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“Situação epidemiológica do tracoma entre estudantes da rede pública de

municípios do Piauí”

por

Mohema Duarte de Oliveira

Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre Modalidade


Profissional em Epidemiologia em Saúde Pública.

Orientador principal: Prof.ª Dr. Leonardo Soares Bastos

Teresina, setembro de 2015.


Esta dissertação, intitulada

“Situação epidemiológica do tracoma entre estudantes da rede pública de


municípios do Piauí”

apresentada por

Mohema Duarte de Oliveira

foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof.ª Dr.ª Luciane de Souza Velasque


Prof. Dr.ª Raquel de Vasconcellos Carvalhaes de Oliveira
Prof.ª Dr.ª Leonardo Soares Bastos – Orientador principal

Dissertação defendida e aprovada em 28 de setembro de 2015.


Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca de Saúde Pública

O48s Oliveira, Mohema Duarte de


Situação epidemiológica do tracoma entre estudantes da rede
pública de municípios do Piauí. / Mohema Duarte de Oliveira. -- 2015.
51 f. : il. ; tab. ; mapas

Orientador: Leonardo Soares Bastos


Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública
Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2015.

1. Tracoma - epidemiologia. 2. Chlamydia Trachomatis.


3. Estudantes. 4. Setor Público. I. Título.

CDD – 22.ed. – 617.772098122


“Mesmo quando tudo parece
desabar, cabe a mim decidir entre rir
e chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar;
porque descobri, no caminho incerto
da vida, que o mais importante é o
decidir” (Cora Coralina)
Agradecimentos

Primeiramente, a Deus pelo dom da vida.

Aos meus pais, que sempre foram um espelho de garra e dedicação, que
ensinaram-me que o mais importante é na vida é conhecimento que
carregamos como bagagem.

À minha tia Arlete que mesmo estando longe fisicamente, sempre esteve
presente em cada conquista minha.

Ao meu noivo Jefferson Ricardo, pelo companheirismo ao longo desses anos.

Ao orientador Leonardo Bastos pela paciência, compreensão e disponibilidade


em atender-me sempre quando solicitado.

Aos colegas da turma do mestrado pelo convívio, aprendizado e partilha das


experiências profissionais e de vida acadêmica, com os quais aprendi muito,
em especial a Pollyana e Margarete.

À ENSP pela oportunidade de qualificação ofertada, do qual honrosamente


poderei de conseguir o tão almejado título.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Transmissão do tracoma.............................................................. ... 15


Figura 2 - Formas clínicas do Tracoma ............................................................ 17
Figura 3 - Exame ocular da conjuntiva no interior da pálpebra superior ..........18
Figura 4 - Estratégia SAFE........................................................................... ... 22
Figura 5 - Distribuição do Tracoma em todo o mundo .................................... 24
Figura 6 - Principais focos de Tracoma no Brasil ............................................. 27
Figura 7 - Distribuição geográfica de percentual do Tracoma. Inquérito de
Tracoma em escolares, Brasil, 2002-2007 ....................................................... 29
Figura 8 - Municípios investigados em inquéritos de Tracoma em escolares no
Piauí de 2007 a 2013 ....................................................................................... 37
Figura 9 - Mediana do IDH-M dos municípios participantes e não participantes
dos inquéritos de tracoma no Piauí de 2007 a 2013. ....................................... 39
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Estratégias de tratamento do tracoma com Azitromicina preconizado


pelo Ministério da Saúde segundo a prevalência ............................................. 21
Tabela 2 - Estimativas globais da população que vive em áreas endêmicas, o
número de pessoas tratadas com antibióticos e número de cirurgias por região
da OMS, 2013 .................................................................................................. 25
Tabela 3 - Faixas de desenvolvimento humano ........................................... ... 32
Tabela 4 - Número de examinados, casos e percentual de percentual de
tracoma notificados em inquéritos em escolares no Piauí, Brasil, 2007-2013 . 34
Tabela 5 - Características dos Casos Confirmados de Tracoma, Piauí 2007 e
2013 ................................................................................................................. 35
Tabela 6 - Formas clínicas detectadas de acordo com a idade, 2007 a 2013 . 35
Tabela 7 - Municípios com maiores percentuais de tracoma diagnosticados em
inquéritos em escolares 2007 a 2013 ............................................................... 36
Tabela 8 - Associação da percentual do tracoma (2007 - 2013) com Índice de
Desenvolvimento Humano dos municípios no ano de 2010 ............................. 38
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

CEP: Comitê de Ética em Pesquisa


CGHDE: Coordenação Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação
CO: Opacidade Corneana
ENSP: Escola Nacional de Saúde Pública
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH: Índice de Desenvolvimento Humano
IDH-M: Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
ITI: International Trachoma Iniative
MS: Ministério da Saúde
OMS: Organização Mundial de Saúde
PNUD: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PSE: Programa Saúde na Escola
SAFE: Surgery - Antibiotictherapy - Facial cleanliness - Envirommentalchange.
SINAN: Sistema de Informação de Agravos de Notificação
SUCAM: Superintendência de Campanhas de Saúde Pública
SUS: Sistema único de Saúde
SVE: Sistema de Vigilância Epidemiológica
SVS: Secretaria de Vigilância em Saúde
TF: Tracoma Inflamatório Folicular
TI: Tracoma Inflamatório Intenso
TS: Tracoma cicatricial
TT: Triquíase Tracomatosa
UF: Unidade Federada
VE: Vigilância Epidemiológica
WHO: World Health Organization
RESUMO

O tracoma é uma afecção inflamatória ocular, bilateral e recidivante causada


pela Chlamydia trachomatis. Casos de cegueira por esta doença estão
relacionados a precárias condições de vida, afetando as pessoas de baixa
renda que vivem preferencialmente em zonas rurais. Objetivos: Descrever os
casos de tracoma diagnosticados em inquéritos epidemiológicos em escolares
do Piauí no período de 2007 a 2013. Métodos: estudo descritivo realizado por
meio de dados secundários de acesso restrito dos casos de Tracoma
diagnosticados em inquéritos epidemiológicos em escolares no estado do Piauí
de 2007 até 2013. Resultados: o percentual (%) de tracoma no Piauí foi 2,6%;
e 50,4% dos casos eram do sexo feminino. Já faixa etária mais acometida foi
entre 1 e 9 anos de idade (89,3%).Em relação à zona de moradia 68,3%
residiam em zona rural. Houve percentual maior das formas mais brandas da
doença, o tracoma inflamatório folicular (71,21%), seguido da forma tracoma
inflamatório intenso (27,70%). Não foram encontrados casos da forma mais
grave da doença. Conclusão: a situação de percentual de tracoma em
escolares no Piauí foi das formas brandas que são tracoma inflamatório
folicular e tracoma inflamatório intenso; adoção de medidas de prevenção e
controle capacitação profissionais da área de saúde para detecção e realização
de outros estudos em regiões semelhantes aos do inquérito e que ainda não
foram avaliadas no estado em busca de novos e possíveis focos da doença.

Descritores: Tracoma. Chlamydia trachomatis.Epidemiologia.


ABSTRACT

Trachoma is an eye inflammatory disease, bilateral and recurrent caused by


Chlamydia trachomatis. Cases of blindness from this disease are related to
poor living conditions, affecting low-income people who live preferably in rural
areas. Objectives: To describe the cases of trachoma diagnosed in
epidemiological surveys in Piauí the school from 2007 to 2013. Methods: A
descriptive study using secondary data restricted cases of trachoma diagnosed
in epidemiological surveys with schoolchildren in Piauí State 2007 to 2013.
Results: the percentage (%) of trachoma in Piaui was 2.6%; and 50.4% of
cases were female. Already most affected age group was between 1 and 9
years old (89.3%). In relation to housing zone 68,3% lived in rural areas. There
was a higher percentage of the milder forms of the disease, follicular
inflammatory trachoma (71,21%), followed by the form intense inflammatory
trachoma (27,70%). There were no cases of the more severe form of the
disease. Conclusion: the situation of trachoma percentage in school in Piauí
was the milder forms that are follicular inflammatory trachoma and intense
inflammatory trachoma; adoption professionals prevention and control capacity
building measures of health to detect and carry out further studies in areas
similar to the investigation and not yet evaluated in the state in search of new
and potential outbreaks of disease.

