnOn the
the psychology
psychology of of the
the Unncany.
Unncany. Angelaki.
Angelaki. Journal
Journal ofof the
the Theoretical
Theoretical Humanities
Humanities
(trans.R.
(trans.R. Sellars
Sellars 1997),
1997), UK:
UK: Routledge
Routledge ,v.2,
,v.2, n.1,
n.1, p.
p. 7-16,
7-16, 1906.
1906.
KAC,
KAC, Eduardo.
Eduardo. Signs
Signs of
of Life.
Life. Bio
Bio Art
Art and
and Beyond.
Beyond. Cambridge,
Cambridge, MA: MA: MITMIT Press,
Press, 2007.
2007.
LAZZARATO,
LAZZARATO, Maurizio. Maurizio. Las Las miserias
miserias de de la
la ‘crítica
‘crítica artista’
artista’ yy del
del empleo
empleo cultural.
cultural. In:
In: Producción
Producción
cultural
cultural yy prácticas
prácticas instituyentes.
instituyentes. Líneas
Líneas de
de ruptura
ruptura en en la
la crítica
crítica institucional.
institucional. Madrid:
Madrid: Traficantes
Traficantes dede
sueños,
sueños, 2008,
2008, p.
p. 101-120.
101-120.
MACDORMAN,
MACDORMAN, Karl. Karl. Androids
Androids as as an
an experimental
experimental apparatus:
apparatus: Why Why is is there
there anan uncanny
uncanny valley
valley and
and
can
can wewe exploit
exploit it?.
it?. Toward
Toward Social
Social Mechanisms
Mechanisms of of Android
Android Science,
Science, Cognitive
Cognitive Science
Science Society,
Society,
p.106-118,
p.106-118, 2005.
2005.
SCHAEFFER,
SCHAEFFER, Jean-Marie.
Jean-Marie. La La tesis
tesis dede la
la excepción
excepción humana.
humana. In: In: El
El fin
fin de
de la
la excepción
excepción humana.
humana. Buenos
Buenos
Aires:
Aires: Siglo
Siglo XXI,
XXI, 2009,
2009, p. p. 21-53.
21-53.
SLOTERDIJK,
SLOTERDIJK, Peter. Peter. Esferas
Esferas III
III (Espumas).
(Espumas). Madrid:
Madrid: Siruela,
Siruela, 2006.
2006.
TRATNIK,
TRATNIK, Polona.
Polona. Hacer
Hacer lala presencia.
presencia. Fotografía,
Fotografía, arte
arte yy (bio)
(bio) tecnología.
tecnología. México:
México: Herder,
Herder, 2014.
2014.
VIRNO,
VIRNO, Paolo.
Paolo. Cuando
Cuando el el verbo
verbo se se hace
hace carne.
carne. Lenguaje
Lenguaje yy naturaleza
naturaleza humana.
humana. Madrid:
Madrid: Traficante
Traficante de de
sueños,
sueños, 2005.
2005.
VITALIEV,
VITALIEV, Dimitri.
Dimitri. The
The eyeborg
eyeborg man.man. Engineering
Engineering & & Technology,
Technology, v. v. 4,
4, n.
n. 8/9,
8/9, p.26-28,
p.26-28, May
May 2009
2009
VON
VON UEXKÜLL,
UEXKÜLL, Jakob. Jakob. Carta
Carta décima
décima (Estado).
(Estado). In: In: Cartas
Cartas biológicas
biológicas aa una
una dama.
dama. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus,
2014,
2014, p.
p. 127-137.
127-137.
ZURR,
ZURR, Ionat;
Ionat; CATTS,
CATTS, Oron. Oron. ¿Utopía
¿Utopía sin sin víctimas
víctimas oo hipocresía
hipocresía sin sin víctimas?.
víctimas?. Revista
Revista aa mínima,
mínima, nº
nº 12,
12,
Barcelona,
Barcelona, 2006,
2006, p.
p. 6-19.
6-19.
429
429

ix. tempo,
finitude,
inquietude e
formação de si.
430
430
431
431

la duración en el espacio educativo

olga grau11
A
A diferencia
diferencia de
de Newton
Newton yy Schopenhauer,
Schopenhauer, nono creía
creía en
en un
un tiempo
tiempo uniforme,
uniforme, absoluto.
absoluto. Creía
Creía
en
en infinitas
infinitas series
series de
de tiempos,
tiempos, en
en una
una red
red creciente
creciente yy vertiginosa
vertiginosa de
de tiempos
tiempos divergentes,
divergentes,
convergentes
convergentes yy paralelos.
paralelos. Esa
Esa trama
trama de
de tiempos
tiempos que
que se
se aproximan,
aproximan, se
se bifurcan,
bifurcan, se
se cortan
cortan oo
que
que secularmente
secularmente sese ignoran,
ignoran, abarca
abarca todas
todas las
las posibilidades.
posibilidades.
(J.L.
(J.L. Borges,
Borges, “El
“El jardín
jardín de
de los
los senderos
senderos que
que se
se bifurcan”)
bifurcan”)

H an sido escasos los acercamientos realizados desde la filosofía de la


educación al pensamiento de Bergson, lo que puede tener su explicación
en el hecho de que el filósofo no hace mayores abordajes específicos en
este ámbito, ofreciéndonos, de manera dispersa, algunas referencias a la enseñanza de las
disciplinas, las capacidades de la infancia, la necesidad de los estudios clásicos y la
diferenciación de tipos de educación. En forma explícita, encontramos referencias a la
educación moral en Las dos fuentes de la moral y la religión, y alusiones a la instrucción
pública en algunos de sus discursos.
Bergson ha sido un pensador un tanto olvidado en los espacios de la academia y sus
lectores no son tan frecuentes, pese a ser una figura decisiva en el pensamiento francés y
europeo en las tres primeras décadas del siglo XX. Actualmente, se lo ha revalorizado a
partir de las lecturas de Bachelard, Deleuze, Yankelevitch, Worms, entre otros. La edición
realizada por Deleuze de fragmentos de sus obras, bajo el nombre de Memoria y vida (1977),
ordenados según algunas categorías que éste destaca, junto a su libro El bergsonismo (1987) y
las referencias a las imágenes en movimiento en Cine I. Bergson y las imágenes (2009) han
sido una invitación para muchos a leer contemporáneamente a Bergson por sí mismo.
Por nuestra parte, hemos emprendido la lectura de sus textos en la búsqueda de
filosofías que en su propio modo encarnen la vida, se vinculen a la comprensión de la
experiencia, y que disuelvan en sus particularidades las dicotomías o los dualismos
consuetudinarios, como, en el caso de Bergson, el de cerebro y mente o cuerpo y espíritu,
materialismo e idealismo, junto a otros.
Y es a propósito del VIII Coloquio Internacional de Filosofía y Educación, que he
querido acercar en este trabajo su concepto de la duración al espacio educativo, y extraer y
elaborar, a partir de sus reflexiones filosóficas, algunos elementos que nos permitan
generar determinadas derivaciones útiles a nuestra intención. Siguiendo el sentido de las
reflexiones bergsonianas, podríamos pensar alterar los variados espacios en los que la
experiencia educativa se realiza, haciéndolos propicios para el pensar creador y el actuar
generador de nuevos caminos para el despliegue del ser propio de quienes los habitan,
independientemente del lugar que ocupen en tales espacios. La experiencia subjetiva
suscitada siempre en la interacción con los otros o lo otro, podría verse enriquecida desde
las sugerencias de esta filosofía que invita a desperezarnos, aproximándonos al “buen
sentido” que consiste, en palabras de Bergson, en “saber recordar, pero más todavía en
saber olvidar”, es decir, en saber dejar atrás, en una movilidad del pensamiento que sigue la
movilidad de las cosas y se abre a su novedad.
El desarrollo de este enfoque pondrá en relación la duración bergsoniana con el
arrojo en la búsqueda de lo nuevo, arrojo que podemos considerar infantil, en el riesgo y en
el orden de lo imprevisible. Bergson pone el término duración en relación a las ideas de
movimiento, cambio, creación, heterogeneidad, novedad, imprevisibilidad,
irreversibilidad, sucesión, impulso vital, continuidad, indivisibilidad, que son nombres que

11 Universidad
Universidad de
de Chile.
Chile. Email:
Email: ograu_2000@yahoo.com
ograu_2000@yahoo.com
432|
432| olga
olga grau
grau

dan cuenta de un mismo sentido, de modo que podemos valernos de tal preñada palabra
para la reflexión propuesta.
Señalo en lo que sigue, algunos pasos que puedan ir profundizando en la relación
señalada, que no son sino momentos de la duración de este texto.

duración
duración yy percepción
percepción del
del cambio:
cambio: la
la expansión
expansión de
de la
la experiencia
experiencia yy el
el lugar
lugar de
de las
las artes
artes
Bergson (2013), en su texto “La percepción del cambio”, apela a que podamos
“reconquistar el cambio y la duración en su movilidad original” volviendo a la percepción
y logrando “que ella se dilate y extienda” (ibid, p.151). ¿Qué significa esta reconquista y de
qué manera puede darse esta experiencia de dilatación y extensión de la percepción? Se
trataría, en definitiva, de poder aproximarse a las diferencias cualitativas de las cosas del
mundo, externas o internas a nosotros, enriqueciendo nuestra visión del universo, visión
debilitada por el necesario trabajo de la inteligencia que requiere de generalizaciones y
abstracciones en su comprensión, uso y dominio de la realidad. En numerosas ocasiones
Bergson nos invita a distanciarnos de los moldes, de los esquemas de generalización, de
nuestros hábitos de clasificación o comprensión habitual, para poder captar las cosas en su
presencia y en tanto portadoras de un tiempo continuo, la duración, que las hace ser las que
son en sus variaciones y alteraciones. Utiliza de pronto una expresión que puede
parecernos curiosa: en una conferencia pide a sus estudiantes y a quienes le escuchan, que
hagan “un esfuerzo violento para apartar algunos de los esquemas artificiales que
interponemos, sin saberlo, entre la realidad y nosotros” (Ibid, p.160). A su juicio, muchos
de nuestros hábitos de pensar y percibir se nos han hecho naturales y con los cuales habría
que romper, tarea que no parece fácil de realizar, pero que Bergson señala como necesidad:
“Es preciso volver a la percepción directa del cambio y de la movilidad” (Ibid, p.160) y en
otro pasaje, “reconquistar el cambio y la duración en su movilidad original” (Ibid, p.159).
Podríamos decir, que en el transcurrir de la vida, en el desenvolvimiento de la
inteligencia que opera para la vida práctica, o amante de establecer comprensiones estables,
acontece una pérdida de un modo de relación con el mundo de carácter más abierto. Tanto
a nivel de los conceptos como de las percepciones se produciría un debilitamiento de la
captación del cambio, la movilidad, la duración. Se trataría, entonces, de la recuperación de
esta captación. Bergson nos propone para ello una atención que distinga las diferencias
cualitativas de las cosas, que haga posible, en definitiva, su “contemplación”,
percibiéndolas en su movilidad y cambio. Podríamos ser invitados con esta propuesta, al
cultivo de una mirada anti-estática, pero sí estética, con percepciones atentas a lo que
acontece rodeándonos.
Esa propuesta contrasta, de manera generalizada, con la configuración de los
espacios educativos formales que parecen obstaculizar o no favorecer la experiencia
contemplativa activa, puesto que estos espacios han sido más bien conservadores en sus
formas y dinámicas. Mantienen, fundamentalmente, la estructura con la que fueron
creados, la que corresponde a un momento de la modernidad y sus lógicas de
determinación de series progresivas y acumulativas de capital; en el caso de la educación,
se transfiere ese sentido a la adquisición y acumulación del conocimiento, del capital
simbólico, y a la institución de niveles, grados de progresividad recortados en función de la
edad. Por otra parte, la memorización o retención de contenidos, que se dictaminan por la
autoridad educativa como los más significativos, viene a ser una piedra fundamental en la
construcción del sistema, junto con el carácter enciclopédico de la adquisición del
conocimiento aún presente, prácticas que se oponen a una educación que apunte a la
intuición y que permita la captación de la fluencia de la vida, su carácter moviente.
Si consideramos la movilidad de lo real, su constante cambio y expansión, la
experiencia educativa queda tremendamente limitada si es la acumulación solidificada el
la
la duración
duración en
en el
el espacio
espacio educativo
educativo || 433
433

signo de sus procesos. La modernidad instaló un modo de vérselas con la diversidad de los
entes que conforman la realidad, haciendo surgir el apetito por la clasificación, el
ordenamiento y administración de los géneros y, de manera más manifiesta y acentuada,
una tendencia de la inteligencia por el dominio del mundo. El ver los agrupamientos de las
cosas en función de características comunes, hace que los sentidos y la conciencia
proporcionen de la realidad una “simplificación práctica”, que se distancia de la
complejidad del percibir la individualidad de las cosas:
(…)
(…) diremos
diremos queque no no vemos
vemos las
las cosas
cosas mismas;
mismas; nos
nos limitamos,
limitamos, lala mayor
mayor parte
parte de
de las
las
veces,
veces, aa leer
leer las
las etiquetas
etiquetas pegadas
pegadas aa ellas.
ellas. Esta
Esta tendencia,
tendencia, nacida
nacida dede la
la necesidad,
necesidad,
se
se ha
ha acentuado
acentuado todavía
todavía más
más bajo
bajo la
la influencia
influencia del
del lenguaje.
lenguaje. Pues
Pues las
las palabras,
palabras, aa
excepción
excepción de de los
los nombres
nombres propios,
propios, designan
designan géneros
géneros (BERGSON,
(BERGSON, 2016,2016, p.137).
p.137).
En Los datos inmediatos de conciencia, Bergson pone la atención en un problema que
es central para abordar las orientaciones del pensamiento en la comprensión de lo real, cual
es la distinción entre las semejanzas y las diferencias que nuestra conciencia es capaz de
percibir en el mundo de las cosas y los individuos y las relaciones que establecemos entre
ellos. Nuestro pensamiento opera estableciendo esos reconocimientos de semejanza y
diferencia entre las cosas, de homogeneidad y heterogeneidad, pero sería la percepción de
la diferencia la que nos haría evidenciar lo propio singular de un ente en su propia
duración. Podría afirmarse que Bergson invita al ejercicio de la mirada por lo singular, por
el encuentro de la percepción con la diferencia y su singularidad.
En un pasaje de La risa, alude a esa capacidad de distinguir que tenemos los seres
humanos:
Resulta
Resulta poco
poco probable
probable que
que el
el ojo
ojo del
del lobo
lobo establezca
establezca una
una diferencia
diferencia entre
entre el
el cabrito
cabrito
yy el
el cordero;
cordero; sese trata,
trata, para
para el
el lobo,
lobo, de
de dos
dos presas
presas idénticas,
idénticas, igualmente
igualmente fáciles
fáciles de
de
prender,
prender, igualmente
igualmente buenas
buenas para
para devorar.
devorar. Nosotros
Nosotros establecemos
establecemos una
una diferencia
diferencia
entre
entre la
la cabra
cabra yy el
el carnero;
carnero; ¿pero
¿pero distinguimos
distinguimos una una cabra
cabra de
de una
una cabra,
cabra, un
un carnero
carnero
de
de un
un carnero?
carnero? LaLa individualidad
individualidad de de las
las cosas
cosas yy de
de los
los seres
seres se
se nos
nos escapa
escapa siempre
siempre
que
que no
no nos
nos es
es materialmente
materialmente útilútil percibirla
percibirla (Ibid, p.136).22
(Ibid, p.136).
Sin embargo, podríamos decir que el pastor reconoce la diferencia entre una oveja y
otra oveja de su rebaño, en función de la utilidad de saber que no se le ha escapado
ninguna. En ese sentido, se podrían advertir dos tipos de utilidad a las que atiende nuestro
pensamiento, la de la inteligencia que generaliza para el manejo práctico o utilitario de las
cosas reconociendo lo común en ellas, y la de la percepción que individualiza para el
manejo práctico de las cosas reconociendo la diferencia en ellas. Pero, para Bergson, habría
una percepción más compleja, más allá del principio utilitario, que sería la percepción
contemplativa, intuitiva, que reconocerá las diferencias y variaciones en un individuo en
su propia duración.
Cómo acercar la percepción a la sutileza y energía vibratoria del momento presente
de una cosa o de una persona que contiene todo su pasado y lo que en su presente abre.
Cómo percibirla en su duración. Un aprendizaje en tal sentido dis-loca posiciones fijas,
estables e invita a permanecer en contacto con las cosas y con los hombres, lo que a juicio
de Bergson exige un esfuerzo de tensión intelectual, el del buen sentido. “Es trabajoso”
(BERGSON, 2016, p.165). Bergson utilizará las expresiones de tensión y elasticidad, como
“fuerzas complementarias que la vida pone en juego”:

22 Imposible
Imposible no
no recordar,
recordar, aa propósito
propósito de
de este
este pasaje,
pasaje, el
el extraordinario
extraordinario relato
relato de
de Borges,
Borges, “Funes
“Funes el
el memorioso”,
memorioso”,
quien,
quien, situado
situado más
más allá
allá del
del principio
principio de
de utilidad,
utilidad, no
no podía
podía reconocer
reconocer que
que el
el perro
perro visto
visto de
de frente
frente era
era el
el mismo
mismo
visto
visto de
de lado.
lado. Llegaba
Llegaba aa identificar
identificar las
las distintas
distintas posiciones
posiciones de
de la
la corporalidad
corporalidad del
del perro
perro en
en el
el espacio,
espacio, con
con
individualidades
individualidades distintas,
distintas, en
en una
una suerte
suerte de
de delirante
delirante percepción
percepción de
de la
la diferencia
diferencia yy variación
variación de
de las
las cosas
cosas que
que
se
se le
le ofrecían
ofrecían aa su
su mirada.
mirada. Veía
Veía el
el cambio
cambio dede posiciones
posiciones recortadamente,
recortadamente, impedido
impedido dede ver
ver el
el perro
perro en
en su
su
duración.
duración.
434|
434| olga
olga grau
grau

Lo
Lo que
que la
la vida
vida yy lala sociedad
sociedad exigen
exigen dede cada
cada uno
uno de
de nosotros
nosotros es
es una
una atención
atención
constantemente
constantemente alerta
alerta que
que discierna
discierna los
los contornos
contornos de
de la
la situación
situación presente,
presente, yy
también
también una
una cierta
cierta elasticidad
elasticidad del
del cuerpo
cuerpo yy dede la
la mente
mente que
que nos
nos permita
permita
adaptarnos
adaptarnos aa ella
ella (BERGSON,
(BERGSON, 2016, 2016, p.146).
p.146).
Cuando el cuerpo carece de ellas se presentan accidentes de todo tipo, las
enfermedades, la minusvalía. Y cuando el alma carece de estas fuerzas, se da la pobreza
psicológica en todas sus variaciones y las locuras de todo tipo se manifiestan.
Podríamos decir que el esfuerzo intelectual configura un pensamiento en lo
moviente de la vida: una experiencia en suspensión en lo imprevisible y, al mismo tiempo,
en el enraizamiento. Una expresión coloquial que dice relación con el experimentar y
sentir lo imprevisible, es la expresión “Es la vida”, "É a vida", “C’est la vie”, “That is life”,
“So ist das leben”, “É la vita”, expresión que pareciera universal y presente en las más
variadas lenguas. Por una parte, podría entenderse como una manera de aceptación estoica
de aquello que sucede a nuestro pesar, de pasividad frente a lo que acontece, pero por otra,
que es la que exploramos aquí, puede significar la disposición serenada hacia la
contingencia, en lo que ella, como siempre, abre o cierra en el juego de las posibilidades
que ofrece la ocasión y de la voluntad que elige, o elige no elegir, entre aquello que entrevé
como posibilidades brindadas por un presente.
Siempre quedará la imaginación para volver e inventar imaginariamente los cursos
de una posibilidad o alternativa en los caminos de la vida que no tomamos y que ésta nos
ofrece. Bergson, en su ensayo La risa, llamará a esta potencia, imaginación poética, a la
capacidad que tenemos de volver sobre nuestros pasos “y seguir hasta el final las
direcciones entrevistas”. La imaginación poética juega con lo entrevisto que queda
suspendido en su realización, reserva su fuerza de aparición para encontrar, podríamos
decir, su materialidad y su exterioridad en el lenguaje. Nos dice Bergson (2016, p.147):
Concedo
Concedo queque Shakespeare
Shakespeare no no ha
ha sido
sido Macbeth,
Macbeth, ni
ni Hamlet,
Hamlet, ni
ni Otelo;
Otelo; pero
pero hubiera
hubiera
sido
sido esos
esos diversos
diversos personajes
personajes sisi las
las circunstancias,
circunstancias, de
de un
un lado,
lado, yy el
el consentimiento
consentimiento
de
de su
su voluntad,
voluntad, del
del otro,
otro, hubieran
hubieran llevado
llevado al
al estado
estado de
de erupción
erupción violenta
violenta lo
lo que
que en
en
él
él sólo
sólo no
no fue
fue sino
sino acceso
acceso interior.
interior.
La imaginación poética no es sino una comprensión más completa de la realidad. Los
personajes creados de manera tan vitalizada, son, a juicio de Bergson, el poeta mismo,
multiplicado, que profundiza en sí mismo “en un esfuerzo de observación tan potente que
capta lo virtual en lo real (…)” (Ibid, p.146). Hay “puntos de bifurcación” a lo largo de
nuestro camino, entrevemos muchas direcciones posibles “aunque sólo podamos tomar
una”.
Siempre podemos activar, a través de la voluntad, una energía que, situada en la
bifurcación, en la encrucijada, abre posibilidades a nuestro ser. En ese sentido podemos
pensarnos desde la multiplicidad, como muchas posibilidades de ser que portamos: unas
quedan asomadas, por decirlo así; a otras les prestamos materialidad. El “espíritu”, dice
Bergson (2012, p.45), es una “fuerza que puede sacar de sí mismo más de lo que tiene”. Y la
voluntad, tiene la capacidad de crear energía con un efecto que puede ser enorme, en la
expansión de la vida en acciones libres.
La expansión implica creación, y “el acrecentamiento de la personalidad mediante
un esfuerzo que saca mucho de poco, algo de nada, (…) que añade sin cesar a aquello que
había de riqueza en el mundo” (BERGSON, 2012, p.37). El artista en la riqueza y
originalidad de las formas que crea, señala un esplendor de la vida, una potencia. Y el
creador por excelencia, el abridor de nuevos caminos, es aquel cuya acción, intensa en sí
misma, es capaz de intensificar a su vez la acción de otros hombres encendiendo así focos
de generosidad.
Los sueños y la imaginación poética serán posibles ocasiones para realizar lo
entrevisto que no alcanzó a tener su realización, la compensación a la frustración del deseo
la
la duración
duración en
en el
el espacio
espacio educativo
educativo || 435
435

o al freno de determinados impulsos. Dirá Bergson que nuestra vida en estado de vigilia es
siempre trabajo, dado que en todo momento debemos elegir y en todo momento debemos
excluir. Se elige entre los recuerdos el que mejor se adapta al estado presente, y “esta
adaptación continuamente renovada, es la condición de lo que llamamos el buen sentido.
Pero adaptación y elección te mantienen en un estado de tensión ininterrumpida”
(BERGSON, 2012, p.114).
Si nos preguntáramos, cómo podríamos lograr en los espacios educativos una
ampliación de la experiencia, una ejercitación en la percepción de las cosas, tal como la
concibe Bergson (2013, p.160), él mismo nos ofrece un tipo de mirada cercana a la
movilidad de lo real: la mirada y la sensibilidad de los artistas, como almas privilegiadas que
pueden llegar a percibir lo moviente, “que ven y nos hacen ver lo que no percibimos
naturalmente” (Ibid, p.153). Poetas, novelistas, dramaturgos, pintores, escultores, músicos
compositores, desprendidos de fines más prácticos, hacen posible que accedamos a la
comprensión de una percepción individualizada de la realidad, nos hacen saber de una
mayor extensión de las facultades del percibir que proporciona el ver la cosas por ellas
mismas, en el percibirlas en su devenir.
Ya en uno de sus primeros escritos, La risa, Bergson señalaba la significación del
arte y su parentesco con la risa en tanto esta surge interrumpiendo las cadenas de sentido
fijadas por el hábito, los conceptos estables: la risa se produce por la desviación de la vida
hacia lo mecánico. La mirada del artista, tendería a un modo “virginal” de ver, de oír, o
pensar, aunque sólo coge el mundo desde una sola dirección o sentido, artes visuales,
literatura, música. Sin embargo, en todas sus formas,
el
el arte
arte no
no tiene
tiene otro
otro objeto
objeto que
que el
el de
de apartar
apartar los
los símbolos
símbolos pragmáticamente
pragmáticamente útiles,
útiles,
las
las generalidades
generalidades convencional
convencional yy socialmente
socialmente aceptadas,
aceptadas, todo
todo aquello
aquello que,
que, en
en
suma,
suma, nos
nos oculta
oculta la
la realidad,
realidad, para
para colocarnos
colocarnos cara
cara aa cara
cara frente
frente aa la
la realidad
realidad
misma
misma (BERGSON,
(BERGSON, 2016,2016, p.140).
p.140).
Para Bergson, el arte es una visión más directa de la realidad que implica una
mayor pureza de la percepción, la que requiere de ciertas condiciones para su realización:
“una ruptura con la convención útil, un desinterés innato especialmente localizado del
sentido o de la conciencia; en suma, una cierta inmaterialidad de la vida (…)”. Es decir,
sólo a fuerza de cierta inmaterialidad puede lograrse la proximidad con la realidad
(BERGSON, 2016, p.140).
En el arte, en sus múltiples manifestaciones, se expresa una percepción única, en un
presente también único, irrepetible, de condiciones que no volverán a darse jamás. Esta
percepción única ocurre fuera de la reproducción: lo que produce el artista “se produjo una
vez para nunca más reproducirse”, y amalgamaría un estado de la conciencia o del alma
con una materialidad que cobra forma única a través de la acción del artista.
De
De ahí
ahí sese sigue
sigue que
que elel arte
arte aspira
aspira siempre
siempre aa lo lo individual.
individual. Lo
Lo que
que el
el pintor
pintor fija
fija
sobre
sobre el
el lienzo
lienzo es
es lo
lo que
que haha visto
visto en
en un
un determinado
determinado lugar,
lugar, un
un determinado
determinado día,día, aa
una
una determinada
determinada hora,
hora, con
con colores
colores que
que nono volverán
volverán aa verse.
verse. Lo
Lo que
que canta
canta elel poeta
poeta
es
es un
un estado
estado dede ánimo
ánimo queque fue
fue suyo,
suyo, solo
solo suyo,
suyo, yy que
que nunca
nunca jamás
jamás volverá.
volverá. LoLo que
que
el
el dramaturgo
dramaturgo pone pone ante
ante nosotros
nosotros es es el
el despliegue
despliegue de de un
un alma,
alma, es
es una
una trama
trama
viviente
viviente dede sentimientos
sentimientos yy acontecimientos,
acontecimientos, algo algo que,
que, en
en fin,
fin, tuvo
tuvo lugar
lugar una
una vez
vez
para
para no
no volver
volver aa reproducirse
reproducirse jamás.
jamás. Aunque
Aunque tratemos
tratemos de de dar
dar nombres
nombres generales
generales aa
estos
estos sentimientos,
sentimientos, en en otra
otra alma
alma ya ya no
no serán
serán lo
lo mismo.
mismo. Están
Están individualizados.
individualizados.
Sobre
Sobre todo
todo porpor eso
eso pertenecen
pertenecen al al arte,
arte, pues
pues las
las generalidades,
generalidades, loslos símbolos,
símbolos,
incluso
incluso loslos tipos,
tipos, sisi ustedes
ustedes quieren,
quieren, son son lala moneda
moneda corriente
corriente dede nuestra
nuestra
percepción
percepción cotidiana
cotidiana (Ibid.,
(Ibid., p.143).
p.143).
Bergson, pese a la potencia de las artes aludidas, privilegiará la música por sobre las
otras, porque, a su parecer, es en la música donde podemos captar de mejor manera la
continuidad del devenir; allí el ritmo encuentra las más variadas expresiones de cambio, de
movimiento.
436|
436| olga
olga grau
grau

más allá de los automatismos. cultivar la atención.


