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Unidade II

Unidade II
5 HIERARQUIA DE VALORES

Entende-se por valor o que mobiliza o anseio humano. É pelo conhecimento de suas necessidades e
pela hierarquia com a qual as apresenta que podemos avaliar o peso que elas detêm nas suas escolhas.
Contemplam-se, então, os valores que vão corresponder aos anseios não materiais da pessoa humana:
o anseio pela verdade, pelo bem, pelo belo, pelo afeto, pelo sagrado, por exemplo.

O valor lógico, buscado pela razão, procura pela verdade por meio da pesquisa e da ciência. Não
são considerados “valores” os conteúdos do conhecimento humano, mas a verdade que encerram e
que pode satisfazer à natural necessidade do saber. A humanidade não se contenta com qualquer
conhecimento, mas quer o que de algum modo e sob algum aspecto e em algum tempo, corresponda
ao real, ou seja, à verdade.

A aceitação da relatividade do conhecimento em relação ao sujeito não implica o abandono da


busca da verdade. O relativismo sim, que nega a possibilidade do conhecimento da verdade, tomando
o interesse do sujeito como único referencial no processo da razão, é incompatível com o incontestável
progresso da ciência.

Os valores éticos correspondem à carência humana pelo bem moral, ao seu anseio por respeito e
justiça, por liberdade, lealdade, honestidade, responsabilidade e por todos os demais valores decorrentes
do princípio da moralidade que exige que se faça o bem e que se evite o mal. Há ainda o anseio pelo
belo, pelo harmônico que é satisfeito pelo valor estético.

Observação

Quando o enunciador/promotor ou defensor recorre ao ato de promover


para mobilizar seus interlocutores a seu favor, vale-se de valores que
repousam no imaginário desses interlocutores.

O ser humano precisa do “outro” não só fisicamente, mas ainda afetivamente, querendo sempre,
com ele, constituir uma comunidade. O “outro” torna-se então valor por satisfazer uma necessidade,
uma carência do sujeito. Ao anseio pelo transcendente, pelo que ultrapassa a dimensão natural e
humana, corresponde o valor do sagrado que se expressa na religiosidade humana. Ocorre, portanto,
não a invenção, a criação de novos valores, mas a sua implantação onde antes não existiam.

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LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Lembrete

Quando o sujeito estrutura seu percurso argumentativo por intermédio


da heterogeneidade discursiva, podemos confirmar a sua necessidade de
completude pelo outro.

O bem estar físico, a saúde, a busca do conhecimento pelo desenvolvimento intelectual, a vida
afetiva, o livre arbítrio com os seus valores do respeito e da justiça, do bem moral, enfim são exigências
de todo ser humano, independentemente, de tempo ou de espaço.

O fato de, em determinadas épocas e culturas, essas necessidades e esses valores não terem sido
ou não serem respeitados, em nada os invalida como exigências fundamentais e universais da pessoa
humana. Não há como relativizá-los sem discriminação, violência ou acomodação. Ao entender-se que
cada pessoa humana é portadora de uma “personalidade” única, própria e individual, chega-se a novos
valores ou nova hierarquia de valores.

Apesar de toda essa valorização do “novo”, pode-se perceber, especialmente no ocidente cristão,
uma direção, um ordenamento que, embora na prática se apresente constantemente com falhas e
retrocessos, mostra-se estável e constante: a permanente busca dos valores do “respeito”, da “justiça”
e da “igualdade de deveres e direitos”. Todos os movimentos culturais se fazem no sentido de garantir ao
ser humano cada vez mais igualdade de gênero, etnia, idade e classe social.

Percebe-se que o valor “igualdade”, pelo menos teoricamente, está no topo da escala. O “respeito”
pelo outro, a prática da “justiça social” são valores almejados pelo homem como nunca, seja ele quem
for. Constata-se uma reordenação dos valores de modo que seja dada maior ênfase, pelo menos
teoricamente, à igualdade, ao respeito e à justiça. O conhecimento é visto como grande valor que pode
promover a valorização das personalidades, permitindo a sua ascensão no plano pessoal, profissional,
econômico e social. Uma característica fundamental dos valores é a polaridade.

A hierarquização não se prende à modalidade, mas à capacidade de satisfazer com maior plenitude
e durabilidade aos anseios humanos. Embora se possa reconhecer a existência de uma hierarquia de
valores, não é fácil definir com clareza qual a melhor nem a mais perfeita. O processo de hierarquização
vai depender do critério adotado – novos valores ou nova hierarquia de valores?

São inúmeras as dificuldades para a hierarquização dos valores. A primeira liga-se à questão da sua
objetividade ou subjetividade. É extremamente difícil demonstrar a objetividade dos valores. Mais fácil
é perceber as necessidades universais do ser humano, o que naturalmente leva a uma escala de valores
para satisfazê-las, segundo o seu nível de exigência e prioridade. Considerar os valores subjetivos,
como criações humanas significa desvalorizá-los, relativizá-los e, assim, minimizar a sua importância
para o homem. A hierarquia de valores feita por um critério empírico só teria validade particular e
temporal. Seria variável e não universalmente válida e, assim, todos os comportamentos humanos
igualmente admitidos.

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O subjetivismo tem seu foco no processo de valoração, na interferência do homem no processo.


O objetivismo, ao contrário parte das necessidades humanas e aceita a independência dos valores como o
modo ideal de supri-las. Para as doutrinas subjetivistas, o sujeito cria o valor e não apenas o aprende.
Para uns, seria o prazer, para outros, o interesse; para outros, ainda seria o desejo a fonte do valor, mas,
seria ele sempre uma criação humana, variando somente com o tempo, as culturas e as situações.

Na hierarquia a ser constituída sobreleva-se o valor da pessoa e o valor de “outro” enquanto “pessoa”.
Não se pode prescindir do “outro”, valor por si mesmo, pois ele vai ocupar um lugar primordial em
qualquer escala. Nada mais ofensivo do que olhar para o “outro” como “coisa”, destituindo-o de sua
dignidade. Nada pode agredi-lo mais do que considerá-lo como simples coisa, objeto ou mesmo como
uma ideia. O “outro” além de pessoa é também uma personalidade, ou seja, um conjunto estruturado de
carências e de valores e como tal, objeto de experiência e apreensão. Nada pior para o ser humano do
que a indiferença que é o mesmo que negar a sua humanidade.

O homem chega então à consciência de si mesmo pelo conhecimento do valor de que se sente
privado. Por meio dele, conhece a sua destinação ao valor pleno e absoluto que fundamenta assim o seu
referencial para a sistematização dos múltiplos valores que vão satisfazer suas inúmeras necessidades.

Pode-se admitir a perenidade e a universalidade. Os valores seriam verdadeiros se valessem pela


universalidade, embora variando de importância na escala de acordo com o tempo e com o espaço.
A pessoa seria então o valor por excelência. A desconsideração, a desvalorização do homem que ocorreu
em todos os tempos por meio da história é tida como agressão, como violência, como erro, não podendo
nunca ser admitida como possível, como fato natural ou cultural em determinado tempo e espaço.

Nas coisas encontram-se participações do valor, mas não o valor propriamente dito. Nelas, por
exemplo, encontra-se alguma beleza, mas não a própria “beleza”. Não se criam e não se inventam valores.
Eles se encontram ou são instaurados nas coisas conferindo-lhes uma significação. A hierarquização dos
valores, embora feita pelos juízos de valor depende, em grande parte, da personalidade de cada um:
nas de sensibilidade mais desenvolvida, prepondera.

O interesse pelo nobre, pelo bom, pelo verdadeiro, até mesmo há aqueles que dão maior valor ao
estético até mesmo sobrepondo-o ao ético. Há aqueles que prezam mais a vida em sociedade. Aqueles
que mais querem a presença do “outro” abominam a solidão que é considerada como grande contra
valor. Há aqueles que priorizam o sagrado, a saúde, a família, o conhecimento ou outros valores da
escala. A preferência pelos valores aparece mais como tendências do que como atitudes exclusivas.
A predominância de uma delas decorre não só da personalidade de cada, mas ainda da educação recebida
nos seus primeiros anos.

Não é possível se definir uma hierarquia perfeita e ideal válida para todos os tempos e todos os
lugares. A saída está no estabelecimento dos critérios justificáveis, segundo os quais vai ser feita a
hierarquização. Propõem-se aqui as noções de “pessoa humana” e de “personalidade” como referências
justificáveis para hierarquização dos valores.

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Há que se considerar que são os valores universais que devem ser priorizados porque são eles que
atendem às necessidades da pessoa humana. Os variáveis e secundários são aqueles que correspondem
às múltiplas.

6 RETÓRICA E ORATÓRIA

Quando pensamos a retórica no gênero discursivo jurídico, não podemos perder de vista o campo
de possibilidades que a heterogeneidade discursiva – vozes, que se completam ou se contradizem
em um mesmo espaço discursivo – nos permite alcançar em termos de organização de um percurso
argumentativo sólido.

A heterogeneidade discursiva permite-nos compreender que é em função da ilusão de origem do


sujeito que essas vozes passam a constituir o discurso que o sujeito acredita ser seu. Assim, retoma a
voz do Outro, sem proceder a demarcações, ou ainda as demarca, movido pela mesma ilusão que o faz
crer que o não demarcado é seu.

Observação
Entendemos que a ilusão de origem é o que move o sujeito a querer
dizer. A consciência do repetível tornaria, ao nosso entender, o dizer muito
enfadonho. As escolhas que trabalha na elaboração do seu dizer lhe permite
acreditar que decide sobre o que diz e sobre o que o outro que retoma
diz, mesmo porque, o que retoma é um recorte do dizer do outro, que ele
entende escolher. Isso lhe confere a ilusão de ter poder, reafirmando as
relações de poder ideologicamente determinadas.