Descriptors: Trachoma. Clamydia trachomatis. Epidemiology.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 11
2 JUSTIFICATIVA............................................................................................ 13
3 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................ 14
3.1 Agente etiológico ............................................................................. 14
3.2 Transmissão .................................................................................... 15
3.3 Formas clínicas ................................................................................ 16
3.4 Diagnóstico ...................................................................................... 18
3.5 Tratamento ..................................................................................... 19
3.6 Ações e vigilância epidemiológica .................................................. 23
3.7 Epidemiologia do tracoma no mundo .............................................. 23
3.8 Tracoma no Brasil ............................................................................ 26
4 OBJETIVOS .................................................................................................. 30
4.1 Objetivo geral ................................................................................... 30
4.2 Objetivos específicos ....................................................................... 30
5 METODOLOGIA .......................................................................................... 31
5.1 Tipos, local e período da pesquisa .................................................. 31
5.2 Fontes de dados e critérios de inclusão/exclusão ........................... 31
5.3 Organização e análise dos dados .................................................... 33
5.4 Aspectos éticos ............................................................................... 33
6 RESULTADOS .............................................................................................. 34
7 DISCUSSÃO ................................................................................................. 40
8 CONCLUSÃO ............................................................................................... 45
REFERENCIAS ............................................................................................... 46
ANEXO ............................................................................................................ 51
11

1 INTRODUÇÃO

O tracoma é descrita como uma afecção inflamatória


ocular,ceratoconjuntivite bilateral e recidivante, que é causada por uma bactéria
do tipo gram-negativa Chlamydia trachomatis com vida intracelular obrigatória26
e que pode causar cegueira senão for evitada e/ou tratada. Assim, era uma das
doenças candidatas a fazerem parte do grupo de doenças negligenciadas no
mundo. Mas, somente em outubro de 2010, a OMS lançou seu primeiro
relatório sobre Doenças tropicais negligenciadas (DTNs) e listava tracoma
como um dos sete DTN1.
Casos de infecções oculares com características semelhantes ao
tracoma são datados desde as primeiras civilizações na China (sec. XXVII a.C),
Egito (sec. XIX a.C), Grécia (sec. V a.C.) e Roma (sec. I a.C.) 2.
A doença pode ter tido origem com os povos nômades da Mongólia com
o qual teve disseminação para a China, Sibéria, e costa mediterrânea por meio
das invasões. Na Idade Média, o tracoma era endêmico no Oriente Médio e na
Grécia com as grandes guerras e migrações, o tracoma foi introduzido no
restante da Europa. A partir de então, foi levado para o ocidente através das
colonizações 3.
A doença foi gradualmente eliminada nos países da Europa e América
do Norte, onde no século XIX eram elevadas as prevalências. Esse
comportamento deu-se em decorrência das mudanças e melhorias das
condições de vida e acesso aos serviços de saúde4.
No Brasil, um papiro descoberto em 1982 por George Ehlers1, que
descrevia uma epidemia de doença ocular com sinais característicos de
tracoma no ano de 19565.
Existem relatos que a chegada do tracoma no Brasil pelos estados:
Ceará, São Paulo e Rio Grande do Sul 2.

1
Primeiro pastor luterano do Rio Grande do Sul.
2
Em estatística, outlier, valor aberrante ou valor atípico, é uma observação que apresenta um
grande afastamento das demais da série.
3
É um instrumento usado para mediro grau de concentração de renda.
Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos
mais ricos. Numericamente, varia de 0 a 1, sendo que 0 representa a situação de total
12

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o tracoma é


considerado uma doença negligenciada por não ser foco de interesse dos
governos e do mercado farmacêutico no cenário mundial 6.
A iniciativa global para a eliminação de cegueira evitável (VISION
2020) “O Direito à Visão”, lançada pela OMS e pela Agência Internacional para
a Prevenção da Cegueira em 1999 identificou o tracoma como umas das cinco
doenças prioritárias das ações de saúde 1.
O Ministério da Saúde (MS) elencou conjunto de doenças que
necessitam de intervenções para eliminação como problema de saúde pública
ou para redução da prevalência dessas doenças e outras relacionadas com a
pobreza, nos quais está incluído o tracoma7.
O tracoma bem como outras endemias negligenciadas possuem
proporções elevadas e altas e grau de incapacidade8. Aproximadamente 3%
dos casos de cegueira em todo o mundo são provocados pelo tracoma9 e cerca
de mais de vinte milhões de pessoas têm tracoma ativo e quase 10 milhões
têm triquíase e cegueira, com base nos relatórios provisórios dos países em
10
2011 dos 53 países em que o tracoma é considerado endêmico .
A infecção tracomatosa está relacionada a fatores socioeconômicos com
precárias condições de vida, afetando as pessoas de baixa renda,
principalmente de países em desenvolvimento, que vivem preferencialmente
em zonas rurais11.
13

2 JUSTIFICATIVA

A situação de casos diagnosticados em escolares e notificados do


estado do Piauí, segundo o ultimo inquérito nacional do Tracoma realizado em
2004 no Piauí e trazer informações que pudessem fornecer subsídios para a
implementação de medidas de controle adequadas, oportunas e efetivas da
endemia em questão justifica a realização do presente estudo.
A escolha do tema foi motivada pelo fato de o tracoma ser uma das
doenças oculares infecto-contagiosas mais comuns no mundo, além da
experiência pessoal e profissional de ter trabalhado em um dos municípios
prioritários para tracoma no estado do Piauí.
A compreensão da situação do tracoma no Piauí poderá orientar a
inserção de um programa de vigilância epidemiológica e controle da endemia
nos modelos de atenção em vigilância em saúde, atenção básica e de média
complexidade, já que as ações de vigilância e controle de endemias no Brasil
estão passando por processos de reorganização, onde se faz necessário
ampliar conhecimento epidemiológico a cerca da doença.
14

3 REFERENCIAL TEORICO

3.1 Agente etiológico

O agente etiológico causador do tracoma é uma bactéria gram-negativa


Chlamydia trachomatis, pertence à família Chlamydiaceae, de vida intracelular
obrigatória, apresenta um tropismo pelas células epiteliais, onde se instala e se
multiplica, formando inclusões citoplasmáticas 12.
A clamídia é um organismo cosmopolita, ou seja está presente em todo
os lugares do mundo, possui um dos menores genomas dentre os organismos
vivos conhecidos, logo, sua capacidade de síntese dos compostos necessários
ao seu metabolismo é bem limitada. O ciclo de vida dura em média 24 a 48
horas 13.
A doença possui um período de incubação de 5 a 12 dias, depois dos
quais o indivíduo apresenta sintomas de conjuntivite ou irritação ocular 14.
Existem 15 sorotipos diferentes de C. trachomatis que são infectantes
para o homem, somente os sorotipos A, B, Ba e C são responsáveis pela
infecção do tracoma. Outros sorotipos como L1, L2 e L3 estão associados às
doenças sexualmente transmissíveis como a síndrome do linfogranuloma
venéreo. Já sorotipos D, E, F, G, H, I, J e K são responsáveis pela pneumonia
em neonatos (Chlamydia pneumonie)15.
A C. trachomatis é termossensível, tornando-se não infectante a
temperaturas superiores a 60°C (após 10 minutos) 13.
O único reservatório conhecido para a C. trachomatis é o homem. As
moscas participam do processo apenas como vetores da bactéria 12.
15

3.2 Transmissão

A principal via de transmissão da doença é a forma direta, que ocorre


de pessoa a pessoa, olho no olho durante o contato intimo (Figura 1). Seguida
pela forma indireta, através de compartilhamento de objetos contaminados com
16
secreção ocular, tais como toalhas, lenços e fronhas . Há também a
possibilidade de que a infecção possa ser disseminada a partir de infecção por
aerossol nasal 17.

