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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

ALTERNATIVAS DE
EDUCAÇÃO NO CAMPO

FACULDADE CAPIXABA DA SERRA/EAD


Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
SUMÁRIO 1
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

GRUPO A Faculdade Multivix está presente de norte a sul


do Estado do Espírito Santo, com unidades em
MULTIVIX Cachoeiro de Itapemirim, Cariacica, Castelo, Nova
Venécia, São Mateus, Serra, Vila Velha e Vitória.
Desde 1999 atua no mercado capixaba, des-
tacando-se pela oferta de cursos de gradua-
ção, técnico, pós-graduação e extensão, com
qualidade nas quatro áreas do conhecimen-
to: Agrárias, Exatas, Humanas e Saúde, sem-
pre primando pela qualidade de seu ensino
e pela formação de profissionais com cons-
ciência cidadã para o mercado de trabalho.

Atualmente, a Multivix está entre o seleto


grupo de Instituições de Ensino Superior que
possuem conceito de excelência junto ao
Ministério da Educação (MEC). Das 2109 institui-
ções avaliadas no Brasil, apenas 15% conquistaram
notas 4 e 5, que são consideradas conceitos
de excelência em ensino.

Estes resultados acadêmicos colocam


todas as unidades da Multivix entre as
melhores do Estado do Espírito Santo e
entre as 50 melhores do país.

MISSÃO

Formar profissionais com consciência cida-


dã para o mercado de trabalho, com ele-
vado padrão de qualidade, sempre mantendo a
credibilidade, segurança e modernidade, visando
à satisfação dos clientes e colaboradores.

VISÃO

Ser uma Instituição de Ensino Superior reconheci-


da nacionalmente como referência em qualidade
educacional.

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2 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

EDITORIAL

FACULDADE CAPIXABA DA SERRA • MULTIVIX

Diretor Executivo Revisão de Língua Portuguesa


Tadeu Antônio de Oliveira Penina Leandro Siqueira Lima

Diretora Acadêmica Revisão Técnica


Eliene Maria Gava Ferrão Penina Alexandra Oliveira
Alessandro Ventorin
Diretor Administrativo Financeiro Graziela Vieira Carneiro
Fernando Bom Costalonga
Design Editorial e Controle de Produção de Conteúdo
Diretor Geral Carina Sabadim Veloso
Helber Barcellos da Costa Maico Pagani Roncatto
Ednilson José Roncatto
Diretor da Educação a Distância Aline Ximenes Fragoso
Flávio Janones Genivaldo Félix Soares

Coordenadora Acadêmica da EaD Multivix Educação a Distância


Carina Sabadim Veloso Gestão Acadêmica - Coord. Didático Pedagógico
Gestão Acadêmica - Coord. Didático Semipresencial
Conselho Editorial Gestão de Materiais Pedagógicos e Metodologia
Eliene Maria Gava Ferrão Penina (presidente Direção EaD
do Conselho Editorial) Coordenação Acadêmica EaD
Kessya Penitente Fabiano Costalonga
Carina Sabadim Veloso
Patrícia de Oliveira Penina
Roberta Caldas Simões

BIBLIOTECA MULTIVIX (Dados de publicação na fonte)

Leão, Fábio Luiz da Silva De Sousa.


Alternativas de Educação no Campo / Fábio Luiz da Silva De Sousa Leão. – Serra: Multivix, 2019.

Catalogação: Biblioteca Central Anisio Teixeira – Multivix Serra


2019 • Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei.

As imagens e ilustrações utilizadas nesta apostila foram obtidas no site: http://br.freepik.com

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SUMÁRIO 3
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APRESENTAÇÃO Aluno (a) Multivix,

DA DIREÇÃO Estamos muito felizes por você agora fazer parte


do maior grupo educacional de Ensino Superior do

EXECUTIVA Espírito Santo e principalmente por ter escolhido a


Multivix para fazer parte da sua trajetória profissional.

A Faculdade Multivix possui unidades em Cachoei-


ro de Itapemirim, Cariacica, Castelo, Nova Venécia,
São Mateus, Serra, Vila Velha e Vitória. Desde 1999,
no mercado capixaba, destaca-se pela oferta de
cursos de graduação, pós-graduação e extensão
de qualidade nas quatro áreas do conhecimento:
Agrárias, Exatas, Humanas e Saúde, tanto na mo-
dalidade presencial quanto a distância.

Além da qualidade de ensino já comprova-


da pelo MEC, que coloca todas as unidades do
Grupo Multivix como parte do seleto grupo das
Instituições de Ensino Superior de excelência no
Brasil, contando com sete unidades do Grupo en-
tre as 100 melhores do País, a Multivix preocupa-
-se bastante com o contexto da realidade local e
com o desenvolvimento do país. E para isso, pro-
cura fazer a sua parte, investindo em projetos so-
ciais, ambientais e na promoção de oportunida-
des para os que sonham em fazer uma faculdade
de qualidade mas que precisam superar alguns
obstáculos.
Prof. Tadeu Antônio de Oliveira Penina
Diretor Executivo do Grupo Multivix Buscamos a cada dia cumprir nossa missão que é:
“Formar profissionais com consciência cidadã para o
mercado de trabalho, com elevado padrão de quali-
dade, sempre mantendo a credibilidade, segurança
e modernidade, visando à satisfação dos clientes e
colaboradores.”

Entendemos que a educação de qualidade sempre


foi a melhor resposta para um país crescer. Para a
Multivix, educar é mais que ensinar. É transformar o
mundo à sua volta.

Seja bem-vindo!

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LISTA DE FIGURAS

>>FIGURA 1 - O conceito de Educação do Campo e


Educação no Campo 15
>>FIGURA 2 - Saída do campo para a cidade 32
>>FIGURA 3 - Sustentabilidade 38
>>FIGURA 4 - Pedagogia do Campo 48
>>FIGURA 5 - Organização do currículo 51
>>FIGURA 6 - Gestão Democrática 56
>>FIGURA 7 - Escola como instituição transformadora da sociedade 66
>>FIGURA 8 - Trabalho e cuidado dos filhos 71
>>FIGURA 9 - Relação família e escola 76
>>FIGURA 10 - Tripé da economia 82
>>FIGURA 11 - Brasil e o capital inglês 85
>>FIGURA 12 - Conceito de política 105
>>FIGURA 13 - Definindo políticas públicas 110
>>FIGURA 14 - Educação do campo e aspectos legais 115

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SUMÁRIO

1 FUNDAMENTOS E CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 14


UNIDADE 1 1.1 FUNDAMENTOS E CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 14
1.1.1 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO 15
1.2 DA EDUCAÇÃO RURAL À EDUCAÇÃO DO CAMPO 18
1.3 LUTAS E CONQUISTAS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO 21

BIBLIOGRAFIA COMENTADA 27

CONCLUSÃO 28

UNIDADE 2 2 OS POVOS DO CAMPO 30

INTRODUÇÃO DA UNIDADE 30
2.1 OS POVOS DO CAMPO 31
2.1.1 DIVERSIDADE DO CAMPO 31
2.1.2 AGRICULTURA FAMILIAR E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 33
2.1.2.1 A AGRICULTURA FAMILIAR 35
2.1.2.2 BRASIL: UMA POTÊNCIA AGRÍCOLA 36
2.1.2.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MEIO AMBIENTE 37
2.1.3 A CULTURA CAMPONESA 41

CONCLUSÃO 44

UNIDADE 3 3 EDUCAÇÃO DO CAMPO 46

INTRODUÇÃO 46
3.1 EDUCAÇÃO DO CAMPO 47
3.1.1 PEDAGOGIA DO CAMPO 47

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SUMÁRIO

3.1.1.1 REFLETINDO SOBRE UMA PROPOSTA DE PEDAGOGIA DO CAMPO 49


3.1.2 EDUCAÇÃO DO CAMPO E CURRÍCULO 50
3.1.2.1 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR DAS ESCOLAS DO CAMPO 53
3.1.3 GESTÃO DEMOCRÁTICA 55
3.1.3.1 A ESCOLA E A GESTÃO DEMOCRÁTICA 57

CONCLUSÃO 60

UNIDADE 4 4 PEDAGOGIA DO CAMPO 62

INTRODUÇÃO 62
4.1 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS 63
4.2 MATERIAIS DIDÁTICOS 67
4.3 PEDAGOGIA SOCIALISTA 69
4.4 O PAPEL DO EDUCADOR DO CAMPO 74

CONCLUSÃO 77

UNIDADE 5 5 CAMPO BRASILEIRO: HISTÓRICO E OCUPAÇÃO 80

INTRODUÇÃO 80
5.1 CAMPO BRASILEIRO: HISTÓRICO E OCUPAÇÃO DA TERRA 81
5.2 INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E A QUESTÃO FUNDIÁRIA 84
5.3 A QUESTÃO DA TERRA NO SÉCULO XX: REPÚBLICA, CAFÉ
E RESISTÊNCIA 87
5.3.1 AS LIGAS CAMPONESAS 89
5.4 MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST) 91

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SUMÁRIO

5.5 CARACTERÍSTICAS E ORGANIZAÇÃO DAS ESCOLAS DO CAMPO:


PROTAGONISMO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO 94
5.5.1 ESCOLAS MULTISSERIADAS E ESCOLAS ITINERANTES 95

BIBLIOGRAFIA COMENTADA 99

CONCLUSÃO 100

UNIDADE 6 6 EDUCAÇÃO DO CAMPO E POLÍTICAS PÚBLICAS 102

INTRODUÇÃO 102
6.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO: REFLETINDO SOBRE
A NOÇÃO DE POLÍTICA E DE PÚBLICO 103
6.1.1 A NOÇÃO DE PÚBLICO 106
6.2 ORIGEM E CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 107
6.3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS 112
6.3.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E MOVIMENTOS SOCIAIS 113
6.4 BASES LEGAIS E MARCOS NORMATIVOS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO 115
6.4.1 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL (1996) 116
6.4.2 DIRETRIZES OPERACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA
NAS ESCOLAS DO CAMPO 117

CONCLUSÃO 119

REFERÊNCIAS 120

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ICONOGRAFIA

ATENÇÃO ATIVIDADES DE
APRENDIZAGEM
PARA SABER

SAIBA MAIS
ONDE PESQUISAR CURIOSIDADES
LEITURA COMPLEMENTAR
DICAS

GLOSSÁRIO QUESTÕES

MÍDIAS
ÁUDIOS
INTEGRADAS

ANOTAÇÕES CITAÇÕES

EXEMPLOS DOWNLOADS

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SUMÁRIO 9
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BIODATA DO AUTOR
Fábio Luiz da Silva de Sousa Leão

Graduado em História e Mestre em Educação. Atua como professor da educação


básica e superior.

JUSTIFICATIVA
O estudo desta disciplina possibilitará que você repense a trajetória da educação no
Brasil, tendo como referência a importância de se respeitar as diferenças culturais,
sociais e econômicas dos variados grupos que forma o país. Estudar as mais variadas
pedagogias relativas à Educação do Campo possibilita refletir sobre a necessidade de
pedagogias que sejam construídas a partir das realidades e experiências sociais dos
próprios educandos.

Outro ponto importante debatido nesta disciplina está relacionado ao tema do


desenvolvimento e da sustentabilidade. Dessa forma, busca-se explicitar as tensões
entre os grupos que defendem a agricultura familiar, como modelo agrário para o
país, e aqueles que acreditam em um modelo agrário baseado nas grandes lavouras
e exportações. Também será apresentada a diversidade dos povos campesinos e as
múltiplas formas de educação que são e podem ser aplicadas nas escolas do campo.
Além disso, enfatiza-se a ideia da diversidade de escolas do campo e seus desafios.

Você poderá analisar as discussões referentes à produção de material didático espe-


cífico para os povos campesinos e a necessidade de um currículo que contemple
toda essa diversidade de povos. Também será debatida a necessidade de políticas
públicas voltadas para a educação dos povos do campo e para a garantia do direito
à educação.

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10 SUMÁRIO
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ENGAJAMENTO
Antes de iniciar a disciplina, reflita e, se preferir, tome nota das suas ideias:

Uma educação voltada para os povos do campo é uma ferramenta importante para a
construção da cidadania, uma vez que permite que os indivíduos que vivem nas áreas
rurais possam usufruir de uma educação embasada na realidade que o circunda.

• Você já ouviu falar em Educação do Campo?

• O que você sabe sobre este tema?

• Você sabia que, no Brasil, os povos do campo têm direito a um currículo esco-
lar diferenciado?

Nesta disciplina, serão tratados todos esses temas, a partir da reflexão da trajetória
histórica da educação nas áreas do campo brasileiro.

APRESENTAÇÃO DA
DISCIPLINA
Caro aluno, seja bem-vindo! Nesta disciplina, serão esclarecidos os fundamentos e
concepções relacionados à Educação do Campo. Sendo assim, serão buscados subsí-
dios para essa reflexão nos próprios princípios desta educação. Além disso, será exami-
nada a diversidade apresentada pelos povos campesinos, desconstruindo a visão de
homogeneidade cultural, social e econômica desses povos.

É importante compreender o campo a partir de todo seu dinamismo e diversidade.


Isso significa que é necessária uma visão crítica sobre a diversidade que compõe o
campo, seja ela social, política, cultural e econômica.

Sua atuação é muito importante para colher bons frutos ao final dos estudos. Faça
as atividades propostas, participe dos fóruns de discussão e debata os assuntos com
seus colegas de curso.

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Leia os materiais complementares e também pesquise a respeito. Tudo isso lhe dará
informações para que você possa aprofundar seus conhecimentos a respeito das
populações do campo.

OBJETIVOS DA DISCIPLINA
Ao final desta disciplina, esperamos que você seja capaz de:

• Esclarecer os fundamentos e concepções da Educação do Campo.

• Explicar o conceito de Educação do Campo.

• Explicar aos princípios da Educação do Campo.

• Examinar a diversidade dos povos do Campo.

• Discutir a agricultura familiar e o desenvolvimento sustentável na escola do


Campo.

• Debater a educação do Campo

• Descrever o currículo da Educação do Campo.

• Descrever os princípios da gestão democrática na Educação do Campo.

• Analisar a influência da pedagogia socialista na Educação do Campo.

• Examinar as práticas pedagógicas aplicadas à Educação do Campo.

• Analisar os materiais didáticos produzidos para o Campo.

• Discutir as disputas que envolvem o Campo.

• Identificar os movimentos sociais do Campo.

• Debater as políticas públicas da Educação do Campo

• Analisar a legislação destinada á Educação do Campo.

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12 SUMÁRIO
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UNIDADE 1

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Esclarecer os
fundamentos e
concepções da
Educação do Campo.

> Discutir a agricultura


familiar e o
desenvolvimento
sustentável na escola
do Campo.

> Debater a educação do


Campo

> Debater as políticas


públicas da Educação
do Campo

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SUMÁRIO 13
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1 FUNDAMENTOS E
CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO
DO CAMPO
Nesta unidade, serão tratados sobre os fundamentos e concepções acerca da Educa-
ção do Campo. A Educação do Campo é uma reivindicação histórica dos povos do
campo. A luta e organização dos povos campesinos, por uma educação que atenda
aos anseios dos povos do campo e que dialoguem com a realidade campesina, estão
presentes nos debates políticos do final do século XIX e ganha força nas primeiras
décadas do século XX.

Se por um lado tínhamos junto à industrialização do Brasil o alvorecer da ideia de


que o progresso e a modernidade estavam no estilo de vida urbana, por outro lado
os movimentos sociais do campo apontavam a necessidade de que a educação nas
áreas rurais fosse pautada em pedagogias diferenciadas e que não fosse uma mera
cópia do currículo das escolas das áreas urbanas. Para os movimentos sociais do
campo, somente através de uma formação escolar específica os povos campesinos
seriam contemplados pelo direito a uma educação crítica e emancipadora.

1.1 FUNDAMENTOS E CONCEPÇÕES DA


EDUCAÇÃO DO CAMPO

A Educação do Campo é fruto de um longo processo histórico de lutas e conquistas


camponesas. O processo de redemocratização do Brasil fomentou o debate em torno
da escola como um direito de todas as pessoas, sejam quilombolas, indígenas, ribei-
rinhos, camponeses, entre outros. Assim, os povos do campo passaram a se organi-
zar para reivindicar uma escola que fosse produzida de acordo com os princípios do
campo e para o campo.

Nesse sentido, a Educação do Campo perpassa pelo protagonismo camponês, pois


entende-se que se trata de um modelo educativo específico que deve ser construí-
do pelos próprios sujeitos, que a partir de suas experiências e especificidades têm
condições de construir uma escola que dialogue com a realidade dos sujeitos que a
frequenta.

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1.1.1 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO

A Educação do Campo, como já citada, é fruto da iniciativa dos próprios morado-


res do campo, permitindo que a escola dialogue com a diversidade das realidades
camponesas que existem em nosso país.

Desse modo, o conceito de Educação do Campo tem o intuito de destacar que se


trata de uma modalidade educativa a ser desenvolvida pelos próprios sujeitos do
campo, pois quando era utilizado o conceito de educação no campo tinha-se uma
falsa concepção de que a mesma educação, era reproduzida nas cidades, poderia ser
levada ao campo sem a necessidade de nenhuma mudança.

A Educação do Campo, ao enfatizar o “do” em detrimento do “no”, chama atenção


para o protagonismo dos sujeitos do campo, compreendendo e reconhecendo-os
como sujeitos da própria história. Não há como reproduzir o mesmo modelo educa-
tivo das escolas da cidade nas escolas do campo, pois se trata de sujeitos com reali-
dades distintas.

FIGURA 1 - O CONCEITO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO E EDUCAÇÃO NO CAMPO

EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO
DO CAMPO NO CAMPO

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Durante muitos anos, uma velha concepção tomou conta da mentalidade de parte
da população e até dos discursos dos políticos brasileiros. Afirmava-se que os povos
do campo, ao terem suas atividades relacionadas ao trabalho braçal, não necessita-
riam da formação escolar.

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SUMÁRIO 15
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Trata-se de uma concepção não apenas preconceituosa, mas também de comple-


to desconhecimento e desvalorização do papel da escola para todos os sujeitos. É
importante reconhecer que teoria e prática são indissociáveis. Os povos do campo
poderiam, no passado, não ter acesso ao estudo, mas sabiamente colocavam em
prática, de forma genial, diferentes teorias científicas.

Essa concepção errônea, de que prática e teoria são coisas distintas, reforçava o mito
que de que os povos do campo não necessitavam de escola. Os governos, para justifi-
car a ausência ou baixos investimentos nas escolas do campo, repetiam essa máxima
como verdade.

A garantia de uma escola de direito do campo só foi possível a partir da organiza-


ção de diferentes movimentos camponeses, com destaque para o movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, que tem a Educação do Campo como um dos
princípios de suas lutas, a partir de um processo educativo voltado para o desenvolvi-
mento sustentável e agroecológico.

A partir da mobilização dos camponeses foi possível reivindicar uma escola do campo
e garantir os recursos necessários para essas escolas, efetivando, dessa maneira, o
direito a educação de qualidade, garantidos em documentos como a Constituição
Federal que define a educação como um direito de todos os cidadãos, conforme
aponta o Art. 5º:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida
e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o traba-
lho (BRASIL, 1988).

Diante da garantia desse direito, seria um crime privar o campo de uma educação de
qualidade, construída a partir da concepção de seus próprios sujeitos, que conhecem
e (re)conhecem a realidade que vivem e, por isso, tem plenas condições legais, éticas
e educacionais para empreender uma educação construída no campo para o campo.

Além da garantia desse direito pela Constituição Federal, podemos citar ainda a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, que define a Educação do Campo
como uma modalidade educacional, reforçando e legitimando o direito dos povos
do campo de construírem uma pedagogia própria que dialogue com suas especifi-
cidades.

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A LDB define, em seu art. 28, que para “oferta de educação básica para a população
rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação
às peculiaridades da vida rural e de cada região” (BRASIL, 1996, art. 28). Assim, regu-
lamenta as especificidades e a escola do campo como um direito. O art. 28 destaca
em seu caput que:

I. conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e


interesses dos alunos da zona rural;

II. organização de escola própria, incluindo adequação do calendário escolar às


fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III. adequação à natureza do trabalho na zona rural (BRASIL, 1996).

Podemos compreender, portanto, que a Educação do Campo, é um direito garanti-


do e deve ser efetivada da perspectiva dos próprios sujeitos do campo sem, contudo,
deixar de atender aos pressupostos teóricos e metodológicos de cada faixa etária.
Na Educação do Campo, os alunos têm aulas e uma escola com qualidade e direitos
iguais a todas as escolas do território nacional.

O que muda na Educação do Campo é a forma de se trabalhar cada temática, os


exemplos cotidianos, as metodologias de trabalho, a forma de organização das séries,
entre outros. Essa especificidade não diminui em nada a escola do campo. Pelo
contrário! Permite que ela possa realizar um processo educativo ainda mais significa-
tivo para a vida.

Durante muitos anos, o campo sofreu com a falta de escolas. Muitas crianças e jovens
foram obrigados a abandonar suas casas e se mudar para outras localidades para conti-
nuarem estudando. Por outro lado, muitas pessoas que não tinham condições de se
manterem em outras cidades acabaram sendo forçadas a abandonar os estudos.

Se você conversar com pessoas adultas que viveram no campo durante sua infância,
certamente irá observar que a maioria delas só estudou até a 4ª série do primeiro
grau (atualmente o 5º ano do ensino fundamental). Isso ocorreu porque não existiam
no campo escolas suficientes para atender a todos aqueles que estavam em idade
para frequentá-las.

Ainda hoje o número de escolas existentes no campo não é suficiente para atendê-
-los, mas é importante registrar que já houve muitos avanços nos últimos tempos e
que agora o número de crianças e jovens na escola já é bem maior.

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SUMÁRIO 17
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

As primeiras escolas do campo foram organizadas e construídas por movimentos


sociais, organizações não governamentais e pastorais da Igreja Católica. A infraestrutu-
ra era muito precária, mas a vontade de lutar e transformar a realidade eram grandes.

Essas primeiras escolas transformaram a vida de várias pessoas, não só daquelas que
aprenderam ali a ler e a escrever, mas também de todos os moradores do campo,
já que essas organizações sociais não pouparam esforços para o crescimento desse
projeto. Assim, mostraram ao Brasil e ao mundo como é importante que todas as
pessoas tenham acesso à educação.

A falta de escolas no campo contribuiu para as desigualdades que existem em nosso


país hoje, pois privou muitas pessoas do saber, tirando delas um direito muito impor-
tante. Entretanto, essa realidade tem se modificado ao longo dos tempos, sobretudo
a partir da criação de programas que têm o objetivo de construir escolas nos campos,
de modo que os educandos possam permanecer em suas cidades natais.

1.2 DA EDUCAÇÃO RURAL À EDUCAÇÃO DO


CAMPO

É importante salientar que a temática da relevância da educação e da escola no meio


rural já se fazia presente nos debates de políticos e educadores brasileiros no final do
século XIX.

Vale lembrar que, no contexto do final do século XIX e início do século XX, o Brasil
vivenciava um processo de urbanização. Ampliava-se, nesse período, o debate sobre
a necessidade de se investir no desenvolvimento econômico e social do meio rural.

É possível identificar três momentos principais acerca dos debates sobre educação
nos meios rurais:

• O primeiro momento está compreendido entre as décadas finais do século


XIX e início do século XX, período em que foi estimulada a criação de institui-
ções de ensino agrário, destinado à formação de grupos específicos, tais como
ex-escravos, negros e pobres. Tinha-se a pretensão de desenvolver a instrução
técnica e profissional agrícola.

