Brasília-DF.
Elaboração
Produção
Apresentação.................................................................................................................................. 5
Introdução.................................................................................................................................... 8
Unidade I
NEUROPLASTICIDADE............................................................................................................................. 9
Capítulo 1
Processos patológicos e recuperação do sistema nervoso central......................... 9
Unidade iI
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA........................................................................................................ 29
Capítulo 1
Paralisia cerebral............................................................................................................... 29
Capítulo 2
Epilepsia................................................................................................................................ 35
Capítulo 3
Síndrome de West................................................................................................................ 44
Capítulo 4
Meningites............................................................................................................................ 48
Capítulo 5
Autismo................................................................................................................................. 55
Capítulo 6
Síndrome de Rett................................................................................................................. 65
Capítulo 7
Anomalias congênitas da medula espinhal e hidrocefalia.......................................... 69
Capítulo 8
Distúrbios musculares e distrofias................................................................................... 80
Capítulo 9
Lesão cerebral aguda........................................................................................................ 90
Capítulo 10
Disfunção cerebral mínima............................................................................................. 101
Capítulo 11
Deficiência intelectual..................................................................................................... 116
Capítulo 12
Síndrome de Down........................................................................................................... 125
Capítulo 13
Lesão do plexo braquial.................................................................................................. 131
Unidade iII
ERROS INATOS DO METABOLISMO...................................................................................................... 140
Capítulo 1
Introdução e fisiopatologia........................................................................................... 140
Capítulo 2
Classificação, identificação e tratamento.................................................................. 142
Referências................................................................................................................................. 149
Apresentação
Caro aluno
Conselho Editorial
5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.
Atenção
6
Saiba mais
Sintetizando
7
Introdução
Os esforços para diminuição das taxas de mortalidade infantil, bem como para
implementação de intervenções adequadas que contribuam para a prevenção de doenças,
detecção precoce e tratamento eficaz, têm surtido efeito na promoção da qualidade de
vida das crianças, seja por meio de políticas públicas ou mesmo pelo avanço de técnicas
diagnósticas, tratamento intensivo e de reabilitação (FIGUEIRAS et al., 2005).
Objetivos
»» Apresentar características próprias do desenvolvimento normal da
criança e os fatores envolvidos neste processo.
Capítulo 1
Processos patológicos e recuperação
do sistema nervoso central
Por sua vez, os neurônios são células básicas do tecido nervoso, sendo que cada um deles
é formado por: corpo, axônio e dendritos. Sua função é receber, conduzir e transmitir
impulsos no Sistema Nervoso (DECs).
9
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
que a célula assuma sua forma madura. Estando maduros, esses neurônios passarão a
produzir diferentes sinais elétricos, que serão utilizados para gerar, receber e transmitir
informações (PINHEIRO, 2007).
Uma vez maduros, as conexões começam acontecer, seja entre neurônio com neurônio;
ou neurônio com outras estruturas, por exemplo, com a musculatura esquelética
(responsável pelos movimentos voluntários). Estas conexões acontecem graças ao
mecanismo denominado sinapse, que permite a passagem do impulso nervoso entre
as células. As sinapses podem ser elétricas, químicas ou gasosas, isso porque a forma
com que o impulso elétrico chega até outra célula pode variar. Entretanto, a forma
mais comum é a elétrica, que acontece quando os neurônios sintetizam substâncias
químicas denominadas neurotransmissores, capazes de inibir ou excitar a atividade de
seus neurônios-alvo (PINHEIRO, 2007; MAGALHÃES, 2011).
Será pelas conexões entre neurônios (redes neurais), resultantes das sinapses, que será
possível o aprendizado em todos os níveis do desenvolvimento, desde atos involuntários
comandados por reflexos, até processos mentais superiores, como abstração e
planejamento (PINHEIRO, 2007).
10
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
A pia-máter, por fim, é a camada mais interna das três meninges, que é
fina e vascularizada (DECs).
11
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
12
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
Ao longo deste Caderno de Estudo e Pesquisa você poderá notar que muitas dessas
estruturas podem ser afetadas em algumas patologias em neuropediatria, e cada
uma delas, ao ser acometida, pode gerar um tipo específico de déficit, acarretando
em consequências para a vida funcional da criança. Neste aspecto, o reconhecimento
da etiologia das patologias, bem como as estruturas afetadas é fundamental para o
planejamento terapêutico e mensuração prognóstica.
O desenvolvimento da criança
Antes de falarmos sobre patologias, é importante frisarmos que três fatores são
fundamentais e influenciam o desenvolvimento da criança, sendo eles:
1. Estrutura Biológica.
2. Estimulação Adequada.
3. Participação Afetiva.
Quando falamos sobre estimulação adequada, queremos dizer que, não basta a criança
apresentar uma estrutura biológica apta para que o aprendizado efetivo aconteça. Para
isso, é importante que ela conte também com estímulos. Ou seja, não adianta querermos
que uma criança comece a andar se não lhe dermos a oportunidade de vivenciar tal
feito. Neste mesmo caminho, citamos então a importância da participação afetiva, que
irá incentivar, valorizar e favorecer o aprendizado, despertando o interesse da criança.
Esta participação é feita por familiares, cuidadores ou tutores, com os quais a criança
iniciará suas primeiras relações (PISATI; GABEL; CYPEL, 2005).
13
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
Cada fator de risco, em razão de seu caráter dinâmico, envolve mecanismos de risco
associados e apresentam influências adversas ao desenvolvimento, que podem ser de
natureza biológica, psicológica e/ou social e ser identificados no indivíduo, no ambiente
ou em ambos de forma combinada (MASTEN; COATSWORTH, 1995).
»» História genética;
»» Desnutrição;
»» Privações afetivas;
»» Baixa escolaridade;
»» Violência doméstica;
14
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
Durante a gestação, além dos fatores de risco já mencionados, o feto pode estar sujeito
à exposição de fatores teratogênicos, que são fortemente associados às malformações
congênitas. Estão inclusos nesse grupo, além de fatores ambientais, alguns medicamentos
e outras drogas como álcool e fumo. Da mãe estes fatores é estendido ao feto e os efeitos
sobre ele irão depender da substância, dos aspectos biológicos e fisiológicos da mãe, da
dose ou quantidade e da época de exposição durante a gravidez (ROCHA et al., 2013).
É importante frisar que cada criança é um ser individual, que conta com experiências
únicas. Algumas são superestimuladas, outras nem tanto. Algumas demoram um pouco
mais para adquirir determinadas habilidades, outras desenvolvem especificidades mais
facilmente. Portanto, mesmo crianças sem qualquer anormalidade podem apresentar
pequenos atrasos ou avanços dentro dos padrões estabelecidos. Denominamos isto
como: variações da normalidade (PISATI; GABEL; CYPEL, 2005).
15
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
Uma questão importante que precisamos entender é que nos três primeiros meses o
bebê inicialmente apresenta movimentos primitivos que não dependem da sua vontade,
ou seja, movimentos involuntários e instintivos, que irão iniciar sua experiência motora
e cognitiva, preparando a musculatura e os impulsos cerebrais, para em seguida
transformarem-se em reações e movimentos voluntários (PISATI; GABEL; CYPEL,
2005).
Além disso, gradativamente a criança consegue maior controle dos eixos corporais,
inicia as transferências de peso que favorecem o uso funcional dos membros, como as
mãos, consequentemente favorecendo as trocas posturais (sentado para em pé, deitado
para sentado, vice versa) e deslocamento.
16
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
1o mês: postura flexora, movimentos involuntários/reflexos primitivos (fuga asfixia, retirada, extensão cruzada, cutâneo patelar em
extensão, busca e sucção, preensão palmar e plantar, marcha automática, tônico cervical assimétrico, reação positiva de suporte ou
de apoio, reação de proteção da cabeça), roda a cabeça, percebe sons.
2o mês: movimento em bloco dos membros inferiores e superiores, mantém a cabeça mais firme, mas ainda não a mantém, segue
com os olhos objetos próximos, sorri, diferencia sons e começa a vocalizar “ah, eh, uh”, reação labiríntica de retificação, preensão
palmar reflexa, reação de colocação palmar.
3o mês: reflexo de moro, inicia controle da cabeça, segura objetos, diferencia pessoas da família e estranhos, vocalização social
Primeiro (começa a tentar responder), leva a mão até a linha média, reação de colocação palmar.
Semestre
4o mês: levanta e mantém a cabeça equilibrada quando sentado, mantém mãos abertas, pega objetos, brinca com as mãos,
preensão palmar voluntária, reação cervical de retificação, postura mais simétrica, coordenação buco-manual.
5o mês: rola de prono para supino e o inverso também, move-se em posição de nadar, reconhece sua imagem no espelho, leva
tudo à boca, percebe de onde vêm os sons e vira-se na direção deles.
6o mês estica os braços para ganhar colo, senta com apoio anterior das mãos, segura objetos com as duas mãos, rasteja-se para
trás, come papinha, repete sons como “má-má, dá-dá”, reação de proteção dos braços para frente, reação de Landau, reação de
anfíbio, reações de equilíbrio, reação corporal de retificação agindo sobre o corpo.
7o mês: senta-se de modo mais firme e sem apoio, inclina-se para frente, passa objetos de uma mão para outra, brinca com os
pés, fica de gatas e transfere peso, rasteja-se para frente.
8o mês: reação de proteção lateral, pivoteia sentado, reconhece seu próprio nome e o “não”, está pronto para engatinhar, levanta-
se para ficar em pé com apoio, discrimina o familiar do não familiar.
9o mês: tem boa rotação de tronco, dá os primeiros passos apoiados, anda em volta dos móveis, os dedos funcionam como pinça
para pegar objetos, faz brincadeiras simples.
Segundo 10o mês: engatinha com rapidez, põe-se em pé, dá passos laterais com apoio, aponta com o dedo indicador, agarra objetos e os
Semestre olha, coloca um objeto dentro do outro, bate palmas, faz “tchau”.
11o mês: locomove-se de joelhos, tenta ficar em pé encostado nas paredes e apoiando-se em móveis, dá passos para frente com
base alargada, seguro por uma mão, fala duas ou mais palavras simples.
12o mês: passa para posição de cócoras, anda com ajuda, coloca um objeto em cima do outro, diz duas ou mais palavras, ajuda a
vestir-se, alimenta-se sozinho, preferindo comer com as mãos.
Evolução da libido: fase oral (nesta fase o bebê pede ao ambiente uma gratificação imediata de suas necessidades, sendo esta
gratificação primariamente oral, por meio do sugar e alimentar-se).
1o ano: começa andar sozinho, começa a comer, sobe em móveis, obedece a ordens simples, vocabulário em torno de dez
1 a 2 anos palavras, início do controle esfincteriano.
Evolução da libido: fase anal (a atenção e o prazer estão direcionados à exceção).
2o ano: chuta bola, empilha objetos, sobe e desce escada sozinho, faz frase de duas ou três palavras, identifica o nome de objetos,
reconhece algumas partes do corpo, imita atividades, utiliza frases para pedir o que deseja.
3o ano: começa pedalar, para sobre um pé, pula com as duas pernas, faz perguntas simples, sabe seu nome e sexo, pode falar
sobre acontecimentos, usa bem a colher, veste-se com supervisão, reconhece as diferentes partes do corpo.
2 a 5 anos 4o ano: corre, anda de bicicleta, reconhece várias cores, brinca em grupos, vocabulário de 1.500 palavras.
5o ano: salta alternadamente em cada pé, agarra bola, veste-se sozinho, vocabulário de 2.500 palavras, faz perguntas usando
como e onde, questiona sobre a diferença entre meninos e meninas.
Evolução da libido: fase genital (é comum que as crianças manipulem os próprios geniais, reconhecendo essa região como
uma zona geradora do prazer).
6o e 8o ano: aumenta o desejo de saber, perguntas mais elaboradas, aparecem noções de espiritualidade e religião, aumento
gradativo da vida social, deixa progressivamente a fantasia, passando a compreender tarefas reais, jogos de equipe, competições,
identificação com o grupo.
6 a 10
anos 9o e 10o ano: início do desenvolvimento sexual com alterações corporais importantes que irão completar-se na puberdade.
Evolução da libido: fase de latência (período em que não se identifica uma zona específica de erotização, ou seja, a criança
investe sua energia libidinal em outros investimentos).
Fonte: (PISATI; GABEL; CYPEL, p. 28, 2005 adaptado).
17
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
da criança. Esses déficits podem ser identificados de diversas formas, tanto intrauterino,
quanto após o nascimento por meio de testes e exames específicos. Outros déficits,
porém podem não ser identificados de imediato, mas manifestar-se aos poucos com
atrasos persistentes no progresso do desenvolvimento neuropsicomotor. Portanto, a
vigilância do desenvolvimento da criança é importante para que determinadas atitudes
sejam tomadas quando existe a percepção de que algo está errado. Identificando o atraso
e compreendendo o que o está causando, é possível que se avalie a necessidade ou não
de encaminhamento para programas de assistência, acompanhamento e intervenção
precoce.
O córtex motor
O córtex motor compreende várias regiões distintas que podem ser definidas como “área
motora primária” (M1), “área pré-motora” (PM), “área motora suplementar” (AMS),
“área motora cingulada rostral” (AMCr) e “área motora cingulada caudal (AMCc). Cada
uma dessas áreas controla preferencialmente o movimento de diferentes partes do
corpo (PORTER, 2001).
Como um ciclo, essas informações que chegam até o córtex motor após serem
processadas, irão gerar uma resposta por meio das vias eferentes e atingir a musculatura
para produzir movimento. A via mais direta para isso é o Trato Córtico-Espinhal (TCE),
que tem a maioria de suas células localizadas na M1, mas também podem ser encontradas
na AMS, na PM e no córtex somatossensorial. As fibras do trato, que nada mais são do
que feixes de axônios, ao atingirem a medula espinhal cruzam a linha média e descem
ao longo da face lateral da medula espinhal, sendo este evento o responsável por um
hemisfério controlar os movimentos do lado oposto do corpo (PORTER, 2001).
Será por meio do TCE que o processamento cortical mais elevado, como controle digital
independente e especializado, preensão de precisão e controle fino dos dedos, será
permitido (PORTER, 2001).
A AMS não está intimamente ligada ao movimento real, mas fica ativa durante longos
períodos antes da atividade muscular, estando mais fortemente relacionada com a
preparação do movimento, como informações e sinais auditivos e visuais relevantes
ao movimento pretendido. Por exemplo, se uma pessoa escuta um sino tocar, ela não
irá se movimentar por causa disso, porém, se ela foi treinada a realizar determinado
movimento ao escutar um sino tocar, a área AMS será ativada e a preparação do
movimento acontecerá. O mesmo acontece com a área PM, cujas células são ativas
durante a fase de planejamento do movimento, enquanto poucas são ativas durante
19
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
o movimento real, porém a diferença é que as células desta área respondem aos sinais
sensoriais desencadeadores de movimentos relacionados, controlando, por exemplo,
atos mentais como a busca de alimentos, a preensão para segurá-los e o ato de levá-los
até a boca (PORTER, 2001).
O quadro 2 apresenta a atividade neuronal de cada uma das áreas do córtex motor.
»» Responsável pela execução real e controle dos movimentos de todas as partes do corpo;
»» Controla parâmetros específicos da contração muscular, como força, velocidade e direção;
Área Motora Primária »» Controla a força das contrações musculares isométricas e dinâmicas (torque) respectivamente;
(M1)
»» Controla a velocidade da contração muscular;
»» Recebe estímulos táteis e proprioceptivos e responde de forma a permitir ajustes rápidos e contínuos do
movimento, como controle de força para examinar e segurar um objeto.
»» A estimulação desta área produz movimentos bilaterais complexos da musculatura axial, proximal e, em alguma
Área Pré-Motora (PM) extensão das extremidades ditais e facial, porém é necessário corrente de alta intensidade para que esses
movimentos sejam observados.
Os gânglios basais
O circuito dos Gânglios Basais processam os sinais corticais que chegam no núcleo
estriado e, pelos núcleos talâmicos, devolvem a resposta ao córtex motor. Para essas
estruturas de comunicação entre córtex e Gânglios Basais é dado o nome de alça motora.