Figura 1 – Transmissão do Tracoma: A transmissão do tracoma por (a)


vetores, (b) o contato de olho com as mãos contaminadas, (c) o contato visual
com as roupas contaminadas.

FONTE: WHO31, 1993.

A mosca doméstica (Musca domestica) que participa do processo de


transmissão passiva e indireta atua apenas como vetor mecânico, aonde após
posar na mucosa ocular infectada, suas patas são infectadas e assim
disseminam a bactéria 18.
Após a contaminação, ocorre o prurido intenso, que apesar de não ser
uma manifestação clínica clássica do tracoma, atua como facilitador na
transmissão da doença, em que as mãos infectadas contaminam objetos ou a
16

19
mucosa de pessoas através do contato intima .
A doença está relacionada com precárias condições socioeconômica e
baixa índices de desenvolvimento humano (IDH), precárias condições de
habitação, grande concentração populacional, falta de saneamento básico,
baixos níveis educacional e cultural. Outros fatores relacionados com a
presença do Tracoma seriam: presença de insetos vetores, migrações
populacionais, presença de outras doenças oculares, precariedade no
20
abastecimento de água e coleta de lixo .

3.3 Formas clínicas

A infecção geralmente na forma inicial pode ser inaparente e possui


período de incubação entre 5 a 12 dias, onde na maioria das vezes instala-se
silenciosamente e progressivamente, havendo primeiramente um ligeiro
desconforto ocular, lacrimejamento, prurido e ardência. Podem ocorrer ainda a
presença de secreção purulenta pela manhã 21.
É uma ceratoconjuntivite autolimitada recidivante, onde episódios
repetidos pode evoluir para um processo inflamatório e fibrinogenico crônico,
22
levando a cicatrizes conjuntival e ofuscante sequelas .
Infecção ativa ou tracoma ativo é caracterizado por inflamação da
conjuntiva com presença de folículos visíveis macroscopicamente através do
exame ocular externo. Infecções repetidas levam a formação de cicatrizes, que
posteriormente provocam a inversão da pálpebra, ou entrópio. A triquíase,
extremamente dolorosa, que é a fricção dos cílios contra o globo, provoca
formação de cicatrizes na córnea e cegueira 23.
É possível o desenvolvimento de folículos e posteriomente formação
de cicatrizes ou depressoes na área no limbo (borda) da córnea, chamados de
Fossetas de Hebert 6.
As recidivas da infecção por C. trachomatis ocorrem, pois mesmo
produzindo uma resposta imunológica, o corpo humano não é capaz de
desenvolver defesa contra os 15 diferentes sorotipos existentes e infectantes
24
aos seres humanos, podendo, portanto ocorrer reinfecção .
17

De acordo com a apresentação clínica, e a classificação de tracoma


preconizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para estudos
epidemiológicos (Figura 2): normal (N), tracoma inflamatório folicular (TF),
tracoma inflamatório intenso (TI), tracoma cicatricial (TS), triquíase tracomatosa
(TT) e opacificação corneana (CO) 25.

Figura 2-Formas clínicas do Tracoma.

Fonte: OMS, 2003.

Considera-se Tracoma Folicular (TF) quando se verifica presença de


cinco folículos de no mínimo 0,5 mm de diâmetro na conjuntiva tarsal superior.
A forma clínica de Tracoma Inflamatório Intenso (TI) ocorre com o
espessamento inflamatório da conjuntiva tarsal superior; o tracoma cicatricial
(TS) a conjuntiva apresenta uma aparência esbranquiçada e fibrosa; triquíase
tracomatosa (TT) há presença de pelo menos um cílio tocando o bulbo ocular
18

ou sinais de epilação recente de um cílio invertido e por fim a opacidade


corneana (CO) 25.

3.4 Diagnóstico

O diagnóstico clínico é feito pelo exame ocular externo (Figura 3). O


exame ocular ocorre por meio da eversão de pálpebras, em que o examinador
observa a área central da conjuntiva tarsal. Esta ação é indispensável para o
estabelecimento do diagnóstico, conforme o grau de inflamação tracomatosa
11
da conjuntiva . No Brasil o diagnóstico é feito através do exame ocular
externo 26.

FIGURA 3 - Exame da conjuntiva no interior da pálpebra superior

FONTE: WHO1, 1993.

A OMS preconiza que diagnóstico clínico de tracoma deve ser


confirmado quando durante o exame ocular houver presença de folículos
inflamatórios na conjuntiva tarsal superior e/ou presença das fossetas de
Herbert, que são cicatrizes na conjuntiva 6.
19

No Brasil, um caso de tracoma é considerado como suspeito quando o


indivíduo ao procurar os serviços de saúde referir história de conjuntivite
27
prolongada e recidivante, ou sintomatologia ocular de longa duração .
Um caso só é confirmado quando em um caso suspeito por meio de
exame ocular externo, apresentar um ou mais dos seguintes sinais: folículos
inflamatórios na conjuntiva tarsal superior, espessamento da conjuntiva
superior, cicatrizes na conjuntiva, triquíase com presença de cicatrizes
conjuntivais e opacificação corneana 27.
A cultura é uma técnica laboratorial com alta sensibilidade e
especificidade para C. trachomatis28. O diagnóstico laboratorial, não é rotina
nos serviços de saúde no Brasil, mas pode ser utilizado apenas para
28
constatação da circulação do agente etiológico na comunidade . Assim, o
exame laboratorial não se faz necessário, já que nenhuma das outras doenças
oculares possui as características epidemiológicas que são peculiares do
tracoma 27.

3.5 Tratamento

O tratamento utilizado pelo MS com antibióticos objetivando acura da


infecção e interrupção da cadeia de transmissão da doença. A C. trachomatis
é sensível a vários antibióticos de uso local/tópico (tetraciclina e sulfa) e de uso
sistêmico (azitromicina) 26.
No Brasil adota-se a azitromicina como antibiótico de escolha no
tratamento do Tracoma, sendo este de forma individual ou coletiva29.
A azitromicina tem uma série de características vantajosas, como um
agente de tratamento de massa, possibilidade e administração por via oral,
meia-vida longa e um perfil de efeitos secundários toleráveis 10.
Conforme portaria nº 67 de 22/12/2005 do Ministério da Saúde do Brasil
que inclui azitromicina no tratamento sistêmico de tracoma, a droga deverá ser
administrada em dose única, por via oral em pó solúvel para crianças até 12
anos e/ou 45 Kg de peso corporal ou através de comprimidos de 500mg para
20