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18 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

• A partir da década de 20, o debate sobre educação traz para o cerne da discus-
são a valorização da escola primária situada nos meios rurais. Sob a bandeira
do chamado “ruralismo pedagógico”, tinha-se o objetivo de desenvolver uma
instrução para a permanência do habitante no campo.

• Já o terceiro momento se desenrolou no final da década de 40 e foi marca-


do pelo desenvolvimento de uma proposta pedagógica diferenciada para as
escolas primárias rurais. Buscava-se, por meio dessas ações, aproximar a popu-
lação que vivia no meio rural ao modo de vida urbano, considerado civilizado
e moderno.

De acordo com a pesquisadora Sônia Mendonça (1997), o movimento ruralista do


início do século XX tinha como objetivo a restauração vocacional agrícola do Brasil, a
partir da ideia de diversificação da produção agrícola.

Nesse sentido, a crise e o atraso agrícola brasileiro levaram a debates e possibilitaram


a definição de uma série de propostas de intervenção que passavam pelos temas de
povoamento dos meios rurais, educação, modernização e racionalização da produ-
ção, crédito financeiro e sistema de cooperativas.

O historiador Marcus Vinícius da Fonseca (2002) aponta que, em relação às propostas


de intervenções educativas, desde 1860, os debates relativos à instrução agrícola e a
construção de instituições de formação agrícola para ex-escravos, negros e pobres era
uma realidade.

O investimento na formação técnica e profissional agrícola caminhou além dos


primeiros anos iniciais da República sempre associado à urgente e necessária forma-
ção de mão de obra para o trabalho. Nesse período, houve a ampliação dos chama-
dos patronatos agrícolas, instituições cuja finalidade era a regeneração de jovens
desvalidos e a formação de mão de obra para o trabalho.

Vale frisar que a expansão do ensino agrícola se desenvolveu em escolas de ensi-


no médio e superior. Isso significa que, antes de 1930, as iniciativas e intervenções
concretas relativas à educação rural ocorreram no ensino médio e superior, em detri-
mento da escola primária.

O discurso do movimento ruralista estimulou a desqualificação da Escola Primária,


a favor da instrução elementar agrícola em instituições criadas para esse fim. Nesse
sentido, poucas orientações faziam referência à Escola Primária rural e, quando

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SUMÁRIO 19
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

faziam, geralmente, estavam ligadas à classificação em relação a outros tipos de esco-


las, tais como as distritais, urbanas e grupos escolares.

É possível perceber que o debate sobre a Escola Primária rural começou a ser siste-
matizada na década de 20, pelo viés do “ruralismo pedagógico”. Esse movimento,
formado por uma elite intelectual e política rural e urbana, defendia que a escola
tinha, como dever, a valorização do meio rural, além do dever de possibilitar que os
povos dos meios rurais pudessem gozar das possibilidades econômicas e sociais rela-
tivas ao meio em que vivem, através da construção de uma estrutura educacional e
programas de educação diferenciados.

Na prática, a construção de uma escola diferenciada para o meio rural não se concre-
tizou. O Programa de Ensino Primário, de 1927, apontava que, no ensino das escolas
rurais, deveria ser dada ênfase aos conhecimentos elementares, tais como ler, escre-
ver e contar, tendo em vista que, para cultivar a terra, não seriam necessárias outras
habilidades que não essas.

O descaso do poder público com a educação no meio rural não se restringiu somente
até a década de 40. Apesar das inúmeras mudanças nas estruturas educacionais que
impactaram o meio rural, o cenário de descaso e desigualdades educacionais ainda
hoje é um peso para as populações que vivem no meio rural.

Em meados da década de 70, uma grande produção acadêmico-científica traz para


o debate a situação da educação nos meios rurais. O processo de modernização do
campo trouxe a escola como pauta central nos debates políticos.

Nesse período, os altos índices de analfabetismo chamaram a atenção de diversos


pesquisadores. Foi nesse contexto que surgiram inúmeros estudos e publicações que
mostravam o retrato da escola brasileira no meio rural. Buscava-se entre os estudio-
sos a resposta de como resolver o problema educacional brasileiro nos meios rurais e
quais diretrizes deveriam ser construídas para tal feito.

Outro grande impacto em relação à educação no meio rural foi a promulgação


da Constituição de 1988, que passou a dispor sobre a regularização do vínculo de
trabalho de professores. Muitas prefeituras optaram pelo concurso, fato que afastou
muitos professores residentes no meio rural das escolas. Situação que ocorreu por
não possuírem habilitação para concorrerem a uma vaga ou pelo fato de não conse-
guirem aprovação no concurso que exigiam saberes que não dominavam.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Os concursos impactaram de maneira profunda o perfil dos docentes. Como aponta


Rocha (2001), muitos professores foram afastados de sua função, pois não tiveram
condições de se submeter ao concurso.

Em 1996, a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação provocou mudan-


ças profundas na Educação Rural. Mudanças como a obrigatoriedade na oferta da
Educação Básica e a ampliação da obrigação dos municípios em relação à educação
foram estímulos para o governo do período para elaboração de uma política de desa-
tivação da Escola Rural.

O sucateamento e precariedade da escola no meio rural serviram como justificativas


para acabar com esses estabelecimentos de ensino. Para garantir o direito à educa-
ção de todas as crianças e jovens, o governo passou a investir em políticas de nuclea-
ção. Sendo assim, os alunos dos meios rurais são transportados para as escolas dos
meios urbanos.

De acordo com Calazans (1993) e Souza (2000), desde então as escolas rurais vêm
sofrendo um processo de desmantelamento, sendo que as escolas resistentes perma-
necem sem grandes investimentos, quase que nas mesmas condições vivenciadas no
início do século XX.

1.3 LUTAS E CONQUISTAS NA EDUCAÇÃO DO


CAMPO

Você viu que a Educação do Campo é um direito estabelecido em importantes docu-


mentos como a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
nal – LDB, contudo a efetivação desses direitos não foi fácil e ainda hoje registramos
obstáculos na garantia da Educação do Campo.

Para a efetivação da Educação do Campo, foi necessária uma intensa mobilização.


Movimentos sociais, educacionais, sindicatos e camponeses precisaram se unir e
promover ações de visibilidade dessa luta, a fim de garantir a efetivação do direito já
garantido e de se construir uma modalidade específica para a educação promovida
no campo.

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SUMÁRIO 21
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A história nos revela que as experiências de educação escolar no campo, em diferen-


tes regiões, surgiram a partir da iniciativa de voluntários que se dedicavam a ensi-
nar aqueles que não sabiam ler, escrever ou fazer contas simples. Nesse sentido, as
primeiras escolas do campo foram promovidas por meio da iniciativa de particulares.

Contudo, a legislação nacional ao garantir a educação como um direito de todos é


responsável por garantir a efetivação desse direito. Por isso, através de ações coletivas,
os camponeses iniciaram um processo de luta e reivindicação pelo direito à escola no
campo, seja reformando as que já existiam ou construído nas regiões ausentes desse
direito.

Nesse sentido, a Educação do Campo deve ser compreendida como fruto da orga-
nização de movimentos sociais camponeses. Sem esse enfrentamento as escolas no
campo estariam fadadas ao abandono. Roseli Caldart, estudiosa destacada das esco-
las do campo pontua algumas aspectos importantes que perpassam pela luta da
escola do campo, destacando que:

Sim! Ela nasce da ‘experiência de classe’ de camponeses organizados em


movimentos sociais e envolve diferentes sujeitos, às vezes com diferentes posi-
ções de classe. Sim! A Educação do campo inicia sua atuação desde a radica-
lidade pedagógica destes movimentos sociais e entra no terreno movediço
das políticas públicas, da relação com um Estado comprometido com um
projeto de sociedade que ela combate, se coerente for com sua materialidade
e vínculo de classe de origem. Sim! A Educação do campo tem se centrado
na escola e luta para que a concepção de educação que oriente suas práticas
se descentre da escola, não fique refém de sua lógica constitutiva, exatamen-
te para poder ir bem além dela enquanto projeto educativo. E uma vez mais,
sim! A Educação do campo se coloca em luta pelo acesso dos trabalhadores
ao conhecimento produzido na sociedade e ao mesmo tempo problematiza,
faz a crítica ao modo de conhecimento dominante e à hierarquização episte-
mológica própria desta sociedade que deslegitima os protagonistas originá-
rios da Educação do campo como produtores de conhecimento e que resiste
a construir referências próprias para a solução de problemas de uma outra
lógica de produção e de trabalho que não seja a do trabalho produtivo para o
capital (CALDART, 2009, p. 42).

A partir dos apontamentos da autora, podemos perceber que a Educação do Campo


surge defendendo um contexto social e político específico. A escola no campo não se
limita apenas a garantir os conteúdos escolares dos alunos, ela também age sobre a
ótica política, conscientizando os sujeitos da realidade em que vivem.

Caldart (2009) destaca ainda que, para se conhecer a Educação do Campo e seu
processo histórico, é preciso ter em mente que se trata de uma modalidade que deve
ser percebida a partir dos seguintes princípios:

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22 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

(CALDART, 2009, p. 38).

Para Caldart (2009), a Escola do Campo surge já como uma crítica ao modelo de esco-
la promovido nas cidades, compreendendo que não apenas o campo deva repensar
seu modelo de escola, mas também as cidades, que reproduzem um modelo educa-
tivo de insucesso que não beneficia os trabalhadores.

Na concepção da Educação do Campo, só seria possível a construção de uma educa-


ção realmente libertadora para os trabalhadores se eles próprios fossem os prota-
gonistas dessa ação. Por isso, as Escolas do Campo são pensadas e construídas por
sujeitos do campo para atender aos interesses do campo.

O processo educativo é complexo, por isso não é possível simplesmente transpor


métodos, teorias e concepções pedagógicas. É preciso que cada escola seja capaz
de reconhecer sua realidade e assim construir um modelo próprio e autônomo que
respeite suas particularidades e princípios.

A emancipação humana também é um dos princípios que regem a Educação do


Campo, pois compreende os sujeitos como seres ativos na sociedade. Nesse contexto,
a escola não pode eximir do papel de conscientizar as pessoas da realidade em que
vivem e ter um papel ativo dentro da sociedade.

Na concepção da Educação do Campo, a escola não pode servir como um instru-


mento de domínio dos seres humanos, mas como uma ferramenta para a emanci-
pação dos povos, discutindo sobre novas formas de produção, organização da socie-
dade, preservação do meio ambiente, entre outras demandas que são fundamentais
para a liberdade humana.

O modelo de escola que prevalece na sociedade brasileira atual não é capaz de


formar sujeitos críticos e reflexivos, pelo contrário, muitas vezes a escola torna-se um
espaço que limita os seres humanos a reproduzirem o sistema nem interrogar sua
ordem e funcionamento.

Esse modelo educativo é amplamente criticado pela Educação do Campo, tendo em


vista que a escola do campo tem o intuito de libertar e emancipar os sujeitos e não
compactuar com o modelo de exploração que vivemos nas sociedades contemporâ-
neas. Caldart (2009) destaca que:

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SUMÁRIO 23
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A Educação do campo, fundamentalmente pela práxis pedagógica dos


movimentos sociais, continua e pode ajudar a revigorar a tradição de uma
educação emancipatória, retomando questões antigas e formulando novas
interrogações à política educacional e à teoria pedagógica. E faz isso, diga-se
novamente, menos pelos ideais pedagógicos difundidos pelos seus diferentes
sujeitos e mais pelas tensões/contradições que explicita/enfrenta no seu movi-
mento de crítica material ao atual estado de coisas (CALDART, 2009, p. 38).

Pode-se compreender a práxis como todas as formas de atividade humana,


a partir da perspectiva de que teoria e prática são indissociáveis. A práxis,
portanto, são as ações humanas na sociedade.

A partir dos apontamentos da autora, podemos compreender a Educação do Campo


como uma instituição em ampla atividade na sociedade, pois suas ações não se limi-
tam apenas aos conteúdos escolares, mas se relacionam com todas as questões que
envolvem a vida em sociedade.

Esse modelo de escola que prega a autonomia e emancipação humana assusta dife-
rentes grupos na sociedade, fazendo com a luta pela Educação do Campo nunca
tenha fim. Cotidianamente, é preciso enfrentar e disputar a escola como um espaço
libertário, e a Educação do Campo não se exime dessa tarefa.

O fato de a Educação do Campo estar diretamente associada aos movimentos sociais


fomentou esse modelo de pedagogia libertário e emancipatório, preocupando
grupos sociais que corroboram com o velho modelo de escola: aquele que não tem o
intuito de formar sujeitos pensantes, mas reprodutores de uma lógica de exploração
proposta pelo mercado. Caldart (2009) destaca que:

Parece, aliás, que essa relação da Educação do campo com a escola incomoda
a alguns: nasceu lutando por escolas e escolas públicas (através do MST fazen-
do a luta por escolas nos acampamentos e assentamentos), continua centra-
da nisso, e ao mesmo tempo nasceu, desde a radicalidade da Pedagogia dos
Movimentos Sociais, afirmando que educação é mais do que escola..., vincu-
lando-se a lutas sociais por uma humanização mais plena: luta pela terra, pelo
trabalho, pela desalienação do trabalho, a favor da democratização do acesso
à cultura e à sua produção, pela participação política, pela defesa do meio
ambiente (CALDART, 2009, p. 43).

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A partir desses apontamentos, podemos perceber que a luta pelas escolas do campo
constituem-se dentro dos movimentos sociais e nesse permanecem vinculados até
o presente momento. Trata-se de uma escola com a árdua tarefa de construir uma
nova sociedade.

A partir dessa articulação social, as escolas do campo conquistaram importantes direi-


tos e puderem colocar outras que já estavam garantidos em lei, mas que ainda não
haviam sido efetivados. O campo é repleto de particularidade e, por isso, carece de
uma pedagógica voltada, que seja capaz de pensar nas especificidades da reunião.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB garante, por exem-


plo, que os calendários das escolas do campo sejam construídos de forma
autônoma, respeitando as especificidades da região onde as escolas estão
localizadas, conforme estabelecido no art. 23, inciso 2º:

Art. 23 § 2º O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais,


inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino,
sem com isso reduzir o número de horas previsto nesta lei (BRASIL, 1996).

Ao permitir que o calendário escolar se adeque à realidade do campo, a LDB


reconhece a diversidade que existe na sociedade brasileira. Quando pensa-
mos, por exemplo, em épocas de cheia dos rios, precisamos ter em mente
que esse processo pode impedir que determinadas crianças e jovens consi-
gam chegar até a escola.

Por isso, adequar o calendário às suas peculiaridades é uma conquista


importante para a educação. A LDB reforça que isso não significa que a esco-
la possa cumprir uma carga horária menor ou fugir a regra do cumprimento
de 200 dias letivos estabelecidos pela legislação. Significa que a escola pode
construir seu calendário de forma adequada, respeitando o clima e a cultura
de cada região.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Outra importante conquista na Educação do Campo diz respeito à produção de


materiais didáticos específicos para a realidade do Campo. Esses materiais trazem
conteúdos gerais que devem ser abordados por todas as crianças e adolescente no
país, mas também trazem a parte especifica em uma dialogo direto com o campo e
sua realidade.

Ao realizar atividades que tinham um olhar voltado apenas para as grandes cidades
brasileiras, os livros utilizados no campo não conseguiam dialogar com as especifi-
cidades dessa região. Porém, com livros específicos tratando de temáticas próximas
da realidade do campo, os alunos e professores se identificam mais com essas obras
e tem a chance de construir um processo educativo mais expressivo e significativo.

O transporte escolar também deve ser citado como uma importante conquista da
Educação do Campo. Muitas crianças e jovens já precisaram caminhar longas distân-
cias para conseguirem chegar à escola. Esse processo é muito penoso para o estu-
dante que muitas vezes chegava tão cansado que não conseguia acompanhar a roti-
na escolar com qualidade, o que implicava o seu rendimento escolar.

Com a garantia do transporte e a construção de escolas mais próximas das casas dos
estudantes, a Educação do Campo conseguiu romper com as cercas da desigualda-
de que dividiam as crianças e jovens entre aqueles que podiam frequentar a escola e
aqueles eram excluídos desse processo.

É certo que as lutas do campo não param por aqui e não se resumem apenas a essas
pautas. Trata-se de um processo ainda mais complexo que será discutido ao longo
do material. Esses exemplos destacados, contudo, sinalizam-nos para as conquistas
efetivadas pela luta camponesa e nos permite refletir sobre os impactos que a orga-
nização política e social é capaz de promover em uma sociedade como a nossa.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

BIBLIOGRAFIA COMENTADA
Veja a seguir algumas indicações de obras que complementarão seu conhecimento
sobre os assuntos abordados na disciplina.

ANTUNES ROCHA, Maria Isabel; MARTINS ALMEIDA, Maria de Fátima; MARTINS Aracy
Alves, [org.]. Territórios educativos na Educação do Campo: escola, comunidade e
movimentos sociais. Coleção Caminhos da Educação do Campo. 5. ed. Belo Horizon-
te: Autêntica Editora, 2012.

Esta obra é essencial para uma visão crítica a respeito dos caminhos e territórios rela-
tivos à Educação do Campo. O livro nos convida a repensar os múltiplos desafios para
a construção de uma Educação do Campo que seja balizada pela esperança e resis-
tência dos povos que compõem o campo brasileiro.

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SUMÁRIO 27
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

CONCLUSÃO
A Educação do Campo é um fenômeno e expressão da realidade social brasileira.
Para compreendê-la é necessário um olhar crítico para a formação histórica brasileira.

Sendo assim, para compreender a Educação do Campo, é importante considerar seu


tempo histórico e seu contexto de origem. Isso significa que a Educação do Campo
deve ser compreendida a partir de suas relações com a prática social, projeto educa-
cional, com a política educacional, além de levar em conta o sujeito do campo.

Dessa forma, pensar em Educação do Campo é analisar a complexidade e diversi-


dade da sociedade brasileira, dimensionando o que constrói a necessidade de uma
educação específica para os povos campesinos. Nesse sentido, deve-se levar em conta
que a educação, assim como a sociedade, é permeada de contradições que precisam
ser enfrentadas e superadas a partir de um olhar para a Educação do Campo que seja
norteado pelos saberes dos povos que compõem o campo brasileiro.

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28 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

UNIDADE 2

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Discutir a diversidade


presente entre as
populações do campo.

> Esclarecer os conceitos


de agricultura familiar
e desenvolvimento
sustentável.

> Esclarecer diferentes


aspectos da cultura
camponesa.

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SUMÁRIO 29
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

2 OS POVOS DO CAMPO
Os povos do campo são formados a partir de uma grande diversidade. Muitas vezes,
quando nos referimos ao campo, somos induzidos a pensar em uma unidade, mas
isso é um erro, pois os povos do campo são muito diferentes entre si, embora carre-
guem algumas marcas em comum.

A diversidade cultural apresentada pelos povos do campo estão ligadas à formação


histórica e social do Brasil. A grande extensão territorial e a diversidade de grupos que
constituem o país refletem diretamente na produção cultural.

Nesta unidade vamos conhecer a diversidade dos povos do campo e as formas de


produção desenvolvidas por eles, compreendendo conceitos como sustentabilidade
e agricultura familiar.

INTRODUÇÃO DA UNIDADE
O campo brasileiro é formado por uma diversidade de povos com organização políti-
ca, social e cultural próprias. Um olhar atento para a diversidade do Brasil nos revela
que os povos do campo, embora reproduzam algumas semelhanças culturais, são
bem diversos.

É com o intuito de revelar essa diversidade que nesta unidade iremos discutir ques-
tões referentes às semelhanças e diferenças que marcam esses povos. O estudo dos
povos camponeses deve considerar toda a diversidade cultural, política e econômica
que está ligada às suas trajetórias.

É na diversidade apresentada por eles que está a riqueza cultural do Brasil. Conhecer
a história e memória desses povos é um exercício importante, além de possibilitar
novas leituras da história do Brasil.

Dessa maneira, nessa unidade abordaremos a diversidade camponesa, a agricultu-


ra familiar, o desenvolvimento sustentável e as práticas culturais que marcam essas
populações.

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30 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

2.1 OS POVOS DO CAMPO

Os povos do campo são fruto de uma grande diversidade. Quando pensamos nos
moradores do campo, precisamos ter em mente que se trata de uma população
presente nas diferentes regiões do país; por isso, sua história, cultura e valores não
devem ser resumidos a um único modo de vida.

O Decreto Presidencial n.º 7.352, de 4 de novembro de 2010, compreende como


povos do campo:

I – populações do campo: os agricultores familiares, extrativistas, os pescado-


res artesanais, os ribeirinhos, os assentados e acampados da reforma agrária,
os trabalhadores assalariados rurais, os quilombolas, os caiçaras, os povos da
floresta, os caboclos e outros que produzam suas condições materiais de exis-
tência a partir do trabalho no meio rural (BRASIL, 2010).

Por esse decreto podemos perceber que os povos do campo não são homogêneos,
pois são frutos de diferentes formas de organização cultural e social. Reconhecer essa
diversidade é fundamental para a compreensão das populações do campo.

A diversidade entre os moradores do campo pode ser percebida na cultura, obser-


vando que cada localidade tem costumes e valores diferentes; nas formas de alimen-
tação, verificando que os pratos tradicionais variam de região para região; no sotaque,
tendo em vista que cada lugar tem suas especificidades; nas atividades laborais, nas
tradições, enfim, na vida dessas pessoas.

Não há como definir uma forma única do campo, já que ele está presente em dife-
rentes regiões do Brasil e, por isso, reproduz os costumes e tradições desses locais. A
seguir, vamos conhecer um pouco mais sobre essa diversidade e como ela se revela
no cotidiano dos povos do campo.

2.1.1 DIVERSIDADE DO CAMPO

Conhecer e compreender a história das pessoas do campo é uma forma de apreciar


nossas origens, afinal de contas muitos brasileiros têm grande proximidade com o
campo, não só física, mas também sentimental, já que grande parte da população

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SUMÁRIO 31
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

brasileira tem sua origem nesses locais.

O campo foi uma das primeiras regiões a ser habitada em nosso país. As várias tribos
indígenas que residiam nestas terras antes da chegada dos europeus tinham um
modo vida rural, cuidando dos seus familiares e da natureza.

Ao longo dos anos, nosso modo de vida foi se modificando. Se antes a maioria dos
brasileiros vivia no campo, hoje a realidade é bem diferente. Grande parte da popu-
lação brasileira vive nos centros urbanos e segue um modo de vida bem diferente de
seus antepassados que viviam no campo.

O processo de industrialização concentrado nos grandes centros urbanos levou muitas


pessoas a migrarem para as cidades em busca de emprego e melhores condições de
vida. É certo que, nesse cenário, muitas pessoas estavam ansiosas por construir uma
nova vida na cidade, outros, porém, precisaram sair de sua terra natal em busca de
emprego e melhores condições de vida.

Ao analisar um pouco a história de muitas das famílias brasileiras, certamente pode-


-se identificar alguém que viveu ou vive no campo. Os antepassados de muitos brasi-
leiros tiveram a oportunidade de viver de forma bem diferente da maioria das pessoas
de hoje.

FIGURA 2 - SAÍDA DO CAMPO PARA A CIDADE

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Muitas pessoas que foram obrigadas a sair do campo em busca de uma vida melhor
ainda hoje sentem saudades da vida que tinham. O cheiro do café e do fogão à lenha
traz muitas recordações para estas pessoas.

Algumas tradições do campo foram levadas para a nova vida na cidade, mas muita
coisa mudou. Nas cidades, diferentemente da vida no campo, as pessoas quase não
se conhecem, como é o caso daquelas que moram no mesmo prédio e nunca tiveram

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32 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

tempo ou oportunidade de se conhecerem melhor.