Por meio deste sistema de comunicação, os Gânglios Basais influenciam diretamente as
áreas motoras da medula espinhal e do tronco encefálico (PORTER, 2001).
20
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
As células do globo pálido estão relacionadas com tarefas recordadas, ou seja, referem-se
ao início do movimento, estimulado internamente. Muitas dessas células estão ativas
durante uma parte do movimento sequencial. Esta característica envolve os Gânglios
Basais em aspectos cognitivos do movimento, programando o início de movimentos
gerados internamente e executando estratégias motoras complexas. Auxiliam a
comparação de comandos motores do córtex com o estímulo proprioceptivo e avaliam
os dados sensoriais para determinar quais estímulos são relevantes (PORTER, 2001).
O cerebelo
Alterações de tônus
Como já mencionado, o tônus mantém a musculatura alerta para que possa responder
aos estímulos imediatamente quando solicitado ou quando necessário. Portanto,
alterações de tônus podem prejudicar a movimentação ativa e/ou reflexa exigida
diariamente em diversas situações cotidianas.
21
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
Essas alterações podem ser ocasionadas por lesões no sistema nervoso central e
influenciam a vida funcional da criança, uma vez que o meio ambiente sempre exigirá
algum tipo de atividade. Portanto, a identificação desses padrões é importante para que
a criança não adquiria determinadas fixações de movimentos e posturas atípicas, que
podem gerar contraturas musculares e progressivamente evoluir para deformidades.
As alterações de tônus mais presentes são hipotonia, hipertonia e/ou tônus flutuante. A
hipotonia é caracterizada por diminuição do tônus muscular esquelético e diminuição
da resistência ao estiramento passivo (DECs).
Estes tipos de alterações podem ser identificados em diferentes tipos de lesão, que
serão estudadas na Unidade II desta apostila. Por hora, iremos entender quais são as
possíveis consequências de lesões especificas em determinados centros motores.
Lesões nesta área, que podem ser causadas por traumatismos cranianos, acidente
vascular encefálico, alterações congênitas, tumorais, inflamatórias, desmielinizantes
22
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
Uma vez que o sistema suprassegmentar é interrompido, ele libera reflexos e explica
a rigidez de descerebração que surge imediatamente após uma lesão central. A
espasticidade que se desenvolve então, é explicada pela plasticidade neuronal e por
mecanismos de brotamento e hipersensibilidade, que serão explicitados em breve
(BARBOSA; CURY, 2016).
O grau de espasticidade pode variar dependendo a postura e posição do corpo. Pela escala
de Ashworth podemos quantificar o tônus muscular em normal, levemente aumentado,
aumentado com mobilização fácil, aumentado com mobilização difícil e rigidez sem
possibilidade de movimento; e com a escala de Penn, podemos quantificar a frequência
dos espasmos em “não existem”, leves induzidos por estímulo, raros com menos de um
por hora, mais de um por hora e mais de dez por hora (BARBOSA; CURY, 2016).
23
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
Lesões nesta área podem incluir sintomas de acinesia severa (imobilidade) do lado
oposto ao da lesão, mutismo, perda da expressão facial e dificuldade em movimentos
bimanuais. Os pacientes também apresentam dificuldade em iniciar tarefas por si,
precisando de auxilio de outras áreas corticais, como sinais auditivos, visuais ou táteis
(PORTER, 2001).
Vale ressaltar que nos casos de lesões no Córtex Sensorial, apesar de os centros motores
estarem intactos, para que os movimentos voluntários sejam suaves é importante a
informação sensorial. Ou seja, lesões no córtex somatossensorial acarretam ataxia (perda
ou irregularidade da coordenação muscular), dismetria (imperfeição na realização de
um movimento) e uma relutância ao movimento (PORTER, 2001).
24
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
Além dos distúrbios já mencionados, lesões na área dos Gânglios Basais também
podem causar distonia (movimentos involuntários geralmente em torção, variando em
velocidade), tique, estereotipia, acatisia (distúrbio caracterizado pela impossibilidade
de se sentar ou permanecer sentado), tremor (contração alternada dos músculos
agonistas e antagonistas, levando a movimentos involuntários), ataxia, mioclonia
(contração muscular súbita e involuntária devido à descarga patológica de um grupo de
células nervosas), Síndrome da “mão alienígena” (a mão funciona involuntariamente,
sem a pessoa perceber), Síndrome das pernas inquietas (vontade incontrolável de
mover as pernas), pseudoatetose (tremor dos dedos quando o doente estende os
braços com os olhos fechados), espasmo hemifacial (mioclonia segmentar da face)
(BARBOSA; CURY, 2016).
Lesões cerebelares
Lesões no cerebelo, apesar de não gerar paralisia ou perda de sentidos, são devastadoras
na habilidade de realizar movimentos sequenciais complexos e suaves. Há deterioração
do equilíbrio, perturbação da coordenação manual e das posturas de apoio. Está
presente também nas lesões cerebelares hipotonia ao alongamento passivo, perda de
sinergia muscular resultando em tremor e ataxia (PORTER, 2001).
Plasticidade neuronal
A Plasticidade Neuronal ou Neuroplasticidade é a capacidade de reorganização e
adaptação do Sistema Nervoso Central em resposta às inúmeras perturbações. Neurônios
e outras células do cérebro são capazes de alterar sua estrutura e seu funcionamento
em resposta a uma variedade de estímulos, incluindo o treinamento comportamental.
Neste aspecto, o cérebro passa a aprender novos comportamentos e esta é a base da
reabilitação para reorganizar o cérebro danificado. Além disso, recentemente foi
descoberto que as células-tronco neurais continuam a produzir neurônios e gliócitos na
fase adulta e também no envelhecimento, sustentando ainda mais a afirmação de que
25
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
Ou seja, acredita-se que regiões não ocupadas ou não definidas do cérebro podem
assumir funções perdidas em decorrência de uma lesão em outra área. Outro mecanismo
que pode explicar a neuroplasticidade é o fato de as funções cerebrais não agirem de
forma isolada, mas sim em uma grande rede de comunicações entre diferentes áreas que
integram os sinais e produzem a resposta adequada para o movimento. Neste aspecto,
quando determinada área é lesionada, várias outras ainda podem manter a capacidade
de controlar a função (HELD; TIM, 2001; SALLES; BATTISTELLA, 2016).
26
NEUROPLASTICIDADE │ UNIDADE I
É importante frisar que muitos tipos de lesões ao SNC causam lesões de axônios e não
dos corpos celulares. Quando o corpo celular não é lesionado, podemos pensar em
regeneração. Neste caso, citamos o brotamento colateral, que nada mais é que a resposta
do corpo celular e a formação de novos brotos, que conforme crescem, aumentam as
projeções residuais e, apesar de não substituir o circuito original, não ocorrem de forma
aleatória. Essas novas projeções originam-se dos sistemas mais intimamente associados
á área lesada (HELD; TIM, 2001).
É importante lembrarmos, como já foi dito, que alguns fatores influenciam a capacidade
de neuroplasticidade, sendo elas:
27
UNIDADE I │ NEUROPLASTICIDADE
mesmos déficits que uma lesão ocorrida na vida adulta. Este assunto será
mais detalhado a seguir;
28
PATOLOGIAS EM Unidade iI
NEUROPEDIATRIA
Capítulo 1
Paralisia cerebral
Introdução
Você pode imaginar uma criança com dificuldade severa ou impossibilitada de
executar atividades básicas do dia a dia, como agarrar um brinquedo, ficar em pé sem
apoio ou caminhar? Pois bem, essa criança pode na verdade apresentar um quadro
clínico chamado Paralisia Cerebral (PC), uma condição ocasionada por uma lesão
neurológica não progressiva, ou seja, não evolui com o passar do tempo, e não passível
de cura. Esta desordem do desenvolvimento ocorre nos três primeiros anos de vida,
gerando comprometimentos de ordem motora que prejudicam a locomoção (figura
1), manutenção da postura, controle de movimentos, uso das mãos e até mesmo a
comunicação verbal (GERALIS, 2007; MONTEIRO, 2015).
Os primeiros relatos sobre esse transtorno motor surgiram em 1843 pelo ortopedista
William John Little, sendo a condição denominada durante anos por “Doença de Little”.
Em 1897, passou a ser chamada de Paralisia Cerebral pelo neurologista Sigmund Freud,
o que para alguns pesquisadores se configura como uma nomenclatura inadequada,
uma vez que a lesão não ocorre exclusivamente no cérebro, mas sim em qualquer
outra estrutura que compõe o encéfalo. No entanto, o termo ainda é o mais utilizado e
difundido na comunidade científica, instituições, clínicas e famílias. Outra terminologia
citada pela literatura atualmente é a Encefalopatia Crônica Não Evolutiva da Infância
(MORRIS, 2007; MONTEIRO, 2015; MUCELIN, 2015).
Incidência
Estudos recentes como de Monteiro (2015) revelam que na população mundial a cada
1000 crianças nascidas vivas, 2 são afetadas pela PC, no entanto, os dados epidemiológicos
variam de lugar para lugar de acordo com as condições socioeconômicas em que se
encontram. Países de terceiro mundo apresentam maior incidência da PC devido à
precariedade dos serviços de saúde oferecidos, sobretudo às gestantes no período pré e
perinatal. O autor também afirma que no Brasil não existem dados precisos acerca da
prevalência dos casos, dada à sua extensão territorial, desigualdade social e assistência
médica inadequada, porém, estima-se que a incidência da desordem seja maior do que
em países desenvolvidos.
30
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Pré-natais
Fatores Ambientais
Radiação
Drogas
Genética
Cromossomopatias
Doenças gênicas
Materno
Infecções intrauterinas
Hemorragia durante período gestacional
Deslocamento prematuro da placenta
Intoxicação materna
Posicionamento inadequado o feto ou prolapso do cordão umbilical
Problemas de coagulação (Síndrome Antifosfolipídeo)
Infecções congênitas
Vasculites
Placenta prévia
Doença hipertensiva específica da gestação (Pré-eclâmpsia ou Eclâmpsia)
Hipotensão Arterial
Perinatais
Asfixia (Hipóxia / Isquemia)
Icterícia grave
Baixo peso
Prematuridade
Crises convulsivas
Infecção neonatal com menos de 30 dias de vida (Sepse e/ou Meningoencefalite)
Hemorragia intracraniana grau IV
Pós-natais
Traumatismo Crânio Encefálico – TCE
Encefalopatia Hipóxico-Isquêmica (Cardiopatia grave, Distúrbios Respiratórios graves associados à Hipóxia, Semiafogamento,
Choque Hipovolêmico, Parada Cardiorrespiratória)
Infecção do Sistema Nervoso Central
Acidente Vascular Encefálico – AVE
Fonte: (MONTEIRO, 2015 adaptado).
31
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Espástico ou piramidal
Atetoide ou hipercinética
Atáxica
Hipotônica
Tipo raro, correspondendo a 1 % dos casos. Nesta classificação há persistência por longo
período da hipotonia em que raramente a criança desenvolve a marcha.
32
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Mista
Tetraplegia (tetraparesia)
Diplegia (diparesia)
33
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Hemiplegia (hemiparesia)
O instrumento possui duas versões, uma com 88 (GMFM – 88) itens e a mais atual
com 66 (GMFM – 66). Ambas são constituídas por medidas observacionais nas quais
as funções motoras são avaliadas em 05 dimensões: deitar e rolar (A); sentar (B);
engatinhar e ajoelhar (C); ficar em pé (D) e andar, correr e pular (E). Cada dimensão
possui sua pontuação expressa em porcentagens, onde quanto mais alta esta for, maior
será considerada a capacidade funcional da criança com PC (CURY et al., 2006).
34
Capítulo 2
Epilepsia
Introdução
Neste aspecto, é importante que neste momento possamos voltar nossas atenções
para este capítulo, para compreender melhor este quadro. Para tanto, faremos uma
breve introdução a cerca das definições e conceitos sobre epilepsia e em seguida
apresentaremos a classificação, sintomatologia, alguns aspectos peculiares da epilepsia,
métodos diagnósticos e para encerrar, algumas formas de tratamento.
35
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Conceitos e definições
O termo epilepsia engloba uma série de síndromes clínicas que tem como principal
característica a predisposição à ocorrência de crises epilépticas de repetição. Neste
sentido, a presença de epilepsia é definida pela ocorrência de pelo menos duas crises
convulsivas espontâneas e não provocadas por febre, agressões agudas ao SNC ou por
distúrbios tóxico-metabólicos graves (ZUGAIB, 2012; CASTRO, 2016).
Sendo assim, é importante que saibamos identificar e definir uma crise epiléptica,
que, segundo Valente e Valério (2003, p. 21), “são decorrentes de descargas neuronais
síncronas, excessivas e anormais que estão localizadas predominantemente no córtex
cerebral”, sendo usualmente intermitente e autolimitada, não se aplicando a doença
específica ou síndrome única, mas a um grupo de condições neurológicas que apresentam
em comum a presença de crises epilépticas recorrentes, não provocadas. De forma mais
simplificada, do ponto de vista fisiopatológico, Zugaib (2012) define crise epiléptica
como um distúrbio paroxístico do SNC, caracterizada por descarga neuronal anormal
acompanhada ou não de perda de consciência.
John Hughlings Jackson e William Richard Gowers foram os introdutores dos conceitos
modernos sobre a epilepsia e contribuíram também com dados sobre as características
clínicas, tratamento e prognóstico (VALENTE; VALÉRIO, 2003).
Atualmente, a definição usada para crise epiléptica é a publicada em 2005 pela Liga
Internacional Contra a Epilepsia (International League against Epilepsy – ILAE),
que a conceitua como “a manifestação transitória de sinais e/ou sintomas em razão
da atividade excessiva ou síncrona de neurônios cerebrais”, sendo que esses sintomas
variam de acordo com a região do cérebro acometida durante a crise. Como mencionado,
essas crises são ocasionadas pela epilepsia, e pode causar consequências neurológicas,
cognitivas e psicossociais associadas (GJILHOTO, 2011).
Também encontraremos no meio médico o termo “estado de mal epiléptico”, que por
sua vez é representado por uma crise com duração de pelo menos 30 minutos ou uma
série de crises durante as quais as funções neurológicas não são restabelecidas neste
mesmo período de tempo (GJILHOTO, 2011).
Causas e etiologia
36
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Incidência e prognóstico
O prognóstico varia, uma vez que a crise epiléptica é a expressão clínica de um grande
número de condições, como já mencionado, entretanto, fatores importantes a serem
analisados para delineamento do prognóstico envolvem o risco de recorrência depois
da primeira crise; possibilidade de remissão após mais de uma crise, o que significa
período livre de crises, que pode durar por 1 ano ou mais; e mortalidade, que parece
estar relacionada à gravidade das crises e, neste aspecto, podemos citar, por exemplo,
acidentes como afogamentos, neoplasias, arritmias cardíacas durante ou após a crise
ou complicações pulmonares (VALENTE; VALÉRIO, 2003).
Em crianças, existe alta incidência de epilepsia nos primeiros anos de vida, permanecendo
alta até o período pré-escolar. As lesões consequentes destas crises podem ser extensas
como as decorrentes de quadros hipóxicos ou de distúrbios do desenvolvimento cortical,
sendo acompanhada por déficit neurológico, cognitivo ou motor, podendo evoluir com
refratariedade às drogas antiepilépticas (DAE) (VALENTE; VALÉRIO, 2003).
Classificação e sintomatologia
37
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Nos casos de epilepsia por etiologia genética, não existe lesão estrutural, sendo a
epilepsia o resultado de um defeito genético conhecido ou presumido e as crises, uma
manifestação fundamental deste defeito. Habitualmente este tipo de epilepsia apresenta
bom prognóstico. As epilepsias de etiologia estrutural/metabólica caracterizam-se por
crises em que há evidência de lesão estrutural, demonstrável em exame de neuroimagem,
já as epilepsias de causa desconhecida, os exames não revelam a etiologia (CASTRO,
2016).
O quadro 4 apresenta os tipos específicos das crises parciais e das crises generalizadas,
segundo a classificação da ILAE.
Quadro 4. Tipos de crise epiléptica segundo a classificação da International League Against Epilepsy (ILAE).