Considerando o outro como constitutivo do discurso do sujeito que o enuncia, entendemos que
a possibilidade de analisá-lo reside na historicidade – condições de produção e circunstâncias de
enunciação - representada pela materialidade discursiva – elementos linguísticos.

As condições de produção estão intrinsicamente relacionadas a todo contexto sócio-histórico que,


de alguma forma, é constitutivo do discurso que se faz ouvir. A memória coletiva – memoria ancestral
da humanidade – faz circular, pelas formações ideológicas e imaginárias, os valores herdados dos
ancestrais, valores que não são conscientemente controlados pelo sujeito, que, aliás, nunca controla o
que pensa controlar

Lembrete
As circunstâncias de enunciação, por outro lado, são muito mais
acessíveis porque cercam o fato – relações, negociações, interesses – enfim,
são circunstâncias que resumem o todo que circunda o fato e que, se
pensadas em função das condições de produção constitutivas do discurso,
formam o quadro perfeito que se manifesta na materialidade linguística
que é a própria historicidade.
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Unidade II

A heterogeneidade discursiva, seja ela mostrada – forma marcada - ou constitutiva – forma não
marcada - passa ser entendida como resultado de uma espécie de acordo imaginário que se estabelece
entre o sujeito e seu leitor virtual, a partir das formações imaginárias, já, no ato da elaboração do texto.
Seja o texto escrito ou oral, o sujeito enunciador recorre a determinadas demarcações ou apagamentos
para reafirmar seu lugar de enunciação como fonte e origem do discurso que enuncia.

Assim, à medida que o sujeito se apresenta ao seu interlocutor virtual no domínio das normas que
o regulam, ele acentua sua ilusão de onipotência e independência, como o “dono de seu pensamento”
que, em nosso entender, reafirma a ilusão de “controlador” que o perpassa, pois, ao demarcar o
discurso do outro que retoma, o sujeito demonstra ser conhecedor das normas éticas de modo a não
se apropriar do dizer do outro, como exige o princípio de autoria.

Observação

Ao proceder a demarcações, o sujeito, provavelmente, tem a ilusão de


“burlar” as normas que o regulam, sem, no entanto, perceber que o próprio
percurso o remete ao mesmo assujeitamento que lhe é imputado pela
instituição, e que ele somente tem ilusão de controlar.

Consideramos que o sujeito demarque o discurso do outro movido pelo desejo de atribuir maior
credibilidade ao seu próprio dizer e, assim, tornar irrefutável seu argumento. Isso se concretiza
devido à aceitabilidade que o outro possa ter perante o seu interlocutor virtual. Dizendo de outro
modo, a demarcação da voz que se retoma confere a quem é retomado a marca essencial ao argumento
de autoridade.

Uma outra possibilidade que, a nosso ver, justifica esse procedimento do sujeito, remete-nos
novamente à questão da ilusão de origem que perpassa o sujeito (PÊCHEUX; FUCHS, 1975). Entendemos
que, perpassado pela ilusão, o sujeito se entende investido do direito de corroborar ou refutar o dizer
do outro, que, em algum outro momento de enunciação, possa ter dito o que ele não se permite estar
repetindo como plágio. Assim, é exatamente por se entender na origem do seu discurso que o sujeito
entende que o outro possa ter dito o que ele (sujeito) não repete, mas também diz.

Nossas considerações, nesse sentido, se dão em relação ao fato de entendermos que o sujeito, no
cumprimento das normas que lhes são impostas, serve-se das mesmas regras que o controlam para
escamotear formas do dizer que lhe permitem proceder aos atos de convencer, persuadir e/ou dissuadir
na direção de seus objetivos.

Esse aspecto, em nosso entender, favorece o sujeito a consolidar a estrutura argumentativa que, lhe
permite atingir o objetivo delineado por ele, objetivo este que se sobrepõe à sua própria resistência em
partilhar com outro enunciador do discurso do qual se entende “senhor”.

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LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Entendemos a pertinência de estabelecer algumas articulações teóricas entre Authier-Revuz (1982;


1984;1990) no que tange à heterogeneidade discursiva e outras teorias de maneira a elucidar como
a heterogeneidade mostrada e constitutiva funcionam enquanto estrutura argumentativa do discurso
jurídico enunciado no tribunal do júri.

Os autores que fundamentam as articulações que passamos a tecer não trataram a questão da
heterogeneidade discursiva quando da proposta das teorias que passamos a apresentar, nossa
opção por proceder a essas articulações teóricas surge da necessidade de compreendermos como a
heterogeneidade discursiva se relaciona com essas teorias de modo a funcionar como estrutura argumentativa
do discurso jurídico.

Observação

Pensar o percurso argumentativo do discurso jurídico enunciado


no tribunal do júri de maneira a entender os sentidos que esse discurso
instaura nos imputa a necessidade de definir a discursividade própria dessa
enunciação. E, nesse sentido, temos de partir do fato de que todo discurso é
por excelência heterogêneo, na medida em que outras vozes se fazem ouvir
no discurso do sujeito, que, por sua vez, ora as retoma de forma marcada,
ora as repete, imiscuindo-se, no seu dizer, como se as escamoteasse ou
ainda se não se permitisse reconhecer as fronteiras que demarcam o seu
dizer e o dizer do outro (AUTHIER-REVUZ, 1984).

A impossibilidade de se conceber um discurso homogêneo encontra ainda, respaldo em Pêcheux


(1969), a partir da sua concepção de discurso enquanto “efeito de sentidos entre locutores”. Trata-se da
ilusão de poder que toma o sujeito no tocante ao seu dizer, de modo que acaba se reafirmando, a tal
ponto que, perpassado pela ilusão de ser o “senhor” do seu discurso, o sujeito pensa controlar o sentido
do seu dizer.

É pertinente, portanto, entender que a aparente homogeneidade que o sujeito busca dar ao texto, na
realidade, parte de normas já institucionalizadas que exigem que o autor alcance uma aparente unidade
de sentidos exigida pelo princípio da autoria que, segundo Orlandi e Guimarães (1988), imputa ao autor
responsabilidade social pelo seu dizer.

À medida que se vê limitado por normas, o sujeito busca atingir uma aparente homogeneidade, que,
na realidade, nada mais é que uma espécie de “maquilagem”, cujo fim é o de esconder as diferenças
dos seus diferentes lugares de enunciação, muitas vezes, determinados pelas diferentes formações
discursivas que dividem o mesmo espaço discursivo.

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Observação

Contudo, não podemos pensar que a ilusão de origem possa ser


superada pelo sujeito no momento em que este demarca o discurso do
outro em seu espaço discursivo, uma vez que, em nosso entender, o simples
fato de proceder a demarcações permite ao sujeito reafirmar sua ilusão de
origem porque se entende “senhor” do discurso que enuncia, inclusive, em
relação àquele com quem divide seu espaço discursivo.

No tocante ao discurso jurídico enunciado no tribunal do júri, há que se considerar que o princípio
da autoria é, igualmente, regulador do dizer de todos que têm o direito a voz neste particular lugar de
enunciação, uma vez que todos são regulados pela responsabilidade do seu dizer, na medida em que
as consequências decorrentes do que é dito em um tribunal dessa ordem não são apenas norteadoras
do veredicto ao qual os jurados devem chegar ao final dos trabalhos, há que se considerar que
testemunhas que prestam compromisso com a verdade, podem sofrer sanções caso mintam quando
são ouvidas.

A tensão que perpassa todo dizer o rito do tribunal do júri toma conta de toda enunciação. Ao
enunciador/juiz compete presidir a enunciação do júri dentro do que preceitua a normatização do
direito processual penal e do direito penal, provendo garantias para que o devido processo legal não seja
comprometido, dando ao referente/réu concretas condições de ampla defesa em toda sua plenitude.

Aos enunciadores/promotor e defensor impõe-se a necessidade premente de manter a coerência


com as teses que defendem. Aos interlocutores/testemunhas compete o dever de dizer a verdade,
exigência que, se não cumprida, gera consequências legais, conforme lhes orienta o enunciador/juiz, na
medida do compromisso que prestam. Ao referente/réu cabe pensar cada palavra ou rever cada gesto
e beneficiar-se do momento em que tem a chance de ser ouvido pelos interlocutores/jurados naquela
enunciação, responsáveis que são pelo destino que será dado à sua vida ao final.

Observação

Entendemos que a tensão própria da enunciação do tribunal do júri


aumenta o conflito a ser superado pelas partes (enunciadores/promotoria
e defensoria) na conquista da adesão dos interlocutores/jurados às suas
teses. Quanto maior o conflito, mais heterogêneo o discurso se mostra,
porque o sujeito enunciador seja ele quem for recorre a toda sorte de
argumentos para estruturar o percurso que escolhe para atingir o fim
desejado, qual seja a conquista da adesão de seus interlocutores à tese
que lhes submete.

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No tribunal do júri, a adesão se materializa pelo voto que os interlocutores/jurados darão ao


referente/réu. Considerando-se que o voto dos interlocutores/jurados é soberano e que estes são
leigos ao conhecimento técnico envolvido, os enunciadores/promotor e defensor esmeram-se para
dar ao seu dizer marcas da irrefutabilidade. Valem-se de lógica no que se refere às provas, laudos e
depoimentos. Esmeram-se na retórica forense no momento de tecer suas considerações quando se
dirigem aos interlocutores/jurados, sobretudo durante os debates e na fase da réplica (promotoria)
ou tréplica (defensoria).