adultos e crianças maiores de 12 anos ou acima de 45 kg de peso corporal em


dose única26.
No entanto, quando não houver disponibilidade da Azitromicima, outros
antibióticos alternativos podem ser utilizados no tratamento do tracoma
ativo,:Eritromicina - 250mg, de 6 em 6 horas, via oral, durante 3 semanas; ou
Tetraciclina – 250mg, de 6 em 6 horas, via oral, durante 3 semanas (somente
para maiores de 10 anos); ou Doxiciclina – 50mg, de 12 em 12 horas, via oral,
durante 3 semanas (somente para maiores de 10 anos); ou Sulfadiazina (Sulfa)
27
– 250mg, de 6 em 6 horas, via oral, durante 3 semanas .
As formas sequelares como entrópio e/ou de triquíase tracomatosa (TT)
devem ser encaminhados correção cirúrgica e casos de opacidade corneana
(CO) para avaliação sua acuidade visual através dos centros de referencia
oftalmológica 27.
O tratamento varia segundo a prevalência da enfermidade (Tabela 1). O
tratamento coletivo deve ser aplicado quando a prevalência de tracoma
inflamatório estiver igual ou acima de 10%, em crianças de 1 a 9 anos de idade
e quando a prevalência é menor que 10% é feito o tratamento individual e nos
comunicantes do caso29.
A OMS aprova e adota a Administração em massa de medicamentos
(MDA) em especial a azitromicina, como ferramenta da estratégia SAFE. No
entanto, para reduzirem a carga de C. trachomatis na comunidade e eliminar o
tracoma como causa de cegueira até 2020 através do MDA deve-se haver
planejamento até a sua execução, relatórios de acompanhamento dessa ação,
além de uma cadeia de abastecimento e distribuição do medicamento 1.
Deve-se realizar o seguimento aos 6 meses e 12 meses após o
27
tratamento de todos os casos de tracoma inflamatório (TF ou TI) .
29
O Ministério da Saúde recomenda que após a detecção, tratamento e
seguimento do caso por um período de 01 ano, sejam utilizados os seguintes
critérios para alta:

Alta clínica do caso ativo ocorre quando transcorridos 6


meses após o início do tratamento, quando não se
evidenciam sinais clínicos do tracoma inflamatório (TF/TI);
curado sem cicatrizes ocorre quando, após 12 meses de
início do tratamento, não se evidenciam sinais clínicos do
21

tracoma inflamatório – TF/TI , nem estão presentes as


formas cicatriciais do tracoma. O critério para
encerramento do caso é curado sem cicatrizes, situação
em que o caso sai do sistema de informação.

Tabela 1- Estratégias de tratamento do tracoma com Azitromicina preconizado


pelo Ministério da Saúde segundo a prevalência.

Prevalênciade crianças de 1 a 9 anos Tratamento com Azitromicina


com tracoma
≥10% de tracoma folicular (TF) Tratamento coletivo de toda a
comunidade por 03 anos seguidos.
5% e <10% de tracoma folicular (TF) Tratamento individual, domiciliar
ou coletivo*.
< 5% de Tracoma Folicular (TF) Tratamento individual ou
domiciliar.
Fonte: CGHDE/DEVEP/SVS (2014)
* Se a prevalência de TF estiver entre 5% e <10%, após três anos consecutivos
de tratamento coletivo, deve-se avaliar a estratégia adotada.

A OMS recomenda que distritos inteiros com prevalencia superior a 10%


em crianças de 1 a 9 anos de idade sejam tratados anualmente por três anos
com doses de azitromicina, pois quebraria a cadeia de transmissão da doença,
23
ja que em áreas hiperendemicas a reinfecção ocorre rapidamente .
Em 1997, a OMS fundou a Aliança para a Eliminação global de tracoma
até 2020 (GET 2020) em que ha uma perspectiva de eliminação do tracoma até
2020 usando a estratégia SAFE (Surgery – Antibiotics - Facial Cleanliness -
Environmental Improvement)(Figura 4) 30.
22

Figura 4- Estratégia SAFE (Surgery – Antibiotics - Facial Cleanliness -


Environmental Improvement).

Fonte: (FRANCIS; TURNER, 1993 reproduzido pela OMS31)

Para atingir a meta de eliminação, a prevalência de tracoma inflamatório


folicular (TF) seja < 5% em crianças de 1 a 9 anos de idade e casos de
triquíase tracomatosa (TT) menor que 1 caso/1.000 habitantes, no nível de
comunidades, em todo o país. Um conjunto de intervenções são estratégias
para redução da transmissão e sequelas da doença tracomatosa e alcançar a
meta de eliminação até 2020, que são: Surgery (cirurgia para correção de
triquíase), Antibiotics (antibióticos para tratamento), Facial Cleanliness (limpeza
das mãos e do rosto) e Environmental Improvement (melhoria ambiental) 30.
Acredita-se que a estratégia SAFE é capaz de eliminar rapidamente o
tracoma em regiões endêmica ou hiperendêmicas, já que em algumas regiões
do mundo , tem controlado sua prevalência, como o México, Marrocos e Gana
atráves desta estratégia32.
23

O Marrocos, um dos primeiros países a implementar SAFE em 1997 ,


a nível nacional, tornou-se o primeiro país a atingir os seus objetivos de
intervenção em 2006, onde diminuiu em 90% da ocorrência da infecção ativa
por tracoma nas crianças com menos de dez anos1.

3.6 Ações e vigilância epidemiológica

A fim de controlar ocorrência de novos casos, acompanhar focos antigos


e detectar novos focos, diagnósticos e tratamento de acordo com a
prevalência27, dentre as atividades desenvolvidas estão os inquéritos de
prevalência em escolares e inquéritos domiciliares para controle de
comunicantes, em municípios com localidades que apresentam características
29
epidemiológicas e estruturais favoráveis a presença da doença .
Anualmente os inquéritos epidemiológicos promovidos pelos estados
com apoio do MS a fim de investigação casos de tracoma ocorrem com
prioridade nos municípios com menores indicadores de qualidade de vida ou
antigas áreas endêmicas, onde são analisados em domicílios e instituições
educacionais e assistências desses municípios, já que nestes locais existem
29
maiores chances de ocorrência da doença .
O Ministério da Saúde recomenda que não haja necessidade de
isolamento de casos, uma vez que já houve exposição a C. trachomatis e
contágio, se houve, já ocorreu. Assim os casos devem receber o tratamento
adotado e frequentar a instituição. Daí a importância do trabalho permanente
nessas instituições, pois certamente, haverá casos no período de incubação e
que não serão detectados na visita inicial 27.

3.7 Epidemiologia do Tracoma no Mundo

A Coalizão Internacional para o Controle de Tracoma (ICTC) fornece um


resumo com dados, com base nos atlas tracoma (Figura 5), estimando-se que
110 milhões de as pessoas viviam em 2010 em áreas endêmicas confirmadas
24

e outro 219 milhões em suspeitas de áreas de endemia em até 59 países 9.


Há cerca de 65 milhões de pessoas vivendo em zona rural que estão
sob o risco de ficarem cegueira por tracoma e estimava-se que 2008 cerca de
9,8 milhões de crianças com sinais clínicos de tracoma ativo e 1,4 milhões de
adultos com triquíase tracomatosa 33.
O número de pessoas que vivem em zonas endêmicas de tracoma foi
estimado e reduzido de 320 milhõesem 2011 para 232 milhões em 2014
(Tabela 2) 34.
Regiões endêmicas incluem grandes áreas da África, o meio Leste,
sudoeste da Ásia, regiões da Índia, regiões de Sudoeste da Ásia e da China, e
25
pequenas regiões na América do Sul e Central . Na América Latina há relatos
de tracoma em Colômbia, Brasil e Guatemala. No entanto, o Brasil, Colômbia e
Guatemala e Índia são ainda excluídos devido à falta de uma base de
evidências nesses países 34.
Tracoma endêmico é geralmente encontrado em países
subdesenvolvidos (Figura 3), embora a Austrália tenha endemia de tracoma em
sua população aborígena. México e Marrocos, que eram endêmicas, têm
controlado com sucesso a doença10. Omã foi o primeiro país a validar a
34
eliminação do tracoma no país em 2012 .

Figura 5 - Distribuição do Tracoma em todo o mundo, 2010.