38
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Crises generalizadas
a) de ausência: curta duração, início e término abruptos, ocorrendo em indivíduos neurologicamente normais
›› Alteração apenas da consciência;
›› Associada a componentes clônicos leves;
›› Associada a componente atônico;
›› Associada a componente tônico;
›› Associada a automatismos;
›› Associada a componente autonômico.
b) de ausência atípica: maior duração, início e término menos abruptos, ocorrendo em indivíduos neurologicamente comprometidos, geralmente
no contexto de síndromes epilépticas mais graves.
c) mioclônicas: “choques” rápidos simétricos ou assimétricos, nas mãos, braços, pernas. Podem ser descritas como perda de controle motor, em
que as coisas “pulam das mãos”, sem prejuízo à consciência, podendo ser desencadeadas por estímulo luminoso repetido, privação de sono ou uso
de bebidas alcoólicas.
d) clônicas: movimentos irregulares e involuntários, associados à apneia e à sialorreia.
e) tônicas: perda abrupta da consciência, rigidez muscular generalizada, extensão dos membros, da musculatura do pescoço, supraversão ocular.
Tendem a ocorrer durante o sono
f) tonicoclônicas: perda abrupta de consciência, queda, rigidez muscular, grito forçado, mordedura da língua, liberação de esfíncteres.
g) atônicas: perda abrupta do tônus axial (cabeça e tronco), frequentemente levando a quedas com ferimentos; geralmente mais comum em
crianças.
*os termos “Parcial simples” e “Parcial complexa” não são mais recomendados, sendo substituído por “Crises focais”,
descritas de acordo com as características específicas subjetivas: motora, autonômica ou discognitiva.
Lactente
»» Epilepsia do lactente com crises focais migratórias;
»» Sindrome de West;
»» Epilepsia mioclônica do lactente;
»» Epilepsia benigna* do lactente;
»» Epilepsia familiar benigna* do lactente;
»» Síndrome de Dravet;
»» Encefalopatia mioclônica em distúrbios não progressivos.
39
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Infância
»» Crises febris plus (podem começar no lactente);
»» Síndrome de Panayiotopoulos;
»» Epilepsia com crises mioclônico atônicas (previamente astáticas);
»» Epilepsia benigna* com descargas centrotemporais;
»» Epilepsia autossômica-dominante noturna do lobo frontal;
»» Epilepsia occipital da infância de início tardio (tipo Gastaut);
»» Epilepsia com ausências mioclônicas;
»» Síndrome de Lennox-Gastaut;
»» Encelalopatia epiléptica com espícula-onda contínua durante sono;
»» Síndrome de Landau-Kleffner;
»» Epilepsia ausência da infância.
Adolescência-Adulto
»» Epilepsia ausência juvenil;
»» Epilepsia mioclônica juvenil;
»» Epilepsia com crises generalizadas tônico-clônicas somente;
»» Epilepsia mioclônicas progressivas;
»» Epilepsia autossômica dominante com características auditivas;
»» Outras Epilepsia familiais do lobo temporal.
Relação menos específica com idade
»» Epilepsia familial focal com focos variáveis (infância à vida adulta);
»» Epilepsias reflexas.
Constelações distintas
»» Epilepsia mesial temporal com esclerose hipocampal;
»» Síndrome de Rasmussen;
»» Crises gelásticas com hamartoma hipotalâmico;
»» Epilepsia hemiconvulsão hemiplegia;
»» Epilepsias que não se enquadram em nenhuma destas categorias diagnósticas podem ser distinguidas inicialmente na presença ou ausência de
condição estrutural ou metabólica (causa presumida) e no modo primário do início de crise (generalizado vs. focal).
Epilepsias atribuídas a causa estrutural-metabólica
»» Malformações do desenvolvimento cortical (hemimegalencefalia, heterotopia etc);
»» Síndromes neurocutâneas (complexo esclerose tuberosa, Sturge-Weber etc;
»» Tumor;
»» Infecção;
»» Trauma;
»» Angioma;
»» Insultos perinatais;
»» Acidente vascular cerebral;
»» Entre outros.
Epilepsias de causa desconhecida
Condições com crises epilépticas que são tradicionalmente não diagnosticadas como uma forma de epilepsia per si
»» Crises benignas* neonatais;
»» Crises febris.
*o termo “benigna” não é mais utilizado, sendo substituído pelo termo “autolimitada”, ou seja, com tendência a resolver
espontaneamente com o tempo.
Fonte: (GJILHOTO, p.102, 2011).
40
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Diagnóstico clínico
Para diagnosticar a crise epiléptica é preciso que se evidencie relato de disfunção
neurológica, ocasionada pela atividade neuronal excessiva ou síncrona de neurônios
cerebrais, manifestada por meio de sinais e sintomas como os apresentados na Tabela
1. É importante que a crise seja identificada e diferenciada como aguda sintomática,
crise única ou epilepsia, sendo a realização do Eletroencefalograma (EEG) fundamental
para que o tipo de crise seja definida. Os dados clínicos, bem como histórico familiar
do paciente devem ser coletados para determinação da etiologia das crises e demais
exames como eletrográficos e de neuroimagem (ressonância magnética ou tomografia
computadorizada de crânio) devem ser realizados para maior detalhamento do quadro
(GJILHOTO, 2011; CASTRO, 2016).
Exames subsidiários
Alguns exames são destinados a investigar a causa desencadeadora da crise epiléptica,
sendo eles:
42
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Tratamento
O objetivo do tratamento é proporcionar ao paciente uma boa qualidade de vida, e o
sucesso depende da escolha adequada dos procedimentos e medicamentos. A priori as
decisões devem ser tomadas levando-se em consideração a etiologia da crise epiléptica,
ou seja, quando existem distúrbios subjacentes que possam estar causando a crise, os
mesmos devem ser identificados e tratados, como, por exemplo, desidratação, infecção,
entre outros (GJILHOTO, 2011; SILVA; CARDOSO; MACHADO, 2013).
Com relação ao tempo de tratamento, quando um paciente faz uso de DAE por
2 anos e não apresenta crises nesse período, a suspensão da terapia pode ser
considerada, levando-se em consideração os aspectos individuais do paciente, bem
como o prognóstico de cada caso. Há possibilidade de 30 a 40% de recorrência após
suspensão da DAE. Ao mesmo tempo, cerca de 10 a 40% das crianças continuarão a
ser acometidas por crises epilépticas mesmo com o uso contínuo de DAEs (SILVA;
CARDOSO; MACHADO, 2013).
A epilepsia pode gerar impacto na qualidade de vida dos pacientes, uma vez que ainda
existe preconceito em escolas, empregadores ou demais ambientes que uma pessoa
queira frequentar. Pode haver excesso de proteção da família, devido a necessidade
de cautela na execução de atividades, como dirigir, nadar, atividades profissionais que
incorra risco ao paciente e outros. Depressão é uma comorbidade frequente em epilepsia,
podendo estar presente em cerca de 40% dos casos. Neste aspecto, o reconhecimento e
o tratamento da epilepsia é de fundamental importância para garantir maior bem-estar
físico, psíquico e social para o paciente (CASTRO, 2016).
43
Capítulo 3
Síndrome de West
Introdução
A Síndrome de West (SW) é um tipo grave de epilepsia em crianças, relacionada
com a idade, que associa uma tríade clássica de manifestações, sendo elas espasmos
musculares (em flexão, extensão, mistos, breves, bilaterais, simétricos e/ou axiais) com
intervalos menores que 60 segundos entre um e outro, variando a várias centenas por
dia; retardo mental (cerca de 80% dos casos, com prognóstico pobre) e anormalidades
eletroencefalográficas caracterizadas por hipsarritmia (PORTILLO et al., 2011; ROSSO;
NICARETTA; MATTOS, 2011).
É o tipo mais frequente das encefalopatias epilépticas, ou seja, condições nas quais a
epilepsia determina deterioração cognitiva, representando cerca de 2,4% de todas as
epilepsias. Com incidência de 1:2000 a 4000 nascidos vivos, pode ser sintomático (85%
dos casos), criptogênicos ou idiopáticos. Os casos sintomáticos podem estar associados
à diversas causas, sendo as mais comuns devido à disfunções orgânicas do cérebro, cujas
origens podem ser pré, peri e pós-natais (PEREIRA FILHO et al., 2004; PORTILLO et
al., 2011; ROSSO; NICARETTA; MATTOS, 2011).
Etiologia
A etiologia dos espasmos infantis está associada a diversos fatores como genéticos,
teratogênicos e, como já mencionado, pré, peri e pós-natais. Para tanto, como exemplo
de fatores pré-natais (presentes em 20 a 30% dos casos) podem ser mencionados toxemia
gravídica, consanguinidade, síndrome de Down, malformações cerebrais congênitas
(lisencefalia, holoprosencefalia, agenesia do corpo caloso), infecções congênitas
(toxoplasmose, rubéola, vírus de inclusão citomegálica), desnutrição intraútero,
doença de Bourneville, dentre outros. Fatores peri (presentes em 15% a 56%) e
44
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Para título de nota, dependendo da literatura escolhida para estudar a SW, pode ser
verificado que alguns autores consideram casos idiopáticos e criptogênicos como uma
mesma categoria (MATTA; CHIACCHIO; LEYSER, 2007).
Manifestações clínicas
As manifestações da SW aparecem por volta do quarto e sexto mês de vida da criança e
são caracterizadas por espasmos, ou seja, contrações bruscas, breves e na maioria das
vezes simétricas, maciças, sendo que em cerca de 70% dos casos predominam a flexão
da cabeça sobre o tronco, os membros superiores se elevam e fletem diante do tronco
e este se flete sobre o abdômen. Podem ser identificados cerca de 30 a 50 espasmos
consecutivos (PEREIRA FILHO et al., 2004).
45
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Fonte: <http://www.westmariana.com/sindromewest.htm>.
Tratamento
A etiologia da síndrome condicionará a resposta ao tratamento, sendo que as terapias que
têm se mostrado eficientes para SW são a vigabatrina (VGB) e o tratamento hormonal
com adrenocorticotropa (ACTH). O sucesso do tratamento requer a eliminação tanto dos
espasmos quanto da hipsarritmia (PEREIRA FILHO et al., 2004; GOMES; GARZON;
SAKAMOTO, 2008; PORTILLO et al., 2011).
46
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
ACTH evoluem com controle dos espasmos infantis e entre 57 a 97% evoluem com
desaparecimento da hipsarritmia, ao final de 14 dias de tratamento. Nesta mesma
revisão foram identificados estudos que evidenciaram maior eficácia do ACTH se
comparado à VGB.
O VGB apresenta-se eficaz no controle imediato da SW, mas deve ser acompanhado
por avaliações oftalmológicas periódicas, uma vez que existe a possibilidade de lesões
retinianas (GOMES; GARZON; SAKAMOTO, 2008).
Entretanto, ainda existem diversos estudos sendo realizados para definir qual o melhor
esquema terapêutico, quais doses, tempo de tratamento e qual a eficácia a longo prazo.
Em relação aos sintomas cognitivos e epilepsias posteriores, de acordo com a Academia
Americana de Neurologia e a Sociedade de Neurologia Infantil, não existem dados
suficientes para concluir se algum tratamento melhora a evolução cognitiva a longo
prazo e reduza a incidência de epilepsia posterior (GOMES; GARZON; SAKAMOTO,
2008; PORTILLO et al., 2011).
Prognóstico
O prognóstico global para SW está relacionado não apenas ao controle precoce das
crises, mas também à etiologia subjacente. Entretanto, dados apontam que o prognóstico
é grave, assim como a maioria das epilepsias que se manifestam no primeiro ano de
vida, que são acompanhadas por deterioração do desenvolvimento neuropsicológico
(GOMES; GARZON; SAKAMOTO, 2008; PORTILLO et al., 2011).
Como fatores preditores de mal prognóstico podem ser citados: antecedentes pré-
natais, antecedentes neonatais, etiologia sintomática, idade de início inferior a
quatro meses, crises epilépticas fora do período neonatal, atraso psicomotor e
eletroencefalograma anormal aos seis meses (GOMES; GARZON; SAKAMOTO,
2008; PORTILLO et al., 2011).
47
Capítulo 4
Meningites
Introdução
Meningite é a inflamação das meninges (membranas de recobrimento do encéfalo e
medula espinhal), podendo ser causada por vários agentes etiológicos, como vírus,
bactérias, fungos e protozoários, helmintos e outras causas, tais como doenças
neoplásicas e imunológicas. As meningites bacterianas respondem por maior frequência
de casos e expressiva morbimortalidade em países desenvolvidos e em desenvolvimento,
tendo grande importância do ponto de vista da saúde pública em razão da magnitude,
capacidade de surtos e taxa de letalidade. No geral, a mortalidade varia dependendo
do agente infeccioso, faixa etária e fatores de risco do paciente (GILIO; TERRA, 2005;
RAGAZZI; GILIO, 2011; GOMES, 2016).
Fonte: <http://www.parkinson.pt.>.
Patogênese e fisiopatologia
Os micro-organismos habitualmente acessam o SNC por via hematogênica, sendo que
o mecanismo pela qual conseguem atravessar a barreira hematoliquórica ainda não
é completamente esclarecida na literatura. Outras formas desses micro-organismos
atingirem o SNC pode ser por contiguidade (contato) ou por inoculação direta (injeção
de vírus ou outros agentes) (RAGAZZI; GILIO, 2011).
Os agentes infecciosos que mais comumente causam meningites agudas são os vírus,
e, embora qualquer bactéria possa causar meningite, quase metade delas são causadas
pelo pneumococo, seguido pelo meningococo, estreptococo do grupo B, listéria e
hemófilos (GOMES, 2016).
Figura 5. Estruturas que podem ser comprometidas por infecção do sistema nervoso.
49
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
0 a 3 meses Streptococcus agalactiae, Escherichia coli, Bacilos Gram negativos, Listeria monocytogenes
No Brasil, em 1999 foi introduzida a vacina para a bactéria Hib, resultando em uma
queda abrupta do número de casos infecciosos causados por essa bactéria, incluindo
as meningites. Já em 2010 foram introduzidas no Programa Nacional de Imunização
(PNI) vacinas contra meningococo e pneumococo, sendo que o impacto desta medida irá
refletir mudanças nos próximos anos. De qualquer forma, os estudos de epidemiologia
do pneumococo e aplicação de estratégias de prevenção são contínuos (RAGAZZI;
GILIO, 2011).
50
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Fonte: <http://www.ymune.com.br/o-que-e-meningite-meningococica/>.
51
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
LCR normal
Resultado Meningite viral Meningite bacteriana
RN > 28 dias
Celularidade (leucócitos/mm³) Até 20 Até 4 Até 500 > 500
Proteinorraquia (mg/dL) < ou igual 100 < ou igual 40 Normal ou pouco aumentada > 100
Glicorraquia (mg/dL) 2/3 glicemia 2/3 glicemia Normal ou pouco diminuída Muito diminuída
Fonte: (RAGAZZI; GILIO, 2011).
Tratamento
Em casos de meningite bacteriana, o tratamento se dá por meio de antibióticos, que
devem ser escolhidos de acordo com o quadro clínico-epidemiológico de cada caso.
A duração do tratamento depende do agente etiológico, sendo sugerido que, para
meningococo o tratamento dure de 5 a 7 dias; para pneumococo de 10 a 14 dias, Hib
de 7 a 10 dias, Listeria monocytogenes de 14 a 21 dias, Bacilos Gram negativos 21 dias
e para agente desconhecido, em crianças com mais de 28 dias de vida, tratamento de
10 a 14 dias. Pacientes com suspeita de meningite meningocócica devem permanecer
em isolamento respiratório por 24 horas após o início da antibioticoterapia (RAGAZZI;
GILIO, 2011; GOMES, 2016).
52
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Além dessas medidas, deve-se garantir oxigenação adequada com oferta de oxigênio ou
intubação, em casos mais graves. Medidas de controle para hipertensão intracraniana
também devem ser tomadas, mantendo a cabeça do paciente em posição neutra
(decúbito elevado a 30°). Para pacientes com crises epilépticas, anticonvulsivantes
devem ser administrados imediatamente para evitar hipóxia e hipermetabolismo
(GILIO; TOPCZEWSKI, 2005; RAGAZZI; GILIO, 2011).
