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Desenvolvimento Infantil

Brasília-DF.
Elaboração

Aline Freire Bezerra Vilela

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário
APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 5

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7

UNIDADE I

DESENVOLVIMENTO HUMANO ................................................................................................................ 9

CAPÍTULO 1

COMPREENDENDO O DESENVOLVIMENTO HUMANO................................................................. 9

CAPÍTULO 2

O DESENVOLVIMENTO HUMANO E A PSICOLOGIA................................................................... 15

CAPÍTULO 3

PERSPECTIVAS TEÓRICAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO..................................................... 26

UNIDADE II

DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO.................................................................................................... 51

CAPÍTULO 1

DESENVOLVIMENTO PRÉ-NATAL................................................................................................ 51

CAPÍTULO 2

DESENVOLVIMENTO DO RECÉM-NASCIDO............................................................................... 64

UNIDADE III

AS INFÂNCIAS...................................................................................................................................... 69

CAPÍTULO 1

DESENVOLVIMENTO DA PRIMEIRA INFÂNCIA............................................................................ 69

CAPÍTULO 2

DESENVOLVIMENTO DA SEGUNDA INFÂNCIA........................................................................... 77

CAPÍTULO 3

DESENVOLVIMENTO DA TERCEIRA INFÂNCIA............................................................................ 87

UNIDADE IV

DESENVOLVIMENTO INFANTIL................................................................................................................ 96

CAPÍTULO 1

QUESTÕES ESPECÍFICAS.......................................................................................................... 96

PARA (NÃO) FINALIZAR.................................................................................................................... 104

REFERÊNCIAS................................................................................................................................. 105
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

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Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para
aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

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Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução
Nesta disciplina iremos abrir espaço em nossas mentes para a percepção de nós
mesmos, como seres humanos, que se desenvolvem e constroem padrões diferentes de
comportamento e personalidade mesmo que com algumas semelhanças, sendo essas,
as que abordaremos para a compreensão deste processo.

Estudaremos, então, desde os pensamentos e apontamentos já levantados acerca do


desenvolvimento humano até o nosso ponto focal que é o desenvolvimento infantil.
Neste ponto abordaremos questões que didaticamente separadas nos farão compreender
a complexidade dos períodos da vida nesta fase. E, portanto, traremos conteúdos que
irão nortear o seu estudo e ajudarão na construção de reflexões, as quais possivelmente
facilitarão a sua compreensão desses novos conhecimentos.

É necessário relembrar que esse caderno de estudo serve como um guia para orientar a
sua pesquisa mais aprofundada sobre os temas levantados, uma vez que a bibliografia é
vasta e será apresentada ao final do caderno, o aluno, quando possível, deverá pesquisar
e aprofundar suas leituras a fim de aprimorar seu estudo.

Objetivos
»» Apresentar conteúdo e transcorrer sobre conceitos relevantes acerca
do desenvolvimento humano, enfatizando a fase do desenvolvimento
infantil. Analisar diversas teorias do desenvolvimento possibilitando
novos conhecimentos e incentivando a busca e a pesquisa concomitante.

»» Sugerir leituras e materiais concernentes ao tema a fim de ampliar o


campo do saber com novos olhares e abordagens diversificadas.

»» Envolver o estudante de modo participativo na construção de sua


aprendizagem a partir das leituras e reflexões propostas voltadas às
experiências cotidianas.

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DESENVOLVIMENTO UNIDADE I
HUMANO

CAPÍTULO 1
Compreendendo o desenvolvimento
humano

Conceitos e definições
Vamos diferenciar alguns termos muitas vezes utilizados como sinônimos,
embora tenham significados diferentes. Assim, iniciaremos definindo alguns
conceitos que nos situem em determinada perspectiva, a começar pelos termos
conceituados pelo Ministério da Saúde (2002):

»» Crescimento: significa aumento físico do corpo, como um todo ou


em suas partes, e pode ser medido em termos de centímetros ou de
gramas. Traduz aumento do tamanho das células (hipertrofia) ou de
seu número (hiperplasia).

»» Maturação: é a organização progressiva das estruturas morfológicas,


já que, como o crescimento, seu potencial está geneticamente
determinado. A maturação neurológica engloba os processos de
crescimento, diferenciação celular, mielinização e o aperfeiçoamento
dos sistemas que conduzem a coordenações mais complexas.

»» Desenvolvimento: é um conceito amplo que se refere a uma


transformação complexa, contínua, dinâmica e progressiva, que inclui,
além do crescimento, a maturação, a aprendizagem e os aspectos
psíquicos e sociais.

»» Desenvolvimento psicossocial: é o processo de humanização que


inter-relaciona aspectos biológicos, psíquicos, cognitivos, ambientais,
socioeconômicos e culturais, mediante o qual a criança vai adquirindo

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UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

maior capacidade para mover-se, coordenar, sentir, pensar e interagir


com os outros e o meio que a rodeia; em síntese, é o que lhe permitirá
incorporar-se, de forma ativa e transformadora, à sociedade em que
vive.

Fonte disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/crescimento_


desenvolvimento.pdf> Acessado em: 11 nov. 2015.

E nós, o que entendemos por desenvolvimento?

Quais as principais mudanças no curso da vida humana e que influências comuns


e individuais afetam as pessoas?

Meus Oito Anos

Casimiro de Abreu

Oh! que saudades que eu tenho, da aurora da minha vida, da


minha infância querida, que os anos não trazem mais !

Que amor, que sonhos, que flores, naquelas tardes fagueiras, à


sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais!

Como são belos os dias

Do despontar da existência!

– Respira a alma inocência, como perfumes a flor; o mar é – lago


sereno, o céu – um manto azulado, o mundo – um sonho dourado,
a vida – um hino d’amor!

Que auroras, que sol, que vida, que noites de melodia, naquela
doce alegria, naquele ingênuo folgar!

O céu bordado d’estrelas,

A terra de aromas cheia,

As ondas beijando a areia

E a lua beijando o mar!

Oh! dias de minha infância!

Oh! meu céu de primavera!

Que doce a vida não era

Nessa risonha manhã!

Em vez de mágoas de agora, eu tinha nessas delícias, de minha


mãe as carícias, e beijos de minha irmã!

Livre filho das montanhas, eu ia bem satisfeito, de camisa aberta


ao peito,

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

– Pés descalços, braços nus – Correndo pelas campinas

À roda das cachoeiras,

Atrás das asas ligeiras

Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos

Ia colher as pitangas,

Trepava a tirar as mangas,

Brincava à beira do mar;

Rezava às Ave-Marias,

Achava o céu sempre lindo,

Adormecia sorrindo,

E despertava a cantar!

Oh! que saudades que eu tenho, da aurora da minha vida, da


minha infância querida, que os anos não trazem mais!

– Que amor, que sonhos, que flores, naquelas tardes fagueiras à


sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais!

A evolução do estudo do desenvolvimento


humano

Figura 1.

Fonte: <http://patatitralala.blogspot.com.br/2010/09/o-conceito-de-infancia-atraves-da_7.html>

Conforme Airès (1981) em seus estudos de apanhados históricos, as crianças eram


vistas desde os séculos XIV até o século XVI como seres iguais aos adultos. Elas eram

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UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

consideradas simplesmente menores e menos capacitadas. Este modo particular, para


nosso entendimento nos dias atuais, fazia com que as crianças fossem tratadas como
adultos, ou seja, não havia distinção social, nem muito menos afetiva em se tratando
de como lidar com elas, sendo elas extremamente participativas no contexto social,
inclusive laboral. Ainda, segundo o autor, não havia um entendimento sobre a infância,
no que implica que as crianças não eram separadas do adulto no seu modo de pensar; as
capacidades inerentes a uma criança não se diferenciavam em muito das de um adulto,
assim como sua forma de elaborar os seus sentimentos.

Mais tarde outros autores divergiram de Airès e no século XIX o estudo científico
sobre o desenvolvimento infantil começou a enfatizar outros argumentos igualmente
relevantes. Trazendo para dentro da nossa realidade, podemos verificar que por volta
dos anos de 1800, no Brasil, houve certa inquietação a respeito dessas atitudes. E foi
então no século XVII com a chegada dos portugueses ao Brasil e a preocupação com
a higiene e a saúde que as famílias começaram a mudar o pensamento. Preocupadas
com o futuro dos seus filhos passaram a protegê-los em comparação ao comportamento
anterior existente na sociedade europeia. A sociedade reservou um maior interesse pelas
crianças, em termos de cuidado, e transferiu esse interesse para o centro da família.
Essa nova perspectiva e preocupação em relação à criança fez desse tema um assunto
de relevância social. Foi em 1989, na Assembleia Geral das Nações Unidas, que então
se convencionou o Direito da Criança, por meio da Carta Magna, garantindo a todas as
crianças o direito e a proteção especial de modo a permitir um desenvolvimento sadio
e feliz.

Convenção sobre os direitos da criança


Adotada em Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989

Preâmbulo

Os Estados Partes da presente Convenção

Considerando que, de acordo com os princípios proclamados na Carta das


Nações Unidas, a liberdade, a justiça e a paz no mundo fundamentam-se no
reconhecimento da dignidade inerente e dos direitos iguais e inalienáveis de
todos os membros da família humana. Tendo em conta que os povos das Nações
Unidas reafirmaram na Carta sua fé nos direitos fundamentais do homem e na
dignidade e no valor da pessoa humana, e que decidiram promover o progresso
social e a elevação do nível de vida com mais liberdade. Reconhecendo que
as Nações Unidas proclamaram e concordaram na Declaração Universal dos

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Direitos Humanos e nos pactos internacionais de direitos humanos que toda


pessoa possui todos os direitos e liberdades neles enunciados, sem distinção
de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política
ou de outra natureza, seja de origem nacional ou social, posição econômica,
nascimento ou qualquer outra condição. Recordando que na Declaração
Universal dos Direitos Humanos as Nações Unidas proclamaram que a infância
tem direito a cuidados e assistência especiais. Convencidos de que a família,
como grupo fundamental da sociedade e ambiente natural para o crescimento
e o bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças, deve
receber a proteção e assistência necessárias a fim de poder assumir plenamente
suas responsabilidades dentro da comunidade. Reconhecendo que a criança,
para o pleno e harmonioso desenvolvimento de sua personalidade, deve
crescer no seio da família, em um ambiente de felicidade, amor e compreensão.
Considerando que a criança deve estar plenamente preparada para uma vida
independente na sociedade e deve ser educada de acordo com os ideais
proclamados na Carta das Nações Unidas, especialmente com espírito de paz,
dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e solidariedade. Tendo em conta que
a necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial foi enunciada
na Declaração de Genebra de 1924 sobre os Direitos da Criança e na Declaração
dos Direitos da Criança adotada pela Assembleia Geral em 20 de novembro
de 1959, e reconhecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no
Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (em particular nos artigos 23
e 24), no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (em
particular no artigo 10) e nos estatutos e instrumentos pertinentes das Agências
Especializadas e das organizações internacionais que se interessam pelo
bem-estar da criança. Tendo em conta que, conforme assinalado na Declaração
dos Direitos da Criança, “a criança, em virtude de sua falta de maturidade física e
mental, necessita de proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção
legal, tanto antes quanto após seu nascimento”. Lembrando o estabelecimento
da Declaração sobre os Princípios Sociais e Jurídicos Relativos à Proteção e ao
Bem-Estar das Crianças, especialmente com Referência à Adoção e à Colocação
em Lares de Adoção, nos Planos Nacional e Internacional; as Regras Mínimas
das Nações Unidas para a Administração da Justiça e da Juventude (Regras de
Beijing); e a Declaração sobre a Proteção da Mulher e da Criança em Situação de
Emergência ou do Conflito Armado. Reconhecendo que em todos os países do
mundo existem crianças vivendo sob condições excepcionalmente difíceis e que
essas crianças necessitam de consideração especial. Tomando em devida conta
a importância das tradições e os valores culturais de cada povo para a proteção
e o desenvolvimento harmonioso da criança. Reconhecendo a importância da

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UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

cooperação internacional para a melhoria das condições de vida das crianças em


todos os países em desenvolvimento. Acordam o seguinte:

»» Parte I.

»» Parte II.

»» Parte III.

»» Protocolo Facultativo para a Convenção sobre os Direitos da Criança


sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados.

»» Protocolo Facultativo para a Convenção sobre os Direitos da Criança


sobre a venda de crianças, prostituição e pornografia infantis.

Fonte: <www.unicef.org.br>. Acessado em: 1 Nov. 2015.

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CAPÍTULO 2
O desenvolvimento humano e a
Psicologia

O homem passa toda sua vida em constante processo de desenvolvimento e


aprendizagem. No caso do desenvolvimento humano sugere-se que o homem passa
grande parte de sua vida transformando-se, vivendo situações que denotam mudanças
externas e internas.

Para que possamos melhor compreender o conceito de “mudança” iremos abordá-la


aqui como uma variável que faz parte da definição de desenvolvimento e se destaca pela
“ruptura da homeostase nos sistemas, seguida por um processo de ajuste que representa
a própria mudança” (GOTTLIEB, 2003 apud DESSEN, 2005, p. 13).

Consideremos, pois, o desenvolvimento humano dentro de sua complexidade como um


processo contínuo e ininterrupto no qual os aspectos biológicos, físicos, sociais e culturais
se relacionam e estão conectados mutuamente, de tal modo que influenciam no pensar,
sentir, estar e se conectar com o mundo, finalizando numa construção individual que
define a personalidade. É devido a essa complexidade que o desenvolvimento humano
tem sido estudado por diversas áreas do conhecimento e atualmente, conforme nos
situa Sifuentes (2007), as teorias epigenética e probalística trazem à compreensão o
significado individual do desenvolvimento humano a partir de inúmeras possibilidades
que estão interligadas ao seu contexto e ao modo como o homem se relaciona com ele.
Sendo assim, é possível perceber que o homem se torna protagonista do seu processo
de transformação, deixando para o passado uma linha de pensamento que via o homem
apenas como receptor de influências externas.

Pensando na complexidade do desenvolvimento humano e na dificuldade da ciência


para compreender seus processos, Bronfenbrenner (1977, 1992, 1994) desenvolveu
um modelo científico/epistemológico que, mais tarde, foi batizado de Modelo
Bioecológico (BRONFENBRENNER, 1994; BRONFENBRENNER; CECI, 1994;
BRONFENBRENNER; MORRIS, 1998). Tal modelo visava criar uma alternativa para
o estudo do desenvolvimento humano, considerando a importância de observarmos o
indivíduo e suas interações nos diferentes contextos e sistemas. (SIFUENTES, 2007,
p. 383)

Seguindo essa linha de pensamento sobre o desenvolvimento humano falaremos


rapidamente de Urie Bronfenbrenner, um autor muito conhecido na psicologia do
desenvolvimento por apresentar uma proposta ecológica acerca do desenvolvimento.

15
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

Essa linha de pensamento aponta para as características saudáveis desse processo


de mudança visando à compreensão de como a pessoa se desenvolve em sistemas
dinâmicos e que ocorrem simultaneamente.

Neste sentido, o desenvolvimento passa a ser concebido, ao mesmo tempo, como


produto e processo que, em íntima relação um com o outro, trazem à tona não só os
efeitos do desenvolvimento como também suas propriedades (POLONIA; COLS., 2005).
A partir dessa compreensão de desenvolvimento e da ênfase nos contextos ambientais,
Bronfenbrenner (1977, 1979/1996) define o ambiente ecológico como um sistema
composto por cinco subsistemas socialmente organizados, que apoiam e orientam o
desenvolvimento humano e estão circunscritos ao ambiente ecológico. (SIFUENTES,
2007, p. 383)

Em se tratando dos psicólogos do desenvolvimento (diferenciados por trabalhar


com modelos teóricos de pensamento clínico ou científico) os estudos começaram a
concentrar-se nas crianças em crescimento.

A psicologia do desenvolvimento é agora definida em termos de todo o ciclo de vida.


Ela abrange a investigação do crescimento da estrutura física, o comportamento e o
funcionamento mental desde qualquer ponto do tempo após o nascimento até qualquer
ponto do tempo antes da morte. (DAVIDOFF, 2001, p. 419)

A partir dessa visão de complexidade do desenvolvimento humano os psicólogos do


desenvolvimento (independentes de sua escolha teórica) começam a concentrar-se
na variação de comportamentos e a estudar a reação aos diversos tipos de influências
(externas e internas) e maneiras peculiares de formar as diversas personalidades,
voltando-se para o estudo do homem em diferentes estágios da vida.

O sujeito humano é constituído por aquilo que é herdado fisicamente e pela experiência
individual, mas sua vida, seu trabalho, seu comportamento também se baseiam
claramente na experiência histórica e social, isto é, aquilo que não foi vivenciado
pessoalmente pelo sujeito, mas está na experiência dos outros e nas conquistas
acumuladas pelas gerações que o procederam. (OLIVEIRA, 2005, p. 11)

Papalia (2000) destacou dois tipos de mudanças no desenvolvimento humano, sendo


elas a mudança quantitativa e a qualitativa, na primeira o homem muda em termos
de número ou quantidade, na segunda a mudança está relacionada aos fatores mais
internos dos processos mentais, por exemplo.

No caso do desenvolvimento humano é importante atentarmos para as mudanças


desde a infância até a vida adulta, esse desenvolvimento, portanto, passa por uma série

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

de fases, variações tão complexas que para melhor significá-las iremos dividi-los em
períodos, são eles:

Quadro 1. Principais desenvolvimentos nos oito períodos do ciclo de vida.

FAIXA ETÁRIA PRINCIPAIS DESENVOLVIMENTOS


Estágio pré-natal »» Formação da estrutura e órgãos corporais básicos.

(concepção até »» O crescimento físico é o mais rápido de todos os períodos.


nascimento) »» Grande vulnerabilidade às influências ambientais.
»» O recém-nascido é dependente, porém competente.
»» Todos os sentidos funcionam no nascimento.
»» Crescimento físico e desenvolvimento das habilidades motoras são rápidos.
Primeira infância »» A capacidade de aprender e lembrar está presente, até mesmo nas primeiras semanas de vida.
(nascimento até 3 anos) »» Compreensão e fala se desenvolvem rapidamente.
»» Autoconsciência se desenvolve no segundo ano.
»» Apego aos pais e a outros se forma aproximadamente no final do primeiro ano de vida.
»» O interesse por outras crianças aumenta.
»» Força e habilidades motoras simples e complexas aumentam.
»» O comportamento é predominantemente egocêntrico, mas a compreensão da perspectiva dos outros
aumenta.
Segunda infância
»» A imaturidade cognitiva leva a muitas ideias ilógicas acerca do mundo.
(3 a 6 anos) »» Brincar, criatividade e imaginação tornam-se mais elaborados.
»» Independência, autocontrole e cuidado próprio aumentam.
»» A família ainda é o núcleo da vida, embora outras crianças comecem a se tornar importantes.
»» Crescimento físico diminui.
»» Força e habilidades físicas se aperfeiçoam.
»» Egocentrismo diminui.
Terceira infância »» Crianças passam a pensar com lógica, embora predominantemente concreta.
(6 a 12 anos) »» Memória e habilidades de linguagem aumentam.
»» Ganhos cognitivos melhoram a capacidade de tirar proveito da educação formal.
»» Autoimagem se desenvolve, afetando a autoestima.
»» Amigos assumem importância fundamental.
»» Mudanças físicas são rápidas e profundas.
»» Atinge-se a maturidade reprodutiva.
»» Capacidade de pensar abstratamente e usar o pensamento científico se desenvolvem.
Adolescência
»» Egocentrismo adolescente persiste em alguns comportamentos.
(12 a 20 anos)
»» Busca de identidade torna-se fundamental.
»» Grupos de amigos ajudam a desenvolver e testar a autoimagem.
»» Relacionamento com os pais geralmente é bom.
»» A saúde física atinge o máximo, depois cai ligeiramente.
»» Habilidades cognitivas assumem maior complexidade.
Jovem adulto
»» Decisões sobre relacionamentos íntimos são tomadas.
(20 a 40 anos)
»» A maioria das pessoas se casa; a maioria tem filhos.
»» Escolhas profissionais são feitas.

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UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

FAIXA ETÁRIA PRINCIPAIS DESENVOLVIMENTOS


»» Ocorre certa deterioração da saúde física, e declínio da resistência e perícia.
»» Mulheres entram na menopausa.
»» Sabedoria e capacidade de resolução de problemas práticos são acentuadas; capacidade de
resolver novos problemas declina.
»» Senso de identidade continua a se desenvolver.
Meia-idade
»» Dupla responsabilidade de cuidar dos filhos e pais idosos pode causar estresse.
(40 a 65 anos)
»» Partida dos filhos tipicamente deixa o ninho vazio.
»» Para alguns, sucesso na carreira e ganhos atingem o máximo; para outros ocorre um esgotamento
profissional.
»» Busca do sentido da vida assume importância fundamental.
»» Para alguns, pode ocorrer a crise da meia-idade.
»» A maioria das pessoas é saudável e ativa, embora a saúde e a capacidade física declinem um pouco.
»» Retardamento do tempo de reação afeta muitos aspectos do funcionamento.

Terceira idade »» A maioria das pessoas é mentalmente ativa. Embora a inteligência e a memória possam se deteriorar
em algumas áreas, a maioria das pessoas encontra modos de compensação.
(65 anos em diante)
»» Aposentadoria pode criar mais tempo para o lazer, mas pode diminuir as rendas.
»» As pessoas precisam enfrentar perdas em muitas áreas (perdas de suas próprias faculdades, perda
de afetos) e a iminência de sua própria morte.
Fonte: PAPALIA, Diane E. & OLDS, Sally W, 2000, p 27.

Ainda segundo as autoras é muito importante destacar que as divisões nos servem como
parâmetro e não condizem exatamente à realidade, uma vez que fatores externos ao
ocorrerem em determinados momentos da vida podem alterar as ordens de padrões de
comportamento; embora dentro das sociedades ocidentais esses critérios apresentados
costumam marcar os períodos conforme as características e preocupações descritas no
modelo.

De acordo com Bjorklund e Pellegrini (2000), os mecanismos psicológicos


selecionados durante o processo evolutivo atuariam como mensagens
codificadas geneticamente que seguiriam regras epigenéticas na interação do
indivíduo com o ambiente. Assim, teríamos não apenas um genoma típico da
espécie, como também um ambiente típico da espécie. Essas características
relativamente estáveis contribuiriam para a universalidade de padrões
desenvolvimentistas, ao mesmo tempo em que explicariam a expressiva
variabilidade interindividual do processo.

A aplicação de uma visão epigenética ao estudo do desenvolvimento motor


foi aventada inicialmente por Connolly (1986). Fugindo à tradicional distinção
entre maturação e experiência, Connolly afirmou que o desenvolvimento motor
corresponderia a um processo em que o organismo estabelece, de forma ativa,
vínculos com o seu meio. O organismo exploraria os recursos contidos nesse
meio para construir seu próprio comportamento. Assim, tarefas e ambientes

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

moldariam e seriam moldados pelas ações do indivíduo. A experiência


motora corresponderia ao momento em que diferentes níveis de organização
(molecular, celular, orgânico, comportamental e social) seriam vinculados
para gerar comportamentos que, por sua vez, iriam gerar informações que
retroalimentariam essas relações de forma positiva e negativa. (PERROTI;
MANOEL, 2001, p. 80)

Fonte: <http://teste.luzimarteixeira.com.br/wp-content/uploads/2010/05/visao-epigenetica-do-
desenvolvimento-motor.pdf>

Aspectos do desenvolvimento humano

Falemos um pouco sobre as diversas variáveis que influenciam no desenvolvimento do


sujeito e no modo como ele constitui o seu “eu”, sua individualidade e singularidade.
Estas variáveis estão diretamente relacionadas aos desenvolvimentos físico, cognitivo e
psicossocial, e se influenciam mutuamente.

Talvez a herança genética seja uma variável de grande influência, não só no aspecto
físico, mas também, sobre aspectos cognitivos e psicossociais que resultam em marcas
individuais capazes de influenciar ou não no desenvolvimento.

O modo como o desenvolvimento é circunscrito depende da variabilidade dos significados


que emergem diante da articulação dos elementos ligados às várias pessoas, a interação
dentro de um contexto específico. Essa articulação/circuncisão que é compreendida,
no entanto, como se alterando continuamente, em função do tempo e dos eventos,
compondo novas configurações e novos percursos possíveis. (ROSSETTI-FERREIRA,
2004, p. 24)

Hereditariedade e o ambiente

Tanto hereditariedade quanto o ambiente têm uma característica contínua que vão desde
o momento da concepção e permeiam todo o ciclo de vida do ser humano; assim como
as características genéticas, o ambiente está sempre influenciando o comportamento.
Deste modo, é possível perceber que tanto o ambiente quanto a hereditariedade moldam
o desenvolvimento humano e se fazem presentes no decorrer de toda a infância e vida
adulta.

Davidoff (2001) destaca que o desenvolvimento é um processo individual e depende,


sobretudo, seja qual for o caso, de propensões biológicas únicas e experiências específicas
relacionadas ao ambiente. Portanto, apenas analisando o contexto e a história de vida

19
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

particular da pessoa em desenvolvimento é que se pode compreender como se deu esse


processo.

As influências hereditárias e ambientais conforme Papalia e Olds (2000, p. 28) dizem


respeito ao modo como as pessoas em seu desenvolvimento são afetadas. O primeiro
tipo de influência citado diz respeito às cargas genéticas que todo ser humano recebe
dos pais biológicos, já o segundo são fatores provenientes do ambiente externo. As
influências genéticas ocorrem devido a um processo que se inicia ainda no útero, e assim
como o ambiente, é um fator que acompanha por toda a vida. As autoras nos propõem
ainda levantar as influências causadas pela raça, cultura, etnia, constelação familiar,
estilo de vida, condição socioeconômica e observarmos que a presença ou ausência
de enfermidades e experiências de outras ordens também podem ser influentes no
desenrolar do desenvolvimento humano.