25

Fonte dos dados: Organização Mundial de Saúde

Estudo realizado na Etiópia nos anos de 2005 a 2006 sugeriu ser este o
país que apresenta a maior ocorrência de tracoma ativo em todo o mundo, com
prevalência de 40,1% em crianças de 1 a 9 anos de idade, a triquíase é
encontrada em até 19% dos adultos35.
Cerca de metade do tracoma ativo no mundo está concentrado em cinco
países (Etiópia, Guiné, Índia, Nigéria e Sudão) e o da triquíase em quatro
países (China, Etiópia, Nigéria e Sudão). Assim, a África é o continente mais
afetado, onde cerca de 27,8 milhões de casos de tracoma ativo (68,5% do total
global) e 3,8 milhões de casos de triquíase (46,6% do total) ocorrem em 28 de
46 países da Região Africana 35.

Tabela 2 - Estimativas globais da população residentes em áreas endêmicas ,


o número de pessoas tratadas com antibióticos e número de cirurgias por
região da OMS, 2013.

Regiões População que vive Cirurgias Tratamentos


26

em áreasendêmica triquiase antibióticos


tracomatosa
África 177.571.840 204.023 5.3712.333
Américas 189.402 1.195 221.426
Sudeste da Ásia* 4.389.641 5.781 763.042
Mediterraeo 41.575.305 3.291 212.949
Oriental**
Pacifico 7.943.215 19.686 -
Ocidental***
Mundo 231.669.403 233.976 54.909. 750
- sem registro
* 11 países
** 22 países
*** 27 países

Fonte: Adaptado WHO34, 2014.

Em algumas áreas, a infecção está a desaparecer, mesmo na


36
ausência de um programa de tratamento dedicado . A infecção pode estar
indo embora por causa da distribuição em massa de antibióticos, higiene
melhorada ou mudanças seculares. Independentemente do mecanismo, as os
programas de saúde precisam avaliar se seus programas são um sucesso ou
fracasso 37.
Uma multiplicidade de fatores socioeconômicos relacionam-se à
38
epidemiologia da infecção tracomatosa . Poucas doenças apresentam tal
grau de correlação com as condições de vida como o tracoma. Assim em uma
mesma população, com mesmo perfil social e grau de desenvolvimento
econômico diferente, podem apresentar prevalência de tracoma diferente,
relacionando a atividade da doença ao estágio de desenvolvimento da
comunidade 39.
Segundo Ramash16, em uma revisão sistemática em que revisou
estudos observacionais que quantificaram uma associação entre fatores
climáticos e tracoma, evidenciou que a doença é normalmente encontrada em
regiõesáridas, de clima quente e poeirenta .
27

3.8 Tracoma no Brasil

O Tracoma chegou ao Brasil por três vertentes: região do Cariri (Ceará),


São Paulo e Rio Grande do Sul (Figura 6) introduzido no Brasil a partir do
século XVIII, no Nordeste, com a deportação dos ciganos europeus
constituindo primeiros "focos" de Tracoma no país, com a expansão da
fronteira agrícola em direção ao oeste, o Tracoma foi disseminando-se e
tornou-se endêmico em praticamente todo o Brasil, sendo encontrado hoje em
todo o território nacional 40.
As primeiras medidas de controle do Tracoma adotadas no Brasil
iniciadas pelo Governo do Estado de São Paulo no início do século XX, onde
em 1904 proibiu a entrada de imigrantes com Tracoma no Porto de Santos. No
entanto o insucesso desta medida deveu-se à pressão dos fazendeiros de café,
que necessitavam da mão de obra imigrante. Desta forma, a proibição foi
substituída por uma multa para o dono do navio que trouxesse imigrantes com
Tracoma. Em 1906, São Paulo promoveu primeira "Campanha contra o
Tracoma" realizada no país, e em 1914 instalou os primeiros serviços
40
especializados em Tracoma, os "Postos Antitracomatosos" .

Figura 6 - Principais Focos de Tracoma no Brasil e suas Linhas de Dispersão.


28

Fonte: Ministério da Saúde/SUCAM

Em nível nacional, a primeira medida de controle do Tracoma foi tomada


em 1923, com do "Regulamento do Departamento Nacional de Saúde Pública",
que proibia o desembarque de imigrantes com Tracoma, medida esta que,
naquele momento, já era totalmente inócua, já que o mesmo encontrava-se
amplamente disseminado no país, e não mais dependia da imigração para sua
manutenção 40.
A partir de 1938, o Estado de São Paulo implantou uma rede de serviços
especializados em tracoma, os "Dispensários do Tracoma" com mais de 200
unidades, cobrindo quase a totalidade do Estado, e foi extinta em 1969 foi
considerado erradicado no Estado de São Paulo. No ano de 1978, embora o
Sistema de Vigilância Epidemiológica no Estado de São Paulo tenha incluído o
tracoma como doença de notificação compulsória, o que levou ao
aparecimento de casos nos anos 80 3.
29

Em 1943 foi realizada a "Campanha Federal Contra o Tracoma", por


iniciativa do Departamento Nacional de Saúde Pública que foi incorporada ao
"Departamento Nacional de Endemias Rurais – (DENERu)", quando da sua
criação em 1956, e posteriormente à Superintendência Nacional de
Campanhas de Saúde Pública (SUCAM), criada em 1970. Em 1990, as
atividades de controle do tracoma passaram a fazer parte das atribuições da
Fundação Nacional de Saúde – FNS 40.
O Programa do Tracoma do Ministério da Saúde, desenvolvido em nível
federal, sofreu uma desestruturação progressiva após a década de 70, com
diminuição crescente de recursos humanos e financeiros. Entretanto, um
inquérito nacional realizado para avaliar a situação do agravo no país, ocorreu
no período de 1974 a 1976, detectou prevalências estaduais de até 26%. No
período de 1980 a 1995, registros demonstram prevalências de 24% a 44% de
tracoma no Brasil. Na década de 90, dados epidemiológicos oficiais do
Ministério da Saúde revelara que as atividades de vigilância epidemiológica e
de controle do tracoma se restringiam a menos de dez estados da federação,
com diminuição do quantitativo de municípios investigados 3.
No período de 2002 a 2007, o Ministério da Saúde realizou um inquérito
de prevalência de tracoma em escolares para conhecer a distribuição e a
ocorrência da endemia no país (Figura 7). O estudo foi desenvolvido por
amostragem em municípios com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
– IDH-M menor que a média nacional, em todos os estados do país 20.

Figura 7 - Distribuição geográfica do percentual de percentual do tracoma.


Inquérito de tracoma em escolares. Brasil, 2002-2007.
30

Fonte: SVS/MS.

Neste inquérito, foram examinados 166.138 escolares, de 1.514


municípios, com 8.420 casos positivos, com uma prevalência média de 4,9%.
Dos 1.514 municípios amostrados, foram encontradas prevalências acima de
5% em escolares de 569 municípios (38% dos municípios amostrados) em
todas as regiões do país 28.
No período de 2007 a 2013 foram examinados uma média de 332.699
pessoas/ano com e 14.288 casos/ano, o que corresponde a um percentual de
positividade médio de 4,3% 41.

4 OBJETIVOS
31

4.1 Objetivo geral

 Descrever a situação epidemiológica do tracoma no Piauí a partir de


inquéritos em estudantes da rede pública realizados de 2007 - 2013.

4.2 Objetivos específicos

 Estimar percentual do tracoma em escolares e sua distribuição nos


municípios.
 Verificar a distribuição do tracoma quanto o sexo, zona de domicilio e
formas clínicas.