Uma vez que a transmissão das meningites ocorre pelo contato interpessoal, é importante
a profilaxia das pessoas de convívio do paciente, que compartilhem o mesmo domicílio,
creche ou pessoas que tenham tido contato de pelo menos quatro horas por dia com
a pessoa doente, nos últimos 7 dias, sendo preferível o uso de quimioprofilaxia nas
primeiras 24 horas após o diagnóstico do caso (GILIO; TOPCZEWSKI, 2005; RAGAZZI;
GILIO, 2011; GOMES, 2016).
Complicações da meningite
Complicações em crianças com meningite podem acontecer em decorrência da idade,
fatores de risco, agente etiológico e demora no início do tratamento, podendo resultar
em acometimento de pares cranianos, necrose cortical, coleções subdurais, vasculite no
SNC, trombose de veias corticais, abscessos cerebrais e hidrocefalia. Essas complicações
podem ser instaladas na fase aguda da doença, durante a evolução ou mais tardiamente.
Em casos particulares de meningococcemia, podem aparecer complicações decorrentes
de alterações circulatórias, com colapso da circulação periférica e evolução fulminante
(GILIO; TOPCZEWSKI, 2005; RAGAZZI; GILIO, 2011). Estima-se que cerca de 50%
53
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
dos indivíduos com história de meningite bacteriana apresentam algum tipo de sequela,
que podem variar entre perda auditiva neurossensorial, convulsões, alterações motoras,
hidrocefalia como já mencionado e retardo mental. Também podem ser descritas
alterações cognitivas, acadêmicas e de comportamento (GILIO; TOPCZEWSKI, 2005;
RAGAZZI; GILIO, 2011; GOMES, 2016).
54
Capítulo 5
Autismo
Introdução
O autismo é um transtorno do desenvolvimento complexo, que pode ser definido com
base em alterações neurológicas que afetam a interação social, o comportamento verbal
e a variabilidade de repertórios comportamentais. Existem diferentes etiologias e graus
variados de gravidade, mas de alguma forma o autismo compromete o desenvolvimento
infantil, gerando déficits qualitativos na interação social e na comunicação, padrões de
comportamento repetitivos e estereotipados e um repertório restrito de interesses e
atividades (GOMES, 2011; CARVALHO, 2012; GADIA, 2013).
Manifestações clínicas
As características do autismo variam principalmente de acordo com o desenvolvimento
cognitivo da criança, portanto podemos encontrar em um extremo: quadros de autismo
associados à deficiência intelectual grave, com padrões repetitivos simples e bem
marcados de comportamento, ausência de desenvolvimento da fala e importante déficit
na interação social. Em outro extremo encontramos quadros de autismo sem deficiência
intelectual, sem atraso significativo na linguagem, sem movimentos repetitivos
evidentes, com interação social peculiar e bizarra. Este último extremo é denominado
“Síndrome de Asperger” (AMA - Associação de Amigos do Autista).
56
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Nível de
Comunicação Social Comportamentos Repetitivos e Restritos
Gravidade
Nível 3 Déficits graves nas habilidades de comunicação
Inflexibilidade de comportamento, extrema dificuldade em lidar
social verbal e não verbal causam prejuízos
“Exigindo com a mudança ou outros comportamentos restritos/repetitivos
graves de funcionamento, limitação em iniciar
apoio muito inferem acentuadamente no funcionamento em todas as esferas.
interações sociais e resposta mínima a aberturas
Grande sofrimento/dificuldade para mudar o foco ou as ações.
substancial” sociais que partem de outros.
Déficits graves nas habilidades de comunicação Inflexibilidade do comportamento, dificuldade de lidar com
Nível 2 verbal e não verbal, prejuízos sociais aparentes a mudança ou outros comportamentos restritos/repetitivos
mesmo na presença de apoio, limitação em dar aparecem com frequência suficiente para serem óbvios ao
“exigindo apoio início a interações sociais e resposta reduzida observador casual e interferem no funcionamento em uma
substancial” ou anormal a aberturas sociais que partem dos variedade de contextos. Sofrimento/dificuldade para mudar o foco
outros. ou as ações.
Na ausência de apoio, déficits na comunicação
social causam prejuízos notáveis. Dificuldade para Inflexibilidade de comportamento causa interferência significativa
Nível 1 iniciar interações sociais e exemplos claros de no funcionamento em um ou mais contextos. Dificuldade em
“exigindo apoio” respostas atípicas ou sem sucesso a aberturas trocar de atividade. Problemas para organização e planejamento
sociais dos outros. Pode aparentar pouco são obstáculos à independência.
interesse por interações sociais.
Fonte: (AMORIM, 2014).
De acordo com a literatura, é possível que alguns sinais de autismo possam ser
identificados ainda no bebê, como, por exemplo, tempo reduzido na habilidade de
olhar para pessoas e estímulos sociais, atenção direcionada para determinados objetos
e sinais físicos do ambiente, diminuição do interesse social e de afeto, dificuldades
para imitação, padrão de temperamento passivo e atraso nas competências linguísticas
(CARVALHO, 2012).
57
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Com relação ao comportamento verbal, este pode variar desde a ausência da fala até a
presença da fala com alterações na função comunicativa, desvios semânticos e desvios
pragmáticos. No Transtorno de Asperger não há atraso na aquisição da fala, apesar
de ser identificada redução de comportamentos não verbais como contato visual,
expressão facial, gestos e linguagem corporal. Também não há atraso significativo
no desenvolvimento cognitivo e na maioria dos casos não é observada deficiência
intelectual (GOMES, 2011; ANDRADE, 2012).
Tanto a interação social como a comunicação das pessoas depende de vários aspectos,
como a capacidade de compartilhar tanto objetos concretos como símbolos sociais
que estão presentes na fala, na leitura, na escrita, em regras, normas e valores. Para
tanto, a criança passa por um processo de aprendizagem que envolve a compreensão
prévia de relações arbitrárias entre símbolos (nome das coisas) e referentes (objetos
concretos). Acontece que pessoas com autismo apresentam dificuldades em aprender
essas relações, sendo difícil entender que, apesar de o símbolo não apresentar qualquer
similaridade física com o referente, eles estão relacionados. Uma vez que essas relações
não são aprendidas, a interação social, comunicação e o uso da linguagem tornam-se
difíceis (GOMES, 2011).
59
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Convulsões têm sido relatadas em cerca de 16 a 35% de crianças autistas, sendo que os
principais fatores de risco para epilepsia são retardo mental grave e a combinação de
deficiência mental grave com déficit motor. Qualquer tipo de convulsão pode ocorrer
em crianças com autismo, existindo associação clara entre autismo e espasmos infantis
(síndrome de West) (GADIA, 2013).
Diagnóstico
60
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Epidemiologia e etiologia
A prevalência do autismo é estimada de 1 em cada 110 crianças, sendo que alguns estudos
apresentam uma prevalência ainda maior, de cerca de 2,64%. Isso coloca o autismo na
posição de terceiro maior distúrbio da infância, com prevalências superiores ao câncer
infantil, diabetes, espinha bífida e Síndrome de Down (GOMES, 2011; GADIA, 2013;
CARVALHO, 2012).
Nos últimos 30 anos houve um grande aumento nos índices de prevalência, o que gerou
hipóteses de uma “epidemia” de autismo, porém não foram realizados estudos à esse
nível, para que se comprovasse esse aumento extraordinário. Entretanto, o aumento
no número de casos pode ser uma consequência do maior reconhecimento desse
transtorno em crianças menos afetadas gravemente, ao maior conhecimento do próprio
61
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
No Brasil, a Associação Brasileira de Autismo estima que cerca de 600 mil pessoas
apresentem este transtorno, sem contar aqueles que não se enquadram em sua
forma típica. Um estudo piloto realizado na cidade de Atibaia-SP indicou um número
aproximado de um caso a cada 333 pessoas. Dificilmente um diagnóstico no Brasil
é fechado antes dos sete anos de idade, dificultando a tomada de decisões quanto
as metodologias e tratamentos a serem destinados à essas crianças (GOMES, 2011;
ANDRADE, 2012; CARVALHO, 2012).
Sabe-se que existe maior incidência no sexo masculino, com proporções de 3,5 a 6,0
ou mais homens para pessoa do sexo feminino. Apesar disso, meninas com autismo
apresentam maior comprometimento cognitivo e em demais habilidades que os
meninos (CARVALHO, 2012).
Evidências por neuroimagem apontam que o sistema límbico de crianças autistas conta
com células pequenas em tamanho e aumentadas em número por unidade de volume,
o que pode gerar atraso no desenvolvimento maturacional dos circuitos do sistema
límbico. Nos cerebelos estudados também foram encontrado um número diminuído
de células específicas, indicando que essas alterações neurológicas podem acontecer
em torno das 30 semanas gestacionais. Também foram encontradas alterações em
tamanho de determinadas estruturas no córtex pré-frontal dorsolateral (responsável por
processos cognitivos). Outros estudos utilizando ressonância magnética apresentam a
relação entre medida da circunferência da cabeça, volume cerebral e autismo, indicando
que apesar de o tamanho da cabeça de autistas ser semelhante ao de outras crianças ao
nascer, o perímetro cefálico apresenta um ritmo mais acelerado de crescimento, sendo
que entre 2 e 5 anos, 90% dos autistas têm volume cerebral maior que a média para
crianças da mesma idade, e cerca de 20 e 37% apresentam macrocefalia (GADIA, 2013).
63
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Com relação à medicação, mais da metade da população de autistas nos EUA utiliza
algum tipo de farmacoterápico, que variam desde antipsicóticos como risperidona e
aripiprazol até neuroestimulantes, anticonvulsivantes, entre outros (GADIA, 2013). Os
antipsicóticos já citados são as medicações mais utilizadas nessa população, entretanto
há uma série de efeitos colaterais associados ao uso prolongado e os benefícios e efeitos
em longo prazo ainda não foram avaliados. Inibidores de serotonina como fluoxetina,
fluvoxamina, paroxetina, sertralina, citalopram e escitalopram também têm sido usados
para diminuir rituais e esteriotipias, porém existem estudos contraditórios quando
a real eficácia do uso. Os medicamentos metilfenidato, atomoxetina e clonidina têm
demonstrado eficácia na melhora da atenção e diminuição da ansiedade, o que gera
impactos positivos em termos do funcionamento social dessas crianças (GADIA, 2013).
Cerca de 5 a 10% das crianças autistas tornam-se adultos independentes e cerca de 25%
alcançam um progresso considerável com algum grau de independência. O restante
continua com déficits significativos. Esta variação se dá de acordo com a gravidade das
manifestações clínicas e das etiologias subjacentes (GADIA, 2013).
64
Capítulo 6
Síndrome de Rett
Introdução
A primeira descrição da Síndrome de Rett - S.R aconteceu em 1966, quando Andreas
Rett, neuropediatra da Universidade de Viana, realizou um estudo com 31 meninas
que apresentavam quadros similares de regressão psicomotora (perda significativa
de aquisições cognitivas, sociais, linguísticas e motoras) associada a estereotipias das
mãos e outras manifestações comportamentais específicas. Entretanto, este quadro só
viria tornar-se verdadeiramente conhecido em 1983, com os trabalhos de Hagberg e
colaboradores por meio da publicação do artigo A progressive syndrome of autism,
dementia, ataxia, and loss of purposeful hand use in girls: Rett´s syndrome: reporte
of 35 cases (FARAGE, 2009; FERNANDES, 2011; PAZETO et al., 2013).
65
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Etiopatogenia
As suspeitas para possível envolvimento do cromossomo X na S.R ocorreu devido ao
fato de a síndrome aparecer exclusivamente no sexo feminino, ao menos em sua forma
típica. Em 1999, foi descrita e comprovada uma alteração cujo locus estava localizado
no braço longo do cromossomo X (Xq28), com comprometimento em até 80% dos
casos, do gene da proteína ligadora à CpG-Metilada 1 - MECP2. Os pacientes com S.R
66
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
apresentam perda parcial ou total da função desta proteína (MONTEIRO et al., 2011;
PAZETO et al., 2013; MELO, 2013; BARRÓN et al., 2014).
Considera-se que cerca de 73-95% dos pacientes com forma clássica da S.R apresentem
essa mutação, mas também é possível que portadores de mutações gênicas no MECP2
não apresentem sintomas da S.R, em decorrência de um padrão de inativação favorável
do cromossomo X. Ou seja, nas mulheres, em cada célula existem dois cromossomos
X, sendo um de origem materna e outro de origem paterna, porém, apenas um deles
encontra-se ativo e esse processo de ativação e inativação acontece ao acaso durante a
fase embrionária da vida. Deste modo, algumas células terão o cromossomo X paterno
ativo, enquanto outras terão o X materno ativo, sendo que um destes pode ter sofrido
a mutação. Mulheres com quadros clínicos mais graves tiveram ativo o cromossomo
X com mutação do gene MECP2, enquanto mulheres com manifestações leves ou
assintomáticas, tiveram inativação do cromossomo X com mutação (MONTEIRO et
al., 2011; PAZETO et al., 2013; BARRÓN et al., 2014).
A quase totalidade dos casos de S.R são decorrentes de uma mutação de novo, ou seja,
não está presente nos genitores, por isso aparecem casos esporádicos e não consecutivos
na mesma família. No sexo masculino, a mutação do gene pode levar a encefalopatia
crônica precoce e grave, com epilepsia grave e alta mortalidade nos anos iniciais de vida
(KOK, 2012; PAZETO et al., 2013; BARRÓN et al., 2014).
Existe uma grande diversidade nas características clínicas de pessoas com S.R e isso
se deve a localização, tipo, gravidade da mutação e inativação do cromossomo X.
De qualquer forma, a síndrome evolui em estágios, que são descritos no Quadro 10
(PAZETO et al., 2013).
67
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
A sobrevida de pessoas com S.R pode ser limitada em geral, em decorrência de quadro
infeccioso ou morte súbita durante o sono. Problemas respiratórios decorrentes
da escoliose também podem limitar a sobrevida. Atualmente, as estratégias de
intervenção conseguem aumentar a expectativa de vida dessas pessoas e, devido a
variedade de comprometimento que a síndrome traz, existem diversas áreas nas quais
as intervenções podem ser realizadas. Além da reabilitação multidisciplinar, alguns
medicamentos são usados para manutenção sintomática, uma vez que não existe um
medicamento que cure a S.R. A instauração de uma alimentação adequada e cuidados
médicos às demandas que surgem à medida em que os estágios avançam também são
responsáveis pelo aumento da sobrevida (MONTEIRO et al., 2011; PAZETO et al.,
2013; MELO, 2013).
68
Capítulo 7
Anomalias congênitas da medula
espinhal e hidrocefalia
Introdução
Anomalias congênitas são malformações de órgãos ou partes do corpo durante o
desenvolvimento no útero (Descritor em Ciências da Saúde – DECs). Neste capítulo
iremos focar as anomalias congênitas da Medula Espinhal, denominados Defeitos do
Tubo Neural (DTN) com enfoque no Disrafismo Espinhal manifestado por Meningocele
e Mielomeningocele, bem como em uma das anomalias congênitas do encéfalo, a
Hidrocefalia.
Disrafismo espinhal
Segundo o Descritor em Ciências da Saúde (DECs), o Disrafismo Espinhal pode ser
definido como defeito congênito do fechamento de um ou mais arcos vertebrais, que
podem estar associados com malformações da medula espinhal, raízes de nervos, bandas
fibrosas congênitas, lipomas e cistos congênitos. Estas malformações podem variar
de suave, como a espinha bífida oculta, à grave, incluindo raquisquise, caracterizada
por insuficiência completa da fusão da medula espinhal com o tubo neural, resultando
em exposição da medula espinhal na superfície. Ou seja, forma-se uma abertura,
geralmente na extremidade inferior da coluna vertebral, por onde sai um saco de uma
hérnia (DECs; LUNDBERG, 2011).
O Disrafismo Espinhal inclui todas as formas de espinha bífida, sendo que a forma
aberta é denominada Espinha Bífida Aberta (ou Cística) (EBA) e a forma fechada é a
Espinha Bífida Oculta (EBO), já mencionada (DECs; LUNDBERG, 2011; MAIA, 2011).