A herança genética

A herança genética é a propriedade dos seres vivos de transmitirem suas


características aos descendentes. Do ponto de vista do crescimento, a herança
genética recebida do pai e da mãe estabelece um potencial ou alvo que pode
ser atingido. Poucas funções biológicas dependem tanto do potencial genético
como o crescimento. No entanto, a qualquer momento, desde a concepção e
especialmente nas crianças pequenas, fatores ambientais podem perturbar o
ritmo e a qualidade deste processo. O alcance dessa meta biológica depende, na
verdade, das condições do ambiente, onde se dá o crescimento da criança, sendo
sua influência marcante. Existem grandes variações individuais no potencial
de crescimento dado pela herança genética. Observa-se, por exemplo, que a
variação de altura da população adulta, saudável, do sexo masculino é cerca
de 20 cm, enquanto que esta mesma variação entre irmãos é de 16 cm e entre
gêmeos homozigóticos é de 1,6 cm. A análise do banco de dados da Pesquisa
Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN, 1989), referente a uma amostra de
jovens de 20 anos, saudáveis e de classe média alta, todos com uma grande
probabilidade de terem atingido seu alvo genético de crescimento, mostra uma
taxa de variação nas suas alturas, com os mais baixinhos, podendo apresentar
médias em torno de 1,64 cm, enquanto os mais altos poderão ter 1,90 cm ou
mais.

Fonte: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/crescimento_desenvolvimento.pdf.>
Acessado em: 29 Out. 2015

20
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Influências normativas e não-normativas

Alguns estudiosos como Baltes, Reese e Lipsitt (1980 apud PAPALIA; OLDS,
2000) trataram dos aspectos de influência do desenvolvimento humano incluindo
os acontecimentos normativos e os não normativos. Como o próprio nome diz, os
acontecimentos normativos são aqueles considerados “normais”, ou seja, ocorrem
de maneira similar na maior parte das pessoas de um mesmo grupo social, e essas
influências normativas podem ser etárias ou históricas.

As influências normativas etárias são acontecimentos que ocorrem de modo


semelhante para pessoas de uma mesma faixa etária e podem se tratar de eventos
biológicos (menarca e a andropausa) e culturais (entrada na escola, no trabalho,
casamento).

Já as influências normativas históricas são influências comuns ao mesmo grupo


de pessoas que compartilham uma experiência semelhante num determinado tempo
ou lugar (jovens dos anos 1990 com o impeachment presidencial ocorrido no Brasil ou
a população de Hiroshima marcada pela explosão nuclear). Essas influências podem
ser biológicas e ambientais quando dentro de uma mesma cultura. Podemos aqui
pensar no aumento de doenças desconhecidas, advento do uso dos anticoncepcionais,
da vacinação, o uso de grandes tecnologias como telefone e computador, todas essas
influências são consideradas normativas.

As influências não normativas são caracterizadas por eventos individuais que


provocam algum tipo de impacto no sujeito que os vivi. Estes podem ser negativos ou
positivos, no entanto irão de algum modo servir de influência pois por serem novos
e inesperados podem gerar algum tipo de estresse, o que influencia no processo de
desenvolvimento uma vez que será necessário uma elaboração e nova adaptação ao que
o evento provocou. Este é um modo ativo que todos nós temos de participar do nosso
próprio desenvolvimento, já que sempre nos colocamos ou enfrentamos situações
diferentes e que requerem um grau de mobilidade e adaptação.

Maturação

A maturação está contida no processo de desenvolvimento e depende diretamente


do desenvolvimento do sistema nervoso. É, portanto, um movimento que antecede o
processo de aprendizagem, e é um termo bastante utilizado nas teorias de aprendizagem,
visto que estão relacionados ao desenvolvimento e amadurecimento do ser humano.
Segundo Davidoff (2001, p. 420) a maturação “é influenciada por experiências únicas
e pela herança genética, é de esperar que as pessoas atinjam pontos de maturação

21
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

em diferentes idades”. A maturação está relacionada ao modo como a criança vai se


desenvolvendo, e pode ser lento moderado ou rápido. O que vemos é que no imaginário
popular o ritmo de desenvolvimento de uma criança, quando não está dentro dos padrões
esperados, são vistos como preocupantes. No entanto, pesquisadores observaram que o
modo como se dá o desenvolvimento não está relacionado ao êxito posterior da pessoa
em questão, já que outros fatores são fundamentalmente contribuintes ao sucesso, bom
desempenho e desenvolvimento físico, intelectual e emocional de uma pessoa.

Personalidade

A personalidade está relacionada às características externas e aspectos visíveis do sujeito


─ que podem ser observados pelo outro; seria como a impressão que o sujeito provoca
no outro. Ou seja, é o modo como nos mostramos para o outro; é aquilo que o define
como pessoa; isso é o que podemos chamar de personalidade. Ainda, a personalidade
está relacionada a uma gama de qualidades subjetivas, caracterizadas pelas emoções e
também pelos aspectos sociais; sendo assim, esse conjunto de qualidades destacadas, e
que podem não estar aparentes, ainda assim são vistas como aspectos da personalidade
do sujeito. O que podemos dizer é que na medida do desenvolvimento humano e levando
em consideração as variáveis complexas, a personalidade como um componente
humano flexível e mutável, que varia de acordo com as circunstâncias, pode ser vista
como “um agrupamento permanente, peculiar de características que podem mudar em
resposta a situações diferentes” (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002, p. 9).

Modelo interno de funcionamento

Sobre os aspectos intrínsecos é possível afirmar que os aspectos internos da experiência


─ construídas a partir de um conjunto de ideias ou suposições centrais que o indivíduo
desenvolveu sobre si, sobre o mundo, sobre os relacionamentos com outras pessoas ─ é
que irão filtrar ou conduzir a resposta, ou modo desse indivíduo interpretar as situações
vivenciadas. O modelo de funcionamento interno das experiências passadas irá operar
no sentido de moldar a compreensão de self, ou seja, do eu, assim como também irá
mudar as experiências futuras.

Teoria da continuidade

Continuidade é um conceito igualmente abordado no que concerne desenvolvimento


humano, se refere aos padrões de comportamento e relacionamento transferidos em
situações que exigem dos envolvidos algum tipo de resposta, reforçando antigos padrões
adaptados aos novos contextos.

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

As teorias da continuidade pressupõem que as pessoas mudam sutil e gradativamente


e crescem continuamente. No início da vida antes do nascimento e durante a lactância
e a infância algumas habilidades (habilidades básicas motoras, de pensamento de
linguagem) surgem de maneira previsível e padronizada (DAVIDOFF, 2001, p. 423).

Vulnerabilidade e resiliência

Temos visto que o desenvolvimento de cada criança é individual e interage de formas


complexas sobre esse ser. O ambiente que para um pode causar efeitos positivos sobre
uma criança para o outro pode ser percebido de uma maneira diferente. O estudo de
crianças vulneráveis e resilientes tem mostrado que a longo prazo parte de um grupo
de crianças nascidas em uma ilha do Hawaí em 1955, crescidas em famílias católicas,
no nível da pobreza, desenvolveram sérios problemas quando adultas. Outra parte
dessas mesmas crianças, descritas como resilientes, tornaram-se adultos competentes,
confiantes e carinhosos. Essa pesquisa tratou de perceber que 1/3 das crianças com
a mesma vulnerabilidade captaram os aspectos negativos da experiência enquanto
2/3 desta mesma população obtiveram da experiência aspectos que influenciaram,
certamente unidos a outros aspectos subjetivos (como os fatores protetores
potencializados) e que foram favoráveis para esse outro tipo de resolução. (PAPALIA;
OLDS, 2000)

Consideremos, pois, resiliência como a compreensão sobre o modo como as pessoas


são capazes de sobreviver e superar as dificuldades, sejam elas de ordem moral,
social, física, econômica, enfim, qualquer evento catastrófico ou não capaz de marcar
profundamente uma vida. E vulnerabilidade como termo utilizado para explicar a
fragilidade de indivíduos ou grupos, seja de ordem política, jurídica, histórica ou social
que requerem proteção e promoção aos seus faltosos direitos.

Segundo Michael Rutter (1991 apud INFANTE, 2005, p. 25) resiliência é:

Uma resposta global em que estão em jogo mecanismos de proteção,


entendendo por estes não a valência contrária aos fatores de risco,
mas aquela dinâmica que permite ao indivíduo sair fortalecido da
adversidade, em cada situação específica, respeitando as características
pessoais.

Ainda podemos compreender, segundo Grotberg (1997), que no projeto internacional


de pesquisa sobre resiliência utilizou o termo com uma noção dinâmica em que
os mecanismos de proteção da pessoa vulnerável permitem-na adaptar-se apesar da
adversidade. A pessoa resiliente, uma vez que dentro dessa dinâmica adaptativa, utiliza

23
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

dos fatores de suporte (fatores resilientes - sociais, habilidades e intrínsecos) que serão
ativados e interativamente atuarão a favor da pessoa em situações de crise.

Genética do comportamento

Busca explicar os padrões de desenvolvimento, que são iguais para os mesmos tipos de
criança, a partir do conceito de maturação e da visão da herança genética do indivíduo,
sendo o ambiente fator contribuinte para significativas diferenças individuais.

Conforme Bee e Boyd (2011), iremos abordar a genética do comportamento a partir


de duas pesquisas, a primeira realizada com gêmeos idênticos e fraternos e a segunda
realizada com crianças adotadas. A pesquisa com os gêmeos revela que sempre que os
pares de gêmeos idênticos forem mais parecidos entre si em algum comportamento
ou qualidade do que são os pares de gêmeos fraternos, mesmo tendo sido criados
em ambientes diferentes, implica dizer que a influência genética provavelmente está
operando. Outro entendimento sobre a herança genética está associado à pesquisa
realizada com crianças adotadas, aqui compara-se o grau de semelhança entre a criança
e seus pais biológicos (com os quais ela compartilha genes, mas não compartilha
ambiente) ao grau de semelhança entre a criança adotada e o seus pais adotivos (com os
quais ela compartilha ambiente, mas não compartilha genes). Neste caso, pesquisadores
geneticistas do comportamento demonstraram que a hereditariedade afeta uma
variedade notavelmente ampla de comportamentos, eles incluem funcionamento
intelectual, social e emocional.

Alguns outros tipos de estudos foram levantados e divulgados em relação ao padrão


genético de comportamento, podendo revelar uma gama de informações minimamente
curiosas e específicas a esse tipo de interação.

Interação gene-ambiente

Ainda, pesquisas revelam que a herança genética é fator de influência no ambiente do


indivíduo. Esse fenômeno se explica quando a criança herda genes de seus pais e eles
criam o ambiente no qual ela está crescendo de modo a reforçar essa carga genética.
Ou seja, crianças com alto nível de fator de inteligência, que são favorecidas por um
ambiente estimulante, tendem a desenvolver baseando suas interpretações por meio
desse mesmo ambiente, que irá proporcionar traços comportamentais igualmente
com alto índice de inteligência. No entanto, as contribuições herdadas não giram em
torno apenas dos fatores cognitivos (no caso da inteligência), mas também de fatores
comportamentais (passividade, agressividade, hostilidade); ou seja, as tendências
herdadas estarão influenciadas por aspectos do temperamento e ainda de patologias.

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DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Teoria do apego

Os estudos de Bowlby foram sendo construídos a partir das observações em primatas;


dos trabalhos com crianças separadas dos pais, as quais se encontravam em ambientes
não familiares e hostis a elas e das observações naturalistas de processos de interação
mãe-bebê. Um dos estudos conhecido como Situação Estranha resultou em um
surpreendente achado em relação às formas como podem se desenvolver o apego do
bebê, sendo eles: apego seguro, apego inseguro evitativo e apego inseguro ambivalente
ou resistente. (BOLWBY, 2004; MAIN, 2000)

Como podemos ver, essa visão do vínculo afetivo na qual o apego está inserido denota
esse comportamento como um comportamento inato baseado na natureza humana e
presente nas figuras do recém-nascido.

Para aprofundar seu conhecimento leia o artigo de Guedea e Dessen (2005).

Com o intuito de instigar seu desejo à leitura, providenciamos o resumo do


referido artigo.

Os avanços ocorridos nas últimas décadas, presentes nos domínios


interdisciplinares da ciência do desenvolvimento, propõem uma mudança na
forma de pensar o estudo do desenvolvimento humano, tendo um forte impacto
na pesquisa. Neste artigo, são discutidos princípios e conceitos básicos que têm,
recentemente norteado a definição do próprio conceito de desenvolvimento
humano, dentre eles, estrutura, temporalidade, mudanças e continuidades.
Destaca-se, também, a necessidade de adotar, na prática da pesquisa, uma
visão sistêmica do processo de desenvolvimento, implicando em análises de
sistemas complexos e integrados em todos os seus níveis: genéticos, neural,
comportamental e ambiental (físico, social e cultural), interagindo ao longo do
tempo e traçando trajetórias de caráter probabilístico.

Fonte: <http://www.scielo.br/pdf/paideia/v15n30/04.pdf> Acessado em: 30 out. 2015.>

25
CAPÍTULO 3
Perspectivas teóricas do
desenvolvimento humano

Figura 2.

Fonte: <http://risedh.com.br/blog/>

A seguir iremos transcorrer sobre as teorias do desenvolvimento, lembrando que


nenhuma teoria se explica sozinha, muito menos quando falamos em desenvolvimento
humano. Deste modo, levantaremos variados pontos de vista a respeito de algumas
perspectivas teóricas.

Algumas teorias são bastante influentes na área do desenvolvimento humano aqui,


no entanto, trataremos mais a fundo das teorias psicanalistas (focaliza as emoções),
cognitivas (se concentra nos processos de pensamento) e teoria da aprendizagem
(enfatiza o comportamento observável).

Magnusson e Cairns (1996 apud DESSEN, 2005) destacam que o ser humano funciona de
modo integrado e se desenvolve psicologicamente a partir dos elementos de maturação,
experiência e cultura. Por isso, o desenvolvimento se dá por meio de uma dinâmica
contínua entre quem interage e o próprio ambiente, tangendo as relações interpessoais,
sociais e culturais. O desenvolvimento ainda se dá pelo modo de funcionamento
individual a partir de influências internas de interação entre a própria pessoa e os
sistemas cognitivo, emocional, fisiológico, morfológico, conceitual e neurobiológico
vigente a todo tempo dentro do processo de desenvolvimento.

Perspectivas das teorias psicanalíticas


A teoria psicanalítica, surgida no final do século XIX a partir da observação em
abordagem terapêutica do médico Sigmund Freud, teve como objeto de estudo o
inconsciente, mensurado através do comportamento humano. A psicanálise freudiana,

26
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

porém, tem grande influência nas teorias do desenvolvimento humano uma vez que
levantou diversas preocupações acerca da personalidade humana.

A psicanálise enfatizava as forças do inconsciente, os impulsos sexuais e de agressão


baseados em impulsos biológicos e os conflitos inevitáveis na infância. Eles eram
considerados os dirigentes e moldadores da nossa personalidade. (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002, p. 39)

Conforme Bee e Boyd (2011, p. 274) “A teoria psicanalítica também deu aos psicólogos
inúmeros conceitos úteis, tais como os mecanismos de defesa e a identificação, os
quais foram tão atualmente adotados e que se tornaram parte da linguagem e da teoria
cotidiana”. Desse modo podemos perceber que a teoria psicanalítica é vista como mais
uma forma de perceber a personalidade e pensar sobre o assunto, mas ainda teve
influência para a compreensão do desenvolvimento, embora não seja considerada
completa como uma teoria do desenvolvimento.

A teoria psicanalítica para a compreensão do desenvolvimento humano se divide na


teoria Psicossexual de Freud e na teoria Psicossocial de Erikson.

Teoria Psicossexual de Freud

Figura 3.

Fonte: <http://administracaonoblog.blogspot.com.br/2011/05/psicologia-sigmund-freud.html>

A teoria freudiana foi pensada por Sigmund Freud por meio das experiências de estudos
de casos e análise dos sonhos, além das lembranças de sua infância. Foi desenvolvida
concomitantemente ao trabalho de análise clínica de seus pacientes. Conforme ia
escrevendo e publicando artigos, Freud passou a ser reconhecido e seguido por
profissionais, os quais se reuniam a fim de aprender como desenvolver e utilizar essas
novas formulações em seus consultórios.

27
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

Freud elabora uma teoria que justifica as forças motivadoras que impulsionam
e determinam o comportamento humano. Para ele, essas forças, chamadas de
instintos, eram os elementos básicos da personalidade. Os instintos, de acordo com a
abordagem freudiana, nada mais eram do que a necessidade do corpo transformada
em um desejo.

Hall, Lindzey e Campbell (2000, p. 56) explicam que “o instinto é um quantum de


energia psíquica ou, como Freud colocou, ‘uma medida da exigência feita à mente para
trabalhar (1905a, p. 168)’”. Para uma melhor compreensão os autores continuam “a
meta do instinto é a remoção da excitação corporal”, ou seja, “a meta do instinto de
fome, por exemplo, é abolir a deficiência nutricional, o que conseguimos, evidentemente,
comendo o alimento”. Deste modo podemos concluir que o comportamento de uma
pessoa é acionado por estímulos internos que só terminam quando a ação acertada for
de remover ou diminuir a estimulação.

O comportamento é controlado por impulsos inconscientes, no caso das crianças suas


habilidades cognitivas se desenvolvem devido à necessidade de gratificação para sua
homeostase. Nesses estágios a criança estimula suas zonas erógenas em busca da
gratificação de suas necessidades básicas (vistas como sexuais). Freud revela que a cada
fase do desenvolvimento há um conflito que deve ser resolvido antes de a criança passar
para o próximo estágio, por exemplo, na fase oral. Quando o conflito não é resolvido, a
criança tende a fixar-se naquela fase do desenvolvimento, embora consiga passar para
os próximos estágios há um investimento de energia que ficou retido, por assim dizer,
na fase anterior. Schultz e Schultz (2002) nos explica que naquela época Freud chocou
o colegiado uma vez que tratou de chamar os impulsos infantis de impulsos sexuais, no
entanto, o mesmo se referia à motivação da criança em obter satisfação corporal por
meio de suas zonas erógenas que começavam da boca, em seguida mudavam para o
ânus, e por fim, para os genitais - tudo isso nos cinco primeiros anos de vida.

A partir da análise dos seus pacientes, Freud concluiu que os sintomas sem causa física
aparente, apresentados durante a análise, estavam ligados a perturbações emocionais,
situadas em experiências traumáticas reprimidas no período da primeira infância.
Essas experiências se traduziam em conflitos que se repetiam no decorrer de todo o
período de desenvolvimento. Para ele os conflitos eram uma forma com que a pessoa
lidava com os impulsos biológicos inatos ligados ao sexo e às exigências sociais. Para
nossa melhor compreensão, Papalia e Olds (2000) destacaram a afirmativa de Freud
de que os conflitos ocorrem invariavelmente em todo o período de vida, portanto são
repetições dos traumas obtidos nas experiências da primeira infância.

28
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Conforme Freud, o prazer muda de uma zona erógena do corpo à outra em algumas
fases da vida. Os cinco estágios do desenvolvimento da personalidade chamados de
Estágios Psicossexuais são:

1. Oral (do nascimento até 12 meses).

Aqui, a principal fonte de prazer são atividades ligadas à boca como mamar e
comer.

A boca é a principal zona erógena.

E o prazer é ligado à sucção.

2. Anal (1 a 3 anos).

A criança obtém gratificação sensual retendo ou expelindo fezes.

O treinamento dos hábitos de higiene resulta da forma de gratificação recebida


ao defecar.

3. Fálico (4 a 5 anos).

A criança apega-se ao genitor do sexo oposto e posteriormente identifica-se


ao genitor do mesmo sexo. A zona de gratificação transfere-se para a região
genital.

Fantasias incestuosas: complexo de édipo, ansiedade, desenvolvimento do


superego.

4. Latência (6 anos à puberdade).

Época de relativa calma entre os estágios mais turbulentos.

Período de sublimação do instinto sexual.

5. Genital (Adolescência à Idade Adulta).

Época do desenvolvimento sexual maduro.

Desenvolvimento da identidade do papel sexual e de relações sociais adultas.

Adaptado de Papalia e Olds (2002, p. 43); Schultz e Schultz (2002, p. 57).

A teoria de Freud certamente contribuiu e gerou grandes controvérsias no mundo


científico, seu método psicanalítico influenciou grandemente a psicoterapia moderna.
Entretanto, sua teoria é o resultado de observações limitadas no contexto histórico

29
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

social da época. O que vimos ainda, é que Freud elaborou suas teorias a partir do
desenvolvimento normal de uma gama de pacientes adultos neuróticos de classe
média alta em psicoterapia, o que nos faz observar que a falta dos fatores biológicos
e do entendimento da importância de se levar em conta os processos de maturação e
experiências precoces influenciaram como fatores limitantes de sua teoria.

Teoria Psicossocial de Erikson

Figura 4.

Fonte:<http://www.intropsych.com/ch11_personality/erikson.html>

Eric Erikson teve grande influência na psicanálise e na cultura de um modo geral nos
anos 30. Vindo da perspectiva freudiana, apresentou inovações sobre os estágios do
desenvolvimento. Segundo ele “A psicanálise é sempre o ponto de partida” (citado em
KENISTON, 1983, p. 29 apud SCHULTZ; SCHULTZ, 2002, p. 204). Percebemos em
seu trabalho que o ego ou “eu” é uma parte independente da personalidade, além do
reconhecimento que ele dá às influências culturais e históricas no desenvolvimento da
personalidade, e ainda, que a personalidade continua seu desenvolvimento numa série
de oito etapas durante toda a evolução da vida.

Erikson divide o crescimento da personalidade em oito estágios psicossociais. Os


quatro primeiros são semelhantes aos estágios oral, anal, fálico e de latência de Freud.
A principal diferença entre as teorias deles é que Erikson enfatizava os correlatos
psicossociais, enquanto Freud se concentrava nos fatores biológicos. (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002, p. 206)

Erikson trabalhou a partir do conceito de princípio epigenético da maturação, o que


leva em consideração as forças sociais e ambientais nas quais vivemos e que influenciam
a forma pelas quais as fases geneticamente predeterminadas se desenvolvem, ou
seja, os fatores biológicos e sociais ou as variáveis pessoais e situacionais acabam por
influenciar a forma como se desenvolve a personalidade.

30
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Erikson ainda sustentava a ideia de que as primeiras experiências da infância eram


responsáveis pelo modo permanente de se desenvolver a personalidade. Para ele,
o desenvolvimento do “eu” continua durante o decorrer da vida. Cada etapa desse
desenvolvimento, portanto, envolve uma crise de personalidade. Essas crises
aparecem conforme uma sequência de maturação e, portanto, para o desenvolvimento
saudável do ego necessitam ser resolvidas satisfatoriamente.

Cada confronto com o ambiente é denominado crise, a qual envolve uma mudança de
perspectiva que requer que reconcentremos a nossa energia instintiva de acordo com
as necessidades de cada estágio do ciclo de vida. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002, p. 207)

Podemos perceber, então, que a teoria de Erikson consegue sustentar a ideia de que
as influências culturais e sociais do desenvolvimento vão para além da adolescência e
isso fez com que sua teoria fosse aceita de maneira mais positiva dentro do contexto
desenvolvimental, uma vez que as fases do desenvolvimento psicossocial, mesmo
girando em torno de crises, possibilita o resultado positivo. Aqui, as experiências
psicossociais e não as forças biológicas instintivas são as determinantes do processo
do desenvolvimento. Embora as influências da infância sejam importantes, os
acontecimentos nas seguintes fases podem suprir as experiências mal adaptadas.

Alguns temas levantados pelo psicanalista Erikson são muito importantes e devem ser
discutidos por terem grande relação à sua explicação sobre as crises desenvolvimentais.
Erikson então explica que durante as fases do desenvolvimento nós passamos por várias
crises, são elas:

1. Confiança versus desconfiança ─ essa é uma crise da primeira


infância e se define com a necessidade que temos, como seres humanos,
de confiar no outro e no que estaria à nossa volta. No entanto, para passar
de maneira favorável pela crise é importante a existência de um certo
grau de desconfiança com a finalidade de proteção.

A força básica da esperança está associada a uma resposta bem-sucedida da crise na


fase oral sensorial. “Erikson escreveu essa força básica como uma crença de que os
nossos desejos serão satisfeitos. A esperança envolve um sentimento persistente
de confiança, um sentimento que iremos manter apesar dos revezes temporários”
(SCHULTZ; SCHULTZ 2002, p. 208, grifo do autor).

2. Autonomia versus dúvida e vergonha ─ ocorre por volta do segundo


e terceiro anos de vida na fase muscular-anal. É dado ao momento em
que a criança está desenvolvendo uma série de habilidades físicas e
mentais. A habilidade física motora de agarrar com as mãos é vista pelo

31
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

autor como de muita importância uma vez que o ato de segurar e largar
algo é usado como modelo ou um treino para a criança, em relação a
como reagir aos conflitos posteriores em forma de comportamentos e
atitudes. É no decorrer dessa etapa que a criança consegue estabelecer
algum grau de escolha e experimentar o poder da sua própria vontade,
mesmo dependente dos pais neste momento elas passam a se ver como
pessoas separadas e com algum grau de força em si mesmas.

A força básica da autonomia é a vontade, que envolve a determinação de exercer a


liberdade de escolha e auto limitação diante das demandas da sociedade. (SCHULTZ;
SCHULTZ 2002, p. 209, grifo do autor)

3. Iniciativa versus culpa ─ ocorre no estágio locomotor-genital entre os


3 e 5 anos de vida e pode ser comparada à fase fálica da teoria freudiana.
Nesse período do desenvolvimento das capacidades motoras e mental
a criança consegue expressar seus desejos e iniciativas para realização
de tarefas. Deste modo, a iniciativa se desenvolve gerando fantasias a
partir do desejo expressado pela mãe (no caso de meninos) e pelo pai
(no caso de meninas), ao que psicanaliticamente se compreende como o
estabelecimento de uma relação edipiana.