Sentar na calçada no fim do dia para conversar com os vizinhos é uma oportunidade
que geralmente somente as pessoas que moram em cidades pequenas ainda têm.
Nas grandes cidades, a maioria está sempre com muita pressa e não realiza gestos
importantes e fraternais como este.

O companheirismo no campo, onde as pessoas são solidárias umas com as outras,


quase se extinguiu nas cidades. Nas grandes capitais é cada vez mais comum encon-
trarmos pessoas que moram sozinhas. O individualismo é a palavra de ordem.

É importante destacar que, quando se faz referência ao campo, as observações não


se limitam a um único modelo de sociedade, mas sim a uma grande diversidade
existente. Os modos de vida e os costumes são únicos em cada lugar, e mesmo no
campo a diversidade é bem grande.

Ao reconhecer a diversidade existente no campo, fugimos de estereótipos e precon-


ceitos que são construídos e difundidos cotidianamente em nossa sociedade. Os
moradores do campo vivem em diferentes regiões geográficas do país, por isso, sua
cultura será influenciada pela região em que vivem.

Um camponês do sul do Brasil, por exemplo, tem uma cultura muito diferente de um
camponês que vive no interior do Pará. Reconhecer essas especificidades é funda-
mental para compreender a diversidade do campo e perceber que não é porque são
moradores do campo que reproduzem os mesmos modos de vida.

2.1.2 AGRICULTURA FAMILIAR E DESENVOLVIMENTO


SUSTENTÁVEL

Um tema de grande relevância ao se discutir a Educação do Campo está ligado ao


desafio de se construir uma educação que tenha como referência a produção susten-
tável da vida.

Isso significa dizer que o movimento em prol da Educação do Campo tem como
grande desafio a construção de uma escola com uma concepção diferenciada de
educação, que deve ser pautada na vivência e nos interesses dos povos do campo e

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SUMÁRIO 33
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

fundamentada na formação humana e integral dos sujeitos.

Como aponta Molina (1999), é necessária uma proposta de educação básica que
assuma a identidade no meio rural, não só a partir de sua diversidade, mas, antes de
tudo, como um novo projeto de desenvolvimento do campo.

Nessa mesma linha de raciocínio, o pesquisador Antônio Júlio Menezes Neto aponta
que:

O modelo capitalista de agricultura, no campo da educação, também defen-


derá a formação capitalista, centrada na competição, na formação para o
“mercado de trabalho”, na “eficiência produtiva”, na “integração ao sistema”
e no individualismo. Já o modelo camponês, sendo alternativo ao modelo
do agronegócio, apresenta o potencial de um projeto de educação também
alternativo ao modelo competitivo deste. Este outro “modelo”, defendido e já
tendo algumas práticas desenvolvidas pelos movimentos sociais, seria centra-
do no direito à cidadania, o direito ao conhecimento crítico, ao conhecimento
científico, à formação, não para o mercado de trabalho, mas para o mundo do
trabalho, entendido como processo de conhecimento e de transformação da
natureza para o bem estar dos seres humanos. Nesta perspectiva educativa,
o trabalho humano apresentaria sua outra face, sendo, inclusive, um processo
pedagógico, capaz de centralizar o processo educativo de forma emancipató-
ria (p. 15, 2019).

Dessa maneira, é importante que estejamos atentos para a discussão em torno dos
projetos desenvolvidos no campo e que visam, por um lado, à manutenção do mode-
lo já estabelecido e, por outro, à superação desse modelo.

Entretanto, devemos ficar atentos para reducionismos que não nos ajudam a refle-
tir de maneira mais profunda sobre essas questões. Um exemplo é a discussão que
aponta que a escola deve preparar os sujeitos do campo para mantê-los no campo
ou prepará-los para a vida na cidade.

Essa ideia é fruto de um pensamento estereotipado que se baseia na dicotomia


campo/cidade. Essa visão, além de ser simplificadora da realidade, também não
contribui para o debate acerca das complexas relações que envolvem os povos do
campo, seus saberes e modos de viver e se organizar.

É necessário entender o campo a partir de toda sua complexa dinâmica, social, cultu-
ral e política, o que nos leva a considerar o território do campo para além da produção
agrícola e dos embates entre produção agrícola e produção industrial.

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34 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Sendo assim, o campo e seus vastos e diversificados territórios devem ser compreen-
didos como espaços de produção de saberes, de novas relações sociais e de produ-
ção, de novas relações entre os indivíduos e o meio ambiente e como um espaço
dinâmico e complexo.

Outro ponto importante na Educação do Campo e que se relaciona diretamente ao


modelo de desenvolvimento do campo é o fato de que historicamente tenham sido
construídos, não de maneira neutra, ideários de desenvolvimento a partir de uma
perspectiva de “amor pela terra” e do “cuidar da terra”.

Como afirma Rocha (2004), para além dessa perspectiva, a educação do Campo deve
refletir sobre a quem pertence essa terra que se deve amar e cuidar. Além disso, uma
Educação do Campo comprometida com o desenvolvimento sustentável do campo
deve se atentar para a reflexão sobre a quem pertence os produtos e bens materiais e
simbólicos produzidos pelo trabalho de homens e mulheres do campo na busca de
superação e transformação de valores e práticas incrustadas na sociedade brasileira.

2.1.2.1 A AGRICULTURA FAMILIAR

Desde as últimas décadas do século XX, diversas críticas e alertas vêm sendo feitos por
pesquisadores sobre os riscos ambientais, em nível global, provocados pelo modelo
produtivo industrial.

De acordo com o Censo Agropecuário 2006, o Brasil possui cerca de 5 milhões de


estabelecimentos agropecuários que ocupam 36,75% do território nacional. Desses
estabelecimentos agropecuários, 84% são dedicados à agricultura familiar, sendo
que a agricultura não familiar ou patronal é representada por 16% desses estabele-
cimentos.

Na agricultura familiar, a atividade produtiva é dirigida pelos próprios trabalhadores,


sendo as funções divididas entre os membros da família.

Diferentemente do que acontece com a produção em grandes latifúndios, a agricul-


tura familiar tem como característica a produção diversificada de alimentos. Além
disso, 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros vêm desse setor.

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SUMÁRIO 35
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Além da alta produtividade agrícola, a agricultura familiar também se destaca pela


geração de empregos no campo. Enquanto a agricultura não familiar ou patronal
gera 26% de empregos no campo, a agricultura familiar emprega 74%.

Esses dados revelam a eficiência produtiva e econômica da agricultura familiar, que


gera mais empregos, produz alimentos com qualidade, garante alimento para o povo
brasileiro e se preocupa com a sustentabilidade ambiental.

A agricultura é uma atividade desenvolvida há milhares de anos. Ela garante os


alimentos básicos de que necessitamos para sobreviver, tais como grãos, verduras,
frutas e legumes.

O grande problema enfrentado pelos agricultores familiares está relacionado à falta


de investimentos no setor. Para produzirem alimentos saudáveis, é necessário investi-
mento em infraestrutura que garanta todo o processo produtivo, desde a manipula-
ção das sementes até a distribuição dos alimentos.

Muitos trabalhadores rurais abandonam o campo por falta de condições dignas de


trabalho e sobrevivência. A agricultura familiar necessita de recursos que estimulem
os pequenos agricultores e suas famílias a continuarem no campo.

A falta de políticas públicas destinadas aos agricultores familiares, por exemplo, aces-
so à educação, transporte e saúde, é um dos fatores responsáveis pelo êxodo rural.
Deve-se garantir a esses trabalhadores condições, inclusive financeiras, para que
possam produzir alimentos com qualidade e sustentabilidade ambiental.

2.1.2.2 BRASIL: UMA POTÊNCIA AGRÍCOLA

O Brasil é um dos maiores países em extensão territorial, ocupando uma área de


8.547.403 quilômetros quadrados. Com um território tão grande, o nosso país se
tornou um dos maiores polos agrícolas do mundo.

Além disso, a diversidade climática brasileira contribui para a variedade de alimentos


produzidos no campo. Boa parte dessa produção é voltada para a exportação, fazen-
do com que o Brasil seja um dos maiores exportadores de produtos agrícolas.

Entre os diversos itens agrícolas produzidos no Brasil para exportação, podemos

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

destacar o café, a laranja, o tabaco, a cana-de-açúcar e a soja.

Os avanços das exportações brasileiras são fruto de uma grande modernização dos
meios de produção no campo. O uso de máquinas modernas e o investimento em
novas técnicas agrícolas de produção fizeram com que o Brasil se tornasse uma verda-
deira potência agrícola.

Durante a década de 1970, uma grande transformação com a criação de grandes


complexos agroindustriais representando a integração da produção agrícola com
técnicas produtivas mais modernas ocorreu no campo. Muitas empresas multinacio-
nais produtoras de tratores e produtos químicos destinados ao setor agrícola “invadi-
ram” o Brasil em busca de lucros.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nesse período houve


um aumento de mais de 1000% no uso de tratores em relação à década de 1950.

Ainda segundo o IBGE, no ano de 2008, apesar da grande crise financeira mundial,
o Brasil teve uma produção agrícola recorde, superando a produção do ano anterior
em 9,1%.

Nos últimos anos o setor agrícola brasileiro tem crescido muito, sendo responsável
por boa parte do Produto Interno Bruto (PIB). O PIB é o cálculo das riquezas que o
país produz, e o órgão responsável por calcular essas riquezas é o IBGE.

Em uma pesquisa realizada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil


e pelo Centro de Estudos Avançado sem Economia Aplicada (Cepea/USP), o cresci-
mento da economia do setor rural é superior à média de crescimento da economia
brasileira.

2.1.2.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MEIO


AMBIENTE

Nos últimos anos vem se intensificando o debate e a preocupação sobre os recursos


naturais do planeta Terra. Isso porque chegamos ao século XXI com diversos proble-
mas ambientais, frutos de um crescimento econômico que ignorou o

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SUMÁRIO 37
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

meio ambiente.

A falta de políticas governamentais voltadas para a conservação e educação ambien-


tal gerou uma enorme destruição da natureza no mundo inteiro.

As ações predatórias dos recursos naturais do nosso planeta tornaram urgente a cria-
ção de políticas públicas que tenham como objetivo o desenvolvimento sustentável
do nosso planeta.

Ao falarmos em desenvolvimento, é comum as pessoas confundirem com cresci-


mento econômico. Porém, devemos lembrar que crescimento econômico exige que
se retirem recursos da natureza de maneira intensa. É preciso pensar em alternativas
sustentáveis para essa ação, pois os recursos naturais são finitos.

FIGURA 3 - SUSTENTABILIDADE

Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019.

Dessa forma, o crescimento econômico acontece ao mesmo tempo em que se esgo-


tam os recursos naturais do planeta

Por isso, é necessário que se crie um modelo de desenvolvimento econômico que


tenha como prioridade a vida e a preservação do meio ambiente, gerando riquezas
para nosso país de maneira responsável.

No Brasil, uma grande expansão industrial ocorreu nas décadas de 1940 e 1950. Esse

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processo de industrialização foi tão intenso que, a partir da metade da década de


1950, o setor industrial já era um dos mais importantes da economia do país.

Durante esse período o mercado mundial sentia os impactos da Segunda Guerra


Mundial (1939-1945), favorecendo a estratégia brasileira de substituição de impor-
tações. A criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) aconteceu nessa época,
fruto de um acordo firmado entre Brasil e Estados Unidos. A Petrobrás foi criada em
1953.

Com a industrialização, diversas mudanças aconteceram na sociedade brasileira.


Tanto no campo quanto nas cidades, as máquinas começavam a ditar um novo ritmo
na vida das pessoas.

A natureza passou a ser explorada intensamente sem nenhuma preocupação com


o esgotamento dos recursos naturais e com o desequilíbrio ambiental causado pela
ação predatória do meio ambiente.

Um dos maiores desafios deste século será salvar a natureza. Isso exigirá uma nova
relação entre os seres e o meio em que vivem.

Meio ambiente é toda a natureza que está a nossa volta. São as árvores, o ar que
respiramos, as flores e nós mesmos. Dessa maneira, podemos entender meio
ambiente como um conjunto de fatores naturais, culturais e sociais que nos
influenciam e são influenciados por nós.

A preservação do meio ambiente é uma tarefa de todos os seres humanos. Isso quer
dizer que precisamos cuidar do nosso planeta, modificando nossas atitudes e hábi-
tos, como não deixar a torneira aberta enquanto escovamos os dentes, tomar banhos
rápidos, apagar lâmpadas acesas sem necessidade, utilizar baterias recarregáveis e
sacolas e recipientes retornáveis.

Além disso, é muito importante que toda a sociedade – família, escola, meios de produ-
ção de bens e serviços, políticos – seja sensibilizada e educada sobre a necessidade

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SUMÁRIO 39
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

de respeitar as leis ambientais, garantindo recursos naturais para esta e as futuras


gerações.

Um dos grandes problemas ambientais da atualidade está relacionado ao consu-


mo. O avanço das indústrias e a utilização de tecnologias cada vez mais desenvolvi-
das aumentaram o consumo de bens e serviços, tornando alguns produtos obsoletos
rapidamente.

Para se ter uma ideia, quando alguém compra um celular de última geração hoje,
possivelmente outros modelos mais modernos já estão sendo lançados no mercado,
tornando o telefone recém-adquirido obsoleto, ou seja, sua tecnologia foi superada.

Importante ressaltar que o ato de consumir, em si, não é o problema. O consumo


é uma necessidade que temos para sobreviver. Por isso bebemos água, comemos
frutas e respiramos.

Esses atos são naturais e são necessários à nossa sobrevivência. O problema está no
consumo abusivo de bens e serviços, que levam à excessiva exploração dos recursos
naturais, promovendo o desequilíbrio ambiental do planeta.

O relatório “Planeta Vivo 2012”, da ONG WWF, nos mostra que temos usado 50% mais
recursos do que o planeta Terra pode nos oferecer. Se o consumo dos recursos natu-
rais continuar abusivo, em 2030 nem mesmo “dois planetas” serão suficientes para
atender às nossas demandas.

Para conhecer um pouco mais sobre a questão dos recursos naturais do nosso
planeta e as metas estabelecidas mundialmente, recomendamos acompanhar
a páginas da “Agenda 2030” da ONU. A partir de uma reunião realizada em 2015
na sede da ONU foram estabelecidas diferentes ações que devem ser empreen-
didas pelas nações até o ano de 2030, visando diversas ações em busca da paz
e do meio ambiente. Visitando a plataforma da instituição é possível conhecer
todas as metas e ações a serem desenvolvidas.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

2.1.3 A CULTURA CAMPONESA

A cultura camponesa é rica e diversificada. Cada região apresenta suas próprias formas
de viver e agir. As festas populares, o patrimônio, a história e os valores de cada gente
podem ser percebidos nas diversas manifestações culturais de cada região.

Nesse sentido, o estudo da cultura é uma das formas de se reconhecer a diversida-


de dos povos do campo. É importante ter em mente que os povos do campo são
quilombolas, ribeirinhos, extrativistas, assentados da reforma agrária, entre outros.
Não se trata de povos com culturas únicas, mas sim diversas.

Muitas festas populares campesinas fazem parte da memória e identidade do povo


brasileiro e, por isso, são consideradas patrimônios. Existem dois tipos de patrimônios:
o patrimônio material, que são prédios, esculturas, igrejas, praças, casarões, dentre
outros; e o patrimônio imaterial ou não material, que são a expressão, a cultura e os
conhecimentos do povo.

Uma receita de bolo ou o jeito de dançar, por exemplo, fazem parte dos nossos patri-
mônios imateriais, pois revelam um pouco da nossa cultura e do nosso jeito de ser.

Preservar estes patrimônios é cuidar para que nossas tradições sejam transmitidas
e conhecidas por diversas outras gerações. Nesta perspectiva existem duas medidas
em nosso país que têm a finalidade de proteger e preservar estes bens, o tombamen-
to e o registro.

O tombamento, de acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacio-


nal (IPHAN), tem o objetivo de proteger e preservar todos os bens materiais que têm
algum significado para a cultura e a história do nosso povo.

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SUMÁRIO 41
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Um casarão antigo, por exemplo, que foi utilizado como cadeia no decorrer do
século XVIII revela importantes características desta época. Por isso, é muito
importante que suas paredes, pinturas e tudo o que houver neste prédio seja
preservado da mesma forma que ele foi um dia.

O registro, por sua vez, é responsável por preservar os bens imateriais. Esses bens
ficam protegidos perante a lei evitando que tradições tão ricas sejam esquecidas ao
longo dos tempos.

O jeito de falar, dançar, cantar de um povo, seu modo de produzir determina-


do alimento, entre outros, não pode ser esquecido, é preciso estar sempre na
memória das pessoas, pois o nosso passado nos diz muito sobre o que somos
no presente.

As festas populares conservam hábitos e costumes do nosso povo e, por meio delas,
conhecemos importantes aspectos do nosso passado e presente. Algumas festas,
como a de São João, cresceram tanto que deixaram de ser exclusivas do campo e
passaram a fazer parte da vida de diversas pessoas moradoras das cidades.

A cultura dos povos também pode ser percebida no artesanato. Chamamos de arte-
sanato todo produto que é feito a partir de uma técnica manual, ou seja, construído
pelas mãos de uma ou mais pessoas em vez de ser construído por uma máquina.

O artesanato é considerado também obra de arte, e aqueles que produzem esta arte
são chamados de artesãos. A arte está presente na vida de todas as pessoas. Ela é
uma forma do ser humano expressar seus sentimentos, sua história e sua cultura.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A arte pode ser representada de diversas maneiras, como na música, na escultura, na


dança, na pintura, no cinema, na fotografia, enfim, em tudo aquilo em que a huma-
nidade expressa suas emoções.

Ao caminhar pela sua região com um olhar mais apurado, prestando atenção
em tudo o que há em seu redor, você certamente irá identificar diversos aspec-
tos da arte: um chapéu, uma rede, cesta, o grafite no muro de alguma casa, um
monumento exposto na praça.

A arte está presente na vida de todas as pessoas e em diversos cantos, revelando a


cultura e a história do nosso povo. Os saberes artesanais são transmitidos de geração
em geração, sobretudo no campo, onde esta arte, muitas vezes, é fonte de renda
complementar e até de sobrevivência para diversas famílias.

O artesanato do campo expressa toda a beleza da região. Os produtos são construí-


dos com base em matérias-primas locais e encantam a todos que conhecem.

Esta atividade é tão importante que o dia 19 de março foi definido no calendário
nacional como o Dia do Artesão. Nessa data os artesãos comemoram o seu dia e
reafirmam a luta em favor do reconhecimento e do respeito por seu trabalho.

A diversidade do campo também pode ser percebida por meio do seu artesanato,
já que este se modifica de região para região. As comunidades rurais, indígenas e
quilombolas produzem trabalhos artesanais que revelam um pouco da identidade
de cada uma destas culturas.

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SUMÁRIO 43
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

CONCLUSÃO
A partir dos apontamentos desta unidade podemos concluir que os povos do campo
são fruto de uma grande diversidade. Reconhecer essa diversidade é fundamental
para o combate a estereótipos que são construídos sobre os povos do campo e suas
culturas.

Para compreender os povos do campo, perpassamos pela agricultura familiar e o


desenvolvimento sustentável, identificando que as formas de produção em larga
escala no Brasil atual priorizam as exportações, fazendo com que a agricultura fami-
liar seja a grande responsável pelos alimentos que chegam às mesas dos brasileiros.

O modelo produtivo nas grandes sociedades, inclusive no Brasil, é fomentado por uma
disputa de mercado que nem sempre levam em consideração as questões ambien-
tais, mas esse é um tema urgente e necessário, visto que os recursos do planeta são
escassos.

A agricultura carece de uma reflexão que seja pautada no meio ambiente e na susten-
tabilidade como alternativas para os modelos produtivos desenvolvidos na atualida-
de. Trata-se de uma temática que interessa não apenas aos povos do campo, mas
toda a sociedade.

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44 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

UNIDADE 3

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Explicar os princípios da


gestão democrática.

> Discutir e problematizar a


construção do currículo nas
escolas do campo.

> Refletir sobre a


necessidade de uma
pedagogia do campo que
dialogue com as realidades
dos povos campesinos.

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SUMÁRIO 45
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

3 EDUCAÇÃO DO CAMPO
Nesta unidade iremos discutir a temática da Educação do Campo, a partir de uma
reflexão sobre a relevância da construção de uma pedagogia que considere os anseios
e interesses dos povos do campo.

Também abordaremos a temática do currículo, uma vez que ele cumpre uma função
primordial na construção da escola do campo. É através do currículo que a escola
constrói sua identidade. É através do currículo que a escola tem a possibilidade de se
aproximar da comunidade escolar.

Pontuaremos a questão da gestão democrática e sua importância na formação de


cidadãos atuantes e críticos, capazes de se envolverem nas questões da escola e da
vida social em geral.

Bons estudos!

INTRODUÇÃO
Pensar em Educação do Campo é considerar a luta dos povos camponeses pelo direi-
to a uma educação diferenciada. Durante muitas décadas os povos do campo foram
submetidos a um modelo de educação que tinha como referência os valores urbanos
em detrimento ao campo.

Nesse modelo de educação, o campo era retratado como local do atraso e seu povo
era representado por um estereótipo negativo.

Embora na mentalidade de muitas pessoas ainda vigore uma visão negativa dos
povos do campo, essa situação vem mudando nos últimos anos. Essas mudanças
estão relacionadas às lutas dos povos campesinos por uma educação que valorize as
vivências e culturas que constituem os povos campesinos.

Dessa forma, vimos nos últimos anos os povos campesinos conquistarem o direito a
uma educação particularizada, balizada por um currículo flexível, que possibilita a
organização escolar a partir dos interesses e realidades dos povos do campo.

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46 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Além disso, a gestão democrática nas escolas do campo também vem contribuindo
de maneira efetiva para a participação social no processo educativo e na gestão da
escola.

Sendo assim, nesta unidade iremos nos debruçar na temática relativa à pedagogia
do campo, atentando-nos para a construção de um currículo diferenciado para as
escolas do campo e na gestão democrática.

3.1 EDUCAÇÃO DO CAMPO

A educação do campo é uma proposta educativa construída e desenvolvida pelos


próprios sujeitos do campo, fugindo do modelo tradicional em que o professor é
considerado o portador do conhecimento com a missão de transmiti-lo aos alunos.

A luta por uma educação diferenciada para as populações do campo faz parte das
lutas dos movimentos sociais do campo e visam à reparação de direitos negados a
esses grupos ao longo da história, entre eles o direito à escola e educação de qualida-
de. Sobre essa temática, Roseli Caldart aponta que:

Os sujeitos que trabalham e vivem do campo e seus processos de formação


pelo trabalho, pela produção de cultura, pelas lutas sociais, não têm entra-
do como parâmetros na construção da teoria pedagógica e muitas vezes são
tratados de modos preconceituosos, discriminatórios. (CALDART, 2008, p. 75).

Dessa forma, podemos entender as lutas pela Educação do Campo como a busca
pela transformação da escola e do seu fazer pedagógico. Para isso, faz-se necessário
repensar os modos de atuação e práticas pedagógicas.

3.1.1 PEDAGOGIA DO CAMPO

A luta pela Educação do Campo nos leva a refletir sobre o modelo de escola oferta-
do às populações do campo. De acordo com Molina (2006), é necessário conhecer as
desigualdades que permeiam os sistemas escolares, pois somente assim seria possí-
vel compreender os resultados e reflexos das escolas do campo para a construção de
alternativas e caminhos para superação desses dilemas.