Estima-se que nos Estados Unidos e no Norte da Europa cerca de 4:1000 nascidos vivos
apresentem a doença (espinha bífida), sendo mais predominante no sexo feminino. No
Brasil, a taxa pode variar de 0,83 a 2,28:1000 nascidos vivos. Mulheres que já tiveram
filhos ou feto com DTN têm o risco de recorrência em futuras gestações aumentado
para cerca de 1:10 (LUNDBERG, 2011; MAIA, 2011).
De forma geral, a Espinha Bífida representa cerca de 75% dos Defeitos do tubo neural
(DTN), afetando o comprimento do tubo neural ou se limitar a uma pequena área. Pode
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
A EBO é caracterizada por um defeito congênito comum da fusão do arco vertebral sem
protrusão da medula espinhal ou das meninges. As vértebras mais comumente envolvidas
são lombar 5 e sacral 1. A deformidade pode estar coberta de pele hiperpigmentada,
um seio dérmico ou um pedaço anormal de cabelo. A maioria dos indivíduos com
esta malformação são assintomáticas, embora haja grande incidência da síndrome da
medula e espondilose lombar (doença degenerativa da coluna vertebral) (DECs).
70
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
A MMC pode ocorrer em qualquer nível da coluna vertebral, mas apresenta maior
incidência na região lombossacral (47%), lombar (26%), região sacral (20%) e torácica
(5%). A ocorrência na região cervical é extremamente rara (MAIA, 2011).
A incidência de MMC tem diminuído nos últimos anos devido à medidas de Saúde
Pública, como a suplementação de ácido fólico para gestantes, instauradas pelo
Ministério da Saúde da Federação Brasileira, seguindo recomendações da Organização
Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que em
portaria de no 710/1999 e Resolução 244/2002, regulamentou a fortificação de farinha
de trigo e farinha de milho com ferro e ácido fólico (LUNDBERG, 2011; MAIA, 2011).
Etiologia e patogênese
Para melhor compreender a patogênese dos DTN, vamos relembrar o que acontece por
volta do período embrionário mencionado acima (terceira e quarta semana de gestação).
Neste período, três camadas germinativas primárias são desenvolvidas, sendo elas a
ectoderma, endoderma e mesoderma, que darão origem à placa neural (futuro Sistema
Nervoso Central). O crescimento rápido das células dentro da placa neural causa uma
grande invaginação, formando uma goteira neural que, ao terminar de se desenvolver
dará origem ao tubo neural (MAIA, 2011; BALDINO, 2011).
Atualmente, o ácido fólico tem sido relacionado como o mais importante fator para
os DTN, uma vez que desempenha papel fundamental no processo de multiplicação
celular, tornando-se imprescindível durante a gravidez. Entretanto, o mecanismo pela
qual este micronutriente previne os DTN ainda é desconhecido (MAIA, 2011).
Portanto, existem multifatores que podem estar associados aos Disrafismos Espinhais,
tais como fatores ambientais, maternos e genéticos, existindo importante relação com
a deficiência de ingestão de ácido fólico durante o período da neurulação (por volta da
terceira/quarta semana de gestação) (LUNDBERG, 2011; MAIA, 2011).
71
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Os fatores maternos que podem levar à Espinha Bífida podem envolver diabetes
melittus materna, terapia materna com valproico, obesidade, idade materna (com
maior prevalência de mães abaixo de 20 e acima de 35 anos), anticonvulsivantes,
deficiência de folato, deficiência de zinco, ingestão de álcool durante os três primeiros
meses, tabagismo, anemia e hipertermia (MAIA, 2011).
Manifestações clínicas
Os Disrafismos Espinhais podem ser severos e na maioria das vezes podem estar
associados à morte prematura no período perinatal (22 semanas de gestação e sete
dias após o nascimento) ou no período neonatal (menos de 28 dias). Cerca de 50%
dos afetados vêm a óbito no primeiro ano de vida e os que sobrevivem, apresentam
sequelas neurológicas e requer reabilitação prolongada e de alto custo para a família
(BALDINO, 2011).
A incidência de EBO gira em torno de 20% da população em geral e tem como principais
sintomas alterações urinárias e dificuldades de locomoção. Pode ser observada dor
irradiada para membros inferiores em crianças mais velhas, geralmente associada a
deformidades ortopédicas graves, como pés tortos congênitos, luxação coxofemoral e
escoliose (BALDINO, 2011; MAIA, 2011).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Diagnóstico
O diagnóstico dos Disrafismos Espinhais pode ser feito durante a gestação, por meio
de exame de ultrassonografia, que revelará, principalmente, o nível da malformação
(LUNDBERG, 2011).
Tratamento
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Prognóstico
Hidrocefalia
São cerca de 85% dos pacientes com MMC que apresentam também a hidrocefalia, na
qual ocorre de maneira secundária à malformação de Arnold-Chiari (alteração complexa
da fossa posterior caracterizada pela herniação de estruturas do tronco encefálico e do
cerebelo através do forame magno) (LUNDBERG, 2011; MAIA, 2011).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Incidência
Estima-se que cerca de 0,5 a 2,5/1000 nascidos vivos apresentem tal condição clínica,
sendo que as incidências brasileiras incluindo nativivos e natimortos com 500g ou
mais, variam de 6,2/10.000 a 50,3/10.000 nascimentos (PINHEIRO, 2012).
Etiologia e patogênese
À medida que é produzido, o líquor passa ao III ventrículo pelos forames interventriculares
ou de Monro, atravessa o aqueduto cerebral, passa para o IV ventrículo e atinge a
cisterna magna através dos forames de Magendie (mediano) e de Luschka (laterais).
Da cisterna magna, a maior parte do líquido passa pelas cisternas da base e chegam aos
espaços meníngeos, onde será absorvido pelas granulações aracnóides de Pacchioni.
Uma pequena parte deste líquor desce ao espaço subaracnoide espinhal, em que parte
é absorvida e o restante volta ao crânio (TOYAMA, 2008).
Para título de nota, o LCR fornece amortecimento para o córtex cerebral e a medula
espinhal, bem como nutrientes para o tecido nervoso e remoção de resíduos metabólicos
do mesmo. Mas, por algum motivo, como veremos adiante, acontece o aumento da
produção (forma mais rara) ou a diminuição na reabsorção do líquor, causando,
portanto a hidrocefalia (TOYAMA, 2008).
75
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Figura 8. Hidrocefalia.
Classificação
Existem três tipos de classificações para a hidrocefalia, sendo elas: interna e externa;
comunicante e não comunicante; aguda e crônica. A hidrocefalia interna caracteriza-se
pelo alargamento ventricular, já a hidrocefalia externa indica alargamento do espaço
subaracnoide na superfície cortical. A hidrocefalia não comunicante, apresenta obstrução
do trânsito liquórico no interior do sistema ventricular, seja de forma intrínseca ou
extrínseca. No tipo comunicante, que representa a maioria das formas de hidrocefalia
adquiridas, existe adequada comunicação do líquor ventricular com o líquor cisternal,
porém existe um déficit de absorção do LCR no espaço subaracnóideo (TOYAMA, 2008;
PINHEIRO, 2012).
Existem também casos de hidrocefalia externa benigna, que se manifesta por volta
dos 6 a 12 meses de vida da criança. A suspeita surge devido ao aumento do PC, mas
geralmente são assintomáticas, resolvendo-se espontaneamente por volta dos 2 anos
de vida. Isto pode acontecer devido à imaturidade da granulação aracnoide, que acaba
por determinar aumento dos ventrículos e do espaço subaracnoide da convexidade
(TOYAMA, 2008).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Manifestações clínicas
Fonte: <http://aebh.org/hidrocefalia/>.
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
A gravidade das lesões que acometem a medula espinhal antes do nascimento faz com
que a hidrocefalia apresente graus variados de retardo neuropsicomotor. Lesões mais
altas estão relacionadas a baixo rendimento escolar e retardo mental; lesões mais
baixas estão relacionadas à inteligência preservada, porém problemas de aprendizagem
específicos (MAIA, 2011).
Diagnóstico
Ultrassonografias são capazes de identificar a presença de hidrocefalia ainda no período
pré-natal e, após o nascimento, exames como ressonância magnética e tomografia
podem confirmar o diagnóstico, além da observação do aumento do perímetro cefálico
(PINHEIRO, 2012).
Em crianças maiores o sinal semiológico do aumento do PC pode não ser tão facilmente
observável, portanto a ultrassonografia transfontanela e a tomografia computadorizada
são medidas úteis para avaliar o tamanho dos ventrículos e acompanhar sua expansão.
A ressonância magnética é ainda mais superior à eficácia dos exames já mencionados,
uma vez que possibilita a avaliação das estruturas e suas relações, principalmente
informações sobre o fluxo liquórico, as paredes ventriculares e os vasos sanguíneos
(PINHEIRO, 2012).
Tratamento e prognóstico
Antes de ser indicado o tratamento cirúrgico é preciso fazer algumas ressalvas, uma
vez que a reabsorção do líquor pode mudar com o tempo e de fato melhorar. Portanto
todas as opções não cirúrgicas devem ser levadas em conta antes de ser decidido pelo
procedimento cirúrgico (MAIA, 2011; PINHEIRO, 2012).
Dentre as opções não cirúrgicas podemos citar o com uso de medicamentos tais como
furosemida, acetazolamida, glicosídeos cardíacos, omeprazol e amiloride, que atuam
na inibição da produção do LCF, porém mostram-se pouco eficazes.
Neonatos estão sob risco mais alto de infecção e disfunção da VP, particularmente
por consequência de terem a pele mais fina, dificuldades nutricionais que retardam a
cicatrização de feridas e a tendência do LCR ser proteináceo (PINHEIRO, 2012).
A hidrocefalia trata-se de uma doença crônica que afeta as funções da criança em suas
atividades diárias por um longo período ou até mesmo por toda a vida, fazendo com
que o paciente necessite de acompanhamento prolongado, sendo que os familiares
devem ser alertados com relação aos cuidados tais como prevenção de úlceras de
decúbito, posicionamento adequado da cabeça, higiene pessoal, estimulação tátil
e encaminhamento para serviços de neurologia, pediatria e especialidades como
fisioterapia, terapia ocupacional, dentre outros (PINHEIRO, 2012).
79
Capítulo 8
Distúrbios musculares e distrofias
Introdução
Os Distúrbios Musculares (ou miopatias) fazem parte das doenças geneticamente
determinadas ou adquiridas durante a vida, que causam algum tipo de disfunção do
tecido musculoesquelético. Para relembrar, tecido musculoesquelético é um subtipo
de músculo estriado fixado ao esqueleto pelos tendões. Esses músculos são inervados
e seus movimentos podem ser conscientemente controlados, por isso também são
chamados de músculos voluntários (DECs; ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
As doenças dos neurônios motores podem ser classificadas como (NEVILLE; RINGEL,
2003; ZANOTELI; CARVALHO, 2016):
»» amiotrofias espinhais;
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Já as doenças dos nervos periféricos podem ser classificadas como (NEVILLE; RINGEL,
2003; ZANOTELI; CARVALHO, 2016):
»» Radiculopatia;
»» Plexopatia;
»» Mononeuropatia;
»» Polineuropatia
Por fim, as doenças dos músculos (miopatias) podem ser classificadas, de forma
resumida em (NEVILLE; RINGEL, 2003; ZANOTELI; CARVALHO, 2016):
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Atrofia e hipertrofia
Fonte:<http://www.farmaciasaude.pt/site/index.php?option=com_content&view=article&id=360:atrofia-muscular&catid=53:si
ntomas&Itemid=226.>. Acesso em: 15/12/2016.
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
A seguir serão detalhados alguns tipos de distrofias mais específicas e comuns, como:
a Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) e a Distrofia Muscular de Becker (DMB);
Distrofias Musculares de Cinturas; Distrofia facioescapuloumeral, Distrofia Miotônica
ou doença de Steinert; a Distrofia Muscular de Emery-Dreifuss; a Distrofia Oculofaríngea
(DOF); e as Miopatias Distais (ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
Fonte: <http://www.guiaparapadres.com/hipotonia-en-recien-nacidos/.>
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
contínua das fibras (necrose muscular), com substituição do tecido muscular por gordura
e tecido conjuntivo, sendo a Distrofia Muscular de Duchenne, a miopatia mais comum
na infância, representada por 1:3000 nascimentos do sexo masculino. Geralmente, as
mulheres portadoras são assintomáticas, mas podem apresentar manifestações clínicas
de miopatia como cardiomiopatia e fraqueza dos membros. Dependendo do grau de
inativação do cromossomo X não mutado, algumas meninas podem apresentar formas
clássicas de DMD, que de forma geral caracteriza-se por fraqueza muscular progressiva,
com início entre 3 e 5 anos de idade. (NEVILLE; RINGEL, 2003; MOURA; OLIVEIRA,
2013; ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
À medida que a idade avança, a criança com o DMD apresenta marcha anserina
(parecida com marcha de pato), postura hiperlordótica e, ao levantar-se do chão e
assumir a posição ereta, apoia nas pernas, nos joelhos e no quadril sucessivamente
(é o clássico levantar de Gowers). Por volta dos 9 a 10 anos de idade, os músculos
das porções proximais dos membros são afetados, levando à perda da deambulação.
Cerca de 40% das crianças podem apresentar deficiência mental e, frequentemente,
vêm a óbito por insuficiência respiratória, geralmente por volta dos 30 anos de idade
(NEVILLE; RINGEL, 2003; ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
Fonte: <http://www.corriere.it/salute/dizionario/duchenne_distrofia_muscolare_di/gallery.shtml?pic=1.>.
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Tanto nos casos de DMD como nos casos de DMB, em cerca de 75% dos pacientes
apresentam deleção ou duplicações do gene da distrofina (proteína muscular localizada
na superfície de membranas a qual é o produto da distrofia muscular). Nos outros
25% podem estar presentes mutações pontuais distribuídas por todo o gene (DECs;
ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Fonte: <http://www.qreferat.com/referate/medicina/DISTROFIILE-MUSCULARE516.php.>
Miopatias distais
Por fim, as miopatias distais, como o nome sugere, são caracterizadas pelo acometimento
predominante dos músculos das porções distais dos membros, manifestando-se
inicialmente por paresia (perda grave ou completa da função motora) nas mãos e
posteriormente nas perdas, com evolução lenta e progressiva, variando a idade de início
dos sintomas, a depender da etiologia causal (ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
A seguir iremos detalhar resumidamente as miopatias congênitas, das quais fazem parte
as distrofias musculares congênitas (DMC), que se manifestam desde o nascimento ou
no primeiro ano de vida da criança, representada por atraso no desenvolvimento motor
ou síndrome da criança hipotônica; miopatias congênitas estruturais e síndromes
miotônicas. As principais características envolvem hipotonia muscular, fraqueza,
atrofia muscular e retrações fibrotendíneas. A depender do subtipo de DMC, o curso será
estacionário ou progressivo. As formas mais frequentes, que representam 40 a 50% dos
casos são resultados de mutações dos genes que codificam a merosina (glicoproteína que
liga as células epiteliais à membrana basal) e as três subunidades do colágeno, levando
a um defeito na estabilidade mecânica da fibra (ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
A grande maioria dos pacientes acometidos por este tipo de DMC quase nunca chega a
deambular, além de apresentarem comprometimento respiratório gradativo, levando à
necessidade de suporte ventilatório por volta da segunda década de vida. Em exames
de neuroimagem é possível observar alteração difusa da substância branca cerebral
(ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
Formas de DMC com espinha rígida são mais raras, manifestas por limitação acentuada dos
movimentos da coluna, especialmente para a flexão toracolombar e cervical, decorrente de
contratura dos músculos extensores da coluna (ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
quando elevados, indicam comprometimento da fibra muscular, que pode ser decorrente
de necrose muscular e estar presente nos quadros de distrofias musculares. Exames
de eletroneuromiografia auxiliam a localização da lesão, bem como na determinação
da etiologia, gravidade da doença e resposta ao tratamento. A biópsia muscular é
fundamental para diferenciar as distrofias das doenças neuromusculares por serem
capazes de detectar defeitos proteicos específicos, além de identificar o tipo exato da
distrofia. Exames de imagem do tecido muscular esquelético, com ultrassom, tomografia
computadorizada e ressonância magnética podem identificar o padrão da distribuição
e o grau de comprometimento muscular, auxiliando assim o acompanhamento ao
tratamento e também direcionando o exame de biópsia (NEVILLE; RINGEL, 2003;
MOURA; OLIVEIRA, 2013; ZANOTELI; CARVALHO, 2016).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
ou traqueostomia em casos mais avançados pode ser indicado a fim de prolongar a vida
dos pacientes (NEVILLE; RINGEL, 2003).