Bergson expresaba que la risa de lo que ríe, como en el ejemplo paradigmático de
cuando alguien involuntariamente se cae, es de los mecanismos que enrigidecen las
respuestas ante lo imprevisto o inadvertido, de las fijaciones que limitan los movimientos
adaptativos a las circunstancias o escollos nuevos, la falta de flexibilidad y atención. El
hábito o la costumbre, alimentados por la inercia podríamos decir, dominan muchas veces
el presente y no permiten la atención a la actualidad. Para Bergson la vida no debería
nunca repetirse en toda su plenitud circunstanciada, porque, en sus palabras, donde quiera
que haya repetición, donde quiera que haya semejanza completa, se vislumbra en seguida
lo mecánico funcionando tras lo vivo. Y nos reímos siempre que una persona nos da una
impresión de cosa, porque el automatismo de su acción resulta ser el movimiento sin la
vida.
La vida y el vivir en sociedad exigen una atención despierta, alerta, una distinción
de los límites de la situación presente, la elasticidad del cuerpo y del espíritu que nos
capacite para adaptarnos a la situación nueva (BERGSON, 2016, p.46). En el rostro mismo
podemos estar dando señas de un “mohín fijo” o de una “mueca arraigada”, “mueca única
o definitiva” o la “arruga adquirida y conservada”, gestos que, sedimentados, dan cuenta
de rasgos del carácter que se solidifican, se cristalizan, se estabilizan. Nos dice Bergson,
que lo que mueve a risa en una fisonomía es el “(A)utomatismo, la rigidez, el hábito
adquirido y conservado”, caracteres que, en definitiva, podemos atribuirlos “a una causa
profunda, a una cierta distracción fundamental de la persona, como si el alma se hubiese
dejado fascinar, hipnotizar por la materialidad de una acción simple” (Ibid., p.51). Llevado
al extremo el planteamiento de Bergson, podría decirse que un carácter atento a la vida y
dispuesto al cambio podría tener un rostro despejado de marcas indelebles 33. Sin embargo,
dice Bergson, ni el rostro más armonioso logra ocultar “el indicio de un hábito que se
anuncia, el esbozo de una posible mueca” y no logra tampoco evadir la mirada del
caricaturista quien “(A)adivina, bajo las armonías superficiales de la forma, las profundas
revueltas de la materia” (Ibid., p.51-52). En el cuerpo vivo se entreveran la dimensión
material, que pesa, y la energía vital. En la figura del danzante o de la danzante en
movimiento, está presente su resistencia o entrega al peso de la gravedad del cuerpo y la
gestualidad flexible del cuerpo. Bergson nos hace ver que cuando no vemos en el cuerpo
vivo más que gracia y flexibilidad, es que olvidamos cuanto hay en él de pesado, de
resistente, de material: prescindimos de su materialidad para pensarlo tan sólo en su
energía espiritual. Y cuando en el cuerpo vemos que domina su materialidad olvidamos su
participación en la ligereza del principio que lo anima.
Para Bergson, rigidez, automatismo y distracción significan lo mismo y estar
distraídos es equivalente a estar des-atentos. La mayor distracción es distraerse de sí
mismo, que no es sino ajustarse, por decir así, a un marco ya hecho. Veamos, ahora, la
importancia que da Bergson a la atención.
Bergson utiliza la expresión “educación de la atención” que “pudiese consistir
mayormente en retirarle sus anteojeras, en deshabituarla de la constricción que le imponen
las exigencias de la vida” (BERGSON, 2013, p.157), para obtener la visión universal del
devenir, que beneficiaría tanto la especulación pura como también nuestra vida cotidiana.
Desde esa experiencia: “Todo se anima alrededor nuestro, todo se vivifica en nosotros. Un
gran impulso arrastra los seres y las cosas. A través de él nos sentimos levantados,
empujados, llevados”. Hundidos en la duración real, “vivimos más” (Ibid.).

33 Al
Al modo
modo del
del rostro
rostro siempre
siempre joven
joven de
de Dorian
Dorian Gray
Gray que
que oculta
oculta la
la intensidad
intensidad de
de la
la vida
vida desplazando
desplazando yy
grabando
grabando sus
sus tribulaciones
tribulaciones en
en la
la materialidad
materialidad de
de su
su retrato.
retrato.
la
la duración
duración en
en el
el espacio
espacio educativo
educativo || 437
437

La educación tendría que propiciar ese más de la vida, generar la experiencia del
contacto con las cosas, con los y las demás, con nosotros mismos, en su fuerza moviente,
en la duración real, en el esplendor de su presente, en la persistencia del pasado en el
presente, en la continuidad de su despliegue indivisible. “La duración real es la que muerde
sobre las cosas y la que deja allí la huella de su diente. Si todo es en el tiempo, todo cambia
interiormente, y la misma realidad concreta no se repite jamás”, Sin embargo, la
inteligencia se aparta de la vida del tiempo, repugnándole lo que fluye y, por tanto,
solidificando lo que toca. “Nosotros no pensamos el tiempo real. Pero lo vivimos, porque
la vida desborda a la inteligencia” (BERGSON, 2007, p.63)
Si pensamos en propiciar en los distintos espacios educativos, formales, informales
y no formales, el tipo de atención señalado anteriormente, estaríamos educando hacia
estadios más altos de percepción, en la plasticidad y vitalidad intuitivas propias del arte.
Recordemos en este momento, y luego compartamos, nuestras propias experiencias
de infancia, de adolescencia, de juventud o de madurez, en que hayamos tenido la
experiencia de un percibir más pleno bajo la forma de un relámpago, en el éxtasis o en la
apacible experiencia de más ser. Podemos poner atención a lo que los sentidos nos ofrecen
en la materialidad peculiar que nos entregan, distinguir las mayores cualidades posibles,
abriendo y extendiendo nuestra percepción. Podemos ser artistas con la mirada, la escucha,
el tacto, olfateando o gustando, creando las condiciones para un pensar más profundo, para
un pensar sensible, sensible al devenir de las cosas.
Puestos en la amplitud de la conciencia de las cosas, ensanchamos la experiencia;
somos más en la duración de lo percibido y en la duración de nosotros mismos. Es esta
dilatación y extensión de la percepción lo que podríamos favorecer como madres o padres,
abuelas o abuelos, profesoras o profesores, monitoras o monitores, sanadoras o sanadores,
cualquiera sea el lugar que ocupemos en las relaciones de interacción de aprendizajes. Sin
embargo, es posible que la relación que tienen los niños y las niñas, las y los adolescentes,
las y los jóvenes con el mundo, sea más cercana a la aprehensión de la duración real, de
una percepción viva de las cosas, y podríamos encontrar en ellos modos más simples de
expresarnos su viveza. Podemos aprender con ellos poniéndoles también atención.
Podríamos también percibirlos en su propia duración.
En los espacios educativos deberíamos propiciar y vivir el sentido de la bifurcación,
de la encrucijada, la conciencia de las posibilidades de una acción creativa, la afirmación de
una voluntad que apuesta por la posibilidad de vivir más allá de la repetición, de la
reproducción, del pasado no vivo, del automatismo. Apostar por el movimiento, lo
imprevisible, entregados a la vida en el juego de circunstancia y voluntad.
Muchos han visto las cercanías que tenía Borges con Bergson, y una de ellas
podemos verla en la concepción del tiempo que Borges nos hace saber en su cuento “El
jardín de los senderos que se bifurcan” a través de su personaje Ts'ui Pên. Lo señalamos en
el epígrafe de este texto: infinitas series de tiempos, tiempos divergentes, convergentes y
paralelos; tramas de tiempos que se bifurcan, se cortan, que abarcan todas las posibilidades.
Bergson, como decíamos anteriormente, utiliza la imagen de la “encrucijada” como
lo que abre a diversas direcciones. Desde lo vivo, la imaginación irradia en direcciones
divergentes, siendo este un punto central en la filosofía de Bergson. Para él, nuestro
carácter es un resultado electivo, sin cesar renovado, donde interviene la voluntad. Hay
puntos de “bifurcación” a lo largo de nuestro camino que nos enfrentan al desafío de la
elección y donde podemos entrever muchas direcciones en un momento del presente,
aunque, como ya decíamos, sólo una de ellas nos sea dado seguir. Si relacionamos la idea
de bifurcación con la de encrucijada, se nos aparece en toda su hondura el sentido de la
438|
438| olga
olga grau
grau

duración, que podemos vivirla de modo más pasivo, como es en la repetición de lo ya


probado o conocido44, o dar lugar a la afirmación de lo virtual que espera por su realización.
Habría que cabalgar en lo virtual, sintiendo el cuerpo del laberinto en que cada uno
está puesto en un presente lanzado al futuro; escapar de las redes de la contención, de la
sustracción que retiene a la energía vital, y hacerlo con arrojo y con riesgo.
En los espacios educativos, podríamos favorecer, en los otros y en nosotros mismos,
experiencias perceptuales que nos permitieran la comprensión del cambio, ejercitar la
atención, la observación de una persona, animal, vegetal o cosa, en su individualidad, en su
particular relación con su contexto de presencia.

referencias
BERGSON,
BERGSON, Henri. Henri. El El alma
alma yy elel cuerpo.
cuerpo. In:
In: BERGSON,
BERGSON, Henri. Henri. La La energía
energía espiritual.
espiritual. Buenos
Buenos Aires:
Aires:
Cactus,
Cactus, 2012a,
2012a, p.43-72.
p.43-72.
________.
________. El
El sueño.
sueño. In:
In: BERGSON,
BERGSON, Henri. Henri. LaLa energía
energía espiritual.
espiritual. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus, 2012b,
2012b, p.97-120.
p.97-120.
_________.
_________. La
La consciencia
consciencia yy lala vida.
vida. In:
In: BERGSON,
BERGSON, Henri. Henri. LaLa energía
energía espiritual.
espiritual. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus,
2012c,
2012c, p.15-41.
p.15-41.
__________.
__________. La
La percepción
percepción deldel cambio.
cambio. In:In: BERGSON,
BERGSON, Henri. Henri. ElEl pensamiento
pensamiento yy lo
lo moviente.
moviente. Buenos
Buenos Aires:
Aires:
Cactus,
Cactus, 2013
2013 pp.-147-177.
pp.-147-177.
__________.
__________. La
La risa.
risa. Ensayo
Ensayo sobre
sobre la
la significación
significación de
de lo
lo cómico.
cómico. Madrid:
Madrid: Alianza,
Alianza, 2016.
2016.
___________.
___________. La
La evolución
evolución creadora.
creadora. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Cactus,
Cactus, 2007,
2007, Cap.
Cap. I,
I, p.21-112.
p.21-112.
BORGES,
BORGES, Jorge Jorge Luís.
Luís. El
El jardín
jardín dede los
los senderos
senderos queque se
se bifurcan.
bifurcan. In:
In: BORGES,
BORGES, Jorge Jorge Luís.
Luís. Ficciones.
Ficciones.
Buenos
Buenos Aires:
Aires: Emecé,
Emecé, 2005,
2005, p.121-143.
p.121-143.

44 Lo
Lo que
que tendría,
tendría, en
en definitiva,
definitiva, una
una dimensión
dimensión ilusoria
ilusoria oo paródica
paródica en
en cuanto
cuanto repetición,
repetición, porque
porque lala repetición
repetición
en
en sentido
sentido estricto,
estricto, absoluto,
absoluto, no
no es
es posible
posible dado
dado que
que nunca
nunca lala circunstancia
circunstancia es
es la
la misma
misma nini el
el sujeto
sujeto que
que la
la
vive
vive es
es el
el mismo.
mismo. LaLa duración
duración se
se hace
hace siempre
siempre presente.
presente.
439
439

educación filosófica e inquietud de sí.


diálogos entre estanislao zuleta y pierre hadot

óscar espinel-bernal11
óscar pulido-cortés22

DOGMA.
DOGMA. Llamaremos
Llamaremos asíasí aa toda
toda convicción
convicción queque haya
haya llegado
llegado aa ser
ser para
para
quien
quien la
la posee
posee –o
–o la
la padece–
padece– una
una referencia
referencia de
de su
su propia
propia identidad;
identidad; algo
algo que
que
por
por lo
lo tanto
tanto no
no puede
puede ser
ser perdido
perdido –por
–por ejemplo
ejemplo superado–
superado– sin
sin que
que se
se abra
abra
inmediatamente
inmediatamente la la cuestión
cuestión esencial
esencial de
de la
la angustia.
angustia.
(ZULETA,
(ZULETA, 2007,2007, p.
p. 19)
19)

A
l interior de la línea de Filosofía y Educación del grupo de investigación
Pensamiento, Filosofía y Sociedad del Departamento de Filosofía de
UNIMINUTO y en compañía del proyecto Filosofía e Infancia33 del Grupo
Filosofía, Sociedad y Educación de la Universidad Pedagógica y Tecnológica (UPTC), nos
hemos propuesto pensar la actividad filosófica, así como las características de una
educación en el ámbito de la filosofía, a partir de la categoría de “educación filosófica” 44.
Esta noción nos ha permitido articular las diversas ideas, divergencias, concepciones,
ángulos de problematización e intereses investigativos. Los apuntes que siguen hacen parte
de dicho trabajo de reflexión y revisión de algunos textos. Nos ha parecido pertinente
discurrir en torno a la concepción de la educación filosófica por cuanto entendemos que
estos ejercicios contribuyen a esta idea de filosofía que venimos intentando afianzar: una
filosofía que se distancia de la frialdad de las aulas para enfrentar la complejidad,
turbulencia y provisionalidad de la vida con la construcción de nuevos espacios de
interlocución e incitación al pensamiento.
Para empezar, es importante partir de tres grandes preguntas que se encuentran
íntimamente entrelazadas: ¿Qué es la educación?, ¿qué es la filosofía? y, por último, ¿qué
es la educación filosófica? Estas tres cuestiones constituyen tres momentos de las
reflexiones que se proponen a continuación. La tesis que se sostiene está sintetizada en la
idea de que los dos escenarios iniciales, es decir, los de las preguntas referidas a la
educación y a la filosofía, devienen en un tercer escenario, el de la educación filosófica.
Revisemos, con la ayuda de algunos autores como Estanislao Zuleta 55 y Pierre Hadot,

11 Corporación
Corporación Universitaria
Universitaria Minuto
Minuto de
de Dios
Dios –– UNIMINUTO.
UNIMINUTO. Email:
Email: oscar.espinel@yahoo.com
oscar.espinel@yahoo.com
22 Universidad
Universidad Pedagógica
Pedagógica yy Tecnológica
Tecnológica –– UPTC.
UPTC. Email:
Email: oscar.pulido@uptc.edu.co
oscar.pulido@uptc.edu.co
33 El
El Proyecto
Proyecto Filosofía
Filosofía ee Infancia
Infancia de de la
la UPTC
UPTC asume asume la la educación
educación filosófica
filosófica como
como eje eje conceptual
conceptual yy práctico
práctico
de
de sus
sus intervenciones
intervenciones educativas.
educativas.
44 De
De hecho,
hecho, algunas
algunas ideasideas respecto
respecto de de esta
esta categoría
categoría han han sido
sido publicadas
publicadas en en Colombia
Colombia bajo bajo el
el título
título “Sobre
“Sobre la la
idea
idea dede unauna educación
educación filosófica”.
filosófica”. El El texto
texto aquí
aquí presentado
presentado obedece
obedece aa la la revisión
revisión conjunta,
conjunta, discusión
discusión yy
ampliación
ampliación del del texto
texto inicial.
inicial.
55 Estanislao
Estanislao Zuleta
Zuleta Velá
Velássquez
quez (1935-1990)
(1935-1990) es es uno
uno de de loslos pensadores
pensadores colombianos
colombianos má máss importante
importante del del siglo
siglo
XX.
XX. Participó
Participó dede diversas
diversas maneras
maneras en en la
la construcció
construcciónn de de la
la nació
naciónn colombiana
colombiana con con sus
sus acciones
acciones de de orden
orden
intelectual
intelectual yy polí
políttico.
ico. EnEn susu amplio
amplio espectro
espectro acadé
académ mico
ico se
se debaten
debaten en en diálogo
diálogo profundos
profundos aná anállisis
isis entre
entre
filosofí
filosofíaa,, psicoaná
psicoanállisis,
isis, polí
políttica,
ica, literatura,
literatura, arte
arte pláplásstico
tico yy enen un
un capí
capíttulo
ulo especial:
especial: la la educació
educaciónn.. AúAúnn este
este
aspecto
aspecto no no se
se ha
ha desarrollado
desarrollado de de manera
manera suficiente
suficiente por por parte
parte de
de los
los comentaristas
comentaristas yy estudiosos
estudiosos de de susu obra
obra
pese
pese aa que
que Estanislao
Estanislao Zuleta
Zuleta realizó
realizó fuertes
fuertes crí
crítticas
icas aa los
los planteamientos
planteamientos especí
específficos
icos yy prá
práccticas
ticas del
del sistema
sistema
educativo
educativo formal.
formal. Incluso,
Incluso, concon su su experiencia
experiencia vital,
vital, dentro
dentro de de la
la cual
cual se
se suscribe
suscribe su
su temprano
temprano autodidactismo,
autodidactismo,
no
no sólo
sólo ha ha mostrado
mostrado su su profunda
profunda inconformidad
inconformidad con con un un sistema
sistema escolar
escolar árido
árido yy mecánico,
mecánico, sino sino que
que ha ha
desplegando
desplegando otras otras maneras
maneras de de entender
entender lo lo educativo
educativo yy lo lo pedagó
pedagóggico.
ico. Aunque
Aunque no no eses propiamente
propiamente un un teó
teórrico
ico
de
de lolo educativo.
educativo. ParaPara ampliar
ampliar estasestas ideas
ideas respecto
respecto aa los los planteamientos
planteamientos fundamentales
fundamentales del del pensamiento
pensamiento
educativo
educativo del del pensador
pensador colombiano,
colombiano, ver ver elel artículo
artículo “Estanislao
“Estanislao Zuleta:
Zuleta: educació
educaciónn con
con filosofí
filosofíaa”” (PULIDO,
(PULIDO,
2012).
2012).
440|
440| óscar
óscar espinel-bernal;
espinel-bernal; óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés

algunos elementos que nos permitan abordar estos interrogantes y sustentar esta idea de la
educación filosófica.

¿educación?
Para poder establecer las relaciones entre filosofía y educación se hace preciso
discernir, como lo sugiere Zuleta, dos comprensiones de la educación. La primera de ellas
entiende la educación “como un proceso de formación y de acceso al pensamiento y al
saber en el sentido clásico en que la filosofía lo ha considerado desde la antigüedad”
(ZULETA, 1995, p. 93). Una segunda postura, que pareciera ser la prevaleciente en nuestra
época, aproxima la educación a un mecánico y regulado procedimiento de transmisión de
contenidos y de datos elaborados dentro de un campo de saber determinado en un proceso
de adiestramiento de determinadas conductas, habilidades y conocimientos para una
actividad específica. Detengámonos un momento en la caracterización de cada uno de los
enfoques que propone Zuleta en su análisis, en búsqueda de algunas luces para la presente
indagación.

1. la educación como proceso de formación.


Este enfoque, nos dice Zuleta (1995), lo encontramos claramente expuesto en las
obras de Platón y, más adelante –con algunas prevenciones–, en cierta línea racionalista, a
la que se refiere Zuleta y en la que se encontrarían pensadores como Spinoza y Kant. La
pregunta fundamental es ¿qué significa enseñar? pues dicha preocupación se circunscribe
en las condiciones para acceder al conocimiento y, desde allí, al saber. “Por esto lo
importante no está en los contenidos, sino en el tratamiento de los mismos. La apuesta de
opción autónoma del conocimiento es una apuesta metodológica, es decir, de enfoque y
estrategia” (PULIDO, 2012, p. 87). En este sentido, la finalidad del acto de educar no
consistirá solamente en acumular conocimientos y teorías, sino en alcanzar un saber para
la vida que posibilite la autonomía del ser y del pensar. Un saber ser. Un saber vivir.
Zuleta, a este respecto, en una ruptura con las habituales tradiciones e instituciones
académicas, “eligió la autoeducación (...) optó por un método distinto para pensar
filosóficamente y compartir su reflexiones con sus compañeros y con la comunidad
universitaria” (PACHÓN, 2011, p. 190). Una decisión asumida como arte de la existencia
evocando los viejos filósofos y pensadores más cercanos al diálogo, al arte y a la sabiduría.
En este punto, son importantes las consideraciones de Pierre Hadot (1998, 2006)
para quien en el mundo griego esta formación hace parte de un horizonte más amplio, a
saber, la formación del espíritu. Solo desde esta óptica podrá comprenderse la complejidad
de la acción educativa en el mundo griego, de la cual hace parte la actividad filosófica;
actividad que Zuleta parece circunscribir a la línea racionalista que intenta trazarse por la
tradición filosófica desde Platón hasta la modernidad. Pero, al margen de esta espinosa
discusión que no puede tratarse en la extensión de este escrito 66, se trata de una formación
en el sentido de cultivar y extraer lo más excelso del hombre. Obtener lo mejor de sí. Se
trata de una labor formativa ligada a la existencia, dentro de la cual la práctica filosófica

66 Michel
Michel Foucault
Foucault ofrece
ofrece algunos
algunos elementos
elementos para
para ampliar
ampliar este
este debate
debate en en su
su clase
clase del
del 66 de
de enero
enero dede 1982
1982 en
en el
el
curso
curso del
del Collège
Collège dede France
France titulado
titulado LaLa hermenéutica
hermenéutica del
del sujeto.
sujeto. Allí
Allí Foucault
Foucault presenta
presenta esta
esta tensión
tensión enen lo
lo que
que
denomina
denomina provisionalmente,
provisionalmente, según
según sus
sus palabras,
palabras, “giro
“giro cartesiano”.
cartesiano”. Lo
Lo que
que pretende
pretende explicitar
explicitar aa través
través de
de esta
esta
noción
noción es es lala independencia
independencia que que asumió
asumió la la teoría
teoría en
en relación
relación con
con el el mundo
mundo de de lala vida.
vida. Un
Un carácter
carácter
fundamental
fundamental en en la
la actividad
actividad filosófica
filosófica en
en el
el mundo
mundo griego
griego antiguo
antiguo —que
—que no no era
era exclusiva,
exclusiva, valga
valga decir,
decir, de
de los
los
filósofos—
filósofos— era,era, precisamente,
precisamente, la la coherencia,
coherencia, relación
relación ee implicación
implicación de de la
la vida
vida misma
misma aa taltal punto
punto queque susu
ejercicio
ejercicio conducía
conducía necesariamente
necesariamente aa unauna serie
serie de
de prácticas
prácticas sobre
sobre sísí yy de
de transformación
transformación en en sus
sus modos
modos de de
existencia.
existencia. A A estas
estas “prácticas
“prácticas de
de sí”
sí” como
como “inquietud
“inquietud dede sí”
sí” que
que conllevan
conllevan aa lala adopción
adopción de de nuevas
nuevas formas
formas de de
vida,
vida, es
es aa lo
lo que
que Hadot
Hadot (2006)
(2006) denomina
denomina “conversión”.
“conversión”.
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot|
hadot| 441
441

ocupa un lugar fundamental. Una formación del espíritu que tiene que ver con el
conocimiento de sí mismo, del cosmos y la transformación de las formas de vida en tanto
gobierno de sí.
Ya Jaeger en su clásica obra Paideia nos anuncia que, en el seno de la mentalidad
griega, la preocupación por el hombre desempeña un lugar central. Por esta razón, la
cultura griega es una cultura que bien puede calificarse de antropocéntrica. Y si el hombre
es su principal preocupación, su formación –la del hombre– es la tarea más compleja,
prioritaria y fundamental. Esta formación se distancia del simple adiestramiento según
leyes exteriores impuestas al individuo. Es una formación –dentro del mundo griego– que,
ligada al concepto de paideia, responde a la naturaleza misma del hombre, a las leyes
naturales que lo constituyen y que está llamado a descubrir y comprender. La paideia se
vincula con un ideal de hombre. A este tenor, la acción formadora se cierne entre el
individuo y la sociedad, entre el ciudadano y la polis. La polis actúa como la guía a seguir
por el ciudadano en tanto entraña las leyes naturales. Mediante la educación, la sociedad
forma al hombre virtuoso por lo que la educación se hace acción creadora: la creación del
hombre-ciudadano. Por ello la educación se entiende como el arte de educar.
Podemos
Podemos ahora
ahora determinar
determinar concon mayor
mayor precisión
precisión la
la peculiaridad
peculiaridad del
del pueblo
pueblo griego
griego
frente
frente aa los
los pueblos
pueblos orientales.
orientales. Su Su descubrimiento
descubrimiento del del hombre
hombre no no eses el
el
descubrimiento
descubrimiento del
del yo
yo objetivo,
objetivo, sino
sino la
la conciencia
conciencia paulatina
paulatina de
de las
las leyes
leyes generales
generales
que
que determinan
determinan lala esencia
esencia humana.
humana. El El principio
principio espiritual
espiritual de
de los
los griegos
griegos no
no es
es el
el
individualismo,
individualismo, sino
sino el
el "humanismo",
"humanismo", para para usar
usar la
la palabra
palabra en
en su
su sentido
sentido clásico
clásico yy
originario.
originario. (JAEGER,
(JAEGER, 2010,
2010, p.
p. 11-12).
11-12).
Por esta razón, en el mundo griego no es acertado referirse a un “individualismo”;
es más adecuado hablar de un “humanismo”. Es decir, prevalece la idea de que el hombre
pertenece al género humano. Pertenece a una naturaleza humana, a la humanidad de la
cual deriva su esencia, su existencia como ser humano. Y a ello responde la formación
griega. Este “humanismo” referido al mundo griego:
Significó
Significó la
la educación
educación del
del hombre
hombre de de acuerdo
acuerdo con
con la
la verdadera
verdadera forma
forma humana,
humana,
con
con su
su auténtico
auténtico ser.
ser. Tal
Tal eses la
la genuina
genuina paideia
paideia griega
griega considerada
considerada como
como modelo
modelo
por
por un
un hombre
hombre dede Estado
Estado romano.
romano. No No surge
surge de
de lo
lo individual,
individual, sino
sino de
de la
la idea.
idea.
Sobre
Sobre el
el hombre
hombre como
como serser gregario
gregario oo como
como supuesto
supuesto yoyo autónomo,
autónomo, sese levanta
levanta el
el
hombre
hombre como
como idea.
idea. (JAEGER,
(JAEGER, 2010,2010, p.
p. 12).
12).
Un ideal de hombre en el cual debe formarse y al cual debe responder el individuo.
La paideia griega es entonces la “(…) acuñación de los individuos según la forma de
la comunidad” (JAEGER, 2010, p. 12). Es decir, la adecuación de la acción y convicciones
individuales a la idea de hombre alrededor de la cual se construye y organiza la
comunidad, la polis. Pero, más allá de lo que a primera vista podría pensarse, este es un acto
consciente, nunca impuesto, ni producto de la imitación o la obediencia ciega. Ante todo,
se trata de un ejercicio de reflexión individual a partir de la relación, comprensión e
inmersión en la comunidad, sustentado en el conocimiento de sí mismo y de las leyes
universales. Prueba de ello es la potestad que deriva de la idea de discutir, debatir y
cuestionar –con ciertos límites y, por supuesto, riesgos– las leyes y la organización de la
ciudad en el ágora. De allí también el significado del “ciudadano” al interior de las
dinámicas de la polis.
Esta formación del individuo a partir de un ideal de hombre no se desarrolla de
manera rígida, inmóvil, abstracta e independiente del espacio y del tiempo. El ideal de
hombre no es un esquema vacío, absoluto y definitivo, pues desde su concepción como ser
finito y parte del cosmos, el hombre griego se sabe en camino hacia el logos, hacia la razón
universal y la verdad (o lo que quiera que sea dicha verdad), por lo que sus concepciones,
creencias y modelos están en permanente revisión, construcción, reflexión y disputa.
442|
442| óscar
óscar espinel-bernal;
espinel-bernal; óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés

Volviendo a Zuleta (1995), éste sostiene que, en el Sofista, Platón expone la labor
esencial de la educación como un combate contra la ignorancia. Y allí mismo presenta una
teoría de la ignorancia en donde ésta no se presenta por ausencia, carencia o vacío sino,
precisamente, por todo lo contrario: llenura, atiborramiento, indigestión, saturación. Por
tanto, la labor de la educación no consistiría en continuar brindando conocimientos y
datos sino, por el contrario, en ayudar a los sujetos a salir de la indigestión provocada por
el exceso de opiniones infundadas y poco reflexionadas para luego pasar al acto mismo de
educar. “Para ello se requiere primero provocar una ‘limpieza’ y producir de nuevo el deseo
y, entonces sí, emprender la tarea de educar” (ZULETA, 1995, p. 58), pues no hay nada
más difícil, indica Zuleta, que dar alimento a alguien que no tiene hambre, a un ahíto. De
allí que la educación deba partir de una refutación y una crítica de las opiniones y
prejuicios –como más adelante lo sostendrán autores como Descartes, Spinoza y Kant.
Opiniones y prejuicios que saturan el pensamiento y que dan la sensación de llenura y
suficiencia negando la posibilidad de nuevas indagaciones, exploraciones, travesías,
percepciones y miradas.
Lo contrario a esta condición de saciedad propia de quienes permanecen en ese
estado de ignorancia es la enigmática expresión socrática: “sólo sé que nada sé”. Es una
manifestación de inquietud constante, de avidez, de deseo por alcanzar lo que no se tiene.
Indica un estado de vaciedad y necesidad de ser saciado. “Es un no saber, producto de una
crítica de lo que se creía saber, que no era más que una opinión” (ZULETA, 1995, p. 96). Es
un reconocer que hay algo que no se sabe y que impulsa a querer saber. Es, de acuerdo con
Hadot (1998), una “inquietud de sí”, un ocuparse de las creencias, concepciones e ideas que
orientan el actuar y el pensar.
La educación para Platón, y en general para el antiguo griego, tiene que ver con
propiciar esta necesidad de saber a través de la refutación y la crítica de la opinión. Una
necesidad de saber que se aleja de una simple compulsión a adquirir información para
afianzarse como una exigencia existencial de pensar. Es decir, un pensar por sí mismo.
El
El conocimiento
conocimiento no no es
es algo
algo heredado,
heredado, ni
ni algo
algo que
que se
se transmita
transmita de
de una
una conciencia
conciencia aa
otra;
otra; por
por elel contrario,
contrario, el
el conocimiento
conocimiento es es una
una construcción
construcción llevada
llevada aa cabo
cabo por
por
sujetos
sujetos cognoscentes
cognoscentes yy concon conciencia
conciencia de
de sí
sí mismos,
mismos, dede su
su realidad,
realidad, de
de su
su relación
relación
con
con otros.
otros. (ESPINEL,
(ESPINEL, 2010,
2010, p.
p. 42).
42).