As várias vozes que estruturam o percurso discursivo das partes formam a heterogeneidade discursiva
que, por sua vez, se manifesta de duas formas, a mostrada que, segundo Authier-Revuz (1984), é
constituída por formas linguísticas que representam as diferentes maneiras de o sujeito negociar com o
dizer do outro que ele (sujeito) permite que constitua o seu discurso. E a forma constitutiva que reúne
outros dizeres que se misturam ao discurso do sujeito sem que sejam por ele demarcados.

Na concepção da autora, a heterogeneidade mostrada pode se manifestar sob “uma forma de


negação”, ou seja, uma espécie de proteção do sujeito em relação à heterogeneidade constitutiva de seu
discurso. Trata-se de um procedimento resultante do fato de o sujeito desconhecer o que é constitutivo
do seu discurso em função da ilusão de origem que o perpassa.

A autora chama a nossa atenção para o fato de que toda compreensão e interpretação de marcas
como: aspas e itálico no glosado passa por uma especificação da alteridade de natureza implícita a que
remete devido ao seu ambiente discursivo “[...] uma outra língua, variedade de língua, um outro discurso
diferente, um discurso oposto, etc.” (AUTHIER-REVUZ, 1990, p. 30).

Segundo a autora, as formas que acenam para o exterior do discurso a ponto de interferir na cadeia
enquanto forma de heterogeneidade são:

[...] uma outra língua, um outro registro discursivo, um outro discurso


caracterizado como discurso dos outros, uma outra palavra potencial
ou explícita nas figuras de reserva, de hesitação e de retificação, de
confirmação; um outro interlocutor, diferente do locutor e a este título
suscetível de não compreender (exemplo: você entende o que eu quero dizer)
(AUTHIER‑REVUZ, 1990, p. 30).

Segundo o que nos foi possível compreender, a outra modalidade de tomada de sentido, à qual
a autora se refere, se dá por meio “de uma palavra, que recorre explicitamente ao exterior de um
outro discurso especificado, ou aquele da língua como lugar de polissemia, homonímia, metáfora etc.,
afastadas ou ao contrário invocadas para constituir o sentido da palavra. A autora esclarece, ainda, que
nos dois casos, ao lado do sentido dado como corrente, um sentido é constituído por uma palavra por
referência a um ou outros sentidos produzidos em alhures (em outro lugar, no interdiscurso ou na língua
(1990, p. 30).

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Unidade II

Observação

No discurso jurídico, sobretudo o do tribunal do júri, o sujeito


enunciador retoma o dizer do outro pela forma marcada quando remete às
testemunhas, a momentos anteriores - inquérito, instrução criminal - nas
quais a enunciadora/testemunha tenha feito declaração divergente daquela
que apresenta em plenário. O mesmo procedimento é comum quando as
partes querem recorrer à condição de enfatizar uma informação e voltam
a depoimentos anteriores apenas para pedir a confirmação destes junto às
testemunhas com o objetivo de sublinhar o valor da sua tese.

É por intermédio da forma marcada que o enunciador se coloca a uma relativa distância do seu
dizer, e, igualmente, se reafirma enquanto “dono de seu pensamento”, pois as demarcações fazem com
que ele (sujeito) assuma a posição do “juiz do seu dizer”. É enfatizado que “as formas marcadas da
heterogeneidade mostrada manifestam a realidade da onipresença do Outro precisamente nos lugares
que tentam encobri-la” (AUTHIER-REVUZ, 1990, p. 33).

Primeiramente, a autora considerou a possibilidade de o sujeito estar regulado por normas


pré‑estabelecidas, e, a exemplo, se remeteu às normas imputadas pelo princípio de autoria, segundo
proposta de Orlandi e Guimarães (1988), que não permitem ao sujeito se apropriar da palavra de outro,
sem demarcá-lo em seu espaço discursivo.

Em um segundo momento, alertou para o fato de que a ilusão de origem do discurso que perpassa
o sujeito continua a perpassá-lo, mesmo quando ele se vê obrigado a assumir as responsabilidades
advindas de normas que o controlam, como as da função de autor. A autora considerou que essa
especificidade pode levar o sujeito a beneficiar-se das mesmas normas que o regulam, pois, à medida
que as cumpre, talvez demarque o outro em seu espaço discursivo na ilusão de que o não demarcado
seja apenas seu.

A heterogeneidade mostrada por formas marcadas tem a particularidade de permitir a negociação


entre as forças de desagregação, da heterogeneidade constitutiva, porque essas formas representam
o desconhecimento da heterogeneidade constitutiva, que, por meio de uma representação, ainda
que ilusória, atuam como uma espécie de “proteção para que um discurso possa ser mantido”
(AUTHIER‑REVUZ, 1990, p. 33).

É fundamental que se entenda que as formas não marcadas da heterogeneidade mostrada implicam
uma outra forma de negociação com a heterogeneidade constitutiva, por meio das quais uma outra
forma caracteriza a presença do outro. Para Authier-Revuz (1990, p. 33), esse tipo de negociação é
“uma forma mais arriscada, porque joga com a diluição, com a dissolução do outro no um, no qual
este pode ser enfaticamente confirmado, ou ainda pode se perder. A exemplo, a autora aponta:
discurso indireto livre, ironia, metáforas, jogos de palavras”.

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LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

No discurso jurídico, podemos observar o uso de formas não marcadas, sobretudo nos debates ou na
réplica ou na tréplica, nos momentos em que enunciadores/promotoria e defensoria retomam trechos
dos depoimentos que mais sustentam suas teses em forma de discurso indireto livre, mesclado com o
discurso direto, recorrem à ironia com acentuada frequência, sobretudo para provocar seu oponente.

Segundo Authier-Revuz (1990, p. 33-34)

o Outro está sempre presente no discurso, demarcado ou não, ele emerge


no discurso nos pontos em que se insiste quebrar a continuidade, a
homogeneidade fazendo vacilar o domínio do sujeito, voltando o peso
permanentemente para o Outro.

Brandão (1991) tece considerações sobre a heterogeneidade mostrada, formulada por Authier (1982),
no que se refere ao discurso relatado:

discurso indireto, quando o locutor, colocando-se enquanto tradutor do outro,


usa de suas próprias palavras para remeter a uma outra fonte do “sentido”;
[...] - discurso direto, o locutor, colocando-se como “porta-voz”, recorta as
palavras do outro e as cita (BRANDÃO, 1991, p. 50).

Ao refletir a respeito do dialogismo que, segundo Bakhtin, se estabelece a partir dos “outros
discursos”, constitutivos do discurso, Brandão (1991, p. 53) corrobora a questão atrelada ao “dizível”:
“O discurso se tece polifonicamente num jogo de várias vozes cruzadas, complementares, concorrentes
e contraditórias”.

Nossas considerações nesse sentido se dão em relação ao fato de entendermos que o sujeito, no
cumprimento das normas que lhes são impostas, serve-se das mesmas regras que o controlam para
escamotear formas do dizer que lhe permitem proceder aos atos de convencer, persuadir e/ou dissuadir
na direção de seus objetivos.

Esse aspecto, em nosso entender, favorece o sujeito a consolidar a estrutura argumentativa que lhe
permite atingir o objetivo delineado por ele, objetivo este que se sobrepõe à sua própria resistência em
partilhar com outro enunciador do discurso do qual se entende “senhor”.

Entendemos que os apagamentos que a memória discursiva permite acabam por comprometer a
qualidade do julgamento feito pelos interlocutores/jurados, na medida em que se torna exaustivo ouvir
por longos períodos determinados fatos de uma parte e, em seguida, ouvir outros fatos como se estivem
diante de dois casos distintos, que são retomados por ocasião da réplica e da tréplica.

7 ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA: OS DIFERENTES TIPOS DE ARGUMENTAÇÃO

Desde a antiguidade, a argumentação tem sido objeto de interesse de todas as áreas em que se
pratica a arte de falar e escrever bem. Na prática das Ciências Jurídicas, a argumentação guarda estreita
dependência com o raciocínio lógico, ainda que seja um jogo discursivo, um jogo de inteligência,
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que possui objetivos pontuais. O percurso argumentativo se estrutura em premissas e propicia o


aprimoramento que leva o sujeito a fazer inferências em situações hipotéticas ou reais. Envolve um
debate de cunho social, no qual o principal objetivo é conquistar a adesão do interlocutor.

O gênero discursivo jurídico, sobretudo aquele que tem como lugar de enunciação o rito do tribunal
do júri precisa se submeter ao rito que, na verdade, confere legitimidade ao discurso que se faz ouvir
nesse lugar de enunciação que se reveste de grande particularidade e que, ao final, abre para uma nova
ordem discursiva que se instaura.

A análise da estrutura argumentativa de um discurso que se inscreve no gênero discursivo jurídico,


sobretudo aquele que é enunciado no tribunal do júri, necessariamente, observa:

• o lugar de enunciação: o lugar físico onde a enunciação acontece (igreja, tribunal, sala de aula,
estádio esportivo);

• o lugar social de quem enuncia: a posição que o sujeito ocupa na sociedade (juiz, promotor,
defensor, réu, jurados, professor, padre, juiz, médico, promotor, advogado);

• os referentes: todo aquele ao qual o sujeito, seja ele locutor, enunciador ou autor se refere, seja
este último humano, animal ou coisa inanimada. Importa ainda o lugar social que o referente
humano ocupa na sociedade.