89
Capítulo 9
Lesão cerebral aguda
Introdução
O traumatismo cranioencefálico é uma lesão cerebral aguda resultante de diferentes
tipos de força, como impacto, aceleração, desaceleração e rotação, que causam lesões
diretas no couro cabeludo, no crânio, no cérebro e nos vasos cerebrais. Este tipo de
lesão pode levar ao inchaço cerebral, causado pelo prejuízo da autorregulação do
fluxo sanguíneo cerebral e é denominada “lesão cerebral primária” ou “focal”. Inchaço
cerebral é o aumento global do encéfalo, consequente ao aumento do volume sanguíneo
encefálico e geralmente está associado à hipertensão intracraniana, que será discutida
adiante (NETO; STAPE, 2005; GATTÁS, 2008; PAULO; PAULIS, 2011).
É importante frisar que, após o aparecimento da lesão primária, pode surgir a lesão
secundária ou difusa, que são danos que ocorrem em consequência a reações fisiológicas
regionais ou sistêmicas em resposta ao trauma inicial, sendo capaz de ampliar a lesão
existente e desencadear novas lesões. As condições responsáveis por isso são a hipóxia e a
hipovolemia, ocasionadas por alterações no fluxo de íons, alterações metabólicas agudas
e alterações no fluxo sanguíneo cerebral. Em resumo, a lesão cerebral secundária é o
resultado da diminuição na síntese proteica e da capacidade oxidativa, culminando na
morte celular neuronal (NETO; STAPE, 2005; GATTÁS, 2008; PAULO; PAULIS, 2011).
90
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Ressalta-se, porém, que esta divisão é apenas didática. Muitas vezes os TCEs apresentam
uma combinação destes mecanismos (GATTÁS, 2008).
A partir de agora iremos descrever de forma mais detalhada as lesões ocasionadas por
traumatismos cranioencefálicos e para tanto, inicialmente iremos abordar as lesões
traumáticas primárias e em seguida as lesões traumáticas secundárias. Vamos lá?
91
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Fraturas cranianas
Hemorragias
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
de óbito se não tratado rapidamente (NETO; STAPE, 2005; GATTÁS, 2008; PAULO;
PAULIS, 2011; FONOFF; AMORIN, 2013)
A Lesão axonal difusa é uma das mais frequentes encontradas em pacientes com
TCEs graves, com taxa de mortalidade estimada em 10%, geralmente associada ao
acentuado rebaixamento do nível de consciência logo após o trauma. As fibras axonais
e pequenos vasos sanguíneos, neste tipo de lesão, são estirados e rompidos durante
a vigência de uma força abrupta de aceleração, desaceleração linear ou rotacional. A
ressonância magnética é a técnica mais sensível para este tipo de lesão, assim como
para as lesões traumáticas primárias do tronco cerebral, que estão associadas às altas
taxas de mortalidade e morbidade (GATTÁS, 2008; FONOFF; AMORIN, 2013).
As contusões corticais constituem cerca de 40% das lesões nos TCEs e acometem
a substância cinzenta cortical. São causadas por mecanismos indiretos, sendo mais
frequentes nas regiões basais, laterais e anteriores aos lobos temporais e frontais.
93
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Devido ao fato de a substância cinzenta ser mais vascularizada que a substância branca,
as contusões corticais são frequentemente hemorrágicas. A técnica de exame mais
indicado para esta lesão é também a ressonância magnética (GATTÁS, 2008 FONOFF;
AMORIN, 2013).
Fonte: <http://correio.rac.com.br/_conteudo/2015/07/colunistas/feres_chaddad_neto/305590-hernias-e-edemas-cerebrais.
html>. Acesso em: 15/12/2016.
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
A compressão dos vasos causada pelas forças de herniação pode gerar hemorragia
ao mesencéfalo ou, eventualmente, isquemia. Já o edema cerebral difuso ocorre pelo
aumento do volume sanguíneo intravascular, por aumento do conteúdo hídrico cerebral
ou ambos. Este último ocorre em cerca de 10% a 20% dos TCEs graves (GATTÁS, 2008).
Variáveis Escore
Espontânea 4
À voz 3
Abertura ocular
À dor 2
Nenhuma 1
Orientada 5
Confusa 4
Resposta verbal Palavras inapropriadas 3
Palavras incompreensivas 2
Nenhuma 1
95
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Variáveis Escore
Obedece aos comandos 6
Localiza dor 5
Movimento de retirada 4
Resposta Motora
Flexão anormal 3
Extensão anormal 2
Nenhuma 1
O TCE leve pode ser dividido em alto risco, risco intermediário ou baixo risco. Nos
casos de alto risco, pode acontecer mais de seis episódios de vômitos por hora ou
cinco episódios de vômito após o trauma, cefaleia persistente, convulsão, perda
de consciência por mais de 1 minuto, fratura aguda do crânio, alteração do nível de
consciência, irritabilidade e abaulamento de fontanela. Geralmente as suspeitas
de causas podem envolver queda de mais de 1 metro de altura, acidente envolvendo
automóvel ou bicicleta sem capacete, queda de mais de quatro degraus da escada e
suspeita de maus tratos. O trauma é considerado de alto risco, pois existe mais de 20%
de possibilidade de lesão intracraniana, sendo importante a realização de tomografia
computadorizada (PAULO; PAULIS, 2011).
Nos casos de risco intermediário, pode acontecer de três a quatro episódios de vômitos
pós-trauma, perda de consciência menor que 1 minuto, fratura com mais de 24 horas
de história, hematoma subgaleal (sangue acumulado entre a aponeurose epicrânica e o
periósteo externo, apresentando-se como uma grande massa uniformemente propagada
ao longo do coro cabeludo) em qualquer região do crânio e história de irritabilidade
resolvida. Geralmente são causados por trauma não presenciado por terceiros e o
risco de lesão intracraniana é de 1%. Caso haja deterioração do quadro, é importante a
realização de exame de imagem, mas geralmente apenas a observação clínica por 4 a 6
horas é suficiente para alta (PAULO; PAULIS, 2011).
Os TCEs com baixo risco não apresentam vômito, nem perda de consciência ou
convulsão. O paciente apresenta bom estado geral, exame neurológico normal, sem
hematoma subgaleal. Nesses casos, o risco de lesão intracraniana é de 0,02% e não
há necessidade de realizar exames de imagem, apenas orientações quanto aos sinais
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
O TCE moderado e grave pode evoluir para lesão secundária, portanto é importante
o monitoramento do paciente, mantendo a estabilidade das funções ventilatórias e
hemodinâmicas a fim de melhorar o prognóstico (PAULO; PAULIS, 2011).
Tratamento
A ocorrência de hipotensão e/ou hipóxia durante os períodos iniciais de tratamento
são fatores determinantes de pior prognóstico em adultos e em crianças, dobrando
a mortalidade e aumentando significativamente a morbidade. Neste aspecto, a
estabilização das funções vitais em união com a prevenção e tratamento dessas
ocorrências são os objetivos principais do tratamento pré-hospitalar (resgate) e
hospitalar inicial do paciente com TCE (NETO; STAPE, 2005; GATTÁS, 2008).
A avaliação pela escala de Glasgow, avaliação das pupilas (diâmetro, simetria e resposta
à luz), bem como déficits motores localizados são exames neurológicos essenciais no
atendimento inicial, mas não devem substituir a avaliação por imagem, que tem importante
papel na determinação do pronto diagnóstico de lesões intracranianas, definindo a conduta
terapêutica clínica ou cirúrgica (NETO; STAPE, 2005; GATTÁS, 2008).
97
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Neste aspecto, a seguir serão apresentadas algumas consequências do TCE, bem como
recomendações para auxiliar a evolução do paciente.
Consequências do TCE
O traumatismo cranioencefálico além do que já foi mencionado, também pode resultar
em sequelas cognitivas e físicas temporárias ou permanentes em diversos graus.
Diversas escalas são usadas para quantificar os déficits físicos e cognitivos, dentre elas
a Escala Rancho Los Amigos e a Escala de Evolução de Glasgow. A primeira escala pode
ser usada por toda equipe de cuidado, para ter de forma mais clara o comportamento
evolutivo do paciente durante o primeiro ano após o TCE. Dividida por dez níveis,
a Escala Rancho Los Amigos apresenta a evolução pela qual os pacientes podem
passar. Muitos passarão por todos os níveis, outros irão evoluir até certo estágio e nele
permanecerão (MARTINS et al., 2016).
São os níveis:
98
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Os pacientes que se encontram nesses três primeiros níveis podem ser beneficiados
por estimulação multissensorial, visando aumentar o nível de consciência, sendo
recomendado que se faça sessões diárias de atendimento. Cinesioterapia respiratória
e motora também é indicada nesta fase, com caráter preventivo e também para
estimulação (MARTINS et al., 2016).
Para os pacientes que se encontram nestes últimos três níveis, recomenda-se que se
faça orientação espacial e temporal do paciente, bem como estímulo aos movimentos de
forma segura, como passeios na cadeira de rodas caso haja possibilidades. A repetição
das coisas é importante sempre que for necessário, sem exigir que o paciente se lembre
do que já foi dito e, gradualmente encorajar a participação em todas as atividades e
terapias (MARTINS et al., 2016).
Nestes níveis, recomenda-se que o paciente seja auxiliado a tomar decisões quando
necessário e que as conversas sejam compostas por linguagem usual, sem a necessidade
de palavras ou frases simples. O encorajamento na realização de atividades que
melhorem o pensamento, memória e resolução de problemas pode auxiliar a evolução,
bem como o incentivo à tornar-se independente nos cuidados pessoais (MARTINS
et al., 2016).
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
100
Capítulo 10
Disfunção cerebral mínima
Introdução
Crianças com DCM apresentam inteligência próxima da média, na média ou até acima
da média, mas podem evidenciar determinadas dificuldades de aprendizagem e/ou de
comportamento, que se manifestam de forma moderada ou severa, estando associada
aos desvios da função do Sistema Nervoso Central. Tais desvios podem manifestar-se
na percepção, conceituação, linguagem, memória, controle de atenção, impulsividade e
função motora (FONSECA, 1995).
Em termos gerais, a DCM não pode ser confundida com deficiência mental, motora
ou sensorial, uma vez que as crianças apresentam capacidade intelectual adequada
e processos motores e sensoriais funcionais. Os problemas estão em processos
perceptivos, integrativos e expressivos que repercutem na adaptação comportamental
e na eficácia de aprendizagem. Ressalta-se que a DCM não é um atraso maturacional,
que desaparece com a idade, mas sim um desvio qualitativo de desenvolvimento que
pode ter repercussões para vida toda, daí a importância da identificação e intervenção
o mais precocemente possível (GOLFETO, 1985; FONSECA, 1995).
101
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Dislexia
A dislexia encontra-se em um grupo específico de distúrbios do neurodesenvolvimento
denominado Distúrbios de Aprendizagem (DA), e manifesta-se na criança como
dificuldade persistente em aprender eficientemente a leitura. Também se enquadra
como DA, além da dislexia, a disgrafia (dificuldade na escrita) e a discalculia (dificuldade
em fazer cálculos matemáticos simples) (MELO, 2013).
Quando pensamos em DA, é preciso estar atento se o quadro vem de forma isolada ou se
está sendo causado por alguma comorbidade como o Déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH), ansiedade, depressão, condições médicas específicas, fatores psicológicos ou a
própria falta do hábito de estudar (GOLFETO, 1985; MELO, 2013).
Embora ainda não haja uma explicação consistente sobre a fisiopatologia dos DA,
alguns pontos podem estar relacionados, como agressão ao SNC durante o período
pré, peri e pós-natal, que pode ser causado pelo uso de drogas e nicotina pela mãe;
diferenças na estrutura do cérebro, que pode ser identificada em disléxicos, por
exemplo, manifestada por assimetria cerebral diante das informações anatômicas, por
neuroimagem, eletrofisiologia, diferenças metabólicas e tomografia por emissão de
pósitron; hereditariedade, estando os cromossomos 6 e 15 possivelmente envolvidos
nos distúrbios disléxicos; e irregularidades bioquímicas, inferidas com base nos níveis
de neurotransmissores reduzidos na urina, no sangue e no líquido cefalorraquidiano
(LCR) (MELO, 2013).
102
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Mais especificamente falando sobre a Dislexia, estudos apontam sua presença em cerca
de 5 a 10% das crianças em idade escolar, com acometimento igualmente frequente em
ambos os sexos. A Dislexia é representada por disfunção no processo funcional ou na
maturação neurológica, que leva a dificuldades referentes à aprendizagem da leitura e
também da escrita (MELO, 2013).
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Fonte: http://esperancanaeducacao.blogspot.com.br/2009/09/afinal-de-contas-o-que-e-dislexia.html.
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Ainda sobre a dislexia, é importante ressaltar que alguns subtipos podem ser
classificados, como a Dislexia Disfonética (ou fonológica); Dislexia Diseidética (ou de
superfície); e Dislexia Mista. A Dislexia Disfonética é caracterizada por dificuldades na
leitura de palavras não muito familiares e na conversão grafema-fonema, que resulta em
prejuízo da análise e da síntese fonética da palavra. Para tanto, os disléxicos costumam
ler a palavra de uma forma global, ou seja, utilizando a memorização da sequência
das letras. Nos casos de Dislexia Diseidética, as crianças apresentam dificuldades no
processamento visual de perceber as letras e palavras de uma forma global; e por fim,
nos casos de Dislexia Mista, as dificuldades são manifestadas em ambas as habilidades
de análise e síntese fonética da palavra. Ressalta-se que a dislexia perdura até a idade
adulta, sendo a dificuldade compensada pela utilização da memória visual ou de outros
meios (CARVALHO, 2013; GONÇALVES, 2015).
Apraxia
A apraxia de fala infantil (Childhood Apraxia of Speech - CAS) é um dos distúrbios
de fala infantil, com origem desconhecida, definido como uma desordem motora dos
sons, com potencial para interferir especificamente o planejamento ou a execução do
movimento orofacial durante a produção dos fonemas, caracterizada pela dificuldade
em programar voluntariamente o gesto articulatório (ALMEIDA-VERDU et al, 2015;
GUBIANI; PAGLIARIN; KESKE-SOARES, 2015).
Ou seja, embora o paciente saiba o que deseja falar, apresenta dificuldade na programação
da produção do som, das sílabas e das palavras. Vale ressaltar que a diferença entre a
CAS e a apraxia adquirida na fase adulta está relacionada apenas às questões etiológicas
(ALMEIDA-VERDU et al, 2015).
106
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Apesar de ser uma área bastante discutida na literatura, assim como a dislexia,
ainda há muitas divergências em relação aos critérios diagnósticos. Para tanto, é
importante que sejam observados os seguintes aspectos para suspeita diagnóstica de
CAS: audição normal e ausência de qualquer anormalidade estrutural ou paralisia
aparente do mecanismo oral; erros de substituições, tateio articulatório, trocas de falas
inconsistentes e maior número de erros em vogais; realização inconsistente do acento e
percepção de ressonância nasofaríngea. Além disso, repertório limitado de consoantes
e vogais pode ser observado na produção da fala, bem como omissões frequentes,
articulação inconsistente, aumento do número de erros em unidades maiores de
fala; dificuldades significativas em imitar palavras e frases e uso predominante de
formas silábicas simples. Em relação aos movimentos orofaciais durante a linguagem,
pode-se notar que os movimentos orais voluntários estão prejudicados e expressão
de linguagem reduzida (SOUZA; PAYÃO; COSTA, 2009; GUBIANI; PAGLIARIN;
KESKE-SOARES, 2015).
Geralmente, as crianças com apraxia no período pré-verbal são descritas como bebês
silenciosos, pois tendem a não engajar-se em jogos vocais. Essas crianças irão emitir
seus primeiros vocábulos significativos por volta dos 19 meses até os 4 anos de idade. A
combinação das primeiras palavras em sentenças de dois vocábulos também acontece
com atraso, aparecendo entre os 33 meses a 7 anos (SOUZA; PAYÃO; COSTA, 2009).