Es necesario que cada quien llegue al saber por sus propios medios, pero en relación
con otros, a través de un continuo ejercicio de reflexión, análisis y crítica. Esta era,
justamente, la función del ejercicio dialéctico en los diálogos platónicos, pues su práctica se
enmarca en un escenario formativo, ascético: “su valor se resalta más en su carácter
formativo que en su uso para validar o sustentar una teoría o tesis” (ESPINEL, 2014, p. 9) 77.
Sólo habrá un auténtico saber en el momento en el cual el sujeto pueda dar razón de ese
nuevo saber producto de este ejercicio de pensar por sí mismo y, además de ello, pueda
extraer conclusiones propias a partir de premisas propias (ZULETA, 1995, p. 97).

2. la educación como entrenamiento.


En la actualidad, la educación tiende a volcarse en una serie de prácticas
radicalmente opuestas a la concepción formativa de la paideia griega y a la relación con el

77 “La
“La dialéctica
dialéctica no
no sólo
sólo enseñaba
enseñaba aa atacar,
atacar, es
es decir,
decir, aa conducir
conducir atinadamente
atinadamente interrogatorios,
interrogatorios, sino
sino también
también aa
contestar
contestar desbaratando
desbaratando las las trampas
trampas del
del interrogador.
interrogador. […][…] Por
Por eso
eso la
la dialéctica
dialéctica platónica
platónica no no es
es un
un ejercicio
ejercicio
puramente
puramente lógico.
lógico. EsEs más
más bien
bien unun ejercicio
ejercicio espiritual
espiritual que
que exige
exige dede los
los interlocutores
interlocutores unauna ascesis,
ascesis, una
una
transformación
transformación de de ellos
ellos mismos.
mismos. No No se
se trata
trata de
de una
una lucha
lucha entre
entre dos
dos individuos
individuos enen lala que
que elel más
más hábil
hábil
impondrá
impondrá susu punto
punto dede vista,
vista, sino
sino de
de un
un esfuerzo
esfuerzo hecho
hecho enen común
común por
por dos
dos interlocutores
interlocutores que
que quieren
quieren estar
estar de
de
acuerdo
acuerdo con
con las
las exigencias
exigencias racionales
racionales del
del discurso
discurso sensato,
sensato, del
del logos”.
logos”. (HADOT,
(HADOT, 1998, 1998, p.
p. 75).
75).
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot|
hadot| 443
443

saber que allí se arraigaba. En el mundo contemporáneo, la educación se piensa “(…) como
empresa de calificación de fuerza de trabajo, para un mercado de trabajo calificado, con un
costo determinado” (ZULETA, 1995, p. 98). La escuela parece convertirse en una especie
de máquina ahorradora de tiempo, que en una economía de esfuerzos, hace menos
laborioso y costoso el proceso (PULIDO, 2012, p. 88). Allí impera la adquisición de
conocimientos de orden irreflexivo en lo que Zuleta identifica como una excesiva
centralidad en el «aprendizaje». Y en estos téminos, “el aprendizaje considerado
simplemente, en el sentido restrictivo, como la adquisición de los resultados anteriores al
trabajo del pensamiento y de la investigación, es decir, en una concepción puramente
cronológica, como mera acumulación de conocimientos, no es educativo"
educativo" (PULIDO,
(PULIDO, 2012,
2012,
p. 89).
Dentro de este enfoque, muy acorde con lo que algunos autores contemporáneos
identifican como “sociedad deldel conocimiento” y la teoría del “capital humano”, prima la
preocupación por la adquisición de nueva información y el adiestramiento de habilidades
específicas88. El mejoramiento de los sistemas educativos se mide en términos de una
mayor eficiencia y eficacia de tiempos de aprendizaje, cantidad de información,
habilidades adquiridas y la calidad de estas nuevas adquisiciones, generalmente en clave de
perdurabilidad y adaptabilidad a nuevas situaciones y contextos.
Se confunde, pues, educación con información (ZULETA, 1995, p. 23). Y en
consecuencia, prima la información sobre la formación; la instrucción mecánica sobre el
pensar por sí mismo, la iniciativa99 y la capacidad creadora; el disciplinamiento y la
adaptación sobre el dar razón de los saberes; la respuesta inmovilizadora, los
procedimientos y los protocolos sobre la pregunta, la crítica, la argumentación y la
refutación; el conocimiento fragmentado, estrecho e hiper-especializado sobre el saber y el
pensamiento complejo y contextualizado.
La
La formación
formación actual
actual nono corresponde
corresponde propiamente
propiamente aa lo lo que
que los
los liberales
liberales llamaban
llamaban
la
la formación
formación de de un
un ciudadano,
ciudadano, eses decir,
decir, de
de un
un hombre
hombre que que pueda
pueda intervenir,
intervenir, dede
alguna
alguna manera,
manera, ee incidir
incidir conscientemente
conscientemente en en el
el destino
destino de de lala sociedad
sociedad en en que
que
vive.
vive. En
En realidad,
realidad, el
el tipo
tipo de
de persona
persona que
que se
se forma
forma es es una
una tuerca
tuerca que
que debe
debe ajustar
ajustar
muy
muy bien
bien en
en alguna
alguna parte
parte del
del engranaje
engranaje productivo.
productivo. Eso Eso es
es lo
lo que
que se
se llamaría
llamaría un
un
"trabajador
"trabajador eficiente".
eficiente". Esta
Esta deformación
deformación puede
puede llegar
llegar alal extremo
extremo de de cuarenta
cuarenta
premios
premios Nobel
Nobel que
que colaboraron
colaboraron enen la
la guerra
guerra de
de Vietnam
Vietnam carentes
carentes por por completo
completo de de
un
un juicio
juicio sobre
sobre el
el sentido
sentido general
general de
de ese
ese proyecto.
proyecto. (ZULETA,
(ZULETA, 1995, 1995, p.
p. 101).
101).
La educación actual reprime el pensamiento. Prohíbe pensar. Se dedica a transmitir
datos, nombres, conocimientos de otros sujetos, teorías que otros pensaron; pero no enseña
ni permite pensar (ZULETA, 1995, p. 19). Para Zuleta, el problema central de la educación
formal en la actualidad, reside en que ella no se concentra en enseñar a pensar, pues bajo el
modelo empresarial que ha adaptado de la mano de los modelos pedagógicos que la
regulan, se ha convertido en instrumento de normalización y control de los estudiantes
ocupada en la reproducción de conocimientos, hábitos y conductas prefiguradas1010. El
sistema escolar, de esta manera, se sustenta en la autoridad del maestro y la “ignorancia
absoluta” del estudiante. Autoridad del maestro que bajo esta lógica se caracteriza por el

88 Algunas
Algunas notas
notas respecto
respecto aa este
este punto
punto hanhan sido
sido desarrolladas
desarrolladas en en el
el artículo
artículo titulado
titulado “Formación
“Formación de de
empresarios
empresarios de de sí
sí mismos:
mismos: miradas
miradas aa la
la educación
educación superior
superior en
en la
la segunda
segunda mitad
mitad del
del siglo
siglo xx”
xx” (Pulido,
(Pulido, 2016).
2016).
99 “Los
“Los profesores
profesores norteamericanos
norteamericanos Gintis
Gintis yy Bowles,
Bowles, al
al analizar
analizar la
la educación
educación norteamericana,
norteamericana, sostienen
sostienen que
que
para
para el
el sistema
sistema capitalista
capitalista es
es necesario
necesario formar
formar no
no solamente
solamente unun conjunto
conjunto de
de individuos
individuos con
con determinados
determinados
conocimientos,
conocimientos, sinosino también
también con
con una
una determinada
determinada actitud,
actitud, que
que es
es básicamente
básicamente la la renuncia
renuncia aa toda
toda iniciativa”
iniciativa”
(ZULETA,
(ZULETA, 1995,1995, p.
p. 30).
30).
10 Para
10 Para un
un desarrollo
desarrollo más
más amplio
amplio de
de estos
estos planteamientos
planteamientos ver
ver PULIDO,
PULIDO, 2012,
2012, p.
p. 87.
87.
444|
444| óscar
óscar espinel-bernal;
espinel-bernal; óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés

manejo de una mayor cantidad de información y de teorías construidas y pensadas por una
serie de expertos.
Esta es la tensión presente en el campo de la educación. Se constata, de un lado, la
exigencia de formación y capacitación de un ciudadano capaz de pensar su sociedad y
participar de manera consciente en su construcción y, de otro lado, una educación
instrumentalizada concentrada en el entrenamiento y producción de expertos en ciertas
habilidades y conocimientos, pero sin ninguna capacidad para pensar por sí mismos y de
manera auténtica. Las sociedades modernas buscan, a través de la ciencia, “eliminar la
irracionalidad del mito para que el hombre pueda dominar la naturaleza” (ESPINEL;
MANRIQUE, 2012, p. 115). Este es, precisamente, el proyecto de la Ilustración que Adorno
y Horkheimer denuncian en su texto “Dialéctica de la Ilustración” 1111 y que parece coincidir,
al menos inicialmente, con el planteamiento foucaultiano respecto al “momento
cartesiano” que distanció a la filosofía de su inicial ejercicio existencial para confinarla a
una obsesiva preocupación por el método, por la producción de un conocimiento “claro y
evidente” y la acumulación del mismo. Aquí quizás nos alejemos un tanto de los
planteamientos de Zuleta, pero nos es necesario recurrir a estas ideas para aclarar y, si se
nos permite, complementar algunas posturas en exceso racionalistas del autor.
El
El saber
saber en
en el
el mundo
mundo moderno
moderno es es poder.
poder. Poder
Poder para
para controlar,
controlar, dominar,
dominar, prever
prever el
el
devenir
devenir de de los
los fenómenos
fenómenos aa partirpartir de
de susu explicación
explicación yy comprensión.
comprensión. El El
conocimiento
conocimiento como como lolo afirma
afirma Bacon,
Bacon, es es poder
poder yy este
este conocimiento
conocimiento en en lala época
época
moderna
moderna se se caracteriza
caracteriza por
por la
la técnica.
técnica. El
El interés
interés porpor el
el conocimiento
conocimiento no no está
está
guiado
guiado por
por elel amor
amor aa la
la verdad,
verdad, lala sabiduría
sabiduría en
en su
su sentido
sentido práctico
práctico de
de la
la phronesis
phronesis
griega,
griega, sino
sino que
que su
su interés
interés reside
reside en
en el
el método
método dede conocimiento
conocimiento másmás seguro
seguro para
para
poner
poner aa lala naturaleza
naturaleza yy aa loslos demás
demás hombres
hombres al al servicio
servicio dede los
los intereses
intereses
particulares.
particulares. (ESPINEL;
(ESPINEL; MANRIQUE,
MANRIQUE, 2012, 2012, p.
p. 115).
115).
En este sentido, y tomando también algo de prudente distancia frente a los autores
de la escuela de Frankfurt, el interés por el conocimiento, la afinación y acumulación del
mismo se cierne sobre el propósito de hallar la manera más efectiva y eficiente para
optimizar los procesos de producción (material e inmaterial), de explotación y dominación
de la naturaleza y de los mismos hombres. Es un conocimiento que se desliga del saber y
de la formación para volverse en contra del hombre y de su formación.

¿filosofía?
Filosofía es pensamiento en ejercicio. Filosofía es un pensar que conduce a la
reconfiguración de la existencia. Es un pensar que, en tanto ejercicio espiritual (HADOT,
2006), implica la reinvención de las formas de vida.
Entiendo
Entiendo porpor filosofía
filosofía lala posibilidad
posibilidad de de pensar
pensar laslas cosas,
cosas, de
de hacer
hacer preguntas,
preguntas, dede
ver
ver contradicciones.
contradicciones. Asumo
Asumo el el concepto
concepto de de filosofía
filosofía enen un
un sentido
sentido muy
muy amplio,
amplio,
en
en el
el sentido
sentido griego
griego dede amor
amor aa la
la sabiduría.
sabiduría. EsEs un
un filósofo
filósofo el
el hombre
hombre queque quiere
quiere
saber;
saber; el
el hombre
hombre queque aspira
aspira aa que
que elel saber
saber sea
sea la
la realización
realización dede su
su ser;
ser; el
el hombre
hombre
que
que quiere
quiere saber
saber por
por qué
qué hace
hace algo,
algo, para
para qué
qué lo
lo hace,
hace, para
para quién
quién lolo hace;
hace; el
el hombre
hombre
que
que tiene
tiene una
una exigencia
exigencia de de autonomía.
autonomía. El El hombre
hombre que que está
está inscrito
inscrito en en una
una
búsqueda
búsqueda de de universalidad
universalidad es es también
también un un filósofo,
filósofo, así
así como
como aquel
aquel que
que quiere
quiere ser
ser
consecuente
consecuente concon los
los resultados
resultados dede su
su investigación.
investigación. (ZULETA,
(ZULETA, 1995, 1995, p.
p. 25).
25).
Zuleta nos da algunas pistas para comprender lo que significa la filosofía. En
primer lugar, es enfático en plantear que la filosofía es pensar, un pensar guiado por la
inquietud permanente. Confrontación sin término. La filosofía se caracteriza por la

1111 “La
“La promesa
promesa de de liberar
liberar al
al hombre
hombre de
de la
la ignorancia,
ignorancia, la
la superstición
superstición yy el
el sufrimiento
sufrimiento aa partir
partir del
del desarrollo
desarrollo de
de
la
la razón
razón yy la
la libertad
libertad parece
parece haberse
haberse convertido
convertido en
en unun instrumento
instrumento para
para falsear
falsear la
la realidad
realidad yy presentar
presentar oo
acomodar
acomodar las las representaciones
representaciones deldel mundo
mundo bajo
bajo una
una extendida
extendida imagen
imagen distorsionada
distorsionada del
del mismo”
mismo” (ESPINEL;
(ESPINEL;
MANRIQUE,
MANRIQUE, 2012, 2012, p.
p. 115).
115).
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot|
hadot| 445
445

pregunta. Ante lo cual surge la inquietud respecto al tipo de pregunta del que se trata o, si
se quiere, ¿cuáles son las características y condiciones de la pregunta filosófica? Se deja así
expuesta la tesis de que no toda pregunta es una pregunta filosófica y, ni siquiera, una
buena pregunta.
La pregunta filosófica es una pregunta que agudiza la mirada, alejando al hombre de
la pretensión de respuestas definitivas. Es una pregunta que no confía ni en el
autoritarismo, ni en los dogmas; por lo que no cae fácilmente en posturas ingenuas,
inocentes o sectarias. Es una pregunta siempre abierta, crítica, disidente y atenta a otras
voces. Es una pregunta que se acompaña de más preguntas, rehuyendo y cuestionando la
perentoriedad de las respuestas que se pretenden concluyentes. Allí luce su carácter
creador, transformador. Allí reside la iniciativa e intempestividad, en términos
nietzscheanos, que caracteriza al filósofo como pensador y que lo distancia de la quietud,
del conformismo y la adaptación.
Otra nota característica de la filosofía, según Zuleta, es la aguda y permanente
crítica. La capacidad de ver contradicciones, incoherencias, de relacionar pensamientos e
identificar falencias. Pero, nuevamente, ¿qué es la crítica? ¿Cuáles son sus características
fundamentales como acción del pensamiento y como actitud? A su vez, el filósofo es un
hombre en búsqueda de sentido, o de sentidos, para su actuar y su pensar. Quiere saber por
qué hace lo que hace, para qué lo hace, para quién lo hace. Sabe del carácter social e
histórico de sus actos, entendiendo que con su actuar construye su entorno y se construye
a sí mismo. Por tanto, asume el compromiso y responsabilidad sobre sus acciones y
omisiones.
El filósofo tiene también una profunda exigencia de autonomía enraizada en la
máxima de pensar por sí mismo. Ser dueño de sus actos y decisiones como producto del
ejercicio de su pensamiento. Persigue, en otras palabras, la capacidad de tomar la iniciativa
con autonomía y creatividad. Además de ello, la filosofía está llamada a la universalidad
como alternativa para superar la opinión subjetiva y los prejuicios acríticos. La reflexión,
la crítica y la coherencia son tres herramientas que le permiten a la filosofía superar la
mera opinión y encaminar los juicios hacia la pretendida universalidad.
En este punto, Zuleta expone tres criterios que a juicio de Kant son las
características de lo que denomina racionalismo, y que en nuestro contexto bien pueden
ayudarnos a caracterizar lo que es la filosofía y, de paso, lo que significa la educación
filosófica. Citado en extenso:
Son
Son tres
tres las
las exigencias
exigencias racionales,
racionales, según
según Kant.
Kant. La La primera,
primera, pensar
pensar por
por sí
sí mismo,
mismo,
es
es decir,
decir, la
la exigencia
exigencia de de renunciar
renunciar aa unauna mentalidad
mentalidad pasiva
pasiva que
que recibe
recibe sussus
verdades
verdades oo simplemente
simplemente las las acepta
acepta dede alguna
alguna autoridad;
autoridad; de
de alguna
alguna tradición,
tradición, de de
algún
algún prejuicio,
prejuicio, sinsin someterlas
someterlas aa su su propia
propia elaboración;
elaboración; la
la segunda,
segunda, ser
ser capaz
capaz de de
ponerse
ponerse enen elel punto
punto dede vista
vista del
del otro,
otro, es
es decir,
decir, mantener
mantener por
por una
una parte
parte elel propio
propio
punto
punto de
de vista
vista pero
pero ser
ser capaz,
capaz, por
por otra
otra parte,
parte, de
de entrar
entrar en
en diálogo
diálogo con
con los
los otros
otros
puntos
puntos de de vista,
vista, en
en lala perspectiva
perspectiva de de llevar
llevar cada
cada uno
uno hasta
hasta sus
sus últimas
últimas
consecuencias,
consecuencias, para para ver
ver en
en qué
qué medida
medida sonson coherentes
coherentes consigo
consigo mismos;
mismos; yy la la
tercera,
tercera, es
es llevar
llevar las
las verdades,
verdades, ya ya conquistadas,
conquistadas, hasta
hasta sus
sus últimas
últimas consecuencias,
consecuencias,
es
es decir,
decir, que
que sisi los
los resultados
resultados de de nuestra
nuestra investigación
investigación nosnos conducen
conducen aa la la
conclusión
conclusión de de que
que estamos
estamos equivocados,
equivocados, loslos aceptemos.
aceptemos. (ZULETA,
(ZULETA, 1995,1995, p.
p. 25).
25).
Tres exigencias: pensar por sí mismo; ser capaz de pensar en el lugar del otro, es
decir, poder escuchar los argumentos del otro y dialogar con ellos; y, finalmente, ser
consecuente, llevando las verdades asumidas hasta las últimas implicaciones, incluso
llegando a reformularlas o abandonarlas de ser necesario y, por tanto, si así lo demuestran
las nuevas indagaciones y reflexiones. Es lo que en otro contexto podríamos denominar la
provisionalidad del pensamiento, producto de la confrontación permanente antes
mencionada. Reconocer, plantea el pensador colombiano en otro de sus textos, “la
446|
446| óscar
óscar espinel-bernal;
espinel-bernal; óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés

pluralidad de pensamientos, opiniones, convicciones, y visiones enriquecedoras; que la mía


no es segura porque su confrontación con otras puede hacérmela cambiar o, bien,
enriquecérmela; que la verdad no es la que yo tengo en la mano; que la verdad sale del
debate, del conflicto”(ZULETA, 1990, p. 32). De aquí su intrínseca cercanía con las
prácticas democráticas.
Filosofía, en síntesis, es un ejercicio que toma para sí una actividad profundamente
humana: el pensar. Pero no un pensar como una acción individual, privada y solipsista,
sino como un pensar de carácter público e intersubjetivo que involucra al individuo en
interacción con los otros y lo otro. Es una búsqueda insaciable de saber. Un saber inquieto
que no se reduce a acumular información. Un deseo nunca acabado porque su búsqueda no
se cifra en alcanzar respuestas sino en suscitar preguntas; las respuestas exactas tienden a
inmovilizar en el confort de la certeza, mientras que las preguntas desestabilizan, alientan,
conspiran, excitan, fustigan. Es un saber que tiene a la base el reconocimiento de la propia
ignorancia, y es este reconocimiento el que, precisamente, agita el deseo de saber.
Pierre Hadot inscribe en esta idea la distinción entre el sabio y el filósofo griego,
dando a la filosofía un lugar preeminente en la cotidianidad existencial del hombre. Para
Hadot, solo los dioses pueden ufanarse de la auténtica sabiduría en cuanto signo de
perfección; mientras que el hombre, por su condición finita, únicamente puede aspirar a
ella. Es la razón de ser del philos-sophos. Escuchemos al propio Hadot:
Gracias
Gracias aa estos
estos ejercicios
ejercicios [los
[los dede la
la filosofía
filosofía entendida
entendida como
como ejercicios
ejercicios
espirituales]
espirituales] debería
debería accederse
accederse aa lala sabiduría,
sabiduría, es
es decir,
decir, aa un
un estado
estado de
de liberación
liberación
absoluta
absoluta de
de las
las pasiones,
pasiones, aa la
la lucidez
lucidez perfecta,
perfecta, al
al conocimiento
conocimiento de de uno
uno mismo
mismo yy
del
del mundo
mundo (HADOT,
(HADOT, 2006, 2006, p.
p. 50-51).
50-51).
Luego de hacer esta presentación de la sabiduría como estado de liberación producto
del conocimiento de sí mismo y del cosmos, advierte el autor: “Este ideal de perfección
humana sirve de hecho, según Platón y Aristóteles, según epicúreos y estoicos, para definir
el estado característico de la perfección divina, y por lo tanto una condición inaccesible al
hombre” (HADOT, 2006, p. 51); sin embargo, a pesar de ser un estado de perfección y
lucidez absoluta derivado del conocimiento pleno y por tanto, exclusivo para los dioses, es
el máximo ideal perseguido por los griegos como realización de su existencia.
La
La sabiduría
sabiduría equivale
equivale ciertamente
ciertamente aa ese
ese ideal
ideal hacia
hacia el
el cual
cual se
se tiende
tiende sin
sin llegar
llegar aa
alcanzarse
alcanzarse […][…] ElEl único
único estado
estado normalmente
normalmente accesible
accesible para
para elel hombre
hombre es es la
la
filosofía,
filosofía, es
es decir,
decir, el
el amor
amor aa la
la sabiduría,
sabiduría, la
la progresión
progresión hacia
hacia la
la virtud.
virtud. (HADOT,
(HADOT,
2006,
2006, p.
p. 51).
51).
Esta idea explica el gran valor que posee la filosofía dentro de la vida griega. Así, la
filosofía es algo diferente a la sabiduría. Es, nos recuerda Hadot, un amor a la sabiduría
según la acepción griega. Pues bien, el amor podría presentarse como un deseo frente a algo
que no está, de lo que se carece y por tanto se anhela. Se desea lo que no se tiene.
Si
Si hay
hay que
que admitir
admitir que
que el
el amor
amor eses deseo
deseo yy que
que no
no se
se posee,
posee, yy si
si el
el amor
amor eses deseo
deseo
de
de la
la belleza,
belleza, ¿no
¿no hay
hay que
que concluir
concluir dede ello
ello que
que el
el amor
amor nono puede,
puede, élél mismo,
mismo, ser
ser
bello,
bello, puesto
puesto que
que no
no posee
posee la
la belleza?
belleza? (HADOT,
(HADOT, 2006,
2006, p.
p. 55).
55).
En este sentido, si la filosofía se define etimológicamente desde Pitágoras como
“amor a la sabiduría”, entonces ella misma no puede ser la sabiduría. Y esto se explica por
una sencilla razón: la sabiduría no es algo que se posea, sino algo que se desea, algo a lo
cual se aspira y que, en tanto tal, dota de sentido el obrar. Así, el filósofo no es el sabio,
sino alguien que, reconociendo sus limitaciones e ignorancia, su “no saber”, emprende la
búsqueda de la sabiduría.
Para decirlo en otras palabras, el amor, en el contexto de esta acepción como pasión
o deseo, se relaciona con algo de lo cual se carece; pero, a su vez, reconoce no sólo la
necesidad de lograr aquello de lo que se carece, sino que reconoce la capacidad para iniciar
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot|
hadot| 447
447

dicha búsqueda. El filósofo, consciente de aquella deficiencia, desea saber. Este es un deseo
movilizador, “salvaje”, instintivo; mueve a la acción. Es un deseo decidido, performativo,
que desestabiliza, que desacomoda. Es un deseo deseante que suscita cambios, nuevas
disposiciones y nuevos hábitos. Por esta razón, compartimos la idea redescubierta por
Hadot según la cual la filosofía no es un simple saber en el sentido de un “saber hacer”,
sino un “modo de vida” mediado por el deseo –nunca satisfecho– de obtener sabiduría.