5 MÉTODOS

5.1 Tipo, local e período da pesquisa


32

Trata-se de um estudo descritivo realizado por meio de dados


secundários de acesso restrito dos casos de Tracoma diagnosticados em
inquéritos epidemiológicos em escolares no estado do Piauí de 2007 até 2013.
O Piauí é um dos 9 estados da Região Nordeste, com 224 municípios e
população total estimada de 3.140.213 habitantes destes 1.067.401 residentes
na zona rural. O estado apresenta um IDH médio (0,646) e com uma população
de escolares de 520.407 com idade entre 5 e 9 anos. A renda per capita média
cresceu 149,61% nas últimas duas décadas, passando de R$ 167,03, em
1991, para R$ 254,78, em 2000, e para R$ 416,93, em 2010 42.

5.2 Fontes de dados e critérios de inclusão/exclusão

O Tracoma ainda não é doença de notificação compulsória nacional,


sendo de notificação obrigatória apenas em alguns estados, como São Paulo,
Minas Gerais, Ceará e Pernambuco, ocorrendo à notificação no Sistema
Nacional de Agravos de Notificação (SINAN) como agregado de casos quando
em inquéritos realizados de Tracoma.
A partir do ano de 2007, o inquérito no Piauí ocorreu nos municípios
prioritários para Tracoma, de acordo com Coordenação de Vigilância em Saúde
Ambiental, foram os municípios que apresentaram percentual acima de 5%
durante o Inquérito Nacional de Tracoma realizado em 2004 no estado e IDH
baixo da média nacional, assim, participaram do Inquérito Nacional, 97
municípios dos 224 existentes, onde 36 municípios apresentaram percentuais
acima de 5%.
Assim, nos anos subsequentes a 2007 foi repetida a busca
nosmunicípios prioritários e inclusão de municípios vizinhos a aqueles que
mantinham percentual inferior a 5%, desde que apresentassem IDH abaixo da
media nacional. Portanto entre o período observado foram investigados 97
municípios durante todo o período analisado.
A investigação epidemiológica do Tracoma no Piauí foi realizada através
da busca ativa de escolares nas instituições educacionais públicas dos
33

municípios escolhidos, onde era realizado o exame oftalmológico e casos


positivos eram imediatamente notificados.
Os alunos examinados e os casos de tracoma detectados foram
registrados em formulários próprios (Anexo 1) e tratados conforme normas do
Ministério da Saúde (Tabela 1).
Segundo a Coordenação de Vigilância em Saúde Ambiental do Piauí, os
escolares participantes dos inquéritos estaduais de Tracoma de 2007 a 2013
foram alunos do 1° ao 5° ano respectivamente, de escolas da rede pública de
municípios com IDH-M abaixo da média nacional. No entanto, todos os alunos
de uma escola eram examinados incluindo alunos de outras séries quando
encontrados mais três casos da forma ativa na mesma sala de aula.
Todos os 92 municípios participantes dos inquéritos no Piauí possuem
IDH abaixo da média nacional que é de 0, 727. (Tabela 3)42.

Tabela 3- Faixas de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)

Muito Alto 0,800 - 1,000


Alto 0,700 - 0,799
Médio 0,600 - 0,699
Baixo 0,500 - 0,599
Muito Baixo 0,000 - 0,499

Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, (2010).

A vigilância epidemiológica do tracoma no Piauí utiliza-se de planilhas


eletrônicas das coletas de dados realizadas nos municípios piauienses e
enviadas a cada 6 meses à gerência técnica do tracoma na Coordenação Geral
de Hanseníase e Doenças em Eliminação – CGHDE na Secretaria de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.
As planilhas com as informações dos casos de tracoma nos anos de
2007 a 2013 foram formalmente solicitadas à Coordenação de Vigilância
em Saúde Ambiental mediante assinatura de termo de responsabilidade e
confidencialidade dos dados, utilizando somente das informações necessárias
ao estudo (idade, sexo, zona de domicilio e forma clínica da doença).
Nas planilhas fornecidas não versava dados sobre os comunicantes
34

familiares e seus seguimentos, somente de casos em escolares.

5.3 Organização e análise dos dados

Foi elaborado um banco de dados para a inclusão dos itens, que


compõem cada instrumento de coleta de dados, o que permitirá a emissão de
relatórios segundo as variáveis de interesse, sendo estas processadas e
analisadas com utilização da estatística descritiva.
Adotou-se o intervalo de confiança de 95% para indicar a confiabilidade
de uma estimativa, assim o intervalo estimado tem uma dada probabilidade de
ocorrer.
Os dados coletados foram tabulados, dispostos em tabelas ilustrativas
Utilizou-se o sistema Excel for Windows para o armazenamento das
informações, bem como o programa R, versão 3.0, para a análise estatística e
criação de gráficos, além do programa TabWin para criação de mapas.

5.5 Aspectos éticos

O projeto foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da


ENSP/Fiocruz sob o número CAAE: 37446214.1.0000.5240 e aprovado
conforme Parecer nº 1.007.613 09/03/2015

6 RESULTADOS
35

Com base de dados agregados, em planilhas (dados brutos dos boletins


de inquérito), o percentual (%) de tracoma no Piauí, considerando uma amostra
de 23.835 escolares examinados nos inquéritos foi de 2,0%%, ou seja, 478
casos em escolares (Tabela 4).

Tabela 4 - Número de examinados, casos e percentual de tracoma notificados


em inquéritos em escolares no período de 2007- 2013 97 municípios do Piauí,
Brasil, com IDH abaixo da média nacional.

Ano Examinados Casos (%) IC (95%)


2007 2433 85 3,4 2,68 - 4,12
2008 4790 168 3,5 2,97 - 4,02
2009 4237 69 1,6 1,22 - 1,97
2010 1875 45 2,4 1,70 - 3,10
2011 3170 91 2,8 2,22 - 3,37
2012 3535 90 2,5 2,49 - 3,01
2013 3795 94 2,5 2,00 - 2,99
TOTAL 23835 642 2,6 2,39 - 2,80

Foi observado que não ouve predominância de sexo, sendo que 50,4%
dos casos eram do sexo feminino. Já faixa etária mais acometida de 5 e 9 anos
de idade (87,2%) e 12,8% entre 10 e 14 anos de idade. Em relação à zona de
moradia 31,7% dos casos foi diagnosticado em zona urbana e 68,3% em zona
rural (Tabela 5).

Tabela 5 - Características dos casos confirmados de tracoma no Piauí de 2007


a 2013.
36

CARACTERÍTICAS n %
Zona
Urbana 151 31,7
Rural 327 68,3
Sexo
Masculino 237 49,6
Feminino 250 50,4
Faixa etária

5 a 9 anos 417 87,2


10 a 14 anos 61 12,8

Quase todas as formas clínicas de tracoma foram detectadas nos


inquéritos, em que houve percentual maior das formas mais brandas da
doença, o tracoma inflamatório folicular (TF) com maior numero de casos
detectados (71,21), seguida da forma tracoma inflamatório intenso (TI) com
percentual de 27,70%. Não foram encontrados casos da forma mais grave da
doença que é a opacidade corneana (Tabela 6).

Tabela 6 - Formas clínicas detectadas de acordo com a idade no Piauí de 2007


a 2013.
Tracoma Tracoma Tracoma Opacidade TOTAL
Inflamatório Inflamatório Cicatricial Corneana
Folicular Intenso

5a9 302 115 0 0 417


anos
10 a 14 60 1 0 0 61
anos
TOTAL 362 116 7 0 478
% 71,21 27,70 1,09 0,00 100

De 2007 a 2013, 92 municípios foram investigados em inquéritos de


Tracoma em escolares, onde 14 municípios concentraram maior parte dos
37

casos, juntos totalizando 492 casos (76%) dos 642 diagnosticados no período
(Tabela 7).