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SUMÁRIO 47
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Torna-se relevante pensar uma escola do campo comprometida com uma pedago-
gia do campo, ou seja, é importante a construção de uma escola que valorize os
povos do campo e que esteja vinculada a um projeto de fortalecimento das múltiplas
identidades que constituem os povos campesinos.

Para isso, é necessário o desenvolvimento de uma pedagogia que tenha como pers-
pectiva e referência os saberes dos povos do campo. Além disso, uma pedagogia do
campo deve-se basear nos mais variados aspectos que constituem as populações
campesinas, tais como a economia, as relações produtivas e de trabalho, os laços
afetivos e identitários com a terra e os aspectos ligados ao valor histórico e cultural
dado ao território.

FIGURA 4 - PEDAGOGIA DO CAMPO

Fonte: Elaborada pelo autor.

Importante ressaltar que não é possível refletir sobre uma pedagogia do campo sem
relacioná-la com as estruturas sucateadas em que se encontram muitas escolas do
campo.

Isso significa que, para garantir o direito à educação dos povos do campo, é neces-
sário que sejam construídas mais escolas e, além disso, é urgente a necessidade de
equipá-las com laboratórios, internet, cantinas, carteiras, bibliotecas, computadores,
entre outros.

Além desses imensos desafios, o êxito da pedagogia do campo está ligado a políticas
que possibilitem a permanência dos estudantes do campo na escola.

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48 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Para além da estrutura, outro ponto importante para a construção da escola do


campo é o comprometimento com a construção de uma pedagogia que implique
processos educativos de valorização dos aspectos históricos e sociais de formação dos
povos e sujeitos do campo.

Como ressalta Antunes-Rocha e Hage (2010), muito mais do que o direito de organizar
uma escola por ciclo ou turmas seriadas e multisseriadas, espera-se que a educação
do campo busque entender os variados processos educativos formados a partir das
lutas coletivas, da transformação das realidades, da garantia do acesso e permanência
na escola e de como a própria escola se relaciona com a comunidade a sua volta.

Assim sendo, é importante pensar a escola do campo não só a partir de sua diferen-
ciação cultural, mas também a partir de um novo modelo e projeto de desenvolvi-
mento do campo.

3.1.1.1 REFLETINDO SOBRE UMA PROPOSTA DE


PEDAGOGIA DO CAMPO

A proposta da educação do campo é construir alternativas de transformação do


próprio campo, possibilitando que os educandos possam continuar residindo em
suas casas sem precisarem migrar para outras regiões em busca de trabalho e melho-
res condições de vida.

Nas escolas do campo é muito importante uma pedagogia que relacione teoria e
prática, propondo reflexões sobre os problemas e anseios do campo, de modo que o
educando possa se sensibilizar pelas ações que precisam ser empreendidas em sua
vida cotidiana.

Assim, as escolas do campo anseiam por desenvolverem uma pedagogia que dialo-
gue com a vida de seus alunos, pois é preciso que a educação seja vista como algo
importante para todos, e não como um processo obrigatório e sem valor.

Nesse sentido, cabe à escola do campo uma prática educativa e a construção de um


currículo que tenha como referência a tarefa de instigar os alunos a refletirem sobre
as relações da humanidade com a natureza, buscando alternativas sustentáveis que
tragam benefícios a todos.

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SUMÁRIO 49
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Nesta perspectiva, os alunos do campo estudam certos temas a partir da interdisci-


plinaridade, como a sustentabilidade ambiental, agrária, econômica, social, política
e cultural, bem como a equidade de gênero, étnico-racial, intergeracional e a diver-
sidade sexual.

Estes diversos temas são estudados em conjunto com as matérias-padrões, que são
lecionadas também nas escolas urbanas, como Língua Portuguesa, Matemática,
História, Geografia e Ciências.

Durante a realização de um encontro da “Coordenação da Articulação Nacional Por


Uma Educação Básica do Campo”, o escritor Bernardo Mançano Fernandes destacou
os diversos objetivos existentes na Educação do Campo. Entre seus objetivos está a
valorização do campo, que engloba os espaços da floresta, da pecuária, das minas,
da agricultura, dos pescadores, dos caiçaras, dos ribeirinhos e dos extrativistas como
espaço de inclusão social, a partir de uma nova visão de desenvolvimento (ARROYO;
FERNANDES, 1999, p. 51).

Nesta perspectiva, é muito importante que os temas trabalhados nas escolas do


campo dialoguem com a realidade destes diversos alunos, pois, como defende
Mançano, “uma escola do campo é a que defende os interesses, a política, a cultura
e a economia da agricultura camponesa, que construa conhecimentos e tecnologias
na direção do desenvolvimento social e econômico dessa população”. (ARROYO e
FERNANDES, 1999, p. 51.)

Por isso, torna-se de suma relevância que a pedagogia das escolas do campo seja
elaborada e construída pelos próprios camponeses, já que estes conhecem os anseios
e as necessidades de sua terra melhor que qualquer outra pessoa.

3.1.2 EDUCAÇÃO DO CAMPO E CURRÍCULO

Para uma reflexão profunda sobre a Educação do Campo é importante considerar a


questão do currículo escolar. O currículo é responsável pela produção de saberes e
significados para o mundo social.

Por meio do currículo os sujeitos são produzidos, e, como aponta Silva (1999), também
podemos compreender o currículo como uma prática de significação, responsável
por instituir diferenças e hierarquias sociais, econômicas e raciais.

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50 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Sendo assim, é importante considerar o currículo a partir das tensões sociais e dos
diferentes projetos de desenvolvimento que refletem os interesses políticos e econô-
micos de diversos grupos, o que nos faz refletir sobre o:

Predomínio cultural, negociações em torno das representações de diferentes


grupos e das diferentes tradições culturais, das lutas entre, de um lado, sabe-
res oficiais, dominantes e, de outro, saberes subordinados, relegados, despre-
zados. (SILVA, 1999, p. 22).

Dessa forma, é necessário analisar o que é incluído ou o que fica fora do currículo
da Educação do Campo. Essa construção não se faz de maneira harmônica, mas, ao
contrário, acontece a partir de tensões sociais, políticas econômicas e culturais.

FIGURA 5 - ORGANIZAÇÃO DO CURRÍCULO

Fonte: Elaborada pelo autor.

O currículo regula o que deve ou não ser ensinado, a partir de um certo controle que
define os sujeitos, ao mesmo tempo em que define o que é relevante ou não ser
considerado na trajetória de escolarização.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A construção curricular não é neutra, de modo que acaba por ser responsável por
criar e determinar posições sociais, assim como prestigiar e legitimar determinados
conhecimentos e saberes em detrimento de outros, justificar e reproduzir condutas
sociais consideradas válidas em determinado contexto social.

É fundamental que o debate em torno das questões relacionadas ao currículo, em


especial ao currículo das escolas do campo, leve em consideração que as questões
curriculares envolvem questões políticas e interesses diversos, tornando-se um palco
de disputas de variados grupos sociais.

As lutas dos movimentos sociais do campo em torno da educação são acompanha-


das da pauta de construção de uma escola que dialogue com as múltiplas realidades,
vivências, saberes e modos de ser dos povos campesinos.

E essa luta dos povos do campo em prol da educação perpassa as disputas pelo currí-
culo. A Educação do Campo, para além do acesso global na escola, também busca
garantir o direito à uma educação baseada nas mais variadas maneiras e modos de
viver e se organizar que apresentam as populações do campo.

É importante ressaltar, a partir dessa discussão, que os movimentos sociais campesi-


nos são protagonistas de um processo educativo que caminha na contramão de uma
concepção educacional que privilegia os aspectos conteudistas em detrimento dos
aspectos relacionados aos saberes e anseios da comunidade.

Vale destacar o exemplo de muitas escolas de assentamentos e acampamentos dos


movimentos sociais campesinos, que trabalham em uma perspectiva de que os sabe-
res científicos devem ser atrelados às experiências e aos modos de vida dos povos do
campo, respeitando suas múltiplas peculiaridades.

Nessas escolas, o currículo volta-se para a promoção de uma educação que constrói
e desenvolve seus objetivos de aprendizagem e planejamento, para a formação de
estudantes como sujeitos ativos e conscientes de seus direitos, assim como de seus
deveres, possibilitando-os exercerem plenamente a cidadania.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

3.1.2.1 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR DAS ESCOLAS DO


CAMPO

Pensar sobre as questões ligadas à organização curricular nas escolas do campo nos
leva a considerar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDBEN 9394/96.

Em seus artigos 26 e 28, a LDB contempla a Educação Rural, reconhecendo a diversi-


dade que constitui o Brasil, que, devido a sua dimensão territorial, possui uma acen-
tuada diversidade cultural.

Nesse sentido, a Educação do Campo necessita de um currículo diferenciado e flexí-


vel, que possibilite que as escolas do campo, partindo da base nacional curricular
comum, possam adaptar e organizar o currículo a partir de suas realidades sociais,
políticas, econômicas, religiosas e culturais.

Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensi-


no médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada
sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversi-
ficada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura,
da economia e dos educandos.

Artigo 28 - Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas


de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculia-
ridades da vida rural e de cada região, especialmente:

I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e


interesses dos alunos da zona rural;

II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às


fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.

(BRASIL, 1996)

É importante destacar a relevância desses artigos, uma vez que eles superam a ideia
de um modelo de ensino universal, desvinculando o ensino do campo do urbano,
que durante muitos anos prevaleceu na educação brasileira.

A LDB também destaca a flexibilização do currículo na organização das escolas do


campo. Essa flexibilidade possibilita que as escolas do campo possam, de acordo
com suas realidades, lançar mão, por exemplo, do ensino não seriado.

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A Lei também traz em seu texto a necessidade de adaptação dos conteúdos curri-
culares, calendário e materiais didáticos às necessidades e realidades dos variados
povos campesinos.

Além da LDB, outra importante lei que trata da organização curricular nas escolas do
campo são as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo,
que entrou em vigor em 2002.

Essas Diretrizes são fruto de lutas históricas dos movimentos sociais do campo e enfa-
tizam em seu texto a questão da flexibilidade na organização das escolas do campo.

Isso significa que as escolas, tendo em vista suas particularidades, incluam no currícu-
lo aspectos relativos as suas especificidades, levando em conta as experiências coti-
dianas dos povos do campo, nos mais diferentes aspectos, sejam eles sociais, políti-
cos, culturais e econômicos.

Exemplo dessa flexibilidade é destacada no artigo 5º das Diretrizes Operacionais para


a Educação Básica nas Escolas do Campo:

Artigo 5º - As propostas pedagógicas das escolas do campo, respeitadas as


diferenças e o direito à igualdade e cumprindo imediata e plenamente o esta-
belecido nos artigos 23, 26 e 28 da Lei 9394/96, contemplarão a diversidade
do campo em todos os seus aspectos: sociais, culturais, políticos, econômicos,
de gênero, geração e etnia.

Parágrafo único: Para observância do estabelecido neste artigo, as propos-


tas pedagógicas das escolas do campo, elaboradas no âmbito da autonomia
dessas instituições, serão desenvolvidas e avaliadas sob a orientação das Dire-
trizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica e a Educação Profissional
de Nível Técnico. (BRASIL, 2002).

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Tanto a LDB 9394/96 quanto as Diretrizes Operacionais para a Educação


Básica nas Escolas do Campo contemplam o calendário escolar das escolas
do campo, apontando que a escola tem autonomia para sua flexibilização,
levando em conta as realidades de cada comunidade campesina. Sobre essa
questão, o artigo 7º das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo aponta:

Artigo 7º - É de responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino, atra-


vés de seus órgãos normativos, regulamentar as estratégias específicas de
atendimento escolar do campo e a flexibilização da organização do calendá-
rio escolar, salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos e tempos de
aprendizagem, os princípios de igualdade.

O ano letivo, observado o disposto nos artigos 23. 24 e 28 da LDB, poderá ser
estruturado independentemente do ano civil (BRASIL, 2002).

As Diretrizes Operacionais podem ser compreendidas como um grande marco e


conquista da população do campo em prol da garantia do direito à educação.

3.1.3 GESTÃO DEMOCRÁTICA

Nos últimos anos, a temática da gestão democrática da escola vem ganhando força e
é um dos principais assuntos discutidos ao se tratar da educação brasileira.

Apesar da ampliação dessa discussão na atualidade, o tema da gestão já era discu-


tido no Brasil há algumas décadas. Durante o período militar no Brasil, por exemplo,
em meio ao processo de crescente centralização e burocratização do sistema escolar,
muitos professores reivindicavam autonomia escolar.

Organizados, os professores apontavam que a autonomia escolar era o caminho para


que a escola pudesse responder aos problemas reais que assolavam a sociedade
(KRAWCZYK, 1999).

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É importante destacar que a gestão democrática visa descentralizar o poder de deci-


são na escola, proporcionando transparência administrativa às ações realizadas. A
descentralização, além de fortalecer a autonomia da escola, também assume rele-
vância, uma vez que as escolas apresentam peculiaridades que exigem um olhar
atencioso ao contexto social, econômico, político e cultural em que estão inseridas.

A gestão democrática da escola está relacionada a diversas questões. Podemos citar,


de maneira geral, os assuntos de cunho administrativo, pedagógico, político e social.

FIGURA 6 - GESTÃO DEMOCRÁTICA

Fonte: Elaborada pelo autor.

Ao gestor da escola cabe o papel não somente de administrar recursos financeiros de


responsabilidade da escola, como também se preocupar com as questões relativas
ao ensino e aprendizagem dos sujeitos que compõem a escola e a inserção social dos
mesmos.

A participação dos atores que compõem a escola na gestão é um exercício de cida-


dania, pois esta instituição é responsável pela formação e transformação da socieda-
de. Participar da gestão significa ser atuante e possibilita que a escola caminhe ao
encontro dos interesses da comunidade que a circunda.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Em sociedades em que os princípios democráticos vigoram, os sujeitos devem ser


estimulados à participação nos processos de decisão. A escola é um desses espaços
e, por isso, é necessário que ela cumpra sua relevante função na formação de sujeitos
participativos e críticos.

Ao refletirmos sobre as escolas do campo, as questões relacionadas à gestão demo-


crática se potencializam, pois a escola, em muitas comunidades, é um único local
onde o poder público se faz presente.

Geralmente, nessas localidades, a escola é o espaço em que os moradores se encon-


tram, para reuniões de associação de bairro, para festas ou qualquer outra atividade
que envolva a comunidade.

Nesse sentido, as escolas do campo assumem um papel central e de referência para


os povos e comunidades do campo. O fato de elas, majoritariamente, serem peque-
nas e se encontrarem em regiões mais isoladas traz outros desafios para a implanta-
ção de uma gestão democrática.

Vale pontuar que pensar em gestão democrática nas escolas do campo é pensar
para além da obrigatoriedade de se ensinar os conteúdos escolares tradicionais. Esse
modelo de gestão traz em seu cerne o remodelamento da realidade escolar brasileira
por meio da participação da sociedade na construção da escola que deseja.

3.1.3.1 A ESCOLA E A GESTÃO DEMOCRÁTICA

Discutir sobre as questões referentes à gestão democrática na escola é um grande


desafio, e implantar esse modelo de gestão é um processo que deve envolver toda a
comunidade escolar.

A gestão democrática da escola baseia-se na ideia de se construir uma escola dife-


renciada, que atenda os anseios e interesses da comunidade escolar. Ao propiciar a
participação social na construção e no dia a dia da escola, esse modelo de gestão
busca construir a identidade da escola, tendo como perspectiva a construção da
cidadania.

Nesse sentido, o processo de construção de uma gestão democrática deve atentar-se


para o contexto e cotidiano escolar. Ao traçar as metas e o planejamento da escola,

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SUMÁRIO 57
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

considerar a realidade social em que está inserida a escola é fundamental para conso-
lidação de uma gestão participativa.

Isso significa que a gestão deve estar atenta para os comportamentos individuais e
coletivos, bem como para as especificidades que marcam cada contexto escolar.

Esse olhar diferenciado e inclusivo possibilita a construção de uma escola que vai
além da formação técnica e conteudista, uma vez que visa preparar os sujeitos para
a vida social, a partir de uma formação integral, que combine conteúdos escolares e
saberes populares.

Sobre a gestão escolar Hora (2007, p. 3) aponta que:

A utilização do termo gestão educacional pelos estudiosos mais críticos, justifi-


ca-se pela reação contra o caráter tecnicista, supostamente neutro e descom-
prometido de que foi imbuído o termo administração educacional, principal-
mente nos anos setenta, quando se assumiu os mesmos princípios e práticas
adotadas pela administração de empresas, o que contraria o significado da
prática política e social da educação e da escola. [...] A gestão de uma escola
envolve sujeitos e, portanto, temos que pensar que se trata de um processo
histórico, político-administrativo contextualizado e coletivo.

O autor chama a atenção para a diferença entre administração e gestão educacional,


uma vez que a escola apresenta especificidades relacionadas à própria organização
da escola, que é marcada por contradições e tensões entre os grupos que a formam.
Sendo assim, a gestão assume o sentido de orientar as pessoas para que se alcance
da melhor forma possível um determinado objetivo. No caso da educação, o obje-
tivo está relacionado à formação de indivíduos para a vida social. Isso significa que
na escola deve-se aprender mais do que os conteúdos das disciplinas, mas também
deve-se preparar para a vida.

A gestão escolar exige muito mais do que conhecimentos técnicos e administrativos.


Gerir uma escola é gerir pessoas e se preocupar com a formação humana integral.

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Para ampliar seus conhecimentos sobre gestão democrática, leia a Lei de


Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, disponível no site da Presi-
dência da República (Planalto).

A gestão educacional possui um caráter amplo e sua abrangência vai além da organi-
zação burocrática. A gestão se dá no processo que envolve as relações pessoais entre
os atores que compõem a escola e a comunidade, e se manifestam no interior da
escola e a sua volta.

Sendo assim, é necessário pensar na escola e gestão democrática como elemento


central na formação de cidadãos críticos e participativos. A escola assume nas socie-
dades democráticas a responsabilidade na formação dos sujeitos, e é necessário que
ela possibilite que os educandos possam participar efetivamente das questões que
envolvem a escola, numa busca pela aproximação entre a sociedade e a escola.

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SUMÁRIO 59
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CONCLUSÃO
Uma reflexão sobre a Educação do Campo nos leva a pensar sobre o protagonismo
dos povos do campo na luta pelo direito a um modelo de educação que esteja rela-
cionado às experiências e vivências desses povos.

Isso significa pensar em uma pedagogia que possibilite estabelecer um canal entre
os anseios e interesses dos povos do campo e um currículo diferenciado, baseado na
junção entre os saberes tradicionais e científicos.

Para isso, é necessário um currículo que respeite a identidade das escolas do campo
e que seja flexível, possibilitando uma adaptação e organização curricular diferencia-
da, dialogando com as múltiplas realidades que marcam as populações do campo.

Outro ponto que merece destaque ao tratar as escolas do campo é a construção de


uma gestão escolar democrática. A participação social no processo educacional é
um exercício de cidadania que contribui para o fortalecimento da educação e para a
construção de uma sociedade mais crítica e justa.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

UNIDADE 4

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Refletir sobre as práticas


educativas na educação
do campo.

> Discutir os aspectos


inerentes à pedagogia
socialista e educação do
campo.

> Refletir sobre a


importância da
produção de materiais
didáticos específicos
para a educação do
campo.

> Explicar o papel do


educador do campo.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

4 PEDAGOGIA DO CAMPO
Nesta unidade, será abordada a importância da construção de práticas educati-
vas específicas para a educação do campo. As diversas realidades e contextos que
permeiam o campo brasileiro levam a refletir sobre a necessidade de um currículo
diferenciado, de acordo com cada realidade. É nesse sentido que, no decorrer da
unidade, será tratada a questão relativa aos materiais didáticos e a importância de
produzir materiais que dialoguem com as múltiplas realidades que constituem o
campo brasileiro.

Além disso, será abordada nesta unidade a pedagogia socialista, que tem como gran-
de referência a pedagoga e revolucionária russa Krupskaia. Sua luta por uma educa-
ção pública e gratuita exerce influência em muitas lutas dos povos do campo.

O papel do educador do campo também é destacado nesta unidade, demonstrando


a importância de que o educador valorize os saberes e vivências dos educandos e alie
os conteúdos escolares a uma formação reflexiva e integral.

INTRODUÇÃO
As práticas educativas na educação do campo envolvem muitas especificidades. Por
ser constituído de múltiplas realidades, o campo brasileiro deve ser analisado a partir
de toda sua complexidade. No campo educacional, refletir sobre as práticas educa-
tivas significa considerar essas realidades dos povos do campo e, por isso mesmo,
considerar também a necessidade de um currículo flexível.

É nesse sentido que se torna relevante a produção de materiais didáticos específi-


cos para a educação do campo e para a realidade dos educandos de cada região. Os
materiais didáticos são ferramentas importantes para a construção do conhecimento.

Os movimentos sociais do campo que se organizam e lutam historicamente por uma


educação diferenciada têm como referência de luta a revolucionária russa Krupiskaia,
que no início do século XX lutava por uma educação pública e gratuita.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

O papel do educador do campo assume grande relevância, uma vez que esse profis-
sional cumpre papel importante na mediação do saber. Vale destacar que o educa-
dor deve ser capaz de ministrar os conteúdos escolares, ao mesmo tempo em que
parte das múltiplas realidades dos educandos para a construção do conhecimento.

4.1 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

A educação do campo conta com práticas pedagógicas específicas para que se possa
promover um processo educativo que seja capaz de dialogar com as diferentes reali-
dades dos povos do campo.

Assim como toda a educação do campo, não é possível simplesmente transportar as


práticas pedagógicas das cidades para os campos. É preciso que essas práticas sejam
construídas e/ou reformuladas dentro do contexto das escolas do campo, sendo,
assim, capazes de dialogar com esses sujeitos e suas realidades.

Garantir uma educação, um currículo e práticas pedagógicas diferenciadas não tem


sido uma ação fácil. Mesmo diante do dever público de promover essa especificidade
e a garantia da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, ainda se encontram
situações de ausência dessas ações nas diversas escolas do campo.

Essa situação é compreendida como um campo em disputa de poder, pois o proje-


to educacional não é neutro, ele envolve diversas realidades e projetos. Diante dessa
realidade, Horácio e Santos destacam que:

[...] é clara a disputa de dois projetos de desenvolvimento/educação/Campo


em curso no país. De um lado, o projeto do agronegócio que nega o campo e
seus sujeitos, limitando-os a uma mercadoria, espaço a ser explorado econo-
micamente apenas, reproduzindo práticas da educação bancária. Por outro
lado, o projeto dos trabalhadores e trabalhadoras rurais que assumem o
campo como o seu lugar, como espaço de (re) produção da vida, do conheci-
mento, da agricultura familiar. Projeto que promove autonomia e emancipa-
ção dos sujeitos (HORÁCIO; SANTOS, 2013, p. 29).

A partir dos apontamentos dos autores, pode-se perceber que um dos problemas que
envolvem a implantação e efetivação do projeto libertador de educação do campo é
o interesse de grupos que visam conceber o campo não como um protagonista das
suas próprias ações, mas como uma região que deve ser subjugada apenas à explo-
ração econômica.

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SUMÁRIO 63
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Nesse contexto de exploração e educação bancária, não há espaço para sujeitos críti-
cos, reflexivos e construtores de suas próprias histórias.