¿educación filosófica?
Es claro, por lo dicho hasta aquí, que una educación filosófica da prioridad a la
formación sobre la información. En ella la enseñanza de las distintas áreas se da de manera
filosófica, es decir, se propone un ejercicio de pensamiento crítico, y no la asimilación de
un cuerpo teórico o de información.
Una educación filosófica se aleja de las respuestas perentorias, tajantes y radicales
para abrirse a la pregunta movilizadora, a la vitalidad del cuestionamiento permanente.
Evita toda doctrina dogmática por su talante autoritario, terminal y silenciador, y prefiere
el diálogo, la confrontación, la diversidad. Enseñar filosóficamente es “[…] darle un
sentido a lo que se enseña” (ZULETA, 1995, p. 104), para evitar caer en un aprendizaje
memorístico, autómata, monótono. Es decir, se enseña en torno a la complejidad de la vida
y para esto es necesario vincular el mundo de la vida en el proceso; vincular el entorno
vital de los sujetos; relacionar las nuevas experiencias y conocimientos con las
experiencias, conocimientos, concepciones y creencias de los sujetos; acercarse a una
mayor comprensión de lo humano y del universo a partir del fragmento de mundo que se
aparece en el fenómeno, explicación o cuestión que se aborda sin quedarse en el dato
insular, desconectado y puntual.
La educación, guiada por las viejas pretensiones del cientificismo, generalmente
tiende a caer en el error de enseñar definiciones y conceptos que aspiran a encerrar de
manera unívoca, y lo más exactamente posible, los complejos entramados de la realidad
que se propone explicar. Además, enseña fórmulas, procedimientos, protocolos que
establecen las relaciones entre dichas definiciones que más allá de esto no terminan siendo
más que datos frágiles, fragmentados y volátiles. Todo ello olvidando que la realidad, el
mundo, la vida son en sí mismos dinámicos, cambiantes, diversos, enmarañados,
polivalentes, complejos y, por tanto, reacios a ser encapsulados y confinados a definiciones
estáticas, absolutas y definitivas. Olvida en esta pretensión que los conceptos son
herramientas para nombrar la realidad, para representar el mundo en el pensamiento y
comunicarlo a través del lenguaje o lenguajes (en plural). Las definiciones, los conceptos,
las fórmulas, las teorías no pierden su lugar, dentro de una educación filosófica, como
herramientas para comprender y comunicar el mundo; pero nunca son las únicas o
absolutas herramientas. Son instrumentos para leer el mundo y no “El mundo” en sí
mismo. La educación no filosófica, la educación academicista y memorística olvida que su
propósito último es comprender el mundo y tiende a concentrarse en la discusión,
reproducción y validación de conceptos y teorías.
Otra gran dificultad de la educación, que se relaciona con la tendencia a reprimir el
pensamiento, es que la educación se esfuerza por transmitir los resultados de largos
procesos de pensamiento reduciendo el ejercicio a replicar la teoría, el sistema conceptual,
la fórmula. Se reproduce el resultado y no se enseña el proceso que llevó a él. Esta práctica
generalizada en la educación oculta las preguntas que dieron origen o motivaron el
conocimiento o dato que se transmite. Por esta razón, el saber en la escuela se entiende
como un repetir y no como un pensar. “La educación y los maestros nos hicieron un mal
favor: nos ahorraron la angustia de pensar” (ZULETA, 1995, p. 22).
448|
448| óscar
óscar espinel-bernal;
espinel-bernal; óscar
óscar pulido-cortés
pulido-cortés

Una educación filosófica, por su parte, emplea las teorías, explicaciones y conceptos
como instrumentos para suscitar nuevas preguntas, nuevas ideas, nuevas perspectivas,
nuevos pensamientos. No le interesan tanto las respuestas elaboradas como el proceso de
conocimiento y las preguntas que llevaron a determinada explicación, así como las
preguntas que quedan sin responder y aquellas otras que empiezan a emerger en el proceso
de pensar.
Por último, una educación filosófica, de acuerdo con las ideas de Zuleta, más que
transmitir nombres, imágenes, conceptos, teorías, propende por comprender, exponer y
cuestionar los conceptos mismos. No bastaría con repetir y memorizar definiciones y
nombres, pues con ello no se habrá garantizado la comprensión de los conceptos. Como ya
lo hemos expuesto anteriormente, el concepto intenta captar y comunicar una realidad o
un aspecto del mundo. Es decir, contiene en sí toda una red de significados, concepciones y
presupuestos que deben ser puestos en evidencia para comprender y discutir la percepción
y comprensión que encierra. No hacerlo implica reproducir mecánica y acríticamente un
conocimiento pensado por otro. De esta práctica, en la mayoría de los casos, se obtiene una
repetición sin sentido que, en consecuencia, termina por incrementar la confusión y la
saturación de prejuicios e ideas no-pensadas. Es decir, retomando una idea anterior,
conduce al aumento de la ignorancia en su acepción de indigestión y atiborramiento.
Ahora bien, “[t]odo hombre racional es un hombre desadaptado, porque es un
hombre que pregunta. Por el contrario, el hombre adaptado es un hombre que obedece”
(ZULETA, 1995, p. 34). Así las cosas, la educación filosófica forma sujetos “desadaptados”
frente a las retóricas normalizadas, estatuidas y, por tanto, frente al código de verdades
dogmáticas establecidas. El sistema, dice Zuleta, se encarga de producir conciencias
ingenuas, dóciles y con cierta actitud sumisa frente al saber - frente al saber de otros -. Se
somete a una autoridad que siempre se le ha presentado como tal de forma naturalizada, ya
sea en la figura del maestro, del libro, del científico, del especialista, del doctor, del oficial,
de la televisión, de los diarios, de los padres, del cura, del adulto, del adinerado, del jefe,
etc. Hay autoridades por doquier. Constantemente se enseña quién o cuál es la autoridad y
por tanto, a quién o a qué se le debe obediencia. Se entrena para obedecer. No se ejercita
para pensar. Es una conducta que a fuerza de repetición y refuerzo ha sido fijada, instalada
e internalizada en los sujetos domesticados.
Es así que la educación filosófica asume el campo de la educación como un campo de
combate.
Combatir
Combatir en en elel sentido
sentido dede que
que mientras
mientras más más se se busque
busque la
la posibilidad
posibilidad de de una
una
realización
realización humana
humana de de las
las gentes
gentes que
que se
se quiere
quiere educar
educar másmás se
se estorba
estorba al
al sistema.
sistema.
Por
Por el
el contrario,
contrario, mientras
mientras más
más se
se oriente
oriente la
la educación
educación aa responder
responder aa las
las demandas
demandas
impersonales
impersonales del del sistema
sistema más
más se
se contribuye
contribuye aa susu sostenimiento
sostenimiento yy perpetuación.
perpetuación.
Repito,
Repito, lala educación
educación es es un
un campo
campo dede combate;
combate; los los educadores
educadores tienen
tienen un
un espacio
espacio
abierto
abierto allí
allí yy es
es necesario
necesario que
que tomen
tomen conciencia
conciencia de de su
su importancia
importancia yy de de las
las
posibilidades
posibilidades queque ofrece.
ofrece. (ZULETA,
(ZULETA, 1995,1995, p.
p. 47).
47).
Una educación filosófica aspira a propiciar un espacio de lucha por la
emancipación, por la transformación de sujetos serviles en sujetos pensantes, creativos y
autónomos. Se trata de una educación con profundos compromisos éticos y políticos en
medio de una convulsionada sociedad. De esta manera, la educación se presentaría como
un potente escenario para la construcción de lo público, del “espacio público” y, por tanto,
como posibilidad de la ética en tanto espacio para el encuentro y reconocimiento de la
vulnerabilidad del ser humano, tal como lo expone el profesor Cullen (2016) en su texto
“Riesgo, violencia y espacio público. Reflexiones éticas”.
En conclusión, desde esta perspectiva de la educación filosófica se propone formar
en el marco de un deseo profundo de saber superando la frenética esquizofrenia por
educación
educación filosófica
filosófica ee inquietud
inquietud de
de sí.
sí. diálogos
diálogos entre
entre estanislao
estanislao zuleta
zuleta yy pierre
pierre hadot|
hadot| 449
449

aprender fórmulas y atesorar información que garanticen el éxito y el ascenso en medio de


una sociedad gobernada por la mercancía, burocrática y despersonalizante. No porque se
consideren innecesarios los conceptos, las definiciones y teorías, sino porque se entiende
que todos ellos han de ser herramientas para la comprensión de las complejidades y para el
ejercicio del pensamiento. El conocimiento ha de estar al servicio de empresas mayores y
no sólo en función de la simple acumulación y reproducción. Educar en este ambiente de
creatividad, de iniciativa, de problematización, de preguntas por lo que significa ser
humano y las condiciones que lo propician, es la lucha y el combate que transfigura e
incita. Es, insisto, el pensamiento instigador que aquí se plantea.

referencias
ADORNO,
ADORNO, Theodor;
Theodor; HORKHEIMER,
HORKHEIMER, Max. Max. Dialéctica
Dialéctica dede la
la Ilustración.
Ilustración. Madrid:
Madrid: Trotta,
Trotta, 2006.
2006.
CULLEN,
CULLEN, Carlos.
Carlos. Riesgo,
Riesgo, violencia
violencia yy espacio
espacio público.
público. Reflexiones
Reflexiones éticas.
éticas. In:
In: ESPINEL,
ESPINEL, Óscar Óscar
(org.).
(org.). Pensar
Pensar aa la
la Intemperie.
Intemperie. Ensayos
Ensayos filosóficos.
filosóficos. Bogotá:
Bogotá: UNIMINUTO,
UNIMINUTO, 2016. 2016.
ESPINEL,
ESPINEL, Óscar.Óscar. Pedagogías
Pedagogías críticas
críticas yy educación
educación en en derechos
derechos humanos.
humanos. Una Una mirada
mirada desdedesde
escenarios
escenarios escolares
escolares yy no no escolares.
escolares. Revista
Revista Nodos
Nodos yy Nudos,
Nudos, n.29,
n.29, p.
p. 41
41 –– 51,
51, 2010.
2010.
ESPINEL,
ESPINEL, Óscar;
Óscar; MANRIQUE,
MANRIQUE, Juan Juan F.F. Interpretación
Interpretación yy crítica
crítica al
al concepto
concepto de de “Ilustración”
“Ilustración” en en
Adorno
Adorno yy Horkheimer.
Horkheimer. In: In: PRADA,
PRADA, Diego Diego (org).
(org). Crítica,
Crítica, Emancipación
Emancipación yy Construcción
Construcción de de
Paz.
Paz. Bogotá:
Bogotá: UNIMINUTO,
UNIMINUTO, p. p. 102
102 –– 122,
122, 2012
2012
ESPINEL,
ESPINEL, Óscar.Óscar. Filosofía,
Filosofía, prácticas
prácticas de de sí sí yy arte
arte de
de vivir.
vivir. Revista
Revista Fermentario,
Fermentario, v.2, v.2, n.8,
n.8, 2014.
2014.
Disponible
Disponible online
online en:
en:
http://www.fermentario.fhuce.edu.uy/index.php/fermentario/article/
http://www.fermentario.fhuce.edu.uy/index.php/fermentario/article/ view/175/224.
view/175/224.
Consultado
Consultado en:en: 08/11/2015.
08/11/2015.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. Hermenéutica
Hermenéutica del del sujeto.
sujeto. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Fondo
Fondo dede Cultura
Cultura Económica,
Económica, 2009. 2009.
HADOT,
HADOT, Pierre.
Pierre. ¿Qué
¿Qué es es la
la filosofía
filosofía antigua?.
antigua?. México:
México: Fondo
Fondo de de Cultura
Cultura Económica,
Económica, 1998. 1998.
______.
______. Ejercicios
Ejercicios espirituales
espirituales yy filosofía
filosofía antigua.
antigua. Madrid:
Madrid: Ediciones
Ediciones Siruela,
Siruela, 2006.
2006.
JAEGER,
JAEGER, Werner.
Werner. Paideia.
Paideia. Bogotá:
Bogotá: Fondo
Fondo de de Cultura
Cultura Económica,
Económica, 2010. 2010.
PLATÓN.
PLATÓN. Diálogos
Diálogos V:
V: Parménides,
Parménides, Teeteto,
Teeteto, Sofista,
Sofista, Político.
Político. Madrid:
Madrid: Gredos,
Gredos, 1972.
1972.
PACHÓN,
PACHÓN, Damián.Damián. Estanislao
Estanislao Zuleta
Zuleta yy la la educación
educación filosófica.
filosófica. In:
In: PACHÓN,
PACHÓN, Damián. Damián. Estudios
Estudios
sobre
sobre pensamiento
pensamiento colombiano.
colombiano. VolVol I.I. Bogotá:
Bogotá: Ediciones
Ediciones desdedesde abajo,
abajo, 2011.
2011.
PULIDO,
PULIDO, Óscar.
Óscar. Estanislao
Estanislao Zuleta:
Zuleta: educació
educaciónn concon filosofí
filosofíaa.. Cuestiones
Cuestiones dede Filosofí
Filosofíaa,, n.14,
n.14, p.
p. 79
79 –– 99,
99,
2012.
2012.
_______.
_______. Formación
Formación de de empresarios
empresarios de de sí
sí mismos:
mismos: miradas
miradas aa la la educación
educación superior
superior en en lala segunda
segunda
mitad
mitad del
del siglo
siglo XX.
XX. In:In: ESPINEL,
ESPINEL, Óscar Óscar (org.).
(org.). Pensar
Pensar aa la
la Intemperie.
Intemperie. Ensayos
Ensayos filosóficos.
filosóficos.
Bogotá:
Bogotá: UNIMINUTO,
UNIMINUTO, 2016. 2016.
ZULETA,
ZULETA, Estanislao.
Estanislao. La La participación
participación democrática
democrática yy su su relación
relación concon lala educación.
educación. In: In: Estanislao
Estanislao
Zuleta
Zuleta 1935-1990.
1935-1990. Tunja:
Tunja: Ediciones
Ediciones la la Rana
Rana yy el
el Águila
Águila UPTC,UPTC, 1990.
1990. 


________.
________. Educación
Educación yy Democracia.
Democracia. Medellín:
Medellín: Hombre
Hombre Nuevo
Nuevo Editores,
Editores, 1995.
1995.
________.Tribulación
________.Tribulación yy felicidad
felicidad deldel pensamiento.
pensamiento. In: In: ZULETA,
ZULETA, Estanislao.
Estanislao. Elogio
Elogio de de la
la dificultad
dificultad yy
otros
otros ensayos.
ensayos. DécimaDécima edición.
edición. Medellín:
Medellín: Hombre Hombre Nuevo Nuevo Editores,Editores, 2007. 2007.
450
450
451
451

reflexiones sobre la finitud y su aproximación a los jóvenes

angel alonso salas11

E n el presente texto se abordará la manera en que se ha reflexionado todas


aquellas problemáticas que giran en torno al dolor, el sufrimiento y la
muerte del ser humano con mis estudiantes en el interior de las aulas con los
jóvenes del Colegio de Ciencias y Humanidades (CCH). Como sabemos, el tema de la
finitud es de suma importancia en la historia de la filosofía y en algún momento de
nuestra existencia seremos afectados por esta cuestión. Aunado a esto, el hecho de que la
misma vida nos lleve o ha llevado a participar de una serie de momentos dolorosos en los
que nos enfrentamos al acto de morir, el tocar este tema suele generar la susceptibilidad y
sensibilidad del grupo. En la mayoría de las ocasiones, la finitud se hace presente a partir
de la muerte de una mascota, de un familiar cercano (tío, abuelo, hermano, padre, primo,
etc.), de alguna amistad o simplemente en aquella noticia con la que se convive con
frecuencia en una sociedad tan violenta como lo es la sociedad mexicana contemporánea.
Recordemos que se ha caracterizado a nuestra época como la que está inmersa en la
“cultura de la muerte”, en donde los Mass Media y acontecimientos en nuestros barrios,
planteles y sociedad en general han manifestado una exacerbada escalada de violencia por
el narcotráfico, violencia de género (discriminación a personas homosexuales o violencia
contra la mujer), la ola de asaltos, asesinatos, desapariciones forzadas, secuestros y
violaciones, en donde los ciudadanos, o bien, han ido asimilando que noticias como éstas
son cotidianas, o que, se debe aprender a actuar en casos de balaceras o asesinatos, como si
fuera un protocolo en caso de sismo o incendio.
Ante este escenario en el que se encuentran nuestros jóvenes, en el transcurso de los
semestres se habla acerca del tema de la finitud y se abordan éstos y muchos temas más.
De esta forma, contaré la experiencia que año con año tengo al hablar de estos temas, y la
manera en que he ido abordando y enfrentando una serie de problemáticas que se derivan
de esta cuestión, en donde paso a paso describiré cómo llevo a cabo dicha actividad.

previo a la clase sobre finitud


Antes de llevar a cabo la clase sobre la finitud, llevo a cabo las siguientes acciones.
En primer lugar, procuro ganarme la confianza de los estudiantes, pues el tema a tratar
puede ser muy emotivo o personal. Considero que a partir de los contenidos de las clases;
el acompañamiento y monitoreo que se deriva del día a día en la convivencia y presencia
con los alumnos, a partir del conocimiento de su nombre, sus intereses académicos y
profesionales, y en ocasiones personales, problemáticas de salud o una evaluación
diagnóstica que se hace el primer día de clases uno va conociendo al grupo y a cada uno de
sus integrantes. El hecho de que el docente elabore ciertos instrumentos para medir en
cada grupo el impacto e interés que ha despertado esta materia obligatoria en los
estudiantes (independientemente de la carrera que vayan a elegir); el hecho de que uno sea
tutor de ese grupo (que implica un trabajo con los padres de familia y un acercamiento
“cara a cara” al estilo Levinas), permiten “calibrar” el momento en que se lleve a cabo la
clase.
En segundo lugar, es necesario encontrar una fecha o acontecimiento que sea
propicia para hablar del tema. A lo largo de más de diez años he procurado llevar a cabo

11 Colegio
Colegio de
de Ciencias
Ciencias yy Humanidades
Humanidades Plantel
Plantel Azcapotzalco,
Azcapotzalco, Universidad
Universidad Nacional
Nacional Autónoma
Autónoma de
de México
México --
CCH
CCH Azcapotzalco,
Azcapotzalco, UNAM;
UNAM; Consejo
Consejo Nacional
Nacional de
de Ciencia
Ciencia yy Tecnología
Tecnología -- Sistema
Sistema Nacional
Nacional de
de
Investigadores
Investigadores -- CONACYT,
CONACYT, SIN.
SIN. Email:
Email: iberoangina@yahoo.com.mx
iberoangina@yahoo.com.mx
452|
452| angel
angel alonso
alonso salas
salas

dicha clase y actividad en una fecha próxima a la celebración de Día de Muertos. Como es
sabido, en México existe una festividad referente al día de Todos los Santos y Fieles
Difuntos (1 y 2 de noviembre), en donde se realizan y dedican las “Ofrendas” dedicadas a
los muertos; existe una presencia de la “Catrina” y todas las manifestaciones religiosas y
artísticas sobre el acto de morir como una cuestión festiva y socio-cultural que caracteriza
la identidad del pueblo mexicano, y que me permite contrastar en el aula la manera en que
la filosofía occidental ha reflexionado sobre esta cuestión.
Cuando no llevo a cabo esta actividad a fines de octubre o los primeros días de
noviembre, y lo considero necesario, retomo este tema a la postre de reflexionar sobre las
escuelas helénicas. He optado por abordar la filosofía helenística en la línea que desarrollan
Pierre Hadot, Michel Foucault y Martha Nussbaum en donde se plantea a la filosofía
como una forma de vida, los temas de la ascésis y ataraxia como elementos que permiten
aproximar y llevar a la práctica cotidiana los contenidos, enseñanzas y reflexiones del
cinismo, estoicismo, epicureísmo y escepticismo.
Es importante resaltar el hecho de que conforme pasan las clases, el profesor
adquiere una sensibilidad sobre el estado del grupo y va conociendo el perfil, características
y necesidades del grupo que atiende, en donde existe una pulsación y palpitar de las clases,
una visión del impacto que tienen los contenidos en el rostro de los chicos, con el interés
manifiesto en sus participaciones, “pláticas de pasillo” o en esas charlas individuales vía
redes sociales o en persona que se generan con las clases, lo que permite reorientar y
resignificar los contenidos del programa operativo.
De esta forma, el docente puede percatarse de las necesidades y sentir de una
generación, del abandono social y familiar al que han sido expuestos, de las carencias de
habilidades y conocimientos que arrastran; la particularidad de cada grupo (ya sea que uno
perciba un interés por las cuestiones artísticas, políticas o culturales, entre otros); una
marcada influencia de una serie de televisión, ánime o acontecimiento social que marca a
una generación; el impacto que tienen temas como el amor o la amistad; alguna
problemática particular (laborales, presencia de madres solteras, predominancia de
repetidores, etcétera), que llevan al docente a cambiar su planeación, semejante a cuando
un conductor siente la necesidad de cambiar la velocidad para no forzar la máquina,
porque ésta lo indica.
Finalmente, un tercer factor que puede ser tomado en cuenta, es la presencia de un
factor social o externo que obliga a hablar un tema político, educativo, internacional o
local, como lo fue la desaparición de los normalistas en Ayotzinapa en 2014; la enfermedad
(hospitalización, accidente o enfermedad grave y delicada como el cáncer) o la muerte
(asesinato, muerte natural o suicidio) de un compañero del aula, o bien, una catástrofe
natural o suceso que lleva a los alumnos a preguntarse el por qué y para qué de dicha
acción; el conocer qué diría la filosofía ante X acontecimiento, etcétera.
A partir de mi experiencia docente, el hablar sobre la finitud se ha debido a razones
como el hecho de que algún compañero del salón haya aparecido en la portada de
periódicos amarillistas, al ser víctima de la violencia y del crimen organizado; el caso de un
estudiante a quien le diagnosticaron cáncer terminal o que sufrieron un accidente y una
discapacidad; el acompañamiento de los familiares ante la muerte repentina de un
estudiante; el suicidio de un compañero cercano a estudiantes de alguno de mis grupos o la
desaparición forzada de algún familiar o conocido, que me llevan a reflexionar acerca de
estos temas y canalizar a los estudiantes con las autoridades e instancias correspondientes.
reflexiones
reflexiones sobre
sobre la
la finitud
finitud yy su
su aproximación
aproximación aa los
los jóvenes|
jóvenes| 453
453

preparación ante estos temas


No existe una capacitación ni preparación como sería un manual para abordar estos
temas ni un protocolo que permita saber qué hacer ante la muerte repentina o esperada de
un familiar o compañero. Tampoco es fácil pasar del plano teórico al acontecimiento de la
muerte de un sujeto particular y mucho menos de alguien a quien se conoce. A veces, el
contenido conceptual sobre el morir de la obra de Heidegger, Platón, Epicuro o Cicerón a
una aplicación inmediata como la muerte con violencia de un normalista o la enfermedad
terminal de un miembro de la familia, producen una tensión que debe trabajarse entre
pares o en las comunidades de indagación. De esta forma, es importante la formación y
actualización docente en el ámbito de la antropología, filosofía, bioética, psiquiatría y
tanatología. Debido a que mi formación docente y personal se ha encaminado hacia las
cuestiones de bioética, en donde he reflexionado acerca de los dilemas existentes en torno
al inicio y fin de la vida (muerte, aborto, suicidio, eutanasia, enfermedades terminales,
acompañamiento en tanatología, cuidados paliativos o bien, la geriatría), he contado con
ciertas bases teóricas para poder abordar estos temas y no quedarme callado, mismas que
retomo en las comunidades de indagación, para así generar una reflexión sobre estos
temas, buscando propiciar una toma de conciencia, una reflexión pausada y no precipitada,
así como también, el apoyarse en la infraestructura del plantel (psicopedagogía, servicios
médicos, servicios escolares, etcétera) a ciertos casos particulares. Afortunadamente en el
plantel donde laboro, cuento con una infraestructura y personal que está capacitada para
responder a situaciones de emergencia. En este sentido, he podido canalizar y dar
seguimiento a pacientes, estudiantes o remitirlos con los especialistas; recibir un apoyo de
parte del equipo de psicopedagogía en el interior del plantel y colegas que trabajan en
centros de cuidados paliativos, religiosos o profesionales de la salud (psiquiatras, médicos,
suicidologos, trabajadores sociales, etcétera), que me han permitido “salir a flote” y decir
algo, estar presente en ese momento difícil, tales como un velorio, entierro o previo a una
crisis de identidad y buscar los apoyos que sean necesarios. Reitero que es necesaria e
indispensable una formación, capacitación y actualización en cuestiones teóricas y
personales constante y aprender generación tras generación nuevos retos y aprendizajes
que son muy significativos.

presentación de power point


El esquema y temáticas que abordo en una presentación de Power Point a partir de
las comunidades de indagación son:
• Finitud. Se reflexiona acerca de la caducidad y vigencia de la existencia del ser
humano. Se menciona la conciencia anticipada de la muerte que poseemos los seres
humanos y cómo ésta puede producir dolor. Además, debido a que somos los únicos
seres que otorgamos una carga valorativa a este proceso natural. De esta forma, la
muerte manifiesta la finitud humana y será a partir de la muerte del Otro, que el
sujeto suele valore su vida.
• Platón. De acuerdo a Sócrates (Apología de Sócrates, 40 c-e), la muerte no
representa nada ya que quien fallece no tiene sensación de nada, o bien, según se
dice, la muerte es precisamente una transformación, un cambio de morada para el
alma de este lugar de aquí a otro lugar.
• Epicuro. Se reflexiona sobre la Carta a Meneceo, en donde se sostiene que la
muerte no representa un problema genuino, ya que ésta se encuentra lejos de los
vivos, y cuando ésta se acerca, los segundos han desaparecido.
• Séneca. Se retoman fragmentos de Sobre la brevedad de la vida, en donde se
reflexiona a partir de ciertas citas tales como el hecho de que el “bien vivir”
454|
454| angel
angel alonso
alonso salas
salas

corresponde al “bien morir”; la fugacidad del tiempo y el desperdicio de éste en


cosas absurdas, así como también, la actitud estoica ante el sufrimiento.
• Schopenhauer. A partir de fragmentos de El mundo como voluntad y representación se
reflexiona acerca del pesimismo y la manera en que el filósofo alemán concibe la
voluntad de vivir y la voluntad de la naturaleza; la perspectiva de la filosofía
oriental que retoma sobre la compasión, el dolor, el velo de maya y el sufrimiento.
• Nietzsche. A partir de pasajes de Así habló Zaratustra o El nacimiento de la tragedia,
se aborda el vitalismo, el sí a la vida, el sentido de la tierra y el papel del cuerpo.
• Heidegger. A partir de fragmentos de Ser y tiempo se reflexiona acerca de la
temporalidad la cuestión de la “mortalidad”, en donde se retoman los temas de la
angustia y el “ser-para-la-muerte”.
• Norbert Elias. Se retoma la reflexión existente en La soledad de los moribundos
sobre el hecho de que la sociedad y las instituciones han contribuido a esconder o
reprimir a la muerte, “escondiéndola detrás de las bambalinas”, así como también
se hace mención de los tipos de “moribundos” (que viven en soledad), a saber, los
“accidentados “u “hospitalizados”; ancianos y “solitarios”.
• Existencialismo. Se hace mención de que la muerte revela al sujeto lo que éste es
desde un punto de vista humano. Por ejemplo, cuando fallece un amigo, dicho
suceso lo remite a la vida de aquel ser, cómo era y que el próximo en morir podría
ser uno mismo. El sujeto reflexiona acerca de los recuerdos, los momentos y las
situaciones agradables o desagradables que pasó con el que ha fallecido y el papel de
la angustia en este proceso.
• Elisabeth Kübler-Ross. Se hace mención de las fases por las que pasa el sujeto ante
la muerte (negación, ira, pacto, depresión y aceptación) que desarrolla en su texto
Sobre la muerte y los moribundos.
• Finamente, se establece un vaso comunicante de los contenidos de Filosofía I
(quinto semestre) con Filosofía II (sexto semestre) al apuntar la manera en que se
piensa la Muerte en ámbito bioético, los enfermos terminales y/o desahuciados, el
suicidio, la eutanasia, el sentido y la significación de la existencia, la dignidad y/o
calidad de vida, entre otros.

resultados y retos
Simplemente quisiera enunciar los frutos, retos, conflictos y resultados que he
tenido al abordar estos temas:
- Realización de pláticas sobre cáncer y atención a enfermos terminales.
- Asistencia y acompañamiento en duelos de familiares, conocidos o estudiantes
en algunos funerales.
- Canalización de estudiantes con especialistas (psicólogos, terapeutas,
tanatólogos, oncólogos, sacerdotes, servicios escolares, entre otros).
- Mostrar la aplicación práctica de estos contenidos filosóficos.
- Hablar sobre la muerte, finitud y suicidio, temores, conflictos y socializar el
tema.
- Hablar en privado con estudiantes que aún sufren el duelo.
- Valorizar la vida a partir de hablar de la muerte, como dice Eduardo Matos
Moctezuma, los mexicas no tienen un “culto a la muerte”, sino un culto a la vida a
partir de la muerte
- Lectura y reflexión desde las comunidades de indagación con la producción
poética de los mexicas y mayas sobre la finitud, haciendo una referencia al capital
cultural e histórico existente en México sobre la muerte.
reflexiones
reflexiones sobre
sobre la
la finitud
finitud yy su
su aproximación
aproximación aa los
los jóvenes|
jóvenes| 455
455

- Comprender la postura de la filosofía occidental y apuntar a los contenidos


filosóficos latinoamericanos y orientales referentes a la muerte, dolor y
sufrimiento.
- Hacer manifiesta la interdisciplina en estos temas, comprender que el papel que
tiene la psiquiatría, religión, sociología, medicina y antropología permiten
aproximarnos más a la comprensión y significación de nuestra vida y muerte.

referencias
ELIAS,
ELIAS, Norbert.
Norbert. LaLa soledad
soledad de de los
los moribundos.
moribundos. Traducción
Traducción de de Carlos
Carlos Martín.
Martín. México,
México, DF:DF: FCE,
FCE,
1989.
1989.
EPICURO.
EPICURO. Obras.
Obras. 3ª3ª ed.
ed. Estudio
Estudio preliminar,
preliminar, traducción
traducción yy notas
notas de
de Montserrat
Montserrat Jufresa,
Jufresa, Madrid:
Madrid:
Tecnos,
Tecnos, 1999.
1999.
HEIDEGGER.
HEIDEGGER. Ser Ser yy tiempo.
tiempo. 4ª 4ª ed.
ed. Traducción
Traducción yy notas
notas dede Jorge
Jorge Eduardo
Eduardo Rivera.
Rivera. Chile:
Chile: Editorial
Editorial
Universitaria,
Universitaria, 2005.
2005.
KÜBLER-ROSS,
KÜBLER-ROSS, Elisabeth.
Elisabeth. Sobre
Sobre lala muerte
muerte yy los
los moribundos:
moribundos: alivio
alivio del
del sufrimiento
sufrimiento psicológico
psicológico para
para los
los
afectados.
afectados. 2ª
2ª ed.
ed. México,
México, DF: DF: DeDe Bolsillo,
Bolsillo, 2006.
2006.
NIETZSCHE,
NIETZSCHE, Friedrich.
Friedrich. Así Así habló
habló Zaratustra.
Zaratustra. Un Un libro
libro para
para todos
todos yy para
para nadie.
nadie. 7ª
7ª reimp.
reimp.
Introducción,
Introducción, traducción
traducción yy notasnotas dede Andrés
Andrés Sánchez
Sánchez Pascual.
Pascual. México:
México: Alianza
Alianza Editorial,
Editorial,
1997.
1997.
________.
________. El
El nacimiento
nacimiento de de la
la tragedia.
tragedia. O O Grecia
Grecia yy elel pesimismo.
pesimismo. 5ª5ª reimp.
reimp. Introducción,
Introducción, traducción
traducción yy
notas
notas de
de Andrés
Andrés Sánchez
Sánchez Pascual.
Pascual. México:
México: Alianza
Alianza Editorial,
Editorial, 1997.
1997.
PLATÓN.
PLATÓN. Diálogos.
Diálogos. Vol.
Vol. I.I. Introducción,
Introducción, traducción
traducción yy notasnotas de
de Francisco
Francisco Lisi.
Lisi. Madrid:
Madrid: Gredos,
Gredos,
2008.
2008.
SARTRE,
SARTRE, Jean-Paul.
Jean-Paul. ElEl ser
ser yy la
la nada.
nada. Ensayo
Ensayo de
de ontología
ontología fenomenológica.
fenomenológica. Buenos
Buenos Aires:
Aires: Losada,
Losada, 1993.
1993.
SÉNECA.
SÉNECA. Epístolas
Epístolas Morales
Morales aa Lucilo.
Lucilo. 2ª
2ª reimp.
reimp. de de la
la 1ª
1ª ed.
ed. Vol.
Vol. III.
III. Traducción
Traducción yy notas
notas de
de Ismael
Ismael
Roca
Roca Meliá.
Meliá. Madrid:
Madrid: Gredos,
Gredos, 1989.
1989.
SCHOPENHAUER,
SCHOPENHAUER, Arthur. Arthur. El El mundo
mundo como
como voluntad
voluntad yy representación.
representación. Introducción,
Introducción, traducción
traducción yy
notas
notas de
de Pilar
Pilar López
López de de Santa
Santa María.
María. Madrid:
Madrid: Trotta,
Trotta, 2003.
2003.
456
456
457
457

colóquios sobre educação:


da vida, o que se sabe; do estudo, o que se pode;
da filosofia, problematizações contemporâneas

daison nelson ferreira dias11


josé menna oliveira22
rosana aparecida fernandes33

primeiro colóquio: o subjetivo

P or favor, silêncio. Temos todo o tempo do mundo, em pouco tempo. Talvez


amanhã seja feriado, desconhecemos as condições climáticas, estamos sem
dúvida em trânsito, alguns há pouco se juntaram a nós, uns mais, outros
menos confiantes. É provável que sejamos poucos. De tudo o que pode ser dito, o eterno
presente velado, caberão a nós outras laudas. Deveríamos, portanto, enunciar perguntas? O
castelão, o campônio, o símio, quem saberá se estão entre nós, e se reclamam vez? Houve
noites em que um parasita arrastava asas entre pernas e blasfemava contra tudo, o que foi
posto em ata. Os documentos se perderam porque havia vento.