Tabela 7 – Municípios com maiores percentuais de tracoma diagnosticados


em inquéritos em escolares 2007 a 2013.
MUNICÍPIOS CASOS (%)
Uruçuí 97 15,1
Monte Alegre do Piauí 70 10,9
Curimatá 46 7,1
Santa Filomena 35 5,4
Sebastião Leal 35 5,4
Guaribas 33 5,2
Baixa Grande do Ribeiro 32 5,0
Ribeiro Gonçalves 29 4,5
Currais 26 4,0
Altos 25 3,8
Bertolínia 17 2,6
Santa Luz 17 2,6
Guadalupe 15 2,3
Porto 15 2,3

As proporções variaram de 0 até 15,1%, onde sete municípios


apresentaram percentual igual ou maior que 5% (Altos, Curimatá, Guaribas,
Monte Alegre do Piauí, Uruçuí, Santa Filomena e Sebastião Leal ).
O mapa (Figura 8) mostra a distribuição do tracoma no Piauí, onde se
verificou a evidencia de maior percentual em municípios localizados na região
sul do Piauí, com percentual acima de 5%.
38

Figura 8 – Municípios investigados em inquéritos de Tracoma em escolares no


Piauí de 2007 a 2013.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Foi realizada análise de correlação de Pearson dos 14 municípios com


maiores proporções de tracoma (Tabela 8) onde se observou fraca e positiva
associação entre a percentual do tracoma e o Índice de Desenvolvimento
Humano dos municípios piauienses com base no ano 2010. Entretanto, o
tracoma é uma doença que depende de fatores relacionados ao Índice de
Desenvolvimento Humano, uma vez que a suscetibilidade ao tracoma ocorre
com maior frequência onde há falta de água e as condições sanitárias são
inadequadas 15.
O IDHM do Piauí é 0, 646, em 2010, o que situa essa Unidade
39

Federativa (UF) na faixa de Desenvolvimento Humano Médio (IDHM entre


0,600 e 0,699). A dimensão que mais contribui para o IDHM da UF é
Longevidade, com índice de 0,777, seguida de Renda, com índice de 0,635, e
de Educação, com índice de 0,547 16.

Tabela 8- Associação do percentual do tracoma (2007 - 2013) com Índice de


Desenvolvimento Humano dos municípios no ano de 2010.

Municípios Percentual (%) IDH-M


Uruçuí 15,1 0,631
Monte Alegre do Piauí 10,9 0,578
Curimatá 7,1 0,607
Santa Filomena 5,4 0,544
Sebastião Leal 5,4 0,562
Guaribas 5,2 0,508
Baixa Grande do Ribeiro 5,0 0,564
Ribeiro Gonçalves 4,5 0,601
Currais 4,0 0,542
Altos 3,8 0,614
Bertolínia 2,6 0,612
Santa Luz 2,6 0,588
Guadalupe 2,3 0,650
Porto 2,3 0,549

r de Pearsona 0, 160442

aCorrelação com a prevalência (r)

De acordo com as faixas de desenvolvimento humano de 2010 (tabela 2)


para classificação dos municípios piauienses segundo o IDH-M, foram
considerados municípios como: alto (2; 0,9%) médio (40; 17,9%); baixo (176;
78,5%) e muito baixo (6; 2,7%).
Comparando o IDH - M dos 92 municípios participantes dos inquéritos
com o IDH - M dos municípios que não participaram dos inquéritos (Figura 9),
40

observou-se que a mediana doIDH-M dos não participantes dos inquéritos, foi
de 0, 580 mostrando-se mais alta que o IDHM dos 92 municípios participantes,
de 0, 544.
O máximo IDH-M não outlier2 admitido nos municípios não participantes
e participantes, respectivamente, foi de 0,661 e 0,601, como também o IDH-M
mínimo não outlier, foi de 0,550 e 0,485.

Figura 9 - Mediana do IDH-M dos municípios participantes e não participantes


dos inquéritos de tracoma no Piauí de 2007 a 2013.

7 DISCUSSÃO

2
Em estatística, outlier, valor aberrante ou valor atípico, é uma observação que apresenta um
grande afastamento das demais da série.
41

Considerando os dados apresentados e a gravidade da situação em


alguns municípios, deve ser considerada a possibilidade de capilaridade da
informação para além da apresentação do estudo finalizado à Coordenação de
Vigilância em Saúde Ambiental do Piauí.
É importante, propor medidas avaliativas das ações de controle e
tratamento implementadas nos municípios com percentual acima de 5%, já que
esta frequência mantem-se em níveis elevados ao longo do tempo.
A investigação epidemiológica no Piauí ocorreu prioritariamente nas
instituições educacionais dos municípios com menores indicadores de
qualidade de vida e áreas hiperendêmicas de acordo com Inquérito Nacional de
Tracoma realizado em 2004 no estado, que constituem locais onde existe
maior probabilidade de ocorrência da doença, desde que haja confirmação da
existência de um ou vários casos numa comunidade.
De acordo com o Inquérito Nacional de Tracoma de prevalência em
escolares, realizado em 2004, o Piauí revelou uma prevalência de tracoma de
4,4%, com variações municipais entre zero e 33,0%. Nesse inquérito, foram
encontradas prevalências acima de 10% nos municípios de Porto, São Pedro
do Piauí, Guadalupe, Valença do Piauí, Manoel Emídio, Guaribas, Pau D’Arco
do Piauí, Santa Luz, Monte Alegre do Piauí, Sebastião Leal, Baixa Grande do
Ribeiro, Uruçuí e Santa Filomena21.
Dados do Inquérito de prevalência do Tracoma em escolares no Brasil
realizado nos anos de 2002 a 2007 observou uma prevalência nacional de
4,9%, Nordeste (4,9%) e no Piauí (4,49%) 41.
No estudo em questão, o Piauí apresentou baixo percentual (2,6%),
havendo um declínio ao longo do período analisado, sendo que para uma
doença que está associada a fatores relacionados ao IDH pode ser reflexo de
melhoria das condições de saúde e acesso a estes serviços. Assim, embora a
suscetibilidade seja geral, ocorre com maior frequência onde há falta de água e
precárias condições sanitárias.
A presença de alta e média prevalência em municípios do estado
reforçam a necessidade de implementação e fortalecimento das ações de
vigilância epidemiológica e controle de tracoma com o objetivo de eliminar a
doença como causa de cegueira. Tais ações visam o alcance das metas de
prevalência de tracoma ativo menor que 5% e prevalência de triquíase
42

tracomatosa menor que um por 1.000 habitantes em todos os territórios e


comunidades dos municípios do estado 19.
Os municípios avaliados apresentaram percentual suficientemente alto
para manutenção do risco de evolução para formas cicatriciais, caso medidas
de monitoramento e vigilância do tracoma não sejam implementadas, em
conjunto com ações intersetoriais de promoção à saúde e melhorias das
condições socioeconômicas e de educação da população. Houve percentual
acima de 10% em dois municípios (Uruçuí e Monte Alegre do Piauí).
O percentual, no entanto, pode ter sido influenciado por fatores
envolvidos na seleção das comunidades. Portanto, epidemiologicamente, deve-
se realizar um rigoroso inquérito com escolares a partir de uma
amostragemprobabilística, ou seja, qualquer indivíduo da população de
interesse tem uma chance de ser escolhido para a amostra, e qualquer
indivíduo selecionado é escolhido de forma completamente aleatória.
A amostragem probabilística viabiliza a validade do estudo, onde a
precisão em estimar a prevalência do Tracoma em escolares depende do
tamanho da amostra. Somente assim, poderia fornecer uma base melhor para
fazer inferências a nivel estadual.
Em relação à zona de moradia 31,7% dos casos foi diagnosticado em
zona urbana e 68,3% em zona rural.
Em um estudo recente realizado com escolares na Etiópia, encontrou-se
uma prevalência maior de casos de tracoma ativo em crianças residentes da
43
zona rural do que as de zona urbana .
Sabidamente, a infecção tracomatosa está relacionada a fatores
socioeconômicos e precárias condições de vida. O tracoma afeta as pessoas
pobres que vivem em áreas rurais, onde o acesso à água e às condições
sanitárias são limitadas12.
Maior prevalência de tracoma ativo na zona rural pode ser explicada
pela falta ou precariedade de acesso aos serviços de saúde, rede de
abastecimento de água e saneamento básico. De acordo com o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 34,2 % da população piauiense é
residente na zona rural, 26% das residências não possuem água encanada,
40% não dispõem de rede de esgoto e 50% não contam com coleta de lixo E
58,13% da população é vulverável a pobreza 42.
43