A educação bancária é compreendida por Paulo Freire como um modelo de


educação tradicional em que o professor é considerado o único detentor do
conhecimento. Nesse modelo, o aluno seria aquele sujeito passivo e recep-
tivo, apenas recebendo as informações transmitidas pelos professores, sem
questionar a possibilidade de construir o conhecimento. Para Paulo Freire, os
alunos devem ser os protagonistas do processo de aprendizagem, cabendo
ao professor mediar e orientar o processo de aprendizagem do aluno.

Essa prática educativa concebe o aluno como um mero depositário de informações,


retirando-lhe o direito de construir seu próprio saber e suas reflexões sobre o mundo
em que vive.

As práticas pedagógicas promovidas na educação do campo atuam em outra dimen-


são, considerando que é preciso que o aluno seja o protagonista da sua aprendiza-
gem, para que a educação seja de fato significativa em sua vida. Machado (2017), ao
estudar o histórico de luta dos povos do campo e seu anseio por uma educação cons-
truída pelos próprios sujeitos do campo, destaca que:

O advento da industrialização e o avanço do capitalismo aumentaram a insa-


tisfação dos trabalhadores rurais, que ao reconhecerem que a subordinação os
distanciava do auto desenvolvimento concluíram que esta condição somen-
te servia para produzir a separação entre trabalho manual e intelectual. O
trabalho no meio rural significa tecnicamente o envolver-se na labuta diária
expostos às intempéries da natureza, perseguir o calendário do plantio e da
colheita em conformidade com o conhecimento da terra e carregar em si as
marcas de um discurso que há séculos vem sendo construído aos trabalhado-
res rurais: gente da roça não precisa estudar. Nas décadas acima menciona-
das o trabalhador rural foi restrito a um mero produtor e executor do trabalho
alheio, descolado de suas origens e pelo trabalhado era obrigado a não pensar
e somente a executar atividades desprovidas de sentido (MACHADO, 2017).

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Machado (2017) sintetiza que as lutas dos povos do campo não são apenas em favor
de uma escola de qualidade que atenda às especificidades do campo, mas também
uma escola que seja capaz de se comprometer com a promoção de uma sociedade
melhor para todos.

O autor destaca que, historicamente, os povos do campo foram relegados a uma


concepção de que suas ações deveriam se limitar apenas às atividades trabalhistas
no campo, como se essas tarefas não necessitassem de conhecimento e reflexão
cientifica, apenas mão de obra.

Trata-se de uma concepção que atualmente é considerada ultrapassada e estraté-


gica para os benefícios de grupos que só tinham o interesse de explorar as riquezas
do campo sem desenvolver a região. Todas as atividades humanas necessitam de
reflexão científica. Acreditar que os trabalhos do campo estariam inerentes ao saber
humano é um grande erro.

Essa visão, contudo, serviu para justificar a falta de investimentos na educação nas
regiões do campo, fazendo com que os próprios sujeitos tivessem de ser tornar os
protagonistas das lutas do campo. Nesse contexto, a escola se torna uma pauta
urgente e necessária para as lutas.

Machado (2017) destaca que o pensamento educativo de Paulo Freire tornou-se um


norteador das lutas dos povos do campo. O autor argumenta que:

O pensamento Freireano em que ensinar exige apreensão da realidade e devi-


do a esta habilidade, ao educador é possível reconstruir um mau aprendizado,
trata do proceder pedagógico em o conteúdo desenvolvido pelo educador
possibilita uma ressignificação por meio de uma Educação problematizadora
(MACHADO, 2017).

O pensamento de Paulo Freire inspira as lutas do povo do campo, na medida em que


defende que a escola não é uma instituição separada do restante do sociedade, mas
sim parte integrante desta. Logo, não há como se pensar em práticas educativas sem
levar em consideração os modos de vida em sociedade e problematizar as relações
impostas no modelo capitalista atual.

Freire dizia, por exemplo, que não fazia sentido ensinar o aluno frases como: “vovô
viu a uva”. É preciso que a educação faça sentido para o aluno e também promova

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

reflexões sobre os modos de vida em sociedade. Assim, essa frase poderia ser substi-
tuída por situações, como quem planta a uva, o preço pelo qual ela é vendida, onde
se comercializa a uva, quem tem dinheiro para comprar a uva, entre outras refle-
xões que permitem que o aluno se torne um sujeito ativo na sociedade em que vive,
compreendendo sua estrutura, organização e, assim, construindo a possibilidade de
lutar por um mundo melhor.

Nesse sentido, as práticas pedagógicas devem ser construídas a partir de uma pers-
pectiva libertária, reflexiva e questionadora sobre a realidade que se estabelece no
campo e na cidade. Não basta ensinar apenas conteúdos escolares, é preciso promo-
ver reflexões sobre a estrutura da sociedade.

FIGURA 7 - ESCOLA COMO INSTITUIÇÃO TRANSFORMADORA DA SOCIEDADE

escola

Sociedade

Transformação

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Machado (2017) argumenta que, a partir dessa perspectiva, a escola é concebida


como uma instituição que seja comprometida com a realidade social e que tenha o
papel de criar mecanismos para conduzir transformações sociais, não se limitando
apenas aos conteúdos tradicionais das escolas, mas propondo momentos de reflexão
de contestação do modelo de sociedade atual.

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Por isso, o autor argumenta que: “A escola do campo é composta por sujeitos que,
por necessidades, lutam e conquistam, no decorrer de décadas, o direito a uma esco-
la que se envolva e seja envolvida por características que valorize suas identidades”
(MACHADO, 2017) Logo, não cabe à escola do campo ser uma reprodutora do mode-
lo tradicional em suas salas de aula, é preciso construir propostas educativas que
dialoguem com a realidade desses povos.

As práticas pedagógicas da educação do campo perpassam por diferentes momen-


tos de acolhida. Sempre realizando uma mítica no início de suas atividades, a educa-
ção do campo busca promover e valorizar a cultura e os valores dos seus povos.

A mítica é um momento de acolhida com atividades variadas que visa inte-


grar os sujeitos que participarão de atividades relacionadas à educação do
campo. Na mítica podem ter poemas, música, teatro, discursos, debates,
danças, entre outros. Ela dialoga com a realidade dos povos do campo e
busca unificar o coletivo.

A realização da mística por si só já revela que a educação do campo é movida por um


sentimento de coletividade e união. Nessa modalidade educativa, as práticas visam
a atividades em conjunto, integração da família, reflexão sobre a realidade dos povos
que vivem no campo, entre outros. Pode-se concluir que as práticas educativas do
campo são movidas por um sentimento de transformação da sociedade.

4.2 MATERIAIS DIDÁTICOS

Durante muitos ano, imaginou-se que existia um padrão de educação que deveria ser
seguido por todas as pessoas, sem distinção. Essa realidade começou a se modificar
quando estudiosos da educação perceberam que o processo educativo deve dialogar
com a realidade das pessoas.

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Sabendo que os costumes e os valores das pessoas se modificam de região para


região, não há como determinar um padrão de ensino É preciso que cada região seja
tratada de acordo com seus anseios e sua realidade.

É claro que crianças e jovens do campo e da cidade precisam aprender muitos


conteúdos em comum, mas a forma como esses conteúdos serão trabalhados deve
variar de acordo com a realidade de cada um.

Nessa perspectiva, o Ministério da Educação (MEC) incorporou ao Programa Nacio-


nal do Livro Didático (PNLD) um edital específico para os livros do campo. A partir de
2013, todas as escolas do campo que atendem ao ensino fundamental receberão
livros didáticos específicos.

Sabendo da especificidade dessa educação e da diversidade do campo, o edital visou


produzir livros para escolas seriadas e multisseriadas, a fim de que todas essas esco-
las tenham acesso a esse material que foi produzido especificamente para o campo.

Esse programa é fruto do empenho de diversos setores da educação e dos movimen-


tos sociais que denunciavam há vários anos a necessidade da produção de um mate-
rial diferenciado para o campo. É preciso valorizar e ressaltar as diferenças, para que
todos os alunos tenham acesso a materiais específicos para a sua formação.

É importante destacar que mesmo antes do “PNLD do Campo”, o Ministério da


Educação já havia desenvolvido outros materiais didáticos específicos para essa
região. Além disso, muitas escolas já utilizavam materiais específicos para o campo,
montados pelos próprios professores dessas localidades, para suprir a necessidade
que sentiam de um material que dialogasse melhor com a vida dos alunos.

No Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a produção de materiais para


os alunos que estudam em acampamentos ou assentamentos da reforma agrária
sempre esteve presente na pauta de luta.

Os professores passaram a questionar informações presentes em livros didáticos


tradicionais, como: “Ana tem três bombons...”. Mas como eles poderiam utilizar o
bombom como exemplo para trabalhar com crianças se muitas estavam até sem
açúcar embaixo de suas lonas pretas?

Nessa perspectiva, o movimento passou a realizar diversas reflexões sobre como as

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aulas poderiam dialogar melhor com a vida daqueles alunos. Assim, surgiu a ideia de
trabalharem a partir da realidade destes.

Para trabalhar matemática, por exemplo, passaram a calcular a área dos assenta-
mentos ou acampamentos, para, a seguir, propor questões, como: “Como poderia ser
dividida esta área entre as famílias acampadas? Qual seria a quantidade de material
necessário para a construção de cercas entre as casas?”.

A partir dessas aulas, crianças e jovens passaram a perceber um maior sentido no


processo educativo e ainda puderam compreender melhor a história e o motivo das
lutas que são empreendidas pelo Movimento Sem Terra.

A utilização de materiais específicos para o campo oferece a esses estudantes uma


educação que valoriza seus saberes e que respeita sua diversidade.

É importante destacar que os materiais didáticos recebidos pelas escolas do campo


não se limitam aos alunos. Os professores também recebem kits didáticos com
conteúdos que objetivam a atualização e a capacitação continuada.

4.3 PEDAGOGIA SOCIALISTA

A pedagogia socialista é construída ao longo do processo revolucionário russo que


culmina na Revolução Russa, em 1917, mas que já estava sendo gestado por dife-
rentes personalidades ao longo do campo. Os revolucionários não se contentavam
apenas em assumir o poder, mas também desejavam construir uma nova sociedade
em que as classes menos privilegiadas tivessem de fato uma vida digna e justa.

Várias figuras vão se destacar no processo revolucionário russo e no fomento a uma


educação pública e de qualidade, como Anton Makarenko, Pistrak, Shulgin e Krupska-
ya, que será a referência desta unidade para se realizar uma reflexão sobre a pedago-
gia socialista.

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SUMÁRIO 69
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Nadejda Konstantinovna Krupskaya nasceu no dia 26 de fevereiro de 1869,


em São Petesburgo, Rússia. Faleceu em 27 de fevereiro de 1939, em Moscou,
Rússia. Envolveu-se na luta revolucionária bolchevique defendendo uma
pedagogia que fosse capaz de libertar as massas da opressão e construir
uma nova sociedade. Casou-se com Lenin e teve um papel ativo nas lutas
educacionais e revolucionárias na Rússia. Seus textos foram traduzidos pelo
português recentemente, por isso sua pedagogia ainda é pouco estudada
no país, mas tem se revelado um importante campo para se refletir sobre a
pedagogia socialista.

Krupskaya (2017) constrói uma crítica ácida à situação das mulheres e crianças no
contexto russo que antecede ao processo revolucionário. Ela aponta que as mulheres,
fadadas a longas jornadas nas fábricas, não têm condições de educar e de cuidar dos
seus filhos.

Essa atividade acaba ficando relegada a terceiros e, no contexto russo, esses terceiros
normalmente são os irmãos mais velhos, que às vezes não têm nenhuma experiên-
cia com a tarefa de cuidar de uma criança ou são tão pequenos que não têm nem
mesmo condições físicas e psicológicas para exercer esse papel.

Krupskaya (2017) aponta que o trabalho nas fábricas era permitido a partir dos 12
anos de idade, o que fazia com que as crianças, desde muito cedo, assim que permiti-
do pela lei, passassem a realizar atividades laborativas em troca de salário. Essa situa-
ção revela hábitos muito diferentes do que são cultuados atualmente na sociedade
contemporânea, ao mesmo tempo em que permite refletir sobre como o debate em
torno do trabalho infantil pode ser prejudicial às crianças e jovens.

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70 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

FIGURA 8 - TRABALHO E CUIDADO DOS FILHOS

Trabalhar
Mulheres Crianças
Educar

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Ao realizar suas reflexões sobre os problemas vivenciadas por mães e crianças,


Krupskaya compreende que o jardim de infância público e gratuito seria a melhor
alternativa para essas famílias, entendendo que:

As mães, ao irem para o trabalho, levam suas crianças pequenas para estes
jardins de infância e as deixam lá até o seu retorno do trabalho. Elas podem
trabalhar tranquilamente, porque nenhum desastre acontecerá com seus
filhos: no jardim de infância, muitas professores cuidam das crianças [...] Nós
apresentamos a descrição de um jardim de infância apenas para mostrar que
a educação das crianças pode começar a partir de uma idade muito precoce
e que no jardim de infância público as crianças podem passar o tempo de
forma bastante produtiva para elas e de forma muito mais alegre do que em
casa (KRUPSKAYA, 2017, p. 29).

Krupskaya (2017) destaca a importância da formação infantil desde muito cedo, reve-
lando a preocupação dos revolucionários com a infância e compreendendo que a
escola seria o local mais adequado, pois além de estar em um ambiente seguro e
protegido, ela ainda tem a oportunidade de estudar, aprender e se divertir.

Nota-se, desse modo, o valor que a educação tem no movimento revolucionário russo
e a importância de se discutir a situação das mulheres como uma categoria que não
se limita apenas à condição de trabalhadora, mas que também leva em consideração
sua condição de mulher.

O texto que Krupskaya trata da situação dessas mulheres e crianças é intitulado “A


mulher e a educação das crianças” e foi produzido no ano de 1899. Pode-se observar
que trata-se de um período bem longínquo e, por isso, suas reflexão era tão moderna
para o seu tempo.

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SUMÁRIO 71
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Os escritos de Krupskaya não se limitam apenas à situação da mulher e seus filhos,


ela perpassa por diferentes situações que se relacionam diretamente ao contexto das
escolas.

No texto “Auto-organização escolar e organização do trabalho”, produzido em 1923,


Krupskaya (2017) apresenta interessantes reflexões sobre a organização da esco-
la como uma atividade que deve ser desenvolvida pela própria classe trabalhadora,
visando não apenas aos interesses lucrativos (como se está habituado a verificar na
educação atualmente e já naquele tempo), mas sobretudo aos interesses humanos,
por isso Krupskaya pontua que:

Na escola de ensino a atividade do estudante se reduz a escutar e memorizar


aquilo que o professor falou. A essência da vida escolar, portanto, fica mutilada
e pobre. A criança não tem como exercitar a organização [...] A vida exige esta
discussão conjunta, exige união de forças, exige divisão de trabalho. É impos-
sível pensar a escola do trabalho sem auto-organização (KRUPSKAYA, 2017, p.
121-122).

A partir dos apontamentos da autora, é possível perceber que o modelo de escola


que se buscou promover deveria ser construído não apenas pela classe trabalhadora,
mas também pelos filhos das classes trabalhadores, tendo em vista que esses sujeitos
são os que estarão vivenciando cotidianamente a escola.

Krupskaya (2017) enfatiza ainda qual deve ser o papel do professor nesse modelo
de escola auto-organizacional que se pretende construir e destaca que o papel do
professor deve ser o de promover:

[...] Boas relações de companheirismo entre ele e as crianças [...] Em essência,


o professor deve influenciar na produção de formas corretas de auto-organiza-
ção, mas a influência deve ser indireta e não direta. Deve consistir em que ele
deve ajudar diretamente as crianças a tomar consciência daqueles problemas
organizacionais com os quais elas se enfrentam todo o tempo no jogo e na
vida (KRUPSKAYA, 2017, p. 123).

É interessante observar que Krupskaya, ainda em 1923, já pontuava a necessidade de


se pensar a escola a partir do protagonismo do estudante, reconhecendo o professor
como um sujeito que vai orientar o trabalho pedagógico de modo que os próprios
alunos possam construir sua consciência.

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No texto produzido para “Ao congresso dos professores públicos”, em 1913, Krupska-
ya defende outras concepções pedagógicos bem à frente do seu tempo, como:

1. Educação geral, gratuita e obrigatória para todas as crianças de ambos os


sexos, com duração até os 16 anos de idade [...] 2. Escola laica, isto é, com
total separação e independência entre escola e igreja. 3. Organização demo-
crática e não burocrática do trabalho escolar, com a mais ampla participação
e controle da população, com a eleição de comitês escolares que acompa-
nham as suas atividades. 4. Garantia plena de liberdade de opinião e direito
de associação aos professores; e, 5. Direito da população de receber educação
em sua língua nativa, sem qualquer tipo de privilégio para qualquer língua
(KRUPSKAIA, 2017, p. 33-34).

É curioso imaginar como a autora foi capaz de apontar situações ideais para uma
escola há mais de 100 anos atrás e que algumas dessas concepções ainda podem
estar tão atuais e carentes de investimento, como é o caso da maior participação
das comunidades no cotidiano da escola ou mesmo a burocracia que perpassa pela
prática pedagógica.

A partir desses apontamentos, pode-se perceber que a educação socialista se estru-


tura a partir de uma perspectiva que deve ser capaz de retirar os sujeitos das situa-
ções de opressões as quais eles estão subordinados, fomentando um processo educa-
tivo que seja capaz de romper com essa lógica mercadológica. Krupskaya (2017)
compreende que:

No Estado burguês [...] A escola é instrumento de subjugação intelectual de


amplas massas nacionais. A finalidade da escola em tal Estado não é deter-
minada pelos interesses dos estudantes, mas pelos interesses da classe domi-
nante, isto é, pela burguesia, e os interesses de uns e de outros frequentemen-
te são essencialmente bem diferentes (KRUPSKAYA, 2017, p. 65).

A escola, sendo um espaço apenas para satisfazer aos interesses dos grupos dominan-
tes, e não dos sujeitos que a frequentam, fez com que fosse uma instituição reivindi-
cada pelo processo revolucionário russo, a fim de formar novas concepções para esse
importante espaço de formação.

Nesse sentido, a pedagogia socialista compreende que a escola também não deve se
limitar a simplesmente a reproduzir os conteúdos escolares burgueses, mas torna-se
um espaço para reflexão sobre os problemas que atingem a sociedade.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Assim, além dos conteúdos escolares, a escola precisa ser capaz de atender ao seu
povo e suas necessidades. A pedagogia socialista defendia uma escola que fosse capaz
de perpassar por diferentes necessidades das vidas dos sujeitos, discutindo desde sua
organização até os processos de trabalhos necessários à sociedade da época.

Pode-se concluir que a pedagogia socialista busca formar um sujeito integral, crítico
e ético, preocupado e consciente do seu papel dentro da sociedade, colaborando
para a efetivação de uma sociedade mais igualitária e melhor para todos.

É nesse sentido que a pedagogia socialista dialoga com a pedagogia do campo. Não
basta apenas o aprendizado dos saberes escolares. A pedagogia do campo visa à
preparação e formação de sujeitos críticos e capazes de decidir seus destinos.

A pedagogia do campo, assim como a socialista, valoriza os saberes dos educandos


e tem como característica uma formação humana aliada ao desenvolvimento pleno
do sujeito.

4.4 O PAPEL DO EDUCADOR DO CAMPO

O educador do campo deve ser capaz de aglutinar em suas atividades pedagógicas


todos os processos que envolvem a formação humana, não se limitando apenas aos
conteúdos escolares em si, mas promovendo formas de reflexão e crítica que permi-
tam que os alunos possam compreender de forma efetiva a sociedade em que estão
inseridos e, assim, construir mecanismos capazes de modificar as situações de violên-
cia, opressão e desigualdade.

Sua responsabilidade pedagógica perpassa também pela necessidade de conduzir


o processo educativo a partir do respeito à diversidade presente na escola, pois, dife-
rentemente do que afirmam algumas pessoas em uma concepção do senso comum,
o campo é uma região muito diversa. Reconhecer essas diversidades é fundamental
para o sucesso do processo educativo.

Além disso, o tempo de aprendizagem é único em cada pessoa, por isso é preci-
so que o educador esteja também atento aos processos de aprendizagem dos seus
alunos, buscando teorias e metodologias diversas, de modo a atender a todas as esfe-
ricidades presentes na sua sala de aula.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A educação do campo, em diferentes momentos, se inspira na pedagogia socialista.


Desse modo, é interessante a auto-organização da escola, fugindo da perspectiva de
que os alunos são sujeitos passivos da escola e os empoderando como sujeitos ativos
de direito.

Na educação do campo, os educandos devem ser compreendidos como responsá-


veis pelo seu próprio processo de aprendizagem, pois eles são os protagonistas da
escola, e não meros reprodutores do conhecimento transmitido pelo professor, como
se instaurou em algumas escolas brasileiras.

Para garantir o protagonismo do estudante, é importante que o educador reconhe-


ça-se como um mediador desse processo de aprendizagem, alguém responsável
por apontar os caminhos da pesquisa, investigação e indagação, ações necessárias à
construção do saber.

Bernadi, Pelinson e Santin (2014), ao promoverem um estudo sobre os desafios que


envolvem a prática pedagógica no campo, entrevistaram um grupo de professores e
monitores que atuam na educação do campo. Na ocasião, ao indagar sobre o papel
do professor na educação do campo, receberam a seguinte definição de um dos
entrevistados:

Para ser educador e voltar-se para essa educação do campo, vejo necessária
a certeza da diversidade. O agricultor não é aquela figura pintada por muitos
do homem que não se atualizava, não buscava conforto. Educar no/para o
campo exige que o professor reconheça o aluno (a família) como responsável
pelo próprio capital, e que este, além de garantir o sustento do próprio lar,
exige o conforto cada vez melhor do seu grupo familiar (BERNADI; PELINSON;
SANTIN, 2004, p. 132).

Pelo depoimento do educador, é possível perceber que a educação do campo deve


ser compreendida como um processo diverso, no qual os sujeitos precisam ter cons-
ciência dessa diversidade para ter condições de atuar dentro dos diferentes contex-
tos que fazem parte do campo.

Nota-se, ainda, que o educador tem a consciência de que o sujeito do campo deve
ser o protagonista da sua própria aprendizagem e, para garantir esse processo, é
importante que o educador reconheça essa autonomia e assim promova condições
adequadas para garantir o protagonismo dos sujeitos do campo.

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SUMÁRIO 75
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

É interessante observar ainda que o educador do campo reconhece a importância da


família no contexto da escola, compreendendo que o processo educativo envolve não
apenas o educando, mas toda a sua família.

A educação do campo, desse modo, mantém a necessidade de se estabelecer uma


relação direta entre família e escola para se garantir o sucesso do processo de apren-
dizagem.

FIGURA 9 - RELAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA

Família

LDB

Escola

Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019.

A participação da família na escola não é uma demanda específica dos povos do


campo. A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) destaca a
importância de a família fazer parte desse processo de escolarização e reconhecer a
escola como uma instituição pertencente à comunidade.

Ao trabalhar de forma coletiva, escola e família têm mais chances de sucesso no


processo de aprendizagem das crianças e jovens. Por isso, ao defender essa relação, a
LDB reconhece que trata-se de uma relação benéfica para todos os sujeitos.

Quando a comunidade e a família reconhecem a escola como um direito e um espa-


ço que carece da sua participação, eles tendem a se envolver mais no cotidiano da
escola e promover práticas que colaborem com o desenvolvimento da escola.

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76 SUMÁRIO
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A escola, por sua vez, passa a receber contribuições da comunidade e, assim, pode
estruturar sua prática pedagógica dentro das expectativas dos povos que ali vivem.