• os interlocutores em função do lugar social de onde falam: quando o sujeito se dirige a um


interlocutor, importa sobremaneira o lugar de enunciação o qual o sujeito e o interlocutor ocupam.

• a(s) tese(s) que se deseja provar: teses são referentes do discurso que é enunciado.

Quando pensamos esse discurso, temos de considerar as estratégias argumentativas que sustentam
seu percurso de modo a permitir que o objetivo norteador do sujeito, que assume a posição de enunciador,
tenha como objetivo a conquista da adesão dos interlocutores às suas teses.

7.1 Estratégias argumentativas

7.1.1 Argumento de autoridade

É o argumento que se realiza pela citação de uma fonte confiável, de um especialista no assunto
ou pela referência a dados fornecidos por instituição de pesquisa, de uma frase dita por alguém que
se tornou um expoente na área. ou, mesmo que não seja da mesma área, que tenha se tornado uma
autoridade de notório saber a ponto e fundamentar argumentos enunciados de outras áreas em
função da credibilidade de que desfruta. Ex.: doutrinadores, autores, professores, cientistas, médicos,
membros da Igreja, instituições de pesquisa, universitárias, centros de pesquisa, tribunais, fontes
governamentais, jornalísticas.

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LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

As citações de doutrina são os exemplos mais claros do argumento de autoridade, que tem duplo
efeito: primeiro, de fazer presumir-se certa a conclusão, porque emanada de alguém de notório
conhecimento; segundo, de revelar que a conclusão é isenta de parcialidade.

O recurso a um argumento de autoridade exige que se adote determinados procedimentos para


que fique marcada a autoridade daquele que se retoma. Afinal, de que vale usar um argumento de
autoridade e fazer apagamento da referência que confere autoridade ao argumento.

Lembrete

Isso significa que no momento que o enunciador/promotor ou


defensor retoma a palavra do outro para dar maior credibilidade ao seu
argumento, não pode ignorar que a legitimidade do que enuncia está
atrelado à autoridade que é o referente que ele retoma ao se dirigir ao
interlocutor/jurado.

Ao fazer a citação, o enunciador/promotor ou defensor deve: fazer uma citação literal ou não literal
com a identificando o autor. Se necessário deve identificar a autoridade e consequentemente a sua
proeminência, porque precisa enfatizar a legitimidade que ele confere àquilo que é retomado, inclusive
porque o enunciador/promotor ou defensor não pode garantir que que todos os interlocutores/jurados
reúnem o conhecimento de quem se trata.

É fundamental a identificação do outro que é retomado exatamente porque o enunciador/promotor


ou defensor quer se valer da importância dele. Mesmo que se trate de uma autoridade de notório saber
e muito conhecida, sempre é melhor esclarecer o interlocutor/jurado, porque, entendemos ser arriscado
deixar que os interlocutores chegam às suas próprias conclusões.

Quando se tratar de texto oral verbal, como é o caso do discurso enunciado no tribunal do júri,
o enunciador/promotor ou defensor deverá encontrar um espaço discursivo para orientar a conclusão
dos interlocutores/jurados de que o referente/argumento é perfeito, exatamente, porque foi dito por
pessoa que é uma referência.

Observação

Há que se observar, contudo, que, no texto oral verbal, o enunciador/


promotor ou defensor deve indicar a legitimidade daquele que retoma
rapidamente, porque o discurso do júri tem de primar pela enunciação
acelerada porque os interlocutores/jurados têm dificuldade de concentração
e se perdem em meio a um turbilhão de informação. O enunciador/promotor
ou defensor tem outra realidade quando enuncia o texto escrito, porque,
nessa condição deverá seguir, obrigatoriamente, as normas da ABNT
(Associação Brasileira de Normas Técnicas), submetendo-se a outras
formar para significar a legitimidade do argumento de autoridade no
qual se fundamenta.
49
Unidade II

No texto escrito, o enunciador, em cumprimento com a normas da ABNT deverá indicar as alterações
que imprime ao que retoma, indicando: grifo nosso, no caso de haver negritado ou sublinhado o
texto. Quando interromper o fio discursivo do texto, deverá acrescentar reticências, parênteses [...].
O enunciador nunca deverá inserir ou alterar palavras da transcrição da citação que retoma de forma
literal. Se houver erros no excerto copiado, a ele caberá acrescentar “(sic)”, logo após o engano, para
deixar claro que o erro está no original.

7.1.2 Argumento de causa e consequência

Neste caso, o enunciador/promotor ou defensor pode recorrer à estratégia argumentativa


de causa (os motivos, os porquês) e de consequência (os efeitos) para conquistar a adesão de seus
interlocutores/jurados.

Esse percurso instaura um efeito de lógica que conquista adesão dos interlocutores, mesmo que não
se proceda a uma verificação capaz que contestar o efeito de lógica.

Cabe esclarecer que o texto oral facilita a aceitação de um argumento que instaura efeito de lógica,
devido ao ritmo acelerado que é próprio do texto oral, sobretudo o da enunciação do tribunal do júri.

Exemplo de aplicação

Na produção cinematográfica americana Doze homens e uma sentença, temos vários exemplos do
uso da estratégia argumentativa de efeito de lógica, como já mencionamos na Unidade I.

Há um momento no qual um dos jurados, que é muito metódico, resiste em aceitar que o referente/réu
não se lembrava do filme que assistira na noite em que seu pai foi morto, tampouco do nome dos
atores. O enunciador/jurado que questionava os argumentos que levariam à condenação, interpela o
interlocutor/jurado indagando-lhe sobre sua vida privada, sobre as vezes nas quais fora ao cinema.
Começa a lhe fazer perguntas sobre o enredo, o nome dos filmes e do elenco.

O interlocutor/jurado, no entanto, não se lembra dos detalhes e o enunciador/jurado o indaga sobre


como sua memória estaria ainda mais falha, caso ele tivesse encontrado seu pai morto na cozinha com
um canivete no peito, como acontecera com o réu.

Não podemos afirmar que o fato de o interlocutor/jurado não ter se lembrado de detalhes dos filmes
aos quais assistira não implica que o referente/réu, de fato, tenha tido uma amnésia temporária quanto
aos filmes, devido ao choque de encontrar o pai morto. Ou seja, isso confirma que o efeito de lógica,
embora seja persuasivo não pode ser entendido como pura lógica.

O enunciador/defensor dirige-se aos interlocutores/jurados nos debates: É fato inconteste que


Malaquias matou Eustárquio, porque não podia suportar que seu próprio irmão lhe roubara o grande
amor de sua vida. Que homem suportaria isso com serenidade?

50
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Observação

Muito embora a conclusão que o argumento em questão instaura –


matou por amor, não há como se afirmar que o real motivo do homicídio
tenha, de fato, sido apenas uma razão passional. Temos apenas um
argumento que instaura efeito de lógica. Tanto que o enunciador/promotor
rebate esses argumentos na réplica.

Exemplo de aplicação

O enunciador/promotor dirige-se aos interlocutores/jurados na réplica: peço a Vossas Excelências


que usem da razão, não da emoção, como o nobre defensor deseja aos lhes submeter um argumento
romântico de que Malaquias matou Eustárquio por amor, porque não suportou o fato de seu próprio
irmão tê-lo traído, tomando-lhe a mulher amada que, na realidade, também o traiu.

É claro que Vossas Excelências não cairiam em uma versão romântica e trágica do homem traído que
perdeu a cabeça por amor. Claro que os senhores já perceberam que o referente/réu matou seu próprio
irmão, referente/sua mulher, referente/vítima por puro sentimento de posse, de ódio. E agora se faz de
coitado com o fim de conquistar a piedade de Vossas Excelências.

7.1.3 Argumento de exemplificação ou ilustração

A exemplificação consiste no relato de um fato (real ou fictício). Esse recurso argumentativo é


amplamente usado quando a tese defendida é muito teórica e carece de esclarecimentos com mais
dados concretos. O enunciador que, pelas formações imaginárias, entende que a dificuldade do que
enuncia exige maiores detalhes para que seu interlocutor possa aderir à tese que defende deve se
esmerar para não incorrer em digressões desnecessárias.

Digressão é momento no qual o sujeito sai do foco do texto que enuncia para trazer outro assunto
para os interlocutores, com vistas a promover um melhor entendimento.

Digressões necessárias e digressões desnecessárias

Digressões necessárias: são aquelas que usamos para orientar a nossa audiência. Ex.: de
maneira, para ilustrar nosso ponto de vista, tomaremos um exemplo ocorrido no contexto...

O sujeito deve se referir ao exemplo que retoma de forma objetiva e rápida. E assim que
tiver concluído, deverá fazer a conclusão com os interlocutores. Não é aconselhável deixar
que a audiência chegue às suas próprias conclusões sozinha, pois isso poderá levar a erros.
Ex.: como pudemos apreciar no exemplo citado... Assim, pudemos verificar que o exemplo
citado ilustra...

51
Unidade II

Digressões desnecessárias: devem ser sempre evitadas, pois geram sérios problemas
de compreensão, deixam o interlocutor confuso porque o enunciador desvia do foco sem
qualquer justificativa – simplesmente – muda de assunto.

O interlocutor não consegue entender o porquê da mudança de assunto e se desliga do


contexto, o que é muito complexo. Ao término da exemplificação, o enunciador não conclui
para seu interlocutor o valor da exemplificação, simplesmente, volta para o assunto anterior.

Resultado: há uma paralização discursiva, o interlocutor deixa de se inscrever como tal,


torna-se apenas o espectador de um texto que parece se dar em outra língua. A interpretação
fica totalmente comprometida.