Calcula-se que 18,77 % dos residentes no Piauí são extremamente


pobres, 34,11% pobres com Índice de Gini3 (0, 61) 42.
No entanto, vale salientar que o processo de urbanização acelerado nos
últimos anos provoca um crescimento no entorno de grandes centros, com o
surgimento acentuado de periferias, onde o acesso à rede de água e esgoto
seja precário requerendo o desenvolvimento de estudos epidemiológicos
nestes locais que abranjam as exclusões e as diferenças de acesso aos
serviços de saúde, já que o tracoma continua a ocorrer nas populações mais
empobrecidas.
A forma clínica mais encontrada foi a mais branda da doença (tracoma
folicular). Já as lesões cicatriciais e seqüelas foram expressivamente menores,
o que justifica que essas complicações são mais freqüentes e diretamente
relacionadas a áreas com altas prevalências e surgimento de complicações
visuais pode ocorrem em crianças que vivem em regiões com alta prevalência
da infecção.
O Piauí possui 1.059.073 (26, 83%) pessoas com idade menor 15 anos.
Na UF, a proporção de crianças de 5 a 6 anos na escola era de 95,24%, em
2010. No mesmo ano, a proporção de crianças de 11 a 13 anos frequentando
os anos finais do ensino fundamental era de 80,08%; a proporção de jovens de
42
15 a 17 anos com ensino fundamental completo era de 45,23% .
A faixa etária de 5 a 9 anos foi a mais acometida pela infecção
tracomatosa na forma ativa. Bayleyet al44afirma que as crianças têm mais
infecções e infecções mais prolongada do que os adultos jovens, e as
infecções ativas mais freqüentes ocorrem em crianças menores de 10 anos.
Não houve diferença em relação à distribuição dos casos por sexo, o
que é consistente com os dados relatados em estudos brasileiros com
população escolar.
A distribuição da doença por sexo nos escolares foi muito pequena,
sendo um pouco maior no sexo feminino (50,4%) afirmando que não existe
3
É um instrumento usado para mediro grau de concentração de renda.
Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos
mais ricos. Numericamente, varia de 0 a 1, sendo que 0 representa a situação de total
igualdade, ou seja,todos têm a mesma renda, e o valor 1 significa completa desigualdadede

renda, ou seja, se uma só pessoa detém toda a renda do lugar.


44

diferença de suscetibilidade ao tracoma entre os sexos nas crianças menores


de 10 anos.
Provavelmente essa diferença pode ser atribuída a maior exposição das
mulheres ao agente etiológico, pois em geral as mulheres cuidam das crianças
menores, principal reservatório da C. trachomatis 45.
As mulheres gastam mais tempo com as crianças do que homens, já
que crianças pequenas são os reservatórios infecção de tracoma, o contato
com eles pode resultar em maior frequencia de infecção. Este exposição
específica de gênero a fatores de risco de tracoma coloca as mulheres em uma
maior risco de inefecção tracomatosa e subsequente cegueira. Emborahomens
e mulheres poossam desenvolver triquíase , as probabilidades de triquíase são
maiores entre as mulheres do que os homens 1.
Por outro lado, é recomendável estabelecer como rotina da rede básica
de serviços, o tratamento dos casos com evidência clínica de tracoma ativo,
assim como de seus familiares e contatos domiciliares.
Apesar de não ser uma doença de notificação compulsória, é
recomendável que o mesmo seja elencando nos agravos de notificação
compulsória a nível estadual, além fazer registros sistemáticos dos casos
detectados e tratados, de forma a proporcionar informações sobre a situação
epidemiológica do agravo na região, permitindo avaliar tanto a sua evolução
como o impacto das ações de controle desenvolvidas, não se detendo somente
a notificações realizadas durante os inquéritos.
Embora os percentuais no Estado por ano tenham sido baixos e os
casos fossem da forma branda da doença, caso estes não fossem
adequadamente diagnosticados e tratados, o contágio poderia elevar a
prevalência ou poderiam os casos evoluir para a forma cicatricial, com lesões
incapacitantes. Assim, a existência de crianças com formas de infecção ativa,
mesmo com baixa prevalência, constitui fonte de infecção e possibilita a
manutenção da cadeia de transmissão do tracoma 20.
Ações como capacitações com palestras, a professores (uma vez que os
dados serão obtidos através de levantamentos de escolares), agentes e
demais profissionais de saúde, campanhas de esclarecimento especialmente a
profissionais de saúde e a população são medidas que levarão retorno à
população estudada e devem ser consideradas como um produto de elevada
45

importância do estudo em questão.


Promover parcerias com o Programa de Saúde Escolar (PSE) nos
estados e municípios deve ser estimulado para o desenvolvimento de
atividades de educação em saúde com o objetivo de integrar esforços na
promoção de melhorias na higiene facial e nas condições de saúde da
população escolar.
No entanto, a abordagem da população, quanto aos aspectos
relacionados à higiene, deverá ser tratada com cautela de forma em que não
ocorram entendimentos distorcidos quanto à transmissão da doença ou
discriminação dos casos quanto aos maus hábitos de higiene.
Talvez o maior desafio nos programas de controle e erradicação do
Tracoma consista na prioridade baixa do Tracoma nas ações de saúde, aliado
a insuficiência da estrutura de programa voltado a esta endemia e a total falta
de recursos e pessoal devidamente treinado.
Assim, investimentos em saneamento básico com acesso aos serviços
de água e esgotamento sanitário bem como o compromisso dos gestores é
fundamental para prevenção de doenças na população, onde saúde é
resultado das condições de vida. Não adiantando apenas realizar medidas de
detecção e tratamento, é imprescindível adotar medidas de prevenção para
que não ocorram ou tenham menores incidências.
O tracoma não é uma doença detectada na rotina dos serviços de saúde
do SUS, por tal motivo, os estados apoiados pelo Ministério da Saúde ficam
incumbidos de organizar inquéritos para busca ativa de novos casos e focos da
infecção, controle da prevalência e notificação das atividades desenvolvidas
(DANTAS, 2013)
8 CONCLUSÃO

Através desse estudo pode-se compreender a situação de percentual de


tracoma em escolares no Piauí, onde se apresentou de uma forma branda e
com baixo percentual, apesar do índice de desenvolvimento humano de grande
parte do estado ser considerado baixo.
São necessárias medidas de prevenção e controle para impedir o
aumento dos percentuais do tracoma ou a possibilidade de evolução dos casos
46

ativos para as formas sequelares.


É recomendável capacitar profissionais da área para detecção do
tracoma e monitoramento de sua situação epidemiológica, além de implantar
atividades de educação em saúde.
Concluiu-se, portanto, que é necessário a realização de outros estudos
em regiões semelhantes aos do inquérito e que ainda não foram avaliadas no
estado em busca de novos e possíveis focos da doença.

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ANEXOS
52

ANEXO I- Ficha 1 – Inquérito/Busca ativa

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