Com prevalência estimada de 1 a 2 para cada 1000 crianças, a apraxia manifesta-se mais
frequentemente no sexo masculino, porém suas formas mais graves são encontradas
em indivíduos do sexo feminino (ALMEIDA-VERDU et al, 2015).
A CAS pode persistir até a idade adulta, portanto é importante a identificação precoce,
existindo atualmente mais de 40 características que podem ser utilizadas para o
diagnóstico correto, mesmo que sejam critérios subjetivos, por meio de avaliação do
paciente e realização de exclusão de outras doenças (GUBIANI; PAGLIARIN; KESKE-
SOARES, 2015).
107
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Vale lembrar que existem dois subtipos de apraxia, sendo eles: Apraxia Ideomotora e
a apraxia ideacional. A Apraxia Ideomotora é caracterizada por uma inabilidade para
adquirir e desempenhar uma atividade motora complexa, apesar da habilidade de
formular mentalmente a ação. Já a Apraxia Ideacional refere-se à perda da habilidade
em formular mentalmente os processos envolvidos no desempenho de uma ação.
Por exemplo, a apraxia de vestir-se pode resultar de uma inabilidade em formular
mentalmente o ato de colocar roupas no corpo. Geralmente as apraxias estão associadas
com lesões do lobo parietal ou interrupção de conexões entre o córtex parietal dominante
e as regiões corticais pré-motoras e suplementares, em ambos os hemisférios (DECs).
Por volta da década de 1940, o termo Lesão Cerebral Mínima era usado para definir
sintomas de hiperatividade e alterações no comportamento atencional, como resultantes
de dano ou lesão no Sistema Nervoso Central (SNC). Já na década de 50, o termo foi
substituído para Disfunção Cerebral Mínima quando descoberto que a criança não
apresentava lesão estrutural, mas sim sintomas de hiperatividade, déficit perceptivo-
motor, déficit de memória e pensamento, bem como distúrbios de aprendizagem, déficit
de linguagem e sinais neurológicos ambíguos (STUBBE, 2000).
Porém, o termo Disfunção Cerebral Mínima ao longo dos anos tornou-se vago por
abranger uma imensidão de sintomatologias, sendo, portanto, substituído por
terminologias mais específicas aplicadas aos transtornos cognitivos, comportamentais
e de aprendizagem (BARKLEY, 2008).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
›› Desatenção:
·· Muitas vezes parece não escutar quando lhe dirigem a palavra (por
exemplo, a mente parece divagar, mesmo na ausência de qualquer
distração óbvia);
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
›› Hiperatividade-Impulsividade:
111
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Ainda durante a gestação, por volta dos 5 ou 6 meses, é possível obter informações da
mãe a respeito do feto que se movimenta muito dentro do útero e, após o nascimento, nos
primeiros meses de vida, o bebê apresenta alterações no processo de desenvolvimento,
é hiperalerta, tem dificuldade de conciliar o sono, dorme pouco, com sono leve, por
vezes agitado, entremeado por choro que muitas vezes é interpretado como cólicas. Ao
iniciar a marcha, a criança é hiperativa, inquieta, desatenta e demonstra os primeiros
sinais de impulsividade. Esta hiperatividade, agitação e desatenção torna-se ainda mais
evidente por volta dos 2 e 3 anos, quando a criança rotineiramente destrói e desmonta
os brinquedos, sempre expressando um contingente de agressividade e impulsividade.
Por volta dos 4 e 7 anos, mostram-se resistentes às medidas disciplinares, regras de jogo
e normas sociais. Dos 7 aos 12 anos, o aprendizado escolar mostra dificuldades devido
à falta de atenção e concentração. É difícil organizar-se, controlar os impulsos e seguir
regras, o que faz com que elas queiram adiantar as tarefas ou mesmo abandoná-las antes
de concluir. Estudos apontam que cerca de 20% das crianças acometidas apresentam
dificuldade de aprendizagem (BARKLEY, 2002; MOURA-RIBEIRO, 2013).
Em geral as crianças com TDAH são descritas como esquecidas, facilmente distraídas,
“desligadas”, que não escutam e que nunca acabam o que começam. São também
apontadas como impacientes, pois interrompem os outros, respondem antes da hora,
não esperam sua vez e estão sempre tentando fazer atalhos em suas tarefas. Não
conseguem ficar sentadas e falam demais (JOU et al., 2010).
Transtorno do desenvolvimento da
coordenação
Cotidianamente, nas atividades de vida diária, no lazer e no ambiente escolar, as
crianças enfrentam situações que demandam domínio de determinadas habilidades
motoras, entretanto, nem todas apresentam o desempenho esperado na realização
112
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
114
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Déficits na integração multissensorial têm sido observados em crianças com TDC nas
tarefas de acertar algo. Bair et al. (2011) examinaram a capacidade de utilização da
informação multissensorial em crianças de 7 anos de idade com TDC e concluíram que
a criança com TDC utiliza o tato e a visão para atenuar o equilíbrio, em parte devido
a informação tátil reduzida. Esse achado sugere um déficit nas informações do toque,
que também podem contribuir para os déficits em integração multissensorial levando a
modelos de orientação corporais menos estabelecidos. Esses déficits deixam o equilíbrio
em pé comprometido, que também podem contribuir para outros problemas motores
observados em crianças com TDC.
115
Capítulo 11
Deficiência intelectual
Introdução
Ao longo do tempo a condição atualmente designada como Deficiência Intelectual (DI)
foi abordada de diferentes formas, desde concepções sobre superstição e misticismo,
quando se acreditava que as pessoas acometidas eram “dementes”, possuídos por
entidades malignas que precisavam ser exorcizadas, castigadas ou segregadas em asilos,
até que, com o passar dos anos, estudos foram sendo realizados e novas concepções
foram adotadas, saindo do misticismo para serem abordados como um problema
médico. O que antes era tratado como “idiotia”, “estupidez” ou “imbecilidade”, passou
a ser considerado como “lesão ou disfunção do Sistema Nervoso Central”, por vezes
visto como imutável e outras como sujeito à mudança, dependente de intervenção,
principalmente em nível educacional. Atualmente, as políticas de intervenção à pessoa
com deficiência intelectual se voltam, cada vez mais, para a escola regular inclusiva
(SOUZA, p.3, 2015; VARGAS, 2015).
Conceitução
De acordo com o Descritor de Ciências em Saúde (DECs), conceitua-se como
DI o funcionamento intelectual subnormal, que se origina durante o período de
desenvolvimento, resultante de múltiplas etiologias potenciais, incluindo defeitos
genéticos e lesões perinatais.
116
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
117
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Classificação
De acordo com a CID-10, existem seis categorias designadas ao retardo mental (DI),
mensurados por meio do quociente de inteligência (QI), classificados em:
Quadro clínico
Geralmente crianças com DI apresentam atraso no desenvolvimento da linguagem
e dificuldades para falar e se expressar. Dependendo do nível de comprometimento
118
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
intelectual este atraso irá manifestar-se com grau de severidade variado. O mesmo
acontece com a percepção, existindo dificuldade em distinguir pequenas diferenças nas
formas, tamanhos e cores (ARAÚJO, 2015; KE; LIU, 2015).
Diagnóstico
Existem três critérios básicos que devem ser levados em consideração para que se faça
um diagnóstico confiável de DI (ou retardo mental). São eles:
119
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Depois de comprovado o início antes dos dezoito anos, para que o diagnóstico seja
confiável, algumas etapas devem ser consideradas, começando pela identificação dos
comprometimentos no comportamento adaptativo. Este item pode ser identificado
por meio do uso de medidas padronizadas que permitam mensurar as limitações
apresentadas pelo indivíduo, unindo-se às informações sobre o desempenho típico da
pessoa em seu dia-a-dia identificados por relatos de diversas fontes a fim de obter uma
convergência de informações, advindas de familiares ou pessoas próximas do convívio
social. Uma vez que no Brasil não se dispõe de testes padronizados autorizados pelo
Conselho Federal de Psicologia para avaliação do comportamento adaptativo, a
alternativa é a observação direta do comportamento do indivíduo, análise de boletins
escolares, dados e registros médicos e avaliações psicológicas complementam a
identificação das limitações e tornam cada vez mais próximo o diagnóstico correto
(ARAÚJO, 2015; SOUZA, 2015; KE; LIU, 2015).
120
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Além das questões sobre o comportamento adaptativo, também é importante que sejam
identificadas e observadas às condições de saúde do indivíduo e sua participação em
papéis sociais, interação em diferentes ambientes (familiar, educacional, profissional,
religioso e cultural), bem como a disponibilidade de serviços educacionais e culturais
em seu contexto de vida (ARAÚJO, 2015; SOUZA, 2015).
Anamnese. Exames físico e Avaliação para autismo. Exame de neuroimagem Gasometria arterial. Biópsias e exame
neurológico, com perímetro Hemograma completo, (tomografia Aprofundar pesquisa histopatológico de
cefálico e pesquisa de níveis séricos de eletrólitos, computadorizada e/ou metabólica (por exemplo, órgãos acometidos.
características dismórficas. ferro, cálcio, magnésio, ressonância magnética aminoácidos e ácidos Técnica FISH para
Heredograma abrangendo fósforo e fosfatase alcalina. com espectroscopia de orgânicos urinários, lactato microdeleções específicas.
três gerações. Revisão Triagem das definiências prótons). Níveis séricos de e piruvato no soro e no Estudos cromossômicos
dos resultados do teste do auditiva e visual homocisteína e amônia. líquido cefalorraquidiano). subtelométricos. Nível
pezinho. Exames endócrinos )por Nível sanguíneo de sérico materno de
exemplo, provas de função chumbo. Nível sérico fenilalanina, se a criança
tireóidea). Testes para de creatinoquinase. tiver microcefalia. Sondas
TORCH, se pertinentes. Pareceres da genética de DNA para mutações
Cariótipo. Pesquisa do X e neuropediatrica. específicas (por exemplo,
frágil, se pertinente. Parecer Eletroencafalograma, se MECP2). Espectroscopia
oftalmológico. Testes houver epilepsia. por ressonância magnética,
neuropsicológicos, incluíndo se ainda não realizada.
o QI.
Epidemiologia
Estudos indicam que a prevalência de DI em todo o mundo varia de 1% a 3%, com maior
incidência no sexo masculino, tanto em adultos quanto em crianças e adolescentes,
variando em proporção de 0,7 mulheres para 1 homem. Países de baixa e média renda
121
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
apresentam taxas quase duas vezes maiores que países de alta renda (KE; LIU, 2015;
VARGAS, 2015).
Os quadros 12, 13 e 14 apresentam alguns fatores que têm sido confirmados como causa
ou como associados a DI, divididos por período pré, peri e pós-natal.
Desordens
Pobreza Uso de drogas pelos pais Prejuízo cognitivo dos pais
cromossômicas
Falta de cuidados
Desordens motoras Imaturidade parenteral
pré-natais
Disgenesia cerebral
Idade parenteral
Falta de encaminhamento
Falta de acesso aos Rejeição dos pais ao cuidado da
Prematuridade para intervenção após a alta
cuidados do parto criança
hospitalar
Desordens neonatais
122
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Abuso e negligência da
Lesão Cerebral traumática Pobreza familiar Prejuízo cognitivo dos pais
criança
Cuidador da criança
Desnutrição Violência doméstica Diagnóstico retardado
incapacitado
Serviços educacionais
Desordens convulsivas Doença crônica na família Privação social
especiais inadequados
Comportamentos infantis
Distúrbios degenerativos Institucionalização Apoio familiar inadequado
difíceis
Tratamento
O objetivo do tratamento não é a “cura”, uma vez que, como mencionado, cerca de 40%
dos casos não são identificados etiologia definida para que o tratamento possa ser 100%
direcionado à causa. Porém, quanto mais precocemente as dificuldades intelectuais
advindas da DI forem identificadas, melhores serão as possibilidades de minimizar os
sintomas, ensinar habilidades para a vida, melhorar a qualidade de vida e apoiar os
familiares e cuidadores. Os objetivos do tratamento de cada pessoa serão individuais,
uma vez que se devem considerar os níveis de comprometimento intelectual, possíveis
comorbidades, bem como as possibilidades de busca de assistência adequada (KE;
LIU, 2015).
123
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
É importante ressaltar alguns aspectos que podem prevenir a DI, tais como adição de
sal iodado na dieta de gestantes, evitar exposição a produtos químicos e substâncias
nocivas incluindo álcool, nicotina e cocaína, triagem neonatal, imunização universal de
crianças com esquema de vacinas recomendadas pela OMS, tratamento imediato para
infecções cerebrais durante a infância, acompanhamento de crianças prematuras e de
baixo peso, entre outros (CAPE, 2012; KE; LIU, 2015).
124
Capítulo 12
Síndrome de Down
Introdução
Há mais de um século, o médico britânico John Langdon Down descreveu uma alteração
genética, que ocorre no momento da concepção da criança, caracterizada pela presença
de um cromossomo 21 a mais em todas ou na maioria das células, acarretando alterações
no desenvolvimento motor, físico e intelectual. Para tal alteração foi designada a
nomenclatura Síndrome de Down – SD, também conhecida como Trissomia do 21
(CAPE, 2012; KE; LIU, 2015).
A causa exata que gera uma criança com SD ainda não está clara, mas sabe-se que
fatores como a idade materna pode ser um grande preditivo (NOBRE, 2015).
Definição
A SD é um distúrbio cromossômico causado por uma cópia adicional de material
genético no cromossomo 21, que consequentemente afeta o desenvolvimento do corpo
e do cérebro. Este distúrbio acontece durante a meiose I e tem alta associação com a
idade materna avançada (KE; LIU, 2012; ZUGAIB, 2012; TEMPSKI, 2016).
125
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
A SD não é uma doença, mas sim um modo de estar no mundo, uma condição humana,
própria da diversidade humana, que pode estar associada a maior incidência de
algumas patologias. Neste aspecto, pessoas com SD apresentam diferenças tanto em
características físicas quando em seu desenvolvimento, que estão associados a aspectos
genéticos individuais, intercorrências clínicas, nutrição, estimulação, experiência
educacional, contexto familiar, social e do meio ambiente em que estão inseridas.
Apesar dessas diferenças, a presença de um cromossomo extra é a mesma em todos os
casos, portanto existe um consenso no meio científico que afirma não ser correto definir
graus à SD (NOBRE, 2015; TEMPSKI, 2016).
Epidemiologia
Cerca de uma em cada 1.000 crianças recém-nascidas apresentam SD, sendo que
mulheres com 35 anos de idade ou mais velhas têm risco significativamente maior de
ter filhos com trissomia do 21. No Brasil, nasce uma criança com SD para cada 700
nascimentos (KE; LIU, 2012; ZUGAIB, 2012; TEMPSKI, 2016).
A expectativa de vida de pessoas com SD, atualmente, chega aos 60 anos, devido ao
melhor entendimento das potencialidades e das necessidades dessas pessoas, bem como
devido aos avanços científicos aplicados ao cuidado com a saúde (TEMPSKI, 2016).
Diagnóstico
O diagnóstico da SD ocorre por meio de testes de cariótipo que podem ser realizados no
feto já nos primeiros meses de gravidez. Em cerca de 95% das manifestações identificadas
possuem não disjunção simples (impossibilidade de segregação dos cromossomos ou
cromátides homólogos durante a mitose ou meiose, resultando em uma célula filha
com os dois cromossomos ou cromátides paternos e a outra sem nenhum), 4% por
translocação do cromossomo 21 (aberração caracterizada pela quebra cromossômica,
com transferência do fragmento para outro local, frequentemente a um cromossomo
126
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Nos casos de translocação a origem pode ser paterna, esporádica ou familiar. Quando
os pais têm translocação, o risco de ter um filho com translocação é de cerca de 10%
quando a origem é materna e de 2% quando a origem é paterna (ZUGAIB, 2012).