A força básica chamada objetivo surge da iniciativa. O objetivo envolve a coragem de


conceber e buscar metas. (SCHULTZ; SCHULTZ 2002, p. 209, grifo do autor)

4. Diligência versus inferioridade ─ ocorre dos 6 aos 11 anos e está


relacionada ao período de latência de Freud. É quando a criança é
submetida a novas experiências e influências sociais, neste momento
ela aprende hábitos novos de trabalho e estudo, é o que Erikson rotulou
“diligência”. Essas atividades para as crianças passam a ser uma forma de
conseguir elogios e obter satisfação por meio da realização bem-sucedida
das tarefas. Importante destacar que a atitude dos pais, cuidadores
ou professores irá influenciar no modo como as crianças perceberão o
resultado de suas próprias atividades. As opiniões omitidas acerca de
suas habilidades direcionarão a criança no modo a perceber sua própria
competência, se repreendida provavelmente irá desenvolver sentimento
de inferioridade e inadequação, e se elogiada provavelmente obterá
sensações positivas que reforçarão e incentivarão a sua competência e o
seu desenvolvimento constante.

32
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

A força básica que surge da diligência durante a etapa de latência é a competência.


Ela envolve o exercício da habilidade e da inteligência na busca e conclusão de tarefas.
(SCHULTZ; SCHULTZ 2002, p. 209, grifo do autor)

5. Coesão da identidade versus confusão de papéis: a crise de


identidade ─ ocorre entre os 12 e 18 anos, fase do desenvolvimento em
que se exige resoluções a respeito da própria identidade ou formação
do ego. É nesta fase que o adolescente tenta construir uma identidade
apropriada, que reflita suas ideias o modo como se vê e o modo como
querem que o vejam. O adolescente que tem experiências positivas dentro
dessa fase sai deste processo preparado para idade adulta.

A força básica que deveria se desenvolver durante a adolescência é a fidelidade, que


surge de uma identidade do ego coesa e engloba sinceridade, genuinidade e um senso
de dever nos nossos relacionamentos com a outra pessoa. (SCHULTZ; SCHULTZ 2002,
p. 212, grifo do autor)

6. Intimidade versus isolamento ─ momento considerado prolongado


se comparado com as fases anteriores, uma vez que vai do fim da
adolescência até aproximadamente 35 anos. Neste caso várias relações
sociais estão em jogo, os relacionamentos envolvem diversos tipos de
emoções que devem ser expressadas. A sensação de isolamento se dá
com aqueles que apresentam maior dificuldade em estabelecer essas
intimidades na vida adulta, nesses casos a pessoa pode evitar relações
sociais ou reagir nos relacionamentos com expressões de sentimentos
mal adaptados, com agressividade, por exemplo, como modo de defesa
contra a ameaça a sua identidade.

A força básica que surge da intimidade do início da fase adulta é o amor, que Erikson
considerava a maior virtude humana. Ele o descreveu como uma devoção mútua numa
identidade compartilhada, a fusão de uma pessoa com outra. (SCHULTZ; SCHULTZ
2002, p. 212, grifo do autor)

7. Preocupação com as próximas gerações versus estagnação ─


ocorre na idade adulta dos 35 aos 55 anos, está relacionada à fase de
maturidade quando relacionado à fase de ensino e orientação da próxima
geração. Essa fase é mais ampla do que a necessidade de estabelecer
ensinamentos no meio familiar, aqui há uma preocupação com as
gerações futuras dentro da sociedade. Essa satisfação não se obtém por
meio dos ensinamentos dos filhos, mas sim, através da característica de
se preocupar com as gerações futuras.

33
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

O cuidar é a força básica que surge da preocupação com as próximas gerações na fase
adulta; Erikson definiu-o como uma preocupação ampla pelos outros e dizia que ele se
manifestava na necessidade de ensinar, não só para ajudar os outros, mas também para
formar a própria identidade. (SCHULTZ; SCHULTZ 2002, p. 213, grifo do autor)

8. Integridade do ego versus desespero ─ geralmente ocorre na fase


final do desenvolvimento psicossocial quando na velhice nos deparamos
com uma escolha entre a integridade do ego e o desespero. Nessa fase
há uma reflexão acerca dos esforços realizados ao longo da vida, deste
modo a visão que se tem da realização pessoal irá influenciar no resultado
dessa fase.

A força básica associada a essa fase final do desenvolvimento é a sabedoria, que,


derivada da integridade do ego, é expressa na preocupação desprendida com o todo
da vida. Ela é transmitida às próximas gerações numa integração de experiências que
é melhor descrita pela palavra “herança”. (SCHULTZ; SCHULTZ 2002, p. 213 grifo do
autor)

Para Erikson as crises se instalam de acordo com uma sequência de maturação que podem
ser resolvidas de modo satisfatório, no intuito de alcançar um desenvolvimento favorável
do ego. Após cada crise, com um nível positivo de resolução, há o desenvolvimento do
que ele chamou de “virtude”, que seria essa força particular do ego.

Nas primeiras fases da infância o resultado depende da relação com o meio uma vez que
há grande influência dessa relação criança x meio-social (comportamento do adulto,
atenção voltada à criança, estimulação etc.) nos resultados.

Já nas últimas fases do desenvolvimento há mais controle sobre o meio social em que
estamos inseridos, o adulto já não é mais completamente influenciado. No entanto, é
importante frisar que essas escolhas relacionadas ao meio social serão influenciadas
pelas características do ego, resultantes do modo como se resolveram as crises passadas.

A partir deste apanhado podemos encerrar com a seguinte compreensão da teoria


psicossocial: que em um desenvolvimento equilibrado tanto as respostas positivas
quanto as negativas fizeram parte da construção do desenvolvimento do eu. Quando
apenas um tipo de resolução seja ela positiva ou negativa estão presente significa dizer
que houve um mau desenvolvimento, “situação que ocorre quando o ego é composto
apenas de uma única maneira de lidar com os conflitos”. (SCHULTZ; SCHULTZ 2002,
p. 214)

34
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Perspectivas das Teorias Cognitivas

Essa perspectiva aponta para a importância das mudanças qualitativas nos processos
de pensamento e no comportamento, refletindo às mudanças do desenvolvimento.
Aqui as pessoas são seres ativos que participam do seu processo de mudança
e se desenvolvem a partir dos seus próprios impulsos e padrões internos de
desenvolvimento. A pessoa é vista como agente de construção do seu mundo, por isso
essa abordagem concentra-se no modo pelos quais esse ser ativo passa a conhecer o
seu ambiente, assim sendo, o enfoque está no modo como ele percebe, avalia, aprende,
pensa, decide, e soluciona problemas.

Os psicólogos cognitivos estão interessados na atividade mental humana, e


especificamente em três dimensões dela: processamento de informação, representação
e autoconsciência. (MANDLER, 1985 apud, FRANÇOIS, 2008, p.23)

Teoria George Kelly

Figura 5.

Fonte: <http://webspace.ship.edu/cgboer/kelly.html>

A teoria de Kelly não foi muito aceita pelo movimento cognitivo contemporâneo. A
psicologia norte-americana não reconhecia o trabalho de Kelly e criticava em seu
pensamento a falta de reconhecimento dos conceitos familiares relacionados à emoção
e motivação, também por apontar sempre os aspectos racionais do funcionamento
humano em detrimento dos aspectos emocionais, além de não ter boa representatividade
de pessoas avaliadas em suas amostras. (BOEREE, 1997)

Essa teoria se fundamentava numa abordagem clínica e trabalhava com os constructos


conscientes, sendo estes o meio pelo qual a pessoa organizava a sua vida. Por
constructos pessoais o autor entendia como sendo uma maneira particular da pessoa
enxergar a vida, seria uma hipótese intelectual construída para explicar, justificar e
interpretar os eventos. Deste modo o comportamento era baseado nesses constructos
pessoais que resultariam numa avaliação, esta, por sua vez, antecedia a ação, ou seja,

35
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

o comportamento. Essa hipótese justificava que ao longo da vida muitos constructos


eram desenvolvidos em diferentes tipos de situação ou para diversos tipos de pessoas.
O ponto central de sua teoria está no pensamento de que se os constructos fossem
fixos e inalterados ─ assim como sugeriam os teóricos antecessores, que afirmavam o
desenvolvimento do “eu” a partir das influências da infância ─ não seríamos capazes de
lidar com novas situações. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002)

A teoria apontava para uma visão do sujeito como ser racional que elabora constructos a
partir de sua percepção do mundo. Para ele os eventos passados não eram determinantes
do comportamento atual. A sua visão, portanto, constrói a ideia do homem como um
ser com capacidade individual: de livre-arbítrio, de escolha e direção dos seus atos ao
longo da vida, de mudança conforme a necessidade, para revisar os constructos antigos
e formar novos constructos.

Dentro desse apanhado teórico é possível observar que, embora não haja uma
fundamentação acerca do papel da hereditariedade, há um pensamento de que a
pessoa não é totalmente determinada por influências ambientais. Então, o processo de
desenvolvimento individual se dá por meio de constructos baseados na interpretação
dos eventos e, portanto, é a operação desses processos mentais racionais, e não os
eventos propriamente ditos, que influenciam a formação do “eu”.

Teoria de Jean Piaget

Figura 6.

Fonte: <https://blogdaformacao.wordpress.com/tag/jean-piaget/>

Piaget foi um ícone para a teoria cognitivo-comportamental e influenciou com seus


pensamentos gerações de psicólogos do desenvolvimento. Seus estudos se deram a
partir da observação e do convívio com seus filhos e outras crianças. A diferença de suas
ideias estava no pensamento de que as crianças não eram moldadas pelo ambiente; para
ele, a criança está em constante busca de compreensão do seu ambiente. O resultado foi

36
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

uma teoria do desenvolvimento cognitivo que enfocava a capacidade crescente do ser


humano em adquirir e se utilizar do conhecimento obtido por meio de suas experiências
com o meio.

O núcleo do comportamento inteligente é uma capacidade inata de adaptar-se


ao ambiente. Usando suas capacidades sensoriais, motoras e reflexas, as crianças
desenvolvem uma ideia mais precisa de seu mundo. (PAPALIA; OLDS 2002, p. 48)

A ideia central desta teoria diz respeito ao modo de adaptação do homem ao meio
ambiente, sendo este um processo ativo do desenvolvimento em que uma pessoa lida
com novas informações. Para uma maior compreensão sobre o processo de adaptação
Piaget discorre sobre três aspectos fundamentais:

1. Assimilação

Por assimilação compreendemos o modo de receber uma informação, incorporá-la em


estruturas cognitivas existentes ou formas de pensar.

Parte do processo de adaptação proposto por Piaget, que envolve a absorção de novas
experiências ou informações, são os esquemas existentes. Entretanto, a experiência não
é assimilada “como é”, mas é um pouco modificada, ou interpretada, a fim de se ajustar
aos esquemas preexistentes. (BEE; BOYD 2011, p.473)

2. Acomodação

É quando há alguma mudança no estilo, ou melhor, nas ideias ou estruturas cognitivas


a fim de incluir novos conhecimentos.

É a parte do processo de adaptação proposto por Piaget pela qual uma pessoa modifica
esquemas existentes como resultado de novas experiências ou cria novos esquemas
quando os antigos não mais administram os dados. (BEE; BOYD 2011, p.473)

3. Equilibração

Por equilibração entende-se uma necessidade de equilíbrio por parte da criança, quando
diante da necessidade de mudança requerida no processo de assimilação e acomodação.
Ocorre na dificuldade da criança em lidar com as novas experiências a partir das
estruturas mentais existentes e então surge uma nova necessidade de organizar outros
padrões mentais e obter o equilíbrio. A equilibração ocorre entre a criança, o mundo
exterior e as suas próprias estruturas cognitivas.

37
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

A terceira parte do processo de adaptação proposto por Piaget, envolvendo uma


reestruturação periódica de esquemas para criar um equilíbrio entre assimilação e
acomodação. (BEE; BOYD 2011, p. 475)

A organização cognitiva, presente nos sistemas de conhecimento, vai se desenvolvendo


e tornando-se cada vez mais complexa a partir do nascimento. Neste sentido, para
Piaget, o conhecimento vai se organizando por meio das representações mentais que
se formam pelo ambiente externo, sendo esse o fator responsável pelo qual a pessoa dá
sentido ao mundo.

Esses esquemas que vão se desenvolvendo desde bebê são diferentes e vão gradativamente
se modificando e transformando-se em novos esquemas, estes vão sendo integrados à
medida que a criança adquire informações, e, por isso, os esquemas tornam-se cada vez
mais complexos. Deste modo, o que vimos como assimilação e acomodação trabalham
juntos para gerar o crescimento cognitivo enquanto a equilibração é a constante busca
de equilíbrio entre a criança, o seu mundo exterior e suas próprias estruturas cognitivas.

Figura 7.

Fonte: <http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/2015/11/livro-neuropsicopedagogia-clinica.html>.
Acessado em: Nov, 2015.

Ao explicar sua teoria do desenvolvimento, ele afirmou que o ambiente social e físico
afetavam somente quando ocorrem eventos específicos marcantes.

38
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Por pensar nessas regularidades do pensamento no desenvolvimento das crianças


ele elaborou uma teoria do desenvolvimento que apontava para as ações destas em
seu ambiente, e sugeria que as mudanças no pensamento e comportamento estavam
relacionadas à idade e que seria esse o fator que explica as mudanças em outras áreas.

Com a teoria de que o comportamento inteligente era uma capacidade inata


de adaptar-se ao ambiente, Piaget desenvolve uma ideia mais precisa sobre o
desenvolvimento cognitivo, a partir de uma série de estágios. De modo que cada
estágio era uma etapa do desenvolvimento, ele justificou que a criança mudava
qualitativamente no pensamento ou comportamento; para ele a criança desenvolve
uma nova maneira de pensar e responder aos estímulos do ambiente passando por
essas fases ou estágios:

Quadro 2. Estágios de desenvolvimento cognitivo de Piaget.

ESTÁGIO IDADE APROXIMADA CAPACIDADES


Sensório-motor 0 a 2 anos Conhecimento do mundo baseado nos sentidos e
habilidades motoras. No final do período, emprega
representações mentais.
Pensamento pré-operatório 2 a 6 anos Uso de símbolos, palavras, números para
representar aspectos do mundo. Relaciona-se
apenas por meio de sua perspectiva individual. O
mundo é fruto da percepção imediata.
Pensamento operatório-concreto 7 a 11 anos Aplicação de operações lógicas a experiências
centradas no aqui e agora, início da verificação
das operações mentais, revertendo-as e
atendendo a mais de um aspecto.
Pensamento operatório-formal Adolescência em diante Pensamento abstrato, especulação sobre situações
hipotéticas, raciocínio dedutivo. Planejamento,
imaginação.
Fonte: Adaptado <http://pepsic.bvsalud.org/img/revistas/psicoped/v23n71/71a11t02.gif>. Acessado em: 10 Nov, 20015.

Sua proposição era de que todas as crianças passavam por uma mesma sequência fixa
de estágios no desenvolvimento do pensamento.

Algo bastante interessante na teoria de Piaget era sua concepção de fixação dos estágios,
portanto para melhor explorar esse aspecto iremos falar do brincar. Para o autor no ato
da brincadeira, quando as crianças estão desempenhando as funções necessárias àquela
brincadeira, elas estão estabilizando em seu esquema mental as tarefas, de modo que
com a repetição e o avanço para brincadeiras mais exigentes a nível mental, elas possam
estar com a informação já disponível e consequentemente progredir no aprendizado a
partir do próximo estágio.

Brincar envolve preponderância da assimilação porque, durante o brincar, objetos e


situações são continuamente assimilados. Assim, quando a criança brinca de cavalo –
nos termos de Piaget, quando o esquema de “andar a cavalo” está ativo –, uma cadeira se

39
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

torna um cavalo tão facilmente quanto um urso de pelúcia ou o cachorro da casa. Esses
objetos são assimilados ao esquema “andar a cavalo”; a criança não precisa mudar (isso
é, não precisa se acomodar) as características da cadeira, do cachorro ou do ursinho e
brinquedo. (LEFRANÇOIS, 2008, p. 247)

Teoria de Vygotsky

Figura 8.

Fonte: <http://www.education.com/reference/article/vygotsky-lev-semenovich-1896-1934/>

Considerado como um psicólogo cognitivo-desenvolvimental, Vygotsky relacionava as


atividades mentais superiores como de grande influência para a cognição e o processo
educativo. Para ele o pensamento da criança, em suas formas complexas, se desenvolvia
graças à interação social com os adultos, que têm fundamental importância no processo
de aprendizado das crianças, uma vez que dirigem e organizam esse aprendizado para
que elas possam internalizá-los. Importante, pois, ressaltar sobre os pensamentos de
Vygotsky é que não apenas a cultura é tida como centro de sua teoria sociocultural,
mas ainda a linguagem (processo que nos distinguem dos animais) e as relações
educador e educando fazem com que possamos compreender a série de raciocínios
apresentados acerca dos processos do desenvolvimento cognitivo.

A importância da cultura na teoria de Vygostky é realçada pela distinção que ele faz
entre funções mentais elementares e funções mentais superiores. As funções
elementares são nossas tendências e comportamentos naturais, não aprendidos,
evidentes na capacidade do recém-nascido de sugar, balbuciar e chorar. Durante o
desenvolvimento, e principalmente por causa da interação social – ou seja, da interação
com a cultura. As funções mentais elementares se transformam em funções
mentais superiores. As funções mentais superiores incluem todas as atividades
que consideramos pensamento, como a resolução de problemas e a imaginação.
(LEFRANÇOIS, 2008. p, 266)

40
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Vygotsky entende que por meio da linguagem (sendo essa a intenção de se comunicar) é
possível desenvolver o funcionamento mental superior, ou seja, o pensamento. A partir
daí ele acredita que sem a linguagem a inteligência da criança não se desenvolve, por
isso que a interação verbal entre criança e adulto é importante, uma vez que se torna
fundamental para o desenvolvimento cognitivo, pois é por meio dessas interações que
a linguagem se desenvolve e como consequência o pensamento lógico.

Dentro da concepção teórica de Vygostky a relação que envolve ensino-aprendizagem


estabelecida entre crianças e adultos é representada pela zona de desenvolvimento
proximal do desenvolvimento psicológico. Nesta fase do desenvolvimento psicológico
a criança desenvolve a percepção de que algumas tarefas só são possíveis de realizar
quando com a ajuda de um adulto, ao que pesquisadores chamaram de “andaimes”,
referindo-se ao apoio temporário em que pais, professores ou irmãos mais velhos
oferecem ajuda à criança para a realização da tarefa (WOOD, 1980; WOOD, BRUNER;
ROSS, 1976 apud PAPALIA; OLDS, 2002). Então, baseado nesse pensamento, que
Vygotsky sugeriu ─ para essa nova fase da aprendizagem da criança ─ o nome de Zona
de Desenvolvimento Proximal (ZDP). A zona de desenvolvimento proximal está
relacionada à tarefa em que a criança quase pode realizar, mas ainda não totalmente
por si mesma. No entanto, dado um certo tipo de instrução, ela consegue realizar com
sucesso. Essa fase do desenvolvimento está em constante modificação e inclui uma
gama cada vez maior de atividades complexas. Algo importante de se destacar aqui é
que o autor acreditava que esse processo interativo era possível por meio da linguagem
usada pelo adulto para orientar e descrever a tarefa para a criança, fazendo com que
ela pudesse se utilizar desta mesma linguagem e orientar suas tentativas individuais
futuras; ficando cada vez mais livres de instruções dos adultos e adquirindo um
repertório maior de possibilidades de respostas comportamentais.

Os Estágios do Desenvolvimento da Linguagem de Vygostky.

Quadro 3.

ESTÁGIOS IDADE APROXIMADA FUNÇÃO


Controle do comportamento dos outros; expressão
Social Até os 3 anos
de pensamentos e emoções simples.
Controle do comportamento da própria criança,
Egocêntrico De 3 a 7 anos
mas é frequentemente falado em voz alta.
Silencioso, fala para si mesmo; torna possível
dirigir o pensamento e o comportamento;
Interno De 7 anos em diante
envolvido em todo o funcionamento mental
superior.
Fonte: Lefrançois, 2008, p. 268.

41
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

A teoria de Vygotsky sugere que a cultura ou um grupo dentro de uma cultura pode
diferenciar no desenvolvimento das crianças de outras sociedades ou grupos.

Toda função no desenvolvimento cultural da criança aparece duas vezes: primeiro, no


nível social, e depois, no nível individual; primeiro, entre as pessoas (interpsicológico)
e em seguida dentro da criança (intrapsicológico). (VYGOTSKY, 1978. p. 57 apud
DANIELS; HARRY p. 117).

Perspectivas das teorias da aprendizagem

A teoria da aprendizagem está relacionada às mudanças no comportamento humano


que resultam da experiência, e por isso, podemos dizer que aprendizagem do ponto
de vista psicológico tem como ponto de referência as observações e mudanças no
comportamento humano.

As teorias da aprendizagem (ou teorias comportamentais) resultam das tentativas


feitas pela psicologia de organizar observações, hipóteses, palpites, leis, princípios
e conjecturas feitos acerca do comportamento humano (...), elas foram ganhando
complexidade devido às novas descobertas e à constatação de que não eram abrangentes.
Ainda assim, as primeiras teorias continuam a exercer forte influência sobre as teorias
e a pesquisa contemporâneas. (LEFRANÇOIS, 2008. p. 22).

A perspectiva teórica da aprendizagem demonstra interesse pelo comportamento


observável que pode ser estudado objetivamente, ao contrário da teoria psicanalítica
que se baseava pelas forças inconscientes. Nesta teoria, o desenvolvimento, que resulta
da aprendizagem a partir da mudança do comportamento, se dá pelas experiências
ou processos adaptativos com o meio ambiente. Aqui o aprendizado é contínuo e o
desenvolvimento quantitativo, ou seja, há um acréscimo na quantidade de informações
processadas pela interação com o meio ambiente. Iremos neste ponto abordar a teoria
comportamental ou behaviorista e a teoria da aprendizagem social ou sociocognitiva.

Teoria Comportamental – Behaviorismo

John B. Watson fundou o comportamentalismo com suas ideias contemporâneas sobre


cientificidade, para ele os psicólogos necessitavam utilizar-se de métodos objetivos,
estudar os comportamentos observáveis, uma vez que defendiam uma psicologia
experimental que se baseava em pesquisas e quantificação de variáveis de estímulo e
resposta. Para ele não havia possibilidade de se fazer ciência a partir de um modelo em
que forças conscientes ou inconscientes, que não poderiam ser observadas, manipuladas
ou medidas, eram as principais variáveis.

42
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

O comportamentalismo de Watson vislumbrava uma psicologia que usava métodos


objetivos de comportamentos observáveis a partir das respostas e estímulos externos
das pessoas submetidas a experimentos.

Segundo Davidoff (2001, p. 12) os behavioristas acreditavam nas seguintes premissas:

1. Os psicólogos devem estudar os eventos ambientais (estímulos) e os


comportamentos observáveis (respostas). Aprender pela experiência
é a principal influência sobre o comportamento e um tópico central de
investigação.

2. A introspecção deve ser substituída por métodos objetivos


(experimentação, observação).

3. O comportamento de animais não humanos deve ser investigado


paralelamente ao comportamento humano porque os organismos simples
são mais fáceis de estudar e entender do que os complexos.

4. Os psicólogos devem voltar-se para os objetivos científicos: descrição,


explicação, predição e controle. Devem também desempenhar tarefas
práticas como aconselhamento de parentes, legisladores, educadores e
homens de negócios.

As teorias de estímulo e resposta apresentadas por Pavlov, fisiólogo Russo que estudava
experimentos em cães, foi utilizada por Watson com crianças. Mais tarde, outro grande
estudioso da prospectiva behaviorista chamado B. F. Skinner, a partir das ideias de
Watson, deu início à aplicação de técnicas de modificação do comportamento. Embora
não negasse a existência de forças internas, ele ressaltava a sua falta de utilidade para
o método científico uma vez que o seu interesse estava nas respostas comportamentais
aos estímulos e não nas experiências da infância ou sentimentos do adulto.

A abordagem skinneriana do comportamento, conceitualmente simples, é fundamentada


em milhares de horas de pesquisa bem controlada. Sua ideia fundamental é que o
comportamento pode ser controlado por suas consequências, ou seja, pelo que o
acompanha. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002. p, 365)

A teoria behaviorista trata de pesquisar dois tipos de aprendizagem chamados


condicionamento clássico e condicionamento operante. Para o condicionamento clássico
destacava-se que um animal ou pessoa aprende alguma resposta a um estímulo que
originalmente não denotava nenhum tipo de resposta, no entanto depois da repetição
desse estímulo a resposta passa a ser associada a ele e se apresenta como sendo um
comportamento condicionado clássico.

43
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

O condicionamento operante é um tipo de aprendizagem que se dá quando um indivíduo


aprende a partir das consequências de “operar” no ambiente. Foi o próprio Skinner
quem desenvolveu os princípios básicos do condicionamento operante baseando-se
em trabalhos realizados com ratos e pombos. O estudioso afirmava que os mesmos
princípios poderiam ser aplicados aos seres humanos, compreendia ainda que o
organismo tende a repetir uma resposta reforçada e a eliminar uma resposta que foi
castigada. O reforço nada mais é que a consequência do comportamento que induz ao
aumento da probabilidade de repetição deste comportamento. Já o castigo ou punição
é uma consequência do comportamento que induz à diminuição da probabilidade de
repetição deste comportamento.

Figura 9.