colóquio ao primeiro
Quais são as riquezas de forma e de conteúdo em quem forma o que contém uma
área de saber? Como podem ampliar ou restringir a função poética do que se constrói com
o viver, o que se sente e o que se abstém de sentir? Existem caminhos para a construção do
conhecimento, mas o que encontramos ao percorrê-los não deixa de influenciar o modo
com que nos relacionamos com o que temos ao chegar ao ponto de partida. Sim, o ponto de
partida. O ponto a partir do qual começa o exercício de quem acabara de receber a
formação para que possa iniciar a sua identidade individual, construída a partir de um
coletivo do qual acaba de começar a fazer parte, compondo, portanto, o grupo para o qual
fora preparado. O ponto de partida é o local onde a educação que o preparou se confunde
com o início do caminho que esse sujeito, ora ativo ora passivo no processo de sua própria
formação, trilhará, invariavelmente, até o final de sua caminhada. Caminhada essa que se
confundirá com a história de sua própria vida. A educação se confunde com a vida do
sujeito. O sujeito não identifica mais os elementos de sua própria educação. A educação se
torna o sujeito e o sujeito não mais o é sem a educação.

segundo colóquio: a profissão


A formação em psiquiatria deve ser baseada no estudo constante de casos clínicos.
Deverão existir as disciplinas fundamentais: história da psiquiatria, semiologia
psiquiátrica, clínica psiquiátrica e terapêutica psiquiátrica. Espera-se que o estudante tenha
sólida formação em medicina, com bom desempenho em disciplinas como morfologia,
fisiologia e farmacologia.

colóquio ao segundo
A medicina sem a ciência não é mais do que um conselho baseado no que se possa
pensar ser o melhor para o outro como o melhor já já fora para quem aconselha. Não é senão
a escolha arbitrária pelo sim e pelo não, pelo que faz ou que deseja não fazer. Não justifica

11 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Rio
Rio Grande
Grande do
do Sul
Sul –– UFRGS.
UFRGS. Email:
Email: daison.dias@ufrgs.br
daison.dias@ufrgs.br
22 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Rio
Rio Grande
Grande do
do Sul
Sul –– UFRGS.
UFRGS. Email:
Email: josemennaoliveira@gmail.com
josemennaoliveira@gmail.com
33 Universidade
Universidade Federal
Federal do
do Rio
Rio Grande
Grande do
do Sul
Sul –– UFRGS.
UFRGS. Email:
Email: rosanafernandes.edu@gmail.com
rosanafernandes.edu@gmail.com
458|
458| daison
daison nelson
nelson ferreira
ferreira dias;
dias; josé
josé menna
menna oliveira;
oliveira; rosana
rosana aparecida
aparecida fernandes
fernandes

com base no que já houve porque não ouve. Não está para o passado porque com ele não
aprende nada. A medicina não pode ser ensinada como quem conflita a ciência. O mundo
repete o sofrimento e o alívio advém das soluções já experimentadas. Respeitemos os que
já sofreram para que se soubesse o que hoje é conhecido. Aceitemos que o brutal já excedeu
em número sua existência possível e que sôfrego é o estado de quem não sabe o que
contempla.

terceiro colóquio: o anti da tese


Em um curso sobre dependência química foi proferido: “o exemplo não é a melhor
maneira de ensinar: é a única”.

colóquio ao terceiro
Não há exemplo na assertiva que busca ensinar que não se ensina sem exemplo.
Não há como idolatrar e saber. Quem é um exemplo a seguir? O que entorpece nos
seguidores que não aprendem sem que para eles se faça?
A droga pode não ser o único objeto de idolatria, mas a ciência não é idolatria. Não
há algo a seguir nas drogas e não há ídolo a fornecer exemplos. A ciência é o instrumento
da razão humana, excelente por sua iconoclastia.

quarto colóquio: ao que se forma?


Em um hospital psiquiátrico a médica de plantão disse ao estagiário: “Quer que eu te
mostre como atender um dependente químico?”. Ligou para uma das enfermarias dizendo:
“Manda vir três parrudões daí!”.

colóquio ao quarto
O que ensina retrata, trata de novo, o que está na cena comum. Oferece um olhar
que expõe o momento a ser pensado como algo particular, não corriqueiro, incomum em
sua descrição pela natureza do olhar crítico que deve sobrevir. Atribuir, à cena sob análise,
as considerações ordinárias é tornar nula a oportunidade de fazer agir o educar.

quinto colóquio: da docência


Frequentemente, os professores percorrem as salas de aula, olham os cadernos dos
estudantes, fazem anotações com as suas canetas, dão ordens, reterritorializam, atribuem
significâncias e interpretações.
O
O déspota
déspota ou
ou oo deus
deus mostra
mostra ameaçadoramente
ameaçadoramente seu seu rosto
rosto solar
solar que
que éé todo
todo seu
seu
corpo,
corpo, como
como corpo
corpo do
do significante.
significante. Ele
Ele me
me olhou
olhou com
com um
um arar esquisito,
esquisito, franziu
franziu aa
sobrancelha,
sobrancelha, oo que
que eu
eu fiz
fiz para
para que
que mudasse
mudasse de de rosto?
rosto? Tenho
Tenho sua
sua foto
foto diante
diante de
de
mim,
mim, parece
parece que
que ela
ela meme olha...
olha... Vigilância
Vigilância do do rosto,
rosto, diria
diria Strindberg,
Strindberg,
sobrecodificação
sobrecodificação dodo significante,
significante, irradiação
irradiação em em todos
todos os
os sentidos,
sentidos, onipresença
onipresença
ilocalizada.
ilocalizada. (DELEUZE;
(DELEUZE; GUATTARI,
GUATTARI, 1995, 1995, p.
p. 66).
66).

colóquio ao quinto
Há uma série de certezas, de clichês e convicções acerca da docência que se
personificam na Figura do professor. O modo como os professores interagem com as
produções dos estudantes está impregnado desses chavões. Em se tratando da Figura docente
uma das operações mais urgentes é, justamente, romper com as representações, borrar traços
figurativos, ilustrativos, para que a Figura se erga, liberta de toda figuração, e produza outros
sentidos para a docência - desarticulação, ou “n” articulações, experimentações em atenção à
lógica das sensações. A figuração tende a engessar as relações docentes e discentes, os dados
figurativos são anteriores ao encontro, preexistem, fundam modelos.
colóquios
colóquios sobre
sobre educação:
educação: da
da vida,
vida, oo que
que se
se sabe;
sabe; do
do estudo,
estudo, oo que
que se
se pode;
pode; || 459
459
da
da filosofia,
filosofia, problematizações
problematizações contemporâneas
contemporâneas

Somos
Somos bombardeados
bombardeados por por fotos
fotos que
que são
são ilustrações,
ilustrações, jornais
jornais que
que são
são narração,
narração,
imagens-cinema,
imagens-cinema, imagens-televisão.
imagens-televisão. HáHá clichês
clichês psíquicos
psíquicos assim
assim como
como clichês
clichês
físicos,
físicos, percepções
percepções já
já prontas,
prontas, lembranças,
lembranças, fantasmas.
fantasmas. (DELEUZE,
(DELEUZE, 2007,
2007, p.
p. 91-92).
91-92).

sexto colóquio: do saber


“O professor sabe e fala, o estudante não sabe, então ouve e recebe”.

colóquio ao sexto
O professor deve também saber calar-se, nem tudo querer saber. Muitas vezes o que
impede o estudo é a impossibilidade da privatividade, do recolhimento, é a exigência de
certo comportamento escolar. Estudar tem muito mais de pausas e alusões do que de
diálogos, exposições, interações. “É para trás que conduz o estudo, que converte a
existência em escrita” (BENJAMIN, 1994, p. 163). O estudo solicita retiros, afastamentos e
interrupções que ativam a criação e desafiam o pensamento, as ideias, a percepção. “A
distinção entre as esferas pública e privada, encarada do ponto de vista da privatividade e
não do corpo político, equivale à diferença entre o que deve ser exibido e o que deve ser
ocultado” (ARENDT, 2001, p. 82). O estudo requer a proteção da intimidade e a segurança
que preserva. Não pode ser regra que o material que decorre do estudo deve ser exposto à
luz do mundo: o estudante é autor, tem autonomia. O compromisso do estudante deve ser
com o estudo, com o objeto de seu estudo.
Estudar é um ato contínuo. Repetidamente, quem estuda cala, lê devagar,
lentamente. O corpo não pode dormir. O sono só vem quando quer. E mesmo quando
dorme, acontece frequentemente de o estudante levantar no meio da madrugada para fazer
anotações. No criado-mudo estão lápis, canetas, borracha, papéis e uma prancheta. O
estudante não põe fim ao estudo, o estudante prorroga o estudo, se detém, lê e escreve
pausadamente, e o estudo dura a noite inteira.
O estudo é pausa que se oferece ao mundo tão habitado, atordoado, sem tempo, e sem
jeito para o recolhimento, a solidão. São muitas as operações que tratam de esburacar um
pouco que seja os arredores estudantis, produzindo interrupções, intervalos, outros mundos
possíveis. O cigarro que se traga entre uma aula e outra, entre um parágrafo e outro, é
também defender o recolhimento de que se necessita. Aceitar o mate e passá-lo adiante não é
o mesmo que tecer, junto com outros, alguns vácuos na conversa que se trava? Um copo com
água, café, tanto faz, não é simplesmente um copo: é um gesto de pausa, um gesto que fabrica
pausa. Estudar é ir e vir, é percorrer um imenso e ilimitado vaivém de mãos, textos, copos,
leituras e pausas.
Os livros vão-se amontoando, abertos, atravessados, empilhados, manuseados. O
estudo persiste, demora-se, estende-se de outono-a-outono. Alguns livros já nem fecham
mais. Quem nunca viu o volume que fazem os vincos? São tantas as marcas, de todos os
tipos, algumas voluntárias, intencionais, convencidas de sublinharem algo importante,
imperdível talvez, outras feitas nesses golpes de afã ou de entusiasmo. Mas também existem
as marcas do acaso, do café que não se contém, do vinho, do chá, da mão que vagueia, e não
sabe se se embriaga com o livro, se se concentra na bebida. E como esquecer as marcas que
sugerem nada mais que o gesto de uma pausa? Mais precisamente ainda, o gesto de uma
pausa qualquer... Uma pausa que se configura na eminência de um cotovelo-apoio, de um
queixo-apoiado. Uma pausa que se cumpre na imanência de uma eventual abertura, de uma
saída, de uma fresta qualquer que, enfim, encontra ocasião.

sétimo colóquio: do poder


“Estudante, mostre o seu caderno, as suas anotações. Eu, professor, preciso ver e corrigir,
acertar, validar e uniformizar.”
460|
460| daison
daison nelson
nelson ferreira
ferreira dias;
dias; josé
josé menna
menna oliveira;
oliveira; rosana
rosana aparecida
aparecida fernandes
fernandes

colóquio ao sétimo
O caderno é privado.
Para
Para mim,
mim, duas
duas coisas
coisas são
são importantes:
importantes: aa relação
relação que
que podemos
podemos ter ter com
com os
os
estudantes
estudantes éé ensinar
ensinar que
que eles
eles fiquem
fiquem felizes
felizes com
com sua
sua solidão.
solidão. Eles
Eles vivem
vivem dizendo:
dizendo:
“Um
“Um pouco
pouco dede comunicação.
comunicação. Nós Nós nos
nos sentimos
sentimos sós,
sós, somos
somos todos
todos solitários”.
solitários”. Por
Por
isso
isso eles
eles querem
querem escolas.
escolas. Eles
Eles não
não poderão
poderão fazer
fazer nada
nada em
em relação
relação àà solidão.
solidão. Temos
Temos
de
de ensinar-lhes
ensinar-lhes os os benefícios
benefícios dada sua
sua solidão,
solidão, reconciliá-los
reconciliá-los com
com sua
sua solidão.
solidão. Esse
Esse
era
era oo meu
meu papel
papel dede professor.
professor. O O segundo
segundo aspecto
aspecto éé um
um pouco
pouco aa mesma
mesma coisa.
coisa. Não
Não
quero
quero lançar
lançar noções
noções queque façam
façam escola.
escola. Quero
Quero lançar
lançar noções
noções ee conceitos
conceitos queque se
se
tornem
tornem correntes,
correntes, que
que se
se tornem
tornem nãonão exatamente
exatamente ordinárias,
ordinárias, mas
mas que
que sese tornem
tornem
ideias
ideias correntes,
correntes, que
que possam
possam serser manejadas
manejadas de de vários
vários modos.
modos. Isso
Isso só
só éé possível
possível se
se
eu
eu me
me dirigir
dirigir aa solitários
solitários que
que vão
vão transformar
transformar as as noções
noções ao
ao seu
seu modo,
modo, usá-las
usá-las de
de
acordo
acordo com com suas
suas necessidades.
necessidades. Tudo
Tudo isso
isso são
são noções
noções dede movimento,
movimento, não não de
de
escola. (L’abécédaire
escola. (L’abécédaire de
de Gilles
Gilles Deleuze,
Deleuze, letra
letra “P”
“P” de
de Professor).
Professor).

Hannah Arendt pondera que a educação se encontra “entre esferas”: a esfera privada,
que “constitui um escudo contra o mundo e, sobretudo, contra o aspecto público do mundo”
(ARENDT, 2014, p. 236); e a esfera pública, do comum, daquilo que é “visto e ouvido por
todos e tem a maior divulgação possível” (ARENDT, 2001, p. 59).
Uma sala de aula é um espaço compartilhado por muitos indivíduos, no entanto,
muitos acontecimentos que nela se dão são privados. Há funcionamentos e particularidades
do estudar que só podem ser experimentados e alcançados na privatividade ou na intimidade.
O que um estudante escreve no caderno é pessoal, não um trabalho público. Um
caderno é feito de anotações, intuições, inícios. O estudante muitas vezes titubeia, duvida,
hesita, mas escreve, anota. O estudante encobre com o braço as palavras recém-escritas,
disfarça, desconversa, não quer o olhar do outro que significa, interpreta, julga. O caderno é
um lugar de possibilidades, e o estudante confia e escreve, porque o caderno é privado.
Volta e meia o estudante conversa com o amigo através do caderno, ele passa adiante,
envia um recado, uma pergunta, quer saber algo que tem a ver com tudo o que se passa ali, na
sala de aula, mas que, não obstante, é privado. O estudante pergunta ao amigo o que não
perguntaria a mais ninguém. O caderno é conduto de uma e outra conversa. O caderno é
guardião de algumas ideias preliminares, inacabadas, recentemente apontadas. O caderno é
arquivo do que se deseja lembrar, pensar melhor depois, dedicar tempo, esmiuçar.
Portanto, a escola apresenta uma espécie de paradoxo: fala do estudar, atrai os
estudantes, pede que estudem, que escrevam em seus cadernos, e não atende o caráter
privativo do estudo, não nota que o estudante que estuda, efetivamente se retira, precisa se
recolher, por vezes passa a habitar uma esfera privada, e seus trabalhos e produções não são,
primeiramente, públicos. Caso uma produção discente seja desprivatizada será sempre porque
o estudante desejou a aparição pública, considerou que a sua produção deve ser publicada. A
exposição não é uma obrigatoriedade.

oitavo colóquio: da verdade


“A verdade está no que eu, professor, digo e tenho para ensinar. Prestem atenção no
que eu digo, não se dispersem, centralizem suas percepções em mim, façam como eu faço, me
copiem”.

colóquio ao oitavo
Pensar e viver são acontecimentos profundamente implicados um no outro. Não se
aprende a pensar fazendo como outros fazem, reproduzindo, imitando, mas sim se atrevendo a
pensar com outros, conjugando as próprias forças com as forças de outros, iniciando trajetos
que não podem ser antevistos.
colóquios
colóquios sobre
sobre educação:
educação: da
da vida,
vida, oo que
que se
se sabe;
sabe; do
do estudo,
estudo, oo que
que se
se pode;
pode; || 461
461
da
da filosofia,
filosofia, problematizações
problematizações contemporâneas
contemporâneas

A
A reprodução
reprodução do do Mesmo
Mesmo não não éé um
um motor
motor dosdos gestos.
gestos. [...]
[...] A
A aprendizagem
aprendizagem nãonão se
se
faz
faz na
na relação
relação da
da representação
representação comcom aa ação
ação (como
(como reprodução
reprodução dodo Mesmo),
Mesmo), mas mas na
na
relação
relação dodo signo
signo com
com aa resposta
resposta (como
(como encontro
encontro com
com oo Outro).
Outro). [...]
[...] Nada
Nada
aprendemos
aprendemos com com aquele
aquele que
que nos
nos diz:
diz: faça
faça como
como eu.
eu. Nossos
Nossos únicos
únicos mestres
mestres sãosão
aqueles
aqueles que
que nos
nos dizem
dizem “faça
“faça comigo”
comigo” ee que,
que, em
em vez
vez de
de nos
nos propor
propor gestos
gestos aa serem
serem
reproduzidos,
reproduzidos, sabem
sabem emitir
emitir signos
signos aa serem
serem desenvolvidos
desenvolvidos no no heterogêneo.
heterogêneo.
(DELEUZE,
(DELEUZE, 1988, 1988, p.
p. 54).
54).
Nas escolas, incidem alguns equívocos acerca do estudar e do pensar. E para
compreender esses mal-entendidos é essencial perceber que existem diferenças de natureza
entre: o pensar que desencadeia mudanças vitais, produz sentido na vida, no cotidiano, e afeta
os envolvidos, impelindo cada um à distensão de si, ao aumento de potência, à enésima
potência das faculdades; e o pensar que é um reconhecimento de pensamentos já elaborados,
um exercício de recognição, de representação e correspondência, de memorização e
reprodução do mesmo.
Constantemente, substitui-se um pensador por um carregador de informações e
conhecimentos, um juiz ou um sábio. Sem ligeireza, o pensamento é capturado e submetido
ao aprendizado e ao exercício das formas mais domesticadas do pensar, que estão ligadas à
Imagem Dogmática do Pensamento44.
Essa posição é tão corriqueira que se pode ver, por exemplo, em bancas de revista
manchetes como: “Boa idéia: Um software que ensina a turma a pensar!”. Pode-se ainda
constatar que alguns programas de governo assumem uma política de apostilamento, e, com
isso, reduzem o pensar e o aprender às concepções cognitivistas da aprendizagem, dando
ênfase aos testes psicomotores e retomando uma classificação difundida pela “Taxonomia de
Bloom”, que resume o pensar e o aprender ao desenvolvimento de habilidades cognitivas,
afetivas e psicomotoras.
Mais
Mais ainda,
ainda, oo preconceito
preconceito éé infantil
infantil ee escolar,
escolar, pois
pois oo professor
professor éé quem
quem “dá”
“dá” os
os
problemas,
problemas, cabendo
cabendo aoao aluno
aluno aa tarefa
tarefa de
de descobrir-lhes
descobrir-lhes aa solução.
solução. Desse
Desse modo,
modo,
somos
somos mantidos
mantidos numa
numa espécie
espécie dede escravidão.
escravidão. AA verdadeira
verdadeira liberdade
liberdade está
está em
em um
um
poder
poder de
de decisão,
decisão, de
de constituição
constituição dosdos próprios
próprios problemas:
problemas: esse
esse poder,
poder, “semidivino”,
“semidivino”,
implica
implica tanto
tanto oo esvaecimento
esvaecimento de de falsos
falsos problemas
problemas quanto
quanto oo surgimento
surgimento criador
criador de
de
verdadeiros.
verdadeiros. (DELEUZE,
(DELEUZE, 1999,1999, p.
p. 9).
9).
Com tudo isso, a distinção entre o “pensar” e a “Imagem Dogmática do Pensamento”
é fundamental para a constituição de problematizações e investigações acerca do ensinar e do
aprender. Por um lado, tem-se a Imagem Dogmática do Pensamento que inibe o pensar e a
criação, ao colocar a obtenção do saber à frente do pensar, do problematizar, do criar; e ao
demandar, prioritariamente, uma correlação do intelecto com a sua exterioridade, não um
encontro com o fora do pensamento, com o mundo, com o outro. De modo que o
reconhecimento, a representação, a reprodução de saberes, ou qualquer outra Imagem
Dogmática do Pensamento, não condizem com o pensar, pois esses processos supõem a
existência de uma faculdade do pensamento que é correlata ao que lhe é exterior, e se
configura numa contiguidade de si no espaço, numa adequação do intelecto ao mundo da
extensão. Pensar não propõe, simplesmente, uma habilidade a ser desenvolvida ou adquirida,
nem se diz de uma faculdade inata aos indivíduos, pois ambas estão longe da criação e da
imanência de uma vida. Pensar não se afina com as faculdades de interpretar, julgar,
reconhecer, separar ou significar. Por outro lado, para pensar e, de fato, aprender e construir
conhecimentos junto com outros, um corpo estabelece uma relação de confiança, intimidade e
atenção para com outros corpos. E a definição de corpo, aqui, é travada junto com Spinoza e

44 No
Nocapítulo
capítulo três
três de
de Diferença
Diferença ee Repetição,
Repetição, Gilles
Gilles Deleuze
Deleuze (1988)
(1988) desenvolve
desenvolve uma
uma crítica
crítica rigorosa
rigorosa àà Imagem
Imagem
Dogmática
Dogmática do do Pensamento,
Pensamento, que
que inibe
inibe oo pensar,
pensar, ao
ao invés
invés de
de promovê-lo,
promovê-lo, pois
pois oo remete
remete sempre
sempre aa algo
algo já

pensado
pensado ee jájá dado.
dado. Tal
Tal imagem
imagem desdobra-se
desdobra-se emem oito
oito postulados,
postulados, ee para
para cada
cada umum correspondem
correspondem duas
duas
respectivas
respectivas figuras.
figuras.
462|
462| daison
daison nelson
nelson ferreira
ferreira dias;
dias; josé
josé menna
menna oliveira;
oliveira; rosana
rosana aparecida
aparecida fernandes
fernandes

Deleuze, e, portanto, um corpo é qualquer coisa: um animal, um corpo de sons, uma mente,
uma ideia, um corpo linguístico, um corpo social, uma coletividade. No ato de pensar com
outrem, um corpo emite signos, e outro, sensível a eles, os recebe e os desenrola.
Michel Foucault, em uma entrevista intitulada “Da amizade como modo de vida”,
publicada no jornal “Gai Pied”, em abril de 1981, coloca a questão:
Como
Como éé possível
possível para
para os
os homens
homens estarem
estarem juntos?
juntos? Viver
Viver juntos,
juntos, compartilhar
compartilhar seus
seus
tempos,
tempos, sua
sua comida,
comida, seus
seus lares,
lares, suas
suas liberdades,
liberdades, suas
suas aflições,
aflições, seu
seu saber,
saber, suas
suas
confidências?
confidências? O O que
que éé isso
isso de
de estar
estar entre
entre homens
homens “em“em desnudo”,
desnudo”, fora
fora das
das relações
relações
institucionais,
institucionais, de
de família,
família, dede coleguismo
coleguismo obrigatório?
obrigatório? ÉÉ umum desejo,
desejo, uma
uma
inquietação,
inquietação, um
um desejo-inquietação
desejo-inquietação queque existe
existe em
em muitas
muitas pessoas.
pessoas.
Há amizades e encontros que aumentam a potência de agir, viver, pensar, sentir. E
pensar com o outro - o amigo - é um pensar que suscita, de fato, aprendizados que persistem e
se desenrolam por toda a vida. Em uma relação de amizade, os corpos envolvidos aprendem
que pensar junto é ouvir, perguntar, ajudar o outro a pensar, mas não necessariamente
concordar, chegar às mesmas conclusões, ou respostas. A amizade mostra-se comprometida,
sobretudo, com o ato de pensar e com o aumento de potência, para que os amigos alcancem
novos limiares de intensidade, e experimentem potências imprevisíveis da percepção, da
sensação, da memória e do pensamento. Os corpos amigos se afetam, desconfiam e
enfrentam um o pensamento do outro, encarnando uma amizade que se faz condição para
iniciar pensamentos, exercer o pensar e a criação. “Trata-se de um início que difere do início
do mundo; não é o início de uma coisa, mas de alguém que é, ele próprio, um iniciador”
(ARENDT, 2001, p. 190).
Na “Dignidade da Política” (1993), Hannah Arendt volta à Grécia Antiga, justamente,
para tratar do diálogo entre amigos. Para Arendt a mais preciosa virtude política é a amizade,
o gesto de aproximar-se dos outros, ouvir com verdadeira atenção o que o outro diz, e de
pensar junto com o outro, acolhendo-o e respeitando-o na sua diferença, na sua idiossincrasia.
Amizades são exercidas em espaços-tempos discursivos, que promovem a coexistência de
diferentes perspectivas, escolhas, ideias.
OO elemento
elemento político,
político, na
na amizade,
amizade, reside
reside no
no fato
fato de
de que,
que, no
no verdadeiro
verdadeiro diálogo,
diálogo,
cada
cada umum dos
dos amigos
amigos pode
pode compreender
compreender aa verdade
verdade inerente
inerente àà opinião
opinião do
do outro.
outro.
Mais
Mais dodo que
que oo seu
seu amigo
amigo como
como pessoa,
pessoa, umum amigo
amigo compreende
compreende comocomo ee em
em que
que
articulação
articulação específica
específica oo mundo
mundo comum
comum aparece
aparece para
para oo outro
outro que,
que, como
como pessoa,
pessoa,
será
será sempre
sempre desigual
desigual ou
ou diferente.
diferente. Esse
Esse tipo
tipo de
de compreensão
compreensão — — em
em que
que se
se vê
vê oo
mundo
mundo (como
(como se se diz
diz hoje
hoje um
um tanto
tanto trivialmente)
trivialmente) dodo ponto
ponto de
de vista
vista do
do outro
outro —— éé
oo tipo
tipo de
de insight
insight político
político por
por excelência.
excelência. (ARENDT,
(ARENDT, 1993,1993, p.
p. 99).
99).