7.1.4 Argumento de provas concretas ou princípio

Quando o enunciador/promotor ou defensor empregar argumentos baseados em provas concretas,


busca evidenciar sua tese por meio de informações concretas, extraídas de dados estatísticos ou fatos
notórios (de domínio público). É o argumento que versa sobre os elementos de fato, buscando realçar
algum aspecto da prova, já colhida no processo. Pode referir-se à prova testemunhal, à prova técnica ou
à prova documental também.

Quando o enunciador/promotor ou defensor se utiliza de argumento da prova testemunhal,


é importante lembrar que esse enunciador/testemunha precisa desfrutar de credibilidade junto aos
interlocutores. Pode ser informante (que ouviu dizer), ou a testemunha do fato em si. Importante definir
se usará as palavras da testemunha, por narrativa, ou se irá chamá-la diante do Conselho de Sentença.

No caso da primeira opção, por narrativa, o enunciador/promotor ou defensor deve se ocupar em


detalhar a informação, dando detalhes passíveis de serem verificáveis, para dar veracidade e, consequente,
credibilidade às informações. Deve-se indicar o local onde a informações se encontram, mencionando as
folhas dos autos, por exemplo. Deve-se dar preferência ao texto literal, fazendo, portanto, uso de citação
direta, ou seja, nas palavras exatas da pessoa citada. Isto causa mais impacto.

No que diz respeito à prova técnica, deve-se ter em mente que é, apenas, o ponto de partida do
raciocínio jurídico. Do resultado do exame técnico, devem nascer as conclusões jurídicas, e não o
contrário. Ao criticar trabalho pericial, o enunciador/defensor deve-se ser objetivo, não deve atingir
o profissional, mas, sim, o resultado da perícia em si.

7.1.5 Argumento por analogia

É o argumento que invoca o próprio discurso da jurídico para que reflexões semelhantes enunciadas
do próprio Judiciário possam nortear novas decisões. As citações de jurisprudência são os exemplos
claros de argumentos por analogia. São muito úteis porque o interlocutor/juiz tende a respeitar, de
algum modo, o que já foi decidido em outras situações e em outras instâncias superiores.
52
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Quando se faz citação jurisprudencial no texto escrito, é importante:

• Citação direta ou literal de até 3 linhas: citar no próprio parágrafo e entre aspas, indicar a fonte
de autoria. Por ser citação literal, deverá se referir ao autor, apenas pelo sobrenome, ano da
publicação, número do volume (se houver) e o número da página.

• Citação direta ou literal de mais de 3 linhas: citar em recuo de quatro centímetros da margem
esquerda, em espaçamento 1,0 e na fonte 10, sem aspas e sem itálico. No momento da citação,
deverá ser indicado o nome do autor, o ano da publicação, o número do volume (se houver) e o
número da página.

• Destaques: momentos nos quais o enunciador decide marcar o texto de alguma forma – itálico,
negrito, sublinhado, mudança de fonte, colorido, porém, deve acrescentar: grifo nosso, ao final,
para deixar claro que aquele destaque é seu.

Importante lembrar que, muitas vezes, marcas são orientadas pela ilusão de origem do sujeito. Vejam
bem, o enunciador invade o discurso do outro que retoma de forma marcada e imprime sua própria
marca. Ao final, demarca escrevendo: grifo nosso. Entendemos que isso apenas concretiza as normas
que são imputadas ao sujeito/autor, mas, se pensarmos isso dentro do espaço de sentidos em que se
realiza, concluiremos que tudo que o sujeito tenta burlar, o que o assujeita.

O enunciador, independentemente, do lugar que enuncia não pode alterar nem corrigir o trecho
citado: à medida que identifica o problema, deve escrever entre parênteses: (sic).

Lembrete

Há que se considerar que é no argumento por exemplificação que o


sujeito que assume a posição de enunciador se encontra mais assujeitado
às normas de autoria.

7.1.6 Argumento de mudança de foco

É o argumento de que se vale o enunciador/defensor para se desviar a atenção dos interlocutores/


jurados do tema central. Vendo-se em um contexto de maior dificuldade para se apegar a um argumento
de mais peso, o enunciador/defensor decidi enaltecer o referente/réu e comprometer o referente/vítima.

Apela-se, em regra, para a subjetividade. O enunciador/defensor, a partir das formações imaginárias,


serve-se de valores que são importantes referências para elencar elementos de valor importantes para
seus interlocutores/jurados. Passa a enaltecer o caráter do referente/réu e, ao mesmo tempo, rebaixa o
referente/vítima.

53
Unidade II

Exemplo

Enunciador/defensor: O referente/réu encontrava-se dormindo em casa às 15h00 porque trabalha


à noite arduamente para sustentar sua filhinha de três anos e meio e esposa. O referente/réu agiu
em defesa do seu lar, cuja inviolabilidade havia sido desrespeitada pelo referente/vítima, jovem
de 17 anos, desempregado, drogado, valentão que sempre andava armado e que, acintosamente
violou o lar do referente/réu que, por sua vez, não tinha outra atitude a fazer senão a de jogar-se
contra o referente/vítima, quando saía com a televisão da família no ombro que decidira levar por
conta da dívida.

No embate corporal, a arma disparou e, por um infortúnio do referente/réu atingiu o referente/réu,


atrás da orelha esquerda.

7.1.7 Argumento por absurdo

O enunciador//promotor ou defensor refuta um argumento, revestindo-o de ironia que, aliás, é


uma forma de heterogeneidade mostrada, na medida em que remete a um outro discurso. Desse modo,
mostra a falta de cabimento ao contrariar a evidência.

Exemplo

Enunciado/promotor: como poderia a referente/vítima/esposa ter disparado três tiros no


referente/vítima/marido, se o laudo necroscópico dela atesta que a hora da morte foi entre meia
noite e 03h00, enquanto a hora da morte dele foi entre 05h00 e 08h00?

Enunciado/promotor: devemos considerar que ela ressuscitou para matar o marido?

Enunciado/promotor: fica claro que houve uma terceira pessoa que matou os dois e fez parecer
que ela tenha matado o marido se suicidado em seguida.

Enunciado/promotor: vossas excelências já chegaram à perfeita conclusão de que foi a ré, a única
pessoa que tinha acesso à casa, que era herdeira da fortuna do casal e que, aliás, foi quem encontrou os
corpos – a filha adotiva do casal que está ali, sentada na frente de Vossas Excelências, chorando, com a
mesma cara deslavada de quem premeditou tudo.

Observação

Podemos verificar que o enunciador/promotor escolheu trabalhar a


irônica para criar o absurdo das alegações do enunciador/defensor que
havia adotado a tese de homicídio e suicídio para defender a referente/ré
se negava a confessar o crime.

54
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

7.1.8 Argumento por exclusão

O enunciador/promotor ou defensor permitirá ao enunciador/promotor eleger várias possibilidades


para seus questionamentos e, em seguida, passa a eliminar essas várias hipóteses que ele próprio havia
formulado, uma a uma. Esse recurso argumentativo instaura os sentidos de controle e ordem.

Exemplo

Enunciador/defensor: poder-se-ia afirmar que o réu não é capaz de controlar os seus atos, não tem
controle emocional, perde o controle rapidamente, é tido como “estouradinho” ou “puxa-faca”.

Exemplo: ninguém viu o acusado pulando o muro da sua casa, tampouco ouviu-se o grito da menina,
o que comprova a improcedência da acusação feita ao réu.

8 LÓGICA JURÍDICA

A lógica é uma ciência de raízes ligadas à Filosofia. O pensamento organizado é a manifestação do


conhecimento e o que o conhecimento busca é a verdade. Portanto, a lógica é um ramo da Filosofia que
cuida das regras do pensamento racional ou do modo de pensar de forma organizada.

O que é a verdade? Quem detém o poder de conhecer a verdade? O homem, sempre, ao longo da
história da humanidade, busca encontrar uma única verdade, ou seja, busca a verdade universal.

A aprendizagem da lógica não constitui um fim, mas, um meio. Ela só tem sentido enquanto meio
para garantir que nosso pensamento chegue a conhecimentos verdadeiros. Podemos dizer que a lógica
trata dos argumentos, ou seja, das conclusões a que chegamos por intermédio da apresentação de
evidências que as sustentam. Os argumentos dividem-se em dois tipos, os dedutivos – argumentos
cuja conclusão é inferida de duas premissas – e os indutivos – argumentos nos quais, a partir de dados
singulares suficientemente numerados, inferimos uma verdade universal.

Os juízos jurídicos são de valor, pois envolvem questões de ordem moral e cultural em sua formação.
As decisões e o raciocínio jurídico não obedecem a esquemas pré-determinados para sua formação, ou
seja, o raciocínio jurídico trabalha com o razoável visando à adequação da norma as questões peculiares
de cada caso, como ensina o renomado jusfilósofo Bittar (2005): enquanto a lógica formal se preocupa
com a estrutura do pensamento, a lógica material investiga a adequação do raciocínio à realidade.
A filosofia moderna procura outros métodos lógicos para determinar o raciocínio válido.

Os sofistas, sábios capazes de elaborar discursos fascinantes, com intenso poder de persuasão foram
interpretados com hostilidade e desconfiança pelos socráticos. Os sofistas foram responsabilizados pela
decadência moral e política da cidade. O termo sofista adquire um sentido pejorativo e desfavorável,
marcando para sempre o vocabulário filosófico: argumento sofístico ou sofisma é o mesmo que falso
argumento ou intencionalmente falacioso; de sofista deriva sofisticado, no sentido depreciativo de algo
muito elaborado ou excessivamente ornado, embora vazio de conteúdo.