O pai reclama do filho até que cumpra uma tarefa: ao cumpri-la, o filho escapa às
reclamações (reforçando o comportamento do pai). Um professor ameaça seus alunos
de castigos corporais ou de reprovação, até que resolvam prestar atenção à aula; se
obedecerem estarão afastando a ameaça de castigo (e reforçam seu emprego pelo
professor). De uma ou outra forma, o controle adverso intencional é o padrão de quase
todo o ajustamento social ─ na ética, na religião, no governo, na economia, na educação,
na psicoterapia e na vida familiar (SKINNER, 1974, pp. 26-27)

Reforço ainda pode ser positivo, se oferece uma recompensa, e negativo, se removido
algo que a pessoa não gosta (que causa aversão). A diferença entre castigo e reforço
negativo é que o castigo elimina um comportamento trazendo um evento aversivo
ou retirando um evento positivo, já o reforço negativo estimula a repetição de um
comportamento removendo o evento aversivo.

Uma resposta, quando deixa de ser reforçada, com o tempo retorna ao seu nível básico,
ou seja, original, a isso chamamos extinção. Outra técnica utilizada para trazer resposta
de reforço é a modelação, esta técnica é utilizada para alcançar uma nova resposta,
reforçando respostas dadas e que são cada vez mais semelhantes à resposta desejada.

A modelação ainda é vista como uma modificação comportamental, uma forma de


condicionamento operante frequentemente utilizada para eliminar um comportamento

44
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

indesejável ou produzir comportamento positivo, como obedecer a regras em sala de


aula. (PAPALIA; OLDS, 2000, p. 45)

Exemplos de condicionamento operante

Se um aluno tiver boas notas recebe um elogio.

*Apresentação de um estímulo agradável após um comportamento desejado. (Reforço


Positivo)

Figura 10.

Se a criança faz birra leva uma repreensão.

*Apresentação de uma consequência desagradável após a


realização de um comportamento não desejado (Punição
Positiva).

Fonte: <http://3.bp.blogspot.com/-6w2bAVyLxVw/T85C-vnifZI/AAAAAAAAADA/6-m-7UPtjKU/s1600/cx>

Figura 11.

Se o doente tomar seus comprimidos deixará de sentir


dores.

*Remoção de um evento desagradável após o


comportamento desejado (Reforço Negativo).

Fonte: <http://2.bp.blogspot.com/-bKNCz39OXzk/T85DLmEfllI/AAAAAAAAADI/9kEKIfiwRNQ/s1600/underwaterkite.jpg>

Figura 12.

Se a criança desobedecer aos pais ficará sem assistir


televisão por uma semana.

* Remoção de um evento agradável após a realização de


um comportamento não desejado (Punição Negativa).
Fonte: <http://4.bp.blogspot.com/-4wgVE_pV4gU/T85DWCoY8HI/AAAAAAAAADQ/iVEzs59V6K8/s1600/crianca-vendo-tv.jpg>

Postado por Daniele Machado Pires

Fonte: <http://motivacaocivil.blogspot.com.br/p/condicionamento-operante.html.>
Acesado em: 15 novembro de 2015.

45
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

Curiosidade!

O trabalho de Skinner teve amplas aplicações práticas. Técnicas terapêuticas originadas


a partir de suas pesquisas têm sido aplicadas em ambientes clínicos para tratar uma
variedade de distúrbios que incluem psicose, retardamento mental e autismo. Suas
técnicas de modificação do comportamento são empregadas em escolas, negócios,
instituições correcionais e hospitais. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002, p. 363)

A análise do teórico sobre avaliação do comportamento é chamada de análise


funcional e envolve três aspectos do comportamento, sendo: a frequência do
comportamento, a situação na qual ele ocorre e o reforço associado a ele.

Análise funcional é a abordagem do estudo do comportamento que envolve


avaliar a frequência de um comportamento, a situação na qual ele ocorre e os
reforçadores associados a ele. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002, p. 377)

Para mensurar o comportamento é preciso ater-se às reações fisiológicas que


estão ligadas ao batimento cardíaco, tensão muscular e ondas cerebrais. Os
efeitos fisiológicos resultantes dos estímulos são usados geralmente para
confirmar a importância da informação obtida por outros métodos avaliativos.
Independente da técnica avaliativa utilizada para verificar o comportamento
em diferentes situações de estímulo, o que permanece é o foco na resposta
que a pessoa dá, ou seja, o que as pessoas fazem ou como elas reagem, e não a
motivação que elas tiveram para fazê-lo ou para reagir.

Skinner avalia o comportamento e não a personalidade através da análise


funcional afim de identificar a frequência do comportamento, a situação na
qual ele eu corria e os reforçadores associados a ele. Sua avaliação se dava a
partir da observação direta, do autor relata e das medidas fisiológicas. Sendo
assim suas pesquisas foram ideográficas, ou seja, para obter resultados válidos
ele acreditava em uma análise estatística a partir de dados coletados suficientes
de um único avaliado sob condição experimental bem controlada. Embora
tivesse uma considerável base empírica sua abordagem é criticada pelo seu
determinismo, simplicidade das situações experimentais, além de demonstrar
desinteresse pelas qualidades humanas.

Teoria da aprendizagem social – sociocognitiva

Baseada na abordagem comportamentalista, a teoria da aprendizagem social


concentra-se em comportamentos sociais obtidos a partir da observação e imitação
dos modelos. Assim como Skinner, o psicólogo estudioso dessa abordagem, Albert

46
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Bandura, concentrou-se nos comportamentos manifestos e não nos traços, impulsos,


necessidades e mecanismos de defesa, no entanto não descartou as variáveis cognitivas
presentes no processo estímulo e resposta.

Dentro da perspectiva da aprendizagem social Bandura dá destaque à relação criança


e ambiente, para ele o comportamento humano é proveniente de um aprendizado
que se forma dentro de relações do que se aprende no contexto social. Deste modo
a aprendizagem é vista como um processo complexo que não se explica pelo
condicionamento, daí a importância da cognição. Por aplicar técnicas de modificação
do comportamento na área clínica utilizando variáveis cognitivas a abordagem também
foi denominada “comportamental cognitiva”.

Aprendizagem social pode significar toda aprendizagem que ocorre como resultado
da interação social, ou que, de alguma forma, envolva interação social. (SALOMON;
PERKINS, 1998 apud, LEFRANÇOIS, 2008, p. 373, grifo do autor).

Os principais agentes de socialização são as instituições: família, escola, igreja,


parquinhos, meios de comunicação etc. Essas instituições transmitem às crianças
costumes, valores, hábitos, crenças e outros aspectos exteriores que definem as culturas
humanas. (p. 374)

A ideia básica de Bandura está na ocorrência da aprendizagem a partir da observação


ou imitação, de modo que o comportamento possa ser influenciado, por algum tipo
de reforço sim, no entanto, não sendo o reforço um limitador para a aprendizagem.
Ou seja, aprendizagem pode ser observacional, chamada ainda de aprendizagem
por modelação, quando a partir da observação do comportamento de outras pessoas
(modelos) adquirimos novas respostas. E ainda, aprendizagem pode se dar por meio do
reforço vicariante, que é o aprendizado a partir do fortalecimento do comportamento
realizado por outros e das consequências desse comportamento. O que quer dizer que
em vez de experimentar a consequência desse comportamento aprenderemos a partir
da observação dessa consequência no comportamento do outro.

Por reforço e modelação, as crianças aprendem não apenas comportamento manifesto,


mas também ideias, expectativas, padrões internos e autoconceitos. A criança aprende
padrões para seu próprio comportamento expectativas sobre o que ela pode não pode
fazer – autoeficácia. (BEE; BOYD, 2011, p. 267, grifo do autor)

É dentro desse desenvolvimento em contato com um conjunto de agentes favorecedores


ao mesmo, como o autorreforço, por exemplo, que a pessoa vai por si só, colaborando
participativamente do seu processo. Uma vez que administra por si própria recompensas
e punições, que está apta a discernir sobre suas atitudes e integrá-las aos princípios

47
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

éticos e morais do seu modelo social, superar ou frustrar suas expectativas e desafiar-
se a construir novos padrões de comportamentos, está demonstrando um crescente
desenvolvimento.

Para sua melhor compreensão vamos conceituar autorreforço e autoeficácia conforme


Bee e Boyd (2011), Schultz e Schultz (2002), Lefrançois (2008), pensemos então,
autorreforço como um processo tão importante quanto o reforço aplicado pelos outros,
pois é um modo de recompensa ou punição que crianças mais velhas ou adultos podem
utilizar a fim de melhorar os padrões internos de desempenho, neste caso podem ser
tangíveis (a compra de um novo automóvel) ou intangíveis (satisfação por uma tarefa
bem realizada). O conjunto de padrões internos, que serão utilizados como modelos
de comparação, é adquirido a partir do comportamento de modelos, geralmente pais
e professores. Já a autoeficácia está relacionada ao julgamento que fazemos sobre o
quanto somos eficazes, o como nos sentimos adequados e competentes para lidarmos
com a vida, e que são regulados pelo nosso padrão de desempenho.

Algo importante de se destacar em sua visão é que não há um processo imitativo


automático dos comportamentos observados, em vez disso, há uma decisão consciente
do comportamento que se irá realizar, o que implica na mediação dos processos
cognitivos dentro dessa ideia de aprendizagem. Para o autor as pessoas são agentes
de suas ações elas não se estão submissas às experiências vivenciadas, seu sistema
sensorial, motor e cerebral são tidos como ferramentas para a realização de tarefas e
objetivos que direcionam, dão sentido e complementam suas vidas.

Para compreender melhor o processo de aprendizagem por observação, que foi


visivelmente influenciado pelos princípios do condicionamento, iremos destacar os
seguintes processos envolvidos.

Processo de atenção
Este processo está relacionado ao modo como distinguimos luz ou damos atenção aos
comportamentos, uma vez que nem todo comportamento nos será útil nesse processo.
Destacar que estar atento ou não é um comportamento modelo que depende muito do
valor que damos a esse comportamento, depende ainda do quanto o comportamento é
nítido e útil.

João tem de 25 anos e viu sua mãe preparar omeletes para o café da manhã quase
todas as manhãs até o dia de hoje, no entanto no dia em que sua mãe precisou que ele
preparasse o café da manhã para sua irmã ele não soube como preparar as omeletes.
Apesar de ser sua comida preferida e de ter visto sua mãe prepará-la repetidas vezes,
o comportamento de sua mãe de fazer omeletes não teve alto valor para João, fazendo
com que ele nunca aprendesse a prepará-la.

48
DESENVOLVIMENTO HUMANO │ UNIDADE I

Processo de retenção
Neste modelo o observador precisa voltar sua atenção e ser capaz de guardar a
informação daquilo que observou. Neste caso dois processos de representação estão
sendo utilizados pelo observador, os quais são o visual e/ou o verbal.

João para aprender a preparar omeletes deve ser capaz de verbalizar a sequência das
ações - acenda o fogão, coloque a manteiga na frigideira, quebre os ovos dentro de uma
vasilha separadamente, bata levemente com um garfo, despeje sobre a panela com a
manteiga derretida e aguarde alguns minutos, com uma espátula vire o lado da omelete,
retire do fogo e desligue o fogo. (Representação verbal)

Processo de reprodução motora


Visa transformar ações imaginadas em comportamentos concretos, no entanto são
necessárias capacidades motoras e físicas, ou ainda capacidades verbais e intelectuais.

A mãe de João pode demonstrar várias vezes como preparar uma omelete, mas se João
não tiver nenhuma habilidade motora para quebrar e bater os ovos não compreenderá
a sequência das ações e não imitará corretamente sua mãe nesse processo, e ainda se
não conseguir avaliar e corrigir o seu desempenho, João não conseguirá imitar o seu
modelo da forma correta.

Processo motivacional
Por fim, o observador deve ter motivação, ou seja, deve ter razões que provoquem e
estimulem o seu comportamento. Será a motivação um facilitador para o processo de
aprendizagem a partir da imitação.

João descobriu que sua mãe estava passando por um processo de enfermidade graças
ao grande cansaço acumulado pelas tarefas rotineiras durante anos, a partir daí João
aprendeu a preparar corretamente as omeletes pelas manhãs.

Figura 13.

Fonte: <http://www.efdeportes.com/efd145/teoria-social-cognitiva-de-albert-bandura.htm> 3 jan, 2016

49
UNIDADE I │ DESENVOLVIMENTO HUMANO

Percebemos que as teorias daquela época colocavam demasiada carga ao que


acontecia às crianças e não ao modo como elas reagiam a partir das informações
obtidas. Pensando sobre o modelo de aprendizagem social de Bandura no
desenvolvimento infantil vimos que, embora sua teoria seja permeada de
influências comportamentais ele traz “o novo” quando apresenta características
que fogem da visão mecanicista – dando lugar aos aspectos cognitivos que se
apresentam no processo de modelação. Baseando o seu modo de compreender
o processo de aprendizagem em um modelo de desenvolvimento social, ele
amplia a compreensão sobre o comportamento da criança em desenvolvimento.
Traz consigo a ideia da modelação como um processo da aprendizagem em
que a criança aprende a partir de um modelo, não sendo esse um processo
inteiramente automático, uma vez que dentro do processo contamos com os
processos e estruturas cognitivas relacionadas ao pensamento e à percepção.

Bandura salienta que a aprendizagem de uma criança (ou um adulto) por


observação de um modelo só depende de quatro fatores importantes, sendo
esses: a atenção voltada ao modelo e sua capacidade de armazenar informações
(processos cognitivos); sua capacidade física para imitar e motivação para
realizar a aprendizagem por observação e por fim a imitação (processos
motores e cognitivos). Importante frisar que as capacidades dirigidas à atenção,
memorização, linguagem, imitação e todos os referentes ao processo cognitivo
mudam conforme a idade, no entanto o que um bebê aprende por modelação
também irá aperfeiçoando-se conforme o seu desenvolvimento.

50
DO PRÉ-NATAL AO UNIDADE II
RECÉM-NASCIDO

Com a com intenção de compreender partes do processo do desenvolvimento infantil


iremos estudar as mudanças do desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial ou
socioemocional. Além disso, iremos classificar esse desenvolvimento conforme os
autores do desenvolvimento infantil. Estudaremos então os períodos pré-natal, e logo
em seguida adentraremos no mundo do recém-nascido.

CAPÍTULO 1
Desenvolvimento pré-natal

Figura 14.

Fonte: <http://atiliano.com.br/embriologia/#.VrIF4PkrKUk>

Neste capítulo iremos abordar aspectos relacionados ao desenvolvimento pré-natal,


sintetizar os estágios em que esse desenvolvimento se dá, além de transcorrer sobre
questões que influenciam nesse período do desenvolvimento.

Aqui veremos como começa a vida de um bebê a partir de disposições celulares que
unidas e em processo de multiplicação se desenvolvem no período de 40 semanas de
vida intra-uterina (dentro do útero da mulher) e formam o feto.

51
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

Pensar no início da vida humana sempre foi de grande inspiração para os estudiosos.
Entender como a vida se inicia foi algo que pouco a pouco foi ganhando notório espaço
dentro das pesquisas científicas de diversas áreas.

Aspectos do desenvolvimento pré-natal


Experiências genéticas que se preocupavam em estudar os fatores inatos herdados
dos pais biológicos prediziam os aspectos hereditários no desenvolvimento de uma
pessoa, portanto esses estudos culminaram em descobertas que vieram a facilitar a
compreensão de algumas características do desenvolvimento humano.

O desenvolvimento de técnicas para acompanharmos o desenvolvimento fetal nos


últimos anos tem crescido espantosamente graças ao esforço de estudiosos de várias
áreas de pesquisa que deram início aos estudos do comportamento fetal; a fim de
estabelecer metodologias de tratamento e avaliação para os cuidados da saúde do feto.

Com o avanço das tecnologias é possível hoje obter informações, ideias acerca do processo
de desenvolvimento pré-natal, inclusive colaborar com a inseminação artificial, estudos
de genes e tantas outras maneiras possíveis de contribuição ao desenvolvimento fetal,
o que não era possível décadas atrás. (BEE; BOYD, 2011)

Pesquisadores descobriram que muitas são as influências que afetam uma nova vida
durante os nove meses antes do nascimento, no entanto a influência genética é a que
transforma o óvulo fecundado em um ser humano cujos padrões de formação já são
estabelecidos. Os estudos genéticos descobriram uma molécula que acionada após a
fecundação começa a esculpir a nós seres humanos, a essa molécula denominaram
morfogenes. Porém, apenas recentemente descobriu-se que diversos outros tipos de
influência podem afetar o desenvolvimento do feto, e daí a importância dos cuidados
no pré-natal.

Feldman (2015, p. 330) explica que os psicólogos desenvolvimentais concordam com a


ideia de que os fatores genéticos fornecem além do potencial para o desenvolvimento de
comportamentos e traços específicos individuais, influenciam na limitação à emergência
desses comportamentos e traços. A exemplo, o autor cita a hereditariedade como capaz
de definir o nível geral e estabelece um limite superior de inteligência das pessoas que
independentemente da qualidade do ambiente elas não conseguem ultrapassar. Ainda,
a hereditariedade pode impor limites às capacidades físicas, uma vez que os seres
humanos simplesmente não conseguem correr a uma velocidade de 90 km/h ou crescer
até 3 m de altura, independentemente da qualidade do ambiente.

52
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

Pensando nisso, percebemos que o processo de desenvolvimento é marcado não só


pela herança genética como também pelo ambiente. Desse modo, os psicólogos do
desenvolvimento concordam que os fatores ambientais muitas vezes são importantes
na capacitação das pessoas para atingirem as capacidades potenciais que a sua base
genética torna possível. Quando uma criança não recebe estimulação intelectual,
quando não é mandada à escola, quando não participa do convívio sociocultural, é
pouco provável que ela possa atingir as capacidades potenciais de sua base genética
ou aperfeiçoar suas habilidades físicas inatas, se não estimuladas por um ambiente
adequado.

Da concepção

A concepção também conhecida como fertilização é um processo de combinação entre


espermatozoide e óvulo na formação unicelular de uma nova célula denominada zigoto.

O início biológico de todo ser humano é a fração de segundo na qual um único


espermatozoide, uma das milhares de células fecundativas do pai, liga-se a um óvulo
(célula-ovo), um das centenas de milhares de ovos produzidos e armazenados no corpo
da mãe. (PAPALIA; OLDS, 2000, p.58)

Após a fecundação do gameta masculino (espermatozoide) no gameta feminino (óvulo)


em que surgirá como resultado o zigoto é que um processo de multiplicação celular
desenvolver-se-á, transformando primeiramente em embrião para em seguida ser um
feto e finalmente um ser humano complexo.

A concepção ou fertilização é o nome dado ao processo pelo qual o espermatozoide e o


ovo se combinam e formam uma única célula nova chamada zigoto. O zigoto por sua
vez continua o processo na tuba uterina e se implanta na parede do útero. A partir daí
um movimento de forças genéticas e desenvolvimento celular influenciam a formação
do indivíduo e se arrastam ao longo da vida.

Ao falarmos sobre desenvolvimento pré-natal, lembramos imediatamente da mulher


em estado gravídico, uma vez que esse estado é visível por se tratar de modificações
corporais na mulher. Entretanto, aqui, vamos nos ater ao período gestacional em
que a mulher está gerando em seu útero o feto, e então descobrir que esse tipo de
desenvolvimento pode nos trazer um vasto conhecimento acerca do seu produto, o ser
humano.

De acordo com Davidoff (2001), as primeiras 40 semanas de vida do bebê em gestação


acontecem dentro do útero. Esse período intrauterino, para uma melhor compreensão,
pode ser dividido em três fases: a fase germinal que vai desde a concepção até o 14o

53
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

dia; a fase embrionária que transcorre de 2 a 8 semanas; e a fase fetal que começa
na 9a semana e estende-se por toda a gravidez, quando então o bebê é chamado de feto.

Figura 15.

Fonte: <https://teovida.wikispaces.com/Fecunda%C3%A7%C3%A3o+e+Desenvolvimento+Embrion%C3%A1rio+e+Fetal>

Dentro desse contexto de pesquisas na área de desenvolvimento pré-natal podemos


dizer que um grande feito dos estudos e pesquisas realizados foi o desenvolvimento de
tecnologias que oferecem aos pais maior conhecimento e segurança nesse processo tão
novo de vida experimentado a cada gestação. A descoberta de estudos que constatam
que a vinculação entre pais e filhos se dá a partir da observação do feto em exames
de ultrassom é o que vai permear os nossos estudos, assim como tudo que estiver
relacionado ao comportamento fetal.

Estágios do desenvolvimento pré-natal

No período pré-natal, segundo Pezott (2013), podemos destacar três tipos de


desenvolvimentos importantes que ocorrem concomitantemente aos três estágios do
desenvolvimento pré-natal (germinativo, embrionário e fetal).

O desenvolvimento físico durante a concepção ocorre desde o início da dotação


genética, e neste caso é diretamente influenciado pelo ambiente. A estrutura
e os órgãos básicos do corpo, assim como o crescimento do cérebro é o tipo de
crescimento físico mais acelerado do ciclo da vida e com maior vulnerabilidade às
influências ambientais. O desenvolvimento cognitivo é quando se inicia a capacidade
de aprender a lembrar, assim como a responder aos estímulos sensoriais. E o
desenvolvimento psicossocial que ocorre quando o feto responde a voz da mãe e
desenvolve uma preferência por ela.
54
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

Estágio germinativo

Ocorre do momento da fecundação até aproximadamente duas semanas. Nesse estágio,


o organismo se divide dando início à divisão celular que ocorre entre um a três dias
após a fecundação. Esse zigoto implantado na parede do útero começa a se dividir e
multiplicar suas células até que se transforme em bilhões de células especializadas que
constituem o corpo humano. (DAVIDOFF, 2001).

Dentre tantos aspectos do desenvolvimento biológico que ocorrem desde o processo


de multiplicação celular e transformações mais complexas, destacaremos no estágio
a formação da placenta, do cordão umbilical e do saco amniótico que são os órgãos
de nutrição e proteção do futuro bebê. As funções desses órgãos são, respectivamente:
combater infecções internas, proteger o bebê das moléstias, sustentar a gestação através
dos hormônios produzidos por ela, preparar os seios da mãe para a lactação e ainda
estimular as contrações uterinas que irão ajudar no nascimento. O cordão umbilical,
por sua vez, está ligado ao embrião e ajudam no fornecimento do oxigênio e nutrientes
para o bebê em desenvolvimento, eliminando ainda os resíduos do bebê. (PAPALIA;
OLDS, 2000; DAVIDOFF, 2001; BEE; BOYD, 2011; FELDMAN, 2015).

Estágio embrionário

Após completo o processo de implantação, o segundo passo da gestação se dá nesse


estágio, quando os órgãos e os principais sistemas corporais (respiratório, alimentar
e nervoso) começam a se desenvolver. A placenta, que já está desenvolvida no final da
quarta semana de gestação, se desenvolve como uma massa de células posicionadas
contra a parede do útero e substitui a função do fígado e dos rins para o embrião até que
os seus próprios órgãos comecem a funcionar. A placenta liga o sistema circulatório do
embrião por meio do cordão umbilical que por sua vez serve para fornecer oxigênio e
remover o dióxido de carbono do sangue. A placenta ainda funciona como filtro entre
o sistema circulatório da mãe e do embrião. Nutrientes como oxigênio, proteínas,
açúcares e vitaminas do sangue materno geralmente passam para o embrião, assim
como os resíduos digestivos e o dióxido de carbono do sangue do bebê passam para
mãe, podendo ser facilmente eliminados pelo corpo. Uma descoberta importante é que
as substâncias nocivas como os vírus ou os hormônios das mães podem ser filtrados pela
placenta, uma vez que são grandes para atravessar as várias membranas que existem
nela. No entanto, a maioria dos medicamentos e dos anestésicos consumidos pela
mãe atravessa a placenta, do mesmo modo que alguns organismos de doença. Neste
estágio as células que formam o embrião, propriamente dito, ainda estão se dividindo
e formando rudimentos de pele, receptores sensoriais, células nervosas, músculos,
sistema circulatório e órgãos internos.

55
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

Nesse período o embrião é muito vulnerável às influências do ambiente pré-natal, uma


vez que ainda está se desenvolvendo e apresenta fragilidades diante de influências
significativamente fortes para a sua estrutura. É neste período também que os defeitos
congênitos de desenvolvimento ocorrem, durante o primeiro trimestre de gravidez.
Embriões que apresentam defeitos congênitos graves geralmente não sobrevivem
além do primeiro trimestre. 50 a 70% dos abortos espontâneos envolvem anomalias
cromossômicas e cerca de 31% de todas as gestações terminam em aborto. (PAPALIA;
OLDS, 2000; DAVIDOFF, 2001; BEE; BOYD, 2011).

Pesquisas atuais revelam a iminência de modificações sobre o entendimento da proteção


da placenta para vírus recém surgidos, para exemplificar esta afirmativa iremos ler o
trecho de uma entrevista realizada com pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz). Segundo a entrevistada Tânia Saad “O vírus passa pela placenta e vai
então acometer o tecido cerebral de uma forma que vai desacelerar o crescimento dos
neurônios e células que existem. E é essa alteração do crescimento cerebral que vai
acabar causando uma alteração na taxa de crescimento do osso. Por isso que leva tanto
tempo, nada que vai aparecer em duas, três semanas e possa calcificar o cérebro. Quando
há calcificações é indício de que essa infecção aconteceu muito cedo na gestação. A
calcificação pode impedir que o cérebro continue a se desenvolver bem”. (Entrevista na
íntegra em: <http://www.iff.fiocruz.br/index.php/8-noticias/187-viruszika>).

Estágio fetal

Uma vez completo o estágio embrionário, o organismo em desenvolvimento é conhecido


como feto. Nesse estágio as primeiras células ósseas aparecem e o embrião começa a
tornar-se um feto em pleno desenvolvimento.