Nesse contexto, cabe ao professor promover momento de interação e escuta das


famílias. Ao conhecer as histórias dos seus alunos e seus modos de vida, os profes-
sores conseguem promover aulas mais significativas, que sejam capazes de dialogar
com os diferentes contextos dos seus alunos. Assim, não apenas para a educação do
campo, mas também para toda a educação, o papel e participação da família nessa
instituição são fundamentais.

A educação do campo, diferentemente das cidades, ainda é recente e tem se conso-


lidado gradativamente. Durante muitos anos, a velha máxima preconceituosa de que
os povos do campo não precisam de escolas serviu como justificativa para que o poder
público destinasse poucos recursos a essa modalidade educativa, o que faz com que
ainda hoje o campo apresente índices de analfabetismo mais altos do que as cidades.

Diante desses apontamentos, pode-se concluir que o papel do educador do campo


não se limita apenas a criar condições para que os alunos sejam os protagonistas
da sua aprendizagem, mas também, sobretudo, promover formas de diálogo entre
família e escola, buscando a promoção de uma escola que seja capaz de transformar
a vida dos povos do campo.

CONCLUSÃO
Tratar da educação do campo é sempre um enorme desafio, tendo em vista a diver-
sidade que constitui e forma o campo brasileiro. Além disso, o campo é marcado por
uma diversidade que precisa ser compreendida a partir de toda sua complexidade.

As práticas educativas na educação do campo também precisam se relacionar com


essa diversidade e dialogar com as vivências dos educandos. Por isso, as práticas
educativas são tão importantes para a garantia do direito à educação.

Aliado às práticas educativas, estão os materiais didáticos. As especificidades das


realidades do campo exigem a utilização de materiais didáticos que dialoguem com
as vivências dos educandos, aproximando-os dos conteúdos curriculares comuns e
incorporando os aspectos referentes às suas culturas.

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SUMÁRIO 77
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

É nesse aspecto que a pedagogia do campo dialoga com a pedagogia socialista, da


revolucionária russa Krupskaya. A pedagogia socialista visava à formação integral do
sujeito.

De acordo com essa teoria, deveria ser valorizado não só os saberes científicos e esco-
lares, mas também os saberes tradicionais que todos indivíduos carregam.

Esse modelo educacional exige uma formação qualificada para o professor e educa-
dor do campo, uma vez que o mesmo deve mediar a relação entre os saberes escola-
res e os saberes que os educandos já trazem a partir de suas vivências.

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78 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

UNIDADE 5

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Refletir sobre a questão


fundiária brasileira.

> Discutir e
problematizar as
desigualdades
e estereótipos
relacionados ao campo
e à cidade.

> Problematizar a
organização dos
povos do campo e dos
movimentos sociais do
campo.

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SUMÁRIO 79
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

5 CAMPO BRASILEIRO:
HISTÓRICO E OCUPAÇÃO
A formação histórica do Brasil é marcada pela concentração de terras, o que leva a
refletir sobre as desigualdades presentes na sociedade brasileira atualmente. Nesse
sentido, é importante problematizar essas desigualdades e trazer à tona a discussão
referente aos estereótipos relacionados ao campo e à cidade.

A ideia de modernização do país foi construída a partir de uma dicotomia que natu-
ralizou a mentalidade de que o campo é o lugar do atraso, enquanto a cidade seria o
espaço da modernidade.

Essa maneira de enxergar o processo histórico foi e é responsável por uma visão
preconceituosa do campo e de toda sua população. É nesse contexto que os movi-
mentos de luta pela terra ganharam visibilidade na luta por uma redistribuição de
terras justa e por oportunidades para os sujeitos do campo, sempre visando à supera-
ção das mazelas e desigualdades sociais.

Assim, esta unidade traz uma reflexão sobre a formação fundiária brasileira e a luta
dos movimentos sociais por uma educação do campo que valorize as culturas e iden-
tidades dos povos do campo.

INTRODUÇÃO
Desde o período da colonização portuguesa, o Brasil apresenta diversas tensões entre
grupos sociais que compõem o campo brasileiro. Essas tensões refletem também as
disputas de interesses relacionados ao uso e ocupação da terra.

Com a chegada dos portugueses, no que atualmente se conhece como território


brasileiro, iniciava-se um processo de ocupação da terra que seria os primórdios da
concentração de terras que hoje é realidade no Brasil.

A formação histórica do campo brasileiro se deu pela concentração de terras nas


mãos de poucas pessoas. Após o processo de independência política do Brasil, as

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80 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

estruturas fundiárias continuaram as mesmas, demonstrando que essa emancipação


aconteceu atendendo aos interesses e anseios das elites fundiárias brasileiras.

Foi no contexto de luta pela terra que os movimentos sociais do campo se organiza-
ram para exigir não só uma redistribuição de terras, mas também o direito à educa-
ção, pois, ao longo de suas trajetórias históricas, perceberam que, para romper com
as desigualdades no acesso à terra, era preciso também conquistar outros espaços.

Nesse sentido, destaca-se o papel dos movimentos sociais do campo na organização


e luta por justiça social e fundiária e se busca refletir sobre o papel de protagonismo
desses movimentos ao longo da história em prol dessas lutas e na construção e valo-
rização das culturas e identidades dos povos do campo.

5.1 CAMPO BRASILEIRO: HISTÓRICO E OCUPAÇÃO


DA TERRA

Uma reflexão sobre o campo brasileiro leva a considerar o conceito de campo em


toda a sua complexidade e dinamismo. Isso significa pensar em toda diversidade que
compõe o campo brasileiro e os múltiplos interesses que fazem do campo um terri-
tório tenso, marcado por embates políticos, econômicos, sociais e culturais.

Desde o início da colonização portuguesa no Brasil, no século XVI, houve o predomí-


nio do latifúndio. A terra ficou concentrada nas mãos de poucos proprietários.

Uma das características do modelo colonizador implantado na América portuguesa


foi o caráter monocultor da agricultura de exportação, dependente de investimentos
e financiamentos externos.

Essa característica inviabilizou, inclusive, a montagem de um sistema baseado em


pequenas e médias propriedades e no trabalho assalariado ou familiar.

Tais aspectos levariam à dinamização do mercado interno e à distribuição de renda


na colônia, fatores contraditórios em relação à dinâmica do sistema colonial mercan-
tilista da época moderna.

A agricultura de exportação do período colonial se baseou no que, de uma maneira


geral, denominou-se “tripé econômico”, isto é, a monocultura, a escravidão e o lati-
fúndio.

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SUMÁRIO 81
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

FIGURA 10 - TRIPÉ DA ECONOMIA

Monocultura

Tripé
econômico

Escravidão Latifúndio

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

A efetiva implementação do sistema colonial na América portuguesa se deu com a


agromanufatura do açúcar. A agromanufatura açucareira se estruturou com base na
plantation, isto é, na grande unidade escravista de produção. Essa unidade compreen-
dia dois setores produtivos: o agrícola e o manufatureiro.

O setor agrícola dividia-se em um setor escravista dominante, produtor de cana-de-


-açúcar, e um setor produtor de alimentos, que abastecia os trabalhadores, sendo
estes subordinados ao primeiro.

No setor produtor de alimentos, os escravos recebiam lotes em usufruto concedidos


pelo grande proprietário. A produção realizada nesses lotes garantia não apenas uma
melhor alimentação aos escravos e às suas famílias, como também diminuía o custo
de manutenção destes por parte dos senhores.

Esse modelo ficou conhecido pela expressão “brecha camponesa”. A maior expansão
da agromanufatura açucareira ocorreu no final do século XVI e na primeira metade

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82 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

do século XVII, quando a produção era realizada em mais de 250 engenhos, coinci-
dindo com o movimento acentuado de alta dos preços no mercado europeu.

Em fins do século XVIII, o quadro geral da economia colonial, já bastante diversifica-


do, apresentava as seguintes características:

• Agromanufatura açucareira

Era um dos setores dominantes da economia colonial (latifundiário e escravista), que,


após um período de declínio em função da concorrência da produção realizada nas
Antilhas, experimentou uma recuperação expressiva.

Durante todo o Período Colonial, o açúcar foi o principal produto agrícola de expor-
tação do Brasil. Entre 1796 e 1811, esse produto foi responsável por 35% das expor-
tações brasileiras. A renda média gerada pela agromanufatura do açúcar, inclusive no
século XVIII, o chamado “século do ouro”, foi maior do que a de qualquer outro setor
da economia colonial.

• Mineração de ouro e diamantes

Nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, a mineração de ouro e diamantes, embora em


declínio desde o último quartel do século XVIII, se manteve como atividade domi-
nante nessas regiões. Entretanto, a população da Capitania de Minas Gerais conti-
nuou a ser a maior da Colônia.

• Tabaco e algodão

Na região Nordeste, destacava-se, além da agromanufatura do açúcar, a produção de


tabaco e algodão. O primeiro, ao longo do Período Colonial, foi largamente utilizado
como “moeda” no tráfico de escravos, enquanto o segundo ganhou crescente impor-
tância em razão do processo de industrialização, iniciado na Inglaterra a partir da
década de 1780. Também nessas atividades predominou uma estrutura latifundiária
e escravista.

• Setores subsidiários

Os setores subsidiários (pecuária extensiva e extrativismo das “drogas” amazônicas)


utilizavam, em grande escala, uma mão de obra de menor custo. Esta era proveniente,

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SUMÁRIO 83
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

notadamente, da mestiçagem de brancos, índios e negros. Os setores subsidiários


continuaram a ter, no final do século XVIII, uma importância relativa no contexto da
economia colonial.

Com o declínio da extração de ouro e diamantes, a pecuária em Minas Gerais, Mato


Grosso e Goiás expandiu-se e, já no século XIX, tornou-se a atividade predominante,
acelerando as lutas contra os povos indígenas e a consolidação de uma estrutura lati-
fundiária, assim como já ocorrera no sertão Nordestino e no extremo Sul.

• Comércio interno

Quanto ao comércio interno, vale destacar a articulação que ele propiciou entre os
vários polos econômicos. Ao mesmo tempo, desenvolveu-se um comércio ambulan-
te em muitas cidades coloniais, com destaque para São Paulo e Rio de Janeiro, reali-
zado principalmente pelos “escravos de ganho” (escravos alugados a terceiros ou que
dividiam os rendimentos auferidos com seus senhores atuando na construção civil,
nos serviços domésticos e em atividades artesanais).

5.2 INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E A QUESTÃO


FUNDIÁRIA

A independência política do Brasil não rompeu com as velhas estruturas econômicas


do país. Todo o processo de independência do Brasil atendia aos interesses e aspira-
ções dos grupos de fazendeiros que compunham a aristocracia rural brasileira.

A economia do país continuou sendo baseada na exploração da mão de obra escravi-


zada e apoiada na produção agrícola monocultora voltada para exportação, fazendo
com que a economia brasileira continuasse dependente do mercado externo.

Importante destacar que, após a independência, as relações com a Inglaterra se


intensificaram. A Inglaterra foi responsável por diversos empréstimos ao Estado brasi-
leiro, principalmente no incentivo da economia cafeeira.

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84 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

FIGURA 11 - BRASIL E O CAPITAL INGLÊS

Brasil

Capital Economia
Inglês cafeeira

A partir da década de 1830, a expansão da economia cafeeira recolocou o Brasil nos


quadros do comércio internacional, reproduzindo o que o historiador Caio Prado
Júnior (1970) definiu como “o sentido da colonização”, isto é, uma economia baseada
no latifúndio monocultor agroexportador. A produção cafeeira, pelo menos em sua
primeira fase (1830-1860/70), alicerçou-se no trabalho escravo, dando nova dimen-
são ao tráfico negreiro e ao tráfico interprovincial, com o deslocamento de grandes
massas escravas não apenas de áreas economicamente estagnadas do Nordeste,
mas também das antigas áreas de mineração.

Entre as características da economia cafeeira em sua primeira fase, destacaram-se:

• concentração da produção no Vale do Paraíba e na Zona da Mata Mineira, com


destaque para cidades, como Vassouras, Resende, Valença, Taubaté, Areias,
Mar de Espanha, Juiz de Fora, Cataguazes;

• capital inicial proveniente de fontes internas (atividades comerciais e minera-


ção);

• predomínio do porto do Rio de Janeiro para o escoamento da produção;

• constituição de uma nova aristocracia rural: os “barões do café”.

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SUMÁRIO 85
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A partir da década de 1870, a chamada “onda verde” começou a atingir as férteis


“terras roxas” (na verdade, vermelhas; rosso, em italiano, significa vermelho) do Oeste
Paulista. Considere-se, no entanto, que o Oeste Paulista cafeeiro não correspondia ao
oeste geográfico da província de São Paulo. Nessa fase, que se estendeu mesmo após
a instalação da República (1889), destacaram-se as seguintes características:

• crescente destaque das cidades de Campinas, Limeira, Rio Claro, Araraquara,


Ribeirão Preto, dentre outras;

• predomínio da mão de obra livre e assalariada, já que a expansão cafeeira


promoveu, em grande parte, especialmente a partir da segunda metade do
século XIX, a transição do trabalho escravo para o trabalho assalariado basea-
do, predominantemente, na mão de obra imigrante;

• implantação de um sistema ferroviário (graças à aplicação de capitais notada-


mente britânicos);

• predomínio do porto de Santos para o escoamento da produção;

• surgimento de uma nova elite econômica com uma mentalidade mais empre-
sarial e dinâmica: a burguesia cafeeira do Oeste Paulista.

A produção cafeeira rapidamente alcançou o primeiro lugar na pauta dos produtos


de exportação:

• na década de 1820, o café respondeu por apenas 18,4% do total das exporta-
ções

• no entanto, já na década de 1830 a exportação de café respondeu por 43,8%


do total, mantendo-se nas décadas seguintes como o principal produto de
exportação do Brasil;

• na última década da Monarquia (1881-1890), o café atingiu o expressivo núme-


ro de 61,5% do total das exportações.

Ao longo do século XIX, durante o Período Imperial, a concentração fundiária se


manteve. Aliás, ela se ampliou, principalmente a partir de 1850. Nesse ano foi aprova-
da pela Assembleia Geral do Império, no dia 18 de agosto, a “Lei de Terras”.

De acordo com essa lei, as terras que ainda não haviam sido plenamente ocupa-
das (terras públicas), passaram a ser vendidas. Os grandes proprietários, que tinham

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86 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

recursos financeiros, puderam incorporar grandes extensões de terras aos seus lati-
fúndios.

A lei não impediu a invasão e a grilagem, em todo o país, das terras devolutas por
parte dos latifundiários, ocorrendo, assim, uma maior concentração da terra.

Na passagem do Império para a República, essa situação não se alterou. A maioria


absoluta da população brasileira nessa época vivia em áreas rurais, sem acesso à terra
e dependente dos grandes proprietários. A luta pela terra passou a ser constante.

5.3 A QUESTÃO DA TERRA NO SÉCULO XX:


REPÚBLICA, CAFÉ E RESISTÊNCIA

As primeiras décadas do século XX caracterizaram-se, no plano econômico, pela


persistência da atividade cafeeira e pela aceleração do processo de industrialização,
que foi dinamizado em razão das alterações conjunturais decorrentes da Primeira
Guerra Mundial (1914-1918) e da Crise de 1929 e de seus desdobramentos.

Durante a chamada Primeira República (1889-1930), houve predomínio político


dos grandes proprietários de terras, em especial aqueles ligados ao setor cafeeiro –
considerado o “motor” da economia brasileira. A hegemonia dessas oligarquias ficou
bastante evidenciada por ocasião da assinatura do Convênio de Taubaté, no ano de
1906, por representantes dos três principais estados produtores: São Paulo, Minas
Gerais e Rio de Janeiro.

Como se tratava de uma atividade econômica subordinada aos interesses das áreas
centrais do capitalismo e cuja produção voltava-se para atender à demanda externa,
a cafeicultura apresentava, a cada ano, safras recordes.

Em pouco tempo, as crises de superprodução tornaram-se cada vez mais recorren-


tes, forçando uma intervenção do Estado brasileiro, com o objetivo de valorização do
produto.

Tratou-se, no entanto, de uma valorização artificial, uma vez que, de acordo com o
Convênio de Taubaté, caberia ao governo federal retirar do mercado os excedentes
que não eram absorvidos pelo mercado internacional, numa tentativa de estabiliza-
ção de preços.

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SUMÁRIO 87
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Ao longo das décadas de 1920 e 1930, a queda dos preços do café no mercado inter-
nacional provocou um deslocamento dos investimentos do setor agrário para o setor
industrial, reforçando, ainda mais, os vínculos entre a burguesia cafeeira e a burguesia
industrial.

A Crise de 1929 atingiu, em maior ou menor escala, todos os países capitalistas. O


Brasil foi profundamente afetado pela queda do volume do comércio internacional,
ficando praticamente sem condições de exportar a safra de café daquele ano.

Como reflexo dessa crise, toda a economia foi abalada, principalmente o setor primá-
rio-exportador, com destaque para o cafeeiro. Com o colapso desse setor, tornou-se
necessário redefinir o modelo econômico até então hegemônico no país.

Logo após a Proclamação da República, em 1889, teve início um dos princi-


pais movimentos sociais em que a questão agrária esteve presente: a Guerra
de Canudos. Em 1893, no sertão da Bahia, surgiu, inicialmente, um arraial no
qual se reuniram pessoas que seguiam Antônio Conselheiro, líder religioso e
político. Esse arraial, localizado na região do Rio Vaza-Barris (sertão da Bahia),
denominado Belo Monte, ficou conhecido como Arraial de Canudos.

Canudos cresceu rapidamente, e, em 1896, já tinha em torno de 35 mil habi-


tantes. Eram pessoas que vinham de diferentes lugares, abandonando fazen-
das e vilas em busca de uma vida melhor.

Em Canudos, ninguém era dono da terra, todos tinham moradia e trabalho,


e os alimentos eram distribuídos à população de acordo com as suas neces-
sidades.

O crescimento de Canudos chamou a atenção dos proprietários de terras,


que, a cada dia, perdiam trabalhadores que preferiam ir viver em Canudos.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Também o governo republicano preocupou-se com o movimento e tratou


de apresentá-lo como uma manifestação de fanáticos que pretendiam o
retorno da monarquia. Para o governo e para os grandes proprietários, Canu-
dos era um exemplo que não poderia sobreviver. Assim, várias expedições
militares foram organizadas com o objetivo de destruir o arraial. A resistên-
cia dos sertanejos – habitantes de Canudos e seguidores de Conselheiro – foi
intensa. Afinal, eles lutavam pela própria vida.

5.3.1 AS LIGAS CAMPONESAS

A luta pela terra teve outro momento importante na década de 1950. Nessa época,
no município de Vitória de Santo Antão, interior de Pernambuco, surgiu um movi-
mento que ficou conhecido como Ligas Camponesas.

O principal líder desse movimento foi Francisco Julião, advogado e deputado esta-
dual pelo Partido Socialista em Pernambuco. Em 1954, solidarizou-se com os traba-
lhadores do Engenho Galileia, em Vitória de Santo Antão, que, após organizarem a
Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco, foram ameaçados
de despejo, sob a alegação, por parte do proprietário, de que “isso era coisa de comu-
nista”. No dia 1º de janeiro de 1955, Francisco Julião legalizou a sociedade fundada
pelos “galileus” como Ligas Camponesas.

O principal objetivo das Ligas Camponesas era a reforma agrária, isto é, a revisão da
estrutura agrária do país com o objetivo de se alcançar uma distribuição mais iguali-
tária da terra, visando à promoção da justiça social.

Para elas, o latifúndio devia ser combatido, pois mantinha as desigualdades sociais
no campo e era responsável pelo crescente êxodo rural, porque não oferecia oportu-
nidades de trabalho para todos.

Em 1955, o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto escreveu o livro “Morte e
vida Severina e outros poemas em voz alta”. Nele o autor relata o drama do sertanejo
sem terra que se torna retirante e busca o litoral para fugir da seca e da pobreza. O

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

retirante de seu poema, chamado Severino, sonha ter uma vida melhor, distante do
latifúndio que o mantém na miséria.

A seguir, foi reproduzido um trecho do poema “Morte e vida Severina”. Trata-se do


momento em que Severino está assistindo ao enterro de um trabalhador rural e ouve
o que dizem do morto os seus amigos.
Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a conta menor
que tiraste em vida.
[...]
Não é cova grande,
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida (MELO NETO, 1987).

A intensa mobilização dos trabalhadores rurais se deu num contexto em que recru-
descia a Guerra Fria em razão da vitória da Revolução Cubana, em 1959, no exato
momento em que seus líderes afirmavam o caráter anti-imperialista e socialista do
processo revolucionário.

Os setores conservadores e, particularmente, os grandes proprietários de terras, se


sentiram ameaçados pela ação das Ligas Camponesas, cujas lideranças, por sua vez,
entendiam que as medidas do governo João Goulart, “Jango”, em relação à questão
da terra eram simplesmente paliativas, isto é, provisórias, pouco eficazes, inócuas.

Como exemplo, pode-se considerar a aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural,


em 1963, que, finalmente, estendia aos trabalhadores do campo a legislação social
implementada desde 1930 que beneficiava os trabalhadores urbanos.

A reação dos proprietários de terras diante do Estatuto foi a de ameaçar os trabalha-


dores rurais de demissão ou simplesmente não cumpri-lo.

As dificuldades para a redistribuição fundiária eram enormes – a própria Constituição


de 1946, em seu artigo 141, a proibia. Apenas por meio de uma reforma constitucio-
nal, a reforma agrária poderia ser implementada. A insistência de Jango em tentá-la
por meios legais, isto é, pelo Congresso Nacional, levantava contra ele suspeitas dos

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

grupos de esquerda em relação às suas reais intenções. Afinal, considerando-se o


perfil claramente conservador do Congresso, tinha-se plena consciência de que se
utilizando somente de uma reforma constitucional não se avançaria nessa questão.

As Ligas Camponesas ampliaram suas reivindicações no início da década de 1960,


exigindo, conforme se dizia na época, “Reforma Agrária já!”. As pressões pela refor-
ma agrária assustaram não apenas os grandes proprietários de terras, mas também
outros setores da sociedade brasileira. A partir de 1964, muita coisa mudou no Brasil.
Nesse ano, foi implantada uma ditadura militar. Nesse novo regime, não havia possi-
bilidade de participação política para os brasileiros de uma maneira geral. As eleições
diretas para presidente foram suspensas e o país passou a ser governado por generais
nomeados pelas Forças Armadas.

As liberdades individuais foram atingidas. Os sindicatos de trabalhadores foram dura-


mente perseguidos, e muitos de seus líderes, presos. Também o movimento estu-
dantil foi reprimido e muitas universidades foram invadidas pelos militares; a União
Nacional dos Estudantes (UNE) teve suas atividades proibidas. A censura aos jornais,
às rádios e às emissoras de televisão passou a ser uma constante, e estes só publica-
vam aquilo que os militares permitiam.

Nessa situação, as Ligas Camponesas foram proibidas e muitos de seus líderes foram
presos. A luta pela terra foi duramente atingida nessa época, no entanto não acabou,
apesar de toda a repressão imposta pelo regime militar.

5.4 MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS


SEM TERRA (MST)

No final da década de 1970, por causa dos conflitos sociais no campo, na região Sul
do Brasil se formou o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Uma das formas
de luta do MST é a ocupação de terras como forma de pressionar o governo a acelerar
a reforma agrária.

Há, também, a preocupação em sensibilizar a sociedade brasileira para a questão


agrária. Afinal, trata-se de uma questão de justiça social e de luta pela cidadania
plena.

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SUMÁRIO 91
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

A cada ano que passa, cresce a polêmica sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) no Brasil. Internacionalmente, é visto como uma forte luta popular
em busca da reforma agrária.