Manifestações
Crianças com SD podem apresentar vocabulário mais reduzido devido ao atraso no
desenvolvimento da linguagem, menor reconhecimento de regras gramaticais e
sintáticas da língua, bem como dificuldades na produção da fala. Consequentemente
essas crianças não conseguem expressar-se na mesma medida em que compreendem
o que é falado. Tais alterações linguísticas podem também afetar o desenvolvimento
cognitivo da criança, devido à dificuldade de usar os recursos da linguagem para pensar,
raciocinar e lembrar das informações (CAPE, 2012).
A deficiência intelectual está presente em grande parte de indivíduos com SD, geralmente
em grau leve, o que possibilita aquisição de boas habilidades sociais (BALLABEN, 2001;
KE; LIU, 2012).
Neste aspecto, é importante que seja dada a oportunidade das crianças mostrarem que
compreenderam o que lhes foi dito, seja por palavras ou mesmo atos motores como
127
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Vale mencionar que tais limitações não seguem padrão idêntico para todas as pessoas
com SD, pois como já ressaltado, cada caso deve ser tratado como individual uma vez
que diversos fatores podem interferir nas complicações associadas às derivadas da
síndrome (BALLABEN, 2001).
Tratamento e prognóstico
É importante que as pessoas com SD recebam intervenção global desde o início da
vida até quando for necessário. Algumas pessoas precisam de intervenções até a idade
adulta ou mesmo na velhice, para que possam seguir de maneira mais autônoma,
desenvolvendo potencialidades e diminuindo o impacto de suas deficiências físicas e
intelectuais (NOBRE, 2015; TEMPSKI, 2016).
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UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
130
Capítulo 13
Lesão do plexo braquial
Relembrando anatomia
Para contextualizar a temática deste capítulo, vale relembrar algumas nomenclaturas
e localizações anatômicas do corpo humano. Vamos começar pela divisão didática do
esqueleto em duas partes, como indica a Figura 18:
Fonte: <http://cienciasmorfologicas.webnode.pt/anatomia%20sist%C3%AAmica/sistema-esqueletico/>.
A união entre o esqueleto axial e o esqueleto apendicular se dá por meio das cinturas
escapular e pélvica. Neste momento, vamos focar na união entre a cintura escapular e o
membro superior, que estão diretamente interligados pela articulação do ombro.
Para que tenhamos êxito em atividades funcionais do dia a dia, é importante que
nossos braços e mãos assumam determinadas posições no espaço, para tanto, as quatro
131
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
articulações da cintura escapular (Figura 19) devem funcionar em sinergia com o braço,
antebraço, punho e mão. Qualquer alteração na cintura escapular pode afetar todo o
membro superior, alterando a biomecânica dessas estruturas (COELHO et al., 2012).
Sabemos que, protegida pela coluna vertebral, temos a medula espinhal, responsável
por transmitir os impulsos do Sistema Nervoso Central (SNC) para as partes do
corpo, por meio do Sistema Nervoso Periférico (SNP). Conectados à medula espinhal
temos 31 pares de nervos espinhais, que coletam dados provenientes dos órgãos dos
sentidos e enviam ao cérebro via medula espinhal, assim como a medula espinhal envia
informações motoras do cérebro para o corpo via rede nervosa espinhal. Esses 31 pares
de nervos são divididos e classificados de acordo com o segmento a que pertencem,
sendo: 8 pares de nervos cervicais; 12 pares de nervos torácicos, 5 pares de nervos
lombares e 6 pares de nervos sacrais (HEISE, 2007).
Neste aspecto, para que possamos executar movimentos de forma correta e desejada, o
sistema motor age em conjunto com o sistema sensorial, que transmite as informações
necessárias ao SNC. Ao interpretar as informações recebidas, o SNC envia impulsos
nervosos para os músculos, gerando uma resposta neuromuscular, denominada
ativação muscular, que executará, portanto, o movimento (COELHO et al., 2012).
Neste momento iremos focar na região responsável pela inervação sensitiva e motora
do membro superior, o Plexo Braquial, maior rede de fibras nervosas que inervam
a extremidade superior, formado pelos nervos espinhais C5, C6, C7, C8 e T1. Esses
nervos, após saírem dos forames vertebrais, se colocam no espaço intermuscular do
músculo escaleno anterior e médio, formando o tronco superior (C5 e C6), responsável
pelo movimento do ombro e cotovelo; tronco médio (C7) responsável pelo movimento
dos músculos extensores; e tronco inferior (C8 e T1), responsável pela inervação dos
flexores de punho e principalmente pela capacidade de preensão. Por sua vez, os troncos
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Fonte: <http://www.auladeanatomia.com/neurologia/braquial.htm.>
Será a partir dos cordões que os principais nervos do membro superior serão formados,
sendo eles: nervo musculocutâneo, nervo mediano, nervos radial e axilar e nervo ulnar.
As fibras nervosas sensitivas também emergem da medula por meio de uma fila
quase ininterrupta de filamentos nervosos, cujos corpos dos neurônios situam-se,
imediatamente, antes da união com as fibras motoras. Por este motivo estas fibras
também são capazes de gerar movimentos, mesmo que de forma indireta, uma vez que
emitem sinais para o SNC a partir de sensações (HEISE, 2007).
133
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Nas LPB existe comprometimento das fibras nervosas que compõem o plexo na região
cervical, de cintura escapular e ombro, que são compostas das raízes de C5 a T1, como já
mencionado. Ou seja, o comprometimento das fibras nervosas do plexo braquial resulta
na perda da condução do axônio, da continuidade do mesmo e da continuidade das
fibras nervosas, dos fascículos ou do tronco completo do nervo, dependendo do nível e
grau da lesão (COELHO et al., 2012).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Sabe-se que quanto maior a velocidade ou energia cinética, mais grave será a lesão do
plexo e suas estruturas associadas. As lesões podem ser causadas durante o parto, por
traumatismos envolvendo acidentes ou colisões de motocicleta, bicicleta, automóveis,
atropelamento, quedas de altura, quedas de objetos sobre o ombro e acidentes industriais
(HEISE, 2007).
Fonte: <http://brachialplexus.wustl.edu/portuguese/Overview.htm.>
135
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
Ressalta-se que nem todas as estruturas sofrem o mesmo tipo ou grau de lesão, sendo
que rotura e estiramento podem estar presentes também em diferentes raízes, troncos
ou segmentos (VIEIRA et al., 2004).
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PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
Fonte: <http://www.marlene.fst.br/2014/02/lesoes-do-plexo-braquial.html>.
Quando a lesão ocorre durante o parto, denomina-se Paralisia Obstétrica (PO), que
acontece quando é aplicada excessiva tração cervical e/ou braquial para a saída do
ombro anteriormente, durante o período expulsivo do recém-nascido e manifesta-se
por alteração motora e sensitiva no membro superior do recém-nascido (VIEIRA et al.,
2004; COELHO et al., 2012).
A prevalência de PO varia de 0,13 a 5,1 por 1.000 nascidos vivos, afetando de forma
homogênea em ambos os sexos e, cerca de 5 a 25% dos casos tem indicação cirúrgica
(VIEIRA et al., 2004; COELHO et al., 2012).
É possível perceber a lesão já nos primeiros momentos de vida, quando o bebê adota uma
postura típica de lesão, levando ao crescimento alterado do membro afetado, que pode
evoluir para contraturas dos tecidos moles e grave interferência no desenvolvimento de
habilidades bimanuais (VIEIRA et al., 2004; COELHO et al., 2012).
Classificar a lesão pode ser uma tarefa difícil, uma vez que são múltiplas as alterações
e as combinações entre os desequilíbrios musculares e os graus de comprometimento.
Dentre as manifestações inclui-se o comprometimento do crescimento do membro
afetado, deformidades da articulação glenoumeral, contratura em rotação interna e
adução sem deformidade na articulação glenoumeral, subluxação ou deslocamento
137
UNIDADE II │ PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA
A recuperação das lesões mais graves irá depender do crescimento dos brotos axonais
a partir do coto proximal da lesão. Estes brotos irão atravessar o segmento lesado
e atingir os tubos endoneurais correspondentes para posteriormente reinervação do
órgão alvo. O crescimento estimado é de cerca de 1 a 5 mm por dia, podendo, portanto
demorar meses até que a reinervação termine, dependendo da distância. A musculatura
mantém-se viável para reinervação por volta de 18 a 24 meses, porém após este
período a fibrose e atrofia muscular tornam o músculo resistente à reinervação, sendo
o crescimento axonial inútil (HEISE, 2007).
138
PATOLOGIAS EM NEUROPEDIATRIA │ UNIDADE II
a ser responsáveis pela sensibilidade de áreas cutâneas maiores e, uma grande diferença
é que os receptores sensitivos não degeneram como os músculos, portanto não há um
limite de tempo para que a reinervação aconteça (HEISE, 2007).
Diagnóstico e tratamento
Além da avaliação neurológica do membro afetado, a ressonância magnética pode
auxiliar na identificação e nível da lesão, bem como na identificação da integridade
ou não da musculatura adjacente. A radiografia simples pode ser importante para
identificação de possíveis fraturas decorridas da lesão (NARAHASHI et al., 2005).
O quadro clínico é definido num prazo de três semanas da lesão, sendo o diagnóstico
essencialmente clínico-neurológico, tanto em casos neonatais como em casos
traumáticos. Quanto mais precocemente for iniciado o tratamento, melhores são as
chances de minimizar os efeitos da lesão, evitando assim futuros problemas de esquema
corporal, limitação de movimentos, hipotrofia, alterações sensitivas e vasomotoras.
Estimulação sensorial, orientações aos familiares e realização de movimentos passivos
suaves são de forte indicação para o tratamento das LPB (VIEIRA et al., 2004; COELHO
et al., 2012).
Se até os três meses de idade a criança ainda não tiver adquirido o controle da
musculatura deltoide e bíceps braquial, o tratamento cirúrgico pode ser indicado e
realizado (HEISE, 2007; COELHO et al., 2012).
139
ERROS INATOS DO Unidade iII
METABOLISMO
Capítulo 1
Introdução e fisiopatologia
Outras doenças são de herança ligada ao cromossomo X, neste sentido se a mãe for
portadora da mutação, o risco de recorrência é de 50% no sexo masculino e 50% de
filhas portadoras, que têm a possibilidade de também gerarem filhos doentes (OKADA;
DINIZ, 2011).
140
ERROS INATOS DO METABOLISMO │ UNIDADE III
A patogênese comum a muitos erros inatos pode ser resumida no seguinte esquema:
Figura 24.
141
Capítulo 2
Classificação, identificação e
tratamento
Existem diversas classificações para os EIM, uma vez que se tratam de alterações
metabólicas bastante distintas, porém algumas classificações foram estabelecidas com
fins didáticos, como apresentados no quadro a seguir:
Descrição Manifestação
142
ERROS INATOS DO METABOLISMO │ UNIDADE III
143
UNIDADE III │ ERROS INATOS DO METABOLISMO
Nos casos de Fenilcetonúria (PKU) existe falha na enzima que degrada o aminoácido
fenilalanina, presente em quase todos os alimentos, com exceção da gordura pura e
do açúcar. Já nos casos da Doença do Xarope de Bordo (MSUD) é resultante de um
distúrbio do metabolismo dos ácidos orgânicos que leva os pacientes a terem dificuldade
em degradar certos aminoácidos encontrados nas proteínas (FEPE).
Quadro clínico
A maior parte dos EIM afeta todo o organismo e pode manifestar-se em qualquer faixa
etária, portanto os médicos devem estar atentos aos sinais e sintomas que possam
caracterizar algum erro metabólico em qualquer paciente que chega aos seus cuidados
(EL HUSNY; FERNANDES-CALDATO, 2006).
144
ERROS INATOS DO METABOLISMO │ UNIDADE III
Alguns EIM são caracterizados por sintomas agudos graves quando a ingestão de
proteína é instituída. Os sintomas iniciam-se com horas a dias de vida e podem ser
fulminantes se não forem tomadas medidas urgentes para evitar o óbito. São exemplos
destes sintomas: hiperamonemia; acidose metabólica fulminante; encefalopatia aguda
metabólica; hipoglicemia; icterícia, disfunção hepática e hepatomegalia (MATSUOKA;
CASELLA; DEUTSCH, 2005; OKADA; DINIZ, 2011).
145
UNIDADE III │ ERROS INATOS DO METABOLISMO
146
ERROS INATOS DO METABOLISMO │ UNIDADE III
Dados da história clínica devem ser pesquisados como problemas gestacionais como
hemólise, elevação das enzimas hepáticas, história familiar de óbitos anteriores
inexplicados, doenças neurológicas sem diagnóstico definido ou consanguinidade;
insuficiência cardíaca, distúrbios da beta-oxigenação e do metabolismo
energético mitocondrial (MATSUOKA; CASELLA; DEUTSCH, 2005; EL HUSNY;
FERNANDES-CALDATO, 2006).
Diagnóstico
O diagnóstico rápido é essencial para que a doença não cause danos irreversíveis ao
paciente, portanto vale destacar o papel fundamental da triagem e avaliação do estado
metabólico por meio de hemograma completo, hemocultura, utocultura, exames de
eletrólitos, glicemia, gasometria, função renal e hepática; amônia e lactato e exames
específicos que forem necessários (MATSUOKA; CASELLA; DEUTSCH, 2005; EL
HUSNY; FERNANDES-CALDATO, 2006).
Diante de forte suspeita clínica direcionada para uma determinada patologia, exames
que confirmam a deficiência enzimática devem ser solicitados, como dosagem de
alfa-1-antitripsina; dosagem de enzimas lisossomais; biópsia hepática; biópsia muscular
e biópsia da pele (MATSUOKA; CASELLA; DEUTSCH, 2005).
Tratamento
A terapêutica mais adequada irá depender de qual é o EIM responsável pela doença
que o paciente apresenta, portanto, enquanto aguardam-se os resultados dos exames
para seguir tratamento específico, que consiste no controle dos metabólitos tóxicos e
estimulação enzimática, é impreterível a manutenção das necessidades fisiológicas e
restauração da estabilidade bioquímica do paciente, como restrição proteica; controle
adequado de ingestão calórica, evitando-se jejum prolongado ou desidratação; promover
um bom débito urinário, que pode auxiliar na excreção de metabólitos tóxicos, ou seja,
assegurar a hidratação do paciente; administração de cofatores como vitaminas, quando
possível e indicado; diálise peritoneal ou hemodiálise em situações graves (MATSUOKA;
CASELLA; DEUTSCH, 2005; EL HUSNY; FERNANDES-CALDATO, 2006).
147
UNIDADE III │ ERROS INATOS DO METABOLISMO
Após os resultados dos exames específicos, a terapêutica poderá variar desde uma
dieta controlada, como redução de substrato acumulado, suplementação de um ou
outro produto, desintoxicação por metabólitos, até terapia de reposição enzimática,
terapia gênica ou transplante de medula óssea, para casos específicos (EL HUSNY;
FERNANDES-CALDATO, 2006).
Nos casos de fenilcetonúria (PKU), a dieta alimentar será restrita em proteínas, com
alimentos que contenham teores baixos de fenilalanina. Frutas, vegetais e alguns
cereais são mantidos, porém alimentos de origem animal e de origem vegetal, ricos
em proteínas, estão excluídos da dieta. Já nos casos da Doença do Xarope de Bordo, a
dieta será pobre em proteínas. Mesmo frutas e verduras que têm pequenas quantidades
deverão ser consumidas sob orientação nutricional. (FEPE).
Para pacientes que apresentam Homocistinúria, a dieta deverá ser restrita em metionina,
com substituição do leite para uma fórmula láctea médica e alguns suplementos
especiais. Nos casos de Hipermetioninemia não há tratamento conhecido, porém o
tratamento com administração de S-adenosilmetionina pode ser recomendável em
alguns casos (FEPE).
O paciente que apresenta Tirosinemia deverá ter uma dieta restrita em fenilalanina e
tirosina, sendo indicada fórmula metabólica isenta dessas mesmas substâncias (FEPE).
Nos casos de defeitos da oxidação dos ácidos graxos, o tratamento é específico para cada
paciente, porém deve-se evitar jejum prolongado por mais de 4 a 6 horas, recomenda-
se refeição a base de amido antes de dormir e ao acordar. Amido cru, com água, leite ou
qualquer outra bebida que garanta energia de longa duração é indicado. Suplementação
especial também é indicada (FEPE).
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