Aos poucos, pesquisadores foram descobrindo que os fetos não eram organismos
passivos instalados no útero das mães, ao contrário, eles chutavam viravam-se,
flexionavam corpo, davam cambalhotas, moviam os olhos, engoliam, fechavam os
punhos, tinham soluços e sugavam polegar, assim como respondiam ações e vibrações
mostrando que podiam ouvir e sentir para além do seu habitat intrauterino.

É por volta da 23a semana que o bebê tem a capacidade de viver fora do útero. No
entanto, grande parte dos bebês nascidos prematuramente são natimortos. Já
bebês nascidos após a 24a semana têm maior probabilidade de vida uma vez que a
função pulmonar se torna mais eficiente. Outro fator curioso é que desde o princípio
avalia-se que os fetos femininos se desenvolvem mais rapidamente em comparação
aos masculinos, na 20a semana após a concepção fetos masculinos estão em média
duas semanas atrás dos femininos e continuam assim até a maturidade. E mais, «as

56
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

estruturas funcionais de todos os sistemas orgânicos do corpo são formadas durante o


estágio embrionário. Contudo a maior parte da formação e dos refinamentos do cérebro
ocorre durante estágio fetal. Os neurônios, células especializadas do sistema nervoso,
começam a se desenvolver durante o estágio embrionário, na terceira semana. Mas
o ritmo de formação neural atinge seu pico entre a 10a e a 18a semanas, um processo
conhecido como proliferação neuronal. Entre a 13a e a 21a semanas, ocorre a migração
neuronal, um processo no qual os neurônios recém-formados migram para as regiões
especializadas do cérebro onde ficarão pelo resto da vida do indivíduo”. (BEE; BOYD,
2011, p. 63).

Figura 16.

Você sabia que proliferação


neuronal é o rápido
desenvolvimento de neurônios
que se dá entre a 10 e a 18a
a

semanas de gestação.

E migração neuronal
é conhecido pelo
movimento de neurônios
E ainda que neurônios são para regiões especializadas
células do sistema nervoso do cérebro.
responsáveis pela transmissão e
pela recepção de impulsos
nervosos.

Figura disponível em: <https://ccbela.wordpress.com/page/4/>

Influências no desenvolvimento pré-natal

O ambiente pré-natal tem suas influências no desenvolvimento do futuro bebê. Boa parte
do conhecimento científico se deu por meio das pesquisas com animais ou de relatos

57
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

de mulheres grávidas e mães que após o nascimento do seu filho relataram situações
vivenciadas durante a gestação. E é sobre essas influências que iremos estudar.

Entre as principais influências pré-natais no feto Feldman (2012, p. 337) destaca as


seguintes:

Nutrição da mãe: o que a mãe come durante a gravidez pode ter


implicações importantes na saúde do bebê. Mães subi nutridas de
modo grave não conseguem fornecer a nutrição adequada a um feto em
crescimento e provavelmente darão à luz a bebês abaixo do peso. Os
bebês mal nutridos também são mais suscetíveis a doenças, e a falta de
nutrição pode ter um impacto adverso em seu desenvolvimento mental.

Doença da mãe: diversas doenças que tem um efeito relativamente


menor na saúde da mãe podem ter consequências devastadoras em um
feto que em desenvolvimento, se contraídas durante o período inicial
da gravidez. Por exemplo, rubéola (sarampo alemão), sífilis, diabetes e
hipertensão podem produzir um efeito permanente sobre o feto. O vírus
que causa a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) também
pode ser passado da mãe para o filho antes do nascimento e por meio da
amamentação após o nascimento.

Estado emocional da mãe: o estado emocional da mãe afeta o bebê. As


mães que são ansiosas e tensas durante os últimos meses da gravidez
estão mais sujeitas a ter bebês irritáveis que dormem e comem pouco.
A razão para isso? O sistema nervoso autônomo do feto torna-se
especialmente sensível em consequência das alterações químicas
produzidas pelo estado emocional da mãe.

Uso de drogas pela mãe: a mãe que usar drogas ilegais fisicamente
aditivas, como cocaína, corre o risco de dar à luz a bebês que são
igualmente adictos. Esses recém-nascidos sofrem de sintomas dolorosos
de abstinência e, por vezes, apresenta um prejuízo físico e mental
permanente. Mesmo substâncias legais tomadas por uma gestante (que
pode não saber que está grávida) podem ter um efeito trágico.

Álcool: o álcool é extremamente perigoso para o desenvolvimento fetal.


Por exemplo, um em cada 750 bebês nascem com Síndrome Alcoólica
Fetal (SAF), uma condição que resulta em inteligência abaixo da média,
atrasos no desenvolvimento e deformidades faciais. A SAF é hoje a
causa evitável primária de déficit intelectual. Mesmo as mães que usam
pequenas quantidades de álcool durante a gravidez colocam seus filhos

58
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

em risco. O Efeito Alcoólico Fetal (EAF) é uma condição em que as


crianças exibem alguns sintomas da SAF devido ao consumo de álcool
pela mãe durante a gravidez.

Uso de nicotina: a gestante que fuma coloca seu filho em risco


considerável. Fumar durante a gravidez pode ocasionar aborto
espontâneo e morte do bebê. Para as crianças que sobrevivem, as
consequências negativas do uso de tabaco pela mãe podem durar toda
a vida.

Outros autores atentaram para as contribuições do pai, visto que os cientistas perceberam
que o bebê recebe do pai metade do material genético e, portanto, a mãe não acumula
responsabilidade pela qualidade desse material. Se nesse material genético houver
substâncias químicas, radiação, infecção ou simplesmente se o material genético estiver
envelhecido ele pode provocar defeitos de nascimento. O material genético defeituoso,
ou seja, o esperma, pode ser responsável por uma grande quantidade de complicações
de nascimento que tradicionalmente sempre foram atribuídas às mães. Por isso, assim
como as mulheres, é importante que os homens estejam atentos à idade e aos tipos de
exposição antes e durante a concepção dos seus filhos.

Assistência pré-natal

No início da gravidez é importante que a gestante inicie um acompanhamento médico


a fim de acompanhar todo o seu desenvolvimento gestacional. Na verdade, esse tipo
de assistência deveria iniciar-se antes mesmo da gravidez. Papalia e Olds (2000)
pontuam que o aconselhamento antes da gravidez teria por finalidade conscientizar
mais mulheres, por exemplo, da importância da inclusão do ácido fólico suficiente em
sua dieta assegurando a sua imunidade à rubéola.

Esse tipo de atenção voltada às gestantes reduz a morte materna e infantil além de
outras complicações de parto, por isso a atenção pré-natal deveria incluir assistência
médica e triagem de defeitos e doenças tratadas, além de serviços educacionais, sociais e
de nutrição. No Brasil, a atenção obstétrica e neonatal prestada pelo sistema público de
saúde tem como qualidade pregada a humanização. Segundo a ordem governamental,
os serviços e os profissionais de saúde devem acolher com dignidade a mulher e o
recém-nascido enfocando-os como sujeitos de direitos. Além disso, o principal objetivo
da tensão pré-natal seria acolher a mulher desde o início de sua gestação e assegurar o
atendimento até o final. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006).

59
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS) dez princípios são fundamentais em


relação à atenção pré-natal e indicam que o cuidado na gestação e nos partos normais
devem: seguir o modelo não medicalizado, ou seja, o cuidado fundamental deve usar
um mínimo de intervenções possíveis; basear-se no uso de tecnologia apropriada, tendo
inclusão de métodos, procedimentos, tecnologia, equipamentos e outras ferramentas
voltadas para resolver um problema específico; estar baseada em evidências,
significa dizer, embasada em evidências científicas disponíveis, estudos controlados e
apropriados; ser regionalizado, baseado em sistema eficiente de referência de centros
de cuidado primário para centros de cuidado secundário e terciário; ser multidisciplinar
e multiprofissional; ser integral e levar em conta as necessidades intelectuais,
emocionais, sociais e culturais das mulheres; estar centrado nas famílias e ser dirigido
para as necessidades não só da mulher e seu filho, mas do casal; ser apropriado, tendo
em conta as diferenças culturais para alcançar os objetivos; compartilhar a tomada de
decisão com as mulheres; respeitar a privacidade, a dignidade e a confidencialidade das
mulheres. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006).

O que ainda podemos destacar de importante da assistência pré-natal é que quando


realizada precocemente pode ajudar as mães quando em sua primeira gravidez ─ no
que concerne às informações sobre a gestação e os cuidados com a criança; beneficiar
as mulheres carentes com o contato de outros serviços sociais necessários, aumentando
a probabilidade de que se obtenha assistência para os bebês após o nascimento; reduzir
a incidência do baixo peso neonatal; além de alertar as mães sobre os perigos dos maus
hábitos para o desenvolvimento e vida do feto.

Comportamento pré-natal

Percebemos com o avanço da tecnologia o aumento das informações sobre o


comportamento fetal. Ao desenvolverem pesquisas sobre o modo como o feto
se desenvolve no período pré-natal, estudiosos colaboraram com uma gama de
informações úteis para o tratamento da saúde do feto nesse período, bem como com o
desenvolvimento de técnicas que favorecem a diminuição da mortandade ainda neste
período.

A cada mês o feto vai se desenvolvendo de modo a aderir a certos comportamentos


diferenciados que vão falando do seu tipo de desenvolvimento e, ainda, do seu tipo de
personalidade.

60
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

Desenvolvimento mês a mês do embrião e do feto

Durante o primeiro mês o crescimento do embrião é mais rápido do que qualquer outra
época da vida do período pré-natal. Neste momento o cordão umbilical é primordial
para a sobrevivência. Aqui, ainda não é possível determinar o sexo do futuro bebê.

Já no final do segundo mês de vida a cabeça do embrião tem a metade do comprimento


total do corpo. Os impulsos cerebrais coordenam a função de sistemas orgânicos, os
órgãos sexuais estão em desenvolvimento, a pele é suficientemente sensível para reagir
à estimulação tátil. Se na oitava semana o embrião é abortado, ao ser tocado ele reage
flexionando o tronco, estendendo a cabeça e movendo os braços para trás.

Ao final do terceiro mês o sexo pode ser facilmente identificado. Os sistemas orgânicos
já funcionam e o feto agora pode respirar, fazer circular o líquido amniótico para dentro
e para fora dos pulmões, e ocasionalmente urinar. Nesse período o feto pode mexer
as pernas, os pés, o polegar e a cabeça; sua boca pode abrir, fechar e engolir. Suas
pálpebras podem contrair-se ao serem tocadas, sua mão pode fechar-se parcialmente
ao ser tocada; quando tocados seus lábios sugam; quando tocada a planta do pé, os
artelhos se abrem em leque. Estes reflexos estarão presentes no nascimento, mas irão
desaparecer durante os primeiros meses de vida.

No quarto mês o corpo está alcançando o desenvolvimento da cabeça. O cordão


umbilical já tem o mesmo comprimento do feto e continuará crescendo com ele, e a
placenta já estará totalmente desenvolvida. A mãe pode sentir o feto se agitando. As
atividades reflexos que apareceram no terceiro mês já são mais bruscas em função do
maior desenvolvimento muscular.

No quinto mês o feto começa a mostrar sinais de uma personalidade individual. Apresenta
padrões definidos de sono e vigília em uma posição predileta no útero, tornando-se
mais ativo. Neste período pode chutar, esticar-se, encolher-se e até soluçar. O sistema
respiratório ainda não está adequadamente desenvolvido para o mundo fora do útero.
Pelos mais grossos começam a aparecer nas sobrancelhas e cílios, cabelos mais finos na
cabeça, e uma lanugem cobre o corpo.

No sexto mês as camadas de gordura vão se formando por baixo da pele; os olhos estão
completos, abrem e fecham, olhando em todas as direções. O feto pode ouvir, chorar e
fechar a mão com força. Um feto nascido durante o sexto mês ainda tem poucas chances
de sobrevivência devido ao aparelho respiratório ainda não estar amadurecido.

No final do sétimo mês o feto apresenta padrões de reflexos plenamente desenvolvidos.


Ele chora, respira, engole, e pode sugar o polegar. As chances de sobrevivência de um

61
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

feto pesando menos de 1,5 kg são bastante boas, contanto que receba atenção médica
intensiva.

No oitavo mês seus movimentos são reduzidos em função da crescente falta de espaço
dentro do útero. É neste mês e no seguinte que se desenvolve uma camada de gordura
em todo o corpo do feto, a qual irá permiti-lo ajustar-se às temperaturas variáveis fora
do útero.

No nono mês, cerca de uma semana antes do nascimento, o bebê para de crescer, sendo
geralmente os meninos um pouco maiores e mais pesados do que as meninas. Nesta
fase, a frequência cardíaca aumenta e há maior eliminação de resíduos pelo cordão
umbilical. Aqui o feto já está preparado para nascer e tornar-se um ser independente
ao menos em suas funções orgânicas.

Fonte: Adaptado de Papalia, 2000, pp. 76 e 77.

O nascimento

O nascimento sugere o encerramento do ciclo gestacional ou pré-natal ─ em que o bebê


está ligado organicamente a sua mãe ─ assim como dá início a uma nova etapa da vida
do bebê.

O processo do nascimento é indicado pelas contrações do útero e existem para que


finalmente o feto possa ser expelido e o bebê enviado para o mundo fora do útero
da mãe. A “dor do parto” como geralmente é conhecida pode durar entre minutos e
horas. Pesquisas sugerem que na primeira gestação o trabalho de parto dura em torno
de 15 horas e para as seguintes gestações 8 horas, no entanto, a duração pode variar
enormemente. (DAVIDOFF, 2001)

Um ponto importante a ser conhecido sobre o nascimento é que esse processo é


controlado pelo cérebro do feto. Assim sendo, serão os órgãos vitais como os pulmões,
quando prontos para vida fora do útero, que irão indicar ao corpo da mãe a hora de
produzir maiores quantidades de estrógeno a fim de estimular o útero a contrair-se e a
cérvix a dilatar-se e alargar-se.

Sabe-se que as taxas de mortalidade infantil são aumentadas por complicações pré-natais
e por isso a preocupação na hora da escolha de um método para o parto, ou nascimento
de um bebê, é importante não só para o conforto da mãe, mas principalmente para
sua segurança e a do bebê. Vários são os métodos de parto utilizados na atualidade,
alguns geram mais controvérsias que outros principalmente acerca da medicalização
(que visam à diminuição das dores de parto), porém será a análise do médico, o viés

62
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

cultural, o resultado do acompanhamento pré-natal (tudo isso com a participação ativa


dos pais), que no final irá garantir o método de nascimento, na maioria dos casos.

A ultrassonografia obstétrica e suas implicações para a relação materno-fetal


(Aline Grill Gomes, Cesar Augusto Piccinini).

Fonte: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/psicologia/article/viewArticle/7511>

Ultrassonografia bidimensional e tridimensional e o vínculo materno fetal: um


estudo comparativo. (Melina Blanco Amarins, Gláucia Rosana Guerra Benute,
Roseli Yamamoto Mieko Nomura, Maria Okumura, Maria Livia Tourinho Moretto,
Mara Cristina Souza de Lucia, Marcelo Zugaib)

Fonte: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S167774092009000200002&
script=sci_arttext>

63
CAPÍTULO 2
Desenvolvimento do recém-nascido

Seguindo a ordem do desenvolvimento humano daremos início à nova jornada da


vida do bebê. É a partir do nascimento que o bebê passará por diversas formas de
aprendizado. Desde o nascimento ele é exposto a uma variedade de estímulos que o
ensinará a se comunicar com o ambiente e a compreender o mundo no qual ele foi
inserido.

O recém-nascido

Figura 17.

Fonte: <https://www.simplewishes.com.br/blog/preocupacoes-com-o-recem-nascido/>

Também conhecido como neonato, o recém-nascido terá essa denominação até


aproximadamente a quarta primeira semana de vida. Ao nascer, embora com aparência
frágil, os recém-nascidos já apresentam capacidades para responder a estímulos e já
são ativos e estão atentos ao meio.

O tamanho entre meninos e meninas é variado e depende ainda da raça, do tamanho


dos pais, da nutrição e saúde materna, além de depender de alguma variável de
complicações no pré-natal.

É nessa nova etapa que o bebê aprenderá a respirar e a expressar-se na tentativa


de comunicar-se com o meio ambiente atual. Ainda em desenvolvimento orgânico,
o bebê vem ao mundo geralmente com todos os sentidos e sistemas orgânicos
funcionando.

64
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

Reflexos

O bebê ou neonato nasce apresentando uma variedade de reflexos. Sendo reflexos


“respostas involuntárias não aprendidas que ocorrem automaticamente na presença
de certos estímulos” (FELDMAN, 2015, p. 341). Os reflexos dentre tantas outras
funções ajudam a sustentar ─ no sentido de sobrevivência ─ o bebê. Estes são respostas
automáticas que estão ligadas a eventos ambientais, e por isso servem de proteção
contra experiências dolorosas e/ou prejudiciais. Os reflexos podem ser:

»» reflexo perioral ─ quando o bebê volta sua cabeça na direção de coisas


que toquem suas bochechas (mamilo da mãe ou mamadeira);

»» reflexo de sucção ─ resposta de sugar coisas que tocam seus lábios;

»» reflexo de preensão ─ faz com que o bebê se agarre a algo;

»» reflexo de moro ─ quando o bebê ouvir um estampido, ou tem parte


do seu corpo apoiado, e após alguns segundos retira-se o apoio, o corpo
reage esticando-se;

»» reflexo de Babinski ─ quando acaricia-se a planta do pé do bebê os


artelhos se abrem em leque. Ainda apresentam os reflexos de piscar,
bocejar, tossir, ter ânsia de vômito, espirrar e o reflexo pupilar, sendo que
estes não desaparecem aos dois ou três meses, como os anteriores (reflexos
do recém-nascido). O fato desses reflexos desaparecerem significa que o
córtex está amadurecendo e se desenvolvendo normalmente, permitindo
mudança do comportamento reflexo para o comportamento voluntário
(PAPALIA; OLDS, 2000; FELDMAN, 2015).

Temperamento neonatal

Estudos indicam que desde o primeiro dia de vida os bebês emitem traços persistentes de
temperamento, e que talvez esses traços sejam pré-programados no organismo devido
à herança genética. Por meio de estudos realizados com gêmeos e crianças adotadas
surgiu a hipótese de que essas características seriam de algum modo influenciadas
pela herança, entretanto o ambiente intrauterino, os momentos que antecedem ao
parto, o próprio momento do parto e o vínculo mãe-bebê também contribuem para as
características da personalidade inicial.

A questão da consistência é um fator influente na formação da personalidade, ou


seja, existe uma grande probabilidade de comportamentos consistentes continuados

65
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

se transformarem em traços da personalidade. Por exemplo, lactentes agitados


frequentemente se tornam crianças agitadas, porém, se rodeado por país sensíveis
e em um ambiente favorável, essa criança agitada pode adaptar-se ao contexto e
tornar-se uma criança de comportamento mais moderado que se repetirá em outras
situações de sua vida.

Desenvolvimento físico

Os neonatos parecem estar aptos a aprender desde o começo, após o seu nascimento.
Embora o comportamento de comer e dormir denote uma aparente condição de
passividade, o bebê tanto anterior quanto posteriormente ao nascimento exibe sinal de
crescimento e desenvolvimento motor, além de demonstrar um tipo de aprendizagem que
sugere alternância de respostas a partir de comportamentos que geram consequências
agradáveis.

Como é de se notar os neonatos são geralmente ativos, demonstram comportamentos


reflexos quando estimulados, e estão quase sempre em movimento. A partir do quarto
mês os bebês mudam para um movimento mais deliberado, o que parece estar associado
ao amadurecimento do córtex cerebral, o qual permite que os bebês desenvolvam cada
vez mais tarefas específicas e novas habilidades. Pesquisadores acreditam que os bebês
estão preparados geneticamente para desenvolver habilidades motoras, no entanto é a
maturação fisiológica quem anteverá o desenvolvimento dessas habilidades.

As capacidades sensoriais já estão impressas nos neonatos desde o primeiro momento


─ como vimos quando falamos sobre os reflexos. Porém, devemos saber que cada ser
humano apresenta características individuais, e se desenvolve de maneira diferenciada.
Em se tratando das capacidades sensoriais podemos exemplificar, que embora os neonatos
não consigam coordenar sua visão, focalizando com exatidão determinados objetos, seu
aparelho visual parece estruturado de tal modo que o bebê esteja sensível às qualidades
que precisamente caracterizam feição, movimento, contraste e tridimensionalidade
(DAVIDOFF, 2000). Ainda é possível perceber em relação à audição, por exemplo,
quando confrontado com certos sons ou vozes agudas, o bebê apresenta algum tipo de
reação. A partir da observação e vários experimentos percebeu-se que os bebês, em sua
grande maioria, já nascem prontos para fazer uso de suas capacidades sensoriais. Aos
poucos, essas mesmas capacidades vão se aperfeiçoando à medida que há um maior
contato com o ambiente.

66
DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO │ UNIDADE II

Importante destacar que aqui estamos sempre lidando com o desenvolvimento normal,
pois como é de nossa compreensão muitos fatores podem tornar-se desfavoráveis ao
desenvolvimento normal e ou situações genéticas ou ambientais ainda podem afetar
neste tipo de desenvolvimento que estamos salientando.

Desenvolvimento cognitivo

Já recém-nascidos, eles são capazes de demonstrar curiosidade para observar objetos


novos em detrimento de objetos já conhecidos, evidenciando que a memória existe e
dá preferência às novidades. Ainda aprendem associar estímulos e a incitar dos adultos
um comportamento correspondente às mudanças do incitamento, como é o caso do
choro.

Vimos anteriormente que Piaget divide em estágios os períodos de desenvolvimento,


para a primeira infância poderíamos então tratar do estágio sensório-motor (que vai do
nascimento até aproximadamente os dois anos).

Piaget acreditava no crescimento dos processos de pensamento das crianças, e com


base em suas observações descreveu os estágios de desenvolvimento cognitivo nos
quais o estágio sensório-motor explica, a partir de subestágios, a forma como o bebê se
desenvolve. O estágio sensório-motor é dividido então em seis subestágios: (PAPALIA;
OLDS, 2000).

Subestágio 1 (do nascimento até 1 mês): aqui há a permanência de reflexos inatos, cujo
alguns serão perdidos, mas outros aperfeiçoados. Prevalência da incapacidade motora.

Subestágio 2 (de 1 a 4 meses): o bebê realiza comportamentos diferentes de diferentes


maneiras, no entanto repete comportamentos agradáveis, como sugar. Ainda não
desenvolveu a permanência de objeto.

Subestágio 3 (de 4 a 8 meses): está mais interessado pelo ambiente, repete ações
que trazem resultados estimulantes. O bebê começa a desenvolver a compreensão da
permanência do objeto.

Subestágio 4 (de 8 a 12 meses): o comportamento está voltado para obtenção de


respostas desejadas, resultado da aprendizagem. Embora saiba que o objeto tenha sido
escondido continua a procurá-lo, resultado de um processo de desenvolvimento parcial.

Subestágio 5 (de 12 a 18 meses): o bebê apresenta ser mais curioso, explora ativamente
o seu mundo e os objetos que tem contato; experimenta novas tarefas e aprende com o
método de tentativa e erro.

67
UNIDADE II │ DO PRÉ-NATAL AO RECÉM-NASCIDO

Subestágio 6 (de 18 a 24 meses): já apresenta um pensamento simbólico e começa a


pensar sobre os acontecimentos e se antecipar às consequências. Começa a demonstrar
compreensão; e a permanência do objeto já está totalmente desenvolvida.

Desenvolvimento psicossocial

Aqui podemos relembrar o debate de alguns pesquisadores do desenvolvimento ─ com


uma visão mais tradicionalista ─ que dimensionava o desenvolvimento motor a partir de
uma série de estágios pré-ordenados dirigidos no cérebro a partir do amadurecimento,
contra os que acreditam que o desenvolvimento é um processo contínuo e dinâmico que
ocorre da interação entre o bebê e o ambiente.

Deste modo, podemos pensar que um ambiente estimulante pode favorecer o


crescimento e o funcionamento do cérebro, o que implica dizer que o desenvolvimento
humano pode sofrer influência quando em um ambiente estimulante (DAVIDOFF,
2002; FELDMAN 2015; PAPALIA; OLDS, 2000).

Conforme Papalia e Olds (2000), o desenvolvimento físico que se observa


a partir da coordenação motora ocorre normalmente segundo o princípio
cefalocaudal, que está relacionado ao desenvolvimento da cabeça para as
partes inferiores do corpo; e ainda segundo o princípio próximo-distal, que
avalia o desenvolvimento do centro do corpo para as partes externas. Sabe-se
ainda que os neonatos se desenvolvem a partir de estágios do sono, que vão
progressivamente diminuindo e mudando conforme o crescimento. Ainda sobre
o crescimento percebe-se que durante o primeiro ano de vida há um crescimento
mais abrupto que vai diminuindo conforme o desenvolvimento, no entanto são
nos três primeiros anos de vida que a criança cresce no ritmo mais acelerado.
As capacidades sensoriais presentes desde o nascimento estão em constante
desenvolvimento no bebê e a capacidade de discriminação de estímulos ocorre
desde o princípio; já a discriminação auditiva e visual parece estar relacionada
ao funcionamento cognitivo, enquanto a percepção ao desenvolvimento motor.

Vimos aqui que durante os três primeiros meses de vida os bebês ganham o
controle sobre os movimentos do seu corpo e suas habilidades motoras vão se
modificando e tornando-se mais complexas, e as mudanças internas e externas
ocorrem em todas as áreas do desenvolvimento.

