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aprofundado e ampliado de si mesma, para que possa ter autodomínio não atribuindo
a outros, responsabilidades que são suas. O referencial do ser humano humanizado é
Deus, pois Ele o criou à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1,26-27).
A segunda diz respeito às relações que a pessoa estabelece com as demais, nas
dimensões de reciprocidade e/ou de mútua pertença. Isto significa acolher,
compreender, considerar e responder de modo que haja um crescimento na
corresponsabilidade em vista do bem comum de ambas. Preparar a fala como oferta
livre e acolher a resposta com apreço, sem julgamento. Cada pessoa traz consigo uma
história, seja ela bem ou mal interpretada e/ou elaborada, mas é sua história, que
precisa ser acolhida e/ou oferecida, considerada e abordada. O Autor de Colossenses
(Cl 3,12-17) nos dá a excelência da medida dessa relação.
A terceira tem a ver com Deus, com o criador, com o ser originante. É nossa
ligação com a fonte. Jesus explicita isso na conversa com a Samaritana (cf. Jo 4,13-14).
Tornamo-nos humanizadores quando a água cristalina da fonte, flui em nós e através
de nós, em todas as nossas relações. São Francisco via Deus em todas as coisas. “Usava
o mundo como campo de batalha contra os príncipes das trevas, mas o usava, com
relação à Deus como exemplo limpidíssimo de sua bondade. Em qualquer obra de arte
ele exalta o Artífice e atribui ao Criador tudo o que descobre nas coisas criadas. Exulta
em todas as obras das mãos do Senhor e intui, através dos espetáculos de
encantamento, a razão e a causa que tudo vivifica” (2 Cel 165,2-5). Contemplemos
também o belíssimo Cântico do Irmão Sol, profunda obra de espiritualidade universal.
“Altíssimo, onipotente, bom Senhor, teus são o louvor, a glória e a honra e toda
bênçãos... (FF p.104-105).
Mas vejamos a relações em Betânia. São três as narrativas sobre a Betânia
próxima a Jerusalém; a) aquela que somente Lucas nos apresenta em 10,38-52 se
estabelece entre três pessoas: Jesus, Marta e Maria. Nesta a iniciativa é de Jesus. Ele
vaia à casa delas em busca de acolhida e oferece a elas a salvação. O modo de se
relacionar de cada uma é único, explicita a beleza da contribuição de cada ser. Marta e
Maria acolhem Jesus de forma bem diversificada e recebem também a Palavra
salvadora de Jesus de forma diversificada, isto é, personalizada, na medida da
necessidade especifica. A certeza de Marta não é tão certa e a fragilidade de Maria não
é tão frágil, mas o problema não está aí. Está na contraposição. As noções de tempo e
prioridade em Marta e Maria são bem diferentes. A palavra de Jesus lança vigorosa luz
sobre nós;
b) aquela que somente João apresenta em 11,1-44, rica de personagens e de
relações. Nesta Jesus é chamado por Marta e Maria, as irmãs de Lázaro; “Senhor.
Aquele que amas está doente” (Jo 11,3). Quando Jesus decide responder ao chamado
convida os discípulos para o acompanhar. Eles questionam o risco de vida ao qual
Jesus irá se expor, mas a missão de animar ou reanimar o amigo é imensamente mais
nobre que a própria preservação dos perigos (Jo 11,8-10). Jesus dá a própria vida aos
membros de sua comunidade, que depositam sua fé nele. Marta sai ao encontro de
Jesus, que segundo ela, chega atrasado (Jo 11,20-21). Aí temos o solene anuncio
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escatológico “Jesus disse a Marta: Eu sou a ressurreição. Quem crê em mim, ainda que
morra, viverá. E quem vive e crê em mim, jamais morrerá. Crês nisso? ” (Jo 11,25-26).
Para Marta Jesus se apresenta como ressurreição.
Nesta narrativa são muitos os personagens: Jesus, os discípulos, os judeus,
Marta, Maria e Lazaro. Os discípulos estão acompanhando Jesus. Os judeus estão
assistindo as mulheres, especialmente Maria que parece a mais vulnerável. Marta é
mais autônoma, ela procura evitar que Jesus seja visto ou encontrado pelos “judeus”
(cf. Jo 11,19-20.28-30). Maria, para a qual Marta revela o segredo no ouvido, acaba
entregando Jesus, atrás dela “os judeus” descobrem a presença de Jesus na vila (cf. Jo
11,31). Em resposta a Maria e os judeus, Jesus ressuscita Lázaro. Jesus fica conturbado
interiormente, em dois momentos: a) ao ver o lamento de Maria e os acompanhantes
(Jo 11,33) sentido profundo de compaixão que o leva ao choro (Jo 11,35); b) ao ver a
murmuração dos céticos (Jo 11,37-38), sentido de profunda irritação que o leva a
ressuscitar Lázaro (Jo 11,39-40). Jesus tira Lazaro do túmulo, tira da morte e tira das
ataduras. Libertação total. Mas o feito de Jesus custou caro. Veja Jo 11,45-54. Temos aí
a melhor catequese sobre a Ressurreição. A ação da comunidade. A ação de Jesus. As
diferentes reações dos membros da comunidade: de Marta, de Maria, dos judeus.
Nosso zelo aplicado ao corpo histórico precisa ser transcendental. Corpo amado,
corpo doente, corpo em decomposição, corpo revivificado.
c) A Betânia da ceia. Jesus foi a convite dos moradores (Jo 12,2). Mateus e
Marcos simplesmente dizem que Jesus se encontrava lá (Mt 26,6; Mc 14,3). Temos aí
Jesus com os discí só p pulos. Marta, Maria e Lázaro. João, porém, acrescenta uma
multidão de judeus (Jo 12,9). O foco está no protagonismo de Maria. Sua relação com
Jesus é especial, inconfundível. Gera muito desconforto, mas testemunha a maravilha
do ser de Deus. Não edir a Deus, mas oferecer e oferecermo-nos, dar-nos à Ele.
Espaço escatológico: A escatologia tem a ver com as últimas coisas, com a
transição, isto é, com o fim do tempo histórico e entrada na eternidade. No encontro
de Jesus na casa de Marta e Maria, segundo Lucas 10,38-42 a escatologia está
estampada nesta palavra de Jesus: “Marta, Marta, tu te inquietas e te agitas por
muitas coisas; no entanto, pouca coisa é necessária, até mesmo uma só. Maria, com
efeito, escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada” (10,41-42). Isto é, Maria
escolheu a que permanece com ela sempre. Por ocasião da ressurreição de Lázaro,
Jesus diz a Marta: “Eu sou a ressurreição. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá.
E quem vive e crê em mim, jamais morrerá. Crês nisso? ” (Jo 11, 25-26). A Maria Ele
diz: “Onde o colocastes? ” (Jo 11,34). Torna a dizer a Marta: “Não te disse que se
creres, verás a glória de Deus? ” (Jo 11,40). Na narrativa da ceia em Betânia, segundo
João, aos incomodados com a atitude de Maria Jesus diz: “Deixai-a; ela está fazendo
isso em vista do meu sepultamento! Pobres sempre tereis convosco, mas a mim nem
sempre tereis” (Jo 12,7-8). Segundo Marcos e Mateus, Jesus diz: “Deixai-a. Porque a
aborreceis? Ela praticou uma boa ação para comigo.... Ela fez o que podia: antecipou-
se a ungir meu corpo para a sepultura” (Mc 14,6.8; Mt 26,10.12).