55
Unidade II

Na esfera jurídica atual, a contribuição dos sofistas estende-se por todo campo da argumentação e da
retórica, muito comum nos debates jurídicos em que as partes pretendem, por meio de seus argumentos
e discursos, alcançar a aceitação de suas teses.

Lembrete

Se os sofistas acreditavam que a verdade é relativa, podemos dizer que


isto se aplica ao contexto do universo do gênero discursivo jurídico?

Há somente uma verdade na argumentação da enunciação do


tribunal do júri?

8.1 A lógica formal versus a lógica dialética no direito

Parmênides defendia o ponto de vista de que nada muda, tudo que existe sempre existiu, nada se
transforma e, por isso, tudo que conhecemos não é um conhecimento confiável. Parmênides acreditava
apenas na razão, para ele, tudo que vemos sempre existiu.

Heráclito acreditava na constante transformação do ser, tudo está em movimento no universo, ao


contrário de Parmênides acreditava nos sentidos. Nada permanece estático no universo, o que vemos
hoje é uma coisa totalmente diferente do que vimos ontem, tudo está em constante mutação, foi
ele que disse que jamais poderíamos tomar banho duas vezes no mesmo rio, visto que, cada vez que
entrássemos, estaríamos entrando em um rio diferente.

O pensamento de Parmênides espelha a lógica formal e o de Heráclito espelha a lógica dialética.


No decorrer dos séculos essas teorias foram aperfeiçoadas por vários filósofos como Aristóteles, Platão,
Immanuel Kant e Hans Kelsen, seguidores da lógica formal e Hegel, Marx, Engels, Lênin, Karl Popper,
seguidores da dialética.

A lógica formal é uma forma de organizar o raciocínio sem levar em consideração o conteúdo.
O raciocínio é feito com as premissas e a conclusão que é chamada de inferência na lógica. Para um
raciocínio ser considerado lógico, terá que obedecer a três regras básicas da lógica formal que são o
princípio da identidade, o princípio do terceiro excluído e o princípio da não contradição.

A lógica formal, como o próprio nome diz, é pura forma, não se preocupando com o conteúdo
das afirmações, nem há compromisso com a realidade. Aristóteles, para melhor explicar sua teoria,
criou símbolos, utilizando o silogismo, em que qualquer que fosse a proposição colocada no lugar dos
símbolos, o argumento seria válido – Se todos os B são C e se todos os A são B, todos os A são C.

O argumento é a exteriorização do raciocínio. Os argumentos podem ser válidos ou inválidos. Para


um argumento ser considerado válido, terá de obedecer, aos princípios da lógica formal, acima citados,
caso não obedeça será considerado inválido.

56
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

O conceito característico da dialética é o diálogo, ou seja, a oposição de ideias e razões entre posições
inicialmente antagônicas ou não. Como vimos anteriormente, a lógica formal trabalha com conceitos
metafísicos, abstratos e absolutos em que a realidade é explicada por suas essências imutáveis. Já a
lógica dialética parte do princípio da contradição, ou seja, da oposição entre duas opiniões contrapostas.

A dialética é o movimento dos contraditórios, segundo a teoria de Hegel, passa por três fases distintas
em sua formação: a tese, a antítese e a síntese, ou seja, o movimento da realidade se explica pelo
antagonismo entre momento da tese e o da antítese, cuja contradição deve ser superada pela síntese.

No direito, a lógica dialética hegeliana tem importância fundamental, visto que o direito se
desenvolve em um cenário de contradição, uma vez que, o direito de um se coloca em oposição
ao direito de outro em que o poder jurisdicional intervém para dizer o direito válido para todo o grupo
social. A tese que representa o direito de A, a antítese que representa o direito de B e, finalmente,
a síntese que é a decisão judicial, que não põe termo ao ciclo como à priori poderia parecer, mas
realimenta o ciclo transformando-se também em uma nova tese que poderá ser contraditada.

Observação

Considerem a posição dos enunciadores/promotores ou defensores no


tribunal do júri – exemplo perfeito. A tese, a antítese e a síntese que no caso é
a manifestação dos interlocutores/jurados mais a formulação da sentença
condenatória pelo interlocutor/juiz.

8.2 As concepções filosóficas de Chaïm Perelman sobre a lógica jurídica

A obra de Chaïm Perelman – maior expoente dos estudos de retórica moderna – (1912-1984) –
intitulada “lógica jurídica: nova retórica” tornou-se um clássico, configurando-se em manual prático
para o estudo de lógica e da argumentação jurídica.

Perelman foca seu trabalho na busca do entendimento do raciocínio jurídico perfeito e na identificação
de suas particularidades específicas, com vista a entender a real influência desses argumentos sobre as
decisões judiciais.

Seus estudos tinham o intuito de responder a questionamentos do tipo: a) como se raciocina


juridicamente? b) qual a peculiaridade do raciocínio jurídico? c) quais as características desse raciocínio?
d) de onde o juiz extrai subsídios para a construção da decisão justa? e) Até onde leva a argumentação
das partes em um processo? f) qual a influência que a argumentação e a persuasão possuem para definir
as estruturas jurídicas? O intuito de tais questionamentos é dar fundamento à reflexão a respeito do
julgamento e do ato jurídico decisório.

Os estudos realizados por Chaïm Perelman sobre a nova retórica, a lógica e a argumentação são de
fundamental importância para a formação acadêmica dos juristas contemporâneos. Perelman tinha
como objetivo claro declarar sua discordância ao positivismo jurídico que colocava o raciocínio jurídico
57
Unidade II

como um raciocínio exato, mecanicista. O que Perelman queria era definir uma lógica específica que
não se utiliza somente do raciocínio dedutivo, mas que se utilize também de outras formas de raciocínio
como o indutivo.

Para esse autor, a aplicação do raciocínio jurídico pelo juiz é matéria complexa, visto que a lógica
judiciária não se resume a uma mera dedução de conclusões extraídas dos textos da lei, ou seja, a lei
posta pelo legislador, muitas vezes, tem um recurso linguístico vago, o que pode dar margem a várias
interpretações. Quando Perelman se refere ao raciocínio jurídico está falando do ato fundamentado e
expresso nas decisões do juiz que engloba também os demais profissionais que atuam com ele dentro
do processo como advogados, promotor etc.

O pensamento de Perelman volta-se mais para a prática do direito e menos para a estrutura lógica
formal do pensamento, isso se dá em função de sua intenção de conferir autonomia ao raciocínio
jurídico em relação à lógica formal, inserida pelos positivistas nas ciências humanas e jurídicas.

Perelman não trabalha com o conceito de verdade, mas sim, substitui esse termo por termos mais
apropriados como razoável, equitativo, aceitável, admissível..., termos mais apropriados para expressar
o raciocínio jurídico. Com isso, quer o autor demonstrar que o juiz não é simplesmente o porta voz
da lei, como ensina o próprio autor: “o juiz não é a ‘boca da lei’, aplicador neutro e desideologizado
das normas jurídicas como se quis no pensamento derivado da Revolução Francesa” (PERELMAN apud
BITTAR; ALMEIDA, 2005, p. 416).

Para Perelman, os estudos lógicos contemporâneos modernos, derivados de uma tradição cartesiana
e leibniziana, negligenciaram a própria lógica aristotélica. A utilização da lógica aristotélica não formal,
ou seja, a lógica aristotélica judiciária é um recurso que é utilizado por Perelman para reinventar as
dimensões do sistema jurídico em seu funcionamento dinâmico na prática. A influência de Aristóteles
na obra de Chaïm Perelman e notória, demonstrando, assim, em que o autor busca embasamento teórico
para fundar sua teoria.

A lógica jurídica consiste em uma lógica argumentativa e por meio do discurso se constrói o saber
jurídico, a justiça, a equidade, a razoabilidade, e a aceitabilidade das decisões judiciais.

A lógica perelmaniana não obedece a esquemas rígidos de formação, elocução, dedução. Trata-se de
uma lógica material, prática com o firme propósito de produzir efeitos diante de um auditório.

É pacífico o entendimento de que o operador do direito, por meio de seus argumentos influencia a
tomada de decisão do juiz. O juiz quando entra em contato com os argumentos, com os documentos,
com as provas orais, recebe informações que posteriormente vão ser condensadas no processo final de
julgamento, que é a decisão.

A proposta da nova retórica é a de reformular o pensamento jurídico contemporâneo, desvinculando-o


do pensamento positivista, ou seja, propondo ao jurista não pensar nos fatos exclusivamente com os
ditames da lei, mas, sim, pensar nos fatos como situações passíveis de valoração que se revelam por
intermédio do discurso e da prática judiciária.
58
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Observação

Quando considero um homicídio privilegiado por injusta provocação da


vítima, estou considerando uma situação passível de valoração, na medida
em que a vida de um ser humano foi violada porque alguém se ofendeu e
se desiquilibrou a ponto de tirar a vida do outro. Não estarei considerando
o que aquele que, supostamente, “perdeu a cabeça” possa ter feito para que
aquele que perdeu seu maior bem – a vida – o tenha ofendido. Em outras
palavras, uma ofensa se equivale a uma vida.

O trabalho desenvolvido por Perelman tem foco sobre o raciocínio jurídico que é o raciocínio
decisório, ou seja, o poder de dizer que o direito está no poder do juiz. Com esse princípio fundamental
é que Perelman visa a afirmar que a lógica jurídica difere das demais formas de lógica, por ser uma
lógica dialética ou argumentativa. Sendo assim não é dedutiva, não é rígida nem abstrata dos fatos
que analisa. Todo o raciocínio jurídico é traçado em meio aos fatos concretos do dia-a-dia sejam fatos
sociais, políticos dos quais surgem as decisões que regulam cada caso concreto em particular.