68
AS INFÂNCIAS UNIDADE III

Nesta Unidade iremos abordar os principais processos formadores da infância que são
divididos em primeira infância, segunda infância e terceira infância. Em cada um desses
estágios do desenvolvimento infantil veremos que a crianças passam por transformações
que vão além do físico, e englobam ainda o cognitivo, social e emocional. Cada etapa
aqui é bem definida, de modo a facilitar a compreensão. Caberá a nós fazermos a ligação
entre os processos e compreendermos que um não se dá independente do outro.

CAPÍTULO 1
Desenvolvimento da primeira infância

Neste capítulo abordaremos os aspectos relacionados ao desenvolvimento físico,


cognitivo e psicossocial das crianças até o terceiro ano de vida levantando alguns
pontos fundamentais para compreensão desta parte do desenvolvimento. Veremos na
literatura que a primeira infância é uma fase do desenvolvimento infantil que se estende
desde o nascimento até os três anos de vida, no entanto para o entendimento didático
utilizou-se essa separação, uma vez que o mundo dos bebês é bastante diferenciado.

A primeira infância

Figura 18.

Fonte: <http://artedainclusao.blogspot.com.br/2013/03/educacao-do-movimento-na-primeira.html>

69
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

Como vimos anteriormente, a primeira infância está relacionada a uma etapa da


vida que vai desde o nascimento até os 3 anos de idade. Após passada a fase do
recém-nascido vamos percebendo gradualmente o desenvolvimento de algumas
habilidades.

Podemos retornar ao pensamento dos estudiosos do desenvolvimento infantil e


observar a partir de cada perspectiva da aprendizagem no desenvolvimento que tanto
as linhas voltadas para o contexto social quanto para o contexto cognitivo trabalham
com estágios. No entanto, cada um dentro de sua perspectiva analisa o modo dessa
evolução e a forma como se dá o processo de desenvolvimento.

Seria válido, portanto, retornarmos, e fazermos um apanhado sobre o pensamento


das teorias psicanalíticas, cognitivas, e da aprendizagem a fim de estipular as possíveis
semelhanças e diferenças entre essas teorias.

O comportamento na primeira infância

O trabalho da desenvolvimentalista Nancy Eisenberg aborda a característica do


controle da emoção sendo construída a partir da variedade de interações sociais, as
quais vão se desenvolvendo ao longo da vida. A pesquisa revela que é no contexto
da vida, na fase da primeira e início da segunda infância, que a criança começa a
desenvolver suas habilidades sociais e a ser capaz de regular as emoções. Neste ínterim
é que as habilidades para o controle das emoções vão sendo firmadas (como traços da
personalidade) com grande probabilidade de serem repetidas no futuro. Por isso, falar
do processo de aquisição do controle emocional é importante e prevalece junto à ideia
de que o ambiente social, assim como a influência dos pais, são fatores influentes para
as características comportamentais. (BEE; BOYD, 2011).

O desenvolvimento das expressões emocionais infantis, a partir do modo como se


apresentam as expressões emocionais dos pais, refletem no modo como os filhos
expressam suas emoções. Quando falamos de emoções negativas dos pais geralmente
estas influenciam no controle das emoções dos filhos, uma vez que estes tenderão
a responder negativamente aos estímulos que gerem algum grau de desconforto ou
exijam alguma resposta menos automática e mais elaborada. No entanto, como
vimos, não parece que influências únicas são responsáveis para o desenvolvimento do
comportamento. (BEE; BOYD, 2011; PAPALIA; OLDS, 2000).

70
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

Aspectos do desenvolvimento físico


Nesse período os sentidos e sistemas corporais funcionam e estão se desenvolvendo em
variados graus. O cérebro ainda continua crescendo e se mostra sensível à influência
ambiental. Em termos físicos, o crescimento e o desenvolvimento de habilidades
motoras são gradativos e ocorrem de maneira rápida. (PAPALIA; OLDS, 2000)

Habilidades motoras

As habilidades motoras se tornam perceptivelmente aumentadas com o grau inicial de


complexidade dos movimentos. Neste período o desenvolvimento motor se caracteriza
por uma série de situações que são realizadas pela criança antes que ela possa ir para
uma próxima etapa, mais elaborada e complexa. Diferentemente de outra área do
desenvolvimento, no desenvolvimento motor o papel do ambiente é limitado, e pode
ser afetado pelo sexo, pela educação dos pais, e até por algum tipo de fator contextual
(clima, nutrição, por exemplo). O aspecto importante do desenvolvimento motor é a
observação de que as relações entre comportamento motor básico e cultura podem
diferenciar atrasando ou promovendo o desenvolvimento motor mais acelerado.

Citaremos o Teste de Avaliação de Desenvolvimento de Denver criado com


a intenção de identificar as crianças que não estão acompanhando o ritmo normal
no desenvolvimento físico-motor, no entanto pode ser utilizado para identificar o
desenvolvimento normal em crianças com idades entre um a seis anos.

Aspectos do desenvolvimento cognitivo

As habilidades cognitivas vão surgindo com a expansão da memória e compreensão


aumentada da fala; esse período se dá quando por volta dos 2 anos o processo de
autoconsciência aparece e a criança começa a distinguir-se do outro assim como o seu
“querer”.

As crianças já são capazes de aprender e de lembrar desde as primeiras semanas de


vida. O uso de símbolos e a capacidade de resolver problemas já iniciaram nessa fase
do desenvolvimento e normalmente a partir do fim do segundo ano de vida começam a
tornar-se mais complexas.

A linguagem

A linguagem que já passa do estágio de compreensão, inicia com a etapa do treino (do
uso), aperfeiçoando-se a cada dia a partir desse estágio. O final da primeira infância é

71
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

um marco no desenvolvimento da linguagem, quando a partir do ambiente e sobre suas


influências a criança normalmente inicia o processo de aprendizagem e internalização
da linguagem e suas funções e modo mais sofisticado. (BEE; BOYD, 2011; PAPALIA;
OLDS, 2000).

Teorizando a compreensão do processo cognitivo

Iremos abordar distintas teorias a fim de compreender o desenvolvimento cognitivo


nesta fase da vida infantil. Esse apanhado faz parte de uma adaptação de Papalia e Olds
(2000, p. 126):

Abordagem behaviorista – “estuda a mecânica básica da


aprendizagem, preocupando-se em como o comportamento muda em
resposta à experiência”.

Como os vimos no apanhado behaviorista, os bebês aprendem e desenvolvem sua


inteligência a partir de reflexos. Os reflexos são comportamentos apreendidos que os
levam a obter satisfação, por exemplo, enquanto no condicionamento operante o bebê
consegue aprender a produzir uma resposta com a intenção de obter algo. Ou seja, com
comportamento operante ele pode, a partir do condicionamento, ser estimulado a ter
um tipo de comportamento que já conhece para obter um resultado satisfatório. Com
condicionamento clássico os estudiosos analisavam que um bebê aprendia a responder
automaticamente a um estímulo que originalmente não provocava a resposta, no
entanto, era aprendida por meio desse tipo de condicionamento. “Uma das primeiras
demonstrações do condicionamento clássico em seres humanos provou que as emoções,
como o medo, podem ser condicionadas” (p. 127)

Abordagem piagetiana – observa as mudanças na qualidade do


funcionamento cognitivo, a partir do que a pessoa é capaz de fazer.
Observa ainda a relação entre as estruturas mentais e o modo como a
criança interage e se adaptam ao ambiente, sustentando a ideia de que
a cognição se desenvolve em etapas.

Estágio sensório-motor ocorre entre os primeiros dois anos de


vida; sendo seus subestágios, anteriormente apresentados os tipos
de comportamento e desenvolvimento cognitivos os quais permeiam
esse período. Aqui o bebê aprende sobre si e sobre o mundo através
do desenvolvimento das atividades sensório-motoras, ou seja, ele sai
do estágio em que se baseava por reflexos e passar a se comportar se
baseando suas relações com o ambiente, coordenando informações
que recebe dos sentidos e progredindo com uma aprendizagem

72
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

“tentativa e erro”. É com os subestágios que os padrões organizados


de comportamento vão tornando-se mais elaborados, assimilados e
adaptados aos antigos esquemas, formando progressivamente novos
esquemas mentais.

Durante estágio sensório-motor dois fatores são importantes para o desenvolvimento


sendo eles: a capacidade representacional quando a criança passa a representar
mentalmente objetos e comportamentos em sua memória. Para isso ela utiliza-se de
símbolos como palavras, números e imagens mentais. Outra capacidade inerente do
estágio sensório-motor é a do desenvolvimento da permanência do objeto quando
há uma compreensão de que o objeto ou pessoa continua a existir mesmo quando não
visíveis aos olhos. A permanência do objeto é vista como a capacidade base que ajuda
a criança a desenvolver uma outra capacidade chamada conscientização ─ que seria
quando ela percebe que sua existência se dá a partir dos objetos e de outras pessoas,
ajudando-a no sentimento de segurança em relação a ausência do objeto interacional.

Abordagem psicométrica – envolve as medições das diferenças


individuais em termos de quantidade de inteligência, avaliando o nível
de Inteligência da pessoa. Quanto mais alto for o escore em um teste de
inteligência mais inteligente presume-se a pessoa.

A fim de criar uma maneira de identificar as crianças que não eram capazes de lidar
com atividades escolares e que deveriam ser afastados das aulas regulares para receber
treinamentos específicos foi que Alfred Binet e seu colega Theodor Simon desenvolveram
testes psicométricos que visavam avaliar a inteligência através de medições numéricas.
A intenção dos testes era medir quantitativamente os fatores que constituíam a
inteligência, como compreensão e raciocínio. Os testes de coeficiente de inteligência
QI, um dos testes medidores de inteligência, podem ser utilizados em escolares, uma
vez que este teste pode prever escores do desempenho escolar de modo relativamente
preciso e confiável; no entanto o teste de inteligência em bebês e crianças jovens já não
é tão recomendado.

Abordagem do processamento de informação – concentra-se


nas diferenças individuais quanto ao modo no qual as pessoas usam
sua inteligência. Deste modo tenta descobrir os processos envolvidos
na percepção e no manuseio da informação.

Essa abordagem tentar explicar o desenvolvimento cognitivo a partir da pergunta:


como é possível ao bebê reconhecer?. Os estudiosos do processamento de informação
baseiam-se na memória, resolução de problemas e na aprendizagem. Assim como
uma abordagem, essa teoria tem a preocupação de diferenciar os indivíduos no

73
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

comportamento inteligente, concentrando-se nos processos mentais envolvidos


no momento da aquisição de informação ou na resolução de problemas, em vez de
simplesmente observar diferenças no funcionamento mental e a partir daí pressupor
os dados e problemas resolvidos. Ou ainda, estudos comprovaram que as habilidades
de processamento de informação no período de desenvolvimento da primeira infância
estavam relacionadas à capacidade cognitiva presente na brincadeira das crianças ─
capacidade de manter a atenção, chamada competência exploratória. A competência
exploratória estava relacionada à capacidade da criança em manter-se atenta ao novo
ambiente explorado de modo a ajudá-lo a desenvolver capacidades simbólica mais do
que aqueles que não se utilizavam dessa capacidade. (BEE; BOYD, 2011; PAPALIA;
OLDS, 2000).

Aspectos do desenvolvimento psicossocial


Desde o nascimento, a personalidade da criança vem mostrando um traço inato com
influências ambientais. Como vimos, a personalidade não é imutável, ela pode variar
ao longo do desenvolvimento, assim sendo, a personalidade que é formada pelas
nossas características externas e invisíveis e que são influenciáveis tanto por fatores
hereditários quanto ambientais (que diz respeito a nossa criação), poderá ser moldada
a partir da inter-relação desses aspectos de influência. (SCHULTZ; SCHULTZ, 2002)

A coleção de padrões relativamente permanentes de reagir aos outros e ao ambiente


e de interagir com estes é que diferencia cada criança ou adulto. (BEE; BOYD, 2011,
p. 254).

As emoções, temperamento e primeiras experiências afetivas com os pais são ainda


fatores contribuintes no processo do desenvolvimento psicossocial.

Emoções

Demonstradas a partir do relacionamento com os estímulos ambientais e


relacionamentos parentais. É dentro desse processo de interação que bebê e criança
vão apresentando os primeiros sinais de tristeza, interesse, alegria, raiva, surpresa,
vergonha e medo (emoções universais). É com a maturação cerebral que as emoções
vão pouco a pouco se desenvolvendo. As emoções básicas universais acontecem para
todos os seres humanos; no entanto são sentimentos subjetivos, e dependem do modo
como será interpretado e da cultura na qual esse indivíduo está inserido.

Os primeiros sinais de emoções do bebê são importantes dentro da área do


desenvolvimento. Desde o princípio eles demonstram infelicidade (desconforto,

74
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

incomodo, desamparo, fome) através das expressões corporais, e é através do choro


que ele expressa o desejo (comer, ser acalentado, trocado, enfim) e é por meio do choro
que ele consegue obter algo inicialmente, o que muda mais para frente quando o choro
expressará desconforto físico, e ainda mais adiante desconforto psicológico.

Segundo Papalia e Olds (2000, p. 155) “as emoções de auto consciência, como empatia,
ciúmes, embaraço, vergonha, culpa e orgulho não aparecem até o segundo e terceiro
ano, depois desse período as crianças desenvolvem auto consciência: a compreensão de
que são separadas das outras pessoas e coisas“.

Temperamento

Algumas pessoas tendem a não compreender o significado de temperamento, para isso


vamos defini-lo como o modo do comportamento, ou melhor, “como a criança faz”.
Pensando assim, podemos verificar como o temperamento afeta o comportamento. As
diferenças entre temperamento são consideradas inatas e amplamente hereditárias,
contudo fatores ambientais como a relação parental podem provocar mudanças
consideráveis. Assim como o cuidado dirigido à criança e o sentimento da mãe em
relação ao seu próprio estilo de vida podem influenciar no temperamento do filho.

Teoria Psicossocial de Erikson

Nesta teoria que ocorre do segundo e terceiro anos de vida na fase muscular-anal há
o desenvolvimento das habilidades físicas e mentais. Erikson desenvolve o pensamento
de que nesse estágio a criança passa por uma crise, que demandará algum grau de
escolha. Na crise desse estágio (autonomia versus dúvida e vergonha) haverá,
dentro do processo de escolha, a chance de a criança experimentar o poder de sua
própria vontade, o que as tornará conscientes de sua existência e capacidades. Aqui
está se desenvolvendo o senso de autonomia, ou melhor, de independência dos pais.
A criança começa a experimentar novas oportunidades de exploração, uma vez que as
habilidades físicas aumentam e ela se sente mais capaz. No entanto, o desejo de realizar
tarefas independentes entra em conflito com a culpa proveniente das consequências
─ caso a atividade não consiga atingir o padrão de comportamento esperado, ou burle
alguma regra. Nesse estágio ela tem noção das consequências de suas ações sobre o
comportamento, assim como entram em contato com a noção de normas sociais.
(FELDMAN, 2015)

75
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

Curiosidade!

Nas teorias psicanalíticas, a qualidade e o caráter dos relacionamentos de uma criança


com algumas pessoas fundamentais são considerados centrais ao desenvolvimento total
da criança. As teorias cognitivo-desenvolvimentais, que enfatizam primariamente
mais o desenvolvimento cognitivo do que a personalidade, invertem essa ordem
de importância, enfatizando a centralidade das ações da criança no ambiente e seu
processamento cognitivo das experiências. (BEE; BOYD, 2011 p. 37).

No tocante geral do que vimos até agora pergunto: Foi possível observar que as
perspectivas teóricas e a linha de raciocínio dos teóricos utilizadas para descrever
partes do desenvolvimento, neste caso, do desenvolvimento da primeira
infância, são entre si complementares? E mesmo quando não, quando essas
teorias vão em direções opostas, foi possível observar que nenhuma delas se
explica em sua totalidade? Você consegue perceber que tantos as perspectivas
teóricas quanto as abordagens de pensamentos acerca do desenvolvimento
estão inter-relacionadas e que algumas inclusive são meros aperfeiçoamento
de outras?

De todo modo, o que temos percebido acerca dos aspectos do desenvolvimento


psicossocial em nosso estudo é que as experiências sociais da criança e o seu
contexto familiar e social são aspectos grandemente importantes para o
desenvolvimento psicológico e a sensação de pertencimento da criança no
mundo em que se encontra.

Sobre este tipo de desenvolvimento poderíamos dar bastante atenção ao fato


de que na vida da criança a interação social favorece no desenvolvimento
da capacidade de responder adequadamente aos estímulos. E que
aproximadamente no início do segundo ano de vida, as interações com os pares
vão tomando forma e sendo percebidos, deste modo, ensinando-as a expressar
suas emoções.

É neste processo de interação na primeira infância que elas aprendem a controlar


suas emoções, assim como vão aumentando gradativamente suas capacidades
em termos de expressões faciais, exibições emocionais e interações sociais.

Vimos também que é por meio desse processo interativo que a criança na
primeira infância adquire o auto-controle físico e emocional.

76
CAPÍTULO 2
Desenvolvimento da segunda infância

Neste capítulo iremos estudar o desenvolvimento da criança que visivelmente já não


é mais tão acelerado quanto anteriormente, no entanto a progressão de aspectos
da sua coordenação, movimentos e desenvolvimento muscular ainda são bastante
significativos. Veremos que as habilidades do desenvolvimento do pensamento, da fala,
da lembrança, e da psicomotricidade deram um salto nessa fase. Agora ela já não se
considera mais bebê e sua aparência tem corroborado para essa sensação; assim como,
a partir de agora ela consegue explorar as possibilidades que os estímulos do ambiente
lhe proporcionam. Agora ela está menos suscetível aos riscos e se encontra mais atenta
para captar as informações que se lhe apresentam.

A segunda infância

Figura 19.

Fonte: <http://www.welcomeescoladeidiomas.com.br/products/aprendendo-ingl%C3%AAs-na-inf%C3%A2ncia-/>

Essa fase do desenvolvimento vai dos três aos seis anos e também é conhecida como
fase pré-escolar. Aqui há uma mudança nos traços físicos que faz a criança parecer
ainda um bebê por apresentar aspectos mais rechonchudos na estrutura corporal. Esse
desenvolvimento é perceptível, pois a criança agora se vê mais alongada em sua estatura
corporal graças ao crescimento dos ossos e musculaturas.

Outro fator também visível, desta vez aos que têm mais convívio com a criança, é o fato
de ela conseguir realizar um número maior de tarefas sem ajuda do outro. Ou seja, nesta
etapa as necessidades pessoais começam a ser atendidas por ela mesma nos âmbitos da
77
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

higiene e vestimenta, por exemplo. Assim como, traços motores mais sofisticados vão
permitindo a ela desenvolver funções quase impossíveis, anteriormente, como comer
sozinha de modo mais ordenado.

O seu mundo infantil agora está mais ampliado, não apenas pela vivência em um
contexto fora do lar, mas pela adaptação a esse contexto que permite espaço para o
aprendizado de novas experiências e tipos de relações. Sua visão de si mesma está
modificando-se e agora ela começa a entrar no mundo da vivência e aprendizado do
controle de suas emoções.

Aspectos do desenvolvimento físico


As mudanças na aparência física estão relacionadas a um desenvolvimento importante
dos grupos muscular e esquelético. Essas mudanças são coordenadas pelo cérebro e
sistema nervoso que estão em amadurecimento e dá lugar a novas e amplas habilidades
motoras.

À medida que os músculos se desenvolvem é possível notar uma aparência mais


alongada; o desenvolvimento das musculaturas abdominal faz com que a criança mais
rechonchuda passe a ter uma barriga menos protuberante, tórax, braços e pernas mais
compridos. A cabeça continua numa proporção mais aumentada que o resto do corpo.

Há ainda uma capacidade aumentada dos sistemas respiratório e circulatório, assim


como do sistema imunológico que mantém a criança cada vez mais afastada das doenças
infantis. No início da segunda infância os dentes de leite já estão completos, dando
maiores vantagens alimentícias à criança.

Habilidades motoras

É dos três aos seis anos que as áreas sensoriais e motoras do córtex cerebral permitem
melhor coordenação, facilitando a realização das tarefas. As tarefas nessa idade estão
mais ligadas ao brincar e se relacionam com as habilidades motoras gerais como pular e
correr; assim como às habilidades motoras finas como desenhar, pinçar, abotoar camisas.
Um aspecto importante sobre o fato de a criança apresentar desenhos cada vez mais
sofisticados, com a utilização de formas geométricas, e depois passar a combinar essas
formas tornando os desenhos mais complexos. Significa dizer que o desenvolvimento
cognitivo aumentou em termos da capacidade de representar simbolicamente ─ através
do desenho ─ os estímulos visuais captados, assim como representar as emoções que
esses estímulos passam.

78
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

As mudanças ocorridas na musculatura promovem o desenvolvimento de habilidades


motoras dos músculos maiores como correr, pular, saltar e arremessar. Assim como as
habilidades motoras dos músculos menores que refletem em atividades mais refinadas
como amarrar os cadarços, desenhar e comer sozinho.

Ritmo do sono

A mudança no ritmo do sono da criança também ocorre nessa fase, uma vez que ela
não precisa mais de um longo período de descanso, no entanto ainda permanece
na necessidade de uma soneca curta para recompor as energias durante o dia ─
até aproximadamente cinco anos. Durante a noite a tranquilidade para ir à cama
tende a diminuir, pois é difícil à criança abrir mão dos estímulos, das atividades e
relacionamentos para dormir. Neste tempo, a dificuldade dos pais em colocar a criança
na cama poderá aumentar; e ainda, novas necessidades ─ por parte da criança ─ podem
surgir para que ela se sinta mais tranquila e segura. É importante que os pais encarem
com naturalidade o fato de a criança pedir para deixar uma luz acesa, ou simplesmente
levar à cama um objeto preferido, o que chamamos objetos transicionais.

Os objetos transicionais são aqueles que ajudam a criança a passar pela fase de
dependência da primeira infância para a independência das fases posteriores da
infância. (PAPALIA; OLDS, 2000, p. 186)

Aspectos do desenvolvimento cognitivo

Nessa fase a criança já mostra uma forma peculiar de ver o mundo e participar dele
a partir da interação, utilizando da linguagem cada vez mais sofisticada. De modo
competente a criança interage demonstrando um nível de memória que a torna capaz
de formar conceitos e compartilhar com os adultos. Essa inteligência é aplicada para
resolver os problemas tanto em casa quanto no seu contexto social, na relação com os
pares no jardim de infância, na pré-escola, fazendo com que seu modo de pensar seja
cada vez mais visível, assim como todas as outras características que a diferenciam de
outras crianças de sua idade.

A linguagem

É nessa fase que a linguagem emerge na tentativa de traduzir as vivências internas.


La Taille (1992) transcorre sobre a compreensão de Piaget acerca da linguagem. A ideia
aqui é de que Piaget trata a chegada da linguagem como um fator a mais e não um fator
em si para o desenvolvimento do pensamento. Ou seja, embora o desenvolvimento da

79
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

linguagem seja necessário dentro da estrutura de desenvolvimento da criança ela não é


fator determinante para o desenvolvimento dos processos cognitivos, uma vez que estes
ocorrem independentemente, mas já a linguagem não ocorre sem o desenvolvimento
dos processos cognitivos, como a inteligência por exemplo.

Em termos de linguagem, a criança é capaz de aprender até nove palavras novas por
dia com um ano e meio de idade, graças a um rápido, mas significativo, mapeamento
de novas palavras que são absorvidas após ouvi-la uma ou duas vezes numa conversa.
O que demonstra que elas são capazes de formar uma compreensão rápida mesmo
que parcial do significado e guardá-las na memória. A criança ainda pode ser bastante
literal na interpretação e no uso de uma palavra, uma vez que a imaturidade cognitiva
é um fato.

A fala privada

Iremos apontar o entendimento, sobre a fala privada, de dois renomados teóricos que
estudaram sobre o desenvolvimento e seus processos de aprendizagem. A fala privada é
uma etapa do desenvolvimento da linguagem em que a criança fala consigo mesma sem
a intenção de se comunicar, geralmente podemos observar no ato de brincar.

Para Piaget a criança conversa sozinha enquanto brinca porque ainda não desenvolveu
totalmente a função simbólica, o que implica dizer que ela não consegue diferenciar as
palavras e as ações representadas pelas palavras, para ele essa era uma ação egocêntrica.
Para Piaget o egocentrismo é quando a criança simplesmente pensa ou supõe que todos
percebem o mundo como ela. (BEE; BOYD, 2011)

Já Vygotsky levantava a hipótese de que a fala privada é estimulada pela experiência


social. Ele sugeriu que ela aumenta nos primeiros anos escolares conforme a criança a
utiliza para controlar suas ações, e mais para frente desaparece, quando ela se tornar
capaz de controlar suas ações de um modo silencioso. Esse tipo de comportamento
é compreendido como parte do processo e deveria ser melhor recebido no contexto
escolar pelos educadores, uma vez que esse processo de falar em voz alta em breve
será substituído pelo processo interno de pensamento. (PAPALIA; OLDS, 2000; BEE;
BOYD, 2011)

A criança pré-operacional

Piaget chamou esse momento do desenvolvimento de estágio pré-operatório (2


a 6 anos) em que a criança passa por uma série de modificações cognitivas que lhe
permite interações, envolvendo parte do que ela vem conhecendo a respeito de suas

80
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

emoções, do mundo – com a interpretação e significação dos estímulos –, e que agem


simultaneamente e em um processo dinâmico.

Habilidades cognitivas do desenvolvimento


segundo Piaget e outros pensadores

Iremos descrever algumas habilidades do processo cognitivo, que mesmo tendo início
na primeira infância, tem o seu pico de desenvolvimento na segunda infância e são
totalmente realizadas até a terceira infância.

A capacidade simbólica já está bem avançada, o que significa dizer que a criança é
capaz de detectar símbolos usados para representar palavras, números ou imagens. E
ainda, não é preciso ser estimulada para pensar (ou obter um estímulo sensorial) sobre
alguma coisa, o que significa dizer que a função simbólica já está internalizada. No
entanto, ainda há muitas limitações no que diz respeito à lógica e ao raciocínio.