nono colóquio: das multitarefas


A
A sociedade
sociedade disciplinar
disciplinar de
de Foucault,
Foucault, feita
feita de
de hospitais,
hospitais, asilos,
asilos, presídios,
presídios, quartéis
quartéis ee
fábricas,
fábricas, não
não éé mais
mais aa sociedade
sociedade dede hoje.
hoje. Em
Em seu
seu lugar,
lugar, há
há muito
muito tempo,
tempo, entrou
entrou
uma
uma outra
outra sociedade
sociedade de de academias
academias de de fitness,
fitness, prédios
prédios dede escritórios,
escritórios, bancos,
bancos,
aeroportos,
aeroportos, shopping
shopping centers
centers ee laboratórios
laboratórios dede genética.
genética. AA sociedade
sociedade dodo século
século
XXI
XXI nãonão éé mais
mais aa sociedade
sociedade disciplinar,
disciplinar, masmas uma
uma sociedade
sociedade de de desempenho.
desempenho.
Também
Também seusseus habitantes
habitantes não
não se
se chamam
chamam mais mais “sujeitos
“sujeitos dada obediência”,
obediência”, mas
mas
sujeitos
sujeitos de
de desempenho
desempenho ee produção.
produção. SãoSão empresários
empresários de de sisi mesmos.
mesmos. Nesse
Nesse
sentido,
sentido, aqueles
aqueles muros
muros dasdas instituições
instituições disciplinares,
disciplinares, que
que delimitam
delimitam os os espaços
espaços
entre
entre oo normal
normal ee oo anormal,
anormal, se se tornaram
tornaram arcaicos.
arcaicos. A A analítica
analítica dodo poder
poder de
de
Foucault
Foucault não
não pode
pode descrever
descrever as as modificações
modificações psíquicas
psíquicas ee topológicas
topológicas que
que se
se
realizaram
realizaram comcom aa mudança
mudança da da sociedade
sociedade disciplinar
disciplinar para
para aa sociedade
sociedade dodo
desempenho.
desempenho. Também
Também aquele
aquele conceito
conceito dada “sociedade
“sociedade dede controle”
controle” não
não dá
dá mais
mais
conta
conta de
de explicar
explicar aquela
aquela mudança.
mudança. Ele
Ele contém
contém sempre
sempre ainda
ainda muita
muita negatividade.
negatividade.
(HAN,
(HAN, 2015,
2015, p.
p. 23-24).
23-24).
Nos primeiros anos deste milênio um de nós foi chamado, como médico recém
formado, para atender a domicílio um paciente portador de demência de tipo Alzheimer
colóquios
colóquios sobre
sobre educação:
educação: da
da vida,
vida, oo que
que se
se sabe;
sabe; do
do estudo,
estudo, oo que
que se
se pode;
pode; || 463
463
da
da filosofia,
filosofia, problematizações
problematizações contemporâneas
contemporâneas

em fase terminal. Jorge55 contava à época 79 anos, residia em uma casa com estrutura
privilegiada em comparação à maioria das residências daquela cidade de médio porte ao sul
do Brasil, parecia ter construído um relacionamento saudável com seus familiares
descendentes e colaterais ao longo da vida, exercera com júbilo uma carreira profissional
como professor universitário de biologia e, à ocasião daquela primeira consulta, no ocaso
de sua vida, parecia dispor de mais recursos do que a média da população daquela cidade,
recursos que comporiam a assistência de sua morte.
Jorge residia em uma casa silenciosa. Propriedade de uma de suas filhas, embora
situada próxima a uma das principais vias rodoviárias daquela cidade, guardava em suas
dependências amplo e sombroso jardim. Logo à entrada percebiam-se árvores, flores,
perfume e umidade, e o quarto em que passava os dias, no andar térreo - a casa contava
dois andares - era iluminado, contava com banheiro e uma ampla porta de vidro que lhe
permitia ver o céu, as árvores e as folhagens. Tinha a assistência constante de cuidadoras,
todas mulheres, que lhe ofereciam alimentos, administravam as várias medicações
prescritas, executavam a higiene de seu corpo e auxiliavam no translado, a cada dia mais
raro, do leito a uma cadeira de rodas. Era um homem robusto, de grande estatura, e seu
discurso, àquela ocasião, consistia quase exclusivamente de duas palavras: “vegetal” e
“animal”.
Quando a filha, com quem morava, comparecia ao seu quarto e a cuidadora lhe
perguntava - “Lembra dela, seu Jorge? Quem é ela?” - respondia com veemência - “Sim!
Animal!” Quando o examinador fazia um desenho, em uma folha de papel, de uma flor ou
de uma folha de planta, e lhe apresentava, observava com extremo interesse e respondia -
“Vegetal!” Quando na TV apareciam pessoas em um programa de auditório e alguém lhe
perguntava - “O que está acontecendo ali?” - respondia com menos ênfase - “Animal...”
Quando deparado a uma fotografia de um crocodilo, de um cachorro, de um inseto,
presente nas revistas de que dispunha em seu quarto articulava aparentemente entediado,
“Animal...”.

colóquio ao nono
Por que a linguagem expressa de Jorge consistia essencialmente de dois conceitos?
Como o comprometimento na fisiologia neural que ocorre na demência de Alzheimer
resultara em que duas palavras, talvez centrais à biologia, ciência a que o paciente em
questão dedicara sua vida, sobrevivessem ao naufrágio a que aparentemente fora
submetido o restante de seu vocabulário? Como seria a fenomenologia do quadro
demencial vivenciado por Jorge se ele tivesse vivido sua infância e conduzido sua
formação profissional em uma época em que existisse acesso à internet e a mídias
portáteis? Como deverá operar o cérebro humano em degeneração, em relação ao
processamento de conceitos, em um mundo tão diverso daquele do passado de Jorge, em
um mundo como se nos é apresentado hoje, no momento em que este texto é escrito?

55 Os
Os nomes
nomes próprios
próprios reclamam
reclamam evidência
evidência nana tradição
tradição médica:
médica: chamamos
chamamos epônimo
epônimo ao ao “termo
“termo formado
formado ou ou
derivado
derivado do
do nome
nome dede uma
uma pessoa
pessoa que
que se
se admite
admite ser
ser oo primeiro
primeiro aa descobrir
descobrir ouou descrever
descrever uma
uma moléstia,
moléstia, uma
uma
síndrome
síndrome ouou uma
uma teoria.
teoria. Os
Os epônimos
epônimos frequentemente
frequentemente homenageiam
homenageiam pessoas
pessoas queque propuseram
propuseram sistemas
sistemas ee
processos,
processos, métodos
métodos ou ou intervenções
intervenções cirúrgicas,
cirúrgicas, mesmo
mesmo que que estes
estes não
não sejam
sejam originais
originais do
do indivíduo
indivíduo em
em apreço”
apreço”
(BLAKINSTON,
(BLAKINSTON, 1987, 1987, p.
p. 371).
371). As
As descrições
descrições de
de casos
casos clínicos
clínicos que
que identificam
identificam umum paciente
paciente com
com asas iniciais
iniciais
de
de seu
seu nome
nome (p.
(p. ex.:
ex.: “F.T.,
“F.T., 25
25 anos”)
anos”) sofrem
sofrem umum preconceito
preconceito velado
velado ee chegou-se
chegou-se aa afirmar,
afirmar, tensionando
tensionando aa
prescrição
prescrição de
de sigilo,
sigilo, que
que “nomes
“nomes reais
reais emprestam
emprestam credibilidade
credibilidade aa histórias
histórias reais”
reais” (SOLOMON,
(SOLOMON, 2002, 2002, p.
p. 11).
11).
464|
464| daison
daison nelson
nelson ferreira
ferreira dias;
dias; josé
josé menna
menna oliveira;
oliveira; rosana
rosana aparecida
aparecida fernandes
fernandes

décimo colóquio: do cansaço


O cansaço é sempre neuronal. O sentimento é neuronal. A agressão, neural -
e a maneira mais efetiva de agredir o neurônio é promover a excitação contínua,
monodirecional e hiperintensa.

colóquio ao décimo

Muitas
Muitas sãosão as
as analogias
analogias feitas
feitas com
com oo cérebro
cérebro humano
humano para para tentar
tentar explicar
explicar aa
importância
importância ou ou oo funcionamento
funcionamento desse desse órgão
órgão maravilhoso.
maravilhoso. ÉÉ claro,claro, estudar
estudar oo
cérebro
cérebro éé umauma etapa
etapa difícil
difícil porque
porque éé no no cérebro
cérebro queque construímos
construímos nossonosso
entendimento
entendimento do do mundo,
mundo, nossa nossa percepção
percepção sobre sobre oo que que acontece,
acontece, nosso
nosso
entendimento
entendimento sobresobre nós
nós mesmos.
mesmos. Imagine
Imagine se se éé possível
possível queque umum órgão
órgão chegue
chegue ao ao
entendimento
entendimento máximomáximo sobresobre eleele mesmo.
mesmo. Será Será queque não
não existem
existem segredos
segredos queque
pudessem
pudessem desvendar
desvendar oo mecanismo
mecanismo de de funcionamento
funcionamento das das nossas
nossas funções
funções
cerebrais
cerebrais dede modo
modo que que aa existência
existência dessas
dessas funções
funções ficasse
ficasse comprometida?
comprometida? EE se se
existem,
existem, será
será que
que oo cérebro,
cérebro, mesmo
mesmo tendotendo como
como objeto
objeto dede estudo
estudo umum outro
outro
cérebro,
cérebro, permitiria
permitiria aa revelação
revelação desses
desses segredos?
segredos? Observem,
Observem, queridos
queridos alunos.
alunos. Não
Não
estou
estou meme referindo
referindo aa nenhuma
nenhuma das das discussões
discussões sobresobre oo inconsciente
inconsciente dentre
dentre as as
amplamente
amplamente desenvolvidas
desenvolvidas por por Dostoiévski,
Dostoiévski, Freud,
Freud, Jung,
Jung, por
por exemplo.
exemplo. Estou
Estou meme
referindo
referindo aa coisas
coisas queque nosnos mostrariam
mostrariam com com objetividade
objetividade como como programar
programar oo
cérebro
cérebro para
para desencadear
desencadear uma uma ou ou outra
outra resposta
resposta aa partir
partir de
de umum estímulo
estímulo inicial.
inicial.
Nesse
Nesse sentido,
sentido, ee aa fimfim dede deixar
deixar mais
mais claro
claro esse
esse ponto
ponto de de vista,
vista, podemos
podemos
comparar
comparar oo cérebro
cérebro aa um um diamante.
diamante. Uma Uma das das propriedades
propriedades do do diamante
diamante éé aa
capacidade
capacidade de de dividir
dividir oo espectro
espectro dada luz
luz visível
visível nos
nos seus
seus diversos
diversos comprimentos
comprimentos de de
onda.
onda. Essa
Essa divisão
divisão do do espectro
espectro da da luz
luz visível
visível nos
nos permite
permite supor
supor que,
que, de
de acordo
acordo
com
com aa inclinação
inclinação do do cristal
cristal teremos
teremos aa emergência
emergência de de diferentes
diferentes cores
cores dede feixes
feixes
luminosos
luminosos ee que,
que, desse
desse modo,
modo, de de acordo
acordo comcom aa cor
cor do
do corpo
corpo aa ser
ser examinado,
examinado, ele ele
pode
pode ouou não
não ser
ser iluminado
iluminado e, e, consequentemente,
consequentemente, visto. visto. Desculpem-me
Desculpem-me aqueles aqueles
mais
mais habituados
habituados com com esse
esse conceito
conceito mas mas tenho
tenho de de ser
ser didático.
didático. Imaginemos,
Imaginemos, ainda,
ainda,
que
que oo corpo
corpo aa ser
ser iluminado
iluminado fosse
fosse vermelho.
vermelho. Qualquer
Qualquer das das cores
cores emem que
que se
se divide
divide
oo espectro
espectro dede luz
luz branca
branca ao ao passar
passar pelo
pelo cristal
cristal que
que não
não seja
seja oo vermelho
vermelho nãonão
iluminará
iluminará oo corpocorpo ee ele ele não
não será
será percebido.
percebido. Para Para mudar
mudar essa essa realidade,
realidade,
precisaríamos
precisaríamos rotar
rotar oo cristal.
cristal. Essa
Essa éé aa analogia!
analogia! O O cérebro
cérebro (cristal)
(cristal) pode
pode expressar
expressar
entendimentos
entendimentos diversos
diversos dede acordo
acordo com com osos diferentes
diferentes estímulos
estímulos ee dede acordo
acordo com
com oo
condicionamento
condicionamento (rotação)
(rotação) dede cada
cada indivíduo.
indivíduo. (DIAS,
(DIAS, 2015,
2015, p.
p. 43-44).
43-44).

O cansaço determina um paradigma: mudança ou falência. Se o sujeito não


modificar o modo de pensar, o modo pelo qual busca concluir a tarefa a que se propôs,
acabará desistindo. Desistirá por atingir um estado de esgotamento de suas vias até o
momento conhecidas. Desistirá pela completa falta de substrato neuroquímico à luz do que
se desenvolvera até então. Mas isso pode não ser o fim.
A balança do que nos motiva, e do que nos faz capaz de realizar, precisa ser
reequilibrada após cada desafio assumido e concretizado. Essa balança, no entanto, precisa
ser calibrada novamente quando as dificuldades determinam que se prossiga por vias
alternativas, ou até mesmo por via a ser construída, para a realização de uma nova tarefa.
Em momentos como esses, a estrutura neuronal que tornará o cansaço um estado
neuroquímico mais distante é aquela construída a partir do exercício que o sujeito fez ao
observar os fatos que se apresentaram como realidade concreta, pensados a partir da
educação que recebera e de seu próprio constructo filosófico. Este é feito a partir de uma
reflexão que inclui as conclusões advindas dos educadores, dos filósofos e de todos aqueles
com quem estabelecemos os processos de pensar e de aprender. Assim, a reflexão que se
faz após a introjeção do complexo que se forma pelo empirismo e pelo pensamento, enfim,
resulta um sujeito capaz de imaginar e de realizar novamente.
colóquios
colóquios sobre
sobre educação:
educação: da
da vida,
vida, oo que
que se
se sabe;
sabe; do
do estudo,
estudo, oo que
que se
se pode;
pode; || 465
465
da
da filosofia,
filosofia, problematizações
problematizações contemporâneas
contemporâneas

filmografia
L’ABÉCÉDAIRE de Gilles Deleuze. Entrevista com Gilles Deleuze. Editoração: Brasil,
Ministério de Educação, “TV Escola”, 2001. Paris: Éditions Montparnasse, 1997.

referências
ARENDT,
ARENDT, Hannah.
Hannah. A A Dignidade
Dignidade da da Política:
Política: ensaios
ensaios ee conferências.
conferências. Tradução
Tradução de de Helena
Helena Martins
Martins ee
outros.
outros. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Relume
Relume Dumará,
Dumará, 1993.
1993.
_______________.
_______________. A A condição
condição humana.
humana. Tradução
Tradução de de Roberto
Roberto Raposo.
Raposo. Rio Rio de de Janeiro:
Janeiro: Forense
Forense
Universitária,
Universitária, 2001.
2001.
______________.
______________. Entre
Entre oo passado
passado ee oo futuro.
futuro. Tradução
Tradução de de Mauro
Mauro W. W. Barbosa.
Barbosa. SãoSão Paulo:
Paulo: Perspectiva,
Perspectiva, 2014.
2014.
BENJAMIN,
BENJAMIN, Walter. Walter. Magia
Magia ee técnica,
técnica, arte
arte ee política:
política: ensaios
ensaios sobre
sobre literatura
literatura ee história
história da
da cultura.
cultura.
Tradução
Tradução de de Sérgio
Sérgio Paulo
Paulo Rouanet.
Rouanet. São
São Paulo:
Paulo: Brasiliense,
Brasiliense, 1994.
1994.
BLAKINSTON.
BLAKINSTON. Dicionário
Dicionário médico.
médico. 2a2a ed.
ed. São
São Paulo:
Paulo: Andrei
Andrei Editora,
Editora, 1987.
1987.
DELEUZE,
DELEUZE, Gilles.
Gilles. Francis
Francis Bacon:
Bacon: lógica
lógica da
da sensação.
sensação. Tradução
Tradução de de Roberto
Roberto Machado
Machado (Coord.).
(Coord.). Rio
Rio de
de
Janeiro:
Janeiro: Jorge
Jorge Zahar,
Zahar, 2007.
2007.
_____________.
_____________. Diferença
Diferença ee Repetição.
Repetição. Tradução
Tradução de de Luiz
Luiz B.B. L.
L. Orlandi;
Orlandi; Roberto
Roberto Machado.
Machado. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro:
Graal,
Graal, 1988.
1988.
_____________.
_____________. Bergsonismo.
Bergsonismo. Tradução
Tradução de de Luiz
Luiz B.B. L.
L. Orlandi.
Orlandi. São São Paulo:
Paulo: Ed.
Ed. 34,
34, 1999.
1999.
GUATTARI,
GUATTARI, Félix; Félix; DELEUZE,
DELEUZE, Gilles. Gilles. Mil
Mil Platôs
Platôs -- capitalismo
capitalismo ee esquizofrenia.
esquizofrenia. Vol.2.
Vol.2. Tradução
Tradução de de Ana
Ana
Lúcia
Lúcia de
de Oliveira;
Oliveira; Lúcia
Lúcia Cláudia
Cláudia Leão.
Leão. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Ed.
Ed. 34,
34, 1995.
1995.
DIAS,
DIAS, Daison.
Daison. Dois.
Dois. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Publit,
Publit, 2015.
2015.
FOUCAULT,
FOUCAULT, Michel. Michel. DeDe l'amitié
l'amitié comme
comme modemode de de vie.
vie. Gai
Gai Pied,
Pied, nº
nº 25,
25, abr.
abr. 1981,
1981, p.
p. 38-39.
38-39. Disponível
Disponível
em:
em: <htttp://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault>.
<htttp://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault>. Acessado Acessado em: em: 10/11/2006.
10/11/2006. Entrevista
Entrevista dede
Michel
Michel Foucault
Foucault aa R.R. de
de Ceccaty,
Ceccaty, J.J. Danet
Danet ee J. J. le
le Bitoux.
Bitoux. Tradução
Tradução de de Wanderson
Wanderson Flor Flor do
do
Nascimento.
Nascimento.
HAN,
HAN, BYUNG-CHUL.
BYUNG-CHUL. Sociedade Sociedade do do Cansaço.
Cansaço. Tradução
Tradução de de Enio
Enio Paulo
Paulo Giachini.
Giachini. Petrópolis,RJ:
Petrópolis,RJ:
Vozes,
Vozes, 2015.
2015.
SOLOMON,
SOLOMON, Andrew. Andrew. O O demônio
demônio ao ao meio-dia:
meio-dia: Uma
Uma anatomia
anatomia da da depressão.
depressão. Tradução
Tradução de de Myriam
Myriam
Campello.
Campello. RioRio de
de Janeiro:
Janeiro: Objetiva,
Objetiva, 2002.
2002.
466
466
467
467

desaprender, viajar, resistir


- por modos outros de formar professores -

rosimeri de oliveira dias11


heliana de barros conde rodrigues22

G ostaríamos de começar considerando o que Michel Foucault (2004, p.323)


nos diz ao final da aula de 17 de fevereiro de 1982, do Curso A Hermenêutica
do Sujeito: “Só se pode chegar a si percorrendo o grande ciclo do mundo”.
Trata-se, pois, de uma busca por meio das coisas do mundo, percorrendo o próprio mundo,
e não sob a forma de reminiscências da alma. Ao nos trazer Sêneca, Foucault mostra que
os escritos filosóficos antigos eram tecidos de perto, para provocar ensinamentos: frases,
livros ou cartas não eram destinados a transmitir uma informação, mas tendiam a uma
formação (HADOT, 2014).
Diríamos que, talvez, essa possa ser uma formação-viagem de uma vida tecida em
conversas, cartas, escritos, livros, práticas para afirmar um modo de vida livre. Na referida
aula, Foucault recupera o livro Questões Naturais, bem como algumas cartas a Lucílio, e nos
diz que Sêneca problematiza sua escrita tardia, feita durante a velhice. Foucault nos
mostra, inclusive, que o propósito de Sêneca é o de percorrer o grande ciclo do mundo e
buscar suas causas e segredos.
Com
Com efeito,
efeito, oo que
que nos
nos aproxima
aproxima destes
destes escritos
escritos éé aa possibilidade
possibilidade que que abrem
abrem para
para
problematizar
problematizar aa noção
noção de de formação:
formação: ela
ela emerge,
emerge, nessa
nessa linha,
linha, como
como um um modo
modo dede vida
vida outro
outro
(DIAS,
(DIAS, 2015)
2015) que,
que, ao
ao se
se singularizar
singularizar emem gestos,
gestos, práticas
práticas ee feituras,
feituras, levando
levando em em conta,
conta, além
além
do
do mais,
mais, asas tessituras
tessituras dede uma
uma viagem-formação
viagem-formação entre-dois
entre-dois –– universidade
universidade ee escola
escola básica
básica –,–,
abre
abre espaço
espaço ee tempo
tempo para
para desaprendizagens.
desaprendizagens. No No presente
presente texto,
texto, juntamente
juntamente comcom esse
esse entre-
entre-
dois,
dois, estarão
estarão presentes,
presentes, ritmando
ritmando oo exposto,
exposto, fragmentos
fragmentos de de cartas
cartas de
de Sêneca
Sêneca aa Lucílio.
Lucílio. “Eu
“Eu
não
não desejo
desejo outra
outra coisa
coisa senão
senão transmitir-te,
transmitir-te, toda
toda aa minha
minha experiência:
experiência: aprender
aprender dá-me
dá-me
sobretudo
sobretudo prazer
prazer porque
porque me me torna
torna apto
apto aa ensinar”
ensinar” (SÊNECA,
(SÊNECA, 2014, 2014, p.
p. 13).
13).
No
No final
final do
do capítulo
capítulo sobre
sobre exercícios
exercícios espirituais
espirituais dodo livro
livro Exercícios
Exercícios espirituais
espirituais ee
filosofia
filosofia antiga,
antiga, Pierre
Pierre Hadot
Hadot (2014)
(2014) recupera
recupera umauma jájá antiga
antiga questão
questão de de G.
G. Friedmann:
Friedmann:
“Como
“Como praticar
praticar exercícios
exercícios espirituais
espirituais nono século
século XX?”.
XX?”. Trazemos
Trazemos aa pergunta
pergunta para
para oo nosso
nosso
século
século ee indagamos:
indagamos: como como praticar
praticar exercícios
exercícios espirituais
espirituais nono século
século XXI?
XXI? A A resposta
resposta de de
Hadot
Hadot remete
remete aa uma
uma tradição
tradição filosófica
filosófica ocidental,
ocidental, rica
rica ee variada,
variada, ee nos
nos convida
convida aa um
um modo
modo
singular
singular dede aproximação:
aproximação:
Vauvenargues
Vauvenargues disse: disse: “Um
“Um livro
livro bem
bem novo
novo ee bem
bem original
original seria
seria aquele
aquele que
que fizesse
fizesse
amar
amar velhas
velhas verdades”.
verdades”. Nesse
Nesse sentido,
sentido, desejo
desejo ter
ter sido
sido “bem
“bem novo
novo ee bem
bem original”
original”
[...].
[...]. Velhas
Velhas verdades...pois
verdades...pois há há verdades
verdades das
das quais
quais as as gerações
gerações humanas
humanas não não
chegam
chegam aa esgotar
esgotar oo sentido;
sentido; nãonão queque elas
elas sejam
sejam difíceis
difíceis dede compreender,
compreender, elas
elas são,
são,
ao
ao contrário,
contrário, extremamente
extremamente simples,simples, frequentemente
frequentemente até até chegam
chegam aa parecer
parecer
banais;
banais; mas,mas, precisamente,
precisamente, para para compreender
compreender seu seu sentido,
sentido, éé preciso
preciso vivê-las,
vivê-las, éé
preciso,
preciso, sem sem cessar,
cessar, refazer
refazer aa experiência
experiência delas:
delas: cada
cada época
época deve
deve retomar
retomar esta
esta
tarefa,
tarefa, aprender
aprender aa lerler ee aa reler
reler essas
essas “velhas
“velhas verdades”.
verdades”. Passamos
Passamos nossa
nossa vida
vida aa
“ler”,
“ler”, isto
isto é,
é, aa fazer
fazer exegese
exegese ee até
até exegese
exegese dede exegese
exegese [...],
[...], mas
mas não
não sabemos
sabemos mais
mais
ler,
ler, isto
isto é,
é, parar,
parar, libertarmo-nos
libertarmo-nos de de nossas
nossas preocupações,
preocupações, voltar
voltar aa nós
nós mesmos,
mesmos, deixar
deixar de
de
lado
lado nossas
nossas buscas
buscas por
por sutilezas
sutilezas ee originalidade,
originalidade, meditar
meditar calmamente,
calmamente, ruminar,
ruminar, deixar
deixar que
que
os
os textos
textos falem
falem aa nós.
nós. ÉÉ um
um exercício
exercício espiritual,
espiritual, um
um dosdos mais
mais difíceis.
difíceis. (HADOT,
(HADOT,
2014,
2014, p.p. 65-66)
65-66) (grifos
(grifos nossos)
nossos)
Para Hadot (2014, p.58), com os exercícios espirituais, a vida filosófica faz-se um
“desenraizamento da vida cotidiana” mediante práticas que favorecem “uma conversão,

11 Faculdade
Faculdade de
de Formação
Formação de
de Professores
Professores da
da UERJ.
UERJ. Email:
Email: rosimeri.dias@uol.com.br
rosimeri.dias@uol.com.br
22 Instituto
Instituto de
de Psicologia
Psicologia da
da UERJ.
UERJ. Email:
Email: helianaconde@uol.com.br
helianaconde@uol.com.br
468|
468| rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias;
dias; heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues

uma mudança total de visão, de estilo de vida”. Vale frisar, contudo, que a filosofia antiga
e seus exercícios espirituais acontecem não como uma construção teórica, mas como uma
formação, uma maneira de viver e de ver o mundo, atrelada ao esforço de transformação
da existência.
Em outro capítulo do livro sobre os exercícios espirituais, Hadot (2014) nos conta
brevemente seu encontro com Foucault no fim de 1980. A despeito de ter mantido com ele
raras conversações, Hadot exalta o aspecto essencial da vida filosófica segundo Foucault
(2014, p.278): “a filosofia é uma arte de viver, um estilo de vida que abarca toda a
existência”. Infelizmente, como diz o próprio Hadot, a morte prematura de Foucault
interrompeu um diálogo que acabara de começar e do qual ambos teriam se beneficiado –
não só dos pontos de acordo, mas também, e sobretudo, dos de desacordo.
Nessa linha, Hadot (2014, p.277) recupera a conhecida definição de filosofia dada
por Foucault: uma “ascese, um exercício de si, no pensamento”. Uma estética da
existência, em suma, seria “a filosofia que ele concretamente praticou ao longo de sua
vida”. Com esta afirmação, Hadot mostra que aquilo que o aproximou de Foucault foram
os exercícios espirituais. Melhor dizendo, a filosofia antiga como uma filosofia ensaística,
entendendo-se o ensaio como “experiência modificadora de si mesmo no jogo da verdade e
não como apropriação simplificadora do outrem para fins de comunicação”. O ensaio é,
para Foucault (1994, p.13), “o corpo vivo da filosofia, se ao menos ela é ainda hoje o que era
outrora, isto é, uma ‘ascese’” (FOUCAULT, 1994, p. 13). Hadot termina o capítulo em
pauta lamentando o diálogo interrompido com Foucault, e complementa:
Ainda
Ainda menos
menos que
que M.
M. Foucault,
Foucault, eu eu não
não tenho,
tenho, quanto
quanto aa mim,
mim, aa pretensão
pretensão dede
propor
propor soluções
soluções gerais
gerais ee definitivas
definitivas para
para os
os problemas
problemas filosóficos
filosóficos do
do nosso
nosso tempo.
tempo.
Confessaria
Confessaria somente
somente que,
que, do
do mesmo
mesmo modomodo queque ele
ele se
se esforçou
esforçou para
para realizar
realizar nos
nos
últimos
últimos anos
anos de
de sua
sua vida
vida uma
uma “estética
“estética da
da existência”,
existência”, aa ideia
ideia antiga
antiga da
da filosofia
filosofia
como
como modo
modo dede vida,
vida, como
como exercício
exercício da
da sabedoria,
sabedoria, como
como esforço
esforço na
na direção
direção da
da
tomada
tomada dada consciência
consciência vivaz
vivaz dada totalidade,
totalidade, mantém
mantém parapara mim
mim umum valor
valor sempre
sempre
atual.
atual. Considero
Considero como
como umum sinal
sinal dos
dos tempos
tempos oo fato,
fato, aos
aos meus
meus olhos
olhos inesperado
inesperado ee
desconcertante,
desconcertante, de de que
que neste
neste final
final dodo século
século XXXX Foucault,
Foucault, eueu próprio
próprio ee
certamente
certamente muitos
muitos outros
outros ao ao mesmo
mesmo tempo
tempo queque nós,
nós, nono final
final de
de itinerários
itinerários
totalmente
totalmente diferentes,
diferentes, tenhamos
tenhamos nos nos encontrado
encontrado nessa
nessa vivaz
vivaz redescoberta
redescoberta da da
experiência
experiência antiga
antiga (HADOT,
(HADOT, 2014, 2014, p.281).
p.281).