Saiba mais

Perelman é referência na área e leitura obrigatória para o futuro


profissional de direito. Leia:

PERELMAN, C. Lógica jurídica: nova retórica. São Paulo: Martins


Fontes, 2004.

8.3 As concepções filosóficas de Robert Alexy sobre a lógica jurídica

Robert Alexy escreve sobre a Teoria da Argumentação – teoria do discurso racional como teoria da
fundamentação jurídica. Alexy não pretendeu formular apenas uma teoria da argumentação capaz de
identificar os bons e os maus argumentos. Sua proposta foi adotar estrutura dos argumentos de forma
analítica e descritiva. Analisa os princípios gerais de direito, sua importância dentro do ordenamento
jurídico e sua aplicação para fundamentar decisões jurídicas.

O tema central da teoria de Alexy repousa na seguinte pergunta: é possível uma fundamentação
racional das decisões jurídicas? Há a possibilidade de determinar critérios que possam determinar que
um discurso prático ou jurídico seja racional? Alexy demonstra em sua obra que tais critérios podem ser
formulados de forma prática mediante a observância de regras práticas a serem seguidas.

59
Unidade II

8.3.1 Regras básicas

A validade do primeiro grupo de regras é condição prévia de toda comunicação linguística:

• Nenhum orador pode se contradizer.

• Todo orador só pode afirmar aquilo que ele próprio crê.

• Todo falante que aplique um predicado F a um objeto A tem de estar preparado para aplicar F
a todo outro objeto que seja semelhante a A em todos os aspectos importantes.

• Diferentes oradores não podem usar a mesma expressão com diferentes significados.

8.3.2 Regras da razão

São as seguintes:

• Não é possível haver um discurso prático sem afirmações.

• Todo falante deve, quando lhe é solicitado, fundamentar o que afirma, a não ser quando puder
dar razões que justifiquem a recusa a uma fundamentação.

• Quem pode falar, pode participar do discurso.

• Todos podem transformar uma afirmação num problema.

• Todos podem introduzir qualquer afirmação no discurso.

• Todos podem expressar suas opiniões, seus desejos e suas necessidades.

Fora isso, há mais algumas regras cuja observância é importante. Falaremos delas a partir de agora.

Regras sobre a carga da argumentação:

• Quem pretende tratar a pessoa A de maneira diferente da adotada para uma pessoa B, está
obrigado a fundamentar isso.

• Quem ataca uma afirmação que não é objeto da discussão deve dar uma razão para isso.

• Quem apresentou um argumento só é obrigado a apresentar outros no caso de surgirem


argumentos contrários.

• Quem introduz uma afirmação que não sirva como argumento a uma manifestação anterior tem,
se isto lhe é pedido, de fundamentar porque introduziu essa afirmação.
60
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Regras de fundamentação:

• A pessoa que afirma uma proposição normativa, que pressupõe uma regra para a satisfação dos
interesses de outras pessoas, deve poder aceitar as consequências dessa regra também no caso
hipotético em que ela se encontre na situação daquelas pessoas.

• As consequências de cada regra para a satisfação dos interesses de cada um devem poder ser
aceitas por todos.

• Toda regra pode ser ensinada de forma aberta e geral.

• As regras morais que servem de base às concepções morais do falante devem passar por uma
análise histórico-crítica. Não passará por essa prova se: t a regra moral perdeu a sua justificação;
t a regra não pôde ser explicada racionalmente desde sua origem nem há novas razões que a
justifiquem agora.

• É preciso aceitar os limites de possibilidade de realização dos dados de fato.

Regras de transição

No discurso prático surgem problemas que obrigam a recorrer a outros tipos de discurso. Isso dá
lugar a mais três regras:

• para qualquer falante e em qualquer momento, é possível passar para um discurso teórico;

• para qualquer falante e em qualquer momento, é possível passar para um discurso de análise
da linguagem;

• para qualquer falante e em qualquer momento, é possível passar para um discurso de teoria
do discurso.

A obra trata do desenvolvimento racional do discurso jurídico a partir da observância de regras e


formas lógicas, como citadas, como fator determinante para o alcance do objetivo dos juízos de dever
e de valor. O intuito do trabalho de Alexy é dar coerência lógica ao discurso jurídico, evitando, assim,
que as decisões judiciais cheguem a absurdos e incoerências em suas formulações. É uma das mais
influentes obras da filosofia do direito surgida nos últimos tempos.

8.4 As concepções filosóficas de Luíz Recaséns Siches sobre a lógica jurídica

Luís Recaséns Siches defende o emprego de um só método, o da lógica do razoável, definida como
uma razão impregnada de pontos de vista estimativos, de critérios de valorização, de pautas axiológicas,
e, além de tudo, traz consigo os ensinamentos colhidos da experiência própria e também do próximo ao
longo da história.

61
Unidade II

Recaséns Siches defende que, assim como a ciência jurídica, a filosofia do direito não tinha condições
de escolher um método ou uma tábua de prioridades entre os vários métodos de interpretação. Decorre
daí, que a única regra que se poderia formular, com universal validade, era a de que o juiz sempre deveria
interpretar a lei de modo que o levasse à solução mais justa dentre todas as possíveis.

Isso não se consubstanciaria em desrespeito à lei, porque, segundo seu pensamento, ao legislador
cabe emitir mandamentos, proibições, permissões, mas não lhe compete o pronunciamento sobre
matéria estranha à legislação, mas, sim, referente apenas à função jurisdicional.

Para Siches, ao contrário do que ocorre com a lógica da inferência, de caráter neutro e explicativo,
a lógica do razoável procura entender os sentidos os vínculos entre as significações dos problemas
humanos, e, portanto, dos políticos e jurídicos, assim como realiza operações de valoração e estabelece
finalidades ou propósitos.

No que tange à atividade do magistrado, especialmente à sentença, é essa também fruto de


estimativa, pois o juiz para chegar à intuição sobre a justiça do caso concreto, não separa sua opinião a
respeito dos fatos das dimensões jurídicas desses mesmos fatos.

A esse particular, o referido autor formula as seguintes observações: primeiramente entende que
a intuição do juiz acha-se embasada na lógica do razoável e que, quando se fala que o juiz procura
uma justificativa para o que pressentiu intuitivamente, isso não significa que deva recorrer àquelas
pseudomotivações lógico-dedutivas de que se serviram os juristas no século XIX, bastando oferecer uma
justificação objetivamente válida, com embasamento na lógica do humano.

Isso faz com que a função do juiz, embora se mantendo dentro da observância do direito formalmente
válido, seja sempre criadora, por alimentar-se de um amplo complexo de valorações particulares sobre
o caso concreto.

Não se trata, contudo, de direito alternativo, muito menos do uso alternativo do direito, porquanto,
trata-se de que o julgador se valha, ao intuir a solução mais justa aplicável ao caso concreto, dos
métodos tradicionais de interpretação para justificar a sua tomada de decisão.

Recaséns Siches explica ainda que a estimativa jurídica informa ao intérprete sobre quais são os
valores cujo cumprimento deve ou não ser perseguido pelo direito, tais como justiça, dignidade da
pessoa humana, liberdades fundamentais do homem, segurança, ordem, bem-estar geral e paz.

Mas há outros que podem ser englobados no conceito que tradicionalmente se denomina prudência:
sensatez, equilíbrio, possibilidade de prever as consequências da aplicação da norma e de sopesar entre
vários interesses contrapostos, legitimidade dos meios empregados para atingir fins justos etc.

No intuito de concluir, Siches salientou que a lógica do razoável está sempre impregnada por
valorações, ou seja, critérios axiológicos. Essa característica valorativa é totalmente estranha à lógica
formal ou a qualquer teoria da inferência, constituindo um dos aspectos que, definitivamente, distingue
a lógica do razoável da lógica matemática.
62
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Para o citado autor, a lógica formal não esgota a totalidade do logos, da razão, é apenas um
setor dela. Existem outros setores que pertencem igualmente à lógica, que possuem natureza
completamente diversa da lógica do racional, que é a lógica dos problemas humanos de conduta
prática, a “lógica do razoável”. Fica claro, então, que Luís Recaséns Siches é o dinamizador na ciência
jurídica latino‑americana, das novas teorias em matéria de hermenêutica do direito.

Saiba mais

Apesar de não ter tradução para o português, a obra de Siches vale o


esforço de ler em idioma estrangeiro:

SICHES, L. R. Tratado general de filosofia del derecho. Ciudad de México:


Porrua, 1959.

No século XX, mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial, os juristas perceberam que não se
podia interpretar o direito por meio de equações lógicas, sem considerar valores e aspectos particulares
de cada caso, não se admitindo o positivismo obcecado nem o jusnaturalismo exagerado.

O pensamento jurídico atual passa a se opor à lógica formal e a utilizar-se da dialética e da lógica
do razoável. O direito como fato gerado no ceio da sociedade e que está em constante evolução,
exige do operador do direito que analise os fatos com uma visão estrita de cada caso, aplicando a
norma de forma a amoldá-la a situações apresentadas e obtendo, assim, o maior grau de êxito em sua
aplicação, abandonando definitivamente o simples silogismo e partindo para a discussão dialética das
questões jurídicas.

Os operadores do direito, principalmente os magistrados, devem preocupar-se com a razoabilidade


das decisões e argumentações jurídicas, visando com isso a fundamentar suas ações e a solidificar a
evolução da lógica jurídica.