A compreensão de identidade faz com que a criança perceba que embora possa
haver alterações superficiais nas pessoas e coisas elas têm uma identidade própria que
as fazem ser o que elas são. Por exemplo, embora mudem de cor, tamanho e aparência
devido às diferenças raciais os cães serão cães e não ursos.

A compreensão de causa e efeito traz uma percepção de ordem e organização do


mundo em que estão inseridas. E, deste modo, as crianças ao mostrarem incompreensão
de causalidade demonstram maior conhecimento e compreensão sobre os eventos ao
seu redor. Por exemplo, quando a criança sabe que o seu irmão mais velho está chorando
porque sua mãe ordenou que ele fosse tomar banho.

Com a capacidade de classificar a criança demonstra que é capaz de organizar


objetos, pessoas e eventos em categorias de significado. Por exemplo, quando a criança
revela que o seu brinquedo favorito é o urso marrom e pequeno.

Já na compreensão do conceito de números a criança pode apresentar uma


compreensão sobre os conceitos básicos de numeração de modo que são capazes de contar
e consequentemente diferenciar os objetos pela quantidade. Esta habilidade cognitiva
se inicia na primeira infância, no entanto é na segunda infância que irá desenvolver-se
mais profundamente. Aqui ela já pode verificar que o número de bolachas do seu prato
é menor que o número de bolachas do prato do irmão.

A habilidade da empatia aproxima a criança dos seus pares e torna possível o


relacionamento, uma vez que a criança está apta a imaginar como o outro poderia
sentir-se, a partir do seu próprio funcionamento acerca das emoções.

81
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

As limitações no estágio pré-operacional


Piaget observou e constatou, de modo experimental, que na segunda infância mesmo
a criança tendo um desempenho cognitivo significativo é possível detectar algumas
limitações no pensamento operacional quando comparado à criança que está no estágio
de operação concreta na terceira infância.

Centração é quando a criança é capaz de concentrar-se em um único aspecto de uma


situação. Nesse estágio ela chega a uma conclusão ilógica por não ser capaz de descentrar
(pensar simultaneamente sobre vários aspectos de uma mesma situação). Para explicar
melhor essa teoria Piaget projetou o teste da conservação, quando descobriu que a
criança não compreende esse princípio até o estágio de operações concretas. A criança
não compreende que duas coisas são iguais e continuam iguais mesmo quando sua
forma é alterada mas nada é retirado ou adicionado.

Confusão entre aparência e realidade aqui a criança não consegue diferenciar o


que vê do que ele pensa que vê; ou seja, se ela pensa que vista de longe a bola parece
menor, ela acha que a bola é menor. É no próximo estágio, logo em seu início, que
segundo Piaget, a criança consegue distinguir o que parece ser do que é.

Irreversibilidade também é um tipo de limitação da lógica infantil, uma vez que a


criança é incapaz de compreender que uma operação pode ter dois ou mais sentidos.
A irreversibilidade faz com que a criança tenha dificuldade em compreender que uma
perna quebrada poderá ser curada após um processo de cicatrização e tratamento, por
exemplo.

O foco nos estados mais do que nas transformações faz com que a criança no
pré-operatório se concentre mais em estados ou situações num ponto de vista estático,
e não reconheça que possa haver transformação de um estado para o outro. Ou seja,
ela não é capaz de perceber que a quantidade de suco contida no seu copo é a mesma
quantidade de suco derramada em cima da mesa após um esbarrão do seu braço no
copo.

Raciocínio transdutivo é quando a criança nesse estágio vê uma situação como base
para outra situação, mesmo que as situações não tenham um relacionamento entre si.
Por exemplo, ela pode pensar que o fato de ter se comportado mal fez com que a mãe
ficasse doente.

O egocentrismo é outra limitação desse estágio, e que já foi comentado anteriormente,


quando falamos da incapacidade que a criança tem de ver as coisas do ponto de vista do
outro. Ou seja, quando a criança pensa que a mãe ficou doente porque ela se comportou
mal significa dizer que ela está pensando de maneira egocêntrica.

82
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

Aspectos do desenvolvimento psicossocial

É nessa fase, mais ou menos por volta de cinco anos, que a criança desenvolve uma
ideia mais sofisticada de si mesma como indivíduo único, com gostos, dificuldades,
características e ideias próprias. O conhecimento do “eu” ou auto-conceito está
relacionado à forma como se dá a construção da nossa própria imagem, é o que
percebemos de nós mesmos, quem acreditamos que somos; e que se constrói graças
ao conjunto de experiências que nos permitem desenvolver esse chamado senso de
identidade. “O auto-conceito é o conhecimento da pessoa e os pensamentos sobre o
conjunto de qualidades atribuídas ao self ” (BEE; BOYD, 2011, p. 280).

A visão neopiagetiana explica que há um modo, divido em etapas, de conhecer o


desenvolvimento contínuo de elaboração da autoimagem. Primeiro acontece na idade
de quatro anos quando a criança se percebe por meio de representações simples,
ou seja, a partir de construções de si mesma isoladas umas das outras. Nesse estágio
seu pensamento é transdutivo o que implica dizer que ela não estabelece conexões
lógicas sobre si mesma. Por exemplo, não consegue imaginar o fato de poder ter duas
emoções ao mesmo tempo. Como não pode se descentrar, ou melhor, ela não considera
diferentes aspectos de si própria ─ ou é tudo ou é nada. Nesse estágio ela não é capaz de
reconhecer que a pessoa que ela realmente é não é a mesma que ela gostaria de ser, por
isso ela se descreve como um modelo imaginário de virtude e capacidade.

A segunda fase do conceito, que ocorre entre os cinco a seis anos, é do estágio de
mapeamentos representacionais, neste caso as conexões lógicas se paralisam,
ainda no pensamento do “tudo ou nada”, por exemplo, como a qualidade bom e mau.
Vendo esses opostos ela não consegue se imaginar sendo boa em algumas coisas e não
tão boa em outras.

Neste período lidar com as emoções e sentimentos conflitantes em relação ao “eu” é


o desafio. Segundo Erik Erickson, a crise pela qual a criança passa é chamada de
iniciativa versus culpa esse conflito surge a partir do momento em que a criança é
capaz de algum planejamento e estabelece objetivos ou faz planos a fim de alcançar metas.
Embora as atividades não sejam tão complexas, o sentimento da criança em relação à
tentativa pode terminar em frustração, gerando comportamentos inadequados como de
agressividade. Essa fase coloca a criança em frente ao desejo de tomar iniciativas para
realizar tarefas, as quais elas têm desejo, em detrimento do que ela não pode realizar
(por algum tipo de limitação) seja por não conseguir, seja por motivos revelados pela
consciência de que não se deve fazer, como por exemplo, para não deixar de seguir as
regras e normas impostas. Neste caso, o comportamento, pensamento ou atitude pode
produzir culpa. Embora pesquisas revelem que a culpa é um sentimento necessário no

83
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

desenvolvimento do auto-controle e consciência em demasia pode inibir a criatividade


ou influenciar nas interações. (FELDMAN, 2015)

As emoções

O estado emocional nessa época está aflorado, quanto mais a compreensão do mundo
externo e interno da criança vai se ampliando mais essa rede de emoções complexas e
confusas vai aumentado. Nesta fase as emoções dirigidas ao “eu” se apresentam todos os
dias em diferentes situações do seu contexto, no entanto ainda é de difícil compreensão
para a criança pré-escolar.

As emoções como vergonha e o orgulho aparecem apenas após o segundo ou terceiro


ano de vida, e surgem após a compreensão da autoconsciência. Essas emoções se
desenvolvem a partir das relações sociais, e ainda, são dependentes da internalização
dos padrões parentais de comportamento, o que irá influenciar no desenvolvimento das
emoções.

A respeito das emoções, as autoras Harter e Whitesell (1987) destacaram que as crianças
adquirem paulatinamente a compreensão de emoções simultâneas, divididas em quatro
níveis que vai desde a idade de quatro anos até de 12 anos. Para as autoras a confusão na
compreensão da criança pequena em relação ao seu sentimento se dá pela incapacidade
de reconhecer que as emoções podem ser experimentadas de modo que mais de uma
reação emocional seja sentida ao mesmo tempo. E então a criança não consegue
fazer essa diferenciação porque a qualidade de sua emoção, seja no aspecto positivo
ou negativo e o alvo ao qual essa emoção é dirigida, ainda não estão suficientemente
compreendidos a nível cognitivo. No nível zero a criança não compreende a existência
de dois sentimentos ao mesmo tempo. No nível um a criança tem a consciência de que
duas emoções podem surgir ao mesmo tempo, no entanto só discernem se estas forem
dirigidas ao mesmo alvo e ambas forem positivas ou negativas. No nível dois a criança
é capaz de reconhecer que tem duas emoções do mesmo tipo dirigidas a diferentes
alvos, portanto não são capazes de reconhecer sentimentos contraditórios. No nível
três a criança pode compreender que tem dois sentimentos opostos simultâneos
apenas se forem dirigidos aos diferentes alvos, mas não é capaz de reconhecer que tem
sentimentos negativos e positivos em relação aos sentimentos. Nível quatro a criança
agora pode descrever seus sentimentos opostos em relação ao mesmo alvo.

O brincar

O brincar é considerado parte do processo de desenvolvimento infantil. A brincadeira


envolve os sentidos, a coordenação, o aprendizado, a estimulação dos movimentos

84
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

musculares, aumenta a percepção do que se vê e do que se faz, facilita a aquisição


do domínio sobre o corpo, abre portas para exploração do mundo e de si mesmo. É
brincando que a criança adquire novas habilidades, se torna mais proficiente na
língua, vive situações da vida real de modo simbólico, treina as emoções complexas,
experimenta papéis diferentes.

A criança pré-escolar brinca de modo diferente e com estilo próprio do brincar anterior.
Brincar nessa idade pode refletir o grau de interação da criança com uma outra criança,
ao que poderíamos chamar de brincar social; ou ainda, o brincar cognitivo que revela
o seu nível no desenvolvimento mental. À medida que vai crescendo a criança tende a
tornar o seu brincar mais social e cooperativo, uma vez que deixa de brincar sozinha
para brincar ao lado de outras crianças e finalmente com outras crianças. O brincar
cognitivo passa pela capacidade da criança de inventar situações, ou seja, criar um jogo
imaginativo em que o seu brincar denota sinais de desenvolvimento, sendo que progride
do brincar simples e repetitivo para o brincar mais complexo que exige além do uso de
um maior número de habilidades, uma maior sofisticação mental. (FELDMAN, 2015;
BEE; BOYD, 2011).

Desenvolvimento de gênero

É na segunda infância que a consciência do gênero (masculino ou feminino) se


desenvolve. Meninos e meninas são diferentes além dos órgãos sexuais, mas também
diferentes em tamanho, força, aparência, capacidade física, intelectual e personalidade.
No entanto dentre esses aspectos podemos distinguir diferenças sexuais ─ diferenças
biológicas entre machos e fêmeas, e as diferenças de gênero ─ diferenças psicológicas
ou comportamentais entre os sexos. (PAPALIA; OLDS, 2000)

Para pensarmos sobre o sentido da compreensão de gênero de uma criança Bee e


Boyd (2011) sugerem que esta é a parte do processo de autocategorização, ou seja, é
quando no entendimento geral do mundo a criança progride cognitivamente sendo
capaz de percebê-la como sendo de determinado sexo. Para os estudiosos, a etapa
de entendimento de gênero se divide em identidade de gênero, que é quando ela
simplesmente consegue rotular o seu sexo e identificar homens ou mulheres, meninos
ou meninas; e estabilidade de gênero que é quando ela tem o entendimento de que as
pessoas permanecem com o mesmo gênero durante toda a vida; já na constância de
gênero ela constrói o entendimento de que o sexo biológico de uma pessoa permanece o
mesmo, ainda que haja mudança em aspectos comportamentais ou estéticos, a clareza
da identificação do gênero é a última fase quando a partir dos 6 anos a criança tem em
seu processo cognitivo a capacidade de diferenciar realidade de aparência.

85
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

Para explicar como os pré-escolares demonstram sua consciência da identidade


de gênero e papéis sexuais pesquisadores, dentro de suas distintas visões, levantam
considerações que se baseiam em influências naturais e adquiridas. (PAPALIA; OLDS,
2000, p. 225).

Na teoria Psicanalítica de Sigmund Freud a aquisição da identidade de gênero se dá


a partir de conteúdos emocionais. É quando há identificação por parte da criança das
características, valores, atitudes, crenças, comportamentos com o genitor do mesmo
sexo.

Na teoria da Aprendizagem Social de Albert Bandura esse processo é baseado na


aprendizagem, quando as crianças adquirem identidade de gênero e papéis sexuais a
partir da observação e imitação dos modelos.

Na teoria do Desenvolvimento Cognitivo de Lawrence Kohlberg se baseia nos processos


cognitivos, quando em desenvolvimento e depois da aquisição da consciência, a criança
classifica a si mesma e aos outros como masculino ou feminino e então organiza seu
comportamento baseado nessa identificação.

Já a Teoria do Esquema Sexual de Sandra Bem tem uma abordagem cognitivo-social


em que a criança organiza as informações sobre o que é considerado apropriado para o
seu sexo com base na cultura.

Embora cada teoria focalize por meio de sua linha de pensamento no desenvolvimento
de gênero, elas não explicam totalmente o modo como meninos e meninas se tornam
diferentes em determinados aspectos.

86
CAPÍTULO 3
Desenvolvimento da terceira infância

Aqui estudaremos como ocorre o desenvolvimento das competências infantis nas áreas
física, cognitiva e psicossocial apontando para as diferenciações apropriadas ocorridas
nessa fase da vida.

Veremos ainda que existem alterações nas competências que afetam a autoestima e o
relacionamento entre os pares, e que esse período é marcado, em seu início, pela entrada
na escola regular. Nesse momento a criança entra em um estágio de desenvolvimento
que irá marcar surpreendentemente seu modo de relacionar-se com o mundo.

A terceira infância

Figura 20.

Fonte: <http://vivamelhoronline.com/2013/08/20/exercicios-na-infancia-melhoram-a-saude-dos-ossos-na-terceira-idade/>

Essa fase compreende os 6 aos 12 anos de vida e traz consigo uma variedade de
transformações que irão desde o tamanho da criança até habilidades motoras
coordenadas e desenvolvidas, e o uso da inteligência com progressões visíveis sobre a
lógica.

Embora seja uma fase de crescimento mais lenta, assim como as transformações que
ocorrem nesse estágio do desenvolvimento, é importante destacar que as mudanças
do começo da terceira infância são bastante diferentes do final desta, uma vez que
as crianças aparentam física e comportamentalmente um nível diferenciado de
desenvolvimento.

87
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

Aspectos do desenvolvimento físico


Neste período as crianças se enfrentam a todo tempo a fim de quebrar seus recordes de
altura, corrida, pisadas, equilíbrio, enfim, os desafios misturados com brincadeiras são
inúmeros e parecem fazer parte de um alarme que soou dentro dela dizendo: “Olá, você
já viu que é capaz de mais?”

O fato de estar aflorada em suas novas habilidades físicas, motoras e intelectuais torna
esse ser único em uma criança diferenciada, quando comparada aos outros estágios do
desenvolvimento. Na medida em que parecem mais altos, mais esbeltos, mais atléticos,
ágeis e enérgicos em sua grande maioria, as crianças entre 6 e 12 anos já não são mais
como no estágio anterior.

Habilidades motoras

Durante essa fase a criança multiplica seu peso corporal médio e cresce até 7,6 cm
a cada ano. Variam de tamanho e peso dependendo do sexo, da cultura, faixa-etária,
raça e herança genética. Conforme estudos, meninas entre 10 e 12 anos crescem mais
rapidamente e ganham mais peso que os meninos, no entanto os meninos as superam
mais adiante dessa fase do desenvolvimento. (DAVIDOFF, 2001). Ainda nessa fase a
criança se torna mais alta, mais fina, mais ágil e forte, estando apta a participar de
brincadeiras e jogos mais elaborados e praticar atividades esportivas mais complexas e
organizadas.

Influências alimentares ainda costumam agir diretamente no peso e de algum modo


também influenciam na altura das crianças, e no mundo atual, assim como a nutrição
sempre foi um alerta para o desenvolvimento adequado das crianças, hoje, o excesso
de alimentação industrializada tem atingido crianças e adolescentes ─ não apenas
no desenvolvimento físico, mas no que concerne ao desenvolvimento psicológico e
cognitivo. (DAVIDOFF, 2001).

Aspectos do desenvolvimento cognitivo

Avanços significativos são encontrados no pensamento lógico e criativo, além de


uma maior compreensão dos juízos morais, crescimento da memória, leitura, escrita.
Sendo assim, é possível dizer que a inteligência ou capacidade de absorver, diferenciar,
realizar e reter aquilo que vem captando e aprendendo com o mundo a sua volta estão
igualmente mais desenvolvidos.

88
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

Piaget e outros estudiosos do desenvolvimento estiveram interessados em verificar


a crescente melhora do desenvolvimento em aspectos cognitivos. O que se percebia
era que as crescentes melhorias inteligíveis advinham do aprendizado e, portanto, a
aquisição de conhecimento adquirida por meio da escolarização ajudaria a explicar esse
crescimento.

Nesta fase a criança já tem capacidades aumentadas no processo da cognição, como


podemos perceber quando se trata de memória. Aqui há uma descoberta, por parte
da criança, de que é possível se utilizar de recursos que irão ajudá-la a realizar algum
tipo de planejamento em relação à memória. As estratégias à medida que crescem vão
tornando-se cada vez mais complexas, fazendo com que o uso de recursos mnemônicos
seja cada vez mais utilizados.

A memória, mais aperfeiçoada na terceira infância, torna as crianças mais capazes


de focar sua atenção. Sendo nessa fase escolar fator contribuinte para aquisição de
informações relevantes. “A capacidade de memória a curto prazo das crianças ─ a
quantidade de informações que podem manter em mente num determinado momento
─ aumenta”. (FLAVELL et al., 1993 apud PAPALIA; OLDS, 2000, p. 260).

Em termos de memória a criança se utiliza de recursos que podem ser: recursos


mnemônicos externos ─ quando são capazes de utilizar de um recurso para
lembrar-se de algo, como por exemplo, deixar ao lado da mochila da escola algum
objeto que tenha interesse em levá-lo à escola; ensaio ─ quando a criança faz repetições
conscientes a fim de treinar para alguma ação que deverá realizar; organização ─
essa habilidade pode ser adquirida a partir do ensinamento e se dá quando já são
capazes de agrupar ou categorizar objetos; elaboração ─ aqui há uma construção
ou criação mental, quando ela se utiliza de recursos imaginativos que irão ajudá-la a
lembrar-se do que deverá realizar, por exemplo, quando ela elabora histórias criativas
a fim de lembrar-se do que precisa realizar.

Além dessas aptidões estudos mostraram por meio de testes de inteligência que
crianças nesta idade deram um salto em várias áreas do conhecimento. Alguns testes de
inteligência tendem a verificar o grau de inteligência e rapidez de uma criança; outros
exploram a linguística, a lógica matemática e a orientação espacial. Embora os testes
tenham sua validade e reconhecimento dentro da área acadêmica é sempre importante
lembrar que os mesmos nem sempre predizem à realidade, portanto nem sempre irão
avaliar corretamente o grau e níveis de aptidão de uma criança de maneira fidedigna,
uma vez que outros fatores poderão contribuir para que essas respostas estejam
enviesadas. Em relação aos testes de coeficiente de inteligência é preciso lembrar que
a inteligência muda e não está paralisada e definida, já que é resultado de processos

89
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

interativos entre criança e ambiente e essa mesma interação está sempre em contínuo
processo evolutivo. (DAVIDOFF, 2001; PAPALIA; OLDS, 2000; BEE; BOYD, 2011).

A linguagem

Para fechar o ciclo de aprendizagem sobre a linguagem iremos abordar a teoria nativista
que percebe o aprendizado da língua como algo inato no organismo. Teóricos nativistas
como Noam Chomsky observavam a complexidade das tarefas que as crianças deveriam
realizar, assim como desempenhavam semelhantes atividades nas determinadas fases
do desenvolvimento da linguagem a fim de obtê-la. No entanto, para eles, esse fenômeno
que atua a partir de princípios operantes inatos que está contido no código genético do
bebê, se dá uma vez que o mesmo está programado a adquirir linguagem. (PAPALIA;
OLDS, 2000).

Já a teoria construtivista justifica o processo de aprendizagem da linguagem por meio


de explicações tal como poderemos ver com Melissa Bowerman que trabalha com a
ideia de que quando a linguagem aparece ela não está introduzida de significados no
mundo da criança, mas sim surge apenas para a expressão dos significados que ela
mesma construiu em sua mente. Por exemplo, o bebê olha para a mãe e balbucia algum
som que lembra “dá”, ainda movimenta suas mãos em direção à mãe, no entanto esse
tipo de linguagem pode estar relacionada a um pedido, o de descer do carrinho por
exemplo. Ainda, ela começa a utilizar a linguagem como forma de expressão aprendida,
e por isso, para os construtivistas o desenvolvimento cognitivo é um processo que se
dá interdependente ao da linguagem, na medida que um vai se desenvolvendo o outro
acompanha com uma determinada direção e sentido. (BEE; BOYD, 2011).

Ainda em se tratando de uma teoria para explicar o desenvolvimento da linguagem


podemos destacar a teoria ambientalista, a qual verifica a influência do ambiente e
cultura sobre o processo linguístico. Estudos foram realizados e descobriu-se que “pais
que falam mais, que leem mais para seus filhos, que induzem mais a linguagem deles
e que respondem adequadamente à sua linguagem podem ter filhos que desenvolvem
a linguagem mais rapidamente, não importando a herança genética.” (BEE; BOYD,
2011, p.244). À semelhança em crianças pequenas de diferentes culturas e línguas é
surpreendente em termos linguísticos, uma vez que pesquisas averiguaram que ainda
na fase pré-linguística a linguagem parece ser idêntica entre todas as comunidades.
Algumas das semelhanças observadas pelos estudos foram que todos os bebês entendem
a língua antes de falar, em todas as culturas os bebês começam a usar suas primeiras
palavras por volta dos 12 meses, e também, todos os bebês a arrulham e balbuciam.
(BEE; BOYD, 2011).

90
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

Pensando nessas teorias para as diversas fases do desenvolvimento da linguagem


vamos abordar esse desenvolvimento entre os 6 e 12 anos, quando na terceira infância
as habilidades de linguagem continuam crescentes. Aqui a criança está visivelmente
mais capacitada a compreender e interpretar as comunicações orais e escritas do seu
ambiente, assim como mais capaz de se fazer entender. A compreensão está cada vez
mais complexa no modo de como organizar as palavras em frases e orações. Chomsky
destacou que muitas crianças até os seis anos ainda não aprenderam a lidar com as
construções verbais complexas, principalmente as de duplo significado, mesmo tendo
elas compreensão do que foi dito e de como usar a palavra corretamente em outras
orações. Embora nessa idade elas usem a gramática de modo complexo e tenham um
vocabulário de milhares de palavras, elas ainda não têm a capacidade de dominar os
aspectos sofisticados da linguagem.

Habilidades cognitivas do desenvolvimento


segundo Piaget e outros pensadores

De acordo com Piaget as crianças a partir dos sete anos de idade entram em um novo
estágio do desenvolvimento cognitivo. Aqui elas desenvolvem a capacidade lógica
e deixam de seguir tão predominantemente as informações sensoriais passando a
entender a natureza ou funcionamento do que está ao seu redor, ou seja, adquirem
habilidades para realizar operações mentais de modo silencioso. Aqui elas se apresentam
menos egocêntricas e se utilizam de operações mentais (pensamento) a fim de
resolver problemas reais. Agora, a criança pensa logicamente levando em conta várias
situações e não mais focalizando apenas em um único aspecto, como fazia no estágio
pré-operacional. Sua capacidade está aumentada para compreender as colocações
e ponderações do outro, isso a ajuda tornando a comunicação mais precisa, efetiva e
eficaz. Ela agora é mais flexível quanto aos julgamentos morais aprendidos.

Nessa fase do desenvolvimento cognitivo a criança pode realizar tarefas no nível mais
elevado e tem melhor compreensão da conservação, da diferença entre aparência e
realidade, e dos relacionamentos entre os objetos, o que as tornam capazes de distinguir
a fantasia da realidade.

Quando se trata de desenvolvimento cognitivo outros pesquisadores abordam os aspectos


relacionados à melhoria gradativa proveniente do aprendizado, para eles a aquisição do
conhecimento se dá também devido à escolarização. A habilidade de conservação se
dá não devido aos novos padrões de organização mental, mas sim pelo maior contato
e experiência da criança com o mundo físico. Ainda levantam a hipótese de que nessa
fase crianças são capazes de processar as informações mais rapidamente, ou seja, o

91
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

tempo de processamento para tarefas como fazer contas mentais, por exemplo, diminui
consideravelmente.

A criança operacional-concreta

Alguns avanços cognitivos são importantes e merecem destaque. Os avanços nas


habilidades chamadas operações concretas, são:

»» Conservação ─ está na capacidade de reconhecimento a respeito da


quantidade; para a criança o objeto permanece igual ainda que o mesmo
material seja reorganizado. Entretanto, para que esse pensamento seja
possível, nada pode ter sido adicionado ou retirado desse objeto. Por
exemplo, a criança consegue identificar a partir da conservação quando
um líquido presente em seu copo habitual é derramado em outro copo
com formato diferente, porém, para ela, a partir de sua capacidade
lógica mais desenvolvida continua sendo aquele líquido conservado
na mesma quantidade, mesmo que apresentado em diferente forma.
Piaget entende esse desenvolvimento, porém pondera, afirmando que a
compreensão da conservação depende da maturação em que se encontra o
desenvolvimento neurológico da criança. Ainda, aos 7 e 8 anos, conforme
Piaget, a criança pode resolver problemas de conservação de substância
de modo diferente da conservação de peso e conservação de volume.
Esse processo de compreensão dos diferentes tipos de conservação
(decalagem horizontal) se explica uma vez que o pensamento da criança
é tão concreto e está intimamente ligado a uma situação particular, que
ela não consegue transferir imediatamente o que aprendeu sobre um tipo
de conservação para o outro tipo de conservação, mesmo tendo ambos os
mesmos princípios básicos.