Os encontros que Michel Foucault fez com a filosofia antiga foram diversos e
intensos, como mostra Blanchot (2011, p.157-159):
Ele
Ele vai
vai procurar
procurar ee encontrar
encontrar uma uma saída
saída [...],
[...], distanciando-se
distanciando-se dosdos tempos
tempos
modernos
modernos ee interrogando
interrogando aa Antiguidade
Antiguidade [...].
[...]. Com
Com que que objetivo?
objetivo? Aparentemente,
Aparentemente,
para
para passar
passar dos
dos tormentos
tormentos da da sexualidade
sexualidade àà simplicidade
simplicidade dos dos prazeres
prazeres ee para
para
lançar
lançar uma
uma nova
nova luz
luz sobre
sobre osos problemas
problemas que, que, contudo,
contudo, suscitam,
suscitam, ainda
ainda queque
ocupem
ocupem muito
muito menos
menos aa atenção
atenção dosdos homens
homens livreslivres ee escapem
escapem àà delícia
delícia ee ao ao
escândalo
escândalo dodo proibido.
proibido. [...]
[...] Os
Os livros
livros que
que vai
vai escrever
escrever sobre
sobre temas
temas que
que lhe
lhe são
são
muito
muito próximos
próximos são,
são, àà primeira
primeira vista,
vista, livros
livros dede historiador
historiador estudioso
estudioso mais
mais do do que
que
obras
obras de
de investigação
investigação pessoal.
pessoal. Até
Até oo estilo
estilo éé diferente:
diferente: calmo,
calmo, apaziguado,
apaziguado, sem sem aa
paixão
paixão que
que queima
queima em em tantos
tantos dede seus
seus outros
outros textos.
textos. Entrevistado
Entrevistado porpor Hubert
Hubert
Dreyfus
Dreyfus ee Paul
Paul Rabinow
Rabinow ee interrogado
interrogado sobre
sobre seus seus projetos,
projetos, ele
ele exclama,
exclama, de de
repente:
repente: “Oh,
“Oh, eueu vou
vou primeiro
primeiro cuidar
cuidar dede mim!”
mim!” Declaração
Declaração que
que não
não éé fácil
fácil dede
esclarecer,
esclarecer, mesmo
mesmo se se pensarmos
pensarmos um um pouco
pouco apressadamente
apressadamente que, que, seguindo
seguindo aa
Nietzsche,
Nietzsche, ele
ele estivesse
estivesse inclinado
inclinado aa fazer
fazer dede sua
sua existência
existência –– daquela
daquela queque lhelhe
restava
restava viver
viver –– uma
uma obra
obra dede arte.
arte. ÉÉ assim
assim que
que será
será tentado
tentado aa pedir
pedir aos
aos antigos
antigos aa
revalorização
revalorização das
das práticas
práticas da da amizade,
amizade, as as quais,
quais, semsem sese perder,
perder, não
não voltaram
voltaram aa
encontrar,
encontrar, aa não
não ser
ser entre
entre alguns
alguns de
de nós,
nós, sua
sua elevada
elevada virtude.
virtude.

Em seus últimos anos de vida e de trabalho, Foucault busca um encontro com a


filosofia antiga que lhe permitisse, de modo outro, um encontro consigo mesmo. Pois suas
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -|-| 469
469

investigações, que se iniciam com uma arqueogenealogia da vontade de saber – a propósito


da sexualidade, no caso –, se intensificam, finalmente, na problematização da relação entre
subjetividade e verdade. Nessa medida, é ele que sai transformado, como afirma na
introdução ao segundo volume de História da sexualidade: “Um exercício filosófico: sua
articulação foi a de saber em que medida o trabalho de pensar sua própria história pode
liberar o pensamento daquilo que ele pensa silenciosamente, e permitir-lhe pensar
diferentemente” (FOUCAULT, 1994, p.14). E Foucault complementa, falando do exercício
da problematização, ligado às “artes da existência”, como capaz de retratar seu próprio
percurso vital-conceitual:
Parece-me
Parece-me que
que seria
seria melhor
melhor perceber
perceber agora
agora de
de que
que maneira,
maneira, um
um tanto
tanto cegamente,
cegamente,
ee por
por meio
meio dede fragmentos
fragmentos sucessivos
sucessivos ee diferentes,
diferentes, eu
eu me
me conduzi
conduzi nessanessa
empreitada
empreitada dede uma
uma história
história da
da verdade:
verdade: analisar,
analisar, não
não os
os comportamentos,
comportamentos, nem nem asas
ideias,
ideias, nem
nem asas sociedades,
sociedades, nemnem suas
suas “ideologias”,
“ideologias”, mas
mas asas problematizações
problematizações
através
através das
das quais
quais oo ser
ser se
se dá
dá como
como podendo
podendo ee devendo
devendo ser
ser pensado,
pensado, ee as
as práticas
práticas aa
partir
partir das
das quais
quais essas
essas problematizações
problematizações se se formam.
formam. (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 1994,1994, p.
p. 15)
15)

Através dessa produção de problematizações moventes, Michel Foucault nos


proporciona uma viagem. Essa viagem segue, talvez, os traçados propostos por Paz (2015, p.
170), ou seja, “desprendimentos: aprendizagens”: “Viajar não é morrer um pouco e sim
exercitar-se na arte de despedir-se para, assim, já leves, aprender a chegar, aprender a
receber”. Cumpre lembrar que a aposta do presente texto é ampliar um campo
problemático nas viagens formativas, visando tecer trajetórias leves, abertas a modos
outros de aprendizagem. Em que sentido a empreitada de Foucault nos ajuda a pensar
modos outros de formação? O que ela nos força a pensar e a derivar do que somos, para
formar professores diferentemente? Será possível produzir modos de vida em sua
dimensão virtual e afetiva no campo da formação de professores? Esta é a problematização
que desejamos percorrer junto com o que Foucault nos propõe como um dos temas
fundamentais das práticas de si: “Tornarmo-nos o que nunca fomos” (FOUCAULT, 2004,
p. 116). Para tanto, ele nos oferece uma pista na aula de 20 de janeiro de 1982, do curso A
hermenêutica do sujeito: a desaprendizagem.
A fim de segui-la, vamos nos deter com atenção e calma sobre os modos de viver
que atravessam nossa formação na contemporaneidade, problematizando-os. Para tanto,
talvez seja melhor formular, inicialmente,
inicialmente, algumas perguntas precisas. Que relações
podem ser, por meio da formação, estabelecidas, inventadas, multiplicadas, moduladas?
Em que sentido abrimos espaço e tempo para modos outros de formar? A formação, como
viagem desaprendizante, consiste em práticas coletivas pelas quais nos abrimos para
singularidades? Michel Foucault será nosso intercessor principal para pensar modos outros
de formar em tempos tão dogmáticos e informacionais como os que hoje passamos.

desaprender para se formar de modos outros....


Verifico,
Verifico, Lucílio,
Lucílio, que
que não
não apenas
apenas estou
estou corrigindo,
corrigindo, antes
antes me
me estou
estou transfigurando.
transfigurando. Não
Não
garanto,
garanto, nem
nem sequer
sequer espero,
espero, que
que nada
nada já
já reste
reste em
em mim
mim sem
sem necessitar
necessitar de
de mudança!
mudança!
(SÊNECA,
(SÊNECA, 2014,2014, p.12)
p.12)

Na nota 47 da primeira hora da aula de 20 de Janeiro de 1982, Foucault nos diz que
Sêneca fala de “dediscere: “permita que teus olhos desaprendam” (sine dediscere oculos tuos)”
(FOUCAULT, 2004, p. 129). Trata-se de uma noção essencial para os cínicos, como
também diz Foucault, em extenso fragmento:
Esta
Esta ideia
ideia de
de desaprendizagem
desaprendizagem que,
que, de
de todo
todo modo,
modo, deve
deve começar
começar ainda
ainda quando
quando aa
prática
prática de
de si
si se
se esboça
esboça na
na juventude,
juventude, esta
esta reformação
reformação crítica,
crítica, reforma
reforma de
de si
si que
que
tem
tem porpor critério
critério uma
uma natureza
natureza –– mas
mas umauma natureza
natureza jamais
jamais dada,
dada, jamais
jamais
470|
470| rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias;
dias; heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues

manifestada
manifestada como como tal tal nono indivíduo
indivíduo humano,humano, de de qualquer
qualquer idadeidade –, –, tudo
tudo isto
isto
assume,
assume, muitomuito naturalmente,
naturalmente, aa feição feição de
de umum desbaste
desbaste emem relação
relação ao ao ensino
ensino recebido,
recebido,
aos
aos hábitos
hábitos estabelecidos
estabelecidos ee ao ao meio.
meio. Desbaste,
Desbaste, inicialmente,
inicialmente, de de tudo
tudo oo queque ocorreu
ocorreu na na
primeira
primeira infância.
infância. NistoNisto consiste
consiste aa famosa
famosa crítica,
crítica, tantas
tantas vezes
vezes repetida,
repetida, da da
primeira
primeira educação
educação ee destas destas famigeradas
famigeradas histórias
histórias da da carochinha
carochinha com com as as quais,
quais,
desde
desde cedo,
cedo, se se oblitera
oblitera ee deforma
deforma oo espírito
espírito da da criança.
criança. Lê-se
Lê-se emem um um conhecido
conhecido
texto
texto de de Cícero
Cícero nas nas Tusculanas:
Tusculanas: “Desde“Desde que que nascemos
nascemos ee somos somos admitidos
admitidos em em
nossas
nossas famílias,
famílias, encontramo-nos
encontramo-nos em em um um meiomeio inteiramente
inteiramente falseadofalseado onde onde aa
perversão
perversão dos dos julgamentos
julgamentos éé completa,
completa, tanto
tanto que,
que, pode-se
pode-se dizer,
dizer, sugamos
sugamos oo erro erro
com
com oo leite
leite de
de nossas
nossas amas.”
amas.” Crítica,
Crítica, pois,
pois, da da primeira
primeira infância
infância ee das das condições
condições
em
em que
que elaela se
se desenrola.
desenrola. Crítica
Crítica também
também do do meio
meio familiar,
familiar, nãonão somente
somente em em seus
seus
efeitos
efeitos educativos,
educativos, como como ainda,
ainda, se se quisermos,
quisermos, [pelo][pelo] conjunto
conjunto de de valores
valores que que ele
ele
transmite
transmite ee impõe; impõe; crítica
crítica do do que,
que, emem nosso
nosso vocabulário,
vocabulário, chamaríamos
chamaríamos de de
“ideologia
“ideologia familiar”.
familiar”. Penso
Penso naquela
naquela cartacarta de de Sêneca
Sêneca aa Lucílio,
Lucílio, em em queque diz:
diz: põe-te
põe-te
em
em segurança,
segurança, tenta tenta reencontrar
reencontrar aa ti ti mesmo,
mesmo, “bem “bem sei sei que
que teus
teus pais
pais almejaram
almejaram
para
para titi coisas
coisas bembem diferentes;
diferentes; tambémtambém eu eu faço
faço por
por titi votos
votos totalmente
totalmente contrários
contrários
aos
aos que
que te te fizeram
fizeram tua tua família;
família; almejo-te
almejo-te um um desprezo
desprezo generoso
generoso por por todas
todas as as
coisas
coisas que
que teus
teus pais
pais te
te almejaram
almejaram em em abundância”.
abundância”. Por Por conseguinte,
conseguinte, oo cuidado
cuidado de de
si
si deve
deve reverter
reverter inteiramente
inteiramente oo sistema
sistema dede valores
valores veiculados
veiculados ee impostos
impostos pelapela família.
família.
Em
Em terceiro
terceiro lugar,
lugar, finalmente,
finalmente, ee não não insisto
insisto nisto
nisto por
por ser
ser bastante
bastante conhecido,
conhecido, toda toda
aa crítica
crítica da da formação
formação pedagógica
pedagógica dos dos mestres
mestres –– mestres
mestres do do ensino
ensino queque chamaríamos
chamaríamos
primário
primário –– ee principalmente
principalmente aa dos dos professores
professores de de retórica.
retórica. [...]
[...] Vemos,
Vemos, por por
exemplo,
exemplo, em em Epicteto,
Epicteto, oo modo
modo divertido
divertido de de colocar
colocar nos
nos eixos
eixos oo pequeno
pequeno aluno
aluno dede retórica
retórica
que
que acabara
acabara de de chegar.
chegar. JáJá seu
seu retrato
retrato físico
físico éé interessante,
interessante, mostrando,
mostrando, situando
situando um um
pouco,
pouco, ondeonde se se acha
acha oo ponto
ponto maior
maior de de conflito
conflito entre
entre aa prática
prática de de sisi filosófica
filosófica ee oo
ensino
ensino retórico:
retórico: oo aluno
aluno chega
chega enfeitado,
enfeitado, maquiado,
maquiado, com com seusseus cabelinhos
cabelinhos frisados,
frisados,
manifestando
manifestando assim assim que que oo ensino
ensino da da retórica
retórica éé um um ensino
ensino decorativo,
decorativo, da da falsa
falsa
aparência,
aparência, da da sedução.
sedução. Importa
Importa não não ocupar-se
ocupar-se consigo,
consigo, mas mas agradar
agradar os os outros.
outros. EE éé
sobre
sobre isto,
isto, precisamente,
precisamente, que que Epicteto
Epicteto interrogará
interrogará oo pequeno
pequeno aluno aluno de de retórica,
retórica,
dizendo-lhe:
dizendo-lhe: muito muito bem,bem, tu tu tete enfeitaste
enfeitaste todo,
todo, acreditavas
acreditavas ocupar-te
ocupar-te contigo;
contigo; de de
fato
fato porém,
porém, reflete
reflete um um pouco
pouco –– oo que que éé ocupar-se
ocupar-se consigo
consigo mesmo?
mesmo? PodemosPodemos
divisar
divisar aa analogia,
analogia, muito
muito provavelmente
provavelmente explícita explícita ee reconhecível
reconhecível pelos pelos leitores
leitores ou ou
ouvintes
ouvintes da da época,
época, isto
isto é,
é, aa retomada,
retomada, oo eco eco dodo próprio
próprio Alcebíades:
Alcebíades: Tu Tu que
que deves
deves
ocupar-te
ocupar-te contigo,
contigo, comocomo oo podes
podes fazer,
fazer, ee oo que
que éé tu
tu mesmo?
mesmo? EE aa repetição:
repetição: há há que
que
ocupar-se
ocupar-se com com aa própria
própria alma,
alma, não não comcom oo corpo.
corpo. Portanto,
Portanto, se se quisermos,
quisermos, esta esta
função
função crítica
crítica dada prática
prática dede si
si éé aa primeira
primeira consequência
consequência do do deslocamento
deslocamento cronológico
cronológico do do
cuidado
cuidado de de si
si do
do final
final da
da adolescência
adolescência àà idadeidade adulta
adulta (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2004, 2004, p.117-118,
p.117-118,
grifos
grifos nossos)
nossos)

Nesta aula, Michel Foucault toca diretamente na questão do cuidado de si em suas


dimensões formadora e curativa, abordando, mediante uma comparação com o diálogo
Alcebíades, o deslocamento cronológico da prática de si da adolescência para a vida adulta:
“Correção-liberação, bem mais que formação-saber” (FOUCAULT, 2004, p.116). Para
Foucault, é no eixo correção-liberação que as práticas de si helenístico-romanas se
constituem e ganham consistência, abrindo a possibilidade de que aconteça um desprender,
expurgar e liberar. Duas são as consequências deste deslocamento cronológico: a função
crítica da prática de si e a aproximação entre prática de si e medicina, ou seja, sua função
terapêutica.
Talvez seja possível dizer que estas duas consequências do deslocamento
cronológico atualizam a noção de desaprendizagem quanto ao tema da formação de
professores. Em especial, poderíamos dizê-lo porque as funções crítica e terapêutica
atravessam nossa trajetória de vida hoje, posicionando a constituição da existência mais
próxima da dimensão de “correção-liberação” que da dimensão de “formação-saber”.
Nestes termos, os gestos professorais atentos à primeira noção se aproximariam muito
mais daquilo que pode criar um espaço-tempo de liberação para modos outros, que daquilo
que está ligado à acumulação de saberes escolares e memorialísticos, ocupados em manter
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -|-| 471
471

escores e expectativas quanto ao suposto “bom professor”. Um suposto “bom” que


mantém as marcas de uma existência dócil e útil (FOUCAULT, 2002).
Estou
Estou triste,
triste, estou
estou zangado,
zangado, estou
estou furioso
furioso contigo!
contigo! Então
Então tu
tu continuas
continuas aa formular
formular
para
para ti
ti os
os mesmos
mesmos votos
votos que
que aa tua
tua ama,
ama, oo teu
teu pedagogo
pedagogo ou
ou aa tua
tua mãe?!
mãe?! Ainda
Ainda não
não
percebestes
percebestes todo
todo oo mal
mal que
que eles
eles te
te desejaram?(SÊNECA,
desejaram?(SÊNECA, 2014, 2014, p.216).
p.216).

Seria a função crítica um procedimento da desaprendizagem? Em conferência


proferida em 1978, diz Foucault: “[...] a crítica será a arte da não-servidão voluntária, da
indocilidade refletida. A crítica teria essencialmente por função o desassujeitamento no
jogo do que poderia ser denominado, em uma palavra, política da verdade” (FOUCAULT,
2000, p.173). Nestes termos, a crítica seria uma função emergente da feitura dos
deslocamentos e, concomitantemente, a possibilidade de se desvencilhar de um conjunto
de códigos, prescrições ou normas, facultando a alguém um fazer-se de maneiras que não
só mostrem a constituição de si, mas também a invenção de si como parte de uma operação
prática e poiética. Um trabalho sobre si mesmo, em suma, que acontece no contexto de um
conjunto de normas que precede e excede o sujeito.
Não
Não háhá criação
criação de
de si
si (poiesis)
(poiesis) fora
fora de
de um
um modo
modo de
de subjetivação
subjetivação e,e, portanto,
portanto, não
não há

criação
criação de
de si
si fora
fora das
das normas
normas que que orquestram
orquestram asas formas
formas possíveis
possíveis que
que oo sujeito
sujeito
deve
deve assumir.
assumir. A A prática
prática da
da crítica,
crítica, então,
então, expõe
expõe os
os limites
limites do
do esquema
esquema histórico
histórico
das
das coisas,
coisas, oo horizonte
horizonte epistemológico
epistemológico ee ontológico
ontológico dentro
dentro do
do qual
qual os
os sujeitos
sujeitos
podem
podem surgir.
surgir. Criar-se
Criar-se de de tal
tal modo
modo aa expor
expor esses
esses limites
limites éé precisamente
precisamente se se
envolver
envolver numa
numa estética
estética dodo si-mesmo
si-mesmo queque mantém
mantém uma uma relação
relação crítica
crítica com
com asas
normas
normas existentes
existentes (BUTLER,
(BUTLER, 2015, 2015, p.29).
p.29).

Talvez se possa ainda acrescentar que a crítica assume o tempo de uma


acontecimentalização, ou seja, de práticas de si que engendram modos de viver e regimes de
verdade. Neste sentido, ela não diz respeito apenas a um quadro de reconhecimento, a uma
prática social determinada ou, ainda, a uma certa inteligibilidade em que surgem práticas e
instituições; ela expressa, inclusive, uma problematização de si mesmo. Como nos é dito
por Foucault na conferência “O que é a crítica?”, o questionamento de si torna-se
consequência ética da crítica. Mas tal problematização de si envolve riscos e pode colocar
em perigo a própria possibilidade de reconhecimento por parte do outro. Uma vez que nos
transformamos, corremos o risco de não mais sermos reconhecidos como professores e, por
isso, nos vermos excluídos. Pois, uma vez que interrogamos o regime de verdade, o modo
de vida com suas normas ou modelos, o que fica de dentro? O que fica de fora? O regime
de verdade é posto em questão na medida em que “‘eu’ não posso ou não vou me
reconhecer nos termos que me são disponíveis” (BUTLER, 2015, p. 38). A crítica, então,
age num esforço para evitar ou superar os termos pelos quais a subjetivação acontece: há
luta com as normas e os modelos, com os sistemas de valores veiculados e impostos tanto
pela família como pela formação pedagógica. Com efeito, talvez, ao problematizar o que
nos tornamos, a prática de si se veja engendrada como um tempo-espaço de correção e
liberação.
Lutemos,
Lutemos, portanto,
portanto, semsem temer
temer pedir
pedir auxílio
auxílio alheio.
alheio. [...]
[...] Se
Se queres
queres um
um conselho,
conselho,
dirige-te
dirige-te aos
aos antigos.
antigos. [...]
[...] Dentre
Dentre osos vivos,
vivos, devemos
devemos escolher
escolher não
não aqueles
aqueles que
que têm
têm
oo verbo
verbo fácil
fácil ee corrente,
corrente, que
que repisam
repisam lugares
lugares comuns
comuns ee se se exibem
exibem emem círculos
círculos
restritos,
restritos, mas
mas simsim os
os que
que comprovam
comprovam as as suas
suas palavras
palavras com com osos próprios
próprios actos
actos ee
ensinam
ensinam oo queque devemos
devemos evitar
evitar sem
sem nunca
nunca serem
serem apanhados
apanhados aa fazer
fazer oo que
que
condenam.
condenam. Em Em suma,
suma, escolhe
escolhe para
para teu
teu mestre
mestre alguém
alguém queque te
te mereça
mereça admiração
admiração
pelas
pelas ações
ações ee não
não pelas
pelas palavras
palavras (SÊNECA,
(SÊNECA, 2014,2014, p.
p. 178).
178).

Como dissemos, a segunda consequência das práticas de si, destacada por Foucault
(2004, p.121), acentua que há, nessas práticas, uma estreita relação entre filosofia e
medicina, “prática da alma e medicina do corpo”. Três são os elementos concernentes às
472|
472| rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias;
dias; heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues

práticas de si em sua dimensão terapêutica: (1) a ideia de um grupo de pessoas que se


associa para praticar o cuidado de si; (2) o corpo que reemerge como um objeto de
preocupação - toda uma imbricação psíquica e corporal constitui o centro deste cuidado; e
3) o deslocamento cronológico, que confere um novo valor à velhice. Esses elementos se
atualizam nos modos de formação, hoje, e exigem de nós: 1) o esforço em produzir
trabalhos que abram um espaço-tempo para a constituição de coletivos; 2) pensar e realizar
práticas que, em suas dimensões corporais, ganhem consistência em políticas, ethos e 3)
experienciar modos de deslocamento que possam nos colocar em contato com uma
dimensão transformadora, uma formação inventiva (DIAS, 2011; 2012).
Todas
Todas as as escolas
escolas de
de filosofia
filosofia antiga
antiga propõem,
propõem, cada
cada uma
uma àà sua
sua maneira,
maneira, uma
uma crítica
crítica
do
do estado
estado habitual
habitual dos
dos homens,
homens, cada
cada estado
estado de
de sofrimento,
sofrimento, de de desordem
desordem ee de de
inconsciência,
inconsciência, ee um um método
método para
para curar
curar os
os homens
homens desse
desse estado:
estado: “A
“A escola
escola do
do
filósofo
filósofo éé uma
uma clínica”,
clínica”, dizia
dizia Epiteto.
Epiteto. Essa
Essa terapêutica
terapêutica se
se situa,
situa, em
em primeiro
primeiro lugar,
lugar,
evidentemente,
evidentemente, no no discurso
discurso dodo mestre,
mestre, que
que produz
produz oo efeito
efeito de
de um
um encantamento,
encantamento,
de
de uma
uma mordida
mordida ou ou de
de um
um choque
choque violento
violento que
que desconcerta
desconcerta oo ouvinte,
ouvinte, tal
tal como
como éé
dito
dito dos
dos discursos
discursos dede Sócrates
Sócrates no
no Banquete
Banquete dede Platão.
Platão. Mas,
Mas, para
para curar,
curar, não
não basta
basta
ficar
ficar comovido,
comovido, éé preciso
preciso querer
querer realmente
realmente transformar
transformar aa vida.
vida. (HADOT,
(HADOT, 2014,
2014, p.
p.
335)
335)

Os dois elementos que vimos abordando – crítica e terapêutica – redirecionam a


própria acepção de velhice na cultura antiga, problematizando certo binarismo que coloca o
idoso em um valor limitado, restrito e parcial: “velhice é sabedoria, mas também fraqueza”
(FOUCAULT, 2004, p.134). Foucault problematiza este valor tradicional, dizendo que o
cuidado de si é uma prática para toda a vida. Com o deslocamento cronológico, a
importância maior se situa na forma de vida.
Ora,
Ora, diz
diz Sêneca,
Sêneca, pensando
pensando muito
muito provavelmente
provavelmente naquele
naquele gênero
gênero dede repartição
repartição
tradicional,
tradicional, não
não posso
posso estar
estar dede acordo
acordo com com asas pessoas
pessoas queque repartem
repartem suasua vida
vida em
em
fatias
fatias ee que
que não
não têm
têm aa mesma
mesma maneira
maneira de de viver
viver conforme
conforme estejam
estejam emem uma
uma ouou
outra
outra idade.
idade. Sêneca
Sêneca propõe
propõe substituir
substituir estaesta repartição
repartição porpor uma
uma espécie
espécie dede unidade
unidade
–– unidade,
unidade, se se quisermos,
quisermos, dinâmica:
dinâmica: unidade
unidade de de um
um movimento
movimento contínuo
contínuo queque
tende
tende para
para aa velhice.
velhice. [...]
[...] Isto
Isto significa
significa queque aa velhice
velhice nãonão mais
mais aparece
aparece como
como oo
termo
termo ambíguo
ambíguo da da vida,
vida, mas,
mas, muito
muito ao ao contrário,
contrário, [...]
[...] (como)
(como) um um polo
polo positivo
positivo
para
para oo qual
qual se
se deve
deve tender.
tender. [...]
[...] Devemos,
Devemos, por por assim
assim dizer,
dizer, ee nisto
nisto consiste
consiste oo
ponto
ponto central
central desta
desta nova
nova ética
ética da
da velhice,
velhice, nos
nos colocar
colocar emem relação
relação àà vida,
vida, em
em um
um
estado
estado tal
tal que
que aa vivamos
vivamos como
como se se já
já aa tivéssemos
tivéssemos consumado.
consumado. No No fundo,
fundo, éé preciso
preciso
que,
que, aa cada
cada momento,
momento, mesmo
mesmo sendosendo jovens,
jovens, mesmo
mesmo na na idade
idade adulta,
adulta, mesmo
mesmo se se
estivermos
estivermos ainda
ainda emem plena
plena atividade,
atividade, tenhamos,
tenhamos, parapara com
com tudo
tudo oo que
que fazemos
fazemos ee
somos,
somos, aa atitude,
atitude, oo comportamento,
comportamento, oo desapego desapego ee aa completude
completude de de alguém
alguém queque jájá
tivesse
tivesse chegado
chegado àà velhice
velhice ee completado
completado sua sua vida
vida (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2004, 2004, p.
p. 136-137).
136-137).

Valoriza-se certo modo de afirmar a vida, portanto, mediante práticas ético-


políticas que se constituem na forma de exercícios de si para consigo – na citação acima,
esse exercício refere-se à meditação sobre a morte. Um ethos afirmativo de modos de viver
que não se dão por uma lei ou ensinamento, mas por práticas, técnicas e tecnologias do
sujeito que independem da forma da lei. Juntamente com o deslocamento cronológico e
com a questão da desaprendizagem, antes destacada, temos aqui mais um ponto levantado
por Michel Foucault, na aula de 20 de janeiro de 1982, que nos ajudará a pensar/fazer
modos outros de formação hoje.
“Pode-se dizer que o cuidado de si constitui agora uma espécie de lei ética
universal?” – indaga Foucault (2004, p. 138). Imediatamente, ele responde: não! Contudo,
mostra igualmente que não devemos nos prender ao que aconteceu após a Idade Média, e
“nos fez tomar a lei como princípio geral de toda regra na ordem da prática humana”
(FOUCAULT, 2004, p. 138). Uma “juridiscisação”, nas suas palavras. Diferentemente
deste modo de fazer humano, muito presente ainda em nossos dias, Foucault redireciona a
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -|-| 473
473

atenção para práticas, tecnologias e técnicas que independem da forma da lei. Afirma,
inclusive, que “no fundo, a lei não passa de um dos aspectos possíveis da tecnologia do
sujeito relativamente a si mesmo. Ou, se quisermos, mais precisamente ainda: a lei não
passa de um dos aspectos desta longa história no curso da qual se constitui o sujeito
ocidental tal como hoje se nos apresenta” (FOUCAULT, 2004, p.139)
Em entrevista a Dreyfus e Rabinow, em 1983, Foucault diz que o que o fascina na
estética da existência é a ausência de relação com o jurídico: “A ideia de que a ética pode
ser uma estrutura muito forte na existência, sem qualquer relação com o jurídico por si,
com um sistema autoritário, com uma estrutura disciplinar” (FOUCAULT, 1984, p.8).
Essa questão remete diretamente nos modos de vida e de formação que nos atravessam.
Nas palavras de Foucault (2004, p. 139),
O
O cuidado
cuidado de
de si
si jamais
jamais foi
foi efetivamente
efetivamente percebido,
percebido, colocado,
colocado, afirmado
afirmado como
como uma
uma
lei
lei universal
universal válida
válida para
para todo
todo indivíduo,
indivíduo, qualquer
qualquer que
que fosse
fosse oo modo
modo de
de vida
vida
adotado.
adotado. OO cuidado
cuidado dede si
si implica
implica sempre
sempre uma
uma escolha
escolha de
de modo
modo de de vida,
vida, isto
isto é,
é,
uma
uma separação
separação entre
entre aqueles
aqueles que
que escolheram
escolheram este
este modo
modo de
de vida
vida ee os
os outros.
outros.