Resumo

Entende-se por valor o que mobiliza o anseio humano. É pelo


conhecimento de suas necessidades e pela hierarquia com a qual as
apresenta que podemos avaliar o peso que elas detêm nas suas escolhas.
Contemplam-se, então, os valores que vão corresponder aos anseios não
materiais da pessoa humana: o anseio pela verdade, pelo bem, pelo belo,
pelo afeto, pelo sagrado, por exemplo.

A humanidade não se contenta com qualquer conhecimento, mas


quer o que de algum modo e sob algum aspecto e em algum tempo,
corresponda ao real, ou seja, à verdade. A aceitação da relatividade

63
Unidade II

do conhecimento em relação ao sujeito não implica o abandono da


busca da verdade. O relativismo sim, que nega a possibilidade do
conhecimento da verdade, tomando o interesse do sujeito como único
referencial no processo da razão, é incompatível com o incontestável
progresso da ciência.

Os valores éticos correspondem à carência humana pelo bem moral,


ao seu anseio por respeito e justiça, por liberdade, lealdade, honestidade,
responsabilidade e por todos os demais valores decorrentes do princípio da
moralidade que exige que se faça o bem e que se evite o mal. Há ainda o
anseio pelo belo, pelo harmônico que é satisfeito pelo valor estético.

Apesar de toda essa valorização do “novo”, pode-se perceber,


especialmente no ocidente cristão, uma direção, um ordenamento que,
embora na prática se apresente constantemente com falhas e retrocessos,
mostra-se estável e constante: a permanente busca dos valores do
“respeito”, da “justiça” e da “igualdade de deveres e direitos”.

São inúmeras as dificuldades para a hierarquização dos valores.


A primeira liga-se à questão da sua objetividade ou subjetividade. É
extremamente difícil demonstrar a objetividade dos valores. Mais fácil é
perceber as necessidades universais do ser humano, o que naturalmente
leva a uma escala de valores para satisfazê-las, segundo o seu nível de
exigência e prioridade. Considerar os valores subjetivos, como criações
humanas significa desvalorizá-los, relativizá-los e, assim, minimizar
a sua importância para o homem. A hierarquia de valores feita por um
critério empírico só teria validade particular e temporal. Seria variável e
não universalmente válida e, assim, todos os comportamentos humanos
igualmente admitidos.

O subjetivismo tem seu foco no processo de valoração, na interferência


do homem no processo. O objetivismo, ao contrário parte das necessidades
humanas e aceita a independência dos valores como o modo ideal de
supri‑las. Para as doutrinas subjetivistas, o sujeito cria o valor e não apenas
o aprende. Para uns, seria o prazer, para outros, o interesse; para outros,
ainda seria o desejo a fonte do valor, mas, seria ele sempre uma criação
humana, variando somente com o tempo, as culturas e as situações.

O homem chega então à consciência de si mesmo pelo conhecimento


do valor de que se sente privado. Por meio dele, conhece a sua destinação
ao valor pleno e absoluto que fundamenta assim o seu referencial
para a sistematização dos múltiplos valores que vão satisfazer suas
inúmeras necessidades.

64
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

Há que se considerar que são os valores universais que devem ser


priorizados porque são eles que atendem às necessidades da pessoa
humana. Os variáveis e secundários são aqueles que correspondem às
múltiplas personalidades com suas características próprias e individuais.

A heterogeneidade discursiva permite-nos compreender que é em


função da ilusão de origem do sujeito retoma outras vozes que passam
a constituir o discurso que o sujeito acredita ser seu. Assim, retoma a voz
do outro, sem proceder a demarcações, ou ainda as demarca, movido pela
mesma ilusão que o faz crer que o não demarcado é seu.

A heterogeneidade discursiva, seja ela mostrada – forma marcada - ou


constitutiva – forma não marcada - passa ser entendida como resultado
de uma espécie de acordo imaginário que se estabelece entre o sujeito e
seu leitor virtual, a partir das formações imaginárias. Seja o texto escrito
ou oral, o sujeito enunciador recorre a determinadas demarcações ou
apagamentos para reafirmar seu lugar de enunciação como fonte e origem
do discurso que enuncia.

Assim, à medida que o sujeito se apresenta ao seu interlocutor virtual no


domínio das normas que o regulam, ele acentua sua ilusão de onipotência
e independência, como o “dono de seu pensamento” que reafirma a ilusão
de “controlador” que o perpassa, pois, ao demarcar o discurso do outro que
retoma, o sujeito demonstra ser conhecedor das normas éticas de modo a
não se apropriar do dizer do outro, como exige o princípio de autoria.

Desde a antiguidade, a argumentação tem sido objeto de interesse de


todas as áreas em que se pratica a arte de falar e escrever bem. Na prática
das Ciências Jurídicas, a argumentação guarda estreita dependência com o
raciocínio lógico, ainda que seja um jogo discursivo, um jogo de inteligência,
que possui objetivos pontuais.

A análise da estrutura argumentativa de um discurso que se inscreve no


gênero discursivo jurídico, sobretudo aquele que é enunciado no tribunal
do júri, necessariamente, observa:

• o lugar de enunciação: o lugar físico onde a enunciação acontece


(igreja, tribunal, sala de aula, estádio esportivo);

• o lugar social de quem enuncia: a posição que o sujeito ocupa na


sociedade (juiz, promotor, defensor, réu, jurados, professor, padre,
juiz, médico, promotor, advogado);

65
Unidade II

• os referentes: todo aquele ao qual o sujeito, seja ele locutor,


enunciador ou autor se refere, seja este último humano, animal
ou coisa inanimada, importa ainda o lugar social que o referente
humano ocupa na sociedade;

• os interlocutores em função do lugar social de onde falam: quando o


sujeito se dirige a um interlocutor, importa sobremaneira o lugar de
enunciação o qual o sujeito e o interlocutor ocupam;

• a(s) tese(s) que se deseja provar: teses são referentes do discurso


que é enunciado.

Abordamos, além disso, as principais estratégias argumentativas,


comentando: argumento de autoridade, de causa e consequência, de
exemplificação ou ilustração, de provas concretas ou princípio, por analogia,
por absurdo e por exclusão.

A lógica é uma ciência de raízes ligadas à Filosofia. O pensamento organizado


é a manifestação do conhecimento e o que o conhecimento busca é a
verdade. Portanto, a lógica é um ramo da Filosofia que cuida das regras do
pensamento racional ou do modo de pensar de forma organizada.

A aprendizagem da lógica não constitui um fim, mas, um meio para


garantir que o pensamento chegue a conhecimentos verdadeiros. As
conclusões a que chegamos se dá por meio de evidências. Os argumentos
dividem-se em dois tipos, os dedutivos – a conclusão é inferida de duas
premissas - e os indutivos – a partir de dados singulares suficientemente
numerados, inferimos uma verdade universal.

A lógica formal se preocupa com a estrutura do pensamento, a lógica


material investiga a adequação do raciocínio à realidade. A filosofia moderna
procura outros métodos lógicos para determinar o raciocínio válido.

Quanto à lógica formal x a lógica dialética no direito, Parmênides


defendia o ponto de vista de que nada muda, tudo que existe sempre
existiu, nada se transforma e, por isso, tudo que conhecemos não é um
conhecimento confiável. Parmênides acreditava apenas na razão, defendia
que tudo que vemos sempre existiu.

A lógica formal, como o próprio nome diz, é pura forma, não se


preocupando com o conteúdo das afirmações, nem há compromisso
com a realidade.

66
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO JURÍDICA

O conceito característico da dialética é o diálogo, ou seja, a oposição


de ideias e razões entre posições inicialmente antagônicas ou não.
opiniões contrapostas.

A dialética é o movimento dos contraditórios, segundo a teoria de


Hegel, passa por três fases distintas em sua formação: a tese, a antítese e
a síntese, ou seja, o movimento da realidade se explica pelo antagonismo
entre momento da tese e o da antítese, cuja contradição deve ser
superada pela síntese.

No direito, a lógica dialética hegeliana tem importância fundamental,


visto que o direito se desenvolve em um cenário de contradição, uma vez
que, o direito de um se coloca em oposição ao direito de outro em que o
poder jurisdicional intervém para dizer o direito válido para todo o grupo
social. A tese que representa o direito de A, a antítese que representa
o direito de B e, finalmente, a síntese que é a decisão judicial, que não
põe termo ao ciclo como à priori poderia parecer, mas realimenta o ciclo
transformando-se também em uma nova tese que poderá ser contraditada.

No século XX, mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial, os


juristas perceberam que não se podia interpretar o direito por meio de
equações lógicas, sem considerar valores e aspectos particulares de cada caso,
não se admitindo o positivismo obcecado nem o jusnaturalismo exagerado.

O pensamento jurídico atual passa a se opor à lógica formal e a utilizar‑se


da dialética e da lógica do razoável. O direito como fato gerado no ceio da
sociedade e que está em constante evolução, exige do operador do direito
que analise os fatos com uma visão estrita de cada caso, aplicando a norma
de forma a amoldá-la a situações apresentadas e obtendo, assim, o maior
grau de êxito em sua aplicação, abandonando definitivamente o simples
silogismo e partindo para a discussão dialética das questões jurídicas.

Os operadores do direito, principalmente os magistrados, devem


preocupar-se com a razoabilidade das decisões e argumentações jurídicas,
visando com isso a fundamentar suas ações e a solidificar a evolução da
lógica jurídica.

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REFERÊNCIAS

Audiovisuais

DOZE homens e uma sentença. Dir. Sidney Lumet. EUA: Orion-Nova Productions, 1957. 96 min.

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Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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