Note que Piaget não afirmava que todas as habilidades operacionais concretas surgiam
no mesmo momento, como se uma lâmpada acendesse na cabeça da criança. Ele usou
o termo decalagem horizontal para referir-se à tendência das crianças de serem
capazes de resolver alguns tipos de problemas operacionais concretos mais cedo que
outras. A palavra francesa de decalage significa ‘movimento’. O movimento para o
pensamento operacional concreto é ‘horizontal’ porque envolve aplicação do mesmo
tipo de pensamento - lógica operacional concreta - a novos tipos de problemas. Uma
decalagem ‘vertical’ seria um movimento de um tipo de pensamento para outro,
como acontece quando as crianças passam do estágio pré-operacional para o estágio
operacional concreto. (BEE; BOYD p. 183, grifo do autor)

92
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

»» Classificação ─ neste caso ela já é capaz de organizar e compreender o


mundo por meio da categorização, porém aqui iremos tratar da inclusão
de classe em que a capacidade de perceber o relacionamento entre o todo
e suas partes já é evidente.

»» Seriação ─ aqui as crianças são capazes de organizar os objetos em série,


deste modo podem ordená-los de acordo com uma ou mais atribuição
dada ao objeto como peso (do mais pesado ao mais leve) e cor (do mais
claro ao mais escuro).

»» Inferência Transitiva ─ essa é a capacidade de reconhecer uma relação


entre objetos a partir do relacionamento entre cada um deles e um terceiro.
Ou seja, a capacidade de reconhecer um objeto ou características dele a
partir da inferência lógica que se deu através do contato ou percepção de
outro objeto.

»» Números e Matemática ─ nessa idade elas são capazes de contar a partir


de um número qualquer, além de contar de cabeça. Também se torna
mais exata para resolver problemas em histórias.

»» Distinção Fantasia e Realidade ─ tem a capacidade de diferenciar o real do


imaginário. Estudos demonstram que criança que assiste muita televisão
está propensa a ser influenciada pelo que vê, por exemplo, querer ser
cantor porque gosta do papel de cantor realizado por um admirado ator.
(WRIGHT et al., 1995 apud PAPALIA; OLDS, 2000).

JULGAMENTO MORAL ─ conforme Piaget, esse tipo de desenvolvimento está


relacionado ao crescimento cognitivo, uma vez que a criança faz julgamentos morais
mais consistentes conforme vai alcançando maior maturidade cognitiva, de modo a
considerar as coisas a partir de mais de um ponto de vista. Os estágios da moralidade
seriam: moralidade de restrição é quando a criança pensa de maneira rígida sobre
os conceitos morais, neste ponto são egocêntricas e acreditam que as regras não podem
ser mudadas; moralidade de cooperação é marcada pela flexibilidade, uma vez
que quando a criança amadurece ela interage com mais pessoas e passa a ter contato
com uma variedade de pontos de vista, essa variedade de informações associadas a
um processo de maturação contribui para formação de um código moral próprio.
(DAVIDOFF, 2001; PAPALIA; OLDS, 2000; BEE; BOYD, 2011).

93
UNIDADE III │ AS INFÂNCIAS

Aspectos do desenvolvimento psicossocial

Nessa fase há uma distinta interação em se tratando de família e amigos, pois o aumento
nas construções sociais, em termos qualitativos, mostra a relevância dos aspectos
relacionados à construção da identidade. É nessa fase que há um salto no conhecimento
acerca de si e do outro envolvendo ainda os padrões de comportamento que se tornam
perceptíveis e se estabelecem de modo mais duradouro. O que faz com que elas
percebam a amizade como um relacionamento que aproxima pessoas com atitudes e
valores semelhantes, de tal modo que crescem e se tornam mais íntimos a partir de
trocas e experiências mútuas. Aqui, como podemos comprovar, há uma diminuição no
egocentrismo e uma ampliação da memória e da linguagem, principalmente no que
condiz aos aspectos simbólicos. A autoimagem e a relação com a autoestima também
sofrem mudanças, uma vez que os aspectos sociais se tornam relevantes e os amigos
assumem um importante papel nesse contexto. Há uma notável separação de gênero
entre as amizades femininas que geralmente são mais intensas e íntimas e as masculinas
que fazem amizade em maior número e menor intensidade de afetos.

A autoestima de uma criança nessa idade se caracteriza pelo grau de diferenciação entre
o que a criança pensa ser e o que deseja ser, no que implica dizer que quanto menor
essa diferenciação maior a autoestima dela. Assim como, quanto maior a percepção da
criança em relação à rede de apoio que ela tem, maior a probabilidade de apresentar um
nível de autoestima satisfatório.

A experiência no contexto escolar da criança de certa forma afeta os aspectos do


seu desenvolvimento emocional e social. Cada experiência vivenciada em contextos
distintos de sua vida tende a influenciar no seu desempenho na escola, o que inclui as
experiências emocionais.

Empatia, agressão e depressão são temas já estudados por pesquisadores nessa fase
escolar e os resultados foram que a empatia estava associada aos bons escores em
leitura e ortografia, já a depressão e agressão pareciam interferir no desenvolvimento
de habilidades cognitivas e estavam relacionadas aos aspectos emocionais como falta
de aceitação entre os pares e sentimento de frustração em virtude da falta de aprovação,
por exemplo. Sendo esses mesmos escores mais altos em meninas do que em meninos,
uma vez que a socialização das meninas está voltada na direção de torná-las mais dóceis
e buscar aprovação do outro, ao passo que os meninos são educados para dominar
habilidades por seu próprio valor. (FESHBACH; FESHBACH, 1987 apud PAPALIA;
OLDS, 2000).

Fatores variados são responsáveis pelo desenvolvimento psicossocial da criança nessa


fase, como pudemos ver em outras fases do desenvolvimento. São eles a motivação da

94
AS INFÂNCIAS │ UNIDADE III

criança, o ambiente em que ela está inserida, os fatores socioeconômicos e os efeitos em


sua vida, as atitudes e crenças parentais, o sistema educacional, fatores limitantes ou
incapacitantes e a própria cultura.

Para Piaget o que é importante nesse aspecto do desenvolvimento são os graus de


socialização e a diferenciação entre uma criança social e uma criança não social, uma
vez que é o grau de socialização que irá possibilitar as trocas intelectuais e a socialização
do pensamento. Já para Erickson, um dos fatores determinantes da autoestima é a
opinião da criança enquanto a sua própria capacidade para realização de tarefas. A crise
a ser resolvida nessa fase do desenvolvimento é “produtividade versus inferioridade”; já
a resolução desta crise se dá pela “competência” quando a criança é capaz de perceber
como domina suas habilidades e consegue realizar tarefas.

Como vimos na visão neopiagetiana (no capítulo anterior) há três etapas no


desenvolvimento contínuo de elaboração da autoimagem. Essa terceira etapa só
ocorre na terceira infância e está relacionada a um estágio chamado de sistemas
de representação, que seria quando a criança começa a integrar características
específicas do “eu” a um determinado conceito. À medida que o pensamento de “tudo
ou nada” diminui, as autodefinições tornam-se mais equilibradas. (Adaptado de
PAPALIA, 2000, p. 217). Essa visão global, do “tudo ou nada”, se estende quando se
trata da autoestima. Nessa idade a criança não é capaz cognitivamente de se comparar
com o outro, nem tampouco fazer julgamentos sobre si. O que acontece aqui é uma
dependência da aprovação dos pais, cuidadores ou professores para que a criança se
sinta motivada a realizar.

95
DESENVOLVIMENTO UNIDADE IV
INFANTIL

CAPÍTULO 1
Questões específicas

Neste capítulo abordaremos algumas questões específicas do desenvolvimento infantil


igualmente importantes nesse processo e que juntamente aos outros fatores têm sua
contribuição sobre o processamento psicofisiológico quando o assunto é infância.

Família
A família é um importante modelo de padrões sociais e afetivos na vida de uma
criança, desde bebê os padrões de comportamento e adoção de sentimentos estão
visivelmente ligados aos fatores familiares e ao papel dos pais dentro desse ambiente. As
influências que exerce a família foram sempre pontos estudados para compreensão do
desenvolvimento infantil, assim como as características individuais da própria criança
são fatores de extrema valia quando o assunto é temperamento infantil, por exemplo.

Como vimos anteriormente na teoria bioecológica de Bronfenbrenner “a família é


um filtro através do qual uma sociedade mais ampla influencia o desenvolvimento da
criança. Como tal, ela pode ajudar a cultura mais ampla a atingir o objetivo de socializar
os novos membros, mas também pode servir como um amortecedor contra elementos
nocivos na cultura geral”. (BEE; BOYD, 2011, p. 362)

A estrutura familiar provoca impacto sobre o funcionamento da família e no


desenvolvimento infantil essa questão provoca igual influência. Crianças criadas em
famílias afetivas e com espírito de unidade familiar cujos vínculos emocionais e relações
afetivas são bem estruturados constroem apego mais seguro, ou seja, há uma influência
positiva enquanto a segurança, autoestima e construção do self dessa criança.

Estudos apontam que crianças educadas em ambientes monoparentais, cuja presença


é de apenas um dos pais, tendem a uma variedade maior de consequências negativas,

96
DESENVOLVIMENTO INFANTIL │ UNIDADE IV

no entanto as variáveis de interação familiar são interdependentes e podem influenciar


conforme as possibilidades de vivência pela criança.

O divórcio na família, cada vez mais comum nos dias atuais, ainda causa grande impacto
não apenas na estrutura familiar, mas no sistema concebido pela criança em termos de
comportamentos dentro das interações familiares. O divórcio dos pais para a maioria
das crianças geralmente afeta na comunicação do sistema familiar e gera conflitos, uma
vez que rompe com os modelos paternais já existentes. Por isso, a prevalência de uma
rede de apoio emocional pode permitir uma abordagem de estruturação de estratégias
efetivas de paternagem nesse momento crítico e de grandes mudanças.

Desenvolvimento social
A psicanálise contemporânea a partir dos estudos realizados por Pichon-Rivière
levanta a necessidade de trabalhar o olhar psicanalítico dentro de questões sociais do
desenvolvimento. Neste sentido voltando seu olhar para as influências psicossociais,
sociodinâmica e institucional no desenvolvimento humano concebe a ideia de homem a
partir de uma dimensão mais humana, que interage em sua totalidade integradora com
as dimensões mente, corpo e mundo exterior. A teoria do vínculo formulada a partir
de um olhar psicanalítico, mas com um viés social, considera o homem um ser individual
resultado de um processo dinâmico mecanicista para além da ação dos extintos e dos
objetos interiorizados ─ resultado das relações estabelecidas entre sujeito e os objetos
internos e externos predominantes em relações de interação dialética. “O vínculo
configura uma estrutura dinâmica em contínuo movimento, que funciona acionada
por motivações psicológicas, resultando daí uma determinada conduta, que tende a
se repetir tanto na relação interna como na relação externa com objeto“. (PICHON-
RIVIÈRE, 2000, p.XIV). Deste modo, podemos compreender que o vínculo é o resultado
de um processo dinâmico e contínuo que envolve sujeito e objeto capazes de estabelecer
características estruturais individuais consideradas normais e ou alteradas ─ que
passam a ser vistas como patológicas. No caso da patologia entenderemos a negação do
vínculo como uma tentativa de perda de si mesmo, essa forma de negar o próprio ser
descompromete o “eu” de estabelecer vínculos e é chamado de despersonalização.

O vínculo é um conceito instrumental em psicologia social que assume uma determinada


estrutura e que é manejável operacionalmente. O vínculo é sempre um vínculo social,
mesmo sendo com uma só pessoa; através da relação com essa pessoa repete-se uma
história de vínculos determinados em um tempo e em espaços determinados. Por
essa razão, o vínculo se relaciona posteriormente a uma noção de papel, de status e de
comunicação. (PICHON-RIVIÈRE, 2000, p.30)

97
UNIDADE IV │ DESENVOLVIMENTO INFANTIL

A psicologia clínica a fim de complementar elaborações realizadas pela psicologia


do desenvolvimento estuda conceitos que abordam modelos de funcionamento e
comportamento do homem. A teoria do apego a partir da concepção Bowlby (2004)
aborda questões para além da teoria dos vínculos, que previa esse comportamento
como a necessidade de satisfazer os impulsos (alimentação e sexo, por exemplo), uma
vez que aponta o comportamento inato de estabelecer contato, observado a partir do
bebê. Essa nova formulação prevê que o ser humano buscar suprir a necessidade, sendo
que essa necessidade está além das necessidades primárias tais como alimentação,
segurança, conforto. O conceito do apego parte da ideia de vínculo em que a segurança
do sujeito está diretamente ligada ao sujeito do apego, sendo um fator importante para
a sobrevivência.

Vínculos afetivos e apego

Nos trabalhos de Bolwby e Ainsworth, esse padrão mútuo de resposta é fundamental


para o desenvolvimento de vínculos afetivos e apego. Ainsworth define vínculo afetivo
como “um laço de duração relativamente longo no qual o parceiro é importante como
um indivíduo único e não é intercambiável com nenhum outro. Em um vínculo afetivo,
há um desejo de manter proximidade com o parceiro” (1987, p. 711). Um apego é uma
subvariedade de vínculo afetivo no qual o senso de segurança de uma pessoa está ligado
ao relacionamento. Quando você está apegado, sente (ou espera sentir) uma sensação
especial de segurança e conforto na presença do outro, e pode usá-lo como uma base
segura para dali explorar o resto do mundo. (BEE; BOYD, 2011, p. 308).

Embora muitas vezes aja uma tendência de pensarmos o apego da criança escolar
como uma situação com menor intensidade, estudos revelam que mesmo passando
mais tempo longe de casa e compartilhando diversos momentos com os pares, crianças
na idade escolar ainda dependem afetivamente de seus pais e da segurança que o
ambiente familiar lhe proporciona. O apego é visto com menos frequência em termos de
comportamento nesta fase, no entanto se torna perceptível quando a criança atravessa
uma experiência estressante.

Desenvolvimento moral
O pensamento e o comportamento moral vão surgindo de modo sólido nas condutas
diárias do ser humano. A conduta moral surge logo no início do primeiro ano de
idade quando demonstrado sinais de culpa, preocupação e solidariedade. Esse tipo
de desenvolvimento está ligado ao processo de desenvolvimento cognitivo e conforme
elaborou Piaget os julgamentos morais apresentam-se de modo consistente quando a

98
DESENVOLVIMENTO INFANTIL │ UNIDADE IV

criança alcança um nível de maturidade cognitiva, suficiente para considerar mais de


um ponto de vista. Embora possam passar pelos estágios de moralidade a ordem se
define em estágio de moralidade de restrição e moralidade de cooperação.

No primeiro estágio a criança pensa sobre os conceitos morais de modo rígido, uma
vez que são egocêntricas elas não conseguem supor que haja mais de uma maneira de
considerar questões referentes à moralidade. Nesse estágio a criança acredita que as
regras são únicas e imutáveis, que o comportamento está definido em certo ou errado, e
que qualquer infração à regra merece punição. Já no segundo estágio o conceito moral é
visto com maior flexibilidade, uma vez que a criança amadurece e já consegue interagir
com mais pessoas e compreender mais de um ponto de vista. Com uma variedade maior
de informações devido sua interação com o mundo estar mais ampla, ela compreende
que os aspectos da moralidade não são imutáveis e consegue formular um código
moral próprio, a ponto de conseguir formular os julgamentos morais mais brandos,
considerando a intenção que há por trás do comportamento. (PAPALIA; OLDS, 2000)

Lawrence Kohlberg formulou a teoria do julgamento moral a partir da teoria


de Piaget, o autor concentra-se no pensamento moral uma vez que ele está baseado
no comportamento moral, o que implica dizer que um ato pode ser moral ou imoral
dependendo do raciocínio ou da intenção que está por trás dele. Kohlberg conclui que
a maneira pela qual a pessoa desenvolve um pensamento sobre questões morais reflete
o próprio desenvolvimento cognitivo pela qual essa pessoa é capaz de desenvolver
o julgamento por si própria ─ ao invés de internalizar padrões já elaborados de
julgamentos (dos pais, amigos e professores). A teoria de Kohlberg apresenta um
modelo de pensamento moral partindo de processos de pensamentos mostrados pelas
respostas aos seus dilemas. (DAVIDOFF, 2001; PAPALIA; OLDS, 2000)

No nível pré-moral ou moralidade pré-convencional as pessoas vivem sob o


nível de controle externo que a fazem obedecer às regras a fim de evitar uma punição e
para obter recompensas; ou ainda agem por interesse próprio. Esse nível se apresenta
para crianças de 4 a 10 anos de idade.

No nível convencional ou moralidade de conformidade ao papel


convencional as pessoas tendem a internalizar os padrões das figuras de autoridade.
Há uma preocupação entre ser boa e agradar aos outros e manter a ordem social. Esse
nível é encontrado geralmente após os 10 anos e algumas pessoas nunca superam,
mesmo com o avançar da idade.

No nível de princípios, pós-convencional ou moralidade dos princípios


morais a pessoa reconhece que os padrões morais podem ser flexíveis e fazem seus
próprios julgamentos com base nos princípios de correção, imparcialidade e justiça.

99
UNIDADE IV │ DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Filhos e moralidade

Conforme Davidoff (2001), associado ao comportamento e pensamento moral estão


três práticas parentais que são influenciadoras nesse processo de solidificação da
moralidade, são elas:

1. Pais carinhosos e empenhados na educação dos filhos


influenciam na tendência de raciocínio moral baseando-se em princípios,
diferentemente de crianças cujos pais agem de modo rígido resultando
na imaturidade moral destas.

2. Modelo parental de comportamento prestativo e moral


influenciam na tendência ao altruísmo e moralidade dos filhos. Estudos
experimentais colaboraram com a ideia de que modelos parentais de
solidariedade tendem a aumentar a probabilidade de comportamento
prestativo em crianças.

3. Treinamento de empatia influencia no aumento da capacidade de


experimentar pensamentos e sentimentos dos outros, ou seja, se colocar
no lugar do outro. Estratégias de explicações causais ou de indução
levam uma criança a escutar os apelos à preocupação para com os outros.
Percebe-se então, que crianças expostas a esses métodos demonstram
níveis altos de maturidade moral, solidariedade e sentimento de culpa
por mau comportamento.

Com esses apontamentos percebemos que o julgamento moral se desenvolve conforme


o amadurecimento da criança; portanto o comportamento e os pensamentos morais
desenvolvidos de modo maduro podem estar associados ao afeto e empenho parentais,
modelos comportamentais solidário e moral, e treinamento da empatia.

Desenvolvimento atípico

Durante o desenvolvimento humano e ainda no desenvolvimento infantil é possível


perceber sinais de distúrbios psicológicos. Certos padrões de desenvolvimentos atípicos
ou anormais podem ocorrer desde muito cedo, como é o caso do retardo mental,
distúrbio de déficit de atenção e hiperatividade. Os distúrbios do desenvolvimento
podem estar relacionados à capacidade diminuída para aprender a ler, por exemplo; ou
ainda podem ser mais profundos, afetando desenvolvimento de funções psicológicas
básicas como no autismo infantil.

100
DESENVOLVIMENTO INFANTIL │ UNIDADE IV

Em crianças e adolescentes podemos destacar os problemas de atenção (transtorno


de déficit de atenção hiperatividade) que prejudicam a capacidade de concentração; os
problemas externalizantes (transtornos de comportamento disruptivo) relacionados
a agressividade, delinquência ou desafio excessivo em que o comportamento desviante é
dirigido para o exterior; e problemas internalizantes (transtornos emocionais) tais
como depressão, sociedade ou transtorno da alimentação, em que o comportamento
desviante está dirigido para o interior, ou seja, contra o próprio indivíduo. (BEE; BOYD,
2011)

Há diversas perspectivas teóricas que tentam explicar o desenvolvimento atípico sendo


elas as teorias biológica, psicodinâmica, da aprendizagem e cognitiva que poderemos
ver abaixo conforme disponibilizado por Bee e Boyd (2011, p. 423):

Perspectiva biológica

O desenvolvimento atípico é um sintoma de um transtorno físico subjacente causado


por uma anormalidade estrutural ou biológica no cérebro, por herança genética ou por
infecção.

O tratamento está em diagnosticar e tratar como qualquer outro transtorno físico, com
o uso de medicamentos ou outro tratamento físico.

Perspectiva psicodinâmica

O desenvolvimento atípico se origina de experiências e conflitos sexuais, são agressivos


inconscientes não resolvidos da primeira infância.

O tratamento se dá trazendo o material perturbador reprimido à consciência e ajudar o


paciente a elaborar conflitos inconscientes ─ psicoterapia.

Perspectiva da aprendizagem

Os comportamentos atípicos são apreendidos e mantidos como quaisquer outros ou a


uma falha em aprender comportamentos adaptativos.

O tratamento está em usar um condicionamento clássico e operante e a modelação para


extinguir o comportamento atípico e aumentar o comportamento adaptativo ─ terapia
do comportamento e modificação do comportamento.

101
UNIDADE IV │ DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Perspectiva cognitiva

Pensamento falho ou percepções distorcidas podem causar desenvolvimento atípico.

O tratamento está em mudar o pensamento falho, irracional e ou negativo ─ terapia


cognitiva.

Ainda, conforme os mesmos autores, os psicólogos contemporâneos buscam através


de diversas variáveis e teorias compreender o fenômeno da psicopatologia do
desenvolvimento, uma vez que a partir da integração dessas perspectivas é possível
estudar os problemas psicológicos das crianças e dos adolescentes e obter uma melhor
compreensão do desenvolvimento atípico. A psicopatologia do desenvolvimento
é, pois, “uma abordagem relativamente nova ao estudo de desvio que enfatiza que
desenvolvimentos normal e anormal têm raízes comuns e que a patologia pode se
originar de muitos caminhos diferentes” (p. 424).

Durante o desenvolvimento infantil algumas síndromes de comportamento desajustados


também podem aparecer, assim como os adultos, as crianças também estão susceptíveis
a desenvolver distúrbios, sejam eles de origem psicológica ou orgânicas tais como,
depressão, distúrbios de personalidade, somatizações, ansiedades e alguns outros
distúrbios que podem ser vistos em crianças.

Alguns padrões de normalidade aparecem cedo como podemos ver no retardo mental,
distúrbio de déficit de atenção hiperatividade, e até anorexia nervosa e bulimia.

O autismo infantil

A origem da palavra autismo vem do grego e significa “si mesmo”, geralmente ocorre
nos primeiros 30 meses de vida e se caracteriza pela falta de resposta da criança a outras
pessoas; evitação consistente do contato visual; tendência a afastar-se de pessoas,
mesmo sendo os seus cuidadores; dificuldade de comunicação; comportamento de
fala repetida (geralmente a criança repete as palavras tal como papagaio); presença
de comportamentos bizarros; resistência a mudanças; tendência a comportamentos
repetitivos.

O autismo é um distúrbio crônico que exige tratamento intensivo embora os pais


possam ser treinados a administrar grande parte dele. Mesmo assim, as pesquisas
atuais indicam que apenas um em cada seis autistas conseguiram ajustamento social

102
DESENVOLVIMENTO INFANTIL │ UNIDADE IV

adequado e encontrarão trabalho na fase adulta. Cerca de 2/3 dos autistas permanecem
severamente incapacitadas e exigem supervisão durante toda a vida (EGGERS, 1978;
WERRY, 1979 apud DAVIDOFF, 2001).

Assim como o autismo, diversos outros transtornos e síndromes podem se desenvolver


em crianças e por isso cabe o estudo detalhado de várias formas de transtorno, sendo
eles psicológicos ou orgânicos.

103
Para (não) Finalizar

O desenvolvimento infantil deve ser considerado como uma importante fase do ciclo da
vida, uma vez que o homem, que irá se formar no futuro, está dependendo dos diversos
fatores ocorridos nesse período.

Na sociedade atual, aspectos formadores da personalidade do ser humano devem


ser cuidados e olhados com atenção, pois tanto as virtudes quanto os problemas
irão influenciar diretamente no fator social. Identificar claramente as etapas do
desenvolvimento irá nos ajudar na formação, compreensão e construção de estratégias
a fim de orientarmos os futuros adultos a serem pessoas sociais cujos valores éticos e
morais estejam bem formados.

Cabe destacar também que não apenas o desenvolvimento infantil em suas diversas
especificações irá contribuir para o ajustamento social, mas também a maneira individual
como cada um irá pensar, compreender e atuar dentro das perspectivas e expectativas
de seu próprio desenvolvimento. Sendo essas influências igualmente contribuintes
para uma sociedade em que as crianças atuais e futuros adultos aprenderão a interagir
e sobreviver socialmente, seja no âmbito do seu lar, vizinhança, escola, igreja, clube,
trabalho, enfim. Sempre teremos um homem se relacionando com o seu ambiente,
deste modo, as formações de caráter e personalidade no período de desenvolvimento
infantil são fundamentais para o futuro, seja ele individual ou coletivo.

A fim de prolongarmos a nossa reflexão sobre o que estudamos até aqui, poderíamos
pensar: se vimos que a formação do caráter e personalidade ocorre dentro desse
processo cheio de variáveis, chamado desenvolvimento infantil, podemos sugerir que
essa etapa natural da vida nos possibilita a formação de novos homens para a mudança
da sociedade nos aspectos de justiça, moral e ética?

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