No período da Ditadura Militar (1964-1985), o Brasil vivenciou um processo de inten-


sa modernização do campo, fruto dos empréstimos realizados pelos governos mili-
tares, principalmente junto aos Estados Unidos, que privilegiavam as grandes produ-
ções agrícolas em detrimento da agricultura familiar.

Essa política privilegiava o agronegócio e prejudicava o pequeno agricultor e fez com


que emergissem novos conflitos e disputas pela terra, uma vez que contribuía para a
concentração cada vez maior da terra.

A sonhada reforma agrária não se realizou, e parte do poder político se concentrou,


ainda mais, nas mãos dos integrantes da conhecida “bancada ruralista” no Congresso
Nacional.

Os estímulos direcionados ao agronegócio e o consequente enfraquecimento da


agricultura familiar contribuíram para a expulsão de milhões de famílias do campo,
que migraram para as cidades e para diferentes regiões brasileiras.

O Brasil tem um dos maiores índices de concentração de terras do mundo.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nasceu do processo de luta e
resistência contra a política de desenvolvimento agropecuário implantada durante o
regime militar. O movimento foi fundado em 1984, em Cascavel, no Paraná.

O objetivo maior do movimento é a defesa do direito à terra em um enfrentamento


contra a exploração do desenvolvimento do capitalismo no campo.

A nossa história registra muitos movimentos de luta dos camponeses. Canudos e


Contestado são os mais conhecidos e os mais estudados.

As lutas que marcaram a história do MST, mesmo antes de sua fundação em 1984,
foram as ocupações realizadas no estado do Rio Grande do Sul em 1979, as ocupa-
ções em Santa Catarina em 1980 e, nesse mesmo ano, as realizadas no Paraná, como
consequência do conflito entre o governo federal e as mais de dez mil famílias que
tiveram suas terras inundadas com a construção da barragem de Itaipu.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Naquela época, o Estado propôs apenas a indenização em dinheiro, enquanto os


camponeses exigiam outras terras. As ocupações de terras em São Paulo e no Mato
Grosso do Sul, nos anos seguintes, consolidaram a ideia da estruturação do movimento.

Foi em meados da década de 1990 que o MST ganhou maior espaço na mídia e,
assim, a questão agrária ganhou maior visibilidade em áreas urbanas. Isso se deve,
entre outros motivos, à decisão do MST de intensificar seu trabalho para sensibilizar
a população das cidades, mostrando que a democratização da terra é fundamental
para resolver problemas sociais, tanto no campo quanto no meio urbano.

Até 1997, o MST havia se organizado em 24 estados, formando uma rede nacional
de luta e resistência, promovendo e criando ocupações, assentamentos, secretarias e
cooperativas implantadas em vários municípios.

Foi nessa época que o MST adotou a palavra de ordem “Reforma agrária, uma luta de
todos”. Além disso, os massacres de Corumbiara, em 1995, e de Eldorado dos Cara-
jás, em 1996, forçaram os meios de comunicação a discutir de forma mais intensa a
questão agrária.

Em abril de 1997, a “Marcha para Brasília” fez com que o MST fosse destaque nas
primeiras páginas dos jornais e revistas de maior circulação. Dois mil sem-terra parti-
ram de três diferentes pontos do Brasil em direção à capital federal, clamando por
terra, emprego e justiça. A caminhada durou dois meses e, no total, contou com cerca
de 40 mil participantes.

Em resposta à preocupação das elites com a alta popularidade do movimento, o que


se viu, na maioria dos grandes jornais, foi o destaque dado a situações de conflito
envolvendo o movimento. As matérias se tornaram mais negativas a partir de 1998,
quando o MST passou a reivindicar mudanças na política econômica do governo
Fernando Henrique Cardoso como forma de resolver a crise no campo.

Hoje, o MST é um fenômeno, uma referência social de contestação e reivindicação,


agregando vários seguimentos. Entre seus seguidores, incluem-se desempregados,
agricultores arruinados, comerciários, boias-frias e expropriados das grandes cidades,
constituindo uma massa de excluídos. Não haveria MST se não houvesse miséria. O
movimento também tem o mérito de ter reconduzido a reforma agrária à agenda
nacional, como na década de 1950.

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SUMÁRIO 93
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

5.5 CARACTERÍSTICAS E ORGANIZAÇÃO DAS


ESCOLAS DO CAMPO: PROTAGONISMO DOS
MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO

Quando se pensa no campo brasileiro, é importante refletir sobre o papel da escola


na transformação e superação das desigualdades pelos povos do campo. E isso leva
a pensar sobre como se organizam as populações do campo em prol da educação.

Ao se refletir sobre as escolas, algumas coisas logo vêm à mente, como livros, quadros
(lousas), bibliotecas, quadras, carteiras, professores e alunos. Mas, mesmo comparti-
lhando algumas coisas em comum, nem todas as escolas são iguais.

As escolas precisam dialogar com a realidade de cada um dos alunos que ali estu-
dam, por isso elas têm características próprias e tornam-se diferentes em cada região.

No campo é bem assim: as escolas têm personalidades e ideias próprias, possibilitan-


do que os alunos aprendam conteúdos que estejam relacionados não só aos gran-
des fatos e acontecimentos, mas também sobre o que é característico do lugar onde
vivem, para que possam compreendê-lo e transformá-lo.

As primeiras escolas fundadas no campo sofreram com precárias condições físicas.


Entretanto, o esforço e a luta de diversas pessoas e de movimentos sociais fizeram
com que diversas escolas florescessem, transformando a vida de muitos.

Quando se pensa nas escolas do campo, é muito importante refletir a partir da diver-
sidade dessas escolas, pois mesmo no campo existem as particularidades.

Essas escolas podem estar localizadas em terras indígenas, áreas remanescentes de


quilombos, acampamentos e assentamentos de reforma agrária, comunidades rurais,
entre outros.

As primeiras aulas ministradas nas escolas do campo foram realizadas, principalmen-


te, por moradores que lutavam por uma sociedade mais justa, com iguais oportuni-
dades para todos, na qual todas as pessoas começassem pelo acesso à educação.

Muitas dessas pessoas não tinham instrução suficiente para praticarem essa função,
mas essa realidade modificou-se ao longo dos tempos e hoje essas escolas contam
com professores capacitados e formados para tal, embora ainda se faça necessário

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

um maior investimento, a fim de criar condições para que todas as regiões sejam
atendidas.

É muito importante que as próprias pessoas do campo estejam à frente da educa-


ção de sua região, pois estas conhecem a realidade e os anseios de sua terra muito
melhor que alguém fora desse contexto. Foram muitas as dificuldades que esses
primeiros professores precisaram enfrentar para se formarem e poderem trabalhar
em suas comunidades.

Essa situação também pôde ser percebida nas comunidades indígenas e quilombo-
las, que atualmente já têm membros da própria comunidade formados em cursos de
licenciatura para ministrar aulas para seus pares.

Os professores indígenas e quilombolas precisaram sair de suas comunidades e estu-


dar nas cidades, mas essa realidade tende a se modificar, visto que projetos governa-
mentais pretendem implantar todas as modalidades de ensino nas diversas comuni-
dades rurais do país, inclusive em comunidades indígenas e quilombolas.

Esses dados revelam que a educação do campo ainda precisa de muitos avanços. É
preciso uma grande mobilização da sociedade civil, movimentos sociais e governan-
tes para que o direito à educação de qualidade seja garantido a todas as pessoas.

5.5.1 ESCOLAS MULTISSERIADAS E ESCOLAS


ITINERANTES

Em muitas escolas do campo, encontram-se os alunos estudando em turmas multis-


seriadas. Mas que tipo de organização é essa? As escolas multisseriadas são muito
comuns nos Estados Unidos, no Canadá, em alguns países da América do Sul e na
Europa.

Nessas escolas, os alunos de idades diferentes estudam na mesma sala, mas apren-
dem conteúdos diferentes de acordo com seu desenvolvimento.

Muitas pessoas consideram que as escolas multisseriadas são um atraso no sistema


educativo, mas a verdade é que, se bem implantadas, apresentam resultados muito
positivos na formação e desenvolvimento dos alunos.

As escolas multisseriadas estão presentes em localidades onde não existe demanda


suficiente de alunos para a abertura de turmas seriadas, assim os alunos são agrupa-
dos de acordo com a faixa etária.

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SUMÁRIO 95
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Para que você possa visualizar alguns exemplos de escolas multisseriadas de


sucesso, veja o trecho da reportagem a seguir, publicada no portal Brasil de
Fato. A reportagem apresenta alguns desafios existentes para a educação do
campo e, ao mesmo tempo, aborda a relevância do trabalho multisseriado
em muitas escolas pelo Brasil. Além disso, aborda a organização do Movi-
mento dos Trabalhadores Rurais sem Terra em prol da educação e de uma
escola atrelada aos interesses dos povos do campo.

“Ao ocupar uma terra improdutiva, uma das principais preocupações do


Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é assegurar o direito à
educação das famílias camponesas.

“Foi assim, por exemplo, com a Escola Bernardo Sabino, no Assentamento


Palmares, em Luzilândia, norte do Piauí. A alfabetização das crianças come-
çou a acontecer pelos próprios assentados em um barracão de palha e hoje
mais de 20 anos depois, se tornou uma referência na região pela qualidade
de ensino.

“’Em 1997, quando se estabeleceu o acampamento, buscamos quem tinha


maior nível de escolaridade entre os acampados. Eu só tinha ensino médio.
Começamos a alfabetizar as crianças e depois de três anos legalizamos a
escola. Porém, professores da rede municipal se recusavam a dar aula no
assentamento. Nós tivemos que nos organizar e fazer curso superior em
outro estado. Voltamos pra escolinha com a proposta de ensinar voltado
mais para a educação do campo’, lembra Ildener Pereira de Carvalho, assen-
tada e educadora da escola que fica a 240 quilômetros da capital Teresina.”
(MOREIRA, 2019).

Se você deseja ler toda a reportagem na íntegra, acesse o portal Brasil de


Fato e busque pelo “Especial saberes da terra”.

Alguns pesquisadores da educação defendem a ideia de que abrir escolas multisse-


riadas no campo é mais eficiente do que pagar transporte para que os alunos sejam

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levados para estudar em cidades próximas às suas casas. As longas jornadas enfren-
tadas diariamente pelos alunos podem desestimular ou impossibilitar que eles conti-
nuem frequentando a escola.

Além disso, os altos valores pagos ao transporte escolar podem ser convertidos em
verbas para a construção de novas escolas multisseriadas, uma vez que estas deman-
dam menor espaço e menor investimento para construção e funcionamento.

O preconceito contra as escolas multisseriadas deve-se, sobretudo, à pouca experiên-


cia que se tem com esse tipo de escola. Assim, muitas vezes prefere-se gastar mais
com as escolas ditas convencionais a se esforçar para implantar outros modelos esco-
lares, que são tão eficientes como os usados na atualidade.

Escolas Multisseriadas:

• Escola Municipal do Campo Trabalho e Saber, localizada no assenta-


mento Eli Vive I, no Paraná;

• Escola Sabino Bernardo, no Assentamento Palmares, município de


Luzilândia;

• Escola Amadeus Carvalho no Assentamento Marrecas, em São João


do Piauí.

Nas áreas rurais da Colômbia, foram implantadas diversas escolas multisseriadas que,
em razão do seu modelo inovador, passaram a ser conhecidas como Escuela Nueva.
O governo da Colômbia realizou grandes investimentos nesse modelo de educação.
Formou professores, desenvolveu métodos e técnicas que foram muito eficientes na
formação dos diversos alunos que tiveram a oportunidade de estudar a partir desse
modelo.

O rendimento dos alunos das escolas multisseriadas foi superior ao dos demais que
estudavam a partir do modelo seriado. Esses resultados fizeram com que o governo
colombiano optasse pelas escolas multisseriadas também na zona urbana.

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No campo brasileiro, as escolas multisseriadas têm feito parte da vida de diversos


alunos, proporcionando uma educação que forma alunos críticos e atuantes em suas
comunidades.

É preciso destacar que no campo também existem as escolas seriadas e que estas
têm apresentado resultados satisfatórios quanto ao desenvolvimento e aprendiza-
gem dos educandos. Algumas dessas escolas têm sido exemplo para várias outras,
visto que suas práticas de sucesso têm sido muito eficientes.

Nesse sentido, vale destacar a atuação das escolas itinerantes que operam na região
do campo, sobretudo a partir da organização de movimentos sociais, como o Movi-
mento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

As escolas itinerantes estão sempre “em movimento”. Elas acompanham a vida e


a luta do povo. Quando famílias do Movimento Sem Terra ocupam fazendas para
pressionarem o governo em nome da reforma agrária, por exemplo, as crianças não
podem ficar sem estudar. Assim, as escolas itinerantes são levadas para todas as áreas
ocupadas pelo Movimento.

Muitas dessas escolas não recebem ajuda do governo e são mantidas pelo próprio
MST. As aulas acontecem em diversos lugares, como na beira de estradas e embaixo
de árvores ou lonas pretas. O cotidiano da vida do campo faz parte desse modelo de
escola.

Pesquisadores da educação defendem que a escola itinerante forma alunos críti-


cos, que aprendem desde cedo a lutar pela liberdade e a compreender e respeitar a
diversidade em que vivem.

Nessas escolas, os alunos aprendem a ser mais solidários com o próximo e têm aulas
que dialogam com sua realidade. Algumas escolas itinerantes foram perseguidas e
fechadas em alguns estados brasileiros, fazendo com que diversas crianças ficassem
longe das escolas. O MST e vários outros movimentos sociais têm lutado muito para
que essas escolas voltem a funcionar e atendam aos alunos que precisam delas.

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BIBLIOGRAFIA COMENTADA
Veja a seguir algumas indicações de obras que complementarão seu conhecimento
sobre os assuntos abordados na disciplina.

• ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; MARTINS, Maria de Fátima Almeida; MARTIS,


Aracy Alves (Orgs.). Territórios educativos na educação do campo: escola,
comunidade e movimentos sociais. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.
col. Caminhos da educação do campo. n. 5.

A obra “Territórios educativos na educação do campo: escola, comunidade e movi-


mentos sociais”, da pesquisadora Maria Isabel Antunes Rocha, convida a refletir sobre
os desafios, limites e possibilidades da educação do campo, propiciando uma refle-
xão que considera as disputas entre grupos e interesses divergentes no campo brasi-
leiro.

• ANTUNES-ROCHA, Maria Isabel; MARTINS, Aracy Alves (Orgs.). Educação do


Campo: desafios para a formação de professores. 2. ed. Belo Horizonte: Autên-
tica, 2011. col. Caminhos da educação do campo. n. 1.

O livro “Educação do campo: desafios para a formação de professores”, das pesqui-


sadoras Aracy Alves e Maria Isabel Antunes Rocha, convida a uma reflexão sobre as
mudanças ocorridas no campo brasileiros, trazendo à tona a relevância dos movi-
mentos sociais do campo na luta por uma educação do campo pautada no protago-
nismo dos sujeitos do campo. Além disso, a obra contribui para refletir sobre a rele-
vância de se formar professores a partir da perspectiva da educação do campo.

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SUMÁRIO 99
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

CONCLUSÃO
Pensar sobre a formação e histórica do campo brasileiro instiga a questionar a forma
como se deu a ocupação do território e como as riquezas do solo brasileiro foram
apropriadas.

A concentração de terras nas mãos de poucas pessoas foi responsável por produzir
no campo um grande abismo social e fundiário, que coloca nas mãos de pequenos
grupos grandes porções de terras, que são utilizadas para a produção agrícola mono-
cultora de exportação. Por outro lado, milhões de pequenos produtores rurais foram
obrigados a deixar suas terras devido aos parcos incentivos para a produção.

Foi nesse contexto que os movimentos de luta pela terra passaram a se organizar na
busca de melhores condições e exigir políticas de redistribuição de terras.

Ao longo do tempo, as pautas desses movimentos pela terra passaram a exigir


também escolas que dialogassem e valorizassem os povos do campo, desconstruin-
do os estereótipos negativos produzidos sobre essa parte da população, que apre-
sentavam o campo como um local atrasado, enquanto a cidade seria o espaço da
modernidade.

Foi com o intuito de problematizar a formação fundiária brasileira que esta unidade
visou compreender as nuances que marcam o campo brasileiro e os múltiplos atores
que ali se encontram.

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100 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

UNIDADE 6

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos
que possa:

> Examinar o conceito de


políticas públicas.

> Discutir as políticas


públicas como espaço
de conflitos e tensões.

> Refletir sobre as


relações entre
políticas públicas e
o fortalecimento da
educação do campo.

> Analisar aspectos legais


e normativos que
tratam da educação do
campo.

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SUMÁRIO 101
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

6 EDUCAÇÃO DO CAMPO E
POLÍTICAS PÚBLICAS
Nesta unidade, serão tratadas as relações entre políticas públicas e educação do
campo. Inicialmente, será apresentada uma discussão em torno dos conceitos de
política e de público, buscando compreendê-los a partir de toda sua complexidade
e historicidade.

Também virá à tona o conceito de políticas públicas, por meio de uma análise que
buscou compreender sua origem e sua relevância para a garantia de direitos de todos
os cidadãos.

Dessa forma, você refletirá sobre a necessidade de que todos os sujeitos se atentem
e compreendam o que são as políticas públicas, como são criadas e sua importância
para a construção de uma sociedade mais igualitária e justa.

Serão focadas as nuances que marcam as relações entre a criação de políticas públi-
cas e a educação do campo, demonstrando o papel relevante dos movimentos sociais
do campo e dos sujeitos do campo na luta por uma educação do campo feita para e
pelos povos do campo.

Também serão destacadas algumas políticas públicas voltadas para a educação do


campo, demonstrando sua importância e refletindo sobre as múltiplas possibilida-
des e limites que as constituem.

INTRODUÇÃO
Nesta unidade será discutida a temática relacionada à educação do campo e às polí-
ticas públicas. Essa discussão é muito importante, pois permite compreender como
se dá o processo de construção de uma política pública a partir da discussão do
próprio conceito de o que vem a ser uma política pública.

Entender esse conceito é relevante para a atuação de maneira crítica e participativa


na sociedade em que se vive. Afinal, as políticas públicas são criadas para garantir
direitos sociais a todos os cidadãos.

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102 SUMÁRIO
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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Foi a partir da criação de políticas públicas, por exemplo, que existe hoje um olhar
diferenciado para a educação e ensino nas áreas rurais do Brasil. Tendo em vista a
importância do tema, além da discussão sobre o conceito e a origem das chama-
das políticas públicas, serão analisadas suas relações com a educação do campo e
a garantia do direito à educação. Essas reflexões são cada vez mais necessárias para
a formação de um sujeito crítico e reflexivo, pois possibilita entender que a garantia
dos direitos sociais passa, antes, pela atuação cidadã dos sujeitos que compõem uma
determinada sociedade.

6.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO:


REFLETINDO SOBRE A NOÇÃO DE POLÍTICA E DE
PÚBLICO

Pensar em políticas públicas leva a refletir sobre o conceito de política. Pode-se desig-
nar a esse termo (política) uma gama variada de sentidos. Muitas pessoas relacionam
diretamente a palavra política a imagens de personalidades políticas, campanhas
eleitorais, propagandas de governo, partidos, voto e ações governamentais.

De fato, todas essas atividades podem ser associadas à esfera política, entretanto há
de se entender que política não se reduz apenas a essas atividades. A complexidade
do conceito de política o leva a se manifestar de forma diversa: quando um indivíduo
se posiciona (ou não) diante de uma determinada situação de opressão ou diante de
situações relacionadas a temas, como violência, miséria, desigualdades etc., ele está
tomando uma decisão que é política.

É muito comum ouvir as pessoas dizendo que política não se discute ou buscando se
afastar da política, alegando desinteresse ou sob o entendimento de que nada tem a
ver com ela. Outras pessoas se afastam, pois enxergam e associam a política a casos
de escândalos e grandes esquemas de corrupção.

Portanto, pode-se perceber que os indivíduos e grupos sociais se expressam e se


comportam de forma diversa em relação à política. Uma análise desses comporta-
mentos ajuda a perceber que, em alguns casos, as pessoas adotam comportamentos
passivos diante dos acontecimentos.

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SUMÁRIO 103
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Essa situação resulta na desinformação e se expressa na ignorância em relação a


alguns fatos, ao desconhecimento de como funcionam as relações sociais e políticas,
assim, acabam por reproduzir o senso comum de que as atitudes individuais e as
posições na sociedade, por exemplo, não são distribuídas e organizadas a partir da
política e poder.

De acordo com Maar (1994), apesar da variedade de significados que se pode atribuir
à palavra política, um significado se destaca, por ser unanimidade entre intelectuais,
que é a sua referência ao poder político e à esfera da política institucional.

Devido à complexidade que envolve o conceito de política, a própria ciência designa


um campo específico de estudo ao mesmo. A esse campo da ciência, dá-se o nome
de ciência política, que tem entre seus objetos de estudo as relações de poder que
marcam as sociedades.

É importante ressaltar que se vive em ambientes perpassados pelas relações de


poder, que constituem tanto o ambiente da atividade política quanto o ambiente do
qual a ciência política recorta seu objeto de estudo.

Independentemente da sua nossa vontade, qualquer que seja o espaço ocupado por
um indivíduo na sociedade, este lugar está marcado pelas relações de poder, que se
expressam sob diferentes formas e maneiras.

Existem relações de poder que se expressam a partir das relações de governos, parti-
dos políticos, instituições, como o Estado, a família, a igreja, a escola, entre outras, e
existem relações que se expressam nos pequenos atos que acontecem no dia a dia.

Importante ressaltar que o termo política foi desenvolvido pelos gregos, na Antigui-
dade. Vale destacar que, na Grécia Antiga, as cidades-estados constituíam-se como
espaços autônomos e soberanos de participação na administração pública e nas
decisões da pólis.

A palavra política é derivada de “pólis”, que significa tudo que se relaciona à cidade.
Faz referência à maneira como os indivíduos se comportam no espaço público.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

FIGURA 12 - CONCEITO DE POLÍTICA

Complexidade

Política

Grécia Relações
Antiga cotidianas

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Até aqui você viu como o conceito de política é complexo e perpassa todas as esferas
e instâncias da sociedade, desde os indivíduos até as instituições, mas deve se atentar
para as relações entre política e educação.

De acordo com Gadotti:

Discutir política na educação não significa reduzir tudo ao político, como se a


política explicasse tudo. Significa não ignorar os prolongamentos políticos do
ato pedagógico. Perceber, por exemplo, que há uma estreita relação entre o
rendimento escolar do aluno e suas condições sociais e econômicas. Perceber,
em relação a esse fato, que o aluno que recebe a melhor nota é, principalmen-
te, aquele que tem origem social privilegiada. Perceber ainda que o acesso à
escola continua sendo privilégio. Mas não só estabelecer relações entre esco-
la e sociedade, se não estabelecer relações também entre o que se ensina e
o conteúdo ideológico do que se ensina, entre os valores que testemunha o
educador e os padrões de comportamento exigidos por uma sociedade ou
pelo grupo social dominante (GADOTTI, 1995, p. 88).