Ligado à existência, e aos grupos ou redes, o cuidado de si, a princípio, pode ser
partilhado – um dos motivos para que não possa ser uma lei universal. O cuidado de si se
dá por gestos de cultivo coletivo. Somos capazes de exercer práticas de si, mas Foucault
(2004, p.147) também nos alerta de que poucos são os efetivamente capazes de ocupar-se
consigo.
ÉÉ aa relação
relação consigo,
consigo, aa modalidade
modalidade ee oo tipo
tipo de
de relação
relação consigo,
consigo, aa maneira
maneira como
como ele
ele
mesmo
mesmo seráserá efetivamente
efetivamente elaborado
elaborado enquanto
enquanto objeto
objeto de
de seus
seus cuidados:
cuidados: éé aí
aí que
que se
se
fará
fará aa partilha
partilha entre
entre alguns
alguns poucos
poucos ee os
os mais
mais numerosos.
numerosos. O O apelo
apelo deve
deve ser
ser lançado
lançado
aa todos
todos porque
porque somente
somente alguns
alguns serão
serão efetivamente
efetivamente capazes
capazes dede ocupar-se
ocupar-se consigo
consigo
mesmo.
mesmo. Reconhecemos
Reconhecemos aí aí aa grande
grande forma
forma dada voz
voz que
que aa todos
todos se
se dirige
dirige ee poucos
poucos
ouvem,
ouvem, aa grande
grande forma
forma dodo apelo
apelo universal
universal que
que só
só aa poucos
poucos garante
garante aa salvação.
salvação.
Encontramos
Encontramos aquela
aquela forma
forma cuja
cuja importância
importância será
será tão
tão grande
grande emem toda
toda aa nossa
nossa
cultura.
cultura.

Tal forma articula a universalidade do apelo e a raridade da salvação, e justamente


ela será reencontrada no cerne do cristianismo. Nas palavras de Foucault (2004, p.148),
O
O importante,
importante, porém
porém [...],
[...], éé que
que foifoi já
já nesta
nesta forma
forma com com dois
dois elementos
elementos
(universalidade
(universalidade do do apelo
apelo ee raridade
raridade dada salvação)
salvação) queque se
se teria
teria problematizado
problematizado no no
ocidente
ocidente aa questão
questão dodo eu
eu ee da
da relação
relação consigo.
consigo. [...]
[...] ÉÉ este
este jogo
jogo entre
entre um
um princípio
princípio
universal
universal que
que só
só pode
pode ser
ser ouvido
ouvido por
por alguns
alguns ee aa rara
rara salvação
salvação dada qual,
qual, contudo,
contudo,
ninguém
ninguém se se acha
acha aa priori
priori excluído,
excluído, que
que estará,
estará, como
como sabemos,
sabemos, no no cerne
cerne da
da maioria
maioria
dos
dos problemas
problemas teológicos,
teológicos, espirituais,
espirituais, sociais,
sociais, políticos
políticos do do cristianismo.
cristianismo. Ora, Ora,
vemos
vemos aqui
aqui esta
esta forma
forma nitidamente
nitidamente articulada
articulada àà tecnologia
tecnologia do do eu,
eu, ou
ou melhor
melhor (pois
(pois
não
não éé mais
mais da
da tecnologia
tecnologia apenas
apenas que
que se
se deve
deve falar),
falar), aa uma
uma verdadeira
verdadeira cultura
cultura de de si
si
propiciada
propiciada pela
pela civilização
civilização grega,
grega, helenística
helenística ee romana
romana ee que,
que, nos
nos séculos
séculos II ee II
II de
de
nossa
nossa era,
era, assumiu,
assumiu, aa meumeu ver,
ver, dimensões
dimensões consideráveis.
consideráveis. ÉÉ no no interior
interior desta
desta
cultura
cultura dede si
si que
que vemos
vemos entrar
entrar plenamente
plenamente em em cenacena esta
esta forma,
forma, repito,
repito, tãotão
fundamental
fundamental em em nossa
nossa cultura,
cultura, entre
entre aa universalidade
universalidade do do apelo
apelo ee aa raridade
raridade da da
salvação
salvação

Trata-se da formação de si através de técnicas de vida, e não do recalcamento pelo


interdito e pela lei. A ideia de salvar-se é uma noção que se desdobra ao longo de toda a
vida e cujo único operador é o próprio sujeito. Para Foucault, nos séculos I e II, época de
ouro da filosofia como cuidado de si, não há referência à imortalidade ou a um outro
mundo. Em nova aula do curso de 1982, Foucault trabalha o tema da salvação helenística e
romana, destacando que ela se dá no plano da imanência.
474|
474| rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias;
dias; heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues

A
A salvação
salvação éé portanto
portanto umauma atividade,
atividade, atividade
atividade permanente
permanente do do sujeito
sujeito sobre
sobre sisi
mesmo,
mesmo, queque encontra
encontra sua sua recompensa
recompensa em em uma
uma certa
certa relação
relação consigo,
consigo, ao
ao tornar-se
tornar-se
inacessível
inacessível àsàs perturbações
perturbações exteriores
exteriores ee ao
ao encontrar
encontrar emem sisi mesmo
mesmo umauma satisfação
satisfação
que
que de
de nada
nada mais
mais necessita
necessita senão
senão dele
dele próprio.
próprio. Digamos,
Digamos, numa numa palavra,
palavra, que
que aa
salvação
salvação éé aa forma,
forma, ao ao mesmo
mesmo tempo
tempo vigilante,
vigilante, contínua
contínua ee completa,
completa, da da relação
relação
consigo
consigo que
que se
se cinge
cinge aa si
si mesma
mesma [...]
[...] –– nesta
nesta salvação
salvação dada filosofia
filosofia helenística
helenística ee
romana,
romana, oo eueu éé oo agente,
agente, oo objeto,
objeto, oo instrumento
instrumento ee aa finalidade.
finalidade. Vemos
Vemos quão
quão longe
longe
estamos
estamos da da salvação
salvação mediatizada
mediatizada pela
pela cidade,
cidade, que
que encontramos
encontramos em em Platão.
Platão. Quão
Quão
longe
longe também
também estamos
estamos dada salvação
salvação na na forma
forma religiosa,
religiosa, referida
referida aa um
um sistema
sistema
binário,
binário, àà dramaticidade
dramaticidade de de um
um acontecimento,
acontecimento, aa uma uma relação
relação com
com oo Outro
Outro ee que,
que,
no
no cristianismo,
cristianismo, implicará
implicará uma
uma renúncia
renúncia aa sisi (FOUCAULT,
(FOUCAULT, 2004, 2004, p.227).
p.227).

Poderíamos dizer que a relação entre a universalidade do apelo e a raridade da


salvação toca de maneira estreita os modos outros de uma formação atenta ao
deslocamento cronológico, e que possui objetivo, instrumento e finalidade no próprio
cuidado de si. Trata-se de uma feição de desbaste, de uma desaprendizagem, para refinar
modos de vida e constituir um ethos, uma política. Quais modificações devem incidir sobre
nós mesmos para termos acesso a uma vida livre, não consensual, bela, em que possamos
diferir do que somos?

deslocamentos e viagens formativas: entre práticas, desnaturalizações, desaprendizagens e


singularidades
Quem
Quem tiver
tiver aa noção
noção do
do esforço
esforço exigido
exigido pela
pela vida
vida da
da sabedoria
sabedoria compreenderá
compreenderá que que
esta
esta luta
luta não
não sese vence
vence através
através da
da sensualidade
sensualidade ee da da moleza.
moleza. [...]
[...] A
A nossa
nossa
expedição
expedição éé mais
mais dura
dura que
que aa dos
dos soldados
soldados cartagineses:
cartagineses: recuemos,
recuemos, ee será
será maior
maior oo
perigo,
perigo, avancemos
avancemos ee será
será maior
maior oo esforço!
esforço! [...]
[...] A
A liberdade
liberdade éé aa nossa
nossa meta,
meta, éé oo
prêmio
prêmio das
das nossas
nossas canseiras.
canseiras. Sabes
Sabes em
em que
que consiste
consiste aa liberdade?
liberdade? EmEm não
não ser
ser
escravo
escravo dede nada,
nada, de
de nenhuma
nenhuma necessidade,
necessidade, dede nenhum
nenhum acaso;
acaso; em
em lutar
lutar de
de igual
igual
para
para igual
igual com
com aa fortuna
fortuna (SÊNECA,
(SÊNECA, 2014,
2014, p.
p. 174).
174).

Até aqui, levantamos alguns dos pontos tratados por Michel Foucault no curso A
Hermenêutica do sujeito. Há inúmeros outros pontos, mas os efetivamente escolhidos são os
que nos ajudam a trabalhar com o que há de arriscado na tessitura de um caminho que luta
para colocar de pé nossos modos de fazer e, ao mesmo tempo, para que tais modos possam
fazer reverberar as questões da análise e da intervenção em uma “formação inventiva de
professores” (DIAS, 2012). Tal formação busca manter vivo um campo problemático,
mostrando-nos que é possível se deslocar, no campo da formação de professores, da
solução de problemas para a invenção de problemas (DIAS, 2011), afirmando, assim, que
formar professores é uma experiência de produção de subjetividade (DIAS, 2014b). No que
se refere ao risco presente neste modo de fazer/pensar a formação, cumpre sentir e saber
que “o risco, temos que ter esse fato sempre diante de nós, é signo da liberdade”
(CASTELO BRANCO, 2011, p. 154).
Um caminho/viagem esse, o da formação inventiva, que percorremos desde 2008
junto com alunos e professores da universidade e da escola básica, por meio de projetos de
pesquisa e de iniciação à docência33. Como seria possível se deslocar do caráter pedagógico

33 As
As pesquisas
pesquisas sobre
sobre formação
formação inventiva
inventiva dede professores
professores acontecem
acontecem nana Faculdade
Faculdade de
de Formação
Formação dede Professores
Professores
da
da Universidade
Universidade do do Estado
Estado do
do Rio
Rio de
de Janeiro
Janeiro (FFP/UERJ)
(FFP/UERJ) desde desde 2008,
2008, ee contam
contam com
com oo apoio
apoio da
da FAPERJ,
FAPERJ, do do
CNPq
CNPq ee da da UERJ.
UERJ. As As análises
análises ee intervenções
intervenções atuais
atuais estão
estão no
no bojo
bojo dos
dos projetos
projetos “Por
“Por uma
uma expansão
expansão dos
dos
territórios
territórios de
de pensamento
pensamento entre entre universidade
universidade ee escola
escola básica/PROCIÊNCIA/UERJ/2012”,“Tessituras
básica/PROCIÊNCIA/UERJ/2012”,“Tessituras
micropolíticas
micropolíticas ee pesquisa-intervenção
pesquisa-intervenção na na formação
formação inventiva
inventiva de de professores/PROCIÊNCIA/UERJ/2015”
professores/PROCIÊNCIA/UERJ/2015” ee
“Uma
“Uma aposta
aposta ética,
ética, estética
estética ee política
política para
para expansão
expansão dede territórios
territórios de
de pensamento
pensamento entre
entre universidade
universidade ee escola
escola
básica/FAPERJ”.
básica/FAPERJ”. As As atividades
atividades dede formação
formação inicial
inicial ee continuada
continuada de de professores
professores acontecem
acontecem nono contexto
contexto dodo
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -|-| 475
475

das práticas formativas? Pedagogias outras? Modos de formar outros? Como forjar modos
formativos que se abram às experiências emergentes, acontecimentais, no encontro com a
escola básica? Em que sentido nossas práticas com o outro se desvencilham de leis e
normativas, para afirmar modos outros de viver? Seria possível traçar viagens mais abertas
e leves? Como se abrir a uma dimensão virtual por meio de um mergulho sobre si, no
encontro com mundos ainda não enunciados? Seria possível aprender diferindo do que
somos?
De onde partimos, afinal? Começamos pelo meio, com os nossos modos de afirmar
práticas concretas e regulares de encontrar e de conversar entre universidade e escola
básica (DIAS, 2012; DIAS; PELUSO; UCHÔA, 2013). Inventar e fazer escola ao mesmo
tempo abre o espaço-tempo de um paradoxo. Como inventar uma formação outra, em
meio a um tempo utilitário e capacitador de estar na escola e na universidade, o qual coloca
alunos e professores a serviço da manutenção do mesmo, da docilização dos corpos? São
questões que enfrentamos diariamente, nas escolas e nas universidades, quando os
estudantes nos perguntam: “para que serve isto”? A função utilitária e preparatória para o
futuro (o mercado de trabalho?) nos secciona de um presente vivo em que pouco temos
colocado nossa atenção. No entanto, diferentemente desse modo docilizador de funcionar,
apostamos nos Encontros e Conversas44 partilhados, nos dois territórios. Como o temos
feito?
O primeiro passo da viagem formativa se instala num entre-dois, em que “já não
estamos no lugar abandonado e ainda não estamos no lugar desejado” (ONFRAY, 2009, p.
37). Deslocamo-nos, ainda, entre-dois marcos, num estado de leveza espaço-temporal,
cultural-social, ético-estético-político: o viajante-formador penetra em uma experiência de
subjetivação que perturba as lógicas conhecidas e o força a desaprender para se abrir ao
prazer de sentir as intensidades disruptivas do próprio corpo vivo, o qual mergulha na
verdade visceral e afectiva. No entre-dois, o viajante se abre às sensações de habitar um
lugar constituído inteiramente pela velocidade e lentidão dos deslocamentos. Nesta
habitação do entre-dois – instituído e instituinte; aprender e desaprender –, há uma espera
sensível e afectiva em que a viagem se inicia solidamente.
É neste entre-dois iniciático que o durante da viagem formativa ganha liga. Como?
Por meio dos regimes e das redes de amizade que se constituem em práticas regulares de
encontrar-se, estudar, ler, escrever, pensar, dar atenção ao que se passa conosco, colocando-
nos no presente vivo da experiência, ou seja, entre a formação e as práticas regulares com a
escola básica. É com gestos de cultivo e atenção ao presente, inclusive, que o viajante não
fará economia de um suporte para fixar as sensações que materializam os deslocamentos.
Como lidar com a embriaguez das viagens? Fotografar? Escrever? Tomar notas?
Desenhar? Eviar e-mails? Curtir mensagens e postagens no facebook? Enviar postais?
Cartas? Registrar fragmentos? Colar tickets de museus, passagens...?
Com efeito, os deslocamentos do durante oferecem um modo de relação consigo
ligado aos sentidos ético-estético-políticos de tomar a vida ‘pelo meio’. E como seria

Subprojeto
Subprojeto dede Pedagogia
Pedagogia dada FFP/PIBID/CAPES/UERJ
FFP/PIBID/CAPES/UERJ desde desde 2011.
2011. Para
Para maiores
maiores detalhes
detalhes ver
ver Dias
Dias (2012;
(2012;
2014a,
2014a, 2014b);
2014b); https://www.facebook.com/pibidcursodepedagogiaffpuerj
https://www.facebook.com/pibidcursodepedagogiaffpuerj ee http://www.ofip.org/
http://www.ofip.org/
44 Quando
Quando falamos
falamos dede encontrar
encontrar ee conversar,
conversar, estamos
estamos afirmando
afirmando oo queque há
há de
de mais
mais raro
raro no
no campo
campo dada formação
formação
de
de professores:
professores: manter
manter vivo
vivo um
um campo
campo problemático
problemático ee não
não consensual,
consensual, tarefa
tarefa nada
nada fácil
fácil em
em territórios
territórios
dogmáticos
dogmáticos como
como os os da
da universidade
universidade ee da
da escola
escola básica.
básica. Por
Por isto,
isto, ao
ao encontrar
encontrar ee conversar
conversar operamos
operamos por
por meio
meio
de
de dispositivos,
dispositivos, tais
tais como
como textos,
textos, livros,
livros, e-books,
e-books, páginas
páginas em
em redes
redes sociais,
sociais, presença
presença semanal
semanal ee regular
regular nana
escola
escola básica,
básica, manutenção
manutenção de de salas
salas de
de pesquisa
pesquisa nas
nas escolas
escolas parceiras,
parceiras, grupos
grupos dede estudos
estudos com
com regularidade
regularidade
quinzenal
quinzenal nas
nas escolas
escolas parceiras,
parceiras, oficinas,
oficinas, atividades
atividades de
de iniciação
iniciação àà docência,
docência, atividades
atividades dede iniciação
iniciação científica,
científica,
orientações
orientações de
de mestrado,
mestrado, reuniões
reuniões regulares
regulares com
com professores
professores dasdas escolas
escolas básicas,
básicas, organização
organização de de seminários,
seminários,
escritura
escritura em
em diário
diário de
de campo,
campo, leituras,
leituras, entre
entre outros.
outros.
476|
476| rosimeri
rosimeri de
de oliveira
oliveira dias;
dias; heliana
heliana de
de barros
barros conde
conde rodrigues
rodrigues

possível suportar o durante, para ampliar a possibilidade de deslocamentos? Supomos que


sentindo e escutando mais intensamente; e, ainda, olhando e vendo com mais acuidade,
degustando e tocando com mais atenção. Pois o corpo desassossegado no meio tenso e
aberto das novas experiências registra mais sensações do que habitualmente fazia.
Nas viagens formativas entre universidade e escola básica, é necessário ampliar o
grau de suportabilidade para o que tensiona e estranha o que é posto como lei e modelo
universalizante do que é ser um “bom professor”. Pois, sob essa lei, ainda que pensemos a
relação ético-política como diádica – entre-professor-e-estudante –, ficamos presos na
esfera da normatividade. O poder pedagógico polariza, objetiva e simplifica a relação de
docência, ao concebê-la como previamente vinculada ao quadro normativo de um
programa, de um currículo e daquilo que é esperado que o professor preserve. Nesse caso, a
viagem-formação acontece, mas o deslocamento mantém o crivo do mesmo, e não deriva.
Nossa viagem formativa se posiciona contrariamente ao tipo de deslocamento que
mantém o mesmo e retorna ao ponto de partida sem diferir. Pois nossa viagem toma para
si uma feição de desbaste, uma desaprendizagem, para poder afirmar o desejo de nos
deixarmos impregnar pelo local, pela paisagem e pelo que emerge do encontro singular
com o outro. Com efeito, “a viagem convoca o desejo e o prazer da alteridade, não da
diferença facilmente assimilável, mas da verdadeira resistência” (ONFRAY, 2009, p. 63).
A resistência como criação de modos outros exige, assim, o abandono das opiniões
sobre “como ensinar os estudantes para terem êxito”. Ela recusa o olhar missionário, e
convoca à libertação dos apriorismos sobre a forma de viajar, de formar e de dispor de uma
inteligibilidade ativa acerca do caminho. Portanto, tomar a dimensão de alteridade e
resistência de nossa viagem faculta a estetização da existência em circunstâncias locais e
encarnadas. “A viagem pressupõe uma experimentação sobre si própria que remete para os
exercícios espirituais dos filósofos antigos: O que posso saber sobre mim? O que posso
descobrir acerca de mim se mudar de lugar, de orientação e modificar as minhas
referências?” (ONFRAY, 2009, p. 80-81).
Nesse sentido, resistência e alteridade como dimensões forjadas entre-dois nos
deslocamentos da viagem formativa podem nos oferecer um balanço, quando retornamos
com a chave na fechadura de casa ou da sala de aula. Tudo pesa no conjunto da viagem,
mas o que o corpo preserva? Que lição aprendemos? Que lições desaprendemos? Queremos
lições com as viagens? O que aprendemos e desaprendemos sobre nós mesmos? Sobre os
outros? Sobre os locais percorridos? Será possível, desde a chave na fechadura de casa, da
sala de aula, concluir, resumir, condensar a viagem em ideias essenciais? Em momentos
importantes? Em que sentido retornamos enriquecidos por percorrermos paisagens outras,
tão diferentes dos nossos cotidianos locais? E, também, qual a pior recordação? As piores
descobertas? As tristes certezas? (ONFRAY, 2009)
Fazendo reverberar, em especial, os pontos destacados da aula do dia 20 de janeiro
de 1982 de Michel Foucault, passamos tanto pela consequência crítica como pela
consequência terapêutica, impondo-nos, desse modo, uma ascese que envolve uma prática
de si por meio de um cultivo coletivo. Pois, para Foucault, há um preço no cuidado de si,
justamente porque o que constitui uma estética de si envolve um dizer verdadeiro.
Supomos, contudo, que se a viagem ganha uma forma movente, colocamo-nos em contato
com uma descrição da atualidade que deveria ser sempre feita de acordo com uma espécie
de rachadura, de quebra virtual. Tal quebra abre um espaço e tempo de liberdade,
inaugurando uma transformação possível de si que problematiza os limites do código e da
norma de uma época, e coloca a si mesmo em risco nesse limite. Supomos, talvez, que esta
quebra possa ser uma figura do ato da crítica, como nos diz Butler (2015), tensionando a
fixidez de um modo de compreensão ou de técnica.
desaprender,
desaprender, viajar,
viajar, resistir
resistir -- por
por modos
modos outros
outros de
de formar
formar professores
professores -|-| 477
477

Quando a crítica problematiza a fixidez e nos coloca em contato com o que nos
move, ela pode, talvez, acontecimentalizar modos de viver e de formar. Eles se fazem então
outros, mais sensíveis às viagens que nos ocorrem no decurso da vida. Por isso, é
necessário manter a chama da resistência e da composição da existência nos caminhos
percorridos. E talvez seja ainda mais importante reafirmar que nossa aposta em modos
outros de formar reconhece a presença de uma estética de si, estética essa que, ao mesmo
tempo, requer que nos arrisquemos em momentos de desaprendizagem. Em especial, no
próprio ato de ensino na escola básica, quando o que nos formou diverge do que está diante
de nós; quando nossa disposição para nos desfazermos diante dos estudantes, das práticas
habituais e dos professores constitui nossa possibilidade de “tornarmo-nos o que nunca
fomos”.
Entre aprender e desaprender, cada traçado de vida e de formação deve ser feito
como se fosse o último. Se tentarmos fazer uma formação pelo que se forja em um espaço-
tempo experiencial de lutas e de liberdade, a partir deste modo outro talvez seja também
possível forjar viagens outras!
Ao
Ao fim
fim de
de longo
longo tempo
tempo revisitei
revisitei aa tua
tua querida
querida cidade
cidade dede Pompeios.
Pompeios. Voltei
Voltei aa
contemplar
contemplar aa minha
minha adolescência;
adolescência; tudo
tudo quanto
quanto por
por lálá fizera
fizera em
em jovem
jovem parecia-me
parecia-me
poder
poder ainda
ainda fazê-lo,
fazê-lo, parecia-me
parecia-me tê-lo
tê-lo feito
feito há
há um
um instante.
instante. Ah!
Ah! Lucílio
Lucílio amigo,
amigo,
temos
temos vindo
vindo aa navegar
navegar ao
ao longo
longo da
da vida.
vida. [...]
[...] Nada
Nada melhor
melhor concebeu
concebeu aa lei
lei eterna
eterna
do
do que,
que, embora
embora apenas
apenas nos
nos dando
dando uma uma porta
porta de de entrada
entrada nana vida,
vida, ter-nos
ter-nos
proporcionado
proporcionado múltiplas
múltiplas saídas
saídas (SÊNECA,
(SÊNECA, 2014, 2014, p.
p. 263-267).
263-267).

referências
BUTLER,
BUTLER, Judith.
Judith. Relatar
Relatar aa si
si mesmo:
mesmo: crítica
crítica da
da violência
violência ética.
ética. Belo
Belo Horizonte:
Horizonte: Autêntica,
Autêntica, 2015.
2015.
BLANCHOT,
BLANCHOT, M. M. Michel
Michel Foucault
Foucault tal tal como
como eu eu oo imagino.
imagino. In: In: Blanchot,
Blanchot, M. M. Uma
Uma vida
vida vinda
vinda de
de
outro
outro lugar.
lugar. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Rocco,
Rocco, 2011a.
2011a.
CASTELO
CASTELO BRANCO, BRANCO, Guilherme.
Guilherme. Agonística
Agonística ee palavra.
palavra. Revista
Revista dede Filosofia
Filosofia Aurora.
Aurora. Dossiê
Dossiê
Parrhesia,
Parrhesia, v.
v. 23,
23, n.
n. 32,
32, p.145-155,
p.145-155, jan./jun.
jan./jun. 2011.
2011. Disponível
Disponível em:
em:
file:///C:/Users/Rosi/Downloads/rf-4756%20(3).pdf
file:///C:/Users/Rosi/Downloads/rf-4756%20(3).pdf .. Consultado Consultado em: em: 01/09/2015.
01/09/2015.
DIAS,
DIAS, Rosimeri
Rosimeri O. O. Outras
Outras pedagogias
pedagogias no no encontro
encontro entre
entre escola
escola básica
básica ee universidade.
universidade. In: In:
GONÇALVES,
GONÇALVES, Márcia Márcia et et ali
ali (org.).
(org.). Saberes
Saberes escolares
escolares ee formação
formação docente
docente na
na educação
educação básica:
básica:
diálogos
diálogos entre
entre aa universidade
universidade ee aa escola.
escola. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: EdUERJ,
EdUERJ, 2015,
2015, p.
p. 43-64.
43-64.
______.Entre
______.Entre analisar
analisar ee intervir
intervir na na formação
formação de de professores.
professores. Rio
Rio de de Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina, 2014a. 2014a.
Disponível
Disponível em:
em: http://www.livrariacultura.com.br/p/entre-analisar-e-intervir-na-
http://www.livrariacultura.com.br/p/entre-analisar-e-intervir-na-
formacao-de-86586805
formacao-de-86586805
______.
______. Vida
Vida ee resistência:
resistência: Formar
Formar professores
professores pode pode ser
ser produção
produção de de subjetividade?
subjetividade? Psicologia
Psicologia em em
Estudo.
Estudo. Maringá,
Maringá, v. v. 19, 19, n. n. 3, 3, p. p. 415-426,
415-426, jul./set.
jul./set. 2014b.
2014b. Disponível
Disponível em: em:
http://www.scielo.br/pdf/pe/v19n3/a07v19n3.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pe/v19n3/a07v19n3.pdf .. Acesso Acesso 30
30 jul
jul 2015.
2015.
______.
______. Formação
Formação inventiva
inventiva de de professores.
professores. Rio Rio dede Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina, 2012.
2012.
______.
______. Deslocamentos
Deslocamentos na na formação
formação de de professores:
professores: aprendizagem
aprendizagem de de adultos,
adultos, experiência
experiência ee políticas
políticas de
de
cognição.
cognição. Rio
Rio dede Janeiro:
Janeiro: Lamparina,
Lamparina, 2011.2011.
DIAS,
DIAS, Rosimeri.
Rosimeri. O; O; PELUSO,
PELUSO, MarilenaMarilena R.; R.; UCHÔA,
UCHÔA, Márcia Márcia H. H. Conversas
Conversas entre
entre micropolítica
micropolítica ee
formação
formação inventiva
inventiva de de professores.
professores. Mnemosine.
Mnemosine. Rio Rio de
de Janeiro:
Janeiro: UERJ,
UERJ, v. v. 9,
9, n.
n. 1,1, p.224-227,
p.224-227,
2013.
2013. Disponível
Disponível em:
em:
http://www.mnemosine.com.br/ojs/index.php/mnemosine/article/view/283 Consultado
http://www.mnemosine.com.br/ojs/index.php/mnemosine/article/view/283 Consultado
em: 30/07/2015.
em: 30/07/2015.
FOUCAULT, Michel.
FOUCAULT, Michel. A A Hermenêutica
Hermenêutica do do sujeito.
sujeito. São
São Paulo:
Paulo: Martins
Martins Fontes,
Fontes, 2004.
2004.
______. Vigiar
______. Vigiar ee punir:
punir: nascimento
nascimento da da prisão.
prisão. 25ª
25ª ed.
ed. Petrópolis:
Petrópolis: Vozes,
Vozes, 2002.
2002.
______. História
______. História dada sexualidade
sexualidade 2: 2: oo uso
uso dos
dos prazeres.
prazeres. Rio
Rio de
de Janeiro:
Janeiro: Graal,
Graal, 1994.
1994.
______. O
______. O que
que éé aa crítica?
crítica? In:
In: BIROLI,
BIROLI, Flávia;Flávia; ALVAREZ,
ALVAREZ, Marcos Marcos C.(orgs.)
C.(orgs.) Michel
Michel Foucault:
Foucault:
histórias ee destinos
histórias destinos de de um um pensamento.
pensamento. Marília:
Marília: UNESP,
UNESP, 2000,2000, Cadernos
Cadernos F.F.C.,
F.F.C., v.9,
v.9, n.1,
n.1,
p.169-189.
p.169-189.
478| rosimeri de oliveira dias; heliana de barros conde rodrigues

______. Sobre a genealogia da ética. In: ESCOBAR, Carlos H. Dossier Michel Foucault: últimas
entrevistas. Rio de Janeiro: Taurus, 1984.
HADOT, Pierre. Exercícios espirituais e filosofia antiga. São Paulo: É Realizações, 2014.
ONFRAY, Michel. Teoria da viagem: uma poética da geografia. Lisboa: Quetzal, 2009.
PAZ, Octavio. Signos em rotação. São Paulo: Perspectiva, 2015.
SÊNECA, Lucio A. Cartas a Lucílio. Portugal, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2014.

Você também pode gostar