Sendo assim, pensar em como a política se relaciona com a educação do campo


implica em uma compreensão da complexidade que envolve o campo e suas parti-
cularidades. É nesse sentido que o pesquisador Miguel Arroyo afirma que:

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SUMÁRIO 105
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

O campo é outro – outras políticas públicas. Ponderamos que uma visão do


campo como atraso não pressionará por políticas públicas de educação. Nem
sequer esperar que a “modernização”, o agronegócio inspirem políticas públi-
cas de educação parece ser uma boa estratégia. O ponto de partida poderá
ser reconhecer que o campo é outro e está a exigir novas políticas. Há tensões
profundas. O agronegócio, as lutas pela terra, os movimentos sociais, o avan-
ço da consciência pelos direitos etc. deixa mais evidentes a precariedade e a
vulnerabilidade da garantia dos direitos mais básicos da condição humana:
terra, trabalho, vida, saúde, alimentação, educação... Esta consciência não é
expressão do tão proclamado atraso dos povos do campo ao contrário pode
ser vista como uma modernização política que exige um equacionamento
novo de políticas públicas que deem conta desse avanço da consciência dos
direitos (ARROYO, 2004, p. 4).

Arroyo (2004) chama atenção para a necessidade de a educação do campo ser


compreendida a partir das dinâmicas que acontecem no campo e em estreita rela-
ção com os processos de luta e organização que se desenvolvem no campo.

6.1.1 A NOÇÃO DE PÚBLICO

Ao se referir à palavra público, tem-se em mente um espaço ou ambiente que vai


além do que é considerado como propriedade exclusiva de um indivíduo ou grupo.
Dessa forma, praças, ruas e parques são, por exemplo, espaços públicos. Entretanto,
é importante ressaltar que o espaço público não está restrito e limitado ao ambiente
urbano.

A palavra público tem sua origem no latim publicus, que significa vindo do povo. É
importante ressaltar que privado não significa liberdade total e ilimitada, pois a vida
privada é mediada pela esfera pública.

Público e privado se relacionam de maneira conflituosa e a política diz respeito, ao


mesmo tempo, ao comportamento e à regulação e fiscalização da vida do cidadão.
É nesse sentido que uma das regras básicas da vida em sociedade é a do uso de sua
liberdade de maneira plena, desde que suas ações não ofendam e agridam as liber-
dades dos outros.

Quando se associa o público à política, deve-se atentar para o fato de que não é
apenas o governo que exercita a política. Ao organizar-se, a sociedade civil também
faz da política um instrumento de transformação da sociedade como um todo.

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Assim, ao se associar o termo público à política, não se está referindo de maneira


exclusiva ao Estado, mas, de uma maneira mais ampla e profunda, está se referindo
à coisa pública, que deve ser pensada a partir dos interesses de todos que a consti-
tuem.

Um ponto importante que merece ser considerado é a grande confusão feita entre
o estatal e o público. De acordo com Davies (2003), muitos autores, percebendo a
presença de características privatistas na educação estatal, vêm discutindo os obstá-
culos à sua publicização e vêm oferecendo elementos para superar esses problemas
e avançar na construção de uma escola pública de qualidade, que não seja apenas
financiada pelo Estado.

Entre os pontos destacados por Davies (2003) para a publicização da educação esta-
tal, pode-se destacar:

• controle social sobre o Estado;

• gestão democrática da escola e do ensino;

• participação da comunidade.

Entretanto, o autor afirma que é necessário estar atento para a natureza e limites
embutidos nessa participação, bem como a participação da comunidade. Sendo
assim, deve-se considerar que a comunidade não é constituída por indivíduos e
grupos homogêneos, mas, pelo contrário, são compostos por grupos diversos.

6.2 ORIGEM E CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Ao longo das nossas vidas, sempre se ouviu falar em políticas públicas relacionadas
ao campo da educação. Para muitos, as políticas públicas representam os programas
apresentados pelo governo, atribuindo a esse termo o seu vínculo com as ações do
Estado.

Entretanto, falar em políticas públicas exige um olhar mais profundo para entender
que elas se originam na dinâmica que envolve as dimensões da vida social, política,
econômica e cultural e que nascem dos mais diversos conflitos de interesses que
podem envolver determinada sociedade.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Nesse sentido, as políticas públicas ocorrem a partir de um imenso jogo de forças e


interesses, relacionados a disputas entre grupos econômicos e políticos e todos os
setores da sociedade.

São as disputas entre essas forças que determinam as decisões na esfera estatal e as
necessidades ou não de indeterminadas intervenções do governo em uma determi-
nada situação. O conjunto dessas decisões é que inflige no que se chama de política
públicas.

É importante destacar a participação e efetiva importância dos movimentos sociais


que lutaram ao longo dos anos pela garantia de direitos civis, políticos e sociais no
processo de construção de políticas públicas.

Como aponta Cunha (2002), muitas ações do Estado foram resultado das pressões
provocadas por essas lutas. A organização e poder de pressão dos movimentos sociais
e demais movimentos em prol dos direitos vinculados à sociedade civil são fatores
fundamentais na conquista de novos direitos sociais, assim como na manutenção de
tantos outros direitos.

É válido salientar que as políticas públicas podem, também, ser orientadas por orga-
nismos e instituições internacionais. Entre esses grupos, pode-se destacar a atuação
do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BIRD). Os documentos
e ações desses organismos enviaram propostas de reformas educacionais para os
países em desenvolvimento como condição essencial para ajuda financeira (conces-
são de créditos).

De acordo com Celina Souza (2006), os governos definem suas agendas de três formas
diferentes:

• Foco nos problemas: os problemas tornam-se parte da agenda quando se


assume que deve ser feito algo para sanar determinado problema. Isso signifi-
ca que o reconhecimento e a definição do que pode ou não ser um problema
afeta de maneira direta os resultados da agenda.

• Foco na política: a agenda com esse foco tem como característica a constru-
ção de uma consciência coletiva sobre determinado problema que deve ser
enfrentado.

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ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

• Foco nos participantes: a definição que tem como foco os participantes os


definem como visíveis e invisíveis. Os visíveis estão ligados aos políticos, mídia,
partidos, entre outros, já os invisíveis, aos acadêmicos e burocracia, por exem-
plo. Nessa perspectiva, os participantes visíveis definem a agenda política, e os
invisíveis, as alternativas a serem buscadas.

Dessa maneira, as políticas públicas desdobram-se em planos, diretrizes, projetos,


programas e em base de dados ou sistemas de informação. Colocadas em ação, as
políticas públicas são submetidas a acompanhamento e avaliação.

O programa pode ser entendido como o desdobramento de uma política pública.


Fazem parte desses desdobramentos um conjunto de ações que representam a
atuação do Estado diante das exigências sociais pelos seus direitos e cobranças por
políticas públicas que visam à garantia deles.

Teixeira, define políticas públicas como:

Diretrizes, princípios norteadores de ação do poder público; regras e proce-


dimentos para as relações entre poder público e sociedade, mediações entre
atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, politicas explicitadas, siste-
matizadas ou formuladas em documentos (leis, programas, linhas de financia-
mento) que orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recur-
sos públicos. [...] As políticas públicas traduzem, no seu processo de elaboração
e implementação e, sobretudo em seus resultados, formas de exercício do
poder político, envolvendo a distribuição e redistribuição de poder; o papel do
conflito social nos processos de decisão, a repartição de custos e benefícios
sociais (TEIXEIRA, 2002, p. 2).

Quando se trata de direitos sociais e suas garantias, a política pública tem como obje-
tivo a concretização desses direitos. Como aponta Duarte (2008), a educação escolar é
um direito presente na Constituição e cabe ao Estado garantir, por meio das políticas
públicas, as condições necessárias para que esse direito seja acessado pelos cidadãos.

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FIGURA 13 - DEFININDO POLÍTICAS PÚBLICAS

Direitos

Diretrizes Planos

Políticas
Públicas

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Pensar na educação do campo leva a considerar as desigualdades de acesso à escola


que marcam a vida no campo brasileiro e que demandam atenção especial das auto-
ridades governamentais, em busca da materialização do direito à educação.

O direito a uma política pública diferenciada, importante como ferramenta de busca


da igualdade, almejada pelos que defendem a educação do campo, indica a necessi-
dade de garantia de igualdade e universalidade da educação, pautada na diversida-
de e nas múltiplas diferenças encontradas no campo (MOLINA, 2008).

São as especificidades do campo brasileiro, sua formação histórica, social, cultural


e econômica, que demandam, por parte do Estado brasileiro, políticas afirmativas
para corrigir as distorções sociais e também para implantar uma política que garanta
condições de igualdade no acesso e permanência dos sujeitos do campo na escola.

É por meio da legislação educacional que se pode cobrar esses direitos. Nesse senti-
do, é importante que as pessoas conheçam as leis que regem a educação e o proces-
so de formulação de políticas públicas e como as mesmas resultam em programas,
projetos e diretrizes que orientam e norteiam a educação.

Souza (2002) aponta que a cidadania participativa seria um dos caminhos para o
desenvolvimento de políticas públicas mais coerentes com os interesses sociais. Essa

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relação entre cidadania e políticas públicas implica em luta por direitos. A busca pela
manutenção e ampliação dos direitos é que configura o que se chama de cidadania.

É nesse contexto de luta por direitos que a educação do campo emerge como bandei-
ra dos sujeitos e movimentos sociais do campo. Os processos de luta por emancipa-
ção social e conquista de direitos constitui-se de atitudes e valores cidadãos. É assim
que as políticas públicas nascem e as sociedades podem se tornar mais justas e igua-
litárias.

De acordo com Celina Souza (2006), as políticas públicas podem assumir quatro
formatos diferentes:

• Políticas distributivas: privilegia grupos específicos, gerando impactos mais


individualizados do que universais.

• Políticas regulatórias: são mais visíveis pelo público. Relacionam-se ao jogo


burocrático, aos políticos e grupos de interesses.

• Políticas redistributivas: são políticas sociais universais, que visam atender a


toda sociedade, independentemente das condições econômicas, sociais e
culturais.

• Políticas constitutivas: são as políticas que estão relacionadas aos procedimen-


tos.

• Para Souza (2006), não existe apenas uma definição do que seja política públi-
ca, mas apesar de existirem abordagens e definições diferentes sobre esse
termo, as políticas públicas acabam assumindo, em geral, uma visão holística
do tema.

Entre as diversas definições, Souza (2006) sintetiza os principais elementos constitu-


tivos de uma política pública, sendo eles:

• a política pública permite a distinção entre as pretensões do governo e o que


ele realmente realiza;

• a política pública envolve diversos atores e não se restringe apenas a partici-


pantes formais;

• a política pública abrange uma gama de questões e não se limita a leis e regras;

• a política pública, embora em muitos casos tenha impactos a curto prazo, é

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realizada a partir de uma perspectiva de longo prazo;

• as políticas públicas implicam em uma série de processos que vão desde sua
proposição até a sua implementação, execução e avaliação.

6.3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

Quando se mencionam as políticas educacionais, deve-se observar que elas fazem


parte das chamadas políticas sociais. As políticas sociais podem ser entendidas como
as políticas relacionadas à educação, saúde, previdência, habitação, entre outras.

De acordo com Hofling, as políticas sociais se referem a:

Ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Esta-


do, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando
a diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento
socioeconômico. As políticas sociais têm suas raízes nos movimentos popula-
res do século XIX, voltadas aos conflitos surgidos entre capital e trabalho, no
desenvolvimento das primeiras revoluções industriais (HOFLING, 2001, p. 31).

No processo de redemocratização do Estado brasileiro, no final da década de 1980,


e com a reorganização da sociedade civil, uma nova ordem social foi instaurada no
país. Os movimentos sociais e expoentes políticos ligados aos interesses da popula-
ção brasileira puderam se reorganizar e, a partir disso, exigir novas políticas sociais.

Os principais questionamentos e tensões, naquele período, envolvendo as políticas


públicas brasileiras, estavam ligados à história e trajetória seletivas e excludente das
mesmas. Sendo assim, buscou-se inscrever na Carta Constitucional direitos sociais
que fossem traduzidos como deveres do Estado, que deveriam ser alavancados a
partir da construção de políticas públicas (CUNHA; CUNHA, 2002).

Nesse contexto, a década de 1990 foi marcada por múltiplos esforços dos setores
progressistas da sociedade na busca de regulamentação e implementação dos direi-
tos sociais presentes na Carta Magna de 1988.

A década de 1990 foi marcada pelos conflitos entre a implementação de políticas


públicas que concretizassem os direitos sociais cravados na Constituição e as restri-
ções políticas e econômicas vivenciadas no país (CUNHA; CUNHA, 2002).

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Os dispositivos constitucionais introduziram diretrizes que se baseiam em um mode-


lo de gestão descentralizado, ou seja, a administração se dá a partir da responsabi-
lidade do Estado e da participação da sociedade civil na formulação e controle de
ações do Estado.

O Estado brasileiro vem direcionando aos estados e municípios boa parte das respon-
sabilidades da gestão das políticas sociais. Um reflexo disso são as políticas públicas
sociais, que, a partir do princípio da descentralização, vêm passando por um processo
de municipalização.

Teixeira (2002) afirma que, em relação ao princípio da descentralização administrati-


va dos sistemas de ensino e da municipalização, pode ocorrer que essa transferência
de funções e novos encargos se efetivem sem se fazer acompanhar o poder de deci-
são a respeito deles ou os recursos necessários para isso.

6.3.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E MOVIMENTOS SOCIAIS

Quando se trata de políticas públicas, em especial para os povos e sujeitos do campo,


não se pode deixar de analisar o papel dos movimentos sociais para a construção
dessas políticas.

É importante ressaltar que as políticas educacionais influenciam e são influenciadas


por forças de ação política. Ela pode ser originada tanto num amplo processo parti-
cipativo quanto da imposição de um pequeno grupo que exerce poder sobre a cole-
tividade.

No último caso, a gestão da política educacional apresentará certamente um perfil


antidemocrático, já que guarda para si o monopólio para a decisão dos rumos da
educação (SCHNECKENBERG, 2000),

De acordo com Schneckenberg (2000), muitas vezes se ouve falar que a ausência de
participação dos múltiplos sujeitos e atores sociais na definição das políticas educa-
cionais estão ligadas aos desinteresses deles ou então ao seu despreparo para uma
vivência democrática. Para esse autor, essas visões e representações não colaboram
para a construção de uma política educacional que garanta o acesso e participação
de todos.

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SUMÁRIO 113
ALTERNATIVAS DE EDUCAÇÃO NO CAMPO

Sem a participação dos movimentos sociais do campo na construção de uma educa-


ção do campo, pouco se teria avançado em termo de conquista ao direito à educação
e implementação de políticas públicas condizentes com a realidade do campo e na
colocação do campo na agenda de políticas públicas.

Sobre essa temática, o pesquisador Miguel Arroyo aponta:

Quando os movimentos sociais estão pressionando por políticas públicas nos


sugerem que como premissa entendamos a rica e contraditória complexida-
de vivida no campo. Exige que enxerguemos a positividade humana dessa
dinâmica. Esperam-se políticas que afirmem, reconheçam e reforcem os ricos
processos de educação, formação, os processos culturais, éticos, identitários
inerentes a essa complexidade vivenciada na diversidade dos movimentos
sociais do campo (ARROYO, 2004, p. 5).

Importante destacar na fala de Arroyo (2004) sua percepção da dimensão educativa


que existe nas lutas empreendidas pelos movimentos sociais em busca de garantir
direitos. Essas lutas resultaram em grandes conquistas e pressionaram as autoridades
governamentais na elaboração de diversas políticas públicas.

Algumas ações por parte do poder público para a educação do campo, em específi-
co, podem ser vistas como um grande avanço. Entretanto, para Nascimento (2009), o
Estado não consegue e não tem interesse em incorporar as demandas dos movimen-
tos sociais, uma vez que suas aspirações ultrapassam os muros da escola.

Para esse autor, após os direitos serem alcançados, o conflito e a resistência não
podem ser desmobilizados.

Lutar por direitos significa caminhar até a metade do caminho e por ali esta-
cionar, ou seja, adquire-se a emancipação política onde lhe é outorgado pelo
Estado ou pelos governos o sentido político adquirido o de ser cidadãos sujei-
tos de direitos... não existe emancipação humana nessa lógica, uma vez que a
luta não acabou (NASCIMENTO, 2009, p. 18).

Dessa forma, é importante compreender que as políticas públicas precisam ser


acompanhadas, terem controle social e serem avaliadas regularmente. Nesse senti-
do, a participação dos diversos atores e sujeitos sociais é de extrema relevância para
a construção de um país mais justo.

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6.4 BASES LEGAIS E MARCOS NORMATIVOS DA


EDUCAÇÃO DO CAMPO

A construção da educação do campo e as lutas por um modelo de educação do


campo que respeite e valorize os povos do campo e seus saberes e modos de se orga-
nizar foram desenvolvidas ao longo dos últimos anos a partir dos vários encontros,
conferências e seminários que contribuíram para dar visibilidade ao tema.

Pode-se destacar o I Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma


Agrária (ENERA), realizado em 1997, pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem
Terra (MST), em Brasília, que representa um grande avanço na trajetória da educação
do campo. Seguidos desse grande movimento, surgiram outros grandes eventos que
tiveram o objetivo de debater e pressionar o governo sobre a importância de legisla-
ções específicas para a educação do campo.

É em meio a essas lutas e mobilizações que a agenda política brasileira incorporou


uma política nacional para a educação do campo.

Por isso, ao se falar de educação do campo, pode-se pensar em uma série de instru-
mentos legais que dão subsídios para a construção de propostas educacionais e
para o desenvolvimento de políticas públicas que atendam às realidades e contextos
sociais do campo brasileiro.

FIGURA 14 - EDUCAÇÃO DO CAMPO E ASPECTOS LEGAIS

Bases legais e
marcos normativos

Educação
do Campo

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

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Nesse sentido, serão abordados os instrumentos legais que tratam da educação do


campo. É importante conhecer a legislação educacional brasileira. De acordo com
Cury (2000), a consciência e o conhecimento da legislação são uma forma de apro-
priar-se da realidade política por meio de regras declaradas e públicas, regras essas
que regem a convivência social e suscitam a cidadania.

A Constituição de 1988 assegura a todos o direito à educação, sendo dever do Estado


zelar pela garantia desses direitos. Desse modo, os princípios e preceitos constitucio-
nais da educação abrangem todos os níveis e modalidades de ensino ministrados em
qualquer região do país.

Vale lembrar que a educação rural só passou a receber atenção a partir de 1934,
entretanto sua viabilização se esbarrou na falta de interesse dos grupos que compu-
nham o poder naquele período.

Apesar da Constituição de 1988 não se referir diretamente ao ensino rural, ao procla-


mar a educação como direito subjetivo de todos os brasileiros e brasileiras, a Carta
Constitucional possibilitou às constituições estaduais e à Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (BRASIL, 1996) o tratamento do rural no âmbito do direito.

6.4.1 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO


NACIONAL (1996)

Os artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que contemplam


a educação rural são os artigos 28 e 26. O texto jurídico que constitui esses artigos é
o reconhecimento da diversidade presente no Brasil. Sendo assim, a LDB reconhece
que em um país continental como o Brasil, marcado por múltiplas culturas, a educa-
ção deve considerar as especificidades de cada contexto e realidade.

Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensi-


no médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada
sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversi-
ficada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura,
da economia e dos educandos. (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)

Art. 28. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de


ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiari-
dades da vida rural e de cada região, especialmente:

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I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e


interesses dos alunos da zona rural;

II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às


fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.

Parágrafo único. O fechamento de escolas do campo, indígenas e quilombo-


las será precedido de manifestação do órgão normativo do respectivo siste-
ma de ensino, que considerará a justificativa apresentada pela Secretaria de
Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a manifestação
da comunidade escolar (Incluído pela Lei nº 12.960, de 2014) (BRASIL, Lei n°
9.394/96, arts. 26-28).

Vale destacar que a flexibilização da lei permitida pela LDB possibilita que as escolas
do campo possam se organizar a partir de suas realidades diversas. As escolas multis-
seriadas são um grande exemplo dessa flexibilização e das especificidades das esco-
las do campo.

Embora sejam notórios os avanços conquistados para a educação do campo por


intermédio da LDB, ainda assim pode-se perceber muitos entraves a essa lei. A educa-
ção rural se inclui no capítulo referente à educação básica e se limita a esse nível da
educação, não sendo mencionada em relação ao ensino superior.

Embora a LDB seja um grande avanço para a educação nacional e em específico para
a educação do campo, ainda é necessário caminhar muito para a efetivação do direi-
to à educação de todos.

6.4.2 DIRETRIZES OPERACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO


BÁSICA NAS ESCOLAS DO CAMPO

As Diretrizes Operacionais para a educação básica nas escolas do campo, resolução


CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002, levaram em consideração as propostas dos
movimentos sociais. Essas diretrizes são a materialização das lutas dos povos campe-
sinos em um documento que assegura uma política que englobe as especificidades
do campo.

Nesse documento, existe uma preocupação com conceitos e estruturas que formam
o campo brasileiro, enfatizando a identidade e a diversidade como elementos funda-
mentais para a organização social dos povos do campo.

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Apesar dos avanços, Nascimento (2009) chama a atenção para uma certa distân-
cia existente entre a política macroestrutural promulgada pelo Conselho Nacional
de Educação e a política microconjuntural existente nas localidades, nos munícipios.
Como afirma o autor:

As diretrizes operacionais se tornaram a partir de 2002 um ponto de chegada da


luta travada pelos movimentos sociais do campo (camponeses, quilombolas e
indígenas), mas, ao mesmo tempo um ponto de partida para a efetivação dessas
diretrizes nas realidades das escolas do campo (NASCIMENTO, 2009, p. 193).

Em relação a essas diretrizes, destacam-se cinco eixos importantes:

• A identidade da escola do campo: a identidade da escola é uma questão


muito importante na construção do projeto político pedagógico da escola do
campo, envolvendo o reconhecimento das especificidades do campo e a valo-
rização da cultura e saberes dos sujeitos que compõem o campo.

• A organização curricular da escola do campo: tendo como base a LDB, a orga-


nização curricular que constitui as diretrizes se baseia na flexibilização do
currículo e na inclusão das particularidades de cada lugar onde se encontra a
escola e os sujeitos do campo.

• A reponsabilidade do poder público com a educação escolar: este eixo das


diretrizes diz respeito ao dever do Estado de garantir o direito à educação de
todos os brasileiros, independentemente de onde se encontra a escola, seja em
região urbanizada, seja rural. Destaca-se, ainda, o dever do Estado de oferecer
educação infantil e fundamental, inclusive para aqueles que não concluíram
seus estudos em idade prevista.

• Formação docente: a formação e qualificação docente é considerada uma das


principais conquistas da educação do campo, uma vez que possibilita uma
formação qualificada para os profissionais da educação do campo. As diretri-
zes ainda incorporam a necessidade de programas de qualificação específicos
para a educação do campo.

• Financiamento da educação do campo: as diretrizes também ressaltam a


importância do financiamento da educação, tornando-se mais transparente
em relação à importância do controle social e utilização dos recursos.

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CONCLUSÃO
Compreender a dinâmica e as relações que envolvem a criação de políticas públicas
é uma tarefa de grande relevância para qualquer sociedade que espera ser igualitária
e justa.

Essa compreensão passa, necessariamente, por compreender também os conceitos


de política e de público, uma vez que os mesmos são fundamentais na construção de
políticas públicas e para a garantia dos direitos dos cidadãos.

Ao pensar a educação do campo, discutir e refletir sobre as políticas públicas especí-


ficas para o campo, é importante lembrar sobre o papel exercido pelos movimentos
sociais do campo na construção e organização de uma escola que atendesse aos
anseios dos povos do campo.

Foi por pressão desses movimentos que foram criadas políticas públicas voltadas
para a educação nas áreas rurais. Conhecer esses dispositivos legais é de suma impor-
tância para que todos os sujeitos do campo tenham seus direitos à educação e cida-
dania garantidos.

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